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MORTE SÚBITA E EXERCÍCIO FÍSICO
Marcos Nasinbene RA: 001200600988
Orientador Científico: Profª Ms Ana Caroline Prioli
Universidade São Francisco
Curso de Educação Física - Licenciatura
Avenida São Francisco de Assis, 218
Jardim São José
CEP 12916-900
Bragança Paulista-SP
e-mail: [email protected]
RESUMO
A morte súbita relacionada à pratica esportiva é um acontecimento
trágico, que na grande maioria das vezes se deve a doenças cardiovasculares
congênitas ou adquiridas. A morte súbita relacionada ao exercício físico
somente pode ser caracterizada como tal nos casos de morte durante a
atividade física ou até uma hora após seu término. Essa morte acontece devido
a várias cardiopatias, na sua maioria de origem congênita.
Palavras Chave: Morte Súbita. Cardiopatias. Exercício Físico
ABSTRACT
The sudden death related to practices her sporting it is a tragic event,
that in the great majority of the times is due to congenital or acquired
cardiovascular diseases. The sudden death related to the physical exercise can
only be characterized as such in the cases of death during the physical activity
or until one hour after end of that. That death happens due to several heart
diseases, in majority of congenital origin.
Words Key: Sudden death. heart diseases. Physical Exercise
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1. INTRODUÇÃO
Atualmente, devido ao estilo de vida sedentário levado pelas pessoas,
principalmente nas grandes cidades, a moda do momento é dedicar um tempo livre a
prática esportiva, geralmente nos finais de semana (PY; JACQUES, 1998).
O grande problema é que na grande maioria das vezes, essa prática esportiva
é praticada sem nenhum tipo de orientação por parte dos profissionais da área da
Educação Física. (PY; JACQUES, 1998).
Isso acaba gerando um mal, muitas vezes mais perigoso que os males
causados pelo sedentarismo: a morte súbita no esporte, que é como se chamam as
mortes ocorridas, geralmente por problemas cardíacos durante ou até uma hora
após a prática esportiva (PY; JACQUES, 1998).
Apesar de ser um mal que atinge relativamente poucas pessoas cerca de 1
para cada 165.000 (BRONZATTO; SILVA; STEIN, 2001), é preciso manter-se atento
para o risco, uma vez que geralmente as males que causam a morte súbita não
apresentam sintomas claros, limitando assim uma possibilidade de diagnóstico
precoce (BRONZATTO; SILVA; STEIN, 2001).
O estudo desse tema controverso permite uma chance a mais de se
reconhecer os grupos de risco e causas da morte súbita.
Trata-se de uma fatalidade lembrada apenas quando atinge atletas famosos,
como o caso do zagueiro Serginho, do time paulista São Caetano, morto em 2005
por um mal conhecido como miocardiopatia hipertrófica.
Esse panorama precisa ser mudado e um maior conhecimento das causas da
morte súbita torna-se imprescindível para que essa mudança seja efetuada de fato.
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2. OBJETIVOS
O objetivo desse trabalho é entender através da revisão de literatura quais as
cardiopatias que causam a morte súbita e de que maneira essas cardiopatias podem
ser previstas, combatidas ou minimizadas.
2.1 Objetivos específicos:
Compreender as causas da morte súbita
Estudar através da revisão de literatura os meios de prevenção e combate às
cardiopatias
3. DESENVOLVIMENTO
3.1 Efeitos do exercício sobre o sistema cardiovascular
Antes de abordar especificamente as causas da morte súbita em si, deve-se
compreender primeiramente os efeitos que o exercício físico tem sobre o sistema
cardiovascular. O exercício físico, como se sabe, demanda um aumento no consumo
da energia utilizada pelo organismo.
Esse aumento no consumo de energia faz com que torne-se necessário
ajustes rápidos no fluxo sanguíneo, afetando todo o sistema cardiovascular
(MCARDLE; KATCH; KATCH, 2003).
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Esse ajuste se dá da seguinte forma: os nervos e os metabólicos locais
atuam sobre as faixas de músculos lisos das paredes arteriolares, aumentando seu
diâmetro interno (MCARDLE; KATCH; KATCH, 2003).
O aumento no diâmetro permite atender rapidamente à demandas de fluxo
sanguíneo. Além desse fator, a vaso constrição visceral e a bomba muscular
desviam um grande fluxo de sangue para dentro da circulação central (MCARDLE;
KATCH; KATCH, 2003).
Por meio desse mecanismo, o sistema cardiovascular desvia o sangue das
vísceras, levando-o até onde o mesmo é necessário no momento, ou seja, os
músculos que estão sendo utilizados no exercício físico. Essa ação obviamente
exige um esforço maior do coração (LEITE, 2000).
O coração, por sua vez, bombeia uma quantidade de sangue “x” por minuto
para o restante do corpo. Essa relação de sangue bombeado por minuto é chamada
de Débito Cardíaco. O valor máximo do débito cardíaco indica a capacidade do
sistema cardiovascular em atender as necessidades da atividade física (MCARDLE;
KATCH; KATCH, 2003).
Nesse contexto, podemos dizer que o rendimento do coração, como acontece
a qualquer bomba, depende de sua velocidade de bombeamento (freqüência
cardíaca) e da quantidade de sangue enviada a cada batida do coração (volume
sistólico da ejeção) (MCARDLE; KATCH; KATCH, 2003).
O valor do débito cardíaco varia de maneira considerável no momento em que
o indivíduo se encontra em repouso. Diversos fatores influem nessa variação e entre
eles podemos elencar as condições emocionais. Modificações nas condições
emocionais fazem com que haja uma alteração no fluxo anterógrado cortical
(comando central). Essa alteração tem efeito sobre os nervos cardioaceleradores e
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sobre os nervos que modulam os vasos de resistência arterial (MCARDLE; KATCH;
KATCH, 2003).
Durante o exercício o fluxo sanguíneo apresenta um aumento proporcional à
intensidade do exercício. Assim, o débito cardíaco aumenta de maneira muito rápida
durante a transição entre o estado de repouso e o exercício em ritmo estável. Desse
momento em diante, o débito cardíaco aumenta gradativamente, até o momento em
que atinge um ponto estável, quando o fluxo sanguíneo consegue suprir as
necessidades metabólicas exigidas pelos exercícios (MCARDLE; KATCH; KATCH,
2003).
A título de ilustração de ponto, McArdle, Katch e Katch 2003 afirmam que:
Nos homens sedentários em idade universitária, o débito cardíaco durante o
exercício máximo aumenta quatro vezes acima do nível de repouso, até um
máximo de 20 a 221 b/min. A freqüência cardíaca máxima para esses
adultos jovens é, em média, de 195 b/min [...] [...] Em contrapartida, os
atletas de endurance de classe mundial alcançam débito cardíacos de 35 a
401/min. Esse valor alto assume um maior significado quando se leva em
conta que a pessoa treinada em geral alcança uma freqüência cardíaca
ligeiramente mais baixa que uma pessoa sedentária de idade semelhante.
Assim sendo, o atleta de endurance alcança um grande débito cardíaco
máximo exclusivamente através de um grande volume sistólico de ejeção.
Isso significa que, por possuírem um maior treinamento, os atletas são
capazes de enviar mais sangue ao organismo a cada batido do coração, ou seja,
são capazes de suprir as necessidades do corpo durante o exercício com um menor
esforço para o coração (POWERS; HOWLEY, 2000).
Compreendidos esses fatores, pode-se partir para o estudo de como as várias
cardiopatias causadoras da morte súbita influenciam o funcionamento normal do
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coração durante a atividade física e quais os principais grupos de risco atingidos por esse
mal.
3.2 Morte súbita: causas e grupos de risco
Conforme foi dito anteriormente, a morte súbita pode ser causada por
diversos fatores relacionados a várias cardiopatias. Para se entender melhor o que
podemos chamar de morte súbita relacionada a atividade física, é interessante
analisarmos a seguinte definição.
A morte súbita relacionada aos exercícios físicos pode ser definida como as
mortes que ocorrem por problemas cardíacos durante ou até uma hora após o
término de atividades físicas vigorosas (BRONZATTO; SILVA; STEIN, 2001).
Uma importante informação deve ser acrescentada a essa definição: deve-se
excluir as atividades esportivas que tenham em si risco de vida intrínseco, tais como
alpinismo, paraquedismo, automobilismo, entre outros (BRONZATTO; SILVA;
STEIN, 2001).
Com relação aos grupos de risco, é possível identificar dois grupos distintos:
indivíduos com menos de 30 anos, nos quais a principal causa da morte súbita deve-
se mais frequentemente a problemas na estrutura do miocárdio e o grupo dos
indivíduos com mais de 30 anos, nos quais a principal causa é a doença arterial
coronária (OLIVEIRA, LEITÃO 2003).
Estudos demonstram que, entre os grupos de risco citados acima, os
corredores de fundo tendem a apresentar maior risco de morte súbita que atletas de
outras modalidades esportivas (BRONZATTO; SILVA; STEIN, 2001). Evidentemente
que esse fator não isenta os atletas de outras modalidades esportivas do risco da
morte súbita, apenas demonstra um risco maior entre os corredores de fundo.
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Estima-se que a proporção de mortes súbitas por ano é de uma para cada
165.000 entre as pessoas que praticam atividades físicas regularmente
(BRONZATTO; SILVA; STEIN, 2001). Embora seja uma baixa proporção, o risco não
pode ser completamente desconsiderado. Seria temerário afirmar que a proporção é
baixa demais para não gerar preocupação.
Entre essas mortes, é importante ressaltar que pessoas sem o hábito de uma
prática esportiva constante tem maior possibilidade de sofrer uma morte súbita do
que indivíduos com uma prática esportiva constante (OLIVEIRA, LEITÃO 2003).
Nesse contexto, pode-se dizer que o risco de se sofrer um infarto agudo do
miocárdio é de aproximadamente 5,9% no período de uma hora após o exercício
físico vigoroso (BRONZATTO; SILVA; STEIN, 2001).
No entanto, há uma queda significativa nesse risco quando a prática do
exercício físico é regular e quando a freqüência dessa atividade semanal aumenta
(BRONZATTO; SILVA; STEIN, 2001).
Assim como os demais eventos cardíacos agudos, a morte súbita apresenta
uma variação circadiana, ou seja, tem maior incidência em determinada hora do dia.
No caso da morte súbita, essa incidência é maior nas primeiras horas da manhã,
embora não há evidencias de que exercitar-se no período da manhã promova riscos
maiores que exercitar-se em qualquer outro período do dia (BRONZATTO; SILVA;
STEIN, 2001).
A atividade física não pode ser encarada como único fator causador da morte
súbita. Há todo um cenário a ser analisado, que envolve a patologia causadora, que
na maioria das vezes atua de forma silenciosa, ou seja, só dá sinais de suas
existência, no momento da morte súbita e também um momento crítico, que altera o
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equilíbrio do sistema, de maneira que acaba desencadeando toda a cadeia de
eventos que acaba por culminar na morte súbita (OLIVEIRA, LEITÃO 2003).
Nesse contexto, a atividade física pode vir a desempenhar esse papel de
“momento crítico”, ou ainda como uma espécie de gatilho, pois, conforme visto
anteriormente, a atividade física causa diversas alterações no funcionamento do
sistema cardíaco, tal como o débito cardíaco, por exemplo (BRONZATTO; SILVA;
STEIN, 2001).
Com relação a esse gatilho, diversos outros fatores podem vir a desempenhar
esse papel, causando alterações que comprometem seriamente a função miocárdia,
seja por aumento excessivo do consumo de oxigênio sem que haja o mesmo em
quantidade suficiente para suprir a demanda, seja por desordem aguda no sistema
excito-condutor cardíaco (OLIVEIRA, LEITÃO 2003).
Assim, a atividade física desempenha um papel paradoxal nesse complexo
cenário: pode vir a produzir as alterações cardiovasculares necessárias para diminuir
o risco de morte súbita em pessoas que praticam atividades físicas regularmente,
possivelmente por proporcionar um aumento na atividade autonômica
parassimpática melhorando assim a estabilidade elétrica do coração; por outro lado,
é passível de aumentar o risco de eventos cardiovasculares agudos, especialmente
em pessoas que não praticam nenhuma atividade física regularmente,
possivelmente por ativar o sistema autonômico simpático e promover a ruptura de
placas ateroscleróticas vulneráveis (BRONZATTO; SILVA; STEIN, 2001).
Como visto anteriormente, dois grupos de risco distintos podem ser
observados com relação a morte súbita: o grupo que compreende os indivíduos com
menos de 30 anos e o grupo dos indivíduos com mais de 30 anos. No grupo com
menos de 30 anos, as doenças mais comuns são a miocardiopatia hipertrófica, em
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todas suas variantes, anormalidades congênitas nas artérias coronárias, doença
arterial coronária e ruptura da aorta causada pela síndrome de Marfan. Outras
causas menos comuns que são dignas de notas: uso de cocaína, a displasia
arritmogênica do ventrículo direito, espasmo arterial coronário e prolapso da válvula
mitral. Em indivíduos com mais de 30 anos, a causa mais comum é a doença arterial
coronária. As valvulopatias adquiridas, o prolapso da válvula mitral a miocardiopatia
hipertrófica e outras causas diversas, correspondem a 5% das mortes súbitas
relacionadas a exercícios físicos nessa faixa etária (BRONZATTO; SILVA; STEIN,
2001).
Assim, uma vez conhecidos os fatores causais e os grupos de risco, é
pertinente conhecer mais a fundo as cardiopatias citadas, para uma melhor
compreensão de sua atuação sobre o sistema cardíaco e quais as possíveis
prevenções contras as mesmas.
3.3 Miocardiopatia hipertrófica – características e prevenção
A miocardiopatia hipertrófica ou cardiomiopatia hipertrófica é uma doença
caracterizada pela hipertrofia concêntrica do ventrículo esquerdo na ausência de
outra explicação fisiopatológica (BRONZATTO; SILVA; STEIN, 2001). Essa
hipertrofia pode afetar desigual o septo interventricular de um ventrículo esquerdo
não dilatado (BRONZATTO; SILVA; STEIN, 2001). Essa característica faz com que
seja produzida uma disfunção ventricular diastólica, devido à maior pressão de
enchimento do ventrículo esquerdo (OLIVEIRA, LEITÃO 2003).
A estimativa é de que a Miocardiapatia Hipertrófica atinja uma pequena
parcela da população, algo em torno de 0,02% e 0,2%. Por outro lado,
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ecocardiogramas apontam ocasionalmente, algum grau de hipertrofia em cerca de
0,5% dos casos (BRONZATTO; SILVA; STEIN, 2001).
Apesar da baixa ocorrência na população, estudos demonstram que a
Miocardiapatia Hipertrófica é apontada como a principal causa da morte súbita em
atletas com menos de 30 anos (OLIVEIRA, LEITÃO 2003).
Nesse segmento, ela é apontada como responsável por cerca de 50% dos
óbitos. Um fator preocupante é que em muitos casos, a morte súbita é a primeira e
única manifestação da doença (BRONZATTO; SILVA; STEIN, 2001). Esse fator
acaba por reduzir e muito as chances de diagnóstico e tratamento.
A miocardiapatia hipertrófica atinge mais frequentemente os homens, embora
as mulheres ainda possam ser atingidas por essa cardiopatia. As mulheres, talvez
devido ao menor volume do ventrículo esquerdo, tendem a apresentar a doença
mais precocemente (BRONZATTO; SILVA; STEIN, 2001).
O grau de hipertrofia é também pode ser um fator chave na determinação do
grupo de risco. Essa afirmação é validada pelo fato de que o risco de morte súbita é
diretamente proporcional ao grau de hipertrofia ventricular esquerda, sendo a
proporção fixada em 0 para 1000 em indivíduos com espessura ventricular esquerda
com valor menor ou igual a 15 mm e de 18,2 para 1000 em indivíduos com
espessura septal maior ou igual a 30mm (BRONZATTO; SILVA; STEIN, 2001).
Por ser uma doença que praticamente não apresenta sintomas, a
miocardiopatia hipertrófica tende a passar desapercebida por toda a vida do portador
dessa cardiopatia. Nesse caso, é interessante a análise do histórico familiar, pois a
miocardiopatia hipertrófica é uma doença que tem um padrão genético autossômico
dominante em cerca de 50% dos casos. Assim, um histórico familiar de sincope, pré-
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sincope ou morte súbita durante exercícios físicos pode servir como fator de alerta
para um possível diagnóstico desse mal (BRONZATTO; SILVA; STEIN, 2001).
Conforme dito anteriormente, a miocardiopatia hipertrófica praticamente não
apresenta sintomas específicos que permitam um diagnóstico preciso. Essa
afirmação fundamenta-se no fato que os sintomas apresentados são dispnéia,
angina e palpitações em mais de 50% dos indivíduos afetados (OLIVEIRA, 2002). O
que torna difícil o diagnóstico a partir desses sintomas é o fato de que os mesmo
ocorrem em diversas patologias cardíacas (OLIVEIRA, 2002).
Existem alguns fatores podem levar a suspeitar da miocardiopatia hipertrófica,
tais como a ocorrência de dispnéia na presença de ação sistólica normal ou a
presença de angina quando o indivíduo apresenta coronárias angiograficamente
normais (OLIVEIRA, 2002). Contudo, algo que poderia caracterizar a miocardiopatia
hipertrófica com muito mais propriedade seria o aparecimento de sincope ou pré-
sincope em indivíduos jovens e previamente assintomáticos (OLIVEIRA, 2002).
Pode-se notar entre os autores consultados um consenso no que diz respeito
à prevenção da morte súbita causada pela miocardiopatia hipertrófica. Tal consenso
seria de que a melhor forma de prevenção é a avaliação pré-participação em
exercícios físicos, observados os critérios para definição se o indivíduo encontra-se
ou não nos grupos de risco (OLIVEIRA, 2002).
Assim, observadas as características da principal cardiopatia causadora da
morte súbita, é importante analisar as características e meios de prevenção da
segunda cardiopatia mais significativa para a morte súbita.
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3.4 Anomalias congênitas nas artérias coronárias – características
e prevenção
As anomalias congênitas coronárias correspondem a cerca de 12% a 14%
dos casos de morte súbita relacionada ao exercício físico em pessoas até 30 anos
(BRONZATTO; SILVA; STEIN, 2001). Essa anomalia, entre diversas anomalias
coronárias, é a que mais comumente leva a morte súbita (BRONZATTO; SILVA;
STEIN, 2001).
Apesar dessa cardiopatia ser a segunda em incidência de casos de morte
súbita, é uma anomalia rara, ocorrendo numa proporção de 1 para cada 300.000.
Representa uma parcela pequena no vasto universo das cardiopatias,
representando cerca de 0,24% (TAKIMURA; NAKAMOTO; HOTTA; CAMPOS;
MÁLAMO; OTSUBO, 2002).
Essa anomalia apresenta-se em duas faixas etárias: a forma infantil e a forma
adulta. A forma infantil ou imatura caracteriza-se pela má circulação colateral ou
intercoronariana, podendo resultar em infarto do miocárdio, insuficiência cardíaca, ou
morte súbita. Estima-se que 80% a 90% das crianças atingidas por essa forma da
anomalia congênita coronária morra no primeiro ano de vida. Nesses casos, devido
às diversas complicações circulatórias, a morte súbita ocorre nos dois primeiros
meses de vida (TAKIMURA; NAKAMOTO; HOTTA; CAMPOS; MÁLAMO; OTSUBO,
2002).
Já a forma adulta da doença, pode ocorrer na criança e, necessariamente no
adulto em cerca de 10% a 15% dos casos. Nessa forma, a doença se caracteriza por
uma vasta circulação colateral intercoronariana, permitindo assim uma sobrevida
relativamente longa. Há relatos de sobrevida de indivíduos que alcançaram uma
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sobrevida de cerca de 72 anos. A doença, nesse caso, pode se apresentar de forma
assintomática, com quadros de cansaço, dispnéia durante esforço físico e angina de
peito, podendo assim levar a morte súbita (TAKIMURA; NAKAMOTO; HOTTA;
CAMPOS; MÁLAMO; OTSUBO, 2002).
Nesse quadro, a estrutura anatômica normal é afetada, fazendo com que a
artéria coronária sofra um estreitamento, devido a sua passagem entre a aorta e o
tronco pulmonar, acabando por formar um ângulo agudo (BRONZATTO; SILVA;
STEIN, 2001).
Essa configuração anatômica acaba por provocar o pinçamento da coronária
esquerda entre esses dois grandes vasos durante a situação em que produzam
contração cardíaca vigorosa (BRONZATTO; SILVA; STEIN, 2001).
Esse acontecimento cardíaco acaba por ocasionar quadros de isquemia
aguda e pelo substrato arritmogênico que esses indivíduos apresentam
(BRONZATTO; SILVA; STEIN, 2001).
Uma vez levantada a suspeita de anomalia, o ecocardiograma é a principal
ferramenta para um diagnostico preciso, embora em alguns casos, mesmo esse
exame apresenta algumas limitações (TAKIMURA; NAKAMOTO; HOTTA; CAMPOS;
MÁLAMO; OTSUBO, 2002).
Se a diagnosticada a tempo, a intervenção cirúrgica se faz necessária, para
correção do defeito e para que se evitem possíveis seqüelas próprias da história
natural da doença, embora muitas vezes, nem mesmo a intervenção cirúrgica afaste
por completo o risco de morte súbita (TAKIMURA; NAKAMOTO; HOTTA; CAMPOS;
MÁLAMO; OTSUBO, 2002).
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Embora as anomalias congênitas nas artérias coronárias sejam a segunda
causa das mortes súbitas, existe outra cardiopatia de origem coronária que também
pode vir a causar a morte súbita, como mostrado a seguir.
3.5 Aterosclerose coronariana prematura – características e
prevenção
A aterosclerose coronariana prematura corresponde, de acordo com estudos
a cerca de 10% das mortes súbitas em jovens praticantes de exercícios físicos. Essa
cardiopatia normalmente causa isquemia miocárdica e infarto do miocárdio,
geralmente na segunda ou na terceira década de vida (BRONZATTO; SILVA;
STEIN, 2001).
Uma das causas mais comuns para essa aterosclerose é formação de placas
de lipídios nas artérias. Um acúmulo de lipídios sugere dislipidemia, condição na
qual há uma concentração anormal de lipídios e lipoproteínas no sangue, condição
essa mais facilmente encontrada em pessoas acima do peso. Dessa, os indivíduos
apresentando sobrepeso com histórico familiar de aterosclerose coronariana
prematura tem uma chance mais alta de desenvolver a doença (ROMALDI; ISSLER;
CARDOSO; DIAMENT;FORTI, 2004).
Um dos fatores que podem servir de alerta da presença de tal cardiopatia é a
aparição de xantomas (lesão cutânea amarelada, causada pelo acumulo de lipídios
no local, que pode apresentar-se na forma de placa, nódulo ou pápula) tendinosos,
bem como um histórico familiar positivo de tal doença, permitindo uma intervenção
rápida a fim de se evitar a morte súbita (BRONZATTO; SILVA; STEIN, 2001).
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Embora infartos e pinçamentos da artérias sejam as principais causas do
morte súbita, como visto anteriormente, há ainda problemas com a ruptura de
artérias, algumas importantíssimas como a aorta. Uma das principais causas dessa
ruptura da aorta será tratada no capitulo seguinte.
3.6 Ruptura da aorta na síndrome de Marfan – características e
prevenção
A síndrome de Marfan é uma doença autossômica dominante,
causadora de uma mutação no gene da fibrilina – 1 (BRONZATTO; SILVA; STEIN,
2001).
Essa doença possui uma imensa variabilidade, podendo afetar os sistema
músculo-esquelético, ocular e cardiovascular (BRONZATTO; SILVA; STEIN, 2001).
As manifestações mais comuns da síndrome de Marfan incluem
aracnodactilia, pectus excavatum (tórax côncavo), frouxidão ligamentar, palato
estreito e alto, miopia, luxação do cristalino, prolapso da válvula mitral e dilatação da
raiz aortica (BRONZATTO; SILVA; STEIN, 2001). Assim, esses sinais externos
podem servir como alerta para o profissional de educação física da provável
presença da síndrome de Marfan, ou seja, indica que o individuo é passível de
possuir doenças cardíacas que podem leva-lo à morte súbita.
O prolapso da válvula mitral será tratado mais a fundo posteriormente. Quanto
à dilatação da raiz aortica, pode resultar em regurgitação aortica, com predisposição
para necrose da camada média da aorta, favorecendo a dissecção e a ruptura da
aorta, levando assim à morte súbita (BRONZATTO; SILVA; STEIN, 2001).
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A dilatação e regurgitação da aorta podem na maioria das vezes ser
identificada através de ausculta, entretanto, cerca de 40% dos casos não podem ser
identificados dessa maneira. Nesses casos, mais uma vez o ecocardiograma é
ferramenta fundamental para a confirmação da patologia. Nesses casos, a
intervenção cirúrgica pode se fazer necessária (BRONZATTO; SILVA; STEIN, 2001).
A ruptura da aorta na síndrome de Marfan é responsável por cerca de 7% das
mortes súbitas de praticantes de atividades físicas (BRONZATTO; SILVA; STEIN,
2001).
Assim como a síndrome de Marfan e outras cardiopatias, a causa de
distúrbios no coração é genética. Essa característica genética é mantida na
cardiopatia seguinte, como visto a seguir.
3.7 Displasia arritmogênica do ventrículo direito – características e
prevenção
A displasia arritmogênica do ventrículo direito é uma cardiopatia de origem
autossômica dominante, que originalmente foi identificada em pessoas submetidas a
cirurgia para tratamento de taquicardia ventricular (ELIAS; TONET; FRANK;
FONTAINE, 1998).
Essa cardiopatia trata-se de uma alteração estrutural do miocárdio, que se
caracteriza por uma progressiva substituição das células miocárdicas sadias por
células de um tecido fribrogorduroso, interferindo assim no funcionamento correto do
músculo cardíaco, alterando de maneira fatal o ritmo das batidas do coração (ELIAS;
TONET; FRANK; FONTAINE,1998).
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Pode-se identificar mais freqüentemente a displasia arritmogênica do
ventrículo direito em adultos jovens, predominantemente em indivíduos do sexo
masculino (ELIAS; TONET; FRANK; FONTAINE, 1998).
A displasia arritmogênica do ventrículo direito é a provável causadora de
cerca de 5,9% das mortes súbitas, sendo que, como acontece com a miocardiopatia
hipertrófica, muitas vezes a morte súbita é a primeira e única manifestação da
doença (ELIAS; TONET; FRANK; FONTAINE, 1998).
As alterações de ritmo têm sua origem em estruturas que normalmente não
existem dentro do ventrículo direito, que normalmente encontra-se dilatado e
recoberto pelo tecido fibro-adiposo. Essas alterações encontram-se em localização e
quantidade maior que o normal, sendo facilmente visualizadas através de
ecocardiogramas. Outra alteração digna de nota freqüentemente presente nesses
ecocardiogramas é a inversão das ondas T (ELIAS; TONET; FRANK; FONTAINE,
1998).
A presença de alguns sintomas durante a prática de exercícios físicos pode
alertar para a presença dessa cardiopatia, tais como palpitações, tonturas e sincope,
geralmente ocasionadas devido à taquicardias provocadas pela displasia
arritmogênica do ventrículo direito. Outro fator importante a ser considerado é a
antecedência familiar de tal cardiopatia, uma vez que trata-se de uma doença de
origem autossômica dominante (ELIAS; TONET; FRANK; FONTAINE,1998).
Um fato curioso, e provavelmente derivado dessa origem genética da doença
é a alta incidência da mesma na região de Veneto, na Itália. Nessa região, a maior
parte das mortes súbitas relacionadas ao exercício físico se devem da displasia
arritmogênica do ventrículo direito (BRONZATTO; SILVA; STEIN, 2001).
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A displasia arritmogênica do ventrículo direito, assim como as demais
cardiopatias elencadas até o momento tende a causar morte súbita em pessoas com
menos de 30 anos. A próxima cardiopatia irá tratar da causa das mortes após essa
faixa etária, conforme tratado a seguir.
3.8 Doença arterosclerótica coronária – características e prevenção
Esse tipo de cardiopatia costuma afetar cerca de 10% dos praticantes de
exercícios físicos com menos de 30 anos, risco esse que se encontra dentro da
normalidade para a população em geral. O risco se torna muito maior para os
praticantes de exercícios físicos com mais de 30 anos, onde passa a apresentar o
índice de cerca de 77% (BRONZATTO; SILVA; STEIN, 2001).
Cerca de 1/3 dos praticantes de exercícios físicos que vêm a morrer depois
da pratica esportiva têm a morte súbita como primeira manifestação da doença
aterosclerótica coronária (BRONZATTO; SILVA; STEIN, 2001). Isso significa que um
montante considerável de indivíduos sequer tem a chance tratar a doença, vindo a
falecer sem nem mesmo desconfiar do risco que corre.
Entretanto, apesar desse 1/3 que nem sequer imaginam que sofrem dessa
cardiopatia, cerca de metade das pessoas que morrem subitamente durante
exercícios físicos experimentam algum tipo de sintoma padrão já sofrem de algum
tipo de doença coronária prévia (BRONZATTO; SILVA; STEIN, 2001).
A doença aterosclerótica coronariana é ainda a responsável por um tipo de
morte súbita, mais comumente entre os homens, curiosamente ligada ao esporte.
Muitos homens morrem em frente a TV ou em estádios, enquanto assistem aos
eventos esportivos (BRONZATTO; SILVA; STEIN, 2001).
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Enquanto a doença aterosclerótica prematura atinge com mais freqüência
homens, outro causador de morte súbita atinge indistintamente homens e mulheres.
Trata-se do prolapso da válvula mitral.
3.9 Prolapso da válvula mitral – características e prevenção
Embora o prolapso da válvula mitral seja freqüentemente apontado como uma
das causas da morte súbita relacionada ao exercício físico, apenas uma pequena
porcentagem de pessoas, algo por volta de 3% morre efetivamente por essa razão
(BRONZATTO; SILVA; STEIN, 2001). Considerando essa porcentagem, o risco
percentual é baixo, embora não totalmente ausente (BRONZATTO; SILVA; STEIN,
2001).
Devido a esse risco, ainda que pequeno, é preciso estar atento para alguns
sinais, que podem indicar a presença dessa cardiopatia, tais como: sincope, dor
torácica incapacitante, arritmias ventriculares complexas, cardiomegalia moderada
devido a regurgitação valvular mitral ou caso algum familiar tenha apresentado morte
súbita.
Nesses casos, é interessante que a prática dos exercícios físicos seja
adequadamente avaliada, procurando uma atuação em parceria entre o médico e o
profissional de educação física para esse fim (BRONZATTO; SILVA; STEIN, 2001).
4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como é fato conhecido que o exercício físico pode ter papel contributivo no
acontecimento da morte súbita em determinados tipos de indivíduos, a reação mais
costumeira de muitos médicos sem o devido preparo é desaconselhar por completo
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a prática de exercícios físicos, com o intuito de diminuir o risco. Esse comportamento
por parte da classe médica acaba por refletir um aspecto importante a ser
observado, que é insistência dessa classe em se envolver na prescrição/proibição da
prática de atividades físicas, atitude essa cabível apenas ao profissional de
educação física. Nesse tipo de situação, talvez uma ação conjunta pudesse ser
levada em consideração.
Por conta disso, esse tipo de atitude por parte desses representantes da
classe médica mostra-se equivocada, já que embora eventualmente um ou outro
individuo possa vir a sofrer a morte súbita durante a pratica de exercícios físico, a
grande maioria dos indivíduos pode praticar exercícios físicos sem problemas, ou
seja, a chance real da morte súbita acontecer durante essas atividades é por demais
pequena.
Apenas esse fator já seria suficiente para que a classe médica não
desaconselhasse a pratica esportiva. Entretanto, há ainda uma questão a se
considerar. É sabido que na grande maioria das vezes a prática de exercícios
regularmente tem ação preventiva contra acontecimentos cardíacos agudos durante
atividades físicas não planejadas, e por isso mesmo impossíveis de serem evitadas.
Uma questão interessante a ser abordada é que, embora o risco efetivo de
morte súbita durante a prática de exercícios físicos seja pequeno, o risco existe e
deve ser considerado. Nesse momento, é imprescindível a observação atenta por
parte do profissional de educação física aos possíveis sinais demonstrado pelo
aluno durante pratica esportiva, principalmente se o aluno em questão encaixa-se no
perfil de algum dos grupos de risco. Para que isso ocorra de maneira efetiva, o
profissional de educação física não pode ser furtar da responsabilidade de conhecer
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esses grupos de risco, podendo assim estabelecer padrões que o auxiliem nesse
sentido.
Assim, é importante conhecer o perfil e o histórico do individuo em questão,
saber seu histórico familiar, se alguma vez apresentou sincope durante a realização
de um esforço físico, se apresenta dor torácica durante a realização de atividades
que aumentem o consumo miocárdico de oxigênio, se há presença de algum familiar
que possua ou tenha possuído alguma cardiopatia e em caso de resposta positiva,
qual a idade desse individuo quando veio a falecer. A resposta a essas questões
aliada ao exame físico e ao eletrocardiograma em geral podem oferecer condições
para o individuo ser liberado ou não para a pratica de exercícios físicos.
Uma vez identificadas, as pessoas portadoras de alguma das cardiopatias
citadas acima deve ser aconselhada de acordo com sua condição. Usualmente, os
indivíduos que possuem cardiopatias consideradas de alto risco, são
desaconselhadas a praticarem exercícios físico, a fim de se evitar complicações
maiores.
Com base nesses dados, decisão de desaconselhar ou não a prática de
exercícios físicos deve ser criteriosa, fundamentada em um risco realmente
presente. Uma avaliação errônea pode privar um individuo em condições de utilizar
uma medida simples e eficaz para evitar o risco de outras doenças cardiovasculares.
Assim, o exercício físico regular pode produzir diversos benefícios, não
apenas sobre a doença arterial coronária, mas também sobre seus fatores de risco.
Dessa forma, faz-se extremamente necessária uma parceria entre os campos
da medicina e da educação física, ambos atuando em uníssono, e trocando
informações para que haja uma constante atualização quanto às causas da morte
súbita relacionada ao exercício físico e suas diversas formas de apresentação.
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6. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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