panorama da competÊncia estatÍstica no ensino...
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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS
Instituto de Física "Gleb Wataghin"
LETÍCIA VIEIRA OLIVEIRA GIORDANO
PANORAMA DA COMPETÊNCIA ESTATÍSTICA NO ENSINO MÉDIO BRASILEIRO: DAS IDEIAS E
PRÁTICAS DOS PROFESSORES AO DESEMPENHO DOS ALUNOS NO ENEM.
AN OVERVIEW OF STATISTICAL COMPETENCE IN
BRAZILIAN HIGH SCHOOL: FROM TEACHERS’ IDEAS AND PRACTICES TO STUDENTS’
PERFORMANCE IN THE ENEM
CAMPINAS
2017
LETÍCIA VIEIRA OLIVEIRA GIORDANO
PANORAMA DA COMPETÊNCIA ESTATÍSTICA NO
ENSINO MÉDIO BRASILEIRO: DAS IDEIAS E PRÁTICAS
DOS PROFESSORES AO DESEMPENHO
DOS ALUNOS NO ENEM.
Tese apresentada ao Instituto de Física
"Gleb Wataghin" da Universidade
Estadual de Campinas, como parte dos
requisitos exigidos para a obtenção do
título de Doutora em Ensino de Ciências
e Matemática, na Área de Ensino de
Ciências e Matemática.
Orientador: Prof. Dr. Maurício Urban Kleinke
ESTE EXEMPLAR CORRESPONDE À VERSÃO
FINAL DA TESE DEFENDIDA PELA ALUNA LETÍCIA
VIEIRA OLIVEIRA GIORDANO E ORIENTADA PELO
PROF. DR. MAURÍCIO URBAN KLEINKE.
CAMPINAS
2017
FOLHA DE APROVAÇÃO
LETÍCIA VIEIRA OLIVEIRA GIORDANO
PANORAMA DA COMPETÊNCIA ESTATÍSTICA NO ENSINO MÉDIO
BRASILEIRO: DAS IDEIAS E PRÁTICAS DOS PROFESSORES AO
DESEMPENHO DOS ALUNOS NO ENEM.
COMISSÃO AVALIADORA
_______________________________________________________________
PROF. DR. MAURÍCIO URBAN KLEINKE – UNICAMP (ORIENTADOR)
_______________________________________________________________
PROFA. DRA. MARIA IGNEZ DE SOUZA VIEIRA DINIZ – USP (BANCA
EXAMINADORA)
_______________________________________________________________
PROFA. DRA. CILEDA DE QUEIROZ E SILVA COUTINHO - PUCSP (BANCA
EXAMINADORA)
_______________________________________________________________
PROFA. DRA. LAURA LETICIA RAMOS RIFO – UNICAMP (BANCA
EXAMINADORA)
_______________________________________________________________
PROF. DR. SAMUEL ROCHA DE OLIVEIRA – UNICAMP (BANCA EXAMINADORA)
A ATA DA DEFESA COM AS RESPECTIVAS ASSINATURAS DOS MEMBROS ENCONTRA-SE NO
PROCESSO DE VIDA ACADÊMICA DO ALUNO.
CAMPINAS, 30 DE NOVEMBRO DE 2017.
Dedico este trabalho a todos aqueles que acreditam
no papel valoroso da Educação: aos meus pais que
me educaram livre para escolher, mas consciente da
responsabilidade das decisões; ao meu marido que
desde o primeiro dia de aula da graduação entendeu
e abraçou meus anseios profissionais; à minha irmã,
amigos e familiares pelo apoio de sempre; àqueles
que foram meus professores e inspiraram minhas
práticas e reflexões e; a todos os meus colegas de
trabalho e alunos que me ensinam, desafiam e
motivam a continuar estudando.
AGRADECIMENTOS
A vida é cheia de encontros, alguns pouco nos influenciam, outros mexem
conosco a ponto de nos transformar, nem que seja só um tantinho. Durante o
doutorado, muitos foram os encontros que proporcionaram transformações –
acanhadas ou grandiosas – e me inspiraram diretamente na realização deste
trabalho. Portanto, aos protagonistas desses momentos, ficam meus
agradecimentos.
Ao Prof. Dr. Maurício Urban Kleinke, pelos ensinamentos, orientação,
respeito e, principalmente, pela disposição em me tirar dos momentos de aparente
inércia.
A todos e cada um dos docentes das disciplinas cursadas, pela
excelência e dedicação à minha formação científica. Àqueles que não foram meus
professores, mas mesmo assim se dedicaram a este trabalho com apontamentos,
críticas, indicações e sugestões.
À UNICAMP, instituição que me acolheu mais uma vez, pela oportunidade
de vivenciar uma Universidade consciente de seu papel na sociedade. Ao Instituto
Federal de São Paulo, pelo apoio e fomento à profissionalização de seus docentes.
Ao Mathema, não só pelo incentivo, mas também por me ensinar que pesquisa e
reflexão podem estar no chão da escola.
A meus amigos de longa data e àqueles que encontrei nos últimos anos,
tanto pelas conversas leves quanto pelas existenciais.
Por fim, mas não menos importante, por todos os encontros no convívio
diário ou mesmo nas ausências, amenos ou intensos, agradeço ao meu marido.
“Há escolas que são gaiolas. Há escolas que são asas.
Escolas que são gaiolas existem para que os pássaros
desaprendam a arte do voo. Pássaros engaiolados são
pássaros sob controle. Engaiolados, o seu dono pode
levá-las para onde quiser. Pássaros engaiolados sempre
têm um dono. Deixaram de ser pássaros. Porque a
essência dos pássaros é o voo.
Escolas que são asas não amam pássaros engaiolados.
O que elas amam são os pássaros em voo. Existem para
dar aos pássaros coragem para voar. Ensinar o voo, isso
elas não podem fazer, porque o voo já nasce dentro dos
pássaros. O voo não pode ser ensinado. Só pode ser
encorajado.”
Rubem Alves
RESUMO
Desde o final da década de 1990, com a publicação dos Parâmetros Curriculares Nacionais,
a Educação Estatística compõe o currículo da Educação Básica brasileira, vindo a se
consolidar como uma linha de pesquisa com temáticas associadas ao ensino e a
aprendizagem de conceitos estatísticos e probabilísticos. A preocupação do
desenvolvimento da Estatística como ciência e, principalmente, como método científico
experimental foi sendo aperfeiçoada nos últimos anos. No entanto, assim como ocorre em
outros países, a Educação Estatística ainda hoje busca seu lugar nas escolas brasileiras.
Essa pesquisa busca auxiliar na compreensão de como as perspectivas teóricas dos
documentos oficiais, as práticas docentes e o desempenho dos nossos estudantes têm se
organizado, sobretudo no que tange ao desenvolvimento da competência estatística. A
presente tese tem seu suporte empírico associado a duas vertentes metodológicas distintas:
a) A aplicação de um questionário a professores que ministram aulas de Estatística na
educação básica; e b) A avaliação e análise do desempenho dos candidatos ao Exame
Nacional do Ensino Médio (ENEM) em questões associadas à Estatística presentes nas
provas de Matemática entre os anos de 2012 a 2014. Os resultados do questionário foram
avaliados utilizando medidas estatísticas de frequência; análise de conteúdo para as
respostas dissertativas de uma questão aberta e Análise Fatorial Exploratória (AFE). A
competência estatística dos candidatos do Enem foi estimada em 30 questões, as quais
foram agrupadas segundo uma categorização baseada no PISA (Programa Internacional de
Avaliação de Estudantes) complementada por outros indicadores. As diferentes
metodologias aplicadas ao questionário indicam que os entrevistados ensinam Estatística
com o foco na leitura e interpretação de dados relacionados a contextos próximos aos
alunos. Situações escolares mais elaboradas, como o trabalho com resolução de problemas;
cálculos estatísticos e a reflexão associada às medidas estatísticas não parecem ser foco do
ensino de Estatística para os professores entrevistados. Observamos uma preocupação
com o desenvolvimento da argumentação e senso crítico, entretanto essa não está
associada aos conhecimentos estatísticos mais elaborados esperados para a escolaridade
média. Ao acompanhar o desempenho dos candidatos no ENEM, observamos que eles
resolvem questões que necessitam de leitura e interpretação em nível simples, sem
conexões e/ou inferências; mas não aparentam dominar o conhecimento estatístico com a
profundidade necessária para sua aplicação em situações problema de que necessitem de
níveis de compreensão mais elevados.
Palavras-chave: Exame Nacional do Ensino Médio (Brasil); Ensino médio; Educação
- Estatística; Desempenho – Estatística; Professores de matemática.
ABSTRACT
Statistical Education has integrated the Basic Education System in Brazil since the 1990s
decade, consolidating itself as a research trend, whose thematic is associated with the
learning process as well as with statistical and probabilistic concepts. Subsequently, the
concern to establish the development of Statistics as science has been perfected through
recent years, with emphasis on its recognition as a valid experimental scientific method.
However, like in other countries, Statistical Education has not yet found its place in the
schoolrooms in Brazil. This research seeks to develop an understanding of how theoretical
perspectives found in official documents, teaching practices and students’ performances
have been laid out, mainly regarding the development of Statistical Competence. This thesis
finds empirical support associated with two methodological approaches: a) A questionnaire
for mathematics teachers, who teach Statistics in elementary schools; b) Evaluate and
assess students’ performance in statistical questions in the 2012 to 2014 editions of Exame
Nacional do Ensino Médio (ENEM), a national high school exam. The results of the
questionnaire were evaluated using statistical measures of frequency, content analysis to the
explanatory responses of an open question and Exploratory Factorial Analysis (EFA).
The Statistical Competence of the ENEM candidates was estimated in 30 questions grouped
according to a categorization based on the Programme for International Student Assessment
(PISA) and additional indicators.The different methodologies applied to the questionnaire
indicated that the interviewees teach Statistics focusing on reading and interpreting data
related to closed contexts to students. More elaborate school situations like solving
problems, calculations and reflection associated with statistical measures do not seem to be
a priority in Statistics teaching. Though a concern with the development of argumentation
and critical sense was observed, that was not associated with a most elaborate statistical
knowledge expected from the interviewees’ students. By monitoring the performance of the
candidates in the ENEM, it was noticeable that they solve reading and interpretation
questions at a simple level, without connections and/or inferences. Moreover, statistical
knowledge was not applied in solving problem situations, which would require higher levels
of comprehension and familiarity with it.
Key words: National Secondary Education Examination (Brazil); High school; Education –
Statistics; Performance – Statistics; Mathematics teachers.
SUMÁRIO
CAPÍTULO 1 – APRESENTAÇÃO DA TESE ......................................................................... 14
1.1. Educação Estatística .............................................................................. 14
1.2. Objetivos gerais e específicos ................................................................ 15
1.3. Metodologia e procedimentos ................................................................. 16
1.4. Premissas ............................................................................................... 17
1.5. A construção de uma investigação ......................................................... 18
CAPÍTULO 2 – TRAJETÓRIAS DA ESTATÍSTICA E DA EDUCAÇÃO ESTATÍSTICA ...... 19
2.1. Visão Geral da Estatística ....................................................................... 19
2.2. Estatística e Suas Relações com o Estado e as Ciências ....................... 20
2.2.1. Statisticum: Relativo ao Estado ........................................... 20
2.2.2. Primórdios da Estatística .................................................... 21
2.2.3. A Estatística na Idade Média............................................... 23
2.2.4. Estatística e o Estado Brasileiro .......................................... 24
2.3. Estatística descritiva e Estatística inferencial .......................................... 24
2.3.1. Estatística e suas Relações com as Ciências ................................ 26
2.4. O Ensino de Estatística ........................................................................... 28
2.4.1. Ensino de Estatística no Séc. XX .................................................. 29
2.4.2. Educação Estatística ..................................................................... 31
2.4.3. Tendências da Educação Estatística ............................................. 35
2.4.3.1. Tendências da Educação Matemática ............................. 36
2.4.3.2. Concepções sobre Educação Estatística ......................... 40
2.5. Educação Estatística no Brasil ................................................................ 45
2.5.1. Disciplinas e cursos de Estatística ................................................. 45
2.5.2. Estatística e os Parâmetros Curriculares Nacionais ...................... 48
2.6. Desafios da Educação Estatística ........................................................... 51
CAPÍTULO 3 – ENSINO E APRENDIZAGEM DE ESTATÍSTICA ......................................... 55
3.1. Ser competente em Estatística ............................................................... 55
3.1.1. Expectativas de aprendizagem ...................................................... 57
3.1.2. Literacia estatística ........................................................................ 61
3.1.3. Raciocínio estatístico ..................................................................... 70
3.1.4. Pensamento estatístico ................................................................. 73
3.1.5. A relação entre literacia, raciocínio e pensamento estatísticos ...... 75
3.2. Os professores que ensinam Estatística ................................................. 77
3.2.1. A formação dos professores que ensinam Estatística ................... 78
3.2.2. O que se espera dos professores que ensinam Estatística ........... 80
3.3. Pressupostos teóricos e metodológicos da Educação Estatística nos
Documentos Oficiais do Brasil ....................................................................... 83
3.3.1. O contexto dos PCNEM ................................................................. 84
3.2.2. O ensino de Estatística dos documentos oficiais ........................... 86
3.3.3. As metodologias sugerida pelos documentos oficiais .................... 89
3.4. A Estatística no ENEM............................................................................ 92
3.4.1. A competência estatística no ENEM .............................................. 98
CAPÍTULO 4 – METODOLOGIA ........................................................................................... 107
4.1. O questionário ...................................................................................... 107
4.1.1. O questionário Piloto ................................................................... 107
4.1.2. A amostra .................................................................................... 108
4.1.3. A estrutura do questionário e métodos da análise dos dados ...... 109
4.1.3.1. Variáveis censitárias qualificadoras da amostra ............. 109
4.1.3.2. Pergunta aberta ............................................................. 111
4.1.3.3. Questões de ordenação ................................................. 112
4.1.3.4. Escala Likert .................................................................. 114
4.2. As questões de Estatística do Enem ..................................................... 116
4.2.1. A complexidade da questão......................................................... 116
4.2.2. Protocolo para complexidade das questões ................................ 126
CAPÍTULO 5 – RESULTADOS E DISCUSSÃO ................................................................... 128
5.1. Os perfis dos professores ..................................................................... 128
5.1.1. Perfis – Ánálise censitária ........................................................... 129
5.1.2. Perfis – Ações didáticas .............................................................. 130
5.1.2.1. Objetos do conhecimento............................................... 132
5.1.2.2. Metodologia ................................................................... 135
5.1.2.3. Recursos didáticos ......................................................... 138
5.1.2.4. Contextos ....................................................................... 139
5.1.2.5. Análise das ações didáticas ........................................... 140
5.1.3. Perfis – Questões de ordenação ................................................. 141
5.1.3.1. A justificativa para o ensino de Estatística ..................... 142
5.1.3.2. As habilidades estatísticas ............................................. 143
5.1.3.3. As questões do ENEM para avaliar o conhecimento sobre
Estatística .................................................................................................... 145
5.1.3.4. Análise das questões de ordenação .............................. 147
5.1.4. Perfis – Escala Likert ................................................................... 148
5.1.4.1. Níveis de concordância .................................................. 148
5.1.4.2. Análise Fatorial .............................................................. 150
5.1.5. Análise sobre os perfis ................................................................ 152
5.2. A competência estatística dos alunos no ENEM ................................... 153
5.2.1. As questões de Estatística nas edições do ENEM ....................... 154
5.2.1.1. ENEM 2012.................................................................... 154
5.2.1.2. ENEM 2013.................................................................... 155
5.2.1.3. ENEM 2014.................................................................... 156
5.2.2. O desempenho dos alunos .......................................................... 158
5.2.2.1. ENEM 2012.................................................................... 158
5.2.2.2. ENEM 2013.................................................................... 170
5.2.2.3. ENEM 2014.................................................................... 182
5.2.3. Análise gráfica dos resultados ..................................................... 193
5.2.4. Análise sobre o desempenho no ENEM ...................................... 198
CAPÍTULO 6 – CONCLUSÃO ............................................................................................... 201
Referências ........................................................................................................................... 206
Apêndices .............................................................................................................................. 216
APÊNDICE A – Questionário piloto ............................................................. 216
APÊNDICE B – Questionário ....................................................................... 220
APÊNDICE C – Ficha para caracterizar cada questão ................................ 223
APÊNDICE D – Análise das questões do ENEM 2012 ................................ 224
APÊNDICE E – Análise das questões do ENEM 2013 ................................ 235
APÊNDICE F – Análise das questões do ENEM 2014................................. 248
APÊNDICE G – ANÁLISE DE CONTEÚDO - UNIDADES DE CONTEXTOS
ORGANIZADAS POR ORDEM ALFABÉTICA ............................................. 260
APÊNDICE H - QUESTÕES DE ORDENAÇÃO - ANÁLISE DESCRITIVA DOS
DADOS ........................................................................................................ 262
APÊNDICE I – Dados do desempenho dos alunos no ENEM 2012 ............. 264
APÊNDICE J – Dados do desempenho dos alunos no ENEM 2013 ............ 265
APÊNDICE K – Dados do desempenho dos alunos no ENEM 2014 ........... 266
ANEXOS ................................................................................................................................. 267
ANEXO A – Habilidades da primeira versão do ENEM ................................ 267
ANEXO B – Eixos cognitivos da matriz de referência do ENEM 2009 ......... 270
ANEXO C – Habilidades da Área Matemática e suas Teconologias ............ 271
ANEXO D – Os objetos do conhecimento de Matemática e suas Tecnologias . 274
14
CAPÍTULO 1 – APRESENTAÇÃO DA TESE
1.1. EDUCAÇÃO ESTATÍSTICA
A Educação Estatística tem se consolidado como uma linha de pesquisa e
estuda questões relativas ao ensino e à aprendizagem de conceitos estatísticos e
probabilísticos.
A origem da Estatística está associada à necessidade de se conhecer
informações relacionadas à governabilidade de cidades, estados e países como, por
exemplo: número de habitantes, taxa de natalidade, produção agrícola etc. Dessa
forma, as primeiras disciplinas de Estatística foram ofertadas na área de Ciências
políticas nos séculos XVII e XVIII inicialmente em países como a Alemanha e a
Áustria, alcançando posteriormente os demais países na primeira metade do século
seguinte. O século XIX é marcado pelo desenvolvimento da Estatística como Ciência
e principalmente como método científico experimental aplicado a pesquisas de
diferentes naturezas, culminando na necessidade de um novo escopo para o ensino
de Estatística. Na tentativa de formar sujeitos para a compreensão e/ou elaboração
de estudos científicos das suas áreas de atuação observou-se, no século XX, a
disseminação de disciplinas de Estatística em diversos cursos técnicos e superiores.
Outra mudança significativa na Educação Estatística se deu na década de 1990
quando diversos países passaram a incluir a Estatística no currículo da Educação
Básica. O ensino de métodos e modelos estatísticos realizado nos cursos superiores
deu lugar à discussões sobre o desenvolvimento de habilidades e competências que
poderiam tornar o aluno mais preparado para compreender e, se necessário,
transformar a realidade que o cerca. Ao viver em uma sociedade repleta de dados e
informações, é oportuno que o cidadão esteja habilitado a desenvolver uma análise
cuidadosa e criteriosa apoiada em conhecimentos estatísticos.
A trajetória da Estatística no Brasil percorreu caminho semelhante ao descrito para
os demais países. O primeiro registro censitário populacional data de 1804, cerca de
50 anos antes da criação da cadeira de “Economia Política, Estatística e
Administrativo” na Academia Real Militar. A década de 1930 marca a fundação do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) consolidando a Estatística no
país e resultando no oferecimento da disciplina Estatística em faculdades de
Filosofia, Ciências, Letras, Ciências Sociais e Pedagogia. A partir da década de
15
1940 surgem os primeiros bacharelados em Estatística ainda associados às
Ciências Sociais e Políticas, fato que se mantém até a década de 1970 quando
algumas instituições passam a oferecer o curso de Estatística nas faculdades de
Matemática. A inserção da Estatística no currículo da Educação Básica de modo
explícito nos documentos oficiais, por sua vez, ocorreu no final da década de 1990
com a publicação dos Parâmetros Nacionais Curriculares. No entanto, assim como
ocorre em outros países, o ensino de Estatística no Brasil não tem se apresentado
de modo coerente às perspectivas atuais da Educação Estatística. O desempenho
dos alunos em avaliações de larga escala como o Exame Nacional do Ensino Médio
(ENEM), que tem como pressuposto a avaliação de habilidades e competências ao
final desse segmento educacional, e nos cursos superiores sugerem que não
estamos formando alunos competentes em Estatística ao final da Educação Básica.
O presente trabalho tem por objetivo auxiliar a traçar um panorama sobre
o ensino de Estatística do Ensino Médio brasileiro a fim de verificar se as
perspectivas atuais presentes nas escolas estão consoantes com o que tem sido
apontado pelas pesquisas científicas na área de Educação Estatística no que se
refere ao desenvolvimento da competência estatística e à formação para a
cidadania. A revisão bibliográfica sobre a história e as atuais perspectivas da
Educação Estatística apresentada nos primeiros capítulos servirão de embasamento
para discutir as propostas para organização do ensino de Matemática e Estatística
presentes nos documentos oficiais do Ensino Médio (Bases legais, PCNEM e
PCN+), práticas e pressupostos do ensino de Estatística de professores do Ensino
Médio e o desempenho dos alunos em questões do ENEM que abordem Estatística.
1.2. OBJETIVOS GERAIS E ESPECÍFICOS
Objetivo geral:
Compreender o status atual do ensino de Estatística do Ensino Médio
brasileiro a fim de verificar se as perspectivas teóricas dos documentos oficiais, as
práticas docentes e o desempenho dos nossos estudantes estão consoantes com as
discussões atuais das pesquisas científicas na área de Educação Estatística no que
se refere ao desenvolvimento da competência estatística.
Objetivos específicos:
1. Analisar a organização do ensino de Matemática e Estatística nos
documentos oficiais do Ensino Médio (Bases legais, PCNEM e PCN+) a fim
16
de identificar seus pressupostos teóricos e metodológicos e confrontá-los com
a perspectiva atual da Educação Estatística (desenvolvimento das
competências, formação para a cidadania);
2. Investigar as práticas e concepções de professores do Ensino Médio sobre o
ensino de Estatística na intenção de verificar afastamentos e aproximações
das discussões atuais da Educação Estatística;
3. Examinar o desempenho de alunos concluintes do Ensino Médio em questões
de natureza estatística no ENEM de modo a avaliar a competência estatística
apurada frente à competência estatística esperada de alunos ao final desse
segmento de ensino.
1.3. METODOLOGIA E PROCEDIMENTOS
1. Os documentos oficiais do Ensino Médio brasileiro foram analisados de modo
qualitativo buscando evidenciar os pressupostos teóricos que os embasam a
fim de confrontá-los com as pesquisas atuais, internacionais e nacionais, no
que concerne à expectativa do desenvolvimento da competência em
Estatística de alunos concluintes do Ensino Médio.
2. As práticas e concepções dos professores que ensinam Estatística no Ensino
Médio foram investigadas por meio de uma análise qualiquantitativa a partir
de um questionário piloto aplicado professores que ensinam Matemática no
Ensino Médio da rede Estadual de São Paulo. O resultado obtido balizou a
adequação do instrumento da presente pesquisa, conforme será relatado
posteriormente. A amostra foi composta por professores de Matemática no
Ensino Médio das redes estaduais de São Paulo e Rio de Janeiro que
responderam ao questionário. A metodologia empregada na análise dos
questionários está detalhada no capítulo 4.
3. A competência estatística dos alunos foi estimada a partir do desempenho
dos alunos em 36 questões das edições de 2012, 2013 e 2014 do ENEM
envolvendo Estatística na área de conhecimento associada a Análise de
Dados nos documentos oficiais. Critérios de categorização das questões
foram criados de modo a evidenciar se o desempenho dos alunos concluintes
do Ensino Médio está ou não de acordo com o esperado pelo referencial
teórico apresentado.
17
1.4. PREMISSAS
Assim como diversos pesquisadores constataram em outros países,
acreditamos que o ensino de Estatística nas salas de aula brasileiras ainda não
atingiu o status sugerido pelos teóricos da Educação Estatística no que se refere ao
desenvolvimento da competência estatística.
Os documentos oficiais do Ensino Médio no Brasil são reconhecidos
como inovadores por defender um ensino por competências para a cidadania,
entretanto, nossa vivência com formação continuada de professores nos permite
inferir que as práticas em sala de aula não refletem diretamente os pressupostos
teórico-metodológicos indicados. É necessário lembrar ainda que os Parâmetros
Nacionais Curriculares (PCNs) não se constituem como um currículo prescrito e,
portanto, não determinam o que ocorre nas escolas.
Observando o desenvolvimento e as orientações atuais do ensino de
Matemática no Brasil, percebemos uma mudança acentuada de tendências e
concepções em um curto período de tempo. A concepção de ensino e aprendizagem
de Matemática transformou-se enquanto nossos professores estavam sentados nos
bancos da escola como alunos e passaram a exercer seus papéis profissionais. O
mesmo ocorreu com o que se entende e ensina por Estatística. Nossa experiência
com formação continuada de professores nos permite levantar a hipótese de que a
formação inicial não contemplou questões relacionadas à Educação Estatística nas
perspectivas atuais. Poucos são os cursos atuais de licenciatura em Matemática ou
Pedagogia que possuem discussões específicas sobre o ensino de Estatística em
suas grades curriculares. Isso posto, acreditamos que os professores ainda não
entendem a Estatística como preconizam os estudos atuais da área, sendo que essa
incompreensão pode conduzir a práticas em sala de aula incongruentes com os
referenciais da área ou superficiais no que tange ao ensino de Estatística.
Resultados recentes do Sistema de Avaliação da Educação Básica
(SAEB), do MEC, revelam que apenas 7,3%1 dos alunos apresentam desempenho
satisfatório em Matemática ao final do Ensino Médio. Em relação ao desempenho
dos alunos no ENEM, observamos um índice muito baixo de acertos, inclusive nas
questões relacionadas ao eixo Análise de Dados que representa cerca de 30% das
1 Dados do Sistema de Avaliação da Educação Básica (SAEB) de 2015 do Instituto
Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP), analisados a partir da matriz de referência para o segmento.
18
questões de Matemática. Nossa intenção nesse trabalho não é apenas apontar
índices de desempenho, mas principalmente entender a competência estatística de
nossos alunos de modo a aprofundar a compreensão sobre o cenário da Educação
Estatística em nosso país, visando fornecer informações que auxiliem os
professores da Educação Básica a desenvolverem novas metodologias e
ferramentas de ensino mais adequadas para a aprendizagem de Estatística.
1.5. A CONSTRUÇÃO DE UMA INVESTIGAÇÃO
A trajetória da Estatística e da Educação Estatística será objeto do
capítulo dois no qual desenvolveremos inicialmente uma visão geral e histórica da
Estatística desde a sua relação com a governabilidade dos Estados, passando pelo
seu viés científico metodológico até alcançar o status de Ciência. Na sequência,
trataremos do percurso do ensino de Estatística, suas tendências e concepções, e a
consolidação da Educação Estatística como área de pesquisa. Por fim, nos
deteremos a analisar o caminho percorrido pela Estatística no Brasil desde os
primeiros registros históricos até os dias atuais.
No capítulo três apresentaremos uma revisão teórica a respeito da
competência estatística discutindo as expectativas de aprendizagem da área bem
como os conceitos de literacia, raciocínio e pensamento estatísticos. A partir de
alguns trabalhos discorreremos sobre a formação e concepções daqueles que
ensinam Estatística na Educação Básica, os professores de Matemática.
Finalmente, analisaremos os documentos oficiais brasileiros relacionados à
Educação e a matriz de referência do ENEM sob o conceito de competência
estatística abordado.
A metodologia da pesquisa será descrita minuciosamente no capítulo
quatro e demonstrará nossas escolhas, princípios e protocolos de investigação dos
dados, anunciando os resultados que aparecem no capítulo cinco. No último
capítulo, o de número seis, manifestaremos nossas conclusões sobre a pesquisa.
CAPÍTULO 2 – TRAJETÓRIAS DA ESTATÍSTICA E DA EDUCAÇÃO
ESTATÍSTICA
2.1. VISÃO GERAL DA ESTATÍSTICA
A Estatística pode ser definida como a ciência de coletar, analisar e inferir
a partir de dados numéricos obtidos por meio de medições ou contagem (LOPES,
1998). Por tratar de dados quantitativos, é comum que seja vista como um ramo da
Matemática, entretanto sua origem não está nas Ciências Exatas. A Estatística
surgiu como um conjunto de métodos a serviço das Ciências Sociais e Políticas.
Essa interpretação encontra eco na história do ensino de conceitos estatísticos e
probabilísticos. Se tomarmos a Estatística como conhecemos no século XXI, é de se
esperar a origem do seu ensino estivesse associada à área das Ciências Exatas.
Entretanto, a Estatística teve sua primeira aparição em centros de formação como
cadeiras de cursos que utilizavam seus conceitos para descrever as situações
econômicas e políticas de distintos grupos sociais.
Mais recentemente, o aprofundamento das discussões sobre os conceitos
e principalmente sua epistemologia concedeu à Estatística um status relevante na
formação do espírito científico. A Estatística passa então a apresentar uma
organização própria em relação a conceitos, métodos, linguagem e raciocínio que a
distanciam da característica exata e determinista associada à Matemática.
Atualmente o ensino de Estatística está presente na formação técnica e
superior de profissionais e pesquisadores das Ciências Sociais, Humanas,
Biológicas e Exatas, bem como no currículo da Educação Básica de diversos países,
dentre eles, o Brasil. Todavia, pesquisas apontam que a inclusão do ensino de
Estatística nos diferentes segmentos não tem garantido um desempenho satisfatório
em avaliações e tarefas que demandam utilizar, relacionar e refletir sobre conceitos
estatísticos.
O objetivo neste capítulo é apresentar a trajetória da Estatística, bem
como de seu ensino, desde sua interpretação como ciência e também como uma
ferramenta para descrever as relações sociais, chegando até os dias de hoje onde a
inserção da Estatística na Educação Básica está associada a uma formação para a
cidadania, para o senso crítico e para o espírito científico.
20
As relações associadas à Estatística serão apresentadas em seis tópicos
principais, delimitados a seguir:
Relações entre a Estatística e o Estado;
Estatística descritiva versus Estatística inferencial;
A Estatística e a Ciência;
Ensino de Estatística;
Ensino de Estatística no Brasil
Educação básica e o ensino de Estatística
2.2. ESTATÍSTICA E SUAS RELAÇÕES COM O ESTADO E AS CIÊNCIAS
A Estatística surgiu associada à necessidade de se estruturar processos
de coleta e organização de dados, bem como de comunicar informações
inicialmente ligadas à governabilidade de empresas, cidades, estados e países. Seu
desenvolvimento inicial foi como uma ferramenta das Ciências sociais e políticas
colocadas a serviço do Estado visando subsidiar as tomadas de decisão de seus
governantes, apresentando, assim um caráter utilitário e pragmático.
No entanto, sua potencialidade em descrever e compreender a realidade
por meio do tratamento de conjunto de dados e informações propiciou sua rápida
disseminação em outras áreas do conhecimento. O estudo e a formalização de seus
métodos por matemáticos deu origem à Estatística Moderna, consolidando assim
seu papel imprescindível na elaboração, condução e análise de pesquisas científicas
nas mais diversas áreas do conhecimento.
Diante do exposto, a Estatística tem garantido um espaço próprio e de
destaque tanto na área das Ciências exatas e quanto nas Ciências aplicadas. O
conceito de Estatística nos remete a formas de coletar, organizar, interpretar e
comunicar informações a fim de caracterizar ou compreender o comportamento de
um conjunto de dados e/ou de informações.
2.2.1. Statisticum: Relativo ao Estado
A palavra “estatística” provém do latim statisticum, que significa relativo ao
estado. Silva e Coutinho, pesquisadoras da área de Educação Estatística da
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), ressaltam que não há
consenso sobre qual civilização ou pesquisador utilizou o termo “estatística” com o
significado de tratamento de um conjunto de dados.
21
Kendal (1978) argumenta que o primeiro uso da palavra “estatística” deu-se num trabalho do historiador italiano Girolamo Ghilini, em 1589, que versava sobre uma descrição política. Por outro lado, Porter (1986) afirma que a palavra “estatística” foi primeiramente usada como um substantivo por Gottfried Achenwall em 1749. (SILVA, COUTINHO, 2005, p. 192)
Lopes aponta outras possibilidades de compreensão da etimologia da
palavra “estatística” e corrobora o uso do termo como conhecemos por Gottfried
Achenwall em meados do século XVIII:
Ao verificarmos a etimologia da palavra estatística, defrontamo-nos com o registro da forma italiana statistica, desde 1633, com o sentido de “ciência do estado”. Do alemão Statistik, originou-se a palavra francesa Statistique em 1771; a espanhola Stadística em 1776; a inglesa statistics em 1787; e, finalmente, a portuguesa estatística no início do século XIX. Contudo, o emprego da palavra estatística, no sentido que ela tem hoje, deve-se ao economista alemão Gottfried Achenwall que, entre 1748 e 1749, registrou em seu livro “Introdução à ciência política” a palavra alemã “statistik”, que vem de “status” que, em latim, significa “estado”. (LOPES, 1998, p. 34)
A despeito de não sabermos exatamente quando e por quem o termo foi
usado pela primeira vez com esse olhar, podemos afirmar que o surgimento da
Estatística associada ao Estado se deu diante da necessidade de se conhecer
dados de população, territórios, posses e outras questões relevantes para governar
e manter o poder estatal. Desse modo, fica clara a relação do vocábulo com a ação
de coletar e organizar os dados de uma referida população ou local para, a partir
dela, tomar decisões relativas à governabilidade. A palavra Estatística nos remete,
portanto, a formas de coletar, organizar, interpretar e comunicar informações a fim
de caracterizar ou compreender o comportamento de um conjunto de dados.
2.2.2. Primórdios da Estatística
Os primeiros usos formais de Estatística, com registros de coletas de
dados seguidas por uma análise criteriosa datam de milhares de anos a.C. A
civilização Suméria (5000 a.C. a 2000 a.C.) deixou listas de homens e seus bens em
tábuas de argila. No Egito (em torno de 2600 a.C.) o faraó Amasis II institucionalizou
os recenseamentos visando cobrança de impostos. Na China (2238 a.C.) o
imperador Yu (ou Yao) realizou o primeiro recenseamento de que se tem registro na
região, onde buscava informações para proceder à divisão de territórios; bem como
cobrar impostos e recrutar homens para o serviço militar. Há ainda registros de
censos populacionais, geográficos e econômicos da civilização Babilônica (1800
22
a.C. a 500 a.C.). Na Índia antiga (313 a.C. a 289 a.C.) o rei Candragupta buscava
ampliar seu reino e, para tanto, realizou uma coleta de dados minuciosa com o
objetivo de controlar esse crescimento. Os registros nos mostram que para além da
estatística populacional, territorial e agrícola, o seu ministro Kautilya registrou os
preços praticados, salários e até a quantidade de elefantes de cada região.
Nos séculos seguintes a Estatística passou a fazer parte da rotina de
governo das civilizações mais importantes. Os romanos (750 a.C. a 476 d.C.), com o
intuito de calcular taxas, impostos e determinar o número de homens aptos a
guerrear, utilizavam recenseamentos nos quais anotavam não só os nomes dos
habitantes, como de seus pais, filhos e esposa, a tribo onde residiam, seus bens,
dentre outros dados. Aqueles que não declaravam seus bens eram punidos com a
perda dos bens ou de seus direitos de cidadãos. Além da obrigatoriedade, chama
atenção a forma de organização dos dados. Há indícios que Roma foi a primeira
civilização a organizar os dados em tabelas cruzadas, de múltiplas entradas. As
civilizações que se estabeleceram nas décadas e séculos seguintes também fizeram
uso da Estatística para decidir ações de governo.
Já no século XI, em 1085, a Inglaterra realizou um levantamento
estatístico intitulado “Doomsday Book” no qual havia informações sobre terras,
propriedades, empregados e animais. É o primeiro registro documentado que se tem
de um arquivo estatal oficial com dados estatísticos. Outro marco importante na
trajetória da Estatística ocorre quando a Igreja, no século XIII, introduziu o registro
obrigatório de nascimentos, matrimônios, mortes e compartilhou um grande banco
de dados populacionais atualizado permanentemente, o que contribuiu imensamente
para gerar as bases de dados iniciais de alguns países europeus.
No final do século XIII a França realizou um estudo populacional no qual
estimou a quantidade de habitantes do país a partir da análise das informações de
alguns lares. Esse é um passo importante para a Estatística uma vez que não foi
realizada uma coleta de dados diretamente e sim uma estimativa a partir de um
padrão observado. A partir de então, a Estatística foi se desenvolvendo de acordo
com necessidades sociais e políticas. (BATANERO, 2001; LOPES e MEIRELLES,
2005; LOPES, 1998; SILVA e COUTINHO, 2005)
23
2.2.3. A Estatística na Idade Média
Jozeau (2011, apud SILVA e COUTINHO, 2005, p.192), aponta que
depois do século XIII, existiram três correntes estatísticas separadas
geograficamente: a Estatística Alemã; a Aritmética Política e a Probabilidade
Estatística. Apresentamos sucintamente cada uma delas.
Estatística Alemã – a qual tinha como foco a descrição da diversidade
territorial nacional, publicação de tabelas cruzadas (dupla entrada)
para representar recenseamentos a fim de descrever e compreender
estados políticos.
Aritmética Política (até séc. XVIII) - que pode ser definida como a arte
de raciocinar com números sobre a governabilidade, muito associada
a estudos envolvendo estimativas e previsões; tais como: como o
número de filhos por mulher, o tempo entre dois nascimentos de uma
mesma mulher, o número de habitantes por família, a proporção de
falecimentos etc (SILVA e COUTINHO, 2005).
Probabilidade estatística: a terceira corrente estaria associada aos
primórdios da Probabilidade estatística inferencial, que teve sua
origem nas tábuas que analisavam expectativa de vida e na análise de
resultados de jogos de azar, revelando aspectos da Estatística para
além das ciências sociais e políticas.
Um grande salto qualitativo no desenvolvimento da Estatística é
observado por volta do século XVII ao associar as medidas-resumo de um conjunto
de dados a um raciocínio de inferência para prever os custos e ganhos de
seguradoras.
Um dos precursores dessa abordagem foi Graunt que, por meio de um
estudo descritivo e minucioso dos dados populacionais, desenvolveu tábuas que
mostravam tendências relacionadas à expectativa de vida e risco de morte daqueles
que contratavam seguros. Suas tábuas se proliferaram e foram usadas durante
décadas para resolver problemas de rendas vitalícias em companhias de seguro,
como nos lembra Lopes (1998):
No século XVII, na Inglaterra, por ser uma época de epidemia de pestes, surgiram as Tábuas de Mortalidade, desenvolvidas por John Graunt (1620-1674), que consistia em muitas análises de nascimentos e mortes [...] Ainda hoje, tábuas de mortalidade são utilizadas por seguradoras. (LOPES, 1998, p. 34)
24
Graunt é referência na história da Estatística por ser apontado como a
primeira pessoa a realizar inferências a partir de dados estatísticos por volta da
década de 1660. Seu feito rendeu a ele um convite do rei Carlos II para ser sócio
fundador da Royal Statistical Society (RSS), fundada em meados da mesma década
com o objetivo em descrever e criar um banco de dados sobre bens públicos. Willian
Petty, outra figura importante para a Estatística e também membro da Royal
Statistical Society utilizou um raciocínio diferente para estimar a população de
Londres usando o conceito de extrapolação: “o número de residências era de
105,000 e, considerando que a média de membros da família era de seis pessoas e
que 10% das residências abrigavam duas famílias, ele concluiu que havia 695,000
habitantes em Londres” (SILVA e COUTINHO, 2005, p. 193). Depois Jean Joseph
d’Expilly por volta de 1750 usou um fator 5,0 para as residências urbanas e 4,5 para
as residências rurais.
2.2.4. Estatística e o Estado Brasileiro
Os primeiros registros da Estatística no Brasil datam do início do século
XIX e apresentam um caráter descritivo que se aproxima da corrente da Estatística
Alemã. Rodrigo Medeiros dos Santos realizou uma descrição da trajetória histórica
no país:
Um dos registros mais antigos sobre a introdução da Estatística no Brasil é uma carta régia, datada de 8 de julho de 1800, onde o rei D. João VI solicita ao vice-rei do Estado do Brasil a remessa de dados censitários do Brasil ao reino de Portugal. Após isso, é conhecida apenas a obra “Um recenseamento na capitania de Minas Gerais: Vila Rica, 1804”, organizada por Herculano Gomes Matias, que representa um primeiro esforço português para produzir estatísticas na antiga colônia. (SANTOS, 2014, p. 3)
Podemos observar, portanto, que assim como ocorrido em outros locais, a
Estatística chegou ao Brasil pelo potencial político que a análise dos dados
apresentava e os primeiros registros de ensino de Estatística estão associados às
Ciências Políticas, como veremos mais a frente.
2.3. ESTATÍSTICA DESCRITIVA E ESTATÍSTICA INFERENCIAL
A Estatística apresenta, em sua essência, duas funções vinculadas, mas
que se diferenciam na sua natureza epistemológica e metodológica, quais sejam:
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Descrição – ato ou efeito de descrever (fazer um relato
circunstanciado de); delimitação.2
Inferência – operação intelectual por meio da qual se afirma a verdade
de uma proposição em decorrência de sua ligação com outras já
reconhecidas como verdadeiras.3
A Estatística descritiva visa retratar a realidade ou a experiência em
estudo, a fim de compreendê-la localmente, no seu contexto. Para isso utiliza
métodos de coleta, tabulação, resumo e representação de dados na intenção de
destacar alguns aspectos essenciais, tais como: padrões, regularidades e
tendências do conjunto observado. São elementos de estudo: tabelas, gráficos,
medidas de posição (média, moda, mediana, percentis, quartis) e de dispersão
(amplitude, variância, desvio padrão).
A Estatística inferencial, por sua vez, objetiva efetuar generalizações
baseadas em amostras estatísticas de populações que não podem ser estudadas na
sua totalidade. Dessa forma, debruça-se sobre estudos probabilísticos na busca de
modelos matemáticos que possibilitem a extrapolação das conclusões alcançadas
localmente para uma população maior. Os testes de hipóteses são exemplos de
objeto de estudo da Estatística inferencial.
Os conceitos de incerteza e chance, assim como muitos outros, estão
presentes nas duas abordagens da Estatística, como ressalta Lisbeth Cordani,
pesquisadora da área de Educação Estatística e formadora de professores:
(na Estatística descritiva) é dada uma informação sobre uma população e quer-se saber qual a probabilidade de se encontrar este ou aquele resultado num experimento ou numa pesquisa observacional. [...] Quanto à inferência Estatística, o caminho é contrário, no sentido de que é oferecido um resultado amostral através de dados coletados e quer se caracterizar a população à qual eles pertencem, com respeito a determinados parâmetros. (CORDANI, 2001, p. 13-14)
Podemos dizer, portanto, que a Estatística descritiva apresenta quase que
exclusivamente um raciocínio dedutivo, uma vez que por meio dela chega-se a uma
conclusão a partir da análise de premissas postas como verdadeiras. A Estatística
inferencial também se vale de raciocínio dedutivo, entretanto, o que a caracteriza é o
2 Houaiss online, acesso em 2 jul. 2017
3 Houaiss online, acesso em 2 jul. 2017
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raciocínio indutivo no qual se espera uma conclusão mais geral do que as contidas
nas premissas iniciais.
Como vimos, a Estatística trata dados de maneira descritiva ou inferencial
e as duas abordagens são igualmente importantes, entretanto, foi o desenvolvimento
da inferência que propiciou à Estatística avançar como ciência.
2.3.1. Estatística e suas Relações com as Ciências
Desde a Antiguidade até o século XVIII a principal função da Estatística
era política, pois estava associada ao estudo dos dados populacionais e econômicos
que subsidiava tomadas de decisões do ato de governar. Nessa ocasião, a
Estatística era vista como a Aritmética política e sua finalidade era servir de olhos e
ouvidos ao governo (BATANERO, 2001).
A partir do século XIX a análise de dados ampliou seu alcance a partir de
estudos envolvendo generalização, era o início da Estatística inferencial.
A Estatística passa, então, a ser objeto de estudo de matemáticos como
Bernoulli e Poison que enxergam possibilidades além das descritivas para o estudo
de dados. A lei dos grandes números, desenvolvida pelo primeiro, permitiu à
Estatística alcançar um status científico, como destaca Batanero:
A estatística alcança com essas construções uma relevância científica crescente, sendo reconhecida pela Associação Britânica para o Avanço da Ciência, como uma seção em 1834, nascendo assim a Royal Statistical Society No momento da sua função, definiu-se estatística como “conjunto de atos, em relação com o homem, suscetíveis de serem expressados em números e numerosos o suficiente para serem representados por leis”. (BATANERO, 2001, p. 10, tradução nossa4)
A partir de então foram criadas sociedades científicas a fim de
sistematizar e uniformizar coletas e análises de dados que eram feitas em distintos
locais com métodos díspares, e organizados os primeiros congressos científicos da
área.
Em 1853 aconteceu o primeiro Congresso Internacional de Estatística, em
Bruxelas. Algumas décadas depois, em 1885, foi criada a Sociedade Internacional
4 La estadística logra con estos descubrimientos una relevancia científica creciente, siendo
reconocida por la British Association for the Advancement of Science, como una sección en 1834, naciendo así la Royal Statistical Society. En el momento de su fundación se definió la estadística como "conjunto de hechos, en relación con el hombre, susceptibles de ser expresados en números, y lo suficiente numerosos para ser representados por leyes".
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de Estatística – International Statistical Institute (ISI) – com a finalidade de
uniformizar os métodos de compilação e abstração de resultados e apresentar os
governos ao uso correto da estatística em soluções de problemas políticos e sociais.
(BATANERO, 2001, p.10)
Desde então, a Estatística tem ganhado destaque e se desenvolvido
rapidamente. Apesar do inegável avanço, atualmente ainda é possível encontrar
discussões sobre a interpretação da Estatística como uma ciência independente ou
como um ramo da Matemática a serviço de outras ciências.
Peter Diggle, pesquisador e professor da Universidade de Lancaster no
Reino Unido, citou em seu artigo intitulado “Estatística: uma ciência de dados para o
século 215” um comentário jocoso que ouve de pesquisadores sobre a Estatística
para mostrar sua preocupação em relação à interpretação da área: Se o seu
resultado precisa de um estatístico então você deve planejar um experimento
melhor. (DIGGLE, 2015, p.793, tradução nossa6). O pesquisador sinaliza que frases
como essas indicam implicitamente a exclusão do estatístico da fase de
delineamento de uma pesquisa. Diggle sinaliza que a associação entre Estatística e
a Matemática se justifica do ponto de vista do ensino, mas não necessariamente da
perspectiva da pesquisa e diferencia a Matemática Estatística da Ciência Estatística:
Matemática Estatística é a parte da Matemática que fornece a base teórica da prática estatística. Ciência Estatística é o envolvimento intelectual de estatísticos especialistas no assunto para avançar nosso entendimento da natureza no seu sentido mais amplo. (DIGGLE, 2015, p. 805, tradução nossa7)
O professor afirma que a Matemática Estatística e a Ciência Estatística
são igualmente importantes e ressalta que cada uma delas exige habilidades
diferentes por apresentarem funções diferentes. Ele defende, inclusive, que
publicações da área deixem de abordar com tanta força exemplos ilustrativos das
técnicas estatísticas já consolidadas para abrir espaço para discussões relacionadas
a novas metodologias e disseminação de insights (DIGGLE, 2015).
5 “Statistics: a data science for the 21
st century”
6 If your result needs a statistician then you should design a better experiment. (DIGGLE,
2015, p.793) 7 (a) statistical mathematics is that part of mathematics that provides the theoretical
underpinning of statistical practice; (b) statistical science is the intellectual engagement of statisticians with subject matter experts to advance our understanding of nature in its broadest sense. (DIGGLE, 2015, p.805)
28
Problematizações sobre o sentido da Estatística como ciência podem ser
encontradas em publicações da área e não serão objeto do nosso estudo.
Entretanto, vale destacar que a história da Estatística ainda está sendo traçada.
2.4. O ENSINO DE ESTATÍSTICA
O ensino de Estatística, tomando por base o seu desenvolvimento,
precisa privilegiar igualmente discussões sobre a importância da coleta de dados e a
seleção daqueles relevantes na resolução de problemas como o desenvolvimento da
noção de variabilidade para compreensão e crítica de artigos publicados na grande
mídia ou em revistas especializadas (CORDANI, 2001).
Nos dias atuais o Ensino de Estatística está organizado do seguinte
modo: a abordagem descritiva é tratada na Educação Básica; enquanto a
abordagem inferencial é quase exclusiva do ensino profissional e/ou superior.
Entretanto, o desenvolvimento histórico da Educação Estatística não apresenta essa
aparente linearidade. Como veremos a seguir, o ensino de Estatística foi fomentado
inicialmente pela necessidade de formar profissionais aptos a usar a análise de
dados em suas pesquisas científicas de diversas áreas. A partir da consolidação das
técnicas estatísticas como parte de um método científico, percebeu-se a importância
de desenvolver o pensamento estatístico desde a Educação Básica.
Em 1660 a Alemanha ofereceu a disciplina Estatística com o objetivo de
descrever o sistema de organização do Estado. Em 1777, o ensino da Estatística foi
introduzido também nas universidades da Áustria. A revolução francesa (1789-1799)
intensificou a necessidade de um olhar para a condição econômica vinculada à
política, fortalecendo a importância da Estatística para compreender a situação de
cada país e atuar politicamente visando seu desenvolvimento, com isso
universidades de outros países adotaram a disciplina em seus cursos. As
universidades italianas de Pavia e Pádua, por exemplo, introduziram a disciplina
Estatística nos cursos de Ciências de Leis e Políticas nos anos de 1814 e 1815,
respectivamente. Os Estados Unidos da América não ficaram atrás e em 1845
fizeram o mesmo em universidades, introduzindo a Estatística na concepção de
Aritmética Social. Com o tempo, a Estatística foi criando elos com outras ciências,
como, por exemplo, quando em 1854 a disciplina Estatística foi inserida em um
curso intitulado “Administração e Negócios Estatísticos” na França. Somente em
29
1859, no Reino Unido, se iniciou o primeiro curso “Ciência Econômica e Estatística”
com identidade própria. (LOPES, 1998, p. 34-35).
2.4.1. Ensino de Estatística no Séc. XX
O desenvolvimento de recursos estatísticos para resolver problemas
aplicados a diversas áreas do conhecimento no início do século XX despertou a
necessidade de ensinar Estatística a futuros profissionais e pesquisadores. Como
ressaltam Cazorla, Kataoka e Silva, pesquisadores brasileiros da Educação
Estatística, o potencial do raciocínio estatístico em investigações científicas foi
essencial para disseminar seu ensino:
A Estatística nos seus primórdios, estava relacionada à organização e à sistematização de informações do Estado, visando subsidiar decisões políticas, econômicas e sociais dos países. Somente no século XX seus métodos foram incorporados à pesquisa científica e empírica, pela capacidade inferencial de suas técnicas, bem como pelo auxílio na tomada de decisões em condições de incerteza. Consequentemente, seu ensino começou a fazer parte dos diversos cursos de graduação e pós graduação, assim como de cursos técnicos de nível médio. (CAZORLA; KATAOKA; SILVA, 2010, p.19)
Em vista disso, ao mesmo tempo em que alguns docentes de
universidades se dedicavam a aprimorar e otimizar métodos estatísticos, outros
começaram a se preocupar com o ensino e disseminação dessa ciência em pleno
desenvolvimento. De modo intuitivo e não intencional a Educação Estatística foi se
constituindo.
O Instituto Internacional de Estatística (ISI), desde a sua fundação em
1885, discute o ensino de Estatística em um viés de disseminação dos conceitos e
métodos. No entanto, foi a partir de 1948, ano da constituição do Comitê de
Educação, que o ISI ficou encarregado de promover a formação estatística. No ano
de 1979 o Comitê de Educação do ISI implementou o que chamaram de forças-
tarefas para promover o avanço da área. Um dos objetivos desse comitê era auxiliar
organizações mundiais como a United Nation Educational, Scientific and Cultural
Organization (UNESCO) a formar pessoas capazes de extrair resultados estatísticos
mais relevantes de países em desenvolvimento.
Outro destaque das atribuições iniciais do Comitê de Educação era
auxiliar no desenvolvimento de cursos de bacharelados e licenciaturas (há relatos de
alguns cursos já descontinuados na Espanha e na Inglaterra) em Estatística nos
quais se formariam profissionais e professores da área. Um dos primeiros centros de
30
formação chamados de International Statistical Education Centre (ISEC) foi criado
em Calcutá, capital da Índia em 1950 e desde então tem promovido cursos de
Estatística para estudantes de alguns países da Ásia e da África. O Comitê de
Educação do ISI assumiu ainda a responsabilidade de produzir materiais específicos
como livros universitários e dicionários e promover conferências e congressos sobre
Educação Estatística.
A International Conference on Statistical Education (ICOTS) teve sua
primeira edição em 1982 na Universidade de Sheffield na Inglaterra e tem ocorrido a
cada quatro anos. Vale destacar ainda que o comitê organizou eventos satélites
para discutir Educação Estatística nas edições de 1970 a 1988 do International
Congress of Mathematics Education (ICME). O mesmo comitê também se dedicou a
discutir o Ensino de Estatística em nível secundário e para difundir essa ideia em
1979 publicou a primeira edição do periódico Teaching Statistics que tem como
público alvo professores da escola básica.
Em 1991 a ISI constituiu a International Association for Statistical
Education (IASE) que absorveu as reponsabilidades do Comitê de Educação e a
elas agregou a elaboração de periódicos e ações visando o desenvolvimento da
Educação Estatística em nível internacional. As incumbências do IASE vão desde o
desenvolvimento de softwares estatísticos, passam pela elaboração de currículos,
livros e materiais didáticos, até a formação de especialistas em Estatística para
atuarem em empresas, indústrias e órgãos de governos. (BATANERO, 2000;
CORDANI, 2015)
Embora a Estatística tenha ocupado lugar de destaque nas áreas das
ciências sociais e políticas, seu desenvolvimento é considerado lento e tardio pela
sua origem distanciar-se das ciências exatas. O caráter utilitário da Estatística tinha
mais força do que o rigor de seus métodos de cálculo a ponto de ter sido vista como
uma ciência das áreas humanas. A virada nessa interpretação se deu por volta de
1900, quando estatísticos investigaram e desenvolveram métodos estatísticos
avançados. Pesquisadores apontam essa época como marco da origem da era
moderna da Estatística:
O período de 1900 a 1915 foi considerado de transição entre a visão original e a nova visão de Estatística, que necessita de técnicas matemáticas, probabilidade, elaborados e sofisticados métodos de estudos de dados. A partir da virada do século é que se foi construindo a Estatística Inferencial, com o uso sistemático da probabilidade nos papéis definidos de coleta, resumo e análise de
31
dados empíricos. Emergiu nesse cenário a figura do estatístico inglês Ronald Fisher (1890-1962) que, permanentemente, alterou o curso do desenvolvimento estatístico e é reconhecido por muitos como o maior estatístico do século. (LOPES, 1998, p.35-36)
A Estatística foi incorporada ao mundo acadêmico e científico por meio da
aplicação de seus métodos e seu caráter inferencial. Entretanto, a partir do século
XX, alguns estudiosos, fomentados pelo processo de formalização e axiomatização
da Matemática, perceberam que a Estatística poderia se desenvolver caso seus
métodos fossem aprofundados e, para isso, foram necessários estudos matemáticos
avançados.
2.4.2. Educação Estatística
A Educação Estatística tem se consolidado como uma linha de pesquisa
da área Educação Matemática e estuda questões relativas ao ensino e a
aprendizagem de conceitos estatísticos. Carmen Batanero, professora da
Universidade de Granada, no início do século XXI, ressaltou que a pesquisa sobre a
compreensão e aprendizagem dos conceitos estatísticos ainda está pouco
sistematizada (BATANERO, 2001, p.1, tradução nossa8). Sua justificativa para essa
lacuna estava no fato do percurso da Estatística e de seu ensino estarem
associados a áreas do conhecimento de naturezas diferentes e, por consequência, a
paradigmas e marcos teóricos diversos. Diante disso, em 2000 a professora
organizou um material didático pensado para os alunos da disciplina de Didática do
curso de Licenciatura em Estatística que ministrava na Espanha no qual pretendia
expressar as diferentes facetas da Estatística: como ciência, como ferramenta de
investigação em áreas diversas e como campo de investigação didática tanto para a
formação de crianças, como de profissionais, investigadores e professores.
A implementação da formação estatística desde a Educação Básica foi
ganhando força mundialmente principalmente pela constatação de que além da
importância na formação do espírito científico relacionado ao caráter investigativo da
Estatística, via-se nessa ciência uma dimensão política e ética importante para o
desenvolvimento do senso crítico dos alunos. Diante disso, tornou-se essencial a
pesquisa sobre aspectos didáticos. Cazorla, Kataoka e Silva afirmam que esse
8 La investigación sobre comprensión y aprendizaje de los conceptos estadísticos
elementales está aún poco sistematizada. (BATANERO, 2001, p. 1)
32
movimento pode ser considerado a base do que hoje conhecemos como Educação
Estatística:
[...] a Educação Estatística é uma nova área de pesquisa que nasceu na década de 1970. Surgiu da necessidade – que se intensificou à medida que os países foram incorporando seus conteúdos à escola básica – de investigar meios para sanar as dificuldades encontradas por professores, ao ensinar seus conceitos e procedimentos aos usuários de Estatística, nos cursos do Ensino Superior. Dessa forma, entendemos a Educação Estatística como uma área de pesquisa que tem como objetivo estudar e compreender como as pessoas ensinam e aprendem Estatística, o que envolve os aspectos cognitivos e afetivos do ensino-aprendizagem, além da epistemologia dos conceitos estatísticos e o desenvolvimento de métodos e materiais de ensino etc. (CAZORLA; KATAOKA; SILVA, 2010, p.23)
Podemos perceber que a consolidação da Educação Estatística é
recente, sobretudo no que diz respeito a políticas educacionais. A partir da década
de 1980 observamos a inserção da Estatística nos currículos da Educação Básica
de diversos países. Celi Lopes, pesquisadora brasileira da área, destaca a influência
do National Council of Teachers of Mathematics (NCTM), órgão estadunidense,
nesse processo. O NCTM publicou em 1980 um artigo intitulado “Agenda for Action
– Recomendations or school mathematics of 1980s” no qual propõe um ensino de
Matemática apoiado na resolução de problemas, investigação e experimentação
(LOPES, 1998). A partir de então, dedicaram-se a discutir o que era esperado para a
formação dos alunos que seriam protagonistas do século XXI. A Estatística aparece
como parte integrante da formação matemática do estudante, como nos mostra a
autora:
Em 1988, o NCSM (National Council of Supervisors of Mathematics) promoveu uma discussão em seu encontro anual, da qual se originou o documento “Basic Mathematical Skills for the 21st Century”, que apresentava doze áreas em que os alunos deveriam apresentar habilidades básicas. Destacamos as áreas de Estatística e Probabilidade que integra-se às demais. Sendo assim, para o desenvolvimento dessas habilidades se faz necessário o investimento nas outras elencadas, como: resolução de problemas, comunicações de ideias matemáticas, raciocínio matemático, aplicação da Matemática a situações da vida quotidiana, atenção para a racionalidade dos resultados, estimativa, habilidades apropriadas de cálculo, raciocínio algébrico, medidas, geometria, probabilidade e estatística. (LOPES, 1998, p. 47)
Impulsionado pelo NCTM, o National Council of Supervisors of
Mathematics (NCSM) sugere uma valorização do raciocínio estatístico uma vez que
os conceitos estatísticos e probabilísticos promovem o desenvolvimento de
33
habilidades mais coerentes do que se entende por competência matemática para o
século XXI. Outro documento influente na discussão da Educação Estatística na
escola básica foi elaborado por Cockcroft, membro do Committee of Inquiry into the
teaching of Mathematics in primary and secondary schools in England and Wales, e
publicado em 1982. Seu relatório “Mathematics Counts” mostra uma preocupação
explícita em organizar o currículo da Matemática de modo coerente às necessidades
para uma vida adulta e apresenta uma visão da Estatística para além de suas
técnicas.
[...] estatística não é apenas um conjunto de técnicas, é uma atitude mental na abordagem de dados. Em particular, reconhece o fato da incerteza e da variabilidade de um dado e na coleção de dados. Ela habilita pessoas a tomar decisões diante da sua incerteza. (COCKCROFT, 1982, p. 234, tradução nossa9)
Podemos afirmar que o relatório de Cockcroft foi um dos pioneiros a
ressaltar o pensamento estatístico, mesmo não se valendo do termo como é usado
atualmente. O documento aponta ainda a relação entre algumas habilidades e a
aprendizagem de Estatística a qual denomina numeracia estatística.
Numeracia estatística requer um senso de números, uma avaliação de níveis apropriados de precisão, a obtenção de estimativas sensatas, uma abordagem de senso comum para usar os dados no suporte de um argumento, a consciência da variedade da interpretação de números, um entendimento sagaz dos conceitos amplamente utilizados, tais como os de média e porcentagem. (COCKCROFT, 1982, p. 236, tradução nossa10)
Acredita-se que a partir do alinhamento desse documento às expectativas
do grupo responsável por suscitar discussões sobre o ensino de Estatística,
ampliou-se o olhar frequentemente pragmático da Estatística para uma área com
uma contribuição para a formação cognitiva do indivíduo. Cordani em uma leitura
pessoal sobre o percurso da área, corrobora a relevância do documento e destaca
as sugestões por ele apresentadas para o ensino da Educação Básica.
9 [...] statistics is not just a set of techniques, it is an attitude of mind in approaching data. In particular it acknowledges the fact of uncertainty and variability in data and data collection. It enables people to make decisions in the face of this uncertainty 10 Statistical numeracy requires a feel for numbers, an appreciation of appropriate levels of accuracy, the making of sensible estimates, a commonsense approach to the use of data in supporting an argument, the awareness of the variety of interpretation of figures, and a judicious understanding of widely used concepts such as means and percentages. All these are part of everyday living. Good statistical teaching can encourage pupils to think in these ways.
34
Esse relatório discute a importância da Estatística no ensino da Matemática nas escolas secundárias, explicitando que a Estatística não se restringe a um conjunto de técnicas e que, ao trabalhar com incerteza e variabilidade, torna-se uma ferramenta de tomada de decisões. Além disso, sugere que a Estatística deveria ser ensinada a partir de dados coletados pelos próprios estudantes, aproveitando o caráter interdisciplinar que ela favorece, através de aplicações em diferentes disciplinas do próprio currículo dos alunos pois, em caso contrário, o trabalho seria considerado árduo pelo aluno, orientado somente pela técnica, e não seria explicitado o poder e a natureza da própria Estatística. (CORDANI, 2015, p. 171)
A partir da publicação do Relatório de Cockcroft, a Inglaterra ganha
espaço na trajetória da Educação Estatística. Em 1983 criou o Royal Statistical
Society Centre for Statistical Education (RSSCSE), coordenado pelo professor e
pesquisador de Educação Estatística da Universidade de Nottingham Trent na
Inglaterra Peter Holmes, com o foco no desenvolvimento de currículo e pesquisa em
Educação Estatística, principalmente da escola básica. O RSSCSE percebeu que a
Estatística na Matemática escolar estava sendo tratada como um conjunto de
técnicas, o que era considerado não apropriado a partir das discussões anteriores.
Nas palavras do coordenador, tratar a Estatística dessa forma era como definir a
Biologia estudando apenas o esqueleto, uma vez que as técnicas não têm vida. Para
ele, era importante que os alunos obtivessem uma visão da natureza do assunto
(HOLMES, 2000). Desse modo, assuntos como motivação, cultura, pensamento
estatístico, avaliação e atitudes dos professores passaram a ser abordados em
oficinas e materiais didáticos elaborados pelo grupo sem perder de vista a
justificativa para o ensino da Estatística na Educação Básica que era formar alunos
conscientes e apreciar o papel da Estatística na Sociedade – os muitos e vários
campos nos quais ideias estatísticas são usadas; a natureza do pensamento
estatístico (HOLMES, 2000, p.53, tradução nossa11).
A partir de então muitos encontros científicos com o foco no ensino e na
aprendizagem de Estatística começaram a ocorrer com mais frequência e em
diferentes locais. Lopes destaca a relação entre estudos da Educação Estatística e a
formação para a cidadania.
11 Pupils should become aware of and appreciate: - the role of statistics in society – the many and various fields in which statistical ideas are used; the nature of statistical thought.
35
Das reflexões ocorridas [...] em relação às competências básicas necessárias ao cidadão que atuará na sociedade do século XXI, emergiram a importância do papel ativo do aluno no processo ensino-aprendizagem, a ênfase na resolução de problemas, a necessidade do uso de calculadoras e computadores e, especialmente, o trabalho com Estocástica no Ensino Fundamental. Nessa concepção, estar alfabetizado neste final de século, supõe saber ler e interpretar dados apresentados de maneira organizada e construir representações, para formular e resolver problemas que impliquem no recolhimento de dados e análise de informações. Assim, observa-se que o raciocínio estatístico e probabilístico faz-se tão necessário à cidadania eficiente quanto a capacidade de ler e escrever. (LOPES, 1998, p. 39)
Diante do exposto, é possível afirmar que a Estatística, que já havia
passado de ferramenta do Estado a um método eficaz em investigações científicas,
começa a se associar à formação para a cidadania, uma vez que propicia o
desenvolvimento de competências importantes para o que se espera da formação
para uma vida profissional plena na era da informação e tecnologia. Batanero
destaca a transição do papel da Estatística nos séculos XX e XXI.
É indiscutível que o século XX tenha sido o século da estatística, que passou a ser considerada uma das ciências metodológicas fundamentais e base do método científico experimental. O ensino da estatística, entretanto, ainda se encontra em seus começos, ainda que como temos descrito pareça avançar em uma forma imparável. Será o século XXI o século da educação estatística? (BATANERO, 2001, p.7, tradução nossa12)
A inserção no currículo da escolaridade básica incentivou e ainda
incentiva pesquisas e desenvolvimento curricular no campo. Também crescem os
materiais didáticos, softwares educativos, investigações, revistas, reuniões e
congressos. Podemos inferir, portanto, que a Educação Estatística ainda é uma área
em processo de amadurecimento.
2.4.3. Tendências da Educação Estatística
A Estatística, como visto anteriormente, está presente no currículo da
Educação Básica de diversos países e apresentada como um componente curricular
da disciplina de Matemática. Desse modo, podemos dizer que a concepção de
12
Es indiscutible que el siglo XX ha sido el siglo de la estadística, que há pasado a considerarse una de las ciencias metodológicas fundamentales y base del método científico experimental. La enseñanza de la estadística, sin embargo, aún se encuentra en sus comienzos, aunque como hemos descrito parece avanzar de una forma imparable. ¿Será el siglo XXI el siglo de la educación estadística?
36
Educação Estatística sofre influências da concepção de Educação Matemática. Para
compreender o papel que a Educação Estatística assume na escolaridade básica
brasileira atualmente, faz-se necessária uma breve discussão sobre as tendências
que a Educação Matemática assumiu em sua história.
2.4.3.1. Tendências da Educação Matemática
José Carlos Libâneo, doutor em Educação e professor da Universidade
Federal de Goiás, em seu livro Didática ressalta que o modo como os professores
realizam seu trabalho, selecionam e organizam os conteúdos escolares, escolhem
as técnicas de ensino e avaliam seus alunos, está relacionado com as suas
concepções de aprendizagem, de ensino, de educação e de matemática, explicita ou
implicitamente. (LIBÂNEO, 1994). O sistema educacional de um país ou de uma
rede de escolas, por sua vez, reflete suas necessidades sócio econômicas, culturais
e políticas. (LOPES, 1998)
No Brasil o ensino da Matemática seguiu as tendências mundiais da
educação e segundo Fiorentini, professor e pesquisador da Educação Matemática
na Universidade Estadual de Campinas (UNICAMP), podemos identificar seis delas,
quais sejam: a formalista clássica; a empírico-ativista; a formalista moderna; a
tecnicista; a construtivista e a sócioetnoculturalista. Apresentamos a seguir uma
breve descrição de cada uma delas a partir do referencial de Fiorentini (1995).
A tendência formalista clássica, observada no Brasil até o final da década
de 50, valorizava a Matemática formal e, para isso, usava nas escolas o modelo
lógico euclidiano de teoremas e axiomas. Havia uma preocupação excessiva em
justificar e demonstrar todos os “fatos” matemáticos logicamente. Desse modo, a
Matemática era vista como uma ciência dogmática e estática, seu ensino se
revelava livresco e centrado no professor e a aprendizagem era passiva. Em relação
ao contexto sócio histórico, somente os alunos bem dotados economicamente eram
privilegiados com um ensino de dimensão acentuadamente técnica e formal.
A tendência empírico-ativista surge como oposição à escola clássica
tradicional. Didaticamente o professor é o orientador ou facilitador da aprendizagem
e o aluno, agora ativo, torna-se o centro da aprendizagem. O currículo, organizado a
partir dos interesses dos alunos, atende o desenvolvimento psicológico da classe.
As salas de aula contam com atividades em pequenos grupos, materiais
manipulativos e jogos. Os materiais montessorianos – material dourado e barras de
37
cusinaire, por exemplo – utilizados durante muitos anos em nossas escolas podem
ser considerados produzidos sob uma concepção empírico ativista.
Epistemologicamente a Matemática era obtida por descoberta com a justificativa de
que ela preexiste no mundo em que vivemos. Os menos ativistas, chamados de
empírico-sensualistas, acreditavam que basta a observação da natureza e de
réplicas de figuras geométricas para a descoberta das “ideias Matemáticas”. Nos
Estados Unidos uma teoria de aprendizagem chamada associacionismo cujos
princípios se assemelham à concepção empírico-ativista surge no início do século
XX. Os mais ativistas acreditam que a ação e a manipulação ou experimentação são
fundamentais e necessárias para aprendizagem – é o mais puro método da
descoberta. No Brasil, a tendência empírico-ativista surgiu a partir da década de 20
e coexistiu com a tendência formalista clássica em um papel de oposição. A
contribuição dessa tendência aos dias de hoje se deve à unificação da Matemática
em uma só disciplina, à formalização de diretrizes metodológicas do ensino dessa
disciplina e ao surgimento de livros didáticos pragmáticos com figuras e desenhos.
As experiências de ensino dessa tendência deveriam estar de acordo
simultaneamente com as exigências sociais e interesse dos alunos.
A década de 1950 foi marcada por uma revolução do Ensino da
Matemática. Com a realização dos Congressos Brasileiros de Ensino de Matemática
surgiu o Movimento da Matemática Moderna (MMM) como resposta à constatação
de uma considerável defasagem entre o progresso científico-tecnológico da nova
sociedade industrial e o currículo vigente. Os propósitos do movimento foram: reunir
os três campos fundamentais da Matemática com a introdução de elementos
unificadores como Teoria dos Conjuntos, Relações e Funções; dar mais ênfase aos
aspectos estruturais e lógicos, e valorizar a matemática por ela mesma.
Didaticamente o ensino era autoritário, centrado no professor que demonstra
rigorosamente tudo no quadro, o aluno volta a ser passivo. O ensino de Matemática
tem como objetivo capacitar o aluno a aplicar estruturas de pensamento inteligente
aos mais variados domínios, dentro e fora da Matemática.
A tendência tecnicista, de origem norte-americana, surge no final da
década de 1960 e se estende até o final da década de 1970 com o objetivo de
otimizar os resultados da escola e torná-la eficiente e funcional para inserir a escola
nos modelos de racionalização do sistema de produção capitalista –
sociofilosoficamente fundamenta-se no funcionalismo. A função da escola era
38
preparar e integrar o indivíduo à sociedade tornando-o capaz e útil ao sistema.
Psicologicamente fundamenta-se no Behaviorismo no qual a aprendizagem consiste
em mudanças comportamentais por meio de estímulos. Do confronto entre o MMM e
a pedagogia tecnicista surge o tecnicismo formalista que priorizava objetivos que se
restringem ao treino e desenvolvimento de habilidades técnicas e enfatiza fórmulas,
definições, uso correto de símbolos, precisão e rigor. Entretanto, havia aqueles que
se contrapunham ao formalismo estrutural e sob o nome de tecnicistas mecanicistas
reduzem a Matemática às técnicas, regras e algoritmos sem justificá-los. A tendência
tecnicista tem como finalidade capacitar o aluno a resolver problemas padrão.
Didaticamente a pedagogia não se centra no professor nem no aluno e sim nos
objetivos instrucionais, nos recursos e nas técnicas de ensino que garantiriam o
avanço dos mesmos. Para essa tendência os conceitos são as regras e os
algoritmos. O papel da pesquisa na área da Educação Matemática era descobrir,
experimentar, avaliar e oferecer ao sistema novas técnicas de ensino e materiais
instrucionais mais eficientes ao desempenho escolar.
Apesar de Piaget nunca ter se preocupado em desenvolver uma teoria de
ensino-aprendizagem foi a partir de seus trabalhos sobre desenvolvimento cognitivo
que emergiu a tendência construtivista, trazendo a esta um embasamento teórico
como nunca havia existido no Ensino da Matemática. O construtivismo visa, com o
auxílio de materiais ditos concretos, a construção das estruturas de pensamento.
Epistemologicamente nega a teoria racionalista de conhecimento que prega o
conhecimento matemático isolado do mundo e a teoria empirista que diz que o
conhecimento matemático resulta diretamente do mundo físico. Para o
construtivismo, o conhecimento matemático resulta da ação interativa e reflexiva do
homem com o meio que o circunda. No Brasil essa tendência surgiu na década de
1960 adquirindo grande força a partir do ano de 1980. O mais valorizado nessa
tendência é o processo e não o produto do conhecimento, o aluno deve “aprender a
aprender” e desenvolver o pensamento lógico-formal. O dinamismo construtivo do
aluno é respeitado, e este é incentivado a ver, manipular o que vê, produzir
significado, representar, desenhar, errar, corrigir. Como o erro não é considerado
negativo e sim como reflexo do pensamento, o professor está sempre junto ao aluno
para que entenda onde e o que ele errou para prontamente corrigir o equívoco e
propiciar ao aluno um novo caminho para pensar. No construtivismo, o foco não
39
deve estar centrado no resultado final e sim no processo pelo qual atingiu-se o
resultado.
Após o fracasso do MMM e a constatação de que alunos com menos
oportunidades tinham mais dificuldade quanto à aprendizagem incluiu-se nos
estudos relacionados à Educação Matemática aspectos sócio culturais. Surgiu então
a tendência sócioetnocultural, chamada também por Teoria da Diferença Cultural
que prega que as crianças de classes pobres não são carentes de conhecimentos e
de estruturas cognitivas, mas talvez não tenham habilidades formais tão
desenvolvidas em relação à escrita e à representação simbólica (Fiorentini, 1995,
p.12). Na Educação Matemática o nome mais forte é o do brasileiro Ubiratan
D´Ambrósio que inicialmente definiu o termo Etnomatemática como sendo a
Matemática não acadêmica e não sistematizada, oral, informal, espontânea,
produzida e aplicada por grupos culturais específicos. Entretanto, após muitos
estudos, o significado de Etnomatemática foi ampliado para “a arte ou técnica de
explicar, de conhecer, de entender nos diversos contextos culturais” (D´Ambrósio,
1990). Epistemologicamente o conhecimento Matemático é um saber prático,
relativo, dinâmico, podendo aparecer sistematizado ou não. Para seguidores dessa
tendência a Matemática só adquire validade e significação dentro do próprio grupo
cultural onde se encontra. A finalidade da Matemática então vem a ser a
desmistificação e compreensão da realidade. Didaticamente o método mais utilizado
pelos professores dessa disciplina é a problematização e a modelagem matemática -
"arte de transformar problemas da realidade em problemas matemáticos e resolvê-
los interpretando suas soluções na linguagem do mundo real” (Bassanezi, p. 16,
2002). A relação aluno/professor é dialógica, marcada pela troca de conhecimentos.
Não existe um modelo de currículo a ser adotado, pronto, o interesse dos alunos é
que define o rumo das aulas. O ideário sócioetnocultural puro só pode ser observado
em algumas poucas experiências isoladas. Entretanto, essa tendência influencia
muitos professores que não se prendem ao currículo estipulado e acabado.
Diante do exposto, acreditamos que a escolha dos componentes
curriculares da Matemática, dentre eles a Estatística, e principalmente o modo pelo
qual eles serão desenvolvidos possuem estreita relação com a concepção que se
tem de Educação Matemática. No Brasil não há um estudo histórico específico sobre
diferentes concepções do ensino de Estatística muito provavelmente pela sua
história recente em nossos currículos. Não obstante, alguns autores portugueses e
40
ingleses se dedicaram a compreender as diferentes concepções relacionadas à
Educação Estatística que estão presentes nos currículos e salas de aula atualmente.
2.4.3.2. Concepções sobre Educação Estatística
João Pedro da Ponte e Helena Fonseca, estudiosos sobre Didática da
Metemática na Universidade de Lisboa, em um artigo apresentado em um congresso
sobre o ensino e aprendizagem de Estatística em 2000, fizeram um comparativo do
Ensino de Estatística em relação aos objetivos, conteúdos e orientações
metodológicas de três países, Estados Unidos, Portugal e Inglaterra:
Esta comparação mostra que o currículo português confere proeminência aos aspectos matemáticos, nomeadamente os conceitos, cálculos e outros procedimentos e que o currículo inglês oficial e a organização americana do NCTM colocam em primeiro plano a análise de dados. Enquanto que, em Portugal, a estatística é vista como um capítulo da matemática, de importância menor, na Inglaterra e nos Estados Unidos ela é encarada como um tema autónomo que suporta a realização de investigações sobre problemas actuais. (PONTE, FONSECA, 2000, p.1)
Em sua análise afirmam que o conjunto de variáveis investigadas revelam
diferentes concepções sobre o ensino de Estatística. Segundo os autores, enquanto
alguns países evidenciam os aspectos matemáticos e métodos estatísticos, há
aqueles que valorizam o seu potencial de análise e interpretação de dados e outros
a enxergam como uma linguagem de descrição e argumentação sobre a realidade.
Holmes, em seu artigo intitulado “Que tipo de Estatística deveria ser
ensinado na escola – e por quê?” (tradução nossa)13 apresentado em um Encontro
com estudiosos da área em 2000, indica que há três tendências relativas ao ensino
da Estatística. A primeira tendência enfatiza o processo de ensino sobre Análise de
Dados uma vez que estamos inseridos em uma sociedade repleta de dados e
necessitamos desenvolver habilidades específicas para compreendê-los e utilizá-los
em situações que por vezes demandam tomadas de decisões. A segunda tendência,
classificada pelo autor como capítulo da Matemática, ressalta aspectos conceituais
e/ou computacionais e é mais presente em salas de aula universitárias, entretanto é
possível encontrar práticas espelhadas no ensino superior em salas de aula da
Educação Básica. A terceira e última tendência foi descrita por Holmes como
‘estat’ística (tradução nossa)14 por fortalecer o caráter de investigação do estado de
13
What sort of statistics should be taugh in schools – and why? 14
‘state’ istics
41
situações e populações. Ponte e Fonseca utilizaram esse referencial na sua
pesquisa sobre o Ensino de Estatística em alguns países e concluíram que a
tendência Análise de Dados é encontrada na Inglaterra, na França a Estatística é
vista com um ramo da Matemática, diferentemente da Suécia que apresenta a
tendência ‘estat’ística.
Ponte e Fonseca (2000) apresentam em seu artigo o estudo feito por
Rosário Almeida em sua dissertação de mestrado defendida em 2000 na qual
identificou quatro grandes perspectivas sobre a Estatística.
Na primeira perspectiva a Estatística é encarada essencialmente como um fim em si mesmo. A ênfase está nos seus conceitos e métodos próprios, bem como nas suas ligações aos outros campos da Matemática, com especial destaque para a Teoria das Probabilidades. É uma perspectiva que informa fortemente o ensino avançado nas universidades, muito em especial para os alunos de Matemática. Numa segunda perspectiva, a Estatística surge como um instrumento ou uma ferramenta que permite representar e descrever aspectos específicos da realidade, sobretudo os que se prestam a um tratamento quantitativo. Aparece aqui com toda a força a ideia de Análise de Dados. Para uma terceira perspectiva, a Estatística envolve a produção de novo conhecimento. [...] A Estatística não se basta a si própria e é preciso dar também atenção à realidade que supostamente irá descrever. Finalmente, para uma quarta perspectiva, a Estatística constitui sobretudo uma actividade social, sendo dada especial atenção à interacção entre os diversos intervenientes que conduzem ao produto final. (PONTE e FONSECA, 2000, p.4)
A cada uma das perspectivas apresentadas por Almeida (2000, apud
PONTE e FONSECA, 2000) subjaz uma perspectiva de Educação Estatística que se
revela na prática e na intencionalidade docente. A Estatística vista com um assunto
que se basta em si mesmo se assemelha a outros ramos da Matemática e como tal
requer métodos avançados e linguagem formal que se revelarão como foco do
ensino. O caráter instrumental da Estatística na resolução de problemas práticos e
no desenvolvimento de outras áreas do saber será ressaltado por meio de aulas
contextualizadas e problematizadoras. Ao enxergar a Estatística como um produto
ou atividade social (duas últimas perspectivas), provavelmente as aulas desse
componente curricular se traduzirão em projetos nos quais o contexto fará parte de
todo o processo, desde a formulação da questão a ser investigada até a
comunicação efetiva dos dados.
Pesquisadores apontam uma valorização do caráter de Análise de Dados
da Estatística na Educação Básica. Robert Hogg, estatístico estadunidense da
42
Universidade de Iowa, ressalta que o ensino de Estatística deve propiciar ao aluno
situações nas quais precisem refletir sobre a formulação de questões de
investigação apropriadas, decidir sobre a forma mais efetiva de coletar e registrar os
dados e conhecer as limitações dessa ciência. Hogg acredita que a Estatística na
Educação Básica precisa seguir essa tendência.
[...] ao nível da iniciação, a Estatística não deve ser apresentada como um ramo da Matemática. A boa Estatística não deve ser identificada com rigor ou pureza matemáticos, mas ser mais estreitamente relacionada com pensamento cuidadoso. Em particular, os alunos devem apreciar como a Estatística é associada com o método científico: observamos a natureza e formulamos questões, coligimos dados que lançam luz sobre essas questões, analisamos os dados e comparamos os resultados com o que tínhamos pensado previamente, levantamos novas questões e assim sucessivamente. (HOGG, 1991, pp. 342-343)
Ronald Snee, doutor em Estatística e consultor em diferentes ramos no
Estados Unidos, reitera o consenso sobre importância da perspectiva da Análise de
dados ao sugerir que, no que se refere aos conteúdos da Educação Estatística na
escolaridade básica, esta:
[...] se deve afastar da abordagem matemática e probabilística e colocar mais ênfase na coleta de dados, na compreensão e modelação da variação, na apresentação gráfica dos dados e na concepção de experiências, surveys, resolução de problemas e melhoria de processos. (SNEE, 1993, pp. 151 apud PONTE, FONSECA, 2000, p. 4)
Ponte e Fonseca (2000) salientam que em alguns países o termo análise
de dados surge como o grande descritor deste tema em substituição à Estatística,
pelo valor dado ao tratamento de dados. É o caso do Brasil cuja Educação
Estatística foi influenciada por países como Estados Unidos, Inglaterra e França,
como nos orienta (CORDANI, 2015). O Ensino de Estatística na Educação Básica
brasileira será abordado e aprofundado posteriormente.
É ponto pacífico a importância da inserção da Estatística na Educação
Básica devida seu caráter utilitário e formador no domínio do tratamento de dados e,
é claro, pelo desenvolvimento, mesmo que superficial de competências relacionadas
a investigações científicas. Entretanto, diversos especialistas e pesquisadores
enxergam outras possibilidades para a formação de estudantes da educação básica
quando se ensinam conceitos estatísticos com o foco na Análise de Dados. É o caso
de Cazorla, Kataoka e Silva que afirmam que A Estatística [...] tem um papel
fundamental no desenvolvimento da interdisciplinaridade, da transversalidade, do
43
espírito científico e da formação dos alunos para a cidadania. (CAZORLA;
KATAOKA; SILVA, 2010, p.20)
A interpretação apresentada é corroborada por diversos autores que
acreditam que ao aprender Estatística, devido ao seu caráter integrador, os alunos
estão indo além de conhecer cálculos de medidas de tendência por estarem
desenvolvendo habilidades importantes para se tornarem competentes em nossa
sociedade atual.
A interdisciplinaridade tem sido buscada por diversos docentes por
entender que a aprendizagem se dá no estabelecimento de relações. Ivani Fazenda,
a maior especialista brasileira sobre o tema, em seu livro “Interdisciplinaridade: um
projeto em parceria” justifica o diálogo entre disciplinas como um meio de alcançar
uma melhor formação geral e profissional e como incentivo à formação de
pesquisadores. (FAZENDA, 1991). Lopes é uma das pesquisadoras que destaca a
relação da Estatística com a interdisciplinaridade ao evidenciar que precisamos
lembrar que as raízes da Estatística estão centradas nas diferentes áreas do
conhecimento e essa percepção nos remete à interdisciplinaridade. (LOPES, 1998,
p. 19)
Lopes, em sua afirmação, associa a interdisciplinaridade à origem da
Estatística nas Ciências Sociais e Políticas. É de se esperar, portanto, que o Ensino
da Estatística esteja atrelado ao seu viés utilitário em outras ciências e áreas do
conhecimento. Vale destacar ainda que, ao desenvolvermos propostas envolvendo
conhecimentos estatísticos, favorecemos, dentre outras possibilidades, a conexão
com diferentes noções e conceitos, dentre os quais se destacam porcentagem,
razão, proporcionalidade, ângulos, diversas modalidades de cálculo, entre outras.
Além do aspecto interdisciplinar da Análise de Dados e da sua relação
com outros conteúdos, destacamos a possibilidade de desenvolver o pensamento
crítico nesse contexto, uma vez que é necessário analisar e relacionar criticamente
os dados coletados. Ao abordar o tratamento das informações na sua essência, é
necessário discutir, por exemplo, se as questões elaboradas para obter os dados
estão de acordo com a pergunta que se pretendia responder, se os dados
apresentados são compatíveis à pesquisa realizada e se a conclusão é coerente
com a investigação. As habilidades desenvolvidas nesse processo permitirão que os
alunos analisem criticamente o produto final de qualquer pesquisa estatística,
avaliando e questionando se for o caso a veracidade da análise ou a adequação
44
dos métodos empregados. Nesse processo, a habilidade de comunicação oral e
escrita também pode ser desenvolvida.
Muitos estudiosos evidenciam ainda a vinculação do Ensino da Estatística
com a formação para a Cidadania, definida por Lopes como a capacidade de
atuação reflexiva, ponderada e crítica de um indivíduo em seu grupo social (LOPES,
1998, p. 13). A autora reitera que a Estatística é essencial para a cidadania por
possibilitar o desenvolvimento de uma análise sob diferentes aspectos científicos,
tecnológicos e/ou sociais. Destacamos ainda as ideias de Cordani que reitera a
aplicação da Estatística em diversas áreas do conhecimento – indo da Medicina ao
Direito, da Indústria ao Governo – e vislumbra nessa relação o favorecimento do
aluno desenvolver sua autonomia e criticidade.
A Educação Estatística prepara cidadãos para pensar por eles mesmos, para fazer perguntas inteligentes e ter confiança para se defender de imposições autoritárias. Por outro lado, também os prepara para entender o papel desempenhado pela Estatística na tomada de decisão em vários campos do conhecimento, com seus pontos fortes e suas limitações. (CORDANI, 2015, p. 179)
Para além da formação para a cidadania destaca-se ainda a formação do
espírito científico, como apontado por Lopes:
O ensino interdisciplinar da Estocástica poderá proporcionar aos alunos uma aquisição de conhecimentos menos compartimentalizados, através de experiências que lhe permitam fazer observações e tirar conclusões, desenvolvendo, assim, seu pensamento científico, fundamental para sua formação. (LOPES, 1998, p.10)
O processo de definir um tema e uma questão sobre a qual deseja-se
investigar, elaborar um instrumento de coleta de dados, tabular e organizar as
informações obtidas, calcular e analisar medidas estatísticas e comunicar o
resultado da pesquisa são ações muito próximas de uma investigação científica.
Batanero (2001) vai além do exposto e descreve uma relação entre a
Estatística e o desenvolvimento de um país.
A relação entre o desenvolvimento de um país e o grau em que seu sistema estatístico produz estatísticas completas e confiáveis é clara, porque esta informação é necessária para uma tomada de decisões acertadas de tipo econômico, social e político. A educação estatística, não somente dos técnicos que produzem estas estatísticas, como também dos profissionais e cidadãos que devem interpretá-las e tomar suas decisões baseadas nessa informação, assim como dos que devem colaborar na obtenção dos dados
45
requeridos é, portanto, um motor do desenvolvimento. (BATANERO, 2001, p. 3 – tradução nossa15).
Tendo em vista o referencial teórico apresentado, acreditamos que a
perspectiva Análise de Dados da Estatística, ou seja, a abordagem descritiva da
Estatística como definida anteriormente, apresenta-se mais adequada à formação do
estudante da Educação Básica por entendermos que responde às demandas
formativas de uma sociedade repleta de dados e informações.
2.5. EDUCAÇÃO ESTATÍSTICA NO BRASIL
2.5.1. Disciplinas e cursos de Estatística
O primeiro registro de um curso de Estatística no Brasil esteve presente
em um curso de origem militar. SANTOS, em seu estudo histórico bibliográfico já
citado previamente, nos conta que:
Ainda em 1808, D. João VI criou, dentro da academia militar, a primeira instituição brasileira de ensino superior de tipo técnico, a Academia Real da Marinha, no Rio de Janeiro. Dois anos depois, é criada também no Rio de Janeiro a Academia Real Militar, destinada a formar oficiais da classe de engenheiros, geógrafos e topógrafos. Nessas instituições, o ensino de disciplinas de ciências exatas seria, enfim, encorajado no Brasil, inicialmente com as disciplinas de Física, Matemática e Química, e posteriormente com a Estatística. Em 1839 a Academia Real Militar da corte portuguesa foi transformada em Escola Militar da Corte e em seguida, em 1858, passou a se chamar Escola Central. Foi nessa época que surgiu a cadeira de Economia Política, Estatística e Direito Administrativo, cujo primeiro catedrático foi José Maria da Silva Paranhos, o Visconde do Rio Branco. A cadeira de Economia Política, Estatística e Direito Administrativo da Escola Central está na origem do ensino da Estatística no Brasil, ainda que a Estatística ali ensinada se preocupasse mais com a descrição dos característicos quantitativos referentes ao Estado. A Escola Central, em 1875, virou Escola Politécnica, e, em 1896, em Escola Politécnica do Rio de Janeiro. (SANTOS, 2014, p. 4-5)
Como dito anteriormente, a Estatística no Brasil visava descrever os
dados relacionados ao Estado. O Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
15
La relación entre el desarrollo de un país y el grado en que su sistema estadístico produce estadísticas completas y fiables es clara, porque esta información es necessária para la toma de decisiones acertadas de tipo económico, social y político. La educación estadística, no sólo de los técnicos que producen estas estadísticas, sino de los profesionales y ciudadanos que deben interpretarlas y tomar a su vez decisiones basadas en esta información, así como de los que deben colaborar en la obtención de los datos requeridos es, por tanto, un motor del desarrollo.
46
(IBGE), fundado em 1934, foi o grande responsável pela consolidação definitiva da
Estatística no Brasil e, apesar de ser o órgão incumbido de todas as etapas de
recenseamentos, se relaciona fortemente com ações de Educação Estatística.
Com efeito, é por meio de um decreto que fica determinado que o IBGE promoverá ou manterá cursos especiais de Estatística, visando sobretudo a formação ou o aperfeiçoamento do funcionalismo de Estatística nas suas várias categorias. (SANTOS, 2014, p.6)
Impulsionados pela criação do IBGE, os cursos de Estatísticas foram
surgindo. O primeiro curso de Estatística como uma disciplina independente foi
ministrado no início do século XX por José Paranhos Fontenelle, médico de
formação e docente de Higiene da Escola Normal do Distrito Federal do Rio de
Janeiro. O objetivo era apresentar Estatística aplicada à Educação. Em 1934 a
Faculdade de Filosofia, Ciências e Letras (FFCL) da Universidade de São Paulo
(USP) foi inaugurada e o curso de Ciências Sociais e Pedagogia contava com a
disciplina Estatística Geral e Aplicada em sua grade curricular. Quatro anos depois,
em 1938, a cadeira Estatística Educacional é inserida na mesma instituição. Em
1941 ocorreu a Reforma Capanema, conjunto de leis que dividiu o ensino
secundário em clássico e científico. Registros mostram que a disciplina Estatística
aparecia no currículo de alguns Estados. Nos anos seguintes a USP outras
universidades foram inserindo disciplinas de Estatística em cursos de distintas áreas
do conhecimento, repetindo uma tendência mundial descrita anteriormente.
(SANTOS, 2014; CORDANI, 2015)
O primeiro curso de bacharelado em Estatística foi oferecido em 1946
pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) na antiga Faculdade Nacional
de Ciências Econômicas que atualmente é conhecida como Faculdade de Economia
e Administração. No mesmo ano a FFLC da USP regulamenta o curso de
especialização em “Estatística Analítica” na área de Ciências Sociais e Pedagogia.
(CARZOLA, 2006), já na década seguinte é fundada a Escola Nacional de Ciências
Estatísticas, especializada na formação de profissionais da área.
Em 1953 é criada a Escola Brasileira de Estatística [Escola Nacional de Ciências Estatísticas], que oferecia dois cursos, um de nível superior, o qual conferia a seus participantes o diploma de bacharel em Ciências Estatísticas; e outro de nível intermediário, que formava técnicos servidores do sistema estatístico nacional. A Escola brasileira de Estatística representa um marco histórico no ensino de Estatística no Brasil, pois é a primeira instituição do Brasil e da América Latina a preparar estatísticos de nível universitário. (SANTOS, 2014, p. 7)
47
Com isso, o ensino de Estatística vai se estabelecendo em nosso país.
Outros cursos superiores foram sendo criados, dentre os quais: Escola Superior de
Estatística da Bahia, em 1966; Universidade Federal da Bahia e UNICAMP, em
1969; Faculdade de Administração e Estatística Paes de Barros (primeira instiruição
privada), em 1971. Vale destacar que os cursos de Estatística oferecidos até então
no nível superior ainda estavam atrelados às Ciências Sociais e Políticas. Cordani
nos chama a atenção para esse fato:
No Brasil, a Estatística não tinha muito espaço nos cursos de graduação em Matemática. Como exemplo, na década de 60, o curso de Matemática da Universidade de São Paulo era ministrado pela Faculdade de Filosofia Ciências e Letras e a grade curricular não continha como obrigatória a disciplina de Estatística, nem no Bacharelado e nem na Licenciatura: a disciplina de Estatística poderia ser cursada como optativa, geralmente no final da grade curricular, junto à grade curricular dos cursos de Ciências Sociais, Psicologia ou Pedagogia. A escolha da Estatística como matéria optativa não gozava de prestígio entre os alunos da Matemática, por ser uma área que trabalhava com coleta de dados. Provavelmente, esta aversão se devia ao fato da Estatística ter sido considerada nos meios acadêmicos como uma ciência de natureza política, que favorecia a definição de políticas de governo, sem relação com a escolaridade básica. (CORDANI, 2015, p. 160)
A associação das disciplinas à aritmética política pode ter impactado
negativamente o desenvolvimento de métodos estatísticos mais avançados e
influenciado o uso tardio da Estatística em estudos científicos brasileiros. Somente
em 1974 o curso de bacharelado em Estatística começou a ser oferecido em uma
faculdade de Matemática, a UFRJ foi pioneira mais uma vez. A partir de então
observou-se uma grande expansão da área que ainda pode ser constatada nas
últimas décadas. Carzola (2006) em sua pesquisa afirma que em 2005 havia 27
cursos de bacharelado, 7 mestrados e 5 doutorados. Já em 2014 esses números
aumentaram para 38, 10 e 7, respectivamente. Santos (2004) ressalta que o alcance
pode ser maior se considerarmos que teses e dissertações sobre Estatística são
elaboradas em diversas áreas como Educação, Educação Matemática,
Administração, Engenharia etc.
Em 1984 foi criada a Associação Brasileira de Estatística (ABE) que
apresenta como meta promover o desenvolvimento, a disseminação e a aplicação
da Estatística no Brasil por meio da organização de eventos e publicações que
visam o intercâmbio entre professores, pesquisadores, profissionais e estudantes de
48
diferentes áreas. Atualmente a sede da ABE está localizada na Universidade
Estadual de São Paulo (USP) e associada ao Instituto de Matemática e Estatística.
2.5.2. Estatística e os Parâmetros Curriculares Nacionais
Apesar do avanço da Educação Estatística no Brasil na formação
profissional, o ensino dos conceitos estatísticos na Educação Básica só foi
consolidado em meados da década de 1990 com a publicação dos Parâmetros
Curriculares Nacionais (PCNs.), documento que incorporou oficialmente a Estatística
no currículo (CAZORLA; KATAOKA; SILVA, 2010).
Os Parâmetros Curriculares Nacionais foram divulgados a partir de 1997
como um documento oficial do Ministério da Educação do Brasil (MEC) com a
função de orientar e garantir a coerência dos investimentos no sistema educacional,
socializando discussões, pesquisas e recomendações (BRASIL 1997, p.13). O
primeiro documento, publicado em 1997, versava sobre as metas escolares para o
Ensino Fundamental. Os Parâmetros Curriculares Nacionais para o Ensino Médio
(PCNEM) foram publicados em 1999, seguido das orientações complementares do
PCN+ de 2002. O termo parâmetro foi utilizado com a intenção de ressaltar o
respeito às diversidades culturais, regionais, étnicas, religiosas e políticas que
atravessam uma sociedade múltipla, estratificada e complexa como o Brasil (BRASIL
1997, p.13).
É necessário lembrar que o estabelecimento de um currículo nacional,
mesmo que de natureza aberta e flexível como os PCNs, revela uma demanda da
sociedade que se modifica e provoca uma transformação na seleção de conteúdos.
As orientações curriculares, os objetivos e as metas estabelecidos possuem uma
intencionalidade na formação dos estudantes explícitas e implícitas nos documentos.
Os PCNs têm por intenção oferecer aos alunos:
[...] pleno acesso aos recursos culturais relevantes para a conquista de sua cidadania. Tais recursos incluem tanto os domínios do saber tradicionalmente presentes no trabalho escolar quanto as preocupações contemporâneas com o meio ambiente, com a saúde, com a sexualidade e com as questões éticas relativas à igualdade de direitos, à dignidade do ser humano e à solidariedade. (BRASIL, 1998, p.8)
Dessa forma, o principal objetivo é formar o aluno para que ele possa
exercer plenamente a cidadania. Para atender a esses objetivos, equipes
especialistas empenharam-se em elencar metas expressas em termos de
49
habilidades e competências para cada ciclo da escolaridade básica coerentes com a
realidade educacional brasileira apresentada nos estudos e com as demandas de
formação. Diante do exposto, o documento oficial sugere o desenvolvimento de
habilidades que permitam ao aluno mobilizar o conhecimento que possui na tentativa
de entender e, se necessário, modificar o que os cerca. Para que isso ocorra, o
estudante deve ser o protagonista na construção do conhecimento que se dá em
rede, na tessitura de um feixe de relações que associa diversos assuntos. O papel
do professor ganha novas dimensões, como organizador da aprendizagem e não
aquele que apresenta as informações prontas aos alunos, espera-se que atue como
mediador ao problematizar e promover o confronto das hipóteses dos alunos a fim
de validá-las, fazendo com que avancem. Essas ideias e concepções sobre o ensino
e a aprendizagem não podem ser diferentes no âmbito da Matemática.
De acordo com os PCNs, o ensino de Matemática na Educação Básica
está organizado em temas estruturadores ou eixos. No Ensino Fundamental a
Matemática se estrutura em 4 eixos, quais sejam: Números e Operações (e Álgebra
a partir do 6º ano); Grandezas e Medidas; Espaço e Forma e Tratamento da
Informação. (BRASIL, 2008).
O eixo Tratamento da Informação do Ensino Fundamental estuda modos
de quantificar e organizar conjuntos finitos de dados, que podem ser de ordem
numérica ou qualitativa. No Ensino Médio esse eixo passa a ser chamado de Análise
de Dados. De acordo com os PCNs+:
A análise de dados tem sido essencial em problemas sociais e econômicos, como nas estatísticas relacionadas à saúde, populações, transportes, orçamentos e questões de mercado. Propõe-se que constitua o terceiro eixo ou tema estruturador do ensino, e tem como objetos de estudo os conjuntos finitos de dados, que podem ser numéricos ou informações qualitativas, o que dá origem a procedimentos bem distintos daqueles dos demais temas, pela maneira como são feitas as quantificações, usando-se processos de contagem combinatórios, frequências e medidas estatísticas e probabilidades. Este tema pode ser organizado em três unidades temáticas: Estatística, Contagem e Probabilidade. (Brasil, 2002, p.123)
É preciso reiterar a especificidade de Análise de Dados que justifica sua
caracterização como um eixo estruturador do ensino. Em suma, este tema
estruturador contempla formas próprias de quantificar, interpretar e comunicar
conjuntos de dados ou informações que não podem ser quantificados direta ou
exatamente. Desse modo, tem como objeto de estudo um conjunto de dados
50
quantitativos ou qualitativos e para tal utiliza processos de contagem, combinatórias,
frequências, medidas estatísticas e probabilidades. Pela primeira vez, oficialmente o
Brasil se responsabiliza pela formação estatística na Educação Básica. Cordani
(2015), reitera a relevância dos Parâmetros Curriculares Nacionais no
desenvolvimento da Educação Estatística em nosso país.
No Brasil já se fazia sentir, há tempos, a necessidade de um currículo pré-universitário que contemplasse de maneira explícita e definitiva a área de Probabilidade e Estatística. [...] Permeando todos os ciclos da Educação é possível detectar a preocupação constante de que os alunos sejam capazes de (dentre outros aspectos): a) utilizar diferentes fontes de informação e recursos tecnológicos para adquirir e construir conhecimento; b) questionar a realidade, formulando problemas e tratando de resolvê-los, utilizando para isto o pensamento lógico, a criatividade, a intuição, a capacidade de análise crítica, selecionando procedimentos e verificando sua adequação. Essas capacidades poderiam ser exploradas no ensino fundamental através da aprendizagem de ferramentas de Estatística, que poderão ser vistas tanto isoladamente dentro da disciplina Matemática, ou então como uma atividade de interação com outras disciplinas, através dos chamados temas transversais (termos usados nos PCN). (CORDANI, 2015, p. 173-174)
Os PCNs descrevem o que se espera dos alunos formados ao final de
cada segmento da Educação Básica em relação à Estatística. A justificativa na
inserção das habilidades e competências desse componente curricular está na
busca por uma formação para a cidadania. A partir da publicação do documento
oficial, foi observada uma demanda crescente de materiais didáticos, cursos,
publicações e pesquisas científicas sobre Educação Estatística e alterações em
livros didáticos, avaliações externas nacionais e processos seletivos de
universidades ou vestibulares.
Ainda que os PCNs tenham sido publicados em 1997, Cordani (2014)
afirma que foi somente em 2006, quando o Brasil sediou a VII ICOTS em Salvador,
com o tema Working Cooperatively in Statistical Education, que a Educação
Estatística se tornou mais visível e próxima da sala de aula. Cazorla, nesse envento,
analisou o estado da arte da pesquisa sobre o ensino de Estatística no Brasil
focando a educação básica e a formação do usuário. Ela destacou que depois que
os PCNs oficializaram o ensino de Estatística na Educação básica, aumentou
substancialmente a procura de alunos e professores por minicursos, oficinas e livros
uma vez que os professores que atuam em sala de aula provavelmente não tiveram
uma formação inicial que privilegiasse esse tema. Para ela, o marco zero da
51
Educação Estatística no Brasil se deu na conferência internacional “Experiências e
expectativas do Ensino de Estatística – Desafios para o século XXI” realizada na
Universidade Federal de Santa Catarina em 1999.
O caminho percorrido pela Educação Estatística nos Ensinos
Fundamental e Médio no Brasil é bastante recente e ainda não está consolidado.
Apesar de quase 20 anos da publicação dos Parâmetros Curriculares Nacionais, nos
quais estão explícitas as habilidades e conteúdos estatísticos que esperamos para
nossos alunos, são raros os sistemas de ensino e coleções de livros didáticos que
se dedicam ao ensino de Estatística em todas as séries e principalmente com o viés
de Análise de Dados sugeridos nos documentos.
Algumas políticas públicas educacionais visam organizar o ensino da
Educação Básica. Desde o final de 2016 especialistas têm se dedicado a elaborar
uma Base Nacional Comum Curricular (BNCC) que elenca as competências e
habilidades que devem ser almejadas por todas as unidades escolares no território
brasileiro. A terceira versão, publicada em meados de 2017, contempla o Ensino
Fundamental e apresenta a Matemática dividida em cinco unidades temáticas, quais
sejam: Números; Álgebra; Geometria; Grandezas e Medidas; Estatística e
Probabilidades. Nesse documento é possível encontrar a indicação do trabalho com
objetos de conhecimento de todos os temas em todas as séries do Ensino
Fundamental, não sendo diferente com Estatística e Probabilidade. As discussões
sobre a BNCC ainda são recentes e seus efeitos provavelmente serão verificados a
partir de 2019, ano no qual chegarão às escolas os livros didáticos avaliados pelo
Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) com base nesse documento.
2.6. DESAFIOS DA EDUCAÇÃO ESTATÍSTICA
A consolidação da Educação Estatística, entretanto, não é um desafio
apenas do sistema educacional brasileiro. Batanero, em 2001, destacou que o fato
da Estatística como Ciência ainda estar em desenvolvimento e expansão na
ocasião, pode ter dificultado seu ensino nessa concepção.
Ao mesmo tempo, a Estatística como Ciência, atravessa um período de notável expansão, sendo cada vez mais numerosos os procedimentos disponíveis, distanciando-se cada vez mais da matemática pura e convertendo-se em uma “ciência dos dados”, o
52
que implica a dificuldade de ensinar um tema em contínua mudança e crescimento. (BATANERO, 2001, p. 6 – tradução nossa16)
Celi Lopes (2010) em seu artigo intitulado “Os desafios para Educação
Estatística no currículo de Matemática”, analisou a organização da Educação Básica
em países distintos pela realidade social, econômica e cultural, Brasil e Estados
Unidos e percorreu a história da Educação Estatística na Escola Básica e revelou
que:
[...] nas últimas décadas a maioria dos países introduziu nos seus currículos de Matemática, conteúdos de Estatística, Probabilidade e Combinatória desde o início da escolaridade. A conferência de Cambridge (Massachusetts), realizada em 1963, é apontada por Rade (1986) como uma das primeiras reuniões científicas em que se propôs que a Estatística passasse a integrar os conteúdos de Matemática a serem ensinados na Educação Básica, mas a precocidade dessa medida não teve ecos na maior parte dos documentos curriculares posteriormente elaborados. [...] Em um levantamento realizado em 1986 pelo International Statistical Institute (ISI), constata-se, nos relatório enviados pelos diversos países, uma insatisfação pelo ensino da Estatística, em particular nas escolas dos anos elementares, onde seus ensino tem sido ignorado. Atualmente, aproximadamente duas décadas após esse levantamento, percebe-se que, embora a inserção da Estatística e Probabilidade seja recomendada nas propostas curriculares de Matemática, na maioria dos países do mundo, ainda não tem sido prioridade na escola, nem nos programas de formação inicial e contínua de professores que ensinam Matemática (LOPES, 2010, p.47-48)
Afirmações como essas nos indicam que a inserção da Estatística nos
currículos oficiais não tem garantido um resultado expressivo na formação dos
estudantes dos diversos países. A forma como se ensina é decisivo para a formação
almejada nos documentos curriculares. Henriques e Nascimento (2013)
apresentaram um resumo do que foi discutido sobre o ensino e aprendizagem de
Estatística no XXIV Seminário de Investigação em Educação Matemática, ocorrido
em Braga em 2013.
Com efeito, o aumento do tempo dedicado à instrução em Estatística, só por si, não é suficiente para preparar cidadãos estatisticamente letrados. As mudanças esperadas no ensino da Estatística não dizem respeito só à quantidade, mas também à qualidade do conteúdo [...] até há bem pouco tempo, a Estatística nos currículos estava reduzida a tarefas nas quais eram fornecidos conjuntos de dados já organizados e de dimensão reduzida e aos alunos era pedida a
16
Al mismo tiempo, la estadística como ciencia, atraviesa un periodo de notable expansión, siendo cada vez mas numerosos los procedimientos disponibles, alejándose cada vez mas de la matemática pura y convirtiéndose en una "ciencia de los datos", lo que implica la dificultad de enseñar un tema en continuo cambio y crecimiento.
53
produção de gráficos específicos, o cálculo de estatísticas simples ou a resposta a questões diretas. (HENRIQUES; NASCIMENTO; 2013, p. 117)
Atividades como as descritas não evidenciam o caráter integrador e
complexo da Estatística que propicia o desenvolvimento de habilidades relevantes
para o exercício da cidadania como descrito anteriormente. Talvez a preparação dos
professores que não vivenciaram a Educação Estatística para além do estudo dos
métodos e cálculos estatísticos na sua formação básica e profissional venha
influenciando esses resultados.
Cazorla, Kataoka e Silva (2010) apontam a demanda por formação e
pesquisa em Educação Estatística e diferenciam Educação Estatística e Estatística
ao enxergar a primeira como uma área de pesquisa com o objetivo de estudar como
as pessoas aprendem e ensinam Estatística.
[...] o ensino de Estatística enfrenta outras dificuldades devido à sua natureza, pois o pensamento estatístico rompe com o paradigma do raciocínio racional, lógico e determinista, característico da Matemática, uma vez que o homem, no seu cotidiano, muitas vezes toda decisões em condições de incerteza. Além disso, os problemas estatísticos costuram ser abertos, isto é pode existir mais de um método de solução correta, ou a solução ou previsão pode não se concretizar, a despeito da modelagem estatística (CAZORLA; KATAOKA; SILVA, 2010, p.21)
Outros autores, como Lopes (2010), apontam a existência de grandes
lacunas na formação docente em relação à Educação Estatística. Além disso, as
pesquisas sobre Educação Estatística com o olhar para a sala de aula da Educação
básica ainda são escassas. Batanero apresentou essa preocupação em 2001:
[...] o número de investigações sobre a didática da estatística ainda é muito escasso, em comparação com as existentes em outros ramos da matemática. Por isso, não se conhecem ainda quais são as principais dificuldades dos alunos em muitos conceitos importantes. Seria também preciso experimentar e avaliar métodos de ensino adaptados à natureza específica da estatística, à qual nem sempre se podem transferir os princípios gerais do ensino de matemática. (BATANERO, 2001, p. 6 – tradução nossa17)
17
[...] el numero de investigaciones sobre la didáctica de la estadística es aun muy escaso, en comparación con las existentes en otras ramas de las matemáticas. Por ello, no se conocen aun cuales son las principales dificultades de los alumnos em muchos conceptos importantes. Sería también preciso experimentar y evaluar métodos de enseñanza adaptados a la naturaleza especifica de la estadística, a la que no siempre se pueden transferir los principios generales de la enseñanza de las matemáticas.
54
Apesar de terem transcorrido mais de uma década desde a afirmação da
autora, estudos como o de Santos (2014) confirmam o desenvolvimento lento e
tardio da Educação Estatística como campo científico. Cordani (2014) lembra ainda
que apesar do aumento de pesquisas dessa área, o desenvolvimento da Educação
Estatística ainda é contingenciado:
[...] hoje em dia temos à disposição textos (principalmente em inglês, embora haja algumas publicações em português), muitos eventos organizados como seminários e simpósios, extensa publicação de artigos, criação de sites interativos e demonstrativos etc. No entanto, esse empenho se dá em alguns “nichos” que se especializam em Educação Estatística, e não resulta necessariamente na real presença da Estatística na sala de aula da escola básica, tanto no Brasil como em outros países. (CORDANI, 2014, p, 175)
A Educação Estatística é discutida apenas em algumas universidades
brasileiras e não faz parte da grade curricular da grande maioria dos cursos de
Licenciatura em Matemática. Apesar do notável desenvolvimento da Estatística nas
últimas décadas, a Educação Estatística ainda não se apresenta como uma área do
conhecimento madura e universalizada na formação dos professores. Muitos países,
dentre eles o Brasil, ainda não apresentam um ensino de Estatística consoante com
o grande potencial do conhecimento em Estatística para colaborar com a formação
do cidadão, conforme apontado nas discussões teóricas.
55
CAPÍTULO 3 – ENSINO E APRENDIZAGEM DE ESTATÍSTICA
3.1. SER COMPETENTE EM ESTATÍSTICA
A Educação Estatística é complexa na sua natureza principalmente por
abarcar questões relacionadas a três campos científicos distintos, quais sejam:
Estatística, Matemática e Educação. A relação entre a Matemática e a Estatística,
apresentada no capítulo anterior, é sensivelmente alterada na presença do olhar da
Educação, cujas principais contribuições se revelam essencialmente no debate
sobre como o ensino de Estatística precisa organizar-se nos diferentes segmentos
de ensino para que os alunos avancem na perspectiva atual do que se entende por
conhecimento estatístico.
O ensino de Estatística na Educação Básica é responsabilidade dos
professores de Matemática e, portanto, sofre influência direta dessa Ciência vista
por alguns como determinista e regida por procedimentos rigorosos. A Educação
Matemática tem passado por grandes mudanças em sua concepção e, ainda que
encontremos salas de aula em que fórmulas e técnicas matemáticas são os focos do
ensino, há algumas décadas pesquisadores e professores da área têm se
preocupado em voltar o ensino para o desenvolvimento de habilidades e
competências nas quais os conceitos de Estatística estão integrados. De todo
modo, muitos pesquisadores ressaltam a diferença epistemológica entre as duas
Ciências. Smith (1998) diz que um bom estudo estatístico não está relacionado à
pureza e à precisão matemática dos seus modelos e sim a um raciocínio cuidadoso.
Com um olhar distinto sobre a Estatística, Batanero (2001) afirma que a natureza da
Estatística nada tem a ver com a cultura determinista presente nas aulas de
Matemática e, em seu material elaborado para o curso de Educação Estatística, a
autora aponta preocupação em reproduzir na resolução de problemas estatísticos a
estratégia utilizada em algumas situações matemáticas de reduzir a complexidade
de um problema, uma vez que essa ação poderia produzir vieses nas conclusões
obtidas e consequentemente nas implicações nas tomadas de decisão.
Joan Garfield, da Universidade de Minessota nos Estados Unidos, e Iddo
Gal, da Universidade de Haifa em Israel, têm desenvolvido nas últimas décadas
pesquisas sobre aprendizagem estatística. Garfield e Gal corroboram a ideia de
Batanero ao afirmarem que a Estatística, apesar de ser uma ciência matemática,
56
não é um ramo da Matemática, por apresentar modos característicos de analisar as
situações problemas e os resultados. No ano de 2007 os pesquisadores publicaram
um artigo no qual descrevem diferenças no raciocínio dessas duas disciplinas:
Em Estatística, dados são vistos como números com um contexto. O contexto motiva procedimentos e é a fonte de significado e base para a interpretação de resultados. A indeterminação da desordem dos dados distingue investigações estatísticas das explorações matemáticas mais precisas e caracterizadas por uma natureza finita. Conceitos e procedimentos matemáticos são usados como parte da tentativa de manejar e “resolver” problemas estatísticos, e alguma facilidade técnica com Matemática pode ser esperada em certos cursos e níveis educacionais. Entretanto, a necessidade de cálculos apurados e execução de procedimentos estão rapidamente sendo substituídos pela necessidade de um uso seletivo, pensado e cuidadoso de dispositivos tecnológicos e de softwares cada vez mais sofisticados. A natureza fundamental de muitos problemas estatísticos é que eles não possuem uma única solução matemática. Em vez disso, problemas estatísticos realistas usualmente começam com uma questão e culminam com a apresentação de opiniões apoiadas por certas conclusões e suposições. Opiniões e inferências esperadas dos alunos muitas vezes não podem ser caracterizadas como “certas” ou “erradas”, mas sim avaliadas em termos de qualidade de raciocínio, adequação dos métodos empregados, e natureza dos dados e evidência utilizados. (GARFIELD; GAL, 1999, p. 208, tradução nossa18)
Em suma, a Estatística vista para além das técnicas e dos modelos exige
de quem aprende uma mobilização de habilidades que vão além daquelas
desenvolvidas em outros conteúdos abordados nas aulas de Matemática. Apesar da
estreita relação com a Educação Matemática pelos métodos empregados na
pesquisa e referenciais, podemos afirmar que a Educação Estatística possui uma
18
In statistics, data are viewed as numbers with a context. The context motivates procedures and is the source of meaning and basis for interpretarion of results. The indeterminacy of messiness of data distinguishes statistical investigations from the more precise, finite nature characterizing mathematical explorations Mathematical concepts and procedures are used as part of the attempt to manage or “solve” statistical problemas, and some technical facility with the mathematics may be expected in certains courses and educational levels. However, the need for the accurate application of computations or execution of procedures is rapidly being replaced by the need for selective, thoughtful, and accurate use of technological devices and increasingly ore-sophisticated software programs. The fundamental nature of many statistical problemas is that they do not have a single matrhematical soclution. Rather, realistic statistical problems usually start with a question and culminate with the presentations of an opinion supported by certain findings and assumptions. Judgments and inferences expected of students [...] very often cannot be characterized as “right” or “wrong”, but rather evaluated in terms of quality of reasoning, adequacy of methods employed, and nature of data and evidence used.
57
especificidade epistemológica que demanda investigações sui generis
principalmente em relação às expectativas de aprendizagem dos alunos e à
elucidação do que seja competência estatística.
3.1.1. Expectativas de aprendizagem
Por expectativas de aprendizagens entendemos não só o conjunto de
conteúdos que os alunos devem dominar, mas também as habilidades e
competência que esperamos que desenvolvam ao final de cada ciclo da
escolaridade.
Diversos pesquisadores da área da Educação definiram competência e
habilidade. Inspirados pelos estudos de Libâneo (1994) e Perrenoud (1999),
assumiremos habilidade como a capacidade do sujeito de desempenhar uma ação
específica baseada nos saberes e conhecimentos que domina e competência, como
o conjunto de recursos cognitivos que são mobilizados na resolução de uma
situação problema19 com coerência e efetividade.
Lino de Macedo, professor e pesquisador da Universidade de São Paulo
(USP) estuda os mesmos conceitos na Educação Básica e enxerga na competência
uma habilidade de ordem geral, enquanto define a habilidade como uma
competência de ordem particular, específica, como ilustrou em uma reflexão feita
para o INEP:
Resolver problemas, por exemplo, é uma competência que supõe o
domínio de várias habilidades. Calcular, ler, interpretar, tomar decisões, responder
por escrito, etc., são exemplos de habilidades requeridas para a solução de
problemas de aritmética. (MACEDO, 2005,p.-)
É possível dizer, portanto, que as habilidades são necessárias, mas não
suficientes, para que um sujeito seja competente. A competência não é somente um
conjunto de habilidades, mas principalmente a forma como as articulamos no
processo da resolução de uma situação-problema.
Voltando ao tema do presente estudo, é pertinente definir o que é ser
competente em Estatística. Pensar no papel da formação estatística talvez ajude a
elucidar essa definição. Gal e Garfield, na publicação “Os desafios da avaliação em
19
Por situação problema, entendemos toda situação que não possui solução evidente e que exige que o resolvedor combine seus conhecimentos e se decida pela forma de usá-los em busca da solução; uma situação que um indivíduo ou grupo quer ou precisa resolver e para a qual não dispõe de um caminho rápido e direto que o leve à solução. (SMOLE; DINIZ, 2001)
58
Educação Estatística”20 de 1999, afirmam que a meta principal do Ensino de
Estatística na formação de um cidadão é torná-lo capaz de compreender e lidar com
as noções de incerteza e variabilidade presentes na informação estatística, e
contribuir com a produção, interpretação e comunicação de dados pertinentes a
contextos nos quais estão inseridos na sua vida profissional (GAL, GARFIELD,
1999). Em outro trabalho Garfield, junto com Ben-Zvi, discutiu os desafios da
Educação Estatística e afirmaram que o estudo da Estatística deve permitir que os
cidadãos reajam de modo inteligente às informações quantitativas (BEN-ZVI;
GARFIELD, 2004).
Acreditamos que um aluno não se torna cidadão estatisticamente
competente sem que haja uma intencionalidade explícita nas ações de formação
escolar. Para atingir o que chamaremos de competência estatística na vida adulta, o
ensino deve se organizar para desenvolver certas habilidades associadas à
Estatística durante a escolarização básica. Gal e Garfield identificaram oito metas
comuns para a Educação Estatística que se aplicam a qualquer contexto e nível
instrucional resumidas no quadro 1:
Quadro 1 – Metas curriculares da Educação Estatística
M
Meta 1
Entender a finalidade e a lógica de uma investigação estatística;
compreender as ideias que subjazem uma investigação como a
necessidade de descrever uma população por meio da coleta de dados, de
reduzir dados brutos, de estudar amostras ao invés de populações inteiras,
a lógica por trás de processos de amostragem, etc.
M
Meta 2
Entender o processo de uma investigação estatística; compreender como,
quando e por que as ferramentas estatísticas existentes podem auxiliar em
um processo de investigação; reconhecer a importância e especificidade de
cada fase de uma investigação, quais sejam: formular questões; planejar o
estudo; coletar e organizar dados; explorar e analisar os dados; interpretar
o que foi encontrado; discutir conclusões e implicações; e identificar
questões para estudos futuros.
20
“The Assessment Challenges in Statistics Education”
59
M
Meta 3
Desenvolver e aplicar habilidades processuais, tais como: organizar dados;
calcular índices tais como medianas, média e intervalo de confiança;
elaborar tabelas e gráficos úteis seja manualmente ou com o auxílio de
tecnologia.
M
Meta 4
Compreender as relações matemáticas envolvidas na estatística; por
exemplo, entender o significado e a influência de um valor extremo em um
conjunto de dados no cálculo da média e mediana.
M
Meta 5
Entender o conceito de chance e probabilidade como a medida de
incerteza;
M
Meta 6
Desenvolver habilidades de interpretação e literacia estatística; ser capaz
de interpretar resultados e estar atento à possíveis vieses e limitações que
generalizações podem extrair dos dados; elaborar perguntas críticas e
reflexivas sobre argumentos que se referem a dados estatísticos.
M
Meta 7
Desenvolver habilidades de comunicar estatisticamente: usar terminologia
apropriada à Estatística e Probabilidade e ser capaz de elaborar
argumentos pertinentes baseados em dados e observações.
Meta 8
Desenvolver dispositivos estatísticos úteis; compreender que uma
investigação baseada em processos estatísticos frequentemente leva a
melhores conclusões do que confiar em experiências próprias e subjetivas
ou intuitivas, mas que essas conclusões nem sempre são garantidas.
Fonte: GAL e GARFIELD (1999)
Apesar de entender que a competência estatística é a integração das
expectativas descritas por Gal e Garfield, que foram separadas apenas para fins de
estudo e definição, interpretamos cada uma das metas como uma subcompetência
descrita por meio de um conjunto de habilidades que se articulam. Isso posto,
assumiremos como competência estatística a capacidade de articular atitudes,
saberes e conhecimentos estatísticos em situações nas quais seja necessário lidar
com informações na intenção de descrever uma população ou situação para, de
modo crítico e reflexivo, compreender ou tomar decisões baseadas no conjunto de
dados coletadas pelo sujeito ou por outrem.
Tomamos por definição de conhecimento estatístico os componentes
interrelacionados descritos por Gal, quais sejam:
60
(a) a capacidade que as pessoas têm de interpretar e avaliar
criticamente a informação estatística, os argumentos
relacionados aos dados ou os fenômenos estocásticos, que
as pessoas podem encontrar em diversos contextos e
quando for pertinente
(b) sua capacidade de examinar ou comunicar suas reações à
referida informação estatística, tais como sua compreensão
do significado da informação, suas preocupações com
relação à aceitabilidade de determinadas conclusões.
(GAL, 2002, p. 3, tradução nossa21)
O pesquisador acredita que para que o conhecimento estatístico seja
mobilizado é necessária a ativação de cinco bases de conhecimento inter-
relacionados (geral, estatístico, matemático, de contexto e crítico) conjuntamente
com um grupo de disposições que servem de apoio e determinam a ação do sujeito
(crenças, atitudes e posição crítica) (GAL, 2002). Dessa forma, além da
preocupação com conceitos e aplicações de modelos estatísticos baseados em
resolução de situações-problema, espera-se que os alunos desenvolvam uma
postura crítica e reflexiva diante das informações estatísticas que, a nosso ver, se
assemelha à postura característica de pesquisadores científicos.
As metas para a Educação Estatística descritas por Gal e Garfield (1999)
alcançaram não só as escolas norte americanas, como também influenciaram
discussões em países da Europa (como a Inglaterra), da América Latina (como o
Brasil) e da Oceania (como a Austrália). Pesquisadores desses locais com as mais
diversas formações também têm se dedicado a estudar a Educação Estatística.
Dentre eles, destacamos a participação de estudiosos da Psicologia Educacional
que vem contribuindo com pesquisas científicas cujo objetivo é auxiliar os alunos a
desenvolverem a almejada competência estatística que, desde o final do século XX,
têm sido aceita como a articulação de três outras competências: a literacia
21
(a) la capacidad que tienen las personas de interpretar y evaluar críticamente la información estadística, los argumentos relacionados con los datos o los fenómenos estocásticos, que las personas pueden hallar en diversos contextos, y cuando sea pertinente (b) su capacidad de examinar o comunicar sus reacciones a dicha información estadística, tales como su comprensión del significado de la información, sus opiniones sobre las repercusiones de esta información, o sus preocupaciones con relación a la aceptabilidad de determinadas conclusiones.
61
estatística (statistical literacy), que está relacionada à comunicação estatística de
modo crítico e reflexivo; o raciocínio estatístico (statistical reasoning), que envolve
conhecer a intenção e utilizar com compreensão cada etapa do processo de uma
investigação estatística; e o pensamento estatístico (statistical thinking), que pode
ser interpretado como a capacidade de relacionar os processos e ferramentas
estatísticas para aplicá-los de forma coerente em relação à natureza dos dados e às
metodologias investigativas em diversos contextos. Na sequência, nos deteremos a
aprofundar o estudo de cada uma dessas competências.
3.1.2. Literacia estatística
Literacia: qualidade ou condição de quem é letrado22
O termo literacia pode ser interpretado como a capacidade de
compreender e fazer uso de informações escritas. Apesar de inusitada, a palavra
literacia tem sido usada na área da Educação Matemática e Estatística para
descrever a competência de ler, interpretar e empregar a linguagem dessas áreas
para se comunicar. Pesquisadores australianos e alguns brasileiros utilizam o termo
letramento, entretanto optamos por usar a palavra literacia por entender que o
vocábulo permite incorporar no seu significado a destreza de um sujeito para
compreender e manifestar ideias envolvendo diferentes linguagens.
Como já vimos anteriormente, no final da década de 1970 as discussões
sobre a importância das habilidades relacionadas à análise de dados na formação
de profissionais, pesquisadores e líderes suscitou a urgência de reformas de
currículos escolares de modo a inserir esses anseios. Em 1980 os Estados Unidos
iniciaram uma revolução no ensino de Estatística ao propor o projeto “Quantitative
Literacy Project” (QLP) de 1980 nos Estados Unidos. O termo literacia estatística
apareceu associado ao ensino no QLP, liderado pelo professor Sheaffer que o
descreveu em um artigo de 1990 como um projeto articulado entre a Associação
Americana de Estatística (American Statistical Association – ASA) e o Conselho
Nacional de Professores de Matemática (National Council of Teachers of
Mathematics – NCTM) como base para a elaboração da vertente estatística que
seria publicada nos “Standards”, documento esse que normatiza os currículos no
país. O QLP desenvolveu materiais curriculares acessíveis a professores e alunos e
22
Houaiss online, acesso em 14 dez. de 2016.
62
estruturou modelos de formação continuada na área de Estatística e Probabilidade.
(SCHEAFFER, 1990). Um dos princípios norteadores do projeto era que a análise de
dados deveria ser a principal ação pedagógica da Educação Básica. Além disso,
sugeria-se a inserção de dados reais e de interesse dos alunos nas aulas dos
diferentes segmentos de ensino. O documento propunha ainda que a ênfase do
ensino não deveria ser em cálculos, mas sim no desenvolvimento da intuição. Após
o QLP, a discussão sobre literacia estatística se propagou no país e um aumento no
interesse sobre a Educação Estatística foi observado nas décadas seguintes. Muitos
pesquisadores se dedicaram a estudar essa competência e como ajudar os alunos a
alcançá-la.
Ben-Zvi e Garfield, em 2004, na intenção de explorar os desafios dos
professores que desejam ensinar estatística de acordo com as expectativas atuais,
compilaram as ideias de outros pesquisadores da área, tais como CHANCE(2002),
DELMAS (2002), GARFIELD (2002) E RUMSEY (2002), e associaram a literacia
estatística às:
[...] habilidades básicas e importantes que podem ser usadas no entendimento de informações estatísticas ou resultados de pesquisas. Essas habilidades incluem ser capaz de organizar dados, elaborar e desenhar tabelas, e trabalhar com diferentes representações de dados. Literacia estatística também inclui o entendimento de conceitos, vocabulário e símbolos, e inclui o entendimento de probabilidade como uma medida da incerteza. (BEN-ZVI; GARFIELD; 2004; p.7; tradução nossa23)
A partir da definição apresentada, podemos observar que a literacia
estatística tem como alvo a comunicação de ideias estatísticas. Portanto, mais do
que compreender os elementos e as etapas da construção de um gráfico, o aluno
precisa ser capaz, por exemplo, de selecionar o tipo de gráfico mais adequado para
comunicar a informação desejada ou ainda decidir que variáveis irá relacionar em
uma tabela de dupla entrada de modo a investigar se há correlações. Como leitor de
gráficos e tabelas, baseado em seus saberes, espera-se que ele seja capaz de
entender o que está por trás do texto, a intenção do autor e de avaliar a veracidade
da informação e da conclusão que se se apresenta de modo explícito ou implícito.
23
Statistical literacy includes basic and important skills that may be used in understanding statistical information or research results. These skills include being able to organize data, construct and display tables, and work with different representations of data. Statistical literacy also includes an understanding of concepts, vocabulary, and symbols, and includes an understanding of probability as a measure of uncertainty.
63
Consciente do papel da Estatística na formação para a cidadania,
Rumsey, da Universidade de Ohio, optou por substituir o termo por outros dois:
competência estatística (statistical competence) e cidadania estatística (statistical
citizenship). Para ele, a cidadania estatística se refere à meta definitiva para o
sujeito compreender e transformar a realidade em uma sociedade repleta de
informações enquanto a competência estatística abarca o conhecimento básico que
subjaz o pensamento e o raciocínio estatísticos que se revelam em cinco
componentes, quais sejam: consciência dos dados; entendimento de conceitos
básicos e terminologia; conhecimento de processos de coletas de dados e geração
de Estatística descritiva; habilidades básicas de interpretação para descrever os
resultados no contexto do problema; e habilidades de comunicação (RUMSEY,
2002). Apesar dessa definição não ter sido utilizada pela comunidade científica,
destacamos a contribuição de Rumsey para a relação entre a competência
estatística e a formação para a cidadania.
Outro estudo relevante relacionado à literacia estatística foi realizado por
duas pesquisadoras australianas, Jane Watson da Universidade da Tasmânia e
Rosemary Callingham da Universidade de New England em 2003. A pesquisa
intitulada “Literacia Estatística: um constructo hierárquico24” teve por objetivo
investigar o conceito de literacia estatística para auxiliar a compreensão do conceito
que havia se revelado uma nova demanda do ensino de Estatística. As
pesquisadoras interpretaram literacia estatística como um constructo25 e visavam,
além de definir os fatores a ela relacionados, verificar a existência de níveis
hierárquicos. A pesquisa foi motivada por alguns estudos anteriores, como o de
Biggs e Collis26 que em 1982 determinaram uma hierarquia relacionada à estrutura
cognitiva associada à literacia estatística baseado em número de tarefas
empregadas. A investigação usou dados arquivados que haviam sido coletados em
duas pesquisas envolvendo avaliações em larga escala que tiveram por objetivo
estudar aspectos da compreensão estatística. Utilizando a Teoria de Resposta ao
24
Statistical Literacy: A complex hierarchical construct.
25 Por constructo compreendemos os indicadores compostos por variáveis latentes que
surgem como resultados de modelos mentais e/ou associados a medidas indiretas. O constructo permite, por exemplo, acessar o grau de conhecimento em tópicos específicos. 26
BIGGS, J. B.; COLLES, K. F. Evaluating the quality of learning: The SOLO
taxonomy. Academic Press: New York, 1982.
64
Item (TRI) foram elaborados 80 itens e analisadas repostas de quase 4000 alunos
do terceiro ao nono ano que participaram da avaliação entre os anos de 1993 e
2000. Para definir o constructo e verificar a existência da hierarquia, Watson e
Callingham utilizaram a Análise Rash, que foi explicado da seguinte forma:
Análise Rash é um conjunto de modelos de medidas compreendidos pelo
título geral de Teoria de Reposta ao Item (TRI) que tem sido amplamente utilizada
em pesquisas.
[...] Eles usam a interação entre pessoas e itens para estimar a probabilidade de reposta de cada pessoa a cada item. Esse procedimento produz um conjunto de pontos que definem a posição de cada item e cada pessoa em relação à variável ou constructo subjacente. [...] é um estudo exploratório mais do que confirmatório, que almeja postular a existência de uma variável hipotética mais do que confirmar a presença de um constructo previamente identificado por outros significados. (WATSON e CALLINGHAM, 2003, p. 8, tradução nossa27)
Como resultado da exploração, foram identificados seis níveis
hierárquicos como uma forma conveniente de distinguir etapas gerais do
desenvolvimento das variáveis/habilidades que subjazem o constructo da literacia
estatística. Cada um dos níveis apresentados descreve aspectos relacionados ao
engajamento com o contexto, terminologia, habilidades matemáticas e estatísticas.
Resumimos no quadro 2 a caracterização de cada um dos níveis nas dimensões
apresentadas sob o ponto de vista das tarefas que os alunos devem ser capazes de
realizar:
Quadro 2 – Níveis de literacia estatística
Nível Engajamento
com o contexto Terminologia
Habilidades matemáticas
Habilidades estatísticas
1 Idiossincrático
Idiossincrático, (peculiar ou
par-ticular ao sujeito
Tautológico (redundante)
Básicas
Contar e ler os valores em células de tabelas um a um; encontrar a maior coluna ou linha de uma tabela; determinar a frequência de uma variável em um pictográfico.
27
Rash models are a set of measurement models coming under the general heading of Item Response Theory (IRT) that have been widely used in surveys.[...] They use the interaction between persons and itens to estimate the probabilities of response of each person to each item. This process procedures a set of score that defines the position of each item and each person against the underlying variable or construct. [...] it is an exploratory rather than a confirmatory study, which aims to postulate the existence of na hypothesized variable, rather than confirm the presence of a construcr prevously identified by other means.
65
2 Informal
Coloquial, infor-mal; crenças in-
tuitivas e não estatísticas
Elementos simples
Procedimentos simples
Interpretar tabelas e gráficos simples e diretos; cálculos básicos de chances.
3 Inconsistente
Seletivo
Reconhecimen-to adequado,
mas sem justifi-cativa
Formatos de suporte
Interpretação mais qua-litativa do que quantita-tiva
4 Consistente não
critico Não crítico
Apreciação em configurações de variação e
chances
Aspectos múltiplos de
uso
Compreender e utilizar conceitos de média, probabilidades simples e identificar caracte-rísticas dos gráficos.
5 Crítico
Crítico, questionador
Uso apropriado
Não envolvem raciocínio
proporcional
Interpretar a medida quantitativa de chance, considerar o conceito de variação.
6 Matematica-mente crítico
Crítico, questio-nador
Interpretação perspicaz de aspectos da linguagem
Envolvem raciocí-nio
proporcional
Considerar o significado e a necessidade da noção de incerteza em previsões.
Fonte: Watson e Callingham (2003); tradução nossa.
Watson e Callingham definiram a literacia estatística como um constructo
hierárquico, e como tal podemos afirmar que os conhecimentos e habilidades de um
nível incluem os níveis anteriores. Em suma, nos dois primeiros níveis os alunos se
esforçam para interpretar contextos mais diretos. Nos níveis 3 e 4 eles realizam
tarefas que requerem conceitos em vários cenários, mas não o fazem de forma
crítica e questionadora. Nos dois últimos níveis os alunos consideram as sutilezas
dos contextos e mostram-se questionadores com base em justificativas estatísticas
apropriadas. Claramente o nível 6 é o almejado para os alunos que completam a
Educação Básica, mas é necessário que o aluno progrida entre os níveis para que
possua uma compressão sólida dos conceitos (WATSON,2003). Frisamos a
contribuição desse estudo uma vez que, comprovado o caráter unidimensional e
hierárquico da literacia estatística, podemos interpretá-la como uma competência
que pode se desenvolver no espaço escolar e está mais associada à oportunidade
de aprender do que a uma capacidade nata. (WATSON, CALLINGHAN, 2003)
Ao reconhecer a literacia estatística como uma competência associada
à ação de comunicação, torna-se imprescindível abordar a leitura e interpretação de
gráficos e tabelas antes de darmos prosseguimento à análise das competências de
raciocínio e pensamento estatísticos. Lopes define o domínio da linguagem gráfica
como a capacidade de leitura dos dados presentes em um gráfico, permitindo que a
66
pessoa leitora consiga interpretar os dados e generalizar as informações nele
presentes. (LOPES, 2002, p, 190)
Francis Curcio é professor e pesquisador da Queens College of the City
University em New York e em 1987 escreveu um artigo intitulado “Compreensão de
relações matemáticas28” com o objetivo de investigar a fundo compreensão de
gráficos de crianças do 4º ao 7º anos. Curcio reconhece que a leitura literal de um
dado apresentado em um gráfico é um componente importante da literacia
estatística, ainda assim salienta que o potencial de comunicação em um gráfico é
ampliado quando o leitor é capaz de interpretar e generalizar os dados nele
apresentados. Tentaremos elucidar o que está envolvido na compreensão de um
gráfico ou tabela.
Curcio (1987) afirma que a compreensão do gráfico engloba três aspectos
fundamentais: o reconhecimento do tipo de gráfico (ou tabela) apresentado, suas
características principais e relação com os dados apresentados; as relações
matemáticas existentes entre os números e seu significado contextual; e as
operações matemáticas implicadas no gráfico. O pesquisador afirma ainda haver
conhecimentos prévios necessários ao domínio da linguagem gráfica.
O tópico de gráfico, o qual é identificado pelo título, legendas e eixos, e as palavras chave do vocabulário usadas no título e legendas podem ser um dos fatores que requerem conhecimento prévio para compreender a relação matemática expressa no gráfico [...] O conteúdo matemático de um gráfico, que são os conceitos de número, relações e operações fundamentais nele contidas, é um segundo fator sobre o qual um conhecimento prévio parece ser necessário para a compreensão. (CURCIO, 1987, p.383, tradução nossa29)
Podemos concluir que a relação entre o assunto identificado em um
gráfico ou tabela por meio de seus elementos permite, por exemplo, que um leitor
possa inferir relações entre as variáveis envolvidas nos eixos do gráfico ou nas
células da tabela.
28
Comprehension of Mathematical Relationships 29
The topic of graph, which is identified by the title, labels and axes, and key vocabulary words used in the title and labels, may be the one of the factors in that requires prior knowledge for comprehending the mathematical relationshio expressed in the graph.[...] The mathematical content of a graph, which is the number concepts, relationships, and fundamental operations contained in it, is a second fator about which prior knowledge seems to be necessary for comprehension.
67
Curcio publicou em 1989 em conjunto com o National Council of Teachers
of Mathematics (NCTM) o texto “Desenvolvimento da compreensão de gráficos”30,
uma espécie de manual no qual apresenta ideias práticas de como auxiliar os alunos
a desenvolver a literacia estatística por meio da interpretação e análise de gráficos
que apresentam informações quantitativas. Nele o pesquisador salienta a
importância do ensino cuidar dessas questões por acreditar que gráficos
proporcionam um meio de comunicar, classificar e comparar dados e relações
matemáticas que seriam difíceis de serem reconhecidas numericamente. Nesse
trabalho, Curcio caracteriza três níveis de compreensão de gráficos com base na
complexidade da habilidade apresentada:
Leitura dos dados: esse nível de compreensão requer uma leitura literal do gráfico. O leitor simplesmente “levanta” os fatos indicados explicitamente no gráfico ou a informação encontrada no título ou nas legendas diretamente do gráfico [...] Não há interpretação nesse nível. A leitura requerida nesse tipo de compreensão é constitui-se uma tarefa com baixo nível cognitivo. [...] Leitura entre os dados: esse nível de compreensão inclui a interpretação e integração dos dados no gráfico. Requer a habilidade de comparar quantidades (exemplo, maior que, mais alto, mais baixo) e usar outros conceitos e habilidades matemáticas(exemplo, adição, subtração, multiplicação, divisão) que permitem ao leitor combinar e integrar dados e identificar relações matemáticas expressas no gráfico. Esse é o nível de compreensão mais avaliado nos testes padronizados. [...] Leitura além dos dados: esse nível de compreensão requer do leitor prever ou inferir a partir dos dados aproximando-se de esquemas existentes (por exemplo, conhecimento prévio, conhecimento na memória) em busca de informações que não estão explicita ou implicitamente indicadas no gráfico. Enquanto a leitura entre os dados requer que o leitor faça inferência baseada nos dados apresentados no gráfico, a leitura além dos dados requer que a inferência seja feita com base em um “banco de dados” na cabeça do leitor, não no gráfico. (CURCIO, 1989, p.5-6, tradução nossa31)
30
“Developing Graph Comprehension” 31
Reading the data: This level of comprehension requeres a literal reading of the graph. The reader simply “lifts” the facts explicitly stated in the graph, or the information found in the graph title and axis labels[...]. There is no interpretation at this level. Readind that requires this type of comprehension is a very low level cognitive task. [...] Reading between the Data: This level of comprehension includes the interpretation and integration of the data in the graph. It requires the ability to compare quantities (e.g., greater than, tallest, smallest) and the use of otther mathematical concepts and skills (e.g. addition, subtraction, multiplication, division) that allow the reader to combine and integrate data and identify the mathematical relationshios expressed in the grah. This is the level of comprehension most often assessed on standardized tests. […] Reading beyond the Data: This level of comprehension requires the reader to predict ou infer from the data by tapping existing schemata (i.e., background knowledge, knowledge in memory) for information that is neither explicitly no implicitly stated in the graph.
68
Os diferentes níveis de leitura constituem uma pista importante na busca
do desenvolvimento da literacia estatística uma vez que é possível concluir que
diferentes questionamentos exigem mobilização de níveis de compreensão distintos
e hierárquicos. No livro, Curcio apresenta uma série de sugestões de atividades de
leitura e interpretação de gráficos que incluem perguntas que requerem os três
níveis de leitura.
Richard L. Sheaffer, que coordenou projetos específicos de Educação
Estatística como o já mencionado QLP, escreveu um artigo no livro “Learning
Mathematics for a new century”, publicado pelo NCTM. Nele o pesquisador fornece
informações sobre como ampliar e aprofundar o ensino e aprendizagem da análise
de dados exploratória, uma vez que acredita que os dados usualmente revelam algo
se examinados apropriadamente e por meio de uma análise cuidadosa ao longo do
processo de planejar a coleta de dados, explorá-los, buscar aparentes associações
entre as variáveis e fazer inferências adequadas a partir dos resultados
(SHEAFFER, 2000).
Em outro trabalho sobre a compreensão de gráficos, publicado em 2001,
Curcio, juntamente com Susan Friel e George Bright da Universidade da Carolina do
Norte, ampliou o olhar para os fatores que influenciam essa habilidade aprofundando
a discussão sobre os componentes matemáticos presentes em um gráfico que
podem interferir na sua interpretação: a estrutura (framework) de um gráfico – por
exemplo, os eixos, escalas, e pontos de referência – fornece informação sobre o tipo
de dados mensurados; as dimensões visuais (visual dimensions), chamados de
especificadores – por exemplo, os pontos, as linhas ou as barras dos gráficos –
representam os valores dos dados; as legendas (labels) incluídas sejam no título ou
nos eixos nomeiam o tipo de medida e os dados apresentados; o fundo
(background) de um gráfico incluem cores, grades e figuras que podem comunicar
informações. Vale lembrar ainda que apesar desses componentes estarem
presentes em todos os tipos de gráfico, a cada um estão associados componentes
estruturais específicos que podem interferir na comunicação de um conjunto de
dados. Cada gráfico estatístico têm suas características próprias para representação
Whereas reading between the data might require that the reader make an inference based on the data presented in the graph, reading beyond the data requires that the inference be made on the basis of a “data base” in reader’s head, not in the graph.
69
dos dados. Por exemplo, ao intencionar comunicar o comportamento de uma
variável quantitativa contínua um gráfico em linha pode ser mais adequado do que
um gráfico em barras. Do mesmo modo, ao comparar duas populações em relação a
uma mesma variável, torna-se mais interessante utilizar um gráfico em barras
múltiplas do que construir dois gráficos de setores lado a lado. Portanto, espera-se
que o leitor compreenda a intenção nem sempre explícita relacionada à escolha do
tipo do gráfico escolhido pelo autor.
Curcio, Friel e Bright denifiniram ainda um constructo chamado sentido
gráfico (graph sense) como sendo a habilidade do sujeito em derivar significado de
gráficos criados por outros ou por si mesmo. Associadas a essa habilidade,
identificaram três ações principais:
[...] para ler a informação diretamente de um gráfico, deve-se entender a convenção do gráfico desenhado; para manipular a informação lida de um gráfico, deve-se fazer comparações e realizar cálculos; para generalizar, prever ou identificar padrões, deve-se relacionar a informação do gráfico ao contexto da situação. (FRIEL, CURCIO, BRIGHT, 2001, p.152, tradução nossa32)
Essas ações descritas pelos pesquisadores fazem emergir três níveis de
compreensão gráfica aparentemente hierárquicos: um nível elementar focado na
extração de dados de um gráfico, um nível intermediário caracterizado pela
interpolação e busca de relação entre os dados apresentados no gráfico e um nível
avançado que envolve a extrapolação dos dados em busca de uma generalização
ou previsão. Esses níveis se aproximam muito dos níveis de leitura descritos por
Curcio em estudos anteriores e permitem que constatemos que o ensino pode e
deve se organizar de modo a auxiliar os alunos a avançarem visando ações mais
complexas de leitura e interpretação de gráficos.
Rumsey (2002) reconhece as pesquisas que evidenciam diferentes níveis
de compreensão e ressalta que a importância dos alunos compreenderem e
utilizarem ideias estatísticas em diferentes níveis de complexidade ao afirmar que
para ser um “bom cidadão estatístico” é necessário ser capaz de explicar, decidir,
julgar, avaliar e tomar decisões a partir das informações. Essas habilidades, que
32
(a) to read information directly from a graph,one must understand the conventions of graph design (e.g., Kosslyn, 1994); (b) to manipulate the information read from a graph, one makes comparisons and performs computation; and (c) to generalize, predict, or identify trends,one must relate the information in the graph to the context of the situation.
70
estão em parte no escopo da literacia estatística, se relacionam ao pensamento e
raciocínio estatísticos descritos a seguir.
3.1.3. Raciocínio estatístico
Raciocínio: exercício da razão através do qual se procura alcançar o entendimento de atos e fatos, se formulam ideias, se elaboram juízos, se deduz algo a partir de uma ou mais premissas, se tiram conclusões.33
Assim como a literacia, o raciocínio estatístico pode ser interpretado como
uma competência que compõe a competência estatística e como tal, pode ser
descrita por meio de habilidades. Por raciocínio estatístico entende-se o modo como
as pessoas raciocinam com as ideias estatísticas e dão significados às informações
obtidas. Tomemos a definição de Ben-Zvi e Garfield ao descreverem o que está
envolvido nessa competência:
[...] fazer interpretações baseados em conjuntos de dados, representações de dados ou resumos estatísticos. Raciocínio estatístico pode envolver a conexão de um conceito com outro (por exemplo, medidas de tendência central e de dispersão) ou pode combinar ideias sobre dados e chance. Raciocinar significa compreender e ser capaz de explicar processos estatísticos e interpretar por completo os resultados estatísticos. (BEN-ZVI; GARFIELD; 2004; p.7, tradução nossa34)
O raciocínio estatístico, assim como a literacia estatística, se faz presente
na ação de interpretação de gráficos e tabelas. Entretanto, enquanto a literacia
mobiliza ideias associadas à comunicação, o raciocínio estatístico se revela no
entendimento das relações entre os dados apresentados do ponto de vista dos
processos estatísticos. Desse modo, estão em foco noções de variabilidade, chance,
incerteza, aleatoriedade e amostragem que permitem interpretar e inferir a partir dos
resultados obtidos.
O raciocínio estatístico é uma competência ampla composta de
raciocínios específicos em relação a alguns processos envolvidos em uma
33
Houaiss online, acesso em 14 dez. de 2016. 34
Statistical reasoning may be defined as the way people reason with statistical ideas and make sense of statistical information. This involves making interpretations based on sets of data, representations of data, or statistical summaries of data. Statistical reasoning may involve connecting one concept to another (e.g., center and spread), or it may combine ideas about data and chance. Reasoning means understanding and being able to explain statistical processes and being able to fully interpret statistical results.
71
investigação estatística. Garfield e Gal, em uma publicação realizada pelo NCTM,
em 1999, sobre o desenvolvimento do raciocínio matemático retomaram as metas
para o raciocínio científico descritas pela Associação Americana para o Avanço da
Ciência (American Association for the Advancement of Science’s – AAAS) em 1993.
Embora a AAAS não usasse o termo raciocínio estatístico, os pesquisadores têm
utilizado essas referências para especificar os tipos de raciocínios envolvidos na
competência:
1. Raciocínio sobre os dados: reconhecer e categorizar dados como
quantitativos ou qualitativos, discretos ou contínuos; e saber por que
um tipo de dado leva a um tipo particular de tabela, gráfico ou medida
estatística.
2. Raciocínio sobre a representação de dados: compreender o modo
como os elementos de um gráfico representam uma amostra; saber
como os gráficos podem ser modificados para representar melhor os
dados.
3. Raciocínio sobre medidas estatísticas: entender por que medidas de
tendência central, de dispersão e de posição informam fatos diferentes
sobre o conjunto de dados; escolher a medida mais adequada para
representar o conjunto de dados e entender quando essa medida não
o representa; compreender o uso das medidas de tendência central e
de dispersão para comparar diferentes conjuntos de dados.
4. Raciocínio sobre incerteza: usar corretamente ideias de variabilidade,
chance e probabilidade para fazer juízo sobre eventos incertos;
compreender por que nem todos os resultados são equiprováveis;
saber que existem diferentes métodos para obter a probabilidade de
eventos de naturezas diversas, como árvore de possibilidades,
simulação, programas de computador.
5. Raciocínio sobre amostras: saber como amostras estão relacionadas
à população e o que pode ser inferido a partir da amostra;
compreender o conceito da representatividade da amostra; ser céptico
em relação a inferências feitas por amostras pequenas ou enviesadas.
6. Raciocínio sobre associação: saber como julgar e interpretar a relação
entre duas variáveis reconhecendo como examinar e interpretar uma
tabela de dupla entrada ou um diagrama de dispersão que considerem
72
uma relação de bivariação; saber por que uma correlação forte entre
duas variáveis não significa necessariamente que uma causa a outra.
(GARFIELD. GAL, 1999)
A descrição esmiuçada dos raciocínios envolvidos na competência
raciocínio estatístico é bastante útil se pensarmos em quem ensina, uma vez que a
partir desse estudo foram levantados alguns parâmetros do que é esperado de
quem aprende Estatística em termos de habilidades. Além disso, os pesquisadores
reiteram que uma das metas da Educação Estatística é apresentar a importância do
desenvolvimento de competências em detrimento da valorização de técnicas e
cálculos.
Garfield, em seu texto “O desafio de desenvolver o raciocínio estatístico35”
de 2002, organizou o referencial teórico sobre o tema e sintetizou o raciocínio
estatístico em um processo que se revela em três etapas na resolução de uma
situação-problema: compreender – relacionar um problema particular a uma classe
já conhecida de problemas; planejar e executar – aplicar métodos apropriados para
resolver o problema; avaliar e interpretar – compreender o resultado e sua relação
com o problema original. (GARFIELD, 2002)
No mesmo trabalho, a pesquisadora conduziu entrevistas com estudantes
para aprofundar o entendimento sobre o raciocínio estatístico. Os alunos
entrevistados eram de diversos cursos como enfermagem, educação, trabalhos
sociais e haviam cursado a disciplina de Estatística Básica. A partir da análise
cuidadosa das entrevistas, Garfield identificou cinco níveis de raciocínio estatístico:
Nível 1 – Raciocínio idiossincrático: o aluno conhece algumas palavras
e símbolos relacionados à estatística, mas os usa sem compreendê-
los totalmente; muitas vezes usam os termos de forma equivocada ou
embaralhadas, associadas a informações não relacionadas.
Nível 2 – Raciocínio verbal: o aluno tem uma compreensão verbal dos
conceitos, mas não aplica as ideias no seu comportamento real; por
exemplo, não compreendem como conceitos de variabilidade e média
estão associados apesar de saber defini-los isoladamente.
35
“The Challenge of Developing Statistical Reasoning
73
Nível 3 – Raciocínio transacional: o aluno é capaz de identificar
corretamente uma ou duas dimensões de uma investigação estatística
separadamente, sem integrá-las.
Nível 4 – Raciocínio processual: o aluno é capaz de identificar
corretamente a dimensão de uma investigação estatística, mas não os
integra completamente nem entendem os processos que geram a
investigação.
Nível 5 – Raciocínio processual integrado: o aluno tem um completo
entendimento da investigação estatística e é capaz de coordenar
conceitos e comportamento em processos estatísticos; explica o
processo nas suas próprias palavras e faz previsões corretas com
confiança.
As contribuições dessa pesquisa de Garfield estão na mesma direção do
que foi apontado sobre os níveis de literacia estatística descritos por Watson e
Callingham apresentados anteriormente. Ao entender que existem níveis diferentes
de raciocínio, podemos inferir que o sujeito pode se desenvolver na competência
raciocínio estatístico e que, portanto, o ensino de Estatística, seja na Educação
Básica ou no Ensino Superior pode e deve se organizar para auxiliar os alunos no
avanço dessas habilidades.
3.1.4. Pensamento estatístico
Pensamento: conjunto de ideias de uma pessoa; conhecimento por conceitos.36
Em um primeiro momento, pensamento aparenta ser algo muito próximo
de raciocínio, entretanto, se retomarmos a definição retirada do dicionário, podemos
dizer que o pensamento vai além do raciocínio, é algo maior pautado no rol de
conhecimentos que o sujeito possui. O pensamento é um processo mental que
ocorre tanto de forma consciente quanto inconsciente, enquanto o raciocínio é um
processo mental desencadeado a partir da necessidade de uma ação. Nesse
mesmo sentido, podemos diferenciar pensamento estatístico de raciocínio
estatístico.
36 Houaiss online, acesso em 14 dez. de 2016.
74
Por pensamento estatístico entendemos os processos mentais que dão
suporte às ações e decisões que ocorrem nas etapas de uma investigação
estatística. Chance (2002), define pensamento estatístico como o conjunto de
habilidades que fazem o sujeito compreender todas as etapas de uma investigação
estatística, suas justificativas e interações. Recorremos mais uma vez a Ben-Zvi e
Garfield que explicitam o que está envolvido na competência pensamento
estatístico.
[...] entendimento de por que e como as investigações estatísticas são conduzidas e as “grandes ideias” que subjazem as investigações estatísticas. Essas ideias incluem a natureza onipresente da variação e a noção de quando e como usar métodos apropriados de análise de dados tais como resumos numéricos e representações visuais de dados. [...] entendimento da natureza da amostragem, como fazemos inferência a partir de uma amostra para uma população e de por que experimentos projetados são necessários para estabelecer a causalidade. [...] entendimento de como modelos são usados para simular fenômenos aleatórios, como os dados são produzidos para estimar probabilidades e como, quando e por que ferramentas existentes de inferência podem ser usadas para ajudar um processo investigativo. Pensamento estatístico também inclui ser capaz de compreender e utilizar o contexto de um problema na elaboração da investigação e no delineamento de conclusões, raciocinar e entender o processo como um todo (desde a proposição da questão até a coleta de dados, até a escolha da análise para testar suposições, etc.) Finalmente, pensadores estatísticos são capazes de criticar e avaliar resultados de um problema resolvido ou de um estudo estatístico. (BEN-ZVI; GARFIELD; 2004; p.7, tradução nossa37)
Cris Wild, estatístico, e Maxine Pfannkuch, educadora matemática, ambos
da Nova Zelândia, publicaram um artigo em 1999 no qual investigaram o processo
de pensamento estatístico envolvido na resolução de um problema de Estatística no
sentido amplo, desde a sua formulação até a sua conclusão. Para isso, os
pesquisadoras acompanharam de perto alunos resolvendo situações-problema
hipotéticas dentro da sala de aula e situações profissionais reais. Enquanto
37
[...] understanding of why and how statistical investigations are conducted and the “big ideas” that underlie statistical investigations. These ideas include the omnipresent nature of variation and when and how to use appropriate methods of data analysis such as numerical summaries and visual displays of data. [...] understanding of the nature of sampling, how we make inferences from samples to populations, and why designed experiments are needed in order to establish causation. [...] understanding of how models are used to simulate random phenomena, how data are produced to estimate probabilities, and how, when, and why existing inferential tools can be used to aid an investigative process. Statistical thinking also includes being able to understand and utilize the context of a problem in forming investigations and drawing conclusions, and recognizing and understanding the entire process (from question posing to data collection to choosing analyses to testing assumptions, etc.). Finally, statistical thinkers are able to critique and evaluate results of a problem solved or a statistical study.
75
resolviam problemas estatísticos, os alunos eram questionados sobre como estavam
agindo e raciocinando. Por meio dessa pesquisa empírica, Wild e Pfannkuch
identificaram quatro dimensões do pensamento estatístico nos quais os
“resolvedores” operam: ciclo investigativo; ciclo interrogativo; tipos de pensamento;
tipos de disposições.
As quatro dimensões não ocorrem necessariamente de modo simultâneo
em uma investigação estatística, mas estão inter-relacionadas. A primeira dimensão
descrita envolve o ciclo investigativo associado ao estágio de planejamento e
envolve problematizar, planejar, coletar os dados, analisar e fazer conclusões. A
segunda dimensão abarca os tipos de pensamento utilizados, seja de ordem geral
de um ciclo investigativo qualquer ou de ordem fundamental que, de acordo com os
autores, envolve o reconhecimento da necessidade dos dados na investigação. A
terceira dimensão está relacionada ao ciclo interrogativo no qual o sujeito questiona
as etapas do processo e a investigação como um todo. A quarta dimensão
apresenta aspectos relacionados à disposição, engajamento e compromisso do
“resolvedor” na investigação. (WILD, PFANNKUCH, 1999). O pensamento estatístico
resulta, portanto, na integração desses processos mentais utilizados em cada etapa
de uma investigação estatística.
3.1.5. A relação entre literacia, raciocínio e pensamento estatísticos
Na mesma edição do Jornal de Educação Estatística38 que Rumsey,
Garfield e Chance escreveram sobre competências estatísticas, Delmas, um
pesquisador em Psicologia Educacional da Universidade de Minessota, publicou, um
artigo intitulado “Literacia, raciocínio e aprendizagem estatística: um comentário39” O
objetivo do pesquisador era discutir as principais ideias desses três autores citados,
ressaltando que cada um havia transitado pelos conceitos de acordo com o seu
interesse. Nesse artigo, Delmas apresenta duas interpretações para a relação entre
as competências literacia, raciocínio e pensamento estatísticos. Na primeira, cada
uma delas tem seu próprio domínio independentemente dos outros, mas há uma
intersecção, ou seja, algumas situações requerem lançarmos mão de duas ou
mesmo das três competências ao mesmo tempo. Essa interpretação foi
representada pela figura 1:
38
Journal of Statistical Education 39
“Statistical literacy, reasoning and learning: a commentary”
76
Figura 1 – Esquema: Domínios independentes, mas com alguma sobreposição
Fonte: DELMAS, 2002
Na segunda interpretação, Delmas assume que a literacia é a meta mais
abrangente do ensino de Estatística e que raciocínio e pensamento estatísticos
fazem parte dela, são suas submetas. Algumas situações demandam a mobilização
das três competências, outras de apenas duas ou uma. Nessa interpretação,
expressa na figura 2, a literacia estatística daria suporte a qualquer conhecimento
estatístico.
Figura 2 – Esquema: Raciocínio e pensamento estatísticos contidos na literacia
Fonte: DELMAS, 2002
77
Assim como Delmas, no presente trabalho não defendemos nenhuma das
duas interpretações. Para nós, literacia, raciocínio e pensamento estatísticos são
competências descritas por meio de habilidades que se integram para compor algo
maior chamado de competência estatística.
Pesquisadores brasileiros também estudaram a relação entre as
habilidades de literacia (ou letramento, termo adotado em alguns trabalhos),
raciocínios estatísticos. Silva, em sua tese sobre o pensamento estatístico e o
raciocínio sobre variação, afirma que:
[...] o nível de letramento estatístico é dependente do raciocínio e pensamento estatísticos. Por outro lado, à medida que o nível de letramento estatístico aumenta, o raciocínio e o pensamento tornam-se mais apurados (SILVA, 2007, p. 35).
Celso de Campos, em sua tese, evidencia que “[...] não é produtivo
pensar no ensino da Estatística baseado nessas três capacidades consideradas
independentemente, pois elas se complementam e somente juntas é que vão
abranger a compreensão global da Estatística.” (CAMPOS, 2007, p. 65)
Isso posto, entendemos que há uma inter-relação das habilidades no
desenvolvimento da competência estatística do sujeito e que, portanto, todas
precisam ser almejadas com intencionalidade pelos professores que ensinam
Estatística.
3.2. OS PROFESSORES QUE ENSINAM ESTATÍSTICA
Chego agora a um ponto que toca mais de perto meu coração. O professor é exortado a fazer muitas coisas bonitas: ele deve dar a seus alunos não só informações, mas know-how, ele deve encorajar sua originalidade e trabalho criativo, ele deve fazê-los experimentar a tensão e o triunfo da descoberta. Mas, e o professor, ele próprio? Há em seu currículo alguma oportunidade de trabalho independente em Matemática, de adquirir o know-how que se espera que ele transmita a seus alunos? A resposta é não. Tanto quanto eu saiba, não há Universidade que dê ao professor oportunidade decente de desenvolver seu know-how, sua própria habilidade em Matemática.
(Elon Lages Lima40)
40
Comentário de Elon Lages Lima ao apresentar o trabalho “Os dez mandamentos para professores” de George Polya.
78
A partir da inserção da Estatística na Educação Básica, consequência de
uma mudança de paradigmas e concepções em relação ao seu significado,
pesquisadores de vários países têm se dedicado a investigar como o ensino dessa
área de conhecimento vem sendo realizado. Grande parte tem sinalizado uma falta
de consonância entre o que se espera da formação estatística dos alunos e as
práticas em sala de aula.
A competência estatística como meta do ensino dos conteúdos da
disciplina, exige uma prática educativa intencional para o desenvolvimento da
literacia, pensamento e raciocínio estatísticos. Delmas (2002) ressalta que não é
possível assumir que essas competências surgirão nos estudantes se não forem
tratadas explicitamente como objetivo pelas escolas e professores. Batanero e Díaz
(2010) salientam que a mudança do ensino da Estatística visando o
desenvolvimento de habilidades e competências depende, essencialmente, da
convicção dos professores sobre a importância e utilidade do tema na formação dos
alunos.
Isso posto, como parte do presente trabalho e tendo por objetivo auxiliar
na descrição do panorama sobre a competência estatística no Brasil, iremos
investigar as ideias e discurso sobre as práticas de professores que ensinam
Estatística no Ensino Médio por meio da aplicação de um questionário a professores
das redes públicas estaduais de São Paulo e Rio de Janeiro. Para isso, faz-se
necessário entender quem são e a sua trajetória.
3.2.1. A formação dos professores que ensinam Estatística
Para compreender como pensam os professores que ensinam Estatística
é preciso entender como se deu sua formação profissional.
Como já vimos, os primeiros cursos de Estatística foram implementados
em institutos relacionados ao Estado, nas escolas militares com um viés sócio
político, a Estatística ficou de fora dos cursos de Matemática no Brasil por um
período considerável de tempo e só encontrou seu lugar nessa área diante da
crescente demanda por professores do tema em vários segmentos do ensino e
áreas do conhecimento. A aproximação da Estatística às faculdades de Matemática
foi se dando naturalmente devido à proximidade do tema e à necessidade do uso
dos conhecimentos matemáticos nas técnicas e modelos estatísticos.
79
Os cursos superiores de Estatística nas Universidades brasileiras
iniciaram seu percurso apenas em 1946. Desde então, apenas a Universidade
Federal do Rio Grande do Sul ofereceu, durante um período de tempo que se
encerrou em 1997, um curso de Licenciatura em Estatística. Isso significa que não
há no Brasil cursos que se dediquem exclusivamente a formar professores de
Estatística.
Cazorla (2006), em uma investigação sobre a formação dos professores
que ensinam Estatística, afirmou que essa aparece na Educação Superior em dois
contextos. No primeiro, a Estatística está associada à formação profissional, que
inclui tanto os bacharelados de Estatística e outros cursos que se valem dessa
disciplina para formar profissionais que saibam lidar com dados. No segundo
contexto, a Estatística aparece na formação de futuros professores, sejam eles do
Ensino Fundamental ou do Ensino Médio.
No Brasil, nas séries iniciais do Ensino Fundamental, a Estatística, assim
como outros tópicos da Matemática, fica a cargo dos professores generalistas,
graduados em Pedagogia. Cazorla (2006) investigou o currículo de alguns desses
cursos e descobriu que a maioria deles oferece uma disciplina de Estatística
relacionada à análise de dados e indicadores educacionais, deixando de lado
discussões sobre a didática da Estatística. A pesquisadora afirmou ainda que as
questões sobre o ensino de Estatística tampouco são contempladas nas aulas de
Metodologia de Ensino de Matemática.
No Brasil, assim como em outros países, os professores de Matemática
são os responsáveis por ensinar Estatística nas séries finais da Educação Básica.
Nos valemos mais uma vez da pesquisa de Cazorla (2006), que analisou também o
currículo de alguns cursos de Licenciatura em Matemática, para tentar compreender
a formação desses professores.
Analisando a grade curricular de alguns cursos observa-se que a maioria
oferece apenas uma disciplina de Estatística e Probabilidade e outros, duas. No
caso da oferta de uma única disciplina a ênfase é dada à teoria de probabilidade,
num contexto do ensino superior. No caso de duas disciplinas, as ementas
abrangem a inferência estatística, também no contexto do ensino superior.
(CAZORLA, 2006)
Apesar do estudo de Cazorla ter sido realizado há cerca de 10 anos,
nossa experiência com formação continuada de professores sinaliza que essa ainda
80
seja a realidade dos nossos cursos e principalmente dos licenciados que neles se
formaram. A lacuna na formação dos professores de Matemática sobre Educação
Estatística nos dá pistas sobre como esses conceitos estão sendo desenvolvidos em
sala de aula. Conforme exposto anteriormente, a natureza da Estatística difere da
Matemática no que diz respeito ao raciocínio envolvido e o fato dos cursos de
formação inicial não tratarem dessas especificidades nos leva a sugerir que a
competência estatística na perspectiva atual não está sendo cuidada na Educação
Básica de nosso país. Sheaffer (2000) compartilha essa preocupação em relação
aos professores de seu país ao afirmar que a Estatística tem sido ensinada mais
como um conjunto de técnicas do que como um processo de pensamento sobre o
mundo, restringindo-se a métodos mecânicos ao invés de ampliar metodologias,
optando por especificar fórmulas ao invés de buscar formulações.
Diante do exposto, a formação inicial daqueles que ensinam Estatística
nas nossas escolas, seja no Ensino Fundamental ou no Ensino Médio, no geral,
possivelmente não aborda explicitamente questões relativas à instrução dos
conceitos estatísticos e, consequentemente, à busca pela competência estatística de
nossos estudantes.
3.2.2. O que se espera dos professores que ensinam Estatística
A busca pelo desenvolvimento da competência estatística dos estudantes
pressupõe uma proposta de ensino cuidadosa em relação às escolhas
metodológicas uma vez que entende-se que as habilidades não se dão por meio da
instrução direta de fatos e conteúdos. Um ensino pautado nas discussões atuais
sobre Educação Estatística precisa enfatizar práticas que visem o desenvolvimento
da literacia, do pensamento e do raciocínio estatísticos.
Hogg (1991) escreveu um editorial em uma revista de Estatística
americana em 1991 intitulado “Educação estatística: melhorias são muito
necessárias”41 em que aponta pistas para a formação para habilidades e
competências:
O curso deveria focar no processo de aprender como elaborar questões
apropriadas, como coletar dados efetivamente, como sumarizar e interpretar essa
informação e como entender as limitações da inferência estatística. [...] Ao invés de
41
“Statistical education: improvements are badly needed”
81
de pedir que os estudantes trabalhem em dados “velhos”, mesmo que reais, não
seria melhor pedir que eles encontrassem ou gerassem seus próprios dados?
Projetos dão experiência aos estudantes em formular questões, definir problemas,
formular hipóteses e definições operacionais, desenhar experimentos e pesquisas,
coletar dados, analisar dados, comunicar resultados, e planejar experimentos de
acompanhamento sugeridos pelos resultados (HOGG, 1991, p.342, tradução
nossa42)
A proposição de investigações estatísticas em sala de aula sugere que o
aluno aprende e se desenvolve enquanto faz. A lógica do ensino tradicional de
Matemática de primeiro ensinar a técnica para depois aplicá-la em uma situação-
problema é invertida. A intencionalidade de cada etapa do processo deve se fazer
presente, permitindo desenvolver desde o início o pensamento estatístico, a partir do
qual se revelará o raciocínio estatístico que exigirá na etapa da comunicação a
literacia estatística.
Em 2007 a ASA endossou a publicação de um guia para auxiliar os
professores a ensinar e avaliar Estatística escrito por especialistas da área. O
GAISE (Guidelines for assessment and instruction in statistics education) apresentou
o seguinte pressuposto:
Todo estudante do colegial (Ensino Médio) deve ser capaz de usar o raciocínio estatístico para lidar inteligentemente com requisitos de cidadania, emprego, e família e estar preparado para uma vida saudável, feliz e produtiva. (FRANKLIN, et al. ;2007; p.1; tradução nossa43)
Os autores do GAISE evidenciam a relevância do conhecimento
estatístico para questões relacionadas às escolhas pessoais, ambientes de trabalho
e profissionais, ao desenvolvimento da cidadania e da Ciência. Após a
apresentação de alguns pressupostos relacionados a discussões da Educação
Estatística, como o desenvolvimento da literacia estatística, o documento apresenta
42
The course should focus on them process of learning how to ask appropriate questions, how to collect data effectively, how to summarize and interpret that information, and how to understand the limitations of statistical inference [...] Instead of asking stidents to work on “old” data, even though real, is it not better to have them find or generate theis own data? Projects give students experience in asking questions, defining problems, formulating hypotheses and operational definitions, designing experiments and surveys, collecting data, analysing data, communicating findings, and planning “follow-up” experiments suggested by the findings. 43
Every high-school graduate should be able to use sound statistical reasoning to intelligently cope with the requirements of citizenship, employment, and family and to be prepared for a healthy, happy, and productive life.
82
uma série de sugestões de explorações baseadas em resolução de problemas
coerentes com o currículo proposto pelo NCTM e que possibilitam o
desenvolvimento de “[...] competências obrigatórias para prosperar no mundo
moderno” (FRANKLIN, et. al.; 2007; p. 4; tradução nossa44).
Em 2008, Garfield e Ben-Zvi se dedicam a descrever como criar um
“Ambiente de Aprendizagem de Raciocínio Estatístico (SRLE)45” que para os autores
se traduz em aulas efetivas e positivas que propiciam ao aluno o desenvolvimento
de um entendimento de Estatística aprofundado e significativo, que o ajude a
desenvolver suas habilidades de pensar e raciocinar estatisticamente. O termo
“ambiente de aprendizagem” foi escolhido pelos pesquisadores para enfatizar que
estão envolvidos aspectos que vão além de livros, atividades ou tarefas que
fornecemos aos alunos. O SRLE se dá na combinação de textos, atividades em
classe, cultura, discussão, tecnologia, abordagem de ensino e avaliação.
O modelo subjacente a esse ambiente proposto por Garfield e Ben-Zvi
está baseado em seis princípios, consoantes com as orientações apresentadas
pelos documentos oficiais que tratam da Educação Estatística, quais sejam:
1. Foco no desenvolvimento das ideias centrais mais do que apresentar conjunto de ferramentas e procedimentos. 2. Uso de conjuntos de dados reais e motivadores para engajar os estudantes em fazer e testar conjecturas. 3. Uso de atividades em classe que dêem suporte ao desenvolvimento do raciocínio dos alunos. 4. Integração do uso de ferramentas tecnológicas apropriadas que permitam ao estudante testar suas conjecturas, explorar e analisar dados, e desenvolver seu raciocínio estatístico. 5. Promoção de discussões em sala que incluam argumentos estatístico e trocas sustentadas que foquem ideias estatísticas significativos. 6. Uso de avaliação para aprender o que os alunos sabem e monitorar tanto o desenvolvimento da aprendizagem estatística quanto avaliar os planos e progressos instrucionais. (GARFIELD e BEN-ZVI, 2008, p. 48, tradução nossa46)
44
[...] can promote the ‘must-have’ competencies for graduates to ‘thrive in the modern world.’ 45
“Statistical Reasoning Learning Environment (SRLE)” 46
1. Focuses on developing central statistical ideas rather than on presenting set of tools and procedures. 2. Uses real and motivating data sets to engage students in making and testing conjectures. 3. Uses classroom activities to support the development of students’ reasoning. 4. Integrates the use of appropriate technological tools that allow students to test their conjectures, explore and analyze data, and develop their statistical reasoning. 5. Promotes classroom discourse that includes statistical arguments and sustained exchanges that focus on significant statistical ideas. 6. Uses assessment to learn what
83
Para que o ambiente de aprendizagem descrito por Garfield e Ben-Zvi
ocorra, é necessário deixar de lado o modelo ensinar é informar e aprender é
lembrar (GARFIELD e BEN-ZVI, 2008, p. 48, tradução nossa47) no qual o professor
informa fatos e procedimentos que os alunos “recebem” e “devolvem” nos momentos
de avaliação. Espera-se que os professores assumam uma postura
problematizadora, cuidem do planejamento das propostas e da qualidade das
intervenções no decorrer das aulas visando o desenvolvimento da competência
estatística dos alunos.
3.3. PRESSUPOSTOS TEÓRICOS E METODOLÓGICOS DA EDUCAÇÃO ESTATÍSTICA NOS
DOCUMENTOS OFICIAIS DO BRASIL
Na Educação Básica do Brasil, a Estatística não se constitui como uma
disciplina independente, seus conteúdos fazem parte do currículo de Matemática
dos Ensinos Fundamental e Médio.
Por currículo entendemos um projeto do que se deseja ensinar, que
cultura e educação, no qual se deve observar não apenas objetivos relacionados
com conteúdos de matérias escolares, mas também ideologias e filosofias sobre a
Educação que se espera oferecer. (SACRISTÁN, 1998).
Gimeno Sacristán, didata espanhol, especialista na área de cultura e
educação, afirma que há diferentes instâncias de um currículo: administrativa,
escolar, docente e dos materiais didáticos. O pesquisador ressalta que algumas
vezes é possível observar contradições entre as metas de cada instância e que é no
equilíbrio dessas instâncias que o ensino vai se definindo na prática.
A instância administrativa é a que nos interessa no momento. O currículo
apresenta dimensões ou aspectos estruturais como a divisão do tempo e a
delimitação e organização dos conteúdos. Entretanto, para Sacristán (1998), no
âmbito administrativo a finalidade do currículo precisa ir além
Planejar o currículo nesse nível consiste em selecionar opções de cultura
básica para os cidadãos, daí que se requer esclarecer quais os critérios culturais,
intelectuais, sociais, econômicos e profissionais justificam essas opções, assim
students know and to monitor the development of their statistical learning as well as to evaluate instructional plans and progress. 47
“teaching is telling and learning is remembering”
84
como derivar as consequências e medidas oportunas das decisões tomadas para
torná-las fáceis na prática. (SACRISTÁN, 1998, p. 233).
Todas as decisões que embasam a forma com que a cultura curricular é
apresentada no sistema educativo compõem o currículo, pois condicionam e
orientam os processos de ensino-aprendizagem. Por entender que o currículo é uma
seleção cultural a partir de diversos campos, que reflete uma filosofia educativa
coerente com as funções da educação geral, explicitando a formação cidadã que se
busca, julgamos ser importante analisar os Parâmetros Curriculares Nacionais na
tentativa de identificar sua concepção sobre a formação da competência estatística.
3.3.1. O contexto dos PCNEM
Em 1996 a nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) –
Lei nº 9.394 – determina que o Ensino Médio integra a Educação Básica, e como tal,
passa a ser direito de todo cidadão brasileiro. Até então, o Ensino Médio, antigo 2º
grau, tinha como função preparar os estudantes para prosseguir nos estudos ou
habilitá-los para o exercício de uma profissão técnica (Lei nº 5.672 de 1971). A partir
da LDB o Ensino Médio assume um status de etapa final da escolaridade básica e
passa a oferecer uma educação equilibrada com um fim em si mesmo, buscando:
a formação da pessoa, de maneira a desenvolver valores e competências necessárias à integração de seu projeto individual ao projeto da sociedade em que se situa;
o aprimoramento do educando como pessoa humana, incluindo a formação ética e o desenvolvimento da autonomia intelectual e do pensamento crítico;
a preparação e orientação básica para a sua integração ao mundo do trabalho, com as competências que garantam seu aprimoramento profissional e permitam acompanhar as mudanças que caracterizam a produção no nosso tempo;
o desenvolvimento das competências para continuar aprendendo, de forma autônoma e crítica, em níveis mais complexos de estudos.
(BRASIL, 2000, p. 10)
A LDB busca a formação para a construção de competências básicas que
permitam que, ao final do Ensino Médio, o estudante seja capaz de produzir
conhecimento, participar do mundo de trabalho e se desenvolver como cidadão.
Nota-se, portanto, uma mudança acentuada na finalidade do ensino nesse segmento
que revela a necessidade de uma adequação das escolas, culminando em uma
reforma curricular. Em 2000 surgem, nesse contexto, os Parâmetros Curriculares
Nacionais do Ensino Médio (PCNEM), que se propõem a ser:
85
Uma proposta nacional de organização curricular [...] considerando a realidade federativa e diversa do Brasil, há que ser flexível, expressa em nível de generalidade capaz de abarcar propostas pedagógicas diversificadas, mas também com certo grau de precisão, capaz de sinalizar ao País as competências que se quer alcançar nos alunos do Ensino Médio, deixando grande margem de flexibilidade quanto aos conteúdos e métodos de ensino que melhor potencializem esses resultados. (BRASIL, 2000, p. 91)
Podemos dizer, portanto, que os PCNEM não podem ser definidos como
um currículo proposto, que apesar de não ser obrigatório pressupõe alterações e
adaptações de acordo com a realidade de cada rede de ensino ou escola. No
documento não encontramos uma lista de conteúdos a serem trabalhados, mas sim
o sentido de aprendizagem de cada disciplina, as competências, habilidades, valores
e atitudes que precisam ser desenvolvido e sua relação com a cidadania.
Os PCNEM organizam o Ensino Médio em três áreas ligadas entre si
pelos objetos de estudo que compartilham: Linguagens, Códigos e suas
Tecnologias; Ciências Humanas e suas Tecnologias; e Ciências da Natureza,
Matemática e suas Tecnologias. O documento aponta que as três áreas, respeitadas
suas especificidades, devem convergir para o desenvolvimento de três grandes
competências:
(a) Representação e comunicação: desenvolver a capacidade de
comunicação;
(b) Investigação e compreensão: desenvolver a capacidade de questionar
processos naturais e tecnológicos, identificando regularidade,
apresentando interpretações e prevendo evoluções;
(c) Contextualização sócio-cultural: compreender e utilizar a ciência, como
elemento de interpretação e intervenção, e a tecnologia como
conhecimento sistemático de sentido prático.
(BRASIL, 2000)
Espera-se, portanto, que os estudantes sejam capazes de elaborar
pensamentos mais abstratos e complexos do que faziam no Ensino Fundamental. O
papel da Matemática nesse processo formativo é contribuir para o desenvolvimento
de habilidades e competências que permitam ao aluno resolver problemas, tomar
decisões, fazer inferências, criar, aperfeiçoar conceitos e valores com base nos
conhecimentos matemáticos que possuem. Diante do exposto, a Matemática no
86
Ensino Médio deve ir muito além de reproduzir técnicas e resultados da Ciência para
que cada aluno desenvolva o saber fazer e pensar matematicamente.
Em 2002, de forma complementar aos PCNEM, foram publicadas as
“Orientações Educacionais Complementares aos Parâmetros Curriculares
Nacionais”, conhecidas popularmente como PCN+. Esse novo documento tem como
objetivo encaminhar um ensino compatível com as novas pretensões educativas e
ampliar as orientações contidas nos PCNEM (BRASIL, 2002, p. 12) por meio da
definição de conteúdos e discussões metodológicas específicas de cada disciplina.
A análise integrada dos dois documentos oficiais brasileiros sobre o Ensino Médio
permite que entendamos o que se espera do ensino de Estatística para esse nível
de escolaridade em nosso país.
3.2.2. O ensino de Estatística dos documentos oficiais
Como já vimos, a Matemática do Ensino Médio está organizada em três
eixos estruturadores: Álgebra, Números e Funções; Geometria e Medidas e Análise
de Dados. A Estatística, tema de estudo do presente trabalho, está inserida no eixo
Análise de Dados e seu ensino é justificado pelo seu caráter utilitário, como
podemos ver a seguir:
As habilidades de descrever e analisar um grande número de dados, realizar inferências e fazer predições com base numa amostra de população, aplicar as ideias de probabilidade e combinatória a fenômenos naturais e do cotidiano são aplicações da Matemática em questões do mundo real que tiveram um crescimento muito grande e se tornaram bastante complexas. Técnicas e raciocínios estatísticos e probabilísticos são, sem dúvida, instrumentos tanto das Ciências da Natureza quanto das Ciências Humanas. [...] Os conceitos matemáticos que dizem respeito a conjuntos finitos de dados ganham também papel de destaque para as Ciências Humanas e para o cidadão comum, que se vê imerso numa enorme quantidade de informações de natureza estatística ou probabilística. (BRASIL, 2000, p. 44-45)
Apesar de o documento fundamentar a inserção da Estatística no Ensino
Médio a partir do seu viés instrumental, percebemos em outros trechos a
preocupação com o desenvolvimento de valores e atitudes relacionadas à
aprendizagem Matemática inerentes ao desenvolvimento da competência estatística,
dentre as quais destacamos: iniciativa na busca de informações, confiança em suas
formas de pensar e fundamentação de ideias e argumentações para comunicar-se.
Os PCNEM destacam, em um dado momento, as competências e
habilidades básicas de representação, comunicação, investigação, compreensão e
87
contextualização sócio-cultural. Não temos por intenção aprofundar a discussão
sobre essas habilidades, entretanto, é preciso ressaltar a relação entre elas e a
competência estatística.
Dentre as habilidades relacionadas à representação e comunicação,
espera-se que os alunos sejam capazes de ler e interpretar e utilizar textos e
representações matemáticas, fazendo uso da linguagem simbólica e da terminologia
correta, utilizar adequadamente os recursos tecnológicos como instrumentos de
produção e de comunicação. Do ponto de vista da competência estatística, podemos
dizer que essas habilidades estão relacionadas à literacia estatística.
Em relação à competência de investigar e compreender, almeja-se que os
alunos saibam identificar o problema, procurar e selecionar informações relevantes,
formular hipóteses e prever resultados, elaborar estratégias de resolução, interpretar
e criticar resultados, e discutir ideias a partir de argumentos convincentes. Esse
conjunto de habilidades se revelam no raciocínio estatístico, apesar de não serem
suficientes para explicá-los totalmente na visão da Educação Estatística.
Por fim, os PCNEM elencam as habilidades matemáticas relacionadas à
contextualização sócio-cultural, dentre as quais destacamos: desenvolver a
capacidade de utilizar a Matemática na interpretação e intervenção no real e aplicar
conhecimentos e métodos matemáticos em situações reais. Acreditamos que o
desenvolvimento do pensamento estatístico está associado a esse grupo de
habilidades gerais, ainda que essas se apresente de modo não específico a esse
tema.
O PCN+, na tentativa de auxiliar os professores na busca por um ensino
que desenvolva a competência matemática, aprofunda a discussão sobre o que está
envolvido no eixo Análise de Dados e, para isso, o divide em três eixos temáticos,
quais sejam:
1. Estatística, cujos objetos de estudo são a descrição de dados,
representações gráficas, análise de dados, medidas de tendência centrais
e de dispersão.
2. Contagem, que abarca o princípio multiplicativo e o raciocínio
combinatório em situações envolvendo grande quantidade de dados ou
eventos.
88
3. Probabilidade, que pressupõe o reconhecimento do caráter aleatório
de fenômenos e eventos naturais e a medição da incerteza envolvendo o
pensamento probabilístico.
O PCN+, documento responsável por essa organização, sugere que os
três eixos estruturantes da Matemática (Álgebra, Geometria e Medidas, e Análise de
Dados) sejam desenvolvidos de forma concomitante nas três séries do Ensino Médio
por acreditar que em cada uma deve haver um projeto de formação dos alunos. A
recomendação é que na primeira série os temas de cada eixo sejam tratados numa
visão contextualizada na qual os alunos possam utilizar ideias e procedimentos
básicos em situações simples. Na série seguinte, cada tema seria tratado do ponto
de vista da Ciência, com suas formas características de pensar e modelar fatos e
fenômenos. Já na última série, propõe-se ampliar as aprendizagens das séries
anteriores com temas mais abrangentes que permitam ao aluno usar o pensamento
matemático para analisar e intervir na realidade. Em relação ao eixo Análise de
Dados, o documento propõe divisão nas séries de acordo com o quadro 3:
Quadro 3: Organização do eixo Análise de Dados nas séries
1ª série Estatística: descrição de dados, representações gráficas.
22ª série
Estatística: análise de dados; Contagem
33ª série
Probabilidade
Fonte: BRASIL, 2002
Infelizmente, em nossa vivência na área temos nos deparado com uma
fragmentação no ensino que costuma ser organizado em blocos. O mais comum,
inclusive, é encontrar escolas nos quais o trabalho com o estudo de Probabilidade
está todo concentrado na 2ª série e da Estatística na 3ª série.
Analisando o texto do PCN+, que se detém a descrever cada um dos
eixos estruturantes, podemos afirmar que o ensino da Estatística no Ensino Médio
brasileiro busca desenvolver a literacia estatística, ainda que não trate dessa
competência explicitamente. Destacamos um trecho do texto que sugere essa meta:
A Matemática do ensino médio pode ser determinante para a leitura das
informações que circulam na mídia e em outras áreas do conhecimento na forma de
tabelas, gráficos e informações de caráter estatístico. Contudo, espera-se do aluno
nessa fase da escolaridade que ultrapasse a leitura de informações e reflita mais
89
criticamente sobre seus significados. Assim, o tema proposto deve ir além da
simples descrição e representação de dados, atingindo a investigação sobre esses
dados e a tomada de decisões. (BRASIL, 2002, p. 126)
Apesar do texto dos documentos oficiais revelar um cuidado com a
competência estatística, mesmo que de modo tácito, podemos afirmar que não há
uma preocupação manifesta para além da literacia estatística, que permita ao
estudante desenvolver o raciocínio e o pensamento estatísticos.
Tania Campos, Cláudia Silva e Irene Cazorla apresentaram no ICMI/IASE
de 2008 uma pesquisa na qual analisam o PCN em relação à literacia estatística e
concluíram que apesar de haver uma forte tendência em direção à exploração
gráfica, não há no documento orientações pedagógicas que tornam possível ao
professor trabalhar o raciocínio sobre a melhor forma de representação de acordo
com a natureza dos dados. As pesquisadoras afirmam que isso tem tido como
consequência o trabalho restrito nas escolas com a construção de gráficos de barras
simples ou de setores, dando à leitura e interpretação um nível muito simples de
literacia estatística, apesar de reconhecer no texto dos PCNs a intencionalidade de
ensinar estatística para a cidadania. As pesquisadoras apontaram ainda a falta de
alguns conceitos importantes ao pensamento estatístico como amostra, estimativa e
aleatoriedade; discorrer sobre pesquisa estatística e sua relação com pesquisas
científicas e sobre a importância dos professores discutirem com os alunos falácias
em dados estatísticos apresentados na mídia.
3.3.3. As metodologias sugerida pelos documentos oficiais
Como estratégias para a ação do professor, o PCNEM e o PCN+
propõem como perspectiva metodológica a resolução de problemas e a define como
uma postura de investigação frente a qualquer situação ou fato que possa ser
questionado (BRASIL, 2002, p. 129). Antes de aprofundar a relação entre a
metodologia indicada e o ensino da Estatística, faz-se necessário explicitar a
concepção de resolução de problemas dos documentos.
Publicações relacionadas à história da Matemática revelam que essa
Ciência se desenvolveu a partir da resolução de problemas com os quais nos
deparávamos e precisávamos solucionar. Resumidamente, conceitos e sistemas
axiomáticos foram sendo elaborados à medida que era necessário compreender e
explicar situações, esse novo conhecimento culminava em novas proposições que
90
faziam a Ciência avançar. Apesar da relação intrínseca entre a evolução da
Matemática e a resolução de problemas, a metodologia da resolução de problemas
no ensino da disciplina de Matemática não está diretamente associada ao processo
histórico vivido pela Ciência.
Nas aulas de Matemática, a resolução de problemas tem apresentado
diferentes funções de acordo com a concepção que se tem de Matemática, de
ensino e de aprendizagem. Nicholas Branca (1997), da Universidade Estadual de
San Diego, na Califórnia, afirma que a resolução de problemas é uma expressão
abrangente que pode apresentar três interpretações bastantes diferentes
relacionadas ao ensino, resumidas a seguir:
1. como meta: quando a resolução de problemas é considerada a razão
principal para estudar matemática;
2. como um processo: o foco está em métodos e procedimentos
necessários para enfrentar uma situação que confronta o indivíduo;
3. como uma habilidade básica: busca pelo desenvolvimento de uma
capacidade de resolver problemas que integra a competência
matemática.
As diferentes concepções de resolução de problemas revelam práticas
diferentes em sala de aula. Ao enxergarmos a resolução de problemas como meta,
os conteúdos e procedimentos precisam ser ensinados antes para que
posteriormente os alunos possam aplicá-los na busca de soluções. Ao concebermos
a resolução de problemas como processo, a intenção é ensinar aos alunos etapas
bem definidas que os levem à solução. Compreender a resolução de problemas
como uma habilidade básica inclui enxergar como meta da aprendizagem
desenvolver a capacidade de identificar, definir e representar o problema, construir
estratégias, organizar informações relevantes para a resolução, alocar recursos,
avaliar suas escolhas e analisar os resultados, evidenciando uma visão mais
construtivista do ensino.
O PCN+ revela a interpretação da resolução de problemas como uma
habilidade básica, ao enunciar que:
A resolução de problemas é peça central para o ensino de Matemática, pois o pensar e o fazer se mobilizam e se desenvolvem quando o indivíduo está engajado ativamente no enfrentamento de desafios. Essa competência não se desenvolve quando propomos apenas exercícios de aplicação dos conceitos e técnicas matemáticos, pois, neste caso, o que está em ação é uma simples
91
transposição analógica: o aluno busca na memória um exercício semelhante e desenvolve passos análogos aos daquela situação, o que não garante que seja capaz de utilizar seus conhecimentos em situações diferentes ou mais complexas. (BRASIL, 2002, p. 112)
Isso posto, podemos afirmar que o desenvolvimento da habilidade de
resolver problemas é uma das metas sugeridas pelos documentos oficiais. É preciso
ressaltar, entretanto, que tanto o PCN quanto o PCN+ enxergam a resolução de
problemas também como uma metodologia de ensino ao sugerirem que o professor
selecione atividades desafiadoras que permitam o engajamento dos alunos no
processo de aprender e assumam uma postura de problematizar e de permitir que
os alunos pensem por si mesmos.
De acordo com os documentos, o ensino de Estatística, assim como de
outros temas da Matemática, também deve ser realizado por meio da resolução de
problemas. Lopes, em sua dissertação de mestrado, já havia anunciado essa
sugestão:
A metodologia da resolução de problemas torna-se muito recomendada para o trabalho com Estatística, por torná-lo mais significativo. Ao se estabelecer uma questão de investigação, é preciso optar por estratégias que levem a respondê-la. É necessário organizar, representar e analisar os dados a partir do problema. Inseridos nesse processo de aprendizagem, os estudantes provavelmente terão maiores possibilidades de desenvolvimento do pensamento crítico. (LOPES, 1998, p.10)
Em uma investigação estatística é necessário elaborar conjecturas,
buscar regularidades, generalização de padrões, ser capaz de argumentar, dentre
outras ações que estão intimamente relacionadas à habilidade de resolver
problemas. Em sua tese de doutorado Lopes (2003) evidenciou o processo de
tratamento de dados como um processo investigativo
Primeiro, precisa-se definir a questão ou a temática - é necessário se ter clareza do que se deseja pesquisar. Em seguida, obtém-se a busca pelo tipo de instrumento de coleta mais adequado para se adquirir as informações sobre a problemática. Depois, segue-se a forma mais adequada de se processar, representar e comunicar os dados, podendo então passar à sua interpretação, que exigirá reflexão sobre quanto o processo foi eficiente na resolução do problema, apresentando respostas relevantes. A próxima etapa [...] trata do momento de exercício da criticidade, a partir das interpretações de relações que podemos estabelecer entre a questão de investigação e os resultados que permitem levar a deduções e/ou tomadas de decisão. (LOPES, 2003, p. 86-87)
92
Concordamos com Lopes ao assumir que a resolução de problemas como
habilidade deve ser o princípio norteador do ensino de Estatística e valorizamos a
tentativa dos documentos oficiais em evidenciar essa metodologia para a
Matemática. Entretanto, essa realidade ainda é distante das salas de aula do Ensino
Médio que preconizam o ensino de fórmulas e modelos estatísticos em detrimento
do desenvolvimento de habilidades.
O PCNEM e o PCN+ estão alinhados com os pressupostos teóricos atuais
da Educação Estatística, entretanto, o fato de não terem por intenção orientar as
práticas pedagógicas dos professores nos permite inferir que apesar da grande
ascendência nas pesquisas em Educação, os documentos influenciaram muito
superficialmente as aulas de Estatística na Educação Básica.
3.4. A ESTATÍSTICA NO ENEM
O Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) foi idealizado pelo Instituto
Nacional de Pesquisas e Estudos Educacionais (INEP), autarquia do Ministério da
Educação (MEC) com o objetivo de avaliar o desempenho dos alunos concluintes e
egressos do Ensino Médio. Desde a sua criação o ENEM focaliza as competências e
habilidades básicas desenvolvidas, transformadas e fortalecidas com a mediação da
escola (BRASIL, 2005). A justificativa para a elaboração do ENEM foi a consolidação
de um modelo de avaliação individual, de caráter voluntário, que possibilitasse uma
auto-avaliação do estudante. A primeira aplicação do ENEM aconteceu em 1998.
O ENEM se apresentou como um instrumento de avaliação coerente com
os pressupostos teóricos dos PCN, é possível observar semelhanças entre a matriz
de competências e habilidades do ENEM e dos Parâmetros.
Por competências o ENEM entende as modalidades estruturais da
inteligência, ou melhor, ações e operações que utilizamos para estabelecer relações
com e entre situações, fenômenos e pessoas que desejamos conhecer. (BRASIL,
2000). Para avaliar o candidato, foi definida uma matriz composta de 5 grandes
competências esperadas de um cidadão que tivesse concluído o Ensino Médio:
Competência l - Dominar a norma culta da Língua Portuguesa e fazer
uso das linguagens matemática, artística e científica.
Competência ll - Construir e aplicar conceitos das várias áreas do
conhecimento para a compreensão de fenômenos naturais, de
93
processos históricos-geográficos, da produção tecnológica e das
manifestações artísticas.
Competência III - Selecionar, organizar, relacionar, interpretar dados e
informações representados de diferentes formas, para tomar decisões
e enfrentar situações-problema.
Competência IV - Relacionar informações, representadas em
diferentes formas, e conhecimentos disponíveis em situações
concretas, para construir argumentação consistente.
Competência V - Recorrer aos conhecimentos desenvolvidos na
escola para elaboração de propostas de intervenção solidária na
realidade, respeitando os valores humanos e considerando a
diversidade sociocultural.
Cada uma dessas competências se traduz por meio da combinação de
um conjunto de 21 habilidades aplicadas às áreas de conhecimento (ANEXO A). Por
trás da ideia de um exame individual, o MEC tinha por intenção avaliar se a
Educação Básica cumpriu seu papel de proporcionar ao aluno o acesso aos saberes
culturais expressos por meio das disciplinas escolares e o desenvolvimento de
habilidades e competências que tornem os saberes significativo. Portanto, as
habilidades elencadas são avaliadas no ENEM por meio de situações problema,
situações diversas em relação às quais necessitamos assumir posições e tomar
decisões que nos ajudem a resolvê-las e superá-las (BRASIL, 2002, p. 36).
Pressupõe-se que para resolver uma situação-problema o sujeito precisa mobilizar
conhecimentos prévios a novas ideias e contextos, revelando suas habilidades e
competências. Na sua primeira versão, que perdurou até 2008, a prova era
composta de três questões de múltipla escolha para cada uma das 21 habilidades,
totalizando 63 questões. As questões tinham o mesmo valor e o total de pontos era
colocado em uma escala de 0 a 100. A avaliação era composta de dois resultados,
um correspondente à parte objetiva e outra à redação.
Elencamos a seguir as principais disposições legais referente ao ENEM
durante os dez primeiros anos do exame que evidenciam seu percurso até a
mudança de formato, que ocorreu em 2009.
Portaria MEC nº 438, de 28/05/1998 – institui o Exame Nacional do
Ensino Médio – ENEM, como procedimento de avaliação do
desempenho do aluno.
94
Portaria MEC nº 318 de 22/02/2001 – dispõe sobre as competências
avaliadas na redação do ENEM.
Portaria MEC nº 391 de 07/02/2002 – regulamenta os processos
seletivos para ingresso nas Instituições Públicas e Privadas
pertencentes ao Sistema de Ensino Superior exigindo que todos os
alunos sejam submetidos a uma avaliação envolvendo a escrita de
uma redação em língua portuguesa de caráter eliminatório; dispõe da
possibilidade do resultado obtido pelo candidato na redação do ENEM
ser considerado para fins de dar cumprimento ao disposto.
Vale ressaltar ainda que a concessão de isenção na taxa de inscrição
para vários alunos a partir de 2001, dentre eles aqueles oriundos de escola pública e
a crescente utilização das notas do ENEM como parte do processo seletivo de
Universidades privadas e públicas resultou em um aumento substancial do número
de candidatos. Em 1998 cerca de 160 mil candidatos realizaram o exame; em 2001
o número já era maior que 1 milhão e 600 mil. Em 2004 foi instituído o do Programa
Universidade para Todos (PROUNI), programa do MEC para a concessão de bolsas
de estudo integrais ou parciais em cursos de nível superior em instituições privadas
de ensino tendo o ENEM como um dos critérios para seleção dos alunos. Com isso,
foi observado outro aumento considerável no número de candidatos, passando de 1
milhão e meio em 2004 para 3 milhões no ano seguinte.
Em 2009 um novo modelo de avaliação foi instituído na intenção de
unificar o processo de seleção das instituições federais de nível superior. Além
disso, os resultados do ENEM passaram a compor a avaliação dos cursos de
graduação como uma “nota de entrada” e parte dos critérios de seleção a programas
governamentais. A portaria MEC nº 109 publicada em 27/05/2009 substitui as
anteriores e descreveu como o ENEM como um procedimento de avaliação do
desempenho escolar e acadêmico dos participantes, para aferir o desenvolvimento
das competências e habilidades fundamentais ao exercício da cidadania. Os
objetivos do exame foram ampliados:
I - oferecer uma referência para que cada cidadão possa proceder à sua
auto-avaliação com vistas às suas escolhas futuras, tanto em relação ao
mundo do trabalho quanto em relação à continuidade de estudos;
95
II - estruturar uma avaliação ao final da educação básica que sirva como
modalidade alternativa ou complementar aos processos de seleção nos
diferentes setores do mundo do trabalho;
III - estruturar uma avaliação ao final da educação básica que sirva como
modalidade alternativa ou complementar aos exames de acesso aos
cursos profissionalizantes, pós-médios e à Educação Superior;
IV - possibilitar a participação e criar condições de acesso a programas
governamentais;
V - promover a certificação de jovens e adultos no nível de conclusão do
ensino médio nos termos do artigo 38, §§ 1o- e 2o- da Lei no- 9.394/96 -
Lei das Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB);
VI - promover avaliação do desempenho acadêmico das escolas de
ensino médio, de forma que cada unidade escolar receba o resultado
global;
VII - promover avaliação do desempenho acadêmico dos estudantes
ingressantes nas Instituições de Educação Superior.
Podemos observar, portanto, uma ampliação para além da auto-avaliação
prevista na primeira versão do exame. Ressaltamos ainda a explicitação da intenção
de avaliar cada instituição de ensino cujos alunos se submeterem ao exame, o que
resultou em um interesse maior da sociedade como um todo aos resultados do
ENEM.
O formato das provas e a análise dos resultados foram substancialmente
alteradas, o ENEM passou a ser composto por uma redação e 4 provas por área de
conhecimento, quais sejam:
I – Linguagens, Códigos e suas Tecnologias e Redação, que compreende
os componentes curriculares de Língua Portuguesa, Língua Estrangeira
Moderna, Artes e Educação Física;
II – Matemática e suas Tecnologias;
III – Ciências Humanas e suas Tecnologias, que compreende os
seguintes componentes curriculares de História, Geografia, Filosofia e
Sociologia;
IV – Ciências da Natureza e suas Tecnologias, que compreende os
componentes curriculares de Química, Física e Biologia.
96
Cada prova contém 45 questões objetivas de múltipla escolha e está
estruturada a partir de uma nova matriz de referência composta de 5 eixos
cognitivos comuns a todas as áreas de conhecimento: dominar linguagens;
compreender fenômenos; enfrentar situações-problema; construir argumentação; e
elaborar propostas. Podemos observar uma ligeira semelhança entre os eixos
cognitivos descritos na matriz de referência de 2009 (ANEXO B) e as competências
elencadas na matriz de referência de 1998. Entretanto, uma mudança significativa
em relação às habilidades foi apresentada, uma vez que cada área do conhecimento
ganhou uma matriz de referência específica na qual estão listadas suas
competências e habilidades.
A matriz de referência de Matemática e suas Tecnologias é composta de
30 habilidades divididas por 7 áreas de competência:
Competência de área 1 - Construir significados para os números
naturais, inteiros, racionais e reais.
Competência de área 2 - Utilizar o conhecimento geométrico para
realizar a leitura e a representação da realidade e agir sobre ela.
Competência de área 3 - Construir noções de grandezas e medidas
para a compreensão da realidade e a solução de problemas do
cotidiano.
Competência de área 4 - Construir noções de variação de grandezas
para a compreensão da realidade e a solução de problemas do
cotidiano.
Competência de área 5 - Modelar e resolver problemas que envolvem
variáveis socioeconômicas ou técnico-científicas, usando
representações algébricas.
Competência de área 6 - Interpretar informações de natureza científica
e social obtidas da leitura de gráficos e tabelas, realizando previsão de
tendência, extrapolação, interpolação e interpretação.
Competência de área 7 - Compreender o caráter aleatório e não-
determinístico dos fenômenos naturais e sociais e utilizar instrumentos
adequados para medidas, determinação de amostras e cálculos de
probabilidade para interpretar informações de variáveis apresentadas
em uma distribuição estatística.
97
A cada um das competências está relacionado um conjunto de
habilidades (ANEXO C). A matriz de referência apresenta ainda objetos de
conhecimento de cada área, que podem ser consultados no ANEXO D.
Podemos afirmar, portanto, que a partir de 2009 o ENEM entende a
competência matemática como sendo a integração das 7 áreas de competências
que se revelam por meio de um conjunto de 30 habilidades que podem ser
mobilizadas a partir da proposição de situações-problema envolvendo conceitos
associados aos 5 objetos do conhecimento matemático descritos.
Diante da complexidade do novo modelo de avaliação, a Teoria de
Resposta ao Item (TRI), foi adotada na formulação de cada uma das 4 provas
objetivas. Em uma nota técnica publicada em dezembro de 2011 o INEP justifica e
explica o uso dessa teoria na análise dos resultados, que possibilita calcular quatro
proficiências para cada participante. A TRI proporciona uma comparabilidade dos
resultados de exames realizados em diferentes anos, por meio de diferentes provas,
uma vez que pressupõe a existência de uma escala padrão. No ENEM, essa escala
foi estabelecida em 2009 a partir do desempenho dos alunos concluintes e tem sido
usada desde então para comparar o desempenho dos participantes. Nos valemos da
explicação da nota técnica para elucidar o método empregado:
A TRI é um conjunto de modelos que relacionam a probabilidade de um aluno apresentar uma determinada resposta a um item, com sua proficiência e características (parâmetros) do item. O modelo utilizado no ENEM é o modelo logístico de três parâmetros que, além dos parâmetros de discriminação e de dificuldade, também faz uso de um parâmetro para controlar o acerto casual. Este último parâmetro tem um papel bastante importante nas avaliações com itens de múltipla escolha, caso do ENEM. O modelo logístico da TRI parte do princípio de que quanto maior a proficiência do respondente, maior a sua probabilidade de acerto, traço latente acumulativo. O seu parâmetro de dificuldade é medido na mesma escala da proficiência, fato este que permite a comparabilidade entre resultados de diferentes testes e a construção e interpretação de escalas de proficiência [...]. Uma outra leitura para esse parâmetro, a qual nos parece mais apropriada, é dizer que ele representa a proficiência mínima que um respondente deve possuir para que sua probabilidade de acerto seja alta, ou seja, ele poderia ser chamado de “proficiência do item”. (Nota técnica, dezembro de 2011, pág. 3)
Por meio da aferição do padrão de respostas apresentadas por um
participante, a TRI associa a ele um nível de proficiência para cada área do
conhecimento. A escala utilizada pelo ENEM associa a média do desempenho dos
98
alunos concluintes de 2009 ao nível 500, e cada desvio padrão vale 100. Isso
significa que um participante cuja proficiência em Matemática e suas Tecnologias
seja 700, está a dois desvios padrões acima da média adotada na escala. A versão
do ENEM de 2009 ainda estava vigente em 2016. No início de 2017 foi realizada
uma consulta pública para verificar a necessidade de reformulação do exame que
resultou, até o presente momento, em uma alteração da distribuições das provas e
no intervalo entre os dois dias de aplicação.
3.4.1. A competência estatística no ENEM
A matriz de Referência de Matemática e suas Tecnologias do ENEM
apresenta duas competências de área associadas à Estatística.
A competência de área 6 é descrita como a capacidade do aluno
interpretar informações de natureza científica e social obtidas da leitura de gráficos e
tabelas, realizando previsão de tendência, extrapolação, interpolação e
interpretação. Podemos afirmar que existe uma aproximação dessa competência ao
conceito de literacia estatística apresentado anteriormente no capítulo 3, seção
3.1.2, uma vez que a descrição vai além da simples leitura dos dados, evidencia a
relação entre alguns conhecimentos estatísticos e as habilidades relacionadas ao
entendimento das informações estatísticas no sentido da comunicação. A essa
competência, estão associadas três habilidades apresentadas no quadro 4 pela sua
descrição, seguidas de um exemplo de item do ENEM que as abordam e por um
breve comentário.
Quadro 4 – Competência de área 6
H24 - Utilizar informações expressas em gráficos ou tabelas para fazer inferências
Exemplo:
(ENEM 2009 – simulado) A cada ano, a Amazônia Legal perde, em média, 0,5% de
suas florestas. O percentual parece pequeno, mas equivale a uma área de quase 5
mil quilômetros quadrados. Os cálculos feitos pelo Instituto do Homem e do Meio
Ambiente da Amazônia (Imazon) apontam um crescimento de 23% na taxa de
destruição da mata em junho de 2008, quando comparado ao mesmo mês do ano
2007. Aproximadamente 612 quilômetros quadrados de floresta foram cortados ou
queimados em quatro semanas. Nesse ritmo, um hectare e meio (15 mil metros
quadrados ou pouco mais de um campo de futebol) da maior floresta tropical do
99
planeta é destruído a cada minuto. A tabela abaixo mostra dados das áreas
destruídas em alguns Estados brasileiros.
Supondo a manutenção desse ritmo de desmatamento nesses Estados, o total
desmatado entre agosto de 2008 e junho de 2009, em valores aproximados, foi
(A) inferior a 5.000 km².
(B) superior a 5.000 km² e inferior a 6.000 km².
(C) superior a 6.000 km² e inferior a 7.000 km².
(D) superior a 7.000 km² e inferior a 10.000 km².
(E) superior a 10.000 km².
Alternativa correta: B
Comentário: para resolver essa questão, o participante precisa selecionar os dados
relevantes da tabela para deduzir uma tendência que extrapola a informação
presente no enunciado; o nível de complexidade é alto uma vez que a resolução
não é imediata.
H25 - Resolver problema com dados apresentados em tabelas ou gráficos
Exemplo:
(ENEM 2012) Uma pesquisa realizada por estudantes da Faculdade de Estatística
mostra, em horas por dia, como os jovens entre 12 e 18 anos gastam seu tempo,
tanto durante a semana (de segunda-feira a sexta-feira), como no fim de semana
(sábado e domingo). A seguinte tabela ilustra os resultados da pesquisa.
100
De acordo com esta pesquisa, quantas horas de seu tempo gasta um jovem entre
12 e 18 anos, na semana inteira (de segunda-feira a domingo), nas atividades
escolares?
(A) 20
(B) 21
(C) 24
(D) 25
(E) 27
Alternativa correta: E
Comentário: nessa questão envolvendo a habilidade 25 o participante precisa
selecionar os dados relevantes para responder a pergunta da situação-problema;
todos os dados necessários para a resolução estão no problema.
H26 - Analisar informações expressas em gráficos ou tabelas como recurso
para a construção de argumentos
Exemplo:
(ENEM 2009 – simulado) As condições de saúde e a qualidade de vida de uma
população humana estão diretamente relacionadas com a disponibilidade de
alimentos e a renda familiar. O gráfico I mostra dados da produção brasileira de
arroz, feijão, milho, soja e trigo e do crescimento populacional, no período
compreendido entre 1997 e 2003. O gráfico II mostra a distribuição da renda
101
familiar no Brasil, no ano de 2003.
Considere que três debatedores, discutindo as causas da fome no Brasil, chegaram
às seguintes conclusões:
Debatedor 1 – O Brasil não produz alimento suficiente para alimentar sua
102
população. Como a renda média do brasileiro é baixa, o País não consegue
importar a quantidade necessária de alimentos e isso é a causa principal da fome.
Debatedor 2 – O Brasil produz alimentos em quantidade suficiente para alimentar
toda sua população. A causa principal da fome, no Brasil, é a má distribuição de
renda.
Debatedor 3 – A exportação da produção agrícola brasileira, a partir da inserção do
País no mercado internacional, é a causa majoritária da subnutrição no País.
Considerando que são necessários, em média, 250 kg de alimentos para alimentar
uma pessoa durante um ano, os dados dos gráficos I e II, relativos ao ano de 2003,
corroboram apenas a tese do(s) debatedor(es)
(A) 1.
(B) 2.
(C) 3.
(D) 1 e 3.
(E) 2 e 3.
Alternativa correta: B
Comentário: para ser proficiente nessa habilidade os alunos precisam ser capazes
de analisar os dados e a relação entre eles de modo crítico e reflexivo; para decidir
com quais teses concordar (habilidade relacionada à argumentação) o participante
precisa analisar cada gráfico separadamente e na relação com o outro.
Fonte: INEP; os autores
A proficiência nas habilidades citadas pressupões a competência do
participante na comunicação de ideias estatísticas. Podemos afirmar que essas
habilidades são necessárias, mas não suficientes para caracterizar a competência
literacia estatística, uma vez que não há menção a habilidades relacionadas à
compreensão e ao uso do vocabulário específico. Ressalta-se, entretanto, a
valorização dada à postura crítica e reflexiva envolvida na interpretação das
informações nas habilidades dessa área de competência.
A competência de área 7 é descrita pela capacidade de Compreender o
caráter aleatório e não-determinístico dos fenômenos naturais e sociais e utilizar
instrumentos adequados para medidas, determinação de amostras e cálculos de
probabilidade para interpretar informações de variáveis apresentadas em uma
distribuição estatística. São 4 as habilidades associadas à essa competência,
apresentadas no quadro 5, seguidas de exemplos e comentários.
103
Quadro 5 – Competência de área 7
H27 - Calcular medidas de tendência central ou de dispersão de um conjunto
de dados expressos em uma tabela de frequências de dados agrupados (não
em classes) ou em gráficos
Exemplo:
(ENEM 2012) O gráfico apresenta o comportamento de emprego formal surgido,
segundo o Caged, no período de janeiro de 2010 a outubro de 2010.
Com base no gráfico, o valor da parte inteira da mediana dos empregos formais
surgidos no período é
(A) 212 952.
(B) 229 913.
(C) 240 621.
(D) 255 496.
(E) 298 041.
Alternativa correta: B
Comentário: a proficiência nessa habilidade é alcançada quando o aluno é capaz
de calcular medidas estatísticas; nessa questão os dados são apresentados em um
gráfico, o que pode ser um complicador uma vez que os alunos estão habituados a
calcular mediana de dados organizados em rol ou em tabela.
H28 - Resolver situação-problema que envolva conhecimentos de Estatística e
Probabilidade
Exemplo:
(ENEM 2009 – simulado) Em um cubo, com faces em branco, foram gravados os
números de 1 a 12, utilizando-se o seguinte procedimento: o número 1 foi gravado
na face superior do dado, em seguida o dado foi girado, no sentido anti-horário, em
torno do eixo indicado na figura abaixo, e o número 2 foi gravado na nova face
superior, seguinte, conforme o esquema abaixo.
104
O procedimento continuou até que foram gravados todos os números. Observe que
há duas faces que ficaram em branco. Ao se jogar aleatoriamente o dado
apresentado, a probabilidade de que a face sorteada tenha a soma máxima é
(A) 1
6
(B) 1
4
(C) 1
3
(D) 1
2
(E) 2
3
Alternativa correta: A
Comentário: a proficiência nessa habilidade se revela na capacidade de
compreender a situação problema de modo a resolvê-lo utilizando conceitos de
variação e incerteza.
H29 - Utilizar conhecimentos de Estatística e Probabilidade como recurso
para a construção de argumentação
Exemplo:
(ENEM 2012) A tabela a seguir mostra a evolução da receita bruta anual nos três
últimos anos de cinco microempresas (ME) que se encontram à venda.
Um investidor deseja comprar duas das empresas listadas na tabela. Para tal, ele
calcula a média da receita bruta anual dos últimos três anos (de 2009 até 2011) e
escolhe as duas empresas de maior média anual. As empresas que este investidor
escolhe comprar são
(A) Balas W e Pizzaria Y.
(B) Chocolates X e Tecelagem Z.
105
(C) Pizzaria Y e Alfinetes V.
(D) Pizzaria Y e Chocolates X.
(E) Tecelagem Z e Alfinetes V.
Alternativa correta: D
Comentário: essa habilidade pressupõe que os alunos saibam calcular e interpretar
medidas de tendência central ou de dispersão ou conceitos relacionados à
probabilidades.
H30 - Avaliar propostas de intervenção na realidade utilizando conhecimentos
de Estatística e Probabilidade
Exemplo:
(ENEM 2013) Ao final de uma competição de ciências em uma escola, restaram
apenas três candidatos. De acordo com as regras, o vencedor será o candidato que
obtiver a maior média ponderada entre as notas das provas finais nas disciplinas
química e física, considerando, respectivamente, os pesos 4 e 6 para elas. As notas
são sempre números inteiros. Por questões médicas, o candidato II ainda não fez a
prova final de química. No dia em que sua avaliação for aplicada, as notas dos
outros dois candidatos, em ambas as disciplinas, já terão sido divulgadas. O quadro
apresenta as notas obtidas pelos finalistas nas provas finais.
A menor nota que o candidato II deverá obter na prova final de química para vencer
a competição é
(A) 18.
(B) 19.
(C) 22.
(D) 25.
(E) 26.
Alternativa correta: A
Comentário: para ser proficiente nessa habilidade o participante precisa fazer
interpretações baseados nos conjuntos de dados com o foco nos processos
estatísticos, coordenando conceitos e comportamentos.
Fonte: INEP; os autores
106
A competência de área 7 está intimamente relacionada à competência
raciocínio estatístico apresentada no referencial teórico, uma vez que releva a
utilização com compreensão de diferentes etapas de uma investigação estatística. O
pensamento estatístico também se faz presente ao observarmos que o participante
precisa ser capaz de relacionar o conhecimento estatístico para aplicá-los de forma
adequada em diferentes contextos de investigação.
Podemos concluir que o ENEM, como avaliação da competência no
Ensino Médio cumpre o seu papel e apresenta pressupostos teóricos consoantes
com as perspectivas atuais da Educação Estatística. Os itens têm sido elaborados
com uma preocupação na variação das habilidades, competências e principalmente
nos níveis de complexidade do raciocínio exigido.
107
CAPÍTULO 4 – METODOLOGIA
A presente tese tem seu suporte empírico associado a duas vertentes
metodológicas distintas: a análise de um questionário aplicado a professores que
ministram aulas de Estatística na Educação Básica e a análise do desempenho dos
candidatos nas questões associadas à Estatística presentes nas provas de
Matemática do Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM).
4.1. O QUESTIONÁRIO
Para buscar compreender o que pensam sobre o ensino de Estatística,
alguns professores de Matemática do Ensino Médio responderam a um questionário
com perguntas abertas e fechadas. Esse questionário consiste de algumas
perguntas censitárias qualificadoras (variáveis sexo, idade, tempo de formação,
tempo de atuação como docente), seguidas de uma questão aberta sobre ações
didáticas para o ensino de Estatística, três perguntas com cinco itens cada para os
professores classificarem a sua importância em relação ao tema e, finalmente, um
conjunto de 30 assertivas tratando também do ensino de Estatística para as quais os
entrevistados deveriam registrar o grau de concordância apresentado em uma
escala de atitude do tipo Likert com cinco níveis (discordo, discordo parcialmente,
não discordo nem concordo, concordo parcialmente e concordo).
A metodologia de análise dos dados do questionário consistiu no uso de
medidas estatísticas de frequência para as variáveis qualificadoras da amostra,
Análise de Conteúdo para as respostas apresentadas na questão aberta, Análise
bivariada (classificação cruzada e correlação) dos itens ordenados segundo o grau
de importância e Análise Fatorial Exploratória (AFE) das perguntas apresentadas em
escala Likert.
4.1.1. O questionário Piloto
Inicialmente foi elaborado um questionário piloto (APÊNDICE A) com itens
formulados de acordo com a nossa experiência tanto como professores quanto
como formadores na área além da revisão da literatura pertinente ao tema. A
proposta do questionário apresentado como piloto é similar à adotada na versão
final, salvo o fato de termos apresentado na primeira versão três questões abertas a
fim de obtermos mais “pistas” para a elaboração do instrumento final de pesquisa.
108
O questionário piloto foi respondido por 17 professores de Matemática do
Ensino Médio que trabalhavam na Rede Estatual de São Paulo em escolas de
período integral. Os professores assinaram o Termo de Consentimento Livre e
Esclarecido (TCLE)
Com a intenção de caracterizar o perfil de professores em relação ao
ensino de Estatística, realizamos uma Análise Fatorial Exploratória (aprofundaremos
a discussão sobre esse método de análise multivariada mais a frente) nos dados
referentes à ordenação dos graus de importância de itens relacionados ao ensino e
à Escala Likert elaborada. Como resultado, obtivemos cinco fatores que permitiram a
caracterização de cinco perfis associados às concepções de professores em relação
ao ensino de Estatística. Os fatores observados a partir das questões associadas à
escala Lickert e as respostas obtidas nas questões abertas nos auxiliaram a
reformular o questionário piloto, principalmente em relação à coerência semântica
dos itens.
4.1.2. A amostra
Para investigar as práticas e crenças dos professores em relação ao
ensino de Estatística, entrevistamos 89 professores de Matemática do Ensino Médio
da rede estadual de São Paulo e Rio de Janeiro. A escolha dos sujeitos se deu a
partir da proximidade entre os mesmos e a pesquisadora, que estava realizando um
trabalho de formação continuada junto aos docentes.
Os professores no Rio de Janeiro ministravam aulas em escolas de
período integral e participavam do Programa Ensino Médio Inovador (PROEMI),
programa do MEC cujo objetivo é: apoiar e fortalecer o desenvolvimento de
propostas curriculares inovadoras nas escolas de ensino médio, ampliando o tempo
dos estudantes na escola e buscando garantir a formação integral com a inserção de
atividades que tornem o currículo mais dinâmico, atendendo também as
expectativas dos estudantes do Ensino Médio e às demandas da sociedade
contemporânea48. Em parceria com o “Instituto Ayrton Senna”, a Secretaria de
Educação do Governo do Estado de Rio de Janeiro ofereceu durante os anos de
2014 e 2015 formação continuada aos professores de várias disciplinas, dentre elas
a Matemática. Os encontros, que aconteciam bimestralmente, eram presenciais e
48
Fonte: http://portal.mec.gov.br/ensino-medio-inovador/apresentacao, acesso em 2 ago. 2017.
109
tinham a duração de 16 horas. O grupo responsável pela formação de Matemática
foi o Mathema, dirigido pelas professoras doutoras Maria Ignez Diniz e Katia Stocco
Smole, as quais também foram responsáveis pela elaboração dos materiais
didáticos utilizados em sala de aula e as orientações metodológicas para os
professores.
Os professores de São Paulo também lecionavam em escolas estaduais
de Ensino Médio em período integral e participavam de uma ação de formação
continuada organizada pela associação “Parceiros da Educação”, uma entidade sem
fins lucrativos que promove parcerias entre empresas, empresários e organizações
da sociedade civil com escolas públicas. A formação desses professores, também
coordenada pelo grupo Mathema, acontece desde o ano de 2014 é presencial e
mensal, totalizando cerca de 44 horas anualmente.
Após a explicação da pesquisa e a assinatura dos termos de
consentimento, os professores responderam aos questionários individualmente na
presença da pesquisadora. Não foram registrados problemas de qualquer natureza
no momento da aplicação do instrumento.
4.1.3. A estrutura do questionário e métodos da análise dos dados
A seguir, descreveremos minuciosamente a estrutura do instrumento de
pesquisa na sua versão final (APÊNDICE B).
4.1.3.1. Variáveis censitárias qualificadoras da amostra
Para a identificação dos professores usamos as variáveis: sexo, idade
(AGE), tempo de magistério (MAG), informações sobre a graduação e formação
complementar (FCM). Os intervalos determinados para a variável AGE e a amplitude
da variável MAG foram inspirados pelo artigo intitulado “O ciclo de vida profissional
de professores” de Huberman (2000) no qual o autor objetiva descrever as etapas
vividas pelos docentes do decorrer da sua carreira, assumindo, é claro, como uma
tendência que não necessariamente será seguida por todos os indivíduos. O artigo
aponta para cinco fases, quais sejam:
a entrada na carreira: caracterizada pela exploração e entusiasmo;
a estabilização: na qual se consolida o sentimento do pertencimento a
um campo profissional e a confiança em relação à sua competência;
a diversificação: nessa fase o autor acredita que o percurso individual
pode se mostrar de diferentes formas, como no perfil de um sujeito que
110
investe seu potencial como docente, naquele que se envolve com
questões administrativas visando a promoção profissional e naquele
que apresenta uma redução do comprometimento com a formação de
seus alunos;
a serenidade: busca por uma situação estável, menor vulnerabilidade à
avaliação dos pares ou superiores;
a preparação para a aposentadoria: caracterizada por uma fase de
interiorização, de libertação progressiva.
(HUBERMAN, 2000)
Apesar de Huberman apontar intervalos de tempo em anos em seu artigo,
optamos por interpretar as fases pela sua caracterização e adaptamos a escala de
Huberman para quatro intervalos para identificar o tempo de magistério, como
mostra o quadro 6:
Quadro 6: Variável tempo de magistério (MAG)
Tempo de magistério (MAG) Fase (Huberman adaptada)
Até 6 anos entrada na carreira e da estabilização
7 a 18 anos Diversificação
19 a 30 anos Serenidade
mais de 30 anos preparação para a aposentadoria
Fonte: os autores
Para além do tempo de magistério, é importante considerarmos também a
época em que os professores concluíram sua formação inicial profissional, uma vez
que a história recente da Educação Matemática é marcada por mudanças
significativas relacionadas a concepções de ensino e aprendizagem que podem se
revelar nas práticas de cada professor. Portanto, definimos cinco intervalos de
tempo associados ao seu período de formação, como pode ser visto no quadro 5.
A escolha dos períodos foi inspirada nas tendências educacionais
descritas por Fiorentini e já tratadas previamente: formalista (clássica e moderna), a
empírico-ativista; a tecnicista; a construtivista e a sócioetnoculturalista. Vale destacar
que os professores que se formaram a partir da segunda metade da década de 1990
provavelmente tiveram sua formação influenciada pela publicação dos Parâmetros
111
Curriculares Nacionais (PCNs). Portanto, organizamos a distribuição apresentada no
quadro 7 para analisar o período de formação inicial dos professores.
Quadro 7 – Variável data da conclusão da formação inicial profissional
Período de formação Tempo de formação
década de 1960 ou antes mais de 50 anos
década de 1970 de 41 a 50 anos
década de 1980 de 34 a 40 anos
início da década de 1990 de 29 a 33 anos
a partir da segunda metade da década de 1990 até 28 anos
Fonte: os autores
Considerando que muitos professores apresentam uma formação inicial
distinta da licenciatura em Matemática e estão atuando nas escolas, outras
graduações além da licenciatura em Matemática e pós-graduações na formação
complementar (variável nomeada como CMP, como abreviação de complementar)
também foram utilizadas para caracterizar a formação docente.
Para a análise dos dados censitários qualificadores do questionário foram
utilizadas medidas de frequência estatística.
4.1.3.2. Pergunta aberta
A pergunta aberta apresentada aos professores foi: “Cite três ações
didáticas que você considere importante para desenvolver os conceitos de
Estatística”. Essa pergunta tinha por objetivo conhecer o tratamento dado pelos
professores aos conteúdos de Estatística de modo menos diretivo. Ao perguntarmos
sobre as ações didáticas que utilizam em sala intencionamos verificar se as práticas
condizem com os objetivos e metas educacionais apontadas pelos docentes. As
respostas referentes às ações didáticas importantes para o desenvolvimento da
Estatística foram tratadas por Análise de Conteúdo.
Laurence Bardin, professora de psicologia da Universidade de Paris,
escreveu em 1977 um manual metodológico da técnica de Análise de Conteúdo e a
definiu como sendo:
Um conjunto de técnicas de análise das comunicações visando obter, por procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conteúdos relativos às condições de
112
produção/recepção (variáveis inferidas) destas mensagens. (BARDIN, 2011, p. 37)
Dessa forma, a descrição e o tratamento do texto caracteriza-se como a
primeira etapa de um processo que visa a interpretação e significação do conteúdo.
Nesse ínterim é necessário realizar deduções lógicas (inferência) baseadas na
ligação com outras proposições e no conhecimento teórico do tema envolvido.
Realizamos uma análise de conteúdo do tipo classificatório no conjunto
de respostas apresentadas à questão aberta, processo caracterizado pela ação de
partir da análise de sentido de elementos particulares visando seu reagrupamento
progressivo por aproximação de significado marcado pela atribuição de um título a
cada categoria criada.
Na primeira fase dessa metodologia – organização da análise – foi
realizada uma leitura flutuante, isto é, uma leitura intuitiva e aberta a todas as ideias,
seguida da marcação de palavras plenas – portadoras de sentido como
substantivos, verbos, adjetivos – em detrimento de palavras instrumentos – artigos,
preposições, pronomes, advérbios, conjunções (BARDIN, 2011). Para isso usamos
como unidades de informação cada uma das três ações didáticas descritas pelos
professores indicadas por frases curtas.
Na fase de codificação, com a intenção de realizar uma análise temática
para auxiliar a classificação, descobrimos os núcleos de sentido de cada frase e a
ela associamos um tema associado ao ensino de Estatística: conteúdos estatísticos,
metodologias e práticas de ensino, fonte de dados e temas. Como regra de
enumeração utilizamos a frequência de aparição das respostas.
Por fim, a análise semântica das frases resultou em agrupamentos que
representam diferentes conjuntos de ações didáticas. A cada um desses conjuntos
ou categorias foi associado um título. As respostas dadas à pergunta aberta
resultaram em 85 unidades de informação, divididas em quatro temas, que foram
reagrupadas em diversas categorias.
4.1.3.3. Questões de ordenação
A análise realizada a partir dos dados do questionário piloto que aferiu
cinco perfis de professores que ensinam Estatística conduziu a elaboração das três
próximas questões do instrumento de pesquisa que solicitavam ordenação de cinco
alternativas de acordo com o grau de relevância, conforme apresentado a seguir.
113
O segundo item apresentava a questão “Por que você considera o Ensino
de Estatística importante?” seguida de cinco afirmações:
Porque está presente no cotidiano dos alunos.
Porque desenvolve o senso crítico e a argumentação.
Porque os conteúdos são usados em outras ciências.
Porque propicia o trabalho de campo e projetos coletivos.
Porque está relacionada à alfabetização matemática.
A essa variável foi associada o nome ENS (abreviação de ensino).
O item 3 solicitava a ordenação das habilidades estatísticas que o
professor considerava importante que os alunos soubessem e apresentava como
opções:
Construir argumentação a partir de informações expressas em tabelas
e gráficos.
Calcular medidas estatísticas de um conjunto de dados (média,
mediana, desvio padrão, etc.)
Usar dados apresentados em tabelas ou gráficos para resolver
problemas.
Fazer inferência a partir de resultados estatísticos.
Ler e interpretar informações apresentadas em tabelas, gráficos e
infográficos.
A essa variável foi associada o nome HAB (abreviação de habilidade).
O quarto item apresentou cinco questões do ENEM relacionadas à
Estatística para que os professores as ordenassem de acordo com a adequação
para avaliar o conhecimento dos alunos sobre Estatística. As questões foram
escolhidas por estarem relacionadas a diferentes habilidades, apresentarem
diferentes contextos e graus de dificuldade. A essa variável foi associada o nome
QUE (abreviação de questão do Enem).
A primeira exploração das respostas consistiu em análises com elementos
da Estatística Descritiva, como cálculos de médias e desvios padrões dos índices de
cada uma das variáveis, que revelaram a ausência de respostas unânimes que
poderiam demonstrar vieses do questionário.
114
Para investigar as questões de ordenação usamos a análise bivariada de
dados na qual estudamos a correlação entre as três variáveis (Ensino, Habilidade e
Questão), duas a duas.
4.1.3.4. Escala Likert
A última etapa do questionário era composta de 30 afirmações elaboradas
para que os professores marcassem um dentre cinco níveis de concordância, em
escala Likert49: 1 (discordo); 2 (discordo parcialmente); 3 (não discordo nem
concordo); 4 (concordo parcialmente) e 5 (concordo). Para evitarmos vícios nas
respostas, algumas destas foram elaboradas de maneira negativa, ou seja, ao invés
de destacarem determinada posição, estavam na verdade negando-a.
As respostas dos participantes foram transcritas e tabuladas em uma
planilha eletrônica. Posteriormente, as respostas dadas às terceira, quarta e quinta
questões, assim como a classificação das afirmações, foram organizadas no
software Statistical Analysis System (SAS) e submetidas às análises estatísticas
descritivas e Análise Multivariada de dados do tipo Fatorial Exploratória (AFE).
Para justificar a escolha da análise empregada, recorremos à definição da
técnica apresentada por Hair e seus coautores.
Análise multivariada se refere a todas as técnicas estatísticas que simultaneamente analisam múltiplas medidas sobre indivíduos ou objetos sob investigação. Assim, qualquer análise simultânea de mais do que duas variáveis pode ser considerada, a princípio, como multivariada. [...] [...] para ser considerada verdadeiramente multivariada, todas as variáveis devem ser aleatórias e inter-relacionadas de tal maneira que seus diferentes efeitos não podem ser significativamente interpretados em separado. (HAIR, et. al., 2009, p. 23)
Por entender que as variáveis da escala Likert devem ser analisadas
simultaneamente para encontrar uma estrutura que revele o perfil do professor que
ensina Estatística, adotamos a análise multivariada de dados como técnica
estatística. Dentre as possibilidades apresentadas, optamos pela Análise Fatorial,
definida como:
[...] técnica particularmente adequada para analisar os padrões de relações complexas multidimensionais encontradas por pesquisadores. [...] A análise fatorial pode ser utilizada para examinar os padrões ou relações latentes para um grande número de variáveis
49
Rensis Likert, em 1932, publicou no Archives of Psychology um relatório no qual explicou o funcionamento desta escala, na qual os entrevistados indicam o grau de concordância com uma afirmação. Este grau pode ter 5, 7 ou 9 níveis.
115
e determinar se a informação pode ser condensada ou resumida a um conjunto menor de fatores ou componentes. (HAIR et. al., 2009, p. 100)
De acordo com a definição apresentada, podemos afirmar que a análise
fatorial é adequada ao conjunto de dados resultante da Escala Likert50, uma vez que
partimos da hipótese de que é possível agrupar variáveis correlacionadas que
descrevem fatores, associados a perfil de professores que ensinam Estatística, um
constructo que não pode ser mensurado diretamente. Como a análise objetivava a
busca da estrutura do conjunto dos dados a perspectiva adotada foi a exploratória,
ou seja, foi realizada uma Análise Fatorial Exploratória (AFE). É importante destacar
os conceitos estatísticos por trás desse tipo de metodologia:
Em análise fatorial, agrupamos variáveis por suas correlações, de modo que variáveis em um grupo (fator) têm elevadas correlações umas com as outras. Assim, para os propósitos da análise fatorial, é importante entender o quanto da variância é compartilhado com outras variáveis naquele fator versus o que não pode ser compartilhado. (HAIR et. al., 2009, p. 112)
Isso significa dizer que para além da justificativa conceitual para a adoção
da AFE, é necessário realizar medidas gerais de correlações para afirmar que a
técnica é adequada ao conjunto de dados. Para validar o instrumento existe o teste
KMO (Kaiser-Meyer-Olkin) que calcula o índice de adequação da amostra com base
na proporção de variância dos itens que pode ser explicada pelo fator (DAMASIO,
2012). O limite mínimo de aceitação do índice KMO é 0,50 e no conjunto de dados
KMO foi de 0,53.
A AFE resultou na matriz de correlações que apresenta as comunalidades
– quantia total de variância que uma variável original compartilha com todas as
outras variáveis incluídas na análise (HAIR et, al., 2009). Para a definição do número
de fatores retidos, utilizamos inicialmente o critério da raiz latente.
[...] qualquer fator individual deve explicar a variância de pelo menos uma variável se o mesmo há de ser mantido para a interpretação. Com a análise de componentes, cada variável contribui com um valor 1,0 do autovalor total. Logo, apenas os fatores que têm raízes latentes ou autovalores maiores que 1 são considerados significantes. (HAIR, et. al., 2009,p. 114)
Esse critério resultou inicialmente em onze fatores retidos. Na sequência
analisamos a significância das cargas fatoriais assumindo como limite mínimo 0,50,
50
A Escala Likert consiste em uma escala de medida não métrica, isso é, os números não representam magnitude, são apenas índices de ordenação.
116
que se traduz em 25% (0,50²) da variância total da variável explicada pelo fator.
Variáveis com cargas fatoriais menores que 0,50 foram eliminadas e uma nova
solução fatorial com seis fatores foi apresentada. Entretanto, ao último fator estava
associada uma única frase, de modo que optamos por recalcular em cinco fatores.
Esses cinco fatores apresentaram um valor de KMO de 0,5353 e explicam 62,51%
da variância encontrada, índice considerado satisfatório para ciências sociais.
Com o intuito de separar mais claramente os fatores e reduzir algumas
ambiguidades encontradas nas cargas fatoriais, optamos por aplicar a rotação
ortogonal VARIMAX, que pressupõe que os fatores extraídos são independentes uns
dos outros e simplifica a interpretação (DAMASIO, 2012).
Por fim, avaliamos a medida de confiabilidade da estrutura fatorial (alfa de
Cronbach) que deve ser maior que 0,60 para garantir que não haja dados
tendenciosos ou vieses internos nos dados obtidos decorrentes de inconsistências
no questionário (SILVA e SIMON, 2005). No conjunto de dados observado, o alfa de
Cronbach foi de 0,7238.
4.2. AS QUESTÕES DE ESTATÍSTICA DO ENEM
A matriz de Referência do ENEM para Matemática e suas Tecnologias
do ENEM contém duas competências de área associadas à Estatística já
apresentadas que abarcam sete habilidades. Optamos por explorar cada uma das
questões para além desses parâmetros e, portanto, adotamos um protocolo de
análise com outras variáveis, aprofundadas a seguir.
4.2.1. A complexidade da questão
Cada questão do ENEM avalia apenas uma habilidade da matriz de
referência. Entretanto, entendemos que não é somente a habilidade que define a
complexidade da questão, mas também o(s) objeto(s) de conhecimento
associado(s), o contexto envolvido, o tipo de texto, o nível de leitura dos dados e,
principalmente, o tipo de pensamento associado a ela. A fim de elucidar essa
afirmação, discutiremos algumas questões que seguem.
As cinco questões apresentadas a seguir, no quadro 8, pretendem avaliar
a mesma habilidade: Resolver problema com dados apresentados em tabelas ou
gráficos (H 25). Apesar de em todas elas o participante precisar selecionar os dados
117
relevantes à pergunta nos gráficos e tabelas para encontrar a solução, o nível de
complexidade associado à questão não é o mesmo.
Quadro 8 – Exemplos de questões da H25
Questão 1 – Rotina juvenil
(ENEM 2012) Uma pesquisa realizada por estudantes da Faculdade de Estatística
mostra, em horas por dia, como os jovens entre 12 e 18 anos gastam seu tempo,
tanto durante a semana (de segunda-feira a sexta-feira), como no fim de semana
(sábado e domingo). A seguinte tabela ilustra os resultados da pesquisa.
De acordo com esta pesquisa, quantas horas de seu tempo gasta um jovem entre
12 e 18 anos, na semana inteira (de segunda-feira a domingo), nas atividades
escolares?
(A) 20.
(B) 21.
(C) 24.
(D) 25.
(E) 27.
Questão 2 – Compra de empresa
(ENEM 2012) Cinco empresas de gêneros alimentícios encontram-se à venda. Um
empresário, almejando ampliar os seus investimentos, deseja comprar uma dessas
empresas. Para escolher qual delas irá comprar, analisa o lucro (em milhões de
reais) de cada uma delas, em função de seus tempos (em anos) de existência,
decidindo comprar a empresa que apresente o maior lucro médio anual. O quadro
apresenta o lucro (em milhões de reais) acumulado ao longo do tempo (em anos)
de existência de cada empresa.
118
O empresário decidiu comprar a empresa
(A) F.
(B) G.
(C) H.
(D) M.
(E) P.
Questão 3 – Crescimento da indústria
(ENEM 2013) A cidade de Guarulhos (SP) tem o 8º PIB municipal do Brasil, além do
maior aeroporto da América do Sul. Em proporção, possui a economia que mais
cresce em indústrias, conforme mostra o gráfico.
Analisando os dados percentuais do gráfico, qual a diferença entre o maior e o
menor centro em crescimento no polo das indústrias?
(A) 75,28.
(B) 64,09.
(C) 56,95.
(D) 45,76.
(E) 30,07.
Questão 4 – Taxas de desemprego
(ENEM 2014) O gráfico apresenta as taxas de desemprego durante o ano de 2011
e o primeiro semestre de 2012 na região metropolitana de São Paulo. A taxa de
desemprego total é a soma das taxas de desemprego aberto e oculto.
119
Suponha que a taxa de desemprego oculto do mês de dezembro de 2012 tenha
sido a metade da mesma taxa em junho de 2012 e que a taxa de desemprego total
em dezembro de 2012 seja igual a essa taxa em dezembro de 2011.
Disponível em: www.dieese.org.br. Acesso em: 1 ago. 2012 (fragmento).
Nesse caso, a taxa de desemprego aberto de dezembro de 2012 teria sido, em
termos percentuais, de
(A) 1,1.
(B) 3,5.
(C) 4,5.
(D) 6,8.
(E) 7,9.
Questão 5 – Remuneração de funcionários
(ENEM 2014) Uma empresa de alimentos oferece três valores diferentes de
remuneração a seus funcionários, de acordo com o grau de instrução necessário
para cada cargo. No ano de 2013, a empresa teve uma receita de 10 milhões de
reais por mês e um gasto mensal com a folha salarial de R$ 400 000,00,
distribuídos de acordo com o Gráfico 1. No ano seguinte, a empresa ampliará o
número de funcionários, mantendo o mesmo valor salarial para cada categoria. Os
demais custos da empresa permanecerão constantes de 2013 para 2014. O número
de funcionários em 2013 e 2014, por grau de instrução, está no Gráfico 2.
120
Qual deve ser o aumento na receita da empresa para que o lucro mensal em 2014
seja o mesmo de 2013?
(A) R$ 114 285,00
(B) R$ 130 000,00
(C) R$ 160 000,00
(D) R$ 210 000,00
(E) R$ 213 333,00
Fonte: INEP; os autores.
Analisando as questões em relação aos objetos de conhecimentos
abordados, é possível perceber que enquanto a questão de número 3 (crescimento
da indústria) exige somente uma subtração de números decimais, a questão 4 (taxas
de desemprego) apresenta cálculos envolvendo porcentagem e a questão 2 (compra
de empresa) pressupõe um conhecimento sobre medidas de tendência (média).
Assim como a questão 3 (crescimento da indústria), a questão 1 (compra
de empresa) aborda apenas as operações com números racionais como objeto do
conhecimento. Entretanto, elas se diferenciam em relação ao tipo de raciocínio
envolvido. A questão 3 apresenta todos os dados necessários no gráfico, trata-se de
uma situação de reprodução no qual uma subtração resolve o problema. Entretanto,
a questão 1 exige que se combine a informação entre os dias da semana e os dados
apresentados na tabela, ou seja, não se trata de um problema rotineiro. A questão 5
(remuneração de funcionários) que também exige apenas operações com números
racionais, se diferencia das anteriores no tocante à apresentação dos dados, uma
vez o participante precisa selecionar e relacionar dados presentes em dois gráficos
independentes.
121
Podemos dizer ainda que os contextos das questões se diferem. A
questão 1 (rotina juvenil) apresenta uma situação do cotidiano do jovem, enquanto
as questões 2 (compra de empresa) e 5 (remuneração de funcionários) remetem a
uma situação do contexto profissional. As questões 3 (crescimento da indústria) e 4
(taxas de desemprego) se aproximam de um contexto público.
Diante do exposto, reconhecendo que cada questão se constitui para
além da habilidade que pretende avaliar, decidimos por criar algumas variáveis para
categorizar cada questão que serão utilizadas para complementar as informações
sobre o desempenho dos alunos na intenção de apresentar uma análise mais
qualitativa dos dados que se apresentarão futuramente.
As variáveis foram criadas a partir do referencial teórico apresentado e
de um estudo cuidadoso da classificação das questões realizada pelo Programa
Internacional de Avaliação de Estudantes (PISA) que se propõe a avaliar, dentre
outros aspectos, a competência matemática de estudantes de 15 anos de idade.
O PISA utiliza três variáveis que se articulam na caracterização da
questão: o conteúdo matemático em que se enquadra a tarefa; o contexto no qual se
localiza o problema e as competências ou processos que devem ser ativados para
conectar o mundo real com a matemática na resolução. (ROMERO E GÓMEZ, 2008)
Inspirados por esse referencial, associamos as discussões teóricas sobre
competências estatísticas e utilizamos sete variáveis para caracterizar cada uma das
questões, quais sejam: (a) competência de área, (b) habilidade, (c) objeto do
conhecimento, (d) contexto, (e) tipo de texto, (f) nível de leitura e (g) processo.
As variáveis (a) competência de área e (b) habilidade de cada questão
estão definidas e apresentadas nos microdados do ENEM, disponíveis no site do
INEP. A cada uma das questões foi associado um (c) objeto do conhecimento
matemático listado na matriz de referência do exame.
O contexto de uma questão é a sua configuração específica dentro de
uma situação, definida por Romero e Gómez (2008) como a parte do mundo do
estudante na qual as tarefas são apresentadas. O PISA classifica o contexto em
quatro tipos:
1. Pessoal: situação mais próxima ao estudante, relacionada
diretamente às suas atividades cotidianas;
2. Educacional/Ocupacional: situações que surgem na escola, no
trabalho;
122
3. Público: aborda temas relacionados à comunidade local ou
sociedade, é uma situação externa relevante em termos coletivos;
4. Científico: situações abstratas, referem-se apenas a objetos,
estruturas e símbolos matemáticos.
Por entender que o ENEM não utiliza contextos científicos em suas
questões, utilizaremos apenas os três primeiros tipos de (d) contextos: pessoal,
educacional/ocupacional e público.
O PISA caracteriza quatro tipos de texto:
1. Contínuo: inclui diferentes tipos de prosa e todos os dados
necessários estão em um texto escrito.
2. Não contínuo: inclui gráficos, formulários e listas; os dados relevantes
para a resolução estão no objeto.
3. Misto: inclui dois formatos (contínuo e não contínuo); os dados
precisam ser combinados para chegar-se à resolução.
4. Múltiplo: inclui textos independentes, de formatos iguais ou diferentes,
justapostos com propósitos específicos.
Por se tratar de uma investigação que trata da competência estatística,
entendemos que o primeiro (e) tipo de texto não se faz presente na nossa análise.
Dessa forma, inspirados nessa classificação, criamos três categorias:
1. Único: apresenta todos os dados relevantes à solução em um gráfico
ou uma tabela; o texto do enunciado apresenta apenas o contexto e a
pergunta da situação problema.
2. Misto: os dados necessários para a solução estão, parte no gráfico ou
tabela apresentado, parte no texto do enunciado.
3. Múltiplo: as informações de dois gráficos, duas tabelas ou de um
gráfico e uma tabela precisam ser combinados para se obter as
informações necessárias na resolução da situação proposta.
Por gráfico entendia-se um conjunto de informação transmitida por
posições de pontos, linha ou área em um plano bi dimensional (FRY, 1984, p.5,
apud FRIEL, CURCIO e BRIGHT, 2001, p. 126). Entretanto, essa definição pode ser
ampliada uma vez que a tecnologia gráfica que dispomos atualmente ampliou as
possibilidades de comunicar dados quantitativos usando outras estruturas e
formatos. As tabelas apresentam os dados por meio de quadros compostos de
células e podem assumir duas funções: organizar as informações como um passo
123
intermediário na criação de representações gráficas ou com um tipo de
representação de dados. (FRIEL, CURCIO, BRIGHT, 2001). A estrutura de tabelas
pode ser diretamente relacionada à estrutura de gráficos, portanto, no presente
trabalho trataremos da leitura e interpretação de gráficos e tabelas conjuntamente.
Para os (f) níveis de leitura, usaremos a definição apresentada por Curcio
(1989):
1. Leitura dos dados: esse nível de compreensão requer uma leitura
literal do gráfico ou dos fatos explicados no título ou nos eixos do
gráfico.
2. Leitura entre os dados: esse nível de compreensão inclui a
interpretação e integração dos dados no gráfico; inclui a comparação
de quantidades e o uso de outros conceitos matemáticos que permitem
ao leitor combinar e integrar dados e identificar relações matemáticas
expressas no gráfico; as inferências, quando necessárias, se dão a
partir dos dados explicitamente apresentados pelo gráfico.
3. Leitura além dos dados: esse nível de compreensão requer do leitor
prever ou inferir a partir dos dados em busca de informações que não
estão explicita ou implicitamente indicadas no gráfico; envolve
estimativa, investigação de padrões ou precisão; a inferência é feita
com base em um “banco de dados” na cabeça do leitor, não no gráfico.
Por (g) processos entendemos as ações que devem ser ativadas para
realizar a conexão com a situação problema e o conhecimento matemático. Para
essa variável, utilizaremos as categorias do PISA:
1. Reprodução: envolvem essencialmente a reprodução do
conhecimento aplicado; está associado a conhecimento de fatos e
representações comuns de problemas e a um desempenho de
procedimentos rotineiros.
2. Conexão: pressupõe a reunião de ideias para solucionar problemas
diretos; solução de problemas não rotineiros, mas que ainda envolvem
configurações conhecidas ou parcialmente conhecidas; algumas vezes
é necessário traduzir uma situação para a matemática.
3. Reflexão: está associado a um pensamento matemático mais amplo;
pressupõe uma capacidade de planejar estratégias para a resolução;
envolve argumentação, abstração e generalização.
124
Diante do exposto, além de classificar cada uma das questões associadas
à Estatística do ENEM em relação à competência e habilidade avaliada,
analisaremos o objeto de conhecimento abordado, o contexto envolvido, o tipo de
texto apresentado, o nível de leitura e a natureza do processo exigidos.
A seguir, apresentamos o quadro 9 que sintetiza as categorias utilizadas
na classificação.
Quadro 9 – Categorização das questões do ENEM
(a)
Competência de área
FONTE: INEP
6 - Interpretar informações de natureza científica e social obtidas da leitura de gráficos e tabelas, realizando previsão de tendência, extrapolação, interpolação e interpretação.
7 - Compreender o caráter aleatório e não-determinístico dos fenômenos naturais e sociais e utilizar instrumentos adequados para medidas, determinação de amostras e cálculos de probabilidade para interpretar informações de variáveis apresentadas em uma distribuição estatística.
(b)
Habilidades
FONTE: INEP
H24 - Utilizar informações expressas em gráficos ou tabelas para fazer inferências.
H25 - Resolver problema com dados apresentados em tabelas ou gráficos.
H26 - Analisar informações expressas em gráficos ou tabelas como recurso para a construção de argumentos.
H27 - Calcular medidas de tendência central ou de dispersão de um conjunto de dados expressos em uma tabela de frequências de dados agrupados (não em classes) ou em gráficos.
H28 - Resolver situação-problema que envolva conhecimentos de estatística e probabilidade.
H29 - Utilizar conhecimentos de estatística e probabilidade como recurso para a construção de argumentação.
H30 - Avaliar propostas de intervenção na realidade utilizando conhecimentos de estatística e probabilidade.
(c)
Objeto(s) do conhecimento
FONTE: INEP
Vide ANEXO D
125
(d)
Contexto
1. Pessoal: relacionada diretamente às suas atividades cotidianas.
2. Educacional/Ocupacional: situações que surgem na escola e no trabalho.
3. Público: temas relacionados à comunidade local ou sociedade.
(e)
Tipo de texto
1. Único: apresenta todos os dados relevantes à solução em um gráfico ou uma tabela.
2. Misto: os dados utilizados na solução estão, parte no gráfico ou tabela apresentado, parte no texto do enunciado.
3. Múltiplo: as informações de dois gráficos, duas tabelas ou de um gráfico e uma tabela precisam ser combinados.
(f)
Nível de leitura
1. Dos dados: leitura literal do gráfico ou dos fatos explicados no título ou nos eixos do gráfico.
2. Entre os dados: interpretação e integração dos dados no gráfico; inferências se dão a partir dos dados explicitamente apresentados pelo gráfico.
3. Além dos dados: previsão ou inferência a partir dos dados em busca de informações que não estão explicita ou implicitamente indicadas.
(g)
Processo
1. Reprodução: envolvem essencialmente a reprodução do conhecimento aplicado; está associado a conhecimento de fatos e representações comuns de problemas e a um desempenho de procedimentos rotineiros.
2. Conexão: pressupõe a reunião de ideias para solucionar problemas diretos; solução de problemas não rotineiros, mas que ainda envolvem configurações conhecidas ou parcialmente conhecidas; algumas vezes é necessário traduzir uma situação para a matemática.
3. Reflexão: está associado a um pensamento matemático mais amplo; pressupõe uma capacidade de planejar estratégias para a resolução; envolve argumentação, abstração e generalização.
Fonte: os autores
As duas primeiras categorias são aquelas utilizadas pelo ENEM para
classificar a questão e podem ser obtidas a partir do banco de dados disponibilizado
no site do INEP. A categoria objeto do conhecimento contempla itens da lista de
mesmo nome disponibilizada pelo INEP (ANEXO D). Na tentativa de caracterizar
padrões de questões, criou-se uma representação gráfica que abarca as demais
categorias, elaboradas a partir dos estudos realizados sobre o PISA e dos níveis de
leitura em Estatística (CURCIO, 1989). Cada uma das questões de Estatística foi
126
analisada de acordo com as sete categorias descritas de acordo com um protocolo,
apresentado a seguir.
4.2.2. Protocolo para complexidade das questões
A partir das categorias escolhidas, elaborou-se uma ficha de análise da
questão (APÊNDICE C). A fim de sintetizar as características principais de cada
questão, um gráfico em radar foi construído utilizando as variáveis: contexto, tipo de
texto, nível de leitura e processo. Para isso, consideramos os itens de cada uma
dessas variáveis como hierárquicos e associamos a eles um índice conforme
informado no quadro anterior. Observe alguns exemplos a título de explicação da
interpretação do gráfico no quadro 10:
QUADRO 10 – EXEMPLOS DA INTERPRETAÇÃO DO GRÁFICO
Exemplo a)
O gráfico ao lado mostra que a questão
apresenta um contexto público (3), em
um tipo de texto misto (2), que exige um
nível de leitura entre os dados (2) e
envolve um processo de conexão (2).
Exemplo b)
O gráfico ao lado mostra que a questão
apresenta um contexto pessoal (1), em
um tipo de texto múltiplo (3), que exige
um nível de leitura além dos dados (2) e
envolve um processo de conexão (2).
Fonte: os autores
A intenção do gráfico é apresentar uma caracterização visual da questão.
Entendemos que um gráfico na qual o quadrilátero possua menor área representa
127
uma complexidade menor do que o item cujo quadrilátero gerado apresenta maior
área.
Como objeto de investigação da competência dos alunos, analisaremos o
desempenho dos participantes nas questões referentes às competências 6 e 7 das
edições de 2012, 2013 e 2014 do ENEM. Acrescentaremos algumas questões
associadas a outras competências de áreas por entender que exigem um nível de
compreensão no sentido de análise de dados.
As fichas da análise realizada para cada questão encontram-se nos
APÊNDICES D (2012), E (2013) e F (2014), respectivamente.
128
CAPÍTULO 5 – RESULTADOS E DISCUSSÃO
Os resultados tratados a seguir apresentam uma visão quali quantitativa
de um diverso conjunto de medidas composto de respostas de professores de
Matemática a um questionário e do desempenho dos alunos em questões de
Estatística do ENEM nas edições de 2012, 2013 e 2014.
5.1. OS PERFIS DOS PROFESSORES
Como já apresentado no capítulo sobre metodologia, na etapa de análise
dos resultados, o questionário aplicado aos 89 professores teve sua análise dividida
em quatro vertentes: variáveis censitárias qualificadoras da amostra; pergunta
aberta; questões de ordenação e escala Likert. Na intenção de compreender um
pouco mais sobre como pensam e agem esses professores, os dados obtidos em
cada uma dessas partes foram qualificados no sentido de buscar perfis. Como perfil
compreendemos descrições de caráter objetivos e subjetivos, buscando ressaltar
suas principais características e atitudes em relação ao ensino de Estatística.
Inicialmente, a partir das variáveis qualificadoras da amostra, revelaremos
o perfil censitário dos entrevistados que indica, dentre outros aspectos, a formação e
a fase profissional em que se encontram. Na sequência, por meio de uma análise de
conteúdo das respostas à pergunta aberta, trataremos dos perfis relacionados às
naturezas das ações didáticas que empregam em suas aulas de Estatística.
Buscaremos ainda, com base nas questões de ordenação, indicar perfis associados
aos pressupostos desses professores em relação a ensino, aprendizagem e
avaliação em Estatística. Por fim, as respostas dadas à escala Likert servirão de
base para discorreremos sobre perfis associados a pormenores da prática do ensino
de Estatística.
Ao examinar perfis buscamos compreender e caracterizar as práticas e
concepções sobre o ensino e a aprendizagem de Estatística dos docentes para
verificarmos afastamentos e aproximações das discussões atuais da Educação
Estatística dissertadas no referencial teórico. Vale ressaltar que nossa intenção não
é classificar ou rotular o grupo de professores participantes da pesquisa, mas sim
compreender de que forma é vista a Educação Estatística.
129
5.1.1. Perfis – Ánálise censitária
Os dados relacionados às variáveis censitárias da amostra foram
analisados e organizados no gráfico 1, apresentado a seguir.
Gráfico 1 – Perfil dos professores: frequência relativa das variáveis censitárias
PERFIL CENSITÁRIO DOS PROFESSORES
Fonte: os autores
Podemos observar uma leve predominância do sexo feminino (54 em 89)
dentre os docentes que responderam o questionário. A partir da distribuição das
idades dos professores, que revela uma concentração entre 34 e 50 anos, podemos
inferir que a maioria teve sua formação básica iniciada na década de 1980 – período
anterior às discussões sobre Educação Estatística no Brasil – a qual foi marcada
pela tendência tecnicista da Educação Matemática.
Em relação ao tempo de magistério, 52 dos 89 professores se encontra
na fase da diversificação (de 7 a 18 anos), caracterizada pela evidência de
diferentes posturas profissionais marcadas pelo percurso vivido pelos docentes
como, por exemplo, aqueles que buscam aperfeiçoamento profissional na área em
que atuam, os que assumem cargos de gestão escolar ou mesmo os que
apresentam uma redução do comprometimento com a profissão (HUBERMAN,
2000).
130
Os dados associados à formação dos docentes chamam a atenção, uma
vez que quase todos são licenciados em Matemática (82 de um total de 89). Os 7
professores que não cursaram Licenciatura em Matemática são licenciados em
Física, em Química ou ainda apresentam formação em Engenharia. Outro dado
interessante em relação à formação é que 27 dos 82 professores licenciados em
Matemática possuem outra formação, dentre as quais destacamos: bacharelado em
Matemática; Pedagogia; Licenciatura em Ciências, Física ou Química, Administração
e Engenharias. Quase 70% dos professores (58 de um total de 89) possuem uma
formação complementar, na maioria das vezes uma especialização. No grupo
observado temos ainda seis mestres e dois doutores.
5.1.2. Perfis – Ações didáticas
Com a finalidade de conhecer as práticas dos professores e confrontá-las
com as demais respostas dadas aos itens mais diretivos do questionário, solicitamos
que eles citassem três ações didáticas que considerassem importantes para
desenvolver os conceitos de Estatística. De um total de 89 professores, apenas
quatro não responderam à questão aberta, três apresentaram somente uma ação
didática e outros quatro descreveram duas práticas das três solicitadas.
Após a leitura flutuante e a marcação das palavras plenas, optamos por
considerar como unidade de informação51 o conjunto de ações didáticas apontadas
por cada um dos 85 professores, uma vez que em alguns casos elas se
completavam ou eram próximas a nível semântico. Cada unidade de informação
gerou uma ou mais unidades de registro52 no formato de temas que foram
reagrupadas de acordo com seus núcleos de sentido em 63 unidades de contexto53,
apresentadas em ordem alfabética no APÊNDICE G.
A partir do estudo minucioso do inventário das unidades de contexto
percebemos que as respostas dos professores abordavam aspectos de naturezas
diferentes relacionadas às suas ações didáticas. Alguns se detinham a elencar os
conteúdos que julgavam importantes de serem trabalhados, outros descreviam seus
51
. Item a ser submetido à análise de conteúdo. 52
Unidade de significação, corresponde ao segmento de conteúdo considerado como unidade de base; pode ser palavra, frase ou tema – frase composta, habitualmente um resumo. (BARDIN, 2011) 53
[...] unidade de compreensão para codificar a unidade de registro e corresponde ao segmento da mensagem cujas dimensões [...] são óptimas para que se possa compreender a significação exata da unidade de registro. (BARDIN, 2011, p. 100-101)
131
métodos de ensino, havia aqueles que destacavam os recursos didáticos que
utilizam ou elencavam os temas que costumam abordar quando ensinam Estatística.
Diante do exposto, antes de agrupar as categorias pelo seu significado e classificar
cada conjunto de respostas, introduzimos uma organização suplementar de quatro
grandes categorias: objeto do conhecimento (o que ensinam), metodologia (como
ensinam), recursos didáticos (com o que ensinam) e contextos (sobre o que
ensinam).
É importante ressaltar que os grandes temas não são excludentes e em
grande parte das respostas mais de um aspecto era abordado pelo professor. Há
desde professores que focaram na sua resposta apenas um dos aspectos como
aqueles que versaram sobre todos eles, conforme pode ser verificado na tabela 1.
Tabela 1 – Temas abordados (frequência absoluta)
TEMA(S) ABORDADO(S) Respostas
Somente objeto do conhecimento 19
Somente objeto do conhecimento e metodologia 16
Somente objeto do conhecimento, metodologia e recursos didáticos 13
Somente objeto do conhecimento e contextos 10
Somente objeto do conhecimento, metodologia e contextos 7
Somente objeto do conhecimento e recursos didáticos 4
Somente metodologia, recursos didáticos e contextos 4
Somente metodologia e recursos didáticos 2
Somente objeto do conhecimento, recursos didáticos e contextos 2
Somente metodologia 1
Somente contextos 1
Somente metodologia e contextos 1
Somente recursos didáticos 0
Somente recursos didáticos e contextos 0
Todos os temas 5
Não responderam 4
Total 89
Fonte: os autores
A figura 3 apresenta a distribuição das respostas dos professores por
meio de uma representação de conjuntos inspirada no diagrama de Venn.
132
Figura 3 – Representação da distribuição das repostas
Fonte: os autores
Após a definição das categorias em cada um dos grandes temas,
voltamos às 85 unidades de informação a fim de caracterizá-las. A cada unidade de
informação foi associada no mínimo uma e no máximo seis categorias.
Apresentaremos, a seguir, o resultado obtido para cada um dos temas.
5.1.2.1. Objetos do conhecimento
Optamos por usar o termo objeto do conhecimento conforme a
definição da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), documento em discussão
final que visa organização da Educação Básica em termos de competências e
habilidades essenciais que os alunos precisam desenvolver. Desse modo,
entendemos por objetos do conhecimento os conceitos, conteúdos e processos
pertinentes às habilidades relacionadas ao ensino de Estatística.
O tema objeto do conhecimento, abordado por 76 professores (85,4%
da amostra), é composto de 28 unidades de contexto, que após a análise dos
núcleos de sentido, foram organizados em 7 categorias conforme mostra o quadro
12.
133
Quadro 12 - Objetos do conhecimento - unidades de contexto e categorias
Tema: Objetos do conhecimento (o que ensinam)
Leitura e interpretação
Estudo e análise de tabelas e/ou gráficos
Leitura e interpretação de tabelas e/ou gráficos
Usar/ler tabelas e/ou gráficos
Extração de informações do gráfico
Conclusão a partir de um gráfico e/ou tabela
Estrutura de tabelas e gráficos
Construção de tabela e/ou gráficos
Tipos de gráficos
Marcar pontos no R2
Associar gráfico e tabela
Crescimento e decrescimento em gráficos
Aplicação
Resolução de situações problema ou exercícios
Elaboração de situação problema
Reconhecimento da importância e aplicação da Estatística no cotidiano
Etapas de uma pesquisa
Agrupamento de dados
Organização dos dados de uma pesquisa
Tratamento dos dados
Elaboração de gráficos para comunicar dados
Tabulação dos dados de uma pesquisa
Argumentação
Argumentação a partir dos dados de gráficos e/ou tabelas
Estatística como auxílio para tomada de decisão
Senso Crítico
Conceitos estatísticos
Média
Medidas estatísticas
Variações na interpretação decorrentes da amostra
Moda
Mediana
Relação com outros conceitos
matemáticos
Conceitos matemáticos relacionados (porcentagem, proporcionalidade, ordem de grandeza)
Conceitos de matemática (fração, manipulação numérica e algébrica)
Fonte: os autores
A categoria leitura e interpretação é composta das unidades de contexto
associadas à comunicação de ideias estatísticas apresentadas em tabelas e
gráficos. O conhecimento sobre os elementos e usos de diferentes representações
de dados caracteriza a categoria estrutura de tabelas e gráfico. Aplicação foi o
nome dado à categoria que apresenta ações didáticas que exigem dos alunos a
134
combinação e integração de dados na resolução de situações problema. Essas três
categorias são componentes necessários, mas não suficientes para o
desenvolvimento da literacia estatística, a qual exige ainda o entendimento de
conceitos, vocabulários, símbolos e probabilidade como medida de incerteza. (BEN-
ZVI; GARFIELD; 2004). Vale ressaltar que as questões do ENEM abordam objetos
do conhecimento mais complexos do que os citados com maior frequência pelos
professores.
A categoria etapas de uma pesquisa é constituída de ações que visam o
desenvolvimento da competência pensamento estatístico no sentido de
compreender o percurso de uma investigação estatística abordada no capítulo 3,
seção 3.4.1. Associada a essa mesma competência, apresenta-se a categoria
argumentação integrada por unidades temáticas que revelam a atenção do
professor com a compreensão e a utilização do contexto na interpretação dos
resultados de uma investigação estatística. Unidades temáticas associadas ao
entendimento das relações entre os dados do ponto de vista dos processos
estatísticos estão na categoria conceitos estatísticos, que revelam práticas
consoantes com a competência raciocínio estatístico no que concerne às medidas
estatísticas e amostras. A categoria relações com outros conceitos matemáticos
apresenta unidades temáticas que revelam o trabalho com conteúdos e técnicas de
cálculo que podem ser necessárias em Estatística.
O gráfico 2 apresenta a frequência das categorias associadas aos objetos
do conhecimento54. Dos 76 professores que trataram de conteúdos, conceitos e
processos nas suas respostas, 63% apontaram aspectos relacionados à leitura e
interpretação de gráficos e tabelas. Cerca de um terço, 25 professores, destacou o
trabalho com as etapas de uma pesquisa (32%), a mesma frequência com que
apareceu o estudo das estruturas de tabelas e gráficos (32%). Certamente a
abordagem dessas questões é importante para a formação dos estudantes, mas
avaliamos como básicos os objetos do conhecimento desenvolvidos pelos
entrevistados, uma vez que nosso escopo é o segmento do Ensino Médio. Apenas
17% dos professores ressaltaram aspectos relacionados à resolução de exercícios e
situações problema e 9% elencaram conceitos estatísticos relacionados a medidas
de tendência e interpretação de amostra. Apesar das respostas sobre os objetos do
54
Para o cálculo da frequência relativa usamos o total de professores que abordaram aspectos relacionados a objetos do conhecimento (76)
135
conhecimento terem sido espontâneas, é provável que os conceitos abordados
pelos docentes sejam bastante simples para as séries finais da Educação Básica.
Gráfico 2 – Objetos do conhecimento: frequências das categorias
OBJETOS DO CONHECIMENTO
Fonte: os autores
5.1.2.2. Metodologia
O tema metodologia, citado por 49 professores, é composto de 20
unidades de contexto, que após a análise dos núcleos de sentido, foram
organizados em 5 categorias conforme mostra o quadro 9. As categorias associadas
à didática dos professores foram criadas de modo a diferenciar a natureza das
ações desenvolvidas em sala de aula.
Unidades temáticas que evidenciam o papel do professor como detentor
do conhecimento foram reunidas na categoria aulas centradas no professor, que
contrapõe a proposição de atividades em que os alunos são protagonistas,
categoria que evidencia, dentre outros aspectos, a importância dos alunos
vivenciarem o processo de uma investigação estatística e a troca entre pares.
Reconhecemos que nessa categoria estão práticas de complexidades bastante
diferentes como a busca por gráficos e tabelas em jornais e revistas e a proposição
de campanhas publicitárias, mas entendemos que o fato do aluno ser o centro
dessas práticas as une.
0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70%
Conceitos estatísticos
Argumentação
Relação com outros conceitos…
Aplicação
Estrutura de tabelas e gráficos
Etapas de uma pesquisa
Leitura e interpretação
136
Quadro 12 – Metodologia: unidades de contexto e categorias
Tema: Metodologia (como ensinam)
Aulas centradas no professor
Aula expositiva
Aula mediada
Atividades individuais
Proposição de atividades em que os alunos são
protagonistas
Pesquisar (procurar) gráficos e tabelas
Atividades envolvendo levantamento de dados
Trabalho em grupo
Pesquisas
Pesquisas com temas escolhidos pelos alunos
Pesquisa de campo
Pesquisas sobre atualidades
Elaboração de projetos com dados estatísticos
Proposição de campanhas publicitárias
Requisitos básicos Partir do conhecimento/realidade dos alunos
Retomada dos conceitos básicos da matemática
Proposição de atividades de argumentação
Produção de texto
Atividades de debate e argumentação
Para além das aulas de Matemática
Oficinas
Atividades que envolvam a interdisciplinaridade
Atividades que envolvam a transdisciplinaridade
Didática inovadora
Fonte: os autores
A categoria requisitos básicos apresenta unidades temáticas que
apontam uma preocupação com conceitos matemáticos básicos na acepção de “pré-
requisito”, ou seja, a crença de que algumas técnicas de cálculo são necessárias
para aprender Estatística faz com que os professores investiguem o ponto de partida
não no sentido de uma avaliação diagnóstica e sim para adaptar o ensino ou
retomar os conteúdos que os alunos já deveriam dominar. Atividades que incentivam
os alunos a utilizar conhecimentos de estatística como recurso para enunciar,
conjecturar e debater ideias foram agrupadas na categoria proposição de
atividades de argumentação. A categoria para além das aulas de Matemática,
por sua vez, abrange ações que podem revelar a compreensão de que as aulas de
Estatística podem ir além dos conteúdos da disciplina escolar.
137
O gráfico 3 apresenta a frequência de cada uma das categorias nas
respostas dos professores que apontaram práticas metodológicas55.
Gráfico 3 – Metodologia: frequências das categorias
METODOLOGIA
Fonte: os autores
O discurso sobre a prática dos entrevistados sugere que os alunos
estão tendo a oportunidade de desenvolver o conhecimento estatístico por meio de
atividades em que assumem o papel de protagonistas, uma vez que ações desse
tipo foram apontadas por mais de 60% dos entrevistados que apresentaram suas
metodologias contra 14% que descreve práticas associadas a aulas centradas no
professor. Desse mesmo grupo, cerca de 20% mostraram uma preocupação com os
requisitos básicos o que pode indicar um tratamento mais matemático ao conteúdo
estatístico. O baixo índice de professores que relataram ações cujo foco seja a
argumentação (14%) e a relação com outros temas para além da sala de aula
sugere que as práticas, embora centradas nos alunos, não estão associadas
necessariamente ao desenvolvimento do senso crítico.
55
Para o cálculo da frequência relativa usamos o total de professores que abordaram aspectos relacionados a metodologia (49)
0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70%
Para além das aulas de Matemática
Aulas centradas no professor
Atividades de argumentação
Requisitos básicos
Protagonismo dos alunos
138
5.1.2.3. Recursos didáticos
O tema recursos didáticos, citado por 30 professores, é constituído de 9
unidades de contexto, que após a análise dos núcleos de sentido, foram
organizados em 4 categorias conforme mostra o quadro 14.
Quadro 14 – Recursos didáticos: unidades de contexto e categorias
Recursos didáticos (com o quê ensinam)
Meios de comunicação Jornais, revistas e/ou internet
Textos informativos com dados estatísticos
Recursos digitais e calculadora
Calculadora
Computador, uso de planilha eletrônica
Vídeos
Recursos da educação formal Livros didáticos
Questões de vestibular, ENEM
Objetos Materiais concretos
Materiais reciclados
Fonte: os autores.
A categoria meios de comunicação abrange ações didáticas que
centram a busca e a análise de tabelas, gráficos e textos em jornais, revistas e/ou
internet. Recursos digitais e calculadoras é a categoria composta de unidades
temáticas que ressaltam o uso da tecnologia nas aulas de Estatística. Livros
didáticos e exercícios compõem a categoria recursos da educação formal. A
categoria objetos foi criada para agrupar respostas genéricas sobre o uso de
materiais concretos ou reciclados.
As frequências de manifestação de cada uma das categorias no conjunto
das respostas sobre recursos didáticos podem ser vistas no gráfico56 4.
Podemos observar que os recursos didáticos mais lembrados pelos
entrevistados foram os meios de comunicação (60%) e a tecnologia (40%), resultado
que sugere uma preocupação dos docentes com a vivência do cotidiano dos alunos.
O fato de poucos professores terem elencado livros e exercícios (7%) não nos
permite afirmar que não o fazem, mas podemos inferir que os mesmos se sentem
inseguros sobre o conteúdo e busca fontes para além dos livros para suas aulas. No
entanto, conhecendo o baixo índice da proposição de resolução de problemas como
objeto do conhecimento conjecturamos que a Estatística não tem sido apresentada
56
Para o cálculo da frequência relativa usamos o total de professores que abordaram aspectos relacionados a recursos didáticos (30)
139
aos alunos na complexidade prevista para o Ensino Médio pelos documentos oficiais
e pelo ENEM.
Gráfico 4 – Recursos didáticos: frequências das categorias
RECURSOS DIDÁTICOS
Fonte: os autores
5.1.2.4. Contextos
O tema contextos, citado por 30 professores, é constituído de 6 unidades
de contexto, que após a análise dos núcleos de sentido, foram organizados em 3
categorias conforme mostra o quadro 14.
Quadro 14 – Contextos: unidades de contexto e categorias
Contextos (sobre o que ensinam)
Contexto pessoal
Altura, número do sapato, moradia, preferências de comida, bebida, esporte, estilo musical, notas escolares
Cotidiano, dia a dia, proximidade e interesse dos alunos
Contexto educacional/ ocupacional
Atualidades
Finanças, juros
Campanhas publicitárias, poder de influência
Contexto público Eleições, inflação, produtos, previsão do tempo
Fonte: os autores
Optamos por classificar o tema contexto com a mesma nomenclatura
utilizada para categorizar as questões do ENEM. A categoria o contexto pessoal
está associada a situações relacionadas diretamente às atividades cotidianas do
estudante. As unidades temáticas que revelam assuntos que surgem na escola e no
0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70%
Recursos da educação formal
Objetos
Recursos digitais e calculadora
Meios de comunicação
140
trabalho fazem parte da categoria contexto educacional/ocupacional. Os assuntos
coletivos, relacionados à comunidade local ou sociedade compõem a categoria
contexto público.
Apresentamos, no gráfico 5 os resultados obtidos considerando como
total o número de entrevistados cujas respostas revelam o contexto sobre o qual
trabalham Estatística57.
Gráfico 5 – Contextos: frequências das categorias
CONTEXTOS
Fonte: os autores
O resultado mostra o predomínio do trabalho com Estatística pautado em
contextos pessoais, 77% das respostas sobre esse tema estão associadas a
assuntos como altura, número de sapato, preferências e notas escolares. Apesar de
relevantes e próximos ao cotidiano dos alunos, esses temas são bastante simples e
dificilmente propiciam argumentação e tomada de decisão, habilidades esperadas
no contexto da competência estatística. Os contextos educacional/ocupacional e
público, que possuem um potencial maior no que diz respeito ao desenvolvimento do
senso crítico, aparecem apenas em 27% e 20% das respostas, respectivamente.
5.1.2.5. Análise das ações didáticas
Na intenção de compreender as ações didáticas dos entrevistados
realizamos uma análise de conteúdo das respostas dadas à pergunta aberta,
57
Para o cálculo da frequência relativa usamos o total de professores que abordaram aspectos relacionados a contextos (30)
0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90%
Contexto público
Contexto educacional/ ocupacional
Contexto pessoal
141
criamos categorias associadas a quatro grandes temas e examinamos suas
frequências.
Os resultados, quando considerados em conjunto, sugerem que a maior
parte dos professores planejam ações nas quais os estudantes são protagonistas e
propõem a vivência das etapas de uma pesquisa sobre temas pessoais desde a
coleta de dados até a construção de tabelas e gráficos. Além disso, a leitura e
interpretação de gráficos e tabelas, sobretudo daqueles publicados nos meios de
comunicação, são habilidades consideradas importantes para o grupo. Esse perfil,
apesar de adequado às discussões teóricas e análises de documentos oficiais da
Educação realizadas até aqui, sugere um tratamento bastante simplificado da
Estatística no Ensino Médio. Poucos são os professores que destacam o trabalho
com conceitos estatísticos – como média, mediana, moda e amostra – ou que
descrevem ações que propiciem a argumentação e tomada de decisões
relacionadas a contextos ocupacionais e públicos com base no conhecimento
estatístico. Podemos inferir que no Ensino Médio há pouco avanço em relação aos
conceitos estatísticos abordados no Ensino Fundamental.
5.1.3. Perfis – Questões de ordenação
As questões de ordenação solicitavam ao entrevistado assinalar o grau de
importância de cinco alternativas dentre um mesmo assunto: justificativa para o
ensino de Estatística (ENS), habilidades estatísticas (HAB) e questões adequadas
para avaliar o conhecimento dos alunos (QUE). Durante a análise dos resultados,
criamos três novas variáveis (ENS_O, HAB_O e QUE_O) considerando a magnitude
da média de modo a trabalhar com as alternativas ordenadas por grau de
importância, ou seja, em posições diferentes das apresentadas no instrumento de
pesquisa.
Para evitar a repetição e facilitar a interpretação, optamos por utilizar
palavras chave para cada uma das alternativas das variáveis ao invés da sentença
completa ou dos códigos.
Apresentaremos inicialmente os resultados da análise estatística
descritiva para cada uma das variáveis e, na sequência, a investigação realizada
sobre a correlação entre as mesmas, duas a duas. Os resultados completos estão
no APÊNDICE H.
142
5.1.3.1. A justificativa para o ensino de Estatística
A pergunta de número dois do questionário solicitava que os professores
ordenassem cinco frases que apresentavam justificativas para o ensino de
Estatística. O gráfico 6 retrata a média e o erro padrão da medida58, sendo
classificados os tópicos em ordem de graus de importância atribuídos pelos
professores para cada uma das alternativas.
Gráfico 6 – Justificativas para o ensino: média e erro padrão do grau de importância
JUSTIFICATIVAS PARA O ENSINO: MÉDIA E ERRO PADRÃO
Fonte: os autores
O desvio padrão dos valores associados aos graus de importância pouca
variabilidade no comportamento dos entrevistados. Para ilustrar a distribuição das
respostas, elaboramos o gráfico 7, de bolhas, no qual suas dimensões estão
atreladas à frequência absoluta, o eixo horizontal é composto das alternativas e o
58
Indicado pelo desvio padrão dividido pela raiz do número de respondentes ao questionário
143
eixo vertical das possíveis respostas (1 a 5). As cores vermelhas e azuis
representam, respectivamente, as respostas mais frequente e menos frequente para
cada uma das alternativas.
Os resultados indicam que o grupo de entrevistados confere maior
relevância ao fato da Estatística propiciar o desenvolvimento de habilidades
relacionadas de argumentação e senso crítico. A proximidade dos conceitos
estatísticos ao cotidiano de uma sociedade repleta de informações obteve um grau
de importância similar. A alternativa relacionada à Alfabetização Matemática foi a
que apresentou o menor grau de importância talvez pelo fato dos professores não
conhecerem o conceito ou não o associarem à Estatística.
Gráfico 7 – Justificativas para o ensino: distribuição das respostas
JUSTIFICATIVAS PARA O ENSINO: DISTRIBUIÇÕES DAS RESPOSTAS
Fonte: os autores
5.1.3.2. As habilidades estatísticas
A terceira pergunta do questionário os professores foram convidados a
ordenar cinco frases que apresentavam habilidades estatísticas importantes para
serem desenvolvidas pelos alunos.
O gráfico 8 retrata a média e o erro padrão dos graus de importância
atribuídos pelos professores para cada uma das alternativas. Assim como ocorreu
144
com a variável ensino, o desvio padrão nos mostra uma distribuição de respostas
considerável para cada alternativa.
Gráfico 8 – Habilidades: média e erro padrão
HABILIDADES: MÉDIA E ERRO PADRÃO
Fonte: os autores
O gráfico em bolhas 9 semelhante ao descrito anteriormente foi elaborado
na tentativa de compreender o conjunto de respostas dos professores.
A análise dos dados sinaliza um grau de importância extremamente alto
para a habilidade ler e interpretar informações apresentadas em gráficos e tabelas
em detrimento ao conhecimento relacionado ao cálculo de medidas estatísticas.
Esses resultados são coerentes com os obtidos na análise de conteúdo realizada a
partir das respostas dos professores sobre as ações didáticas que costumam adotar
no ensino de Estatística. Duas são as hipóteses para o fato dos resultados
apresentarem um grau de importância baixo associado à habilidade “fazer inferência
a partir de resultados estatísticos”: a primeira diz respeito ao desconhecimento do
termo por parte dos entrevistados; já a segunda sugere que os professores não
145
associam a operação analisar a veracidade de uma proposição por meio do estudo
de medidas estatísticas de um conjunto de dados. Isso significa dizer que não se
reconhece a importância da média, mediana e moda, por exemplo, para descrever,
interpretar, analisar e, se necessário, inferir informações.
Gráfico 9 – Habilidades: distribuições das respostas
HABILIDADES: DISTRIBUIÇÕES DAS RESPOSTAS
Fonte: os autores
5.1.3.3. As questões do ENEM para avaliar o conhecimento sobre Estatística
A última questão que envolvia a ordenação de alternativas apresentava
cinco questões do ENEM relacionadas à Estatística e solicitava que os professores
as numerassem de 1 a 5 de acordo com o grau de importância que conferissem a
cada uma delas. O gráfico 10 retrata a média e o desvio padrão dos graus de
importância atribuídos pelos professores para cada uma das questões.
As médias dos graus de importância ficaram muito próximas umas das
outras, indicando, talvez, que os professores não enxergavam muitas diferenças
entre os objetivos das questões apresentadas. Essa pequena separação entre os
grupos sugere que exista uma dificuldade por parte dos professores em associar as
estruturas mais teóricas do ensino de Estatística com a prática na resolução de uma
questão proposta.
146
Gráfico 10 – Questões: média e erro padrão
QUESTÕES: MÉDIA E ERRO PADRÃO
Fonte: os autores
Observemos o gráfico 11, de bolhas, associado à essa ordenação, na
busca de uma melhor compreensão dessa ordenação das questões.
A distribuição do gráfico em bolhas permite uma ampliação na análise do
conjunto dos dados. É possível observar, por exemplo, que as questões de
inferência e análise de informação obtiveram grau de importância máximo (5) com
maior frequência, o que indica a relevância dessas alternativas para os professores.
Os resultados das questões graus de relevância mais baixos merecem destaque,
uma vez que a alternativa com a menor média não foi aquela com resposta um mais
frequente. Uma análise cuidadosa indica que os professores consideraram menos
importante a questão que envolvia a leitura direta dos dados do que aquela que
esperava a resolução de um problema a partir de dados expressos em um gráfico.
147
Gráfico 11 – Questões: distribuições das respostas
QUESTÕES: DISTRIBUIÇÕES DAS RESPOSTAS
Fonte: os autores
5.1.3.4. Análise das questões de ordenação
O estudo dos dados referentes às questões de ordenação do instrumento
de pesquisa sugere que os entrevistados conhecem o teor dos referenciais teóricos
e das indicações dos documentos oficiais em relação ao ensino de Estatística. Às
afirmações relacionadas ao desenvolvimento da argumentação e do senso crítico
estão associados os maiores graus de importância nos assuntos ensino e
habilidades.
Ao examinarmos os graus de importância das questões em conjunto
percebemos algumas incoerências, como é o caso da leitura e interpretação de
representações de dados. Enquanto a habilidade “Ler e interpretar informações
apresentadas em tabelas, gráficos e infográficos” obteve a maior frequência de grau
cinco de importância, a questão do ENEM que exigia explicitamente essa habilidade
apresentou a menor frequência de grau um de importância, assim como a
justificativa do ensino de Estatística relacionada à Alfabetização matemática.
As incoerências nos resultados talvez sejam frutos da incompreensão
sobre alguns termos utilizados no questionário, como “Alfabetização matemática” e
“inferência”. Entretanto, gostaríamos de ressaltar o valor do diálogo entre os
referenciais teóricos da Educação e a prática em sala de aula. Por exemplo,
148
daqueles que consideram o desenvolvimento da argumentação e do senso crítico
como uma justificativa relevante para o ensino de Estatística, espera-se ações
didáticas que privilegiem momentos de investigação, de levantamento de hipóteses,
de confronto e debate não só a partir do que é explícito nos dados, mas também do
que é formulado com base no conhecimento estatístico que se tem.
5.1.4. Perfis – Escala Likert
Na tentativa de compreender as principais ideias dos professores sobre o
ensino de Estatística, foi solicitado que classificassem 30 afirmações de acordo com
o seu nível de concordância, usando uma escala Likert como a descrita
anteriormente. Antes de apresentar os perfis extraídos da análise fatorial dos dados,
faremos uma análise sobre o grau de concordância dos itens.
5.1.4.1. Níveis de concordância
Para examinar os níveis de concordância com os itens dispostos na
escala Likert, calculamos a média (�̅�) das respostas dos entrevistados para cada
um dos itens e os agrupamos com base nesse valor. Foram criados quatro grupos:
alto nível de concordância, nível parcial de concordância, nível parcial de
discordância e alto nível de discordância. Optamos por desconsiderar os itens que
obtiveram média próxima a 3 (2,5 ≤ �̅� < 3,5) por entender o expressa uma posição
intermediária, de indiferença.
Apenas uma afirmação apresentou alto nível de concordância, como
podemos ver no quadro 15, revelando a importância conferida pelos professores às
publicações dos meios de comunicação como recurso didático.
Quadro 15: Item com alto nível de concordância
Item com alto nível de concordância (�̅� ≥ 𝟒, 𝟓)
11. Dados de jornais, revistas e internet devem ser utilizados na construção de
gráficos e tabelas pelos alunos. (�̅� =4,72)
Fonte: os autores
O conjunto de itens que apresentam um nível parcial de concordância
(3,5 ≤ �̅� < 4,5), apresentados no quadro 16, sugere que os professores reconhecem
a relação da Estatística com outros conceitos matemáticos e destacam como objeto
do conhecimento mais relevante a tomada de decisão em situações do cotidiano em
contextos de natureza pessoal.
149
Quadro 16: Itens com nível parcial de concordância
Itens com nível parcial de concordância (𝟑, 𝟓 ≤ �̅� < 𝟒, 𝟓)
15. É necessário buscar a conexão de Estatística com os eixos do conhecimento.
(�̅� =4,44)
5. O ensino de Estatística deve ser adaptado à realidade dos alunos. (�̅� =4,37)
12. Os exemplos que os alunos trazem para as aulas são relevantes para o ensino
de Estatística. (�̅� =4,36)
21. A Estatística ajuda os alunos a tomarem decisões no seu dia a dia. (�̅� =4,32)
7. É necessário complementar as orientações de Estatística da rede estadual da
qual faço parte. (�̅� =4,28)
20. A produção de texto deve ser trabalhada nas aulas de Estatística como uma
forma de expressar os resultados de pesquisas. (�̅� =4,13)
28. É mais relevante aplicar Estatística em temas atuais do que aprofundar
conceitos estatísticos. (�̅� =4,03)
14. Toda informação em gráficos e tabelas pode ser utilizada nas aulas de
Estatística. (�̅� =3,97)
30. Perguntar a preferência dos alunos sobre algum tema é uma atividade chave do
trabalho com Estatística. (�̅� =3,91)
18. Os gráficos de jornais e revistas devem ser os mais utilizados em sala de aula.
(�̅� =3,88)
6. A principal função do ensino de Estatística é o desenvolvimento do senso crítico
dos alunos. (�̅� =3,81)
9. A principal função da Estatística é a compreensão de gráficos e tabelas
presentes no dia a dia. (�̅� =3,77)
1. Os alunos não precisam conhecer todas as fórmulas de Estatística. (�̅� =3,68)
27. A aprendizagem de Estatística não impede que os alunos sejam enganados por
pesquisas eleitorais. (�̅� =3,68)
Fonte: os autores
Em relação à metodologia, nota-se um cuidado com a adaptação do
ensino à realidade dos alunos e a importância conferida à leitura e à interpretação
de tabelas e gráficos e ao desenvolvimento da argumentação. Para isso os
professores usam recursos que vão além dos oferecidos pela rede estadual na qual
trabalham, como gráficos de jornais e revistas. As respostas revelam ainda o não
aprofundamento dos conceitos estatísticos.
Os itens do grupo de afirmações com níveis parciais de discordância,
apresentados no quadro 17, estão associados à organização e práticas de ensino.
Nota-se uma leve concordância em relação à necessidade de trabalhar conceitos
estatísticos frequentemente, assim como indicam as discussões atuais de Educação
150
Estatística. Além disso, os professores parecem concordar com o uso da tecnologia
para auxiliar os cálculos estatísticos.
Quadro 17: Itens com nível parcial de discordância
Itens com nível parcial de discordância (𝟐, 𝟓 ≤ �̅� < 𝟏, 𝟓)
2. Assuntos de Estatística não precisam ser abordados em todas as séries.
(�̅� =2,10)
17. É mais produtivo concentrar todos os conteúdos de Estatística em um bimestre
do ano do que distribuí-los ao longo do ano. (�̅� =1,90)
16. O uso da calculadora é prejudicial à aprendizagem dos conceitos de Estatística.
(�̅� =1,54)
Fonte: os autores
Os itens com maior nível de discordância, dispostos no quadro 18, estão
relacionados à fonte dos dados utilizados em sala de aula. O resultado, condizente
com os demais, sugere que os professores são favoráveis ao uso de dados
provenientes da internet e de infográficos de jornais e revistas.
Quadro 18: Itens com maior nível de discordância
Itens com maior nível de discordância (�̅� ≤ 𝟏, 𝟓)
24. A internet não é uma boa fonte de dados para o trabalho de Estatística em sala
de aula. (�̅� =1,50)
4. Infográficos de jornais e revistas não fazem parte do ensino de Estatística.
(�̅� =1,29)
Fonte: os autores
Analisando o conjunto das afirmações e seus níveis de concordância, é
possível inferir que os professores acreditam que um trabalho relacionado ao
cotidiano dos alunos, aplicado a situações com as quais os cidadãos se deparam, é
o mais indicado no Ensino Médio. É muito provável que os docentes que
participaram da pesquisa não dão ênfase aos métodos e processos estatísticos, que
conforme apresentado anteriormente, estão relacionados a um nível mais complexo
de literacia estatística e ao desenvolvimento do pensamento e dos raciocínios
estatísticos indicados para esse segmento de ensino.
5.1.4.2. Análise Fatorial
A busca pelo constructo associado ao perfil dos professores a partir do
nível de concordância com sentenças previamente elaboradas foi realizada por meio
151
da análise fatorial, técnica adequada à investigação de padrões e dimensões
latentes de variáveis. De acordo com a descrição detalhada das etapas do método
estatístico empregado, obtivemos cinco fatores entendidos aqui como conjuntos de
variáveis, no caso, os itens da escala Likert.
Ao primeiro fator estão associados os três itens a seguir:
26. Dominar vários conceitos matemáticos é fundamental para
compreender Estatística. (carga fatorial de 0,71738)
16. O uso da calculadora é prejudicial à aprendizagem dos conceitos de
Estatística (carga fatorial de 0,67289)
23. A principal função da Estatística é fornecer ferramentas para outros
conteúdos de Matemática e de outras disciplinas. (carga fatorial de
0,61313)
Em uma análise fatorial, o primeiro fator retido é o que mais explica o
conjunto de respostas, no caso 17,85% da variância encontrada. O conjunto de itens
descrito revela uma tendência mais tecnicista dos entrevistados para os quais,
aparentemente, a Estatística é vista ora como uma aplicação de conteúdos
matemáticos, ora como ferramenta para o desenvolvimento de outros conceitos.
Ensina-se Estatística para aprender Matemática.
O segundo fator explica 13,37% da variância encontrada e é composto
por dois itens, quais sejam:
21. A Estatística ajuda os alunos a tomarem decisões no seu dia a dia.
(carga fatorial de 0,83316)
20. A produção de texto deve ser trabalhada nas aulas de Estatística
como uma forma de expressar os resultados de pesquisas. (carga fatorial
de 0,75197)
Podemos associar esse fator a um ensino da Estatística que visa
desenvolvimento do senso crítico, os conceitos estatísticos subsidiam ações de
argumentação e de tomada de decisão dos alunos.
O terceiro fator é descrito por três itens da escala Likert:
30. Perguntar a preferência dos alunos sobre algum tema é uma atividade
chave do trabalho com Estatística. (carga fatorial de 0,74388)
29. O ensino de Estatística precisa estar associado ao uso do
computador. (carga fatorial de 0,5701)
152
4. Infográficos de jornais e revistas não fazem parte do ensino de
Estatística. (carga fatorial de -0,68425)
Esse fator, que explica 11,86% da variância encontrada, apresenta uma
visão mais utilitária e intuitiva da Estatística para a qual a constatação dos fatos é
mais relevante do que o trabalho com a resolução de situações-problema e a
inferência. Observa-se que a carga fatorial associada ao item 4 é negativa, o que
indica que os professores consideram que infográficos e revista fazem parte do
ensino de Estatística.
Dois itens estão associados ao quarto fator, que explica 10,13% da
variância encontrada.
11. Dados de jornais, revistas e internet devem ser utilizados na
construção de gráficos e tabelas pelos alunos. (carga fatorial de 0,72398)
9. A principal função da Estatística é a compreensão de gráficos e tabelas
presentes no dia a dia. (carga fatorial de 0,50094)
8. O recurso didático mais produtivo para o ensino de Estatística são os
projetos. (carga fatorial de -0,71601)
O quarto fator está associado a um ensino de Estatística focado
unicamente na leitura e interpretação de representações de dados. Ao negar o uso
de projetos, esse conjunto de itens revela um olhar mais superficial ao tema na
perspectiva da literacia, do pensamento e do raciocínio estatísticos.
O último fator é composto de dois itens:
10. O trabalho com Estatística deve ocorrer em todos os meses. (carga
fatorial de 0,86946)
17. É mais produtivo concentrar todos os conteúdos de Estatística em um
bimestre do ano do que distribuí-los ao longo do ano. (carga fatorial de
-0,60804)
Esse quinto fator, que explica 9,30% da variância encontrada, apresenta
aspectos relacionados à periodicidade do trabalho com a Estatística e revela uma
preocupação em trabalhar essa unidade temática em todos os períodos escolares,
seguindo as sugestões dos documentos educacionais oficiais.
5.1.5. Análise sobre os perfis
As diferentes metodologias que foram aplicadas a cada parte do
questionário sugerem que os entrevistados, professores de Matemática do Ensino
153
Médio, ensinam Estatística com o foco na leitura e interpretação dos dados
expressos em gráficos e tabelas publicados em meios de comunicação e, talvez por
isso, propõem situações de pesquisas para as quais o produto final é a produção de
um gráfico ou tabela.
Usando como referência os níveis de desenvolvimento das variáveis e
habilidades associadas à literacia estatística de Watson e Callingham (2003), as
ações didáticas apontadas pelos entrevistados na questão aberta se aproximam do
nível 3, nomeado pelos autores de inconsistente. Nesse nível o engajamento com o
contexto é seletivo, as habilidades matemáticas exigidas são simples ou pautadas
em procedimentos já conhecidos, ainda não há uso com compreensão dos conceitos
medidas estatísticas. Aparentemente os professores propõem aos alunos situações
de leitura dos dados e entre dados, denominações de Curcio (1989) para a
compreensão de informações explícitas ou combinadas dos dados apresentados,
deixando de lado propostas cuja leitura e interpretação permitam a identificação de
padrões de comportamento e a generalização buscando previsões ou inferências.
Apesar da importância da leitura e interpretação na competência estatística, a
literacia estatística pressupõe certo conhecimento dos conceitos estatísticos, algo
que a análise dos dados não revela.
Em relação à competência raciocínio estatístico, as ações didáticas
privilegiam parte do raciocínio sobre os dados e sobre a representação dos dados
na definição de Garfield e Gal (1999), excluindo a reflexão sobre medidas
estatísticas, sobre amostras e sobre associação.
Ainda que a vivência das etapas da pesquisa esteja associada ao
desenvolvimento do pensamento estatístico, não há sinais de que as ações didáticas
descritas privilegiam o caráter investigativo que envolve desde a elaboração da
problematização até o questionamento dos métodos de coleta, organização e
análise dos dados. Os resultados podem indicar que dos estudantes não está sendo
exigida a elaboração de pensamentos mais abstratos e complexos do que faziam no
Ensino Fundamental.
5.2. A COMPETÊNCIA ESTATÍSTICA DOS ALUNOS NO ENEM
A seguir, apresentaremos os resultados da análise do desempenho de
alunos concluintes do Ensino Médio em questões de natureza Estatística no ENEM
de acordo com a metodologia descrita. Nossa intenção será avaliar a competência
154
estatística apurada frente à competência estatística esperada de alunos ao final
desse segmento de ensino e, posteriormente, confrontar com a análise do discurso
sobre as práticas e concepções dos professores.
5.2.1. As questões de Estatística nas edições do ENEM
Para examinar a competência estatística dos alunos, conforme explicitado
anteriormente, analisamos o desempenho dos alunos nas questões relacionadas à
Estatística das edições de 2012, 2013 e 2014.
Inicialmente foram selecionadas as 32 questões categorizadas como
avaliadoras das competências 6 e 7 de Matemática de acordo com os arquivos
disponibilizados pelo INEP. A esse conjunto foram acrescentadas 4 questões
inicialmente associadas a outras competências e habilidades, mas que exigiam na
sua resolução a leitura e interpretação de dados expressos em gráficos e tabelas,
totalizando 36 questões.
A fim de caracterizar o desempenho dos alunos nas questões do ENEM
relacionadas à competência estatística, apresentaremos uma análise das questões
de agrupadas pelo ano de edição do ENEM.
5.2.1.1. ENEM 2012
Na edição de 2012, 10 questões estavam diretamente relacionadas à
competência estatística, de acordo com os microdados do exame. Optamos por
acrescentar uma questão referente à habilidade 20 (Interpretar gráfico cartesiano
que represente relações entre grandezas) no conjunto a ser analisado pelos motivos
já citados anteriormente. No gráfico 12 apresentamos uma síntese da distribuição
das questões pelas categorias utilizadas.
O número de questões da prova de 2012 do ENEM relacionadas ao eixo
Análise de Dados é significativo e a distribuição entre as competências de área é
equitativa (desconsiderando a questão 1, que pelos dados do INEP pertence à
competência de área 5). O mesmo não se pode dizer das habilidades dessas
competências, uma vez que nessa edição duas delas não estavam associadas às
questões (H24 e H29). A habilidade 25 foi avaliada por meio de quatro questões,
mostrando uma preocupação inerente ao exame relacionada à resolução de
problemas.
155
Gráfico 12: Caracterização das questões do ENEM 2012
CARACTERIZAÇÃO DAS QUESTÕES DO ENEM 2012
Frequência absoluta das categorias por variável
Fonte: os autores
Em relação ao contexto, grande parte das questões apresentou situações
que surgem na escola, trabalho e lazer não necessariamente relacionadas de modo
direto às atividades cotidianas do indivíduo. A leitura entre os dados foi a mais
exigida, seguida da leitura além dos dados. Isso revela a preocupação com a
necessidade de ser competente para além da simples busca pela informação, de
combinar e relacionar dados no estabelecimento de estratégias de resolução de
problemas. Por fim, notamos uma predominância na exigência de processos de
reflexão na resolução das questões. É preciso ressaltar que os exercícios rotineiros
que envolvem o uso de técnicas aparecem em menor número, processos mais
complexos são exigidos no exame que se propõe avaliar a competência matemática.
5.2.1.2. ENEM 2013
Na edição de 2013, 11 questões estavam diretamente relacionadas à
competência estatística, de acordo com os microdados do exame. Acrescentamos
duas questões no conjunto a ser analisado. A primeira questão (22) estava
associada originalmente à habilidade 5 (avaliar propostas de intervenção na
realidade utilizando conhecimentos numéricos) e apresentava dados relevantes na
resolução da situação-problema em uma tabela de dupla entrada. A segunda
questão (24) apresenta a relação entre a carga horária e o desempenho de alguns
156
países no Pisa por meio de um gráfico de dispersão e associada à habilidade 10
(identificar relações entre grandezas e unidades de medida)
A seguir apresentamos o gráfico 13 com a distribuição das questões de
2013 pelas categorias utilizadas.
Gráfico 13: Caracterização das questões do ENEM 2013
CARACTERIZAÇÃO DAS QUESTÕES DO ENEM 2013
Frequência absoluta das categorias por variável
Fonte: os autores
Na edição de 2013 do ENEM todas as habilidades relacionadas às
competências de área 6 e 7 são avaliadas. Mais uma vez notamos a força dada à
resolução de problemas no exame, uma vez que a habilidade 25 apareceu mais
vezes do que as demais habilidades. Em relação ao contexto, grande parte das
questões apresentou situações que surgem na escola, trabalho e lazer. Essa edição
não incluiu contextos pessoais nas questões de Estatística. Assim como na edição
de 2012, a leitura entre os dados foi a mais exigida, seguida da leitura além dos
dados. Por fim, notamos uma predominância na exigência de processos de conexão
na resolução das questões.
5.2.1.3. ENEM 2014
Na edição de 2014, assim como em 2012, de acordo com os microdados
do exame, 10 questões estavam diretamente relacionadas à competência
estatística. Optamos por acrescentar mais duas questões no conjunto a ser
analisado. A questão 26, referente à habilidade 20 (interpretar gráfico cartesiano que
157
represente relações entre grandezas), apresenta um gráfico em linha que relaciona
duas espécies de bactérias a suas respectivas quantidades no decorrer do tempo. A
questão 29, originalmente associada à habilidade 18 (avaliar propostas de
intervenção na realidade envolvendo variação de grandezas) exige do participante
relacionar dados de uma tabela simples e de uma lista. A distribuição das questões
pelas categorias utilizadas está representada no gráfico 14.
Gráfico 14: Caracterização das questões do ENEM 2014
CARACTERIZAÇÃO DAS QUESTÕES DO ENEM 2014
Frequência absoluta das categorias por variável
Fonte: os autores
É possível notar um equilíbrio entre as competências de área associadas
à Estatística. Assim como em 2013, a edição de 2014 avalia todas as habilidades
das competências de área 6 e 7, mais uma vez, a habilidade 25 (Resolver problema
com dados apresentados em tabelas ou gráficos) se revela como mais frequente.
Em relação ao contexto, há uma predominância por questões que apresentam
situações educacionais e/ou ocupacionais. A leitura entre os dados e além dos
dados foram as mais exigidas, mostrando uma tendência de esperar que os alunos
sejam capazes de ir além da simples leitura dos dados. Por último, percebemos,
assim como em 2012, uma força para os processos de reflexão na resolução das
questões de Estatística.
158
5.2.2. O desempenho dos alunos
Na sequência, examinaremos o desempenho de um grupo de
participantes do ENEM formado por estudantes concluintes do ensino médio em
escolas regulares no ano de aplicação do exame, com até 18 anos, que estiveram
presente em todas as provas e com a redação válida. A definição de escola pública
ou privada usada na análise refere-se à escola que o candidato frequentou no último
ano.
As categorias criadas para a análise de cada uma das questões descritas
na metodologia serão usadas como embasamento na investigação aprofundada
sobre o desempenho dos alunos em Estatística. Usaremos ainda, quando relevante,
a distribuição entre as alternativas assinaladas pelos alunos na intenção de
compreender seu raciocínio.
Para essa etapa da investigação optamos por manter apenas as questões
que apresentam como cerne objetos do conhecimento associados à Estatística no
sentido de análise de dados, resultando na exclusão de questões que abordam
probabilidade associada ao raciocínio combinatório da Contagem.
5.2.2.1. ENEM 2012
Na análise que segue, de acordo com o universo já descrito, avaliaremos
uma amostra de cerca de 960 mil alunos que realizaram a prova de 2012,
distribuídos em escolas cuja dependência administrativa está mostrada na tabela 2:
Tabela 2 – Total de alunos por dependência administrativa no exame de 2012
Dependência administrativa escolar
Número de participantes concluintes
Pública 706.721
Privada 253.211
Total 959.932
Fonte: INEP
É preciso ressaltar que não iremos olhar para as questões do ENEM por
meio da escala utilizada pela TRI, uma vez que somente a análise dos itens
associados à competência Estatística não permite que o façamos dessa forma. Os
números que seguem representam o índice de acertos em porcentagem.
Apontamos o desempenho dos alunos nas questões de Estatística da
prova de Matemática da edição de 2012 do ENEM por meio do gráfico 15.
159
Gráfico 15 – Desempenho dos alunos em estatística no ENEM 2012
DESEMPENHO DOS ALUNOS EM ESTATÍSTICA
NA PROVA DE MATEMÁTICA DO ENEM 2012
Média e desvio padrão do desempenho dos alunos
por dependência administrativa das escolas (em porcentagem)
Fonte: INEP
A média de acertos em Estatística na edição de 2012, tomado o universo
de análise com um todo, foi de 37,63%, com um desvio padrão de 19,81%. O
desempenho dos alunos oriundos das escolas públicas é ligeiramente inferior ao
desempenho geral, média 33,66% com desvio padrão de 17,48%, diferentemente do
desempenho dos concluintes das escolas privadas que apresentaram uma média de
acertos de 48,75% e desvio padrão de 26,29%.
Apesar do desempenho das escolas privadas ter sido superior ao das
escolas públicas, é preciso destacar que o desvio padrão desse tipo de escola é
alto, revelando que a maior parte dos alunos apresentou um desempenho nas
questões de Estatística entre 22,46% e 75,05%. Já o desempenho de grande parte
dos concluintes nas escolas públicas ficou entre 16,18% e 51,14%, resultado que
revela grande defasagem em relação ao que o exame espera que esses alunos
saibam sobre Estatística.
A seguir, apresentamos, nos quadros 19 a 28, a análise de cada uma das
questões selecionadas de Estatística organizadas pelas competências de área e
habilidades, e na sequência uma investigação sobre o desempenho dos alunos em
relação às variáveis observadas. Uma tabulação com todos os dados referentes ao
desempenho dos alunos por questão encontra-se no APÊNDICE I.
160
Questões da competência de área 6
Quadro 19 – Questão 1 Questão 1 – ENEM 2012 – número 136 (prova cinza) – H25
O dono de uma farmácia resolveu colocar à vista do público o gráfico mostrado a seguir, que apresenta a evolução do total de vendas (em reais) de certo medicamento ao longo do ano de 2011.
De acordo com o gráfico, os meses em que ocorreram, respectivamente, a maior e a menor venda absolutas em 2011 foram (A) março e abril. (B) março e agosto. (C) agosto e setembro. (D) junho e setembro. (E) junho e agosto. (alternativa correta)
Caracterização visual da questão
Desempenho dos alunos (em %)
Comentários: A questão 1 apresenta um nível de complexidade muito baixo tanto em relação ao processo envolvido, quanto ao nível de leitura. A nossa experiência com formação de professores nos permite afirmar que grande parte do trabalho com Estatística em relação à leitura de dados se assemelha a essa questão. O aluno precisa apenas fazer uma leitura dos dados para indicar o maior e o menor valor. Não observamos uma discrepância significativa entre o desempenho dos alunos nos diversos tipos de escola.
Fonte: os autores
161
Quadro 20 – Questão 3
Questão 3 – ENEM 2012 – número 140 (prova cinza) – H25
Uma pesquisa realizada por estudantes da Faculdade de Estatística mostra, em horas por dia, como os jovens entre 12 e 18 anos gastam seu tempo, tanto durante a semana (de segunda-feira a sexta-feira), como no fim de semana (sábado e domingo). A seguinte tabela ilustra os resultados da pesquisa.
De acordo com esta pesquisa, quantas horas de seu tempo gasta um jovem entre 12 e 18 anos, na semana inteira (de segunda-feira a domingo), nas atividades escolares? (A) 20 (B) 21 (C) 24 (D) 25 (E) 27 (alternativa correta)
Caracterização visual da questão
Desempenho dos alunos (em %)
Comentários: À questão pode ser associado um nível baixo de complexidade, uma vez que é necessário apenas ler os dados relacionados às atividades escolares e relacioná-los entre si na busca da resposta. Entretanto, o desempenho dos alunos não demonstra facilidade com a questão, talvez por não estarem habituados a resolver problemas nos quais os dados são retirados do gráfico para serem usados em uma estratégia estabelecida de resolução de problemas, como é o caso da questão. A maioria dos alunos que errou, cerca de 36%, foi atraído pela alternativa C, que apresenta a soma dos números em cada uma das colunas. Vale ressaltar ainda a discrepância entre o desempenho dos alunos de acordo com o tipo de escola.
Fonte: os autores
162
Quadro 21 – Questão 9
Questão 9 – ENEM 2012 – número 176 (prova cinza) – H25
Um laboratório realiza exames em que é possível observar a taxa de glicose de uma pessoa. Os resultados são analisados de acordo com o quadro a seguir.
Um paciente fez um exame de glicose nesse laboratório e comprovou que estava com hiperglicemia. Sua taxa de glicose era de 300 mg/dL. Seu médico prescreveu um tratamento em duas etapas. Na primeira etapa ele conseguiu reduzir sua taxa em 30% e na segunda etapa em 10%. Ao calcular sua taxa de glicose após as duas reduções, o paciente verificou que estava na categoria de (A) hipoglicemia. (B) normal. (C) pré-diabetes. (alternativa correta) (D) diabetes melito. (E) hiperglicemia.
Caracterização visual da questão
Desempenho dos alunos (em %)
Comentários: A questão 9 envolve uma complexidade média uma vez que é necessário relacionar informações entre o texto e a tabela e tomar decisões em relação à escolha da categoria mais adequada. Não se trata de um processo de resolver um cálculo e apontar o resultado, é necessário articular as informações. Menos da metade dos concluintes acertaram essa questão, o que nos mostra uma falha no ensino em relação ao trabalho com situações-problema que fujam do convencional nas salas de aula. O desempenho dos alunos da rede privada foi bastante superior ao desempenho dos alunos das redes públicas de ensino.
Fonte: os autores
163
Quadro 22 – Questão 10
Questão 10 – ENEM 2012 – número 178 (prova cinza) – H25
O gráfico fornece os valores das ações da empresa XPN, no período das 10 às 17 horas, num dia em que elas oscilaram acentuadamente em curtos intervalos de tempo. Neste dia, cinco investidores compraram e venderam o mesmo volume de ações, porém em horários diferentes, de acordo com a seguinte tabela.
Com relação ao capital adquirido na compra e venda das ações, qual investidor fez o melhor negócio? (A) 1 (alternativa correta) (B) 2 (C) 3 (D) 4 (E) 5
Caracterização visual da questão
Desempenho dos alunos (em %)
Comentários: O objeto de conhecimento associado a essa questão, operações em conjuntos numéricos, é bastante simples. Entretanto, o que torna o item mais complexo são o nível de leitura e o processo exigido. Uma vez que é preciso articular informações entre dois “textos” – gráfico e tabela – uma leitura para além dos dados se faz necessária para tomar uma decisão de compra. O contexto, apesar de educacional/ocupacional pode ter sido um complicador pelo tema ser distante da realidade de grande parte da nossa sociedade. O desempenho dos alunos das escolas privadas é bastante superior em relação aos alunos das demais escolas. A maior parte dos alunos que erraram, cerca de 37% assinalou a alternativa C, que mostra um reconhecimento do horário de pico do preço da ação, mas a falta da percepção da relação desse dado com o horário de compra na resolução do problema. Outros 30% dos que erraram assinalaram a alternativa D, que talvez indique uma inversão de pensamento, uma vez que essa resposta mostra a situação de compra no momento de alta e venda no momento de baixa.
Fonte: os autores
164
Quadro 23 – Questão 2
Questão 2 – ENEM 2012 – número 139 (prova cinza) – H26
O gráfico mostra a variação da extensão média de gelo marítimo, em milhões de quilômetros quadrados, comparando dados dos anos 1995, 1998, 2000, 2005 e 2007. Os dados correspondem aos meses de junho a setembro. O Ártico começa a recobrar o gelo quando termina o verão, em meados de setembro. O gelo do mar atua como o sistema de resfriamento da Terra, refletindo quase toda a luz solar de volta ao espaço. Águas de oceanos escuros, por sua vez, absorvem a luz solar e reforçam o aquecimento do Ártico, ocasionando derretimento crescente do gelo.
Com base no gráfico e nas informações do texto, é possível inferir que houve maior aquecimento global em (A) 1995. (B) 1998. (C) 2000. (D) 2005. (E) 2007. (alternativa correta)
Caracterização visual da questão
Desempenho dos alunos (em %)
Comentários: Essa questão apresenta um contexto público explicado pelo enunciado. Apesar de todos os dados necessários para resolver o problema estarem no gráfico, é preciso coordenar as informações entre os dados apresentados. Cerca de 20% do total de alunos foram atraídos pela alternativa B e 12% pela alternativa A, talvez por terem entendido que uma maior extensão de gelo no início do período significasse um maior aquecimento global. Nota-se uma discrepância significativa entre as escolas públicas e as escolas privadas. Aparentemente questões com essa complexidade não são trabalhadas da mesma forma nos diferentes tipos de escola.
Fonte: os autores
165
Quadro 24 – Questão 11
Questão 11 – ENEM 2012 – número 179 (prova cinza) – H26
A figura a seguir apresenta dois gráficos com informações sobre as reclamações diárias recebidas e resolvidas pelo Setor de Atendimento ao Cliente (SAC) de uma empresa, em uma dada semana. O gráfico de linha tracejada informa o número de reclamações recebidas no dia, o de linha contínua é o número de reclamações resolvidas no dia. As reclamações podem ser resolvidas no mesmo dia ou demorarem mais de um dia para serem resolvidas. O gerente de atendimento deseja identificar os dias da semana em que o nível de eficiência pode ser considerado muito bom, ou seja, os dias em que o
número de reclamações resolvidas excede o número de reclamações recebidas. Disponível em: http://blog.bibliotecaunix.org. Acesso em: 21 jan. 2012 (adaptado).
O gerente de atendimento pôde concluir, baseado no conceito de eficiência utilizado na empresa e nas informações do gráfico, que o nível de eficiência foi muito bom na (A) segunda e na terça-feira. (B) terça e na quarta-feira. (alternativa correta) (C) terça e na quinta-feira. (D) quinta-feira, no sábado e no domingo. (E) segunda, na quinta e na sexta-feira.
Caracterização visual da questão
Desempenho dos alunos (em %)
Comentários: A questão 11 está associada ao objeto de conhecimento representação e análise dos dados, não sendo necessário nenhum tipo de cálculo. Espera-se que o aluno seja capaz de analisar e refletir sobre as informações na busca da resposta. Menos da metade dos alunos foi capaz de resolver adequadamente essa questão. A maior parte dos alunos que erraram (46%) assinalou a alternativa C, talvez por tenham sido atraídos pela diminuição do número de reclamações que o gráfico aponta após os dias da semana indicados, revelando uma incapacidade de realizar uma leitura entre os dados, uma vez que é necessário articular o comportamento das duas linhas (cheia e tracejada) apresentadas no gráfico. Vale ressaltar ainda a discrepância entre o desempenho de alunos oriundos de diferentes tipos de escolas.
Fonte: os autores
166
Questões da competência de área 7
Quadro 25 – Questão 5 Questão 5 – ENEM 2012 – número 157 (prova cinza) – H27
Um produtor de café irrigado em Minas Gerais recebeu um relatório de consultoria estatística, constando, entre outras informações, o desvio padrão das produções de uma safra dos talhões de sua propriedade. Os talhões têm a mesma área de 30 000 m² e o valor obtido para o desvio padrão foi de 90 kg/talhão. O produtor deve apresentar as informações sobre a produção e a variância dessas produções em sacas de 60 kg por hectare (10 000 m²). A variância das produções dos talhões expressa em (sacas/hectare)² é: (A) 20,25. (B) 4,50. (C) 0,71. (D) 0,50. (E) 0,25. (alternativa correta)
Caracterização visual da questão
Desempenho dos alunos (em %)
Comentários: Dentre as questões de Estatística de 2012, essa foi a questão com menor índice de acertos independentemente do tipo de escola. Além de o processo exigido ser bastante complexo, desvio padrão e variância não costumam ser trabalhados no Ensino Médio brasileiro. Atribuímos o resultado a esse fato.
Fonte: os autores
167
Quadro 26 – Questão 7
Questão 7 – ENEM 2012 – número 160 (prova cinza) – H27
(ENEM 2012) O gráfico apresenta o comportamento de emprego formal surgido, segundo o CAGED, no período de janeiro de 2010 a outubro de 2010.
Com base no gráfico, o valor da parte inteira da mediana dos empregos formais surgidos no período é (A) 212 952. (B) 229 913. (alternativa correta) (C) 240 621. (D) 255 496. (E) 298 041.
Caracterização visual da questão
Desempenho dos alunos (em %)
Comentários: A questão 7 avalia o conceito e o cálculo de mediana de um conjunto de dados expressos em um gráfico. Consideramos que a questão envolve um processo de reprodução porque para a sua solução era necessário apenas encontrar a mediana de um conjunto de dados explícitos no gráfico. Apenas 15% dos alunos, aproximadamente, foram capazes de ordenar os números apresentados para determinar a medida de tendência solicitada. Chama bastante a atenção o fato de cerca de metade dos alunos terem assinalado as respostas A (19%) e E (30%) que indicam os valores localizados na região do meio do gráfico. Uma hipótese é de que os alunos conhecem pouco o conceito de mediana e estão habituados a resolver exercícios nos quais conjuntos de dados estão expressos em rol ou em tabelas.
Fonte: os autores
168
Quadro 27 – Questão 4
Questão 4 – ENEM 2012 – número 156 (prova cinza) – H28
Em um blog de variedades, músicas, mantras e informações diversas, foram postados “Contos de Halloween”. Após a leitura, os visitantes poderiam opinar, assinalando suas reações em: “Divertido”, “Assustador” ou “Chato”. Ao final de uma semana, o blog registrou que 500 visitantes distintos acessaram esta postagem. O gráfico a seguir apresenta o resultado da enquete. O administrador do blog irá sortear um livro entre os visitantes que opinaram na postagem “Contos de Halloween”. Sabendo que nenhum visitante votou mais de uma vez, a probabilidade de uma pessoa escolhida ao acaso entre as que opinaram ter assinalado que o conto “Contos de Halloween” é “Chato” é mais aproximada por (A) 0,09. (B) 0,12. (C) 0,14. (D) 0,15. (alternativa correta) (E) 0,18.
Caracterização visual da questão
Desempenho dos alunos (em %)
Comentários: Nessa questão, os alunos precisavam utilizar intuitivamente o conceito de probabilidade condicional para encontrar a solução do problema. Observa-se que era necessário articular as informações entre o texto e o gráfico e realizar uma leitura para além dos dados, uma vez que é necessário calcular a probabilidade em relação apenas ao total dos que opinaram. Chama a atenção o fato de cerca de metade dos participantes (52%) terem assinalado a alternativa B, o que revela uma leitura direta da porcentagem dos entrevistados que responderam que o conto era “chato”. A nosso ver, esse resultado revela que os alunos estão habituados a resolver questões mais diretas e simples de Estatística.
Fonte: os autores
169
Quadro 28 – Questão 8
Questão 8 – ENEM 2012 – número 175 (prova cinza) – H29
A tabela a seguir mostra a evolução da receita bruta anual nos três últimos anos de cinco microempresas (ME) que se encontram à venda.
Um investidor deseja comprar duas das empresas listadas na tabela. Para tal, ele calcula a média da receita bruta anual dos últimos três anos (de 2009 até 2011) e escolhe as duas empresas de maior média anual. As empresas que este investidor escolhe comprar são (A) Balas W e Pizzaria Y. (B) Chocolates X e Tecelagem Z. (C) Pizzaria Y e Alfinetes V. (D) Pizzaria Y e Chocolates X. (alternativa correta) (E) Tecelagem Z e Alfinetes V.
Caracterização visual da questão
Desempenho dos alunos (em %)
Comentários: A questão 8 exige um processo de tomada de decisão a partir da análise dos dados e por isso, foi classificada como uma questão de reflexão. Um pouco mais da metade dos alunos (51%) foi capaz de relacionar os dados de cada uma das microempresas para decidir qual compra seria mais vantajosa para o investidor. Vale ressaltar, entretanto, a discrepância entre os resultados das escolas públicas e privadas.
Fonte: os autores
170
5.2.2.2. ENEM 2013
Na análise que segue, de acordo com o universo já descrito, foram
analisados os desempenhos de cerca de 1 milhão e 44 mil estudantes, que
realizaram o ENEM em 2013, distribuídos em escolas regulares cuja dependência
administrativa está mostrada na tabela 31.
Tabela 3 – Total de alunos por dependência administrativa no exame de 2013
Dependência administrativa escolar
Número de participantes concluintes
Pública 778.008
Privada 266.291
Total 1.044.299
Fonte: INEP
Apresentamos o desempenho dos alunos nas questões de Estatística da
prova de Matemática da edição de 2013 do ENEM por meio do gráfico 16 que
segue.
Gráfico 16 – Desempenho dos alunos em estatística no ENEM 2013
DESEMPENHO DOS ALUNOS EM ESTATÍSTICA
NA PROVA DE MATEMÁTICA DO ENEM 2013
Média e desvio padrão do desempenho dos alunos
por dependência administrativa das escolas (em porcentagem)
Fonte: INEP
A média de acertos em Estatística, tomado o universo de análise com um
todo, está em 35,4%, com um desvio padrão de 15,27%. O desempenho dos alunos
oriundos das escolas públicas é ligeiramente inferior ao desempenho geral, média
32,38% com desvio padrão de 13,21%, diferentemente do desempenho dos
171
concluintes das escolas privadas que apresentaram uma média de acertos de
44,10% e desvio padrão de 21,27%.
Apesar do desempenho das escolas privadas ter sido superior ao das
escolas públicas, é preciso destacar que o desvio padrão desse tipo de escola é
alto, medida que revela que a maior parte dos alunos apresentou um desempenho
nas questões de Estatística entre 22,81% e 65,35%. Já o desempenho de grande
parte dos concluintes nas escolas públicas está entre 19,17% e 45,59%.
Isso posto, é possível afirmar que tanto os concluintes oriundos das
escolas públicas quanto os que se formaram nas escolas privadas apresentaram um
desempenho insatisfatório em Estatística nessa edição do exame.
A fim de aprofundar a análise na tentativa de elucidar a competência
estatística dos estudantes concluintes que participaram do ENEM 2013,
examinaremos separadamente cada uma das questões selecionadas nos quadros
29 a 38. Nossa intenção é compreender o que estava envolvido na resolução do
item, quais conhecimentos e habilidades era preciso mobilizar e o índice de acerto
apresentado por tipo de escola. Usaremos ainda, quando necessário, a distribuição
entre as alternativas assinaladas pelos alunos na intenção de compreender seu
raciocínio.
Uma tabulação com todos os dados referentes ao desempenho dos
alunos por questão encontra-se no APÊNDICE J.
172
Questões da competência de área 6
Quadro 29 – Questão 14 Questão 14 – ENEM 2013 – número 141 (prova cinza) – H24
As projeções para a produção de arroz no período de 2012 - 2021, em uma determinada região produtora, apontam para uma perspectiva de crescimento constante da produção anual. O quadro apresenta a quantidade de arroz, em toneladas, que será produzida nos primeiros anos desse período, de acordo com essa projeção.
A quantidade total de arroz, em toneladas, que deverá ser produzida no período de 2012 a 2021 será de (A) 497,25. (B) 500,85. (C) 502,87. (D) 558,75. (alternativa correta) (E) 563,25.
Caracterização visual da questão
Desempenho dos alunos (em %)
Comentários: Essa questão pode ser resolvida utilizando a regularidade da sequência de dados apresentados ou calculando a soma de todos os valores sem se ater aos conceitos de progressão aritmética. O nível de complexidade desse item não é alto, uma vez que os dados necessários para inferir a sequência de valores estão explícitos na tabela. Diante disso, os resultados sugerem que grande parte dos alunos não percebeu a regularidade nos valores que permitem prever as próximas previsões. Nota-se uma discrepância no desempenho dos alunos oriundos dos diferentes tipos de escola.
Fonte: os autores
173
Quadro 30 – Questão 12
Questão 12 – ENEM 2013 – número 136 (prova cinza) – H25
A cidade de Guarulhos (SP) tem o 8º PIB municipal do Brasil, além do maior aeroporto da América do Sul. Em proporção, possui a economia que mais cresce em indústrias, conforme mostra o gráfico. Analisando os dados percentuais do gráfico, qual a diferença entre o maior e o menor centro em crescimento no polo das indústrias?
(A) 75,28 (B) 64,09 (C) 56,95(alternativa correta) (D) 45,76 (E) 30,07
Caracterização visual da questão
Desempenho dos alunos (em %)
Comentários: Dentre todas as questões analisadas na edição de 2013 do ENEM, essa foi a que apresentou o maior índice de acertos. Tratava-se de uma questão simples, na qual os alunos precisavam encontrar o maior e o menor valor apresentado no gráfico e calcular sua diferença. O desempenho dos alunos das escolas públicas é preocupante, uma vez que apenas 66,36% identificou as variáveis necessárias e realizou a operação corretamente.
Fonte: os autores
174
Quadro 31 – Questão 17
Questão 17 – ENEM 2013 – número 162 (prova cinza) – H25
Cinco empresas de gêneros alimentícios encontram-se à venda. Um empresário, almejando ampliar os seus investimentos, deseja comprar uma dessas empresas. Para escolher qual delas irá comprar, analisa o lucro (em milhões de reais) de cada uma delas, em função de seus tempos (em anos) de existência, decidindo comprar a empresa que apresente o maior lucro médio anual. O quadro apresenta o lucro (em milhões de reais) acumulado ao longo do tempo (em anos) de existência de cada empresa.
O empresário decidiu comprar a empresa (A) F. (B) G. (alternativa correta) (C) H. (D) M. (E) P.
Caracterização visual da questão
Desempenho dos alunos (em %)
Comentários: Nessa questão era necessário calcular a média de lucro anual e compará-los, observando que cada empresa apresentava o lucro de um período de tempo diferente. Menos da metade dos alunos de escola pública, aproximadamente 36%, foi capaz de resolver a proposta que não exigia nenhum nível de raciocínio complexo. Chama a atenção ainda o ato da alternativa C ter atraído cerca de 27% do total de alunos, uma vez que o resultado apresentado sugere o foco foi apenas nos valores do lucro, independentemente do tempo observado. Outra parcela considerável de alunos, cerca de 16% do total, assinalaram a alternativa D talvez atraídos pelo menor tempo apresentado pela tabela.
Fonte: os autores
175
Quadro 32 – Questão 18
Questão 18 – ENEM 2013 – número 163 (prova cinza) – H25
Deseja-se postar cartas não comerciais, sendo duas de 100 g, três de 200 g e uma de 350 g. O gráfico mostra o custo para enviar uma carta não comercial pelos Correios:
O valor total gasto, em reais, para postar essas cartas é de (A) 8,35. (B) 12,50. (C) 14,40. (D) 15,35. (alternativa correta) (E) 18,05.
Caracterização visual da questão
Desempenho dos alunos (em %)
Comentários: Cerca de metade dos alunos foi capaz de selecionar os dados relevantes do gráfico para calcular o preço do serviço indicado no enunciado da questão. A maior parte dos alunos que erraram, cerca de 17% do total, assinalou a alternativa A, revelando ter somado os valores das cartas indicadas sem se ater à quantidade de cada item. Vale ressaltar ainda que era necessário conhecer a notação de intervalo usada no gráfico, fato desconhecido por cerca de 9% dos alunos que assumiram o outro extremo do segmento (intervalo aberto) como o preço dos itens. Mais uma vez notamos uma discrepância entre o desempenho dos alunos oriundos de escolhas de instâncias administrativas diferentes.
Fonte: os autores
176
Quadro 33 – Questão 23 Questão 23 – ENEM 2013 – número 176 (prova cinza) – H26
O índice de eficiência utilizado por um produtor de leite para qualificar suas vacas é dado pelo produto do tempo de lactação (em dias) pela produção média diária de leite (em kg), dividido pelo intervalo entre partos (em meses). Para esse produtor, a vaca é qualificada como eficiente quando esse índice é, no mínimo, 281 quilogramas por mês, mantendo sempre as mesmas condições de manejo (alimentação, vacinação e outros). Na comparação de duas ou mais vacas, a mais eficiente é a que tem maior índice. A tabela apresenta os dados coletados de cinco vacas:
Após a análise dos dados, o produtor avaliou que a vaca mais eficiente é a (A) Malhada. (B) Mamona. (C) Maravilha. (D) Mateira. (alternativa correta) (E) Mimosa.
Caracterização visual da questão
Desempenho dos alunos (em %)
Comentários: A questão 23 envolvia um raciocínio complexo, uma vez que exigia que os alunos relacionassem os dados entre si e criassem uma estratégia para resolver a situação-problema. Apenas 21% dos alunos foram capazes de entender a relação entre o tempo de lactação, a produção diária de leite e o intervalo entre partos, apesar dela estar explícita no texto do enunciado. Praticamente a mesma parcela dos alunos, 20%, assinalou a alternativa A, que indicava a vaca com maior tempo de lactação. A maior arte dos alunos, cerca de 35% do total, assinalou a alternativa C que apresenta o nome da vaca com maior produção diária, indicando talvez que a escolha da resposta do animal se deu a partir do senso comum de que a vaca mais eficiente é aquela que produz mais, sem estabelecer relação com as demais variáveis apresentadas.
Fonte: os autores
177
Quadro 34 – Questão 24
Questão 24 – ENEM 2013 – número 180 (prova cinza) – H26
Uma falsa relação O cruzamento da quantidade de horas estudadas com o desempenho no Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (Pisa) mostra que mais tempo na escola não é garantia de nota acima da média. Dos países com notas abaixo da média nesse exame, aquele que apresenta maior quantidade de horas de estudo é (A) Finlândia. (B) Holanda. (C) Israel. (alternativa correta) (D) México. (E) Rússia.
Obs.: a questão, de acordo com os microdados do ENEM, estava associada à habilidade 10 (identificar relações entre grandezas e unidades de medida.).
Caracterização visual da questão
Desempenho dos alunos (em %)
Comentários: Os microdados do ENEM associam essa questão à competência de área 3, construir noções de grandezas e medidas para a compreensão da realidade e a solução de problemas do cotidiano. Entretanto, resolvemos por considera-la no nosso conjunto de questões por entender que a interpretação dos dados expressos no gráfico é intrínseca à resolução do item. A representação gráfica apresentada se assemelha a um gráfico de dispersão no qual indica-se a relação entre duas variáveis. Classificamos a questão como sendo de reprodução por entender que não é necessário combinar ideias de matemática, traduzir uma situação para a linguagem matemática ou realizar inferências. Era necessário apenas entender o papel dos eixos na representação dos dados apresentados.
Fonte: os autores
178
Questões da competência de área 7
Quadro 35 – Questão 16 Questão 16 – ENEM 2013 – número 145 (prova cinza) – H27
As notas de um professor que participou de um processo seletivo, em que a banca avaliadora era composta por cinco membros, são apresentadas no gráfico. Sabe-se que cada membro da banca atribuiu duas notas ao professor, uma relativa aos conhecimentos específicos da área de atuação e outra, aos conhecimentos pedagógicos, e que a média final do professor foi dada pela média aritmética de todas as notas atribuídas pela banca avaliadora.
Utilizando um novo critério, essa banca avaliadora resolveu descartar a maior e a menor notas atribuídas ao professor. A nova média, em relação à média anterior, é (A) 0,25 ponto maior. (B) 1,00 ponto maior. (alternativa correta) (C) 1,00 ponto menor. (D) 1,25 ponto maior. (E) 2,00 pontos menor.
Caracterização visual da questão
Desempenho dos alunos (em %)
Comentários: Poucos foram os alunos capazes de entender a variação na média de um conjunto de dados ao retirarmos dele alguns valores, cerca de 26%. Aproximadamente 24% dos indivíduos considerados na análise assinalaram a alternativa D, indicando que subtraíram as notas mais baixa e mais alta do total, mas não as descontaram do número de elementos da amostra. Praticamente a mesma parcela de alunos, 23%, subtraíram 18 pontos do total, a diferença entre a maior e a menor nota. O baixo desempenho sugere que os alunos não estão habituados a raciocinar sobre o papel de cada valor no cálculo e principalmente na interpretação da média de um conjunto de dados.
Fonte: os autores
179
Quadro 36 – Questão 19
Questão 19 – ENEM 2013 – número 164 (prova cinza) – H27
Foi realizado um levantamento nos 200 hotéis de uma cidade, no qual foram anotados os valores, em reais, das diárias para um quarto padrão de casal e a quantidade de hotéis para cada valor da diária. Os valores das diárias foram: A = R$ 200,00; B = R$ 300,00; C = R$ 400,00 e D = R$ 600,00. No gráfico, as áreas representam as quantidades de hotéis pesquisados, em porcentagem, para cada valor da diária.
O valor mediano da diária, em reais, para o quarto padrão de casal nessa cidade, é (A) 300,00. (B) 345,00. (C) 350,00. (alternativa correta) (D) 375,00. (E) 400,00.
Caracterização visual da questão
Desempenho dos alunos (em %)
Comentários: Entendemos que a questão 19 exigia um nível de leitura além dos dados devido ao fato de que para resolvê-la era necessário não somente buscar informações não indicadas no gráfico (preço das diárias) como articulá-las entre si. Apenas 23% dos alunos, aproximadamente, foram capazes de calcular a mediana de dados expressos em frequência relativa em um gráfico em setor. Cerca de 26% calculou uma média direta dos valores das diárias sem considerar a distribuição apresentada no gráfico. Outros 17% calcularam a média ao invés da mediana. Vale ressaltar que o desempenho dos alunos das escolas privadas foi bastante semelhante ao desempenho dos alunos das escolas públicas. Essa questão vai além da literacia estatística, exige a mobilização do raciocínio estatístico e talvez esse fato explique o resultado observado.
Fonte: os autores
180
Quadro 37 – Questão 13
Questão 13 – ENEM 2013 – número 138 (prova cinza) – H28
Uma loja acompanhou o número de compradores de dois produtos, A e B, durante os meses de janeiro, fevereiro e março de 2012. Com isso, obteve este gráfico:
A loja sorteará um brinde entre os compradores do produto A e outro brinde entre os compradores do produto B. Qual a probabilidade de que os dois sorteados tenham feito suas compras em fevereiro de 2012?
(A) 1
20 (alternativa correta)
(B) 3
242
(C) 5
22
(D) 6
25
(E) 7
15
Caracterização visual da questão
Desempenho dos alunos (em %)
Comentários: Para resolver essa questão, além de selecionar e interpretar conjuntamente os dados relevantes, os alunos precisavam aplicar conceitos de probabilidade condicional. Cerca de 27% dos alunos demonstraram corretamente a noção desse conceito ao aplica-lo no problema. Aproximadamente 26% do total assinalou a alternativa C, resultado do cálculo da probabilidade dos dois sorteados terem feito suas compras em fevereiro, independentemente do produto comprado (50/220), revelando uma noção de probabilidade simples. Essa questão, assim como a anterior, exigia que o aluno alocasse recursos relacionados ao raciocínio estatístico.
Fonte: os autores
181
Quadro 38 – Questão 22
Questão 22 – ENEM 2013 – número 136 (prova cinza) – H30
Um comerciante visita um centro de vendas para fazer cotação de preços dos produtos que deseja comprar. Verifica que se aproveita 100% da quantidade adquirida de produtos do tipo A, mas apenas 90% de produtos do tipo B. Esse comerciante deseja comprar uma quantidade de produtos, obtendo o menor custo/benefício em cada um deles. O quadro mostra o preço por quilograma, em reais, de cada produto comercializado.
Os tipos de arroz, feijão, soja e milho que devem ser escolhidos pelo comerciante são, respectivamente, (A) A, A, A, A. (B) A, B, A, B. (C) A, B, B, A. (D) B, A, A, B. (alternativa correta) (E) B, B, B, B.
Caracterização visual da questão
Desempenho dos alunos (em %)
Comentários: Os microdados do ENEM associam a questão 22 à competência de área 1 (construir significados para os números naturais, inteiros, racionais e reais). Apesar disso, acreditamos que o fato dos dados que precisam ser analisados estão expressos em uma tabela nos permite avalia-la do ponto de vista da Estatística. Para resolver essa questão é necessário desenvolver uma estratégia para avaliar a informação apresentada e tomar uma decisão. Além disso, é necessária uma leitura para além dos dados, uma vez que nem todos os dados estão explícitos ou implícitos no gráfico. Poucos foram os alunos que mostraram essa habilidade, aproximadamente 17%. A maioria, cerca de 30%, assinalou a alternativa E revelando terem optado pelo preço mais baixo de cada produto independentemente do aproveitamento do mesmo indicado no enunciado da questão. Esse resultado sugere que nossos alunos não estão habituados a resolver problemas não rotineiros relacionados à análise de dados.
Fonte: os autores
182
5.2.2.3. ENEM 2014
Na análise que segue, de acordo com o universo já descrito, foram
analisados os desempenhos de cerca de 1 milhão e 100 mil estudantes, distribuídos
em escolas regulares cuja dependência administrativa está mostrada na tabela 4:
Tabela 4 – Total de alunos por dependência administrativa no exame de 2014
Dependência administrativa escolar
Número de participantes concluintes
Pública 823.967
Privada 272.575
Total 1.096.542
Fonte: INEP
Apresentamos o desempenho dos alunos nas questões de Estatística da
prova de Matemática da edição de 2014 do ENEM por meio do gráfico 17 que
segue.
Gráfico 17 – Desempenho dos alunos em estatística no ENEM 2014
DESEMPENHO DOS ALUNOS EM ESTATÍSTICA NA PROVA DE MATEMÁTICA DO ENEM 2014
Média e desvio padrão do desempenho dos alunos por dependência administrativa das escolas (em porcentagem)
Fonte: INEP
A média de acertos em Estatística, tomado o universo de análise com um
todo, a menor dentre as três edições, está em 25,6%, com um desvio padrão de
6,55%. É possível inferir que o conjunto de questões desse tema da edição de 2014
estava mais complexo para os alunos do que os itens das edições anteriores, um
exemplo disso é o fato de que a questão com o maior desempenho nessa prova
apresentou um índice de acerto de 45,35%. O desempenho dos alunos oriundos das
escolas públicas é um pouco inferior ao desempenho geral, média 22,46% com
desvio padrão de 5,31%, ao contrário do que aconteceu com o desempenho dos
183
concluintes das escolas privadas que apresentaram uma média de acertos de
35,13% e desvio padrão de 12,02%.
As medidas de dispersão revelam que a maior parte dos alunos, no geral,
apresentou um desempenho nas questões de Estatística entre 19,05% e 32,17%.As
escolas privadas apresentaram um desempenho superior ao das escolas públicas,
mas não suficiente para afirmar que os alunos dominam o conhecimento estatístico,
uma vez que a maior parte dos alunos apresentou um índice de acertos entre
23,12% e 47,15%. Já o desempenho de grande parte dos concluintes nas escolas
públicas está entre 16,93% e 27,99%.
Os índices de acertos observados nas questões relacionadas à Estatística
na edição de 2014 do ENEM foram bastante baixos. Talvez a análise mais
aprofundada de cada um dos itens, apresentada nos quadros 39 a 48, revele a
dificuldade apresentada pelos alunos.
Uma tabulação com todos os dados referentes ao desempenho dos
alunos por questão encontra-se no APÊNDICE K.
Questões da competência de área 6
Quadro 39 – Questão 27 Questão 27 – ENEM 2014 – número 148 (prova cinza) – H24
Uma empresa de alimentos oferece três valores diferentes de remuneração a seus funcionários, de acordo com o grau de instrução necessário para cada cargo. No ano de 2013, a empresa teve uma receita de 10 milhões de reais por mês e um gasto mensal com a folha salarial de R$ 400 000,00, distribuídos de acordo com o Gráfico 1. No ano seguinte, a empresa ampliará o número de funcionários, mantendo o mesmo valor salarial para cada categoria. Os demais custos da empresa permanecerão constantes de 2013 para 2014. O número de funcionários em 2013 e 2014, por grau de instrução, está no Gráfico 2.
184
Qual deve ser o aumento na receita da empresa para que o lucro mensal em 2014 seja o mesmo de 2013? (A) R$ 114 285,00 (B) R$ 130 000,00 (alternativa correta) (C) R$ 160 000,00 (D) R$ 210 000,00 (E) R$ 213 333,00
Caracterização visual da questão
Desempenho dos alunos (em %)
Comentários: O nível de leitura da questão 27 foi classificado como além dos dados porque a solução necessita a busca de informações que não estão explícitas ou implícitas em nenhum dos dois gráficos e sim na relação entre eles Menos de um quarto dos alunos, 24%, foram capazes de combinar as informações presentes nos dois gráficos e no texto do enunciado para criar uma estratégia de resolução, adotando um processo de reflexão. A mesma parcela de alunos, 24%, assinalou a alternativa D, cujo valor é mil vezes maior do que o número de funcionários em 2013. A alternativa C foi escolhida por cerca de 27% dos alunos que para encontrar a resposta calcularam a média de salários sem considerar a distribuição do número de
funcionários nos níveis de escolaridade, (1.000+2.000+5.000
3) e multiplicaram pela
quantidade de funcionários novos (20 000+30 000+10 000). Nota-se, portanto, que cerca de 51% dos alunos apresentaram um raciocínio estatístico bastante superficial, uma vez que utilizam apenas um gráfico ou parte da informação na busca da resposta.
Fonte: os autores
185
Quadro 40 – Questão 35
Questão 35 – ENEM 2014 – número 171 (prova cinza) – H24
A taxa de fecundidade é um indicador que expressa a condição reprodutiva média das mulheres de uma região, e é importante para uma análise da dinâmica demográfica dessa região. A tabela apresenta os dados obtidos pelos Censos de 2000 e 2010, feitos pelo IBGE, com relação à taxa de fecundidade no Brasil.
Suponha que a variação percentual relativa na taxa de fecundidade no período de 2000 a 2010 se repita no período de 2010 a 2020. Nesse caso, em 2020 a taxa de fecundidade no Brasil estará mais próxima de (A) 1,14. (B) 1,42. (C) 1,52. (alternativa correta) (D) 1,70. (E) 1,80.
Caracterização visual da questão
Desempenho dos alunos (em %)
Comentários: Essa questão envolvia a comparação percentual entre dois valores. Os alunos precisavam encontrar a diferença entre as taxas de fecundidade apresentadas e calcular a relação entre esse valor e a taxa inicial. Apenas 21% dos alunos, aproximadamente, acertaram esse item. A maior parte deles, cerca de 45%, assinalou a alternativa B que apresenta a diferença entre as taxas em valor absoluto. Acreditamos que o processo envolvido era de reflexão por entender que à resolução está associado um pensamento mais amplo na elaboração de uma estratégia que vai além de exercícios rotineiros. O desempenho entre os alunos oriundos de escolas de tipos diferentes é próximo.
Fonte: os autores
186
Quadro 41 – Questão 26
Questão 26 – ENEM 2014 – número 141 (prova cinza) – H25
Um cientista trabalha com as espécies I e II de bactérias em um ambiente de cultura. Inicialmente, existem 350 bactérias da espécie I e 1 250 bactérias da espécie II. O gráfico representa as quantidades de bactérias de cada espécie, em função do dia, durante uma semana. Em que dia dessa semana a quantidade total de bactérias nesse ambiente de cultura foi máxima?
(A) Terça-feira. (alternativa correta) (B) Quarta-feira. (C) Quinta-feira. (D) Sexta-feira. (E) Domingo. Obs.: Originalmente a questão estava associada à habilidade 20 (interpretar gráfico cartesiano que represente relações entre grandezas).
Caracterização visual da questão
Desempenho dos alunos (em %)
Comentários: Originalmente a questão 26 estava associada à competência de área 6, modelar e resolver problemas que envolvem variáveis socioeconômicas ou técnico-científicas, usando representações algébricas. Entretanto, entendemos que a resolução do item pressupõe uma compreensão do gráfico para além da sua estrutura algébrica, envolvendo a análise de dados. O desempenho dos alunos das escolas privadas foi bastante superior ao desempenho dos alunos das escolas públicas. Enquanto 58% do primeiro grupo se mostrou capaz de comparar a diferença entre os valores dia a dia, apenas 32% do segundo grupo o fez corretamente. Analisando o resultado como um todo, sem distinguir o tipo de escola de origem, cerca de 39% encontrou a resposta correta. Vale destacar que praticamente a mesma parcela de alunos assinalou a alternativa B, que apresenta o dia da semana em que houve o maior pico no número de bactérias de um tipo, independente da quantidade da outra bactéria. Diante disso, é possível afirmar que a menor parte dos nossos alunos são capazes de estabelecer conexões entre dados na resolução de um problema.
Fonte: os autores
187
Quadro 42 – Questão 29
Questão 29 – ENEM 2014 – número 152 (prova cinza) – H25
De acordo com a ONU, da água utilizada diariamente, - 25% são para tomar banho, lavar as mãos e escovar os dentes. - 33% são utilizados em descarga de banheiro. - 27% são para cozinhar e beber. - 15% são para demais atividades. No Brasil, o consumo de água por pessoa chega, em média, a 200 litros por dia. O quadro mostra sugestões de consumo moderado de água por pessoa, por dia, em algumas atividades. Se cada brasileiro adotar o consumo de água indicado no quadro, mantendo o mesmo consumo nas demais atividades,
então economizará diariamente, em média, em litros de água, (A) 30,0. (B) 69,6. (C) 100,4. (alternativa correta) (D) 130,4. (E) 170,0. Obs.: Essa questão estava associada originalmente à habilidade 18 (avaliar propostas de intervenção na realidade envolvendo variação de grandezas).
Caracterização visual da questão
Desempenho dos alunos (em %)
Comentários: Originalmente a questão 29 estava associada à competência de área 4 (construir noções de variação de grandezas para a compreensão da realidade e a solução de problemas do cotidiano). Apesar disso, optamos por inseri-la no conjunto de questões analisadas por entender que para a sua resolução é necessário combinar os dados expressos na tabela e na lista apresentadas. Apenas 18% do total de alunos foi capaz de selecionar as informações relevantes em cada um dos textos e relacioná-las. Cerca de 34% do total assinalou a alternativa B, cujo valor representa a somatória dos números da tabela. A mesma parcela de alunos assinalou a alternativa D, resposta obtida ao desconsiderar o consumo das demais atividades como solicitado no enunciado. Mais uma vez notamos a falta da habilidade de nossos alunos a elaborar estratégias envolvendo mais do que um processo. Ressaltamos ainda a discrepância no desempenho dos alunos oriundos dos diferentes tipos de escola.
Fonte: os autores
188
Quadro 43 – Questão 34
Questão 34 – ENEM 2014 – número 170 (prova cinza) – H25
O gráfico apresenta as taxas de desemprego durante o ano de 2011 e o primeiro semestre de 2012 na região metropolitana de São Paulo. A taxa de desemprego total é a soma das taxas de desemprego aberto e oculto.
Suponha que a taxa de desemprego oculto do mês de dezembro de 2012 tenha sido a metade da mesma taxa em junho de 2012 e que a taxa de desemprego total em dezembro de 2012 seja igual a essa taxa em dezembro de 2011. Disponível em: www.dieese.org.br. Acesso em: 1 ago. 2012 (fragmento). Nesse caso, a taxa de desemprego aberto de dezembro de 2012 teria sido, em termos percentuais, de (A) 1,1. (B) 3,5. (C) 4,5. (D) 6,8. (E) 7,9. (alternativa correta)
Caracterização visual da questão
Desempenho dos alunos (em %)
Comentários: Cerca de 30% dos alunos foram capazes de criar uma estratégia de resolução que envolvia inferência e raciocínio estatístico. A maior parte dos alunos que erraram, aproximadamente 23% do total, assinalou a alternativa C que mostra a metade do valor observado em dezembro, revelando uma incompreensão na interpretação do problema. Cerca de 17% dos alunos assinalaram a alternativa A, que apresenta a metade da taxa de desemprego oculto de junho. Quase a mesma parcela de alunos, 15% aproximadamente, assinalou a alternativa D que é o resultado da diferença entre a taxa de desemprego total de dezembro e a taxa de desemprego oculto de junho (9,0 - 2,2). Mais uma vez chama atenção a discrepância do desempenho dos alunos concluintes em escolas de tipos diferentes.
Fonte: os autores
189
Quadro 44 – Questão 36
Questão 36 – ENEM 2014 – número 172 (prova cinza) – H26
O Ministério da Saúde e as unidades federadas promovem frequentemente campanhas nacionais e locais de incentivo à doação voluntária de sangue, em regiões com menor número de doadores por habitante, com o intuito de manter a regularidade de estoques nos serviços hemoterápicos. Em 2010, foram recolhidos dados sobre o número de doadores e o número de habitantes de cada região conforme o quadro seguinte.
Os resultados obtidos permitiram que estados, municípios e o governo federal estabelecessem as regiões de doação de sangue. As campanhas deveriam ser intensificadas nas regiões em que o percentual de doadores por habitantes fosse menor ou igual ao do país. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br. Acesso em: 2 ago. 2013 (adaptado). As regiões brasileiras onde foram intensificadas as campanhas na época são (A) Norte, Centro-Oeste e Sul. (B) Norte, Nordeste e Sudeste. (alternativa correta) (C) Nordeste, Norte e Sul. (D) Nordeste, Sudeste e Sul. (E) Centro-Oeste, Sul e Sudeste.
Caracterização visual da questão
Desempenho dos alunos (em %)
Comentários: A questão 36 apresentou o maior índice de acertos, ainda que baixo, dentre as questões analisadas na edição de 2014 do ENEM. Cerca de 45% dos alunos foram capazes de dar significado aos dados apresentados na tabela e compará-los entre si. Nota-se uma discrepância no índice de acertos de escolas de tipos diferentes.
Fonte: os autores
190
Questões da competência de área 7
Quadro 45 – Questão 25 Questão 25 – ENEM 2014 – número 141 (prova cinza) – H27
Um pesquisador está realizando várias séries de experimentos com alguns reagentes para verificar qual o mais adequado para a produção de um determinado produto. Cada série consiste em avaliar um dado reagente em cinco experimentos diferentes. O pesquisador está especialmente interessado naquele reagente que apresentar a maior quantidade dos resultados de seus experimentos acima da média encontrada para aquele reagente. Após a realização de cinco séries de experimentos, o pesquisador encontrou os seguintes resultados:
Levando-se em consideração os experimentos feitos, o reagente que atende às expectativas do pesquisador é o (A) 1. (B) 2. (alternativa correta) (C) 3. (D) 4. (E) 5.
Caracterização visual da questão
Desempenho dos alunos (em %)
Comentários: A questão 25 foi a que apresentou o menor índice de acertos dentre o conjunto de questões das três edições analisadas. Apenas 10% dos alunos elaboraram uma estratégia adequada para inferir informações a partir dos dados apresentados na tabela. Para isso, era necessário mobilizar pensamento e raciocínio estatísticos. Cerca de 36% dos alunos assinalou a alternativa E, revelando terem selecionado o número de experimento com maior número de reações. Outros 31% dos alunos assinalou a alternativa C que mostra o reagente com maior média de reações. Vale destacar que a consigna do enunciado é complexa, fato que pode ter interferido no resultado.
Fonte: os autores
191
Quadro 46 – Questão 30
Questão 30 – ENEM 2014 – número 153 (prova cinza) – H29
Os candidatos K, L, M, N e P estão disputando uma única vaga de emprego em uma empresa e fizeram provas de português, matemática, direito e informática. A tabela apresenta as notas obtidas pelos cinco candidatos.
Segundo o edital de seleção, o candidato aprovado será aquele para o qual a mediana das notas obtidas por ele nas quatro disciplinas for a maior. O candidato aprovado será (A) K. (B) L. (C) M. (D) N. (alternativa correta) (E) P.
Caracterização visual da questão
Desempenho dos alunos (em %)
Comentários: A questão 30 exigia dos alunos um conhecimento básico sobre mediana e um nível de leitura entre os dados, uma vez que era necessário integrá-los na resolução. Cerca de um quarto dos alunos escolheu adequadamente o candidato que apresentou a maior mediana das notas. Aproximadamente 51% dos alunos assinalou a alternativa C que apresenta o candidato que obteve a maior média das notas. Outros 10% assinalaram a alternativa B provavelmente por terem olhado para o “meio” dos dados, sem terem se atido à ordenação dos valores. O desempenho dos alunos das escolas privadas, ainda que baixo, foi bastante superior ao desempenho dos alunos das escolas públicas.
Fonte: os autores
192
Quadro 47 – Questão 31
Questão 31 – ENEM 2014 – número 156 (prova cinza) – H29
Uma loja que vende sapatos recebeu diversas reclamações de seus clientes relacionadas à venda de sapatos de cor branca ou preta. Os donos da loja anotaram as numerações dos sapatos com defeito e fizeram um estudo estatístico a fim de reclamar com o fabricante. A tabela contém a média, a mediana e a moda desses dados anotados pelos donos.
Para quantificar os sapatos pela cor, os donos representaram a cor branca pelo número 0 e a cor preta pelo número 1. Sabe-se que a média da distribuição desses zeros e uns é igual a 0,45. Os donos da loja decidiram que a numeração dos sapatos com maior número de reclamações e a cor com maior número de reclamações não serão mais vendidas. A loja encaminhou um ofício ao fornecedor dos sapatos, explicando que não serão mais encomendados os sapatos de cor (A) branca e os de número 38. (alternativa correta) (B) branca e os de número 37. (C) branca e os de número 36. (D) preta e os de número 38. (E) preta e os de número 37.
Caracterização visual da questão
Desempenho dos alunos (em %)
Comentários: Para resolver mão da questão 31, o aluno precisava alocar recursos relacionados aos raciocínio e pensamento estatísticos. Era necessário, por exemplo, inferir que o fato da média da distribuição ser 0,45 revela que a maioria das reclamações se refere aos sapatos brancos (indicado pelo número 0). Compreender os conceitos de média, moda e mediana e articulá-los para desenvolver uma argumentação era a chave para resolver o problema. Cerca de 28% dos alunos acertaram a questão. Aproximadamente 24% dos alunos assinalaram a alternativa D, demonstrando talvez a incompreensão em relação ao significado do valor 0,45 no problema. Outros 21% assinalaram a alternativa C, sugerindo terem observado apenas o valor da média para tomar sua decisão.
Fonte: os autores
193
Quadro 48 – Questão 28
Questão 28 – ENEM 2014 – número 150 (prova cinza) – H30
Ao final de uma competição de ciências em uma escola, restaram apenas três candidatos. De acordo com as regras, o vencedor será o candidato que obtiver a maior média ponderada entre as notas das provas finais nas disciplinas de química e física, considerando, respectivamente, os pesos 4 e 6 para elas. As notas são sempre números inteiros. Por questões médicas, o candidato II ainda não fez a prova de química. No dia em que sua avaliação for aplicada, as notas dos outros dois candidatos, em ambas as disciplinas, já terão sido divulgadas. O quadro apresenta as notas obtidas pelos finalistas nas provas finais.
A menor nota que o candidato II deverá obter na prova final de química para vencer a competição é: (A) 18. (alternativa correta) (B) 19. (C) 22. (D) 25. (E) 26.
Caracterização visual da questão
Desempenho dos alunos (em %)
Comentários: Para resolver essa questão era necessário utilizar conceitos de média ponderada. Aproximadamente um quarto dos alunos foi capaz de calcular a média de acordo com a descrição do enunciado. A maior parte dos participantes analisados assinalou a alternativa B, valor resultante da análise de média aritmética. Podemos observar uma discrepância considerável entre o desempenho dos alunos oriundos de escolas de tipos diferentes.
Fonte: os autores
5.2.3. Análise gráfica dos resultados
Os resultados do desempenho dos alunos no ENEM revelam que os
participantes concluintes não são proficientes na competência estatística. Os
estudantes demonstram dominar apenas processos estatísticos bastante simples,
como é o caso da questão 1 que apresentou um índice de acerto de cerca de 85% e
194
exige apenas uma leitura direta dos dados. Questões associadas a um pensamento
mais amplo, como o que pressupunha a elaboração de estratégias ou argumentação
e generalização, como as questões 5, 21 e 25, apresentaram um baixo índice de
acerto (13%, 12% e 10%, respectivamente).
Para investigar a competência estatística por meio do estudo do
desempenho apresentado pelos alunos investigados, agrupamos as questões a
partir dos níveis de acerto. A intenção é verificar o que os alunos sabem e o que
ainda precisam aprender sobre Estatística.
Analisaremos, a princípio, as questões que apresentaram um índice de
acerto superior a 60%, ilustradas no quadro 49.
Quadro 49 – Questões com desempenho maior que 60%
Questões com desempenho maior que 60%
Questão 24: ENEM 2013 – H26 (64,71%)
Questão 12: ENEM 2013 – H25 (71,20%)
Questão 1: ENEM 2012 – H25 (87,93%)
Fonte: os autores
As três questões apresentam uma caracterização visual semelhante por
demandarem uma competência simples de conexão de dados expressos
explicitamente em gráfico ou tabela e não apresentarem dados relevantes para a
resolução no texto do enunciado, não sendo necessário articular informações. Esse
resultado nos revela que os alunos são capazes de resolver parcialmente situações-
problema nas quais não se exija uma análise integrada dos dados, nem um
raciocínio estatístico mais elaborado que envolva, por exemplo, previsão,
argumentação ou inferência. Analisando em conjunto as três questões, podemos
concluir ainda que o contexto no qual a situação está inserida não interferiu no
desempenho dos alunos.
Observemos, a seguir, as características das questões com índice de
acerto maior que 40% e menor que 60%, ilustradas no quadro 50. O grupo de
questões apresentado exige uma complexidade maior de processo e pensamento
em relação ao primeiro grupo de questões. Entretanto, o que caracteriza a relação
entre os itens é a competência de área a qual estão relacionadas. Todas elas,
195
exceto a questão 8, foram elaboradas para avaliar a capacidade de interpretar
informações de natureza científica e social obtidas da leitura de gráficos e tabelas,
realizando previsão de tendência, extrapolação, interpolação e interpretação. Diante
do exposto, podemos concluir que os alunos apresentam um desempenho mediano
em habilidades relacionadas à análise de dados.
Quadro 50 – Questões com desempenho maior que 40% e menor que 60%
Questões com desempenho maior que 40% e menor que 60%
Questão 9: ENEM 2012 – H25 (43,07%)
Questão 17: ENEM 2013 – H25 (43,50%)
Questão 36: ENEM 2014 – H26 (45,35%)
Questão 14: ENEM 2013 – H24 (46,06%)
Questão 11: ENEM 2012 – H26 (47,02%)
Questão 10: ENEM 2012 – H25 (47,12%)
Questão 18: ENEM 2013 – H25 (50,62%)
Questão 8: ENEM 2012 – H29 (51,28%)
Questão 3: ENEM 2012 – H25 (57,39%)
Questão 2: ENEM 2012 – H26 (58,39%)
Fonte: os autores
196
Apresentamos, na sequência, o grupo das questões com índice de acerto
maior que 20% e menor que 40%. Por meio da observação das principais
características dos itens, resolvemos por separar esse conjunto em dois subgrupos.
O primeiro deles apresenta as questões relacionadas à competência de área 6
(interpretar informações de natureza científica e social obtidas da leitura de gráficos
e tabelas, realizando previsão de tendência, extrapolação, interpolação e
interpretação), como mostra o quadro 51.
Quadro 51: Questões com desempenho maior que 20% e menor que 40% - competência de área 6
Questões com desempenho maior que 20% e menor que 40% - competência de área 6
Questão 35: ENEM 2014 – H24 (20,75%)
Questão 23: ENEM 2013 – H26 (21,09%)
Questão 27: ENEM 2014 – H24 (24,39%)
Questão 34: ENEM 2014 – H25
(29,71%)
Questão 26: ENEM 2014 – H25 (38,77%)
Fonte: os autores
Podemos notar que as questões desse primeiro subgrupo se assemelham
na complexidade do processo envolvido na resolução. Todas as questões, exceto a
26, estão associadas a um pensamento mais amplo, pressupondo a capacidade de
planejar estratégias e envolvendo argumentação ou inferência a partir dos dados
apresentados. Vale ressaltar que a questão 26 estava originalmente associada à
competência de área 4 e apesar de exigir do ponto de vista da Estatística apenas a
análise dos dados apresentados no gráfico cartesiano, revela a necessidade de uma
conexão entre temas distintos da Matemática.
197
O segundo subgrupo reuniu as questões associadas à competência de
área 7, que pretende avaliar se os alunos compreendem o caráter aleatório e não-
determinístico dos fenômenos naturais e sociais e utilizam instrumentos adequados
para medidas, determinam amostras e cálculos de probabilidade para interpretar
informações de variáveis apresentadas em uma distribuição estatística, como mostra
o quadro 52.
Quadro 52 – Questões com desempenho maior que 20% e menor que 40% - competência de área 7
Questões com desempenho maior que 20% e menor que 40% - competência de área 7
Questão 19: ENEM 2013 – H27 (22,87%)
Questão 28: ENEM 2014 – H30 (24,60%)
Questão 30: ENEM 2014 – H29 (25,41%)
Questão 16: ENEM 2013 – H27 (25,63%)
Questão 13: ENEM 2013 – H28 (27,87%)
Questão 31: ENEM 2014 – H29 (27,98%)
Fonte: os autores
Entendemos que esse grupo de questões se assemelha pela natureza
das habilidades necessárias na sua resolução e pelo nível de processo envolvido
que pressupõe uma reunião de ideias para se chegar à resposta, ou seja, uma
conexão entre conceitos. Apenas a questão 31 foge desse padrão.
Analisemos, por fim, o grupo de questões nas quais os alunos
apresentaram o menor desempenho, organizado no quadro 53. Todas as questões
que compõem esse grupo, exceto a 29, estão associadas à competência de área 7.
Além disso, ora é exigido um nível de leitura para além dos dados, ora um processo
de reflexão, ora os dois ao mesmo tempo, revelando uma complexidade no
198
raciocínio da resolução. Nesse sentido, a questão de número 7 destoa das demais,
porque apesar de se tratar de um processo rotineiro, definir a mediana de um
conjunto de dados, apresenta as informações em um gráfico e não em uma tabela
ou rol como é mais frequentemente trabalhado nas escolas.
Quadro 53: Questões com desempenho menor que 20% Questões com desempenho menor que 20%
Questão 25: ENEM 2014 – H27 (10,01%)
Questão 5: ENEM 2012 – H27 (13,62%)
Questão 4: ENEM 2012 – H28 (14,25%)
Questão 7: ENEM 2012 – H27 (15,48%)
Questão 22: ENEM 2013 – H30 (16,92%)
Questão 29: ENEM 2014 – H25 (18,14%)
Fonte: os autores
5.2.4. Análise sobre o desempenho no ENEM
A investigação sobre o desempenho dos alunos nas questões envolvendo
Estatística nas edições de 2012, 2013 e 2014 do ENEM nos sugere que grande
parte dos estudantes não desenvolveu plenamente a competência estatística,
entendida aqui com o a integração entre a literacia, o raciocínio e o pensamento
estatísticos. Os alunos demonstraram serem capazes de ler e interpretar gráficos de
tabelas de modo superficial, sem integrar os dados entre si ou inferir informações
para além deles.
Retomando o referencial teórico sobre Educação Estatística, podemos
dizer que os alunos que tiveram seu desempenho investigado desenvolveram certas
habilidades processuais, como organizar dados, calcular médias aritméticas e
habilidades de interpretação e literacia estatística que não exigem argumentação.
199
Entretanto, nota-se a falta de atitudes que revelem uma postura mais crítica e
reflexiva sobre a leitura e interpretação de dados, e principalmente compreensões
das relações matemáticas envolvidas em estatística. Se usarmos a classificação
apresentada por Watson e Callingham (2003), podemos dizer que, de modo geral,
os estudantes que encerram o Ensino Médio, se encontram mais próximos do nível
3 de literacia estatística, nomeado como inconsistente pelos pesquisadores. Nesse
nível, o engajamento do aluno com o contexto é seletivo, não crítico e questionador
e evidencia-se um reconhecimento apenas superficial da terminologia estatística.
Além disso, sujeitos nesse nível de literacia estatística interpretam tabelas e gráficos
simples e diretos, realizam cálculos básicos de chances, mas não utilizam com
compreensão medidas de tendência central e de dispersão.
Em relação ao nível de leitura dos dados, de acordo com o referencial de
Curcio (1987), os alunos demonstraram um maior desempenho em situações que
não exigem inferir informações a partir da integração dos dados. Podemos dizer que
o grupo investigado domina a leitura dos dados, e realiza com restrições a leitura
entre dados, ou seja, são capazes de fazer comparações e realizar cálculos simples
que não envolvam manipulação dos dados no sentido da estatística. Grande parte
dos alunos não extrapola as informações apresentadas a fim de generalizar ou
prever situações.
Sobre o raciocínio estatístico dos estudantes, usando o referencial de
Garfield e Gal (1999) apresentado anteriormente, concluímos que os alunos
apresentam um raciocínio sobre os dados e sobre a representação de dados,
somente. Os dados revelam um raciocínio raso sobre medidas estatísticas uma vez
que demonstraram não entender completamente os fatos mostrados por elas. Os
pesquisadores afirmam que o raciocínio estatístico exige uma compreensão sobre a
associação dos dados, saber como julgar e interpretar a relação entre as variáveis
tratadas. A análise dos resultados do desempenho nas questões sugere que a
ausência do raciocínio sobre associação seja o grande problema dos nossos alunos
do Ensino Médio, entendendo que a ausência dessa habilidade pode interferir
negativamente no desenvolvimento da competência estatística.
Usando o referencial de Garfield (2002), podemos afirmar que a amostra
de estudantes demonstrou estar no nível 3 de raciocínio estatístico, o nível
transacional. Para esse autor, nesse nível o aluno é capaz de identificar
corretamente uma ou duas dimensões de uma investigação estatística
200
separadamente, sem integrá-las, falta a ele um completo entendimento da
investigação estatística e a coordenação de conceitos estatísticos.
Investigar a competência de pensamento estatístico por meio de questões
de múltipla escolha é um desafio. No entanto, os dados sugerem que os processos
mentais que dão suporte para as decisões relacionadas à Estatística dos alunos são
insuficientes considerando o nível de escolaridade que apresentam.
Os resultados obtidos são bastante preocupantes uma vez que
conhecemos a importância de ser competente em Estatística na sociedade atual
repleta de dados e informações. Os alunos do Ensino Médio não demonstram utilizar
o conhecimento estatístico desenvolvido para resolver situações problema de
qualquer natureza de processos e níveis de compreensão. Falta a eles a capacidade
de inferir, generalizar, argumentar e tomar decisões com base na análise de dados
apresentados.
CAPÍTULO 6 – CONCLUSÃO
Saber ler, selecionar, interpretar e agir a partir de dados numéricos têm se
revelado habilidades fundamentais em uma sociedade repleta de informações como
a qual vivemos atualmente. Essas competências estão associadas à literacia
estatística, sendo o ensino e a aprendizagem de Estatística cada vez mais se
transformado em objeto de discussão em pesquisas científicas e congressos da
Educação Matemática. A presente tese analisou indicadores sobre as práticas de
professores ao ensinar conceitos estatísticos e a aplicação desses conceitos pelos
alunos em questões de estatística no Enem dos alunos (analisando os seus
microdados). Ambas as análises conjugadas tem a intenção de auxiliar na
compreensão do status atual do ensino de Estatística do Ensino Médio brasileiro.
Esses indicadores dos professores e dos alunos foram confrontados com as
expectativas expressas nos documentos oficiais brasileiros sobre educação
estatística.
A investigação foi particularmente contextualizada a partir de uma revisão
teórica sobre os conceitos de literacia, raciocínio e pensamentos estatísticos
relacionados à competência estatística.
A pesquisa mostrou que os documentos oficiais brasileiros atuais da
Educação Matemática estão alinhados às discussões atuais sobre habilidades e
competência estatísticas. Entretanto, assim como ocorre em outros países,
pesquisas nacionais indicam que discussões pertinentes ao ensino e aprendizagem
de Estatística não têm sido objeto de estudo das licenciaturas em Matemática,
cursos responsáveis pela formação dos professores que ensinam o tema nas séries
finais do Ensino Fundamental e no Ensino Médio. Esse fato sugere que grande parte
daqueles que estão em sala atualmente não tiveram a oportunidade de desenvolver
habilidades relacionadas à competência estatística enquanto alunos da Educação
Básica nem de refletir sobre o assunto em sua formação inicial. Na perspectiva da
aprendizagem, diversas aferições têm apontado fragilidades dos estudantes que
concluem a Educação Básica em nosso país em relação à Matemática.
Diante do cenário descrito, para estabelecer a relação entre a teoria, os
documentos oficiais, as práticas dos professores e o desempenho dos alunos,
utilizamos duas ferramentas quali quantitativas: uma pesquisa com os professores
202
que por meio de um questionário revelaram suas práticas, escolhas,
intencionalidades e justificativas para o ensino de Estatística e; a análise do
desempenho dos alunos em questões envolvendo Estatística de três edições do
ENEM (2012, 2013 e 2014).
A análise das variáveis censitárias do questionário aplicado a 89
professores de Matemática do Ensino Médio revelou uma amostra de professores
com experiência na docência, licenciados em Matemática e muitas vezes pós-
graduados (principalmente especialização). Em uma questão aberta os sujeitos
listaram três ações didáticas que julgam importantes em relação à Estatística. O
conjunto de respostas, que foi analisado por meio da técnica de análise de
conteúdo, indicou a preocupação dos docentes com o protagonismo e vivência das
etapas de uma pesquisa em temas relacionados ao cotidiano dos alunos, entretanto,
sugere a predominância do trabalho com leitura e análise dos dados somente.
Aparentemente ficam de fora da sala de aula propostas que evidenciam o papel
investigador da Estatística e permitam que o aluno construa argumentações
consistentes, elaborem propostas de intervenção e aliem a leitura e interpretação de
representações de dados os conhecimentos aos conhecimentos estatísticos para
fazer inferência.
Propusemos no mesmo questionário três perguntas com cinco itens cada
para os professores classificarem a sua importância em relação aos temas:
justificativas para o Ensino de Estatística; habilidades necessárias para o
desenvolvimento dos alunos; questões do ENEM no sentido de avaliação da
aprendizagem. Quando solicitados a ordenar as afirmações sobre a justificativa para
o Ensino de Estatística e as habilidades esperadas, de acordo com o grau de
importância, os entrevistados mostraram mais uma vez a força que dão à leitura e
interpretação aliada à formação para a argumentação. No entanto, ao ordenarem
questões do ENEM que avaliam a competência estatística nos termos do exame,
consideraram aquelas relacionadas à leitura e interpretação de dados e resolução
de problemas como as de menor relevância dentre as questões do conjunto. Essa
análise revela incoerência em relação ao seu discurso sobre o que fazem na prática
em sala de aula, as respostas relacionadas ao ensino e as escolhas de questões
para avaliar essa aprendizagem. O resultado sugere que os professores propõem
um trabalho abordando principalmente o desenvolvimento de habilidades
relacionadas à leitura e interpretação dos dados na intenção de que seus alunos
203
desenvolvam o senso crítico e argumentação, mas que não parecem reconhecer
questões que avaliem a aprendizagem nessa mesma direção.
O questionário apresentou ainda um conjunto de 30 assertivas tratando
também do ensino de Estatística para as quais os professores entrevistados
deveriam registrar o grau de concordância apresentado em uma escala de atitude do
tipo Likert com cinco níveis. Analisamos os dados por meio da técnica de análise
fatorial exploratória a fim de investigar perfis dos professores associados a
pormenores da prática do ensino de Estatística. A investigação de padrões e
dimensões latentes de variáveis característica do método empregado indicou cinco
fatores entendidos aqui como conjuntos de variáveis, no caso, as assertivas. O
primeiro fator, que mais explica o conjunto de respostas, revelou uma tendência
mais tecnicista dos entrevistados para os quais, aparentemente, ensina-se
Estatística para aprender Matemática. Ao segundo fator revelado está associada
uma ideia de ensino da Estatística que visa desenvolvimento do senso crítico, os
conceitos estatísticos subsidiam ações de argumentação e de tomada de decisão
dos alunos. O terceiro fator apresentou uma visão mais utilitária e intuitiva da
Estatística para a qual a constatação dos fatos apresentados em representações de
dados é mais relevante do que o trabalho com a resolução de situações-problema e
a inferência. O quarto fator mostrou um ensino de Estatística focado unicamente na
leitura e interpretação de representações de dados. O quinto e último fator apresenta
aspectos relacionados à periodicidade do trabalho com a Estatística e sinaliza uma
preocupação em trabalhar essa unidade temática em todos os períodos escolares,
seguindo as sugestões dos documentos educacionais oficiais.
A análise integrada dos dados do questionário revelou que o trabalho com
resolução de problemas, cálculo e utilização com compreensão de medidas
estatísticas não parece ser foco do ensino para os entrevistados. A hipótese é de
que não há conhecimento sobre como os raciocínios mais elaborados de Estatística
podem auxiliar na leitura, na interpretação, na análise e na construção de
argumentação sobre os dados.
Ao abordar majoritariamente contextos próximos à realidade dos alunos e
não investir fortemente em atividades que exijam a combinação da alfabetização
estatística com as medidas estatísticas para argumentar e tomar decisões, os
professores estão ignorando o potencial da Estatística no desenvolvimento de
204
competências de investigação e compreensão como pregam os documentos oficiais
da Educação e os referenciais teóricos abordados no presente trabalho.
A investigação se deu a partir das respostas dadas por um grupo de
professores com um perfil de formação que destoa da maior parte dos docentes do
país: licenciados em Matemática, pós-graduados e que frequentam cursos de
aperfeiçoamento. A despeito desse perfil hipoteticamente melhor preparado
profissionalmente, os resultados indicam que da parte dos professores, aos
estudantes não está sendo oferecida a oportunidade de elaborar os pensamentos
mais abstratos e complexos em relação aos conhecimentos estatísticos esperados
para aqueles que se formam no segmento de ensino no qual trabalham. Diante do
exposto, é possível inferir que a abordagem dos conceitos estatísticos no Ensino
Médio não se diferencia do que é feito no Ensino Fundamental.
A competência estatística dos estudantes foi aferida a partir do
desempenho no ENEM de mais de três milhões de concluintes da Educação Básica.
Desde a sua concepção o exame se propõe a avaliar habilidades e competências, a
matriz de Referência do ENEM para Matemática e suas Tecnologias contém duas
competências de área associadas à Estatística já apresentadas que abarcam sete
habilidades. Na intenção de conhecer o desempenho dos estudantes para além do
índice de acertos nesses parâmetros e sob a perspectiva do referencial teórico
previamente citado, criamos um protocolo de análise com outras variáveis.
Inspirados pela classificação das questões adotada no PISA e ao referencial sobre
leitura e interpretação de dados em gráficos, utilizamos sete variáveis para
caracterizar cada uma das questões, quais sejam: competência de área, habilidade,
objeto do conhecimento, contexto, tipo de texto, nível de leitura e processo.
A análise realizada indica que os estudantes concluintes do Ensino Médio
no ano da aplicação do exame são capazes de analisar dados em um nível de
leitura e interpretação dos dados que não exija conexões e inferência, mas não
dominam o conhecimento estatístico a ponto de resolver situações problema de
qualquer natureza de processos e níveis de compreensão. O resultado sugere que a
Educação Básica em nosso país não tem propiciado o desenvolvimento pleno da
competência estatística, entendida aqui com o a integração entre a literacia, o
raciocínio e o pensamento estatísticos.
Os pressupostos e as práticas dos professores sobre ensino e
aprendizagem de Estatística, aferidos a partir da análise do questionário, parecem
205
se revelar no desempenho dos alunos no ENEM. Ao analisar conjuntamente os
resultados das ferramentas de pesquisa, notamos uma coerência entre o que os
docentes propõem e o que os alunos mostram conhecer. Porém essa coerência não
se coaduna aos pressupostos dos referenciais educacionais brasileiros ou ao que se
entende atualmente sobre competência estatística.
As mudanças acentuadas nas concepções sobre ensino de Matemática
em um curto período de tempo contribuem para esse cenário de incoerência. Os
professores que hoje ensinam Estatística aos estudantes do Ensino Médio tiveram
sua formação básica e profissional pautadas em outros modos de conceber a função
da escola, do ensino e da aprendizagem matemática. Diante do exposto, por
entender que a formação profissional também se dá no processo, julgamos como
essenciais e urgentes ações intencionais que visem não somente à formação inicial
como principalmente à formação continuada crítica e reflexiva daqueles que
ensinam Estatística na Educação Básica.
206
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em 5 de outubro de 2015.
260
APÊNDICE G – ANÁLISE DE CONTEÚDO - UNIDADES DE CONTEXTOS
ORGANIZADAS POR ORDEM ALFABÉTICA
Agrupamento de dados
Altura, número do sapato, moradia, preferências de comida, bebida, esporte, estilo musical, notas escolares
Argumentação a partir dos dados de gráficos e/ou tabelas
Associar gráfico e tabela
Atividades de debate e argumentação
Atividades envolvendo levantamento de dados
Atividades individuais
Atividades que envolvam a interdisciplinaridade
Atividades que envolvam a transdisciplinaridade
Atualidades
Aula expositiva
Aula mediada
Calculadora
Campanhas publicitárias, poder de influência
Computador, uso de planilha eletrônica
Conceitos de matemática (fração, manipulação numérica e algébrica)
Conceitos matemáticos relacionados (porcentagem, proporcionalidade, ordem de grandeza)
Conclusão a partir de um gráfico e/ou tabela
Construção de tabela e/ou gráficos
Cotidiano, dia a dia, proximidade e interesse dos alunos
Crescimento e decrescimento em gráficos
Didática inovadora
Elaboração de gráficos para comunicar dados
Elaboração de projetos com dados estatísticos
Elaboração de situação problema
Eleições, inflação, produtos, previsão do tempo
Estatística como auxílio para tomada de decisão
Estudo e análise de tabelas e/ou gráficos
Extração de informações do gráfico
Finanças, juros
261
Jornais, revistas e/ou internet
Leitura e interpretação de tabelas e/ou gráficos
Livros didáticos
Marcar pontos no R2
Materiais concretos
Materiais reciclados
Média
Mediana
Medidas estatísticas
Moda
Oficinas
Organização dos dados de uma pesquisa
Partir do conhecimento/realidade dos alunos
Pesquisa de campo
Pesquisar (procurar) gráficos e tabelas
Pesquisas
Pesquisas com temas escolhidos pelos alunos
Pesquisas sobre atualidades
Produção de texto
Proposição de campanhas publicitárias
Questões de vestibular, ENEM
Reconhecimento da importância e aplicação da Estatística no cotidiano
Resolução de situações problema ou exercícios
Retomada dos conceitos básicos da matemática
Senso Crítico
Tabulação dos dados de uma pesquisa
Textos informativos com dados estatísticos
Tipos de gráficos
Trabalho em grupo
Tratamento dos dados
Usar tabelas e/ou gráficos
Variações na interpretação decorrentes da amostra
Vídeos
262
APÊNDICE H - QUESTÕES DE ORDENAÇÃO - ANÁLISE DESCRITIVA DOS
DADOS
VARIÁVEL ENS_O
Variáveis Amostra Média Desvio
padrão Mínimo Máximo
Alfabetização matemática 88 2,136364 1,4398421 1 5
Outras ciências 88 2,977273 1,1242088 1 5
Projetos coletivos 88 3,034091 1,4419723 1 5
Presente no cotidiano 88 3,477273 1,4382083 1 5
Senso crítico e argumentação 89 3,651685 1,2622232 1 5
Grau de importância
1 2 3 4 5
EN
S_O
Alfabetização matemática 45 17 4 13 9
Outras ciências 9 21 29 21 8
Projetos coletivos 14 26 12 15 21
Presente no cotidiano 12 12 17 16 31
Senso crítico e argumentação 7 9 22 21 30
VARIÁVEL HAB_O
Variáveis Amostra Média Desvio
padrão Mínimo Máximo
Calcular Medidas 88 2,136364 1,4398421 1 5
Fazer inferências 88 2,977273 1,1242088 1 5
Usar dados para resolver
problemas 88 3,034091 1,4419723 1 5
Construir Argumentação 88 3,477273 1,4382083 1 5
Calcular Medidas 89 3,651685 1,2622232 1 5
263
Grau de importância
1 2 3 4 5
HA
B _
O
Calcular Medidas 38 17 17 4 13
Fazer inferências 27 19 16 17 10
Usar dados para resolver
problemas 9 28 19 28 5
Construir Argumentação 6 13 24 26 20
Ler e interpretar 8 9 10 11 51
VARIÁVEL QUE_O
Variáveis Amostra Média Desvio
padrão Mínimo Máximo
Resolução de problema 87 2,8045977 1,1992156 1 5
Leitura direta dos dados 88 2,8522727 1,4506421 1 5
Cálculo de medidas de
tendência 88 2,9545455 1,4134745 1 5
Inferência, análise entre
variáveis 88 3,2386364 1,477761 1 5
Análise de informações 89 3,3033708 1,5255736 1 5
Grau de importância
1 2 3 4 5
QU
E _
O
Resolução de problema 12 26 26 13 10
Leitura direta dos dados 21 20 14 17 16
Cálculo de medidas de tendência 22 10 19 24 13
Inferência, análise entre variáveis 15 16 16 15 26
Análise de informações 17 14 11 19 28
264
APÊNDICE I – DADOS DO DESEMPENHO DOS ALUNOS NO ENEM 2012
Questão
Índice de acertos (em %)
Geral
Por tipo de escola
Privada Pública
1 87,93 93,59 85,9
2 58,39 77,36 51,6
3 57,39 77,37 50,24
4 14,25 17,93 12,79
5 13,62 16,45 12,6
6 25,31 30,9 23,31
7 15,48 21,75 13,23
8 51,28 66,08 45,98
9 43,07 59,85 37,06
10 47,12 68,98 39,29
11 47,02 68,97 39,15
Questão
Frequência das alternativas assinaladas (em%)
A B C D E
1 1,74 1,61 2,02 6,40 87,93
2 12,17 19,47 3,81 5,92 58,39
3 7,70 8,25 15,32 11,11 57,39
4 16,21 52,24 9,49 14,25 7,47
5 18,76 25,59 20,04 21,34 13,62
6 14,79 19,77 29,03 25,31 10,60
7 19,08 15,48 16,67 18,23 30,09
8 6,02 9,58 16,48 51,28 16,24
9 11,28 14,72 20,20 43,07 10,28
10 47,12 8,78 19,68 15,95 8,14
11 13,59 47,02 24,60 8,60 5,92
265
APÊNDICE J – DADOS DO DESEMPENHO DOS ALUNOS NO ENEM 2013
Questão
Índice de acertos (em %)
Geral
Por tipo de escola
Privada Pública
12 71,20 85,33 66,36
13 27,57 30,56 26,55
14 46,06 59,97 41,30
15 28,89 23,30 30,83
16 25,63 35,08 22,40
17 43,50 65,03 36,14
18 50,62 68,65 44,38
19 22,87 24,42 22,34
20 29,16 32,98 27,85
21 11,55 11,58 11,54
22 16,92 23,00 14,84
23 21,09 33,45 16,85
24 64,71 79,68 59,59
Questão
Frequência das alternativas assinaladas (em%)
A B C D E
12 4,06 8,14 71,20 7,54 8,82
13 27,57 16,30 25,83 21,77 8,10
14 16,83 10,10 12,37 46,06 14,24
15 28,89 21,93 25,21 14,01 9,61
16 8,77 25,63 18,17 23,28 23,79
17 9,43 43,50 26,75 15,92 4,08
18 16,81 12,00 10,90 50,62 9,31
19 15,80 16,74 22,87 26,48 17,74
20 10,69 29,16 32,66 18,10 8,91
21 11,55 16,11 18,82 34,37 18,60
22 13,23 25,53 13,57 16,92 30,32
23 20,37 8,89 34,71 21,09 14,56
24 9,92 9,19 64,71 9,77 6,07
266
APÊNDICE K – DADOS DO DESEMPENHO DOS ALUNOS NO ENEM 2014
Questão
Índice de acertos (em %)
Geral
Por tipo de escola
Privada Pública
25 10,01 15,13 8,31
26 38,77 58,50 32,24
27 24,39 28,28 23,11
28 24,6 39,66 19,61
29 18,14 26,00 15,53
30 25,41 37,99 21,25
31 27,98 36,35 25,21
32 24,62 26,37 24,04
33 17,64 18,90 17,22
34 29,71 47,08 23,97
35 20,75 24,03 19,67
36 45,35 63,33 39,40
Questão
Frequência das alternativas assinaladas (em%)
A B C D E
25 6,13 10,1 31,01 16,41 36,08
26 38,77 39,04 8,00 7,00 6,79
27 15,15 24,39 26,76 23,61 9,48
28 24,6 40,51 22,07 7,56 4,94
29 9,15 34,28 18,14 34,27 3,82
30 6,25 10,44 51,03 25,41 6,57
31 27,98 16,51 20,56 24,35 10,14
32 22,52 20,6 18,00 13,82 24,62
33 27,36 17,64 22,21 21,09 11,24
34 16,57 15,51 23,03 14,77 29,71
35 11,45 44,78 20,75 9,96 12,73
36 12,68 45,43 9,70 14,59 17,33
267
ANEXOS
ANEXO A – HABILIDADES DA PRIMEIRA VERSÃO DO ENEM
Fonte: Eixos cognitivos do ENEM (BRASIL, 2002)
1. Dada a descrição discursiva ou por ilustração de um experimento ou fenômeno,
de natureza científica, tecnológica ou social, identificar variáveis relevantes e
selecionar os instrumentos necessários para realização ou interpretação do mesmo.
2. Em um gráfico cartesiano de variável socioeconômica ou técnico-científica,
identificar e analisar valores das variáveis, intervalos de crescimento ou decréscimo
e taxas de variação.
3. Dada uma distribuição estatística de variável social, econômica, física, química ou
biológica, traduzir e interpretar as informações disponíveis, ou reorganizá-las,
objetivando interpolações ou extrapolações.
4. Dada uma situação-problema, apresentada em uma linguagem de determinada
área de conhecimento, relacioná-la com sua formulação em outras linguagens ou
vice-versa.
5. A partir da leitura de textos literários consagrados e de informações sobre
concepções artísticas, estabelecer relações entre eles e seu contexto histórico,
social, político ou cultural, inferindo as escolhas dos temas, gêneros discursivos e
recursos expressivos dos autores.
6. Com base em um texto, analisar as funções da linguagem, identificar marcas de
variantes linguísticas de natureza sociocultural, regional, de registro ou de estilo, e
explorar as relações entre as linguagens coloquial e formal.
268
7. Identificar e caracterizar a conservação e as transformações de energia em
diferentes processos de sua geração e uso social, e comparar diferentes recursos e
opções energéticas.
8. Analisar criticamente, de forma qualitativa ou quantitativa, as implicações
ambientais, sociais e econômicas dos processos de utilização dos recursos naturais,
materiais ou energéticos.
9. Compreender o significado e a importância da água e de seu ciclo para a
manutenção da vida, em sua relação com condições socioambientais, sabendo
quantificar variações de temperatura e mudanças de fase em processos naturais e
de intervenção humana.
10. Utilizar e interpretar diferentes escalas de tempo para situar e descrever
transformações na atmosfera, biosfera, hidrosfera e litosfera, origem e evolução da
vida, variações populacionais e modificações no espaço geográfico.
11. Diante da diversidade da vida, analisar, do ponto de vista biológico, físico ou
químico, padrões comuns nas estruturas e nos processos que garantem a
continuidade e a evolução dos seres vivos.
12. Analisar fatores socioeconômicos e ambientais associados ao desenvolvimento,
às condições de vida e saúde de populações humanas, por meio da interpretação de
diferentes indicadores.
13. Compreender o caráter sistêmico do planeta e reconhecer a importância da
biodiversidade para preservação da vida, relacionando condições do meio e
intervenção humana.
14. Diante da diversidade de formas geométricas planas e espaciais, presentes na
natureza ou imaginadas, caracterizá-las por meio de propriedades, relacionar seus
elementos, calcular comprimentos, áreas ou volumes, e utilizar o conhecimento
geométrico para leitura, compreensão e ação sobre a realidade.
269
15. Reconhecer o caráter aleatório de fenômenos naturais ou não e utilizar em
situações-problema processos de contagem, representação de frequências relativas,
construção de espaços amostrais, distribuição e cálculo de probabilidades.
16. Analisar, de forma qualitativa ou quantitativa, situações-problema referentes a
perturbações ambientais, identificando fonte, transporte e destino dos poluentes,
reconhecendo suas transformações; prever efeitos nos ecossistemas e no sistema
produtivo e propor formas de intervenção para reduzir e controlar os efeitos da
poluição ambiental.
17. Na obtenção e produção de materiais e de insumos energéticos, identificar
etapas, calcular rendimentos, taxas e índices, e analisar implicações sociais,
econômicas e ambientais.
18. Valorizar a diversidade dos patrimônios étnicos, culturais e artísticos,
identificando-a em suas manifestações e representações em diferentes sociedades.
épocas e lugares.
19. Confrontar interpretações diversas de situações ou fatos de natureza histórico-
geográfica, técnico-científica, artístico-cultural ou do cotidiano, comparando
diferentes pontos de vista, identificando os pressupostos de cada interpretação e
analisando a validade dos argumentos utilizados.
20. Comparar processos de formação socioeconômica, relacionando-os com seu
contexto histórico e geográfico.
21. Dado um conjunto de informações sobre uma realidade histórico-geográfica,
contextualizar e ordenar os eventos registrados, compreendendo a importância dos
fatores sociais, econômicos, políticos ou culturais.
270
ANEXO B – EIXOS COGNITIVOS DA MATRIZ DE REFERÊNCIA DO ENEM 2009
I. Dominar linguagens (DL): dominar a norma culta da Língua Portuguesa e fazer
uso das linguagens matemática, artística e científica e das línguas espanhola e
inglesa.
II. Compreender fenômenos (CF): construir e aplicar conceitos das várias áreas do
conhecimento para a compreensão de fenômenos naturais, de processos histórico-
geográficos, da produção tecnológica e das manifestações artísticas.
III. Enfrentar situações-problema (SP): selecionar, organizar, relacionar, interpretar
dados e informações representados de diferentes formas, para tomar decisões e
enfrentar situações-problema.
IV. Construir argumentação (CA): relacionar informações, representadas em
diferentes formas, e conhecimentos disponíveis em situações concretas, para
construir argumentação consistente.
V. Elaborar propostas (EP): recorrer aos conhecimentos desenvolvidos na escola
para elaboração de propostas de intervenção solidária na realidade, respeitando os
valores humanos e considerando a diversidade sociocultural.
271
ANEXO C – HABILIDADES DA ÁREA MATEMÁTICA E SUAS TECONOLOGIAS
Competência de área 1 - Construir significados para os números naturais,
inteiros, racionais e reais.
H1 - Reconhecer, no contexto social, diferentes significados e representações dos
números e operações - naturais, inteiros, racionais ou reais.
H2 - Identificar padrões numéricos ou princípios de contagem.
H3 - Resolver situação-problema envolvendo conhecimentos numéricos.
H4 - Avaliar a razoabilidade de um resultado numérico na construção de argumentos
sobre afirmações quantitativas.
H5 - Avaliar propostas de intervenção na realidade utilizando conhecimentos
numéricos.
Competência de área 2 - Utilizar o conhecimento geométrico para realizar a
leitura e a representação da realidade e agir sobre ela.
H6 - Interpretar a localização e a movimentação de pessoas/objetos no espaço
tridimensional e sua representação no espaço bidimensional.
H7 - Identificar características de figuras planas ou espaciais.
H8 - Resolver situação-problema que envolva conhecimentos geométricos de
espaço e forma.
H9 - Utilizar conhecimentos geométricos de espaço e forma na seleção de
argumentos propostos como solução de problemas do cotidiano.
Competência de área 3 - Construir noções de grandezas e medidas para a
compreensão da realidade e a solução de problemas do cotidiano.
H10 - Identificar relações entre grandezas e unidades de medida.
H11 - Utilizar a noção de escalas na leitura de representação de situação do
cotidiano.
H12 - Resolver situação-problema que envolva medidas de grandezas.
H13 - Avaliar o resultado de uma medição na construção de um argumento
consistente.
H14 - Avaliar proposta de intervenção na realidade utilizando conhecimentos
geométricos relacionados a grandezas e medidas da realidade e a solução de
problemas do cotidiano.
272
Competência de área 4 - Construir noções de variação de grandezas para a
compreensão da realidade e a solução de problemas do cotidiano.
H15 - Identificar a relação de dependência entre grandezas.
H15 - Identificar a relação de dependência entre grandezas.
H16 - Resolver situação-problema envolvendo a variação de grandezas, direta ou
inversamente proporcionais.
H17 - Analisar informações envolvendo a variação de grandezas como recurso para
a construção de argumentação.
H18 - Avaliar propostas de intervenção na realidade envolvendo variação de
grandezas.
Competência de área 5 - Modelar e resolver problemas que envolvem variáveis
socioeconômicas ou técnico-científicas, usando representações algébricas.
H19 - Identificar representações algébricas que expressem a relação entre
grandezas.
H20 - Interpretar gráfico cartesiano que represente relações entre grandezas.
H21 - Resolver situação-problema cuja modelagem envolva conhecimentos
algébricos.
H22 - Utilizar conhecimentos algébricos/geométricos como recurso para a
construção de argumentação.
H23 - Avaliar propostas de intervenção na realidade utilizando conhecimentos
algébricos.
Competência de área 6 - Interpretar informações de natureza científica e social
obtidas da leitura de gráficos e tabelas, realizando previsão de tendência,
extrapolação, interpolação e interpretação.
H24 - Utilizar informações expressas em gráficos ou tabelas para fazer inferências.
H25 - Resolver problema com dados apresentados em tabelas ou gráficos.
H26 - Analisar informações expressas em gráficos ou tabelas como recurso para a
construção de argumentos.
273
Competência de área 7 - Compreender o caráter aleatório e não-determinístico
dos fenômenos naturais e sociais e utilizar instrumentos adequados para
medidas, determinação de amostras e cálculos de probabilidade para
interpretar informações de variáveis apresentadas em uma distribuição
estatística.
H27 - Calcular medidas de tendência central ou de dispersão de um conjunto de
dados expressos em uma tabela de frequências de dados agrupados (não em
classes) ou em gráficos.
H28 - Resolver situação-problema que envolva conhecimentos de estatística e
probabilidade.
H29 - Utilizar conhecimentos de estatística e probabilidade como recurso para a
construção de argumentação.
H30 - Avaliar propostas de intervenção na realidade utilizando conhecimentos de
estatística e probabilidade.
274
ANEXO D – OS OBJETOS DO CONHECIMENTO DE MATEMÁTICA E SUAS TECNOLOGIAS
Conhecimentos numéricos: operações em conjuntos numéricos (naturais, inteiros,
racionais e reais), desigualdades, divisibilidade, fatoração, razões e proporções,
porcentagem e juros, relações de dependência entre grandezas, sequências e
progressões, princípios de contagem.
Conhecimentos geométricos: características das figuras geométricas planas e
espaciais; grandezas, unidades de medida e escalas; comprimentos, áreas e
volumes; ângulos; posições de retas; simetrias de figuras planas ou espaciais;
congruência e semelhança de triângulos; teorema de Tales; relações métricas nos
triângulos; circunferências; trigonometria do ângulo agudo.
Conhecimentos de estatística e probabilidade: representação e análise de dados;
medidas de tendência central (médias, moda e mediana); desvios e variância;
noções de probabilidade.
Conhecimentos algébricos: gráficos e funções; funções algébricas do 1.º e do 2.º
graus, polinomiais, racionais, exponenciais e logarítmicas; equações e inequações;
relações no ciclo trigonométrico e funções trigonométricas.
Conhecimentos algébricos/geométricos: plano cartesiano; retas; circunferências;
paralelismo e perpendicularidade, sistemas de equações.