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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC – SP
Janaina Pereira da Silva
Função Social da Escola e o Aspecto Educacional do
Programa Bolsa Família
MESTRADO EM EDUCAÇÃO:
HISTÓRIA, POLÍTICA, SOCIEDADE
SÃO PAULO
2014
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC – SP
Janaina Pereira da Silva
Função Social da Escola e o Aspecto Educacional do
Programa Bolsa Família
MESTRADO EM EDUCAÇÃO:
HISTÓRIA, POLÍTICA, SOCIEDADE
SÃO PAULO
2014
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
Janaina Pereira da Silva
Função Social da Escola e o Aspecto Educacional do Programa Bolsa Família
Dissertação apresentada à Banca
Examinadora da Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo, como exigência
parcial para obtenção do título de Mestre em
Educação: História, Política, Sociedade, sob
a orientação da Prof.ª Dr.ª Leda Maria de
Oliveira Rodrigues.
SÃO PAULO
2014
BANCA EXAMINADORA
___________________________________________
___________________________________________
___________________________________________
Dedico este trabalho aos
meus pais Aurora e Francisco, pelo eterno
incentivo aos estudos; as minhas irmãs
Osvana e Susana, pelo apoio e
companheirismo, e aos meus sobrinhos
Vitória, Marcella e Samuel, que me fizeram
sorrir nos momentos de angustia.
Agradecimentos
À DEUS, por gerar e gerir o sonho de continuar estudando e me tornar mestre.
À minha incomparável irmã, Osvana, que esteve ao meu lado em todos os
momentos de ansiedade, angustia e indecisão, mostrando que com calma e
determinação se vai longe.
À minha mãe Aurora, que com sua praticidade e jeito peculiar de lidar com
desafios, não permitiu que eu esmorecesse ou desistisse durante a caminhada.
À minha professora orientadora, Leda Maria de Oliveira Rodrigues, por sua
amizade, disponibilidade, paciência, companheirismo, competência e compromisso
profissional e principalmente pelos preciosos conhecimentos recebidos.
Ao Prof. Dr. Carlos Antônio Giovinazzo Junior e a Profa. Dra. Marieta Gouvêa
de Oliveira Penna, pela cuidadosa leitura que demonstram ter realizado deste trabalho e,
pelas valiosas e precisas considerações para melhoria do mesmo.
Aos professores do Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação: História,
Política, Sociedade, pelas significativas aulas e discussões que contribuíram para
construção e ampliação do trabalho realizado.
À Betinha, secretaria geral do Programa EHPS, por seu cuidado, carinho e
atenção aos nossos pedidos e anseios.
À CAPES, pela concessão de minha bolsa de estudos, fundamental para me
manter no curso.
À amiga Verônica, pela companhia desde o princípio da caminhada, indagando,
criticando e fazendo pensar e repensar a elaboração deste trabalho.
Aos amigos Adilson, Cecília, Priscila e Suelem, que ao final da caminhada
disponibilizaram seu tempo e companhia para leitura e escrita final deste trabalho.
A todos os familiares e amigos, que durante esse percurso assistiram minhas
transformações e compreenderam minhas ausências, permanecendo companheiros até o
fim.
Resumo
SILVA, Janaina Pereira da. 2014. Função Social da Escola e o Aspecto Educacional
do Programa Bolsa Família. Dissertação de Mestrado. Pontifícia Universidade
Católica de São Paulo.
Este trabalho apresenta os estudos e os resultados de uma investigação sobre o aspecto
educacional do Programa Bolsa Família e a sua relação com a possível reconfiguração
da função social da escola. Tal aspecto é apresentado como exigência para o
recebimento do benefício, isto é, os inscritos no programa devem matricular seus filhos
na escola e garantir a frequência escolar mínima de 85% no caso das crianças e
adolescentes entre 6 e 15 anos e a mínima de 75% entre os jovens de 16 e 17 anos.
Pretende-se investigar se houve mudança na concepção de uma das funções sociais da
escola, seja ela, o oferecimento do conhecimento formal e científico para assistência
social a partir da exigência do aspecto educacional do programa, além de analisar se
houve alterações nas atribuições da escola no que tange a sistematização de
conhecimento e ainda verificar o que tem sido priorizado na escola, o ensino ou a
efetivação do Programa Bolsa Família. Para atingir tais objetivos foi selecionada a
escola com maior número de beneficiários do programa, da Delegacia de Ensino do
Butantã – Zona Oeste de São Paulo. Após contato com a escola os pais, professores e
agentes administrativos que aceitaram participar da pesquisa, responderam um
instrumento de coleta de informações: questionário elaborado para esse fim específico.
A análise dos resultados consistiu em considerar as falas dos entrevistados, a luz do
conceito de função social da escola constituído pelo referencial teórico aqui
apresentado: Teixeira (1971), Fernández (1989), Sacristán e Gómez (1998), Hamilton
(2001), Tenti (2007), Young (2007). Entre os 22 sujeitos envolvidos nessa investigação,
14 entendem a escola como espaço de oferecimento de conhecimento formal e
científico, 6 compreendem a escola como uma espaço que oferece conhecimento, mas
também benefícios assistenciais e 2 acreditam que a escola tem suas funções mais
voltadas para assistência social do que, para o oferecimento de conhecimento formal e
científico.
Palavras-chave: Programa Bolsa Família, função social da escola, oferecimento de
ensino.
Abstract
SILVA, Janaina Pereira da. 2014. School’s Social Function and the Educational
View of Brazilian Social Programme Support “Bolsa Família” Master degree thesis.
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
This paper bring forward the studies and results of a research about educational view of
Brazilian Government Social Programme Support “Bolsa Família” and a possible
reconfiguration about school’s social function. This view is a legal consideration to
receive this government support, that is to say, the families registered in programme
must do the school enrolment of their children and ensure they will have attend school
of 85% for children and teenagers – 6 to 15 years old – or 75% for teenagers with 16 or
17 years old. We intend to investigate whether or not changed the conception of one of
school’s social function, from the assumption of: the formal and scientific knowledge
support for social welfare policies; and research if there changed the schools function
from the educational system beyond what are the current school’s priorities: the
knowledge or enforcement of “Bolsa Famíla”. To reach this purpose we choose the
school with more beneficiaries of this programme on São Paulo City Educational
Department of Butantã Hills – West Side. We made contact with responsible for school,
families, teachers, civil servants that agreed to apply our basis research form. That form
was studied from the concept and theories of school social function, the framework was:
Teixeira (1971), Fernández (1989), Sacristán e Gómez (1998), Hamilton (2001), Tenti
(2007), Young (2007). Between the 22 appliers, 14 think that school is a local only to
offer and support the formal and scientific knowledge, 6 understand school as a place of
education and as a place of government social programme, and 3 believes school is
more a place of government social programme than a place of support knowledge.
Key-words: Brazilian Social Programme “Bolsa Família”, school’s social function,
educational support
Sumário
Introdução 13
Capítulo 1 – O Programa Bolsa Família e a condicionalidade Educação 28
Capítulo 2 – Escola e suas funções sociais 35
2.1. O que entendemos por função social da Escola? 35
2.2. Funções sociais da Escola ao longo da História 38
Capítulo 3 – Procedimentos de Pesquisa 50
3.1. Delimitação do campo empírico 50
3.1.1. Funcionamento da escola 52
3.1.2. A gestão escolar 52
3.1.3. O corpo docente 53
3.1.4. O corpo de apoio escolar 53
3.1.5. A esfera pedagógica 53
3.1.6. Os espaços 57
3.2. Caracterização do grupo pesquisado 58
3.2.1. Beneficiários do Programa Bolsa Família 59
3.2.2. Os professores 60
3.2.3. Os agentes de apoio administrativo 60
3.3. A pesquisa 61
3.3.1. Coleta de dados 61
3.3.2. Apresentação e análise dos dados 63
3.4.1. Análise 1 – Entrevista com os pais 63
3.4.2. Analise 2 – Questionários dos professores 75
3.4.3. Análise 3 – Entrevista e questionários dos agentes
Administrativos 84
Considerações Finais 87
Referências Bibliográficas 91
Anexos 95
Anexo 1. Questionário e roteiro de entrevista 95
Anexo 2. Tabelas de dados: entrevistas dos agentes administrativos 104
Anexo 3. Lista de motivo para justificativa de
frequência inferior a 85% 107
Lista de Quadros
Tabelas referentes às respostas das entrevistas com os pais:
Quadro 1 – Caracterização do grupo pesquisado 63
Quadro 2 – Conhecimento acerca do Programa Bolsa Família 64
Quadro 3 – Em relação à frequência escolar 66
Quadro 4 – Abandono escolar, por não recebimento do PBF 68
Quadro 5 – Expectativas e motivação em relação à escola 69
Quadro 6 – Mudanças das expectativas após o PBF 71
Quadro 7 – Mudanças na escola e no desenvolvimento
de seu filho após o PBF 72
Quadro 8 – Demandas junta à escola 73
Quadros referente às respostas de questionários dos professores
Quadro 9 – Caracterização dos professores 75
Quadro 10 – Sobre a concepção de função social da escola 76
Quadro 11 – Conhecimento sobre o Programa Bolsa Família (PBF) 77
Quadro 12 – Interferência do Programa Bolsa Família no trabalho pedagógico 78
Quadro 13 – Demandas dos pais e relação a escola 79
Quadro 14 – Mudanças das expectativas dos pais
em relação à escola após o PBF 80
Quadro 15 – Acesso e permanência na escola, exigido pelo PBF relacionado à
melhoria do rendimento escolar dos alunos beneficiários 81
Quadro 16 – Programas sociais e mudanças de expectativas dos pais em relação à
escola 83
Quadros referente às respostas das entrevistas e aos agentes administrativos
Quadro 17 – Caracterização dos agentes administrativos 104
Quadro 18 – Conhecimento acerca do Programa Bolsa Família
e sua relação com a escola 104
Quadro 19 – Interferência do Programa Bolsa Família no objetivo da escola 104
Quadro 20 – Demandas dos pais em relação à escola 105
Quadro 21 – Percepção das expectativas dos pais em relação a escola 105
Quadro 22 – Mudanças das expectativas dos pais depois do PBF 105
Quadro 23 – Acesso e permanência na escola, exigido pelo PBF melhorou
rendimento escolar 106
13
Introdução
Historicamente a escola e o ato de educar sempre estiveram ligados ao
atendimento das demandas científicas, econômicas e sociais de uma sociedade, no
sentido de transmitir conhecimento, preparar para o trabalho e para o convívio social,
atendendo expectativas de formação intelectual, formação moral, formação da
personalidade e promoção social, variando em seus objetivos e funções.
Pode-se dizer que as ideias e discussões sobre a função social da escola,
acompanhou o percurso histórico desta e mostra-se como um tema discutível e
pertinente até os dias atuais, devido às contínuas transformações sofridas pela escola,
pelos indivíduos e pela própria sociedade.
Sabemos que a escola não é um espaço neutro e de pura transmissão do
conhecimento, mas sim um espaço complexo, multifacetado que lida com problemas e
demandas sociais. A escola reflete e atende a sociedade na qual se está inserida (Tenti,
2007), todavia esse espaço possui determinada característica e obrigação que
formalmente só diz respeito a ele, como afirma Sanches (2009):
A escola opera sob a forma de pensamento privilegiado e
legitimado socialmente, há intencionalidade educativa na promoção
de experiências, para que os alunos tenham acesso a dimensões
fundamentais de sua própria cultura [...] sua função está relacionada
à especificidade de nossa sociedade, ao mundo da escrita, as
disciplinas científicas e à lógica formal, ou seja, sua prática peculiar
é trabalhar com o conhecimento (p.137).
[...]
A escola deve operar com o desconhecido com um funcionamento
intelectual que privilegie a formação de conceitos, direcionado a
ruptura com o cotidiano, com o senso comum (p.138).
E, é essa característica destacada por Sanches (2009), definida como transmissão
e desenvolvimento de conhecimento que aqui nos interessa, pois mediante tantas
reconfigurações que a escola contemporânea tem passado a partir de sua relação com a
sociedade, acreditamos que pode ter sido agregado a essa inúmeros atributos que têm
gerado críticas e acirrado a sensação de insuficiência da escola como espaço de oferta e
sistematização de conhecimento.
14
Acreditamos hoje que a escola se divide entre espaço de transmissão do
conhecimento científico, saber escolar/formal, e de assistência social, instrumento de
efetivação de políticas públicas como o Programa Bolsa Família.
O interesse de pesquisa aqui apresentado, surgiu exatamente dessa aparente
“dualidade da função social da escola e os impactos na qualidade de ensino”, ou seja,
como ficou o objetivo da escola, isto é, o oferecimento do conhecimento formal /
científico após a entrada do Programa Bolsa Família?
É importante ressaltar que o Programa Bolsa Família (PBF) foi escolhido para
essa análise por trazer entre suas condicionalidades de participação a exigência de
acesso e a permanência na escola, e por ser um dos programas de assistência mais
presente entre a população brasileira, por integrar o Plano Brasil sem Miséria do
Governo Federal.
Tem como foco de atuação os 16 milhões de brasileiros com renda per capita
inferior a R$ 70 mensais, e está baseado na garantia de renda, inclusão produtiva e de
acesso aos serviços públicos1.
O Programa Bolsa Família (PBF) em si pode ser definido como um programa de
transferência direta de renda, que beneficia famílias em situação de pobreza e de
extrema pobreza em todo o país e seus principais objetivos são:
Promover o alívio direto da pobreza, por meio da transferência direta da
renda à família;
Reforçar o exercício de direitos sociais básicos nas áreas de Saúde e
Educação, por meio do cumprimento das condicionalidades, o que
contribui para que as famílias consigam romper o ciclo de pobreza entre
gerações;
Coordenar programas complementares que tem por objetivo o
desenvolvimento das famílias, de modo que os beneficiários do Bolsa
Família consigam superar a situação de vulnerabilidade e pobreza. São
1 Disponível em:< http://www.mds.gov.br/>.
15
exemplos de programas complementares: programa de geração de renda,
de alfabetização de adultos, de fornecimento de registro civil e demais
documentos2.
Da definição e objetivos expostos acima, o que mais nos interessa e pode dar
base para parte deste trabalho é o segundo objetivo. Este relaciona o PBF com os
serviços públicos de Saúde e Educação (mais especificamente o que tange a educação)
por meio das condicionalidades.
É o cumprimento de condições nesses setores pelos beneficiários do programa,
que se faz pertinente a análise da possível “dualidade da função da escola”, visto que
esta pode ganhar outra direção no caso de executora, fonte avaliadora ou ainda
maquiadora dessa política.
No geral, as condicionalidades ligadas à Educação e Saúde pretendem manter as
crianças e adolescentes na escola e garantir que as crianças até seis anos, gestantes e
nutrizes cumpram a agenda de atenção básica à saúde. Concomitantemente o
monitoramento do acesso das famílias a esses serviços visa assegurar que os brasileiros
mais vulneráveis sejam atendidos por essas redes de proteção social.
Ressaltamos que o foco desta pesquisa está pautado na condicionalidade
Educação, uma vez que no bojo do PBF esta é apresentada como exigência, isto é, os
inscritos no programa devem matricular seus filhos na escola e garantir a frequência
escolar mínima de 85% no caso das crianças e adolescentes entre 6 e 15 anos e mínima
de 75% entre 16 e 17 anos3.
Estas condições têm como intuito melhorar o rendimento escolar, garantir o
acesso e a permanência na escola e romper com a pobreza a longo prazo, uma vez que o
direito a educação, leva a outros direitos (SANTOS, 2010).
Com intuito de obter familiaridade e ampliar os conhecimentos acerca do tema
de interesse, foi feita pesquisa nas diferentes fontes de conhecimento e exposição de
trabalhos científicos como: Anped (Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa
2 Disponível em: < http://www.mds.gov.br/>.
3 Idem .
16
em Educação), Scielo (Science Eletronic Library Online) e Capes (Coordenação de
Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior).
Pode-se, a priori, destacar que não foi encontrado nenhum trabalho que
efetivamente trate o impacto das políticas públicas, em especial o PBF, na função social
da escola, no sentido de responder as seguintes questões:
Como fica o objetivo da escola a partir da entrada do Programa Bolsa
Família em seu interior?
Qual objetivo a escola passa a desenvolver: de espaço socializador,
provedor de igualdade ou de conhecimento?
Foram questões como essas que nortearam esta pesquisa, no entanto os trabalhos
encontrados abordam mais as mudanças ocorridas na vida do sujeito (beneficiário do
PBF) do que na escola em si. Tal constatação foi diretamente ao encontro de nosso
interesse em pesquisar o aspecto educacional do Programa Bolsa Família (PBF).
Uma vez que os próprios objetivos e exigências do programa, isto é, garantir
acesso e permanência, melhorar o rendimento escolar e romper com a pobreza a longo
prazo, podem dar a entender que acessar e permanecer na escola é sinônimo de
aquisição de conhecimento escolar formal e científico e condição para ser beneficiário
do programa.
É exatamente essa ideia de acesso e permanência na escola ligada à condição de
recebimento do benefício do Programa Bolsa Família que nos levou a indagações sobre
a possível mudança de uma das funções sociais da escola: a de oferecimento de
conhecimento escolar formal e científico para assistência, já que a escola pode ter
passado a desempenhar o papel de “controladora do benefício” pela condicionalidade
Educação, por ficar atrelado a ela o recebimento ou não deste.
Nesse sentido os beneficiários do PBF podem ter passado a entender a escola
como um espaço de assistência social e não de oferecimento de conhecimento para
emancipação e ascensão social, como direito a outros direitos, passando a exigir da
escola responsabilidades que não dizem respeito ao oferecimento de ensino e sim de
recebimento e manutenção do benefício.
17
Partindo do exposto acima buscamos conhecer os trabalhos realizados acerca do
PBF e a escola, e dentro das bases de pesquisa utilizadas (Anped, Capes e Scielo)
foram encontrados inúmeros trabalhos entre teses, dissertações e artigos que relacionam
o Programa Bolsa Família com os mais diversos assuntos como: saúde, segurança,
produtividade de mercado, consumo, violência, entre outros.
Deste montante, destacamos sete trabalhos (três dissertações e quatro artigos das
reuniões da Anped), sendo que três discorrem sobre a relação do Programa Bolsa
Família (PBF) e a escola; um lida com a função social da escola a partir das percepções
dos diferentes segmentos da equipe escolar e os últimos três tratam algumas mudanças
ocorridas na escola a partir das políticas educacionais (não necessariamente o PBF).
A ideia mais presente nos trabalhos de Corrêa (2008), Reis (2009) e Santos
(2010), que tratam a relação PBF e a escola, constitui-se da efetividade legal deste
programa em relação aos interesses educacionais: acesso a educação, permanência na
escola, aumento do rendimento, diminuição da evasão escolar e inclusão social. Todos
utilizaram como metodologia de pesquisa questionários ou entrevistas respondidos por
alunos, professores, gestores e familiares e, no caso de Santos (2010) e Reis (2009),
empregaram também a análise documental: prontuários de alunos, histórico escolar,
média anual e frequência escolar.
Estes trabalhos foram escolhidos por tratar de alguma forma da relação
Programa Bolsa Família (PBF) e escola, não na perspectiva de reconfiguração da função
social da mesma, mas sim, na legalidade do programa na escola.
Os resultados variam de trabalho para trabalho. Em Corrêa (2008) e Reis (2009),
respectivamente, conclui-se que, por meio de falas dos entrevistados, houve uma
melhora significativa na permanência na escola por parte dos alunos beneficiários do
PBF, embora os níveis de frequência ainda não sejam os ideais; que se evidencia uma
melhora significativa na participação dos beneficiários do PBF no que tange ao
desempenho escolar e a permanência na escola; e, por fim, destaca-se que, passados
cinco anos (na época da pesquisa do trabalho) da implantação do PBF, percebe-se uma
melhora nas condições de vida e consequente redução na condição de miserabilidade.
Cabe ressaltar que estes trabalhos apontam os aspectos positivos do PBF na escola
demonstrando sua contribuição para efetividade legal do mesmo em relação à escola.
18
No entanto, o olhar desses autores se mostra mais voltado para as mudanças
ocorridas na vida dos beneficiários do PBF do que na escola, o que pode ser um
indicativo da importância do trabalho que nos colocamos a desenvolver aqui, uma vez
que entendemos que a escola também sofreu reconfigurações a partir das demandas e
exigências do programa, principalmente no que tange a uma de suas funções sociais,
seja ela, o oferecimento de ensino.
É importante ressaltar que o trabalho de Reis (2009) utiliza-se do PBF para
analisar a pobreza do Brasil por um viés educacional, trazendo informações sobre
desigualdade social, o histórico das políticas de transferência direta de renda e
inferências acerca da condicionalidade Educação, além de acesso e permanência na
escola, mas também como estratégia do governo para diminuir o analfabetismo e o
trabalho infantil.
Também se faz pertinente destacar no trabalho de Corrêa (2008), o enfoque dado
pelas famílias ao aspecto financeiro do programa (segundo os professores entrevistados)
ao serem questionadas sobre a maneira como o Bolsa Família (BF) tem contribuído para
inclusão e manutenção das crianças menos favorecidas na escola.
Outro ponto destacado pelos sujeitos da pesquisa (professores que atuam em
diferentes setores escolares desde a docência até a gestão) é que, embora haja um alto
índice de falta, os alunos não abandonam a escola, mas também não demostram
comprometimento com os “verdadeiros” objetivos da educação (aquisição de
conhecimento formal e científico) e que os pais dos alunos beneficiários demonstram
medo de perder o beneficio e por isso cobram de seus filhos a presença na escola.
O medo dos pais, encontrado nas entrelinhas do trabalho de Corrêa (2008), pode
ser um indicativo de mudança de concepção da função social da escola, pois espera-se
que os pais tenham preocupação com o desenvolvimento escolar dos filhos e não se sua
presença ou ausência implicará na perda ou não do benefício “relacionado” a escola.
Este artigo fomenta o interesse de pesquisa aqui apresentado, por indicar uma
possível alteração no conceito de função social da escola pelos pais, passando a
entendê-lo como assistência social por meio do recebimento do beneficio Bolsa Família,
ao invés de oferecedor de conhecimento.
19
Já o trabalho de Santos (2010) teve como intuito analisar o Programa Bolsa
Família (PBF) em seu aspecto educacional: acesso e permanência na escola como meio
de inclusão social. Para isso, analisou índices de frequência e o rendimento escolar de
uma 8ª série de uma escola da Zona Leste de São Paulo. Entrevistou quatro mães, sendo
duas participantes do programa e duas não participantes. Utilizou como base teórica os
trabalhos de Bourdieu, Lahire e Charlot que tratam da exclusão escolar a partir da
origem social e do desempenho escolar e concluiu que o PBF alcança o objetivo de
incentivar a permanência na escola, contudo ele não representa a garantia de sucesso
escolar para as crianças e jovens atendidos.
O trabalho de Santos (2010) vai ao encontro do interesse de pesquisa aqui
apresentado, por se preocupar especificamente com um dos objetivos do programa, qual
seja, o acesso e permanência na escola olhando-o sob uma ótica de inclusão social e não
necessariamente de oferecimento de ensino, o que também pode demonstrar mudança
de função social da escola (não na perspectiva que desejamos tratar aqui).
Gianotti (2006) tem por objetivo levantar os diversos entendimentos que se tem
sobre a função social da escola e como os diversos segmentos da equipe escolar a
percebem. Para isso utilizou-se dos estudos de Libanêo, Mizukami e Gramsci,
procedendo a um estudo qualitativo do tipo etnográfico, por meio de entrevistas semi-
estruturadas, observação de campo e análise documental. Verificou-se que a escola
apresenta em seu Projeto Pedagógico uma forte tendência tradicional liberal, e nas falas
dos sujeitos envolvidos na pesquisa (pais, professores e colaboradores) há forte crença
na escola como possibilitadora de sucesso e ascensão social dos educandos, o que
estimula o depósito de todas as expectativas nesse sentido na escola.
A autora, por meio dos autores que baseiam teoricamente seu trabalho, define a
escola como socialmente destinada à transmissão do conhecimento acumulado pela
humanidade para as novas gerações. Buscando em Libanêo e Mizukami, formas de
caracterizar cada uma das tendências/abordagens pedagógicas e sua função social,
entende-as nos níveis micro, meso e macro como uma “teia de relações
caleidoscópicas”.
Por buscar pontuar e significar a função social da escola, o trabalho de Gianotti
(2006), estabelece relação com o interesse de pesquisa aqui apresentado por conceituar
20
a função social da escola, qual seja, a transmissão de conhecimento socialmente
acumulado pela humanidade, função essa que precisamos conhecer e definir para
responder um dos questionamentos desta pesquisa: se houve ou não mudança da função
social da escola a partir da exigência da condicionalidade Educação do PBF?
Os trabalhos que se seguem não tratam especificamente o Programa Bolsa
Família, mas têm por objetivo compreender algumas mudanças ocorridas ou não na
escola e na sua “função” a partir da execução de políticas educacionais, os artigos
pontuam a transformação do Estado provedor em diagnosticador/gerenciador e a escola
como executora dessas políticas educacionais.
Esses trabalhos foram escolhidos por destacarem o contexto e as influências da
ideologia neoliberal na implantação das políticas educacionais e consequentemente
políticas assistenciais como o Programa Bolsa Família (PBF).
A ideologia neoliberal pode ser definida como um liberalismo econômico, que
exalta o mercado, a concorrência e a liberdade de iniciativa empresarial, rejeitando de
modo agressivo, porém genérico e vago a intervenção do Estado na economia e na
sociedade (BOITO, Jr. 1999):
A ideia de plenitude individual no sentido de que o indivíduo é o
único responsável por seu fracasso ou sucesso social, a liberdade
como condição necessária ao progresso individual e
consequentemente coletivo, a implantação gradual, mas
significativa do Estado mínimo uma vez que os sujeitos são
convidados junto com as organizações sociais a resolver problemas
que diz respeito ao poder e a obrigação do Estado e a propriedade
como direito natural do homem, preparam o ambiente para
implementação de políticas educacionais e sociais, uma vez que
esse contexto de individualismo econômico baseado na oferta e na
procura, aumenta as desigualdades sociais o que exige ações para
diminuição dessas desigualdades pelo Estado (p. 37).
Nessa perspectiva, os autores destacados trazem em seus trabalhos análises
acerca dos pressupostos economicistas, reorientação das prioridades do Estado e a
redução e eficiência de seus gastos. O Estado passa a ser gerenciador e não mais
provedor do bem estar social, e os agentes e atores da educação como “salvadores da
pátria”- presente na educação na década de 1990, período de inauguração do
neoliberalismo no Brasil, por meio do governo de Fernando Henrique Cardoso.
21
Libanori e Rical (2011) tiveram como objetivo a análise das concepções que
fundamentam as parcerias intersetoriais em cinco programas da Secretaria Estadual de
Educação de São Paulo, implementados desde 1995 até 2008: Escola da Família;
Desenvolvimento de Cultura de Paz no Estado de São Paulo; Superação Jovem; Justiça
e Educação: Parceria para Cidadania; Escola em Parceria e comunidade Presente.
Procurou-se compreender a concepção e papel assumido pela unidade escolar na
execução desses programas.
Para o trabalho foram analisados documentos de criação e publicidade dos
programas a partir de três fases: (1) levantamento de programas; (2) análise do conteúdo
e seleção das categorias de análise e (3) análise dos documentos a luz das categorias
selecionadas.
Os programas selecionados têm em comum o fato de: se realizarem no âmbito da
educação; terem como público alvo os jovens; apontarem para participação da
comunidade e terem os mesmos objetivos partilhados pelas Organizações Sociais (OSs)
que foram chamadas para parceria.
Vale ressaltar que as parcerias são apresentadas como uma forma de partilha de
responsabilidade de execução das políticas públicas com a sociedade civil ou com a
comunidade. Se, por um lado, nos programas, é reconhecida a responsabilidade do
governo das políticas públicas de educação, saúde e promoção social, ela se restringe ao
diagnóstico dos problemas e planejamento das ações a serem desenvolvidas. A
responsabilidade pela execução é compartilhada com a sociedade, que é chamada à
participação e, portanto, deve ser capacitada para agir e implementar programas.
A análise dos programas permite concluir que a função dos mesmos é, em
grande parte, pedagógica, porque pretende ensinar os participantes a se comportarem
como cidadãos, no sentido de conseguir resolver problemas sociais, assumindo o papel
que deveria ser ao Estado.
Sendo a escola o espaço mais viável para essa aprendizagem, o que se percebe é
uma possível mudança de função social da escola a partir da entrada das políticas
educacionais, de oferecedora de conhecimento à promovedora de parcerias para
capacitar os seus sujeitos para lidar com situações que compete ao Estado.
22
Concomitantemente verifica-se que as políticas realizadas nos programas da
Secretaria Estadual de Educação do Estado de São Paulo (SEESP), podem ser
caracterizadas como compensatórias, isto é, buscam remediar desequilíbrios localizados
e pontuais gerados pelo desenvolvimento econômico e a desigualdade social, isto é, não
há uma política educacional global. A política educacional realiza-se por meio de ações
sociais; as organizações sociais não se apresentam apenas como parceiras de execução,
mas principalmente como agentes de elaboração e que há disseminação de uma nova
concepção do papel da escola, que passa agora a exercer o papel de executora de
projetos sociais do Estado.
As conclusões de Libanori e Riscal (2006) convergem com o interesse de
pesquisa aqui apresentado, uma vez que temos como hipótese que a condicionalidade
Educação do PBF também provocou mudanças significativas em uma das funções
sociais da escola, ou seja, o oferecimento de conhecimento formal e científico.
Ramos (2010) teve por intuito analisar histórica e politicamente a materialização
da lógica da reforma do Estado Paulista, por meio de apresentação de suas ações no
campo político-educacional a partir de 1995, que a despeito de sua aparência
pedagógica trazia em seus fundamentos alguns pressupostos economicistas muito
coerentes aos próprios pressupostos da Reforma do aparelho do Estado brasileiro.
Faz-se necessário ressaltar que tal reforma guiou-se por uma lógica
economicista, tendo como pontos estratégicos a reorientação das prioridades do Estado:
a redução e eficiência de seus gastos; redistribuição de funções e verbas entre suas
instâncias federadas; sua atuação focalizada; seu controle de resultados; a associação
qualidade-produtividade em suas ações e a focalização do funcionário público como
dinamizador e responsável pelos resultados desse processo.
Foram utilizados como instrumentos metodológicos a revisão bibliográfica e a
análise documental de discursos proferidos no período do governo de Fernando
Henrique Cardoso e seus filiados.
Conclui-se que a reforma praticada na educação escolar paulista, pós-1995, e o
desejo de mudança na concepção pedagógica sinalizada pela Secretaria Estadual de
Educação (SEE), não resultaram fundamentalmente de uma concreta busca de melhorias
23
em relação à qualidade educacional presentes nos discursos, manifestos e documentos
então elaborados.
Tais propostas revelaram-se mais como pretextos, com origens e finalidades
econômicas, que como metas efetivas consoantes as necessidades prementes e concretas
do ensino fundamental paulista.
O percurso e as conclusões do estudo de Ramos (2010) contribuem com
ampliação do nosso olhar sobre a escola, pontuando-a como espaço permeado de “boas
ideias” que nem sempre tem o intuito de melhorá-la, e sim torná-la mais eficiente e
econômica, incutindo em seus atores o dever de salvador da pátria, o que de alguma
forma também pode ser a realidade e/ ou a intencionalidade do PBF.
O último trabalho escolhido na pesquisa até aqui realizada foi o de Vieira
(2011), que teve como intuito a construção de um referencial teórico para analisar os
atuais processos de reestruturação do Estado e as consequências dessa reestruturação
para as políticas educacionais, mais do que tratar as teorias que alicerçam processos do
neoliberalismo, terceira via, globalização entre outros. A autora buscou considerar
diretamente a concepção que embasa a reforma e como o Estado passou a ser gerido: o
gerencialismo.
Para isso, utilizou centralmente as contribuições de John Clarke e Janet Newman
no livro The Managerial State: power, politics and ideology in the remaking of Social
Welfare (1997) em que os autores examinam as novas formas de administração e
gerenciamento do Estado contemporâneo e, nesse processo, oferecem inúmeros
conceitos chave para aqueles, como nós, envolvidos em entender e analisar as políticas
públicas em educação.
Em seguida, a autora faz o levantamento histórico para pontuar a passagem do
Estado de bem-estar social para o Estado Gerenciador destacando o discurso da Nova
Direita, que afirmava a necessidade de reestruturar o Estado em termos econômicos,
aplicando doutrinas de controle fiscal, mas a novidade é um pensamento econômico que
vê os gastos públicos como algo que impedia a viabilidade competitiva de indivíduos,
empresas e da própria nação.
24
Em relação à educação, a situação desesperadora enfrentada cotidianamente nas
escolas por professores e estudantes é vista como resultado de uma má gestão e
desperdício de recursos por parte dos poderes públicos, como falta de produtividade e
esforço por parte dos professores e gestores educacionais, como consequência de
métodos “atrasados” e ineficientes de ensino e de currículo inadequados e anacrônicos.
É nesse contexto de “fracasso escolar” e exigência da Nova Direita que surge a
ideia de Estado gerenciador no sentido de diagnosticador de problemas demandando aos
diferentes grupos da sociedade as soluções, ou seja, não mais “fornecer serviços”, mas
principalmente gerenciar estes por meio de políticas.
Uma vez que atribuiu seu poder de provedor a diversas instâncias, essa nova
reestruturação do Estado compromete a transparência de sua governabilidade e aumenta
a burocracia já que estabelece metas e objetivos claros a serem alcançados, o que dá a
ideia de eficácia, pois a sociedade e o próprio governo podem verificar se tais objetivos
foram atingidos (Vieira, 2011).
O estudo conclui a partir do interesse de construir um referencial teórico, que a
avaliação passou a ser um elemento central do estado gerencial: essa é a forma de
controle que o Estado gerencialista exerce ao invés de controlar/avaliar o processo, o
gerencialismo focaliza o resultado. Na educação as avaliações escolares passaram a ser
uma exigência do Banco Mundial para liberação de empréstimos para o país.
Concomitantemente, constatou-se que as políticas públicas não são frutos apenas
das ideias que alicerçam o Estado e dos grupos hegemônicos que o compõe, o que
significa dizer que elas não são implementadas de forma direta e sem nenhuma
resistência nas escolas: há também a ação de sujeitos que estão nas instituições
escolares e que vão, em certa medida, reformular muitas dessas políticas. A análise de
políticas públicas precisa levar em conta essas mediações se quer dar conta da
complexidade de sua concepção, circulação e implementação.
Esse estudo mostra, mais uma vez a mudança do Estado de provedor a
gerenciador do bem estar social. De certa forma, há consequências dessa mudança na
escola, que passa a ter um de seus importantes instrumentos, a avaliação, como forma
25
de controle do Estado sobre a escola, e não mais como ferramenta de análise para
possíveis progressos.
Tal ideia, pode denotar a política pública como modificadora do espaço escolar,
aspecto que pode ser convergido ao objetivo de pesquisa deste trabalho, uma vez que se
busca verificar se ocorreu mudança da função social da escola a partir da
condicionalidade Educação do Programa Bolsa Família que é também uma política
pública.
Com a pesquisa realizada até aqui, nos trabalhos já divulgados, pode-se entender
que o Programa Bolsa Família foi analisado a partir de diferentes aspectos normalmente
relacionados ao rendimento escolar e a melhora nas condições de vida dos beneficiários,
o que contribui para o nosso tema de pesquisa no sentido de mostrar um panorama
social e educacional do programa.
No entanto, nenhum dos trabalhos encontrados analisa a possível mudança de
concepção da função social da escola a partir das exigências do aspecto educacional do
PBF, o que pode demonstrar a relevância e contribuição científica e social do nosso
trabalho, uma vez que queremos desvendar o olhar dos beneficiários acerca da escola,
como eles veem a escola e o que esperam ou entendem que podem esperar dela a partir
da exigência educacional do programa, sistematização de conhecimento formal e
científico ou assistência social.
Pretende-se com essa pesquisa responder o seguinte problema: Com a
implantação do Programa Bolsa Família (PBF), a escola passa a ter outra função social
que não a de transmitir conhecimento?
Para nortear a temática de dualidade da função social da escola do nosso
problema de pesquisa decorrem as seguintes questões:
Qual é o valor atribuído à instrução e a transmissão do conhecimento por
pais e professores?
Para os pais e professores o que tem sido priorizado na escola: o ensino
ou a efetivação do Programa Bolsa Família?
26
O Programa Bolsa Família alterou uma das funções sociais da escola,
qual seja a transmissão do conhecimento?
Temos como objetivo geral da pesquisa o interesse de investigar se houve
mudança na concepção de uma das funções sociais da escola, qual seja oferecimento de
conhecimento formal/científico, para outra função, a partir do aspecto educacional do
Programa Bolsa Família (PBF).
E como objetivos específicos para melhor compreender e responder o problema
e seus questionamentos derivam os seguintes pontos:
Identificar as demandas dos beneficiários do PBF em relação à escola, se
essas dizem respeito ao ensino ou ao benefício;
Verificar junto aos pais as expectativas para ingresso e permanência na
escola;
Conhecer e analisar as impressões dos pais acerca da obrigatoriedade de
frequência mínima à escola e sua relação com a função atribuída à escola
especialmente instrução ou outra função;
Reconhecer a função social da escola por meio do seu Projeto Político
Pedagógico (PPP).
Para pensar a função social da escola teoricamente falando, primeiramente fez-se
necessário reconhecer o processo histórico pelo qual passou, passa e sempre passará a
educação, uma vez que ela é histórica, dialética e contínua, isto é, corresponde a seu
tempo, seu meio e a realidade a qual está inserida (Durkheim, 1965).
Partindo desse pressuposto, o referencial teórico deste estudo baseia-se nos
conceitos de escola e educação presentes nos estudos de Teixeira (1971), Fernández
(1989), Sacristán e Gómez (1998), Hamilton (2001), Tenti (2007), Young (2007).
A hipótese central desta pesquisa pressupõe que o aspecto educacional do
Programa Bolsa Família tem provocado mudança na concepção da função social da
escola, tornando-a controladora deste beneficio, enviesando sua função principal de
provedora de conhecimento.
27
Com intuito de analisar tal hipótese, faz-se necessário conhecer e definir os
sujeitos e a escola que possui as características que atendam ao objeto de pesquisa, ou
seja, ter o maior número beneficiários do PBF.
Nesse sentido definiram-se os seguintes procedimentos de pesquisa:
Buscar junto a Delegacia Regional de Ensino do Butantã (DRE-BT) as
escolas que mais possuem beneficiários do programa4;
Visitar a escola e apresentar a pesquisa;
Elaborar um instrumento de pesquisa do tipo questionário com questões
abertas e fechadas para os professores e entrevista para pais e secretários
da escola;
Consultar o Projeto Político Pedagógico da escola a fim de conhecer a
função social da escola.
Para apresentação da pesquisa, este trabalho está dividido em quatro capítulos. O
primeiro trata do Programa Bolsa Família contexto social e histórico de implementação
e realização. O segundo traz o que entendemos por função social da escola e o
referencial teórico. O terceiro caracteriza a escola, os procedimentos de pesquisa
utilizados, e análise dos dados coletados. O quarto é constituído pelas considerações
finais, anexos com os questionários, roteiro de entrevista e outros documentos.
4 Faz-se necessário destacar que a escolha da Delegacia de Ensino do Butantã (DRE-BT) e a escola aqui
pesquisada, foi norteadas pelo acesso aos dados necessários a pesquisa, pela quantidade de beneficiários
desta escola e pela atuação da pesquisadora em uma das escolas dessa DRE.
28
CAPÍTULO 1 – O Programa Bolsa Família e a condicionalidade Educação
“Todo cambio em um campo social determinado (la economia, la
ciencia y la tecnologia, la estrutura social, la cultura, la política y
otros) “se siente” em la escuela” (TENTI, 2007, p.15).
Partindo do pressuposto que a escola lida com toda complexidade social de uma
sociedade, para compreender o porquê esta instituição trabalha com políticas de
assistência como o Programa Bolsa Família (PBF) faz-se necessário olhar para fora
dela, para demandas sociais as quais ela atende:
[...], és difícil comprender lo que sucede em el interior de las
instituiciones si no se presta atención a lo que sucede em el ámbito
más general de la sociedade” (TENTI, 2007, p.15)
As transformações ocorridas na década de 1990 a partir das reformas e
mudanças no âmbito escolar, a consolidação do neoliberalismo no governo de Fernando
Henrique Cardoso (FHC), o desenvolvimento do capitalismo que produziu uma
crescente exclusão social, multiplicando as formas de pobreza e instituindo a
meritocracia que homogeneizou o que era heterogêneo, dando a ideia de que todos são
iguais e aptos a conquistar tudo, e se não o fazemos é porque nossos esforços não foram
suficientes (RAMOS, 2010).
Trouxeram para escola demandas antes não cuidadas por ela, as famílias, os
alunos e os docentes vivem cotidianamente as consequências desse conjunto de
fenômenos expressados pela exclusão social, o caráter massivo da exclusão e
escolarização gera entre outras coisas, uma crise do sentido tradicional da escola, ou
seja, os alunos podem passar anos nela, mas não necessariamente desenvolveram as
capacidades básicas de leitura e cálculo (entre outras aprendizagens), todavia na medida
do possível foram assistidos em suas necessidades sociais e certificados ou intitulados
pelo tempo passado na escola (TENTI, 2007).
Outra justificativa para tais políticas está pautada na concepção de que a
capacidade de aprender não é um caso absoluto, e sim relativo, ou seja, todas as crianças
são capazes de aprender desde que lhes ofereça as oportunidades de aprendizagem
pertinentes e adequadas as suas condições materiais, sociais e psíquicas. Nesse sentido,
29
o desenvolvimento escolar exige condições sociais básicas que variam do comer ao
cuidar-se (TENTI, 2007).
Com intuito de atender as demandas de inclusão social, diminuição da pobreza e
vulnerabilidade social e garantir o acesso e a permanência na escola, as instituições de
ensino estão repletas de políticas públicas educacionais ou não, que variam desde a
entrega de leite para complementação alimentar até o acompanhamento de frequência
escolar para recebimento de benefícios de transferência direta de renda como é o caso
do Programa Bolsa Família (aspecto educacional do mesmo) aqui pesquisado.
Nessa perspectiva, o Programa Bolsa Família (PBF) nasceu da política de
combate à fome – Programa Fome Zero - iniciada em 2003, primeiro ano do primeiro
mandato do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, os programas de distribuição de renda
existentes – Bolsa Escola, Bolsa Alimentação, Auxílio Gás e Cartão Alimentação –
foram unificados pela Medida Provisória nº 132 de outubro de 2003, depois
transformados na Lei 10.832 de janeiro de 2004 que foi regulamentada pelo Decreto
5.209 de setembro de 2004 (SANTOS, 2010).
Pode ser definido como um programa de transferência direta de renda que
beneficia famílias em situação de pobreza e de extrema pobreza em todo o país, integra
o Plano Brasil Sem Miséria (BSM), que tem como foco de atuação os 16 milhões de
brasileiros com renda familiar per capita inferior a R$ 70 mensais, e está baseado na
garantia de renda, inclusão produtiva e no acesso aos serviços públicos,
Possui três eixos focados na transferência de renda, condicionalidades e ações e
programas complementares, seus principais objetivos são:
Promover o alívio direto da pobreza, por meio da transferência direta da
renda à família;
Reforçar o exercício de direitos sociais básicos nas áreas de Saúde e
Educação, por meio do cumprimento das condicionalidades, o que
contribui para que as famílias consigam romper o ciclo de pobreza entre
gerações;
Coordenar programas complementares que tem por objetivo o
desenvolvimento das famílias, de modo que os beneficiários do Bolsa
30
Família consigam superar a situação de vulnerabilidade e pobreza. São
exemplos de programas complementares: programa de geração de renda,
de alfabetização de adultos, de fornecimento de registro civil e demais
documentos (BRASIL, MDS, 2013).
Dos objetivos acima destacados, o que mais nos interessa é o segundo, que
relaciona o PBF com os serviços públicos de Saúde e Educação (mais especificamente o
que tange a educação) por meio das condicionalidades, isto é, cumprimento de
condições nesses setores para ser beneficiário do programa.
As condicionalidades podem ser definidas como os compromissos assumidos
tanto pelas famílias beneficiárias do Programa Bolsa Família quanto pelo poder público
para ampliar o acesso dessas famílias a seus direitos sociais básicos. Por um lado, as
famílias devem assumir e cumprir esses compromissos para continuar recebendo o
benefício. Por outro, as condicionalidades responsabilizam o poder público pela oferta
dos serviços públicos de saúde, educação e assistência social (BRASIL, MDS, 2013).
Na área de saúde, as famílias beneficiárias assumem o compromisso de
acompanhar o cartão de vacinação e o crescimento e desenvolvimento das crianças
menores de 7 anos. As mulheres na faixa de 14 a 44 anos também devem fazer o
acompanhamento e, se gestantes ou nutrizes (lactantes), devem realizar o pré-natal e o
acompanhamento da sua saúde e do bebê (BRASIL, MDS, 2013).
No campo educação, o qual nos interessa neste trabalho, determina que todas as
crianças e adolescentes entre 6 e 15 anos devem estar devidamente matriculados e com
frequência escolar mensal mínima de 85% da carga horária no caso dos estudantes entre
16 e 17 anos devem ter frequência de, no mínimo, 75% (BRASIL, MDS, 2013).
De acordo com a Portaria Interministerial MEC/MDS nº 3.789 de 17 de
novembro de 2004, a associação da transferência de renda ao “direito básico à educação
e permanência na escola” constitui um fundamento do Programa Bolsa Família, o
documento considera ainda que a educação é um elemento fundamental para inclusão
social das famílias beneficiadas:
Considerando que a concretização do direito à educação
compreende a responsabilidade tanto por parte do Estado quando
da sociedade e dos indivíduos, cabendo a União, Estados, Distrito
31
Federal e Munícipios o papel de oferecer os serviços de educação
de forma digna e com qualidade, elemento fundamental para
inclusão social das famílias beneficiadas, (BRASIL, MEC, 2010).
Segundo a lógica do discurso governamental, a educação é um elemento
fundamental para inclusão social. Deste modo o Programa Bolsa Família é uma politica
pública que pressupõe que o acesso à educação e a permanência na escola possibilitaria
a inclusão social das famílias atendidas.
Tal discurso pode denotar mudança na função social da escola e
simultaneamente eximir o Estado e o governo de suas obrigações para com a sociedade,
pois sabemos que a educação formal dá direito a outros direitos, produz riquezas e
contribui para diminuição da pobreza, todavia a mudança na estrutura deve ser
considerada no processo de inclusão social.
O PBF funciona de forma articulada com estados e municípios e, segundo dados
do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS), já está
implementado em 100% dos municípios, atendendo 67% das famílias mais pobres,
possui seis tipos de beneficio: o básico, o variável, o variável vinculado a adolescente, o
variável à gestante, o variável à nutriz e o benefício para superação da extrema pobreza.
Os valores podem variar de R$ 32,00 a R$ 306,00 de acordo com a renda e a
composição familiar:
O Benefício Básico, de R$ 70,00 (setenta reais), é pago as famílias
consideradas extremamente pobres, aquelas que a renda mensal de
até R$ 70,00 (setenta reais) por pessoa (pago às famílias mesmo
que elas não tenham crianças adolescentes ou jovens).
O Benefício Variável, de R$ 32,00 (trinta e dois reais), é pago às
famílias pobres, aquelas com renda mensal de até R$ 140,00 (cento
e sessenta reais) por pessoa, desde que tenham crianças e
adolescentes de até 15 anos, cada família pode receber até cinco
benefícios variáveis, ou seja, até R$ 160 (cento e sessenta reais).
O Benefício Variável Vinculado ao Adolescente (BVJ), de R$
38,00 (trinta e oito reais), é pago a todas as famílias do PBF que
tenham adolescentes de 16 e 17 anos frequentando a escola. Cada
família pode receber até dois benefícios, isto é, até R$ 76,00
(setenta e seis reais).
O Benefício Variável a Gestantes (BVG), de R$ 32,00 (trinta e
dois reais), é pago às famílias do PBF que tenham gestantes em sua
composição; pagamento de nove parcelas consecutivas a contar da
data do inicio do pagamento do benefício, desde que a gestação
tenha sido identificada no inicio da gestação até o nono mês.
32
Benefício Variável à Nutriz (BVN): R$ 32,00 (trinta e dois reais),
é pago às famílias do PBF que tenham crianças com idade entre 0 a
6 meses em sua composição; pagamento de seis parcelas
consecutivas, a contar da data do inicio do pagamento do benefício,
desde que a criança tenha sido identificada no Cadastro Único5.
Benefício para Superação de Extrema Pobreza (BSP),
calculado caso a caso, pago às famílias beneficiárias do PBF que
continuem em situação de extrema pobreza (renda mensal per
capita menor ou igual a R$ 70,00), mesmo após o recebimento dos
outros benefícios do PBF. O BSP independe da composição
família. (BRASIL, MDS, 2010).
Conforme o Ministério do Desenvolvimento Social (MDS), o cálculo do
benefício é feito conforme a renda e composição familiar e até maio de 2013 existiam
25.800.472 famílias inscritas no Cadastro Único para Programas Sociais, o que
corresponde a 82.488.661 pessoas cadastradas.
No que tange às condicionalidades e o acompanhamento da frequência escolar,
com base no bimestre de maio de 2013, atingiu o percentual de 91,47%, para crianças e
adolescentes entre 6 e 15 anos, o que equivale a 270.512 alunos acompanhados em
relação ao público no perfil equivalente a 295.737. Para os jovens entre 16 e 17 anos, o
percentual atingido foi de 75,36%, resultando em 32.415 jovens acompanhados de um
total de 43.013 (BRASIL, MDS, 2013).
O uso das condicionalidades na perspectiva do MDS não se limita ao controle,
mas aos conseguintes efeitos deste no benefício recebido pela família. O objetivo é
identificar e acompanhar com outras políticas sociais as famílias que se encontram em
maior vulnerabilidade:
Desse modo, a concepção de condicionalidade vai além do registro
e dos respectivos efeitos no benefício da família. É uma estratégia
para identificação das famílias que se encontram em maior
vulnerabilidade e risco social e requerem, portanto, a realização de
acompanhamento mais próximo por outras políticas (de saúde,
educação, assistência social, trabalho e geração de renda,
habitação, entre outras), de forma a serem atendidas em outras
5 É um instrumento do Governo Federal que identifica e caracteriza as famílias de baixa renda, entendidas
como aquelas que têm: renda mensal de até meio salário mínimo; ou renda mensal total de até três
salários mínimos.
33
dimensões determinantes das vulnerabilidades, além da
insuficiência de renda. (BRASIL, MDS, 2013).
Esta afirmação contribui de maneira significativa com discussão da hipótese
central dessa pesquisa de que com a entrada do Programa Bolsa Família na escola, a
função da mesma pode ter sido reconfigurada pelos pais, que passaram a esperar da
escola o controle da frequência escolar, um dos subsídios para o benefício e,
consequentemente, o acesso a outras políticas assistências ao invés da transmissão de
conhecimento.
A escola, pode ter se transformado, em porta de entrada para a vida social, o que
faz parte de suas funções, uma vez que é nela que estabelecemos as primeiras relações
sociais fora do núcleo familiar. Contudo não no sentido de provisão para vida em
sociedade, mas sim como espaço de suprimento direto de seus anseios
socioeconômicos.
Tenti (2007) relata no seu livro “La escuela y la cuestión social” exatamente essa
relação da escola com as questões sociais e as estratégias para lidar com essas, como é o
caso dos programas compensatórios que buscam diminuir a exclusão social e cultural do
aluno, dando a escola outro sentido e outras funções:
La escuela fue adquiriendo funciones no pedagógicas que em
muchos casos ocasionaron no pocas confusiones y discusiones
entre los maestros y la propia comunidade escolar;
[...]
La escuela tuvo que ceder parte del tiempo de aprendizaje para el
deserrollo de programas sociales destinados a la infância (TENTI,
p.132).
Ainda segundo o autor, ao ceder parte de seu tempo para o cuidado com os
programas compensatórios, a escola teve provavelmente dois efeitos aparentemente
contraditórios:
Por um lado, contribuyó a extender la cobertura, assistência y
permanencia em la escuela. Por el outro, puede haber afectado el
logro de adecuados niveles de rendimento escolar (aprendizajes
significativas) (TENTI, 2007, p. 132).
Ambas as ideias embasam nosso problema de pesquisa, pois acreditamos que o
acúmulo de políticas de assistência pode declinar e sobrecarregar a função social da
escola de oferecimento de ensino e sistematização de conhecimento formal e científico.
34
A escola como instituição especializada, no sentido de estar voltada para o
ensino e aprendizagem, não é a mesma escola que se preocupa e trabalha com as
políticas de assistência e outras demandas sociais, além do oferecimento de
conhecimento.
Nesse sentido é necessário utilizar outros dispositivos institucionais a fim de
garantir a satisfação das necessidades básicas para o desenvolvimento do trabalho
pedagógico. Dessa forma, a escola teria a responsabilidade exclusiva de cumprir com
sua função de transmitir conhecimento às novas gerações (TENTI, 2007).
Reconhecemos, então, que a escola está permeada pelas questões sociais e por
políticas de assistência que as atende, todavia acreditamos e defendemos a ideia de que
seria importante haver uma instituição responsável por tais cuidados para que a escola
pudesse cumprir com mais eficiência e imparcialidade sua função de transmissão de
conhecimento.
35
CAPÍTULO 2 – Escola e suas funções sociais
2.1. O que entendemos por função social da escola?
Antes de falarmos dos autores, base para nossa interpretação dos dados acerca da
função social da escola, faz-se necessário definirmos o que entendemos por função
social da escola.
Ao longo da história, como veremos, detalhadamente no próximo tópico, a
escola possuiu diferentes funções no tempo e no espaço, tais como: socialização,
instrução, domesticação da humanidade, preparação para o trabalho, formação para vida
pública, controle dos indivíduos “perdidos e sem causa”, entre outras.
Todavia, entendemos a escola como uma instituição educativa especializada,
nisto se distingue da família, dos clãs familiares, dos locais de trabalho, das
comunidades de ofício, de associações e de grupos de todo tipo. A escola é uma
invenção de indivíduos que vivem em sociedade; se separa das instâncias educativas
não-especializadas porque é consequência de estruturas sociais complexas que
englobam essas instâncias de base. (PETITAT, 1994).
Portanto, não aprendemos no seio familiar ou em outras situações sociais e de
interação o que a escola deve nos ensinar, isto é, nos transmitir o conhecimento
poderoso (YOUNG, 2007).
Para Young (2007), as escolas são instituições com propósito específico de
promover a aquisição do conhecimento, elas capacitam ou podem capacitar jovens a
adquirir o conhecimento que, para a maioria deles, não pode ser adquiridos em casa ou
em sua comunidade, e para os adultos em seus locais de trabalho. A ideia é que a escola
é, primordialmente, um agente de transmissão cultural ou de conhecimento poderoso.
O conhecimento poderoso do qual Young (2007) nos fala pode ser definido
como:
Conceito que não se refere a quem tem mais acesso ao
conhecimento ou quem o legitima, embora ambas sejam questões
importantes, mas refere-se ao o que o conhecimento pode fazer,
como, por exemplo, fornecer explicações confiáveis ou novas
formas de pensar a respeito do mundo [...] é o conhecimento
especializado [...] conhecimento independente do contexto ou
36
conhecimento teórico – desenvolvido para fornecer generalizações
julgamentos e é geralmente, mas não unicamente relacionado às
ciências. É esse conhecimento independente de contexto que é,
pelo ao menos potencialmente, adquirido na escola e a ele que me
refiro como conhecimento poderoso. (p.1296).
Partilhamos da mesma ideia de Young (2007), e acreditamos que a função
necessária da escola, nos dias atuais, seria a de oferecer esse conhecimento poderoso –
especializado e teórico - para ajudar as novas gerações a lidar com o mundo e suas
mudanças contínuas. Contudo, o que temos hoje, são escolas esvaziadas de
conhecimento, que reconfiguram sua função dia-a-dia a partir das exigências sociais das
políticas de assistências, que faz pais, governantes e inconscientemente alunos,
esperarem da escola ações (informações e controle) para conceder ou não benefícios ao
invés de conhecimento.
As formas contemporâneas de responsabilidade estão ameaçando enfraquecer as
fronteiras entre o conhecimento escolar e o não-escolar, com a alegação de que essas
fronteiras inibem o currículo mais acessível e economicamente mais relevante
(YOUNG, 2007).
Documentos da UNESCO (Organização das Nações Unidas para Educação, as
Ciências e Cultura), retratam bem essa reconfiguração e esvaziamento do conhecimento
poderoso da escola. Os quatro pilares da educação deixam claro que escola não é lugar
de transmissão de conhecimento, uma vez que o conceito de educação ao longo da vida
supera a distinção tradicional de conhecimento inicial, para conhecimento permanente
em resposta ao mundo em rápida transformação:
Parece-nos que é imperativo impor o conceito de educação ao
longo da vida com suas vantagens de flexibilidade, diversidade e
acessibilidade no tempo e no espaço. É a ideia de educação
permanente que deve ser, simultaneamente, reconsiderada e
ampliada; com efeito, além das necessárias adaptações
relacionadas com as mudanças da vida profissional, ela deve ser
uma construção contínua da pessoa, de seu saber e de suas
aptidões, assim como de sua capacidade para julgar e agir. Ela
deve permitir que cada um venha a tomar consciência de si próprio
e de seu meio ambiente, sem deixar de desempenhar sua função na
atividade profissional e nas estruturas sociais (DELORS, 2010, p.
8);
É claro que acreditamos também no conhecimento como algo não acabado,
pronto e inflexível, pois é formado diariamente pelas nossas experiências individuais e
37
coletivas, porém existem conhecimentos formais acumulados ao longo da história da
humanidade que nos ajudam a lidar e a formar esse conhecimento contínuo. É esse
conhecimento que esperamos encontrar na escola, servindo-nos até mesmo para
compreender as próprias mudanças escolares.
Outro ponto que demonstra bem o interesse político, econômico de uma escola
esvaziada de conhecimento, é a ideia propagada pelos quatro pilares de educação,
baseada na aprendizagem individual do sujeito em prol da boa convivência no mundo,
sem interferência direta de segundos:
1º Aprender a conviver, desenvolver o conhecimento a respeito dos
outros, de sua história, tradições e espiritualidade, perceber nossa
crescente interdependência;
2º Aprender a conhecer, ter acesso aos processos científico e as
novas formas de atividade econômica e social, cultura geral que
constitui de algum modo, o passaporte para uma educação
permanente, à medida que fornece o gosto, assim como as bases,
para aprender ao longo da vida;
3º Aprender a fazer, aprendizagem continuada de uma profissão,
convém adquirir, de forma mais ampla, uma competência que torne
o individuo apto a enfrentar numerosas situações, algumas da quais
são imprevisíveis, além de facilitar o trabalho em equipe que,
atualmente, é uma dimensão negligenciada pelos métodos de
ensino.
4º Aprender a ser, capacidade de autonomia e discernimento,
acompanhada pela consolidação da responsabilidade pessoal na
realização de um destino coletivo. (DELORS, 2010, p. 13 e 14)
Como podemos constatar, as ideias presentes nos quatro pilares da educação vão
ao encontro de com os ideais neoliberais de responsabilização do sujeito por todo seu
sucesso ou fracasso social, econômico e educacional. A preocupação com uma possível
escola de qualidade cheia de ‘conhecimento poderoso’ só aparece no segundo pilar,
mesmo assim, de forma generalista e de senso comum. Não conseguimos enxergar
nesse texto as funções sociais da escola e de seus atores como professores, gestão e
alunos; a ordem é aprender a aprender não importa como, com quem, nem onde.
O indivíduo passa a ser quase que unicamente responsável pela sua
aprendizagem, a escola e o conhecimento “contido” nela pode se tornar elemento
secundário, ideia de enfraquecimento das fronteiras entre o conhecimento escolar e não-
escolar (YOUNG, 2007).
38
Afinal, não queremos ser ingênuos de pensar a escola despregada da realidade
social que a cerca, assim sabemos que a escola não é uma instituição pura e neutra, mas
sim um local de tensões, por lidar com a diversidade biopsicossocial dos sujeitos,
todavia se mostra cada vez mais necessário retomar, relembrar ou quem sabe deixar
mais claro que função essa escola tem, para torná-la um instrumento de transformação
social pelo conhecimento.
2.2. Funções sociais da Escola ao longo da História
“A função da escola diz respeito à relação entre educação, escola e sociedade”
(Caldart, 1988)
Pensar a função social da escola, exige o reconhecimento do processo histórico
pelo qual passou, passa e sempre passará a educação, uma vez que ela é histórica,
dialética e contínua, correspondendo a seu tempo, a seu meio e à realidade a qual está
inserida (Durkheim, 1965).
Esse espírito transformador e contínuo de vir a ser da escola nos remete ao
desafio de conhecer a função social da escola ao longo da própria história humana, pois
se a humanidade está em processo evolutivo, a educação que a serve também, ou seja,
historicamente a escola se refaz a partir das demandas sociais de seu tempo.
Nesse sentido, destacamos alguns autores que discorrem sobre escola, educação
e a sua relação com a sociedade a fim de construir o conceito de função social da escola
e, consequentemente utilizá-lo para responder ao problema desta pesquisa. São eles:
Teixeira (1971), Fernández (1989), Sacristán e Gómez (1998), Hamilton (2001), Tenti
(2007) e Young (2007).
De todo trabalho desenvolvido por Hamilton (2001), em “Notas de Lugar
Nenhum”, as considerações mais necessárias e condizentes com esta pesquisa diz
respeito à desconstrução do ideal romântico de criação da escola, de que esta surgiu de
pensamentos bem definidos e objetivos sólidos.
De acordo com o autor, as escolas da Idade Média Inglesa surgem exatamente
do contrário, ou seja, de uma sucessão de fatos aleatórios e sem precedentes:
39
As escolas da Inglaterra Medieval devem ser lembradas, talvez não
como sementeiros cuidadosamente organizados da escolarização
moderna, mas ao contrário, em termos evolucionários, como os
chamados esportes não domesticados (variações acidentais ou
anormais). Essas escolas foram muito mais precursores mal
nutridos do que robustos arautos da escolarização moderna. Não
sobreviveram intactas. Ao invés, foram significativamente
obliteradas por outros desenvolvimentos da sociedade
(HAMILTON, 2001, p.51);
Uma das motivações da criação da escola foi a necessidade de instrução, isto é, o
emprego dos usos e costumes domésticos não eram mais suficientes para viver em
sociedade, exigiam-se agora alguns ensinamentos que transpunham a família e a
educação feita no seio dela, situações educacionais como o uso do livro-texto, o
currículo, a catequese, a disciplina e a didática confeririam identidade cultural tanto à
escolarização moderna quanto à sociedade européia moderna (HAMILTON, 2001).
Consequentemente, o benefício do ensino reverberaria na Igreja e no Estado
(instituições fortes na época) – adequadamente organizado, o ensino escolar poderia
alcançar o “treinamento” de crianças tornando-as “instrumentos úteis de muita valia”
[na Igreja e no Estado]. E sem sustentação política proporcionada pelas instituições da
escolarização, o “Estado” definharia como “o corpo”, porque nenhum membro
desempenharia a função correta, ou seja, a criação da escola, não foi pensada a priori,
mas encontrou com facilidade na sociedade motivos e objetivos para se fazê-la.
Podemos dizer que a função social da escola, segundo Hamilton (2001), está
pautada na preparação de pessoas para vida social, por meio da instrução, o que não se
difere muito dos objetivos atuais da escola.
Outro autor que passeia pela história da educação e as possíveis funções sociais
da escola encontradas ao longo dela é Fernández (1989), que em seu livro “A face
oculta da escola” descreve os “hábitos de ensino”, desde as sociedades primitivas até a
sociedade capitalista, o que vai ao encontro da pesquisa aqui apresentada. Para perceber
se houve mudança na função social da escola, é preciso conhecer e compreender tal
função.
A primeira afirmação de Fernández (1989) está presente na maioria dos autores
que discorrem sobre a educação, escola e sua função social:
40
[...] sempre existiu algum processo preparatório para a integração
nas relações sociais, e com frequência, alguma outra instituição
que não a própria família em que se efetuou esse processo (p.105).
Socialmente falando, sempre existiu um processo que integrou novos indivíduos
a realidades antigas e, é a partir dessa afirmação que autor discorre os diferentes tipos de
educação ao longo da história, a começar pelas sociedades primitivas. Estas, por meio
de jogos ou fratrias de adolescentes, marcava seu desenvolvimento por algum rito de
iniciação, em alguns casos a responsabilidade da iniciação é dos adultos ou dos anciãos,
da família enquanto instituição.
Em seguida, destaca que na Roma arcaica a aprendizagem ocorria no seio
familiar na participação das atividades da vida adulta. O jovem acompanhava o pai no
trabalho da terra, no foro ou na guerra e a moça permanecia junto à mãe ajudando em
outras tarefas (FERNÁDEZ, 1989).
Na Idade Média, a educação também acontecia no seio familiar, só que com um
diferencial: após os sete ou nove anos os pais ingleses colocavam tanto meninos quanto
meninas, no duro serviço das casas de outras pessoas, as quais as crianças ficavam
vinculadas durante um período de sete a nove anos como aprendizes – desempenhando
todos os ofícios domésticos.
Acreditava-se que alguns hábitos só poderiam ser aprendidos no seio familiar
diferente do seu, pois o afeto presente na família progenitora poderia servir como
obstáculo a aprendizagem de independência e autodisciplina, por isso a escolha de
mandar os filhos a outras famílias – nesta época (Idade Média) já se retratava a
dificuldade das famílias em iniciar os jovens nas relações sociais existentes.
As escolas não eram muito apreciadas pelas famílias abastadas na Idade Média.
Serviam para aqueles que se tornariam copista ou algo similar e, a via de regra, à
aprendizagem, eram as “estadias” nas casas de outras famílias servindo e aprendendo
boas maneiras.
Essa espécie de intercâmbio familiar tinha lugar especial no artesanato.
Artesãos acolhiam um pequeno número de aprendizes estabelecendo com eles uma
relação de obrigações mútuas. O aprendiz estava obrigado a servir fielmente o mestre
não apenas na tarefa de ofício, mas no conjunto da vida doméstica e o mestre estava
obrigado a ensinar-lhe as técnicas do ofício, mas também alimentá-lo, vesti-lo, dar-lhe
formação moral e prepará-lo para converter-se em um cidadão e, com frequência, a
41
ensinar-lhe rudimentos literários ou enviá-lo a uma escola na qual pudesse adquiri-lo,
era uma relação de família ampliada sem laços consanguíneos (FERNÁNDEZ, 1989).
Nesse sentido, a aprendizagem e a educação tinham lugar como socialização
direta de uma geração por outra, mediante participação cotidiana das crianças nas
atividades da vida adulta e sem intervenção sistemática de agentes especializados que
representam hoje a escola.
Segundo Fernández (1989), o ideal educativo feudal não passava pelas letras,
mas por aprender a montar a cavalo, a usar armas e, talvez, a tocar um instrumento
musical.
Mas vale ressaltar que, numa época na qual as relações de produção eram
atravessadas de cima para baixo por relações sociais de dependência, a criança mandada
como aprendiz – servente à outra família - está aprendendo algo a mais que ofício ou
boas maneiras: está assimilando as relações sociais de produção.
E são das relações sociais de produção modificadas pela Revolução Industrial,
que surgem outros espaços de “aprendizagens ou de preparação” de indivíduos para
viver em sociedade como: o internato da infância marginal, workhouses, hópitaux,
Zuchthausen e outros voltados para mendigos, vagabundos, pícaros e órfãos despojados
de seu meio de vida no processo da Revolução Industrial (FERNÁNDEZ ,1989, p.108):
[...] haja colégios de meninos e meninas, desejando dar remédio à
grande perdição que de vagabundos, órfãos e crianças
desamparadas [...] porque é certo que ao se remediar estas crianças
perdidas põe-se obstáculos aos latrocínios, delitos graves e
enormes (VARELA, 1983, p. 240 FERNÁNDEZ, 1989)
Nesse sentido, a escola ou os espaços de “ensino” surgem da preocupação em
controlar e formar esses indivíduos aparentemente “perdidos e sem causa”
extremamente pré-dispostos a violência e a desobediência social, em sujeitos aptos ao
trabalho e a disciplina, ou seja, o essencial não era já pôr os vagabundos e seus filhos a fazer
um trabalho útil com vistas a sua manutenção, mas educá-los na disciplina e nos hábitos
necessários para trabalhar posteriormente (FERNÁNDEZ, 1989).
Para Fernández (1989), a expressão do desejo universal de escolarização das
crianças pobres é encontrada em muitos autores da época e significava muitas horas de
trabalho e alguma de instrução, num sistema de internato. Essas crianças a partir dos
quatro anos eram enviadas a uma casa de trabalho rural. Ali eram ensinadas a ler por
duas horas ao dia e mantidas plenamente ocupadas o resto seu tempo ao menos por doze
42
horas; assim esperava-se que a geração que estava crescendo estaria habituada à
ocupação constante que, em geral, lhe seria agradável e divertida.
Essas crianças eram “guloseimas” cobiçadas pelos industriais, devido à mão de
obra barata, e indiretamente, como futura mão de obra disciplinada e obediente. Os
orfanatos eram denominados como escola de formação para as fábricas e o ensino como
um todo, estava pautado na preparação para atuação social na sociedade industrial, ou
seja, indivíduos disciplinados, obedientes, eficientes e pontuais com conhecimentos
limitados apenas a fábrica e a sua realidade social:
Ninguém é obrigado a saber de tudo. O estudo das ciências em
geral é assunto daqueles que vivem confortavelmente e dispõem de
tempo livre. Os que têm empregos particulares devem entender as
funções; e não é insensato exigir que pensem e raciocinem apenas
sobre o que forma sua ocupação cotidiana (LOCKE, sd.:III, p. 225
apud FERNÁNDEZ, 1989).
[...] ensinassem a ler e a escrever pessoas que não necessitavam
mais que aprender a desenhar e manejar o buril e a serra, mas que
não querem continuar fazendo-o [...]. O bem da sociedade exige
que os conhecimentos do povo não se estendam além de suas
ocupações (CHARLOT e FIGEAT, 1985, p.84 apud
FERNÁNDEZ, 1989).
[...] Não precisamos de homens que pensam, mas sim de bois que
trabalhem (MURILLO, 1985, p.111 apud FERNÁNDEZ, 1989).
A educação começa a ser vista como uma estratégia valorosa para tornar os
homens aos moldes da sociedade vigente. Um instrumento idôneo. Não que as escolas
tivessem sido criadas necessariamente com este propósito (a priori as escolas foram
criadas para socialização direta de uma geração sobre a outra) (Fernández, 1989), nem
que já não pudessem ou fossem deixar de cumprir outras funções, mas simplesmente
estavam ali e se podia tirar bom partido delas. Os governantes e industriais perceberam
a importância e utilidade da escola para formação de sujeitos “ideais” a sociedade
industrial:
É expandindo as luzes entre o povo que se pode impedir que seus
movimentos se convertam em perigosos (CONDORCET, 1847,
p.447 apud FERNÁNDEZ, 1989)
[...] educá-los, mas não demasiadamente. O bastante para que
aprendessem a respeitar a ordem social, mas não tanto que
pudessem questioná-la. O suficiente para que conhecessem a
justificação de seu lugar nesta vida, mas não ao ponto de despertar
neles expectativas que lhes fizessem desejar o que estavam
43
chamados a desfrutar (NECKER, 1788, p.112 apud FERNÁNDEZ,
1989)
Desse modo, a escola serviria a população como ferramenta de assimilação das
novas relações sociais produzidas pela industrialização. Em seu interior estavam
presentes ideias e ideais da administração empresarial. Desde o tempo de estadia na
escola, as práticas escolares davam destaque a pontualidade, a disciplina e a eficiência.
Neste período, a escola aparecia como a melhor solução para todas as
resistências individuais e coletivas às novas condições de vida e trabalho ou, ao menos,
como a mais prudente e barata. Tratava-se de um recurso preventivo, se já não podia se
usar o chicote, devia-se recorrer à escola, para não perder o controle da mão de obra.
Assim como Hamilton (2001), Fernández (1989) conclui que as escolas de hoje
não são o resultado de uma evolução não conflitiva e baseadas em consensos
generalizados, mas o produto provisório de uma longa cadeia de conflitos ideológicos,
organizativos e, em um sentido amplo, sociais.
Todavia, é sempre mais conveniente apresentar a história da escola como um
longo e frutífero caminho, desde as presumidas misérias de ontem, até as supostas
glórias de hoje ou de amanhã, do que como um processo de domesticação da
humanidade a serviço dos poderosos.
Dessa conclusão podemos definir outro olhar sobre a função social da escola,
qual seja, a domesticação da humanidade a serviço dos poderosos, prepararando os
dominados para atuar segundo a vontade dos dominantes. Refletindo o exporto,
Nascimento (2003) relata que:
[...] as velhas e ultrapassadas práticas, hoje hegemônicas, as do
neoliberalismo na educação, das classes dominantes que sempre
pensaram que o tipo de educação oferecer-se-ia aos pobres e
miseráveis, uma forma de torná-los presos à coleira, obedientes,
submissos, humildes e prestativos nas horas necessárias (p. 5).
As considerações finais a qual Fernández (1989) chega pode parecer pessimista
e generalizadora, porém existem outros estudos que nos convencem que essa é uma das
possiblidades da função social da escola de ontem e de hoje, como os escritos de
Sacristán e Gómez (1998). Esses autores também fazem um panorama histórico da
escola e começa afirmando que a educação tem a função de socializar, hominizar e
humanizar.
44
Segundo esses autores, o processo educativo é o mecanismo utilizado pelas
gerações mais velhas sobre as mais novas para transmitir suas conquistas históricas –
artefatos, instrumentos, costumes, normas, códigos de comunicação e convivência, a
fim de garantir a sobrevivência do grupo.
Nos grupos humanos e sociedades primitivas, a educação dos membros mais
jovens acontecia pela socialização direta, isto é, na participação destes nas atividades da
vida adulta, mais tarde a socialização direta tornou-se ineficaz devido a aceleração do
desenvolvimento histórico das comunidades humanas, complexificação das estruturas e
a diversificação de funções e tarefas da vida nas sociedades.
Dessa dificuldade, surgem ao longo da história outras formas de especialização
no processo de educação ou socialização secundária – tutor, preceptor, academia, escola
religiosa, escola laica e outras, que conduziram aos sistemas de escolarização
obrigatória para todas as camadas da população nas sociedades industriais
contemporâneas.
A formação da sociedade industrial mudou o interesse de preparação das novas
gerações passando de mero apresto para vida em sociedade à participação no mundo do
trabalho e na vida pública, o que requereu a intervenção de instâncias específicas como
a escola, cuja função é atender e canalizar essa nova característica do processo de
socialização.
Sacristán e Gómez (1998) tomam a preparação para o mundo do trabalho como
objetivo básico e prioritário da socialização dos alunos na escola hoje, e destacam a
dificuldade de definir o que significa a preparação para o mundo do trabalho, como se
realiza esse processo, quais consequências têm na promoção da igualdade de
oportunidades ou mobilidade social, ou para reproduzir e afirmar as diferenças sociais
de origem dos indivíduos e grupos.
Uma vez que, a preparação para o mundo do trabalho requer o desenvolvimento
nas novas gerações, não só, nem principalmente de conhecimento, ideias, habilidades, e
capacidades formais, mas também da formação de disposições, atitudes, interesses e
pautas comportamentais – estas devem se ajustar às possiblidades e exigências dos
postos de trabalho e sua forma de organização em coletividades ou instituições,
empresas, administrações, negócios, serviços.
Nesse sentido, outra função do processo de socialização na escola trazida por
Sacristán e Gómez (1998) é a formação do cidadão para sua intervenção na vida
45
pública. A escola deve prepará-lo para que se incorporem a vida adulta e pública, de
modo que possa se manter a dinâmica e o equilíbrio nas instituições bem como nas
normas de convivência que compõem o tecido social da comunidade humana. Ou seja,
é na escola que os indivíduos aprendem seu lugar na sociedade, pois na esfera política,
efetivamente todas as pessoas têm, em princípio, os mesmos direitos; contudo na esfera
econômica, a primazia não é dos direitos da pessoa, mas os da propriedade. A escola se
encontra frente a demandas contraditórias no processo de socialização das futuras
gerações.
O processo de socialização nas instituições de ensino, deve ainda provocar o
desenvolvimento de conhecimentos, ideias, atitudes e pautas de comportamentos que
permitam sua incorporação eficaz no mundo civil, no âmbito da liberdade de consumo,
da liberdade de escolha e participação política, da liberdade e responsabilidade na esfera
da vida familiar. Características bem diferentes daquelas que requer sua incorporação
submissa e disciplinada, para a maioria, no mundo do trabalho (Sacristán e Gómez,
1998).
Assim a escola produz e reproduz conhecimentos e condutas, esta no meio de
todas as disposições e orientações sociais, possui uma ideologia flexível, frouxa,
eclética, que não apela para lógica da razão para sua legitimação, mas que se justifica
exclusivamente com a força do que existe, a aceitação e a consolidação do status quo,
da realidade que se impõe inexoravelmente (SACRISTÁN e GÓMEZ, 1998).
Concomitantemente a função de socialização (preparação para o trabalho e a
vida pública), a escola, segundo Sacristán e Gómez (1998) possui uma função
educativa:
Função educativa da escola: 1) organizar o desenvolvimento
radical da função compensatória das desigualdades de origem,
mediante a atenção e o respeito pela diversidade. 2) provocar e
facilitar a reconstrução dos conhecimentos, das disposições e das
pautas de conduta que as crianças assimila em sua vida paralela e
anterior a escola; preparar os alunos para pensar criticamente e agir
democraticamente numa sociedade não-democrática (p.22).
A função educativa da escola ultrapassa a função reprodutora do processo de
socialização, já que se apoia no conhecimento público (a ciência, a filosofia, a cultura, a
arte...) para provocar o conhecimento privado de cada um dos seus alunos, ou seja, a
utilização do conhecimento público, da experiência e reflexão da comunidade social ao
longo da história introduz um instrumento que quebra ou pode quebrar o processo
46
reprodutor - o conhecimento dos diferentes âmbitos do saber é uma poderosa ferramenta
para analisar e compreender as características, os determinantes e as consequências do
complexo processo socializador.
Eis aí o caráter emancipador da escola, conscientizar os sujeitos de seu processo
socializador dando-lhes condições de lutar por meio do conhecimento: “o desafio
educativo da escola contemporânea é atenuar, em parte, os efeitos da desigualdade e preparar
cada indivíduo para lutar e se defender, nas melhores condições possíveis, no cenário social”
(SACRISTÁN e GÒMEZ, 1998, p.24).
Nesse sentido, a escola tem o papel de diagnosticar as preconcepções e
interesses com as quais os indivíduos e grupos interpretam a realidade e decidem sua
prática, ao mesmo tempo oferecer os conhecimentos públicos como ferramenta para
reconstrução de suas preconcepções.
A escola deve provocar a reconstrução das preocupações vulgares, facilitar o
processo de aprendizagem permanente, ajudar o indivíduo a entender que todo
conhecimento ou conduta encontram-se condicionados pelo contexto e, portanto,
requerem ser comparados com representações alheias, assim como evolução de si
mesmo e do próprio contexto.
Em suma, Sacristán e Gómez, a função social da escola está estritamente
relacionada à preparação para o trabalho, à reinterpretação social e conceitual por meio
do conhecimento e ao ajustamento dos indivíduos à sociedade permeados pela
transmissão de conhecimento.
Mais um autor que ofereceu contribuições para compor o referencial teórico é
Teixeira (1961):
[...] com o advento da Revolução Francesa e seus ideais de
Igualdade, Liberdade e Fraternidade a educação escolar para todos
apareceu como oportunidade de buscar pela escola, sua posição na
vida social, a escola universal viria a dar a cada indivíduo a
oportunidade de ser na sociedade, aquilo que seus dotes inatos
devidamente desenvolvidos permitissem e não mais o que
privilégio da classe a qual pertencia oferecia (TEIXEIRA, 1971, p.
31).
Para Teixeira (1971), a escola surgiu como uma possibilidade de mudança e
ascensão social, no sentido de diminuir os privilégios de classe e valorizar as condições
de desenvolvimento dos sujeitos.
47
Já Tenti (2007) demonstra em seu estudo exatamente a relação escola, educação
e sociedade ao afirmar que:
Todo campo social se sente na escola a economia, a ciência, a
tecnologia, a estrutura social, a cultura, a politica e outros. [...] Um
terço dos habitantes do mundo estão na escola, então é difícil
compreender o interior da escola se não olhar para fora dela –
interação escola sociedade (TENTI, 2007, p.15).
As citações dos autores deixam claro a estrita relação de reciprocidade da escola
com a sociedade, ou seja, a escola está para sociedade, assim como a sociedade está
para escola, por isso, é impossível tentar explicar ou compreender uma dessas partes
sem olhar para a outra.
Para construir sua análise acerca da escola e da questão social, o autor começa
explicitando o contexto social e as transformações ocorridas na década de 1990 a partir
das reformas e mudanças no âmbito escolar, cita a multiplicação das formas de pobreza
após o capitalismo, que homogeneizou o que é heterogêneo, dando ideia de que todos
somos iguais e aptos a conquistar tudo, e que se não o fizemos é porque nossos esforços
não foram suficientes, questão da meritocracia.
E ainda destaca a escolarização como um paradoxo: ao mesmo tempo em que
aumenta a exclusão social, registra-se um crescimento escolar, tal fenômeno de
exclusão social e aumento da escolarização gera uma crise no sentido tradicional da
escola.
Para os novos alunos a escola não é necessariamente um lugar onde se aprendem
coisas importantes para vida. Alunos, professores e diretores estão perdidos em relação
a real função social da escola hoje, devido às demandas extraescolares, seja na família,
nas relações sociais, nas tecnologias e em tudo que rodeia a vida principalmente do
aluno.
Podemos dizer que a exclusão social e cultural são uma das demandas
extraescolares mais frequentes na escola e que estão estritamente relacionadas com a
aprendizagem, ou seja, não existem condições em si de educabilidade e a possibilidade
de aprendizagem dos aprendizes depende da relação das características dos aprendizes e
as características da oferta escolar.
Ao mesmo tempo, a capacidade de aprender não é um caso absoluto, e sim
relativo – todas as crianças são capazes de aprender desde que lhe ofereça as
oportunidades de aprendizagem pertinentes e adequadas a suas condições materiais,
48
sociais e psíquicas. Nesse sentido, o desenvolvimento escolar exige condições sociais
básicas que variam do comer ao cuidar-se, tal afirmação justifica a existência de
políticas assistenciais na escola.
Políticas essas que podem ser divididas segundo Tenti (2007) da seguinte forma:
1. Política de igualdade – intervenção social busca resolver os
problemas atuando nas condições sociais das demandas
educativas, deseja garantir e satisfazer as necessidades básicas
imprescindíveis para se pensar em educar as novas gerações:
alimentação, proteção da infância, saúde, afeto, vestir-se,
transporte e outros (p.131).
[...]
2. Política de oferta escolar – ligada ao capital cultural e as
condições de vida dos aprendizes, concebe que existe uma
distância variável entre o capital cultural acumulado durante a
primeira socialização e o capital cultural como se apresenta no
currículo escolar (p. 134).
A primeira política busca garantir a satisfação das necessidades básicas
imprescindíveis para depois pensar em educação das novas gerações, o que levou a
escola a adquirir funções não pedagógicas que em muitos casos levaram a discussões
entre professores e a própria comunidade escolar. A escola teve que ceder parte do seu
tempo de aprendizagem para o desenvolvimento de programas sociais destinados a
infância, como é o caso do Programa Bolsa Família aqui pesquisado.
Esse ceder parte do tempo da escola teve provavelmente dois efeitos
aparentemente contraditórios: por um lado, contribuiu para estender a assistência e
permanência na escola. E, por outro, pode ter afetado a realização dos adequados níveis
de rendimento escolar (aprendizagens significativas), pois não se podem adicionar
responsabilidades sem afetar a instituição como um todo.
Já a segunda política chama atenção para as implicações no desenvolvimento a
partir do capital cultural, o que exige a adequação da oferta pedagógica e institucional
às condições culturais dos aprendizes.
Por fim, podemos dizer que a escola como instituição especializada, não é a
mesma escola que a multifuncional. É necessário utilizar outros dispositivos
institucionais a fim de garantir a satisfação das necessidades básicas para o
desenvolvimento do trabalho pedagógico. Neste caso, a escola teria a responsabilidade
exclusiva de cumprir com sua função de transmitir conhecimento às novas gerações.
Pensar outro espaço de cuidado para as políticas públicas assistenciais que
permeiam a escola é uma tarefa complexa e trabalhosa, pois a escola tem o contato
49
direto com os diferentes sujeitos da sociedade. É por meio dela hoje que a situação de
miserabilidade ou de ascensão social é constatada. Contudo, acreditamos que um espaço
mais voltado para o conhecimento poderia diminuir a sensação de escola cuidadora,
controladora e esvaziada de aprendizagens.
Concomitante a isso, Tenti (2007) reconhece que a escola está permeada das
questões sociais e que deve lidar com elas da maneira mais esclarecedora e
desnaturalizada possível, a fim de contribuir para o desenvolvimento dos aprendizes.
Todavia também ressalta que este não é o papel a priori da escola e sugere que seria
importante haver uma instituição responsável por tais políticas para que a escola
pudesse cumprir sua função primordial que é a transmissão de conhecimento.
Enfim, à luz dos autores aqui apresentados buscou-se definir as funções sociais
da escola ao longo da história, função esta que pode ser resumida no servir a sociedade
na formação moral, intelectual e cívica, visando sempre à vida em sociedade e a
manutenção do sistema social econômico por meio do trabalho.
Essa definição nos servirá de olhar direcionador para constatar se houve
mudança na função social da escola a partir da condicionalidade educação do Programa
Bolsa Família, objetivo do trabalho aqui apresentado.
50
CAPÍTULO 3 – Procedimentos de Pesquisa
Neste capítulo, retomamos na análise os objetivos e hipóteses, além dos
procedimentos utilizados nesta investigação, a saber, a delimitação do campo empírico,
a caracterização dos sujeitos investigados, bem como os procedimentos de coleta de
dados. Além dessas informações, serão apresentados os dados das entrevistas, bem
como das observações realizadas durante a pesquisa. Revendo os objetivos da pesquisa:
Identificar as demandas dos beneficiários do PBF em relação à escola, se
essas dizem respeito ao ensino ou ao beneficio;
Verificar junto aos pais as expectativas para ingresso e permanência na
escola;
Conhecer e analisar as impressões dos pais acerca da obrigatoriedade de
frequência mínima à escola e sua relação com a função atribuída à
escola, especialmente a de instrução ou de assistência social.
Reconhecer a função social da escola por meio do Projeto Político
Pedagógico (PPP) da mesma.
Para consecução do primeiro objetivo, procuramos analisar as respostas dos
secretários e professores da escola. As considerações acerca do segundo até o quarto
objetivo foram norteadas pelas respostas dos pais e o último objetivo foi alcançado por
meio da análise de documento, o Projeto Político Pedagógico da escola.
3.1. Delimitação do campo empírico
Situada no Residencial Parque dos Príncipes, bairro nobre do Butantã, Zona
Oeste de São Paulo, a Escola Municipal de Ensino Fundamental I, II e EJA (Educação
de Jovens e Adultos) possui 1.163 alunos sendo quase 30% deles beneficiários do
Programa Bolsa Família.
O cruzamento dos dados da localização da escola com a realidade de
vulnerabilidade social de seus alunos foi uma das informações coisas que nos chamou
atenção. Como uma escola localizada dentro de um residencial de alto padrão tem o
51
maior número de beneficiários do PBF da Diretoria de Ensino do Butantã6, sobrepondo-
se a escolas que estão localizadas dentro de comunidades com maior índice de
vulnerabilidade como o caso das do bairro Real Parque?
Esse questionamento começou a ser respondido na primeira visita a escola, ao
entrar no residencial pela portaria da Avenida Escola Politécnica; inicialmente fui
surpreendida com um ambiente tranquilo e arborizado, por calçadas bem cuidadas, e a
presença de possíveis moradores fazendo caminhadas e outros exercícios físicos.
No entanto a arborização do lado direito desta rua de entrada esconde Conjuntos
Habitacionais, casas, barracos e um córrego com moradias em suas margens; oculta
também uma passagem de pedestre que provavelmente serve de corte de caminho para
os moradores do bairro vizinho encurtar alguns de seus percursos dentro e fora do
residencial.
A escola oferece um ambiente receptivo e a coordenadora pedagógica do Ensino
Fundamental II mostrou-se solícita a proposta de pesquisa apresentada. Apesar de a
escola estar situada em uma região nobre do município de São Paulo, a coordenadora
não se surpreendeu com a escolha de se fazer o estudo de campo na unidade e fez a
seguinte ressalva:
“Já era de se imaginar que a nossa escola tivesse muitos alunos
beneficiários do PBF, pois atendemos aos moradores dos bairros
vizinhos e suas comunidades, em especial os do Jardim D’Abril; não
temos nenhum morador do Parque dos Príncipes estudando aqui”
(Diário de campo, 2013).
É necessário ressaltar que a escola encontra-se na mesma rua de um colégio
particular de alto padrão, provavelmente frequentado por moradores do residencial
Parque dos Príncipes.
A partir de tal afirmação, entendemos que se fazia necessário conhecer o
histórico e a realidade social desse bairro e de seus moradores. Todavia não foi possível
6 A escolha da escola e da Diretoria de Ensino do Butantã (DRE-BT) justifica-se pela área de atividade da
pesquisadora nessa região, pelo interesse da mesma em conhecer melhor seu local de atuação, pela
disponibilidade de acesso a materiais e dados relevantes a pesquisa e principalmente pelas características
da própria escola pesquisada, tão pertinente ao interesse de estudo. Vale ressaltar que a escola pesquisada
não é a escola que a pesquisadora trabalha.
52
encontrar caracterizações contundentes e, acima de tudo, confiáveis nos documentos
históricos de fundação, estruturação e situação dos bairros de São Paulo, disponíveis
principalmente em sites. Também não foi possível conhecer tal realidade por meio de
visita a outras instituições da localidade como posto de saúde e associação de
moradores.
3.1.1. Funcionamento da escola
A escola funciona em três turnos, sendo o primeiro das 7h às 12h (Fundamental
II 6º ao 9º ano), o segundo das 13h30 às 18h30 (Fundamental I 1º ao 5º ano) e o terceiro
das 19h às 23h (Educação de Jovens e Adultos). Há 19 classes em funcionamento
divididas nos três turnos, com um total de 1.163 alunos matriculados e uma média de 35
alunos por sala.
A entrada é feita pela quadra; os alunos fazem uma refeição antes do início das
aulas, de acordo com o horário de entrada na escola (café da manhã, almoço ou jantar);
organizam-se em fila, no caso dos alunos do Fundamental I (grupo observado), e vão
para suas salas com seus respectivos professores. O horário de intervalo das professoras
ocorre no momento da refeição dos alunos, e estes nesses momentos ficam sob a
responsabilidade da inspetora de alunos da escola.
3.1.2. A gestão escolar
O corpo administrativo da escola é composto pela diretora, dois assistentes de
direção e três coordenadoras pedagógicas. A primeira é responsável pela organização
geral, como controle de frequência de funcionários, alimentação, limpeza e organização
dos espaços. A assistente acompanha a diretora, enquanto a coordenadora atua junto às
professoras, crianças e famílias. Com as professoras, a coordenadora atua na formação
docente, no controle de falta e no planejamento das atividades. Em relação aos alunos,
atende aqueles que apresentam dificuldades de aprendizagem ou os que apresentam
problemas de comportamento durante a realização dessas atividades.
53
3.1.3. O corpo docente
O corpo docente é formado por 83 professores, sendo que 33 atuam no Ensino
Fundamental I e 50 no Ensino Fundamental II, ambos os grupos são constituídos por
pedagogos ou especialistas das diferentes áreas do conhecimento. Alguns deles também
lecionam na Educação de Jovens e Adultos, são responsáveis pelo planejamento e
ministração de aulas.
3.1.4. O corpo de apoio escolar
O corpo de apoio escolar é formado por nove agentes de apoio administrativos e
quatro agentes de apoio educacional. Os primeiros têm por função auxiliar a diretora em
suas atividades administrativas cuidando de prontuários, documentos funcionais, e
frequência, inclusive a frequência dos alunos do Programa Bolsa Família, e do
andamento de outros programas sociais, além do atendimento ao público, pais, alunos,
professores, funcionários e telefone. Os segundos têm suas atividades relacionadas
diretamente ao cuidado dos alunos principalmente nos momentos de intervalos,
refeições e atividades externas, acompanham a entrada e saída de alunos e o uso dos
banheiros. Para isso, estão sempre nos corredores e em outras áreas da escola.
3.1.5. A esfera pedagógica
Uma das fontes de dados desta pesquisa é o Projeto Político Pedagógico (PPP),
uma vez que esse é a identidade da escola. O documento apresenta os objetivos da
instituição de ensino, missão, caracterização, concepções filosóficas e educacionais da
escola e, consequentemente, sua função social (Veiga, 2011), interesse de pesquisa aqui
apresentado.
Sobre as concepções filosóficas, políticas e pedagógicas da escola, podemos
destacar os seguintes excertos do projeto pedagógico para discussão:
[...] numa sociedade marcada pelo conhecimento e pela tecnologia
da informação e da comunicação [...] a educação é imprescindível
como ação contínua e permanente, a necessidade de reinventar-se e
melhorar suas competências de formar pessoas com capacidade de
enfrentar e superar desafios, com o objetivo maior de preservar a
coletividade, não só o ideal de ensinar o saber produzido
54
socialmente, mas o de aprender com princípios de contínua
renovação.
[...]
A instituição escolar é uma organização social constituída para
formação humana, nos aspectos culturais, sociais, políticos e
científicos, mediante experiências de aprendizagem e ambiente
educacional condizentes com os fundamentos, princípios e
objetivos da educação.
“A educação é um processo organizado, sistemático e intencional e
ao mesmo tempo complexo, evolutivo e dinâmico” (Projeto
Político Pedagógico, 2013, p. 7).
Tais citações buscam basear e justificar as concepções da escola analisada, no
sentido de apresentar suas concepções de educação, escola e realidade de atuação, ou
seja, esta escola entende o trabalho educacional como um sistema complexo e
intencional voltado para determinada realidade e suas constantes transformações. Além
disso, acredita na formação humana, nos seus aspectos culturais, sociais e políticos,
ideais historicamente almejados segundo o referencial teórico desse estudo.
Mas o que significa as crenças e concepções educacionais dessa escola, até que
ponto elas são verossímeis e reais, o que está contido nesse discurso tão batido e
aparentemente repleto de ideais?
Nada. Se analisarmos um pouco mais atentamente o discurso desse Projeto
Político Pedagógico (PPP) e compará-lo com o discurso de outros tantos PPPs,
constataremos o vazio e os chavões educacionais sem fim, existentes nas entrelinhas de
cada um deles, que não dizem nada além do que a legislação, as portarias e orientações
educacionais dizem, ou seja, é uma cópia, que nem sempre condiz com a realidade de
ensino aprendizagem, mas que é exigida como parâmetro de educação.
Os conceitos e finalidades de “educação como ação contínua e permanente”, e
de “formar pessoas com capacidades de enfrentar e superar desafios, com objetivo
maior de preservar a coletividade”, está respectivamente ligado ao primeiro e segundo
pilar da Educação presente no relatório da UNESCO ‘Educação um tesouro a
descobrir’ (DELORS, 2010).
O primeiro pilar é o aprender a conviver, o qual caracteriza a escola como um
espaço de socialização e de exercício de tolerância à diversidade humana, buscando no
outro a interdependência, ou seja, a escola não é local de formação intelectual, mas sim
de socialização, de lidar com as questões da coletividade e suas diferenças (DELORS,
55
2010). É inegável que a escola exerce um papel socializador, todavia não entendemos
esse papel como o mais importante exercido por ela.
O segundo pilar que aparece no PPP é o de aprender a conhecer, este traz nas
suas entrelinhas a questão de educação ao longo da vida, ideia que amplia os locais de
ensino não sendo mais a escola especificamente responsável pelo conhecimento, o que
pode denotar certo esvaziamento da função social da escola de transmissão do
conhecimento.
Outro destaque necessário para compreensão da função social da escola por
meio do PPP da instituição pesquisada é o que a define ‘como uma organização social
constituída para formação humana, nos aspectos culturais, sociais, políticos e
científico’, isto é, uma escola primeiramente voltada para as demandas sociais e depois
para transmissão do conhecimento científico.
Dos fins e objetivos educacionais da unidade educacional pesquisada:
[...] temos como objetivo nesta unidade educacional abranger os
processos formativos que se desenvolvem na vida familiar, na
convivência humana e nas manifestações culturais e cognitivas.
[...]
A escola tem por finalidade o pleno desenvolvimento do educando,
preparando-o para o exercício da cidadania, de forma a torná-lo um
sujeito crítico, participativo e autônomo na construção de seu
próprio conhecimento, assegurando-lhe uma participação
consciente e responsável na sociedade, desafiando-o a viver como
agente construtor da história.
Dos objetivos da escola:
Preservar a espontaneidade do educando, buscando desenvolvê-
lo em seus aspectos físicos, emocionais, afetivos, cognitivos,
sociais e éticos;
Oportunizar experiências que deem continuidade ao processo de
leitura e compreensão de mundo do educando, pata atuação dentro
do seu contexto social;
Proporcionar condições para que o educando desenvolva a
capacidade de aprender, buscando a construção de conhecimentos,
competências e habilidades, que promovam a autonomia e o
exercício da cidadania.(Projeto Político Pedagógico, 2013, p. 10)
Nesse ponto do PPP, aparece a função social da escola que é o pleno
desenvolvimento do educando para cidadania, entendendo que tal exercício o ajudará a
entender-se como ser social, histórico e transformador de sua realidade, ideia presente
no trabalho de Sacristán e Gómez (1998) e na própria legislação brasileira referente à
educação.
56
Concomitante a essa ideia podemos destacar mais uma vez a presença de
chavões do discurso educacional como ‘formar sujeito participativo, crítico e autônomo’
estes são princípios que deveriam estabelecer conexão entre a elaboração consciente da
ideia de educação e o fazer consciente do processo educativo. No entanto não passam de
slogans educacionais inteiramente assistemáticos de tom menos solene, mais popular a
serem repetidos com veemência ou de maneira tranquilizadora (SCHEFFLER, 1974).
É como se fosse inerente esperar da educação certos objetivos, mesmo estando
estes longe de serem realizados pela ação escolar.
Em relação às metas e ações da escola:
1. Pedagógico: promover a aprendizagem dos alunos e a formação
dos professores; ressignificar o currículo em ação visando a
melhoria da qualidade de ensino; formação de grêmio estudantil;
2. Recursos financeiros: otimizar a utilização das verbas públicas e
dos recursos humanos;
3. Reorganização dos tempos,
4. Reorganização dos registros: análise de dados e reflexão como
princípio para definir ações;
5. Melhorar as relações humanas, fortalecer o trabalho coletivo, o
compartilhamento de ações e envolvimento da comunidade
escolar;
6. Qualificar o atendimento ao público (docentes, discentes,
funcionários e comunidade) (Projeto Político Pedagógico, 2013,
p.13).
Como já imaginávamos o Programa Bolsa Família e as possíveis políticas
assistenciais presentes na escola, não aparecem em nenhum momento no documento
que identifica a instituição de ensino. Por meio de seus objetivos e metas presentes em
tal documento, vê-se a preocupação da escola em provocar mudanças no fazer
educacional. Assim, a escola em questão pode contribuir muito com esse trabalho
tendo-a como objeto de estudo.
O único momento no qual aparece programas assistenciais no Projeto Político
Pedagógico, em especial o Programa Bolsa Família e o Programa Leve Leite é no plano
de ação da secretaria – equipe administrativa, isto é, em suas ações estes programas
aparecem como uma atividade pertencente somente a esse grupo, e limitada à digitação
de frequência e disponibilização de declarações de matrícula e frequência aos pais.
Enfim, com a análise do PPP da escola podemos demonstrar que seu processo
pedagógico está determinado por uma série de fundamentos, princípios, diretrizes,
57
orientações e expectativas de aprendizagem estabelecidas por suas concepções
filosóficas, políticas e também pela rede municipal de ensino.
E mesmo sendo os programas sociais alimentados por informações vindas da
escola, eles não aparecem no projeto como uma atividade a mais da unidade de ensino,
mas sim como atividade inerente a ela, no sentido de fazer parte, principalmente de sua
rotina administrativa, podendo dar a entender que esses não modificam o ambiente
escolar.
3.1.6. Os espaços
O prédio da escola contém dois andares e é composto por 19 salas de aula – cada
sala possui um ou dois armários, uma lousa, e uma média de 35 mesas com um lugar
para cada aluno. As salas são pintadas de bege; as utilizadas pelo Ensino Fundamental I
possuem um grande número de cartazes e painéis de auxílio à leitura e escrita; algumas
possuem caixas de revistas, gibis e livros de histórias infantis.
Além das salas de aula há uma sala de informática com 25 computadores, uma
sala de leitura e uma SAAE (Sala de Atendimento a Alunos Especiais). As três salas
estão localizadas no piso térreo. Os alunos frequentam esses espaços uma vez por
semana, acompanhados por professores titulares - das determinadas classes, que
desempenham trabalhos e atividades específicas de suas áreas - ou em conjunto com os
professores de sala. Os alunos com necessidades especiais, sem exceção, frequentam a
SAAE em horários e dias diferenciados, sendo sempre essa sala o local de
aprendizagem desses alunos.
O espaço externo da escola é constituído por duas quadras sendo uma coberta e
um parque com duas gangorras e um trepa-trepa7.
A área administrativa é composta por cinco salas: secretaria, direção, assistentes
de direção, professores e da coordenação pedagógica. Os alunos têm acesso livre a esses
espaços. Há ainda o refeitório, composto por 20 mesas que comportam 10 alunos cada
uma, além da cozinha, espaço restrito às funcionárias do setor.
7 Trata-se de um brinquedo de metal constituído por traves horizontais e verticais escaladas pelas
crianças, conforme desejam.
58
3.2. Caracterização do grupo pesquisado
O grupo pesquisado é constituído por pais e professores de alunos do Ensino
Fundamental I, e por agentes de apoio administrativos que atuam na secretaria da escola
estudada. o critério de escolha desses sujeitos está pautado no seguinte objetivo desta
pesquisa:
Identificar as demandas dos beneficiários do PBF em relação à escola, se
essas dizem respeito ao ensino ou ao benefício;
Verificar junto aos pais as expectativas para ingresso e permanência na
escola.
O primeiro objetivo foi verificado a partir de entrevista e questionário
semiestruturados junto aos professores e agentes de apoio. Buscamos conhecer as
demandas mais frequentes que levam os pais ou responsáveis à escola, se essas dizem
respeito ao ensino ou a preocupação com a assistência propiciada pelos diferentes
programas sociais que estão na escola, em especial o Programa Bolsa Família (PBF).
O segundo foi constatado nas entrevistas e também questionários8
semiestruturados realizados com os pais, procurando identificar as motivações destes
em relação ao ingresso e permanência de seus filhos na escola, se essas estão ligadas ao
acesso ao conhecimento ou a garantia do benefício.
Acreditamos ter sido esse um dos objetivos mais importantes para responder
nossa hipótese de mudança de uma das funções sociais da escola, ou seja, a de
transmissão de conhecimento para a assistência social.
A escolha dos instrumentos de pesquisa, questionário semiestruturado e
entrevista podem ser justificados, primeiramente pelo nosso intuito em caracterizar o
perfil de interesse dos pais em relação à escola, o conhecimento e o trabalho dos
professores e agentes escolares administrativos em relação ao PBF. Entendendo-os
8 A priori o procedimento de pesquisa utilizado junto aos pais seria a entrevista, no entanto devido ao
tempo e disposição da comunidade escolar em relação à pesquisa, optou-se por mias um procedimento, os
questionários. Ver roteiro para entrevista e questionário em anexo.
59
como fatos sociais, estes podem exigir uma enquete sociológica com combinação de
mais de uma técnica de pesquisa para melhor compreendê-los (THIOLLENT, 1981).
O autor ainda destaca outros pontos pertinentes a nossos instrumentos de
pesquisa:
Questionário e entrevistas são considerados como técnicas de
observação direta pelo fato de estabelecerem um contato efetivo
com as pessoas implicadas no problema investigado;
[...]
Sem investigação concreta, a sociologia não está longe de ser um
discurso filosófico ou político arbitrário. Por outro lado, sem
problemática teórica a sociologia é considerada apenas como
enquete e degenera em vulgar pesquisa de opinião (THIOLLENT,
1981, p. 72).
Nesse sentido tomamos nossos instrumentos de pesquisa como ponto de acesso
às ideias e princípios dos sujeitos acerca do nosso problema, entendendo-os como uma
das fontes para compreensão do mesmo. Concomitantemente, para não incorrermos no
equívoco apontado pelo autor, e com intuito de responder ao problema de pesquisa
levando em conta os sujeitos envolvidos por meio da teoria e dos dados coletados nas
entrevistas e questionários.
3.2.1. Beneficiários do Programa Bolsa Família (PBF)
Os beneficiários do PBF são as famílias que vivem em situação de pobreza ou
extrema pobreza em todo país. Tal situação é medida pela renda per capita da família
que não pode ser maior que R$ 70 reais. Além disso, esses sujeitos devem acessar os
serviços de Saúde e Educação como condição para recebimento do beneficio. No caso
da Saúde, crianças até seis anos, gestantes e nutrizes devem cumprir a agenda de
atenção básica à saúde.
Em relação à Educação os inscritos no programa devem matricular seus filhos na
escola e garantir a frequência escolar mínima de 85%, no caso das crianças e
60
adolescentes entre 6 e 15 anos e mínima de 75%, entre 16 e 17 anos (BRASIL, MDS,
2013)9.
O monitoramento do acesso das famílias a esses serviços visa assegurar que os
brasileiros mais vulneráveis sejam atendidos por essas redes de proteção social,
entendendo que a promoção de tais direitos, em especial o de Educação, leva a outros
direitos básicos e sociais (SANTOS, 2010).
3.2.2. Os professores
A escola possui 33 professores que atuam no Ensino Fundamental I. Deste
grupo, 17 são professoras polivalentes titulares de sala, estas trabalham em período
integral com turmas de 1º ao 5º ano, e os outros 16 variam entre professores e
professoras readaptados10
, professores módulo11
, e de área específica como Educação
Física, Artes, Inglês e da Sala de Leitura. A atuação desses professores na rede
municipal de ensino de São Paulo varia de cinco meses a vinte cinco anos, a faixa etária
deles é de 28 a 60 anos.
3.2.3. Agentes de Apoio Administrativo
O grupo de agentes de apoio administrativo é formado por nove funcionários
que possui idade média entre 30 e 55 anos; tem por função auxiliar a diretora em suas
atividades administrativas, cuidando de prontuários, documentos funcionais, e
frequências, inclusive a dos alunos com Bolsa Família e outros programas sociais -
atendimento ao público, pais, alunos, professores, funcionários e telefone; foram
escolhidos como sujeitos desta pesquisa exatamente por causa do seu contato direto
com os pais, pois sabemos que para manter o cadastramento do programa em ordem é
necessária a apresentação de declarações conseguidas na escola.
9 Disponível em:< http://www.mds.gov.br/>.
10 Professores que por motivos de saúde foram afastados de suas atividades de trabalho em sala de aula e
desenvolvem outras atividades normalmente voltadas à secretaria ou gestão da escola.
11 Professores substitutos que entram em sala quando o professor titular da sala está ausente por algum
motivo.
61
3.3. A pesquisa
A pesquisa que aqui se apresenta é considerada como qualitativa, por buscar
conhecer determinado fenômeno por meio de observações, descrições, comparações e
interpretações do próprio campo onde o fenômeno está inserido, diferente das pesquisas
quantitativas que visam enumerar e medir eventos por meio de instrumentos estatísticos
e pré-formulados. Nossa pesquisa busca meios para se desenvolver na própria interação
com seus participantes.
Para se realizar uma pesquisa nessa perspectiva é preciso promover o confronto
entre os dados, as evidências, as informações coletadas sobre determinado assunto e o
conhecimento teórico acumulado a respeito dele.
Em geral isso se faz a partir do estudo de um problema, que ao mesmo tempo
em que desperta o interesse do pesquisador, limita sua atividade de pesquisa a uma
determinada porção de saber, a qual ele se compromete a construir naquele momento.
Trata-se assim de uma ocasião privilegiada, que reúne o pensamento e a ação de uma
pessoa ou de um grupo, no esforço de elaborar o conhecimento de aspectos da realidade
que deverão servir para composição de soluções propostas aos seus problemas (LUDKE
e ANDRÉ, 2011).
Os instrumentos de pesquisa mais comuns a esse tipo de estudo são: a
observação e entrevista para coletas de dados e a experiência direta para verificação da
ocorrência de determinado fato. Também podem ser utilizados questionários e análise
documental, todos com intuito de conhecer e descrever o fenômeno pesquisado a luz da
realidade de seus participantes.
Isso posto, a pesquisa qualitativa na área educacional se mostra um tipo de
abordagem pertinente por valorizar os fenômenos educacionais, no sentido de não
entendê-los como fatos isolados, mas sim envolvidos numa perspectiva mais
abrangente. É como se olhássemos para peças de quebra-cabeça que formam uma
imagem (LUDKE e ANDRÉ, 2011).
Portanto, a construção de pesquisa e ciência é um fenômeno social por
excelência, que envolve pesquisador, objeto de pesquisa, sujeitos, teorias e práticas com
intuito de se conhecer e revelar perspectivas inerentes, mas ocultas de determinado
62
fenômeno. Este é o caso do aspecto educacional do Programa Bolsa Família, que é claro
no texto de sua regulamentação, mas subjetivo em suas interpretações.
3.3.1. Coleta de dados
Após a apresentação da escola de interesse para a pesquisa, o primeiro passo
para coleta de dados foi feito na secretaria da escola com a análise da lista de
beneficiários do Programa Bolsa Família (PBF), com intuito de localizar os alunos
beneficiários e, consequentemente, seus pais, ou seja, qual sala ou salas do Ensino
Fundamental I que possuía o maior número de bolsistas.
A partir desse procedimento foram definidas duas salas, a 4ª série A com 14
alunos beneficiários e a 3ª série C com 11 alunos beneficiários. Como nossos sujeitos de
pesquisa são os pais desses alunos, passamos a observar a entrada e saída das crianças
para conhecer a possibilidade de abordar esses sujeitos nesses momentos de espera.
Todavia, ao compartilhar essa estratégia com a coordenadora do Ensino Fundamental I
da escola, esta prontamente propôs que ao invés disso, participássemos das reuniões de
pais das respectivas salas que aconteceriam no final da semana seguinte e
apresentássemos a pesquisa aos mesmos, convidando-os a participar. A ideia pareceu
factível e mais possível para coletas de dados.
No entanto devido a mudanças nos dias e horários das reuniões não foi possível
contatar todos os 25 pais, conforme pensamos. Deles, entrevistamos apenas cinco,
sendo dois da 3ª série C e três da 4ª série A. Depois desse ocorrido, voltamos à primeira
estratégia pensada para coleta de dados, acompanhar a entrada e saída dos alunos e
abordar os pais aleatoriamente. Desta forma, conseguimos entrevistar mais nove pais
somando um total de 14 entrevistados.
Em relação aos outros sujeitos de nossa pesquisa foram aplicados 16
questionários aos professores das diferentes salas do Ensino Fundamental I, tendo
retorno de seis, no caso dos agentes administrativos foram feitos sete questionários e
duas entrevistas aos agentes. À gestão escolar foi entregue um questionário para cada
um de seus membros – direção (1), coordenação (2), assistente de direção (2), mas não
obtivemos retorno.
63
3.3.2. Apresentação e análise dos dados
Foram apresentadas e analisadas, à luz do referencial teórico, as 14 entrevistas
feitas com os pais dos alunos beneficiários.
Para entrevista com os pais, elaboramos um roteiro que contemplasse o
conhecimento dos pais sobre o Programa Bolsa Família (PBF) e/ou outros programas
sociais ligados à escola. O instrumento possibilitava o levantamento das expectativas
dos pais em relação à escola e se essas mudaram depois do PBF. Também buscamos
conhecer quais as motivações que os levam à escola, e se essas estão ligadas ao ensino
ou ao benefício.
A partir desse roteiro foram desenvolvidos alguns critérios para interpretação
dos dados:
Compreensão que os pais têm do Programa Bolsa Família
A relação que os pais estabelecem com a escola,
As expectativas educacionais dos pais em relação à escola.
3.4.1. Análise 1: Entrevista com aos Pais
Quadro 1 – Caracterização do grupo pesquisado (pais ou responsáveis)
NOME12
SEXO IDADE ESCOLARIDADE FAMILIRIARIDADE PROFISSÃO
Albertina Feminino 48 anos Fundamental I
completo Avó Diarista
Madalena Feminino 45 anos Ensino Médio
completo Mãe
Empregada
doméstica
Ordália Feminino 36 anos 5º série – Fund. I Mãe Desempregada
Benedita Feminino 27 anos Ensino Médio
Completo Mãe Ajudante geral
Carla Feminino 33 anos 7ª série – Fund. I Mãe Dona de casa
Roberta Feminino 32 anos Nunca foi a escola Mãe Dona de casa
Silmara Feminino 33 anos 7ª série – Fund. I Mãe Babá
Laura Feminino 36 anos 5º série – Fund. I Mãe Dona de casa
Gabriela Feminino 32 anos Ensino Médio
completo Mãe Dona de casa
12
Todos os nomes utilizados nessa pesquisa são fictícios, o que ao mesmo tempo em que caracteriza o
sujeito pesquisado, preserva o anonimato de sua identidade.
64
Renata Feminino 56 anos 4ª série – Fund. I Avó Empregada
doméstica
Marcela Feminino 24 anos 2º ano – Ens. Médio Mãe Atendente
Paula Feminino 30 anos Fund. completo Mãe Desempregada
Elza Feminino 29 anos 6ª série – Fund. I Mãe Dona de casa
Antônia Feminino 30 anos 4ª série – Fund. I Mãe Auxiliar de
limpeza
Das 14 entrevistas realizadas destacamos as seguintes informações: todos os
pesquisados são mulheres, com idade média de idade entre 24 e 56 anos, a maioria
possui Ensino Fundamental I incompleto e a atividade profissional de todas é manual e
de baixa qualificação.
Mesmo não sendo um critério de escolha para pesquisa o gênero, o fato dos
entrevistados serem mulheres contribuiu significativamente para o estudo, pois segundo
o próprio site do Ministério do Desenvolvimento Social13
o benefício do Programa
Bolsa Família é sempre pago a mulher da família.
Isso pode ser justificado pela diversidade familiar e o abandono dos pais em
relação à família prematuramente construída, ou a própria frequência de mães solteiras e
mulheres responsáveis pelas responsabilidades, econômicas e sociais da casa.
Quadro 2 – Conhecimentos acerca do Programa Bolsa Família
Albertina É bom. Porque dá um dinheirinho que serve para ajudar nas contas de casa, na
alimentação e compra de roupas e sapatos para as crianças.
Madalena É muito bom, porque serve para eu comprar algumas coisinhas que o Danilo gosta e que
eu não posso dar, porque o dinheiro que ganho é pouco.
Ordália
Eu sei que me ajuda muito, porque eu tenho quatro filhos e estou desempregada, meus
filhos são pequenos, senão fosse o Bolsa Família estava “ferrada”. Quando recebo a
primeira coisa que faço é comprar uma cesta básica e pagar minha conta de água e luz, me
ajuda muito.
Benedita Sei que muito bom e tem ajudado muitas famílias, inclusive a minha.
Carla Sei que é um programa que ajuda muitas pessoas carentes e eu também.
Roberta Sei que é muito importante para as pessoas carentes e que não tem dinheiro, é muito
importante para minha família.
Silmara Sei que é um programa que dá dinheiro para as famílias carentes que mandam seus filhos
13
Disponível em:<htpp//www.mds.gov.br/>
65
para escola e mantém a carteira de vacinação em dia, para mim é muito importante, pois
ajuda a realizar as vontades das crianças como uma bolacha recheada e um iogurte, sem
contar a compra de roupas e calçados.
Laura Um benefício que lida com a fome e a desnutrição, um modo de exigir a presença das
crianças na escola e diminuir a mortalidade infantil.
Gabriela Não sei muita coisa a não ser que tenho que manter as crianças na escola e levá-las ao
posto de saúde para não perder o benefício.
Renata Não sei de nada a não ser que ela recebe os R$ 32,00 foi a mãe dela que fez tudo.
Marcela Programa que ajuda crianças carentes
Paula Programa que contribui para renda das famílias.
Elza Um dinheiro que ajuda muito as famílias necessitadas, inclusive a minha.
Antônia A única coisa que sei, é que recebo o benefício.
Podemos analisar os dados acerca do conhecimento dos pais sobre o Programa
Bolsa Família a partir de duas categorias:
1. Benfeitorias do benefício,
2. Programa Bolsa Família – objetivos e condicionalidades.
A maioria dos pais resume seu conhecimento acerca do Programa Bolsa Família
(PBF) como transferência de renda, ou seja, ao dinheiro que recebe e as benfeitorias que
ele traz, como: a compra de alimentos por meio de uma cesta básica, o pagamento de
contas de saneamento básico água, luz e gás e a realização de pequenos desejos dos
filhos em termos de alimentação e vestimentas.
Contudo alguns pais demonstram conhecer o PBF em seus objetivos e
condicionalidades, isto é, aparecem nas falas às condições para o recebimento do
benefício ligado a educação e saúde, e o próprio objetivo de diminuição da pobreza.
No que tange a educação, a exigência de que as crianças precisam estar
matriculadas e frequentando a escola é conhecida pelos pais, da mesma forma, em
relação à saúde a necessidade de que a carteira de vacinação esteja em dia, ambos os
pontos são critérios para o recebimento do beneficio presente em suas orientações no
site do Ministério do Desenvolvimento Social14
.
Nas entrelinhas das falas “ajudar as famílias pobres, carentes, lidar com a fome,
desnutrição e mortalidade infantil” ficam claros alguns dos principais objetivos do PBF:
14
Disponível em: <htpp://www.mds.gov.br/;
66
Promover o alívio direto da pobreza, por meio da transferência
direta da renda à família;
Reforçar o exercício de direitos sociais básicos nas áreas de Saúde
e Educação, por meio do cumprimento das condicionalidades, o
que contribui para que as famílias consigam romper o ciclo de
pobreza entre gerações;
Coordenar programas complementares que tem por objetivo o
desenvolvimento das famílias, de modo que os beneficiários do
Bolsa Família consigam superar a situação de vulnerabilidade e
pobreza.15
.
Portanto, podemos dizer a partir dos dados apresentados, mesmo que
indiretamente, que os pais conhecem o Programa Bolsa Família e reconhecem sua
relação com a Escola (Educação) e saúde o que pode contribuir para mudança da
relação pais escola, no sentido de suas preocupações.
Quadro 3 – Em relação à exigência da frequência escolar
Albertina
Eu sou contra a exigência da frequência escolar porque esse dinheiro é direito da criança,
às vezes tenho que mandá-los doentes para não perder o Bolsa Família porque precisamos
do dinheiro.
Madalena Eu acho certo que a escola cobre que o aluno venha, porque tem muito pai que recebe e
não tem coragem de mandar o filho para escola, deixa a criança na rua.
Ordália Sim, porque a criança tem que ir para escola aprender.
Benedita Sim. Com certeza
Carla Sim.
Roberta Sim a criança tem que ir estudar independente se recebe ou não.
Silmara
Sim, com certeza porque a escola é muito importante para aprender as coisas é como tem
pai que tem preguiça o fato de receber o benefício ajuda a dar coragem para mandar os
filhos para escola (risos).
Laura Sim. E o Bolsa família é um incentivo para nós mandarmos as crianças para escola.
Gabriela Sim, porque senão fosse assim muitas mães não mandariam os filhos para escola.
Renata Não, porque tendo o Bolsa família ou não ela teria que ir para escola.
Marcela Sim, porque a criança passa a ter mais responsabilidade e incentivo para vir para escola.
Paula Não porque minha filha viria pra escola recebendo ou não o Bolsa família.
Elza Sim, porque exigi responsabilidade da mãe de mandar o filho para escola, porque tem
quem só manda o filho por causa do PBF.
Antônia Sim, porque incentiva as mães e os filhos.
15 Idem.
67
O aspecto do roteiro de entrevista que constituiu esse quadro diz respeito à
relação da frequência escolar com o Programa Bolsa Família (PBF) no sentido de saber
se os pais acham importante que o programa exija a frequência escolar para o
recebimento do benefício.
Os critérios que nortearam a análise desse questionamento foram:
1. Frequência escolar voltada para o recebimento do benefício,
2. Frequência escolar ligada à aquisição de conhecimentos.
Das 14 mães entrevistadas 11 acham importante a exigência da frequência
escolar para o recebimento do benefício, pois alegam que este é um estímulo e incentivo
para que os filhos não deixem de ir à escola, pois segundo eles existem pais que só
mandam os filhos para escola por causa do benefício. É interessante destacar aqui a
questão do julgamento do outro, o pai que nos fala não tem esse comportamento, mas
conhece pais que se comportam dessa maneira, ou seja, que vê na escola uma
possibilidade de renda por meio do bolsa família.
Essa perspectiva pode denotar o esvaziamento da função social da escola de
instituição responsável pela transmissão do conhecimento, para instituição que lida com
as necessidades sociais e básicas do aluno (TENTI, 2007).
Em contrapartida tem três mães que são enfáticas ao dizer que independente do
benefício seus filhos teriam que ir a escola, para aprender, ou seja, por causa do
conhecimento que ela oferece que independe do recebimento ou não do bolsa família.
Podemos dizer que estes pais estão em busca do conhecimento poderoso
definido por Young (2007), conhecimento esse que não pode ser aprendido no seio
familiar, ou no trabalho no caso dos adultos, ligado à transmissão cultural, ao
fornecimento de explicações confiáveis ou nova forma de pensar o mundo,
independente do contexto ou conhecimento teórico, propiciador de generalizações e
universalidades intelectuais.
Enfim, os entrevistados deixam claro que sabem que existem pais ou em casos
específicos eles mesmos que relacionam a frequência escolar com o benefício bolsa
família, mas que há também pais que mantém o compromisso de mandar seus filhos
para escola pelo conhecimento.
68
Quadro 4 – Abandono da escolar, por não recebimento do PBF.
Albertina
O pequeno que estuda aqui não porque o trabalho dele é a escola, e se não está na
escola, está comigo, mas os mais velhos de 14 e 15 anos que às vezes não me obedecem
iriam trabalhar pra não ficar na rua vagabundando e fazendo o que não presta e,
principalmente, pra ajudar em casa, porque se não tivesse esse dinheirinho ia faltar as
coisa até pra comer, porque eu sempre faço um biquinho, mas o bolsa família ajuda
bastante.
Madalena De jeito nenhum, assim como eu trabalho hoje para mandar ele para escola, trabalharia
mais para ele continuar porque quero que ele aprenda mais.
Ordália Nunca e escola é importante para os meus filhos, para que eles aprendem e possam ser
mais do que só estudei até a 5ª série.
Benedita Não, porque ela precisa estudar e esses R$ 32,00 não vai garantir o futuro dela, tem que
estudar para ser alguém na vida.
Carla Não, porque quero que eles aprendam.
Roberta Não, porque o estudo é muito importante para formação dele no futuro, para ele ter um
trabalho melhor dos que os que pais têm.
Silmara Claro que não, quero que eles aprendam e sejam mais do que eu e o pai deles
conseguimos ser até agora.
Laura Não, porque o aprendizado dele é mais importante do que o dinheiro, ele tem que ter um
futuro melhor do que eu e não depender do Bolsa família como agente depende.
Gabriela Não, porque a escola é para aprender a ser alguém na vida.
Renata Não, porque ela deve ir à escola para aprender e não pelo dinheiro.
Marcela Não, tem que estudar independente de receber alguma coisa ou não
Paula Oxê, claro que não tem que ir para escola aprender e ser melhor do que os pais, o bolsa
família não garante futuro não, mas os estudos sim.
Elza Não, porque a escola é importante para aprender, mas que de vez em quando dá vontade
de não trazer dá (risos).
Antônia Não, porque o que não tive para mim, quero que eles tenham para eles “estudo”.
Este quadro diz respeito a possibilidade de abandono da escola, caso houvesse a
perda do benefício Bolsa Família (BF), dos 14 pais entrevistados apenas um, mesmo
assim parcialmente, diz que os netos no caso, mais velhos deixariam a escola para
ajudar na renda de casa e evitar o ócio na rua.
Todos os outros 13 pais trazem em suas respostas as expectativas de ascensão
social pelo conhecimento oferecido pela escola, ao falar de forma geral que desejam que
seus filhos sejam mais do que eles, tenham ocupação profissional diferentes das suas e
que acima de tudo aprendam mais para garantir um futuro melhor.
69
Teixeira (1971) em seus estudos traz exatamente essa perspectiva de escola
como possibilidade de ascensão social das classes menos favorecidas ao afirmar que a
educação escolar para todos apareceu como oportunidade de buscar pela escola, sua
posição na vida social independente de privilégios sociais. Segundo Teixeira (1971), a
escola universal viria a dar a cada indivíduo a oportunidade de ser na sociedade.
Estes pais ao enfatizarem em suas falas o ‘aprender mais e ser mais do que eles’,
demonstram dois interesses. O primeiro refere-se ao interesse pelo conhecimento;
esperando da escola melhores condições de ensino aprendizagem, que proporcione
conhecimento poderoso (Young, 2007) que transforme sua realidade social. O segundo
diz respeito a ocupação profissional que a escola pode proporcionar, também por meio
do conhecimento, interesses esses explicados por Sacristán e Gómez (1998), quando
afirmam o papel da escola na preparação para o mundo do trabalho.
Assim, com a análise dessa questão começa a aparecer a escola não “pura” da
qual falamos em outro momento, isto é, a escola que exerce diferentes funções a partir
de suas demandas sociais seja difundir conhecimento, preparar para o trabalho ou para o
convívio social, mesmo assim, os seus usuários ainda esperam dela aquilo que
consideramos essencial, a transmissão do conhecimento acumulado ao longo da história
da humanidade, como instrumento de ascensão social pelo trabalho.
Os quadros cinco e seis a seguir referem-se às perguntas relacionadas às
expectativas e motivações sobre a escola, ao porque esses pais mandam seus filhos à
escola, o que eles esperam dela, e se essas motivações sofreram mudanças após a
entrada do programa bolsa família.
Quadro 5 – Expectativas e motivações em relação escola
Albertina
É claro que mando as crianças para escola porque quero que elas aprendam e espero que
a escola ensine, mas também para não perderem o bolsa família que nos ajuda muito em
casa.
Madalena
Eu quero que o Danilo, seja mais do que eu, que não tenha que trabalhar no pesado com
limpeza como eu, e se com estudo não está fácil, imagina sem, espero que a escola o
ajude nisso ensinando ele aprendendo.
Ordália
Espero o melhor dos professores para os alunos e dos alunos para os professores, que
eles possam respeitar as pessoas todas que tem na escola e na vida, que aprendam e que
sejam mais do que eu.
Benedita Que meu filho tenha um bom conhecimento e sabedoria, para que ele venha a ter um
grande futuro pela frente.
70
Carla Espero que os meus filhos aprendam mais e mais.
Roberta Para que ele aprenda a ler e escrever, para ter um bom conhecimento das coisas.
Silmara Que ela possa ajudar meu filho a aprender e crescer para ser alguém na vida
Laura
Que a escola ajude meus filhos e serem homens e mulheres melhores, eu não quero que
eles passem pelo que eu passei, a escola e os professores são bons se preocupam e
ajudam o meu filho, mas está faltando segurança todo dia tem briga é que criança que
leva arma de brinquedo causando bagunça, falta segurança.
Gabriela
Que ela melhore mais um pouquinho, principalmente em relação a disciplina, porque
assim ela vai poder ajudar minha filha a ser alguém na vida, fazer uma faculdade coisa
que eu não fiz.
Renata Que ela ofereça estudo que é importante, para que meu filho possa estudar e aprender e
ter um futuro melhor.
Marcela Um bom aprendizado, para que minha filha possa ser alguém na vida, aprender a ler e
escrever.
Paula Que seja uma escola boa, com conhecimento forte, que ensine e ajude as crianças a
aprender.
Elza
Que seja melhor para meu filho e para os professores, diretor e coordenador, pois a
violência, a bandidagem e as drogas estragam a escola. E claro que seja uma escola que
ensine e ajude o meu filho ser mais do que eu com os estudos, que tenha profissão e
tudo que os estudos pode dar.
Antônia
Que melhore cada vez mais e em tudo, porque hoje não tá boa não, é professor, é diretor
e todos mal educados e que também ela trabalhe mais conhecimentos com meus filhos
para que eles possam crescer e ser mais do que eu no futuro.
Ao olharmos para esse quadro enxergamos todas as demandas que envolvem o
espaço escolar, desde a gestão, relação professor aluno, relação aluno – aluno, condição
de ensino aprendizagem, até os problemas com indisciplina, drogas, violência e
segurança, ou seja, os anseios relacionados à escola transcendem o ler, escrever e contar
que às vezes resumem o fazer escolar.
Essa afirmação nos leva a algumas reflexões acerca da própria pesquisa que aqui
é apresentada, que teve como ponta pé inicial o interesse em conhecer os possíveis
desdobramentos causados na função social da escola de transmissora do conhecimento,
a partir da entrada do Programa Bolsa Família.
No entanto, esse aspecto do roteiro de entrevista nos propiciou olhar a escola sob
os olhos dos pais, que a frequentam através de seus filhos, ou seja, a escola para esses
pais deve ser um local de transmissão de conhecimento e possibilidade de ascensão
71
social, todavia eles enxergam uma escola cheia de mazelas que precisa de qualidade no
seu aspecto global de acesso, permanência e coerência de conteúdos e ações.
Nesse sentido mais uma vez os estudos de Teixeira (1971) sobre ascensão social
por meio da escola e as considerações de Sacristán e Gómez (1998) que pontuam o
papel preparador da escola para o mundo do trabalho e convivência social ao longo da
história, nos ajudam a compreender as expectativas e motivações dos pais em relação à
escola.
Estas transcendem o ler, escrever e contar, e relacionam-se com a melhoria do o
cotidiano escolar, talvez os quatro pilares da educação pontuados no documento
Educação, um tesouro a descobrir (DELORS, 2010), e o próprio Programa Bolsa
Família, se justifiquem nos anseios desses pais, que entendem a escola como um espaço
de transmissão do conhecimento, mas também de alternativa de equidade social.
Quadro 6 – Mudanças das expectativas após o PBF
Albertina Mudar, não mudou não, escola é sempre bom para aprender, mas agora pego mais no pé
das crianças para elas não faltarem.
Madalena
Claro que não, eu continuo esperando que a escola ensine e ajude meu filho a aprender,
o PBF ajuda bastante, mas como já disse quero que meu filho aprenda e seja mais do
que eu.
Ordália
Não mudou, continuo acreditando que a escola é para aprender e ajudar as crianças a
serem melhor que os seus pais que muitas vezes não foram para escola, mas mais do
que nunca não deixo eles faltarem para não perdermos o bolsa família.
Benedita Não mudou não, mas como ela fica com avó quando trabalho, falo com minha mãe pra
não deixar ela faltar, para não perdermos o bolsa família.
Carla O bolsa família não mudou meus pensamentos sobre a escola.
Roberta Nunca mudei o meu pensamento, a escola é importante para o futuro do meu filho, para
ele ser uma pessoa formada sobre as coisas.
Silmara Não mudou nada continuo acreditando que a escola é para ensinar, mas me preocupo
deles não faltarem para não perdermos o bolsa família.
Laura Não mudou não, continuo mandando meus filhos para escola para aprender.
Gabriela Não mudou, continua sendo o de que eles estudem para ser alguém na vida.
Renata Não mudou.
Marcela Não mudou continua as mesmas.
Paula Não mudou nada, escola é para estudar, aprender e ensinar.
Elza Mudou, antes eu não ligava muito de mandar meu menino para escola, mas hoje com o
PBF eu trago ele para escola sempre.
Antônia Não. Continua sendo os mesmos de antes, aprender para ter um futuro melhor.
72
No geral, podemos constatar que as expectativas e motivações dos pais em
relação à escola não mudaram após a entrada o Programa Bolsa Família, isto é, ainda
esperam da escola o conhecimento poderoso (Young, 2007) para ascender socialmente
por meio do trabalho Sacristán e Goméz (1998) e Teixeira (1961).
Porém, percebemos em algumas falas a preocupação com a frequência escolar
assídua da criança, para não perder o benefício bolsa família o que pode apontar
possível mudança nas expectativas dos pais em relação à escola de provedora do
conhecimento, para controladora do benefício.
Quadro 7 – Mudanças na escola e no desenvolvimento de seu filho
Albertina
Na escola não percebi nenhuma mudança não, continua a mesma porcaria, mas os
meninos estão aprendendo mais, porque vão mais para escola e eu pego no pé deles para
fazer a lição de casa e estudar.
Madalena Eu não percebi mudança nenhuma na escola não, o Danilo tem umas dificuldades, não
gosta muito de matemática e tem se esforçado na escrita e eu ajudo como posso.
Ordália A escola não mudou, mas o fato das crianças irem mais a escola parece que estão se
desenvolvendo mais.
Benedita Creio que mudou bastante, e como agora eu incentivo mais elas irem para escola por
causa do bolsa família elas também aprendem mais.
Carla Não houve mudanças na escola e acho que são os professores que ajudam os nossos
filhos aprenderem.
Roberta Para mim a escola não mudou nada continua a mesma coisa e o desenvolvimento dos
meus filhos continua dependendo da educação dos professores.
Silmara Ah, a escola mudou sim as quadras foram cobertas, ganhamos um parquinho e as
crianças aprendem mais porque estão na escola com mais frequência.
Laura
Tudo na escola é igual o mesmo tratamento com alunos e pais, mas é claro que o
incentivo dado pelo bolsa família leva os alunos mais a escola e eles acabam
aprendendo mais também.
Gabriela A escola pode não ter melhorado, mas as crianças sim porque as mães têm mandado
mais elas pra escola o que ajuda no aprendizado.
Renata Não aconteceu nenhuma mudança, só que as crianças vêm mais pra escola para não
perder o bolsa família.
Marcela Não mudou nada, porque a escola não sabe do bolsa família.
Paula Não mudou não, a escola continua precisando melhorar em algumas coisas, mas pode
ser que as crianças aprendam mais por faltar menos por causa do bolsa família.
Elza Melhorou sim, porque as crianças vem mais para escola o que ajuda a aprender mais e
da mais responsabilidade para elas e para as mães.
Antônia Não mudou nada, continua a mesma porque o PBF não tem nada haver com a escola.
73
Quando os pais, afirmam não perceber mudanças na escola, estão se referindo a
melhorias no ensino, o que realmente pode não ter acontecido, pois o Programa Bolsa
Família (PBF) tem por objetivo a diminuição da vulnerabilidade social das famílias em
situação de pobreza ou extrema pobreza e não a melhoria da qualidade de ensino.
Contudo podemos perceber nas entrelinhas de algumas falas a preocupação com
a frequência escolar para não perder o benefício bolsa família, isso denota dois aspectos
um positivo e outro negativo.
O positivo refere-se à maior participação dos pais na vida escolar dos filhos
percebida quando alguns pais dizem exigir mais das crianças em relação aos estudos e
ajudar no dever de casa. Em contrapartida, o negativo expressa exatamente a nossa
preocupação, de que a escola passe a ser vista pelos pais como um espaço controlador
do benefício. Essa visão pode estar relacionada também com a sobrecarga da escola
destacada por Tenti (2007) que ao desempenhar papéis de assistência pode deixar a
desejar seu papel primordial ligado a transmissão de conhecimento – ensino
aprendizagem.
O último ponto tratado nas entrevistas foram as razões que levam os pais à
escola, seja para conversar com a professora, coordenadora ou diretora. Gostaríamos
com esse questionamento de conhecer as demandas dos pais junto à escola.
Quadro 8 – Demandas junto à escola
Albertina
Conversar com a diretora, coordenadora ou professora só quando sou chamada por
causa do comportamento do Gerson, ou quando tem reunião de pais, mas passo sempre
na secretaria para pegar declarações para o bolsa família e saber se ele tem vindo pra
aula, para não perder o leite que também ajuda.
Madalena É difícil eu vim trazer ou buscar o Danilo, mas sempre que passo por aqui é para ver
como ele anda, seja na frequência ou na bagunça (risos).
Ordália
Procuro a escola para saber do aprendizado, das faltas, mas com mais frequência pra
saber do leite que as vezes não chega em casa e também pra pegar declarações para o
bolsa família.
Benedita
Sempre que vou a escola é para saber do aprendizado, principalmente na reunião de
pais, porque é difícil eu ir em outro horário, só quando preciso de alguma declaração
para recadastrar o bolsa família.
Carla Informações sobre o aprendizado do meu filho, mas também quando precisa as
74
declarações para o bolsa família.
Roberta Para saber do aprendizado, às vezes por causa do leite e também para pegar declarações
para o bolsa família.
Silmara Mais para saber do aprendizado do meu filho, e quando precisa porque o leite não chega
também pergunto e pra pegar a declaração do bolsa família.
Laura Do aprendizado e comportamento e muito raramente a declaração para o bolsa família.
Gabriela Para saber do aprendizado e quando preciso da declaração do bolsa família, ou quando o
leite não chega em casa.
Renata Para saber do aprendizado e quando é a época pegar a declaração do bolsa família.
Marcela Aprendizado e comportamento e as vezes leite e pelo ao menos uma vez a cada um ou
dois anos o bolsa família.
Paula
Me preocupo com o aprendizado e comportamento do meu filho, mas também procuro a
escola para saber porque o leite não chegou e para pedir declaração para
recadastramento do bolsa família.
Elza
Eu me preocupo com o aprendizado, com as faltas e também com o PBF e Leve-Leite,
mas normalmente me informo disso nas reuniões ou quando me é pedido algum
comprovante para o PBF.
Antônia Para saber do aprendizado, quando tem reunião ou quando sou chamada por causa do
comportamento dela.
Todas as falas trazem dois aspectos: o interesse no aprendizado das crianças e
ao mesmo tempo as condições para manter o benefício, isso que dizer que ao mesmo
tempo em que, esses pais ou responsáveis vão à escola para saber de seu filho (a),
normalmente nas reuniões, eles também vão a escola para conseguir os instrumentos
(declarações, atestados de matriculas e etc.) necessários para manter benefícios como o
Programa Bolsa Família, Leve-Leite e tantos outros que permeiam a escola.
Essa dualidade funcional da instituição de ensino, expressada nas diferentes
demandas dos pais junto à mesma, apontam para aquilo que Tendi (2007) destacou
como multifuncionalidade da escola, isto é, ao mesmo tempo em que esta cuida da
transmissão do conhecimento, cuida também de políticas de diminuição de
desigualdades sociais, essa diversidade de funções pode esvaziar a função primordial da
75
escola que é o processo de ensino aprendizagem. Este sim, se fosse bem desenvolvido
poderia ao longo do tempo diminuir as desigualdades sociais e não os programas
assistências.
Tais perspectivas são subsídios para discussão de nossa hipótese de pesquisa: de
mudança da função social da escola a partir da entrada do Programa Bolsa Família.
3.4.2. Análise 2: Questionários dos Professores
Quadro 9 - Caracterização dos professores.
NOME16
SEXO PROFISSÃO TURMA
Tulipa Feminino Prof.ª de Educ.
Infantil e Fund. I 3ºano
Rosa Feminino Prof.ª de Educ.
Infantil e Fund. I 3º ano
Angélica Feminino Prof.ª de Educ.
Infantil e Fund. I 4º ano
Violeta Feminino Prof.ª de Educ.
Infantil e Fund. I 4º ano
Iris Feminino Prof.ª de Educ.
Infantil e Fund. I 4º ano
Amarílis Feminino Prof.ª de Educ.
Infantil e Fund. I 5º ano
O grupo de professores é constituído por seis sujeitos, todos do sexo feminino,
docentes do Ensino Fundamental I.
16
Todos os nomes utilizados nessa pesquisa são fictícios, o que ao mesmo tempo em que caracteriza o
sujeito pesquisado, preserva o anonimato de sua identidade.
76
Quadro 10 - Sobre a concepção de função social da escola
Tulipa Leitura e escrita com recursos do cidadão se torna ativo na sociedade.
Rosa Manter o aluno na escola no período matriculado, para que tenha o direito a
aprender.
Angélica
Ensinar o aluno a ler, escrever e trabalhar as quatro operações matemáticas
(investigar, compreender, descobrir, vivenciar, experimentar) são situações
que surgirão após compreender a leitura e a escrita e o raciocínio lógico,
despertar para leitura do cotidiano.
Violeta O objetivo principal da escola é oferecer ao cidadão conhecimento que
contribuam para sua formação.
Iris Desenvolver as potencialidades dos alunos para integrá-los na sociedade.
Preparar para vida.
Amarílis Educar, preocupação com ensino e a aprendizagem.
Como podemos verificar a ideia mais frequente relacionada à concepção de
função social da escola refere-se à transmissão do conhecimento, ou seja, para maioria
dos professores a escola tem o papel de organizar e transmitir o conhecimento para
formar cidadãos ativos na sociedade.
Perspectiva essa que perpassa todos os autores que embasam nosso trabalho,
para Sacristán e Gómez (1998) a escola é responsável exatamente pela formação dos
sujeitos para viver em sociedade, praticar cidadania e executar trabalho.
Para Hamilton (2001) a escola é instrumento de organização da sociedade e de
suas ocupações, principalmente a questão da instrumentalização, do ensinar aquilo que
transcende os ensinamentos familiares de usos e costumes. Concomitantemente Young
(2007) define o papel da escola como o lugar de oferecimento do conhecimento
poderoso, aquele que não se aprende em casa com os familiares, conhecimento esse que
penso ser o tratado nas entrelinhas das falas das professoras pesquisadas.
Outro ponto interessante a ser destacado é a presença dos ‘chavões educacionais’
como: formar cidadãos, desenvolver as potencialidades dos alunos, integrá-lo a
sociedade, esses tratados posteriormente como discurso de praxe, vazio, embasados em
documentos oficiais que denominam o que é educação, como a Lei de Diretrizes e
77
Bases 1996 e Constituição Federal de 1988, mas que na prática muitas vezes não dizem
nada além de palavras bonitas distantes da realidade.
A professora Rosa também enfatiza em sua exposição à legalidade do direito a
educação, quando afirma “é função da escola manter o aluno matriculado, para que
tenha direito a aprender”, essa fala transcende chavões educacionais enfatizando a
responsabilidade da escola com o processo de ensino aprendizagem.
Uma vez que esse direito é garantido por lei no artigo 206 da Constituição
Federal de 1988 e nos artigos 3º e 4º da Lei de Diretrizes e Bases da Educação 9394/96,
e seus incisos, definindo ambos em seus princípios a igualdade de acesso e permanência
na escola e a liberdade de aprender:
O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios:
I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;
II - liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar o pensamento, a
arte e o saber (CONSTITUIÇÃO FEDERAL, 1988, p. 5 e LEIS DE
DIRETRIZES E BASES DA EDUCAÇÃO, 1996, p. 7)
Enfim, podemos dizer que para os professores transmitir conhecimento para
formar cidadão e preparar para vida é função social da escola.
Tabela 11 - Do conhecimento sobre o Programa Bolsa Família (PBF)
Tulipa
É um programa onde se exige a presença dos filhos na escola e vacinação em
dia, para família que vivem em situação de pobreza, com renda per capita de
R$ 70,00. A única relação com a escola que percebo é a presença dos alunos
mais assídua.
Rosa É um programa oferecido aos pais, para que tenham interesse de manter seus
filhos na escola.
Angélica Sei que cobra frequência do aluno, que a família recebe uma quantia por
mês, e penso que é muito importante na renda da família.
Violeta O Programa Bolsa Família é uma complementação de renda oferecida aos
pais com crianças na escola.
Iris Sei muito pouco, apenas que alguns alunos participam, mas não sei quem são
e nem quais são os critérios de escolha.
Amarílis Sei que a intenção é incentivar os pais se preocuparem com o
desenvolvimento educacional do filho, mas nem sempre é o que ocorre.
78
De forma geral, os professores conhecem o Programa Bolsa Família de maneira
genérica e superficial, conseguem elencar a exigência de frequência escolar e
acompanhamento de saúde como condição para o recebimento do benefício. E
entendem esse benefício como um estímulo, um incentivo aos pais para manterem seus
filhos na escola.
Esse conceito de incentivo que aparece especificamente nas falas das professoras
Rosa e Amarílis pode denotar o possível esvaziamento da função social da escola de
oferecedora do conhecimento para controladora do programa.
Outro ponto interessante é o trazido pela professora Iris ao afirmar que sabe
muito pouco do programa, apenas que alguns alunos recebem, mas não sabem quais. O
não saber quem são os alunos, pode não permitir aos professores constatar as mudanças
no desenvolvimento dos alunos esperada pelos objetivos do programa a partir do acesso
e permanência na escola.
Portanto, podemos dizer que os professores conhecem o programa e reconhecem
como relação mais frequente da escola com este a questão da frequência e assiduidade
escolar, pois quando perguntado ao grupo sobre se houve aumento na frequência e
assiduidade dos alunos depois do Programa Bolsa Família quatro dos seis responderam
que sim e apenas duas dizem não perceber mudanças.
Isso demonstra que o objetivo do programa de garantir o acesso e permanência
na escola tem sido atingido.
Quadro 12 - Interferência do Programa Bolsa Família no trabalho pedagógico
Tulipa Não, o trabalho continua com o mesmo objetivo.
Rosa Não sei, pois ingressei na escola da prefeitura a pouco tempo e não consigo perceber
diferença.
Angélica Sim, o fato de a criança estar presente na escola é muito importante para ela, pois
propicia acompanhar e melhorar seu conhecimento.
Violeta Não, nunca recebemos orientações para que alterássemos o trabalho por conta do
programa.
79
Íris Sinceramente, não.
Amarílis A preocupação dos faltosos resume-se em vai ou não receber o bolsa família e não a
aprendizagem.
Quando perguntados sobre a interferência do Programa Bolsa no trabalho
pedagógico, de modo geral as professoras não percebem grandes diferenças no
desenvolvimento dos alunos, nem em seu trabalho em relação a eles, com exceção da
professora Angélica que destaca uma ideia presente também nas falas dos pais, a
questão de que se a criança está mais tempo na escola, ela tem mais chances de ser
acompanhada pedagogicamente e de melhorar seus conhecimentos.
A exposição da professora Amarílis, ao afirmar que a preocupação dos faltosos é
com o recebimento ou não do bolsa família e não com o possível conteúdo perdido em
sua ausência na escola, demonstra um provável esvaziamento da função social da escola
de oferecimento de conhecimento, para lugar de manutenção e controle do benefício.
Essa ideia pode ser explorada pelos estudos de Tenti (2009), que destaca o
prejuízo da multifunção da escola, isto é, o fato da escola cuidar do processo de ensino e
aprendizagem e ao mesmo tempo, “controlar, manter” as informações para os
programas de diminuição da vulnerabilidade social, como é o caso do Programa Bolsa
Família (PBF). Este autor pontua exatamente a possível sobrecarga de função e ao
mesmo tempo esvazio da função social primordial da escola que é o desenvolvimento
do conhecimento.
Quadro 13 - Demandas dos pais em relação à escola
Tulipa
Desenvolvimento pedagógico, frequência escolar, bolsa família e outros
programas assistenciais. Acredito que são todos, pois diante das conversas
com os mesmos, muitos assumem a importância de todos.
Rosa
Desenvolvimento pedagógico. Coloquei essa resposta, pois percebo que os
pais estão presente quando são convocados pela direção, na maioria das
vezes com problemas no desenvolvimento pedagógico do aluno.
Angélica Bolsa família e outros programas assistenciais. Infelizmente as famílias se
preocupam mais com o benefício do que com a construção do conhecimento.
80
Violeta
Não tenho como afirmar, qual o principal motivo dos pais para virem a
escola, mas o número dos que questionam faltas e o não recebimento do leite
é significativo.
Íris Frequência escolar. Os pais geralmente comparecem para justificar ausências
dos filhos, de outra forma somente quando convocados.
Amarílis
Bolsa família e outros programas assistenciais. Os pais de alunos com maior
dificuldade tem demonstrado mais preocupação com os programas
assistenciais.
Não são todas as respostas acerca das demandas dos pais em relação a escola
que explicitam a preocupação com o Programa Bolsa Família ou outros programas de
assistência que permeiam a unidade de ensino. Todavia, em quatro das seis falas, a
inquietação em saber e justificar as faltas para manter a frequência em dia pode dar a
entender que uma das maiores preocupações dos pais em relação a escola é o benefício
e não o ensino.
As duas outras exposições que não citam os programas sociais, como causa da
visita dos pais na escola, foram baseadas pelos pesquisados na prontidão dos pais,
quando chamados a escola para tratar de assuntos pedagógicos.
Esses dados dão a entender que as demandas dos pais em relação a escola
resumem-se a assistência e ao desenvolvimento pedagógico, questão já interpretada à
luz do conceito de multifunção da escola de Tenti (2009).
Quadro 14 - Mudanças das expectativas dos pais em relação à escola após o
PBF.
Tulipa Não houve.
Rosa
Acredito que não, pois a maioria dos alunos que recebem esse benefício são
muito carentes, o os pais não estão preocupados com mudanças na escola e
sim com o benefício.
Angélica
Eu acredito no programa, sendo assim mesmo que a frequência estará
atrelada ao assistencialismo, a escola sempre vai colaborar para melhorar a
construção do conhecimento.
81
Violeta Não, não é possível fazer essa afirmação, não nos é informado qual criança é
beneficiária e não percebo diferenças entre as que são e as que não são.
Íris
Só a expectativa de receber o benefício.
Amarílis Não houve.
De acordo com os professores pesquisados não houve mudança na perspectiva
dos pais em relação à escola após a entrada do Programa Bolsa Família, com exceção da
professora Íris que pontua em sua fala a expectativa e possível preocupação dos pais em
receber o benefício, fato que pode demonstrar uma possível mudança de expectativa,
uma vez sendo, a função da escola a transmissão do conhecimento, a atenção dos pais
deveria ser na qualidade, quantidade e forma desse conhecimento e não nos programas e
políticas de assistência agregados ao espaço no qual ele é oferecido.
Quadro 15 - Acesso e permanência na escola exigido pelo PBF relacionado a
melhoria do rendimento escolar dos alunos beneficiários
Tulipa Não. Pois os pais e alunos não fazem essa relação de compromisso.
Rosa O rendimento escolar dos alunos depende da união do professor com a
família, quando isso não acontece, só a frequência não garante rendimento.
Angélica Acredito que sim. Pode não ser para todos, mas que uma grande parte dos
alunos beneficiários tem um bom desempenho, isto é real.
Violeta
O acesso e a permanência na escola é um dado extremamente positivo para a
aprendizagem das crianças, mas não tenho como afirmar se há diferenças
entre beneficiários e não beneficiários. Geralmente não percebo diferença.
Íris
Acho que não. O acesso e a permanência deles não garantem um melhor
rendimento. Os problemas estão nos valores morais, éticos. Na minha
opinião.
Amarílis Não, porque os alunos relacionados que tem bom rendimento independem do
Programa Bolsa Família.
82
No que diz respeito, ao acesso e permanência na escola exigido pelo Programa
Bolsa Família (PBF), relacionado à melhoria do rendimento escolar dos alunos
beneficiários, os dados mostram que segundo a maioria dos professores pesquisados não
se pode dizer que houve melhora do rendimento após o PBF (é importante ressaltar que
a melhora do rendimento escolar dos alunos beneficiários não é objetivo do programa, e
sim uma possível consequência).
Essa afirmação pode ter si dado pelo desconhecimento dos professores, dos
beneficiários de sua sala de aula. Pois quando a pesquisa foi apresentada ao grupo de
professores a primeira indagação deles foi a respeito de como responderiam um
questionário sobre os beneficiários do programa se não os conhecia (Diário de pesquisa,
2013), ou seja, talvez esse grupo não tivesse observado o desenvolvimento dos alunos
beneficiários por esse viés.
Todavia os professores elencam outros fatores que contribuem para melhoria do
rendimento escolar como: a parceria e compromisso família escola e os valores morais e
éticos.
A professora Angélica, não faz a relação direta do acesso e permanência na
escola com a melhoria do rendimento escolar, mas afirma que grande parte dos alunos
beneficiários do programa tem bom desempenho escolar, porém não podemos dizer que
esse fato se deu pelo benefício, primeiro porque os alunos beneficiários até a pesquisa
não estavam sendo acompanhados pedagogicamente com esse olhar e segundo porque
não sabemos como era o desenvolvimento do aluno antes do PBF.
Enfim, de modo geral os professores não relacionam o acesso e permanência
exigido pelo programa, como condição de melhoria do rendimento escolar.
83
Quadro 16 - Programas sociais e mudanças das expectativas dos pais em relação
a escola.
Tulipa Para alguns sim, pois muitos pais deixaram de obrigar seus filhos a trabalhar
para estudar e receber esse benefício.
Rosa Não respondeu.
Angélica Sim, a construção da cidadania se faz também com valores e beneficio, uma
inclusão positiva.
Violeta
O que mudou é que hoje as crianças vem para a escola mais cuidadas do que
vinham antes (com tênis, meias, mochilas, agasalhos), mas a expectativa dos
pais não mudou.
Íris
Esses programas contribuem para que o foco da educação esteja em outros
valores, que não a aprendizagem. A escola fica encarregada de muitas
funções e o ensino fica prejudicado.
Amarílis Não respondeu.
Essa questão diz respeito à visão dos professores sobre as possíveis mudanças
das expectativas dos pais em relação à escola a partir da entrada dos diferentes
programas sociais como: Leve-Leite, Bolsa Jovem, Jovem Cidadão entre outras em
especial o Programa Bolsa Família (PBF) aqui pesquisado.
Os argumentos apresentados a partir desse questionamento trouxeram a tona
diferentes perspectivas acerca da relação PBF escola, pois como vemos na maioria das
respostas o programa mudou a vida de seus beneficiários principalmente em seus
aspectos sociais, ou seja, pais deixaram de obrigar seus filhos trabalharem, crianças vêm
mais bem arrumadas para escola, com roupas e calçados em bom estado e asseadas.
Tais respostas apontam para possível diminuição da vulnerabilidade social, uma
vez que os beneficiários podem ter acessado bens materiais e de consumo e mais do que
isso bens sociais como saneamento básico e saúde, um dos objetivos do programa.
Esta diminuição de vulnerabilidade é apontada nos estudos de Tenti (2007)
como uma das condições para o aprendizado:
84
[...] A decir verdad, se sabe casi desde siempre que para un ninõ
empreenda y sotenga con éxito el difícil, largo y sotenido caminho
del aprendizaje escolar es preciso que se den algunas condiciones
sociales previas. En primer lugar, es necessario que haya satisfecho
otras necesidades materiales tan básicas como la de la alimentación
(TENTI, 2007, p. 128)
Ou seja, o sucesso escolar talvez esteja relacionado a demandas sociais externas
a escola, o que pode justificar a existência das políticas assistenciais na escola.
Entre as respostas podemos destacar a da professora Íris que afirma que esses
programas contribuíram para que o foco da educação esteja em outros valores, que não
a aprendizagem e afirma que a escola ficou encarregada de muitas funções o que pode
prejudicar o ensino.
Aqui vemos claramente a multifunção da escola tratada por Tenti (2009) e sua
própria declaração de que as políticas de assistência sobrecarregam a função primordial
da escola de transmissão do conhecimento, seja pela visão deturpada dos pais que
passam a esperar dela recursos além do ensino e da própria dinâmica da escola que
tende a se reorganizar para manter e alimentar programas sociais com informações e
dados.
3.4.3. Análise 3: Entrevista e questionários aos agentes administrativos
A pesquisa com esse grupo foi feita por meio de sete questionários e duas
entrevistas. Dos questionários entregues não obtivemos resposta de nenhum, ou seja, os
dados que aqui serão apresentados e analisados referem-se as duas entrevistas que
fizemos com os agentes administrativos.
Por ser o número de entrevistados pequeno, optamos por fazer a descrição de
cada um dos dados, sem a apresentação das tabelas, que estão disponíveis no anexo
desse trabalho.
85
A dupla pesquisada é caracterizada por um homem e por uma mulher, ambos
exercem a função de agente administrativo, todavia Âmbar17
atua mais diretamente com
público geral da escola (pais, professores e alunos) e a Ametista cuida mais da parte
burocrática (digitação de listas, merendas, materiais, evolução funcional).
Quando perguntados sobre o conhecimento acerca do Programa Bolsa Família
(PBF) e sua relação com a escola, ambos apontam para características e objetivos gerais
do programa como: repasse de dinheiro a famílias carentes, exigência de frequência
escolar como condição para recebimento ou não do benefício e a obrigatoriedade da
escola enviar ao órgão responsável as faltas dos alunos a cada bimestre.
Ametista lembra ainda da necessidade de apontar os possíveis motivos18
das
ausências dos alunos em um item da página eletrônica de digitação do PBF.
Ao serem questionados sobre a interferência do PBF no objetivo da escola, a
dupla afirma que há interferência. Uma vez que percebem que a preocupação desses
pais nunca é com o desenvolvimento escolar de seu filho, mas sim, com as condições
para continuarem recebendo o bolsa família. Outro argumento citado por ambos é o
aumento da visita dos pais na escola para saber da frequência escolar, do recebimento
do leite, material escolar e outras solicitações a ‘respeito do que a escola dá’.
As demandas dos pais junto à escola, segundo os agentes administrativos
podem ser resumidas assim: as declarações para o bolsa família, inscrição e pedido de
matrícula para garantir o recebimento do benefício do PBF e de outros programas,
principalmente dos pais que vêm de outros estados, recebimento do leite e material
escolar e outros recursos sociais oferecidos pela escola.
No que tange a percepção das expectativas dos pais em relação à escola, os dois
entrevistados declaram que estão voltadas para o que a escola pode dar além do
conhecimento, ou seja, nos programas sociais que variam de complementação alimentar
a transferência direta de renda.
17
Todos os nomes utilizados nessa pesquisa são fictícios, o que ao mesmo tempo em que caracteriza o
sujeito pesquisado, preserva o anonimato de sua identidade.
18 Lista de motivos disponível no anexo desse trabalho.
86
Em relação às mudanças das expectativas dos pais a partir da entrada do PBF na
escola, ambos agentes afirmam que elas se modificaram, pois eles acreditam que a
escola antes dos programas sociais era melhor, porque os pais estavam mais
preocupados com a escola e conhecimento que ela oferecia e não com os recursos
econômicos que ela poderia dar.
Ametista também destaca o esvaziamento do conhecimento da escola e o tempo
que a gestão e os professores despendem para preencher listas e rever faltas para esses
programas.
Quando inquiridos se a exigência de acesso e permanência na escola melhorou o
rendimento escolar, os entrevistados concordam que esse aluno é mais frequente,
todavia afirmam que as provas externas e os comentários de corredores e sala dos
professores não apontam melhoria no rendimento escolar, mas ambos creem que e
assiduidade na escola pode contribuir para a aprendizagem.
A visão trazida pelos agentes administrativos demonstra exatamente o
esvaziamento da função social da escola, a qual nos referimos ao longo desse trabalho.
Em nenhuma de suas falas pode-se constatar o contato do pai com a escola para saber
sobre o desenvolvimento da aprendizagem de seu filho (a), mas sempre ligada aos
recursos financeiros, alimentícios ou de outra ordem que a escola oferece além do
ensino.
Os autores que basearam teoricamente essa pesquisa apontam para não
neutralidade e variedade da função social da escola ao longo da história. Preocupamo-
nos aqui com a função social da escola ligada a transmissão de conhecimento. Os dados
dos agentes administrativos mostram que a escola está esvaziada dessa função e que se
resume pura e simplesmente ao controle dos programas sociais, segundo o viés da
relação escola família observada por eles.
Assim, podemos dizer que a multifunção da escola (Tenti, 2009) de cuidar do
conhecimento e das questões sociais por meio dos programas sociais, realmente
sobrecarregou e modificou a função social da escola, dando a compreensão para os pais
de um espaço de controle e manutenção dos benefícios atrelados a ela ao invés de lugar
do conhecimento.
87
Considerações Finais
Este trabalho teve como intuito conhecer a função social da escola depois da
entrada do Programa Bolsa Família.
A partir de experiências no campo educacional, de questionamentos e discussões
sobre as políticas públicas de assistência na escola, foi levantada a hipótese de que o
aspecto educacional do Programa Bolsa Família poderia ter reconfigurado à função
social da escola, ou seja, de transmissora de conhecimento para controladora e condição
para o recebimento do beneficio Bolsa Família.
O primeiro desafio encontrado durante a investigação foi a própria definição do
que entendíamos como função social da escola, já que ao longo da história as
instituições de ensino possuíram diferentes funções sociais sempre ligadas às demandas
científicas, econômicas e sociais de uma sociedade.
Encontramos nos estudos de Teixeira (1971), Fernández (1989), Sacristán e
Gómez (1998), Hamilton (2001), Tenti (2007) e Young (2007) conceitos de educação e
sua relação com a sociedade no decorrer da história humana, o que contribuiu
significativamente para constituição do nossa definição de função social da escola.
Função essa definida e assumida neste trabalho como: não neutra, complexa e
multifacetada, todavia diretiva, pontual e transformadora voltada para transmissão e
desenvolvimento do conhecimento formal.
Assim, a busca de confirmação ou refutação da hipótese exigiu conhecer o que
pais, professores e agentes administrativos da instituição de ensino entendiam como
função social da escola e se houve mudança dessa após a entrada do Programa Bolsa
Família.
O procedimento de pesquisa constituiu-se em: selecionar a escola com mais
beneficiários do Programa Bolsa Família da Diretoria de Ensino do Butantã no
Município de São Paulo, além de elaborar um instrumento de coleta de informações –
questionário e roteiro de entrevista para que os pais, professores e agentes
administrativos respondessem.
88
Os resultados permitem algumas considerações, contudo não pretendem concluir
ou fechar a possibilidade de outras formas de análise, dado que a pesquisa não trabalhou
com amostragem de escolas, professores e alunos, o que não nos permitiu fazer maiores
generalizações e nem mesmo concluir de forma mais assertiva.
Com a entrevista direcionada aos pais, podemos perceber que independente do
Beneficio Bolsa Família eles ainda esperam da escola transmissão de conhecimento
para ascensão social. A maioria das falas é permeada pela seguinte afirmação ‘eu quero
que meu filho seja melhor do que eu, conclua os estudos, chegue à faculdade e tenha
uma profissão’.
Essas ideias vão ao encontro de com os conceitos tratados por Teixeira (1971)
que entende a escola como um espaço de possibilidade de mudança e ascensão social,
por meio da diminuição de privilégios de classe e valorização das condições de
desenvolvimento do sujeito.
Por outro lado, as falas são também explicadas por Sacristán e Gómez (1998),
que relatam em seus estudos a perspectiva de escola responsável pela formação dos
sujeitos para viver em sociedade, praticar cidadania e executar trabalho.
Dos questionários direcionados aos professores, podemos destacar que todos os
entrevistados entendem a escola como um espaço de transmissão de conhecimento,
formação de cidadãos, preparação para o trabalho e convívio social (princípios tratados
por Sacristán e Gómez, 1998). Destacam também, que com a chegada do Programa
Bolsa Família houve um aumento da preocupação com a frequência escolar, que as
demandas dos pais junto à escola variam entre o pedagógico e os programas de
assistência e que teve melhoria das condições de vida dos alunos, percebidas pelo
cuidado com o corpo e higiene.
As entrevistas realizadas com os agentes de apoio foram as que mais trouxeram
dados de comprovação da possível mudança da função social da escola. Afirmam que as
demandas das famílias têm diferentes dimensões, desde transmissão de conhecimento
até a de oferecimento de políticas assistenciais, caracterizadas pelo repasse direto de
renda para a complementação alimentar.
89
Isso pode ser explicado pelo contato direto dos pais e de suas demandas
estendidas à continuidade dos benefícios, ou seja, é na secretaria da escola que os pais
conseguem declarações e comprovantes escolares da situação de seus filhos; solicitam
informações sobre o recebimento do leite, dos materiais escolares, da frequência e
tantos outros dados e informações que garantem o recebimento dos benefícios que a
escola possibilita, além do conhecimento.
Enfim, os agentes de apoio relatam que as preocupações dos pais estão
diretamente voltadas ao recebimento ou não dos benefícios, isto é, para os agentes a
escola mudou de função na perspectiva dos pais que atendem. Segundo eles a
preocupação demonstrada pelos pais volta-se aos benefícios assistenciais, e não ao
pedagógico. Os mesmos reconhecem que os alunos são mais frequentes, todavia não
podem dizer que existe grandes mudanças no desenvolvimento intelectual desses
alunos, mas verificam sim, pela observação, o aumento da bagunça, depredação e
violência na escola.
A percepção que os agentes de apoio têm dos interesses e demandas dos pais
junto à escola pode ser interpretada à luz do conceito de multifunção da escola que
Tenti (2007), traz em seus estudos. Para ele a sobrecarga de tarefas da escola,
principalmente as relacionadas aos cuidados com a assistência social pode confundir as
expectativas dos sujeitos (pais, alunos) em relação à mesma, podendo contribuir para
que esta não seja mais entendida como um espaço de conhecimento e sim de
oferecimento de políticas assistenciais.
Assim, pelas informações e pelas contribuições de Tenti (2007), nossa hipótese
foi parcialmente confirmada: os pais se preocupam com o Bolsa Família e outros
benefícios, mas não têm nele a maior motivação para mandar os seus filhos à escola, ou
seja, há uma preocupação além do benefício, ligada a ideia de ascensão social por meio
do conhecimento.
Os pais matriculam e mandam seus filhos para escola por acreditar que, por
meio do conhecimento disponibilizado e transmitido pela escola, seus filhos construirão
histórias diferentes das suas, serão mais profissionais e bem sucedidos
socioeconomicamente.
90
Escrevendo as considerações finais desse trabalho renova-se a sensação de que o
conhecimento é sempre algo em construção, pois algumas de nossas inquietações foram
respondidas, outras acalmadas e tantas outras reformuladas. A contribuição principal foi
estudar o papel social da escola depois da instituição do Programa Bolsa Família, e este
problema pôde ser analisado e respondido dentro dos limites estabelecidos pela escola
escolhida como objeto de estudo, pais, professores, alunos e agentes escolares que
participaram da pesquisa. Além disso, a análise está demarcada pelos conceitos dos
quais partimos.
Fica o anseio de que este trabalho amplie olhares e contribua para que outras
questões dentro deste tema sejam colocadas. Espera-se ainda pela ampliação dos focos
de análise e que estes possam contribuir para a reflexão, construção e transformação das
funções da escola à luz de novos conceitos e interpretações.
91
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95
ANEXOS
Anexo 1:
Questionários e roteiro de entrevista
1.1. Questionário enviado aos pais que não puderam ser entrevistados;
PONTIFICIA UNIERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PROGRAMAS DE ESTUDOS PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO: HISTÓRIA,
POLITÍCA E SOCIEDADE.
AOS PAIS OU RESPONSÁVEIS
Meu nome é Janaina, sou professora e faço mestrado em Educação, estou
desenvolvendo uma pesquisa sobre o Programa Bolsa Família.
Gostaria de saber sua opinião sobre o Programa Bolsa Família e a escola de seu
filho (a), a pesquisa é anônima, isto é, todos os dados e informações coletadas serão
usados SOMENTE pela pesquisa, NENHUMA das informações dadas aqui
implicará no recebimento ou não do Bolsa Família.
Abaixo segue o questionário da pesquisa, caso possa e queira venha conversar comigo
pessoalmente no inicio ou final da aula é só colocar a data e o horário aqui:
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
NOME: ______________________________________________SEXO: (__) F (__) M
ESCOLARIDADE: ____________________________________ IDADE: __________
PROFISSÃO:_________________________________________
96
1. O que a Sra. (o) sabe sobre o Programa Bolsa Família?
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
2. A Sra. (o) acha importante que o Programa Bolsa Família exija que a criança vai
para escola para o receber benefício?
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
3. A Sra. (o) costuma conversar com seu filho (a) sobre a importância dele (a) ir a
escola para que vocês não percam o Bolsa Família? Por quê?
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
4. Seu filho (a) já foi à escola doente ou com alguma indisposição de saúde para
não perder o Bolsa Família?
( ) Sim ( ) Não
5. Seu filho (a) deixaria de ir à escola se você perdesse o Bolsa Família? Por quê?
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
97
EM RELAÇÃO À ESCOLA:
1. O que a Sra. (o) espera da escola para seu filho?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
2. Porque a Sra. (o) manda o seu filho vai para escola?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
3. Depois do Bolsa Família os motivos para mandar seu filho a escola mudou? Por
quê?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
4. Para a Sra. (o) a escola mudou depois do Bolsa Família? Se sim, em quê a escola
mudou?
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
5. A Sra. (o) acredita que o Bolsa Família melhorou o aprendizado e a escola de seu
filho (a)?
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
___________________________________________________________________
98
SOLICITAÇÕES À ESCOLA:
1. Por quais razões você procura a professora, coordenadora ou diretora da escola de
seu filho (a)?
( ) para saber do aprendizado;
( ) para saber das faltas;
( ) para saber do Bolsa Família, Leve Leite ou outros programas assistenciais.
1.1.2. Questionário dedicado aos professores:
PONTIFICIA UNIERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PROGRAMAS DE ESTUDOS PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO: HISTÓRIA,
POLITÍCA E SOCIEDADE.
Este questionário faz parte da Pesquisa Escola e o aspecto Educacional do Programa
Bolsa Família, apresentada ao Programa de Estudos Pós-Graduados – Mestrado – em
Educação: História, Política, Sociedade da Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, para obtenção do titulo de MESTRE em EDUCAÇÃO, sob a orientação da
Professora Doutora Leda Maria de Oliveira Rodrigues. Pretende-se investigar se houve
mudança na concepção de uma das funções sociais da escola, ou seja, o de oferecimento
de conhecimento formal e científico para assistência social, a partir da exigência
educacional do Programa Bolsa Família. O conteúdo coletado e sua análise ficarão
restritos ao trabalho em questão.
NOME: ______________________________________________SEXO: (__) F (__) M
TURMA: ______________________
99
1. Na sua concepção, qual é a função social (objetivo) da escola?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
2. O que você sabe sobre o Programa Bolsa Família e a sua relação com a escola?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
3. Após a entrada do Programa Bolsa Família na escola os alunos beneficiários
passaram a ser mais assíduos (frequentes)?
(__) Sim (__) Não
4. Há ou houve interferência do Programa Bolsa Família em seu trabalho pedagógico?
Por quê?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
5. Quais são os motivos mais frequentes que levam os pais à escola:
( ) Desenvolvimento pedagógico;
( ) Frequência escolar;
( ) Bolsa Família e/ou outros programas assistenciais.
Por favor, comente sua resposta:
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
100
6. Após a entrada do Programa Bolsa Família, você percebeu que houve mudanças
das expectativas dos pais em relação à escola?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
7. Na sua concepção, o acesso e a permanência na escola exigida pelo Programa Bolsa
Família melhorou o rendimento escolar dos alunos beneficiários?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
8. Na sua concepção programas sociais como: Bolsa Família, Leve Leite, Renda
Mínima, Bolsa Cidadã, Jovem Cidadão e outros, mudaram as expectativas dos pais
em relação à escola?
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
____________________________________________________________________
101
1.1.3. Questionário aplicado a Gestão da escola: coordenação, direção e assistente
de direção.
PONTIFICIA UNIERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PROGRAMAS DE ESTUDOS PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO: HISTÓRIA,
POLITÍCA E SOCIEDADE
Este questionário faz parte da Pesquisa Escola e o aspecto Educacional do Programa
Bolsa Família, apresentada ao Programa de Estudos Pós-Graduados – Mestrado – em
Educação: História, Política, Sociedade da Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, para obtenção do titulo de MESTRE em EDUCAÇÃO, sob a orientação da
Professora Doutora Leda Maria de Oliveira Rodrigues. Pretende-se investigar se houve
mudança na concepção de uma das funções sociais da escola, ou seja, o de oferecimento
de conhecimento formal e científico para assistência social, a partir da exigência
educacional do Programa Bolsa Família. O conteúdo coletado e sua análise ficarão
restritos ao trabalho em questão.
NOME: ______________________________________________SEXO: (__) F (__) M
CARGO:_____________________________________________
1. O que você sabe sobre o Programa Bolsa Família, Programa Leve Leite e a sua
relação com a escola?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
102
2. Na sua concepção o Programa Bolsa Família e Programa Leve Leite interferem
no objetivo da escola? De que forma?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
3. Quais são os motivos mais frequentes que levam os pais à escola:
( ) Desenvolvimento pedagógico;
( ) Frequência escolar;
( ) Bolsa Família e/ou Leve Leite.
Por favor, comente sua resposta:
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
4. Como você percebe as expectativas dos pais em relação à escola?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
5. Na sua concepção houve mudanças dessas expectativas depois do Programa Bolsa
Família? Quais?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
103
6. Na sua concepção o acesso e a permanência na escola exigida pelo Programa Bolsa
Família, melhorou o rendimento escolar dos alunos beneficiários?
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
______________________________________________________________________
104
ANEXO 2:
Tabelas de dados: Entrevistas Agentes Administrativos
QUADRO 17: Apresentação dos agentes
NOME SEXO CARGO
Ametista Feminino Agente administrativo
Âmbar Masculino Agente administrativo
QUADRO 18: Conhecimento acerca do Programa Bolsa Família e sua relação com a
escola
Ametista
Eu sei que é um programa que repassa dinheiro as famílias e que a
escola tem que mandar a frequência dos beneficiários ao órgão
responsável e determinado período de cada bimestre.
Âmbar Que é um programa para famílias carentes e que a frequência escolar
determina o recebimento ou não.
QUADRO 19: Interferências do Programa Bolsa família no objetivo da escola.
Ametista
Para mim há uma interferência sim, uma vez que você não percebe a
preocupação desse pai nunca com o como seu filho está na escola,
mas sim com as condições para continuarem recebendo o bolsa
família.
Âmbar
Houve interferência, isso pode ser percebido com as visitas frequentes
dos pais na secretaria para saber da frequência, o porque do
recebimento do leite e outras solicitações a respeito das coisas que
escola dá.
105
QUADRO 20: Demandas dos pais em relação a escola.
Ametista
Eu acredito que hoje, pelo que escuto os outros secretários responder
os pais só se preocupam e só vem a escola para requerer declarações
de matrícula e frequência para se cadastrar ou se recadastrar nesses
programas.
Âmbar
Nossa, quando não é a declaração para o bolsa família, é a inscrição
só pra garantir que se está procurando vaga, quando não é isso é o
porque meu leite não chegou em casa, fora o uniforme e as demandas
para outros programas como o bolsa jovem e outras.
QUADRO 21: Percepção das expectativas dos pais em relação a escola
Ametista Voltada para o que a escola pode dar além do conhecimento
“programas assistenciais”
Âmbar Os pais estão interessados no leve-leite, uniforme, material escolar,
bolsa família e outros.
QUADRO 22: Mudanças das expectativas dos pais depois do PBF
Ametista
Essa pergunta me leva a duas reflexões: primeiro de que a escola
antes desses programas sociais era melhor, porque os pais estavam
mais preocupados com o ensino e o conhecimento de seus filhos;
segundo, a escola da prefeitura assisti mais esse aluno dá mais coisas
para ele ficar na escola e esvazia a escola de conhecimento, nós, a
gestão e os professores, passamos um bom tempo preenchendo lista e
revendo faltas para esses programas.
Âmbar
Com certeza houve mudanças, antes do Programa Bolsa família tenho
a impressão de que os pais se preocupavam mais com a escola e o
conhecimento que ela estava passando e não se ia receber algo ou
não.
106
QUADRO 23: Acesso e permanência na escola, exigido pelo PBF melhorou o
rendimento.
Ametista
Do que ouvimos falar das provas externas e nos corredores não, mas
uma coisa é certa esse aluno vêm mais para escola e isso pode
contribuir para a melhora de seu rendimento.
Âmbar
Eu acho que não, porque eu percebo que muitos alunos vem para
escola com frequência, mas não é pra estudar e sim para bagunçar,
seja beneficiário ou não.