o carste no plano de manejo do 2010

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Artido sobre Sistemas Cársticos

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  • Universidade de So Paulo

    2010

    O carste no plano de manejo do ParqueEstadual Intervales e zona de amortecimento,Estado de So Paulo, Brasil

    Rem: Revista Escola de Minas, v.63, n.3, p.441-448, 2010http://producao.usp.br/handle/BDPI/11935

    Downloaded from: Biblioteca Digital da Produo Intelectual - BDPI, Universidade de So Paulo

    Biblioteca Digital da Produo Intelectual - BDPI

    Departamento de Geologia Sedimentar e Ambiental - IGc/GSA Artigos e Materiais de Revistas Cientficas - IGc/GSA

  • 441REM: R. Esc. Minas, Ouro Preto, 63(3): 441-448, jul. set. 2010

    William Sallun Filho et al.

    William Sallun Filho Doutor, Pesquisador Cientfico do Instituto Geolgico (IG/SMA-SP)

    E-mail: [email protected]

    Jos Antonio FerrariDoutor, Pesquisador Cientfico do Instituto Geolgico (IG/SMA-SP)

    E-mail: [email protected]

    Silvio Takashi HirumaDoutor, Pesquisador Cientfico do Instituto Geolgico (IG/SMA-SP)

    E-mail: [email protected]

    Aletha Ernandes Martins Sallun

    Doutora, Pesquisadora Cientfica do Instituto Geolgico (IG/SMA-SP)

    E-mail: [email protected]

    Ivo Karmann Doutor, Professor Doutor, Instituto de

    Geocincias (IGc-USP)E-mail: [email protected]

    Geocincias

    O carste no plano de manejo do Parque Estadual Intervales e zona de

    amortecimento, Estado de So Paulo, BrasilThe karst in the management plan of the Intervales State Park

    and buffer zone, State of So Paulo, Brazil

    ResumoO Parque Estadual Intervales (PEI) e sua Zona de Amortecimento (ZA), inse-

    ridos nos vales dos rios Ribeira de Iguape e Paranapanema, situam-se em domnios de rochas carbonticas proterozicas de grande interesse para a minerao, onde se verifi ca a formao de carste com ocorrncia expressiva de cavernas. A carac-terizao do carste no PEI e ZA para o plano de manejo foi baseada em estudos geolgicos e geomorfolgicos que permitiram defi nir o grau de vulnerabilidade contaminao do aqufero crstico. As regies de maior vulnerabilidade do carste no PEI e ZA so aquelas que permitem a introduo direta de contaminantes no aqufero e se caracterizam pela presena de feies crsticas tais como cavernas e sumidouros. Para as regies onde a recarga ocorre exclusivamente por infi ltrao difusa e o escoamento superfi cial converge para rios de superfcie, foi associado grau de vulnerabilidade intermedirio. Considerando essa anlise, foram identi-fi cadas reas com maior potencial para impactos e feitas recomendaes para a gesto do parque e sua zona de amortecimento.

    Palavras-chave: Carste, vulnerabilidade, plano de manejo, Parque Estadual Intervales, zona de amortecimento.

    AbstractLocated in the valleys of the Ribeira de Iguape and Paranapanema Rivers,

    where karst features and a large number of caves can be found, the Intervales State Park and its buffer zone lie within an area of Proterozoic carbonate rocks that are of great interest to the mining industry. Based on geomorphological and geological studies, the characterization of the karst was performed in order to develop a management plan for the Intervales State Park and its buffer zone. With this, it was possible to defi ne the degree of vulnerability of the karst aquifer to contamination. The areas of greatest vulnerability are those that facilitate injection of contaminants directly into the aquifer, being characterized by such karst features as caves and sinks. In regions where recharge occurs exclusively via diffuse infi ltration, and runoff convergence with surface watercourses, the degree of vulnerability is lower. Considering this analysis, areas with the greatest impact potential were identifi ed and recommendations made regarding management of the park and its buffer zone.

    Keywords: Karst, vulnerability, management Plan, Intervales State Park, buffer zone.

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    O carste no plano de manejo do Parque Estadual Intervales e zona de amortecimento...

    1. IntroduoO Parque Estadual Intervales (PEI)

    uma Unidade de Conservao do Es-tado de So Paulo criada em 1995 no sentido de promover o desenvolvimento sustentvel regional e a conservao da natureza no Vale do Ribeira, frente necessidade de proteo s reas de mananciais, aos stios espeleolgicos e s frgeis encostas da serra do Mar/Pa-ranapiacaba, cobertas pela Mata Atln-tica. Esses elementos so reconhecidos constitucionalmente, em nveis federal e estadual, como Patrimnio Nacional.

    O PEI localiza-se no Estado de So Paulo, a 270 km da capital, ocupando uma rea de 41.704,27 hectares (Figura 1). Para o Plano de Manejo do parque, foi defi nida uma Zona de Amortecimen-to (ZA) correspondente a uma faixa en-voltria de 10 km em relao aos limites do PEI. Faz divisa com outras Unidades de Conservao, formando em conjunto com o Parque Estadual Carlos Botelho, o Parque Estadual Turstico do Alto Ribeira (PETAR), a Estao Ecolgica de Xitu, a APA da Serra do Mar e a Reserva da Biosfera da Mata Atlntica, o continuum ecolgico de Paranapiaca-ba, um corredor de Mata Atlntica que ultrapassa 120.000 hectares de rea.

    Est situado na serra de Parana-piacaba, entre os vales dos rios Parana-panema e Ribeira do Iguape, e abrange, parcialmente, os municpios de Ribeiro Grande, Guapiara, Iporanga, Eldorado Paulista e Sete Barras, alm de Capo Bonito e Apia, na Zona de Amorteci-mento.

    Na rea do PEI e da ZA, ocorrem rochas carbonticas proterozicas com desenvolvimento do carste, cujas carac-tersticas intrnsecas o tornam suscept-vel a problemas ambientais. O presente trabalho teve por fi nalidade caracterizar o sistema crstico do PEI e da ZA e esta-belecer sua vulnerabilidade frente con-taminao do aqufero. Seus resultados decorrem do Plano de Manejo elaborado por Sallun Filho et al.(2008), o qual sub-sidiou, em conjunto com outros temas, o zoneamento fi nal do PEI e da ZA. O zoneamento, de acordo com o conceito

    estabelecido pelo Sistema Nacional de Unidades de Conservao (SNUC - Lei N 9.985, de 18 de Julho de 2000), a defi nio de setores ou zonas em uma unidade de conservao com objetivos de manejo e normas especfi cos, com o propsito de proporcionar os meios e as condies para que todos os objetivos da unidade possam ser alcanados de forma harmnica e efi caz. Como orientao para a sua elaborao, o Roteiro Metodo-lgico de Planejamento (Galante et al., 2002) esclarece que o zoneamento um instrumento de ordenamento territorial, usado como recurso para se atingirem melhores resultados no manejo da uni-dade de conservao. O Zoneamento Ambiental do Plano de Manejo do PEI, que agrega os diversos diagnsticos, foi aprovado no CONSEMA (Conselho Estadual do Meio Ambiente-SP) em 18 de fevereiro de 2009.

    2. MetodologiaA caracterizao do sistema crsti-

    co e de sua vulnerabilidade baseou-se no levantamento de informaes geolgicas e geomorfolgicas, com apoio de tcni-cas de geoprocessamento. Para elabora-o do Plano de Manejo, foi realizado um sobrevo rea e foram integradas informaes decorrentes de projetos anteriores, no tendo sido efetuados levantamentos de campo. Na anlise do

    sistema crstico, foi considerada no apenas a rea de rochas carbonticas, mas, tambm, a rea de captao alog-nica situada em rochas no carbonticas. Para a avaliao dos fenmenos crsti-cos utilizaram-se: a) base geolgica em escala 1:50.000 (Campanha, 2002); b) dados geoqumicos (Gonzalez et al., 1972); c) mapa das feies crsticas de superfcie (Hiruma et al., 2007), elaborado a partir de fotografi as areas 1:25.000; d) mapas temticos (hipso-mtrico, declividade, rugosidade, etc.), gerados a partir de dados de elevao do SRTM (2006); e e) lineamentos extra-dos do MDT, de imagens LANDSAT 7 ETM+ e de mosaicos semicontrolados de radar (RADAMBRASIL, 1976).

    A vulnerabilidade intrnseca do aqufero crstico levou em conta apenas as caractersticas hidrogeolgicas do sistema, que so, por defi nio, inde-pendentes das propriedades especfi cas dos contaminantes. Para Foster e Hirata (1988), a vulnerabilidade de um aqufero poluio representa as suas caracte-rsticas intrnsecas, que determinam sua sensibilidade em ser afetado por um determinado contaminante. Foster et al. (2002) destaca que a delimitao de reas de proteo em carste difcil pois os padres de fl uxo so irregulares e com velocidades mais altas do que as calculadas para outros aquferos. Esses autores tambm indicam que o mapea-

    Figura 1 - Localizao do Parque Estadual Intervales (PEI), Zona de Amortecimento (ZA) e unidades de conservao adjacentes.

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    mento de feies crsticas de superfcie e subsuperfcie podem auxiliar nessas defi nies. Uma das abordagens para mapear a vulnerabilidade intrnseca do aqufero crstico baseada no modelo origem (risco na superfcie) - trajeto (camadas entre a superfcie e o topo do aqufero) - alvo (gua subterrnea na parte superior do aqufero). Essa abordagem foi amplamente utilizada em mapeamento da vulnerabilidade de aqufero crstico na Europa (Zwahlen, 2003; Goldscheider, 2005).

    De acordo com as premissas apre-sentadas anteriormente, possvel obter diferentes gradaes de vulnerabilidade do aqufero, considerando-se proprieda-des da cobertura vegetal, a topografi a, dos solos, as coberturas sedimentares, as camadas rochosas, a estrutura e a qumica dos calcrios e, at mesmo, a intensidade das chuvas. Levando em conta a complexidade do tema e a falta de controle de alguns dos parmetros ci-tados, nessa proposta, a vulnerabilidade do aqufero crstico, na rea de estudo, foi determinada a partir das caracters-ticas da infi ltrao.

    Alm disso, confrontou-se a vul-nerabilidade com a proteo legal, a fi m de se estabelecerem as reas vulnerveis que se encontram fora dos limites das unidades de conservao e que devem merecer maior ateno pelo poder pblico.

    Considerando os limites do PEI e do PETAR e a zona de amortecimento do PEI, foi possvel defi nir reas que no se encontram protegidas sob o ponto de vista legal, mas que necessitam de pro-teo, em funo de sua vulnerabilidade natural. Essas informaes so impor-tantes para balizar discusses futuras sobre a delimitao dessas unidades de conservao e de suas ZAs.

    3. Caracterizao do Sistema Crstico

    Nas regies sudoeste do Estado de So Paulo e norte do Paran, ocorrem rochas carbonticas proterozicas do Subgrupo Lajeado (Faixa de Dobramen-tos Ribeira), onde se situam o PEI e sua

    ZA. Nessa faixa carbontica, ocorrem os terrenos crsticos e cavernas da Provn-cia Espeleolgica do Vale do Ribeira (Karmann & Sanchez, 1979), carac-terizada por feies crsticas do tipo escarpas rochosas, torres isoladas, do-linas, sumidouros e ressurgncias, com cavernas apresentando rios subterrneos e abismos. Karmann e Ferrari (2002) observam que a regio caracteriza-se pela superfcie carbontica rebaixada em relao s rochas no carbonticas, con-dicionando sistemas crsticos de recarga mista, com predomnio de injeo alc-tone. Essa faixa apresenta setores com paisagem crstica bem desenvolvida, com variadas formas de carste poligo-nal e trechos fl uviocrsticos (Karmann, 1994; Karmann & Snchez, 1986).

    As rochas carbonticas ocupam 6,5% da poro W-NW do PEI e ZA, com altitudes entre 137 e 1040 m (Figura 2). O carste insere-se no Cinturo Orog-nico do Atlntico de Ross et al. (2008), com reas mais elevadas (acima de 650 m) ao norte, correspondendo ao Planalto de Guapiara (W-NW do PEI e ZA) e as mais rebaixadas (inferiores a 650 m), ao sul, nos morros e escarpas da serra do Mar e Paranapiacaba. O Planalto de Guapiara representa o divisor entre a ba-cia do Rio Piles (bacia do Rio Ribeira), com escoamento para sul, e as bacias dos rios das Almas e So Jos do Guapiara (bacia do Rio Paranapanema), com es-coamento para norte (Figura 2). A bacia do Rio Piles possui gradiente mdio de 3,15% e amplitude de vales variando en-tre 100 e 800 m, valores esses superiores aos observados nos rios das bacias dos rios das Almas e So Jos do Guapiara, com gradientes mdios de 1,6% e 1%, respectivamente, e amplitudes de vales entre 115 e 260 m. Alm disso, o com-partimento dos morros e escarpas da serra do Mar e Paranapiacaba, na bacia do Ribeira, exibe uma maior frequncia de declividades acima de 25 graus, ao contrrio do observado no planalto de Guapiara, de declividades mais baixas (at 5 graus). O mesmo observado com relao rugosidade, que, no planalto de Guapiara, baixa, entre 1 e 1,011, enquanto que, nos morros e escarpas da

    serra do Mar e Paranapiacaba, encontra-se entre 1,011 e 1,203.

    A anlise integrada desses ndices denota a maior dissecao e entalha-mento do relevo no compartimento dos morros e escarpas da serra do Mar e Pa-ranapiacaba. Esse aspecto mostra refl exo direto na forma de desenvolvimento do carste e das cavernas. Ao norte do PEI, na rea do Bairro Carioca, inserida na ZA, ocorrem depresses crsticas de baixa amplitude e fundo plano (Figura 3), evidenciando o relevo crstico menos dissecado na bacia do Rio Paranapane-ma. J na bacia do Rio Ribeira (Figura 4), vales, depresses e cones crsticos de grande amplitude denotam a maior dissecao do relevo crstico.

    Na faixa carbontica do PEI e nas pores N-NE e SE da ZA, as rochas carbonticas apresentam maiores teo-res de CaO em relao a MgO e SiO2, comparativamente s lentes carbonticas isoladas encontradas a W do PEI. De forma geral, como indicado por Rau-ch e White (1977), calcrios (mesmo aqueles com pequena quantidade de impurezas, ou seja, de sedimentos no carbonticos) so mais solveis que os dolomitos. Assim, pode-se concluir que as diferenas observadas na intensidade de carstifi cao, nos diversos setores, no podem ser atribudas composio das rochas carbonticas.

    As bacias que drenam para o carste ocupam rea de 206 km, sendo que 17% corresponde a bacias autctones e 83%, a alctones (Figura 5). Assim, a contribuio alognica na recarga do sistema crstico do PEI, PETAR e ZA muito signifi cativa. As depresses com contribuio de recarga alctone seguem o padro geral do escoamento superfi cial da regio, ou seja, do planalto de Gua-piara para os terrenos mais baixos, o que permite a entrada de grandes volumes de gua mais acidificada no sistema crstico, aumentando, ainda mais, a sua evoluo como observado na borda oeste do PEI e na poro norte do PETAR. O carste da poro N-NW da ZA, no Planalto de Guapiara, praticamente

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    desprovido de depresses autctones e bacias alctones (Figura 5).

    Quanto s cavernas, segundo a SBE - Sociedade Brasileira de Espeleo-logia, em fevereiro de 2006, havia 135 cadastradas no PEI e ZA e no PETAR, sendo que 34 foram re-localizadas por Domingues et al. (2008). O trabalho de Domingues et al. (2008) resultou em 83 cavernas com informaes consolidadas, e 59 com dados de desenvolvimento e desnvel. O desenvolvimento mdio de 243 m (mximo de 3692 m e mnimo de 5 m), sendo que 5% so maiores que 1000 m e 63%, menores que 100 m. O desnvel mdio de 15 m (mximo de 174 m e mnimo de 0 m). Destaca-se a gruta dos Paiva (na ZA), que est entre as 50 maiores cavernas do Brasil no levantamento realizado por Auler et al. (2001).

    4. Interferncia de processos antrpicos no carste

    As atividades antrpicas podem impactar a paisagem crstica, acele-rando processos morfodinmicos e/ou contaminando o aqufero. Desse modo, foi possvel defi nir trs graus de vulne-rabilidade, do maior para o menor, com referncia s formas de infi ltrao: (1) regies que permitem a introduo direta de contaminantes no aqufero a partir das feies crsticas como sumidouros e cavernas, (2) regies carbonticas onde a recarga ocorre, exclusivamente, por infi ltrao difusa e o escoamento superfi -cial converge para rios de superfcie e (3) regies onde o escoamento no converge para regies crsticas e no oferecem, portanto, risco para a contaminao do aqufero (Figura 6).

    Relacionando o grau de vulnera-bilidade natural e as reas legalmente protegidas, foi estabelecido um zone-amento das reas crsticas. A ZA no foi considerada como uma unidade de proteo efetiva ao carste (assim como as APAs), visto que diversas atividades so desenvolvidas dentro dela (Figura 7). Na regio W-SW da ZA (e fora da

    Figura 2 - Distribuio das rochas carbonticas, mapa hipsomtrico simplifi cado, bacias hidro-grfi cas principais e compartimentos geomorfolgicos (Ross et al., 2008) na rea do PEI e ZA.

    Figura 3 - Grande depresso autctone de baixa amplitude e fundo plano, na rea do Bairro Carioca, bacia do Rio Paranapanema, Zona de Amortecimento do Parque (Ponto 7318387,989N/763531,085 E).

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    ZA), as bacias dos rios Temimina e Cam-pina (Figura 8) drenam para o PETAR e podem gerar impactos de poluio. Essas duas bacias so bacias mistas (alognicas e autognicas) com grande rea de captao alognica, que drenam para dentro do sistema crstico, inclu-sive para sumidouros e cavernas, como as grutas Temimina e Ribeirozinho, entre outras. Essas duas bacias juntas correspondem a quase 50% da captao alognica do carste. A bacia do Crrego Campina est dentro da ZA do PEI, porm totalmente inserida no PETAR, estando, assim, protegida. Entretanto a bacia do Rio Temimina possui parte de suas cabeceiras dentro e fora da ZA do PEI e fora do PETAR, estando, assim, vulnervel, especialmente ao longo da rodovia SP-250 (Guapiara - Apia), cujo trfego de veculos e transporte de cargas diversas so intensos, alm de existir maior ocupao humana.

    Outras duas reas foram identifi ca-das como potencialmente susceptveis por no estarem dentro do PEI e PETAR. So as reas da gruta dos Paiva (bacia do Crrego do Lajeado) e a rea entre o PEI e o PETAR (Figura 8). Atualmente essas reas no esto em situao de risco a impactos diretos. A primeira, na regio da gruta dos Paiva, foi considerada mais vulnervel, pois uma rea de recarga mista, bastante carstifi cada e que drena para bacias dentro do PEI. Alm disso, a gruta dos Paiva representa uma caverna importante, sendo uma das maiores do Estado e est entre as 50 maiores caver-nas do Brasil. A segunda rea, entre o PEI e o PETAR, mostra-se isolada entre as duas Unidades de Conservao, o que lhe confere relativa proteo. Mesmo assim, encontra-se bastante desmatada com ocupao caracterizada por peque-nas propriedades. uma importante rea de captao mista para o carste do PETAR e PEI, com cavernas associadas. Essas reas foram classifi cadas como zonas de proteo ao carste no zonea-mento fi nal.

    A minerao se instalou nessa regio h muitos anos e novos empre-endimentos vm surgindo especialmente na rea a norte e oeste do PEI (na ZA).

    Figura 4 - Vales, depresses e cones crsticos de grande amplitude, na regio de Bulhas dgua (PETAR), bacia do Rio Ribeira (Ponto 7306455,711N/753409,941E).

    Figura 5 - Distribuio das depresses fechadas no PEI e ZA, segundo Hiruma et al. (2007) e de cavernas segundo SBE - Sociedade Brasileira de Espeleologia (dados de fevereiro de 2006) e Domingues et al. (2008).

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    Figura 6 - Graus de vulnerabilidade natural estabelecidos para im-pactos antrpicos no sistema crstico do PEI e ZA.

    Figura 7 - Zoneamento das reas crsticas do PEI e ZA com base na vulnerabilidade e reas legalmente protegidas. As reas em vermelho e azul so as de maior vulnerabilidade e no esto protegidas do ponto de vista legal, por estarem fora dos limites do PEI e PETAR.

    Segundo Shimada et al. (2004), os impactos causados no carste pela minerao so representados por supresso da vegetao, alterao do relevo, alterao de cursos dgua, disposio inadequada de estril, destruio de cavidades naturais, deslocamento de fauna e alterao do regime hidro-lgico subterrneo. Alm da minerao, a prpria ocupao e outras atividades, como a agricultura, so potencialmente poluidoras. No ocorrem concentraes urbanas signifi cativas na rea, visto que a cidade mais prxima, Ribeiro Grande, est distante e fora do carste. Vilas ocorrem na ZA e devem ter seus esgotos monitorados quando lanados em reas crsticas. Esse mesmo procedimento deve ser adotado para a prpria sede do PEI e toda a infra-estrutura turstica l existente.

    Quanto ao turismo, o impacto pontual, restrito s caver-nas e trilhas. Apesar do turismo nas cavernas ser uma forma de aproveitamento econmico sustentvel, ele tambm causa impacto. Boa parte dos visitantes do PEI procura as cavernas como principal atrativo. As medidas de minimizao dos impactos so possveis, tais como visitas monitoradas, que so praticadas no PEI e em alguns locais da ZA. O fl uxo de turistas em cerca de 14 (quatorze) cavernas utilizadas no PEI ocorre de forma espordica, mas, s vezes, de forma intensa. Das cavernas com visitao, duas respondem por 35% do fl uxo de turistas: gruta Colorida e gruta dos Paiva.

    5. Recomendaes para o manejo do Sistema Crstico

    Os dados coletados at o momento so considerados ainda insufi cientes para a tomada de decises quanto adequada gesto sustentvel do Sistema Crstico do PEI e sua ZA. De forma a atender a legislao vigente e permitir o uso susten-tvel da regio, foram propostas algumas recomendaes, apresentadas a seguir.

    1) Aumentar a rea de abrangncia do PEI, englobando as duas reas do Sistema Crstico contguas ao PEI e PETAR, que apresentam importantes feies crsticas e alta restri-o ambiental. A primeira rea para possvel incorporao ao PEI a rea da gruta dos Paiva e a segunda localiza-se entre o PEI e o PETAR, uma rea isolada que no foi abrangida pelas Unidades de Conservao (Figura 8).

    2) Elaborar diagnstico e mapeamento em detalhe das con-dies atuais do Sistema Crstico, especialmente no que se refere localizao de feies.

    3) Promover o zoneamento de detalhe para se estabelecerem normas de proteo, levando-se em considerao a rea de recarga.

    4) Estabelecer a poltica de manejo do Sistema Crstico e os tipos apropriados de uso, com a determinao de estrat-gia de proteo de cavidades naturais, do carste e de seu sistema hidrogeolgico.

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    5) Proporcionar oportunidades educati-vas e recreativas para visitantes, com o intuito de descobrir, explorar, estu-dar, respeitar e apreciar as cavidades naturais, defi nidas pelo respectivo Plano de Manejo Espeleolgico, de modo a minimizar os impactos degradantes do uso antrpico.

    6) Criar programas em Educao Am-biental.

    7) Implantar sistemas para monitorar a degradao do Sistema Crstico com o uso turstico.

    6. ConclusesNo carste existe uma interao

    entre o relevo e a evoluo do aqufero. Nessas paisagens, a gua subterrnea um importante agente geomrfico, ocorrendo um feedback positivo: a evo-luo da drenagem subterrnea infl ui na evoluo do relevo e vice-versa. Assim, a ocorrncia de depresses fechadas indicadora da existncia de aquferos de condutos (aquferos carstifi cados). Apesar da ocorrncia restrita de rochas carbonticas no PEI e ZA, esse estudo demonstrou o importante desenvolvi-mento do carste e de cavernas e, tam-bm, relacionou os possveis impactos. Pode-se inferir a hiptese da maior cars-tifi cao no compartimento dos morros e escarpas da serra do Mar e Parana-piacaba, na bacia do Ribeira, do que no planalto de Guapiara, a partir da maior incidncia de feies crsticas. As reas do PEI e PETAR estariam inseridas em reas de maior carstifi cao, ao contr-rio da ZA (excluindo-se o PETAR). As rochas carbonticas situadas na poro N-NW da ZA, no planalto de Guapiara, so praticamente desprovidas de depres-ses fechadas autctones e alctones, denotando menor carstifi cao.

    Da mesma forma, constatou-se maior freqncia de cavernas na bacia do Ribeira. Nos setores onde as cavernas tendem a ser mais extensas, associa-se um aqufero crstico mais desenvolvido. Sendo assim, regies com grande con-centrao de cavernas so indicadoras de aquferos bem carstifi cados. As maiores

    Figura 8 - Detalhe das reas potencialmente susceptveis.

    cavernas (acima de 500 m de extenso, no total de cinco cavernas) ocorrem na regio da transio do planalto para as reas mais rebaixadas.

    Considerando apenas a natureza, extenso e densidade das feies crs-ticas, determinaram-se como regies de maior vulnerabilidade do aqufero crstico no PEI e ZA, aquelas em que h possibilidade de introduo direta de contaminantes. Para as regies onde a recarga ocorre, exclusivamente, por infi ltrao difusa e o escoamento super-fi cial converge para rios de superfcie, foi relacionado grau de vulnerabilidade intermedirio, enquanto que, nas regi-es onde o escoamento no converge para regies crsticas, no se verifi ca risco para a contaminao do aqufero. Nesse contexto, foram identificadas as seguintes reas mais susceptveis a impactos graves de poluio: a bacia do Rio Temimina (W-SW da ZA) e a regio da gruta dos Paiva (ZA).

    Essa configurao, em conjunto com outros elementos, permitiu o esta-belecimento de 5 reas de proteo do carste no Zoneamento Final para a zona

    de amortecimento do PEI: trs reas de proteo do carste e ordenamento territoriaI e duas reas de interesse conservao da biodiversidade e proteo integral do carste (Furlan & Leite, 2008). O Plano de Manejo do PEI e sua ZA foi, provavelmente, a nica unidade de conservao no Brasil a ter realizado estudos especfi cos em carste, que, a exemplo APA Carste de Lagoa Santa em Minas Gerais (Sousa, 1997), resultou em um zoneamento especfi co para essas reas.

    7. Referncias bibliogrfi casAULER, A. et al. As grandes cavernas do

    Brasil. Belo Horizonte: Grupo Bambu de Pesquisas Espeleolgicas, 2001. 228p.

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    O carste no plano de manejo do Parque Estadual Intervales e zona de amortecimento...

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    Artigo recebido em 03/09/2009 e aprovado em 19/05/2010.

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