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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP Rogério Bettin Pluralidade de Mundos do Conhecimento em Karl Popper DISSERTAÇÃO DE MESTRADO SÃO PAULO 2014

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP

Rogério Bettin

Pluralidade de Mundos do Conhecimento em Karl Popper

DISSERTAÇÃO DE MESTRADO

SÃO PAULO

2014

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Rogério Bettin

Pluralidade de Mundos do Conhecimento em Karl Popper

MESTRADO EM FILOSOFIA

Dissertação apresentada à Banca Examinadora da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Filosofia, sob a orientação do Prof. Dr. Ivo Assad Ibri.

SÃO PAULO

2014

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Banca Examinadora

______________________________________

______________________________________

______________________________________

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AGRADECIMENTOS

Meus sinceros agradecimentos ao professor Dr. Edélcio Gonçalves Souza por ter

aceitado orientar esse trabalho, pelo auxílio e pelas valiosas contribuições produtivas que

trouxeram um norte ao presente trabalho.

Agradeço ao professor Dr. Ivo Assad Ibri que aceitou dar continuidade na

orientação e pela contribuição ao longo deste percurso.

Agradeço ao professor Dr. Cassiano Terra Rodrigues por aceitar participar

da banca examinadora tecendo alguns questionamentos que enriqueceram o

trabalho aqui proposto.

A CAPES pela concessão da bolsa na modalidade taxa que em muito me

ajudou para a consolidação deste trabalho.

Aos meus pais e irmãos que sempre estiveram comigo em todos os

momentos, fornecendo apoio mais que necessário para que fosse possível

prosseguir com minha formação acadêmica, sempre disponibilizando apoio material,

amor e carinho.

Ao meu amor, Olga, pessoa mais especial que já conheci em minha vida.

Obrigado por partilhar tantos momentos maravilhosos e por me apoiar, com certeza,

sem o teu apoio, eu não teria chegado até aqui.

Aos meus colegas de trabalho e especialmente aos meus chefes que

permitiram que eu frequentasse, durante meu expediente de trabalho, as aulas do

curso de mestrado na PUC, possibilitando compensar esses dias de ausência

trabalhando aos finais de semana.

Ao Programa de Pós-Graduação em Filosofia e a todos os professores do

curso.

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A crítica é, num sentido muito importante, a

principal força motriz de qualquer

desenvolvimento intelectual. Sem contradições,

sem crítica, não haveria qualquer motivo racional

para modificarmos as nossas teorias: não haveria

qualquer progresso intelectual. (Karl Popper)

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RESUMO

Esta pesquisa tem o objetivo de analisar a pluralidade de realidades de

mundos do conhecimento em Karl Popper.

Na primeira seção, optamos por analisar o objeto aqui estudado respeitando a

ordem cronológica das publicações popperianas, tendo em vista a verificação do

desenvolvimento da tese dos três mundos em Popper.

O autor não aceita as posições monistas e dualistas, por isso que ele propõe

uma noção de realidade tripartite, ao afirmar que a realidade é composta pela

interação de três mundos: mundo um, dos objetos físicos ou de estados materiais;

mundo dois, de estados de consciência ou de estados mentais, ou, talvez, de

disposições comportamentais para agir é o mundo do conhecimento subjetivo; e,

mundo três, do conhecimento objetivo e autônomo que independe do sujeito que

conhece.

Este é “habitado” pelos problemas, argumentos críticos e teorias, como

resultado da evolução da linguagem humana. O mundo três é a história de nossas

ideias, de como a inventamos e reagimos diante desses produtos de nossas próprias

elaborações de conteúdos objetivos de pensamento.

Na segunda seção, com o intuito de melhor compreendermos a tese dos três

mundos, mesmo sendo uma teoria metafísica, apresentaremos uma conexão desta

tese em relação a epistemologia popperiana - o racionalismo crítico.

Para o autor, todo conhecimento científico é falível, corrigível e provisório,

tendo a crítica papel fundamental para o desenvolvimento do conhecimento.

Portanto, ao analisarmos a o estatuto da tese dos três mundos inserida na

epistemologia popperiana, nos será permitido compreender melhor alguns aspectos

da teoria dos três mundos, assim como de que forma ocorre o crescimento do

conhecimento, segundo os pressupostos defendidos por Karl Popper.

Palavras-chave: Karl Popper, epistemologia, teoria dos três mundos,

falsificação, conjectura, refutações.

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ABSTRACT

This paper aims at analyzing the plurality of realities of worlds of knowledge in

Karl Popper.

In the first section, we have chosen to analyze the object studied respecting

the chronological order of the Popperian publications, bearing in mind the verification

of the development of the three worlds thesis in Popper.

The author rejects both monistic and dualistic positions and hence proposes a

notion of a tripartite reality, claiming that reality is made up by the interaction among

three worlds: World 1, of physical objects and material states; World 2, of states of

consciousness or mental states or, maybe, of behavioral willingness to act, the world

of subjective knowledge; and World 3, of objective autonomous knowledge, which

doesn't depend on the subject who knows.

World 3 is “inhabited” by problems, critical arguments and theories, as a result

of the evolution of human language. It contains the history of our ideas, of how we

invent and react to such products of our own elaboration of objective contents of

thinking.

In the second section, aiming at better understanding the three worlds theory,

even though it is metaphysical, we present a connection between this thesis and the

Popperian epistemology, known as critical rationalism.

For the author, scientific knowledge is fallible, correctable and provisional, thus

making criticism assume a crucial role in the development of knowledge. Therefore,

as we analyse the thesis of the three worlds inserted in Popperian epistemology, we

can better understand some aspects of the theory of the three worlds, as well as how

knowledge grows, according to the presuppositions defended by Karl Popper.

Keywords: Karl Popper, epistemology, theory of the three worlds,

falsificationism, conjecture, refutability.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO ......................................................................................................................09

PARTE I - A TESE DOS TRÊS MUNDOS EM KARL POPPER ...................................13

1. Livro: Conhecimento Objetivo.............................................................................................14

2. Comparações das Obras Publicadas Sobre a Tese dos 3 Mundos em Karl Popper.............. 26

2.1 Livro: Autobiografia intelectual .......................................................................... 27

2.1 O mundo três ou o terceiro mundo ...................................................................... 27

2.1.2 O problema corpo-mente e o mundo 3. .............................................................. 30

2.1.3 Posição dos valores num mundo de fatos .......................................................... 31

2.2 Livro: O eu e seu cérebro ................................................................................... 32

2.2.1 O materialismo transcendente a si próprio ......................................................... 32

2.2.2. Os mundos 1,2 e 3 .............................................................................................. 34

2.3 Livro: Karl Popper textos escolhidos ................................................................. 36

2.3.1 Texto: “O problema corpo-mente” ..................................................................... 36

2.4 Livro: O conhecimento e o problema corpo-mente ............................................ 39

2.4.1 Conhecimento objetivo e subjetivo .................................................................... 39

2.4.2 O problema corpo-mente ou mente-corpo .......................................................... 40

2.4.3 A autonomia do mundo 3 ................................................................................... 45

PARTE II – O ESTATUTO DA TESE DOS 3 MUNDOS INSERIDA NA

EPISTEMOLOGIA DO RACIONALISMO CRÍTICO, DE KARL POPPER ................ 47

1. Racionalismo crítico ........................................................................................................ 48

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2. Realismo .......................................................................................................................... 52

3. O problema da indução .................................................................................................... 55

4. A solução de Kant para a indução .................................................................................. 59

5. A solução de Popper para a indução ................................................................................ 62

6. O método da dedução ...................................................................................................... 65

7. Falseabilidade empírica ................................................................................................... 67

8. Tentativas e eliminação de erros ..................................................................................... 74

CONCLUSÃO ........................................................................................................................77

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................. 81

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INTRODUÇÃO

O presente estudo tem como objetivo analisar a pluralidade de realidades de

mundos do conhecimento em Karl Popper – uma tese de caráter metafísico, que, em

certa medida, apresenta também um cunho epistemológico relacionado com o

racionalismo crítico popperiano. A reflexão acerca da tese popperiana apresentar-se-

á na primeira seção do nosso trabalho, intitulada: A tese dos três mundos em Karl

Popper, em que atestaremos como o autor concebe a existência de três mundos

distintos do conhecimento e a interação entre eles. Para Popper, os mundos

distinguem-se do seguinte modo:

primeiro, o mundo de objetos físicos ou de estados materiais; segundo, o

mundo de estados de consciência ou de estados mentais, ou talvez de

disposições comportamentais para agir; e, terceiro, o mundo de conteúdos

objetivos de pensamento, especialmente de pensamento científico e

poéticos e de obras de arte.(POPPER, 1999, p.78)

Cabe ressaltar que a tese dos três mundos popperiano interagem entre si: o

mundo 1 (físico) e o mundo 2 (conhecimento subjetivo) relacionam-se diretamente.

Assim como o segundo e terceiro mundo. Contudo, o primeiro e o terceiro mundo

não podem interagir senão por intervenção do segundo. Logo, este mundo (de

estados de consciência ou de estados mentais) torna-se o fio condutor na relação

interativa entre o terceiro e o primeiro mundo. Sobre o mundo três, podemos afirmar

que não é mera ficção, já que se valida no primeiro mundo, causando mudanças no

mundo 1 (físico).

Outro aspecto que discutiremos no primeiro capítulo desta dissertação refere-

se à objetividade e à autonomia do mundo três – já que estas são características

importantes para o terceiro mundo. Destacamos que apesar de muitos objetos do

mundo três serem de criações humanas, os problemas derivados a partir destes

objetos surgem independente de nossa vontade e fora do nosso domínio, pois são

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problemas que surgiram nesse mundo sem que nós contribuíssemos diretamente ou

desejássemos os seus surgimentos. Apenas os descobrimos, não os criamos.

Podemos tomar como exemplo, o conjunto dos números naturais que é uma criação

humana, mas a distinção entre os números que se classificam entre par e ímpar é

um fato autônomo, não contribuímos diretamente para seu surgimento, é uma

consequência não pretendida e inevitável de nossa criação, portanto independe do

sujeito conhecedor.

A tese dos três mundos foi divulgada por Popper pela primeira vez em 1972,

com a publicação do livro Conhecimento objetivo. Obra em que o autor realiza a

distinção entre conhecimento objetivo e subjetivo – característica fundamental para a

possibilidade da teoria dos três mundos. Convém destacar, que desde a publicação

da obra A lógica da pesquisa científica, lançada entre 1933 e 1934, os conceitos

objetivo e subjetivo já eram usados por Popper, que, segundo ele, não diferem dos

elaborados por Kant. Neste sentido, escreve Popper sobre Kant: “ele usa a palavra

“objetivo” e subjetivo” para indicar que o conhecimento científico deve ser justificável,

independentemente de caprichos pessoais; uma justificação será “objetiva” se puder,

em princípio, ser submetida a prova e compreendida por todos” (POPPER, 2007,

p.46). Ainda, de acordo com Karl Popper,

Kant aplica a palavra “subjetivo" a nossos sentimentos de convicção (de

vários graus). Saber como surgem esses sentimentos é tarefa da

Psicologia. (...).

Kant,foi talvez, o primeiro a reconhecer que a objetividade dos enunciados

científicos está estreitamente relacionada com a elaboração de teorias -

com o uso de hipóteses e de enunciados universais.(POPPER, 2007, p. 46

e 47)

O livro Conhecimento objetivo é a obra que servirá de base para

analisarmos as demais publicações do autor. Examinaremos as publicações sobre a

tese dos três mundos em Popper de forma cronológica, sobretudo as mais

conhecidas pelos leitores, a fim de mostrarmos como se dá o desenvolvimento da

tese dos três mundos e os desdobramentos entre eles, ao longo da vida intelectual

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de Karl Popper. Esclarecemos que, com este estudo, não intencionamos esmiuçar

e/ou cartografar a literatura popperiana, mas proporcionar, ao longo de nossas

reflexões, a plena compreensão de algumas das argumentações filosóficas

defendidas por Popper.

Segundo o autor, duas ideias o encorajaram a escrever sobre a tese dos três

mundos e a mostrar que não era uma teoria sem significado. A primeira motivação

origina-se do fato do mundo 3 também ser uma criação humana e os objetos que o

constituem serem tão reais quanto os produtos pertencentes ao mundo 1, a ponto de

causar transformações sobre o mundo 1 (físico), conforme mencionamos

anteriormente. A segunda ideia surge quando Popper percebe a possibilidade de um

estudo, à luz da teoria da evolução, acerca do problema do conhecimento. Cabe

mencionar que o desdobramento filosófico de tais ideias foi preponderante para que

Karl Popper publicasse a teoria da pluralidade de mundos do conhecimento.

No segundo capítulo, apresentaremos uma investigação ampliada sobre a

tese dos três mundos, já que nos detivemos no estudo da epistemologia de Karl

Popper – o racionalismo crítico. Mostraremos o porquê nas teses científicas ser

indispensável o papel da falseabilidade das teorias estabelecidas.

As pesquisas realizadas nos dois capítulos se propõem a comprovar que uma

tese de Karl Popper é consequência da outra, pois, neste caso, verificaremos como

o estatuto da tese dos três mundos insere-se na epistemologia popperiana – o

racionalismo crítico.

A finalidade a ser alcançada interligando a tese dos três mundos com o

racionalismo crítico em Popper é que, desta forma, ampliaremos as condições de

análise visando compreender a tese dos três mundos no interior da epistemologia

popperiana..

Nosso estudo tem o objetivo de promover a ampliação das considerações

filosóficas para se analisar a obra de Karl Popper, aqui, em especial a tese dos três

mundos incluída na teoria do racionalismo crítico. Contudo, destacamos que,

distante estamos de ter a pretensão de estabelecer ponderações conclusivas com o

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trabalho que se apresenta, pois, o que pretendemos, por meio deste espaço crítico,

é abrir, cada vez mais, no universo filosófico, outras discussões.

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PARTE I

A TESE DOS TRÊS MUNDOS

EM KARL POPPER

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1. LIVRO: CONHECIMENTO OBJETIVO

Com o livro Conhecimento Objetivo, lançado em 1972, Karl Popper

descreve, nos capítulos três e quatro, a tese dos três mundos de realidades do

conhecimento – proposição elaborada por ele a partir de uma palestra e conferência

realizadas no fim dos anos 60.

Para estudarmos a tese dos três mundos de Popper precisaremos buscar a

base que sucedeu o objeto de estudo aqui, pretendido para a pesquisa. Tal base

pauta-se na distinção que Popper realiza entre os conhecimentos objetivo e

subjetivo e nas funções superiores da linguagem, consideradas pelo filósofo

austríaco como uma das maiores criações humanas.

Para ele, as funções da linguagem: a descritiva e a argumentativa tornam

possível a existência do conhecimento objetivo. Somente neste contexto filosófico de

conhecimento objetivo que se abre todo um universo possível para o surgimento do

terceiro mundo em Popper.

A linguagem, por possuir as funções descritivas e argumentativas, está

impregnada de teorias científicas, religiosas, ideológicas, mitos, entre outras. São

essas funções linguísticas que possibilitam à discussão crítica um papel

importantíssimo para a expansão do conhecimento.

Popper afirma que uma teoria somente pode ser formulada e passível de

crítica, se ela for objetiva, portanto a “objetividade é que torna a crítica possível”

(POPPER, 1999, p.40). O conhecimento objetivo é o eixo central para a postulação

de Popper concernente à existência de um terceiro mundo.

A distinção do conhecimento entre subjetivo e objetivo realizada por Popper

amplia o sentido da definição do pensamento.

(1) conhecimento ou pensamento no sentido subjetivo, constituído de um

estado de espírito ou de consciência ou de uma disposição para reagir; e (2)

conhecimento ou pensamento num sentido objetivo, constituído de

problemas, teorias e argumento como tais. Neste sentido objetivo, o

conhecimento é totalmente independente de qualquer alegação de

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conhecer que alguém faça; é também independente da crença ou

disposição de qualquer pessoa para concordar; ou para afirmar, ou para

agir. O conhecimento no sentido objetivo é conhecimento sem conhecedor:

é conhecimento sem sujeito que conheça. (POPPER, 1999, pp.110 - 111)

Retomando as reflexões de Popper, citamos como exemplos de

conhecimentos objetivos as “teorias publicadas em revistas e livros e conservadas

em bibliotecas; discussões dessas teorias; dificuldades ou problemas apontados em

conexão com essas teorias; etc” (POPPER, 1999, p.78). Neste sentido, o

conhecimento objetivo passa a ser desvinculado do sujeito conhecedor, conforme

afirma Popper: “O conhecimento científico constitui um mundo à parte, juntamente

com as ideias, as instituições, a linguagem, a ética e as artes. É este o mundo que,

na linguagem de Popper, é identificado como terceiro mundo” (PELUSO, 1995,

pp.105 - 106).

A filosofia tradicional tem estudado, segundo Popper, o conhecimento ou

pensamento no sentido subjetivo, isto é, o conhecimento possuído por algum sujeito

que conhece. A tese popperiana está além da tradição filosófica, pois realiza uma

distinção de duas espécies para o conhecimento: o subjetivo e o objetivo,

possibilitando não apenas o conhecimento no sentido subjetivo: conhecimento que

diz respeito somente ao sujeito cognoscente, mas o conhecimento objetivo que é o

conhecimento em si, que transcendem o sujeito que conhece.

O conhecimento subjetivo, segundo Popper, torna-se explícito em Descartes

“penso eu sou”, significa que o sujeito cognoscente quando pensa tem certeza de

que existe e quando deixa de pensar não tem nenhuma razão para pensar que

exista. Logo o sujeito é uma substância cuja essência é pensar. Portanto, “conhecer

é uma atividade e pressupõe a existência de um sujeito conhecedor. É o ser

subjetivo quem conhece” (POPPER, 1999, p.77).

Já o conhecimento objetivo, “ou o conhecimento no sentido objetivo, que

consiste dos conteúdos lógicos de nossas teorias, conjecturas e suposições”

(POPPER, 1999, p.78), independe do sujeito conhecedor. É o conhecimento sem

conhecedor. Exemplos de conhecimento objetivo são as teorias ou hipóteses

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científicas publicadas em livros, revistas, memórias de computadores, entre outras

formas, bem como as discussões e os problemas alusivos a essas teorias ou

hipóteses.

Popper critica o método do estudo da epistemologia sobre o problema do

conhecimento primar apenas pela faceta subjetiva. O autor afirma que

A epistemologia tradicional tem estudado o conhecimento ou o pensamento

num sentido subjetivo - no sentido comum das expressões “sei” ou “estou

pensando”. Isto, afirmo, tem levado estudiosos de epistemologia a

irrelevâncias: enquanto pretendiam estudar o conhecimento científico,

estudavam de fato algo que não tem significado para o conhecimento

científico. Pois o conhecimento científico simplesmente não é conhecimento

no sentido de “sei” pertence ao que chamo “segundo mundo”, o mundo de

sujeitos, o conhecimento científico pertence ao terceiro mundo, ao mundo

de teorias objetivas, problemas objetivos e argumentos objetivos. (POPPER,

1999, p.110)

Desta forma, a epistemologia tradicional abordando o conhecimento

científico no sentido subjetivo, faz com que o conhecimento fique dependente de um

sujeito conhecedor, sem autonomia e existência próprias que transcendam o sujeito.

Na epistemologia tradicional, “tanto racionalistas quanto empiristas procuram

explicar o conhecimento como processo subjetivo de conhecer. Ora, por essa via

jamais se conseguirá tocar nas questões fundamentais que envolvem o

conhecimento científico, pois esse é fruto do mundo 3” (PELUSO, 1995, p. 106).

Importante dizer, que Popper compreende a epistemologia como teoria do

conhecimento científico, logo como conhecimento objetivo. Desse modo, fica

evidente a discordância de Popper em relação à abordagem do conhecimento em

sentido subjetivo propagada pela epistemologia tradicional.

Ao discordar da epistemologia tradicional de teóricos consagrados como

Descartes, Locke, Hume, entre outros. Popper afirma que ao adotarem esta forma

subjetiva de pensar o conhecimento, eles não foram capazes de explicar

satisfatoriamente a realidade. Para o filósofo austríaco, a solução deste problema

está na apresentação da tese pluralista dos três mundos de realidades do

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conhecimento. Tese em que se postulam três mundos do conhecimento distinguidos,

conforme mencionamos na seção introdutória do nosso trabalho.

O primeiro mundo é o mundo físico, são os objetos físicos; o segundo mundo,

o mundo do conhecimento subjetivo, são os processos mentais com os quais

interagimos com o mundo; e, o terceiro, o mundo de publicações dos conteúdos

objetivos de pensamentos, tais como as teorias e hipóteses científicas, obras de

artes, entre outras.

Popper afirma que os três mundos se relacionam, ou seja, interagem da

seguinte forma: os dois primeiros mundos interagem diretamente, assim como o

segundo e terceiro mundo também interagem diretamente. Ao passo, que o primeiro

e o terceiro mundo não podem interagir senão por intervenção do segundo mundo,

eles precisam de alguma ação intermediária exercida pelo segundo mundo.

Logo, o segundo mundo (o mundo de estados de consciência ou de estados

mentais) passa a ser uma ligação para que o terceiro mundo possa interagir e não

ser apenas uma mera ficção, mas ter validade e efeito no primeiro mundo, o mundo

físico.

Com respeito ao impacto ou mudanças que o terceiro mundo causa no

primeiro mundo, diz Popper: “basta pensar apenas no impacto da transmissão de

energia elétrica ou da teoria atômica sobre nosso ambiente inorgânico e orgânico,

ou no impacto das teorias econômicas sobre a decisão de construir um barco ou um

aeroplano" (POPPER, 1999, p.156).

Portanto, uma das principais funções do segundo mundo é apreender os

conteúdos do terceiro mundo para relacionar com o primeiro. Dessa forma, todo ato

subjetivo de compreensão está amplamente ancorado no terceiro mundo (POPPER,

1999, p.158).

Assim, podemos considerar que o terceiro mundo não é mera ficção e

exerce imensa influência sobre o primeiro mundo, pois é através do segundo mundo

- conhecimento subjetivos - que as teorias científicas, que pertencem ao terceiro

mundo, podem intervir no mundo 1 a tal ponto de influenciar e causar mudanças

sobre o mundo físico. Segundo Popper:

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Todas as coisas importantes que podemos dizer acerca de um ato de

conhecimento consistem em apontar os objetos de terceiro mundo do ato –

uma teoria ou proposição – e sua relação com outros objetos de terceiro

mundo, tais como os argumentos referentes ao problema bem como os

objetos conhecidos. (POPPER, 1999, p.159)

Em Conhecimento objetivo (1999), Popper revela aos seus leitores a

influência platônica na elaboração da sua tese pluralista.

Platão descobriu não só o terceiro mundo, mas parte da influência ou

retrocarga do terceiro mundo sobre nós mesmos; compreendeu que

tentamos apreender as ideias de seu terceiro mundo; e também que as

usamos como explicações. (POPPER, 1999, p.126)

O mundo das ideias de Platão referem-se as coisas que não ocupam

espaço, tais como: justiça, beleza, número, dentre outras, para o filósofo ateniense

as ideias são mais reais do que as coisas físicas. O mundo físico seria uma espécie

de ilusão, que, em certa medida, apresenta-se de forma defeituosa ao ser, não está

na matéria a razão de sua inteligibilidade, pois o mundo físico é constituído por

cópias das ideias que habitam um mundo suprassensível, isso é, o mundo físico

somente se explica mediante o recurso ao suprassensível.

Ponderamos que a teoria das ideias de Platão compreende um mundo

divino, imutável e perfeito – um universo constituído por ideias verdadeiras. Ao

passo, que o terceiro mundo de Popper não trata de conceitos imutáveis, perfeitos e

divinos, mas sim de um mundo das criações humanas sendo passíveis de mudanças

no decorrer do tempo.

Portanto, cabe salientar que, enquanto a teoria de Platão pauta-se na

concepção de que as ideias são verdadeiras, divinas e imutáveis, Popper, ao

contrário, afirma que seu terceiro mundo constitui-se de teses e hipóteses tanto

verdadeiras como falsas. Mesmo a hipótese sendo falseada, ela não deixa de existir

e poderá continuar interagindo e influenciando o mundo físico.

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A tese popperiana, conforme afirma o filósofo austríaco, baseia-se no

universo de conteúdos de pensamento de Frege. Lendo Frege, Popper encontrou a

possibilidade de um terceiro mundo, e aquele antecedendo este, admite a existência

de um terceiro reino que, para ele, é intemporal e verdadeiro, onde as teorias para

serem consideradas verdadeiras não estão condicionadas ao descobrimento.

Leiamos a explicação de Frege.

É preciso admitir um terceiro domínio. O que este contém coincide com as

idéias, por não poder ser percebido pelos sentidos, e também com as

coisas, por não necessitar de um portador a cujo conteúdo de consciência

pertenceria. Assim, por exemplo, o pensamento que expressamos no

teorema de Pitágoras é intemporalmente verdadeiro, verdadeiro

independentemente do fato de que alguém o considere verdadeiro ou não.

Ele não requer nenhum portador. Ele é verdadeiro não a partir do momento

de sua descoberta, mas como um planeta que já se encontrava em

interação com outros planetas antes mesmo de ter sido visto por alguém.

(FREGE, 2002, p.27)

Conforme exposto pela citação acima, Frege nos remete para um terceiro

reino, onde um pensamento não é a representação ou um ato subjetivo do pensar, já

que nele há o conteúdo objetivo do que é pensado. O professor Mario Ariel

Gonzalez Porta, ao refletir sobre a abordagem de Frege, declara: “A diferença entre

o objetivo e o real se aplica não só ao objetivo, mas também, ainda que em forma

modificada, ao sujeito. Se nem tudo „no sujeito‟ é representação, então este acesso

a algo que, não sendo real „nele‟, é, não obstante, em algum sentido, „objetivo‟.”

(PORTA, 2011, p.223).

Enfatizamos que a distinção entre os pensamentos subjetivo e objetivo é

essencial para a fundamentação da teoria do terceiro mundo popperiano. Pois, de

acordo com o autor,

conhecimento ou o pensamento no sentido subjetivo, constituído de um

estado de espírito ou de consciência ou de uma disposição para reagir; e

Conhecimento ou pensamento num sentido objetivo, constituído de

problemas, teorias e argumentos como tais. (POPPER, 1999, p.110)

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Popper acredita que ao propor uma tese que preze pela existência de um

terceiro mundo objetivo estará provocando os filósofos que defendem uma

epistemologia tradicional. O autor os rotulam de “filósofos de crença”, e afirma que

tais estudiosos estão preocupados com nossas crenças subjetivas, as que

compreendem o segundo mundo. Já o terceiro mundo popperiano tem a crítica e

não a crença como “habitante”. Tornando, desse modo, a epistemologia tradicional

irrelevante para o conhecimento científico.

Acerca da compreensão dos objetos do terceiro mundo, Popper afirma que

quase todos os estudiosos da humanidade e, sobretudo, aqueles interessados na

compreensão de suas pesquisas atuam no segundo mundo, ou seja, operam com

atividades de processos intelectuais deste universo subjetivo, visto que a

compreensão é o objeto que pertence ao mundo dois. Embora, a compreensão seja

um processo mental e faça parte do conhecimento subjetivo, seu resultado final

pode vir a pertencer ao terceiro mundo, ao figurar uma teoria ou uma explicação

pautada de argumentos. Dentro dessa perspectiva, Popper diz que a tese principal

do mundo 3 é

quase todo o nosso conhecimento subjetivo (conhecimento do mundo 2)

depende do mundo 3, isto é, de teorias formuladas linguisticamente (pelo

menos virtualmente). Exemplo: nossa “autoconsciência imediata”, ou o

“conhecimento de si mesmo”, que é muito importante, depende muito

amplamente de teorias do mundo 3: de nossas teorias a respeito do nosso

corpo e de sua existência continuada quando dormimos ou ficamos

inconsciente; de nossas teorias a respeito de tempo (sua linearidade); de

nossa teoria de podermos captar nossas lembranças de experiências

passadas com vários graus de clareza; e assim por diante. Com essas

teorias estão ligadas nossas expectativas de acordar depois de dormir.

Proponho a tese de que a plena consciência de si mesmo depende de todas

essas teorias (mundo 3) e de que os animais, embora capazes de

sentimentos, sensações, memória e, portanto, de consciência, não possuem

a plena consciência do próprio ser, que é um dos resultados da linguagem

humana, e o desenvolvimento do mundo 3, especificamente humano.

(POPPER, 1999, p.78)

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De acordo com a argumentação do filósofo austríaco, “o conhecimento

científico pertence ao terceiro mundo, ao mundo de teorias objetivas, problemas

objetivos e argumentos objetivos” (POPPER, 1999, p.110).

A autonomia, para a tese popperiana, apresenta-se como a ideia central do

terceiro mundo. Ainda, que o terceiro mundo seja uma criação humana, há a

possibilidade constante dos objetos pertencentes ao terceiro mundo, criarem novos

problemas e novos fatos não pretendidos e não previstos. Neste sentido, Popper

declara:

Concordo com Brouwer em que a sequencia dos números naturais é uma

construção humana. Mas, embora criemos essa sequencia, ela por sua vez

cria seus próprios problemas autônomos. A distinção entre números

ímpares e pares não é criada por nós: é uma conseqüência não pretendida

e inevitável de nossa criação. Os números primos, sem dúvida, são fatos

autônomos e objetivos similarmente não pretendidos (não são criados por

nós, mas descobertos por nós); e em seu caso é óbvio que há aí, para nós,

muitos fatos a descobrir. (POPPER, 1999, p.120)

O filósofo apresenta um terceiro mundo autônomo e que independe do

sujeito que conhece, embora seja uma criação humana, a existência de elementos

do mundo 3 independe do sujeito que conhece, pois há problemas que existem e

que, ainda, não se tornaram conscientes do sujeito conhecedor. Além de haver

problemas que não foram criados por nós humanos, porém, descobertos por nós.

Podemos esperar que surjam novos fatos, novos problemas e novas refutações não

aguardados e nem antecipados pela ação humana. Assim, novos elementos do

terceiro mundo em Popper surgirão e, consequentemente, contribuirão para o

crescimento do conhecimento. Sobre isto, retomaremos as considerações de Popper

ao afirmar que “a autonomia do terceiro mundo e a retrocarga do terceiro mundo

sobre o segundo e mesmo o primeiro estão entre os fatos mais importantes do

crescimento humano“ (POPPER, 1999, p.120).

Muitos opositores da existência da tese de um terceiro mundo até admitem a

existência de teses científicas, argumentos e críticas, mas para eles tudo isso se

resume em entidades de estados mentais subjetivos. Em defesa da existência de um

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terceiro mundo de conhecimento objetivo e independente de estados mentais

subjetivos, Popper apresenta dois argumentos.

O primeiro argumento pauta-se na concepção de que “todas as nossas

máquinas e equipamentos são destruídos, bem como todo o nosso aprendizado

subjetivo, incluindo nosso conhecimento subjetivo sobre as máquinas e

equipamentos e de como usá-los” (POPPER, 1999, p.109). Sobram, somente, as

bibliotecas com livros de todas as nossas descobertas científicas e tecnológicas, tais

como: química, matemática, física, sociologia, biologia, entre outros conhecimentos

científicos e tecnológicos.

Interessante dizer, que depois de algum tempo a humanidade poderá

alcançar o conhecimento científico e tecnológico próximo ao que temos nos dias

atuais, pois todo o conhecimento encontra-se nas bibliotecas. Bastam aos homens

ávidos de conhecimento adquiri-los. Segundo Popper, “claramente, depois de muito

sofrimento, nosso mundo pode continuar a andar” (POPPER, 1999, p.110).

Quanto ao segundo argumento, o filósofo disse: “máquinas e equipamentos

são destruídos, bem como nosso aprendizado subjetivo, incluindo nosso

conhecimento subjetivo de máquinas e equipamentos e de como usá-los” (POPPER,

1999, p.110). Mas, desta vez, todas as bibliotecas e todos os livros também foram

destruídos.

Diante desse cenário, podemos constatar a autonomia do terceiro mundo,

uma vez que haverá enormes possibilidades de os habitantes do segundo

argumento levarem um tempo maior que os habitantes do primeiro argumento para

alcançar o conhecimento científico e tecnológico que nós possuímos atualmente,

pois a humanidade que pertence ao primeiro argumento, beneficiada com as

bibliotecas, livros e também com o conhecimento subjetivo das ciências, bastam que

os homens leiam e entendam os livros para adquirem e aplicarem na sociedade os

conhecimentos científico e tecnológico. Já os habitantes do segundo argumento,

conforme diz Popper: “não haverá aparecimento de nossa civilização por muitos

milênios” (POPPER, 1999, p.110).

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23

A reflexão popperiana evidencia que o conhecimento objetivo tem existência

autônoma e independe de um sujeito conhecedor, e, que o conhecimento subjetivo

integra os processos mentais que interagem com o mundo.

Outra importante reflexão para a defesa da existência de um terceiro mundo

autônomo é, segundo Popper, reconhecê-lo por meio de uma espécie de

argumentos biológico ou evolucionário. O filósofo explica que um biólogo pode estar

interessado no comportamento de animais, porém, pode também se interessar por

estruturas “que os animais produzem, tais como teias de aranha, ninhos construídos

por vespas ou formigas, tocas de texugos, barragens feitas por castores, ou

caminhos abertos por animais em florestas” (POPPER, 1999, p.114).

Os pressupostos reflexivos aplicados às estruturas de produção dos animais

também podem ser utilizados para as atividades humanas. Popper, lançando mão

da abordagem anti-behaviorista e anti-psicológica, disse que podemos aprender

mais estudando os próprios produtos produzidos pela atividade humana do que

estudar o comportamento de produção.

Ainda, neste contexto de validação da existência de um terceiro mundo,

Popper aponta mais dois aspectos principais para a existência deste universo que,

segundo ele, são as duas funções superiores da linguagem humana: a descritiva e a

argumentativa.

Em relação às linguagens inferiores, como a autoexpressão e a sinalização,

sabemos que todos os animais as possuem. A função autoexpressão ou sintomática

ocorre por meio da expressão corporal de sinais linguísticos, nos quais se percebe

os significados, os valores, os sentimentos e as emoções. Já a sinalizadora exige a

existência de dois organismos: um emissor – o produtor de sinais linguísticos –, e o

receptor, que a partir do que fora emitido corresponderá satisfatoriamente.

Permitimo-nos afirmar que tais funções linguísticas inferiores são dispositivos

biológicos inatos aos animais, ao passo que, somente o homem é detentor das duas

funções superiores da linguagem: a descritiva e a argumentativa. Estas, ao contrário

das inferiores, não são dispositivos biológicos inatos, mas uma criação humana, um

fato cultural. Somente através dessas funções superiores que problemas, hipóteses,

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teses e críticas podem se desenvolver de modo a emergir um terceiro mundo. Pois a

linguagem descritiva podemos expor fatos que se ajustam à verdade e a criar

objetos que servirão para a função argumentativa. Com o argumento é possível

raciocinar e criticar as ideias reguladoras dos objetos expostos pela função

descritiva. Logo, será no terceiro mundo que poderão se desenvolver as funções

superiores da linguagem humana, como a descrição e a argumentação.

Ainda, no livro Conhecimento objetivo, Popper apresenta um método de

solução de problemas, que ele nomeia de conjectura e refutação. Conforme a

formulação popperiana, o esquema se estrutura do seguinte modo:

P1 → TT → EE → P2

Sobre isto, Popper explica:

Aqui, P1 é o problema do qual partimos, TT (teoria experimental) é a

solução conjectural imaginativa que alcançamos primeiro, por exemplo,

nossa primeira interpretação experimental. EE (eliminação de erro) consiste

de um severo exame crítico de nossa conjectura, nossa interpretação

experimental: decorre, por exemplo, do uso crítico de evidência

documentária e, se tivermos nesta etapa inicial mais de uma conjectura ao

nosso dispor, consistirá também de uma discussão crítica e da avaliação

comparativa das teorias concorrentes. P2 é a situação de problema tal como

emerge de nossa primeira tentativa crítica de solucionar nossos problemas.

Leva à nossa segunda tentativa (e assim por diante). Uma compreensão

satisfatória será alcançada se a interpretação, a teoria conjectural, encontrar

apoio no fato que esperávamos; ou se achar apoio no fato de explicar

muitos subproblemas, alguns dos quais não foram vistos no começo. Assim

podemos dizer que podemos avaliar o progresso que fizemos comparando

P1 com alguns de nossos problemas posteriores (P2, digamos). (POPPER,

1999, p.160)

O esquema acima apresentado indica uma atividade de processos

intelectuais de nosso segundo mundo subjetivo, porém quando tentamos

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compreender algo para tal análise é necessário utilizar objetos do terceiro mundo,

como problemas, conjecturas e argumentos críticos.

Por fim, Popper afirma que as hipóteses, mesmo não logrando êxito ao se

submeterem aos testes severos da falseabilidade empírica, elas continuarão

frutíferas, já que se pode aprender com seus insucessos e, desta forma, criar

hipóteses melhores. Percebe-se que o crescimento do conhecimento para Popper

não é um processo acumulativo, mas de seleção darwiniana pautado na eliminação

do erro. A expansão do conhecimento é concebida pela substituição de teorias

científicas, melhores e mais satisfatórias.

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2. Comparações das obras publicadas sobre a tese dos três

mundos em Karl Popper

Nosso objetivo, neste segundo capítulo, é analisar a tese dos três mundos,

bem como as reformulações teóricas ao longo da vida intelectual de Popper.

Importante ressaltar, que lançaremos mão de uma análise comparativa para esta

reflexão com a primeira publicação a obra Conhecimento Objetivo, que servirá

conforme já foi dito de parâmetro para comparações para as demais publicações

aqui apresentadas.

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2.1. Livro: Autobiografia Intelectual

2.1.1. O mundo três ou o terceiro mundo

Em 1974, Karl Popper escreveu sua autobiografia intelectual, na qual

explicita suas ideias filosóficas. Encontraremos nos capítulos 38 e 39 desta

publicação uma reflexão do objeto aqui pesquisado: a tese da pluralidade de

realidades de mundos do conhecimento.

Mais uma vez, registramos que o filósofo austríaco afirma que a distinção

entre conhecimento objetivo e subjetivo é a condição necessária para a existência

de um terceiro mundo. O caminho seguido por Popper foi pautado na concepção de

Bolzano (POPPER, 1999) “verdades em si mesmo”, em que apresenta a distinção

entre enunciados em si mesmos e os processos mentais subjetivos:

Os enunciados em si mesmos podem manter relações lógicas uns com os

outros: um enunciado pode ser decorrência de outro e os enunciados

podem ser logicamente compatíveis ou incompatíveis. De outra parte, os

processos mentais subjetivos só podem manter entre si relações

psicológicas. (POPPER, 1978, p.190)

Bolzano contempla os enunciados em si mesmo, sob o status ontológico.

Portanto, o enunciado não mantém relações de ordem psicológica entre si. Os

enunciados, em si mesmo, se diferenciam dos processos mentais subjetivos, mas

ambos pertencem a dois mundos, em sentidos diversos.

A leitura, retomada por Bolzano, do professor Mario Ariel Gonzalez Porta

contribuirá para o nosso entendimento. Vejamos algumas das suas considerações:

Existem “verdades em si” (Wahrheiten an sich), isto é: há verdades

independentes do homem e inclusive, de Deus; o sujeito pode captá-las,

mas não produzi-las. Do conceito de “verdades em si”, segue-se o de

“proposição em si” (Satz an sich). Verdades em si supõem “proposições em

si”, pois elas não são outra coisa que proposições em si que são

verdadeiras. Proposições em si são o sentido de enunciados pensados ou

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expressados, um sentido, porém, que não pressupõe atos psicológicos ou

lingüísticos. (PORTA, 2004, p.111)

Segundo Bolzano, pautado nas reflexões de Mario Ariel González Porta, há

verdades que independe do homem e que não se trata do conhecimento, sob a ótica

de processos mentais subjetivos. Bolzano antecipa a teoria do conhecimento

moderno ao registrar “a distinção bolzaniana entre teoria do conhecimento e da

ciência marca de forma explícita um corte com a tradição moderna e antecipa a

“Theory of science” contemporânea” (PORTA, 2004, p.110).

Os três mundos de Popper estão além dos enunciados, em si mesmos,

propostos por Bolzano. Ele povoa o terceiro mundo não somente com enunciados,

mas sobretudo com problemas e argumentos críticos. “Com efeito, as teorias devem

ser sempre discutidas sem que se percam de vista os problemas que elas possam

resolver” (POPPER, 1978, p.192).

Popper disse, que as teorias em si mesmas “são tão reais quanto mesas e

cadeiras” (POPPER, 1978, p.193). Uma vez que todas as coisas que são capazes

de agirem sobre objetos físicos, são reais. Por exemplo, os gases e as correntes

elétricas podem matar-nos e as imagens da televisão também são reais. Essas

imagens correspondem às ondas eletromagnéticas, a televisão capta as ondas e as

codifica através de seus componentes internos, convertendo-as em imagens e sons.

O mundo 3 também é um produto da mente humana. Somos nós que

criamos a maioria dos objetos do mundo 3. Por outro lado, Popper afirma que a

concepção da intemporalidade do mundo 3 não é agradável, apesar de possível. Se

um enunciado é verdadeiro, será sempre verdadeiro. De acordo com Popper: “Seria

fácil, por esse motivo, considerar intemporal todo o mundo 3, tal como Platão sugeriu

a respeito de seu mundo de Formas ou Ideias. Bastaria admitir que jamais criamos

uma teoria; que sempre a descobrimos” (POPPER, 1978, p.196).

Popper diz que não lhe agrada essa posição de considerar intemporal todo o

mundo 3, “ela não só deixa sem solução o problema do status ontológico do mundo

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3, como torna esse problema insolúvel, de um ponto de vista racional” (POPPER,

1978, p.196).

Ao contrário da concepção de intemporalidade no mundo 3, Popper formula

que apesar do mundo 3 ser um produto da mente humana, pois somos nós que

criamos os objetos do mundo 3, ele é tão real quanto outros produtos pertencentes

ao mundo 1. Os objetos do mundo 3 existem sob a forma de corpos materiais, e, em

certo sentido, pertencem tanto ao mundo 3 como ao 1. Exemplo disso é o livro que

é um objeto físico que pertence ao mundo1, porém, seu conteúdo, que é o que faz

do livro um produto significante da mente humana pertence ao mundo 3.

Um ponto que Popper chama a atenção é de que consideramos real tudo

aquilo que seja capaz de agir sobre coisas físicas. “Entretanto, nosso mundo de

coisas físicas foi grandemente alterado pelo conteúdo de teorias como as de

Maxwell e Hertz, ou seja, por objetos do mundo 3. Assim, esses objetos devem ser

chamados reais” (POPPER, 1978, p.194).

Nesse caso podemos verificar um intercâmbio entre as teorias científicas

que pertencem ao mundo 3, com relação ao mundo físico, chamado de mundo 1.

Esse cenário é importante para Popper, quando ele trata do problema corpo-

mente em que ele afirma que o mundo 1 e o mundo 2 podem interagir, assim como o

mundo 2 e mundo 3. Porém, o mundo 3 e o mundo 1 somente interagem com a

intervenção do mundo 2. Como por exemplo, a incorporação de uma teoria a um

livro, pois “para ser lido, o livro requer a intervenção de uma mente humana, do

mundo 2. Mas requer também a própria teoria” (POPPER, 1978, p.195). Essa teoria

pertence ao mundo 3, assim sendo, temos o mundo 1 e o mundo 3 interagindo com

a intervenção do mundo 2.

Outro aspecto importante, que Popper disse acerca do mundo 3 é que este é

o mundo dos problemas, dos argumentos críticos e das teorias, como resultado da

evolução da linguagem humana. O mundo 3 é a história de nossas ideias de como

as inventamos e reagimos diante desses produtos de nossas próprias elaborações.

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2.1.2. O problema corpo-mente e o mundo 3

Karl Popper julga tolo negar a existência de experiências mentais e de que

elas estejam ligadas aos estados fisiológicos. Para ele, os estados mentais são

produtos evolutivos da vida, e que se progride muito pouco estudando os estados

mentais, reduzidos aos critérios físicos ou biológicos.

Com respeito ao problema da relação entre corpo-mente, Popper declara

que “parecia óbvio o fato de sermos eus ou mentes (ou almas) encarnadas. Mas

como compreender racionalmente a relação corpo-mente (ou estados fisiológicos) e

nossas mentes (ou estados mentais)?” (POPPER, 1978, p.198). A abordagem

proposta pelo filósofo é de teor biológico e evolucionista do problema na relação

corpo-mente.

Popper acredita que a mente humana deva ser encarada como um órgão

corporal altamente desenvolvido, que além de produzir objetos do mundo 3, é,

essencialmente, um produtor da linguagem humana, constituída por “teorias,

argumentos críticos e de muitas outras coisas, tais como erros, mitos, relatos,

anedotas, ferramentas e obras de arte” (POPPER, 1978, p.199).

Quanto à linguagem humana, Popper a define como um dispositivo biológico

inato e que somente através da linguagem nos tornamos produtores de teorias, de

argumentos e de outras questões que “habitam” o mundo 3. Ainda, de acordo com

Popper, o nascimento da linguagem descritiva é o epicentro da nossa capacidade

humana de usar a imaginação, a inventividade e do surgimento do mundo 3. Neste

sentido, o autor afirma: “Entendo que foi a linguagem e que a linguagem é quase o

único instrumento exossomático de uso inato no homem, ou melhor, de base

genética” (POPPER, 1978, p.199).

Para a tese popperiana, a base fisiológica da mente humana está no centro

da fala, e não na glândula pineal, conforme pensa Descartes ao acreditar que a

relação entre a nossa consciência e o corpo se dê através da glândula pineal, que

para ele se localiza na sede da alma. A respeito disto, Popper explica, “seja como

for, a base fisiológica da mente humana deve ser procurada, se estou certo, no

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centro da fala; e talvez não seja acidental o fato de parecer existir nos dois

hemisférios do cérebro apenas um centro de controle da fala” (POPPER, 1978,

p.200).

2.1.3. Posição dos valores num mundo de fatos

Os valores surgem com o aparecimento da vida e não com o aparecimento

da consciência, como muitos estudiosos pensam. Sobre isto, Popper declara o seu

desapontamento com a solução proposta por Kohler em relação ao problema por ele

elaborado, através da questão: “Qual a posição dos valores no mundo dos fatos; e

como puderam eles ter entrada nesse mundo de fato?” (POPPER, 1978, p.203).

A concepção popperiana trata dos valores como elementos pertencentes ao

mundo 3, pois os valores são concebidos conjuntamente com os problemas. Valores

não podem existir sem problemas, que juntamente com as teorias e as críticas

constituem o epicentro do mundo três. Se um determinado valor criado ou

descoberto for discutido a fim de solucionar um problema, esse valor poderá tornar-

se “habitante” do terceiro mundo. Leiamos as considerações de Popper:

Nossas mentes, nossos eus, não podem existir sem o mundo 3: estão

enraizados neles. À interação com o mundo 3 devemos nossa

racionalidade, a prática do pensamento crítico e autocrítico, e o agir.

Devemos-lhe nosso desenvolvimento mental. E devemos-lhe nossa relação

com nosso trabalho, com nossa obra, e as repercussões que isso tem sobre

nós mesmo. (POPPER, 1978, p.206)

Desta forma, os valores surgem conjuntamente com os problemas, e,

consequentemente, não existem valores sem problemas. Como o terceiro mundo de

Popper é o mundo das teorias, da crítica e dos problemas, logo o valor também

poderá se transformar em elemento do terceiro mundo.

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2.2. Livro: O eu e Seu Cérebro

Publicado em 1977, O eu e seu cérebro é um livro que conjuga a

interdisciplinaridade entre ciência e filosofia. A obra divide-se em duas partes: a

primeira escrita por Popper – um filósofo – e, a segunda elaborada por Ecles – um

cientista interessado nos estudos do cérebro. O ponto chave da publicação refere-se

ao fato de ambos os autores discutirem sobre o problema da relação corpo-mente e

considerarem a existência da consciência como realidade no mundo do

conhecimento.

2.2.1. O materialismo transcendente a si próprio

Nas páginas iniciais do livro O eu e seu cérebro (1977), Popper discute

acerca do termo real. Ele menciona que o que nós entendemos por real são as

coisas materiais que podemos segurar, como também consideramos como real, os

líquidos, os gazes e o ar. De acordo com o filósofo, devemos encarar como real as

“forças e campos de forças, cargas, e assim por diante, ou seja, entidades físicas

teóricas, outras, que não a matéria – são também reais” (POPPER, 1991, p.28).

Trata de entidades que nós conjeturamos serem reais e que deveriam ser

capazes de exercer um efeito causal sobre as coisas que, prima facie, são

consideradas reais, ou seja, sobre coisas materiais de tamanho ordinário.

Assim, podemos explicar mudanças no mundo material comum de coisas,

por efeitos causais de entidades tidas como reais. (POPPER, 1991, p.26)

Tomando as reflexões de Popper, concluímos que o entendimento de real

está além da matéria ou coisa física que podemos ter acesso pelos nossos sentidos,

já que as entidades teóricas abstratas, como as hipóteses ou teses científicas, por

influenciarem direta ou indiretamente sobre as coisas físicas, são igualmente reais.

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Outra questão tratada por Popper no livro se refere à evolução. Como um

darwinista, considera tratar o problema da relação corpo - mente (a consciência)

como produtos da evolução por seleção natural. Segundo ele, a evolução do

universo ocorreu através das seguintes etapas:

(1) a produção dos elementos mais pesados, inclusive isótopos, e o

aparecimento de líquidos e cristais; (2) o aparecimento da vida; (3) o

aparecimento da sensibilidade; (4) o aparecimento, juntamente com a

linguagem humana, da consciência do “eu” e da morte (ou mesmo do córtex

cerebral); (5) o aparecimento da linguagem humana e de teorias do “eu” e

da morte; (6) o aparecimento de produtos da mente humana, tais como

mitos explicativos, teorias científicas ou obras de arte. (POPPER, 1991, p.34

e 35)

O homem ao emergir na terra com sua criatividade e inventividade, cria um

mundo à parte do mundo físico que, segundo Popper, é um mundo de conhecimento

objetivo, definido por ele de mundo 3 - o universo dos produtos da mente humana,

dos mitos, das teorias, das hipóteses científicas, das poesias e das obras de artes.

Essa ideia de evolução é considerada criativa, pois ao longo do curso da evolução

“novas coisas e eventos ocorrem, com propriedades inesperadas e certamente

imprevisíveis; coisas e eventos que são novos, mais ou menos no sentido em que

uma grande obra de arte pode ser considerada como nova” (POPPER, 1991, p.41).

Até o momento, destacamos os argumentos popperianos sobre a existência

de um mundo da consciência. Agora, abordaremos outra discussão proposta pelo

filósofo no livro: o aparecimento da consciência.

Para a teoria cartesiana, a consciência existe somente no homem, pois

sendo os animais meros seres inanimados, estes não possuem consciência. Mas,

para Popper, o animal é também possuidor de consciência. De acordo com ele, o

aparecimento dessa consciência é um processo evolutivo que surge sob pressão da

seleção natural. E, para nós, humanos, há os estágios da consciência mais altos e

mais baixos que se refletem nos sonhos.

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Portanto, sob a ótica darwinista, Popper defende a relação entre corpo e

mente e que o terceiro mundo (produtos da mente humana) participa do processo

evolutivo da consciência. Karl Popper justifica tal posicionamento, declarando que a

existência do terceiro mundo só foi possível com “o aparecimento da linguagem

humana que criou a pressão seletiva sob a qual surgiu o córtex cerebral e, com ele,

a consciência humana do „eu‟.” (POPPER, 1991, p.51).

2.2.2. Os mundos 1, 2 e 3

As realidades de estados de eventos mentais têm sido negadas por muitos

filósofos, alguns até aceitam a existência destes estados de eventos mentais, porém

negam que eles interajam com o mundo físico.

Popper defende um pluralismo dos mundos do conhecimento e menciona que

uma de suas principais ideias sobre os objetos do mundo 3 é que eles são reais:

existem objetos que pertencem tanto ao mundo 3, como ao mundo 1. Como

exemplo: há o livro, que “é um objeto físico, logo pertence ao mundo 1; mas o que

faz dele um produto significante da mente humana é o seu conteúdo, que pertence

(...) ao mundo 3” (POPPER, 1991, p.62).

Um aspecto importante e que devemos considerar é que possuímos uma

curiosidade inata, geneticamente direcionada para a exploração do meio ambiente

físico e social. Tal curiosidade no campo social “leva-nos primeiramente a aprender

a falar, depois a ler e, então, a apreciar a ciência e a arte” (POPPER, 1991, p.71). É

a linguagem possibilitando ao homem a produção de teorias, de argumentos e de

muitas outras coisas que habitam o terceiro mundo.

O método que usamos para apreender, segundo Popper, se dá “não pela

visão direta ou pela contemplação, mas pela prática, pela participação ativa, como

fazer objetos do Mundo 3, como entendê-los e como vê-los” (POPPER, 1991, p.71).

Daí ser perfeitamente compreensível que o cientista se interesse pelo mundo 1.

Contudo, ressaltamos que para ele apreender o mundo 1 terá que entender e

compreender hipóteses ou teses que habitam o mundo 3. Pois, “somente pela

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investigação, e daí, ou seja, fazer uso dos produtos do Mundo 3 como instrumento,

para mudar o Mundo 1” (POPPER, 1991, p.72). Por isso, que podemos considerar

os objetos abstratos do Mundo 3 como reais, já que são instrumentos importante

para mudar o Mundo 1.

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2.3. Livro: Karl Popper Textos Escolhidos

2.3.1. “O problema corpo-mente”

No texto O problema corpo-mente, apresentado em 1977, Popper explicita

sua tese dos três mundos sem muitas diferenças em relação às primeiras reflexões

realizadas, em 1972, no livro: Conhecimento objetivo.

Popper disse que considerar a hipótese da existência do terceiro mundo,

ajudará a lançar luz no esclarecimento do problema corpo-mente e, ainda, apresenta

três argumentos nos sentido de reforçar a existência dos três mundos.

O primeiro argumento trata os objetos do mundo 3, como reais, apesar de

abstratos, pois exercem influência para transformar o mundo 1. No segundo

argumento, destaca-se que o mundo 3 somente interage com o mundo 1 através de

processos mentais que pertencem ao mundo 2. Analisar a interação entre os

mundos 2 e 3 é compreender o epicentro do problema corpo-mente. Já no terceiro

argumento, Popper afirma que os mundos 2 e 3 são entidades que existem, logo são

reais.

Importante ressaltar, como o problema da relação corpo e mente relaciona-

se ao status da linguagem humana. Popper disse que a capacidade de aprender

uma língua é um dispositivo biológico inato no ser humano, isto quer dizer que há no

humano uma disposição inata para aprender alguma linguagem. É diferente de

aprender um idioma, como o português, francês ou inglês, que não é um processo

regulado pelos genes, mas um fator cultural pertencente ao terceiro mundo, “embora

se tornem possíveis graças a aptidões, necessidades e objetivos que ficaram

registrados geneticamente” (POPPER, 2010, p.263). Segundo Popper, o homem é

um criador de instrumentos:

Porém, se por instrumentos nos referirmos aos corpos físicos materiais,

devemos assinalar que nenhum instrumento humano é geneticamente

determinado, nem mesmo uma vareta. O único instrumento que parece ter

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uma base genética é a linguagem, que é imaterial e aparece sob as mais

variadas formas físicas, ou seja, sob a forma de diferentes sistemas de

sons. (POPPER, 2010, p.262)

Neste cenário biológico da linguagem, cabe destacar que a aquisição da

habilidade de adquirir uma fala é de suma importância para nossa capacidade de

amadurecimento para nos tornarmos plenamente humanos. “Aprende-se não só a

perceber e a interpretar as próprias percepções, mas também a ser uma pessoa, a

ser um eu” (POPPER, 2010, p.263).

Outra questão apresentada no texto “O problema corpo-mente” refere-se à

questão: Como é o mundo 3, visto em perspectiva materialista1 ? Para um pluralista,

a existência de aviões, livros, prédios, computador, conferências, obra de arte, entre

outros, apesar de pertencerem ao mundo 1 (o mundo físico) são considerados

encarnações de objetos do mundo 3. No entanto, para um materialista, esses

objetos são simples existências físicas, não existindo interação entre o mundo 3 e o

1.

O materialismo não leva em consideração a existência do mundo 3, pois os

conteúdos do mundo 3 para eles não passam de ideias de nossa cabeça, como as

predisposições para o comportamento verbal baseadas no cérebro.

Popper se contrapõe à conceituação materialista de que o mundo 3

constitui-se de concepções de nossas cabeças e reduzidas ao mundo 2, como

estados cerebrais. Sobre isto, Popper declara: “Sustento que o Mundo 1 não é

causalmente fechado e afirmo que há uma interação, mesmo indireta, entre o Mundo

1 e o Mundo 3. Parece-me claro que essa interação é mediada por eventos mentais

e até parcialmente conscientes do Mundo 2” (POPPER, 2010, p.265).

O filósofo menciona que, do ponto de vista darwiniano, somos levados a

especular sobre o valor dos processos mentais para a sobrevivência. O darwinismo

explica o surgimento, em parte, inicial do mundo 3 como evolução sob pressão da

1 “O materialismo consiste em afirmar que a única causa das coisas é a matéria, (...). A atividade espiritual humana é efeito

estrito da matéria, ou seja, do organismo, do sistema nervoso do cérebro. (...). O M. reducionista (que visa a traduzir, ou melhor, a reduzir, os eventos mentais em estados físicos do cérebro)”. (ABBAGNANO, 2007, p. 747 - 748)

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seleção natural. Pois, neste universo se é permitido a formulação de nossas teorias

sobre o mundo como objetos fora de nós, e, ainda, podemos criticá-las e testá-las

severamente, propondo soluções satisfatórias às enunciações elaboradas ou

eliminando-as, por meio do método de tentativa e erro.

A respeito da existência do mundo três, sob a ótica darwinista, Popper

registra: “A existência do mundo 3 cultural e da evolução cultural, pode despertar

nossa atenção para o fato de que há muita coerência sistemática dentro do Mundo 2

e do Mundo 3. Isso pode ser explicado, em parte, como o resultado sistemático das

pressões da seleção” (POPPER, 2010, p.268). Para o filósofo austríaco, a

explicação da evolução da linguagem só acontecerá se ela for favorável na luta pela

vida. As capacidades linguísticas entram em competições e serão selecionadas por

seus efeitos biológicos.

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2.4. Livro: O Conhecimento e o Problema Corpo-Mente

2.4.1. Conhecimento objetivo e subjetivo

Vinte e um anos após o lançamento do primeiro livro, Conhecimento objetivo

(1972), em que Karl Popper faz menção à tese dos três mundos, o autor publica a

obra O conhecimento e o problema corpo-mente. Na primeira publicação, em 1972,

conforme mostramos nos capítulos anteriores, Popper trata o conhecimento sob dois

aspectos: o subjetivo e o objetivo, contestando, desse modo, a discussão clássica e

moderna da epistemologia – a que aborda o conhecimento apenas sob o prisma do

conhecimento subjetivo.

Segundo a concepção epistemológica clássica, elaborada na obra de Platão

Teeteto ou (Do Conhecimento), o conhecimento refere-se à alma que reflete. No

diálogo de Teeteto Sócrates disse: “mas é assim que imagino a alma no ato de

pensar: formula uma espécie de diálogo para si mesma com perguntas e respostas,

ora para afirmar ora para negar” (PLATÃO, p. 52).

Para Platão, conhecer e crer estão associados, pois o filósofo grego defende

a teoria que não se pode ter conhecimento de algo em que não acreditamos. Diante

desse cenário platônico, confirma-se a crítica de Popper ao mencionar que não se

explora nos estudos tradicionais epistemológicos, desde Platão, a possibilidade de

haver o conhecimento autônomo, sem o sujeito que o conhece, o conhecimento

objetivo – assim identificado por Popper. Sobre a tese geral do conhecimento,

Popper declara:

interessa-me sobretudo o conhecimento objetivo e a sua evolução, e

sustento que não é possível compreendermos os princípios do

conhecimento subjetivo se não estudarmos a evolução do conhecimento

objetivo e o intercâmbio entre os dois tipos de conhecimento ( no qual o

conhecimento subjetivo recebe mais do que dá). (POPPER, 1996, p.16)

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2.4.2. O problema corpo-mente ou mente-corpo

Popper afirma que, apesar de vivermos em um mundo físico, há outros

mundos, pois, de acordo com o autor, “quando vos falo, dirijo-me não aos vossos

corpos, mas às vossas mentes” (POPPER, 1996, p.17). Além da existência do

mundo 1 – dos corpos físicos – há também a existência do mundo 2 – o dos estados

mentais. Eis, aí, o problema da relação entre corpo e mente.

Para explicar o problema corpo-mente, Descartes propõe uma análise

dualista: o corpo (res cogitans) e o espírito (res extensa), conceitos distintos um do

outro. O corpo e a mente são considerados como substâncias distintas entre si, mas

que se relacionam, para que a mente intervenha no corpo. Isto é o que Descartes e

os cartesianos chamam de interação entre corpo e alma.

Popper substitui as definições de corpo e alma concedidas por Descartes

para uma interação entre os mundos físicos e estados mentais. Popper acredita que

sua proposta seja melhor do que as explicações dualista, razão pela qual ele ter se

tornado um pluralista e propagar a existência de um terceiro mundo - o mundo 3.

Quanto a tese principal, Popper considera:

Não é possível compreender o mundo 2, isto é, o mundo povoado pelos

nossos próprios estados mentais, sem que se entenda que a sua principal

função é produzir os objetos do mundo 3 e ser influenciado pelos objetos

deste último. Com efeito, o mundo 2 interage não só com o mundo 1, como

Descartes pensava, mas também com o mundo 3; e os objetos deste

exercem influência sobre o mundo 1 apenas através do mundo 2, que atua

como intermediário.(POPPER, 1996, p.19)

Dois problemas são apresentados pela teoria popperiana: o primeiro refere-

se à distinção do conhecimento entre subjetivo e objetivo. O segundo problema

aborda a questão do corpo e mente. Uma relação sobre esses dois problemas nos é

apresentada por Popper, do seguinte modo: “O conhecimento objetivo pertence ao

mundo 3. Constitui a parte biológica mais importante do mundo 3 e é a que tem

repercussões mais significativas sobre o mundo 1” (POPPER, 1996, p.22).

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Para estudiosos, dedicados ao estudo do objeto aqui em foco, prevalece a

corrente a favor do monismo, ou seja, negar a existência de estados mentais que

não sejam propriedades cerebrais. Existem somente coisas e estados físicos, pois,

segundo esses filósofos, considerar a existência do mundo 2, defendida por

Popper,só resultará em complicações desnecessárias.

Há filósofos, chamados behavioristas radicais, ou fisicistas, que pensam ter

razões a priori, tais como a navalha de ockham, para asseverar que nossa

introspecção de estados ou eventos mentais e nossos relatos acerca de

estados ou eventos mentais são simplesmente introspecções e relatos a

respeito de nós mesmos, como sistemas físicos: são relatos acerca de

estados físicos desses sistemas. (POPPER, 1999, p.268)

O filósofo Quine, fisicista2 (outra forma de monismo) – amigo de Popper –

defende a posição da redução de nossos relatos (ou teorias) mentais a eventos

físicos, isto é, reduz os estados mentais às formas de comportamento. Quine expõe

o assunto da seguinte maneira: “Os estados corporais existem de qualquer modo;

por que acrescentar os outros?” (POPPER apud QUINE, 1996, p.21).

Popper admite que a negação dos estados mentais simplifique o problema.

Mas, quanto à posição adotada por Quine, declara:

Penso que Quine não é coerente quando pergunta: Para quê juntar-lhes os

outros? A quem dirige ele a interrogação? Aos nossos corpos? Aos nossos

estados físicos? Ao nosso comportamento? Quine argumenta. E os

argumentos, sustento eu, pertencem ao mundo 3. Os argumentos podem

ser compreendidos ou apreendidos e compreensão ou apreensão são

assuntos do mundo 2: os nossos corpos podem aprender uma pedra ou um

pau, mas não, apreender ou compreender um raciocínio. (POPPER, 1996,

p.21)

2 “Fisicalismo é um termo usado para designar qualquer forma de materialismo. Uma versão forte e ontológica dele, associável

a uma fase do neopositivismo, afirma que tudo o que existe ou ocorre pode ser descrito completamente pelo vocabulário da física”. (ABBAGNANO, 2007, p. 539)

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Em contraposição à abordagem reducionista de Quine, Popper ainda

acrescenta:

Se entidades mentais ou, melhor, estados mentais existissem – e eu próprio

não duvido de que existam – então é necessário postular estados mentais

para qualquer explicação verdadeira deles; e se eles um dia forem

reduzidos a estados físicos, isto será um tremendo sucesso. Mas não

haverá sucesso algum, em absoluto, se rejeitarmos sua existência notando

simplesmente que podemos explicar todas as coisas sem eles, pelo método

simples de nos confinarmos às coisas físicas e a seu comportamento.

(POPPER, 1999, p.268)

Na opinião de Popper, Quine foi leviano e incoerente ao argumentar a favor

do fisicalismo, atribuindo aos estados mentais status de mero comportamento. Ora,

essa simplificação ou redução de Quine não se revela satisfatória para a resolução

do problema corpo-mente, já que a solução está em considerar a existência do

mundo 3, pois o mundo 2 (estados mentais) funciona como intermediário entre os

mundos 1 e 3.

Acerca desse cenário, torna-se necessário ressaltar que as teorias, as

hipóteses, os argumentos, as críticas contra ou a favor de teorias publicadas em

livros, revistas ou qualquer outra forma de publicação consistem do conhecimento

objetivo, que faz parte do mundo 3. Portanto, ao passo que acontece o progresso do

conhecimento objetivo, este também refletirá parte do crescimento do mundo 3.

Para a solução do problema da evolução do conhecimento humano, Popper

elaborou um esquema quatripartido, pautado no método de ensaio e eliminação de

erro. Tal proposta já havia sido apresentada, sucintamente, pelo filósofo no livro

Conhecimento objetivo (1972). Vejamos de que modo se apresenta o esquema

popperiano:

P1 → TE → EE → P2

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Ele explica:

Onde, P1, representa o problema de partida – que pode ser prático ou

teórico; TE é a teoria experimental proposta e destinada a resolver o

problema; EE significa o processo de eliminação de erros por meio de

ensaios ou discussões críticas; P2 representa os problemas finais – os que

emergem das discussões e dos ensaios.

O esquema global indica que partimos de um problema, quer de

natureza prática quer teórica; tentamos resolvê-lo elaborando uma teoria

possível na qualidade de solução possível – é o nosso ensaio; em seguida,

ensaiamos a teoria, procurando fazê-la abortar – é o método crítico de

eliminação de erros; em resultado deste processo, surge um novo problema,

P2 (ou, quem sabe, vários novos problemas). Em geral, o progresso

alcançado ou o aumento de conhecimentos conseguido calcula-se pela

distância que medeia entre P1 e P2, sabendo-se assim se progredimos.

Resumindo, o esquema diz-nos que o conhecimento parte de problemas e

desemboca em problemas (até onde for possível ir). (POPPER, 1996, p.23)

Karl Popper, ainda, mostrou um esquema quádruplo que pode ser elaborado

de diversos modos. Vejamos:

TEa → EEa → P22a

P1 TEb → EEb → P22b DCA

TEn → EEn → P22n

É no Debate Crítico Apreciativo (DCA) que se avalia qual das teorias é a

melhor, qual sobreviverá e qual deve ser eliminada. Com esse esquema quádruplo,

mostra-se que na evolução do conhecimento apenas as teorias mais aptas

sobreviverão. Dessa forma, é possível compreender que o cenário da evolução da

teoria humana, logo, o crescimento do conhecimento objetivo se dá através de uma

mutação. Nossas teorias são instrumentos, pois nós não desenvolvemos melhores

mãos, mas criamos o martelo; não desenvolvemos melhores olhos, mas criamos os

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binóculos; não desenvolvemos melhores as pernas para locomovermos com mais

rapidez, porém, criamos os automóveis; entre outros instrumentos que criamos para

melhorar as nossas habilidades que se assemelham aos órgãos exossomáticos.

Retomando a reflexão sobre o conhecimento objetivo, destacamos as

seguintes considerações:

Aprendemos muito nos livros e nas universidades. Porém, o oposto não é

verdadeiro: embora o conhecimento objetivo seja um produto do homem,

raramente surge do conhecimento subjetivo. Não é habitual formar opiniões

com base nas experiências pessoal e depois divulgá-las e serem

objetivamente aceites como se fossem uma espécie de “É sabido que”. Em

regra, o conhecimento objetivo resulta de teorias rivais apresentadas

experimentalmente em relação a um problema objetivo conhecido e aquele

só é admitido no domínio objetivo ou no domínio público após longos

debates críticos baseados em experiências. (POPPER, 1996, p.26)

Uma teoria do conhecimento subjetivo não explicará uma teoria do

conhecimento objetivo e, dificilmente, o conhecimento subjetivo se tornará um

conhecimento objetivo. “Um elemento do conhecimento subjetivo (mundo 2) torna-se

objetivo (mundo 3) ao ser formulado numa linguagem” (POPPER, 1996, p.26).

O método do esquema quádruplo também pode ser aplicado às disposições

biológicas inatas nos humanos e nos animais, contudo, ressaltamos que todas as

tendências inatas foram adquiridas pelas espécies por meio da seleção natural. Esta

é uma abordagem da teoria do conhecimento em relação à biologia evolucionista, e

leva em consideração o resultado da seleção natural.

Neste cenário evolucionista da proposição do conhecimento, Popper refuta a

tese do conhecimento empirista defendida pelos filósofos ingleses Locke, Berkeley e

Hume. Segundo o autor, esta é uma teoria totalmente equivocada, pois para eles o

conhecimento é obtido através dos sentidos, que é alimentado pelos estímulos vindo

do mundo exterior.

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É uma teoria de conhecimento subjetivo e tem ainda muitos seguidores.

Pode ser representada esquematicamente como a teoria da mente como

recipiente, bem conhecida na história da filosofia como teoria da tabula rasa

ou quadro vazio, no qual a experiência grava as suas descobertas.

(POPPER, 1996, p.40)

Ao contrário da teoria tradicional do conhecimento, Popper afirma que a

maior parte das nossas tendências em formar o conhecimento é inata ou hereditária,

assim como o conhecimento objetivo, mas nunca provém do conhecimento

subjetivo.

2.4.3. A autonomia do mundo 3

O mundo 3 é formado pelo mundo dos produtos da mente humana.

“Pertencem-lhe os produtos da arquitetura, da arte, da literatura, da música, da

erudição e, bem mais importantes que estes, os problemas, teorias e discussões

críticas das ciências” (POPPER, 1996, p.40).

No âmbito do presente estudo, vale dizer que Popper formulou três

realidades de mundos do conhecimento, ele poderia ter formulado mais que três

realidades, como, por exemplo, separando o mundo do conhecimento objetivo, do

mundo das artes ou outras distinções. Porém, Popper diz que mais realidades de

mundos do conhecimento não são necessárias para seus propósitos fundamentais.

Uma característica importante do mundo 3 é sua autonomia. Apesar de

muitos objetos do mundo 3 serem de criações humanas, cabe ressaltar que desses

objetos de invenção humana derivam muitos outros problemas, que habitam o

mundo 3 e surgem independente de nós.

Para ilustrar a concepção de autonomia do terceiro mundo analisaremos os

números naturais (1, 2, 3, 4, 5...), que são criações humanas, mas, que suscitaram

muitos outros problemas, como, por exemplo: o surgimento dos números primos,

que não foi uma criação humana, mas sim uma origem dos próprios números

naturais.

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Os números primos são uma inventividade que independe do homem. São

autônomos. Nós apenas descobrimos os números primos, não os criamos. Há outro

problema dos números primos: considere os números primos gêmeos que são

separados por um número par, tais como: 3 e 5, 5 e 7, 11 e 13, 17 e 19, 29 e 31.

Será que existe uma quantidade infinita de números primos gêmeos? Sobre isso,

Popper explica:

Não obstante os vários domínios ou áreas do mundo 3 surgirem como

invenções humanas, aparecem também, na qualidade de consequências

involuntárias destas, os problemas autônomos e as suas possíveis

soluções. Tais problemas existem independentemente da consciência que

temos deles mas podemos descobri-los no mesmo sentido em que

descobrimos outras coisas. (...). Quero dizer que temos possibilidade de

extrair mais do mundo 3 do que aquilo que introduzimos nele. (POPPER,

1996, p.46)

O mundo 3 é um espaço autônomo. Embora seja “habitado” por objetos que

surjam de criações humanas, também é “ocupado” por objetos em que a existência

deles independe de que o sujeito os conheça. Pois, há problemas que existem, e,

ainda, não se tornaram conscientes do sujeito conhecedor. Como há também

problemas que não foram criados diretamente pelos humanos, mas descobertos por

nós.

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PARTE II

O ESTATUTO DA TESE DOS TRÊS MUNDOS

INSERIDA NA EPISTEMOLOGIA DO RACIONALISMO

CRÍTICO DE KARL POPPER

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1. RACIONALISMO CRÍTICO

Neste capítulo, nossa análise se detém em apresentar o racionalismo crítico

de Popper e a defender a concepção de que o pluralismo dos mundos de

conhecimento está relacionado com a epistemologia popperiana. Intencionamos

comprovar que uma tese surge em consequência da outra a fim de que possamos,

através desta intersecção, ampliar a compreensão das questões da teoria

popperiana sobre os três mundos.

A teoria do conhecimento popperiana é conhecida como racionalismo crítico.

Diferente do empirismo, que tem como metodologia o princípio da verificabilidade e

da indução para buscar o conhecimento. O racionalismo crítico, diferentemente,

caracteriza-se pela discussão do conhecimento científico. Aplica-se um método

crítico – o teste dedutivo –, que desempenha o papel de falseamento das teorias

empíricas. Destacamos que o progresso do conhecimento científico, para Popper,

não ocorre por acumulação, como acreditam os empiristas, mas por tentativas e

eliminações de teorias que foram falsificadas.

No racionalismo crítico há necessidade de se estabelecer uma atitude

crítica, o confronto com a realidade é fundamental para a racionalidade. “É a única

maneira viável de expandir nosso conhecimento – conhecimento conjectural ou

hipotético” (POPPER, 2010, p.29).

O racionalismo é uma atitude de disposição a ouvir argumentos críticos e a

aprender da experiência. É fundamentalmente uma atitude de admitir que

„eu posso estar errado e vós podeis estar certos, e, por um esforço,

poderemos aproximar-nos da verdade‟. É uma atitude que não abandona

facilmente a esperança de que por meios tais como a argumentação e a

observação cuidadosa se possa alcançar alguma espécie de acordo sobre

muitos problemas de importância, e que, mesmo onde as exigências e os

interesses se chocam, é muitas vezes possível discutir a respeito das

diversas exigências e propostas a alcançar – talvez por arbitramento – um

entendimento que, em consequência de sua equidade, seja aceitável para a

maioria, senão para todos. Em suma, a atitude racionalista, ou, como talvez

possa rotulá-la, „a atitude da razoabilidade‟, é muito semelhante à atitude

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científica, à crença de que na busca da verdade precisamos de cooperação

e de que, com a ajuda da argumentação, poderemos a tempo atingir algo

como a objetividade. (POPPER, 1974, p.232)

O racionalismo estabelece, como fundamento, que a razão humana é

detentora de recursos em si mesmo. Estes possibilitam a compreensão da realidade

do mundo, sem a dúvida de que a razão é a principal fonte do conhecimento.

A fim de evitar incompreensões e equívocos a quem pensa que o

entendimento da razão, para os racionalistas, possa ir tão longe, ao ponto de dizer,

que a razão poderá nos informar sobre tudo que queremos saber, tomamos, como

guia de esclarecimento, algumas das considerações de Huenemann (2008),

A razão, de acordo com os racionalistas, diz-nos somente sobre alguns

aspectos profundos da realidade. Considere, por exemplo, as seguintes

afirmações:

* Uma coisa não pode existir e deixar de existir ao mesmo tempo;

* Duas coisas iguais a uma terceira são iguais entre si;

* Cada coisa é idêntica a si”. (HUENEMANN, 2008, p.14)

Para tais afirmações lógicas não se trata de prová-las, através da

experiência, pois, de acordo com os racionalistas, há algumas assertivas que não

dependem da experiência, já que se confirmam por si só, ou seja, na própria razão.

Popper é um realista que aceita o senso comum como ponto de partida, para

ele “nosso grande instrumento para progredir é a crítica” (POPPER, 1999, p.42). O

filósofo ao adotar os preceitos do realismo não o faz ingenuamente, pois propaga a

atitude sob o olhar da crítica, tornando-se, desse modo, em um notável crítico sobre

o comportamento dos positivistas lógicos. Este tem como único conhecimento

científico o empirismo, baseado na experiência e no princípio da verificabilidade:

toda proposição para ser verdadeira deve passar pela verificação empírica, que tem,

como princípio rígido, a crença do hábito na indução. Sobre isto, transcreveremos o

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posicionamento positivista de Schlick: “Parece-me ser um núcleo justo e

incontestável das correntes „positivistas‟ o princípio de que o sentido de qualquer

proposição se encerra absolutamente no fato da sua verificação no „dado‟.” (1975,

p.68).

Distinguindo-se do pensamento positivista lógico, Popper declara que “a

ciência começa pela solução de problemas relacionados ao mundo aos quais os

seres humanos estão inseridos, por isso a importância de compreender como a

realidade é composta” (ROMANINI, 2012, p.16). O autor austríaco nega o caráter

cumulativo do conhecimento científico, e, afirma que é impossível saber se uma

teoria está mais próxima da verdade do que outra. A solução que Popper apresenta

origina-se da sua epistemologia – o racionalismo crítico:

Uma teoria científica é válida na medida em que suas proposições podem

ser empiricamente falsificáveis através de experimentos, testes,

observações etc., o que permite que se autocorrijam e se desenvolvam em

direção a um ideal de verdade objetiva, no entanto jamais atingido de modo

conclusivo, evitando o seu fechamento em posições dogmáticas. A ciência

não deve, portanto, visar à formulação de teses irrefutáveis, já que não há

critério de verdade definitiva, mas sim adotar hipóteses falsificáveis.

(MARCONDES, 2007, p.267)

Para Popper é mais acertado falsear a teoria do que verificar sua legitimidade

e, dessa forma, estabelece que toda teoria tenha um caráter provisório até não

passar pelos testes da falsificação empírica. A única forma de conhecer o mundo é

através de uma atitude crítica das teorias, conforme bem esclarece Popper:

Elas, em si, são conjecturas. Não sabemos, apenas conjecturamos. Se me

perguntassem: Como você sabe? Minha resposta seria: Não sei, só

conjecturo. Se vocês estiverem interessados em meu problema, ficarei

muito contente se criticarem minha conjectura; se me oferecerem

contrapropostas, tentarei criticá-las. (POPPER, 2010, p.30)

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Assim, o racionalismo crítico de Popper caracteriza-se pela discussão crítica

do conhecimento científico, bem como pela falseabilidade empírica das proposições

como critério de demarcação, sendo denominado de método crítico do teste

dedutivo.

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2. REALISMO

O realismo é a modo natural do conhecimento humano. Sua afirmação

fundamental é de que nós conhecemos coisas. “Daí o emprego da palavra

„realismo‟, que diz respeito à „coisa‟(res) reconhecida independente da consciência.

(...) Quando o homem aceita a identidade de seu conhecimento com as coisas que

sua mente menciona”. (REALE, 2007, p.96).

O ponto chave do interesse de Popper está na cosmologia e na forma sobre

o qual podemos validar nosso conhecimento sobre o mundo. No prefácio da primeira

edição inglesa da obra A lógica da pesquisa científica, Popper declara:

“acredito que exista pelo menos um problema filosófico no qual todos os

homens de cultura estão interessados. É o problema da Cosmologia: o

problema de compreender o mundo – inclusive nós próprios e nosso

conhecimento como parte do mundo”. (POPPER, 2007, p.535).

Admitindo ser um estudioso de caráter realista, Popper credita ao conceito de

senso comum o ponto de partida, já que este age como progenitor das filosofias

contemporâneas. O senso comum é sempre nosso ponto de partida, mas deve ser

criticado, declara o filósofo austríaco. Convém lembrarmos de que “Popper admite

um idealismo tal como o de Kant pode ser defendido até onde diz que todas as

nossas teorias são de fabricação humana e que tentamos impô-las ao mundo da

natureza” (POPPER, 1999, p.302).

Para Popper é indiscutível a associação do senso comum ao realismo, pois

o realismo é a única hipótese sensata. Todas as alternativas contrárias a ele não

passam de hipóteses subjetivas e errôneas, tais como o positivismo, o idealismo, o

fenomenalismo, a fenomenologia etc. A teoria do senso comum, de acordo com as

considerações popperianas,

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é simples. Se você ou eu quisermos conhecer alguma coisa ainda não

conhecida a respeito do mundo, temos de abrir os olhos e olhar em redor. E

temos de aguçar nossos ouvidos e ouvir ruídos, especialmente os feitos por

outras pessoas. Assim nossos vários sentidos são nossas fontes de

conhecimento – as fontes ou os acessos para nossas mentes. (POPPER,

1999, p.66)

Apesar de o senso comum nos propor um ponto de partida vago e inseguro,

este, por outro lado, pode ser contestado e criticado, resultando, assim, em uma

correção ou uma substituição por outra teoria durante determinado tempo. Pois se

tivermos a consciência de que estamos errados, após algumas críticas, temos a

oportunidade de aprender com os erros e a reformular as nossas teorias. Dessa

maneira é possível chega mais próximo do ideal, conforme afirma Popper: “toda

ciência e toda filosofia são senso comum esclarecido” (POPPER, 1999, p.42).

Sobre o realismo, Popper o classifica como irrefutável assim como o

idealismo. Mas, destaca que a teoria realista é passível de debate, enquanto o

idealismo não.

Na sua mais simples forma, o idealismo diz: o mundo (incluindo o leitor

deste texto) é apenas meu sonho. Ora, é claro que esta teoria (embora

saibais que é falsa) não é refutável: qualquer coisa que você, leitor, faça

para me convencer da sua realidade – falar comigo, me escrever uma carta

ou talvez me dar um pontapé – não pode ter força de uma refutação, pois

eu continuarei a dizer que estou apenas sonhando que você falou comigo,

que recebi uma carta ou que senti um pontapé.(Seria possível dizer com

razão que todas essas respostas são, de vários modos, estratagemas

imunizadores. (POPPER, 2010, p.218)

O realismo é a única hipótese sensata, pois se não houvesse realidade,

tudo que fosse nosso sonho, nossa ilusão e nossas questões sobre verdade e

falsidade de opiniões se tornariam sem sentido. Já o idealismo “parece absurdo por

implicar também algo assim: que é minha mente que cria este belo mundo”

(POPPER, 1999, p.48). Um juízo de beleza que realizamos de uma determinada

obra de arte não está nos nossos olhos, podemos até alegar que não temos bons

olhos até apreender toda a beleza da obra de arte. No entanto, existem outras

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pessoas que até são mais capacitadas para tecer um juízo, resultando em uma

melhor apreciação acerca da beleza que envolve a obra de arte.

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55

3. O PROBLEMA DA INDUÇÃO

Um dos problemas da ciência investigado por Popper é o da indução. Em

sua Autobiografia Intelectual (1978), ele menciona que somente em 1928, após seu

doutoramento, conseguiu ordenar seus pensamentos, compreendendo, desse modo,

o erro científico da demarcação (pautada no método da indução de Bacon, que é até

hoje consagrado), usada pelos positivistas para marcar a ciência da pseudociência.

Para Bacon as ciências naturais são indutivas e devem ser submetidas a um

processo de verificação dos fatos repetidos.

No entanto, para Popper, o critério de verificabilidade não bastava para

definir o que é ciência e o que não é ciência. Sendo assim, Popper propôs o critério

de falseamento empírico, que, segundo ele, é muito mais satisfatório que o método

indutivo defendido por Bacon para a demarcação científica.

Que incoerências podem surgir facilmente, com respeito ao princípio da

indução, é algo que a obra de Hume deveria ter deixado claro. E também

que as incoerência só serão evitadas, se puderem sê-lo, com dificuldade.

Pois o princípio da indução tem de ser, por sua vez, um enunciado

universal. Assim, se tentarmos considerar sua verdade como decorrente da

experiência, surgirão de novo os mesmos problemas que levaram à sua

formulação. Para justificá-los, teremos de admitir um princípio indutivo de

ordem mais elevada, e assim por diante. Dessa forma a tentativa de

alicerçar o princípio de indução na experiência malogra, pois conduz a uma

regressão infinita. (POPPER, 2007, p.29)

O princípio da indução é importante para comprovar a veracidade de uma

determinada teoria científica, ou seja, diferenciar o que é ciência das criações

fantasiosas. De modo geral, a indução se caracteriza depois que alguns

determinados números de enunciados particulares ou singulares se repetem,

atribuindo-lhes um valor universal. Dito de outra forma, a indução constrói um

discurso da ciência a partir de fatos singulares observados.

Em termos lógicos, a conclusão de um argumento não pode ter maior

conteúdo do que é afirmado pelas suas premissas. Ora, é, exatamente, este o

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problema encontrado da indução, pois na sua conclusão se é atribuído um valor

universal, um pensamento que se origina das premissas de ordem particular ou

singular. Logo, observamos que a conclusão tem maior conteúdo do que as

premissas.

Assim, revela-se que é errônea a posição de que a indução sobre a verdade

dos enunciados universais, encontra-se base na experiência, ou melhor, erram os

que acreditam que os enunciados universais são elaborados a partir da experiência

de certas regularidades. “Contudo, está claro que a descrição de uma experiência –

de uma observação ou do resultado de um experimento – só pode ser um enunciado

singular e não um enunciado universal” (POPPER, 2007, p.28).

A indução é apenas uma mera probabilidade e sempre se revelará falsa, não

importa quantas confirmações de uma teoria tenham sido obtidas. Logicamente, será

possível que no futuro se confirme uma observação que não satisfaça a conclusão

anterior. Pois mesmo podendo notar milhares de casos de cisnes brancos, basta

apenas um cisne preto, para mostrar que tal hipótese é falsa.

A história da ciência apresenta exemplos de teorias científicas que refutaram

outras teorias, servindo de base indutiva para a justificação de suas regularidades.

Tomemos como exemplo a física newtoniana, nunca houve teoria mais bem

sucedida e com grande aproximação da verdade. No entanto, ela foi superada pela

teoria de Einstein no campo astronômico.

Diante desse cenário, Hume levantou dois problemas do método da indução:

o lógico e o psicológico. Quanto ao problema lógico, surge a questão: “Somos

justificados em raciocinar partindo de exemplos (repetidos), dos quais temos

experiência, para outros exemplos (conclusões), dos quais não temos experiência ?”

(POPPER, 1999, p.15). A resposta de Hume ao problema lógico foi de que por maior

que seja o número de repetições. Não, por maior que seja o número de repetições.

O outro problema é o psicológico: por que temos expectativas de que

determinadas experiências se repetirão no futuro? Hume explica que é por causa do

“costume ou hábito”, que depositamos expectativas nas repetições de nossas

experiências – mecanismo psicológico que dificilmente sobreviveríamos sem ele.

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Hume mostra que as repetições de certas regularidades não têm força

argumentativa para ser sustentada, sendo considerada irracional, conforme atesta o

Gerárd Lebrun:

Uma bola de bilhar que se acha em movimento deve ter recebido um

impulso? O problema - replicava Hume - é que não é essa a questão: o que

lhe pergunto é se a simples noção de "movimento da bola" envolve já a de

"impulso" e se, por mero raciocínio, antes de qualquer experiência, você

poderia descobrir esta contida naquela. (LEBRUN, 1993, p.7)

A nossa crença irracional em depositar confiança na repetição, segundo

Hume, é necessária e faz parte de nossa convicção cognitiva e do nosso

entendimento para que haja ordem às coisas e, assim, o homem garanta a

sobrevivência do homem.

Ainda, de acordo com Hume, a experiência é a fonte legítima para o

conhecimento das inferências estabelecidas pela causalidade, portanto, ele salienta

que não é pela razão que se funda o princípio de causa e efeito. Ora, se não é pela

razão que se fundamenta a inferência estabelecida pela causalidade, indagamos:

qual é seu fundamento? Hume responde: a experiência.

A conclusão de que o futuro será semelhante ao passado carece de validade

lógica. Será necessário que as experiências se repitam, se acumulem e criem

hábitos mentais, pois, dessa forma é que criamos confiança na repetição de que

determinadas experiências se repetirão no futuro. “O espírito nunca pode encontrar

pela investigação e pelo mais minucioso exame o efeito na suposta causa. Porque o

efeito é totalmente diferente da causa e, por conseguinte, jamais pode ser

descoberto nela” (HUME, 1996, p.51).

“As teorias são nossas invenções, nossas idéias – não se impõem a nós”

(POPPER, 2006, p.144). Não descobrimos leis que regem a natureza, apenas

inventamos ou criamos teorias e leis que são nossas tentativas de descrever e

interpretar a realidade. Popper discorda da opinião de Hume e de outros filósofos de

que a indução é uma realidade necessária ao homem, e propõe o método do ensaio

e eliminação de erros. Neste sentido, ele declara: “Afirmo que nem os animais nem

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os seres humanos usam qualquer procedimento como a indução ou qualquer

argumento baseado na repetição de casos. Acreditar que usamos a indução é um

erro, uma espécie de ilusão de óptica” (POPPER, 2012, p.103).

Ao promover o método de ensaio e eliminação de erros, Popper está

afirmando que na luta pela sobrevivência de hipóteses, podemos ter preferência por

hipóteses que tenham resistido à crítica, do que por outras que tenham sido

eliminadas por não resistirem à pressão da crítica.

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4. A SOLUÇÃO DE KANT PARA A INDUÇÃO

Kant em sua obra Critica da razão pura, disse que foi despertado de seu

sono dogmático ao ler o cético David Hume sobre o problema da indução. Conforme

menciona Gerárd Lebrun, a astúcia que Kant propôs para resolver o problema da

indução de Hume, “foi libertar o saber do sistema de segurança ideológica chamado

"razão universal". Foi pensar que uma proposição, para ser científica, não precisa

inscrever-se num logos que já tivesse organizado o Ser ou o "fenômeno"” (LEBRUN,

1993, p.12).

Postulando um princípio de causalidade3 ou de indução como uma verdade

sintética a priori, que Kant apresenta a solução para o problema da indução em

Hume. Ele não tentou alegar que o princípio da causalidade pertença à lógica, pois

defender tal fato seria atribuir à causalidade, um juízo analítico – atribuição

impossível. Mas, postulou a existência de juízos sintéticos a priori, que para a

concepção popperiana não teve êxito.

A distinção proposta por Kant de que todo juízo necessariamente ou é

analítico ou é sintético divide-se, ainda mais, em a priori ou a posteriori. Destas

quatro possibilidades de combinações, Kant menciona que apenas três são

possíveis: o juízo analítico, o sintético e o sintético a priori. A fim de evitarmos

incompreensões, mencionamos que todo juízo analítico é a priori e todo juízo

sintético é a posteriori. O analítico se fundamenta na lógica e o juízo sintético, no

conhecimento empírico. Entretanto, todo conhecimento se expressa no juízo que

também poderá ser “a priori” ou “a posteriori”.

3 É verdade que a causalidade não é uma "condição inscrita nas coisas": salvo por intervenção de um Deus ex machina, como

seria possível que um conceito nascido da nossa razão ("B é consequente constante de A") fosse residir nas coisas, isto é, em

seres que, por definição, existem fora de nossa razão? Toda a Crítica da Razão Pura é escrita para convencer-nos de que,

quando conhecemos ou formulamos um conhecimento, nada desvendamos de "Ser em si", não deciframos um texto que teria

sido gravado "nas coisas", como pretendiam os metafísicos desde Platão. Penetrar por nossa razão nas coisas. (LEBRUN,

1993, p.9 -10)

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Neste cenário kantiano, será necessário um conceito negativo para

conceituarmos o conhecimento a priori, pois é o conhecimento que apresenta o

caráter de necessário e universal e que não pode ser fundamentado na experiência.

Enquanto, o conhecimento a posteriori constitui-se do conhecimento empírico.

Daí, surge a questão: “Como é possível juízo sintético a priori”?. O problema

abrange a questão: como posso provar esse juízo se não posso fundamentar na

lógica, pelo fato de ser um juízo sintético e, também, não posso fundamentar na

experiência, pois é conhecimento “a priori”? Kant apresenta a revolução corpenicana

como a resolução desse problema. Leiamos:

A grande descoberta de Kant, a que confere todo o seu alcance à sua

revolução copernicana, é a da existência de uma terceira classe de juízo, os

juízos sintéticos a priori. Estes são universais e necessários, como os juízos

analíticos, mas, além disso, nos permitem ampliar os nossos

conhecimentos, enquanto os juízos analíticos apenas podem explicá-los ou

esclarecê-los. (PASCAL, 2011, p.29)

Para Kant, tanto na física como na matemática, existe conhecimento a priori

do fenômeno. Logo, a física de newtoniana, o princípio de causalidade é um

conhecimento a priori, ou seja, é uma ordem surgida da razão e antecipadora da

experiência. Portanto, conhecer essas leis que regem a causa e efeito dos

movimentos – é disso que trata a mecânica de Newton - é um conhecimento

universal e necessário que não necessita da experiência para sua validade, portanto

é um conhecimento a priori.

Ressaltando aqui a crítica realizada por Popper a Kant, declara o filósofo

austríaco:

“apesar dessa tentativa ousada de Kant para a solução do problema da

indução de Hume, as teorias se renovam e o principio da indução é

constantemente falseável, logo ruiu quando se verificou que a dinâmica de

Newton não era válida a priori, mas uma hipótese maravilhosa, uma

conjectura” (POPPER, 2007, p.95).

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No entanto, percebemos que Kant tentou solucionar o problema da indução

de Hume postulando que o princípio de causalidade ou da indução é uma verdade

sintética a priori. Entretanto, segundo Popper, essa engenhosa tentativa de Kant não

teve êxito, a história da ciência nos revelou isso.

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5. A SOLUÇÃO DE POPPER PARA A INDUÇÃO

As primeiras palavras de Popper em sua obra Conhecimento Objetivo (1972)

são:

Julgo haver resolvido importante problema filosófico: o problema da

indução. Devo ter chegado à solução em 1927 ou por aí. Essa solução tem

sido extremamente frutífera, capacitando-me a resolver bom número de

outros problemas filosóficos. (POPPER, 1999, p.13)

Popper acredita que tenha encontrado a solução para o problema

psicológico da teoria da indução de Hume:

Primeiro que a indução – a formação de uma crença por meio de repetição

– é um mito. Primeiramente em animais e crianças, mas depois também em

adultos, foi que observei a imensamente forte necessidade de regularidade

– a necessidade que os leva a procurar regularidades: que às vezes os faz

experimentar regularidades mesmo onde não há nenhuma. (...). Quando

Kant disse que nossa inteligência impõe suas leis à natureza, estava certo –

só que não notou quantas vezes nossa inteligência falha ao tentá-lo: as

regularidades que tentamos impor são psicologicamente a priori, mas não

há a menor razão para admitir que sejam válidas a priori, como pensou

Kant. A necessidade de tentar impor tais regularidades a nosso ambiente é

claramente inata e baseada em impulsos, ou instintos. (POPPER, 1999,

p.33 - 34)

Frente ao problema da indução de Hume, importa dizer que Popper

apresenta uma solução negativa, pois apesar de não ser possível provar a

veracidade de uma teoria através do método indutivo, é possível provar a sua

falsidade, ou seja, se determinada teoria não passar no teste e falhar, será

considerada, logicamente, falsa. Daí é que surge a solução negativa apresentada

por Popper. Sobre esta solução, ele explica, “minha resposta negativa, deve ser

interpretada como significando que devemos encarar todas as leis ou teorias como

hipotéticas ou conjecturas; isto é, como suposições” (POPPER, 1999, p.20).

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As proposições gerais das ciências são meras hipóteses, e Popper, para

defender tal posição, menciona como exemplo, a teoria da gravidade de Einstein

que refutou a tese apresentada por Newton, mostrando que ambas as enunciações

são meras hipóteses ou conjecturas.

O racionalismo crítico popperiano apresenta um tratamento diferente para o

problema da indução. Enquanto, a epistemologia irracionalista de Hume mostra que

a indução é uma crença no hábito – de uma fé irracional – e que essa nossa

confiança na repetição é de natureza humana irracional, conclui-se que a razão

desempenha apenas um papel menor no nosso entendimento. Ao contrário de

Hume, o racionalismo crítico de Popper mostra que temos a

tendência em experimentar hipóteses ousadas que podemos corrigir se não

quisermos perecer. A primeira descreve um processo de instrução

tipicamente lamarckiano; a segunda, um processo de seleção darwiniano. A

primeira é irracional, como observou Hume, enquanto a segunda não

parece ter em si nada de irracional. (POPPER, 1999, p.99)

Contudo, chamamos a atenção para uma pergunta: se não há indução,

quais são, afinal, as fontes do nosso conhecimento? Será só um processo

psicológico? A respeito disto, encontramos nas considerações de Popper

esclarecimento:

nosso conhecimento tem fontes de todo o gênero, mas nenhuma tem

autoridade (...) Não nego, evidentemente, que uma experiência possa

contribuir para o nosso conhecimento, de forma muito significante. Mas não

constitui uma fonte em nenhum sentido terminante. Tem sempre de ser

verificada. (POPPER, 2006, p.44 - 45)

De acordo com o exposto acima, podemos afirmar que tanto o jornal como

uma enciclopédia são fontes de conhecimento, mesmo tendo a consciência de que

um artigo científico sobre astronomia, publicado em uma revista especializada neste

assunto terá mais autoridade que um jornal ou enciclopédia que venham a discutir o

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mesmo tema. Apesar de todas estas fontes contribuírem para o nosso conhecimento

que em nenhum sentido é terminante e conclusivo.

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6. MÉTODO DA DEDUÇÃO

O método da dedução lógica que apresentaremos pauta-se nas abordagens

popperianas de submeter criticamente, sem quaisquer imunizações à refutação, à

prova as teorias e de selecioná-las, conforme os resultados obtidos. Popper encara

a crítica como uma característica da atitude racional, pois, segundo ele, somente

uma teoria passível de crítica poderá alcançar a objetividade do conhecimento.

Podemos se quisermos, distinguir quatro diferentes linhas ao longo das

quais se pode submeter a prova uma teoria. Há, em primeiro lugar, a

comparação lógica das conclusões uma às outras, com o que se põe, à

prova a coerência interna do sistema. Há, em segundo lugar, a investigação

da forma lógica da teoria, com o objetivo de determinar se ela apresenta o

caráter de uma teoria empírica ou científica, ou se é, por exemplo,

tautológica. Em terceiro lugar, vem a comparação com outras teorias, com o

objetivo sobretudo de determinar se a teoria representará um avanço de

ordem científica, no caso de passar satisfatoriamente as várias provas.

Finalmente, há a comprovação da teoria por meio de aplicações empíricas

das conclusões que dela se possam deduzir. (POPPER, 2007, p.33)

A teoria que prevalecerá é aquela que resistir às tentativas severas de

falseabilidade e que não seja substituída por outra, para que possamos comprovar

sua legitimidade, nomeada, por Popper, de teoria corroborada. A demarcação

científica se realizará pela dedução, logo, o conhecimento científico será sempre

provisório e uma teoria somente poderá ser classificada como científica se houver a

possibilidade de ser falseada. A discussão crítica acerca do conhecimento científico,

denominado de método crítico de teste hipotético, é a defendida por Popper que

propaga a argumentação de que mesmo que o nosso conhecimento busque uma

aproximação à verdade, o cientista não chegará a uma verdade última. Popper

destaca que, somos buscadores da verdade, mas não somos seus possuidores.

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Tanto nas ciências sociais como nas naturais, os esforços devem ser feitos no

sentido de criticar ou falsear teorias estabelecidas, na medida em que conseguimos

provar ou não uma determinada teoria, nosso conhecimento avança. Pois a

ciência é reconhecida valorizada pelos seus resultados práticos; mas é

ainda mais valorizada pelo seu conteúdo informativo e pela sua capacidade

de libertar as nossas mentes de velhas crenças, velhos preconceitos e

velhas certezas, oferecendo-nos, em seu lugar, novas conjecturas e

audaciosas hipóteses. A ciência é valorizada pela sua influência libertadora

– por ser uma das maiores forças que concorrem para a liberdade humana.

(POPPER, 2006, p.145)

O método científico que Popper sugere é o dedutivo, uma forma de

submeter à prova, as teorias formuladas. Importante, também, dizer que as teorias

não devem ser imunizadas contra a crítica, ou seja, o autor austríaco defende uma

abordagem que evite a imunização da teoria contra a refutação. Dessa forma, ele

encara a crítica como uma característica da atitude racional. Somente uma teoria

formulada, que não é imunizada contra a crítica, pode vir a ter objetividade e tornar a

crítica possível para uma possibilidade do aumento do conhecimento.

Segundo Popper, herdamos dos gregos tal atitude crítica. Ele disse: “Um dos

mais importantes ingredientes da nossa civilização ocidental é aquilo a que chamo a

„tradição racionalista‟ que herdamos dos Gregos. É a tradição da discussão crítica –

não a discussão pela discussão, mas a discussão no interesse da busca da

verdade" (POPPER, 2006, p.145).

Portanto, podemos afirmar que encontramos o ponto de conexão em que o

pluralismo de realidades do conhecimento pode ser interpretado como consequência

do realismo crítico popperiano, comprovando que uma tese pode ser consequência

da outra. O ponto de conexão está na atitude racional de criticar, pois torna possível

a objetividade das teorias formuladas.

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7. FALSEABILIDADE EMPÍRICA

Cabe registrar a título da história da ciência que o nascimento da ciência

moderna deve-se à filosofia de Bacon e Descartes, os inventores de uma

epistemologia que não precisava de nenhuma autoridade divina para buscar o

conhecimento e distinguir a verdade do erro. O homem por si só reúne as fontes do

conhecimento, seja pela percepção dos sentidos ou pela intuição intelectual.

Já em Popper, a ideia do critério de falseabilidade surgiu em 1919, como

oposição à atitude dogmática dominante do conhecimento científico da época. No

entanto, desempenhou papel de suma relevância para Popper o alento de Albert

Einstein que escreveu:

não pode haver melhor destino para uma teoria física do que abrir margem

para uma teoria mais ampla, na qual sobreviva, como caso-limite (...).

Entretanto o que mais impressionou (Popper) foi a explícita asserção de

Einstein, de que consideraria insustentável a sua teoria caso ela viesse a

falhar em certas provas. (POPPER, 1978, p. 44)

Para Popper está aí um critério científico que traz luzes satisfatórias para ter

condições de possibilidades para o progresso científico, pois a atitude científica tem

que ser uma atitude crítica do conhecimento, não importando tanto a verificação

empírica, provas que podem ser refutadas pela teoria em análise.

A principal diferença entre Einstein e uma ameba é que Einstein busca

conscientemente a eliminação do erro. Ele procura matar suas teorias: é

conscientemente crítico de suas teorias, as quais, por isto, procura formular

nitidamente e não vagamente. Mas a ameba não pode ser crítica vis-a-vis

de suas expectativas ou hipóteses; não pode ser crítica porque não pode

enfrentar suas hipóteses; estas fazem parte dela. (Só o conhecimento

objetivo é criticável: o conhecimento subjetivo só se torna criticável quando

se torna objetivo. E torna-se objetivo quando dizemos o que pensamos; e

mais ainda quando o escrevemos, ou imprimimos.) (POPPER, 1999, p.34 -

35)

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Popper, em seu racionalismo crítico, afirma que somente o conhecimento

objetivo é criticável. É neste momento, em que a tese dos três mundos de realidades

do conhecimento interage com o racionalismo crítico. Logo, confirma-se que a tese

dos três mundos é consequência das considerações advindas do racionalismo crítico

popperiano.

Antes de esclarecer o princípio da falseabilidade empírica de Popper,

devemos tecer algumas observações preliminares para mostrar que ao formular tal

princípio, Popper não intenciona criar um “critério de distinção entre teorias

científicas e não-científicas, ele não pretende resolver a questão da distinção entre

enunciado com significado e enunciado sem significado” (PELUSO, 1995, p.33). A

refutabilidade não quer excluir ou marginalizar saberes que não são refutáveis, o

que ele propõe com esse critério de demarcação é exclusivamente de delimitar uma

área do discurso.

Cabe destacar, que para Popper, uma teoria que não é científica não

significa que ela não tenha significado em seu conteúdo informativo. O princípio da

falseabilidade empírica não tem o objetivo de separar e valorar se determinadas

teorias são verdadeiras e outras falsas. Distante que está a teoria popperiana da

ambição positivista em instituir critérios que excluam ou marginalizem domínios do

saber, como o “metafísico”, pois ele tem a consciência do quanto a ciência erra e a

pseudo ciência acerta. Portanto, o objetivo da falseabilidade empírica resume-se,

simplesmente, à delimitação de uma área do discurso, a ciência. Sobre isto, o

filósofo explicita:

Compreendereis então, espero eu, que não proponho que tracemos a linha

de demarcação de modo a fazê-la coincidir com os limites de uma

linguagem que inclua a ciência e expulse a metafísica, excluindo-a da

classe dos enunciados com sentido. Pelo contrário: logo quando da minha

primeira publicação sobre esta matéria, eu enfatizei o fato de que seria

inadequado traçar uma linha de demarcação entre ciência e metafísica que

excluísse esta última – como desprovida de significado – de uma linguagem

com sentido. Indiquei uma das razões para isto ao dizer que não devemos

tentar traçar a linha demasiado vincada. A questão torna-se clara se nos

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lembrarmos de que muitas das nossas teorias científicas têm origem em

mitos. O sistema copernicano, por exemplo, foi inspirado por um culto

neoplatônico da luz do Sol, que tinha de ocupar o ”centro” em virtude da sua

nobreza. Este fato demonstra como é que os mitos podem desenvolver

componentes testáveis. No decurso da sua discussão, podem tornar-se

proveitosos e importantes para a ciência. (POPPER, 2006, p. 346)

Popper acredita que a solução de determinados problemas não está no uso

dos métodos da ciência de verificabilidade empírica, propagados pelos positivistas

como o método em que uma proposição torna-se significativa se, e apenas se, puder

ser verificada empiricamente. Isto é, se houver um método baseado na experiência

para determinar se é verdadeira ou falsa. Na ausência de tal método, julga-se que

há uma pseudoproposição desprovida de significado e sentido. A formulação

popperiana propõe o rompimento deste método, que é o da verificação empírica e

qualquer tentativa de construir uma lógica indutiva. Assim sendo, Popper apresenta

outra estratégia para a demarcação da ciência: a falsificabilidade – em que uma

proposição classifica-se como científica se, e apenas se, puder ser falsificada pela

experiência:

Com seu critério – a falseabilidade –, Popper transfere para o momento da

crítica da teoria a possibilidade de identificá-la como científica ou não, ou

seja, se uma teoria não fornece os meios para um possível falseamento

empírico, se não há experiência capaz de falseá-la, ela deve ser

reconhecida como um mito, explicação pseudocientífica do real. Uma teoria

científica deve ser falseável empiricamente, ou seja, se as proposições

observacionais dela deduzidas forem falseadas, a teoria será considerada

falsa. (MACHADO, 2012, p. 51 e 52)

Desta forma, há um critério para o método científico que está além da lógica

dos enunciados científicos. Para Popper, assim como o jogo de xadrez tem suas

regras próprias, a ciência também poderá ser determinada por uma metodologia.

A decisão aqui proposta para chegar ao estabelecimento de regras

adequadas ao que denomino “método empírico” está estreitamente ligada a

meu critério de demarcação: proponho que se adotem as regras que

assegurem a possibilidade de submeter a prova os enunciados científicos, o

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que equivale a dizer a possibilidade de aferir sua falseabilidade. (POPPER,

2007, p. 51)

A falseabilidade pauta-se no recurso hipotético-dedutivo, em que a teoria

é submetida às tentativas de provar sua falsidade. Resistindo tal teoria às provas

aplicadas, deverá ser aceita pela comunidade científica.

O princípio fundamental da falseabilidade empírica refere-se ao fato de que

uma proposição só poderá ser considerada científica se for possível deduzir

enunciados de observação que possam falsificá-las. Fato este que permite

determinar o grau de verossimilhança, além de afastar e demarcar as teorias

pseudocientíficas.

A teoria que resistir às tentativas severas de falseabilidade define-se como

teoria corroborada. A corroboração de uma teoria, cujo efeito de refutação não se

confirma, torna a enunciação mais credível, classificada como a indicada pelos

cientistas, sem mesmo a confirmação. Jamais se pode afirmar que uma teoria

científica é verdadeira.

Uma lei científica será considerada pertinente, se possuir maior conteúdo, isto

é, aquela que faz afirmações de amplo alcance e que ao ser testada, resista à

falsificação. Importante lembrar, que as teorias que tenham sido falsificadas têm de

ser rejeitadas. Porém, enfatizamos que mesmo tendo nossas teorias refutadas pela

falseabilidade ainda podemos aprender com elas, visto que, ao descobrirmos que a

nossa conjectura era falsa, aprendemos sobre o que não é a verdade, nos

aproximando ainda mais da verdade.

Vale dizer que para Popper, as regras do processo científico devem ser

elaboradas de maneira a assegurar a aplicabilidade do critério de demarcação,

desde que não proteja e blinde qualquer enunciado científico contra o falseamento.

Dentro desse cenário, podemos observar que, de acordo com a visão

popperiana, um determinado sistema científico é válido se for passível a falsidade.

Equivale afirmar que somente a falsidade de um sistema científico pode ser provada,

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ao passo que nunca a sua veracidade absoluta. Neste sentido, a visão de Karl

Popper explica-se da seguinte forma:

O jogo da Ciência é, em princípio, interminável. Quem decida, um dia, que

os enunciados científicos não mais exigem prova, e podem ser vistos como

definitivamente verificados, retira-se do jogo.

Uma vez proposta e submetida à prova a hipótese e tendo suas qualidades

comprovadas não se pode permitir seu afastamento sem uma "boa razão”

será, por exemplo, sua substituição por outra hipótese, que resista melhor

às provas, ou o falseamento de uma consequência da primeira hipótese.

(POPPER, 2007, p. 56)

Segundo esse critério, podemos comparar somente teorias concorrentes,

tais como a teoria da gravitação de Newton e Einstein. A teoria mais influente e que

conter persuasão, logo, maior poder explicativo, consequentemente, será a tese de

maior conteúdo, como será também a de maior verossimilitude, pois por ter maior

conteúdo será a teoria mais ousada. Porém, a mais arriscada e, por sua vez, a mais

vulnerável à refutação. Segundo Popper: “Uma asserção que transmita mais

informação tem maior conteúdo informativo ou lógico; é a asserção melhor. Quanto

maior for o conteúdo de uma asserção verdadeira, melhor será ela como abordagem

da verdade” (POPPER, 1999, p.61).

A verificação da verossimilitude das teorias poderá acontecer da seguinte

maneira: submeter a comparação as teorias; a teoria (N) de Newton e a Teoria (E)

de Einstein. A cada questão que a teoria de Newton (N) oferecer uma resposta a

teoria de Einstein (E) também dará uma resposta, que do mesmo modo será precisa.

Mas, a teoria de Einstein (E) apresenta respostas a determinadas questões que a

teoria de Newton (N) não tem respostas. Portanto, conclui-se que a teoria de

Einstein é a que tem o conteúdo maior:

Isto torna a teoria de Einstein potencialmente ou virtualmente a melhor

teoria; pois mesmo antes de qualquer teste podemos dizer: se verdadeira,

ela tem maior poder explicativo. Além disso, desafia-nos a realizar maior

variedade de testes. Assim, oferece-nos novas oportunidades para aprender

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mais a respeito dos fatos; sem o desafio da teoria de Einstein, nunca

teríamos medido (com o maior grau de precisão necessário) a distância

aparente entre as estrelas que rodeiam o sol durante um eclipse, ou o

desvio vermelho da luz emitida pelas chamadas “anãs brancas”. (POPPER,

1999, p.59)

Observaremos que a teoria de Einstein (E) apresenta maior grau de

verossimilitude do que a teoria de Newton (N). A teoria (E) é mais forte, seu grau de

falseabilidade é maior que a teoria (N) e por conter maior conteúdo a teoria (E) é

potencialmente melhor e é a mais desafiadora. Portanto, a teoria da gravidade de

Newton foi falseada. Quando Einstein percebeu que o tempo e o espaço são

relativos, ele propôs que a gravidade é causada por uma distorção do espaço-

tempo, oriunda da presença de matéria, e não por uma força atrativa. Ele substituiu

a teoria da gravidade de Newton pela teoria da relatividade, bem como, falseou a

teoria do tempo absoluto de Newton. Cabe mencionar, que mesmo sendo a teoria de

Newton falseada, ela continua útil e válida, pois muitos cálculos ainda são feitos a

partir dela.

Outro conteúdo informativo da teoria de Einstein é a hipótese de uma

velocidade finita para a luz. A velocidade da luz é o limite sem superação, não há

informação que possa ser transmitida com velocidade maior que a da luz.

Mostrando, assim outro dado que falseia a teoria de Newton de que a luz tem

velocidade instantânea.

Apesar da teoria da relatividade de Einstein ser uma teoria bem

fundamentada e consolidada, ela não passa de uma hipótese que, no futuro, poderá

ser refutada por outra teoria científica de maior conteúdo informativo, aproximando-

se mais da realidade. Como propõe o método popperiano, que tem como principal

objetivo da ciência a busca da verossimilitude de uma asserção, e não a formulação

simples de que o objetivo da ciência é a verdade. Neste sentido, revela o filósofo

austríaco:

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A procura da verossimilitude é um alvo mais nítido e mais realista do que a

procura da verdade. Mas pretendo mostrar um pouco mais. Pretendo

mostrar que, embora possamos nunca ter argumentos suficientemente

bons, nas ciências empíricas, para alegar que alcançamos de fato a

verdade, podemos ter argumentos fortes e razoavelmente bons para alegar

que é possível termos feitos progresso no rumo da verdade.

(POPPER,1999, p.63)

Conforme o método da falseabilidade empírica , o progresso da ciência se

dá da seguinte forma: a ciência começa a partir de problemas para a solução desses

problemas o cientista cria hipóteses que são submetidas a críticas e testes

rigorosos, algumas hipóteses são eliminadas e outras podem passar pelos testes

obtendo êxito.

Cabe ressaltar, que quando uma hipótese supera os rigorosos testes de

falsificação por um determinado tempo, mas que passado um tempo é falsificada,

surge, então, um novo problema, que é a invenção de novas hipóteses, seguidas de

novas críticas e testes. Assim uma teoria científica não é uma verdade absoluta, por

mais testes rigorosos que tenha superado. Somente podemos afirmar que uma

teoria científica é superior a sua antecessora pelo fato de seus conteúdos

informativos terem superado testes que falsificará as teorias anteriores.

Dentro dessa perspectiva, o progresso da ciência se dá por meio de ensaio

de tentativas e erros, permitindo que se resolvam problemas e inventem outros. A

falseabilidade empírica não desvaloriza os saberes não científicos como, por

exemplo, a filosofia, pois a atitude filosófica é crítica e argumentativa do pensamento

humano.

Enfim, para Popper, uma teoria nunca é mais do que uma mera hipótese,

nunca poderá ser provada sua veracidade, mas poderá ser bem sucedida se resistir

por um tempo determinado pelos testes severos e críticos da falseabilidade. Sendo,

portanto uma teoria corroborada que ainda não foi falsificada.

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8. TENTATIVAS E ELIMINAÇÃO DE ERROS

As teorias científicas na concepção Popperiana não tratam de verdades

absolutas, elas ainda não foram provadas como falsas. O conhecimento é

perfectível, ou seja, pode ser sempre melhorado ou aperfeiçoado. A verdade só

pode ser em última instância provisória, pertencente a essa cadeia interminável de

resultados que nos aproximam da realidade. A verdade nós não a possuímos,

apenas a buscamos, como já destacamos anteriormente.

Popper analisa o progresso da ciência e do conhecimento humano não pelo

acúmulo de verificações ou por revolução entre lutas de teorias opostas, ele analisa

a partir do ponto de vista biológico ou evolutivo, sua reflexão epistemológica

incorpora elementos darwinianos e, que, por isso, deve ser analisada sob a

perspectiva evolucionista, cujo método usual realiza-se através de ensaios de

tentativas e eliminação de erros. A competição pela sobrevivência é latente entre as

teorias. Popper comenta que

o crescimento de nosso conhecimento é o resultado de um processo

estreitamente semelhante ao que Darwin chamou “seleção natural”; isso é,

a seleção natural de hipóteses: nosso conhecimento consiste, a cada

momento, daquelas hipóteses que mostraram sua aptidão (comparativa)

para sobreviver até agora em sua luta pela existência, uma luta de

competição que elimina aquelas hipóteses que são incapazes. (POPPER,

1999, p.238)

Popper vê semelhanças em sua teoria da evolução do conhecimento

(tentativas e erros) com a da seleção natural das espécies, de Charles Darwin. O

desenvolvimento do pensamento humano se realiza através do método de ensaio e

eliminação de erro, segundo a concepção do filósofo austríaco: “Minha Logik der

Forschung apresentou uma teoria do crescimento do saber por meio da tentativa e

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da eliminação do erro, ou seja, por seleção darwiniana e não por aprendizado

lamarckiano4” (POPPER, 1978, p.176).

Reagimos a um determinado problema de duas maneiras diferentes:

acreditamos em determinada teoria e nos tornamos crentes a ela o máximo possível.

Caso ela venha a ser uma teoria errônea, poderemos ser eliminados com ela.

Outra maneira de reagirmos é refutar uma teoria. Essa segunda forma é o

que podemos definir de desenvolvimento do pensamento humano, pois é o modo

para o crescimento da ciência e do conhecimento.

Mesmo não sendo a teoria da seleção natural das espécies de Charles

Darwin científica (não é possível ser falsificável), Popper a considera indispensável

para a ciência, devido ao seu valor ímpar.

A teoria da seleção natural não é uma teoria científica passível de prova,

mas um programa de pesquisa metafísica; e embora esse programa seja,

no momento, o melhor de que dispomos, ele pode ser talvez ligeiramente

aperfeiçoado. (POPPER, 1978, p.160)

Popper ao revelar que a teoria da seleção natural pode ser ligeiramente

aperfeiçoado está em harmonia com o principal objetivo da ciência, que é, cada vez

mais, expandir o conhecimento, para se aproximar mais da verdade.

Apesar de Popper destacar a importância da teoria evolucionista quanto à

explicação de fenômenos como, o crescimento do conhecimento científico, ele a

considera insatisfatória sob diversos pontos. Um deles refere-se à explicação dada

por Darwin sobre as formas orgânicas de vida, que segundo ele, somente as mais

aptas sobrevivem. Enunciação esta refutada, pois sabe-se que as formas orgânicas

inferiores sobrevivem há muito tempo, mesmo após as formas mais elevadas.

Logo, fica difícil sustentar uma hipótese sobre a sobrevivência dos mais aptos. Para

Popper, “o método de eliminação de erros não constitui uma simples luta pela

sobrevivência entre indivíduos: inclui, por exemplo, o afastamento de

4 Os seres vivos incorporam em seu organismo modificações impostas pelas características do ambiente externo e transmitem

esse conhecimento para a prole como uma herança.

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comportamentos que se revelem ineficazes para atingir um resultado particular”

(POPPER, 1996, p.70). Ainda, a respeito da evolução, Popper registra uma

apreciação moderada:

Na verdade, se na geração seguinte um tipo até então sobrevivente ou apto

não conseguir sobreviver para além dela, é porque não se adaptou a novas

condições ambientais, que se alteram de maneira constante, modificadas

pelo próprio processo evolutivo. Verifica-se claramente que a aptidão é

sempre relativa às condições existentes, podendo afirmar-se apenas “o que

é apto aqui e agora é o que sobrevive aqui e agora”. (POPPER, 1996, p.70)

Sobre a teoria evolutiva, Popper a incorpora na concepção acerca do

crescimento científico, que ele explica por meio do esquema definido por ele de

“método de conjecturas e refutações ou método de ensaio e eliminação de erros”.

Conforme verificaremos na apresentação do esquema abaixo:

P1 → TT → EE → P2

P1 é o problema da qual se parte, TT é a teoria para se resolver o problema

inicial, EE é o processo de eliminação de erros que consiste de um severo exame

crítico de nossa conjectura e P2 representa os problemas finais ou os novos

problemas surgidos das soluções encontradas que emergiram das discussões e dos

ensaios. Conclui-se que o crescimento do conhecimento inicia de velhos problemas

para novos problemas surgidos da solução encontrada por meio de ensaio e

tentativas de eliminação de erros.

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CONCLUSÃO

Ao término deste estudo, após a análise das teorias de Karl Popper,

esperamos ter viabilizado um olhar crítico que contribua para as discussões

filosóficas em torno da tese dos três mundos e os seus desdobramentos.

Nossas considerações se estruturaram em duas partes principais: A tese dos

três mundos em Karl Popper e O estatuto da tese dos 3 mundos inserida na

epistemologia do racionalismo crítico, de Karl Popper, em ambas explicitamos os

meandros teóricos que permeiam a proposição do filósofo austríaco.

Respeitando a ordem cronológica das publicações popperianas,

apresentamos reflexões das obras referentes à tese dos três mundos e o seu

desenvolvimento ao longo da vida intelectual de Popper.

No primeiro momento de nossa pesquisa, acreditávamos que o problema

entre corpo - mente era uma questão unicamente metafísica. Entretanto, ao longo

do estudo, constatamos a sua associação com a epistemologia popperiana –

racionalismo crítico. Eis o motivo de podermos afirmar que a tese dos três mundos é

uma proposição que surgiu em decorrência de outra enunciação de Karl Popper.

A tese dos três mundos rompe com a tradição filosófica, pois a solução

defendida por Popper refere-se à pluralidade de realidades do mundo do

conhecimento, em que o filósofo postula como a existência de três mundos, que

interagem entre si. Embora Popper não aceite a solução elaborada pelos filósofos,

tanto clássicos como modernos, quanto ao problema da relação entre corpo - mente,

Popper declara que a sua tese, a dos três mundos, se desenvolve a partir da

concepção “verdades em si mesmo”, de Bolzano (POPPER, 1999), quando o autor

apresenta a distinção entre os enunciados em si mesmos e os processos mentais

subjetivos.

No livro Conhecimento Objetivo, Popper registra uma advertência em

relação aos estudos epistemológicos existentes, até o momento. Menciona que,

apesar dos esforços dos teóricos em justificar a origem e a evolução do

conhecimento, eles, ainda, não conseguiram distinguir o conhecimento subjetivo do

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objetivo. Desse modo, erroneamente, tratam o conhecimento científico apenas sob a

ótica subjetiva. Diante deste equívoco epistemológico, Popper expõe no livro

Conhecimento Objetivo a distinção entre o conhecimento subjetivo e objetivo. Já que

a referida distinção é condição essencial para o filósofo comprovar a existência de

um terceiro mundo. Cabe destacar que, para Karl Popper, o conhecimento científico

é o conhecimento objetivo.

Para Popper, o conhecimento objetivo está desvinculado do sujeito

conhecedor, é, aí, onde habita o terceiro mundo, pois o conhecimento científico, as

hipóteses e as teorias científicas publicadas em livros ou revistas são identificadas

por ele como elementos do terceiro mundo.

Na segunda parte da dissertação, abordamos a epistemologia popperiana –

o “racionalismo crítico” –, e a tese da falseabilidade empírica – que nega a indução

como método confiável das análises da ciência.

Mostramos as severas críticas ao método da indução, realizadas por

Popper, que considera que a indução incorre em erro. Pois, não acredita que o

princípio da verificabilidade, como método científico, seja um meio confiável para

demarcar o que é ciência e o que é pseudociência. Para Karl Popper, o princípio da

verificabilidade é uma tentativa malograda, pois a ciência não tem como ponto de

partida a observação, mas sim conjecturas. Por isto, ele propõe outro recurso

científico para a demarcação científica: a “falseabilidade empírica”. Essa estratégia,

segundo Popper, além de apresentar uma solução para o problema da demarcação

científica, também contribui para a expansão do conhecimento. Pois se destina à

reiterada substituição de teorias científicas por outras mais satisfatórias e, de acordo

com o critério de falseabilidade empírica, uma proposição será científica se puder

ser falsificada pela experiência.

Outra importante característica da falseabilidade empírica refere-se ao fato

de ter proposto uma estratégia que fornecesse uma solução para o problema da

indução de Hume, pelo menos em parte. Embora, não seja possível provar a

veracidade de uma teoria através do método indutivo, pelo método hipotético-

dedutivo é possível, provar a sua falsidade. Aí é que se situa a solução popperiana.

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O critério de falseabilidade empírica revela uma atitude científica crítica em

torno do conhecimento, não importando a verificação empírica, mas sim as provas

que podem refutar a teoria em análise, que tem sustentação no processo hipotético-

dedutivo de conjecturas e refutações. Segundo Popper, somente, desta forma, que o

conhecimento científico poderá progredir.

Importante retomar que o objetivo do racionalismo crítico em Popper, ao

propiciar a crítica constante às teses científicas, é favorecer o surgimento de novas

hipóteses ou conjecturas mais ousadas e com mais conteúdos informativos na

tentativa de se aproximar da realidade. Uma vez que, para Popper a ciência não

admite resultados definitivos. Ela não deve trabalhar com asserções irrefutáveis que

não admitam crítica, porque a ciência não é dogmática e muito menos crença.

Sempre haverá a possibilidade de surgir novos fatos ou hipóteses científicas que

refutem ou rejeitem teorias, que até então eram tidas como válidas.

No último capítulo, descrevemos a aproximação da epistemologia

popperiana à tese darwinista, devido a semelhança teórica de Popper ao processo

de seleção natural da teoria, de Charles Darwin.

Popper reconhece as influências da concepção darwinista em sua

epistemologia, como a incorporação dos elementos evolutivos darwinianos nas

reflexões acerca da evolução do conhecimento, pois, ele acredita que o progresso

do conhecimento se apresenta através de tentativas e eliminação de erros nas

hipóteses. Prevalecendo, somente, a hipótese mais forte, a que mais resistir ao

critério severo de refutação.

Sob este ponto de vista, confirma-se que o progresso da ciência não se dá

pelo acúmulo de verificações ou por revolução de lutas de teorias opostas. Popper

analisa o progresso da ciência e do conhecimento humano sobre o ponto de vista

biológico ou evolutivo.

A questão central desta dissertação destinou-se a apresentar que a tese dos

três mundos não é uma dicotomia da epistemologia popperiana, mas consequência

do seu racionalismo crítico.

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Esta pesquisa é apenas um começo da busca pela compreensão da gênese

da tese dos três mundos em Popper. Portanto, finalizamos, por ora, nossas

reflexões, questionando-nos: é a tese dos três mundos uma consequência

necessária da epistemologia popperiana? Será que a tese em questão é formulada

para responder às dificuldades epistemológicas, ou para justificar opções

epistemológicas, políticas ou qualquer interesse de outra ordem? A partir de tais

perguntas, pautaremos nossos futuros estudos investigativos.

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