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O FENÔMENO JURÍDICO N’A CRÍTICA DA FILOSOFIA DO DIREITO DE HEGEL THE RIGHT IN THE CRITICAL PHILOSOPHY OF THE RIGHT OF HEGEL Éder Ferreira Alaerte José Barbosa Júnior RESUMO O presente projeto de pesquisa situa-se no campo dos fundamentos do direito, pois pretende localizar n’A Crítica da Filosofia do Direito de Hegel, de Karl Marx, uma teorização do fenômeno jurídico. Trata-se de pesquisa exploratória, quanto aos objetivos, e de pesquisa bibliográfica, quanto às fontes e aos procedimentos de coleta de dados. Como fonte de pesquisa será utilizada, pois, A Crítica da Filosofia do Direito de Hegel produzida pelo jovem Marx. A análise da fonte consistirá em revisão teórica centrada na categoria “direito”. Espera-se, com a realização da pesquisa, a produção de conhecimento novo quanto à teoria sociológica do direito que servirá de embasamento para futuras pesquisas, sobretudo na sub-área da Sociologia Jurídica. PALAVRAS-CHAVES: DIREITO, PODER SOBERANO, CONSTITUIÇÃO, ESTADO, MARXISMO. ABSTRACT This research project is situated in the grounds of the law, because you want to find n'a Critique of Hegel's Philosophy of Law, in Karl Marx, a legal theory of the phenomenon. It is exploratory research, about the goals, and bibliographic research on the sources and procedures for data collection. As a source of research will be used, because, A Critique of Hegel's Philosophy of Law produced by the young Marx. The analysis of the source is focused on theoretical review of "right." It is hoped the completion of the research, production of new knowledge about the sociological theory of law that serves as a basement for future research, especially in sub-field of legal sociology. KEYWORDS: LAW, SOVEREIGN POWER, CONSTITUTION, STATE, MARXISM. 1 INTRODUÇÃO 4932

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O FENÔMENO JURÍDICO N’A CRÍTICA DA FILOSOFIA DO DIREITO DE HEGEL

THE RIGHT IN THE CRITICAL PHILOSOPHY OF THE RIGHT OF HEGEL

Éder Ferreira Alaerte José Barbosa Júnior

RESUMO

O presente projeto de pesquisa situa-se no campo dos fundamentos do direito, pois pretende localizar n’A Crítica da Filosofia do Direito de Hegel, de Karl Marx, uma teorização do fenômeno jurídico. Trata-se de pesquisa exploratória, quanto aos objetivos, e de pesquisa bibliográfica, quanto às fontes e aos procedimentos de coleta de dados. Como fonte de pesquisa será utilizada, pois, A Crítica da Filosofia do Direito de Hegel produzida pelo jovem Marx. A análise da fonte consistirá em revisão teórica centrada na categoria “direito”. Espera-se, com a realização da pesquisa, a produção de conhecimento novo quanto à teoria sociológica do direito que servirá de embasamento para futuras pesquisas, sobretudo na sub-área da Sociologia Jurídica.

PALAVRAS-CHAVES: DIREITO, PODER SOBERANO, CONSTITUIÇÃO, ESTADO, MARXISMO.

ABSTRACT

This research project is situated in the grounds of the law, because you want to find n'a Critique of Hegel's Philosophy of Law, in Karl Marx, a legal theory of the phenomenon. It is exploratory research, about the goals, and bibliographic research on the sources and procedures for data collection. As a source of research will be used, because, A Critique of Hegel's Philosophy of Law produced by the young Marx. The analysis of the source is focused on theoretical review of "right." It is hoped the completion of the research, production of new knowledge about the sociological theory of law that serves as a basement for future research, especially in sub-field of legal sociology.

KEYWORDS: LAW, SOVEREIGN POWER, CONSTITUTION, STATE, MARXISM.

1 INTRODUÇÃO

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O alemão Karl Heinrich Marx (1818 – 1883) foi o pensador mais influente da modernidade.[1] Ao lado de Friederich Engels (1820 – 1903), erigiu uma obra grandiosa voltada para a análise, a crítica e a transformação radical da sociedade capitalista. Ao romper com a tradição meramente discricionária do pensamento filosófico e inaugurar a escola crítica, Marx exerce uma ascendência moral e intelectual ímpar no pensamento ocidental.[2] A influência definitiva, direta e poderosa deste pensador sobre a humanidade pode ser percebida no caráter científico e histórico que assumiu o socialismo romântico e utópico da primeira metade do século XIX e na práxis crítica e transformadora do pensamento filosófico e social originários das contribuições deste profícuo filósofo.

Não obstante sua monumental contribuição, “Marx é tomado por muitos como um anátema, sem se dar conta da profundidade e da genialidade de sua interpretação a respeito de nossos tempos, quiçá de um modo como nenhum outro pensador da contemporaneidade tenha alcançado”. (MASCARO, 2007, p. 96)

Seja por “uma série de preconceitos forjados por desconhecimento ou por uma espécie de repulsa intrínseca às implicações de seu modo de entender o mundo” (Ibidem, p. 96), é fato que Marx vem sendo reiterada e sistematicamente ignorado e vilipendiado pelo senso comum e pela academia, sobretudo nos âmbitos da filosofia e do direito.

Então, esta pesquisa, exploratória quanto aos objetivos, e bibliográfica quanto às fontes e aos procedimentos de coleta de dados, situada no campo dos fundamentos do direito, ambiciona buscar na obra da juventude marxiana uma teorização do fenômeno jurídico. A Crítica da Filosofia do Direito de Hegel[3] constituiu fonte de pesquisa para análise textual centrada na categoria “direito”.

É evidente que o problema levantado anteriormente não é equacionado pela realização deste esboço, que pretende apenas contribuir – ainda que de maneira modesta – para a proposta, mas como disse Fernando Pessoa “O esforço é grande e o homem é pequeno [...] da obra ousada, é minha a parte feita.”

Além do anteriormente posto, este se justifica quanto à sua relevância para o direito e para as profissões jurídicas no que diz respeito à possibilidade de apresentação de resultados positivos decorrentes de uma práxis profissional alternativa à concepção positivista, o que pode auxiliar o processo de reconstrução do judiciário e do ensino e da educação jurídica superior. Para a comunidade poderá explicitar a importância da concepção marxiana do direito no enfretamento das questões do cotidiano, assim como para a formação de uma nova cultura jurídica, a partir da crítica da realidade social, uma vez que os direitos estão pré-figurados nas demandas sociais (COUTINHO, 2005). E por fim, para a ciência, será construído conhecimento novo, isto é, fidedigno e relevante teórica e socialmente (LUNA, 2002), já que A crítica não constitui texto sobre o qual se convergem os esforços da ciência jurídica.

2 O JOVEM MARX

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Como pensador holístico, na busca da apreensão total da realidade, Marx realizou incursões pela filosofia, sociologia, psicologia, história, antropologia, economia e direito. Para compreender o enorme alcance do pensamento deste influente alemão é necessária, segundo Lukacs, a análise tanto da fisionomia espiritual quanto dos “momentos históricos relevantes no processo de desenvolvimento do jovem Marx.” (LUKACS, 2007, p. 123) Este filósofo húngaro assevera que “foram poucas as personalidades de importância histórica em face das quais se pode constatar, como é o caso em Marx, uma tão estreita coincidência do desenvolvimento individual e do desenvolvimento global da sociedade”. (Ibidem, p. 122)

Ainda no esteio de Lukacs, no período de formação de Marx (1840 a 1844), “o processo de superação do hegelianismo e do próprio Feuerbach, com a conseqüente fundação da dialética materialista, coincidiu passagem das posições democrático-revolucionárias a um socialismo consciente.” (Ibidem, p. 122)

Isto só foi possível devido à manifestação concomitante e não casual de características intelectuais imanentes a Marx, tais como impulso de apropriação e de reelaboração dos resultados científicos da época, atitude crítica inigualável, determinação e rigor ímpares, aspiração à universalidade e um desejo fáustico de apreender os fenômenos em sua totalidade. Estas características foram desenvolvidas (de maneira absurdamente precoce e estão inexoravelmente associadas às condições políticas da Alemanha) ao mesmo tempo em que Frederico Guilherme IV ascendia ao trono prussiano e iniciava uma virada em sentido reacionário-romântico na política interna, fomentando o quadro político e ideológico necessário às primeiras manifestações do movimento operário e revolucionário alemão. (Ibidem, p.122.)

É interessante observar como todo esse processo deu-se no interior do pensamento alemão. Desde a apropriação da dialética idealista de Hegel – através do contato com a esquerda hegeliana – à sua superação e reformulação crítica, até a inversão materialista sob influência de Ludwing Feuerbach[4], culminando na superação também do materialismo metafísico deste. Em traços fundamentais, esta é a linha evolutiva seguida por Marx desde seu jovem hegelianismo até a fundação do materialismo histórico e dialético.

Tendo em vista que o objeto deste estudo é o fenômeno jurídico n’A Crítica da Filosofia do Direito de Hegel, segue um sucinto histórico do jovem Marx até 1843, ano de redação da obra em questão.

Karl Marx nasceu em 15 de maio de 1818, em Tréveris. Filho de Heinrich Marx, advogado protestante de origem judia e iluminista fervoroso, inclinou o filho à carreira jurídica e incitou-lhe o gosto pela política e pelas leituras de Rosseau, Voltaire, Kant e Fitch, que influenciaram Karl até 1836, ano da mudança da Universidade de Bonn para a de Berlim. É em Berlim que o jovem Marx toma contato com a filosofia de Hegel, entende as vantagens deste pensamento em detrimento do idealismo subjetivo de Kant e Fitch, tornando-se membro da Associação dos Jovens Hegelianos[5]. Foi ao estudar o pensamento de Hegel que Marx certificou-se do atraso das relações políticas alemãs quando comparadas à França e a Inglaterra.

Após graduar-se em Jurisprudência, Marx obtém, em 1841, doutorado em Filosofia pela Universidade de Iena, ao defender tese sobre as Diferenças das Filosofias da Natureza

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em Demócrito e Epicuro[6]. Apesar da abordagem, ainda idealista, este trabalho é marcado pela genialidade do resultado. Tanto que Marx, já maduro, em correspondência com Ferdinand Lassalle, datada de 1858, julga correta tanto as linhas fundamentais de sua tese e o método nela para abordar os problemas histórico-filosóficos, quanto, em particular, a exposição da teoria geral de Epicuro. (Ibidem, p. 124)

Neste lento e laborioso escrito[7] já era possível perceber, mesmo no influxo do idealismo, o distanciamento e a diferenciação do jovem Marx em relação a Hegel e aos jovens hegelianos[8] (e no caso destes, a evidente superioridade de Karl). E também, a forma incipiente do que viria a ser o seu projeto filosófico transformador.

Além da riqueza conceitual e profundidade do arcabouço teórico, Marx era superior aos hegelianos de esquerda “sobretudo, por que ia muito além deles na questão decisiva para o desenvolvimento ideológico da Alemanha na época, ou seja, na crítica da filosofia de Hegel.”(Ibidem,p. 124) Marx não compartilhava da posição generalizada dos jovens hegelianos que distinguiam o Hegel esotérico (que veladamente teria sido ateu e revolucionário) do exotérico (que teria sido submisso ao poder político)[9].

Apesar de reconhecer a importância desta distinção no desenvolvimento radical do pensamento hegeliano, Marx a considera superficial, não atingindo o cerne da questão. Ele concebe esta insuficiência como transitória, um momento necessário da passagem histórica. Para este,

em seu idealismo e no caráter metafisicamente fechado de sua sistematização, estavam previamente contidas as premissas que havia tornado possível a acomodação de Hegel diante do Estado reacionário prussiano, ou melhor, que se a tinham tornado necessária precisamente em virtude da própria essência de seu sistema filosófico.( Ibidem. p. 124)

Ao não se colocar de maneira acrítica diante de Hegel, como faziam os jovens hegelianos[10], Marx vai muito além de iniciar o cisma que culminaria em obras como A Questão Judaica[11] e A Sagrada Família[12]. Nesse momento surge o núcleo, ainda que rudimentar, da posterior superação de Hegel e seu idealismo objetivo. Em Diferenças a crítica de Marx a Hegel não está voltada contra o centro do pensamento deste, mas para certos aspectos da concepção hegeliana da história.

Além da crítica à escusa de Hegel diante da situação política prussiana de sua época, Marx distancia-se daquele na exposição da filosofia de Epicuro. Se para o velho mestre de Berlim, devido as suas reservas ao materialismo, o epicurismo foi um momento de importância secundária para o desenvolvimento da filosofia helenista e a doutrina atomista de Epicuro em nada acrescentara à de Demócrito, para o jovem Marx, despido de qualquer repulsa herdada do mestre, considera Epicuro uma mente esclarecida, que como ateu libertou o homem do temor irracional aos deuses.

A grande contribuição do jovem Marx à história da filosofia foi ter (re)colocado Epicuro, e principalmente, a tradição materialista em seu devido lugar. E mais que isso

A avaliação da diferença entre Demócrito e Epicuro é um passo importante na direção da superação do materialismo metafísico, na medida em que, pela primeira vez, tenta-se

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apreender os primeiros elementos dialéticos na própria tradição materialista, bem como formular uma concepção universal da história que se diferencia radicalmente da visão hegeliana. (Ibidem, p. 129)

Em Diferenças, Marx também lança o embrião de seu projeto: alçar a filosofia a instrumento transformador da realidade, como reação ao que considerava os desenlaces débeis de até então. Como se lê em uma passagem de sua tese:

O que era luz interior se desenvolve em chama que devora e se dirige para o exterior. Disse decorre que a transformação do mundo em filosofia é, ao mesmo tempo, uma transformação da filosofia em mundo; que a sua realização é, ao mesmo tempo, sua perda; que aquilo que ela combate fora de si é sua própria deficiência interna [...]. Libertando o mundo da não-filosofia, os filósofos se libertam da filosofia que, como sistema determinado, os havia aprisionado. (MARX, apud Lucaks, 2007. p. 131)

Entre a conclusão da tese (em abril de 1841) até sua admissão na Gazeta Renana (em outubro de 1842) como redator, Marx intensifica sua produção filosófica e jornalística, tendo contribuído em publicações de Bauer[13] e Ruge[14]. É nesse período que Marx tem seu primeiro contato com o materialismo na tradição do pensamento alemão, ao ler A essência do cristianismo[15] de Feuerbach, e de imediato esboça a superação deste, quando cogita estender a crítica iniciada em Diferenças, aos “aspectos especificamente políticos do sistema hegeliano, em particular à filosofia do direito e do Estado.” (Ibidem p. 133) Dessa amálgama entre a identificação com o materialismo de Feurbach e a intenção de criticar os aspectos jurídicos e políticos do pensamento hegeliano nasce o impulso que levará Marx, de forma inexorável, a fundar o materialismo histórico.

Após Bruno Bauer ser expulso da cátedra de Teologia da Universidade de Bonn acusado de ateísmo, Marx se vê virtualmente impedido do magistério, por ser conhecido como colaborador daquele. Então, o futuro fundador do socialismo científico volve seus interesses para a atividade jornalística e nos primeiros meses de 1842 ingressa na Gazeta Renana de Política, Comércio e Cultura[16], da qual viria a ser diretor em outubro do mesmo ano.

Devido à Gazeta, os propósitos filosóficos do jovem Marx são temporariamente adiados. Mas em contrapartida, esta experiência permite a Marx envolver-se de modo imediato com os acontecimentos políticos do Vormärz[17], que catalisam seu desenvolvimento filosófico. Outros acontecimentos importantes do período são o acirramento das divergências com os jovens hegelianos e o início da amizade entre Marx e Engels que se conhecem durante uma visita deste ao jornal.

Mesmo não tendo completado 25 anos, e ainda não ter desenvolvido a consciência social e revolucionária, Marx já exibia como diretor da Gazeta excepcional maturidade política e tentava através desta “realizar a unificação de todas as forças progressistas alemãs, numa ampla oposição, profundamente enraizada na vida nacional, contra o regime reacionário de Frederico Guilherme IV, com o objetivo de liquidar radicalmente o absolutismo alemão.” (Ibidem, p. 133)

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Isto se evidencia em um editorial no qual Marx atribui como tarefa principal do jornal renano “deslocar para a Alemanha os numerosos olhares fixados na França e fazer assim nascer um liberalismo alemão e não francês.” (MARX, apud Lukács, 2007. p. 133)

Esta proposta de integrar todos os elementos progressistas alemães na luta contra o absolutismo, leva Marx a se chocar com os seus antigos colegas de Berlim, principalmente Bruno Bauer. Marx acusava os jovens hegelianos de flertarem levianamente com o socialismo, sobre o qual ainda não tinha uma posição definitiva, afastando as pessoas sérias da batalha prática contra o regime reacionário e expondo o jornalismo progressista, que já sofria duras e sistemáticas perseguições, ao risco da proibição. Também censurava o fato do grupo ater-se à crítica da religião e a dispersão do ateísmo, escusando-se da luta central contra o absolutismo feudal.

Embora tenha sido incansável na luta contra a censura prussiana, tenaz na propaganda progressista, habilidoso e inventivo como diretor-redator, tendo dito “as coisas mais radicais [...] sem despertar a atenção da censura” (Ibidem, p. 135), Marx esbarrou na pressão do governo, nas ameaças de proibição do jornal e na escassa propensão dos acionistas patrocinarem sua causa. Então, em março de 1843 Marx demite-se da Gazeta Renana, que é fechada no mesmo ano.

Neste período, merece destaque a luta que Marx travou contra o romantismo reacionário de Frederico Guilherme IV em favor das massas populares oprimidas. Como democrata radical, já se manifestava de modo evidente que a concepção do Estado e do direito do jovem, e ainda idealista, Marx era oposta à defendida por Hegel.

Com a saída da Gazeta Renana, Marx muda-se para Paris em 1843. Lá edita junto com Ruge os Anais Franco-Alemães[18], publicação que inclui duas obras fundamentais da juventude marxiana: A Questão judaica e A Crítica da filosofia do direito de Hegel.

3 CRÍTICA DA FILOSOFIA DO DIREITO DE HEGEL

Antes de rumar para a França, Marx dedica-se ao que chamou de “estudos de gabinete” entre março e agosto de 1843. É durante este lapso que ele retoma o projeto concebido um ano antes, de realizar a crítica da filosofia do direito e do Estado de Hegel. Então, Marx debruça-se sobre a mais importante e representativa obra política hegeliana: Filosofia do Direito[19].

As implicações políticas do pensamento de Hegel expressavam o espírito de uma época e de uma nação: o projeto prussiano de liderar os estados alemães. O hegelianismo constituía os fundamentos de um Estado como efetivação do conceito. É neste contexto que Hegel, com sua Filosofia do Direito – corolário de seu pensamento político – surge como elemento de síntese entre a filosofia e as aspirações alemãs.

Esse tratado ético-político é um clássico do pensamento ocidental, e era inicialmente, um compêndio para acompanhar as lições de Hegel. Seu tema central está relacionado à efetivação do plano da liberdade como dimensão do direito no sentido da eticidade (HARTMANN apud Trotta, 2004, p. 26), em que o Estado assume a instância universal

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de superação de todas as particularidades. Deste modo, “o Estado hegeliano tem em si a idéia de representar a totalidade político-social, de encerrar em si o mundo público e o mundo privado”. (TROTTA, 2004, p. 26) Esta afirmação parte da aceitação do pressuposto de que tudo que é efetivo é racional, e de que o real se efetiva no racional. É sobre este aspecto político da doutrina de Hegel, que o mais talentoso hegeliano de esquerda, iniciará sua penetrante crítica ao sistema hegeliano e sua dialética idealista.

Em correspondência com Ruge, Marx revela que o objeto central do exame de Hegel será a natureza híbrida da monarquia constitucional, assevera ainda que este “promoveu uma tal inversão na ordem sujeito-predicado, que acabou subordinando a existência do real ao plano lógico, isto é, o objeto surgido a partir do pensamento enquanto instância necessária” (TROTTA, 2004, p. 55). Em outra carta ao mesmo, Marx vê no “tom de Bauer”[20], um “gravoso aprisionamento no modo hegeliano de exposição” (apud LUKÁCS, 2007, p. 141). Destarte, era nítido que Marx já havia superado definitivamente o jovem hegelianismo – para esta corrente importava a exposição do lado revolucionário esotérico de Hegel – e que iria ao fundo da questão, e numa crítica revolucionária exporia as contradições principiológicas da filosofia hegeliana. Esta idéia remeta a reserva expressa em Diferenças sobre as razões da acomodação exotérica de Hegel.

A motivação de Marx é a mesma da época da Gazeta: “a luta contra a reação prussiana, contra o regime de Frederico Guilherme IV[...], o desmascaramento daquele romantismo falso sob cuja bandeira a reação na Prússia cometia os seus mais odiosos crimes.” (LUCÁKS, 2007, p. 131) Para Marx a dialética e o sistema hegeliano “acarreta uma aprovação de, ou ‘reconciliação’ com, o status quo” (INWOOD, 1997, p. 148) da monarquia constitucional prussiana. Contudo, após a experiência jornalística e a analise crítica do sistema, ainda como democrata radical, Marx retoma seu projeto sob um prisma muito mais amplo, o “centro de seu interesse [é] o problema crucial da filosofia hegeliana do direito, ou seja, a relação entre sociedade civil-burguesa e Estado.” (LUKÁCS, 2007, p. 142), não mais alguns aspectos, mesmos que representativos, da concepção histórica de Hegel.

Marx atinge um ponto qualitativamente novo em relação a Hegel, como afirma Lukács “os escritos da primavera e do verão de 1843 não representam mais apenas um desenvolvimento radical, mas uma crítica de princípio, que aponta para uma inversão da filosofia hegeliana do direito e [...] da filosofia hegeliana em geral.” (Ibidem, p. 142) O fator decisivo que permite Marx superar suas críticas anteriores a Hegel – tornando uma retomada ampla sobre concepções antigas em uma nova formulação – é a passagem definitiva ao materialismo.

Se a metodologia empregada nos artigos da Gazeta é essencialmente dialética idealista, embora desenvolvida numa perspectiva democrático-revolucionária, e se o contato com A essência do cristianismo significou somente uma adesão genérica às concepções materialistas, ao retomar a crítica a Hegel, Marx o faz sob a influência das Teses provisória para a reforma da filosofia[21] de Feuerbach, obra em que “desmascara os sistemas panteístas construídos a partir de Spinoza e, em particular, o idealismo objetivo de Hegel, que ele considera a última encarnação da teologia, camuflada de filosofia” (Ibidem, p 143.). Assim, Feuerbach demonstra que seres metafísicos superiores constituem alienação da natureza humana, e afirma nestas Teses

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Do mesmo modo como a teologia cinde o homem e o aliena de si, para depois mais uma vez identificá-lo com este ser alienado, também Hegel divide e decompõe em muitas partes a essência simples e idêntica a si mesmo da natureza e do homem, para depois buscar uma mediação forçada entre aquilo que ele havia forçadamente separado (FEUERBACH, apud Lukács, 2007, p. 143)

Atormentado pela lógica especulativa hegeliana – que até então se passava por dialética, Feuerbach nega as premissas desta, e declara que o Espírito Absoluto de Hegel não passa do “espírito finito, abstrato, alienado de si mesmo, tal como o ser infinito da teologia não é outra coisa que o ser abstrato e finito”. (FEUERBACH, apud Lukács, 2007. p.143) Dessa forma concluía que “quem não renuncia à filosofia de Hegel não renuncia a teologia [...]. Todas as ciências devem buscar seu fundamento na natureza. Uma doutrina permanece mera hipótese enquanto não for encontrada sua base na natureza [...]. A filosofia deve de novo unir-se à ciência natural, assim como esta deve unir-se à filosofia”. (FEUERBACH, apud Lukács, 2007, p. 143)

Teses marca a adesão definitiva do jovem Marx à tradição materialista. A influência do pensamento de Feuerbach, o materialismo da existência como crítica ao pensamento especulativo de Hegel, facultou a Marx um rico material de possibilidades teóricas dentre elas a preocupação em colocar o homem como centro de sua ação, como determinação de si (concepção antropológica de Feuerbach) e o conceito de alienação como aquilo que retira do homem o seu sentido de humanidade e pensar sobre si mesmo. Entretanto, Marx faz uma significativa ressalva aos aforismos de Feuerbach. Para ele, este se referia excessivamente à natureza e muito pouco à política (em carta de Marx a Ruge apud Lukács, 2007, p. 143). Pois para Marx a filosofia efetiva-se não na natureza, mas na política. Como de forma arguta assinala Trotta “O interessante é que o pensamento de Feuerbach contesta um absoluto que por sua vez institui um outro só que diferente, não o absoluto da lógica do pensamento, mas do sensível, do imediato, da intuição.” (TROTTA, 2004, p. 61)

No âmago de sua concepção filosófica e do intuito de criticar a filosofia hegeliana do direito, Marx, trazia a superação de Feuerbach[22], ou seja,

a extensão da crítica materialista à doutrina hegeliana da sociedade, a ampliação explicação materialista do mundo da natureza às relações sociais, a passagem da crítica da religião à crítica da política, a superação da concepção antropológica abstrata do homem própria de Feuerbach, e [...] a criação da dialética materialista como metodologia como metodologia e concepção do mundo. (LUKÁCS, 2007, p. 144)

A inversão do método filosófico-especulativo pelo filosófico-histórico foi uma grande revolução dentro da filosofia e algo essencialmente novo. Isto só foi possível pela abordagem crítica de Marx a seus precursores imediatos: Hegel e Feuerbach.

O fundamento do distanciamento de Feuerbach e suas Teses é a experiência adquirida por Marx na batalha jornalística, sob a égide domocrática-revolucionária, contra o absolutismo. Os acontecimentos do Vörmaz permitiram a superação de Feuerbach, que

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por falta de orientação política apegava-se a construções idealistas no referente às questões sociais. Marx rejeita o único aforismo político de Feuerbach “O soberano deve representar indistintamente todos os estamentos, já que, diante dele, todos são igualmente necessários e todos têm os mesmos direitos. O soberano é o representante do homem universal” (FEUERBACH, apud Lukács, 2007, p. 144), porque este representava uma regressão em relação a Hegel, no sentido da abstratividade do sollen[23] kantiano-fichteano.

Indubitavelmente, Hegel e Feuerbach encontravam-se no caminho do progresso. O primeiro, “embora de maneira mistificada e com base no idealismo absoluto que distorce os problemas reais, já havia afirmado o conceito de necessidade e legalidade histórica e havia intuitivamente descoberto e explicitado características importantes da sociedade burguesa.” (Ibidem, p. 145). Enquanto o segundo iniciou a tradição materialista no pensamento alemão e evidenciou o erro metodológico de Hegel, ou seja, “inverter arbitrariamente a relação entre sujeito e predicado, manifestando desprezo pelas conexões reais.” (Ibidem, p. 146).

“A verdadeira relação entre pensamento e ser só pode esta: o ser é o sujeito, o pensamento é o predicado. Portanto, o pensamento deriva do ser, mas não o ser do pensamento” (FEUERBACH apud Lukács, 2007. p. 146). É especificamente este prisma que permite Marx indicar como o idealismo de Hegel “torna possíveis precisamente aquelas arbitrárias construções conceituais que permitem demonstrar de modo aparentemente dialético – mas, na verdade especulativo – a ‘necessidade’ da monarquia baseada nos estamentos.” (Ibidem, p. 146), ponto basilar da sua crítica da filosofia hegeliana do Estado e do direito.

Marx é taxativo ao alegar que Hegel mistificou toda realidade em favor da idéia que se auto-desenvolve no plano lógico, como se o Estado fosse uma determinação teológica-teleológica em si mesma, anterior aos homens. Isto se torna evidente em alguns trechos d’A Crítica, particularmente no que se refere à constituição e ao poder soberano.

Sobre a constituição, no parágrafo 272 da Filosofia do Direito Hegel afirma

A constituição é racional na medida em que o Estado diferencia e determina a sua atividade segundo a natureza do Conceito, de tal modo que cada um desses poderes seja, em sim mesmo, a totalidade [...] uma vez que exprimem a diferença do Conceito, permaneçam simplesmente em sua idealidade e constituam apenas Um todo individual. (HEGEL apud Marx, 2005, p. 40)[24]

Ao que Marx responde “O Estado diferencia e determina sua atividade não segundo sua natureza específica, mas segundo a natureza do conceito, móbil mistificado do pensamento abstrato [...] Em lugar do conceito da constituição, obtemos a constituição do Conceito.” (MARX, 2005, p. 40)

Destarte, “no confronto que estabelece com Hegel, Marx, almeja demonstra que todo pensamento político existente na Filosofia do Direito é um logicismo que não encontra amparo na realidade, nas relações empíricas.” (TROTTA, 2004, p. 72) Para Marx a constituição – elemento ontológico ou modo de ser do Estado – é uma construção

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humana de conteúdo político sobre determinadas condições materiais e históricas, não sendo mera efetivação de uma determinação lógico-abstrata.

Em um contexto epistêmico, Marx rechaça o determinismo lógico como forma de apreensão do real, e define as condições materiais concretas – ou infra-estruturais – como ponto de partida para se compreender o real, “para Marx a lógica serve para explicar as coisas como elas são, sem que com isso sejam determinadas fora de suas realidades dentro do sujeito”. (TROTTA, 2004, p. 74)

Mais adiante, no parágrafo 274, Hegel continua

O Estado, como espírito de um povo, é ao mesmo tempo a lei que perpassa todas as suas relações [...] a constituição de um determinado povo depende, em geral, do modo e formação da autoconsciência desse povo; [...] Cada povo tem, assim, a constituição que lhe cabe e que lhe é própria. (HEGEL apud Marx, 2005, p. 40)

Marx comenta que

do raciocínio de Hegel segue-se apenas que o Estado, em que o “modo e formação da autoconsciência” e a “constituição” se contradizem, não é um verdadeiro Estado. [...] Disso deveria resultar, antes, a exigência de uma constituição que contivesse em si mesma a determinação e o princípio de avançar [...] com o homem real, o que só é possível quando se eleva o “homem” a princípio da constituição. (HEGEL apud Marx, 2005, p. 40)

Na concepção marxiana “as relações jurídicas como as formas de Estado não podem ser compreendidas por si mesmas nem pela chamada evolução geral do espírito humano, mas se baseiam, pelo contrário nas condições matérias de vida” (MARX apud Ferreira, 2008, p.2). Logo, as constituições expressam o conteúdo político dos Estados, não pela determinação lógica do espírito absoluto, abstrato e alienado dos homens, mas pelo espírito destes – pelos interesses, necessidades e vontades manifestos na sociedade civil.

Para Hegel o poder político se divide em distinções substanciais, a saber: o poder legislativo, poder de determinar e estabelecer o universal; poder governamental, a subsunção das esferas particulares e dos casos singulares sob o universal; poder soberano, decisão última do querer, no qual os diferentes poderes convergem em uma unidade individual. (Hegel apud Marx, 2005, p. 40).

Sobre o poder soberano, síntese dos outros dois, Hegel afirma no parágrafo 277

As funções e atividades do Estado lhe são próprias como seus momentos essenciais. Conduzidas e exercidas pelos indivíduos [...] estão unidas à sua personalidade particular como tal de uma maneira exterior e acidental. As funções e atividades estatais não podem, por isso, ser propriedade privada. (HEGEL apud Marx, 2005, p.42)

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Marx acusa o autor de Filosofia do Direito de tautologia e argumenta

As funções e atividades do Estado estão vinculadas aos indivíduos (o Estado só é ativo por meio dos indivíduos), mas não ao indivíduo como indivíduo físico e sim ao indivíduo do Estado, à sua qualidade estatal. [...] Elas estão, antes, unidas ao indivíduo mediante um vinculum substantiale, por uma qualidade essencial do indivíduo. (MARX, 2005, p. 42)

Um traço marcante das análises marxianas é que sempre partem das condições materiais de existência dos indivíduos. Isto se torna determinante para afirmar que o Estado só pode atuar através dos indivíduos, porque não possui existência própria, é uma determinação dos indivíduos em sociedade. Se a natureza do Estado modifica-se, transforma-se com o evolver histórico, isso só pode significar a mudança dos indivíduos, da sociedade no decurso do tempo, não a evolução de um espírito abstrato.

Quando Marx enfatiza que o Estado age por indivíduos, atinge o cerne da monarquia defendida por Hegel. Tratar representação e soberania como categorias políticas e não como atribuições de algum indivíduo em específico é uma atitude tipicamente democrática, modo pelo qual Marx se opõe à monarquia prussiana. Para esse, é simplesmente ridículo uma função pública ser atribuída a alguém por uma qualidade específica como nascimento ou algum atributo físico, tais atribuições vinculam-se aos indivíduos pelas suas qualidades sociais, pela representação dentro da sociedade civil. Portanto, não há função que seja estatal exclusivamente em si e para si, como algo dado pelas relações abstratas de uma lógica exterior aos indivíduos, com a quimera de superação das contradições.

Mais adiante, Marx afirma que “os indivíduos, na medida em que estão investidos de funções e poderes estatais, são considerados segundo suas qualidades sociais e não segundo suas qualidades privadas.” (Ibidem, p. 42) Como essas qualidades sociais só podem ser compreendidas a partir das relações estritamente materiais, ou seja, nas relações entre os indivíduos em sociedade, a implicação lógica da soberania hegeliana é destruída, porque desta forma elimina-se a necessidade de identificar a soberania com a existência física do monarca. Dessa forma, é desnecessário confirmar a universalidade e unidade do Estado em qualidades particulares de um indivíduo determinado. Ao devolver a soberania ao elemento subjetivo do Estado, o povo, Marx reata o que Hegel havia cindido: o político do social.

No parágrafo 279 Hegel tenta demonstrar a necessidade do monarca

a soberania, primeiramente apenas o pensamento universal dessa idealidade, existe somente como subjetividade certa de si mesma e como autodeterminção abstrata, porque sem fundamento, da vontade, autodeterminação esta na qual reside a decisão última. (HEGEL apud Marx, 2005, p. 43)

Ao que Marx responde

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Se Hegel tivesse partido dos sujeitos reais como a base do Estado, ele não precisaria deixar o Estado subjetivar-se de uma maneira mística [...] A subjetividade é uma determinação da pessoa. Em vez de concebê-las como predicados de seus sujeitos, Hegel autonomiza os predicados e logo os transforma, de forma mística em seus sujeitos [...] O que importa, para Hegel, é apresentar o monarca como o homem-Deus real, como a encarnação real da Idéia. (MARX, 2005, p. 44)

Assim, Marx acusa Hegel de adequar a realidade à sua lógica idealista. “Esta mistificação idealista tem como única finalidade a astuciosa justificação, mediante construções especulativas, de uma instituição reacionária.” (LUKÁCS, 2007, p. 147) Identificar o monarca com a idéia encarnada é necessário para amoldar os acontecimentos históricos e materiais à lógica hegeliana, a saber: a fundação dos Estados Nacionais, através das monarquias constitucionais.

Para Marx, Hegel distorce os fatos empíricos em axiomas metafísicos quando “transforma todos os atributos do monarca constitucional na Europa atual em autodeterminações absolutas da vontade. Ele não diz: a vontade do monarca é a decisão última, mas diz que a decisão última da vontade é ... o monarca.”(MARX, 2005, p. 45) Assim, “Marx indica a conexão que existe entre o fundamento filosófico geral de Hegel e os aspectos reacionários de sua teoria da sociedade.” (LUKÁCS, 2007, p. 148). E revela que, em última instância, é o idealismo que possibilita as construções conceituais que sustentam e justificam a Restauração prussiana.

Marx assevera que “Hegel confunde os dois sujeitos: a soberania ‘como a sua subjetividade autoconsciente’ e a soberania ‘como autodeterminação sem fundamento da vontade’ como vontade individual, para, a partir daí, construir a ‘Idéia’ como ‘Um indivíduo’. (Marx, 2005, p. 44) “O poder soberano em Hegel pretende assumir a universidade do Estado na figura de uma representação para além do seu ser social, [...] em função de seu posto e condição dada a partir de uma determinada tradição.” (TROTTA, 2004, p. 79) Esta soberania personificada representa somente a individualidade político-estatal, o Estado tratado como propriedade privada. Esta aversão ao Estado tratado como res privada fica evidente na afirmação de que a “Souveraineté Persone”[25] é vazia de conteúdo além do “Eu quero”, L’ état c’est moi.[26] (MARX, 2005, p. 47).

Hegel tenta demonstrar a independência do monarca, entendido como personificação do poder soberano, em relação ao povo. “A soberania pode ser dita popular no sentido de que um povo em geral seja autônomo em relação ao exterior e constitua um Estado próprio” (HEGEL apud Marx, 2005, p. 48). Ao que Marx responde “Se o príncipe é a ‘soberania real do Estado’, então ‘o príncipe’ pode, também externamente, valer como o ‘Estado autônomo’, mesmo sem o povo. Mas se ele é soberano porque representa a unidade do povo, então ele é apenas [...] símbolo da soberania popular.(Ibidem, p. 48) Para Marx, só o povo é o Estado real, a única condição para existência do Estado. Este só existe em função do povo, que o constitui em unidade de si. “A soberania é um predicado que só existe em relação ao Estado, e este somente em relação ao povo real, uma multidão de homens que por força de sua unidade histórica se constitui em uma ordem para fins associativos, político, e sobretudo, sociais.” (TROTTA, 2004, p. 80-81) Caso contrário, é o monarca fosse a real soberania do Estado, não precisaria de um povo

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para representar, e configuraria em si próprio, o Estado. Como observa Trotta “Soberania é um conceito abstrato, porém um conceito construído pelos indivíduos em sociedade”. (Ibidem, p. 81)

Em certa nota, lê-se

sociedade, comunidade, família, por mais concreta que ela seja em si mesma, tem a personalidade apenas como momento, nela abstrato; ela não chegou, aí, à verdade de sua existência, mas o Estado é precisamente essa totalidade, na qual os momentos do Conceito alcançam a realidade segundo a sua verdade peculiar. (HEGEL apud Marx, 2005, p. 58)

Ao que Marx contra-ataca

Hegel concebe sociedade, família etc., a pessoa moral em geral, não como a realização da pessoa real, empírica, mas como pessoa real que tem nela, porém o momento da personalidade apenas abstratamente. É por isso que, para ele, também não é a pessoal real que se converte em Estado, mas é o Estado apenas que deve se converter em pessoa real. Em vez do Estado ser produzido como [...] a mais elevada realidade social do homem, ocorre que um único homem empírico [...] é produzido como a mais alta realidade do Estado. (MARX, 2005, p. 58)

Assim, em Marx “tem na soberania a razão do Estado, o cume da realização política baseada numa racionalidade dentro dos parâmetros reais, e que tudo isso se atrela ao fato do homem ser, enquanto ser social, a fonte da existência do Estado.” (TROTTA, 2004, p. 82) Marx não ataca a concepção monárquica de governo em si, mas os malabarismos idealistas e especulativos, a inversão da relação sujeito-predicado indispensáveis para justificar a monarquia prussiana, uma instituição reacionária que pretendia passar-se por universal, por efetivação da Idéia.

Em Hegel se confundem soberania e poder soberano, que é exercido pelo monarca. Sendo que, em Marx o poder soberano repousa na sociedade e é exercido na qualidade social dos indivíduos.

Esses fragmentos são exemplos significativos da monarquia constitucional que Marx critica em Hegel, que da forma este concebe é “algo contraditório de cabo a rabo, é autocontraditório e nega a si mesmo” (LUKÁCS, 2007, p. 143).

N’ A Crítica Marx alcança dois objetivos fundamentais. No caráter imediato, ou seja, na crítica ao corolário político de Hegel, dá a luta democrática e de oposição contra o regime prussiano uma nova base teórica, superando as insuficiências do jovem hegelianismo. Já no caráter mediato, ou seja, na crítica holística do hegelianismo, traz à tona a contraditoriedade lógica da dialética idealista, submersa sob o mar da abstratividade lógico-especulativa. Nesta obra, ou seja, no interior da crítica de Marx ao sistema hegeliano está “a premissa para que a unidade de universal e particular possa ser

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concebida pelo marxismo de modo dialético-materialista, ou seja, pela primeira vez de modo científico.” (Ibidem, p. 150)

Outro ponto importante sobre os manuscritos de 1843 é que estes já revelam de modo evidente que o materialismo dialético não é uma síntese, mero potpourri ou justaposição da dialética hegeliana e do materialismo feuerbachiano, pelo contrário é um método fundamentalmente novo, oposto à dialética idealista. Como certifica Lukács

o marxismo não nasce simplesmente da decisão de cancelar a mistificação do ‘espírito do mundo’ e de outros conceitos desse tipo, mas conservando, ao mesmo tempo, o método de Hegel, combinado de modo eclético [...] com um material recolhido das ciências naturais, com análises econômicas e sociológicas etc. (Ibidem, p. 150)

4 O CONCEITO DE DIREITO N’ A CRÍTICA DA FILOSOFIA DO DIREITO DE HEGEL

Marx não se incomodou em erigir um sistema filosófico orgânico como Aristóteles, Kant ou Hegel. Pelo contrário, toda sua obra é voltada para a análise da sociedade a partir das condições materiais apresentadas, não através de um sistema lógico-abstrato. Isto torna, às vezes, difícil extrair conceitos prontos e acabados, tanto mais conceitos equívocos como direito, que em virtude da riqueza e complexidade que encerra, pertence ao rol daquelas categorias cujo conteúdo é mais facilmente intuído que definível.

A tarefa torna-se ainda mais árdua por ser A crítica uma obra da juventude, ou do amadurecimento, marxiana. No início de 1843, o método materialista dialético não está totalmente desenvolvido, apesar do expressivo avanço e do seu significado histórico, “ainda esta integralmente subordinada à crítica democrática-revolucionária da teoria social de Hegel.” (Ibidem, p. 151) Como assegura Lukács, “Com efeito, embora o ponto de vista materialista já desempenhe um papel significativo em tais manuscritos, falta ainda o fundamento essencial, ou seja, o ponto de vista de classe do proletariado.” (Ibidem, p. 151) Soma-se a este agravante, a relação do jovem Marx com a ciência jurídica e a atenção que dispensou a esta, e embora houvesse “iniciado sua carreira universitária como estudante de direito, logo perdeu o interesse pelo assunto e pouco escreveu de sistemático ou extenso sobre questões de teoria jurídica e de história do direito ou sobre o lugar do direito na sociedade”. (WAYNE, 2006. p. 32)

Apesar do exposto, as profícuas idéias críticas e igualitárias de Marx dirigidas ao direito possibilitam um vasto cabedal teórico e a construção de uma práxis profissional alternativa à concepção positivista. Algumas categorias trabalhadas por Marx nos manuscritos de 1843 são fundamentais na análise zetética do direito hodierno[27], contrário à dogmática estéril.

Marx situa o direito “no plano da superestrutura política, alicerçada na infra-estrutura econômica.” (Ibidem, p. 30) Destarte, a concepção jurídica de Marx fundamenta-se em dois pontos precípuos e inter-relacionados: a subordinação do direito à economia e,

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conseqüentemente, a sua dependência da evolução histórica. N’ A crítica Marx ainda não havia tomado contato com o pensamento inglês político e econômico clássico de Adam Smith e David Richard, tampouco com o socialismo utópico francês de Saint-Simon, Fourier e Blanc.[28] Portanto, não havia desenvolvido a marcante consciência social-proletária das obras da maturidade, porém em 1843 já percebia de maneira assaz nítida o caráter histórico e social das construções morais, religiosas, políticas e filosóficas, dentre elas o direito. Ao defender-se da acusação de instigar a revolução em Colônia, Marx sintetiza de maneira magnífica seu pensamento sobre a relação entre direito e sociedade “a sociedade não se alicerça no direito. Isso é uma ficção legal. Pelo contrário, é o direito que tem a sua base na sociedade. O direito deve exprimir os interesses e as necessidades da sociedade, que são o resultado dos métodos matérias de produção.” (MARX apud Sá Wayne, 2006, p. 30)

Dessa forma, refuta-se a afirmação de que Marx – e o marxismo – hostilizam o direito posto, à semelhança do anarquismo. Isto é uma falácia, Marx não é avesso ao direito e a suas normas, desde que emanem da sociedade. Tanto que no hegelianismo radical de sua juventude, pré manuscritos de 1843, adotou a posição de que “o ‘verdadeiro’ direito é a sistematização da liberdade, das regras internas das atividades humanas coerentes e ‘universais’.” (Ibidem, p. 32) O Marx de 1843 ojeriza as construções lógico-abstratas, dentre elas o direito hegeliano, que justificam e perpetuam o pseudo-poder político, e as atrocidades cometidas em nome e por ele, alienado dos indivíduos em sociedade.

As considerações feitas sobre A crítica, associadas à análise da evolução de Marx permitem conceituar direito como instrumento de síntese e forma ou modo de expressão das vontades e necessidades dos indivíduos da sociedade civil. Essa vontade sintetizada e legitimada pela sociedade é expressa na forma de ordenamento jurídico e de Estado. Para Marx, direito é uma categoria eminentemente social, realça-se, assim, sua ação como democrata-radical na sua juventude. É evidente que na Prússia do século XIX o direito era instrumentalizado e utilizado como sustentáculo de um governo anacrônico e reacionário, que não representava os anseios sociais, e por isso Marx resolve realizar a crítica democrática e radical da base teórica desse sistema, o idealismo hegeliano. Fê-lo para recolocar no lugar aquilo que lhe parecia de cabeça para baixo: a relação entre o social e o político. No jovem Marx, em 1843, a subordinação das condições espirituais às materiais já era capital para compreensão do mundo, por isso n’A crítica é o social, o elemento humano, o material que determinam o político, o lógico-especulativo, o abstrato. Dessa forma, o direito não deve condicionar a sociedade através de sua lógica própria e abstrata, mas sim, a partir das condições materiais daquela sociedade instituir o conjunto de normas necessárias à sua organização e funcionamento, estas consubstanciadas e legitimadas nos fatores reais, materiais de poder.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Volpe afirma que A crítica em relação aos outros textos da juventude marxiana

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É o mais importante porque contém as premissas mais gerais de um novo método filosófico – sob o aspecto daquela crítica da lógica hegeliana (mediante a crítica da filosofia ético-jurídica hegeliana) como que Marx desmascara as mistificações da dialética apriorítisca, idealista e especulativa em geral, ou seja, as suas constitucionais petições de princípio ou tautologias substanciais (não meramente formais), conceptuais de tal dialética; contrapondo-lhe ao mesmo tempo aquela revolucionária dialética científica para que se apelará explicitamente na Miséria da Filosofia (1847) e que aplicará no Capital, depois de ter tomado consciência específica dela no que se refere aos problemas econômicos na Introdução de 1857 e Para a Crítica da Economia Política (1859). (VOLPE apud Trotta, 2006, p. 64)

Portanto, pelo exposto neste trabalho, fica claro que o conceito de direito marxiano nos manuscritos de 1843 ainda está em construção e em constante superação, ainda muito distante da afirmação feita no Manifesto do partido comunista: “O executivo do Estado (direito) moderno nada mais é do que um comitê para a administração dos assuntos comuns de toda a burguesia.” (MARX apud BOTTOMORE, 2001, p. 133). Marx já se encontrava no caminho das realizações que o colocariam de maneira definitiva – e em posição de destaque – no panteão dos grandes pensadores da humanidade.

Porém, apesar d’ A Crítica tratar-se de momento transitório do desenvolvimento de Marx, a análise de sua evolução espiritual e intelectual – do seu jovem hegalianismo até o materialismo histórico-dialético – e os aspectos críticos de sua concepção do direito e da sociedade constituem uma poderosa ferramenta na reconstrução de toda estrutura jurídica, do ensino superior até a práxis profissional, de maneira alternativa a concepção dogmática-positivista, ainda excessivamente presente no universo jurídico.

Por fim, o aspecto precípuo da obra analisada, bem como de toda a obra de Marx, não é a construção dos conceitos de direito e Estado, ou quaisquer outros, tampouco a desmistificação da lógica especulativa do idealismo hegeliano, mas o exemplo de entrega total e intensa às suas convicções e ideais. Como Marx exorta

A exigência de abandonar as ilusões sobre sua situação é a exigência de abandonar uma situação que precisa de ilusões [...] A crítica não arranca as flores imaginárias dos grilhões para que o homem suporte os grilhões sem fantasias e consolo, mas para que se livre delas e possam brotar as flores vivas. (MARX apud Ferreira, 2008, p. 1)

É intrínseco ao direito seu caráter instrumental, ora é usado como cadeia opressora, ora como ferramenta libertária. Clama-se a todos aqueles que constroem diária e paulatinamente o universo jurídico que abandonem as flores ilusórias, aparentemente imanentes a esta realidade, contemplem os grilhões e utilizem o direito como instrumento de transformação. Que o direito seja utilizado na edificação de uma sociedade mais humana, justa e solidária.

6 REFERÊNCIAS

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BOTTOMORE, Tom. Dicionário do pensamento marxista. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2001.

COUTINHO, Carlos Nelson. Notas sobre cidadania e modernidade. In Revista Ágora: Políticas Públicas e Serviço Social, Ano 2, nº 3, dezembro de 2005, s/p. Disponível em: <www.assistentesocial.com.br/agora3/coutinho.doc >. Consulta em: 28 jul. 2008.

FERREIRA, Éder; ARANTES, Mariana Furtado; QUERINO, Rosimar Alves. Materialismo histórico-dialético I: Produção e reprodução social – uma leitura do trabalho como categoria ontológica. In: ABRÃO, Maria Bárbara Soares e. Serviço Social: Etapa 01. v.3. Uberaba: UNIUBE, 2008, p. 11-29.

FERREIRA, Éder; ARANTES, Mariana Furtado; QUERINO, Rosimar Alves. Materialismo histórico-dialético II: Luta de classes e revolução social - contribuições marxianas para a crítica e a superação da sociedade capitalista. In: ABRÃO, Maria Bárbara Soares e. Serviço Social: Etapa 02. v.2. Uberaba: UNIUBE, 2008, p. 18-33.

INWOOD, Michael. Dicionário de Hegel. Tradução de Álvaro Cabral; Revisão técnica de Karla Chediak. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1997.

LUKÁCS, György. O jovem Marx, sua evolução filosófica de 1840 a 1844. In: ______. O jovem Marx e outros escritos de filosofia. Rio de Janeiro: EDUFRJ, 2007, p.89-120.

MARX, Karl. Crítica da Filosofia do Direito de Hegel. São Paulo: Bomtempo, 2005.

PAULO, Vicente; ALEXANDRINO, Marcelo. Direito Constitucional Descomplicado. 3. ed., rev. e atualizada. São Paulo: Método, 2008.

WEYNE, Gastão Rúbio de Sá. Elementos para análise marxista do direito. São Paulo: Memória Jurídica, 2006.

TROTTA, Wellington. A Crítica da Filosofia do Direito de Hegel como matéria prima da teoria política de Marx em 1843. Dissertação (Mestrado em Ciência Política)- Instituto de Filosofia e Ciências Sociais, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2004.

[1] Segue-se a classificação de Carlos Nelson Coutinho que considera Modernidade “... da época histórica que se inicia com o Renascimento e na qual, apesar das apressadas afirmações em contrário dos chamados ‘pós-modernos’, ainda estamos hoje inseridos” (Coutinho, 2005)

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[2] “Die Philosophen haben die Welt nur verschieden interpretiert; es kömmt drauf an, sie zu verändern”(Os filósofos se limitaram a interpretar o mundo de diferentes maneiras; o que importa é transformá-lo.)

[3] Obra publicada em 1843, sob o título original de Zur Kritik der hegelschen Rechtsphilosophie.

[4] Marx se apropriou do materialismo após ter contato com as Teses provisórias para a reforma da Filosofia (1842), de Feuerbach.

[5] Doktorklub – Clube do doutor. Ou hegelianos de esquerda, grupo que propunha uma leitura progressista de Hegel. Eram membros do grupo além de Marx e Hegel, pensadores do calibre de Feuerbach, Stauss, os irmãos Bauer, Hess, Ruge e Stirner.

[6] Über die Differenz der Demokritischen und Epikureischen Naturphilosophie.

[7] Marx já trabalhava em Diferenças em 1939, e só a concluiu em 1841.

[8] Que em 1843 seriam radicalizados n’ A Questão Judaica

[9] Interpretação formulada pela primeira vez por Heinrich Heine, por volta de 1830.

[10]Segundo Lukacs, “para estes era suficiente extrair da doutrina de Hegel o núcleo revolucionário esotérico, deixando de lado o invólucro exotérico, ou seja, o momento da efetiva acomodação. (LUKACS, 2007, p. 126).

[11] Zur Judenfrage. Ensaio escrito em 1843, crítica às concepções de Bauer sobre o anti-semitismo e os Direitos Humanos.

[12] Die heilige Familie oder Kritik der Kritischen Kritik.Obra escrita em parceria com Engels em 1844, crítica aos jovens hegelianos, principalmente os irmãos Bauer (satirizados no título), que preconizavam uma política liberal elitista.

[13] Die Posaune des Jüngsten Gerichts über Hegel den Atheisten et l'antichristen ou Trombeta do juízo universal contra Hegel ateu e anti-Cristo.

[14] Anedokta.

[15] Das wesen des christentums, 1841.

[16] Rheinische Zeitung.

[17] Literalmente, pré-março; período que antecede a revolução alemã de março1848. Marcado pela efervescência política de cunho democrata e radical.

[18]Deutsch-Französische Jahrbücher. Publicação periódica voltada para o debate entre filósofos alemães e socialistas franceses. Foi publicado apenas um número (Paris, 1844).

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[19] Grundrisse der Philosophie dês Rechts oder Naturrecht und Staatwissenschaft im Grundrisse ou Fundamentos da filosofia do direito ou direito natural e ciência política em compêndio, obra de 1833.

[20] Notadamente na Trombeta.

[21] Vorläufige Thesen über die Reform der Philosophie. Obra publicada em 1842.

[22] Superação cristalizada em 1845 nas Thesen über Feuerbach (Teses sobre Feuerbach), curtas notas críticas sobre Feuerbach e o materialismo metafísico dos jovens hegelianos.

[23] Dever ser.

[24] Nas citações de Hegel retiradas d’ A crítica o grifo é de Marx.

[25] Soberania personifica

[26] O Estado sou eu.

[27] Em rol meramente exemplificativo: o conceito e substancia constitucional, titularidade e exercício da soberania, legitimação popular, estado democrático de direito.

[28] Segundo Lênin foram três fontes e três partes integrantes do marxismo ou socialismo cientifíco. A filosofia alemã, além do socialismo utópico francês e da economia política inglesa, já citados. Em 1843, Marx havia tomado contato somente com a primeira.

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