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OLHARES VIRTUAIS AOS PATRIMÔNIOS: AS REPRESENTAÇÕES
DOS JARDINS RECIFENSES DE BURLE MARX NO POKÉMON GO
MATHEUS SEVERO RAMOS1
Resumo
O jogo Pokémon GO, lançado em 2016 pela empresa Niantic, surgiu despertando pessoas de todo o
mundo a saírem de suas casas e percorrerem as cidades, em busca dos seres digitais conhecidos
como pokémons. O game que se tornou um fenômeno global possibilita que jogadores se aproximem
de certos espaços de suas cidades, vivenciando novas experiências na urbe. Além dos deslocamentos
pelos espaços públicos, as aproximações dos jogadores com as cidades ocorrem também por
representações urbanas dentro do jogo. Isso ocorre por meio de quadros geográficos que simulam as
cartografias urbanas e apresentam locais simbólicos que se tornam cenários do jogo, e através de
fotografias e textos descritivos são acessíveis em telas dos aparelhos celulares. Estes quadros
representativos de símbolos das paisagens urbanas possuem uma importância a mais pelo fato de
poderem ser produzidos através de participações dos próprios jogadores, e assim, revelarem os olhares
que os mesmos possuem para os símbolos de suas cidades. À par desta realidade, refletindo acerca
dos patrimônios materiais, devido à sua importância simbólica, o presente artigo propõe uma reflexão
sobre as representações, no Pokémon GO, das praças que possuem jardins tombados pelo Instituto
do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) projetadas por Roberto Burle Marx na cidade do
Recife/PE. Com esta proposta, se pretende levantar as representações das praças e de seus jardins
no jogo, e através dessas representações virtuais, compreender os olhares que os jogadores possuem
sobre estes importantes patrimônios recifenses. A escolha da temática ocorre por ser na cidade do
Recife onde se desenvolve a pesquisa de mestrado do autor acerca das espacializações de jogadores
de Pokémon GO no espaço urbano, e que dentre diversas questões, considera as representações da
cidade no game. Já a escolha por tratar das praças de Burle Marx, ocorre incialmente pela importância
destes espaços públicos e seus jardins – os primeiros produzidos por um dos maiores nomes do
paisagismo brasileiro – e em seguida por motivos simbólicos, já que no presente ano se completam
quatro anos dos tombamentos destes jardins, e em 2018 completaram-se 60 anos da inauguração do
último dos seis vergéis em questão, a Praça Faria Neves. Para alcançar os objetivos propostos, além
da revisão bibliográfica, as praças analisadas foram visitadas pelo pesquisador que, acessando o jogo
no seu aparelho celular, realizou levantamentos das representações das mesmas e de seus jardins no
game. Com o artigo, será possível realizar um diálogo acerca da potencialidade do jogo de receber e
transmitir informações sobre os patrimônios para sociedade e o aproveitamento desse potencial para
provocar reflexões nas gestões dos mesmos. Por fim, se espera contribuir para reflexões geográficas
acerca das imagens que a sociedade produz dos patrimônios urbanos, dialogando com novos
fenômenos globais oriundos da virtualidade.
Palavras-chave: Patrimônios; Representações; Ciberespaço; Ressignificações; Olhares.
Abstract
The game Pokémon GO, launched in 2016 by the company Niantic, has emerged waking people of the whole world to get out of their houses and wander around the cities, searching for digital beings know as pokémons. The game that became a global phenomenon allows the players to approach of certain urban spaces of their cities, living new experiences in the city. Besides the displacements around the
1 Acadêmico do Programa de Pós-graduação em Geografia da Universidade Federal de Pernambuco. E-mail de contato: [email protected]
public spaces, the approaches of the players with the cities occurs as well because of the urban representations inside the game. That occurs because of geographical canvas that simulate the urban cartography and present symbolic locals that become scenarios of the game, and by photographs and descriptive texts that are accessible in screens of cell phones. These canvas representative of symbols of urban landscape have one more importance, by the fact that they can be produced by participations of the players themselves, and by that, revealing the views that they have about the symbols of their cities. Knowing this reality, reflecting about the materials patrimonies, the present paper proposes to reflect about the representations in Pokémon GO of the squares that have heritage gardens listed in the Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) and projected by Roberto Burle Marx in the city of Recife/PE. With this propose, intents to bring up the representations of the squares and their gardens in the game, and through those virtual representations, understand the views that the players have about these importants heritages of Recife. The chosen of this theme occurs by being in the city of Recife where the masters research of the autor is developing, about the spatialization of the Pokémon GO players in the urban space, and between diverse questions, considerate the representation of the city in the game. The choice to deal with Burle Marx squares, occurs at first by the importance os these public spaces and their gardens – the firsts produced by one of the biggest names of Brazilian landscaping – and by symbolic reasons, because in this present year is completing four years that the gardens where listed as a heritage, and in 2018 where completed 60 years of the inauguration of the last of the six gardens cited, the Praça Faria Neves. To reach the proposed objectives, besides the literature review, the squares analysed where visited by the researcher that accessing the game in a cell phone realized a research of their representations and your gardens in the game. With this paper it will be possible to make a dialogue about the potentiality of the game to receive and transmit information, about the heritages, to the society and the exploitation of this potential to provoque reflections in the management of them. At the end, it expects to contribute with geographical reflections about the images that the society product of the urban heritages, dialoguing with a new global phenomenon originated from virtuality.
Key-words: Heritage; Representations; Cyberspace; Resignfications; Views.
1 – Introdução
Lançado em 2016 pela empresa Niantic, em parceria com a Nintendo e a The
Pokemon Company (CUNHA, 2018), o Pokémon GO surgiu com a premissa de
provocar seus jogadores a saírem de suas residências e percorrem os espaços
públicos das cidades, que se tornam os cenários deste game, e assim conquistarem
os seres digitais conhecidos como pokémons. Assim, o Pokémon GO marca uma nova
fase na história dos jogos digitais por integrar, com grande destaque (MUNHOZ,
2018), o concreto ao ciberespaço (LÉVY, 1999), uma vez que por meio da
representação das cidades, em forma de quadros geográficos (GOMES, 2017)
virtuais, semelhantes a mapas, torna as urbes, os cenários onde o mesmo se
desenvolve. Assim, as paisagens da cidade passam por meio de representações a
serem as ciberpaisagens (CARVALHO JÚNIOR, 2006) do game.
As representações das cidades no Pokémon GO são produzidas com base em
dados de mapeamentos colaborativos, e se tornam ilustrações da cartografia urbana
da cidade onde o jogador se encontra. Através do georreferenciamento, que utiliza a
localização do aparelho do jogador oferecida pelos sistemas de GPS, o jogo
apresentará na tela do aparelho quadros semelhantes a mapas do local onde o
indivíduo se encontra.
Além da cartografia, determinados símbolos das paisagens (COSGROVE,
2012) das cidades também podem ser representados de outra maneira dentro do jogo,
se tornando os chamados ginásios e poképaradas, locais onde os jogadores realizam
especialmente batalhas e adquirem itens respectivamente. As representações destes
espaços ocorrem por ícones inseridos nos quadros virtuais de forma similar a
localização destes símbolos na cidade concreta. Estes ícones contêm fotografias e
pequenos textos descritivos para identificar os símbolos, e permitir que os jogadores
conheçam mais a respeito dos mesmos. Os símbolos que serão representados no
game, podem ser sugeridos pelos jogadores que alcançam o último nível de
experiência, desde que respeitem alguns critérios como localizações acessíveis e
seguras ou tenham importância histórica, cultural, artística e/ou simbólica para
população local (CUNHA, 2018). Ao considerar estes critérios é possível supor que
dentre os patrimônios (RIBEIRO, 2006), os materiais (FIGUEIREDO, 2013), por
carregarem as importâncias desejadas pelo jogo, se encontram representados dentro
do mesmo.
Ao refletir acerca dos patrimônios da cidade do Recife/PE, onde a pesquisa de
mestrado do autor deste artigo a respeito das vivências dos jogadores de Pokémon
GO no espaço público se desenvolve, surgiu a proposta do presente artigo, de
compreender as representações das seis praças que possuem jardins tombados
projetados por Roberto Burle Marx no jogo Pokémon GO. A escolha por estes
patrimônios ocorre pelos seus valores culturais paisagísticos (SÁ CARNEIRO, et., al,
2007). Além disso, no presente ano se completam quatro anos dos tombamentos
destes jardins, e em 2018 completaram-se 60 anos da inauguração do último dos seis
vergéis em questão, a Praça Faria Neves. Deste modo, há uma relevância maior em
discutir as realidades destas obras no presente momento.
Considerando a contribuição do Pokémon GO para redescobertas das cidades
(CUNHA, 2018), e as utilizações já existentes das tecnologias virtuais na valorização
de patrimônios (MANÃS-VIEGA, 2018), se percebe que o jogo possui um potencial
informativo. Assim, na medida que as ciberpaisagens do jogo são representações de
paisagens concretas, ao observá-las, se tornará viável realizar conclusões acerca do
olhar sobre estes patrimônios, como estão sendo enxergados atualmente, seja pela
sociedade que participa do jogo, seja pelo Estado que deve se dedicar na manutenção
dos mesmos. Sendo o Pokémon GO um jogo que repercute em diversos países, se
pretende que o artigo possa contribuir na inserção dos jogos digitais, o ciberespaço e
a virtualidade nos debates acerca dos olhares aos patrimônios e das utilizações
destes símbolos culturais.
2 – Metodologia
Para alcançar o proposto, os procedimentos metodológicos foram divididos
entre revisão bibliográfica e as atividades de campo. Em relação a revisão
bibliográfica, foram buscadas obras que contribuíssem para compreensão da
importância dos projetos de Roberto Burle Marx e que transmitissem os conceitos
pensados pelo paisagista para cada jardim. Além disso, obras geográficas a respeito
dos simbolismos da paisagem, dos patrimônios e dos quadros geográficos também
foram compreendidas como necessárias de serem utilizadas. Visto a relevância do
ciberespaço e de variáveis como a ciberpaisagem para este artigo, alguns trabalhos
de geógrafos e cientistas de outras áreas, como a comunicação também foram
utilizados de construção teórica.
No que se refere as atividades de campo, o pesquisador se dirigiu as praças
com jardins tombados pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Arquitetônico Nacional
(IPHAN, 2015) projetadas por Burle Marx, sendo elas as praças de Casa Forte, Derby,
Euclides da Cunha, Faria Neves, Ministro Salgado Filho e Praça da República e jardim
do Campo das Princesas. O intuito destes movimentos foi observar e registrar, através
de screenshots, as representações das mesmas dentro do jogo, e assim compreender
as situações atuais das praças e os modos como são vistas pela sociedade.
Observações e registros fotográficos da realidade das praças concretas, também
tenham sido realizados de modo a respaldar e contextualizar as representações
discutidas por este trabalho. Na seleção das imagens utilizadas, se privilegiou as
imagens retiradas do Pokémon GO, pois por meio desta abordagem, seria possível
alcançar o objetivo do artigo. Para observar as representações virtuais, analisou-se
os quadros apresentados na tela dos aparelhos eletrônicos conectados ao game,
semelhantes a mapas, de modo a averiguar sua representatividade dos traçados das
praças. Também se esteve atento a existência de símbolos das praças representados
no jogo como ginásios ou poképaradas, pois assim, haveria fotos dos símbolos e
textos descritivos sobre os mesmos, que poderiam ser analisados e comparados com
os conceitos pensados por Burle Marx.
3 – Resultados
Ao considerar as representações das cidades expostas nas telas dos aparelhos
eletrônicos como quadros geográficos semelhantes a mapas, o julgamento que se
pode fazer em relação a fidelidade das representações virtuais com os jardins das
praças projetadas por Burle Marx, é possível de ser feito apenas utilizando os
contornos projetados pelo paisagista como referência. Neste sentido, foi possível
observar que das seis praças visitadas, quatro possuíam representações satisfatórias
dos contornos atuais dos jardins das praças, sendo essas, as praças de Casa Forte,
Faria Neves, Derby e Euclides da Cunha das quais as duas últimas podem ser vistas
na Figura 01.
Figura 01 – Representações das praças do Derby (A) e Euclides da Cunha (B). Fonte: Screenshot do aplicativo Pokemón GO.
Fica visível através das imagens, como as representações dos contornos das
praças remetem aos contornos curvos e retilíneos da Praça do Derby, e um oval da
Praça Euclides da Cunha. Contornos estes, que foram planejados por Burle Marx.
Com relação a Praça da República e Jardim do Campo das Princesas, que é
considerada uma obra única, se percebe duas realidades diferentes. Enquanto os
contornos da Praça da República (Fig. 2). são visíveis e bem fidedignos da realidade
concreta, o mesmo não acontece com o Jardim do Campo das Princesas, que não
está presente de nenhuma forma no jogo. Já na Praça Ministro Salgado Filho (Fig. 2),
assim como o Jardim do Campo das Princesas, não há contornos representados no
game, sendo possível enxergar apenas a representação do espelho d’água projetado
por Burle Marx. Além desta forma de retratar a materialidade da praça, as
representações através de ginásios e poképaradas, que trariam consigo fotografias e
textos descritivos sobre símbolos, também são quase inexistentes nesta praça,
diferente do que se pôde ver nas demais praças. Na Praça Ministro Salgado Filho, há
apenas uma poképarada, sendo referente a própria praça. No entanto, não há
nenhuma menção ao idealizador da mesma nesta representação.
Figura 02 – Representações da Praça da República e Campo das Princesas (A) e da Praça Ministro Salgado Filho (B), junto a sua poképarada (C). Fonte: Screenshot do aplicativo Pokemón GO.
Em relação a quantidade de poképaradas e ginásios, as demais praças
possuem bons quantitativos. Porém, no modo como os símbolos das praças são
representados, se percebe de maneira geral, poucas referências, e em alguns casos
nenhuma, a Roberto Burle Marx. Em relação as vegetações das praças, que possuem
símbolos da flora brasileira e mundial, que foram intencionalmente introduzidas nas
praças pelo paisagista, e são os elementos centrais que justificam os tombamentos
das praças (SÁ CARNEIRO et., al. 2006; SÁ CARNEIRO et., al. 2016), não há
nenhuma referência dentro das representações do jogo. Na Praça de Casa Forte, há
mais símbolos dos arredores da praça, como estátuas dos edifícios vizinhos (Fig. 3)
do que símbolos da própria praça. Já na Praça Euclides da Cunha, chama a atenção
o fato de as representações associarem a praça mais ao tradicional Club Internacional
do Recife (Fig. 3), que se localiza na frente da mesma, do que ao seu nome, Euclides
da Cunha.
Figura 03 – Poképarada na Praça de Casa Forte (A) e Euclides da Cunha (B). Fonte: Screenshot do aplicativo Pokemón GO.
Os únicos casos de referencia a Burle Marx encontrados no Pokémon GO
foram nas praças de Casa Forte e Faria Neves. Na Praça de Casa Forte, duas
poképaradas representando uma placa informativa sobre a praça e uma placa
referente (Fig.4) a uma recuperação da mesma e de uma semana comemorativa em
homenagem ao paisagista, permitem ler textos que citam Burle Marx. Já a Praça Faria
Neves, que em 2018 completou 60 anos de sua inauguração, é de todas as praças, a
que possui melhores representações no Pokémon GO a Roberto Burle Marx. Isto
ocorre através de duas poképaradas, uma, se trata de uma placa semelhante as
citadas na Praça de Casa Forte, já a segunda, é uma representação de uma estátua
em homenagem ao próprio Burle Marx (Fig. 4).
Figura 04 – Poképaradas na Praça de Casa Forte (A) e (B) e Faria Neves (C). Fonte: Screenshot do aplicativo Pokemón GO.
Contando com textos descritivos, que embora sejam mais resumidos do que
poderiam ser, os jogadores que forem as praças de Casa Forte e Faria Neves e
visualizarem as poképaradas acima ilustradas, poderão ser ao menos introduzidos à
figura de Roberto Burle Marx, e posteriormente, conhecerão a história deste
importante paisagista brasileiro.
4 – Discussão
Uma possível explicação para a situação na Praça da República e Campo das
Princesas, pode estar no fato do jardim ter acesso restrito ao público, por ser parte do
palácio que é sede do governo do estado de Pernambuco. Desta forma, os
mapeamentos coletivos produzidos pela própria sociedade se tornam difíceis de
serem realizados no jardim. Considerando ainda, que o jogo privilegia os espaços
públicos de acessos livres, se torna realmente compreensível que o Jardim do Campo
das Princesas siga sem ser representado no Pokémon GO. Em relação a falta de
representatividade na Praça Ministro Salgado Filho, esta pode ser compreendida
como um reflexo do estado em que se encontra a praça atualmente, com estruturas
danificadas e pouca presença humana. A situação de abandono pode ser justificada
com o distanciamento do Aeroporto Internacional dos Guararapes, que até o ano de
2000, tinha sua entrada principal localizada em frente a praça. Após o distanciamento,
a praça perdeu sua função de introduzir quem chegava ao aeroporto à flora
pernambucana (SÁ CARNEIRO e SILVA, 2017).
No caso das representações de estátuas dos edifícios vizinhos na Praça de
Casa Forte, a explicação pode estar no fato da mesma se encontrar cercada
principalmente por edifícios residenciais. Assim, é possível que os jogadores que
sugeriram essas estátuas como símbolos a serem simbolizados, estivessem
desejando poder acessar as poképaradas na comodidade de suas residências, sem
precisar sair de casa. Por mais que isto contrarie a premissa do jogo, muitas pessoas
até mesmo burlam essa premissa inclusive utilizando falsificadores de localização, de
modo a poder se manter em casa, enquanto se deslocam na cidade digital do
Pokémon GO (CUNHA, 2018). Já no caso da Praça Euclides da Cunha, é possível
entender que a mesma tenha passado por um processo de ressignificação
(BONNEMAISON, 2012), uma vez que muitas pessoas na cidade do Recife costumam
associar a praça ao Club Internacional. Deste modo, a Praça Euclides da Cunha
sofreu um distanciamento dos seus simbolismos originais.
Através do apresentado anteriormente, fica claro que as representações no
Pokémon GO das praças com jardins tombados pelo IPHAN, não conseguem, em sua
maioria, transmitir aos jogadores do game a importância que estas praças possuem.
As ausências de referências no jogo aos conceitos planejados por Roberto Burle Marx
para as praças, além da inexistência de menções ao próprio paisagista em quatro das
seis praças visitadas, provocam algumas reflexões a serem realizadas.
As causas das ausências de representatividade constatada na maioria das
representações das praças podem ser entendidas como problemas do Estado, mas
também da sociedade em geral. Por parte do Estado, a falta de manutenção pode
gerar situações de afastamento entre as praças e a população, como ocorre na Praça
Ministro Salgado Filho. Este afastamento pode ser uma das causas da falta de
representatividade que a praça possui seja em informação, seja em quantidade de
símbolos representados no jogo. O Estado também erra quando não promove com
frequência situações que resgatem as histórias das praças, como em eventos. Assim,
a população, principalmente em faixas etárias mais jovens, acaba desconhecendo as
importâncias que as praças contêm.
É importante ressaltar, contudo, que a população também pode e deve
contribuir na manutenção destes patrimônios, fato que se constatou na Praça Ministro
Salgado Filho, por exemplo. Além do desconhecimento do passado, a população por
muitas vezes ressignifica as paisagens das cidades, como é o caso da Praça Euclides
da Cunha, que é mais conhecida como praça do Club Internacional. No entanto,
caberia aos jogadores que produzem as representações, realizarem algum estudo
prévio para compreender e passar adiante, através do jogo, as importâncias que estas
praças como paisagens culturais possuem, mesmo que de forma simples, como foi
encontrado na poképarada referente a estátua de Burle Marx na Praça Faria Neves.
5 - Conclusão
A falta de representatividade encontrada na maioria das praças no Pokémon
GO guia para um quadro geográfico revelador do modo como Estado e sociedade
observam e cuidam dos seus patrimônios. Além de simples entretenimento, o
Pokémon GO tem o potencial de ser uma ferramenta que proporciona a aproximação
e a redescoberta das cidades por parte de seus jogadores. Através das
representações e informações que pode transmitir, o jogo pode revalorizar patrimônios
e paisagens culturais, que passam a ser visitados por moradores e turistas, que assim,
passam a conhecer as importâncias destes espaços. Considerando a potencialidade
explanada, caberia aos jogadores explorarem este potencial de um lado, e o Estado
de outro, realizando as manutenções necessárias e garantindo a segurança destes
locais, para que este potencial seja explorado.
Acredita-se que ao fim deste artigo foi possível levantar como o Pokémon GO
está sendo utilizado na cidade do Recife/PE para transmitir aos seus adeptos as
importâncias que as praças com jardins tombados projetadas por Roberto Burle Marx
possuem. É possível constatar que o potencial que o jogo possui não está sendo
explorado como poderia. Isto, no entanto, é apenas um reflexo de como o Estado e a
sociedade olham e agem para seus patrimônios e paisagens culturais, uma realidade
que precisa ser mudada. É necessário que o olhar, o conhecimento e a valorização
da sociedade acerca destes espaços mudem, para isso, é válido utilizar as novas
ferramentas disponíveis, como o Pokémon GO. Por fim, para a geografia, se espera
poder contribuir com este trabalho, ao demonstrar como os jogos digitais, em especial,
os georreferenciados, podem ser úteis nas discussões e nas proposições acerca dos
patrimônios, e dos modos como a cidade é enxergada.
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