o diabo, lutero e o protestantismo

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Pe. Jlio Maria, S.D.N.

O DIABO, LUTERO E O PROTESTANTISMO

2. Edio

1950 Editora O Lutador Manhumirim Minas Montagem deste arquivo: http://alexandriacatolica.blogspot.com

Nihil Obstat Santos, 24 julii 1937 Pe. Angelo Contessolo Censor ad hoc IMPRIMATUR Coratingen, 10 julii 1937 Mons. Aristides Rocha Vic. Capitularis REIMPRIMATUR Manhumirim, 15 de Agosto de 1949 Joo Cavati Bispo Diocesano de Caratinga

APRECIAO DO CENSOR Santos, 24 de Junho de 1937 A Monsr. Aristides Rocha Vigrio Capitular de Caratinga

Excelncia Reverentssima Remeto V. Excia. o Nihil Obstat a, publicao do novo trabalho do incansvel Pe. Jlio Maria S. D. N., o qual intitula: O Diabo, Lutero e o Protestantismo. Essa obra, especialmente em centros onde os prolestantes assalariados, assentam suas besteiras,como nas Alterosas. s pode fazer um grande bem, apesar de, aps a leitura de tais e tantas vilezas, a gente sentir necessidade instintiva de esfregar os olhos e lavar a lngua", como costumava dizer a saudosa Maria Desidria. bem possvel at que essa histria nua e crua no agrade a certas almas que, depois de uma srie infinda de infidelidades, foram parar no lamaal do vcio, e acarrete dissabores ao destemido autor. Neste caso, queira V. Excia. consol-lo fazendo-lhe notar que, quando Denifle, no primeiro decnio deste sculo, correndo de vez o vu de quatrocentos anos, mostrou ao mundo protestante apavorado a realidade de seu famigerado fundador, no prprio catolicismo no faltaram "pequenos escandaizados''. E a grandiosa obra de Grisar, que nessa poca j estava pronta, teve at de esperar por mais algum tempo oportunidade de publicao. Obras destas so necessrias; so testemunhos eloquentssimos prestados a verdade, contra a ignbil hipocrisia de apstatas e protestantes de m f que procuram ocultar, aos olhos do povo, a srie monstruosa de imoralidades, baixezas e delitos desde os tempos de Henrique VIII ao duque de Windsor; com tais chefes espirituais, natural que os pobres protestantes de boa f passem vergonha. De V. Excia servo em Cristo Pe. Angelo Contessoto, S. J.

CARTA DE APROVAO Do Revo. Sr. Vigrio Capitular de Caratinga Caratinga, 10 de Julho de 1937 Meu caro Pe. Jlio Maria Ainda sob a impreso do entusiasmo que me causou o seu ltimo livro: "Sol Eucarstico e Trevas Protestantes", escrito e publicado a pedido meu. eis que novo opsculo me vem s mos. Que homem extraordinrio V. Rvma! Parece que os livros lhe brotam da pena. como as gotas dgua porejam das estalactites, nas abbadas das grutas. Remeti o seu trahalho ao Censor nomeado pelo nosso saudoso D. Jos Maria Parreira Lara, para receber o exame e o parecer dele. 0 nihil obstat do ilustre Jesuta, o qual lhe envio e peo publicar, mais que uma opinio, uma aprovao completa, um estmulo e um conforto. No vejo necessidade de consolar a V. Rvma. como recomenda o censor, nos dissabores que lhe possa trazer a publicao de um livro que ir ferir, em pleno peito, os revoltosos contra a Igreja Catlica, pois sei quanto o seu esprito paira acima de todos os ataques e calnias, que o comodismo e os sectrios do erro possam suscitar. O seu livro "O Diabo, Lutero e o Protestantismo" retraa, com fidelidade e penetrao, uma das pocas mais agitadas da Igreja. Esta poca conhecida pela decadncia que apresenta na histria. Poucos, porm, conhecem de perto, e nos pormenores, a luta titnica, que a Igreja sustentou contra os abusos e erros de Lutero e comparsas. Os catlicos e at os prprias protestantes olham Lutero apenas atravs de curtas monografias, que nos mostram a sua revolta contra a Igreja, mas no o situam no ambiente em que viveu e agiu. Dai provm certa noo incompleta e falha da vida e dos atos do "reformador". Mostra-nos V. Rvma., num quadro completo e em cores destacadas, a decadncia e os males dessa poca, as tendncias dos povos de ento, a balbrdia nas idias reinantes, a desunio dos governos. E em quadro tal, como bem o acentua V. Rvma., Lutero nos aparece em realce, no pelas qualidades pessoais, mas como a encarnao viva e fogosa dos distrbios do seu tempo. Neste mesmo painel lgubre pela perversidade do monge revoltoso, v-se a ao calma, fecunda e regeneradora da Igreja Catlica, refutando o erro e restabelecendo a verdade. Meus parabns, caro Pe. Jlio Maria, por mais este raio, fulgurante de luz que o seu livro, onde resplende a verdade histrica, to deturpada pelos historiadores protestantes, a qual vem iluminar o esprito do leitor sincero e a inteligncia dos vacilantes e, talvez dos iludidos. Peco Nosso Senhor abenoe o sua pena sempre terrvel e brilhante, pela Sabedoria do Alto e pela cincia da terra. Sou de V. Rvma. sincero e dedicado admirador Monsr. Aristides Rocha Vig. Capitular

CAPTULO I O DESAPARECIMENTO DA IGREJA 1. Qual o mentiroso? 2. Assero ridcula; 3. A santidade continua; 4. A mentira protestante; 5. Os protestos dos protestantes; 6. A obra de Jesus Cristo; 7. Concluso. CAPTULO II UM RETRATO AUTNTICO 1.Primeiros anos de Lutero; 2. A Vocao de Lutero; 3. Estudos Incompletos de Lutero; 4.Viagem a Roma; 5. Os dois grandes erros de Lutero; 6. Concluso. CAPTULO III A QUEDA DE LUTERO 1. O estado de alma e a converso de Lutero; 2. Os escrpulos de Lutero; 3. Concluso. CAPTULO IV A ENTRADA EM CENA 1. A questo das indulgncias; 2. A declarao de Guerra; 3. Primeira reao da Igreja; 4. Lutero e o Papa; 5. A discusso de Leipzig; 6. Furores de Lutero; 7. Concluso. CAPTULO V A CONDENAO DE LUTERO 1. O desesperado; 2. Novas doutrinas herticas; 3. A Bula de Condenao; 4. Os insultos de Lutero; 5. A excomunho de Lutero; 6. Perante o Conselho de Worms; 8. Concluso. CAPTULO VI LUTERO EM WARTBURGO 1. A pretensa misso de Lutero; 2. Aparies do Diabo; 3. Tentaes impuras; 4. A liberdade evanglica; 5. Sada de Wartburgo; 6. Fingimento hipcrita; 7. Concluso. CAPTULO VII SANGUE E LAMA 1. A guerra dos campnios; 2. Lutero e o povo; 3. Lutero autoridade; 4. Adversrios do Reformador; 5. O feminismo de Lutero; 6. Raptores e raptadas; 7. Catarina de Bora; 8. O casamento de Lutero; 9. O casamento de Lutero; 7. Concluso. CAPTULO VIII OS ALICERCES DAS SEITAS PROTESTANTES 1. Os primeiro projetos; 2. Constituio do protestantismo; 3. Propaganda e Violncia; 4. Adversrios do reformador; 5. O monge e os fanticos; 8. Os falsos amigos de Lutero; 7. Concluso. CAPTULO IX OS AUXILIARES DE LUTERO 1. O fogoso Zwnglio; 2. O iconoclasta Carlostadt; 3. O infame Calvino; 4. O sanguinrio Henrique VIII; 5. Outros colaboradores; 6. Concluso. CAPTULO X LTIMAS LUTAS DO REFORMADOR 1. Na fortaleza de Coburgo; 2. O dio ao Papado; 3. Bigamia de Felipe de Hesse; 4. Louco ou possesso. 5. Concluso. CAPTULO XI LTIMOS DIAS E MORTE DE LUTERO

1. O homem terrvel; 2. Desgostos e remorsos; 3. ltima viagem; 4. A morte misteriosa; 5. Outras opinies; 6. O enterro de Lutero; 7. Concluso. CAPTULO XII A CONTRA REFORMA 1. O Conclio de Trento; 2. A sagrada Escritura e a tradio; 3. pecado Original; 4. A Justificao; 5. Os sacramentos em geral; 6. A eucaristia; 7.Penitncia e Extrema Uno; 8. Ordem a Matrimnio; 9. Purgatrio e indulgncias; 10. O culto dos santos; 11. Decretos disciplinares; 12. Concluso. CAPTULO XIII OS SANTOS E A SANTIDADE 1. Os Papas; 2. As ordens religiosas; 3. Os santos dessa poca; 4. Os sbios da poca; 5. Concluso. CAPTULO XIV OS SUCESSORES DE LUTERO 1. Os Batistas; 2. Os presbiterianos; 3. Os metodistas; 4. Os quakers ou tremedores; 5. A fragmentao protestante; 6. Seitas, seitas, seitas; 7. Seitas excntricas; 8. Concluso CAPTULO XV O PROTESTANTISMO 1.Julgados por si mesmos; 2. A sentena de morte; 3. Um morto ainda vivo; 4. O simulacro de religio; 5. A mixrdia protestante; 6. A moral protestante; 7. Concluso. CAPTULO XVI UMA VISTA GERAL 1. Grandes e grandes; 2. Lutero; 3. O grande erro; 4. A interpretao individual; 5. Retrataes de Lutero; 6. Fatos significativos; 7. Juzo de um anglicano; 8. Concluso

INTRODUO '"O Diabo, Lutero e o Protestantismo" o estranho ttulo de um livro a nos contar uma histria

macabra. A princpio parece exagero a aproximao dessas trs realidades. Mas no , como o leitor chegar a verificar. Do mesmo modo por que se entrelaam e se completam numa s entidade o CRISTO, O PAPA E A IGREJA, como demonstrei noutro volume sobre esse ttulo, tambm se ligam e se estreitam no diabo, Lutero e o Protestantismo. Assim como deixei provada a suave, harmoniosa e divina unio entre Nosso Senhor, o Pontfice de Roma e a instituio de Pedro, tentarei, agora estabelecer a conexo flagrante e diablica e as seitas ditas da reforma. No me acusem de deturpar as coisas, antes de manusearem com ateno o livro todo. Quem o ler logo estar convicto do fato. Calnia alguma assaquei ao protestantismo. Apenas tirei do olvido e frisei, com argumentos numerosos e seguros, a expresso viva de um acontecimento histrico e moral. A vida de Lutero jaz num esquecimento inexplicvel. Por que razo um homem que revolucionou tanto o mundo, as conscincias, as idias e at a poltica, permanece de tal forma desconhecido, que mesmo os seus seguidores lhe ignoram os gestos? Como atinar com o sepulcral silncio que envolve a existncia desta curiosa personagem?

muito simples a resposta. que ele, a despeito do papel saliente desempenhado no mundo, algum cuja vida, moral e aspiraes pessoais no sobressaram pelo valor e predicados prprios, mas unicamente devido ao ambiente de degradao, sensualidade e revolta que o envolveram, nele se corporificando de forma tal a torn-lo o representante de sua triste poca, o heri dos males reinantes de ento. Est patente que quem elevou a sublimou a personalidade de Lutero no foram as suas qualidades pessoais, seno os males morais de seu tempo. E isto se ver nestas pginas, onde o contemplaremos de acordo com o retrato a ns legado pela histria imparcial e no como o representam lendas gratuitas e suspeitas. Nada inventarei, aqui, pois a histria, sendo a reproduo de realidades vividas e objetivas, no se forja assim de repente. Consultarei autoridades antigas, historiadores srios, catlicos, protestantes, e at o prprio Lutero, apoiando-me sobre documentos que me possibilitaro reproduzir a feio histrica e moral da Reforma e dos reformadores. Leitores delicados acharo, talvez, essa histria um tanto dura e violenta. Tm razo. Apenas quero lembrar-lhes ser mister, na reproduo de cenas rudes, usar de termos correspondentes realidade. No se pintam quadros de guerra em tons amenos e plidos, mas de maneira persuasiva e forte. A linguagem predileta de Lutero pode ser qualificada furiosa desenfreada, apelando a cada passo para o demo, com que ele assegurou possuir relaes estreitas. No convinha modificar esse seu modo de falar, sob pena de alterar-se a fisionomia do autor. Catlicos e protestantes devero ler atentamente este livro. Para os primeiros ele ser um relmpago e para os segundos, um trovo. O relmpago projeta claridade, o trovo faz tremer os mais valentes. Precisam os catlicos de luz, para se precaverem contra o erro protestante; os protestantes necessitam de trovo, para acordarem do sono dos seus ensinos falhos. Apesar de sua forma popular, este livro um verdadeiro estudo, com argumentos slidos, certos, tendo por mira somente mostrar a verdade. O protestantismo, ao contrrio, firma-se exclusivamente na ignorncia da doutrina catlica. A est porque os pastores protestantes probem com tanto rigor aos seus adeptos a leitura dos livros catlicos, sabendo que a verdade, neles exposta, bastante clara e contagiante para uma alma reta procura da luz. Possa esse volume tornar conhecida esta verdade que com tanto fulgor se irradia da Igreja, luzeiro divino, em face da qual aparecem as falsidades do pretenso reformador e de suas multiformes denominaes sectrias. A Igreja Catlica o pleno dia da verdade; as seitas protestantes so a noite trevosa dos erros. Mostrar essa luz, este dia, esta escurido, salientando o bem a ser seguido e o mal a evitar-se, tal a grande aspirao do autor. Pe. Jlio Maria

CAPTULO I O DESAPARECIMENTO DA IGREJA... Chama-se Protestantismo o conjunto de seitas provenientes da revolta de Lutero. Que significa e exprime esse nome? Significa que os seus adeptos protestam. E contra que? Contra e doutrina da Igreja Catlica, Apostlica, Romana. E quando comeou este protesto? No sculo quatorze; de origem relativamente nova, pois data de quase catorze sculos depois do aparecimento da Religio Catlica Romana, fundada por Jesus Cristo. E por que protestou Lutero? Para se vingar do Papa que no se curvara perante os caprichos do herege. Asseveram os protestantes ter sido motivo do rompimento deles contra a Igreja Romana o ter esta se desviado dos ensinamentos de Cristo. Seria verdica esta afirmao?... Eis-nos perante uma destas concluses, verdadeiro dilema: ou Cristo mentiroso, ou Lutero falso, pois ambos, como haveremos de verificar, se contradizem reciprocamente em toda linha. 1. QUAL O MENTIROSO? Disse Jesus a Pedro: - Tu s Pedro e sobre esta pedra edificarei a minha Igreja, e as portas do inferno (os seres e as paixes) no prevalecero contra ela (Mat. XVI,18). E, mais explcito e categrico ainda, o Cristo prossegue: - Foi-me dado todo o poder no cu e na terra; ide, pois, (revestidos deste poder), e instru a todos os povos... ensinando-os a observar as coisas que vos tenho mandado. E eis que ESTOU convosco todos os dias, at a consumao dos sculos. (Mat. 28,18-20). Nada mais claro e positivo. O Cristo, Deus, estar com o chefe dos Apstolos at ao fim dos tempos. Quer isto dizer que a Igreja existir eternamente na pureza e na firmeza de sua f, que ser infalvel, pois jamais sucumbir ao peso das falsidades e paixes. Tal a forma promessa de Jesus. No entanto, Lutero e, aps ele, os seus filhos e netos, denominados protestantes, falam que a instituio de Cristo decaiu de sua altura divina, tornando-se um antro de vcios e exploraes. E, por isso, quis o monge de Wittemberg reform-la. Qual, pois, o mentiroso? O Divino Mestre ou o frade revoltoso e os seus asseclas? Raciocinemos. Se a Igreja sucumbiu, pela influncia do erro e das paixes, como afirmam, ento temos trs enormes mentiras atribudas a Jesus: 1.: as portas do inferno prevaleceram contra ela, apesar da afirmao contrria de Cristo; 2. : Pedro deixou de ser PEDRA, para se fazer lodo; 3. : Cristo abandonou a Igreja, depois de garantir que ficaria com ela at o fim dos tempos. Respondam os protestantes: qual entre os dois o mentiroso: Jesus ou Barrabs, Cristo ou Lutero?...

2. ASSERO RIDCULA Algo ainda mais insensato se desprende da suposta desapario da Igreja de Jesus Cristo. A Igreja, como toda sociedade humana, - pois uma sociedade divino-humana, - abrange necessariamente duas partes: uma dirigente e outra dirigida, ou, como reza o catecismo, contm o elemento docente, a autoridade, e o elemento discente, os fiis.

Destas partes qual ser teria corrompido? Teria sido a primeira, a docente, integrada pelos sucessores de Pedro, os bispos de Roma, pelos continuadores dos apstolos, os bispos de mundo inteiro e pelos representantes dos 72 discpulos, os sacerdotes catlicos?... E entre estes qual ou quais se teriam deteriorado?... O Papa? Mas este, sozinho, no constitui a Igreja. Os Bispos? Nem estes, por si, so a Igreja. O Padres? Tambm estes no encarnam a Igreja. Ento, teriam errado todos duma vez? Difcil acreditar-se em decadncia to generalizada: impossvel mesmo admit-la. A Igreja docente, - isto , o Papa, os Bispos e os Padres, - forma, atravs dos tempos um exrcito de aproximadamente de 500 mil pessoas, cultas e, em geral, de posio e responsabilidade! Seria admissvel que, numa sociedade de tantos membros, esparsos pelo mundo inteiro, pertencentes a todas as naes, climas e pases, todos ao mesmo tempo se transviassem, precipitando-se no erro e na idolatria: Seria mais do que ridcula tal afirmao. Quanto, porm parte discente, os fiis, os catlicos, difundidos em todo o universo, com milhes de adeptos em cada pas, constando de imperadores, reis, chefes, mdicos, advogados, cientistas, etc., ilustraes mundiais e homens do povo, seria crvel toda essa gente tivesse cado conjuntamente na mais grotesca superstio, de modo a perder-se a crena dos seus antepassados, a sua prpria religio? No seria at ridculo imaginar-se tal coisa? E teria isto acontecido no durante alguns anos apenas, ou no intervalo de alguns sculos, mas no correr de centenas de anos a fio, durante quinze sculos!... E pensar-se que, somente, aps todo este tempo um nico homem tenha chegado a descobrir a verdade!... E, pior ainda, quando era de esperar-se que tal gnio fosse um santo, aparece ele como um libertino, bbado, orgulhosos atrabilirio, qual foi Lutero!... No seria de fato o cmulo dos absurdos?.... At parece estaria Deus zombando do mundo.

3. A SANTIDADE CONTINUA Encontraramos ainda coisas mais estapafrdias, se prossegussemos analisando o mesmo assunto. Perdera-se a religio de Jesus Cristo, assim o garante os protestantes; deturpara-se o evangelho, e a crena verdadeira cessara de existir desde o sculo segundo at ao advento do reformador alemo. Mas, coisa curiosa: no intervalo do sculo 2. At o 15 sculo, a Igreja Catlica produziu ininterruptamente grande quantidade de homens santos, e a praticarem virtudes hericas e operarem milagres e sendo visivelmente assistidos e inspirados por Deus! O milagre o grande caracterstico da santidade e da verdade. Somente Deus pode realizar fatos desta natureza. S ele tem poder de comunicar tal dom aos homens. E, no percurso destes sculos, comunicou-o a milhares de pessoas privilegiadas pertencentes ao grmio da Igreja Catlica que, segundo os protestantes, no era mais a Igreja de Deus. Ento, transmitiria Deus um tal poder a idlatras e perversos, para que estes provassem ser verdade o erro em que viviam e ostentassem como virtudes os vcios por eles praticados?...

Neste caso, evidente, Deus estaria cooperando para o mal e, aprovando tal coisa, estaria iludindo a humanidade inteira e perdendo as almas!... Quem teria coragem de afirmar tal fato?... No entanto, outra coisa no o que dizem os senhores protestantes, quando arriscam e sustentam a ridcula afirmao que aqui comentamos agora. Conhecessem os amigos um pouco de histria eclesistica e a vida dos santos, encontrariam um argumento decisivo na sucesso contnua de pessoas que brilharam por virtudes hericas e exemplares atravs de todas as idades. No pode haver prova mais palpvel da santidade ininterrupta da Igreja, nem melhor demonstrao de que jamais deixou ela de existir publicamente, do que o testemunho da histria sempre em seu favor. Para satisfao de nossa curiosidade e objeto de admirao citaremos aqui alguns representantes de cada sculo, escolhidos entre centenas de outros. NO 1. SCULO temos Jesus Cristo e os Apstolos; NO 2. SCULO temos So Justino, Santo Ireneu, Tertuliano etc. NO TERCEIRO: Santo Hiplito, S. Gregrio, S. Cipriano, Orgenes, etc. NO QUARTO SCULO: Santo Atansio, Santo Efrm, So Baslio, Santo Epifnio, Santo Ambrsio, S. Gregrio de Nisse, S. Jernimo, S. Sofrnio, S. Joo Crisstomo etc. NO QUINTO SCULO: Santo Agostinho, S. Cirilo, S. Baslio de Celucia, S. Joo, S. Pedro Crislogo, S. Gregrio Magno; NO 6. SCULO: S. Fulgncio, Santo Anastcio, Santo Andr, S. Leandro. NO 7 SCULO: Santo Hesquio de Jerusalm, Santo Eli, Santo Ildefonso, Sto. Isidoro, S. Teonulfo, S. Beda, etc.... NO 8 SCULO: S. Gregrio, S. Srgio, S. Leo, S. Germano, S. Joo Damasceno. NO 9. SCULO: S.Nicforo, Tefano, Strabo, Alcuno etc. NO 10. SCULO: Ven. Raimundo Jordo, S.Pedro Damio, S. Fulberto, Santo Adalberto, Santa Adelaide de Burgundy, etc. NO 11. SCULO: Santo Anselmo, Santo Ivo de Chartres, S. Bernardo, S. Celestino, etc. NO 12. SCULO: Hugo e Ricardo de So Vtor, Alexandre de Hales, Cardeal Hugo, etc. NO 13. SCULO: Santo Alberto, Santo Toms de Aquino, S. Boaventura, S. Domingos, S. Francisco de Assis, Santo Antnio de Pdua, Duns Scott, etc. NO 14 SCULO: Sta. Brgida, Santa Isabel, S. Vicente Ferrer, S. Bernardino de Sena, S. Leonardo, etc, etc.

4. A MENTIRA PROTESTANTE A citao atrs visa justamente aquela poca em que, segundo opinam os nossos irmos transviados, a verdadeira Igreja teria desaparecido. Como possvel tenha ela florescido de modo to extraordinrio, quando ainda no existia: De que modo se explica essa sucesso ininterrupta de Papas na Ctedra de Pedro? De que maneira puderam viver, em todo esse tempo, no seio da Igreja, figuras de consumadas virtudes, profetizando, operando maravilhas e at ressuscitando morto? Como pode ser isso?... A Igreja cessara de viver, cara na apostasia e, no obstante, ei-la a estuar de vida e santidade. Como deslindar to estranho fato?... Uma s explicao admissvel, porquanto a nica verdadeira. E esta no agradar talvez aos nossos adversrios. A mentira protestante - eis a resposta. A triste cfila dos reformadores nada mais fez do que caluniar e mentir. Imitam-nos os seus admiradores e sequazes, mesmo sem acreditar nas balelas propaladas. A grande afirmativa, porm inabalvel, cheia de vida, que a Igreja verdadeira, fundada por Jesus Cristo, nunca interrompeu sua existncia, jamais cessou e decaiu de sua sublime funo, nem renegou sua f e santidade. Nesta Igreja pode haver membros gangrenados, como os h em toda associao de homens. mister, porm distinguir entre a sociedade e os seus componentes. No houvera entre ns gente de mau proceder, e os protestantes no possuiriam Lutero, Zwnglio, Calvino, Beza e outros, assim como esta coleo de padres apstatas e esquecidos de sua f e dignidade provando isto no passar o protestantismo de "esgoto do catolicismo" segundo a tpica expresso de um protestante famoso: - "Quando o Papa limpa os seus domnios, lana o capim por cima do muro do quintal protestante. (Klaus Harm, Protestante). No prometeu Jesus Cristo a santidade, ou a

perseverana, a todos os membros da Igreja por ele fundada; garantiu-as, porm, prpria Igreja, tomada no seu todo, sociedade. Esta, no correr dos tempos, soube permanecer fiel sua dignidade e sua misso, de maneira que, hoje como amanh, e como foi nos dias em que viveu na terra o Divino Mestre, ela santa e assim ficar, malgrado todas as pedras e toda a lama que os seus inimigos e os adversrios de todo bem lhe atirem, tentando enodoar-lhe a imaculada tnica. O lodo lhes recai sobre o crnio e nisto reside o motivo de seu dio, das calnias que inventam e das perseguies que movem. A Igreja, to atacada hoje, refulge em sua majestade, enquanto as mil e uma seitas protestantes se entre devoram, a ponto de se poder e dever asseverar: atualmente no h mais protestantismo; existem apenas protestantes.

5. OS PROTESTOS DOS PROTESTANTES No pode a Igreja verdadeira e divina carecer de reformadores humanos, pois, no caso contrrio, perderia o seu carter principal. A igreja fundada por Jesus Cristo, sobre a pedra de Pedro, outra no seno a CATLICA APOSTLICA ROMANA. Os protestantes vem-se obrigados a confessar no se originarem de Pedro, porque este o primeiro papa, e, por isto, eles odeiam o bispo de Roma. Na qualidade de descendentes de Lutero, acompanham o chefe em sua mania de protestos contra a santa instituio apostlica. Ora, a Igreja de Roma a de Pedro, e esta perfeitamente idntica de Cristo. Protestando, pois, contra ela, batem-se consequentemente, contra o Mestre Divino, insurgem-se contra a verdade e pretendem ser, eles mesmos, a prpria verdade que forcejam substituir. Ser possvel isto?... Sejam lgicos, meus amigos! Pretendem seguir a Bblia, e s a Bblia. Mas, como no enxergam que Mateus, 28 18-20 e Mateus 16,18 pura Bblia, puro Evangelho?... O prprio Lutero, que falsificou tanto as Escrituras, no ousou deturpar as passagens em apreo. Mostram-se ilgicos os filhos de Lutero, quando rejeitam toda autoridade eclesistica e se submetem aos ditames dum padeiro e dum servente de pedreiro, que se proclamam ministros e saem pelo mundo pregando o Evangelho. Veja-se o contra-senso em que laboram: repelem o Pontfice Romano, os pastores diocesanos e os sacerdotes que estudaram e so experimentados em cincias divinas e humanas e se deixam guiar pelos seus mentores, muitos dos quais tolos, sem terem jamais freqentado uma escola primria nem chegado a conseguir certificado de estudos. o cmulo da insensatez. Bastaria raciocinassem que seu fundador Lutero no tinha misso, nem capacidade para imprimir novo rumo a uma obra divina. E que esta no necessitava nem podia precisar de retoques humanos, sob pena de o prprio Cristo cair na mais lamentvel contradio e mentira. Qualquer protestante sincero deve inclinar-se perante estas palavras do Evangelho, se neste ainda acredita, e confessar que a igreja de Lutero no passa de um protesto, de uma revolta contra a nica Igreja verdadeira, fundada por Cristo sobre Pedro, feito pedra, rochedo eterno a permanecer inabalvel no meio das ondas dos erros e das paixes humanas. 6. A OBRA DE JESUS CRISTO Afirmar, como costume entre os irmos dissidentes, que a instituio de Cristo descambou na idolatria e no paganismo, sentenciar, em termos claros e positivos: o Divino Mestre enganou-se, pois pretendeu construir uma obra eterna e fez uma instituio, durvel apenas por dois sculos.

Assim sendo, as promessas divinas falharam, revelando-se o Mestre impotente para manter a instituio encetada e envolta na firme promessa de fecundidade e durao. E, como resultado, esta Igreja, divina em seus fundamentos, cercada de gararantias de indefectvel estabilidade, desaparece. E a humanidade ficaria em estado pior do que antes da vinda do Salvador, quando, pelo menos, ainda existia uma religio verdadeira. Veio Jesus Cristo ao mundo, para substituir a crena dos judeus por outra mais perfeita; ou melhor, apareceu para aperfeioar a primeira, figurativa em si, a fim de lhe comunicar toda a perfeio, pelo cumprimento das promessas e profecias antigas. E eis que tudo se afunda no caos ou nos plagos das humanas supersties. Afinal, nem Judasmo, nem Cristianismo!... Se ao menos naquela poca houvessem surgido Lutero e os protestantes, ter-se-ia pensado numa semelhana de verdade, pois se poderia garantir ter ele chegado para soerguer a religio e reconduzi-la pureza primitiva. Mas no! Quinze sculos se escoam... e s ento se levanta um monge apstata libertino e bbado; e tal decado teria vindo introduzir uma reforma na crena tradicional, na obra de Cristo... Veio para melhorar os costumes?... No; pois ele mesmo foi o mais dissoluto da poca. Veio para trazer nova doutrina? Ele teve a ousadia de pretend-lo. Esta doutrina crist, j admitida no mundo inteiro como ensino de Cristo, no passava, aos olhos do revoltoso, de uma adulterao profunda do Evangelho, acervo de crendices patrocinadas pelo anticristo de Roma, que, pouco antes, o prprio Lutero proclamara Pai da humanidade e sustentculo da verdade. Nada mais ridculo que a pretenso luterana. Ento, durante treze sculos, teria o mundo permanecido nas trevas absolutas do erro, vivera a humanidade no desconhecimento da verdade, e Deus no teria suscitado sequer um vidente e taumaturgo para desvendar o segredo da corrupo reinante e apontar a deturpao perpetrada?... Teria este Deus se descuidado de sua obra, ele que na antiga lei a cada passo suscitava profetas, visando manter o seu povo na prtica de seus mandamentos? Como admitir-se que este Deus, que acabava de sacrificar a vida de seu Filho encarnado, para a salvao dos homens, dele haveria de desinteressar-se, aps a crucifixo e subida aos cus, descuidando-se de sua tarefa salvadora que deixaria resvalar-se miseravelmente no erro, nas trevas, a ponto de no ser possvel mais reconhec-la?... Tal suposio seria uma blasfmia e uma verdadeiro insulto. Ou Deus no pde, ou no quis salvar a sua prpria obra! Se pensassem um pouco sobre as conseqncias de tal assero, os protestantes haveriam de horrorizar-se em frente concluso fatal: Jesus quis fundar uma Igreja imortal, a sua Igreja, com destinos imperecveis e, no entanto, no teve a fora suficiente e a inteligncia necessria para conserv-la ereta! Sendo assim Cristo no pode ser Deus, pois Deus onipotente para realizar tudo aquilo que projeta e quer. E aceitando que Lutero tivesse conseguido mais do que Jesus, suplantando-o at, concluir-se-ia ter ele sido mais sbio e poderoso que o prprio Filho de Deus... Pobre soberba protestante! Em que abismo no se foi lanar!... Nas profundezas do atesmo, no erro dos sem Deus.

7. CONCLUSO

A verdade una. E foi Cristo quem no-la deu (Joo 1 18-20), por intermdio de sua Igreja construda sobre a rocha de Pedro. Tudo quanto contraria verdade se chama erro. Ora, Lutero ensina o contrrio do que ensinaram Pedro e os seus sucessores. Est, pois, errado, e anticrist, de fato, a seita por ele estabelecida. Assim como Pilatos colocou perante os Judeus exaltados a Jesus e Barrabs, tambm o bom senso apresenta humanidade as figuras de S. Pedro e de Lutero, e indaga: qual entre eles desejais vos deixe livre Pedro ou Lutero?... A humanidade sensata, o universo religioso, com vozes unnimes, exclama: Queremos Pedro, porque com ele est a verdade. O mundo protestante, porm atendendo mais ao cego dio, excitado pelos modernos fariseus, os seus pastores e chefes, brada: Queremos Lutero, no aceitamos que Pedro reine sobre ns. Pobres protestantes!... Tal cegueira, tamanha incompreenso um grande castigo de Deus: Tm olhos e no vem. o que afinal de conclui.

CAPTULO II UM RETRATO AUTNTICO Dizem os amigos protestantes que Lutero foi o enviado especial de Deus para reformar a Igreja Catlica decada, ou melhor: levant-la da morte e sepultamento no lamaal dos maiores vcios e torpezas. Faz-se mister descomedida audcia para lavrar a certido de bito da Igreja fundada por Jesus Cristos, qual prometeu ele a sua perptua assistncia e a preservao de todo erro. Ademais, preciso uma superabundante dos de ignorncia da histria para desmentir fatos conhecidos e zombar de todos os historiadores antigos. Como que, antes de Lutero, autor algum jamais nota tal ausncia da Igreja verdadeira, aspirando surgisse qualquer taumaturgo para ressuscit-la, tir-la do sepulcro ou que o prprio Cristo viesse reabilit-la, clamando, bem alto, com o mesmo poder com que levantara Lzaro: Igreja, sai para fora deste tmulo?! Nada de tudo isso; somente, aps transcorridos quinze sculos, os protestantes descobriram este total desaparecimento da Igreja. Segundo eles, Deus suscitou enfim o homem desejado possuindo misso superior ao maior dos profetas e mensageiros divinos, instrumento do Altssimo, capaz de reconstruir a obra de Jesus Cristo e restituir-lhe a primitiva beleza evanglica. Tal indivduo foi Lutero. Examinemos num instante a histria de sua vida, as suas qualidades e obras; estudemo-la sem exageros, com toda imparcialidade, visando apenas os fatos provados historicamente, para vermos se, de fato, o pai do protestantismo ostenta credenciais de sua misso divina, pois duma rvore boa, conforme a sentena do Divino Mestre, h de sair uma produto bom, e de uma arvora m viro frutos maus.

1. PRIMEIROS ANOS DE LUTERO Nasceu Lutero em Eilesben, aos 10 de novembro de 1483.

Seus pais eram pobres camponeses, catlicos sinceros, segundo Melanchton; a me de Lutero era mulher virtuosa e dedicada piedade. Quanto ao pai, se dermos crdito ao prprio Lutero e contemporneos, era um homem rude, violento, quase cruel. E violncia do pai do pai que a princpio o educara sem carinho e desvelo, que o reformador atribua o dio por ele votado humanidade inteira. Aos 6 anos de idade iniciou os estudos em Mansfeld, na escola pblica, onde constas ter sido castigado constantemente, o que vem demonstrar seu gnio irrequieto, turbulento, sempre levado aos extremos. Sobre seu tempo de escola, deixou ele mesmo esta notaA nossa escola era um inferno e um purgatrio onde nos atormentavam com declinaes e verbos. O professor era um algoz. Numa s manh chegou e espancar-me quinze vezes. Aos quatorze anos dirigiu-se nosso heri para Magdeburgo, onde estudou por algum tempo sob a direo de religiosos; depois, vamos encontr-lo em Eisenach, mendigando pelas ruas, cantando e pedido esmolas para sustentar a vida. Foi nessa ocasio que uma piedosa viva, comovida pelo estado lastimvel do pequeno mendigo e por sua bela voz, acolheu-o, adotando-o como filho (Luther, por H. Wachters). Devido aos cuidados de sua benfeitora, que lhe pagou os estudos, o menino freqentou a escola latina dos Franciscanos. Em 1501 o estudante saiu de Eisenach, para ir terminar os estudos em Erfurt, onde, durante trs anos e meio, cursou a universidade, a colando grau de bacharel e mestre em cincias; no primeiro ttulo conseguiu o 13. Lugar entre 57 alunos, e no segundo, o 3. Lugar, o que indica que, como mestre, se revelou ele de uma inteligncia bastante viva, embora no genial. Findos os estudos, pretendia Lutero comear os cursos de Direito Cannico e civil, o que fez apenas durante um ms. De repente, sem mais nem menos, abandonou a universidade, voltando para Mansfeld, lugar onde comeara a sua instruo primria. Logo depois seguiu para o convento. Aqui nos deparamos com o mistrio da vocao de Lutero.

2. A VOCAO DE LUTERO At essa data nada apresentava o menino como sinal provvel de chamado divino para a vida sacerdotal ou religiosa. De estudante catlico que era, sem trao algum capaz de distingui-lo, com temperamento colrico e irrequieto, repentinamente se resolveu a deixar o mundo e retirou-se ao Claustro. A respeito de to sbita resoluo, correram diversas lendas que as modernas pesquisas histricas pem em dvida ou desmente. Numa carta ao pai disse Lutero, certa vez, que o medo das ameaas de morte lhe arrancara uma promessa involuntria. Houve quem procurasse saber a que ameaas ele se referia. Cogitam alguns de assassinato; outros pensam em duelo; certos, de um raio que cara ao seu lado, impressionando-o consideravelmente. Tudo isso poder ser verdico, mas no convence. Em certa ocasio, em palestras com amigos, o reformador se referiu a um desastre que com ele dera, quando acompanhado de um amigo, nas cercanias de Erfurt. Fazendo exerccios com armas, ele feriu, sem o querer, a prpria perna; to abundante foi a perda de sangue que pensou chegado a hora da morte. Temendo o perigo, invocara a proteo da Santssima Virgem, prece que repetiu depois. Noutra feita Lutero disse que, ao regressar de uma viagem a Mansfeld, surpreendeu-o violenta tempestade; uma fasca eltrica lhe caiu aos ps, enchendo-o de pavor; nesta ocasio teria

exclamado: Valei-me SantAna; quero ser monge. Teriam sido tais acontecimentos a causa da vocao de Lutero? Se ele nunca tivesse pensado antes em seguir a vida monacal, por certo teria feito qualquer outra promessa; mas o fato de voltar o seu pensamento para a vida religiosa parece demonstrar que desde algum tempo nutria tal idia, no correspondendo ao chamado do Alto por deficincia de coragem. Vendo-se em perigo de vida, julgou ser isto um castigo de Deus e prometeu realizar o que j considerava como vocao. Parece ser esta a opinio mais admissvel. Certamente Lutero fez logo o que prometera. Pela ltima vez reunio os amigos em festa ntima e, no fim, convidou-os a acompanh-lo. Relutaram. Afinal o seguiram, conforme lhes pedira. Deste modo, a 16 de julho de 1505 Lutero ingressava no Convento dos Agostinianos em Erfurt. Entrei para o Claustro, explica ele, porque estava desesperado de minha salvao. Ali a vida de nosso pretendente foi dividida entre a orao, o estudo da Sagrada Escritura e dos escritos dos santos padres. As constituies dos Agostinianos prescrevem aos aspirantes: ler atentamente, escutar com devoo e decorar as passagens principais da Escritura Sagrada; e, para este fim, no dia da profisso, cada monge recebe um exemplar completo da Bblia. a refutao radical aos historiadores protestantes que divulgam ter sido a Bblia escondida cuidadosamente e at ligada por meio de correntes de ferro, para Lutero no a poder ler. Felizmente os prprios protestantes j refutaram tal absurdo. Ouamos Otto Scheel: No passara um dia sem que a leitura da Bblia no houvesse enriquecido a alma de Lutero: nela encontrara consolao, luz e felicidade (Scheel-II:2). Sua vida como religioso nada oferece digno de nota; pequenos fatos, no entanto, manifestam, vez por outra, o seu carter inquieto, propenso sempre a excessos, parecendo considerar a Deus no como pai cheio de bondade, mas como juiz rigoroso. A crnica dos monges do convento do Lutero refere que um dia, ao recitarem o ofcio, ao ser lida no Evangelho a histria do surdo-mudo possesso pelo demnio, de repente o nosso heri caiu no cho, e, em contores horrveis, exclamou: No sou eu! No sou (o possesso) (Grisar 44). Falando de sua vida monacal, disse ele certa vez: Atormentei-me, rezei, jejuei, vigiei e tanto frio sofri que seria bastante para matar-me (Grisar, p.57). Estes fatos todos revelam uma molstia nervosa, histrica, ou grande desequilbrio de conscincia; no entanto, em tudo isso no viram os superiores impedimento srio para a vocao do jovem monge, e em 3 de abril de 1507 Lutero foi ordenado sacerdote na catedral de Erfurt, celebrando sua primeira missa aos 2 de maio do mesmo ano. Nesta ocasio, quando recitava a orao: Te igitur, no comeo do Cnon, o neo-padre foi tomado de um tal medo de Deus, que teria fugido do altar, se o sacerdote assistente no o houvesse acalmado. Em 1515, quando ao lado de seu superior assistia procisso do Santssimo Sacramento, tamanho pavor da proximidade de Deus o invadiu, que ele se ps a tremer da cabea aos ps (Tischreden W.;I. n. 137). Lutero era sacerdote para a eternidade... e nada neste mundo ou no outro, seria capaz de apagar o carter sacerdotal que em suas mos devia ser um meio de salvao para muitos e no, como se tornaria em breve, um instrumento de perdio. 3. ESTUDOS INCOMPLETOS DE LUTERO Temos agora diante de ns o monge recm ordenado, no limiar de sua vida nova. Logo uma primeira observao se apresenta: em 1505 entrara Lutero para o convento; em 1507, dois anos aps, foi ordenado sacerdote. To curto intervalo foi apenas o tempo necessrio para fazer o seu

noviciado ou aprendizagem, donde se depreende ter ele feito curso irregular de Teologia, que s veio a estudar depois da ordenao. Que dizer deste novo perodo de sua vida? O prprio Lutero explica: "... eu sou da escola de Occam, autor e propagandista-mor do nominalismo", sistema que negava o valor objetivo das idias, de maneira que o homem no pode ter nenhuma certeza da metafsica, caindo, necessariamente, no ceticismo. Verdades, por exemplo, como a imortalidade da alma, a existncia, a unidade, bondade e misericrdia de Deus, no caem sob a competncia da razo, s podendo os homens conhec-las atravs da revelao. Destarte o papel da inteligncia se torna muito restrito, e mais limitado ainda o da f e o da revelao. A simplificao visada por Occam objetivava a supresso do ensino escolstico, cuja doutrina admite tornarem-se as verdades de f mais acreditveis pelo auxlio da razo. To perversora a doutrina havia penetrado em muitas escolas, e at consta que os monges Agostinianos de Erfurt a professavam. Embora o nominalismo no atacasse diretamente as doutrinas da Igreja, no deixava, contando, de colocar os estudantes num perigoso declive que facilmente poderia conduzi-los ao erro. Aqui temos, pois, o incio e, qui a base dos erros do patriarca protestante; duplo este fundamento: a deficincia de estudos teolgicos e as doutrinas falsas de Occam, que envenenaram os primeiros passos teolgicos do pretenso reformador. Pouco depois da sua ordenao, foi Lutero transferido para Wittemberg; ali encontrou o vigrio geral da ordem, Pe. Staupitz, que desempenhava, alm do cargo d3e superior, o de professor de exegese na universidade local. Devendo, Staupitz, visitar, de vez em quando, as residncias da provncia, mal podia dar cumprimento ao seu ofcio, pelo que cogitava desistir e passar a ctedra de mestre a um sucessor da mesma ordem. Para substitu-lo, pensou em Lutero e aconselhou-o a se preparar, para tirar o bacharelato em Sagrada Escritura, afim de se habilitar a exercer o cargo de professor desta disciplina. Efetivamente Lutero seguiu-lhe o conselho. E em 9 de maro de 1509 colou grau de mestre na referida matria. Estudos assim precipitados e acumulados permitiram-lhe conquistar o ambicionado posto, mas no lhe deram o tempo de assimilar as doutrinas vistas, motivando isso, no esprito dele, uma verdadeira balbrdia de idias, sem fundamentos, sem provas e sem nexos. Grisar observa que, mesmo em Elbstad, foram falhos os estudos do reformador.(Grisar, 43). - De Wittemberg transferiram-no para Erfurt, novamente, para que desempenhasse ali o professorado como leitor de teologia, que estudara com pressa, incompleta e erradamente. 4. VIAGEM A ROMA Em Erfurt o novo leitor de teologia foi encontrar dupla guerra: - na cidade onde encontrara uma insurreio popular, e no convento dos frades Agostinianos no qual a discrdia era de espcie diferente. A Congregao abrangia nesse tempo duas provncias: a parte alem, mais rigorosa na observncia das regras, e a saxnica, um pouco mais mitigado no rigor primitivo.

Tendo sido o Pe. Staupitz nomeado Vigrio Geral provincial, para a Alemanha, procurou reunir as duas provncias sob sua alada, nelas introduzindo a observncia rigorosa. A Santa S favoreceu esta medida de unio, permitindo tambm que as duas partes se reunissem e escolhessem um s Vigrio Geral. A escolha recaiu em Staupitz. Isto agradou a quase todas as casas. Sete entre as da provncia alem resolveram protestante e entre elas estava o convento de Erfurt. Foi enviada uma deputao a Roma para defender os interesses dos insubmissos, perante a Cria Romana; Lutero integrava esta comisso. Que impresso trouxe ele da Cidade Eterna? Uma viso toda materialista, como se descobre pelo seu modo de descrever o que vira ali. No tinha o reformador alma de artista, para admirar grandezas, panoramas, antiguidades; nem possua um esprito perspicaz capaz de penetrar e ler a histria nos monumentos. Pouco empenho lhe ofereceu a estadia na grande metrpole do Cristianismo. Desejava ver o Papa e no o conseguiu, pois o Santo Padre estava ento em viagem pelo norte da Itlia. E a reclamao contra a unio das duas provncias agostinianas no foi aceita por Roma, o que contrariou bastante o frade descontente. Somente dez anos aps este fato que entrar ele a bradar contra os pretensos abusos da Igreja Romana. Parece que Lutero no retornou mais a Erfurt, mas foi logo se fixar em Wittemberg, onde continuou a estudar teologia. Em outrubro de 1512 a recebeu o barrete e anel doutoral na matria; no mesmo ms comeou a lecionar Sagrada Escritura, substituindo Staupitz. Neste ponto que Lutero comeou a manifestar os e=seus erros de princpios, e a sua ignorncia em assuntos teolgicos. Em 1515 iniciou ele a explicar a Epstola de So Paulo aos Romanos, e foi da m compreenso e interpretao desta carta paulina que o professor extraiu os erros sobre a graa e a salvao. 5. OS DOIS GRANDES ERROS DE LUTERO Dois foram os erros fundamentais do novo catedrtico primeiro: s a Bblia a regra suprema de f; segundo: o homem justificado s pela f e as boas obras de nada valem para a justificao. Desde esse tempo apareceram como pontos bsicos de todas as suas doutrinas esses dois erros. A primeira destas regras de crena substitui a autoridade da Igreja, supremo juiz em questes de f, pelo livre arbtrio, infligindo, assim um golpe infernal na unidade visvel da cristandade. A outra perverte toda a doutrina das relaes entre a criatura e o Criador. Combinados, estes dois princpios subversivos produzem a mais tremenda desordem moral nas almas e na sociedade. Teria Lutero aprofundado a extenso destes seus postulados de crena? Impe-se-nos imperiosa a questo e a resposta de longo alcance. Julgamos que no. No h dvida de que Lutero tinha inteligncia; era, porm pssimo psiclogo; segundo vimos atrs haviam sido feitos com precipitao os seus estudos teolgicos, mal assimilados e muito superficiais; era mais filsofo do que telogo, revelando-se sutil no raciocnio, mas fraco em doutrina revelada. Esta assero encontra prova a cada passo em seus escritos. Demais, ele era de carter altivo, orgulhosos, com uma inclinao natural demais acentuada, para a revolta. Um homem desse quilate geralmente teimoso.

Durante quinze sculos a Igreja interpretara e expusera a Bblia luz de sua tradio, de sua prpria histria e, infalvel no seu ensino e nas suas decises a respeito, fora a regra viva de f no passado. O monge rebelde no atinou com o valor e a segurana desta autoridade suprema, e o seu orgulho supremo levou-o a crer que o homem a sua prpria regra de f. Para ele no havia outra fonte de verdade revelada seno um livro mudo (embora inspirado) de que cada indivduo constitudo juiz. Este livro, portanto, tem de ser o guia e a norma de f para todos indistintamente, tornando-se todos infalveis, excludos, naturalmente, os sacerdotes, os bispos e o Papa. Lutero no tolerava a existncia de um homem infalvel na Igreja; mas, por cmulo de contradio, admitia serem os indivduos todos infalveis, exceto o Pontfice de Roma, que na verdade o nico infalvel por divina instituio. Em teoria tal era a doutrina de Lutero, embora na prtica no aceitasse que ningum contradissesse s suas opinies. O princpio: - a justificao s pela f era igualmente deletrio e perverso, pois deveria produzir os mais desastrosos resultados numa sociedade decada. Conforme o ensino catlico, a f que justifica uma f viva, isto , fundada na revelao e informada pela caridade. Lutero no que saber de caridade; para ele basta possuir confiana em Deus e ele, por amor a Cristo, no mais nos imputar os nossos delitos, mas nos tratar como inocentes e santos. Para salvaguardar uma idia tal, no trepidou Lutero em falsificar o texto de So Paulo (Romanos 3,28). O apstolo escrevera: julgamos que o homem justificado pela f, sem as obras da lei (mosaica). O reformador transcreve o texto assim: O homem justificado s pela f. V-se logo a perversidade do falso intrprete. So Paulo pretende mostrar que lque, para algum se salvar, no basta executar apenas as obras prescritas pela lei de Moiss, mas que, alm disso, mister possuir f em Deus; Lutero, porm, depois de liquidar as obras da lei mosaica, suprimiu, ainda as da nova lei, contentando-se unicamente com a f. E, como na Epstola de So Tiago se lem estas palavras textuais: O homem justificado pelas obras pela f, e no pela f somente (Tiago 2,14-28), o inovador taxou esta epstola de Epstola de palha. Tal a grande descoberto de Lutero, que constitua para ele a suprema novidade, mas que, para o mundo, no era mais que a grande heresia. Neste seu peculiar modo de entender a Bblia apalpa-se a sua falta de conhecimento seguro. Est a o princpio da decadncia do reformador, cujos fundamentos remotos o vimos beber na errnea filosofia nominalista que seguira desde os bancos de escola superior. 6. CONCLUSO A fica a primeira fase da vida de Lutero. Visto atravs dum olhar superficial, nada ainda se apresenta de muito importante; no entanto, no mago desta alma irrequieta, graves problemas se agitavam. que as grandes quedas no se realizam de repente, como as grandes virtudes no se adquirem num dia. Querer julgar Lutero pelos acontecimentos em que passou a exercer influncia preponderante na poca recolher efeitos como se fossem causas, e atribuir a um destino cego aquilo que na verdade uma concluso final.

A primeira educao na casa paterna, os primeiros estudos, o ambiente em que se encontrava, a converso tudo isso constitui necessariamente a trama que devia moldar o carter e orientar as tendncias de Lutero. Pelas notcias que nos ficaram dos seus tempos escolares nota-se que ele fora um menino traquinas, insubordinado, colrico, e dado independncia e insubmisso. No se castiga continuamente um aluno bem comportado e exemplar. E Lutero foi punido a toda hora. No concorde e sempre reclamando contra penas e ordens, de contnuo avesso a quem no lhe seguisse s idias, assim cresceu o futuro reformador. Pertencendo a uma poca bastante viciada, privado de carinho e vigilncia, a estrada de corrupo precoce estava largamente aberta em sua frente, prometendo saciar-lhe os instintos... Ao orgulho juntou-se a imoralidade. A acusao grave. Exige provas. Ei-las: Referindo-se sua vida anterior converso, deixou ele um dia escapar estas palavras: Sim, fui um grande, triste e vergonhoso pecador; tive uma juventude culpada (Weimar, 26, 508). Relacionados tambm com este perodo da vida de Lutero h dois documentos contemporneos, bem desfavorveis integridade de seus costumes. O primeiro de Jernimo Dumgersheim, que, num escrito contra o herege, assacou-lhe publicamente os maus hbitos de sua vida de estudante, continuados depois, e causadores de sua apostasia. Noutra parte o mesmo autor falou de faltas graves, e apelou para o testemunho de um daqueles camaradas que depois o acompanharam at porta do convento. O segundo depoimento de Jernimo Emser que conhecera Lutero quando estudante em Erfurt. Em 1520, numa polmica, o monge revoltoso lembrou alguns deslizes do seu adversrio. Emser, que no era irrepreensvel, retrucou-lhe no mesmo tom: Ignoras talvez que a teu respeito eu saiba de faltas bem graves?... E Lutero no prolongou o ataque, ele que nunca deixava o contendor sem resposta!... A ele emudeceu e nem a Dumgersheim, nem a Emser respondeu palavra. Tudo o que foi dito neste captulo faz sobre-sair em cores bastante vivas a primeira fase da vida que estamos expondo.

CAPTULO III A QUEDA DE LUTERO A fisionomia da mocidade de Lutero j nos conhecida. Esse perodo de sua existncia no foi, de certo, a preparao condigna para a misso to sublime de quem se dizia chamado por Deus para mudar por completo as idias de um sculo e reformar a Igreja de Cristo. Bom que o leitor saiba logo nada estar eu adiantando por minha conta e risco. A minha apreciao vai apoiada sobre os documentos contemporneos, pois recorri aos melhores autores modernos que relataram os fatos (*). Anteriormente vimos as tendncias de sua meninice; estas j se apresentam como sinais certos na mocidade; afinal, na idade madura, sero fatos consumados. Temos assim, realizada a palavra da sabedoria: O homem no se afastar, na velhice, do caminho seguido em sua mocidade. O que no juntaste em tua juventude, como o poders encontrar em tua velhice? (Eclesistico 25,5). Entremos agora nos meandros da segunda fase desta existncia, tristemente clebre e cinicamente corrupta.

1. O ESTADO DE ALMA E A CONVERSO DE LUTERO Vimos Lutero exercendo o professorado na universidade de Wittemberg: a insensivelmente se precipitou no maiores absurdos e erros que, por cmulo de obcecao mental, tomou como A DESCOBERTA DA VERDADE, sepultada pelos antigos. Pode-se acreditar na sinceridade de sua converso? Optamos pela afirmativa, muito embora se possa admitir que o principal mvel desta mudana de vida tenha sido o temor dos castigos que o desejo de servir a Deus. Por que este medo?... Devido aos dois motivos j expostos: o seu gnio arrebatado que nos primeiros anos lhe atrara tantos castigos, e sua vida livre e desregrada da mocidade. Examinando-se tudo atentamente, nota-se que a converso de Lutero, conquanto se tenha como sincera de sua parte, no possua fundamentos suficientemente sobrenaturais, para agentar o peso de seu estado de sacrifcios preparativos santidade. Ingressando no convento, o seu nimo irrequieto achou nesta ambiente, quanto nos mltiplos afazeres que o envolviam, uma preocupao para mant-lo, relativamente parte externa, na linha reta do dever. Mas o conhecido axioma OMNE VIOLENTUM NON DURAT achou em Lutero a aplicao cabal. Quis sair do mal e praticar o bem; faltando, porm, o apoio sobrenatural sua resoluo, este seu voluntarismo, redundando num esforo contnuo, se transformou, para ele, num jugo e num tormento. Esta oposio formal entre as idias, ou tendncias de Lutero, e o seu teor de vida, gerou nele um terrvel escrpulo, pelos modernos psiclogos denominado OBSESSO: estado de alma em mais comum do que geralmente se cogita, sobretudo entre estudantes e intelectuais. Para disfarar a sua realidade, empresta-se-lhe o nome benigno de neurastenia, nervosismo, mania; no entanto, fundamentalmente, no passa de uma verdadeira molstia: a OBSESSO ou o ESCRPULO. Ao comear manifestar-se, esta importuna impresso mal e mal perceptvel, no indo alm de um abatimento que inquieta, de qualquer coisa obscura e AMEAADORA. Logo, porm, esta disposio se altera: o pavor se determina, a IDIA fixa aparece como fator principal e pesa sobre todas as deliberaes da pessoa, influindo em sua vida afetiva, sobre tudo o que faz; numa palavra, tal idia IMPORTUNA E PACIENTE. Muitas vezes no ultrapassa os limites de um simples talvez, mas uma dvida inquietante a martirizar o doente; tal estado, afinal, assume, assim, pouco a pouco, aspecto de verdadeira loucura. Como efeito do fenmeno, o obsesso se v assaltado de vacilaes da mente, condenado a nunca encontrar certeza, exatamente nas questes que mais de perto lhe dizem respeito. Basta pretender ele uma coisa, para logo se lhe apresentarem as mais fantsticas indecises, aborrecendo-o e impelindo-o a odiar o que mais amava e apetecia. Foi em conseqncia desta disposio, que Lutero viu nas molstias que o atingiram, at em simples acidentes sem importncia, tremendas ameaas e castigos de Deus. Isto nos revela a sua deciso repentina de se fazer monge. Desde ento j ele era vtima de uma obsesso de cuja tirania inutilmente procurou safar-se. Estas ligeiras observaes psicolgicas acham confirmao plena nas palavras e nos gestos subseqentes de Lutero, aps a entrada no convento. Ouamos algo de seus escrito de 1535, em Wittemberg, j ex-frade, no seu comentrio epstola aos Glatas: Quando ainda monge, julgavame perdido, sem salvao possvel, sentindo, com tamanha violncia, impulsos e atrativos pecaminosos e uma tendncia acentuada clera, ao dio e inveja, contra um dos meus irmos

de hbito. Este mal se renovava continuamente, no podendo eu encontrar descanso. E prossegue: Ah! Se tivesse ento compreendido a palavra de Paulo: a carne luta contra o esprito e ambos se hostilizam mutuamente (Erl. Com. In Gall. III). Tudo isso acentua sempre mais a grande desgraa do escrpulo ou da obsesso a persegui-lo desde a Infncia. ------------------(*) Alm do livro de Grisar e das obras de Lutero, recolhidas por Weimar, estou seguindo particularmente um autor holands: H. J. Achters: Luther, leven, persoon, leer, resumo de tudo o que se tem dito de mais fundado sobre Lutero. ------------------2. OS ESCRPULOS DE LUTERO Segundo vimos, nosso homem era nada menos que um escrupuloso e um obsesso pela idia fixa do rigor de Deus. Desconhecendo a influncia deste estado psicolgico numa pessoa, os protestantes no o admitem em Lutero, e chegam a atribuir erradamente ao Catolicismo as mazelas todas do "reformador". que, para eles, CHEFE tem de ser sempre o HERI, cuja sede da verdade e cujos anseios de paz com Deus no encontraram na Igreja Catlica possibilidade de serem satisfeitos. A esto, para atestar o estado anormal do esprito de Lutero, hsitoriadores de renome, homens de primeiro valor, como Grisar, Denifle, Paquier, Duinster, etc. Otto Scheel, escritor protestante, atesta ter sido Lutero frequentemente repreendido durante o seu noviciado, porque, perturbando-se continuadamente, enxergava todas as coisas atravs do prisma dos seus escrpulos, segundo os quais tudo era pecado. Qual a causa de to aflitivo estado dalma? Simplesmente a falsa concepo de Lutero sobre a graa divina. Por certo ele aspirava gosar aquela paz e alegria infundida pela graa no esprito; no lhe era suficiente a certeza moral de estar bem com Deus; desejava obter uma prova sensvel, esta consolao que, s vezes, Deus concede a algumas almas generosas e frequentamente recusa a outras. Superiores e mestres espirituais apontaram-lhe o erro. Tempo perdido. Lutero seguiu a sua prpria idia, a ningum querendo submeter-se. Foram impotentes para remediar o mal as violentas prticas de mortificao a que de contnuo recorria. O defeito era de outra natureza, pois no passava de uma espcie de "ultimatum" lanado face de Nosso Senhor. J Santo Agostinho se expressava admiravelmente a respeito: VIS FUGERE A DEO, FUGE IN DEUM - quem quiser fugir de Deus, nele se refugie. O pobre Lutero muito ao invs, parecia nunca haver sentido a doce e consoladora intimidade com Deus, lanando-se cegamente nas garras do demnio, quando era o seu lugar o regao carinhoso do Pai. Em vista de to lastimvel estado, foi ele aos poucos abandonando as oraes prescritas aos sacerdotes, e se absorvia, de corpo e alma, na atividade exterior, envolvente, materializante, e tanto que, em 1516, escrevia assim a Lange: "Raramente me sobra tempo para rezar o brevirio e celebrar a missa; acrescentem-se a isto as tentaes que padeo". (Wette I, 41). Eis a iminente a desgraa de Lutero. Era um vencido, a entregar as armas, capitulando vergonhosamente. O pobre monge comeou, desde aquela hora, a indagar de si para si: por que no encontro eu a paz e a satisfao no convento? Por que me sinto hoje mais desanimado do que nos primeiros dias

de noviciado? Aps tantos esforos nada consegui. E se no me salvar no papismo, haver possibilidade de algum outro o conseguir?... (Wachters; Luther, 46). Perante seu esprito turbulento e povoado de revolta surgiu ento o fantasma do erro. Veio em seguida a indagao: No haver na natureza humana um foco de inclinaes perversas, mais pujante do que a nossa vontade, o qual nos consome, sendo-nos impossvel apagar-lhe as chamas? E, dando ouvidos ao seu carter voluntarioso e s idias pessoais, concluiu afinal: "A natureza humana est corrompida pelo pecado original, at s ltimas fibras, e o desejo do mal invencvel". (Jaques Maurtain: Trois Refomateurs 1925). Era a queda irremedivel, a heresia formal. Destarte se estabeleceu a fonte de todos os seus erros e culpas. O desastre teve como ponto de partido o escrpulo, a obsesso, o medo de Deus, a rebelio contra tudo e contra todos. E tal esprito doentio jogou-o no abismo. Sabe-se alis, que um escrupulosos, de um dia para outro, pode cair no excesso oposto ao de seu escrpulo. Para muitos tal disposio conduz a um laxismo corruptor. Para Lutero, porm, levou-o fundao de uma nova seita religiosa.

3. CONCLUSO Lutero se pervertera, pois, de corpo e alma. Desde ento era um decado, entregue ao vcio, perdido em deboches. E, com pouco tempo mais, um revoltoso em franca rebelio contra a sociedade, contra a Igreja e contra Deus. Narrando este seu estado de nimo, disse certa vez: "Todos aqueles aos quais eu comunicara o meu estado, me diziam logo: No compreendo a sua dificuldade. E refletia: ser que sou o nico a debater-me em situao to triste, somente eu que sou to tentado?... De fato, em toda parte eu via vises horrveis e aparncias de fantasmas". (Hausrath: Luther leben, p. 30). Mesmo a confisso, que a todos os cristos traz alvio e paz, veio a ser, para ele, uma fonte de tormentos. Desanimado, procurava recurso de salvao, sem lograr encontr-lo. Lutero olvidara o doce Cristo que dissera: "Vinde a mim todos vs que sofreis a vos achais carregados, e eu vos aliviarei" (Mat XI, 28). O Jesus do tabernculo, prisioneiro do amor, no era para ele mais do que um juiz encolerizado, sentando-se ameaador sobre um arco-ris" (Wachters, p.44). Confesso-te, dizia a um amigo, ainda no mesmo ano de 1516, que a minha vida mais e mais dse aproxima do infoerno; torno-me sempre pior e mais execrvel. (Enders I, 16). Pouco tempo antes, (1515), comunicando seu estado dalma ao superior, Pe. Staupitz, revelou-lhe dolorosamente: "Sou um homem exposto e implicado na m sociedade, na crpula, nos movimentos carnais, em negligncias e noutros incmodos a que se vm juntar os do meu prprio ofcio" (Wette I, 232). Tais palavras deixam entrever com clareza o que era no ntimo a alma de Lutero. Excessivamente orgulhoso a ningum queria sujeitar-se. Em certos momentos, porm, por mais humilhante que tal se lhe afigurasse, escapava-lhe a confisso da verdade, quais as abafadas labaredas de um incndio interior, forcejando evadir-se. Depois, qualquer ocasio favorvel mudar-lhe-ia a obsesso em revolta externa a entreg-lo, acorrentado, ao domnio das paixes mais abjetas que no conseguira vencer, por desprezar os meios adequados, no renunciar s idias fixas e esquivar-se obedincia. Convertera-se POR MEDO. E ainda o medo f-lo- depois cair no lamaal do vcio. O amor para com Deus e as almas no lograra apossar-se de seu corao. E foi preenchido este vcuo pela rebelio, pelo rancor odiento e pelas baixezas carnais.

No o impressionou em absoluto a bondade divina. Isolado, porm, na sua misria, envolto na soberba, quis ditar leis ao prprio Deus e a ele se impor. Ento Deus se afastou do miservel que o repelira, deixando-o entregue aos instintos da prpria perversidade. Deus d a sua graa aos humildes, mas resiste aos soberbos (Pr 3,34).

CAPTULO IV A ENTRADA EM CENA Dada a ndole turbulenta de Lutero, compreende-se logo que as suas novas doutrinas enunciando: - S A BBLIA NECESSRIA, - e A F QUE SALVA no ficariam encerradas no limitado espao de sua cela monacal. O frade revoltoso no era homem de meias medidas; depois de cair, necessariamente arrastaria outro consigo, pois as idias concebidas na leitura falsificada da Epstola ao Romanos tornaram nele logo uma verdadeira OBSESSO, passando a informar toda a sua vida e as suas atividades. Faltava apenas uma ocasio azada para serem manifestadas em pblico. E esta circunstncia no tardou. Foi a pregao das indulgncias na Alemanha. Conforme confessou o prprio reformador, pouco significaram para ele tais benefcios espirituais, chegando mesmo a dizer ignorar o que fosse uma indulgncia (W. W. I. 65). Analisemos, aqui, o desenrolar dos fatos intitulados por ns: A ENTRADA DE LUTERO EM CENA. 1. A QUESTO DAS INDULGNCIAS Havia tempo que a Santa S projetava construir em Roma uma grande baslica em honra de So Pedro, em substituio velha igreja do mesmo nome. A idia do Papa Jlio II, em 1506, era fazer que a catolicidade contribusse para levantar-se o monumento que devia ser como que a manifestao pblica da unidade catlica; o projeto ultrapassava os mais suntuosos edifcios do mundo. Para que os catlicos de todo o mundo se interessassem pela obra comum, o Papa concedeu uma indulgncia particular a todos os cooperadores desta empresa por meio de esmolas. J havia tal indulgncia sido pregado em quase todos os pases, com exceo da Alemanha, devido s grandes somas que, de direito, tenha o imprio germnico de dar Roma, o que anteriormente suscitara certo descontentamento. Julgou o Papa Leo X que tal animosidade desaparecera, podendo, tambm a Alemanha contribuir, opor seu turno, para ajudar Baslica de Roma, e, por isso, mandou publicar a Bula das indulgncias em maro de 1515. Eram condies para se lucrar a indulgncia: confisso, comunho, um dia de jejum, a visita a sete igrejas ou altares e um esmola para a Baslica em construo. Foi nomeado o arcebispo de Mainz comissrio desta indulgncia, devendo ela entrar em vigor na Quaresma de 1517. O arcebispo nomeou como vice-comissrio do arcebispado de Magdeburgo o dominicano Joo Tetzel, que j havia exercido a mesma funo em Mainz, no ano anterior. Como desempenhou o padre Tetzel este ofcio?... O dominicano era um orador popular, talentoso, mas, segundo consta das informaes de Grisar, cometeu exageros ao explicar o modo de aplicao das indulgncias aos vivos. H quem afirme que os desvios nas expresses do pregador em nada afetaram a sua doutrina, sempre exata.

No ensino eclesistico, a INDULGNCIA A REMISSO DA PENA TEMPORAL DEVIDA AOS PECADOS J PERDOADOS, benefcio espiritual que a Igreja concede sob certas clusulas a quem est em estado de graa, aplicando-lhe os mritos infinitos de Jesus Cristo, e os superabundantes de Maria Santssima e dos Santos, os quais constituem o tesouro da Igreja. A indulgncia plenria perdoa toda a pena temporal, enquanto a parcial apaga apenas um parte dela. Para se lucrarem as indulgncias, importa estar em estado de graa e cumprir o que elas prescrevem. Em virtude da Comunho dos Santos, as indulgncias podem geralmente ser aplicadas s almas do purgatrio, sem que, entretanto saibamos com certeza os frutos praticamente a elas comunicados. Tal aplicao, de fato no depende s da Igreja, seno da vontade de Deus. Depois da revolta de Lutero, e para motiv-la, inventaram os protestantes mil e tantas calnias contra Tetzel e o objeto de suas pregaes, mas os ataques foram sem fundamento e sem provas.

2. A DECLARAO DE GUERRA Tetzel no falou em Wittemberg, mas na Saxnia, em Juterbog; desta sorte, Lutero no ouviu pessoalmente a tal pregao, conhecendo-a atravs das informaes de seus alunos e amigos. Lutero se inflamou, achando favorvel a ocasio para agir. E logo comeou, decidido a todos os excessos, com todo o ardor de seu temperamento impetuoso, vido de proezas e novidades. Na vspera da festa de Todos os Santos, orago da Igreja dos Agostinianos, uma multido se acotovelava na praa para ganhar a indulgncia da Porcincula, quando Lutero apareceu com 95 teses contrrias s indulgncias, as quais afixou porta do templo. Era a declarao de guerra religiosa. O novo herege levantou-se contra o ensino da Teologia, declarando no terem as indulgncias valor algum perante Deus, no passando de apenas cannicas impostas pela Igreja. Alm disso, negou a doutrina referente ao tesouro da Igreja. Finalmente pergunta Lutero: por que o Papa no constri a baslica de So Pedro com seu prprio dinheiro, ele que possui riquezas maiores do que o mais abastado Cresus, em vez de recorrer aos fiis pobres?... No mesmo dia o revoltoso remeteu as teses ao arcebispo de Mainz, aconselhando-o a substituir a pregao das indulgncias por outras, para evitar se escrevesse contra esta doutrina. Tetzel, prevendo a significao e a rpida propaganda das teses de Lutero, ps-se logo em campanha contra o adversrio. Para este fim, publicou uma lista de 106 proposies por ele defendidas, em 20 de janeiro de 1518, publicamente, diante da Universidade de Francfort. Lutero estava com as armas e, em vez de refletir e comparar as doutrinas expostas por ele com as do seu adversrio, comeou a atacar com furor mal contido a doutrina escolstica sobre a confisso, a contrio e a satisfao. Aos amigos que lhe observaram a excentricidade da nova doutrina, Lutero retrucou com aquela sua teimosia costumeira: Pouco me importa alguns me considerarem herege; so crebros escuros que mal cheiraram a Bblia. Permaneceu Tetzel firme e com perspiccia e preparo teolgico que o exornavam, compreendeu logo profundamente a perversidade das teorias luteranas. Enquanto muitos telogos viram nestas discusses uma simples questo de palavras, Tetzel sentia estar em jogo uma verdadeira heresia, cujas consequncias abalariam a f em muitos catlicos. De fato, a questo das indulgncias foi desaparecendo rapidamente e, j em maio de 1518, toda a discusso se deslocara para a autoridade da Igreja. A novidade se espalhou clebre no meio do

povo, que apreciava, sobretudo a crtica de certos deslizes reais ou fictcios entre o clero e a instigao contra o pagamento de qualquer tributo ou sustento porventura exigido pela Igreja.. O povo no atinou logo no se trata aqui simplesmente de criticar abusos, mas ser desejo dos rebeldes um rompimento completo com a doutrina e a autoridade da Igreja. 3. PRIMEIRA REAO DA IGREJA As idias revolucionrias do heresiarca ecoaram na Alemanha inteira e abalaram a crena de muitos, tanto mais que o terreno se achava admiravelmente preparado para receber qualquer semente de protesto e insurreio. Efetivamente, o sculo XVI era de uma quase universal decadncia, e a Religio divina no escapava em sua parte material, ao influxo de ambiente to corruptor dos costumes. Havia abusos nos governos, e at no governo subalterno da Igreja, devido ambio das honrarias, da fortuna e das posies. A doutrina catlica no vacilou jamais, por ter as promessas divinas; o seus dirigente, porm seus membros so homens e, como tais, susceptveis de se deixarem impregnar pelas idias dos lugares, onde nascem e onde so educados. Infelizmente, muito no sabem distinguir entre DOUTRINA e PESSOA, confundindo esta com aquela e atribuindo primeira, - o que aconteceu com Lutero, - o que exclusivamente da segunda. o que aconteceu com Lutero e seus asseclas, admitindo-se estivessem em boa f nesta guerra contra a Igreja. Havia defeitos na vida dos catlicos; no os havia, porm, no ensino eclesistico. Pretendiam os descontentes atacar os abusos; podiam faz-lo. Mas, ao invs, atacaram a doutrina, deixando subsistirem os abusos que cresciam cada vez mais, demolindo-se o verdadeiro ensino em proveito das pessoas ou dos seus erros. Foi esta a grande aberrao, ou a triste confuso de Lutero. O arcebispo de Mainz, D. Aberto de Brandeburg, vendo o erro tomar vulto, denunciou-o a Roma em janeiro de 1518. Em 3 de fevereiro daquele ano, o Papa Leo X escreveu ao substituto do Superior geral dos Agostinianos, encarregando-o de persuadir Lutero, seu sdito, a desistir de suas opinies perigosas ou erradas, para evitar que desta fasca do erro resultasse um incndio, impossvel talvez de se apagar mais tarde. Infelizmente, j no era uma simples fagulha, mas uma fogueira que lavrava. Parece ter Lutero encontrado em sua ordem vrios cmplices, partilhando das suas idias e erros. A nica medida, que se conhece tomada pelos seus superiores, foi a de impedir a reeleio de Lutero como vigrio de distrito. No continuou em seu cargo o monge deposto, prosseguindo, porm, em sua revolta, atacando a doutrina e a autoridade da Igreja Catlica.

4. LUTERO E O PAPA Em face da persistncia de Lutero, os Dominicanos o denunciaram outra vez a Roma. O monge rebelde receava a excomunho e, prevendo-a, procurou evitar a impresso, que necessariamente ela exerceria sobre o pblico. Em maio de 1518 pregou sobre as CONSEQNCIAS DA EXCOMUNHO, procurando mitig-las o mais possvel e dispor o esprito da populao em seu favor.

Na mesma ocasio mandou ao Papa Leo X uma defesa de seus ensinos sobre as indulgncias, queixando-se das acusaes injustas a ele feitas. Conta, a seu modo e de maneira falsa, a causa desta luta, declarando No posso retratar-me. Apesar desta teimosia, declarou pela mesma carta escutar a voz de Leo, como sendo a voz de Cristo, que fala e dirige por Ele. Faze-me viver e matar, chama, aprova, rejeita como te agradar escreve ao Papa; e, ao mesmo tempo, em linguagem desabrida e com revoltante cinismo, escreve a um amigo: Pouco me importa agrade ou no ao Papa, homem como os outros. Houve at Papas que no s cometeram erros e crimes, mas at monstruosidades. Eu escuto o Papa como Papa, quando ensina as leis da Igreja, de acordo com os Conclios, mas no quando ele fala por prpria cabea (Obras de Lutero, Weimar). Julgou a Santa S de seu dever adotar novas providncias contra ele. Chamou Lutero a Roma, onde devia apresentar-se dentro de 60 dias. Este estava resolvido a no obedecer e procurou proteo junto do prncipe Frederico e do imperador Maximiliano. Solicitou a Frederico que o chamasse perante o Conselho do reino, ento reunido em Ausburgo, por querer ser julgado por juzes alemes. Para no irritar os espritos, o Papa lhe concedeu permisso de comparecer em Augsburgo, ante o legado da Santa S, o Cardeal Cajetano, com faculdades para tratar do assunto. Em 7 de outubro chegou Lutero a Augsburgo tendo ali vrias conferncias e entrevistas com o prncipe Frederico e o Cardeal, nos dias 12 e 13 do mesmo ms. O enviado papal mostrou-se bondoso e paciente, e, tendo-lhe Lutero declarado estar pronto a seguir em suas palavras e obras, a doutrina da Igreja de Roma, indicou-lhe o dignitrio os dois erros notrios: a negao dos tesouros da Igreja como depositria das indulgncias, e a opinio da exclusividade de salvao pela f somente. O cardeal no admitiu discusses, j que os dois pontos se opunham formalmente doutrina da Igreja. Lutero respondeu ao legado: No posso retratar-me, se no me provarem ter ensinado qualquer coisa contrria s Escrituras, aos Santos Padres, s decises dos Papas ou do bom senso. A entrevista terminou infrutfera; o monge revoltoso protestava obedecer em tudo ao Papa, enquanto ao mesmo tempo no concordava com ele em nada. Dali se retirou Lutero para a residncia onde se hospedava, mas, com espanto geral, fugiu secretamente de Augsburgo, na noite de 20 para 21 de outubro, regressando a Wittemberg, onde achou apoio na pessoa do seu superior Stuapitz. Lutero, depois de ter feito um papel to triste e covarde, sentia-se satisfeito em ver-se longe de Augsburgo, onde no encontrar o esperando apoio. Em 28 de novembro, para desculpar-se, apelou da sentena do Papa, para um Conclio geral. Era apenas um meio de ganhar tempo. Lutero estava definitivamente perdido e cada vez mais teimoso em suas idias de revolta. Uma carta a seu amigo Lenk, de Nuremberg, nos transmite as suas verdadeiras idias e o seu dio ao Papa. A luta no est nem comeada, escreve ele, longe de estes senhores poderem esperar o fim. Remeto-lhe a relao dos fatos de Augsburgo, para ver que, como julgo, o verdadeiro Anticristo de que fala Paulo reina na S de Roma; penso poder provar que ele pior que os turcos (Enders Correp. I. 316-II/12/1518). Quem fala deste modo est decidido a continuar no erro e segui-lo at o fim.

Lutero prosseguir com seus discursos inflamados de insubmisso e um dia exclamara cheio de amor prprio: Roma pode experimentar condenar-me, mas Cristo, por sua vez, jamais se afastar de mim (Cartas I. 30,.320 a Staupitz 13 dez.1518). 5. A DISCUSSO DE LEIPZIG Exteriormente a luta acalmara um pouco. Roma protelava, aguardando a converso do filho prdigo. Tendo falecido o imperador Miximiliano, em 12 de janeiro de 1519, foi s depois da eleio do seu sucessor Carlos V (out. de 1519) que o processo contra Lutero foi retomado. Nesse nterim um novo acontecimento patenteara a m vontade de Lutero: a discusso de Leipzig. Os erros de Lutero foram-se espalhando com a repulsa de uns e a aprovao de outros. Em breve as prprias universidades da Alemanha veriam as suas opinies divididas, efeito das dvidas e discusses suscitadas. O enfraquecimento da f e o relaxamento da moral eram um terreno propcio para as novidades e revoltas. As universidades de Wittemberg, Ingolstad e Leipzig combinaram entre si um debate pblico para resolver a pendncia. O lugar escolhido foi o castelo do conde Jorge de Sax, em Leipzig. Ali deviam reunir-se os representantes de cada partido. O salo de honra do castelo foi dividido em duas partes destinadas s duas faces, com dois plpitos no centro, um em frente ao outro. A discusso teve incio a 27 de junho de 1519 entre Carlostad e Eck. O enviado de Lutero foi vergonhosamente vencido, no podendo provar as suas teses, nem refutar as do seu antagonista. Referindo-se, mais tarde, a esse fracasso, falou Lutero: Em Leipzig Carlostad recolheu vergonha em vez de honra, mostrando-se um miservel polemista, com esprito tapado e tolo (H. Boeckmer: Der Junge Luther 1929, pg. 255). A impresso foi pssima para a pretensa reforma. Os partidrios chamaram Lutero para vingar a desfeita e soerguer a honra comprometida da nova doutrina. Em 4 de julho reencetou-se a polmica, desta vez entre Lutero e Dr. Eck. Tudo convergiu logo para a palpitante questo: a autoridade da Igreja em matria doutrina. Lutero havia opugnado as indulgncias, proclamando o valor supremo da Bblia e a inutilidade das boas obras, mas no tinha ainda opinio formada sobre a jurisdio da Igreja em questes de doutrina. Caiu em contradio, titubeou, aderindo, publicamente s condenadas doutrinas de Huss, rejeitando a autoridade da Igreja. O Dr. Eck refutou vitoriosamente as asseres herticas, e Lutero no fez papel mais brilhante do que o seu representante vencido, Carlostad. Os nimos dos sectrios se exaltaram e vrios comearam a grita contra as asseres catlicas de Eck. A 14 de julho encerrou-se a discusso, levando os louros do triunfo o Dr. Eck, como o prprio Lutero depois declarou em uma carta a Melanchton: Eck tem as vantagens: ele triunfa e reina. Estes leipziganos no nos saudaram, nem visitaram, mas nos trataram como inimigos, enquanto acompanharam Eck em toda parte... para nossa vergonha... a est todo o drama: comeou mal e acabou pior... discutimos mal (Enders: corr. II, 85, 20 de julho de 1519).

O conde Jorge de Saxe, o povo de Leipzig, a universidade e os catlicos hesitantes sentiram-se fortalecidos em sua f, mas Lutero, recolhendo-se sob a capa do seu amor prprio ferido, se tornou cada vez mais intratvel e grosseiro. Ei-lo feito definitivamente herege. 6. FURORES DE LUTERO Lutero compreendeu que Roma, diante destes acontecimentos, no mais permaneceria por muito tempo calada e resolveu tomar a frente , para romper publicamente com o papado. Em 1520 publicou um pasquim intitulado: Do Papado de Roma. Era uma resposta violenta e grosseira ao franciscano Agostinho Halfeld, que publicara um escrito em defesa dos direito divinos do papado. Este escrito, segundo atestou um protestante daquele tempo, zombava da lgica e punha a sua fora em grandes palavras. Tratava Halfeld de asno, que no sabe zurrar, e expunha a sua doutrina hertica sobrte o reino invisvel da Igreja e o sacerdcio universal, que no deixavam mais lugar para o papado. O monge revoltoso tornou-se um verdadeiro energmeno, blasfemando, insultando a todos os que no estavam pelas suas idias. Prieirias havia refutado alguns erros de Lutero. Este no demora com a resposta: Este homem miservel, escreve ele, produziu um escrito que parece feito pelo prprio Satans, no fundo do inferno.,.. se tal a doutrina de Roma, eu declaro que verdadeiramente o anticristo est sentado no templo de Deus e reina em Roma, a verdadeira Babilnia, revestido de prpura, sendo a corte de Roma a sinagoga de Sat . O furibundo monge continua, parecendo um verdadeiro possesso: Contra a clera da Cria Romana, continua ele parece no haver mais outro meio seno que o imperador, reis e prncipes enfrentem esta peste pela fora das armas e a estirpem da terra. Se ns castigamos ladres com a forca, bandidos com a espada, hereges com o fogo, por que no agredimos com qualquer arma estes doutrinadores da corrupo, estes cardeais, estes papas e toda esta bicharada da Sodoma romana, que leva toda Igreja putrefao? Por que no lavamos as nossas mos no sangue dele? (Corresp. III. 73. jan. 1521). O dominicano inquisidor Jacques von Hostraten no melhor acolhido. Na expresso de Lutero, ele um assassino, doido e sanguinolento, que no pode ser saciado seno pelo sangue dos cristos... deve procurar besouros nas estrumeiras, em vez de cristos, at aprender o que pecado, erro e heresia... pois, continua o monge furibundo, nunca vi maior burro do que tu... s uma cabea cega, tapada; tu, co raivoso... inimigo da verdade, herege, pois trazes em ti mais veneno o que todos os hereges deste ltimos 4.000 anos (Obras Lutero, Weimar II. 384). As universidades de Lovaina e de Colnia no escaparam sanha furibunda do reformador. Segundo o costume daqueles, haviam se pronunciado contrrias a certas asseres do professor de Wittemberg. Este lhes respondeu logo: Enquanto no me tiverdes refutado, ligo tanto s vossas condenaes, quanto me importo com as blasfmias de uma mulher bbada! (Obras Weimar VI. 157). Em uma carta a seu amigo Spalatino, trata estes doutores de asnos de Lovaina e de Colnia. Em 1518, Lutero exclama com razo: Eu sou completamente o homem das disputas, sou segundo as palavras de Jeremias, o homem da discrdia (Grisar I. 340).

7. CONCLUSO Eis como Lutero entrou em cena. V-se logo no ser um reformador desejoso de extirpar abusos e de reconduzir os homens prtica de virtudes que tinham abandonado. um homem, s confiante em seu prprio valor e na sua personalidade, orgulhoso ao ponto de preferir as sua opinies s do mundo inteiro; um esprito irrequieto cata de novidades, ou, como vimos no comeo, um homem obsesso por uma idia fixa, que pretende impor-se a todos. Numa palavra, um anormal, doente, uma espcie de nevropata. Se, neste tempo, houvesse existido o espiritismo, de presumir se houvesse Lutero lanado, de corpo de alma, nas prticas espritas, sem pensar na fundao de uma seita hertica. s pessoas sensatas pergunto se tal pode ser a disposio, o modo de agir, as pretenses de um reformador de religio, de um homem escolhido por Deus, como dizem os protestantes, para reconduzir a Igreja verdadeira pureza de seus princpios e das suas doutrinas. impossvel. O simples bom senso protesta contra a assero crentista. O reformador de uma religio divina devia ser pelo menos, um homem de virtude, calmo, prudente; Lutero, no entanto, se apresenta como um vulgar insultador, insolente, grosseiro, indecente e, muitas vezes grotesco. Atravs de sua vida, de suas palavras e atos, sente-se unicamente a paixo, o orgulho, a sensualidade, o esprito de revolta. Lutero, pela doutrina, o fundador do protestantismo; pelos atos, o fundador da mentalidade comunista-revolucionria. Convinha salientar bem esta primeira fase da vida pblica de Lutero, pois ela constitui, com os seus preldios j expostos, as premissas das inmeras concluses que, em breve, seremos impelidos a extrair desta vida agitada e tristemente fecunda.

CAPTULO V A CONDENAO DE LUTERO Mesmo com todas as suas fanfarronadas e provocaes, o reformador senti-se inquieto. Aps se rebelar contra a Igreja, recorreu ajuda dos grandes do seu tempo.

Em data de 23 de outubro de 1520 escreveu ao imperador Carlos V, dizendo-se desejoso de comparecer perante ele, COMO UMA PULGA perante o rei dos reis, soberano universal. Contra o meu querer, acentuou ele em sua carta, apresentei-me publicamente em cena; se cheguei a escrever algo, foi porque outros a isto me obrigaram pela fora ou pelo embuste; jamais aspirei por outra coisa seno solido da minha cela... Mas h quase trs anos estou exposto ao dio dos outros, entregue a toda espcie de zombarias e perigos. Em vo imploro me perdoem; em vo prometo calar-me; em vo ofereo as condies de paz; em vo espero melhores instrues para mim.; lana-se todos sobre mim, com o fito de destruir o Evangelho inteiro.

E, em situao tal, suplicava Lutero autoridade civil o defendesse, no a ele, desamparado e prostrado por terra, mas ao tesouro da verdade...

Eis o pai dos protestantes, o sublime Lutero implorando, submisso e cheio de bajulao, a proteo dos potentados da terra. Em suas expresses sente-se a hipocrisia do herege, a obsesso do doente, e, sobretudo, o remorso duma conscincia que no cala. Em cartas subsequentes, segundo as circunstncias, chegou ele a atacar o poder, abandonando a sua situao de POBRE PULGA, para se transformar num TIGRE FURIOSO, pretendendo assaltar a Igreja e a sociedade, e tudo destruir e esmagar. Percorramos a vida de Lutero, nesta nova fase.

1. O DESESPERADO Sobre a sua cabea em ebulio Lutero sentiu pesar a excomunho da Igreja. Como j ficou dito atrs, pressentiu ele, antes de tudo, ser-lhe urgente destruir na opinio pblica o receio provocado por aquele castigo oficial e supremo da autoridade. Para lograr o seu intento, comeou, ento, a pregar abertamente contra a mencionada pena, apresentando-a, no como temvel, mas propalando-a desejvel. Tal castigo, exclamou ele, no separa da comunho dos cristos; antes, de grande mrito perante Deus que abenoa duplamente ao que vem a falecer nesta injusta maldio. No entanto, malgrado bravatas deste porte, Lutero padecia de terrvel inquietao. As universidade de Lovaina e Colnia se declararam contra ele, enquanto o processo correia. O Dr. Eck reunira os documentos da discusso de Leipzig, com outras provas de heresias, e levara tudo a Roma. Exasperado, Lutero escreveu ento um panfleto incendirio, dirigido nobreza alem, tratando dos melhoramentos do estado cristo. Em termos furiosos ele exps como, a seu ver, o papado pecou contra a nao germnica e contra a Igreja. Em 25 captulos abordou ele o assunto dos abusos eclesisticos, j por outros apontados com mais calma e ponderao (*). Afinal, era um simples plgio. Ao finaliz-lo, fervendo em dio e sedento de vinganas, levantou os olhos ao cu, e exclamou: Cristo, meu Senhor, olhai para a terra, fazei raiar o ltimo dia e destru o ninho diablico de Roma. Estava lanada a declarao de guerra, com que pretendia lrevoltar o povo alemo em peso contra a Igreja de Cristo. ------------(*) - Gravamina: Onus Ecclesiae; Perstinger: De planctu Ecclesiae; De runa Ecclesiae, etc... 2. NOVAS DOUTRINAS HERTICAS Logo se ps Lutero a fabricar um tratado DOUTRINAL da sua reforma, justificando que, assim como outrora haviam os judeus sido libertados da escravido por Moiss, iria ele, ento, livrar os povos cristos da servido babilnica. O novo libelo foi intitulado: Da escravido babilnica; nesta exposio Lutero liquidou completamente com o Papa, com a hierarquia e com a Igreja visvel. Lutero reduziu a trs os

sacramentos: batismo, confisso e ceia, considerando os dois ltimos como uma coisa grotesca, sem carter obrigatrio. Falando sobre a Eucaristia, ensinava que na Sagrada Hstia no permaneciam apenas as aparncias, mas at a prpria substncia do po, de sorte que no h propriamente a TRANSUBSTANCIAO ou mudana da substncia de po na do corpo de Jesus Cristo, como o ensina a Igreja, mas se d uma espcie de empanao em virtude da qual a substncia do corpo de Nosso Senhor est presente na hstia consagrada, conjuntamente com a substncia do po, o que se poderia chamar: consubstanciao ou duas substncias sob uma s aparncia. Conforme a nova doutrina, a Santa Missa no mais um sacrifcio; o direito de impor mandamentos ou fazer votos ope-se liberdade eclesistica; o celibato deve desaparecer e a Igreja, com suas prescries a respeito do matrimnio torna-se culpada de adultrio. O contedo deste novo Evangelho pode resumir-se nestas palavras do reformador: Nem o Papa, nem o Bispo, nem homem algum tem direito de impor a um cristo uma vgula sequer, sem que este o consinta Como patente, tal modo de falar traz completa destruio de toda autoridade, a anarquia no governo e a rebelio no povo. Lutero no raciocina mais. um msero possesso ou, melhor, um desequilibrado.

3. A BULA DE CONDENAO Era tempo de agir, p0ois no havia mais esperana de pacificao. Lutero queria a guerra. Em fins de abril de 1520 uma Comisso de Cardeais e telogo, presidida pelo Papa Leo X, redigiu a Bula de condenao, publicada em 15 de junho do mesmo ano. a Bula: EXURGE, DOMINE, composta de trs partes; a primeira tratando dos ERROS; a segunda dos ESCRITOS e a terceira, da PESSOA do excomungado. Em 41 asseres foram compreendidos os erros do herege, acerca da justificao e da autoridade da Igreja. Sobre os escritos herticos ficou declarado deverem ser queimados em toda a parte onde houvessem sido difundidos. Quanto pessoa de Lutero, a Santa S no promulgava ainda castigo algum, desejando deixar-lhe tempo e oportunidade de reconhecer os erros e poder retrat-los. O aviso do Pontfice paternal e conciliador; sem razo que os protestantes reclamam contra a aspereza do tom desta Bula. Eis o que disse Leo X neste documento: Tomando como exemplo a vontade de Deus que no quer a morte do pecador, mas que se converta e viva, ns queremos esquecer todos os insultos lanados contra ns e contra a S Apostlica. Estamos resolvidos a exercer a maior indulgncia possvel, e, enquanto depende de ns, levaremos a coisa de maneira tal que o culpado se levante, se converta de corao e retrate os erros indicados e que, voltando ao seio da Igreja, tal o prdigo do Evangelho, possamos receb-lo com alegria. Avisamos, pois, ao culpado e aos seus partidrios de todo o corao, pelo amor e misericrdia de Nosso Senhor Deus e pelo sangue de Nosso Senhor Jesus Cristo, por quem foi resgatada a humanidade e confirmada a Igreja, e os conjuramos a desistirem de perturbar a paz, a unidade e a verdade da Igreja, pelos erros perversos que vo espalhando.

Mostrando-se obedientes, eles encontraro em ns copioso amor paternal, e braos abertos pela generosidade e a mansido. Que distncia no vai entre esta linguagem paternal, calma e ponderada do Chefe da Igreja, e os brados rancorosos, odientos e sanguinrios do monge rebelde! Algumas expresses extradas da Sagrada Escritura e ainda outras em uso naquele tempo no apenas frmulas comuns de casos semelhantes, sem serem a expresso dos sentimentos do Papa. A promulgao desta Bula foi confiada ao Dr. Eck, o conhecido adversrio resoluto das inovaes de Lutero. Tal escolha agradou aos catlicos, mas irritou aos partidrios do erro que viram nisto uma espcie de provocao. O Dr. Eck encontrou srias dificuldade para promulg-la, devido ao estado de irritao entre o povo de seu pas. Vrias universidades, como as de Leipzig, Wittemberg, Erfurt e Viena, promulgaram a Bula aps longo demora. Vrios bispos, receosos de oposio, no a publicaram logo. Tal demora e este medo nos mostram que bom nmero de catlicos e mesmo autoridades no compreendiam ainda o perigo representado pelos novos ensinos e pelas revoltas do frade apstata. Julgando pacificar os nimos pela pacincia, deixaram o erro penetrar no esprito do povo que, sem dar ouvidos a vozes contrrias, abraou o erro como se fosse a verdade, tornando-se, deste modo, protestante sem o perceber.

4. OS INSULTOS DE LUTERO No foi possvel Lutero esperar proteo do imperador Carlos V, que era religioso demais para dar passaporte a um inimigo da Igreja, porm podia contar com o prncipe Frederico de Saxe para proteg-lo, caso o atingisse a excomunho. Primeiramente fingiu no acreditar na Bula e divulgou o boato de ser ela arranjo e obra do Dr. Eck; em conseqncia, pretendera insultar o Papa na pessoa de Eck, em fez de faz-lo diretamente. So Bulas e mentiras de Eck, falava ele. Era-lhe, porm intil sustentar por longo tempo este fingimento, e, no podendo mais conter o seu dio, externa-o em novo escrito: Contra a Bula do Anticristo(*) publicado em novembro de 1520. Neste novo pasquim diz o herege que a sua doutrina a nica verdadeira e, por isso, esta Bula pretende obrig-lo a renegar a Deus e adorar o demnio. O Papa e os Cardeais, diz ele, devem provar as suas afirmaes, seno serei coagido a considerar a Santa S como a sede do Anticristo, condenando-a e entregando-a a Satans, com esta Bula e todas as suas decretais. O pseudo-reformador parece antes uma possesso do que um homem equilibrado. Dirigindo-se ao