n°13 ciÊncia espÍrita - herculano pires.pdf

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 www.autoresespiritasclassicos.com  J . He r culano Pires Ciência Esp ír it a e suas im pl ic õ e s te r a uti c as Conteúdo r e s um ido  Nesta obra Herculano analisa os principais aspectos da Ciên- cia Espírita e suas implicações terapêuticas. O autor demonstra que a metodologia científica varia com o tempo, mas a ciência

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    J. Herculano Pires

    Cincia Espritae suas implicaes teraputicas

    Contedo resumido

    Nesta obra Herculano analisa os principais aspectos da Cin-cia Esprita e suas implicaes teraputicas. O autor demonstraque a metodologia cientfica varia com o tempo, mas a cincia

  • em si mesma imutvel; seu objetivo um s: o conhecimentoexato da realidade.

    Temas estudados: o desenvolvimento da Cincia em geral e oda Cincia Esprita, princpios da teraputica esprita, naturezamoral da terapia esprita, tratamentos de vcios e perverses,motivos de dificuldades nas curas, interpretaes errneas dahomossexualidade, psiquiatria esprita, negros e ndios terapeu-tas, os perigos das religies primitivas e a situao perigosa dosmdiuns de cura.

    Para oDr. Carlos Imbassahyque sustentou a luta sem trguas para es-clarecimento dos problemas da Cincia es-prita, a partir de sua modesta fortaleza deNiteri, publicando uma srie de livros emque respondeu a todas as crticas dos ad-versrios, apresentando-lhes, com elegn-cia e bom-humor, todo o panorama daspesquisas cientficas no mundo, as quaisconfirmaram as pesquisas de Kardec.

  • Se Kardec no houvesse fundado, desenvolvidoe propagado a Cincia Esprita, pela qual deu sua vi-da e seu gnio, nossa cultura no passaria de um cis-car de galinhas na crosta da Terra. Nunca saberamos,atravs de pesquisas psicolgicas e fsicas incessan-temente repetidas, o que somos, qual o nosso destinoe o que a morte representa no vir-a-ser da Humanida-de. Ele obrigou os mais famosos cientistas do SculoXIX a pr de lado as suas preocupaes com a mat-ria para descobrir e provar a existncia do esprito,como aconteceu com William Crookes, Charles Ri-chet, Alexandre Aksakof, Ochorowicz, FriedrichZllner e tantos outros, a enfrentar os fantasmas co-mo dipo enfrentou a Esfinge. Em nosso sculo for-ou Rhine e McDougal a desenvolver na Parapsico-logia as suas pesquisas, hoje vitoriosas em todo omundo.

    (Palavras do Dr. Urbano de Assis Xavier,na abertura do I Congresso Esprita

    da Alta Paulista, em Marlia,em maio de 1946.)

  • Sumrio

    Esclarecimento ..............................................................................5O Desenvolvimento Cientfico......................................................61 Desenvolvimento da Cincia Esprita ...................................112 Princpios da Teraputica Esprita.........................................143 Natureza Moral da Terapia Esprita ......................................174 Tratamento de Vcios e Perverses .......................................215 Motivos de Dificuldades nas Curas.......................................246 Interpretaes Errneas sobre a Homossexualidade .............287 Psiquiatria Esprita ................................................................318 Os Imponderveis da Cura Esprita.......................................349 Negros e ndios Terapeutas ...................................................3810 Manifestaes Espirituais de Crianas ................................4111 Perigo das Religies Primitivas...........................................4412 Situao Perigosa dos Mdiuns de Cura .............................48Ficha de Identificao Literria...................................................52

  • Esclarecimento

    A Filosofia Esprita foi reconhecida pelo Instituto de Frana efigura no Dicionrio Tcnico da Filosofia, de Lalande. O reco-nhecimento da Cincia Esprita, em virtude de suas implicaesgnosiolgicas profundas, que provocaram uma revoluo copr-nica nas Cincias, e por causa da fragmentao destas em diver-sas especificaes, somente agora, com o desenvolvimento daParapsicologia, conseguiu o seu reconhecimento pelos grandescentros universitrios do mundo. Somente os espritos sistemti-cos e as instituies dogmticas (fora da rea cientfica), ainda seopem a esse reconhecimento, jogando com argumentos e nocom fatos, portanto de maneira no-cientfica.

  • O Desenvolvimento Cientfico

    A inquietao do mundo atual, na busca de novas soluespara os problemas humanos, abrange todos os setores de nossasatividades e teria necessariamente de afetar o meio esprita. Masa nossa Doutrina no uma realidade entranhada nas estruturasatuais. um arqutipo carregado de futuro, um vir-a-ser que seprojeta precisamente no que ainda no , na rota das aspiraesem demanda. Confundi-la com as estruturas peremptas destemomento de transio e querer sujeit-la s normas e modelos doque j foi, tentar prend-la no crculo vicioso dos abortosculturais. O Espiritismo, rejeitado pelo mundo agora agonizante,no cmplice nem herdeiro, mas vtima inocente desse mundo,como Jesus e o Cristianismo o foram no seu tempo.

    Se no tomarmos conscincia dessa realidade histrica, com alucidez necessria, no saberemos como sair do labirinto em queo Minotauro nos espera. O fio de Ariadne, da salvao, estnessa tomada de conscincia. Na verdade, no o fio mitolgico,mas o fio racional das proposies doutrinrias de Kardec,limpidamente cientficas.

    A prova disso ressalta aos olhos dos estudiosos e dos pesqui-sadores experientes, que no se deixam levar pelo sopro davaidade em seus precrios bales de ensaio. Porque a hora propcia s inovaes nefelibticas do tipo de Rabelais. Paraandar nas nuvens os nefelibticos no precisam mais de subir aocu, basta-lhes tomar o elevador de um arranha-cu.

    No podemos adaptar o Espiritismo s exigncias dos quenegaram e negam a existncia dos espritos, aviltando o princpiointeligente e a razo nas correntes de Prometeu.

    A Revelao Espiritual veio pelo Esprito da Verdade, mas aCincia Esprita (revelao humana) foi obra de Kardec. Elemesmo proclamou essa distino e se entregou de corpo e almaao trabalho cientfico, sacrificial e nico de elaborao da Cin-cia Admirvel, que Descartes percebeu por antecipao em seusfamosos sonhos premonitrios. Cientista, Pedagogo, diretor deestudos da Universidade de Frana, mdico e psiclogo1, ele se

  • serviu de sua experincia e seu saber onmodo para organizar aNova Cincia, que se iniciara desdobrando as dimenses espaci-ais e humanas da Terra. Em meados do Sculo XIX, s portas dogrande avano cientfico do Sculo XX, os cientistas ainda nopercebiam a sua total ignorncia da estrutura real do planeta, desuas vrias dimenses fsicas e de sua populao oculta. O pesoesmagador da tradio teolgica, com sua cincia infusa escora-da na Bblia judaica, vendava os olhos da Cincia, que tinha deandar s cegas como a prpria justia humana. Essa Cinciatrpega e bastarda, no obstante os seus pressupostos atrevidos,contava em seu seio com os pioneiros do futuro. frente dessespioneiros se colocou Kardec, dotado de uma coragem assustado-ra, que lhe permitiu enfrentar com a insolncia dos gnios todasas foras culturais da poca. Graas sua viso genial, o solitrioda Rua dos Mrtires conseguiu despertar os maiores cientistas dotempo para a realidade dos fenmenos espritas, hoje estrategi-camente chamados paranormais. Fundou a Sociedade Parisiensede Estudos Espritas como entidade cientfica e no religiosa.Dedicou-se a pesquisas exaustivas e fundou a Revista Espritapara divulgao ampla e sistemtica dos resultados dessas pes-quisas. Sua coragem serviu de amparo e estmulo aos cientistasque, surpreendidos pela realidade dos fenmenos, fizeram osprimeiros rasgos na cortina de trevas que cercava as mais impo-nentes instituies cientficas. Foi para contest-lo e estigmatiz-lo como inimigo das Cincias, comparsa dos bruxos medievais,restaurador das supersties, que cientistas como Crookes,Schrenk-Notzing, Richet e outros resolveram atender aos apelosangustiados das Academias e Associaes cientficas. Dessaatitude corajosa resultou o escndalo das batalhas que romperamo impasse cientfico, revelando que o bruxo agia com o conhe-cimento e a segurana dos mais reputados cientistas. Era impos-svel desmenti-lo ou derrot-lo. Kardec rompera definitivamenteas barreiras dos pressupostos para firmar em bases lgicas eexperimentais os princpios da Cincia Admirvel dos sonhos deDescartes e das previses de Frances Bacon. A metodologiacientfica, minuciosa e mesquinha, desdobrou-se no campo doparanormal e aprofundou-se na pesquisa do inteligvel comaudcia platnica. Kardec no se perdeu, como Wundt, Werner e

  • Fechner, no sensvel das pesquisas epidrmicas do limiar dassensaes. Percebeu logo que os mtodos no podiam ser aplica-dos a fenmenos extrafsicos e estabeleceu o princpio da ade-quao do mtodo ao objeto. Quando alguns membros da SocitParisien quiseram desvi-lo para a pesquisa biofsica das materi-alizaes, ele se recusou faz-lo, alegando que essa tarefa cabiaaos especialistas das cincias materiais. Os objetivos que perse-guia eram psicolgicos, por isso deu Revue Spirite o subttulode Jornal de Estudos Psicolgicos. Quando Zllner, em Leipzig,realizou suas pesquisas psicofsicas com o ectoplasma e o pro-blema da quarta dimenso, tornou-se evidente que o mestreestava no caminho certo. Era preciso penetrar nos segredos daalma, deixando para os fsicos as questes materiais. Sua firmezametodolgica denunciava o gnio de viso segura e posioinabalvel. Ele criava, como declarou, a Cincia dos Espritos,sua natureza, suas relaes com a matria e com os homens. Seno foi colocado oficialmente entre os pioneiros da Cincia, foiporque a sua posio era de rebeldia consciente e declaradacontra o materialismo cientfico. Afirmava em seus escritos epalestras que os cientistas se empolgavam com o campo objetivodos efeitos materiais, fugindo pesquisa das causas profundascomo o Diabo fugia da cruz. Mais tarde Richet, o fisiologistaimplacvel, reconheceria o rigor das suas pesquisas, a firmeza dasua posio, sem as quais a Cincia no se libertaria da poeira daterra. Kant lhe opunha a barreira de sua autoridade ao afirmarque a Cincia s era possvel no plano dialtico. A proposiokantiana pesa at hoje na limitao das atividades cientficas.Mas a audcia de Kardec o levou vitria. Richet observou,numa carta histrica a Ernesto Bozzano, o grande metapsiquistaitaliano, que a posio kardeciana deste contrastava decisiva-mente com as teorias que atravancam o caminho da Cincia.

    As teorias podem ser as mais brilhantes como observouBozzano , mas no podem prevalecer contra a realidade dosfatos. E Lombroso, que combatera tenazmente a volta s supers-ties, acabaria se penitenciando do seu erro nas pginas darevista Luce e Ombra, de Milo. Os frutos da tremenda batalhakardeciana comeavam a modificar a mentalidade cientfica

  • temerosa dos absurdos teolgicos. Kardec provara que as Cin-cias no deviam temer os fantasmas, mas enfrent-los e explic-los. Nenhuma autoridade era mais elevada, para ele, do que arealidade dos fatos comprovveis pela experincia cientfica eobjetiva das pesquisas. Os cientistas mais audaciosos aprende-ram com ele a superar os condicionamentos do formalismoacadmico e enfrentar o mundo como ele . Richet reconheceria,no Tratado de Metapsquica, que Kardec jamais fizera umaafirmativa que no tivesse sido provada pelas pesquisas. Ocriador da Cincia atual e de sua metodologia eficiente e eficaz,queiram ou no os alrgicos ao futuro, na expresso recente deRemy Chauvin, foi precisamente Kardec, o homem do sculoXIX que revelou, numa batalha sem trguas, estes dois princ-pios fundamentais da nossa mundividncia:

    1) A realidade una e indivisvel, firmada na Unidade Pita-grica que se revela na multiplicidade da Dcada;

    2) Tudo se encadeia no Universo, sem soluo de continui-dade. Os que tentam fragmentar essa unidade orgnica es-to presos s falveis condies do sensrio humano.

    No desenvolvimento atual das Cincias, muitas cabeas gre-gas e troianas formularo novas, fascinantes e complexas teorias,mas s prevalecero as que forem sancionadas pelas profeciasfatais de Cassandra. O fatalismo, no caso, no decorre da nature-za trgica das previses, mas da comprovao dos fatos. A figurade Kardec continua suspensa sobre o panorama cientfico atualcomo o orientador indispensvel dos novos caminhos do conhe-cimento, na rota csmica das constelaes. Em recente congressorealizado em Moscou, provocado pelas controvrsias sobre adescoberta do corpo bioplsmico do homem, Kardec foi conside-rado como um racionalista francs do sculo XIX que antecipoudiversas conquistas da tecnologia moderna. Nossos jornaisnoticiaram a realizao desse congresso, mas os dados a respeitoforam escassos. Pesava sobre o congresso a suspeio de atitudesque pudessem perturbar as relaes entre a Cincia Sovitica eos interesses bsicos da ideologia fundamental do Estado. NaRomnia marxista a Parapsicologia mudou de nome, passando achamar-se Psicotrnica, e isso com a finalidade declarada de

  • aproximar das cincias paranormais os materialistas mais ferre-nhos ou mais cautelosos, que no desejam ver-se envolvidos emcomplicaes espritas. Todos esses fatos provam que a CinciaAdmirvel elaborada pelo bruxo parisiense continua a pesar naspreocupaes e no desenvolvimento da Cincia atual, que avanainelutavelmente sobre o esquema cientfico de Kardec. Este ofato mais significativo dos nossos dias, que os espritas nopodem ignorar. As prprias pesquisas da Astronutica tmseguido sem querer e sem saber o esquema de Kardec naSocit Parisien. Das comunicaes medinicas de Mozart,Bernard Pallissy, Georges e outras entidades, na Socit, referin-do-se Lua, a Marte e Jpiter, at a remessa de homens Lua esondas soviticas e norte-americanas a Marte e Jpiter mostramque o mapa das incurses possveis foi decalcado, de maneirainconsciente, mas evidente, no mapa kardeciano. Alm disso, asprprias descries desses corpos celestes, feitas pelos espritoscomunicantes em Paris, que Kardec considerou com reservas,tm geralmente coincidido com os dados atuais das pesquisasastronuticas. No tocante Lua h um problema referente suaposio na rbita em torno da Terra. Mas Kardec acentuou, noseu tempo, com o apoio do famoso astrnomo Flammarion, queos dados espirituais davam a nica teoria existente na pocasobre o problema. O esquema kardeciano no foi feito intencio-nalmente. Resultou de comunicaes espirituais espontneas,que Kardec recebeu com reservas, acentuando que esse fato nose enquadrava nas pesquisas da Socit e eram recebidos comocuriosidades significativas, sujeitas a confrontos futuros noprocesso de desenvolvimento das Cincias.

    Tambm nessa atitude evidencia-se o critrio cientfico deKardec, interessado nos casos gratuitos, mas reservando a suaverificao real ao futuro. Aos que, na poca, entusiasmadoscom essa possvel revelao de problemas csmicos, diziam aKardec que as utopias de hoje se realizam no amanh, Kardecrespondia que deviam esperar a transformao das utopias emrealidade para depois as aceitar. Os dados positivos, os fatos, arealidade evidente e a lgica de clareza meridiana eram os ele-mentos preferenciais do seu trabalho. Suas obras nos mostram a

  • limpidez clssica do pensamento francs. Era o mestre porexcelncia. Sua didtica ressalta de toda a sua obra. Richet lhecensurou a aparente facilidade com que aceitava a realidade dosfenmenos medinicos e da vida aps a morte, mas acaboureconhecendo que ele nunca fizera uma s afirmao que noestivesse respaldada pelas pesquisas. No dispunha dos recursosatuais da pesquisa tecnolgica, mas tocou a verdade com a pontados dedos, como Tom. Tudo quanto afirmou no seu tempopermanece vlido at hoje. A instabilidade das hipteses e dasteorias cientficas no existiu para ele. Os cientistas atuais noconseguiram abalar o edifcio das suas concluses. Giram aindahoje como borboletas noturnas em torno da sua lmpada e aca-bam queimando as asas no fogo da sua verdade mil vezes com-provada em todo o mundo.

    Esse problema da comprovao freqentemente levantadopelos contraditores da doutrina e at mesmo por adeptos poucoinformados, que alegam a impossibilidade de repetio dosfenmenos para atender s exigncias do mtodo cientfico. Comesse velho chavo nas mos, pensando haver descoberto a chavedo mistrio, declaram com nfase que a Cincia Esprita no cincia, mas apenas um apndice esprio da doutrina. Com issoagridem a competncia de Kardec e de todos os grandes cientis-tas que, desde o sculo passado at o presente, de Crookes aRhine, submeteram os fenmenos s formas possveis de repeti-o. Basta a leitura das anotaes de Kardec em Obras Pstu-mas, o episdio do seu encontro com o fenmeno das mesas-girantes, para se ver a falcia dessa acusao. A impossibilidadede repetio dos fenmenos espritas implicaria a impossibilida-de da pesquisa. Todos os anos da pesquisa sistemtica, minucio-sa e exaustiva de Kardec, e os anos de pesquisa exemplar deCrookes, Notzing, Gibier, Ochorowicz, Aksakof, Myers, Geley eOsty, e assim por diante, so displicentemente atirados no badas antigidades estpidas. Foi por essa e por outras que Richetescreveu o seu livro O Homem Estpido. A repetio de experi-ncias medida corriqueira em qualquer pesquisa. Os que lan-am mo dessa alegao para negar a existncia da Cincia

  • Esprita nos do a prova gratuita da sua incapacidade para tratardo assunto.

    Houve interrupo no desenvolvimento da Cincia Esprita,alegam outros. Depois de Kardec ningum mais pesquisou e osespritas se entregaram a rememorar os feitos do passado. Setivssemos feito isso, simplesmente isso, j teramos mantidoviva a tradio doutrinria, vigorosamente apoiada em sriesinfindveis de pesquisas mundiais, realizadas por nomes expo-nenciais das Cincias. Mas a verdade que no houve soluo decontinuidade na investigao, mas simples diversificao dasexperincias em vrias reas culturais, acompanhada de renova-es metodolgicas. A Cincia Esprita projetou-se em direesdiversas, desdobrou-se em outras coordenadas e deu nascimentoa outras cincias. Atacada por todos os lados, por todas as forasculturais da poca, a Cincia Esprita firmou-se nos seus princ-pios e multiplicou os seus meios de comunicao. A escassez doelemento humano interessado na busca da realidade pura no lhepermitiu a expanso necessria. O homem terreno continua aindaapegado aos interesses imediatistas e aos seus preconceitos, suavaidade sem razo e sem sentido. So poucas as pessoas demente aberta e corao sensvel, nesta humanidade egosta evoraz. Esses elementos compreensivos e abnegados nem sempredispem de condies culturais suficientes para enfrentar a lutacontra as fascinaes do seu prprio passado e dos insufladoresde idias confusas e perturbadoras no meio esprita e nas reasadjacentes. Mas tudo isso faz parte da lenta e difcil evoluohumana. Estamos ainda nos arrancando dos instintos animais,dos mecanismos condicionados pelos milnios do passadogensico. O panorama atual do mundo nos d a medida exata donosso atraso evolutivo. O contraste chocante entre os pesadoslastros da barbrie e as aspiraes renovadoras do futuro, geral-mente desprovidos de recursos materiais para realizaes concre-tas urgentes, revelam a densidade do nosso carma coletivo.

    A preguia mental e a atrao magntica do passado encarce-radas em si mesmas mostram-se incapazes de um gesto de gran-deza em favor de realizaes urgentssimas. Por isso a dor ex-plode por toda a parte, em vagalhes enfurecidos. A dor aumen-

  • tar, porque s ela pode arrancar os insensveis de suas tocas. Asleis da evoluo so implacveis e nada as deter enquanto oshomens no acordarem para o cumprimento dos seus deveresmorais e espirituais. A Cincia Esprita est em nossas mos enos indica o roteiro a seguir. Mas ns a envolvemos em dvidase debates inteis, ao invs de nos alistarmos em suas fileiras e denos entregarmos generosamente ao seu estudo, sua divulgaoe sua prtica. Homens de recursos financeiros julgam-se agra-ciados por Deus para viverem tripa forra, esquecidos dasmultides de ignorantes, muitos deles ansiosos por elevaocultural, mas presos s grilhetas da chamada sociedade de con-sumo, que na verdade est consumindo o prprio planeta. Osprivilgios sociais de uma ordem social estabelecida pela fora eno pelo amor lhes do a iluso da graa divina. Desapareceramdo mundo os antigos messenas, que punham suas fortunas aoservio da coletividade. Preferem socorrer os pobres com suasmigalhas de sopas e assistncias precrias, julgando que assimaumentam seu crdito nos Bancos da Eternidade. No jogamcom a caridade, mas com os clculos de juros que no existemno Alm. So os novos vendilhes do Templo, os cambistas dacaridade fcil e supostamente rendosa. Chegaro no Alm demos vazias e manchadas pelas ndoas da ambio desmedida eda insensibilidade moral. A Cincia Esprita necessita de escolas,de Universidades, de bibliografias especializadas. No podecontar com os recursos comuns da simonia, em que se banque-teiam as religies pomposas e mentirosas. No existe no mundouma nica Universidade Esprita, em que a Cincia Admirvelpossa manter e desenvolver os seus trabalhos de pesquisa cient-fica. De vez em quando, um potentado se sente tocado pelaintuio de uma entidade benvola e faz doaes generosas a ummdium ou a uma instituio de assistncia social. O mdium, dehonesto e sensvel, passa a doao para outras instituies decaridade. Os servios culturais continuam mngua, sustentadosapenas pelos que do seu tempo, sua vida e seu sangue para asustentao da cultura esprita. Certas instituies gastam os seusrecursos em aviltamento da Doutrina, com a produo de obrasesprias, a servio da mistificao. Respondem por essa situao

  • precria da Cincia Esprita todos os que preferem os jurosbancrios ao desenvolvimento cultural.

    A Ordem Divina regida por Deus, mas a ordem humana dominada pelo homem, no aprendizado da vida terrena. Se noconseguirmos despertar os homens para o urgente desenvolvi-mento da Cincia Esprita, nada mais teremos do que a culturaterrena em que vivemos, de olhos fechados para o alvorecer dosnovos tempos. No veremos o raiar da Era csmica, porqueteremos voluntariamente enterrado a cabea na areia, em plenodeserto, na hora das tempestades. E o que faremos, ento, denossos parcos conhecimentos, de nossa ignorncia espiritual,ante a proliferao das Universidades das subculturas materialis-tas?

    Coloquemos ainda, se possvel, de maneira mais clara e obje-tiva esta situao. O Instituto Esprita de Educao, fundado emSo Paulo pelo II Congresso Estadual de Educao Esprita,funcionou por alguns anos, tendo formado trs turmas de ginasi-anos, com reconhecimento oficial. Est atualmente fechado2,lutando para a concluso do seu edifcio no Itaim. Sofre essainterrupo altamente prejudicial por falta de recursos. O Clubedos Jornalistas Espritas, com seus cursos de Espiritismo, Filoso-fia Esprita e Parapsicologia, depois de vinte anos de funciona-mento, teve de fechar suas portas por falta de recursos. O Institu-to de Cultura Esprita do Brasil, no Rio de Janeiro, mantm seufuncionamento com dificuldades, em local cedido por um CentroEsprita. Carece de recursos e s funciona graas abnegao deDeolindo Amorim, seu fundador. Institutos Estaduais que surgi-ram por sua inspirao lutam para subsistir. A revista EducaoEsprita, nica no mundo, lanada e sustentada heroicamentepelo Editor Frederico Giannini, saiu de circulao por falta derecursos e de interesse do prprio professorado Esprita. Seuestoque de edies lanadas, seis volumes, dorme o sono dainocncia na Editora Cultural Esprita - EDICEL. A ColeoCientfica dessa Editora, iniciada com a edio de obras espritasclssicas, continua lutando com insuperveis dificuldades. AsFaculdades Espritas de Marlia, Franca e outras cidades lutampara sobreviver. Todas as iniciativas culturais espritas no

  • conseguem desenvolver-se por falta de apoio e de recursosfinanceiros. A Editora Paidia, organizada por trs acionistas,para a divulgao cultural Esprita, luta para se firmar, retendovrias obras por falta de recursos para lan-las. Os acionistasno percebem dividendos, que revertem para o capital de giro daeditora, que no tem funcionrios remunerados. A Revista Esp-rita, de Kardec, 12 volumes, editada pela EDICEL, vai pingandonas vendas individuais, sem recursos para uma divulgao maisampla e efetiva. As tentativas de fundao do Instituto de Cultu-ra Esprita de So Paulo fracassaram.

    Esse panorama estadual, desolador, no Estado mais rico daFederao, reflete-se em todo o Brasil, considerado como anao mais esprita do mundo.

    A Biblioteca Esprita, fundada por Jos Dias, franqueada aopblico para leituras e consultas, num andar da Rua 24 de Maio,morreu com a morte sbita do fundador abnegado.

    Quais so os motivos dessa situao calamitosa? Unicamentea falta de compreenso e interesse dos homens de recursos queno se sensibilizam com as iniciativas culturais espritas. Se aCincia Esprita no se desenvolve entre ns, a culpa exclusi-vamente dos homens de recursos, que preferem enderear suascontribuies para as obras assistenciais, com os olhos voltadospara a conquista de um pedao do cu depois da morte. Almdisso, o prprio pblico esprita mostra-se alheio aos interessessuperiores do desenvolvimento da cultura esprita, no se inte-ressando pelas publicaes culturais, dando preferncia aosimpressos avulsos de mensagens gratuitas para distribuio nosCentros.

    Temos assim uma situao calamitosa, em que o aspecto cul-tural da Doutrina, e particularmente o seu aspecto cientfico,estruturado na Cincia Esprita, com a mais brilhante tradio,v-se relegado, como se nada representasse nessa fase de transi-o, em que todos os espritas conscientes da importncia daCincia Esprita deviam empenhar-se em lhe assegurar as possi-bilidades de desenvolvimento. Enganam-se os que pensam quetudo vir do Alto. O trabalho nosso, dos homens pobres ouricos, de todos os que se beneficiaram com os recursos da com-

  • preenso esprita em suas vidas passageiras. Ao invs de sepreocuparem com o progresso da Cincia Esprita, que modifica-r o mundo, os espritas se apegam s suas instituies particula-res, como os vigrios s suas igrejas e sacristias, pensando queisso lhes basta no cumprimento dos seus deveres espirituais.

    O tempo voa, as exigncias de uma reformulao dos concei-tos humanos sobre a vida e a morte so simplesmente olvidados.Temos de criar a Universidade Esprita, onde a Cincia Espritapoder desenvolver-se suficientemente para termos e ampliarmosos benefcios da Cultura Esprita no mundo. S a Cultura Espri-ta efetivada nas instituies culturais superiores poder nosfranquear os portais da Era Csmica.

  • 1Desenvolvimento da Cincia Esprita

    cada vez maior o nmero de pessoas que recorrem s insti-tuies espritas suplicando ajuda para si mesmas ou para paren-tes e amigos que se entregam a viciaes e perverses de todaespcie. Na sua humildade muitas vezes simplria, alimentadaracionalmente pelos princpios doutrinrios, os dirigentes decentros e grupos espritas fazem o que podem, servindo-se dosrecursos naturais da prece, do passe e das sesses medinicas.Dos resultados positivos obtidos no passado, no obstante ascampanhas difamatrias, perseguies e processos criminaismovidos contra os mdiuns, nasceram os Hospitais PsiquitricosEspritas, hoje em grande nmero em nosso pas e geralmentebem aparelhados e dotados de assistncia mdica especializada.S no Estado de So Paulo funcionam atualmente mais de trintahospitais espritas reunidos numa Federao Hospitalar de que oGoverno do Estado se serviu para aliviar o Juqueri, HospitalFranco da Rocha, numa das suas crises mais ameaadoras. Osespritas sentem-se na obrigao de atender a esses casos, sempreque possvel, por considerarem que eles so mais espirituais doque materiais, de maneira que o tratamento mdico geralmenteinsuficiente para cur-los. Fiis aos princpios de caridade efraternidade da Doutrina, esforam-se por dar a sua ajuda desin-teressada em favor dos sofredores.

    Essa inteno piedosa, humanitria, foi constantemente dene-grida por mdicos e clrigos desconhecedores do problema. Aluta foi sempre rdua e at mesmo desesperadora para os espri-tas, num pas em que a maioria da populao pobre e desprovi-da de cultura, prevalecendo sempre as opinies dos doutores edos sacerdotes, os primeiros apoiados em sua formao cientficae acadmica, e os segundos em sua falvel cultura religiosa, maisde sacristia do que se seminrio. Essas duas classes gozavamamplamente da autoridade de saberetas num meio social deanalfabetos e bacharis em direito. Os espritas que mais sedestacavam por seus conhecimentos doutrinrios no haviam

  • sequer compreendido os fundamentos cientficos do Espiritismoe os encaravam misteriosa e at mesmo cabalisticamente. Osadversrios no encontravam dificuldades para mistur-los, aosolhos do pblico, com possveis remanescentes da Gocia oumagia-negra medieval. Padres, bacharis e juristas pintaram ochamado demonismo-esprita moda do tempo, com rabo,chifres e a foice e o martelo do atesmo pendurados no pescoo.

    Quando os espritas de Amparo resolveram fundar naquelacidade um Sanatrio Esprita para doentes mentais, ilustre,jovem e fogoso mdico e intelectual paulista explicou pelosjornais da poca, nos anos 40, que os espritas fundavam esseshospitais por dor de conscincia, pois fabricavam loucos e depoisqueriam reabilit-los. Foi necessrio que um jornalista esprita orevidasse, mostrando que o motivo no era esse, mas o fatoevidente da falncia da medicina que, no desconhecimento doproblema, enchia diariamente os caldeires do diabo no Juquericom pobres criaturas desprotegidas da cincia e da religio. Omestre implume, no podendo voar mais alto, teve de calar obico. Logo mais, o mdium Arig, que por sinal ainda era catli-co e fazia milagres ao invs de produzir fenmenos, foi atacadobrutalmente por uma srie de artigos publicados em jornal degrande circulao por um mdico que no chegara a ver o m-dium e diagnosticava distncia a sua loucura, e por famosoprofessor universitrio que o apoiava, alegando que Arig ope-rava sob a ao alucinatria do caf, que bebia em excesso. Oscientistas norte-americanos salvaram o mdium j ento conde-nado priso, vindo a So Paulo e expondo, no auditrio doMuseu de Arte Moderna, perante convidados ilustres, os motivoscientficos de seu interesse pelo mdium. Apesar disso, Arigacabou sendo preso e s foi libertado por uma deciso do Su-premo Tribunal, ante o prestgio dos nomes dos cientistas, per-tencentes a famosas Universidades dos Estados Unidos, cujospareceres foram divulgados nos Dirios Associados e em todo oBrasil. Mas isso no impediu que o Padre Quevedo prosseguissecom suas arruaas contra o mdium e o Espiritismo, no bomestilo de toureiro que, de capa e espada, desafiava as aspas da

  • verdade na imprensa e na televiso com rendosa propagandagratuita de seus cursos de pseudoparapsicologia made in Madri.

    A moda pegou e o Brasil se encheu de pseudoparapsiclogosque brotavam do cho como as heresias no tempo de Tertuliano.Ainda hoje continua a florao desses cogumelos por todo opas. Cursos e escolas semeiam diplomas da Cincia de Rhine eMcDougal margem da lei e das reas educacionais oficialmenteautorizadas. Esse panorama surrealista responsvel pelo atrasoem que nos defrontamos no campo dos estudos e das pesquisasdos fenmenos paranormais no Brasil. O Instituto Paulista deParapsicologia, fundado por Cientistas, Mdicos, Psiclogos,estudantes de Medicina (atualmente j mdicos famosos) novingou, ante a avalanche de aproveitadores que o invadiram,levando seus diretores a fech-lo, por esse motivo e pelo totaldesinteresse das nossas Universidades, temerosas do pandemnioque se avolumava. Tivemos de voltar estaca-zero. Ningum,nem mesmo os governos, tiveram coragem de pr a mo nacumbuca, proporcionando recursos ao Instituto para a montagemde seu laboratrio. Nas vsperas da Era Csmica, preferimos ogesto cmico, supinamente burlesco, de lavar as mos na baciade Pilatos e deixar o problema no campo da charlatanice.

    Os espritas continuam, num clima de maiores esperanasmundiais nesse terreno, com o avano espantoso das pesquisasparapsicolgicas nos Estados Unidos e na URSS, a socorrer noBrasil as vtimas de perturbaes mentais e psquicas, em seuscentros de trabalho permanente e gratuito. A eficcia de seusmtodos simples, desprovidos dos recursos tecnolgicos daatualidade, so evidentes, mas no constam de comprovaesestatsticas. No h recursos nem tempo para o luxo das avalia-es estatsticas. Mas a verdade salta aos olhos, brilha nos laresbeneficiados por dedicaes annimas. J tempo de acordar-mos para a constatao desse fato. O Brasil avanou cultural-mente entre os anos 30 e 60, com a descentralizao do ensinosuperior e a criao de Faculdades de Filosofia, Cincias e Letraspor toda a sua extenso. Nem mesmo o interregno das agitaespolticas e militares conseguiu perturbar esse desenvolvimento.Demos a prova decisiva da nossa preferncia pela paz, a ordem e

  • o progresso. Mas o meio esprita, infenso s agitaes e inquieta-es polticas, deixou-se embalar pelas canes de ninar dasmensagens medinicas piedosas, dos relatos curiosos da vidaaps a morte, nas pregaes medinicas incessantes sobre acaridade, a humildade, o amor ao prximo, a moral evanglica, apreparao de todos para a migrao a mundos superiores eassim por diante. Desenvolveu-se um curioso processo de alie-nao religiosa que nem mesmo nas sacristias se processava.Surgiram, alm das fascinaes do tipo roustainguista (intencio-nalmente retrgradas) correntes pseudo-espritas de mentalismoe esoterismo pretensiosos, agrupamentos de fiis acarneiradosem torno de pseudomestres dotados de sabedoria infusa e arro-gante, como a dos telogos das igrejas, resqucios assustadoresde pretenses divinistas e divinatrias, correntes alienantes deum formalismo becio, pregando o aperfeioamento formal dasatitudes e do comportamento humanos, com processos de impos-tao da voz e de gesticulaes pr-fabricadas, e at mesmo(Deus nos acuda) tentativas de criao do celibato esprita eimposio da abstinncia sexual aos casados.

    Toda essa florao de cogumelos venenosos, vinda evidente-mente das razes da Patrstica, redundava na volta ao farisasmoe s suas conseqncias no meio patrstico da era ps-apostlica,que tanto enfurecia o Apstolo Paulo. Pouco faltava para que aproposta de Tertuliano, de recorrer-se figura jurdica do usuca-pio, fosse aplicada ao Evangelho. Formava-se e ainda se tentaformar, no meio esprita, uma estrutura totalitria de poder earbtrio, com uma disciplina legal asfixiando a liberdade esprita.Ao mesmo tempo, a terapia esprita, nascida humildemente daprece e da imposio das mos aos doentes, segundo o ensino e oexemplo de Jesus, era transformada em ritos complicados epretensiosos, aplicados por mdiuns diplomados pelas Federa-es. At mesmo as prticas do confessionrio foram estabeleci-das em vrias instituies, a partir do manda-chuva, que agiacom rigorosa disciplina paramilitar. O escndalo da adulteraodas obras fundamentais da doutrina, declaradamente inspiradaspelo sucesso das adulteraes da Bblia pelas igrejas crists,produziu felizmente o estouro do tumor. Algum tivera a cora-

  • gem de usar o bisturi na hora precisa, mostrando a profundidadedo processo infeccioso, definindo e localizando os focos dainfeco na corroda e orgulhosa estrutura do movimento espri-ta.

    Restabelecia-se a verdade e reanimava-se o corpo doente eminado pelas trevas. As reas no contaminadas pela infecoreagiam de todos os lados e os vencidos pela fascinao comea-vam a sentir os primeiros abalos da conscincia. Encerrava-se ociclo perigoso das infiltraes malignas e os que no haviamcedido ao autoritarismo dos falsos mestres e mentores experi-mentavam a alegria da volta ao bom-senso kardeciano.

    A terapia esprita comeava lentamente a recuperar-se em suasimplicidade e pureza. O prestgio do passe esprita, desprovidode encenaes esprias e pretensiosas, restabelecia-se nos gruposno contaminados. Jesus aplacara o temporal como num gesto depiedade. O farisasmo tem suas razes nas entranhas animais dohomem, de onde brotam os instintos primitivos, perturbando amente e envenenando o corao. Os cristos primitivos foramlevados loucura de se julgarem puros e santos, como vemos nasepstolas ardentes de Paulo, reprimindo os ncleos desvairados.No meio esprita domesticado por incessantes mensagens pa-drescas, algumas instituies doutrinrias chegaram a proclamar-se donas exclusivas da verdade. Um enviado dos anjos fez-seorculo dos novos tempos (por conta prpria) e a autodenomina-da Casa-Mter do Espiritismo no Brasil ampliou a sua orgulhosae falsa pretenso, cortando do seu ttulo autoconcedido a expres-so do Brasil, tornando-se, com essa simples operao, a Casa-Mter do Espiritismo no Mundo. Com essa manobra as trevascortavam a possibilidade de uma estruturao mundial do movi-mento esprita3. O movimento brasileiro fechava-se a si mesmo epoderia restabelecer entre ns o Templo de Jerusalm com seurabinato exclusivista. A reao de Andr Dumas, na Frana, daConfederao Esprita Pan-americana da Argentina, da prpriaFederao Argentina, da Venezuela e de intelectuais espritascomo Humberto Mariotti, Robert Fourcade e outros mostrou oalcance dessa manobra. Que esse triste exemplo dos descami-nhos a que o farisasmo pode levar-nos sirva para acordar o bom-

  • senso dos desprevenidos. A terapia esprita no ter eficcia seno pudermos aplic-la a ns mesmos e ao nosso movimentodoutrinrio. Sem uma base de convico firme e de fidelidade obra de Kardec no poderemos curar-nos a ns mesmos, quantomais aos outros.

  • 2Princpios da Teraputica Esprita

    A teraputica esprita se funda na concepo do Universocomo estrutura unitria e infinita. Tudo se encadeia no Universo,como ensina Kardec. Dessa maneira, h uma constante relaode todas as coisas e todos os seres no Universo Infinito. Essaestrutura inimaginvel encerra tudo em si mesma e por isso todosos recursos de que necessita esto nela mesma. Cada partcula doUniverso reflete o todo e formada semelhana do Todo. Esseprincpio de similaridade universal supera as nossas concepese as nossas percepes fragmentrias. Foi da intuio natural dasimilaridade que surgiu a magia, como primeira tentativa deconquista e domnio, pelo homem, das energias da natureza. Amagia das selvas, na sua simplicidade elementar, encerrava empotncia toda a atualizao futura. O homem primitivo percebeua semelhana das coisas e dos seres nas suas experincias domundo. Seu mundo era um fragmento do Universo e, para ele,no tinha limites. Na sua intuio globalizante (pois toda intui-o uma percepo global) comeou a conquista do real pelaconquista progressiva das coisas e seres semelhantes. Paraatingir o pssaro no ar precisava de um instrumento voador e feza flecha. Para curar uma ferida produzida pelo espinho de umaplanta, recorreu ao suco de suas folhas. Para saciar os seusimpulsos sexuais devia conquistar a mulher. Dessa satisfaonascia um novo ser, semelhante a ambos. A dialtica da vida seinsinuava naturalmente em sua conscincia fragmentria, ligandoos fatos entre si e desenvolvendo-lhe o tirocnio. Este o levarias conquistas subseqentes, infundindo-lhe o sentimento domundo, na fuso da mente com a afetividade. Nessa fuso temoso homem ligado terra pela similitude de seus interesses vitais, eao mesmo tempo atrado ao cu pelo despertar de seus impulsosde transcendncia. Por isso, desde as inscries rupestres nascavernas at s mais altas civilizaes do Oriente e do Ocidente,o homem teve sempre a idia de Deus em seu ntimo e em suasmanifestaes em busca da sociabilidade. A magia simpattica

  • das selvas impregnara as religies nascidas dessa dupla fonte,marcadas at hoje pelo impulso da lei de adorao a Deus. Comos ps enraizados na terra do mundo, ele voltar sempre para aluz, o fogo e a chuva que o alimentam e estimulam em suasatividades criadoras. O sentimento do mundo a confirmaosincrtica de suas percepes sensoriais e de sua intuio extra-sensorial do todo como unidade.

    O estranho episdio da cura pelo p de mmia, na Histria daMedicina, quando as mmias se esgotaram nas escavaes doEgito e os terapeutas mgicos passaram a produzir mmiasartificiais para os doentes, revela a que intensidade chegou aligao do homem com a terra. A mmia representava ao mesmotempo o homem e a terra, encerrando, portanto, os poderescuradores da natureza humana e os do solo, em cujas entranhasesses poderes se fundiam sob a ao misteriosa do tempo. Dessamitologia aparentemente absurda nascera em tempos remotos,curtido pelo sentimento do mundo, o sentimento da fraternidadehumana, da possibilidade das aes fludicas entre os corpos doshomens vivos. Jesus empregaria ento os seus poderes espirituaisna transmisso das energias vitais do terapeuta ao doente, atravsdo rito da imposio das mos, que marcaria todo o perodo dedesenvolvimento do Cristianismo at o Sculo XIX, em queKardec reavivaria essa prtica antiqssima em plena era cient-fica. Tinham razo os que temiam o restabelecimento das supers-ties do passado remoto, sem conhecer, e portanto sem levar emconta, os princpios renovadores da concepo esprita do mun-do. Eram realmente as velhas supersties que renasciam, maspelas mos de um cientista que as depurava de sua ganga demilnios para extrair-lhes apenas a essncia.

    Kardec anunciou que, no seu tempo, com o advento da reve-lao esprita, divina, pelas manifestaes espirituais, e humana,pela elaborao cientfica dos homens, os erros do passado setransformariam em verdades. Esse um exemplo das transfor-maes previstas. Os erros de interpretao de um passadoobscuro tornaram-se acertos ante as investigaes do homemmoderno. Assim podemos afirmar que o primeiro princpio dateraputica esprita de origem telrica, fundado na realidade

  • objetiva de um dos mais curiosos e intrigantes episdios dahistria da Medicina. A volta Natureza, que Rousseau pregouna Educao, ironizado por Voltaire, Kardec efetivou, comopesquisador cientfico e mdico, professor e diretor de estudos naUniversidade de Frana. Ao seu lado, o Dr. Demeur, em suaclnica de Paris, dava a Kardec a sua assistncia de observador epesquisador dos efeitos curativos da nova teraputica. Os mdi-cos modernos tomaram o lugar de Voltaire no caso de Kardec,entendendo que Kardec desejava que o homem voltasse a andarde quatro, como dissera Voltaire sobre a revoluo educacionalde Rousseau. No perceberam que essa volta natureza no sereferia s selvas, mas natureza humana desfigurada pelosartificialismos da civilizao. Se o objetivo pedaggico deRousseau era psicolgico e tico, principalmente tico, o deKardec era tambm da mesma dupla natureza, abrangendo aomesmo tempo a Psicologia e a tica, duas coordenadas histricase cientficas a balizarem as transformaes evolutivas dos tem-pos modernos.

    Podemos enunciar o primeiro princpio da teraputica espritada seguinte maneira:

    1) A cura das doenas depende da ao natural das energiasconjugadas do homem e da terra (psicolgicas e mesol-gicas), na reconstituio do equilbrio das energias natu-rais do doente.

    Os demais princpios podem ser definidos na seqncia abai-xo:

    2) A renovao de energias depende da ao conjugada dosespritos terapeutas com o mdium curador, que se pe disposio dos espritos para a transmisso dos fluidosenergticos atravs da prece e do passe.

    3) A eficcia do passe depende da boa-vontade do mdium,que se entrega humildemente ao dos espritos, semperturb-la com gesticulaes excessivas, limitando-se sque os espritos lhe sugerirem no momento. No temosnenhum conhecimento objetivo do processo de manipula-o dos fluidos pelos espritos e poderamos perturbar-

  • lhes a ao curadora com nossa interveno pretensiosa.O mdium instrumento vivo e inteligente da ao espiri-tual, mas s deve utilizar a sua inteligncia para compre-ender o seu papel de doador de fluidos, como se passa nocaso da doao de sangue nos hospitais.

    4) A ao curadora dos espritos no mgica nem milagro-sa; est sujeita a leis naturais que regem a estrutura psico-biolgica do homem. A emisso de ectoplasma do corpodo mdium para o corpo do doente revela-se atualmente,nas pesquisas russas, como emisso de plasma fsico a-companhado de elementos orgnicos. As famosas pesqui-sas da Universidade de Kirov, na URSS, comprovaram econfirmaram as pesquisas de Richet, Schrenk-Notzing,Gustave Geley e Eugne Osty, no sculo XIX, sobre a a-o do plasma fsico (quarto estado da matria) nos efei-tos fsicos da mediunidade. Na teoria do perisprito, Kar-dec j havia tambm, com grande antecedncia, constata-do a importncia da relao esprito-matria nesses pro-cessos.

    5) Nos casos de cura distncia, sem a presena do mdium,a eficcia depende das condies psicofsicas do doente,que permitem a colaborao do seu prprio organismo naselaboraes fludicas do plasma, em conjugao com asenergias espirituais dos espritos terapeutas. Kardec con-siderava o perisprito como organismo semimaterial. Fre-deric Myers estudou a atividade da mente supraliminar(consciente) e subliminar (inconsciente) em todos essesprocessos ento considerados como misteriosos.

    6) As chamadas operaes espirituais (hoje paranormais)podem realizar-se por interveno fsica do mdium, do-minado pelo esprito que dele se serve por influenciaomedinica no transe hipntico. Mas a simples ao mentaldo mdium pode produzir efeitos fsicos no paciente, co-mo Rhine provou nas suas experincias com animais.Rhine resumiu os resultados de suas pesquisas no seguin-te princpio: A mente, que no fsica, age por vias nofsicas sobre a matria. Soal, Carington e outros verifica-

  • ram que as atividades internas do organismo animal ehumano (funes vegetativas e correlatas) so controladaspor ao mental sobre o sistema nervoso, vascular e mus-cular. A teoria do dinamismo psquico inconsciente deGeley se desenvolve nesse mesmo sentido.

    O mistrio teolgico da encarnao transformou-se atualmen-te numa questo cientfica universalmente pesquisada nos maio-res centros universitrios do planeta. A terapia esprita est hojerespaldada pelas mais recentes e avanadas descobertas cientfi-cas. Os que pretendem rejeit-la com argumentos se esquecemde que os problemas da cincia s podem ser resolvidos pormeio de pesquisas e provas. Maldies e antemas desvaloriza-ram-se totalmente num processo inflacionrio de dois milnios.No era sem razo a luta cruenta da Igreja contra o desenvolvi-mento cientfico. Ela se defendeu ferozmente do atrevimento doscientistas porque agia sob a compulso violenta do instinto deconservao. Mas a favor da cincia estavam as leis irresistveisda evoluo. A era cientfica nasceu ensangentada dos calabou-os medievais em que os mrtires do progresso sofriam nas mosdos inquisidores, espera das fogueiras divinas em que seriampurificados. A Cincia avanou, apesar de tudo, derrotando osterroristas da magia negra, da antiga e temvel Gocia que osprprios clrigos empregavam em suas lutas de poltica intestina.Coube ao coronel Albert de Rochas, diretor do Instituto Politc-nico de Paris, pesquisar em laboratrio os possveis efeitos damagia negra, demonstrando o engano dos que a consideravamdotada de poder diablico. O desprestgio da superstio permi-tiu aos mdiuns, hoje chamados sujeitos paranormais (nemanormais, nem patolgicos, nem diablicos), transformarem-senos instrumentos humanos da investigao cientfica das poten-cialidades da criatura humana. Atualmente a prpria Igrejadispe de organismos de pesquisa dos fenmenos que antesconsiderava como estigmas infamantes da maldio divina.

    Quando a Academia de Frana reconheceu a realidade domagnetismo e seu interesse cientfico, mas mudando-lhe o nomepara hipnotismo, Kardec escreveu um artigo sobre o fato naRevista Esprita, lembrando que o magnetismo cansara de bater

  • porta da Academia, sendo sempre enxotado. Por fim resolveramudar de nome e entrar na casa pela porta dos fundos, sendoento recebido e aclamado pelos cientistas. O mesmo aconteceagora com o Espiritismo, que, sendo batizado na universidade deDuke com o nome de Parapsicologia, teve entrada franca eentusistica na URSS e no Vaticano. Na verdade, a Parapsicolo-gia, com roupa nova, linguagem grega e seguindo as pegadas deKardec, para atingir os seus mesmos objetivos, nada ofereceu denovo ao mundo atual alm de sua roupagem tecnolgica. Pres-tou, assim mesmo, um grande servio ao mundo materialo,conseguindo despertar-lhe o interesse pelos problemas espiritu-ais. Os materialistas e os religiosos formalistas tinham medo dosespritos. Rhine conseguiu mostrar-lhes, por meios estatsticos,que todos somos espritos. O medo se foi e com ele a iluso damatria desfeita na poeira atmica da Nova Fsica.

  • 3Natureza Moral da Terapia Esprita

    Kardec adverte quanto s relaes da moralidade do mdiumcom a sua mediunidade. Considerada em si mesma como umcampo de produo fenomnica, a mediunidade independe damoralidade. Mas considerada como instrumento cognitivo, ouseja, como meio de conhecimento, a mediunidade dependeestritamente da moralidade. Sacerdotes e religiosos de vriasseitas aproveitaram-se dessa declarao de Kardec para acusar oEspiritismo de doutrina sem moral. Revelavam com isso apouca-da inteligncia e falta de moral. Essa observao de Kardeccomprovou-se amplamente nas pesquisas espritas e das socieda-des de pesquisas psquicas da Europa e da Amrica. A tese lmpida e precisa. Os fenmenos medinicos, como os fenme-nos fsicos, independem da moral do mdium ou do fsico. Oqumico de vida moral mais condenvel produz as suas reaesqumicas em laboratrio sem pensar na moral. Mas quando setrata da busca da verdade ou de processos de cura, a mediunida-de divorciada da moralidade no serve, tornando-se mesmoperigosa. A eficcia da terapia esprita depende da inteirezamoral do mdium que lhe serve de instrumento. Esse umproblema de relaes humanas no plano das sintonias espirituais.

    Desejando acelerar o trabalho de ordenao da doutrina, naCodificao no qual trabalhava apenas com as meninas Boudin Kardec pensou em utilizar-se da boa-vontade de um mdiumseu conhecido, mas o seu orientador espiritual o advertiu de queesse mdium no tinha condies morais para o trabalho, acres-centando: A verdade no pode falar pela boca da mentira.Desse episdio, bem como dos princpios morais da doutrina,ampla e minuciosamente explanados na Codificao, nunca selembraram nem se lembram os clrigos e materialistas acusado-res da suposta amoralidade esprita. Basta isso para mostrar adebilidade moral desses acusadores.

    Na teraputica esprita, como nas investigaes cientficas damediunidade, a exigncia da moral de importncia bsica. As

  • constantes denncias de fraudes medinicas nas pesquisas decor-rem da falta de escrpulo dos pesquisadores na escolha de seusinstrumentos medinicos, no tocante s exigncias morais.

    No caso de mdiuns realmente moralizados as denncias defraudes so geralmente fraudulentas. Costuma-se citar o caso domdium escocs Daniel Douglas Home, que produzia os fen-menos mais espantosos, como a sua prpria levitao e materia-lizaes sucessivas e contra o qual s houve acusaes sem basenem sentido. A famosa mdium Ana Prado, no Par, cruelmentecombatida e caluniada por um clrigo fantico, saiu ilesa detodas as invencionices como Ansio Siqueira, Urbano de AssisXavier, Luiz Parigot de Souza e tantos outros mantiveram-sesempre inclumes de acusaes dessa espcie, defendidos porseu comportamento moral, que lhes garantia permanente prote-o das entidades espirituais superiores. A moral do mdium oseu escudo em todas as circunstncias. No a moral social, quepode ser avaliada de fora e no raro de maneiras contraditrias,mas a moral ntima, pessoal, endgena, ou seja, que nasce da suaprpria conscincia e no precisa de sanes externas. Essamoral legtima, vivencial, garante a sintonia espiritual do m-dium com os espritos elevados nica verdadeira garantia daeficcia de sua terapia. do prprio Evangelho de Jesus queressalta esse princpio da moral esprita.

    Fala-se muito da importncia da f nas curas espirituais dequalquer setor religioso. A f se revela, nesses casos, mais comoum anseio ardente de cura do que propriamente como f. Oconceito vulgar de f tem por fundamento a crena. Quem nocr, no tem f. Mas, como explicou Kardec, a f verdadeira noprescinde da razo, que a fundamenta no conhecimento e nosaber. A f esprita racional. A crena apenas uma aceitaoemotiva de um princpio ou de um mito. Denis Bradley, depoisde suas experincias espritas, sustentava: Eu no creio, eu sei.Na terapia esprita a f representa apenas um estmulo moral aopaciente, para que ele se predisponha melhor, emocionalmente, ao dos elementos curadores. Kardec acentuou a existncia dedois campos da f, assim divididos: f humana e f divina. Ohomem que confia em si mesmo para as suas realizaes fortale-

  • ce-se na f humana. Mas aquele que possui a f divina, resultantedo seu conhecimento dos poderes da divindade, dispe da mxi-ma firmeza na busca dos seus intentos. Na terapia esprita essa fno se funda nos elementos rituais das religies, concentrando-sena sintonia do seu pensamento e dos seus sentimentos com asentidades espirituais socorristas.

    H pessoas que usam a terapia esprita como autgena, entre-gando-se prece, sem procurar o socorro de mdiuns. Esse umaspecto pouco conhecido da terapia esprita. As pessoas querecorrem a esse processo no o fazem por auto-suficincia, maspor estarem submetidas a viciaes ou perverses de que seenvergonham. Conhecemos casos de homossexualismo masculi-no e feminino que foram assim autocurados. No se trata propri-amente de uma autocura, pois a terapia esprita foi realizadapelos espritos e no por elas mesmas. Essas vtimas, conhecen-do a doutrina, cultivaram a f racional e conseguiram impor a simesmas disciplinas curadoras a que se apegaram com firmeza econstncia. Os que perseveram em suas boas intenes criamcondies favorveis ao curadora dos espritos terapeutas. emocionante o caso de um rapaz de famlia exemplar que chegou beira do suicdio. Foi salvo pela voz que soou em sua mentedizendo-lhe: Deus me permitiu anunciar-te a hora da libertao.Daqui por diante no sentirs mais os impulsos negativos que tetorturavam. Esgotaste perante a Espiritualidade Superior umpassado de ignomnias. No foi um caso de auto-sugesto, masde perseverana na prova, como depois lhe explicou a entidadeprotetora que lhe falara em particular, falando ento pela boca deum mdium que no o conhecia e nada sabia do seu sofrimentooculto.

    Em casos como esses revela-se a importncia da vontade dopaciente, como ocorre na teraputica em geral. Numa batalhaoculta como a desse jovem intervem influncias de entidadesvingativas, que podem lev-lo ao desespero, mas, em contrapeso,h sempre assistncia de espritos amigos, cuja ao se tornamais poderosa quando o paciente desperta as suas potencialida-des volitivas e decide o seu destino por si mesmo. Firmado noseu direito de escolha e amparado pelas energias da vontade e os

  • estmulos da conscincia de sua dignidade humana, o espritopode superar as provas mais desesperantes e triunfar sobre assuas tendncias inferiores provenientes do submundo da anima-lidade. Por isso a teraputica esprita condena e repele a capitu-lao atual da psiquiatria da libertinagem.

    A condenao hipcrita do sexo pelas religies crists sobre-carregou de preceitos e ordenaes morais que fomentaram portoda parte o fingimento e a hipocrisia. As tentativas cruis deabafar o instinto sexual atravs de um moralismo ilgico, como oda era vitoriana na Inglaterra, prepararam a exploso sexualistada atualidade, com o rompimento explosivo dos diques e audestradicionais. Todos os moralistas condenaram veementemente opan-sexualismo de Freud, como se ele tivesse culpa de s encon-trar, nos traumatismos espantosos do consultrio, a violncia dalibido, dominadora oculta de uma civilizao em runas. Aloucura de Hitler e de seus comparsas recalcados e homossexu-ais, bem como a megalomania ridcula e exibicionista de Musso-lini, no surgiram das heranas brbaras, mas do pietismo cas-trador do medievalismo. O histerismo nazista, ligando-se aoexibicionismo fascista e necrofilia nipnica, resultaram naformao do Eixo e na exploso da Segunda ConflagraoMundial. Foi uma exploso de recalques. At mesmo os signossexuais estavam presentes no sigma nazista, no fascio de Musso-lini e no sol nascente de Hiroto. Veio depois, confirmando esseconluio libidinoso, em que floresceu desavergonhado o homos-sexualismo germnico. Era evidente que viria depois a era por-nogrfica em que nos encontramos. Marcuse diagnosticou o malda civilizao, mas no foi capaz de lhe propor a soluo conve-niente, que aos poucos vai se delineando numa volta penosa aoreconhecimento da naturalidade do sexo, sem os excessos edesmandos da atualidade, em que a contribuio russa aparececom a mstica libidinosa de Rasputin.

    Historicamente, pesa sobre a figura angustiada de Paulo deTarso a responsabilidade dessa tragdia mundial. Porque foi ele,o Apstolo dos Gentios, quem implantou nas comunidadesnascentes do Cristianismo Primitivo as leis de pureza do Judas-mo farisaico, tantas vezes condenadas pelo Cristo. Seu zelo pelo

  • Cristianismo chegou ao excesso de deform-lo, na luta que tevede enfrentar com a libertinagem do paganismo. Armou a dialti-ca histrica da tese pag contra a anttese crist-judaica, queresultou na sntese da hipocrisia clerical. Aldous Huxley colocouesse problema em seus livros Os Demnios de Loudan e O Gnioe a Deusa.

    Kardec j havia antecipado, em meados do sculo passado, asconvulses morais que abalariam o mundo a partir da Guerra doPiemonte. Previu a sucesso de guerras e revolues que sedesencadeariam, com surpreendentes transformaes sociais,polticas e culturais em todo o mundo, acentuando que no eramcatstrofes geolgicas, que ocorreriam naturalmente, comosempre ocorrem, mas catstrofes morais que abalariam as naesaparentemente mais seguras em suas tradies. E o remdioindicado para a reconstruo do mundo seria a educao dasnovas geraes, nos princpios de liberdade, igualdade e fraterni-dade, o lema da Revoluo Francesa que ressurgiria com orestabelecimento ou a ressurreio do Cristianismo do Cristo eno dos seus vigrios, como anunciaria tambm o Padre Alta,Doutor da Sorbonne, suspenso de ordens por suas idias perigo-sas.

    A natureza moral da teraputica esprita decorre da moral deJesus, pura e natural, desprovida dos aparatos, rituais e ordena-es antinaturais forjadas pelos telogos. Por isso a terapiaesprita, como a de Jesus, no se funda em prticas sacrificiais,em exorcismos demonacos, em condenaes da funo gensicado homem e da mulher, mas na liberdade regida pelos princpiosbsicos da conscincia humana, onde e somente nela estoinscritas as verdadeiras leis morais da humanidade. Os atosnaturais, exigidos pela prpria continuidade da espcie humana,capitulados como pecados veniais e capitais nas tabelas depreos das indulgncias, que provocaram a revolta de Lutero,no so considerados como crimes contra a Divindade. Crimesso os abusos e as perverses desses atos, que nivelam o homemaos animais. Mas a educao o antdoto desses desvios aeducao natural de Rousseau, desenvolvida em suas tcnicaspor Pestalozzi e seu discpulo e sucessor Allan Kardec. Pestaloz-

  • zi era desta e universalista, educador por excelncia, o homofaber da educao nos sculos XVIII e XIX, mas faltava-lhe avocao pedaggica, que sobrava a Kardec. Em Kardec havia odoubl de filsofo e cientista, as duas vocaes necessrias aofazer pedaggico, que implica a reflexo global sobre a educaoe a complementao experimental da pesquisa cientfica. Mergu-lhado nesses dois planos da realidade educativa, Kardec ansiavapela descoberta da essncia do homem, da sua natureza ltima edo seu destino. Entendia, como declarou tantas vezes, que semesse conhecimento no podamos conhecer realmente o educan-do e dar-lhe, por uma educao adequada, o pleno desenvolvi-mento de suas potencialidades. Entregou-se primeiro s pesqui-sas do magnetismo, que lhe revelava um novo aspecto da nature-za humana, e mais tarde, ante a insistncia de amigos, ao estudoe pesquisa dos fenmenos paranormais, que na poca explodi-am por toda parte. Foi esse o caminho que o levou ao Espiritis-mo, num verdadeiro ato de amor, para usarmos a expresso deHubert. Emparelhou-se casualmente com a revoluo teolgicade Kierkegaard, que fundava na Dinamarca, sem querer, a Filo-sofia Existencial. Sua tendncia platnica levou-o a sonhar coma Repblica de Plato em termos universais, atravs da educaointegral do homem, no desenvolvimento de toda a sua perfectibi-lidade possvel, como queria Kant e como querem ainda hoje osneokantianos do realismo crtico. Essa a relao sensvel existen-te entre a pedagogia de Hubert e Kerchensteiner com a Pedago-gia Esprita entranhada na obra kardeciana. O princpio grego daunidade orgnica do Universo decorre de uma viso lgicasuperior. A Psicologia Infantil nos mostra que a percepo dacriana em suas primeiras fases de desenvolvimento fragmen-tria. O mesmo ocorre com os povos primitivos que se isolam noseu torro e na tribo com a arrogncia de nicos habitantes domundo. Essa incapacidade natural de uma concepo ampla gerao orgulho do exclusivismo racista, da xenofobia, das cidades edas civilizaes muradas do geocentrismo e do antropocentris-mo. S o desenvolvimento da civilizao, maneira do desen-volvimento orgnico e da sociabilidade na criana, abre perspec-tivas para a mente fechada. Os gregos passaram tambm por esseprocesso, mas, auxiliados pela sua posio geogrfica e por uma

  • capacidade de abstrao mental superior, mostraram-se maisavanados, conseguindo imaginar o mundo como uma unidadeorgnica e viva, como vemos na sua teoria do ilososmo. Dooutro lado do mundo estavam os celtas, que foram capazes deimaginar o universo hipostsico dos crculos superpostos deAnunf, o crculo infernal; Abred, o crculo das reencarnaes;Gwinfid, o crculo divino ou Morada de Deus. Bastaria esses doisexemplos para mostrar a necessidade das migraes entre osmundos habitados no cosmos segundo o princpio esprita. Oaparecimento do indivduo em Atenas no decorreu do comrciodo Mar Egeu, mas do nico milagre grego que se pode admitir: aavanada capacidade grega de abstrao. Scrates, que partilhouda leviandade dos sofistas, abandonou-os ao perceber o vazio desuas teorias e fundou a Filosofia Moral. O moralismo socrticopreparou, distncia da corriola rabnica dos sofistas judeus oadvento do Cristianismo. Kardec reconheceu essa funo precur-sora de Scrates e Plato e comparou o estgio evolutivo dosgregos ao dos celtas, que Aristteles considerou o nico povofilsofo do mundo. Note-se bem: um povo filsofo, que osromanos conquistaram para se apoderarem de sua sabedoria.Esse apanhado sucinto e fragmentrio dos mundos grego e celtamostra a razo da superioridade da moral esprita, que Kardecdesenvolveu na Frana do iluminismo e da liberdade.

    Curar e educar so funes conjugadas do homem na luta pe-la sua transcendncia. Por isso, Kardec as reuniu em suas primei-ras atividades em Paris, tendo exercido a medicina, como assina-la Andr Moreil, confirmando as informaes de Henry Sausse,primeiro bigrafo de Kardec e contemporneo do mestre. Moreilmenciona o perodo em que Kardec clinicou em Paris. Ficouassim anulada a dvida que se levantou sobre as suas atividadesmdicas. Por outro lado, pacfico que ele lecionou cinciasmdicas em Paris4. Era uma inteligncia onmoda e se empenha-va com afinco na decifrao dos mistrios do homem. Sua maiorrealizao foi a criao da Cincia Esprita. Ela lhe custou muitocaro, pois teve de enfrentar sozinho uma batalha sem trguascom todas as foras culturais, religiosas, polticas e sociais doseu tempo. Seu senso e sua moralidade comprovam-se atualmen-

  • te na volumosa obra que deixou como o alicerce inabalvel daCincia e da Filosofia Esprita.

  • 4Tratamento de Vcios e Perverses

    A embriagus, os txicos e a jogatina so os flagelos atuaisdo nosso mundo em fase aguda de transio. Cansados de recor-rer sem proveito a internaes hospitalares, as vtimas e suasfamlias acabam recorrendo ao Espiritismo e s diversas formasmgicas do sincretismo religioso afro-brasileiro. comum fazer-se confuso entre essas formas de religies primitivas da frica eo Espiritismo, em virtude de haver manifestaes medinicasnos dois campos. Os socilogos, que deviam ser minuciosos aotratar desses problemas, carregam a maior parte da culpa dessaconfuso. Esto naturalmente obrigados, pela prpria metodolo-gia cientfica, a distinguir com rigor um fenmeno social dooutro, mas preferem a simplificao dos processos de pesquisa,que gera confuses lamentavelmente anticientficas. A palavraEspiritismo, cunhada por Kardec como um neologismo da lnguafrancesa, na poca, uma denominao gensica da DoutrinaEsprita. Nasceu das suas entranhas e s a ela se pode aplic-la.Kardec rejeitou a denominao de Kardecismo, que seus pr-prios colaboradores lhe sugeriram, explicando que a doutrina noera uma elaborao pessoal dele, mas o resultado das pesquisas edos estudos das manifestaes espritas. Entrando em contatocom o mundo espiritual, em todas as suas camadas, Kardecrecebeu dos Espritos elevados os lineamentos da doutrina, masno os aceitou de mo beijada. Submeteu essas comunicaes dooutro mundo a rigoroso processo de verificao experimental. Saceitou como vlido o que era provado pelas numerosas pesqui-sas incessantemente repetidas e confrontadas entre si. Para tanto,criou uma metodologia especfica, pois entendia que os mtodosdevem ajustar-se natureza especfica do objeto submetido pesquisa. Sem essa adequao seria impossvel obterem-seresultados significativos. Escapava assim, aos fracassos iniciaisda Psicologia Cientfica, que lutara em vo para enquadrar osfenmenos psicolgicos na metodologia da Fsica e de outrasdisciplinas. As experincias de Wundt, Weber e Fechner, por

  • exemplo, restritas a mensuraes de intensidade, no iam almde exploraes epidrmicas, pouco sugerindo sobre a natureza eo mecanismo dos fenmenos. Os fenmenos espritas, querevelavam inteligncia, no eram simples efeitos de processosbiolgicos e fisiolgicos. Eram fenmenos muito mais comple-xos, que podiam provir da mente ou das entranhas humanas, mastambm podiam ser produzidos por foras ainda no suficiente-mente conhecidas, como o magnetismo natural, a eletricidade,energias e elementos procedentes de regies ainda no devassa-das da prpria conscincia humana. O inconsciente era aindauma incgnita. Kardec o abordou quando Freud estava ainda naprimeira infncia. Kardec deu Revista Esprita, rgo quefundou para divulgar seus trabalhos e pesquisas de opinies, osubttulo de Jornal de Estudos Psicolgicos, provando j estarconvencido de que enfrentava os problemas do psiquismo huma-no. Estava fundada a Cincia Esprita, que os cientistas da pocarejeitaram, considerando que Kardec fugia da metodologiacientfica originada das proposies filosficas de Bacon eDescartes. A psicologia introspectiva, ainda apegada matrizfilosfica, atacou-o com a antecedncia de meio-sculo aosataques dirigidos aos pioneiros da Psicologia Experimental. Essa uma das glrias de Kardec, geralmente desconhecida. Maistarde, Russel Wallace iria declarar que toda a psicologia nopassa de um espiritismo rudimentar, glorificando Kardec. Char-les Richet, prmio Nobel de Fisiologia e fundador da Metaps-quica, discordante de Kardec, declarou no seu prprio Tratadode Metapsquica que Kardec era quem mais havia contribudopara o aparecimento das novas cincias e lembrou que Kardecjamais fizera uma afirmao que no estivesse provada em suaspesquisas. Depois desses sucessos no meio cientfico, numerosose famosos cientistas se entregaram s pesquisas espritas, alguns,como William Crookes, com o fim exclusivo de provar que osfenmenos espritas no passavam de fraude. Aps trs anos depesquisas, Crookes publicou os seus trabalhos, pondo-os ao ladodo antigo adversrio. Aps a morte de Kardec, em 1869, LonDenis o substituiu na direo do movimento esprita mundial, e aSociedade Parisiense de Estudos Espritas, que Kardec chamavade sociedade cientfica, ficou praticamente viva. Mas as pesqui-

  • sas prosseguiram no Instituto Metapsquico, sob a direo deGustave Geley e Eugne Osty, com grande proveito. Ao mesmotempo, pesquisas continuavam a ser feitas em vrias Universida-des europias, como a de Zllner em Leipzig, as de Crookes emLondres, as de Ochorowicz na Polnia e assim por diante. ACincia Esprita continuava a se desenvolver. O Baro VonSchrenk-Notzing fundou em Berlim o primeiro laboratrio depesquisas espritas do mundo, procedeu a valiosa srie de pes-quisas sobre o ectoplasma, com o auxlio de Madame Bisson.Aps a primeira Guerra Mundial a Cincia Esprita continuavacombatida, mas ativa. Mas a guerra desencadeara no mundo asambies e interesses materiais, deixando exgua margem para ointeresse espiritual. S agora ressurge na Frana, com AndrDumas, uma instituio de estudos e pesquisas espritas. ARevista Renaitre 2.000, dirigida por Dumas, substitui a RevueSpirite de Kardec.

    Este breve escoro do aparecimento e desenvolvimento daCincia Esprita prova a sua vitalidade, apesar das campanhasincessantes e sistemticas movidas contra ela. Em todos osgrandes centros universitrios do mundo as pesquisas espritasprosseguem com resultados positivos. Nenhum princpio dadoutrina foi sequer abalado pelas novas descobertas verificadasem quaisquer dos ramos da investigao. Pelo contrrio, ospostulados bsicos do Espiritismo se comprovaram, confirmandoa posio avanada da Cincia Esprita e da Filosofia Espritaperante a cultura atual. Isso representa, para a Terapia Esprita,uma base de segurana inegvel para o desenvolvimento dosseus processos de cura. O que hoje se chama, na Europa, de curaparanormal, no mais do que a cura esprita revestida ou fanta-siada de novidades superficiais.

    No difcil e geralmente falho tratamento das viciaes, oprincipal a integridade moral dos terapeutas. Os viciados noso apenas portadores de vcios, mas tambm de cargas deinfluncias psquicas negativas provenientes de entidades espiri-tuais inferiores que a eles se apegam para vampirizar-lhes asenergias e as excitaes do vcio. As pesquisas parapsicolgicasprovam a existncia desses processos de vampirismo espiritual,

  • que na verdade so apenas a contrafao no aps morte dosprocessos de vampirismo entre os vivos. Nas relaes humanas,quer sejam entre encarnados ou desencarnados, sempre existemos que se tornam parasitrias de outras pessoas. No h nissonenhum mistrio, nem se trata de aes diablicas. Em toda aNatureza a vampirizao uma constante que vai do reinomineral ao humano. A cura depende, em primeiro lugar, davontade da vtima em se livrar do perseguidor. As intenesdeste nem sempre so maldosas. Ele procura o amigo ou conhe-cido encarnado que era seu companheiro de vcio e o estimula naprtica para obter assim os elementos de que necessita na suacondio de desencarnado. Obtm a satisfao por induo.Ligando-se mental e psiquicamente ao ex-companheiro, podehaurir suas emanaes alcolicas ou das drogas psicotrpicas deque se servia antes da morte. De outras vezes o esprito vampi-resco se serve de algum que, no sendo viciado, revela tendn-cias para o vcio e o leva facilmente para a viciao.

    A terapia esprita consiste, nesses casos, num processo oral depersuaso, conhecido como doutrinao. Conseguindo-se levar oesprito vampiro e sua vtima a se convencerem da necessidade eda convenincia de abandonarem o vcio, ambos se curam. Adoutrinao se distingue profundamente do exorcismo por serum processo racional e persuasivo e no pautado pela violncia.A terapia esprita parte da compreenso de que ambos, o vampi-ro e a vtima, so criaturas humanas necessitadas de socorro eorientao. Essa posio favorece o tratamento, que ao invs deprovocar reaes de indignao do esprito tratado como diabli-co, provoca-lhe a razo e o sentimento de sua dignidade humanae lhe mostra as possibilidades de uma situao feliz na vidaespiritual. Submetido s reunies de preces, passes e doutrina-o, os dois espritos, o desencarnado e o encarnado, so tratadoscom a assistncia das entidades espirituais encarregadas dessetrabalho amoroso. Kardec acentuou a necessidade de boas condi-es morais das pessoas que se dedicam a esse trabalho, pois sa moralidade do doutrinador exerce influncia sobre os espritos.Toda pretenso de afastar o esprito vampiresco pela violncia sservir para irrit-lo e complicar o caso. A boa inteno do

  • doutrinador para com o vampiro e a vtima, sua atitude amorosapara com ambos, fator importante para o xito do trabalho. Aformao de correntes de mos dadas em torno do paciente. ouso de defumadores e outros artifcios semelhantes, e qualqueroutra forma de encenao material so simplesmente inteis eprejudiciais. O imprudente que gritar com o esprito, dando-lheordens negativas, arrisca-se a prejudicar o trabalho e chamarsobre si a indignao do esprito ofendido. O clima dos trabalhosdeve ser de paz, compreenso, amor e confiana nas possibilida-des de recuperao das criaturas humanas. Nenhum esprito tema destinao do mal. Todos se destinam ao bem e acabaromodificando-se por seus prprios impulsos de transcendncia.

    Levados pelas excitaes novidadeiras do momento de transi-o que atravessamos, certas instituies mal dirigidas preten-dem modernizar as prticas doutrinrias, suprimindo as sessesmedinicas e substituindo-as por reunies de estudos doutrin-rios. Alegam que a doutrinao e esclarecimento dos espritosinferiores funo dos espritos superiores, no plano espiritual.Essa uma boa maneira de fugir s responsabilidades doutrin-rias e cortar as ligaes do homem com os espritos, relegando-os ao silncio misterioso dos tmulos, onde, na verdade, no seencontram. Foi essa a maneira que os cristos fascinados pelopoder romano, na fase de romanizao do Cristianismo, encon-traram para se livrarem das manifestaes agressivas dos espri-tos rancorosos, contrrios aos ensinos evanglicos, sem percebe-rem que se desligavam assim do mundo espiritual. A supressodos cultos pneumticos sesses medinicas da era apostlica ,permitiu a romanizao da Igreja, frustrando-lhe os objetivosespirituais. O mundo espiritual unitrio e orgnico, exatamentecomo o mundo material. Cortar a ligao humana com a regioinferior desse mundo atentar contra o princpio doutrinrio dasolidariedade dos mundos e constitui uma ingratido para com osespritos que deram a prpria doutrina. Mais do que isso, umainsensatez, pois no dispomos de meios para fazer essa cirurgiacsmica. A Igreja pagou caro a sua insensatez, tendo de recorrermais tarde revelao grega, Filosofia de Plato (Santo Agos-

  • tinho) e de Aristteles (So Toms de Aquino) para erigir comdecalques e emprstimos a sua prpria Filosofia.

    Por outro lado, a interpenetrao dos mundos (espiritual ematerial) faz parte do sistema, ou seja, da organizao universal,que no temos o direito de violar em favor do nosso comodismo,do nosso egosmo e da nossa cegueira espiritual. Essa pretensocriminosa lembra a teoria do Espiritismo sem espritos, deMorselli, famoso diretor da Clnica de Doenas Mentais deGnova, que, obrigado a aceitar a realidade dos fatos, escapou doaperto por essa via estratgica. Querem os espritas atuais seguira esperteza do genovs ilustre, sem os seus ilustrados argumen-tos?

    A alegao de que os espritos inferiores que nos perturbamso doutrinados no Alm, o que dispensa o nosso trabalho nassesses medinicas, de estarrecer. Ento essas criaturas quepassaram anos assistindo e dirigindo sesses medinicas, doutri-nando espritos, no se doutrinaram a si mesmas? No viram osespritos necessitados a que se dirigiam, no ouviram as suasameaas e os seus lamentos, passaram pelas atividades doutrin-rias como cegos e surdos? No aprenderam nos compndios dadoutrina que os espritos apegados matria necessitam deesclarecimento como o sedento necessita da gua, como oescafandrista necessita do oxignio da superfcie para respirar nofundo do mar? No aprenderam, com as pesquisas de Geley, quenas sesses medinicas se processa em fluxo contnuo a emissode ectoplasma que permite aos espritos sofredores sentirem-seamparados na matria, como se ainda estivessem encarnados,para poderem compreender as explicaes doutrinrias? Noaprenderam que os espritos superiores descem s sesses medi-nicas para poderem comunicar-se com entidades sofredorasinadaptadas ainda aos planos elevados? Querem negar a realida-de dolorosa das obsesses e entregar totalmente os obsidiados aointernamento das clnicas de Morselli? No sabem que a relaohomem-esprito uma condio permanente dos mundos inferio-res como o nosso, em que a maioria dos espritos desencarnadospermanece apegada Terra e por isso necessita do socorro dassesses medinicas? Annie Besant, a admirvel autora de A

  • Sabedoria Antiga, discpula e sucessora de Blavatsky na presi-dncia da Sociedade Teosfica Mundial apesar da repulsa dostesofos s prticas medinicas , abriu uma exceo no aludidolivro, ensinando que, no caso de perturbaes de espritos numacasa, se algum tiver coragem de falar com a entidade e provar-lhe que j morreu, conseguir afast-la. A grande teosofistareconhece a necessidade e a eficcia da doutrinao esprita, e osprprios espritas querem agora, tardiamente, assumir a atitudeteosfica que o prprio Sr. Sinet, tesofo do mais alto prestgio,condenou em seu livro Incidentes da Vida da Sra. Blavatsky.Sinet corrige esta (sua mestra) no tocante teoria dos cascesastrais e sustenta a legitimidade das manifestaes medinicas.Tudo isso ignorncia em excesso para representantes de Fede-raes e outras instituies espritas que visitam grupos e cen-tros, como fiscais de feira, mandando suspenderem as sessesmedinicas.

    Nas perverses sexuais e sensoriais em geral, bem como noscasos de toxicomania, a doutrinao dos espritos vampirescos indispensvel ao xito da terapia. Porque nesses casos estosempre envolvidos pelo menos o vampiro espiritual e o vampiri-zado encarnado. Se no se obtiver o desligamento dessas vtimasrecprocas, no se conseguir a cura. Os que defendem a tese deMorselli no meio esprita, essa tese j h muito superada entre osprprios adversrios gratuitos ou interesseiros da doutrina,passaram com armas e bagagens para o adversrio. No queremapenas a amputao da doutrina, pois na verdade querem a mortee o sepultamento inglrio do Espiritismo, como os telogoscatlicos e protestantes da Teologia Radical da Morte de Deusquerem enterrar o suposto cadver de Deus na cova aberta pelolouco de Nietsche, que acabou morrendo louco. Sirva o exemplodo filsofo infeliz para os filosofantes imberbes e desprevenidosdo nosso meio esprita. No h nada mais desastroso para umadoutrina do que abrigar entre seus adeptos criaturas que sedeixam levar por cantos de sereias. Precisamos, com urgncia,recorrer ttica de Ulisses, mandando tapar com chumaos dealgodo os ouvidos desses ingnuos navegantes de mares perigo-sos.

  • 5Motivos de Dificuldades nas Curas

    H curas que se verificam com surpreendente facilidade e ra-pidez, dando s vtimas de graves perturbaes e s suas famliasa impresso de um socorro divino especial. Nosso povo, deformao geralmente catlica, est sempre disposto a se deslum-brar com milagres. No h privilgios numa estrutura orgnicaperfeita, como a do Universo, regida por leis infalveis e teleol-gicas, ou seja, leis que dirigem tudo no sentido de fins previstos.A cura fcil e rpida decorre de mritos pessoais do doente, decompensaes merecidas por esforos despendidos por ele noseu desenvolvimento espiritual e em favor da evoluo humanaem geral. O objetivo da vida o desenvolvimento das potencia-lidades que trazemos em ns como sementes de angelitude edivindade semeadas na imperfeio humana. Os que compreen-dem isso, se procuram conscientemente trabalhar para que essassementes germinem mais depressa, adquirem crditos que lhesso pagos no momento exato das necessidades. Quando Jesusdizia a um doente: Perdoados foram os teus pecados, no eraporque ele fizesse um milagre naquele instante, mas porque odoente vencera a sua prova graas aos seus mritos.

    As doenas revelam desajustes da nossa posio existencial.Esses desajustes decorrem da liberdade de que dispomos em facedas exigncias evolutivas. A dor, a angstia, as inibies socomo campainhas de alarme prevenindo-nos de abusos ou des-cuidos. Sem a liberdade de errar no poderamos desenvolver asnossas potencialidades espirituais. A idia do castigo divino, dojuzo de Deus condenando os que erram uma maneira humana,antropomrfica, de interpretarmos os acidentes de nossa viagemna astronave planetria que nos faz rodar em torno do Sol. Po-demos socorrer-nos dessa imagem para modificar a nossa anti-quada maneira de ver e interpretar a nossa precria passagempela Terra. Somos passageiros de uma nave csmica, envoltos noescafandro de carne e osso, submetidos a experincias semelhan-tes s dos astronautas que, no podendo ainda atingir as estrelas,

  • fazem treinamento na rbita planetria. Acidentes da viagem,falhas tcnicas, dificuldades, fracassos perigosos, dor e mortedependem da nossa maneira de agir durante a viagem e da per-cia ou impercia nossa, do grau de responsabilidade, de perspic-cia, de bom-senso, de calma, de amor e respeito ao semelhanteque conseguimos desenvolver. Deus, conscincia Csmica, nointerfere em nosso aprendizado, mas tambm no est alheio aoque se passa conosco. Da mesma maneira que um telepata naLua pode captar as mensagens mentais que lhe sejam enviadasda Terra ou de outras naves espaciais, a mente suprema de Deuscapta, naturalmente, ligada a tudo o que se passa no Universo,nos seus mnimos detalhes. Se necessrio, as entidades a seuservio sero enviadas a socorrer-nos. Por toda parte os seresespirituais agem continuamente no universo. Como dizia ofilsofo e vidente Tales de Mileto, na Grcia Antiga: O mundoest cheio de deuses, que trabalham na terra, nas guas e no ar. fcil compreendermos isso se nos lembrarmos da infinidade deseres invisveis e visveis que enchem o Universo agindo emtodos os sentidos, sob uma orientao secreta, como robs vivos,para manterem as condies adequadas em cada organismo dosreinos naturais e em ns mesmos. Se isso se passa no planomaterial denso, com muito mais facilidade podemos imaginaressa vigilncia infinita no plano espiritual. A Providncia Divina o modelo supremo, arquetpico, de todas as formas de provi-dncia que os homens organizam na Terra. As grosseiras ima-gens de Deus e de sua ao no Universo, que as religies nosderam no passado, so agora substitudas por vises mais lgi-cas, racionais e justas, graas aos progressos do homem, noconhecimento progressivo e incessante da realidade em quevivemos. So retrgrados todos aqueles que ainda se apegam, emnossos dias, s idias ingnuas de um passado de milhares deanos. Mal iniciamos os primeiros passos na Era Csmica e jpodemos compreender melhor a beleza e a ordem da Obra deDeus e a importncia suprema de seus objetivos que so, naverdade, o destino de cada um de ns.

    As dificuldades nas curas pela terapia esprita decorrem, por-tanto, de nossas atitudes e aes no passado e no presente. Se

  • prejudicamos a evoluo de criaturas e comunidades em nossosavatares anteriores, natural que agora tenhamos de suportar asua companhia e sofrer a sua inferioridade em nosso ambienteindividual. Nenhum mago ou sacerdote nos livrar disso, ne-nhum exorcismo nos libertar, mas a nossa compreenso espiri-tual do problema e o nosso desejo natural de reparar os erros dopassado nos far livres atravs dos entendimentos possveis queos fenmenos medinicos nos propiciam. Como ensinou Jesus,devemos aproveitar a oportunidade de estarmos no mesmocaminho com o adversrio, para nos entendermos com ele. Sesoubermos fazer isso com amor, chegaremos ao fim da caminha-da comum como companheiros e amigos, prontos para novasconquistas em nossa evoluo. A terapia esprita nos d o socor-ro possvel na medida exata da nossa capacidade de receb-lo.No , porm, por meio de atos vulgares e interesseiros decaridade e nem de medidas artificiais de reforma interior quechegaremos a esse resultado. Lembremo-nos do moo rico queprocurou Jesus, perguntando-lhe o que faltava para ele merecer oReino dos Cus. Jesus tocou-lhe no ponto decisivo da questo o desapego dos bens terrenos , mandando-o vender tudo o quepossua e distribuir o resultado aos pobres. O moo entristeceu-se e retirou-se da presena do Mestre. No era a fortuna em sique o prejudicava, mas o seu apego a ela, a sua incapacidade decompreender ainda o verdadeiro sentido da vida. Por isso tam-bm a definio de Paulo sobre a caridade, num arrebatamentoespiritual do apstolo, ainda no foi compreendida por ns. Oapego s condies passageiras da vida terrena, aos seus benstransitrios, perecveis, nos impede de abrir o corao e a mentepara a suprema e imperecvel grandeza da realidade espiritual.Dar esmolas, socorrer as necessidades do prximo so apenasmeios de aprendizagem que nos levam libertao. Temos de iralm, de abrir a nossa mente e o nosso corao para ver, sentir,brotando em ns mesmos, sem nenhum interesse inferior, a fonteoculta que no est no poo de Jac, mas na realidade ntica,espiritual, profunda da pobre mulher samaritana. Temos em nstoda a riqueza do Universo, com todas as suas constelaes etodas as hipstases da teoria de Plotino, mas continuamos apega-dos s vaidades e intrigas da Terra. A terapia esprita, que a

  • mesma do Cristo, nos oferece a gua viva da sua nova concepodo ser e do mundo. Enquanto essa gua no jorra em ns, noseremos curados.

    Passar de um tipo de mentalidade a outro, no processo hist-rico, exige enorme e persistente esforo de uma civilizao. Nummomento agudo de transio como enfrentamos em nosso tempo,esse processo exige modificaes violentas que provocam medoe inquietao. O homem atual perdeu a segurana do passado.Suas prprias certezas cientficas foram substitudas por probabi-lidades. Ele se recusa inconscientemente a trocar os seus mitosreligiosos por idias racionais, mas ao mesmo tempo sente-seobrigado a troc-los, por fora do desenvolvimento cultural etecnolgico. O antropomorfismo, que o cevou por milnios nasidias cmodas de um Deus semelhante a ele e o fez familiar deDeus, para ele muito caro. Deixar esse Deus familiar pela idiade uma Conscincia Csmica o confunde. Como Kardec acentu-ou, esse processo se torna fcil graas sucesso das geraes.J podemos notar o enfraquecimento dos mitos atuais no decor-rer dos anos. Toynbee mostrou que as civilizaes se apiam noalicerce das grandes religies, confirmando a influncia da lei deadorao no processo histrico. No se referiu a essa lei karde-ciana, mas reconheceu a sua necessidade bsica para a evoluomental e espiritual das comunidades humanas. Esse hoje umtema pacfico. As grandes ideologias revolucionrias, por maisbrutais que fossem, acabaram sempre por se estruturar nas for-mas de religies, no podendo vingar sem essas metamorfosessignificativas. O Positivismo de Comte desembocou, para espan-to dos seus adeptos mais fiis, na Religio da Humanidade; osidelogos da Revoluo Francesa entronizaram a Deusa Razona Catedral de Notre Dame, o Marxismo converteu-se numaorganizao fantica de salvacionistas, com a adorao de Marxentre a foice e o martelo, a reverncia aos dolos sagrados daRevoluo Bolchevista e a obedincia servil s bulas papalinasdo Kremlin ressuscitado das cinzas. mas tudo isso foi precedidode longas e dolorosas metamorfoses conceptuais. A pretensocientfica do materialismo Dialtico foi asfixiada pela falncia damatria no desenvolvimento da Fsica Moderna. Todas essas

  • tentativas de religies artificiais esboroaram-se, abrindo passa-gem lgica realista e irrefutvel da concepo esprita, inteira-mente livre de smbolos e mitos que favorecem o desenvolvi-mento de novos formalismos e de novos mitos. MonsenhorPisoni, expert de Espiritismo no Vaticano, declarou recentemen-te revista italiana Gente que teve a oportunidade de recebermensagens autnticas de dois amigos falecidos, e acrescentouque o Vaticano no condena as pesquisas espritas. J chegou cpula do mundo catlico o abalo inevitvel das velhas estrutu-ras. Cabe-nos agora vigiar ativamente, aprofundando os estudosdoutrinrios do Espiritismo, para que a metamorfose conceptualem curso no arraste os espritas para a voragem das deturpaessincrticas. S um esforo conjunto dos intelectuais espritaspoder impedir a ameaa desse novo naufrgio da razo nomisticismo formalista e mitolgico dos criadores de mitos. Aterapia esprita, natural e simples, seria ento sufocada por umretorno de sculos adorao espria das fantasias.

    Estamos num desses vrtices perigosos da histria, em que osacidentes dessa espcie so comuns, por falta de conhecimentoreal das doutrinas renovadoras. Precisamos aprofundar os estu-dos doutrinrios, atravs do esforo de pensadores espritassuficientemente integrados na cultura atual e empenhados nodesenvolvimento da nova cultura da era csmica.

    Temos de dinamizar os nossos esforos na elaborao consci-ente e esclarecida da Cultura Esprita, nica realmente dotada decapacidade para absorver os elementos vlidos da cultura leiga.As culturas, como ensina Ernst Cassirer, nascem e se desenvol-vem por esse processo de assimilao seletiva (no sincrtica) daherana cultural anterior. Se os espritas no compreenderemessa necessidade histrica e no se prepararem para enfrent-las,sero os responsveis pelo retrocesso ao misticismo obscurantis-ta que j nos ameaa.

    Kardec insistiu na necessidade de nos firmarmos na razo pa-ra no recairmos nos delrios da imaginao excitada pelo impul-so de sublimao que levou os clrigos de todos os tempos a sejulgarem privilegiados de Deus e agraciados pela sabedoriainfusa do teologismo. A imaginao, como observara Descartes,

  • leva-nos a romper os limites do possvel. Nada mais apropriadopara transformar e acelerar de repente os passos cautelosos nadisparada quixotesca. Por isso, o campo do paranormal oferecemais dificuldades para a pesquisa cientfica do que o dos fen-menos fsicos. Myers advertiu que a mente subliminar destina-se vida espiritual e no material, que corresponde s exignciasimediatistas do mundo sensorial. Kardec esquivou-se ao uso dosprocessos da vidncia e do desprendimento medinico para ainvestigao do plano espiritual, preferindo obter informaesdos espritos, sempre que controlveis, para atingir a verdadesobre o outro mundo. Alegava que os que vivem naquele mundoesto mais aptos a nos fornecer dados sobre ele. O espritoencarnado est condicionado ao nosso plano, mas o desencarna-do c