ousadia e determinação sertaneja

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O agricultor Lourisval Felipe, é conhecido como Lourinho, tem 43 anos, e mora com a sua mãe em Serra Branca, município de Ipubi, Araripe de Pernambuco. Sua infância foi marcada pelas práticas incorretas na agricultura adotadas pela sua mãe no Sítio Potós, local que a família morava na época. Apesar de criança, Lourinho já pensava em uma forma de ajudá-la, então, resolveu seguir sua intuição e, corajosamente, foi sozinho até Serra Branca. Ao chegar lá, o menino prodígio - que já sabia observar a natureza – pediu ao feirante para ir com ele vender frutas em Ouricuri. O colega não permitiu, devido a pouca idade de Lourinho. Desapontado, ele voltou para casa, juntou as poucas frutas que tinha e, conseguiu despistar a mãe, seguindo para Serra Branca novamente. Quando chegou na comunidade, o menino disse ao feirante que sua mãe havia dado permissão, sendo assim, a dupla partiu para Ouricuri. Naquele tempo, as estradas que davam acesso às comunidades eram ruins, com isso os agricultores perdiam alimentos durante o percurso. Mesmo com as dificuldades enfrentadas por Lourinho, a iniciativa dele garantiu uma quantia suficiente para que ele pudesse comprar alguns produtos e levar para casa. Quando viu sua mãe, surpreendeu: “Mãe, estão aqui as compras que fiz com o dinheiro que consegui na feira, e daqui pra frente, a senhora não me segura mais, pois vou lhe ajudar”, afirmou Lourinho, que aos 11 anos, passou a sustentar a família. Dessa forma, o agricultor logo buscou se alfabetizar para facilitar as suas negociações. Cinco anos depois, Lourinho foi para São Paulo onde passou alguns anos. Durante esse período, o jovem conheceu a feira orgânica paulista e ficou encantado. Ele recorda que quando viajava de férias para visitar à família em Ipubi, costumava procurar feiras similares na região, mas nunca encontrava. Quando o agricultor fez 25 anos, resolveu voltar para sua terra. Durante o tempo em que esteve no Sudeste, Lourinho acumulou experiência e aprendeu como ganhar a vida, descobrindo o que gosta de fazer. Isso lhe Pernambuco Ano 5 | nº 126 | setembro | 2011 Ipubi - Pernambuco Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas Ousadia e determinação sertaneja 1 Lourinho e seu ajudante colhendo as frutas na propriedade.

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O agricultor Lourisval Felipe, é conhecido como Lourinho, tem 43 anos, e mora com a sua mãe em Serra Branca, município de Ipubi, Araripe de Pernambuco. Sua infância foi marcada pelas práticas incorretas na agricultura adotadas pela sua mãe no Sítio Potós, local que a família morava na época. Apesar de criança, Lourinho já pensava em uma forma de ajudá-la, então, resolveu seguir sua intuição e, corajosamente, foi sozinho até Serra Branca.

Ao chegar lá, o menino prodígio - que já sabia observar a natureza – pediu ao feirante para ir com ele vender frutas em Ouricuri. O colega não permitiu, devido a pouca idade de Lourinho. Desapontado, ele voltou para casa, juntou as poucas frutas que tinha e, conseguiu despistar a mãe, seguindo para Serra Branca novamente. Quando chegou na comunidade, o menino disse ao feirante que sua mãe havia dado permissão, sendo assim, a dupla partiu para Ouricuri.

Naquele tempo, as estradas que davam acesso às comunidades eram ruins, com isso os agricultores perdiam alimentos durante o percurso. Mesmo com as dificuldades enfrentadas por Lourinho, a iniciativa dele garantiu uma quantia suficiente para que ele pudesse comprar alguns produtos e levar para casa. Quando viu sua mãe, surpreendeu: “Mãe, estão aqui as compras que fiz com o dinheiro que consegui na feira, e daqui pra frente, a senhora não me segura mais, pois vou lhe ajudar”, afirmou Lourinho, que aos 11 anos, passou a sustentar a família. Dessa forma, o agricultor logo buscou se alfabetizar para facilitar as suas negociações.

Cinco anos depois, Lourinho foi para São Paulo onde passou alguns anos. Durante esse período, o jovem conheceu a feira orgânica paulista e ficou encantado. Ele recorda que quando viajava de férias para visitar à família em Ipubi, costumava procurar feiras similares na região, mas nunca encontrava. Quando o agricultor fez 25 anos, resolveu voltar para sua terra. Durante o tempo em que esteve no Sudeste, Lourinho acumulou experiência e aprendeu como ganhar a vida, descobrindo o que gosta de fazer. Isso lhe

Pernambuco

Ano 5 | nº 126 | setembro | 2011Ipubi - Pernambuco

Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas

Ousadia e determinação sertaneja

1

Lourinho e seu ajudante colhendo as frutas na propriedade.

rendeu boas economias, assim, ele pôde voltar para Ipubi com boas perspectivas.

Inicialmente o agricultor comprou a propriedade em que vive com sua mãe nos dias atuais. Ele conta que à princípio só havia mato no terreno, entretanto ele percebeu que a terra estava fraca, sendo assim, Lourinho resolveu aproveitar todos os elementos disponíveis na propriedade. “Comecei a trabalhar a terra sem queimar, sem desmatar, sem usar venenos, utilizando as práticas de conservação do solo”, detalha. Lourinho deu vida ao local, cultivando frutas e reativando um poço existente na propriedade, uma iniciativa que garantiu uma fonte de água para beber e produzir.

Em 2000, o agricultor procurou o Centro de Assessoria e Apoio aos Trabalhadores e Instituições Não Governamentais Alternativas (Caatinga) para participar de uma reunião da associação a qual ele fazia parte. Na ocasião, os técnicos da organização perceberam o potencial da comunidade na produção de frutíferas, em especial de algumas famílias. Uma delas foi a de Lourinho, que trouxe de longe, inspiração e criatividade, elementos que lhe ajudaram a encontrar um caminho para viver de maneira digna na sua terra. Como forma de ampliar os seus conhecimentos, o agricultor também participou de algumas atividades de formação em agroecologia promovidas pelo Centro de Habilitação e Apoio ao Pequeno Agricultor do Araripe (Chapada) e pelo Caatinga. “Eu tinha aprendido muita coisa em São Paulo, mas os cursos, as capacitações e as visitas de intercâmbio que participei foram importantes para eu entender a essência do trabalho com agroecologia. A partir disso, comecei a inovar na propriedade, respeitar o meio ambiente, e também aproveitar tudo o que eu podia da natureza”, destaca.

Há oito anos, Lourinho foi convidado à comercializar seus alimentos na Feira Agroecológica de Ouricuri, e posteriormente, no Empório Kaetéh, espaço de comercialização agroecológico na mesma cidade. Em 2005, com o apoio do Caatinga e do Chapada, Lourinho e outras famílias agricultoras fundaram a Feira Agroecológica de Ipubi. No início ele levava poucas frutas, mas percebeu que poderia ampliar e diversificar a produção. “Hoje a minha vida não tem sentido sem a feira agroecológica, pois a minha barraca é a minha felicidade. Além das frutas e verduras, eu também levo alguns lanches, água de coco, caldo de cana, e estou sempre atento às necessidades da clientela”, garante.

Atualmente Lourinho vê seus produtos acabarem rápido na feira, e investe na sua barraca para também torná-la um espaço de lazer. Uma única vez, ele trocou essa atividade por outro ofício, o que lhe deixou insatisfeito, e o fez voltar para a feira. A mais recente conquista do agricultor, foi fruto do seu trabalho na feira agroecológica, e trata-se da aquisição de um carro de carroceria, um antigo sonho de Lourinho. O veículo foi fundamental para transportar os produtos e dar agilidade ao trabalho. Além disso, Lourinho continua aprendendo coisas novas. Hoje ele consegue produzir plantas ornamentais, e atua como paisagista em uma empresa local, oportunidade que ele também soube aproveitar.

Para o futuro, o criativo agricultor deseja que outras famílias agricultoras produzam de forma agroecológica, consigam transformar suas vidas, e principalmente tenham uma saúde melhor. “Para mim, a essência de tudo é ter muita fé e vontade de trabalhar, correr atrás, trazer coisas novas para comunidade, com isso, as coisas chegam na hora certa”, acredita Lourinho.

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O agricultor cuidando das suas mudas.