o combate naval do riachuelo da história para pintura
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O Combate Naval do Riachuelo da História para Pintura.
Graziely Rezende da Silva.
O olhar que se projeta para uma das telas históricas do catarinense Victor
Meirelles (1832-1903), intitulada “Combate Naval do Riachuelo”, retrata o
momento mais marcante da Marinha Imperial Brasileira durante a Guerra do
Paraguai ocorrida entre 1864 a 1870. A obra refere-se a uma das batalhas
decisivas, ocorrida na manhã do dia 11 de Julho de 1865, no afluente do Rio
Paraná, onde a atuação da marinha foi fundamental para os aliados compostos
pelos países Brasil, Argentina e Uruguai contra o Paraguai.
Desceram no rio Paraná a força brasileira, comandada por Francisco
Manuel Barroso, constituída pela fragata Amazonas e pelos vapores
Jequitinhonha, Beberibei, Belmonte, Parnaíba, Mearim, Araguaí, Iguatemi e
Ipiranga. A esquadra paraguaia enviada nesta missão de ataque, sob o comando de
Pedro Inácio Meza, dispunha também de nove navios, mas todos eram mercantes
improvisados em embarcações de guerra. A esquadra brasileira, junto há seus
comandantes, procurara a situação que lhe era mais favorável, indo postar-se junto
ao Riachuelo e a sombra de barrancos previamente guarnecidos de artilharia. O
chefe Barroso não hesitou um momento diante da atitude dos seus inimigos
paraguaios: suspendeu a sua divisão de nove navios e, tomado à frente da linha
com a Fragata Amazonas, onde tremulava o seu pavilhão, deu ordem para investir.
A esquadra paraguaia e a bateria de terra romperam fogo.
Foi neste momento mais critico que o chefe Barroso teve a decisão de
transformar em aríete a proa da Amazonas e arremeteu com toda violência contra
os navios inimigos. Desta forma inutilizou quatro navios paraguaios, lançando o
pavor nos restantes que, por volta da tarde, desalentados, abandonaram o campo da
luta.
O resultado da batalha ajudou por fim ao avanço das tropas paraguaias,
obrigando-as a uma retirada. Isto significou naquele momento o enfraquecimento
da força naval de Solano Lopez, bem como “causou otimismo exagerado no
Brasil, a ponto de Silveira Lobo, ministro da marinha do período, escrever que a
guerra estava próxima de seu desenlace e que haveria, em breve, a destruição de
Humaitá, a tomada de Assunção e o resgate de Mato Grosso”. 1
O quadro “Combate Naval do Riachuelo” representa o momento final do
confronto entre a marinha brasileira e a paraguaia.
A tela apresenta um tratamento cromático denso, o que se deve a uma
paleta quente, de tons avermelhados e alaranjados repercutindo sobre toda sua
área, fundindo os elementos da paisagem e aqueles do acontecimento bélico. Este
tratamento tende a dar certo ar dramático a cena, isto talvez deve-se a um uso de
cores comum aos românticos. Outra aproximação se dá com a utilização das cores
na paisagem ao fundo da tela de Vítor, fazendo com que o desenho, esmaecido,
assuma papel secundário em relação às cores.
Situa-se no primeiro plano da cena, estendendo-se da parte inferior a direita
do quadro à parte inferior central, as ruínas de uma embarcação dos “camisas
vermelhas”, tendo seu assoalho disposto em eixo oblíquo, inclinado, sugerindo
uma desestabilização que compromete todo grupo de personagens ali situados,
estando alguns se esforçando para se manterem em posição de defesa, enquanto
outros são consumidos pelo pânico e desespero.
Este sentimento de acuação é fortalecido pelo movimento desequilibrado
dos personagens, em sua descoordenação, cujos eixos de movimento se
desencontram, bifurcando e fragmentando todo grupo. Assoma-se nas feições o
medo, a valentia, a dúvida, a incerteza, a desolação amontoando-se. Vitor permite
um tratamento apurado dos semblantes e feições apresentados por tais
personagens. As expressões dos soldados são bem marcadas devido a sua
dedicação ao desenho, uma dedicação adquirida com sua formação neoclássica,
cujos exercícios consistiam no aperfeiçoamento das precisões anatômicas. Sua
passagem pelo gênero de retratos também deve ser considerada na aquisição de
uma técnica apurada no tratamento de expressões faciais.
1 DARATIOTO, Francisco. Maldita Guerra; nova história da Guerra do Paraguai. São Paulo: Companhia das Letras, 2002. p.151.
Na parte inferior central, ainda correspondendo a este grupo, encontra-se a
figura de um marinheiro cuja vestimenta indica ser integrante do corpo militar dos
brasileiros, sendo alvejado por um disparo, expandindo-se em uma gestualidade
heróica que se fortalece com os restos da bandeira paraguaia caída sobre o
fragmento do barco.
Em segundo plano, ocupando quase toda área esquerda da tela, encontra-se
a fragata Amazonas rompendo o véu de fumaça e avançando em direção oblíqua
ao espectador, mobilizando-o, tornando-o participante de todo evento. Em sua
proa encontra-se o Almirante Barroso exibindo um gesto de vitória sendo
aclamado por seus companheiros. Neste momento toda estrutura da embarcação se
projeta verticalmente, erigindo e fortalecendo a composição monumentalizada que
a destaca em meio ao cenário esfumaçado e fragmentado do quadro.
Afastando-se para os planos posteriores, os elementos ora se perdem, ora
ressurgem em meio a uma cortina de fumaça que envolve toda a tela, encobrindo e
inviabilizando o reconhecimento do local onde se desfecha o acontecimento.
Embarcações e personagens diversos pontuam a cena espalhando-se e
contaminando todo ambiente. As nuvens do céu se adensam e se fundem com a
fumaça expelida pelas chaminés das embarcações. Esta construção do quadro
sugere então um ambiente imersivo, onde o espectador torna-se um contemplador
envolvido pelo evento.
Outro detalhe a ser destacado diz respeito ao lugar pouco definido do
combate, sem a presença de margem e com todos os elementos se expandindo
quase que indeterminadamente. Não fosse uma pequena vegetação situada na parte
inferior à esquerda não teríamos nenhuma indicação do tipo de ambiente em que
se trava a batalha, podendo esta se confundir com uma paisagem marítima.
Este quadro, junto a “Passagem de Humaitá”, foi encomendado pelo
Ministro da Marinha, Afonso Celso de Assis Figueiredo. Em 14 de Agosto de
1868, registrou-se o oficio2, assinado pelo então diretor da Academia Imperial de
Belas Artes, Manuel de Araújo Porto Alegre, aceitando a encomenda. Estas duas
2 ROSA, Ângelo de Proença. Victor Meirelles de Lima: 1832-1903. Rio de Janeiro: Pinakotheke, 1982. p.68.
telas célebres fariam parte do futuro Museu da Marinha, criado pelo respectivo
ministro.
Nesta época, Victor Meirelles ocupava as funções de pintor e professor de
Pintura Histórica da Academia Imperial de Belas Artes, e desfrutava de grande
prestígio nos meios artísticos. Passou por uma longa formação na própria
academia e viajou pela Europa a fim de aprimorar sua técnica e, finalmente,
assumir o cargo de professor em 1861, exercido até o fim do Império.
O pintor, ao receber a encomenda, embarcou para o Paraguai em 15 de
Junho de 1868, na esquadra brasileira que ocupava o Porto Elisiário, a bordo do
navio chefe da divisão que tinha como comandante Jose Joaquim Inácio, que deu o
consentimento de sua estadia. Sua presença no local não possibilitou ao pintor
presenciar as batalhas que registrou, mas pode “estudar o ambiente, assentou o seu
ateliê a bordo, tão serenamente como se fizesse em terra. Durante dois meses,
trabalhou afincadamente, tirando croquis, copiando o céu, que servia de cúpula à
tragédia, as águas, os navios de um e outro lado, observando a natureza nos pontos
mais diversos, de trégua ou de luta entre os homens, momento das naves, as
manobras, os apetrechos de guerra, os objetos e aparelhos náuticos” 3.A
honestidade profissional, sua modéstia e seu senso de responsabilidade para a
composição, são algumas das qualidades do pintor apontadas por Rangel de
Sampaio, demonstrado em suas pesquisas das “condições topográficas e
meteorológicas do lugar de ação, a flora circundante e outros requisitos
necessários à boa e fiel reprodução plástica de uma página histórica”4.
O artista antes de executar sua obra, fez vários desenhos e anotações
realizadas no front. Retornando ao Brasil, Victor Meirelles instalou em uma das
dependências do convento de Santo Antônio, no Rio de Janeiro. Como a academia
não oferecia espaço adequado para a tarefa, o Ministério da Marinha enviou ao
convento um pedido, em nome do Governo Imperial, solicitando uma sala para a
execução da obra. Neste local Meirelles trabalhou até a finalização da obra em
1872.
3 Id. Ibid; p.70. 4 Id. Ibid; p.69.
Na época havia grandes investimentos em produções artísticas que se
destinavam a afirmação de um projeto político na criação de símbolos nacionais,
na formulação de um verdadeiro imaginário para a nação.
A Academia Imperial de Belas Artes apresentava um modelo de ensino
baseado na academia francesa, onde havia a exigência de um desenho rigoroso e
de uma técnica primorosa. A pintura de Victor tem por base estes cuidados,
presentes no destaque para herói, a narrativa do fato e as dimensões dos grandes
quadros. A produção nesta época buscava os temas nacionais, dentro de uma
historia celebrativa dos feitos e dos homens. É importante ressaltar, de acordo com
Jorge Coli, que a Guerra do Paraguai trouxe para artes no Brasil, a ativação do
gênero de pintura de batalha, para fortalecer a historia do país. Dentre os pintores
da época, Vitor Meirelles e Pedro Américo compunham o corpo de artistas
oficiais, seguidores diretos do sistema acadêmico. No entanto o cenário da época
contava ainda com as produções de outras figuras de menor relevância como
Eduardo de Martino e Domingos Ramos. Este ex-escravo atuante na campanha do
Paraguai, aquele, um imigrante de origem italiana. Ambos contribuintes
periféricos da pintura histórica então produzida no contexto da guerra.
EXIBIÇÃO E RECEPÇÃO.
A tela de Victor foi exibida na 22ª Exposição Geral da Academia Imperial
de Belas Artes, iniciada em 15 de Junho de 1872, quando também se exibiu a
Batalha do Campo Grande, de Pedro Américo. A fama das duas telas atraiu a
Academia 63.949 visitantes.
Quatro anos depois, em 1876, o quadro veio a participar da Exposição
Universal da Filadélfia, que tinha como propósito mostrar imagens da nação, do
progresso e da tecnologia, comemorando o centenário da emancipação norte-
americana. Junto ao Combate Naval do Riachuelo foram enviados "A Primeira
Missa" e a "Passagem de Humaitá". Vitor, não podendo acompanhá-las, solicitou
que uma pessoa fosse enviada para zelar pela a conservação das telas, mas tal
solicitação não foi atendida, pois aquele que seria responsável pela tarefa, o Sr.
Saldanha da Gama, não pode atender o compromisso, devido à necessidade de ter
que se ausentar daquele país.
Ao final da exposição, as telas haviam sido remetidas de volta envolvidas
em cilindros de madeira que, mal condicionados, ocasionou sua perda. Tal
indignação manifestou-se inclusive nos jornais, como registrado no jornal carioca
Gazeta Musical, no ano de 1897. "Com quanto não sejamos um povo
essencialmente artístico, a notícia da perda da ‘Batalha do Riachuelo’ (...) causou
profunda impressão".5
Victor, incomodado com a situação, em 1883, embarcou para a capital
francesa, instalando-se no Boulevard Vaugirard e iniciou a réplica do "Combate",
que ao ser concluída foi exposto no Salon de 1883. A respeito de tal exposição,
Jorge Coli, esclarece um equívoco cometido por Donato de Mello Junior, quando
este afirma ter sido a tela de Meirelles, exposta ao lado de "Piloto" de Renoir e
"Andrômaca" de Rochegrosse, quando na verdade esteve acompanhada do "Le
Pilote" de Renouf, "um quadro de grandes dimensões, que conquistou certa
celebridade então e foi adquirida pelo Estado francês. Era natural que esta obra se
encontrasse na mesma sala do "Combate", de Meirelles, devido a proximidade do
tema marinho"6. Ressalta-se que a atenção dos comentadores se volta para o
quadro de Renouf, fazendo com que a tela brasileira passasse despercebida aos
olhos daquela crítica.
Após o êxito em Paris, a obra chega ao Rio no ano de 1884, sua primeira
exposição ao público brasileiro, no Largo de São Francisco de Paula é seqüenciada
de uma segunda exibição na Exposição Geral, no mesmo ano. Este salão foi um
dos mais importantes realizados na época, junto à exibição da réplica elaborada
pela força de vontade e patriotismo do pintor.
Passando por diversos dilemas e conflitos, a negociação em torno da
aquisição do quadro acaba por envolver diversos personagens e instâncias
institucionais, entre eles o próprio artista, o Ministério da Marinha e a Academia
5 RUBENS, Carlos. Victor Meirelles; sua vida e sua obra. Rio de Janeiro: Imprensa Nacional, 1945. p.56. 6 COLI, Jorge. Victor Meirelles e a pintura internacional. Campinas: (Tese de livre docência, UNICAMP,1997).p.335.
Nacional de Belas Artes, sendo finalmente adquirida por esta instituição no dia 13
de Fevereiro de 1924, tendo sido posteriormente transferida para o Museu
Histórico Nacional, sua atual sede. “Esta instiga a uma pausa obrigatória no
percurso da exposição ‘Expansão, Ordem e Defesa’, que celebra a glória de um
império vitorioso, mas não esquece dramas e derrotas dos homens”.7
Através da recepção crítica do quadro, em suas passagens por algumas
exposições, obtemos referências importantes sobre como a sociedade da época
recebeu esta obra. Tais críticas costumam referir-se ao temperamento artístico de
Victor, acreditando-se não se ajustar perfeitamente aos temas bélicos, isto é, sua
inaptidão em tratar com forca e dramaticidade as cenas de violência. Tapajós
Gomes, no ano de 1944, o classifica como “pintor sentimental”8 , Gonzaga Duque,
anteriormente, no ano de 1888, da mesma forma, afirma que “o assunto era
refratário à natureza do artista”9, ressaltando uma timidez inerente ao seu
temperamento, o que “não lhe consente ver o lado trágico da luta”10.
Na 22ª Exposição de Geral de 1872, na Academia Imperial de Belas Artes,
surgiram críticas, ora embebida de entusiasmo pela elaboração exemplar do pintor,
ora investida de certa reserva. Outros mencionam a fidelidade do artista ao local da
guerra e seu talento para representar um dos grandes acontecimentos da história
brasileira, como José Leão Ferreira Souto, afirmando que “quem uma vez cruzasse
as águas do Paraguai naquela altura, veria que Victor Meirelles não imitou apenas
a perspectiva, copiou-a, ipsis verbis, como se costuma dizer, falando a outros
respeitos”11. Moreira de Azevedo também tece elogios dizendo que “este painel de
Victor Meirelles é de admirável produção de um gênio artístico, brilhante
concepção de uma alma patriótica de um artista inspirado pela poesia das artes,
pelas auras da pátria e pela luz do gênio” 12. Da mesma maneira, outros críticos
cantaram louvores sobre a grande tela, tais como Giorgio Vasari, Flumen Junior,
Pedro Meirelles, Lopes de Mendonça e Álvaro de Azevedo.
7 SILVA, Luiz Carlos. Em Guerra no Riachuelo. Rio de Janeiro: Revista de Historia da Biblioteca Nacional: Ano 2.n 18, março 2007. p74. 8 ROSA, op. cit.,p.69 9 DUQUE, Gonzaga. A arte brasileira. Campinas: Mercado das Letras, 1995.p.174. 10 Id. Ibid; p.175. 11 ROSA, op. cit.,p.71. 12 Id. Ibid; p.72.
Dos jornais da época, alguns escreveram sobre a obra, entre eles o
Reforma, o Jornal do Comércio e o Mosquito, tendo este último publicado uma
crítica no dia 6 de julho de 1872 negativa à obra, apontando, entre outras coisas,
sua fraqueza de composição.13
Encontram-se também críticas internacionais, principalmente na Franca,
em virtude de sua participação no Salon de 1883. Estas reforçam a presença do
patriotismo e ressaltam as qualidades do pintor para pensar a pintura histórica,
comparando a tela com obras de artistas europeus. O jornal francês Le Courrier
International ressaltava “ser Vitor Meirelles o único representante da pintura
histórica no Salon e que levantou a arte brasileira ao nível de altitude da arte da
Europa, trabalhando assim mais para o seu país do que a glória própria” 14.
Já na Exposição Geral realizada no Rio de Janeiro em 1884, após a chegada
da réplica, algumas revistas e jornais fazem uma crítica atacando violentamente o
quadro e o artista. Na Revista Ilustrada é publicado o seguinte comentário sobre o
quadro: “o fato de reproduzir exatamente a mesma composição, prova a pobreza
de imaginação” 15.
Mesmo com seus pros e contras, a obra “Combate Naval do Riachuelo”,
tem presença no cenário de nossa pintura e história.
UM OLHAR DESCONHECIDO
Dos artistas que trataram da Guerra do Paraguai, há um anônimo, autor de
uma tela, “Batalha do Riachuelo”, que se assoma aos outros dois pintores, Victor
Meirelles e Eduardo de Martino.
Ao fazer uma análise da obra do pintor anônimo, cuja referência somente
se tem a local onde a tela se encontra, Museu Naval e Oceanográfico do Rio de
Janeiro, percebe-se uma aproximação com relação a composição com a obra do
pintor napolitano, Martino.
A tela apresenta uma forte presença da paisagem marítima. O tratamento
13 Id. Ibid; p.72. 14 RUBENS, op. cit.;p.62. 15 ROSA, op. cit. ;p.78.
cromático usado é fiel à natureza. A tonalidade das águas do rio Paraná se mistura
com o céu azul, gerando uma perspectiva mais tênue, onde o horizonte não se faz
presente. Do lado direito está presente a encosta do rio com uma vegetação típica,
e em meio desta há um grupo de soldados preparados para o ataque. Tais soldados,
atuando em primeiro plano, não apresentam feições nítidas, são antes marcados
apenas pelo uniforme azul que representa o Brasil. Já os soldados paraguaios não
possuem forte presença na obra, apenas é encontrado uma embarcação
improvisada em meio das águas com apenas dois paraguaios.
No lado esquerdo do quadro encontram-se várias embarcações muito bem
detalhas avançando para o centro, se encontrando com outras duas, a brasileira,
identificada pela bandeira, e outra paraguaia, que foi atingida pelo inimigo que
naufraga em meio das águas.
O que se pode perceber no primeiro instante é que o pintor anônimo não
apresenta formação nada afim do gênero de pintura histórica. Este detalhe muito
esclarece sobre as soluções plásticas alcançadas em sua tela, o que demonstra uma
distância das escolas e regras acadêmicas da arte, qualidade presente na construção
da cena, na composição do quadro, nos elementos que denunciam a própria
maneira de como o pintor optou por meios formais para melhor representar o tema.
Neste aspecto difere-se do pintor oficial do império, Victor Meirelles que possui
uma fidelidade àquele sistema.
Além disso, Victor apresenta uma série de elementos ordenados que visam
a construção de uma cena monumental, e reforça a imagem dos personagens
vitoriosos e derrotados, presente na cena idealizada da guerra. Enquanto na tela do
anônimo, o evento é figurado de maneira distanciada, fria, sem apelo ao olhar
dramático do espectador, buscando apenas por uma retratação impessoal.
Apesar de ambas as obras apresentarem soluções diferenciadas na
concepção da cena, a postura de seus autores no tratamento do tema guardam
semelhanças no tocante ao compromisso em representar o fato. Tanto Victor
quanto o anônimo, analisado aqui por mim, mantêm-se fiéis à veracidade do fato:
buscam construir a cena segundo o relato do acontecimento batalha, cedendo
pouco espaço para artifícios idealistas e mesmo alegóricos.
BIBLIOGRAFIA:
COLI, Jorge. Victor Meirelles e a pintura internacional. Campinas: (Tese de livre
docência UNICAMP), 1997.
DARATIOTO, Francisco. Maldita Guerra; nova historia da Guerra do Paraguai.
São Paulo: Companhia das Letras, 2002.p.617.
DUQUE, Gonzaga. A arte brasileira. Campinas: Mercado das Letras, 1995.p.270.
PAIO, Rangel de S.. Combate Naval do Riachuelo. Rio de Janeiro: Typographia
Nacional, 1883.
ROSA, Ângelo de Proença. Vitor Meirelles de Lima: 1832-1903. Rio de Janeiro:
Pinakotheke: 1982.
RUBENS, Carlos. Vitor Meirelles, sua vida e sua obra. Rio de Janeiro: Imprensa
Nacional, 1945. 176p.
SÁ, Francisco de. Exposição do Quadro Combate Naval do Riachuelo. Rio de
Janeiro: 1883.
SALLES, Ricardo. Guerra do Paraguai; memórias e imagens. Rio de Janeiro:
Biblioteca Nacional, 2003.p.253.
TORAL, André. Imagens em desordem; a iconografia da Guerra do Paraguai
(1864-1870). São Paulo: Humanetas, 2001.
Vitor Meireles, Combate Naval do Riachuelo. Óleo sobre tela. 8,20m x 4,20m. 1882, Acervo do Museu Histórico Nacional, RJ.
Eduardo de Martino. Batalha Naval do Riachuelo. Óleo sobre tela. 1870. Museu Histórico Nacional, RJ.
Anônimo. “Batalha do Riachuelo”. Museu Naval e Oceanográfico. RJ.