modelo monetário civil (1.5)
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Modelo monetário matematicamente viável de política monetária humanistaTRANSCRIPT
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Mode lo Monet rio
Civil
Proposta matematicamente vivel
de poltica monetria humanista
de Joo Alves Marrucho
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Agradeo as contribuies na reviso e debate deste livro de:
Maria do Cu Martins (professora de enfermagem)Jos Albino Marrucho (enfermeiro)Jos Marrucho (msico)Cristiana Bastos (antiquria e mdica)Antnio Manuel (estudante de economia)Joo Santos (economista)Dinis Santos (realizador)Virgnia Pinho (designer)Helena Menino (artista e produtora)Lusa Martelo (designer)Pedro Borrata (farmacutico)Pedro Baltazar (matemtico)Rodrigo Neto (artista)Joana Miranda (economista)Assembleia Popular do Porto
Agradeo tambm de antemo a todos os que queiram questionar e criticar este livro. Peo que, sempre que o faam, me enviem um exemplar ou um link com os contedos que resultarem para o e-mail: [email protected] com a palavra Contacto (filtro).
proibido fazer uso deste livro, adulterando contedos, lucrar com a venda de exemplares, ou cobrar direitos de autor em meu nome ou em nome de qualquer associao de proteco dos direitos de autor que alegue ser minha representante, sem o meu consentimento expresso por escrito.
Este documento no foi alvo de reviso profissional, portanto provvel que contenha alguns erros gramaticais e ortogrficos.
Joo Marco Martins Alves Marrucho, Maro de 2014
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Mode lo Monet rio Civil
Modelo matematicamente vivel
de poltica monetria humanista
Joo Alves Marrucho
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4LA LMPARA MARINA
PORTUGAL,
vuelve al mar, a tus navos,
Portugal, vuelve al hombre, al marinero,
vuelve a la tierra tuya, a tu fragancia,
a tu razn libre en el viento,
de nuevo
a la luz matutina
del clavel y la espuma.
Mustranos tu tesoro,
tus hombres, tus mujeres.
No escondas ms tu rostro
de embarcacin valiente
puesta en las avanzadas del Ocano.
Portugal, navegante,
descubridor de islas,
inventor de pimientas,
descubre el nuevo hombre,
as islas asombradas,
descubre el archipilago en el tiempo.
La sbita
aparicin
del pan
sobre la mesa,
la aurora,
t, descbrela,
descubridor de auroras.
Cmo es esto?
Cmo puedes negarte
al cielo de la luz t, que mostraste
caminos a los ciegos?
T, dulce y frreo y viejo,
angosto y ancho padre
del horizonte, cmo
puedes cerrar la puerta
a los nuevos racimos
y al viento con estrellas del Oriente?
Proa de Europa, busca
en la corriente
las olas ancestrales,
la martima barba
de Camoens.
Rompe
las telaraas
que cubren tu fragante arboladura,
y entonces
a nosostros os hijos de tus hijos,
aquellos para quienes
descubriste la arena
hasta entonces oscura
de la geografa deslumbrante,
mustra-nos que t puedes
atravesar de nuevo
el nuevo mar escuro
y descubrir al hombre que ha nacido
en las islas ms grandes de la tierra.
Navega, Portugal, la hora
lleg, levanta
tu estatura de proa
y entre las islas y los hombres vuelve
a ser camino.
En esta edad agrega
tu luz, vuelve a ser lmpara:
aprenders de nuevo a ser estrella.
Pablo Neruda, Las uvas y el viento, 1954
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56 introdUo
8 liberdade, lei e Poder10 A natureza do dinheiro
13 Por uma economia subjugada Declarao Universal dos Direitos Humanos
14 Bruxos-adivinhos
15 deUS eX-MaCHina? *
18 Doutrinassociaisvindasdocampofilosfico
20 Compreenderamaiorcrisefinanceira
23 Um mercado baseado na dvida perptua
31 MoedaRiqueza
35 Algicadesumanadamacroeconomia
38 A Lei da Oferta e da Procura aplicada moeda
41 A escala
43 Liberdade de deslocao
44 a ProPoSta: UMa Moeda UMa Moeda 44 Umamoedadevalorfixo
48 Ofimdosistemadereservafraccionada
49 novaS reGraS MonetriaS e PoltiCaS51 Criao de moeda
62 Sofisticaodademocracia
63 Sistemas de representao poltica
64 Comunicaoeinformaooficialemestadosdemocrticos
67 Umnovopoderqueamplieademocracia
72 Servioseprofissesessenciais
74 Definiodosvaloressalariais
90 Contas
92 Lgicasdosmecanismosdemanutenoeeliminaodemoeda
97 UM CdiGo internaCional Sobre ProdUo97 Legislaosobrerecursosambientais(particularidadesdumataxaecolgica)
100 Sumriodeimpostosetaxas
102 Legislao laboral internacional
105 Equilbrioentrepreosepoderdecompra
106 MUndo de Moeda diGital109 Viabilidade de um sistema global
indCe
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6introdUo
Um problema um conjunto de caractersticas existentes num
contexto que impede o alcance das expectativas de um ou mais
sujeitos. Como seres humanos somos capazes de agir no sentido de
mudar as caractersticas de um meio. s vezes para melhor, outras
vezes para pior. Espero sempre a primeira.
O que me fez comear escrever, nunca foi nem criar con-
senso, nem radicalizar posies. Foi algo bem mais mundano e
pequeno como escapar, com a conscincia tranquila, s meias
verdades e barbaridades proferidas por amigos e conhecidos nos
cafs. O que me levou a pensar sobre economia, foi tentar manter
um pensamento crtico relativo ao jornalismo de opinio que con-
stitui o grosso da actividade informativa contempornea, ques-
tionando e refutando o contedo das constantes palestras televisi-
vas dadas por comentadores profissionais que me assaltavam com
as certezas mais cruis, diariamente, sem que neles vislumbrasse
algum tipo de viso, coragem ou bom senso. Desconfio sempre de
quem discursa em nome da inevitabilidade de um caminho negro
para as construes humanas.
Com o passar do tempo tornou-se desafiante, pensar num
modelo monetrio alternativo. Nestas pginas est o resultado
dessas reflexes. No aprofunda teorias sobre relaes entre os
actuais indicadores econmicos nem pretende eliminar pequenos
ndulos do corrente sistema monetrio. Pelo contrrio, considera
a natureza da moeda e as premissas que lhe esto associadas para
justificar a falncia ideolgica e matemtica do que agora nos
imposto, sugerindo uma nova forma de olhar para o dinheiro. O
actual sistema monetrio (operando atravs do sistema de criao
de moeda pela reserva fraccionada), apresenta-se como a raz de
um problema que se ramifica em muitas e perversas limitaes
liberdade e dignidade humana, incluindo minha prpria. Este
um documento de carcter criativo e, espera-se, que criador tam-
bm. Desde que encontre um pequeno espao e algum respeito no
debate especializado e acadmico j ter alcanado uma das suas
grandes expectativas. Se alm disso conseguir permear o debate
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7pblico, fantstico, mas sei bem que tambm corre o risco de ser agil-
mente engavetado com um qualquer chavo. Se algum dia existir uma
tentativa de traduzir a filosofia aqui proposta para um sistema mon-
etrio efectivo, o desafio ser ento outro.
Hoje em dia as responsabilidades e o poder sobre a criao de
dinheiro esto afastadas dos cidados, que se remetem a uma falsa
zona de conforto alheada de preocupaes sobre a criao de moeda.
Como a maior parte de ns sabe, muitas das decises das nossas vidas
so tomadas de acordo com a quantidade de dinheiro que se tem. A
produo de moeda, no entanto, est no controlo de uma percentagem
absurdamente pequena da sociedade, que delibera sobre a criao do
dinheiro (ferramenta essencial da economia).
Este livro nasce da crena de que prefervel viver numa so-
ciedade mais responsvel por si mesma do que numa limitada pelas
decises de uma elite. Dizer que a proposta aqui desenhada tem uma
componente restritiva do poder dos bancos, e que est pensada para
funcionar dentro de uma economia global, incentivando um entendi-
mento entre naes, no significa dizer que seja um modelo concebido
para um regime global totalitrio. Alis, um pequena zona administra-
tiva, um pas ou um pequeno grupo de naes que possuam todos os
recursos dos quais necessitam podem adopt-lo.
Porque foi pensado para pessoas e no para uma entidade per-
feita, este um modelo imperfeito. insuficiente para eliminar a
estratificao social mas, permitindo uma maior mobilidade social e o
cumprimento dos direitos humanos, atenua-a.
As disciplinas que estudam a economia abordam quase sempre o
assunto da criao monetria dentro do actual cenrio. A minha for-
mao no a de economia e talvez por isso me tenha sido possvel es-
crever isto, assim. Eu tenho uma licenciatura em design de comunicao.
Este livro no complexo. Se eu o consegui escrever, qualquer
pessoa que saiba ler letras e nmeros consegue vir a perceb-lo, ainda
que seja preciso um pouco de concentrao e algum interesse pessoal.
Acontea o que acontecer, espero que, como eu, o leitor d o tempo
que nele investir como bem gasto.
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8liberdade, lei e Poder
A troca de coisas por coisas, a permuta de mercadorias por mer-
cadorias, pela sua simplicidade, e sempre ser um gesto comum
na sociedade. Mais que uma possibilidade indubitavelmente uma
necessidade social.
Antes de existir dinheiro, a troca directa, ou escambo, era
o nico modo de comrcio. No entanto, por muitas razes, no se
pode considerar que a simples troca directa seja um sistema flxiv-
el o suficiente para abranger a maior parte das trocas numa econo-
mia contempornea. Num mercado de tendncia global, espao
onde se encontram culturas com facilidades e dificuldades to
distintas, tentar legislar um sistema de trocas para uma economia
de recursos um gesto demasiado afastado do modelo de organi-
zao civilizacional em que vivemos. Por outro lado inventar um
mecanismo de definio de valores dos produtos e servios tarefa
condenada a falhar partida e, receio bem, que qualquer tenta-
tiva de o fazer se possa rapidamente transformar num trabalho
inglrio. O valor de uma mercadoria, no normalizvel porque
alm de depender de contextos mutveis, o valor de uma coisa
deve permitir aos agentes da troca uma interpretao pessoal. Por
outras palavras, o valor de uma mercadoria tambm em parte
subjectivo. Legislar no sentido oposto ditar atentando contra a
prpria liberdade de interpretao de acordo com valores pes-
soais. Por estes motivos, esta proposta ainda usa a moeda enquan-
to ferramenta socio-econmica, variando apenas as regras da sua
utilizao.
Nenhuma lei capaz de estabelecer o exacto valor mon-
etrio de uma sopa. No entanto, e tambm esse o propsito deste
livro, possvel compreender a natureza da produo para tentar
legislar sem retirar liberdade. J Immanuel Kant escreveu, sobre a
procura de justia:
Liberdade e lei (pela qual a liberdade limitada)
so os dois eixos em torno dos quais gira a legis-
lao civil. Mas, a fim de que a lei seja eficaz, em
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9vez de ser uma simples recomendao, deve ser
acrescentado um meio-termo, o poder, que, ligado
aos princpios da liberdade, garanta o sucesso dos
da lei. possvel conceber apenas quatro formas
de combinao desse nico elemento com os dois
primeiros:
A. Lei e liberdade sem poder (Anarquia).
B. Lei e poder sem liberdade (Despotismo).
C. Poder sem liberdade nem lei (Barbrie).
D. Poder com liberdade e lei (Repblica).
Immanuel Kant, in Antropologia do Ponto de Vista Pragmtico
Se fosse obrigado a optar j e a considerar que apenas existem
estas quatro formas de organizao, para este modelo mone-trio,
optaria pela Repblica. Felizmente no sou, e apesar da viabilidade
deste sistema monetrio se perder nas outras opes (Anarquia,
Despostismo e Barbrie), mais prximo do fim do livro se per-
ceber que com este modelo, at os orgos de poder dos Estados
devem sofrer alteraes aos seus moldes de funcionamento, sendo
necessria uma sofisticao da democracia, a fim de aproximar a
lei, a liberdade e o poder dos cidados.
Voltando economia, todos os grupos de pessoas foram
encontrando, mais cedo ou mais tarde, a necessidade de desen-
volver ento, um meio legtimo de representar valor. Com con-
chinhas ou metais raros, foram-se inventando maneiras de medir,
guardar e transportar o valor para efectuar pagamentos. Essas
maneiras foram sendo aceites pela maioria das pessoas dentro uma
determinada comunidade no sentido de agilizar as trocas comerci-
ais. Quase invariavelmente, chegmos ao sculo XXI com sistemas
monetrios aceites por milhes de pessoas. O dinheiro hoje, e
talvez seja durante mais algumas dcadas, quem sabe sculos, a
ferramenta social mais usada nas trocas econmicas.
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Uma economia de recursos, tecnologicamente desenvolvi-
da, que no precise de moeda nem lei, pode ser considerada um
horizonte que assenta em premissas mais puras, mas enquanto os
cidados encontrarem na moeda e na sua lei, um obstculo a essa
viso, dificilmente podero alterar o seu comportamento. Por este
motivo este documento apresenta uma tese que tenta explanar
uma proposta para um passo intermdio. Um passo que necessita
de um sistema monetrio e de um sistema jurdico, assim como
de outras instituies, mas que tenta aproximar estas ferramentas
sociais dos mais elementares direitos humanos.
A natureza do dinheiro
A natureza do dinheiro distinta da de um produto pela simples
razo de que foi precisamente para esse efeito que o dinheiro foi
inventado: para simbolizar o valor de um produto e no para o
substituir em forma ou funo. Apesar de ser usado nas trocas
comerciais e ter uma representao fsica, o dinheiro uma ferra-
menta significante: um conceito. Uma ideia que pode ser to preci-
sa quanto uma conta de somar ou subtrair. A compreenso da na-
tureza do dinheiro enquanto uma mera ideia essencial para que
se perceba mais adiante, como os sistemas de criao de moeda
vigentes* ainda no conseguiram aproveitar, todo o potencial de-
sta ferramenta social no sentido de criar um mundo melhor. Pelo
contrrio, o dinheiro tem sido usado para fazer estagnar as guas
da evoluo social. Se o dinheiro uma coisa to precisa quanto a
matemtica, pode tambm ser uma coisa to preciosa quanto um
poema.
Idealmente o dinheiro tm trs funces bsicas:
Medida de valorEsta funo muito importante, porque permite medir o valor
das coisas. E.g. se uma pessoa tem cabras, e outra tem galinhas,
e quiserem trocar, se uma cabra no vale exactamente 10 nem
Vrios tipos de criao de moe-da sucintamente descritos em:http://pt.wikipedia.org/wiki/Cria%C3%A7%C3%A3o_de_moe-da
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11 galinhas, (talvez valha 10,5) e como a dona das cabras quer
galinhas vivas no se pode dar meia galinha. O dinheiro serve
como medida exacta das coisas.
reserva de valorSe uma pessoa quiser guardar o fruto do seu trabalho, em vez de
guardar ouro, galinhas ou cabras debaixo do colcho e no quintal,
troca o seu trabalho por dinheiro. O dinheiro enquanto represen-
tao de valor armazenvel e transportvel.*
Meio de pagaMentoVoltando s cabras e s galinhas, o dinheiro substitui conchas ou
sal (antigas moedas) na nossa troca comercial. Com dinheiro con-
sigo ir ao supermercado sem levar as minhas cabras para a caixa a
fim de pagar as compras com elas.
O sistema monetrio, enquanto construo humana, pode e deve
ser reformulado, sofisticado ou at abandonado, sempre que deix-
ar de servir sociedade que o legitima. Se verdade que o actual
sistema monetrio criou muitos ricos, e que o sistema capitalista
conseguiu criar uma classe mdia, infelizmente inegvel que no
evitou o aumento do fosso econmico entre os mais ricos e os mais
pobres, no conseguindo garantir s classes sociais com menos
moeda, acesso a todos os seus direitos. A prpria representao de
poder, os governos que representam as naes, v os seus antigos
campos de deciso altamente limitados quando tenta agir dentro
do actual quadro monetrio. possvel afirmar, sem qualquer difi-
culdade, que os polticos so hoje actores secundrios, que deix-
aram de intervir em nome da populao que lhes concede, e lhes
mantm, o poder para legislarem sobre matrias comuns a todos
os cidados e para administrarem os recursos pblicos, na procu-
ra de uma sociedade livre e justia. De modo geral podemos dizer
que, presentemente, a poltica delegou as decises que mais afec-
tam a vida dos cidados, nas disciplinas econmicas e actividades
do mercado.
Estas duas primeiras funes do dinheiro esto enfraqueci-das pelo actual sistema finan-ceiro, que apesar de permitir e at fomentar a acumulao de dinheiro, necessita que a moeda possa variar de valor para funcionar (mercados de cmbio)
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Assim, hoje apenas natural que o discurso sobre poltica e
economia tenha sempre que ver com esta luta ingrata entre polti-
ca e mercado. Enquanto as apelidadas polticas de direita aplicam
os ensinamentos da escola econmica neoclssica, que reza que
o governo deve reduzir a legislao sobre a actividade econmica
ao mnimo possvel, na crena que o mercado encontre solues
prprias, as chamadas polticas de esquerda, acreditam que o gov-
erno deve sofisticar e fazer aplicar as leis fundamentais do comrcio.
Para a maior parte do Mundo a globalizao, como
tem sido conduzida, assemelha-se a um pacto com
o diabo. Algumas pessoas nalguns pases ficam
mais ricas, as estatsticas do pib pelo valor que
possam ter aparentam melhoras, mas o modo
de vida e os valores bsicos da sociedade ficam
ameaados. Isto no como deveria ser.
Joseph E. Stiglitz* Joseph Eugene Stiglitz foi presidente do Conselho de Assessores Econmicos no governo do Presidente Bill Clinton (1995-1997), Vice-Pres-idente Snior para Polticas de Desenvolvimento do Banco Mundial, onde se tornou econ-omista chefe. Recebeu, juntam-ente com A. Michael Spence e George A. Akerlof, o Prmio Nobel de Economia em 2001 por criar os fundamentos da teoria dos mercados com infor-maes assimtricas. Stiglitz defende a nacionalizao dos bancos americanos e membro da Comisso Socialista Interna-cional de Questes Financeiras Globais.http://pt.wikipedia.org/wiki/Jo-seph_E._Stiglitz
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Por uma economia subjugada Declarao Universal dos Direitos Humanos
Antes de me alongar sobre o porqu deste ttulo, necessrio sub-
linhar que os sistemas econmicos contemporneos so comple-
tamente dependentes dos sistemas monetrios com que operam.
a reviso e reformulao do modo como o sistema monetrio
e o sistema econmico se interligam que pode permitir manter a
liberdade de mercado preconizada pelo sistema capitalista (lib-
eral) sem comprometer a possibilidade do existir um Estado de
Bem-Estar Social. Quero com isto dizer que se a moeda, ferra-
menta essencial da economia estiver correctamente associada
base da produtividade, o trabalho, talvez a justia social e a liber-
dade voltem a entrar no vocabulrio poltico.
Tentar erradicar o capitalismo com uma revoluo s faz
sentido se no percerbermos que apenas a mecnica de produo
do dinheiro, e no a raiz do liberalismo, que sentencia a sociedade
a uma morte lenta e dolorosa.
ELEAnORROOSEvELtCOMA
DECLARAOUnivERSALDOS
DiREitOShUMAnOS
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Apesar de se considerar que necessria a completa re-
criao do sistema monetrio, no parece que o liberalismo, en-
quanto sistema onde alguns meios de produo so de propriedade
privada, possa ser posto de parte por decreto. As premissas do
liberalismo podem muito bem funcionar numa economia mista.
Numa onde os bens e direitos essenciais sejam providenciados pela
administrao pblica, e onde os bens e direitos secundrios pos-
sam ser disponibilizados pela adminitrao privada. Ou, sendo ain-
da um pouco mais liberal, num sistema onde a actividade do sector
privado possa tambm ser no campo dos bens essenciais, desde que
tal exerccio nunca ameae o acesso a esses bens e direitos. A dis-
tino entre bens essenciais e bens secundrios, no tanto objecto
de anlise da economia como da tica. No obstante este livro no
contenha nenhum captulo sobre tica, a teoria geral sobre econo-
mia que aqui proposta dever ser praticvel sem prejuzo dos
direitos humanos. Os valores afectos aos processos aqui propostos
so os que vejo subjacentes maior parte das aces humanas tam-
bm reiterados na Declarao Universal dos Direitos Humanos *.
Bruxos-adivinhos
O trabalho dos economistas que fazem previses econmicas tem-
se revelado menos til que o dos bruxos-adivinhos. Por isso mes-
mo, quando percebi o processo de criao de dinheiro pelo sistema
de reserva fraccionada*) decidi investigar um pouco mais a fundo,
lendo sobre a matria, questionando especialistas, acadmicos,
funcionrios bancrios, intelectuais, gestores e contabilistas.
Ningum conseguiu responder satisfatoriamente questo
colocada neste web-movie: onde e quando, num mundo de livre
circulao de capitais e de regrada produo de moeda, criado o
dinheiro para pagar os juros?
Cruzei vrias respostas: uma pessoa licenciada em gesto,
que trabalha num banco, disse-me que a moeda necessria para
pagar os juros aos bancos vinha dos clientes que conseguiam, do
trabalho, tirar resultados para pagar os juros. Esta resposta
Declarao Universal dos Dire-itos Humanos em portugus: http://www.ohchr.org/EN/UDHR/Pages/Language.aspx-?LangID=por
Link para vdeo (em ingls) Modern Money Mechanics, excerto do filme Zeitgeist Add-edum.Este filme, realizado e produz-ido em 2008 por Peter Joseph, tenta identificar as causas da corrupo, oferecendo um mod-elo social distinto. O caminho para a proposta apresentada nest filme, no est definido, mas aponta para uma socie-dade que vive imagem dos conhecimentos e tecnologias actuais.http://www.youtube.com/watch?v=vm3DixfL9o0
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parcial e no argumento vlido. Alis, ludibriante. Os clientes
dos bancos (governos, empresas e trabalhadores) apenas esto no
meio de uma cadeia de trocas comerciais de produtos e servios e,
apesar de usarem dinheiro nas suas trocas, nunca podem produ-
zir moeda (so agentes intra-econmicos e no supra-econmi-
cos). Uns meses depois, completou, um amigo de longa data (cuja
inteligncia e perspiccia admiro desde h muito), que quando um
devedor de dinheiro conseguia produzir riqueza nesta cadeia de
trocas, no s pagava o capital (e os juros) como contribuia para
o aumento do pib*, valorizando a moeda permitindo ao banco
central emitir mais dinheiro repondo o valor que esta tinha antes
da riqueza ser criada. No entanto, nem o aumento de riqueza de
um determinado produtor obriga a que o pib aumente, (e.g. dum
qualquer exerccio econmico em que um produtor obtenha suces-
so, pode sair outro produtor lesado sem que haja uma notificao
aos bancos do sucedido), nem existe qualquer tipo de lei que o
obrigue os governadores dos bancos centrais a imprimirem mais
moeda caso isso acontea. Mesmo que partssemos do princpio
que os ndices financeiros tm uma relao prxima com a reali-
dade econmica dos cidados chegaramos a concluses tristes.
deUS eX-MaCHina? *
Em Portugal, num sbado de Agosto de 2010, na segunda pgina
do suplemento Economia do jornal Expresso podia ser visto um
grfico onde estava sobreposta a evoluo durante o perodo de
20 anos dos ndices bolsistas da grande derrocada evoluo dos
ndices bolsistas do sculo XXI. O que se registou entre 1912 e 1922
apresenta muitas semelhanas com o que se passou desde 2000
at 2010. Num exerccio de lgica um pouco grosseira, consid-
erando que duas situaes com as mesmas caractersticas tm as
mesmas consequncias, em 2015/16 se no antes, talvez possamos
assistir a uma nova grande depresso.
Mesmo que os nmeros do pib subam, nada mas absoluta-
mente nada, no actual sistema financeiro, garante que as condies
De grosso modo o PIB um indicador financeiro que agluti-na o valor total dos produtos de um pas. Se um pas tem muita riqueza (recursos, produo, etc.) e tem poucas moedas, a sua moeda vale mais. Se pelo contrrio, tem pouca riqueza e muitas moedas, a sua moeda vale menos.
Deus ex machina expresso latina vinda do grego (...)signifi-ca literalmente Deus surgido da mquina e utilizada para indicar uma soluo inespera-da, improvvel e mirabolante para terminar uma obra de fico ou drama.http://pt.wikipedia.org/wiki/Deus_ex_machina
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de vida da populao sejam mantidas ou melhoradas pela sim-
ples subida dos valores estatsticos. Alm de que, como se explica
matematicamente mais frente, como a dvida de moeda paga
com moeda, mesmo injectado mais dinheiro na economia (com
taxa de juro adjacente) a quantidade de dvida existente sempre
maior que o todo o dinheiro existente para a pagar. Essa dvida ser
perpetuada a ampliada se o sistema monetrio no for alterado.
A reformulao das crenas algo de natural na evoluo
das civilizaes, e os momentos de crise so sempre o ponto de
partida para novos e mais largos horizontes. Algumas pessoas,
numa situao de crise passam de uma situao de excesso de con-
fiana, calma e passividade, para um estado de depresso, pnico
ou revolta. Este texto foi escrito para que o leitor se mantenha
fora de uma situao de letargia, pense um pouco sem radicalizar
posies, e depois contribua com o que quiser para a construo
de um mundo melhor. Nunca o desespero resolveu coisa alguma.
Para uns, alguns excertos deste livro podero ser de difcil
entendimento. Outros, podero detectar concluses erradas e cons-
tataes infundadas. Espero que no, mas em qualquer um dos casos
agradeo um contacto para que possa explicar melhor, melhorar e
corrigir este documento, ou simplesmente abandon-lo, caso seja
argumento de fora maior.
No est longe o dia em que a problemtica
econmica se voltar a sentar onde pertence, e a
arena do nosso corao e da nossa cabea ser ocu-
pada ou reocupada, pelos nossos problemas reais/
os problemas da vida e das relaes humanas...
John Maynard Keynes *
Qualquer aluno de primeiro ano de Gesto ou Economia sabe que
a definio de uma empresa uma pessoa colectiva (representao
oficial de uma ou mais pessoas) que vende bens e/ou servios com
o objectivo do lucro. Todos os agentes econmicos se regem por
esta premissa. Isto a regra base do capitalismo/liberalismo. O
Traduo livre a partir de: http://en.wikipedia.org/wiki/Steady_state_economy
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capitalismo assim, e quanto a isso no h grande coisa a fazer. O
lucro est para o capitalismo como o golo para o futebol. O din-
heiro, esse, a bola.
As Finanas (enquanto arte ou cincia que estuda a ad-
mi-nistrao dos recursos) tambm funcionam segundo a procura
do lucro. Agora, a poltica monetria, infelizmente definida pelos
mesmo agentes que operam dentro das regras do sistema finan-
ceiro. Durante o sculo vinte foi-se estabelecendo que mesmo as
instituies financeiras autorizadas a produzir moeda (como o
Banco Central Europeu na ue, ou a Fed nos eua), instituies cuja
finalidade deveria ser a da manuteno de um sistema econmico
equilibrado, tambm devem procurar a acumulao de riqueza. E
aqui reside uma grande parte do problema:
uma das principais questes da microeconomia
a busca da validade da intuio de Adam Smith,
saber se os indivduos na busca dos seus interesses
prprios contribuem para promover os interesses
da sociedade no seu conjunto
Paul Krugman *
Em macroeconomia a questo repete-se mas com o agravamento
da distncia emocional. A sucesso de falncias, a falta de em-
prego, a falta de liquidez dos bancos menos poderosos, o agrava-
mento da dvida soberana, o aumento do fosso econmico entre
pessoas (individuais ou colectivas), tm sido sinal que algo neste
sistema no est a funcionar bem. No muito fcil perceber de
repente o que est a correr mal porque este sistema no tem sido
transparente para todos os seus agentes. Os meios de comunicao
social tambm no conseguem ser independentes, porque operam
dentro da mesma lgica, e hoje em dia, mesmo as cadeias televisi-
vas mais poderosas, esto to centradas em reduzir custos que j
pouco investem em jornalismo de investigao, procurando modos
mais baratos de informar ou at abdicando da informao para dar
lugar ao entretenimento.
Krugman, Paul R; Wells, Robin.. Economic. New York, NY: Worth Publishers, 2009. p. 27. ISBN 978-0-7167-7158-6
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A mais recente tentativa de precaver uma crise monetria de
larga escala, o Mecanismo Europeu de Estabilidade (mee ou, na
sigla em ingls, esm). Este um fundo de 700 mil milhes de euros
(2100 euros por cidado da eurozona e, fala-se j na necessidade de o
aumentar para 1500 ou 2000 mil milhes, portanto duas a trs vezes
mais). Supostamente servir para ajudar pases com grandes dfices.
O seu modo de reunir os fundos to simples como a exigncia dessa
quantia aos estados membros que as devem enviar em sete dias. Os
julgamentos que faz para decidir moeda muito similiar ao de um
fundo como o fmi, ou at parecido ao de um banco comercial, com a
agravante de proteger os seus trabalhadores, garantindo-lhes direitos
e poderes que no so cedidos populao europeia, e retirando ain-
da mais autonomia poltica aos estados membros. Se isto por alguma
razo at puder ser debatido enquanto ferramenta de manuteno da
estabilidade financeira, tambm ter que ser encarado como um me-
canismo empobrecimento do patrimnio social, no tanto porque faa
exigncias de somas astronmicas, mas mais porque transforma as
funes da Unio Europeia nas de uma instituio ditatorial. Diz esta
tentativa de tratado que o mee competente para encetar proced-
imentos jurdicos, mas o mee, suas propriedades, seus meios finan-
ceiros e seus activos, desfrutam de imunidade jurdica, ilibando os ser
administradores de responsabilidades caso o processo no corra bem.
Muitas pessoas no fazem ideia, mas a grande maioria dos mer-
cados financeiros nem sequer so regulados e no tem sido possvel
efectuar qualquer tipo de fiscalizao criteriosa. Apesar de se estar a
fazer algum esforo poltico no sentido de contrariar esta situao, no
preciso investigar muito para concluir que este esforo inglrio.
Permitam-me partir deste problema: ser possvel que um capitalis-
mo/liberalismo slido possa continuar a ter o lucro como objectivo,
quando se ajoelha Declarao Universal dos Direitos Humanos.
certo que isso no tem sido conseguido, mas as possibilidades no
esgotam no que j foi tentado. Que fazer? Esperar pela resposta deste
sistema? No.
Doutrinas sociais vindas do campo filosfico
-
19
De grosso modo possvel afirmar que todas as ideologias modernas tm como objectivo, acabar com o Estado:
O capitalismo (pelo menos a corrente mais radical, o neoliberal-
ismo, ou ultraliberalismo) tem f que o mercado, livre de legis-
lao imposta por um governo eleito democraticamente, consi-
ga resolver todos os problemas sociais. Os governos neoliberais
apelam a esta crena quando implantam medidas que comprome-
tem o Estado Providncia*.
O socialismo, de acordo com seus tericos, depois da abolio da
propriedade privada, atravs da eliminao das diferenas en-
tre classes, tendo a humanidade controlo e conscincia de todo o
processo social de produo, abandona a fase de transio, atinge o
seu ltimo grau de emancipao (comunismo) deixando de precis-
ar de um governo central.
O anarquismo por sua vez, no sendo contra a ausncia de or-
dem, cria as suas formas organizao recusando qualquer tipo
de ordem hierrquica que no seja livremente aceite. Assim sendo,
logo partida, para um anarquista, um governo eleito apenas por
alguns, carece de legitimidade para legislar para todos.
Todas estas ideologias sem excepo so fundamentadas em va-
lores supremos do Homem, mas nenhuma delas se conseguiu dis-
seminar e implantar sem negligenciar outros valores ou at mesmo
os seus prprios postulados.
A ttulo de exemplo (e sem dissertar sobre as contradies, e atropelos aos valores humanos que as tentativas de pr em prctica estas trs ideologias podem ter gerado):
No liberalismo, a liberdade de organizao socio-econmica, defendida enquanto valor essencial na luta contra o autoritarismo
socio-econmico.
No comunismo, a igualdade entre indivduos a palavra de or-dem em favor de uma sociedade mais justa.
Estado de bem-estar social (em ingls: Welfare State), tam-bm conhecido como Esta-do-providncia, um tipo de organizao poltica e econmi-ca que coloca o Estado como agente da promoo (proteCtor e defensor) social e organizador da economia.http://pt.wikipedia.org/wiki/Esta-do-provid%C3%AAncia
-
20
No anarquismo, a automomia e a espontaneidade de um sujeito racional so ideais fortes contra todas as formas de submisso e ser-vido.
A necessidade de repensar as ferramentas conceptuais pelas quais
a sociedade se organiza na procura de valores to nobres quanto a
liberdade, igualdade ou automomia, existe mesmo fora dos guar-
da-chuvas ideolgicos, das doutrinas ou das religies. A abolio dos
Estados (quer seja pela via transitria da concentrao do poder na
administrao pblica, quer seja pela delegao da responsabilidade
social na administrao privada, ou mesmo pela recusa de qualquer
forma de poder) objectivo transversal a estas trs ideologias. Mas
existe uma espcie de pragmatismo, que no nos vai permitir extin-
guir, pelo menos de modo pacfico e eficaz todas as formas de poder
centralizado, sem que primeiro se alcance a capacidade de aceitao
de um novo modelo de organizao que amplie a liberdade, igual-
dade de direitos e autonomia dos cidados alargando o espectro de
aco da democracia. Pelo menos no de imediato. Se a democracia
for sofisticada no h necessidade de acabar com o conceito de Es-
tado. E assim se abre um caminho menos penoso e mais responsvel
para que tal possa vir a acontecer.
Compreender a maior crise financeira
Serve este captulo para se tentar perceber se podemos ter f nalgu-
ma das propostas polticas actuais. Enquanto os socialistas apontam
o dedo s polticas neoliberais, os neoliberais exaltam-se contra ao
excesso de interveno Estado, paralela e marginalmente as comuni-
dades anarquistas continuam a sua aco...
Podemos afirmar sem grande risco de errar que o agigantar
dos mercados, criado pela globalizao, aglutinou pequenas, mdi-
as e grandes empresas em corpores multinacionais. No mundo
ocidental as estruturas empresariais cresceram ao ponto de terem
mais poder socio-econmico que as prprias naes. Convm hoje
em dia relembrar que o Estado a figura abstracta que representa a
-
21
totalidade de pessoas de um pas. Curiosamente, nas ltimas dca-
das temos visto governos um pouco por todo o mundo (Pinochet,
Nixon, Reagan no sculo passado, ou Merkel, Sarkozy, Cameron,
Passos Coelho * j neste sculo) empenhados em salvar a liberdade
dos mercados e pouco importados com a liberdade dos indivduos.
Como j foi referido, a ideologia neoliberal acredita que mesmo
um Estado democrtico governado atravs de um sistema de ad-
ministrao pblica predeterminado e aceite pela populao, no
deve colocar a mo no mundo dos negcios. Ora, essa pretenso
apenas defendida pelas pessoas que ainda no querem perceber
que o bem de uma grande empresa no significa necessariamente
o bem comum. E que o governo legitimamente escolhido para, em
nome do Estado que representa, tentar melhorar as condies de
vida de todos, tem a autorizao e legitimidade para negociar e
legislar sobre comrcio.
John Stuart Mill, considerado um dos pioneiros do lib-
era-lismo, escreveu os Princpios da Economia em 1848, mas entre-
Angela Merkel (na Alemanha), Nicolas Sarkosy (na Frana) ou Pedro Passos Coelho (em Portugal), apesar de aumen-tarem as os impostos, podem ser entendidos como lderes de uma fase de transio para uma verdadeira sociedade de merca-do livre.O que permite encaixar este tipo de polticas dentro da ideologia neoliberal a prpria argumentao dada por estes governos, que crm piamente na reduo dos poderes da administrao pblica. A Austeridade to somente o nome correcto para uma polti-ca que mantem ou aumenta a carga fiscal, mas deixa de zelar pelo Estado Providncia. Mas em tese, numa democracia, os recursos arrecadados pelos governos deviam ser revertidos para o bem comum, para inves-timento em bens e servios p-blicos, como sade, segurana, vias de transporte e educao.
SUffRAgEUnivERSELDDi
LEDRU-ROLLin,pintADOpOR
fRDRiCSORRiEUin1850.
EStALitOgRAfiAUMtRiBU-
tOAEStADiStAfRAnCSAL-
EXAnDRELEDRU-ROLLinpOR
tEREStABLECiDOOSUfRgiO
UnivERSALEM1848,nOSE-
gUiMEntODAREvOLUO
fRAnCESA.
-
22
tanto, os polticos neoliberais do sculo xxi parece que se foram
esquecendo deles:
a influncia do governo tratado no livro cinco.
Simplificando a posio de Mill, podemos dizer
que a interferncia do governo tem aspectos bons e
aspectos maus; portanto, a interferncia deve ocor-
rer de forma a maximizar os aspectos bons e a min-
imizar os aspectos maus. Um critrio fundamental
de bom e mau o efeito sobre a liberdade do
indivduo; se esta restringida, mau; se amplia-
da, bom.
Autor colectivo *
Em meados do sculo xx, Ludwig von Mises, homem de crenas
liberais escrevia que o objetivo do capitalismo era a cooperao
pacfica de todos os homens. Ningum duvida que tambm a teoria
neoliberal tenha por objectivo a paz entre as naes. Alis para
este pensador do neoliberalismo, as fronteiras de um pas seri-
am irrelevantes se a propriedade privada e os meios de produo
estivessem em todos os lugares, e tratassem as leis e as adminis-
traes, todos os estrangeiros e cidados de forma igual.
Se algum rejeita o laissez-faire por causa da falib-
ilidade e fraqueza moral humana, deve-se tambm
pela razo rejeitar todos os tipos de aco governa-
mental.
Ludwig von Mises *
Este argumento pode ser refutado de muitas formas. um erro de
lgica pouco inocente. A priori, a grande diferena entre o governo
e os gestores privados exactamente a responsabilidade social.
isso que os administradores neoliberais (por ingenuidade ou in-
teresse) no querem entender. Colocam-se as seguintes questes:
uma administrao privada de uma corporao que produz bens
http://pt.wikipedia.org/wiki/Princ%C3%ADpios_de_Econo-mia_Pol%C3%ADtica#Princ.C3.ADpios_da_Economia_Pol.C3.ADtica
Traduo livre a partir de:If one rejects laissez-faire on account of mans fallibility and moral weakness, one must for the same reason also reject ev-ery kind of government action.von Mises, Ludwig - Planning for Freedom (1952), p. 44
-
23
para uma sociedade eleita democraticamente? Existem ferra-
mentas legais para retirar administradores privados do exerccio
das suas funes caso no contribuam para o bem comum? Devem
essas ferramentas ser to acessveis e democrticas quanto o poder
voto? Talvez no.
certo que devemos acreditar nas boas intenes de todos
os intervenientes da economia (sejam eles gestores privados ou
pblicos), mas das intenes aos actos vai algum caminho. O que a
doutrina neoliberal efectivamente est a pedir aos cidados que
confiem nos actos e no nas intenes. Que se confie na mo in-
visvel do mercado e no num crebro/corao invisvel do mer-
cado. Se de mo que falamos, tambm de responsabilidades
sobre os actos.
Um Estado, tem leis, criadas pelos governos eleitos, que
servem precisamente para garantir que a liberdade de uma pessoa
(colectiva ou individual) no seja causa da priso de outra.
Um mercado baseado na dvida perptua
Em poucos pases, mesmo nos mais desenvolvidos, tem existido
por parte dos Ministrios da Educao empenho na promoo
da educao econmica. Em Portugal, por exemplo, uma pessoa
que no siga Economia e no tenha uma boa carga de experincia
empresarial oriunda da sua prpria famlia, pode chegar ao fim de
um longo investimento em educao sem saber a diferena entre
as contribuies para a Segurana Social, as taxas de irs e de irc,
sem saber preencher um cheque, fazer uma compra online, calcular
o iva ou saber calcular juros.Hoje em dia, a maior parte das pessoas, e mesmo alguns em-
presrios e economistas, ainda vivem na iluso de que foi criado
num sistema econmico matematicamente equilibrado. Isso no
verdade.
As bases do nosso sistema econmico no so ms por na-
tureza mas existem valores completamente esquecidos pelas in-
stituies que desenham a actual estrutura social. O crescimento
-
24
desregrado do mundo financeiro, baseado no sistema de criao
monetria pela reserva fraccionada, dita que a dvida seja sempre
maior do que o total de dinheiro existente para a pagar.
Como? simples.
Na Europa, o Banco Central Europeu produz moeda em
troca de um documento que prova que algum lhe deve. Antes do
Euro, os Bancos Nacionais tinham esta funo; nos Estados Unidos
a Fed que o faz. Na Europa o bce apenas empresta aos bancos de
retalho*. Quando os bancos emprestam, exigem quase sempre uma
certificao de que o pedinte tem em seu nome posses, rendimen-
tos (activos) que sejam pelo menos iguais ao montante empresta-
do, hipotecam o valor assegurando assim o retorno do investi-
mento. E como esse valor fica assegurado os bancos tm o direito
de criar cerca de 90% desse montante do ar. Este contracto de
emisso de moeda sempre celebrado com uma taxa de juro adi-
cional. Assim, quem pede o dinheiro fica sempre a dever a quantia
criada mais taxa de juro. Quando isto feito: as naes nas quais os
bancos criam mais moeda, ficam tambm com uma moeda de valor
mais baixo porque, como j foi explicado na nota lateral sobre o
pib, havendo mais dinheiro em circulao, ele desvaloriza, para
tentar corresponder riqueza existente e, consequentemente, os
preos dos bens sobem. Como isto se passa num mercado tenden-
cialmente global, de livre circulao de capitais, foi sendo criado
um mecanismo de comparao do valor das moedas: as taxas de
cmbio. Estas taxas, desde de 1971 que no esto dependentes do
padro do ouro. Regra geral o valor de uma moeda depende muito
simplesmente do valor cobrado pelos bancos de um determinado
pas a um agente comercial de outro pas que, por exemplo, precise
de importar activos com essa moeda*.
Excusando-me a explicaes sobre os mtodos usados para
definir o valor de uma moeda em relao a outra, adianta-se o
discurso para um exerccio de lgebra elementar capaz de expr a
natureza fraudulenta do actual sistema monetrio.
Como foi dito, o Banco Central Europeu, tal como a Fed, e
todos os bancos que actuam dentro deste sistema de criao mon-
Os bancos de retalho so aque-les que, no passo seguinte da criao da moeda, investem o dinheiro atravs de emprsti-mos com juros.
Existem outras particularidades deste mtodo de clculo mon-etrio mas, invariavelmente, radicam a sua construo e validao no sector bancrio. Em casos extremos, quando se precisa de uma matria prima ou se quer vender um produto a um pas que no tenha uma moeda conversvel, ou que no tenha reservas internacionais da sua moeda, so criadas moe-das-convnio onde os bancos negoceiam linhas de crdito nessa moeda, por um perodo de tempo limitado (para tro-carem um determinadas merca-dorias) acertando as contas no fim.
-
25
etria, nunca produzem o dinheiro que chegue para que se possa
pagar o acrscimo dos juros. Sempre que h um emprstimo com
uma taxa de juro, cria-se mais dvida do que dinheiro. Muitos
economistas podem desacreditar na possibilidade de termos um
sistema financeiro sem juros mas em algumas economias contem-
porneas essa a prtica. Apesar de ser bastante bvio, para ns no
ocidente, que a lei islmica no respeita todos os direitos humanos,
em matria de poltica monetria existe uma diferena fulcral. O
Banco Islmico*, submete-se aos princpios da lei islmica (Sha-
ria*) e nesse sistema, a atividade bancria estava, at h bem pouco
tempo (2004), legalmente impedida de praticar juros. No sistema
monetrio islmico, os bancos, se quiserem emprestar dinheiro
fazendo desse servio o seu negcio, so obrigados a comprar a
propriedade, alugando-a depois at que a dvida esteja paga, pro-
longando o pagamento durante um perodo extraordinrio previa-
mente aceite.
A dvida total de um sistema monetrio ocidental pode ser
calculada assim, onde: M = montante, j = juros, C = capital inicial ou
base monetria, i = taxa de juro, t = tempo, D = dvida infinita.
Dvida total (com juros simples, juros que incidem sempre sobre o
capital inicial):
M = C + (C i t)
Se C>0 (se se empresta um euro que seja), se i>0 (se a taxa de juro
for maior que 0) e t>0 (se o tempo de pagamento for maior que 0),
ento o capital existente em circulao sempre menor que a dvi-
da a pagar, (atente-se nas explicao da pgina seguinte).
moeda em circulao moeda devida
Ca + Cb + Cc + ... < Ma + Mb + Mc +
Clculo isolado do total de dvida impossvel de pagar:
(Ma + Mb + Mc + ...) - (Ca + Cb + Cc + ...) = D
Recapitulando e pormenorizando. O actual mtodo para a criao
O termo Banco islmico se refere a um sistema ou ativi-dade bancria que seja coerente com os princpios da lei is-lmica (Sharia) e sua aplicao prtica atravs do desenvolvi-mento da economia islmica.http://pt.wikipedia.org/wiki/Ban-co_isl%C3%A2mico
A Sharia, ou Chari, o cdi-go de leis do islamismo. O princpio bsico de operao bancria islmica a partilha do lucro e da perda e a proibio de riba (usura).
-
26
de dinheiro na Unio Europeia e nos eua, chama-se sistema criao de
moeda pela reserva fraccionada. Neste sistema, enquanto uma empre-
sa normal no pode criar dinheiro do ar para acumular riqueza, uma
instituio bancria pode faz-lo, embora ambos procurem o lucro. A
possiblidade que concedida aos Bancos Nacionais e Internacionais de
criarem dinheiro em troca de um documento comprovativo de dvida,
estende-se num segundo passo a qualquer banco de retalho. Um banco
comercial pode criar dinheiro a partir do dinheiro que no lhe pertence,
se mantiver cerca de 10% do depsito inicial como reserva. O dinheiro
quando devolvido passa a ser propriedade do banco.
Bancos Centrais 100 Bancos comerciais 90,0 Empresas/trabalhadores base monetria
Bancos comerciais 90,0 + juros 8 1,0 Empresas/trabalhadores
Bancos comerciais 81,9 + juros 73,7 Empresas/trabalhadores
Bancos comerciais 73,7 + juros 66,3 Empresas/trabalhadores Bancos comerciais 66,3 + juros 59,7 Empresas/trabalhadores
Bancos comerciais 59,7 + juros
53,7 ... expanso da base monetria (90+81+ 73,7+66,3+59,7+53,7...)
E.g.: Um banco comercial que tenha 100 moedas depositadas por um cli-
ente pode, se lhe for pedido um emprstimo de 90 moedas, criar virtual-
mente 90 moedas, e pode ainda cobrar uma taxa de juro adicional para
reforar o lucro. A lei assim o permite. Desta forma o actual funciona-
mento da Banca, assegura que um emprstimo concedido a uma deter-
minada pessoa nunca possa ser impedimento para outro emprstimo
deste que mantenha nos seus cofres uma fraco dos depsitos inciais).
-
27
Em pases economicamente menos poderosos da zona euro,
como nem sempre existe liquidez que baste, um banco comer-
cial tm que se financiar junto de bancos internacionais com mais
liquidez (bce ou outros bancos que, sem excepo, cobram taxas
de juro). O sistema corrente ainda tenta garantir que nem todo o
dinheiro que um banco comercial empreste tenha origem num
outro emprstimo. Para isso, cada pas criou legislao que exige
que uma parte de cada emprstimo seja capital prprio do banco.
Assim, dos 100% de um emprstimo que um banco queira conced-
er, para garantir a percentagem do emprstimo de capital prprio
exigida por lei, esse mesmo banco obrigado a criar e vender pro-
dutos novos (normalmente so produtos financeiros, como de-
psitos a longo prazo, plano de poupana, fundos de investimento,
mas tambm pode passar venda de patrimnio), e ainda tem que
se endividar junto de Bancos mais fortes para conseguir o resto da
moeda para o emprstimo.
Em Portugal, se a memria ou uma eventual alterao desta
lei no me falharem, a percentagem de capital prprio exigida de
8%, sendo que o banco pode emprestar 92% de dinheiro que efec-
tivamente no lhe pertence e do qual apenas depositrio.
Observa-se que estas regras de criao de dinheiro, por si s,
oferecem ao sector da banca um modo gil mas relativamente frgil
de se autofinanciar, mas tentam garantir que ao mesmo tempo que
se empreste dinheiro exista uma garantia liquidez, caso algum de-
cida resgatar o seu depsito. Assim, os juros, so efectivamente uma
simples margem de lucro sobre a venda do dinheiro.
Expresses como o preo do dinheiro confundem
qualquer criana. E no de espantar pois se uma das funes do
dinheiro precisamente a reserva de valor, conceber um siste-
ma financeiro onde esse valor varivel paradoxal. A economia
moderna no tem qualquer dificuldade em aceitar que, no que diz
respeito ao valor de um produto ou servio, o excesso de pro-
duo/oferta cause uma descida do seu valor, porque a procura
em relao oferta diminui, mas fatal aceitarmos que se con-
siga aplicar esta mesma lgica ao dinheiro. Como se o dinheiro
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28
fosse um produto ou um servio igual aos outros e como se fosse
possvel haver menos procura de dinheiro. Num modelo de vrias
moedas, bvio que isto pode acontecer mas este comportamen-
to de variao de valor do dinheiro de acordo com critrios de
deciso centralizados extremamente perigoso num mercado
global como o que temos hoje em dia. Esta contradio terica,
(por um lado o capitalismo tem sempre o lucro como objectivo e,
por outro, as moedas podem aumentar e diminuir de procura) est
enterrada nas razes do actual sistema monetrio. Se o capitalis-
mo tem sempre o lucro como finalidade, a procura de moeda no
pode ser menor. Reflectir sobre se algum precisa ou no de din-
heiro, um fenmeno pertencente ao campo da liberdade desse
mesmo algum e no deve ser um facto ditado pelas instituies
bancrias. As leis gerais de funcionamento de um sistema mon-
etrio no podem, portanto, contradizer o princpio da medida e
reserva de valor. Apenas possvel considerar que o dinheiro pode
ter menos procura, e consequentemente variar de valor, quando
acima do juzo baseado na Necessidade prevalece o juzo basea-
do no Investimento. O valor com a qual a economia tem que estar
comprometida o da Necessidade (certamente mais que com o
do Investimento se quisermos continuar a garantir a liberdade do
indivduo). A situao torna-se insanvel quando so as prprias
instituies legitimadas para agir no processo de criao e aval-
iao do valor monetrio que pervertem os princpios da reserva e
da medida de valor.
Por vezes as mesmas leis de aplicaes de juros que per-
mitem que os bancos singrem, condenam os bancos mais fracos,
e ningum pode garantir que um dia no vir a aplicar a mesma
sentena aos bancos mais slidos. Este processo de gesto de acti-
vos financeiros de valor flutuante gerou, s nos eua um mercado
to gigantesco como o visvel no grfico* que na pgina seguinte
representa o custo da crise financeira por comparao ao capital
envolvido noutros grandes projectos mundiais.
-
29
INFOGRAFIA E FONTES DA SEGUINTE PGINA DISPONVEL NESTES LINKS PARA CONSULTA
The Billion Dollar GramDavid McCandless, V1.2, Se-tembro 2009http://www.informationisbeauti-ful.net/visualizations/the-billion-dollar-gram/
Fontes do autor: New York Times, The Guardian, Fortune, etc. Para ver todos os detalhes so-bre as fontes consulte o docu-mento neste endereo https://docs.google.com/spread-sheet/ccc?key=0AmCeWwNK-r6FmdEhUMkhOLTdqMjducD-FkT05qVzRqSkE&hl=en#gid=0
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30
The Billion Dollar GramMilhares de milhes gastos em coisas
$60ORA-
MEntO
EXRCitO
USA
$206BigtOBACCOSEttLEMEnt
$102gUERRA
iRAqUE2006
$135gUERRAiRAqUE2007
$515gAStOSAnUAiSpARAtRAnSitAROMUnDOtUDOpARAEnERgiA
SOLAREOUtRASEnERgiASREnOvvEiS
$230MiSSOtRipULADA
AMARtE
$534MERCADOfARMACUtiCOgLOBAL
$570pACOtEDEEStMULOECOnMiCODOgOvERnOChinS,
nOv.2008
$238RESgAtESfinAnCEiROS
fEitOSpELOgOvERnODAgR-
BREtAnhA
$67RESgAtES
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$35RESgAtES
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pERARAECOnOMiADEpOiSDAgRAnDEDEpRESSODE1933
$200DviDAtOtALDOSpASES
AfRiCAnOS
$2800CUStOtOtALDACRiSEfinAnCEiRApARAOgOvERnOEStADUniDEnSE(AtAgOStODE2009)
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tERRADURAntE5AnOS
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$11
$3
$20
-
31
Moeda Riqueza
Brevssimacrticadosvaloresmatemticosehumanos inerentes ao corrente sistema de emisso de moeda
Muitos economistas ainda acreditam que a criao de moeda
(emitida de acordo com a anlise de indicadores como o pib, ou a
taxa de cobertura da balana comercial) est eficazmente asso-
ciada riqueza de um estado, e que o sistema financeiro consegue
sempre, por um qualquer mecanismo indirecto, equilibrar a econo-
mia. Convencionou-se tambm que os bancos, pelo emprstimo do
dinheiro, podem retirar uma fatia de lucro que aparece ao cliente
na forma de juros. Este mtodo usado h muitos anos, e no sen-
do matematicamente vivel e claramente injusto.
Para perceber bem isto importante reforar a distino
entre as instituies que tm capacidade para produzir moeda (os
Bancos Centrais e os Bancos de Retalho) e as que no tm esse
direito (todas as outras). Assim, no actual quadro econmico, as
outras tm que produzir riqueza (produzindo e comercializando
bens) para conseguirem moeda, enquanto os bancos no necessi-
tam de produzir riqueza para acederem moeda. H assim dois
mercados que operam segundo regras monetrias diferentes. O da
criao de moeda (que deveria depender da riqueza de um pas)
e o da criao de riqueza (que depende de muita coisa, incluindo
do prprio acesso ao dinheiro). No entanto, ambos os mercados
perseguem assumidamente a acumulao de riqueza e de moeda.
No mnimo, isto preverso.
Os defensores da poltica de criao de moeda pela reserva
fraccionada argumentam que a quantidade de dinheiro no tem
realmente qualquer interesse e que o dinheiro s existe como re-
flexo de um valor comparado de algo na economia mundial. Este
argumento contraditrio. Na prtica, em economias complexas,
para algum criar riqueza/lucro, o acesso ao dinheiro quase sem-
pre imprescindvel, nem que seja para a alimentao e hidratao,
que do fora ao homem para trabalhar. No caso dos bancos, o
-
32
mero direito criao de moeda serve para aceder a mais moe-
da. Atravs de emprstimos e da formulao de juros, conseguem
ampliar as suas reservas. Mas este mecanismo fora os agentes
intra-econmicos, sem os mesmos direitos que os bancos, a produ-
zirem riqueza pela fora do trabalho, ou ento a alienarem-se dos
seus bens para conseguirem pagar a dvida.
E.g.: Imaginemos, como em muitos casos acontece, que existe
um indivduo portugus sem moeda nem recursos, e existe tambm
um ndivduo espanhol nas mesmas circunstncias. Numa econo-
mia global regida pelas premissas actuais, este portugus pede 10
moedas emprestadas para tentar criar riqueza. Se conseguir produ-
zir e vender coisas ao indivduo espanhol (que por sua vez tambm
pediu 10 moedas emprestadas a um banco espanhol para comear
o seu negcio), como o banco espanhol e o banco portugus criam
dinheiro do mesmo modo, vo exigir a ambos o retorno do que lhe
deram, mais os juros (que nunca foram injectados na economia
inicialmente). Algum tem que falir, ainda que a economia esteja
a tentar funcionar. Este exemplo de 4 intervenientes resulta para
uma economia global, onde os bancos pedem sempre mais do que
o que do. Se dvida tem que ser paga com moeda, tem que exist-
ir moeda para a pagar. Se se parar de emprestar/criar dinheiro,
algum tem que falir, neste caso seria o espanhol, mesmo que a sua
empresa pudesse encontrar viabilidade econmica.
Como foi explicado, se perguntarmos a pessoas que per-
cebam as regras deste sistema monetrio onde criada a moeda
para pagar os juros, muito provvel que nos respondam que os
juros so pagos criando riqueza, usando matrias primas, tecno-
logia e trabalho para fazer um produto ou gerar um servio. Se
uma empresa fizer um hamburger Big Mac, por exemplo, pode
troc-lo por moeda. Em macroeconomia, estando a riqueza criada,
argumenta-se que esta mensurvel por aproximao (atravs da
interpretao de centenas de ndices e rcios distintos). A moeda
valoriza e os bancos centrais podem depois decidir emitir mais
moeda (repondo o seu anterior valor). Tambm podem optar por
manter a quantidade de moeda, e aproveitar o aumento do valor
-
33
da mesma para importarem produtos mais baratos de pases com
moedas mais fracas.
Em pleno sculo xxi, de um ponto de vista matemtico, os
cenrios macroeconmicos apenas conseguem ser representados
em ndices, mas estes no reflectem com nenhuma preciso as
idiossincrasias que decorrem durante actividade socioeconmica.
Essa tarefa executada um pouco por todo o mundo por milhares
de trabalhadores da rea financeira, atrs de computadores topo
de gama, no obstante ser um trabalho exaustivo praticamente im-
possvel e inglrio (para a sociedade).
Trs razes simples para a falibilidade dos ndices:
Os mercados de concorrncia perfeita s existem na teoria.
Entende-se por mercado de concorrncia perfeita aquele onde ex-
istem muitos pequenos compradores e vendedores; onde o produ-
to transacionado homogneo; onde h livre entrada de empresas
no mercado; perfeita transparncia para os vendedores e para os
compradores de tudo que ocorre no mercado; perfeita mobilidade
dos insumos produtivos.
Os valores e hbitos humanos so mutveis no tempo e no es-
pao. O ndice Big Mac* por exemplo, que tem como elemento da
sua equao o preo de um hamburguer da multinacional Mc-
Donalds, no assume qualquer relao com um hbito ou norma
socio-econmica. Os diferentes franchisados tm receitas comple-
tamente imprevisveis. Na Bolvia, por exemplo, a cadeia de fast-
food teve prejuzos consecutivos durante mais de dez anos at sair
do pas em 2011.
O avano tecnolgico altera os modos de produo espontanea-
mente. Uma economia de mercado tem que aceitar as mudanas
tecnolgicas com agilidade. Muitas descobertas cientfcas poten-
cialmente proveitosas para o progresso, no conseguem produzir
resultados porque no possvel que um sistema financeiro como
o actual lhes reconhea directamente o valor. O actual funciona-
mento da indstria farmacutica e ambiental prova disso.
O ndice Big Mac, um ndice calculado sobre o preo do Big Mac tendo como objectivo medir o valor de uma moeda em relao ao dlar ameri-cano, comparando os preos do hamburger Big Mac nos Estados Unidos com o preo do Big Mac do pas ao qual se pretende comparar a o dlar americano.O princpio que os procedi-mentos da cadeia de fast food McDonalds so os mesmo em todos os pases.
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Apesar do conceito de riqueza ter sido deformado pelo sistema fi-
nanceiro*, incorrecto afirmar que o dinheiro deve estar dissocia-
do da tentativa de clculo da riqueza. No faz sentido sequer. Em
suma, a riqueza no pode ser apenas entendida pela quantidade
de terras e imveis que se possui e pela capacidade de trabalho.
tambm possvel considerar que a reserva de valor em moeda seja
parte integrante da riqueza. Numa economia tendencialmente
global, inserir moeda no mercado por indicadores imprecisos e
sem qualquer correlao com valores humanos, no inteligen-
te. Torna-se cada vez mais bvio que este sistema de controlo
monetrio centralizado nos bancos se baseia em mtodos arcai-
cos, falveis quando confrontados com as exigncias das transfor-
maes sociais da nossa era.
A natureza das civilizaes no a da estagnao, a da
emergncia. Assim como acontece micro-escala, onde mesmo
um pequeno nmero de molculas origina incalculveis possibi-
lidades de interao, tambm impossvel calcular o nmero de
arranjos possveis entre agentes econmicos simples que operam
num determinado ambiente, formando comportamentos com-
plexos enquanto conjunto. Esta caracterstica dos sistemas com-
plexos origina quase sempre novos nveis de evoluo dos sistemas
de organizao. Isto tudo para dizer que nenhum mecanismo de
criao de moeda onde o poder de deciso centralizado poder
ser suficientemente orgnico para resultar bem um sistema com-
posto por muitos agentes. Na prtica a moeda nunca valoriza em
medida directamente proporcional riqueza criada mas ainda
possvel dizer que, neste sistema, ter mais ou menos moeda, am-
plia ou aumenta a contruo de riqueza.
Estes processos devem ser simplificados, democratizados e
tornados transparentes o quanto antes, no s porque as tentati-
vas de equilibrar a economia atravs deles resultam em constan-
tes fracassos, mas tambm porque so falseveis. O maior centro
comercial da China, por exemplo, movimentou enormes quanti-
dades de dinheiro e gerou emprego, mas o capital natural e de in-
fra-estruturas foram desperdiados num investimento que apesar
Por exemplo h produtos financeiros em que se ganha dinheiro se terminada empresa falir. I.e. actividades financei-ras em que gerada riqueza atravs da perda real de pro-duco.
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de ser significativo para o clculo do pib nesse ano no conseguiu
criar riqueza*. Uma depresso de macro-potncias econmicas
um cenrio mais que plausvel se nada mudar neste sector. Ter um
sistema monetrio como o actual a depender dos actuais indica-
dores pura tolice.
Existem mais maneiras de distorcer o sistema econmico.
O livro Confisses de um Assassino Econmico (em ingls, Confes-
sions of an Economic Hit Man) a autobiografia de John Perkins.
Descreve a actuao do consultor da empresa Chas. T. Main., John
Perkins. Durante alguns anos usou recursos financeiros do Banco
Mundial, da Agncia Americana para o Desenvolvimento Inter-
nacional (usaid), alm de outras organizaes com objectivos
traados fora das funes oficiais destas organizaes. Atravs de
emprstimos, foram endividados pases, canalizando essas mes-
mas verbas para corporaes e famlias abastadas que controlari-
am grandes fontes de recursos naturais.
A lgica desumana da macroeconomia
Como foi explicado, a mecnica do dinheiro actual , ao contrrio
do que a grande maioria da populao pensa, bastante fcil de
compreender.
Recapitulando: os bancos centrais so responsveis pela
criao de moeda. Na Europa, as instituies, Banco Central
Europeu e bancos nacionais, no s esto em constante comuni-
cao umas com as outras como recebem os relatrios dos bancos
comerciais e dos bancos de investimento dos seus pases. No Esta-
dos Unidos, a Fed, a partir de contractos com o Departamento do
Tesouro, pode emitir mais dinheiro ao governo. Na Unio Euro-
peia o artigo 123 do Tratado de Lisboa probe que o Banco Cen-
tral Europeu conceda qualquer emprstimo aos pases membros.
Estes emprstimos devem ser concedidos unicamente a bancos
privados que depois podem ceder emprstimos com taxas de juros
mais elevadas. Estes emprstimos, alm dos impostos cobrados aos
seus cidados, e da venda de ttulos de dvida so as maneiras que
Link para vdeo (em ingls)Chinas Ghost Cities and Malls. As bolhas so sem dvida alguma uma maneira de falsear indicadores de act-vidade econmica, simulando a criao riqueza atravs de indicadores econmicos que no representam a realidade. Alguns economistas contestam a sua existncia mas aconte-ceram ao longo da histria do capitalismo inmeras vezes.http://www.youtube.com/watch?v=rPILhiTJv7E
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um estado (relembro que o conceito de estado engloba a adminis-
trao pblica e privada), tem para conseguir fazer face s neces-
sidades da economia. Apesar desta e de outras ligeiras diferenas,
a mecnica de emisso de moeda a mesma. Quando se analisam
ambos os casos repara-se que ambos se baseiam num poder de
deciso centralizado que age de acordo com o pricpio da mximi-
zao de lucros, tal e qual uma empresa de produo e venda de
batatas.
Hoje, o dlar americano e o euro dominam a maioria dos
mercados financeiros. Nestes mercados, as taxas de cmbio so
expressas em termos de dlares americanos e euros. Actualmente,
o dlar americano e o euro somam cerca de 50% de todas as tran-
saes de cmbio de moedas no mundo. Ao acrescentarmos as
libras, os dlares canadianos, os dlares australianos e o iene
lista, a soma de mais de 80% de todos os cmbios de moedas do
mundo. Quando a Unio Europeia foi criada, e as moedas nacio-
nais foram convertidas, o bce emitiu todos os euros que passaram
a existir em circulao. Basicamente no incio da era Euro, o bce
criou dinheiro, entregou-o aos pases. chamada a Base Mon-
etria. A partir da, os pases, quando se querem financiar, fazem-
no no mercado de dvida, passando em troca um documento que
comprova que os pases devem essa quantia com uma taxa de juro
acrescida: os ttulos de dvida soberana que podem ser comprados
por outras potncias econmicas que depois so livres de revender
esses ttulos no mercado. em alternativa, os governos podem pedir
grandes emprstimos a bancos privados. Em suma, toda a emisso
de moeda feita quando se assume um contrato de dvida. Dvida
essa que depois passa para a responsabilidade de todos os cidados
dos Estados que elegeram os governos que as contraem.
Na ue, quando concedido um emprstimo adicional a
um estado membro, o bce fica com ttulos de dvida nesse val-
or, obrigaes dos estados membros que ele prprio pode vender
nos mercados internacionais. Nos ltimos anos, pases em acel-
erado crescimento econmico como a China, o Brasil ou a ndia,
inves-tiram somas avultadas em ttulos de dvida das mais respeit-
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adas economias mundiais (ue e eua). Isto significa que, se houver
um crash monetrio de mdias muito provvel que seja impos-
svel evitar o contgio entre macropotncias econmicas, pois no
h garantias de reserva de valor nem na zona euro nem em lado
algum. Nenhuma instituio monetria, (bce, Fed, fmi, nem mes-
mo o ainda em construo mee - Mecanismo Europeu de Estabili-
dade) consegue suportar uma crise de dimenses multinacionais.
Embora existam organismos que tentam regular as Finanas,
estes mercados internacionais de contratos de dvida no so reg-
ulamentados e muito menos so fiscalizados. Esta situao no
garante nenhum tipo de segurana, transparncia ou eficcia. Os
banqueiros dominam a vida poltica da maior parte dos pases.
da banca pblica e privada que saem muitos dos polticos, minis-
tros e deputados destacados pelos meios de comunicao de mas-
sas. Muitas vezes os administradores das corporaes de comuni-
cao tradicional de massas tambm pertencem esfera poltica. E
tambm nos bancos e nas grandes empresas que se asilam muitos
ex-polticos. Estes administradores podem argumentar que nas
ltimas dcadas tem sido desenvolvido um sistema internacional
de mtua vigilncia cada vez mais apertado que rege a produo e
o valor da moeda dos pases. Pode dizer-se que para esse contro-
lo tem sido desenvolvido um grande conjunto de mecanismos
cada vez mais inventivos. Mas tambm possvel dizer que essas
tcnicas so cada vez mais idiotas e cada vez menos eficazes. Este
conjunto de tcnicas inclui: a anlise risco internacional da dvida;
o balano de pagamentos que descreve as relaes comerciais de
um pas com o resto do mundo; os regimes cambiais que definem a
variao das taxas de cmbio; as supresses da inflao por decre-
to-lei que impem o congelamento dos preos dos bens e servios;
os perdes de dvida monetria em troca de riqueza natural;
acordos de explorao e cedncia de empresas pblicas; o clculo
da inflao atravs de cabazes de produtos; entre outros.
Estas formas esto a contribuir para o aumento das contas
de dbito em relao s de crdito e, mais grave, no esto a con-
seguir resolver o problema social do fosso entre os seres humanos
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que tm excesso e os que precisam do mnimo.
No soar a disparate se dissermos que estes instrumentos
se encontram desactualizados e que se tm revelado incuos na
aplicao de justia enconmica entre estados e infrutferos na
promoo da liberdade e igualdade de direitos entre os cidados
desses estados.
A Lei da Oferta e da Procura aplicada moeda
Existe uma regra basilar da Economia para definir o valor de
uma coisa: a lei da oferta e da procura. Esta lei garante o funciona-
mento saudvel entre a produo e o consumo de um certo mer-
cado e permite a livre formao de um preo atravs da interao
entre as espectativas (elemento varivel) de ambos os agentes da
troca. Quando o preo pretendido pelo vendedor, encontra o preo
que o comprador est disposto a pagar, achado o preo para essa
mercadoria.
Sempre que a lei da oferta e da procura aplicada dentro
de um contexto de uma economia simples tem-se revelado eficaz.
Mas foi indevidamente transportada para o sector monetrio. Du-
rante os ltimos sculos, o dinheiro assim com outros documentos
que o representam, tm sido tratados como produtos ou servios,
Preo
QuantidadeProcura
Oferta
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enquanto no passam de ideias. Esta transposio automtica da
Lei da Oferta e da Procura para o dinheiro um erro de lgica
com resultados cruis. Ao contrrio dos produtos de consumo,
o dinheiro nunca tem menos procura, porque faz parte da sua
concepo, da sua natureza, poder ser trocado livremente por
qualquer produto, sendo que reserva e medida de valor. Todos
sabemos que o capitalismo s funciona porque mesmo um homem
com muito dinheiro quer sempre mais dinheiro.
At aos dias da depresso mundial, que est a tomar forma
na ltima dcada, sempre que mais dinheiro foi sendo criado, ele
tem descido de valor. este o fenmeno da inflao. Tendo em
conta que j foi produzida uma tal quantidade de moeda, injec-
tar moeda numa economia contempornea a partir de pontos de
emisso e gesto centralizados no resulta. humanamente im-
possvel administrar correctamente tamanhas quantidades.
Capacidade de desvalorizao da moeda pela constante injeco de capital
Ao lado vemos uma economia imaginria onde foi injectada anualmente exactamente a mesma quantidade de unidades monetrias.Mesmo a criao de, digamos, quinhentos mil-hes de euros no espao de um trimestre, no hoje suficiente para conseguir inflacionar. Na figura ao lado, podemos ver um grfico com uma frmula que sintetiza a capacidade de des-valorizar o dinheiro. Enquanto numa economia recm criada a produo de dinheiro implica a acentuada desvalorizao do mesmo, numa economia global e secular como a nossa, a pro-duo da mesma quantidade de dinheiro apenas consegue desvalorizar a moeda a um nvel microscpico. por esta razo que em economias com sistemas monetrios recentes se consegue activar a econo-mia eficazmente e em sistemas monetrios antigos a economia tende a estagnar entrando em recesso antes das crises.
100%=Moeda criada
Moeda existente no mercado
Capacidade de desvalorizao da moeda (em relao moeda emitida)
Anos
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Num mercado global, que opera com vrias moedas de valor
flutuante, relativamente fcil apresentar e compreender razes
que impedem os bancos centrais de emitirem moeda na tentativa
de melhorar as condies de vida dos seus cidados.
A desvalorizao da moeda tem sido um dos truques mais utiliza-
dos. Quando se desvaloriza moeda, injecta-se dinheiro na econo-
mia, podem pagar-se grandes dvidas internas e abre-se espao
para o investimento. As exportaes podem aumentar porque os
bens embaratecem aos olhos de moedas de valor mais constan-
te. No entanto, internamente, o preo dos bens sobe e o consumo
diminui por falta de confiana dos intervenientes e, sendo que os
salrios no crescem ao mesmo tempo dos preos, a economia
tende a estaganar. Alm de que existindo dvida externa, esta au-
menta violentamente. Injectar dinheiro na economia num merca-
do como este apenas pode ser feito em pases com um crescimento
econmico brutal baseado em exportaes de larga escala, porque
a demanda de activos na sua prpria moeda grande. Qualquer
pas que faa isto sem estar a exportar massivamente corre o risco
de ser comprado pelo pas vizinho.
Como vemos, a emisso de mais dinheiro a partir dos actuais
pressupostos macro-econmicos, no soluo completa que baste
quando existe todo um sistema que usa a moeda negligenciando
pelo menos duas das suas funes primordiais (a de medida de valor
e, consequentemente, a de reserva de valor). Ademais, o problema
no est s nos ndices econmicos. O problema tambm humano,
alm de matemtico. Mesmo que fosse possvel activar eternamente
a economia desta forma (imaginemos que todos os estados concorda-
vam em criar mais moeda, na mesma proporo, ao mesmo tempo)
todas as experincias apontam para um resultado socialmente dese-
quilibrado. Quando existe desigualdade econmico-social pratica-
mente impossvel resolver o problema injectando moeda para o topo
da pirmide econmica esperando que o grupo que constitui esse topo
consiga criar emprego e distribua o dinheiro pela sociedade. Recor-
rentemente, quase que por uma lei gravitacional da moeda, a rique-
za continua a ser distribuda de modo previsivelmente desequilibrado.
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Nveis elevados de desigualdade econmica acen-
tuam os desequilbrios de poder poltico pois os que
esto no topo usam seu peso econmico para moldar
a nossa poltica de forma a obterem ainda mais poder
econmico.
Joseph E. Stiglitz, 2012 *
Quantidades maiores de dinheiro, tm-se revelado de impossvel
gesto, e completamente desnecessrio produzir mais moeda,
quando se sabe que j foi criado dinheiro mais que suficiente (dis-
tribudo de modo desigual) nos pases desenvolvidos para que to-
dos possamos viver com acesso sade, educao e a outros bens,
mesmo que no essenciais. O que nos leva ao ponto seguinte.
A escala
Num passado recente a populao dos Estados era menor. Era
mais fcil para um governo redistribuir justamente a riqueza e
esperar que o mercado continuasse o natural ciclo de trocas. Esta
facilidade foi posta em causa com a exploso demogrfica dos lti-
mos sculos.
Existem hoje correntes de pensamento desesperado que
acreditam que qualquer sistema que leve a um aumento da igual-
dade a nvel mundial conduz inevitavelmente a uma destruio de
recursos, e ao implodir social associado. So correntes de pensa-
mento que apregoam que todas as espcies dominantes esto des-
tinadas a reproduzir-se, destruindo todos os recursos disponveis,
e a implodir como consequncia inevitvel da sua existncia.
verdade que com o capitalismo, com o aumento de produo e a ex-
ploso demogrfica, j ultrapassmos a fronteira do que os recursos
do nosso habitat permitem. Por isso mesmo, um arqutipo mon-
etrio que tenha como desgnio a eliminao da pobreza a um nvel
global (ou que se predisponha pelo menos a atenuar o actual fosso)
tem que ter isso em considerao.
http://www.rollingstone.com/politics/blogs/national-af-fairs/the-price-of-inequali-ty-interview-with-joseph-e-sti-glitz-20120625#ixzz1yz8F54U2
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Alguns polticos defendem que se o capital for emprestado
s grandes empresas e se baixarem os impostos aos ricos, a din-
heiro tem tendncia a escorrer pela pirmide social chegando ao
sop. Este tipo de argumento recorrentemente apresentado por
administradores, ou pessoas de ideologia neoliberal. Sobre esta
matria talvez seja importante dar alguma ateno s concluses
de um estudo de Mehrun Etebari realizado nos Estados Unidos em
2003, disponvel para consulta na internet:
Em ampla perspectiva, os dados dos ltimos 50
anos refutam veementemente quaisquer argumen-
tos que suportem que o corte de impostos para os
americanos mais ricos vai melhorar a capacidade
econmica das classes mdia e baixa, ou a nao
como um todo. Para ter certeza, os indicadores
econmicos apresentados neste relatrio foram
examinados a partir de uma variedade de fatores
que no apenas a poltica fiscal. Pelo contrrio, o
que este estudo mostra que qualquer tentativa de
estimular o crescimento econmico, redu-zindo os
impostos para os ricos no vai fazer absolutamente
nada se no tem funcionado nos ltimos 50 anos,
ento por que razo h-de funcionar no futuro?
Mehrun Etebari, 2003 *
A viso que se apresenta neste texto estabelece como prem-
issa, que o dinheiro, enquanto parcela essencial da activao da
economia, no pode continuar nas mos de poucos. Como todas as
ideias, a moeda pode ser regrada nesse sentido. E para que se pos-
sa democratizar, quem sabe escala mundial, a sua emisso e o seu
valor no podem estar dependentes dos mecanismos que foram
sendo descritos. Numa economia matematicamente saudvel, o
dinheiro, ao contrrio do po, no pode valorizar nem desvalorizar
porque no como o po. O po mata a fome e estraga-se quando
no comido, por isso pode valorizar e desvalorizar, o dinheiro
no. A moeda a medida essencial da economia. Foi tambm para
http://www.faireconomy.org/re-search/TrickleDown.html
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isso que foi concebida, para ser medida de valor. uma das suas
funes primordiais. Permitir que os bancos (e o sistema finan-
ceiro em que operam) alterem o valor do dinheiro como alterar o
valor do centmetro sempre que crescemos um pouco. Alm de ser
desleal, impede o desenvolvimento colectivo baseado na igualdade
de oportunidades.
Liberdade de deslocao
Como sabemos, nem todos os pases tm os mesmo recursos, as
mesmas oportunidades, nas mesmas alturas. O desenvolvimento
dos meios de comunicao e transporte criaram um paradigma
onde a deslocao de pessoas, bens e informao sinnimo de
liberdade de opo. Privar um ser humano da possibilidade de
deslocao entre pases por questes do foro monetrio uma
privao da liberdade. Pensar que um regresso ao passado de
economias fechadas, possa ser uma soluo para esta ingern-
cia global, apenas uma ideia romntica para quem nunca viveu
afastado do desenvolvimento socio-econmico-cultural que uma
sociedade tendencialmente global trouxe civilizao humana. A
necessidade de deslocao no s nos liberta das proposies de
onde estamos como nos vai livrando de comportamentos etnocn-
tricos pondo-nos em contacto com seres humanos com culturas
distintas. A viagem no mera coisa de negcio ou turismo. um
percurso feito entre ns e o outro, que nos permite no s trocar
produtos e servios apenas possveis com o contacto com outras
culturas, como nos permite conceber outras formas de viver. A
viagem est na nossa natureza. O nomadismo, o mercantilismo e,
hoje, a globalizao so disso prova.
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a ProPoSta: UMa Moeda UMa Moeda
Uma moeda de valor fixo
Uma moeda de valor fixo, cuja produo seja regrada pelos esta-
dos (de preferncia em conjunto) e fiscalizada pelos sistemas de
justia, aplicando uma lei monetria, cdigo laboral e cdigo de
produo de amplitude internacional. So estes os vectores da
proposta deste livro.
A moeda vale coisas diferentes para pessoas diferentes. Bas-
ta pensarmos que pessoas distintas esto dispostas a pagar quan-
tias diferentes pelo mesmo objecto. Por isso mesmo, impossvel
de legislar sobre o valor de um bem. J o trabalho, actividade
humana feita por necessidade ou livre escolha, e que quase toda
a gente pode desempenhar, pode ser legislado. Fazer operaes
econmicas entre duas naes que tenham cdigos de trabalho
distintos e moedas distintas sem desvalorizar a moeda do pas com
menos gastos laborais sobre o mesmo trabalho, d, como se tem
visto, maus resultados. Seria mais inteligente e economicamente
eficaz legislar internacionalmente o nico acto humano sobre o
qual existe uma espcie de consenso em que deva ser compensado
com moeda (o trabalho) do que acrescentar ao preo de uma coisa
ndices e rcios relativos ao valor econmico da fora do trabalho
necessria para a produzir. Esta lei laboral que aqui se prope tem
que ser desenhada para promover a liberdade individual e a igual-
dade de direitos entre homens. No pode descurar a individuali-
dade de quem trabalha, assim como no pode deixar ao abandono
quem no consegue trabalhar ou quer deixar de trabalhar.
Todos vs, que amais o trabalho desenfreado (...),
o vosso labor maldio e desejo de esquecerdes
quem sois.
Friedrich Nietzsche *
Nietzsche ocupa-se com muito trabalho. D aulas sobre squi-lo e palestras, como: Sobre a personalidade de Homero, O drama musical grego. Redige um texto, A origem e finalidade da tragdia. Alguns no concor-dam com Nietzsche, mas todos o consideram um jovem de futuro promissor.http://www.culturabrasil.pro.br/nietzsche.htm
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O trabalho uma necessidade de uma civilizao, mas no
uma obrigao do indivduo e, por isso mesmo, a grande maio-
ria das pessoas concorda que ele deva ser pago. Quando algum
realiza uma tarefa da qual o outro tira proveito, a remunerao no
serve apenas para compensar quem trabalha, mas tambm para
garantir liberdade a quem no trabalha, pois a liberdade no s
tempo livre, tambm moral. Ningum tem dificuldade em aceitar
que quando se remunera o trabalho, quem realiza a tarefa no se
sente explorado. Ao mesmo tempo ao sentimento de culpa no vai
pesando nos ombros de quem no trabalha e usufrui dos resul-
tados do trabalho (porque v que apesar de tudo quem trabalhar
recebe um prmio monetrio). Estas ideias j existem dentro do
actual quadro econmico, mas ainda h imensas limitaes cau-
sadas pelo sistema monetrio que resultam em injustias sociais.
Para que a Declarao dos Direitos do Homem tenha alguma hip-
tese de ser cumprida, a relao entre a poltica laboral e mecanis-
mo monentrio tem que mudar. Tm que lutar os trabalhadores,
porque o que vir tem que partir do princpio de uma compen-
sao justa, e igualitria: um mdico portugus que t