paraíso para quem? populações indígenas e o parque nacional do
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GLENN SHEPARD JR. KLAUS RUMMENHOELLER
PARAISO PARA QUEM? POPULAÇÕES INDÍGENAS E O PARQUE NACIONAL DO MANU (PERU).
XXII Reunião Brasileira de Antropologia. Fórum de Pesquisa 3: “Conflitos Socioambientais e Unidades de Conservação”.
Disponível na internet em: <ftp://ftp.unb.br/pub/download/dan/f.3-22rba/sessao2>
BRASÍLIA
Julho de 2000 RESUMO
O Parque Nacional do Manu (PNM) foi fundado em 1973 sob profunda contradição: o
coração do Parque, a chamada "área intangível", é território de vários grupos indígenas. Até
1990, a política indigenista do PNM era uma mistura de protecionismo e negligência,
desgostando comunidades contatadas e contribuindo para graves crises de saúde entre
populações isoladas. As atividades turísticas cresceram na região sem benefícios para os índios.
Nos últimos dez anos, a nova administração do Parque e algumas ONGs procuram maior
aproximação com os indígenas. No entanto, alguns biólogos argumentam que os índios
representam uma ameaça ao Parque. Apresentamos a política antropológica do PNM,
discutimos os conflitos e interesses comuns entre Parque e índios, e refletimos sobre diferentes
construções culturais da relação homem-natureza.
INTRODUÇÃO
A presença de populações indígenas em áreas de proteção ambiental na Amazônia tem
provocado polêmica entre os que vêem os povos indígenas como "conservacionistas", e aqueles
que vêem os índios como predadores que ameaçam o futuro da biodiversidade (Alcorn 1993;
Peres 1993; Redford and Stearman 1993). Em sua essência, essa polêmica relaciona-se a
diferentes concepções da Natureza, e ao fato da cultura humana, ou de algumas culturas
humanas, fazerem parte ou não do mundo natural.
Em 1993, um de nós (G. Shepard) presenciou o diálogo entre um funcionário do Parque
e um índio Matsigenka, que ilustra ironicamente o conflito entre concepções distintas da
Natureza. Esse episódio ocorreu em um seminário no PNM, onde pela primeira vez desde sua
criação em 1973, representantes da administração do Parque se reunia com os Matsigenka para
explicar o quê vem a ser um Parque Nacional, e por que o PNM havia sido criado vinte anos
antes. O funcionário estava definindo o termo "espécie ameaçada de extinção", usando como
exemplo o macaco-aranha, e explicando que parques são criados para proteger tais espécies
vulneráveis. Um jovem caçador Matsigenka ficou confuso com a explicação, e fez a pergunta,
que Shepard traduziu do Matsigenka para o espanhol: "Deixe ver. Uma espécie ameaçada é
aquela que está quase acabando, verdade? E o macaco-aranha é uma espécia ameaçada,
verdade? Mas aqui onde eu moro, eu, e o meu pai, e o pai dele, e todos os meus parentes
Matsigenka desde os tempos que os antigos contam as histórias, caçamos tantos macacos-aranha
quanto podemos, a cada estação de chuvas quando os macados estão gordos. E ainda tem muito
macaco. Então não são ameaçados, verdade? Pelo menos aqui. Talvez sejam ameaçados lá em
Lima onde vocês moram, porque os brancos caçam com espingarda. Mas aqui não. Talvez
vocês devessem ter criado o Parque lá e não aqui." O tom de voz do indígena não era nem
sarcástico nem hostil, mas simplesmente refletia sua confusão ao tentar seguir a lógica do
argumento. Nessa mesma noite, os Matsigenka serviram um jantar para os visitantes que incluia
carne de macaco-aranha. O caçador perguntou para o funcionário: "Está gostosa a carne da
espécie ameaçada?!"
EXPULSÃO DO PARAÍSO
Em filmes, publicações populares, e passeios turísticos, o Manu é retratado como sendo
um "paraíso sem perturbações humanas" ou um "Jardim do Eden vivo." "Paraíso sem
perturbação humana" certamente não é. Mas, ironicamente, a metáfora do Jardim do Eden
talvez seja correta. Ao longo do último século, vários "povos eleitos" foram expulsos por forças,
não necessariamente divinas, mas além de seu controle. No final do século XIX, os habitantes
do rio Manu provavelmente incluíam Matsigenka e membros da familia linguística Harakmbut,
os chamados "Mashco", mencionados em relatos da época (Cenitagoya 1943). Para os
indígenas, o encanto do "Jardim" acabou com a chegada da febre da borracha na região, no
início do século XX. Pelo pecado de não aceitarem o fruto tentador da civilização, os Mashcos
foram praticamente exterminados pelo Barão da Borracha, "Fitzcarraldo" (Reyna 1941).
"Fitzcarrraldo" empregou indígenas aculturados do rio Urubamba para procurar a passagem
entre o rio Manu e o alto Mishagua, região até então inacessível à exploração seringueira, e para
realizar "correrias" visando a captura de escravos indígenas ou a punição de índios fugidos
(Camino 1977). No filme de Werner Herzog, "Fitzcarraldo" (representado por Klaus Kinski) é
um empresário culto que contempla a paisagem escutando música de Verdi, mas a situação dos
indígenas não é abordada, especialmente a dos Matsigenka, que foram escravizados e mortos
por doenças como malária, sarampo e variola.(von Hassel 1904; Farabee 1922; Lyon 1976;
Rummenhoeller 1985). Mas a febre da borracha durou pouco, e a lei de mercado acabou
expulsando os seringueiros da região. Com o colapso mundial do preço da borracha em 1917, o
Manu ficou praticamente abandonado. Até mesmo a missão católica estabelecida em San Luis
del Manu foi abandonada. Os habitantes indígenas que sobreviveram às correrias se isolaram
evitando qualquer contato com pessoas fora de seu grupo, e cortando seu acesso às rotas de
intercâmbio interétnico que existiam há séculos na região (Lathrap 1973; Lyon 1981). Assim, os
grupos indígenas atuais "não contatados" do Manu não são povos "selvagens", que vivem em
completa ignorância da chamada civilização. Em realidade, são refugiados da violência de
selvagens homens de negócios.
Nos anos 60, os atrativos do "Jardim" voltam a chamar a atenção de novos
comerciantes: de madeira, de peles de animais, e de almas humanas. Enquanto os madeireiros e
comerciantes de peles trabalharam na região da foz do rio, missionários do Summer Institute of
Linguistics (Instituto Linguístico de Verão) usaram guias indígenas para contatar populações
Matsigenka isoladas das cabeceiras do rio Manu. Estabeleceram a Comunidade Nativa de
Tayakome, com uma escola de educação em idioma Matsigenka, posto médico, pista de pouso,
e uma igreja. Os missionários traziam espingardas e munições, e os Matsigenka traziam valiosas
peles para ajudar a financiar as operações missionárias. Com a criação do PNM em 1973, os
madeireiros, caçadores e missionários foram expulsos. O uso de armas de fogo foi proibido, e os
Matsigenka foram impedidos de realizar atividades extrativistas ou comerciais além das
atividades supostamente tradicionais de subsistência.
Durante os anos 80 e 90, a fama do "Paraíso Amazônico" do Manu cresceu, tanto em
círculos científicos como em negócios de ecoturismo. A Estação Biológica de Cocha Cashu tem
sido uma das principais fontes de informação científica sobre os ecossistemas naturais de
floresta tropical (Gentry 1990; Terborgh 1990), e serviu como local de treinamento para uma
geração de cientistas em ecologia tropical. Hoje, o renomeado biólogo John Terborgh, que
trabalha no Manu desde a criação do Parque, acredita que os moradores índigenas do Parque,
tendo provado o fruto tentador da civilização -- isto é, saúde moderna, educação, e acesso a bens
ocidentais -- deveriam ser novamente expulsos (Terborgh 1999). A metáfora do Jardim do Eden
ainda está em vigor no Manu.
A RESERVA DE BIOSFERA DO MANU
O PNM é considerado uma das regiões com maior diversidade biológica nos trópicos,
incluindo toda a bacia hidrográfica do rio Manu, desde as suas cabeceiras nos Andes a mais de
4.000 metros de altitude, até os bosques úmidos da planície do rio. O Manu foi decretado como
Reserva Nacional Florestal em 1968, e declarado Parque Nacional em 29 de maio de 1973, com
uma extensão de 1.532.806 ha. Desde sua criação, o PNM em sua totalidade é considerado
como área de caráter intangível, onde a integridade ecológica dos ecossistemas é protegida e
apenas atividades de pesquisa são permitidas. Em março de 1977, o Parque foi incorporado
como núcleo intangível em uma unidade de conservação ainda maior: a Reserva da Biosfera do
Manu (RBM), estabelecida pelo Programa Homem e Biosfera da UNESCO (Mapa 1). A RBM
foi declarada Patrimônio Mundial pela UICN em 1987. A RBM abrange três zonas de
amortização ao redor da área intangivel do Parque:
a) Zona Reservada do Manu (ZRM), com uma superfície de 257.000 ha. situada no
baixo Manu, foi estabelecida com o propósito de preservar a flora e a fauna silvestre e
possibilitar ações complementares de conservação e aplicação de diferentes técnicas de uso
sustentável, como o turismo. O ingresso à ZRM requer autorização e as entradas e saídas são
fiscalizadas por guardas-florestais. Desde os anos 80, empresas privadas receberam autorização
para utilizar algumas áreas em atividades de ecoturismo.
b) Zona Cultural , também conhecida como zona de cooperação ou de uso múltiplo
andino e amazônico, abrange todo o vale do rio Alto Madre de Dios e parte dos vales dos rios
Mapacho-Yavero e Urubamba. A Zona Cultural contém diversos assentamentos semi-urbanos,
propriedades privadas, concessões madereiras, comunidades indígenas e camponesas andinas.
Sua função principal é promover o desenvolvimento sustentável para as populações alí
assentadas. Desde os anos oitenta, ONGs e entidades estatais realizam programas e projetos de
educação ambiental e de manejo de bosques, entre outras atividades.
c) Reserva do Estado, com superfície de 443.887 ha, tem como função proteger uma
região habitada por povos indígenas com pouco contato com a sociedade maior, especialmente
as populações nativas nômades Kugapakori e Nahua, encontradas entre os rios Ticumpinia e
Mishagua.
A RBM sofre de uma contradição fundamental: o coração da Reserva, a "área
intangível" correspondente ao PNM, foi criado sobre terras ancestrais de comunidades indígenas
amazônicas e andinas. Até hoje, não se conhece ao certo a população total indígena morando
dentro do território do PNM. Além das duas Comunidades Nativas Matsigenka de Tayakome e
Yomybato, com população total de aproximadamente 500 pessoas, existem várias aldeais
Matsigenka isoladas nas cabeceiras do Manu. Os Yora (ou "Nahua"), do grupo lingüístico Pano,
habitaram as cabeceiras dos rios Manu e Mishagua até final dos anos 80, quando foram
dizimados por doenças ocidentais (Zarzar 1987). Hoje, os Yora moram no alto Mishagua fora
do PNM, mas ocasionalmente voltam para caçar, colher ovos de tracajá, ou simplesmente para
"passear". Além dos Matsigenka e Yora, existe um número desconhecido de grupos indígenas
isolados dentro do Parque e em regiões próximas, incluindo Kogapakori ou Nanti (parentes
lingüísticos próximos dos Matsigenka), Mashco-Piro, Amahuaca, e talvez outros (d’Ans 1972;
Kaplan and Hill 1984; Shepard in press-b). Na região andina do PNM existe um assentamento
de camponeses andinos chamado Callanga, com população de aproximadamente 200 pessoas.
A POLÍTICA ANTROPOLÓGICA DO PARQUE
Nos últimos 25 anos, as políticas do PNM relacionadas às populações indígenas e não
indígenas foram modificadas e muitas vezes contraditórias, não tendo sido desenvolvida uma
política coerente e de longo prazo. Até hoje, entidades estatais, ONGs, ecologistas, antropólogos
e organizações indígenas estão envolvidos em debates sobre políticas de manejo dos impactos
antropogênicos no PNM.
O antropólogo belga André-Marcel d'Ans (1971; 1975) viu na criação do PNM uma
chance de proteger os indígenas contra influências que pudessem alterar seu modo de vida
evitando assim fenômenos generalizados como a mendicidade e servidão. Mas o PNM foi
criado principalmente por iniciativa de naturalistas, científicos e organizações de proteção do
meio ambiente. Os limites do Parque foram determinados tendo por base critérios
exclusivamente ecológicos. Não foram considerados os territórios dos povos indígenas nem os
direitos ancestrais das comunidades altoandinas quéchuas. Regiões que em seu conjunto eram
aproveitadas economicamente por grupos indígenas foram dessa maneira divididas.
Hoje, no Peru, seria praticamente impossível desenhar e configurar um parque nacional
sem estudos prévios sobre sua viabilidade social, sobre os direitos e participação das populações
tradicionais. Mas na época em que os estudos para a criação do PNM foram realizados, no Peru
ainda não havia lei demarcando terras indígenas. As terras ocupadas pelos indígenas eram
consideradas como terrenos "baldios", terras de ninguém, sobre as quais o Estado reservou-se o
direito de decisão sobre seu uso, dando preferência às pessoas e empresas interessadas na
exploração da madeira, gado e minérios. Em muitas regiões, os indígenas foram expulsos de
suas terras, marginalizados e/ou submetidos a relações de dependência de um patrão. Em 1974,
o governo militar do General Velasco Alvarado decretou a "Lei de Comunidades Nativas". Pela
primeira vez na história do Peru, estabeleceu-se o direito das comunidades indígenas de
possessão de terras coletivas. Entretanto, os governantes militares formularam uma lei que não
permite a titulação de territórios étnicos, mas apenas a demarcação individual de Comunidades
Nativas, levando a fragmentação dos territórios tradicionais. Desse modo, a presença de áreas
indígenas não se tornam obstáculo à colonização, construção de estradas e de grandes projetos
de desenvolvimento.
Uma das primeiras ações conservacionistas frente a populações indígenas no Manu data
de 1968, logo após a declaração pelo governo da região como Reserva. Trata-se de uma anedota
curiosa que não chegou a ter nenhum impacto, mas que reflete o tratamento vertical dado aos
indígenas e a pouca valorização de sua cultura. Uma equipe do Instituto de Pesquisa Florestal da
Universidad Nacional Agraria La Molina propôs a zonificação do habitat dos Matsigenka,
propondo áreas de coleta de produtos vegetais silvestres, de cultivo e áreas destinadas à caça,
sem antes ter estudado os padrões culturais de uso da terra dos próprios Matsigenka (Ríos et al.
1985).
Os primeiros administradores do PNM estabeleceram algumas regras não escritas que
até hoje não foram alteradas:
� Os indígenas residentes no PNM podem circular livremente dentro do PNM; significa na prática
que os indígenas residentes não necessitam de autorização para a entrada e saída, mas devem se
submeter à fiscalização em busca de objetos não autorizados.
� A liberdade para realizar atividades de subsistência como caça, pesca, agricultura e coleta em
todo o Parque, mas não é permitida a criação de gado e porcos.
� A proibição da comercialização de peles, couros, animais vivos e madeira.
� O controle de acesso e fiscalização de qualquer indivíduo que possa alterar o modo de vida dos
índios.
Não obstante, na década de setenta e oitenta não foram os índios que puseram em perigo
a existência do PNM. O Estado outorgou concessões a empresas petroleiras nas zonas limítrofes
do PNM, estimulou projetos de colonização e extração de madeira na Zona Cultural, planificou
a construção de um canal interfluvial e de uma estrada transversal ao Parque até a fronteira com
o Brasil. Em 1982, um bote da Marinha de Guerra do Peru achava-se numa missão de
reconhecimento do rio Alto Manu no PNM, quando foi atacado com flechadas pelos indios
isolados Yora; os militares abriram fogo e mataram um número não determinado de índios
(Moore 1984).
Em 1985 foi aprovado o Plano Diretor para o PNM (Rios et al.), documento até hoje
inalterado. Esse plano carece de um profundo estudo antropológico e etnohistórico. Apresenta
alguns lineamentos sobre a política e ações referentes às populações indígenas que contemplam
apenas duas opções: conservar a vida tradicional e poder permanecer no Parque ou optar por um
processo de aculturação e abandonar o PNM. A esperança dos conservacionistas era de que o
território do Parque iria se despovoar paulatinamente, a medida que seus habitantes fossem
atraídos pelos centros de intercâmbio em seu entorno (Helberg 1989). Aqueles que
simpatizaram com essa idéia subestimaram os fortes vínculos que os índios têm com suas terras.
Ao mesmo tempo o PNM se converteu para índios com e sem contato num território atrativo por
carecer da pressão colonizadora.
Nos anos oitenta, a política protecionista rígida frente às comunidades indígenas ficou
cada vez mais obsoleta. O acesso a serviços básicos e uma comunicação cada vez maior com a
sociedade nacional levou ao crescimento de novas necessidades nas comunidades Matsigenka
do Parque. Os Matsigenka começaram a ver o Parque como uma instituição repressiva e
privativa, impedindo-lhes o acesso a produtos do mercado. Em 1985-88 a administração do
PNM contratou pela primeira, e até hoje, única vez, um antropólogo. Esse profissional formulou
novas diretrizes de política antropológica enfocando o diálogo intercultural com as populações
indígenas (Helberg 1989; Rummenhoeller/Helberg 1992).
Na década dos 90, tanto a Chefia do Parque quanto o INRENA tomaram mais interesse
na situação das populações indígenas. Em 1996-97, a Chefia do PNM elaborou um projeto para
estabelecer diretrizes e políticas para coordenar ações entre setores do Estado, ONGs e
populações locais, visando melhorar a qualidade de vida e promover a participação das
populações (Rummenhoeller 1997). Entre os problemas antropológicos mencionados no
PNM/RBM destacam-se:
a) a ocupação de terras no PNM por camponeses da ex-fazenda Callanga.
b) a sobreposição entre territórios titulados de três comunidades campesinas e uma comunidade
nativa com o território do PNM.
c) a regularização da propriedade de terras de comunidades campesinas nos limites do Parque.
d) o uso de pastos naturais dentro do Parque pelas comunidades campesinas.
e) a proteção das populações indígenas isoladas e sua extrema vulnerabilidade a doenças
infecto-contagiosas, incluindo a elaboração de um plano de emergência.
f) a participação efetiva da população indígena e local no manejo do PNM.
g) a proteção dos direitos de propriedade intelectual e dos conhecimentos coletivos dos índios no
PNM.
h) as deficiências nos serviços básicos do Estado como saúde e educação.
i) o estabelecimento de políticas e regras claras, transparentes e de longo prazo para o
desenvolvimento de atividades relacionadas à subsistência e a alternativas econômicas, assim
como a atividades de pesquisa, desenvolvimento e turismo envolvendo as comunidades
indígenas.
j) o manejo do projeto piloto de ecoturismo dos Matsigenka ("casa Matsigenka") referente a
monitoramento ambiental, social, cultural e capacitação.
k) a inserção da (re-) valorização da herança cultural das populações no manejo do Parque.
Até hoje, uma política antropológica tendo por base um documento acessível a todos
não foi colocada em prática. Tanto a Chefia do PNM quanto o INRENA não apresentam
antropólogos ou especialistas em ciências sociais em seus quadros. Os múltiplos problemas
antropológicos ultrapassam a capacidade operativa da Chefia do Parque, na qual prevalecem
funções meramente administrativas e de fiscalização. Assim, a solução de conflitos
socio-ambientais e a aplicação de idéias e conceitos inovadores já apresentam limitações nas
próprias estruturas institucionais. Reconhecemos os grandes esforços e avanços substanciais da
Chefia do PNM desde 1995 no trabalho com os índios e outras populações, incluíndo a tentativa
da formulação de uma política antropológica numa forma amplamente participativa, mas isto
não diminui a importância das críticas formuladas anteriormente.
CONFLITOS SOCIOAMBIENTAIS NO MANU
Em essência, os conflitos socioambientais no PNM estão relacionados com diferentes
opiniões sobre a importância relativa do desenvolvimento socioeconômico, por um lado, e a
preservação da biodiversidade, por outro. Os conflitos se manifestam em questões sobre acesso
ao Parque e a seus recursos naturais, meio de exploração econômica desses recursos, e quem se
beneficia com essa exploração. Os conflitos atuais no Manu incluem: (1) conflitos jurídicos,
entre, por exemplo, a legislação vigente para áreas de proteção ambiental e a que trata dos
direitos territoriais e humanos de povos indígenas; (2) conflitos ideológicos decorrentes, por
exemplo, de diferentes concepções sobre a relação entre Homem e Natureza; (3) conflitos
políticos e econômicos, por exemplo, entre os interesses de diferentes organizações e
representantes do governo, ONGs, comunidades e federações indígenas, ambientalistas, e
agências de turismo; e (4) conflitos sociais, por exemplo, entre diferentes grupos humanos que
usam os recursos do Parque.
CONFLITOS E CONTRADIÇÕES JURÍDICAS
Segundo a legislação vigente, nos parques nacionais estão absolutamente proibidos
assentamentos de novos grupos humanos e o aproveitamento dos recursos naturais, exceto pelo
estabelecido na legislação a favor das comunidades e grupos ancestrais. "Esses poderão
continuar suas práticas e usos tradicionais na medida que forem compatíveis com os objetivos
da área protegida" (INRENA 1999). As comunidades nativas localizadas em parques nacionais
cujas atividades não atentem contra os princípios de conservação poderão permanecer nessas
áreas. Comunidades indígenas em parques não tem o direito de receber título de propriedade,
embora possam ser reconhecidas como pessoas jurídicas, conforme a Lei de Comunidades
Nativas e de Desenvolvimento Agrário de 1978. A pesar disso, três comunidades campesinas e
uma comunidade nativa foram parcialmente demarcadas nos anos oitenta em terras do PNM.
Entretanto, o Código do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais (D.L. 613 de 7 de setembro de
1990) reconhece o direito das comunidades indígenas localizadas dentro de áreas naturais
protegidas, à propriedade e ao uso dos recursos naturais. Esses compreendem especialmente o
direito de participar na utilização, administração e conservação de tais recursos (Convênio 169
da OIT sobre Povos Indígenas Tribais em Países Independentes, aprovado por R.L. No. 26253).
As diversas leis existentes estão sujeitas a interpretações arbitrárias e contraditórias. Por
um lado existe um conceito rígido de parque nacional excluindo quaisquer atividades humanas
não relacionadas com pesquisa e fiscalização; por outro lado, as populações tradicionais têm o
direito de permanecer em suas terras ancestrais quando sua presença não atentar contra o
Parque. O Plano Diretor das Areas Naturais Protegidas (INRENA 1999) considera que apenas
as atividades de subsistência são compatíveis com os objetivos de um parque, proibindo as
atividades de uso comercial de recursos naturais. Mas numa interpretação restrita da lei,
poderia-se também alegar que as chamadas atividades de subsistência podem ter impacto
suficiente sobre a natureza para serem consideros incompatíveis com os objetivos de um parque.
A situação se complica ainda mais quando se consideram as atividades de subsistência de
grupos indígenas aculturados, os quais requerem em maior ou menor grau trocar ou comprar
ferramentas, roupas e outros bens. Permitir apenas atividades de subsistência, na prática
significa excluir de uma economia de mercado as populações residentes no Parque. O Plano
Diretor, cuja elaboração durou mais de seis anos, busca algumas soluções como o
estabelecimento de sistemas de quotas para o uso de recursos. Estabelece um sistema de
benefícios econômicos e compensações para substituir atividades danosas, buscando um
equilíbrio entre as prioridades de conservação para o manejo da área e os interesses das
populações. Também propõe a participação das populações mediante comitês de gestão e
contratos de serviços do uso de recursos naturais renováveis. Entretanto, até agora não chegou a
satisfazer nem as expectativas dos conservacionistas, nem a solucionar os problemas concretos
in situ das populações.
A "Defensoria del Pueblo" (El Peruano, 10/02/2000) criticou recentemente a política
conservacionista nas áreas naturais protegidas por impor às populações indígenas um conjunto
de restrições que dificultam suas possibilidades de subsistência e a realização de atividades
produtivas. Segundo a Defensoria, "as limitações que prejudicam essas minorias se produzem,
em alguns casos, devido as interpretações arbitrárias que alguns representantes públicos efetuam
das normas sobre preservação de áreas naturais (...) pelo qual dá-se um excessivo zelo no
cuidado dos recursos naturais, que impede às comunidades ascender a melhores condições de
vida".
O problema prioritário para organizações indígenas é a proteção e consolidação de
direitos territoriais, que em alguns casos entra em conflito direto com os interesses do Estado ou
das entidades encarregadas das áreas naturais protegidas. Por exemplo, a "Federación Nativa del
Río Madre de Dios y Afluentes" (FENAMAD), em junho de 2000 iniciou uma nova campanha
para segurar os direitos territoriais dos índios no PNM e nas outras áreas naturais protegidas da
região.
CONFLITOS ENTRE O PARQUE E OS MATSIGENKA
A expulsão dos missionários do PNM em 1973 representa o primeiro grande conflito
entre o Parque e a população indígena, e coincide com a visão protecionista-idealista do Parque
na sua fase inicial: retirando as influências externas, os índios voltariam a seu estado "natural".
O problema dessa visão é que certas necessidades econômicas, e sobretudo médicas, já foram
criadas. Quando foram embora do Manu, os guias indígenas que trabalhavam com os
missionários tentaram convencer os moradores de Tayakome a irem juntos. Os argumentos
eram tanto materiais como espirituais: os índios que ficarem no Manu não teriam mais acesso à
medicina e bens ocidentais, e também perderiam a sua chance de salvação e vida eterna no
Paraíso. Os que ficassem no Manu seriam condenados ao Inferno. Quase a metade da população
de Tayakome acompanhou os missionários no Exodo do Manu, estabelecendo novas
comunidades no rio Camisea e no Alto Madre de Dios.
No início, o Parque estabeleceu um posto de controle na Comunidade de Tayakome. Por
falta de apoio material e falta de uma educação antropológica adequada, os guardas-florestais
provocaram conflitos com os moradores de Tayakome que até hoje são lembrados: relações
sexuais com as mulheres da aldeia, dependência alimentar sobre a aldeia, abuso de autoridade,
alcoolismo, entre outros. Após repetidas queixas, e também por razões logísticas de acesso, o
posto de controle de Tayakome foi retirado e relocalizado rio abaixo.
A retirada dos missionários deixou uma grande vazio político, econômico, e médico na
aldeia de Tayakome. Um morador, treinado pelos missionários, continuou ensinando por alguns
anos depois da saída oficial do SIL, mas abandonou as atividades por falta de apoio dentro e
fora da comunidade. Um grupo de famílias mudou rio abaixo e começou a manter relações
esporádicas de intercâmbio com os cientistas de Cocha Cashu, trocando peixe e produtos
agrícolas por bens ocidentais. Outro grupo de famílias, temendo epidemias de gripe e ataques de
grupos indígenas isolados, deixou Tayakome em 1978 para estabelecer novas aldeias no alto da
Quebrada Fierro, constituindo o que é hoje a comunidade de Yomybato. A situação de saúde
nas comunidades foi bastante precária nessa fase. Epidemias de doenças respiratórias eram
comuns e fatais. A chegada de algumas doenças estranhas resultou em acusações de bruxaria.
Em 1987, quando Shepard realizou seu primeiro trabalho de campo em Yomybato, a taxa de
mortalidade infantil durante a década anterior era de aproximadamente uma criança por cada
cinco nascimentos, as causas principais de mortalidade sendo doenças respiratórias e
gastrointestinais (veja Shepard 1999-a).
Depois da saída do grupo missionário protestante, a missão dominicana de Shintuya
decidiu reconquistar as almas dos Matsigenka do Manu para a Igreja Católica. Inicialmente, a
missão de Shintuya deu apoio humanitário aos índios (assistência médica, ferramentas), e depois
de 1984 a diocese estabeleceu escolas nas comunidades de Tayakome e Yomybato. Houveram
vários episódios de conflito entre padres dominicanos e o Parque, como por exemplo, quando
um padre tentou levar munição de armas de fogo para as aldeias, ou quando tentava levar para
fora do Parque carne seca ou ovos de tracajá presenteados pelos Matsigenka.
Os professores enviados pelos dominicanos são Matsigenka aculturados do rio
Urubamba que estudaram sob o sistema escolar dominicano. A chegada dos professores mudou
a organização social das comunidades. Como na época do Summer Institute, a escola tornou-se
novamente ponto fixo e central nas comunidades para acesso a medicinas e bens ocidentais.
Entretanto, a filosofia pedagógica da escola mudou completamente: enquanto os missionários
do Summer Institute ensinam o alfabeto na língua indígena a fim de que os índios leiam a Bíblia
em seu idioma, o método de ensino dominicano é castelhanizado, com uma filosofia de
aculturação da sociedade e da economia indígena. Os professores chegaram a ter bastante poder
político, econômico e cultural nas comunidades e trouxeram novas idéias e contatos com o
movimento indigenista peruano. Eles são os principais responsáveis pela conscientização
política atual nas comunidades. Mas, os professores também introduziram uma complexa e
paradóxica dinâmica cultural: defendendo os direitos humanos e culturais de povos indígenas,
os professores também incorporam inconscientemente preconceitos negativos da sociedade
nacional sobre a sua propia cultura indígena. São principalmente os professores de escola que
determinaram mudanças socio-culturais entre os Matsigenka do Manu durante as últimas duas
décadas.
Em vários momentos da história do Parque, pessoas e organizações que trabalhavam
com os Matsigenka e outros povos da região foram expulsos, vetados, ou de outra forma
impedidos de realizar seus trabalhos com as comunidades. Nesses casos, as autoridades
responsáveis pelo Parque percebiam que o trabalho dessas pessoas ou organizações entrava em
conflito com os interesses e a filosofia protecionista do Parque. Em determinadas circunstâncias,
um parque tem o direito, e até mesmo o dever, de limitar o acesso a seu território e tomar
decisões sobre os trabalhos que serão autorizados. Mas por falta de clareza das políticas
indigenistas e falta de projetos concretos alternativos, essas proibições e expulsões tomaram
forma bastante arbitrária. Quando o trabalho de certas organizações ou pesquisadores era
dificultado, desconhecendo os motivos e sem poder discutí-los, os índios percebiam esses fatos
como perseguição a seus próprios interesses. Até a reunião de 1993 mencionada anteriormente,
as regras e as proibições chegavam aos ouvidos dos índios indiretamente, e muitas vezes com
versões contraditórias, principalmente por meio dos guardas-florestais e dos cientistas de Cocha
Cashu. Não houve diálogo direto entre os indios e os altos funcionarios do parque.
Essa situação foi gerando grande insatisfação, que chegou a níveis críticos entre 1993 e
1996, quando o INRENA negou a aprovação de um projeto de albergue turístico proposta por
uma ONG indigenista em nome dos Matsigenka. Incentivados pela ONG, os índios começaram
a construção sem pedir autorização, e ameacavam roçar pastos de boi se o albergue não fosse
aprovado. Para superar o impasse, o INRENA decidiu criar seu próprio projeto de albergue para
os Matsigenka. Esse projeto está sendo financiado pela cooperação técnica alemã GTZ, através
de um convênio com INRENA, de tal forma atendendo a solicitação dos índios, mas sem ceder
o controle do projeto para a ONG indigenista. O conflito entre a ONG e o INRENA apresentou
graves repercusões nas comunidades, uma das quais ainda mantém forte ligação com a ONG,
enquanto a outra, em função do conflito, cortou relações. Nesse exemplo, observamos como as
comunidades indígenas podem virar campo de batalha politíca entre diferentes organizações e
filosofias indigenistas. Mesmo que a política indigenista do Parque tenha mudado, ainda tenta
manter o controle.
Agora, depois de três anos do projeto de Albergue, vem surgindo uma aproximação
positiva entre o PNM/INRENA e os Matsigenka. Mas o albergue, como qualquer outro projeto
de desenvolvimento, vai desencadear uma série de mudanças culturais e conflitos
socioeconomicos entre e dentro das comunidades. O projeto apresenta um componente
antropológico de capacitação e avaliação de impactos socioculturais nas comunidades, mas
sofreu mudanças, atrasos e restrições na sua aplicação em prática. Também existe o risco de que
o projeto obedeça aos interesses e mudanças políticas do INRENA. Sem uma fortalecida visão
antropológica, é possível que o projeto gere tantos conflitos nas comunidades quanto soluções
econômicas.
IDEALISMO E NEGLIÊNCIA: A SITUAÇÃO DOS ÍNDIOS "SEM CONTATO"
A visão protecionista do Parque teve resultados trágicos especialmente na década dos
anos 80. Desde antes da criação do PNM, os Matsigenka já apresentavam uma longa história de
confrontos e ataques contra dois grupos indígenas isolados, os Toyeri ou Aoyeri, aparentemente
descendentes dos Mashcos sobreviventes dos massacres de Fitzcarraldo, e os Yora ou "Nahua",
um grupo Pano que migrou para o alto Manu, ocupando a região dos acampamentos
seringueiros abandonados depois da época da borracha. Os conflitos continuaram após a criação
do Parque, sem uma política efetiva ou um plano emergencial. Houve um grande enfrentamento
entre Matsigenka e "Mashcos" aproximadamente em 1978 perto da boca da Quebrada Fierro, no
qual Matsigenkas saíram feridos, e vários Mashcos mortos.
Talvez provocados por atividades madeireiras e petroleiras no Alto Mishagua no início
dos anos 80, os Yora atacaram aldeais Matsigenka do alto Cumerjali e Quebrada Fierro nos anos
1980-1985, deixando varios mortos e feridos em ambos grupos. Os Yora foram forçosamente
contatados em 1986 por madeireiros no rio Mishagua, fora da fronteira do Parque (Zarzar 1987).
Poucos meses após o contato, teve início uma epidemia de doenças respiratórias que reduziu a
população Yora à metade. Procurando assistência médica e alimentos, os Yora desceram o rio
Manu em grandes números, causando transtornos às comunidades indígenas do Manu e do Alto
Madre de Dios. A epidemia de gripe também chegou a afetar os Matsigenka, causando a morte
de várias pessoas. Com pouco dinheiro, pouco pessoal, e sem uma política consistente, o Parque
reagiu tarde demais às epidemias, e não conseguiu estabelecer um trabalho antropológico com
as comunidades Yora. Sentindo a falta de atenção e de ajuda por parte do Parque, os Yora
migraram para o Alto Mishagua, onde inicialmente receberam apoio de missionários do
Summer Institute, e atualmente da Missão Católica de Sepahua.
Ainda existe grande número de índios isolados no Parque. Os Matsigenka das
cabeceiras do rio Manu já realizam contatos esporádicos com as comunidades de Yomybato e
Tayakome, e já sofreram algumas epidemias de gripe. Os Mashco-Piro, povo nômade de
caçadores-coletores aparentemente sem agricultura, migram dentro das Zona Reservada e Zona
Cultural da RBM, na região oeste do rio Manu. Exceto por três mulheres exiliadas do grupo nos
anos 80, até os dias de hoje os Mashco-Piro não estabeleceram contato definitivo com outros
moradores da região. Existe grande interesse entre missionários de várias denominações,
Católicos e Protestantes, em contatar o grupo. Indios Piro (ou Yine) do Alto Madre de Dios
também vem tentando contatar os seus "primos" culturais há mais de uma década.
Desde 1996, vestígios de grupos indígenas desconhecidos começaram a aparecer na
região leste do rio Manu. Os indios chegaram a lançar flechas como senha de advertência a
alguns botes de turistas. A data da sua chegada no Manu coincide com o início de atividades de
exploração sísmica da companhia Mobil no Rio de las Piedras, a leste do Manu (veja Mapa 2).
Madeireiras e missionários protestantes também estão começando a penetrar nessa remota
região, território de vários grupos indígenas isolados desconhecidos, próximo a áreas de indios
isolados no Brasil (Shepard in press-b). Essa preocupante situação gera uma sensação de
"déja-vu", considerando a tragédia dos Yora nos anos 80 frente à penetração petroleira,
madeireira e missionária. Apesar dessa experiência, pouco mudou em termos da capacidade do
Parque de responder a emergências de saúde e contatos com povos indígenas isolados.
PROTEÇÃO SEM ALTERNATIVAS ECONÔMICAS
A visão protecionista do Parque, historicamente, apresenta padrão duplo ("double
standard"): populações indígenas residentes devem viver uma vida tradicional e sustentável
usando recursos locais, enquanto biólogos e turistas se alimentam de sardinhas e atum trazidos
de fora e tirados não sustentavelmente dos mares do mundo. A oferta turística cresceu
dramaticamente na região, especialmente nos últimos dez anos. Mas, três décadas de estudos
científicos e quase duas décadas de ecoturismo trouxeram poucos benefícios, tanto para os
Matsigenka morando dentro do Parque, quanto para os moradores indígenas e mestiços na sua
periferia. Até recentemente, aos moradores do Parque e de seus arredores foram oferecidas
poucas alternativas econômicas para compensar as limitações impostas pelo Parque. Algums
moradores da Zona Cultural constroem barcos utilizados pela indústria turística e comércio da
região. Alguns trabalham como motoristas ou peões nas operações turísticas, mas os benefícios
são geralmente mínimos, e de curto prazo. Os Matsigenka moradores do Parque receberam
poucos ou nenhum benefício da indústria turística. (Em algumas ocasiões, venderam palha de
palmeira para telhados do albergue turístico e da Estação de Cocha Cashu). A interação com
antropologos nas comunidades e cientificos de Cocha Cashu foi uma fonte importante de acesso
a bens occidentais. Apenas nos últimos anos foram inaugurados projetos de ecoturismo em
várias comunidades dentro e fora do Parque, a fim de que elas participem de maneira mais
direta no ecoturismo. Porém, existem interesses fortes entre as agências turísticas estabelecidas,
que procuram manter a participação local no ecoturismo num nível mínimo.
A falta de alternativas econômicas causou uma série de problemas e até conflitos graves
na região do Manu. Durante os anos 80, homems Matsigenka saiam do Parque por períodos de
até vários meses, trabalhando em condições semi-escravizadas na mineração de ouro ou com
madeireiros, expostos a péssimas condições de saúde, e ganhando quase nada. A falta de opções
econômicas contribuiu para a entrada do narcotráfico na Zona Cultural da Reserva em 1994. Os
traficantes ocuparam o aeroporto turístico da região, e empregaram pessoas das aldeias
indígenas/mestiças de Boca Manu e Diamante. Quando finalmente as autoridades responderam
às denúncias, os traficantes aparentamente foram avisados e saíram antes da operação policial
chegar. Indígenas e mestiços locais, sem envolvimento significativo no tráfico, foram quase os
únicos a serem presos durante a operação. Pelo menos um morador local foi assasinado pelos
policiais. Treze pessoas de Boca Manu e Diamante, entre indios e mestiços, ficaram mais de dos
anos na cadeia em Cuzco. Graças ao apoio legal da Igreja Católica, uma condenação de
"narcotráfico e terrorismo internacional", que levaria a uma sentança de até quarenta anos, pôde
ser evitada.
A tendência tanto de adminstradores como de biólogos trabalhando no Parque é de ver o
Manu, tanto em aspectos ecológicos quanto históricos e culturais, como um sistema fechado.
Basta fiscalizar a "porta de entrada" do Parque em Boca Manu para eliminar influências
externas à ecologia e às culturas do Parque. Essa visão esqueçe a longa história humana na
ecologia do Parque, e as relações culturais e históricas entre povos daquela região. Desde a
época da borracha e provavalmente antes, os varadeiros entre Manu, Camisea e Mishagua foram
importantes para o intercâmbio econômico entre várias etnias. Hoje, um quarto de século depois
da criação do parque, algumas famílias Matsigenkas que foram embora do Manu com os
missionários estão retornando. Os moradores Matsigenka atuais de Tayakome e Yomybato
vêem essas e possíveis migrações futuras com ambivalência. Embora sejam parentes, os
imigrantes do rio Camisea são considerados como de fora. Em alguns casos, trazem atitudes
"superiores" e malandragem do mundo mestiço. Os Matsigenka do Manu também temem
doenças e bruxarias que os imigrantes poderiam trazer do "outro lado," a bacia do Urubamba.
Além de migrações de índios por meio dos varadeiros, existem evidências que
narcotraficantes da região do Urubamba estão usando o varadeiro do Istmo de Fitzcarraldo para
levar drogas até aeroportos clandestinos no Alto Manu. Vôos noturnos são escutados
regularmente. As vezes, artefatos estranhos foram encontrados nas praias do Alto Manu. Em
pelo menos uma ocasão, pessoas estranhas têm chegado em aldeais Matsigenka do Parque
oferecendo emprego e procurando guias.
NOVA EXPULSÃO DO PARAISO?
Em seu novo livro, Requiem for Nature (1999), John Terborgh dedica todo um capítulo
(com o título ameaçador "O Perigo de Dentro" - "The Danger Within") à consideração da
incompatibiidade fundamental entre a presença indígena e o futuro do PNM. Terborgh (1999),
que desde 1973 realiza pesquisas na Estação Biológica Cocha Cashu no PNM, afirma que
"parque e gente não podem coexistir" ("park and people cannot coexist"). Terborgh reconhece
que seu argumento é "politicamente incorreto" e acha que uma discussão "racional" do conflito
parque/índios fica cada vez mais difícil, já que os indígenas estão conquistando espaço político,
e seus direitos estão sendo promovidos por ONGs e Governo. Na sua visão, a conseqüência
inevitável seria que o PNM "passará de parque nacional à condição de reserva para seus
habitantes indígenas". Analisando a situação do Manu e de outras áreas nos trópicos, Terborgh
tragicamente conclui: "Quando as necessidades humanas são balanceadas contra o mundo
natural, a natureza sempre perde". Terborgh considera o reassentamento fora do parque das
populações indígenas do PNM, especialmente à medida que forem se aculturando, como única
solução válida para que o Parque Nacional seja resguardado.
Em trabalhos ecológicos, Terborgh considera a presença de predadores como
componente essencial para o funcionamento de ecossistemas sadios (1990: 57). Nesse sentido, é
irônico que ele recomende a retirada dos grupos humanos do Parque, sendo o Homem predador
par excellence e espécie chave na história recente de alguns ecossistemas "naturais" (Kay 1998).
O argumento de Terborgh também representa uma simplificação da realidade social dentro e
fora do Parque. O proposto reassentamento das comunidades indígenas do Manu para terras fora
do Parque não tem viabilidade alguma. Além dos obstáculos políticos mencionados por
Terborgh, esbarra também na pouca disponibilidade de terras nos arredores do Parque, e em
interesses conflitantes quanto ao destino dessas mesmas terras. Na área do baixo Manu
mencionada por Terborgh como "terras devolutas", existem numerosas concessões de
exploração de madeira e de petróleo, terras ocupadas, demarcadas ou em vias de demarcação de
índios e ribeirinhos, e propostas de Reservas Comunitárias e Indígenas (Mapa 2). Na mesma
região, existem áreas de trânsito de índios isolados, tanto no Baixo Manu quanto nos rios De
Los amigos e De Las Piedras, e pelas quais a FENAMAD solicita uma demarcação urgente.
Além do mencionado, toda a região entre o Alto Madre de Dios, Madre de Dios e Karene é
reclamada, há mais de dez anos, pelas comunidades Harakmbut e Piro para o estabelecimento da
"Reserva Comunal Amarakaeri". Recentemente (06/07/2000) a região foi declarada "Zona
Reservada". Pelo exposto, o proposto reassentamento dos Matsigenka do Parque provocaria
uma série de conflitos sócio-ambientais que certamente afetaria o PNM em sua integridade.
Terborgh menciona a presença ilegal de 60 colonos no PNM, sobre os quais existem
rumores de que poderiam estar envolvidos no narcotráfico de cocaína. Terborgh alega que o
Parque não toma nenhuma ação para reassentá-los, preferindo evitar o confronto por razões
políticas. Aqui também a situação é muito mais complicada que Terborgh imagina.
CALLANGA: OS INDIOS ESQUECIDOS
Os "colonos ilegais" mencionados por Terborgh são, de fato, índios Quechua, habitantes
ancestrais da área que hoje fica na fronteira oeste do Parque. O assentamento de Callanga se
encontra num vale para onde confluem os rios Pitama e Sihuas, numa altitude de
aproximadamente 1.200 metros. Callanga possui cerca de 40 famílias e um total de 200 pessoas.
As relações de parentesco que suas famílias mantém com as comunidades altoandinas vizinhas
fora do Parque dificultam estabelecer quem são os moradores permanentes de Callanga. A
grande maioria da população é monolingüe e fala quechua. Cultivam macaxeira, frutas tropicais,
café, coca e praticam uma economia de subsistência familiar que envolve trocas de excedentes
com as aldeias andinas, que oferecem produtos de clima frio como batatas e cebolas. Essas
aldeias estão situadas a cerca de dois dias de viagem com mulas, e alí os moradores de Callanga
oferecem seus produtos nas pequenas feiras de domingo. O consumo e a troca de folhas de coca
têm profundas raízes culturais, e antecedem o tráfico de drogas.
A ruínas hoje cobertas de vegetação de calçamentos, muros e caminhos do que
aparentemente era um pequeno assentamento incaico, mostram que Callanga, onde prevaleceu a
produção de coca, era um dos enclaves de ocupação andina na Amazônia. Na Visita General do
Peru de Francisco Toledo (1570-79), menciona-se Callanga numa relação de repartimentos de
índios na Província de Paucartambo. No século XVIII, Callanga figura como fazenda de
grandes proporções num documento do corregimento de causas ordinárias da província de
Paucartambo, que data de 1780-84 (Archivo Departamental de Cusco, Legajo 76, 1780-84). Os
documentos indicam a existência de cultivos de coca e de gado em Callanga. Ao final do século
XIX, Callanga havia se convertido num importante centro de produção de cachaça e de coca,
abrangendo zonas ecológicas de 3.200-1.100 metros de altitude. As fazendas continuavam
organizadas tendo por base estruturas coloniais feudais, que privavam os camponeses de suas
terras. Quando o último fazendeiro morreu (1965), os arrendatários e os peões, que não
possuiam parcelas, tomaram posse da fazenda e repartiram as parcelas entre si. Um grupo ficou
na parte baixa, outro na parte altoandina fora do Parque. Assim, o PNM foi criado em parte
sobre as terras de um latifúndio não afetado pela Reforma Agrária de1969, e que foi ocupado
pelos camponeses que se libertaram do sistema feudal. Do ponto de vista da saúde, hoje essa é
uma das piores regiões em todo o Peru e talvez em toda a América Latina, com uma taxa de
mortalidade infantil em comunidades andinas de 124,2 para cada 1.000 (1997), desnutrição
infantil crônica em mais de 70%, cobertura de vacinação contra tétano, sarampo, difteria,
poliomielites, tos ferina de 21%, alta incidência de TBC, e taxa de mortalidade materna de 38%.
A memória das famílias camponesas sobre os direitos de usos ancestrais remota a
séculos, e as reivindicações e litígios para recuperar áreas passam de geração em geração. A
fundação do PNM é apenas uma data recente na historia oral campesina. Os camponeses não
aceitam facilmente a propriedade do PNM sobre áreas que ancestralmente tem sido utilizadas
por eles. Vale mencionar que, para ter seus direitos reconhecidos, o camponês precisa lavrar a
terra para ser considerado como seu proprietário.
A presença dos moradores de Callanga no PNM não é ilegal. Eles poderiam solicitar seu
reconhecimento como Comunidade Camponesa ou em alguma outra forma de pessoa jurídica,
alegando direitos ancestrais sobre as terras que ocupam. Durante muitos anos, os camponeses de
Callanga foram estigmatizados, fiscalizados e considerados como invasores do PNM,
provocando relações conflituosas com os guardas-florestais. Desde 1995, a Chefia do PNM
estabeleceu um diálogo com os moradores de Callanga e conseguiu a remoção pacífica do gado
das áreas baixas para as áreas de pastos nas partes altas do Parque.
INTERESSES COMUNS
Seria injusto mencionar apenas aspectos negativos na relação entre o Parque e seus
povos indígenas. A existência do Parque também tem contribuido positivamente para os
moradores locais, e ajudou a evitar e a aliviar vários tipos de conflitos socioambientais
observados em outras regiões do Peru. Fiscalizando a entrada de estranhos, o parque protege
uma grande área de florestas que servem como fonte de animais silvestres, peixes, e outros
recursos que todos os moradores do Parque e de fora acabam tendo acesso direto ou indireto.
Por exemplo, o Manu é um dos poucos lugares no Madre de Dios onde existem populações
significativos de tracajá (Podocnemos spp.), e onde ainda existe grande quantitade da árvore de
valor madeireiro, cedro (Cedrela odorata). Com a fiscalização do Parque, os moradores
mestiços de Boca Manu têm realizado o manejo sustentável do cedro, usando apenas os troncos
caídos naturalmente no rio e trazidos pela correnteza na estação de chuvas. Em princípio,
Matsigenka e outros moradores indígenas do Parque têm o direito de caçar e coletar dentro do
Manu. Atualmente, existe uma proibição informal de caça perto da Estação Biologica de Cocha
Cashu. Até o momento, os Matsigenka têm respeitado essas proibições informais, em troca de
acesso a bens materiais e serviços na estação de Cocha Cashu (veja Terborgh 1999). Na última
década, a fama internacional do Parque tem atraido recursos financeiros para vários projetos em
benefício dos moradores locais. Apesar das falhas, a fiscalizão da região tem ajudado a limitar a
invasão dos territórios indígenas por colonos, madeireiros, garimpeiros, etc. Se os moradores do
Parque conseguirem mais acesso a financiamentos e à indústria turística, o Parque poderá trazer
benefícios ainda maiores no futuro.
POVOS INDÍGENAS E CONSERVAÇÃO
As culturas indígenas da Amazônia evoluiram em associação com os ecossistemas
amazônicos (Norgaard 1981), fato que se reflete tanto nos aspectos práticos como ideológicos
de culturas e economias indígenas. Em alguns casos, práticas e crenças indígenas sobre áreas
sagradas desempenham função similar a dos santuários de peixes ou caça na conservação
ocidental (Reichel-Dolmatoff 1976; Chernela 1994; Shepard in press-a). A cosmologia dos
Matsigenka e de outros povos Amazônicos inclui crenças de circuitos energéticos e de feedback
entre a sociedade humana e os animais de caça e outros aspectos da natureza
(Reichel-Dolmatoff 1976; Shepard 1999-a). Os conhecimentos etnobiológicos dos Matsigenka e
de outros povos indígenas mostram uma atenção detalhada para os organismos da floresta, e
apresentam imensa importância para estudos científicos e desenvolvimento da região (Nations
1980; Parker, et al. 1983; Posey 1983; Berlin 1984; Posey 1984; Boster, Berlin and O’Neill
1986; Plotkin 1988; Balée 1994; Chernela 1994; Shepard, et al. in press; Fleck and Harder in
press).
Entretanto, a construção Matsigenka da relação entre Homem e Natureza é, de certa
forma, uma inversão da perspectiva ocidental. Para os Matsigenka, os seres primordiais da Terra
eram humanos, e a criação da biodiversidade aconteceu por meio de um processo onde vários
grupos humanos foram convertidos em diferentes espécies de animais (Shepard 1999-b). Para os
Matsigenka e outros povos indígenas, a Natureza e a Cultura não são separadas. A distinção
entre a floresta e o espaço cultural da aldeia não é absoluta, porque as aldeais e as roças
abandonadas voltam a um estado natural depois de acabar a ocupação humana. É interessante
observar que, alguns tipos de vegetação "naturais" na Amazônia, talvez sejam, de fato, de
origem antropogénica (Balée 1989).
No entanto, a noção de que os povos indígenas são "selvagens ecologicamente nobres"
tem recebido muitas críticas entre biológos e antropológos (Johnson 1989; Redford 1991;
Alvard 1993; Robinson 1993; Brosius 1997). Esse debate apresenta consequências não apenas
acadêmicas. Por um lado, afirmações positivas sobre a relação de povos indígenas com a
biodiversidade apoiam científica e politicamente a criação de reservas indígenas. Por outro lado,
a projeção de atitudes conservacionistas sobre culturas indígenas pode ser inapropriada (Brosius
1997) e perigosa, sobretudo se os índios não corresponderem à visão idealista.
Em todo caso, as sociedades indígenas são uma força importante na conservação do
ambiente amazônico. Reservas indígenas representam 54% de todas as reservas naturais nos
nove paises amazônicos (Peres 1993). Projetos de pesquisa aplicada e participativa são muito
importantes para promover um melhor diálogo sobre sustentabilidade e conservação entre
populações indígenas e cientistas (veja Bodmer 1994; Bodmer, et al. 1997). Se os indios são
obrigados a viver como "conservacionistas" em áreas protegidas, precisarão de alternativas
viáveis e de apoio técnico e financeiro. O projeto GTZ/INRENA de turismo, que visa beneficiar
as comunidades nativas do Manu, é um bom passo para o aprimoramento do diálogo entre os
Matsigenka e o Parque. Entretanto, sem um programa antropológico coerente, o INRENA e o
Parque dificilmente poderão reagir e resolver conflitos socioambientais cada vez mais
complexos enfrentados pela Reserva de Biosfera do Manu.
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