okawa cristhiane 2009 do
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Tese de doutorado de Cristhiane Okawa, sobre relação entre hidrologia e ecologia na planície de inundação do alto rio Paraná.TRANSCRIPT
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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE MARING CENTRO DE CINCIAS BIOLGICAS
DEPARTAMENTO DE BIOLOGIA PROGRAMA DE PS-GRADUAO EM ECOLOGIA DE
AMBIENTES AQUTICOS CONTINENTAIS
CRISTHIANE MICHIKO PASSOS OKAWA
Em busca do hidrograma ecolgico para a plancie de inundao do alto rio Paran: consideraes iniciais
Maring 2009
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CRISTHIANE MICHIKO PASSOS OKAWA
Em busca do hidrograma ecolgico para a plancie de inundao do alto rio Paran: consideraes iniciais
Tese apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Ecologia de Ambientes Aquticos Continentais do Departamento de Biologia, Centro de Cincias Biolgicas da Universidade Estadual de Maring, como requisito parcial para obteno do ttulo de Doutor em Cincias Ambientais rea de concentrao: Cincias Ambientais. Orientador: Prof. Dr. Edvard Elias de Souza Filho
Maring 2009
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"Dados Internacionais de Catalogao-na-Publicao (CIP)" (Biblioteca Setorial - UEM. Nuplia, Maring, PR, Brasil)
O41e
Okawa, Cristhiane Michiko Passos, 1970- Em busca do hidrograma ecolgico para a plancie de inundao do alto rio
Paran: consideraes iniciais / Cristhiane Michiko Passos Okawa. -- Maring, 2009. 92 f. : il. (algumas color.)
Tese (doutorado em Ecologia de Ambientes Aquticos Continentais)--Universidade Estadual de Maring, Dep. de Biologia, 2009.
Orientador: Prof. Dr. Edvard Elias de Souza Filho. 1. Hidrograma ecolgico - Plancie de inundao - Alto rio Paran. 2. Vazo
ambiental - Plancie de inundao - Alto rio Paran. 3. Hidreltricas - Impactos hidrolgicos - Plancie de inundao - Alto rio Paran. I. Universidade Estadual de Maring. Departamento de Biologia. Programa de Ps-Graduao em "Ecologia de Ambientes Aquticos Continentais".
CDD 22. ed. -551.48309816 NBR/CIP - 12899 AACR/2
Maria Salete Ribelatto Arita CRB 9/858 Joo Fbio Hildebrandt CRB 9/1140
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FOLHA DE APROVAO
CRISTHIANE MICHIKO PASSOS OKAWA
Em busca do hidrograma ecolgico para a plancie de inundao do alto rio Paran: consideraes iniciais
Tese apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Ecologia de Ambientes Aquticos Continentais do Departamento de Biologia, Centro de Cincias Biolgicas da Universidade Estadual de Maring, como requisito parcial para obteno do ttulo de Doutor em Cincias Ambientais pela Comisso Julgadora composta pelos membros:
COMISSO JULGADORA
Prof. Dr. Edvard Elias de Souza Filho Universidade Estadual de Maring (Presidente)
Prof. Dr. Juan Jos Neiff Centro de Ecologa Aplicada del Litoral (CECOAL/ARGENTINA)
Prof. Dr. Paulo Csar Rocha Universidade Estadual Paulista Jlio de Mesquita Filho, campus de Presidente Prudente
Prof. Dr. Sidinei Magela Thomaz Universidade Estadual de Maring
Prof. Dr. Luiz Carlos Gomes Universidade Estadual de Maring
Aprovada em: 04 de junho de 2009. Local de defesa: Anfiteatro do Nuplia, Bloco G-90, campus da Universidade Estadual de Maring.
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DEDICATRIA
Ao amor da minha vida: Julio.
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AGRADECIMENTOS
Agradeo aos meus pais, Takumi (in memorian) e Therezinha, pelos ensinamentos de vida
no s com palavras, mas com exemplo. Voc, meu pai, meu modelo, meu padro de
disciplina, persistncia e diplomacia. Voc, minha me, minha parte suave, alegre.
Ao meu esposo Julio, pelo apoio constante, pacincia infinita e conselhos valorosos. Voc me
d paz!
Ao meu orientador, Prof. Edvard, pela orientao segura e pelas horas interminveis de
conversas. Obrigada pelo tempo dispensado, pela pacincia, pela orientao e pela
tranqilidade.
Aos meus amigos da primeira turma, em especial Sandrinha, Susi, Henrique, Junior,
Solange e Marlene, meus companheiros de raves e aliados, que tanto me ensinaram
ecologia. Vocs estaro sempre em meu corao.
Aos amigos da segunda turma, com quem fiz Ecologia de Comunidades e Ecologia de
Campo, por me receberem to bem. Vocs so especiais.
Agradeo Harumi pela ida a campo, pela disponibilidade e carinho.
Aos professores do curso, por acreditarem que essa engenheira pudesse se tornar uma ecloga
e por repassarem o conhecimento de forma to generosa.
Aldenir, Jocemara, Salete e Joo, pelo atendimento sempre atencioso, pelas conversas e
amizades. Ao Jaime, pela confeco dos mapas de localizao da rea de estudo.
Ao CNPq, pelo financiamento do projeto institucional PELD.
The Nature Conservancy, por desenvolver e por tornar disponvel o programa
computacional IHA verso 7.
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EPGRAFE
Isso ns sabemos. Todas as coisas so conectadas
O que acontecer com a terra acontecer com os filhos da terra.
O homem no teceu a teia da vida, ele dela apenas um fio.
O que ele fizer para a teia estar fazendo a si mesmo.
Ted Perry
(Inspirado no Chefe Seatlle)
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Em busca do hidrograma ecolgico para a plancie de inundao do alto rio Paran: consideraes iniciais
RESUMO A rea de estudo uma rea de Proteo Ambiental, com uma plancie de inundao com
heterogeneidade de hbitats e elevada biodiversidade. A existncia de reservatrios em
cascata a montante da rea de estudo promove uma forte regularizao das vazes naturais,
acarretando mudanas nas caractersticas abiticas e na estrutura e integridade das
comunidades biticas, diminuindo a biodiversidade local. O paradigma do regime natural
estabelece que h um regime de fluxos, existente antes da ocorrncia de alteraes
significativas devido a aes antropognicas, capaz de manter a sade de um rio. A partir do
regime natural de fluxos e da determinao da magnitude, durao, freqncia, periodicidade
e taxa de mudana de vazes ecologicamente relevantes, possvel a confeco de um
hidrograma ecolgico inicial que contemple alguns aspectos hidrolgicos. Portanto, no
Captulo I, apresentada uma reviso dos conceitos que, ao longo do tempo, foram
modificados e conduziram definio do conceito de hidrograma ecolgico; um pouco da
legislao brasileira sobre outorga de direito de uso dos recursos hdricos e alguns mtodos e
questes que auxiliam a elaborao do hidrograma ecolgico. No Captulo II, so
determinadas as alteraes no regime de fluxos aps a construo dos reservatrios em
cascata, principalmente aps o funcionamento da usina hidreltrica de Porto Primavera,
relacionando essas alteraes com algumas implicaes ecolgicas. Esses resultados geram
subsdios hidrolgicos para a confeco do hidrograma ecolgico para a rea de estudo. No
Captulo III, com base nos subsdios obtidos no Captulo II, so determinadas as vazes
ecologicamente relevantes e confeccionado um hidrograma ecolgico inicial baseado nos
aspectos hidrolgicos. Este hidrograma ecolgico inicial dever ser amplamente discutido
pelos pesquisadores que estudam a plancie, para que outros aspectos sejam contemplados na
confeco do hidrograma ecolgico definitivo. O hidrograma ecolgico definitivo poder
nortear o gerenciamento eficaz do recurso hdrico, de tal forma que se promova uma gesto
das guas que atenda s necessidades humanas e proteja a integridade ecolgica do
ecossistema aqutico.
Palavras-chave: Hidrograma ecolgico. Vazes ecologicamente relevantes. Indicadores de alterao hidrolgica. Variabilidade de regime de fluxos.
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Searching the environmental flows for the floodplain of the Upper Paran River: initial considerations
ABSTRACT The study area is an Protected Area, with a floodplain containing heterogeneity of habitats
and high biodiversity. The existence of reservoirs cascade above the study area promotes a
strong regularization of the natural flow, causing changes in abiotic characteristics and in the
structure and integrity of biotic communities, reducing the local biodiversity. The natural
regime paradigm dictates that there is a flow regime, existing before the occurrence of
significant changes due to anthropogenic activities, capable of maintaining the health of a
river. From the natural flow regime and the magnitude, duration, frequency, timing and the
rate of change of the ecologically relevant flows, it is possible to find an initial environmental
flow that assembled some hydrological aspects. Therefore, in Chapter I, there is a review of
concepts that, over time, changed and led to the definition of the environmental flow concept;
some of the Brazilian legislation on water grant and some methods and issues that help the
development of the environmental flow. In Chapter II, the goal is generate hydrological
subsidies for the construction of the environmental flow for the research. For this, it was
determined the changes on the flow regime after the construction of the reservoir cascade,
especially after the hydroelectric power plant operation in Porto Primavera, and to relate this
changes with some ecological implications. In Chapter III, based on the information obtained
in Chapter II, the ecological natural flows were determined and the initial environmental flow
was found based on the hydrological aspects. This initial environmental flow should be
widely discussed by the researchers who study the floodplain, and other aspects should be
considered at finding the final environmental flow. The environmental flow can guide the
effective water resource management in a way the water management is promoted to meet the
human needs and protect the ecological integrity of the ecosystem.
Keywords: Environmental flow. Indicators of hydrologic alteration. Variability of flow
regime.
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Tese elaborada e formatada conforme as
normas da publicao cientfica Acta Scientiarum. Biological Sciences.
Disponvel em:
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SUMRIO Captulo I O hidrograma ecolgico e a vazo ecolgica: conceitos. RESUMO ............................................................................................................... 11 ABSTRACT........................................................................................................... 11 INTRODUO ..................................................................................................... 11 OUTORGA DE DIREITO DE USO COMO INSTRUMENTO DE GESTO DOS RECURSOS HDRICOS NO CONTEXTO BRASILEIRO........ 15 VAZO ECOLGICA.......................................................................................... 17 MTODOS PARA DETERMINAO DE VAZO ECOLGICA UTILIZADOS PELOS RGOS GESTORES NO BRASIL .............................. 31 DISCUSSO.......................................................................................................... 32 REFERNCIAS..................................................................................................... 34 ANEXO A.............................................................................................................. 39 Captulo II Alteraes no regime de fluxos na plancie de inundao do alto rio Paran devido a aes antropognicas e conseqentes implicaes ecolgicas. RESUMO ............................................................................................................... 43 ABSTRACT........................................................................................................... 43 INTRODUO ..................................................................................................... 44 MATERIAIS E MTODOS .................................................................................. 45 RESULTADOS E DISCUSSO ........................................................................... 48 CONCLUSES...................................................................................................... 68 REFERNCIAS..................................................................................................... 69 Captulo III Em busca do hidrograma ecolgico para a plancie de inundao do alto rio Paran: consideraes iniciais RESUMO ............................................................................................................... 73 ABSTRACT........................................................................................................... 73 INTRODUO ..................................................................................................... 73 MATERIAIS E MTODOS .................................................................................. 75 RESULTADOS...................................................................................................... 76 DISCUSSO.......................................................................................................... 84 CONCLUSES...................................................................................................... 89 REFERNCIAS..................................................................................................... 90
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O hidrograma ecolgico e a vazo ecolgica: conceitos
RESUMO Este trabalho apresenta uma breve reviso da situao atual do instrumento de outorga dos direitos de uso dos recursos hdricos no contexto brasileiro. Apresenta ainda uma reviso dos conceitos e dos mtodos que, ao longo do tempo, foram aprimorados e conduziram transio entre o conceito de vazo ecolgica para o conceito de hidrograma ecolgico em rios. A vazo ecolgica assegura condies mnimas para a manuteno de macrossistemas fluviais, e assume um valor constante. O hidrograma ecolgico envolve uma viso holstica do macrossistema fluvial, na medida em que considera as necessidades das espcies ao longo do seu ciclo de vida, sendo flexvel em funo das condies hidrolgicas naturais que se verificam ano a ano. Por fim, so mencionados alguns mtodos e questes que auxiliam na confeco de um relatrio tcnico que contemple os aspectos hidrolgicos para a elaborao do hidrograma ecolgico. Palavras-chave: Hidrograma ecolgico. Vazo ecolgica. Outorga. The environmental flows and the instream flow: concepts
ABSTRACT This paper presents a brief review of the current status of the water grant in the brazilian context. It also presents a review of concepts and methods that, over time, were improved and led to the transition between the instream flow concepts to the environmental ecological flows in rivers concept. The instream flow ensures minimum conditions to maintain fluvial macrosystems, and assumes a constant value. The environmental flow involves a holistic view of the fluvial macrosystem, where the needs of the species are considered throughout its life cycle, being flexible in terms of natural hydrologic conditions that are verified year by year. Finally, some methods and questions that help to produce a technical report covering the hydrological aspects for the development of the environmental flow were mentioned. Keywords: Environmental flow. Instream flow. Water grant.
INTRODUO
O primeiro paradigma para prescrio de vazo ecolgica em rios surgiu durante a
primeira metade do sculo XX, decorrente das preocupaes com o salvamento de espcies
ameaadas de extino e com a criao de reas de preservao ambiental; este paradigma
baseou-se nos estudos da biologia pesqueira e no conceito de nicho ecolgico. A partir da
dcada de 50, com o incio da construo das grandes barragens (intensificada na dcada de
70), a preocupao centrou-se na conservao das espcies de peixes afetadas, principalmente
das espcies com valor comercial e esportivo como o salmo (CRUZ, 2005).
Este paradigma de manuteno de condies mnimas para a preservao de espcies
de peixes foi consolidado pelo desenvolvimento dos primeiros mtodos para clculo da vazo
ecolgica: os mtodos hidrolgicos, os hidrulicos e, posteriormente, os mtodos de
classificao de disponibilidade de hbitats para espcies-alvo (BENETTI et AL., 2003).
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Estes mtodos foram extensamente utilizados e continuam sendo amplamente usados no
Brasil, legitimados pelas muitas publicaes tcnicas, pelas legislaes ainda vigentes e pela
simplicidade de uso, especialmente dos mtodos hidrolgicos (CRUZ, 2005).
A partir de meados da dcada de 70, os mtodos baseados neste primeiro paradigma,
que estabelecia vazes ecolgicas mnimas e constantes, se contrapem busca por
desenvolvimento sustentvel, representado por tentativas de entendimento da complexidade
dos ecossistemas. Essa busca representada por mtodos que contemplam ao mesmo a
sazonalidade do regime hidrolgico (TENNANT, 1976) ou os requerimentos de fluxos de ao
menos uma espcie do meio bitico (BOVEE et al., 1998), at evoluir para os mtodos
holsticos, que so baseados no segundo paradigma.
O segundo paradigma surgiu das recentes teorias de ecologia fluvial, formuladas a
partir da dcada de 80, como o conceito do Rio Contnuo, que introduziu a continuidade
fluvial pela existncia de um gradiente fluvial longitudinal de fatores fsicos (VANNOTE et
al., 1980). Pouco tempo depois, surgiu o conceito de descontinuidade serial fluvial, que prediz
e explica os efeitos de reservatrios colocados ao longo do contnuo (WARD; STANFORD,
1983). Junk et al. (1989) conceituaram o pulso de inundao, considerado pelos autores como
a principal fora direcionadora responsvel pela existncia, produtividade e interaes da
biota em sistemas rio-plancie de inundao.
Neiff (1990) introduziu o conceito de pulso de energia e matria ou pulso
hidrossedimentolgico, com uma fase seca e outra de cheia, ressaltando que ambas as fases
do pulso tm igual importncia. Os atributos do pulso hidrossedimentolgico foram tambm
descritos, quais sejam freqncia, intensidade, tenso, recorrncia, amplitude e
estacionariedade (cujo acrnimo em ingls resulta na palavra FITRAS). No mesmo artigo,
Neiff introduziu o conceito de macrossistema fluvial em contrapartida aos conceitos de
ecossistema aqutico ou ecossistema fluvial.
O conceito de ecossistema enunciado por Tansley (1935) refere-se a um sistema
aberto, que troca energia e matria com o seu entorno, do qual fazem parte os seres vivos e
no vivos. Odum (1988) define ecossistema como qualquer rea da natureza que inclui
organismos vivos e substncias abiticas interagindo entre si para produzir um intercmbio de
materiais entre as partes vivas e no vivas. Independente do conceito adotado, uma das
caractersticas fundamentais dos ecossistemas o estabelecimento dos limites do mesmo.
Com relao aos sistemas fluviais, os limites de um rio dependem grandemente do estado
hidrolgico em que se encontra; a prpria delimitao de algumas bacias hidrogrficas
fortemente dependente dos nveis dos rios que as compem, como o caso, por exemplo, de
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bacias onde ocorre transposio de guas nos perodos de chuvas. Alm desses fatores, os
rios, de uma maneira geral, so sistemas com taxas de renovao muito altas, no que tambm
diferem do conceito tradicional de ecossistema, que geralmente se comportam como sistemas
de acumulao crescente (NEIFF, 1990).
O conceito de ecossistema fluvial considera como limites: o rio, seus principais
afluentes e as transformaes que ocorrem nas guas lticas. Este conceito tambm no
apropriado, visto que o rio est inserido em uma bacia hidrogrfica, sendo to somente um
segmento do sistema, fortemente condicionado pelas transformaes que ocorrem nesse
ltimo. O termo macrossistema fluvial expressa o conjunto de interaes que ocorre entre os
ecossistemas de uma bacia hidrogrfica (NEIFF, 1990), e, dentro desse contexto, este ser o
termo empregado nesse trabalho.
O pulso hidrossedimentolgico governa o funcionamento das plancies de inundao,
ou seja, o gradiente dos atributos de freqncia, intensidade, tenso, recorrncia, amplitude e
estacionariedade dos pulsos considerado a principal funo de fora que regula a estrutura
das comunidades biolgicas nestes macrossistemas (JUNK et al., 1989; NEIFF, 1990, 2001;
SOUZA FILHO et al., 2004).
Estes conceitos conduziram ao segundo paradigma para determinao da vazo
ecolgica: o paradigma do regime natural, que surgiu em 1992 (POSTEL; RICHTER, 2003),
mas s foi formalmente enunciado por Poff et al. (1997). Esse paradigma estabelece que a
completa variabilidade intra e inter-anual do regime hidrolgico, associada com as
caractersticas de periodicidade, durao, freqncia e taxa de mudana, so crticas para
sustentao de toda a biodiversidade nativa e da integridade dos ecossistemas aquticos
(POFF et al., 1997; RICHTER et al., 1997). O paradigma do regime natural difere-se da f
FITRAS, ao no considerar o atributo tenso.
A partir desse segundo paradigma, Richter e colaboradores desenvolveram mtodos
tentando contemplar a enorme complexidade de se determinar quais vazes so
ecologicamente relevantes, ou seja, quais vazes atendem aos requerimentos de fluxos das
espcies de um macrosistema fluvial. Os mtodos dos Indicadores de Alterao Hidrolgica
Indicators of Hidrologic Alterations ou IHA (RICHTER et al., 1996) e da Abordagem da
Faixa deVariabilidade Range of Variability Approach ou RVA (RICHTER et al., 1997) tm
por objetivo quantificar as alteraes hidrolgicas ocorridas ao longo do tempo no regime de
fluxos em rios, decorrentes de aes antropognicas, porm sem estabelecer as causalidades
das alteraes. O programa computacional IHA Version 7 aplica esses mtodos, por
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comparao entre o regime de fluxos em um perodo pr-impacto e um perodo ps-impacto,
ou seja, antes e aps interveno antropognica significativa.
Outra forma de estudar as alteraes ocorridas no regime de fluxos de um rio utilizar
o programa computacional PULSO. Este programa foi projetado para explorar algumas
relaes quantitativas entre as caractersticas ecolgicas das reas inundveis e as diferenas
nas fases de inundao e de solo seco (potamofase e limnofase) em cada zona da paisagem. A
disponibilidade de hbitats para micro e macro-organismos distinta durante os perodos de
potamofase e de limnofase, e pode ser qualificada e quantificada com PULSO (CASCO et al.,
2005). Arenas-Ibarra (2008) utilizou o programa computacional PULSO para avaliar as
alteraes no regime de fluxos no alto rio Paran, com importantes resultados e
estabelecimento de relaes hidroecolgicas.
H ainda uma outra metodologia, proposta por Cruz (2005) para avaliao da
significncia de pulsos em anlise espectral de sries temporais de vazes dirias, partindo-se
do pressuposto de que processos adaptativos, manifestados em termos de tipos funcionais de
plantas, dependem de um grau de previsibilidade dos pulsos (associada a pulsos
significativos). Nessa metodologia, a srie temporal de vazes dirias filtrada por
Transformada Rpida de Fourier, produzindo o hidrograma significativo, que pode ento ser
estudado atravs dos programas computacionais IHA e PULSO.
Com relao ao estabelecimento de regras de gesto de recursos hdricos a partir dos
requerimentos de fluxos de um macrossistema fluvial, Richter et al. (2003) publicaram uma
nova metodologia intitulada Ecologically sustainable water management (Manejo
Ecologicamente Sustentvel da gua), em que as necessidades de vazo para manuteno dos
processos no macrossistema fluvial, as necessidades de vazo futura e os conflitos entre
diferentes interesses no uso da gua devem ser estimados. A partir dessas estimativas, inicia-
se a busca por solues para os conflitos, de forma colaborativa e participativa dos envolvidos
e dos gestores do recurso hdrico. Resolvidos os conflitos, deve-se monitorar a soluo
atravs de experimentos prticos de manejo da gua e, por fim, usar esse monitoramento para
desenvolver um programa de manejo experimental com o objetivo de retroalimentar a
metodologia, havendo um retorno constante aos passos anteriores (RICHTER et al., 2003).
Posteriormente, Collischonn et al. (2005) adaptaram essa metodologia para a realidade
brasileira e introduziram o termo hidrograma ecolgico, que significa definir quais so as
vazes ambientais, distribudas ao longo do tempo, que atendam aos requerimentos de fluxos.
A metodologia Ecologically sustainable water management, de manejo experimental
de vazes, foi aplicada por Richter et al. (2006) ao rio Savannah, nos Estados Unidos. As
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vazes ecologicamente relevantes foram estimadas, por coleta de informaes da literatura e
dados complementares e promoo de fruns de discusso com a participao de todos os
atores interessados. As vazes foram implementadas e manteve-se uma coleta de dados e
pesquisa experimental constante, ou seja, nessa metodologia a atividade no se encerra, sendo
realizadas novas discusses em fruns sempre que h necessidade de aprimoramento das
recomendaes de vazo (RICHTER et al., 2006). Durante o frum de discusso na aplicao
da metodologia no rio Savannah, foram especificadas algumas perguntas visando aumentar o
entendimento de quais sejam os requerimentos ambientais de fluxos em um determinado
macrossistema fluvial; essas questes so mostradas no Anexo A.
No Brasil, os mtodos hidrolgicos, hidrulicos e de classificao de disponibilidade
de hbitats continuam sendo utilizados pelos rgos gestores dos recursos hdricos, por vrias
razes que sero posteriormente discutidas.
OUTORGA DE DIREITO DE USO COMO INSTRUMENTO DE GESTO DOS
RECURSOS HDRICOS NO CONTEXTO BRASILEIRO
No Brasil, a Lei n 9.433/97, sancionada em 08 de janeiro de 1.997, instituiu a Poltica
Nacional de Recursos Hdricos e criou o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos
Hdricos (BRASIL, 1997). Um dos objetivos desta normativa assegurar atual e s
futuras geraes a necessria disponibilidade de gua, em padres de qualidade adequados
aos respectivos usos (Artigo 2, inciso I). Este objetivo remete ao conceito de
desenvolvimento sustentvel, e para tal a normativa utiliza-se de diversos instrumentos, tais
como: estabelecimento de planos de recursos hdricos por bacia hidrogrfica; enquadramento
dos corpos dgua em classes qualitativas de acordo com os usos preponderantes da gua;
outorga dos direitos de uso dos recursos hdricos; cobrana pelo uso de recursos hdricos e
criao do sistema de informaes de recursos hdricos.
De acordo com a Lei n 9.433/97, a outorga um mecanismo pelo qual garantido ao
usurio o direito de uso da gua. Segundo Britto (2005), constitui-se de uma licena emitida
pelo Estado para que o usurio possa derivar volumes de gua especficos para atender as suas
necessidades, com ou sem devoluo de parte ou de toda a gua (usos consuntivos e no
consuntivos) ou reserva de volume para a diluio de poluio. A outorga tem por objetivo
assegurar o controle quantitativo e qualitativo dos usos da gua e o efetivo exerccio dos
direitos de acesso gua (Artigo 12 da Lei n 9.433/97). Est condicionada s prioridades de
uso estabelecidas nos Planos de Recursos Hdricos e deve respeitar a classe em que o corpo
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dgua estiver enquadrado bem como a manuteno de condies adequadas ao transporte
aquavirio, quando for o caso (Artigo 13 da Lei n 9.433/97).
A outorga est fundamentada no exerccio de resolver o problema de oferta versus
demanda. Para a instruo de um processo de outorga, necessrio o conhecimento dessas
duas grandezas fundamentais: oferta, representada pela disponibilidade hdrica e demanda,
representada pelos diferentes usos (CRUZ, 2001).
A demanda pode ser estimada a partir de um eficiente cadastramento dos usurios. J a
disponibilidade hdrica, determinada em uma seo fluvial de interesse, varia no tempo e no
espao e estimada a partir da avaliao do regime hidrolgico da bacia, a partir de dados
fluviomtricos e de estudos que utilizam modelos hidrolgicos. Portanto, a determinao da
disponibilidade hdrica pressupe o monitoramento contnuo das variveis indicadoras (como
vazo, nvel dgua e precipitao) e do conhecimento das condies climticas (BRITTO,
2005).
A correta determinao da disponibilidade hdrica de fundamental importncia na
concesso da outorga, pois ela a vazo, varivel no tempo e no espao, em que parte
utilizada pela sociedade e parte mantida nos cursos dgua, para conservao da integridade
de seu sistema ambiental e para atender a usos no consuntivos (navegao, recreao). A
estimativa da disponibilidade hdrica reveste-se de particular interesse quando se percebe que
dela depende a quantidade de gua que ser considerada como vazo mxima outorgvel
(CRUZ, 2001).
Para calcular a vazo mxima outorgvel, necessrio determinar uma vazo de
referncia, a partir da qual parte outorgada e parte destinada manuteno dos
ecossistemas aquticos. Desta forma, a parcela de gua a ser outorgada deve ser computada
apenas da vazo outorgvel e no da vazo de referncia, pois essa inclui a vazo que deve ser
reservada para a manuteno dos processos no macrossistema fluvial. Vazes de referncia
utilizadas atualmente pelos rgos gestores no Brasil so, por exemplo, percentagens da curva
de permanncia de vazes ou da vazo Q7,10 (BRASIL, 2007), cujas definies encontram-se
no item Vazo ecolgica.
O modelo brasileiro de gesto dos recursos hdricos referente outorga a outorga
administrativa ou controlada. Neste modelo, o rgo responsvel pela outorga analisa que tipo
de uso se far do recurso hdrico, sob uma tica ampla, que deve se basear no somente nos
aspectos econmicos, mas tambm nos aspectos tcnicos, sociais e ambientais, de forma
integrada. Assim, a instituio reguladora quem estabelece a vazo mxima outorgvel,
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alm de quais sero os usos prioritrios, a vigncia da outorga e quais sero as vazes
ecolgicas adotadas (ARNZ, 2002).
Para a emisso de outorga para empreendimentos hidreltricos, o rgo gestor faz o
levantamento dos usos consuntivos a montante do empreendimento e sua evoluo prevista no
perodo de outorga. So levantadas, ainda, restries ecolgicas a jusante e a necessidade de
alocao de vazes para outros usos (navegao, controle de cheias, recreao, entre outros).
A outorga emitida reservando as vazes disponveis no curso de gua, descontando-se os
usos consuntivos previstos. Salienta-se que, de acordo com diagnstico de outorga de direito
de uso levantado pela ANA, em todo o Brasil, apenas a ANA e os Estados da Bahia, Paran,
Rio Grande do Sul e So Paulo emitem outorgas para aproveitamentos hidreltricos. No
Estado do Paran, o rgo responsvel pela outorga de direito de uso de recurso hdrico no
mbito do Estado a Superintendncia de Desenvolvimento de Recursos Hdricos e
Saneamento Ambiental SUDERHSA (BRASIL, 2007).
Assim, para emisso de outorga para empreendimentos hidreltricos, necessrio
estabelecer valores de vazo mnima residual a jusante dos empreendimentos. A exigncia da
manuteno de vazes mnimas nos rios uma tentativa de assegurar a conservao dos
ecossistemas aquticos frente aos mltiplos usos da gua e seus conflitos. Essa manuteno de
vazo mnima no corpo dgua recebe vrias denominaes, tais como vazo mnima residual,
vazo mnima remanescente e vazo ecolgica.
VAZO ECOLGICA
A vazo ecolgica definida pela Agncia Nacional de guas (ANA) como sendo
uma vazo mnima constante residual a jusante de um empreendimento hidrulico, que
permita assegurar a conservao e manuteno dos ecossistemas aquticos (BRASIL, 2005).
No entanto, a manuteno de uma vazo mnima e de valor constante ao longo do tempo no
suficiente para a conservao de um ecossistema aqutico. A permanncia deste conceito
desde a dcada de 50 at meados da dcada de 90 deve-se dificuldade de se definir quais
valores de vazo promovem a conservao do ecossistema aqutico.
Um novo conceito de vazo ecolgica tem sido objeto de estudo, em que a vazo
ecolgica substituda por uma srie temporal de valores de vazo, denominada de
hidrograma ecolgico, que considere as necessidades das espcies ao longo do ciclo de
vida, flexvel em funo das condies hidrolgicas naturais que se verificam ano a ano
(ALVES; HENRIQUES, 1994; GARCIA; ANDREAZZA, 2001; RICHTER et al., 2003;
COLLISCHONN et al., 2005).
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Existem cerca de 207 mtodos distribudas em 44 pases para a determinao da vazo
ecolgica em rios. Os mtodos podem ser divididos em quatro categorias: 1. mtodos
hidrolgicos; 2. mtodos de classificao hidrulica; 3. mtodos de classificao de habitats; e
4. mtodos holsticos (UNESCO, 2007).
As trs primeiras categorias expressam o conceito de que a vazo ecolgica representa
a manuteno de uma quantidade mnima de gua no rio, seja a partir de observaes
hidrolgicas ou hidrulicas em segmentos crticos de rio, seja considerando observaes
empricas da qualidade do hbitat em relao determinada espcie pr-selecionada,
geralmente de peixes migradores. De acordo com Cruz (2005), grande parte dos mtodos
desenvolvidos que se enquadram nessas categorias seguem o paradigma do incio da dcada
de 50, centrada em uma viso utilitria do rio.
A partir de meados da dcada de 70, desenvolveram-se novas teorias ecolgicas para
os rios (TENNANT, 1976; VANOTTE et al.,1980; WARD; STANFORD, 1983; JUNK et
al.,1989; NEIFF, 1990; POFF et al., 1997; RICHTER et al., 1996, 1997, 2003; POSTEL;
RICHTER, 2003; COLLISCHONN et al., 2005), que aumentaram o conhecimento do
ecossistema fluvial e possibilitaram que o conceito de manuteno de um valor constante de
vazo mnima no rio fosse substitudo por um espectro mais pleno de condies de fluxo
para sustentar as espcies nativas (POSTEL; RICHTER, 2003).
- Mtodos hidrolgicos Os mtodos hidrolgicos baseiam-se na utilizao das sries histricas de vazes para,
atravs da manipulao dos dados, estabelecer uma vazo ecolgica mnima constante que
suporte o ecossistema aqutico (ALVES; HENRIQUES, 1994; BENETTI et al., 2003;
MENDES, 2007). A maior vantagem que esta categoria apresenta necessitar apenas da srie
histrica de vazo, e as maiores desvantagens so: resultar em um valor constante de vazo,
desprezando a sazonalidade, e resultar em um valor geralmente muito baixo, no
considerando os requerimentos das espcies ao longo de seu ciclo de vida.
Os mtodos hidrolgicos mais conhecidos so os mtodos estatsticos, como os de
Tennant, Q7,101, mdia das vazes anuais mnimas de 7 dias de durao e curva de
permanncia de vazes, descritos neste trabalho.
- Mtodo de Tennant:
Este mtodo foi desenvolvido a partir de observaes realizadas durante 10 anos,
relacionando hbitats e vazes, nos estados americanos de Montana, Nebraska e Wyoming. 1 Q7,10 a vazo anual mnima de 7 dias de durao e tempo de retorno de 10 anos.
-
19
Baseado na srie histrica de vazes, Tennant (1976) categorizou as condies do rio em
funo da sazonalidade anual (perodo seco e perodo chuvoso) e de percentagens do valor de
vazo mdia de longo termo (QMLT), conforme apresentado no Quadro 1.
Apesar da recomendao feita pelo mtodo de se considerar a sazonalidade anual,
geralmente adota-se um valor constante de vazo ecolgica, sendo 10% a condio mnima a
ser atendida, 30% representando uma condio boa e 60% como sendo excelente (Richter et
al., 1997).
Vazo recomendada Condio do rio Outubro maro
(seco) Abril setembro
(chuvoso) Flushing ou mxima 200% da vazo mdia anual Faixa tima 60 a 100% da vazo mdia anual Excepcional 40% 60% Excelente 30% 50% Boa 20% 40% Regular ou em degradao
10% 30%
M ou mnima 10% 10% Degradao severa 10% a zero da vazo mdia anual
Quadro 1: Recomendaes de vazo pelo mtodo de Tennant para peixes, vida selvagem e recreao. Fonte: adaptado de Tennant (1976)
- Mtodo de vazo mdia mnima de sete dias de durao com perodo de retorno
de 10 anos (Q7,10):
De acordo com Mendes (2007), o conceito da vazo mdia mnima de 7 dias de
durao com tempo de retorno de 10 anos (Q7,10) surgiu da necessidade de caracterizao do
potencial de abastecimento de um curso dgua para suprimento das demandas de uma
localidade. Fixou-se a durao de sete dias porque este intervalo de tempo considera as
variaes de demanda em uma semana completa (dias teis e finais de semana) e fixou-se o
perodo de retorno em 10 anos por julgar-se aceitvel que, em todo o ano, houvesse 10% de
probabilidade de que a vazo ficasse abaixo do valor mnimo exigido pela demanda.
A Q7,10 reflete uma situao de severa escassez, representando a mdia da vazo
mnima dos sete dias mais crticos do ano cuja probabilidade de ocorrncia seja de 10%.
Usualmente, os rgos gestores que adotam este mtodo para determinar a vazo ecolgica
adotam uma percentagem da Q7,10 como valor de vazo mnima, ou seja, um valor ainda
menor do que o obtido.
A Q7,10 determinada por reteno das mnimas das mdias mveis das vazes
dirias com janelas de sete dias ao longo do ano e posterior ajuste com alguma distribuio de
-
20
probabilidades, como a de Gumbel para mnimos, a log-normal, a de Weibull, entre outras
(NAGHETTINI; PINTO, 2007; MENDES, 2007). Aps o ajuste, deve-se realizar uma
investigao para verificar existncia de outliers, que pode ser feita pela anlise dos resduos
estudentizados. Deve-se tambm verificar a aderncia dos valores ajustados srie observada,
conforme Naghettini e Pinto (2007). Um exemplo da aplicao deste mtodo na estao
fluviomtrica de Porto So Jos no alto rio Paran mostrado na figura 1.
0
1000
2000
3000
4000
5000
6000
7000
8000
9000
10000
1 10 100
T (anos)
Q7 (
m3 /s
)
Figura 1: Ajuste das vazes anuais mnimas pela distribuio de probabilidades de Gumbel para a estao fluviomtrica de Porto So Jos no alto rio Paran Fonte: Okawa (2008)
- Mtodo de mdia das vazes anuais mnimas de sete dias de durao:
No mtodo das vazes anuais mnimas de 7 dias de durao, o procedimento o
mesmo do mtodo de Q7,10, com reteno das mnimas das mdias mveis das vazes dirias
com janelas de sete dias ao longo do ano. O valor adotado como vazo ecolgica ser a mdia
dos valores retidos, conforme Benetti et al. (2003).
- Mtodo da curva de permanncia de vazes:
A curva de permanncia de vazes pode ser determinada utilizando-se a srie
histrica de vazes mdias dirias, mensais ou anuais. Os registros de vazo mdia so
classificados em ordem decrescente e a permanncia de cada vazo expressa como uma
porcentagem do tempo em que a vazo considerada igualada ou superada (PINTO et al.,
1976). Um exemplo da aplicao deste mtodo mostrado na figura 2 para a estao
fluviomtrica de Porto So Jos no alto rio Paran.
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21
0
2000
4000
6000
8000
10000
12000
14000
16000
18000
20000
22000
24000
26000
28000
30000
32000
34000
0 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100
Porcentagem de tempo (%)
Vaz
o m
dia
di
ria (m
3 /s)
Figura 2: Curva de permanncia de vazes para a estao de Porto So Jos no alto rio Paran. Fonte: Okawa (2008)
Geralmente, adota-se como vazo ecolgica a Q90%2 ou a Q95%, ou ainda
percentagens destas vazes, o que geralmente resulta em valores extremamente baixos para
manuteno do macrossistema fluvial.
Os mtodos hidrolgicos estatsticos para determinao da vazo ecolgica foram
aplicados para clculo da vazo mnima residual a jusante do barramento da usina hidreltrica
de Porto Primavera no alto rio Paran (OKAWA, 2008). Os resultados encontram-se no
quadro 2, onde so apresentados a vazo calculada, o critrio adotado por diferentes rgos
gestores e a vazo mnima residual resultante da aplicao concomitante do mtodo e do
critrio adotado.
Mtodo Vazo calculada (m3/s)
Critrio adotado Vazo mnima residual pelo critrio adotado
(m3/s) Tennant (QMLT) 8.777,84 30% da QMLT 2.633,35
Q7,10 3.913,99 Q7,10 3.913,99
Mdia das Q7 5.865,17 Mdia das Q7 5.865,17 Curva de permanncia de vazes com Q95%
4.200,00 50% da Q95% 2.100,00
Quadro 2: Vazo mnima residual a jusante do barramento da usina hidreltrica de Porto Primavera no alto rio Paran, na estao de Porto So Jos. Fonte: OKAWA (2008).
2 Q90% a vazo correspondente a 90% na curva de permanncia. Em outras palavras, em 90% do tempo esta vazo igualada ou superada. A Q95% tem definio anloga, com percentagem de 95%.
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22
- Mtodos de classificao hidrulica
Os mtodos de classificao hidrulica utilizam parmetros hidrulicos para prever
modificaes nos hbitats aquticos. Alguns parmetros hidrulicos so: a velocidade da
corrente, a profundidade, o permetro molhado, a rea molhada da seo e o raio hidrulico
(BENETTI et al., 2003). A maior vantagem que esta categoria apresenta tentar relacionar
parmetros hidrulicos com as modificaes nos hbitats, o que leva o pesquisador a conhecer
a rea de estudo; as maiores desvantagens so aquelas relacionadas necessidade do
conhecimento da rea de estudo (necessidade de equipamentos, pessoal e recursos financeiros
para as medies, por exemplo) e, embora sejam mais completos em considerar os aspectos
ambientais do que os mtodos hidrolgicos, h a necessidade de estabelecer relaes
especficas para a rea em estudo (COLLISCHONN et al., 2005).
O mtodo do permetro molhado, elaborado em 1983, um exemplo desta categoria.
Este mtodo supe a existncia de uma relao direta entre o permetro molhado e a
disponibilidade de habitat para a ictiofauna. Geralmente, escolhe-se um trecho crtico do rio
(locais com velocidades altas e profundidades baixas) para realizar as medies de permetro
molhado, profundidade e velocidade para, no mnimo, trs vazes. De posse destes dados,
confecciona-se um grfico de vazo versus permetro molhado, observando se ocorre um
ponto de inflexo no grfico, conforme figura 3.
Figura 3: Grfico de vazo por permetro molhado na aplicao do mtodo do permetro molhado para estimar vazo ecolgica (Qecolgica). Fonte: adaptado de Stalnaker et al. (1995)
O ponto de inflexo representa o ponto a partir do qual o aumento da vazo traduz-se
num aumento pouco significativo do permetro molhado e numa rpida deteriorao das
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23
condies de habitat. A vazo referida no ponto de inflexo a vazo recomendada,
considerando como pressuposto que a vazo ecolgica obtida nas zonas de corredeiras
igualmente adequada para os outros tipos de habitat (BENETTI et al., 2003; PAULO, 2007;
UNESCO, 2007).
- Mtodos de classificao de hbitats
Os mtodos de classificao de hbitat combinam as caractersticas hidrulicas
(velocidade, profundidade, cobertura vegetal e substrato) de um trecho do rio com critrios de
aptido do hbitat para uma espcie, numa determinada fase do seu ciclo de vida, para estimar
a variao do hbitat disponvel em funo da vazo. Parte-se da premissa de que as espcies
refletem as condies existentes para manuteno do ecossistema. Esta categoria usualmente
implica na determinao de uma relao de vazo-hbitat para comparar alternativas de vazo
ecolgica ao longo do tempo.
O modelo computacional IFIM (Instream Flow Incremental Methodology) o mais
conhecido para esta abordagem (BOVEE et al., 1998); o fator limitante para a aplicao do
modelo a grande quantidade de informaes necessrias que inviabilizam sua aplicao de
forma mais extensiva. (ALVES; HENRIQUES, 1994; BENETTI et al., 2003; MENDES,
2007). Alm deste fator, o mtodo requer bom entendimento das espcies em estudo, a
durao para sua implantao varia entre 2 e 5 anos e possui alto custo de execuo
(UNESCO, 2007).
- Mtodos holsticos
A maioria dos mtodos para definio de vazo ecolgica tem seu foco no
conhecimento ou nos requerimentos hidrolgicos de uma ou de poucas espcies aquticas,
negligenciando as necessidades de outras espcies ou dos processos do ecossistema em geral,
sem considerar, por exemplo, a influncia dos processos hidrolgicos sobre o material
transportado, a ciclagem de nutrientes ou as mudanas geomorfolgicas. Embora estes
mtodos possam ser teis para avaliar os requerimentos de vazo de algumas espcies
individuais, pouco contribuem para o conhecimento da dinmica complexa de macrossistemas
fluviais, que envolve hbitats multivariados, histrias de ciclo de vida variadas e complexas,
interaes biticas (competio, predao), mudanas geomorfolgicas e outros fatores
crticos em potencial (RICHTER et al., 1997).
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24
De acordo com Richter et al. (1996), um dos propsitos do gerenciamento de
ecossistemas deve ser o de sustentar a integridade do ecossistema protegendo a diversidade
nativa e os processos ecolgicos que criam e mantm esta diversidade.
Pesquisas limnolgicas sugerem que a composio bitica de ambientes aquticos
depende grandemente do regime hidrolgico e a variao intra-anual essencial para
completar com sucesso o ciclo de vida de muitas espcies aquticas. Alm da variao intra-
anual, a variao inter-anual do regime hidrolgico tambm importante para sustentar a
biodiversidade nativa.
Estas concluses conduzem ao paradigma do regime natural, no qual a manuteno
da biodiversidade nativa sustentada pela proteo (ou restaurao) do regime hidrolgico
chamado de natural, ou seja, o regime hidrolgico existente sem interveno humana
(RICHTER et al., 1996). De uma forma concisa, o paradigma do regime natural estabelece
que: a completa variabilidade intra e inter-anual do regime hidrolgico, associada com as
caractersticas de periodicidade, durao, freqncia e taxa de mudana, so crticas para
sustentao de toda a biodiversidade nativa e da integridade dos ecossistemas aquticos
(RICHTER et al., 1997; ROCHA, 2002). O paradigma do regime natural rege os mtodos
holsticos (BBM e hidrograma ecolgico) descritos a seguir.
- Mtodo BBM (Building Blocks Methodology) ou Mtodo de Construo de
Blocos
O mtodo BBM considerado um dos mtodos holsticos para determinao da vazo
ecolgica. Tais mtodos consideram as necessidades dos componentes de um ecossistema
bem como suas inter-relaes, para estabelecimento da vazo ecolgica. De acordo com
Britto (2005), o mtodo BBM foi desenvolvido pelo Department of Water Affairs and
Forestry, com ajuda de cientistas, para determinar as necessidades de vazo para ecossistemas
aquticos na frica do Sul. O mtodo foi desenvolvido paralelamente na Austrlia, onde
denomina-se mtodo holstico. Este mtodo considera que a proteo dos recursos hdricos
inclui a proteo de todo ecossistema fluvial, englobando a gua, a biota, os sedimentos e a
mata ciliar, bem como a proteo de todos os componentes que esto interligados ao
ecossistema fluvial, tais como outros rios, lagoas e banhados.
A denominao Building Blocks refere-se aos componentes do regime de vazo que
so especficos para o rio estudado. Os blocos de vazo usualmente pertencem s seguintes
categorias: vazes de base em perodos de estiagem; vazes de base em perodos de chuvas;
enchentes nas estaes chuvosas; pulsos de curta durao e vazes sub-superficiais na estao
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25
seca. Os mnimos volumes de gua requeridos para cada bloco so determinados, definindo
um regime de vazes mnimas para manter os ecossistemas aquticos (BENETTI et al., 2003).
Segundo Britto (2005), o princpio bsico do mtodo BBM dita que, em qualquer rio,
h algumas vazes, dentro de um regime de vazes, que so mais importantes que outras para
a manuteno dos ecossistemas fluviais. Estas vazes podem ser identificadas e descritas
atravs de seu tempo de ocorrncia, durao e magnitude. O mtodo tem por hiptese que a
identificao dos componentes mais importantes do regime natural de vazes e a sua
incorporao no regime modificado podem contribuir para a manuteno do ecossistema
aqutico.
O mtodo BBM depende do conhecimento da rea de estudo e da opinio de
especialistas em diversas reas, reunidos em um processo estruturado de encontros para
apresentao, debates e concluses sobre qual o regime de vazes a ser adotado para
possibilitar a manuteno do ecossistema aqutico, no estado de qualidade desejado. Nestes
encontros, geralmente, renem-se especialistas das reas de peixes, limnologia,
geomorfologia fluvial, plncton, invertebrados aquticos, vegetao, integridade de hbitats,
hidrlogos, hidrulicos, qumicos e cientistas sociais (BRITTO, 2005; BENETTI et al., 2003).
- Ecologically sustainable water management (Manejo Ecologicamente Sustentvel
da gua) e Hidrograma ecolgico conceitos e elaborao
A determinao do hidrograma ecolgico para um dado local baseia-se em procurar a
quantidade de gua necessria, varivel no tempo, para dar sustentabilidade a um rio. Richter
et al. (2003) enuncia que o gerenciamento ecologicamente sustentvel da gua protege a
integridade ecolgica do ecossistema afetado, ao mesmo tempo em que atende s
necessidades humanas. Salienta, ainda, que proteger a integridade ecolgica implica em
manter a composio e a estrutura da diversidade, assim como o funcionamento natural do
ecossistema.
Tradicionalmente, o gerenciamento da gua altera de forma significativa a
variabilidade natural do recurso hdrico com o objetivo de atender a requerimentos de usos
consuntivos (abastecimento pblico, usos industriais, usos para irrigao, entre outros) e usos
no consuntivos (navegao, gerao de energia, recreao, entre outros). No entanto, de
acordo com Richter et al. (2003), quando a variabilidade natural fortemente alterada
ocorrem mudanas marcantes nas condies biolgicas, qumicas e fisicas dos ecossistemas
aquticos naturais. Quando alteraes no regime natural se tornam excessivas, causam uma
degradao do ecossistema aqutico.
-
26
O grande desafio para o gerenciamento de recursos hdricos projetar e implementar
um programa de gerenciamento que armazene e derive a gua para propsitos humanos de
maneira que no cause degradao ao ecossistema aqutico (RICHTER et al., 2003). A
questo implcita que existem limites para cada um dos parmetros que influenciam na
conservao da integridade do ecossistema, ou seja, a disponibilidade de gua deve ser tal que
no ocorram alteraes fora dos limites aceitveis na sedimentologia, na geomorfologia, nas
caractersticas limnolgicas, nas alteraes climticas locais, entre outros fatores. Cada local
estudado ter seus limites estabelecidos de acordo com seus requerimentos de fluxo.
Para tal, torna-se necessrio conhecer o regime hidrolgico do rio quanto magnitude
das vazes, freqncia de ocorrncia, durao, periodicidade, incio e fim de cheias e
estiagens, variabilidade intra e inter-anual, fluxos normais altos e eventos extremos (NEIFF,
1990; POFF et al., 1997; RICHTER et. al, 2003; COLLISCHONN et al., 2005). Os
requerimentos de fluxo podem ser especificados como faixas de valores dentro das quais o
componente em questo deva ser mantido, ou podem ser expressos como limites limiares para
caractersticas especficas de fluxo, que no devam ser ultrapassados.
Como exemplo de aspectos fundamentais do regime hidrolgico, pode-se definir quais
so as vazes de base nos perodos seco e mido, quais as vazes correspondentes s cheias
normais que ocorrem todos os anos, quais as correspondentes s cheias extraordinrias; quais
as vazes mnimas extraordinrias; quais as taxas de variao de vazo ao longo do tempo;
qual a variabilidade interanual. Todos estes valores de vazo sero obtidos olhando para o
passado, por meio da srie histrica de vazes, em uma tentativa de prever o futuro por
meio da definio de um hidrograma ecolgico. Ao assumir esse pressuposto, de que o
passado se repetir no futuro ou de que o futuro ser ao menos parecido com seu passado, h
um elevado grau de incerteza associado prescrio de um hidrograma ecologicamente
aceitvel (COLLISCHONN et al., 2005).
A metodologia proposta por Collischonn et al. (2005) baseada em Richter et al. (2003)
para determinao do hidrograma ecolgico a do Manejo Ecologicamente Sustentvel da
gua, denominado MESA, que busca o gerenciamento dos recursos hdricos de uma maneira
que possa atender aos usos humanos ao mesmo tempo em que mantm ou recupera a
integridade dos ecossistemas. Esta metodologia est organizada em seis passos, mostrados na
figura 4.
Aspectos fundamentais desta metodologia esto implcitos nos passos 4, 5 e 6: no
passo 4, a busca por solues para os conflitos deve ser feita com a colaborao de todos os
envolvidos no cenrio de manejo e gesto do recurso hdrico; no passo 6, salientam-se as
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27
Figura 4: Metodologia proposta por Collischonn et al. (2005) baseada em Richter et al. (2003) para determinao do hidrograma ecolgico Manejo Ecologicamente Sustentvel da gua (MESA). Fonte: adaptado de Richter et al. (2003)
Passo 1 Estimar necessidades de vazo para conservar o macrossistema fluvial
Passo 2 Estimar necessidades de vazo atuais e futuras para uso humano
Passo 3 Quantificar e avaliar os conflitos entre necessidades de vazo do macrossistema fluvial e do uso humano
Passo 6 Desenvolver e implementar um programa de manejo adaptativo
Passo 5 Realizar experimentos prticos de manejo da gua
Passo 4 Buscar solues para os conflitos de forma colaborativa
-
28
palavras manejo experimental e monitoramento, ou seja, o resultado deve ser
continuadamente testado, validado e aprimorado, conforme novas situaes e informaes so
obtidas ao longo do tempo. Portanto, o passo 6 no se encerra em si mesmo, mas h um
constante retorno aos passos anteriores (RICHTER et al., 2003; COLLISCHONN et al.,
2005). No passo 5, as hipteses das relaes fluxo-biota, ou da influncia do fluxo sobre o
hbitat fsico ou sobre a qualidade da gua, devem ser formuladas de maneira que possam ser
testadas por experimentos cuidadosamente delineados (RICHTER; RICHTER, 2000).
A questo do manejo experimental fundamental para a definio de metodologias
que contemplem os requerimentos ambientais de fluxo. De acordo com Richter et al. (2006),
no manejo experimental, uma viso ou modelo mental construdo para o ecossistema a ser
gerenciado e um programa de monitoramento desenvolvido baseado neste modelo, no qual
os indicadores principais que sinalizam as respostas do ecossistema s aes de manejo so
monitorados experimentalmente e depois avaliados de tal forma que os resultados das
decises de gerenciamento possam ser reavaliadas. Os objetivos de manejo so explicitamente
definidos e periodicamente revisados, j que o manejo experimental um processo e no um
fim em si mesmo. Desta forma, os gerenciadores e intervenientes devem estar dispostos a
fazer mudanas frente a novas respostas do ecossistema e frente a aprendizados adquiridos ao
longo do tempo, em que se reconhece que h uma faixa de opes a serem testadas conferindo
grande flexibilidade ao manejo.
O processo cientfico para desenvolvimento de quais so os requerimentos ambientais
de fluxos compreendem a execuo de cinco etapas (RICHTER et al., 2006), conforme
mostrado na figura 5. A etapa 2 envolve a reviso da literatura (realizada neste Captulo) e o
resumo de resultados para a rea de hidrologia (ver Captulos II e III). Naturalmente, no
possvel estimar exatamente os requerimentos de fluxos, seja de espcies individuais, seja de
todo o macrossistema fluvial, mas possvel a definio de estimativas iniciais que devero
ser discutidas, testadas e refinadas posteriormente.
Uma forma de estabelecer os requerimentos de fluxo usar os Indicadores de
Alterao Hidrolgica (Indicators of Hydrologic Alterations IHA) descritos em Richter et
al. (1996) e estabelecer as faixas de valores de vazo pela Abordagem da Faixa de
Variabilidade (RVA) de acordo com Richter et al. (1997). Estes mtodos no tm por objetivo
descrever ou prever respostas biolgicas decorrentes das alteraes hidrolgicas, e sim
quantificar as alteraes hidrolgicas no regime de fluxos, sem estabelecer relaes de causa-
efeito. A aplicao do IHA e da RVA podem ser constatados em Richter et al. (1996), Richter
et al. (1997), Rocha (2002), Richter et al. (2006) e no captulo II deste trabalho.
-
29
Figura 5: Fluxograma do processo cientfico para determinao dos requerimentos ambientais de fluxos Fonte: adaptado de Richter et al. (2006)
A aplicao desses mtodos auxilia no estabelecimento do hidrograma ecolgico, pois
para tal deve-se avaliar quais aspectos do regime hidrolgico so fundamentais para a
manuteno do ecossistema em questo, ou seja, quais os objetivos ecolgicos, traduzidos
para valores de vazo, que devam ser atendidos ou evitados, no limitados a uma ou poucas
Etapa 1 Encontro para orientaes
gerais
Etapa 2 Confeco de relatrios com
reviso da literatura e resultados para a rea de
estudo - Passos 1, 2 e 3 da MESA
Etapa 3 Encontro com debates entre todos os atores envolvidos -
definir o hidrograma ecolgico -
Passo 4 da MESA
Etapa 5 Definio de um programa
de pesquisa e coleta de dados -
Passos 5 e 6 da MESA
Etapa 4 Implementao da
prescrio de fluxos
-
30
espcies individuais (RICHTER et al., 2003). As necessidades de fluxo de espcies
individuais provm apenas uma perspectiva muito limitada comparada faixa mais ampla de
fluxos necessrios para sustentar todo o macrossistema fluvial (RICHTER; RICHTER, 2000).
De uma forma resumida, so apresentadas no quadro 3 as caractersticas dos principais
mtodos para determinao da vazo ecolgica. Os mtodos foram apresentados conforme a
categoria em que se enquadram e foram destacadas as principais vantagens e desvantagens, a
relao hidrologia/ecologia presente no mtodo, a durao e o custo para implementao. O
custo foi avaliado apenas em baixo, mdio ou alto, conforme UNESCO (2007). Categoria Mtodo Vantagens Desvantagens Relao
ecologia /
hidrologia
Durao
para
implemen-
tao
Custo
para
implemen-
tao
Hidrolgicos Tennant Baixo custo, rpido e fcil implementao.
Feito para gesto de hbitat de trutas; vlido somente para a regio em que foi desenvolvido; inexistncia de validao biolgica.
Inexistente Duas semanas
Mdio
Hidrulicos Permetro molhado
Uso fcil e pouca aquisio de dados
Considera as caractersticas fsicas e no as necessidades da biota do rio.
Inexistente 2 a 4 meses
Baixo
Classificao
de hbitats
IFIM Muito bem documentado para espcies de peixes
Requer muitos dados de campo; difcil uso; requer bom entendimento da espcie adotada.
Mdia 2 a 5 anos Alto
Holstico Considera o macrossistema fluvial e no uma nica espcie
No possui conjunto estruturado de procedimentos para uso; requer muitos dados de campo; requer equipe multidisciplinar.
Alta 6 a 18 meses
Alto
BBM Extremamente documentado, considera o macrossistema fluvial e no uma nica espcie
Julgamento de sua efetividade necessita de tempo; requer muitos dados de campo; requer equipe multidisciplinar.
Alta 6 a 18 meses
Alto Holsticos
MESA Considera o macrossistema fluvial e no uma nica espcie
Julgamento de sua efetividade necessita de tempo; requer muitos dados de campo; requer equipe multidisciplinar.
Alta 6 a 18 meses
Alto
Quadro 3: Caractersticas dos principais mtodos para determinao da vazo ecolgica/ambiental. Fonte: modificado de UNESCO (2007).
-
31
MTODOS PARA DETERMINAO DE VAZO ECOLGICA UTILIZADOS
PELOS RGOS GESTORES NO BRASIL
Atualmente, no so todos os rgos gestores no Brasil que tm definido qual seja o
critrio adotado para determinao da vazo ecolgica (BRASIL, 2005), j que no h
legislao nacional sobre o tema. A falta de adoo de um critrio resultante de diversos
fatores, como a heterogeneidade de regimes hidrolgicos existente no Brasil, em que cada
regio possui suas particularidades, inclusive com rios intermitentes. Usualmente, os rgos
gestores dos recursos hdricos tm adotado critrios particulares para o estabelecimento das
vazes de referncia para outorga, porm sem apresentar justificativas para a adoo de
determinado critrio em detrimento de outro, conforme quadro 4.
Estado Vazo de
referncia
Critrio de outorga
usos consuntivos
Critrio de outorga vazo mnima residual a jusante
de empreendimentos hidrulicos
ANA Curva de permanncia de vazes QMLT
70% da Q95% Tennant - % da QMLT
PR Curva de permanncia de vazes 50% da Q95% 50% da Q95% BA Curva de permanncia de vazes 80% da Q90% 80% da Q90% Distrito Federal
Q7,10 Q90%
QMLT (Decreto n 22.359, de 31 de
agosto de 2001)
80% das vazes de referncia
90% da Q7,10 para
abastecimento humano
80% das vazes regularizadas
GO Curva de permanncia de vazes 70% da Q95% No possui RO Q7,10 30% da Q7,10
(captao a fio dgua)
30% da vazo normal
SP Q7,10 50% da Q7,10 Q7,10 MG Q7,10 30% da Q7,10 70% da Q7,10 PI Curva de permanncia de vazes 80% da Q95%
80% da Q90% reg No possui
PB Curva de permanncia de vazes 90% da Q90% reg No possui RN Curva de permanncia de vazes 90% da Q90% reg No possui CE Curva de permanncia de vazes 90% da Q90%reg Outros estudos
Quadro 4: Critrios de outorga de direito de uso de gua em alguns estados brasileiros. Fonte: adaptado de BRASIL (2005)
Do quadro 4, percebe-se que todas as abordagens adotadas baseiam-se unicamente na
srie histrica de vazes. Nos estados onde os rios no so naturalmente perenes, e sim
perenizados por reservatrios, o critrio adotado baseia-se em percentagem da vazo
regularizada. Sendo assim, todos os critrios aqui apresentados so destitudos de significado
ecolgico.
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32
O rgo gestor no Cear no adota critrio nico para a vazo mnima residual a
jusante de empreendimentos hidrulicos, e considera que a dinmica do semi-rido
ligeiramente diferente tendo em vista que algumas caractersticas so peculiares, tais como:
hidrogramas naturais com pico acentuado e valores nulos em alguns meses do ano. A
preservao ambiental passa pela compreenso desta dinmica e mecanismos para mitigar a
atenuao dos picos provocados pela audagem, e no propriamente promoo de uma
vazo artificial mnima (BRASIL, 2005). Neste caso, pode ser que os requerimentos de fluxo
estejam sendo considerados, e que haja significado ecolgico na adoo de vazes residuais a
jusante de empreendimentos hidrulicos nesse estado.
DISCUSSO
Os mtodos para determinao dos valores de vazo que sustentam um macrossistema
fluvial foram desenvolvidos ao longo do tempo, a partir dos estudos de novas teorias
ecolgicas. Ainda que se considere que o conceito de uma vazo ecolgica mnima e
constante est ultrapassado e incorreto, a utilizao de um dos primeiros mtodos
(hidrolgico, classificao hidrulica ou classificao de hbitats) em detrimento de um
mtodo holstico, baseia-se em muitos outros fatores.
Um deles a ampla produo tcnico-cientfica utilizando esses mtodos. Alm disso,
a falta de aquisio regular de dados em muitas bacias hidrogrficas no Brasil e a necessidade
de trabalho conjunto de uma equipe multidisciplinar so dificuldades a serem enfrentadas na
transio de paradigmas.
Com relao aos mtodos atualmente utilizados pelos rgos gestores no Brasil, antes
da aplicao de ajuste de distribuio de probabilidades no mtodo Q7,10 devem ser testados
os pressupostos de aleatoriedade, estacionariedade, independncia e homogeneidade das
sries histricas de vazes (NAGHETTINI; PINTO, 2007). Assim, os rgos gestores que
aplicam o mtodo Q7,10 para determinao da vazo mnima residual a jusante de barramentos
devem atentar para o fato de que os pressupostos de aleatoriedade e estacionariedade no so
atingidos em reas com reservatrios de acumulao. Com relao aleatoriedade, as vazes
de um curso dgua regularizadas pela operao de reservatrios constituem exemplo de srie
no aleatria. Quanto estacionariedade, a construo de reservatrios constitui saltos ou
alteraes bruscas na srie (NAGHETTINI; PINTO, 2007).
O pressuposto de independncia varia com o intervalo de tempo que separa as
observaes consecutivas da srie hidrolgica, sendo considerada forte dependncia para
vazes mdias dirias, e fraca ou nenhuma para vazes mdias mnimas anuais. Portanto,
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pode-se considerar que o pressuposto de independncia atingido no ajuste de distribuio de
probabilidades para mnimas anuais no mtodo Q7,10.
O pressuposto de homogeneidade implica que todos os elementos de uma amostra
provm de uma nica e idntica populao. Por exemplo, em uma srie de vazes mximas
anuais, os valores decorrentes de enchentes provocadas por precipitaes comuns devem ser
diferenciados daqueles decorrentes de precipitaes extraordinariamente elevadas, resultantes
de condies hidrometeorolgicas especiais, como a ocorrncia do fenmeno El Nio; neste
caso, a srie hidrolgica deve ser considerada heterognea (NAGHETTINI; PINTO, 2007).
Como o ajuste realizado para vazes mnimas anuais no mtodo Q7,10, as vazes ocorridas
em anos de El Nino provavelmente no afetam significativamente o ajuste, porm essa
possibilidade deve ser verificada em cada caso.
Com relao ao mtodo de Tennant, esse mtodo recomenda uma vazo ecolgica
baseada num conjunto de percentagens em relao vazo mdia de longo termo, calculada
para o local do aproveitamento hidrulico, recorrendo-se a diferentes percentagens para os
perodos seco e mido. Sendo assim, a correta aplicao deste mtodo envolve vrias etapas:
1. a determinao da vazo mdia anual no local do aproveitamento hidrulico; 2. a
observao do curso dgua durante os perodos em que a vazo aproximadamente igual a
10%, 30% e 60% da vazo mdia anual, documentando-o com fotografias dos vrios tipos de
hbitats caractersticos; 3. a utilizao da informao obtida na etapa 2 para elaborar
recomendaes de vazes ecolgicas conforme o quadro 1. Entretanto, na aplicao desse
mtodo raramente cumpre-se a etapa de reconhecimento de campo, sendo a recomendao de
vazes efetuada com base na porcentagem de 30% da vazo mdia de longo termo
(UNESCO, 2007).
Com relao aos mtodos holsticos, esses so mais complexos do que os de
classificao de hbitats. Por outro lado, os mtodos de classificao de hbitats consideram
os requerimentos de fluxos de apenas uma espcie e resultam em um valor mnimo constante
de vazo ecolgica, desprezando a variabilidade intra e inter-anual, bem como os atributos de
periodicidade, durao e freqncia das vazes. Alm disso, os mtodos de classificao de
hbitats no tm por base o manejo experimental como uma ferramenta a ser aplicada
continuadamente, retroalimentando as regras de gesto do recurso hdrico. Portanto, dada a
complexidade de ambos os mtodos, mais interessante a aplicao de um mtodo holsitico,
por ser mais abrangente ao considerar o macrossistema fluvial e por resultar na determinao
das vazes ecologicamente relevantes, alm de considerar a variao intra e inter-anual de
vazes e possibilitar a elaborao de um hidrograma ecolgico para a rea considerada.
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No Brasil, os debates envolvendo a questo de qual a vazo que sustenta a
integridade dos rios tm se intensificado nos ltimos anos, seja por iniciativa de associaes,
de rgos gestores estaduais e federais, ou de rgos de fomento pesquisa. O momento
poltico da gesto de recursos hdricos no Brasil de processo de transio entre os dois
conceitos e de definio de metodologias, onde a comunidade cientfica deve decidir de que
forma as estimativas de fluxos para atender os requerimentos ambientais sero determinadas.
Dentro desse contexto, o Ministrio do Meio Ambiente confeccionou o Plano
Nacional de Recursos Hdricos, que prev, entre suas propostas, o aperfeioamento dos
procedimentos de outorga de uso dos recursos hdricos e menciona a necessidade de definio
de hidrogramas ecolgicos (BRASIL, 2008). Portanto, o termo vazo ecolgica tem sido
substitudo por vazo ambiental ou hidrograma ecolgico.
As novas abordagens e o novo conceito de hidrograma ecolgico esto nos seus
passos iniciais, o que levar a muitos desafios para a sua implantao no Brasil. Um dos
desafios estabelecer e realizar pesquisas cujo objetivo seja identificar a relao entre
ecologia e hidrologia, tais como as realizadas no macrossistema fluvial com plancie de
inundao do alto rio Paran (ver Captulo II; THOMAZ et al., 2004; TRAIN; RODRIGUES,
2004; LUZ-AGOSTINHO, 2005; ABUJANRA, 2007; RODRIGUES, 2007).
Outros aspectos a serem considerados para implantao do hidrograma ecolgico so a
heterogeneidade de biomas existentes no Brasil, com diferentes comportamentos climtico-
hidrolgicos e diversos graus de interveno humana no recurso hdrico. Diante dessas
questes, provavelmente as tcnicas aplicadas para elaborao do hidrograma ecolgico
devero ser diferenciadas por regio do pas, no obedecendo necessariamente geopoltica
(SOUZA et al., 2006). O papel dos comits de bacia hidrogrfica com a elaborao de planos
de recursos hdricos especficos ser essencial para este fim.
Com relao aos rgos gestores, para a efetiva determinao do hidrograma
ecolgico, o cadastro de usurios e de usos da gua dever estar estabelecido, e ser
verdadeiro, ou seja, um grande levantamento de campo associado a uma campanha para
adeso da sociedade poltica pblica de outorga dever ser realizado. Dever ainda ser
realizada uma consistncia de dados hidrolgicos, principalmente com relao s curvas de
descarga dos rios.
REFERNCIAS ABUJANRA, F. Influncias do controle de nvel e transparncia da gua impostos pela formao do reservatrio de Porto Primavera sobre peixes de diferentes categorias
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ANEXO A ALGUMAS QUESTES QUE AUXILIAM NO ENTENDIMENTO DOS REQUERIMENTOS AMBIENTAIS DE FLUXOS Fonte: adaptado de Richter et al. (2006)
Hidrologia
1. Existem estaes de monitoramento ao longo do rio, e, se existem, onde esto localizadas,
quem as mantm, e h quanto tempo elas esto em operao?
2. Quais so, ou quais foram, os padres sazonais tpicos de variao do fluxo do regime
natural do rio, por exemplo, quando os fluxos mais altos e os mais baixos tendiam a ocorrer?
3. Em que extenso os fluxos baixos, altos e de enchente que ocorrem no rio mudaram ao
longo do tempo em resposta s influncias antropognicas? Os fluxos baixos extremos
tornaram-se mais freqentes? Como so os hidrogramas dos anos recentes comparados aos
hidrogramas pr-desenvolvimento?
4. Quais so as influncias antropognicas primrias sobre o regime de fluxos, e onde estes
impactos ocorrem? Alguns impactos parecem ser dominantes?
5. Que tipos de atividades para o recurso hdrico so planejadas para o futuro e como estas
atividades influenciam o regime de fluxos?
6. Qual a importncia da contribuio das guas subterrneas para o fluxo de base? Qual a
natureza das conexes hidrulicas entre as fases do rio e os nveis do lenol fretico aluvial?
Como estas conexes podem ser alteradas por planejamentos futuros para o recurso hdrico?
Hidrulica
1. Existe alguma modelagem hidrulica sendo feita no rio? Existe algum estudo para
confeco de mapeamento de reas com risco de inundao?
2. Quo bom o entendimento entre fases do rio (elevaes de nvel) e vazes?
3. Quo bom o entendimento entre relaes dos fluxos e as distribuies de velocidades e as
profundidades no canal do rio?
4. Existe conectividade longitudinal (de montante para jusante) no escoamento ou h grandes
descontinuidades (barragens de derivao); se existem, onde se localizam?
5. A conectividade lateral entre o rio e sua plancie de inundao tem sido alterada de alguma
forma?
Geomorfologia
1. Existem pesquisas topogrficas sendo conduzidas no canal do rio ou na plancie de
inundao (incluindo pesquisas para pontes, estradas, mapeamento da plancie, etc)?
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40
2. O sistema canal-plancie est em equilbrio ou em desequilbrio? A entrada de sedimentos
em cada segmento est em equilbrio com a capacidade do canal em transport-los atravs do
segmento? Foram detectadas tendncias na elevao do leito do rio ou fundo do lago,
indicando degradao ou agradao? O perfil longitudinal do rio mudou ao longo do tempo?
3. A largura do canal ou da plancie mudou ao longo do tempo?
4. O traado do canal mudou ao longo do tempo, como por exemplo entre formas
meandrantes e entrelaados?
5. A distribuio dos tamanhos dos sedimentos do leito do rio mudaram ao longo do tempo?
6. A disponibilidade de habitats fsicos de vazantes mudaram ao longo do tempo?
7. A migrao do canal lateral ou a formao de barras so importantes ecologicamente (por
exemplo, para suportar comunidades de plantas riprias)?
8. Atividades humanas e uso do solo alteraram significativamente a morfologia e os processos
do canal e da plancie?
Qualidade da gua
1. Os dados de qualidade da gua tem sido coletados no rio, e, em caso afirmativo, por quem,
onde, por quanto tempo e de que tipos?
2. Como as condies de qualidade da gua variam espacialmente no rio?
3. Qual o conhecimento sobre problemas de qualidade da gua no rio?
4. Existe descarga de guas residuais no rio? Onde e quanto? Que proporo de baixos fluxos
do rio a montante resulta da descarga de guas residuais?
5. Qual o conhecimento sobre flutuaes dirias, sazonais, anuais em parmetros chave como
oxignio dissolvido ou temperatura?
6. Como as atividades humanas afetam a qumica da gua, temperatura ou oxignio dissolvido
no rio?
7. Quais componentes de qualidade da gua so de maior preocupao para os organismos-
alvo, fases de vida ou processos ribeirinhos (por exemplo, oxignio dissolvido, sedimentos
em suspenso, temperatura, elementos qumicos, nutrientes)? A distribuio ou abundncia de
espcies so afetadas pela poluio da gua?
8. Os grandes escombros de rvores so componentes importantes do ecossistema aqutico?
9. Alguma espcie de planta invasiva motivo para preocupao?
Ecologia de gua doce 1. Que tipo de dados biolgicos tem sido coletado no rio? Quem coletou, sobre que moldes
de tempo e com que freqncia?
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41
2. A abundncia ou distribuio de determinadas espcies mudou com o tempo? Estas
mudanas podem ser relacionadas com mudanas no regime de fluxos ou na qualidade da
gua do rio? Os dados esto disponveis para documentar estas tendncias?
3. Quais espcies (peixes, pssaros, mamferos, invertebrados, plantas aquticas ou vegetao
ripria) so as de maior preocupao dos pontos de vista ecolgico, scio-econmico ou
recreacional?
4. Qual o conhecimento sobre as relaes entre os fluxos no rio e as histrias de vida das
espcies aquticas? Que pocas do ano so mais crticas para espcies indicadoras, estgios de
vida ou assemblias de espcies?
5. Os requerimentos de fluxos de determinadas espcies indicadoras podem ser usados para
representar os requerimentos de fluxos de assemblias de organismos (por exemplo,
comunidades de peixes, vegetao ripria)?
6. Se o regime de fluxos no rio tem sido alterado por influncias humanas, so necessrias
condies de escoamento ainda devidamente seqenciadas para permitir que os ciclos de vida
de espcies indicadoras sejam concludos com xito?
7. Que habitats so mais limitantes, e qual a importncia de condies de fluxo de seca, cheia
ou vazes intermedirias