nodo duplo / double node

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CARDOSO, Cláudio U. P.. Performance de harmônicos naturais …Per Musi. Belo Horizonte, v.1, 2000. p.77-88 Performance de harmônicos naturais com a técnica de nodo duplo aplicada ao violoncelo Cláudio Urgel Pires Cardoso Resumo: O artigo é um estudo sobre a técnica de performance dos harmônicos naturais do violoncelo, na qual dois nodos adjacentes, de um mesmo modo de vibração e em uma mesma corda são tocados simultaneamente. A técnica tem três utilidades principais: primeiro, ela aumenta o número de nodos disponíveis para a performance de alguns harmônicos naturais; segundo, ela facilita a performance de passagens musicais que envolvem sons harmônicos; terceiro, ela reforça e assegura a performance de qualquer harmônico natural. São apresentados três exemplos da aplicação da Técnica de Nodo Duplo a passagens musicais do repertório do violoncelo. Palavras-chave: Performance Musical, Violoncelo, Sons Harmônicos Cello Natural Harmonics Performed with the Double-Node Technique Abstract: The article is a study on a performance technique of the cello natural harmonics in which two adjacent nodes, of the same mode of vibration and on the same string are touched simultaneously. The technique has three special utilities: first, it increases the number of nodes for the performance of some natural harmonics; second, it makes easier to perform musical passages in which harmonic tones are involved; third, it reinforces and assures the performance of any natural harmonic. Three examples of the application of the double-node technique to musical passages of the cello repertoire are presented. Key-words: Musical Performance, cello, Harmonic Tones I - INTRODUÇÃO De acordo com a ciência acústica, sons produzidos por instrumentos musicais são compostos de outros sons chamados harmônicos 1 ou parciais. A fim de evitar, neste texto, o uso excessivo da palavra harmônico ao nos referirmos aos sons que compõem outro som e à performance desses mesmos sons, usaremos o termo parcial para os componentes de um som e som harmônico para o efeito especial em discussão. Quando a corda de um instrumento vibra, ela produz diferentes modos de vibração, os quais vibram ao mesmo tempo gerando os parciais. Estes parciais compõem o som produzido por aquela corda (som percebido). Os modos de vibração de uma corda são divididos por nodos, sem precisar apertar a corda contra o espelho. Diferentemente da técnica de performance regular, corda presa, para tocarmos os sons harmônicos, usamos um leve toque de um dos dedos da mão esquerda sobre os nodos. Com esse leve toque sobre os nodos, eliminamos alguns dos modos de vibração (parciais) que compõem um som, dando aos sons harmônicos o seu timbre característico. Como exemplo, se estamos tocando o sexto harmônico natural, eliminamos todos os parciais que não sejam múltiplos inteiros de seis, ou seja, somente estarão compondo o som ouvido o sexto parcial, o décimo segundo, o décimo oitavo e assim por diante. Chamaremos esta técnica de Técnica de Um Nodo para diferencia-la da que iremos discutir neste texto. A Ex.1 ilustra alguns dos conceitos apresentados acima. 1 Os principais termos técnicos usados neste artigo estão definidos no Glossário e sua primeira ocorrência no texto é indicada com o estilo de fonte negrito. As definições têm apenas o objetivo de esclarecer o seu uso neste texto.

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tecnica de harmônico artificial técnica do nodo duplo.para baixo elétrico double node technic for eletric bass .

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  • CARDOSO, Cludio U. P.. Performance de harmnicos naturais Per Musi. Belo Horizonte, v.1, 2000. p.77-88

    Performance de harmnicos naturais com a tcnica de nodo duploaplicada ao violoncelo

    Cludio Urgel Pires Cardoso

    Resumo: O artigo um estudo sobre a tcnica de performance dos harmnicos naturais do violoncelo, naqual dois nodos adjacentes, de um mesmo modo de vibrao e em uma mesma corda so tocadossimultaneamente. A tcnica tem trs utilidades principais: primeiro, ela aumenta o nmero de nodosdisponveis para a performance de alguns harmnicos naturais; segundo, ela facilita a performance depassagens musicais que envolvem sons harmnicos; terceiro, ela refora e assegura a performance dequalquer harmnico natural. So apresentados trs exemplos da aplicao da Tcnica de Nodo Duplo apassagens musicais do repertrio do violoncelo.Palavras-chave: Performance Musical, Violoncelo, Sons Harmnicos

    Cello Natural Harmonics Performed with the Double-Node Technique

    Abstract: The article is a study on a performance technique of the cello natural harmonics in which twoadjacent nodes, of the same mode of vibration and on the same string are touched simultaneously. Thetechnique has three special utilities: first, it increases the number of nodes for the performance of somenatural harmonics; second, it makes easier to perform musical passages in which harmonic tones areinvolved; third, it reinforces and assures the performance of any natural harmonic. Three examples of theapplication of the double-node technique to musical passages of the cello repertoire are presented.Key-words: Musical Performance, cello, Harmonic Tones

    I - INTRODUODe acordo com a cincia acstica, sons produzidos por instrumentos musicais socompostos de outros sons chamados harmnicos1 ou parciais. A fim de evitar, nestetexto, o uso excessivo da palavra harmnico ao nos referirmos aos sons que compemoutro som e performance desses mesmos sons, usaremos o termo parcial para oscomponentes de um som e som harmnico para o efeito especial em discusso.

    Quando a corda de um instrumento vibra, ela produz diferentes modos de vibrao, osquais vibram ao mesmo tempo gerando os parciais. Estes parciais compem o somproduzido por aquela corda (som percebido). Os modos de vibrao de uma corda sodivididos por nodos, sem precisar apertar a corda contra o espelho. Diferentemente datcnica de performance regular, corda presa, para tocarmos os sons harmnicos,usamos um leve toque de um dos dedos da mo esquerda sobre os nodos. Com esseleve toque sobre os nodos, eliminamos alguns dos modos de vibrao (parciais) quecompem um som, dando aos sons harmnicos o seu timbre caracterstico. Comoexemplo, se estamos tocando o sexto harmnico natural, eliminamos todos os parciaisque no sejam mltiplos inteiros de seis, ou seja, somente estaro compondo o somouvido o sexto parcial, o dcimo segundo, o dcimo oitavo e assim por diante.Chamaremos esta tcnica de Tcnica de Um Nodo para diferencia-la da que iremosdiscutir neste texto. A Ex.1 ilustra alguns dos conceitos apresentados acima.

    1 Os principais termos tcnicos usados neste artigo esto definidos no Glossrio e sua primeira

    ocorrncia no texto indicada com o estilo de fonte negrito. As definies tm apenas o objetivo deesclarecer o seu uso neste texto.

  • 2Pestana Cavalete

    1 MododeVibrao

    1 Parcial(SomFundamental)

    2 MododeVibrao

    2 Parcial(2 HarmnicoNatural)

    1/2 nodo de som real

    3 MododeVibrao

    3 Parcial(3 HarmnicoNatural)

    1/3 2/3 nodo nodo de som real

    4 MododeVibrao

    4 Parcial(4 HarmnicoNatural)

    1/4 2/4 3/4 nodo nodo nodo de som real

    Ex.1 - Os primeiros quatro modos de vibrao de uma corda. Para todos os modos de vibrao (1 coluna)so mostrados seus parciais correspondentes e os sons harmnicos que podero ser produzidos a partirdeles (3 coluna), assim como os nodos de cada modo (2a coluna), indicados com fraes do comprimentoda corda, e o nodo de som real.

    Os modos de vibrao tm nodos comuns chamados nodos coincidentes. Os nodoscoincidentes so pontos na corda em que encontramos mais de um nodo de diferentes modosde vibrao. A coincidncia de nodos melhor entendida com as fraes que indicam alocalizao desses pontos. Nos nodos em que h a equivalncia de fraes, acontecem osnodos coincidentes, i.e., o ponto 1/2 equivale ao 2/4, ao 3/6, ao 4/8 e assim por diante. Essacaracterstica de vibrao das cordas cria um problema para a performance dos sonsharmnicos. Em um ponto da corda onde acontece a coincidncia de nodos, o modo devibrao mais baixo (numericamente inferior) ser sempre preponderante sobre os outrosmodos e o som harmnico produzido (som ouvido) ser sempre o do modo de vibrao maisbaixo. Outros sons harmnicos, numericamente superiores, produzidos a partir de modos devibrao que tenham nodos naquele mesmo local, no podero ser tocados a partir destesnodos coincidentes. Como exemplo, no sexto modo de vibrao, a partir do qual tocado osexto harmnico natural, existem teoricamente cinco nodos (no sexto modo de vibrao, acorda est dividida em seis partes iguais com cinco nodos), contudo somente dois podem serusados, os no coincidentes localizados nos pontos 1/6 e 5/6. Os outros trs so coincidentescom nodos de modos de vibrao mais baixos: o nodo 2/6 coincidente com o nodo 1/3 doterceiro modo de vibrao (produz o terceiro harmnico natural); o 3/6 coincidente com o 1/2do segundo modo de vibrao (produz o segundo harmnico natural); e o 4/6 coincidente como 2/3 do terceiro modo (produz o terceiro harmnico natural). Em resumo, podemos dizer que,quando a tcnica de um nodo usada, o som harmnico produzido (som ouvido) sempreaquele do modo de vibrao mais baixo que tenha um nodo naquele local especfico. Os

  • 3demais sons harmnicos, os quais tm nodos naquele local da corda, no podem ser tocados apartir daquele nodo. A Ex.2 ilustra as idias apresentadas acima.

    6 Modo deVibrao(6 Harm. Natural)

    1/6 2/6 3/6 4/6 5/6 coinc coinc. coinc.

    3 Modo deVibrao(3 Harm. Natural)

    1/3 2/32 Modo deVibrao(2 Harm. Natural)

    1/2Ex.2 - A coincidncia de nodos do sexto modo de vibrao (2/6, 3/6, 4/6) com nodos do terceiro modo (1/3 e2/3) e do segundo modo (1/2). Alm dos modos de vibrao, so apresentados (1a coluna) os sonsharmnicos que podem ser produzidos a partir destes modos. Os nodos de cada modo so indicados comfraes do comprimento da corda (2a coluna).

    Um bom experimento para verificar esta teoria, no caso de violoncelistas, tocar o sextoharmnico natural na corda D, a partir do nodo 1/6 (Mib1) ou 5/6 (Sol3) e olhar para a corda nadireo dos outros nodos, localizados nos pontos 2/6 (Sol1) 3/6 (D2), 4/6 (Sol2). possvelvisualizar os nodos (pontos que no vibram), contudo, o sexto harmnico natural no pode sertocado a partir daqueles nodos com a tcnica regular, tcnica de um nodo (Ex.3).

    ?FundamentalCorda D

    w &6a. Harm. Nat.

    w ?Nodos

    1/6b

    2/6 coinc.

    3/6 coinc.

    4/6 coinc.

    5/6

    Ex.3 - Nodos do sexto harmnico natural na corda D do violoncelo.O Sol3 (sexto parcial) o somproduzido, o qual pode ser tocado a partir dos nodos localizados sobre a nota Mib1 e Sol3 na corda D (1/6 e5/6). Os outros nodos (nodos coincidentes) localizados sobre o Sol1 (2/6), D2 (3/6) e Sol2 (4/6) podem servisualizados na corda quando o som harmnico tocado, mas no possvel produzir o sexto harmniconatural a partir deles.

    II - A TCNICA DE NODO DUPLO devido ao problema apresentado acima que a Tcnica de Nodo Duplo tem a sua maiorutilidade. A tcnica tem um princpio muito simples, i.e., dois nodos adjacentes do mesmo modode vibrao e na mesma corda devem ser tocados ou pressionados levemente esimultaneamente. Com esse toque duplo em nodos adjacentes de um mesmo modo devibrao, fazemos com que este modo de vibrao seja preponderante sobre os outros eproduza o som harmnico desejado, no importando a coincidncia ou no de nodos.

  • 4WOODRICH (1980) fez um estudo sobre o toque de mais de nodo ao mesmo tempo, contudosua abordagem foi diferente da que estamos propondo neste artigo. Neste trabalho, a Tcnicade Nodo Duplo como uma maneira de recuperar nodos coincidentes como nodos deperformance e uma tcnica de reforo do modo de vibrao, para ter certeza que o somdesejado ser o produzido. O toque de mais de nodo ao mesmo tempo tem mais utilidadespara contrabaixistas, uma vez que mais harmnicos naturais podem ser usados no contrabaixo.As razes para essas limitaes no violoncelo, quando comparado ao contrabaixo, estorelacionadas aos mesmos problemas da tcnica de um nodo, i.e., a dificuldade de localizar eisolar nodos, assim como ao menor espao para a colocao do arco nas cordas (ponto decontato). No caso do violino e da viola, a tcnica pode tambm ser aplicada, contudo commaiores limitaes que no violoncelo, uma vez que violino e viola tm cordas mais curtas e umadificuldade maior de localizar e isolar os nodos, quando comparados com o violoncelo ou ocontrabaixo.

    O exemplo mais antigo que encontrei do uso da Tcnica de Nodo Duplo est no tratado deALEXANIAN (1922), Ex.4. Alexanian apresenta essa tcnica de toque duplo de nodos comouma maneira de reforar a produo de sons harmnicos mais difceis, especialmente o oitavoharmnico natural, ele no considera a coincidncia ou no de nodos e outras utilidades que otoque duplo pode trazer.

    Ex.4 Tcnica de Nodo Duplo de Alexanian (ALEXANIAN, 1922, p. 106). As notas do pentagrama superiorrepresentam os sons que sero produzidos. As notas do pentagrama inferior representam a localizao dosnodos na corda l, os quais devem ser tocados ao mesmo tempo para produzir o som harmnico indicadono pentagrama superior.

    A Tcnica de Nodo Duplo pode ser usada para tocar qualquer som harmnico, noimportando a existncia de nodos coincidentes. Essa tcnica de toque duplo refora omodo de vibrao e assegura a produo de qualquer som harmnico. Ela aumenta onmero de nodos para a performance de alguns dos harmnicos naturais. O Ex.5 mostrao quarto, sexto e oitavo harmnicos naturais. Entre os oito primeiros harmnicos naturais,que so os mais usados no violoncelo, somente o quarto, sexto e oitavo harmnicosnaturais perdem nodos de performance devido coincidncia de nodos. Por esta razosomente eles foram includos na tabela do Ex.5. Para melhor entender esta tabela desons harmnicos, as fraes indicam a localizao dos nodos e quais deles socoincidentes. As fraes para a indicao de nodos foram colocadas apenas na corda Dpara se evitar o excesso de smbolos na tabela. Dos trs harmnicos naturais emquesto, o sexto que mais se beneficia da Tcnica de Nodo Duplo. Com a Tcnica deUm Nodo, o sexto harmnico natural pode ser tocado somente em dois de seus cinconodos, como pde ser visto anteriormente no Ex.3. Utilizando a Tcnica de Nodo Duplo

  • 5aumentamos as possibilidades de performance do sexto harmnico natural de duas paraseis, sendo quatro com o toque duplo (Ex.5: sistema inferior, Corda D, segundopentagrama). Se observarmos todas as combinaes de nodos, veremos que somente nosexto harmnico natural encontramos combinaes em que os dois nodos adjacentes socoincidentes, o que faz com estas combinaes sejam as de maior importncia para arecuperao de nodos de performance (Ex.5, sistema inferior, Corda D, segundopentagrama, compassos trs e quatro).

    III - A APLICAO DA TCNICA DE NODO DUPLOOs trs exemplos apresentados a seguir ilustram como a Tcnica de Nodo Duplo pode seraplicada em importantes passagens do repertrio do violoncelo. Antes de apresentar osexemplos, algumas observaes sobre a notao de sons harmnicos precisam ser feitas. Umadas maneirais mais usadas para indicar sons harmnicos a indicao de um pequeno crculosobre ou abaixo da cabea da nota. Neste caso, cabe ao instrumentista de corda encontrar amelhor opo para tocar o som harmnico. Para este tipo de notao, o compositor precisasaber apenas os limites de altura, para sons harmnicos, de cada instrumento (Ex.6a). Se ocompositor quer indicar como um determinado som harmnico deve ser tocado, outrasanotaes devem ser feitas. A indicao do nmero da corda junto com o pequeno crculoindica que o som harmnico deve ser tocado em seu nodo de som real, aquele em que a notaescrita e o som real tm a mesma altura (Ex.6b). Para indicar o local de outros nodos, a cabeada nota deve estar em forma de losango, com o som real indicado acima (Ex.6c). A notao desons harmnicos deve distinguir entre a indicao da Tcnica de Nodo Duplo (dois nodos namesma corda) e a notao para harmnico natural duplo (dois nodos em cordas diferentes).Portanto, esta distino feita atravs da indicao da corda ou das cordas a serem tocadas(Ex.6d e Ex.6e). No caso de harmnico artificial, a nota mais grave das duas escritas indica apestana artificial (Ex.6f). As cordas do violoncelo so indicadas com algarismos romanos: I(L), II (R), III (Sol) e IV (D) (Ex.6b). Os dedos da mo esquerda so indicados comalgarismos arbicos, 1 indicador, 2 mdio, 3 anular e 4 mnimo. O polegar da mo esquerda,tambm chamado de capotasto, indicado por um pequeno crculo com um trao para baixo(Ex.6e). importante observar que em todos os casos em que o nodo no o de som real, aaltura correta indicada acima da nota que representa o nodo.

  • 6&&

    &

    C o r d a L

    4 Harm. Nat.

    w

    6 Harm. Nat.

    w

    8 Harm. Nat.

    w

    &&

    &

    C o r d a R

    4 Harm. Nat.

    w

    6 Harm. Nat.

    w

    8 Harm. Nat.

    w

    ?

    ?

    ?

    b b

    &&

    &

    C o r d a Sol

    4 Harm. Nat.w ?

    6 Harm. Nat.

    w

    8 Harm. Nat.

    w

    ?

    ?

    bb b

    &&

    &

    C o r d a D

    4 Harm. Nat.w ?

    6 Harm. Nat.w

    8 Harm. Nat.

    w

    2/4 coinc.3/45/64/6 coinc.

    ?

    7/86/8 coinc.

    ?

    1/42/4 coinc.4/6 coinc.3/6 coinc.

    6/8 coinc.5/8

    3/6 coinc.2/6 coinc.

    4/8 coinc.5/8

    2/6 coinc.1/6

    b4/8 coinc.3/8

    b 3/82/8 coinc.

    b 2/8 coinc.1/8

    Ex.5 - Tcnica de Nodo Duplo aplicada ao quarto, sexto e oitavo harmnico naturais nas cordas Do, Sol, Re L do violoncelo. Cada sistema representa uma corda, onde podem ser vistos os nodos para aperformance do quarto, sexto e oitavo harmnicos naturais. Somente no sistema da corda D os nodos soindicados com fraes do comprimento da corda. A abreviao coinc. indica os nodos coincidentes commodos de vibrao mais baixos.

  • 7Notao Exemploa Sons harmnicos & c o o o ob Harmnico Natural no

    Nodo de Som Real ? cIV

    o III oII o I o

    c Harmnico Naturalem outros Nodos &

    ?c

    c

    III IV d Harmnico Natural

    tocado com aTcnica de Nodo Duplo

    & w( )?

    IVe Harmnico Natural Duplo & ww( )?

    IVIII

    f Harmnico Artificial &?

    c

    c

    III g Indicao de Dedilhado

    &

    ?c

    c

    II3 o

    III3 o

    III

    3 Ex.6 Notao dos sons harmnicos no violoncelo

    O Ex. 7 mostra uma passagem da Sonata in C major for Cello and Piano, PROKOFIEV (1958).A passagem apresenta trs notas que devem ser tocadas como sons harmnicos, o R3, Sol2 eR4. A notao original indica a performance dos sons harmnicos em seus nodos de som real,sendo por isto a que apresenta o mais alto nvel de dificuldade tcnica. No Ex. 7 esto sendosugeridas trs opes diferentes para a performance desta passagem com a utilizao daTcnica de Nodo Duplo. As opes apresentadas diferem em dificuldades de performanceassim como em qualidade de som. A nmero 3 , na minha opinio, a melhor, por apresentarum equilbrio entre a dificuldade tcnica e qualidade do som. Na opo 3 utilizada a Tcnicade Nodo Duplo para o ltimo som harmnico, sobre os nodos 2/6 e 3/6 do sexto harmniconatural da corda Sol. O sexto harmnico natural tocado com a Tcnica de Nodo Duplo (2/6 e3/6), em substituio ao quarto harmnico natural no nodo de som real, facilita a performance e

  • 8tambm apresenta uma qualidade sonora que se ajusta a passagem, que um fim de frasecom a dinmica piano e carter delicado (o R4, tocado como sexto harmnico natural nacorda Sol, tem um nvel de dinmica menor que quando tocado na corda R como quartoharmnico natural).

    original

    opo 1

    opo 2

    opo 3

    ?

    ?

    ?

    ?

    43

    43

    43

    43

    68 j o o &

    j

    III4IV4

    j II o III o

    j II o

    3

    IIIo3

    69 o

    III 14

    III..3

    III ..3

    70 .

    ..

    ..Ex.7 - Sonata in C major for Cello and Piano (PROKOFIEV, Op. 119, 1958)

    O Quatuor pour la fin du temps de MESSIAEN (1957), oferece outro bom exemplo de como aTcnica de Nodo Duplo pode ser usada. O Ex. 8 apresenta em seu primeiro pentagrama (somreal) as cinco notas que so empregadas na parte do violoncelo, em todo o primeiro movimento,com ritmos variados e devem ser tocadas como sons harmnicos. No segundo pentagrama,parte original, os sons harmnicos so dedilhados para serem tocadas com o harmnicoartificial de quarta. No terceiro pentagrama apresento a opo de tocar o Mi5 como o sextoharmnico natural com a Tcnica de Nodo Duplo nodos 2/6 e 3/6, ao invs do harmnicoartificial de quarta indicado no original. As outras notas mantm o mesmo dedilhado do original.Diferentemente das outras notas, as ocorrncias do Mi5 (mais de 20 vezes) tm sempre adurao de uma semnima pontuada, dando mais tempo para a preparao do uso destatcnica. A maior dificuldade desta passagem, se for toda tocada com um harmnicoartificial, est em manter o polegar pressionando a corda por um perodo muito longo detempo, o que pode provocar cimbra no polegar. A mudana de harmnico artificial dequarta para o sexto harmnico natural com a Tcnica de Nodo Duplo no precisa serusada todas as vezes que o Mi5 ocorre. Contudo, toc-lo algumas vezes como sextoharmnico natural usando a Tcnica de Nodo Duplo, ser uma maneira de descansar opolegar.

  • 9som real

    original

    opo

    &

    &

    &

    w

    I

    w 3

    I

    w 3

    w

    w 3

    w

    ww 3

    w#

    w#w#

    wb

    wbbwbb

    Ex.8 - Quatuor pour la fin du temps (MESSIAEN, 1957). Na partitura original, as notas musicais acima soapresentadas sempre nesta seqncia, mas com ritmos variados.

    A obra Dialoghi per Violoncello e Orchestra, DALLAPICOLA (1960), apresenta muitaspassagens com sons harmnicos. O Ex. 9 mostra uma das passagens em que o sextoharmnico natural pode ser tocado com a Tcnica de Nodo duplo. Na opo 1, o mesmodedilhado e cordas da verso original so usados. Contudo, para o ltimo som harmnico, oharmnico artificial de quarta substitudo pelo sexto harmnico natural, tocado com a Tcnicade Nodo Duplo nos nodos 2/6 e 3/6. Esta mudana facilita a performance dessa passagem emelhora a qualidade sonora, uma vez que mantm as duas notas como harmnico natural. Noopo 2 os dois ltimos sons harmnicos so modificados. O Si3 tocado como quintoharmnico natural no nodo 3/5, ao invs do 2/5, e para o R4 usado o sexto harmniconatural com a Tcnica de Nodo Duplo nos nodos 3/6 e 4/6. A opo 2 apresenta a mesmaqualidade sonora da opo 1 mas oferece maior dificuldade tcnica.

    som Real

    original

    opo 1

    opo 2

    ?

    ?

    ?

    c

    c

    c

    ( )&48

    7

    III 3 o II b4 III 1 II 3

    7

    III 3 o II b4 III 1 II 3

    7

    III o II b1 III 2 III 3

    Ex.9 - Dialoghi per Violoncello e Orchestra (DALLAPICOLA, primeiro movimento, 1960).

  • 10

    IV - CONCLUSOSons harmnicos tm sido usados nos instrumentos de corda desde os primrdios de suahistria, quando somente cordas soltas em forma de longos pedais e sons harmnicoseram utilizados. Os sons harmnicos oferecem muitas possibilidades. Podem ser tocadoscomo naturais (de corda solta), artificiais (de pestana artificial), em combinao comoutros efeitos especiais, tais como o pizzicato ou o glissando e outras possibilidades. Elesso tambm um grande recurso de variao timbrstica.

    A performance de sons harmnicos no oferece grande dificuldade tcnica e , at certoponto, de extrema simplicidade. Apesar disto, um grande nmero de instrumentistas decorda e compositores tm dificuldade em utilizar os sons harmnicos. Em minhaexperincia profissional, sempre encontro instrumentistas e maestros que, diante de umapassagem musical que contenha uma indicao de som harmnico, ficam sem sabercomo tocar ou qual exatamente o som a ser ouvido.

    Acredito que este trabalho, alm de introduzir uma tcnica de performance de sonsharmnicos praticamente desconhecida, faz com que msicos pensem e entendamoutras questes relacionadas aos sons harmnicos, como por exemplo a sua corretanotao. Outros estudos precisam ser realizados e publicados para que todos os msicose estudiosos de msica possam entender e usar os sons harmnicos em todas as suaspossibilidades.

    Os exemplos de aplicao da Tcnica de Nodo Duplo apresentados neste artigo soapenas trs de muitos outros que podem ser encontrados. Como pode ser visto no artigo,a Tcnica de Nodo Duplo tem trs valores principais: primeiro, ela aumenta o nmero denodos para a performance de alguns harmnicos naturais; segundo, ela facilita aperformance de passagens musicais que envolvem sons harmnicos; e terceiro, elarefora a execuo de qualquer som harmnico.

    V - GLOSSRIOCavalete - Parte dos instrumentos de corda que fixa (a corda presa ou amarrada no

    estandarte) a corda e ao mesmo tempo transmite a sua vibrao para que sejaamplificada pelo corpo do instrumento.

    Corda Presa - Tcnica de performance dos instrumentos de corda em que a corda presa com a presso dos dedos da mo esquerda contra o espelho (em oposio corda solta) variando o seu comprimento e produzindo sons de diferentesalturas.

    Corda Solta - As cordas dos instrumentos quando no esto presas pelos dedos da moesquerda.

    Espelho - Pea de madeira dos instrumentos de corda colada no brao do instrumento econtra a qual as cordas so pressionadas com os dedos da mo esquerda paraserem presas e produzirem sons de diferentes alturas.

    Estandarte - Pea de madeira que fica na parte inferior (abaixo do cavalete no caso dovioloncelo e contrabaixo) dos instrumentos e em que so presas ou amarradas ascordas.

    Fraes - Partes de um todo. Neste texto as fraes do comprimento da corda indicam osnodos dos diversos modos de vibrao. As Fraes equivalentes so aquelas em que a

  • 11

    relao entre numerador e denominador a mesma e so usadas para indicar acoincidncia de nodos, i.e., 1/2 = 2/4 = 3/6 = 4/8, etc.

    Fundamental - Primeiro (mais grave) dos membros de uma srie harmnica, ou doscomponentes de um som. A freqncia da qual todos os outros componentes somltiplos inteiros.

    Harmnicos - Harmnicos so componentes de um som, os quais so membros de umasrie em que a relao entre eles harmnica, i.e., os membros so mltiplosinteiros de uma freqncia ou som fundamental (srie harmnica). Harmnicospodem tambm ser chamados de parciais. Deve ser feita uma distino entreharmnico enquanto componente de um som e som harmnico. Um harmnico apenas uma freqncia, enquanto que um som harmnico, o efeito especial usadonos instrumentos de corda tem outras freqncias componentes.

    Harmnico Artificial - Som harmnico produzido a partir de uma corda presa, compestana artificial. Os harmnicos artificiais so classificados pelo intervalo musicalentre a pestana artificial e a nota sobre a qual o dedo toca o nodo, i.e., harmnicoartificial de oitava, harmnico artificial de quinta, harmnico artificial de quarta, eassim por diante.

    Harmnico Natural Duplo - Efeito especial em que dois sons harmnicos de cordasdiferentes so produzidos ao mesmo tempo.

    Harmnico Natural - Som harmnico produzido a partir de uma corda solta. Osharmnicos naturais so classificados pela ordem em que os parciais aparecem nasrie harmnica, i.e., segundo harmnico natural, terceiro harmnico natural,quarto harmnico natural, e assim por diante.

    Modos de Vibrao - So os diferentes modos em que uma corda vibrasimultaneamente para produzir os parciais que compem o som.

    Nodo - Pontos de repouso no movimento vibratrio de uma corda. Estes pontos soutilizados para tocar os sons harmnicos.

    Nodo Coincidente - So pontos na corda onde encontramos mais de um nodo de modos devibrao diferentes.

    Nodos de Performance - So os nodos de um modo de vibrao que podem ser usados paraa performance de um som harmnico, i.e., no quinto modo de vibrao a corda estdividida em cinco partes iguais com quatro nodos de performance (no considerando apestana e o cavalete, no caso de harmnico natural).

    Nodos de Som Real - So os nodos de cada modo de vibrao (1/2, 2/3, 3/4, 4/5, 5/6,etc.) em que o som real e a nota escrita para indicar o nodo tm a mesma altura.

    Parciais - Parciais so as freqncias componentes de um som, as quais no precisamestar exatamente dentro das relaes da srie harmnica, ou serem mltiplosexatos de uma freqncia fundamental. O termo parcial mais abrangente queharmnico. Portanto, harmnicos podem ser chamados de parciais, mas nemtodos os parciais podem ser chamados de harmnicos.

    Pestana - Parte superior dos instrumentos que fixa a corda (a corda presa pelacravelha que est acima da pestana no caso de violoncelo e contrabaixo).

    Pestana Artificial - Pestana criada artificialmente por um dos dedos da mo esquerdapara a produo de harmnicos artificiais.

    Ponto de Contato - Local na corda onde o arco posicionado para, com o uso dafrico, fazer a corda vibrar.

    Srie Harmnica - Uma srie de freqncias em que os membros que a compem estoem uma relao harmnica, i.e., os componentes so mltiplos inteiros dafreqncia fundamental.

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    Som Harmnico - Som harmnico um efeito especial produzido nos instrumentosmusicais em que, atravs de tcnicas especiais, alguns parciais so eliminados deum som. Quando pressionados levemente os locais onde existem os nodos,foramos a excluso de alguns modos de vibrao e fortalecemos outros,produzindo os sons harmnicos.

    Tcnica de Nodo Duplo - Tcnica de performance dos sons harmnicos nosinstrumentos de corda em que dois dedos da mo esquerda tocamsimultaneamente dois nodos adjacentes de um mesmo modo de vibrao e emuma mesma corda.

    Tcnica de Um Nodo - Tcnica de performance dos sons harmnicos nos instrumentosde corda em que somente um dedo da mo esquerda toca levemente um nodo deum dos modo de vibrao.

    VI - BIBLIOGRAFIAALEXANIAN, Diran. Theoretical and Practical Treatise of the Cello, trad. por Frederick Fairbanks. Paris:

    ditions Salabert, 1922. (Edio em francs e ingls)CARDOSO, Cludio Urgel Pires. The Performance of Violoncello Harmonics. The University of Iowa, 1994.

    209p. (Tese, Doutorado em Msica)CAMPBELL, Murray e GREATED, Clive. The Musician's Guide to Acoustics. London: J. M. Dent & Sons

    Ltd., 1987.DALLAPICCOLA, Luigi. Dialoghi per Violoncello e Orchestra, Red. Franco Donatoni. Milano: Edizioni Suvini

    Zerboni, 1960.RANDEL, Don Michael (Ed.). The New Harvard Dictionary of Music. Cambridge: Belknap Press, 1986.MESSIAEN, Olivier. Quatuor pour la fin du temps. Paris: Editions Durant & Cie, 1957.PROKOFIEV, Sergei. Sonata in C major for Cello and Piano, opus 119, ed. por Mstislav Rostropovich. New

    York: International Music Company, 1958.WOODRICH, Dennis Lane. Multi-Nodal Performance Technique for Contrabass Harmonics. University of

    California, 1980. 33p. (Dissertao de Mestrado em Msica)

    Cludio Urgel Pires Cardoso ([email protected]) Doutor e Mestre emMsica/Violoncelo pela University of Iowa - EUA, sob a orientao do Prof. CharlesWendt. Cludio Urgel teve a sua formao bsica e de graduao na Escola de Msicada UFMG com o Prof. Watson Clis. Atualmente Professor da Escola de Msica daUFMG, onde exerceu a funo de Chefe do Departamento de Instrumentos e Canto eexerce a de Diretor desde outubro de 1998. Atualmente coordena um grupo de pesquisaque est desenvolvendo um guia analtico de estudos para violino e viola. Atuou junto Orquestra Sinfnica de Campinas, Orquestra Sinfnica de Minas Gerais, GrupoExperimental de Cmara da Fundao de Educao Artstica, alm de diversasapresentaes em grupos de cmara, grupos de msica contempornea e apresentaescomo solista junto Orquestra Sinfnica da EMUFMG.