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Versão On-line ISBN 978-85-8015-075-9 Cadernos PDE OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSE NA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE Produções Didático-Pedagógicas

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Versão On-line ISBN 978-85-8015-075-9Cadernos PDE

OS DESAFIOS DA ESCOLA PÚBLICA PARANAENSENA PERSPECTIVA DO PROFESSOR PDE

Produções Didático-Pedagógicas

ALEXANDRO MUHLSTEDT

CADERNO TEMÁTICO

A IDENTIDADE E A PROFISSIONALIDADE DO PROFESSOR REFLEXIVO

CURITIBA – PARANÁ

2013

2

SUMÁRIO

IDENTIFICAÇÃO ................................................................................................... 3

APRESENTAÇÃO ................................................................................................. 4

ORIENTAÇÕES METODOLÓGICAS …................................................................ 8

TEXTO 1

O professor e a escola na sociedade contemporânea .......................................... 11

TEXTO 2

O professor e a sua identidade ............................................................................. 21

TEXTO 3

O professor e a sua prática: do habitus ao conceito de profissionalidade ............ 32

TEXTO 4

O professor e o ato de ensinar .............................................................................. 41

TEXTO 5

O professor reflexivo ............................................................................................. 50

3

IDENTIFICAÇÃO

Título da Produção Didático-pedagógica:A IDENTIDADE E A PROFISSIONALIDADE DO PROFESSOR REFLEXIVO

Autor: ALEXANDRO MUHLSTEDT

Área:PEDAGOGIA

Escola de Implementação:COLÉGIO ESTADUAL DO PARANÁ - ENSINO FUNDAMENTAL, MÉDIO EPROFISSIONAL RUA JOÃO GUALBERTO, 250 – ALTO DA GLÓRIA – CURITIBA - PARANÁ

Município da Escola:CURITIBA

Núcleo Regional de Educação:CURITIBA

Instituição de Ensino Superior:UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ

Orientador:PROFº DR. GRACIALINO DA SILVA DIAS

Resumo: O material que ora se apresenta é um Caderno Temático, resultado de pesquisabibliográfica e de campo, sobre o trabalho docente que é desenvolvido por professores deescola pública estadual de Educação Básica do Paraná e direciona-se a estes sujeitos comofonte de formação e reflexão. Está organizado em cinco textos sendo que no primeiro textohá uma breve reflexão sobre o professor e a escola no mundo contemporâneo, sinalizandointerferências deste na ação docente; no segundo texto analisa-se a questão da constituiçãoda identidade do professor, forjada inicialmente na licenciatura e lapidada pelos saberesdocentes da prática, sendo embasada pelos estudos de Maurice Tardif; no terceiro texto háum aprofundamento teórico sobre a categoria habitus de Pierre Bourdieu e o conceito deprofissionalidade; no quarto texto há uma breve explanação a respeito do ato de educar,elucidado pelo pensamento educacional de Paulo Freire, bem como uma exposição sobreos contextos de adversidade que dificultam o trabalho do professor e, finalmente, no quintotexto apresenta-se a possibilidade de constituir-se como professor reflexivo, a partir doconhecimento específico e ligado à ação, de acordo com postulados de Donald Schön. Antea isso, concretizam-se neste material as reflexões oriundas da prática, a teorização refletidae a busca por uma educação pública melhor e mais crítica. Tem o intuito de, pelo trabalhodocente, transformar o ensino e construir um espaço-escola de bem viver.

Palavras-chave: Escola pública; Profissionalidade docente; Identidade profissional;Professor reflexivo.

Formato do Material Didático:CADERNO TEMÁTICO

Público Alvo:PROFESSORES DA ESCOLA PÚBLICA DA EDUCAÇÃO BÁSICA

4

APRESENTAÇÃO

Compreender supõe, antes de tudo, perguntar-se algo e abrir com isso um espaço de novas significações e sentidos.

(Josep Maria Puig)

O que importa para mim, querida Sofia, é que você não esteja entre aqueles que consideram o mundo uma evidência.

(Jostein Gaarder)

O material que ora se apresenta é resultado de

pesquisa bibliográfica e de campo sobre o trabalho docente

dos professores da escola pública de Educação Básica e

direciona-se a estes sujeitos como fonte de estudos e

reflexão.

O interesse pela compreensão de como ocorre a construção da identidade e

profissionalidade do professor vem acontecendo ao longo da minha carreira como

docente, pedagogo e gestor na educação pública.

Em 1996 iniciei o curso de Pedagogia, na Universidade Estadual do Centro-

Oeste, em Guarapuava e também minha atividade profissional como professor

alfabetizador de jovens e adultos, no Centro de Estudos Supletivos (CES), no

município de Pinhão, no estado do Paraná. Desenvolvi trabalho junto a

trabalhadores domésticos, trabalhadores rurais, presidiários e operários da indústria

madeireira, bem como com outras categorias de trabalhadores que se encontravam

em situação de analfabetismo.

No ano 2000 fui aprovado no concurso do Paranaeducação - Serviço Social

Autônomo vinculado à Secretaria de Estado da Educação - assumindo também no

CES, agora denominado Centro Estadual de Edução Básica para Jovens e Adultos

(CEEBJA) a função de Supervisor de Ensino.

Em 2002 realizei curso de Pós graduação na Universidade Norte do Paraná

e aprimorei a compreensão sobre o fenômeno educacional. Desenvolvi estudo sobre

a motivação dos alunos jovens e adultos.

No ano de 2003 transferi-me para escola de ensino regular, Colégio

Estadual Santo Antonio, onde desenvolvi trabalho junto aos professores na função

de Supervisor. Nesse mesmo período, também coordenei a implantação do

Programa de Educação de Jovens e Adultos junto à Prefeitura Municipal de Pinhão,

estabelecendo parceria junto ao Serviço Social da Indústria (SESI) de Guarapuava.

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Em 2005 realizei concurso público e assumi a função de Professor

Pedagogo neste Colégio. Nessa escola, entre os anos de 2006 – 08 desenvolvi

trabalho no âmbito da Gestão, coordenando, como diretor auxiliar, o período

noturno.

A partir de 2009 mudei-me para Curitiba, atuando no Colégio Estadual

Professor Francisco Zardo - Ensino Fundamental, Médio e Profissional, no qual,

entre outras atividades, coordenei a construção do Projeto Político Pedagógico e

implementei os encontros semanais dos gestores e equipe pedagógica com o

objetivo de constituir coletivos de trabalho e consolidar a “linguagem em comum”

entre os profissionais da instituição. No ano de 2012 atuei como diretor do turno da

tarde, priorizando a organização do trabalho pedagógico, enfocando a participação

dos alunos e professores em atividades culturais de música, teatro, cinema, visitas

orientadas, etc. e estabeleci parcerias com Fundação Cultural, Casa da Leitura e

Secretaria Municipal Antidrogas. No período noturno dessa escola, minha atuação

dirigiu-se principalmente na consolidação do trabalho pedagógico junto aos

coordenadores e professores atuantes na Educação Profissional.

Em 2012, por meio de concurso, fiz remoção para o Colégio Estadual do

Paraná (CEP), sendo esta a instituição na qual o estudo sobre a Identidade e a

Profissionalidade Docente ocorrerá, bem como a implementação do Projeto.

E foram nessas três instituições públicas estaduais (CES, Santo Antonio e

Zardo) que aconteceram observações, vivências, discussões e reflexões que

despertaram meu interesse em analisar mais profundamente a prática docente. Não

na intenção ingênua de tentar “ensinar o peixe a nadar”, mas imbuído pelo

compromisso em refletir, revisitar, reelaborar e, sobretudo, analisar as formas de ser

professor, repensar as possibilidades de atuar com coerência considerando os

limites impostos pelas situações políticas e sociais, bem como pelas condições e

necessidades.

Esses limites e possibilidades tem feito que, ao longo dos anos, tem

contribuído para que eu observe que escola pública atuam professores que pouco

se comprometem com o processo de ensino aprendizagem, comportando-se com

indiferença e desilusão, cinismo ou ceticismo com o trabalho pedagógico. São

profissionais iniciantes, com bagagem experiencial, em final de carreira. A este

grupo, percebo também aqueles que atuam de modo ético, crítico e comprometido,

em diferentes estágios da profissão, com diversas vivências escolares e, sobretudo,

6

buscando inovar em suas práticas pedagógicas. E são a esses professores que

minha atenção se volta, com intuito de compreender o que eles possuem em sua

atuação profissional que os diferencia positivamente no coletivo escolar.

A partir de observações, diálogos, intervenções pedagógicas, discussões,

reflexões, leituras e tentativas de acerto, fui formulando várias hipóteses a respeito

desses professores. Uma dessas hipóteses tem sido sobre como acontece a

construção da identidade profissional. Para isso tenho buscado subsídios nas teorias

do conhecimento, nas práticas escolares, nas tarefas rotineiras e no diálogo com os

professores. A partir das atividades do Programa de Desenvolvimento Educacional

(PDE), articuladas na Universidade Federal do Paraná, tornou-se possível

sistematizar as questões que fazem parte das minhas reflexões pedagógicas e

análises educacionais.

Propus-me a dialogar com os professores do Colégio Estadual do Paraná

para conhecer deles a história pessoal de início na profissão docente. Por meio da

Memória Pedagógica busquei relatos, registrados na ferramenta Blog, das histórias

de como se deu a escolha pelo curso de licenciatura e como foi o primeiro contato

com a docência.

Compreendo que o professor da escola pública estadual vivencia inúmeras

situações e enfrenta diferentes condições de trabalho. Estudar o cotidiano da ação

docente é um exercício que exige sensibilidade e senso crítico, uma vez que envolve

as histórias de vida, os processos culturais, as crenças, os posicionamentos, os

pensamentos, as verdades de cada um.

Assim, construí a ideia da necessidade, pedagógica e social, de, ao explorar

a práxis docente na escola pública da educação básica, também investigar a

construção da identidade profissional e observar as dificuldades oriundas das

condições de trabalho. Com isso, pretendi analisar as razões, as motivações e os

elementos constitutivos da identidade profissional e dos saberes docentes dos

professores da educação básica no CEP.

Recorri, então, às reflexões de Paulo Freire sobre o ato de educar,

elaboração dos saberes docentes de Maurice Tardif e formação do professor

reflexivo de Donald Schön. Com esses educadores, foi possível lançar as redes no

campo intelectual sobre a profissionalidade do professor e embasar as hipóteses de

construção da identidade profissional.

7

Essas reflexões, pautadas também nas vivências pedagógicas em escolas

da rede estadual, resultaram neste Caderno Temático, o qual está organizado da

seguinte maneira:

No primeiro texto há uma breve reflexão sobre o professor e a escola no

mundo contemporâneo, sinalizando as situações impostas pelo processo de

globalização, que, em certa medida, interferem na ação docente.

No segundo texto analisa-se a questão da constituição da identidade do

professor, forjada inicialmente na licenciatura por meio de elementos técnicos e,

lapidada pelo cotidiano, ao construir os saberes docentes da prática, de acordo com

Maurice Tardif.

No terceiro texto há um aprofundamento teórico sobre a categoria habitus,

de Pierre Bourdieu, e o conceito de profissionalidade, sendo que bem

compreendidas, permitem ao professor enfrentar os desafios imponderáveis da

profissão.

No quarto texto há uma breve explanação a respeito do ato de educar,

elucidado pelo pensamento educacional de Paulo Freire, enaltecendo a postura

competente e compromissada com o processo de ensino aprendizagem. Também

uma exposição sobre os contextos de adversidade que dificultam o trabalho do

professor.

No quinto texto apresenta-se a possibilidade de constituir-se como

professor reflexivo, a partir do conhecimento específico e ligado à ação. Aprofunda-

se a categoria professor-reflexivo, de Donald Schön, e os conceitos reflexão-na-

ação, reflexão-sobre-a-ação e reflexão sobre a reflexão na ação.

Ante a isso, concretizam-se neste material as reflexões oriundas da prática,

a teorização refletida e o desejo por uma educação pública melhor e mais crítica.

Creio que, sendo o professor um profissional reflexivo, ciente de sua

responsabilidade e do seu compromisso social, envolvido em sua formação

intelectual e competência técnica, é possível transformar o ensino e construir um

espaço-escola de bem viver, de ensinar com convicção e de aprender com

humildade.

Alexandro Muhlstedt1

1 Professor Pedagogo da Rede Estadual de Educação Básica do Paraná. Atua no Colégio Estadualdo Paraná (CEP), em Curitiba. E-mail: [email protected]

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ORIENTAÇÕES METODOLÓGICAS

O conhecimento não se restringe ao “pronto”, mas ao que deve ser levadoà discussão e à contradição para que novas verdades possam surgir a

partir de raciocínios complexos.(Ilca Oliveira de A. Vianna)

Esta Produção Didático-pedagógica, no formato de Caderno Temático

denominado A Identidade e a Profissionalidade do Professor Reflexivo, foi concebida

na perspectiva de contribuir para repensar a prática pedagógica a partir da

constituição da identidade docente. Parte-se do princípio que para efetivar boas

aulas, o professor deve ser profissional comprometido com a profissão, com o ato de

ensinar, com a aprendizagem dos alunos. Para isso, ao assumir-se como professor,

este profissional precisa ter a clareza dos muitos aspectos constituintes inerentes a

sua função, estabelecendo metas e objetivos, sabendo sobre o que se vai ensinar,

sem perder de vista para quem se está ensinando. Isso exige um compromisso

social e uma responsabilidade com o aluno, o que permite avançar na exigência da

compreensão da pessoa no processo de ensinar e aprender. É aí que se situam os

aspectos da identidade e da profissionadade do professor.

As ideias apresentadas neste Caderno são propostas a serem analisadas,

ampliadas, criticadas, refletidas, contextualizadas e reinventadas por professores

entendidos como sujeitos de sua prática.

1. Sugere-se a formação de um grupo de professores, entre 15 e 30

participantes, que deverão estar dispostos a discutir a própria profissão, no intuito de

compreender a identidade docente e construir um processo intenso e consciente de

profissionalidade.

A principal característica do trabalho com um grupo de professores resideno fato de se trabalhar com a reflexão expressa através da “fala” dosparticipantes, permitindo que apresentem, simultaneamente, seusconceitos, impressões e concepções sobre o tema, no caso, a própria

profissão. Em decorrência, as informações produzidas ou aprofundadas são decunho essencialmente qualitativo. Não se objetiva respostas certas ou erradas, masreflexões e opiniões acerca da identidade docente construída no bojo das escolhaspessoais e das relações sociais que se firmam no cotidiano escolar. Como processode profissionalidade, a percepção de si e os questionamentos sobre a própria práticasão questões promotoras de busca por melhorias evitando acusações ouculpabilizações. Incentiva-se a escrita das discussões como forma de registro ememória.

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2. Cada um dos cinco textos foi elaborado a partir da Fundamentação

Teórica do Projeto de Intervenção Pedagógica. Nos textos estão questões

consideradas mais significativas, fruto de pesquisa, leitura e estudos, mas sem

nenhuma intenção de serem verdades absolutas.

O professor está em constante criação, buscando, estruturando,organizando o seu fazer pedagógico. E nesta constante busca, precisa serleitor, escritor, pesquisador. Ele é um leitor, quando lê amplamente arealidade, a sua e a dos outros, buscando nessa leitura, interpretar,

significar, dar sentido. Ao registrar seu cotidiano e seu ponto de vista, ele é umescritor, pensando, questionando, revendo suas hipóteses. E pesquisador ao pensara própria prática, conectada na necessidade de conhecer melhor o seu fazerpedagógico e constituir a sua profissionalidade. Não se espera uma resposta certa,mas respostas significativas e originais, fruto de crítica reflexão.

3. Para concretizar o estudo, os encontros deverão ter duração de 2 horas,

em dia e horário a ser definido pelos participantes.

Os encontros devem começar na hora, se não o valioso tempo dosprofessores se perderá. Uma vez acordado dia e horário, começar na horaexata, bem como concluir no tempo determinado. Para realizar as atividadesprevistas neste Caderno é necessária a leitura prévia do texto, pelos

participantes, bem como o compromisso dos mesmos de postar os comentários noblog. O melhor dia e o melhor horário para estudar e refletir é aquele em que oprofessor tenha disponibilidade e vontade, com a articulação sensata e prudente dotrabalho pelo professor coordenador.

4. Organizado o grupo, definido dia e horário dos encontros, num primeiro

momento, faz-se a leitura, a discussão e a contextualização das ideias apresentadas

no texto. Em seguida, cada participante responde as questões sugeridas, as quais

são socializadas em pequenos grupos, e, por fim, apresentadas em plenária.

A importância da escrita resi de no fato de permitir a construção da“memória compreensiva”, aquela memória que não é só simplesrecordação, lembranças vãs, mas é base para a reflexão do professor,tendo em vista a análise do cotidiano educativo e do trabalho desenvolvido

com o grupo. O ato de escrever o vivido desencadeia um processo reflexivo no quala vivência restrita e singular torna-se pensamento sistematizado, apropriação doconhecimento. É através da escrita, portanto, que percebe os erros, avanços,contempla o vivido diariamente na prática, não só para lembrar do que aconteceu,mas também compreender o acontecido, analisá-lo para poder aprender com ovivido. A reflexão registrada tece a memória, a história do sujeito e de seu grupo.Sem a sistematização deste registro refletido não há apropriação do pensamento dosujeito-autor, até porque um sujeito alienado do próprio pensamento torna-se ummero copiador da teoria do outro.

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5. Num segundo momento, a síntese de cada grupo deverá ser postada em

forma de comentário no blog www.docentescep.blogspot.com, no post de tema

correspondente. Ou, se for o caso, enviado ao endereço eletrônico (e-mail) do

coordenador do grupo, ou mesmo impressa e arquivada em uma pasta.

O blog, como ferramenta educacional, contribui para afirmação de novasaprendizagens, oportunizando aos usuários condições de ampliarem osseus conhecimentos mediante diferentes formas de pensamentos. Pode

ser considerado um instrumento de escrita colaborativa importante, na medida emque um leitor pode acrescentar informações, na forma de comentários, notadamenteporque os “posts” e as mensagens a ele associadas podem ser vistos por outrosleitores, cibernautas. É uma forma mais ágil e eficiente tendo em vista que oprofessor poderá postar no momento em que melhor lhe convier, desde que noprazo acordado entre um encontro e outro.

6. Após o estudo dos cinco textos, as respostas dos participantes, bem como

as possíveis sínteses, deverão ser agrupadas e “costuradas” numa produção

coletiva para fazer parte do Projeto Político Pedagógico da Escola.

A produção de um texto final, ou relatório, constitui-se em uma síntesesistemática das reflexões, que expressa o percurso das discussões dogrupo. É um documento que, de certo modo, representa a história do

grupo e os avanços do próprio professor. O ato de refletir, parar e analisar a práticapedagógica é um ato libertador, por ser instrumento no pensar da prática. Através dereflexão se realiza as constatações, descobertas, reparos, aprofundamentos,fazendo mudar e transformar algo em si mesmo, no outro e na realidade vivida.Transformar isso em expressão no PPP da escola reforça a necessidade daseriedade no trabalho a ser desenvolvido.

O conteúdo do material didático pretende ser um instrumento de diálogo

entre os professores, sendo os mesmos convidados a assumirem uma postura

reflexiva, crítica e formativa sobre as suas ações pedagógicas, tendo a realidade, o

cotidiano e as vivências de cada participante como ponto de partida e de chegada e,

nesse processo, articular variados saberes, experiências e conhecimentos.

Ao se trabalhar em grupo nota-se que a fala de um colega, um olhar de

estranhamento, a expressão de uma dúvida, a partilha de uma ideia, uma opinião

sobre um assunto possuem uma profunda ligação com questões como cultura,

identidade, memória, escolhas, valores e tantos outros conceitos correlatos.

Assim o processo educativo deixa de ser paralelo a outras coisas que

vivenciamos e se integra a um todo ao qual chamamos de vida.

O Autor

11

TEXTO 01

O professor e a escola na sociedade contemporânea

A docência é um processo complexo que supõe uma compreensão darealidade concreta da sociedade, da educação, da escola, do aluno, doensino aprendizagem, do saber, bem como um competente repensar e

recriar do fazer na área da educação, em suas complexas relação e com asociedade.

(Ildeu Coelho)

Nosso mundo é um mundo uno. Mas é um mundo dilacerado.

(Roger Garauday)

Ser professor é transforma o discente em sujeito do seu tempo.(Alfio Brandemburg)

OBJETIVOS

- Analisar elementos da sociedade contemporânea que atuam na construção da

identidade do professor e influenciam na prática pedagógica e nos procedimentos

do dia-a-dia escolar.

- Compreender a relação entre as condições de trabalho e a saúde do professor.

- Refletir sobre as características da sociedade contemporânea influentes nas rotinas da

escola.

PASSO A PASSO

- Leitura e discussão do texto.

- Resolução, em duplas ou trios, das questões sugeridas no item “QUESTIONAMENTOS”.

- Socialização das respostas e síntese do grupo. Escolher um participante para anotar as

ideias principais.

- Orientação para postagem de comentário no Blog (www.docentescep.blogspot.com) sobre

o tema discutido ou envio da resposta para o e-mail do coordenador do grupo.

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O trabalho é a identidade básica do ser humano, podendo ser definido como

“[...] a intervenção intencional e consciente dos homens na realidade, elemento

distintivo do homem dos outros animais” (RIOS 1993, p. 33). Saviani (2006) explica

que “a essência humana não é, então, dada ao homem; não é uma dádiva divina ou

natural; não é algo que precede a existência do homem. Ao contrário, a essência

humana é produzida pelos próprios homens. O que o homem é, é-o pelo trabalho. A

essência do homem é um feito humano. É um trabalho que se desenvolve, se

aprofunda e se complexifica ao longo do tempo: é um processo histórico” (p. 35). A

ação sistemática na escola designa, então, o que se pode chamar de trabalho do

professor. É a escola o local primeiro onde a ação docente, junto aos alunos,

materializa o ensino. Mas que tipo de trabalho é esse?

Saviani (1991, p. 20) esclarece isso, explicando que a educação é um

trabalho, situando-se na categoria do trabalho não-material, como produção de

ideias, conceitos, valores. Trata-se, em última instância, “da produção do saber, seja

do saber sobre a natureza, seja do saber sobre a cultura, isto é, o conjunto da

produção humana”. Nessa produção não-material, o ato de produzir e o ato de

consumir imbricam-se, diferenciando-se, por exemplo, de atividades – como a

produção de livros e objetos de arte – em que o produto se separa do produtor,

havendo um intervalo entre produção e consumo.

Ao trabalhar, concretizando o ato de ensinar, o professor depende, dentre

outras coisas, das condições de trabalho. Tais condições contribuem para a

construção da identidade docente e suas variantes são fatores importantes para a

formação daquilo que ocorre na prática. Saviani (2008, p. 43) assevera que quando

são precárias, “essas condições neutralizam a ação dos professores”, mesmo que

estes sejam bem formados (conhecimentos acadêmicos e técnicos). De modo geral,

ilustram essas condições precárias as salas de aula lotadas, baixa remuneração,

excessiva carga de trabalho, esgotamento físico e, principalmente emocional dos

professores, entre outros. Como consequência, há efeitos subjetivos tais como uma

forte sensação de impotência, angústia profissional, desalento e baixa autoestima.

Há muitos estudos sobre as condições de trabalho e saúde dos professores

que comprovam a relação direta entre o aumento de fatores estressores no trabalho

e níveis elevados de fadiga, alterações do sono, transtornos depressivos e consumo

de medicamentos. No trabalho docente, entre os fatores estressores de maior

relevância encontram-se os relacionados ao ambiente de trabalho, conteúdo do

13

trabalho, condições organizacionais, estabilidade no emprego, salário, relações

sociais no trabalho, carga de trabalho, autonomia, reconhecimento e valorização

profissional. Ou seja, são cada vez mais frequentes classes superlotadas, baixos

salários, escassos recursos materiais e didáticos, excesso de carga horária, falta de

participação nas políticas e planejamento institucionais. O professor tem, ainda, a

obrigatoriedade de desempenhar inúmeras funções dentro do âmbito escolar além

de ministrar aulas: disciplinador e solucionador de problemas sociais dos alunos,

bem como conflitos ocasionados pela expectativa de pais, administradores e

comunidade (GASPARINI, BARRETO, ASSUNÇÃO, 2005).

Observa-se que os trabalhadores docentes se sentem obrigados a

responder às novas exigências pedagógicas e administrativas, contudo, expressam

sensação de insegurança e desamparo tanto do ponto de vista objetivo (faltam-lhes

condições de trabalho adequadas) quanto do ponto de vista subjetivo (um exigente

carga mental para solucionar problemas).

Há que se pensar, no entanto, que o papel da escola não deve ser o de

reprodução da sociedade classista, mas antes o lugar da produção, apropriação e

socialização do saber. Esta é a tarefa por excelência da escola. De acordo com

Saviani (1997, p. 101) “a escola tem uma função específica, educativa, propriamente

pedagógica, ligada à questão do conhecimento; e é preciso, pois, resgatar a

importância da escola, e reorganizar o trabalho educativo”. Embora a escola não

seja a única responsável pela transformação da sociedade e pelas contradições

existentes, a partir dela poderá ser construída uma nova consciência que leve à

superação do estado de dominação e desemboque na construção de uma nova

ordem social, pois, “a escola não é a alavanca da transformação social, mas essa

transformação não se fará sem ela” (GADOTTI, 1984, p.73).

Assim sendo, se analisada a situação de boa parte das escolas públicas, da

perspectiva de condições de existência, há o fato desta apenas cumprir, obedecer e

pouco “pensar” (MORAES, p. 53) o processo pedagógico que nela se realiza, não se

comprometendo efetivamente com o projeto de emancipação do ser humano. Na

sala de aula é comum ocorrer a falta de postura filosófica, pedagógica e

administrativa por parte de alguns professores, demonstrando com isso pouco

compromisso com a educação e resistência em conhecer as diferentes dimensões

do fenômeno educativo (MORAES, p. 53). E isso não pode ser tomado como a única

fonte do despreparo profissional docente.

14

Com relação aos alunos, é notável a presença de indisciplina em sala de aula,

desatenção sistemática, faltas à aula, baixo aproveitamento do ensino, manifestação

de desinteresse e atitudes irresponsáveis, altos índices de desistência e reprovação,

entre outros. Com relação aos pais, é elevado o número daqueles que não

acompanham a vida escolar do filho e entendem que a sua presença na escola só

deve ser feita quando convocado (matrícula, retirada de boletim, problemas de

saúde do filho durante o período escolar, etc).

Esse panorama pode ser melhor compreendido a partir da crise atual que toma

conta do ser humano em dimensões planetárias. Não há este ou aquele indivíduo,

sociedade ou nação atingidos por esta crise, mas todos (HOBSBAWM, 2001). A

sociedade contemporânea é constituída, pois, por elementos dessa crise.

Uma das principais características da sociedade atual é o fato desta ser

marcada por profundas transformações: a rapidez de informações e o avanço de

novas tecnologias modificaram o modo de pensar e de viver das pessoas.

Atualmente, as regras e valores já não possuem mais a mesma rigidez de cinquenta

anos atrás. Vive-se em um tempo de quebra de modelos e paradigmas.

Moraes (2004, p. 48) explica que na sociedade contemporânea “[...] há uma

valorização daquilo que é quantificável, ou seja, dá-se muita importância a aquisição

de bens materiais, a expansão, a competição e a obsessão pela tecnologia,

decorrentes da valorização do racionalismo crítico, do empirismo e do individualismo

e de uma mentalidade manipuladora da era industrial”. Explica também que

“vivemos hoje, numa sociedade dominada pelo interesse, pelo lucro, ao mesmo

tempo, pela insegurança e pelo medo. Uma sociedade manipulada por interesses

políticos, econômicos, sociais e religiosos sem precedentes. Na realidade, vivemos

em um mundo cada vez mais globalizado, onde todos nós somos vítimas inocentes

dos ataques terroristas e prisioneiros das loucuras alheias. Somos todos vítimas do

terrorismo como também de suas represálias. Ao mesmo tempo, somos

testemunhas históricas das enormes carências do ser humano, não apenas em

termos de conhecimento e educação, mas também de afetividade, amor,

solidariedade e espiritualidade” [p. 50].

Já Agostini (2009, p. 118) analisa que a sociedade contemporânea

“descambou no utilitarismo, abriu o caminho ao consumismo, cultivou nacionalismos

diversos, idolatrou o poder, resvalou num racionalismo fragmentado, cultivou um

individualismo crescente, transmutou a liberdade em poder possuir

15

desmedidamente, transformou a razão em instrumentalização técnico-científica,

elegeu o mercado como detentor do poder máximo”.

De acordo com Rojas (2013) as conquistas técnicas e científicas propiciaram

avanços evidentes: a revolução da informática, os progressos da ciência em seus

diversos aspectos, uma nova ordem social, uma preocupação com os direitos

humanos, a democratização de tantos países etc. Por outro lado, esse mesmo autor

sinaliza aspectos da realidade que funcionam mal e que mostram a outra face da

moeda: materialismo que faz com que um indivíduo obtenha certo reconhecimento

social pelo simples fato de ganhar muito dinheiro; hedonismo em que viver bem a

qualquer custo é o novo código de comportamento e significa a morte dos ideais, a

ausência de sentido e a busca de uma série de sensações cada vez mais novas e

excitantes; permissividade que arrasa os melhores propósitos e ideais; relativismo

de tudo, o que leva a regras presididas pela subjetividade; consumismo que

representa a fórmula pós-moderna da liberdade.

Com isso, valores antes referenciais para a vida em sociedade tornam-se

obsoletos, ou configuram atraso em relação às ideias de mercado. Vive-se sem

balizas disciplinares e institucionais e o ser humano acaba mergulhando na sua

própria subjetividade, na esfera privada, num verdadeiro culto ao individualismo de

cunho narcisista, gerando um processo de isolamento e de perda da própria

essência humanizadora.

Dos meandros dessa realidade sociocultural vai surgindo o novo perfil de ser

humano, produto de seu tempo. Rojas (2013) indica que é possível delinear alguns

componentes ao perfil desse “novo” ser humano: pensamento fraco, convicções sem

firmeza, assepsia nos compromissos, indiferença sui generis feita de curiosidade e

relativismo ao mesmo tempo. Esse mesmo autor aponta que a ideologia é o

pragmatismo, a norma de conduta, a vigência social: que vantagens leva, o que está

na moda; a ética se fundamenta na estatística, substituta da consciência; a moral

repleta de neutralidade, carente de compromisso e subjetividade, fica relegada à

intimidade, sem se atrever a sair em público.

Esses contornos complexos da vida moderna se tornam presentes nas rotinas

escolares das mais variadas formas, inclusive por meio das ações docentes.

Compreender o contexto mundial, para compreender o contexto local da unidade

escolar é processo essencial no desenvolvimento reflexivo da práxis pedagógica.

16

Libâneo, Oliveira e Toschi (1998, p. 598-599) também analisam aspectos da

sociedade contemporânea e destacam a importância, nessa nova realidade mundial,

que a ciência e a inovação tecnológica adquirem. Estas têm levado os estudiosos a

denominarem a sociedade de hoje de sociedade do conhecimento (DRUCKER,

1999), de sociedade técnico informacional (CASTELLS, 1999), de sociedade

tecnológica (SANTOS, 1996), outros ainda, seguindo a tradição cronológica, de

terceira revolução industrial (KUMAR, 1997). Com essa lógica o conhecimento, o

saber e a ciência adquirem um papel muito mais destacado e por isso mesmo as

pessoas aprendem na fábrica, na televisão, na rua, nos centros de informação, nos

vídeos, no computador e, cada vez mais, vão se ampliando os espaços de

aprendizagem. Como consequência, a educação é oferecida como uma mercadoria.

Frente a essa realidade do mundo contemporâneo, Libâneo (2002) destaca

alguns aspectos importantes sobre o posicionamento docente. Segundo ele, o

professor, ao desenvolver sua prática pedagógica diante das transformações atuais,

deve: assumir o ensino com mediação; adotar práticas interdisciplinares; conhecer

estratégias de ensinar a pensar e ensinar a aprender; mediar os alunos a buscarem

uma perspectiva crítica dos conteúdos; desenvolver um processo comunicacional e

capacidades comunicativas; reconhecer o impacto das novas tecnologias de

comunicação e informação na sala de aula; atender a diversidade cultural; respeitar

as diferenças no contexto da escola; participar de formação continuada; integrar ao

ensino a dimensão afetiva e desenvolver comportamentos éticos. Observa-se que

isso constitui uma gama enorme de exigências que se impõem ao professor, como

forma deste concretizar de modo atualizado o ato de ensinar.

E é considerando esse contexto cultural, social e econômico, complexo,

dinâmico e paradoxal, que a escola pública estadual de educação básica está

imersa. Rios (1993, p. 45) aponta que a escola “tem características específicas e

cumpre uma função determinada, na medida em que está presente e é constituinte

de uma sociedade que se organiza de maneira peculiar, historicamente.” Nesse

espaço o professor concretiza sua prática. E assim, vai constituindo a sua

identidade. Moraes (2004, p. 221), em estudos sobre um novo paradigma para a

educação escolar, propõe que se abandone a identidade “de um professor

disciplinador, condicionador, que monopoliza a relação, a informação e a

interpretação dos fatos, que sabe impor e induzir respostas, (e se busque) […]

formar um novo mestre que saiba ouvir mais, observar, refletir, problematizar

17

conteúdos e atividades, propor situações-problema, analisar 'erros', fazer perguntas,

formular hipóteses e ser capaz de sistematizar. É ele o mediador entre o texto, o

contexto e o seu produto”. E isso constitui desafios para a formação de identidade

docente em consonância com a escola que aí está.

Mas que identidade é essa? Como ela se constitui? Qual sua importância

enquanto categoria de análise do trabalho docente?

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AGOSTINI, N. Pós-modernidade e ser humano. Revista de Cultura Teológica, fascículo 63, 2008, p.113-126CASTELLS, M. A sociedade em rede. São Paulo: Paz e Terra, 1999.DRUCKER,P. F. Sociedade pós-capitalista. 7. ed. Rio de Janeiro: Campus, 1999.GADOTTI, M. Ação pedagógica e prática social transformadora. Educação e Sociedade, v.1, n. 4, p.5-14, set. 1984.GASPARINI, S. M.; BARRETO, S. M.; ASSUNÇÃO, A. A. O professor, as condições de trabalho e osefeitos sobre sua saúde. Revista Educação e Pesquisa, vol.31, n.2, São Paulo, Mai/Ago. 2005.HOBSBAWM, E. J. Era dos extremos: o breve século XX. São Paulo: Companhia das Letras, 2001.KUMAR, K. Da sociedade pós-industrial à pós-moderna: novas teorias sobre o mundocontemporâneo. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1997. LIBÂNEO, J. C. Adeus professor, adeus professora?: novas exigências educativas e profissãodocente. 6. ed. São Paulo: Cortez, 2002.______; OLIVEIRA, J. F.; TOSCHI, M. S. Educação escolar: políticas, estrutura e organização. 7 ed.São Paulo: Cortez, 2009.MORAES, M. C. O paradigma educacional emergente. 10 ed. Campinas: Papirus, 2004.RIOS, T. A. Ética e competência. São Paulo: Cortez, 1993.ROJAS, E. O homem moderno: a luta contra o vazio. 22. ed. Curitiba: Editora do Chain, 2013.SANTOS, M. A natureza do espaço: técnica e tempo, razão e emoção. São Paulo: Hucitec, 1996. SAVIANI, D. Escola e democracia: teorias da educação, curvatura da vara, onze teses sobreeducação e política. 31. ed. Campinas: Autores Associados, 1997.______. Pedagogia histórico-crítica: Primeiras aproximações polêmicas do nosso tempo. 7. ed. SãoPaulo. Autores associados, 2008.

18

PARA REFLETIR I

Segundo LIBÂNEO (2004), a função da escola é preparar o aluno para o exercício

da cidadania, torná-lo capaz de interferir criticamente na realidade para transformá-

la, envolvendo-se diretamente na luta pela justiça social e pela solidariedade humana,

proporcionando serviços e resultados de qualidade, para que todos aqueles que passem por

ela tenham asseguradas as condições de exercício de liberdade política e intelectual,

interagindo e articulando-se com as práticas sociais. A escola necessária para fazer frente a

essas realidades é aquela que garante um currículo de formação cultural e científica, que

possibilita o contato com a cultura/conhecimento produzido pelo ser humano ao longo da

história da humanidade.

QUESTIONAMENTOS I1. Levando em consideração o contexto mundial e local, como o professor que

atua na escola percebe o seu papel?

2. Qual é o perfil de quem escolhe a profissão professor hoje? Ou, de quem

inicia na profissão docente?

3. Quais as consequências, para a escola, das novas exigências impostas pela sociedade

contemporânea?

4. A partir de seu trabalho, que valores o professor pode transmitir e desenvolver no

cotidiano da escola, ao trabalhar com seus alunos e na convivência com seus colegas?

5. O que leva muitos professores a se desmotivarem com a educação e, em consequência,

a não se comprometerem com um projeto educativo e com o Projeto Político Pedagógico da

escola?

6. Em que se situações se percebe o individualismo e o isolamento no trabalho do

professor?

ATIVIDADE I

Acesse o blog www.docentescep.blogspot.com, localize o texto “O professor e a

escola na sociedade contemporânea”, clique em Comentários e envie sua

opinião sobre o tema abordado.

Lembre-se: Pontue as questões pautadas em sua prática pedagógica e conste seu nome e

a disciplina que ministra.

19

SUGESTÕES I - LIVROS

O homem moderno: a luta contra o vazio, de Enrique Rojas (Editora do Chain, 2013).

No livro, o autor faz uma reflexão sobre a sociedade

atual mencionado drogas, televisão, egoísmo, liberdade,

permissividade, cansaço, amor, sexo e muitos outros temas.

Apresenta um ser humano descomprometido com o mundo, com

os valores e com a moral, capaz de produzir uma realidade,

argumentos e opções conforme seus interesses, sendo

extremamente manipulado pela mídia, pelo capital, pelo

materialismo. O autor aponta caminhos em que a felicidade, o

amor e outros valores precisam fazer parte da vida só ser

humano. Neste sentido, a obra é m ais uma tentativa de fazer o

homem mais feliz interiormente, com espírito de luta, garra e firmeza nos objetivos.

Sociedade dos filhos órfãos, de Sergio Sinay (Editora Best Seller, 2012).

O autor usa o conceito de órfãos funcionais para explicar

a orfandade com pais ainda vivos e faz críticas aos pais que se

gabam de serem amigos e, muitas vezes cúmplices de seus filhos,

em situações de risco, como o consumo de álcool. Na sociedade

atual, em que pais e mães vivem excessivamente atribulados,

crianças e adolescentes carecem de orientação, referências,

limites e valores que deem sentido às suas vidas. O autor faz um

chamado para que seja assumida a responsabilidade da educação

dos filhos, tarefa que não cabe exclusivamente às escolas, muito

menos às mídias, apresentando uma reflexão extremamente lúcida das consequências

dessa omissão, como a violência crescente entre grupo de adolescentes, a obesidade

infantil, números estarrecedores de dependentes menores de idade de álcool e outras

drogas, etc.

20

LEITURA COMPLEMENTAR I

Dermeval Saviani

Nasceu em Santo Antônio de Posse –São

Paulo, em 1944.

Formado em filosofia pela PUC-SP, é doutor

em filosofia da educação e livre-docente em história da

educação, tendo realizado “estágio sênior” na Itália em

1994-1995. De 1967 a 1970, lecionou nos cursos

colegial e normal. Desde 1967, é professor no ensino

superior.

Autor de grande número de trabalhos

publicados, atualmente é professor emérito da

UNICAMP e coordenador geral do Grupo Nacional de

Estudos e Pesquisas História, Sociedade e Educação no Brasil.

Considerado filósofo da educação e/ou pedagogo latu sensu, fundador de uma

pedagogia dialética, que denominou Pedagogia Histórico-Crítica.

Sempre defendeu de forma sistemática e intransigente a escola pública e

preocupou-se com o alcance político da ação pedagógica enquanto estratégia de

construção da contra ideologia, sem, no entanto confundir esta ação com uma ação

propriamente política. Sua atividade intelectual, sempre a serviço da contra ideologia,

destina-se a explicitar valores necessários à libertação dos oprimidos. Esse caráter de

solidária militância é um traço fundamental que marca sua obra. Os acontecimentos políticos

e os eventos históricos que constituem a história da sociedade brasileira e que direta ou

indiretamente marcaram a educação nacional sempre estiveram presentes no pensamento

de Saviani, que em todas as obras se preocupou em analisar a prática educacional inserida

num processo político-social, com uma visão de organicidade do pensar sobre a ação e sob

a perspectiva da globalidade.

Outra peculiaridade da obra de Saviani é a grande quantidade de textos

elaborados com um objetivo pedagógico, enquanto resposta a sua atuação como professor

em sala de aula e sua interação com os alunos. A elaboração destes textos pedagógicos

suscitou condições de criação de uma obra que transcende os limites críticos da realidade.

(Fontes: http://pt.wikipedia.org/wiki/Dermeval_Saviani

http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/arquivos/File/2010/artigos_teses/Pedagogia2/apedhistcritica.pdf )

(Foto: http://pt.wikipedia.org/wiki/Ficheiro:Demerval_saviani.JPG )

21

TEXTO 02

O professor e a sua identidade

Uma instituição não tem cara e não tem alma, não tem histórias... Cara e história têm pessoas que ali trabalham.

E são elas que lhe fornecem alma.(Luiz Fernando Veríssimo)

Não há educação fora das sociedades humanas e não há homem no vazio.

(Paulo Freire)

A identidade é resultado a um só tempo estável e provisório, individual ecoletivo, subjetivo e objetivo, que, conjuntamente, constroem os

indivíduos e definem as instituições.(Claude Dubar)

OBJETIVOS

- Compreender as razões, os motivos e os interesses que conduzem os sujeitos

ao exercício profissional da docência.

- Estabelecer as características que compõem a identidade do professor como trabalhador,

cientista e educador, na formação inicial e na prática pedagógica escolar.

- Analisar as motivações e o grau de satisfação que mantêm os docentes exercendo sua

profissão de modo comprometido.

PASSO A PASSO

- Leitura e discussão do texto.

- Resolução, em duplas ou trios, das questões sugeridas no item “QUESTIONAMENTOS”.

- Socialização das respostas e síntese do grupo. Escolher um participante para anotar as

ideias principais.

- Orientação para postagem de comentário no Blog (www.docentescep.blogspot.com) sobre

o tema discutido ou envio da resposta para o e-mail do coordenador do grupo.

22

É na escola que o professor desenvolve seu trabalho por meio do exercício

de sua profissão. Nesse espaço assume a responsabilidade de trabalhar com o

conhecimento historicamente elaborado, situando-o sem neutralidade. A prática

profissional do professor não é a simples aplicação dos saberes acadêmicos, mas,

sim, a realização de um processo de “filtração, onde eles (os saberes) são

transformados em função das exigências do trabalho” (TARDIF, 1999, p.17). E a

prática pedagógica do professor é concretizada quando realiza o processo de

ensino. Mas essa prática não é dada simplesmente, ela precisa ser lapidada e

construída por um processo de profissionalização, sendo que é por meio da

convivência no cotidiano escolar que o professor vai constituindo sua identidade e

concretizando essa profissionalização. Nesse caso, “o termo profissionalização

indica o processo de formação de um sujeito numa profissão, que se inicia com a

formação inicial e atravessa todos os momentos de formação continuada” (PENIN

2009, p. 25).

O professor tem uma atividade que deriva do latim professus, “aquele que

declarou em público”, do verbo profitare, “declarar publicamente, afirmar perante

todos”. Os dicionários (Aurélio, Luft, Michaelis) definem professor como “aquele que

professa ou ensina uma ciência, uma arte, uma técnica, uma disciplina”. Trata-se,

então, de um sujeito que se declara apto a ensinar. E o processo de ensinar, ação

desse profissional, situa-se numa sociedade determinada, em contextos bem

delimitados que necessitam ser compreendidos e avaliados.

Nesse sentido, as condições do contexto contribuem ao que se pode

denominar como a competência profissional do professor. Esta ocorre na práxis, ou

seja, por meio da ação concreta em seu fazer pedagógico. Não se é competente de

uma vez por todas, mas “ela (a competência) se amplia na construção coletiva, na

partilha de experiências, de reflexão” (RIOS 2001, p.91). E sem prática, não há

como conferir competência a quem se denomina professor.

Ao realizar sua função com competência, o professor realiza seu papel social

que é o de orientador, o do formador de seus alunos por meio do conhecimento.

Considerando o professor como sujeito de suas ações não é mais possível associar

a docência somente à vocação, ao amor, à abnegação, à doação e à missão,

vinculando o ensino como transferência de informação e a aprendizagem, como o

recebimento e a armazenagem de informações. Para ser professor, cumprindo seu

papel social e construindo-se como sujeito, não basta gostar de ensinar e dominar

23

conhecimentos específicos de determinada área e algumas habilidades técnicas. É

preciso algo mais, é preciso articular os conhecimentos elaborados na academia

(formação inicial) e as informações do mundo globalizado, com os conhecimentos da

prática (formação continuada e experiência). Inclui-se aí a sensibilidade para refletir,

atenta, crítica e criteriosamente, as ações do cotidiano.

Em consequência, é possível perceber que a identidade do professor vai

sendo forjada através de duas perspectivas: uma, a partir da formação adquirida no

ensino superior, em curso de licenciatura – a técnica, e a outra, pela formação vivida

na prática – a experiência.

O professor, enquanto técnico, tem em sua trajetória de formação as

instituições de ensino superior, via de regra, que se apoiam no modelo de

‘racionalidade técnica’, onde a resolução de problemas colocados pela prática está

relacionada ao domínio e à aplicação de teorias científicas (BOLFER, 2008. p. 46). A

racionalidade técnica na formação de professores acaba por defender,

simplesmente, a aplicação do conhecimento e do método científico, ou seja, uma

racionalidade instrumental. Essa posição, porém, se depara com situações do

mundo real que frequentemente são complexas, singulares e imprevisíveis, não

apresentando estruturas bem delineadas, mas caóticas e indeterminadas. Em

contraposição a isso, nota-se a exigência para a formação docente que leve em

consideração uma racionalidade prática, a qual supõe a existência de um professor

reflexivo que examina os resultados de suas ações (do ponto de vista pessoal,

acadêmico ou sócio-político).

Na racionalidade prática, o professor vai aprendendo a ser professor e a

como agir na ação. Nesse processo de profissionalização o professor age também

de acordo com as representações de suas experiências como aluno, ora imitando os

bons professores, ora rejeitando ações pedagógicas consideradas negativas ou

inadequadas. Afinal, o professor já tem certa experiência e uma espécie de leitura

da docência pelos anos vividos como aluno, na educação básica e no curso de

licenciatura. Assim, desenvolve, historicamente, padrões metodológicos que

combinam os seus conhecimentos acadêmicos e suas experiências vivenciadas com

os alunos, no cotidiano escolar. O conjunto de saberes que explica suas ações e

que o identifica na profissão – construído pelo próprio professor – dimensiona a

relação que o professor estabelece entre sua formação e sua prática.

24

As experiências docentes, que constituem a historicidade do sujeito, quando

valorizadas, possibilitam, no coletivo, refletir e recriar novos conhecimentos. Como

consequência, o docente vai forjando sua identidade e cristalizando ações, posturas

e modos de pensar o mundo. Afinal, somente a formação técnica (acadêmica) do

professor não é suficiente para sua ação pedagógica na docência, tendo em vista

que os conhecimentos elaborados a partir da prática são fundamentais para a

constituição de sua identidade, sendo que já há um conjunto de procedimentos

éticos e morais que precedem a atuação do professor, bem como o contexto social

no qual a unidade escolar está situada. Sobre isso, Berger e Luckmann (1985)

explicam que a identidade se configura como um elemento chave da subjetividade e

da sociedade, formando-se e sendo remodelada através dos processos e relações

sociais. As identidades são singulares ao sujeito e produzidas a partir de interações

do indivíduo, da consciência e da estrutura social na qual este está inserido, sendo a

“identidade um fenômeno que deriva da dialética entre um indivíduo e a sociedade”

(p. 230).

Pimenta (2012, p. 22) alerta para “a natureza do trabalho docente (que) é

ensinar como contribuição ao processo de humanização dos alunos historicamente

situados.” Nesse sentido, a atuação competente do professor exige deste os

conhecimentos constituídos em sua formação inicial e os conhecimentos que são

elaborados em sua prática cotidiana. Essa prática é construída pelas vivências

cotidianas na sala de aula e apropriação dos modos de agir da profissão que

incluem procedimentos éticos, morais, pedagógicos e sociais. Essa interação

possibilita o desenvolvimento pessoal e social do sujeito.

A identidade pessoal e a identidade construída coletivamente são essenciais

para definir a identidade profissional do indivíduo. A esse respeito Pimenta (1997, p.

07) define que a identidade profissional “[...] se constrói a partir da significação social

da profissão e, também, pelo significado que cada professor, enquanto ator e autor

confere à atividade docente de situar-se no mundo, de sua história de vida, de suas

representações, de seus saberes, de suas angústias e anseios, do sentido que tem

em sua vida: o ser professor”.

A identidade docente constitui-se então numa construção que envolve o

professor em sua individualidade, mas que o envolve, também, como ser histórico e

social. Nas reflexões de Dubar (2005), a constituição da identidade é resultante de

diferentes socializações, revelando-se produto inacabado marcado por sucessivas

25

transformações. No que diz respeito à construção da identidade profissional de

docentes, Gatti (1996) alerta para a necessidade de perceber a ação tanto dos

sujeitos construtores quanto das circunstâncias em que tal construção ocorre.

Essa identidade profissional, expressão inspirada nos trabalhos

desenvolvidos por Dubar (2005), pode ser empregada não somente como a maneira

socialmente reconhecida pelos indivíduos de se identificar uns aos outros no campo

das atividades remuneradas, mas também, e em especial, como a projeção que os

indivíduos fazem de si no futuro, como a antecipação de uma trajetória de emprego

a ser viabilizada por certos investimentos na formação. Não se trata simplesmente

da escolha de uma profissão ou da obtenção de um certo diploma, mas da

construção de estratégias de identificação, que colocam em perspectiva a imagem

de si, a apreciação de suas próprias aptidões e capacidades, a realização de seus

desejos.

Afinal, ao ingressar na profissão docente, o sujeito já tem diante de si um

universo de dispositivos legais e regulamentares que delineiam seu estatuto

profissional e definem os termos de troca entre tempo e salário. São as legislações

prescritas que determinam os modos de atuação na prática pedagógica do

professor. Uma dessas leis é a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

(LDB 9394/96). À luz da legislação federal, todos aqueles profissionais de Educação

Escolar, em particular os das redes oficiais de ensino, que ingressam no serviço

público através de concurso público de provas e títulos são, portanto, detentores de

cargos públicos e, por isso, têm incumbências enumeradas ou responsabilidades

explicitadas pelo Estado.

Em seu artigo 13 a LDB estabelece as incumbências aos docentes que são:

participar da elaboração da proposta pedagógica do estabelecimento de ensino;

elaborar e cumprir plano de trabalho, segundo a proposta pedagógica do

estabelecimento de ensino; zelar pela aprendizagem dos alunos; estabelecer

estratégias de recuperação para os alunos de menor rendimento; ministrar os dias

letivos e horas-aula estabelecidos, além de participar integralmente dos períodos

dedicados ao planejamento, à avaliação e ao desenvolvimento profissional;

colaborar com as atividades de articulação da escola com as famílias e a

comunidade.

Nesse artigo da LDB é possível perceber três componentes principais que

atuam na constituição da identidade docente: 1 – posicionamento do professor como

26

aquele a quem incumbe zelar pela aprendizagem do aluno - inclusive daqueles com

ritmos diferentes de aprendizagem tomando como referência, na definição de suas

responsabilidades profissionais, o direito de aprender do aluno, o que reforça a

responsabilidade do professor com o sucesso na aprendizagem do aluno; 2 -

associação do exercício da autonomia do professor, na execução de um trabalho

próprio, ao trabalho coletivo de elaboração da proposta pedagógica da escola e 3 –

ampliação da responsabilidade do professor para além da sala de aula, colaborando

na articulação entre escola e a comunidade.

Ainda em referência à legislação vigente, de acordo com o artigo 82 da Lei

Complementar 007/1977, que dispõe sobre o Estatuto do Magistério do Estado do

Paraná, todo professor “tem o dever constante de considerar a relevância social de

suas atribuições, cabendo-lhe manter conduta moral, funcional e profissional

adequada à dignidade do Magistério”, apresentando um conjunto de normas a

serem observadas pelos docentes em sua ação pedagógica na escola pública. Vale

ressaltar que esta lei foi implantada em um contexto de restrição de liberdades

democráticas e forte intervencionismo político (Ditadura Militar), ficando bastante

evidenciados os preceitos morais e políticos daquele momento histórico.

Essas incumbências, articuladas a outros elementos mais particulares da

unidade escolar, como o Projeto Político Pedagógico, o Regimento Escolar e o

Regulamento Interno compõem as obrigações, normas e deveres do trabalho

prescrito do professor, sendo estes “aspectos que antecedem a realização do

trabalho e que os professores precisam levar em consideração para desenvolvê-lo”

(ALVES, 2010. p. 149).

No entanto, em se tratando do que ocorre no cotidiano escolar, é comum

observar que a atividade docente de planejar, estudar e organizar o ensino

confundem-se com as atividades de compreender como o aluno aprende, vencer a

falta de motivação do aluno, gerenciar conflitos, fazer cursos, preencher

documentos, etc. Tudo isso contribui para a elaboração de formas de perceber a

escola e de como a identidade docente vai se constituindo. Nota-se que na

construção da identidade do professor tem havido, por falta de análise mais

apurada, um certo empobrecimento do conteúdo do seu trabalho, tendo em vista ser

comum o professor deparar-se, nas diversas realidades escolares, com atividades

de resolução de questões acessórias ou secundárias em detrimento das essenciais.

De certo modo, o professor se torna gestor dos conflitos alheios e vítimas de seus

27

próprios conflitos, dificultando que a reflexão de sua ação, na sua ação, ocorra de

modo adequado. O cotidiano escolar, repleto de atividades desgastantes,

consomem tempo e energia, não possibilitando que o professor realize uma reflexão

crítica sobre a própria atuação.

Quando se observa esse cotidiano do trabalho do professor verifica-se que

este está imerso em atividades escolares com os alunos que parecem

prolongamento dos cuidados da família, protegendo os mais fracos e desvalidos,

ocupando o tempo ocioso das ruas, atendendo as necessidades básicas (através da

alimentação, das merendas, bolsa-escola), e, eventualmente, provendo

conhecimentos e formação cultural. Com isto, pode-se dizer que aspectos

importantes na relação educacional e docente vem sofrendo modificações. A

realidade de trabalho na escola vem mudando, assim como a própria escola. Afinal,

esta já não é mais a mesma como há algumas décadas, assim como os alunos, que

depositam outras expectativas e atribuem outros valores à instituição.

Por outro lado, como destaca Enguita (1991) “[...] os educadores podem ser

mártires, mas isso não garante que sejam santos”, pois o funcionamento do ensino

público, somada à relativa autonomia de cada docente no exercício de seu trabalho

permite que seus rendimentos e esforços individuais se movam em graus de grande

amplitude. As atitudes e os comportamentos do professor, explica o autor, não são

iguais, podendo ir desde uma alta preocupação com seu trabalho, um desejo

constante de atualização, uma elevada responsabilidade etc. até a passividade, a

rotina e a aplicação da lei do menor esforço mais absolutas. Há ainda, professores

que preferem trabalhar apenas o mínimo, conformando-se em receber pouco, em

troca de não dar mais. Com esse comportamento, degradam a imagem de sua

categoria e cerceiam as oportunidades daqueles que trabalham mais duramente

sem ver reconhecido o valor de seu trabalho.

Enguita (1991, p. 60) ainda considera que “[...] um setor do professorado

encontra em sua vocação e responsabilidade estímulo suficiente para render

adequadamente em seu trabalho; para estes, o problema é simplesmente de justiça:

que seu bom trabalho seja reconhecido e recompensado. A questão é que a

organização do corpo docente, como a de qualquer outro, não pode estar baseada

na presunção da boa vontade individual e carecer de meios para atuar quando esta

não exista; ao contrário, deve estar organizada à prova da pior vontade, ou da falta

de qualquer vontade, e contar com os meios para recompensar a boa e, onde não

28

exista, criá-la ou aproximar-se dos mesmos resultados através de outras

motivações”.

Por isso, é importante questionar: como construir uma identidade docente

que seja científica, educadora e política?

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ALVES, W. E. O trabalho dos professores: saberes, valores, atividade. Campinas: Papirus, 2010.BERGER, P. L. ; LUCKMANN, T. A construção social da realidade: tratado de sociologia doconhecimento. 6 ed. Petrópolis: Vozes, 1985.BOLFER. M. M. M. de O. Reflexões sobre prática docente: estudo de caso sobre formaçãocontinuada de professores universitários. 237 f. Tese de Doutorado em Educação da UniversidadeMetodista de Piracicaba, Piracicaba, 2008. (mimeo)BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação: Lei nº 9.394/96 – 24 de dez. 1996. Estabelece asdiretrizes e bases da educação nacional. Brasília, 1998.DUBAR, C. A socialização: construção das identidades sociais e profissionais. São Paulo: MartinsAfonso, 2005.ENGUITA, M.F. A ambiguidade da docência: entre o profissionalismo e a proletarização. RevistaTeoria & Educação, Porto Alegre, n. 4, p. 41-61, 1991. GATTI, B. Os professores e suas identidades: o desvelamento da heterogeneidade. Cadernos depesquisa, São Paulo, n.98, p. 85-90, ago. 1996.PARANÁ. Lei Complementar 007/1977 – Estatuto do Magistério, 22 de dezembro de 1976. Dispõesobre o Estatuto do Magistério Público do Ensino de 1º e 2º graus, de que trata a Lei Federal n.º5.692, de 11 de agosto de 1971, e dá outras providências. DIOE: 13/01/1977.PENIN, S; Profissão docente e contemporaneidade. In ARANTES, V. A. (Org.). Profissão docente:pontos e contrapontos. São Paulo: Summus, 2009. p. 16-39.PIMENTA, S. G. Saberes pedagógicos e atividade docente. 8 ed. São Paulo: Cortez, 2012.______. Formação de professores: saberes da docência e identidade do professor. Nuances, vol III,Presidente Prudente, 1997, p.05 – 14.PLACCO, V. M. N. de S. Perspectivas e dimensões da formação e do trabalho do professor. In:Simpósio: A formação docente sob diversos olhares e o compromisso com a inclusão social, 2006. RIOS, T. A. Ética e Competência. São Paulo: Cortez, 1993.SAVIANI, D. Pedagogia histórico-crítica: Primeiras aproximações. Polêmicas do nosso tempo. 7. ed.São Paulo. Autores associados, 2000.TARDIF, M; LESSARD, C. O trabalho docente: elementos para uma teoria da docência comoprofissão de interações humanas. 7 ed. Petrópolis: Vozes, 2012.

29

PARA REFLETIR II

O ser professor se estabelece pela representação construída a respeito da escola e

da docência, de forma que se torna um produto da própria experiência individual,

estabelecido a partir das práticas sociais em que cada sujeito se constituiu. O sujeito se

significa em relação a alguma coisa e o significado, tão indispensável ao homem, não se faz

no vazio. O ser professor se institui pelas práticas e nos discursos acadêmicos, sociais,

escolares, históricos (FAISTEL, Ana Luisa Klein - A construção da identidade nos discursos

de professoras, p. 34)

António Nóvoa (1992) explica que a identidade do professor “é um lugar de lutas e conflitos,

é um lugar de construção de maneiras de ser e de estar na profissão”. Portanto, discutir,

analisar e debater a formação profissional e pessoal constitui a própria formação da

identidade do professor.

QUESTIONAMENTOS II

1. De onde vem o interesse pela profissão docente? Que motivações conduzem

os sujeitos ao magistério?

2. Baseado na sua vivência e no seu cotidiano, como descreveria a realidade escolar a um

estudante de Licenciatura?

3. De modo geral, quais são os valores presentes nos discursos e na prática dos

professores?

4. Quais seriam as atividades escolares que competem ao professor e que atividades são

desenvolvidas na escola que podem ser consideradas acessórias ou secundárias em

relação a sua verdadeira função no ensino?

5. Em que medida o ambiente e a cultura da escola interferem no fazer pedagógico do

professor?

ATIVIDADE II

Acesse o blog www.docentescep.blogspot.com, localize o texto “O professor e a

sua identidade”, clique em Comentários e envie sua opinião sobre o tema

abordado.

Lembre-se: Pontue as questões pautadas em sua prática pedagógica e conste seu nome e

a disciplina que ministra.

30

SUGESTÃO II - FILME

O Substituto (Detachment, 2011. EUA, Drama, 97 min).

Henry Barthes é um professor brilhante com um

verdadeiro talento para se conectar com seus alunos. Em

outro mundo, ele seria um herói para sua comunidade.

Mas, assombrado por um passado conturbado, ele

escolhe ser professor substituto - nunca na mesma escola

por mais que algumas semanas, nunca permanecendo

tempo suficiente para formar qualquer relação com os

alunos ou colegas. Uma profissão perfeita para alguém

que busca se esconder ao ar livre. Quando uma nova

missão o coloca numa decadente escola pública, o

isolado mundo de Henry é exposto por três mulheres que

mudam a sua visão sobre a vida: uma estudante, uma

professora e uma adolescente fugitiva.

O filme expõe, de modo atual e sincero, a realidade de um professor numa escola

com um meio social complicado. De certa forma, explora os desejos dos professores,

aquelas motivações primárias que os encaminharam à profissão – a vontade de ajudar e

marcar a diferença –, e depois o seu cair na realidade, no desespero, na pressão por

resultados forçadamente positivos, conformando-se com a inaptidão de alunos

desinteressados e pais indiferentes. Retrata, de forma crua, a realidade pessoal e social, os

sentimentos mais íntimos de vidas sofridas, relacionamentos interpessoais insanos, um

ambiente escolar dramático, o fracasso de uma política educativa concebida em escritórios

de políticos, famílias que somente agravam a tragédia na vida dos adolescentes.

Junto ao protagonista aparecem outros professores e diretores escolares,

desencantados, decepcionados, frustrados, em algum caso próximo já da demência. Os

problemas dos outros somente acrescentam mais carga de culpa, de vergonha, de

desespero. Sem confiança, sem esperança, sem horizonte nem rumo, o professor acaba se

transformando em vítima da vida, em objeto de chacota, de humilhação por parte de todos.

Não tem nada para oferecer para os adolescentes porque não tem vida própria, somente um

se arrastar dia após dia pela realidade hostil e violenta. Neste tempo complexo e difícil

somente os indiferentes sobrevivem, mas isso é vida?

O Substituto é um filme provocativo, que impacta e conduz, diante desse mundo

caótico e complicado, a formulação de inúmeros questionamentos.

31

LEITURA COMPLEMENTAR II

Maurice Tardif

É filósofo, sociólogo e investigador canadense.

Professor da Universidade Laval, em Quebec, e da

Universidade de Montreal, onde leciona sobre a história

do pensamento pedagógico. É membro de diversos

grupos, comissões e associações de investigação sobre

o trabalho docente e participa com frequência de debates

internacionais sobre as reformas do ensino e da escola.

Suas pesquisas são voltadas para evolução e a

situação da profissão docente, além da formação de

professores e os conhecimentos de base da docência.

Para o autor, a docência é uma profissão de interações humanas. Nesta perspectiva,

segundo Tardif, as ações do professor se constituem de forma completamente diferente de

qualquer outra profissão. “Esse profissional precisa realizar um trabalho interativo com os

alunos, como objetos de sua ação docente”.

Esta interação constante e intensa entre os atores da educação é que norteará o

trabalho na sala de aula. Assim, “o planejamento pedagógico se dará em um processo

dialético, contínuo e em constante elaboração, considerando o pensamento do aluno e

compondo, através da observação e da intervenção, o contexto das ações na sala de aula”,

ensina Tardif.

É na mesma linha de Paulo Freire que Tardif vê o professor como agente de

mudanças e intelectual engajado. Contextualiza a prática docente com a cultura local,

abrindo possibilidades de entendimento de como os saberes docentes são construídos.

Para o autor, o saber também é um “constructo social, produzido pela racionalidade

concreta dos atores, por suas deliberações, racionalizações e motivações que constituem a

fonte de seus julgamentos, escolhas e decisões”.

(Fonte: http://antonioluceni.blogspot.com.br/2011/06/maurice-tardig.html)

(Foto: http://mestrado2010-lpii.blogspot.com.br/2010/10/memorias.html )

32

TEXTO 03

O professor e a sua prática: do habitus aoconceito de profissionalidade

Do diálogo entre o já adquirido e o que ora se adquire, e uma certa nuancedo devir, surgem sincretismos que correspondem à emergência de uma nova

dimensão do ser, não estática, nunca terminada, sempre sujeita amudanças, a reconstruções identitárias.

(Ricardo Vieira)

A presença no mundo não é a de quem a ele se adapta, mas a dequem nele se insere. É a posição de quem luta para não ser apenas

objeto, mas sujeito também da Historia.(Paulo Freire)

É na inconclusão do ser, que se sabe como tal, que se funda aeducação como processo permanente.

Mulheres e homens se tornaram educáveis, na medida em que se reconheceram inacabados.

(Paulo freire)

OBJETIVOS

- Compreender as atribuições delegadas e as ações concretizadas pelo

professor no cotidiano da sala de aula.

- Refletir sobre as práticas docentes que constituem o habitus profissional.

- Compreender as relações pedagógicas que se estabelecem na escola por meio do

diálogo e troca de experiência.

- Analisar a prática do professor sob a perspectiva da profissionalidade.

- Estabelecer relação entre a atuação do professor, sua identidade profissional e as

condições de trabalho no cotidiano da escola.

PASSO A PASSO

- Leitura e discussão do texto.

- Resolução, em duplas ou trios, das questões sugeridas no item “QUESTIONAMENTOS”.

- Socialização das respostas e síntese do grupo. Escolher um participante para anotar as

ideias principais.

- Orientação para postagem de comentário no Blog (www.docentescep.blogspot.com) sobre

o tema discutido ou envio da resposta para o e-mail do coordenador do grupo.

33

É no contexto mundial da sociedade contemporânea, e também local, de

lógica capitalista, com forte presença da ideologia neoliberal, que a escola pública

de educação básica do Paraná está situada e onde configura-se o espaço de

formação da identidade docente do professor. As questões econômicas, de

mercado, entram na escola por meio de mecanismos que causam, entre outras

coisas, problemas de repetência, evasão dos alunos e, ao professor, um desânimo e

adoecimento físico e mental. E este quadro não pode servir de tônica única para a

formação política do professor, visto que o fazer pedagógico do professor não pode

ser deixado de lado, assim como a consciência política não pode ser desvinculada

da ação do professor.

A consciência política alivia as culpabilizações emocionais individuais e

coletivas e contribui para construir autoestima com a profissão, identificar-se com o

fazer pedagógico docente e entender também os limites da ação profissional.

Como já foi mencionado, é por meio de sua atuação que o professor vai

constituindo sua práxis e os saberes da experiência. Estes, como exercício da

prática cotidiana da profissão, são fundados no trabalho e no conhecimento do meio.

“São saberes que brotam da experiência e são por ela validados. Incorporam-se à

vivência individual e coletiva sob a forma de habitus e de habilidades, de saber fazer

e de saber ser” (TARDIF, 1991. p. 220).

Dialogar com os saberes da experiência, que têm origem na prática

cotidiana do professor em confronto com as condições de trabalho, se torna

fundamental para compreender que eles "...não são saberes como os demais, eles

são, ao contrário, formados de todos os demais, porém retraduzidos, 'polidos' e

submetidos às certezas construídas na prática e no vivido" (TARDIF, 1991. p. 232).

O processo de construção dos saberes da prática não é automático.

Dominar tais saberes não garante a competência técnica e política da ação docente.

Uma das formas de compreender como esse processo se realiza é trabalhar com a

categoria de habitus de Bourdieu. Tal categoria pode ser compreendida no contexto

de trabalho do professor como disposições adquiridas na e para a prática real, e que

permitem ao professor enfrentar os desafios imponderáveis da profissão,

constituindo a condição básica para um novo profissionalismo.

Habitus é conceito capaz de conciliar a oposição aparente entre realidade

exterior e as realidades individuais.

34

Pensar a relação entre indivíduo e sociedade, entre professor e escola, com

base na categoria habitus implica afirmar que o individual, o pessoal e o subjetivo

são simultaneamente sociais e coletivamente orquestrados. O habitus é uma

subjetividade socializada (BOURDIEU, 1992, p. 101).

Analisar a ação docente, tendo como base e ferramenta a categoria habitus,

propicia a compreensão da relação que se estabelece entre os condicionantes

sociais exteriores (condições de trabalho do professor, por exemplo) e a

subjetividade dos sujeitos (formas de proceder em sala de aula, por exemplo).

Habitus não é fatalidade. Habitus é consequência de uma trajetória de vida que

auxilia a pensar as características de um ser social (no caso, o professor) e que se

materializa como um sistema de disposições ora consciente ora inconsciente de

suas escolhas (no caso, a práxis docente). Por meio do conceito habitus entende-se

“o processo de constituição das identidades sociais no mundo contemporâneo, uma

vez que o habitus passa a ser o social incorporado” (SETTON, 2002, p. 33).

Bourdieu (2004, p. 134) assevera que o habitus é produto da inculcação

exercida pelas condições objetivas de existência, e este ao ser incorporado através

de um processo longo, é transformado em uma forma de ser, pensar e agir presente

em cada indivíduo, oportunizando uma quebra entre individuo e sociedade, sendo o

habitus o princípio não escolhido de tantas escolhas que desespera os nossos

humanistas

As atividades que são desenvolvidas na escola, coordenadas pelo

professor, criam o ser social. O meio utilizado são as estratégias educacionais que

são movidas pelos habitus tanto do professor (com seus saberes adquiridos e

incorporados na sua trajetória de vida) como dos alunos e esses vão sendo

mobilizados durante todo o processo educacional.

Setton (2001, p.61) explica habitus como “uma matriz cultural que predispõe

os indivíduos a fazerem suas escolhas.” Assim, pode se compreender que o habitus

profissional do professor é constituído antes mesmo de sua inserção no espaço

escolar. Uma vez desenvolvendo sua práxis pedagógica e construindo seus saberes

docentes, o professor pode questionar seu habitus, buscando compreender, por

meio da reflexão, a sua própria ação. Com isso, construir novo habitus a partir de

ações experienciadas na prática.

A partir da categoria habitus é possível compreender o sujeito no mundo.

Nesta perspectiva, há uma tendência em reduzir a prática docente a uma prática

35

individualizada. A crise que ocorre nas instituições sociais afeta sobremaneira o

fazer pedagógico docente. Afinal, o processo de globalização acompanhado ao

avanço tecnológico tem provocado alterações significativas na sociedade atual. O

destaque é a individualização, a luta pelos direitos individuais e a busca pela

afirmação da identidade.

Perceber o professor e desvelar sua ação docente no interior da escola é

percebê-lo neste contexto altamente globalizador, na perspectiva de indivíduo e

sujeito ativo no processo de seu trabalho. A finalidade da educação escolar na

sociedade tecnológica, multimídia e globalizada, grosso modo, é trabalhar os

conhecimentos científicos e tecnológicos, desenvolvendo aptidões para operá-los,

revê-los e reconstruí-los. Inegável o papel do professor para conduzir de modo

competente e coerente este processo. Ao analisar a prática educativa do professor,

há que se levar em consideração os seus processos de formação e desenvolvimento

profissional, haja vista que sua função docente abrange enorme quantidade de

atribuições e atividades.

Enquanto prática social, a educação ocorre em inúmeras instituições da

sociedade, mas é na escola, enquanto processo sistemático e intencional, que esta

ocorre com destaque. E é justamente no trabalho do professor que este processo

acontece. Assim, no trabalho com seus alunos, o professor assume uma

responsabilidade que é pedagógica, ao mesmo tempo que é social e política.

A formação profissional do professor é construída, pois, por diversificadas

experiências que compõem e fundamentam a prática pedagógica. Construir-se

professor requer, desde a formação inicial, a constante reflexão do que se faz, como

se faz e como deveria ser feito. Esse movimento de construir e reconstruir a prática

pedagógica resulta no processo dialético que norteará a formação profissional

Nas atuais tendências investigativas sobre a docência, a constituição da

profissionalidade do professor vem emergindo como uma temática relevante, que

tem como referência os contextos e processos envolvidos na constituição do ser

professor. Sacristán (1995, p. 65) entende a profissionalidade como, “[...] a

afirmação do que é específico na ação docente, isto é, o conjunto de

comportamentos, conhecimentos, destrezas, atitudes e valores que constituem a

especificidade de ser professor”. De acordo com Ambrosetti e Almeida (1999) o

conceito de profissionalidade sugere uma nova perspectiva para a docência visando

compreendê-la, em sua complexidade, como uma construção que se dá nas

36

relações entre os indivíduos e os espaços sociais nos quais exercem sua atividade

profissional. Na perspectiva da profissionalidade os professores são compreendidos

como atores sociais que, agindo num espaço institucional dado, constroem nessa

atividade sua vida e sua profissão. Como destacam Tardif e Lessard (2005, p. 38),

os professores são atores que “[...] dão sentido e significado aos seus atos, e

vivenciam sua função como uma experiência pessoal, construindo conhecimentos e

uma cultura própria da profissão”. Nesse sentido, as dimensões do social e do

psicológico se integram nas formas de viver o trabalho e de se identificar com a

profissão.

Para atender os requisitos da profissionalidade docente, Contreras (2002)

apresenta três dimensões constitutivas deste conceito: 1. a obrigação moral por ser

o ensino uma atividade que supõe um compromisso de caráter moral para quem o

realiza; 2. o compromisso com a comunidade na qual os professores devem

realizar a prática profissional, pois educação não é um problema da vida privada do

professor, mas uma ocupação socialmente encomendada e responsabilizada

publicamente e 3. a competência profissional para o cumprimento da obrigação

moral e o compromisso com a comunidade, que combinam habilidades, princípios e

consciência do sentido e das consequências das práticas pedagógicas.

Para Contreras (2002), ainda, a profissionalidade se refere às qualidades da

prática profissional dos professores em função das exigências do trabalho educativo.

Nesta perspectiva, falar de profissionalidade significa, “[...] não só descrever o

desempenho do trabalho de ensinar, mas também expressar valores e pretensões

que se deseja alcançar e desenvolver nesta profissão”.

Entendendo, então, a profissionalidade como um processo de constituição e

identificação profissional, é desenvolvido pelos professores ao longo de sua

trajetória, nos diferentes espaços de socialização, desde a escolarização básica,

passando pela formação profissional e, principalmente, na organização escolar,

onde os professores exercem, aprendem e desenvolvem a profissão. Esse processo

envolve uma relação dialética entre as condições sociais e institucionais colocadas

ao trabalho docente e as formas de viver e praticar a docência, desenvolvidas pelos

professores individual e coletivamente, que são constituídas e constituem o contexto

escolar.

A formação docente (inicial e continuada) apresenta assim duas facetas:

pode ser considerada como espaço de aquisição e de reforço do habitus de ensinar

37

(nos termos propostos por Bourdieu) e como espaço de construção de uma

“identidade profissional”, que não somente opõe-se à “identidade vocacional” mas

propõe-se a superá-la. E é aí que reside o processo de profissionalidade docente,

quiça torne-se o principal instrumento de conquista de um maior prestígio social da

profissão, de melhores condições de trabalho e remuneração, de desenvolvimento

de uma consciência crítica, de engajamento nas lutas do magistério e na

transformação social.

Discutir a profissionalidade docente é ir para além da formação pedagógica,

é trazer também, como objeto de estudo, os caminhos que o próprio professor busca

para alcançar seu desenvolvimento profissional. Nessa perspectiva, os saberes

docentes têm muito a contribuir. Segundo Tardif (2002), existem diferentes formas

de se analisar os saberes construídos pelos professores, referenciados pelo autor

com base em três dimensões: social, temporal e plural. Os saberes sociais são

adquiridos na relação com o outro (aluno, pares, instituição, sociedade), no contexto

de uma socialização profissional; os saberes temporais ocorrem ao longo da vida do

professor, mesmo antes que inicie sua carreira docente; e finalmente, os saberes

plurais, que emanam de várias fontes: “O saber dos professores é plural, compósito,

heterogêneo, porque envolve, no próprio exercício do trabalho, conhecimentos e um

saber-fazer bastante diversos, provenientes de fontes variadas e, provavelmente, de

natureza diferente.” (TARDIF, 2002, p. 18).

Há que considerar que na elaboração desses saberes a experiência como

aluno é parte constituinte da identidade docente, é um tipo de habitus que poderia

explicar determinadas escolhas e comportamentos na prática pedagógica. Afinal, a

vivência como aluno também traz raízes tradicionalistas sobre a forma de ensinar, a

concepção de aluno, a visão da educação e o papel da escola. Tardif (2002, p. 74-

75) reforça que essa vivência pode levar a um “[...] papel institucionalizado do

professor [...]”, que pode expressar dificuldades em acatar o novo, por manter “[...]

esquemas de ação e interpretação implícitos, instáveis e resistentes através do

tempo.” Essa cristalização de ideias e comportamentos poderia ser um dos aspectos

que explicaria as dificuldades de alguns professores em analisar, criticamente, a sua

atuação docente ou mudar comportamentos.

Por fim, a atividade de ensino é um processo complexo que envolve os mais

diferentes saberes: pedagógicos, sociais, culturais, afetivos, políticos, históricos, etc.

É na atuação profissional que o professor aprende e coloca em ação os saberes de

38

que dispõe. Os processos formativos não estão somente nos cursos de formação

inicial e continuada, mas nas mais diferenciadas vivências pelas quais passa o

professor. O cotidiano da sala de aula, por exemplo, pode ser um “lócus” de

construção de saberes, pois eles fornecem elementos que auxiliam na resolução de

questões específicas da sala de aula, sendo que as situações reais vividas em sala

podem ser geradoras de saberes docentes. E é essa clarificação do “ser docente” e

dos “saberes docentes” que compõem, também, o processo de profissionalidade

permeado por um processo reflexivo e crítico.

A ideia de profissionalidade repõe, então, a centralidade dos professores

como atores da prática educativa. Que importância tem, então, essa centralidade no

ato de ensinar, de concretizar o currículo na sala de aula?

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

AMBROSETTI, N. B.; ALMEIDA, P. C. A. de. Profissionalidade docente: uma análise a partir das rela-ções constituintes entre os professores e a escola. In: Revista Brasileira de Estudos Pedagógicos,Brasília, v. 90, n. 226, p. 592-608, set./dez. 2009.BOURDIEU, P. Coisas Ditas. São Paulo: Brasiliense, 2004. CONTRERAS, J. A autonomia de professores. São Paulo: Cortez, 2002.SACRISTÁN, J. G. Consciência e ação sobre a prática como libertação In: NÓVOA, A. (org.).Profissão professor. 2. ed. Portugal: Porto, 1995. p. 63-92.SETTON, M. da G. J. A teoria do habitus em Pierre Bourdieu: uma leitura contemporânea. RevistaBrasileira de Educação, n. 20. maio/jun./jul./ago. de 2002. TARDIF, M. . Saberes docentes e formação profissional. Petrópolis: Vozes, 2002.______; LESSARD, C. O trabalho docente: elementos para uma teoria da docência como profissãode interações humanas. 7 ed. Petrópolis: Vozes, 2012.

39

PARA REFLETIR III

A Formação Continuada tem sido apontada como o melhor caminho para a

educação atingir a qualidade de ensino desejada. O enfoque teórico desta pesquisa

tomou como base a formação continuada defendida por Antônio Nóvoa, considerando o

professor como um intelectual orgânico (Gramsci) e sujeito autônomo em sua função de

ensinar. Segundo Paulo Freire (1996) entre dizer que não sabe, mas pode aprender e

mentir que sabe para não perder a pose, o bom educador certamente optará pela primeira,

no entanto o despreparo do professor não pode se tornar uma constante. Não se pode

admitir como educador um sujeito de omissão, mas sim de opção. Ainda segundo Freire

“ensinar exige tomada consciente de decisões.” (1996, p. 122)

QUESTIONAMENTOS III1. Atualmente, quais são as condições de trabalho do professor na escola

pública estadual? Quais seriam as condições ideais?

2. Quais são os elementos que demonstram desprestígio social da profissão

docente? Quais são as características dessa desvalorização?

3. O que o professor aprende ao agir no cotidiano escolar? Como ele constrói a sua

prática? Quais são as formas mais comuns para se identificar como professor?

4. O que caracteriza o “bom” professor?

5. Quais são as formas de atualização e reflexão que ocorrem como formação continuada

aos professores do Paraná? Qual a validade dessa formação para a prática cotidiana?

ATIVIDADE III

Acesse o blog www.docentescep.blogspot.com, localize o texto “O professor e a

sua prática: do habitus ao conceito de profissionalidade”, clique em

Comentários e envie sua opinião sobre o tema abordado.

Lembre-se: Pontue as questões pautadas em sua prática pedagógica.

40

SUGESTÃO III - FILME

Minhas tardes com Margueritte (La tête en friche, 2011. França, Comédia, 82 min).

Germain é um cinquentão quase

analfabeto, aparentemente bruto e rude que

convive, desde a infância, com a intolerância.

Marguerite é uma senhora de mais de noventa

anos apaixonada por livros. Um dia, por acaso, ele

senta ao lado dela em um banco na praça. Ela

recita em voz alta versos dando assim, a ele a

chance de descobrir a magia dos livros, que nunca

fizeram parte de sua vida. A partir desse dia,

religiosamente eles se encontram para a leitura e

aos poucos ela o traz para o mundo das palavras.

Mas Marguerite está perdendo a visão e pelo

carinho e afeto que serão criados dessa relação, Germain aprenderá a ler, para

mostrar que pode fazer, quando ela não puder mais.

O filme trabalha a amizade e a relação livro-leitor. O cenário de cidade do

interior francês e o tema são fatores que chamam a atenção. O encantamento com a

possibilidade de interlocução, o afeto e suas várias formas de expressão são as

entrelinhas que costuram a narrativa. Desses elementos pode-se compreender

como ocorre a construção e elaboração de crenças, comportamentos, atitudes,

valores, opiniões e hábitos do cotidiano na vida do ser humano.

Baseado no livro de Marie-Sabine Roger e dirigido com simplicidade e

sensibilidade por Jean Becker, o filme se desenvolve em torno do improvável

encontro dos dois, mas também a partir das lembranças de infância de Germain, de

seu namoro com alguém que o compreende, de seus amigos no cotidiano da pacata

cidade em que vive.

Minhas tardes com Margueritte é um filme que fala das diferenças que, mais

que atrair, complementam as pessoas. As vidas, envolvidas nas tramas e tragédias

da própria história, expõem-se nos limites e nas possibilidades de busca pelo melhor

de si.

41

LEITURA COMPLEMENTAR III

Pierre Bourdieu

Nasceu em Denquin – França, em 1930 e faleceu

em Paris / França em 2002. Foi um importante sociólogo

francês.

Fez os estudos básicos num internato em Pau,

experiência que deixou nele profundas marcas negativas.

Em 1951 ingressou na Faculdade de Letras, em Paris, e na

Escola Normal Superior. Três anos depois, graduou-se em

filosofia. Prestou serviço militar na Argélia (então colônia

francesa), onde retomou a carreira acadêmica e escreveu

o primeiro livro, sobre a sociedade cabila. De volta à

França, assumiu a função de assistente do filósofo e

sociólogo Raymond Aron (1905-1983) na Faculdade de Letras de Paris e, simultaneamente,

filiou-se ao Centro Europeu de Sociologia, do qual veio a ser secretário-geral. Bourdieu publicou

mais de 300 títulos, entre livros e artigos. Fundou as publicações Actes de la Recherche en

Sciences Sociales e Liber e presidiu o CISIA (Comitê Internacional de Apoio aos Intelectuais

Argelinos), sempre se posicionado claramente contra o liberalismo e a globalização.

Foi docente na École de Sociologie du Collège de France. Desenvolveu, ao longo de

sua vida, diversos trabalhos abordando a questão da dominação e é um dos autores mais lidos,

em todo o mundo, nos campos da Antropologia e Sociologia, cuja contribuição alcança as mais

variadas áreas do conhecimento humano, discutindo em sua obra temas como educação,

cultura, literatura, arte, mídia, linguística e política. Também escreveu muito sobre a Sociologia

da Sociologia.

O mundo social, para Bourdieu, deve ser compreendido à luz de três conceitos

fundamentais: campo, habitus e capital.

Uma das mais importantes questões na obra de Bourdieu se centraliza na análise de

como os agentes incorporam a estrutura social, ao mesmo tempo que a produzem, legitimam e

reproduzem. Neste sentido se pode afirmar que ele dialoga com o Estruturalismo, ao mesmo

tempo que pensa em que espécie de autonomia os agentes detêm. Bourdieu, então, se propõe a

superar tanto o objetivismo estruturalista quanto o subjetivismo interacionista (fenomenológico,

semiótico).

(Fontes: http://pt.wikipedia.org/wiki/Pierre_Bourdieu

http://educarparacrescer.abril.com.br/aprendizagem/pierre-bourdieu-307908.shtml )

(Foto: http://cinaraaline.blogspot.com.br/2012/09/pierre-bourdieu-escola-enquanto.html )

42

TEXTO 04

O professor e o ato de ensinar

Onde quer que haja mulheres e homens há sempre o que fazer, há sempre o que ensinar, há sempre o que aprender.

(Paulo Freire)

Todos eles traziam sacolas, que pareciam muito pesadas.Amarraram bem seus cavalos e um deles adiantou- se em direção a

uma rocha e gritou: “Abre-te, cérebro.(Arnaldo Antunes)

Ensinar não é a mesma coisa que fazer aprender, ainda que, muitas vezes,para fazer o aluno aprender, o professor tenha que ensinar.

(Bernard Charlot)

OBJETIVOS

- Analisar os recursos e as condições necessárias para o desenvolvimento

adequado do ensino no cotidiano da escola.

- Refletir sobre os estranhamentos, as dúvidas, as queixas e as indignações dos

professores diante do complexo cotidiano escolar.

- Identificar elementos e estratégias para compreensões mais apuradas da realidade

escolar a partir do cotidiano e do processo de ensino decorrente da atividade e da

identidade docente.

PASSO A PASSO

- Leitura e discussão do texto.

- Resolução, em duplas ou trios, das questões sugeridas no item “QUESTIONAMENTOS”.

- Socialização das respostas e síntese do grupo. Escolher um participante para anotar as

ideias principais.

- Orientação para postagem de comentário no Blog (www.docentescep.blogspot.com) sobre

o tema discutido ou envio da resposta para o e-mail do coordenador do grupo.

43

Ensinar é atividade tão antiga quanto a própria vida humana. No entanto,

ensinar sistematicamente numa instituição de ensino é algo recente na história da

humanidade, sendo esta função do professor, entendido como o profissional do

ensino.

A atividade de ensinar ligada à profissão de professor só apareceu no século

XVIII, nas lutas por democratização, empreendidas pela revolução burguesa.

ARANHA (2006, p. 172) aponta que “contra os privilégios hereditários da nobreza,

os burgueses defendiam os princípios de igualdade, liberdade e fraternidade”. A

revolução burguesa representa a tomada pelo Estado burguês à função de instrução

pública como forma de legitimar seu poder, encontrando neste papel uma forma de

coesão social, articulando seus interesses aos das classes subalternas. Nesse

contexto, aparece a atividade profissional de professor.

A docência, como atividade de ensino e instrução, é um termo recente na

Língua Portuguesa e refere-se ao trabalho dos professores. É uma atividade

profissional especializada, ou seja, caracterizada como profissão (construção social)

e produzida pelas ações dos docentes – sujeitos da própria história (construção

pessoal). Para exercer a docência é necessário a formação profissional na qual o

sujeito deverá adquirir os conhecimentos específicos e, a partir deles, construir

saberes para realizar sua atividade em sala de aula, na escola. Esses

conhecimentos, com densidade epistemológica, adquiridos em cursos de

Licenciatura, constituem a formação inicial, e a partir deles, juntamente com a

prática docente, na relação com outros profissionais e nos cursos de formação

continuada, vão determinando os saberes pedagógicos e também elaborando

quadros de dúvidas, de certezas, de perplexidades, de compromissos, de escolhas e

de vontades.

Compreender o processo de formação do professor, bem como as suas

ações no cotidiano escolar e suas relações com os alunos e demais professores, é

tarefa que exige pesquisa, diálogo, observação e interação, pois o professor e sua

ação docente “não nasce ontologicamente com a pessoa, nem depende de um

despertar mágico ou de uma iluminação súbita da consciência para um

compromisso até então ausente de um projeto de vida” (ROMÃO, 2001, p.64).

Entende-se, então, que a relação que se estabelece entre o sujeito e a

profissão ocorre ao longo da vida produtiva, num processo contínuo, no qual

ocorrem experiências estimulantes e motivadores junto com outras carregadas de

44

tensão, conflitos e desânimo. Esse processo pessoal, que sofre as interferências dos

demais participantes do cotidiano escolar, transforma o próprio sujeito. Essas

vivências se constituem pelo diálogo com os outros e com a própria realidade, pois é

“através de sua permanente ação transformadora da realidade objetiva, (que) os

homens, simultaneamente, criam a história e se fazem seres históricos-sociais”

(FREIRE, 1987, p. 92).

As condições de trabalho (exteriores ao sujeito e também internas)

constituem a realidade profissional vivenciada pelo professor. As lutas para a

melhoria dessas condições caracterizam, em certa medida, o comprometimento e o

compromisso do sujeito com o seu trabalho e com o seu ambiente de trabalho. E a

melhoria nessas condições reflete de forma positiva sobre a profissão e seu papel

social.

Paulo Freire preocupou-se em discutir a educação brasileira e pensar meios

de torná-la melhor mediante o compromisso e a participação de todos. Essa análise

foi desenvolvida na perspectiva de uma educação libertadora, capaz de contribuir

para que o aluno se torne sujeito de seu próprio desenvolvimento, diante da

presença orientadora que tem o professor.

Para Freire, a educação é ato de amor e coragem, sustentada no diálogo, na

discussão, no debate. E isso requer o olhar para os saberes dos homens e

mulheres, já que não se ignora tudo, da mesma forma que não se domina tudo.

Cabe realizar a compreensão de que a história é um processo de participação de

todos, e neste sentido é na escola que se encontra mais um lugar privilegiado para o

ensino e a aprendizagem. Local que deve ser constituído pela sua natureza e

especificidade. Segundo ele, é necessário ainda que seja conferido ao homem o

direito de dizer sua palavra, o que significa sua iniciação quanto a compreender-se e

aos demais homens no mundo, e seu papel no processo de transformação.

Compreender que o homem é um ser histórico e, portanto capaz de construir sua

história participando ativamente com os outros no mundo.

Para Paulo Freire, “o papel do professor é ajudar o aluno a descobrirem que

dentro das dificuldades há um momento de prazer, de alegria” (FREIRE, 2003, p.

52). Para tanto, torna-se prioritário a prática do diálogo em que ambos, educador e

educando, através da realização de seus objetivos chegam ao acesso do saber

historicamente elaborado pelo exercício cultural da humanidade.

45

Ainda de acordo com Paulo Freire, “o educador como um intelectual tem que

intervir. Não pode ser um mero facilitador” (2003, p.177), o que traduz a exigência da

formação docente para o exercício pleno de sua função pedagógica, enquanto

articulador do processo ensino e aprendizagem.

O exercício da docência impõe ao educador a seriedade da sua formação,

sendo que de acordo com Paulo Freire “a incompetência profissional desqualifica a

autoridade do professor” (2007, p. 92).

Paulo Freire traz para a realidade escolar, o pensar educação. Permite o

reencontro com a esperança de um trabalho comprometido, responsável. Possível,

se emanado no coletivo escolar. Uma necessária compreensão de que a escola é

lugar de gente, onde se faz amigos, nada de ser como a do tijolo que forma a

parede, indiferente, frio, só. É essa escola que se deseja construir: humana, capaz

de compreender os desafios de seu tempo, comprometida com as gerações futuras,

que luta pelo melhor viver, que reconhece fatos e gestos, que une conhecimentos,

que recorda e que se reinventa. Para Paulo Freire (2006, p. 111), uma escola em

que “o direito de saber melhor o que já sabem, ao lado de outro direito, o de

participar, de algum modo, da produção do saber ainda não existente”.

Ante a este ideal de trabalho docente, bem como uma meta, em essência e

nas condições físicas e materiais, não se pode deixar de refletir que as grandes

transformações pelas quais o mundo do trabalho vem passando estão mudando

também as características do trabalho em educação. De modo geral, observa-se a

massificação do ensino, a mercantilização, a expansão do ensino superior privado, a

utilização das estratégias organizacionais voltadas para o lucro. Todos estes fatores

favorecem a comercialização do ensino e são passíveis de serem vistos no contexto

atual de educação.

Ao mesmo tempo, influenciam também o perfil do professor, que vem sendo

rediscutido, na tentativa de atender a estas demandas. As características atribuídas

ao professor acabam sendo delineadas pelo contexto socioeconômico e político e

pela inserção de novas tecnologias.

Observa-se uma desvalorização da figura do professor, a perda de

prestígio, de poder aquisitivo, de condições de vida e, sobretudo, de respeito e

satisfação no exercício da profissão. Freitas (2007) mostra o triste e real cenário,

onde o professor é considerado um “aulista”, não podendo, em grande parte, emitir

juízo sobre seu trabalho na sala de aula.

46

Como consequência desse novo cenário a escola pode ser considerada um

lugar de risco para a saúde. O excesso de trabalho tem sido produzido pela

mudança na prática de ensino, com a incorporação de novas tecnologias que

ajudam, mas, aceleram o ritmo de trabalho. Além das competências relacionadas à

sua área de conhecimento específica e à sala de aula, o professor deve ter

conhecimentos tecnológicos mínimos para preparar seu material didático, usando

instrumentos cada vez mais sofisticados. Tornam-se frequentes as doenças

psicossomáticas entre professores de todos os níveis e ambientes de trabalho.

Gastrite, taquicardia, hipertensão, irritabilidade, insônia, depressão e síndrome do

pânico estão entre os males mais diagnosticados (FREITAS, 2007). O estresse

profissional se alimenta hoje de múltiplas fontes. A sala de aula, o relacionamento

com os alunos, as cobranças excessivas, a falta de tempo, a competição, a contínua

atualização tecnológica e da área de estudos dão origem a uma fadiga institucional

que coloca a carreira como uma das mais estressantes e desgastantes (CODO,

1999; ESTEVE, 1999; FREITAS, 2007).

Estas constatações, evidentemente, não devem ser impeditivos para as

buscas de transformações proferidas por Paulo Freire. Devem, sim, ser analisadas

em seu conjunto e, uma vez que estão situadas em contextos plurais e dinâmicos,

precisam ser entendidas como desafios a serem enfrentados pelos docentes, em

sua coletividade. A própria atividade docente demanda a adoção de variadas

atitudes, por vezes lançando mão de posturas criativas para fazer frente às

situações práticas que implicam atividades interativas, entre professor e aluno,

professor e profissionais da educação, familiares de alunos, etc. (TAVARES, 2001).

Algumas estratégias são possíveis para o desenvolvimento de

compreensões mais apuradas da realidade escolar, bem como na forma dos

professores se organizarem e se posicionarem ante a profissão que escolheram: o

diálogo com a situação e entre os pares para o desvelamento de aspectos

implícitos e nem sempre contemplados da realidade divergente, estimulando a

criação de novos marcos de referencia; o autoconhecimento das características

dos modos de ser professor, problematizando a própria prática e as atividades

docentes; a reflexão como forma de encarar e responder aos problemas, em um

processo de busca de soluções e a flexibilidade para diferentes formas de agir, nas

distintas situações da realidade.

47

Essas estratégias se tornam práticas cotidianas quando o professor, ao

posicionar-se de forma crítico-reflexiva, preocupa-se verdadeiramente com as

consequências éticas e morais de suas ações na prática social, quando insere a

escolarização diretamente na esfera política e vice-versa, concebe os alunos como

agentes críticos, o conhecimento e torna problemático, o diálogo crítico e afirmativo

e os argumentos, a favor de um mundo melhor para todas as pessoas. Nessa

perspectiva de prática pedagógica, o professor considera a voz ativa dos alunos,

cujos sentidos e significados de ser e estar no mundo, construídos historicamente,

permeiam todas as suas ações no que se refere à sua aprendizagem, à escola e à

sociedade.

Por isso, é necessário agir. Não uma ação solitária, ingênua, acrítica, e

utilitarista, simplesmente. Mas agir de modo coletivo, evitando a inércia profissional,

as queixas miúdas, o pensamento raso e as lamentações vazias. Agir com

coerência, em prol de condições adequadas e de novas possibilidades de ensino.

Agir para realmente constituir a sala de aula espaço de diálogo, ensino e

aprendizagem. Agir para que as relações entre os professores se consolidem

pedagogicamente. Para isso, um processo de formação continuada é fundamental,

desde que envolva a teoria que mobiliza a prática e a socialização das experiências

que avalia e transforma a prática, num processo de construção constante. Assim

sendo, faz sentido, mesmo que não se tenha todas as respostas, envolver-se na

tarefa de criar, coletivamente, formas de atuação na escola, numa superação da

tentação de estar só.

E, uma vez definidos os caminhos da ação, o que é essencial para uma

prática realmente crítica e reflexiva?

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ARANHA, M L. de A. História da educação e da pedagogia: geral e Brasil. 3. ed. São Paulo: Moderna,2006.CODO, W. (Org.). Educação: carinho e trabalho. Petrópolis, RJ: Vozes, 1999.ESTEVE, J. M. O mal estar docente: a sala de aula e a saúde dos professores. São Paulo: EDUSC. 1999.FREIRE, P. Educação na cidade. 4. ed. São Paulo: Cortez, 2000.__________. Pedagogia do oprimido. 38 ed.; São Paulo: Paz e Terra, 1987. __________, Conscientização: Teoria e pratica da libertação: Uma introdução ao pensamento de PauloFreire. 3a ed.; São Paulo: Centauro, 2006.__________, Educação e mudança. 30a ed.; Rio de Janeiro: Paz e Terra, 2007.__________,Pedagogia da Autonomia: saberes necessários a prática educativa. 35 ed. São Paulo: Paz eTerra, 2007. (Coleção Leitura)FREITAS, M. E. A carne e os ossos do ofício acadêmico. O&S, v.14, n.42, Jul/Set, 2007, p.187-191.ROMÃO, J. E. Compromisso do educador de jovens e adultos. In: GADOTTI, M.; ROMÃO, J. E. (Orgs.).Educação e jovens e adultos: teoria, prática e proposta. 4 ed. São Paulo: Cortez, 2001. p. 61-78.TAVARES, J. Resiliência e educação. 2 ed. São Paulo: Ed. Cortez, 2001.

48

PARA REFLETIR IV

Não se pode recriminar o professor por não se manter em formação constante, pois

apesar das boas intenções o grande número de aulas e situações encontradas para

que dê conta, além da pressão natural do dia a dia, os priva até da leitura prazerosa.

Embora até reconheçam que necessitam de maior fundamentação para contribuírem para

efetivas mudanças em suas salas de aulas, não encontram motivação para buscá-las.

Apesar de estarmos tratando de pessoas que lidam diariamente com o conhecimento

existem professores que não gostam de ler, de se atualizar, talvez este seja um dos motivos

pelo qual a formação continuada acaba falhando. Embora se tenha tentado motivar os

colegas para o estudo, a forma de como conseguir a adesão destes professores permanece

como uma incógnita.

QUESTIONAMENTOS IV1. Atualmente, quais são os recursos necessários para ensinar bem e quais são os

procedimentos profissionais valorizados pela escola?

2. O que se espera do professor que se dispõe a ensinar com competência, levando

em consideração as características dos alunos?

3. Quais são as obrigações (deveres) dos professores prescritos na Lei? E quais são os

seus direitos?

4. Qual a importância da relação entre os diferentes níveis da organização escolar

(Conselho Escolar, Direção, Equipe Pedagógica)?

5. O que importa, de fato, na relação entre o professor e seus alunos? Quais valores e

atitudes devem permear essa relação?

6. Quais as causas das “doenças” do Magistério? Como evitá-las?

7. Como se caracteriza o professor sem o devido compromisso com o ensino, com os

alunos e com a escola? Quais as razões disso? Que características tem o posicionamento

crítico-reflexivo do professor?

ATIVIDADE IV

Acesse o blog www.docentescep.blogspot.com, localize o texto “O professor e o

ato de ensinar”, clique em Comentários e envie sua opinião sobre o tema

abordado.

Lembre-se: Pontue as questões pautadas em sua prática pedagógica e conste seu nome e

a disciplina que ministra.

49

SUGESTÃO IV - FILME

Entre os muros da escola (Entre les murs, 2008. França, Drama, 128 min).

O filme é o retrato da ação pedagógica do

Professor François com uma turma de adolescentes

entre 13 e 15 anos. Ambientada em uma escola

pública de Paris, sua trama acompanha o cotidiano

dessa turma, focando a relação dos alunos com o

professor e os métodos utilizados por este para tentar

contornar os inúmeros conflitos que surgem a cada

instante. O roteiro adquire um tom quase documental

ao retratar a sala de aula sem qualquer tipo de

maniqueísmo. Em seu desenvolvimento ficam

evidentes erros cometidos tanto pela escola, quanto

pelo professor e pelos estudantes. O professor é um

apaixonado pela arte de educar, sua determinação em

fazer com que cada um dos alunos tenha condições de subverter o determinismo de suas

vidas é louvável, porém, em dados momentos, o que ele faz parece inútil, uma vez que os

resultados de seu esforço não são tão perceptíveis. Nesse quesito, a sua angústia ao sentir-

se incapaz diante da turma que coordena parece quase palpável em diversos momentos.

A classe que o filme acompanha é uma miscelânea de etnias, estilos e crenças,

podendo ser considerada um reflexo da população francesa, composta em boa parte por

imigrantes. Neste curioso microcosmo é possível ver estampados o preconceito contra o

diferente, a desigualdade social e principalmente a violência, que insurge como uma

resposta dos adolescentes às duras realidades em que vivem.

É interessante perceber que mesmo o professor, que poderia ser visto a princípio

como o herói da história, acaba também sendo vítima das divisórias invisíveis que

aparentam manter cada um dos personagens segregado dos demais. A trama se mantém

firme em seu propósito de funcionar apenas como um recorte social, isento de verdades

absolutas e incapaz de apontar soluções fáceis para os problemas expostos.

A intenção do filme não é a de se posicionar como uma crítica ao sistema

educacional, o que ele faz é tão somente criar um recorte realista do modelo pedagógico

adotado pela escola, que é semelhante ao trabalhado em inúmeras instituições de ensino

brasileiras.

(Baseado em J. Bruno, http://sublimeirrealidade.blogspot.com.br/2013/03/entre-os-muros-da-escola.html)

50

LEITURA COMPLEMENTAR IV

Paulo Freire

Nasceu na cidade de Recife / Pernambuco em

1921 e faleceu em São Paulo em 1997.

Estudou Direito na Faculdade de Direito do

Recife.

Em sua vida trabalhou como professor em

escolas, dirigiu o departamento de educação e cultura

do SESI (Serviço Social da Indústria), coordenou o

Programa Nacional de Alfabetização, foi Secretário

Municipal da Educação de São Paulo e assessorou

projetos culturais na América Latina e África.

Foi um importante educador brasileiro que se

preocupou com a consciência do educando sobre sua cidadania e seu papel na sociedade.

Para o autor, a educação é um ato político que deve buscar conscientizar as classes

populares, chamadas por ele de oprimidas. Sua principal teoria refere-se à pedagogia da

libertação, a qual versa sobre essas convicções do autor e como a educação pode libertar

os cidadãos oprimidos.

O ponto de partida de seus estudos foi a alfabetização de jovens e adultos,

buscando uma alfabetização crítica, que levasse o educando a renovar seus instrumentos

de leitura, inserindo-se na sociedade. Assim, a educação para Paulo Freire está sempre

ligada à cultura e às práticas sociais. Para ele, as práticas pedagógicas tornam-se

libertadoras, ao mesmo tempo em que problematizam o contexto dos alunos, baseando-se

na inquietude do pensamento e tornando o indivíduo consciente de si e de suas ações. De

acordo com o autor, o professor precisa ser consciente de sua autonomia, enquanto

capacidade de decidir e assumir a responsabilidade de educar. Somente assim, o educador

poderá respeitar a curiosidade e a linguagem do educando, flexibilizando e problematizando

suas práticas.

Sua principal obra é Pedagogia do Oprimido, lançada em 1969, na qual está

detalhado o método de alfabetização de adultos. Já sua última obras foi Educação e

atualidade brasileira, publicada em 2001.

(Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Paulo_Freire)

Foto: wwwpedagogiaaesacesa.blogspot.com )

51

TEXTO 05

O professor reflexivo

Que fique para trás o mundo moderno essencialmente racional, quebuscou (utópica e inutilmente) uma unidade universal de indivíduo,

para que vivamos num mundo moderno reflexivo.(Anthony Giddens)

A educação será tão mais plena quanto mais esteja sendo um ato deconhecimento, um ato político, um compromisso ético e uma experiência estética.

(Paulo Freire)

Ninguém começa a ser educador numa certa terça-feira às quatro a tarde.Ninguém nasce educador ou marcado para ser educador.

A gente se faz educador, a gente se forma, como educador, permanentemente, na prática e na reflexão sobre a prática.

(Paulo Freire)

Eu quero sempre mais do quem vem dos milagres.(Cecília Meireles)

OBJETIVOS

- Compreender os elementos necessários para o desenvolvimento de prática

pedagógica reflexiva.

- Estabelecer formas de desenvolver práticas pedagógicas reflexivas no cotidiano escolar.

- Elaborar estratégias a fim de melhorar as relações pedagógicas nos processos de ensino e

aprendizagem a partir da construção de coletivos de professores.

PASSO A PASSO

- Leitura e discussão do texto.

- Resolução, em duplas ou trios, das questões sugeridas no item “QUESTIONAMENTOS”.

- Socialização das respostas e síntese do grupo. Escolher um participante para anotar as

ideias principais.

- Orientação para postagem de comentário no Blog (www.docentescep.blogspot.com) sobre

o tema discutido ou envio da resposta para o e-mail do coordenador do grupo.

52

Na elaboração e reelaboração do processo de humanização, o papel

desempenhado pelo professor assume contornos complexos, que exige profissional

comprometido e ético, pois não se pode mais admitir “o ensino como transferência

de informação e a aprendizagem, como o recebimento, a armazenagem e a digestão

de informações” (SCHÖN, 2000, p. 226). É necessário construir uma identidade

profissional combinada com uma prática pedagógica adequada ao mundo moderno.

Neste sentido, é o conhecimento historicamente elaborado que serve de pano de

fundo para a práxis pedagógica do professor.

Este tratamento pedagógico dado ao conhecimento é atividade que ocorre

ao longo da carreira do professor. No decorrer de sua existência profissional,

elaborando os saberes da docência, o professor comprometido passa por um

importante processo de reflexão sobre a própria prática (SCHÖN, 2000. p.21). E é

justamente a tomada de consciência desse processo reflexivo que concretiza a

existência de um professor-reflexivo. Ao estudar essa “cultura reflexiva” incorporada

a um perfil de professor nota-se que um dos autores que teve maior peso na difusão

do conceito de “reflexão” foi Donald Schön, filósofo e pedagogo norte-americano que

tem seus estudos e suas preocupações centrados nos problemas de aprendizagem,

nas organizações e na eficácia profissional. Os pressupostos de Schön, apoiados na

herança do pensamento de John Dewey2 acerca da reflexão aplicada às questões

educacionais, começaram a ser difundidos por meio de seus livros “The Reflective

Practitioner”3 e “Educating the Reflective Practitioner”4, que contribuíram para

popularizar as teorias sobre a epistemologia da prática (termo utilizado para referir-

se ao estudo das teorias do conhecimento, adquirido através de atividades práticas).

Conforme Lüdke (2000), a partir da proposta de Schön acerca do reflexive

practitioner, surgiu a idéia de pesquisa como parte do trabalho do professor, e do

próprio professor como pesquisador. Daí a crítica ao processo de formação de

professores principalmente quanto à dicotomia teoria e prática e à distância entre as

pesquisas acadêmicas e os problemas vividos pelos docentes no dia-a-dia de sua

2 John Dewey (1859-1952) foi um filósofo, psicólogo e educador norte-americano que influenciou, deforma determinante, o pensamento pedagógico contemporâneo. Suas obras foram fundamentais paraque o movimento da Escola Nova tomasse impulso e se propagasse por quase todo o mundo, sendocitado, por muitos, como o pai da educação progressista. O enfoque que dava à pedagogia eravoltado à experiência prática, sendo, por isso, às vezes, chamada de fazendo e aprendendo.

3 SCHÖN, D. The reflective practitioner. New York (EUA): Basic Books; 1983.

4 SCHÖN, D. Educating the reflective practitioner. New York (EUA): Jossey-Bass; 1987.

53

profissão.

Ao se deparar com a realidade escolar, o professor passa a enfrentar os

dilemas de formação obtida na Licenciatura e as exigências impregnadas na

vivência em sala de aula da escola pública. Isso é o início de uma aprendizagem

docente que constituirá um saber elaborado por meio do fazer. Segundo Schön

(2000), os professores criam um conhecimento específico e ligado à ação; é

pessoal, tácito, não-sistemático, espontâneo, intuitivo, experimental e cotidiano. Esta

análise cria a categoria professor-reflexivo e os conceitos reflexão-na-ação, reflexão-

sobre-a-ação e reflexão sobre a reflexão-na-ação.

De acordo com Schön, a reflexão-na-ação consiste em refletir no meio da

ação, sem interrompê-la. O pensamento conduz a dar nova forma ao que está sendo

feito, no momento em que está sendo feito, possibilitando interferir na situação em

desenvolvimento. Para ele, observando e refletindo sobre as ações, pode-se

descrever um conhecimento que nelas está implícito. Então, mediante a observação

e a reflexão, pode-se descrever e explicitar essas ações e, para isso, posicionando-

se diante do que se deseja observar, podendo, então, encontrar novas pistas para a

solução dos problemas que se apresentam. É um processo de diálogo com a

situação problemática que exige uma intervenção concreta. O autor considera que,

nesse processo, o profissional envolvido com a situação, encontra-se constrangido

pelas pressões espaciais e temporais e pelas solicitações psicológicas e sociais do

cenário em que atua. Portanto, como assevera Gómez (1992) “é um processo de

reflexão sem o rigor, a sistematização e o distanciamento requerido pela análise

racional, mas com a riqueza da captação viva e imediata das múltiplas variáveis

intervenientes e com a grandeza da improvisação e criação”

A reflexão-sobre-a-ação consiste em pensar retrospectivamente sobre o

que foi feito, almejando descobrir como o ato de conhecer-na-ação pode ter

contribuído para um resultado inesperado. Esse “conhecimento-na-ação” traz

consigo um saber que está presente nas ações profissionais as quais, por sua vez,

vêm carregadas de um “saber escolar”, entendido como um tipo de conhecimento

supostamente possuído pelos profissionais; uma visão dos saberes profissionais

como fatos e teorias aceitos. É esse “saber escolar” que possibilita ao profissional

transitar no seu meio e poder agir, por possuir “um conhecimento na ação”. Porém, o

“saber escolar” também se caracteriza por estar colado a um certo modo de

enfrentamento das situações do cotidiano e por revelar um conhecimento

54

espontâneo, intuitivo, experimental. O conhecimento, portanto, está na ação em si, e

o revelamos por meio de ações espontâneas e habilidades.

Diferentemente, a reflexão sobre a reflexão-na-ação repousa no ato de

pensar sobre a reflexão-na-ação passada, consolidando o entendimento de

determinada situação e, desta forma, possibilitando a adoção de uma nova

estratégia. Esse momento pode ser considerado como a análise que o professor

realiza a posteriori sobre as características e processos da sua própria ação. É a

utilização do conhecimento para descrever, analisar e avaliar os vestígios deixados

na memória por intervenções anteriores. Para o autor, “na reflexão sobre a ação, o

profissional prático, liberto dos condicionamentos da situação prática, pode aplicar

os instrumentos conceituais e as estratégias de análise no sentido da compreensão

e da reconstrução da sua prática”. Esse distanciamento da ação presente, para

refletir, é um movimento que pode ser desencadeado sem gerar, necessariamente,

uma explicação verbal, uma sistematização teórica. Todavia, ao produzir uma

descrição verbal, isto é, uma reflexão sobre a reflexão da ação passada, pode influir,

diretamente, em ações futuras, colocando em prova uma nova compreensão do

problema. Esse momento é caracterizado pela intenção de se produzir uma

descrição verbal da “reflexão-na-ação”. É necessário, ainda, a capacidade de se

refletir acerca da descrição resultante, podendo-se gerar modificações em ações

futuras, ou seja: quando se reflete sobre a “reflexão-na-ação”, julgando e

compreendendo o problema, pode-se imaginar uma solução para ele.

Esses três processos descritos - reflexão-na-ação, reflexão-sobre-a-ação e

reflexão sobre a reflexão-na-ação - constituem o “pensamento prático” do

profissional, com o qual enfrenta as situações “divergentes” da prática. Esses

processos não são independentes, mas, sim, completam-se entre si para garantir

uma intervenção prática racional.

Sendo no exercício compartilhado em busca de soluções para dificuldades

individuais e coletivas é que, de acordo com Schön, a reflexão na ação e sobre a

ação podem se constituir em forte aliada profissional. É possível reconhecer que

“todos nós que habitamos a escola sabemos que fazemos parte de um sistema

social onde coexistem diferentes actores, diferentes filosofias, percepções e

objetivos e muitos jogos de poder conflituosos.” (ALARCÃO, 2010, p. 96). Assim,

construir a si mesmo, num ambiente dessa natureza, exige a capacidade de

55

mobilizar-se em direção à concretização de atividades compartilhadas, em constante

desenvolvimento porque coletivamente construídos.

Nesse contexto, merece atenção o modo como o professor realiza a reflexão

sobre as suas práticas pedagógicas e como procede a relação de sua vida com a

vida profissional. Para assegurar um processo pedagógico reflexivo há que se

investir na formação de um sujeito ativo e reflexivo, reorganizando atividades

escolares, revendo acumulação de informação e buscar a interpretação da

informação.

Schön (1992, p. 81) aponta que é importante formar um professor reflexivo,

que dê conta de lidar com confusão e incerteza que surgem na sua ação, tanto por

parte dos alunos quanto do próprio professor, pois é impossível aprender sem ficar

confuso. A formação pedagógica deve levar em conta, portanto, uma formação de

professor que tenha um practicum reflexivo.

O conteúdo da reflexão se forma através das relações sociais de produção

situadas ideologicamente como pessoas de determinada classe que lutam contra

certas práticas. A reflexão também é, então, ideológica por sustentar, reproduzir,

transformar estas práticas, criando distintas relações entre as pessoas, entre estas e

o processo de produção, de tomada de decisões e de comunicação.

Nesta proposta fica evidente a importância da ação prática do professor, que

quase se autonomiza. Assim, para evitar certo espontaneísmo e elaboração de uma

concepção de reflexão com perspectiva meramente individual, é que a prática

reflexiva pressupõe uma situação institucional, coletiva, e deve levar também à

ação, de modo a promover alterações desde a sala de aula, a escola e a

comunidade até as estruturas sociais mais amplas.

Desse modo, a atenção do professor estará voltada para a sua própria

prática e para as condições sociais nas quais a mesma se situa, numa perspectiva

democrática e emancipatória. Tornar o ensino reflexivo é tornar mais conscientes os

saberes tácitos: criticá-los, examiná-los e melhorá-los. A prática reflexiva tem

compromisso com a reflexão como prática social.

A tarefa de investigar a própria prática, de examinar o rigor e a coerência ou

não com o que foi realizado, de avaliar as próprias percepções, é uma tarefa de

prática teórica que a investigação-ação escolar, permite construir uma identidade

mais próxima do compromisso social com o desenvolvimento humano e com o

próprio processo de humanização.

56

Os professores que refletem em ação e sobre a ação estão envolvidos num

processo investigativo, não só tentando compreender melhor a si próprios como

professores, mas também procurando melhorar o seu ensino. A profissionalidade

desse professor envolve: o empenho para o questionamento sistemático do próprio

ensino como uma base para o desenvolvimento; o empenho e as competências para

estudar o seu próprio ensino; a preocupação para questionar e testar teoria na

prática fazendo uso dessas competências e a disponibilidade para permitir a outros

professores observar o seu trabalho – diretamente ou através de registos e discuti-

los numa base de honestidade. Esta perspectiva pressupõe que ensinar é mais do

que uma arte. É uma procura constante com o objetivo de criar condições para que

aconteçam aprendizagens.

A ideia de reflexão surge associada ao modo como se lida com problemas

da prática docente à possibilidade do professor aceitar um estado de incerteza e

estar aberto a novas hipóteses. Com isso, acaba dando forma a esses problemas,

descobrindo novos caminhos, construindo e concretizando soluções. Este processo

envolve, pois, um equacionar e reequacionar de uma situação problemática. Num

primeiro momento há o reconhecimento de um problema e a identificação do

contexto em que ele surge e, num segundo momento, a conversação com o

“repertório de imagens, teorias, compreensões e ações” (SCHÖN, 2000, p. 31)

criando uma nova maneira de o ver. A reconstrução de algumas ações pode resultar

em novas compreensões da situação. E isto é pressuposto do processo reflexivo,

que se caracteriza por um vaivém permanente entre acontecer e compreender na

procura de significado das experiências vividas.

Thompson (1992 apud OLIVEIRA; SERRAZINA, 2002, p. 34) afirma que o

professor é conduzido, através da reflexão na sua própria prática e, especialmente,

através da reflexão sobre ela a obter uma visão crítica do contexto estrutural ou

ideológico em que trabalha. A reflexão desempenha, então, um papel essencial

sobre o conteúdo a ensinar, sobre as suas próprias práticas e sobre o que é o

ensino e a aprendizagem. Isso pode levar à alteração de crenças e concepções

sobre o que é ensinar e da relação do professor com a disciplina que ministra.

O processo reflexivo caracteriza-se por um vaivém permanente entre

acontecer e compreender na procura de significado das experiências vividas. Há,

através das práticas, um ganho na compreensão e esta nova compreensão pode

fazer surgir um insight sobre o que significa ser professor. Deste modo, a artistry do

57

professor, metáfora útil para expressar o que os professores em cooperação são

capazes de fazer, vai-se desenvolvendo. Claramente, os vários tipos de reflexão têm

um papel importante no desenvolvimento da artistry, segundo Schön (1987).

Só a reflexão, no entanto, não é suficiente para empreender mudanças. Ela

tem de ter força para provocar a ação. A ação exige um ambiente propício, como por

exemplo, uma equipe comprometida com o projeto de escola e de sociedade, como

uma forma de enriquecer a reflexão individual. Esta equipe de reflexão funciona

como o espaço onde se colocam e discutem as questões que resultam da prática,

onde se sentem novas necessidades e se constroem novos conhecimentos.

Refletir sobre a ação e na ação, constituindo-se sujeito reflexivo, leva o

professor a extrapolar o âmbito de questões pedagógicas. A realidade, longe de ser

trivial, aproxima de questões da esfera macro, fazendo pensar sobre as políticas

públicas em suas finalidades e intencionalidades. E nesta perspectiva, o processo

educativo assegura os espaços de interlocução, de identificação de relações de

poder, de papéis sociais, de diferenças e de identificações. Por isso mesmo, o

professor que reflete em ação e sobre a ação está envolvido num processo

investigativo, não só tentando compreender melhor a si próprio como professor, mas

também procurando melhorar o seu ensino.

Assim, construir a identidade de professor reflexivo é analisar o saber escolar

tendo como ponto de partida o professor e sua ação. Não se pretende, portanto,

analisar a reação do saber escolar com o saber de referência, embora seja o fio

condutor da prática docente. A concepção que se pretende explorar é sobre o saber

escolar que surge de preocupações com o saber do professor e não com o saber

escolar propriamente dito. Nesta perspectiva, ensinar os saberes escolares é uma

procura constante com o objetivo de criar condições para que aconteçam

aprendizagens.

Conforme afirma Zeichner (1981), o ensino reflexivo requer uma permanente

autoanálise por parte do professor, o que implica abertura de espírito, análise

rigorosa e consciência social. Esse mesmo autor dá um exemplo: quando se fala em

ensino de Química, o professor tem de analisar a situação concreta, perceber os

alunos com que trabalhará, o que se espera que eles aprendam em Química, o que

se entende hoje por aprender e ensinar Química e o seu papel na formação pessoal

e social do aluno. É este processo investigativo realizado pelo professor, em termos

individuais e coletivos, que o leva a ação. Para que este processo tenha sucesso é

58

necessário que o professor questione e reflita sobre situações de sala de aula e que

o faça no contexto da sua realidade.

De acordo com Resende (apud VEIGA, 2003, p. 255) os sujeitos reflexivos

são sujeitos coletivos, pela consciência do não isolamento científico; sujeitos

concretos e históricos, tendo o contexto e as circunstâncias vivenciadas como

referenciais; sujeitos sociais, pela não-neutralidade e pela ênfase no pressuposto

das intervenções; sujeitos éticos, pelo compromisso e pelo respeito a si e ao outro;

sujeitos políticos, pela intencionalidade de suas ações.

Na constituição desses sujeitos reflexivos, há que se considerar ainda um

importante elemento que é a consciência histórica que constrói o ser humano. Sem

essa consciência, o mundo passa a ser entendido como uma fatalidade, um

determinismo resultante da assimetria na relação do opressor com o oprimido. O

saudosismo, o desejo da volta a um mundo em que não havia contestação, o

professor tinha status e era o centro da sala de aula, ditando normas, pontos e

conceitos, não se coadunam com o professor reflexivo, homem de seu tempo, de

passo acertado com a evolução que continua. Vasconcellos (1995, p.67) explica que

“o espaço de reflexão crítica, coletiva e constante sobre a prática é essencial para

um trabalho que se quer transformador”.

Na sociedade atual, plural e diversa, caracterizada pelos conflitos, incertezas

e complexidades, o professor precisa desenvolver uma prática reflexiva no sentido

de transformar a sala de aula. As práticas reflexivas na medida em que vai

envolvendo o professor em um trabalho coletivo e colaborativo podem constituir um

modo de lidar com a incerteza, encorajando a trabalhar de modo competente e ético

tendo como meta a melhoria educacional. Construir uma identidade reflexiva é

vivenciar, então, uma prática pautada numa identidade social, ética e política.

Por meio do processo reflexivo, o professor tem como resultado, em primeira

e em última instância, um estranhamento, uma dúvida, uma interrogação, uma

indignação que, em função disso, pode desencadear o pensamento crítico. Até

porque, nas situações decorrentes da prática, não existe um conhecimento

profissional para cada caso-problema, que teria uma única solução correta. O

profissional competente atua refletindo na ação, criando uma nova realidade,

experimentando, corrigindo e inventando por meio do diálogo que estabelece com

essa mesma realidade. Na base dessa perspectiva, que confirma o processo de

“reflexão-na-ação” do profissional, é que se encontra uma concepção construtivista

59

da realidade confrontada.

Espera-se evidenciar o importante papel da profissionalização do professor,

elevando o status do saber docente e colocando tal profissional como pólo de

referência ao pensamento e à prática pedagógica na escola de educação básica da

rede estadual. Tal empreitada passa, obrigatoriamente pela compreensão crítica das

razões que antecederam a profissionalização docente e das motivações que

impelem ao compromisso com a escola, passando pela análise dos elementos que

constituem a identidade profissional construída junto com os saberes docentes,

contextualizados na sociedade contemporânea.

Freire reforça a necessidade da postura crítica e da prática reflexiva para

compreender o mundo. O professor, em sua prática pedagógica, ao refletir sua ação,

deve levar seus alunos a constituírem uma compreensão crítica do mundo. Também

salienta que são verdadeiramente críticos os professores que vivem a plenitude da

práxis. Isto é, que incorporam na ação uma crítica reflexão que organiza o

pensamento e conduz à superação de um conhecimento estritamente ingênuo da

realidade. Estes precisam alcançar um nível superior para que os sujeitos cheguem

à razão da realidade. Para concretização disso, antes de mais nada, há a exigência

de um pensar constante, que não pode ser negado às massas populares, se o

objetivo visado é a libertação e a transformação (FREIRE, 1987).

Nesse sentido, a prática docente tendo em vista a formação de um aluno

crítico, observador, questionador, exigente, que cobra qualidade, que precisa ser

formado cidadão, exige um professor, ele também, crítico de sua ação e sempre

pronto a se questionar-se para progredir. Vasconcellos (1995, p. 56) descreve que o

professor necessita “conhecer, acolher criticamente, buscar o aprofundamento da

proposta da escola; procurar unidade de ação com colegas; postura de investigação

em relação à sua disciplina; abertura; não querer ser o dono da verdade; ser

observador; saber ouvir; confiar nos companheiros; disponibilidade para aprender;

desenvolver a postura interdisciplinar”.

A construção desse processo de reflexão crítica permite aos professores

avançar num processo de transformação da prática pedagógica mediante sua

própria transformação como intelectuais críticos, isto requer, de acordo com

Contreras (2002) a tomada de consciência dos valores e significados ideológicos

implícitos nas atuações docentes e nas instituições, e uma ação transformadora

dirigida a eliminar a irracionalidade e a injustiça existentes nestas instituições. Como

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sinaliza Ghedin, (2012) “a reflexão crítica apela a uma crítica da interiorização de

valores sociais dominantes, como maneira de tomar consciência de suas origens e

de seus efeitos” (p. 170).

Há que se levar em consideração, no entanto, uma questão fundamental

explicitada por Aquino e Mussi (2001, p. 225): “A experiência dessa vivência peculiar

contemporânea, acreditamos, obriga os sujeitos-professores desse tempo a

cogitarem sobre quem são diante das novas ingerências do presente sobre a

profissão, quase a exigir que o professor dilate antigos códigos do 'dever ser' da

profissão e se insira no interior de seu próprio presente. Que, enfim, ele aprenda a

se ver altercado pelas teorias educacionais que o legitimam como um sujeito da

reflexão, autodeterminação e autonomia”. Nessa perspectiva, há que se considerar

alguns aspectos e algumas atitudes a serem desenvolvidas por aqueles que se

desejam profissionais críticos-reflexivos. De acordo com Zeichner (1981), esses

professores necessitam analisar e enfrentar os dilemas que se colocam na sua

atividade; assumir os seus valores; estar atento aos contextos culturais e

institucionais; envolver-se na mudança e tornar-se agente do seu próprio

desenvolvimento profissional.

Finalmente, levando em consideração a sociedade plural em que se vive,

caracterizada pela conflitualidade, incerteza e complexidade, os professores

precisam de desenvolver uma prática reflexiva no sentido de transformar a sala de

aula. E a discussão em torno das práticas reflexivas e do professor reflexivo, longe

de estarem concluídas, permanecem em aberto. Afinal, muitas perguntas emergem

no processo de estudo de tais questões, como por exemplo a percepção que os

professores têm sobre a reflexão, como reconhecem seu papel na educação, como

constroem suas identidades, como realizam sua prática, entre outras. Assim, as

práticas reflexivas na medida em que envolvem equipes de professores em trabalho

coletivo e engajado ao Projeto Político Pedagógico da instituição, podem constituir

um modo de lidar com a incerteza de modo competente e ético.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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61

GHEDIN. E. Professor reflexivo: da alienação da técnica à autonomia da crítica. In: PIMENTA, S. G.;GHEDIN, E. (orgs). Professor reflexivo no Brasil: gênese e crítica de um conceito. 7 ed. São Paulo:Cortez, 2002. p. 148 – 173.GÓMEZ, A. I. P. O pensamento prático do professor: a formação do professor como profissionalreflexivo. In: NÓVOA, A. (org.). Os professores e a sua formação. Lisboa (Portugal): Publicações DomQuixote, 1992. p.95-114.______. A função e formação do professor/a no ensino para a compreensão: diferentes perspectivas.IN: SACRISTÁN, J. G; GÓMEZ, A. I. P. Compreender e transformar o ensino. 4 ed. São Paulo:Artmed, 1996. p. 353 – 379.LÜDKE, M. A pesquisa e o professor da escola básica: que pesquisa, que professor? In: CANDAU, V.M. (Org). Ensinar e aprender: sujeitos, saberes e pesquisa. Encontro Nacional de Didática e Práticade Ensino (ENDIPE). Rio de Janeiro: DP&A, 2000. OLIVEIRA, I; SERRAZINA, L. A reflexão e o professor como investigador. In: GTI – Grupo deTrabalho de Investigação (org.). Reflectir e investigar sobre a prática profissional. Portugal: APM,2002, p.29-42.PIMENTA, S. G. Saberes pedagógicos e atividade docente. 8 ed. São Paulo: Cortez, 2012.RESENDE, L. M. G. O sujeito reflexivo no espaço da construção do projeto político-pedagógico. In.VEIGA, I. P. A.; FONSECA, M. (Orgs.). As dimensões do projeto político-pedagógico: novos desafiospara a escola. 2 ed. Campinas: Papirus, 2001. p. 239 – 256.SCHON, D. A. Educando o profissional reflexivo: um novo design para o ensino e a aprendizagem.Porto Alegre: Artmed, 2000.VASCONCELLOS, C. dos S. Para onde vai o professor? Resgate do professor como sujeito detransformação. São Paulo: Libertad, 1995.ZEICHNER, K. M. A Formação Reflexiva de Professores: Ideias e Práticas. Lisboa: Educa, 1981.

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PARA REFLETIR V

Quando Schön concebeu a abordagem do professor reflexivo, não ignorou a

existência das questões institucionais, porém essas não foram contempladas como

elementos essenciais para a transformação da prática pedagógica. Para isso, Schön

argumenta que não está propondo implantar um processo de mudança institucional, pois

essa demanda mais tempo que as mudanças centradas na prática.Os pressupostos do

trabalho do teórico se assentam em práticas reflexivas individualizadas, ou seja, o professor

é o responsável por enfrentar os problemas de sua prática pedagógica. Essa proposta

reflexiva leva o professor a acreditar que a reflexão sobre a prática possibilitaria por si só as

formas de intervenção, de acordo com Libâneo (2002, p. 66). Contudo, isolado, as

transformações que o docente pode propor não ultrapassam o limite imediato da sala de

aula. Como escapar dessa armadilha?

QUESTIONAMENTOS V1. Quais são as características do professor que reflete criticamente sua ação

pedagógica?

2. Como o professor elabora os “jeitinhos” para dar conta das situações problemáticas no

cotidiano escolar?

3. Por que se diz que, ao passar do tempo, o professor apenas repete a prática dos

primeiros anos da profissão?

4. Como organizar um trabalho coletivo e colaborativo na atual organização da escola

pública estadual, levando em consideração a organização curricular por disciplinas?

5. Quais são as ações concretas de seu cotidiano que expressariam a concretude dos

momentos da reflexão explicitados por Donald Schön?

6. Que ações o pedagogo pode realizar com a intenção de contribuir para que o professor

desenvolva uma abertura de espírito, realize uma análise rigorosa e construa uma

consciência social de sua profissão, de sua ação e de sua relação pedagógica no interior da

escola?

ATIVIDADE V

Acesse o blog www.docentescep.blogspot.com, localize o texto “O professor

reflexivo”, clique em Comentários e envie sua opinião sobre o tema abordado.

Lembre-se: Pontue as questões pautadas em sua prática pedagógica e conste seu nome e

a disciplina que ministra.

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SUGESTÕES V - LIVROS

Professor reflexivo no Brasil: gênese e crítica de um conceito, organizado por Selma

Garrido Pimenta e Evandro Ghedin, 2012.

Esta obra traz a tona o pensar e o refletir que é

próprio do ser humano e evidencia a contribuição da

reflexão no exercício da profissão de professor. A proposta é

discutir criticamente o conceito do professor reflexivo,

destacando ainda as origens, os pressupostos, os

fundamentos e as características deste termo. A perspectiva

conceitual do professor reflexivo tem se revelado importante

para a leitura, compreensão e orientação do processo de

formação de professores, mas, também tem sido apropriado

por diversos atores pesquisadores e reformadores

educacionais, com perspectivas divergentes para esse

processo.

O professor refém: para pais e professores entenderem por que fracassa a educação

no Brasil, de Tania Zagury, 2006.

O livro, resultado de pesquisa da autora com mais

de mil e duzentos professores do Brasil, realiza análise

fundamental sobre o sistema educacional brasileiro,

enfocando o que vem ocorrendo com os profissionais da

educação. As angústias e impossibilidades concretas do

professor são dissecadas, lançando luzes sobre o porquê

do fracasso do ensino. Segundo a autora, a problemática do

ensino brasileiro não se restringe apenas à qualificação do

professor. Pelo contrário, o docente também é atingido por

problemas da educação como falta de infra-estrutura e

baixa remuneração. Em tom de alerta, observa que a

problemática também tem causa na sociedade e na família.

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LEITURA COMPLEMENTAR V

Donald Schön

Nasceu em Boston / EUA, 1930 e faleceu

em Boston / EUA, 1997.

Foi um filósofo e pedagogo estadunidense

que estudou sobre a reflexão na educação. Foi

professor no Instituto de Tecnologia de

Massachusetts (MIT) de 1968 até sua morte.

Estudou em Yale, na Sorbonne e em

Harvard. Lecionou Filosofia na UCLA e na

Universidade do Kansas antes de integrar a

conhecida empresa norte-americana de consultoria

Arthur D. Little; mais tarde trabalhou no

Departamento de Comércio dos Estados Unidos da

América tendo chegado a presidente da Organização para a Inovação Social e Técnica do MIT.

Foi pioneiro no desenvolvimento do conceito de "ciência-ação", uma abordagem

investigativa da gestão para lidar com problemas e erros nas organizações Da sua obra escrita,

destacam-se os livros "Organizational Learning: A Theory of Action Perspective" e "Theory and

Pratice: Increasing Professional Efficiency", ambos escritos em co-autoria com Chris Argyris.

As suas ideias têm tido muita influência no campo educacional, designadamente nas

pessoas interessadas na formação de professores. O trabalho que desenvolveu tem sustentado

as posições dos que, como Kenneth Zeichner, defendem a emancipação do professor como

alguém que decide e encontra prazer na aprendizagem e na investigação do processo de ensino

e aprendizagem.

As ideias de Schön sobre o desenvolvimento do conhecimento profissional baseiam-se

em noções como a de pesquisa e de experimentação na prática. A designação “professional

artistry” é usada pelo autor com o sentido de referir as competências que os profissionais

revelam em situações caracterizadas, muitas vezes, por serem únicas, incertas e de conflito. O

conhecimento que emerge nestas situações de um modo espontâneo e que não se é capaz de

explicitar verbalmente pode ser descrito, em alguns casos, por observação e reflexão sobre as

ações. Os pressupostos de Schön são apoiados na herança do pensamento de Dewey acerca

da reflexão aplicada às questões educacionais, sendo que sua proposta central centra a

aprendizagem prática na “reflexão-na-ação”, como alternativa para a formação do profissional

reflexivo.

(Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Donald_Schön)

(Foto: http://degreesfiction.files.wordpress.com/2012/04/schon.jpg )