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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP Leandro Gomes Amaral A política fiscal brasileira no período de 1995 a 2010, com ênfase no comportamento da despesa governamental MESTRADO EM ECONOMIA POLÍTICA SÃO PAULO 2012

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP

Leandro Gomes Amaral

A política fiscal brasileira no período de 1995 a 2 010, com

ênfase no comportamento da despesa governamental

MESTRADO EM ECONOMIA POLÍTICA

SÃO PAULO

2012

1

PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

Leandro Gomes Amaral

A política fiscal brasileira no período de 1995 a 2 010, com

ênfase no comportamento da despesa governamental

MESTRADO EM ECONOMIA POLÍTICA

Dissertação apresentada à Banca Examinadora como exigência parcial para obtenção do título de MESTRE em Economia Política pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, sob a orientação do Prof. Doutor Júlio Manuel Pires.

SÃO PAULO

2012

2

Banca Examinadora

___________________________

___________________________

___________________________

3

Dedico este trabalho: ao Sr. Antônio e à Sra. Maria de Lourdes, meus pais; aos mestres que participaram da minha formação e a todos os amigos, em especial, aos também mestrandos Fernando Gdikian e Mauro Selingarde.

4

AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente aos meus pais, Antônio Amaral e Maria de Lourdes

Amaral, todo esforço e dedicação para que hoje eu esteja concluindo mais uma

etapa da minha caminhada.

Faço um agradecimento especial ao Prof. Dr. Julio Pires, orientador desta

dissertação de mestrado, aos professores Antonio de Lacerda, Daniel Arias e

Rubens Sawaya, integrantes das bancas de qualificação e defesa, e ao amigo

economista Fernando Matias, da Universidade Federal do ABC (UFABC), os quais

contribuíram com valiosos conselhos e ensinamentos.

Agradeço ainda à Rosana Dias, gerente da Auditoria Interna da UFABC, a

qual sempre demonstrou toda compreensão e apoio imagináveis, à Adriana Couto,

administradora de empresas na AudIn/UFABC, que muito me incentivou a cursar o

mestrado, bem como aos colegas de AudIn: Bruna Colombo, Denise Senda, Gebel

Barbosa, Patrícia Moreira e Rayane Magalhães.

Sou também muito grato ao Prof. Ms. Ubiratã Reis, contador pertencente ao

quadro de servidores técnicos administrativos da UFABC, em razão dos convites

para participar de bancas examinadoras de trabalhos de conclusão de curso. Sem

dúvida, tal experiência agregou bastante à minha incipiente vivência acadêmica.

Não posso olvidar de agradecer ainda aos seguintes amigos: Fabíola Savioli,

Juliana Savioli, Raoni Alejandro, Carlos Alejandro, Juanna Gugliermoni e Aline

Almeida. Estas seis pessoas e eu somos responsáveis por fazer da nossa

“república” uma segunda família.

Faço menção também aos queridos amigos Danielle Lourenço, Mônica

Carneiro e Manuel da Costa, que sempre estiveram ao meu lado, principalmente nos

momentos mais difíceis, quando necessitei de palavras de incentivo.

Deixei para o final o agradecimento maior a Deus, que, num ato de sua infinita

bondade, colocou pessoas tão especiais em minha vida.

5

“Pode muito bem ser que a teoria clássica represente o caminho que a nossa economia, segundo o nosso desejo, deveria seguir, mas supor que na realidade ela assim se comporta é presumir que todas as dificuldades estejam removidas.”

(John Maynard Keynes)

6

RESUMO

Este trabalho tem por objetivo analisar a política fiscal brasileira, no período de 1995

a 2010, em especial a despesa governamental, a fim de que se possa opinar quanto

ao caráter pró-cíclico ou anticíclico daquela. Pode-se dizer que as medidas adotadas

pelo governo brasileiro foram pró-cíclicas durante quase todos os anos pertencentes

ao período 1995-2010, exceto em 2001 e 2009. Nestes anos, a política fiscal foi

anticíclica, haja vista as desonerações tributárias, em 2009, e o aumento da

formação bruta de capital fixo das administrações públicas, em ambos. Contudo, não

se identificou evidência de que a expansão do investimento ocorrida em 2001 tenha

sido deliberada, ao contrário de 2009, quando o Governo Federal visou à atenuação

da fase recessiva do ciclo econômico, conforme proposto por Keynes. Considera-se,

com isso, que os estímulos fiscais à demanda agregada foram possíveis porque a

economia estava em condição de absorver, num contexto de crise, eventuais efeitos

colaterais das desonerações tributárias, da elevação do investimento público e da

redução do superávit primário.

Palavras chave: política fiscal brasileira, superávit primário, investimento público.

7

ABSTRACT

This study aims to analyze the Brazilian fiscal policy in the period 1995 to 2010,

especially government spending, so that one can opine about the character

procyclical or countercyclical that. We can say that the measures adopted by the

Brazilian government were pro-cyclical during almost every year belonging to the

period 1995-2010, except 2001 and 2009. In these years, fiscal policy was counter-

cyclical, given the tax cuts in 2009 and the increase of fixed capital formation of

government in both. However, it wasn’t identified evidence that the expansion of

investment occurred in 2001 was deliberate, unlike 2009, when the Federal

Government aimed to mitigate the recessionary phase of the cycle, as proposed by

Keynes. Therefore, the fiscal stimuli to aggregate demand were possible because the

economy was in a position to absorb during crisis possible adverse effects of tax

cuts, the increase in public investment and reducing the primary surplus.

Keywords: Brazilian fiscal policy, surplus, public investment.

8

LISTA DE ILUSTRAÇÕES

GRÁFICO 3.1 – RECEITAS PRIMÁRIAS DO GOVERNO CENTRAL ...................... 47

GRÁFICO 3.2 – DESPESAS PRIMÁRIAS DO GOVERNO CENTRAL ..................... 50

GRÁFICO 3.3 – NFSP GOVERNO FEDERAL E BANCO CENTRAL ....................... 56

GRÁFICO 3.4 – NECESSIDADES DE FINANCIAMENTO DO SETOR PÚBLICO CONSOLIDADO ................................................................................................. 57

GRÁFICO 3.5 – DESPESAS CORRENTES DA UNIÃO – EM MILHÕES DE R$ DE 2010 ................................................................................................................... 64

GRÁFICO 3.6 – DESPESAS CORRENTES EM (%) DO PIB ................................... 64

GRÁFICO 3.7 – DESPESAS DE CAPITAL DA UNIÃO – EM MILHÕES DE R$ DE 2010 ................................................................................................................... 65

GRÁFICO 3.8 – DESPESAS DA UNIÃO – GRUPO INVESTIMENTOS – EM MILHÕES DE R$ DE 2010................................................................................. 66

GRÁFICO 3.9 – (%) DAS DESPESAS CORRENTES E DE CAPITAL, EM 2010 ..... 67

GRÁFICO 3.10 – FBCF ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA – EM MILHÕES DE R$ DE 2010 ................................................................................................................... 70

GRÁFICO 3.11 – FBCF ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA – EM (%) DO PIB ................. 71

GRÁFICO 3.12 – DESPESAS DISCRICIONÁRIAS DA UNIÃO – EXECUTIVO – VARIAÇÃO (%) EM RELAÇÃO AO ANO ANTERIOR ....................................... 75

GRÁFICO 3.13 – DESPESAS DISCRICIONÁRIAS DO EXECUTIVO ...................... 76

9

LISTA DE TABELAS

TABELA 2.1 – INDICADORES DO PERÍODO 1995-1998 ....................................... 30

TABELA 2.2 – INDICADORES DO PERÍODO 1999-2002 ....................................... 34

TABELA 2.3 – INDICADORES DO PERÍODO 2003-2006 ....................................... 37

TABELA 2.4 – INDICADORES DO PERÍODO 2007-2010 ....................................... 42

TABELA 3.1 – RECEITA TOTAL, TRANSFERÊNCIAS E RECEITA LÍQUIDA – EM (%) DO PIB ....................................................................... ............................... 48

TABELA 3.2 – DESPESAS PRIMÁRIAS DO GOVERNO CENTRAL – EM MILHÕES DE R$ DE 2010 ................................................................................................. 51

TABELA 3.3 – DESPESA PRIMÁRIA E PIB: TAXAS MÉDIAS ANUAIS DE CRESCIMENTO ................................................................................................. 55

TABELA 3.4 – NFSP RESULTADO PRIMÁRIO – EM (%) DO PIB ........................... 57

TABELA 3.5 – RELAÇÃO ENTRE CATEGORIA ECONÔMICA E GRUPO DE NATUREZA DA DESPESA ................................................................................ 60

TABELA 3.6 – DESPESAS PRIMÁRIAS DISCRICIONÁRIAS DA UNIÃO – EM MILHÕES DE R$ DE 2010 ................................................................................. 74

TABELA 3.7 – DESPESAS COM INVESTIMENTO DO ANO DE 2009, POR MODALIDADE DE APLICAÇÃO - EM MILHÕES DE R$ ................................... 81

TABELA 3.8 - RECEITA, DESPESA DISCRICIONÁRIA, FBCF E PIB: TAXAS ANUAIS DE VARIAÇÃO .................................................................................... 81

10

SUMÁRIO

INTRODUÇÃO .......................................................................................................... 11

CAPÍTULO 1 - ENFOQUES TEÓRICOS A RESPEITO DA EFICÁC IA DA POLÍTICA FISCAL ............................................ ......................................................................... 14

Seção 1.1 - A visão teórica convencional: o efeito crowding out e a questão da centralidade da política fiscal ................... ............................................................. 14

Seção 1.2 - A proposta de Keynes e dos pós-keynesia nos................................. 20

CAPÍTULO 2 - CONTEXTO HISTÓRICO E POLÍTICO ........ .................................... 26

Seção 2.1 - O Primeiro Governo FHC: 1995-1998 ..... ............................................ 26

Seção 2.2 - O Segundo Governo FHC: 1999-2002 ...... .......................................... 31

Seção 2.3 - O Primeiro Governo Lula: 2003-2006 .... ............................................. 34

Seção 2.4 - O Segundo Governo Lula: 2007-2010 ..... ........................................... 39

Seção 2.5 - Balanço do período 1995-2010 .......... ................................................. 43

CAPÍTULO 3 - A TRAJETÓRIA DAS RECEITAS E DESPESAS GOVERNAMENTAIS NO PERÍODO 1995-2010 ............... ....................................... 46

Seção 3.1 - Receita bruta, receita líquida, despesa primária e resultado fiscal 46

Seção 3.2 - A despesa pública segundo sua categoria econômica .................... 59

Seção 3.3 - Despesas discricionárias da União e o v iés da política fiscal brasileira ........................................ .......................................................................... 72

CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................. ........................................................ 85

REFERÊNCIAS......................................................................................................... 89

11

INTRODUÇÃO

Esta investigação consiste em analisar a execução da política fiscal brasileira,

no intervalo de 1995 a 2010, especialmente a despesa governamental, de modo a

poder opinar quanto ao caráter pró-cíclico ou anticíclico das medidas adotadas pelo

governo.

Compete anotar que o debate teórico no tocante ao grau desejável de

intervencionismo estatal na economia vem sendo travado desde longa data, com a

alternância de posição entre escolas de pensamento econômico.

Os adeptos da teoria neoclássica afirmam que a intervenção do Estado não

se justifica, porque não é capaz de influenciar o comportamento de variáveis reais

da economia, sendo apenas causadora de desequilíbrios, como a elevação dos

preços e das taxas de juros. Além disso, o estágio atual da teoria dominante ressalta

a relação das variáveis econômicas com os fundamentos fiscais, pois o dilema

crescimento versus estabilidade é superado somente por meio da restauração da

confiança na trajetória sustentável das contas públicas.

De maneira diferente, Keynes e os pós-keynesianos veem nas políticas de

governo um instrumento para aproximar a demanda efetiva do nível de pleno

emprego. Em se tratando de uma economia empresarial, na qual a moeda pode ser

alternativa preferível a outros ativos, à medida que cresce a incerteza quanto ao

futuro, não há, portanto, garantia de que o equilíbrio entre a oferta e a demanda

agregadas coincida com a plena utilização dos fatores produtivos.

A possibilidade de haver compatibilidade entre expansão do gasto público e

equilíbrio fiscal está presente nos ensinamentos de Keynes, uma vez que a adoção

de política de gastos expansionista que induza o crescimento do produto tende a

aumentar a arrecadação de impostos ou a poupança disponível para financiar

eventuais déficits, por intermédio da colocação de títulos públicos.

Keynes teria ainda sugerido a segregação em dois orçamentos estatais,

sendo um de gastos de correntes e outro de gastos de capital, com a intenção de

separar a função estatal de prover a contínua oferta de bens públicos da que

objetiva regularizar a demanda agregada. Assim, a concepção da política fiscal

12

propugnada por Keynes não é tolerante com a irresponsabilidade, ou seja, não

avaliza posturas que levem ao desequilíbrio permanente das contas públicas, ainda

que, em certos casos, seja necessária e permitida a ocorrência de déficits pontuais.

A escolha do tema foi motivada pela relevância da discussão sobre a política

fiscal brasileira pós-Plano Real, haja vista que a década de 1990 ficou marcada

como o momento da história brasileira recente no qual ocorreu a reformulação na

concepção em torno do papel do Estado na economia, trazida no bojo das reformas

neoliberais empreendidas à época, em meio ao movimento imperativo de

globalização.

No início dos anos oitenta, as dificuldades enfrentadas pela economia

brasileira no seu balanço de pagamentos e a crise da dívida deflagraram o

esgotamento da capacidade de financiamento que permitira o aparelhamento da

indústria nacional. Ademais, a aceleração inflacionária, que seria interrompida

somente em 1994, com a adoção do Plano Real, dificultava a previsão econômica e

aprofundava as distorções sociais.

Diante disso, os esforços empreendidos na área da política econômica

acenavam para a busca da estabilidade macroeconômica enquanto objetivo

primeiro, como um pré-requisito ao crescimento econômico sustentado. Acreditava-

se ser necessário promover o ajuste nas finanças públicas e ampliar a eficiência da

máquina administrativa, ao mesmo tempo em que a abertura dos mercados de bens

e financeiro seria responsável pelo aumento da competitividade da economia

brasileira e pela atração de recursos financeiros suficientes para financiar o balanço

de pagamentos.

Não obstante, a prática de elevadas taxas de juros reais após a

implementação do Plano Real, com a dupla finalidade de frear o crescimento do

consumo e promover a utilização da ancoragem cambial, resultou na piora dos

indicadores de endividamento do setor público durante a segunda metade dos anos

1990, obrigando as autoridades brasileiras a celebrarem, em 1998, um acordo com o

Fundo Monetário Internacional quanto às metas aplicáveis ao resultado fiscal.

Pouco tempo depois, foi promulgada a Lei Complementar nº. 101/2000, mais

conhecida como a Lei de Responsabilidade Fiscal, que dispõe sobre a

responsabilidade na gestão e aplicação dos recursos públicos. Com isso, criou-se

13

para a União, estados e municípios a obrigação de controlarem suas despesas,

conforme a expectativa de receita para determinado exercício financeiro, tendo em

vista a meta de superávit primário estabelecida na Lei de Diretrizes Orçamentárias

(LDO).

No entanto, é somente após 2003 que a relação dívida/PIB deixa de ser

ascendente, apesar do esforço fiscal praticado de 1999 a 2002, no intuito de atingir

as metas primárias para cada ano. Observa-se, então, a elevação das taxas de

FBCF da administração pública, principalmente nos anos posteriores a 2005,

quando o indicador supera a marca de 2% do produto interno bruto (PIB).

Partindo-se do pressuposto que o investimento público tem se mostrado a

variável de ajuste da política fiscal, pois, suscetível a fortes oscilações,

diferentemente das despesas correntes, a hipótese a ser testada é de que a política

de gastos e receitas foi predominantemente pró-cíclica, isto é, atrelada de forma

direta à fase momentânea do ciclo econômico, exceto em 2009, quando o Governo

Federal atuou deliberadamente no sentido de atenuar os reflexos negativos da crise

financeira americana.1

Para tanto, são etapas indispensáveis da dissertação: discutir, com base na

literatura sobre o assunto, a questão dos estímulos à atividade econômica

decorrentes da intervenção estatal, contrapondo as visões neoclássica e keynesiana

– objeto do capítulo um; contextualizar a discussão em meio ao cenário político e

econômico da época examinada, o que será feito no capítulo dois; e analisar dados

relativos à política fiscal empreendida dentro do período delimitado, a fim de

verificar, dentre outros aspectos, o peso das despesas discricionárias no orçamento

geral da União, bem como a condução de tal política em face do ciclo econômico

(temática do capítulo três). Por fim, serão explicitadas as conclusões originárias do

presente estudo.

1 Os dados mostram que em 2001, quando o crescimento real do Produto Interno Bruto foi de 1,31%, a formação bruta de capital fixo do setor público aumentou 11,78%. Pretende-se analisar, no capítulo três, a questão da intencionalidade de empreender política fiscal anticíclica.

14

CAPÍTULO 1 - ENFOQUES TEÓRICOS A RESPEITO DA EFICÁC IA DA POLÍTICA

FISCAL

O intento deste capítulo é apresentar os conceitos da visão mainstream que

são norteadores da política fiscal recente, em contraposição à proposta teórica de

Keynes e seus adeptos. Para Carvalho (2008), muitas vezes os ensinamentos de

Keynes têm se confundido com uma visão de economia apoiada na concepção de

preços e salários rígidos, cujo ajuste é feito por intermédio de mudanças de

quantidades, ao invés de preços, como preconiza a teoria clássica. Além disso, o

autor cita o equívoco cometido pelos que identificam o “keynesianismo” como sendo

uma atitude permissiva com relação à intervenção estatal na economia e

despreocupada com a geração continuada de déficits públicos.

A seção 1.1 trata de descrever as implicações de uma expansão fiscal sobre

a taxa de juros e o produto, no âmbito do modelo IS-LM, assim como aborda a tese

da centralidade do equilíbrio das contas públicas para a estabilidade

macroeconômica. A seção 1.2, por sua vez, resgata ideias do pensador John

Maynard Keynes e da corrente pós-keynesiana a respeito do caráter instável do

investimento numa economia empresarial, em meio às incertezas quanto ao futuro.

Por isso, justificar-se-ia a intervenção governamental, a fim de assegurar o nível de

demanda efetiva condizente com o pleno emprego.

Seção 1.1 - A visão teórica convencional: o efeito crowding out e a

questão da centralidade da política fiscal

O arcabouço teórico do IS-LM se originou de artigo publicado em 1937, por

John Hicks, que procurou sintetizar as principais ideias do livro Teoria Geral do

Emprego, do Juro e da Moeda, escrito por John Maynard Keynes. Naquele trabalho,

Hicks relacionava o funcionamento dos mercados de bens, monetário e de ativos,

por meio de um sistema equações e de representação gráfica das respectivas

curvas. (ANDRADE; MAGALHÃES, 2004).

15

De um lado, a curva IS, cuja sigla significa investiment-saving (investimento-

poupança), é a reprodução das combinações de taxa de juros e renda que conferem

equilíbrio ao lado real da economia, isto é, ao mercado de bens. De outro, a curva

LM (liquidy money) simboliza o equilíbrio no mercado monetário, ou a igualdade

entre oferta e demanda de moeda.

O traçado da IS é decrescente, devido à relação entre taxa de juros e

investimento ser inversamente proporcional. Assim, quanto mais altos os juros

menor será a magnitude do investimento e vice-versa. Logo, a renda cairá ou

aumentará em resposta à queda ou ao aumento do investimento e, por conseguinte,

será determinado um novo ponto de equilíbrio entre a oferta agregada e a demanda

agregada.

É de suma importância ainda mencionar o conceito do multiplicador

keynesiano de gastos, que foi incorporado à curva IS. Com base em Keynes (2007),

o tamanho do efeito da variação do investimento sobre a renda é maior ou menor

conforme aumenta ou diminui a propensão marginal a consumir, que seria um

número situado na faixa de zero a um, pois o consumo cresce com a renda, mas

não na mesma proporção.

Com isso, dependendo da amplitude do multiplicador, um pequeno

incremento no gasto autônomo (aquele que não se relaciona com as variáveis

endógenas, a saber, taxa de juros e renda) ou uma diminuta queda dos juros

poderiam resultar em expansões aceleradas da renda. Em termos geométricos, a

primeira medida deslocaria a IS para a direita, visto que certo nível de taxa de juros

corresponderia agora a uma renda mais elevada, enquanto a segunda ocasionaria

movimentos ao longo da curva.

No tocante à LM, seu desenho é uma linha crescente. Dado que a oferta de

moeda é fixa pela autoridade monetária, o movimento da curva é explicado pela

demanda por moeda, a qual varia em função da renda e da taxa de juros, segundo

os motivos transação e portfólio.

Quanto ao motivo portfólio ou especulação, a taxa de juros é o custo de

oportunidade de se reter moeda, portanto, maiores níveis daquela implicam menor

quantidade demandada. No que se refere ao motivo transação, à medida que a

16

renda se eleva, a demanda por moeda aumenta numa dada proporção, para um

dado nível de taxa de juros.

Assim sendo, o crescimento da renda gera um incremento na demanda por

moeda pelo motivo transação, que provoca a elevação da taxa de juros, caso a

oferta monetária não se altere.

Compete esclarecer que o breve resgate de conceitos do modelo IS-LM é

necessário, por ora, a fim de que se possa refletir sobre o efeito crowding out,

argumento da teoria ortodoxa contrário à expansão do dispêndio público.

Supondo um modelo de economia fechada e com governo, uma política de

expansão do gasto governamental corrente provocaria o aumento da renda na

magnitude do efeito multiplicador. Entretanto, tende a crescer, com a elevação da

renda, a demanda por moeda pelo motivo transação, pressionando a taxa de juros

para cima, na hipótese de a autoridade competente não ampliar a base monetária.

Então, o investimento se retrai e acarreta a contração da renda.

Desta forma, os críticos da política fiscal keynesiana que se baseiam no efeito

crowding out atribuem ao gasto público a responsabilidade pela “expulsão” do

investimento privado. Lopreato (2006, p.20), ao analisar o enfoque tradicional

referente à política fiscal, descreveu também as implicações para uma economia

aberta.

O efeito crowding-out explica o menor valor dos investimentos e, por outro lado, ocorre a deterioração do saldo da conta corrente graças à valorização da taxa de câmbio induzida por taxas de juros mais elevadas. Assim, o efeito positivo do aumento do déficit público no consumo e na renda não se mantém no longo prazo. O aumento do déficit público e, conseqüentemente, a menor taxa de poupança nacional reduz o crescimento do investimento e do estoque de capital, deixando como resultado apenas o aumento da taxa de juros.

Na visão da teoria clássica, a política fiscal é ineficaz para influenciar

variáveis reais da economia, como o produto e o emprego, todavia, é causadora de

mudanças na taxa de juros e nos preços. A premissa subjacente é de que a

economia opera no equilíbrio de pleno emprego, logo, não se conjectura haver

insuficiência de demanda efetiva, como foi aventado por Keynes (2007).

As hipóteses dos “mundos teóricos” clássico e keynesiano receberam

tratamento no arcabouço IS-LM, sendo casos particulares em que a curva LM é

17

desenhada na vertical ou na horizontal, respectivamente. No primeiro, a demanda

por moeda é totalmente inelástica em relação à taxa de juros, ao passo que, no

segundo, é infinitamente elástica.

Ocorre que a política fiscal tem efeitos distintos para os clássicos e

keynesianos. No caso especial com a LM vertical, a política fiscal é inócua, porque

com o deslocamento da curva IS não há qualquer elevação da renda, apenas da

taxa de juros. Com relação ao caso keynesiano, a política fiscal é eficaz, visto que

gera incrementos na renda da amplitude do efeito multiplicador.

Verificou-se o efeito crowding out pela aplicação do esquema IS-LM, o qual,

embora tenha perdido terreno no espaço acadêmico, permanece enquanto

instrumental útil para se avaliar os desdobramentos da política econômica e para

fins didáticos, como observam Andrade e Magalhães (2004). Segundo eles, o

apogeu do IS-LM ocorreu ao longo da “era keynesiana”, nos anos 1960, nos Estados

Unidos. Contudo, data de meados da década de 1970 o início de um processo de

declínio, quando tal modelo sofreu a crítica (teórica e empírica) de Lucas e de

associados aos modelos keynesianos e monetaristas da época, de modo paralelo

aos eventos que estavam ocorrendo na disciplina Macroeconomia.

Lopreato (2006) identificou, na abordagem mainstream mais recente, certo

consenso teórico em torno das expectativas racionais, conceito ligado à escola Novo

Clássica. Estabeleceu-se a ideia de que as autoridades econômicas, ao escolherem

as medidas que serão implantadas, têm de levar em consideração a repercussão

das decisões nas expectativas dos agentes, os quais assumirão posturas distintas

conforme a sua avaliação da política vigente e crença na continuidade da estratégia

adotada.

No que concerne à política fiscal, o estágio atual da teoria dominante destaca

as inter-relações das variáveis econômicas com os fundamentos fiscais, bem como

sugestiona que os problemas são superados somente por meio da restauração da

confiabilidade na trajetória sustentável das contas públicas. Denota, pois, que a

política econômica responsável deve garantir a credibilidade da política fiscal,

condição indispensável ao restabelecimento da confiança dos agentes, que agem de

acordo com os padrões previstos nos modelos de expectativas racionais

(LOPREATO, 2006).

18

Evidenciou-se, nos dois parágrafos anteriores, um entendimento alternativo

às interpretações do esquema IS-LM, pelo qual foi demonstrado o efeito crowding

out, e da curva de Phillips, que expõe o trade-off entre inflação e desemprego. Uma

política caracterizada por déficits públicos não seria apenas causadora de inflação e

de modificações na composição da demanda agregada (decorrente da “expulsão” do

investimento privado), pois também viria a interferir na expectativa dos indivíduos

quanto ao futuro das variáveis macroeconômicas.

Deste modo, a centralidade da política fiscal torna incontestável

[...] o esforço fiscal capaz de incutir confiança aos investidores e de atender os interesses de valorização financeira. A crença na trajetória de solvência da situação fiscal emerge como o pilar da estabilidade macroeconômica, que é a base a partir da qual os investidores definem as suas ações, responsáveis, de acordo com essa visão, por impulsionar o crescimento. (LOPREATO, 2006, p. 8-9). (grifo do autor)

Nesse sentido, Franco (1998) segue em defesa da tese de que a dinâmica

básica do desenvolvimento depende da elevação da produtividade e prescinde das

ações de governo, que se torna coadjuvante, pois o progresso e o crescimento são

obtidos na esfera privada. Com isso, há o deslocamento das prioridades dos

programas e despesas para os indicadores sociais e econômicos, assim como os

grandes projetos de investimento acontecem à proporção que o setor privado confia

na sustentabilidade de um quadro macroeconômico básico, visto que o governo

deixa de ser o agente primordial do processo.

Um fator determinante para o desenvolvimento do país, segundo Franco

(1998), seria a inserção externa da economia brasileira, na contramão do

protecionismo que vigeu durante o processo de substituição de importações. Ainda

com base no autor, a decadência do antigo modelo de industrialização explica a

estagnação da taxa de crescimento da produtividade e a instabilidade econômica

vividas nos anos 1980. E, complementa:

[...] um projeto conseqüente (portanto, livre de charlatanismo populista) de crescimento com redução da pobreza e da concentração de renda, haverá de ter como elemento central a aceleração da taxa de crescimento da produtividade, o que, necessariamente, haverá de ter lugar com a superação da SI e aprofundamento do processo de abertura. (FRANCO, 1998, p.127)

19

Em condições de abertura financeira e de mobilidade de capital, o papel de

defesa da valorização do capital, delegado à política fiscal, ganhou relevo no campo

da teoria dominante. Diante dos crescentes fluxos financeiros internacionais, os

Estados nacionais atuaram de maneira a assegurar a rentabilidade dos títulos da

dívida pública, ofereceram salvaguardas aos bancos e empresas nas crises, bem

como defenderam a lucratividade de outros ativos atraentes ao capital (LOPREATO,

2006).

Assim sendo, a trajetória esperada da situação fiscal veio a se tornar fator

preponderante para as decisões privadas, o qual é responsável por constantes

reavaliações das posições ativas e ríspidos movimentos de capital. Pode-se, pois,

traçar um paralelo entre esta interpretação e a experiência brasileira durante a

década de 1990. Na opinião de Franco (2005, p.276)

[...] era fundamental que se tivesse clareza de que estávamos na presença de condições fiscais melhoradas, mas ainda muito frágeis, que facilmente caracterizavam o que a literatura técnica conhece como “dominância fiscal”, ou seja, uma situação onde o déficit fiscal, ou mais precisamente a rolagem da dívida pública determinava a taxa de juros.

Perante as circunstâncias narradas por Franco (2005), a ausência de ajuste

fiscal reforçaria a rigidez da política monetária, de modo a configurar o efeito

crowding out, ou seja, a substituição do investimento privado e das exportações na

composição da demanda agregada.

Com isso, o comportamento esperado do indicador dívida/PIB sinaliza ao

mercado a trajetória da situação fiscal. Se os cenários apontarem riscos, caso o

endividamento aumente bruscamente ou atinja um patamar considerado elevado, a

política fiscal teria de ser revista, visando obter o superávit primário condizente com

a estabilização da relação dívida/PIB e garantir a política de sustentação da

estabilidade (LOPREATO, 2006).

Expostos os argumentos pertencentes à teoria convencional, cujo fio condutor

do qual descende é a tradição neoclássica, deduz-se que não compete à política

fiscal instrumentalizar a gestão da demanda agregada, ao contrário do que preceitua

a visão keynesiana. Em conformidade com aquela, a política fiscal deve criar um

20

ambiente propício à estabilidade e estabelecer a credibilidade da política econômica,

porque somente assim contribuirá para o crescimento sustentável.

Portanto, a expressão “centralidade da política fiscal”, como bem observou

Lopreato (2006), não quer dizer que tal política desempenha papel ativo na

administração da demanda agregada e do ciclo econômico. Diferentemente, significa

que o resultado das contas públicas, sobretudo, a solvência da dívida, é visto como

elemento central no que diz respeito à orientação dos investidores. Assim,

alterações de cenário podem repercutir no prêmio de risco, no câmbio e na taxa de

juros dos países com maior vulnerabilidade e, por conseguinte, acarretar inflação e

deter o crescimento.

Seção 1.2 - A proposta de Keynes e dos pós-keynesia nos

A análise desenvolvida por Keynes acerca do funcionamento do sistema

capitalista trouxe inovações quanto à maneira de interpretar o comportamento

agregado da economia. O referido autor, ao comparar sua teoria com o ideário

clássico do equilíbrio de pleno emprego, confere a este o status de caso particular

daquela, assim como utiliza o termo geral para simbolizar a abrangência da teoria

por ele elaborada.

Segundo Carvalho (2008), Keynes teria escrito a Teoria Geral do Emprego do

Juros e da Moeda para dar conta de explicar as deficiências da demanda agregada,

embora tenha ainda reconhecido, no último capítulo do livro, outro problema central

do capitalismo moderno: a concentração de renda e riqueza que separa as classes

sociais.

De acordo com Keynes (2007), a atividade econômica pode operar em um

ponto de equilíbrio abaixo do que caracterizaria o pleno emprego, situação que

tende a ocorrer quando existe insuficiência de demanda efetiva. Tal equilíbrio

keynesiano, dado conceitualmente pela interseção das funções de oferta agregada e

de demanda agregada, sofre mutações frequentemente, conforme os agentes

revisam, periodicamente, suas expectativas.

A construção de uma teoria centrada na demanda é a antítese do enunciado

da Lei de Say, pelo qual as condições de oferta são responsáveis por criar as de

21

procura. Diversamente dos “clássicos”, Keynes vislumbrou a possibilidade de existir

desemprego involuntário da mão de obra, pois a determinação da quantidade de

emprego deriva do funcionamento do mercado de bens.

Com fundamento no princípio da demanda efetiva, a instabilidade sistêmica

decorre do fato de que as decisões de investimento são tomadas num ambiente de

incerteza com relação ao futuro, baseadas no fluxo de rendas que se espera obter

dos bens de capital passíveis de serem incorporados, em comparação com o custo

de reposição deste capital. A relação descrita representa o conceito de eficiência

marginal do capital, que nas palavras de Keynes (2007, p. 115) é “[...] a taxa de

desconto que tornaria o valor presente do fluxo de anuidades das rendas esperadas

desse capital, durante toda sua existência, exatamente igual ao seu preço de oferta.”

Existe ainda um componente autônomo na decisão de investir, o qual Keynes

(2007) apelidou de animal spirits (espírito animal), uma espécie de otimismo

espontâneo independente do cálculo estritamente econômico. Enquanto os

indivíduos dotados de espírito empreendedor são mais propensos a assumir os

riscos do investimento produtivo, gerando empregos e renda, os mais cautelosos

preferem conservar sua riqueza em ativos seguros e líquidos, como, por exemplo, a

moeda. Em economias monetárias, nas quais a moeda é uma forma alternativa de

riqueza, a disposição do empresariado para produzir e investir

[...] diminuirá sempre que houver razões para temer-se que a demanda agregada será insuficiente para absorver a produção ou quando o futuro se tornar excessivamente opaco para permitir que se faça previsões de demanda com algum grau de confiança. Nesse caso, ao invés de converter seus recursos monetários em fatores de produção, eles preferirão retê-los na forma de moeda. (CARVALHO, 2008, p. 14).

Para Keynes (2007), a liquidez inerente à moeda é salvaguarda contra a

incerteza que permeia a economia, por isso influencia decisões dos agentes

econômicos, dentre as quais, o investimento. À medida que a decisão de investir é

comprometida, porque as pessoas preferem, diante de um futuro incerto, reter

moeda a realizar investimento produtivo, o crescimento da renda e do emprego se

restringe. Desta forma, a moeda não é neutra, pois é ela “[...] que articula no tempo

tais decisões e resultados, num contexto de tempo histórico, diferentemente do

tempo lógico dos ortodoxos.” (MOLLO, 2004, p. 336).

22

Adicionalmente, a taxa de juros, que depende da preferência pela liquidez e

da oferta monetária, é o outro fator determinante do investimento. Denota que,

ceteris paribus, oscilações na taxa de juros provocam movimentos inversamente

proporcionais na variável investimento. Todavia, no sistema econômico, onde

variações na quantidade de moeda interferem nas decisões, esse efeito não está

garantido, pois

embora seja de esperar que, ceteris paribus, um aumento na quantidade de moeda reduza a taxa de juros, isto não ocorrerá se a preferência do público pela liquidez aumentar mais que a quantidade de moeda; e, conquanto se possa esperar que, ceteris paribus, uma baixa na taxa de juros estimule o fluxo de investimento, isto não acontecerá se a escala da eficiência marginal do capital cair mais rapidamente que a taxa de juros; [...] (KEYNES, 2007, p. 141).

Em outra passagem, o autor expõe seu ceticismo a respeito da capacidade de

a política monetária estimular um fluxo adequado de investimento e sugere que o

Estado assuma uma crescente responsabilidade na organização direta dos

investimentos, caso flutuações de grande magnitude na eficiência marginal do

capital não possam ser compensadas através de alterações na taxa de juros.

Encontrando-se o Estado em situação de poder calcular a eficiência marginal dos bens de capital a longo prazo e com base nos interesses gerais da comunidade, espero vê-lo assumir uma responsabilidade cada vez maior na organização direta dos investimentos, ainda mais considerando-se que, provavelmente, as flutuações na estimativa do mercado da eficiência marginal dos diversos tipos de capital, calculada na forma descrita antes, serão demasiado grandes para que se possa compensá-las por meio de mudanças viáveis na taxa de juros. (KEYNES, 2007, p.135).

Carvalho (2008) sublinha que a política fiscal pode induzir variações no gasto

privado, por alterações na imposição de tributos, ou operar diretamente pela

complementação de gastos. Destarte, o Estado possui meios para compensar a

diminuição da demanda agregada, se os agentes privados recuarem de seus planos

de dispêndio em consumo ou investimento.

Eis o ponto que tem suscitado amplo debate nos meios acadêmicos e

políticos, em razão de interpretações equivocadas acerca do que seria a política

fiscal prescrita por Keynes, a qual é associada, por vezes, à ocorrência de

desequilíbrios orçamentários. Conforme afirma Carvalho (2008), a teoria keynesiana

23

não pactua com o desequilíbrio fiscal. Keynes teria inclusive propugnado a

separação em dois orçamentos estatais, a saber, um de gastos de correntes e outro

de gastos de capital.

O orçamento corrente, cujo intento seria garantir a oferta de bens públicos,

deveria estar sempre equilibrado, enquanto o de capital, onde se enquadram os

investimentos, teria a incumbência de regularizar a demanda agregada, quando esta

se distanciasse do pleno emprego. Logo, a segregação entre os dois orçamentos

cumpria o papel de separar as funções de Estado que não podem ser adiadas ou

suprimidas, nem mesmo provisoriamente, daquelas de teor anticíclico (CARVALHO,

2008).

À luz dos ensinamentos de Keynes, Ferrari Filho e Terra (2010, p.6)

ponderam que o orçamento de capital é

[...] construtor de seu superávit, ao longo termo. Para o equilíbrio das finanças públicas basta que não se incorra em déficit corrente, uma vez que os superávits demandados no orçamento corrente financiam eventuais déficits no orçamento de capital, no curto prazo, bem como os retornos dos investimentos públicos realizados tendem a equilibrar, no longo prazo, o próprio orçamento de capital.

De fato, uma política de gastos expansionista que induza o crescimento do

produto tende a aumentar a arrecadação de impostos ou a poupança disponível

para financiar eventuais déficits, por intermédio da colocação de títulos públicos. Os

efeitos estão relacionados aos conceitos do multiplicador keynesiano do gasto e da

igualdade entre investimento e poupança.

Conforme Keynes (2007) elucidou, dada a propensão marginal a consumir de

uma coletividade, certa variação no investimento provoca um incremento, de

amplitude do efeito multiplicador, na renda, que, por sua vez, gerará montante de

poupança igual ao investimento inicial. De modo diferente, os teóricos da economia

clássica pensavam que a conversão da poupança (pré-existente) em investimento

ocorria mediante movimentos na taxa de juros. Assim, se a oferta de recursos fosse

superior à demanda, a queda na taxa de juros trataria de igualar as duas

quantidades; se fosse inferior, os juros se elevariam.

Portanto, a concepção da política fiscal proposta por Keynes não é conivente

com a irresponsabilidade, ou seja, não avaliza práticas que acarretem desequilíbrio

24

permanente das contas públicas. Desta forma, déficits fiscais são “[...] instrumentos

de último recurso, a serem utilizados se e quando os mecanismos mais adequados

falhassem na sustentação da demanda agregada.” (CARVALHO, 2008, p. 24).

Ademais, Keynes acreditava na compatibilidade entre expansão do gasto

público e equilíbrio fiscal, uma vez que o resultante crescimento da renda pode

financiar o dispêndio efetuado. De acordo com Carvalho (2008), se a busca pelo

equilíbrio fiscal caminhar no sentido oposto, isto é, por meio do aumento da

tributação ou do corte de despesas, numa economia onde há desemprego, tal

política resultará em contração da renda, com reflexos negativos sobre a

arrecadação. Como corolário, o equilíbrio entre receitas e despesas será

eventualmente encontrado a um menor nível de produto.

Outra questão a ser discutida tem a ver com a associação da política fiscal

com a inflação. Na visão de Carvalho (2008), deve-se avaliar se a economia está em

pleno emprego, porque, neste estágio, o somatório das demandas pública e privada

será superior à capacidade produtiva do país, circunstância que provoca pressões

inflacionárias.

Patenteia-se, pois, que as medidas de cunho fiscal devem ter caráter

contracíclico, de maneira a contrarrestar as oscilações da demanda agregada.

Ferrari Filho e Terra (2010, p. 6) entendem que

[...] a principal tarefa do estabilizador automático seria o de prevenir largas flutuações por meio de um programa estável e contínuo de investimentos de longo prazo. Não seria sua função socorrer a um pico ou um vale de uma trajetória do sistema econômico, mas evitar que picos ou vales existam. (grifos dos autores).

Assim sendo, ao evitar que os vales e picos existam no curto prazo, o

governo estaria preocupado tanto com a insuficiência de demanda quanto com o seu

excesso. Disto se pode inferir que o orçamento de capital, o qual é composto por

despesas discricionárias, desempenharia o papel de regulador da demanda efetiva,

enquanto o orçamento corrente limitar-se-ia aos bens e serviços essenciais, a fim de

que se preserve o equilíbrio fiscal e se evite a aceleração da inflação.

Segundo Ferrari Filho e Terra (2010), deve haver complementaridade entre as

iniciativas privadas e públicas de investimento, sendo que estas devem ser indutoras

daquelas, assim como estabilizadoras das flutuações cíclicas do sistema econômico.

25

Afinal, a política fiscal deve atuar sobre as expectativas dos agentes, as quais são o

fator desestabilizador da economia empresarial.

Embora criticasse a teoria econômica clássica, assinalando o fato de que as

hipóteses desta quase nunca são satisfeitas, Keynes (2007) não teria aconselhado a

transição para um sistema em que o Estado assumisse a propriedade dos meios de

produção. Na realidade, ao se referir à expressão “socialização do investimento”, o

autor tinha em mente uma maneira de conduzir a atividade econômica até a

proximidade do nível de pleno emprego.

Eu entendo, portanto, que uma socialização algo ampla dos investimentos será o único meio de assegurar uma situação aproximada de pleno emprego, embora isso não implique na necessidade de excluir ajustes e fórmulas de todas as espécies que permitam ao Estado cooperar com a iniciativa privada. (KEYNES, 2007, p. 288).

Finalmente, tão logo fosse estabelecido o volume de produção agregado

equivalente ao pleno emprego, o arcabouço teórico clássico faria novamente

sentido. Desta forma, Keynes (2007) entendia que não há outra razão para socializar

a vida econômica, senão prover a necessidade de um controle central para ajustar a

propensão marginal a consumir e o estímulo para investir.

Enquanto a teoria convencional enxerga na austeridade fiscal um indicador

capaz de sinalizar aos agentes econômicos o compromisso com a estabilidade

macroeconômica, que propiciaria um ambiente adequado para o investimento

privado, Keynes e os pós-keynesianos, diversamente, propõem a intervenção estatal

justamente para atenuar as flutuações relacionadas ao ciclo econômico, as quais

são provocadas pela instabilidade do investimento numa economia tipicamente

monetária. Como foi dito, nesta o equilíbrio entre a oferta e a demanda agregadas

pode ocorrer num ponto abaixo do nível de pleno emprego dos fatores produtivos,

devido à insuficiência de demanda efetiva, o que justificaria a adoção de medidas de

administração da demanda agregada pelo Estado.

Considera-se, pois, cumprida a pretensão deste primeiro capítulo, qual seja a

de apresentar ao leitor divergências de concepção acerca do papel que compete ao

Estado na economia, à luz de vertentes teóricas distintas, especialmente sob o

prisma da política fiscal. A seguir, será desenvolvido um capítulo de

contextualização, a fim de embasar a análise de dados feita no capítulo três.

26

CAPÍTULO 2 - CONTEXTO HISTÓRICO E POLÍTICO

O período sob exame foi marcado por inúmeras transformações no campo

socioeconômico, dentre as quais são passíveis de destaque: aprofundamento das

reformas no aparato estatal; crescente abertura comercial e financeira; controle da

inflação; introdução de mecanismos saneadores do desequilíbrio fiscal do setor

público, tais como a Lei de Responsabilidade Fiscal – LRF e o estabelecimento de

metas para o superávit primário; expansão dos gastos sociais, inclusive as

transferências de renda focalizadas nas famílias de baixa renda; e redução da

disparidade de renda, que propiciou a ascensão social de segmentos mais pobres

da população brasileira.

Nos dezesseis anos contados a partir de 1995, o Brasil foi governado pelos

presidentes: Fernando Henrique Cardoso (FHC), filiado ao Partido da Social

Democracia Brasileira (PSDB), e Luiz Inácio Lula da Silva (Lula), ligado ao Partido

dos Trabalhadores (PT). O social democrata governou a nação de 01° de janeiro de

1995 a 31 de dezembro de 2002, ou seja, por dois mandatos, acontecimento

semelhante ao ocorrido com Lula, que esteve no comando do país de 01° de janeiro

de 2003 a 31 de dezembro de 2010.

Em virtude das diferenças de concepção de política econômica existentes

entre os governos, inclusive sob uma mesma bandeira partidária, o presente capítulo

está subdividido em cinco seções, sendo os itens 2.1, 2.2, 2.3 e 2.4 correspondentes

a cada mandato presidencial e o 2.5 uma síntese dos principais acontecimentos do

período 1995-2010.

Seção 2.1 - O Primeiro Governo FHC: 1995-1998

Os quatro anos inaugurais da gestão do presidente FHC evidenciaram a

ampliação das reformas neoliberais iniciadas durante o Governo Fernando Collor,

bem como o esforço para manter a estabilidade do real, moeda em vigor a partir de

01° de julho de 1994.

27

No que concerne às reformas, destaca-se a continuidade das privatizações,

em sintonia com os preceitos do Programa Nacional de Desestatização (PND),

instituído pela Lei nº. 8.031, de 12 de abril de 1990, o qual visava, primordialmente,

reordenar o papel do Estado na economia. No intervalo 1995-1998, as principais

áreas abarcadas pelo processo foram a de telecomunicações e energia, na

expectativa de que, com a transferência de propriedade para o setor privado, o

investimento naqueles segmentos pudesse ser alavancado.

Não cabe aqui descrever detalhadamente os meandros, nem ajuizar quanto à

pertinência e efetividade das ações tomadas, mas apenas sublinhar a intenção

subjacente ao programa, de estreitar a intervenção estatal na seara econômica. Ao

mesmo tempo, o governo defendia a desregulamentação dos mercados, objetivando

criar um ambiente competitivo e atrair o financiamento externo.

Em meio ao contexto delineado, foi concebido o Plano Real, cuja

operacionalização ocorreu em três etapas: ajuste fiscal prévio; instituição da URV –

Unidade Real de Valor, moeda indexada que cumpriria a função de unidade de

conta; e a reforma monetária, propriamente dita, quando passou a viger o novo meio

de pagamento. Apesar de os três estágios terem transcorrido no Governo Itamar

Franco, a defesa da estabilidade da moeda se tornaria um desafio para as próximas

gestões presidenciais.

No início dos anos 1990 havia a memória recente das tentativas realizadas

desde o Plano Cruzado, lançado em 1986, as quais não obtiveram êxito quanto ao

seu objetivo de cessar a inflação inercial. Pelo contrário, após um breve sucesso

inicial dos planos, o efeito era o recrudescimento inflacionário, ao mesmo tempo em

que a atividade econômica permanecia estagnada.

Segundo Belluzzo (1999), a origem de tal processo inflacionário crônico

experimentado pelo Brasil e por outras economias latino-americanas está

relacionada ao colapso do financiamento externo, pós 1979, como resultado da

defesa do dólar pelo Federal Reserve e da estabilização da economia americana, e

à correspondente crise fiscal gerada quando os programas de ajustamento foram

postos em prática.

Um fator crucial, enfatizado pelo autor, a ser considerado para o bom

funcionamento da economia, é o grau de confiança dos agentes na moeda e na

28

capacidade de esta desempenhar suas funções de meio de troca, unidade de conta

e reserva de valor. Ao invés disso o que se verificou nos anos de instabilidade

macroeconômica foi a descrença na moeda enquanto convenção, comportamento

traduzido no encurtamento do horizonte temporal relativo a tomada de decisões.

Esse fenômeno expressou-se mediante a freqüente revisão das decisões de preços, a concentração de acumulação de riqueza nos instrumentos indexados e dotados de liquidez instantânea e, finalmente, para fins práticos, no desaparecimento do crédito. Tal situação limitava severamente os poderes da política monetária. A limitação se traduzia na incapacidade de construir um ambiente econômico que encaminhe as decisões privadas ao investimento produtivo e à fixação de preços fundada nos critérios de custo de produção e de margens “normais” de lucro. (BELLUZZO, 1999, p. 83).

Logo, políticas de estabilização bem sucedidas devem sinalizar a longo prazo,

bem como convencer o público a respeito da correção do regime monetário e fiscal.

Vislumbra-se, portanto, o diferencial do Plano Real em relação aos demais planos

executados entre 1986 e 1994.

Para Belluzo (1999), a estratégia básica do Plano Real consistiu na

estabilização da taxa de câmbio nominal, a qual foi sustentada pelo financiamento

adequado em moeda estrangeira e por um montante em reservas capaz de inibir a

especulação contra a paridade estabelecida. Ainda com base no autor, o aumento

da liquidez internacional observado no começo dos anos 90, fruto de políticas

monetárias cujo propósito era contrabalançar os efeitos da recessão americana e da

crise japonesa, assim como as novas oportunidades de aplicação rentável do capital

em mercados emergentes, foram circunstâncias decisivas para a consecução do

Plano.

Em conformidade com Belluzzo e Coutinho (1996), a adequação dos países

emergentes à agenda de reformas conhecida como “Consenso de Washington” nos

anos 1990, em meio ao abundante influxo de capitais privados, ensejou a execução

de programas de estabilização que se utilizaram da “ancoragem” cambial, os quais

obtiveram êxito no combate à inflação, ao contrário de seus antecessores.

Embora a inflação tenha sido debelada, a manutenção do real artificialmente

valorizado desequilibrou a balança comercial e, por conseguinte, a conta de

transações correntes, haja vista a tendência historicamente deficitária da balança de

29

serviços. Paralelamente, a prática de taxas de juros reais elevadas, visando

estimular o ingresso do capital externo necessário para financiar o balanço de

pagamentos e conter a expansão consumista, inibiu o investimento produtivo

privado, onerou as finanças públicas em nível incompatível com as receitas

arrecadadas, além de tornar o país mais vulnerável a crises externas.

Para se ter uma ideia, foi no período em que se operacionalizou a chamada

“âncora cambial” que a taxa básica de juros alcançou os maiores patamares vistos

no intervalo pós Plano Real, como relatam Ferrari Filho e Terra (2010, p. 9):

[...] entre 1995 e dezembro de 1998, a taxa de juros acumulou uma média anual equivalente a 36,4%, enquanto que, entre 1999 e 2009 – regime de “metas de inflação” e câmbio flutuante – a média alcançou 17,6% anuais.

De acordo com Franco (2005), a calibração dos juros em níveis elevados foi

um artifício que permitiu a rolagem da dívida interna, num regime de “dominância

fiscal”, e ajudou a contrapesar o impacto expansionista provindo da estabilidade.

Como resultado, o autor ressalta que a apreciação do real em relação ao dólar,

dentro do sistema de “bandas cambiais”, o qual vigorou até 1999, auxiliou no

processo de estabilização, mas levantou preocupações e polêmicas quanto ao futuro

das contas externas.

Ao final de 1998, momento em que o país vivia o clima de eleição

presidencial, a estratégia de combate à inflação que ratificara a reeleição de FHC no

referido pleito teve que ser revista, em virtude de acordo firmado junto ao Fundo

Monetário Internacional (FMI). O saldo das sucessivas crises internacionais

deflagradas - no México, em 1994, na Ásia, em 1997, e na Rússia, em 1998 - foi o

aumento da desconfiança quanto ao financiamento de economias emergentes que

apresentassem déficits fiscais elevados e deterioração da conta de transações

correntes do balanço de pagamentos, o que resultou na interrupção de afluxos de

capital estrangeiro ao Brasil.

Franco explica que o Brasil tirou proveito de circunstâncias externas

excepcionalmente favoráveis para erradicar a inflação, pois: “[...] a magnitude das

entradas de capitais no país nesses anos era tamanha que simplesmente não nos

deixava outra alternativa, especialmente diante da frágil situação fiscal desses

30

anos.” (FRANCO, 2005, p. 277). Contudo, o autor reconhece que a crise asiática e

principalmente a russa trouxeram o imperativo de mudar as políticas domésticas.

Na visão de Belluzzo (1999), a suposição acerca de um fluxo permanente de

financiamento externo de boa qualidade, justificada pelo aumento de confiança nos

mercados financeiros atribuído à estabilização, desconsiderou três questões chave:

a mutabilidade das condições financeiras globais; a reação dos mercados à situação

das nações deficitárias e devedoras; e o risco associado à fuga de capitais.

Destarte, o esgotamento do nível de reservas fez aumentar a expectativa de

desvalorização do câmbio, acarretando diferenciais elevados entre as taxas de juros

domésticas e as internacionais.

Enfim, as medidas monetárias e cambiais do Plano Real repercutiram sobre a

demanda agregada, mediante inibição do investimento privado e do consumo,

estímulo às importações e desestímulo às exportações. A inflação foi controlada,

porém à custa de um baixo crescimento do produto e de distorções nas finanças do

Estado e no balanço de pagamentos, fato evidenciado pela tabela 2.1.

Tabela 2.1 – Indicadores do período 1995-1998

Ano 1995 1996 1997 1998

Variação anual do PIB - deflator implícito

4,42 2,15 3,38 0,04

Inflação medida pelo IPCA 22,41 9,56 5,22 1,65

NFSP nominal Governo Federal - c/ desvalorização cambial - em (%) do PIB

2,38 2,56 2,63 5,40

Saldo da balança comercial (FOB) - em milhões de US$

-3.465,62 -5.599,04 -6.752,89 -6.574,50

Saldo em transações correntes do balanço de pagamentos - em milhões de US$

-18.383,71 -23.502,08 -30.452,26 -33.415,90

Saldo da conta capital e financeira do balanço de pagamentos - em milhões de US$

29.095,45 33.968,07 25.800,34 29.701,65

Fonte: Ipeadata

31

Seção 2.2 - O Segundo Governo FHC: 1999-2002

Perante um cenário externo adverso - depois das crises mexicana, asiática e

russa, que comprometeram o ingresso de divisas pela conta financeira e de capitais

do balanço de pagamentos - e frente à piora dos indicadores fiscais, cujo reflexo foi

a elevação do endividamento do setor público, o Segundo Governo FHC se inicia,

em janeiro de 1999, tendo que enfrentar prontamente as pressões para desvalorizar

a taxa de câmbio.

Não obstante os esforços envidados na área cambial, a desvalorização do

real em relação ao dólar não pôde ser evitada, ocorrendo em meados do primeiro

mês de governo. Todavia, o temor de um surto inflacionário decorrente da variação

no câmbio, tal qual o experimentado pelo México anos antes, não se concretizou.

Embora a desvalorização nominal acumulada entre 1998 e 2002 tenha sido da

ordem de 192%, o equivalente a 30% ao ano, a inflação no mesmo período foi

inferior a 40%, ou 8,8% ao ano (GIAMBIAGI, 2005a).

Conquanto a crise cambial de 1999 possa ser enxergada como uma repetição

de tantas outras ao longo da história brasileira, se distingue das demais por ter

implicado mudanças nos rumos da política econômica, as quais abrangeram os

segmentos monetário, cambial e fiscal, por meio do regime de metas de inflação, do

câmbio flutuante e do ajuste fiscal.

O regime de metas de inflação consiste num mecanismo pelo qual o Banco

Central calibra a taxa básica de juros conforme o diferencial entre o nível vigente de

inflação e a meta deliberada no âmbito do Conselho Monetário Nacional. Desta

forma, cabe à política monetária o condão de promover a convergência do

parâmetro oficial de inflação - atualmente o Índice de Preços ao Consumidor Amplo

(IPCA) – para o alvo definido.

No que se refere ao câmbio flutuante, o preço de uma unidade monetária

estrangeira, por exemplo, o dólar americano, em reais, passou a ser determinado

pela oferta e demanda de divisas. Contudo, apesar do termo “flutuante”, não está

excluída a possibilidade de o Banco Central intervir pontualmente no mercado

cambial, na posição de ofertante ou demandante de moeda estrangeira, a fim de

estabilizar o movimento da taxa de câmbio num dado momento. O citado regime

32

recebeu a denominação “flutuante sujo”, porque há interferência no livre

funcionamento das forças de mercado.

Em termos práticos, a flutuação do câmbio é responsável por promover o

ajuste das transações correntes do balanço de pagamentos. Se ocorrerem elevados

déficits em transações correntes, o câmbio nominal tende a depreciar, estimulando

as exportações e desestimulando as importações. De modo diverso, se as

transações correntes forem superavitárias, o câmbio nominal tende a apreciar, em

favor das importações e em desfavor das exportações.

Quanto ao ajuste fiscal, os acontecimentos a se destacar são: a reforma

parcial da previdência, a renegociação dos passivos estaduais e a Lei de

Responsabilidade Fiscal.

Com relação ao primeiro, Giambiagi (2005a) menciona que o governo ampliou

a necessidade de tempo de contribuição para os trabalhadores na ativa, estabeleceu

idade mínima para os ingressantes na administração pública, “desconstitucionalizou”

a fórmula de cálculo das aposentadorias concedidas pelo INSS, bem como aprovou

o fator previdenciário. Este foi utilizado para instrumentalizar uma política de

desestímulo a aposentadorias precoces, haja vista que, com a aplicação do fator, o

valor do benefício pago diminui quanto menores forem a idade do segurado e o

tempo de contribuição.

A renegociação dos passivos estaduais teve consequências não desprezíveis

para o ajuste de suas finanças. De acordo com Giambiagi (2005a), as dívidas dos

estados frente ao mercado foram assumidas pela União, em troca do compromisso

de aqueles efetuarem a quitação do débito no prazo de trinta anos, na forma de

pagamentos mensais. Ainda segundo o autor, caso os estados não cumprissem com

o acordado, a União poderia se apropriar de receitas transferidas por intermédio dos

fundos de participação, bem como até mesmo de parcelas do Imposto sobre a

Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS).

Por sua vez, a Lei Complementar nº 101, de 04 de maio de 2000, introduziu

mecanismos voltados para a responsabilidade na gestão das finanças públicas, aos

quais a União, os estados, o Distrito Federal e os municípios ficaram obrigados. Com

fulcro no §1º do artigo 1º da aludida norma, tal responsabilidade

33

[...] pressupõe a ação planejada e transparente, em que se previnem riscos e corrigem desvios capazes de afetar o equilíbrio das contas públicas, mediante o cumprimento de metas de resultados entre receitas e despesas e a obediência a limites e condições no que tange a renúncia de receita, geração de despesas com pessoal, da seguridade social e outras, dívidas consolidada e mobiliária, operações de crédito, inclusive por antecipação de receita, concessão de garantia e inscrição em Restos a Pagar. (grifos adicionados)

Adicionalmente, o §1º do artigo 4º da LRF determina que o Anexo de Metas

Fiscais integre o projeto de lei de diretrizes orçamentárias (PLDO), visto que naquele

“[...] serão estabelecidas metas anuais, em valores correntes e constantes, relativas

a receitas, despesas, resultados nominal e primário e montante da dívida pública,

para o exercício a que se referirem e para os dois seguintes.”

Outro ponto essencial da LRF é o controle das despesas com pessoal. Os

artigos 19 e 20 impuseram limites para União, estados e municípios, com base na

receita corrente líquida, sendo os percentuais distribuídos, em cada esfera, pelos

poderes Executivo, Legislativo e Judiciário. De fato, nos anos 2000 a razão entre os

gastos do Governo Central com pessoal e encargos sociais e o PIB se estabilizou

em torno de 4,5%, como será demonstrado no capítulo 3.

Conquanto as novas diretrizes possam ter cooperado para aumentar a

credibilidade da política econômica, de outro lado, a exemplo do que ocorrera no

intervalo 1995-1998, a performance do PIB deixou a desejar, como revela a tabela

2.2. Entretanto, é pertinente anotar que o desempenho da economia foi também

influenciado por eventos de ordem interna e externa, dentre os quais: as crises

cambiais brasileiras, em 1999 e 2002; a crise energética; a crise argentina e os

atentados terroristas nos Estados Unidos (os três últimos no ano de 2001).

Sem embargo, no que concerne ao balanço de pagamentos, verifica-se a

alteração de status da balança comercial, a qual voltou a ser superavitária em 2001,

repercutindo para diminuição do déficit em transações correntes. Observa-se ainda,

na tabela 2.2, que o saldo negativo destas torna a ser superado pelos ingressos

mediante a conta capital e financeira, inclusive em 2002, quando o movimento de

capitais se reduziu de US$ 27.052,26 milhões para US$ 8.004,43 milhões.

34

Tabela 2.2 – Indicadores do período 1999-2002

Ano 1999 2000 2001 2002

Variação anual do PIB - deflator implícito

0,25 4,31 1,31 2,66

Inflação medida pelo IPCA 8,94 5,97 7,67 12,53

NFSP nominal Governo Federal - c/ desvalorização cambial - em (%) do PIB

6,87 3,13 3,41 5,87

Saldo da balança comercial (FOB) - em milhões de US$

-1.198,87 -697,75 2.650,47 13.121,30

Saldo em transações correntes do balanço de pagamentos - em milhões de US$

-25.334,78 -24.224,53 -23.214,53 -7.636,63

Saldo da conta capital e financeira do balanço de pagamentos - em milhões de US$

17.319,14 19.325,80 27.052,26 8.004,43

Fonte: Ipeadata

No que diz respeito às finanças públicas, no capítulo 3 será mostrado que

houve elevação da dívida pública durante os anos de 1999 a 2002, não obstante o

esforço fiscal para prática de superávits primários. Depreende-se, pela análise da

tabela 2.2, o efeito da desvalorização cambial sobre as necessidades de

financiamento do setor público, as quais tiveram aumento expressivo nos anos de

1999 e 2002.

Seção 2.3 - O Primeiro Governo Lula: 2003-2006

Às vésperas das eleições de 2002, quando o candidato Luiz Inácio Lula da

Silva, do Partido dos Trabalhadores (PT), despontava como favorito à sucessão

presidencial, dúvidas surgiram quanto à manutenção dos fundamentos que

constituíam o “tripé” da política econômica vigente caso as urnas confirmassem o

resultado das pesquisas de intenção. Havia, naquela época, o receio da decretação

de moratória em 2003, no bojo da adoção de políticas de cunho populista por parte

do governo encabeçado pelo PT, sendo tal instabilidade e a ação especulativa as

prováveis causas da depreciação cambial vista no segundo semestre de 2002.

Contudo, os temores não se justificaram, visto que durante os oito anos de

Governo Lula (2003-2010) o compromisso assumido com a responsabilidade fiscal e

35

com a estabilidade da moeda foi preservado. Na realidade, o ambiente de confiança

na política econômica foi se constituindo em virtude das decisões tomadas a partir

da vitória petista nas eleições presidenciais de 2002.

Na opinião de Giambiagi (2005b), as medidas iniciais que teriam revertido a

favor de Lula as expectativas foram:

a) a nomeação de Henrique Meirelles, ex-presidente mundial do Banco de

Boston, para a presidência do Banco Central do Brasil, conservando-se o

restante da diretoria anterior;

b) o anúncio das metas de inflação para 2003 e 2004, de 8,5% e 5,5%,

respectivamente, inferiores à taxa efetiva observada em 2002;

c) a elevação da taxa básica de juros (SELIC), em reuniões do Comitê de

Política Monetária do Banco Central (COPOM);

d) a definição de meta mais rígida para o superávit primário, que aumentou de

3,75% para 4,25% do PIB;

e) o estabelecimento de cortes do gasto público, a fim de tornar viável o alcance

do objetivo fiscal; e

f) a colocação, na LDO, da intenção de manter a meta anual referente ao

superávit primário, de 4,25% do PIB, até o final de 2006.

Marques e Nakatani (2007) elucidam que a elevação da taxa básica de juros,

ao longo dos primeiros seis meses de 2003, visando conter a alta dos preços e

assegurar o afluxo de capitais externos ao país, combinada com a austeridade fiscal,

causaram o arrefecimento da demanda interna. Os autores advertem, entretanto,

que a melhora do câmbio e o desaparecimento das pressões inflacionárias

possibilitaram, no segundo semestre, a redução da SELIC, que trouxe consigo a

recuperação do nível de atividade.

Apesar da sobrevida ganha na segunda metade do ano, o desempenho do

PIB foi modesto em 2003, tendo variado 1,15% na comparação com o ano anterior

(tabela 2.3). Nos três anos subsequentes, a economia brasileira cresceu a taxas

36

acima de 3% ao ano, mas não sustentou um mesmo ritmo de crescimento, haja vista

que a expansão de 5,71%, em 2004, deu lugar a 3,16% e 3,96%, em 2005 e 2006,

respectivamente.

A inflação, ao contrário, não foi uma decepção, porque houve queda no

período retratado na tabela 2.3. Embora a variação do IPCA relativa a 2003 tenha

superado a meta anual, ainda assim a magnitude do aumento não chegou a dois

dígitos, diversamente de 2002, quando se aproximou de 13% ao ano (para este

dado ver tabela 2.2).

No tocante à área fiscal, as necessidades de financiamento do setor público –

incluída a variação cambial - foram em média menores que no intervalo de 1999 a

2002, ainda que tenham aumentado entre 2004 e 2005. A questão será melhor

explorada em instante oportuno, ao se investigar pormenores do resultado fiscal e

suas implicações para a dívida pública. Por ora, não é possível extrair conclusões

adicionais dos dados apresentados.

Continuando a análise da tabela 2.3, chama atenção o resultado positivo em

transações correntes, algo que não aconteceu durante os dois mandatos de FHC. A

explicação para o fenômeno está na ocorrência de mega superávits comerciais entre

2003 e 2006, decorrentes do comportamento excepcional das exportações, as quais

foram impulsionadas pela boa fase da economia mundial e pelos preços em

elevação das commodities, a despeito da apreciação do real em relação ao dólar.

De fato, os seguidos superávits em transações correntes atenuaram a dependência

do financiamento via conta financeira e de capitais, para equilibrar o balanço de

pagamentos, assim como proporcionaram a redução da dívida externa.

Nesse ínterim, Marques e Nakatani (2007) demonstraram preocupação com

as variáveis explicativas do crescimento econômico brasileiro, diante da

proeminência das exportações para sustentação do nível de atividade. De acordo

com eles, o governo não conseguiu criar condições de crescimento interno que

diminuíssem a dependência da performance do resto do mundo, especialmente da

China, demandante de grande quantidade de matérias primas. Desta forma, o Brasil

teria se beneficiado do boom da economia mundial, mesmo em 2004, ano positivo

para o consumo das famílias e para o investimento.

37

Tabela 2.3 – Indicadores do período 2003-2006

Ano 2003 2004 2005 2006

Variação anual do PIB - deflator implícito

1,15 5,71 3,16 3,96

Inflação medida pelo IPCA 9,30 7,60 5,69 3,14

NFSP nominal Governo Federal - c/ desvalorização cambial - em (%) do PIB

2,32 1,22 3,20 3,05

Saldo da balança comercial (FOB) - em milhões de US$

24.793,92 33.640,54 44.702,88 46.456,63

Saldo em transações correntes do balanço de pagamentos - em milhões de US$

4.177,29 11.679,24 13.984,66 13.642,60

Saldo da conta capital e financeira do balanço de pagamentos - em milhões de US$

5.110,94 -7.522,87 -9.464,05 16.298,82

Fonte: Ipeadata

Devem ser enfatizadas também as nuances da política monetária, certas

horas contracionista, noutras, expansionista.2

Verificou-se que no primeiro semestre de 2003 a taxa SELIC foi majorada,

chegando a 26,5% ao ano. Com a melhora de cenário nos seis últimos meses do

ano, a taxa básica foi reduzida por nove rodadas consecutivas de reuniões do

COPOM, mais precisamente até abril de 2004, quando foi fixada em 16% ao ano. A

SELIC foi mantida neste patamar de abril a setembro, mês em que voltou a

aumentar, sob a justificativa do retorno de pressões inflacionárias.

Ocorreram, desde então, elevações sucessivas nas reuniões do COPOM, até

maio de 2005. Neste mês, a taxa básica de juros alcançou 19,75% ao ano, 3,75%

maior que o nível pré 16 de setembro de 2004.

Todavia, é a partir de setembro de 2005 que a SELIC vivenciou seu declínio

mais acentuado, em se tratando do Primeiro Governo Lula. Em 31 de dezembro de

2006, a taxa de juros nominal anual correspondia a 13,25%, contra 18% no início

deste ano.

Apesar de a tendência dos juros reais ser de queda, pode-se inferir que a

ortodoxia monetária praticada ao longo do período não viabilizou a superação de

2 Dados da política monetária obtidos a partir de: <https://www3.bcb.gov.br/sgspub/localizarseries/localizarSeries.do?method=prepararTelaLocalizarSeries>.

38

problemas estruturais peculiares da economia brasileira. Para Marques e Nakatani

(2007), a trajetória errática da taxa de crescimento do PIB se manteve, a

participação do investimento na demanda agregada permaneceu baixa, a

capacidade de intervenção do Estado não foi restaurada e a fragilidade a choques

externos e ao movimento do capital especulativo não foi sanada.

No entanto, pode-se dizer que o Primeiro Governo Lula foi um marco para a

política social do tipo assistencialista, a contar da unificação dos diversos programas

existentes – tais como o Bolsa Escola, Bolsa Alimentação, Cartão Alimentação e

Auxílio Gás - no Programa Bolsa Família. Este ficou sob a coordenação de apenas

um ministério, diferentemente do que ocorrera durante a gestão presidencial de

FHC, quando a administração de cada um dos programas de transferência de renda

competia a ministérios distintos.

Além da unificação e centralização no Bolsa Família, foram ampliados a

cobertura e os benefícios concedidos. Destaca-se a instituição de uma base fixa

para o valor do benefício, a qual é independente da existência de filhos em idade

escolar. Nas palavras de Marques et al. (2010, p. 271), a fixação da base

[...] pode ser entendida como um pequeno embrião de uma renda mínima. O benefício, somado aos recursos da família, estaria sendo reconhecido como o mínimo para uma família viver. É claro que, para isso de fato ocorrer, seria preciso que o PBF3 fosse um direito e não um programa de governo.

Os autores também avaliaram a abrangência e representatividade do citado

Programa, que beneficiava, em outubro de 2006, cerca de 48 milhões de pessoas,

isto é, mais de um quarto da população estimada pelo Instituto Brasileiro de

Geografia e Estatística (IBGE). Outrossim, entre janeiro e outubro de 2006, os

recursos do Bolsa Família correspondiam a 15% da transferências federais pelo

fundo de participação dos municípios – FPM.

Merecem ainda relevo a crise política que se instalou no governo em meados

de 2005, derivada do escândalo do “mensalão”, bem como a substituição do ministro

Antonio Palocci por Guido Mantega, no Ministério da Fazenda, em abril de 2006.

3 Programa Bolsa Família.

39

Aquela teve seus desdobramentos a partir da denúncia feita pelo deputado

federal Roberto Jefferson, do Partido Trabalhista Brasileiro (PTB), sobre um

esquema de desvio de recurso público e compra de votos que envolvia a cúpula do

PT e partidos integrantes da base aliada. Então, foi constituída uma comissão

parlamentar mista de inquérito para tratar do assunto, a qual recebeu a alcunha “CPI

dos correios”.

Resultou das averiguações a cassação do mandato de alguns poucos

parlamentares, a absolvição de outros e renúncias. Outro corolário foi a

reformulação ministerial, que culminou com a saída dos ministros José Dirceu (Casa

Civil) e Antonio Palocci (Fazenda).

Seção 2.4 - O Segundo Governo Lula: 2007-2010

A eleição presidencial de 2006 foi protagonizada pelo candidato à reeleição,

Luiz Inácio Lula da Silva, do PT, de um lado, e o ex governador do Estado de São

Paulo, Geraldo Alckmin, do PSDB, de outro. A disputa foi vencida por Lula, no

segundo turno, a quem coube a responsabilidade de governar o país de 01° de

janeiro de 2007 a 31 de dezembro de 2010.

Uma das grandes bandeiras de governo, anunciada em janeiro de 2007, foi o

Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). Dentre seus objetivos, o plano

estratégico teria o condão de

[...] resgatar o planejamento em infraestrutura, retomar investimentos em setores estruturantes, fazer crescer o emprego e a renda, incentivar o investimento público e privado e, principalmente, construir a infraestrutura necessária para sustentar o crescimento do Brasil. Um plano que só teria êxito se houvesse forte articulação no Governo Federal e fosse executado em parceria com estados, municípios e com a iniciativa privada. (PROGRAMA, 2010, p. 3).

Ademais, o Plano Plurianual para o quadriênio 2008-2011 - instituído pela Lei

n° 11.653, de 07 de abril de 2008 - reforçou a relevância do PAC como política

prioritária de governo. Em consonância com o artigo 3°, §1°, I, da aludida lei, a

gestão fiscal e orçamentária e legislação correlata deveriam levar em conta, dentre

outros aspectos, a “elevação dos investimentos públicos aliada à contenção do

40

crescimento das despesas correntes primárias até o final do período do Plano.” E,

com fundamento no §2°, I, os projetos associados ao Projeto-Piloto de Investimentos

Públicos - PPI e ao Programa de Aceleração do Crescimento seriam considerados

prioritários.

Vislumbra-se, portanto, nas entrelinhas dos trechos supracitados, uma

intenção desenvolvimentista por parte do governo, cujo foco teria se deslocado para

a necessidade de acelerar o crescimento do PIB, enquanto um dos meios para se

atingir o desenvolvimento econômico. Deste modo, o PAC simboliza a retomada da

capacidade de o Estado conduzir um programa de investimentos.

Sobre a conjuntura do período, a tabela 2.4 traz o mesmo conjunto de

indicadores analisados nas três seções precedentes.

Nota-se que o PIB variou com intensidade maior de 2007 a 2010, na

comparação com os intervalos 1995-1998, 1999-2002, 2003-2006, ainda que se

considere a recessão de 2009. Compete esclarecer que neste ano a atividade

econômica foi negativamente influenciada pela contratação do crédito, advinda após

a quebra do banco de investimentos Lehman Brothers, nos Estados Unidos, em

setembro de 2008. Para o Brasil, o evento marcou o início da fase crítica da crise

americana, que desencadeou a retração do PIB por dois trimestres consecutivos (o

quarto de 2008 e primeiro de 2009).

No que diz respeito à inflação, esteve abaixo do centro da meta em 2007 e

2009 e, nos demais anos, não ultrapassou a banda superior. O dado concernente a

2008 oculta ainda um detalhe bastante discutido à época, sobre a real causa da

inflação. O Banco Central, perante um cenário de aumento dos preços, elevou a

taxa básica de juros de 11,25% para 11,75% ao ano, em abril de 2008, enquanto

havia quem afirmasse que uma parcela da inflação não decorria de expansão da

demanda, mas sim dos custos.

O maior nível da taxa SELIC, no quadriênio 2007-2010, foi de 13,75% ao ano,

definido em setembro de 2008, antes de o país sentir os efeitos do agravamento da

crise financeira americana, ainda neste ano. Não obstante isso, o COPOM aguardou

até janeiro de 2009 para começar a mover para baixo os juros básicos, que

chegaram à marca de 8,75% ao ano, entre julho de 2009 e abril de 2010. Deste mês

a dezembro de 2010 a taxa básica voltou a subir, encerrando o período em 10,75%.

41

Conquanto os juros reais no Brasil tenham diminuído durante o Segundo

Governo Lula, sendo indubitavelmente inferiores aos vigentes nos oito anos FHC e

nos quatro primeiros da gestão petista, cabe frisar que o estigma de ser uma das

economias líderes no quesito juros altos não foi debelado. Aliás, o diferencial entre

os juros domésticos e os internacionais ajuda a explicar a apreciação cambial

experimentada ao longo do quadriênio.

A combinação câmbio apreciado e arrefecimento da economia mundial

provocou o achatamento dos saldos comerciais entre 2007 e 2010, após a época de

bonança da economia mundial. Como ilustra a tabela 2.4, em 2010, o superávit da

balança comercial representava a metade do gerado em 2007, ao mesmo tempo em

que o saldo em transações correntes retornava para o terreno deficitário. A

apreciação cambial favorecia também a remessa de lucros e dividendos,

desequilibrando a balança de serviços.

Entretanto, os ingressos pela conta capital e financeira foram suficientes para

cobrir os déficits em transações correntes, sem ocasionar problemas para o

financiamento do balanço de pagamentos. Por outro lado, o reaparecimento de um

saldo negativo crescente nas relações de intercâmbio de bens e serviços com o

resto do mundo inspira cuidados, para que não se repita a situação de

vulnerabilidade externa enfrentada na segunda metade da década de 1990.

Quanto às necessidades de financiamento do setor público, evidencia-se que

o governo federal esteve próximo, em 2008, de equilibrar suas receitas e despesas,

visto que o indicador foi inferior a 1% do PIB. No ano seguinte, contudo, o gap entre

os gastos e a arrecadação aumentou para 3,32%, o que pode ser indicativo de uma

política fiscal anticíclica, aspecto a ser analisado com maior cuidado no capítulo três.

42

Tabela 2.4 – Indicadores do período 2007-2010

Ano 2007 2008 2009 2010

Variação anual do PIB – deflator implícito

6,09 5,17 -0,33 7,53

Inflação medida pelo IPCA 4,46 5,90 4,31 5,91

NFSP nominal Governo Federal - c/ desvalorização cambial - em (%) do PIB

2,15 0,93 3,32 -

Saldo do balança comercial (FOB) - em milhões de US$

40.031,63 24.835,75 25.289,81 20.146,86

Saldo em transações correntes do balanço de pagamentos - em milhões de US$

1.550,73 -28.192,02 -24.302,26 -47.273,10

Saldo da conta capital e financeira do balanço de pagamentos - em milhões de US$

89.085,60 29.351,65 71.300,60 99.911,78

Fonte: Ipeadata

Deve-se registrar outro evento não desprezível transcorrido à época: os

aportes do Tesouro Nacional ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e

Social (BNDES), nos anos de 2009 e 2010. A capitalização de R$ 210 bilhões, pela

colocação de títulos no mercado, permitiu ao BNDES a ampliação da capacidade de

financiamento a projetos de longa maturação e viabilizou uma atuação anticíclica por

parte do governo brasileiro, diante dos desdobramentos da crise financeira

americana.

Todavia, os meios empregados foram alvo de críticas, em razão do diferencial

entre a taxa SELIC, que remunera os títulos públicos federais, e a taxa de juros de

longo prazo (TJLP), praticada nos empréstimos concedidos pelo BNDES.

Apesar dos questionamentos a respeito do impacto fiscal dos empréstimos do

Tesouro ao Banco, Pereira, Simões e Carvalhal (2011) ajuízam que o simples

cálculo do custo da operação desconsidera as benesses fiscais indiretas resultantes

do financiamento aos investimentos do setor privado, os quais são impulsionadores

da produção, da renda e da arrecadação federal no curto prazo, além de expandirem

o potencial produtivo da economia no longo prazo.

A metodologia utilizada pelos autores estimou um ganho fiscal líquido de

cerca de R$ 100 bilhões. A cifra significa a consolidação de um custo fiscal direto

líquido de R$ 50,6 bilhões e benefícios indiretos, em virtude da arrecadação

43

tributária da União, de R$ 151,8 bilhões, medidos em valores presentes (PEREIRA;

SIMÕES; CARVALHAL, 2011).

Com base em informações do Banco Nacional de Desenvolvimento

Econômico e Social (2011), o Sistema BNDES demonstrou, no período de 2007 a

junho de 2011, desempenho recorde em todos os níveis de atuação, ratificando o

status de principal instituição de financiamento de longo prazo no Brasil, bem como

o de agente direto na consecução das finalidades da política de investimentos do

Governo Federal. A concessão de linhas de crédito se concentrou, dentre outras,

nas áreas de: infraestrutura, ampliação da capacidade produtiva, incremento das

exportações, crédito para micro, pequenas e médias empresas (MPMEs), inovação,

desenvolvimento socioambiental e do Norte e Nordeste, que garantiram uma

tendência de melhoria qualitativa nos desembolsos do Banco.

Seção 2.5 - Balanço do período 1995-2010

Em resumo, parece-nos que a tônica da política econômica dos dois

mandatos de FHC foi assegurar a estabilidade do real a qualquer custo. Para tanto,

utilizaram-se medidas monetárias restritivas, como os elevados juros praticados, que

implicaram severo ajuste das finanças públicas. A natureza estabilizadora da política

fiscal se mostrou, então, inibidora do dispêndio público gerador de condições

favoráveis à expansão da demanda, em especial do investimento produtivo.

Concomitantemente, com o programa de privatizações o Estado transferiu ao

setor privado a responsabilidade de investir, de modo que a dinâmica do

investimento nos segmentos privatizados se sujeitou aos determinantes analisados

por Keynes (2007) - abordados no capítulo 1 desta dissertação - fatores que

contribuem, numa economia capitalista, para a instabilidade dessa variável.

Como foi anotado por Belluzzo e Coutinho (1996), críticos do modelo adotado

pelo país nos anos 1990, o Estado ficou incumbido de criar um ambiente propício

para atrair investidores, reforçando a liberdade privada de acumulação sob a

hegemonia do pensamento neoliberal. Os autores explicam que caberia àquele

suprir, no máximo, certas externalidades e assegurar a estabilidade de preços, sob

44

austeridade fiscal e liberdade cambial, enquanto os mercados e a exposição às

forças da competição global seriam respostas suficientes.

Outro intento da gestão FHC foi instigar a modernização de cadeias

produtivas domésticas, na expectativa de se obter ganhos de produtividade por

intermédio da exposição à concorrência de empresas estrangeiras de um mesmo

setor. O ex-presidente do Banco Central do Brasil, Gustavo Franco, chegou a

afirmar, sobre a abertura “[...] é a base para a construção de um modelo de

crescimento, para os próximos anos, que permita que o Brasil dê um salto qualitativo

e conseqüente em termos de padrões de vida de sua população.” (FRANCO, 1998,

p.131). Porém, a amplificação da abertura comercial expôs as fragilidades de uma

indústria obsoleta, carente de grandes investimentos por aproximadamente uma

década e ainda refém da antiga política de reservas de mercado, com implicações

iniciais desastrosas para a atividade econômica.

No mesmo sentido, a valorização real do câmbio de julho de 1994 a

dezembro de 1998 puniu o setor exportador com a diminuição de competitividade do

produto nacional no mercado externo, principalmente o do ramo manufatureiro, ao

passo que cresceu a atratividade das importações, ocasionando déficits na balança

comercial. À medida que crescia a dificuldade de captar recursos externos para

financiar o desequilíbrio em transações correntes, tanto mais complicado era

sustentar a paridade com o dólar.

De certa forma, o Segundo Governo FHC esteve condicionado ao resultado

da política econômica do período anterior. A crise cambial de 1999 trouxe no seu

bojo a apreensão com relação ao repasse da desvalorização da taxa de câmbio para

os preços. Adicionalmente, o acordo firmado junto ao FMI exigiu do país o

imperativo do ajuste fiscal.

Formou-se então o “tripé” da política econômica, cujas bases são: superávit

primário, metas de inflação e câmbio flutuante. Ao contrário do que se supunha à

época das eleições presidenciais de 2002, não houve qualquer ruptura com os

fundamentos, nem com a estabilidade macroeconômica.

A era Lula teve dois momentos bem distintos, cuja linha divisória imaginária é

a troca do Ministro da Fazenda, quando a ortodoxia característica da gestão de

Palocci deu lugar à filosofia desenvolvimentista de Mantega. Além disso, a

45

progressiva redução da razão endividamento público/PIB, a contar de 2004, e dos

encargos financeiros incidentes sobre o principal da dívida abriram espaço fiscal

para a expansão do investimento governamental, sem comprometer com isso o

ajuste das finanças do Estado (fato que será explorado no capítulo 3).

Deve-se enfatizar também a política de valorização real do salário mínimo,

que se intensificou ao longo do Governo Lula.

Em janeiro de 1995, o salário mínimo nominal era de R$ 70,00, sendo

elevado, durante os dois governos FHC, até o patamar de R$ 200,00, valor vigente

em dezembro de 2002 (variação acumulada de 185,71%). Porém, neste intervalo, o

Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) variou +100,67%, de modo reduzir o

ganho real a 42,38%.

Por outro lado, entre janeiro de 2003 e dezembro de 2010, a valorização real

foi de 62,75%, pois, enquanto o crescimento do salário mínimo nominal foi de 155%

(de R$ 200,00 para R$ 510,00), a inflação medida pelo IPCA acumulou 56,68%.

Apesar do impacto positivo em termos sociais (redução da pobreza, melhoria da

distribuição de renda, etc.), houve reflexo desfavorável sobre as contas do sistema

previdenciário público.

Há indícios de que, no transcorrer dos dezesseis anos aqui estudados, à

medida que o Estado recuperava a capacidade de promover o investimento, seja por

vias diretas, seja pelos financiamentos do BNDES, a política fiscal deixava de ser

meramente passiva para se transformar num instrumento complementar de estímulo

à atividade produtiva, imbuído da tarefa de suprir a deficiência de demanda efetiva,

tal como aconteceu em 2009.

Aprofundemos a investigação acerca da política fiscal relativa ao intervalo

1995-2010, objetivo do capítulo seguinte.

46

CAPÍTULO 3 - A TRAJETÓRIA DAS RECEITAS E DESPESAS

GOVERNAMENTAIS NO PERÍODO 1995-2010

Seção 3.1 - Receita bruta, receita líquida, despesa primária e resultado

fiscal

A presente seção trata do desempenho das receitas e despesas primárias do

Governo Central (Governo Federal e Banco Central), no intervalo de 1995 a 2010.

Optou-se por analisar primeiro cada variável separadamente, para depois examinar

sua interação, que acontece sob a forma das necessidades de financiamento do

setor público.

O gráfico 3.1 retrata a evolução das receitas primárias realizadas do Governo

Central, como proporção do PIB. A princípio, a receita total declinou de 18,92% do

PIB para 16,14%, entre 1994 e 1996. Contudo, do ano seguinte em diante, a

arrecadação não apenas se recuperou, mas se expandiu até atingir 25,20% do PIB,

em 2010. Por sua vez, a receita líquida – que é a receita total menos as

transferências a estados e municípios - correspondia a: 16,37% do PIB, em 1994;

17,86%, em 2002; culminando em 21,35% no ano de 2010.

Observa-se então que o aumento da relação receita total/PIB, de 1995 a

2010, foi de 33,19%. Ademais, da expansão vislumbrada, 14,48% se devem ao

período 1995-2002, ante os 16,34% transcorridos de 2003 a 2010. De maneira

semelhante, o indicador receita líquida/PIB se elevou 30,42% ao longo da série,

tendo 9,10% acontecido nos governos FHC e, 9,54%, nos dois mandatos do

presidente Lula.

Outro aspecto que merece destaque, embora seja pontual, é a reversão do

movimento ascendente das linhas verificada entre os anos de 2002 e 2003 e 2008 e

2009, quando a receita total (em termos do PIB) caiu de 21,66% para 20,98% e de

23,64% para 23,21%. Igualmente, a receita líquida passou de 17,86% para 17,44%

e de 19,25% para 19,20%, nos referidos anos.

Conforme mencionado, os anos de 2003 e 2009 se caracterizam pela

desaceleração da atividade econômica, cuja tendência é refletir sobre a arrecadação

47

governamental de forma mais intensa, uma vez que a elasticidade tributos/PIB tende

a ser superior a um. Além do mais, em 2009 houve redução de alíquotas de

impostos para vários produtos, como tentativa de atenuar o impacto da crise

internacional sobre a economia brasileira.

1

8,92

%

16,

77%

16,

14%

16,

93% 1

8,74

%

19,6

6%

19,9

3%

20,

77%

21,6

6%

20,9

8%

21,6

1% 22,7

4%

22,

94%

23,2

5%

23,6

4%

23,

21% 2

5,20

%

16,3

7%

14,

17%

13,6

1%

14,2

7% 15,

83%

16,3

8%

16,5

1%

17,

23%

17,

86%

17,4

4%

18,

13%

18,8

4%

19,0

2%

19,2

9%

19,

25%

19,2

0%

21,3

5%

12,00%

14,00%

16,00%

18,00%

20,00%

22,00%

24,00%

26,00%

1994

1995

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

2007

2008

2009

2010

(%) d

o P

IB

Receita total

Receita líquida

Fonte: dados anteriores a 1997, Giambiagi (2007). A partir de 1997, Ministério da Fazenda / Tesouro NacionalElaboração: própria

Gráfico 3.1 – Receitas primárias do Governo Central

Continuando, a tabela 3.1 detalha as componentes da arrecadação primária

do Governo Central, que são as receitas: do Tesouro, da Previdência Social e do

Banco Central.

As receitas do Tesouro, decorrentes principalmente de impostos e

contribuições, juntamente às do Banco Central, são responsáveis por cerca de três

quartos do total arrecadado. Num comparativo entre o primeiro e último dados da

série, nota-se que o crescimento da componente (relativamente ao PIB) foi de

aproximadamente 39%.

Os 25% restantes dizem respeito às receitas da Previdência Social, as quais

correspondiam, em termos do PIB, a 5,01% no ano de 1994, saltando para 5,81%

em 2010, ou seja, obtiveram um aumento de 16%, apresentando, portanto, um

dinamismo menor.

48

Além disso, a tabela 3.1 traz informações atinentes à rubrica Transferências a

Estados e Municípios, as quais são regulamentadas pela Constituição Federal ou

por legislação específica. No período sob exame, a participação do item II oscilou de

2,53% a 4,39% do PIB, percentuais estes concernentes a 1996 e 2008,

respectivamente.

Tabela 3.1 – Receita total, transferências e receita líquida – em (%) do PIB

Ano 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002

1. Receita total 18,92% 16,77% 16,14% 16,93% 18,74% 19,66% 19,93% 20,77% 21,66%

1.1 Receitas do Tesouro / Banco Central

13,91% 12,15% 11,33% 12,22% 14,01% 15,05% 15,21% 15,97% 16,85%

1.2 Receitas da Previdência Social

5,01% 4,62% 4,81% 4,71% 4,73% 4,61% 4,72% 4,80% 4,81%

2. Transferências a estados e municípios

2,55% 2,60% 2,53% 2,66% 2,91% 3,28% 3,42% 3,53% 3,80%

3. Receita líquida total (1-2) 16,37% 14,17% 13,61% 14,27% 15,83% 16,38% 16,51% 17,23% 17,86%

Ano 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010

1. Receita total 20,98% 21,61% 22,74% 22,94% 23,25% 23,64% 23,21% 25,20%

1.1 Receitas do Tesouro / Banco Central

16,23% 16,78% 17,69% 17,73% 17,98% 18,25% 17,50% 19,39%

1.2 Receitas da Previdência Social

4,75% 4,83% 5,05% 5,21% 5,28% 5,39% 5,71% 5,81%

2. Transferências a estados e municípios

3,54% 3,48% 3,91% 3,92% 3,97% 4,39% 4,01% 3,85%

3. Receita líquida total (1-2) 17,44% 18,13% 18,84% 19,02% 19,29% 19,25% 19,20% 21,35%

Fonte: dados anteriores a 1997, Giambiagi (2007). A partir de 1997, Ministério da Fazenda / Tesouro Nacional.

Tendo em vista os objetivos deste estudo, não será necessário investigar

pormenorizadamente o comportamento das receitas auferidas pelo Governo Central.

Entretanto, a etapa cumprida foi essencial para dar contornos à análise que se

pretende desenvolver a partir de agora, cujo foco recairá sobre as despesas

governamentais.

Inicialmente é cogente definir o que são despesas primárias ou não

financeiras, bem como saber o porquê da utilização deste conceito em finanças

públicas.

Com base em Albuquerque, Medeiros e Silva (2008), a fórmula para se obter

apenas as despesas não financeiras consiste em subtrair da despesa total o

dispêndio com: amortização, juros e outros encargos da dívida interna e externa;

49

aquisição de títulos de capital já integralizado; concessão de empréstimo com

retorno garantido; e transferências entre entidades que compõem o ente federativo,

de modo a evitar a duplicidade na contagem.

O uso da terminologia “primário” se justifica em razão da metodologia de

apuração do resultado primário do governo, cujo objetivo é:

[...] avaliar a sustentabilidade da política fiscal, ou seja, a capacidade dos governos em gerar receitas em volume suficiente para pagar suas contas usuais (despesas correntes e investimentos), sem que seja comprometida sua capacidade de administrar a dívida existente. (ALBUQUERQUE; MEDEIROS; SILVA, 2008, p. 72).

Eis que, pelo critério exposto, são gastos primários os relativos a: pessoal e

encargos sociais, benefícios previdenciários e custeio e capital. Também fazem

parte do agrupamento as transferências do Tesouro Nacional ao Banco Central,

assim como as despesas efetuadas por esta entidade.

Para efeito de cálculo do resultado primário realizado “acima da linha”, pelo

Tesouro Nacional, as despesas não financeiras são apuradas segundo a ótica de

caixa, isto é, condizem com o total de cheques emitidos (ordens bancárias – OB). 4

É pertinente salientar que o total das despesas primárias na esfera federal

saltou de 13,95% do PIB, dado de 1994, para 15,72%, em 2002, e 19,19%, em

2010, tendo sofrido somente quedas esporádicas entre: 1994 e 1996; 1998 e 1999;

2002 e 2003; e 2007 e 2008 (gráfico 3.2). Logo, da ampliação verificada, cerca de

22% foram nos anos posteriores a 2002, contra 13% no intervalo 1995-2002,

totalizando 37,86% nos dezesseis anos.

Há ainda três movimentos ilustrados: a estabilização das despesas com

pessoal e encargos sociais ao redor dos 4,5% do produto interno bruto; a elevação

das despesas com benefícios previdenciários, do patamar de 5% para

aproximadamente 7% do PIB; e o aumento das despesas com custeio e capital, que

passaram a ser da ordem de 7,5% do PIB em 2010, ante os 4% respeitantes ao ano

inaugural da série, elevação ocorrida principalmente após 2003.

4 Para maiores detalhes, acessar documento da Secretaria do Tesouro Nacional, pelo endereço eletrônico: <http://www.stn.fazenda.gov.br/hp/downloads/resultado/mnf_gv_central.pdf>.

50

5,1%

5,1%

4,8%

4,3% 4,6%

4,5%

4,6% 4,8%

4,8%

4,5%

4,3%

4,3% 4,5%

4,4%

4,3% 4,

8%

4,6%

6,6% 7,

1%

7,0%

4,0%

3,8%

3,7%

4,7% 5,0%

4,4%

4,5% 4,

9%

4,9%

4,3% 4,

7% 5,2% 5,4% 5,7%

5,4% 6,

0%

7,5%

4,9%

4,6% 4,9%

5,0%

5,5%

5,5%

5,6% 5,8% 6,0% 6,3% 6,

5% 6,8%

7,0% 7,

0%

16,4

2%

17,9

6% 19,1

9%

13,9

5%

13,5

7%

13,4

2%

14,0

1% 15,0

4%

14,4

9%

14,7

3% 15,5

7%

15,7

2%

15,1

4%

15,5

9% 16,3

8%

16,9

6%

17,1

2%

0%

2%

4%

6%

8%

10%

12%

14%

16%

18%

20%

1994

1995

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

2007

2008

2009

2010

(%)

do P

IB

Despesa - pessoal eencargos sociais

Despesa - benefíciosprevidenciários

Despesa - custeio ecapital

Despesa primária total

Fonte: dados anteriores a 1997, Giambiagi (2007). A partir de 1997, Ministério da Fazenda / Tesouro Nacional.Elaboração: própria

Gráfico 3.2 – Despesas primárias do Governo Central

Constatado o crescimento da relação gastos primários/PIB, vejamos então

como variou o dispêndio em termos absolutos. A tabela 3.2 mostra os valores de

cada integrante da despesa primária do Governo Central.

51

Tabela 3.2 – Despesas primárias do Governo Central – em milhões de R$ de 2010

Ano 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002

Despesa total 319.700,63 324.727,93 328.044,53 353.953,93 380.101,73 367.213,16 389.482,31 416.851,40 432.237,52

1. Pessoal e Encargos Sociais (1)

117.796,50 122.760,08 118.311,14 107.983,12 115.294,88 113.397,88 120.703,26 128.532,17 132.256,38

2. Benefícios Previdenciários

111.150,40 110.555,86 119.533,36 126.598,21 137.780,81 139.301,56 147.438,85 154.927,69 163.762,19

3. Custeio e Capital

90.753,73 91.411,99 90.200,02 119.372,60 127.026,04 112.416,90 119.235,67 131.145,00 133.978,10

3.1. Despesa do FAT

- - - 13.334,60 13.612,14 13.229,02 12.306,37 13.605,95 14.980,49

3.2. Subsídios e Subvenções Econômicas (2)

- - - 7.217,70 7.618,94 6.153,28 8.191,29 9.495,16 4.359,23

3.3. Benefícios Assistenciais (LOAS e RMV) (3)

- - - - - - - - -

3.4.Capitalização da Petrobras

- - - - - - - - -

3.5. Outras Despesas de Custeio e Capital

- - - 98.820,30 105.794,96 93.034,60 98.738,01 108.043,89 114.638,38

4. Transferência do Tesouro ao Banco Central

- - - - - - - - -

5. Despesas do Banco Central

- - - - - 2.096,81 2.104,53 2.246,54 2.240,86

Continuação na próxima página

52

Continuação tabela 3.2

Ano 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 Despesa total 420.980,41 458.350,35 496.799,06 534.822,77 572.587,86 577.597,42 619.266,23 700.158,34

1. Pessoal e Encargos Sociais (1)

124.064,46 126.665,61 130.257,85 140.360,97 146.247,96 151.770,38 164.131,50 166.486,43

2. Benefícios Previdenciários

175.253,97 190.402,26 206.210,59 220.307,99 232.863,54 231.505,09 243.380,22 254.858,55

3. Custeio e Capital

118.860,20 137.959,80 157.139,99 170.913,24 190.353,87 190.292,04 207.369,79 274.544,01

3.1. Despesa do FAT

14.309,56 15.065,42 17.008,96 20.545,85 23.434,53 24.392,04 29.690,35 30.310,65

3.2. Subsídios e Subvenções Econômicas (2)

9.889,07 8.445,15 14.593,92 12.747,58 12.593,63 6.937,01 5.616,89 7.875,17

3.3. Benefícios Assistenciais (LOAS e RMV) (3)

7.276,14 11.358,94 13.068,14 15.485,26 17.835,48 18.603,04 20.504,96 22.234,21

3.4.Capitalização da Petrobras

- - - - - - - 42.927,855

3.5. Outras Despesas de Custeio e Capital

87.385,43 103.090,29 112.468,97 122.134,55 136.490,24 140.359,95 151.557,58 171.196,12

4. Transferência do Tesouro ao Banco Central

858,75 941,87 780,85 925,18 654,53 1.209,39 1.276,60 1.241,95

5. Despesas do Banco Central

1.943,03 2.380,82 2.409,79 2.315,38 2.467,96 2.820,52 3.108,12 3.027,40

Fonte: os dados até 1996 foram calculados tendo como referência Giambiagi (2007). A partir de 1997, Ministério da Fazenda / Tesouro Nacional. (1) Exclui da receita da Contribuição para o Plano da Seguridade Social (CPSS) e da despesa de pessoal a parcela patronal da CPSS do servidor público federal, sem efeitos no resultado primário consolidado. (2) Inclui despesas com subvenções aos fundos regionais e, a partir de 2005, despesas com reordenamento de passivos. (3) Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS) e Renda Mensal Vitalícia (RMV) são benefícios assistenciais pagos pelo Governo Central. Nota: Valores atualizados com base no deflator implícito do PIB.

5 Não confundir com a capitalização ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), efetuada entre 2009 e 2010, por meio da emissão de títulos públicos. Para maiores informações, ver reportagem da Agência Brasil. Disponível em: <http://agenciabrasil.ebc.com.br/noticia/2011-04-25/emissao-para-bndes-serviu-para-concluir-capitalizacao-da-petrobras>.

53

Percebe-se, prontamente, por meio de um simples cálculo de variação

percentual, que as despesas primárias foram majoradas em 119% durante a série.

Mais uma vez, será empregado o artifício do corte em 2002 – último ano do Governo

FHC - de modo a isolar a contribuição advinda dos sub-períodos 1995-2002 e 2003-

2010.

Assim como ocorrera com os gastos primários relativamente ao PIB, os dados

revelam que a expansão do dispêndio governamental foi mais acelerada de 2003 a

2010, quando variou 61,98%. Por seu turno, a elevação realizada de 1995 a 2002 foi

mais modesta (35,20%).

Sobre as despesas com pessoal e encargos sociais, foram incrementadas a

uma taxa inferior à média, passando de R$ 117.796,50 milhões, em 1994, para R$

132.256,38 milhões, no exercício de 2002, alcançando em 2010 os R$ 166.486,43

milhões. Ou seja, estão implícitas as seguintes variações: (+12,28%) no primeiro

sub-período; (+25,88%) no segundo; e (+41,33%) no intervalo maior.

De forma diversa, os benefícios do Regime Geral de Previdência Social

auferiram um aumento expressivo na época retratada na tabela 3.2, sendo da ordem

de 129,29%. Caso se queira ainda isolar o efeito dos sub-períodos 1995-2002 e

2003-2010, observa-se que tais benefícios sofreram expansão de 47,33% e 55,63%,

respectivamente. Entre os fatores que colaboraram para tais resultados, ressaltem-

se a elevação da expectativa média de vida da população e a política de valorização

real do salário mínimo registrada no Governo Lula.

No que concerne às despesas de custeio e capital, estas podem ser

desmembradas nos seguintes subitens: despesas do Fundo de Amparo ao

Trabalhador (FAT), subsídios e subvenções econômicas, benefícios assistenciais

originários da Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS) e da Renda Mensal

Vitalícia (RMV), capitalização da Petrobrás e outras despesas de custeio e capital.

A rubrica correspondente ao item três da tabela 3.2 experimentou variação

acumulada de +202,52%, nos anos 1995-2010. Do crescimento observado, 47,63%

transcorreram entre 1995 e 2002, enquanto 104,92% se devem ao sub-período

2003-2010.

Focalizando as “outras” despesas de custeio e capital, que representavam,

em 2010, 62,36% do custeio e capital totais, é importante evidenciar os altos e

54

baixos que marcaram a sua trajetória. O primeiro registro da série foi de R$

98.820,30 milhões, referente ao exercício de 1997. Consecutivamente, o dispêndio

cresceu para R$ 105.794,96 milhões, em 1998, depois se situou abaixo dos R$

100.000,00 milhões, no intervalo 1999-2000, quando foi indispensável implementar

um ajuste fiscal. Nos anos de 2001 e 2002, se recuperou para algo em torno de R$

110.000,00 milhões, voltando a cair no ano seguinte, quando atingiu R$ 87.385,43

milhões (em virtude das circunstâncias que marcaram o primeiro ano do Governo

Lula, conforme explanação feita na seção 2.3 deste trabalho). Em 2004, teve início a

retomada, que culminou no montante de R$ 171.196,12 milhões, dado de 2010.

Vale ressaltar que no referido grupo são contabilizadas as despesas: com

sentenças judiciais; do legislativo e judiciário; decorrentes de créditos

extraordinários; do PAC; outras de caráter obrigatório; e discricionárias. Sobre esta

modalidade de gastos (não obrigatórios), chegará o momento oportuno para

discorrer a respeito de suas particularidades.

Embora não pertença aos objetivos desta dissertação detalhar a execução

das despesas relacionadas à política social, ao que parece, a unificação de diversas

iniciativas no Programa Bolsa Família e a ampliação de sua cobertura ajudam a

explicar a expansão mais acelerada das despesas do grupo custeio e capital na

gestão do presidente Lula, ante o Governo FHC. Igualmente, a retomada do

investimento público pode ser outro fator causador da diferença de percentuais, mas

deixemos a análise acerca dos pormenores desta variável para as seções 3.2 e 3.3.

Cabe ainda mencionar que tanto as despesas do Banco Central quanto as

transferências do Tesouro ao Banco Central elevaram de patamar ao longo do

tempo, embora este fato não implique grandes transformações nos rumos da política

fiscal brasileira.

Portanto, deduz-se que o gasto primário na esfera do Governo Central tem

sido incrementado a um ritmo superior ao do crescimento da economia, haja vista o

aumento da proporção gasto/PIB, que saltou de 13,95%, em 1994, para 19,19%, em

2010. O fenômeno citado é ratificado pelo conteúdo da tabela 3.3, que ilustra a

superioridade das taxas médias anuais de variação das despesas com benefícios

previdenciários e de custeio e capital, comparativamente ao PIB real.

55

Tabela 3.3 – Despesa primária e PIB: taxas médias anuais de crescimento

Período 1995-2002 2003-2010 1995-2010

Despesa total 3,84% 6,21% 5,02% 1. Pessoal e Encargos Sociais 1,46% 2,92% 2,19% 2. Benefícios Previdenciários 4,96% 5,68% 5,32% 3. Custeio e Capital 4,99% 9,38% 7,16%

PIB real 2,30% 4,03% 3,16%

Fonte: baseada nos dados apresentados na tabela 3.2, no tocante às despesas primárias, e Ipeadata, de onde

se obteve a série histórica referente ao PIB real.

Colocados separadamente os dados pertinentes às receitas e despesas do

Governo Central, ambas sob a égide do conceito não financeiro ou primário, o curso

natural da análise conduz-nos à necessidade de relacionar os dois eixos

constituintes da política fiscal. Para tanto, serão empregados dois indicadores

consagrados na área de finanças públicas, à luz das respectivas definições

adotadas pelo Banco Central do Brasil, quais sejam: resultado primário e resultado

nominal.6

O primeiro corresponde ao resultado nominal das necessidades de

financiamento do setor público (NFSP) subtraídos os juros nominais incidentes sobre

a dívida líquida interna e externa, que são determinados pela taxa de juros nominal e

pela dimensão dos déficits anteriores (dívida atual). Com isso, a metodologia de

cálculo do resultado primário possibilita avaliar a consistência entre as metas de

política macroeconômica e a sustentabilidade da dívida, bem como a capacidade do

governo de honrar seus compromissos.

Quanto ao resultado nominal, é constituído da variação do endividamento

líquido, descontados os ajustes patrimoniais e os efeitos do movimento da taxa de

câmbio sobre os estoques da dívida interna indexada ao câmbio, da dívida externa e

das reservas internacionais.

Introduzidas algumas definições básicas, vejamos, por meio do gráfico 3.3, o

comportamento das necessidades de financiamento do Governo Central, no período

de 1994 a 2010. O posicionamento das curvas demonstra que a magnitude do

resultado nominal deriva da soma dos juros nominais ao resultado primário (no caso

ilustrado, valores abaixo do eixo x significam superávits). Destarte, os sinais

6 Ver séries temporais - metadados. Disponível em: <https://www3.bcb.gov.br/sgspub/localizarseries/localizarSeries.do?method=prepararTelaLocalizarSeries>.

56

positivos das NFSP (nominais) sinalizam a insuficiência dos superávits primários

para cobrir o pagamento dos encargos financeiros incidentes sobre a dívida pública.

3,30

%

2,24

%

0,82

%

-2,0

9%

-2,3

5%

-2,1

7%

-2,6

0%

-2,7

0%

-2,2

8%

-2,1

6%

-1,7

3%

-2,1

3%

-0,5

1%

0,25

%

-3,2

5% -0,4

7%

-2,2

3% -1,3

1%

-1,6

9%

-0,3

4%

3,85

%

11,1

1%

2,54

%

2,02

%5,

12%

4,60

%

3,63

%

2,84

%

5,94

%

4,09

%

6,01

%

5,31

%

4,47

%

2,62

%

3,17

%

4,62

%

4,61

%

2,47

%

2,12

% 3,14

%

3,41

%

1,39

%

3,66

%

0,68

%

1,94

%

2,27

%

2,06

%

7,86

%

2,27

%

3,31

%

1,21

%

1994

2002

2010

(%) d

o P

IB

Resultado primário

Juros nominais

Resultado nominal

Fonte: Banco Central do Brasil. Obs: sem desvalorização cambialElaboração: própria

Gráfico 3.3 – NFSP Governo Federal e Banco Central

Analisando a tabela 3.4, patenteia-se que a maior parte do esforço fiscal

primário do setor público recai sobre Governo Central. No entanto, os estados e

municípios passaram da condição de deficitários, entre 1995 e 1998, para uma

situação superavitária, a partir de 1999, em virtude do regramento trazido pela Lei de

Responsabilidade Fiscal, o qual submeteu a União e os entes subnacionais a um

controle mais rígido de suas finanças.

Como consequência do ajuste fiscal, as necessidades de financiamento do

setor público consolidado foram reduzidas no transcorrer dos anos 2000, ainda que

tenham aumentado expressivamente entre 2001 e 2003 (gráfico 3.4). Em 2010, as

NFSP equivaliam a 2,48% do PIB, percentual inferior à metade do atingido em 2003.

57

Tabela 3.4 – NFSP resultado primário – em (%) do PIB

Ano 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 1. Governo Federal e BACEN -3,25 -0,47 -0,34 0,25 -0,51 -2,13 -1,73 -1,69 -2,16

2. Estados e municípios -0,77 0,16 0,5 0,69 0,18 -0,2 -0,51 -0,8 -0,72

3. Empresas estatais - - - - - - - -0,72 -0,34

4. Setor público - - - - - - - -3,21 -3,22

Ano 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 1. Governo Federal e BACEN -2,28 -2,7 -2,6 -2,17 -2,23 -2,35 -1,31 -2,09

2. Estados e municípios -0,81 -0,9 -0,99 -0,83 -1,12 -1,01 -0,65 -0,55

3. Empresas estatais -0,18 -0,12 -0,2 -0,2 0,05 -0,06 -0,04 -0,06

4. Setor público -3,27 -3,72 -3,79 -3,2 -3,31 -3,42 -2 -2,7

Fonte: Banco Central do Brasil. Obs. sem desvalorização cambial.

3,45

2,48

2,9

5,24

4,45

3,58

3,63

2,8

2,04

3,28

2

2,5

3

3,5

4

4,5

5

5,5

2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010

(%)

do P

IB

Fonte: Banco Central do Brasil. Obs. Sem desvalorização cambial e excluídas Petrobrás e EletrobrásElaboração: própria

Gráfico 3.4 – Necessidades de financiamento do setor público consolidado

Ao elucidar os traços marcantes da política fiscal empreendida de 1991 a

2007, Giambiagi (2007) destaca quatro momentos das contas públicas: uma fase de

déficits operacionais artificialmente reprimidos pela inflação elevada, até meados da

década de 1990; na segunda metade desta, a convivência com desequilíbrios fiscais

agudos; depois, o ajuste promovido ao final dos anos 1990, mas ainda com uma

elevação da dívida pública até 2003, quando atingiu o patamar de 52% do PIB; e

finalmente a redução da relação dívida/PIB a partir de 2004.

No tocante à dívida líquida do setor público (DLSP), o aludido autor chama

atenção para alguns aspectos relevantes:

58

a) o crescimento da parcela referente à dívida externa, de 1997 a 2002, e a

subsequente queda de sua importância relativa, a ponto de o país se tornar

credor líquido do exterior no Governo Lula;

b) a escalada da dívida mobiliária federal, ao longo dos oito anos do Governo

FHC e do primeiro mandato de Lula – neste como contrapartida da

acumulação de reservas internacionais;

c) mudanças que impactaram a dívida renegociada junto a estados e municípios

(um crédito da União), a qual cresceu até 2003, devido à influência do IGP, e

decresceu a partir de então; e

d) a interferência dos “ajustamentos patrimoniais”, que são fenômenos

independentes do fluxo das NFSP, associados a variações cambiais sobre a

dívida pública e ao reconhecimento de passivos contingentes, também

conhecidos pela denominação “esqueletos”.

Ainda de acordo com Giambiagi (2007), o fator ressaltado na alínea (d) foi

decisivo para explicar a elevação da dívida pública entre 1998 e 2002, não obstante

o ajuste fiscal implementado concomitantemente. Todavia, nos anos posteriores, os

“ajustamentos patrimoniais” favoreceriam a diminuição da dívida líquida do setor

público, mesmo com a permanência do estoque da dívida fiscal ao redor do patamar

de 2002.

Em suma, no que se refere aos dados analisados nesta seção, constatou-se

que apesar da ampliação das receitas governamentais, não foi possível gerar

excedentes primários que fossem ao menos equivalentes ao montante destinado ao

pagamento dos juros da dívida pública, ainda que a trajetória da DLSP - como

proporção do PIB - tenha sido controlada após 2003.

Para Ferrari Filho e Terra (2010), a maneira como se administra a política de

déficit público brasileira não permite que se constituam fontes de financiamento no

longo prazo, em razão de os fluxos de pagamento financeiro serem patrocinados

pela geração de superávits primários e, portanto, obstarem os dispêndios

governamentais estimuladores da demanda agregada e do crescimento da riqueza

social. Desta forma, a política econômica pós-Plano Real, com seu objetivo precípuo

59

de controlar a inflação, caracterizou-se pela subsunção da política fiscal à monetária,

visto que:

[...] a política monetária operacionalizou taxas de juros bastante elevadas que, por um lado, foram incoerentes com o crescimento econômico sustentado e, por outro lado, oneraram as finanças públicas em um nível incompatível com os superávits de gastos primários (correntes) auferidos, redundando no crescimento vertiginoso da DLSP. (FERRARI FILHO; TERRA, 2010, p. 15).

Belluzzo e Coutinho (1996), ao discorrerem sobre anos iniciais do Plano Real,

ressaltaram a perda de autonomia das políticas nacionais em relação aos mercados

financeiros, que são sujeitos à instabilidade das expectativas. Assim sendo, países

cujo passado monetário foi turbulento precisaram arcar com elevados prêmios de

risco para financiar déficits em conta corrente, de maneira a restringir a política fiscal

pelo crescimento da parcela dos encargos financeiros no orçamento público.

Com o ajuste fiscal posterior a 1999 o objetivo era sinalizar para o mercado o

comprometimento com a sustentabilidade das contas públicas a longo prazo. Porém,

a primazia da lógica financeira da dívida pública não permitiu ao Estado recuperar a

capacidade de investir, ainda que, recentemente, seja patente o esforço do Governo

Federal no sentido de fomentar grandes projetos de investimento, a exemplo do

PAC.

Diante da constatação, deve-se aprofundar os exames no tocante às

despesas, no intuito de radiografar o papel de cada categoria econômica na

expansão do gasto público transcorrida de 1995-2010. Este é o assunto da próxima

seção.

Seção 3.2 - A despesa pública segundo sua categoria econômica

Esta seção aborda o dispêndio governamental pela ótica da sua categoria

econômica, visando avaliar a evolução das despesas correntes e das despesas de

capital realizadas pela União.7

7 Vale lembrar que a divisão por categoria econômica está prevista no artigo 12 da Lei nº. 4.320, de 17 de março de 1964.

60

Com fundamento na Portaria Interministerial STN/SOF nº. 163, de 4 de Maio

de 2001, são consideradas despesas correntes as que não contribuem diretamente

para formação ou aquisição de um bem de capital, diferentemente das despesas de

capital, cuja contribuição é direta.

Ambas as categorias apresentam, à luz da referida Portaria, subdivisões

cognominadas grupos de natureza da despesa, detalhados na tabela 3.5:

Tabela 3.5 – Relação entre categoria econômica e grupo de natureza da despesa

Categoria econômica Grupo de natureza

da despesa Descrição

3- Despesas

correntes

1 - Pessoal e

Encargos Sociais

Despesas orçamentárias com pessoal ativo, inativo e

pensionistas, relativas a mandatos eletivos, cargos,

funções ou empregos, civis, militares e de membros de

Poder, com quaisquer espécies remuneratórias, tais

como vencimentos e vantagens, fixas e variáveis,

subsídios, proventos da aposentadoria, reformas e

pensões, inclusive adicionais, gratificações, horas extras

e vantagens pessoais de qualquer natureza, bem como

encargos sociais e contribuições recolhidas pelo ente às

entidades de previdência, conforme estabelece o caput

do art. 18 da Lei Complementar 101, de 2000.

2 - Juros e Encargos

da Dívida

Despesas orçamentárias com o pagamento de juros,

comissões e outros encargos de operações de crédito

internas e externas contratadas, bem como da dívida

pública mobiliária.

3 - Outras Despesas

Correntes

Despesas orçamentárias com aquisição de material de

consumo, pagamento de diárias, contribuições,

subvenções, auxílio-alimentação, auxílio-transporte,

além de outras despesas da categoria econômica

"Despesas Correntes" não classificáveis nos demais

grupos de natureza de despesa.

4- Despesas de

capital

4 – Investimentos

Despesas orçamentárias com softwares e com o

planejamento e a execução de obras, inclusive com a

aquisição de imóveis considerados necessários à

realização destas últimas, e com a aquisição de

instalações, equipamentos e material permanente.

5 – Inversões

Financeiras

Despesas orçamentárias com a aquisição de imóveis ou

bens de capital já em utilização; aquisição de títulos

representativos do capital de empresas ou entidades de

qualquer espécie, já constituídas, quando a operação

não importe aumento do capital; e com a constituição ou

aumento do capital de empresas, além de outras

despesas classificáveis neste grupo.

61

6 - Amortização da

Dívida

Despesas orçamentárias com o pagamento e/ou

refinanciamento do principal e da atualização monetária

ou cambial da dívida pública interna e externa,

contratual ou mobiliária.

Fonte: Portaria Interministerial STN/SOF nº. 163/2001.

Em conformidade com o artigo 3º da Portaria Interministerial STN/SOF nº.

163/2001, a classificação por natureza da despesa incorpora, adicionalmente, o

elemento de despesa, cuja finalidade é identificar o objeto de gasto, bem como a

informação gerencial intitulada modalidade de aplicação, a qual indica se os

recursos são aplicados por órgãos ou entidades no âmbito de uma mesma esfera de

governo ou por outro ente da Federação e respectivas entidades.

Logo, com fulcro no artigo 5º da Portaria supramencionada, a estrutura da

natureza da despesa engloba: categoria econômica, grupo de natureza, modalidade

de aplicação, elemento de despesa e o desdobramento facultativo deste. Entretanto,

os exames pretendidos limitar-se-ão aos dois primeiros itens, porquanto os objetivos

delineados dispensem a investigação no nível atômico do elemento de despesa.

Contudo, cumpre previamente explicitar, ao lume da Lei nº. 4.320, de 17 de

março de 1964, o significado das expressões empenho, liquidação e pagamento, as

quais dizem respeito aos estágios da despesa orçamentária.

Segundo o artigo 58 do aludido diploma legal, entende-se por empenho da

despesa: “[...] o ato emanado de autoridade competente que cria para o Estado

obrigação de pagamento pendente ou não de implemento de condição.” Por sua

vez, o caput do artigo 63 versa que a despesa liquidada consiste: “[...] na verificação

do direito adquirido pelo credor tendo por base os títulos e documentos

comprobatórios do respectivo crédito.” E, quanto ao pagamento8, observa-se o

disposto no artigo 62: “[...] só será efetuado quando ordenado após sua regular

liquidação.”

Ou seja, a Lei nº. 4.320/1964 construiu o ordenamento das três fases

descritas, pois veda a realização de despesa sem prévio empenho, conforme o seu

artigo 60, e condiciona o pagamento à liquidação da despesa. No entanto, podem

8 Segundo definição do Tesouro Nacional, o pagamento se consuma com a emissão de cheque ou ordem bancária em favor do credor.

62

acontecer situações em que não seja possível completar, dentro de um mesmo

exercício financeiro9, o percurso da despesa.

Em observância ao artigo 35 da Lei nº. 4.320/1964, pertencem ao exercício

financeiro tanto as receitas arrecadadas quanto as despesas legalmente

empenhadas. Diante da impossibilidade de efetuar, em certos casos, até o dia 31 de

dezembro, o pagamento da despesa empenhada, o artigo 67 do Decreto nº. 93.872,

de 23 de dezembro de 1986, prevê a inscrição de restos a pagar, devendo-se

distinguir as despesas processadas ou liquidadas das não processadas.

As séries referentes ao dispêndio por categoria econômica – que serão

apresentadas neste trabalho – levam em conta o montante liquidado, mas é preciso

ter cautela ao interpretar os resultados, devido ao procedimento contábil por vezes

chamado “liquidação forçada”, especialmente quando se trata da variável

investimento público.

Houve autores que alertaram para os problemas que poderiam advir de uma

interpretação equivocada acerca dos números disponibilizados:

Muitos pesquisadores tomam o valor das despesas liquidadas sem saber que, na realidade, elas não foram realmente liquidadas na totalidade, mas apenas empenhadas.

[...]

O principal problema para a correta mensuração dos investimentos pelo critério econômico é que os balanços oficiais produzidos pelo governo não permitem diferenciar os valores de empenho e de liquidação efetiva ao final do ano. (GOBETTI, 2006, p.13-14).

Diante da percepção desse fenômeno, surgiram críticas à mensuração do investimento com base na despesa liquidada: uma vez que os documentos oficiais do governo não diferenciavam, no final do ano, os valores liquidados automaticamente pelo SIAFI dos valores liquidados nos termos do artigo 63 da Lei nº 4.320/64, a mensuração dos investimentos pelos valores liquidados tendia a igualar-se ao montante de investimentos empenhados, distorcendo, conforme explicitado, qualquer análise oriunda desse dado. (COSTA, 2008, p.103).

A ambiguidade ensejou, inclusive, o Ministério da Fazenda, por meio de sua

Secretaria de Política Econômica, a emitir nota de esclarecimento10, pela qual

9 Coincide com o ano civil (artigo 34 da Lei nº. 4.320/1964). 10 Disponível em: <http://www.fazenda.gov.br/spe/publicacoes/fiscal/seminarios/Nota%20de%20Esclarecimento%20-%20SPE%20v4%20revis%C3%A3o.pdf>.

63

ressalta que o investimento da União em determinado ano, segundo a contabilidade

do Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal (SIAFI),

equivale aos empenhos emitidos (liquidados e não liquidados) no exercício, menos

os cancelados ao longo deste.

Feitas as considerações conceituais indispensáveis para um melhor

entendimento acerca do proposto, analisemos os dados. Os gráficos 3.5 a 3.7

mostram as despesas correntes e de capital liquidadas da União11, no intervalo de

1995 a 2010, pertencentes aos orçamentos fiscal e da seguridade social.

A curva que descreve os gastos correntes em valores reais cresce ao longo

do tempo, sem a ocorrência de grandes flutuações. No ano de 1995, as despesas

com pessoal e encargos sociais, juros da dívida e outras correntes somavam R$

450.924,43 milhões, passando para R$ 630.800,85 milhões em 2002 e, finalmente,

R$ 886.698,65 milhões em 2010. Deste modo, o aumento acumulado de 1996 a

2010 foi de 96,64%, dos quais 39,89% se devem ao sub-período 1996-2002 e

40,57% a 2003-2010.

Em termos relativos do PIB, o dispêndio da “categoria econômica 3” partiu de

18,84%, em 1995, alcançou 22,94%, em 2002, e fechou a série, em 2010, sendo

23,52%. Sem embargo, não se deve negligenciar a expansão acelerada do gasto

corrente - comparativamente ao PIB - de 2004 a 2006, bem como o revés

subsequente, nos anos de 2007 e 2008, explicado pelo desempenho das despesas

correntes inferior à variação do PIB. Em 2009 (ano de crise) a proporção tornou a

aumentar, mas logo retrocedeu, no ano seguinte, com a recuperação da economia.

11 A partir de 2007, os valores relativos à despesa executada discriminam os empenhos efetivamente liquidados dos inscritos em restos a pagar não processados. Em face da ambiguidade acerca dos dados coletados dos balanços oficiais, citada por alguns autores, optou-se por considerar como indicador a despesa executada, para os anos a contar de 2007.

64

886.

698,

65

872.

003,

62

837.

149,

38

851.

403,

47

839.

061,

18

732.

324,

92

665.

776,

69

628.

025,

23

630.

800,

85

604.

109,

72

560.

290,

42

543.

345,

99

514.

570,

18

460.

987,

01

444.

444,

60

450.

924,

4319

95

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

2007

2008

2009

2010

Fonte: Ministério da Fazenda / Tesouro Nacional Elaboração: própria. Obs: valores atualizados com base no deflator implícito do PIB .

Gráfico 3.5 – Despesas correntes da União – em milhões de R$ de 2010

18,8

4%

18,1

8%

18,2

4% 20,3

6%

21,4

4%

21,2

0%

22,5

6%

22,9

4%

22,5

8%

22,6

5% 24,1

5% 26,6

2%

25,4

6%

23,8

0%

24,8

7%

23,5

2%

1995

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

2007

2008

2009

2010

Fonte: no que concerne às despesas correntes, Ministério da Fazenda - STN. Quanto à série do PIB nominal, Ipeadata. Elaboração: própria

Gráfico 3.6 – Despesas correntes em (%) do PIB

Os gastos de capital, diferentemente, são mais sujeitos à instabilidade, como

pode ser observado no gráfico 3.7. Iniciaram a série em R$ 72.771,55 milhões,

estiveram acima dos R$ 200.000,00 milhões, entre 1997 e 1999, e caíram para R$

146.615,06 milhões, em 2000. Após uma ligeira recuperação em 2001 e 2002, teve

65

início mais uma reversão de tendência, que durou até 2005. De 2006 em diante as

despesas de capital oscilaram, com destaque para 2009, quando atingiram R$

358.397,31 milhões.

Ao comparar as curvas traçadas no gráfico 3.7, a ampliação da distância

entre as duas sugere que a partir de 2000 as amortizações se tornaram o item mais

expressivo das despesas de capital. Assim sendo, os altos e baixos desta variável

verificados na década de 2000 refletem, sobretudo, as parcelas amortizadas da

dívida, haja vista que a soma dos investimentos e inversões financeiras variou, no

mesmo período, dentro do intervalo de R$ 48 bilhões a R$ 89 bilhões.

Todavia, deve ser buscada uma explicação para os valores consideráveis das

despesas de capital entre os anos 1997-1999. Tomando-se por base 1998, quando

foram despendidos vultosos R$ 205.705,50 milhões a título de despesas de capital

exceto amortizações, apenas R$ 21.385,31 milhões pertencem ao grupo

investimentos. Com isso, é plausível que as inversões financeiras sejam o cerne da

questão, visão reforçada pela transcrição a seguir:

Finalmente, deve-se considerar o item que aqui foi chamado de renegociação de dívidas. Consistem, na verdade, em inversões financeiras, mas de caráter extraordinário. Uma parte significativa foi relativa à renegociação das dívidas dos estados e dos municípios, e outra menor serviu para sanear bancos estaduais que foram posteriormente privatizados. (RODRIGUEZ; ZACKSESKI, 2007, p. 12).

72.7

71,5

5

74.9

03,6

5

227.

847,

59

268.

718,

06

216.

442,

71

146.

615,

06

184.

408,

77

186.

082,

24

179.

030,

98

157.

543,

04

124.

848,

15 222.

443,

22

202.

368,

40 287.

105,

40

358.

397,

31

228.

873,

42

42.1

49,7

2

52.0

46,1

8 192.

151,

41

205.

705,

50

151.

763,

12

48.2

29,2

5

72.0

39,2

5

57.7

88,7

2

48.8

99,4

7

49.1

28,2

6

55.2

90,4

9

61.5

48,9

5

80.3

48,4

6

88.4

92,5

2

85.3

90,9

5

88.2

70,2

9

1995

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

2007

2008

2009

2010

Capital

Capital semamortizações

Fonte: Ministério da Fazenda / Tesouro Nacional Elaboração: própria. Nota: valores atualizados com base no deflator implícito do PIB .

Gráfico 3.7 – Despesas de capital da União – em milhões de R$ de 2010

66

Com relação ao grupo de natureza investimentos, o gráfico 3.8 revela uma

trajetória errática de 1995 a 2003, seguida de um movimento ascendente de 2004

em diante, apesar de suave queda entre os anos de 2007 e 2008. Por outro lado, os

únicos momentos em que as despesas atinentes ao grupo não estiveram aquém da

média associada ao período (R$ 26.719,99 milhões) foram em 2001 e de 2007-

2010, reforçando a tese de que, no tocante ao investimento público, a política fiscal

se tornou mais pró-ativa no Segundo Governo Lula.

16.1

01,8

4

16.5

87,7

1

20.2

81,9

7

21.3

85,3

1

16.5

50,9

2

22.6

33,6

1

29.9

87,6

2

18.8

39,6

6

10.5

54,5

7

16.4

52,4

4

24.4

64,0

7

26.0

71,8

5

42.7

46,0

2

41.9

75,2

3

49.5

80,6

3

53.3

06,3

5

1995

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

2007

2008

2009

2010

Fonte: Ministério da Fazenda / Tesouro Nacional Elaboração: própria. Nota: valores atualizados com base no deflator implícito do PIB .

Gráfico 3.8 – Despesas da União – grupo investimentos – em milhões de R$ de 2010

Destarte, enquanto o gasto corrente da União se expandiu, entre 1995 e

2010, sem enfrentar fortes reveses, o gasto de capital se mostrou mais instável.

Além disso, ao examinar qual o peso das categorias econômicas no gasto total12,

constata-se a dominância das despesas correntes, as quais respondiam, em 2010,

por cerca de 80%, conforme retrata o gráfico 3.9.

12 Não inclui o refinanciamento da dívida pública.

67

4,78%

3,13%

79,48%

12,60%

(%) correntes

(%) investimentos

(%) inversõesfinanceiras

(%) amortizações

Fonte: Ministério da Fazenda / Tesouro Nacional Elaboração: própria.

Gráfico 3.9 – (%) das despesas correntes e de capital, em 2010

Posto isso, é relevante registrar que o levantamento do investimento público

pela ótica do grupo de natureza da despesa (GND 4) não é o único meio existente.

Há também o indicador denominado formação bruta de capital fixo (FBCF), o qual

está alinhado ao método de apuração das contas nacionais.

Em consonância com a definição aceita pelo Instituto Brasileiro de Geografia

e Estatística (IBGE), a FBCF inclui:

“[...] o valor da aquisição de bens de capital novos, da importação de bens de capital usados e as aquisições, líquidas de cessões, de bens de capital já existentes na economia nacional. Quanto às categorias de ativos considerados, destacam-se os bens imóveis (construções residenciais, comerciais, industriais, obras de infra-estrutura, etc.) e móveis (meios de transporte, máquinas, equipamentos e outros bens de capital). A formação bruta de capital fixo inclui, ainda, o valor dos serviços ligados à instalação dos bens de capital, dos bens e serviços incorporados aos terrenos, das melhorias que elevam a vida útil dos ativos existentes, assim como o valor dos gastos inerentes à transmissão de propriedades de terrenos, edifícios e outros bens de capital existentes. Ficam excluídos da formação bruta de capital fixo o valor da aquisição de pequenos equipamentos, como as máquinas-ferramentas, o gasto com manutenções e reparações ordinárias em ativos tangíveis, bens de consumo duráveis adquiridos pelas famílias e despesas com pesquisas e desenvolvimento.” (IBGE, 2008, p.35-36).

Os dados publicados pelo IBGE destacam ainda a contribuição dos setores

institucionais para a FBCF, dentre os quais: empresas financeiras, empresas não-

68

financeiras, administrações públicas (APUs), famílias e instituições sem fins

lucrativos a serviço das famílias. Sobre a administração pública, é composta por:

[...] - Órgãos governamentais da administração direta e indireta (autarquias, fundações e fundos), nos âmbitos federal, estadual e municipal; e

- Entidades públicas juridicamente constituídas como empresas com funções típicas de governo e cujos recursos são provenientes, em sua maior parte (mais de 50% do total das receitas), de transferências;

- Entidades para-estatais que têm como principal fonte de receita a arrecadação de contribuições compulsórias. São elas:

Sistema S - instituições produtoras de serviços sociais (Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial - SENAI, Serviço Social da Indústria - SESI, Serviço Social do Comércio - SESC, etc.);

Conselhos profissionais - instituições de apoio à regulação das atividades profissionais; e

Fundos de caráter público, como os fundos constitucionais, o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço - FGTS e o fundo remanescente do Programa de Integração Social e Programa de Formação do Patrimônio do Servidor Público - PIS/PASEP. (IBGE, 2008, p. 84).

Continuando, a obtenção dos dados é feita pelas seguintes fontes:

[...] dados do governo federal, utilizou-se o Balanço Geral da União e o Sistema Integrado de Administração Financeira - SIAFI, da Secretaria do Tesouro Nacional, do Ministério da Fazenda, e levantamentos especiais de dados contábeis do FGTS, PIS, PASEP, Sistema S (SENAI, SESI, SESC, etc.) e conselhos profissionais.

As informações dos governos estaduais, assim como dos municípios das capitais e das regiões metropolitanas, foram obtidas através de pesquisa própria do IBGE, Estatísticas Econômicas das Administrações Públicas.

Para os (sic!) governo municipais, além da pesquisa Estatísticas Econômicas das Administrações Públicas, são utilizadas as informações do sistema Finanças do Brasil - FINBRA, da Secretaria do Tesouro Nacional, e do Sistema de Informações de Orçamentos Públicos em Saúde - SIOPS, do Ministério da Saúde. (IBGE, 2008, p.84).

No entanto, em razão de peculiaridades inerentes ao processo orçamentário,

existem controvérsias em torno de qual método produziria o indicador mais

apropriado para representar o investimento do setor público.

De acordo com Orair (2011), as informações divulgadas nos demonstrativos

fiscais do setor público, no que tange ao investimento, não estão em harmonia com

69

os princípios das contas nacionais. Dentre as causas da divergência, o autor cita: o

distanciamento da despesa orçamentária empenhada em relação ao momento

econômico de contabilização das despesas nas contas nacionais e a necessidade

de compatibilizar conceitos, pois a tradução da contabilidade pública para a

contabilidade nacional não ocorre de forma imediata.

Para Gobetti (2006), apesar da equivalência dos conceitos FBCF e

“Investimentos” não ser perfeita, não é a principal causadora de distorções, uma vez

que o impacto da “liquidação forçada” é superior ao que decorre da dificuldade de

depurar os dados relativos ao GND 4, para fins de harmonização com os critérios

das contas nacionais. O autor adverte quanto à possibilidade de um investimento ser

liquidado antes da sua efetivação, ocasionando um descompasso entre a oferta e a

demanda, o qual se reflete nas contas nacionais, mas afirma que o IBGE possui

instrumentos para lidar com a situação.

Perante isso, se faz necessário esclarecer que o intuito ao mencionar

obstáculos à mensuração do investimento público é apresentar ao leitor elementos

que compõem o debate atual ao redor do tema, sem ter a pretensão de aprofundar a

discussão a respeito das metodologias adotadas pelos órgãos governamentais. De

fato, o objetivo específico a ser alcançado nesta seção consiste em analisar o

investimento governamental no período de 1995 a 2010, vis à vis as despesas

correntes. Para tanto, deve-se buscar características gerais que evidenciem o

percurso da variável ao longo do tempo e que sejam comuns às duas óticas citadas.

Vejamos então a evolução da FBCF para as administrações públicas. Neste

caso, os dados coletados não permitem distinguir a parte que cabe ao Governo

Federal, aos estados e Distrito Federal e aos municípios.

O gráfico 3.10 ilustra uma queda inicial, em valores absolutos, de 1994 a

1997, sucedida de uma breve recuperação no ano de 1998. Em 1999, quando se fez

necessário um ajuste fiscal, a FBCF retraiu fortemente, mas se recuperou nos três

anos subsequentes. Entretanto, o investimento tornou a cair em 2003, em face da

política fiscal austera implementada neste ano, chegando ao segundo menor valor

da série, embora, desde então, a trajetória da variável tenha retomado o movimento

de ascensão, até alcançar R$ 104.900,00 milhões, em 2010.

70

É interessante notar que o total investido pela administração pública

correspondia, em 2010, a 2,78% do PIB, porcentagem inferior apenas à auferida em

1994 (gráfico 3.11). Com efeito, o crescimento progressivo verificado nos anos mais

recentes pode estar relacionado à preocupação do governo com as questões ligadas

à infraestrutura econômica, como sugere texto técnico produzido pelo Instituto de

Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA).

Essa retomada do investimento pode ser parcialmente atribuída à mudança de orientação do governo, ainda embrionária, no sentido de reassumir seu papel no planejamento estratégico e promover o crescimento econômico por meio da ampliação dos investimentos públicos, com grande destaque para a retomada das obras voltadas à remoção dos gargalos da infraestrutura (ver o PPA 2008-2011). (IPEA, 2011, p. 3-4).

104.

900

82.7

48,2

8

54.1

08,3

3

49.3

96,0

9

43.6

73,3

1

61.0

87,0

2

36.3

45,0

5

47.7

20,8

5

53.3

40,6

4

56.6

81,7

6

41.8

83,7

1

50.5

79,3

1

52.9

47,2

5

64.1

89,0

2

70.1

85,7

7

86.2

99,6

2

90.1

24

1994

1995

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

2007

2008

2009

2010

Fonte: dados anteriores a 2000, Ipeadata. De 2000 a 2009, IBGE-Sistema de Contas Nacionais ref. 2000. Dado de 2010, ver IPEA (2011, p. 14). Elaboração: própria. Nota. Valores atualizados com base no deflator implícito do PIB.

Gráfico 3.10 – FBCF administração pública – em milhões de R$ de 2010

71

2,78

%3,61

%

2,26

%

2,02

%

1,73

% 2,42

%

1,43

%

1,81

%

1,99

%

2,06

%

1,51

%

1,72

%

1,75

%

2,04

%

2,10

%

2,45

%

2,57

%

1994

1995

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

2007

2008

2009

2010

Fonte: dados anteriores a 2000, Ipeadata. De 2000 a 2009, IBGE-Sistema de Contas Nacionais ref. 2000. Dado de 2010 calculado com base em IPEA (2011, p. 14). Elaboração: própria.

Gráfico 3.11 – FBCF administração pública – em (%) do PIB

Deve-se ter em mente que a elevação da taxa de investimento público

coincide com um momento de maior dinamismo da economia brasileira. Outrossim,

contribuiu para a expansão do investimento o espaço proporcionado pela

flexibilização da política fiscal, em decorrência da melhoria dos indicadores de

solvência do setor público.

A este respeito, o IPEA (2011) salienta a importância crescente da execução

direta dos investimentos pelo Governo Federal para o aumento da FBCF, cuja

contrapartida foi a redução da participação dos governos municipais. Isto ocorreu

porque os entes subnacionais estão submetidos a um controle mais rígido do

endividamento e das despesas, além da própria natureza dos investimentos públicos

retomados, nos quais se incluem grandes obras a cargo do Governo Federal e dos

estados.

O lançamento do PAC, em janeiro de 2007, vai ao encontro da tendência

mencionada13. De acordo com balanço do Governo Federal sobre o período 2007-

2010, os investimentos executados pelo programa atingiram, até 31 de outubro de

2010, R$ 559,60 bilhões, o equivalente a 85,1% do valor previsto, e alcançariam, até

31 de dezembro do mesmo ano, R$ 619 bilhões (94,1%). Deste montante, os

investimentos sob a responsabilidade do setor público totalizariam, ao final de 2010,

R$ 267,1 bilhões, estando assim distribuídos:

13 O Governo Federal lançou em 2011 a segunda versão do PAC, que se desenvolverá até 2014.

72

a) R$ 55 bilhões do Orçamento Geral da União (OGU);

b) R$ 202,8 bilhões das estatais; e

c) R$ 9,3 bilhões a título de contrapartida de estados e municípios

(PROGRAMA, 2010).

Outro fator digno de menção é a influência exercida pelos ciclos eleitorais

sobre a FBCF da administração pública. O “modelo estrutural ajustado”,

desenvolvido pelo IPEA (2011), induz a pensar um padrão segundo o qual a

execução do investimento se intensifica nos anos de eleição e desacelera

imediatamente após, quando tem início um ajuste fiscal. Na opinião de Orair (2011),

a FBCF se decompõe em dois componentes cíclicos: um de frequência bienal, no

âmbito dos governos subnacionais, e outro quadrienal, encontrado nas séries do

Governo Federal e dos governos estaduais.

Em face das evidências explicitadas, conjectura-se que os gastos correntes

são menos suscetíveis a cortes orçamentários que os investimentos, visto que é

inviável contingenciar despesas tais como: pessoal, previdência social, juros da

dívida, benefícios de prestação continuada (LOAS e RMV), dentre outras

obrigatórias. Por conseguinte, faz sentido deduzir quanto ao traçado ascendente da

curva que descreve as despesas correntes, conforme visto no gráfico 3.5.

Contudo, cabe uma seção específica para mensurar quanto (em termos

percentuais) do orçamento da União não está destinado, por determinação da

Constituição Federal ou da legislação infraconstitucional, a despesas obrigatórias.

Pretende-se averiguar, na seção 3.3, a margem disponível para realização de

despesas discricionárias, bem como diagnosticar se a política fiscal adotada no

período 1995-2010 foi pró-cíclica ou anticíclica.

Seção 3.3 - Despesas discricionárias da União e o v iés da política fiscal

brasileira

Um dos objetivos desta seção é discorrer acerca do componente

discricionário das despesas efetuadas pela União, no intervalo de 1995-2010, a fim

73

responder à seguinte questão: existe espaço para o Governo Federal empreender

política fiscal anticíclica por meio do investimento público?

Consecutivamente, almeja-se obter resposta para outra pergunta: pode-se

dizer que a política fiscal realizada ao longo do período estudado teve natureza

anticíclica?

Para cumprir a primeira etapa, será utilizada a base de dados disponibilizada

pela Secretaria de Orçamento Federal (SOF), órgão vinculado ao Ministério do

Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG), no que concerne ao cálculo do

resultado primário pelo regime de competência. Convém relatar que o MPOG (2007)

adota o estágio da liquidação como critério para apuração da despesa

orçamentária.14

A tabela 3.6 traz os montantes relativos aos gastos discricionários federais,

corrigidos para o último ano da série. No ano de 1995, o dispêndio totalizava R$

90.298,94 milhões, chegando aos R$ 106.935,24 milhões, em 2002 (variação de

+18,42%), e, finalmente, R$ 186.730,51 milhões, em 2010 (crescimento de 74,62%

na comparação com 2002). Logo, o aumento acumulado nos anos de 1996 a 2010

foi de 106,79%.

É evidente que o Poder Executivo, em virtude das atribuições que lhe foram

outorgadas pela Constituição Federal de 1988, é o maior responsável por realizar o

gasto público. A título de exemplo, no ano de 2010 apenas 3,79% das despesas não

obrigatórias couberam aos poderes Legislativo e Judiciário.

A decomposição dos gastos da alçada do Executivo revela a predominância

da “categoria econômica da despesa 3” (custeio), haja vista que cerca de 70% do

dispêndio discricionário executado em 2010 são gastos correntes. Porém, em 2002

a participação beirava os 81%, enquanto no ano inaugural da série o percentual era

algo em torno de 78%. Denota, portanto, que as despesas de capital têm

conquistado espaço no orçamento da União, pois representam, desde 2007,

aproximadamente 30% dos gastos não obrigatórios.

Outra questão saliente na tabela 3.6 é a queda das despesas do Executivo

advinda nos períodos 1997-1999, 2001-2003 e 2007-2008. Curiosamente, as

14 Apesar da tentativa, o resultado primário oficial permanece sendo o apurado pelo Banco Central do Brasil, pela metodologia “abaixo da linha”.

74

situações guardam certa similaridade com o desempenho da despesa primária total

do Governo Central - objeto de análise da tabela 3.2. Na ocasião, constatou-se que

a variável caíra nos anos de 1999 e 2003, em relação a 1998 e 2002,

respectivamente.

No que tange aos gastos discricionários, percebe-se que os cortes

impactaram severamente o dispêndio de capital, sendo o principal alvo da contenção

de despesas, como evidencia o gráfico 3.12. Por outro lado, no instante

imediatamente seguinte ao ajuste os gastos pertencentes à categoria econômica

“Capital” se expandiram a um ritmo mais acelerado que a média.

Deveras, patenteia-se que as despesas correntes sentem menos a influência

dos ciclos econômicos que as de capital. Não por acaso, Velloso, Mendes e Caetano

(2009) mencionam o padrão comportamental pró-cíclico, nas fases ascendentes,

das despesas correntes, quando crescem acima da variação do PIB e, ao mesmo

tempo, anticíclico em fases descendentes não relacionadas a uma crise que ameace

a solvência do setor público. Para os autores, com exceção dos anos de 1999 e

2003, a tendência à elevação permanente da razão gasto/PIB se explica pelo

comportamento das despesas correntes.

Tabela 3.6 – Despesas primárias discricionárias da União – em milhões de R$ de 2010

Ano 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002

Total 90.298,94 86.948,32 97.077,26 95.022,73 92.427,83 100.641,73 113.646,89 106.935,24

1. Executivo 86.960,08 83.006,19 93.304,95 90.803,41 88.655,09 96.578,18 109.520,72 102.092,66

1.1 Correntes 67.914,21 65.034,55 70.242,21 67.981,09 71.540,14 73.876,64 79.460,84 82.685,65

1.2 Capital 19.045,87 17.971,65 23.062,73 22.822,32 17.114,95 22.701,54 30.059,88 19.407,01

2. Legislativo, judiciário e MPU

3.338,87 3.942,13 3.772,31 4.219,32 3.772,75 4.063,55 4.126,18 4.842,58

Ano 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010

Total 88.403,16 105.723,64 121.910,03 128.200,93 155.757,18 154.389,52 174.714,51 186.730,51

1. Executivo 83.996,33 100.043,17 116.041,63 121.808,98 149.146,16 147.649,28 168.244,17 179.657,60

1.1 Correntes 73.343,75 83.122,68 90.088,61 94.438,17 104.416,62 105.167,20 117.119,57 125.925,64

1.2 Capital 10.652,58 16.920,48 25.953,02 27.370,81 44.729,55 42.482,08 51.124,60 53.731,97

2. Legislativo, judiciário e MPU

4.406,83 5.680,47 5.868,40 6.391,95 6.611,02 6.740,25 6.470,34 7.072,90

Fonte: Ministério do Planejamento / Secretaria de Orçamento Federal.

Nota: Valores atualizados com base no deflator implícito do PIB.

75

-60,00%

-40,00%

-20,00%

0,00%

20,00%

40,00%

60,00%

80,00%

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

2007

2008

2009

2010

Total

Correntes

Capital

Fonte: baseado nos dados da tabela 3.6.Elaboração: própria

Gráfico 3.12 – Despesas discricionárias da União – Executivo – variação (%)

em relação ao ano anterior

Dando sequência, o gráfico 3.13 mostra os gastos discricionários do Poder

Executivo - como proporção do PIB e da despesa fixada na lei orçamentária anual

(LOA).15 O desenho das curvas insinua a elevação do patamar de 3,63% para 4,77%

do PIB ou, visto por outro prisma, de 8,01% para 10,17% da despesa prevista na

LOA.

Conquanto tenha aumentado, a margem da qual o Executivo podia dispor em

2010, para fins de políticas discricionárias, era menor que 11% do orçamento da

União. Deste percentual, somente 3,04% foram alocados para despesas de capital,

na qual são contabilizados os investimentos.

Logo, pode-se inferir que o espaço para o Governo Federal realizar política

fiscal anticíclica pela ampliação do investimento é ainda reduzido, por conta do

enorme peso das despesas obrigatórias no orçamento e da rigidez dos gastos com o

15 Relativa aos orçamentos fiscal e da seguridade. Legislação orçamentária disponível para consulta em: <http://www.planejamento.gov.br/secretaria.asp?cat=248&sub=264&sec=8>.

76

custeio. Entretanto, a orientação recente do governo, visando à remoção dos

gargalos de infraestrutura, e a estabilidade do ambiente macroeconômico, a qual

reflete nos indicadores fiscais, são condições propícias para que a participação da

FBCF da administração pública seja majorada.

3,63

%

3,40

%

3,69

%

3,59

%

3,50

%

3,65

%

4,09

%

3,71

%

3,02

%

3,40

%

3,83

%

3,86

%

4,46

%

4,20

% 4,80

%

4,77

%

8,01

%

9,16

%

8,03

%

8,02

%

6,82

%

4,25

%

5,60

%

8,44

%

4,96

%

4,50

%

5,11

%

5,51

%

7,78

%

9,34

% 9,83

%

10,1

7%

1995

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

2007

2008

2009

2010

(%) do PIB

(%) da LOA

Fonte: MPOG / SOF. Elaboração: própria

Gráfico 3.13 – Despesas discricionárias do Executivo

Enfim, para o alcance dos desideratos preestabelecidos resta verificar se foi

empreendida, em algum momento das gestões FHC e Lula, uma política anticíclica

deliberada. Com o fito de averiguar a veracidade da proposição, serão comparadas

as taxas reais anuais de variação: da receita bruta do Governo Central, da despesa

discricionária da União, da FBCF (empresas, famílias e administrações públicas) e

do PIB.

Cumpre novamente ressaltar que a estatística oriunda das contas nacionais,

no tocante ao investimento público, não segrega a execução por ente da federação.

Apesar da limitação, o arquivo “Consolidação das Contas Públicas”, disponível no

sítio eletrônico do Tesouro Nacional, traz números desagregados por esfera de

governo, grupo de despesa e modalidade de aplicação, para que se tenha uma

noção – no que tange aos valores investidos - do papel desempenhado pela União,

estados e DF e municípios.

A tabela 3.7 exemplifica a decomposição do investimento realizado em 2009.

As aplicações diretas, que eliminam a duplicidade na contagem, somam R$

81.071,89 milhões, sendo os estados os maiores responsáveis (R$ 33.502,12

milhões), seguidos da União (R$ 25.002,52 milhões) e dos municípios (R$ 22.567,26

77

milhões). Todavia, o Governo Federal transferiu cerca de R$ 20 bilhões aos estados,

Distrito Federal e municípios, recursos aplicados em investimentos dos governos

subnacionais.

Desta forma, a União assume o encargo de grande provedora de recursos

financeiros, mediante transferências a órgãos e entidades no âmbito da

administração pública, bem como a instituições privadas, fato demonstrado pelo

somatório das três primeiras colunas da tabela 3.716.

Embora exista a série divulgada pelo Tesouro Nacional, a qual se baseia nos

grupos de despesa da contabilidade pública, entende-se que o conceito de formação

bruta de capital fixo é mais apropriado, a fim de que sejam testadas as conclusões

emanadas do Comunicado nº 126 do IPEA, de 29 de dezembro de 2011.

No que diz respeito a anos pares, a tabela 3.8 registra taxas positivas de

variação do investimento público (exceto 1996), o que pode estar relacionado aos

ciclos eleitorais bienais e quadrienais identificados por IPEA (2011) e Orair (2011).

No caso de 1998, a FBCF das APUs variou +39,87%, na comparação com

1997 e a receita bruta do Governo Central +10,72%, ambas a despeito do fraco

desempenho da economia naquele ano. Contudo, o crescimento pontual do

investimento público não permitiu a equiparação ao patamar de 1994, visto que as

sucessivas quedas ocorridas entre 1995 e 1997 perfazem 47,22%. Ademais, o

contexto era de elevação da dívida pública e de deterioração dos principais

indicadores macroeconômicos internos e externos, fatores que poderiam

comprometer, sobretudo, a estabilidade do Real.

De fato, a DLSP cresceu impetuosamente entre 1995 e 2003, como observa

Giambiagi:

[...] os anos do primeiro Governo FHC (1995-1998) podem ser definidos como sendo de “déficit aberto” [...] Neste contexto, a dívida líquida do setor público (DLSP), que no começo do Plano Real, em 1994, era de 30% do PIB, atingiu 39% do PIB quatro anos depois. O segundo Governo FHC (1999-2002) pode ser definido como sendo de “ajuste com endividamento”, após o forte ajuste primário de 1999. Embora a menor despesa com juros reais e o ajustamento primário tenham diminuído as NFSP nominais do período para 4,0% do PIB, estas continuaram sendo importantes. Ao mesmo tempo, o expressivo aumento da importância relativa da dívida pública

16 O uso desta informação serve unicamente para evidenciar a predominância dos recursos da União no total investido pelas APUs, porquanto deveria ser ainda expurgada a duplicidade na contagem.

78

associada à taxa de câmbio e o reconhecimento de passivos contingentes acabaram elevando a dívida pública para perigosos 51% do PIB no final de 2002. (GIAMBIAGI, 2007, p. 10-11).

Assim sendo, o conjunto de evidências reduz a possibilidade da adoção, em

1998, de uma política fiscal contracíclica deliberada, voltada para elevação da

FBCF, sendo bastante provável a concorrência de fatores de natureza política. De

modo semelhante, o viés negativo da FBCF e das despesas discricionárias, perante

a diminuição das receitas, enfatiza o caráter pró-cíclico da política de gastos adotada

no ano de 1996.

Sobre os anos pares, verifica-se ainda o bom comportamento da economia

brasileira nos anos 2000, 2002, 2004, 2006, 200817 e 2010, o qual coaduna o

crescimento do PIB, da receita e da FBCF das APUs. Logo, não há sinais de que

uma política fiscal anticíclica tenha sido conduzida intencionalmente.

Focalizando os anos ímpares, emergem prontamente os argumentos

apresentados pelo IPEA (2011). No Comunicado nº 126 do Instituto, é ressaltada a

tese de que a FBCF das APUs se acelera em anos eleitorais (pares) e desacelera

ou se contrai seguidamente, entendimento ratificado pelos dados.

Não obstante, cabe rememorar que os anos de 1995, 1997 e 1999 foram

marcados pelas crises mexicana, asiática e cambial brasileira18, nesta ordem, as

quais impactaram o balanço de pagamentos e as contas públicas, com

consequências danosas para a solvência do setor público.

É razoável, então, pensar que o governo estivesse preocupado com o

contágio das sucessivas crises internacionais e, por conseguinte, não pouparia

esforços para defender a estabilidade da moeda. Na realidade, o temor de uma

desvalorização cambial, no final da década de 1990, levou o governo a praticar

elevadas taxas de juros reais, o que causou um severo desequilíbrio orçamentário.

Deste modo, a contração acumulada da FBCF das APUs, de 1995 a 1999, é

coerente com as dificuldades à época vivenciadas pela economia brasileira.

Igualmente, os dados atinentes a 2003 denunciam o viés pró-cíclico da

política fiscal, pois diminuíram: a receita governamental, o investimento público e

17 Lembrando que a crise americana se agravou com a quebra do Lehman Brothers, em setembro de 2008, repercutindo no PIB brasileiro do quarto trimestre. 18 Teve ainda a crise russa, em 1998.

79

inclusive as despesas correntes da União (ver gráfico 3.5). Afora isso, a FBCF das

empresas e famílias recuou 2,76% e o PIB cresceu parcos 1,15%.

Quanto a 2005 e 2007, os indicadores abordados na tabela 3.8 variaram

positivamente, sem exceção. O resultado pode ser reflexo da conjunção de três

fatores: o boom da economia mundial, o qual coincidiu com o Primeiro Governo Lula

e início de seu segundo mandato, até o agravamento da crise financeira americana;

a estabilidade macroeconômica e a mudança de orientação da política econômica,

após a substituição de Palocci por Mantega, no Ministério da Fazenda. Mesmo

assim, nos dois anos, a FBCF das APUs cresceu menos que em 2004 e 2006,

reforçando a hipótese dos ciclos eleitorais bienais e quadrienais.

Restaram 2001 e 2009, que parecem se distanciar do padrão característico

dos anos ímpares. A diferença fundamental reside no contraponto entre as

performances do PIB e da formação bruta de capital fixo da administração pública.

Em 2001, o PIB real variou +1,31% e a FBCF das empresas e famílias

+1,62%. Enquanto isso, a receita, a despesa discricionária e o investimento público

tiveram elevações mais expressivas – 5,59%, 12,92% e 11,78%, respectivamente.

À vista do descompasso exposto pelos dados, podem ser colocadas duas

perguntas: a política fiscal empreendida em 2001 foi contracíclica? Em caso

afirmativo, ficou caracterizada a intenção de realizá-la? Para responder aos

questionamentos deve-se primeiro revisar os principais acontecimentos respeitantes

ao ano de 2001.

Um evento de ordem interna que restringiu momentaneamente as

potencialidades da economia brasileira foi a chamada “crise do apagão”. De acordo

com Giambiagi (2005a), a baixa intensidade pluviométrica durante o pico sazonal

das chuvas comprometeu a capacidade dos reservatórios da região Sudeste e

Centro-Oeste, alertando sobre um eventual desabastecimento de energia caso não

houvesse um ajuste da demanda. Todavia, o cerne da questão parece ter sido outro.

Ferrari Filho e Terra (2010) creditam a crise de insuficiência energética à

privatização de parcelas substanciais do setor e à contenção dos investimentos

públicos na indústria de produção de energia, a fim de compor superávits primários

nos anos 1990. Em vez de atuar sobre as causas, a solução do governo foi impor

80

aos consumidores a obrigação de cortar 20% do consumo, tendo como base o ano

anterior, ou seja, um ajuste pelo lado da demanda.

Dentre os episódios marcantes ocorridos em 2001 figuram também os

atentados terroristas, nos Estados Unidos da América, e a crise econômica

argentina, os quais abalaram os mercados financeiros pelo mundo.

Por conseguinte, não fosse a repercussão dos três eventos, a economia

doméstica poderia, em 2001, ter mantido ou superado os 4,31% de expansão do

PIB, transcorridos ao longo do ano 2000. Por outro lado, o incremento de 11,78% na

FBCF das APUs, na contramão das forças que arrefeciam a economia real, deve ter

amenizado a intensidade da fase descendente do ciclo econômico.

Diante dos elementos analisados é plausível afirmar que houve política fiscal

anticíclica no ano de 2001. Contudo, não há evidências que possibilitem ajuizar

acerca de sua intencionalidade, diferentemente de 2009, quando o governo se

mostrou disposto a enfrentar as adversidades causadas pela crise financeira dos

Estados Unidos da América (EUA) – também denominada crise americana ou do

subprime.

Prova disso é a declaração de Guido Mantega, Ministro da Fazenda, feita no

dia 1º de dezembro de 2008, a qual foi registrada por emissário do jornal Folha de

SP: “[...] com trabalho, o país vai perseguir o crescimento de 4%. O governo vai

manter todos os seus investimentos programados e, se for necessário, vamos

aumentá-los.” (MANTEGA apud ANTUNES, 2008)

Adicionalmente, foram anunciadas desonerações tributárias, dentre as quais a

redução de IPI para produtos da “linha branca”, conforme discurso do Ministro

Mantega, em 17 de abril de 2009: a partir de hoje, o IPI das geladeiras cai de 15%

para 5%, o de fogões, de 5% para zero, o de máquinas de lavar, de 20% para 10%,

e o de tanquinhos, de 10% para zero". (MANTEGA apud PETRY; WARTH, 2009).

Com efeito, a receita bruta do Governo Central caiu 3,76%, em 2009, o que

pode ter sido tanto pelos incentivos tributários oferecidos quanto em função da

queda da atividade econômica, cujo sinal mais evidente é a contração do PIB real

(0,33%). Entretanto, as despesas primárias discricionárias aumentaram 13,16%,

notadamente as de capital, como demonstra o gráfico 3.12, e a FBCF das APUs

teve elevação de 4,43%.

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82

Deve-se ter em mente, ao analisar os dados, que em 2009 o tecido

econômico do país apresentava fundamentos mais sólidos que outrora. A existência

de um estoque de reservas internacionais em montante considerado satisfatório, o

controle do grau de endividamento do setor público e o fortalecimento do mercado

interno propiciaram mecanismos distintos de enfrentamento, os quais não puderam

ser empregados nas demais crises experimentadas pelo país nos vinte últimos anos,

ainda que estivessem ao alcance dos governos.

Segundo Velloso, Mendes e Caetano (2009), embora o Brasil tenha sido

atingido pela crise americana, como praticamente todos os países, as perdas de

riqueza e a necessidade de reduzir o consumo para recompô-las foram bem

menores que nos EUA e na Europa, em virtude da baixa exposição do sistema

bancário brasileiro a riscos e do rigor da política monetária. Todavia, não houve meio

de escapar incólume, visto que: “[...] diante da contaminação que vem de fora, é

natural que haja comportamento pró-cíclico de parte dos consumidores, dos bancos

e dos investidores, acentuando-se o impacto externo negativo.” (VELLOSO;

MENDES; CAETANO, 2009, p. 8).

Entende-se, portanto, que as medidas fiscais anticíclicas, postas em prática a

partir do agravamento da crise americana, não foram arbitrárias, porque a economia

brasileira tinha condições de absorver eventuais efeitos colaterais decorrentes das

desonerações tributárias e da elevação do investimento público. Em 2009, o

superávit primário do Governo Central foi inferior a 2% do PIB - pela primeira vez

desde 2002 - chegando inclusive a se aproximar dos patamares vistos antes de

1999. Porém, naquele ano, diferente de outras épocas, nem a solvência da dívida

pública brasileira, nem o financiamento do balanço de pagamentos estavam

ameaçados.

Na visão de Ferrari Filho e Terra (2010, p. 15-16), tão somente no ano de

2009

[...] assistiu-se a uma política fiscal balizadora de boas expectativas empresariais. Todavia, esta ação estabeleceu-se como elemento de última instância e não como estabilizador automático par excellence, como seria em uma administração fiscal puramente keynesiana. Outrossim, tal postura fiscal foi confrontada por uma política monetária que muito embora tenha reduzido a taxa básica de juros, não a operacionalizou em níveis condizentes com o necessário para

83

estimular expectativas otimistas num momento de pessimismo espraiado. (grifos dos autores).

Em suma, o Governo Federal buscou deliberadamente, no contexto da “crise

do subprime”, atenuar a flutuação do produto, bem como pôde adotar, para tanto,

uma política fiscal expansiva, em face da margem existente para diminuir o superávit

primário. Os estados e municípios, por sua vez, têm menos facilidade para estreitar

os excedentes fiscais, tendo em vista que:

nos Estados e Municípios, a arrecadação cai, a despesa de pessoal sobe com base em promessas passadas, mas não há margem para reduzir muito os excedentes fiscais. Nesse caso, os dirigentes se vêem instados a reduzir o item mais flexível dos gastos, que são os investimentos, ou a pedir socorro financeiro ou renegociação de dívidas à União; [...] (VELLOSO; MENDES; CAETANO, 2009, p.8).

Os autores assinalaram ainda o perigo latente numa forte queda dos

excedentes, se combinada à subida desenfreada dos gastos correntes, fatores que

poderiam fazer ressurgir o velho problema da insolvência. Para eles, seria desejável

a expansão do investimento público, ao tempo em que os gastos correntes fossem

cortados.

A problemática levantada por Velloso, Mendes e Caetano (2009) é de

extrema relevância para o campo das finanças públicas, por se tratar dos impactos

originários da elevação permanente das despesas correntes, a exemplo dos

benefícios previdenciários, sobre a situação fiscal do Brasil no médio e no longo

prazos. Em razão de o assunto transcender o escopo da presente dissertação, fica

como sugestão à comunidade de pesquisadores, para que a temática seja explorada

em futuras pesquisas.

Por ora, pode-se dizer que a política fiscal foi pró-cíclica durante quase todos

os anos pertencentes ao período 1995-2010, à exceção de 2001 e 2009. Nestes, o

governo adotou medidas anticíclicas, tais como as desonerações tributárias, em

2009, e o aumento da FBCF, em ambos. No entanto, não foram identificadas

evidências capazes de qualificar a política expansionista de 2001 como sendo algo

deliberado, ao contrário de 2009, quando o governo declarou abertamente suas

intenções.

84

Outrossim, evidenciou-se a interferência do calendário eleitoral na FBCF das

APUs, uma vez que o aumento das despesas com investimento tende a ser mais

intenso nos anos pares, quando há eleições presidenciais ou municipais.

85

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Foram estudados alguns aspectos da política fiscal brasileira no intervalo

1995-2010, com ênfase na despesa governamental. Constatou-se que, nos anos

pós-Real, tanto a arrecadação quanto os gastos do governo central se elevaram em

ritmo mais acelerado que o produto interno bruto.

Apesar do esforço fiscal para promover o superávit primário, o Brasil

continuou a apresentar substanciais déficits nominais, devido à prática de elevadas

taxas de juros ao longo do período estudado. Nos instantes iniciais do Plano Real, o

manejo deste instrumento de política monetária teve por finalidade fomentar o

ingresso de capital estrangeiro, para financiar os déficits em transações correntes e,

mais recentemente, tem sido empregado com a intenção de conter o

superaquecimento da demanda agregada, em favor do regime de metas de inflação.

A tônica da política econômica dos dois mandatos de FHC foi assegurar a

estabilidade do real a qualquer custo. Para tanto, foram praticadas elevadas taxas

de juros, que implicaram severo ajuste das finanças públicas. O viés estabilizador da

política fiscal se mostrou, então, inibidor do dispêndio público gerador de condições

favoráveis à expansão da demanda, em especial do investimento produtivo.

No tocante aos oito anos de Governo Lula, pode-se observar dois momentos

bem distintos, cuja linha divisória imaginária é a troca do Ministro da Fazenda,

quando a ortodoxia característica da gestão de Palocci deu lugar à filosofia

desenvolvimentista de Mantega. Adicionalmente, a progressiva redução da razão

endividamento público/PIB, a contar de 2004, e dos encargos financeiros incidentes

sobre o principal da dívida abriram espaço fiscal para a expansão do investimento

governamental, sem comprometer com isso o ajuste das finanças do Estado.

Desta forma, a política fiscal deixou de ser meramente passiva para se

transformar num instrumental complementar de estímulo à atividade produtiva,

imbuído da tarefa de suprir a deficiência de demanda efetiva, tal como aconteceu em

2009. Frise-se a recuperação pelo Estado da capacidade de promover o

investimento, seja diretamente, seja por meio dos financiamentos do BNDES.

Demonstrou-se que a trajetória da variável foi errática nos anos de 1995 a 2003,

86

seguida de um movimento ascendente de 2004 em diante, apesar de suave queda

entre os anos de 2007 e 2008.

Além disso, esta dissertação objetivou apresentar os conceitos da visão

mainstream que são norteadores da política fiscal recente, em contraposição à

proposta teórica de Keynes e seus adeptos, de modo a acrescentar elementos ao

debate em torno da eficácia da política fiscal, contudo, sem a pretensão de esgotar a

discussão do tema.

De acordo com a teoria convencional, a austeridade fiscal é um indicador

capaz de sinalizar aos agentes econômicos o comprometimento com a estabilidade

macroeconômica, que propiciaria um ambiente adequado para o investimento

privado. Diversamente, Keynes e os pós-keynesianos propõem a intervenção estatal

justamente para atenuar as flutuações relacionadas ao ciclo econômico, as quais

são provocadas pela instabilidade do investimento numa economia tipicamente

monetária.

A concepção da política fiscal proposta por Keynes não é conivente com a

irresponsabilidade, ou seja, não avaliza práticas que acarretem desequilíbrio das

contas públicas. Portanto, é desprovido de validade associar os ensinamentos de

Keynes a uma atitude permissiva com relação à intervenção estatal na economia e

despreocupada com a geração continuada de déficits públicos.

Ademais, no intuito de evitar pressões inflacionárias, deve-se avaliar se a

economia está em pleno emprego, porque, neste estágio, o somatório das

demandas pública e privada será superior à capacidade produtiva do país. Deduz-

se, pois, que as medidas de cunho fiscal devem ter caráter contracíclico, de maneira

a contrarrestar as oscilações da demanda agregada. Assim, o governo estaria

preocupado tanto com a insuficiência de demanda quanto com o seu excesso.

Disto se pode inferir que o orçamento de capital, cuja composição presume

despesas discricionárias, desempenharia o papel de regulador da demanda efetiva,

enquanto o orçamento corrente limitar-se-ia aos bens e serviços essenciais, a fim de

que se preserve o equilíbrio fiscal e se evite a aceleração da inflação.

Considerando as categorias econômicas da despesa, notou-se que as

despesas correntes em valores reais cresceram entre 1995 e 2010, sem a

ocorrência de grandes reveses, enquanto o gasto de capital se mostrou mais

87

instável. Além disso, ao examinar qual o peso das categorias econômicas no gasto

total, constatou-se a dominância dos gastos correntes, os quais respondiam, em

2010, por cerca de 80%.

Conquanto tenha aumentado, no intervalo de 1995 a 2010, a margem da qual

o Poder Executivo podia dispor para fins de políticas discricionárias, neste ano, era

ainda menor que 11% do orçamento da União. Deste percentual, somente 3,04%

foram alocados para despesas de capital, na qual são contabilizados os

investimentos. Visto de um prisma diferente, em 2010, o dispêndio discricionário

correspondia a 4,77% do PIB, ante 3,63%, em 1995.

Desta forma, compete pontuar que o espaço para o Governo Federal realizar

política fiscal anticíclica pela ampliação do investimento é ainda reduzido, por conta

do enorme peso das despesas obrigatórias no orçamento e da rigidez dos gastos

com o custeio. Entretanto, a orientação recente do governo, visando à remoção dos

gargalos de infraestrutura, e a estabilidade do ambiente macroeconômico, a qual

reflete nos indicadores fiscais, são condições propícias para que a participação da

FBCF da administração pública seja majorada.

Focalizando os gastos discricionários, percebe-se que os cortes realizados

em 1999, 2003 e 2008 impactaram severamente o dispêndio de capital, sendo o

principal alvo da contenção de despesas. Por outro lado, no instante imediatamente

posterior ao ajuste, os gastos pertencentes à categoria econômica “Capital” se

expandiram a um ritmo mais acelerado que a média.

A respeito da formação bruta de capital fixo das administrações públicas,

verificou-se a crescente participação da variável proporcionalmente ao PIB. Como

sugere o Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (2011), a elevação

progressiva nos anos mais recentes pode estar relacionada à mudança de

orientação do governo, ainda embrionária, com vistas a reassumir seu papel no

planejamento estratégico e promover o crescimento econômico por meio da

ampliação do investimento público, com destaque para as questões ligadas à

infraestrutura econômica.

Outro fator digno de menção é a influência exercida pelos ciclos eleitorais

sobre a FBCF das APUs. O “modelo estrutural ajustado”, desenvolvido pelo IPEA

(2011), induz a pensar um padrão segundo o qual a execução do investimento se

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intensifica nos anos de eleição e desacelera logo após, quando tem início um ajuste

fiscal. Adicionalmente, na visão de Orair (2011), a FBCF se decompõe em dois

componentes cíclicos: um de frequência bienal, no âmbito dos governos

subnacionais, e outro quadrienal, encontrado nas séries do Governo Federal e dos

governos estaduais.

Diante do exposto, pode-se afirmar que a política fiscal foi pró-cíclica durante

quase todos os anos pertencentes ao período 1995-2010, exceto em 2001 e 2009.

Nestes, foram adotadas medidas anticíclicas, tais como as desonerações tributárias,

em 2009, e o aumento da FBCF em ambos. Todavia, não se identificou evidência de

que a política expansionista de 2001 foi deliberada, ao contrário de 2009, quando o

Governo Federal assumiu publicamente o intento de executar política fiscal

anticíclica.

De maneira diferente de outras épocas, nem a solvência da dívida pública

brasileira, nem o financiamento do balanço de pagamentos estavam ameaçados no

contexto da crise financeira americana. Entende-se, portanto, que os estímulos à

demanda agregada pelo governo brasileiro foram viáveis somente porque a

economia tinha condições de absorver, num contexto de crise, eventuais efeitos

colaterais resultantes das desonerações tributárias, da elevação do investimento

público e da redução do superávit primário.

No entanto, deve-se repensar a forma como é administrada a política de

déficit público brasileira, a qual não permite que se constituam fontes de

financiamento no longo prazo, visto que os fluxos de pagamento financeiro são

patrocinados pelos superávits primários. Com isso, impõem-se limites para os

dispêndios governamentais estimuladores da demanda agregada e do crescimento

da riqueza social.

Uma alternativa plausível seria considerar o orçamento biparte keynesiano, no

qual as despesas discricionárias do orçamento de capital desempenhariam papel

regulador da demanda efetiva, enquanto o orçamento corrente deveria ser

superavitário, a fim de que se preserve o equilíbrio das contas públicas e se evite a

aceleração inflacionária.

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