memorias operacao rodin

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BRUNO MENEZES ADVOCACIA CRIMINAL WWW.BMMC.ADV.BR AVENIDA NOSSA SENHORA DAS DORES, 424 - SALA 102 BAIRRO DORES - CEP 97050-530 - SANTA MARIA - RS FONE: [+55] 55 3025 7904 AVENIDA CARLOS GOMES, 222 - ANDAR BAIRRO AUXILIADORA - CEP 90480-000 PORTO ALEGRE - RS FONE: [+55] 55 3378 1123 1 Excelentíssimo Senhor Juiz Federal da 1ª Vara Federal Subseção Judiciária de Santa Maria Processo nº. 2007. 71.02.007872-8 SUMÁRIO: I. BREVE RESUMO DOS FATOS ; II. DAS PRELIMINARES; II.1 INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL; II.2 PROCESSO INICIADO POR DENÚNCIA ANÔNIMA; II.3 ILICITUDE DA PROVA: COMPARTILHAMENTO DE DADOS (MPF-RFB); II.4 ILICITUDE DA PROVA: FORMAÇÃO DOS 44 MILHÕES (MPC-TCE); II.5 DA CISÃO PROCESSUAL FEITA PELO JUÍZO DE GRAU - USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAL DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL; II.6 CERCEAMENTO DE DEFESA: INDEFERIMENTO DE PERÍCIA; II.7 CERCEAMENTO DE DEFESA: DELAÇÃO PREMIADA; III. DO MÉRITO; III.1 FORMAÇÃO DE QUADRILHA OU BANDO; ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA E OUTRAS ADJETIVAÇÕES TANTO PEJORATIVAS COMO DESCABIDAS: NECESSÁRIO REALINHAMENTO DOS FATOS; III.2 DA DESNECESSIDADE DE LICITAÇÃO; III.3 LOCUPLETAMENTO EM INDEVIDA DISPENSA DE LICITAÇÃO X PECULATO; III.4 O CRIME DE CORRUPÇÃO ATIVA E SEU EXAURIMENTO; III.5 DA INOCORRÊNCIA DE CRIMES DE CORRUPÇÃO ATIVA; III.6 DO SUPERFATURAMENTO DOS SERVIÇOS; III.7 DA FALSIDADE IDEOLÓGICA; III.8 DA AGRAVANTE DO ARTIGO 62, INCISO I DO CÓDIGO PENAL; III.9 DO ACUSADO FERDINANDO FRANCISCO FERNANDES; III.10 DO ACUSADO FERNANDO FERNANDES; III.11 DA ACUSADA LENIR BEATRIZ DA LUZ FERNANDES; IV. DOS REQUERIMENTOS FINAIS JOSÉ ANTÔNIO FERNANDES, FERDINANDO FRANCISCO FERNANDES, FERNANDO FERNANDES e LENIR BEATRIZ DA LUZ FERNANDES, todos qualificados, nos autos do processo criminal acima numerado, vêm a V. Exa., na forma e no prazo do artigo 403, §3º do Código de Processo Penal, apresentar MEMORIAIS , forte na fundamentação que segue:

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Excelentíssimo Senhor Juiz Federal da 1ª Vara Federal Subseção Judiciária de Santa Maria Processo nº. 2007. 71.02.007872-8

SUMÁRIO: I. BREVE RESUMO DOS FATOS ; II. DAS PRELIMINARES; II.1 INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL; II.2 PROCESSO INICIADO POR DENÚNCIA ANÔNIMA; II.3 ILICITUDE DA PROVA: COMPARTILHAMENTO DE DADOS (MPF-RFB); II.4 ILICITUDE DA PROVA: FORMAÇÃO DOS 44 MILHÕES (MPC-TCE); II.5 DA CISÃO PROCESSUAL FEITA PELO JUÍZO DE 1º GRAU - USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAL DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL; II.6 CERCEAMENTO DE DEFESA: INDEFERIMENTO DE PERÍCIA; II.7 CERCEAMENTO DE DEFESA: DELAÇÃO PREMIADA; III. DO MÉRITO; III.1 FORMAÇÃO DE QUADRILHA OU BANDO; ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA E OUTRAS ADJETIVAÇÕES TANTO PEJORATIVAS COMO DESCABIDAS: NECESSÁRIO REALINHAMENTO DOS FATOS; III.2 DA DESNECESSIDADE DE LICITAÇÃO; III.3 LOCUPLETAMENTO EM INDEVIDA DISPENSA DE LICITAÇÃO X PECULATO; III.4 O CRIME DE CORRUPÇÃO ATIVA E SEU EXAURIMENTO; III.5 DA INOCORRÊNCIA DE CRIMES DE CORRUPÇÃO ATIVA; III.6 DO SUPERFATURAMENTO DOS SERVIÇOS; III.7 DA FALSIDADE IDEOLÓGICA; III.8 DA AGRAVANTE DO ARTIGO 62, INCISO I DO CÓDIGO PENAL; III.9 DO ACUSADO FERDINANDO FRANCISCO FERNANDES; III.10 DO ACUSADO FERNANDO FERNANDES; III.11 DA ACUSADA LENIR BEATRIZ DA LUZ FERNANDES; IV. DOS REQUERIMENTOS FINAIS

JOSÉ ANTÔNIO FERNANDES, FERDINANDO FRANCISCO FERNANDES, FERNANDO FERNANDES e LENIR BEATRIZ DA LUZ FERNANDES, todos qualificados, nos autos do processo criminal acima numerado, vêm a V. Exa., na forma e no prazo do artigo 403, §3º do Código de Processo Penal, apresentar MEMORIAIS , forte na fundamentação que segue:

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I. BREVE RESUMO DOS FATOS Os acusados foram denunciados pelo Ministério Público Federal, juntamente com mais quarenta pessoas, nos autos da ação penal nº. 2007.71.02.007872-8/RS, que ficou conhecida como Operação Rodin. Na manhã do dia 6 de novembro de 2007, a Polícia Federal,

com autorização da então 3a. Vara Federal, hoje 1a. Vara Federal, da Subseção Judiciária de Santa Maria, deflagrou a “fase ostensiva” da investigação, promovendo buscas e apreensões a residências e escritórios, além de prisões temporárias de vários investigados. Tudo porque, segundo as investigações, os acusados teriam participado de desvio de recursos públicos no valor aproximado de R$ 44 milhões, conforme descrição da denúncia:

Ou seja, a contratação da FATEC ocorreu de forma simultânea à contratação das sistemistas, tudo de forma a garantir que a dispensa indevida de licitação produzisse o fim colimado pelos integrantes da quadrilha, qual seja, o desvio dos recursos públicos na ordem de R$ 44.000.000,00 (quarenta e quatro milhões de reais), em favor dos membros do bando.

Os réus foram citados; o feito foi regularmente instruído; e o Ministério Público Federal apresentou suas derradeiras considerações. Esses, os fatos, em sua máxima brevidade. II. DAS PRELIMINARES

II.1 INCOMPETÊNCIA DA JUSTIÇA FEDERAL

Não se pode começar o exame da matéria em questão sem antes examinar, ainda que superficialmente, o papel das fundações no direito brasileiro. O Código Civil contempla sua existência a partir do artigo 44, e a regulamenta a partir do artigo 62 e seguintes, de modo que se caracteriza pela atribuição de personalidade a determinado patrimônio para atender a fins religiosos, morais, culturais ou de assistência.

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Sua existência pressupõe um patrimônio, designado pelo seu instituidor, que recebe do ordenamento jurídico a determinação de agir em determinado fim específico. O Decreto-Lei nº. 200/67, que dispõe sobre a organização da Administração Pública, admite a possibilidade de uma fundação pública, desde que criada por autorização legislativa, e funcionamento custeado pela União e outra fontes. No texto legal:

Art. 5º Para os fins desta lei, considera-se: (...) IV - Fundação Pública - a entidade dotada de personalidade jurídica de direito privado, sem fins lucrativos, criada em virtude de autorização legislativa, para o desenvolvimento de atividades que não exijam execução por órgãos ou entidades de direito público, com autonomia administrativa, patrimônio próprio gerido pelos respectivos órgãos de direção, e funcionamento custeado por recursos da União e de outras fontes.

A partir da Lei nº. 8.958/94, com a regulamentação dada pelo Decreto 7.423/2010, passa-se a se admitir a existência de fundações de apoio a instituições de ensino superior, devidamente registradas no Ministério da Educação e da Ciência e Tecnologia, com o fim de "dar suporte a projetos de pesquisa, ensino e extensão e de desenvolvimento institucional, científico e tecnológico de interesse das instituições apoiadas e, primordialmente, ao desenvolvimento da inovação e da pesquisa científica e tecnológica, criando condições mais propícias a que as instituições apoiadas estabeleçam relações com o ambiente externo" (art. 1º, parágrafo único, Decreto nº. 7.423/2010). Mesmo com essa previsão de atuação gravitacional no entorno de instituições de ensino superior, e, com isso, ter toda a sua existência intrinsecamente ligada a elas, ainda assim as fundações de apoio têm mantida a sua natureza de pessoa jurídica de direito privado, nos moldes do que o Código Civil as concebeu. O que se permite concluir do exame do contrato social da FATEC é que não há qualquer informação de que tenha sido instituída com destacamento de patrimônio público, ou que seja subvencionada exclusivamente com recursos públicos, o que lhe caracterizaria como fundação pública. Pelo contrário. A sua natureza privada é evidenciada tanto pelo seu patrimônio que, a despeito de se encontrar na estrutura física da Universidade Federal de Santa

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Maria, é absolutamente privado, constituído com recursos próprios, além de ser mantida com seus contratos dentro da natureza de sua constituição social. A esse respeito, diz seu website1:

E tem, dentre seus objetivos, claramente definidos no artigo 2º, a promoção da integração Universidade-Empresa-Estado; a promoção de estudos, pesquisas e prestação de serviços para órgãos públicos e privados; a instituição de bolsas de estudo e de investigação científica para o aprimoramento de recursos humanos; a articulação com entidades públicas ou privadas, nacionais ou estrangeiras, visando a forma de colaboração, contratos ou convênios, para a execução de programas e atividades de formação e aperfeiçoamento; a capacitação e valorizaçào de recursos humanos vinculados ou de interesse do desenvolvimento tecnológico e da pesquisa dentro de seu programa de ação. Dito de outra forma, não há razão jurídica, seja pelo Código Civil, seja pela Lei nº. 8.958/94 para que a FATEC, como Fundação de Apoio de Instituição de Ensino Superior atraia a competência federal apenas e tão-somente em razão de sua natureza vinculada à Universidade Federal de Santa Maria. Convém lembrar, ainda, que, como Fundação, a FATEC está sujeita ao controle exercido pelo Ministério Público Estadual, que dispõe, em Santa Maria, de uma promotoria própria para as fundações, e que, por meio da Portaria nº. 246/09-PF, firmada pela Subprocuradora-Geral de Justiça para Assuntos Jurídicos Ana Maria Schinestsok, teve as contas do exercício financeiro de 2007 (ano da deflagração da Operação Rodin) aprovadas. Em casor extremamente semelhante, envolvendo a apuração de crimes de apropriação indébita, lavagem de capitais e formação de quadrilha, no âmbito da FINATEC - Fundação de Apoio da UnB, o Superior Tribunal de Justiça firmou a competência estadual para processar e julgar a questão, nos termos da ementa abaixo:

                                                                                                               1 http://www.fatecsm.org.br/docs/estatuto.pdf

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HABEAS CORPUS. FORMAÇÃO DE QUADRILHA. APROPRIAÇÃO INDÉBITA. LAVAGEM DE CAPITAIS. COMPETÊNCIA. VÍTIMA. FUNDAÇÃO DE DIREITO PRIVADO INSTITUÍDA PARA APOIAR FUNDAÇÃO PÚBLICA FEDERAL DE ENSINO SUPERIOR. RELAÇÃO REGULAMENTADA PELA LEI N. 8.958/94. DIVERSIDADE DE RECEITAS E DESTINAÇÃO DE RECURSOS. AUSÊNCIA DE RELAÇÃO EXCLUSIVA COM A INSTITUIÇÃO FEDERAL DE ENSINO SUPERIOR. 1. Não se tratando a vítima de fundação pública, já que não foi instituída a partir do destacamento de patrimônio público, imperioso o reconhecimento da sua natureza jurídica de direito eminentemente privado. 2. A sua relação com a fundação pública federal de ensino superior é regulada pela Lei n. 8.958/94, que dispõe sobre as relações entre estas e as chamadas fundações de apoio, a qual se dá por meio de instrumento contratual, sendo, para este fim, dispensável o procedimento licitatório. 3. Embora a fundação vítima tenha sido instituída no âmbito de fundação pública federal, diante da autonomia funcional que lhe é atribuída no seu estatuto, não se verifica nenhuma exclusividade de vínculo com esta, já que a sua receita não é composta somente por subvenções públicas, tampouco suas finalidades são voltadas apenas para os interesses da aludida instituição federal de ensino superior. 4. Portanto, a verificação da existência ou não de interesse da fundação pública federal - e por via reflexa, da União - nas causas em que for parte a fundação vítima, deve ser feita caso a caso, de acordo com a natureza da relação contratual celebrada por esta. TRIBUNAL DE CONTAS DA UNIÃO. FISCALIZAÇÃO APENAS DOS CONTRATOS CELEBRADOS ENTRE A FUNDAÇÃO VÍTIMA E A FUNDAÇÃO PÚBLICA FEDERAL NO ÂMBITO DA QUAL FOI INSTITUÍDA. 5. A fiscalização do Tribunal de Contas da União se dá apenas nos contratos celebrados entre a fundação vítima com a fundação pública federal no âmbito do qual foi instituída, nos moldes do artigo 71, inciso IV, da Constituição Federal, em razão dos interesses desta, fundada a partir de destacamento de parcela do patrimônio da União, nos termos do artigo 4º da Lei n. 3.998/61, controle que não recai sobre aqueles firmados com outras pessoas jurídicas de direito público ou privado. DENÚNCIA. FATOS OCORRIDOS NO ÂMBITO DE RELAÇÃO CONTRATUAL ESTABELECIDA COM PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PRIVADO. PREJUÍZO APENAS EM DETRIMENTO DA FUNDAÇÃO DE APOIO. AUSÊNCIA DE INTERESSE DA UNIÃO. 6. Na hipótese dos autos, a exordial acusatória atribui aos pacientes a prática do crime de formação de quadrilha, apropriação indébita e lavagem de dinheiro em detrimento da fundação de apoio vítima, na qualidade de sócios ou proprietários de empresas privadas com as quais a aludida fundação celebrou contratos de parceria para a execução de suas atividades, qual seja, a prestação de serviços a órgãos públicos e privados. 7. Assim, as condutas atribuídas aos pacientes seriam aptas apenas a causar dano exclusivamente ao patrimônio da fundação de apoio, não se revelando qualquer lesão a patrimônio, bens ou interesse da União, nem mesmo de forma reflexa. SEQUESTRO DE BENS DOS ACUSADOS. MANDADO DE SEGURANÇA CONTRA ATO DE AUTORIDADE JUDICIÁRIA.

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LIMINAR DEFERIDA PARCIALMENTE. AGRAVO REGIMENTAL INTERPOSTO PELA ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO. INDÍCIO DE INTERESSE DO ALUDIDO ENTE FEDERADO NA CAUSA. DEFESA DO ATO COATOR. INVIABILIDADE. PECULIARIDADE NO PROCESSAMENTO DO MANDAMUS. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES E DA GARANTIA DA INDEPENDÊNCIA E IMPARCIALIDADE DO JUIZ. AUSÊNCIA DE INTERESSE DA UNIÃO NA CAUSA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL NÃO EVIDENCIADO. ORDEM DENEGADA. 8. Embora as disposições normativas aplicáveis ao mandado de segurança prevejam a necessidade de defesa do ato coator, estas aplicam-se somente quando o remédio constitucional é impetrado contra ato de autoridade administrativa. 9. Quanto se coloca como coator ato judicial, tem-se que este é proferido no exercício da função jurisdicional constitucionalmente atribuída ao Poder Judiciário e dotado da autonomia que lhe é inerente à efetiva separação dos poderes, tratando-se de princípio fundamental do Estado Democrático de Direito. 10. A legalidade ou justiça da decisão proferida por órgão do Poder Judiciário deve ser discutida por meio do exercício do duplo grau, sucedâneo do princípio do devido processo legal, do qual sequer poderá participar a autoridade responsável pela sua prolação, justamente em respeito à imparcialidade que deve reinar na prestação jurisdicional. 11. Em casos como tais, o procedimento do mandado de segurança assemelha-se ao do habeas corpus, no qual a autoridade responsável pela prolação do ato tido por coator é chamada somente a prestar as informações que julgar cabíveis, com as quais, em ponderação com as alegações do impetrante, o órgão jurisdicional responsável pela análise da impetração decidirá pela legalidade ou ilegalidade do ato, mantendo-o ou reformando-o. 12. Assim, não sendo constatado nos fatos que são tratados na exordial acusatória nenhum interesse da União capaz de atrair a competência da Justiça Federal, seja pela natureza jurídica da fundação vítima, ou pela falta de legitimidade da Advocacia-Geral da União em intervir no mandado de segurança impetrado em favor dos acusados, não se evidencia o alegado constrangimento ilegal. 13. Ordem denegada. (HC 150.450/DF, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 01/06/2010, DJe 04/10/2010)

No voto que conduziu o julgamento, de lavra do Ministro Jorge Mussi, a questão foi assim colocada:

Desde já, constata-se que a aludida fundação não possui como fonte de renda somente as subvenções públicas, mormente as destinadas por determinado ente da federação, sendo certo que fazem parte da sua receita outros recursos provenientes de remunerações por serviços prestados, juros bancários, etc. Por outro lado, embora a FINATEC tenha sido instituída no âmbito da Universidade de Brasília - UnB, não significa que a sua atuação seja voltada exclusivamente para os interesses desta, conforme se depreende do artigo 3º do

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seu próprio estatuto (fl. 163), sendo certo que também mantém relações com outras pessoas de direito público e de direito privado, de acordo com o que atestam o contrato acostado às fls. 215/225, bem como os extratos financeiros dos projetos executados pela FINATEC junto a prefeituras e governos estaduais (fls. 1.775/1.850). Diante de tais constatações, conclui-se que nem as receitas da Fundação de Empreendimentos Científicos e Tecnológicos - FINATEC - são exclusivamente oriundas de verbas federais, tampouco os seus recursos são voltados unicamente para o apoio à Unviersidade de Brasília - UnB. Partindo-se desta premissa, a verificação da existência ou não de interesse da UnB - e por via reflexa, da União - nas causas em que for parte a FINATEC, deve ser feita caso a caso, de acordo com a relação contratual celebrada por esta.

Ainda nessa linha:

CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. AÇÃO ORDINÁRIA. FUNDAÇÃO DE APOIO A UNIVERSIDADE PÚBLICA. PERSONALIDADE JURÍDICA DE DIREITO PRIVADO. COMPETÊNCIA DO JUÍZO ESTADUAL. I - As fundações de apoio às universidades públicas têm personalidade jurídica de direito privado, com patrimônio e administração próprios, não fazendo parte da Administração Pública Indireta, razão pela qual as ações em que atuarem como parte devem deverão ser julgadas pela Justiça Comum Estadual, mormente não se enquadrarem na previsão do artigo 109, inciso I, da CF/88. II - Conflito de competência conhecido, para declarar competente o MM. Juízo de Direito da Vara Cível de Santa Maria - RS, suscitado. (CC 89.935/RS, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 22/10/2008, DJe 10/11/2008)

Pois bem. Se a regra definida pelo Superior Tribunal de Justiça é a análise de caso a caso, de acordo com a relação contratual, menos razão há para que a Justiça Federal seja competente para processar e julgar o feito. Explica-se. Os projetos são institucionais da Universidade Federal de Santa Maria (exigência da Lei nº. 8.958/94), mas o que é contratado é o apoio para a sua execução, de responsabilidade da Fundação de Apoio. Do valor recebido pela FATEC do contrato com o Detran, havia uma taxa institucional de 10% que revertia exclusivamente à Universidade Federal de Santa Maria, sem a exigência de qualquer contraprestação a respeito, o

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que faz da instituição de ensino não uma lesada, mas uma beneficiária desse contrato, durante todo o prazo de sua execução. A denúncia tenta atrair o prejuízo à Universidade Federal de Santa Maria ao afirmar, por exemplo "fundação firmava contrato com a UFSM para desenvolver as atividades contratadas com o DETRAN/RS, consumindo recursos físicos e humanos da própria Universidade Federal2" Tal afirmação não corresponde minimamente à verdade, sendo tão somente uma tentativa de ilaquear o juízo, induzindo-o em erro em razão dessa natureza bastante próxima da Fundação de Apoio à Instituição de Ensino que lhe dá razão de existir. Todo o serviço prestado, e isso parece já ter ficado suficientemente claro, foi feito com recursos humanos e físicos próprios da Fundação. Até mesmo seus diretores, muitos portadores de cargos públicos na Universidade Federal, não atuavam à frente da Fundação em seus horários de trabalho como servidores públicos. De todas as lesões supostamente concebidas pelo Ministério Público Federal, pode-se até cogitar - por hipótese - que o Detran/RS tenha sido lesado, mas jamais a Universidade Federal de Santa Maria. Esse ponto é tão sintomático, que a Procuradoria-Geral do Estado se habilitou nesses autos como assistente à acusação, e moveu ação civil pública de improbidade administrativa, movimentação que não foi vista por parte da Advocacia-Geral da União. Isso porque jamais houve dano à Universidade Federal de Santa Maria. Não se pode - como já se afirmou ao longo do processo - atribuir eventual dano à "imagem" da Universidade Federal de Santa Maria. Primeiro, porque, como suficientemente já dito, a Fundação de Apoio à Tecnologia e Ciência é instituição de direito privado, absolutamente

                                                                                                               2 Folha 23 da denúncia.

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independente da Universidade Federal de Santa Maria, cuja única relação com esta é o fato de servir de apoio, nos termos da Lei nº. 8.958/94. Segundo, porque o que atrai a competência criminal federal, a teor da redação do artigo 109 da Carta Constitucional, são "infrações penais praticadas em detrimento de bens, serviços ou interesse da União". Ora, não há a possibilidade de imagem ou bom nome ou prestígio serem utilizados como elementos aptos a atrair a competência criminal, porque restaria evidenciada uma interpretação extensiva de um conceito suficientemente claro e limitador. Fosse assim, um estupro, um roubo, um homicídio ocorrido dentro do campus da Universidade Federal de Santa Maria causaria o mesmo desprestígio à sua imagem, ensejando, portanto, a atração da competência federal. E isso não é o que ocorre. O fato é que o presente caso foi criado nos porões da Polícia Federal para atender a um interesse político muito claro à época, quando o atual Governador do Estado era Ministro da Justiça, chefe-maior da Polícia Federal. O interesse político (e partidário) sempre foi muito maior do que qualquer interesse jurídico ou social. O caso foi criado para atender a interesses pessoais, partidários, políticos e todos outros menos nobres. Tudo foi engendrado para afetar diretamente aos partidos políticos que se revezavam no poder local, de modo a viabilizar a eleição do então Ministro da Justiça, tal como efetivamente ocorreu. A candidatura, que à época já se manifestava, foi pavimentada por uma corrida eleitoral sem opositores de peso, diante da eliminação de candidatos e partidos promovida pela policialesca operação. Sem uma lesão a bens, interesses ou serviços da União, não há se falar em competência federal, razão pela qual é de ser acolhida a presente preliminar.

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II.2 PROCESSO INICIADO POR DENÚNCIA ANÔNIMA

Prática desenvolvida nos porões dos regimes mais antidemocráticos da história recente da humanidade, tanto a denúncia anônima, como outros expedientes delatórios, vêm ganhando corpo no atual panorama processual penal brasileiro e das ações de improbidade. Virou prática corriqueira investigações serem iniciadas por denúncias anônimas, isentando o delator das consequências de uma denunciação caluniosa, fazendo pesar sobre o acusado toda uma gama de medidas constritivas. O caso presente é, pois, emblemático, já que originado de denúncia anônima realizada aos Procuradores da República de Santa Maria. Ora, naturalmente nada impede que de fato tenha ocorrido a fraude, mas da leitura dos autos se vê que o denunciante, em nome de suposta moralidade, aduz situações de um modus operandi e que, por meio dele, todos que reuniam condições fáticas próximas, mesmo que não identificado qualquer elemento de materialidade, fosse processado por improbidade. Que moralidade é essa que permite que alguém se esconda por detrás de um documento apócrifo, valendo-se daquele anonimato que a Constituição Federal veda expressamente3? Da mesma forma que o uso da denúncia anônima pode proteger o denunciante, ele pode, igualmente, acobertar a utilização de informações obtidas por meios ilícitos, como interceptações telefônicas sem autorização judicial, que, naturalmente, em juízo seriam rejeitadas, mas que por meio da denúncia anônima adquiriram uma roupagem de legalidade. Dentre as proteções, é muito mais razoável optar pela proteção à ampla defesa do acusado, do que proteger abstratamente o direito de um denunciante anônimo. Existem mecanismos de proteção à testemunha no ordenamento brasileiro, cuja adesão requer o preenchimento de uma série de                                                                                                                3 Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes: (...) IV - é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato;

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requisitos. Fosse admitido um risco abstrato à testemunha, teríamos que abrir mão daquele meio de prova que mais frequentemente enfrenta-se em ações judiciais. Em que pese, com isto, haja a possibilidade de que eventuais culpados sejam absolvidos quando observados estritamente os direitos e garantias fundamentais, este é um preço a ser pago por um Estado Democrático de Direito, conforme plasmado por nossa Carta Política. A esse respeito, posicionou-se Afrânio Silva Jardim com a precisão que lhe é peculiar:

Uma premissa conceitual deve ser estabelecida em todo o processo de interpretação das normas constitucionais que tutelam os chamados direitos individuais: ao estabelecer regras que asseguram um processo penal democrático, o Estado sabe, de caso pensado, que irá absolver culpados diuturnamente. Entretanto, faz esta opção para não assumir igual risco de condenar inocentes ou mesmo culpados a penas injustas. A toda evidência, o Estado seria muito mais eficaz em combater a criminalidade se não necessitasse processualizar sua pretensão punitiva, estabelecendo um processo que garanta valores outros, tão relevantes ou mais relevantes do que condenar quem mereça ser condenado. O “preço” de combater a criminalidade desta forma é muito alto, vez que tem de postergar valores relevantes conquistados através do processo civilizatório, criando, por outro lado, uma coletiva insegurança entre a sociedade civil4.

É, pois, inapta para a instauração processo criminal a denúncia anônima que tece ilações a respeito de suposta prática delitiva, sem indicar, minimamente indícios suficientes de materialidade. Causa surpresa, medo e asco a utilização de práticas próprias de um Estado Policial, diametralmente oposto ao Estado Democrático de Direito que a Constituição Cidadã idealizou, mas que, dia-a-dia, dele se afasta. Neste sentido, aliás, já se posicionou a Corte Suprema:

ANONIMATO - NOTÍCIA DE PRÁTICA CRIMINOSA - PERSECUÇÃO CRIMINAL - IMPROPRIEDADE. Não serve à persecução criminal notícia de prática criminosa sem identificação da autoria, consideradas a vedação constitucional do anonimato e a necessidade de haver parâmetros próprios à

                                                                                                               4 Parecer no RESE no 2007.051.00622, junto à 7a Câmara Criminal, do TJRJ.

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responsabilidade, nos campos cível e penal, de quem a implemente. (HC 84827, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Primeira Turma, julgado em 07/08/2007, DJe-147 DIVULG 22-11-2007 PUBLIC 23-11-2007 DJ 23-11-2007 PP-00079 EMENT VOL-02300-03 PP-00435)

No voto condutor do Habeas Corpus acima ementado, o Ministro Marco Aurélio assim decidiu questão idêntica:

Acrescento que se, de um lado, há de se ouvir o cidadão, de se preservar a manifestação de pensamento, de outro, a própria Constituição Federal veda o anonimato – inciso IV do artigo 5º. Sob o ângulo da inviolabilidade da vida privada, é ainda a Carta da República que assegura o direito à indenização pelo dano material ou moral decorrente da inobservância da vedação. É justamente esse contexto que bem diz com a vida em um Estado Democrático de Direito, com a respeitabilidade própria ao convício das pessoas em cultura satisfatória que direciona à impossibilidade de se agasalhar o denuncismo irresponsável, maculando-se, sem seriedade maior, a vida das pessoas. Sim, tudo deve merecer enfoque visando à preservação da dignidade da pessoa humana que, conforme já assinalado, é fundamento da República Federativa do Brasil. A se agasalhar a óptica da denúncia anônima, mediante carta apócrifa, ter-se-á aberta a porta1a vindita, à atuação voltada tão-somente a prejudicar desafetos, alguém que tenha contrariado interesses.

E prossegue:

A envergadura do tema contrasta, a mais não poder, com a vida democrática, com a segurança jurídica que deve se fazer presente no dia-a-dia dos cidadãos. A esta altura, acolher a referida prática é dar asa à repetição desse procedimento, passando-se a vive época de terror, em que a honra das pessoas ficará ao sabor de paixões condenáveis, não tendo elas meio de incriminar aquele que venha a implementar verdadeira calúnia.

No mesmo julgamento, o Ministro Cezar Peluso assim se manifestou:

A menos que o voto de Vossa Excelência me traga subsídios irrefutáveis, estou absolutamente convencido de que a proibição constitucional do anonimato significa que, como meio de expressão do pensamento no mundo jurídico, ela é inválida e ineficaz, qualquer que seja a modalidade usada e qualquer que seja o tipo de pensamento manifestado ou declarado. Portanto, isso abrange não apenas as manifestações de opinião, mas também as declarações de sentimentos, de ciência e de vontade. A razão, ao que me parece, não está apenas no aspecto censurável, do ponto de vista ético, de que se reveste o anonimato, mas é a circunstância de que o anonimato torna irresponsável, do ponto de vista penal e do ponto de vista civil, aquele que formulou eventualmente uma acusação. Então, não se pode dar ao anonimato, sob uma forma de denúncia anônima, as consequências legais de uma declaração de ciência que atenda aos requisitos de

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validez e de eficácia dos outros casos.

Exatamente nesta linha, posiciona-se Paulo Rangel:

O denunciante anônimo se esconde atrás das vestes da impunidade, pois se sua denúncia for falsa, ele não será responsabilizado. O Estado não pode dar causa a uma investigação policial ou administrativa, muito menos a um processo judicial, com base, única e exclusivamente, em uma denúncia anônima, e depois, com base nela, sair procurando outros meios de prova5.

Ainda, há jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça a respeito do tema:

Investigação criminal (início). Delação (falta de assinatura). Anonimato (vedação). Identificação posterior (irrelevância). Incompatibilidade de normas (antinomia). 1. Em nosso conjunto de regras jurídicas, normas existem sobre sigilo, bem como sobre informação; enfim, normas sobre segurança e normas sobre liberdade. 2. Havendo normas de opostas inspirações ideológicas – antinomia de princípio –, a solução do conflito (aparente) há de privilegiar a liberdade, porque a liberdade anda à frente dos outros bens da vida, salvo à frente da própria vida. 3. "É livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato" (Constituição, art. 5º, IV). À vista disso, delação não assinada não pode dar início a investigação criminal. Requer o ordenamento jurídico brasileiro – e é bom que assim requeira – que também o processo preliminar – preparatório da ação penal – seja iniciado sem mácula. 4. Tampouco se admite, em razão de posterior identificação do autor, venha à baila a figura da ressurreição, porque, se admissível fosse, estar-se-ia admitindo o comportamento de quem se escondeu para acusar. 5. Agravo regimental improvido. (AgRg na Sd .100/TO, Rel. Ministro NILSON NAVES, CORTE ESPECIAL, julgado em 04/03/2009, DJe 30/04/2009) Procedimento criminal (acusação anônima). Anonimato (vedação). Incompatibilidade de normas (antinomia). Foro privilegiado (prerrogativa de função). Denúncia apócrifa (investigação inconveniente). 1. Requer o ordenamento jurídico brasileiro – e é bom que assim requeira – que também o processo preliminar – preparatório da ação penal – inicie-se sem mácula. 2. Se as investigações preliminares foram iniciadas a partir de correspondência eletrônica anônima (e-mail), tiveram início, então, repletas de nódoas, tratando-se, pois, de natimorta notícia. 3. Em nosso conjunto de regras jurídicas, normas existem sobre sigilo, bem como sobre informação; enfim, normas sobre segurança e normas sobre liberdade. 4. Havendo normas de opostas inspirações ideológicas – antinomia de princípio –, a solução do conflito (aparente) há de privilegiar a liberdade, porque a liberdade anda à frente dos outros bens da vida, salvo à frente da própria vida. 5. Deve-se, todavia, distinguir cada caso, de tal sorte que, em determinadas hipóteses, esteja a autoridade policial, diante de notícia, autorizada a apurar eventual ocorrência de crime. 6. Tratando-se, como se trata,

                                                                                                               5 RANGEL, Paulo. A linguagem pelo avesso: a denúncia anônima como causa (i)legitimadora da instauração de investigação criminal: inconstitucionalidade e irracionalidade. Disponível em: http://www.egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/33404-42886-1-PB.pdf

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porém, de paciente que detém foro por prerrogativa de função, ao admitir-se investigação calcada em denúncia apócrifa, fragiliza-se não a pessoa, e sim a própria instituição à qual pertence e, em última razão, o Estado democrático de direito. 7. A Turma ratificou a liminar – de caráter unipessoal – e concedeu a ordem a fim de determinar o arquivamento do procedimento criminal. (HC 95838/RJ, Rel. Ministro NILSON NAVES, SEXTA TURMA, julgado em 26/02/2008, DJe 17/03/2008) Anonimato (vedação). Competência originária (sindicância). Precedentes do STJ (aplicação). Segundo o Superior Tribunal, não se instaura, em seu âmbito, com base em carta anônima, sindicância a propósito de autoridades sujeitas a sua jurisdição penal. Arquivamento. (QO na Sd .166/DF, Rel. Ministro NILSON NAVES, CORTE ESPECIAL, julgado em 28/05/2009, DJe 03/09/2009)

Com um assustador realismo, a ditadura das delações anônimas aproxima o que hipocritamente chamamos de Estado Democrático de Direito à ditadura dos camisas púrpuras , da obra ficcional (?!) de Lon Fuller, "O caso dos denunciantes invejosos", leitura obrigatória no primeiro semestre de qualquer Faculdade de Direito. Qualquer semelhança com a realidade é (é?) mera coincidência:

Seu país teve o privilégio de viver, por muitas décadas, sob um regime pacífico, constitucional e democrático. Infelizmente, há algum tempo começaram os problemas. A vida normal foi interrompida por uma profunda crise econômica e por graves conflitos entre grupos que seguiam diferentes linhas econômicas, políticas e religiosas. O salvador da pátria apareceu na figura do chefe de um partido político ou sociedade que se autodenominava “Camisas-Púrpuras”. Em uma disputa eleitoral marcada por sérios conflitos e irregularidades, esse Chefe foi eleito Presidente da República e seu partido obteve a maioria das vagas na Assembléia Nacional. O sucesso eleitoral desse partido ocorreu em razão de uma campanha com promessas insensatas e falsificações engenhosas e com a intimidação física causada por patrulhas noturnas de Camisas-Púrpuras, motivo pelo qual muitos adversários do partido não tiveram coragem de votar. (...) Os Camisas-Púrpuras adotaram uma política que permitia flexibilidade na ação. Algumas vezes agiam como partido político “nas ruas”. Outras vezes atuavam por meio dos aparelhos estatais que eles mesmos controlavam. A escolha do método de atuação era questão de pura conveniência. (...) Durante o regime dos Camisas-Púrpuras, muitíssimas pessoas, movidas por inveja, denunciaram seus inimigos pessoais ao partido ou a autoridades governamentais. Entre as atividades que foram objeto de denúncias estava a crítica ao governo formulada em discussões particulares, a escuta de estações de rádio estrangeiras, o relacionamento com notórios vândalos e baderneiros, o armazenamento de saquinhos de ovos em pó em quantidade maior do que a autorizada, a omissão de informar a perda de documentos de identidade no prazo de cinco dias

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etc6.

A denúncia anônima é a arma dos fracos, dos covardes, dos invejosos!!! Talvez a sua "moralidade", em nome da qual supostamente comunicou ao Ministério Público Federal, tenha um preço que não foi pago. Talvez o seu civismo (?!) em denunciar revista-se de uma inveja de ter sido preterido. Talvez o denunciante nem mesmo exista. Talvez... Talvez... Talvez... Nunca se saberá, a menos que o denunciante invejoso, o caluniador impune, seja nominado e chamado ao processo. Caso contrário, o acusado é como Josef K., personagem de Franz Kafka, denunciado sem saber por quem, sem saber por quê, denunciado em razão de devaneios de um covarde. Nota-se que o procedimento investigatório levado a cabo no Ministério Público Federal é maculado pela ilegalidade, porquanto viola frontalmente o dispositivo acima citado. Dessa forma, o feito grita pelo reconhecimento da nulidade, pela contaminação da ilicitude, cujo odor de tirania exala desde as primeiras páginas da investigação policial, tudo chancelado pelo Ministério Público Federal.

II.3 ILICITUDE DA PROVA: COMPARTILHAMENTO DE DADOS (MPF-RFB)

Tão logo provocado pela ilegal denúncia anônima, o Ministério Público Federal, sem se preocupar em apurar minimamente os fatos, e tampouco em obter autorização judicial para tanto, comunicou-se diretamente com a Receita Federal do Brasil, buscando informações protegidas por sigilo, como se pode observar:

                                                                                                               6 DIMOULIS, Dimitri. O caso dos denunciantes invejosos: introdução prática às relações entre direito, moral e justiça. 4. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2007.

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Folha 10 do Volume 1 da Ação Penal nº. 2007.71.02.007872-8

Nesse afã de burlar o devido processo legal e sangrar as garantias processuais individuais, procedeu a devassa de mais de 40 pessoas e de mais de 20 empresas, dentre as quais aquelas que dizem diretamente com os acusados:

Folha 10 do Volume 1 da Ação Penal nº. 2007.71.02.007872-8

A questão em exame se cinge a discutir, portanto, se pode o Ministério Público obter diretamente, sem autorização judicial, informações protegidas por sigilo diretamente junto aos órgão que têm por múnus zelar por ele. A defesa da corré Denise Nachtigall Luz provocou esse Juízo, sustentando a ilegalidade do compartilhamento, o que foi acolhido pela magistrada que conduzia o feito, que determinou o desentranhamento da prova. Em Correição Parcial movida pelo Ministério Público Federal, que o Tribunal Regional Federal da 4ª Região deu provimento, foi assentado que feriria a razoabilidade não permitir que o Ministério Público Federal obtivesse informações fiscais junto à Receita Federal, na medida em que esta pode

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encaminhar representação para fins penais sempre que constate que determinado fato configura crime. O entendimento exarado pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, entretanto, não honra a melhor jurisprudência sobre a matéria. Em acórdão paradigmático sobre o tema, a Desembargadora Convocada Jane Silva assim conduziu o julgamento do Recurso em Habeas Corpus nº. 20.329/PR junto ao Superior Tribunal de Justiça:

RECURSO EM HABEAS CORPUS – CRIMES CONTRA A ORDEM TRIBUTÁRIA, CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO E DE LAVAGEM DE DINHEIRO – INVESTIGAÇÕES PRELIMINARES – QUEBRA DO SIGILO FISCAL DO INVESTIGADO – INEXISTÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO JUDICIAL – REQUISIÇÃO FEITA PELO MEMBRO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DIRETAMENTE À RECEITA FEDERAL – ILICITUDE DA PROVA – DESENTRANHAMENTO DOS AUTOS – TRANCAMENTO DO INQUÉRITO POLICIAL – IMPOSSIBILIDADE – EXISTÊNCIA DE OUTROS ELEMENTOS DE CONVICÇÃO NÃO CONTAMINADOS PELA PROVA ILÍCITA – DADO PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO. I. A requisição de cópias das declarações de imposto de renda do investigado, feita de forma unilateral pelo Ministério Público, se constitui em inequívoca quebra de seu sigilo fiscal, situação diversa daquela em que a autoridade fazendária, no exercício de suas atribuições, remete cópias de documentos ao parquet para a averiguação de possível ilícito penal. II. A quebra do sigilo fiscal do investigado deve preceder da competente autorização judicial, pois atenta diretamente contra os direitos e garantias constitucionais da intimidade e da vida privada dos cidadãos. III. As prerrogativas institucionais dos membros do Ministério Público, no exercício de suas funções, não compreendem a possibilidade de requisição de documentos fiscais sigilosos diretamente junto ao Fisco. IV. Devem ser desentranhadas dos autos as provas obtidas por meio ilícito, bem como as que delas decorreram. V. Havendo outros elementos de convicção não afetados pela prova ilícita, o inquérito policial deve permanecer intacto, sendo impossível seu trancamento. VI. Dado parcial provimento ao recurso. (RHC 20329/PR, Rel. Ministra JANE SILVA (DESEMBARGADORA CONVOCADA DO TJ/MG), QUINTA TURMA, julgado em 04/10/2007, DJ 22/10/2007, p. 312)

Não se trata, aqui, de equiparação, tal como feito pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, com a possibilidade de a Receita Federal representar ao Ministério Público quando presente a possibilidade de se estar frente a um ilícito penal.

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A situação é bastante diversa. A representação fiscal para fins penais tem regulamentação dada pelo artigo 83 da Lei nº. 9.430/96:

Art. 83. A representação fiscal para fins penais relativa aos crimes contra a ordem tributária previstos nos arts. 1o e 2o da Lei no 8.137, de 27 de dezembro de 1990, e aos crimes contra a Previdência Social, previstos nos arts. 168-A e 337-A do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), será encaminhada ao Ministério Público depois de proferida a decisão final, na esfera administrativa, sobre a exigência fiscal do crédito tributário correspondente.

Essa regulamentação vai ao encontro do que dispõe o artigo 198 do Código Tributário Nacional:

Art. 198. Sem prejuízo do disposto na legislação criminal, é vedada a divulgação, por parte da Fazenda Pública ou de seus servidores, de informação obtida em razão do ofício sobre a situação econômica ou financeira do sujeito passivo ou de terceiros e sobre a natureza e o estado de seus negócios ou atividades. § 1o Excetuam-se do disposto neste artigo, além dos casos previstos no art. 199, os seguintes: I – requisição de autoridade judiciária no interesse da justiça; II – solicitações de autoridade administrativa no interesse da Administração Pública, desde que seja comprovada a instauração regular de processo administrativo, no órgão ou na entidade respectiva, com o objetivo de investigar o sujeito passivo a que se refere a informação, por prática de infração administrativa. § 2o O intercâmbio de informação sigilosa, no âmbito da Administração Pública, será realizado mediante processo regularmente instaurado, e a entrega será feita pessoalmente à autoridade solicitante, mediante recibo, que formalize a transferência e assegure a preservação do sigilo. § 3o Não é vedada a divulgação de informações relativas a: I – representações fiscais para fins penais; II – inscrições na Dívida Ativa da Fazenda Pública; III – parcelamento ou moratória.

Não é porque a lei prevê uma possibilidade de se compartilhar informações, que se possa tal permissão ser interpretada de maneira alargada, em nítido desprestígios às garantias individuais. Não há, e em momento algum houve, situação que se amoldasse à causa de representação fiscal para fins penais. Até porque a situação fiscal, tantos dos réus como das empresas de que são sócios, está absolutamente em conformidade com todas as

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regras tributárias vigentes, como, inclusive, restou afirmado pela própria Receita Federal em auditoria feita após a deflagração da policialesca operação. Em verdade, o documento enviado pela Receita Federal, denominado de "Informação de Pesquisa e Investigação" foi suficientemente claro ao referir que as informações ali contidas atendiam a requerimento do Ministério Público Federal, em nítida usurpação de sua competência. Não é demais lembrar que a Lei Complementar nº. 75/1993, que regulamenta o Ministério Público da União, assim disciplina:

Art. 6º Compete ao Ministério Público da União: (...) XVIII - representar; a) ao órgão judicial competente para quebra de sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, para fins de investigação criminal ou instrução processual penal, bem como manifestar-se sobre representação a ele dirigida para os mesmos fins;

Nesse contexto se manifestou a Ministra Cármem Lúcia:

Diferentemente é o que se dá em relação ao Ministério Público, que não teve aceito pelo Poder Judiciário o entendimento segundo o qual se poderia ter legislação infraconstitucional a assegurar-lhe o exercício daquela competência. Tanto se daria porque a) o Ministério Público é advogado da sociedade e, nesta condição, requer, pleiteia, não impõe condutas diretamente às pessoas; b) não exerce atividade fiscalizadora autoexecutória da Administração Pública - que pode ser fundamento da aceitação, segundo parece possível numa determinada linha de raciocínio e interpretação constitucional - que buscaria embasamento na norma do art. 145, parágrafo único, in fine. Atua, portanto, o Ministério Público, no exercício de suas atividades, por meio de aquiescência judicial prévia quando buscar dados que estejam reservados ao conhecimento de terceiros, assim considerados aqueles que não dispõem nem podem deles dispor sem a aquiescência do próprio interessado. Considerando necessário em determinado caso e comprovanto, na espécie, ser preciso o conhecimento de informações havidas no âmbito resguardado pelo sigilo fiscal ou bancário, haverá que buscar, então, o Ministério Público autorização judicial específica para aceder ao conhecimento do quanto tido e comprovado como necessário para seu desempenho eficiente7.

No mesmo sentido é a posição do Ministro Gilmar Mendes:

                                                                                                               7 ROCHA, Cármem Lúcia Antunes. Direito à privacidade e os sigilos fiscal e bancário. In: Revista Interesse Público. n. 20. ano 5. Porto Alegre: Notadez. 2003.

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A jurisprudência do STF admite a quebra do sigilo pelo Judiciário ou por Comissão Parlamentar de Inquérito, mas resiste a que o Ministério Público possa determiná-la diretamente, por falta de autorização legal específica. Há precedente do STF, contudo, tendo a requisição do Ministério Público ao Banco do Brasil de dados relativos a concessão de empréstimos, subsidiados pelo Tesouro Nacional, com base em plano de governo, a empresas do setor sucroalcooleiro como de atendimento devido. Assentou-se, invocando o princípio da publicidade disposto na lei maior, que 'não cabe ao Banco do Brasil negar, ao Ministério Público, informações sobre nomes de beneficiários de empréstimos concedidos pela instituição, com recursos subsidiados pelo erário federal, sob invocação do sigilo bancário, em se tratando de requisição de informações e documentos para instruir procedimento administrativo instaurado em defesa do patrimônio público. O STF não toma a quebra do sigilo bancário como decisão integrante do domínio das matérias sob reserva de jurisdição. À lei está facultado, portanto, que órgãos do Poder Publico determinem a abertura dessas informações protegidas. Cobra-se, todavia, que tais decisões sejam fundamentadas, apontando razões que tornem a providência necessária e proporcionada ao fim buscado. A propósito, a Lei Complementar nº 105/2001 atribui a agentes tributários, no exercício de seu poder de fiscalização, o poder de requisitar informações referentes a operações e serviços das instituições financeiras, independentemente de autorização judicial. A lei cerca a providência de cuidados formais, com vistas a minimizar os custos para o direito à privacidade do investigado e assegurar que esteja nítida a necessidade da medida8.

Juliana Garcia Belloque enfrentou a questão a partir da ótica das atribuições ministeriais, e assim se posicionou:

Pretende-se extrair das atribuições descritas, insculpidas no art. 129 da Constituição da República, a atribuição do Ministério Público para requisitar diretamente às instituições financeiras, sob pena de crime de desobediência, informações pertinentes a investigações civis ou criminais por ele desenvolvidas, mesmo quando o cumprimento da ordem implique violação dos sigilos fiscal ou financeiro. Nossos tribunais, no entanto - em interpretação sistemática do texto constitucional, aplicando o princípio da prevalência dos direitos humanos -, apontaram a insuficiência deste dispositivo para se conferir tal poder à instituição, já que constituindo o sigilo financeiro modalidade de manifestação do direito à intimidade, consagrado constitucionalmente como direito individual fundamental, suas limitações devem decorrer de mandamentos expressos e inequívocos, mesmo quando contidos em normas igualmente constitucionais. Também estas, em sendo mitigadoras de direitos fundamentais, merecem interpretação restritiva. Dentre as possibilidades de quebra de sigilo financeiro disciplinadas pela Lei 4.595/1964 não se encontra a solicitação do Ministério Público. Passaram a sustentar os membros da instituição que a LC 75/1993 teve o condão de derrogar tacitamente o art. 38 da Lei 4.595/1964, para conferir atribuição ao

                                                                                                               8 MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. 5.ed São Paulo: Saraiva. 2009. pp. 477-478.

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Ministério Público à requisição direta das informações sigilosas conservadas pelas instituições financeiras. (...) Por seu turno, o dispositivo contido na LC755/1993 merece análise mais detida, buscando-se sua interpretação jurídica conforme aConstituiçãoo, em adequação substancial, a qual, de resto, serve a qualquer tentativa de atribuição de poderes inconstitucionais ao Ministério Público. (...) É nesse sentido que se edifica a interpretação mais acertada deste aparente conflito de normas, ou seja, a LC755/1993 deve ganhar aplicação condizente com a estrutura constitucional de separação dos poderes estatais e de proteção aos direitos humanos, que encarregou o Poder Judiciário das decisões valorativas atinentes à coexistência harmônica de todos os direitos fundamentais, individuais e coletivos. Além disso, o perfil do Ministério Público, desenhado pela Constituição de 1988, no qual sobressai a defesa da ordem jurídica, não lhe retira a posição de parte processual, mormente nas causas penais e nas ações civis públicas. Não há como negar que ele constitui um dos sujeitos da relação processual, interessado perante a decisão jurisdicional final, ao qual são atribuídos ônus processuais. O fato de o membro do Ministério Público não deduzir pretensões próprias em juízo e apenas representar o poder-dever de punir do Estado - ao qual não incumbe a imposição de penas àqueles contra quem não se conseguiu reunir provas suficientes à condenação - não autoriza a afirmação de que à instituição não possa ser atribuído interesse no processo penal9.

Na mesma linha:

O artigo 5º, XII, da CF, assim anuncia: "é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal." Percebe-se que a interpretação do artigo mencionado no parágrafo anterior merece uma especial atenção para a compreensão de seu pleno e sistemático significado. Evidentemente, não é somente a comunicação telefônica que deve ser protegida de forma constitucional. Conforme já afirmado, a proporcionalidade deve ser utilizada neste momento interpretativo, para determinar um efeito equilíbrio entre a fundamental proteção dos sigilos pessoais, e a necessidade social de tutela penal. Trata-se de uma análise constitucionalizada. A expressão dados, no já citado artigo 5º, XII, da CF, evidentemente deve compreender os dados fiscais e financeiros/bancários. Não há justificativa plausível para uma negativa neste sentido semântico. Certo é que os sigilos fiscais e financeiros/bancários são parte da proteção inclusa no artigo 5º, XII, da CF. Para esta conclusão restar perfeita, é de se apresentar outro dispositivo constitucional, que acrescenta dados à interpretação que se deseja fazer. Eis o artigo 5º, X, da CF:"São invioláveis a intimidade, a vida privada, a honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação."

                                                                                                               9 BELLOQUE, Juliana Garcia. Sigilo Bancário: Análise crítica da LC 105/2001. São Paulo: RT. 2003. pp 138-141.

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A proteção dos sigilos fiscal e financeiro/bancário, liga-se inevitavelmente à tutela da intimidade das pessoas. (...) Para concluir e retornando ao problema da quebra de sigilos diretamente pelo Ministério Público, os sigilos fiscais e financeiros/bancários são constitucionalmente tutelados, por se tratar de direitos fundamentais ligados à intimidade das pessoas. Ainda em conclusão, há necessidade de controle judicial das devassas desses sigilos em investigações criminais10.

Tal entendimento é voz corrente no Superior Tribunal de

Justiça: HABEAS CORPUS. QUEBRA DE SIGILO FISCAL REALIZADA DIRETAMENTE PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. REQUISIÇÃO DE CÓPIAS DE DECLARAÇÕES DE IMPOSTO DE RENDA SEM AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. ILICITUDE DA PROVA. DESENTRANHAMENTO DOS AUTOS. CONCESSÃO DA ORDEM. 1. Considerando o artigo 129, inciso VI, da Constituição Federal, e o artigo 8º, incisos II, IV e § 2º, da Lei Complementar 75/1993, há quem sustente ser possível ao Ministério Público requerer, diretamente, sem prévia autorização judicial, a quebra de sigilo bancário ou fiscal. 2. No entanto, numa interpretação consentânea com o Estado Democrático de Direito, esta concepção não se mostra a mais acertada, uma vez que o Ministério Público é parte no processo penal, e embora seja entidade vocacionada à defesa da ordem jurídica, representando a sociedade como um todo, não atua de forma totalmente imparcial, ou seja, não possui a necessária isenção para decidir sobre a imprescindibilidade ou não da medida que excepciona os sigilos fiscal e bancário. 3. A mesma Lei Complementar 75/1993 - apontada por alguns como a fonte da legitimação para a requisição direta pelo Ministério Público de informações contidas na esfera de privacidade dos cidadãos - dispõe, na alínea "a" do inciso XVIII do artigo 6º, competir ao órgão ministerial representar pela quebra do sigilo de dados. 4. O sigilo fiscal se insere no direito à privacidade protegido constitucionalmente nos incisos X e XII do artigo 5º da Carta Federal, cuja quebra configura restrição a uma liberdade pública, razão pela qual, para que se mostre legítima, se exige a demonstração ao Poder Judiciário da existência de fundados e excepcionais motivos que justifiquem a sua adoção. 5. É evidente a ilicitude da requisição feita diretamente pelo órgão ministerial à Secretaria de Receita Federal, por meio da qual foram encaminhadas cópias das declarações de rendimentos d paciente e dos demais investigados no feito. 6. Conquanto sejam nulas as declarações de imposto de renda anexadas à medida cautelar de sequestro, não foi juntada ao presente mandamus a íntegra do

                                                                                                               10 LOPES, Luciano Santos. A possibilidade de quebra de sigilo fiscal diretamente realizada pelo Ministério Público: limites da investigação criminal e o respeito aos direitos fundamentais do acusado. In: Análise de precedentes criminais do Superior Tribunal de Justiça. Estudos em homenagem à Desembargadora Jane Ribeiro Silva. Belo Horizonte: Atualizar. 2009. p. 201

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mencionado procedimento, tampouco o inteiro teor da ação penal na qual a citada documentação teria sido utilizada, de modo que este Sodalício não pode verificar quais "provas e atos judiciais" estariam por ela contaminados, exame que deverá ser realizado pelo Juízo Federal responsável pelo feito. 7. Ordem concedida para determinar o desentranhamento das provas decorrentes da quebra do sigilo fiscal realizada pelo Ministério Público sem autorização judicial, cabendo ao magistrado de origem verificar quais outros elementos de convicção e decisões proferidas na ação penal em tela e na medida cautelar de sequestro estão contaminados pela ilicitude ora reconhecida. (HC 160646/SP, Rel. Ministro JORGE MUSSI, QUINTA TURMA, julgado em 01/09/2011, DJe 19/09/2011) RECURSO EM MANDADO DE SEGURANÇA. PROCEDIMENTO INVESTIGATÓRIO CRIMINAL. QUEBRA DE SIGILO FISCAL PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. AUSÊNCIA DE AUTORIZAÇÃO JUDICIAL. IMPOSSIBILIDADE I - A proteção ao sigilo bancário e fiscal não consubstancia direito absoluto, cedendo passo quando presentes circunstâncias que denotem a existência de interesse público relevante ou de elementos aptos a indicar a possibilidade de prática delituosa (Precedentes). II - Entretanto, o Ministério Público não tem legitimidade para proceder a quebra de sigilo bancário e fiscal sem autorização judicial (Precedentes). Recurso desprovido. (RMS 25375/PA, Rel. Ministro FELIX FISCHER, QUINTA TURMA, julgado em 19/02/2008, DJe 07/04/2008) PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. DELITO TRIBUTÁRIO. LANÇAMENTO. CONDIÇÃO OBJETIVA DE PUNIBILIDADE. MINISTÉRIO PÚBLICO. AÇÃO PENAL. INÍCIO. IMPOSSIBILIDADE. REQUISIÇÃO. INFORMAÇÕES BANCÁRIAS E FISCAIS. INTERVENÇÃO JUDICIAL. INEXISTÊNCIA. PROVA ILÍCITA. ORDEM CONCEDIDA. 1. O lançamento definitivo é conditio sine qua non para a constituição do crédito tributário, de modo que, sem ele, não há que se falar em supressão de tributo e, portanto, inexiste a necessária legitimidade para instauração da ação penal; 2. Sendo o exaurimento do processo administrativo-fiscal de lançamento condição objetiva de punibilidade do delito tributário, a sua falta configura-se barreira intransponível ao Parquet para iniciar a persecutio in judicio, pois além de ensejar constrangimento ilegal, será de todo inútil; 3. O Ministério Público não detém o poder de, per se, determinar a quebra de sigilo fiscal e bancário, mas somente quando for precedida da devida autorização judicial, pena de macular de ilícita a prova obtida e, assim, imprestável para o fim de sustentar a ação penal ou decisão condenatória; 4. Ordem concedida para trancar o processo criminal. (HC 31205/RJ, Rel. Ministro HAMILTON CARVALHIDO, Rel. p/ Acórdão Ministro PAULO MEDINA, SEXTA TURMA, julgado em 02/09/2004, DJ 26/11/2007, p. 247) PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS. EVASÃO DE DIVISAS E SONEGAÇÃO FISCAL. QUEBRA DE SIGILO FISCAL E BANCÁRIO. AUTORIZAÇÃO JUDICIÁRIA PARA COMPARTILHAMENTO DE INFORMAÇÕES OBTIDAS EM OUTROS INQUÉRITOS QUE NÃO SE ESTENDE A FUTURAS QUEBRAS DE SIGILO FISCAL E BANCÁRIO.

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REQUISIÇÃO DIRETA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO. IMPOSSIBILIDADE. CONSTRANGIMENTO ILEGAL RECONHECIDO. RECURSO PROVIDO. 1. Os membros do Ministério Público, no uso de suas prerrogativas institucionais, não estão autorizados a requisitar documentos fiscais e bancários sigilosos diretamente ao fisco e às instituições financeiras, sob pena de violar os direitos e garantias constitucionais da intimidade de da vida privada dos cidadãos. 2. A despeito de o sigilo das informações fiscais e bancárias não ser absoluto, uma vez que pode ser mitigado quando haja preponderância de interesse público, notadamente da persecução criminal, o próprio texto constitucional (art. 5º, inciso XII) exige a prévia manifestação da autoridade judicial, preservando, assim, a imparcialidade da decisão. 3. A autorização judicial para compartilhamento de dados e documentos obtidos nos autos de inquéritos policiais já instaurados, não valida, absolutamente, a futura requisição de dados sigilosos diretamente ao Fisco ou às Instituições Financeiras. 4. Recurso provido para determinar o desentranhamento dos autos das provas colhidas diretamente perante o Fisco sem autorização judicial. (RHC 26236/RJ, Rel. Ministro ARNALDO ESTEVES LIMA, QUINTA TURMA, julgado em 15/12/2009, DJe 01/02/2010)

O Supremo Tribunal Federal não destoa do entendimento:

E M E N T A: CRIME ELEITORAL - DELITO DE DESOBEDIÊNCIA (ART. 347 DO CÓDIGO ELEITORAL) - ALEGAÇÃO DE FALTA DE JUSTA CAUSA PARA A INSTAURAÇÃO DA PERSECUÇÃO PENAL - POSSIBILIDADE DE CONTROLE JURISDICIONAL, MESMO EM SEDE DE "HABEAS CORPUS", PORQUE LÍQUIDOS OS FATOS SUBJACENTES À ACUSAÇÃO PENAL - QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO - GERENTES DE INSTITUIÇÃO FINANCEIRA QUE SÓ DEIXAM DE CUMPRIR A ORDEM JUDICIAL, EM FACE DA AUSÊNCIA, NELA, DE DADOS ESSENCIAIS À SUA FIEL EXECUÇÃO - INOCORRÊNCIA DE DOLO - NÃO-CONFIGURAÇÃO DO CRIME DE DESOBEDIÊNCIA - "HABEAS CORPUS" DEFERIDO. PERSECUÇÃO PENAL - AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA - CONSTATAÇÃO OBJETIVA DA LIQUIDEZ DOS FATOS - POSSIBILIDADE DE CONTROLE JURISDICIONAL EM SEDE DE "HABEAS CORPUS". - É lícito, ao Poder Judiciário, mesmo na via sumaríssima da ação de "habeas corpus", verificar se existe, ou não, justa causa para a instauração da "persecutio criminis", ainda que já iniciado, em juízo, o procedimento penal. - Para que tal controle jurisdicional se viabilize, no entanto, impõe-se que inexista qualquer situação de iliquidez ou de dúvida objetiva quanto aos fatos subjacentes à acusação penal, pois o reconhecimento da ausência de justa causa, para efeito de extinção do procedimento persecutório, reveste-se de caráter extraordinário, quando postulado em sede de "habeas corpus". Precedentes. A QUEBRA DE SIGILO NÃO PODE SER UTILIZADA COMO INSTRUMENTO DE DEVASSA INDISCRIMINADA, SOB PENA DE OFENSA À GARANTIA CONSTITUCIONAL DA INTIMIDADE. - A quebra de sigilo não pode ser manipulada, de modo arbitrário, pelo Poder Público ou por seus agentes. É que, se assim não fosse, a quebra de sigilo converter-se-ia,

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ilegitimamente, em instrumento de busca generalizada e de devassa indiscriminada da esfera de intimidade das pessoas, o que daria, ao Estado, em desconformidade com os postulados que informam o regime democrático, o poder absoluto de vasculhar, sem quaisquer limitações, registros sigilosos alheios. Doutrina. Precedentes. - Para que a medida excepcional da quebra de sigilo bancário não se descaracterize em sua finalidade legítima, torna-se imprescindível que o ato estatal que a decrete, além de adequadamente fundamentado, também indique, de modo preciso, dentre outros dados essenciais, os elementos de identificação do correntista (notadamente o número de sua inscrição no CPF) e o lapso temporal abrangido pela ordem de ruptura dos registros sigilosos mantidos por instituição financeira. Precedentes. CRIME DE DESOBEDIÊNCIA (ART. 347 DO CÓDIGO ELEITORAL) - GERENTES DE INSTITUIÇÃO FINANCEIRA QUE SÓ DEIXAM DE CUMPRIR ORDEM JUDICIAL DE QUEBRA DE SIGILO BANCÁRIO, PORQUE NELA AUSENTES DADOS ESSENCIAIS - INEXISTÊNCIA DE DOLO - NÃO-CARACTERIZAÇÃO DE DELITO ELEITORAL. - Não pratica o crime de desobediência previsto no art. 347 do Código Eleitoral, o gerente de instituição financeira que somente deixa de cumprir ordem de quebra de sigilo bancário emanada da Justiça Eleitoral, porque não indicados, pelo magistrado que a ordenou, elementos essenciais à fiel execução da determinação judicial, como a correta identificação do correntista (referência ao seu CPF, p. ex.) e a precisa delimitação temporal (que não pode ser indeterminada) correspondente ao período abrangido pela investigação estatal. (HC 84758, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 25/05/2006, DJ 16-06-2006 PP-00005 EMENT VOL-02237-02 PP-00206 RTJ VOL-00201-02 PP-00581 LEXSTF v. 28, n. 331, 2006, p. 419-435) EMENTAS: 1. RECURSO. Extraordinário. Inadmissibilidade. Instituições Financeiras. Sigilo bancário. Quebra. Requisição. Ilegitimidade do Ministério Público. Necessidade de autorização judicial. Jurisprudência assentada. Ausência de razões novas. Decisão mantida. Agravo regimental improvido. Nega-se provimento a agravo regimental tendente a impugnar, sem razões novas, decisão fundada em jurisprudência assente na Corte. 2. RECURSO. Agravo. Regimental. Jurisprudência assentada sobre a matéria. Caráter meramente abusivo. Litigância de má-fé. Imposição de multa. Aplicação do art. 557, § 2º, cc. arts. 14, II e III, e 17, VII, do CPC. Quando abusiva a interposição de agravo, manifestamente inadmissível ou infundado, deve o Tribunal condenar a agravante a pagar multa ao agravado. (RE 318136 AgR, Relator(a): Min. CEZAR PELUSO, Segunda Turma, julgado em 12/09/2006, DJ 06-10-2006 PP-00064 EMENT VOL-02250-04 PP-00800) EMENTA: - CONSTITUCIONAL. MINISTÉRIO PÚBLICO. SIGILO BANCÁRIO: QUEBRA. C.F., art. 129, VIII. I. - A norma inscrita no inc. VIII, do art. 129, da C.F., não autoriza ao Ministério Público, sem a interferência da autoridade judiciária, quebrar o sigilo bancário de alguém. Se se tem presente que o sigilo bancário é espécie de direito à privacidade, que a C.F. consagra, art. 5º, X, somente autorização expressa da Constituição legitimaria o Ministério Público a promover, diretamente e sem a intervenção da autoridade judiciária, a quebra do sigilo bancário de qualquer pessoa. II. - R.E. não conhecido. (RE 215301, Relator(a): Min. CARLOS VELLOSO, Segunda Turma, julgado

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em 13/04/1999, DJ 28-05-1999 PP-00024 EMENT VOL-01952-07 PP-01303 RTJ VOL-00169-02 PP-00700)

Admitindo-se, por exercício de retórica, que V. Exa. entenda pela possibilidade de o Ministério Público Federal requisitar informações sigilosas a quaisquer órgãos, dentre os quais a Receita Federal, ainda assim seria pernicioso o compartilhamento de informações estabelecido entre os dois órgãos. Primeiro, porque absolutamente arbitrário, sem que tivesse fundamentado minimamente o interesse na prova ilicitamente buscada. Ora, sendo o Delegado da Receita Federal o garantidor do sigilo daquelas informações, o mínimo que se espera é que seja diligente na relativização de tal confidencialidade. Sequer poderia saber se se tratava de interesse institucional em investigação que tramitava junto ao Ministério Público Federal, ou se o Procurador da República estava buscando informações fiscais de terceiros para atender a algum interesse privado (eventual investidor, ou futuro comprador de um imóvel seu, por exemplo) Mesmo no âmbito administrativo, é imprescindível a fundamentação dos atos, até para se saber a necessidade de medida gravosa à privacidade do cidadão. Além da falta de qualquer fundamentação, o pedido foi lastreado exclusivamente em denúncia anônima, conforme o despacho que encaminhou o requerimento, o que é absolutamente incompatível em um Estado Democrático de Direito. Os Tribunais Superiores, em que pese admitam a denúncia anônima, vêm mitigando sua importância como prova única a autorizar medidas constritiva a direitos fundamentais dos investigados, como é o caso dos autos, e conforme amplamente tratado no tópico acima.

HABEAS CORPUS. "OPERAÇÃO CASTELO DE AREIA". DENÚNCIA ANÔNIMA NÃO SUBMETIDA À INVESTIGAÇÃO PRELIMINAR. DESCONEXÃO DOS MOTIVOS DETERMINANTES DA MEDIDA CAUTELAR. QUEBRA DE SIGILO DE DADOS. OFENSA ÀS GARANTIAS CONSTITUCIONAIS. PROCEDIMENTO DE INVESTIGAÇÃO FORMAL. NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DE MOTIVOS IDÔNEOS. BUSCA GENÉRICA DE DADOS.

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As garantias do processo penal albergadas na Constituição Federal não toleram o vício da ilegalidade mesmo que produzido em fase embrionária da persecução penal. A denúncia anônima, como bem definida pelo pensamento desta Corte, pode originar procedimentos de apuração de crime, desde que empreendida investigações preliminares e respeitados os limites impostos pelos direitos fundamentais do cidadão, o que leva a considerar imprópria a realização de medidas coercitivas absolutamente genéricas e invasivas à intimidade tendo por fundamento somente este elemento de indicação da prática delituosa. A exigência de fundamentação das decisões judiciais, contida no art. 93, IX, da CR, não se compadece com justificação transversa, utilizada apenas como forma de tangenciar a verdade real e confundir a defesa dos investigados, mesmo que, ao depois, supunha-se estar imbuída dos melhores sentimentos de proteção social. Verificada a incongruência de motivação do ato judicial de deferimento de medida cautelar, in casu, de quebra de sigilo de dados, afigura-se inoportuno o juízo de proporcionalidade nele previsto como garantia de prevalência da segurança social frente ao primado da proteção do direito individual. Ordem concedida em parte, para anular o recebimento da denúncia da Ação Penal n.º 2009.61.81.006881-7. (HC 137349/SP, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, SEXTA TURMA, julgado em 05/04/2011, DJe 30/05/2011)

O raciocínio é singelo: se existiam outros meios para se apurar os fatos, torna-se absolutamente desnecessária a opção pela medida mais invasiva da privacidade dos investigados, como é exatamente o caso em exame, razão pela qual é de ser reconhecida a nulidade da prova decorrente dessa criminosa comunicação lateral entre Ministério Público Federal e Receita Federal.

II.4 ILICITUDE DA PROVA: FORMAÇÃO DOS 44 MILHÕES (MPC-TCE)

A partir de comunicação apócrifa inicialmente recebida no Ministério Público Federal e, posteriormente, tomado e reduzido a termo o depoimento do denunciante anônimo naquela mesma repartição, algumas informações ensejaram compartilhamento de dados com a Receita Federal do Brasil. O Ministério Público Federal, desrespeitando a verticalidade exigida no que diz respeito a dados sigilosos, tratou de buscá-los diretamente junto à Receita Federal do Brasil, fato que já é objeto de discussão no Habeas Corpus nº. 234.857/RS, de relatoria da Ministra Laurita Vaz, impetrado em favor de Denise Nachtigall Luz, ainda pendente de julgamento. Naquela ocasião o Ministério Público Federal oficiou à Delegacia da Receita Federal de Santa Maria/RS, a realização de investigações iniciais sobre a mencionada denúncia anônima, tendo como fonte as informações

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sigilosas de que o Fisco dispunha. Com as informações, foram requeridas – e deferidas – interceptações telefônica de diversas pessoas. Durante o procedimento investigatório, aportou aos autos – além dos dados indevidamente compartilhados junto à Receita Federal – curiosa troca de e-mails entre o Procurador da República Rafael Brum Miron, à época encarregado do caso (e que posteriormente se declarou impedido) e o Adjunto de Procurador do Ministério Público de Contas do Rio Grande do Sul Geraldo da Camino:

Folha 1005 do Procedimento de Escutas Telefônicas nº. 2007.71.02.004243-6

As aproximações entre Ministério Público Federal e o Ministério Público de Contas do Rio Grande do Sul se iniciaram, como se permite ver do email de 26 de julho de 2007, enviado pelo Procurador da República Rafael Brum Miron ao Adjunto de Procurador de Contas do Ministério Público do Rio Grande do Sul Geraldo Da Camino, por iniciativa deste último, diretamente ao parquet federal, sem qualquer participação da Corte de Contas. Mais adiante, as comunicações se tornam mais explícitas, com

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evidente troca de materiais. Na comunicação abaixo, datada de 6 de agosto, o Ministério Público de Contas encaminhou ao Ministério Público Federal cópia da Representação nº. 0035/2007, solicitando, inclusive, ao final, o envio de novas informações que eventualmente aportassem ao Ministério Público Federal.

Folha 806 do Procedimento de Escutas Telefônicas nº. 2007.71.02.004243-6

Justamente nesta Representação 0035/2007, enviada pelo Adjunto de Procurador do Ministério Público de Contas ao Procurador da República, elaborada com material compartilhado entre os dois parquets que se faz alusão expressa aos R$ 44 milhões, valor que desde sua veiculação suja de maneira indelével os nomes de todos os envolvidos. Naquele documento, primeiramente o Ministério Público de Contas admite expressamente ter se valido de informações obtidas diretamente junto ao Ministério Público Federal, como se pode ver:

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Folha 831 do Procedimento de Escutas Telefônicas nº. 2007.71.02.004243-6

E, posteriormente, faz suas conclusões – ilações? – sobre o montante envolvido, as quais serviram para balizar não só os julgamentos preconceituosos da imprensa, como a denúncia ministerial e até mesmo a decisão de 26 de maio de 2008, que recebeu a inicial incoativa, notadamente no final do item 1.1.

Folha 832 do Procedimento de Escutas Telefônicas nº. 2007.71.02.004243-6

No e-mail seguinte aos reproduzidos acima, ainda no mesmo dia 6 de agosto, o Procurador da República atende a solicitação do Adjunto de Procurador do Ministério Público de Contas, remetendo-lhe termo de depoimento do Prof. Dario Trevisan de Almeida (PA824-2007), colhido em um procedimento que, desde maio, era – ou deveria ser – sigiloso.

Folha 1003 do Procedimento de Escutas Telefônicas nº. 2007.71.02.004243-6

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Ainda, em 28 de agosto, o Adjunto de Procurador do Ministério Público de Contas solicitou ao Procurador da República acesso a novos documentos da investigação.

Folha 1003 do Procedimento de Escutas Telefônicas nº. 2007.71.02.004243-6

Aliás, o sigilo que o representante do Ministério Público Federal violou, compartilhando informações com um burocrata do Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul, foi determinado no mesmo procedimento de escutas telefônicas, na primeira decisão que deferiu as interceptações.

Folha 264 do Procedimento de Escutas Telefônicas nº. 2007.71.02.004243-6

Causa estranheza que apesar das inúmeras comunicações eletrônicas entre Ministério Público Federal e Ministério Público de Contas, somente em 21 de setembro de 2007 (mais de um mês e meio depois das primeiras trocas de informações) o parquet Federal tenha requerido expressamente nos autos

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do Procedimento de Escutas Telefônica o acesso àquele acervo probatório, nos termos que seguem:

Folha 998 do Procedimento de Escutas Telefônicas nº. 2007.71.02.004243-6

Se quando já tinha franqueado amplo acesso de documentos sigilosos ao Ministério Público de Contas, mesmo assim o Ministério Público Federal entendeu necessário requerer autorização para permitir acesso dos documentos àquele órgão, é absolutamente razoável concluir que não era dado ao parquet disponibilizar acesso a documentos sigilosos quaisquer fossem, em especial a um órgão atípico como esse Ministério Público Especial, organicamente satelitário da Corte de Contas. Fazendo-o, da forma como fez, incorreu em grave irregularidade ensejadora da nulidade ora apontada. Em 21 de setembro de 2007 sobreveio decisão que deferiu o pedido ministerial, sob o seguinte fundamento:

Folha 1008v do Procedimento de Escutas Telefônicas nº. 2007.71.02.004243-6

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E assim prosseguiu seu raciocínio:

Folha 1009 do Procedimento de Escutas Telefônicas nº. 2007.71.02.004243-6

Em 7 de outubro de 2009, o procurador dos acusados à época protocolou junto ao Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul pedido de informações com relação aos fatos acima descritos, no qual solicitava respostas aos seguintes questionamentos:

1. Quais foram os trâmites do processo que resultou nas informações técnicas n. 0066/2007 e 0074/2007 de autoria dos servidores APE Roberto Ponsi e Sérgio Iengler? Referido procedimento ocorreu de acordo com as normas legais (internas, ordinárias e constitucionais) que regem os procedimentos desse Conselho de Contas? 2. À época em que ocorreu a chamada Operação Rodin - 06.11.2007 - tinha essa Corte termo de cooperação firmado com o Ministério Público Federal, Justiça Federal e Polícia Federal para fornecimento de dados e ou informações? Tal termo em existindo foi apreciado pela Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul? 3. Qual a razão ou fundamento para o ora requerente na qualidade de representante da empresa não ter sido notificado para exercer o direito constitucional à mais ampla defesa e ao contraditório, considerando que envolvia

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interesse da mesma como amplamente divulgado pela imprensa, chegando esta a ser taxada de mentora do "esquema criminoso" que envolveu o alegado desvio dos quarenta e quatro milhões? 4. Tinha o Procurador atribuição e competência para atuar conjuntamente com a Polícia Federal fora do âmbito do Tribunal de Contas atuando inclusive junto à Superintendência da Polícia Federal como noticiado? Em caso afirmativo qual o fundamento legal considerado no caso para tal atuação? 5. O compartilhamento de informações e dados sigilosos envolvendo a Polícia Federal, o Ministério Público Federal e o Sr. Procurador Geraldo da Camino era de conhecimento formal desta Corte? Recebeu esta Corte alguma determinação judicial para compartilhar informações?

Em 2 de dezembro de 2009, o Conselheiro Porfírio Peixoto, DD. Presidente do Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul respondeu ao requerimento, por meio do Of. GP nº. 1686/2009, com o seguinte teor:

Tenho a satisfação de cumprimentá-lo e, na oportunidade, em atenção aos questionamento enviados por Vossa Senhoria, como Procurador do Senhor José Antônio Fernandes e da Empresa Pensant Consultores Ltda., informo-lhe o que segue. 1. Não compete a este Tribunal explicitar o trâmite do processo, o fundamento legal e a metodologia de trabalho empregados na produção das "informações técnicas nº. 0066/2007 e 0074/2007 de autoria dos servidores APE Roberto Ponsi e APE Sérgio Lender (sic)", porquanto referidos documentos foram produzidos no âmbito do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas do Estado, instituição dotada de independência funcional. O fornecimento de "cópia na íntegra de todo procedimento efetuado, estudos técnicos utilizados, bem como eventuais documentos com informações a respeito das atividades da Empresa Pensant Consultores Ltda. porventura utilizados que serviram para análise e conclusão do valor alegado pelos Servidores"não é viável, tendo em vista que não foram produzidos pelo Tribunal de Contas do Estado, como já explicitado. 2. Na data de 06 de novembro de 2007, o Tribunal de Contas do Estado não mantinha Termo de Cooperação firmado com o Ministério Público Federal, com a Justiça Federal e com a Polícia Federal. 3. Nos termos do artigo 34 da lei Estadual nº. 11.424, de 06 de janeiro de 2000 (LOTCE), não se aplica ao requerente o disposto no incio III do artigo 48 do Regimento Interno desta Corte que trata da intimação do responsável à apresentação de defesa ou de esclarecimentos, tendo em vista que o mesmo não consta como administrador ou responsável em expediente, processo ou procedimento levado a efeito pelo Tribunal de Contas. 4. As atribuições, as competências e as prerrogativas do Procurador que oficia junto ao Tribunal de Contas do Estado decorrem dos artigos 127 a 130 da Constituição da República, da Lei Estadual nº. 11.424, de 06/12/2000, da Lei Estadual nº. 11.160, de 26/05/1998, do Regimento Interno do Tribunal de Contas do Estado, aprovado pela Resolução nº. 544, de 21/06/2000, e do Regimento Interno do Ministério Público de Contas (Resolução nº. 001/2000 - DOE de 21/07/2000). 5. Não foram localizados, neste Tribunal, documentos probantes de que era de seu conhecimento formal "o compartilhamento de informações e

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dados sigilosos envolvendo a Polícia Federal, o Ministério Público Federal e o Sr. Procurador Geraldo Da Camino"; e nem recebeu esta Corte de Contas determinação judicial para compartilhar informações. 6. O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, por seu Procurador, formalizou a Promoção nº. 0606/2009 de 02 de setembro de 2009. Em 16 de setembro de 2009 o Conslheiro-Relator João Osório Ferreira Martins determinou a reinstrução do processo. Nos termos do artigo 2º da Resolução nº. 770/2007, alterado pela Resolução nº. 862/2009, somente poderão ser fornecidas informações e cópia de processos em tramitação no Tribunal de Contas às partes ou aos seus procuradores devidamente constituidos, bem como aos demais legitimados à interposição de recursos e proposição de pedidos de revisão. Assim, considerando que o requerente não é parte no referido processo, nem representante constituído, carece de legitimidade para o pleito. Ao ensejo, apresento minhas cordiais saudações.

Ocorre, Excelência, que há situação sui generis no caso presente. A Constituição Federal assegura ao Ministério Público de Contas as mesmas disposições com relação a direitos, vedações e forma de investidura dos demais órgãos do Ministério Público11. Todavia, tal equiparação - diretamente relacionada ao cargo - não dá ao Ministério Público os mesmos poderes institucionais dos demais Ministérios Públicos, notadamente os investigatórios. Vale lembrar que o Tribunal de Contas é órgão integrante da estrutura do Poder Legislativo, tendo sua atuação, no âmbito federal, previsto no artigo 71 da Constituição Federal:

Art. 71. O controle externo, a cargo do Congresso Nacional, será exercido com o auxílio do Tribunal de Contas da União, ao qual compete: I - apreciar as contas prestadas anualmente pelo Presidente da República, mediante parecer prévio que deverá ser elaborado em sessenta dias a contar de seu recebimento; II - julgar as contas dos administradores e demais responsáveis por dinheiros, bens e valores públicos da administração direta e indireta, incluídas as fundações e sociedades instituídas e mantidas pelo Poder Público federal, e as contas daqueles que derem causa a perda, extravio ou outra irregularidade de que resulte prejuízo ao erário público; III - apreciar, para fins de registro, a legalidade dos atos de admissão de pessoal, a qualquer título, na administração direta e indireta, incluídas as fundações instituídas e mantidas pelo Poder Público, excetuadas as nomeações para cargo de provimento em comissão, bem como a das concessões de aposentadorias,

                                                                                                               11 Art. 130. Aos membros do Ministério Público junto aos Tribunais de Contas aplicam-se as disposições desta seção pertinentes a direitos, vedações e forma de investidura.

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reformas e pensões, ressalvadas as melhorias posteriores que não alterem o fundamento legal do ato concessório; IV - realizar, por iniciativa própria, da Câmara dos Deputados, do Senado Federal, de Comissão técnica ou de inquérito, inspeções e auditorias de natureza contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial, nas unidades administrativas dos Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário, e demais entidades referidas no inciso II; V - fiscalizar as contas nacionais das empresas supranacionais de cujo capital social a União participe, de forma direta ou indireta, nos termos do tratado constitutivo; VI - fiscalizar a aplicação de quaisquer recursos repassados pela União mediante convênio, acordo, ajuste ou outros instrumentos congêneres, a Estado, ao Distrito Federal ou a Município; VII - prestar as informações solicitadas pelo Congresso Nacional, por qualquer de suas Casas, ou por qualquer das respectivas Comissões, sobre a fiscalização contábil, financeira, orçamentária, operacional e patrimonial e sobre resultados de auditorias e inspeções realizadas; VIII - aplicar aos responsáveis, em caso de ilegalidade de despesa ou irregularidade de contas, as sanções previstas em lei, que estabelecerá, entre outras cominações, multa proporcional ao dano causado ao erário; IX - assinar prazo para que o órgão ou entidade adote as providências necessárias ao exato cumprimento da lei, se verificada ilegalidade; X - sustar, se não atendido, a execução do ato impugnado, comunicando a decisão à Câmara dos Deputados e ao Senado Federal; XI - representar ao Poder competente sobre irregularidades ou abusos apurados. § 1º - No caso de contrato, o ato de sustação será adotado diretamente pelo Congresso Nacional, que solicitará, de imediato, ao Poder Executivo as medidas cabíveis. § 2º - Se o Congresso Nacional ou o Poder Executivo, no prazo de noventa dias, não efetivar as medidas previstas no parágrafo anterior, o Tribunal decidirá a respeito. § 3º - As decisões do Tribunal de que resulte imputação de débito ou multa terão eficácia de título executivo. § 4º - O Tribunal encaminhará ao Congresso Nacional, trimestral e anualmente, relatório de suas atividades.

O Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul tem sua disciplina definida na Constituição Estadual, de 3 de outubro de 1989, a partir do também artigo 71:

Art. 71 - O controle externo, a cargo da Assembléia Legislativa, será exercido com auxílio do Tribunal de Contas, ao qual compete, além das atribuições previstas nos arts. 71 e 96 da Constituição Federal, adaptados ao Estado, emitir parecer prévio sobre as contas que os Prefeitos Municipais devem prestar anualmente. § 1º - Os contratos de locação de prédios e de serviços firmados entre quaisquer das entidades referidas no artigo anterior e fundações privadas de caráter previdenciário e assistencial de servidores deverão ser encaminhados ao Tribunal de Contas, que também avaliará os valores neles estabelecidos.

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§ 2º - O Tribunal de Contas terá amplo poder de investigação, cabendo-lhe requisitar e examinar, diretamente ou através de seu corpo técnico, a qualquer tempo, todos os elementos necessários ao exercício de suas atribuições. § 3º - Não poderá ser negada qualquer informação, a pretexto de sigilo, ao Tribunal de Contas. § 4º - A Mesa ou as comissões da Assembléia Legislativa poderão requisitar, em caráter reservado, informações sobre inspeções realizadas pelo Tribunal de Contas, ainda que as conclusões não tenham sido julgadas ou aprovadas. § 5º - Compete ao Tribunal de Contas avaliar a eficiência e eficácia dos sistemas de controle interno dos órgãos e entidades por ele fiscalizados.

A Constituição Estadual, no artigo 77, tratou de condicionar a atuação do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas à lei regulamentadora:

Art. 77 - O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, instituído na forma do art. 130 da Constituição Federal, será regulamentado por lei.

A Lei Estadual Complementar nº. 11.299, de 29 de dezembro de 1998, ao dispor sobre os contratos celebrados pela administração pública direta, indireta ou fundacional de qualquer dos Poderes do Estado, assim definiu em seu artigo 6º:

Art. 6º - O Tribunal de Contas verificará a ocorrência, em contrato, de ilegalidade, abuso de poder ou violação de princípio a que se subordine a administração pública: I - de ofício; II - por determinação da Assembléia Legislativa, mediante deliberação do Plenário, de sua Mesa ou de qualquer de suas comissões, permanentes ou de inquérito; III - diante de petição ou representação de qualquer pessoa, física ou jurídica. § 1o - A atividade de ouvidoria pública prevista pelo artigo 74, parágrafo 2o, da Constituição Federal, que funciona junto ao Tribunal de Contas do Estado, será amplamente divulgada e acolherá denúncias fundamentadas de irregularidades. § 2o - Em caso de ilegalidade ou irregularidade em contratação, o Tribunal de Contas, nos termos do artigo 71, inciso IX, da Constituição Federal, combinado com o artigo 70, caput, da Constituição do Estado, determinará seu saneamento à autoridade responsável, se entender a providência adequada e suficiente, assinando prazo para tanto. § 3o - Se a determinação do saneamento da irregularidade for considerada inadequada ou insuficiente, ou não for atendida no prazo fixado, o Tribunal de Contas do Estado deliberará pela impugnação do contrato, no todo ou em parte, nos termos e para os fins do artigo 53, inciso XV, da Constituição do Estado. § 4o - O Tribunal de Contas do Estado comunicará as decisões previstas nos parágrafos 2o e 3o deste artigo: I - ao Ministério Público; II - à Assembléia Legislativa, quando ela tiver determinado a verificação de irregularidade; III - ao peticionário ou reclamante, em caso de petição ou reclamação.

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Ou seja, da breve leitura já se permite notar que quem tem legitimidade para provocar o Ministério Público é o Tribunal de Contas, e não um departamento desta Corte, como o é o Ministério Público de Contas, como se permite ver da estrutura organizacional do Tribunal de Contas do Rio Grande do Sul, definida em seu Regimento Interno, instituído pela Resolução nº. 544, de 21 de junho de 2000, atualidada até a Resolução nº. 943, de 4 de abril de 2012:

Art. 24 – O Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, ao qual se aplicam os princípios constitucionais da unidade, da indivisibilidade e da independência funcional, compõe-se do Procurador, que será seu chefe, e de três (3) Adjuntos de Procurador, dentre brasileiros, bacharéis em Direito e nomeados pelo Governador do Estado, tendo como função precípua zelar pela aplicação da lei. Art. 25 - Compete ao Ministério Público: I - promover a defesa da Ordem Jurídica, requerendo, perante a Corte de Contas, as medidas de interesse da Justiça, da Administração e do Erário, bem como outras definidas em lei ou decorrentes de suas funções; II - comparecer às sessões do Tribunal, com declaração de ter sido presente; III - opinar, em parecer oral ou escrito, em todos os processos, exceto os de natureza administrativa interna, os relativos às consultas, nos recursos de agravo regimental e de embargos declaratórios; IV - propor a instauração de tomada de contas especial, quando souber da existência de alcance ou de pagamentos ilegais; V - levar ao conhecimento da administração fatos ou atos ilegais de que tenha conhecimento em virtude do cargo; VI - zelar pelo cumprimento das decisões do Tribunal; VII - acompanhar administrativamente, junto à Procuradoria-Geral do Estado, as providências decorrentes de representações e de cumprimento de decisões do Tribunal de Contas; VIII - interpor recursos e propor pedidos de revisão previstos em lei e neste Regimento. Parágrafo único - Compete, ainda, ao Procurador avocar, quando julgar necessário, processo que esteja sob exame de qualquer membro do Ministério Público.

Dentre as atribuições definidas pelo próprio Regimento Interno do Tribunal de Contas do Rio Grande do Sul, verte claro que a atividade investigatória não restou contemplada, e a jurisdição do Ministério Público de Contas limita-se à jurisdição do Tribunal de Contas do Estado. Entendimento diverso, o Ministério Público de Contas ocuparia o mesmo espaço jurisdicional do Ministério Público Estadual. Dessa forma, qualquer iniciativa investigatória por parte do Procurador-Geral ou de seus Adjuntos nasce já maculada de insanável ilegalidade. Maior gravidade, Excelência, quando ela é um dos pilares de

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sustentação de uma despropositada denúncia, como é o caso presente. Mas não se pense que a questão é nova. A discussão acerca da natureza jurídica do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas já foi submetida ao Plenário do Supremo Tribunal Federal, por meio da ADI 789-1/DF, proposta pelo Procurador-Geral da República contra dispositivos constantes na Lei nº. 8.443, de 16 de julho de 1992, que dispõe sobre a Lei Orgânica do Tribunal de Contas da União. Especificamente, o Procurador-Geral da República buscava a inconstitucionalidade de todos os dispositivos que outorgavam Ministério Público junto ao Tribunal de Contas identidade de órgão autônomo, por entender que tal dispositivo acabaria por violar as autonomias funcional e administrativa conferidas constitucionalmente ao Ministério Público12. No voto que conduziu o julgamento improcedente da pretensão declaratória de inconstitucionalidade, o Ministro Celso de Mello pontuou o caráter excêntrico do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas, mas reconheceu as garantias inerentes ao cargo asseguradas pela Constituição Federal. Em seu voto, assim se manifestou:

Impõe-se reconhecer, desse modo, que existe esse Ministério Público especial, cujas atividades funcionais, no entando, acham-se restritas ao âmbito do Tribunal de Contas da União. Por encontrar assento normativo no texto de nossa Carta Política, o Ministério Público especial não pode ser desconsiderado em sua inquestionável existência jurídica. (...) A mera previsão constitucional da existência de um Ministério Público especial junto ao Tribunal de Contas não basta, contudo, para conferir-lhe as mesmas prerrogativas jurídicas que inerem, no plano institucional, ao Ministério Público da União e dos Estados-membros. (...) O exame desse preceito normativo [o artigo 130 da Constituição Federal] permite nele divisar, desde logo, a existência de cláusulas de garantia de ordem meramente subjetiva, desprovidas de conteúdo orgânico-institucional, e vocacionadas, no âmbito de sua destinação tutelar, a proteger os integrantes do Ministério Público - e a estes, somente - no relevante desempenho de suas funções junto aos Tribunais de Contas. Essas garantias, na realidade, visam a conferir, no âmbito das relações que se estabelecem entre esses agentes estatais e a instituição perante a qual atuam, um estatuto jurídico especial destinado a assegurar a independência (CF, art. 128, §

                                                                                                               12 Ou, como pontuou o Ministro Francisco Rezek, em seu voto: "Quer a impetração convencer de que esse singular Ministério Público a que se refere o art. 130 nada mais é que algo compreendido na letra a do inciso I do art. 128, ou seja, parte do Ministério Público Federal".

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5º, I), a preservar a imparcialidade (CF, art. 128, § 5º, II) e a conferir vantagens específicas de carreira (CF, art. 129, §§ 3º e 4º) em favor dos membros do Ministério Público junto aos Tribunais de Contas, impondo-lhes, para efeito de ingresso nessa instituição, a prévia aprovação em concurso público de provas e títulos, com a necessária participação da OAB. Tendo presente o conteúdo normativo desse preceito constitucional, torna-se bastante evidente que não se pode, com fundamento nele, sustentar que o Ministério Público junto aos Tribunais de Contas configure, não obstante a sua indiscutível realidade constitucional, um organismo revestido de perfil institucional próprio, dotado de plena autonomia jurídica e investido das mesmas garantias de ordem objetiva que foram outorgados pela ordem constitucional ao Ministério Público da União e dos Estados-membros. (...) Não obstante o elevado grau de autonomia funcional conferido aos membros desse Ministério Público especial torna-se imperioso reconhecer que essa circunstância, por si só, não se revela suficiente para identificar, nesse órgão estatal, o atributo da autonomia institucional, nos termos, na extensão e com o conteúdo que a Constituição outorgou ao Ministério Público comum. (...) Considero, pois, que a norma constitucional em questão só tem por destinatários os agentes públicos nela referidos. Trata-se, como já pude salientar, de norma de extensão cuja natureza permite nela vislumbrar, tão-somente, um instrumento pelo qual o Estado buscou conferir, a quem ordinariamente não as possuiria, as garantias próprias dos membros do Ministério Público da União e dos Estados-membros.

E a razão pela qual o Ministro Celso de Mello chegou a tal conclusão é límpida e cristalina:

Estivesse esse Ministério Público incorporado ao próprio Ministério Público da União, tornar-se-ia de todo dispensável a utilização, pelo legislador constituinte, da norma de extensão mencionada, eis que os membros dessa instituição, precisamente por já se acharem a ela vinculados, titularizariam, por direito próprio, sem necessidade de expresso comando constitucional, as diversas situações subjetivas de vantagem que se revelam inerentes aos integrantes do Ministério Público comum, por efeito do que já dispõe a própria Constituição. (...) Disso tudo, Senhor Presidente, parece evidente que o legislador constituinte, ao referir-se, no art. 130 da Carta Política, aos membros do Ministério Público junto aos Tribunais de Contas, quis, na realidade, desvinculá-los do âmbito do Ministério Público comum, razão pela qual - como pude enfatizar - não se justifica o entendimento, meramente adstrito à literalidade do texto constitucional, de que a falta de referência a esse Ministério Público especial no art. 128 da Constituição teria o sentido de sumária recusa normativa de sua própria existência. O próprio conteúdo da regra inscrita no art. 130 da Constituição configura diretriz nitidamente indicativa de que o Ministério Público especial junto ao TCU não compõe o Ministério Público da União, a não ser por um dispensável exercício de superfetação constitucional, nada justificaria a extensão ordenada pela norma em causa.

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O voto do Ministro Relator foi acompanhado à unanimidade pelos demais Ministros. E não é somente da experiência jurisprudencial que decorre tal entendimento. Na visão de José Afonso da Silva, "...o art. 130 admite o Ministério Público especial, não mencionado no art. 128, junto aos Tribunais de contas, portanto junto a órgão não jurisdicional (...). Ao Ministério Público junto aos Tribunais de Contas só compete o exercício de suas funções essenciais de custos legis, porque a representação das Fazendas Públicas, aí, como em qualquer outro caso, é função dos respectivos Procuradores, nos termos dos arts. 131 e 13213". Com propriedade, José Cretella Jr. aponta elemento que derruba qualquer argumento em sentido contrário:

Os Tribunais de Contas, em qualquer esfera, a da União, a dos Estados, a do Distrito Federal e a dos Municípios, têm, em seus quadros, membros do Ministério Público, aplicando-se a esses membros as disposições constitucionais pertinentes a direitos, a vedações e a formas de investidura...14

O Ministério Público junto aos Tribunais de Contas não dispõe de fisiologia institucional própria, encontrando-se consolidado na intimidade estrutural das Corte de Contas, razão pela qual não pode ser considerado um órgão pertencente ao Ministério Público, com as prerrogativas e atribuições a ele inerentes, dentre as quais, a de investigar. Daí porque se conclui que a premissa utilizada pela magistrada no despacho que – mesmo sem poder – autorizou o compartilhamento de informações obtidas pelo Ministério Público Federal com o Ministério Público junto à Corte de Contas não corresponde ao melhor direito. Certamente por desconhecimento ou descuido, equiparou o Ministério Público de Contas ao Ministério Público Estadual, o que, como se vê, nem de longe é o caso. Repete-se, por oportuno, a reprodução do documento abaixo:                                                                                                                13 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 9a. ed. São Paulo: Malheiros. 1993. pp. 511-514 14 CRETELLA JR., José. Comentários à Constituição de 1988. vol. VI, item n. 355. Rio de Janeiro: Forense Universitária. 1992. p. 3334.

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Folha 1009 do Procedimento de Escutas Telefônicas nº. 2007.71.02.004243-6

Ora, Ministério Público Estadual, como já suficientemente dito, é completamente diferente do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas. A manifestação judicial confunde os Ministérios Públicos. Enquanto o Estadual tem suas atribuições definidas no artigo 127 da Constituição Federal, o que atua junto ao Tribunal de Contas não é propriamente um Ministério Público, senão que seus membros apenas gozam das mesma prerrogativas funcionais. O entendimento exarado é de que o Ministério Público Estadual atue diretamente junto à Corte de Contas, com atribuições de Procurador de Justiça, quando na verdade o Ministério Público junto ao Tribunal de Contas é uma procuradoria geral com garantias descritas no artigo 130 da Constituição Federal e poderes limitadíssimos aos descritos no Regimento Interno do Tribunal de Contas.

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O quarto parágrafo faz menção a uma figura que inexiste na ordem jurídica pátria: o Ministério Público Estadual Especial junto ao Tribunal de Contas, evidenciando claramente que a decisão incorreu em gravíssimo erro. Tal natureza, pouco convencional, do Ministério Público junto ao Tribunal de Contas restou reafirmada pelo Parecer nº. 23/2008, de lavra do Auditor Substituto de Conselheiro Pedro Henrique Poli de Figueiredo:

Na dicção de decisões transitadas em julgado no âmbito do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal, e que orientam as decisões desta Corte, principalmente tendo em vista que o Superior Tribunal de Justiça apreciou a situação específica deste Tribunal, o Ministério Público de Contas “não dispões de fisionomia institucional própria e encontra-se consolidado na intimidade estrutural” do Tribunal de Contas, razão pela qual, embora não tenha legitimidade para intimar, representar ou ajuizar, em nome do Ministério Público, ações judiciais, ou exigir providências administrativas externamente a este Tribunal, tem competência para noticiar, requerer e recorrer perante a Corte de Contas, inclusive no que diz respeito a atos praticados por magistrados dela.

De tudo, permite-se concluir que:

I. O Ministério Público de Contas não tem legitimidade investigatória. Trata-se de órgão pertencente ao quadro do Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul, este último vinculado à Assembléia Legislativa. Mesmo assim, participou ativamente, antes da deflagração da fase ostensiva da Operação Rodin, enviando e solicitando documentos, como o que ocorreu com o envio da Representação nº. 0035/2007 pelo Adjunto de Procurador do Ministério Público de Contas ao Procurador da República lotado em Santa Maria, e o envio do termo de depoimento de Dario Trevisan de Almeida pelo Procurador da Repúlica lotado em Santa Maria ao Adjunto de Procurador do Ministério Público de Contas.

II. Não havia qualquer força-tarefa, autorização judicial ou qualquer outro

protocolo de cooperação entre Ministério Público Federal e Ministério Público de Contas do Estado do Rio Grande do Sul que autorizasse compartilhamento de informações de forma horizontal, sem que passasse pelo Plenário da Corte de Contas.

III. As informações compartilhadas pelo Ministério Público Federal ao Ministério Público de Contas, em agosto de 2007, estavam protegidas por sigilo, tendo sido feitas antes da autorização judicial, que se deu somente em setembro de 2007.

IV. Há dois grandes problemas: todas as informações que saíram do Ministério Público Federal estão maculadas por terem sido compartilhadas

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antes de eventual autorização judicial no curso do presente processo; ao passo em que todas as informações, solicitações e requerimentos que partiram do Ministério Público de Contas estão maculadas por extrapolarem os limites institucionais do parquet junto ao Tribunal de Contas, nos termos do já apresentado acima.

Não bastasse o fato de ratificar todo o acima dito, ainda evidencia a contumácia da prática justiceira por parte do Ministério Público de Contas, razão pela qual é de ser reconhecido, de plano, a nulidade das provas emanadas daquele órgão.

II.5 DA CISÃO PROCESSUAL FEITA PELO JUÍZO DE 1º GRAU - USURPAÇÃO DE COMPETÊNCIA CONSTITUCIONAL DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

Em face dos princípios da conexão e da continência, dado o concurso de agentes na prática do delito, deve haver simultaneus processus. A circunstância de encontrar-se entre os co-réus pessoa que deve ser processada pelo Supremo Tribunal Federal, sua competência se prorroga em relação aos demais acusados, salvo se esta Corte declinar de sua competência, na hipótese de demora na manifestação da Casa Legislativa sobre o pedido de licença para processar o parlamentar. É de ser tida por afrontoso à competência do STF o ato da autoridade reclamada que desmembrou o inquérito, deslocando o julgamento do parlamentar e prosseguindo quanto aos demais. Reclamação que se julga procedente15.

Em 13/05/2013, o Diário Eletrônico do Supremo Tribunal Federal veiculou decisão proferida pelo Tribunal Pleno nos autos do Inquérito nº 2.842, dando conta da rejeição de denúncia oferecida em detrimento do Deputado Federal José Otávio Germano16.

Conquanto o acórdão ainda esteja pendente de publicação, a transmissão do julgamento (sessão de 02/05/2013) pela TV Justiça e a gravação respectiva disponibilizada na internet 17 possibilitaram, aos reclamantes, ter conhecimento dos fundamentos utilizados pelo Tribunal Pleno para o resultado final.                                                                                                                15 STF, Rcl 1121/PR, Tribunal Pleno, rel. Min. ILMAR GALVÃO, j. em 04/05/2000, DJ de 16/06/2000, p. 32 16 Decisão: O Tribunal, por maioria e nos termos do voto do Relator, rejeitou a denúncia, vencido o Ministro Luiz Fux. Declarou suspeição a Ministra Rosa Weber. Ausentes, justificadamente, o Ministro Joaquim Barbosa (Presidente), para participar da celebração do Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, na corte Interamericana de Direitos Humanos, em São José, Costa Rica, e o Ministro Teori Zavascki. Falaram, pelo Ministério Público Federal, o Dr. Roberto Monteiro Gurgel Santos, Procurador-Geral da República, e, pelo investigado, o Dr. Aristides Junqueira Alvarenga. Presidiu o julgamento o Ministro Ricardo Lewandowski (Vice-Presidente). Plenário, 02.05.2013. 17 Disponível em: http://www.youtube.com/watch?v=CPEIjzKpp9Y

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Logo no início do voto do Ministro Ricardo Lewandowski, relator para o caso, foi antecipada a conclusão no sentido de que “os elementos probatórios destinados a embasar a denúncia foram, sim, confeccionados sob a égide de autoridade desprovida de competência constitucional para tanto” (43min do vídeo). Isso porque o juízo da 3ª Vara Federal Criminal de Santa Maria/RS teria presidido investigação (inclusive mediante quebra de sigilo telefônico) denominada Operação Rodin objetivando investigar diversas pessoas, dentre elas, o Deputado Federal José Otávio Germano, sem autorização do Supremo Tribunal Federal para tanto (art. 102, I, b, da CF/88). O voto condutor do acórdão, logo em seguida, esclareceu os elementos de prova que estariam justificando o reconhecimento da usurpação da competência da Suprema Corte. Quanto às ligações telefônicas, veja-se o que constou no voto do Ministro Ricardo LewandowskI:

Digo em seguida que, do teor dos diálogos telefônicos travados entre os diversos interlocutores, seria simples identificar que um deles ou, enfim, flagrado diretamente em alguma ligação ou então mencionado por terceiros, era, à época, Deputado Federal. Então eu digo que, em primeiro lugar, à fl. 541 existe a descrição de uma interceptação telefônica ocorrida em 06/08/2007 em que um dos interlocutores é apontado como o ‘Deputado Zé’. Logo abaixo do mesmo documento, parte do diálogo é atribuído expressamente a José Otávio Germano. Na interceptação de fl. 543, datada de 08/08/2007, embora não haja alusão expressa a José Otávio Germano, mas apenas à sigla HNI, que provavelmente significa ‘homem não identificado’, o número do telefone celular envolvido pertence ao denunciado. O documento de fls. 545/546, além de registrar uma interceptação telefônica de diálogo travado entre alguns envolvidos, faz as seguintes alusões: ‘na data de 09/08/2007’, sempre esse ano de 2007, já noutro contexto, após terem recebido dinheiro destinado ao pagamento de propina ao Deputado Federal José Otávio Germano, Maciel e Flávio, responsáveis pelo repasse do numerário ao chefe, combinaram de realizar uma reunião no escritório de José Otávio Germano, na ocasião em que irão lhe entregar a propina mensal. De fato, no bojo desse documento, existem frases como ‘que horas chega o Zé?’, ‘o Zé vai ta? Eu vou me encontrar com ele amanhã às 10h no escritório do Zé Otávio, pode ser? Tu, o Zé Otávio e eu.’ (43min07seg)

Em seguida, o voto refere a existência de notícias veiculadas em meios de comunicação dando conta de que o Deputado Federal era investigado:

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Eu trago à colação, também. Vossas Excelências têm a transcrição, uma página publicada, uma matéria publicada no site do jornal gaúcho Zero Hora, no qual se reconhece com todas as letras que o Superintendente da Polícia Federal do Rio Grande do Sul, Delegado Ildo Gasparetto, disse nessa segunda-feira, no programa tal, que havia, ou que a corporação sabia da gravação de conversas telefônicas do Deputado Federal Otávio Germano e do Presidente do Tribunal de Contas do Estado. (45min45seg)

Ademais, foi mencionada diligência executada pela Polícia Federal durante a Operação Rodin, ocasião em que o Deputado Federal figurou dentre os investigados, juntamente com os ora reclamantes:

Também, digo eu em continuação, é muito revelador o documento de fls. 888/894. Trata-se de uma cópia de diligência realizada pela Polícia Federal, denominada Operação Rodin, ficha de organização Equipe POA 02, cujo objetivo era a apreensão de documentos em escritório de contabilidade localizado em Porto Alegre, Rio Grande do Sul. Nessa diligência, dentre os diversos alvos, entre aspas, expressão que é utilizada à fl. 889, consta o nome de José Otávio Germano, juntamente com outras 28 pessoas. (46min35seg)

Com base nesses e em outros elementos de prova, o Ministro relator concluiu:

Todos esses elementos, de modo conjugado, robustecem o meu convencimento de que, embora as autoridades que conduziam o inquérito na época tivessem ciência do suposto envolvimento do parlamentar federal no caso, nada fizeram para corrigir a situação. Ressalto, ademais, que o investigado não era alguém desconhecido, alguém que iniciasse, talvez, naquele instante, uma carreira política. Ao contrário, José Otávio Germano já havia sido Secretário de Segurança por vários anos, não sendo crível que as autoridades ignorassem de quem se tratava. Em complemento, não vislumbro a presença nos autos de indícios ou de provas que, produzidas antes da posse do acusado como Deputado, o que ocorreu em janeiro de 2007, eventualmente pudessem apontar para a sua participação nos crimes descritos na denúncia. Aliás, pelas cópias trazidas aos autos, o que se verifica é que a investigação teve efetivo início precisamente no ano de 2007, ou seja, após a posse do acusado como Deputado Federal. Porém, enquanto os demais envolvidos estão sendo processados na 3ª Vara Federal de Santa Maria desde 2007, apenas em agosto de 2009 o Procurador Geral da República solicitou instauração de inquérito contra o denunciado nesta Corte. E desde o início o Procurador Geral da República esclareceu o seguinte: ‘Convém destacar que os fatos que embasam o presente pedido relacionam-se ao apurados na ação penal número tal, em trâmite na 3ª Vara Federal de Santa Maria, no Rio Grande do Sul, proposta contra 44 pessoas envolvidas em fraudes no Detran do Rio Grande do Sul. A ligação entre ambos os procedimentos é certamente umbilical.’ No presente caso, após o pedido de única diligência, isto é, a requisição de cópia de ação de improbidade em curso na 3ª Vara Federal de Santa Maria, a denúncia contra o parlamentar foi apresentada, folhas tais. Assim é forçoso concluir-se que, salvo a cópia da mencionada ação de improbidade, nenhuma outra prova foi produzida no âmbito deste inquérito. Todas, com

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efeito, foram importadas do inquérito da ação penal número tal que tramita no juízo federal de Santa Maria, Rio Grande do Sul. Nessa esteira, (...) a verdade é que os elementos que compõem os autos, muitos acima por mim destacados, amparam a minha convicção de que as provas que alicerçam a presente denúncia foram essencialmente confeccionadas sob a supervisão de autoridade incompetente. Caso assim não fosse, indaga-se: quais provas surgiram após a propositura da ação penal de número tal, aptas a indicar a participação do denunciado nos fatos? Em resumo, nenhuma, não obstante as afirmações do parquet em sentido contrário. (...) (47min10seg) Como se sabe, a competência do Supremo Tribunal Federal, quando da possibilidade de envolvimento de parlamentar em ilícito penal, alcança a fase de investigação, materializada pelo desenvolvimento do inquérito, então o Supremo é muito cioso, neste aspecto, no sentido de resguardar a sua competência quando se trata de parlamentares envolvidos, não permitindo que a Polícia Federal deflagre qualquer investigação contra pessoas que detenham prerrogativa de foro. (50min21seg)

Após divergência instaurada com o voto do Ministro Luiz Fux, assim manifestou-se o Ministro Dias Toffoli:

Sem embargo, a nossa jurisprudência é no sentido de ilações, menções a terceiros ou mesmo conversas de quem tem foro... prerrogativa de função, em conversa interceptada em conversa com terceiro que tinha a interceptação deferida pela justiça não implica automaticamente a vinda do processo ou da investigação ao Supremo Tribunal Federal. Mas eu penso que aqui no caso Vossa Excelência deixou bastante claro no voto que não foram meras menções, meras ilações. Inclusive há um documento que vem da própria Polícia Federal que cita o acusado como alvo da operação. Então, deveria, o Ministério Público, ou a Polícia Federal, àquela altura, já ter, então, encaminhado os autos do inquérito lá instalado para o Supremo Tribunal Federal.(59min02seg) Aqui no caso houve, e está demonstrado faticamente com provas, que aquele que já detinha foro de prerrogativa de função foi alvo de uma investigação por autoridades não competentes. (...) Peço vênia para acompanhá-lo (o relator), porque já se tinha, desde a investigação, presente a coparticipação deste acusado, e não meras citações. E identificada uma coparticipação de uma autoridade com foro de prerrogativa de função, o que se deve fazer? Deve-se então remeter a investigação ao Supremo Tribunal Federal, por isso acompanho Vossa Excelência. (1h01min03seg)

A Ministra Carmen Lúcia acompanhou o relator: Entretanto, os fundamentos apresentados por Vossa Excelência em relação à competência, e as consequências e os efeitos destes atos, que foram praticados quando já de conhecimento, e comprovados devidamente de que havia naquela operação a que se dava seguimento, alguém que por competência constitucional

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deveria ter tido essa investigação sob o pálio do Supremo Tribunal Federal, faz que outros argumentos possam não ser considerados como válidos. Por isso eu peço vênia ao Ministro Fux, que divergiu para receber a denúncia, mas eu me atenho à fundamentação exclusiva que foi o ponto de Vossa Excelência, sem negativa do que ocorreu, sem negativa de que aos demais realmente poderia ter curso, como está tendo para essa ação, mas que aqui não se poderia seque aventar a possibilidade de ter havido ilações ou referências a esta pessoa que depois levassem ao conhecimento de que se cuidava de alguém com prerrogativa de foro. Não, a gravidade dos fatos e a chamada descrita por Vossa Excelência no voto é exatamente no sentido de que se tinha conhecimento exatamente de quem se tratava e, portanto, não poderia ser desconhecida essa competência. (1h02min36seg)

Da mesma forma, o Ministro Gilmar Mendes: Nós temos vários precedentes nesse sentido, assim como temos também, ao contrário, como disse o Ministro Fux, os casos do chamado encontro fortuito de provas, que devem dar ensejo à remessa, quando se faz esse tipo de investigação, ao Supremo Tribunal Federal. (1h04min56segs)

O Ministro Marco Aurélio seguiu a mesma orientação: É inadmissível que uma vez surgindo o envolvimento de detentor de prerrogativa de foro se prossiga nas investigações, chegando-se, até mesmo, como está no voto de Vossa Excelência, a interceptar um telefone móvel do próprio denunciado, do próprio detentor da prerrogativa de foro. E há mais. Falou-se em desdobramento do processo que teria ocorrido na origem, implementado pelo juízo. E portanto se imagina que esse desdobramento tenha surgido pelo envolvimento em si do detentor da prerrogativa de foro. E aí, com o deslocamento, quanto à materialização, quanto aos indícios de autoria, se calcou a denúncia no que levantado naquele processo crime, alcançados mediante interceptação, em que houve referência ao próprio detentor da prerrogativa de foro. O caso para mim presente é emblemático. E o Supremo deve estar preso a princípios para que situações como a presente não se repitam. E uma vez surgindo indícios do envolvimento de quem tem a prerrogativa de ser julgado pelo Supremo, que haja a imediata remessa do inquérito ou da ação penal ao próprio Supremo. (1h08min40seg)

O Ministro Celso de Mello, por fim, consignou: No caso, Vossa Excelência, no voto que acaba de proferir, demonstrou, de maneira muito consistente, que as autoridades públicas atuando em primeiro grau tinha conhecimento, tinham ciência de que um dos alvos das investigação penal era um membro do Congresso Nacional. E isso bastaria para que naquele momento, reconhecida tal circunstância, fosse, o procedimento, encaminhado a esta Corte, não cabendo o prosseguimento como ocorreu,

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conduzido, seja pela polícia judiciária, seja pelo Ministério Público, seja pelo Poder Judiciário em primeira instância. (1h11min50seg) E essa competência nitidamente usurpada na espécie destes autos, ela se estende não apenas, como salientei no início e como Vossa Excelência bem destacou em seu douto voto, não se estende apenas ao processo e julgamento, da própria persecução penal em juízo, mas antecede... esse momento inicial. (1h14min55seg)

A presente preliminar toma por base premissa fática já discutida e reconhecida pelo Tribunal Pleno do Supremo Tribunal Federal: durante a Operação Rodin, Polícia Federal, Ministério Público Federal e juízo da 3ª Vara Federal Criminal de Santa Maria/RS agiram ao arrepio da competência constitucionalmente determinada para a investigação, porquanto usurparam a prerrogativa de Deputado Federal ser investigado e processado perante o Supremo Tribunal Federal. Não está mais em discussão, portanto, a prática de atos de polícia judiciária em detrimento de parlamentar federal durante a Operação Rodin , porquanto tal matéria foi definitivamente apreciada pelo Tribunal Pleno. O que se sustenta é que a referida usurpação de competência também se verificou em relação aos demais investigados, ora réus, que, por conexão ou continência, em conjunto com o referido Deputado Federal, não foram investigados e processados perante o juiz natural nos termos do que dispõe a Constituição Federal e as normas processuais penais incidentes na espécie. Os votos proferidos no julgamento do Inquérito nº 2.842 se fizeram ratificar por diversos precedentes jurisprudenciais, a saber: Rcl 10.908 (rel. Min. Gilmar Mendes), Inq 2.291 (rel. Min. Ayres Britto), Rcl 4.830 (rel. Min. Cezar Peluso), Pet 3.825 (rel. Min. Gilmar Mendes) e Rcl 511 (rel. Min. Celso de Mello). Em todos os acórdãos referidos, o Supremo Tribunal Federal se debruçou sobre casos de investigação criminal ou de ação penal propostas exclusivamente contra autoridades detentoras da prerrogativa de julgamento perante essa e. Corte. Em momento algum aqueles precedentes examinaram a possibilidade de uma persecução penal que investiga, além de parlamentar federal, outras pessoas não detentoras de prerrogativa de foro privilegiado, ter início e seguimento antes de a Suprema Corte pronunciar-se acerca (i) da

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viabilidade da investigação e (ii) da possibilidade de cisão processual para os investigados sem prerrogativa de foro. Acerca da primeira quaestio juris – não aventada no julgamento do Inquérito nº 2.842 -, a jurisprudência do STF encontra-se sedimentada no sentido de que, por razões de conexão ou continência, prorroga-se a competência dessa Corte para julgar também os corréus não detentores de prerrogativa de foro18. O efeito processual dessa conclusão nos conduz ao enfretamento da segunda questão acima destacada. No particular, a jurisprudência do STF é remansosa no sentido de que haverá usurpação de competência da Corte sempre que outra autoridade judicial deliberar sobre o prosseguimento da investigação, que também envolve parlamentar federal, em relação a todos os investigados, assim como pronunciar-se acerca de eventual viabilidade da cisão processual. O leading case, na espécie, verificou-se quando do julgamento da Rcl nº 1.121/PR, relatada pelo Ministro Ilmar Galvão:

EMENTA: RECLAMAÇÃO. ALEGADA USURPAÇÃO DA COMPETÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. PROCESSO-CRIME EM QUE FIGURA COMO CO-RÉU DEPUTADO FEDERAL. DESMEMBRAMENTO DETERMINADO PELO JUIZ DE PRIMEIRO GRAU. Em face dos princípios da conexão e da continência, dado o concurso de agentes na prática do delito, deve haver simultaneus processus. A circunstância de encontrar-se entre os co-réus pessoa que deve ser processada pelo Supremo Tribunal Federal, sua competência se prorroga em relação aos demais acusados, salvo se esta Corte declinar de sua competência, na hipótese de demora na manifestação da Casa Legislativa sobre o pedido de licença para processar o parlamentar. É de ser tida por afrontoso à competência do STF o ato da autoridade reclamada que desmembrou o inquérito, deslocando o julgamento do parlamentar e prosseguindo quanto aos demais. Reclamação que se julga procedente19.

O caso dizia respeito a investigação que tramitou perante o juízo da 2ª Vara Federal Criminal de Curitiba/PR, instaurada para apurar a prática de crimes de sonegação fiscal (art. 1º da Lei nº 8.137/90), evasão de divisas (art. 22

                                                                                                               18 EMENTA: - Exceção de incompetência. Co-reus de autoridade sujeita a competência criminal do Supremo Tribunal Federal. - E firme a jurisprudência desta Corte no sentido de que sua competência se prorroga, em virtude das normas sobre conexão e continência, para estender-se a acusados que não gozem do foro por prerrogativa de função previsto na Constituição Federal. Exceção de incompetência improcedente. (STF, Pet 760/DF, Tribunal Pleno, rel. Min. Moreira Alves, j. em 08/04/1994, DJ de 17/06/1994) 19 STF, Rcl 1121/PR, Tribunal Pleno, rel. Min. ILMAR GALVÃO, j. em 04/05/2000, DJ de 16/06/2000, p. 32

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da Lei nº 7.492/86) e de falsidade (art. 299 do CP) praticados por diversas pessoas, dentre eles, José Carlos Martinez, alçado à condição de Deputado Federal. O juízo reclamado, a partir da diplomação, remeteu os autos da investigação ao Supremo Tribunal Federal para a adoção das providências cabíveis em relação ao parlamentar, porém declarou-se competente para o processamento dos demais investigados (reclamantes) desprovidos da prerrogativa de foro. No mérito, o Plenário julgou procedente (por unanimidade) a reclamação.20 Em outro precedente, o Tribunal Pleno ratificou essa mesma orientação jurisprudencial:

Agravo regimental. Reclamação. Desmembramento de representação criminal. Envolvimento de parlamentar federal. Desmembramento ordenado perante o primeiro grau de jurisdição. Usurpação da competência do Supremo Tribunal Federal. Reclamação procedente. Anulação dos atos decisórios. 1. Até que esta Suprema Corte procedesse à análise devida, não cabia ao Juízo de primeiro grau, ao deparar-se, nas investigações então conjuntamente realizadas, com suspeitos detentores de prerrogativa de foro - em razão

                                                                                                               20 Como se verifica, os fatos levam à existência de dependência recíproca entre os denunciados, seja pela simultaneidade de sua ocorrência, seja por efeito de eventual concurso de pessoas, ou ainda em face da identidade probatória. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal está sedimentada no sentido de se aceitar a prorrogação de sua competência ante as regras de conexão e continência, como destacado, no voto do Ministro Octavio Gallotti no Inq 559-2, vebis: (...) A vista dos fatos surge a indagação: poderia a autoridade reclamada determinar a separação dos processos? Certo que a orientação do Supremo Tribunal Federal acerca do alcance da norma do art. 78, III, que regula a prorrogação de competência do juízo de atração, é no sentido de restringi-lo, conforme Questão de Ordem no Inq. 559, rel. Min. Octavio Gallotti. Nesse precedente fora determinada a separação do processo ‘por relevante motivo de conveniência (art. 80 do CPP), decorrente da diferença do regime de prescrição a que estão sujeitos os acusados, visto achar-se o seu prazo somente suspenso em relação ao parlamentar (art. 53, par. 2º, da Constituição)’. Tratava-se de hipótese de parlamentar, denunciado juntamente com corréus, em que a Corte entendeu que, ante a demora na deliberação da Casa Legislativa, o processo deveria ser desmembrado, prosseguindo-se no juízo competente em relação aos acusados de foro privilegiado. Foi partindo dessa decisão que a autoridade reclamada desmembrou o inquérito, deslocando o julgamento do parlamentar para esta Corte e prosseguindo quanto aos demais. Assentada essa premissa – a da possibilidade de desemembramento -, resta saber se poderia a autoridade reclamada fazê-lo ou se lhe cumpria determinar a remessa do inquérito para esta Corte, em face da continência, para que tal providência daqu partisse, nos moldes da Questão de Ordem. A se admitir a segunda, existiria espaço para se falar em competência jurisdicional suscetível de usurpação. Demonstrada, pelas razões acima expostas, a existência de motivo para o julgamento, pelo Supremo Tribunal Federal, dos outros corréus – salvo se esta Corte declinar sua competência, na hipótese de demora na manifestação da Casa Legislativa sobre o pedido de licença para processar o parlamentar – é de ser tida como afrontosa à competência deste Tribunal a decisão reclamada, sendo, portanto, procedente a reclamação.” (g.n.)

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das funções em que se encontravam investidos -, determinar a cisão das investigações e a remessa a esta Suprema Corte da apuração relativa a esses últimos, com o que acabou por usurpar competência que não detinha. 2. Inadmissível pretendida convalidação de atos decisórios praticados por autoridade incompetente. Atos que, inclusive, foram delimitados no tempo pela decisão agravada, não havendo, evidentemente, ao contrário do que afirmado pelo recorrente, determinação de “reinício da investigação, com a renovação de todos os atos já praticados”, devendo, tão somente, emanar novos atos decisórios, desta feita, da autoridade judiciária competente. 3. Agravo regimental não provido21.

O caso: investigação criminal que tramitou na 1ª Vara Federal Criminal de Curitiba/PR, ocasião em que foi apurado o possível envolvimento, juntamente com outros investigados, de Deputado Estadual e de Deputado Federal. O juízo reclamado desmembrou o feito para o fim de declinar a competência da investigação ao TRF da 4ª Região – para apurar o envolvimento do Deputado Estadual – e ao Supremo Tribunal Federal – no que pertine ao Deputado Federal -, porém prosseguindo nos demais atos de persecução penal. O Ministro Dias Toffoli, então, julgou procedente a Reclamação nº 7.913/PR e declarou nulos os atos judiciais proferidos após usurpada a competência. Logo em seguida, negou provimento a agravo regimental interposto pelo parquet, que pretendia ver convalidados os atos judiciais após a investigação ter sido remetida ao Supremo Tribunal Federal e, posteriormente, ser autorizado o desmembramento.22

                                                                                                               21 STF, Rcl 7913 AgR, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 12/05/2011, publicado em 09/09/2011 22 Como destacado na decisão agravada, até que esta Suprema Corte procedesse à análise devida, não cabia ao Juízo de primeiro grau, ao deparar-se, nas investigações então conjuntamente realizadas, com suspeitos detentores de prerrogativa de foro – em razão das funções em que se encontravam investidos -, determinar a cisão das investigações e a remessa a esta Suprema Corte da apuração relativa a esses últimos, com o que acabou por usurpar a competência que não detinha. Nessa conformidade, ainda que mediante cotejo posterior pelo Parquet Federal se tenha concluído pela desnecessidade de prosseguimento de investigação conjunta perante o Supremo Tribunal Federal, com o acolhimento do pleito de desmembramento (que, repita-se, era decisão privativa desta Suprema Corte), essa circunstância não é capaz de revigorar as decisões emanadas de autoridade hierarquicamente incompetente para tanto, razão pela qual não poderia a presente reclamação ser extinta sem julgamento de mérito, com a pretensa afirmação de perda de seu objeto. No caso, embora não se manifestasse evidente conexão intersubjetiva (CPP, art. 76, I), em um primeiro momento, verificou-se a ocorrência de conexão instrumental ou probatória (CPP, art. 76, III), o que ensejou o processamento de investigação única visando à apuração de crimes praticados no seio da Assembleia Legislativa do Estado do Paraná, tendo a autoridade policial se deparado, dentre os investigados, com pessoas detentoras de mandato

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Os acusados, após aprofundado exame na jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, não identificaram, s.m.j., um único acórdão reconhecendo a possibilidade de o juízo comum conduzir investigação ou ação penal em que são apurados delitos praticados, em tese, por investigados que não possuem prerrogativa de foro, em relação a delitos conexos com parlamentares federais. Comparando-se a denúncia oferecida pelo Ministério Público Federal contra os acusados nos autos desta Ação Penal com a denúncia oferecida pela Procuradoria Geral da República nos autos do Inquérito n° 2.842 contra o Deputado Federal José Otávio Germano, não restam dúvidas de que os fatos são exatamente os mesmos (aliás, a descrição em ambas as exordiais é praticamente a mesma), todos relacionados à Operação Rodin. A Procuradoria-Geral da República reconhece tal identidade, conforme constou em fragmento da manifestação ministerial destacado no voto do Ministro Ricardo Lewandowski (Inquérito 2.842):

E desde o início o Procurador Geral da República esclareceu o seguinte: ‘Convém destacar que os fatos que embasam o presente pedido relacionam-se ao apurados na ação penal número tal, em trâmite na 3ª Vara Federal de

                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                                         parlamentar, o qual lhes garantia, em razão de preceito de ordem constitucional, prerrogativa de foro perante esta Suprema Corte. A essa altura, ao invés de submeter, de imediato, à consideração desta Suprema Corte a proposta para desmembramento, ordenou o Juízo de primeiro grau o desdobramento dos procedimentos, com o encaminhamento de cópias a este Supremo Tribunal Federal e ao Tribunal Regional Federal da 4ª Região, para prosseguimento das investigações apenas em relação aos detentores da prerrogativa de foro. Essa foi a razão do ajuizamento de reclamação relativamente ao qual foi liminarmente deferida pelo saudoso Ministro Menezes Direito, até o julgamento final da reclamação, a suspensão da Representação Criminal nº 2006.70.00.013388-0, em trâmite na 1ª Vara Federal Criminal de Curitiba/PR (fls. 13 a 19), bem como das Representações Criminais nº 2006.70.00.015764-7 e nº 2007.04.00.016831-8, em curso no Tribunal Regional Federal da 4ª Região (fls. 20 a 24), tendo o pedido, por fim, culminado com o reconhecimento de sua procedência, por meio da decisão ora agravada (de 3/2/11). Ressalto, todavia, que, a despeito de haver declarado nulos os atos decisórios praticados entre 31/8/07 e a decisão liminar do Ministro Menezes Direito (de 2/4/09) – que suspendeu o curso das investigações (fls. 537/546) -, em especial aquele que ordenou a cisão do inquérito, ressalvei que ulterior reunião dos procedimentos em relação aos corréus (quando ainda verificada a conexão intersubjetiva) está autorizada, por força da determinação de remessa de todos os procedimentos ao Juízo singular, conforme ordenado no Inquérito nº 2.652/PR, cabendo, agora, se o caso, ordenar a autoridade judiciária competente as providências de sua alçada tendentes ao prosseguimento das apurações. Observe-se, inclusive, que, em relação a cada um dos grupos aos quais se imputa a prática de atos criminosos contra o erário público, continua a existir inegável conexão intersubjetiva e instrumental, devendo os sucessivos pedidos de desmembramentos ser, agora, apreciados pela autoridade judiciária às quais foram remetidos os procedimentos. Inviável, todavia, a pretendida convalidação de atos decisórios praticados por autoridade incompetente, os quais, inclusive, foram delimitados no tempo pela decisão agravada, não havendo, evidentemente, ao contrário do que afirmado pelo recorrente, determinação de ‘reinício da investigação, com a renovação de todos os atos já praticados’, devendo, tão somente, emanar novos atos decisórios, deste feita, da autoridade judiciária competente.

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Santa Maria, no Rio Grande do Sul, proposta contra 44 pessoas envolvidas em fraudes no Detran do Rio Grande do Sul. A ligação entre ambos os procedimentos é certamente umbilical.’ No presente caso, após o pedido de única diligência, isto é, a requisição de cópia de ação de improbidade em curso na 3ª Vara Federal de Santa Maria, a denúncia contra o parlamentar foi apresentada, folhas tais. Assim é forçoso concluir-se que, salvo a cópia da mencionada ação de improbidade, nenhuma outra prova foi produzida no âmbito deste inquérito. Todas, com efeito, foram importadas do inquérito da ação penal número tal que tramita no juízo federal de Santa Maria, Rio Grande do Sul.

É dizer: é o próprio Ministério Público Federal que está a admitir, no mínimo, a hipótese de conexão descrita no art. 76, I, do Código de Processo Penal23, e também de continência, na forma do art. 77, I, do Código de Processo Penal.24 A incontroversa conexão/continência entre os fatos imputados aos reclamantes e ao Deputado Federal José Otávio Germano traz como consequência a incidência da diretriz do art. 79, caput, do Código de Processo Penal: “A conexão e a continência importarão unidade de processo e ju lgamento .” Não se ignora que a unidade de processo e de julgamento não seja absoluta. Com efeito, afora os casos descritos nos incisos e parágrafos do art. 79 de cisão processual obrigatória, calha lembrar que o art. 80 do Código de Processo Penal igualmente prevê a possibilidade de separação facultativa dos processos “quando as infrações tiverem sido praticadas em circunstâncias de tempo ou de lugar diferentes, ou, quando pelo excessivo número de acusados e para não lhes prolongar a prisão provisória, ou por outro motivo relevante, o juiz reputar conveniente a separação.” Não se pretende sustentar que os acusados obrigatoriamente deveriam ter sido investigados e processados perante o Supremo Tribunal Federal, em conjunto com o Deputado José Otávio Germano. Pelo contrário, havia, de fato, a possibilidade jurídica de este Juízo investigar a processar todos os reclamantes, em procedimento destacado da persecução penal proposta contra o parlamentar federal. O que se pretende enfatizar, pelo contrário, é que a competência para a decisão acerca da eventual separação da investigação ou                                                                                                                23 Art. 76. A competência será determinada pela conexão: I - se, ocorrendo duas ou mais infrações, houverem sido praticadas, ao mesmo tempo, por várias pessoas reunidas, ou por várias pessoas em concurso, embora diverso o tempo e o lugar, ou por várias pessoas, umas contra as outras; 24 Art. 77. A competência será determinada pela continência quando: I - duas ou mais pessoas forem acusadas pela mesma infração;

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do processo, na forma do art. 80 do Código de Processo Penal, era do Supremo Tribunal Federal, e não deste Juízo. Na Operação Rodin, a usurpação da competência do Supremo Tribunal Federal pelo juízo da 3ª Vara Federal Criminal de Santa Maria/RS verificou-se numa dupla dimensão:

(i) num primeiro momento, mediante a ocultação (caracterizador, como bem referiu o Ministro Gilmar Mendes, de um abuso de autoridade) de que a investigação criminal também recaía sobre Deputado Federal; (ii) num segundo momento, quando o juízo, tomando conhecimento da remessa da investigação para a Procuradoria-Geral da República a fim de ser apurado o envolvimento de parlamentar federal, absteve-se de encaminhar ao STF a integralidade dos autos, prosseguindo na condução do feito.

O primeiro momento acima referido, conforme decidido no Inquérito n° 2.842, já é fato incontroverso. A despeito de o Tribunal Pleno ter reconhecido evidências de que, desde a origem, a Operação Rodin investigava também um Deputado Federal,25 o voto do Ministro relator – no que foi acompanhado pela maioria dos seus pares – fixou temporalmente a primeira evidência probatória objetiva de que o parlamentar federal tornara-se suspeito na investigação: as ligações telefônicas interceptadas em agosto de 2007, fazendo expressa menção ao nome de José Otávio Germano. Tais ligações telefônicas constaram em relatório de monitoramento elaborado pela Polícia Federal, sendo submetidas ao juízo, para fim de renovação do grampo, no mesmo mês de agosto de 2007. Apesar da eloquência objetiva (segundo já reconhecido pelo Supremo Tribunal Federal) de que os diálogos telefônicos referidos naquele relatório também implicavam o Deputado Federal José Otávio Germano nos fatos apurados na Operação Rodin, o juízo da 3ª Vara Federal Criminal, ao autorizar a prorrogação do monitoramento, absteve-se de, naquele momento,

                                                                                                               25 Disse o Ministro relator: “não vislumbro a presença nos autos de indícios ou de provas que, produzidas antes da posse do acusado como Deputado, o que ocorreu em janeiro de 2007, eventualmente pudessem apontar para a sua participação nos crimes descritos na denúncia.”

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encaminhar toda a investigação ao Supremo Tribunal Federal. Este é o registro objetivo da usurpação da competência que se iniciava. Destaque-se que a referida providência processual, além de exigida nos precedentes antes referidos (Reclamações n° 1.121 e n° 7.913), ecoou nos votos dos Ministros Dias Toffoli, Gilmar Mendes, Marco Aurelio e Celso de Mello:

Aqui no caso houve, e está demonstrado faticamente com provas, que aquele que já detinha foro de prerrogativa de função foi alvo de uma investigação por autoridades não competentes. (...) Peço vênia para acompanhá-lo (o relator), porque já se tinha, desde a investigação, presente a coparticipação deste acusado, e não meras citações. E identificada uma coparticipação de uma autoridade com foro de prerrogativa de função, o que se deve fazer? Deve-se então remeter a investigação ao Supremo Tribunal Federal, por isso acompanho Vossa Excelência. (1h01min03seg – Min. Dias Toffoli) Nós temos vários precedentes nesse sentido, assim como temos também, ao contrário, como disse o Ministro Fux, os casos do chamado encontro fortuito de provas, que devem dar ensejo à remessa, quando se faz esse tipo de investigação, ao Supremo Tribunal Federal. (1h04min56segs – Min. Gilmar Mendes) É inadmissível que uma vez surgindo o envolvimento de detentor de prerrogativa de foro se prossiga nas investigações, chegando-se, até mesmo, como está no voto de Vossa Excelência, a interceptar um telefone móvel do próprio denunciado, do próprio detentor da prerrogativa de foro. E há mais. (...) O caso para mim presente é emblemático. E o Supremo deve estar preso a princípios para que situações como a presente não se repitam. E uma vez surgindo indícios do envolvimento de quem tem a prerrogativa de ser julgado pelo Supremo, que haja a imediata remessa do inquérito ou da ação penal ao próprio Supremo. (1h08min40seg – Min. Marco Aurélio) No caso, Vossa Excelência, no voto que acaba de proferir, demonstrou, de maneira muito consistente, que as autoridades públicas atuando em primeiro grau tinham conhecimento, tinham ciência de que um dos alvos das investigação penal era um membro do Congresso Nacional. E isso bastaria para que naquele momento, reconhecida tal circunstância, fosse, o procedimento, encaminhado a esta Corte, não cabendo o prosseguimento como ocorreu, conduzido, seja pela polícia judiciária, seja pelo Ministério Público, seja pelo Poder Judiciário em primeira instância. (1h11min50seg – Min. Celso de Mello)

É certo que em momento algum o Tribunal Pleno disse que a remessa deveria alcançar também a investigação em relação àqueles que não detinham prerrogativa de foro.

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Por óbvio: no julgamento do Inquérito n° 2.842, estava em discussão apenas a usurpação da competência em relação ao parlamentar; não se debateu, porquanto extrapolava os limites objetivos e subjetivos do julgamento, a (i) reflexa usurpação da competência em relação aos reclamantes e (ii) a conexão/continência da investigação relacionada a todos. Por tal razão é que o acolhimento da presente questão preliminar é consequência lógica – desta feita, alcançando aqueles que constitucionalmente não se encontram submetidos ao processamento perante o Supremo Tribunal Federal, mas sim por contigência processual (art. 79, caput, do Código de Processo Penal) – do julgamento proferido no Inquérito n° 2.842. Assim, a decisão de prorrogação do monitoramento telefônico proferida 2007, assim como as que a ela se sucederam – autorização/prorrogação de monitoramento telefônico dos investigados, prisões e buscas e apreensões, recebimento da denúncia e todas as demais que deram curso no presente processo – são nulas porquanto usurpadoras da competência do juízo natural (art. 5°, LIII, da CF/88), na espécie, o Supremo Tribunal Federal (art. 102, I, b, da CF/88, c/c arts. 76, I, 77, I, 79, caput, todos do CPP). De tudo, o que se evidencia é que a Operação Rodin foi instaurada e processada mediante o conhecimento velado da Polícia Federal, do Ministério Público Federal e deste Juízo acerca do envolvimento de investigados com prerrogativa de foro (além do Deputado Federal José Otávio Germano, calha lembrar que também João Luiz Vargas, então Presidente do TCE/RS, foi monitorado). Tal circunstância foi ardilosamente ocultada com um propósito claro: usurpar a competência do Supremo Tribunal Federal para analisar o caso. Em momento posterior, entretanto, aquilo que era velado tornou-se explícito. O Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul, de posse dos elementos de prova colhidos durante a Operação Rodin, encaminhou, em 30 de julho de 2008, notitia criminis ao Procurador-Geral da República para apurar o envolvimento do Deputado Federal José Otávio Germano e do Presidente do Tribunal de Contas João Luiz Vargas naqueles fatos.

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Ao que tudo indica, tal iniciativa não foi resultado de uma deliberação conjunta entre parquet estadual e federal, mas sim, quiçá, uma denúncia de arbítrio, subscrita pelo Ministério Público gaúcho, contra o abuso de autoridade que vinha ocorrendo na Operação Rodin . A primeira evidência disso é que o Ministério Público Federal, no dia seguinte (em 31 de julho de 2008), também encaminhou outra notitia criminis ao Procurador-Geral da República, com idêntico objeto. É dizer: acuados pela iniciativa do dia anterior, os Procuradores da República (co)responsáveis pela usurpação da competência do Supremo Tribunal Federal durante a Operação Rodin formularam a referida peça processual como uma tentativa de “lavar” o abuso de autoridade. Ambas as notitias criminis originaram a instauração do Inquérito n° 2.842. A segunda evidência do ardil é percebida no fato de o Ministério Público Federal (i) não postulado, ao juízo da 3ª Vara Federal Criminal, o compartilhamento das provas para encaminhadas à Procuradoria-Geral da República, (ii) não ter juntado, neste processo, qualquer informação relativa à representação criminal encaminhada à Procuradoria-Geral da República e (iii) não ter acostado, aos autos, a posterior denúncia formulada no Inquérito n° 2.842. Foi a defesa de um dos réus que, às suas expensas, tomou tal inciativa. Indaga-se: por que tais providências não foram observadas pelo parquet? Porque, naquela altura, se fazia necessário contornar a objetividade processual da usurpação da competência. A despeito disso, a investigação encaminhada à Procuradoria-Geral da República, contendo as mesmas provas apuradas durante a tramitação da Operação Rodin, chegou ao conhecimento deste Juízo. Com efeito, a imprensa gaúcha, em agosto de 2008, divulgou amplamente que o parquet havia encaminhado a representação à Procuradoria-Geral da República. O jornal Zero Hora veiculou, em 8 de agosto de 2008, as declarações públicas do Deputado José Otávio Germano contra a providência adotada pelos Ministérios Públicos estadual e federal, dizendo-se vítima de uma “perseguição”:26                                                                                                                26 http://zerohora.clicrbs.com.br/rs/noticia/2008/08/jose-otavio-germano-se-diz-vitima-de-perseguicao-2105550.html

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O site da Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul, em 11 de agosto de 2008, estampou a seguinte notícia:27

Ou seja: em agosto de 2008, tornou-se público – e isso este Juízo não pode alegar desconhecer – que as provas produzidas na Operação Rodin geraram investigação contra Deputado Federal e Presidente do Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul. Ganhava contornos de objetividade, portanto, o estratagema de o parquet (com a cumplicidade da Polícia Federal e do Poder Judiciário) decidir

                                                                                                               27 http://www2.al.rs.gov.br/noticias/ExibeNoticia/tabid/5374/IdMateria/209042/default.aspx

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quem seria investigado no juízo de primeiro grau e quem seria investigado perante o Supremo Tribunal Federal. Ao não impedir o abuso de autoridade que, naquele momento, se tornava público, este Juízo consorciou-se, agora de forma manifesta, com a usurpação da competência do STF que, até então, vinha ocorrendo de forma velada. Mas registre-se: os acusados não estão alegando que a usurpação da competência ocorrera em agosto de 2008. Não. Os fatos acima narrados, ao contrário, servem para corroborar que a mesma omissão operada em agosto de 2007 (com as primeiras ligações envolvendo o parlamentar) tornou a ocorrer, agora de forma confessa, em agosto de 2008. É de ser reconhecida a usurpação de competência, anulando-se o processo desde agosto de 2007, nos termos acima postos.

II.6 CERCEAMENTO DE DEFESA: INDEFERIMENTO DE PERÍCIA

Ao longo desses mais de cinco anos de processo, muito se falou em fraude de 44 milhões de reais. O próprio Ministério Público Federal, na denúncia, refere que o valor de 44 milhões é inexato e foi estimado "partir do valor superfaturado, mensalmente pago pelo DETRAN/RS às fundações de apoio (calcado na Informação Técnica – MP/TCE no 74 – fls. 311/318), multiplicado pelo número de meses em que perdurou a fraude – de julho de 2003 a novembro de 200728". Ocorre que um dos crimes imputados, peculato, em que se aponta uma reiteração de 53 vezes, é um crime material, conforme questão absolutamente sedimentada, tanto doutrinária quanto jurisprudencialmente.

Peculato na modalidade desvio (crime material). Ausência de prejuízo (caso). Tipicidade (não-ocorrência). Súmula 7 (aplicação). 1. O crime de peculato na modalidade desvio (art. 312, caput, segunda parte, do Cód. Penal) é crime material. Em outras palavras, consuma-se com o prejuízo efetivo para a administração pública. 2. Na hipótese, afirmou o acórdão recorrido inexistir tal prejuízo. Para se chegar a conclusão diversa, necessário seria o reexame vedado pela Súmula 7. 3. Agravo regimental a que se negou provimento.

                                                                                                               28 Nota de rodapé nº. 57. Fl. 52 da denúncia.

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(AgRg no Ag 905.635/SC, Rel. Ministro NILSON NAVES, SEXTA TURMA, julgado em 16/09/2008, DJe 24/11/2008)

Sendo, pois, crime que não pode abrir mão da demonstração de sua materialidade, a perícia buscada pela defesa dos réus era imprescindível para atestar ou afastar a ocorrência de crime e, mesmo assim, foi ignorada pelo Juízo. Em seus argumentos, pontuou que a perícia não teria a contribuir com a instrução, já que "o que se pretende é saber se ocorreu obtenção ou desvio indireto de verbas públicas que teriam ocorrido, segundo a acusação, por intermédio de irregularidades na contratação dos serviços (por indevida dispensa de licitação), com consequente superfaturamento do valor dos contratos pacutados pelas fundações de apoio vinculadas à UFSM (Fatec e Fundae) com empresas privadas, para execução do contrato desta instituição de ensino com o Detran-RS29". Ocorre, Excelência, que a perícia requerida em 23 de abril de 2010 poderia trazer à luz a metodologia de realização dos exames para esclarecer a ilaçào especulativa sobre suposta fraude. A perícia auxiliaria em demonstrar que as práticas operadas pela FATEC e Fundae, desde sua contratação mediante dispensa de licitação até a execução das atividades-fim do contrato teriam se pautado exatamente dentro da legalidade, e de acordo com a execução que a Fundação Carlos Chagas realizava. Ocorre que a Fundação Carlos Chagas foi quem primeiro assumiu a execução desse contrato, a partir da vigência do Códito de Trânsito Brasileiro. Entretanto, a Fundação Carlos Chagas desempenhou suas atividades desde o fim do governo Antônio Britto até meados do Governo Germano Rigotto, passando pelo governo Olívio Dutra. Talvez por ter tido a maior parte de sua execução durante o governo do mesmo partido do então chefe-maior da Polícia Federal, hoje governador do Estado, o contrato com a Fundação Carlos Chagas foi pontualmente retirado da investigação, o que demonstra, mais do que nunca, que essa operação nada mais foi do que uma manobra político-partidária do que efetivamente jurídica.

                                                                                                               29 Fl. 29688v.

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Certamente foi subtraída das defesas o direito de produzirem prova técnica, sob o crivo do contraditório, diferentemente do que fez a acusação, que lastreou suas falsas premissas em denúncia anônima, em acordo de colaboração premiada, em interceptações telefônicas, todas práticas muito mais próximas de Estados Policiais do que de Estados de Direito.

II.7 CERCEAMENTO DE DEFESA: DELAÇÃO PREMIADA

O juízo, acolhendo a pedido feito pela defesa do réu Hermínio Gomes Junior, com fundamento na Lei nº. 12.850, de agosto de 2013, autorizou o acesso das demais defesas aos acordos de colaboração premiada existentes. Notadamente, porque referido dispositivo legal, ainda que de natureza procedimental, mas com nítido viés de direito material, especialmente no que diz respeito à ampla defesa e ao contraditório, em seu artigo 7º, parágrafo 3º, diz que o acordo de colaboração, uma vez recebida a denúncia, deixa de ser sigiloso. Isso porque é da natureza dialética do processo que se oportunize às partes eventualmente citadas no dito acordo o direito de rebaterem todo o lá alegado, e provarem qualquer impropriedade dita pelo delator, o que no caso presente conduz a Lair Ferst, sujeito de péssima reputação, mínima credibilidade e diminuta idoneidade moral, fato sabido por todos e amplamente demonstrado no processo. Entretanto, quando oportunizado às partes o conhecimento do conteúdo dos acordos de colaboração premiada, alcançou somente parte do direito que o legislador quis assegurar, o de conhecer as delações eventualmente feitas. Restou pendente, contudo, o direito a que fosse produzida prova em sentido contrário ao que fora declarado no acordo de colaboração premiada, possibilitando – pelo menos – que fossem novamente interrogados aqueles réus citados nos referidos acordos. Vale lembrar que esse feito teve uma peculiaridade que não honrou com a boa-fé que se espera de uma tramitação judicial imparcial. Por incontáveis vezes foi negado pelo juízo a existência de acordos de colaboração premiada. Simplesmente se disse que inexistiam.

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A magistrada faltou com a verdade, induzindo as defesas em erro, informando que não existiam acordos de colaboração premiada. O sigilo que é próprio de tais procedimentos não autoriza o Juízo a faltar com a verdade. Deve afirmar suas existência, mesmo que negue o réu que firmou dito acordo e seu conteúdo. Mas mesmo quando parcela significativa da imprensa já tinha acesso, quando o Ministério Público Federal colheu as declarações, e o Juízo as homologou, as defesas foram enganadas por decisões judiciais. Veja-se, por exemplo, o despacho do dia 7 de novembro de 2011, publicado em 11 de novembro de 2011 diz o que segue:

O requerimento de certificação, pela Secretaria da Vara, acerca da tramitação de algum procedimento de delação premiada já foi formulado por outro corréu e negado pelo Juízo, nos seguintes termos (GED 5220688, D.E. 18/11/2009), aos quais ora faço remissão: (...)

b) De outro lado, importante ressaltar que a defesa não é afetada por tal sigilo, na medida em que o resultado do acordo, se houve, deve figurar no inquérito ou ação penal como prvoa, integralmente acessível ao(s) acusado(s). c) Assim, se tivesse vindo a este Juízo o resultado de alguma colaboração premiada prestada por corréu, certamente estaria acostado ao processo, com determinação de ciência às partes. Somente desta forma poderia, se fosse o caso, ser utilizado no âmbito da ação penal: fornecendo provas que, necessariamente, deveriam constar dos autos, acessíveis aos réus. O que não consta nos autos não pode ser tomado como prova, isto é, não pode ser tomado para fins de julgamento, sob pena de violação do contraditório.

Da leitura do trecho ao qual a magistrada fez remissão permite-se tranquilamente concluir que ela afirma perempetoriamente que se houvesse acordo de colaboração, deveria estar no processo, induzindo as defesas - únicas que desconheciam a existência do dito acordo. Vale repetir que até a imprensa já tinha conhecimento do acordo, e continuava sendo negado pelo Juízo, como se pode ver30:

                                                                                                               30 Fls. 10 e 11 do Acordo de Colaboração nº. 2009.71.02.000191-1

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O Juízo violou um dever de boa-fé que deve pautar o trato do órgão jurisdicional com as partes. Mesmo com todas essas informações, sonegadas pela magistrada que conduzia o feito, quando dos interrogatórios, o Juízo subverteu a ordem da denúncia, e deixou para interrogar somente por último aqueles réus que haviam firmado acordos de colaboração. Ora, não somente foi negada a existência dos ditos acordos, como foram transformados os réus em verdadeiras testemunhas de acusação após todos os interrogatórios, em uma manobra de duvidosa legalidade e de nenhuma moralidade, frontalmente violadora de seus direitos à ampla defesa e ao contraditório. Sendo assim, era imperioso que fossem oportunizados novos interrogatórios aos réus eventualmente citados no acordo de colaboração premiada firmado pelos réus delatores, como forma de assegurar a higidez do feito, no que concerne à sua esfera procedimental. Considerando que essa questão foi alegada oportunamente, visando oportunizar a reabertura da instrução, permitindo-se novo interrogatórios dos réus envolvidos nos acordos de colaboração premiada, e outras eventuais provas, mas não restou acolhido pelo Juízo, em sua ânsia de encerrar esse processo, a nulidade há de ser reconhecida nesse tocante.

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III. DO MÉRITO

III.1 FORMAÇÃO DE QUADRILHA OU BANDO; ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA E OUTRAS ADJETIVAÇÕES TANTO PEJORATIVAS COMO DESCABIDAS: NECESSÁRIO REALINHAMENTO DOS FATOS

Parturiunt montes, nascetur ridiculus mus31.

Não se pode começar o exame da matéria em questão sem expor – em que pese tenha ficado já suficientemente claro ao longo da instrução – quem era a Pensant Consultores. A empresa, atualmente inativa, possui sede própria na rua Felipe Néri, nº. 414, em Porto Alegre, conjuntos 101 (auditório e sala de treinamento com 45 lugares); 302; 303; 401; 403; 404; 501; 502; 503; e 6º andar inteiro. Com infraestrutura tecnológica constituída de 30 (trinta) computadores, instalados em rede lógica certificada, interligados a dois servidores; 50 (cinquenta) terminais telefônicos DDR conectados a central telefônica digital com capacidade para 140 ramais; biblioteca com acervo de 3.000 (três mil) títulos catalogados por profissional bibliotecário; cofre para mídias modelos Fire King, com resistência a temperaturas de até 800 ºC, por até 8 horas; arquivo deslizante de 2m x 3m x 2m, estruturado e gerenciado por profissional arquivologista, de acordo com avançadas técnicas de arquivística e gestão eletrônica de documentos - GED. Com essa estrutura, a Pensant foi responsável por uma quantidade bastante significativa de assessorias e supervisões a projetos os mais variados, dentre os quais:

1. Assessoria técnica para elaboração do Documento Base do Pacto pelo Rio Grande, para Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul (2006); 2. Desenvolvimento da Metodologia Técnica e Programa de Necessidades Financeiras para implementação de unidade de produção industrial com cinza da queima da casca do arroz e outros resíduos, para a Fundae (2007); 3. Assessoria em apoio à fiscalização, pela ANATEL, no Estado de São Paulo, para a Fundação - FATEC (2005-2006); 4. Supervisão do serviço referente aos procedimentos de aplicação e elaboração de exames concernentes a obtenção da Carteira Nacional de Habilitação – CNH, para a Fundação FATEC de Apoio a UFSM (julho

                                                                                                               31 "As montanhas partejam; nascerá um ridículo rato".

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de 2003 a 15 de maio de 2007); 5. Elaboração do Projeto Esperança, concepção do paradigma da economia solidária e assessoria ao Bispo Emérito de Santa Maria D. Ivo Lorscheister, de 1978 a 2007 (trabalho voluntário não remunerado); 6. Elaboração do Programa de Modernização e Melhoria da Administração e da Gestão Pública do Estado do Rio Grande do Sul com focos na estrutura administrativa, processos de gestão e redesenho de processos, para a Fundação FATEC de Apoio à UFSM (2000-2005); 7. Elaboração de projetos de modernização e gestão administrativa, vinculados ao Programa Nacional de Modernização Administrativa e Fiscal dos Municípios Brasileiros BID - Ministério da Fazenda, para a Prefeitura Municipal de Canoas-RS (2001-2002); 8. Supervisão da Modernização da Gestão Administrativa e Fiscal, vinculados ao Programa Nacional de Modernização Administrativa e Fiscal dos Municípios Brasileiros BID - Ministério da Fazenda, para a Prefeitura Municipal de Canoas-RS (2003-2004); 9. Elaboração do Programa de Promoção da Saúde e Valorização dos Servidores Municipais, para o Município de Canoas – RS (2003-2004); 10. Supervisão dos Projetos de Infraestrutura e Desenvolvimento Urbano, para a Prefeitura Municipal de Canoas-RS (2003-2004); 11. Elaboração dos Projetos de Modernização da Gestão vinculados ao Programa Nacional de Modernização dos Municípios BID – Ministério da Fazenda e Capacitação em Planejamento Estratégico para as seguintes prefeituras gaúchas: São Borja (2004); Viamão (2004); Santa Cruz do Sul (2004); Santa Rosa (2003); Uruguaiana (2003); Passo Fundo (2003); Santa Maria (1998); Rosário do Sul; Dilermando de Aguiar; Gramado dos Loureiros; Três Passos; Barra do Quaraí e São Gabriel; 12. Elaboração do Projeto de Modernização da Administração Pública com foco na Implantação dos 30 novos municípios emancipados no Rio Grande do Sul, com instalação em 1º de janeiro de 2001; para Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul (trabalho voluntário não remunerado); 13. Supervisão da realização do Inventário Florestal e Avaliação Comercial do Horto Municipal, para a Prefeitura Municipal de Uruguaiana – RS (2001); 14. Estudo da Viabilidade da Implantação de Agências Municipais Reguladoras dos Serviços Públicos Concedidos, para as cidades de Canoas – RS (2003) e Uruguaiana – RS (2000); 15. Elaboração dos Projetos dos Cadastros Técnicos Municipais, para as Prefeituras Municipais de Alegrete (1975), Pelotas (1983) e Santa Maria (1998); 16. Relatório Técnico Descritivo do Sistema de Abastecimento de Água e respectivo Dossiê dos Impactos Ambientais dos Esgotos do Sistema Corsan, para a Prefeitura do Município de Uruguaiana-RS (1999); 17. Estudo de Viabilidade para a Criação do Estado do Iguaçú no Extremo Oeste dos Estados do Paraná e Santa Catarina, para a Prefeitura do Município de Cascavel-PR (1987);

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18. Projeto de Modernização Administrativa/Programa Cidades de Porte Médio do BIRD, para a Prefeitura do Município de Pelotas-RS (1983); 19. Concepção dos Conselhos Regionais de Desenvolvimento – COREDES, considerada uma das duas referências mundiais bem sucedidas de Governança Regional com participação popular institucionalizada (1991) (trabalho voluntário não remunerado); 20. Diversos projetos setoriais de desenvolvimento urbano e regional, para Municípios e Regiões do RS (1980-2006); 21. Planejamento Gerencial e Capacitação da Alta Gerência do Governo Municipal de Passo Fundo-RS (1979); 22. Estudo de Viabilidade dos Programas de Recuperação Urbana Acelerada (CURA), para os Municípios de Santa Maria (1979), Campo Bom (1980) e Sapiranga (1981); 23. Estudo de Viabilidade do Porto Seco, para a Prefeitura Município de Porto Alegre – RS (1978); 24. Estudo de Viabilidade de Integração Agropecuária, para a Cooperativa Tritícola de Júlio de Castilhos-RS (1976);

Tudo isto somente foi possível pela capacidade técnica e visão empreendedora de José Antônio Fernandes. Graduado em Economia pela Universidade Federal de Santa Maria e Mestre em Administração pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul desde 1982, com dissertação defendida e aprovada sobre "A Política Tributária Municipal como Instrumento de Independência Financeira e Administração Urbana", o Professor José Antônio Fernandes é um dos mais modernos e ágeis estudiosos da modernização da gestão pública, aliando conceitos teóricos a uma consistente atuação prática que pode ser verificada a partir de seu Currículo Lattes32. Muito embora o Ministério Público Federal tenha tentado diminuir a importância e a qualidade dos serviços prestados pela empresa (até de empresa fantasma já fora chamada), algumas explicações são necessárias. Com toda sua estrutura e expertise, o principal serviço prestado pela empresa era o de "projetar e supervisionar a implantação de métodos e técnicas de planejamento e gestão, capacitando e fornecendo os conhecimentos necessários para que as instituições clientes se tornem referência de boa gestão pública". A Pensant Consultores Ltda. nunca foi empresa que executou projetos, mas que executou supervisão e gestão de projetos.

                                                                                                               32 Disponível em <http://lattes.cnpq.br/2723070450267436>

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A Gestão de Projetos é conhecimento que restou codificado a partir da década de 1980, como consequência da era da economia da informação, que fixou o conhecimento como insumo básico na formação dos preços. A estrutura de gestão na era da informação requer organização matricial, substituindo a organização industrial clássica e neoclássica.

Como já referido, a Pensant em 1998, elaborou o Projeto de Modernização da Gestão Pública Municipal de Santa Maria. Programa BID - MF .

O município de Santa Maria recebeu R$ 15 milhões desse

Programa. Nesta oportunidade a Pensant contratou a Fatec para

elaborar o Projeto de Tecnologia da Informação. Esse trabalho Pensant e Fatec resultou elogiado pelos

técnicos do Programa no Brasil e na sede do BID(EUA). Disso resultou a assinatura do Acordo de Cooperação entre

Pensant e FATEC em 16/06/2000, renovado em julho de 2002. Esta nova organização e seus detalhes estão no desenho abaixo, que retrata as conexões dessa nova estrutura, ainda desconhecida pela maioria das instituições do aparelho do Estado.

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Em artigo intitulado Capital Inteligente é o Ativo Mais Valioso, Idalberto Chiavenato explica:

Em 1494, um monge veneziano conhecedor da matemática, Luca Pacioli, publicou o summa de Arithmetica, Geometria, Proportioni et Propornalitá, o primeiro livro sobre contabilidade. Pacioli criou um sistema de registros financeiros (entradas e saídas de capital, compra e venda etc.) em um modelo de dupla entrada, permitindo o gerenciamento contábil nos modelos atuais. Passado meio milênio, está surgindo um paradigma que diz que o esquema de Pacioli foi elaborado para lidar com créditos e débitos relativos a bens físicos mensuráveis quantitativa ou financeiramente. Nas modernas organizações – onde o conhecimento é o principal recurso produtivo – as aferições de medidas numéricas e quantitativas não são mais suficientes. Hoje os principais componentes de custo de um produto são P&D (pesquisa e desenvolvimento), ativos inteligentes e serviços [...] O que perturba os contadores é a dificuldade de medir o principal ingrediente da nova economia: o capital intelectual está na cabeça das pessoas [...]. A moeda do futuro certamente não será a financeira, mas a intelectual. A nova realidade é que a maioria dos bens mais valiosos das organizações bem-sucedidas é intangível, como o são a habilidade gerencial, o conhecimento tecnológico, o conhecimento do mercado, a lealdade do cliente, o moral das pessoas, a cultura corporativa, o comportamento dos parceiros de alianças estratégicas etc. [...] A informação passou a cruzar o planeta em milésimos de segundos. A tecnologia da informação forneceu as condições básicas para o surgimento da globalização da economia: a economia se globalizou. A competitividade tornou-se intensa e complexa entre as organizações. O volátil mercado de capitais passou a migrar de um continente para o outro em segundos à procura de novas oportunidades de investimentos, ainda que transitórias. Em uma época que todos dispõem da informação em tempo real, são mais bem-sucedidas as organizações capazes de tomar a informação e transformá-la rapidamente em uma oportunidade de novo serviço, antes que outras o façam. O capital financeiro deixou de ser o recurso mais importante, cedendo lugar ao conhecimento. Nestas circunstâncias, os fatores tradicionais de produção – terra, mão-de-obra e capital – produzem retornos cada vez menores. É a vez do conhecimento, e do capital intelectual. O conhecimento torna-se básico e o desafio maior passa a ser a produtividade do conhecimento. Tornar o conhecimento útil e produtivo tornou-se a maior responsabilidade gerencial33.

Essa nova forma de trabalhar o conhecimento e gerir as pessoas requer processo de comunicação que assegure geração, coleta,                                                                                                                33 CHIAVENATO, Idalberto. Gestão de Pessoas. 3. ed. São Paulo: Elsevier. 2008. p. 21.

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divulgação, armazenamento e distribuição das informações com instantaneidade34. A comunicação nessa estrutura horizontalizada e orgânica está representada no Modelo de Gerenciamento de Projeto, descrito na figura abaixo:

As boas comunicações obtidas com o devido Planejamento Estratégico dos Projetos, segmentando as etapas, levam a melhoria contínua como no gráfico abaixo:

Memórias de Reuniões, Atas, Planilhas, Orçamentos e Cronogramas são instrumentos indispensáveis à Gestão das Comunicações em Projetos, como disposto no gráfico abaixo:                                                                                                                34 Fonte: Project Management Institute. 2004

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Aliás, uma pergunta que se impõe: qual organização criminosa, que tem dentre suas finalidades maiores, a de não ser descoberta, registra suas ações em documentos, como atas, emails, etc.??? Infelizmente, por desconhecimento ou má-fé, tanto a Polícia Federal como o Ministério Público Federal criminalizaram procedimentos de rotina, os quais evidenciam não apenas a máxima transparência como a absoluta licitude de todas as suas práticas. Criminalizaram a virtude e não o vício.

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Ao longo da execução de um Projeto, a área das comunicações é intrinsecamente vinculada à área de integração, nos fluxos dos processos de gestão da comunicação, conforme demonstrado abaixo35:

Assim, atas de reunião, planilhas, orçamentos, organogramas,

memoriais de reuniões, em Gestão de Projetos são instrumentos de trabalho e não prova de crime, como tentou fazer parecer o acusador público federal. Dentro desse contexto de Gestão de Projetos, sobressai a noção de eficientização.

                                                                                                               35 CARVALHO, Marly Monteiro; RABECHINI JUNIOR, Roque. Construindo Competências para Gerenciar Projetos. São Paulo: Atlas. 2008. p. 255

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Ela é o que diferencia a visão empreendedora do serviço prestado, da visão engessada e conservadora do Ministério Público Federal ao longo de todo o processo. A título de exemplo, compare-se o preço dos três principais contratos do Detran no período, e seus critérios de correção. O contrato da Fundação Carlos Chagas previa, em 10 de março de 2007, o valor de R$ 20,00 (vinte reais) para o exame teórico, e de R$ 35,66 (trinta e cinco reais e sessenta e seis centavos) para o exame prático, devendo ser reajustado anualmente pelo IGP-M da Fundação Getúlio Vargas.

Contrato com a Fundação Carlos Chagas

No ano de 2003, quando firmado o contrato com a FATEC, respeitando-se os índices de atualização monetária ajustados na cláusula décima segunda, totalizariam R$ 42,34 (quarenta e dois reais e trinta e quatro centavos) para o exame teórico, e de R$ 75,49 (setenta e cinco reais e quarenta e nove centavos) para o exame prático. Mesmo com essa impressionante diferença, de 211,7% (duzentos e onze vírgula sete por cento) sobre os valores contratados seis anos antes, o DETRAN-RS firmou contrato com a FATEC, em 19 de dezembro de 2003, definindo os valores de R$ 21,42 (vinte e um reais e quarenta e dois centavos) para o exame teórico, e de R$ 43,47 (quarenta e três reais e quarenta e sete centavos) para o exame prático.

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Contrato com a FATEC

Note, Excelência, que a cláusula décima primeira do contrato com a FATEC previa um critério de reajuste diferente. Valeu-se da Unidade de Padrão Fiscal (UPF), cuja unidade, desde o ano de 200036 tem os seguintes valores:

Para se chegar ao valor devido no ano de 2007, quando assinado o contrato com a Fundae, deveria se calcular qual foi o valor contratado, em UPFs, e, posteriormente, fazer uma regra de três simples. Em 2003, a UPF valia R$ 7,7568, de modo que o exame teórico, que foi contratado por R$ 21,42 (vinte e um reais e quarenta e dois centavos) equivalia a 2,7614 UPFs, e o exame prático, que foi contratado por R$ 43,47 (quarenta e três reais e quarenta e sete centavos) equivalia a 5,6041 UPFs.

                                                                                                               36 Disponível em https://www.sefaz.rs.gov.br/site/MontaDuvidas.aspx?al=l_ind_upf

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Para se chegar ao reajuste contratado, deveria se multiplicar o valor, em UPFs, contratado em 2003 (contrato com a FATEC), pelo valor da UPF em 2007 (contrato com a Fundae), que era de R$ 9,9901. Assim, o preço justo, conforme o contrato 70/2003, seria de aproximadamente R$ 27,58 (vinte e sete reais e cinquenta e oito centavos) para o exame teórico, e de aproximadamente R$ 55,98 (cinquenta e cinco reais e noventa e oito centavos) para o exame prático. Entretanto, o valor que foi firmado pelo contrato 09/2007, com a Fundae, foi de R$ 24,99 (vinte e quatro reais e noventa e nove centavos) para os exames teóricos, e de R$ 53,56 (cinquenta e três reais e cinquenta e seis centavos), ambos os valores abaixo daqueles que seriam devidos pela simples atualização dos valores ajustados no contrato anterior.

Contrato com a Fundae

Um breve histórico da contratação, primeiramente com a FATEC e, posteriormente, com a FUNDAE torna-se necessário para explicar as alegações mentirosas de Lair Ferst, pessoa tida por pouco honesta, pouco confiável em todos os meios em que transita, e os próprios equívocos acusatórios. O contrato do DETRAN com as Fundações de Apoio à Universidade Federal de Santa Maria, sem prejuízo do ensino, envolveu a participação efetiva de acadêmicos na área da pesquisa científica relacionada a um problema crônico de nossa sociedade - o trânsito de veículos automotores e a elevada incidência de acidentes com mortos e feridos. Como exemplo de ações de impacto técnico, social e de interesse público que buscam preservar e valorizar a vida, destaca-se o questionário aplicado no Concurso Vestibular da UFSM de 2005, submetido aos candidatos a fim de coletar informações dos que possuíam a Carteira Nacional de Habilitação e dos candidatos a obtê-la.

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As respostas subsidiaram pesquisas científicas dentro da instituição de ensino. Parte dos recursos provenientes desse contrato, referentes tanto da parcela institucional, como da eficiência decorrente da informatização gerada, foi utilizada para manter 2000 alunos carentes na Universidade Federal de Santa Maria, através do fornecimento de moradia e alimentação. Diferentemente do que ironicamente foi sugerido pelo Ministério Público Federal, de que se tratavam de medidas de caráter publicístico, era a efetiva e concreta retribuição social à comunidade acadêmica. Firmado o contrato, que teve sua origem na aproximação do DETRAN com a FATEC, e desta com a Universidade Federal de Santa Maria, surgiu a necessidade de se buscar uma empresa que gerenciasse o Projeto. Ao contrário do que faz crer o Ministério Público Federal, jamais houve um ajuste prévio, ou um pacote de serviços, em que a Pensant Consultores Ltda. estivesse inserida. Os documentos abaixo reproduzidos evidenciam que houve uma busca por parte da FATEC de empresas que pudessem desenvolver atividades junto à Fundação de Apoio, antes de ser assinado o contrato entre DETRAN e FATEC, todos protocolos firmados por Marione Medeiros, funcionária da FATEC. A empresa PROPEC - Projetos, Planejamentos e Pesquisas Ltda., em documento de 26 de junho de 2003, firmado por Antônio Elbo de Oliveira Pereira, Sócio-Gerente, informa que está atuando exclusivamente em projetos voltados para o meio ambiente, razão pela qual declina do interesse. A empresa ConsulProject - Consultoria Econômica, em documento de 26 de junho de 2003, firmado por Morecy Vaz More, Sócio-Diretor, informa da impossibilidade de aceitar o encargo antes de setembro de 2003, e que se for possível fazê-lo após esta data, manifesta o interesse. Por fim, a Pensant Consultores Ltda., em documento de 25 de junho de 2003, firmado por José Antônio Fernandes, manifesta o interesse no contrato, e encaminha termo de referência para viabilizar a "compreensão dos serviços

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oferecidos, fornecendo elementos suficientes para avaliação da sistemática operacional, produtos, equipe técnica e custos, além de viabilidade de se alcançar o objetivo proposto".

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Convém lembrar que antes da aproximação entre DETRAN e FATEC, a Pensant já havia firmado dois termos de cooperação com a FATEC, um em 2000, e outro em 2002, devidamente comprovado nos autos, em que a Pensant prestava serviços de modernização da Fundação. A contratação da Pensant e das demais empresas pelas fundações jamais carregou a característica de contratações “casadas”, como tentou fazer crer a irresponsável acusação.

A prestação de serviços da Pensant às fundações era anterior à execução (por parte das fundações) do Projeto DETRAN-RS, o que demonstra que as fundações já tinham conhecimento do serviço prestado pela empresa, e, consequentemente, a qualidade com que eles eram executados. Dito de outro modo, conhecendo a empresa e a qualidade de seus serviços, com a contratação pelo DETRAN, a lembrança da Pensant para prestar serviços de supervisão e gerenciamento do contrato era consequência natural. Feitas as considerações necessárias para a compreensão da contratação do DETRAN pela FATEC, e da Pensant Consultores Ltda., e devidamente provado todo o alegado, resta desmantelada toda a construção falaciosa da acusação pública. Entrtanto, há uma peça-chave ainda inexplicada. O surgimento de Lair Ferst é enigmático na execução do projeto. O Sr. Lair Ferst, pessoa desconhecida até então na Universidade, apareceu na cerimônia de posse, para o 2º mandato, do Reitor Paulo Sarkis. É de conhecimento das lideranças universitárias e políticas local que o Presidente Fernando Henrique Cardoso estava sendo pressionado a nomear o 2º indicado na lista tríplice, Prof. Tabajara Gaúcho da Costa, encaminhada pelos Conselhos Superiores, por pertencer aos quadros do PSDB. O falecido Deputado Federal Nelson Marchezan, do PSDB, defendeu com veemência a nomeação de Sarkis, em razão de, apesar de não ter

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filiação partidária, ter feito um 1º mandato com bons resultados, o que foi amplamente demonstrado ao longo da instrução. No dia da posse, sem ser convidado, compareceu o Sr. Lair Ferst, coordenador da bancada do PSDB na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Sul. O Sr. Lair Ferst, loquaz e de fácil comunicação, interagiu com as lideranças universitárias presentes, criando relacionamentos que lhe abriram as portas para vir a ser relações externas da FATEC, nomeado e renomeado pelo Presidente Tadeu Carlos da Silveira, com o apoio do então vice-reitor Clóvis Lima. O estreito relacionamento que se criou permitia ao Sr. Lair Ferst visitas sem agendamentos aos reitores que sucederam o Prof. Sarkis. O Presidente da FATEC, à época, Tadeu Carlos da Silveira, fora dos limites do Projeto, agendou audiência com o Presidente do DETRAN para ofertar uma solução de Tecnologia de Informação instalada em aparelhos portáteis PALM, destinada ao uso de agentes de trânsito. Esse produto, por ser desconhecido, não fora aprovado em razão da sofisticação do equipamento. Soube-se, posteriormente, que quem intercedeu para que a audiência fosse realizada entre o Sr. Tadeu e o Sr. Carlos Ubiratan foi o Sr. Lair Ferst.

A FATEC firmou contrato com o DETRAN-RS, em 10 de dezembro de 2003, para execução do seguinte objeto:

A CONTRATADA obriga-se a prestar ao CONTRATANTE, serviços técnicos especializados, objetivando o estabelecimento de procedimentos, execução e condições concernentes ao Exame de Habilitação para condução de veículos automotores no Estado do Rio Grande do Sul.

Da leitura do termo de contrato observa-se que seu objeto engloba a aplicação de exames teóricos e práticos aos candidatos à Carteira Nacional de Habilitação para condução de veículos automotores, bem como, a elaboração das provas teóricas por instrumento de softwares que escolham as questões aleatoriamente.

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A contratação se deu com fulcro no artigo 24, inciso XIII, da Lei Federal 8.666/93. Por meio de tal fundamento, são passíveis de serem contratadas instituições brasileiras incumbidas, regimental ou estatutariamente, da pesquisa, do ensino ou do desenvolvimento institucional, desde que a contratada detenha inquestionável reputação ético-profissional e não tenha fins lucrativos. A FATEC, preenchendo esses requisitos legais, teve sua “Proposta de Fornecimento de Serviços Técnicos Especializados ao Departamento Estadual de Trânsito DETRAN-RS” aprovada pela Procuradoria–Geral do Estado – Processo SPI n° 005690-1244/03-7, o que culminou na sua contratação. Para atender com eficiência ao objeto, a FATEC firmou contrato com a Pensant Consultores Ltda., cujo objeto é "a prestação de serviços técnicos especializados de Supervisão das obrigações decorrentes do contrato firmado entre a FATEC e o DETRAN-RS, em 10 de dezembro de 2003, de n° 70/2003". À FATEC competia executar o serviço com seus profissionais, enquanto a Pensant supervisionava a execução, sem poder de mando, tudo conforme o Termo de Referencia apresentado. A Pensant Consultores Ltda. é uma sociedade empresária limitada, regulada pelo Código Civil Brasileiro. Como pessoa jurídica de direito privado tem ampla liberdade de negociação, desde que o objeto seja lícito. A FATEC também é uma pessoa jurídica de direito privado, regulada pelo Código Civil, diferenciando-se da Pensant, por ser uma Fundação. Nesse contexto, o contrato firmado entre FATEC e Pensant é regulado pelo Direito Privado, uma vez que trata de interesses individuais das partes pactuantes. Trata-se de contrato de prestação de serviços, firmado por pessoas jurídicas legalmente constituídas, cujo objeto é lícito, de modo que a pertinência de se firmar contratos como esse dependem exclusivamente da disposição de ambas as partes de se obrigarem perante si. O objeto contratado com a FATEC guarda relação direta com o contrato firmado entre a FATEC e o DETRAN-RS, uma vez que incumbe à

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Pensant supervisionar as obrigações decorrentes deste. No plano prático, se extinto o contrato entre FATEC e o DETRAN-RS, haverá naturalmente a perda do objeto daquele firmado com a Pensant. O Contrato da Pensant, embora “gravite” em torno do Contrato da FATEC com DETRAN-RS não configura subcontratação, visto que o objeto do contrato FATEC-Pensant não consiste na aplicação de provas teóricas ou práticas, nem na elaboração do banco de questões, nem na execução de qualquer ato concernente ao objeto contratado entre FATEC e DETRAN. Esses serviços são prestados diretamente pela FATEC:

a) os exames teóricos eram elaborados por técnicos da própria FATEC; b) os exames práticos eram aplicados por examinadores empregados da FATEC pelo regime celetista; c) a coordenação das equipes era feita pela própria FATEC.

Todas as etapas do processo e todos os procedimentos de execução para elaboração e aplicação dos Exames de Habilitação para condução de veículos automotores no Estado do Rio Grande do Sul eram feitos diretamente pela FATEC, através de seus servidores contratados mediante as regras da CLT. À Pensant cabia supervisionar o exercício das atividades da FATEC para a boa e fiel execução do contrato com o DETRAN-RS, e não executar o trabalho pela FATEC. A Pensant não elaborava, não aplicava tais exames, e nem executava obrigações estabelecidas no contrato 070/2003. A atividade de supervisão consta do “Termo de Referência” o que torna cristalina tratar-se de objeto distinto e, por consequencia afasta a hipótese de subcontratação, não havendo, portanto, qualquer mácula no contrato firmado entre FATEC e Pensant Consultores Ltda. A supervisão de um projeto feita por empresa que não a contratada para a sua execução é, hoje, prática indispensável das melhores práticas de gestão. Isso era tão transparente dentro da Universidade Federal de Santa Maria, a ponto de que, em dezembro de 2005, quando registrado na Gerência

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de Projetos da Universidade Federal de Santa Maria o Projeto Trabalhando pela Vida, tombado sob o nº. 018.346, sob a coordenação do Prof. Dario Trevisan de Almeida, havia a previsão expressa de pagamentos, sob a rubrica de "Outros Serviços de Terceiros", a empresas, no valor de R$ 7.970.040,60 (sete milhões, novecentos e setenta mil e quarenta reais e sessenta centavos). Essa supervisão concretiza a possibilidade de alguém, externo ao vínculo estabelecido para a execução das atividades-fins do contrato ter a isenção suficiente para identificar e apontar eventuais defeitos e falhas na execução do contrato, bem como para evitá-las. Dentre as obsessões da Pensant Consultores Ltda. estava a segurança na aplicação dos exames, bem como a eficientização das práticas de execução do contrato, a bem de obter a redução de custos frente a maximização de resultados. Para isso, a Pensant mantinha um setor de benchmarking, atividade desenvolvida por Ferdinando Francisco Fernandes, e é visto como um processo positivo dentro da empresa, e consiste em analisar como outras empresas realizam determinada função, com o intuito de melhorar o desempenho da sua. O que acontecia nessas viagens era justamente uma comparação de sistemas, na busca de ideias inovadoras junto aos outros DETRANs e procedimentos mais eficazes que viessem a conduzir a empresa PENSANT a um desempenho cada vez melhor, afinal, a empresa sempre foi reconhecida pela excelência nos serviços prestados. Essa busca por inovações na prestação dos serviços também era feita por outros consultores, de outros estados, vinculados a outras empresas, e que também prestavam esse tipo de serviço. Os recursos utilizados para a realização dessas viagens eram, como não se poderia pensar nada diferente, inteiramente próprio da Pensant. A título de exemplo, nunca, em todo o período que a Pensant Consultores Ltda. supervisionou o contrato do DETRAN-RS com as Fundações de Apoio houve qualquer episódio de fraudes envolvendo a emissão de Carteiras Nacionais de Habilitação, bem diferente do que ocorre em tempos atuais, quando o Estado avocou as responsabilidades pela execução:

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Zero Hora Online de 27 de novembro de 201337

Globo.com de 11 de junho de 2013

A segunda manchete refere-se à Operação Teseu, deflagrada em junho de 2013, envolvendo mais de 480 policiais, e teve como objetivo o desmantelamento de uma fraude que contava com a colaboração efetiva de examinadores. Diz a matéria que:

A investigação apurou que existia um esquema em que instrutores de Centros de Formação de Condutores (CFC) de Porto Alegre e examinadores do Departamento Estadual de Trânsito (Detran) recebiam dinheiro para aprovar clientes sem a realização das provas. O delegado Emerson Wendt informou que a grande maioria dos envolvidos são examinadores. Um médico, que é suspeito de participar do esquema, também será encaminhado à delegacia para prestar depoimento38.

Esses episódios jamais ocorreram em todo o período do contrato do DETRAN-RS com as Fundações de Apoio. Isso porque a supervisão e gerência estratégica exercida pela Pensant avaliava permanentemente possibilidades de envolvimento de examinadores da FATEC em prováveis crimes. Foi através de sugestão da Pensant que a FATEC iniciou o

                                                                                                               37 Disponível em http://zerohora.clicrbs.com.br/rs/policia/noticia/2013/11/sindicato-que-ameacaria-concorrentes-no-porto-de-rio-grande-e-suspeito-de-falsificar-cnhs-4347262.html 38 Disponível em http://g1.globo.com/rs/rio-grande-do-sul/noticia/2013/06/operacao-policial-visa-combater-fraude-na-emissao-de-cnh-no-rs.html

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monitoramento dos examinadores pelos relatórios emitidos pelo Serasa (credit rating) de cada examinador, comparando com possível evolução patrimonial, dentre outros itens avaliados mensalmente. Procediam-se análises estatísticas referentes ao atendimento de cada examinador por Centro de Formação de Condutores (examindor que recorrentemente atendia ao mesmo Centro de Formação de Condutores atraía suspeitas), por índice de aprovação e reprovação, por rendimento em aplicação de exames diários, por atendimento aos agendamentos realizados pelo Centro de Formação de Condutores. Toda essa preocupação, de competência da Pensant, foi a responsável para jamais ter havido um único episódio de violação dos protocolos de segurança dos exames para a outorga de Carteira Nacional de Habilitação. Importante salientar, desde já, que os responsáveis pelas Fundações de Apoio nunca mantiveram a relação de subordinação à Pensant que tenta impor a acusação (fl. 54.185). Ao contrário, os dirigentes das fundações sempre tiveram autonomia funcional e sempre tomaram as decisões pertinentes ao contrato sem ter a necessidade de consultar a Pensant. Essa consulta só acontecia quando dizia respeito ao serviço que de fato deveria ser prestado pela empresa, restrita a uma questão contratual de supervisão e gerência. Quando essas informações eram prestadas pela Pensant às fundações, tratava-se de uma influência exclusivamente técnica. Avançando a análise dos requisitos para a dispensa de licitação, a inquestionável reputação ético-profissional da FATEC e sua contratação por dispensa de licitação já foram analisadas favoravelmente por diversos órgãos da administração direta e indireta, tanto na esfera federal como na estadual e municipal, inclusive pelo Poder Judiciário, que, embora não se tratasse do contrato da FATEC com o DETRAN, proferiu a seguinte sentença:

E é patente a legalidade do convênio firmado entre o Município e a FATEC, haja vista que esta entidade preenche todos os requisitos exigíveis pelo art. 24, inc. XIII, da Lei 8.666/93. (...) À toda evidência, é objetivo básico da FATEC, previsto estatutariamente (fls. 5356) a promoção de estudos, pesquisas e prestações

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de serviços para órgãos públicos e privados, como requer o artigo sob análise. Além disso, é uma entidade sem fins lucrativos e que goza de notória reputação ético-profissional na sociedade local, como faz prova a extensa listagem de instituições que firmaram convênios com a Fundação39.

Todas essas questões restaram suficientemente explicadas pela FATEC quando, em maio de 2007, foi encaminhado documento pelo Presidente à época ao Ministério Público Federal esclarecendo uma série de pontos.

                                                                                                               39 TJRS. Processo nº. 02700122564 (número atual 027/1.05.0093507-9). 3ª Vara Cível da Comarca de Santa Maria. Sentença prolatada em 10 de agosto de 1998 pelo Juiz de Direito Gilberto La-Flor.

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O fato é que o formato de trabalho contratado com o DETRAN exigia rigoroso serviço de controle externo de auditorias e inteligências contra fraudes. Para cumprir essa tarefa, a FATEC contratou as empresas Rio del Sur (auditoria) e Newmark Tecnologia (inteligência).

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O Sr. Lair Ferst emergiu das sombras quando, decorridos alguns meses do início do trabalho, em agosto de 2004, a supervisão apontou incompetências técnicas na qualidade do trabalho prestado por essas empresas, além da falta de vínculo dos profissionais e do responsável técnico, conforme relatórios mensais de supervisão, totalizando 5000 folhas, já nos autos. O relatório entregue no final do contrato totalizava 10 folhas de inconsistências apontadas pela Pensant, todas elas pagas pela FATEC, juntado à fl. 36.783, especialmente na planilha de fl. 36.822 e seguintes.

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Após as primeiras inconsistências, foi encaminhado à FATEC determinação às empresas Newmark e Rio del Sur, , em 28 de abril de 2005, em que se especificaram tarefas a serem cumpridas por essas empresas, com o grau de detalhamento desejável. Nos memoriais, na fl. 54.186, o Ministério Público Federal se vale da transcrição de uma carta que fora enviada a Ferdinando Fernandes por Rubem Hoher. É um dos principais documentos defensivos de José Antônio Fernandes, Ferdinando Francisco Fernandes, Fernando Fernandes e Lenir Beatriz da Luz Fernandes. Rubem Hoher desempenhava atividade de auditoria sobre os serviços prestados pela FATEC ao DETRAN-RS. Por conta disso, havia grande troca de informações técnicas com a autarquia. Repete-se, troca de informações técnicas, o que gerou uma distorção dos fatos por parte do Ministério Público Federal. A referida carta foi recebida por Ferdinando com certa surpresa, já que o acusado não tinha acesso aos documentos de trabalho das empresas Rio del Sur – Auditoria e Consultoria Ltda e Newmark – Tecnologia da Informação, Logística e Marketing Ltda, nunca esteve nas sedes das referidas empresas, nunca obteve conhecimento dessas relações, dos vínculos, bem como não fazia a análise desses relatórios. A carta demonstra justamente que Ferdinando não detinha nenhum poder de mando, sequer tinha conhecimento efetivo de que poderiam estar ocorrendo irregularidades no âmbito do projeto DETRAN-RS envolvendo essas empresas. O conteúdo da carta evidencia a preocupação de Rubem Hoher com o andamento do projeto DETRAN-RS, ao mesmo tempo em que solicita a intervenção de Ferdinando, através da empresa Pensant.

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Note-se que o que Rubem Hoher solicita justamente que a Pensant execute seu papel, qual seja, de supervisão e gerência estratégica. A preocupação demonstrada por Rubem é relativa à prestação de serviço de outras empresas, Newmark e Rio del Sur, empresas administradas de forma oculta por Lair Ferst. A acusação menciona que no conteúdo dessa carta Rubem teria feito referência a um possível superfaturamento dos serviços prestados, além de uma possível preocupação dos “riscos” a todos os envolvidos. Se de fato ocorria, a carta só comprova que a Pensant e seus administradores eram alheios, até o momento, a essas irregularidades.

Contudo, a carta não se refere a nenhum esquema criminoso ou repasse de vantagens indevidas envolvendo a empresa Pensant ou seus sócios. Ao contrário, revela a preocupação de Rubem Hoher em relação ao serviço que estava sendo prestado pelas empresas Rio del Sur e Newmark, pois a Pensant já vinha apresentando relatórios de produtos parciais à FATEC com apontamentos e sugestões.

Inclusive, esse era um dos produtos desenvolvidos pela empresa Pensant, os chamados POPs (Procedimentos Operacionais Padrão), dentre os 40 procedimentos executados. Essa denominação era utilizada na fase FATEC, ao passo em que na fase FUNDAE os objetos eram denominados SA (Supervisão de Atividades) pois foram se modernizando a medida das necessidades. Convém lembrar que a data dessa carta - 27 de abril de 2006 - remonta muito mais ao final do contrato do DETRAN com a FATEC , e evidencia, ao contrário do que supõe a acusação, uma não participação dos acusados, do que sua adesão a um eventual esquema criminoso. Diante da continuidade das inconsistências recomendou-se fossem suspensos os pagamentos, momento em que o Sr. Lair Ferst passou a agir ativamente na defesa de tais empresas. Mesmo com a recomendação de suspensão desses pagamentos, a fundação os efetuou, comprovando, mais uma vez, a

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INEXISTÊNCIA de poder de mando e influência da Pensant em relação às fundações. Diferentemente do que supõe a acusação, de que “a quadrilha estava determinada a excluir LAIR FERST na obtenção das vantagens econômicas decorrentes do desvio dos dinheiros públicos” (fl. 54.197), a explicação é muito mais trivial. As empresas do núcleo familiar de Lair Ferst não continuaram no contrato, provavelmente em razão de o Presidente da FUNDAE, Economista Mário Franco Gaiger, ser conhecedor dos serviços de péssima qualidade prestados. O acusado José Antônio Fernandes, supervisor-geral do projeto, mandou rastrear os Cartórios de Porto Alegre, e foi encontrada, junto ao 4º Tabelionato - Azenha -, uma procuração dessas duas empresas ao Sr. Lair Ferst, dando plenos e irrenunciáveis poderes, cuja cópia encontra-se devidamente protocolada nos autos. Posteriormente, compareceu na FATEC o advogado Luiz B. Machado Alves, de Caçapava do Sul, buscando arrestar recursos das empresas antes referidas, por conta de dívidas da empresa Ferst Indústria e Comércio de Calçados Ltda. e Weste Walley Indústria de Calçados Ltda., ambas com sede em Porto Alegre. Esse fato é de amplo conhecimento público, como se pode ver notícia veiculada no jornal Farrapo, de Caçapava do Sul, em 18 de junho de 2008:

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Com o término do contrato com a ANATEL, em 2005, o Sr. Lair Ferst acompanhou o Presidente Tadeu Carlos da Silveira, em audiência na sede da ANATEL, em Brasília, para diligenciar novos contratos, sem o conhecimento da equipe técnica responsável pelo serviço até então prestado para aquela agência. No dia da renovação do mandato da direção da FATEC, uma articulação de última hora lançou o Professor Luiz Carlos de Pelegrini (Diretor do Centro de Ciências Rurais) para Presidente, que acabou vencendo o então Presidente Tadeu Carlos da Silveira. O Sr. Lair Ferst esteve presente logo após a reunião do Conselho da FATEC para assumir a função de Secretário-Executivo, posto que acabou ocupado por Silvestre Selhorst. Informações de presentes dão conta que, na ante-sala da presidência, o Sr. Tadeu Carlos da Silveira teria dito ao Sr. Lair Ferst: "perdemos". O Presidente Tadeu Carlos da Silveira era o candidato do Reitor Clóvis Lima, com quem o Sr. Lair Ferst passou a manter estreito relacionamento, ao ponto de agendar audiências com o Reitor, com o Vice-Reitor e deles com o Presidente do DETRAN, marginalizando a estrutura técnica do serviço dos exames, executados pela FATEC, segundo rigorosa técnica de administração, conforme relatórios juntados aos autos. Na primeira contratação do Sr. Lair Ferst, como celetista da FATEC, ainda titulava cargo na Assembleia Legislativa do Estado do Rio Grande do Sul. Silvestre Selhorst refere que havia dificuldade de o Presidente Luis Carlos de Pelegrini marcar audiência com o Reitor Clóvis Lima, ocasião em que o Sr. Lair Ferst colocou-se à disposição, dizendo que, em razão de sua intimidade com o Reitor, conseguiria resolver a situação. Esse é o cenário dos fatos: um empresário que faliu no Vale dos Sinos, depois instalou empresas fantasmas em Caçapava do Sul, exerceu a função de Coordenador da Bancada do PSDB na Assembléia Legislativa do Rio Grande do Sul e conseguiu, junto ao Presidente da FATEC, Tadeu Carlos da Silveira, um emprego como celetista junto à Fundação.

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Essa é a pessoa que o Ministério Público Federal escolheu para ser o pilar de sua acusação. Uma pessoa que em toda sua trajetória nunca valeu muito, e do pouco que restou se vendeu para delatar quem trabalhou corretamente. A explicação é bastante simples. Quando as empresas do Sr. Lair Ferst foram afastadas da execução do contrato, em razão do péssimo serviço que desempenhavam, este senhor viu ser fechada uma porta que lhe fora aberta - dos fundos, por certo - pelo ex-Presidente Tadeu Carlos da Silveira, integrante do grupo adversário do Reitor Paulo Sarkis, e que vinha lhe rendendo bons frutos. A FUNDAE assumiu os exames do DETRAN a partir de 15 de maio de 2007. E a razão para isso foi suficientemente esclarecida ao longo da instrução. A FATEC acumulava um passivo trabalhista muito grande, de modo que a manutenção dos examinadores em seu quadro de pessoal representava um risco muito grande de não conseguir suportar os custos sociais dos examindores. A título de exemplo, no ano de 2005, a FATEC fora condenada a pagar R$ 150.000,00 (cento e cinquenta mil reais) a um examindor, porque a Justiça do Trabalho não aceitava o enquadramento de sua atividade como sendo "atividade externa sem controle de horário". Dentre os documentos apreendidos, constam três planilhas de autoria do Prof. Dario Trevisan de Almeida, em que traça cenários para a Fundação com relação aos pagamentos de horas extras, nos termos do que vinha sendo definido pela Justiça. Fosse seguido o contrato em seus termos iniciais, isso geraria um passivo de mais de 6 milhões de reais, conforme aquelas planilhas. Tentou-se um reequilíbrio econômico-financeiro do contrato entre FATEC e Direção do DETRAN-RS, à época o acusado Carlos Ubiratan dos Santos, que sugeriu esse assunto fosse tratado com o novo Diretor-Presidente,

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Flávio Vaz Netto, ocasião em que ocorreram as primeiras reuniões entre a nova Diretoria do DETRAN-RS e a FATEC. Após manifestação da Assessoria Jurídica do DETRAN-RS, foi negado o pedido da FATEC, e ratificado após pedido de reconsideração. Sem possibilidade de reequilibrar o contrato, a FATEC tratou com a Direção do DETRAN-RS uma solução para se resolver a situação. Uma ação judicial não era uma questão concreta, já que, provavelmente, o contrato expiraria antes de uma decisão definitiva. O caminho passava pela rescisão com as empresas de controle externo. O problema estava em uma cláusula que vinculava a duração de seus contratos à duração do contrato entre DETRAN-RS e FATEC. Para evitar a rescisão unilateral e as consequências judiciais desse ato, a contratação da FUNDAE surgiu como uma concreta possibilidade que atenderia a todas as necessidades. O DETRAN-RS solicitou à Universidade Federal de Santa Maria requerendo informações de outras Fundações que poderiam assumir a execução do contrato. Isso fica muito claro do depoimento do Sr. Ildo Mario Szinvelski, servidor concursado do DETRAN, especialmente na fl. 17.283v.:

Na época, já havia assumido a reitoria da Unviersidade Federal de Santa Maria o Professor Clóvis da Silva Lima, muito próximo politicamente aos dirigentes da FUNDAE, à época.

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De pronto, a FUNDAE encaminhou proposta de serviços ao DETRAN. Com isso, o serviço poderia continuar sendo prestado, sem solução de continuidade, com o mesmo benefício à Universidade Federal de Santa Maria, e com menos custo ao Estado, já que a FUNDAE gozava de privilégio que a FATEC não tinha, a filantropia, o que lhe permitia reinvestir o valor referente à contribuição previdenciária patronal, dentro de suas finalidades institucionais. Para a coordenação executiva, em tempo integral, na Fundae, foi nomeado o Prof. Rubem Höehr, a quem competia coordenar todas as atividades de gestão e diligenciar o pagamento das despesas vinculadas ao Projeto, tudo com a devida ciência e autorização da Diretoria da Fundae. A Pensant, por sua experiência, foi contratada pela FUNDAE, mas com muito mais atribuições do que detinha à época do contrato com a FATEC. Além de suas mesmas atribuições, a Pensant passou a acumular as tarefas que vinham sendo (mal) desempenhadas pela Newmark Tecnologia e Rio del Sur. Consolidada a migração, o primeiro procedimento adotado pela Coordenação de Projetos da Fundae foi elaborar uma matriz de distribuição de recursos para apropriação dos custos. Em razão do modelo já implantado anteriormente na FATEC, foi possível definir os itens de apropriação a serem configurados na FUNDAE, com a preocupação preponderante de apropriar recursos para a cobertura da filantropia, condição indispensável para o cumprimento de compromissos que representam a razão de ser da Fundae. A comprimida Matriz de Distribuição, com cem por cento dos recursos alocados, obriga eleger as rubricas de custeio e de remuneração institucional, passíveis de contingenciamento, para direcionar à filantropia. Com este modelo e com este contingenciamento, foi iniciado o Projeto na Fundae.

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As fontes de financiamento se restringem à realização dos exames, de modo que coube identificar o potencial físico desta operação tendo por base os valores unitários dos exames devidamente contratados, e uma estimativa mensal de realização, o que levaria a uma estimativa mensal de arrecadação.

Identificação do Ponto de Equilíbrio Financeiro para 2007 Projeto FUNDAE/DETRAN

Item Exame Prático Exame Teórico Somas Valor unitário 53,56 24,99

Estimativa mensal 28.000 26.000 54.000 Arrecadação mês 1.499.680,00 649.740,00 2.149.420,00

Média mês exames 2006 28.666 18.647 47.313

Para o ano de 2007, havia a previsão de arrecadação média mensal de R$ 2.200.000,00 (dois milhões e duzentos mil reais), com a realização de 48 mil exames por mês.

COMPOSIÇÃO DOS CUSTOS PARA A RECEITA ESTIMADA DEMONSTRATIVO DA COMPOSIÇÃO DE CUSTOS

CONTRATO 009/2007 – DETRAN Itens de Apropriação Indice de Participação Financeiro

I - Custos Diretos 72,18 1.587,960,00 I.I - Pessoal e Encargos 41,41 911.020,00 Examinadores 25,65 564.300,00 Suporte Operacional 5,45 119.900,00 Suporte Administrativo 2,00 44.000,00 Gestão de RH 3,41 75.020,00 Constituição Provisões 4,90 107.800,00 I.II - Logística de Exames 8,77 192.940,00 Software e Sistemas 4,00 88.000,00 Metodologias e Sistemas 4,77 104.940,00 I.III - Logística de Gestão 22,00 484.000,00 Custeio de Atividade 8,00 176.000,00 Segurança Institucional 14,00 308.000,00 II - Custos Indiretos 27,82 612.040,00 II.I - Coordenação e Controle 7,82 172.040,00 Gerência e Coordenação 4,00 88.000,00 Contabilidade e Folha 1,82 40.040,00 Suporte Jurídico 2,00 44.000,00 II.II - Remuneração Institucional 20,00 440.000,00 Vinculação Institucional (UFSM)

10,00 220.000,00

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Resultado da Eficientização 10,00 220.000,00 Total 100,00 2.200.000,00

Feitos os estudos iniciais e bases preliminares para adequação do Projeto DETRAN dentro da Fundae, a etapa seguinte foi definir o fluxo financeiro considerando os compromissos institucionais e legais, como a filantropia, por exemplo. A perspectiva média de realização de 48 mil exames por mês, projetava arrecadação de R$ 2.200.000,00 (dois milhões e duzentos mil reais), totalmente revertidas à Fundae para preservação e garantia da necessária destinação de recursos para atividades de filantropia. As empresas especializadas contratadas abrangem ações de controle, com ganho de qualidade, produtividade, confiabilidade, desempenho e segurança. É notória a complexidade das atividades, uma vez que abrangia 100% do território do Rio Grande do Sul, com, à época, 276 (duzentos e setenta e seis) Centros de Formação de Condutores, com agendamentos diários de exames práticos e teóricos. Não basta esforço e dedicação. Sem competeência e vinculação em tempo integral, com terceirização de atividades de controle, não se consegue atender e suportar a demanda do serviço. A estimativa de 48 mil exames por mês, distribuídos em 22 dias úteis, representa a realização de 2.180 exames individuais por dia. Somente uma organizada e estruturada equipe tem condições de atender esse grau de demanda, com a qualidade exigida, em uma distribuíção espacial bastante grande. O resultado disto é o fornecimento de documento de fé pública, com uma potencialidade lesiva elevadíssima, se não observados cuidados mínimos. O Balanço Financeiro, por envolver de forma universal o fluxo de caixa - a totalidade dos ingressos financeiros, recebimentos; e a totalidade das

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saídas financeiras, pagamentos - revela a movimentação do período em perfeita harmonia entre o fluxo financeiro e as metas do Projeto. Vale lembrar que todos os recebimentos e todos os pagamentos são efetivados por meio de sistema bancário e mediante vinculação de origem e destino (credor), sendo absolutamente possível identificar o fluxo financeiro do projeto. Não existe operação ao portador, nem conta caixa, de modo que todo o fluxo bancário vincula o procedimento a uma pessoa, física ou jurídica, o que pode ser facilmente comprovado a partir da análise dos extratos bancários já constantes dos autos. Tudo isso já dito explica, ainda e mais uma vez, a necessidade de uma perícia contábil, auditoria, tomada de contas especial, etc., o que foi sonegado dos réus ao longo da instrução. Os resultados da execução do Projeto DETRAN-FUNDAE, de maio a outubro de 2007, indicam que foram realizados 337.543 exames, algo que era extremamente vantajoso ao Detran, diametralmente oposto às ilações de que houve prejuízo ao Erário. Primeiro, porque a média de exames realizados pela FUNDAE, no período, foi de 2.750 exames por dia. Se comparados com os 2.387 exames por dia da FATEC, houve um aumento de 16% na relação de exames por dia. Segundo, porque da taxa cobrada, somente parte era destinada à Fundae. Aquilo que a Fundação realizava, gerava para o Estado, livre de qualquer custo acessório, significativo ganho. Especialmente no período DETRAN-FUNDAE, o Estado do Rio Grande do Sul auferiu R$ 8.172.928,66 (oito milhões, cento e setenta e dois mil, novecentos e vinte e oito reais e sessenta e seis centavos). Terceiro, porque os encargos da folha do DETRAN, a partir de 2007, período em que o Estado retomou a execução das atividades anteriormente contratadas, aumentaram 482% (quatrocentos e oitenta e dois por cento). As despesas com pessoal e encargos sociais cresceram de pouco mais de 9 milhões, em 2007, para mais de 43 milhões, em 2012.

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Isso é muito semelhante ao que aconteceu com a estatização do transporte coletivo, em Porto Alegre. Em um curto prazo, voltou ao sistema privado com uma gigantesca indenização, toda suportada pela municipalidade. Diferentemente do que fez o Ministério Público Federal, ao tecer ilações, ao servir a interesses político-partidários maquinados pela Polícia Federal, a defesa aponta dados concretos, valores, percentuais. E agora, Excelência, quem causa prejuízo ao Erário? Outra informação importante que corrobora tais conclusões é o fato de que no período em que os exames teóricos e práticos eram executados pela Fundação Carlos Chagas, o DETRAN-RS retia 10% (dez por cento) do valor da taxa cobrada para a realização dos exames; e repassava 90% (dez por cento) à Fundação Carlos Chagas. No período em que o contrato foi executado pela FATEC, a Fundação recebia 72% (setenta e dois por cento) do valor da taxa; e 28% (vinte e oito por cento) eram retidoso DETRAN-RS. O Estado somente teve a ganhar no período em que contratou fundações para a execução de seu projeto, ao passo em que agora, em que avocou a execução, seus custos dispararam, em uma razão muito maior do que as receitas auferidas. Há considerações que merecem ser feitas com relação à forma de arrecadação das taxas pelo DETRAN. O DETRAN arrecada taxas para Exame Médico, Exame Psicotécnico, Prova Técnica e Prova Prática, por meio de guias a serem recolhidas via Banrisul. Essa verba não pertence propriamente ao Estado, mas àqueles que são os responsáveis pelas aplicações de cada um destes exames - médicos, psicólogos e, à época, as Fundações.

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O Estado é um intermediário, tão somente; mas um itermediário que cobra comissão por intermediar um serviço que lhe seria próprio, mas que não tem condições de fazê-lo. A necessidade de que terceiros apliquem esses exames finais corresponde à máxima de que quem planeja não executa, quem executa não administra, pilar de sustentação da gestão, como um todo, mais ainda da pública. Tecnicamente, estes recursos não compõem receita do Estado, sendo ele um mero depositário de valores destinados a terceiros, conforme os contratos vigentes à época. Por conta, disto, é razoável concluir que tais recursos não integram as receitas do órgão, mas sim a rubrica de Passivo Financeiro, devendo ser mantido depositado em conta vinculada classificada em Depósitos de Diversas Origens. Essa não é uma discussão menor, na medida em que, definindo-se a questão da titularidade dos recursos, resta afastada a competência federal, como já dito acima, e, por tabela, qualquer crime contra a administração pública. Trata-se de discussão de elevado teor técnico, disciplinada pela Lei nº. 4.320/64. Não há prejuízo ao erário. Muito pelo contrário, se não é o Estado que executa essas atividades de avaliação, a ilegalidade que há é na retenção de percentual da parcela recolhida pelo contribuinte, com objetivo específico. A prova dessa conduta ilícita do Estado (e não contra o Estado) está no fato de que os valores recolhidos a título de Exames Médico e Psicotécnico não sofrem qualquer retenção. Retomando. Houve um contrato, firmado após um processo de dispensa de licitação, devidamente amparado em parecer da Procuradoria-Geral do Estado, e sobre seus dados contábeis houve análise de órgãos de fiscalização, como Contadoria Geral do Estado – CAGE, Tribunal de Contas do Estado, Curadoria das Fundações do Ministério Público, e mais auditorias permanentes do Estado pelo SIAPC – Sistema de Auditoria e Prestação de Contas, nunca tendo sido feito qualquer apontamento a respeito da licitude do contrato e de sua execução.

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A partir dos valores definidos em contrato, uma vez efetivado o trabalho, tabulando os dados na FUNDAE, no DETRAN e na PROCERGS, e cumpridos os estágios de execução da despesa pública - empenho, liquidação e pagamento, estava cumprido bilateralmente o ajustado. Ora, uma vez ingressado o valor devido na FUNDAE, como receita de seus serviços, a forma como esse valor é destinado compete unicamente à Fundação, pessoa jurídica de direito privado, que pode lhe destinar como bem lhe aprouver, de acordo com seus compromissos e regimentos. Pareceu esquecer o órgão acusador que enquanto a pessoa jurídica de direito público pratica atos que a lei lhe autoriza, a de direito privado pratica atos que a lei não lhe proíbe. As Fundações jamais movimentaram recursos públicos. Todos os valores utilizados, tanto para custeio da execução como para pagamento a prestadores de serviço especializado de controle foram recursos privados, devidamente escriturados em contabilidade, tanto das Fundações como das empresas contratadas. Foram produtos de suas receitas, legais, contabilizadas e todos os encargos fiscais, tributários e previdenciários recolhidos. Todas as pessoas jurídicas vinculadas ao projeto tinham, todos os meses, comprovadas as suas obrigações fiscais. Vale lembrar, o que reforça a ideia da ilicitude do compartilhamento de informações por parte do Ministério Público de Contas com o Ministério Público Federal e ao mesmo tempo evidencia a ausência de dano ao erário, o que foi decidido na inspeção extraordinária nº. 4789-0200/08-0, realizada no DETRAN pelos auditores do TCE-RS:

O órgão de contas, e não se fala aqui de seu departamento

Ministério Público de Contas, mas do Tribunal, efetivamente, reconheceu suas limitações, ao afirmar que “face as já mencionadas limitações impostas à atuação desta Corte de Contas, como consequencia de sua jurisdição e competências estabelecidas constitucionalmente não se teve acesso a documentação probatória” (fl. 1991 da inspeção extraordinária)

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Sobreleva consignar, conforme consta no relatório de inspeção extraordinária, que a jurisdição e competência dos Tribunais de Contas definidas constitucionalmente, não asseguram o acesso desta corte aos instrumentos contratuais, as informações contábeis e financeiras das entidades contratada pelo DETRAN, tampouco daquelas eventualmente subcontratadas, limitando-se o trabalho as conclusões da auditoria aos documentos que teve acesso.

E nesse sentido, concluiu que “inexistem elementos que permitam

apurar e indicar com razoável grau de certeza, quais os valores que seriam devidos pelos serviços efetivamente prestados” (fl. 2808 da inspeção extraordinária).

É importante consignar que a inspeção extraordinária foi

requerida pelo Adjunto de Procurador do Ministério Público de Contas Geraldo Da Camino, tendo como fundamento uma eventual necessidade de reinstrução da tomada de contas ordinária, definida pelo Conselheiro João Osório, em que se concluiu não existir prejuízo ao erário.

Os parâmetros de preços e serviços foram os valores cobrados

pela Fundação Carlos Chagas, durante os 72 meses de contrato, os quais eram superiores aos preços praticados pelas Fundações de Apoio da Universidade Federal de Santa Maria.

Entretanto, ao passo em que as Fundações de Apoio foram

contratadas com fundamento na dispensa de licitação, a Fundação Carlos Chagas foi contratada com base na inexigibilidade de licitação.

A diferença, como é sabido, reside no fato de que, ao passo em

que a inexigibilidade, ao admitir não haver outra instituição capaz de realizar o serviço, confere ao contratado um tratamento mais flexível do que o conferido à dispensa de licitação vincula o contratado à observância de uma série de requisitos legais, dentre os quais a previsão de que os preços praticados sejam de mercado, o que é absolutamente comprovável pelas tabelas abaixo.

PREÇOS UNITÁRIOS COBRADOS, POR INSTITUIÇÕES ESPECIALIZADAS,

PARA REALIZAÇÃO DE EXAMES TEÓRICOS JANEIRO DE 2009

Objeto do Exame Preços Unitários em R$

Organização Responsável

OUTROS CONCURSOS Concurso TRE 60,00 a 80,00 Consulplan Consultoria * Concurso MPE 70,02 a 116,70 Fundação Carlos Chagas PMPA - 1º, 2º e 3º graus 36,50 a 81,50 Fundação Conesul

Detran-RS (nível médio e superior) 48,43 a 110,43 Fundatec

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Inspetor de Polícia 110,43 IBDH Unipampa 100,00 a 130,00 www.unipampa.edu.br

Ministério da Defesa-Marinha/BR 60,00 www.ensino.mar.mil.br

UFRGS 28,00 a 43,00 www.faurgs.ufrgs.br

Prefeitura de Cachoeirinha-RS 20,00 a 40,00 www.objetivas.com.br

VESTIBULARES FEDERAIS UFSM 75,00 Comissão Permanente do Vestibular UFRGS 100,00 Comissão Permanente do Vestibular FURG 82,40 Comissão Permanente do Vestibular

DETRAN-RS -HABILITAÇÃO CNH Exame Teórico 24,99 Fundae Exame Prático 53,56 Fundae Exame teórico com redução de 30% ** 17,49 Fundae a partir de nov/2007 Exame teórico com redução de 30% ** 37,49 Fundae a partir de nov/2008

TAXA RECOLHIDA PARA O DETRAN-RS POR CANDIDATO Exame Teórico 40,24 Exame Prático 69,80

* Concurso anulado pelo TRE; ** Deferido pela M.M. Juíza Federal Simone Barbizan Fortes, baseado em denuncia do MPF e inquérito policial da PF, com a consequente suspensão do controle externo e supervisão realizados por empresas especializadas;

Vale lembrar que após a superação arbitrária de serviços fragilicou-se o mérito do trabalho na prevenção de fraucdes, como se pode ver do quadro abaixo.

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Fosse feita uma perícia, nos moldes do que foi pedido, e suficientemente justificado no tópico preliminar acima, essas inquietações poderiam ser melhor esclarecidas. Entretanto, o Juízo optou pelas trevas, pelo desconhecimento, pelo não esclarecimento de uma questão intransponível. Vale dizer que tanto FATEC como Fundae são veladas pelo Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul, a teor do que dispõe o artigo 66 do Código Civil, e em razão de sua regularidade, eram certificadas anualmente pelo Curador de Fundações do Ministério Público do Estado do Rio Grande do Sul. A Contadoria e Auditoria Geral do Estado do Rio Grande do Sul (CAGE) e o Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul, em suas inspeções ordinárias e especiais, anuais, atestaram a ausência de prejuízo ao erário. As contas dos exercícios objeto da denúncia foram aprovadas, inclusive pelo Ministério Público de Contas, presente na Reunião do Pleno do Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul. Enquanto o Ministério Público Federal tratou dos valores absolutos, a comparação dos valores a partir dos índices de correção que foram contratados em cada um dos períodos evidencia que o DETRAN-RS cada vez pagou menos pelos excelentes serviços que lhe eram prestados. É absolutamente inadequada a conclusão feita pelo Ministério Público Federal de que, para que fosse possível a contratação de outras empresas para prestarem auxílio na execução do contrato, os valores do contrato original eram evidentemente superfaturados. Primeiro, porque, como se viu, os valores, quando confrotados com as perdas inflacionárias, somente decresceram. Segundo, porque, soa até mesmo absurdo, quando tanto FATEC quanto Fundae, operando com remuneração comprovadamente inferior à praticada pela Fundação Carlos Chagas, conseguiram imprimir uma rotina de segurança nas atividades nunca antes vista.

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Por exemplo, nunca houve um escândalo de falsificação de Carteiras de Habilitação, como o que foi noticiado em junho deste ano40. Isso porque era absolutamente rígido o controle sobre exames teóricos e práticos, responsabilidade direta das Fundações, sob constante e obsessiva supervisão da Pensant. Terceiro, porque, excluindo a absurda imputação de dispensa indevida de licitação e consequente locupletamente, o que já está superado por inúmeros pareceres de procuradores do Estado, além de ser uma prática na contratação de serviços dessa natureza, absolutamente tudo que se discute nesse feito diz respeito a relações de direito privado. A realidade da iniciativa privada é completamente oposta à realidade do serviço público. Enquanto na esfera pública o servidor é um técnico, na iniciativa privada, além de técnico, o profissional é um administrador, um gestor, que gere todo o capital disponível para atingir a finalidade a que se destinou o serviço. O servidor público recebe seu salário, seus benefícios sempre na data certa, e não precisa se preocupar se faltará verba para o pagamento de todos, ou se haverá recurso para a compra de material de escritório, despesas de viagens, etc. Na iniciativa privada, todas essas preocupações assolam diariamente o profissional técnico, que há que não apenas desempenhar suas atividades executivas, como também administrar os recursos e as despesas existentas. É da atividade do bom profissional a redução de custos e a manutenção da ótima qualidade do serviço prestado. Exatamente o que houve no caso presente. Se houve lucro, ele é inerente à prática empresarial, e não pode ser criminalizado.                                                                                                                40 Disponível em http://noticias.r7.com/cidades/policia-desarticula-esquema-de-fraude-de-cnh-no-rs-12062013

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Aqui são necessárias algumas considerações sobre a acusação minis t er ia l de terem os acusados um intui to lucrat ivo . Por se tratar de uma empresa de consultoria, obrigatoriamente, deve-se considerar duas questões, a “alavancagem” e, dependendo do regime tributário adotado, a sua “lucratividade”. A alavancagem é um indicador usado no mercado financeiro equivalente a rotação do Patrimônio Líquido usado nas empresas. Mais precisamente, significa a relação entre as Receitas Totais e o Patrimônio Líquido empregado por uma empresa. Assim, esses dois quocientes, refletem o grau de alavancagem. Quanto maior for o quociente, maior será a alavancagem e consequentemente maior será o risco de a empresa não atender seus compromissos quanto a prazos, mas especialmente em relação à qualidade do objeto do trabalho, pois se trata de uma atividade que pertence a economia do conhecimento. Diante disso, sabe-se que o conhecimento encontra-se “dentro da cabeça” dos profissionais, onde todas as soluções são processadas considerando uma lógica, bem como uma velocidade, que, por óbvio, não pode ser acelerada. Já a lucratividade é um indicador que relaciona o resultado operacional com as receitas totais. A tributação da empresa Pensant se dava pelo lucro presumido, opção essa escolhida por José Fernandes, devido a sua formação em economia, mestrado em administração, bem como sua vasta experiência na área. Essa era uma de suas tantas responsabilidades frente à Pensant. Empresas de consultoria, no caso da Pensant, pagam seus tributos pelo regime do lucro presumido, e adotam para remunerar seus sócios um pró-labore mínimo, mas a remuneração de fato é feita através da distribuição de lucros. Na Pensant, uma empresa de fornecimento de conhecimento, onde seus profissionais técnicos eram em sua maioria sócios, essa questão é

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extremamente significativa, pois na conta “Resultado do Período Base” estão presentes as remunerações dos sócios realizadas através da distribuição de lucros e o lucro não distribuído. Especificamente em relação à empresa Pensant, o lucro não distribuído constava como uma das fontes de recursos para aumento do capital, até o valor necessário para suprir em infraestrutura física e tecnológica, nas dimensões consideradas ideais para o espaço da empresa no mercado, e a capacidade de trabalho dos seus profissionais sócios. Tendo em vista que a infraestrutura de redes físicas e lógicas tem valor significativo, a Pensant optou por adquirir os espaços físicos onde seria instalada a empresa e para isso, utilizou as “reservas de lucros”. O capital registrado da empresa, em 2005, era de R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais). Ademais, a Receita Federal do Brasil estabelece que o limite lucrativo para esse setor (setor econômico) é de 32% na área de consultoria, sendo que era esse o percentual da margem de lucro no setor referido, sobre os quais incidia a alíquota, e o imposto recolhido a cada trimestre. Esse valor está plenamente dentro dos padrões da empresa Pensant, conforme consta dos livros contábeis, todos eles disponibilizados e submetidos às mais variaveis auditorias e fiscalizações. Todo o histórico de faturamento das notas em comparação com a movimentação bancária da empresa Pensant é o meio de demonstrar que nunca houve o chamado “intuito lucrativo”. Ademais, se houvesse, ele é absolutamente lícito e próprio das relações de mercado, não se apresentando adequado serem acusados de tal fato. Feitas essas considerações preliminares, necessárias para um esclarecimento linear e lógico dos fatos, cabem algumas considerações sobre o crime de formação de quadrilha ou bando, ou, como denominado pelo Ministério Público Federal, de associação criminosa.

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Do exame atento da prova dos autos, bem como dos argumentos que integram os presentes memoriais, não há como ser acolhida qualquer pretensão punitiva no tocante ao crime de quadrilha ou bando. Primeiro, porque, como já dito, não há qualquer crime que justifique a imputação de uma associação criminosa. Segundo, porque, ainda que houvesse, somente há um fato de fundo, o que não preenche, nem de longe, os requisitos exigidos pela doutrina, com apoio na massiva jurisprudência, para a verificação da formação de quadrilha. Como dito, e que será minudentemente explicado, todas as consequênc ias imputadas aos réus (locupletamento em indevida dispensa de licitação e peculato-desvio) decorrem de uma única ação, imputada como corrupção ativa, de modo que não preenche o tipo legal do artigo 288 do Código Penal. Ademais, não há, no caso dos autos, qualquer indicativo mínimo de que existisse entre todos os acusados estabilidade, habitualidade e permanência da associação criminosa, requisitos sem os quais resta esvaziado o tipo penal do artigo 288 do Código Penal. Há uma diferença substancial entre o mero concurso de agentes e o delito de formação de quadrilha. A vingar a versão acusatória, há, aqui, um concurso imprescindível para a prática do crime. Uma única pessoa não poderia, sozinha, dispensar licitação, contratar as Fundações de Apoio, executar e supervisionar o contrato, etc. Dito de outro modo, trata-se de uma eventualidade necessária para, admitindo-se por procedente a denúncia, a execução dos fatos lá narrados. Para que o injusto típico do artigo 288 do Código Penal reste demonstrado, é fundamental que se afira e demonstre o dolo específico dos agentes envolvidos no cometimento de crimes. Admitindo-se a procedência de todos os outros fatos imputados, ainda assim estaria havendo apenas um fato central, a justificar a

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atuação de todos os envolvidos, o que não caracterizaria o tipo penal da formação de quadrilha. Nesse sentido:

PELAÇÕES CRIME. CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO. PRELIMINARES. ROUBO MAJORADO. SUFICIÊNCIA DA PROVA. COAÇÃO MORAL IRRESISTÍVEL. PARTICIPAÇÃO DE MENOR IMPORTÂNCIA. CONCURSO DE AGENTES. EMPREGO DE ARMA DE FOGO. RESTRIÇÃO À LIBERDADE DA VÍTIMA. FORMAÇÃO DE QUADRILHA. ABSOLVIÇÃO. RECEPTAÇÃO. PRESCRIÇÃO. ADULTERAÇÃO DE SINAL IDENTIFICADOR DE VEÍCULO. PORTE ILEGAL DE ARMA DE FOGO. PRINCÍPIO DA CONSUNÇÃO. DOSIMETRIA DA PENA. Inépcia da inicial acusatória. Não vislumbrada a ocorrência da aludida inépcia, pois a peça acusatória apresentada pelo ilustre representante do Ministério Público conteve os requisitos estabelecidos no artigo 41 do Código de Processo Penal. Ademais, o réu defende-se do fato e não do artigo do Código Penal que classifica o delito. Incompetência absoluta do juízo. As práticas delitivas imputadas a um dos réus, que é policial militar, foram realizadas fora de suas atribuições. Incidência do art. 9º, Parágrafo Único, do Código Penal Militar. Violação ao princípio da individualização da pena. Apesar de objetiva, a análise da pena-base encontra-se clara e coesa, tanto que viabilizou, inclusive, o manejo da presente inconformidade. Suficiência da prova da prática delitiva relativa ao roubo. Embora apenas a corré Edilvane seja confessa, a negativa de autoria dos demais codenunciados, os quais nem sequer comprovaram os álibis noticiados, não encontra eco no confronto com os demais subsídios de prova angariados na instrução probatória, que obedeceu aos princípios do contraditório e da ampla defesa. Inocorrência da excludente da coação moral irresistível. Tal alegação está isolada no contexto do feito, e essa perspectiva ganha especial relevo no contraste com o fato de que a acusada, inclusive, recebeu pagamento por sua contribuição. Ademais, o numerário em questão nem sequer foi entregue de forma espontânea, mas, sim, após o chamamento a comparecer na Polícia. Participação de menor importância não configurada, pois do acervo probatório resulta estreme de dúvidas que cada um dos denunciados desempenhou papel decisivo para o sucesso da empreitada criminosa. Majorante do concurso de agentes. Indelével que a prática delitiva contou com a atuação dos nove agentes para seu desenvolvimento, entre os quais patente o liame subjetivo, já que atuaram em conjunto na realização do delito, em comunhão de esforços e divisão de tarefas, o que se estendeu até a fuga e separação do produto da subtração. Configuração da majorante do emprego de arma de fogo. Embora não haja, nos autos, laudo pericial que tenha atestado a funcionalidade de todos as nove armas de fogo apreendidas, tal ausência, contudo, diante do laudo pericial confeccionado, não é suficiente a afastar a majorante. Até porque, os demais elementos de prova existentes, como visto, demonstram, induvidosamente, que o ilícito foi praticado com o emprego de arma, uma vez que se tratava de roubo à agência bancária. Não reconhecimento da majorante de restrição da liberdade da vítima. A configuração de tal majorante perquire que a vítima permaneça em poder do autor do delito por período de tempo considerável. Acaso não se atente a esse temperamento, todos os delitos de roubo implicarão a incidência da aludida moduladora. Absolvição pelo crime de formação de quadrilha, pois, apesar de resultar patente que os denunciados concatenaram o crime de roubo ao banco, ausente do processo dados a evidenciar a estabilidade, habitualidade e permanência da associação criminosa. Decretação da extinção da punibilidade pela incidência da prescrição intercorrente em relação à receptação, com fulcro no art. 109, inciso V, combinado com o art. 119, ambos do Código Penal. Absolvição pelo crime de adulteração de sinal identificador de veículo, porquanto não constam dos autos provas de que o réu concorreu para tal prática delitiva. Necessidade de prestígio ao princípio da verdade real que não se coaduna a meras

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conjecturas. Ratificação da absolvição pelos delitos de porte ilegal de arma, já que aplicado o princípio da consunção, pois trata-se de crime-meio absorvido pelo crime-fim, no caso, o roubo. Redimensionamento da pena aplicada quanto à prática delitiva pela qual a denunciada Edilvane restou responsabilizada. Tendo presente que foi em razão do seu depoimento que houve o desencadeamento de toda a investigação e o processo penal, a aferição da atenuante da confissão espontânea sofreu reajuste mais favorável que o constante da sentença apelada. No tocante à pena de multa, inviável a exclusão respectiva, sob pena de macular o princípio da reserva legal. No entanto, possível readequar a reprimenda ao mínimo legal. Substituição por pena restritiva de direito. Descabida a substituição da pena corporal por restritiva de direitos, pois incidente o disposto no art. 44, inciso I, do Código Penal. Tendo presente o reajuste no apenamento corporal, de ofício, resulta modificado o regime inicial de cumprimento da pena para a modalidade semiaberta. PRELIMINARES DEFENSIVAS REJEITADAS. RECURSOS DEFENSIVOS PARCIALMENTE PROVIDOS. RECURSO MINISTERIAL DESPROVIDO. (Apelação Crime Nº 70034100990, Quinta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Diogenes Vicente Hassan Ribeiro, Julgado em 29/02/2012) APELAÇÕES CRIME. CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO. ESTELIONATO. FORMAÇÃO DE QUADRILHA. DOSIMETRIA DA PENA. INCIDÊNCIA DE CAUSA EXTINTIVA DA PUNIBILIDADE. PRESCRIÇÃO RETROATIVA. PRECEDENTE. Absolvição pelo crime de estelionato. Ausente comprovação do dolo no agir dos corréus, irretocável o juízo absolutório levado a efeito na sentença apelada, razão pela qual vai ratificado o desfecho ora combatido. Absolvição pelo crime de formação de quadrilha, pois, não consta do feito prova da configuração de tal delito, para o qual, inclusive, é exigido dolo específico. Ademais, ausente do processo dados a evidenciar a estabilidade, habitualidade e permanência da associação criminosa. Dosimetria da pena. Não se verificam razões a respaldar o afastamento das basilares do mínimo legal, porquanto dos vetores do art. 59 do Código Penal ausente excepcionalidade a justificar o redimensionamento pretendido pela acusação. Atendidos os requisitos do art. 44 do Código Penal, descabida a pretensão de cassar a substituição da pena definida no dispositivo sentencial. Reprimendas aplicadas confirmadas. Decretação da extinção da punibilidade pela incidência da prescrição retroativa, com fulcro no art. 109, inciso V, combinado com o art. 110, § 1º, segunda parte, ambos do Código Penal em relação a todos os réus, ora apelantes. APELAÇÕES DA ACUSAÇÃO DESPROVIDAS. PRELIMINAR DEFENSIVA QUANTO A PRESCRIÇÃO RETROATIVA ACOLHIDA. MÉRITO DAS APELAÇÕES DEFENSIVAS PREJUDICADO. (Apelação Crime Nº 70039769443, Quinta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Diogenes Vicente Hassan Ribeiro, Julgado em 23/05/2012) APELAÇÃO. ROUBO. ABSOLVIÇÃO. Incabível a absolvição quando a prova colhida não deixa dúvida acerca da materialidade e autoria do delito. REINCIDÊNCIA. Mantida, porém em quantum diverso do fixado na sentença. FORMAÇÃO DE QUADRILHA. A formação de quadrilha ou bando é crime plurisubjetivo, no qual se exige a associação de pessoas com o propósito deliberado de cometer crimes, o que não se configura no caso em exame. MAJORANTES DO EMPREGO DE ARMA DE FOGO E CONCURSO DE AGENTES. Devidamente demonstradas. Comprovada a utilização de arma de fogo para a prática do delito (apreensão de fls. 70, 101 e 106 e perícia de fls. 610/612), o reconhecimento da majorante se impõe. MULTA. EXCLUSÃO. Inviável a exclusão da pena de multa face ao contido no art. 157, § 2º, do Código Penal. PENAS DE RECLUSÃO E MULTA. Redimensionadas. APELO MINISTERIAL IMPROVIDO. APELO DEFENSIVO PARCIALMENTE PROVIDO. (Apelação Crime Nº 70039299904, Quinta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Genacéia da Silva Alberton, Julgado em 23/02/2011) APELAÇÃO CRIME. CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO. ROUBO

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MAJORADO. INSUFICIÊNCIA DE PROVAS QUANTO À AUTORIA. FORMAÇÃO DE QUADRILHA. ABSOLVIÇÃO MANTIDA. Apesar de demonstrada a existência material da subtração, os elementos de convicção aportados aos autos não afastam a dúvida em relação à participação dos acusados no delito de roubo descrito na inicial acusatória, afigurando-se impositiva a manutenção da sentença absolutória, fundada no princípio do in dubio pro reo. Para a configuração do crime de formação de quadrilha é necessária a demonstração da estabilidade ou permanência da associação de mais de três pessoas para a prática de crimes, o que não foi levado a efeito no caso dos autos. APELAÇÃO DESPROVIDA. (Apelação Crime Nº 70042544544, Sétima Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Naele Ochoa Piazzeta, Julgado em 16/06/2011) APELAÇÃO CRIME. ROUBO MAJORADO TRIPLAMENTE MAJORADO. 1. SENTENÇA CONDENATÓRIA. MANUTENÇÃO. O reconhecimento feito pela vítima, nesta espécie de delito, indicando sem qualquer dúvida o réu como um dos autores do assalto, constitui prova segura o suficiente para condenação. 2. EMPREGO DE ARMA. Configurada a causa especial de aumento de pena referente ao emprego de arma, ainda que não apreendida, quando a utilização do instrumento vem demonstrada satisfatoriamente pela palavra firme da vítima. 3. FORMAÇÃO DE QUADRILHA. ABSOLVIÇÃO MANTIDA. Ausência de indicação dos demais envolvidos que dificulta o exame da estabilidade e permanência da associação criminosa, requisitos imprescindíveis a tipificação do delito. 4. PENA DEFINITIVA. MAJORANTES. ALTERAÇÃO DO FRACIONAMENTO. Seguindo entendimento do STJ, o aumento por três majorantes deve ser de 5/12, fracionamento que melhor se ajusta ao caso. RECURSO DO MINISTÉRIO PÚBLICO DESPROVIDO. RECURSO DO RÉU PARCIALMENTE PROVIDO. (Apelação Crime Nº 70036161834, Oitava Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Danúbio Edon Franco, Julgado em 03/11/2010) APELAÇÃO-CRIME. ROUBO MAJORADO. DEPOIMENTO DA VÍTIMA. RELEVO PROBATÓRIO. A palavra da vítima ganha relevo probatório em delitos dessa espécie, quando coerente, harmônica e uníssona com os demais elementos existentes no feito. FORMAÇÃO DE QUADRILHA. DELITO NÃO CONFIGURADO. Inexistência de comprovação do prévio planejamento das ações delitivas e do ânimo de estabilidade necessário à caracterização do delito. Evidente, no caso, o concurso de agentes, porquanto os réus agiram em conjunto, mediante divisão de tarefas e comunhão de desígnios. Penas alteradas. Apelo ministerial intempestivo. Apelos da defesa provido e parcialmente provido. Unânime. (Apelação Crime Nº 70036131365, Quarta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Aristides Pedroso de Albuquerque Neto, Julgado em 30/09/2010) APELAÇÃO CRIME. LAVAGEM DE DINHEIRO, ESTELIONATO E FORMAÇÃO DE QUADRILHA. PROVA. PENA. 1. A prova oral produzida nos autos embasa, com certeza, a manutenção da condenação quanto aos 2º e 3º fatos. As vítimas foram coerentes e uníssonas ao descrever o modus operandi empregado pelos réus E.R.C. e M.J.M. 2. É de ser mantida, igualmente, a absolvição dos imputados pelos delitos descritos no 1º, 4º e 5º fatos ante a ausência de provas da estabilidade dos integrantes da quadrilha. Não havendo esse delito, não há como ser reconhecida a lavagem de dinheiro. 3. Não houve comprovação da participação da ré C.S.V. nos delitos de estelionato. A única vítima que soube mencionar o nome da acusada disse ter esta apenas acompanhado os outros imputados quando foram propor o negócio. Absolvição mantida. 4. Decretada a prescrição, diante do redimensionamento das penas. 5. Afastada a condenação ao pagamento de indenização. 6. Tendo sido a ré absolvida, não há nexo causal entre o seqüestro dos bens e a acusação, cabendo a liberação dos bens que estiverem em seu nome e foram objeto da constrição. APELO ASSISTENTE DE ACUSAÇÃO DESPROVIDO. APELOS DEFENSIVOS PARCIALMENTE

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PROVIDOS. PUNIBILIDADE DOS IMPUTADOS M.J.M. E E.R.C. EXTINTA PELA PRESCRIÇÃO. (Apelação Crime Nº 70035709419, Sexta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Nereu José Giacomolli, Julgado em 09/09/2010)

Não destoam os julgados do Superior Tribunal de Justiça: PENAL E PROCESSUAL PENAL. HABEAS CORPUS SUBSTITUTIVO DE RECURSO ORDINÁRIO. NÃO CONHECIMENTO DO WRIT. PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL E DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. TRANCAMENTO DA AÇÃO PENAL. CRIMES DE ESBULHO POSSESSÓRIO (ART. 161, II, DO CÓDIGO PENAL) E FORMAÇÃO DE QUADRILHA (ART. 288 DO CÓDIGO PENAL). AUSÊNCIA DE JUSTA CAUSA. SUPERVENIÊNCIA DA PRESCRIÇÃO DA PRETENSÃO PUNITIVA, PELA PENA EM ABSTRATO, QUANTO AO CRIME DE ESBULHO POSSESSÓRIO. CAUSA EXTINTIVA DA PUNIBILIDADE. CRIME DE QUADRILHA. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO, NA DENÚNCIA, DE VÍNCULO ASSOCIATIVO ESTÁVEL E PERMANENTE ENTRE OS DENUNCIADOS. DEFICIÊNCIA DA NARRAÇÃO DOS FATOS, NA INICIAL ACUSATÓRIA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL DEMONSTRADO. PRECEDENTES. HABEAS CORPUS NÃO CONHECIDO. CONCESSÃO DA ORDEM, DE OFÍCIO. I. Dispõe o art. 5º, LXVIII, da Constituição Federal que será concedido habeas corpus "sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder", não cabendo a sua utilização como substituto de recurso ordinário, tampouco de recurso especial, nem como sucedâneo da revisão criminal. II. A Primeira Turma do Supremo Tribunal Federal, ao julgar, recentemente, os HCs 109.956/PR (DJe de 11/09/2012) e 104.045/RJ (DJe de 06/09/2012), considerou inadequado o writ, para substituir recurso ordinário constitucional, em habeas corpus julgado pelo Superior Tribunal de Justiça, reafirmando que o remédio constitucional não pode ser utilizado, indistintamente, sob pena de banalizar o seu precípuo objetivo e desordenar a lógica recursal. III. O Superior Tribunal de Justiça também tem reforçado a necessidade de cumprir as regras do sistema recursal vigente, sob pena de torná-lo inócuo e desnecessário (art. 105, II, a, e III, da CF/88), considerando o âmbito restrito do habeas corpus, previsto constitucionalmente, no que diz respeito ao STJ, sempre que alguém sofrer ou achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder, nas hipóteses do art. 105, I, c, e II, d, da Carta Magna. IV. Nada impede, contudo, que, na hipótese de habeas corpus substitutivo de recursos especial e ordinário ou de revisão criminal - que não merece conhecimento -, seja concedido habeas corpus, de ofício, em caso de flagrante ilegalidade, abuso de poder ou decisão teratológica. V. Está consagrada, na jurisprudência nacional, a diretriz no sentido de que, na via estreita do habeas corpus, o trancamento da ação penal, por falta de justa causa, somente pode ocorrer desde que se comprove, de plano, a atipicidade da conduta, a incidência de causa de extinção da punibilidade, a ausência de indícios de autoria ou de prova sobre a materialidade do delito. VI. O prazo prescricional do delito de esbulho possessório (art. 161, II, do Código Penal) é de 2 (dois) anos, considerando-se a pena máxima cominada ao tipo penal - 6 (seis) meses de detenção -, consoante disposto no art. 109, VI, do Código Penal, na redação original, anterior às alterações promovidas pela Lei 12.234/2010, em observância ao postulado constitucional da irretroatividade da lei penal mais gravosa. VII. Assim, decorrido prazo superior a 2 (dois) anos, desde a data do recebimento da denúncia (22/02/2010), sem a prolação de sentença condenatória - marco interruptivo da prescrição previsto no art.

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117, IV, do Código Penal -, operou-se a prescrição da pretensão punitiva do Estado, pela pena em abstrato. VIII. A configuração típica do crime de quadrilha deriva da conjunção dos seguintes elementos caracterizadores: a) concurso necessário de, pelo menos, quatro pessoas; b) finalidade específica dos agentes, voltada ao cometimento de delitos, e c) exigência de estabilidade e de permanência da associação criminosa. Diferentemente do concurso de agentes, que exige, apenas, um ocasional e transitório encontro de vontades para a prática de determinado crime, a configuração do delito de quadrilha pressupõe a estabilidade ou permanência do vínculo associativo, com o fim de prática de delitos. IX. O crime de formação de quadrilha ou bando é delito formal, que se consuma com a reunião ou a associação do grupo, de forma permanente e estável, para a prática de crimes, e independentemente do cometimento de algum dos crimes acordados pelos membros do bando, tendo em vista que a convergência de vontades já apresenta perigo suficiente para conturbar a paz pública. X. Na hipótese, entretanto, não restou minimamente evidenciada, na inicial acusatória, a existência do crime de quadrilha, à míngua de elementos que demonstrassem a existência de vínculo associativo estável e permanente entre os denunciados, com o fito de delinquir. XI. Ordem não conhecida. XII. Concessão da ordem, de ofício, para declarar extinta a punibilidade dos pacientes, quanto ao delito de esbulho possessório, e reconhecer a inépcia da denúncia, relativamente ao crime de quadrilha, anulando a inicial acusatória da Ação Penal 250-53.2010.8..10.0026, em tramitação na 1ª Vara da Comarca de Balsas/MA, por ausência de justa causa, sem prejuízo de que outra denúncia seja oferecida, se for o caso, quanto ao delito de quadrilha, atendidos os requisitos do art. 41 do CPP. (HC 186.197/MA, Rel. Ministra ASSUSETE MAGALHÃES, SEXTA TURMA, julgado em 28/05/2013, DJe 17/06/2013) HABEAS CORPUS. FORMAÇÃO DE QUADRILHA. INÉPCIA. OCORRÊNCIA. AUSÊNCIA DE INDICAÇÃO DO VÍNCULO ASSOCIATIVO E DO ELEMENTO SUBJETIVO ESPECIAL DO TIPO (FINALIDADE DE COMETER CRIMES). ORDEM CONCEDIDA. 1. Para a imputação do crime previsto no art. 288 do Código Penal, o concurso necessário de mais de 3 agentes, de forma permanente, ligados subjetivamente pela vontade consciente de cometerem delitos, como elementares que são do tipo, devem ser demonstradas pelo parquet quando do oferecimento da peça acusatória, sob pena não só de inviabilizar o exercício da defesa como, até mesmo, impossibilitar a adequação típica entre a conduta e a norma. 2. Na hipótese, não há na exordial acusatória menção à convergência de vontades direcionada à prática criminosa, o que faz com que ela não atenda as exigências do art. 41 do Código de Processo Penal, notadamente por não conter a exposição clara dos elementos indispensáveis dos fatos tidos como delituosos, pois não demonstra a associação da paciente aos demais correús, tampouco os contornos da conduta que indiquem o preenchimento da elementar subjetiva. 3. Habeas corpus concedido, a fim de pronunciar a inépcia formal do Aditamento à denúncia nº 001/2011, e excluir a paciente da ação penal que apura a ocorrência do crime de formação de quadrilha, ratificando-se a liminar anteriormente concedida. (HC 207663/CE, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, QUINTA TURMA, julgado em 06/03/2012, DJe 24/04/2012)

Feitas tais a considerações, a partir de tudo o já dito, bem como o que se apresentará a seguir, não há absolutamente nada de ilícito no serviço prestado, tampouco na contratação.

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O feito grita por improcedência.

III.2 DA DESNECESSIDADE DE LICITAÇÃO

Ao longo da instrução já restou absolutamente demonstrada a licitude do procedimento de contratação com a dispensa do procedimento licitatório. Tanto porque o que ocorria antes da contratação das Fundações de Apoio era a contratação da Fundação Carlos Chagas mediante inexigibilidade de licitação, um procedimento muito mais flexível do que o de dispensa, como porque esses contratos contaram com pareceres favoráveis da Procuradoria-Geral do Estado, bem como foram submetidos a inúmeros órgãos de controle, todos eles aprovando a contratação da forma como feita. A contratação da Fundação para o Desenvolvimento e Aperfeiçoamento da Educação e da Cultura – FUNDAE se deu no mês de abril de 2007 nos mesmos moldes da contratação anterior, com amparo no art. 24, inciso XIII da referida lei. A acusação alega que o núcleo familiar Fernandes teria se beneficiado da dispensa ilegal de licitação, o que consistiria o chamado locupletamento (fl. 54.196). Há questões fundamentais a serem examinadas. Primeiro, que resta mais do que comprovado que ninguém do núcleo familiar Fernandes teve o poder de mando que supõe a acusação para determinar a dispensa de uma indevida licitação. Nenhum dos acusados mantinham contato direto com os dirigentes do DETRAN-RS, a ponto de explorar algum prestígio nesse sentido. A prova é absolutamente insuficiente neste tocante. Tanto o Parecer nº. 005690-12.44/03-7, firmado pelo Procurador Adjunto para Assuntos Jurídicos Telmo Lemos Filho, ratificado pela Procuradora-Geral do Estado Helena Maria Silva Coelho, de 16 de dezembro de

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200341; como o nº. 003592-12.44/07-2, firmado pela Procuradora do Estado Joline Baldwin Erig Weiller, ratificado pela Procuradora-Geral do Estado Eliana Soledade Graeff Martins, de 4 de abril de 2007, caminharam no mesmo sentido favoravelmente à dispensa de licitação42. Para questionar a contratação da FATEC, foi movida Ação Popular, proposta por Andréa da Cruz Lima e outros, tombada sob o nº. 001/1.05.0282019-9 (número antigo 115127137), distribuída à 2ª Vara da Fazenda Pública do Foro Central. Nos autos da ação popular, o Estado do Rio Grande do Sul - o mesmo que hoje figura como assistente à acusação - deduziu contundente defesa de mérito sobre a contratação por dispensa de licitação. Disse, em sua defesa, que:

Desta forma, findo o prazo contratual, urgia a contratação de nova prestadora de serviços emergencialmente. Contatadas diversas instituições com capacidade para prestação dos serviços necessários, foi ajustada a contratação emergencial da Fundação de Apoio à Tecnologia e Ciência - FATEC, dispensada a licitação com base no art. 24, IV da Lei de Licitaçòes. Este contrato foi firmado em julho de 2003, pelo prazo de 180 dias. As razões para a escolha da FATEC encontram-se declinadas nas informações prestadas pelo DETRAN, que ora transcrevemos:

A indicação da FATEC, conforme justificado no competente processo administrativo, deveu-se ao fato de ela ter condições comprovadas de executar o objeto contratado, inclusive com a participação dos técnicos e com o uso do laboratório da COPERVES - Comissão Permanente de Vestibular, o que demonstrava a excelência na realização de provas, concursos, análises estatísticas , com ampla comprovação de estar a referida instituição plenamente equipada e capacitada para aplicação de exames com uso de tecnologia da informação. Aliada a excelência tecnológica e à capacidade operacional comprovada e aprovada, a posição geográfica da Universidade Federal de Santa Marai, exatamente na região central do Estado, outorgava-lhe condições mais favoráveis à plena e satisfatória execução do contrato em razão da facilidade de deslocamento de seus técnicos para as demais regiões do Estado.

(...) O DETRAN-RS agiu estritamente dentro da legalidade.

                                                                                                               41 Fls. 7791/7794 dos autos 42 Fls. 7795/7807 dos autos

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(...) Ressalte-se que a proposta da FATEC constavam os mesmos valores que já vinham sendo praticados no contrato com a Fundação Carlos Chagas, não podendo se falar, portanto, em inadequação dos mesmos. De outra banda, pelos documentos já juntados pelo DETRAN-RS aos autos, constata-se a inexistência de outras entidades com capacitação para prestar os serviços contratados. Ressalte-se que o contrato incialmente firmado com a FATEC, findo em dezembro de 2003, encontrou-se plenamente cumprido pela contratada, não havendo qualquer objeção à excelência dos serviços prestados43.

É de causar estranheza que o mesmo Estado do Rio Grande do Sul, que defendeu com afinco e denodo a contratação, hoje figure como assistente à acusação desta ação penal. Há um fato de que não se pode ultrapassar. O DETRAN-RS é autarquia estadual, com autonomia administrativa, personalidade jurídica e patrimônio próprios. Não poderia contratar com a FATEC, com a FUNDAE ou com qualquer outra Fundação sem que houvesse um parecer favorável da Procuradoria-Geral do Estado. Dito de outra forma, não bastaria o DETRAN querer contratar a FATEC ou a FUNDAE por dispensa de licitação. Se não houvesse parecer favorável de um órgão que é externo ao DETRAN - Procuradoria-Geral do Estado - não se levaria a efeito a contratação. Afora isto, é prática comum a contratação de instituições para a execução de exames teóricos e práticos mediante licitação dispensada, sem que isso represente qualquer ilegalidade. A título de exemplo, veja-se trecho da Declaração de Dispensa de Licitação do DETRAN-GO, de 8 de fevereiro de 201144:

                                                                                                               43 Fls . 7814/7822 dos autos. 44 Disponível em http://www.sgc.goias.gov.br/upload/links/arq_707_Despacho-CPLAnA040-2011.pdf

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Muito recentemente, o Tribunal de Contas da União já se posicionou a respeito da possibilidade de contratação de Fundações de Apoio mediante procedimento de dispensa de licitação:

1. É possível a contratação de fundação de apoio por dispensa de licitação, com fundamento no art. 24, inciso XIII, da Lei 8.666/1993, para a realização de vestibular, desde que haja nexo efetivo entre a natureza da instituição e o objeto contratado e compatibilidade com os preços de mercado. Tomada de Contas Especial decorrente de Denúncia apurou indícios de irregularidades em contratações realizadas pela Fundação Universidade Federal de Rondônia - Unir. Além de outras ocorrências, apontou-se possível irregularidade na contratação de fundação de apoio, por dispensa de licitação, para a realização dos vestibulares de 2004 e 2005. Quanto a essa questão, a unidade técnica entendeu que "a contratação da Fundação RIOMAR, diretamente, com dispensa de licitação, pela UNIR, mostra-se irregular ... não se pode conceber dispensa de licitação tendo por objeto atividade rotineira, como é o caso do vestibular". Registrou ainda que "A dispensa prevista na Lei nº 8.666/93, art 24, inc. XIII, ... somente se aplica ao desenvolvimento institucional, algo relevante e excepcional". O relator, ao discorrer sobre a evolução jurisprudencial do TCU acerca da matéria, destacou que "Ao longo dos anos, o TCU primeiramente entendeu ser possivel a aplicação do art. 24, inciso XIII, da Lei 8.666/1993 às atividades relacionadas à promoção de concurso público, desde que tendo pertinência com o desenvolvimento institucional da contratante (Acórdão 569/2005 – Plenário). O debate sobre a aplicabilidade do art. 24, inciso XIII, da Lei 8.666/1993, para a contratação de fundações de apoio por universidades, para a realização de vestibulares, começou a ser dirimido a partir do Acórdão 1534/2009 – 1ª Câmara, que reconheceu a legitimidade desse procedimento. De fato, o Tribunal, hoje, entende que não há diferença substancial entre a contratação para realização de concurso para admissão de servidores e o vestibular para ingresso nas instituições de ensino". Em face desse panorama, o relator concluiu que "a tese encampada pela unidade instrutiva quanto à contratação, por dispensa, da fundação Riomar, não

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encontra respaldo na jurisprudência desta Corte". Ainda sobre a aplicabilidade do art. 24, inciso XIII, da Lei 8.666/1993, o relator acrescentou que recentemente, por meio do Acórdão 3019/2012 - Plenário, de sua relatoria, "o Tribunal firmou entendimento de que a contratação, por dispensa de licitação, para realização do Enem é admitida desde que haja nexo efetivo entre a natureza da instituição e o objeto contratado e compatibilidade com os preços de mercado". O Tribunal, ao acolher a proposta do relator, decidiu julgar regulares com ressalvas as contas dos responsáveis e emitir determinações à Unir em razão de falhas formais. Precedentes citados: Acórdãos 569/2005 e 3019/2012, ambos do Plenário, e Acórdão 1534/2009 – Primeira Câmara. Acórdão 2506/2013-Segunda Câmara, TC 019.856/2005-5, re lator Ministro José Jorge , 7.5.2013.

Já está mais do que evidenciado que dentre as finalidades das Fundações de Apoio inseriam o desenvolvimento científico e tecnológico, o que se amolda com precisão ao que buscava - e foi efetivamente desenvolvido - com relação ao contrato com o DETRAN. É estranho como o Ministério Público Federal avoca para si o monopólio do saber, a ponto de decidir o que é efetivamente relevante para o desenvolvimento científico e o que não é. O contrato DETRAN-FATEC, para justificar a celebração com uma Fundação de Apoio correspondia a um respectivo projeto institucional entabulado entre FATEC e Universidade Federal de Santa Maria (Contrato nº. 188/2003), que tinha como objetivo a "Pesquisa, Desenvolvimento e Manutenção de Instrumentos e Procedimentos necessários à realização de Exames de Habilitação para condução de veículos automotores". Note, Excelência, que esse projeto, que tinha como Coordenador o Prof. Dario Trevisan de Almeida, e participantes Nirvan Hofstadler Peixoto, Thaís Scott do Canto Dorow, Rosmari Graeff Ávila da Silveira, Felipe Batista Ethur, Marco Aurélio Antunes Della Mea e Amauri Almeida, não tinha dentre seus objetivos a atividade-fim do contrato DETRAN-FATEC. Ao passo em que o contrato DETRAN-FATEC tratava de aplicar os exames teóricos e práticos, esse projeto institucional, firmado em 1º de julho por Paulo Jorge Sarkis, Reitor da Universidade, e Ronaldo Etchechurry Morales, Presidente da FATEC, tinha por finalidade o estudo sobre instrumentos e procedimentos necessários à aplicação dos exames.

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O Projeto Trabalhando pela Vida ganhava com os resultados da pesquisa, e a Universidade Federal de Santa Maria ganhava com o pagamento de bolsas de pesquisa, no valor de R$ 136.000,00 (centro e trinta e seis mil reais), valores que tinham origem no contrato da DETRAN-FATEC, honrando o cabimento de ter sido celebrado com uma Fundação de Apoio. Desenvolvido entre 1º de julho de 2003 e 31 de dezembro de 2003, esse foi o relatório final, que apresentou seus resultados, devidamente registrado na Universidade Federal de Santa Maria:

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O t râns i to é assunto que preocupa os pesquisadores nas mais variadas esferas. Dos ruídos, na medicina e fonoaudilogia, passando pela engenharia de tráfego, chegando à questão da punição dos infratores no direito, a academia vem debruçando especial atenção a esse assunto, e isso pode ser visto a partir de uma rápida busca nas Bibliotecas da Universidade Federal de Santa Maria, sobre a palavra TRÂNSITO, filtrando apenas trabalhos feitos dentro da instituição:

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A temática é de interesse da Universidade Federal de Santa Maria, como é de qualquer cidadão preocupado com o desenvolvimento acelerado de nossa sociedade. Não há qualquer dúvida sobre a pertinência dos trabalhos desenvolvidos, e não se pode admitir que a Polícia Federal, o Ministério Público Federal, ou mesmo o Judiciário, decidam sobre o que é pertinente e o que não é pertinente para que se pesquise cientficiamente. Pode-se justificar tanto pelo aspecto histórico da universidade, uma instituição pluridisciplinar voltada ao domínio e cultivo do saber humano, com sua origem em Bolonha, no século XII, em que não se cogita admitir argumentos de autoridade como os praticados pelos Procuradores da República, buscando pautar o que deve ser pesquisado. Mas também se pode justificar a partir da impossibilidade de o Poder Judiciário interferir na esfera de atribuições e prerrogativas da Universidade Federal de Santa Maria, autarquia especial do Poder Executivo Federal. Nesse contexto é a decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul.

Agravo de Instrumento. Licitação e Contrato Administrativo. Contrato de Prestação de Serviço. Dispensa de Licitação (Artigos 37, inciso XXI e Art. 24, inciso XIII, Lei Federal n.° 8.666/93). A licitação é a regra; mas a própria Constituição deixa em aberto a possibilidade de serem fixadas pela legislação ordinária as hipóteses de dispensa. Se a Administração agiu dentro da lei, sem desvio de finalidade, não podem seua atos ser submetidos à sumária intervenção do Poder Judiciário com base em conceitos vagos de imoralidade.45

Em outras linhas, pode-se discutir a legalidade da contratação, mas não pode o decidir o Judiciário sobre mérito do ato administrativo, se é adequado o interesse institucional da Universidade em determinado assunto científico ou não. O depoimento da Procuradora-Geral do Estado, à época, Eliana Graeff Martins, fls. 17.158/17.166 é altamente esclarecedor sobre as práticas

                                                                                                               45 Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. Agravo de Instrumento n.° 70006176333, 21ª Câmara Cível..70005808209. Centro Universitário La Salle, Acordão. Relator Desembargador Dr. GENARO JOSÉ BARONI BORGES. Desembargador Dr. FRANCISCO JOSÉ MOESCH e Desª LISELENA SCHIFINO FLORES.

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ocorridas dentro da Procuradoria-Geral do Estado, a respeito do parecer favorável à contratação por dispensa de licitação. Disse que a rapidez na tramitação - que foi estranhada pelo Ministério Público Federal - era praxe em questões urgentes, e que, sendo necessário, poderia haver parecer até mesmo no mesmo dia. Mais ainda, disse que era bastante comum a contratação de Fundações para a execução de certos serviços, e que a Procuradora que examinou a questão tinha muita experiência e conhecimento em direito administrativo, tendo sido submetido o parecer ao Procurador-Geral Adjunto e à Procuradora-Geral, tendo sido ratificado nessas duas instâncias. Salvo algumas ressalvas, que foram observadas no contrato celebrado, não havia qualquer óbice à contratação. A contratação das Fundações de Apoio atendeu rigorosamente à legalidade, bem como aos interesses institucionais da Universidade Federal de Santa Maria.

III.3 LOCUPLETAMENTO EM INDEVIDA DISPENSA DE LICITAÇÃO X PECULATO

Admitindo-se, por hipótese, que V. Exa. entenda por indevida a dispensa de licitação, mesmo assim, a denúncia apresenta intransponível inconsistência técnica, que acaba criando a potencial ocorrência de dupla punição pelo mesmo fato, um bis in idem. Note, Excelência, que o acusador ao descrever os tipos penais de locupletamento em dispensa indevidade de licitação e de peculato reporta-se aos mesmos fatos, o que é absolutamente inadmissível. A denúncia descreve que os réus concorreram para as indevidas dispensas de licitação que originaram os contratos DETRAN-FATEC e DETRAN-FUNDAE, visando ao posterior locupletamento. Posteriormente, quando avança na análise do delito de peculato, diz que os réus atuaram decisivamente para que fossem praticados todos os atos tendentes ao desvio de recursos dos contratos DETRAN-FATEC e DETRAN-FUNDAE.

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As definições dos dois parágrafos acima são extraídas dos memoriais ministerais. Uma breve análise já permite concluir que os réus estão sendo acusados em ambos os casos por terem recebido valores dos contratos do DETRAN com as Fundações de Apoio da Universidade Federal de Santa Maria. Sobre o locupletamento em indevida dispensa de licitação, figura que integra o tipo penal da própria dispensa indevida de licitação, caracteriza-se como uma figura própria para o contratado. A rigor, sequer teria legitimidade para figurar como sujeito ativo desse crime, já que nunca representou nem a FATEC nem a FUNDAE, mas é sócio de empresa que foi delas contratado para supervisionar o contrato. Mas, ainda que se admita um alargamento da incidência do tipo penal, certo é que se tratando de tipo penal voltando à empresa contratada - aquela que se beneficia de uma dispensa indevida de licitação -, é absolutamente inadequado que figure como sujeito ativo do delito de peculato, esse sim, próprio de funcionário público. A esse respeito, explica Guilherme de Souza Nucci:

Logo, não pode o agente administrativo eleger um fornecedor qualquer, por critérios subjetivos, especialmente pelo fato de se envolver montantes elevados, como regra, em contratações feitas pelo Poder Público. Esta é a razão pela qual, no parágrafo único deste artigo, inseriu-se que, quanto ao contratado (não servidor), deve-se buscar, além do dolo, a específica vontade de se beneficiar da dispensa ou inexigibilidade da licitação, tendo tomado parte na concretização da ilegalidade46.

Essa compreensão não diverge da que a antiga magistrada que conduzia o feito exarou em decisão de 11 de outubro de 2011 (fls. 29.678-29.705v). Ao apreciar o pedido de perícia feito pelas defesas, a digna magistrada apresentou um quadro para explicar o que se apurava em cada um dos delitos imputados, e assim disse do peculato-desvio, na fl. 29.690:

                                                                                                               46 NUCCI, Guilherme de Souza. Leis Penais e Processuais Penais Comentadas. 5. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2010. p. 897

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Aqueles que eram funcionários públicos, vinculados ao Detran, em tal condição tendo a posse de dinheiro público (destinado à estruturação do sistema para outorga de carteira nacional de habilitação, mediante avaliações de natureza teórica e prática) o teriam desviado em proveito alheio (para as empresas - e seus proprietários fictícios e reais - subcontratadas pela Fatec e Fundae para a execução do contrato)

Para o locupletamento em indevida dispensa de licitação, assim referiu, na fl. 29.691:

A partir da dispensa indevida da licitação, aqueles que concorreram para sua ocorrência teriam obtido proveito, na condição de proprietários reais das empresas subcontratadas (que receberam valores oriundos do contrato entre Detran e UFSM) ou na condição de servidores públicos ligados à contratação (pela via do recebimento de propina).

Tanto o peculato como o locupletamento são crimes materiais consistentes, no caso presente, no recebimento de valores decorrentes do contrato DETRAN-FATEC e DETRAN-FUNDAE. Há um evidente bis in idem na imputação de duas figuras típicas tendo como lastro o mesmo fato. Os crimes previstos no artigo 89, no caput e no parágrafo único são duas faces do mesmo fato. É como ocorre em corrupções ativa e passiva. Não que um não exista sem o outro, mas quando presente a bilateralidade, eles são indissociáveis. Para que haja um locupletamento em dispensa indevida de licitação é fundamental que tenha havido uma dispensa indevida de licitação. As penas não são pequenas. Muito pelo contrário. É cominada pena de detenção, de 3 a 5 anos para qualquer uma das duas figuras, seja a do caput, seja a do parágrafo único. Em razão de pena mínima maior do que a do peculato, tanto a pena do crime de locupletamento, como o de peculato, acabam tendo penas bastante próximas.

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O que não é correto é o acusador imputar dois crimes, cumulados, que se apresentam sob a mesma roupagem fática. Caso V. Exa. entenda se tratar, efetivamente, de peculato, então que entenda que o locupletamento em dispensa indevida de licitação é crime-meio do peculato, devendo, com isso, incidir apenas um dos tipos penais em questão. Neste sentido:

Ementa PENAL E PROCESSUAL PENAL. INQUÉRITO. PARLAMENTAR FEDERAL. DENÚNCIA OFERECIDA. ARTIGOS 89, CAPUT, E 90 DA LEI Nº 8.666/93 e ART. 1º, INCISOS II E XIV, DO DL Nº 201/67. ARTIGO 41 DO CPP. INDÍCIOS DE AUTORIA E MATERIALIDADE DELITIVA. CONFORMIDADE ENTRE OS FATOS DESCRITOS NA EXORDIAL ACUSATÓRIA E O TIPO PREVISTO NO ART. 90 DA LEI Nº 8.666/93. PRESENÇA DE JUSTA CAUSA. PECULATO DE USO (ART. 1º, II, DO DL 201/67). AUSÊNCIA DE ADEQUAÇÃO TÍPICA. CORREÇÃO DA CAPITULAÇÃO EMPREENDIDA NA DENÚNCIA. IMPOSSIBILIDADE. NEGATIVA DE EXECUÇÃO DE LEI (ART. 1º, XIV, DO DL Nº 201/67). CONSUNÇÃO RECONHECIDA. MANIFESTA AUSÊNCIA DE ADEQUAÇÃO TÍPICA QUANTO AO CRIME DO ART. 89 DA LEI N° 8.666/93. RECEBIMENTO PARCIAL DA DENÚNCIA. 1. A questão submetida ao presente julgamento diz respeito à existência de substrato probatório mínimo que autorize a deflagração da ação penal contra o denunciado, levando em consideração o preenchimento dos requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal, não incidindo qualquer uma das hipóteses do art. 395 do mesmo diploma legal. 2. A denúncia somente pode ser rejeitada quando a imputação se referir a fato atípico, certo e delimitado, apreciável desde logo, sem necessidade de produção de qualquer meio de prova, eis que o juízo acerca da correspondência do fato à norma jurídica é de cognição imediata, incidente, partindo-se do pressuposto de sua veracidade, tal como se dá na peça acusatória. 3. As imputações feitas ao denunciado na denúncia, foram de, na condição de prefeito municipal, haver fraudado licitações e se utilizado indevidamente em favor de terceiros de valores do erário. 4. Encontram-se preenchidos os requisitos do art. 41 do Código de Processo Penal, havendo justa causa para a deflagração da ação penal em relação ao crime previsto no art. 90 da Lei nº 8.666/93. 5. No peculato de uso, previsto no inciso II do art. 1º do DL nº 201/67, o sujeito ativo do crime utiliza-se, ilicitamente, de bens, rendas ou serviços públicos, em seu proveito ou de terceiros, agente público ou não. Não se pode falar em peculato de uso quando versar sobre dinheiro, ou seja, coisa fungível. Se o funcionário usar dinheiro que tem sob sua guarda para seu próprio benefício, pratica o delito de peculato. 6. Inviável, no caso, a alteração excepcional na classificação do fato descrito na denúncia, dada a ausência de conformidade entre os fatos e os demais crimes previstos no Decreto-lei nº 201/67. 7. Se um crime é meio necessário ou fase normal de preparação ou de execução de outro crime, encontrando-se, portanto, o fato previsto em uma lei inserido em outro de maior amplitude, permite-se apenas uma única tipificação, por óbvio, a mais ampla e específica (por força do fenômeno da consunção): no caso em exame, exatamente a do crime previsto no art. 90, da Lei nº 8.666/93,

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não se legitimando o processamento e o julgamento do denunciado por dois crimes distintos. 8. Não se cuida, na espécie, de imputação de crimes decorrentes da dispensa ou inexigibilidade indevidas de licitação, mas de fraudes decorrentes da adoção de modalidade imprópria de certame licitatório, não havendo, a esse respeito, a devida e necessária conformação e correlação entre os fatos e o tipo penal que se diz violado. 9. Denúncia recebida em parte. (Inq 3108, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 15/12/2011, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-059 DIVULG 21-03-2012 PUBLIC 22-03-2012) III.4 O CRIME DE CORRUPÇÃO ATIVA E SEU EXAURIMENTO

Desprezando-se os crimes menores que gravitam no entorno do eixo principal do que se apura no presente feito, a discussão, pelo menos no que diz respeito aos ora acusados, cinge-se ao oferecimento de vantagem indevida a servidores públicos, para viabilizar a contratação do DETRAN com as Fundações de Apoio, e dela se beneficiar. Sobre o recebimento dos valores decorrentes do contrato, aliás, é que o Ministério Público imputou os delitos de locupletamento em dispensa indevida de licitação e peculato. Ocorre que o tipo penal de corrupção ativa, previsto no artigo 333 do Código Penal, tem a seguinte redação:

Corrupção ativa Art. 333 - Oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público, para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício: Pena – reclusão, de 2 (dois) a 12 (doze) anos, e multa. Parágrafo único - A pena é aumentada de um terço, se, em razão da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou omite ato de ofício, ou o pratica infringindo dever funcional.

Facilmente notado é o especial fim de agir dentro do tipo penal. A esse respeito, diz Juarez Cirino dos Santos:

A intenção, como característica psíquica especial do tipo, aparece, geralmente, nas conjunções subordinativas finais para, a fim de, com o fim de etc., indicativas de finalidades transcendentes do tipo, como ocorre com a maioria dos crimes patrimoniais47. Ainda, acrescenta Cezar Roberto Bitencourt:

                                                                                                               47 CIRINO DOS SANTOS, Juarez. Direito Penal - Parte Geral. 3.ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris. 2008. p. 166.

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Elemento subjetivo geral é o dolo, constituído pela vontade consciente de oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público para praticar, retardar ou omitir a prática de ato de ofício. Essa infração penal exige também o elemento subjetivo especial do tipo, representado pelo especial fim de agir, isto é "para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício48.

O legislador não deixou de se preocupar com a hipótese de que o ato de ofício buscado pelo sujeito ativo do delito viesse a ser efetivamente praticado. Traduzindo para o caso presente, ao se imputar o crime de corrupção para o fim de obter uma dispensa indevida de licitação e dela se beneficiar, há previsão específica para a hipótese de essa licitação ser efetivamente dispensada e beneficiar o sujeito ativo do crime de corrupção. Essa previsão se apresenta pelo parágrafo único do artigo 333, implicando um aumento de 1/3 na pena fixada para o injusto de corrupção ativa ("A pena é aumentada de um terço, se, em razão da vantagem ou promessa, o funcionário retarda ou omite ato de ofício, ou o pratica infringindo dever funcional"). Tal ocorrência, forte o suficiente a ensejar o aumento de pena, representa o exaurimento da conduta prevista no caput, conforme lição de Cezar Roberto Bitencourt:

À semelhança da previsão do §1º do art. 317 (corrupção passiva), se o funcionário público, em razão da vantagem ou promessa dela, retarda ou omite ato de ofício ou o pratica infringindo dever funcional, a pena é majorada em um terço. Não deixa de ser uma espécie de pena pelo exaurimento do crime49.

Ao explicar esse parágrafo único, diz Guilherme de Souza Nucci que, "nessa hipótese, o crime é material, isto é, exige o resultado naturalístico50". Ora, esse resultado naturalístico, inserto no parágrafo único do artigo 333 é que o Ministério Público Federal está imputando duas vezes aos acusados, uma vez pelo locupletamento em indevida dispensa de licitação e outra pelo peculato-desvio.

                                                                                                               48 BITENCOURT, Cezar Roberto. Direito Penal - Parte Especial. Vol. 5. 2. ed. São Paulo: Saraiva. 2008. p. 212. 49 BITENCOURT, Cezar Roberto. Direito Penal - Parte Especial. Vol. 5. 2. ed. São Paulo: Saraiva. 2008. p. 215. 50 NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. 13. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2013. p. 1222

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Nesses dois crimes, a tentativa de punição é apenas pela ocorrência de um determinado resultado, sem, contudo, a demonstração de condutas que as tenham ensejado. Dito de outra forma, o recebimento de valores decorrentes do contrato DETRAN-FATEC insere-se no desdobramento causal natural da corrupção imputada. Se é verdade que corromperam servidores públicos para obterem dispensa indevida de licitação, o que se admite apenas por exercício retórico, ao ser dispensada, todas as consequências patrimoniais desse ato administrativo são lógicas e necessárias, não podendo ser imputado aos réus resultados sem ações, sob pena de incorrer na violação dos princípios da culpabilidade da vedação do bis in idem. Não há independência alguma entre a corrupção e os dois crimes imputados. Há uma única ação e vários resultados que são desdobramentos naturais dessa única ação. Sendo assim, independentemente da compreensão que V. Exa. tenha sobre os crimes de locupletamento em indevida dispensa de licitação e de peculato-desvio, é fundamental que se os tenham como inseridos dentro do desdobramento natural do crime de corrupção ativa exaurido, sendo, portanto, abarcado pelo parágrafo único do artigo 333 do Código Penal.

III.5 DA INOCORRÊNCIA DE CRIMES DE CORRUPÇÃO ATIVA

Julgar só mediante indícios e, com eles condenar, é o adultério da

razão com o acaso, nos jardins de Júpiter51. No que concerne às imputações dos delitos de corrupção, basta uma fácil compreensão do que é imputado nos autos para evidenciar a mais absoluta improcedência dos pedidos neste tocante. De todos os cenários de corrupção imputados aos acusados da Família Fernandes, o Ministério Público Federal pediu a absolvição em três deles, remanescendo apenas um que supostamente teria ocorrido "em data não definida, mas certamente no primeiro semestre de 2003" envolvendo os acusados Carlos Ubiratan dos Santos e Hermínio Gomes Júnior, e outro "em data não definida, próxima ao mês de abril de 2006" envolvendo o acusado Gilson Araújo de Araújo.                                                                                                                51 ROSA, Eliézer. Dicionário de Processo Penal. Rio de Janeiro: Editora Rio. 1975. p. 131.

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Sobre a denúncia (e suas nulidades), sempre conveniente lembrar das lições de Ada Pelegrini Grinover, Antonio Scarance Fernandes e Antônio Magalhães Gomes Filho:

A instauração válida do processo pressupõe o oferecimento de denúncia ou queixa com exposição clara e precisa de um fato criminoso, com todas as suas circunstâncias (art. 41, CPP), isto é, “não só a ação transitiva, como a pessoa que a praticou (quis), os meios que empregou (quibus auxiliis), o malefício que produziu (quid), os motivos que o determinaram a isso (cur), a maneira por que a praticou (quomodo), o lugar onde a praticou (ubi), o tempo (quando)” (João Mendes Jr.). A narração deficiente ou omissa, que impeça ou dificulte o exercício da defesa, é causa de nulidade absoluta, não podendo ser sanada porque infringe os princípios constitucionais52.

Sobre o tema, oportuna é a lição de Rômulo de Andrade Moreira:

O devido processo legal também pressupõe uma imputação certa e determinada, permitindo que o réu, conhecendo perfeita e detalhadamente a acusação que lhe pesa, possa exercitar a sua defesa plena. [...] O que não podemos admitir é que o réu tenha que se defender não se sabe exatamente de que, ou que alguém tenha que enfrentar todos os percalços de um processo criminal sem que tenha sido imputado a ele, de uma maneira mais ou menos certa (a denúncia exige, no mínimo, indícios de autoria) um fato delituoso53.

Ainda, a situação em debate é a mesma que levou o Ministro Celso de Mello a divergir do voto do Ministro Joaquim Barbosa, no HC nº. 85.190/SC, para conceder a ordem para trancar ação penal por inépcia da denúncia:

A leitura da denúncia oferecida contra os ora pacientes permite constatar que o Ministério Público, ao formular acusação imperfeita, não só deixou de cumprir a obrigação processual de promover a descrição precisa do comportamento desses mesmos pacientes, como se absteve de indicar fatos concretos que os vinculassem ao evento delituoso narrado na peça acusatória54.

                                                                                                               52 GRINOVER, Ada Pellegrini; FERNANDES, Antonio Scarance; GOMES FILHO, Antonio Magalhães. As Nulidades no Processo Penal. 2. ed. São Paulo: Malheiros. 1992. p. 78. 53 MOREIRA, Rômulo de Andrade. Direito ao Devido Processo Legal. In: SCHMITT, Ricardo Augusto (Org.). Princípios Penais Constitucionais: Direito e Processo Penal à Luz da Constituição Federal.São Paulo: Podivm. 2007. p. 154-155. 54 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 85190, Relator(a): Min. JOAQUIM BARBOSA, Segunda Turma, julgado em 08/11/2005. < http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=2259221>.

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Não apenas a denúncia deixou de expor o fato supostamente delitivo e todas as suas circunstâncias, como nem mesmo os memoriais conseguiram fazê-lo. Com relação às provas carreadas, o processo é franciscano. Mais pela pobreza do que pela nobreza, por óbvio. A acusação não conseguiu se desincumbir minimamente de seu ônus probatório. Teceu considerações especulativas na denúncia e, após uma longa instrução, mesmo assim, repetiu esse apanhado de acusações vazias, despidas de qualquer amparo probatório, buscando a condenação dos réus, sem saber exatamente por quê. A denúncia extrapola de definições vagas, construindo afirmações que não se sustentam ante o menor choque com a prova dos autos. Diante da fragilidade da versão acusatória, seus pilares de sustentação são porosos e inconsistentes, como se vê:

Evidentemente , a aproximação da FATEC ao DETRAN-RS (...) fora antecipadamente orquestrada pelos demais integrantes do esquema criminoso, notadamente os acusados José Antônio Fernandes, Ferdinando Fernandes e Paulo Jorge Sarkis (...) A vontade dos dirigentes máximos do DETRAN/RS em contratar a FATEC, motivada c e r tamente pela promessa de vantagem econômica (...)

Tratam-se de considerações que - sendo muito compreensível com a acusação - no máximo, admitem um juízo de possibilidade, mas nada perto de um juízo de probabilidade da ocorrência de tais fatos, quanto menos de certeza. Precisa se escorar em na ocorrência de alguns elementos lícitos para supor, presumir, conjeturar a ocorrência de um resultado ilícito que não está provado. Mas note, Excelência, o acusador público não se desincumbe de apontar um elemento normativo indissociável da ocorrência do tipo penal. Fala, alude, cita a ocorrência de vantagem ilícita, mas não aponta quando, não aponta como, não aponta quanto.

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Diz, por exemplo, que tanto Carlos Ubiratan dos Santos como Hermínio Gomes Júnior teriam praticado ato de ofício infringindo dever funcional em decorrência de vantagem. Sequer o ato de ofício realizado com infração de dever funcional consegue se sustentar, na medida em que o contrato celebrado imediatamente anterior ao da FATEC foi feito mediante procedimento de inexigibilidade de licitação, e é tido por lícito pelo Ministério Público Federal. O que o DETRAN-RS fez foi manter a prática de não se fazer licitação, escolhendo, contudo, um meio mais rigoroso para a contratação, na qual poderia definir algumas condições que sequer existiam no contrato com a Fundação Carlos Chagas, além de adequar o fator de correção que no contrato que no primeiro era pelo IGP-M e nos próximos passou a ser a UPF-RS. É muita suposição ministerial para um processo dessa envergadura. É terrível, para os réus, em um processo penal democrático, estarem na beira do abismo condenatório, sem se saber exatamente pelo quê. Tudo o que Ministério Público Federal não compreende vira ilícito. Apenas para ilustrar, tome-se, por exemplo, a decisão que recebeu a denúncia, em 26 de maio de 2008, quando a magistrada, à época, teceu considerações sobre como o Ministério Público teria descrito o esquema . Assim descreveu a inicial incoativa:

Em data não definida, mas certamente no primeiro semestre de 2003, JOSÉ ANTÔNIO FERNANDES, FERNANDO FERNANDES, FERDINANDO FRANCISCO FERNANDES, LAIR ANTÔNIO FERST, CARLOS DAHLEM ROSA e PAULO JORGE SARKIS ofertaram vantagem indevida a CARLOS UBIRATAN DOS SANTOS e HERMÍNIO GOMES JÚNIOR, ambos os funcionários públicos estaduais, com o objetivo de que praticassem atos de ofício com infringência de dever funcional. Na ocasião, o denunciado CARLOS UBIRATAN, vulgo “BIRA”, exercia o cargo de Diretor-Presidente do DETRAN/RS, ao passo que o acusado HERMÍNIO era o Diretor Administrativo e Financeiro daquela autarquia. O oferecimento de vantagem indevida visava a que os denunciados CARLOS UBIRATAN e HERMÍNIO, na condição de dirigentes do DETRAN/RS,

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autorizassem e firmassem contrato entre a autarquia de trânsito e a FATEC mediante procedimento de dispensa de licitação que todos os envolvidos sabiam ser ilícito, em virtude da ausência de enquadramento no permissivo legal invocado e do superfaturamento do preço dos serviços. Após tal oferta, devidamente aceita, o ato de contratação da FATEC veio a se consumar, ensejando a configuração da primeira fase do esquema criminoso já anteriormente exposto nessa peça acusatória. As vantagens indevidas oferecidas a CARLOS UBIRATAN DOS SANTOS e HERMÍNIO GOMES JÚNIOR estavam diretamente ligadas aos benefícios financeiros advindos do contrato da FATEC com o DETRAN/RS, e assim foram posteriormente auferidas por esses agentes públicos corruptos, conforme amplamente demonstrado nessa denúncia. A oferta foi realizada por todos os acusados, uma vez que foram os responsáveis por idealizar e concretizar a fraude que ocorreu com o superfaturamento decorrente dos Contratos nos 34/2003 e 70/2003 entre DETRAN e FATEC, dos quais decorreu a contratação das empresas vinculadas aos acusados (diretamente ou por intermédio de familiares ou “laranjas”). A evidência do crime é extraída, também, da circunstância de que Carlos Ubiratan e Hermínio Gomes Júnior interromperam, subitamente, procedimento licitatório em curso para contratação de empresa para realizar os exames teóricos e práticos de direção veicular – justamente o mesmo objeto dos contratos celebrados entre o DETRAN e a FATEC – e, ato contínuo, dispensaram licitação em virtude de suposta (mas inexistente) “emergencialidade”, ignorando o trâmite e a necessidade do procedimento licitatório interrompido. PAULO JORGE SARKIS participou ativamente dos atos de corrupção dos dirigentes do DETRAN, sendo “peça-chave” no esquema, já que, em decorrência de sua condição de reitor da UFSM, induziu “Bira” e Hermínio a contratarem a FATEC, atuando, assim, na condição de garantidor da viabilidade da realização dos serviços, elemento necessário à gênese e à mantença do ardil criminoso55.

A denúncia não se preocupa em apontar uma vantagem indevida, mas em presumi-la, supô-la, tão somente. Também não aponta condutas individualizadas dos acusados, apenas listando-os, como se isso bastasse, para justificar a imputação coletiva de um crime que sequer permite se presumir tenha ocorrido, o que é absolutamente vedado segundo a regra, e a interpretação que lhe é conferida, do artigo 41 do Código de Processo Penal. Para que fosse viabilizada essa cogitação acusatória, as pessoas que, expressamente, teriam concorrido para a prática, seriam os acusados Lair Ferst e Marco Aurélio da Rosa Trevizani, conforme restou bem pontuado pela magistrada que recebeu a denúncia, em maio de 2008:

                                                                                                               55 Fls. 157/159 da denúncia.

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Nesse sentido, importante frisar que indícios constantes nos autos indicam a possibilidade de que, para percepção dos valores, os dois dirigentes tenham criado empresas titularizadas por "laranjas", ambas contratadas pela Newmark Tecnologia da Informação, Logística e Marketing Ltda.: a) Carlos Ubiratan dos Santos teria se valido da empresa NT Pereira, cuja titular fictícia é Nilza Terezinha Pereira, amiga da família, mas efetivamente administrada por Patrícia Jonara Bado dos Santos, esposa de Ubiratan. Diversos elementos indicam que, na realidade, a empresa seria de Patrícia e de Carlos Ubiratan, existindo somente em proveito dos mesmos. Para sua criação, teriam tido participação Lair Ferst e Marco Aurélio da Rosa Trevizani, técnico contábil que prestava serviços para as empresas da família Ferst e que também o fazia para a NT Pereira. b) Hermínio Gomes Júnior teria se valido da empresa P.L.S. Azevedo, cujo titular fictício é Pedro Luís Saraiva de Azevedo, cunhado de Hermínio. Também aqui, para a constituição da empresa, teriam obrado Lair Ferst e Marco Aurélio da Rosa Trevizani. A "propina" seria, assim, repassada por meio de tais empresas, cuja propriedade, de fato, seria dos dirigentes do Detran, acima mencionados. Em seguimento, as firmas individuais NT Pereira e P.L.S. Azevedo, juntamente com a Newmark Tecnologia e com Alfredo Pinto Telles (cunhado de Lair Ferst), constituíram a Newmark Serviço da Inteligência e Informação Ltda., supostamente para evitar a tributação incidente sobre a "propina", que a partir de então dar-se-ia a título de "distribuição de lucros aos sócios". Veja-se, a respeito, o episódio em que a NT Pereira, em 2006, efetivou um empréstimo, sem garantias, a Carlos Ubiratan dos Santos, no valor de R$ 500.000,00. Ao que tudo indica, o valor seria referente ao pagamento de propina com valores obtidos no contrato DETRAN, que teriam circulado por intermédio de uma das empresas sistemistas, a New Mark Tecnologia da Informação e Marketing, seguindo por empresa-irmã, a New Mark Serviços, cujos lucros foram distribuídos à NT Pereira, chegando finalmente às mãos do servidor público56.

Quando individualizou as condutas imputadas para cada um dos acusados, assim definiu, ratificando o dito acima:

b) Carlos Ubiratan dos Santos O denunciado é ex-Diretor do DETRAN, e integrava a Direção da empresa pública TRENSURB até a deflagração da Operação RODIN. Na condição de Diretor do DETRAN, foi quem esteve presente nas tratativas e firmou o primeiro contrato, entre a autarquia e a Fatec, em 2003. Segundo deflui dos autos (Relatórios de Investigação e Pesquisa formulados pela Receita Federal), teria percebido dinheiro da empresa NT Pereira Processamento de Dados ME, de que é titular Nilza Terezinha Pereira, mas que é administrada pela esposa do denunciado, a também denunciada Patrícia Jonara Bado dos Santos. Há indícios de que a titular seja "laranja" do casal, uma vez que o endereço da empresa é o mesmo do escritório de advocacia de Patrícia e, ainda, tem patrimônio absolutamente incompatível com aquele movimentado pela

                                                                                                               56 Fls. 18 e 19 do recebimento da denúncia, de 26 de maio de 2008

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empresa, imensamente menor. empresa sócia da New Mark Serviços da Informação e Inteligência (sócia de NEWMARK - Tecnologia da Informação, Logística Marketing, grande beneficiária do esquema). Há, pois, indícios de seu envolvimento no caso, pelo que viável a denúncia57. d) Hermínio Gomes Jr. Diretor-financeiro do DETRAN, e, posteriormente, Diretor-técnico. Participou da contratação da Fatec pelo Detran, em 2003, na condição de Diretor- financeiro, ao que tudo indica tendo ciência das irregularidades, bem como da manutenção do contrato e da posterior substituição da primeira fundação pela Fundae, já como Diretor-técnico. Há elementos no sentido de que teria despesas pessoais pagas pela PLS Azevedo. A empresa PLS Azevedo, que tem como titular Pedro Luis Saraiva Azevedo, genro de Hermínio, é uma das sócias da New Mark Serviço (que, como acima se disse, também tinha, em seu quadro societário, a New Mark Tecnologia, sendo ambas vinculadas à família Ferst, tendo a última recebido recursos do DETRAN, via Fatec). Há indicativos de que Pedro Luis Saraiva Azevedo seja "laranja" de Hermínio, constituindo a empresa para que por ela possam circular valores oriundos do Detran, em benefício do denunciado. Há, pois, indícios de seu envolvimento no caso, pelo que viável a denúncia58.

A denúncia com relação ao crime de corrupção ativa dos acusados Carlos Ubiratan dos Santos e Hermínio Gomes Júnior foi uma aposta alta ministerial, uma roleta russa acusatória que nem de longe se confirmou. A acusação foi vaga, genérica, imprecisa, e a prova dos autos não elidiu minimamente as dúvidas decorrentes da imputação. O próprio Lair Ferst, em seu acordo de colaboração premiada59, faz menção à aproximação entre suas empresas e os diretores do DETRAN, sem fazer qualquer alusão aos integrantes da família Fernandes. Sem entrar em qualquer análise de mérito, trabalhando-se apenas em tese, a partir do que denunciado pelo Ministério Público Federal, as condutas imputada a Carlos Ubiratan dos Santos e Hermínio Gomes Júnior sugerem uma aproximação com as empresas NT Pereira e PLS Azevedo, as quais, por sua vez, em conjunto com a Newmark Tecnologia constituíram a Newmark Serviços de Inteligência e Informação Ltda. Não há qualquer menção, nem no depoimento de Lair Ferst, nem nas análises feitas pela magistrada, à época, quando do recebimento da

                                                                                                               57 Fls. 37 e 38 do recebimento da denúncia, de 26 de maio de 2008 58 Fls. 38 e 39 do recebimento da denúncia, de 26 de maio de 2008 59 Fls. 71 e 72 do Acordo de Colaboração nº. 2009.71.02.000191-1

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denúncia, e tampouco na prova colhida ao longo da instrução processual que permita vincular qualquer integrante do núcleo familiar Fernandes nesse episódio. Não bastasse tudo isto, o próprio Ministério Público Federal se contradiz com relação a eventual corrupção dos Diretores do DETRAN. Na denúncia que ofereceu contra o Deputado Federal José Otávio Germano, nos autos do Inq 2842, Relator o Ministro Ricardo Lewandowski, o Procurador-Geral da República lhe imputa um papel tão decisivo a ponto de não fazer menção a qualquer ato de corrupção. Note, Excelência, a diferença de imputações sobre o mesmo fato - assinatura do contrato entre DETRAN e FATEC60. O Ministério Público Federal está completamente perdido. Não tem a mínima ideia do que fazer nesse processo, e lhe falta dignidade de admitir que projetou um elefante branco que jamais, em momento algum, se concretizou. Não podem haver versões tão conflitantes, dentro do mesmo órgão, sobre um único fato. A questão é que, para o Procurador-Geral da República, jamais houve corrupção dos Diretores do DETRAN.

Tudo diferente do dito acima é mera especulação, invencionice; é um querer ministerial que extrapola todos os elementos integrantes dos autos.

                                                                                                               60 Fls. 257 e 258 do Inq 2842 - Supremo Tribunal Federal

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A mais absoluta ausência de provas para sustentar a estapafúrdia cogitação ministerial somente conduz à absolvição como medida única. Conveniente lembrar da lição do Ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal, nos autos do Habeas Corpus nº. 73.338/RJ:

Nenhuma acusação penal se presume provada. Não compete ao réu demonstrar a sua inocência. Cabe, ao Ministério Público, comprovar, de forma inequívoca, a culpabilidade do acusado. Já não mais prevalece, em nosso sistema de direito positivo, a regra, que, em dado momento histórico do processo político brasileiro (Estado Novo), criou, para o réu, com a falta de pudor que caracteriza os regimes autoritários, a obrigação de o acusado provar a sua própria inocência (Decreto-Lei nº 88, de 20/12/37, art. 20, n. 5)61.

O Ministério Público Federal denunciou sem base alguma, e em momento algum se desincumbiu de seu ônus probatório, razão pela qual não resta outro caminho que não o decreto absolutório. Já com relação à imputação de corrupção no que diz respeito ao corréu Gilson Araújo de Araújo, tem-se que sequer poderia ter sido recebida. Nos memoriais, quando tenta descrever o que teriam feito os réus, descreve que:

Ademais, igualmente comprovado que o servidor do DETRAN-RS GILSON ARAÚJO DE ARAÚJO foi corrompido pelo réu FERDINANDO FERNANDES (agindo juntamente com seu irmão FERNANDO FERNANDES, ambos sob as ordens do pai JOSÉ ANTÔNIO FERNANDES). O oferecimento de vantagem indevida visava que o denunciado GILSON, na condição de funcionário do DETRAN/RS com atuação próxima aos dirigentes do órgão, agisse em nome dos interesses dos integrantes da FAMÍLIA FERNANDES perante a autarquia de trânsito, bem assim intermediasse os contatos da organização criminosa com outros DETRANs do Brasil, porquanto tinha, em razão da função, canais de comunicação interna com esses órgãos.

Sofrível a descrição feita, tanto porque deixa de examinar o acervo probatório dos autos, quanto porque sangra princípios elementares de direito penal, descrevendo um tipo penal que é recheado de elementos normativos, sem minimamente apontá-los na descrição da suposta conduta delitiva.

                                                                                                               61 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. HC 73338, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Primeira Turma, julgado em 13/08/1996. Disponível em: <http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=1629265>.

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O tipo de corrupção exige, para a sua ocorrência, que haja o oferecimento de vantagem indevida a funcionário público para praticar, omitir ou retardar ato de ofício, certamente em razão de sua função. A descrição dos memoriais nesse tocante limita-se a reproduzir os standards do tipo penal, sem apontar, minimamente, de que oferecimento de vantagem indevida se está falando, ou ainda qual o ato de ofício deveria ser praticado. Começando pelo ato de ofício a ser praticado, é absolutamente amplo e indemonstado pelo órgão ministerial. Diz que, em razão de seus canais de comunicações internos, o Sr. Gilson Araújo de Araújo poderia intermediar contatos com outros DETRANs do Brasil. Ora, o Sr. Gilson Araújo de Araújo era funcionário concursado do DETRAN-RS, que ingerência teria em outros DETRANs, como faz supor o Ministério Público Federal? Vale lembrar o que diz Sebastian Soler sobre o ato de ofício que integra o tipo penal do crime corrupção ativa:

Para que exista cohecho, es preciso que éste corresponda a un acto relativo a las funciones: acto de la competencia funcional y territorial, esto es, regularmente posible o debido de parte del funcionario62.

E arremata Cezar Roberto Bitencourt: Com efeito, para a configuraçào do crime de corrupçao ativa exige-se que o ato cuja ação ou omissão é pretendida esteja compreendido nas específicas atribuições funcionais do servidor público visado. Se o ato não é da competência do funcionário, poder-se-á identificar qualquer outro crime, mas, com certeza, não o de corrupção ativa63.

Na mesma linha, Guilherme de Souza Nucci:

                                                                                                               62 SOLER, Sebastian apud BITENCOURT, Cezar Roberto. Direito Penal - Parte Especial. Vol. 5. 2. ed. São Paulo: Saraiva. 2008. p. 212 63 BITENCOURT, Cezar Roberto. Direito Penal - Parte Especial. Vol. 5. 2. ed. São Paulo: Saraiva. 2008. p. 212

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68. Ato de ofício: é o ato inerente às atividades do funcionário. Portanto, o ato visado deve estar na esfera de atribuição do funcionário, não necessitando ser ilícito64.

E a compreensão dos Tribunais caminha no mesmo sentido:

O art. 333 do CP pressupõe ato de ofício, que seja da atribuição do funcionário a quem é oferecida ou prometida a vantagem (TRF da 1ª R., Ap. 4.031, DJU 8.11.93, p. 47286, in RBCCr 5/191; TJSP, RT 513/380). A oferta deve ser a funcionário encarregado de praticar ou omitir, e não a qualquer funcionário (TJSP, RJTJSP 82/363, RT 511/349). O ato deve estar compreendido entre as específicas atribuições funcionais do servido público (TJSP, RT 571/302, 498/292)65.

Ora, beira o surreal a imputação de que o Sr. Gilson Araújo de Araújo, servidor concursado do DETRAN-RS, tivesse recebido vantagem (ou promessa de vantagem) para intermediar contatos com outros DETRANs. A acusação está perdida. Não há ato de ofício que um servidor concursado de um órgão possa desempenhar em outro órgão. Não há qualquer elemento que respalde a suposição ministerial. Não há indicação mínima de quais ações, devidamente circunstanciada, o acusado Gilson Araújo de Araújo teria feito (ou teria, pelo menos, poderes de fazer). Não há, também, qualquer indicação sobre a vantagem ou promessa de vantagem que os acusados teriam ofercido ao acusado Gilson Araújo de Araújo Pior do que isso. Quando afirma que o oferecimento de vantagem indevida visava a que o denunciado GILSON (...) agisse em nome dos interesses dos integrantes da FAMÍLIA FERNANDES, o acusador público sequer descreve uma vantagem oferecidade, quanto menos que fosse indevida.                                                                                                                64 NUCCI, Guilherme de Souza. Código Penal Comentado. 13. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais. 2013. p. 1222 65 DELMANTO, Celso; DELMANTO, Roberto; DELMANTO JÚNIOR, Roberto; DELMANTO Fábio M. de Almeida. Código Penal Comentado. 7. ed. Rio de Janeiro: Renovar. 2007. p. 835.

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Não há nenhuma prova de qualquer relação entre os ora acusados e o acusado Gilson Araújo de Araújo, que não eventuais e-mails em que seu nome é citado. Tudo não passa de uma fantasiosa versão construída nos criativos gabinetes do Ministério Público Federal, onde, em conjunto com a Polícia Federal, idealizaram uma fraude que nunca houve, causando um prejuízo que nunca se apurou, mediante condutas ilícitas que nunca foram demonstradas. Em um primeiro e-mail, datado de abril de 2005, em que Rosmari Graeff envia para Fernando Fernandes, consta que Gilson Araújo de Araújo teria entrado em contato com a FATEC para agendar visitas de Diretores de Detrans de outros estados ao Rio Grande do Sul66. Em email de maio de 2006, enviado por Dario Trevisan a Fernando Fernandes, o que se evidencia é justamente o contrário do que sugerido pela acusação, na medida em que o que se revela é que o acusado Gilson Araújo de Araújo deixou seu nome cadastrado no site do DETRAN-SC para obter cópia do edital de licitação, razão pela qual não era mais visto como um parceiro, mas como um concorrente67. Em junho de 2006, Ferdinando Fernandes envia e-mail a Denise Nachtigall Luz em que consta o objeto do contrato - absolutamente lícito - entre a AC Gestão de Trânsito Ltda. e a Pensant Consultores Ltda., definido o custo por hora técnica da empresa contratada68. Por fim, em maio de 2007, o acusado José Antônio Fernandes enviou e-mail a múltiplos destinatários, em que se afirma que o acusado Gilson Araújo de Araújo seria um homem forte, o que foi interpretado pelo Ministério Público Federal de uma forma absolutamente diversa daquela pretendida pela comunicação. O contexto do adjetivo era não no sentido de poder, mas de necessidade de manutenção em razão de seu conhecimento técnico e experiência. Isso pode ser facilmente inferido a partir do texto original daquele e-mail:

                                                                                                               66 PR24-MIDIA-01.zip - analise 101 mídia 253.doc 67 PR24-MIDIA-01.zip - AMO 060-08 Laudo 2811-2007-Equipe-SMA 03A.doc 68 PR39-MIDIA-01.zip - AMO 061-08 Laudo 0587-2008 - Equipe POA - 03.doc

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O novo Presidente está procedendo mudanças, sendo umas pelo esvaziamento da função. Podemos saber previamente para não bater na porta errada. Uma coisa é certa, o Eng. Gilson é um homem forte69.

A evidência de que os acusados sócios da Pensant Consultores Ltda. não tinham nenhuma relação institucional com o acusado Gilson Araújo de Araújo pode ser vista a partir de alguns interrogatórios judiciais, como no de Flávio Vaz Netto, por exemplo:

Magistrada: O Sr. veio acompanhado do seu Gilson Araujo de Araujo por ser o servidor mais antigo do DETRAN, ele teve, de alguma forma, participação e influência na sua opção? FVN: Nenhuma, eu não tratei com ele nenhuma vez sobre isso, nem ele participou de reuniões sobre esta questão. Esta questão foi tratada Doutora dentro do DETRAN, por razões de cautela, que eu adotei, por bem ou por mal podia tá (sic) equivocado, foi tratada por mim, pelo Dr. Fernando Coronel Magalhães que é Diretor da área, e pelo Doutor Ildo, que era o Assessor Jurídico que deu o parecer sobre isos e tal. Fora disso, as relações foram entre eu, o Diretor Fernando e a direção da FUNDAE e eu repito: sempre liderada pelo Professor Isaías70.

Essa informação é repetida, mais adiante: Defesa: O Advogado Carlos Dahlem da rosa teve alguma participação na aproximação da FUNDAE com os dirigentes do DETRAN, no caso o Senhor? FVN: Não, nenhuma, e eu volto a enfatizar: a relação com a FUNDAE foi institucional, entre o Diretor Presidente, o Diretor Administrativo Financeiro e, com a interveniência, por vezes, quando necessária, do Diretor Jurídico do DETRAN. Não teve mais ninguém do DETRAN nisso, e pela FUNDAE exclusivamente seus dirigentes que, repito, sempre foram representados pelo Professor Isaías71.

Resta claro que o acusado Gilson Araújo de Araújo não era e nunca foi um contato de confiança da empresa Pensant Consultores Ltda., fazendo uma ponte nem mesmo com o DETRAN-RS, quanto menos com os outros DETRANs. Essa ilação somente ganha corpo porque em 2004 o acusado Gilson Araújo de Araújo assumira a presidência da Associação Nacional de Detrans - AND, pessoa jurídica de direito privado que tem a finalidade de promover a integração e a troca de experiências entre os DETRANs da Federação.

                                                                                                               69 RIP07-MIDIA-01.zip - Trabalhando pela vida.eml 70 Fl. 41.182v. 71 Fl. 41.186v.

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Ainda que toda a fantasiosa versão ministerial fosse verdadeira, nem mesmo assim encontraria amparo no tipo penal imputado, já que não há um ato de ofício qualquer que pudesse ser realizado pelo acusado Gilson Araújo de Araújo a fim de se amoldar naquilo descrito na inicial incoativa. Nicola Framarino Dei Malatesta, desde o final do século XIX, apresenta invulgar distinção entre probabilidade e certeza na apreciação das provas. Explica:

Eis como fica fácil estabelecer a diferença entre a probabilidade de um lado e a certeza com motivos divergentes, de outro. A probabilidade percebe os motivos convergentes e divergentes e os julga todos dignos de serem levados em conta, se bem que mais os primeiros e menos os segundos. A certeza acha, ao contrário, que os motivos divergentes da afirmação não merecem racionalmente consideração e, por isso, afirma. Esta afirmação surge para o espírito humano como correspondente à verdade, e a certeza que dela provém, como qualquer outra certeza, não é senão a consciência da verdade. Como se pode confundir este estado de alma com o precedente? É necessário este repúdio dos motivos divergentes, para se ter certeza; necessário para que se possa pronunciar condenação com justiça: não bastaria a simples probabilidade. Desde que se encontre um motivo para não crer digno de ser levado em consideração, falta a certeza e não se pode condenar.72

E arremata, com sabedoria: Mas se é bom que, para as ocorrências ordinárias da vida, o homem confie em juízos, racionais, se assim se queira, mas simplesmente prováveis, isso já não é mais permitido na verificação do fato criminoso ocorrido ou para exercitar o sacro e terrível ministério da justiça punitiva: sacro e terrível por ser um ministério divino nas mãos do homem. Se se pusesse condenar em consequência de juízos simplesmente prováveis, a justiça punitiva, já o dissemos, perturbaria mais a consciência social que o próprio delito: os cidadãos pacíficos, ante agressões dos delinquentes em particular, sentir-se-iam expostos às mais temíveis, porque mais irresistíveis, da suposta justiça social. É sempre a certeza e sempre esta como estado de alma, que deve servir de base à condenação.73

Bem mais recente é a lição de Antônio Dellepiane, insigne Catedrático da Universidade de Buenos Aires, que na primeira metade do século XX, já advertia com precisão:

Toda verdade deve resistir ao choque da dúvida e sair triunfante dela por meio da prova, da qual poderíamos dizer que é filha da dúvida e mãe da verdade.74

                                                                                                               72 MALATESTA, Nicola Framarino Dei. A Lógica das Provas em Matéria Criminal. 2ª. ed. Campinas: Bookseller. P. 62-63. 73MALATESTA, Nicola Framarino Dei. A Lógica das Provas em Matéria Criminal. 2ª. ed. Campinas: Bookseller. p. 64. 74 DELLEPIANE, Antonio. Nova Teoria da Prova. 2ª ed. Rio de Janeiro: José Konfino Editor. 1958. p. 45.

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Pode-se dizer que um decreto condenatório, estaria baseado em certeza? Ou em mera probabilidade? E que se pode falar sobre a prova dos autos? Resiste ao choque da dúvida? E, mais, pode-se pretender seja ela – esta falaciosa verdade acusatória – mãe da verdade? Não, não se pode! Qualquer decreto que não o absolutório será violência mortal a princípios que o legislador constituinte erigiu a patamares inatingíveis em nossa Carta Republicana. Ofenderá tanto a presunção de inocência, como o princípio da culpabilidade. Violenta a responsabilidade subjetiva no âmbito criminal e estabelece, via de consequência, a condenação independentemente de aferição de dolo ou culpa. Ou, mais longe, independentemente da constatação da existência do fato. Já disse Francesco Carnelutti, sobre a pretensão de verdade no processo penal

(...) a verdade de uma coisa nos foge até que nós não possamos conhecer todas as outras coisas e, assim, não podemos conseguir senão um conhecimento parcial dessa coisa. (...). Em síntese, a verdade está no todo, não na parte; e o todo é demais para nós75.

É por tal razão que tal imputação reclama por improcedência.

III.6 DO SUPERFATURAMENTO DOS SERVIÇOS76

Um ponto sobre o qual o Ministério Público Federal debruça especial atenção é o do que trata de eventual superfaturamento dos serviços prestados pelas empresas especializadas, o que representaria o superfaturamento do próprio serviço a ser prestado pelas Fundações de Apoio.

                                                                                                               75 CARNELUTTI, Francesco. Verità, dubbio e certeza. Rivista di diritto processuale. Padova: Cedam, 1965, v. XX. P. 4-9 76 Todos os dados utilizados são públicos e estão disponíveis em http://www.polibiobraga.com.br/RODIN_RELATO.pdf

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Manifestando-se contrariamente a perícia solicitada pela defesa dos sócios da Pensant, e sem se amparar em nenhum documento contábil, o acusador público estribou sua especulação acusatória em três pilares centrais:

1) Os preços dos exames de habilitação no Rio Grande do Sul são mais altos que nos demais Estados; 2) Informativos do Ministério Público de Contas demonstrariam superfaturamento; 3) Proposta do Reitor da Universidade Federal de Santa Maria para executar os serviços a preço 30-40% inferior aos praticados.

O acusador público federal foi irresponsável e leviano em tecer considerações tão superficiais sem o aprofundamento necessário. Não respeitou padrões metodológicos mínimos para uma pesquisa dessa grandeza. Primeiro, porque os Estados não tem um padrão para a concessão da primeira habilitação. Há Estados em que os serviços são integralmente realizados pelo DETRAN; ao passo em que noutros os serviços são parcialmente realizados pelo DETRAN. Há Estados em que a taxa é única; noutros as taxas são fixadas isoladamente; e outros, ainda, em que há taxas privadas não regulamentadas. Devem ser considerados, para tal valoração, itens como atendimento aos agendamentos exigidos pelos CFCs ao DETRAN e por este agendado, tendo a equipe de execução de aplicação de provas, atender a todos os agendamentos em todos os quase 300 Centros de Formações de Condutores distribuídos pelo Rio Grande do Sul. Devem, ainda, ser considerados os atendimentos realizados em locais ermos e que, de acordo com o número de exames aplicados, sequer conseguem cobrir a despesa da comissão de examinadores atuantes na regional, conforme a distriuição da força laboral humana capacitada para tais serviços, compostas por no mínimo 1 examinador teórico, 1 examinador teórico-prático e 1 examinador prático, de acordo com as categorias agendadas.

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Havendo mais categorias agendadas, eram destacadas outras equipes. A quantidade de examinadores determina, inclusive, a quantidade de veículos a serem empregados em viagens, e, consequentemente, o custo final. Caso ocorrido em Mostardas/RS exemplifica a quantidade de serviços prestados pela FATEC. Supervisionado pela Pensant, ao serem agendados 85 exames para aquele município, 23 teóricos e 62 práticos. Os examinadores aplicavam os exames de acordo com protocolos rígidos de execução, inexistindo a possibilidade de aplicação de uma prova prática em tempo inferior a 45 minutos por candidato, o que influenciava na quantidade de trabalhadores designados ao atendimento daquela demanda. Ao chegar no local, havia um número menor do que o agendado pelo CFC. Isso representa um custo excessivamente alto à FATEC, porque desloca equipes, assume os custos de provas impressas em malotes transportados por empresas de transporte intermunicipais, as quais, sem terem sido aplciadas, devem ser destuídas, além de trabalho de identificação, bipagem, armazenamento, transporte do cofre de impressão de provas, emalotamento, deslocamento até a transportadora, etc. Além disto, no custo, devem ser considerados os seguros contratados pela FATEC contra acidentes de trabalho, terceiros, e cobertura contra sinistros ligados à responsabilidade civil dos examinadores. Mesmo com um serviço muito mais completo e efetivo, os valores recebidos pela FATEC eram inferiores aos recebidos pela Fundação Carlos Chagas, e mesmo assim a FATEC conseguia realizar mais exames do que a Fundação Carlos Chagas. Somente se pode fazer uma comparação séria quando comparados Estados com características comuns.

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Dada a dificuldade de se encontrar um critério homogêneo, considerando todas essas variáveis, o meio mais seguro de se comparar é a partir do custo final para o contribuinte.

Na tabela acima, escolheu-se alguns Estados, definiu-se um valor médio - R$ 207,00 - e se comparou o custo final ao contribuinte em cada Estado com o valor médio obtido. Valendo-se deste quadro, o preço do Rio Grande do Sul está apenas 8,3% (oito virgula três por cento) acima do valor médio, muito em razão ao Estado do Paraná, que por ter uma política de tarifas altamente subsidiada faz o custo final despencar. Não bastasse isso, o custo mais elevado da Carteira Nacional de Habilitação no Rio Grande do Sul se deve a uma política de Estado, já que a taxa paga pelo cidadão, para os Exames Teórico e Prático, é em parte apropriada pelo Estado (40%), quando, de fato, são terceirizados os serviços. Se a taxa cobrada do contribuinte fosse a mesma paga pelo DETRAN à entidade contratada para a aplicação dos exames, o quadro indicaria um preço do Rio Grande do Sul 8,8% (oito virgula oito por cento) menor que a média, conforme o quadro:

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Tomando somente o preço dos Exames Teórico e Prático, como fez o Ministério Público Federal, o resultado é ilusório e distorcido, de modo que é impossível a comparação. Isso porque a estruturação dos serviços varia de Estado para Estado. No Rio Grande do Sul, os exames são feitos em quase 300 Centros de Formação de Condutores, ao passo em que no Maranhão em dois polos regionais, para onde os candidatos do Estado inteiro devem se deslocar, se quiserem submeter-se aos exames teóricos e práticos de direção veicular. Deve-se lembrar que não existem naquele Estado veículos suficientes para a demanda, o que por sua vez provoca o retorno do candidato em outro dia, ainda, despesa com viagem, estadia e alimentação, correm as expensas dos candidatos, bem como o desconto do dia de trabalho não realizado, valores, obviamente, não computados no cálculo estatístico referente às taxas cobrados, valores que devem ter sido apurados por levantamento telefônico feito por um funcionário do Ministério Público Federal. O valor de um exame, em nada se compara ao valor do aluguel do veículo de propriedade do centro de formação de condutores, sobre o qual se remunera o capital e não o conhecimento, em torno de R$ 21,00/candidato/prova, recolhido direto ao Centro de Formação de Condutores, que por sua vez possui descontos de IPVA e de IPI para aquisição de tais veículos, bem como descontos especiais das autorizadas por serem frotistas. Aqui, os examinadores se deslocam para atender os cidadãos, ao passo em que lá, no Maranhão, o cidadão viaja até 400 km para fazer os Exames. Essa capilaridade do serviço, em grande escala implementada pelo contrato do DETRAN com as Fundações de Apoio, para criar essas facilidades ao cidadão, precisa haver um custo a ser suportado com deslocamentos e demais despesas. Com relação ao segundo argumento, há que se reafirmar o caráter privado das Fundações de Apoio, de modo que o Tribunal de Contas deve

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ficar adstrito a apreciar contrato do DETRAN com as Fundações, e não os dela com eventuais outras empresas. Se as Fundações de Apoio julgassem necessário a contratação de empresas de segurança, gerenciamento, tecnologia da informação, a relação entre elas era de direito privado, não havendo se falar em interferência de órgãos de fiscalização, nem mesmo do Ministério Público Federal e do Poder Judiciário. Mesmo assim, em 2007 o DETRAN elaborou planilha apontando qual deveria ser o valor do contrato com a FUNDAE. Nessa planilha, o valor da fatura média estimada, a partir das projeções feitas de quantidade de exames a serem realizados, seria de R$ 2.395.017,61 (dois milhões, trezentos e noventa e cinco mil e dezessete reais e sessenta e um centavos), dos quais apenas 66% (sessenta e seis por cento) seria o valor total efetivo, totalizando a monta de R$ 1.580.711,62 (um milhão, quinhentos e oitenta mil, setecentos e onze reais e sessenta e dois centavos). Examine-se a tabela completa:

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Ocorre que, seguindo a mesma metodologia empregada, a análise feita não corresponde com a realidade, na medida em que reclama alguns ajustes. O valor bruto da folha de pagamento da FUNDAE, em outubro de 2007 era de cerca de R$ 282 mil (duzentos e oitenta e dois mil reais), inferior aos R$ 312 mil (trezentos e doze mil reais) utilizados pelo DETRAN no cálculo, além de não considerar as horas extras que continuavam existindo na FUNDAE. Recorde-se que com a migração do contrato da FATEC para a FUNDAE o ganho foi exclusivamente relacionado à filantropia e a isenção da contribuição previdenciária patronal (obrigação de investimento de tal valor). As horas extras, direito do trabalhador, permaneciam. Veja-se a o custo efetivo da folha de pagamento em outubro de 2007:

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Além disso, os funcionários administrativos, que já deveriam estar na FUNDAE, continuavam na FATEC e representavam um custo de salários e provisões de R$ 102 mil (cento e dois mil reais) Além disso, os serviços jurídicos continuavam sendo prestados e não foram computados na primeira planilha. Corrigindo essas informações e inserindo na tabela, tem-se o que segue:

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Prova da correção dos preços do contrato é que, se nessa planilha forem alocados 10% para supervisão e 6% para serviços jurídicos, como era ao tempo da FATEC, o total da planilha fecha exatamente em 100% da Fatura Mensal devida pelo Detran:

Por fim, no que diz respeito ao terceiro ponto que supostamente justifica a absurda tese de superfaturamento, a proposta do Reitor de conseguir executar o contrato com redução de 30-40%, algumas breves considerações são devidas.

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O que pretendeu o Reitor, com essa afirmação, foi dizer que, se executado o contrado diretamente pela Universidade Federal de Santa Maria, conseguiria executá-lo com custo reduzido. Esqueceu-se, entretanto, de ponderar que a Universidade Federal de Santa Maria não pode contratar servidores em caráter temporário para atender a prestação de serviços a terceiros. Assim, ela necessariamente teria que contratar uma Fundação para executar, o que, aí sim, caracterizaria uma subcontratação ilegal do objeto do contrato com o DETRAN, sua atividade-fim, algo evidentemente ilegal. Tudo não passou, portanto, de um devaneio demagógico do Sr. Clóvis Limas, reitor à época. Além disto, há elemento indispensável para a certeza de que não havia superfaturamento. O MEMORANDO 017 – RODIN II/DPF/SMA/SR/RS, confeccionado pela Polícia Federal dentro do “processo RODIN II” (anexo aos autos) comprova onde estava presente a irregularidade, seus percentuais de recebimento, bem como quais empresas recebiam esses valores ilícitos. Ao passo que demonstra também quais empresas não faziam parte do esquema criminoso e a Pensant encontra-se dentro do quadro de empresas que recebia o percentual devido pela prestação de serviços lícitos e regulares.

CARLOS ROSA = 6% PENSANT = 10%

UFSM = 10% OPERACIONAL = 50%

RIO DEL SUR = 10% NEWMARK = 14%

A Polícia Federal realizou o memorando em análise com base em interceptações telefônicas, cujos interlocutores eram Silvestre Selhorst e Rubem Hoher. Esclarece que nessas conversas os interlocutores estariam tratando de um cálculo estimativo sobre propina financeira que seria retirada do orçamento DETRAN-RS (contrato 70/2003).

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Dos valores acima transcritos a Polícia Federal conclui que:

Destes percentuais, LAIR ANTÔNIO FERST possu ía contro l e sobre 24%, que são os va lor e s v in cu lados as SISTEMISTAS RIO DEL SUR e NEWMARK or ig em dos r e cursos que o mesmo LAIR far ia a prop ina . Abstrai-se, ainda, ás folhas 10/19 e 11/19 que, em reunião com a CARLOS ROSA ficou pacificado o montante de R$ 380.000,00, (R$ 320.000,00 inicial mais R$ 60.000,00), que seriam destinados 50% para os partidos e 50% para o GOVERNO. Contudo, conforme abstrai-se das folhas 12/19, em momento posterior, onde a FATEC já havia sido substituída pela FUNDAE, o interrogado reafirma que o montante da propina volta a ser majorada, girando em torno de R$ 450.000,00. Destarte, conclui-se que a propina ficou estabelecida nesse montante em torno de R$ 450.000,00 e que o per c en tua l a s e r ap l i cado pe lo s par t i c ipantes g i rava em torno de 24% do or çamento , va lor e s v incu lados a LAIR, mediante as SISTEMISTAS RIO DEL SUR com 10% e NEWMARK com 14% que no entanto, naquele momento, estavam sendo considerados insuficientes para cumprir a demanda, haja vista os custos operacionais de manter essas Pessoas Jurídicas. Ora, resta suficiente claro quem são as pessoas que recebiam

valores superfaturados, de onde havia retorno de propina, segundo conclusões da Polícia Federal. Feitas tais considerações, pode-se afirmar com a mais absoluta certeza que não houve qualquer superfaturamento na contratação das empresas de serviços especializados.

III.7 DA FALSIDADE IDEOLÓGICA

O Ministério Público Federal descreve conduta de falsidade ideológica que teria sido cometida por Gilson Araújo de Araújo, e resolver, de forma leviana e irresponsável, vincular todo o núcleo familiar Fernandes. Gilson Araújo de Araújo foi contratado através de proposta de aceite, dispensando o instrumento contratual formal que seria celebrado, se necessário, posteriormente, para aí sim produzir os requisitos do esforço técnico necessário ao funcionamento das atividades inerentes à inspeção veicular, rotinas e procedimentos vistos como necessários ao atendimento para um DETRAN, conforme o que determina o Código de Trânsito Brasileiro. Também se inseriva em conformidade com o Projeto Novo Detran, implantado em 1997, pelo então Secretário José Eichemberg, sendo a premissa de tal intento, quem ensina (CFCs), não examina (Fundações; quem

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examina, não imprime (ABN Bank Note), quem imprime não entrega (ECT Correios). Tal trabalho seria utilizado para a melhoria na prestação de serviços pela Pensant, ao possuir conhecimentos técnicos especializados de profissional com qualificação avançada e experiência internacional com mestrado na França. Os requisitos foram aperfeiçoados durante seis meses, para então a Pensant dar o próximo passo contratando a empresa DBServer para programa o software a partir do desenho do esforço descrito e aprimorado pelo quadro técnico interno e externo da empresa Pensant. O software integrado que deveria estar pronto, não fosse a interrupção provocada pela ação penal, trata como possibilidade de mercado, a impossibilidade de fraudes envolvendo processos e procedimentos inerentes ao ciclo de obtenção da Carteira Nacional de Habilitação. O software trabalhado com a DBServer esta descrito no item 5 dos documentos protocolados em dezembro de 2011, na Vara Criminal onde esta Ação Penal esta em andamento. Com descrição técnica do engenheiro Gilson Araújo de Araújo, o acusado foi remunerado pelo serviço prestado, possibilitando a Pensant executar as etapas seguintes da solução (desenvolvimento), instalação, implantação e manutenção. Note, Excelência, que como não era uma contratação de trato contínuo, mas a remuneração por um serviço específíco, de modo que não havia necessidade de formalização, visto que os produtos constavam de relatórios produzidos antes do pagamento à empresa AC GESTÃO DE TRÂNSITO LTDA, regularmente constituída. Admitir o que alegam os acusadores de que “o objetivo da constituição da referida empresa, urdida em conluio entre esses corréus, era viabilizar os repasses de recursos (propina) feitos pela Pensant Consultores a GILSON como pagamento pelos serviços ilícitos que este realizava para os integrantes da família Fernandes (...)”, seria o mesmo que dizer que a constituição dessa empresa era destinada a repassar valores a título de “propina”, a partir de nota fiscal regularmente emitida e declarada à Receita Federal (fl. 54.238).

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A acusação tenta desmerecer o trabalho, dizendo que não é percebido. Compreende-se o limitado alcance dos acusadores públicos, mas a isso é dado o nome de trabalho intelectual, e ele vale muito mais do que um apanhado de documentos. Compreende-se, porque neste processo o trabalho físico da acusação foi sempre muito mais visível do que o intelectual. A transpiração sempre foi muito mais presente do que a inspiração. Prova disso foi a entrevista coletiva para a entrega dos memoriais, em que o primeiro ponto abordado foi a quantidade de folhas que tinha o documento, como se isso foa unidade de medida de qualidade de um trabalho. Einstein transforou a percepção de mundo com uma fórmula que tinha três letras e um número. Razoável, pois, que não compreenda um trabalho intelectual, sem que ele seja palpável. O fato é que os sócios da Pensant sequer sabiam quem eram os sócios da AC GESTÃO DE TRÂNSITO LTDA. Apenas efetuaram uma transação com uma pessoa jurídica prestadora de serviço, mediante a emissão de nota fiscal. Mais uma vez a acusação se perturba entre seus argumentos, todos eles vazios de qualquer base probatória, e cria uma versão falaciosa, nada crível, de que alguém emitiria uma nota fiscal para o recolhimento de propina. O ridículo da situação reclama urgente absolvição, diante da mais absoluta ausência de provas que dêem suporte à pretensão ministerial

III.8 DA AGRAVANTE DO ARTIGO 62, INCISO I DO CÓDIGO PENAL

Não há qualquer elemento que autorize concluir serem José Antônio Fernandes e Ferdinando Francisco Fernandes autores intelectuais, ao ponto de atrairem para si a incidência da circunstância agravante prevista no artigo 62, inciso I do Código Penal.

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Rompe com a lógica a narrativa de que o autor intelectual não integre nenhum dos polos da relação contratual em exame. Ou seja, os acusados não integravam a Diretoria do DETRAN, nem da FATEC. Também não integravam a Diretoria da FUNDAE, e nem a Universidade Federal de Santa Maria. Como os sócios de uma empresa de supervisão e gerência estratégica do projeto, foram convidados a participar após a definição da contratação da FATEC pelo DETRAN, como já dito. O Ministério Público Federal não consegue apontar um único elemento que indiquem serem os acusados José Antônio Fernandes e Ferdinando Francisco Fernandes os autores intelectuais dos fatos aqui apurados. Isso ainda se verifica no depoimento de Ana Paula Alves Soares, que o Ministério Público Federal transcreveu nas fls. 54.187/54.188, na tentativa de validar o depoimento não judicializado de Dario Trevisan de Almeida. Mais uma vez labora muito mal o Ministério Público Federal, porque tenta a emprestar valor ao depoimento colhido na fase policial de um acusado que, como os outros que estvam na mesma condição, foram submetido a uma verdadeira tortura psicológica, fortemente violadora da dignidade da pessoa humana, tudo devidamente registrado nas audiências de interrogatório, e absolutamente nada feito até a presente data. Segundo, porque o depoimento da testemunha Ana Paula apenas ratifica tudo o que foi dito sobre a ausência de controle, direção, organização da execução. Prova concreta de que à Pensant competia somente o controle externo conforme metodologia que consta do termo de referência. Ele evidencia simplesmente que Dario estava se sentindo ameaçado pela (altíssima) qualidade na prestação dos serviços da Pensant, ao mesmo tempo em que comprova de quem efetivamente era o poder de mando do próprio Dario Trevisan de Almeida. Tanto isso é verdade que o próprio Ministério Público Federal se contradiz quando aponta a organização e direção de todo o suposto esquema.

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Se aqui imputa claramente a organização e a direção a José Antônio Fernandes e a Ferdinando Francisco Fernandes, o mesmo Ministério Público Federal, no Inq 2842, que tramitou perante o Supremo Tribunal Federal, para investigar o Deputado Federal José Otávio Germano imputou a ele o controle total dos fatos, nos seguintes termos:

Excelência, isso são trechos da denúncia do Procurador-Geral da República contra o Deputado Federal José Otávio Germano, sobre os fatos apurados neste processo. No primeiro deles, diz que José Otávio determinou a contratação da FATEC ao seu subordinado. No segundo, diz que a contratação do escritório Carlos Rosa Advogados Associados foi imposição de José Otávio. No terceiro, por fim, o Ministério Público Federal diz que para manter o domínio da ação do grupo, controlando as decisões dos demais agentes, José Otávio impôs a contratação do escritório Carlos Rosa Advogados Associados.

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Embora esteja mais do que demonstrado que José Antônio Fernandes e Ferdinando Francisco Fernandes sequer cometeram crimes, há aqui uma questão maior a se debruçar especial atenção. A partir do momento em que o Ministério Público Federal age em duas diferentes frentes, apresentando teses evidentemente conflitantes77, pode-se dizer que a fragilidade da versão ministerial é questão prejudicial ao acolhimento da pretensão acusatória. A tese acusatória, como se sabe, deve ser única, escorreita, diferentemente do que ocorre com a defesa, a quem é dado apresentar várias teses subsidiárias. O Ministério Público Federal segue um caminho hesitante, titubeante, nem ele sabe ao certo qual tese é correta. Fosse efetivo fiscal da lei, tivesse agido com a dignidade de um órgão com todas as suas responsabilidades, teria pedido a absolvição dos acusados. Entretanto, agiu na contramão de sua história de lutas e construção democrática, para pedir duas condenações por fundamentos distintos pelo mesmo fato. Está-se diante, aqui, com a mais absoluta certeza, de hipótese de dúvida razoável a autorizar o afastamento da circunstância agravante em questão. Sabe-se, pois, que no regramento processual penal, o juízo condenatório (e, via de consequência, o de acolhimento de circunstância agravante, por exemplo) somente pode ser prolatado diante de uma certeza. Qualquer dúvida, ou mera probabilidade, autoriza o decreto absolutório (ou o afastamento de qualquer causa que agrave a situação do réu), como é o caso dos autos.

III.9 DO ACUSADO FERDINANDO FRANCISCO FERNANDES

                                                                                                               77 Exemplo disso é o que há na imputação de corrupção dos Diretores do DETRAN ao núcleo familiar Fernandes, circunstância que sequer é alegada no Inq 2842, atribuindo-se a decisão de contratar a FATEC como ato exclusivo do Deputado Federal José Otávio Germano.

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O Ministério Público Federal, em seus memoriais, se apegam a uma série de áudios obtidos por interceptação telefônica. Convém relembrar que em seu interrogatório, o acusado Ferdinando Francisco Fernandes colocou-se inteiramente à disposição do Ministério Público Federal para explicar qualquer trecho de conversa interceptada, ou qualquer dúvida ainda exitente dos autos, e o órgão acusador, de forma constrangedora, para alguém que, supostamente, busca a verdade, NADA PERGUNTOU. Absolutamente compreensível que não perguntasse nada, porque naquela altura, o castelo de cartas que construíra quando da deflagração da fase ostensiva da Operação Rodin já havia desmoronado. O que não é compreensível é que mesmo tendo claro que a ficção acusatória já não se sustentava, mesmo assim pediu a condenação de todos os réus. Isso é a incoerência de um órgão que sempre que confrontado, invoca o dispositivo constitucional que lhe coloca como defensor da ordem jurídica e do regime democrático. O que fizeram a Polícia Federal e o Ministério Público é o que há de mais próprio de agências subterrâneas, que se alimentam do que há de mais poder e marginal ao regime democrático. É a constatação dolorida do Estado de Polícia a serviço de interesses político-partidários. Malgrado todas as considerações acima lançadas, o acusado explicará um a um no tópico abaixo. A primeira conversa (fl. 54.207) já comprova que a interpretação feita pela acusação é aquela que lhe favorece, pois essa conversa demonstra exatamente o contrário do que defende o Ministério Público Federal. Fica demonstrado que se José Fernandes tivesse o “poder de mando” estabelecido pela acusação, não faria a indagação feita à Ferdinando Fernandes como mostra a própria conversa.

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Quem determinava qualquer tipo de pagamento a título de prestação de serviços era a própria fundação, nesse caso, a FUNDAE e não a Pensant. Se a posição de José Fernandes e sua família tivesse relação com aquela artificialmente imposta pela acusação, ele não estaria consultando Ferdinando, ele próprio faria esses pagamentos. O segundo diálogo (fl. 54.207) faz referência a uma colaboração financeira em prol da canonização do Diácono Pozzobon, onde diversas pessoas físicas e jurídicas estavam colaborando. Nesse caso Ferdinando, como pessoa física, menciona na conversa que já havia efetuado sua colaboração, ao passo que solicita que a FUNDAE efetue a sua colaboração, como pessoa jurídica. Menciona que entrará em contato com Rubem Hoher, pois era ele o coordenador do projeto. A terceira conversa (fl. 54.208) diz respeito ao assunto anterior. O próprio Ministério Público Federal menciona no seu “resumo” que nessa conversa Ferdinando solicita que a FUNDAE efetue o pagamento da sua contribuição como pessoa jurídica. A quarta interceptação (fl. 54.208) refere-se ao pagamento de bolsistas do curso de química que já haviam desenvolvido projetos em escala de bancada, porém Ferdinando menciona que esses recursos ainda não estão disponíveis. Note-se que a acusação não transcreve essa conversa (ou as outras) de forma integral, nem mesmo fiel. Especificamente nesse diálogo, quando menciona que Helvio Debus estaria “prestando contas” a Ferdinando, não especifica que tipo de prestação, apenas traz uma suposição genérica que fica sujeita a qualquer interpretação. Ademais, essa conversa diz respeito a uma pesquisa científica para a produção em escala industrial de sílica a partir da casca de arroz, um projeto totalmente alheio ao Projeto DETRAN-RS.

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Além de não ter nenhuma relação com o projeto DETRAN-RS não faz nenhuma referência a dispensa indevida de licitação. O quinto diálogo (fl. 54.208) trata-se de um contato operacional que diz respeito estritamente ao contrato FUNDAE-PENSANT, de supervisão das atividades. Ferdinando solicita a Helvio que entre em contato com Diogo, pois ele era consultor da Pensant, especificamente para o assunto que estava sendo tratado. Essa conversa revela única e exclusivamente o trabalho efetivo da Pensant, ao mesmo tempo em que demonstra a atuação de trabalho de Ferdinando frente a Pensant. A sexta conversa (fl. 54.209) trata simplesmente da remessa da documentação solicitada pelo Ministério Público Federal. O papel da empresa Pensant era justamente o de assessoramento. Nada mais normal do que a empresa realizar triagem da documentação e remeter à autoridade. A sétima interceptação (fls. 54.209/54.210) comprova que o controle técnico, funcional, era de Mário, então presidente da FUNDAE, não vindo a confundir-se com a atuação da Pensant. Além de se tratar de uma conversa extremamente técnica, tinha relação com outros projetos que não o projeto DETRAN-RS. Quando Ferdinando menciona a existência de “problemas” está se referindo ao componente da filantropia, pois na fase FATEC ela não existia, por isso a existência desses problemas em manter as metas de filantropia. Quanto à expressão “prestamistas”, por diversas vezes mencionada no decorrer da demanda criminal, estava relacionada às empresas que prestavam serviços às fundações.

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É uma expressão que não denota nenhum caráter ilícito, apenas era utilizada para denominar as empresas prestadoras de serviço. Em relação a afirmação de Ferdinando de que “teria um contrato e iria cumpri-lo”, a justificativa para tal afirmação é exatamente o que esclarece a própria frase. Ferdinando referia-se ao fato de que iria cumprir o contrato antes firmado. “FERDINANDO diz que a FATEC estava faturando a título de assessoria jurídica, comenta que isto estava errado, tem que corrigir isto ali (...)”. Nessa passagem, Ferdinando estava repassando uma orientação de supervisão, pois somente poderia realizar a cobrança de pessoa física ou sociedade de advogados (pessoa jurídica), mas que Fundações não poderiam prestar serviços de assessoria jurídica. A FUNDAE alugou a estrutura física onde antes a FATEC executava o projeto DETRAN-RS. Durante os primeiros meses a FATEC estava efetuando a cobrança pelo espaço físico e pelo serviço de assessoria jurídica. Por esse motivo que Ferdinando efetuou essa orientação, mas a acusação, mais uma vez, distorceu os fatos para adequá-los a realidade fantasiosa que criou. Com relação a última frase dessa conversa, “HELVIO fala que está sobrando folha (R$ 2.000,00) daquela secretária que trabalhava ai (dando a entender de alguém que era pago pela FUNDAE e trabalhava na PENSANT)”, cabem alguns esclarecimentos. O Projeto PROJOVEM (FUNDAE) de Porto Alegre utilizava um andar do prédio da Pensant para alocar uma funcionária que executava serviços para esse projeto. A FUNDAE mantinha um contrato com o PROJOVEM o qual não mantinha nenhuma relação com o Projeto DETRAN-RS.

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Na oitava conversa (fl. 54.210) a acusação já estabelece, inicialmente, uma relação de “fidelidade” de Helvio com a Pensant, a qual não passa de mera e superficial suposição. O “ponto único” mencionado na conversa é o chamado “shared point”, um software da Microsoft de gestão e supervisão de projetos e uma das ferramentas mais avançadas de gestão. Esse software era adotado na supervisão do Projeto DETRAN-RS. Cada agente tinha uma senha de acesso e, nesse caso, Helvio estava dando conhecimento dos documentos que trocava com a FATEC. Acontece que o acusado Ferdinando nunca aceitou, por uma questão de respeito a autonomia de Helvio. O fato de Ferdinando ter acesso a esses documentos consistia em algo natural, pois a Pensant realizava esse trabalho de supervisão do contrato, ao passo que tinha que ter conhecimento dessas questões. A nona conversa (fl. 54.211) também é relacionada a execução de um outro projeto que não o Projeto DETRAN-RS, e sim o PROJOVEM. Esse diálogo comprova que a relação da Pensant com a FUNDAE é anterior ao projeto DETRAN-RS, sendo que a fundação já tinha conhecimento do trabalho desempenhado pela Pensant e da qualidade na prestação desses serviços. No mesmo sentido de uma das conversas anteriores, Helvio dá ciência de que recebeu uma solicitação de envio de documentos por parte do Ministério Público Federal. A décima interceptação (fls. 54.211/54.212) trata-se de uma interpretação de terceiros, a qual não tem como um dos interlocutores Ferdinando Francisco Fernandes. Diante disso, a defesa se detêm apenas em explicar alguns pontos que são de seu conhecimento e que envolvem o nome de Ferdinando.

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Ao afirmar, mais uma vez, que cumprirá o contrato firmado, Ferdinando demonstra seu comprometimento com a contratação. Essa conversa, assim como outras antes mencionadas, demonstra de quem realmente era o poder decisório, ou seja, da coordenação das fundações, e não da empresa Pensant ou de qualquer dos seus sócios, como tenta impor o órgão acusador, na contramão de tudo que foi produzido nos autos. Em resumo, esse diálogo trata-se de uma conversa técnica do coordenador do Projeto DETRAN-RS, Rubem Hoher, com Helvio Debus, Secretário-Executivo da FUNDAE. O breve diálogo, nº 11 (fl. 54.213), faz referência a uma consulta feita a Ferdinando, sobre o melhor modelo de gestão de frota, se própria ou particular, através de quilômetros rodados ou terceirização de frota através de locadora, todas eles com custos diferentes. Por se tratar de uma empresa de supervisão nada mais natural que venha responder esse tipo de questionamento. A conversa nº 12 (fl. 54.213) é relacionada a um projeto que a FUNDAE mantinha com a Prefeitura de Porto Alegre, mais especificamente com a Secretaria de Educação de Porto Alegre, chamado Paisagens da Educação. Ferdinando deixa bem claro em sua fala que não iria interferir em nenhuma questão envolvendo o referido projeto, porque a empresa Pensant não mantinha nenhuma relação com esse projeto. A compra de móveis para uma sala da FUNDAE onde seriam atendidos todos os projetos da fundação é o tema do diálogo nº 13 (fl. 54.213/54.214). Esta sala funcionava como se fosse uma central de atendimento de Recursos Humanos, onde as despesas dividiam os valores entre os projeto, para viabilizar a implantação e manutenção desta central. Mais uma vez fica demonstrado que quem efetuava os pagamentos e, portanto, tinha a total coordenação e direção, nesse caso, era a direção da entidade.

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O suposto diálogo nº 14 (fl. 54.214) não pode ser chamado de conversa, e nem mesmo transcrição. Trata-se de uma interpretação feita pela acusação de uma conversa qualquer, que tem relação com outro projeto que não o Projeto DETRAN-RS. Porém, ao contrário do que afirma o Ministério Público Federal nesse “resumo”, nunca existiu nenhuma influência, seja ela de qualquer natureza, tampouco política. O diálogo nº 15 (fls. 54.214/54.215) também diz respeito a outro projeto, qual seja, o PROJOVEM. A conversa comprova que a FUNDAE, através do Secretário-Executivo, eram quem coordenava o projeto e tomava as decisões. Nesse diálogo estão sendo feitas determinações, demonstrando ainda mais quem executava a coordenação. O final desse diálogo mostra que o prazo do projeto estava sendo encerrado, ao passo que comprova que não se tratava de um diálogo estratégico de negociação. A conversa nº 16 (fl. 54.215) trata de assuntos alheios à denúncia e ao Projeto DETRAN-RS, ao mesmo tempo em que comprova que não existia nenhum poder de mando de Ferdinando ou qualquer um dos seus familiares e sócios das empresas Pensant e IGPL. O diálogo nº 17 (fls. 54.215/54.216) diz respeito a uma notificação recebida pela FATEC, pois a fundação estaria confundindo seu papel após ter prestado seus serviços ao DETRAN-RS. A FATEC efetuou a locação do seu espaço físico e tecnológico para a FUNDAE, onde anteriormente executava o Projeto DETRAN/RS. Essa notificação teria causado certo mal estar entre as fundações, por isso, a conversa interceptada gira em torno desse assunto.

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Mais adiante os interlocutores já estão tratando do Projeto Esperança. O conteúdo da conversa diz respeito ao pagamento de uma publicação no jornal A Razão à editora do jornal, Renata Degrandi. Prova disso é o registro público desse pagamento. A conversa nº 18 (fl. 54.216), mais precisamente na frase em que “HÉLVIO diz para eles não tomar nenhuma atitude que a parceria está mantida...” explica-se a partir do fato de que a FATEC manifestou que teria interesse em suspender o contrato com a FUNDAE, pelo recebimento da notificação. Por conta disso, Hélvio orienta que não o faça, e leva ao conhecimento de Ferdinando a situação. A última conversa, de nº 19 (fl. 54.217) trata de uma reunião com a FATEC, à época da prestação de serviços para a FUNDAE, a fim de ajustar alguns pontos de trabalho. Como bem se observa a acusação traz trechos de interceptações telefônicas, as quais não transcreve de maneira integral nem mesmo com fidelidade aquilo que foi dito por seus interlocutores. Em todas as vezes traz “resumos” dos diálogos interceptados, o que de fato não merece nenhuma credibilidade, uma vez que o Ministério Público Federal transcreve as comunicações da maneira que melhor lhe convém. As atividades prestadas por Ferdinando Francisco Fernandes, como sócio da Pensant eram eminentemente técnicos. As transcrições de diálogos interceptados evidenciam a natureza e qualidade do trabalho desempenhado, sem evidenciar, nem de longe, o cometimento de crimes. Aliás, a utilização de uma quantidade bastante significativa de áudios que não dizem respeito ao objeto do presente processo, o que demonstra, mais uma vez, que o Ministério Público Federal não tem o real alcance do que se está tratando no presente processo.

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Seleciona um apanhado aleatório de áudios e atribui a eles a interpretação que melhor satisfaz seus interesses. Tenta explicar tanta coisa a partir da alteração de sentido de algumas conversas, mas não explica o porquê de não ter feito um único questionamento ao acusado, quando de seu interrogatório. Ainda que não seja ilícito, é pelo menos imoral acusar alguém de práticas ilícitas obtidas em conversas interceptas e sequer perguntar ao acusado o que significavam aqueles diálogos.

III.10 DO ACUSADO FERNANDO FERNANDES

Os memoriais ministeriais com relação a Fernando Fernandes são sintomáticos da inexistência de provas nas acusações contra ele dirigidas. Em pouco mais de 25 folhas, não há uma única individualização de sua conduta. Da leitura dos memoriais se permite ter certeza que o Ministério Público Federal pretende, com relação a Fernando Fernandes, condená-lo por figurar no quadro societário da Pensant Consultores Ltda., em evidente responsabilidade penal objetiva. É absolutamente ridícula a associação que o Ministério Público Federal faz a Fernando Fernandes, quando, após reproduzir 5 folhas de um e-mail trocado com Denise Nachtigall Luz, a conclusão é a de que como Denise se refere a vocês, referindo-se à Pensant, então Fernando Fernandes também comete os delitos imputados (?!?). É óbvio que existam comunicações a Fernando dirigindo-se à Pensant, na medida em que era uma empresa regularmente constituída, que desempenhava uma atividade lícita, do mais amplo conhecimento das autoridades. Não há absolutamente nada de irregular nisto, e tampouco é crime ser sócio de empresa. Os documentos utilizados pelo Ministério Público Federal para presumir a ocorrência de crime tratavam-se de informações e apontamentos

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oriundos de uma relação empresarial, a qual contava com uma organização de trabalho, e suas rotinas próprias. “Assim, admitido pelo próprio réu a participação nas atividades da empresa PENSANT (...)”. É dessa maneira vazia que a acusação inicia mais uma explanação na tentativa caracterizar a atuação profissional, e absolutamente lícita, de Fernando Fernandes e seus familiares, frente às empresas Pensant e IGPL, como se ilícita fosse. Fernando Fernandes, como já dito e demonstrado era um dos sócios da empresa Pensant, participando, portanto do desempenho das atividades da empresa. Qualquer acusação de que os integrantes da empresa Pensant teriam se associado para o fim de cometer crimes já restou suficientemente afastado nos tópicos acima. A alegação do Ministério Público Federal nesse sentido não vem acompanhada de uma base probatória eficaz, uma vez que todos as provas apresentadas são só documentos que não apenas elidem qualquer prática delitiva por parte dos acusados, como evidenciam o profissionalismo e o denodo com que desempenhavam suas atividades, tudo dentro da melhor técnica, conforme padrões internacionais de supervisão e gerência estratégica de projetos. A acusação cita que Fernando Fernandes desempenhava, também, uma “posição de mando e de inteiro conhecimento da fraude perpetrada”. Primeiramente foi José Fernandes quem detinha “o comando”; passou por Ferdinando Fernandes, e agora mencionam que Fernando também exercia esse papel. É nítida a absoluta falta de convicção do Ministério Público Federal. Lança acusações a esmo e reza para vê-las demonstrada, o que nem de longe foi o caso dos presentes autos. O único conhecimento de que detinha o acusado sempre foi técnico, profissional e estrutural, no que se refere à empresa Pensant.

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O Ministério Público Federal, dentro de suas evidentes limitações, sugeriu que Fernando não teria conhecimento jurídico para orientar Denise, os e-mails trocados sugeririam algo de ilícito. A supervisão e gerencia estratégica de um processo dessa magnitude passa longe do mero conhecimento jurídico. É compreensível que uma pessoa com formação em Zootecnia, mas com experiência em gestão de projetos, tenha muito a agregar a um advogado que presta o apoio jurídico, como ocorre em qualquer empresa de fornecimento de conhecimentos especializados. Todos ajudam todos. É horizontal o relacionamento e a troca de conhecimentos. Uma troca de e-mail como a apontada pela acusação é prova insuficiente para justificar a condenação do acusado nos termos pretendidos. O intuito da acusação era de que os e-mails servissem como prova “do poder de comando de Fernando no grupo”, porém, o único fato que esses e-mails confirmam diz respeito ao papel desempenhado por Fernando dentro da Pensant em relação aos serviços que eram prestados por ela junto ao contrato FATEC e, posteriormente, FUNDAE. A conversa trazida pela acusação tem início à fl. 54.320, quando Dario Trevisan de Almeida envia e-mail a Denise Nachtigall Luz, relatando que o site do Programa “Educando e Valorizando a Vida”, da Universidade do Estado de Goiás, teria sido totalmente desenvolvido pelo projeto “Trabalhando pela Vida!”, do qual fazia parte, e que esse desenvolvimento incluía entrevistas, fotografias e lay-out. Dario teria enviado este e-mail à Denise a fim de buscar uma orientação jurídica em relação a esta questão. Onde reside qualquer ilicitude nas comunicações, Excelência? Quando Fernando, em seu e-mail, menciona sobre o ajustamento de algumas “tratativas”, refere-se aos Procedimentos Operacionais Padrão, os quais ficavam sob seus cuidados.

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Aliás, essa questão, por certo passou ao largo da acusação, mas o que foi feito nesse e-mail foi justamente ações de supervisão e gerência estratégica de projetos, pelo que foi contratada a Pensant. Atípico seria se a assessoria omitisse esse tipo de acontecimento da empresa Pensant, portanto, mais uma vez, a defesa reitera que nada há de irregular ou ilícito na troca de informações entre assessoria jurídica e a empresa responsável pela supervisão do projeto. Quanto aos valores apresentados na fl. 54.322, cabe esclarecer que João Luiz Vargas e Ferdinando Fernandes eram sócios da IGPL. No momento em que João Luiz Vargas foi indicado conselheiro do Tribunal de Contas do Estado do Rio Grande do Sul, por exigência legal, teve que deixar a sociedade. Fernando Fernandes foi quem assumiu a participação na sociedade, adquirindo sua quota capital no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Trata-se de negociação lícita, sobre a qual nada mais há a acrescentar. Os devaneios acusatórios inserem-se no terreno da especulação. Sobre a interceptação telefônica trazida pelo Ministério Público Federal, nas fls. 54.323/54.323 há uma questão muito séria de má-fé ministerial. Essa mesma transcrição constou da denúncia, na fl. 151, nota de rodapé 157 e foi impugnada pelo acusado em sua resposta à acusação, tendo pedido, inclusive, perícia sobre o conteúdo daquela gravação, para demonstrar não se tratar de diálogo do qual fizesse parte. Quando apreciou as respostas à acusação, a magistrada que conduzia o feito, à época, na ânsia de terminar o feito com a máxima brevidade, indeferiu o pedido de perícia, mas assim decidiu:

A defesa do réu Fernando postula, ainda, a seja efetuada perícia nas interceptações telefônicas, a fim de que reste demonstrado que não era interlocutor da conversa citada na nota de rodapé 157, p. 151 da denúncia.

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Como se pode aferir, o denunciado em referência não nega que tenha tido diálogos interceptados; diz, apenas, que não seria interlocutor de uma dessas conversas, qual seja, a referida na nota de rodapé 157 da denúncia. É sabido que a parte ré, no processo penal, possui direito absoluto à ampla defesa, podendo, portanto, requerer a produção de toda a prova que entender necessária para demonstrar a inocência em relação à imputação que lhe foi atribuída. Entendo, contudo, que a determinação de se realizar uma perícia fonética, na hipótese vertente, eternizaria a prestação jurisdicional, em total contramão ao princípio da efetividade. A solução, ao meu ver, para harmonizar os princípios em conflito - ampla defesa e efetividade - é deixar consignado, desde já, que o trecho de conversa impugnado pelo denunciado não será utilizado como prova na apreciação dos fatos típicos que lhe foram imputados. (...) Assim, indefiro a perícia fonética requerida, deixando consignado, de outro lado, que o diálogo telefônico impugnado será afastado do julgamento, no referente ao denunciado Fernando Fernandes.

Ora, o Ministério Público Federal, além de se valer de acusação com provas frágeis, agora se vale das nulas, na tentativa de ilaquear o juízo, induzindo-o em erro. Trata-se de conduta repulsiva, que deve ser rechaçada com a máxima veemência por esta defesa. Não há nenhuma transcrição de diálogo interceptado que evidencie eventual ilicitude no proceder do acusado. A sentença de absolvição é caminho lógico para o julgamento dos fatos imputados ao acusado Fernando Fernandes.

III.11 DA ACUSADA LENIR BEATRIZ DA LUZ FERNANDES

Lenir Beatriz da Luz Fernandes é graduada em Arquivologia, pela Universidade Federal de Santa Maria. Foi servidora concursada do quadro do Estado do Rio Grande do Sul entre 1984 a 1998. No período de 1992/1994 exerceu a função de Diretora do Arquivo Público do Estado do Rio Grande do Sul, localizado na Rua Riachuelo, na cidade de Porto Alegre. O caminho escolhido pela acusação a fim de embasar a tese de que Lenir supostamente teria feito parte da chamada “organização criminosa”, foi o de

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selecionar movimentações bancárias da empresa IGPL e atribuir um caráter ilícito a elas. Lenir passou a figurar como sócia da referida empresa quando da modificação ocorrida no Código Civil de 2002, o qual vedava e ainda veda sociedade entre cônjuges casados pelo regime da comunhão universal de bens, situação que se enquadra na relação matrimonial entre Lenir e José Fernandes, impedindo a sociedade. Como sócia de direito da empresa, Lenir era responsável técnica de um dos objetos de trabalho da empresa, o setor de arquivística. Ocorre que José Fernandes detinha conhecimento necessário e essencial à administração da IGPL, por isso sempre que preciso era ele quem auxiliava na administração da empresa. O nível de envolvimento de Lenir junto a IGPL se resumia a atuação na área de sua formação, como arquivista e não exclusivamente na administração da empresa propriamente dita, até porque sempre dividiu a sociedade com outros profissionais no decorrer dos anos de atuação da IGPL. A empresa foi constituída no ano de 2002, e seus sócios eram Ferdinando Francisco Fernandes e Eduardo Barin Facin. Com o passar dos anos, a IGPL foi evoluindo, se modernizando e em uma 2º etapa ampliou sua área de atuação, época em que Gildo de Lima se tornou sócio da empresa. A empresa avançou sua estrutura e então mantinha sede na Rua Lucas de Oliveira, nº 15, salas 601, 602 e 604, onde estava em processo de instalação com equipamentos para atuar e implementar o sistema EAD (Ensino à Distância). O capital inicial da empresa era de 100 mil reais, sendo que no período em que ocorreu a deflagração da Operação Rodin, seu capital tinha passado a ser de 300 mil, registrados na Junta Comercial. Agregava um corpo de técnicos altamente especializados em arquivística, Tecnologia da Informação e Gestão Eletrônica de Documentos.

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A cidade de Santa Maria (Universidade Federal de Santa Maria) foi a primeira a implantar o curso de Arquivologia no Brasil onde recebeu orientação dos técnicos do arquivo público da Torre do Tombo, em Portugal, que guarda a carta de Pedro Vaz de Caminha. Diante disso, a arquivística passou a ocupar espaço significativo na Gestão Pública Administrativa Brasileira com a implantação desse curso em Santa Maria o qual introduziu uma cultura de preservação de documentos que antes não existia. Muito do que existe no Brasil nesse sentido surgiu da criação do curso de Arquivologia na cidade de Santa Maria e a atuação da IGPL se dava nesse sentido, Arquivística, de Gestão Eletrônica de Documentos e Tecnologia da Informação. A contratação da empresa tinha por objetivo pôr em prática projeto para recuperar informaçòes documentadas de extrema importância. O contrato entre FATEC e DETRAN/RS (por conta da execução dos Exames de Direção) gerava cerca de 60 mil unidades documentais por mês, recebidas, classificadas e arquivadas por um período de 5 (cinco) anos, para servirem de suporte a eventuais litígios que viessem a ocorrer nesse período, referente a examinadores ou exames. Era mantida uma sala de 200 metros quadrados nas dependências da FATEC, onde esses documentos eram armazenados com toda a agilidade e tecnologia para sua preservação, pois poderiam ser requisitados, como determina a legislação. A legislação regulamenta a questão da classificação, eliminação e guarda de documentos. Temperatura média, umidade, controle de pragas eram alguns dos controles que deveria ser feitos dentro das atribuições desempenhadas pela IGPL. Quando transferida a responsabilidade pelo DETRAN-RS à Fundação, a autarquia tinha um arquivo com 80 milhões de documentos. A chefia específica descreveu em relatório a necessidade de organização desse estoque, amontoado no próprio DETRAN. Daí a importância do serviço que era prestado para a IGPL à FUNDAE.

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No decorrer da história da IGPL, Gildo Gomes de Lima passou a ser um dos sócios da empresa e especialista em soluções de Tecnologia da Informação e Analista de Sistemas. Lenir Beatriz da Luz Fernandes era responsável técnica, registro MTb nº 599/RS. Devido às inovações, a empresa passou a ter a necessidade da contratação de um profissional de engenharia, momento em que Eduardo Wegner Vargas veio a fazer parte da sociedade. A acusada era titular e responsável técnica, e qualquer inconsistência nos arquivos, deterioração, má conservação, arquivamento inconsistente (fora do projeto) eram de responsabilidade de Lenir. Quando da recuperação das informações é necessário que se respeite um método que só quem detém conhecimento do assunto pode realizar. A título de conhecimento, legalmente é estabelecido que o percentual de 80% dos documentos produzidos devem ser eliminados depois de 5 anos (período fiscal), mas os documentos que dizem respeito a relação de trabalho, comprovantes, até 95 anos porque ainda tem uma previsão de aposentadoria e os descendentes que podem vir a requerer algo posteriormente e juridicamente esses documentos são imprescindíveis. Acontece que durante esses períodos era de extrema importância a realização do serviço prestado pela empresa IGPL. O trabalho de recuperação de documentos desperta discussão sobre a falta de segurança que existe da preservação, em meio eletrônico, da informação, ao passo que dá uma importância maior a esse serviço. Com o papel há a possibilidade de preservação, mas com relação ao meio eletrônico essa garantia já não existe. A recuperação da história dos fatos é algo muito importante. A arquivística é o instrumento indispensável para tanto. Como reconstruir, caso necessário, os papeis de um trabalho de monta como o Projeto DETRAN/RS sem a conservação dos documentos? Exemplo disso são as “memórias de reunião”, documentos que a acusação trata como ilícitos.

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Estas são questões que o Ministério Público Federal abordou de forma irresponsável, no intuito de desqualificar o trabalho da IGPL. A acusação tem que reconstruir a história dos acusados com provas, mas provas verdadeiras, pois vem imputando infâmias e inverdades. Na área de supervisão e gerência estratégica de projetos, a gestão de documentos é essencial para o trabalho, conforme literatura especializada. O acusado José Fernandes, especialista em Modernização da Gestão Pública, com experiência comprovada no Programa Nacional de Modernização de Administração Pública BID (Banco Interamericano de Desenvolvimento) Ministério da Fazenda, é um dos mais qualificados profissionais do Rio Grande do Sul. No que se refere ao planejamento tributário da empresa IGPL, dava-se lucro presumido, isto é, estima-se um lucro de até 32%, sobre as receitas, com pagamento de imposto de renda com alíquota de 15%. Quando o percentual de 32% exceder os R$ 20.000,00 (vinte um mil reais) mensais ou R$ 60.000,00 (sessenta mil reais) no trimestre, o valor que exceder a alíquota passa a ser em 25%. Esse é o regime tributário adotado pela empresa. No caso da Pensant e IGPL, a remuneração dos sócios pelos serviços prestados é realizada através da distribuição de lucros. Esta é uma questão incontroversa para a Receita Federal, tanto que concluiu sua fiscalização declarando inexistir irregularidades. As transferências trazidas pela acusação como se caracterizassem algo ilícito ou regular não podem ser analisadas separadamente, pois fazem parte de um contexto englobando regime tributário que representava, em média, com encargos de 20% sobre a receita realizada, assim distribuídos:

- IMPOSTO DE RENDA SOBRE LUCRO PRESUMIDO 8,00%

- COFINS 3,00% - CONSTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO 2,88%

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- PIS/PASEP 0,65% - ISSQN/PREFEITURA MUNICIPAL DE PORTO ALEGRE5,00%

- IOF 0,38% - IPTU, CONSELHOS PROFISSIONAIS, TAXAS 0,09%

TOTAL 20,00% O regime do lucro real exige contabilidade rigorosa, enquanto o lucro presumido não.o Ilicitude somente somente haveria com desvio de finalidade, o que não é o caso. A média de remuneração dos sócios dessas empresas são remunerações abaixo do verificado no mercado de trabalho. Com a demonstração dessas movimentações (trazidas pela acusação), assim como no decorrer de toda a instrução, o Ministério Público Federal usou desses documentos na tentativa de justificar suas alegações absurdas. Isso é importante porque as movimentações bancárias trazidas pela acusação em sede de memoriais nada tem de irregulares, não demonstram qualquer ilicitude, uma vez que as receitas recebidas pela IGPL não se resumiam aos pagamentos efetuados por parte das Fundações, no decorrer do contrato. Ao contrário disso, as receitas da IGPL relacionadas aos pagamentos efetuados pelas Fundações eram mínimas. Houvesse sido feita perícia, toda a dúvida seria dirimida em favor da IGPL e da acusada. O quadro comparativo apresentado pela acusação referente às receitas da Pensant (fl. 54.203), não foi apresentado pela acusação em relação a IGPL, pois não seria conveniente ao Ministério Público Federal, já que se demonstraria a receita mínima da IGPL recebida das Fundações, pois a IGPL recebia valores de outros clientes, referentes a outros projetos e contratos que executava. A acusação tenta dar uma natureza única aos depósitos feitos em conta bancária de Lenir Beatriz da Luz Fernandes como se fossem

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exclusivamente advindos de pagamentos feitos pelas fundações FATEC/FUNDAE. A qualidade dos serviços prestados pela IGPL sempre foi altíssima, diante disso a empresa sempre manteve outros contratos tão importantes quanto aqueles que manteve com as Fundações, o que demonstra que a IGPL não tinha sua receita restrita ao recebimento de valores exclusivamente das Fundações. Vale sempre lembrar que, diferente do que sugere a acusação, os serviços prestados tanto pela Pensant quanto pela IGPL eram contratados pelas Fundações, para que atuassem dentro do que dispunha o contrato firmado, sem restar estabelecida nenhuma relação direta com o DETRAN/RS. Não havia nem dinheiro público, nem recursos físicos públicos, nem recursos humanos públicos. Beira ao absurdo o argumento escolhido pela acusação para, de alguma forma, tentar inserir Lenir Beatriz da Luz Fernandes em um esquema que jamais contou com sua atuação ou de qualquer outro membro de sua família. O simples fato de Lenir Beatriz da Luz Fernandes ocupar o posto de sócia majoritária da empresa IGPL, não dá à acusação o direito de simplesmente envolver o nome de uma pessoa idônea em tamanha demanda criminal. A situação da acusada Lenir Beatriz é idêntica à da sua filha, Francene, que foi excluída do processo após as respostas à acusação, com a única diferença que uma detinha maior participação societária que outra. Quando do recebimento da denúncia, em maio de 2008, a magistrada à época à frente do feito, assim se posicionou com relação às imputações da acusada Lenir Beatriz da Luz Fernandes:

f) Lenir Beatriz da Luz Fernandes Esposa de José Antônio Fernandes. Sócia da empresa IGPL - Inteligência em Gestão Pública Local Ltda., recebendo, por seu intermédio, valores (v.g. Planilha de Pagamento ref. mês setembro 2007, apreendida na empresa Pensant, em que consta pagamento feito pela empresa IGPL em seu favor - POA 01, Pensant, Anexo 17, item 25). Também figura, comprovadamente, como sócia da empresa Casa Editorial Ltda., que também recebeu valores oriundos do contrato Detran. Há indícios, até mesmo por conta de sua relação com José Antônio Fernandes, aliada à condição de sócia de empresa que recebia valores do esquema, de que

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fosse conhecedora e beneficiária do esquema, o que torna viável o manejo da ação penal78.

Ocorre que Lenir Beatriz da Luz Fernandes era sócia da IGPL - Inteligência em Gestão Pública Local Ltda., assim como sua filha, Francene Fabrícia Fernandes Pedrozo que, na mesma decisão reconheceu, em tese, até mesmo maior participação à Francene do que à Lenir:

e) Francene Fabrícia Fernandes Psicóloga, filha de José Antônio Fernandes. Sócia da empresa IGPL - Inteligência em Gestão Pública Local Ltda., Elementos indicam, ainda, que prestava serviços à Pensant, sendo por ela também remunerada, v.g. Planilha de Pagamento ref. mês setembro 2007, apreendida na empresa Pensant, em que consta pagamento feito pela empresa em seu favor, na ordem de R$ 6.000,00 (POA 01, Pensant, Anexo 17, item 25), bem como planilha de despesas com pessoal, da empresa Pensant, no período de junho de 2007 a abril de 2008, em que lhe consta destinação de pro-labore de idêntico valor (POA 01, Pensant, Anexo 17, item 08). Segundo resolução n. 002/2005 da Pensant, do "sócio-administrador José Antônio Fernandes", Francene teria participação direta no âmbito do Projeto Detran, como responsável pelos "recursos humanos" (ao lado dele próprio, como coordenador geral, e de seus irmãos Fernando Fernandes, como coordenador adjunto, e Ferdinando Francisco Fernandes, na assessoria jurídica) (cf. POA 01, Pensant, Anexo 17, item 05). Há indícios, até mesmo por conta de sua condição de parente dos principais envolvidos, de que fosse conhecedora e beneficiária do esquema, suficientes a viabilidade de que se admita a ação penal79.

Ocorre que a decisão que apreciou as respostas à acusação assim rejeitou a denúncia com relação a Francene Fabrícia Fernandes Pedrozo:

A defesa de Francene Fabrícia aduz que falta justa causa ao exercício da ação penal, porquanto a peça acusatória não possui mínimo respaldo probatório. Francene Fabrícia foi denunciada pelos delitos de formação de quadrilha (art. 288, caput, do Código Penal), locupletamento em dispensa de licitação (art. 89, parágrafo único, Lei 8.666/93, por três vezes, na forma do art. 69, do Código Penal) e peculato-desvio (art. 312, caput, do Código Penal c/c 29 e 30, por cinqüenta e três vezes, na forma do art. 69 do Código Penal). Em virtude da participação direta da ré no Projeto Detran (responsável pelos recursos humanos) e de pagamentos efetuados em seu favor pela Pensant, considerei, por ocasião do recebimento da denúncia, que havia indícios da ciência e participação efetiva da denunciada nas ilicitudes perpetradas. Oportunizado o oferecimento de "reposta à acusação" (art. 396, do CPP), a denunciada manifestou-se nos autos, trazendo argumentos defensivos. Justamente a partir desses novos argumentos, entendo que a decisão que recebeu a denúncia deve ser reconsiderada no que se refere à Francene Fabrícia.

                                                                                                               78 Fl. 26 da decisão que recebeu a denúncia, em 26 de maio de 2008. 79 Fl. 26 da decisão que recebeu a denúncia, em 26 de maio de 2008.

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É que, reexaminando os elementos até então carreados aos autos, constatei que inexiste substrato fático-probatório mínimo e suficiente para o prosseguimento da ação penal em relação aos delitos que lhe foram imputados, devendo ser acatada a tese de justa causa para o exercício da ação penal. Em verdade, os únicos indícios de que Francene teria concorrido para a consecução de tais delitos são as funções que ocupava no Projeto Detran e os pagamentos recebidos pela Pensant. Não há, na investigação que embasou a denúncia, qualquer outro elemento (seja decorrente das interceptações telemáticas e telefônicas, ou de documentos apreendidos e depoimentos prestados) que corrobore, de forma mais densa, a tese de que Francene seria integrante de quadrilha ou bando, tendo concorrido no desvio de recursos públicos e na dispensa indevida de licitação, beneficiando-se posteriormente deste ato. Melhor explicando, sabe-se apenas que Francene era responsável pelos recursos humanos no Projeto Detran, recebendo pagamentos para tanto, inexistindo, contudo, elementos concretos que a demonstrar que, a partir de suas ocupações funcionais, tenha concorrido para a prática dos tipos penais esculpidos no art. 89, parágrafo único, Lei no 8.666/93, art. 312, caput, CP e art. 288, CP. Nesse aspecto, pondero que cabe ao Judiciário, na sua atribuição de controle do poder persecutório do Estado, evitar a instauração/prosseguimento de injusta situação de coação processual contra qualquer cidadão. Por conta disso, não é possível deduzir, unicamente a partir das funções ocupacionais de Francene, que a mesma concorria na prática dos crimes perpetrados em seu meio de trabalho. Dessa forma, cotejando a peça acusatória e as provas colhidas durante a investigação, bem como os argumentos invocados pela defesa, concluo que inexistem elementos aptos a amparar a acusação. Por conta disso, revejo a decisão anteriormente proferida, para entender que não há justa causa para o prosseguimento da ação penal em relação à denunciada Francene Fabricia Fernandes Pedrozo80.

Entretanto, diferentemente do que fez com a filha, a decisão de dezembro de 2008 rejeitou as alegações de ausência de justa causa e manteve Lenir Beatriz da Luz Fernandes como ré do processo, sob o seguinte argumento:

A defesa técnica de Lenir Beatriz aduz que falta justa causa ao exercício da ação penal, porquanto a peça acusatória não possui mínimo respaldo probatório. Diversamente do alegado pela denunciada, entendo que é possível extrair, a partir da análise perfunctória dos elementos até então coligidos aos autos, indícios da prática, pela ré Lenir, das condutas típicas que lhe foram imputadas. Com efeito, o próprio contrato social das empresas Casa Editorial e IGPL dá conta de demonstrar que Lenir possuía poderes de gestão dessas pessoas jurídicas. Nesse mister, note-se que Lenir detinha 50% do capital social da Casa Editorial (os outros 50% eram divididos entre 5 sócios - p. virtuais 661/672, caixa 17, v. 1) e 75% do capital social da empresa IGPL (p. virtuais 244/245, caixa 17, v. 6). Em ambas as pessoas jurídicas, a denunciada exercia a função de administradora. Vale lembrar, nessa toada, que a IGPL foi subcontratada pelas fundações vinculadas à UFSM para a prestação dos serviços objeto do contrato DETRAN. A Casa Editorial, por seu turno, também teve participação no

                                                                                                               80 Fls. 147 a 149 da decisão que se manifestou sobre as respostas à acusação, de 10 de dezembro de 2008.

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esquema. A posição da denunciada perante a Casa Editorial e a IGPL confere, de per si (por conta dos poderes de gestão inerentes), indícios de que, ao operacionalizar a subcontratação das referidas empresas, recebendo, em contraprestação, valores superfaturados (ao menos em tese), estaria participando do esquema de que trata a presente ação penal, sendo dele conhecedora. Impende salientar, outrossim, que Lenir, na condição de sócia-administradora, supostamente possuía o dever de saber o que se passava nas empresas, o que impede, prima facie, o reconhecimento de ausência do elemento subjetivo das figuras típicas pelas quais foi denunciada. Dessa forma, rejeito a alegação de que inexistem elementos mínimos a amparar a denúncia contra Lenir Beatriz da Luz Fernandes.

Note, Excelência, que o que fez a magistrada à época não excluir a acusada Lenir Beatriz da Luz Fernandes, tal como fez com Francene Fabrícia Fernandes Pedroso foi o fato de ser sócia da IPGL e supostamente da Casa Editorial, além de ser esposa de José Antônio Fernandes. Primeiro ponto é que a acusada JAMAIS foi sócia da Casa Editorial. Isso já foi demonstrado com a juntada aos autos de todos os contratos sociais registrados na Junta Comercial, e com o depoimento de testemunhas, como a de João Luiz Roth, professor da Universidade, nas fls. 22.664/22.668:

Ora, lá naquela época, o que a magistrada fez foi antecipar uma responsabilidade penal objetiva, vinculando uma pessoa a um fato delitivo tão-somente em razão da posição que ocupa frente a uma empresa, por exemplo.

Sobre essa tentativa de se criminalizar alguém tão somente pelo posto ocupado à frente de uma empresa, recorre-se à lição de Enrique Bacigalupo:

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Um direito em que é preciso responder pelo que se é, e não somente pelo que se fez, não é um direito penal da culpabilidade81.

Anda no mesmo caminho o entendimento de Ronaldo Augusto Bretas Marzagão:

Se há compromisso da lei com a culpabilidade, não se admite responsabilidade objetiva, decorrente da imputação genérica, que não permite ao acusado conhecer se houve e qual a medida da sua participação no fato para poder se defender. Desconhecendo o teor preciso da acusação, o defensor não terá como orientar o interrogatório, a defesa prévia e o requerimento de provas, bem assim não terá como avaliar eventual colidência de defesas entre a do seu constituinte e a do co-réu. O acusado será obrigado a fazer prova negativa de que não praticou o crime, assumindo o ônus da prova que é do Ministério Público, tendo em vista o princípio constitucional da presunção de inocência. [...] A denúncia genérica, nos crimes de sonegação fiscal, impossibilita a ampla defesa e, por isso, não pode ser admitida82.

Do Superior Tribunal de Justiça é de ser sublinhado o entendimento do Ministro Assis Toledo, do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do RHC nº. 4.214/DF:

Ser acionista ou membro do conselho consultivo da empresa não é crime. Logo, a invocação dessa condição, sem a descrição de condutas específicas que vinculem cada diretor ao evento criminoso, não basta para viabilizar a denúncia83.

A acurada percepção, tanto de Bacigalupo como de Assis Toledo, é complementada com a adequada conclusão de Bettiol: "A responsabilidade penal é apenas responsabilidade pela ação, pelo fato próprio, nunca pelo fato alheio84". Facilmente identificável que não foi esse o entendimento exarado pelo juízo, que declaradamente vinculou a acusada Lenir Beatriz da Luz Fernandes aos fatos tão somente pelo papel que ocupava à frente de tais empresas. A sentença de improcedência do pedido deduzido na denúncia com relação à acusada Lenir Beatriz da Luz Fernandes é corolário lógico da leitura                                                                                                                81 BACIGALUPO, Enrique. A personalidade e a culpabilidade na medida da pena. Rio de Janeiro : RDPen, 1974, p. 41. 82 MARZAGÃO, Ronaldo Augusto Bretas. Denúncias Genéricas em Crime de Sonegação Fiscal. In: Justiça e Democracia. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. 1996. Vol. 1. p. 207-211. 83 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. RHC 4214/DF, Rel. Ministro ASSIS TOLEDO, QUINTA TURMA, julgado em 22/02/1995. <http://www.stj.jus.br/webstj/processo/Justica/detalhe.asp?numreg=199400405464&pv=010000000000&tp=51>. 84 BETTIOL, Giuseppe. Direito Penal. Vol. 1. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. 1966. p. 278.

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da denúncia e do cotejo com os elementos produzidos na fase judicial do presente processo. Primeiro, porque como dito acima, sequer houve crime. Toda a execução, gerenciamento e supervisão do contrato se deu absolutamente dentro da legalidade. E, segundo, porque ao longo do processo não se fez uma única prova de que a acusada tivesse adotado qualquer conduta para concorrer às práticas que lhes foram imputadas. IV. DOS REQUERIMENTOS FINAIS Diante de todo o acima exposto, requerem sejam recebidos os presentes memoriais, acolhendo-se primeiramente as questões preliminares, para reconhecer as nulidades lá apontadas, bem como declarar nulo o feito desde sua primeira ocorrência, facultado, nas hipóteses dos tópicos II.6 e II.7, serem baixados os autos em diligência, reabrindo-se a instrução para permitir a produção das provas lá requeridas. Com relação ao mérito, conforme suficientemente demonstrado nas razão acima, convencidos de sua mais absoluta inocência, requerem a improcedência dos pedidos condenatórios deduzidos na inicial incoativa, com as limitações impostas pelos memoriais, acolhendo-se os pedidos de absolvição lá deduzidos, e absolvendo-se os réus dos demais, diante da mais absoluta inexistência de prova de que os fatos lá descritos constituíam ilícitos penais, ou da concorrência dos réus para sua realização. Por fim, requerem a juntada dos documentos anexos, alguns deles inéditos nos autos.

Termos em que, D. e A.,

E. Deferimento.

Santa Maria, 2 de dezembro de 2013.

BRUNO SELIGMAN DE MENEZES ADRIANO FARIAS PUERARI OAB/RS 63.543 OAB/RS 88.802