patrimônio histórico e cultural. cidade de londrina (pr)

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PATRIMÔNIO HISTÓRICO E CULTURAL Alberto Gawryszewski (org.) Coleção História na Comunidade – volume 5 cidade de Londrina-PR

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Trata-se do volume 05 da coleção História na Comunidade, editada pelo Laboratório de Estudos dos Domínios da Imagem (LEDI), do departamento de História da UEL

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Page 1: Patrimônio Histórico e Cultural. Cidade de Londrina (PR)

PATRIMÔNIO HISTÓRICO E CULTURAL

Alberto Gawryszewski(org.)

Coleção História na Comunidade – volume 5

cidade de Londrina-PR

Page 2: Patrimônio Histórico e Cultural. Cidade de Londrina (PR)

Coleção História na Comunidade

volume 5

PATRIMÔNIO HISTÓRICO E CULTURALcidade de Londrina-PR

Page 3: Patrimônio Histórico e Cultural. Cidade de Londrina (PR)

ReitoraProfa. Dra. Nádina Aparecida Moreno

Vice-ReitoraProfa. Dra. Berenice Quinzani Jordão

Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-graduaçãoProf. Dr. Mário Sérgio Mantovani

Pró-Reitora de ExtensãoProfa. Dra. Cristianne Cordeiro Nascimento

Pró-Reitor de GraduaçãoProf. Dr. Ludoviko Carnascialli dos Santos

Diretor do Centro de Letras e Ciências HumanasProfa. Dra. Mirian Donat

Chefe do Departamento de HistóriaProfa. Dra. Edméia Ribeiro

Coordenador do LEDiOrganizador da Coleção História na ComunidadeProf. Dr. Alberto Gawryszewski

Agradecemos ao Museu Histórico de Londrina/UEL pela cessão das imagens de seu acervo e, em especial, a funcionária Célia Rodrigues de Oliveira

Page 4: Patrimônio Histórico e Cultural. Cidade de Londrina (PR)

Alberto Gawryszewski (org.)

Universidade Estadual de Londrina

Londrina • 2011

Coleção História na Comunidade

volume 5

PATRIMÔNIO HISTÓRICO E CULTURALcidade de Londrina-PR

Page 5: Patrimônio Histórico e Cultural. Cidade de Londrina (PR)

Uma publicação do Laboratório de Estudos dos Domínios da Imagem (LEDI), do Departamento de História da Universidade Estadual de Londrina

Copyright© dos autores

Capa e editoração: Humanidades Comunicação Geral

Imagem da capa: Primeira Estação Ferroviária de Londrina, 1935, fotografia de José Juliani, acervo do Museu Histórico de Londrina/UEL.

Imagem da contracapa: Cemitério São Pedro/2011, fotografia e arte final de Alberto Gawryszewski

Tiragem: 1000 exemplares

Distribuição gratuita. Venda proibida.

Catalogação elaborada pela Divisão de Processos Técnicos da Biblioteca Central da Universidade Estadual de Londrina

Dados Internacionais de Catalogação-na-Publicação (CIP)

Impresso no Brasil / Printed in Brazil

Feito depósito legal na Biblioteca Nacional

P314 Patrimônio histórico e cultural : cidade de Londrina-PR / Alberto Gawryszewski (org.). – Londrina : Universidade Estadual de Londrina / LEDI, 2011.

90 p. : il. (Coleção História na Comunidade ; v.5)

Inclui bibliografia. ISBN 978-85-7846-124- 9

1. Patrimônio histórico – Londrina (PR). 2. Patrimônio cultural – Londrina (PR). 3. História social. I. Gawryszewski, Alberto. II. Série.

CDU 930.1:719

Page 6: Patrimônio Histórico e Cultural. Cidade de Londrina (PR)

Apresentação

A Cidade de Londrina e a Imagem do

Patrimônio Edificado: a Estação/Museu e a

Secretaria de Cultura/Casa da CriançaZueleide Casagrande de Paula

Casas de Madeira em LondrinaAntonio Carlos Zani

Cemitério São Pedro: espaço de vida, espaço de memóriaAlberto Gawryszewski

Referências bibliográficas

Sumário

7

43

59

89

9

Page 7: Patrimônio Histórico e Cultural. Cidade de Londrina (PR)

Sobre os autores

Alberto GawryszewskiDoutor em História Econômica pela Universidade de São Paulo (USP). Pós-doutorado em História Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Professor Associado do Departamento de História da Universidade Estadual de Londrina (UEL)[email protected]

Antonio Carlos ZaniDoutor em Arquitetura e Urbanismo pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (USP). Professor Associado do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Estadual de Londrina (UEL)[email protected]

Zueleide Casagrande de PaulaDoutora em História pela Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho” (UNESP-Assis). Professora Associado do Departamento de História da Universidade Estadual de Londrina (UEL). [email protected]

Page 8: Patrimônio Histórico e Cultural. Cidade de Londrina (PR)

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Apresentação

A publicação deste quinto livro, da coleção História na Comunidade, é a

continuidade da realização de um desejo: dar transparência às atividades científicas

produzidas pelos professores da Universidade Estadual de Londrina (UEL), em

especial do Departamento de História, que participam do Laboratório de Estudos

dos Domínios da Imagem (LEDI). É possibilitar um diálogo entre o saber científico

e a comunidade. No decorrer dos anos de suas atividades (2006 até hoje) muitas

realizações: cursos de extensão, publicação da revista do LEDI (“Domínios da

Imagem”), do livro “Imagens em debate” (pela EDUEL, 2011), realização do Encontro

Nacional de Estudos da Imagem (ENEIMAGEM, 2007, 2009 e 2011), além da

produção de exposições e vídeos. Toda esta produção pode ser conferida pelo site do

LEDI - http://www.uel.br/cch/his/ledi

Em 2008, o LEDI teve aprovado seu projeto junto ao PROEXT/2008-

Programa de Extensão Universitária (ProExt Cultura), um programa dos Ministérios

da Cultura e da Educação, realizado com a colaboração da Fundação de Apoio

à Universidade Federal de São João Del Rei (FAUF) o que possibilitou o início da

coleção História na Comunidade, a realização de exposições e produção de vídeos.

Em 2008 tivemos a grata notícia da aprovação de nosso projeto junto ao Conselho

Nacional Científico Nacional (CNPq) no edital Difusão científica. Foi com este que

demos a continuidade à coleção História na Comunidade, das exposições e da

produção de vídeos.

Este quinto livro, que acompanha a exposição com o mesmo nome, foi

concebido como mais um instrumento nas mãos dos professores na tarefa de dialogar

com os alunos. A exposição, composta por cerca de 60 banners (que podia variar

conforme o espaço físico disponível), foi e está sendo montada em escolas, museus,

associações esportivas,classistas e culturais. Foi dividida em três partes, as mesmas

que compõem este livro. Assim, portanto, este possui três capítulos.

A cidade de Londrina completou, neste ano de 2011, 77 anos de emancipação.

Uma cidade recente de conta com dois cursos de História (sendo um não presencial)

e dois cursos de especialização em Patrimônio Histórico e Cultural. Conta a

prefeitura com uma diretoria de Patrimônio Histórico, vinculada a Secretaria

Municipal de Cultura. O PROMIC (Programa de Incentivo à Cultura) têm financiado

diversos projetos de educação patrimonial e publicação de livros. Da mesma forma

Universidade Estadual de Londrina tem conseguido verbas para desenvolver projetos

nesta área (PROEXT, Universidade Sem Fronteiras entre outros). Entretanto o que se

assiste hoje na cidade de Londrina é a devastação de seu patrimônio histórico cultural.

Dezenas de edificações de seu centro histórico, dezenas de casas de madeiras, tanto

na zona rural quanto urbana, centenas de jazigos de seus cemitérios são destruídos

no silêncio de todos os membros da comunidade londrinense. Este livro se insere

na discussão da necessidade da compreensão do patrimônio histórico e cultural

de uma cidade nova, mas possuidora de uma rica história e memória e, portanto,

necessitando de sua conservação para esta e futuras gerações.

Page 9: Patrimônio Histórico e Cultural. Cidade de Londrina (PR)

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O primeiro texto desta obra foi escrito por Zueleide Casagrande de Paula e

é intitulado “A cidade de Londrina e a imagem do Patrimônio edificado: a Estação/

Museu e a Secretaria de Cultura/ Casa da Criança”. Sua preocupação foi abordar

o patrimônio urbano de Londrina sob os aspectos histórico e cultural, mas na

perspectiva da identidade, da rememoração, utilizando-se de espaços e lugares

sacralizados e ainda não patrimonializados (Casa da Criança/ Secretaria de Cultura)

e já patrimonializados (Estação rodoviária/ Museu de Arte), ambas obras projetadas

pelo consagrado arquiteto João Batista Vilanova Artigas (1915-1985).

O segundo texto foi escrito por Antonio Carlos Zani sob o título “Casas de

madeiras em Londrina”. O objetivo deste texto foi apresentar um pequeno histórico

das construções das casas de madeira em Londrina entre os anos 40/60, período

que se deu o boom desta modalidade de construção. Pretendeu demonstrar a

existência de uma cultura arquitetônica local, única, por meio dos ornamentos

(frontões e varandas), tipos de madeiras usadas, técnica de carpintaria entre outras.

Mostrou que é impossível pensar a história de Londrina e região sem compreender a

importância das casas de madeira na ocupação deste espaço geográfico. Por décadas

elas resolveram o problema de moradia, sempre com estética e exatidão construtiva.

Mas, hoje, há uma sistemática demolição deste importante instrumento da história

da cidade e da zona rural de Londrina. Assim, adverte o autor: “Caso não hajam

mecanismos legais de controle pela preservação desta arquitetura ela estará fadada

a desaparecimento.”

Por fim, o último texto, escrito por mim, trata do cemitério São Pedro de

Londrina, localizado no centro da cidade e fundado no ano de 1935. Voltamo-nos

para vários aspectos do cemitério São Pedro: o uso da fotografia e dos epitáfios nas

sepulturas, a estatuária, ornamentos e outros signos. Foi dividido em três tópicos:

os epitáfios, no qual percebemos o uso de metáforas e eufemismos que ajudam a

enfrentar a morte; a fotografia cemiterial como forma de memória do falecido, sendo

este tópico subdividido em três partes (casais; “personalidades” e retratos pintados);

por fim, o último, os túmulos, ornamentos e estatuária.

O cemitério é compreendido como um espaço privilegiado da memória da

cidade, daí o título do capítulo “Cemitério de São Pedro: espaço de vida, espaço

de memória”. Pelas imagens fotográficas, pelos epitáfios, pela estatuária podemos

perceber os valores morais e sociais de uma época. As formas de vestir, o uso de

variados cortes de cabelo, do bigodinho entre outros aspectos culturais. As imagens

de casais, o uso da fotopintura nos apresentam as marcas de um tempo na forma de

produzir uma imagem e a valorização da permanência da imagem do casal, formador

de uma família, exemplo de união e amor.

Espero que este livro, da coleção História na Comunidade (composta por

nove livros), contribua para o debate e o ensino de História, em especial na discussão

da preservação dos bens históricos e culturais de nossa terra.

Este material pode ser copiado, no todo ou em parte, devendo ser nomeada

sua fonte. O download dos textos poderá ser realizado pela página do LEDi .

Prof. Dr. Alberto Gawryszewski / coordenador da coleção

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A Cidade de Londrina e a Imagem do Patrimônio Edificado:

a Estação/Museu e a Secretaria de Cultura/Casa da Criança

Zueleide Casagrande de Paula

Introdução

O século XXI apresenta uma nova perspectiva quando tratamos

do patrimônio, sobretudo do urbano. O patrimônio urbano proporciona

uma racionalidade socioespacial diferente daquela que marcou o século

passado, pois o patrimônio arquitetônico assumiu novos contornos e

novos sentidos de uso.

Este texto tem, portanto, a preocupação de abordar o patrimônio

urbano na cidade de Londrina (localizada na parte norte do Estado do

Paraná), sob os aspectos histórico e cultural. Porém, na perspectiva da

identidade, da rememoração, principalmente do uso relativo aos espaços

e lugares, sacralizados e não patrimonializados ainda, como a antiga

Casa da Criança, hoje Secretaria Municipal da Cultura (no decorrer do

texto, serão empregados Casa da Criança e Secretaria de acordo com o

necessário); de edificações já patrimonializadas, como a antiga Estação

Rodoviária de Londrina, hoje Museu de Arte (mencionada, doravante,

como Estação/Museu). Esses espaços foram sacralizados na memória

promotora da identidade, no uso cotidiano de tais lugares.

Se para as cidades antigas há uma preocupação em discutir a

revitalização e consequente refuncionalização do patrimônio

urbano, para as cidades que nasceram no século XX, há um cuidado em

definir o que deve ser primeiro contemplado como bens patrimoniáveis,

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Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

para, então, ser defendido como tal, visto que a cidade é, ela toda, um

lugar de atenção e de tensão, pois sua temporalidade é muito recente

e os processos de construção/demolição/reconstrução perpassam seu

cotidiano com a naturalidade que marca sua essência, ou seja, aquilo

que a identifica na sua condição de urbana – em outras palavras,

edificar/demolir, reconstruir, restaurar.

A revitalização implica o uso dos bens patrimonializados com seus interiores readaptados, mantendo-se, geralmente, as fachadas restauradas, para a nova realidade que passarão a compor. A revitalização das cidades, de acordo com Odete Douro, apresenta a seguinte perspectiva, a qual destacamos: “Na verdade, trata-se de construir sobre o já construído, aproveitando o já existente como base para uma nova configuração tanto funcional quanto estética. Aliás, nesses casos, uma nova configuração estética é considerada primordial, no sentido de obliterar a antiga imagem de decadência da área abordada, fazendo reemergir a sua nova condição moderna, condição essa fundamental para sua reinserção na totalidade do tecido urbano e na vida econômica do país.” POR UM RESTAURO URBANO: novas edificações que restauram cidades monumentais”. http://www.portalseer.ufba.br/index.php/rua/article/view/3225/2342

A paisagem das cidades novas é marcada por esta espécie de

tripé – construção/demolição/reconstrução. isso caracteriza todas

as cidades, mas nas cidades novas tais práticas são intrínsecas à sua

condição de terem sido iniciadas no século XX. Esses espaços urbanos

recentes são marcados pela velocidade, pela urgência em renovar

sua plasticidade de acordo com os materiais mais atuais e dentro das

mais modernas tendências arquitetônicas. Características como as

mencionadas se fazem presentes nas cidades do norte paranaense.

Diferentemente daquelas que praticam demolições de construções

antigas para “atualizar” sua paisagem urbana, as cidades novas dessa

região substituem uma arquitetura que remonta a setenta anos atrás,

no máximo, por outra em estilo mais recente, por não entendê-la como

cidade histórica, entre outras razões.

No caso de Londrina, a paisagem nos lembra um canteiro de

obras, pois nela há regiões em que a construção nunca silencia. A cidade

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A Cidade de Londrina e a Imagem do Patrimônio Edificado...

está em expansão constante: regiões desabitadas pertencente às áreas

rurais são integradas à área urbana; são planejadas para se tornarem

habitáveis. Em alguns casos o planejamento propõe aglomerados de

edifícios, como é o caso da região da gleba Palhano, cujo aspecto altera

a paisagem de quem circula ou mora nessa região: e de onde olharmos,

vemos cotidianamente as constantes transformações, seja um edifício

finalizado, seja uma construção iniciada. Enfim, é a cidade se fazendo...

Essa imagem urbana parece nos dizer que o horizonte, embora não

devesse ser um limite para as edificações horizontais, necessita

respeitar o limite imposto pela verticalização, por contraditório que

possa parecer.

Marcos: são referenciais que o observador desenvolve em contato com a cidade numa relação de interação. Os marcos, na visão de Kevin Lynch (1997), quase sempre, são físicos e se constituem como tais porque o usuário estabelece uma relação simples, mas funcional, com o marco. Geralmente são edifícios, sinais, lojas ou outro lugar, como uma praça, etc. Um exemplo para o morador de Londrina: a “Casa dos Anões” era um marco, bem como o relógio instalado no alto do Edifício América, no cruzamento da rua Paraná com a rua Rio de Janeiro, e conhecido pelos usuários como “Relojão”. Para se tornar marco, foi preciso que a imagem do “Relojão” se construísse socialmente. http://www.jornaldelondrina.com.br/edicaododia/conteudo.phtml?id=992888. Exposições retratam a busca do tempo perdido. Consulta em 29/10/2010. Reportagem de 15/04/2010 | 00:00 Paulo Briguet.

- Limites: Os limites podem ser barreiras claras e definidas, como abaixo do Calçadão ou acima dele, abaixo da linha de trem ou acima dela, abaixo da Avenida Leste-oeste ou acima dela, ou ainda, a travessia do lago que divide os bairros ( Cinco Conjuntos) da zona norte de Londrina. Portanto, são elementos entendidos como fronteira entre uma face e outra dentro da cidade, mas podem também ser espaços em construção, muros e paredes.

- Bairros: são lugares reconhecíveis por seus moradores e por possuírem características comuns que os identificam, como, no caso de Londrina, a gleba Palhano: sua verticalização faz com que o bairro seja reconhecido por essa característica e, quando mencionado, remeta o observador a essa imagem já mentalmente construída. Nesse bairro também encontramos a ideia de limite.

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Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

O mesmo cenário há pouco descrito encontramos na região dos

Cinco Conjuntos, que, há muito tempo, deixou de abranger apenas

cinco conjuntos habitacionais para reunir vários, que podem ser

considerados bairros, aonde a verticalização também chegou. Embora

ainda impere ali a residência horizontal, o número de construções

verticais vem aumentando, e até mesmo a legibilidade urbana está

sendo comprometida.

Entendemos, a legibilidade, com base na leitura de Kevin Lynch (1997), como a facilidade com a qual as partes podem ser reconhecidas e organizadas numa estrutura coerente. Um exemplo: ao nos aproximarmos da entrada da Praça Primeiro de Maio pela Avenida Souza Naves a partir da Secretaria da Cultura, reconhecemos, o espaço/lugar, e sabemos que o prédio do Correio fica na extremidade da praça, cujo o acesso se faz pela rua Rio de Janeiro. Trata-se de uma informação dada pela capacidade do usuário de ler o espaço urbano e se reconhecer nele, mesmo que ele não visualize a edificação que tem em mente. A imaginabilidade também pode ser definida em termos de uma qualidade de um objeto físico que oferece grande probabilidade de evocar uma imagem forte num dado observador; Cada usuário constrói sua própria Londrina de acordo com as informações, percepções, religiosidade, cultura, poder econômico e até mesmo lugar de residência que tenha, enfim sua visão de mundo é que permite essa imaginabilidade. A imagem elaborada a respeito da antiga casa dos anões e sua integração á imagem urbana depende da formulação de cada usuário e do seu lugar social (os moradores do Centro a viam diferentemente do modo como a viam os moradores dos bairros da região norte da cidade).

As construções “antigas” (erguidas há sete décadas, por exemplo)

também são atingidas pela renovação da paisagem urbana. Nesse

momento, põem-se em risco as edificações que já se consolidaram no

imaginário urbano e são referência para seus usuários. isso não as

impede, contudo, de serem “varridas” da face urbana para que outras

ocupem seu lugar. Um exemplo desse processo é a “casa dos anões”,

uma das residências mais mencionadas pelos usuários urbanos de

Londrina. Foi demolida recentemente para que, em seu lugar, fosse

erguido um edifício onde funciona hoje uma agência de atendimento

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A Cidade de Londrina e a Imagem do Patrimônio Edificado...

a clientes especiais (contas personalizadas) do Banco do Brasil. Dito

de outra forma, o que poderia vir a ser patrimonializado sucumbiu ao

capital.

A cidade vive entre a expansão territorial com construções que

fazem uso das mais modernas tecnologias e a demolição de edificações

consideradas velhas, mas não históricas o suficiente para serem

protegidas pela patrimonialização. Mas não é só isso: há prédios que

devem ser preservados; entra, então, em cena, a ideia de restaurar o

“antigo” – o que, como dito anteriormente, não exclui a renovação, ou

seja, manter a cidade sempre “nova”.

Se nas cidades mais antigas o tratamento dado à arquitetura,

quando falamos de bens patrimoniáveis, visava a manter a cidade com

sua legibilidade histórica “intacta” quanto a seus equipamentos urbanos

(praças, parques, playgrounds, entre outros) e também sua arquitetura

com a “marca” de antiga (caso das cidades mineiras), ou seus “centros

históricos” sempre antigos, há, por outro lado, no contexto da

patrimonialização, a ideia de revitalização, como o que se propõe hoje

para o centro da cidade de São Paulo.

Patrimonialização é o termo utilizado para referir-se a todo o processo instaurado para proceder ao possível tombamento da obra, incluindo a base jurídica que sustente os argumentos de defesa do bem a tombar, assim como a avaliação técnica e o parecer dos vários técnicos (engenheiros, arquitetos entre outros) e conselheiros (membros eleitos, geralmente integrantes dos órgãos oficiais de tombamento, como iphan e representantes da comunidade). Também se inclui nesse processo o próprio registro de tombamento. Ao se iniciar esse processo a obra ficará impossibilitada de sofre qualquer alteração até finalizar. Se tombada, e, em sua maioria, sempre ocorre o tombamento, somente os órgãos oficiais podem conceder qualquer mudança na obra, mas apenas em caráter de manutenção.

Tombamento é o ato de registrar a obra, com todas as suas características, no livro tombo (livro de registro especial para esse fim), junto ao órgão no qual se iniciou o processo de patrimonialização. O registro no livro tombo é o último ato a ser praticado para que uma obra esteja realmente tombada.

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Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

Nas cidades novas, por seu turno, as práticas levam-nos a

concluir que sua arquitetura se revigora, mesmo que não se pergunte

aos seus usuários se desejam ou não que o lugar por eles habitado

permaneça constantemente em renovação/reformulação.

Quando há uma preocupação puramente estética, em outras

palavras, do ponto de vista da beleza, da forma, da criatividade do

arquiteto etc. sobre uma edificação, a perspectiva histórica tende a se

perder nesse caminho, porque a estética de uma construção, muitas

vezes, não tem valor para a arquitetura, pois a edificação pode apresentar

uma repetição de expressões já existentes e, portanto, nada de novo a

acrescentar e a legitimar seu valor.

Para a história, no entanto, a relação é outra, pois,

independentemente de como seja a visualidade que temos do edifício,

ele está ligada a uma memória e a uma história do lugar. Não levamos

em consideração, portanto, se o edifício em questão atende ou não a

uma forma de ver e entender a arquitetura – como faz o arquiteto, por

exemplo. Quando tratamos de patrimonialização, vemos, sobretudo, o

sentido de memória, de vivência histórica, de identidade, de lembrança

afetiva. Talvez seja essa última a primeira que estabelecemos com um

bem que se pretende tombar e tornar patrimônio. Em outros termos,

a ideia de patrimonializar um bem pode ocorrer primeiro pela relação

de afetividade que o usuário e a comunidade estabeleceram com ele.

Essa relação não é histórica, mas é também a partir da afetividade que

uma edificação desperta em seus usuários que se manifesta o desejo de

preservação dos bens edificados. Entretanto a afetividade, geralmente

se constitui a partir da convivência com a edificação, mas não é

suficiente para que seja patrimonializada, é sim mais um dos elementos

de definição desse processo.

Nesse sentido, ao pensarmos a cidade de Londrina, consideramos

que a velocidade característica de sua história é realmente muito

significativa; contudo, ou exatamente por essa razão, foi possível a

sacralização de lugares no decorrer desse mesmo tempo veloz. Temos

claro que, ao nos propormos tratar de tal tema nessa dimensão,

inserimo-nos na condição de sacralizadores, pois assim trazemos

para o leitor um debate que diz respeito à história e à memória dos

Page 16: Patrimônio Histórico e Cultural. Cidade de Londrina (PR)

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A Cidade de Londrina e a Imagem do Patrimônio Edificado...

usuários dessa cidade. E não apenas nós historiadores, mas também

os professores de história dos Ensinos Fundamental e Médio, quando

levam seus alunos para visitar lugares considerados de memória e de

lembranças, como os museus, o Centro “velho” da cidade, as áreas

verdes preservadas; os representantes de instituições oficiais e não

oficiais de preservação patrimonial, quando propõem que determinado

edifício seja tombado pelo patrimônio histórico, e não outro que possui

a mesma temporalidade; os legisladores, ao propor a proteção em forma

de lei; o Poder Judiciário, quando faz o cidadão e a cidade cumprirem

essa lei, o Poder Executivo, quando aplica a lei...

Desse modo, somos um grupo social significativo de

sacralizadores. Porém, ao historiador cabe tratar a respeito da história

da obra, sobre seu passado e sua relevância histórica na composição da

paisagem urbana no presente. Compete tratar a respeito da relevância

ou não da edificação, se esta é merecedora de atenção dos órgãos

patrimolializadores, de acordo com o que pensa a comunidade, enfim,

contribuir no que tange à sua história.

Neste ponto, cabe lembrar o que dissemos ao iniciar esse texto:

nas cidades novas tudo é histórico, pois tudo está-se fazendo, ou se fez em

um tempo tão próximo que não dispomos dos instrumentos oferecidos

pelo tempo histórico para definir o que é necessário e premente

preservar (isto é, o que compõe a paisagem urbana há muito, muito

tempo). No caso de que tratamos, a temporalidade de tudo é a mesma.

Também não podemos “descartar” a presença viva dos “fazedores de

história”, ou seja, daqueles que controem a cidade – e esses são todos,

pois ela está em construção contínua desde sua fundação, portanto seu

fazer histórico é ininterrupto, atual, e seus fazedores estão vivos.

Entretanto não se pode preservar tudo, pela razão já exposta:

o que caracteriza a cidade é a sua demolição/construção permanente.

Então, vemo-nos frente a um problema, qual seja: o que eleger, quando

tratamos de edificações, e como justificar que um determinado edifício

seja merecedor de preservação/patrimonialização?

Esta é uma das questões-chave da nosso texto. Para responder

a essa indagação, destacamos duas edificações, a fim de mostrar por

que elas são diferentes das demais de sua época e por que elas podem

ser integrantes do patrimônio edificado da cidade na perspectiva do

historiador.

Page 17: Patrimônio Histórico e Cultural. Cidade de Londrina (PR)

16

Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

A contribuição de João Batista Vilanova Artigas ao patrimônio

histórico de Londrina

As duas obras que elegemos para discutir o patrimônio edificado

em Londrina, como já dissemos, são a Casa da Criança e a Estação/

Museu. Visamos a demonstrar seu valor histórico e por que merecem

compor o patrimônio histórico da cidade.

Nesse sentido, faz-se necessário dizer quem as idealizou, dito

de outro modo, quem é o arquiteto que as concebeu – João Batista

Vilanova Artigas –, pois se trata de um dos motivos pelos quais essas

edificações são possuidoras de características diferentes das de outros

prédios da mesma época.

João Batista Vilanova Artigas, conforme informa Suzuki

(2007), nasceu em junho de 1915, em Curitiba, no estado do Paraná.

Sua formação superior se deu na Escola Politécnica da Universidade

de São Paulo – USP, quando a engenharia e a arquitetura formavam

o engenheiro-arquiteto. Embora sua relação com a cidade de Curitiba

tenha se mantido sempre atualizada, pois era lá que se encontravam

seus familiares, estabeleceu-se em São Paulo (SP), onde a identidade

urbana e a do arquiteto se encontraram e se manifestaram em vários

momentos e obras. Artigas amava São Paulo; a cidade, por sua vez,

proporcionou tudo aquilo de que precisou para expor seu pensamento

modernista em suas obras, consideradas obras de arte.

Artigas igualmente deixou sua marca no Paraná, sobretudo na

cidade de Londrina. A Estação/Museu foi sua principal obra, mas há

outras, como veremos mais adiante. Era filiado ao Partido Comunista

Brasileiro , e essa filiação rendeu-lhe o exílio durante a época da ditadura

militar. Foi considerado um dos fundadores da arquitetura modernista

no País (KAMITA, 2003).

Era um defensor, no Brasil, das ideias de Frank Lloyd Wright,

arquiteto norte-americano que defendia a tese de que, quando três

linhas eram suficientes para projetar uma edificação, era estupidez fazer

empregar mais. Em outras palavras, defendia a arquitetura limpa. Por

essa influência, Yves Bruand (1981) denominou a primeira fase da obra

de Artigas (a compreendida entre 1938 e 1944) de “fase wrightiana”.

Mais tarde Artigas manteve estreito diálogo com o pensamento e

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17

A Cidade de Londrina e a Imagem do Patrimônio Edificado...

as obras de Le Corbusier. Esse arquiteto era francês e teve uma influência

marcante no pensamento dos arquitetos brasileiros. Artigas foi um

desses arquitetos e acabou por estabelecer laços com Le Corbusier, cujo

nome verdadeiro era Charles-Édouard Jeanneret. Corbusier era também

modernista e defendia que “as formas primárias são as formas belas,

porque são claras de ler” (LASZLO TASCHEN, 2010). Artigas fundia

o pensamento dos dois arquitetos em suas obras, embora tenha sido

influenciado, num determinado período, mais por um do que por outro.

Como veremos em suas duas obras aqui destacadas, Vilanova

Artigas apresenta essa mesma clareza na leitura das formas, pois

entendia que deveria expressar, ao propor um projeto para qualquer

edificação, uma linguagem arquitetônica que fosse acessível ao público

– como a que se expressou na Estação/Museu e na Casa da Criança.

Simultaneamente à atividade de arquiteto, Artigas foi professor

na Escola Politécnica na Universidade de São Paulo e, posteriormente,

no curso de Arquitetura dessa mesma instituição. Muitos foram

seus discípulos durante sua atuação como professor. Vários foram

seus projetos, os quais marcaram profundamente sua carreira e sua

existência. Em consequência de suas convicções políticas, foi exilado

durante a ditadura militar no Brasil. Ao retornar ao País, não mais

pode assumir a cadeira de Projetos, a qual lhe pertencia antes do exílio.

Permaneceu na Universidade de São Paulo como professor colaborador

de outras disciplinas e, em 1985, submeteu-se a uma banca de titulares

para reintegrar o quadro de professores daquela instituição, o que

causou grande constrangimento na ocasião (ARANTES, 2002).

As exigências institucionais às quais não pode fugir, ainda com os

resquícios da ditadura militar e reforçadas pelas correlações de forças

dentro da FAU/USP, ficam claras nesse acontecimento. Morreu um

ano depois, em consequência de um câncer. Tornou-se, em sua época,

um dos mais reconhecidos arquitetos do País. Porém, foi arremessado

ao esquecimento cultural e histórico. Se não tivesse tido uma morte

prematura e vivido como seus colegas de trabalho e de vida – Oscar

Niemeyer, ainda atuante, Lucio Costa, que morreu em 1998, e Oswaldo

Bratke, falecido em 1997 –, certamente seria o arquiteto mais festejado

depois de Niemeyer, conforme afirma o arquiteto e professor Hugo

Segawa.

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18

Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

Hugo Segawa, também professor da USP, teceu o seguinte comentário em artigo que publicou sobre o evento do retorno oficial de Artigas a FAU/USP: “figura emblemática do ativismo engajado do Partido Comunista Brasileiro, seu discurso espelhou as vicissitudes que marcaram a trajetória das esquerdas brasileiras. Dono de uma retórica mais impetuosa que a esquemática oratória comunista de Niemeyer, Artigas não viveu para acompanhar a queda do muro de Berlim. Um homem que sempre estimou a literatura e a escrita, ele é um dos poucos arquitetos que têm registrado no papel seus posicionamentos intelectuais como cidadão e como artista, e esses textos retratam as ortodoxias e as incoerências de um período pleno de contradições. Por sua franqueza e ímpeto, ele foi criticado por jovens discípulos mais à esquerda, como massacrado pelas alas mais conservadoras. Sua morte precoce não pode ser desvinculada da humilhação de se submeter a uma prova para titulação acadêmica na USP aos 69 anos de idade, apesar de uma veemente vocação de professor, dentro e fora da universidade. A aula pública do concurso foi seu canto do cisne.” Publicado em jan. 2002, em: http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/resenhasonline/01.001/3258, por Hugo Segawa, sob o título: “Vilanova Artigas, renascer de um mestre”. Consulta em 21/10/2010.

São diversas as obras de João Batista Vilanova Artigas realizadas

na cidade de São Paulo, aproximadamente setecentos projetos.

Faremos, todavia, referência específica a duas delas, certamente

já vistas pessoalmente ou pela televisão: o prédio da Faculdade de

Arquitetura e Urbanismo/FAU, localizado no espaço da Universidade

de São Paulo, e o estádio do Morumbi (o do São Paulo Futebol Clube),

onde são realizados diversos jogos dos mais variados torneios do mundo

do futebol. Em ambos, fez vasto uso do concreto armado – um dos

elementos definidores dessas edificações e da escola paulista/brutalista.

Mesmo que Artigas nunca tenha se assumido como um dos

fundadores da escola de pensamento paulista/brutalista no campo

da arquitetura, a ele foi atribuída a maior influência dessa vertente

arquitetônica. Essa escola de arquitetura é conhecida por fazer uso

expressivo do concreto armado em suas construções, como é o caso da

Estação/Museu em Londrina. O que caracteriza a mencionada escola

é o uso do concreto exposto visível e as formas simples no uso desse

concreto, o emprego do tijolo aparente e das caixas expostas.

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19

A Cidade de Londrina e a Imagem do Patrimônio Edificado...

Portanto, a poética da forma em Artigas descaracteriza a peculiar

dureza do concreto. Como podemos ver no mencionado exemplar

arquitetônico (um dos símbolos do passado da cidade de Londrina, a

propósito), a forma apresenta leveza e a clareza defendidas por Artigas.

Essa defesa das formas simples tinha o objetivo de popularizar a

arquitetura modernista, para que todos tivessem acesso à compreensão

de tais formas e para que todos pudessem ter moradias construídas com

simplicidade, mas não desprovidas de formas suavizadas e de uma certa

arte, mesmo que as condições das construções, na época, não permitissem,

por exemplo, um acabamento refinado para as edificações populares.

Se o concreto ficasse exposto e fosse aceito pelas elites em suas

residências e em obras públicas, como a Estação/Museu em Londrina

e o estádio do Morumbi em São Paulo, seria possível construir para as

classes populares, sem que fosse necessário o acabamento (esconder

o concreto), pois o concreto seria o próprio acabamento. Para isso, no

entanto, era preciso que o concreto se tornasse arte. A causa de Artigas

era ideológica e política, por isso ele defendia o uso direto e exposto do

concreto: o rebuscamento na arquitetura encarecia a obra, e o Brasil era

um país onde a pobreza imperava.

Por outro lado, as formas “rudes” dessa arquitetura também

expunham o país onde se vivia; expressar suas ideias, materializadas

na arquitetura, era uma forma de posicionamento político frente à

pobreza. Porém, Artigas era, antes de tudo, alguém que enfrentava

Figura 1. Fotografia da autora, agosto de 2009. imagem transversal do edifício da Estação /Museu.

Nesse exemplar, em Londrina, é visível a exposição do concreto. Se em muitas edificações o concreto exposto é agressivo, aqui a forma elimina essa aspereza. O fato de o concreto compor uma forma/desenho em cascata – as chamadas abóbadas – proporciona a sensação de que elas irão levantar voo, pois apresentam uma leveza que o concreto parece impossibilitar, por sua dureza.

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Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

conflitos em suas escolhas e posições políticas e humanas, em seu

trabalho e nas demais relações que estabelecia. Assim, percebemos que

não seria possível estudar as obras (edificações) de Artigas sem saber

mais a respeito de sua vida, seus ideais e suas posições políticas. Não

seria possível separar a obra do artista: um estava no outro, e ambos

expressavam sua força imaginativa, sua arte criadora e vontade de

construir uma cidade acessível a todos.

Num futuro não muito distante, algumas de suas edificações (da

vasta obra de sua vida) localizadas na cidade de Londrina tornar-se-

iam patrimônio arquitetônico. Conforme o site da Coordenadoria do

Patrimônio Cultural da Secretaria de Estado da Cultura, a Estação/

Museu e o Cine Teatro Ouro verde já estão patrimonializados e

constam dos bens tombados pelo estado do Paraná. http://www.

patrimoniocultural.pr.gov.br/search.php?query=artigas&action=result

s&mids%5B%5D=2.

Portanto, embora não seja o objetivo nesse trabalho, tratar a

respeito das duas edificações que passaremos a apresentar, o faremos,

por entender que o leitor ao caminhar pela cidade, pode se reconhecer

nesses espaços e distinguir as obras de Artigas, às quais nos referiremos.

Nesse sentido, apresentaremos dentro dessa breve biografia do referido

arquiteto, o Cine Teatro Ouro Verde e o edifício Autolon.

O Cine Ouro Verde (hoje Cine Teatro Outro Verde) e o edifício

Autolon compuseram também marcos urbanos durante muitos anos na

cidade de Londrina. Ambos construídos, um ao lado do outro, ligados

por uma edificação que se estendia do edifício Autolon em direção

ao prédio do cinema, no qual foi instalado um restaurante. Foram

construídos na Rua Paraná, hoje o Calçadão.

Figura 2. Fotografia 1 – Cine Ouro Verde: destaque para as colunas em cunha, com cobertura em pastilhas. Fotografia 2 – Vão entre o Cine Ouro Verde e o Edifício Autolon: no passado um restaurante, hoje, uma loja. Fotografia 3 –Edifício Autolon: destaque para as colunas elípticas e cobertura em pastilhas. (acervo da autora).

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A Cidade de Londrina e a Imagem do Patrimônio Edificado...

O espaço funcionava como restaurante, era freqüentado pelos

moradores da cidade em almoços e jantares antes e depois das sessões

de cinema. Era também o ponto de encontro em final de tarde para os

empresários, profissionais liberais e políticos locais. Entre o edifício

do teatro e do Autolon, hoje funciona uma pequena loja de ponta de

estoque, como é possível constar pela imagem da figura 2, fotografia 2.

Esse conjunto arquitetônico foi pensado e proposto por um

grupo de empresários locais: Celso Garcia Cid, proprietário da empresa

de transporte rodoviário Viação Garcia, mas na época uma empresa

regional; Ângelo Pesarini e Jordão Santoro, também sócios proprietários

da Sociedade Auto Comercial de Londrina – Autolon, cujo produto

consistia nos veículos da marca Chevrolet. Esse edifício foi construído

sobre pilotis (nesse caso, coluna de forma elíptica e de extenso diâmetro)

e o espaço de vãos era destinado ao estacionamento dos visitantes

da loja de carros que era acessada pela Rua Paraná, ao passo que o

estacionamento tinha acesso pela Rua Rio de Janeiro. No decorrer do

tempo, esses espaços que eram abertos, foram fechados, passaram a

ser ocupados por lojas, mas ainda assim, quando transitamos pela rua

ou adentramos essas lojas, nos deparamos com as imensas colunas a

impor, aos freqüentadores, a sua presença.

O Cine Ouro Verde (Figura 2 – fotografia 1) foi construído para ter

uma plasticidade eloquente, pois a ideia, segundo Suzuki (2003), era de

que fosse o maior e o mais luxuoso cinema do interior do Brasil. Desde

sua proposição em 1948, tornara-se orgulho para a cidade, em razão

de sua grandeza, o que de certa forma também despertou a expectativa

sobre sua inauguração, a qual foi amplamente noticiada pelo jornal A

Folha de Londrina no ano de 1952. O jornal apresentou uma extensa

e elogiosa reportagem sobre a inauguração e destacou a classificação do

empreendimento, que nada deixaria a desejar aos cinemas dos grandes

centros, “pois foi ele construído sob os mais modernos e extraordinários

quesitos contemporâneos, admitida engenharia arquitetônica [sic]

que foi sua classificação entre os maiores da América Latina – o Cine

Marrocos, em São Paulo, e o São Luiz no Rio de Janeiro” (Folha de

Londrina, 20 dez. 1952, Apud, Kamita, 2003).

O jornal ainda defende a construção do edifício contra as

críticas, que assinalavam a suposta inutilidade de um cinema daquelas

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Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

proporções para uma cidade como Londrina, “plantada” no que

chamavam de “boca do sertão”. Essa defesa sinaliza para o contraste

da edificação com o universo citadino local, ou seja, para a existência

de um estranhamento: a convivência sertão/arquitetura sofisticada. São

essas impressões e sinais que se manifestaram à época e que sustentam

a ideia de que esse conjunto de edifícios foi um dos mais destacados

marcos urbanos para a cidade, pois até hoje o teatro ainda é referência

no Calçadão de Londrina, onde está localizado.

Percebemos, ao estudar sua vida, que Vilanova Artigas era um

caminhante urbano, um observador das cidades e também apaixonado

por elas. Durante sua existência, traçou seu próprio caminho: como bom

comunista que era, burlava o poder disciplinador que o planejamento e

a arquitetura impõem à cidade. Marcava os espaços urbanos com suas

obras, ao criar lugares e, dessa forma, possibilitava novas identidades

para esses espaços.

Esses marcos eram ainda inovadores. As obras que realizou em

Londrina mostram esse espírito: naquele momento, era o concreto

vencendo a mata, vencendo o sertão. Era o concreto vencendo a

resistência do País quanto ao seu uso como acabamento, sua brutalidade

tornando-se digna de ser vista, conforme demonstra a imagem da

Estação/Museu (figura 1), como o que havia de mais moderno na

arquitetura brasileira. E mais: era o concreto compondo uma cidade

nova numa expansão cafeicultora que urbanizava o sertão paranaense,

sertão esse que ainda teimava em ocupar grande parte do País. Era o

Brasil modernizando-se. O concreto, no período, era amplamente usado

por arquitetos norte-americanos e europeus; era o que havia de mais

moderno na construção civil. Sua obra, em meio a esse sertão, possuía

harmonia, leveza e integração, ao ser aplicado na construção de um

edifício que tinha como função ser um cartão de visita de Londrina. A

Estação Rodoviária, “plantada” numa cidade que ainda era marcada pelo

agreste, pela terra vermelha, pela fronteira em expansão, apresentava

em sua forma, em sua plasticidade, o que havia de mais moderno para

a época: o concreto.

A imagem a seguir apresenta a integração e modernidade do

edifício; a cada curva das abóbadas, observa-se um movimento de asas,

como as asas dos pássaros que certamente circulavam pela região em

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A Cidade de Londrina e a Imagem do Patrimônio Edificado...

bandos e de variedades diversas, muito mais presentes do que hoje, no

ambiente urbano, onde o desequilibrio levou a eliminação de especies e

superpopulações de outras.

A Estação trazia na sua própria arquitetura a ideia de moderno,

expressão que aparecia no concreto, sem excluir a da natureza

brasileira, ao representar na curvatura das abóbadas o movimento das

asas das aves. Em suma, a Rodoviária apresentava, em sua suas formas

arquitetônicas, movimento, passagem, deslocamento. Tudo o que era a

cidade de Londrina no período áureo do café na região.

Além dessa edificação, Artigas “plantou” na cidade de Londrina

edifícios que até hoje chamam a atenção, por todas as características

que expusemos acima: o Cine/Teatro Ouro Verde e o Edifício Autolon,

a seu lado; parte do edifício da Santa Casa de Misericórdia; o Londrina

Country Clube e apenas uma residência, afora os já mencionados

Estação/Museu e Casa da Criança.

Esse rápido relato sobre o homem e o arquiteto João Batista

Vilanova Artigas permite que se possa ter uma ideia de sua relevância

para a história da arquitetura no Brasil. Para a arquitetura das cidades

novas, mas sobretudo para Londrina (PR), que praticamente desconhece

a importância histórica desse arquiteto para o Brasil, para a existência

de sua própria arquitetura, para a formação da paisagem e da imagem

que a cidade exibe hoje (visto que, depois de Artigas em Londrina, a

arquitetura local assumiu outra dimensão).

Figura 3. Fotografia da autora, agosto de 2009.

Essa imagem retrata um corte no edifício, exatamente onde se observa o movimento em que é possível fazer a comparação com o das asas de uma ave. Não por acaso, foi pensado para essa região e para a função de estação rodoviária – porta de entrada e saída das pessoas que se dirigiam à cidade.

Page 25: Patrimônio Histórico e Cultural. Cidade de Londrina (PR)

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Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

Cidade-usuário-patrimônio

É preciso entender como a cidade desenvolve sua compreensão

sobre o patrimônio local e como esse patrimônio foi eleito como tal,

de que modo alcançou essa condição, e mais, como população local

participa dessa eleição.

Essa relação é complexa. Por mais que se busque simplificá-la,

isso não é possível, quando tratamos do patrimônio urbano, pois a

relação que temos com a cidade é a de usuários.

O usuário, nesse caso, tem uma perspectiva de relação com a cidade que vai além da de ser apenas seu morador. Morar na cidade não significa dela usufruir, ser seu usuário, pelo contrário, há pessoas que se restringem ao espaço de seu bairro, ilhando-se nele. O usuário diferentemente usufrui dia a dia de todos os seus espaços e lugares. Usufrui em sua plenitude, se integra a ela, faz parte de sua paisagem desde seu lugar de moradia até as multidões nas ruas, na circulação urbana, leva e traz informações, sensações, percepções visualidade, enfim, é seu usuário. Essa relação não diz respeito apenas ao morador, mas a todos aqueles que dela usufruem, por uma razão ou outra.

Assim, nós, mesmo que não nos apercebamos desse movimento,

produzimo-la; contudo, ela também nos produz... Então, como podemos

entender de forma simples algo que é, em sua natureza, complexo?

Tentaremos discutir um pouco essa relação entre cidade, usuário e

patrimônio, para que, ao nos deparamos com as imagens da Estação/

Museu (figuras 1, 3, 4, 5, 6, 7) e da Casa da Criança (figura 4 – fotografia

3, figura 9 e 10), possamos entender por que há lugares na cidade que

nos dizem coisas que outros não dizem. Por que nossas lembranças são

constantemente ameaçadas por novas edificações e novos lugares, e

como todo esse emaranhado toca nossa sensibilidade. Sobretudo, por

que há edificações que são reconhecidas como patrimônio urbano e

outras não.

As imagens que até aqui apresentamos sobre a obra de Vilanova

Artigas, foco deste trabalho, são contemporâneas, e todas as demais,

neste texto, são do mesmo período. Há um propósito claro nesse uso.

Page 26: Patrimônio Histórico e Cultural. Cidade de Londrina (PR)

25

A Cidade de Londrina e a Imagem do Patrimônio Edificado...

Qual? O de fazer o leitor relembrar sua relação com essas obras ao longo

de sua ligação com a cidade, de sua convivência como usuário.

Enfim, ao apresentarmos as mencionadas obras em imagens

recentes, propomos a você, leitor, rememorar, lembrar e então somar

tudo isso ao já dito neste texto, a fim de que possamos entender por que

esses dois edifícios são históricos, e por que a Estação/Museu (figura

4 – fotografia 1 e 2 ) já compõe o patrimônio local e estadual (conforme

registrado na Coordenadoria Cultural da Secretaria de Estado da

Cultura), em detrimento de outras, como a Casa da Criança ( figura 4 –

fotografia 3), também de autoria de Artigas e ainda não tombada.

Figura 4. fotografias 1e 2 – Estação/Museu, 2009; fotografia 3 – Casa da Criança em reforma, 2010. Acervo da autora.

O geógrafo e arquiteto Kevin Lynch defende que nós, humanos,

desenvolvemos quadros mentais para nos deslocarmos na cidade. Esses

quadros mentais possibilitam a um usuário de Londrina se deslocar da

Estação/Museu em direção à Casa da Criança, sem pedir orientação a

ninguém; isso porque esse usuário teria um quadro mental referente

ao espaço e ao tempo de deslocamento entre essas duas edificações.

Tal mapa mental é formado pelo convívio cotidiano com e na cidade

de Londrina; portanto, guiar-se por intermédio desse quadro, ou de

outros quadros metais que tenha elaborado sobre a cidade, é o que

sempre ocorre, mesmo que não se atente para tal fato. Assim formamos

a imagem urbana.

É comum, quando ficamos algum tempo sem ir a um lugar, ou a

outra cidade, observarmos, quando novamente em contato com esses

locais, que o quadro mental que tínhamos sobre o lugar em questão não

mais corresponde ao que nos proporciona a nova visita. Nosso quadro

mental, portanto, está desatualizado e nos deu uma informação que já se

encontra no passado. Desse modo, num primeiro momento, tudo pode

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Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

parecer estranho, mas não demorará para percebermos que temos uma

lembrança sobre esses espaços. Ou seja, nossa memória e nosso quadro

mental estão sempre em contato; ambos tocam nossas sensibilidades,

principalmente quando a cidade está relacionada às nossas lembranças

e até às nossas afetividades.

Nesse sentido, é preciso pensar as imagens urbanas como uma

das formas para refletir acerca da cidade, pois esta é constituída de um

todo cujo interior apresenta uma sobreposição de imagens individuais.

imagens que são pensadas pelos planejadores de modo individual, mas

também imagens que nós, quando nos remetemos ao nosso quadro

mental, vemos individualmente. Porém, tanto quem planeja e projeta

as edificações, quanto nós, não descolamos de seu contexto as imagens

dessas construções. Em outras plavras, mesmo que sejam imagens

individuais, referem-se também ao todo da cidade e cada um de nós

elaborou mentalmente a sua Londrina. O exemplo que apresentamos

acima, a respeito de nossas lembranças sobre um determinado lugar

que muda, pode ser retomado aqui para que possamos entender essas

sobreposições de imagens que formam as “camadas” da cidade, tanto

para nós, seus usuários, como para seus planejadores e projetistas. Estes

últimos fazem registros fotográficos para que, ao ser necessário alterar

um lugar, seja possível ter informações sobre como ele era antes. Tudo

isso forma as muitas camadas urbanas ou sobreposições de imagens.

Tudo o que compõe uma espacialidade urbana procede da

leitura visual de sua paisagem, feita por seus habitantes, planejadores

– enfim, usuários –, por meio de seus olhares, percepções, definições,

interpretações, representações e intervenções.

A existência de uma cultura urbana é determinada pela imagem

construída pelos moradores da cidade por intermédio de seus sentidos,

lembranças, sentimentos e impressões, vividos diariamente nesse

ambiente. É, contudo, igualmente resultado da percepção que a imagem

urbana proporcionada ao usuário. isso quer dizer que o usuário urbano

promove a imagem urbana quando constrói e vivencia a cidade, mas

também é promovido por ela no seu contexto, no seu desenho, na sua

“textura” urbana e arquitetônica, por suas edificações e pela propria

imagem individual que elaboru a respeito dela.

Por conseguinte, vale olharmos novamente para a paisagem

Page 28: Patrimônio Histórico e Cultural. Cidade de Londrina (PR)

27

A Cidade de Londrina e a Imagem do Patrimônio Edificado...

urbana, a fim de reconhecermos que há, em seu interior, um conjunto de

objetos físicos (edifícios, residências, praças, ruas, avenidas, viadutos,

pontes, lagos, placas, sinais etc.). A representação da imagem produzida

por esses objetos pode ser do conjunto ou isolada, como já apontamos.

Essas imagens, contudo, são significativas para os usuários urbanos e

podem, dependendo de um conjunto de elementos que constroem essas

imagens, conduzir à eleição, pelos sacralizadores, de qualquer objeto

com vistas à sua patrimonialização. Lembramos que estamos tratando

de edificações, mas qualquer coisa pode ser patrimonializada dentro do

urbano, como um busto, uma luminária, uma árvore, o traçado de um

bairro, entre outros.

Um prédio, visto isoladamente, para efeitos de análise de sua

identidade, nada mais é que um objeto físico no espaço que ajuda a

compor a imagem da cidade. No entanto, a imagem que ele oferece

tem de incluir a sua relação estrutural (a do próprio prédio) ou a

espacial (o que significa aquele prédio naquele lugar) com os outros

objetos (no conjunto da rua, da praça, de todos os prédios ao redor),

com o observador/usuário. Afinal, a cidade não é vista em seus objetos

tomados isoladamente; pelo contrário, ela é vista pelo todo, é composta

pelo todo das edificações. O edifício não pode responder isoladamente

por toda espacialidade urbana, mas pode “falar” por ela, pois a integra.

É preciso que sejamos capazes de ler a cidade. Nessa leitura

está implícito que possamos ser capazes também de imaginá-la,

para que possamos fazer um diagnóstico da qualidade visual que ela

possui. Esse conhecimento está em nós e o aprimoramos à medida que

“usufruímos” do espaço urbano. É nesse uso da cidade que promovemos

o reconhecimento dela e construímos uma imagem mental de que

passamos também a usufruir quando queremos remetermo-nos a ela e

em nossos deslocamentos. A partir dessa imagem e dos elementos que

são significativos para quem dela usufrui (como os marcos, limites, vias,

bairros...), é possível realizar a análise e descrição de qualquer espaço

urbano, as quais possibilitam uma leitura sobre a cidade.

É preciso compreender essa leitura da cidade como uma

metodologia para entendermos a relação entre cidade e patrimônio

arquitetônico, e como essa relação nos ajuda a compreender a ordenação

urbana – em nosso caso, a da cidade de Londrina, pois é nesse complexo

Page 29: Patrimônio Histórico e Cultural. Cidade de Londrina (PR)

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Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

da composição do urbano que estão a Estação/Museu e a Casa da

Criança.

A imagem da Estação/Museu é, entre várias outras, um desses

elementos de construção de uma identidade para Londrina, pois nos

remete ao passado, a uma imagem construída a respeito da cidade. A

cidade moderna e metrópole regional. Remete-nos às lembranças e

rememorações desse passado de modo tal que nos sentimos ligados a

sua existência e acabamos por estabelecer uma memória afetiva para

com a cidade e com determinados lugares.

Portanto, é preciso pensar como Londrina foi sendo constituída

cotidianamente, a partir do seu próprio fazer-se, por meio de seus

moradores. Mais: como se construiu sua arquitetura, como se registrou

essa arquitetura na memória, na lembrança; como essa arquitetura se

tornou símbolo no imaginário da população e, ao mesmo tempo, nos

escritos e na imagem sobre a cidade. Aí incluímos as imagens/memórias

que os historiadores locais produzem e aquelas que são transmitidas

nas escolas de Ensino Fundamental e Médio.

A construção à qual nos referimos anteriormente promove

a eleição do que deve ser patrimonializado e, do mesmo modo, é

promovida nessa eleição simbólica a respeito de sua própria história

e de seu patrimônio arquitetônico. É preciso considerar, portanto,

quando tratamos dos bens patrimoniais de Londrina, que tratamos

também da sua natureza, em outras palavras, de como ela se construiu

como cidade – consequentemente, também de entender a importância

do patrimônio arquitetônico nesse contexto. Pois voltamos a lembrar:

Londrina é uma cidade do século XX; assim, o patrimônio urbano

do qual tratamos é entendido de modo muito diferente daquele que

considera e vê o usuário da cidade de Ouro Preto, em Minas Gerais,

por exemplo. Também difere o “olhar” dos próprios órgãos de proteção

patrimonial, como o IPHAN (Instituto do Patrimônio Histórico e

Artístico Nacional), órgão orientador e gestor das políticas patrimoniais

no Brasil, ao definir políticas, consequentemente verbas, destinadas à

proteção do patrimônio das cidades antigas e das novas, no País.

Talvez caiba perguntar: defender o patrimônio arquitetônico

é uma preocupação de toda a população londrinense? Quem são os

defensores desse patrimônio local? Essa defesa partiu da organização das

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A Cidade de Londrina e a Imagem do Patrimônio Edificado...

vivências em grupos sociais? Quais os interesses acerca da preservação do

patrimônio urbano na cidade e até onde seus cidadãos participam dessa

defesa? E ainda: em que consiste o trabalho do historiador na construção

da imagem urbana sobre a patrimonialização? Como participam dela

os professores da formação básica? Eles, em seu fazer histórico no

cotidiano da sala de aula, também são sacralizadores patrimoniais? De

que maneira? Esses são questionamentos que precisam ser feitos, pois

nos permitem pensar como a cidade de Londrina produziu uma imagem

de progresso e desenvolvimento para si e em que medida a Estação/

Museu e a Casa da Criança participaram dessa construção, de que forma

foram elevados à condição de bens patrimoniais urbanos.

Se, em linhas gerais, a cidade pode ser estável durante algum

tempo, por outro lado está sempre se modificando nos detalhes, pois

cotidianamente nos deparamos com construções em todas as direções.

Grandes e pequenas interferências, desde a construção de um novo

edifício a uma reforma de residência ou de uma rua, como é o caso

do Calçadão. Então, se por um lado a cidade é estável, por outro ela

muda dia após dia. Só um controle parcial pode ser exercido sobre seu

crescimento e sua forma. Não há resultado final, apenas uma contínua

sucessão de fases de seu crescimento/transformação (CERTEAU,

1997, p. 2).

Vemos, pois, a cidade sempre em transformação. Ela é, assim,

um espaço indomável, porém está à mercê dos homens e mulheres;

deles depende para a sua forma, seu traçado, sua existência, sua

imagem (conforme vimos), mas principalmente para a escolha de seu

patrimônio. Nesse caso, a imagem da Estação/Museu representada pela

figura do seu criador, por sua arquitetura com múltiplo uso, o de Estação

Rodoviária e Museu de Arte, por sua história de porta de entrada e saída

da cidade durante anos, demonstra por que essa edificação tem todos

os elementos necessários para compor o patrimônio urbano, histórico e

cultural de Londrina.

igualmente, o próprio arquiteto João Batista Vilanova Artigas não

deixa de ser também um dos símbolos de nosso patrimônio histórico,

pois, com sua proposta de arquitetura, trouxe para o município de

Londrina, na época, a arquitetura modernista, o que veio a mudar a

imagem da urbe “plantada” no meio da floresta, para a de cidade que

visava se modernizar.

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30

Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

Sua arquitetura passou a ser a representação da modernidade na

região norte do estado do Paraná na época em que foi construída. Foi

também uma manifestação da arquitetura modernista no Brasil. A esta

altura, acreditamos que o leitor tem as informações necessárias para

entender por que essa obra, a Estação/Museu tem valor de patrimônio

arquitetônico urbano para a cidade de Londrina; enfim, por que ela foi

patrimonializada e tombada como patrimônio arquitetônico.

Diante do exposto, passaremos a apresentar algumas imagens

dessa edificação, com o objetivo de demonstrar a diferença desse

exemplar arquitetônico em relação aos demais construídos na mesma

época. Em outras palavras, suas características modernistas.

Figura 5. fotografias: 1 – caixote maior brise-soleil, 2 – Caixote sobre colunas, 3 – parcial das abóbadas, 2009. Acervo pessoal da autora.

Nesse conjunto de fotografias vemos a parte de trás do edifício da

Estação Rodoviária, hoje Museu de Arte. Na imagem está em destaque

o caixote principal; vemos que o concreto está exposto, e há um

amplo uso do vidro e do ferro. Aparece também, do lado esquerdo, na

primeira imagem, o conjunto de brise-soleil (quebra sol – uma espécie

de proteção feita de fibrocimento), distribuído em várias faixas de

lâminas com formas curvas e horizontais. Essas lâminas possuem uma

certa mobilidade, promovida por meio do uso de manivelas planejadas

especificamente para esse modelo e para esse fim. Trata-se de algo que

correspondia ao mais apurado gosto modernista, na época, para essa

edificação, e protege a parte norte do edifício.

O uso do brise-soleil para proteção de janelas e paredes

envidraçadas tem a função de equilibrar a temperatura. Essa tecnologia

foi trazida ao Brasil pelo arquiteto Le Corbusier, que a empregou num

de seus projetos, em 1933. (Artigas, como já dissemos, era admirador

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A Cidade de Londrina e a Imagem do Patrimônio Edificado...

do mencionado arquiteto.) Mas não só por isso essa técnica foi aplicada

na antiga Estação Rodoviária. O brise-soleil era um dos elementos

da arquitetura moderna que emoldurava a fachada dos edifícios

considerados pertencentes a essa vertente arquitetônica e viria a

compor a plasticidade de vários dos imponentes prédios da arquitetura

brasileira. Entre essas edificações, estão o edifício que abrigava o

Ministério da Educação e Saúde (conhecido como Palácio Gustavo

Capanema) e o Edifício Seguradoras, ambos localizados na cidade do

Rio de Janeiro (RJ).

O exemplar dessa arquitetura mais próximo de nós e amplamente

conhecido está localizado em São Paulo (SP). Trata-se do edifício Copan,

cuja espetacular arquitetura foi considerada, durante muito tempo, a

obra máxima da produção do arquiteto Oscar Niemayer na cidade. A

forma do mencionado prédio é a de um grande “S”, e sua fachada é toda

em brise-soleil. Ainda hoje, o edifício Copan é tido como uma das mais

importantes obras da arquitetura moderna brasileira.

A parte interna da Estação/Museu apresenta um jogo de rampas

e amplos espaços em composição com as paredes envidraçadas – algo

inusitado para a Londrina de 1952.

Figura 6. fotografias: 1- rampa de acesso ao 1º andar; 2 – coluna pastilhada interligando as rampas; 3 – série de colunas cujo pé direito interliga os três andares; 4 – rampa de acesso ao 3º andar e paredes com uso de vidro e ferro. 2009, do acervo da autora.

O jogo de rampas é amplamente aplicado nas obras projetadas

por Artigas. Elas se encontram no edifício da FAU/USP, em São Paulo;

na Estação Rodoviária de Jaú (SP); na Casa da Criança, em Londrina;

no edifício Louveira, em São Paulo; no edifício Autolon, em Londrina;

no Anhembi Tênis Clube, em São Paulo, e em praticamente todas as

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32

Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

residências e outras edificações projetadas por Artigas. As rampas

não eram necessárias naquele período (pois não se pensava ainda nas

necessidades especiais dos cadeirantes, por exemplo), mas suas criações

já apresentavam esse melhoramento, embora não se fizesse alusão a

essas estruturas nesse aspecto (o de benfeitoria).

Figura 7. fotografais: 1- visão da sala de exposição e térreo do 1º andar; 2 – visão de sala de exposição e ultimo andar com a proteção do quebra sol; 3 – vista do caixote principal e escadaria que da acesso ao estacionamento; 4- área coberta por abóbadas e antigamente denominado de gare (estacionamento de ônibus); 5 – pátio frontal do edifício; 6 e 7 – corredor com rampa de acesso a biblioteca; interior da biblioteca no subsolo. Acervo da autora, 2009.

É significativo o lugar que a Estação/Museu ocupa na paisagem

londrinense, uma vez que os estudos realizados a respeito da vida e da

obra de Vilanova Artigas apontam seus trabalhos como inovadores na

cidade de Londrina. Essa informação é citada por muitos arquitetos

brasileiros e estrangeiros que estudam a obra de Artigas, além de ter

sido confirmada por uma informação que o próprio deixou.

Trata-se de uma das fotografias que documentam a construção

da Estação/Museu, cujo foco na imagem, apresenta a última sequência

de abóbadas com dois pilotis que a acompanham até finalizar em terra.

Por sobre esta imagem Artigas escreveu: avisar Vasconcelos que não

caiu”. Esta anotação referia-se à retirada das estacas e em deixar apenas

as duas colunas como suporte ao final da sequência das abóbadas. Assim

permaneceu até a década de 1970. Vasconcelos era o engenheiro chefe

da obra em construção. Essa mensagem, registrada na fotografia, indica

a preocupação da equipe a respeito do que estava sendo construído. A

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33

A Cidade de Londrina e a Imagem do Patrimônio Edificado...

condição de laboratório que a cidade de Londrina teve para as obras de

Artigas não pode, portanto, ser descartada.

Contudo, é sabido que, durante a aplicação de projetos, também

podem acontecer imprecisões ou situações nas quais é preciso repensar

ideias, bem como determinar ajustes não planejados, materiais e

técnicas. É preciso considerar, também, que não há, no projeto, certeza

absoluta de precisão, antes que ele seja executado, por mais que

tenhamos, no senso comum, desenvolvido a confiança de que há.

Esse mesmo tema rendeu outros enfrentamentos ao longo da

história do prédio da Estação/Museu. Anos mais tarde um engenheiro

iria pôr duas estacas para dar suporte àquelas duas colunas (mencionadas

por Artigas na mensagem a Vasconcelos) que pareciam suspensas no

ar. As mesmas pilastras que foram projetas por Artigas para servir de

âncora para as abóbadas que não caíram ao tirar as estacas. A imagem a

seguir mostrará o acréscimo sofrido, o que lhe rendeu outra plasticidade.

Figura 8. Fotografia do acervo da autora, 2009

As referidas colunas, que tinham o objetivo de evitar que a

sequência de cascatas ruísse, tinham formas redondas em oposição

às elípticas, portanto, diferentes daquelas que suportaram a Estação/

Museu desde a inauguração, em 1952.

Em sua última visita a Londrina, em 1983, Artigas se referiu à

mencionada interferência na obra. Segundo ele, sua obra, depois de

concluída, se tornara autônoma e se misturara com o povo, se esfregando

nele, adquirindo vida própria. Assim não caberia ao autor opinar sobre

a vida independente da obra.

Pelo fato de as últimas colunas ficarem aparen-temente distantes do final da última cascata, e alegando rachaduras na obra, a Secretaria de Obras do Município propôs, na década de 1970, a adição de duas colunas, inseridas pelo engenheiro José Augusto Queiroz.

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34

Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

Entretanto, em 2003, de acordo com entrevista concedida pelo

engenheiro Queiroz a Juliana Suzuki, Artigas teria ficado enfurecido,

mas nada manifestou a respeito para a imprensa. Comportou-se com

elegância e não expôs sua raiva, que poderia ter sido pública, mas não

o foi, pois não há registros. O que encontramos, em uma entrevista ao

jornal Folha de Londrina (a que nos iremos referir, daqui em diante,

como a Folha), diz respeito à autonomia da obra, não a seu desagrado

com as intervenções.

É interessante notar que nem mesmo o processo de tombamento

menciona as tais colunas. E, ao realizar a patrimonialização, a

Coordenadoria de Patrimônio Cultural da Secretaria de Estado da

Cultura, agiu de forma a que o acréscimo não se tornasse um empecilho

ao tombamento da obra de modo que segue o registro de tombamento.

ESTAÇÃO RODOViÁRiA DE LONDRiNA – PRAÇA ROCHA POMBOANTiGA ESTAÇÃO RODOViÁRiAInscrição Tombo: 52 – II L ivro Tombo HistóricoProcesso Número 53/74Data da Inscrição: 08 de dezembro de 1.974Localização: Município de LONDRiNA Praça Rocha PomboProprietário: Prefeitura Municipal de Londrinahttp://www.patrimoniocultural.pr.gov.br/modules/conteudo/conteudo.php?conteudo=128

Em arquitetura, como em qualquer outra autoria, um acréscimo

é uma violação praticada na obra. Trata-se de uma discussão que não

enfocaremos, embora, muitas vezes, ela esteja no centro do debate

sobre a patrimonialização, pois a questão é tombar ou não tombar,

quando há uma interferência na obra. Para responder a essa questão tão

relevante, passaremos agora a tratar da segunda obra de João Batista

Vilanova Artigas: a Casa da Criança. E procuraremos mostrar por que a

Estação/Museu já foi tombada e a Casa da Criança ainda não. Podemos

adiantar que, no cerne do não tombamento, está a adição de um andar

à obra, o que, conseqüentemente, a impediu de tornar-se patrimônio

arquitetônico da cidade.

Em 2010, uma reportagem da Folha, publicada em 01 de

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35

A Cidade de Londrina e a Imagem do Patrimônio Edificado...

agosto e intitulada Patrimônio recuperado. Reforma vai devolver as

características (quase) originais à antiga Casa da Criança, planejada

por Vilanova Artigas, chamou nossa atenção, pois abordava a proposta

de restauro/reforma da referida edificação. De acordo com a matéria

jornalística, o secretário de Cultura do município de Londrina, Leonardo

Ramos, vinha a público anunciar o que denominou de restauro do

referido edifício. Esse restauro/reforma traz para o centro do problema

levantado neste texto a questão da adição à obra. A intervenção que se

faria na Casa da Criança tinha como um dos principais objetivos retirar

um andar que havia sido acrescido logo após a sua inauguração, em

1952.

Na entrevista concedida à Folha, o secretário de Cultura teria

dito que a proposta era a de recuperar a ideia original da obra e remover

dela tudo aquilo que havia sido acrescido durante sua a existência

até aquele momento. Segundo o texto, o edifício em questão tinha se

transformado em um “Frankenstein”; havia sido criada para ser uma

creche, mas acabou por se tornar uma biblioteca e, depois, sede da

Secretaria Municipal de Cultura. De acordo com a citada reportagem:

“a proposta é recuperar a ideia original, fazendo as pazes, mesmo que

postumamente, com Artigas. ‘Vamos mudar o revestimento de pastilhas

e retirar os anexos construídos ao longo dos anos. Perdemos o segundo

andar, o solarium volta a ser solarium, e os jardins ficarão integrados’ ’’.

Chamamos a atenção para esse restauro/reforma, pois traz

para nosso debate a questão da relevância da obra, de sua história e

do reconhecimento feito por seu autor acerca dela, no momento da

inauguração. O restauro/reforma, no entanto, aponta sobretudo para

a negação da obra pelo autor, após a inserção das adições, que se

avolumaram e tornaram a obra sem identidade. A patrimonialização e

seu tombamento exigiam que ela apresentasse algo de inédito, para que

se pude argumentar em favor de seu mérito, de um diferencial que viesse

a justificar a patrimonialização. Com a perda de identidade, não haveria

mais a originalidade da obra como argumento para seu tombamento.

A perda da identidade da edificação por sua vez, levou-a a

igualar-se a todas as edificações de seu período e cuja identidade não

justificava o tombamento, desse modo, a Casa da Criança tornou-se

apenas mais uma edificação na cidade, sua perda de identidade levou

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36

Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

consigo sua história, sua memória e a integrou às demais edificações

urbanas de valor menor e que não justificam o tombamento, a não ser

que se tombasse toda a cidade, pois todas suas edificações são históricas

e oriunda de uma vivência recente data de 1930 em diante. Porém, esse

não é um argumento relevante para a patrimonialização de um bem,

como já vimos até aqui.

Diante dessa situação, a Secretaria de Cultura do Município,

por meio da Diretoria de Patrimônio, solicitou que se pensasse nessa

edificação como obra de arte de um arquiteto de renome na arquitetura

(ou seja, como obra de arte de João Batista Vilanova Artigas) e

propusesse a “recuperação” do prédio em questão, a fim de que fosse

possível solicitar à Coordenadoria de Patrimônio Cultural da Secretaria

de Estado da Cultura sua patrimonialização. Esse processo teve início,

segundo a Folha, com o restauro/reforma.

Podemos concluir, desse modo, que, se a adição das colunas na

Estação/Museu não alterou sua autoria ou sua história (ou seja, não

impediu seu tombamento), o mesmo não se pode dizer a respeito da

Casa da Criança, que exatamente pela existência de acréscimos não

pode ser patrimonializada.

O edifício da Casa da Criança, como bem disse o secretário de

Cultura, tem em si uma série de adições, feitas ao longo de sua existência.

Trata-se de um fato. No entanto, cabe dizer que esses acréscimos

foram incorporados em razão de seu uso, embora prejudiquem sua

originalidade. Mas, então, caberia retirar os acréscimos e fazer o edifício

retornar à sua imagem original, dela apagando toda a história da obra?

Essa questão é uma das principais no centro do debate para os

restauradores; portanto, por mais que queiramos não tratar da questão

da reforma (ou restauro) no momento (como o leitor pode notar), torna-

se impossível evitá-la, diante da existência e da importância das citadas

adições. Não poderemos ignorar que foi feito um acréscimo, seja ele a

retirada do solarium (que se transformaria em sala), ou um andar

inteiro acrescido.

Solarium é uma varanda por sobre a casa, destinada a banhos de sol. Na arquitetura antiga, era denominada “terraço”.

Page 38: Patrimônio Histórico e Cultural. Cidade de Londrina (PR)

37

A Cidade de Londrina e a Imagem do Patrimônio Edificado...

Seguimos apresentando ao leitor duas imagens, uma do início do

processo de reforma/restauro e a outra do andamento.

Na sequência, reproduzimos a segunda imagem, que mostra a

reforma/restauro em processo avançado em relação à imagem da figura 9.

Figura 10. Fotografia panorâmica da edificação em restauro/reforma: edifício Casa da Criança, hoje Secretaria da Cultura.

A ideia defendida pela Secretaria de Cultura é a de que demolição

dos agregados devolverá ao edifício sua feição primeira e a aparência

projetada por Artigas o que possibilitará a solicitação do processo de

patrimonialização. Essa obra sofreu outra interferência significativa:

Figura 9. Fotografia panorâmica do alto: edifício Casa da Criança, hoje Secretaria da Cultura.

É uma imagem panorâmica, mas pode-se observar que houve a retirada da cobertura do solarium. Além disso, há uma demolição em curso do segundo andar da parte frontal.

Page 39: Patrimônio Histórico e Cultural. Cidade de Londrina (PR)

38

Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

a inserção de um painel de azulejos, exposto na fachada principal do

edifício e cujo tema é a força e a pujança do trabalho dos pioneiros locais

(Figura 4 – fotografia 3). O mencionado painel retrata fragmentos da

paisagem que se constituiu entre 1930 (década que marca o início da

cidade) e 1960, quando foi instalado no edifício da Prefeitura Municipal.

Um dos referenciais urbanos da cidade, o edifício que hoje abriga

a Secretaria da Cultura compõe uma parte da Praça da Concha, como

é conhecida a Praça Primeiro de Maio e seu entorno, espacialidade que

orienta todo usuário no centro da cidade.

O prédio em questão constitui também um dos marcos urbanos

da cidade de Londrina, mas há outros de igual relevância e que servem

de orientação para o usuário apressado, cuja preocupação é reduzir

trajetos ao longo do dia e, assim, facilitar sua rotina diária. A relação

dos usuários com a urbe é a de identidade, estabelecida ao longo d e sua

vivência na cidade.

Londrina, uma entre as muitas cidades novas brasileiras, trava

sua “batalha” contra a corrosão do tempo. Qual o melhor caminho:

deixar que suas edificações, seus monumentos, a despeito de sua pouca

idade, sucumbam ao desgaste, ou restabelecer-lhes a imagem idealizada

pelo projeto original? Enfrentar a relação com o tempo ou retornar

ao “novo”, por meio do restauro/reforma? Ou ainda: se restaurar/

reformar, como fazê-lo?

Essas questões aqui levantadas põem em evidência um lugar de

práticas sociais e culturais em Londrina acerca de que história, memória

e patrimônio são desejadas para a cidade, ou sinalizam para sua opção.

Apresenta-se, pois, outro dos eixos condutores da patrimonialização:

para quê e para quem?

O edifício da Casa da Criança está localizado numa das

extremidades da Praça Primeiro de Maio, para onde se voltam os

olhos dos moradores e usuários do Centro, quando veem o prédio da

Secretaria da Cultura cercado por tapumes e seu teto sendo “destruído”.

Muitos que por ali circulam não sabem que prédio é aquele e quem o

projetou. Desconhecem que é uma obra de Artigas e que sua história se

mistura com a da cidade de Londrina, pois “nasceu” no decurso do fazer

da urbe em suas primeiras décadas.

No entanto, muitos conheceram a Casa da Criança e a

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39

A Cidade de Londrina e a Imagem do Patrimônio Edificado...

frequentaram, pois ali funcionava um posto de atendimento médico

destinado a crianças.Outros têm suas lembranças vinculadas ao edifício

quando ele abrigava a antiga Biblioteca Municipal, onde provavelmente

passaram horas de sua vida escolar em pesquisas, encontros com colegas

e mesmo estudos e visitação com professores. Mais recente e presente

é sua identificação com a Secretaria da Cultura; afinal, Londrina é

conhecida no País por seus festivais de teatro e de música, durante os

quais a cidade é “povoada” por visitantes.

Nessas ocasiões, a circulação de pessoas nas proximidades do

prédio em questão aumenta significativamente, e o morador do Centro

está sempre disposto a dizer ao visitante onde está localizada a Secretaria

da Cultura. Logo, causa estranhamento a demolição visível da rua e das

cercanias dos edifícios vizinhos, do segundo andar do prédio e o retorno

à sua imagem inicial, que data dos anos 1950.

Acreditamos que fornecemos informações e questões pertinentes

para que o leitor perceba o porquê da necessidade de reforma/restauro.

Ela se faz mister para que possa ser solicitada a patrimonialização do

edifício que abrigou a Casa da Criança. Por outro lado, é necessário

perguntar: cabe deixar a arquitetura contemporânea sob tutela? Esse

problema diz respeito a todas as cidades com arquitetura recente e que

se deparam com mudanças constantes e impiedosas.

A alteração da paisagem citadina, decorrente das muitas

demolições/construções, ou então de restauros/reformas, tem sua

plasticidade centrada na tentativa de preservar e na necessidade de

implantar novas tendências arquitetônicas, o que não deixa de ser

o cotidiano das espacialidades urbanas. Por outro lado, onde fica

o reconhecimento do valor histórico? Afinal, em termos gerais, as

construções têm temporalidades correspondentes às da própria cidade;

elas também são alteradas, como vimos no exemplo da Casa da Criança.

Se o “envelhecimento’ da obra não é permitido, se suas adições são

retiradas para que ela possa ser patrimonializada, se sua história, até

aquele momento, não foi preservada, estamos realmente preocupados

com a história de nossas cidades, com seus patrimônios? Por outro

lado, também importa indagar: os acréscimos feitos na Casa da Criança

não fazem parte de sua história, não merecem ser incorporadas a essa

história, como memória identitária da obra? Tudo é valido quando

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40

Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

propomos a patrimonialização de obras históricas como a Casa da

Criança? Até mesmo apagar da lembrança dos usuários urbanos como

o mencionado prédio foi um dia, em nome da sua identidade original?

E a identidade construída pelo uso, pela história local, não conta? Não

é história?

É possível que você, leitor, se pergunte agora: qual a posição dessa

historiadora, que parece não saber se defende ou não a obra original,

se apoia ou não a patrimonialização da obra de Vilanova Artigas?

Pois bem, eis minha posição acerca dos estudos urbanos, entre eles a

patrimonialização das edificações históricas: temos, antes de qualquer

atitude, informar a comunidade, ou melhor, o usuário urbano, por

meio de todos os veículos possíveis. Saber, consultando-o, se esse

usuário deseja ou não a patrimonilização; se quer ou não a reforma,

pois é a ele que diz respeito a transformação da paisagem urbana. A

ele pertencem as lembranças, a memória, e só por ele existe história.

Portanto, as medidas de transformação urbana – , mesmo que medidas

mais nobres, como a patrimonialização de um bem como uma obra de

João Batista Vilanova Artigas – precisam levar em conta quem faz a

cidade e quem dela faz uso.

Nossos argumentos são formulados exatamente com base no fato

de que as obras de Vilanova Artigas vieram a ocupar esse lugar simbólico,

no que diz respeito à criação desses espaços/lugares sacralizados em

Londrina. E já não é sem tempo que o usuário urbano dessa cidade

venha a saber quem é João Batista Vilanova Artigas.

A cidade de Londrina, em sua oficialidade, entra na corrida pela

salvaguarda de seu passado recente, visto que pertence ao grupo de

várias outras que compõem as cidades novas no Brasil e que reivindicam

aos órgãos públicos atenção para com seus patrimônios. Contudo, tudo

isso só terá sentido, se o uso dos edifícios e bens patrimonializados for

posto em prática, assim como se deu com a Casa da Criança, que sediou

a Biblioteca e, depois, a Secretaria da Cultura. Essa tendência de uso

de um bem, ainda que tenha passado por restauro/reforma, é parte do

processo e também e história. Mesmo quando ocorre a restauração de

uma edificação, ela só tem sentido se houver o uso da obra restaurada.

Seguindo essa linha de raciocínio, podemos dizer que a cidade é um

lugar de polifonia urbana: nela se justapõem diferentes temporalidades

Page 42: Patrimônio Histórico e Cultural. Cidade de Londrina (PR)

41

A Cidade de Londrina e a Imagem do Patrimônio Edificado...

em um mesmo lugar. As duas obras de Artigas aqui abordadas

apresentam essas características, pois em ambas se sobrepõem

camadas temporais históricas, seja em suas paredes, compartimentos

e corredores, seja em outros de seus espaços. De suas janelas, emanam

muitas lembranças, que retumbam na própria espacialidade onde estão

localizadas e, certamente, na textura da própria cidade.

Passado e presente se encontram nas citadas obras, exatamente

porque são edificações reabilitadas e em processo; também porque

possibilitam esse intercâmbio de lembranças e memórias de diferentes

usuários no interior da cidade; porque possibilitam pormos em discussão

a cidade e seu patrimônio – no caso em questão, seu patrimônio

arquitetônico (DOSSE, 2004, p. 88).

Para que essa dinâmica seja compreensível, no caso de Londrina,

faz-se necessário pontuar os caminhos pelos quais as obras arquitetônicas

que passaram a ocupar os lugares de patrimônio enfocados neste texto

reivindicaram tal condição. Também é preciso determinar quem foram

os responsáveis por essas reivindicações.

Pois bem: a sacralização tem início no momento em que a autoria

da obra é vinculada à do arquiteto (nesse caso, à do arquiteto Vilanova

Artigas).

As cidades novas, como aponta Yves Bruand (1981), reivindicam

o direito de ter seu patrimônio preservado. Em 2008, foi organizado

um evento, em Londrina, denominado Encontro Cidades Novas –

A Construção de Políticas Patrimoniais, durante o qual se afirmou

que essas cidades são merecedoras de análise no que diz respeito à

possibilidade de patrimonialização de seus bens. Na organização desse

mesmo evento estiveram envolvidos os seguintes sacralizadores: a

Diretoria de Patrimônio da Secretaria de Cultura Municipal, o Centro

de Documentação e Pesquisa Histórica da Universidade Estadual de

Londrina, o Museu Histórico de Londrina Padre Carlos Weiss e Unifil.

Na ocasião, estiveram presentes inúmeras representações de cidades do

Paraná, com o forte compromisso de reivindicar a patrimonialização

dos bens que constituem a paisagem das cidades novas desse estado,

sua arquitetura inclusive. Essa é uma reivindicação que vem tomando

corpo, mas está longe de atingir seus objetivos. Como vimos, com todas

as controvérsias que envolvem a reforma/restauro da Casa da Criança,

Page 43: Patrimônio Histórico e Cultural. Cidade de Londrina (PR)

42

Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

a tentativa de solicitar sua patrimonialização faz parte de um processo

que já se iniciou e que promete muitos debates, polêmicas, disputas e

contestações.

Page 44: Patrimônio Histórico e Cultural. Cidade de Londrina (PR)

43

Casas de Madeira em Londrina

Antonio Carlos Zani

O objetivo deste texto é apresentar um pequeno histórico das

construções das casas de madeira em Londrina entre os anos 40 e

60. Foi exatamente neste período que se deu o boom deste tipo de

construção. Pretende-se demonstrar a existência de uma cultura

arquitetônica local, única, por meio dos ornamentos (frontões e

varandas), tipos de madeiras usadas, técnica de carpintaria entre

outras modalidades. Houve um recorte nesta temática em função do

espaço disponível.1

O homem inicialmente se adapta ao meio para depois dominá-

lo. A abundância de diversos tipos de madeira favoreceu a criação

de variadas madeireiras na região, o que barateou o custo da peça

da madeira e gerou muitos empregos. Assim, não se pode furtar de

apresentar o importante papel deste setor da produção. igualmente

não se pode deixar de citar o papel do imigrante japonês na aplicação

da técnica construtiva nativa, seus ornamentos etc., bem como sua

adaptação às ferramentas e madeiras disponíveis.

Com o decorrer do tempo as casas de madeira de Londrina

têm sido demolidas para atender a demanda por moradia, ou seja,

a construção de prédios de andares. A expansão imobiliária para o

1 Para maiores informações sobre as casas de madeira, ver outras obras do autor cita-das nas referências bibliográficas.

Page 45: Patrimônio Histórico e Cultural. Cidade de Londrina (PR)

44

Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

Marco Zero, região ainda possuidora de numerosas casas de madeira,

leva-nos a pensar em uma nova onda demolitória. Outro fator da

demolição desenfreada desse tipo de moradia é o alto valor da peroba

rosa, principal madeira usada em tempos idos. Assim, dentro em breve,

este importante componente de nossa história local será passado. Um

patrimônio cultural que irá desaparecer.

Casa de madeira

Os primeiros habitantes da região de Londrina encontraram uma

imensa floresta cobrindo toda sua extensão. Para habitá-la era necessário

desmatar para poder cultivar, seja para seu sustento imediato, seja para

obter uma renda que pudesse pagar pela terra e demais demandas

da vida (vestimenta, saúde, querosene para iluminação etc.). Assim,

aliaram-se duas atividades com um objetivo: construir moradias e abrir

espaço para o plantio com a derrubada da mata.

As primeiras moradias foram edificações precárias com o objetivo

de atender a questão da moradia, pois não havia uma preocupação

imediata com a qualidade da mesma e sua durabilidade. Além do

que, havia um desconto de 50% sobre o valor do terreno para quem

construísse, fato que estimulou ainda mais sua ocupação.

Corte de peroba rosa executado a machado na década de 30. Foto: José Juliani, Museu Histórico de Londrina/UEL

Desdobramento de madeira com a serra portuguesa. Foto: Theodor Preising, Museu Histórico de Londrina/UEL

Page 46: Patrimônio Histórico e Cultural. Cidade de Londrina (PR)

45

Casas de Madeira em Londrina

O primeiro lote urbano da cidade de Londrina foi adquirido pelo

sr. Alberto Koch, em 28 de novembro de 1930, da Companhia de Terras

Norte do Paraná (CTNP) e ficava localizado onde hoje seria a esquina

da av. Duque de Caxias com Celso Garcia Cid. Sua primeira casa foi

construída com paredes de palmito e cobertas de tabuinhas de cedro,

substituindo-a, posteriormente, por uma edificação de madeira maciça

serrada.

Assim como Alberto Koch, os primeiros habitantes e

comerciantes construíram suas casas e lojas com tais materiais. Narciso

Rodrigues, um carpinteiro pioneiro de Londrina, que chegou ao ano

de 1932, comprou um lote e também construiu sua própria casa: “Meu

primeiro rancho em 1932 era de palmito coberto com tabuinhas: cortei

os palmitos, fiz caibros e vigas e amarrei-os com cipó. O telhado fiz em

tabuinhas tiradas de um cedro que existia onde é a delegacia”. Tanto o

palmito, como o cedro abundavam na região. Note-se que o material era

amarrado com outro material da região, o cipó, pois era difícil o acesso

ao prego.

Muitos dos migrantes e imigrantes (japoneses, poloneses,

alemães entre outros) que vieram para o Paraná tinham a profissão de

carpinteiro e possuíam técnicas específicas de construção em madeira.

Estas sofreram mudanças em função da disponibilidade do material e

das madeiras existentes. Assim, uma técnica local foi surgindo.

A ocorrência de muita peroba rosa, uma árvore grande e com

madeira de boa qualidade, favoreceu o seu uso sistemático na construção

das casas definitivas a partir, em especial, dos anos 40. Juntamente

Rancho da Família Baum - década de 30. Parede de palmito e telhado de tabuinhas de cedro. Autor desconhecido. Acervo Museu Histórico de Londrina/UEL.

Casa de Sr. Alberto Koch, década de 30. Fotografia José Juliani. Acervo Museu Histórico de Londrina/UEL.

Page 47: Patrimônio Histórico e Cultural. Cidade de Londrina (PR)

46

Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

com a abundância desta árvore típica, o surgimento de serrarias de

grande porte e a vinda de carpinteiros para a região barateou o preço

da madeira, favorecendo ainda mais sua expansão com o tempo. Como

relata Zortéa: “A primeira casa de madeira de tábuas e mata-junta,

serrada manualmente por dois portugueses, com a serra chamada

portuguesa, foi construída pelo Sr. David Dequech […], na qual utilizou-

se da peroba rosa, que foi retirada do próprio local.” Mais uma vez vemos

que a construção era no local ou próxima de onde se retirava a madeira.

Das muitas casas de madeira lavradas (aplainadas) à machado

feitas nas zonas rural e urbana, poucas restam. Na cidade de Londrina,

nenhuma; na roça, ainda persistem algumas.

A tabela abaixo nos ajuda a perceber como houve a predominância

da construção em madeira entre os anos de 1940 e 1959. Se pensarmos em

dados para a década de 30, o número de casas de madeira predominaria

ainda mais. Os dados nos apontam que houve um crescimento de casas

de alvenaria entre 1940 e 1959, mas as construções de casas em madeira

permaneceu como predominante.

Tabela 1. Construção de casas aprovadas pela Prefeitura Municipal de

Londrina.

Ano Madeira Alvenaria Mista

1940 189 56 --

1941 210 80 --

1942 135 48 --

1943 28 35 --

1944 95 91 --

1945 258 135 5

1946 304 101 10

1947 318 82 5

1948 400 130 14

1949 305 141 30

Total 2242 899 64

Page 48: Patrimônio Histórico e Cultural. Cidade de Londrina (PR)

47

Casas de Madeira em Londrina

Ano Madeira Alvenaria Mista

1950 402 131 35

1951 648 246 49

1952 723 232 38

1953 734 278 41

1954 667 218 12

1955 481 268 12

1956 431 247 7

1957 467 312 13

1958 561 302 19

1959 425 314 70

Total 5539 2466 298

Tipologias e ornamentos

O inventário realizado revela que as casas de madeira construídas

nas décadas de 40, 50 e 60 produziu um repertório arquitetônico

com uma tipologia singular, ou seja, através das variações dos tipos

volumétricos, proporcionado pelas diversas formas geométricas dos

telhados, das varandas e dos detalhes figurativos. Pode se perceber,

portanto, a possibilidade da existência de inúmeras formas construtivas,

que dá uma dimensão das edificações como frutos de uma cultura local e

regional. Não se pode pensar a cidade de Londrina do passado como um

conjunto de casas de madeira em formato padrão, muito pelo contrário.

É isto que pretende mostrar a seguir.

Uma das riquezas das casas de madeira de Londrina é o

ornamento dos frontões e dos emolduramentos das varandas. Era por

meio destes que os carpinteiros mostravam suas habilidades manuais

e criativas. Certamente, em razão disto, deveria haver uma saudável

competição entre eles, favorecendo ainda mais a realização de um

trabalho mais cuidadoso e esmerado. Tudo isto valorizando ainda mais

a beleza plástica da habilitação, dando-lhe um aspecto peculiar, uma

marca própria. As ilustrações abaixo apresenta uma diminuta amostra

dos frontões que podíamos (e podemos ainda) encontrar nas residências

de madeira da cidade de Londrina.

Page 49: Patrimônio Histórico e Cultural. Cidade de Londrina (PR)

48

Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

Os ornamentos dos frontões e varandas podem possuir um caráter

de utilidade, como elemento construtivo (pingadeiras, testeiras, grades

da varanda entre outras) ou não, isto é, poderiam possuir apenas função

decorativa, tais como o rendilhado nos frontões e o emolduramento das

varandas.

Nas ilustrações abaixo uma variedade de grades das varandas

das casas, dando um ar de distinção e valorizando o ambiente.

Page 50: Patrimônio Histórico e Cultural. Cidade de Londrina (PR)

49

Casas de Madeira em Londrina

Nas construções das casas

de madeiras eram necessárias

as estruturas complementares

formadas por vedações verticais

e horizontais e o enquadramento

dos vãos. Uma das mais usadas

nas casas construídas na região

era a vedação vertical: tábua e

mata-junta. Este sistema era

composto por tábuas de 22 x

2,2 cm colocadas na vertical, pregadas perpendicularmente no quadro

inferior e superior, tendo juntas entre elas de 1 cm, que posteriormente

eram cobertas no lado interno e externo com réguas de 6 x 1,2 cm

chamadas de mata-juntas.

Outra característica das

casas de madeira é o uso do

xadrez ou ripado nas paredes

e tetos. Trata-se de um painel

composto por ripas de 5 X 1,5

cm (nas paredes) ou 10 por 1,5

cm (teto) pregadas umas sobre

as outras no sentido diagonal ou

ortogonal. Esse sistema ajuda a

manter a privacidade (parede) e

a circulação do ar (parede e teto, em especial na cozinha e áreas de

serviço).

Page 51: Patrimônio Histórico e Cultural. Cidade de Londrina (PR)

50

Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

Outro tipo de forro, que dá uma particularidade às edificações,

principalmente quando do uso de formas geométricas, é o tipo macho

e fêmea. Este é formado por painéis horizontais de madeiras medindo

10 por 1,2 cm, com o encaixa que leva seu nome: macho e fêmea. São

pregadas no sentido diagonal ou ortogonal sob tarugamento de caibros

no quadro superior. Abaixo temos uns modelos ilustrativos.

Vejamos agora os pisos mais utilizados. O piso misto (lastro de

tijolo comum sobre tábuas cruas) é composto de tábuas de 22 X 2,2 cm

sobre barrotes e cobertas por lastro de tijolo maciço, com revestimento

de argamassa tendo como acabamento cimento alisado, às vezes

pigmentado com óxido de ferro, também conhecido como “vermelhão”.

Esta solução era adotada para evitar umidade na cozinha, banheiro e

área de serviço sobre porão (ver ilustração abaixo à esquerda).

O piso assoalho, outra forma usada, era composto de tábuas de

10 X 2,2 cm com encaixe tipo macho e fêmea, as quais eram pregadas

em barrotes de madeira com espaçamento de 50 cm, sendo utilizado

nos quartos, salas e varandas, ou seja, área de pouco acesso à água,

umidade (ver ilustração acima à direita)

Page 52: Patrimônio Histórico e Cultural. Cidade de Londrina (PR)

51

Casas de Madeira em Londrina

Por fim, encerrando esta ligeira descrição construtiva das casas

de madeira vejamos como eram os telhados. As construções em madeira

estudadas, utilizaram-se da mesma técnica e sistema construtivos, ou

seja, o mesmo material e os mesmos procedimentos. A única diferença

está na composição estrutural dos telhados que variam de acordo com o

uso ou a origem do carpinteiro e do proprietário. Tanto as casas urbanas

como as rurais, utilizaram-se das tesouras romanas, com exceção das

casas produzidas pelos carpinteiros alemães em Rolândia, que se

utilizaram das tesouras atirantadas para usarem o espaço da cobertura

para o sótão, as capelas na sua maioria, utilizaram-se de pórticos

atirantados. Uma das características marcantes, nas casas em madeira,

é a diversidade de soluções formais dos telhados adotados pelos

carpinteiros. Estes surgem com as mais diversas soluções volumétricas

que se originaram do quadro inferior da casa.

Pelos levantamentos efetuados durante demolições de várias

composições de telhados, constatamos que apesar de apresentarem

uma diversidade de soluções formais, eles obedecem a uma

única regra construtiva, isto é, adotam a mesma solução

estrutural e o mesmo processo de montagem.

A solução estrutural adotada pelos carpinteiros é formada a

partir de tesouras romanas e sobre estas, a trama de terças, caibros e

ripas.

A tesoura adotada tem as mesmas características das tesouras de

Paládio ou romanas, que chegaram até o Brasil através dos portugueses.

Por este motivo, também são chamadas de “portuguesas”.

Os cinco tipos mais utilizados foram: Telhado de quatro águas;

Telhado de duas águas; Telhado de duas águas desencontradas; Telhado

de seis águas; Telhado de oito águas.

Page 53: Patrimônio Histórico e Cultural. Cidade de Londrina (PR)

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Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

As serrarias

Não pode pensar em expansão da habitação em madeira sem

a presença de serrarias. O estado do Paraná tem história sobre este

setor produtivo uma vez que foi um grande fornecedor de madeiras

(extrativismo da madeira nativa) desde meados do século XIX até a

década de 80 do século passado.

No período aqui estudado nos anos 40 e 50, constam a existência

na cidade de Londrina pelo menos três grandes serrarias e 10 de médio

porte, que serravam cerca de 50 mil metros cúbicos ano. As três de

grande porte seriam: Siam, Mortari e Curotto..

A serraria SiAM (Seleção industrial de Artefatos de Madeira),

foi instalada em 1937 pelos seus diretores Henry e Otto Blumenschein,

que trouxeram parte de seu equipamento de Santo André (SP). Foi a

primeira indústria da região de laminados para compensados, e em

sua volta formou-se uma pequena vila formada por seus operários,

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53

Casas de Madeira em Londrina

chamada de Vila Siam. Além dos laminados que era exportado, produzia

tacos, assoalhos, forros e esquadrias, que eram vendidos nos grandes

centros. Somente na década de 1950 é que começou a produzir peças

padronizadas para construções de madeira na região. Sua produção

anual girava em torno de 12 mil m3 (LUESDORF, 1987)

A serraria Mortari, de Amadeu Mortari, foi fundada no ano de sua

chegada em Londrina, 1936, vindo de Matão (SP). Nesta cidade fabricava

carroças e trabalhava de marceneiro, ofício que aprendera com o pai, que

por sua vez o praticara em seu país de origem, a itália. Trouxe consigo,

além da família, todo o maquinário da serraria e seus funcionários

especializados. inicialmente trabalhava com a comercialização da

madeira serrada padronizada para construção da região. Adquiria a

maior parte da madeira dos proprietários dos lotes rurais, que tinham

que destruir a mata para a formação da lavoura. Retirava toda a madeira

de lei de boa qualidade e dava em troca a madeira serrada necessária

para o proprietário de o lote construir sua casa e a estrutura de serviços,

como a tulha e o paiol. Além de ser o responsável pela produção de uma

grande quantidade de peças padronizadas para construções das casas de

madeira da região, a serraria Mortari produzia janelas, portas, batentes,

assoalhos e forros para comercialização com grandes centros, e também

exportava madeiras em pranchões. O cedro, a peroba e o pinho eram

exportados com mais frequência (SILVA, 1986).

As serrarias Mortari e SiAM exportavam grandes quantidades

de vigas 8 x 16 cm de peroba rosa para a Inglaterra, que a utilizava na

construção naval, principalmente durante a segunda guerra mundial

(1939-45), além de grande quantidade de cedro e pinho para móveis e

esquadrias (SILVA, 1986).

Serraria SIAM 1937. Acervo Museu Histórico de Londrina/UEL

Serraria Mortari 1941. Acervo Museu Histórico de Londrina/UEL

Page 55: Patrimônio Histórico e Cultural. Cidade de Londrina (PR)

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Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

A serraria Curotto iniciou suas atividades de beneficiamento de

madeira em 1945, com a Adolfo Curotto, que chegou em Londrina vindo

de São Paulo em 1937, para comercializar toras, ou seja, comprava as

toras na mata, extraía e mandava de trem em gôndolas para São Paulo.

Seu maior cliente era a serraria Americana do sr, Salim Maluf (ZANi,

1987).

Em 1945, o sr. Adolfo Curotto e os filhos instalaram a serraria

e construíram um conjunto de casas e um escritório na antiga estrada

dos pinoneiros, hoje Avenida Celso Garcia Cid, esquina com estrada dos

japoneses, hoje Avenida Paul Harris. Ali funcionava a serraria e moradia

do sr. Adolfo e dos filhos que ajudavam na atividade da serraria. As

madeiras mais serradas pela Curotto foram peroba rosa e o cedro que

adquiriam em pé na mata, ou após as queimadas para a formação das

lavouras. A retirada e o transporte eram por conta da serraria. O cedro

e a peroba de boa qualidade eram comercializadas em São Paulo, a

maior parte para a serraria Americana. Em São Paulo os Curottos eram

conhecidos como o “rei do cedro”, por venderem grande quantidade

de cedro de boa qualidade, que era extraído na lua certa, ou seja, lua

nova.2 A peroba rosa também era exportada para a inglaterra e França,

e parte destinada para consumo da região em peças padronizadas para

construções de madeira, normalmente vendidos em lotes fechados. Os

pedidos eram os mais variados: 20 casas para colonos, 3 tulhas e uma

capela para as fazendas ou 1 casa, uma tulha e um paiol, ou ainda 5 casas

6x6m para casas de aluguel, e assim por diante. Consta que do final da

década de 30 até o final de 50 atuaram na cidade cerca de 13 serrarias

com produção média anual de 40 a 50 mil metros cúbicos de toras de

madeira (ZANI, 2003).

Abaixo uma lista das peças padronizadas produzidas pelas serrarias

de Londrina que podemos encontrar ainda nas casas de madeira:

• Vigas - 6 x 12 ou 6 x 16 cm

• Caibros - 6 x 5 ou 6 x 7 cm

• Tábuas - 2,2 x 22 cm

• ½ Tábuas - 2,2 x 11 ou 2,2 x 16 cm

2 Existe uma crença entre os madereiros lenhadores e agricultores que a madeira deva ser retirada na “lua certa”, para não “apodrecer”, não ser atacada pelo “cupim” e não “torcer”, ou seja, quando ela descansa na “lua nova”

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Casas de Madeira em Londrina

• Ripas - 1,5 x 5 cm

• Mata-junta - 1,2 x 6 cm

• Assoalho - 2,0 x 10 cm

• Forro - 1,2 x 10 cm

• Esteio - 10 x 10 cm

A presença da imigração japonesa

Os carpinteiros imigrantes tiveram uma atuação importante

neste ramo na região de Londrina. Os alemães se destacaram na cidade

de Rolândia, os japoneses em Cambé, Londrina, Uraí e Assaí. Vamos

nos ater somente à Londrina, portanto, discutiremos a presença e a

participação dos carpinteiros japoneses e seus descendentes a partir de

agora.

Os mestres carpinteiros japoneses (Daiku) deixaram sua marca

em Londrina, em especial nas décadas de 30 a 60. Adaptando seu ofício

à realidade e à cultura arquitetônica regional de construir em madeira,

mantiveram alguns aspectos que ajudam a perceber suas marcas nas

construções, em especial nas casas, tais detalhes veremos mais adiante.

As sambladuras (encaixes de madeira em madeira) foram

utilizadas por carpinteiros de diversas nacionalidades, com destaque

para os carpinteiros japoneses que as utilizavam sem o uso do prego

de metal, em seu lugar utilizavam cavilhas de madeira. As sambladuras

foi usada em todas as casas de madeira construídas, em especial nas

montagens dos telhados.

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Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

As casas edificadas pelos

mestres carpinteiros nipônicos

possuíam traços que lhe davam

uma identidade. Na zona urbana de

Londrina puderam lançar mão de uma

criatividade única sem romper com as

tradições, mantendo particularidades

no espaçamento interno e espaço

da habitação. Um exemplo desta

característica estão contidas na planta

ao lado. A habitação é composta por

quatro zonas básicas: estar, repouso,

serviços e higiene do corpo. A primeira

composta pela varanda e sala; a segunda pelos quartos; a terceira, pela

cozinha, área de serviço e despensa; por fim, a última, é composta pelo

banheiro e pelo espaço destinado ao ofuro (banheira japonesa).

Com o decorrer do tempo, em especial a partir da década de 40,

a técnica e o sistema construtivo dos mestres carpinteiros japoneses

se aproximaram muito das técnicas usadas pelos carpinteiros locais.

Entretanto, construções são marcadas pelo simbolismo no uso do espaço

físico e na ornamentação das varandas, telhados e frontão. Esta última

dava as casas japonesas um aspecto peculiar, própria da comunidade

nipônica em Londrina.

Page 58: Patrimônio Histórico e Cultural. Cidade de Londrina (PR)

57

Casas de Madeira em Londrina

As qualidades plásticas das casas japonesas estão centradas nas

riquezas de seus elementos, enriquecendo a volumetria com a colocação

do telhado irimoya (treliça de madeira no frontão), guenkan (varanda)

e ornamentos como onigawara e o ranma. Todos estes elementos

conferem uma identidade nipônica à estas construções, diversa das

demais casas de madeira da região.

Da Terra da Promissão ao fim do Eldorado

O repertório arquitetônico dos edifícios em madeira do norte

do Paraná, construído por carpinteiros de 1930 a 1970, apresenta uma

série de elementos arquitetônicos que lhe conferem caráter próprio de

um vocabulário regional. Dentre eles destacamos: a volumetria dos

telhados; a textura do material madeira aplicado na vertical conjunto

tábua mata-junta; os ornamentos; varandas; cor e o apoio dos edifícios

sobre porão.

A ocorrência deste tipo de arquitetura coincide com as

representações históricas da região, ou seja, inicia-se em 1930 com a

“Terra da promissão”, passa pelo “Eldorado” de meados da década de

1940 até final da década de 1960 e termina com o fim do “Eldorado” a

partir da década de 1970.

Comparamos o repertório arquitetônico de Londrina com os

três períodos históricos da região, analisando-o do ponto de vista

das qualidades plásticas, através da cronologia da ocorrência desta

arquitetura no período acima citado, verificamos que, à medida que

mudou o período histórico mudou também o vocabulário arquitetônico,

ou seja, encontramos três momentos distintos no repertório da

arquitetura das casas em madeira: o primeiro correspondente a da

“Terra da promissão” inicia-se no final de 1929 e vai até meados da

década de 1940. É caracterizado por uma volumetria pura, composta

por telhados de quatro de duas águas, sem ornamentos nem cor,

deixando claro seu caráter provisório pela despreocupação estética. O

segundo, que corresponde ao “Eldorado”, marca o ápice da arquitetura

em madeira na região tanto pela quantidade como ela qualidade, é

caracterizado pela complexidade volumétrica, riqueza de ornamentos,

textura e cores, deixando claro seu caráter permanente e preocupação

no plano da estética e da qualidade construtiva.

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Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

O terceiro momento correspondente ao “Fim do Eldorado”

e inicia-se a partir de 1970. É caracterizado pela simplificação

volumétrica, ausência dos porões, varandas e ornamentos,

incorporação de novos elementos como telhado de fibrocimento

com pouca declividade e esquadrias metálicas.

A partir destas comparações do repertório arquitetônico com

as representações históricas da região, apresentadas no trabalho de

José Miguel Arias Neto (ARIAS NETO, 1993), podemos afirmar que a

ocorrência da arquitetura em madeira na região refletiu através do seu

vocabulário arquitetônico as duas representações histórica da região o da

“Terra da Promissão” e do “Eldorado”. Com o fim do “Eldorado” diminui

a ocorrência dessa arquitetura e seu repertório é marcado pela decadência

estética e construtiva, sinalizando o fim de uma cultura arquitetônica de

se construir em madeira com qualidade plástica e rigor construtivo.

Patrimônio Arquitetônico a ser preservado

As casas de madeira mostraram uma resposta coerente ao meio

físico no qual foram implantadas e deram suporte ao desenvolvimento da

cidade. Apesar do grau de espontaneidade com que foram construídas,

conseguiram resolver durante décadas o problema da moradia, sempre

com estética e exatidão construtiva.

Dos exemplares inventariados, muitos já foram demolidos

e outros permanecem intactos compondo o patrimônio cultural

arquitetônico da cidade. Estas casas testemunham o passado e ajudam a

contar a história de Londrina e região. Mas aos poucos com as constantes

demolições, perdem-se peças importantíssimas da memória urbana e

rural. Caso não hajam mecanismos legais de controle pela preservação

desta arquitetura ela estará fadada a desaparecimento.

É necessário proteger legalmente a arquitetura de madeira

da especulação imobiliária, através de leis municipais e estaduais de

preservação, as quais devem sempre que possível estar relacionadas

com o planejamento urbano e territorial. Carecemos da criação de zonas

especiais de proteção no plano diretor a fim de garantir um tratamento

diferenciado a esta arquitetura.

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59

Cemitério São Pedro:

espaço de vida, espaço de memória1

Alberto Gawryszewski

Não é feio o nosso jazigo; podia ser um pouco mais simples, — a inscrição e uma cruz, — mas o que está é bem feito. Achei-o novo demais, isso sim. Rita fá-lo lavar todos os meses, e isto impede que envelheça. Ora, eu creio que um velho túmulo dá melhor impressão do ofício, se tem as negruras do tempo, que tudo consome. O contrário parece sempre da véspera. Memorial de Aires, Machado de Assis.

Machado de Assis publicou no ano de 1908, ano de sua morte,

Memorial de Aires. A cena acima se passa no dia 10 de janeiro de

1888. Para Aires, principal personagem de seu romance, um diplomata

aposentado, as negruras do tempo nos jazigos os enobrecem. Rita,

entretanto, mantém o jazigo da família sempre limpo, dando uma

aparência de novo. O cemitério São Pedro, no centro de Londrina,

inaugurado em 1935, tem passado por reformas em função das

ameaças da autarquia municipal, que controla os cemitérios municipais

(ACESF), de se apropriar e vender os túmulos que aparentarem

abandono. Assim, somando este aspecto ao cuidado de muitas famílias

por seus entes falecidos, o cemitério São Pedro possui um aspecto

bom de conservação. Quando se coloca esta ideia, está se pensando na

1 Este texto faz parte da pesquisa “imagens e narrativas em cemitérios paranaenses: estudos de casos (séculos XIX e XX)”, ora desenvolvida no pós-doutoramento junto ao Departamento de História da UFF, sob supervisão da Profa. Dra. Ana Mauad.

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Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

manutenção dos antigos jazigos no seu estado primitivo, de construção de época. Muitas imagens apresentadas no decorrer deste trabalho nos dará uma demonstração do estado desses jazigos. Uma outra boa parte sofreu a ação do homem no sentido de sua “modernização”, isto é, sua ampliação para comportar um número maior de corpos, a utilização de novos materiais e a substituição de antigas imagens, estatuária e epitáfios. Talvez Aires considerasse o cemitério São Pedro sem as negruras do tempo, mas uma observação mais atenta poderia encontrar tais negruras em muitos jazigos e, em outros, muitas histórias de outros tempos, muitas memórias de um tempo passado. Um espaço privilegiado para a guarda do patrimônio histórico/cultural/religioso da cidade de Londrina.

O cemitério como espaço de memória, de visitação turística já é uma realidade em cidades importantes do mundo (Paris, Buenos Aires entre outras). Os cemitérios alcançaram status de museu a céu aberto. As sepulturas de pessoas outrora importantes ou famosas, a estatuária presente e mausoléus imponentes projetados e construídos por grandes mestres em seu ofício tornaram estas visitas um grande ato de apreciar a arte e lembrar aquele que marcou a vida de muitos.

No Brasil, vários cemitérios têm sido protegidos pela legislação do tombamento, em especial nacional, como no caso do cemitério de Belém, estado do Pará. Localizado em área nobre da cidade, encontra-se em estado de decadência muito grande, de abandono. Lá está enterrada a famosa negra Anastácia, além de outros nomes lendários da região. Outro caso é o de Joinville (cemitério protestante), no estado de Santa Catarina, que possui um rico acervo de peças em ferro fundido e que igualmente ficara muitos anos abandonado. Por fim, mais um caso seria o cemitério típico japonês da cidade paulista de Álvares Penteado, que funcionou de 1918 a 1943, tombado pelo Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico do estado de São Paulo (Condephat).

Muitas pesquisas acadêmicas discutem o cemitério como importante componente na história. Ora, não poderia ser diferente uma vez que a morte se faz presente em todo o tempo. As formas de se lidar com ela, as dores sentidas, as formas de morrer, velar e enterrar, bem como o local dentro dos muros da igreja ou dos cemitérios, variaram com tempo, possuem história própria. Entretanto, a maioria dos estudos realizados até então se voltaram para a estatuária, os impotentes

mausoléus, aos signos existentes nos sepulcros.

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Cemitério São Pedro: espaço de vida, espaço de memória

Neste trabalho, voltamo-nos para vários aspectos do cemitério

São Pedro: o uso da fotografia e dos epitáfios nas sepulturas, a estatuária,

ornamentos e outros signos.

Se existe a cidade dos vivos, existirá uma cidade dos mortos?

Apesar do muro que separa o cemitério das ruas abertas da cidade, não

seria este muro ilusório? É possível pensar os vivos sem os mortos, a

cidade dos vivos sem a cidade dos mortos? Pensando também nestas

perguntas e em suas respostas que este texto foi pensado. O cemitério

pode ser imaginado como local pedagógico, de memória. A escrita tem

seu tempo, o uso de metáforas e eufemismo nos epitáfios ajudam no

ensino da língua portuguesa, mas também a compreender a visão de

vida e morte para os que ficaram; o uso da fotografia cemiterial ajuda

a compreender a sua própria história (técnica entre outras), a entender

a vestimenta, costumes, valorização da família, do trabalho, forma de

representação etc. O próprio uso do cemitério no ensino das religiões

é fundamental. Provavelmente é um dos espaços mais democráticos

que existem, pois é lá que encontraremos a junção de diversas religiões

(cristã, hindu, muçulmana, judaica, budista entre outras) e mesmo a

ausência de religião (jazigo laico) cada qual expressando seus valores

sobre a vida e a morte.

Este texto está dividido em três tópicos2. No primeiro trataremos

de discutir os epitáfios. O uso de metáforas e eufemismos que ajudam a

enfrentar a morte, ou melhor, manter a vida. Nos epitáfios não apenas

encontramos nomes e datas, mas expressões poéticas, formas de

valorização do falecido, sua forma de viver, suas qualidades morais e

profissionais entre outras. Não cabe interpretar verdades pessoais ou

coletivas, mas perceber a representação desejada pela família, amigo

etc. No segundo tópico, vamos tratar do uso da fotografia cemiterial

como forma de memória do falecido. Este será subdividido em três

partes: casais, “personalidades” e retratos pintados. O terceiro tópico

é sobre os túmulos, ornamentos e estatuária. Outras opções de análise

cemiterial existem, mas o espaço destinado a este texto nos obriga a

escolhas. As apresentadas neste texto são as mais visíveis ao passante,

ao visitante que se dispõe a um passeio no cemitério São Pedro.

2 Em razão do espaço disponível foi subtraído o tópico “A presença japonesa”.

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62

Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

Epitáfios: formas escrita de expressar valores

Propomo-nos nesta parte do texto apresentar alguns epitáfios,

mostrando as informações em si contidas como importantes para a

história e o patrimônio da cultura londrinense.

A palavra epitáfio vem do grego epi (sobre) e taphos (tumba),

ou seja, escrito que se coloca sobre a sepultura. Enfim, são frases, curtas

ou longas, na forma simples ou poética, supostamente produzida pelo

próprio morto, por representante da família (pai, mãe entre outros)

ou amigo(s). São expressões léxicas que exprimem sentimentos

que ajudam a atenuar o fato da morte e traz ao passante (o familiar

ou visitante do cemitério) uma mensagem/memória sobre o falecido.

Sua base é o eufemismo, ou seja, é uma figura de estilo que procura

esconder ideias desagradáveis, que tem um significado diverso. No caso

específico, a existência ou a ocorrência da morte. A metáfora aparece

como a mais importante forma de eufemismo nos epitáfios. Esta deve

ser entendida como uma forma de perceber a realidade, pensar e agir

sob um olhar conceitual diferenciado, mais familiar, mais concreto.

Se a morte é uma realidade, pois como diz o ditado popular

“a única coisa certa na vida é a morte”, todos querem dela distância.

Os epitáfios, com suas metáforas eufemísticas, são um importante

componente nesta relação. A palavra cemitério quer dizer dormitório,

ou seja, um lugar em que o finado está em repouso. Então lá se jaz,

descansa ou dorme. A palavra finado, também ajuda a compor este

quadro, pois significa que uma pessoa teve fim, morreu. Outra palavra

que nos remete à morte é faleceu, que vem do latim fallere, ou seja,

faltar.

Os epitáfios podem associar a morte a um fato positivo ou

negativo, sendo o primeiro caso o mais comum. Como já vimos acima,

a morte pode ser vista como um repouso. Em um dos mais antigos

localizados no cemitério São Pedro apenas diz: “Aqui jaz Harue Gotto.

Fal – 20-11-1934. Saudades dos seus.” O corpo está deitado, sepultado,

descansando. Mas o ato imóvel causa a saudade em quem “ficou de pé”,

que continua “em ação”.

Então não morreram, apenas descansam. Depois de muito

trabalhar, de doar, de rezar, ao defunto é dada a oportunidade de

Page 64: Patrimônio Histórico e Cultural. Cidade de Londrina (PR)

63

Cemitério São Pedro: espaço de vida, espaço de memória

descansar. “Descansa na paz do Senhor”, como na ilustração 1, em que

fica patente um repouso espiritual. Ou descansa enquanto “aguarda

a ressurreição”, como diz a religião do morto e/ou sua família na

ilustração 2. Esta trata bem da questão, pois o casal, falecido em anos

diferentes, aguarda a ressurreição dos justos e injustos. Aguardam o

julgamento final.

Se o defunto descansa, como vimos,

também pode partir, deixa o mundo terreno

e segue para uma “viagem”. Neste caso,

encontra-se em movimento, pois subiu aos

céus, partiu e foi se encontrar com Deus. Isto

quando Deus não vem buscá-lo. É a ideia

maior, o sonho desejado por todo cristão de

alcançar o reino de Deus. A morte se transforma em uma expressão

hiperbólica, é a vida pós-morte, é a morte da própria morte. Na

ilustração 3, o falecido “partiu sorrindo às regiões celestiais [...]”.

Os epitáfios funcionam como um instrumento para atenuar a

morte, é a luta da vida contra a morte, a presença do ausente. Assim,

a memória, a saudade, as lições e o

amor vencem a morte. Na ilustração

4 mais uma vez é apresentado alguém

que partiu. Mas, muito bem lembra

que ele não morreu: “A palavra

morrer não faz sentido naquele que

viveu como cristão. Viveu e viverá

eternamente na noiva, nos pais,

nos irmãos e parentes que o tem no

coração.”

Ilustração 1 Ilustração 2

Ilustração 3

Ilustração 4

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Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

O ato de não esquecer é mútuo, tanto do

falecido (que não esquecerá quem amou na terra),

quanto os amigos e parentes. Vejamos o exemplo

da ilustração 5. São dois momentos, com duas

frases. Uma da família em que diz que “Jesus

veio à porta de nosso lar e chamou para sua

divina companhia nosso inesquecível”. E outro, a

mensagem do morto, uma frase comum: “Eu vou

para Deus, mas não esquecerei aqueles que amei

na terra.” O ato de não esquecer é uma vitória contra a morte. Comum

a frase em epitáfios com o sentido de que “quem vive na memória não

morre”.

A ilustração 6 traz uma frase muito interessante, pois, deixa em

branco as razões da permanência do morto. Não apenas levou, não

apenas deixou, simplesmente marcou e permaneceu. A ilustração 7 vai

no mesmo sentido.

Em relação à vitória, mais uma vez deslocando o sentido da morte,

temos o contraponto mundo real e mundo espiritual. Enquanto que este

é o reino de Deus, o fim da caminhada, a recompensa pelo exemplo, pela

luta, o outro é muito sofrimento e angústia. As ilustrações abaixo muito

bem mostram isto. De um lado vida, alegria, paz e esplendor; de outro

iniquidades.

ilustração 5

Ilustração 6 ilustração 7

ilustração 8 ilustração 9

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Cemitério São Pedro: espaço de vida, espaço de memória

Nesse mesmo sentido, podemos lembrar a separação carne/

espírito. Na ilustração 10 pode-se ler que sob a lage fria está o corpo do

falecido, “mas seu espírito, liberto dos lhames [sic] da matéria, continua

animando aqueles que gozaram do seu convívio, em um mundo de

provações” (mais uma vez o contraponto da felicidade espiritual e a

tristeza terrena). A ilustração 11 segue a mesma lógica: ficou a carne, o

envólucro carnal.

A morte pode ser contestada e ficar registrada na lápide, no

epitáfio. Mas ao lado da contestação há também a consolação. Neste

espaço, a metáfora pode ser muito usada, tal qual o eufemismo. Duas

expressões são muito usadas ao se referir à criança ou ao jovem: anjo e

flor. Nas ilustrações abaixo (12 e 13) podemos ver dois exemplos.

Ilustração 10

Ilustração 11

Ilustração 12

Ilustração 13

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66

Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

Dina tinha 4 anos quando faleceu. Ela foi “arrancada tão

bruscamente”, mas os seus estão consolados pois sabem que ela foi

“mais uma rosa colhida para o jardim do Criador”. Em outro caso, Deus

deu, mas também tirou. Mas a devolução, apesar de dolorosa, deixando

o coração dilacerado, foi feita com o mesmo amor da chegada.

Entre outros tantos motivos e eufemismos, veremos mais dois

exemplos: um com a mensagem do próprio morto; outro o falecido

como exemplo a ser seguido com seus valores morais. No primeiro

caso, ao dar vida ao finado, a morte perde espaço mais uma vez. Rafael

(o finado) não partiu, apenas voltou de onde veio. Disse ele: “Foi bom

ser materializado, mas Deus me chamou, valeu!” Em outra mensagem

encontramos: “Passei pela vida muito rapidamente somente para

trazer a grande mensagem de alegria e beleza que foi a minha curta

existência terrena. Deixo com você todo o carinho daquele sorriso o que

só eu sabia dar e volto contente para a casa do Pai. Porque terminei a

minha tarefa”. Teoricamente Maria, que viveu 56 anos, teria escrito tal

mensagem. Por seu conteúdo, tal frase foi elaborada por membros da

família. O importante é que ela teria cumprido seu papel na Terra para

poder voltar para a casa do Pai.

Por fim, outro exemplo interessante de mensagem do falecido é o

de Arquimedes que deixa claro os valores importantes para um homem

em sua existência terrena. Quais seriam eles? Resposta: respeito pelo

trabalho realizado; a amizade de uma verdadeira legião de amigos; o

amor da esposa e companheira e, por fim, os filhos.

Ilustração 14

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67

Cemitério São Pedro: espaço de vida, espaço de memória

Se pensarmos na questão do falecido como modelo, a própria

Maria serviria, pois, só trouxe alegria. O mesmo poderia ser dito de

Arquimedes, porque foi bom marido, pai, trabalhador e amigo sincero.

Mas citemos outro exemplo, o de Deolinda, falecida aos 92 anos, com

uma frase simples e sincera: “Aqui descansa uma grande mulher”.

Dentro dos padrões morais e comportamentais da época entende-se

que ela era uma mulher honesta, boa mãe, avó, vizinha, companheira,

trabalhadora (no lar e/ou fora dele).

Uma conclusão a que se pode chegar sobre os epitáfios é que

estes buscam atenuar a morte sob a forma de eufemismos. As frases dos

epitáfios fazem parte da formação cultural e mental de uma época que,

somados à religiosa, dão um caráter menos pesado ao fato da existência

da morte, tabu em quase todos os meios. A palavra morte, como nos

exemplos aqui apresentados, é pouco usual nos epitáfios. Mais comum

o “JAZ”, “DORME”, “DESCANSA”, “PARTE”, “VAi COM DEUS”, entre

outras expressões de esperança e leveza.

Os epitáfios nos dão, ao longo do tempo, informações culturais e

religiosas importantes frente ao conceito de morte e de sua superação.

Formas de expressar e vivenciar sentimentos.

Fotografia

A escolha da fotografia a ser colocada na sepultura não é gratuita.

Ela traz afetividade que comove. No entanto, não é só uma forma de

amenizar a dor, mas também manter a memória do falecido viva para

os próximos e distantes. A escolha pode ser feita por este ainda em vida

ou por algum parente ou amigo sobrevivente.

A fotografia constitui importante ferramenta nas mãos dos

historiadores, uma vez que está impregnada de valores e ideias sobre

aparência, padrões de beleza, saúde, valorização do ofício entre outros.

A fotografia possui uma marca cultural, a do seu tempo. A própria

fotografia cemiterial tem sua história. Seu formato, seu suporte, a

técnica usada etc. estão sofrendo mudanças no decorrer do tempo.

Por que o uso da fotografia em sepulturas? Com certeza busca-se

a construção de uma perenidade pelo uso de uma imagem. Ao passante

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Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

do cemitério fica mais fácil lembrar-se de um conhecido falecido

por meio de uma fotografia do que de um nome na lápide. Ela ajuda

a emocionar, a dar maior sentimento ao fato da morte. A mensagem

contida no epitáfio pode ser diferentemente entendida ou ter seu

conteúdo reforçado pelo uso da fotografia.

Vamos dividir esta parte em subtópicos para facilitar o

desenvolvimento das ideias. Trataremos do amor dos casais, das

“personalidades” e dos retratos pintados.

Casais

A presença de fotos de casais é comum nas sepulturas. O uso de

epitáfios na forma de um livro aberto possibilita o uso de cada “página”

para um membro do casal. Outra forma é o uso de foto-pintura ou foto-

montagem, em que os membros, mesmo tendo morrido em épocas

diferentes, ficam juntos no post-mortem. Neste caso, é um parente que

se encarrega de colocar a nova foto, independente do suporte.

Esse tipo de uso de fotografia

busca mostrar a união do casal. As

consequências sobre o passante podem

ser variadas. Apresentaremos um

pouco disto a seguir. A ilustração 15

choca e traz tristeza: um casal jovem morreu no mesmo dia. Talvez

um acidente de automóvel. A visitação ao cemitério nos apresenta

este tipo de informação: a morte de muitos jovens por arma de fogo e

acidente automobilístico. Um traço recente da vida moderna.

O epitáfio que está na sepultura, utilizando-se da metáfora, ajuda

a atenuar a tristeza, pois eram como “gotas de orvalho nas manhãs de

sol”, tiveram vida efêmera. Por fim, a resignação: “assim seja”: “Antônio

e Aparecida. Vocês vieram, vocês foram embora. Assim como as gotas

de orvalho nas manhãs de sol. Nós gostaríamos que vocês ficassem

para sempre, mais [sic] isto não pode ser. Que assim seja. Saudade da

família”.

Um exemplo do uso de “livro aberto” é do casal Nagafuti. Embora

encontremos outros semelhantes, a escolha recaiu sobre este em função

Ilustração 15

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69

Cemitério São Pedro: espaço de vida, espaço de memória

das diversas possibilidades de análise e por mostrar a “aculturação”

dos japoneses no Brasil. Ele se encontra jovem, faleceu em 1943. Ela,

uma idosa, faleceu 29 anos depois, em 1977. Aqui as fotografias estão

separadas, optou-se em colocar uma em cada página. Talvez já fosse

uma realidade o uso dos “livros em mármore” em 1943. O falecido

espera por sua companheira de viagem. Poderia ser a esposa, um filho,

irmão ou outro parente qualquer.

Outro exemplo de casal é dos também japonêses Kayamori.

Com uma das maiores diferenças entre as mortes que encontramos

no cemitério São Pedro (41 anos), a fotografia chama a atenção para a

diferença visual entre ambos. Ele muito jovem faleceu com 45 anos, e

ela bem idosa com 84 anos. Percebe-se que neste último caso houve a

opção de juntar os dois, formando uma só fotografia.

Quando retratamos um casal, estamos nos referindo à família,

um dos pilares da sociedade. E se pensarmos no início da colonização

de Londrina e região, a família passa a ter um caráter mais importante

ainda, pois a união da família, então bem numerosa, foi fator de

crescimento econômico não só da região como da própria família. Além

do que ao verificarmos, em ambos os casos acima, foi a matriarca quem

se manteve viva. Passou a ser responsável pela família, por sua união.

Foram décadas de viuvice. Uma opção de solidão matrimonial, de

lealdade à memória do morto.

Outro caso de longevidade de viuvez, agora acrescida de uma

fotografia que traz um marco na família, – uma passagem importante

na vida de ambos –, fotografia retirada do álbum de família, é a do

casal Bessa. Aqui, no caso, ela faleceu primeiro em 1968 com 53

anos. Ele depois, em 1987, com 72 anos. Foram 19 anos na viuvez. A

Ilustração 16Ilustração 17

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70

Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

fotografia escolhida para o casal foi

a do casamento. Ambos bem jovens,

elegantes e formalmente vestidos para

a ocasião e compenetrados na pose. O

local talvez seja o estúdio fotográfico

ou o interior da sacristia. Na mão o

buquê de flores, que será jogado para

as outras moças casadouras.

Caso semelhante ao anterior, no que se refere à escolha da

fotografia, é do casal Mendes. Ele faleceu primeiro, com 77 anos, ela

depois com 82 anos. A fotografia escolhida também foge ao padrão. Mais

uma retirada do álbum de família: jovens posando para a máquina com

olhares vivos. Bem vestidos, ela de saia, ele de paletó e gravata. Ela bem

penteada, com brincos e de batom, ele com seu bigodinho charmoso

de então e com o cabelo com brilhantina. Para reforçar este encontro

de amor e felicidade, a sepultura contém um poema. Na realidade,

trata-se de um trecho da letra da música “Eu gostava tanto de você”, de

Tim Maia. Com a retirada de algumas estrofes, concluindo com a frase

própria: “Porque o amor não conhece a barreira da morte”. A escolha

busca retratar a saudade e a vida de ambos, e demonstrar, mais uma

vez, que a morte não venceu.

Outro caso inovador, que se soma a todos os apresentados, é do

casal Busnardo. Em uma sepultura que destaca a lápide onde está escrito

o nome do casal e que suporta a fotografia, nada passa desapercebido.

Ilustração 18

Ilustração 19

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Cemitério São Pedro: espaço de vida, espaço de memória

Vestidos para o casamento, com o buquê nas mãos, jovens, posam para

a fotografia de um importante acontecimento, o dia mais importante na

vida deles. Ela faleceu ainda jovem, com 54 anos, ele bem idoso com 98

anos. Foram 37 anos de viuvez. Mais dois detalhes foram colocados na

fotografia original. Ao lado de cada um, na altura das cabeças, um círculo

contendo a fotografia em idade mais avançada. Ela provavelmente com

seus 50 anos, próxima da morte e ele, bem idoso, talvez com 80 anos.

Estas representações do casamento, de felicidade, fidelidade,

mesmo com a separação da morte, traz exatamente a ideia dos epitáfios

vistos anteriormente, pois a morte não vence o amor. A mensagem

sepulcral é de alegria, esperança e não de tristeza.

“Personalidades”

Outra temática em relação às fotografias cemiteriais refere-se às

personalidades que habitam o cemitério São Pedro. São os chamados

“pioneiros”. Estes, segundo a Associação Pró-Memória, foram aqueles

que chegaram ao Norte do Paraná até 1939, com pelo menos 15 anos

de idade. As “personalidades” também são algumas pessoas que

possuem nome de rua, empresários reconhecidos, personagens que

realizaram atos destacados em vida, e os chamados “intercessores” ou

“milagreiros”.

Comecemos pelos “intercessores”, ou seja, aqueles que possuem

o poder de interceder perante a Deus pelo pedinte. Em geral, quase todos

Ilustração 20

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Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

os cemitérios possuem tal personagem. São

crianças, jovens que morreram defendendo

sua honra, ex-escravos, entre outros

personagens. O principal intercessor, uma

das sepulturas mais visitadas, é o jovem José

Oswaldo Schietti, morto por atropelamento

em 1950, aos 9 anos de idade, em frente à

Catedral Metropolitana após fazer a primeira

comunhão, conforme depoimentos colhidos

no local. Até a reforma recente de seu túmulo, era conhecido como o

“túmulo que chora”. Hoje não há mais “lágrimas” no lugar, mas muitas

pessoas visitam diariamente o túmulo do menino intercessor. No dia de

finados, 2 de novembro, seu túmulo fica repleto de flores, velas acesas

e são colocadas imagens (fotografias) de crianças, em especial, e de

adultos, que dizem ter alcançado a graça pedida.

Outra importante intercessora, que já fora mais conhecida, é a

jovem Lecy Suzana Garcia, falecida em 1962, com 22 anos de idade.

Em seu túmulo, tal qual o do menino, podemos encontrar ex-votos.

Estes seriam manifestações de devotos por meio de fotografias e outras

formas de agradecimento, ou seja, que tiveram seus pedidos (saúde,

amor, riqueza etc.) atendidos. A parada do passante, visitante do

cemitério para uma oração, mostra ainda sua vitalidade no imaginário

popular londrinense. O caso da jovem Lecy ficou famoso nacionalmente,

inclusive com grande repercussão na imprensa3. A revista O Cruzeiro,

a mais importante e popular do Brasil da época, publicou uma

reportagem intitulada “A Bela Adormecida do Paraná”, em março de

1960, quando já haviam passados três anos que Lecy estava em sono

profundo. Sua tragédia começa aos 17 anos, em 1957, quando aparecem

os primeiros sintomas da doença (dormência e perda dos sentidos). Até

então era muito alegre e bonita, estava noiva e feliz com a vida. Nenhum

médico, nacional ou estrangeiro, nenhum religioso ou paranormal

conseguiu reverter a situação de Lecy. A dedicação dos pais, por cinco

anos, emocionou ainda mais a cidade de Londrina. Seu sepultamento

Ilustração 21

3 Ver link http://www.memoriaviva.com.br/ocruzeiro/26031960/260360_2.htm.

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73

Cemitério São Pedro: espaço de vida, espaço de memória

deve ter mobilizado toda a cidade. Em sua sepultura a alcunha (Bela

Adormecida) e uma fotografia de uma bela jovem em traje especial.

Um terceiro personagem que chama a atenção no dia de finados

é do primeiro falecido sepultado no cemitério. Não há nome, nem

data. Apenas um epitáfio tão apagado que foi necessário fazer outro,

intitulado “Justa Homenagem”, no qual está escrito: “Morto estendido

no chão, com seus braços abertos em forma de cruz. Jaz neste humilde

túmulo o número 1 deste cemitério. Os que passarem por aqui rezem

por sua alma.” Não bastava ser o primeiro sepultado, também morreu

estendido na rua, talvez só, abandonado pela família, um errante, mas

o principal, seu corpo inerte formava uma cruz, um sinal sagrado, que a

todos chamou a atenção. Junto ao túmulo, muitas velas, flores e placas

de agradecimento. Mais um intercessor.

Saindo dos “milagreiros”, voltemo-nos para a categoria

“pioneiros”. Estes são homenageados de diversas formas na cidade

de Londrina, dentro de um conceito estipulado e aceito pela história

oficial. Estão nos museus da cidade, nos nomes das ruas e praças e

monumentos específicos etc. São sempre referenciados e lembrados.

Mas, para alguns, a marca de uma vida dedicada à história da cidade

também se faz necessária dentro dos muros do cemitério. Vejamos três

exemplos, dentre outros semelhantes.

O primeiro, a família Romagnollo. Em sua capela-sepultura

há um altar onde se pode ver o porta-retratos dos irmãos Guerino e

Eventuil e duas miniplacas de rua, portando cada uma o nome de cada

Ilustração 22

Ilustração 23 Ilustração 24

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Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

irmão. Lembra ao passante curioso que ali há não só um pioneiro,

mas um homenageado que deu seu nome à via pública (Ilustração 25).

Outro caso seria a de Assumpta Bonini Campanhã. Sua família colocou

em seu túmulo, uma placa em porcelana que reproduz o diploma

recebido pela falecida, ofertado pelos poderes municipais por ocasião

do cinquentenário da emancipação de Londrina, em 1984. Neste

está escrito: “O Município de Londrina, estado do Paraná, outorga a

Assumpta Bonini Campanhã o título de Pioneiro de Londrina, nos termos

da Lei n. 3.738 de 9 de novembro de 1984, ao ensejo das comemorações

do Cinquentenário de Emancipação Política do Município. Ao pioneiro,

o tributo de gratidão dos Poderes Públicos e do povo de Londrina.”

A imagem da placa traz a mensagem do progresso pelo qual a cidade

passou. Em uma ampulheta, símbolo do tempo e da história, a cidade

das casas de madeira, com destaque para a velha catedral, na parte

superior, simbolizando o passado, e a cidade de hoje, com seus edifícios

altos em concreto e, mais uma vez, a catedral ao centro, agora mais

majestosa, simbolizando a modernidade (Ilustração 27).

Por fim, em uma sepultura reformada, vemos um “pergaminho”

com palavras respeitosas ao pioneiro Alberto Loureiro (Ilustração 26).

Este, junto com o inglês Craig Smith, o agrimensor russo Alexandre

Razgulaeff e outros peões, participou da primeira caravana da

Companhia de Terras do Norte do Paraná, fincando o primeiro marco da

cidade (hoje conhecido como Marco Zero) no dia 21 de agosto de 1929.

Em sua placa os dizeres: “Aqui repousa ALBERTO LOUREiRO pioneiro

londrinense da primeira caravana de desbravadores, que deixa um

legado de honradez, austeridade, justiça e generosidade. Homenagem

de seus filhos e netos”. Em sua fotografia, a presença de uma figura

madura, tranquila. Ao fundo a casa de madeira, uma marca da cidade.

Ilustração 25

Ilustração 26

Ilustração 27

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Cemitério São Pedro: espaço de vida, espaço de memória

Uma mulher que chama a atenção entre

tantas é a senhora Lindalva Milhomem Campos.

Além da sepultura comportar uma arquitetura

diferenciada, possivelmente dos anos 1970, em

função das cores e do material utilizado (ver

adiante), sua fotografia é expressiva. A placa

menciona uma senhora falecida aos 78 anos, mas

a fotografia nos apresenta uma jovem com uma

proteção na cabeça (de corrida de automóvel ou

de aviação), usando um batom de cor forte, meio

de perfil. Enfim, uma pose para a posteridade. Uma pesquisa na internet

nos dá as informações necessárias. Segundo a Folha de Londrina, de

28 de novembro de 2004, Lindalva foi a segunda aviadora brasileira

e escolheu Londrina para morar no ano de 1951. Mais uma busca na

internet e encontramos o Diário Oficial da União, de 12 de abril de

1944, com a aprovação do requerimento de carta piloto de recreio ou

desporto de Lindalva. Ela foi homenageada com o nome em logradouro

público na cidade. A família Campos optou por uma marca própria de

Lindalva: aviadora. Assim foi com muitas famílias que têm seus parentes

enterrados no cemitério São Pedro. Passar pela vida e deixar um legado,

como vimos escrito acima, ter contribuído com o desenvolvimento da

cidade e manter-se vivo, lembrado, e um exemplo a ser seguido.

Outra sepultura que chama a atenção

é da família Ermel. Lá encontramos um

tabuleiro de xadrez. O jogo está encerrado, as

peças brancas venceram com um xeque-mate.

As peças formam uma cruz, símbolo cristão.

Abaixo um trecho de Eclesiastes 3:5, “Tempo

de espalhar pedras, e tempo de ajuntar pedras”.

Mais uma busca na internet e encontramos a

explicação desta marca no túmulo. Hercilio Ermel, cirurgião dentista

e agropecuarista, fixou residência em Londrina a partir de 1957,

vindo a falecer nesta cidade em 1998, aos 72 anos. Em sua biografia

se acrescenta que fora um brilhante enxadrista, conquistando diversos

títulos estaduais. Hoje existe um torneio com seu nome “Memorial

Hercílio Ermel”, realizado em Londrina.

Ilustração 28

Ilustração 29

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Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

Bem no fundo, perto ao muro, pode-se encontrar um túmulo

rente ao chão. Sobre ela abre-se um enorme livro. Diferentemente

dos livros abertos vistos nos cemitérios, como já apresentado, trata-

se realmente de um livro publicado. É a apresentação da autora/

falecida por um texto escrito pelo professor Francisco iglésia para a

obra História da Educação no Brasil (1930-73). Produzida em 1973,

por Otaíza de Oliveira Romanelli, é uma obra ainda atual, referência

no estudo da educação no Brasil. Falecida em 1978, aos 34 anos, seu

túmulo sintetiza sua vida: educadora e pesquisadora.

Por fim, não poderia ficar de

fora deste trabalho a sepultura de

Avelino Antonio Galante. Este faleceu

recentemente, em 2009, aos 86 anos. Foi

um dos mais antigos fotógrafos da cidade

de Londrina, atuando como “lambe-

lambe” na praça até se estabelecer com

um estúdio/laboratório, passando por

outras empresas como fotógrafo. A família

escolheu uma das últimas fotografias em que Galante posou ao lado

de seu instrumento de trabalho. Uma profissão que não só marcou a

cidade, mas a registrou. Seu acervo imagético está calculado em 50 mil

negativos.

O uso dos retratos pintados

Uma das presenças mais marcantes nos cemitérios, sem dúvida,

é a do retrato pintado. Técnica antiga que resistiu ao tempo, deixando de

ser produzido recentemente em Londrina, mas ainda viva no nordeste

brasileiro. Comum era um profissional passar pelas fazendas e sítios para

Ilustração 30

Ilustração 31

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Cemitério São Pedro: espaço de vida, espaço de memória

fotografar ou recolher fotografias

em preto e branco das famílias para

ser executado na cidade, por outro

profissional, o retrato pintado. Uma

visita aos parentes ou moradores

mais antigos e se poderá encontrar

pendurado na parede da sala ou

quarto uma moldura, em geral oval,

com uma fotografia pintada. Na

ilustração 32 temos um exemplo. A

imagem foi feita e colorida à mão tendo por base uma (do casal) ou duas

fotografias (isoladas), em geral no formato 3X4, feita em “lambe-lambe”

da via pública. No caso, parece-nos que houve uma montagem para formar

o casal. Esta fotografia, que antes adornava uma residência, hoje habita

uma capela-sepultura. Esta última questão é de fundamental importância,

pois este fragmento da vida, de um ornamento familiar continua vivo e

presente para que todos, familiares ou não, possam admirar.

Um exemplo em preto e branco do processo de junção de um

casal pode ser encontrado em um jazigo simples do cemitério São Pedro.

A primeira e segunda fotografias (Ilustrações 33 e 34) acompanhavam

as placas com os nomes e datas de nascimento e falecimento dos

retratados. A terceira fotografia (Ilustração 35), que nos interessa aqui,

foi o processo de retrato pintura. Percebe-se uma melhora na qualidade

da imagem frente aos originais: mais vivacidade facial. Da mesma

forma, como na ilustração original, foi desenhada uma vestimenta mais

distinta no cavalheiro, paletó e gravata, arrumada a camisa e colocado

brincos na senhora. Em geral também se acrescentava o colar.

Ilustração 32

ilustração 33 Ilustração 34 ilustração 35

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Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

Outro exemplo que podemos encontrar dentro de uma capela-

sepultura é o da ilustração 36. Composta por cinco porta-retratos,

um vaso com flores e uma representação da crucificação de Cristo, a

imagem nos traz importantes informações. Apesar da parede estar

descascando, as fotografias ainda apresentam boa qualidade visual,

cores bem vivas (as fotografias centrais) mesmo recebendo o sol diário.

Duas delas são retratos pintura. Tanto a camisa com flores quanto o

paletó e a gravata (segunda e quarta retratos pintura da esquerda para

direita) são pintadas, ou seja, não necessariamente vestiam tal roupa. A

primeira fotografia pode ser pintada ou não, a posição e o seu estado de

conservação dificultam confirmar. A terceira e a última são fotografias

originais em preto e branco. Todos são aparentemente jovens ou estão

na meia idade. As três molduras centrais parecem recentes, ou seja, a

família adotou a foto antiga, mas a colocou em moldura nova. As outras

duas molduras devem ser as originais da fotografia. Portanto, além da

variedade técnica da fotografia, temos uma variedade de molduras.

O importante é perceber também que o jazigo, em especial a capela-

sepultura, transforma-se em extensão do lar, seu complemento. Não

se trata de um depósito de fotografias velhas, pois estas continuam a

rondar as casas em caixas e álbuns de famílias dentro dos armários, nas

gavetas e, mesmo, ainda nas paredes e sobre móveis.

Para concluirmos esta etapa do texto, observa-se que as

ilustrações 37, 38 e 39 possuem semelhanças e particularidades com as

anteriores. A primeira e a última encontravam-se em capela-sepultura.

A primeira é um suporte antigo, não mais existente, que era comum nas

Ilustração 36

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Cemitério São Pedro: espaço de vida, espaço de memória

primeiras décadas do século XX, mas ao que parece deve ter continuado

a existir em Londrina até os anos 1950. A fotografia ficava presa em

um suporte protegida por um plástico grosso, com quatro cantoneiras

nas extremidades. Percebe-se que, mesmo com a proteção, a fotografia

sofreu a ação da umidade, pois está machada. A ilustração central é

de uma fotografia em porcelana, em um jazigo comum. Trata-se de

um desenho de um senhor japonês trajando seu kimono. Neste jazigo

todos estão retratados assim. Por fim, a última ilustração refere-se a um

casal japonês. Está na tradicional moldura oval e é um retrato pintura.

A vestimenta é bem ocidental e o casal na meia idade. A mulher está

de frente, olhando diretamente para a câmera. O homem, meio de

lado, olhando para um horizonte. Diga-se, de passagem que fotografias

de perfil são raras, considerando o conjunto total das fotografias

cemiteriais no São Pedro. Vemos que a tradicional forma de fotografia

foi incorporada pela comunidade nipônica de Londrina.

Túmulos, Ornamentos e Estatuária

Sem a pretensão de esgotar a discussão sobre os ornamentos,

signos e a estatuária existente no cemitério São Pedro, propomo-nos a

apresentar algumas imagens que mostram as representações religiosas

e o imaginário social e cultural da cidade de Londrina, bem como do

material usado nos jazigos como prova de um tempo passado.

É curioso como símbolos da cidade são transpostos para o

cemitério, vinculados à religiosidade ou a profissão do falecido. Nas

ilustrações 40 e 41, temos dois casos sobre esta questão. O primeiro que

ilustração 37 ilustração 38 ilustração 39

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Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

vamos discutir é o da concha acústica, construída na década de 1950 no

centro de Londrina, e que foi palco de grandes manifestações políticas

e culturais (Ilustração 40). No cemitério encontramos uma concha,

abaixo e bem à sua frente, uma placa com um desenho de um saxofone,

e mais abaixo uma lira, símbolos da música (Ilustração 41). O falecido,

ou sua família, deixou claro o seu vínculo com a música por meio do

instrumento.

Outro exemplo é o uso da arquitetura da catedral de Londrina

(Ilustração 44)4. Esta foi iniciada no ano de 1968 e concluída e inaugurada

em 17 de dezembro de 1972. Possui um projeto considerado “moderno”.

Construída em local elevado, no centro da cidade, destaca-se por sua

imponência. Trata-se, portanto, de uma referência arquitetônica e

religiosa na cidade. Podemos encontrar dois tipos de reprodução da

catedral: uma em formato miniatura, sobre um túmulo, onde a família

Ilustração 40 Ilustração 41

Ilustração 42 Ilustração 43 Ilustração 44

4 imagem da catedral atual retirada de: http://www.google.com.br/search?q=catedral+de+londrina&hl=pt-BR&prmd=imvns&source=lnms&tbm=isch&ei=C_ffTuD2IMfj0QHPstjNBw&sa=X&oi=mode_link&ct=mode&cd=2&sqi=2&ved=0CBoQ_AUoAQ&biw=1170&bih=566

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Cemitério São Pedro: espaço de vida, espaço de memória

colocou em seu pequeno interior imagens de santos e dos falecidos da

família (Ilustração 43), outro, em formato maior ocupando o espaço de

dois jazigos comuns, é uma capela-sepultura (Ilustração 42). Assim,

comporta em seu interior não apenas as fotografias, ornamentos e dados

dos falecidos, mas os próprios restos mortais. A primeira revestida de

cerâmica (azulejos) e a segunda por pastilhas verdes, comuns nos anos

1960 e 1970. Parece-nos, por isto, que a segunda seria a mais antiga.

Por ser um cemitério com mais de 70 anos, sofreu a ação do

homem em todo este período. Os espaços que eram de enterramento,

propriamente ditos, dos primeiros tempos foram ocupados por jazigos

perpétuos. A necessidade de mais espaço para o enterro fez com que a

administração do cemitério autorizasse a construção de jazigos em pleno

caminho de deslocamento interno, bem como em outros espaços ainda

livres. Jazigos antigos foram reformados, ampliados ou modificados.

Assim, o material empregado nestas construções também variam com o

tempo, deixando sua marca.

O uso de revestimentos de pastilhas e azulejos, como já vimos,

é marcante. Outros exemplos de “modernidade” dos anos 1960 e 1970

seriam as ilustrações seguintes.

A ilustração 45 traz um jazigo em tijolo vazado, sem teto. Em

seu interior existe um pequeno jardim. Defronte à porta, os dados dos

falecidos e suas fotografias. Um ambiente transparente para quem “está”

dentro e para quem está fora. A ilustração 46 traz um jazigo em material

típico de sua época, com duas cercas que separam os dois ambientes,

tem um fundo em azulejo vazado, trata-se do local onde está sepultada

uma mulher aventureira: Lindalva Milhomem Campos.

Ilustração 45 Ilustração 46

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Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

Por várias vezes citamos a existência das capelas-sepulturas

no cemitério São Pedro, que são um destaque a parte na paisagem

cemiterial. Muitas mantidas com esmero pelos familiares, com cores

vivas e floridas. Infelizmente ainda não catalogamos este material, mas

vamos apresentar exemplos de sua arquitetura construtiva e o uso das

cores para realçá-las.

As ilustrações 47 e 48 trazem variadas formas das capelas-

sepulturas. Com colunas grego-romanas, com varanda, lisas, com

janelões, com janelinhas, umas maltratadas e outras cuidadas pelos

proprietários. Todas, entretanto, possuem a cruz no local mais alto.

Algumas possuem anjinhos, outras não. Podemos ver também outras

formas de sepultura, mais antigas, como, por exemplo, a da ilustração

da direita, bem à frente na esquerda. Sua cor é azul e foi pintada

recentemente. É baixa, com uma pequena mureta. Ao seu lado, um

jazigo mais atual, em mármore, com a gaveta acima do nível da rua.

Assim são grande parte das sepulturas novas e reformadas do cemitério.

As variedades das formas das cruzes existentes também são ricas

em detalhes. Um estudo aprofundado daria uma visão exata de sua

datação. Muitas, provavelmente, como os anjinhos, devem datar dos

primeiros anos do cemitério. Aparentemente a maioria foi construída

em cimento, mas também existem produzidas em ferro e em outros tipos

de pedra (coloração, superfície, qualidade etc.) Abaixo, as ilustrações

apresentam diversos tipos. Na ilustração 49 uma cruz localizada no alto

de uma capela-sepultura e em seu centro as iniciais INRI. Na ilustração

50 um dos formatos em ferro e, por fim, a ilustração 51 uma variedade

das cruzes que ornamentam as sepulturas. Estes modelos predominam

e atestam sua época.

Ilustração 47 Ilustração 48

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Cemitério São Pedro: espaço de vida, espaço de memória

Quanto aos anjinhos, já citados em muitos momentos deste

trabalho, sua presença é constante. Aparentemente seguem um padrão

de tamanho e de forma (aqui com pequena variação). Eles se situam,

em geral, nos telhados das capelas-sepulturas e nas extremidades dos

jazigos térreos. Geralmente suas mãos estão juntas, como se estivessem

orando, de humildade, ou uma das mãos apontando para o céu. Muitos

são retirados das sepulturas e por isso ficam abandonados pelos cantos

do cemitério em função das reformas/demolições que ocorrem e/ou em

razão de adoção de uma religião que não adote tal ornamento.

A figura do anjinho também está associada a da criança falecida.

Hoje há placas específicas para adornar sepulturas de crianças. Nestas

aparece o rosto de um anjo alado e ao lado a data de nascimento e morte

da criança. A colocação de imagens de anjos para enfeitar sepulturas de

crianças é uma tradição brasileira. Vejamos dois exemplos. A ilustração

55 é de porcelana ou resina, de porte pequeno, uns quinze centímetros,

está colocada sobre o jazigo da família. Vê-se que está ajoelhada, em

posição misericordiosa. Em suas mãos uma pequena pulseira com um

crucifixo. Já a ilustração 56 ornamenta um túmulo de uma criança

falecida com 01 ano, em 1951. O anjo, com o sexo coberto, está sobre um

livro aberto jogando flores. Foi feito de mármore e no epitáfio, abaixo do

livro, está escrito: “Candura, graça e inocência refugiaram aqui: Terra

não peses sobre ela pois não pesou sobre ti.”

Ilustração 49 Ilustração 50 Ilustração 51

Ilustração 52 ilustração 53 Ilustração 54

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Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

Uma atenção especial ao piso em volta dos túmulos que nos

revelam um material muito usado nas calçadas, em locais mais

movimentados da casa, como varandas e hall de entrada das residências.

Estas peças encontram-se fora de linha e de difícil acesso, isto é, por

não serem mais produzidas seu valor cultural e histórico é inestimável.

Pelas ilustrações abaixo, percebe-se que foram mosaicos, em geral com

peças coloridas, tornando os jazigos mais leves e alegres. A ação do

tempo e do homem está agindo sobre eles, um pela ação da natureza via

chuva, vento e seres vivos (bactérias etc); outra pela ação demolidora e

de descarte do homem.

Quanto à estatuária, o cemitério São Pedro não é muito rico,

comparado às capitais de São Paulo, Rio de Janeiro e Porto Alegre.

Talvez pela decadência deste tipo de ornamento cemiterial, pela falta de

mão de obra especializada ou pelo seu alto custo. Muitas destas imagens

são de fundição, segundo um molde padrão, de pouco valor artístico.

Em alguns aspectos mantém o tradicional, ou seja, a desoladora, a

piedosa, o Sagrado Coração, e a figura de Cristo (caído, carregando a

cruz). Vejamos algumas destas obras.

Na ilustração 59 visualizamos duas sepulturas, a da esquerda

a tradicional Pietá, com o Cristo morto em seu colo; a da direita,

Cristo carregando a cruz. Em sua cabeça a coroa de espinhos e o suor

ilustração 55

Ilustração 56

ilustração 57 ilustração 58

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Cemitério São Pedro: espaço de vida, espaço de memória

escorrendo, aos seus pés os pregos que fixaram Cristo à cruz. Uma feita

em material escuro brilhante e outra na cor bronze. Ambas em tamanho

quase natural, destacam-se no visual cemiterial.

Outra figura presente em vários jazigos é da desoladora. A figura

feminina que lamenta a morte dos que estão na sepultura (ilustrações

60 e 61). Tal como esta figura, outras imagens obrigatoriamente se

apresentam, como Nossa Senhora Aparecida, Santo Antônio (figura

apresentadas em todos os cemitérios pelo número de devotos no Brasil),

São José, entre outros.

A existência de muitas placas alusivas aos fabricantes dos jazigos

com sua estatuária, ajuda-nos a definir datas de sua fabricação e origem.

Em conversa com descendentes de japoneses que visitavam os túmulos

de seus parentes, foi afirmado que estes foram encomendados na cidade

ilustração 59

Ilustração 60 Ilustração 61

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Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

de Marília, estado de São Paulo (Ilustração 62). Lá, portanto, havia

serviço especializado em língua japonesa, essencial para tal. Mas se para

este grupo a cidade de Marília foi importante, firmas de outras cidades

foram contratadas, inclusive da própria Londrina, para a comunidade

não nipônica, como podemos ver nas ilustração 63 e 64.

Considerações Finais

Ao passar os olhos atentamente sobre as ilustrações aqui

mostradas, muitas outras observações podem ser feitas, tais como: corte

de cabelo, forma de pentear, uso de bigodes e brilhantina nos cabelos,

vestimenta variando no decorrer do tempo, surgimento do sorriso nas

fotografias cemiteriais, entre outros temas possíveis. Muitos na busca

da valorização da pessoa, expressar a condição social e o respeito por

sua profissão (traje especial, uniforme, farda que usa etc.).

O combate entre a vida e a morte, a permanência do ausente,

as formas de encarar a morte e a vida post-mortem, a importância do

uso de eufemismos, como foi mostrado em algumas frases escolhidas de

epitáfios, no uso da fotografia para marcar presenças, como no caso da

fotografia do casal para expressar uma união que transpôs o tempo, um

amor que a morte não venceu, ou melhor, que venceu a morte.

O retrato pintura, muito usual em tempos idos, hoje resiste

em alguns lares, mas se faz presente de forma viva e permanente

nas fotografias cemiteriais e no interior das capelas-sepulturas. Sua

técnica, somada ao uso das molduras ovais, enfeitam, mantém presente

o(s) ausente(s) aos familiares e passantes, uma forma de fazer e ver,

rememorar.

Por meio da estatuária, ornamentos e da arquitetura cemiterial,

percebeu-se as representações religiosas e o imaginário social e cultural

da cidade de Londrina no passado e na atualidade. A presença de jazigo

Ilustração 62 Ilustração 63 Ilustração 64

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Cemitério São Pedro: espaço de vida, espaço de memória

assemelhando-se a símbolos arquitetônicos, a variedade de estátuas de

anjos, de formas das cruzes, com muitos detalhes, das estatuárias com

seus personagens naturais (Cristo, Maria, Sagrado Coração etc.), os

selos dos fabricantes destas, bem como o material usado na construção

dos túmulos (com suas substituições no decorrer do tempo), dão uma

ideia das transformações em especial, e a permanência de um tempo

passado no presente.

Como espaço de memória, o cemitério São Pedro possui uma

importância ímpar para o estudo da história cultural e religiosa da

cidade de Londrina. Seu uso pedagógico, sua compreensão como

um museu a céu aberto, como local privilegiado de perceber a vida e

a morte (ou a post-mortem), obriga-nos a pensá-lo com outro olhar,

com a necessidade de preservá-lo como ponto de referência de nossa da

histórica local.

No início foram expressas algumas questões que cabe agora

responder. Somos frutos de um passado, dos mortos. Não se pode

separar os vivos dos mortos. O muro existente entre a “cidade dos

vivos” (agora colocamos aspas) da “cidade dos mortos” é imaginário. O

cemitério é um local privilegiado para a construção dos monumentos/

documentos, onde uma história familiar, particular, é também uma

história coletiva.

Um lugar privilegiado para se encontrar o nosso patrimônio

cultural material e imaterial: os modos de fazer, as celebrações, os

rituais, tradições de nossa ancestralidade e de nossa atualidade, o

material empregado nos jazigos, a estatuária religiosa, nossos costumes,

lendas entre outras expressões culturais.

Não se pode pensar, assim, o cemitério como um espaço

morto, pelo contrário, os roubos das peças de bronze, de estatuária, as

desapropriações pela prefeitura municipal, a venda de jazigos “perpétuos”

pelas ordens terceiras etc., mostram seu valor comercial. As reformas

nos jazigos pelos familiares e pelos novos proprietários demonstram

também que é um espaço ainda passível de grandes transformações,

isto em grande sentido, ou seja, estatuária, arquitetônica, cultural e

religiosa.

Portanto, faz-se necessário pensar o espaço cemiterial como

passível de perda de uma memória histórica, cultural e religiosa

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Patrimônio Histórico e Cultural: cidade de Londrina-PR

importante para a cidade de Londrina. Tal qual o acervo de um museu,

no caso do Museu Histórico de Londrina, pertencente à Universidade

Estadual de Londrina, o cemitério municipal São Pedro é um museu

a céu aberto, passível de ser admirado e estudado, portanto, objeto de

resguardo de memória a ser preservado.

Page 90: Patrimônio Histórico e Cultural. Cidade de Londrina (PR)

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