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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO PUC-SP MARCUS VINÍCIUS ANDRADE SANTOS A NOVA EVANGELIZAÇÃO E O PROCESSO DE SECULARIZAÇÃO À LUZ DO SÍNODO DOS BISPOS DE 2012 MESTRADO EM TEOLOGIA SÃO PAULO 2014

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

MARCUS VINÍCIUS ANDRADE SANTOS

A NOVA EVANGELIZAÇÃO E O PROCESSO DE

SECULARIZAÇÃO

À

LUZ DO SÍNODO DOS BISPOS DE 2012

MESTRADO EM TEOLOGIA

SÃO PAULO

2014

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MARCUS VINÍCIUS ANDRADE SANTOS

A NOVA EVANGELIZAÇÃO E O PROCESSO DE

SECULARIZAÇÃO

À

LUZ DO SÍNODO DOS BISPOS DE 2012

MESTRADO EM TEOLOGIA

Dissertação apresentada à Banca

Examinadora como exigência parcial para a

obtenção do título de Mestre em Teologia

Prática pela Pontifícia Universidade

Católica de São Paulo, sob a orientação do

Prof. Dr. Pedro Iwashita.

SÃO PAULO

2014

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO

PUC-SP

MARCUS VINÍCIUS ANDRADE SANTOS

A NOVA EVANGELIZAÇÃO E O PROCESSO DE SECULARIZAÇÃO

À

LUZ DO SÍNODO DOS BISPOS DE 2012

MESTRADO EM TEOLOGIA

Banca Examinadora

______________________________________

______________________________________

______________________________________

2014

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Agradecimentos

A Trindade Santa que se desdobra em amor e proximidade para com

humanidade.

A minha comunidade Carmelitas Mensageiros do Espírito Santo, que

disponibilizaram compreensão e tempo para este estudo e como lugar teológico me

ajudam a viver a grandeza da fé nos pequenos detalhes que compõe a vida no cotidiano.

Aos professores Padre Sergio Conrado e Padre Pedro Iwashita que colaboraram

e acompanharam este trabalho, com preciosas observações e precioso discernimento.

A Adveniat que colaborou ajudando-me em parte dos custos para que

possibilitasse o avanço na elaboração do trabalho.

Ao apoio de pessoas que na vida pastoral pelas paróquias e comunidades em que

passeia me ajudaram a compreender com maior profundidade a corresponsabilidade

pastoral com aquele que é o Sumo e Eterno Pastor: Jesus Cristo.

A PUC Unidade-Ipiranga onde encontrei professores capazes de construir

sonhos e realidade que permitem proximidade com o Mistério de Deus e o mistério de

cada pessoa.

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À minha Mãe, Vaneusa Viana de Andrade, que em muitas de

nossas manhãs através de suas orações, palavras e exemplos

pastoreou o meu coração e o colocou na direção de Deus.

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Resumo

SANTOS, Marcus. A Nova Evangelização e o processo de secularização à luz do

Sínodo dos Bispos de 2012.

Ao apresentarmos as duas dimensões propostas pelo tema de abordagem deste

trabalho, buscamos dar um destaque a Nova Evangelização e como ela se coloca na

contemporaneidade. Conhecer por outro lado o processo de secularização e suas

distintas abordagens e desdobramento na história e no pensamento cientifico nos

permite olhar para o desafio evangelizador da Igreja com a devida sobriedade frente ao

necessário e permanente testemunho que a fé deve apresentar das razões que a animam.

Fazer a verificação destes dois mundos presentes no mesmo ambiente em que a vida

acontece permite-nos dialogar e até mesmo perceber, seja no que se refere à fé cristã,

seja o que se refere ao processo de secularização as dimensões que convergem em um

mesmo sentido e no que um coloca ao outro fronteiras conceituais.

Procuramos neste trabalho além da importante abordagem do processo de

secularização e o modo como os Padres sinodais refletiram sobre a presença do mesmo

nos ambientes eclesiais, abordar também uma nova compreensão do conceito de

evangelização e “nova evangelização” nesta atual etapa proposta e oferecida a toda a

Igreja a partir do Sínodo dos Bispos de 2012, e que culminou na Exortação Apostólica

Evangelii Gaudium do Papa Francisco. Sabemos que o resultado desta Exortação

Apostólica Evangelii Gaudium, reuni em si o “Sentire cum Eclesia”, não apenas a partir

de um epicentro institucional, mas um sentir eclesial a partir da universalidade

considerando o particular de cada experiência, cultura e vida dos diferentes rostos da

Igreja presente no mundo como um precioso contributo ao todo do tecido eclesial.

O Documento de Aparecida, assim como a V Conferência Geral do Episcopado

Latino-Americano e do Caribe foram sinais que levaram a Igreja a propor através de

dimensões maiores e não somente continentais, uma nova convocação universal a Nova

Evangelização tendo como referência o Sínodo de 2012.

A conclusão que apresento é que podemos adentrar mais profundamente neste

“novo paradigma” e nestes “novos conteúdos programáticos” que convocam a Igreja a

uma permanente conversão pastoral. Aprender a discernir os “sinais dos tempos” e se

fazer presente na história através de uma frutuosa atitude de resignificação de todos os

meios e estruturas, como de costumes ou tendências, para que a Igreja se veja menos

atada por elementos secundários, expressando sua força evangélica no mundo, e sendo

um sinal escatológico e histórico do Reino dos Céus em meio aos seus contemporâneos.

Palavras-chaves: Nova Evangelização, secularização, Conversão Pastoral.

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Abstract

SANTOS, Marcus. “The New Evangelization and the secularization process in the

light of the Synod of Bishops in 2012”

When we aim to present the two proposed dimensions given by the approaching theme

from this work, we seek to highlight the New Evangelization and how it is inserted in

the contemporaneity.

On the other hand, knowing the secularization process, its distinct approaches and its

unfolding in History and in the scientific thought, it allows us to see the evangelizing

challenge of the Church with the right sobriety before the permanent and necessary

witness which faith must present on the reasons that motivate it.

Verifying these two worlds which are present at the same environment where life

happens, it permits us to dialogue and even to realize, concerning to Christian Faith or

to the secularization process the dimensions are converged into the same sense and how

each of them provide concept borders.

Besides the important approaches on the process of secularization and how the priest of

the Synod reflected on the present of it in the Ecclesial environments, this work also

aims to express a new comprehension of the evangelization concept and the “new

evangelization” in this current proposed stage that is offered to the whole Church

starting from the Synod of Bishops from 2012 which culminated in the Apostolic

Exhortation of Pope Francis Evangelii Gaudium.

We know that the result of this Apostolic Exhortation Evangelii Gaudium reunites on

itself the “Sentire cum Ecclesia” not only from an institutional epicenter but an ecclesial

feeling from the universality considering life, culture and each particular experience of

the Church which is present in the world as a precious contribution to a whole Ecclesial

tissue.

The Document of Aparecida, as well as the V General Conference of the Latin

American and Caribbean Episcopate were signs that led the Church to propose a new

universal convocation to the New Evangelization not only continental but also through

greater dimensions by having the Synod of 2012 as a reference.

The conclusion I present is that we can go deeper in this “new paradigm” and in these

“new programmatic contents” that convoke the Church to a permanent pastoral

conversion. Learning how to discern the “signs of the times” and being present in

History thought a fruitful attitude of reframing of all means and structures, such as

customs and tendencies, so that the Church may see Herself less tied by secondary

elements, expressing Her evangelic strength in the world, and being a eschatologic and

historical signs of the Kingdom of Heavens among the contemporaries.

Key Words: New Evangelization, secularization, Pastoral Conversion.

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SIGLAS E ABREVIAÇÕES

AG Ad Gentes

CD Christus Dominus

CDF Congregação par Doutrina da Fé

CELAM Conferência Episcopal Latinoamericana

CFL Christisfidelis Laici

CIC Catecismo da Igreja Católica

CNBB Conferência Nacional dos Bispos do Brasil

CV Caritas in veritate

CVII Concílio Vaticano II

DA Documento de Aparecida

DM Documento de Medellín

DP Documento de Puebla

DS Documento de Santo Domingo

DV Dei Verbum

EG Evangelii Gaudium

GS Gaudium et Spes

LG Lumen Gentium

NMI Novo Millenio Ineunte

PP Populorum Progressio

RM Redemptoris Missio

SC Sacrossanctum Concilium

VD Verbum Domini

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SUMÁRIO

Introdução........................................................................................................................12

CAPÍTULO I

O PROCESSO DE SECULARIZAÇÃO COMO DESAFIO A FÉ CRISTÃ

1. Secularização e processo de secularização..........................................................16

2. O Sentido Histórico da secularização..................................................................17

2.1 A Tensão entre secularização e secularismo........................................................19

2.1.2 A Fé cristã e o Estado..............................................................................21

2.3 O Sentido Filosófico da Secularização................................................................24

2.4 O sentido sociológico da secularização.............,.................................................27

2.4.1 O Hibrido e a liquefação da vida como cultural..................................................28

2.4.2 Modernidade, ambivalência e as rupturas sociais e culturais..................29

2.4.4 Pluralismo, crise da modernidade e da razão iluminista..........................32

2.5. O Sentido Teológico da Secularização................................................................34

2.5.1 A Teologia da morte de Deus: espelho de um ambiente secularizado.....35

2.5.2 O Homem emancipado.............................................................................38

2.5.3 A teologia política e o projeto secularizador...........................................38

3. Uma nova antropologia e eclesiologia secular....................................................41

3.1 Degeneração da religião e a mercantilização da Fé.............................................42

3.2 O Corpo como sujeito central da mercantilização...............................................45

4. O Pontificado de Bento XVI e o processo de secularização.....,,,,,,.....................47

4.1. A Antiga Europa Cristã e os novos desafios da secularização............................50

4.2 Sínodo: A nova evangelização e a Transmissão da fé Cristã: “A Igreja existe

essencialmente para evangelizar”....................................................................................52

4.3 Papa Francisco e a resposta testemunhal á secularização ...................................52

II CAPÍTULO

EVANGELIZAÇÃO E NOVA EVANGELIZAÇÃO

1. O Conceito de Evangelização e “Nova Evangelização”......................................56

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1.2 A Nova Evangelização: “nova no seu fervor, nos seus métodos, nas suas

expressões”......................................................................................................................58

1.2.1 Fundamentos Teológico-Pastorais da nova evangelização......................60

12.2 Fundamento Antropológicos da Nova evangelização..............................62

1.2.3 Fundamentos Cristológicos da Nova Evangelização...............................63

1.2.4 Fundamentos Eclesiológicos da Nova Evangelização.............................64

1.2.5 Fundamentos Soteriológicos da nova evangelização...............................65

2. A Conversão: princípio fundamental para uma nova evangelização...................66

2.1 A Vida Eterna principiada nas bem-aventuranças...............................................68

2.2 A dimensão social da evangelização: O Reino de Deus e sua expansão no

mundo..............................................................................................................................71

2.3 A centralidade do ministério da pregação na nova evangelização......................74

2.4 Os novos evangelizadores-mistagogos................................................................76

3. A Igreja Particular, primeiro sujeito da missão...................................................78

3.1 A missão da pastoral orgânica como um desafio eclesial....................................79

3.2 A paróquia como lugar privilegiado para uma nova evangelização....................81

3.3 A Missão e a espiritualidade de comunhão.........................................................84

3.4 Novos movimentos eclesiais e nova evangelização............................................87

3.5 Nova evangelização e ecumenismo.....................................................................91

III- CAPÍTULO

CAMINHOS PARA UM NOVO PENTECOSTES

1. Conversão Pastoral: um novo paradigma e um novo programa de missão.........93

1.2 Missão Integral e evangelizadores com Espírito.................................................96

1.3 Auto-conversão eclesial.......................................................................................98

2. Discipulado e missão.........................................................................................104

2.1 Bispos, presbíteros, religiosos e leigos: discípulos missionários.......................108

2.1.1 O bispo discípulo Missionário..............................................................108

2.1.2 O sacerdotes discípulos missionários.....................................................109

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2.1.3 A vida consagrada discípula missionária...............................................111

2.1.4 Leigos discípulos missionários..............................................................112

3. A Igreja diaconal como rosto autêntico da comunidade cristã..........................114

3.1 O Querigma: primeiro anúncio e novas perspectivas........................................115

3.2 A Igreja: uma comunidade a serviço do amor e da verdade..............................117

3.3 Kairós: Um novo encontro pessoal com Jesus Cristo na Igreja.........................118

3.4 Em torno da Palavra...........................................................................................121

3.4.1 O lugar da homilia na nova evangelização............................................122

3.4.2 O ministério catequético........................................................................126

3.4.3 Os meios de comunicação e a nova evangelização................................128

4. A Igreja: Uma comunidade do testemunho a favor e em defesa da vida...........128

4.1 Redescobrir a sacralidade da família.................................................................129

4.2 A família célula fundamental a ser valorizada.....................................................132

4.3 A nova evangelização e os caminhos da educação..............................................133

4.4 Jovens que evangelizam jovens..............................................................................135

4.5 Os Santos: testemunhas credíveis e modelos para os “novos

evangelizadores.”...........................................................................................................136

5. A Igreja: uma comunidade do mistério partindo do mistério do ser humano ao

mistério de Deus............................................................................................................137

5.1 A liturgia e a Contemplação de Deus e do outro como pedagogia mistagógica a

serviço da nova evangelização......................................................................................138

5.2 Veni Creator Espiritus: “Como um novo Pentecostes”.....................................141

5.3 A experiência de Deus na nova evangelização como experiência de

Sentido...........................................................................................................................143

Conclusão.....................................................................................................................147

Bibliografia...................................................................................................................154

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Introdução

O objetivo central da pesquisa que procuramos aqui desenvolver é o de ressaltar

o sentido da nova evangelização dentro da missão e da natureza do próprio ser da Igreja

frente aos desafios postos pelo processo de secularização. A Igreja é essencialmente

missionária, ou seja, vive profundamente sua missão de evangelizar e de fazer presente

no mundo dos homens os valores do Reino de Deus. Dentro desta temática: Nova

evangelização e processo de secularização, encontramos o Sínodo dos Bispos como um

eixo importante de reflexão.

A partir do Sínodo ou sob a sua luz buscamos apresentar seja com os próprios

textos e discursos neles proferido, a Igreja na sua missão evangelizadora. Procuramos

aqui buscar compreender o fenômeno da secularização não apenas em seu sentido

contraditório, mas como um fenômeno que faz pensar a própria ação pastoral da Igreja

dentro desta configuração de mundo secularizado. Ao falarmos em nova evangelização

em nossos dias faz-se necessário compreender ao mesmo tempo as forças, as ideias e a

estrutura que a cada dia se faz sentir no grande tecido da sociedade e que traz marcas de

um mundo em acelerada transformação. A Nova evangelização com seus novos

evangelizadores são convidados a compreender este movimento e perceber quais são as

suas fronteiras conceituais e quais são os elementos que podem convergir para uma

preciosa colaboração para a própria obra evangelizadora.

A Igreja de Cristo está no mundo para ser sal da terra e luz do mundo. É

justamento dentro desta paisagem atual de paradoxos múltiplos que está mesma Igreja

composta de membros e de agentes de evangelização é convocada a ir de encontro com

o mundo contemporâneo e todas as suas conquistas e dramas. A Igreja é convocada a

sair, ir ao encontro vivendo o “Ide por todo mundo” como um “Indo” pelos caminhos e

estradas da história seja pessoal seja comum de todos os homens.

Tendo em vista o conjunto da dissertação, procurei no primeiro capítulo

apresentar um panorama comum sobre as grandes transformações operadas pelo

processo de secularização em algumas ciências humanas tais como a história, sociologia

e sociologia da religião, filosofia e teologia, buscando relacionar estes saberes e

compreender o processo de secularização como algo que permeia não só uma ciência de

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modo isolado, mas comunica ao seu entorno um impacto conceitual de reflexão sobre o

pensamento e o agir humano.

Uma das instituições a sentir os grandes impactos do processo de secularização

foi justamente a Igreja. A Partir deste impacto a Igreja é convocada a refletir sobre a sua

ação no mundo. Aqui se faz necessário compreender um caminho que proponha a

construção de uma resposta que não seja apenas uma nova apologética, um novo

confronto de conceitos e ideias, mas uma dialética deste mesmo processo. O sínodo ao

analisar tal processo convoca num primeiro momento a própria Igreja a redescobrir o

que significa evangelização e Nova Evangelização. Este é o ponto fundamental que

procuramos abordar no segundo capítulo considerando a importância de fazer crescer a

compreensão sobre a ação evangelizadora da Igreja.

No capítulo segundo ao colocarmos as bases da evangelização, e, por

conseguinte apresentar o contexto da convocação da Igreja para um a nova

evangelização procuramos evidenciar a atualidade e os desafios, sejam dos pastores,

seja de cada agente de evangelização frente a nova configuração de mundo. Procuramos

apresentar alguns fundamentos teológicos, pastorais, cristológicos, antropológicos e

soteriológicos que nos permitissem avançar dentro do trabalho percebendo alguns

conceitos fundantes da mesma missão evangelizadora da Igreja. Também trabalhamos

neste capítulo o valor das Sagradas Escrituras em sua importância na nova

evangelização. O sínodo falou da importância de valorizar a homilia e o contexto

litúrgico como lugar excelente de praticar uma hermenêutica da fé assim como uma

formação mais sólida, seja do clero como da vida consagrada e laical dentro dos

conteúdos centrais que são transmitidos através da Palavra de Deus..

A nova evangelização dentro do mundo atual deve acontecer como ensinava o

Papa João Paulo II por meio de um “novo ardor”, de “novos métodos” e “novas

expressões”. Isto demonstra que esperar mudanças significativas sem uma dinâmica

interna de reavaliação da própria ação evangelizadora seria cair numa nova estagnação

ideológica. A Igreja para dar respostas significativa a sua missão no mundo deverá

propor a partir de suas estruturas internas uma maior coesão e uma espiritualidade de

comunhão que permita que sua ação pastoral e evangelizadora não seja uma atividade

isolada de alguns grupos ou uma atividade sem alma. O trabalho apresenta algumas

propostas oferecidas pelo Sínodo dos Bispos de 2012, através de um planejamento de

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conjunto seja em nível de Igreja particular, seja em nível de Igreja universal

revalorizando a importância de todas as forças de evangelização dentro da Igreja e que

podem através de uma pastoral orgânica ser de grande valia a nova evangelização.

Dentro destas propostas verifica-se que a paróquia não é uma realidade ultrapassada,

mas uma presença viva em meio ao povo de Deus capaz de suscitar novas expressões

eclesiais, ao mesmo tempo às novas comunidades e os movimentos com seus carismas

específicos oferecem uma preciosa colaboração na ação evangelizadora da Igreja e

numa atitude de abertura podem melhor colaborar nas realidades paroquiais e

diocesanas em que estão inseridas. Para manter seja a força dinâmica da paróquia em

atividade, assim, como a colaboração dos novos movimentos e comunidade no seu

vigor evangelizacional é preciso uma auto-conversão eclesial, ou seja, uma conversão

pastoral. Este é o ponto que buscaremos abordar no terceiro capítulo a conversão

pastoral como uma pré-disposição da Igreja para viver um novo Pentecostes.

No terceiro capítulo, continuaremos a aprofundar os discursos do Sínodo tendo

como seu ponto culminante o texto da Exortação Apostólica Evangelii Gaudium em que

o Papa Francisco oferece por meio deste documento uma síntese e um sentir comum das

necessidades centrais da Igreja universal considerando a riqueza das Igrejas particulares.

Percebe-se, também, a presença da grande experiência pastoral do continente latino

americano e do evento que culminou no Documento de Aparecida, assim como a

preciosa experiência pastoral vivenciada pelo Papa Francisco como Pastor de uma

Igreja particular e agora de toda Igreja Universal. Deste modo algumas balizas são

apresentadas por meio da Exortação Apostólica Evangelii Gaudium para os próximos

anos. Uma das preciosas colaborações que estão em sintonia com o Sínodo e que a

Exortação Apostólica do Papa Francisco propõe é a necessidade de uma autêntica

conversão Pastoral. Conversão esta que deve ser fomentada pelo empenho de conversão

pessoal de cada membro do Corpo de Cristo, passando pela conversão das estruturas e

do modo de realizar a missão até atingir a vida dos pastores e ser um caminho de melhor

compreensão sobre o que significa ser pastor dentro dos atuais desafios. Como auxiliar

hoje os pastores a serem construtivos? Missionários em sua própria realidade pastoral?

São questionamentos importantes colocados aos pastores da Igreja. A Exortação propõe

colocar todas as estruturas da igreja em chave missionária. Compreender desde os

simples trabalhos cotidianos na comunidade até os que precisam de um melhor

discernimento e cuidado, dentro de um programa missionário. De tal forma que a

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pastoral da Igreja se torne profundamente missionária vivendo sua vocação ad intra e

ad extra. Sendo capaz de edificar para dentro e sair ao encontro daqueles que mesmo

batizados estão for ou distantes da prática de sua fé batismal.

Dentro destas perspectivas o trabalho procurou apresentar cada membro do

Corpo de Cristo como um discípulo missionário, que busca através de seu testemunho e

de seu compromisso com Cristo e sua Igreja viver de modo diaconal a sua fé. Vimos por

bem apresentar a Igreja no seu rosto diaconal à serviço de Deus e dos irmãos, seja

através da celebração dos sacramentos, seja na defesa da vida através da caridade, seja

através do anúncio da Palavra de Deus de modo a fazer com que a fé seja transmitida

operando transformações significativas na vida pessoal, familiar e social.

A Igreja diaconal está a serviço da vida e uma das maneiras de proteger e

promover a vida é proteger e promover a família. A família como Igreja doméstica e

célula mãe da sociedade é um lugar onde a vida pode se desenvolver. A família é

convoca a ser sujeito da nova evangelização comunicando valores cristãos e humanos

no seu próprio interior.

Dentro deste conjunto observamos que uma nova evangelização no contexto de

mundo secularizado só será possível tendo como protagonista a Pessoa do Espírito

Santo. O Espírito Santo é o promotor de um novo pentecostes na Igreja. Ao estudarmos

sobre o sínodo dos bispos de 2012 percebemos que o Sínodo dentro da esteira do

Concílio Vaticano II, pretende ser como bem afirmou o Papa João XXIII na abertura do

Concilio Vaticano II, como que um novo Pentecostes para toda a Igreja. Ao Modelo do

primeiro Concílio de Jerusalém, o Concílio Vaticano II e os subsequentes sínodos gerais

tem como finalidade principal tirar todas as faixas que impedem com que a beleza da fé

resplandeça por meio da Igreja e assim ela possa propor aos seus contemporâneos uma

experiência pessoal com Deus que de sentido a cada ser humano. Renovando, assim, a

vida cristã e a presença da Igreja no mundo como sinal escatológico e histórico do

Reino em meio aos homens.

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CAPÍTULO I

O PROCESSO DE SECULARIZAÇÃO COMO DESAFIO A FÉ CRISTÃ

1. Secularização e processo de secularização

O processo de secularização está profundamente ligado a modernidade e vem

penetrando na sociedade humana das mais variadas formas. Verifica-se que nos últimos

anos varias estâncias dos saberes sejam eclesiásticos ou seculares tem se ocupado com o

fenômeno da secularização. Este fenômeno tem sido um dos centrais objetos de estudo

recentemente na Igreja católica:

“A secularização se entende por um processo histórico pelo qual o

mundo toma consciência de sua consistência e de sua autonomia;

seria, portanto, um processo geral de libertação, pelo qual o homem,

a sociedade a cultura seriam libertados da tutela e do controle do

mito, da religião e da metafísica ou das normas ou instituições

dependentes do âmbito sacro ou religioso. As atenções são fortemente

voltadas contra o mito, (desmitização), contra o sacro,

(dessacralização), contra a metafísica, contra o sobrenatural e contra

a religião como tal”1

O processo de secularização hoje é um fenômeno que pode ser percebido e

notado não apenas como algo presente já no mundo, mas ele se coloca de tal forma que

se impõe como uma via existencial em busca de um humanismo que seja referencia para

o ser humano:

“À medida que a secularização avança, o caminho tradicional vai sendo

abandonado, a começar pelas elites intelectuais, pela classe operária e pela

juventude secularizada. Na origem, estão à virada cientifica, a crítica aos

mitos da natureza, o desfazimento da cosmologia ptolomaica, a entrada do

espírito cientifico de experimentação, a explosão da subjetividade, a

afirmação da autonomia.

1 KLOPPENBURG, Boaventura. O cristão secularizado. Petrópolis: Vozes: 1971, p. 21-22.

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Este novo caminho corta as paragens já trabalhadas pela nova visão

cientifica do universo. Deixa-se para trás toda leitura mítica da natureza. Só

realmente existe aquilo que cai sob a explicação da razão cientifica. Se algo

lhe escapa não vem da natureza da realidade, mas da imperfeição dos

conhecimentos e instrumentos científicos presentes. “Posterga para o futuro

certo, nem sempre previsível, a solução ainda não conhecida.2

“Para melhor situar o conceito de secularização e secularismo o presente

trabalho buscou situá-los dentro de um panorama histórico, precisamente porque na

“secularização” temos um conceito político-ideológico”. Ou seja, um conceito que, no

embate das idéias, não mais vem a ser diferenciado, mas se fixa no símbolo da posição

própria ou do adversário, e impõe-se uma explicação tanto mais cautelosa e sopesada

dos seus níveis de sentido, como também o dos seus níveis de sentido dados à palavra

“secularização”, enfatizando também a diferença entre secularização e o conceito de

“secularismo”.

2 O Sentido histórico da secularização

No sentido de fazer justiça as dimensões históricas deste conceito e ao seu

emprego sistemático e pluriforme, recomenda-se a análise histórico-conceitual ou

histórico-linguistíca dos mesmos, requerendo-se também o levantamento sistemático

dos principais sentidos do conceito de secularização na atualidade.

“Acentuações histórico- linguísticas. O dado histórico-linguistíco

aponta, no que se respeita aos dois termos mencionados

(secularização e secularismo), para o mesmo campo vocabular

derivado de saeculum. A palavra saeculum _ originalmente idade do

homem e Idade do mundo, sofre decisiva mudança de modo particular

na teologia Paulina, no contexto-bíblico cristão, onde o vocábulo

passa a ser usado no sentido de mundo do aquém dominado pelo

pecado (a ítala e a vulgata traduzem o grego aiôn por saeculum).

Esta ênfase, que não se acha absolutamente desprovida de valor,

continua marcando o contexto patrístico e medieval de saeculum (

mundo ), de que seria necessário fugir. Mas fornece o fundo para a

compreensão que o direito eclesiástico faz do conceito: secularizatio

2 LIBÂNEO, J.B. Qual o futuro do Cristianismo. São Paulo: Paulus, 2008, p. 17.

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é, conforme o CIC ( 684, 688, 691; 693), a dispensa de um membro de

ordem religiosa que rechaçou a profissão perpétua, do grêmio da

vida de clausura e o seu retorno definitivo ao “mundo”3.

Outras definições a respeito do conceito de secularização tentam encontrar em

acontecimentos históricos demarcações mais precisas sobre o conceito de secularização

tentando relacionar a figura da Igreja e o sua restrição no que diz respeito a expansão ou

a redução de seus bens onde este processo colocou limites ao processo de expansão

demográfica da própria Igreja:

O conceito de secularização adquire ênfase decisivamente nova e essencialmente

política na história da Igreja, que com este termo veio designar a expropriação por parte

do estado e o subseqüente uso para os fins profanos dos bens da Igreja, e na maioria das

vezes contra a sua vontade. No decorrer da história da Igreja muitas vezes se procedeu a

semelhantes confiscos de propriedades eclesiásticas para finalidades não eclesiais como

ocorrera, por exemplo, na época franco-carolíngia e posteriormente no tempo das

reformas. Neste contexto histórico e de modo mais específico nas tratativas que

antecede o tratado de paz de Vestfália, deve ter sido empregado pela primeira vez o

conceito de “secularização”, no sentido de passar do uso profano, em forte contraste

com o “espiritual”. A Intensificação desta linha de significado acarretam as

desapropriações dos bens dos mosteiros e das dioceses, como se levaram a cabo em

grande escala na Alemanha em 1803 pelo “Reich” alemão.

A partir deste fundo histórico, não admira que do ponto de vista dos

interessados, estes processos como tais tenha sido sentidos e julgados e condenados

como injustos. A categoria da ilegitimidade para caracterizar o conceito de

secularização torna-se, porém, problemática, quando este conceito passa a referir-se a

conceitos espirituais e culturais, ou seja, em sentido figurado. Somente com este

significado é que atinge aquele nível que possibilita o uso do conceito e a apreciação

respectiva de índole filosófica e teológica.4

Neste primeiro momento nos deparamos com o conceito de secularização que

encontrou na linguagem teológica um campo mais amplo de abordagem e de estudos.

3 DICIONÁRIO DE CONCEITOS FUNDAMENTAIS DE TEOLOGIA. São Paulo: Paulus, 2005, p.

815. 4 Ibidem, p. 815.

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19

Berger diz: “é possível também investigar suas origens históricas, inclusive sua conexão

histórica com o cristianismo, sem afirmar em um primeiro momento suas causas

positivas e uma degenerescência do mesmo. Este ponto deve ser particularmente

enfatizado, tendo-se em vista as discussões correntes entre os teólogos. Uma coisa é

sustentar que há uma relação de causalidade histórica entre o cristianismo e alguns

traços do mundo moderno. Outra completamente diferente é dizer que „portanto‟, o

mundo moderno, inclusive seu caráter secular, deve ser tido como certa realização

lógica do cristianismo. É saudável lembrar, a esse respeito, que a maior parte das

relações históricas tem um caráter irônico. Em outros termos, o curso da história tem

pouco a ver com a lógica interna das idéias, que nele aparecem às vezes como fatores

causais”.5 Outro aspecto do desdobramento histórico da secularização é que a guinada

antropológica fora interpretada de diversas formas sejam por aqueles que refletem as

mudanças que se deram na sociedade, ou seja, por aqueles que pretendiam se fazer os

sujeitos desta mudança colocando o homem no centro de todas as importantes e

possíveis transformações históricas que se deveriam efetuar. Por vezes este

antropocentrismo se verificou em sua fragilidade, por não saber conter ou direcionar

adequadamente toda a energia ideológica presente em si mesmo. É o que se verificou na

história da secularização, iniciada no século XVII, culminando no século XX com o

postulado da “morte de Deus” e com a exaltação do super homem. Os dois

totalitarismos mais assustadores da época, assim como as duas grandes guerras

mundiais são inexplicáveis sem estas duas teses que entram em crise depois de 1945

demonstrando assim, o lado doloroso do processo de secularização no que diz respeito

ao seu posicionamento radical e agressivo como se verificou em alguns momentos

históricos.6

2.1 A Tensão entre secularização e secularismo

Num segundo momento temos também a reflexão que se desenvolve sobre o

tema do secularismo que já é uma situação em que a secularização uma vez tendo

ganhado carta de cidadania procura se desenvolver como realidade inerente ao ambiente

5 BERGER, Peter. O dossel sagrado-Elementos para uma teoria sociológica da Religião. 1º Edição, São

Paulo: Paulus, 2004, p. 119. 6 L‟ Osservatore. Romano. sábado 10 de dezembro de 2012, número 45, p.10.

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social, político, jurídico que já se encontra marcadamente definido através de uma

reflexão altamente secularizada que busca cortar o foco de um horizonte transcendente

sobre a vida, o mundo, o ser humano e focá-lo na imanência das realidades temporais:

1. A palavra “secularismo” indica a forma mais radical de

secularização ou respectivamente o seu “estado consumado”

enquanto definitivo desvinculamento da religião ou a atitude de

espírito em que a secularização levou e na qual o homem restringe-se

exclusivamente ao campo do profano (contradizendo a interpretação

religiosa ou transcendente do sentido).O conceito alcança aí o seu

mais extremado limite, visto que no significado de interpretação do

mundo como pura imanência elimina-se o seu correspondente, que

dele originariamente fazia parte, a saber, o conceito de religioso e

sagrado, visto que então o horizonte, em que antes se achava incluído

o conceito de secular e secularismo, surge como tendo sido ocultado.

O conceito de secularismo nos meados do século XIX entende-se no

sentido de cosmo visão ideologicamente delimitada e acentuadamente

anti-religiosa7

Ao tentarmos definir o significado dos termos e conceitos que se relacionam

com o secularismo nos deparamos com uma gama de definições:

Secularizar é tornar secular o que era eclesiástico. Sujeitar às leis

civis. Absolver (alguém) do voto de clausura; deixar de ser religioso.

A origem da palavra indica claramente que se trata de um processo

contra o clericalismo, contra a separação de um universo eclesial do

resto do mundo, contra uma legislação de isenção que beneficia

pessoas e bens da Igreja; e finalmente, contra a separação do

religioso e do civil, do sagrado e do profano8

Geralmente uma grande parte das referências a secularização cai

numerosamente sobre uma definição puramente de cunho religioso-clerical.

7 DICIONÁRIO DE CONCEITOS FUNDAMENTAIS DE TEOLOGIA. São Paulo: Paulus, 2005, p.

816.

8 LEPARGNEUR, Hubert. A Secularização. 1ª edição. São Paulo: Duas Cidades, 1971, p. 36.

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2.1.2 A Fé cristã e o Estado

A história narra que com a queda do império Romano o cristianismo alcança

uma importante vitória que iria principiar mudanças significativas nos futuros séculos

no mundo da política, economia, filosofia e toda a compreensão sobre o mundo, o

homem e sobre Deus nos séculos seguintes. Após milênios de gerência de várias partes

do mundo e de forma especial da Europa o cristianismo experimentará um poderoso

golpe através da revolução Francesa onde se inicia uma revogação de todos os

privilégios e extensão de domínio que pertencia ao sacro Império Romano liderado por

Sumos Pontífices a século. Contudo a expansão da revolução Francesa com propósitos

que futuramente feriram sua relação com a Igreja deslocou de maneira contundente a

Igreja e sua pretensão política secular, ou pelo menos na prática enfraqueceu

consideravelmente o estado católico modelo de governo para o grande desenvolvimento

social: “a secularização transformou-se no grande desafio do mundo contemporâneo

com relação a Igreja, causa determinante da diminuição da prática religiosa, da redução

das vocações, da perda dos valores éticos do catolicismo na vida individual e familiar, e

ainda, em particular, por tender a meta de uma organização de vida coletiva que

prescinde dos valores cristãos, reduzindo ou anulando a importância social da Igreja”.9

O Beato João Paulo II em contrapartida ao avanço da secularização apresenta

uma oportuna “Nova Evangelização” como caminho para restaurar na Europa cristã a

relevância da fé na qual a sociedade receba novamente da Igreja seus valores

fundamentais.10

No interior da Igreja contemporânea várias motivações impulsionam

aos diversos grupos ou correntes espirituais, intelectuais ou organizacionais no que se

refere a secularização. Para os neo-integristas a secularização representa a atual ameaça

a Igreja em nossos dias. A Secularização seria o sinônimo de descristianização. Permitir

a marcha deste processo de secularização seria o mesmo que perder a identidade cristã,

moldando-se ao mundo e assumir princípios que seriam destrutivos para os valores

católicos. Já em outros ambientes católicos pensa-se justamente num programa e numa

agenda que procure justamente englobar de maneira universal toda a estrutura política,

sindical, econômica buscando garantir a incidência da Igreja católica buscando superar

9 AAS – 80 (1988), PP. 1310-14; 81 (1989), PP 233 e 1335-36; (1991), p. 99, e em “La documentation catholique”, 70 (1988), p. 1038. 10 TESTA.B. Nuova Evangelizzazione Dell`Europe nel magistero di Giovanni Paolo II. Bolonha, 1991, p. 46.

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por meio de uma “Nova Cristandade” os conflitos quanto aos limites conceitos no que

se refere à secularização e ao secularismo. Este movimento pretenderia concordar com

alguns postulados da modernidade tais como o pluralismo, os direitos humanos,

contudo, a Igreja deveria permanecer a ser a legitimadora última dos princípios da vida

social.11

Rosino Gibellini diz que a secularização tem dois significados: o jurídico, no

qual se vê a passagem de pessoas do estado clerical para o secular, o de bens

eclesiásticos a propriedade secular, e ainda o sentido cultural, que é bem mais tardio se

formando apenas por volta do final do século XIX e início do século XX, o qual aponta

para a emancipação da vida cultural da tutela eclesiástica.12

Portanto, desde os seus primórdios, o termo secularização, mostra-se já marcado

por um esquema antitético: o do dualismo de regular e secular que já contém em si

mesmo a metamorfose moderna dos pares “paulinos” celeste/terreno,

contemplativo/ativo, espiritual/mundano.

A teologia eclesial ainda não concebeu esta tarefa (ou seja: chamar o processo de

secularização, a partir de sua degeneração em secularismo, de volta até sua essência

verdadeira). Em vez disso, algumas linhas teológicas procuram reverter à secularização

como tal, na medida em que contrapõe a ela um modo de pensar baseado em realidades

sacrais, as quais pretensamente rompem e limitam a mundaneidade natural de todo o

existente.13

A distinção de conteúdo entre secularização e secularismo apresenta conotações

diferentes. Existe uma diferença entre a secularização e o secularismo. A palavra

"secularização" sugere um movimento, um processo, e não um estado essencial, o qual é

mais bem expresso pela palavra "secu1aridade".

Tendo verificado como Gogarten descreve a degeneração da secularização na

modernidade, cabe dar um nome a esta "degeneração". Isto Gogarten realiza ao

introduzir o conceito de secularismo. A tarefa necessária e possível da fé cristã é, para

11 BUTTIGLIONE, R. “Secolarizzazione e cristianitá”, em “La Chiesa Del concilio. Studi e contributi”, Milão, 1985, p. 165-184. 12 GIBELLINI, Rosino. A Teologia do século XX. 2ªEdição, São Paulo: Loyola, 2002, p. 123. 13 Wilfried JüEST, Verhangnis und Hoffnung der Neuzeit: Kritische Gedanken zu F..Gogartens Buch., 1966, p. 74.

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ele, proteger a secularização de sua degeneração em secularismo.

Isso não se faz, como

no modelo de cristandade, buscando-se inverter o processo de secularização, o que é

contraproducente, ou procurando-se uma apropriação eclesiástica deste processo.

Tendo como pano de fundo todo este processo de secularização em andamento

desde o século XVI na Europa de forma específica se verifica também um processo de

desclericalização que é apresentado como um desafio empírico para a Igreja. Sendo que

a proposta deslocada do teocentrismo a cada dia apercebe-se como que colocada de lado

pelos que promovem o processo de secularização e reconhecem que o teocentrismo

promove a dominação de Deus, assim como a hierocracia a dominação dos clérigos.14

A secularização transformou-se no grande desafio do mundo contemporâneo em

relação à Igreja, causa determinante da prática religiosa, da redução das vocações, da

perda dos valores éticos do catolicismo na vida individual e familiar, e ainda, em

particular, por tender a meta de uma organização de vida coletiva que prescinde dos

valores cristãos, reduzindo ou anulando a importância social da Igreja.15

Contudo, na

prática o que se verifica é que ainda existe uma incidência verbal da Igreja sobre várias

dimensões da sociedade, entretanto, o impacto da seculariação fez a Igreja reconsiderar

sua presença na sociedade frente ao secularismo pessoal e ambiental que permeiam as

novas estruturas sociais.16

O historicísmo, como a secularização, é visto como um produto do próprio

cristianismo. Ressegurado dessa sua proveniência, ele pode abrir espaço para uma

compreensão da historicidade onde autonomia e a noção de uma dependência radical -

como filiação -podem ser reconciliadas.

Para Vattimo, porém, a secularização só é um fato interior ao cristianismo e ao

Ocidente porque Deus se debilita e recusa sua transcendência violenta.17 Afirma

schimitt que “Todos os conceitos concisos da teoria do Estado moderno são conceitos

teológicos secularizados”.18

14 CONGAR, Yves-Marie. Entretiens D`autonomne. Les editions Du Cerf, 29, bd Latour-Maubourg, Paris, p. 35. 15 MENOZZI, Daniele. A Igreja católica e a secularização. São Paulo: Paulinas, 1998, p. 11. 16 L’Osservatore Romano. Sábado 03 de novembro de 2012, número 44, p.07. 17 VATTIMO, Gianni. Acreditar em acreditar, p. 17-18. 50. 18 SCHMITT, Carl. Teologia Política. 1º Edição, Belo Horizonte: Del Rey, 2006, p. 35.

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2.3 O Sentido Filosófico da Secularização

O processo de secularização é uma tentativa de busca de autonomia por parte da

sociedade e das ciências que vendo-se atada ao mito e a religião ou qualquer esfera

normativa religiosa quer agora buscar a sua autonomia. Podemos verificar que o

processo de secularização produz na sua lógica interna um progressivo afastamento da

dimensão religiosa da vida, seja de Deus e de qualquer realidade sobrenatural que não é

empiricamente verificável. Contudo, o iluminismo não surge num primeiro momento

como rompimento com a fé cristã, mas como uma busca possível e mais ilustrada de

conhecimento. O Cristianismo desde a sua origem buscou ser também uma forma de

iluminismo.19

Alguns autores tentam apresentar o princípio da secularização no início do

iluminismo. Kant fora um dos primeiros a propor e a colocar a questão:

“O que é o Iluminismo? Kant inicia tal texto, esclarecendo que o

iluminismo é à saída do homem da menoridade da qual ele mesmo é

culpado, consistindo tal menoridade na incapacidade de se servir do

entendimento sem a orientação de outrem. O próprio homem seria

culpado por isso, pois não é que lhe falte o entendimento, mas o que

ele não teria seria a decisão e a coragem em servir de si mesmo, não

se valendo de tutores, daí resultando não só o preconceito, como a

opressão gananciosa ou dominadora. Sair da menoridade só seria

possível por meio do uso público da razão.”20

É importante aqui considerar que esta guinada estrutural por vezes leva em conta

os pressupostos cristãos, contudo, tentam superá-los:

Numa perspectiva sociológica, é possível dizer, inclusive, que as

formas de consciências modernas relacionadas com o direito

abstrato, a ciência e a arte autônoma, que gira em torno do quadro

profano, não poderiam ter-se desenvolvido sem as formas

19 RATZINGER, Joseph. D’ÁRCAIS, Paulo F. Deus Existe? São Paulo: Planeta, 2009, p. 24. 20OLIVEIRA, M.L.P. Filosofia do Direito. Modernidade e Religião. Revista Direito, Estado e Sociedade n. 31, Jul/dez 2007, p. 106-126

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organizacionais do cristianismo helenizado e das igrejas cristãs, sem

as universidades, os conventos e as catedrais. E isso vale

especialmente para as estruturas mentais”.21

Na área do direito e da política várias são as formas e mecanismo pensados para

deslocar ou colocar a fé em uma dimensão não pertinente o que de fato gera um

estranhamento na pessoa, pois sendo cidadão pertencente a um estado tendo os seus

direitos e deveres convive também em uma “outra” sociedade humana que é a Igreja no

caso o cristão católico. O ordenamento jurídico universalista e moral social igualitário

precisam ser unidos, a partir de dentro, ao ethos da comunidade de tal forma que um

consistentemente, saiba conviver na alteridade com o outro.

Aqui é oportuno confrontar o pensamento de Kant com o de Gogarten. Entretanto

esta relação de dependência assume, para Gogarten, uma matiz que exclui por princípio

a heteronomia. A filiação não tem como modelo, a infância. O ser humano que é

pensado como filho é autônomo. O filho não é criança em sua menoridade, mas é filho

emancipado (mündig). Como filho emancipado, sua própria relação com o mundo é

redefinida. Este último, o mundo, passa a ser concebido como a herança do filho, pela

qual ele é responsável em sua autonomia. 31

A filiação do homem representa, no âmbito da fé, a afirmação originária de Deus

quanto à autonomia do homem. Diferentemente do que acontece na maioridade de Kant.

A autonomia é um dom. Somente através da filiação a autonomia pode ser alcançada e

preservada. Em outras palavras: não há autonomia autêntica à parte da filiação

originária, assim como não há responsabilidade (Verantwortung) autêntica pelo mundo

que não contenha constitutivamente a referência ao Pai em termos de resposta

(Antwort). É óbvio, nisto tudo, que o próprio falar de uma autonomia autêntica ou

legítima supõe uma forma da autonomia que se efetiva inautêntica ou ilegitimamente.22

Esta expectativa normativa, com a qual o Estado liberal se defronta com as

comunidades religiosas, coincide com os próprios interesses delas à medida que se abre

a possibilidade de desempenhar, para além do espaço público político, uma influência

própria na sociedade como um todo. Contudo, esta influência pode apresentar aspectos

21

HABERMAS, J. Era das Transições. Tradução Flávio Beno Siebeneichler. Rio de Janeiro: Tempo

Brasileiro, 2003, p. 53. 22

GOGARTEN, Der Mensch zwischen Gott und Welt. Stuttgart. Munique, 1956, p. 74.

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contraditórios que beiram a indiferença como bem descreveu Kierkegaard e que fora

apresentada por Harvey Cox em seu livro a Cidade secular:

“Um circo ambulante ardia em chamas junto de uma aldeia

dinamarquesa. O diretor dirigiu-se aos artistas que estavam já

preparados para atuar e escolheu entre eles o palhaço para que

chamasse os aldeões e os avisasse do perigo que corriam, pois as

chamas através dos campos recém-ceifados podiam chegar à própria

aldeia. O pintalgado palhaço correu às pressas para a praça da

aldeia e gritou a todos que viesse ao circo a apagar as chamas. Os

aldeãos riam e aplaudiam esta nova e magnífica forma de atraí-los ao

grande espetáculo. O palhaço chorou e suplicou, insistiu que não

estava a representar um papel, mas que a aldeia estava realmente em

perigo mortal. Quanto mais implorava, mais os aldeões se riam... até

que o fogo, saltando através dos campos, chegou à aldeia: Isto é

também o que se passa quando os clérigos falam de Deus. A gente

escutá-os com curiosidade e condescendência, como a homens que

representam o seu papel. Mas pela coisa em si, com a íntima

convicção de que o que eles dizem pode ser ignorado sem perigo23

.

O iluminismo afirma que o olhar que merece consideração seria o olhar do

cientista imparcial que analisa friamente as questões correntes e os preconceitos do

vulgo. Mas descobriu-se que não era tão fácil assim. Como se podia estar seguros de

estar vendo as coisas como eram? Como se pode ultrapassar a distância entre a mente e

o mundo? Como se podia ter a certeza que o objeto ali em frente é de fato, idêntico à

minha percepção dele? Na sua busca de certeza, a mente tem de duvidar de tudo. Tem

de ser cética suspeitosa e desconfiada.

Bernard Williams caracteriza seu pensamento da seguinte maneira: “Há um

imenso empenho em face da verdade ou, de qualquer modo, uma suspeita generalizada,

uma disponibilidade contra ser enganado, uma ânsia de ver para lá das aparências as

estruturas reais e os motivos que estão por detrás delas”.24

Pode-se afirmar que o modo

de se produzir ciência em nossos dias é profundamente influenciado pela duvida,

contudo, além de toda a dívida que temos para com o iluminismo em seu sentido

positivo, mas “se este torna-se o modo prioritário de entender a procura da verdade, 23

HARVEY, Cox. La Ciudad secular. Barcelona, 1968, p. 265. 24

WILLIAM, B. Truth and Truthfulness: Na Essay in Genealogy, Princenton, 2002, p.1.

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criaremos inevitavelmente uma sociedade que será desconfiada, marcada pela suspeita e

pela insegurança, e cujos laços sociais hão de desmoronar-se.”25

Dentro deste contexto e

quadro verificamos que o processo de secularização interpretado por teólogos como um

eclipsar do sentido de Deus26

na estrutura de sociedade atual e de forma específica

européia apresenta seus efeitos27

contra- dissentes a toda a cultura cristã até então

vigente.

O processo de secularização causou um impacto tanto na vida pessoal de vários

cristãos como em todo o tecido da comunidade eclesial, tornado nítido28

cada vez mais

sua influência e desafiador para os cristãos a tarefa de se manter fiel ao evangelho

nestas circunstâncias.29

2.4 O Sentido Sociológico da Secularização

A sociologia da religião procura compreender este fenômeno através de outras

abordagens descrevendo a religião como sub specie temporis e não como sub specie

aeternitatis como pretende a teologia aqui já temos uma configuração específica de

conceitos em que ciência plaina sobre seus referenciais teóricos:

O sentido de modernidade aqui trabalhado encontra

analogia com sua aplicação filosófica, que se traduz como

modernidade pós-renascentista. Um dos traços substantivos desta

modernidade refere-se à “iniciativa teórica, até agora inédita na

história humana, que propugna a imanentização dos termos da

relação de transcendência, com a abolição da sua dimensão

metafísica e a emergência do existente humano como fonte de

movimento de autotranscendência desdobrando-se na esfera da

imanência: nas instituições do universo político, na construção do

mundo técnico, na concepção autônoma do agir ético, na

fundamentação teórica, enfim, da visão de mundo”30

25 RADCLIFFE,Timothy. Por que ser cristão? São Paulo: Paulinas, 2011, p.193 26L’ Osservatore. Romano. sábado 13 de Outubro de 2012, número 41, p.21. 27L’ Osservatore. Romano. sábado 20 de Outubro de 2012, número 42, p.17. 28L’ Osservatore. Romano. sábado 03 de Outubro de 2012, número 14, p. 44. 29 L’ Osservatore.Romano.sábado 03 de Novembro de 2012, número 44, p. 10. 30 VAZ, Henrique,C,L. Raízes da modernidade. São Paulo: Loyola, 2002, p. 16.

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Entendemos ser pertinente destacar também os sentidos que podem ser

identificados em torno do conceito da secularização no âmbito das humanidades.

Segundo Marramao é possível identificar cinco acepções de secularização: 1) Como

ocaso da religião; 2) Como conformidade ao mundo; 3) Como dessacralização do

mundo; 4) Como descomprometimento da sociedade para com a religião, relegando a

religião ao âmbito privado; 5) Como transposição de crenças e modelos de

comportamento da esfera religiosa à secular.31

Aqui verifica-se que os atuais processos

sociais que tem se destacado nas atuais gerações trazem uma marca palpável do

processo de secularização verificado de maneira contundente nas sociedades

contemporâneas.32

Algumas característica da configuração do processo de secularização

apresentamos aqui dentro das formas de uma sociedade marcadamente híbrida,

ambivalente, e plural. Elementos estes que já carregam sementes para posteriores

situações estruturais da sociedade.

2.4.1 O Hibrido e a liquefação da vida como cultural

O hibridismo cultural desperta várias observações positivas e negativas a

respeito deste fenômeno cada vez mais crescente. A globalização é um permanente

convite a um posicionamento hibrido diante da história. O fenômeno cultural perpassa

as culturas e se entrelaça de modo mais freqüente e intenso. Vemos por exemplo como

este fenômeno se faz presente no mundo da música onde vários ritmos se misturam dos

mais variados cardápios musicais presentes em todo o planeta. Hoje o recurso técnico

usado nas gravações a “mixagem” onde se pode re-masterizar e se criar verdadeiras

novidades sonoras apontam para o potencial deste fenômeno.

No pensamento de Bauman vemos como ele tenta descodificar uma face da

cultura hibrida questionando a sua vulnerabilidade:

“...a imagem da “cultura híbrida” é um verniz ideológico sobre a

extraterritorialidade alcançada ou proclamada. Isenta da soberania

31 MARRAMAO, Giacomo. Céu e Terra: Genealogia da Secularização. São Paulo: Fundação editora da Unesp, 1997, p. 135. 32L’ Osservatore Romano. Sábado 10 de novembro de 2012, número 45, p. 15.

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de unidades políticas territorialmente circunscritas, tais como as

redes extraterritoriais habitadas pela elite global, “ cultura hibrida”

busca sua identidade na liberdade em relação a identidades

designadas e inertes, na licença para desafiar e menosprezar os tipos

de mercadores, rótulos ou estigmas culturais que circunscrevem e

limitam os movimentos e as escolhas do resto das pessoas, presas ao

lugar: os “locais”. 33

Frente a uma permanente dissolução dos laços de interdependência social e de

compromissos revogáveis existe uma luta simultânea contra a dissolução e a

fragmentação. O ser humano está sitiado entre o desejo de liberdade e a necessidade de

segurança. Contudo, a hibridação é apresentada como uma função que a torna louvável

e cobiçada no mundo a separação34

. Na busca identitária o ser humano é pressionado a

não pertencer definitivamente a nada de maneira que o ser humano encontra-se

conflitado e perturbado entre uma tendência cosmopolita de emancipação individual e a

participação numa coletividade nacional e regional. E desse conflito não há quem o

salve: é ele mesmo que deverá fazer todas as escolhas tornando-se responsável por

aquilo que venha a se tornar.

A Identidade na contemporaneidade é uma reinvidicação pela diferença. Na vida

líquida, a dissolução permanente dos valores sociais e das antigas referências do

passado, a identidade encontra como meio de afirmação a distinção e a diferença como

objetivos e metas a serem vivenciadas.

2.4.2 Modernidade, ambivalência e as rupturas sociais e culturais

Uma evidência importante que o processo de secularização traz e que se faz

verificável no que se refere a uma presença “totalizadora” do pensamento secularizante

é que ele não se restringiu em ser uma mera retórica, mas este pensamento se impôs

como uma forma de viver e de ser no mundo moderno. Forjou consciências e criou

33

BAUMAN Zygmunt. Vida líquida. Rio de Janeiro: Zahar, 2009, p 46. 34

BAUMAN, Zygmunt. Modernidade Líquida. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Editor, 2001, p.29-31.

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estruturas jurídicas onde a vida e o pensamento tivesse uma emancipação cada vez

maior sobre as realidades da vida seja política, social e econômica.

Com o apogeu da modernidade nos deparamos com outro fenômeno que nos

chama a atenção que é justamente a ambivalência como lugar de sua residência. A

modernidade é de fato esta manifestação ou esta busca de luzes que por vezes apresenta

as mais variadas ambivalências. Queremos aqui analisar um pouco a dimensão

ambivalente da modernidade no período contemporâneo em que vemos as mais variadas

formas de tentativas de legitimação da modernidade.

Sabemos que um dos sonhos da razão legislativa se funda no auxílio em que ela

encontra por parte da filosofia. A filosofia na modernidade prestou e presta um papel

importante na fundamentação de todo o sistema do estado moderno que temos hoje.

Filósofos como Kant não são apenas artistas das palavras, que se ocupam de novas

concepções sobre o mundo e o ser humano, mas um doador de lei, que legisla para a

razão humana.35

A filosofia é na modernidade está força que possui autoridade legislativa. A

razão na modernidade não tolera desconexão no pensamento, mas por meio de várias

cognições claras e distintas procura se legitimar como autêntico conhecimento. O

conhecimento que se propõe procurar por parte da modernidade é aquele que transcende

o senso comum, constituído de meras opiniões e crenças (opinião: Juízo insuficiente

tanto subjetivo como objetivamente; crença o tipo mais pérfido de juízo, “reconhecido

como objetivamente insuficiente”, mas subjetivamente aceito como convincente), só

pode e deve “ser revelado pelos filósofos”.

Define-se como modernidade o conjunto de rupturas sociais e culturais que se

desencadeia no mundo a partir de várias mudanças verificáveis. O humanismo e o

renascimento que se desencadeia no século XVI, assim como as diversas batalhas

intelectuais vão configurando o mundo moderno, contudo esta gestação da modernidade

acontece mediante uma tensão entre o tradicional e o novo. Esses acontecimentos

terminaram por desfazer a imagem do mundo antigo, o valor das tradições, a matriz

hegemônica da natureza dando lugar ao primado da razão teórica e prática, á

subjetividade, à história, às experiências, ao fenômeno de secularização. A teologia

européia, ao defrontar-se com tal realidade complexa, empenhou-se, num primeiro

35

ZYGMUNT, Bauman. Modernidade e ambivalência, Rio de Janeiro: Zahar, 1999, p. 45.

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31

momento, numa atitude de defesa e depois em amplo diálogo crítico e interpretativo da

Tradição da Fé.

A complexidade das relações que vão se fazendo presente neste novo mundo

moderno é configurada no século XVII e XVIII através de elaborações científicas que

dão fundamentos políticos e filosóficos a modernidade. A modernidade acaba por se

tornar um valor transcendental, uma moral e um mito de referência presente em toda

parte36

.

Apresentamos aqui os três planos que a modernidade busca de forma geral

desenvolver na sociedade:

1) Plano técnico-econômico: A modernidade define o tipo de relação com a

natureza que leva à procura sistematizada de produtividade. Na era moderna, A

natureza já não é a matriz de toda ordem social e moral. Ela é um reservatório

das forças produtivas. O homem já não se situa na natureza, mas face à natureza,

não pensa como um elemento da natureza, mas como o seu mestre;

2) Plano jurídico-político: A modernidade reside na separação que se instaura

entre a esfera da vida pública e a esfera da vida privada. Kant desloca esta

dissociação entre esfera pública ( uso da razão sempre livre) e esfera privada (

uso da razão pode ser limitada)para o centro do processo pelo qual o homem sai

da menoridade e que ele é responsável. E desloca a religião para a esfera

privada. Esta dissociação do privado e do público é a pedra angular da

concepção moderna do político.37

Por um lado, há o estado, transcendente e abstrato, e o conjunto das regras

formais de direito que lhe correspondem; por outro lado, há o indivíduo e as sua

liberdade. Esta dualidade era ignorada pelos sistemas políticos anteriores.

Esta separação do estado político da vida privada pertence aos tempos

modernos. As hierarquias, os grupos intermediários, as comunidades primárias

da sociedades tradicionais desaparecem ou perdem a sua consistência para dar

36

J.CHESNEAUX, De La modernité, Paris: Découvert, 1984, p.71. 37

KANT, E. Philosophie de l`histoire. Les Orígenes de La pensée de Hegel. Paris: Denoel-gonthier, Coll.

Méditations, 1947, p. 46.

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lugar ao burocrático do estado, modelando, segundo a sua própria racionalidade,

todos os setores da vida social.

3) O sujeito como plano: A hegemonia do estado esvai-se para dar lugar a

modernidade filosófica, plenamente realizada com Kant, que separa o sujeito e o

objeto, a consciência deslocada para o centro e o universo. A este duplo processo

poder-se-a chamar a modernidade psicológica, isto é, certa maneira de o homem

pensar a sua individualidade e conquistar a sua identidade.38

2.4.4 O pluralismo e crise da modernidade e da razão iluminista

A quebra de paradigmas e as diversas manifestações do pluralismo religioso,

impõem-se a cada dia de forma a tender o ser humano a valorizar as diversas idéias,

normas pensamentos, símbolos, instituições que o circundam. A Europa principalmente

encontra-se afetada por um pluralismo intercontinental.

Todo Europeu é atirado para uma pluralidade de valores, modelado por uma

pluralidade de normas, comprometido por uma pluralidade de referências, emergido

numa pluralidade de sensibilidades, solicitado por maneiras diversas de levar a sua

existência a se organizar socialmente39

.

A pluralização institucional da modernidade provoca uma instabilidade das

estruturas de plausibilidade. No lugar das antigas certezas religiosas, instaura-se a

dúvida. O tempo da cristandade cedeu e hoje estamos vivendo em um mundo pluralista.

É mister que tenhamos uma chave de leitura de um mundo plural e não mais como uma

realidade monolítica, estática e hierarquicamente organizada. Em uma sociedade

dinâmica o “pluralismo consiste essencialmente num regime de competitividade

cultural, que vê todos os valores em competição, primeiro através da conquista do

direito de cidadania e depois pela formação de hierarquia em que são ordenados”40

. Ao

mesmo tempo em que o pluralismo não descarta a religião e os seus valores culturais ele

a nivela e a coloca em uma situação de relativização.

38

BARBOSA, G. ADÉRITO. A nova evangelização. Lisboa: Paulinas, 1994, p. 256. 39

G.THILS, foi chretienne, p. 44. 40

GRUMELLI, A. La chiave di lettura della societá di oggi, “Quaderno di Studi Sociali” 1, Napoli:

Dehoniane, 1979, p. 11-26.

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33

A diversidade acontece em um ambiente desprovido de preferências e

exclusivismos onde a persuasão pode tornar um ideal religioso pertinente através de sua

persuasão e não imposição. Aqui surge justamente o problema da plausibilidade cristã.

Uma vez que o pluralismo não admite qualquer tipo de monopólio e entra em crise a sua

plausibilidade diante da sociedade de um modo universal, a sua tradição eclética

enquanto se apresenta em suas pretensões entra em crise.

Em si mesmo, tal dissenso pode ser legítimo se considerado o fato que a

mensagem cristã não possibilita interpretações definitivas pautadas num único

referencial hermenêutico. Contudo, quando o dissenso manifesta controvérsias

doutrinais e de autoridade que acarretam divisões na comunidade cristã, ele é mais do

que um posicionamento hermenêutico diferenciado.

Se o pluralismo torna-se um problema para as religiões outro maior seria a

própria privatização da religião como um golpe fatal do secularismo frente a grande

pluralidade de afirmações ou hermenêuticas sobre a presença da religião no mundo. As

religiões não seria uma realidade pertinente na organização da sociedade por isso

deveria ser vivida de modo privativo. Isto dá-nos a impressão que a fé seria algo mais

simbólico ou até mesmo folclórico que não proporcionasse nada de claro aos novos

rumos históricos das sociedades.41

.

É verificável a forma clara e perceptível que os sintomas de crise da

modernidade. A primeira e a segunda guerra com seus rastros de destruição produzidos

pelas bombas atômicas. Os regimes totalitaristas como o nazismo, stalinismo,

comunismo com sua lógica de opressão e morte como jamais se tinha visto. Em épocas

mais recentes verificamos os regimes ditatoriais do terceiro mundo, a fome que assolou

mais de um terço da população mundial. A massa de excluídos nos países ricos, a

extensão do comércio de armas e o narcotráfico, a crise do mundo socialista e as guerras

da atualidade. Nota-se claramente que a razão que pretendia ser altamente desvinculada

de qualquer alienação política e ideológica tornou-se novamente uma razão

41L’ Osservatore. Romano. sábado 3 de novembro de 2012, número 44, p.14.

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34

instrumentalizada. A crise da razão iluminista fora reduzida a instrumento do poder e do

lucro42

.

A razão iluminista ao se dedicar aos vários aspectos da realidade por vezes,

descartou elementos importantes do ser humano, ou pelo menos quis apenas considerar

estas mesmas realidades somente a partir de seu ponto de vista, desconsiderando outros

saberes. Desta forma por vezes a razão se viu incapaz de dar conta de todos os fatores

da realidade e acabou por ser manipulada por interesses técnicos e científicos que

pretendem dominar a natureza e a história e colocar a razão como serviçal do poder

econômico, político e ideológico.

2.5 O Sentido Teológico da Secularização

A busca de sentido feita dentro do contexto da modernidade coloca o homem de

certa forma em um ambiente em que ele percebe certa decadência dos antigos projetos

de engajamentos em realidades que para ele seriam de vital importância como bem

descreve William Mc Namara:

“O meu lamento em relação à sociedade contemporânea é devido a

sua decadência. Há ainda uns poucos prazeres que ainda me atraem,

mas quase nenhuma beleza me cativa e nada de heróico me excita.

Não me sinto provocado ou desafiado por nenhum círculo ou posição

intelectual, nem por novas teologias e filosofias e não há nenhuma

arte que me prenda a atenção ou me desperte a mente. Tampouco

existem movimentos sociais, políticos ou religiosos que me

entusiasmem ou me animem. Não há homens livres a quem possa

submeter-me, nem santos em quem possa encontrar inspiração. Não

há pecadores descontrolados o bastante para me impressionar ou

com quem eu possa compartilhar a minha infeliz condição. Ninguém

suficientemente humano para validar o estilo de vida “corrente”. É,

portanto, muito difícil viver neste enfadonho mundo sem se sentir

dominado pelo tédio.

O futuro está, nas mãos daquela minoria de coração humilde e

compassivo, que apaixonadamente busca a Deus no mundo

42 CONFERÊNCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL. Evangelização e missão profética da Igreja, Novos desafios. Texto aprovado pela 43ª Assembléia Geral, Itaici. Indaiatuba (SP), 9 a 17 de agosto de 2005. São Paulo: Paulinas, p. 38.

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35

maravilhoso e ao mesmo tempo confuso de realidades redimidas e

interligadas que se estende diante de nosso nariz43

.

É justamente dentro deste ambiente da religião que o indivíduo trava sua

peregrinação de fé, ora sitiado por um ambiente profundamente hostil a sua fé ora,

encontrando nas antigas estruturas religiosas uma medicinal dose de sentido oferecido

pela mesma religião. Abordamos aqui o pensamento teológico nascido no contexto da

teologia protestante como do ambiente da teologia católica, assim como alguns de seus

expoentes.

2.5.1 A Teologia da morte de Deus: espelho de um ambiente secularizado

Outro ponto importante é o discurso a respeito da morte de Deus que foi

engendrado no campo filosófico e que penetrou também nas ciências teológicas. A

secularização fora apresentada como uma perda do sentido religioso e metafísico do

mundo e do homem e uma concentração neste mundo e neste tempo.44

Hubert Lepargneur conseguiu muito bem captar as diversas mudanças ocorridas

pelo processo de secularização, percebendo as grandes mudanças ocorridas nas

estruturas:

“A secularização que aos poucos abrange todos os domínios da cultura

comporta: 1) Um elemento positivo que corresponde ao termo largamente

utilizado de maturidade do homem (homem adulto), da sua libertação dos

mitos, da magia, das alienações do sagrado e das assombrações do além, da

prepotência abusiva daqueles que tinham pretensões ao poder espiritual

para dominar as formas terrestres da vida social dos homens. Este aspecto

só é possível em favor de um crescente domínio do homem sobre a natureza,

muito tempo considerada, como enigmático habitável de forças

sobrenaturais. Neste sentido a secularização é uma reação cultural global,

aos progressos específicos das ciências e das técnicas, da industrialização e

da urbanização. 2) Um elemento destrutivo das religiões, se não da

religiosidade, da humanidade, assim como da própria noção de Deus. Deus

não existe porque a nossa maneira pragmática de pensar, hoje em dia, não

nos permite mais conceber um conteúdo concreto atrás desta palavra „Deus‟.

Este aspecto abre o caminho para a crítica radical da religião e para seu

desaparecimento histórico, com a possível conservação da fé cristã, para

43

MCNAMARA, William. The Human Adventure. Garden City: Image Books, Doubleday, 1976, p. 9. 44

COLOMER, Eusebi. A morte de Deus. Porto: Tavares Martins, Porto, 1972, p. 143.

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36

alguns (teólogos da morte de Deus), ou sua eliminação, para a maioria dos

homens radicalmente secularizados. Desde já podemos situar a questão do

movimento teológico da „morte de Deus‟ (movimento sem nenhuma

estruturação, muito diversificado e até contraditório) com o nosso tema

secularização: 1) Esta chamada „teologia da morte de Deus‟ constitui um

esforço - um tanto desesperado - para interpretar „de maneira cristã‟, o

fenômeno da secularização, representativo no mundo atual. Essa

interpretação poderia ser resumida da seguinte maneira: Deus morreu em

Jesus Cristo; eis a Boa Notícia do Evangelho. Jesus libertou o homem

religioso do constrangimento imposto às gerações anteriores pelo

imperialismo do Deus transcendente. Jesus representa a redução da

transcendência divina à pura imanência histórica (re-interpretação da

kenosis de São Paulo): eis a que se reduz o fato da Encarnação. Não há

Reino dos Céus a não ser o reino terrestre da humanidade. Ser cristão é

compreender este significado da pessoa e da vida de Jesus, e imitar sua

dedicação aos outros homens. 2) O definhamento da religião e o repúdio

cultural da divindade (que tem um dos seus pólos no movimento da „morte de

Deus‟), não são somente interpretação de um fenômeno de secularização que

lhe seria exterior; eles fazem parte, inclusive o referido movimento

„teológico-ateu‟, deste fenômeno total de secularização. A razão disto é

simples: a secularização é uma verdadeira práxis que engloba o processo

sociológico e sua elaboração ou auto-justificação teórica. A „teologia da

morte de Deus‟ constitui a ponta avançada do movimento de secularização

tomando consciência de si e refletindo ainda sobre sua possível ligação com

o que se chamava anteriormente cristianismo.45

Filósofos como Nietzsche acreditam que todo o processo de niilismo pode ser

resumido na morte de Deus, ou, também, na “desvalorização dos valores supremos”.

Para Heidegger, o ser se aniquila na medida em que se transforma completamente no

valor. É importante aqui tentarmos retomar o movimento ateu que ocorre em toda a

Europa e outros países do ocidente como um movimento que aparece cheio de

ambigüidades e que por vezes buscou fundamentar-se em conceitos cristãos.

Outra ambigüidade gerada pela pretensa concepção da morte de Deus é o

fatalismo que se degenera em desespero. A figura do niilismo como uma forma de

autonomia esvazia o esquecimento secularista da filiação, do cuidado e do encargo de

uma herança. Assim, também o secularismo carece de purificação. Esta purificação

exige uma justa distinção entre Deus e o mundo. O conceito de salvação aparece na

modernidade encapado de um engajamento na mundaneidade o que permite voltar

novamente a uma divinização do mundo sem uma justa diferenciação das realidades que

o constituem. É preciso retomar de modo equilibrado a presença do divino no mundo.

45

LEPARGNEUR, Hubert. Secularização. São Paulo: Duas cidades, 1971, p. 13-14.

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37

Ratzinger afirmou que a incredulidade no pensamento e a humildade ante o

desconhecido parecem aconselhar ao agnosticismo, entretanto o ateísmo declarado

pretende saber demais e leva consigo claramente um elemento dogmático.46

Vemos hoje na modernidade uma vasta tentativa de secularização ou

“racionalização” da religião Cristã. Um problema visível que aparece nesta afirmação

da morte de Deus é justamente uma acentuada crise do humanismo tentando colocar o

homem novamente no centro do universo fazendo dele o senhor do ser. Entretanto, com

o desenvolvimento técnico-cientifíco que se verifica nas últimas décadas o homem

novamente é lançado em uma situação marginal.

Harvey Cox consegue de maneira precisa e pontual apresentar o caminho pelo qual

pode melhor trabalhar para manter-se consciente de sua dignidade e empenho no

mundo:

As principais teses do meu livro mostram que o processo estrepitoso

de modernização não é algo que os cristãos devem temer. Devemos

festejá-lo. Trata-se de uma das maneiras pelas quais Deus trabalha

para libertar os homens do cativeiro. Não é uma maldição negra nem

uma bênção pura. É, antes, uma oportunidade, um chamado à

maturidade, exigindo dos indivíduos e das sociedades que escolham,

em plena consciência, onde desejam ir e o que desejam ser. Sou da

opinião de que o lugar em que surge este senso de resposta humana é

também, o lugar em que o cristianismo está atingindo na história.

Deus é mais plenamente Deus onde o homem se torna mais

plenamente homem.47

O homem secular, emancipado, já não é dependente ou imoral Seria ingenuidade

tentar submetê-lo a um Deus cuja força depende da fraqueza e da ignorância do homem.

O evangelho cristão ensina que o homem é responsável assustadoramente responsável

na sua liberdade em relação a um Deus cuja força atinge a perfeição na fraqueza e no

sofrimento.48

46

RATZINGER, Joseph. Mirar a Cristo. Exercícios de fé esperança e amor. Valência: Ediap, 1990,

p.17. 47 COX, Harvey. Ciudad secular, Barcelona 1971, p. 8.

48 ROBINSON, John A.T. Pesquisa em torno de Deus. 1ºEdição, Rio de Janeiro: Moraes Editores, 1968,

p. 38.

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38

2.5.2 O Homem emancipado

A secularização é um processo e não um estado de coisas”49

Sabemos que este

processo tende a querer transformar o processo nas coisas em si. Aqui se encontra um

perigo eminente que é justamente o de transformar o ser humano num arranjo

existencial uma vez que valores que perduram podem ser descartados displicentemente.

Tal coisa é simplesmente impossível. O simples fato de dizer “não há valores”

por si só já é um valor. Como afirma Cox: “A secularização coloca a responsabilidade

pela formação de valores humanos, bem como pela elaboração de sistemas políticos, nas

próprias mãos dos homens. Isto exige uma maturidade que nem o niilista nem o

anarquista desejam assumir”.50

A proposta de Bonhoeffer é aplicar aos apologistas teístas que se gabavam de ter

um trunfo contra o homem emancipado no que diz respeito às “questões últimas” o

mesmo princípio que eles aplicaram ao homem emancipado. Deus foi relegado somente

para as questões derradeiras pelo homem emancipado, pois para este, Deus não é mais

necessário nas outras questões de sua vida. Se Deus também tornar-se desnecessário

para as questões derradeiras, então o homem religioso se encontrará num desespero

ainda maior que o do homem emancipado.

2.5.3 A teologia política e o projeto secularizador

O pensador italiano Giorgio Agamben tem elaborado uma original leitura da

tradição política ocidental, privilegiando, porém, a modernidade. Ele entende que a

tradição política ocidental é tributária de dois registros teológicos: a teologia política e a

teologia econômica. A primeira vinculada a uma perspectiva ontológica e a segunda à

primazia da pragmática. Na política lembramos a Carl Schmitt quem afirma que “Todos

os conceitos concisos da teoria do Estado moderna são conceitos teológicos

secularizados”.51

49 COX, 1971, p.40. 50

Ibidem, p.47. 51

SCHMITT, Carl. Teologia Política. 1º Edição Belo Horizonte: Editora Del Rey, 2006, p. 35.

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39

A teologia econômica constitui-se a partir da elaboração do problema da relação

entre as três pessoas da Trindade, que resultou na teoria do homoousious, unidade de

substância entre Pai, Filho e Espírito Santo, porém com três expressões distintas.

Agamben entende que o maior entrave para a elaboração do aparato teológico cristão foi

de ordem administrativa, o gerenciamento da casa divina, das relações entre as pessoas

da Trindade. A oikonomía divina é a marca distintiva da teologia econômica, que torna

evidente o primado da pragmática neste registro. Esse dispositivo permite que se torne

possível o início de algo como a história designada pela escatologia cristã, tornando a

história ocidental e cristã história da salvação. Nesse contexto, torna-se decisiva a

orientação divina para o agir humano através da Divina Providência, a saber: pronóia.

Na teologia econômica, a vida e seu gerenciamento também são centrais, porém na

forma da operosidade, do agir humano para a glória de Deus, que oculta o caráter

sabático da condição humana.

Este construto teológico, que opera articulado com a teologia política, como uma

máquina governamental, triunfou na modernidade. Esse fato permite entender o

primado da economia, ou de forma mais ampla, da pragmática, nesse período histórico.

Novamente, neste caso, a relação com a vida torna-se ambígua. Se neste registro a vida

é marcada pela operosidade, pelo imperativo da ação orientada pela providência divina,

é justamente nesse espaço que reside à possibilidade da experiência da condição

inoperosa do humano. Vários teólogos tentaram pensar os novos desafios da teologia

em um ambiente profundamente secular. Teólogos como Harvey Cox tentaram

apresentar um intento de levar a teologia à política e de encarnar a missão da Igreja nas

realidades da promoção do homem e na construção da cidade Secular. Harvey não pensa

que o homem secular tenha perdido o sentido da transcendência, mas como Unamuno

afirma e se questiona: “Está o homem só no Universo ou não”?52

.

O projeto secularizador apresenta várias dificuldades no seu processamento

prático. Um dos riscos que ele corre é justamente o de converter a secularidade em

secularismo, isto é, numa visão irreligiosa do mundo com visos de nova religião que

anule totalmente a liberdade do indivíduo e se interponha como um muro absoluto entre

a humanidade histórica e a chamada a transcendência.

52

COX Harvey. La ciudad secular. Barcelona, 1968, p. 265.

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40

A visão eclesiológica da Igreja ainda tem dificuldade de desenvolver uma visão

positiva do processo de secularização que se degenerou em secularismo a sua essência

verdadeira. Em vez disso ele procura reverter à secularização como tal, à medida que

contrapõe a ela o seu modo de pensar baseado em realidade sacral, as quais

pretensamente rompem e limitam a mundaneidade natural de todo o existente.53

Aqui

verifica-se uma necessária tarefa da fé cristã que é justamente de proteger a

secularização de sua degeneração em secularismo. Este acontecimento não deve tomar

como referência o modelo de cristandade invertendo o processo de secularização e

procurando absorve-lo numa apropriação eclesiástica.

A fé deve distinguir-se radicalmente das realizações da razão autônoma,

entretanto a razão autônoma não pode converter-se em ideologia, ou seja, não deve

reinvidicar fé e um caráter salvifico.54

Harvey Cox tenta apresentar de forma sucinta como a fé bíblica se manifestou

como uma secularização para o mundo até então compreendido em suas estruturas

cósmicas quando ele afirma juntamente com Friedrich Gogarten que a secularização é

“a conseqüência legítima do impacto da fé bíblica na história humana”55

,e assim, o

desencantamento da natureza começa com a criação, a dessacralização da política, com

o Êxodo, e a desconsagração dos valores, com o pacto do Sinai, especialmente com a

proibição dos ídolos”.56

Isto é, a criação distingue decididamente entre Deus e a natureza: o mundo não é

Deus. Com isso acaba a concepção sacral ou mágica da natureza, vigente até então nas

sociedades primitivas e até mesmo nas grandes civilizações.

O mundo deixa de estar cheio de forças divinas imanentes para converter-se na

obra do Deus Criador transcendente. Este desencantamento da natureza é o que depois

tornará possível o desenvolvimento da ciência e a técnica que estão na base da ciência

moderna. Em segundo lugar, Deus revela-se ao seu povo ao tirá-lo do Egito, isto é,

através de um “ato de desobediência civil” contra a monarquia estabelecida. Com isso

dessacraliza-se a política: o Faraó não é Deus. De novo nos encontramos com o

53

Wilfried Jüest. Verhangnis und Hoffung der Neuzeit: Kritiche Gedanken zum Gogartens Buch,

Munique, p. 74. 54

GOGARTEN, Der Mensch zwischen Gott und Welt. Stuttgart. Munique, 1956, p.195. 55

Ibidem, p. 39. 56

Ibidem, p. 135.

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41

primeiro passo de uma ordem política sagrada para um mundo como o atual em que a

chefia política depende da capacidade individual e da eleição do povo e não de uma

pretensa prerrogativa divina. Finalmente, a aliança do Sinai, ao condenar absolutamente

a Idolatria, relativiza os valores religiosos consagrados e mostra o que realmente são,

isto é, pura elaboração humana. Desde este ponto de vista, a moderna secularização, ao

levar até as últimas conseqüências a distinção entre Deus e tudo o que não é Deus, que é

a alma da fé bíblica, ajuda a realçar a afirmação central desta fé: Tu solus Sanctus! (a

morte de Deus citação bibliografia da página).

3. Uma nova antropologia e eclesiologia secular

Quando verificamos escritos como os de Harvey Cox, Paul Van Buren vemos

um grande esforço por tentar colocar ao cristianismo importantes questionamentos

humanos que poderiam fazê-lo representar um pensamento mais amplo a respeito da

vida humana e seus dramas.

A secularidade da fé cristã é apresentada como elemento imprescindível no fazer

teológico de teólogos como Harvey Cox e Paul Van Buren. “A secularidade autêntica

pede que nenhuma concepção de mundo, nenhuma tradição, nenhuma ideologia se

converta jamais na concepção oficialmente imposta fora da qual não se tolera nenhuma

outra.”57

De modo cada vez mais intenso se aperceba a presença do profano na

compreensão de mundo por parte de muitos homens. Podemos até mesmo afirmar que

o homem secular está profundamente marcado por uma profanidade e este “homem

profano é um homem que percebe a si mesmo como a fonte de qualquer significação

que possa ter impressão humana”58

. Escritores como Albert Camus expressam um

pouco da presença desta profanidade presente na vida humana tentando dar ao seu modo

uma resposta ao problema de “como viver com um fim e com uma integridade num

mundo sem Deus”59

.

57

COX, p. 92. 58

Ibidem, 95. 59

Ibidem, 93.

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42

Uma atual releitura da dimensão eclesiológica dentro do plano da salvação

coloca a igreja uma responsabilidade importante no que se refere ao seu papel não

apenas de outra sociedade dentro de uma sociedade, mas procura colocar a Igreja

justamente dentro de uma missão que é justamente a presença do Reino dentro ou no

coração do mundo. A Igreja é aquela que procura levar a cabo uma verdadeira

revolução no mundo, e para J.C. Hoeckendijk, a Igreja é a “vanguarda de Deus no

mundo”.

Ora a Igreja só estará nesta vanguarda de Deus se, em continuidade com a

missão histórica de Jesus se levar a cabo neste nosso mundo esta quádrupla função.

Primeiro, a função do kerigma: a Igreja há-de proclamar a liberdade e a adultez do

homem que recebeu de Deus a responsabilidade do mundo. Depois, a função de

Diakonia: a Igreja há de conceber a sua missão como serviço ao homem no tratamento

de suas feridas e fraturas individuais e coletivas. A seguir, a função de koinonia: A

Igreja há-de ajudar a criar a comunidade entre os homens, colaborando com todos os

movimentos que se esforçam por caminhar para uma meta nova e melhor da história.

Finalmente, a função dos exorcismos: a Igreja há-de assumir a tarefa de tirar da

humanidade atual os maus “demônios” que a possuem tanto no campo do trabalho como

do sexo e da cultura.60

A nova eclesiologia que deve marcar o agir e a missão da Igreja deve se inserir

nesta cotidianidade dos desafios que se fazem presente na realidade dos dramas

humanos sejam coletivos e individuais. Assim, a Igreja torna-se cada vez mais a

presença do Reino no mundo, pois, o Reino é Jesus e Jesus é a conjunção de homem e

Deus. Nele se reúne ao mesmo tempo o que deve reunir-se na Igreja: iniciativa divina e

resposta humana.

3.1 A Degeneração da religião e a mercantilização da Fé

Enquanto o desencantamento do mundo fala da ancestral luta da religião contra a

magia, sendo uma de suas manifestações mais recorrentes e eficazes a perseguição aos

feiticeiros e bruxas levada a cabo por profetas e hierocratas, vale dizer, a repressão

60

Ibidem, p. 149.

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político-religiosa da magia 61

a secularização, por sua vez, nos remete à luta da

modernidade cultural contra a religião, tendo como manifestação empírica no mundo

Moderno. O declínio da religião como potência in temporalibus, seu disestablishment

(vale dizer, sua separação do Estado), a depressão do seu valor cultural e sua

demissão/liberação da função de integração social.

O mercado é, para Ortiz, a outra instituição que concorre com o estado-nação

moderno. Neste caso o autor se vale dos teólogos que analisam a “religião do mercado”,

como Harvey Cox. No mercado fazem-se presentes as duas qualidades outrora já

verificadas na religião, a transcendência e a onipresença. Para o autor o mercado seria

uma “falsa religião”, porque carece de um fundamento ontológico. O mercado global

contém duas qualidades freqüentemente associadas à herança religiosa: transcendência e

onipresença.

A universalidade do mercado, ou seja, sua extensão confere-lhe a dimensão de

totalidade (e muitas vezes de totalitarismo). A transcendência é, contudo, sempre

abstrata, algo latente; para se realizar ela deve manifestar-se no mundo, afirmar sua

onipresença. A transcendência do mercado perpetua-se através do consumo, este é o ato

que a situa e a singulariza, inserindo o indivíduo no seu ser. Metaforicamente eu diria

que o consumo torna coetânea a presença na transcendência62

. O consumismo como tal

apresentado pela secularização radical desvela-se de um modo devastador banindo toda

a possibilidade de uma transcendência que não se funde no mercado ou no consumo.63

O reavivamento religioso é entendido como uma prova viva do vigor do

processo da secularização; diferentemente dos defensores da tese da dessecularização

que somente atentam para o aumento da oferta religiosa, sem considerar que essas novas

instituições religiosas precisam ser autorizadas pelo Estado e reguladas por este para seu

funcionamento, isto é, sem considerar que o Estado (supostamente) laico regula o

mercado religioso. O livro é constituído de uma série de ensaios, um dos mais

instigantes, de autoria de Theodor Adorno, intitulado “A indústria cultural – o

iluminismo como mistificação das massas”, é referência obrigatória para a compreensão

da reprodução da cultura enquanto mercadoria. Esse ensaio inicia com uma contundente

61

SZASZ, Thomas. La teología de la medicina. Barcelona: Tusquets, 1981,p. 237. 62

COX, p. 72. 63

L‟Osservatore. Romano. Sábado, 03 de novembro de 2012, número 44, p. 22.

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afirmação sobre o caráter religioso da cultura moderna, colonizada pela indústria

cultural:

Na opinião dos sociólogos, a perda do apoio que a religião objetiva

fornecia a dissolução dos últimos resíduos pré-capitalistas, a

diferenciação técnica e social e a extrema especialização levaram a

um caos cultural. Ora, essa opinião encontra a cada dia um novo

desmentido. Pois a cultura contemporânea confere a tudo um ar de

semelhança. O cinema, o rádio e as revistas constituem um sistema.

Cada setor é coerente em si mesmo e todos o são em conjunto. Até

mesmo as manifestações estéticas de tendências políticas opostas

entoam o mesmo louvor do ritmo do aço.64

Já nos anos 70 um perspícuo sociólogo como Alain Touraine declarava que: “É

perigoso falar de secularização quando as sociedades industrializadas, como todas que

as precederam são orientadas por um modelo cultural. Ora, este modelo é “prático” e

não mais metassocial, mas nem por isso é menos sacro. O progresso é um modelo

cultural mais prático de quanto o sejam Deus ou o soberano; todavia, tudo que ele toca

torna-se sacro65

”. Oliveira entende que a sacralidade do mercado distingue-se da

sacralidade das religiões porque a primeira é de caráter imanente, enquanto a segunda se

ancora na transcendência. Entretanto, esses dois registros, longe de serem

contraditórios, se complementam. Dado que o “ethos” do mercado rege a esfera pública

e a vida material, enquanto as religiões regem apenas a vida privada e funcionam mais

como sistemas simbólicos para a produção do sentido das biografias individuais, essas

duas formas de sacralidade –a sacralidade imanente e a sacralidade referente à

transcendência- não se opõem. Antes, se completam e se apoiam mutuamente. O

“ethos” do mercado só entra em contradição com as antigas religiões cuja dimensão

ética as proíbe de abandonar a esfera pública ao mercado e, caminhando na contramão

do processo de modernização e de secularização, propõem a existência de uma

sociedade não regida pelo mercado. Mas este já é outro problema para a sociologia da

religião66

.

64

ADORNO, HORKHEIMER, Max. Dialética do esclarecimento. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1985, p.

256. 65

TOURAINE, 1974 apud MARRAMAO, 1997, p. 74. 66

Ibidem, p.75.

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3.2 O Corpo como sujeito central da mercantilização

Os “novos clérigos” são os profissionais da cura, seja do corpo ou da alma. Essa

fronteira se torna na atualidade (européia, burguesa) mais porosa e os antigos problemas

reputados à alma são considerados agora problema relativos ao corpo. Assim, o antigo

monopólio pela cura das almas e pela administração dos bens simbólicos de salvação

não se restringe mais aos especialistas formados nas diferentes denominações religiosas,

mas se tornaram também objeto dos profissionais da medicina, da psicologia, da

Educação Física, dentre outros.

Para Giacomo Marramao, o “teorema da secularização” estaria pautado por duas

questões-chave: a compreensão de tempo moderna e a relação do homem com o

mundo67

. Este autor entende, seguindo os passos de Karl Löwith, que a concepção de

tempo moderna, calcada na noção de progresso, Fortschritt, é a versão secularizada da

escatologia cristã. Porém, na medida em que a modernidade avança, aconteceu uma

“segunda secularização” que, diferentemente da primeira, já não mais se pauta pela

idéia de progresso enquanto processo que tem uma meta salvífica, redentora, mas pela

idéia de progresso enquanto destino, enquanto pathos moderno.

Trazemos para o debate a fala lapidar que se registra no final da “Ética

Protestante e o espírito do capitalismo”: Um dos elementos componentes do espírito

capitalista moderno, e não só deste, mas da própria cultura moderna: a conduta de vida

racional fundada na ideia de profissão como vocação, nasceu – como queria demonstrar

esta exposição – da ascese cristã.

O puritano queria ser um profissional – nós devemos sê-lo. Pois a ascese, ao se

transferir das celas dos mosteiros para a vida profissional, passou a dominar a

moralidade intramundana e assim contribuiu com sua parte para edificar esse poderoso

cosmos da ordem econômica moderna ligada aos pressupostos técnicos e econômicos da

produção pela máquina, que hoje determina com pressão avassaladora o estilo de vida

de todos os indivíduos que nascem dentro dessa engrenagem não só dos

67

Ibidem, p. 75-118.

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economicamente ativos e talvez continue a determinar até que cesse de queimar a última

porção de combustível fóssil.68

Em outra passagem em que Weber já discute o ascetismo intramundano do

protestantismo ascético como legado cultural do homem moderno, expressa de maneira

resignada o quadro que se apresenta:

A idéia da obrigação do ser humano para com a propriedade que lhe

foi confiada, à qual se sujeita como prestimoso administrador ou

mesmo como “máquina de fazer dinheiro”, estende-se por sobre a

vida feita uma crosta de gelo. Quanto mais posses, tanto mais cresce

se a disposição ascética resistir a essa prova – o peso do sentimento

da responsabilidade não só de conservá-la na íntegra, mas ainda de

multiplicá-la para a glória de Deus através do trabalho sem

descanso69

. (Ibid., p. 155)(77)

Nas palavras de Weber:

Eis, porém algo ainda mais importante: a valorização religiosa do

trabalho profissional mundano, sem descanso, continuado,

sistemático, como o meio ascético simplesmente supremo e a uma só

comprovação a mais segura possível da regeneração de um ser

humano e da autenticidade se sua fé tinha que ser, no fim das contas,

a alavanca mais poderosa que se pode imaginar da expansão dessa

concepção de vida que aqui temos chamado de “espírito” do

capitalismo70

.

Todavia, os efeitos da “segunda secularização” são radicalmente diversos dos da

primeira: de fato, se extingue toda e qualquer resídua utopia do “homem novo” e em seu

lugar entra a idéia de uma evolução constantemente adaptativa do sistema social,

garantida pela “cooperação”.

68

WEBER, 2004, p. 164-165. 69

Ibid., p. 155. 70

WEBER, 2004, p. 156-157.

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A secularização na política é condição necessária para a constituição do campo

religioso e a consequente pluralidade religiosa, na medida em que se desvincula a

relação simbiótica entre a Igreja Católica e o Estado. O Estado passa a ter entre suas

funções a regulação da religião, o que leva a incluir como duas das suas prerrogativas

determinarem se uma entidade poderá ou não ser considerada religiosa, e, uma vez

reconhecida como religiosa, garantir as condições de livre profissão da sua fé, bem

como garantir aos cidadãos a liberdade de escolha e prática da religião.

O grande desafio da fé cristã frente a mentalidade hedonista pseudo-religiosa

que enfraquece os valores da fé na vida cotidiana é o de justamente questionar aquilo

que se coloca como a única ou preferencial busca de finalidades possíveis pela

sociedade, ou seja, o dinheiro e o que advêm de sua presença.71

4. O Pontificado de Bento XVI e o processo de secularização

Queremos abordar dentro deste tema o estudo que o Papa Bento XVI faz desta

temática seja dentro do seu pontificado, seja dentro de seu contexto teológico inicial

como professor de várias faculdades na Alemanha, assim como o movimento de seu

pensar em seus escritos enquanto teólogo e antigo Cardeal presidente da atual

Congregação para Doutrina da Fé.

O atual pontífice no ultimo livro de entrevistas sal da terra demonstra de forma

incisiva qual é sua atual abordagem da relevância da fé e do mundo secularizado quando

com grande propriedade procura captar a situação do mundo atual no que se refere ao

secularismo:

“Encontramo-nos diante do confronto entre dois mundos espirituais,

o mundo da fé e o mundo do secularismo. A questão é: em que o

secularismo tem razão? Em que coisa, portanto, a fé deve apropriar-

se de formas e imagens da modernidade, e em que deve, ao contrário,

opor resistência? Esta grande luta atravessa hoje o mundo inteiro. Os

bispos do Terceiro milênio dizem-me: “Também entre nós existe o

secularismo; aqui, porém, mistura-se a estilos de vida ainda arcaicos.

71

L’ Osservatore. Romano. Sábado 17 de novembro de 2012, número 46, p. 22.

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Muitas vezes nos perguntamos como é possível que cristãos, que são

pessoalmente crentes, não encontrem a força para tornar a sua fé

politicamente operante. Devemos buscar sobretudo que as pessoas

não percam de vista Deus; que reconheçam o tesouro que possuem;e

que, além disso, elas mesmas, a partir da própria fé, no embate com o

secularismo, possam praticar o discernimento espiritual. Este

processo enorme é a verdadeira, a grande tarefa do momento

presente. Podemos apenas esperar que a força interior da fé que

existe nas pessoas adquira vigor também na opinião pública,

formando a opinião pública, e, ao agir assim, impeça a sociedade de

cair em um poço sem fundo72

É importante perceber que o esforço feito pelo teólogo Joseph Ratzinger muito

antes de ser Bento XVI ou o anterior cardeal Ratzinger sempre esteve presente em seus

escritos uma preocupação com o processo de secularização.

Queremos aqui destacar que estes dois mundos espirituais se fazem sentidos

através de diversos porta-vozes do mundo da ciência em nossos dias e que não apenas

falam a respeito da religião, mas justamente buscam conhecê-la e fazer um juízo a

respeito de sua afirmação e seus porta-vozes é o que encontramos nas afirmações de

Richard Rorty principalmente quando ele descreve seu conceito de espiritualidade:

Se por espiritualidade se entende uma aspiração pelo infinito, esta

acusação é perfeitamente justificada, mas ela não se justifica quando

se vê a espiritualidade como um sentido elevado de novas

possibilidades que se abrem para os seres finitos. A diferença entre

estes dois significados do termo espiritualidade é a diferença entre a

esperança de transcender a finitude e a esperança num mundo em que

os seres humanos tenham vidas muito mais felizes dos que as que

vivem atualmente”73

No primeiro momento o tema da secularização aparece nos escritos de Joseph

Ratzinger como um inimigo antigo que fora combatido com toda a veemência. A

tentativa que o processo de secularização realiza de tornar a fé meramente um

72 BENTO XVI. O Papa, a Igreja e os sinais dos tempos. Uma conversa com Peter Seewald. São

Paulo:Paulinas, 2011, p. 70.

73 RORTY, Richard. Uma ética laica. São Paulo: editora Martins Fontes, 2010, p.22.

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departamento privado da vida humana inquieta o cardeal Ratzinger que afirma que Deus

se encontra marginalizado no mundo moderno:

“... N a vida política, parece quase indecente falar de Deus, como se

fosse um ataque à liberdade de quem não crê. O mundo político segue

as suar normas e os seus caminhos, excluindo Deus como uma

realidade que não pertence a esta terra. O mesmo acontece no mundo

do comércio, da economia e da vida privada. Deus fica a margem. No

entanto, parece-me necessário voltar a descobrir[...] que também a

esfera política e econômica têm necessidade de uma responsabilidade

moral, de uma responsabilidade que nasce do coração do homem e

que, em última análise, tem a ver com a presença e a ausência de

Deus. Uma sociedade que Deus esteja absolutamente ausente

autodestrói-se.”74

O início do Pontificado de Bento XVI é marcado pela encíclica: Deus caritas

est. Esta é justamente uma tomada de posição do Papa frente ao ambiente secularizado

presente na Europa que não apenas se contenta em avançar em todas as esferas da

sociedade, mas procura fazer-se presente também no âmbito teológico utilizando-se de

conceitos que até então são usufruídos pela teologia, e que são utilizados através de uma

abordagem secular. Analisaremos como a Igreja propõe caminhos diante deste

fenômeno de proporções mundiais que se faz presente hoje em várias esferas do mundo

intelectual e espiritual de nosso tempo.

O Papa Bento XVI reconhece que é necessário repensar o sentido dos valores

morais que norteiam nossa própria existência e que a cada dia estão como que entrando

em colapso na sociedade:

“Esta catarse é um apelo a todos nós, a toda sociedade mas,

naturalmente, acima de tudo, à Igreja, a que voltemos a reconhecer os

valores que nos orientam, a reconhecer os perigos que nos ameaçam

não somente os sacerdotes, mas profundamente toda a sociedade. A

consciência da ameaça de toda a estrutura moral de nossa sociedade

deveria ser, para nós, um apelo a purificação. Devemos voltar a

74

PABLO, Blanco. Joseph Ratzinger uma bibliografia. Porto: Zenit, 2004, p. 155.

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reconhecer que não podemos viver na indiferença, e que é importante

aprender uma liberdade que seja responsabilidade”75

O êxodo da catarse é uma missão importante pela qual a Igreja deve atravessar.

Reconhece o Papa que a liberdade enquanto conquista, é também uma tarefa e uma

responsabilidade que deve percorrer caminhos que conduzam o ser humano ao ser

humano naquilo que realmente torna relevante a sua dignidade. Para o Papa Bento XVI

a modernidade não é uma realidade a ser ignorada ou descartada , mas acolhida naquilo

que apresenta toda sua realidade positiva de busca de sentido por parte do ser humano:

“É importante que busquemos viver e pensar o cristianismo de maneira tal que assuma

a modernidade boa e justa e, portanto ao mesmo tempo, afaste-se e se distinga daquela

que se está transformando em uma contra-religião”.76

Dentro desta perspectiva a liberdade tão cara ao ser humano não aparece como

uma oposição a verdade, fazendo assim pender a liberdade a uma ditadura do

relativismo e nem mesmo fazer da verdade um meio de impor um autoritarismo que

também tenha seus desdobramentos clericais. A modernidade aparece aqui como

possibilidade da verdade ser buscada e proposta na liberdade. “Em uma direção

contrária, a modernidade fora apresentada e pensada como a emancipação e liberdade

do homem que caminham pari passu para o seu distanciamento de Deus e da fé.77

5.1 A Antiga Europa Cristã e os novos desafios da secularização

O grande desafio enfrentado em nossos dias por parte da fé cristã diz respeito

justamente aos fundamentos apresentados pela secularização negativa no que se refere

em pensar a moralidade a partir da subjetividade e da autonomia do sujeito

desencantando de modo contundente o aspecto religioso até se tornar abertamente anti-

religiosa a nova forma de pensar sobre os novos caminhos da humanidade.

75

BENTO XVI. O Papa, a Igreja e os sinais dos tempos. Uma conversa com Peter Seewald. Ed:

Paulinas, São Paulo. 2011, p. 60. 76

Ibidem, p.78. 77

DEL NOCE, Augusto. B. La legitimazione crítica Del moderno. Genov – Milano: Marietti, 2011, p.

368.

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O cardeal Ratzinger pode vivenciar em diferentes gerações as grandes mudanças

que se operou no mundo nos decênios anteriores a partir da ditadura nazista passando

pela segunda guerra mundial, vivenciando o Concílio Vaticano II e o 4 de maio de 1968

momento em que se operou uma grande revolução cultural em muitos países da Europa.

Ratzinger esta vivenciando este período de grande turbilhão de revoluções que se opera

no mundo moderno. Na missa Pro Eligendo Romano Pontífice Celebrada pelo Cardeal

Ratzinger e posteriormente Bento XVI visualizamos um pouco do contexto eclesial que

o então Cardeal descreve historicamente:

“Quantos ventos doutrinários conhecemos nestes últimos decênios,

quantas correntes ideológicas, quantos modos de pensamento.O

pequeno barco do pensamento de muitos cristãos foi, não raro,

agitado por essas ondas e jogado de um extremo ao outro: do

marxismo ao liberalismo, até a libertinagem; do coletivismo ao

individualismo radical; do ateísmo a um vago misticismo religioso;

do agnosticismo ao sincretismo, e assim por diante. A cada dia nasce

novas seitas e se realiza o que diz São Paulo sobre o engano dos

homens, sobre a astúcia que tende a induzir ao erro. Ter uma fé clara,

segundo o credo da Igreja, muitas vezes é rotulado como

fundamentalismo. Enquanto o relativismo, ou seja, o deixar-se levar

“para lá e para cá por qualquer vento doutrinário”, aparece como

única atitude diante dos tempos atuais. Vai-se constituindo uma

ditadura do relativismo, que não conhece nada como definitivo e que

deixa como última medida somente o eu e suas vontades”78

Esta crise gerou um fastio grande com relação principalmente a Igreja Católica. A

partir da revolução francesa o conflito trono e altar se acirraram. Uma procura por parte

do poder civil de um desligamento de sua relação de proximidade e acordos substâncias

com a fé católica. Uma das saídas possíveis ao desafio do processo de secularização

seria a atitude da fé adulta capaz de dialogar com os novos questionamentos que são

apresentados a fé cristã.79

78

RATZINGER, Joseph. Ditadura do relativismo. Veja. São Paulo, 27 de abril, 2005. Pg.36-37. 79

L‟Osservatore Romano. Sábado 20 de Outubro de 2012, número 42, p.11.

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5.2 O Sínodo: Nova Evangelização e Transmissão da Fé Cristã; “A Igreja existe

essencialmente para evangelizar”.

A Igreja possui uma missão intransferível que é a de ser um sinal histórico do

Reino dos Céus na terra. Este legado abrange a valorização da vida humana e tudo

aquilo que por meio dela e de seu legado faz resplandecer sua visão de homem. A Igreja

que não tivesse a valentia de evidenciar o valor, inclusive publicamente, de sua visão

antropológica, haveria deixado de ser sal da terra e luz do mundo, cidade sobre o

monte.80

Aqui faz-se mister compreender a missão da Igreja a partir de seu envio para

ser no mundo expressão dos valores do Reino de Deus. Valores estes que são

transmitidos há séculos por meio da fé crista de modo mais situado através do

cristianismo e por meio de uma transmissão que hoje compreendemos como

evangelização ou “Nova Evangelização”.

Os Padres sinodais reunidos recentemente no XIII sínodo dos Bispos bobre a

nova evangelização e a transmissão da fé cristã afirmaram a necessidade de uma

autêntica renovação espiritual. Seja da Igreja e ao mesmo tempo do mundo. O

compromisso de fé por parte dos cristãos seria capaz de lançar os primeiros germes

desta possível renovação espiritual: “O compromisso de renovação espiritual da própria

Igreja, para poder renovar espiritualmente o mundo secularizado81

. Constatou-se que a

secularização modelou duas gerações de católicos que não conhecem as orações

fundamentais da Igreja82

e nem a sua missão no mundo. Necessário se faz em propor

como tarefa fundamental uma profunda conversão pastoral que possa aproximar e dar a

compreender melhor ao mundo qual é a tarefa e a missão da Igreja.

4.3 Papa Francisco e a resposta testemunhal à secularização.

80

RATZINGER, Joseph. Mirar a Cristo. Exercícios de fé esperança e amor. Valência: Ediap, 1990,

p.82. 81

L‟Osservatore Romano. Sábado 03 de novembro de 2012, número 44, p. 12-13. 82

L‟Osservatore Romano. Sábado 13 de outubro de 2012, número 41, p.21.

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Ao Lançarmos um olhar sobre o atual pontificado exercido na pessoa do Papa

Francisco, ou como ele mesmo gosta de ser cognominado Jorge M. Bergoglio, vemos

que o processo de secularização também ocupa um lugar de reflexão. O Papa Francisco

constata através de um olhar sinodal que o “processo de secularização tende a reduzir a

fé e a Igreja ao âmbito do privado e íntimo”83

. Para Francisco quando o homem perde

ou não leva em conta a sua dimensão espiritual a transcendência a sua visão

antropológica mergulha no vazio, desembocando em um relativismo progressivo. O

olhar do Papa Francisco não se situa somente na preocupação secular do homem

moderno de se emancipar de toda e qualquer instituição, mas o Papa percebe que ao

perder a referência, ou não considerar a dimensão transcendental presente na vida

humana a desorientação se generaliza na sociedade e a adolescência e a juventude torna-

se joguete de um relativismo moral84

incapaz de propor ao ser humana caminhos que

promovam a verdadeira pessoa em sua dignidade.

Outro aspecto que é destacado pelo Papa Francisco é justamente a atual crise

cultural profunda pela qual passa a família. O matrimonio na visão do Papa deve

superar o nível da afetividade e das necessidades ocasionais do casal e por outro lado

deve conduzir o casal a uma dimensão da dimensão matrimonial que apresente este

compromisso como uma união de vida total85

.

Outra dimensão que deve ser considerada ao referir-se ao processo de

secularização como compreende o Papa Francisco é justamente o individualismo pós-

moderno e globalizado. Este tipo de individualismo como compreende o Papa Francisco

somente debilita o desenvolvimento e a estabilidade dos vínculos entre as pessoas e

distorce os vínculos familiares.

Ao levantarmos alguns traços do olhar do Papa Francisco sobre o processo de

secularização destacamos aqui outra realidade que é justamente os caminhos

apresentados pelo mesmo Papa para encontrar caminhos que possam mudar esta

paisagem negativa gerada pelos frutos de uma secularização que não considera o ser

humano em sua diferentes dimensão. Um dos pontos ou dos caminhos que o Papa

Francisco apresenta é uma ação pastoral que promova e incentive uma comunhão

83

PAPA FRANCISCO. Exortação Apostólica Evangelii Gaudium. São Paulo, Ed: Loyola, 2013, II, §

64, p. 45. 84

Ibidem, II, § 64, p.45. 85

Ibidem, II, § 66, p. 46.

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salutar, que promova e fortaleça os vínculos pessoais: “Enquanto no mundo,

especialmente em alguns países, reacendem-se várias formas de guerras e conflitos,

nós, cristãos, insistimos na proposta de reconhecer e ajudar o outro, de curar as

feridas, de construir pontes, de estreitar laços e de nos ajudarmos “a carregar as

cargas uns dos outros” (Gl 6,2).86

O caminho pelo qual o Papa Francisco se propõe a percorrer e indicar como

caminho comum para toda a Igreja é um caminho testemunhal. A Igreja compreendida

como estrutura de serviço humilde aos irmãos e a humanidade. É principalmente no

testemunho da pessoa de Jesus e de modelo supremo.

O desafio atual da Igreja na contemporaneidade não se situa unicamente no

confronto de idéias, ou no apresentar um conceito que seja mais sólido do que aquele

que o processo de secularização apresenta, mas a urgência que se encontra hoje no

tecido eclesial é o de buscar caminhos para que a caridade de Cristo continue sendo um

evento por meio do qual a Igreja encarnado os valores do Reino de Deus em meio aos

seus contemporâneos apresente melhor o rosto de Deus aos seus contemporâneos.

Redescobrir o aspecto acolhedor do evangelho, o olhar do bom samaritano, para

o qual pessoa alguma é invisível, será o começo para que se iniciem novas mudanças

dentro das estruturas eclesiais, superando assim á atitude burocrática, onde o aspecto

administrativo sufoca a ação pastoral, desembocando em uma sacramentalização que

não visualize outros caminhos oportunos a evangelização.

Procuramos aqui nesta primeira parte da dissertação apresentar algumas

dimensões que consideramos necessária para situarmos um pouco o sentido do Processo

de secularização. Apresentamos algumas abordagens científicas por parte de algumas

ciências humanas e trouxemos reflexões por parte da XIII Assembleia ordinária do

sínodo dos Bispos sobre a nova evangelização e a transmissão da fé cristã. Por último

demos um acento seja nas propostas colocadas pelo sínodo, contudo já adentrando com

sua síntese na Exortação Apostólica Evangelii Gaudium do Papa Francisco que sintetiza

o pensamento dos padres sinodais.

A partir do próximo capítulo apresentaremos a visão de alguns pontos de

reflexão sobre o conceito de evangelização e “Nova evangelização” dentro dos novos

86

Ibidem, II, § 67, p. 46.

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desafios atuais da Igreja. Também dentro deste segundo capítulo continuaremos a fazer

dos textos Sinodais um caminho para a compreensão da ação evangelizadora da Igreja

buscando assim acolher de modo mais universal aquilo que valioso será para a vivência

local e de toda Igreja. O testemunho e a experiência, e até mesmo as dificuldade

daqueles que evangelizam e do caminhar das diversas Igrejas locais acrescentam e

enriquecem consideravelmente a visão e a ação evangelizadora da Igreja na sua

universalidade.

O segundo capítulo colhendo os desafios postos pelo processo de secularização

apresentará caminhos de superação deste mesmo processo e alguns elementos

necessários para que se compreendam melhor as necessidades internas da Igreja de se

auto-estruturar na compreensão necessária do conceito de evangelização e Nova

evangelização, assumindo de maneira comum e caminhando na mesma direção

considerando a particularidade de cada experiência e cultura e ao mesmo tempo

utilizando da própria experiência para que numa dinâmica interna se abra a uma guinada

paradigmática dentro de um novo modo de olhar os horizontes missionários e pastorais

de toda a Igreja.

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II CAPÍTULO

EVANGELIZAÇÃO E “NOVA EVANGELIZAÇÃO”

2. O Conceito de Evangelização e “Nova Evangelização”

A palavra “evangelium” “euangelisasthai” aparece já nos escritos de Homero

como o anúncio de uma vitória e, por conseguinte, é anuncio de bem, de alegria, de

felicidade. O segundo livro do Profeta Isaias (40, 9) como voz que anuncia a alegria de

Deus, como voz que faz compreender que Deus não se esqueceu de seu povo, que Deus,

o qual aparentemente quase se tinha retirado da história, existe, está presente.87

Neste

contexto sobressaem três palavras: dikaiosyne, eirene, soteria – justiça, paz, salvação. O

próprio Jesus retoma as palavras de Isaías, em Nazaré, falando deste “Evangelho” que

agora ele leva precisamente aos excluídos, aos encarcerados, aos sofredores e aos

pobres. Dentro do ambiente do novo testamento a palavra “evangelium” aparece

paralelamente ao uso da mesma que o Império Romano começando pelo Imperador

Augusto realizava.

A Igreja existe para evangelizar, ela é essencialmente missionária. A reflexão

sobre a dimensão missionária na Igreja com seus desdobramentos na pastoral encontra-

se em uma autêntica encruzilhada. Deparamo-nos com uma estrutura de mundo em

permanentes transformações e com o paradigma antropológico bem acentuado. O

mandato missionário do Redentor e a preocupação em ser autêntica com este mandato

leva novamente a Igreja a se concentrar em sua missão evangelizadora.

A teologia da missão encontra nos documentos do Concílio Vaticano II um

suporte teológico na missão ad gentes, que apresenta uma progressão na

corresponsabilidade missionária. A missão aparece como um acontecimento Trinitário é

o Pai que envia o Filho e o Filho por sua vez em Pentecostes envia o Espírito Santo e o

Espírito é que envia a Igreja por meio dos apóstolos e de todos aqueles que crendo e

sendo batizados são tocados pela experiência com o Ressuscitado.

87

CONFERÊNCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL. Meditação do Papa Bento XVI durante

a oração da Hora Tércia na inauguração dos trabalhos do Sínodo dos Bispos. A Nova Evangelização para

a Transmissão da Fé Cristã. São Paulo: CNBB. 2013, P.15.

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A evangelização obedece ao mandato missionário de Jesus: “Ide, pois, fazei

discípulos de todos os povos, batizando-os em nome do Pai, do Filho e do Espírito

Santo, ensinando-os a cumprir tudo quanto vos tenho mandado” (Mt 28, 19-20). Nestes

versículos, aparece o momento em que o Ressuscitado envia os seus discípulos a pregar

o Evangelho em todos os lugares e tempos e, para que a fé n‟Ele se estenda a todos os

cantos da terra.88

A Igreja reconhece que: “não pode haver verdadeira evangelização

sem o anúncio explícito de Jesus como Senhor e sem existir uma «primazia do anúncio

de Jesus Cristo em qualquer trabalho de evangelização».89

Hoje os agentes de evangelização enviados pelo espírito são os cristãos que

sendo por sua vez evangelizados tornam-se evangelizadores. A evangelização não é

uma propaganda ou uma estratégia de marketing, mas antes de tudo é a “arte de

viver”.90

Crer em Cristo e em seu evangelho não é apenas partirmos em busca de

realizar algo por nós mesmos, mas de acolhermos a graça que se apresenta como

caminho de vida e salvação. Os profetas anunciaram e transmitiram a Palavra de Deus

impelido pelo Senhor a situações concretas do peregrinar do povo de Israel. Grandes

personalidades e mestres conferiram saberes aos seus discípulos que eram verdadeiras

instruções para o seu agir e ser. Ser evangelizado é acolher o Reino na sua proximidade.

O Reino que se faz presente “em” e “entre nós”. O Reinado de Jesus transforma a vida

em um servir. Este servir os outros com o anúncio explícito da pessoa de Cristo e uma

vida que se coadune com a mesma mensagem e fé.

Os anunciadores e missionários da nova evangelização deverão superar

distâncias ideológicas de igual modo imensas, muitas vezes ainda antes de sair fora do

bairro ou da própria família.91

O sínodo por sua vez constatou que três fases devem estar presentes no novo

empenho da ação evangelizadora da Igreja:

88 PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium. Exortação Apostólica. São Paulo:Paulus-Loyola, 2013, I, § 19, p. 19. 89 Ibidem, III, § 110, p. 69. 90 http://www.vatican.va/roman curia / congregations/cfaith/documents/rc con cfaith doc 20001210 jubillcatechists-ratzinger po. Html. 22-06-2014/ 9:00hs. 91 L’ Osservatore Romano. Relatório do Cardeal William Wuerl, relator-geral, antes do debate geral, por ocasião da primeira congregação geral do sínodo dos bispos, sábado 13 de outubro de 2012, número 41, p. 21.

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1. A primeira fase: corresponde à renovação ou o aprofundamento da nossa fé a

nível intelectual e afetivo. Abraçando com alegria a mensagem evangélica e

podo-a em prática na própria vida92

;

2. A segunda fase: refere-se a uma nova confiança na verdade da nossa fé e na

própria mensagem que vamos anunciar. Aqui temos como referência o próprio

Jesus que ensinava com autoridade (Mc 1, 21-22). Ensinou do fundo de sua

identidade. Jesus tem autoridade por saber que Ele é: “Eu sou o caminho, a

verdade e a vida”93

;

3. A terceira fase: deve ser à vontade e o desejo de partilhar a própria fé. O

testemunho pessoal se fará fundamental e se constituirá em si uma proclamação

da Palavra de Deus.94

A Igreja reconhece que guiar os homens e mulheres do nosso tempo a

Jesus, ao encontro com Ele, é uma urgência em todas as regiões do mundo, de

antiga e de recente evangelização:95

1.2 A Nova Evangelização: “nova no seu fervor, nos seus métodos, nas suas

expressões”

A Igreja reconhece que guiar os homens e mulheres do nosso tempo a

Jesus, ao encontro com Ele, é uma urgência em todas as regiões do mundo, de

antiga e de recente evangelização:96

As transformações sociais às quais assistimos nos últimos decênios

têm causas complexas, que afundam as suas raízes no tempo

longínquo e modificaram profundamente a percepção do nosso

mundo. Considerem-se os gigantescos progressos da ciência e da

técnica, o ampliar-se das possibilidades de vida e dos espaços de

liberdade individual, as profundas mudanças em âmbito econômico, o

92

SÍNODO DOS BISPOS. Instrumentum Laboris.A nova evangelização para a transmissão da fé.

Brasília: CNBB, 2012, § 24, 37, 40, 118,-119, 147-158. 93

Ibidem, 31,41,46,49,120. 94

Instrumentum Laboris, 33-34, 81. 95

L‟ Osservatore Romano. Sábado 3 de novembro de 2012, número 44, P. 6. 96

L‟ Osservatore Romano. Sábado 3 de novembro de 2012, número 44, P. 6.

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59

processo de mistura de etnias e culturas causadas por maciços

fenômenos migratórios, a crescente interdependência entre os povos.

Tudo isto causou consequências também na dimensão religiosa da

vida do homem. E se por um lado a humanidade conheceu inegáveis

benefícios por estas transformações e a Igreja recebeu ulteriores

estímulos para dizer a razão da sua esperança (1 Pd 3, 15), por outro

se verificou uma preocupante perda do sentido do sagrado, chegando

até a pôr em questão aqueles fundamentos que pareciam indiscutíveis,

como a fé num Deus criador e providente, a revelação de Jesus Cristo

único salvador, e a comum compreensão das experiências

fundamentais do homem como nascer, morrer, viver numa família, a

referência a uma lei moral natural.97

Outra referência que amplia o conceito de evangelização é aquele apresentado

pelo Papa João Paulo II, quando propôs a toda Igreja uma nova evangelização, “nova no

seu ardor, nos seus métodos e nas suas expressões”.98

Este deve ser o primeiro e mais

necessário serviço que a Igreja deve oferecer a toda a humanidade. Aqui se faz ressoar

também as Palavras do Papa Paulo VI, em Evangelii Nuntiandi:

a) Uma evangelização nova em seu fervor (ardor):” Uma

evangelização inspirada no fervor que se pode sempre observar

sempre na vida dos grandes pregadores e evangelizadores, que se

consagraram ao apostolado”.[...]”Esta falta de fervor manifesta-se

no cansaço e na desilusão, no acomodamento e no desinteresse e,

sobretudo, na falta de alegria e esperança em numerosos

evangelizadores”(EN 80).

b) Uma evangelização nova em seus meios (método):”Este problema

de como evangelizar apresenta-se sempre atual, porque a maneira de

o fazer variam em conformidade com as diversas circunstâncias de

tempo de lugar e de cultura...”[...]” incumbe o cuidado de remodelar

com ousadia e com prudência e numa fidelidade total ao seu

conteúdo, os processos, tornando-os o mais possível adaptados e

eficazes para comunicar a mensagem evangélica aos homens de nosso

tempo”(EN 40).

C) Uma evangelização nova na maneira de expressar os conteúdos

(expressões); “ Na mensagem que a Igreja anuncia, há. certamente

muitos elementos secundários. A sua apresentação depende, em larga

escala das circunstâncias mutáveis. Também eles mudam”(EN 25).

[...] É por isso que a evangelização comporta uma mensagem

explícita, adaptada as diversas situações e continuamente

atualizada...”(EN 29).99

97

http://www.vatican.va/holy_father/benedict_xvi/apost_letters/documents/hf_benxvi_apl_20100921_ubi

cumque-et-semper _po.html 29. 06. 2014./ 16:00hs. 98

JOÃO PAULO II. Discurso á XIX Assembleia do CELAM, Porto Príncipe, Haiti, 9 de março de 1983,

3; AAS 75 I, 1983, 778. 99

BRIGHENTI, Agenor. Por uma evangelização realmente nova, Perspectiva Teológica, Belo

Horizonte, Ano 45, Numero 125, p. 83-106, Jan/ Abril, 2013.

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60

A nova evangelização seguindo na esteira da proposta de atualização do

Concílio Vaticano II quer fazer novamente resplandecer a beleza da fé no hoje do nosso

tempo100

, sem sacrificar às exigências do presente nem a manter ligada ao passado: na

fé ressoa o eterno presente de Deus, que transcende o tempo e, contudo pode ser

acolhido por nós unicamente no nosso hoje irrepetível.101

Outro elemento que é importante compreender no que se refere ao conceito de

evangelização e nova evangelização abordado pelo sínodo é justamente de compreendê-

lo como um acontecimento testemunhal dos discípulos de Jesus frente aos novos

desafios que se apresentam através da realidade, e não um “sonhar com a volta de uma

cristandade, o que seria um engano, uma ilusão, pois se baseia na sacralização de uma

forma histórica da presença da Igreja Católica no mundo”. 102

1.2.1 Fundamentos Teológico-Pastorais da nova evangelização

Uma das particularidades importantes neste Sínodo fora justamente o

complemento apresentado pelo Papa Bento XVI: “para Transmissão da fé cristã” o que

100

“Novo fervor/ardor se refere ao mensageiro, que também é mensagem. Na evangelização não é

possível desvincular a mensagem do mensageiro, sobretudo, como dirá a Evangelii Nuntiandi, porque o

testemunho constitui” o momento primeiro de um processo de evangelização” (EN 21). Antes do anúncio

explícito do querigma, impõe-se à necessidade de uma prévia evangelização implícita, alicerçada num

falar de Deus sem falar, a exemplo de seu próprio modo silencioso de comunicar-se. Neste particular, Os

grandes pregadores e evangelizadores tem muito a nos inspirar, entre os quais, nossos mártires brilham

como modelo de zelo pela defesa e promoção da “vida em abundância”(Jo 10, 10), que Jesus veio trazer.

Para uma nova evangelização, um mensageiro novo, sintonizado com seu tempo e contexto é, sobretudo,

expressão da mensagem sempre nova do evangelho.

Novos meios/métodos aludem ao fato de que a evangelização, além do mensageiro, o método é também

mensagem. E como as meditações o mensageiro tira da cultura, sempre viva e dinâmica, inevitavelmente,

os métodos caducam e passam. Métodos e mediações que num determinado tempo e espaço mostram-se

inadequados, em outras circunstâncias, podem se revelar totalmente defasados. O mensageiro precisa

zelar para que os métodos que ele utiliza para evangelizar estejam sempre em congruência com o

conteúdo da mensagem veiculada. Não basta que o fim seja evangélico; também os meios precisam ser

evangélicos. Na evangelização, os meios são sempre o fim na gradualidade do processo. É preciso ficar

atento a meios que não são bom caminho, pois desviam do fim ao qual a mensagem se acena.

Novas expressões ou nova maneira de expressar o conteúdo dizem respeito à roupagem através da qual se

veicula o evangelho. E a roupagem é também mensagem. Além do mensageiro e do método, a instituição

é também mensagem, assim como estruturas, organização, configurações históricas, são também

mensagem dado que afetam o caráter de uma Igreja sacramento do Reino de Deus. Sacramento, além de

Instrumento, é também sinal que precisa mostrar ou visibilizar a mensagem na forma como se busca

explicita-la e atualiza-la nas novas circunstâncias.”(BRIGHENTI, Agenor. Por uma evangelização

realmente nova, perspectiva Teológica, Belo Horizonte, Ano 45, Numero 125, p. 83-106, Jan/ Abril, 2013

p, 89. 101

http://www.vatican.va/holy_father/benedict_xvi/homilies/2012/documents/hf_bentoxvi_hom_2012101

1_anno-fede_po.html. 28.06.2013/ 14:00hs 102

L‟ Osservatore Romano. D. Pascal Wintzer, Arcebispo de Poitiers (França), 27 de outubro de 2012,

número 43, p. 7.

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dá justamente a conotação de uma unidade entre a “nova evangelização” e a transmissão

da fé cristã que costuma a ser transmitida pela vivíssima Tradição da Igreja. Sem este

componente essencial a nova evangelização poderia consistir numa experiência que, por

conseguinte poderia se tornar mais uma experiência intimista e subjetivista do que algo

que direcionasse a um engajamento e a um ser no corpo de Cristo que é a Igreja

comunidade dos que creem. Conceito como a encarnação, a ressurreição, a redenção, os

sacramentos e a graça são temas fundamentais para compreensão da própria fé vivida

pela igreja.103

É de fundamental importância que o evangelizador esteja aberto a abordar

outras temáticas importantes sendo ele um grande responsável por socializar e clarificar

melhor pela vivencia do evangelho o que crê.

Aqui é importante compreender a nova evangelização dentro de sua profunda

relação com a pastoral. O termo “pastoral” deriva de pastor. No início de seu uso (finais

do século XVIII e princípios do século XIX) referia-se basicamente à doutrina e prática

de formar pastores (presbíteros), e ao modo de realizar o ofício da cura animorum

(cuidado das almas) próprio do pároco.104

Contudo dentro da eclesiologia do Vaticano

II, compreendemos a pastoral dentro de uma perspectiva de ministérios onde cada

membro do corpo de Cristo, dentro de seu carisma e vocação específica colabora para

uma auto-edificação da própria comunidade eclesial a partir do paradigma testemunhal

do próprio Jesus.105

Faz-se necessário a compreensão neste contexto da importante

relação entre evangelização e pastoral:

“Entendendo-se por evangelização o anúncio da Boa-Nova do Reino

e do amor do Pai, manifestado em Jesus Cristo morto e ressuscitado,

para a salvação, podemos dizer que a pastoral e evangelização não se

identificam, mas são interdependentes e complementares; a

evangelização é a tarefa que deve ser realizada (o que), e a pastoral é

o modo necessário de concretizar tal tarefa (o como); a evangelização

é uma e única, a pastoral é diversa e com métodos variados. O

ministério pastoral é instrumento e canal, o Evangelho, a fonte. Daí

que o mais importante não seja realizar ações, mas evangelizar por

meio delas. Conclusão: se o ministério não fizer presente Jesus Cristo

103

L‟ Osservatore Romano. Relátorio do Cardeal William Wuerl, relator-geral, antes do debate geral,

por ocasiaão da primeira congregação geral do sínodo dos bispos, sábado 13 de outubro de 2012, número

41, p. 21. 104

FLORISTÁN, C. Teología práctica, teoria y práxis de La acción pastoral. Salamanca: sígueme,

1993. P. 108. 105

VALADEZ FUENTES, S. Espiritualidade Pastoral: Como superar uma pastoral “sem alma”? São

Paulo: Paulinas, 2008.

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e sua práxis, não é evangelizador e não merece o qualificativo de

„pastoral‟.”106

Uma das atuais e oportunas definições sobre a pastoral encontra-se no discurso

do Papa Francisco no encontro que teve com o episcopado brasileiro por ocasião da

Jornada da Juventude em 27 de Julho de 2013:

“Pastoral nada mais é que o exercício da maternidade da Igreja. Ela

gera, amamenta, faz crescer, corrige, alimenta, conduz pela mão. Por

isso, faz falta uma Igreja capaz de descobrir as entranhas maternas

da misericórdia. Sem misericórdia poucas chances temos hoje de

inserir-nos em um mundo de “feridos”, que têm necessidade de

compreensão, de perdão, de amor. ”107

1.2.2 Fundamento Antropológicos da Nova evangelização

A nova evangelização deve indicar a própria origem da nossa dignidade humana,

o conhecimento de si e a realização de si dentro de um horizonte antropológico mais

amplo. Evangelizar será o esforço de colocar o ser humano frente ao projeto de Deus

para sua própria vida. Abeirando-se dos direitos fundamentais a respeito da vida

humana da família e de tudo aquilo que pode promover integralmente a dignidade

humana:

“A nova evangelização deve basear-se sobre a compreensão teológica

que é Cristo que revela o homem ao homem a si mesmo, que a

verdadeira identidade do homem está em Cristo, o novo Adão. Este

aspecto da Nova evangelização tem um significado muito prático para

o indivíduo. Se é Cristo quem nos revela quem é Deus e, por

conseguinte, quem somos e como nos relacionamos com Deus, então

Deus não está distante ou incrivelmente distante.”108

106

Ibidem, p. 21. 107

PAPA FRANCISCO. Pronunciamentos do Papa Francisco no Brasil. São Paulo: Loyola, 2013, p.

54. 108

SÍNODO DOS BISPOS. Instrumentum Laboris.A nova evangelização para a transmissão da fé.

Brasília: CNBB, 2012, §19. P.30.

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O fundamento antropológico da nova evangelização deve ser o desejo natural,

que todos sentimos, de comunhão com o transcendente- com Deus. Outro elemento é

que a compreensão antropológica sobre a abertura do homem a Deus o coloca diante do

drama do enfrentamento do mal e do pecado na própria vida. Frente a este drama o ser

humano tem o auxílio do próprio Cristo para empreender um peregrinar a uma vida

nova buscando superar e transcender o que lhe apequena sua dignidade. Esta é a tarefa

da nova evangelização, ajudar o ser humano a reconhecer que através da luz da fé que

tem sua visibilidade na encarnação e na humanidade do Filho de Deus, Ele também ser

humano torna o homem mais plenamente homem.

1.2.3 Fundamentos Cristológicos da Nova Evangelização

A nova Evangelização é a re-proposta da pessoa de Jesus Cristo. A apresentação

da pessoa de Jesus e sua relação com o Pai, a sua atividade e missão na humanidade e a

realidade de sua paixão, morte e ressurreição. O Cristo apresentado deve ser o Cristo da

revelação, da auto-comunicação de Deus. Jesus veio revelar a verdade sobre Deus e

sobre nós mesmos.109

O sínodo dos bispos ao tomar novamente os fundamentos cristológicos de todo o

ser e missão da Igreja está bem consciente que a fé cristã não diz respeito somente a

comunicação de saberes culturais cristãos que plasmaram por muitos séculos os

continentes beneficiados pela mensagem evangélica, mas o que a Igreja realmente

pretende é reconhecer e trazer a memória de cada um de seus membros que: “Ao início

do ser cristão, não há uma decisão ética ou uma grande idéia, mas o encontro com um

acontecimento, com uma pessoa que dá a vida um novo horizonte e, desta forma, o

rumo decisivo.”110

Ao colocarmos a experiência com Cristo como evento testemunhal do envio

missionário ressaltamos aqui a importância de que os que se lançam na missão

evangelizadora assumam também o estilo evangelizador de Jesus Cristo, que é o

109

Ibidem, p. 18-21. 110

BENTO XVI. Deus caritas est . Carta Encíclica. São Paulo: Paulus-Loyola, 2005, § 1, p.7.

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primeiro e o maior evangelizador.111

Esta atitude renovada deve se fazer presente em

qualquer atividade que se realiza.112

1.2.4 Fundamentos Eclesiológicos da nova evangelização

A missão da nova evangelização deve também apresentar uma explícita

compreensão teológica sobre o lugar da Igreja para a salvação. De fato é um desafio

delicado, pois a cultura moderna é permeada por um sentimento de que a salvação é um

acontecimento unicamente do encontro com a pessoa de Jesus Cristo. Aqui é necessário

apresentar a Igreja na sua dimensão diaconal. A dimensão diaconal da Igreja não é

aquela que se coloca como a detentora de todos os meios sem o qual ninguém poderá

chegar à salvação, mas como aquela que deseja, reza e auxilia a cada crente para que

este vivencie a salvação e sinta-se como pertencente a este corpo eclesial, mesmo que

esta pertença por vezes não seja plena ou ainda não testifique uma plena unidade cristã

em diferentes aspectos, costumes e disciplinas internas seja das igrejas mais históricas,

ou seja, das nova comunidades eclesiais.113

. Os novos evangelizadores se esforçarão por

apresentar a Igreja como corpo de Cristo:

“Agora Vós sois o Corpo de Cristo e, cada um segundo a própria

parte, seus membros (I Cor 12,13). A base de nossos esforços na nova

evangelização deve ser o reconhecimento de que no batismo Cristo

deu a cada um de nós dons do Espírito Santo. É o Espírito, a alma da

Igreja, que nos liga numa unidade que supera qualquer tipo de

divisão (I Cor 12, 13). A nova evangelização deve falar da vontade

salvífica de Deus e ao mesmo tempo reconhecer que Jesus ofereceu

um percurso claro e único para a redenção e salvação. A Igreja não é

um entre os muitos modos para se alcançar a Deus, considerados

todos igualmente válidos. Enquanto Deus quer que sejamos todos

salvos, é precisamente por sua vontade salvífica universal que Deus

111

PAULOVI. Evangelii Nuntiandi . Exortação Apostólica. (8 de dezembro de 1075), 7: AAS 68 (1976),

9. 112

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium. Exortação Apostólica. São Paulo: Paulus-Loyola,

2013,§18, p. 17. 113

SÍNODO DOS BISPOS. Instrumentum Laboris.A nova evangelização para a transmissão da fé.

Brasília: CNBB, 2012, § 35-36.p. 44-45.

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65

enviou Cristo para nos fazer filhos adotivos e leva-nos á eventual

glória eterna”.114

A nova evangelização é inseparável de uma renovação da comunhão eclesial na

relação entre dimensão carismática e hierarquia.115

1.2.5 Fundamentos soteriológicos da Nova evangelização

Uma justa compreensão da presença de Deus conosco é a consciência do que

entendemos como seu Reino. O novo testamento todo fala sobre o Reino de Deus. Já

desde o início da pregação evangélica Jesus diz que “reino de Deus está próximo” (Mt

4, 17). O coração do evangelho é o Reino de Deus. Se quisermos reivindicar o fato de

que somos seguidores de Jesus é essencialmente necessário que olhemos para o Reino

que Ele proclamou. Na terra o reino está misteriosamente escondido, mas pode ser

conhecido em toda parte de modo espiritual, contudo, o Reino que veio na pessoa de

Cristo, cresce no coração de quantos a ele são incorporados.116

O grande empreendimento da evangelização em nossos dias consistira em uma

organização aberta que deverá contar com alguns pontos fundamentais tais como a

necessidade de reafirmar a natureza essencial da evangelização em toda igreja. Outro

aspecto será a solidez dos fundamentos teológicos a serem colocados como balizas para

a nova evangelização.

O encorajamento de numerosas e atuais manifestações e iniciativas pastorais,

evangelizadoras, espirituais que fomentem um novo impulso evangelizador demonstra-

se de fundamental importância. Também será de grande importância sugerir meios

114

L‟ Osservatore Romano. Relátorio do Cardeal William Wuerl, relator-geral, antes do debate geral,

por ocasião da primeira congregação geral do sínodo dos bispos, sábado 13 de outubro de 2012, número

41, p. 21. 115

L‟ Osservatore Romano. Cardeal Marc Quellet, P.S.S, Prefeito da Congregação para os Bispos

(Cidade do Vaticano), sábado 17 de novembro de 2012, número 46, p.19. 116

CATECISMO DA IGREJA CATÓLICA. Petrópolis: Vozes, 1993, I, § 865, p. 212.

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concretos de se introduzir em toda Igreja iniciativas que permeiem tanto paróquias, e

movimentos num atualizado compromisso missionário.117

Destacamos aqui a importante da contribuição dada pela exortação Apostólica

Evangelii Gaudium que bem apresenta e sintetiza as dimensões particulares e universais

em que a nova Evangelização e a transmissão da fé cristã se preocupa em abordar:

“À escuta do Espírito, que nos ajuda a reconhecer comunitariamente

os sinais dos tempos, celebrou-se de 7 a 28 de Outubro de 2012 a XIII

Assembleia Geral Ordinária do Sínodo dos Bispos, sobre o tema A

nova evangelização para a transmissão da fé cristã. Lá foi recordado

que a nova evangelização interpela a todos, realizando-se

fundamentalmente em três âmbitos. Em primeiro lugar, mencionamos

o âmbito da pastoral ordinária, animada pelo fogo do Espírito a fim

de incendiar os corações dos fiéis que frequentam regularmente a

comunidade, reunindo-se no dia do Senhor, para se alimentarem da

sua Palavra e do Pão de vida eterna. Devem ser incluídos também

neste âmbito os fiéis que conservam uma fé católica intensa e sincera,

exprimindo-a de diversos modos, embora não participem

frequentemente no culto. Esta pastoral está orientada para o

crescimento dos crentes, a fim de corresponderem cada vez melhor e

com toda a sua vida ao amor de Deus. Em segundo lugar, lembramos

o âmbito das pessoas batizadas que, porém, não vivem as exigências

do Batismo, não sentem uma pertença cordial à Igreja e já não

experimentam a consolação da fé. Mãe sempre solícita, a Igreja

esforça-se para que elas vivam uma conversão que lhes restitua a

alegria da fé e o desejo de se comprometerem com o Evangelho. Por

fim, frisamos que a evangelização está essencialmente relacionada

com a proclamação do Evangelho àqueles que não conhecem Jesus

Cristo ou que sempre O recusaram. Muitos deles buscam

secretamente a Deus, movidos pela nostalgia do seu rosto, mesmo em

países de antiga tradição cristã. Todos têm o direito de receber o

Evangelho. Os cristãos têm o dever de anunciá-lo, sem excluir

ninguém, e não como quem impõe uma nova obrigação, mas como

quem partilha uma alegria, indica um horizonte estupendo, oferece

um banquete apetecível. A Igreja não cresce por proselitismo, mas

por atração.118

2. A Conversão: princípio fundamental para uma nova evangelização.

117

L‟ Osservatore Romano. Relátorio do Cardeal William Wuerl, relator-geral, antes do debate geral,

por ocasiaão da primeira congregação geral do sínodo dos bispos, sábado 13 de outubro de 2012, número

41, p. 21. 118

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium. Exortação Apostólica. São Paulo: Paulus-Loyola, 2013, §

14, p. 14.

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“Arrependei-vos, porque o Reino dos céus está próximo.”(Mt 3, 2)119

. A

mensagem da conversão é a mensagem que acessa a nova vida. O estilo de vida dos

discípulos de Jesus manifestam o projeto de Deus e dilata a presença de seu Reino em

meio ao mundo. A conversão é a abertura e um redimensionar integral do ser humano e

de sua potencialidade em direção ao mistério de Deus auto-comunicado através do

mistério do Verbo encarnado. O acontecimento da conversão não é apenas um

movimento ad extra que acontece para fora dos portões ou dos muros da própria Igreja:

“A conversão (metanoia), no seu significado propriamente cristão, é

uma mudança de mentalidade e de ação, como expressão da vida

nova em Cristo proclamada pela fé: trata-se de uma contínua reforma

do pensamento e de obras para uma mais intensa identificação com

Cristo(Gl 2, 20), que são chamados primeiro os batizados. Tal é, em

primeiro lugar, o significado do convite formulado por Cristo:

„convertei-vos e crede na Boa Nova‟(Mc 1, 15; Mt 4, 17).”120

Sabemos que a conversão pastoral, condição para uma autêntica evangelização

deve também passar pela conversão dos pastores para que eles sejam os primeiros a se

abrirem a uma nova primavera do Espírito Santo sobre a Igreja:

“Fechamo-nos em nós mesmos, mostramos uma auto-suficiência que

impede que nos aproximemos como uma comunidade viva e fecunda

que gera vocações, a tal ponto burocratizamos a vida de fé e

sacramental. Numa palavra, já não sabemos que ser batizados é

sermos evangelizadores. Incapazes de ser propositivos do evangelho,

tíbios na certeza da verdade que salva, e cautos no falar porque

estamos oprimidos pelo controle da linguagem, perdemos

credibilidade e arriscamos tornar vão o Pentecostes. Neste momento

não nos serve as saudades dos tempos passados nem a utopia para

perseguir os sonhos; ao contrário serve uma análise lúcida que não

esconde as dificuldades e nem sequer o entusiasmo de todas as

experiências que permitiram nestes anos realizar a nova

evangelização.121

120

CONGREGAÇÃO PARA DOUTRINA DA FÉ. Nota Doutrinal sobre alguns Aspectos da

Evangelização. São Paulo: Paulinas, 2007, p. 17. 121

L‟ Osservatore Romano. D. Rino Fisichella. Durante a terceira congregação geral, intervenção dos

Padres sinodais, sábado 20 de outubro de 2012, número 42, p.12.

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A finalidade da evangelização é metanoia e a opção pela palavra de Deus,

através de uma mudança radical no modo de refletir, viver e estar no mundo.122

É

justamente esta Palavra, este falar de Deus aos homens que produzirá um modo de ser,

pensar e agir.123

A conversão é em si uma antecipação da vida nova sob as condições

deste mundo nas possibilidades do evangelho e que o Espírito de Deus põe a vigorar:

Conversão é vida na antecipação do Reino de Deus com base na proveniência desse

reino.124

Mesmo que o Reino de Cristo não tenha chegado na terra a plenitude ele faz-se

sinalizar através da presença da igreja. A Igreja é o meio pelo qual Cristo reina e dilata o

seu Reino em meio aos homens. Contudo, este Reino, encontra fecundidade quando

pessoas que assumiram viver uma conversão autêntica explicitam a vida nova em

Cristo.125

2.1 A Vida Eterna principiada nas bem-aventuranças

Um dos aspectos fundamentais do cristianismo é que ele abre o ser humano para

dimensões de eternidade. No início da pregação de Jesus está presente a pregação sobre

o Reino de Deus que se faz presente no “já” e no “ainda não” da Igreja peregrinante. Ao

caminhar na companhia de seu Senhor a Igreja reconhece-se como a discípula bem

aventurada que vive a beatitude de Deus já na cotidianidade das relações humanas. Este

entrar na vida já é um acontecimento existencial-ontológico de quem se abriu para a

vida que é comunicada pelo Senhor Jesus Cristo: “Eu vim para que tenham vida e a

tenham em abundância”(Jo 10,10), realiza-se só quando as pessoas entram na vida

eterna. É a ação da Igreja que indica o caminho rumo a vida em abundância.126

As motivações do alto é o que deve mover as iniciativas que tomamos no

cotidiano da nossa história. Afirma a Constituição Dogmática Lumen Gentium que: “...

122

L‟ Osservatore Romano. D. Mauro Semren, O.F.M. Auxiliar de Banja Luka (Bósnia e Herzegovina)

sábado 3 de novembro de 2012, número 44, p. 18 123

123

L‟ Osservatore Romano. Relátorio do Cardeal William Wuerl, relator-geral, antes do debate geral,

por ocasião da primeira congregação geral do sínodo dos bispos, sábado 13 de outubro de 2012, número

41, p. 21. 124

MOLTMANN, JÜRGEN. O Caminho de Jesus Cristo. Cristologia em dimensões messiânicas,

Petrópolis: Ed; Vozes, 1993, p, 147. 125

CONFERÊNCIA NACIONAL DOS BISPOS DO BRASIL. Evangelização e missão profética da

Igreja: Novos desafios, (n 80), São Paulo: Paulinas, 2006, p. 29. 126

L‟ Osservatore Romano. Sua Beatitude Baselios Cleemis Thottunkal, chefe no sínodo da Igreja Sírio

Malancar (índia).

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enquanto consideramos a vida daqueles que seguiram fielmente a Cristo, somos

incitados a buscar por novas motivações a Cidade futura (cf. Heb 13, 14 e 11, 10)”.127

O crer é o acolhimento da vida que produz vida abundante no coração do

discípulo. A partir do batismo a vida eterna se faz presente na vida dos discípulos

levando a pessoa a um enraizamento no relacionamento com Cristo.

A bem-aventurada vida que propõe o evangelho é a amizade com a pessoa de

Jesus Cristo que se consolidando, se desdobra na missão como auto realização. A bem-

aventurança são os sinais daqueles que pelo amor ao Reino de Deus dão o melhor de si

e a si mesmo pela causa do evangelho. Não é trocar uma ideologia ateia por uma

ideologia religiosa, mas é a manifestação da presença do ressuscitado em meio aos

homens.128

Esta manifestação do ressuscitado nos aproxima daquele que conhece as

dores que atinge a alma e o corpo do ser humano. Ao tornar-se humano o Senhor Jesus

assumiu como suas chagas as chagas da humanidade, deste modo evangelizar para a

Igreja é se aproximar também das chagas de seu Senhor:

“Às vezes sentimos a tentação de ser cristãos, mantendo uma

prudente distância das chagas do Senhor. Mas Jesus quer que

toquemos a miséria humana, que toquemos a carne sofredora dos

outros. Espera que renunciemos a procurar aqueles abrigos pessoais

ou comunitários que permitem manter-nos à distância do nó do drama

humano, a fim de aceitarmos verdadeiramente entrar em contacto

com a vida concreta dos outros e conhecermos a força da ternura.

Quando o fazemos, a vida complica-se sempre maravilhosamente e

vivemos a intensa experiência de ser povo, a experiência de pertencer

a um povo.”129

A nova evangelização deve ser um apelo a uma nova caridade: “Só seremos

portadores credíveis da alegria do evangelho se a proclamação for acompanhada da

127

CONCÍLIO VATICANO II. Constituições, decretos e declarações. Constituição Dogmática Lumen

Gentium, 135. Vozes, 1968. 128

L‟ Osservatore Romano. D. Luigi Negri, Bispo de San Marino-Montefeltro (Itália), sábado 3 de

novembro de 2012, número 44, p. 21. 129

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium. Exortação Apostólica. São Paulo: Paulus-Loyola, 2013, V,

§ 270, p. 151.

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mensagem inseparável da caridade. A caridade de Jesus é o dom de si. A caridade da

nova evangelização deve ser o dom de Jesus.”130

O homem é um ser pluridimensional. A boa nova da salvação deve assumir

todas as dimensões do humano para lhe fazer experimentar na vida terrena o bem-estar

como sacramento da beatitude futura.131

A evangelização deve partir das coisas práticas

e fundamentais da nossa existência: “Quando nós cristãos anunciamos este Deus

pessoal, que nos ama, que nos salvou, que nos convida a uma vida feliz e eterna em

comunhão com ele, não estamos a formular conclusões que derivam automaticamente

dos nossos conhecimentos sobre a natureza”.132

É dentro deste horizonte mais amplo e que abarca a missão dentro de sua

dimensão integral que os padres do sínodo buscaram apresentar respostas que fossem ao

mesmo tempo teológicas e pastorais, não deixando de tomar a existência concreta da

vida de cada ser humano e sua presença no mundo:

“Já não se pode afirmar que a religião deve limitar-se ao âmbito

privado e serve apenas para preparar as almas para o céu. Sabemos

que Deus deseja a felicidade dos seus filhos também nesta terra,

embora estejam chamados à plenitude eterna, porque Ele criou todas

as coisas para nosso usufruto (1Tm 6, 17), para que todos possam

usufruir delas. Por isso, a conversão cristã exige rever especialmente

tudo o que diz respeito à ordem social e sua consecução do bem

comum”133

A beatitude proposta pelo evangelho que procura sinalizar o Reino na busca de

uma “Magna” felicidade se desdobra como contributo a ética e a vida frente ao

próximo: “a ética leva a Deus que espera uma resposta comprometida que está fora

das categoria do mercado”.134

A proposta da vida beatifica não é somente uma utopia

em direção a qual caminhamos,mas já é o desdobramento do eterno no temporal, é o

130

L‟ Osservatore Romano. Dom Sócrates B. Villegas, Arcebispo de Lingayen-Dagupan (Filipinas),

sábado 20 de outubro de 2012, número 42, p.15. 131

L‟ Osservatore Romano. D. Der Raphael Dabiré Kusiéle, Bispo de Diébougou ( Burquina Faso ),

sábado 17 de novembro de 2012, número 46, p. 18. 132

L‟ Osservatore Roamano. Cardeal Peter Erdó, Arcebispo de Esztergom-Budapeste, Presidente da

Conferência Episcopal (Hungria), Presidente das conferências Episcopais da Europa (C.C.E.E.), sábado

17 de novembro de 2012, número 46, p. 18. 133

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium. Exortação Apostólica. São Paulo: Paulus-Loyola, 2013,§

182, p. 109. 134

CONCÍLIO VATICANO II. Lumen Gentium. Constituição Dogmática. Petrópolis: Vozes, 1968, §

57, p.41.

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fundamento de uma “vida mais feliz” que nos coloca a caminho. Uma fé autêntica é

uma fé que se envolve com as grandes questões do mundo, porque envolve a vida de

seus contemporâneos:

“Uma fé autêntica que nunca é cômoda nem individualista comporta

sempre um profundo desejo de mudar o mundo, transmitir valores,

deixar a terra um pouco melhor depois da nossa passagem por ela.

Amamos este magnífico planeta, onde Deus nos colocou, e amamos a

humanidade que o habita, com todos os seus dramas e cansaços, com

os seus anseios e esperanças, com os seus valores e fragilidades. A

terra é a nossa casa comum, e todos somos irmãos. Embora a justa

ordem da sociedade e do Estado seja dever central da política, a

Igreja não pode nem deve ficar à margem na luta pela justiça. Todos

os cristãos, incluindo os Pastores, são chamados a preocupar-se com

a construção dum mundo melhor. É disto mesmo que se trata, pois o

pensamento social da Igreja é primariamente positivo e construtivo,

orienta uma ação transformadora e, neste sentido, não deixa de ser

um sinal de esperança que brota do coração amoroso de Jesus Cristo.

Ao mesmo tempo, une o próprio empenho ao esforço em campo social

das demais Igrejas e Comunidades eclesiais, tanto na reflexão

doutrinal como na prática.”135

2.2 A dimensão social da evangelização: O Reino de Deus e sua expansão no

mundo

O Reino de Deus é outro acontecimento importante como componente essencial

da evangelização. O Reino por meio dos sinais se faz presente como obra de Deus que

se opera no mundo. O Reino de Deus não é uma oposição radical a sociedade, mas é

sinal de tensão que sinaliza outra realidade que opera como fermento dilatando a

presença dos valores do Reino de Deus no mundo. A teologia do Reino é a teologia que

justamente se coloca de modo integral a serviço da vida humana e propõe a esta mesma

vida o Cristo total. Aqui é importante a compreensão do Reino não somente como

cristandade operando como uma força centrípeta e centrifuga, mas operando ao molde

de sementes, acolhendo “a multiplicidade e a evolução das culturas, penetra a fé, que é

135

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium. Exortação Apostólica. São Paulo: Paulus-Loyola, 2013,

IV, § 183, p. 110.

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uma comunhão transcendente com Deus, e se múltipla em sua imanência”136

A

evangelização aparece através de várias facetas nos diversos campos missionários, por

exemplo em alguns países árabes ela é realizada de modo direto através das escolas,

universidades, nos hospitais, e nos institutos pertencente às ordens religiosas aberta quer

aos cristãos quer aos muçulmanos.137

A fé e a caridade são complementares na vida cristã de modo que se apoiam

mutuamente.138

A caridade permite que vejamos o rosto de Cristo expresso na opção

preferencial pelos pobres abraçada pela Igreja como uma opção que está “ implícita na

fé cristológica naquele Deus que se fez pobre por nós, para nos enriquecer com a sua

pobreza”.139

A nova evangelização na Igreja em nossos dias é indispensável à dimensão do

social como componente a dimensão missionária, testemunha a caridade de Cristo

através das obras da justiça, da paz e do desenvolvimento humano integral que propõe

esta doutrina.140

Hoje, a cultura da mudança de época apresenta-nos desafios: “a

dificuldade de aceitar Deus como fundamento do comportamento humano, assim, como

fundamento da justiça, da paz, da fraternidade, a dificuldade de conciliar a experiência

democrática com o respeito pelos valores morais”.141

A nova evangelização trilhará

também o caminho de uma libertação integral do ser humano, ou seja, abordará desde as

dimensões e consequências pessoais do pecado até seus estragos na vida social.142

A dimensão social do evangelho toca várias dimensões da própria vida pública

dos cristãos que por sua vez evoca um testemunho público de toda a Igreja:

136

LECLERC, JEAN. O amor às letras e o desejo de Deus: Iniciação aos autores monásticos da Idade

média. São Paulo: Paulus, 2012, p. 05. 137

L‟ Osservatore Romano. Sua Beatitude Béchara Boutros Raí, O.M.M, Patriarca de Antioquia dos

Maronitas(Líbano), 3 de novembro de 2012, número 44, p. 19. 138

L‟ Osservatore Romano. D. José Luis Azuaje Ayala, Bispo de El Vigía-San Carlos Del Zulia,

Presidente da Conferência Episcopal (Venezuela), sábado 3 de novembro de 2012, número 44, p. 20. 139

DOCUMENTO DE APARECIDA. Texto legislativo da V Conferência do Episcopado Latino-

Americano e do Caribe: 13-31 de Maio de 2007., Brasília-São Paulo: CNBB, Paulus, Paulinas, §3, p. 10. 140

BENTO XVI. Caritas in veritate .Carta Encíclica. São Paulo: Paulinas, 2009, I, § 15, p. 23. 141

L´Osservatore Romano. D. Benedito Beni dos Santos, Bispo de Lorena (Brasil), 27 de outubro de

2012, número 43, p. 9. 142

L‟ Osservatore Romano. D. Eduardo Lozano, Bispo de Gualeguaycitu (argentina), sábado 27 de

outubro de 2012, número 43, p. 19.

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“Evangelizar é tornar o Reino de Deus presente no mundo. Nenhuma

definição parcial e fragmentada, porém, chegará a dar razão da

realidade rica, complexa e dinâmica que é a evangelização, a não ser

com o risco de empobrecê-la e até mesmo de mutilá-la. Desejo agora

partilhar as minhas preocupações relacionadas com a dimensão

social da evangelização, precisamente porque, se esta dimensão não

for devidamente explicitada, corre-se sempre o risco de desfigurar o

sentido autêntico e integral da missão evangelizadora.”143

Em alguns continentes de minoria católica a ação caritativa da Igreja foi

apresentada como porta de evangelização para muitos não cristãos. O cuidado com a

vida realizado por meio de hospitais, ambulatórios, colégios são para adeptos de outras

tradições religiosas sinais eloquentes de amor a humanidade.144

O sínodo dos bispos

também procuro elucidar o aspecto diaconal da caridade no processo de evangelização:

“A relação intrínseca entre evangelização e diaconia manifesta-se,

como recorda a encíclica Deus Caritas Est, no fato de que juntamente

com a liturgia são as dimensões fundamentais e próprias através das

quais a Igreja se realiza a si mesma. A Igreja oferece ao mundo um

invejável testemunho de caridade, do qual nascem numerosas

conversões. A nossa pastoral de caridade é um grande instrumento de

evangelização, quer para quem presta, quer para quem recebe os

nossos serviços. É claro que a Igreja não se reduz a uma agência

social, mas o desafio para nós é exatamente ajudar a reconduzir

através das obras de caridade, ao Deus que é caridade. Com efeito, o

que chama a fé são a unidade e a caridade. Um elemento essencial da

encíclica Deus caritas est talvez tenha sido um pouco descuidado. A

chave que abre e fecha a porta do homem ao evangelho é a

experiência que Deus ama. Sem esta verdade simples o homem

moderno nunca poderá conhecer verdadeiramente a Cristo. A

atividade caritativa da Igreja, por conseguinte, pode oferecer-nos

uma oportunidade enorme para fazer entrar a luz no mundo.”145

A Igreja deseja ser como uma artéria da sociedade, para levar esperança,

encorajamento, conforto e infundir nova energia em toda a sociedade, como o corpo

humano é vitalizado pela ação das artérias e das vias que levam oxigênio e nutrimento e

143

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium. Exortação Apostólica. São Paulo:Paulus-Loyola, 2013, IV,

§ 176, p. 105. 144

L‟ Osservatore Romano. D. Kyrillos William, Bispo de Assiutidcos Coptas (Republica Árabe do

Egito), 17 de novembro de 2012, número 46, p. 22. 145

L‟ Osservatore Romano. Cardeal Robert Sarah, Presidente do Pontifício Conselho “Cor

Unum”(Cidade do Vaticano), sábado 27 de Outubro de 2012, número 43, p. 18.

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eliminam as escórias: “Se a Igreja se afastar da sociedade a evangelização não

produzirá fruto. É indispensável que através da evangelização, a Igreja infunda

abundantemente nova linfa na vida social e familiar”.146

A caritas desdobrada em amor a Deus e amor ao próximo sinaliza a presença do

Reino de Deus no mundo e viabiliza a sua presença:

“A proposta é o Reino de Deus (Lc 4, 43); trata-se de amar a Deus,

que reina no mundo. Na medida em que Ele conseguir reinar entre

nós, a vida social será um espaço de fraternidade, de justiça, de paz,

de dignidade para todos. Por isso, tanto o anúncio como a

experiência cristã tendem a provocar consequências sociais.

Procuremos o seu Reino: „Procurai primeiro o Reino de Deus e a sua

justiça, e tudo o mais se vos dará por acréscimo‟ (Mt 6, 33). O projeto

de Jesus é instaurar o Reino de seu Pai; por isso, pede aos seus

discípulos: „Proclamai que o Reino do Céu está perto‟ (Mt10, 7)”.147

A ética é um viés importante dentro do contexto de um testemunho social do

evangelho: “a ética leva a Deus que espera uma resposta comprometida que esta fora

das categorias do mercado.”148

Em síntese a dimensão social do evangelho nos remete a integralidade da

missão, isto é a totalidade do evangelho que a Igreja nos transmite e nos envia a pregar.

A sua riqueza plena incorpora acadêmicos e operários, empresários e artistas, incorpora

todos.149

2.3 A centralidade do ministério da Pregação na nova evangelização

Uma das verdades centrais no que se refere ao anúncio do evangelho é

justamente a renovação profunda do ministério da pregação no interior da Igreja. É

preciso que o clero e o laicato continuem se abrindo a um frutuoso ministério da

146

L‟ Osservatore Romano. D. Dominic Ryoni Miyahara, Bispo de Fukuoka (Japão), sábado 20 de

novembro de 2012, número 45, p. 11. 147

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium. Exortação Apostólica. São Paulo:Paulus-Loyola, 2013, §

80, p. 108. 148

Ibidem, II, § 57, p. 41. 149

Ibidem,IV, § 237, p. 133.

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palavra, onde a palavra de Deus ocupe a centralidade na vida cristã não apenas como

um dado na hierarquia de valores internos da própria Igreja, mas como uma realidade

em que a Igreja jamais deve se descurar. Podemos até mesmo afirmar que se faz

necessário em nossos dias uma verdadeira reforma ou uma autêntica renovação do

ministério da pregação. A pregação não pode somente ser um discorrer lógico sobre um

assunto ou um tema o que não significa que o discurso não deva aqui ter uma lógica

interna. Mas sabemos que de fato a grande missão da Igreja em nossos dias é ajudar a

fazer com que as pregações no interior do ministério dado pelo Senhor a sua Igreja

provenha da vivência de uma profunda intimidade com o Senhor por parte daqueles que

pregam o evangelho.

É Justamente dentro deste contexto que se insere o atual convite da Igreja para

anunciarmos o evangelho no transbordamento da alegria que surge da missão de

transmitir a fé: “A Alegria do Evangelho enche o coração e a vida inteira daqueles que

se encontram com Jesus. Quantos se deixam salvar por Ele são libertados do pecado,

da tristeza, do vazio interior, do isolamento. Com Jesus Cristo, renasce sem cessar a

alegria.”150

Os verdadeiros frutos que devem surgir de conversão e de nova vida em Cristo

não é apenas fruto da eficácia humana com as estratégias próprias de empresas ou um

marketing sofisticado, mas o que de fato garante a eficácia da pregação são os bons

frutos a que dela advêm é justamente uma vida de fidelidade ao Senhor. É preciso que

Jesus volte a ser o centro de nossa pregação:

“Chegou a hora, para nós como bispos, de colocar Cristo no centro

de nossa pregação e de nossos ensinamentos, e de encorajar os

nossos sacerdotes e diáconos a fazer o mesmo. Devemos deixar as

pessoas serem arrebatadas pelo fascínio que o Jesus dos evangelhos

exerce sobre os corações e as mentes. O maior desafio que a Igreja

deve enfrentar hoje é o retorno da Igreja a Cristo e a restituição de

Cristo à Igreja, não para se tornar diversos, mas para ser de forma

mais plena quem somos e o que somos.151

150

CONCÍLIO VATICANO II .Lumen Gentium Constituição Dogmática. Petrópolis: Vozes, 1968, § 1,

p. 39. 151

L‟Osservatore Romano. D. Thimothy John, Quarta Congregação geral, sábado 20 de outubro de

2012, número 42, p. 24.

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2.4 Os novos evangelizadores-mistagogos

Queremos destacar aqui algumas qualidades necessárias dos novos

evangelizadores na Igreja, e que o Sínodo destacou como sendo de fundamental

importância. Quatro qualidades deveriam ser evidenciadas nestes novos evangelizadores

que por sua vez devem também ser mistagogos.

A primeira qualidade encontra-se no livro dos Atos dos Apóstolos é a coragem.

A figura de São Pedro é apresentada corajosamente pregando o evangelho da

Ressurreição, mais tarde Paulo retoma o tema e se lançando-se numa corrida de gigante

pelo mundo vai anunciando esta mesma Palavra.152

Hoje a nova evangelização deve mostrar uma coragem nascida da confidência

em Cristo. Quando se fala de coragem pode nos reportar tanto a figuras de Santos

carismáticos como São Maximiliano Maria Kolbe, a beata Madre Teresa de Calcutá, os

mártires sejam da Coréia, Nigéria e Japão. Mas sabemos que várias pessoas cristãs

também hoje, vivendo nos mais diferentes ambientes institucionais como hospitais,

serviços sociais, escolas, universidades são convocados a continuar a sendo luz em meio

a estas realidades.

Os evangelizadores de hoje devem ser homens de fé capazes de descobrirem que

a nova evangelização exige um caráter profético. Pois, o “profeta é aquele que

interpreta as circunstâncias e os acontecimentos com o olhar de Deus, mas é também

aquele que antecipa de forma simbólica o caminho da história.”153

A segunda qualidade que deverão portar os novos evangelizadores será o

compromisso de realizarem a evangelização num “sentire cum Eclésia”. A unidade e o

testemunho de comunhão eclesial são fundamentais para que o mundo creia. A

solidariedade entre ministérios e carismas é de fundamental importância. O caminhar

em comunhão com os pastores da Igreja deve ser a marca de quem deseja anunciar o

evangelho “com”, “na” e junto à própria Igreja.154

152

SÍNODO DOS BISPOS. Instrumentum Laboris.A nova evangelização para a transmissão da fé.

Brasília: CNBB, 2012, II, §41, p. 51. 153

L‟ Osservatore Romano. Cardeal Angelo Bagnasco, Arcebispo de Gênova, Presidente da

Conferência Episcopal (Itália), sábado 17 de novembro de 2012, número 46, p.17. 154

SÍNODO DOS BISPOS. Instrumentum Laboris.A nova evangelização para a transmissão da fé.

Brasília: CNBB, 2012, II, § 77-78, p. 76-77.

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A terceira qualidade que deve portar os novos evangelizadores é a urgência. O

fato de serem urgente, ou seja, prontos para anunciar o evangelho. Talvez tenham a

necessidade de voltar ao Evangelho de Lucas da Visitação de Maria a Isabel, modelo

para o nosso sentido de urgência. O evangelho narra como Maria partiu as pressas para

uma longa viajem de Nazaré a uma aldeia nas colinas da Judéia.155

Não havia tempo a

perder porque a missão era muito importante. É justamente este sentido de urgência que

será o gerador de prontidão para os novos evangelizadores. Se o continuo sentimento de

não estar preparado para evangelizar permear a mentalidade de alguns cristãos, algo de

muito grave estará acontecendo na identidade do próprio ser cristão.

Por fim, a última qualidade que auxiliará os novos evangelizadores é a alegria.

Os evangelizadores dos tempos atuais devem lançar sementes de vida nova no campo

aberto do mundo de hoje, sabendo serem eles próprios alvos deste evangelho redentor.

A alegria deve caracterizar os novos evangelizadores. A mensagem que anunciamos é

uma mensagem de grande alegria, é a mensagem de que Cristo ressuscitou, Cristo está

conosco. Sejam quais forem as nossas circunstâncias, o nosso testemunho deve irradiar,

juntamente com os frutos do Espírito Santo, amor, paz e alegria (Gl 5, 22).

O Sínodo sinalizou que a tarefa dos novos evangelizadores é de promover uma

renovação espiritual que implique num renovado encontro com a pessoa de Jesus Cristo

e uma catequese que promova o crescimento espiritual.156

Contudo, “só seremos novos

evangelizadores, se nos renovarmos primeiramente”,157

somente assim, poderemos

comunicar aos de dentro e aos de fora do ambiente eclesial à alegria de evangelizar,

sabendo que: “o homem contemporâneo escuta com melhor boa vontade as

testemunhas do que aos mestres, ou então, se escuta os mestres, é porque eles são

testemunhas”.158

O caminho proposto pela nova evangelização encontrará na celebração dos

mistérios de Deus uma fonte permanente que permitira amadurecer e fazer crescer a

155

Ibidem, IV, § 138, 149, p.123. 156

L‟ Osservatore Romano. Cardeal Wuerl, O relatório post disceptationem, sábado 27 de Outubro de

2012, número 43, p. 5. 157

L‟ Osservatore Romano. Cardeal D. Gerarhard Ludwig Muller, Prefeito da Congregação para

Doutrina da Fé (Cidade do Vaticano), sábado 20 de outubro de 2012, número 42, p. 13. 158

PAULO VI. Exortação Apostólica Evangelii Nuntiandi (8 de dezembro de 1975), n. 41: AAS 68

(1976) 31-12.

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vida espiritual de cada cristão: “Guiar de modo pedagógico os fiéis nos percursos

mistagógicos que permitem que o crente entre na experiência do mistério de Deus”159

Quanto mais as Sagradas Escrituras e a mistagogia for elementos que

proporcionem uma frutuosa catequese, mais servirá a grandiosa causa do nova

evangelização.160

A escola dos Ícones são métodos também que trazem uma particular colaboração

no ensino sobre pontos fundamentais da fé cristã. É de fato parte de uma tradição antiga,

porém sempre pode ser revisto com um olhar renovado que contribui de modo singular

a nova evangelização.161

A catequese atualmente percebe a necessidade de integrar-se a uma dimensão

querigmática e mistagógica. A catequese e a educação é um serviço de crescimento.

Dentro deste percurso pedagógico a Igreja propõe novamente uma mistagogia que seja

ao mesmo tempo iniciática e permanente:

“A iniciação mistagógica, que significa essencialmente duas coisas:

a necessária progressividade da experiência formativa na qual

intervém toda a comunidade e uma renovada valorização dos sinais

litúrgicos da iniciação cristã. Muitos manuais e planificações ainda

não se deixaram interpelar pela necessidade duma renovação

mistagógica, que poderia assumir formas muito diferentes de acordo

com o discernimento de cada comunidade educativa. O encontro

catequético é um anúncio da Palavra e está centrado nela, mas

precisa sempre duma ambientação adequada e duma motivação

atraente, do uso de símbolos eloquentes, da sua inserção num amplo

processo de crescimento e da integração de todas as dimensões da

pessoa num caminho comunitário de escuta e resposta.”162

3. A Igreja Particular, primeiro sujeito da missão.

159

L „ Osservatore Romano. Relatório de D. Carlos Aguiar Retes, Arcebispo de Tlalnepantla, sábado 20

de outubro de 2012, número 42, p. 7. 160

L‟ Osservatore Romano. Cardeal Quellet, Relátorio sobre a Exortação Apostólica Pós-Sinodal da

precedente Assembleia Ordinária, Atuação da “Verbum Domini”, sábado 20 de Outubro de 2012, número

42, p. 18. 161

L‟ Osservatore Romano. D. Virgil Berle, Bispo de Ordea Mare, Grão-Variano dos Romeno

(Romênia), sábado 10 de novembro de 2012, número 45, p. 11. 162

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium. Exortação Apostólica. São Paulo: Paulus-Loyola, 2013, III,

§ 166, p. 99.

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Por força do mandato missionário cada um dos membros da Igreja deve assumir

a tarefa de ser discípulo missionário. O documento de aparecida afirma: A diocese

presidida pelo bispo é o primeiro espaço de comunhão e missão. Ele deve estimular e

conduzir uma ação pastoral orgânica e vigorosa deve fazer que a variedade de carismas,

ministérios, serviços e organizações se orientem em auxiliar este mesmo projeto

missionário para comunicar vida no próprio território. Este projeto surge de um

caminho de variada participação, torna possível a pastoral orgânica, capaz de dar

respostas aos novos desafios. Porque um projeto só é eficiente se cada comunidade

cristã, cada paróquia, cada comunidade educativa cada comunidade de vida consagrada,

associação e movimento se inserem ativamente na pastoral orgânica de cada diocese.

Cada uma é chamada a evangelizar de um modo novo e integrado no projeto pastoral da

diocese.163

Aqui se verifica de modo claro que a base da evangelização está, portanto, na

articulação da Igreja particular, enriquecida de carismas, ministérios e serviços,

diversificados presente no meio do povo de Deus. Uma catequese vigorosamente

alimentada pela palavra de Deus é meio imprescindível para gerar um sentido de

pertença dos convertidos. O compromisso e o sentido de pertença fazem parte do

processo que inclui os novos cristãos como novos agentes de evangelização no coração

da comunidade cristã.164

3.1 A missão da pastoral orgânica como um desafio eclesial

O grande desafio a ser observado na execução de uma missão que seja integral

na abordagem e na concretização da conversão pastoral é justamente a responsabilidade

de desenvolver em conjunto ações eclesiais que sejam como que um leimotiv para

direcionar toda a ação evangelizadora da Igreja.

A pastoral orgânica deve ser justamente o primeiro âmbito da missão e da

comunhão. O Bispo ao presidi-la deve estar aberto aos carismas e ministérios e procurar

163

DOCUMENTO DE APARECIDA. Texto legislativo da V Conferência do Episcopado Latino-

Americano e do Caribe: 13-31 de Maio de 2007, Brasília-São Paulo: CNBB, Paulus, Paulinas, II, §166,

p.85. 164

L‟ Osservatore Romano. D. Cornelius Fontem Esua, Arcebispo de Bemenda (Camarões), sábado 27

de Outubro de 2012, número 43, p.17.

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um caminho que seja frutuoso a todos os setores eclesiais envolvidos. Todas as

potencialidades pastorais e ministeriais, tanto quanto as carismáticas devem tender a um

projeto que seja comum onde se procurará produzir frutos positivos no próprio território

em que atuam.

A tomada de consciência a respeito da nova evangelização deve proporcionar

entre aqueles que pretendem fazer com que ela tome corpo e consistência a importância

de que este projeto pastoral não é apenas um lenitivo contra a crise presente que se

instala sobre a Igreja e o mundo. A nova evangelização é uma missão constante na

Igreja que deve fazer parte da agenda dos discípulos de Cristo.

O desenvolvimento do projeto pastoral não acontece apenas através de uma

modalidade. Aqui residiria o perigo de cair no uniformismo onde também as iniciativas

singulares e que partissem de grupos com índoles específicas se veriam tolhidas por tais

iniciativas tomadas. Mas é preciso, contudo que haja uma linguagem comum e de sinais

participados que fazem emergir mais o caminho de toda Igreja do que a originalidade de

uma experiência particular.165

O trabalho e o empreendimento missionário em prol de uma nova

evangelização devem levar em consideração e fundamental colaboração de uma eficaz

pastoral orgânica. A Igreja particular precisa de um programa pastoral para poder

cumprir em circunstâncias concretas de espaço e de tempo, à vontade salvifíca de Deus

Pai, plenitude cumprida no seu Filho Jesus.166

A organização de uma pastoral orgânica

demanda empenho de todos os fiéis no projeto de nova evangelização. O programa

missionário diocesano não é uma simples estratégia, mas uma ação conjunta de Pastores

e fiéis em atitude de abertura ao Espírito Santo, ao mesmo tempo discernindo e lendo os

sinais dos tempos.

O plano pastoral encontrará sempre uma solidez maior, quanto mais for uma

colaboração dos diversos setores da Igreja particular. Trata-se de organizar a missão de

evangelizar a Igreja diocesana, inspirando-se no discernimento do Espírito e com

participação autêntica e direta dos fiéis. Dedicando-se a oração e a contemplação,

porque nos dão a liberdade de espírito que nos permite superar os moralismos e

165

L‟Osservatore Romano. D. Rino Fisichella Intervenções dos Padres Sinodais durante a terceira

congregação geral. sábado, 20 de Outubro de 2012, numero 42, p.12. 166

L‟ Osservatore Romano. Durante a terceira Congregação Geral. D. Fabio Suescún Mutis, sábado 20

de Outubro de 2012, número 42, p. 16.

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fundamentalismos doutrinais tão iníquos. Esta é a mística que nos convida a unir fé e

vida, fé e razão e, sobretudo, fé e amor.167

3.2 A paróquia como lugar privilegiado para uma nova evangelização.

Sabemos que a figura da paróquia em nossos dias sofre um desgaste muito

grande. Alguns chegam até mesmo a afirmar que a estrutura paroquial em que nos

organizamos em nossos dias seria já uma realidade ultrapassada e que não

corresponderiam mais os anseios missionários e pastorais de uma nova evangelização.

Aqui é preciso muito cuidado, pois, a paróquia assim como outros ambiente que

compõem o mandato missionário e que abrange também um território diocesano pode

ser um meio privilegiado para fomentar a nova evangelização e o surgimento de

inúmeros novos ministérios no interior das comunidades cristãs. É verdade, contudo que

as paróquias não podem se restringir em ser apenas um centro de serviços culturais e

administrativos, mas devem se tornar por sua vez como que casas da comunidade dos

cristãos e escolas de discípulos missionários.168

Este aprendizado do discipulado tem

como uma das metas principais tornar a paróquia em um ambiente missionário. É

justamente este estilo e consciência missionária que colocara as paróquias em um

continuo movimento evangelizador.169

Quando vemos as diversas iniciativas que vem sendo tomadas por parte da Igreja

no que se refere a um novo empenho evangelizador é preciso atentar para um

importante desafio a ser enfrentado em nossos dias que é justamente o de fazer com a fé

seja expressa e vivida num contexto missionário, isto significa, empenhar-se para que a

paróquia assuma um modo de ser pastoralmente missionária.

Em um primeiro momento alguns podem se questionar se este modelo de

paróquia missionária não seria um tanto quanto ingênua, contudo, verificamos que é

justamente isto o que as nossas paróquias devem se tornar: autenticamente missionária.

Sabemos que no passado toda a vida eclesial acontecia em torno das paróquias. Esta

167

L‟ Osservatore Romano. D. Pedro Mario Ossanron Bucjevic, Bispo titular de La Imperial- auxiliar

de Santiago (Chile), sábado 27 de outubro de 2012, número 43, p, 18. 168

L‟Osservatore Romano. D. Fábio Suescun Mutis. Terceira Congregação Geral. Sábado 20 de

Outubro de 2012, número 42, p. 16. 169

L‟ Osservatore Romano. D. Stanislav Lipovsek, Bispo de Celje (Eslovénia), sábado 17 de novembro

de 2012, número 46, p. 17.

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consolidação da estrutura paroquial começou acontecer a partir do século V quando o

cristianismo tornou-se religião oficial do império Romano e recebera também a

incumbência de se fazer presente nas aldeias por meio de um presbítero residente. Com

o passar do tempo várias paróquias foram tomando um aspecto não apenas espiritual,

mas também a vida social, jurídica e política também aconteciam sob a sombra das

paróquias. Em alguns países o próprio presbítero não era apenas um membro do clero e

o seu representante, mas os presbíteros também eram vistos como funcionários do Rei o

do Estado.

O Concílio Vaticano II na Constituição Dogmática Lumen Gentium sobre a

Igreja nunca se verifica a palavra “paróquia”. Os pensamentos dos Padres conciliares

não estão fixados no conceito de paróquia, mas eles tentam resgatar a compreensão de

comunidade o que não diminui a responsabilidade e aquilo que de fato é positivo na

estrutura paroquial, contudo amplia consideravelmente a compreensão de igreja

enquanto “Communnio”. Sabemos, contudo que à obra da evangelização não é obra

apenas de alguns na Igreja, mas das comunidades eclesiais como tais, onde se tem

acesso a plenitude dos instrumentos do encontro com Cristo: a Palavra, os sacramentos,

a comunhão fraterna, o serviço da caridade, a missão.170

O sínodo denotou que as Paróquias continuam a ser designados aos quais se

realiza a maior parte da vida da Igreja. A importância das paróquias no desenvolvimento

da nova evangelização foi ressaltada muitas vezes, porque falta o lócus no qual se

realiza grande parte da experiência das pessoas na igreja. Tanto as paróquias e as novas

comunidades têm uma fundamental importância em nossos dias porque podem

promover uma organização e uma canalização oportuna de todas as energias de

renovação dentro do tecido eclesial.171

O grande desafio par dinamizar as paróquias é

justamente o de transformá-las não somente para uma ação pastoral e catequética, mas o

de transformá-las em um lugar de formação para a evangelização.172

O sínodo percebeu

a grande relevância da paróquia na vida eclesial, e percebe nesta estrutura eclesial uma

grande plasticidade:

170

L‟ Osservatore Romano. Sábado 03 de novembro de 2012, número 44, p. 07. 171

L‟ Osservatore Romano. O relatório post disceptationem, sábado 27 de Outubro de 2012, número 43,

p. 5. 172

L‟ Osservatore Romano. Cardeal Kazimierz Nycz, Arcebispo de Varsóvia, Ordinário do próprio rito

(Polônia), sábado 10 de novembro de 2012, número 43, p. 20.

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“A paróquia não é uma estrutura caduca; precisamente porque

possui uma grande plasticidade, pode assumir formas muito

diferentes que requerem a docilidade e a criatividade missionária do

Pastor e da comunidade. Embora não seja certamente a única

instituição evangelizadora, se for capaz de se reformar e adaptar

constantemente continuará a ser «a própria Igreja que vive no meio

das casas dos seus filhos e das suas filhas». Isto supõe que esteja

realmente em contato com as famílias e com a vida do povo, e não se

torne uma estrutura complicada, separada das pessoas, nem um

grupo de eleitos que olham para si mesmos. A paróquia é presença

eclesial no território, âmbito para a escuta da Palavra, o crescimento

da vida cristã, o diálogo, o anúncio, a caridade generosa, a adoração

e a celebração. Através de todas as suas atividades, a paróquia

incentiva e forma os seus membros para serem agentes da

evangelização. É comunidade de comunidades, santuário onde os

sedentos vão beber para continuarem a caminhar, e centro de

constante envio missionário. Temos, porém, de reconhecer que o

apelo à revisão e renovação das paróquias ainda não deu

suficientemente fruto, tornando-as ainda mais próximas das pessoas,

sendo âmbitos de viva comunhão e participação e orientando-as

completamente para a missão. ”173

Nova evangelização é sinal de atualização, e mesmo se a Igreja crescesse até

alcançar dimensões colossais, ela deveria manter a estratégia do pequeno rebanho. É a

estratégia apostólica: “formar o pequeno rebanho com o fervor do grande rebanho”174

e

“pensar emocionalmente com a Igreja universal e agir com eficácia na Igreja local”.175

Sem um renovado impulso missionário da paróquia, e uma estrutura que

possibilite as paróquias serem comunidades fraternas176

do qual sejam protagonistas os

próprios agentes pastorais que nela trabalham, será difícil viver uma nova evangelização

radical:177

173

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium. Exortação Apostólica. São Paulo: Paulus-Loyola, 2013, I,

§ 28, p. 24. 174

L‟ Osservatore Romano. Sua Beatitude Gregóire III, B.S., Patriarca de Antioquia dos Greco-

Melquitas, chefe do Sínodo da Igreja Greco-Melquita católica (Síria), sábado 27 de Outubro de 2012,

número 43, p.10. 175

L´‟ Osservatore Romano. D. Joseph Vu Duy Thong, Bispo de Phnathiêt (Vietname), sábado 27 de

outubro de 2012, número 43, p.11. 176

L‟ Osservatore Romano. D. José Dolores Grullón Estella, Bispo de La Maguana (República

Dominicana),sábado 27 de Outubro de 2012, número 43, p. 11. 177

L‟ Osservatore Romano. D. Bruno Forte, Arcebispo de Chieti-Vasto (Itália), sábado 27 de Outubro

de 2012, número 43, p. 14.

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“A renovação Pastoral das nossas paróquias inclui uma condição de

missão permanente, de modo que se tornem menos burocráticas.

Cremos na co-responsabilidade pastoral dos batizados, que colocam

a serviço da comunidade a própria fé, o seu tempo, talentos e

bens.[...] A nova evangelização significa reconstruir o tecido cristão

da sociedade humana, ajudando a Igreja a continuar a viver dentro

das casas dos seus filhos”.178

3.3 A Missão e a Espiritualidade de comunhão

Outro fator importante ao lançar-se diante do mandato missionário de Cristo é

justamente atentarmos para outra dimensão que será de fundamental importância e cujo

descuido viria a dificultar em muito o impulso missionário, o que tratamos aqui é

justamente a espiritualidade de Comunhão. Seria como que impermeável aos corações,

seja dos mais simples fiéis seja dos presbíteros e bispos em suas respectivas dioceses

falar de discipulado e missão sem que houvesse uma abertura verdadeira e sincera para

viver uma espiritualidade de comunhão que resultasse numa nova evangelização eficaz

para toda a Igreja. Falar de evangelização hoje é justamente atentar para a importância

da conversão de corações. Não se transmite uma experiência viva da fé se o transmissor

ou o comunicador não se dispõe a ser o primeiro a ser atingido pela mensagem que é

maior do que aquele que a anuncia.

Sabemos que evangelizar não é apenas uma iniciativa humana. Não é o homem

com sua própria iniciativa a fazer algo para Deus. Se o desejo de evangelizar emergiu

no coração humano é justamente uma chamada do próprio Deus. O ser humano aberto à

vontade Divina, e colaborando com a mesma pode ou não corresponder a este chamado.

A nova evangelização precisa de um chão, ou um fundamento seguro e sólido que só

pode ser encontrado na espiritualidade, senão seria apenas um corpo atuando sem alma

fadado ao fracasso ao passar o entusiasmo.

Um dos pontos de urgência no percurso da nova evangelização é de aprofundar e

fazer própria a autêntica espiritualidade cristã. Aos que se colocam neste

empreendimento pelo Reino lhes é pedido uma substancial busca de “viver em Cristo” e

178

L‟ Osservatore Romano. D. Juan José de Pineda Fasquelle, C.M.E., Bispo titular de Obori, auxiliar e

vigário-geral de Tegucigalda (Honduras), sábado 27 de Outubro de 2012, número 43, p. 19.

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“no Espírito” que se aceita na fé, se expressa no amor, e animada pela esperança, se

traduz no cotidiano da comunidade eclesial.179

O Papa João Paulo II bem descreveu o

sentido da espiritualidade de Comunhão:

Que significa isso concretamente? Também aqui o nosso pensamento

poderia fixar-se imediatamente na ação, mas seria errado deixar-se

levar por tal impulso. Antes de programar iniciativas concretas, é

preciso promover uma espiritualidade de comunhão, elevando-a ao

nível de princípio educativo em todos os lugares onde se plasmam o

homem e o cristão, onde se educam os ministros do altar, os

consagrados, os agentes pastorais, onde se constroem as famílias e as

comunidades. Espiritualidade de comunhão significa em primeiro

lugar ter o olhar voltado para o mistério da Trindade, que habita em

nós e cuja luz há de ser percebida também no rosto dos irmãos que

estão ao nosso redor. Espiritualidade de comunhão significa também

a capacidade de sentir o irmão de fé na unidade profunda do Corpo

místico, isto é, como “um que faz parte de mim”, para saber partilhar

as suas alegrias e os seus sofrimentos, para intuir os seus anseios e

dar remédio ás suas necessidades para oferecer-lhe uma verdadeira e

profunda amizade. Espiritualidade de comunhão é ainda a

capacidade de ver antes de tudo o que há de positivo no outro, para

acolhê-lo e valorizá-lo como dom de Deus: um “dom para mim”,

como o é para o irmão que diretamente o recebeu. Por fim,

espiritualidade da comunhão é saber “criar espaço” para o irmão,

levando “os fardos uns dos outros” (Gl 6,2) e rejeitando as tentações

egoístas que sempre nos insidiam e gera competição, arrivismo,

suspeitas, ciúmes. Não haja ilusões! Sem essa caminhada espiritual,

de pouco servirão os instrumentos exteriores da comunhão. Revelar-

se-iam como estruturas sem alma, máscaras de comunhão, do que

como vias para a sua expressão e crescimento. 180

A nova evangelização é inseparável de uma renovação da comunhão eclesial. É

de fundamental importância para a Igreja que exista uma relação bem estabelecida da

dimensão carismática com a dimensão hierárquica da Igreja. Fora constatado que nas

relações entre hierarquia e vida consagrada surgiu bastante desentendimento: em alguns

casos devido a certa ignorância a respeito dos carismas e do seu papel na missão e na

comunhão da Igreja; noutros devido à inclinação de alguns consagrados à contestação

do magistério.181

Contudo, o que se verifica nos últimos decênios fora justamente um

grande crescimento da dimensão carismática na Igreja e o que deve ser revisto nos

179

Ibidem, § 6, p. 10. 180

JOÃO PAULO II. Novo Millennio Ineunte, Carta Apostólica. São Paulo, 2001, III, § 43, p. 65. 181

L‟Osservatore Romano. Cardeal Marc Quellet, Durante décima quinta congregação geral, sábado 17

de novembro de 2012, número 46, p. 19.

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aspectos de relação entre hierarquia e carismas é justamente a oportunidade para ambos

crescerem e se renovarem superando divisões no corpo diocesano e paroquial em suas

relações sejam com os bispos, sacerdotes e as novas comunidades e novas formas de

consagração para que por meio desta comunhão aconteça uma nova primavera para uma

nova evangelização na Igreja. A Igreja é chamada a ser como bem expressara Dietrich

Bonhoeffer a “casa fraterna”, onde pelo testemunho visível de unidade ilumina as

dimensões da convivência humana.182

O que se pretende fomentar na espiritualidade de comunhão é a eclesiologia de

comunhão incentivando uma nova liberdade para a evangelização e o cuidado pastoral,

percorrendo o caminho de um permanente, e também oportuna comunhão com a Sé

apostólica e todas as outras expressões do tecido eclesial.183

Esta mesma Sé apostólica

consciente de ser um instrumento precioso para a unidade da fé deverá perceber a

urgência de uma nova relação entre Igreja católica e as outras Igreja e comunidades

eclesiais.184

A espiritualidade de comunhão é profundamente trinitária.185

O convite à

comunhão é mais que um slogan. É a conversão do coração. Os ministros e os agentes

de pastoral, assim como os movimentos eclesiais e as congregações religiosas, com a

espiritualidade formada e reavivada pelo mistério da Santíssima Trindade abrirão novos

caminhos ao diálogo com o mundo secularizado, dando uma contribuição à nova

evangelização.186

Ressaltamos aqui também outras dimensões da espiritualidade de comunhão que

se expressa constituinte de uma comunidade autenticamente cristã e que estão presentes

nos atos dos Apóstolos (At 2, 42. 46-47). O livro dos atos dos apóstolos apresenta a

comunidade que perseverava na fração do Pão e nas orações: A Eucaristia é fonte

inesgotável de vida cristã. Outro aspecto era a perseverança nos ensinamentos dos

Apóstolos, Anunciadores da Palavra de Deus em todos os âmbitos da existência

humana. Também a perseverança na comunhão: Tinham tudo em comum, partilhavam

182

LOEW, Jaques. Vocês serão meus discípulos. São Paulo: Paulinas, 1981, p. 142. 183

L´ Osservatore Romano. Cardeal George Alencherry, Durante a nona congregação geral, sábado 03

de novembro de 2012, número 44, p. 15. 184

L‟Osservatore Romano. Cardeal Francesco Coccopalmerio, Durante a décima primeira congregação,

sábado 03 de novembro de 2012, número 44, p.22. 185

L‟Osservatore Romano. D. John Corriveu, O.F.M. CAP., Durante a Terceira congregação geral,

sábado 20 de Outubro de 2012, número 42, p. 13. 186

Ibidem, p.19.

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os seus bens com todos irmãos porque antes partilharam o maior de todos os bens o

próprio Cristo. E por fim a alegria da atração, o Senhor juntava a comunidade novos

irmãos que desejavam viver o mesmo estilo de vida marcado pelo encontro com a

pessoa de Jesus Cristo que transbordava na alegria de ser salvo.187

O fruto da espiritualidade de comunhão que deverá sinalizar também a

comunhão eclesial não é uma tarefa somente a ser realizada dentro do âmbito do mundo

católico, mas é um convite a uma unidade entre os cristãos para que o mundo creia. O

grande obstáculo para a evangelização é a divisão entre os cristãos. A colaboração entre

igreja católica e outras comunidades eclesiais pode ser um recomeço para melhorar e

reforçar a confiança no cristianismo como caminho de unidade para o bem integral do

ser humana. A nova evangelização deve contar com todas as energias do mundo cristão

em todas as suas diversidades e especificidades, crendo na multiforme graça de Deus

que atua em todo o tecido eclesial seja no mundo católico, ortodoxo e protestante.188

Potencializar a comunhão nos leva a descobrir um caminho de cura originador de uma

oportuna fraternidade mística, contemplativa:

“Nisto está à verdadeira cura: de fato, o modo de nos relacionarmos

com os outros que, em vez de nos adoecer, nos cura é uma

fraternidade mística, contemplativa, que sabe ver a grandeza sagrada

do próximo, que sabe descobrir Deus em cada ser humano, que sabe

tolerar as moléstias da convivência agarrando-se ao amor de Deus,

que sabe abrir o coração ao amor divino para procurar a felicidade

dos outros como a procura o seu Pai bom. Precisamente nesta época,

inclusive onde são um pequenino rebanho (Lc 12, 32), os discípulos

do Senhor são chamados a viver como comunidade que seja sal da

terra e luz do mundo (Mt 5, 13-16). São chamados a testemunhar, de

forma sempre nova, uma pertença evangelizadora.Não deixemos que

nos roubem a comunidade”!189

3.4 Novos movimentos eclesiais e nova evangelização

187

L‟ Osservatore Romano. Cardeal Angelo Scola, Arcebispo de Milão (Itália), sábado 3 de novembro

de 2012, número 44, p. 22. 188

L´Osservatore Romano. Cardeal Francesco Cocco Palmerio, Presidente do Pontifício Conselho dos

Textos Legislativos (Cidade do Vaticano), sábado 3 de novembro de 2012, número 44, p. 22. 189

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium. Exortação Apostólica. São Paulo:Paulus-Loyola, 2013, III,

§ 92, p.59.

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Podemos afirmar que um dos sinais de Pentecostes após o Concílio Vaticano II

que mais impressionam é justamente o do grande crescimento dos movimentos e novas

comunidades. É surpreendente como estes novos movimentos e novas comunidades

vem dar um novo impulso a todo o corpo eclesial. Contudo, por outro lado ainda se

verifica em muitos bispos e sacerdotes, que existe certa reserva quanto a dar confiança a

estes novos movimentos que surgem dentro da Igreja. Aqui também a Igreja é

convidada na pessoa de seus pastores a colocar primeiramente o desafio da conversão

pastoral dos bispos e sacerdotes, chamados a reconhecer que os movimentos são antes

de tudo um dom precioso, e não um problema.190

Uma grande colaboração fora dada pelo Cardeal Ratzinger para os catequistas e

professores de religião, por ocasião do grande jubileu de 2.000 e que encaixa muito bem

com a missão que devem desenvolver as novas comunidades e os novos movimentos no

interior da Igreja:

“Em primeiro lugar, a Lei da Expropriação, ou seja, não falar em

nome próprio, mas em nome da Igreja, tendo como ponto firme o fato

de que evangelizar não é simplesmente uma forma de falar, mas uma

forma de viver, isto é, a clara consciência de pertencer a Cristo e ao

seu corpo que é a Igreja. A segunda lei é a do pequeno grão de

mostarda, ou seja, a coragem de evangelizar com paciência e

perseverança, sem pretender alcançar resultados imediatos e

recordando sempre que a lei dos grandes números não é a lei do

evangelho. É uma atitude que podemos reconhecer, por exemplo, na

obra de evangelização empreendida por movimentos e novas

comunidades nas regiões mais secularizadas da terra. A terceira

“lei” é a do grão de trigo, que para dar vida deve morrer, deve

aceitar a lógica da cruz. Nestas leis estão encerrados os segredos

mais profundos da eficácia do compromisso evangelizador da Igreja

em todos os tempos.”191

Aprofundar a problemática dos carismas e remover os obstáculos que não

permitem integrar plenamente os carismas a fim de apoiar a nova evangelização seria

um descuido. No sínodo fora constatado que o primeiro obstáculo é que grande parte

dos sacerdotes não estão dispostos a ocupar-se dos novos grupos e dos novos

movimentos, porque não receberam uma preparação adequada para este governo de

190

L‟ Osservatore Romano. Cardeal Stanislaw Rylko, Sábado 20 de Outubro de 2012, p.11. 191

Ibidem, p.12.

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trabalho pastoral. Outro consiste que a maior parte dos líderes não tem uma preparação

teológica e facilmente erram sob o ponto de vista doutrinal. Com freqüência os

sacerdotes se mantêm distantes destes grupos. Encorajar os sacerdotes para se ocuparem

com estes grupos e movimentos seria auxiliá-los a exercer através do acompanhamento

e do discernimento um auxílio favorável a toda Igreja, pois estes mesmos movimentos e

grupos sempre foram vistos como um dom da providência divina por vários

pontífices.192

Um grande dom do Espírito Santo são os novos movimentos eclesiais, que

contribuem para o desenvolvimento de uma “cultura de Pentecostes”.193

Um dos

grandes e positivos aspectos destes novos movimentos e destas novas comunidades é o

acompanhamento espiritual que oferecem a cada irmão. Vemos o quanto é importante

acompanhar aqueles que vivem, por exemplo, o fenômeno migratório que ao saírem de

um ambiente, uma cultura, um modo específico de viver os valores familiares e ao se

encontrarem por vezes em ambientes hostis veem-se vivendo em realidades por vezes

hostis a sua própria fé e tem-na por vezes colocada a prova. A mobilidade humana que

se verifica nos grandes centros urbanos é hoje um desafio a fé cristã a se aproximar dos

homens que vivem nesta condição e oferecer a eles o seu auxílio fraterno e solidário.194

Outro desafio é o de acolher àqueles que também migram de religiões africanas

para a Igreja. Notou-se o crescimento de sacerdotes dedicados ao ministério de cura e

libertação em muitos ambientes eclesiais que tentam aliviar o sofrimento de muitos

através da aproximação, acolhimento e acompanhamento destes irmãos.195

A nova evangelização traz uma nova estação de evangelização para toda a

Igreja. Já apontada no Concílio Vaticano II:

“O dinamismo missionário dos movimentos e das novas comunidades,

representam um Dom de Deus para a nova evangelização e para a

192

L‟ Osservatore Romano. D. Zbig Ev Stakevics, Arcebispo de Riga (Letônia), sábado 17 de novembro

de 2012, número 46, p. 20. 193

L‟ Osservatore Romano. D. Christopher Charles Prowse, Bispo de Sale (Austrália), sábado 27 de

Outubro de 2012, número 43, p. 7. 194

L‟ Osservatore Romano. Cardeal Antonio Maria Veglio, Presidente do Pontifício Conselho para a

Pastoral dos Migrantes e Itinerantes (Cidade do Vaticano), sábado 3 de novembro de 2012, número 44,

p.20. 195

L‟ Osservatore Romano. D. Nicodême Anani Barrigah-Bénissan, Bispo de Atakpamé (Togo), sábado

3 de novembro de 2012, número 44, p. 20.

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atividade missionária propriamente dita. A Partir da conversão

Pastoral dos bispos e dos sacerdotes chamados a reconhecer que os

movimentos são antes de tudo um dom precioso, e não um

problema.”196

Os movimentos eclesiais as associações de leigos são forças necessárias que

somadas a Igreja particular dão um testemunho de evangelização baseados na

comunhão e unidade dos agentes de pastorais da diocese que, como sacramento de

Cristo, é sujeito da evangelização.197

Outra dimensão importante no que se refere a ajuda oportuna que os novos

movimentos e novas comunidades oferecem é preciso que seja profundamente eclesial.

Todo carisma autêntico surge na Igreja como uma nova resposta aos antigos e novos

desafios de sua própria ação evangelizadora, e não somente como “uma espécie de

clube espiritual aberto só a membros santos, mais fiéis a minúcias prescritas pelo

manual redigido pelo seu fundador do que pelas exigências de Jesus e de seu

evangelho.”198

Os novos movimentos são um grande dom para a Igreja mais a atenção a sua

eclesialidade será fundamental para autenticar um bom direcionamento daquilo que é

específico de sua missão e direcionar seu enfoque evangelizacional como uma preciosa

colaboração a pastoral orgânica da Igreja local: “Esta integração evitará que fiquem só

com uma parte do Evangelho e da Igreja, ou que se transformem em nômades sem

raízes.”199

A Igreja no seu materno exercício pastoral é mediadora e promotora de todos os

carismas autênticos no seu interior. O intuito profundo que sinaliza a autenticidade

operante do carisma no tecido da ação evangelizadora da Igreja é a sua eclesialidade:

196

L‟ Osservatore Romano. Cardeal Stanislaw Rylko, Presidente do Pontifício Conselho para Leigos,

sábado 20 de Outubro de 2012, número 42, p. 11. 197

L‟ Osservatore Romano. D. Milton Luis T., Bispo titular de Munatiana, auxiliar de Montevidéu

(Uruguai), sábado 20 de Outubro de 2012, número 42, p, 22. 198

L‟ Osservatore Romano. D. Berhaneyesus De Merew Souraohiel, C.M, Arcebispo Metropolita de

Adis Abeba, Presidente da Conferência Episcopal de Etiópia e Eritreia, Presidente do Conselho da Igreja

Etíope, sábado 10 de novembro de 2012, número 45, p, 10. 199

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium. Exortação Apostólica. São Paulo: Paulus-Loyola, 2013, I, §

29, p. 25.

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“Um sinal claro da autenticidade dum carisma é a sua

eclesialidade, a sua capacidade de se integrar

harmoniosamente na vida do povo santo de Deus para o bem de

todos. Uma verdadeira novidade suscitada pelo Espírito não

precisa fazer sombra sobre outras espiritualidades e dons para

se afirmar a si mesma. Quanto mais um carisma dirigir o seu

olhar para o coração do Evangelho, tanto mais eclesial será o

seu exercício. É na comunhão, mesmo que seja fadigosa, que um

carisma se revela autêntico e misteriosamente fecundo.” 200

3.5 Nova evangelização e ecumenismo

A atenção a dimensão ecumênica é também um aspecto importante da nova

evangelização. O desafio da nova evangelização interpela a Igreja universal e pede-

nos também que prossigamos com o compromisso de buscar a plena unidade entre

os cristãos201

. A nova evangelização deve ser um acontecimento que encontra no

ecumenismo uma dimensão testemunhal importante de credibilidade frente ao

mundo. Somente por meio de provas significativas de comunhão será possível

caminhar em direção a uma superação das divisões no dom total de si pela causa do

evangelho.202

Três desafios a serem considerados e enfrentados pela nova evangelização são:

1) O desfio da Identidade: Que é Deus? A minha vida está em sintonia com as minhas

convicções?;

2) O desafio da alteridade: quem pratica uma religião diversa da minha, não é

necessariamente um inimigo, mas um peregrino da verdade;

200

Ibidem, II, § 130, p. 80-81. 201

L‟Osservatore. Romano. Cardeal Kurt Kocch, durante a décima terceira congregação geral, sábado

10 de novembro de 2012, número 45, p. 18. 202

Ibidem, p.18.

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3) O desafio do pluralismo: Deus age em cada pessoa, através de vias que só ele

conhece (AG, 7).203

O caminho da unidade tem sido visto no interior da Igreja como um caminho

possível comum frente aquilo que nos une as outras Igrejas e comunidades cristãs frente

às tarefas comuns no mundo como sinal e testemunho do Reino de Deus. É preciso

olhar para o movimento ecumênico não apenas com algumas suspeitas como se tem

verificado em alguns setores eclesiais, mas como uma exigência de superar as nossas

representações, as quais muitas vezes, se resumem em conflitos bairristas.204

Ao abordarmos neste segundo capítulo a importância de uma profunda

compreensão no que venha a ser evangelização e nova evangelização e a pedra de toque

que é a espiritualidade de comunhão para que os organismos e projetos pastorais

caminhem como forças vivas e dinâmicas uma vez que são formados por pessoas que

compartilham da mesma fé e que devem sempre caminhar na direção de uma

permanente superação daquilo que são preferências pessoais que minimizam a ação do

todo buscando abraçar de modo mais amplo um desafio comum a todo o Corpo de

Cristo de tal modo que a disponibilidade e a abertura de cada discípulo missionário seja

uma predisposição essencial para que se realize um novo pentecostes sobre a Igreja e

nossas pastorais se tornem cada vez mais proféticas e missionárias.

No terceiro capítulo pretendemos abordar a proposta de um “novo paradigma”

que é a conversão pastoral, proposta para um novo Pentecostes em todos os setores da

Igreja. Este Pentecostes tem como finalidade desvelar de modo mais visível o “rosto”

diaconal da Igreja. Uma Igreja servidora de Deus e dos homens.Tendo diante dos olhos

o grande acontecimento de Aparecida em 2007, e que tomou proporções maiores uma

vez que inspirou em muitos aspectos o Sínodo da nova evangelização para a

transmissão da fé cristã e que culminou na Exortação Apostólica Evangelii Gaudium do

Papa Francisco trazendo valiosas contribuições para uma nova primavera de

evangelização na Igreja. Buscaremos fazer uma conexão entre a evolução do Conceito

de Conversão pastoral na proposta de uma identificação clara do cristão com o

discipulado missionário de Jesus Cristo.

203

L‟ Osservatore Romano. Cardeal Jean-Louis Tauran, Presidente do Pontifício Conselho para o

Diálogo inter-religioso (Cidade do Vaticano), sábado 27 de outubro de 2012, número 43, p.6. 204

L‟ Osservatore Romano. Prof. Emmanuel [Adamakis], Metropolita de França, Presidente da

Conferência das Igrejas Europeias, sábado 27 de Outubro de 2012, número 43, p. 15.

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III- CAPÍTULO

CAMINHOS PARA UM NOVO PENTECOSTES

2. Conversão Pastoral: Um novo paradigma e um novo programa de missão

A missão continental é verdadeiramente um grande sopro do Espírito Santo que

trará tempos novos para o ambiente eclesial, partindo da América Latina e Caribe para

toda a Igreja. A conferência dos Bispos que se realizou em Aparecida foi de fato um

grande pentecostes para toda a Igreja e uma referência de como caminhar a luz dos

caminhos do Espírito para viver um novo pentecostes no interior da Igreja e fora de seus

muros físicos. O Acontecimento da V Conferência Geral do Episcopado Latino-

Americano e do Caribe realizado em Aparecida retomou com intensidade o termo

Ecclesia peregrinans natura sua missionária est. Como a Igreja Peregrina é, por sua

natureza, missionária205

, é a partir desta chave de leitura que se propõe uma renovada

ação evangelizadora e pastoral:

“Sonho com uma opção missionária capaz de transformar tudo, para

que os costumes, os estilos, os horários, a linguagem e toda a

estrutura eclesial se tornem um canal proporcionado mais à

evangelização do mundo atual que à auto-preservação. A reforma das

estruturas, que a conversão pastoral exige só se pode entender neste

sentido: fazer com que todas elas se tornem mais missionárias, que a

pastoral ordinária em todas as suas instâncias seja mais

comunicativa e aberta, que coloque os agentes pastorais em atitude

constante de «saída» e, assim, favoreça a resposta positiva de todos

aqueles a quem Jesus oferece a sua amizade. ”206

A missão Continental realizada em Aparecida não termina com um documento,

mas é justamente referência para A Igreja Universal que se faz presente em toda face do

urbi e do orbe. A Igreja a partir da América Latina percebe que a missão continental é o

modo de levar a cabo o compromisso evangelizador dos pastores da Igreja em

comunhão com todo o povo de Deus.

205

CONCÍLIO VATICANO II. Decreto Ad Gentes, § 2; 5-6; 9-10; Constituição Dogmática Lumen

Gentium, § 8; 13; 17; 23; Decr. Cristus Dominus, § 6. Petrópolis: Vozes, 1968. 206

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium. Exortação Apostólica. São Paulo:Paulus-Loyola, 2013, I §

27, p. 23.

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O acontecimento de Aparecida empenha profundamente a Igreja no continente

Latino-americano, porém têm uma real significação para a Igreja em sua universalidade.

O acontecimento de Aparecida tomou proporções maiores através da convocação para o

Sínodo dos Bispos em 2012.

Queremos aqui apresentar alguns pontos que foram assinalados no Sínodo, e que

denotam justamente o grande sinal de esperança que foi para a Igreja todo o

acontecimento de Aparecida, agora remodelado em uma maior configuração. Este

acontecimento fora uma grande iniciativa do Papa Bento XVI e dos Padres Sinodais

para pensar e refletir mais amplamente o ano da Fé considerando de modo particular a

missão evangelizadora da Igreja.

A missão continental quer ser na Igreja uma missão universal que tira a Igreja de

uma ação de “simples administração” e a coloca num “estado permanente de missão”.207

Seja a missão ad extra, que por sua vez está intimamente ligada a missão ad intra. A ad

intra e a ad extra enriquecem-se mutuamente exortando a servir de forma única à

missão de evangelização.208

A missão continental destacou a importância da presença da ação pastoral no

interior da Igreja e na sua presença no mundo. De modo específico nos últimos duzentos

anos, o significado de Pastoral tem ampliado o seu raio de ação, de tal forma que, em

primeiro se refere ao trabalho dos pastores, depois ás tarefas intra-eclesiais e, por

último, ao diálogo com o mundo.209

A pastoral faz referência à sua ação de modo

específico tendo como referência a ação do próprio Deus na história por meio daqueles

que o Senhor escolhe para colaborar em seu pastoreio:

“Podemos, pois, dizer que a salvação de Deus em relação ao seu

povo apresentada a Israel em termos pastorais e esta salvação se

desenvolveu por meio de mediações humanas nem sempre fiéis como

deveriam. E como a fidelidade de Deus supera a resposta humana, o

seu pastoreio exige uma novidade no comportamento de seus pastores

e que expresse na radicalidade a ação de Deus. Isto nos mostra como

207

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium. Exortação Apostólica. São Paulo: Paulus-Loyola, 2013, I §

25, p. 22. 208

L‟ Osservatore Romano, D. Olivier Schitthausler, M.E.P. , Bispo Titular de Catabum castra, Vigário

Apostólico de Phnom-Penh (Camboja), sábado 3 de novembro de 2012, número 44, p. 22. 209

RAMOS, A., J, Teologia Pastoral, Madrid: BAC, 2001, p.18.

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a ação Divina e ação humana caminham juntas na pastoral e esta

exigência está presente nos tempos messiânicos.”210

A conversão Pastoral é um convite à profundidade do encontro com a pessoa de

Jesus Cristo e o seu estilo evangelizador. Encontro este que é um convite a passar de

uma tradição fraca a uma vivacidade através da adesão pessoal da pessoa de Jesus

Cristo.211

A conversão Pastoral quer ser nos tempos atuais em que a Igreja vive a

oportunidade para renovarmos o grande acontecimento de pentecostes: “Precisamos de

um novo pentecostes para que a salvação de Jesus possa alcançar o mundo inteiro e

transforma-lo, a fim de que a Igreja possa ser renovada e a santidade prospere nela, e

por fim, para que nós, cristãos, procedamos com a nova evangelização.” 212

Outra dimensão importante que ressalta o Papa Francisco na Exortação Apostólica

Evangelii Gaudium é justamente levar a Igreja a viver esta conversão Pastoral por meio

de uma pastoral em chave missionária:

“Uma pastoral em chave missionária não está obsessionada pela

transmissão desarticulada de uma imensidade de doutrinas que se

tentam impor à força de insistir. Quando se assume um objetivo

pastoral e um estilo missionário, que chegue realmente a todos sem

exceções nem exclusões, o anúncio concentra-se no essencial, no que

210

CONRADO, S. O Planejamento Pastoral a Luz do Documento de Aparecida. Revista de Cultura

Teológica, São Paulo, v.16, n. 64, 75-88,- jul/Set 2008. 211

“A evangelização tem como finalidade a conversão dos homens, ou seja o acolhimento da novidade

de Cristo (cf. Instrumentum Laboris, n. 24) Esta conversão começa dentro da Igreja, realizando mudanças

pastorais. Trata-se, nos países de antiga tradição cristã, de passar de um cristianismo de tradição para um

cristianismo de adesão pessoal a pessoa de Jesus cristo e de um compromisso missionário. Esta conversão

pastoral diz respeito a todos os batizados e participantes da vida eclesial, mas sobretudo, aos pastores:

bispos e sacerdotes. A fim de que a nova evangelização não se reduza a um slogan, ou a uma ação a

cumprir, que não seja sufocada pelo imobilismo, da burocracia ou do clericalismo, é importante que

todos os pastores sejam bem mais preparado para a prática do governo pastoral.

Esta conversão dos pastores depende primeiramente de uma obra de santificação pessoal, acompanhada

de uma profunda releitura dos textos conciliares e do magistério da Igreja em vista de uma compreensão

eclesial e teológica da renovação missionária. Esta conversão requer ainda da aprendizagem de um novo

modo de exercer a responsabilidade pastoral; por em primeiro lugar na pastoral ordinária o anúncio direto

da fé, promover uma catequese de iniciação de tipo catecumenal para os principiantes e para os que

recomeçam os percursos apologéticos adequados, desenvolver uma eclesiologia de comunhão que

considere a complementaridade dos estados de vida e dos carismas, favorecer a criação de lugares de

acolhimento e de diálogo aberto às expectativas espirituais, suscitar nos cristãos o testemunho da

caridade. L‟Osservatore Romano, D. Dominique Rey, Bispo de Frejus-Toulon (França), sábado 3 de

novembro de 2012, número 44, p, 22.

212

L‟ Osservatore Romano. D. Gustavo Garcia-Siller, M.S.P.S., Arcebispo de Santo Antônio (Estados

Unidos), sábado 20 de outubro de 2012, número 42, p. 14.

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é mais belo, mais importante, mais atraente e, ao mesmo tempo, mais

necessário. A proposta acaba simplificada, sem com isso perder

profundidade e verdade, e assim se torna mais convincente e

radiosa”.213

A conversão Pastoral é o novo desafio que a Igreja coloca a si mesma no intuito

de retomar um revigorador frescor evangélico:

“Para reencontrar este fervor primitivo do evangelho, aceitaríamos

nós uma segunda conversão? Por vezes temos dificuldade de aceitar a

expressão carregada de emotividade. Mas se trata de saber se nós,

adultos, aceitamos revisões tanto mais difíceis quanto os hábitos de

longos anos e o orgulho da vida que se opõe ao espírito de pobreza e

a espera de Deus? O orgulho da vida cria uma fissura pela qual se

escoa todo o frescor evangélico. Mas, se aceitamos esta conversão em

sua totalidade, em nós o Cristo penetrará as regiões da inteligência e

do coração. Ele atingirá mesmo nossa carne até as entranhas, de

modo que, por nossa vez, tenhamos “entranhas de misericórdia”.214

A urgência missionária de nossos dias exige uma renovada práxis pastoral, é

preciso convocar todas as forças vivas da Igreja para difusão do evangelho.215

1.2 Missão Integral e evangelizadores com Espírito

Esta opção missionária de viver a missão requer evangelizadores com Espírito.

Evangelizadores que se lancem com coragem na missão. Missionários que procuram

viver um permanente pentecostes em suas vidas:

“Evangelizadores com espírito quer dizer evangelizadores que se

abrem sem medo à ação do Espírito Santo. No Pentecostes, o Espírito

faz os Apóstolos saírem de si mesmos e transforma-os em

213

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium. Exortação Apostólica, I, § 35, p, 27. 214

SCHUTZ, R. Dinâmica do provisório. São Paulo: Duas Cidades, 1967, p, 34. 215

CONGREGAÇÃO PARA O CLERO. Carta circular sobre: A Identidade Missionária do Presbítero

na Igreja como dimensão intrínseca do exercício dos Tria Munera,. (Doc 5) Brasília: CNBB, 2011, p. 25.

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anunciadores das maravilhas de Deus, que cada um começa a

entender na própria língua. Além disso, o Espírito Santo infunde a

força para anunciar a novidade do Evangelho com ousadia

(parresia), em voz alta e em todo o tempo e lugar, mesmo

contracorrente. Invoquemo-Lo hoje, bem apoiados na oração, sem a

qual toda a ação corre o risco de ficar vã e o anúncio, no fim das

contas, carece de alma. Jesus quer evangelizadores que anunciem a

Boa Nova, não só com palavras, mas, sobretudo com uma vida

transfigurada pela presença de Deus.”216

Ao caminho pelo qual a evangelização pretende percorrer vivendo uma nova

estação ardorosa, alegre, generosa, e cheia de amor e vivida com uma atitude

contagiante, faz-se necessário imbuído deste mesmo fervor de espírito.217

Os novos

evangelizadores com Espírito abraçarão a missão na sua integralidade. Serão agentes

revestidos de um renovado impulso missionário:

“Evangelizadores com espírito quer dizer evangelizadores que

rezam e trabalham. Do ponto de vista da evangelização, não

servem as propostas místicas desprovidas de um vigoroso

compromisso social e missionário, nem os discursos e ações

sociais e pastorais sem uma espiritualidade que transforme o

coração.”218

Assumir a conversão pastoral como uma missão integral nos possibilita a

redescobrir algo novo sobre Deus no encontro com o ser humano. O reconhecimento do

outro como um dom alarga os nossos horizontes missionários:

“O amor às pessoas é uma força espiritual que favorece o encontro

em plenitude com Deus, a ponto de se dizer, de quem não ama o

irmão, que «está nas trevas e nas trevas caminha» (1Jo 2, 11),

«permanece na morte» (1 Jo 3, 14) e «não chegou a conhecer a

Deus» (1 Jo 4, 8). Bento XVI disse que «fechar os olhos diante do

próximo torna cegos também diante de Deus» e que o amor é

216

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium. Exortação Apostólica, v, § 259, p, 145. 217

Ibidem, V, § 262, p. 146. 218

Op. cit. 146.

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fundamentalmente a única luz que «ilumina incessantemente um

mundo às escuras e nos dá a coragem de viver e agir”.219

A conversão pastoral como missão integral aproxima os pastores da vida do

povo, os coloca numa atitude de servidores. É justamente nesta atitude ontológico-

existencial que a Igreja na pessoa de seus bispos, sacerdotes, diáconos, leigos

redescobre a missão no coração do povo. A Igreja no contato com o seu ser mais

profundo recupera a sua misteriosa e operosa existência que acontece evangelizando,

“primeireando”, e envolvendo-se com o povo e com o mundo onde se encontra. A

missão dentro do mistério da Igreja não é simplesmente um eslogan, mas é o ser mesmo

da Igreja, se pudéssemos designar outro nome a Igreja seria missão220

, o que melhor

demonstraria esta aproximação com a sua vida e a sua ação, pois está só o é na medida

em que é enviada a anunciar Jesus Cristo:

“A missão no coração do povo não é uma parte da minha vida, ou um

ornamento que posso pôr de lado; não é um apêndice ou um momento

entre tantos outros da minha vida. É algo que não posso arrancar do

meu ser, se não me quero destruir. Eu sou uma missão nesta terra, e

para isso estou neste mundo. É preciso considerarmo-nos como que

marcados a fogo por esta missão de iluminar, abençoar, vivificar,

levantar, curar, libertar. Nisto uma pessoa se revela enfermeira no

espírito, professor no espírito, político no espírito, ou seja, pessoas

que decidiram, no mais íntimo de si mesmas, estar com os outros e ser

para os outros. Mas, se uma pessoa coloca a tarefa dum lado e a vida

privada do outro, tudo se torna cinzento e viverá continuamente à

procura de reconhecimentos ou defendendo as suas próprias

exigências. Deixará de ser povo.”221

1.3 Auto-Conversão eclesial

Ao falarmos sobre o tema da conversão eclesial queremos aqui destacar que a

nova evangelização e sua tarefa de começar com um profundo sentido de resposta e de

219

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium. Exortação Apostólica, V, § 272, p. 152. 220

CHANTRAINE, G. Les Laics Chretiens Dans le Monde. París: Fayard, 1987, p. 97. 221

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium. Exortação Apostólica, V, § 273, p, 153.

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reverência pela humanidade e pela cultura. A evangelização foi ferida e continua ser

obstada pela arrogância de alguns de seus agentes. A hierarquia deve evitar a

arrogância, a hipocrisia e o sectarismo222

:

“Se a fé de hoje se torna cada vez mais débil, não se podem

acusar os outros, mas a nós mesmos. Se a mensagem da fé não é

mais interessante nem atraente é talvez assim, porque a própria

mensagem já não o é para nós mesmos, porque já não nos

apaixona, porque não pregamos Cristo às nossas famílias e nas

ruas e nas nossas cidades.”223

O apelo à conversão que se torna para Igreja como que um conteúdo

programático é também uma interpelação interna de conversão que se dirige também em

primeira pessoa a própria Igreja: “O convite a evangelizar traduz-se num apelo a

conversão. Sentimos sinceramente que devemos converter em primeiro lugar a nós

mesmos ao poder de Cristo, o único capaz de renovar todas as coisas, antes de tudo as

nossas próprias existências”.224

Toda a conversão eclesial é conversão do coração dos evangelizadores. Anunciar

o evangelho é mudar de vida, metanoia. Esta mudança deve ser um trabalho motivado a

ser desenvolvido em todos os membros da Igreja, sejam os fiéis como os pastores, e de

modo acurado aos futuros pastores da igreja que precisam encontrar ambientes

favoráveis a esta formação mais sólida numa atitude de colaboração e indispensável

labor auto-formativo:

“Não é raro encontrar nas comunidades, quer as locais, quer as

provinciais, grupos que lutam para impor a hegemonia de seu

pensamento e de suas preferências. Isso costuma acontecer quando a

caritativa abertura ao próximo é suprida pelas ideias de cada um. Já

não se defende o todo da família, e sim a parte que me toca. Já não se

adere à unidade que vai configurando corpo de Cristo, e sim ao

conflito que divide parcializa, debilita. E, para os formadores e

superiores, nem sempre é fácil formar nessa pertinência o espírito de

família, especialmente quando é preciso formar atitudes interiores,

222

L‟ Osservatore Romano. Durante a terceira congregação geral. D. Socrates B. Villegas, Sábado 20 de

Outubro de 2012, número 42, p.15. 223

L‟ Osservatore Romano. D. Josef Michalik, Arcebispo de Przemysl dos Latinos, Presidente da

Conferência Episcopal (Polônia), sábado 27 de outubro de 2012, número 43, p, 19. 224

L‟ Osservatore Romano. Sábado 3 de Novembro de 1012, número 44, p. 6.

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em si pequenas, mas que têm sua repercussão no âmbito do corpo

institucional.”225

Um dos auxílios sacramentais que temos neste caminho de mudança é o

sacramento da reconciliação. O sacramento da reconciliação evangeliza os

evangelizadores porque nos põe em contato com Jesus que nos chama a conversão do

coração e nos inspira a acolher o seu convite a arrepender-nos.226

Esta busca de novos caminhos já começara a ser uma atitude de profunda

delegação e distribuições de novos modos de viver antigas responsabilidades. Um dos

pontos interessantes que aconteceram na Assembleia geral dos bispos foram os

remanejamentos que vieram a acontecer através da pessoa do Papa Bento XVI em

alguns dicastérios da Cúria Romana:

“No contexto das reflexões do Sínodo dos bispos: A Nova

evangelização para a transmissão da Fé Cristã” e na conclusão

de um caminho de reflexão sobre as temáticas dos seminários e

da catequese, de bom grado anuncio que decidi, depois de rezar

e refletir, transferir a competência sobre os seminários da

Congregação para a educação católica para a congregação

para o clero e a competência sobre a catequese da

Congregação para o clero e a competência sobre a catequese

da Congregação para o clero para o pontifício Conselho para a

promoção da Nova Evangelização”.227

Este movimento que busca novos caminhos e novas experiências ajuda a ação

pastoral da Igreja investir em capacidades latentes presentes em todo o povo de Deus.

“Respeitando o que é específico de cada ministério mais avançando sem medo de rever

o que é necessário”.228

Faz-se necessário aqui uma tomada de consciência pelos vários setores da Igreja

de viver um novo estilo do seguimento de Cristo:

225

BERGOGLIO, J. M. Sobre a acusação de si mesmo. São Paulo: Ave-Maria, 2013,p.10. 226

L‟ Osservatore Romano. Cardeal Timothy Michel Dolan, sábado 20 de Outubro de 2012, número 42,

P.13. 227

L‟ Osservatore Romano. 03 de Novembro de 2012, número 44, P. 5. 228

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium. Exortação Apostólica. São Paulo: Paulus-Loyola, 2013, I, §

43, p. 32.

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“A tomada de consciência para gerar comunhão eclesial inicia com a

conversão pastoral (A conversão pastoral é a chave para a

evangelização nova e fervorosa), entendida como aceitação da

manifestação do Reino de Deus e do compromisso de se tornar

discípulo de Cristo para dar a conhecer o mundo (Mc 1, 15),

compromisso que requer a conversão pessoal permanente ( A

conversão pessoal desperta a capacidade de por tudo a serviço da

afirmação do reino da vida. Bispos, presbíteros diácono permanentes,

consagrados, consagradas, leigos e leigas, todos somos chamados a

assumir uma atitude de conversão pastoral permanente, que abrange

a escuta atenta e o discernimento „ do que o Espírito diz as igrejas‟

através dos sinais dos tempos no qual Deus se manifesta.(DA 366)” 229

A comunhão eclesial proposta por uma conversão pastoral é sempre um

acontecimento que coloca a Igreja em um caminho de autenticidade. Esta autenticidade

expressa a opção pelo reino como a preocupação central da decisão por uma vida

evangélica:

“Proponho que os sacerdotes e os bispos examinem constantemente a

própria vida pessoal à luz deste “simples” modo de ser, ou seja, do

ser “simples”. A simplicidade exclui o “auto-engano”, o colocar

“máscaras”, atos típicos de quem está dividido entre a realidade de

ser uma “personagem pública” muito respeitada e a de ser

aparentemente embaixador do Reino. Porque Jesus se sentia “tão à-

vontade” e se identificava perfeitamente com a maior parte do povo

de seu tempo, até com os pecadores? Simplesmente por que se sentia

profundamente à-vontade consigo mesmo, porque era livre como

pessoa radicada numa educação simples e humilde entre os seus

contemporâneos. Ele era mais conhecido como o “filho do

carpinteiro”. A coerência na reflexão pessoal pode evitar a tendência

a ser enviados inconscientemente no mundo superficial do

“protagonismo a qualquer preço” e da busca da visibilidade das

celebridades.”230

A conversão Pastoral quer ser um caminho para elevar o nível espiritual dos

sacerdotes e das comunidades reconhecendo ao mesmo tempo em que somente uma

229

L‟ Osservatore Romano. Relatório de D. Carlos Aguiar Retes, Arcebispo de Tlalnepantla. Missão

Continental para a América. Sábado 20 de Outubro de 2012, n°42, p. 06. 230

L‟ Osservatore Romano. D. Soane Patita Paini Mafi, Bispo de Tonga, Presidente da Conferência

Episcopal (C.E.P.A.C), sábado 17 de novembro de 2012, número 46, p.21.

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realidade evangelizada é por sua vez evangelizadora.231

Esta dimensão atrai-nos a uma

vida simples dentro de uma frutuosa pobreza evangélica, onde aprendemos não apenas a

renunciar aos bens materiais, mas também a apreciar a simplicidade e a humildade dos

pobres, a sua felicidade baseada no pouco que tem e a sua solicitude para com os

outros.232

O cristão que acolhe viver sua dimensão discipular e missionária busca abrir-se a

convocação do Espírito Santo a sair das “catacumbas do medo” e da consciência de

“nós mesmos” para compartilhar mais Jesus com os outros: Os “espaços originais do

mass media”, ou seja, os campos de Jogos, as ruas, as cidades, os mercados, os night

clubs, os centros comerciais, ou até os bares e os guetos aspiram a ser em certa medida

“Igreja”.233

A auto-conversão eclesial evoca dimensões importantes para uma ação

consolidante da evangelização. Ser evangelizador e anunciar o evangelho é procurar

viver uma identidade profunda:

“O Concílio Vaticano II apresentou a conversão eclesial como a

abertura a uma reforma permanente de si mesma por fidelidade a

Jesus Cristo: „Toda a renovação da Igreja consiste essencialmente

numa maior fidelidade à própria vocação. (…) A Igreja peregrina é

chamada por Cristo a esta reforma perene. Como instituição humana

e terrena, a Igreja necessita perpetuamente desta reforma‟.á

estruturas eclesiais que podem chegar a condicionar um dinamismo

evangelizador; de igual modo, as boas estruturas servem quando há

uma vida que as anima, sustenta e avalia. Sem vida nova e espírito

evangélico autêntico, sem „fidelidade da Igreja à própria vocação‟,

toda e qualquer nova estrutura se corrompe em pouco tempo.”234

Um aspecto surpreendente também com relação à conversão pastoral que coloca

toda a Igreja em chave de leitura missionária apresenta uma tensão oportuna para uma

231

L‟ Osservatore Romano. Cardeal Mauro Piacenza, Prefeito da Congregação para o Clero (Cidade do

Vaticano), sábado 27 de Outubro de 2012, número 43, p. 17. 232

L‟ Osservatore Romano. D. Gervas Rozario, Bispo de Rajshsri (Bangladesh), sábado 20 de outubro

de 2012, número 42, p. 23. 233

L‟ Osservatore Romano. D. Emmanuel Adetoyse Badejo, Bispo de Oyo (Nigéria), sábado 10 de

novembro de 2012, número, p. 17. 234

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium. Exortação Apostólica. São Paulo: Paulus-Loyola, 2013, I, §

26, p. 23.

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renovação interna da própria Igreja. O Papa Francisco reconhece que ao propor a

conversão pastoral aos Bispos e todos os setores da Igreja o papado também deve ser

alvo desta conversão, pode-se falar desta forma na conversão do papado:

“Dado que sou chamado a viver aquilo que peço aos outros, devo

pensar também numa conversão do papado. Compete-me, como Bispo

de Roma, permanecer aberto às sugestões tendentes a um exercício do

meu ministério que o torne mais fiel ao significado que Jesus Cristo

pretendeu dar-lhe e às necessidades atuais da evangelização. O Papa

João Paulo II pediu que o ajudassem a encontrar «uma forma de

exercício do primado que, sem renunciar de modo algum ao que é

essencial da sua missão, se abra a uma situação nova».Pouco temos

avançado neste sentido. Também o papado e as estruturas centrais da

Igreja universal precisam de ouvir este apelo a uma conversão

pastoral. O Concílio Vaticano II afirmou que, à semelhança das

antigas Igrejas patriarcais, as conferências episcopais podem

«aportar uma contribuição múltipla e fecunda, para que o sentimento

colegial leve a aplicações concretas» Mas este desejo não se realizou

plenamente, porque ainda não foi suficientemente explicitado um

estatuto das conferências episcopais que as considere como sujeitos

de atribuições concretas, incluindo alguma autêntica autoridade

doutrinal.Uma centralização excessiva, em vez de ajudar, complica a

vida da Igreja e a sua dinâmica missionária.”235

Uma das virtudes fundamentais que deve acompanhar todo caminho proposto

pela nova evangelização é a virtude da humildade. Afirmou o Arcebispo de Malinas D.

Luis Tagle nas Filipinas descrevendo um episódio pastoral vivenciado em sua

arquidiocese: “um jovem perguntou: “Somos nós que nos perdemos ou a Igreja que nos

perdeu”.236

Entre esta pergunta e a resposta apresentada por este episódio Sinodal há um

convite de que a Igreja continue a apreender a humildade de Jesus. A força e o poder de

Deus estão no esvaziamento de si através de seu Filho Jesus. A humildade, o respeito e

o silêncio podem recordar de modo mais claro o rosto de Deus em Jesus.

É de fundamental importância redescobrir hoje a Igreja no seu frescor

evangélico. A Igreja será tanto mais convincente quanto ela trazer em si os traços de seu

Fundador. A Igreja sacramento caminhando humildemente pelas estradas da vida será

235

Ibidem, I, § 32, p. 26. 236

L‟Osservatore Romano. Durante a terceira Congregação Geral. D. Luis Tagle. Sábado 20 de Outubro

de 2012, número 42, p.12.

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uma Igreja que comove o coração. Uma Igreja simples. Uma Igreja hospitaleira. Uma

Igreja orante. Uma Igreja Jubilosa.237

3. Discipulado e Missão

É importante retomar no âmbito da vida eclesial o tema do discipulado cristão.

Como comunidade de fé é preciso procurar compreender melhor o que significa ser

discípulo de Cristo de forma que melhor conhecendo a própria identidade cristã opere-

se um movimento de crescimento e amadurecimento desta mesma identidade mesma.

Tivemos importantes contribuições de experiências no Sínodo sobre o

discipulado que melhor ajuda a compreender a experiência em alguns povos como, por

exemplo, da comunidade asiática:

“Para nós, a religião é mais o discipulado de uma pessoa do

que a adesão a uma doutrina ou a obediência a uma série de

regras. A pessoa de Jesus é profundamente fascinante: a sua

mensagem e a sua vida, a sua paixão, morte e ressurreição. A

adesão a uma doutrina nasce como fruto de ser discípulo de um

mestre. Foi deste modo que os primeiros cristãos proclamaram

a boa nova.”.238

Quando abordamos este tema do discipulado tendo sempre em mente a sua

complementaridade na missão percebemos que a Igreja necessita se preparar com toda a

energia de seus membros para o grande empreendimento da evangelização. Os leigos

são de fundamental importância nesta tarefa de comunicar a fé e os tesouros do

evangelho.

A exortação apostólica Evangelii nuntiandi recorda que “os leigos podem

também sentir-se ou ser chamados a colaborar com seus pastores no serviço da

237

L‟ Osservatore Romano. D. Olivier Schitthausler, M.E.P. , Bispo Titular de Catabum castra, Vigário

Apostólico de Phnom-Penh (Camboja), sábado 3 de novembro de 2012, número 44, p. 22. 238

L‟ Osservatore Romano. Cardeal Oswald Gracias, Arcebispo de Bombaim, sábado 20 de Outubro de

2012, número 42, p. 10.

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comunidade eclesial, para o crescimento e a vitalidade da mesma, exercendo ministérios

muito diversos, segundo a graça e os carismas que o Senhor quiser dispensar.”239

A exortação apostólica Christifidelis laici é assumida na conferência episcopal

latino americano de Santo Domingo, quando propõe:

“Que todos os leigos sejam protagonistas da nova evangelização, da

promoção humana e da cultura cristã. É necessário à promoção

constante do laicato, livre de qualquer clericalismo e sem redução ao

intra-eclesial. Que os batizados não evangelizados sejam os

principais destinatários da nova evangelização. Ela será efetivamente

cumprida se os leigos, conscientes do seu batismo, respondem a

chamada de Cristo a converter-se em protagonistas da nova

evangelização.”240

O sínodo fora um momento propositivo para que todos os bispos, sacerdotes,

diáconos, religiosos e leigos sejam renovados concretamente na fé e na vida cristã para

que aspirem um discipulado e a transmissão da Boa Nova, com referência ao magistério

da Igreja, á liturgia, a vida de oração, e a formação permanente.241

Muitos viram a

urgência de acompanhar de maneira progressiva a formação dos pastores locais e dos

leigos através da criação de seminários e de centros de formação, assim, como o

trabalhar em traduções bíblicas que ajudem em uma frutuosa compreensão das Sagradas

Escrituras.242

No caminho do discipulado é preciso compreender as escrituras em

conexão com os grandes questionamentos do coração humano:

“Hoje, a maioria dos cristãos fica feliz se ninguém lhe faz perguntas.

Entre cinco homens, que podemos encontrar na vida cotidiana, três

estão a percorrer o mesmo caminho do emissário etíope, ou seja,

estão a regressar depois de ter vivido um momento de socialização

religiosa na sua vida atual. Trazem consigo interrogações sobre o

sentido da própria vida, desde seu passado, limitando-se a lê-las

tristemente, sem compreender o que têm a ver com as suas próprias

vidas. Compraram até um documento da mensagem bíblica,

239

PAULO VI. Evangelli Nuntiandi. Exortação Apostólica, 1976. São Paulo: Paulinas, 22ª edição2011,

V, § 73, p. 92. 240

L‟ Osservatore Romano. D. Leonardo Ulrich Steiner, O.F.M. Bispo auxiliar de Brasília, sábado 3 de

novembro de 2012, número 44, p. 7. 241

L‟ Osservatore Romano. D. Francis Xavier Kriengsak Kovithavanij, Arcebispo de Bang-Kok

(Tailândia), sábado 3 de Novembro de 2012, número 44, p. 21. 242

L‟ Osservatore Romano. D. Jean-Baptiste Tiama, Bispo de Sikasso, Presidente da Conferência

Episcopal (Mali), sábado 3 de Novembro de 2012, número 44, p. 21.

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exatamente como o viajante tinha comprado o trecho de Isaías, mas

não tem ninguém para orientá-los, ninguém para lançar uma ponte

entre a palavra da fé e sua vida cotidiana. [...] Muitas vezes, não nos

deixamos envolver pelos problemas das outras pessoas, porque os

temos medo de tê-los que resolver em seu lugar. Talvez ele precise

apenas de ser ouvido, de partilhar os seus pensamentos e de um ato

benéfico por parte de alguém capaz de se por em seu lugar, que sobe

a carroça de sua vida e leve a sério as suas perguntas. Isso significa

iniciar a refletir a partir do lugar onde o outro se encontra.”243

É importante retomar no âmbito da vida eclesial o tema do discipulado cristão.

Como comunidade de fé têm vários testemunhos importantes neste sentido, como por

exemplo, a inculturação do cristianismo nas dimensões asiáticas. O discipulado tornou-

se uma arte a se viver:

“para nós, a religião é mais o discipulado de uma pessoa do que a

adesão de uma doutrina ou a obediência a uma série de regras. A

pessoa de Jesus é profundamente fascinante: a sua mensagem e a sua

vida, a sua paixão, morte e ressurreição. A adesão a uma doutrina

nasce como fruto do discípulo de um mestre. Foi deste modo que os

primeiros cristãos proclamavam a boa nova”.244

Retomar o tema do discipulado é procurar compreender melhor a própria identidade

cristã:

“O dever de anunciar a verdade salvifíca não é só responsabilidade

do clero e dos religiosos. Aliás, o sínodo ressaltou o importante papel

de cada discípulo de cristo na missão de difundir a fé. O debate

acentuou a participação decisiva e vital de cada católico na missão

evangelizadora, sobretudo mediante o compromisso lícito e graças

aos dons dos fiéis leigos”.245

Vemos de modo claro que a convocação para viver o discipulado e a missão na

Igreja não é tarefa de um grupo de pessoas especiais, mas uma convocação a todo o

batizado:

243

L‟ Osservatore Romano. Cardeal Joachim Meisner, Arcebispo de Köln (Alemanha), sábado 27 de

Outubro de 2012, número 43, p. 11. 244

L‟ Osservatore Romano. Cardeal Oswald Gracias, Sábado 20 de Outubro de 2012, número 42, p.10. 245

L‟Osservatore Romano. Cardeal Wuerl, relatório post disceptionem, sábado 27 de outubro de 2012,

número 43, p. 4.

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“Em virtude do Batismo recebido, cada membro do povo de Deus

tornou-se discípulo missionário (Mt 28, 19). Cada um dos batizados,

independentemente da própria função na Igreja e do grau de

instrução da sua fé, é um sujeito ativo de evangelização, e seria

inapropriado pensar num esquema de evangelização realizado por

agentes qualificados enquanto o resto do povo fiel seria apenas

receptor das suas ações. A nova evangelização deve implicar um novo

protagonismo de cada um dos batizados. Esta convicção transforma-

se num apelo dirigido a cada cristão para que ninguém renuncie ao

seu compromisso de evangelização, porque, se uma pessoa

experimentou verdadeiramente o amor de Deus que o salva, não

precisa de muito tempo de preparação para sair a anunciá-lo, não

pode esperar que lhe deem muitas lições ou longas instruções. Cada

cristão é missionário na medida em que se encontrou com o amor de

Deus em Cristo Jesus; não digamos mais que somos «discípulos» e

«missionários», mas sempre que somos «discípulos missionários»”.246

É dentro desta consciência e chamado universal ao discipulado que vai se

compreendendo que ser discípulo: significa ter a disposição permanente de levar aos

outros o amor de Jesus; e isto sucede espontaneamente em qualquer lugar: na rua, na

praça, no trabalho, num caminho.247

Dentro desta dimensão do seguimento de Cristo o

discípulo do Senhor vive sob o prisma de uma confiança em Deus frente à

imprevisibilidade dos novos cenários públicos que são para o discípulo lugares de

testemunho de sua fé e de seu seguimento da pessoa de Cristo:

“O discípulo é arrancado de sua relativa segurança de vida e

lançado à incerteza incompleta (isto é, na verdade, para a

absoluta segurança e proteção da comunhão com Jesus); de

uma situação previsível e calculável (isto é, na verdade, de uma

situação totalmente imprevisível) para dentro do imprevisível e

fortuito (na verdade, para dentro do único que é necessário e

previsível); do domínio das possibilidades finitas (isto é, na

realidade das possibilidades infinitas (isto é, na verdade, para a

única realidade libertadora”. 248

246

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium. Exortação Apostólica. São Paulo: Paulus-Loyola, 2013, §

120, p.75. 247

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium. Exortação Apostólica. São Paulo: Paulus-Loyola, 2013,

III, § 128, p. 79. 248

BONHOEFFER, DIETRICH. Discipulado. São Leopoldo: Sinodal, 2004, p. 21.

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2.1 Bispos, presbíteros, religiosos e leigos: discípulos missionários.

Outro elemento importante na nova evangelização é a sua dimensão de suscitar

vocações. Uma autentica evangelização corresponde ao desejo de Jesus de “pedir ao

Senhor da colheita que envie operários para sua colheita. (Mt 9, 38). Evangelização e

vocação são dois elementos inseparáveis. Aliás, critérios de autenticidade de uma eficaz

evangelização é a sua capacidade de suscitar vocações, de amadurecer projetos de vida

evangélica de envolver inteiramente as pessoas que são evangelizadas, até os tornar

discípulos, testemunhas e apóstolos.

O despertar de vocações deve ser compreendido não como uma mera conquista,

mas como uma presença servidora.249

A vocação é sempre uma participação no mistério

pascal de Cristo, e de modo específico se formos co-relacionarmos a vocação com o

discipulado veremos que a na origem de toda vocação está o encontro com a cruz de

Cristo. Ser discípulo de Cristo assumindo por meio de uma vocação uma forma de ser e

estar operando na Igreja significa colocar-se nas sendas da cruz. A cruz é imprescindível

ao seguimento de Cristo por meio do discipulado: “Quando caminhamos sem a cruz e

buscamos um Cristo sem Cruz, não somos discípulos do Senhor: somos mundanos,

somos bispos, padres, cardeais, papas, mas não discípulos do Senhor”.250

2.1.1 O Bispo discípulo missionário

O Bispo discípulo missionário tem a missão confiada pelo seu Senhor de ir

visitar as suas ovelhas nas casas, nas praças onde se reúnem os jovens, nos campos

desportivos, nos lugares de festa, nas prisões, nos hospitais, nas escolas e em qualquer

outro lugar para lhes dizer que o caminho da felicidade, da verdade e da vida verdadeira

é Jesus Cristo. É muito importante que o primeiro anúncio e a aproximação dos pastores

não sejam um tanto quanto reprovativa, mas educativa ensinando e infundindo

positivamente valores, ao invés de simplesmente reprovar e não acompanhar aqueles

249

L‟ Osservatore Romano. Pe. Pascual Chávez Villanueva S.D.B., Reitor-Mor da sociedade salesiana

de São João Bosco, Presidente da União dos Superiores-Gerais (U.S.G), sábado 27 de Outubro de 2012,

número 43, P,17. 250

FRANCISCO, Homilia na Santa missa com os cardeais (Roma, 14 de Março de 2013), in: AAS 105

(2013), p. 365-366.

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que necessitam de instrução religiosa. Verificou-se no sínodo que quando o bispo é

protagonista da evangelização na própria diocese, toda a sua Igreja o segue. Aqui esta

também a arte pastoral que é “catequizar, antes, durante e depois da celebração”.251

A evangelização como arte de viver será na vida do Bispo um caminho pelo qual

vivenciando a amizade com Cristo será ele também para sua comunidade diocesana um

amigo de Deus e um amigo de seu povo:

“O encontro com Cristo reveste um caráter profundamente pessoal,

de tipo amistoso. Os amigos são destinatários da dedicação redentora

do Senhor (Jo 15, 18), aos quais Jesus revela o Pai (Jo 15, 15). Nós

bispos corremos o risco de perder a humanidade e a sensibilidade

pastoral, se os outros compromissos não nos deixarem tempo para

cultivar relações de amizades concretas”.252

É nesta proximidade com o povo real que a vida pastoral vai tomando

tonalidades e sentidos importantes para o bispo. Que prosseguindo para além de um

funcionalismo empresarial ou de uma postura de generais derrotados, é mais oportuno

que os bispos se reconheçam como soldados preciosos no campo do Senhor.253

2.1.2 Os. Sacerdotes discípulos missionários

Onde trabalha um sacerdote zeloso, um homem de vida santa, a fé cresce,

enquanto que onde trabalha um sacerdote tíbio, tudo se extingue. Os bispos e os

sacerdotes devem ser homens da nova evangelização e este aspecto da sua vida deve ser

desenvolvido já desde a sua formação no seminário.254

O Sínodo apresentou caminhos importantes para serem trilhado por aqueles que

desejam tornar-se um pastor construtivo no desempenho de sua colaboração com o

Bispo Local no exercício de seu sacerdócio, assim, como reconheceu também a

importância de que alguns teólogos pode também desenvolver trabalhos relevantes em

251

L‟ Osservatore Romano. D. Juan de La Caridad Garcia Rodríguez(cuba), Sábado 20 de Outubro de

2012, número 42, p.10. 252

L‟ Osservatore Romano. D. Antonio Arregui Yarza, Arcebispo de Guayaquil, Presidente da

Conferência Episcopal do Equador, sábado 20 de Outubro de 2012, número 42, p. 15. 253

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium. Exortação Apostólica. São Paulo: Paulus-Loyola, 2013, II,

§ 96, p. 61. 254

L‟ Osservatore Romano. D. Ján Bab Jack, S.J, Arcebispo metropolitano de Presov dos católicos de

rito bizantino, Presidente do conselho da Igreja Eslovaca, sábado 27 de Outubro de 2012, número 43, p.

14.

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110

prol do Reino de Deus, contudo por outro lado constatou algumas deficiências e alguns

obstáculos a nova evangelização advinda da má vivência do ministério sacerdotal:

“O maior obstáculo para se tornar teólogo ou pastor construtivo, e,

por conseguinte, eficaz na perspectiva da nova evangelização, é sem

dúvida alguma soberba com o seu aliado natural: o egoísmo. A mania

de se tornar grande, original, importante, levam não poucos a serem

„Pastores que apascentam a si mesmos e não o rebanho‟ (Ez 34, 8;

Santo Agostinho, Sobre os Pastores), na realidade tornam-se pouco

relevantes no Reino dos céus, contraproducentes para o crescimento

da Igreja e para a evangelização. Dado que em cada um de nós,

depois do pecado original, há uma dose de soberba, devemos fazer

constantemente nesta matéria um sólido exame de consciência e, aos

pés da cruz, aprender a humildade e o amor autêntico”.255

Um ministério presbiteral vigoroso exige o compromisso de cada presbitério na

sua formação permanente, mas exige também a proposta institucional das Igrejas

particulares, singularmente ou com as outras Igrejas da região ou do país.256

Promover

uma permanente formação dos presbíteros possibilitando uma melhor atualização

teológica-Pastoral-Espiritual mostra-se fecundo em todos os sentidos, uma vez que

muitos presbitérios se veem carentes de uma sólida e atualizada formação.

O sínodo constatou por várias experiências vividas no decorrer dos anos que a

ignorância, o cansaço, o desencorajamento, a indiferença, a rotina danificaram

imensamente o espírito presbiteral.257

Por outro lado é preciso ver o sacerdote hoje não

apenas como um “ministro do culto”, mas também um representante de Cristo-esposo,

que veio para desposar a humanidade.258

O sacerdote deve ser ele também, um

apaixonado pela humanidade. O múnus regendi vivido pelos sacerdotes diz respeito a

um governo que opera pelo serviço a Deus e a comunidade:

Não se esqueça que, quando falamos da potestade sacerdotal,

„estamos na esfera da função e não na da dignidade e da

santidade‟. O sacerdócio ministerial é um dos meios que Jesus

utiliza ao serviço do seu povo, mas a grande dignidade vem do

Batismo, que é acessível a todos. A configuração do sacerdote

255

L‟ Osservatore Romano. Cardeal Zenon Grocholewski, Prefeito da Congregação para a Educação

Católica (Cidade do Vaticano), sábado 20 de Outubro de 2012, número 42, p.13. 256

L‟ Osservatore Romano. D. Carlos Maria Franzini, Bispo de Rafaella (Argentina), sábado 20 de

Outubro de 2012, número 42, p, 15. 257

L‟ Osservatore Romano. D. Fábio Svescún Mutis, Bispo Ordinário Militar (Colômbia), sábado 20 de

outubro de 2012, número 42, p, 16. 258

L‟ Osservatore Romano. D. André Léonard, Arcebispo de Malina-Bruxelas, Presidente da

conferência Episcopal (Bélgica), sábado 20 de Outubro de 2012, número 42, p, 23.

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com Cristo Cabeça – isto é, como fonte principal da graça –

não comporta uma exaltação que o coloque por cima dos

demais. Na Igreja, as funções „não dão justificação à

superioridade‟ de uns sobre os outros ”.259

O frutuoso anúncio do evangelho por parte do sacerdote discípulo-missionário

terá o desejado impacto frutuoso não apenas pelo discurso que este pode apresentar a

sua comunidade, mas principalmente através da presença de um pastor próximo que

caminha com o seu povo com a eloquência do bom exemplo.260

2.1.3 A vida consagrada discípula e missionária

A vida consagrada sempre foi uma preciosa ajuda a toda a Igreja no que se refere

a sua missão evangelizadora. Hoje mais do que nunca a Igreja percebe a necessidade de

um renovado testemunho na vida religiosa e a necessidade de continuar por meio de um

testemunho profético anunciando os valores do Reino de Deus que se faz presente em

meio aos homens. Isto implica em colocar Cristo no centro da própria vida e a coragem

de testemunhar abertamente a sua pessoa.261

O Sínodo procurou novamente convidar a

vida religiosa a fazer confluir as potencialidades de cada carisma específico da vida

consagrada a uma preciosa colaboração no programa diocesano de evangelização.

A vida Religiosa nesta dimensão de conversão pastoral é convocada a dar um

testemunho mais eloqüente de presença e de abertura e a lançarem-se em meio aos

novos desafios e a vencerem a tentação de se tornarem multinacionais, desempenhando

um trabalho bom e útil para responder as necessidades materiais esquecendo-se de seu

fim principal de anunciar o evangelho.262

A vida religiosa discípula e missionária deve recuperar o amor a evangelização e

o compromisso com o mundo:

Hoje nota-se em muitos agentes pastorais, mesmo pessoas

consagradas, uma preocupação exacerbada pelos espaços pessoais de

259

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium. Exortação Apostólica. São Paulo: Paulus-Loyola, 2013, II,

§ 104, p. 65. 260

L‟ Osservatore Romano. D. Benjameim Phiri, auxiliar de Chipata, zâmbia, sábado 3 de novembro de

2012, número 44, p. 18. 261

L‟ Osservatore Romano. Pe. Mauro Johri, O.F.M.Cap, Ministro Geral da Ordem Fransciscana dos

Frades Capuchinhos, sábado 27 de outubro de 2012, numero 43, p. 17. 262

L‟ Osservatore Romano. Cardeal Telesphore Placidus Toppo, Arcebispo Ranchi, Presidente da

Conferência Episcopal (Índia), sábado 10 de novembro de 2012, número 45, p. 18.

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autonomia e relaxamento, que leva a viver os próprios deveres como

mero apêndice da vida, como se não fizessem parte da própria

identidade. Ao mesmo tempo, a vida espiritual confunde-se com

alguns momentos religiosos que proporcionam algum alívio, mas não

alimentam o encontro com os outros, o compromisso no mundo, a

paixão pela evangelização. Assim, é possível notar em muitos agentes

evangelizadores não obstante rezem uma acentuação

do individualismo, uma crise de identidade e um declínio do fervor.

São três males que se alimentam entre si.263

É de fundamental urgência recuperar em muitas comunidades onde se vive a

vida consagrada o caráter profético da missão, sendo em primeiro lugar profetas nas

estruturas ad intra para serem também profetas e sinais do reino de Deus ad extra:

“Para quantos estão feridos por antigas divisões, resulta difícil

aceitar que os exortemos ao perdão e à reconciliação, porque pensam

que ignoramos a sua dor ou pretendemos fazer-lhes perder a memória

e os ideais. Mas, se virem o testemunho de comunidades

autenticamente fraternas e reconciliadas, isso é sempre uma luz que

atrai. Por isso me dói muito comprovar como nalgumas comunidades

cristãs, e mesmo entre pessoas consagradas, se dá espaço a várias

formas de ódio, divisão, calúnia, difamação, vingança, ciúme, a

desejos de impor as próprias ideias a todo o custo, e até perseguições

que parecem uma implacável caça às bruxas. A Quem queremos

evangelizar com estes comportamentos?”. 264

2.1.4 Leigos discípulos missionários

São de fato os leigos que, pela sua índole secular, têm a responsabilidade de

transformar a realidade social, cultural, política, e econômica dos nossos povos.265

É

preciso potencializar a missão dos leigos no interior da Igreja, e parar de vê-los apenas

objetos de evangelização. Na verdade os leigos são os primordiais sujeitos da nova

evangelização através de um testemunho eficaz no coração da sociedade.266

É preciso

263

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium. Exortação Apostólica. São Paulo: Paulus-Loyola, 2013, II,

§ 78, p. 52. 264

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium. Exortação Apostólica. São Paulo:Paulus-Loyola, 2013, II,

§ 100, p. 63. 265

L‟ Osservatore Romano. D. José Luis Azuaje Ayala, Bispo de El Vigía-San Carlos Del Zulia,

Presidente da Conferência Episcopal (Venezuela), sábado 3 de novembro de 2012, número 44, p. 20. 266

L‟ Osservatore Romano. D. José S. Palmo, Arcebispo de Cebu, Presidente da Conferência Episcopal

(Filipinas), sábado 17 de novembro de 2012, número 46, p. 21.

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também com que estes mesmos leigos encontrem em seus pastores a presença e o

auxílio necessários para que sejam confirmados em sua missão dentro da vida secular.

A nova evangelização que deve ser tomada pelos leigos na Igreja não pode ser

um evento apenas a nível paroquial, mas deve ser um acontecimento que leva ao

encontro aqueles que se distanciaram da vida da fé. A autêntica evangelização procurará

encurtar caminhos e colocar-se a caminho e em direção aos nossos irmãos que ficaram

pelo caminho. É preciso ir até o encontro daqueles que não se identificam com a Igreja

em seus próprios ambiente como por exemplo; clubes , creches, hospitais, prisões,

shoppings. É preciso ir até a casa das mães e pais daqueles que se preparam para a

primeira comunhão, é preciso encurta e se por a caminho.

O sínodo foi também uma grande oportunidade para constatar que muitos leigos

na tarefa da evangelização desempenham um papel de verdadeiros protagonistas, muitos

dedicam a própria vida a missão evangelizadora da Igreja.267

A evangelização, a transmissão da fé passa principalmente de uma pessoa a

outra. Cada batizado é capaz de testemunhar aos parentes, vizinhos e colegas, a alegria

humilde de conhecer a Cristo.268

Hoje a Igreja precisa de leigos bem formados e bem

informados, capazes de renovar e frutificar a ordem temporal. Para tal, a formação dos

leigos deve estar no cimo da nossa lista de prioridades.269

O dinamismo missionário é

importante para um novo impulso à tarefa missionária:

“Quando mais precisamos dum dinamismo missionário que leve sal e

luz ao mundo, muitos leigos temem que alguém os convide a realizar

alguma tarefa apostólica e procuram fugir de qualquer compromisso

que lhes possa roubar o tempo livre. Hoje, por exemplo, tornou-se

muito difícil nas paróquias conseguir catequistas que estejam

preparados e perseverem no seu dever por vários anos. [...] Isto,

muitas vezes, fica-se a dever a que as pessoas sentem imperiosamente

necessidade de preservar os seus espaços de autonomia, como se uma

tarefa de evangelização fosse um veneno perigoso e não uma resposta

alegre ao amor de Deus que nos convoca para a missão e nos torna

267

L‟ Osservatore Romano. D. Benedito Beni dos Santos, Bispo de Lorena (Brasil), 27 de Outubro de

2012, número 43, p, 9. 268

L‟ Osservatore Romano. D. Yves Le Sux, Bispo de Le Mans (França), sábado 27 de Outubro de

2012, número 43, p, 11. 269

L‟ Osservatore Romano. D. Julian Winston Sebastian Fernando, S.S.S., Bispo de Badulla (Siri

Lanka), sábado 17 de novembro de 2012, número 46, p, 20.

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completos e fecundos. Alguns resistem a provar até ao fundo o gosto

da missão e acabam mergulhados numa acédia paralisadora”.270

3 A Igreja diaconal como rosto autentico da comunidade cristã.

Não é o poder e nem mesmo a dignidade, mais a humildade e a disponibilidade

que constituem os ministérios na Igreja. As pessoas de nosso tempo estão ávidas de ver

o rosto diaconal da Igreja. Querem ver a Igreja diaconal a serviço do plano de Deus no

mundo. Uma Igreja serva que a exemplo de seu Senhor e mestre foi aos pés, e pode se

sentir próxima daqueles que vivem debaixo de inúmeras angustias e desesperos e falta

de sentido na própria vida. O serviço recíproco entre os cristãos e a comunidade local

faz refletir uma auto-comunicação da Igreja como servidora ao modelo de seu fundador

que soube servir e dar a sua vida por muitos. É a partir desta configuração que passamos

a refletir e a pensar nestas ultimas páginas que virão a Igreja vista como comunidade, a

Igreja em seu mistério diaconal.

O serviço diaconal da Igreja quer apresentar a paternidade de Deus como uma

aproximação amorosa do ser humano a partir da pessoa de seu Filho Jesus. O

testemunho diaconal da atenção as pessoas no mundo de hoje é muito bem

compreendido.271

Quem com a graça do Espírito Santo alcança esta experiência

fundamental e originária de Jesus; a filiação, encontrando esta experiência encontra a

vida e possui a força de realizar o projeto de Deus.

Outro ponto fundamental ao apresentarmos o rosto diaconal da Igreja é

justamente de vê-la como a servidora da comunidade e criadora de comunhão. Somente

que veio para servir pode criar laços verdadeiramente perduráveis. Dentro desta

perspectiva a família a paróquia, a Igreja doméstica, os novos movimentos e as novas

comunidades tornam-se ambientes de serviço e de doação humilde. A Igreja diaconal é

uma Igreja que comunica Deus pela pregação e pelas atitudes. Não pode existir maior

alegria para a Igreja de Jesus Cristo do que comunicar aquilo ou Aquele que a faz feliz.

270

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium. Exortação Apostólica. São Paulo: Paulus-Loyola, 2013,

II,§ 81, p. 53. 271

L‟ Osservatore Romano. D. Franz-Josef Hermann Dode, Bispo de Osnabruck (Alemanha), sábado 10

de novembro de 2012, número 45, p. 17.

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Contudo a Igreja diaconal compreende que a verdadeira evangelização brota do

encontro com Deus e com os homens sob a Guia do Espírito Santo.272

O amor diaconal manifesta-se na paixão que o Filho de Deus manifestou aos

homens. Neste amor está o fundamento da paixão que a Igreja deve vivenciar por cada

ser humano.273

Uma linha teológica-pastoral para a reflexão e concretização da nova

evangelização se construa ao redor desta linha de “comunhão-testemunho-serviço.”274

É

dentro deste modelo diaconal que descrevemos aqui algumas observações feitas pelo

sínodo dos Bispos e que demonstram de modo claro que a tradição e a transmissão fiel

da Palavra de Deus, testemunhada no cânon das Escrituras, por meio dos profetas e

apóstolos e na leiturgia(liturgia), martyria (testemunho) e diakonia275

(serviço) da

Igreja.276

A transmissão da fé encontrará nesta tríade comunicante a expressão de uma

dinâmica continuada nos Actus Christi Testimonial, que convida a Igreja a uma

participação mais operosa enquanto esposa que convoca a humanidade a união com

Deus por meio das relações humanas por meios dos Actus Christi Relacional.277

3.1 O Querigma: O primeiro anúncio e novas perspectivas

O sínodo dos bispos foi um grande cenário para refletir sobre as novas

perspectivas e ações concretas para a nova evangelização. Uma das propostas foi

272

L‟ Osservatore Romano. D. Ricardo Antonio Tobón Restrepo, Arcebispo de Medellín (Colômbia),

sábado 3 de novembro de 2012, número 44, p. 19. 273

L‟ Osservatore Romano, Pe. José Rodríguez Carballo, O.F.M, Ministro Geral da Ordem dos

Fransciscanos dos Frades menores, sábado 10 de novembro de 2012, número 45, p.14. 274

L‟ Osservatore Romano, D. Mario Del Valle Moronha Rodríguez, Bispo de San Cristobál

(Venezuela), 27 de Outubro de 2012, número 43, p.19. 275

“O sentido de diakonía está estreitamente relacionado com o forte gesto de Jesus na última ceia – o

lava-pés. Contrapondo-se à “bacia da omissão de Pilatos” está a “bacia do serviço de Jesus” na quinta

feira Santa. Com toalha nas mãos, ele se faz o menor, quem serve, inaugurando uma nova ordem de

relação interpessoal, fundada no descentrar-se de si mesmo para “amar primeiro”, assim como Deus nos

amou: “Já não vos chamo servos, mas amigos” (Jo 15, 15); “quem não se fizer o menor, como as crianças,

não entrará no Reino dos Céus” (Mt 11, 11; Lc 7, 28; 9, 48).BRIGHENTI, AGENOR. A Pastoral dá o

que pensar: A inteligência da Prática transformadora da fé. São Paulo: Ed: Paulinas, 2ª Edições, 2011, p.

130. 276

COMISSÃO TEOLÓGICA INTERNACIONAL. Teologia hoje: perspectivas, princípios e critérios.

Brasília: CNBB, 2012, p. 16. 277

FERREIRO, FRANCISCO. Cristologia Del Testimonio en El Concilio Vaticano II. Búsqueda Del

“centro real” Del Concílio Vaticano II a partir Del estúdio Del Actus Christi. Madrid, Universidade San

Dámaso, 2011, p. 465.

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justamente aproximar novamentente o querigma da catequese, potencializando estas

duas vias de transmissão da fé para melhor servir a causa da evangelização:

“A proclamação Querigmática exige a conversão ao Senhor

ressuscitado Jesus Cristo através do Batismo. A catequese de maneira

diferente mais não separada promove o crescimento e a instrução na

vida cristã. Ambos constituem dois aspectos de uma única ação

pastoral. O primeiro anúncio e a catequese devem cantar unidos ao

mundo, em harmonia perfeita, um dueto que responda novamente ao

mandato do Senhor Jesus: “Ide, por todo o mundo e anuncia o

evangelho a todas as criaturas” (Mc 16, 15)”278

Gera preocupação a escassez do primeiro anúncio na vida cotidiana.279

A

retomada atualidade do querigma faz-se necessário para uma evangelização no quadro

de prioridade em nossos dias. Anunciar a palavra de Deus em todas as ocasiões,

oportuna e inoportunamente, recuperando a voz profética da Igreja, buscando discernir

os sinais dos tempos.

O retorno a uma compreensão que auxilia a nova evangelização em chave

querigmática é fundamental importância. O Sínodo percebeu a necessária impostação

profética que a vida laical é chamada a dar através de um testemunho profético no

mundo:

“Cristo, o grande Profeta que, pelo testemunho de sua vida e pela

força da sua palavra, proclamou o reino do Pai, cumpre o seu múnus

profético até à plena manifestação da glória, não apenas por meio da

hierarquia, que ensina em seu nome e com o seu poder, mas também

por meio dos leigos, aos quais estabelece suas testemunhas e aos

quais dá o sentido da fé e a graça da palavra (cf. At 2,17-18; Ap

19,10), para que façam brilhar a força do Evangelho na vida

cotidiana, familiar e social. Eles apresentam-se como filhos da

promessa, quando, fortes na fé e na esperança, aproveitam o tempo

presente (cf. Ef 5,16; Cl 4,5) e com paciência esperam a glória futura

(cf. Rm 8,25). Não escondam esta esperança no interior da alma, mas

exprimam-na também através das estruturas da vida secular, por uma

renovação contínua e pela luta “contra os dominadores deste mundo

278

L‟ Osservatore Romano. D. Chistopher Charles Prowse, Bispo de Sale (Austrália), sábado 27 de

Outubro de 2012, número 43, p. 7. 279

L‟ Osservatore Romano. Pe. Julián Carrón, Presidente da fraternidade de Comunhão e libertação,

sábado, 3 de Novembro de 2012, número 44, p. 16.

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de trevas e contra os espíritos do mal” (Ef 6,12). Lumen Gentium

(35)”280

3.2 A Igreja: Uma comunidade a serviço do amor e da verdade.

A Igreja é convidada em nossos dias a se fazer presente em meio ao mundo não

como realidade impositiva, mas propositiva e expositiva dos valores que tendem a

enobrecer a família humana. Para isso é preciso ter uma atitude importante de simpatia e

empatia para com o mundo. Neste aproximar-se do “mundo” a Igreja discerne a si

mesma em sua identidade fundamental de ser sinal histórico e escatológico em meio ao

“saeculum”, não somente através de uma contra-posição, mas discernindo os pontos

convergentes destas “duas cidades”:

A cidade de Deus, não é a Igreja visível: muitos das cidade celestial estão na

Roma pagã, e muitos da terrena, na Igreja cristã. As “cidades” são entidades

escatológicas: no juízo final, poderão visualizar-se com seus perfis definidos, como o

joio e o trigo depois da colheita. Até lá, aqui na história, estão intrinsecamente

entremeadas. O “secular” é a existência histórica das duas cidades. Se

escatologicamente elas são mutuamente excludentes, por sua vez no saeculum, o tempo

mundano, não podem ser adequadamente distintas e separadas. A linha divisória passa

pela liberdade dos seres humanos, pessoal e coletiva”.281

A Igreja diaconal é também dialogal não tem medo da diferença e nem teme o

que é humano, porque sabe que o Filho do homem veio trazer a plenitude a todos os

homens e a cada homem. Por isso a Igreja não pode ser vista como realidade poderosa

sempre a se impor, mas uma comunidade diaconal a partilhar a verdade no serviço do

amor.282

A diaconia da verdade é parte central da mensagem do evangelho e de sua

missão.283

280

CONCÍLIO VATICANO II. Lumen Gentium, Constituição Dogmática. Petrópolis: Vozes, IV, § 35,

p.81. 281

BERGOGLIO, JORGE MARIO. Educar: exigência e paixão. Desafios para educadores cristãos.

São Paulo: Ave-Maria, 2013, p.153. 282

L‟ Osservatore Romano. D. Santiago Silva Retamales. Secretário do Conselho episcopal latino-

americano, sábado 3 de novembro de 2012, número 44, p. 18. 283

L‟ Osservatore Romano. D. Zygmwski, Arcebispo emérito de Radom (Polônia). Presidente do

Pontifício Conselho para a pastoral no campo de saúde (Cidade de Vaticano), sábado 10 de novembro de

2012, número 45, p. 20.

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A nova evangelização a serviço do amor e da verdade priorizará a formação de

cristãos coerentes, capazes de responder sobre a própria fé, mediante palavra simples e

sem temor.284

A comunidade do amor e da verdade deve na sua ação apostólica transbordar as

torrentes e os rios caudalosos da graça de Deus de que dispõe. Isto somente irá

acontecendo saindo. Saindo para acolher, saindo pelas estradas da vida:

“Saiamos, saiamos para oferecer a todos a vida de Jesus Cristo!

Repito aqui, para toda a Igreja, aquilo que muitas vezes disse aos

sacerdotes e aos leigos de Buenos Aires: prefiro uma Igreja

acidentada, ferida e enlameada por ter saído pelas estradas, a uma

Igreja enferma pelo fechamento e a comodidade de se agarrar às

próprias seguranças. Não quero uma Igreja preocupada com ser o

centro, e que acaba presa num emaranhado de obsessões e

procedimentos. Se alguma coisa nos deve santamente inquietar e

preocupar a nossa consciência é que haja tantos irmãos nossos que

vivem sem a força, a luz e a consolação da amizade com Jesus Cristo,

sem uma comunidade de fé que os acolha, sem um horizonte de

sentido e de vida. Mais do que o temor de falhar, espero que nos mova

o medo de nos encerrarmos nas estruturas que nos dão uma falsa

proteção, nas normas que nos transformam em juízes implacáveis, nos

hábitos em que nos sentimos tranquilos, enquanto lá fora há uma

multidão faminta e Jesus repete-nos sem cessar: «Dai-lhes vós

mesmos de comer» (Mc 6, 37).285

É dentro desta cultura do encontro que o caráter testemunhal da vida dos cristãos

torna-se um meio indispensável a nova evangelização pois a “evangelização não se

realiza só através da pregação pública do Evangelho, nem unicamente através das

obras de relevância pública, mas também por meio do testemunho pessoal, que é

sempre uma via de grande eficácia evangelizadora”.286

3.3 KAIRÓS: Um novo encontro pessoal com Jesus Cristo na Igreja

284

L‟ Osservatore Romano. Cardeal Jean-Louis Tauran, Presidente do Pontifício Conselho para o

Diálogo Inter-Religiosos (Cidade do Vaticano), sábado 27 de Outubro de 2012, número 43, p. 6. 285

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium. Exortação Apostólica. São Paulo: Paulus-Loyola, 2013, I,

§ 49, p. 34-35. 286

CONGREGAÇÃO PARA DOUTRINA DA FÉ. Nota Doutrinal sobre alguns Aspectos da

Evangelização. São Paulo: Paulinas, 2007, p. 21.

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O caráter pessoal do cristianismo se configura a partir do encontro pessoal com

Jesus Cristo e da relação com Ele. Esta dimensão do encontro tem sua especificidade na

experiência de conversão. A conversão é o chamado de Deus para que o homem

caminhe na sua companhia, e este caminhar se dá “com” e “na” Igreja. A Igreja é o

“Locus” do encontro com Jesus Cristo. Esta “communio” é a sinalização testemunhal

do serviço de amor que a Igreja realiza como meio eficaz na evangelização.287

É

justamente dentro desta comunhão eclesial que escutamos o convite da Igreja na Pessoa

do Papa Francisco: “Convido todo o cristão, em qualquer lugar e situação que se

encontre, a renovar hoje mesmo o seu encontro pessoal com Jesus Cristo ou, pelo

menos, a tomar a decisão de se deixar encontrar por Ele, de procurá-lo dia a dia sem

cessar”.288

A nova evangelização propõe uma hermenêutica de continuidade no que se

refere à vivência da própria fé e adesão a Pessoa de Jesus Cristo. Outro elemento

importante a ser enfrentado é a separação intelectual e ideológica de Cristo e de sua

Igreja. Algo que seria de difícil compreensão e o que dificultaria uma adesão plena ao

evangelho e ao programa apresentado por Cristo que passa pela sua Igreja, pois, “a

Igreja é em Cristo, o sacramento, ou seja, o sinal e o instrumento da união intima com

Deus e da unidade de todo o gênero humano”.289

Dentro desta mesma reflexão

encontramos uma abertura a superação de toda a forma de individualismo produzido de

modo exacerbado pela secularização como se cada pessoa tivesse que receber um acento

especial no que lhe é particular desconectando assim a pessoa do todo da sociedade o

que minimiza os relacionamentos pessoais.

Ao refletirmos sobre o conceito de evangelização devemos ter claro que este

conceito se esclarece à medida que cresce na pessoa o evento e o acontecimento do

encontro com a pessoa de Jesus Cristo. A dimensão eclesiológica da Igreja aqui se

demonstra em sua fundamental importância. O encontro com a pessoa de Jesus remete a

pessoa a sua família que é a Igreja. Tornar-se discípulo seguidor de Jesus significa

287

L‟ Osservatore Romano. D. Leo Laba Ladjar, O.F.M. Bispo de Jayapura( indonésia), sábado, 3 de

novembro de 2012, número 44, p, 16. 288

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium. Exortação Apostólica. São Paulo: Paulus-Loyola, 2013, §

3, p. 8. 289

SÍNODO DOS BISPOS. Instrumentum Laboris.A nova evangelização para a transmissão da fé.

Brasília: CNBB, 2012, I, § 27, p.37.

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inserir-se nesta grande família espiritual que tem como fundamento tornar de modo

claro a presença do Reino de Deus através da vida e da missão dos cristãos neste

mundo: “A obra de evangelização consiste em repropor ao coração à mente, não pouca

vezes distraídos e confundidos, dos homens e das mulheres do nosso tempo, antes de

tudo a nós mesmos, a beleza e a novidade perene do encontro com Cristo.”290

Este fortalecimento da própria vida cristã é um caminho eficaz e um instrumento

necessário para nova evangelização. Um caminho que se resumisse somente numa via

intelectual se demonstraria insuficiente, é necessário “um contato pessoal com o Deus

vivo”291

verdadeiro promotor da vida nova.

Para uma nova guinada na maneira de compreender a fé cristã e sobre sua

incidência na vida humana nos deparamos com dois dos problemas que são atualmente

claramente verificáveis que são justamente o limite entre abraçar a fé em Jesus Cristo e

o inteirar-se de uma fé que passa também pelo circuito institucional. Um fenômeno

aparentemente insignificante, mas que a cada ano toma proporções maiores é justamente

o fenômeno dos “novos cristãos”, ou seja, daquelas pessoas que até se propõe a iniciar

um caminho espiritual, contudo se veem profundamente perplexos quando este caminho

quase que necessariamente precisa passar pelo caminho da instituição. Sabemos, porém

que é necessário que existam alguns sinais para identificar a necessária eclesiologia para

um desenvolvimento harmônico da própria caminhada de fé dentro de um ambiente

favorável ao desenvolvimento da própria vivência cristã: A Igreja é o espaço em que

Cristo se oferece ao ser humano na história para o poder encontrar, porque ele lhe

confiou a sua Palavra, o Batismo que nos torna Filhos de Deus, o seu Corpo e o seu

Sangue, a graça do perdão do pecado, sobretudo no sacramento da reconciliação, a

experiência da Comunhão que é reflexo do próprio mistério da Santíssima Trindade, a

força do Espírito que gera caridade para com todos.”292

Entretanto, é importante

compreender que a dilatação do Reino de Deus acontece mesmo frente as fragilidade

humanas seja dos Pastores da Igreja, assim como as de todo o povo de Deus: “Sabemos

que devemos reconhecer humildemente a nossa vulnerabilidade ás feridas da história e

não hesitemos em reconhecer os nossos pecados pessoais. Estamos também

290

L‟ Osservatore Romano. Sábado 03 de novembro de 2012, número 44, p. 06. 291

L‟ Osservatore Romano. Cardeal Zenon Grocholewsk, Prefeito da Congregação para a Educação

Católica (Cidade do Vaticano), sábado 20 de outubro de 2012, número 42, p. 13. 292

L´ Osservatore Romano. Sábado 3 de novembro de 2012, número 44, p. 6.

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121

convencidos de que a força do Espírito do Senhor pode renovar a sua Igreja e tornar

esplendorosa a sua veste, se nos deixarmos plasmar por ele.293

A igreja por sua vez como serva do evangelho não pode se omitir frente às

urgências que lhe são colocadas e que lhe evocam o cumprimento da sua própria missão

que é anunciar o evangelho: “A Igreja está envolvida neste movimento de Auto-

revelação Divina que começa com a Bem-Aventurada Virgem Maria quando sob a ação

do Espírito Santo, recebe no seu seio a Palavra de Deus que se encarnou nela para

poder se dar ao mundo inteiro”.294

3.4 Em torno da Palavra

O conteúdo programático da nova evangelização será tanto mais eficiente quanto

mais for capaz de se fazer em torno da Palavra de Deus. A nova evangelização terá

como auxilio fundamental o uso das Sagradas Escrituras, em unidade com os

sacramentos e os diversos aspectos da vida cristã.295

Fora recordado no Sínodo a grande paixão que tinham os Padres da Igreja pelas

Sagradas Escrituras e suas interpretações. Os seus comentários bíblicos são místicos,

totalizadores, mistagógicos, simbólicos e alegóricos. Sobretudo, suas homilias

catequéticas. Além disso, serviam da poesia como melhor instrumento de

evangelização.296

Um dos pontos fundamentais desta renovada aproximação da Palavra de Deus é

a atitude de escuta: “A evangelização não começa com a pregação, mas com a escuta.”

297 . É na escuta da Palavra que somos gerados: “A Palavra de Deus é o ventre do nosso

ser, e para encontrar a „novidade‟ tão desejada, para a evangelização do presente,

293

Ibidem, p. 6. 294

L‟ Osservatore Romano. Cardeal Wuerl, O relatório post disceptationem, sábado 27 de Outubro de

2012, número 43, p.4. 295

L‟ Osservatore Romano. D. Ricardo Blasquez Péres, Arcebispo de Valladolid (Espanha), 27 de

outubro de 2012, número 43, p. 9. 296

L‟ Osservatore Romano. D. Joseph Kallarangatt, Bispo de Palai dos Sírios Malabares (Índia), sábado

27 de Outubro de 2012, número 43, p 8. 297

L‟ Osservatore Romano. Sua Excelência Leo Makkonen, Arcebispo de Karelia e de toda Finlândia,

Patriarcado Ecumênico, sábado 27 de Outubro de 2012, número 43, p. 14.

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devemos voltar a este lugar original do nosso ser. A Palavra tornada é „espírito e vida‟,

este é o lugar.” 298

A evangelização é a pregação da Palavra, a qual é a resposta á Palavra

transmitida por Deus e, portanto, é uma realidade Divino-humana expressa sob forma

interpessoal.299

A nova evangelização é um acontecimento que tem a Palavra de Deus como uma

referência insubstituível, pois é por meio desta palavra que a Igreja se consolida, pois

ela é o coração de toda atividade eclesial:

“Não é só a homilia que se deve alimentar da Palavra de Deus. Toda

a evangelização está fundada sobre esta Palavra escutada, meditada,

vivida, celebrada e testemunhada. A Sagrada Escritura é fonte da

evangelização. Por isso, é preciso formar-se continuamente na escuta

da Palavra. A Igreja não evangeliza se não se deixa continuamente

evangelizar. É indispensável que a Palavra de Deus «se torne cada

vez mais o coração de toda a atividade eclesial».A Palavra de Deus

ouvida e celebrada, sobretudo na Eucaristia, alimenta e reforça

interiormente os cristãos e torna-os capazes de um autêntico

testemunho evangélico na vida diária. Superamos já a velha

contraposição entre Palavra e Sacramento: a Palavra proclamada,

viva e eficaz, prepara a recepção do Sacramento e, no Sacramento,

essa Palavra alcança a sua máxima eficácia.”300

3.4.1 O lugar da homilia na nova evangelização

Na esteira do sínodo dos Bispos sobre a da Palavra de Deus na vida e na missão

da Igreja ocorrido em 2008, temos também uma preciosa contribuição, e no Sínodo de

2012 sobre a nova evangelização e a transmissão da fé cristã o relevante imperativo do

anúncio evangélico no mundo de hoje. O sínodo dos Bispos de 2008 ressaltou a

importância do contexto litúrgico como o lugar por excelência da proclamação da

Palavra de Deus, também o sínodo dos Bispos de 2012 ressaltou a importância de 298

L‟ Osservatore Romano. D. Vincent Ri Pyungi-ho, Bispo de Jeonju (Coréia), Sábado 17 de

Novembro de 2012, número 46, p. 18. 299

L‟ Osservatore Romano. D. Tarassenkiu, O.M., Bispo titular de Sccenna, Auxiliar Proto-sincelo e

administrador Apostólico “Ad nutum sanctae sedis” de Stryj dos Ucranianos (Ucrânnia), sábado 10 de

novembro de 2012, numero 45, p. 18. 300

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium. Exortação Apostólica. São Paulo: Paulus-Loyola, 2013,

III, § 174, p. 103.

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potencializar a homilia: “Potencializar o a missa Dominical, a fim de que seja o ponto

de referência para a nova evangelização”.301

O anúncio do evangelho por meio da homilia no contexto litúrgico merece uma

atenção particular e uma renovação decisiva. As pregações nas nossas Igrejas com

frequência perdem o caráter querigmático, e, portanto, já não tem a força do evangelho

(Rm 1,16) e a eficácia da Palavra de Deus.302

A homilia capacita a Igreja a “ver” em

Jesus o mestre que ensina pela palavra e pelos gestos o estilo de Deus:

“A celebração do Domingo [...] Cada semana aprendemos palavras e

gestos do mestre, para viver em família, no bairro, no lugar de

trabalho e de estudo. Uma preparação atenta da liturgia e dos sinais

da celebração constitui a melhor catequese para os fiéis; por isso, a

proclamação bíblica e os cânticos devem conduzir-nos a uma

participação consciente, ativa e frutuosa que nos encha o espírito

para a missão.”303

A homilia fora vista como um local nuclear na Igreja de onde a Palavra de Deus

encontra toda uma eficácia e uma proposta pertinente aqueles que participam da

celebração eucarística, mas é também um modo de compreender a sintonia do Pastor

local com o coração de sua comunidade:

“A homilia é o ponto de comparação para avaliar a proximidade e a

capacidade de encontro de um Pastor com o seu povo. De fato,

sabemos que os fiéis lhe dão muita importância; e, muitas vezes, tanto

eles como os próprios ministros ordenados sofrem: uns a ouvir e os

outros a pregar. É triste que assim seja. A homilia pode ser,

realmente, uma experiência intensa e feliz do Espírito, um consolador

encontro com a Palavra, uma fonte constante de renovação e

crescimento”.304

301

L‟ Osservatore Romano. Cardeal Luiz Martínez Sistach, Arcebispode Barcelona (Espanha), sábado 3

de Novembro de 2012, número 44, p. 22. 302

L‟ Osservatore Romano. Sua Beatitude Sui Atolslav Sche Uchuuk, Arcebispo Mor de Hyiu-Halyc,

chefe do Sínodo da Igreja Greco-católica Ucraniana, sábado 27 de Outubro de 2012, número 43, p. 16. 303

L‟ Osservatore Romano. D. Salvador Pineiro Gárcia-Calderón, Arcebispo de Ayacucho (Peru),

sábado 20 de Outubro de 2012, número 42, p. 11. 304

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium. Exortação Apostólica. São Paulo: Paulus-Loyola, 2013,

III, §135, p. 82.

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124

Um dos temas programáticos na Exortação Apostólica Evangelii Gaudium é

sobre a singular importância da homilia e também da pessoa do pregador. Isto sinaliza a

valor conferido pelo sumo Pontífice Papa Francisco a este ministério na Igreja que fora

minimizado ou por vezes encontrou-se desqualificado ou sem a pertinência oportuna,

também no que se refere à nova evangelização. A temática da Homilia, da pregação, da

pessoa do pregador é tomada de modo sentida pelo sumo pontífice o que o fez dedicar

25 parágrafos sobre o tema tentando trazer novamente o ministério da palavra ao centro

de importância no ambiente eclesial principalmente diante desta situação emergente em

que a Igreja se encontra diante do grande desafio de harmonizar o conteúdo

programático do grande mosaico de doutrinas e conteúdos, ou seja, o seu depósitum

Fidei dentro de uma síntese evangélica apropriada ao contexto de mundo em que

vivemos:

. O desafio duma pregação inculturada consiste em transmitir a

síntese da mensagem evangélica, e não ideias ou valores soltos. Onde

está a tua síntese, ali está o teu coração. A diferença entre fazer luz

com sínteses e o fazê-lo com ideias soltas é a mesma que há entre o

ardor do coração e o tédio. O pregador tem a belíssima e difícil

missão de unir os corações que se amam: o do Senhor e os do seu

povo. O diálogo entre Deus e o seu povo reforça ainda mais a aliança

entre ambos e estreita o vínculo da caridade. Durante o tempo da

homilia, os corações dos crentes fazem silêncio e deixam-No falar a

Ele. O Senhor e o seu povo falam-se de mil e uma maneiras

diretamente, sem intermediários, mas, na homilia, querem que alguém

sirva de instrumento e exprima os sentimentos, de modo que, depois,

cada um possa escolher como continuar a sua conversa. A palavra é,

essencialmente, mediadora e necessita não só dos dois dialogantes

mas também de um pregador que a represente como tal, convencido

de que «não nos pregamos a nós mesmos, mas a Cristo Jesus, o

Senhor, e nos consideramos vossos servos, por amor de Jesus» (2 Cor

4, 5).305

Todo pregador consciente de sua instrumentalidade enquanto, meio pelo qual

Deus se comunica com o seu povo deve manter de modo profundo uma

intencionalidade de comunicar à vida que vem do Espírito Santo. A colaboração entre

pregador e a Pessoa do Espírito Santo deve ser uma abertura onde a co-responsabilidade

305

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium. Exortação Apostólica. São Paulo: Paulus-Loyola, 2013,

III, § 143, p. 86.

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de se preparar não sufoca a abertura interior e a atenção ao mistério de Deus da parte do

mesmo pregador:

“A confiança no Espírito Santo que atua na pregação não é

meramente passiva, mas ativa e criativa. Implica oferecer-se como

instrumento (cf. Rm12, 1), com todas as próprias capacidades, para

que possam ser utilizadas por Deus. Um pregador que não se prepara

não é «espiritual»: é desonesto e irresponsável quanto aos dons que

recebeu”.306

Todo aquele que diante do chamado do Senhor se dispuser a anunciar o

evangelho deve manter uma contínua familiaridade com a Palavra de Deus para que o

próprio pregador seja o primeiro a estar embebido e de certo modo impregnado da

Palavra, por um contínuo estudo, meditação e leitura orante, desta mesma Palavra:

“O pregador «deve ser o primeiro a desenvolver uma grande

familiaridade pessoal com a Palavra de Deus: não lhe basta conhecer

o aspecto linguístico ou exegético, sem dúvida necessário; precisa de

se abeirar da Palavra com o coração dócil e orante, a fim de que ela

penetre a fundo nos seus pensamentos e sentimentos e gere nele uma

nova mentalidade». Faz-nos bem renovar, cada dia, cada domingo, o

nosso ardor na preparação da homilia, e verificar se, em nós mesmos,

cresce o amor pela Palavra que pregamos. É bom não esquecer que,

«particularmente, a maior ou menor santidade do ministro influi

sobre o anúncio da Palavra». Como diz São Paulo, «falamos, não

para agradar aos homens, mas a Deus que põe à prova os nossos

corações» (1 Ts 2, 4). Se está vivo este desejo de, primeiro, ouvirmos

nós a Palavra que temos de pregar, esta transmitir-se-á duma

maneira ou doutra ao povo fiel de Deus: «A boca fala da abundância

do coração» (Mt 12, 34). As leituras do domingo ressoarão com todo

o seu esplendor no coração do povo, se primeiro ressoarem assim no

coração do Pastor”.307

Outro passo importante sinalizado pela Exortação Apostólica Evangelii

Gaudium é que o pregador se deixe interpelar no profundo de sua consciência e de seu

306

Ibidem, 145, p. 87. 307

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium. Exortação Apostólica. São Paulo: Paulus-Loyola, 2013,

III, § 149, p. 89.

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coração por esta mesma Palavra. Saber ambientar a Palavra dentro de seu contexto

confrontá-la com a própria vida e lançando um olhar sobre a realidade da própria

comunidade em que vive deve ele o pregador carregar a mensagem de Deus que ilumina

e dá sabor as realidades humanas e espirituais que habitam no pessoal e no coletivo das

circunstâncias eclesiais e sociais que o envolvem:

“Na presença de Deus, numa leitura tranquila do texto, é bom

perguntar-se, por exemplo: «Senhor, a mim que me diz este texto?

Com esta mensagem, que quereis mudar na minha vida? Que é que

me dá fastídio neste texto? Porque é que isto não me interessa?»; ou

então: «De que gosto? Em que me estimula esta Palavra? Que me

atrai? E porque me atrai?”.308

.

O ministério do anúncio do evangelho carrega em si outra dimensão significativa

que é a contemplação. A esfera contemplativa que permeia o conhecimento da

mensagem sagrada convida o pregador a ser ele também um contemplativo da Palavra

atento à vida concreta do povo a quem ele anuncia esta mesma palavra:

“Um pregador é um contemplativo da Palavra e também um

contemplativo do povo. Desta forma, descobre as aspirações, as

riquezas e as limitações, as maneiras de orar, de amar, de encarar a

vida e o mundo, que caracterizam este ou aquele aglomerado

humano, prestando atenção ao povo concreto com os seus sinais e

símbolos e respondendo aos problemas que apresenta”.309

3.4.2 O Ministério catequético

Notou-se desde o início das discussões de preparação e no desenvolvimento das

pautas do sínodo uma insistência em buscar uma compreensão mais profunda sobre uma

instituição de um ministério catequético na Igreja como uma forma de estabelecer uma

308

Ibidem, III, § 153, p. 92. 309

Ibidem, III, § 154, p. 93.

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permanente tarefa onde houvesse um empenho maior na formação dos catequistas para

uma melhor realização do ensino da fé cristã.310

A Igreja reconhece o lugar específico e particular de cada catequista na tarefa de

transmitir a fé e educar para a vida cristã, e de modo totalmente especial podem os

catequistas oferecer uma importante contribuição para a nova evangelização. O Sínodo

procurou refletir sobre a profundidade desta tarefa e a urgência de dar a este ministério

maior estabilidade, visibilidade ministerial e formação.311

Essas mudanças poderiam

traduzir-se na formação de grupos pastorais compostos por presbíteros e leigos, como

reflexão e reconhecimento oficial dos ministros eclesiais leigos, também mediante uma

participação deliberada e sistemática das mulheres, conferindo-lhes ser designadas

como leitoras e ministrantes e constituindo o ministério do catequista.312

O sínodo foi contundente em reconhecer o possível ministério do catequista

como um precioso recurso para a transmissão da fé neste momento de evangelização em

que a Igreja vive.313

No livro Anunciar o Evangelho: Mensagens aos catequistas vemos

de modo contundente como o até então Cardeal Jorge Mario Bergoglio falando num

tom coloquial expressa a grandeza da vocação do ministro da catequese:

“Detrás de cada catequista, de cada um de vocês, há um chamado,

uma eleição, uma vocação. Esta é uma verdade fundadora de nossa

identidade: fomos chamados por Deus, eleitos por Ele. Cremos e

confessamos a iniciativa de amor que há na origem do que somos.

Nós reconhecemos como dom, como graça [...]”.314

3.4.3 Os meios de comunicação e a Nova evangelização

310

L‟ Osservatore Romano. Cardeal Wuerl, O relatório post disceptationem, sábado 27 de Outubro de

2012, número 43, p. 5. 311

L‟ Osservatore Romano. D. Sérgio da Rocha, Arcebispo de Brasília (Brasil), sábado 27 de Outubro

de 2012, número 43, p. 8-9. 312

L‟ Osservatore Romano. D. Brian Joseph Dunn, Bispo de Antigunish (Canadá), sábado 27 de

outubro, número 43, p. 19. 313

L‟ Osservatore Romano. D. Patrick Christopher Pinder, Arcebispo de Nassau (Bahamas), Presidente

da Conferência Episcopal (Antilhas), 27 de outubro de 2012, número 43, p. 20. 314

BERGOGLIO, J.M. Anunciar o Evangelho (mensagem aos catequistas) .Campinas: CEDET, 2013,

p. 43.

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Um dos novos métodos e expressões que a Igreja lança mão nos últimos

decênios fora justamente os meios de comunicação. O adentramento da presença da

Igreja na internet através do lançamento do documento Eclesia in Oceania constata que

a Igreja quis e quer se fazer cada vez mais presente através das vias eletrônicas para

levar ao coração do homem contemporâneo a mensagem do evangelho.315

É fundamental, para a eficácia da nova evangelização, um profundo

conhecimento atual na qual os meios de comunicação social têm grande influência.

Portanto, conhecer e usar estes meios quer nas suas formas tradicionais quer nas mais

recentes introduzidos pelo progresso tecnológico são indispensáveis:

“Os novos Mass Media mudam radicalmente a nossa cultura e

oferecem novos percursos para partilhar a mensagem do evangelho.

A arena digital não é um espaço „virtual‟ menos importante que o

mundo „real‟ e, se a boa nova não for proclamada também

„digitalmente, corremos o risco de abandonar muitas pessoas, para

as quais este é o mundo em que „vivem‟.A Igreja já esta presente no

espaços digitais, mas o próximo passo é mudar nosso estilo

comunicativo para tornar eficiente esta presença. Temos que

valorizar as „vozes‟ aos numerosos católicos presentes nos blogs,

para que possam evangelizar e apresentam o ensinamento da Igreja.

A Igreja é chamada a um diálogo no respeito de todos, explicando-

lhes a razão da própria esperança”.316

A Igreja para ser evangelizadora deve ser mediática. Na nova cultura

secularizada os meios de comunicação social devem ser capazes de ajudar a Igreja a ser

deveras evangelizadora e missionária, em correspondência dos tempos, quando é

necessário não só batizar os convertidos, mas também converter os batizados.317

4 A Igreja: Uma comunidade do testemunho a favor e em defesa da vida

315

L‟ Osservatore Romano. Relatório de D. John Atcherley Dew Arcebispo de Wellington, sábado 20

de Outubro de 2012, número 42, P.8. 316

L‟ Osservatore Romano. D. Claudio Maria Celli, Arcebispo Titular de Civitanova, Presidente do

Pontifício conselho de comunicações Sociais (Cidade do Vaticano), sábado 10 de novembro de 2012,

número 45, p. 19. 317

L‟ Osservatore Romano. D. Tadeusz Kondrusiewicz, Arcebispo de Minsk-mohilev (Bielo-Rússia),

sábado 27 de outubro de 2012, número 43, p. 14.

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Queremos abordar aqui a importância que teve desde o início da Igreja as

manifestações elevadas de amor a vida que deram muitos dos cristãos que nos

precederam. O testemunho do martírio ilumina hoje a ação de cada cristão para que na

defesa da vida possa também ofertar a própria vida em causas que sejam elevada como

ensina-nos o Senhor no evangelho: “Ninguém tem maior amor do que aquele que dá a

vida por seus amigos” (Jo 15, 13). É nesse amor aos irmãos que somos interpelados

como Igreja a irmos procurar o encontro com cada homem, de modo particular no

caminho do seu sofrimento.318

Na história a “profissão e a confissão” da fé são tangíveis na vida doada dos

pastores, sacerdotes e religiosos; mas também é precisos realçar dos fiéis leigos, das

suas famílias. Sendo o martírio a forma mais explícita e convincente de transmissão da

fé, devemos também nos questionar “Em que ponto a nossa não credibilidade se torna

contra testemunho para os outro? Com efeito, a fé nunca pode fechar-se na dimensão

pessoal, porque o testemunho do cristão por natureza é público.”319

4.1 Redescobrir a sacralidade da família

Um dos pontos cardeais que devem nortear a nova evangelização é a

redescoberta da sacralidade da família. A vida matrimonial apresentada na sua beleza

dos vínculos matrimoniais tem por outro lado a critica secularista das ideologias na

contemporaneidade que atacam de maneira frontal a santidade da família. O divórcio,

outrora, considerado um tabu, agora já não é tão insólito. Começaram a se levantarem

várias vozes contra a santidade do matrimônio.320

A Igreja reconhece que a família é o

lugar no qual se forja o futuro da humanidade e se concretiza a fronteira decisiva da

nova evangelização.321

A renovação da vida familiar deve ser tomada como uma das prioridades

principais para a conservação da família no mundo ocidental. O sacramento do

318

L‟ Osservatore Romano. Pe. Renato Salvatore, M.I, Superior-Geral dos clérigos regulares ministros

dos enfermos (camilianos), 27 de Outubro de 2012, número 43, p. 11. 319

L‟ Osservatore Romano. Cardeal Josip Boazanic, Arcebispo de Zagrábia (Croácia), 3 de novembro

de 2012, número 44, p. 20. 320

L‟ Osservatore Romano. Relatório do Cardeal Oswald Gracias Arcebispo de Bombaim, Sábado 20

de outubro de 2012, número 42, p.10. 321

L‟ Osservatore Romano. D. Nicolas John Lola. Sábado 20 de Outubro de 2012, número 42, p.14.

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130

matrimônio é precioso para a Igreja, pois as famílias não são apenas um lugar

privilegiado de missão, mas elas são também agentes de missão dentro do tecido

eclesial e social. São assim comunicadoras de valores de fé e humano para outras

famílias.322

O Sínodo percebeu que em grande parte o futuro da evangelização passa pela

família, ou seja, da Igreja doméstica. Isto apresenta a urgência de acompanhar as

famílias que passam por diversas dificuldades a ponto de desenvolver e fortalecer uma

pastoral do acompanhamento dos matrimônios e das famílias. Vemos que a família não

é posta em questão não só como modelo cristão. Foi-lhe tirado o valor ou colocada num

plano de concepções que obedecem a interesses ideológicos de alguns grupos.323

A valorização da vida após a concepção é uma causa na qual a Igreja reconhece

a importância primordial de proteger e promover a própria vida humana. Uma proposta

de valorização da própria vida é a sugestão que fora dada no sínodo de abençoar a

criança no ventre materno e orientar ao mesmo tempo um oportuno acompanhamento

até o batismo.324

Isto leva a Igreja como comunidade de fé a se colocar na defesa da

vida: desde sua concepção até o seu desfalecimento biológico.

O futuro de uma nova evangelização conta com o auxílio em grande parte da

família que verdadeiramente assumiram os valores da fé cristã, e propriamente dizendo

o ser cristão. É perceptível em nossos dias como a “deflagração da família surge como

o problema número um da sociedade contemporânea, mesmo se poucos se dão conta

disso”.325

Na contemporaneidade a Igreja é convocada a ter um rosto de família. A futura

evangelização depende em grande parte da Igreja doméstica. Em muitas partes do

mundo encontramos uma infecundidade pastoral, não é porventura porque nos tornamos

mais instituição do que família?326

322

L‟ Osservatore Romano. Pe. Heinrich Walter, Superior Geral dos Padres de Schönstt, sábado 3 de

novembro de 2012, numero 44, p. 17. 323

L‟ Osservatore Romano. D. Eusébio Ramos Morales, Bispo de Fajardo-Humacao (Porto Rico),

sábado 3 de novembro de 2012, número 44, p. 22. 324

L‟ Osservatore Romano. D. Joseph Edward Kurtz, Arcebispo de Louisville, Vice-Presidente da

Conferência Episcopal dos Estados Unidos da América, sábado 20 de outubro de 2012, número 42, p. 15. 325

L‟ Osservatore Romano. D. Vincenzo Paglia, Arcebispo Emérito de Terni-Narni-Amelia (Itália),

Presidente do Pontifício Conselho para a Família ( Cidade do Vaticano), sábado 3 de novembro de 2012,

número 44, p. 21. 326

Ibidem, p. 21.

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131

Outro ponto referente à família que deve ser de fundamental importância é o

acompanhamento daquelas que estão em situação irregular e os “recasados” como

superar a incompreensão e buscar uma proximidade com estes sem permitir-lhes

estarem distante da misericórdia de Deus.327

A família transmite a fé com o coração, com a vida e com a prática. Ela é o

ambiente primeiro onde se comunica os verdadeiros valores de vida e de fé:

“A nova evangelização terá sucesso se conseguir restituir a

sacralidade do matrimônio que é o lar familiar do amor, assim

como a família torna-se a pequena Igreja. Posso afirmar que se

transmite a fé muito mais com que se é do que com o que diz. A

verdade da vida é que nos sacrificamos pelo que amamos e, se

for necessário, até morremos. Aquilo pelo qual estamos prontos

a dar a vida nunca pode morrer, porque a força do amor é mais

forte do que a morte”.328

A defesa da vida não pode ser apenas uma pauta na agenda eclesial, mas deve se

constituir verdadeiramente uma das causas centrais da diaconia, da caridade, do serviço

que a Igreja oferece a vida humana. Serviço este que é sinal eminente de seu amor a

humanidade:

“A consciência da sacralidade da vida que nos foi confiada, não

como algo que se possa dispor livremente, mas como dom a guardar

fielmente, pertence a herança moral da humanidade.[...] A morte da

pessoa amada é, para quem ama, o acontecimento mais absurdo que

se possa imaginar: aquela é incondicionalmente digna de viver, é bom

e belo que exista. Entretanto, a mesma morte da pessoa aparece, aos

olhos de quem não ama, como um acontecimento natural, lógico (não

absurdo). Quem têm razão? Aquele que ama („a morte desta pessoa é

absurda‟) ou que não ama („a morte desta pessoa é lógica‟)? A

primeira posição só é defensível se cada pessoa for amada por um

poder infinito; e aqui está o motivo por que foi preciso apelar a Deus.

De fato, quem ama não quer que a pessoa amada morra; e, se

pudesse, impedilo-ia sempre. Se pudesse. O amor finito é importante;

o amor infinito é onipotente. Ora, está é a certeza que a Igreja

anuncia „tanto amou Deus o mundo, que lhe entregou o seu filho

327

L‟ Osservatore Romano. D. José Ulloa Mendieta, O.S.A, Arcebispo de Panamá (Panamá) ,sábado, 3

de novembro de 2012, número 44, p. 18. 328

L‟ Osservatore Romano. Cardeal Vinko Puljic, Arcebispo de Urhbosna (Bósnia-Herzegovina),

sábado 27 de Outubro de 2012, número 43, p. 8.

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132

unigênito, a fim de que todo o que nele crê não se perca, mas tenha a

vida eterna‟(Jo 3, 16). Sim! Deus ama a cada pessoa e, por isso, é

incondicionalmente digna de viver.”329

O amor maturado e bem orientado na relação matrimonial é uma colaboração

para redescobrir de maneira essencial o benéfico relacionamento e desenvolvimento do

amor entre os esposos e sua vivência no contexto social:

“A família atravessa uma crise cultural profunda, como todas as

comunidades e vínculos sociais. No caso da família, a fragilidade dos

vínculos reveste-se de especial gravidade, porque se trata da célula

básica da sociedade, o espaço onde se aprende a conviver na

diferença e a pertencer aos outros e onde os pais transmitem a fé aos

seus filhos. O matrimônio tende a ser visto como mera forma de

gratificação afetiva, que se pode constituir de qualquer maneira e

modificar-se de acordo com a sensibilidade de cada um. Mas a

contribuição indispensável do matrimônio à sociedade supera o nível

da afetividade e o das necessidades ocasionais do casal. Como

ensinam os Bispos franceses, não provém do sentimento amoroso,

efêmero por definição, mas da profundidade do compromisso

assumido pelos esposos que aceitam entrar numa união de vida

total”.330

4.2 A família célula fundamental a ser valorizada

Desde a primeira evangelização a transmissão de a fé no suceder-se das gerações

encontrou um lugar natural nas famílias:

“Não escondemos o fato de que hoje a família, que se constitui no

matrimônio de um homem e de uma mulher, que os torna “uma só

carne” (Mt 19, 6) aberta a vida, é atravessada em toda a parte por

fatores de crise, circuncidada por modelos de vida que a penalizam,

descuidadas pelas políticas daquela sociedade da qual é conteúdo a

célula fundamental, nem sempre respeitada nos seus ritmos nem

apoiadas nos seus compromissos pelas comunidades eclesiais. Mas

precisamente isto nos estimula a dizer que devemos ter uma solicitude

329

BENTO XVI. Mensagem aos participantes no Átrio dos Gentios em Portugal, L‟Osservatore

Romano.sábado 17 de novembro de 2012, número 46, p. 12-13. 330

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium. Exortação Apostólica. São Paulo:Paulus-Loyola, 2013, II,

§ 66, p.46.

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133

particular para com a família e pela sua missão na sociedade e na

Igreja”.331

A nova evangelização vê nesta célula fundamental para ao desenvolvimento da

vida humana um lugar privilegiado para comunicar os valores da fé e ao mesmo tempo

percebe certa indiferença no que se refere a um importante acompanhamento, para que

os horizontes onde a vida humana se dá no ambiente familiar não sejam relativizados:

“A vida familiar é o primeiro lugar no qual o Evangelho se encontra

com o dia-a-dia da vida e mostra a sua capacidade de transfigurar as

condições fundamentais da existência no horizonte do amor. Mas é

importante também para o testemunho da Igreja mostrar como esta

vida no tempo tem um cumprimento que vai além da história dos

homens e alcança a comunhão eterna com Deus”.332

4.3 A nova evangelização e os caminhos da educação

A educação sempre fora vista pela Igreja como um caminho excelente de

desenvolvimento integral do ser humano. As escolas constituem um terreno fértil para a

nova evangelização, porque oferece a possibilidade de voltar a inserir as famílias na

vida da Igreja.333

O Sínodo foi um momento de reflexão e de percepção do importante

papel da educação na nova evangelização e para compreender que o seu descuido torna-

se espaço para o domínio e imposição de várias ideologias:

“A situação atual de descristianização progressiva da velha Europa

depende, entre outros, de dois processos inegáveis ligados entre si,

são: A estatização do direito e a Estatização das escolas. De fato, as

escolas e as universidades (inclusive católicas), estão cada vez mais

submetidas ao controle dos estados. O cavalo de Tróia, através do

qual os estados se apropriam das inteligências dos estudantes, é a

formação dos professores. A Progressiva descristianização do

Ocidente aconteceu desta forma, através da descristianização das

escolas e das Universidades. Uma nova evangelização deverá tratar

com urgência e prioridade do bom funcionamento das escolas e das

331

L‟ Osservatore Romano. 3 de novembro de 2012, número 44, P, 7. 332

Ibidem, p. 7. 333

L´Osservatore Romano. Relatório de D. John Atcherley Dew. Sábado 20 de Outubro de 2012,

número 42, p.8.

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universidades em geral, mas de modo particular das católicas. Um

projeto de evangelização que pudesse em segundo lugar- ou pior

descuida-se o papel insubstituível das escolas, correria o risco de

falir”.334

No Caminho proposto pela nova evangelização a educação encontra-se como

uma realidade constitutiva. Por isso a emergência educativa é também uma emergência

de evangelização.335

As escolas católicas não se apresentam no contexto da nova

evangelização apenas como lugares de formação intelectual e humana, mas são lugares

oportunos que oferecem a possibilidade de inserir as famílias na vida da Igreja.336

Esta presença da Igreja nos meio escolares e universitários é novamente proposta

para que aqueles que na Igreja consagram grande tempo de sua existência ao ensino e ao

estudo, e ao mesmo tempo vivendo a sua fé nos ambientes intelectuais encontram nos

meios acadêmicos os novos areópagos onde anunciar o evangelho. Dentre as propostas

apresentadas no sínodo viu-se a necessidade de um renovado testemunho através do

encontro pessoal com Jesus Cristo, a fim de que os jovens vivam a fé dentro de um

compromisso com a própria sociedade em que vivem. Aqui a proximidade dos pastores

da Igreja deve ser reconhecida como um sinal profético capaz de despertar novas

vocações seja ao sacerdócio seja a vida consagrada.337

Nas dioceses de países laicos com uma rede de escolas e colégios católicos, a

principal comunidade de fé tornou-se a escola, Ali, pela primeira vez, a maior parte dos

batizados experimenta de modo sistemático, a pessoa de Jesus Cristo através da liturgia

e da vida sacramental da Igreja. Os professores, mais do que os pais, em muitas

ocasiões tornaram-se os primeiros formadores dos nossos jovens.

As escolas católicas não são produtos, mas agentes da missão da Igreja. Entre os

diversos pontos basilares de uma escola comprometida na nova evangelização,

enumeramos os seguintes:

334

L‟ Osservatore Romano, D. Enrico Dal Covoto, S.D.B., Bispo Titular de Eraclea Magnifíco Reitor

da Pontifícia Universidade Lateranense em Roma (Itália), 27 de Outubro de 2012, número 43, p.18. 335

L‟ Osservatore Romano, D. Rogelo Carreira Lópes, Arcebispo de Monterrey (México), sábado 20 de

outubro de 2012, número 42, p. 15. 336

L‟ Osservatore Romano. D. John Atcherley Dew Arcebispo de Wellington, sábado 20 de outubro de

2012, número 42, p. 8. 337

L‟ Osservatore Romano. D. Launay Saturné, Bispo de Jacmel (Haiti), sábado 10 de novembro de

2012, número 45, p. 18.

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1) O Encontro com Jesus Cristo: a amizade com o Senhor ressuscitado, levará as

nossas escolas a animar a vida de oração, a liturgia, o respeito que provém do

confronto com os outros como irmãos e irmãs em Cristo, e o serviço caritativo;

2) A diaconia da verdade: nas sociedades nas quais os ventos de relativismo e de

individualismo comportam os trágicos destroços da confusão moral e da queda

das aspirações. As escolas sobressaem como faróis de esperança. O

conhecimento da verdade amorosa de Jesus e do seu evangelho leva os jovens à

descoberta do bem: o caminho da paz interior, da beleza interior e do respeito de

si e dos outros;

3) O espírito de sabedoria: Um antídoto à superficialidade e a trivialidade. Os

jovens podem empreender por meio da sabedoria uma reflexão que de bases e

fundamento ao qual podem se inspirar para potenciar a arte do discernimento e

da crítica;

4) O sentido de pertença ao povo de Deus: a identidade e a convicção são

estimuladas quando a escola reflete a vida de fé eclesial da Igreja. Trata-se

essencialmente de uma manifestação de apreço do significado do Dia do Senhor

e da participação à santa missa.

Quando é dada ampla ressonância à liderança de fé dos professores e dos alunos

nas nossas paróquias, as próprias comunidades escolares poderão fazer muito pela

renovação das paróquias. De fato, tocados pelo encanto da vida da verdade, de bondade

e de beleza de Deus, tornam-se testemunhas extraordinárias nas suas famílias da vida

em Cristo que a nova evangelização repropõe a cada um de nós.338

4.4 Jovens que evangelizam Jovens

A nova evangelização devera considerar como “novos agentes” de

evangelização os jovens. Prepará-los para a catequese através da participação da vida da

comunidade de fé e das experiências missionárias para poderem agir na comunidade e

na sociedade. Considerar os novos areópagos dos jovens como o mundo da instrução,

338

L‟ Osservatore Romano. D. Charles Edward Drennan, Bispo de Palmerston North (Nova Zelândia),

sábado 17 de novembro de 2012, p. 19.

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dos mas media, da internet, da arte. Espaços irrenunciáveis para a nova

evangelização.339

A nova Evangelização deve ser, marcada por um confronto de idéias, não em

termos de agressão ideológica, mas deve ajudar os jovens a discernir as idéias.340

É neste

discernimento que os jovens vão aprendendo a discernir as grandes mudanças ocorridas

no mundo e viver sua juventude e identidade cristã de modo frutuoso:

“A pastoral juvenil, tal como estávamos habituados a desenvolvê-la,

sofreu o impacto das mudanças sociais. Nas estruturas ordinárias, os

jovens habitualmente não encontram respostas para as suas

preocupações, necessidades, problemas e feridas. A nós, adultos

custa-nos a ouvi-los com paciência, compreender as suas

preocupações ou as suas reivindicações, e aprender a falar-lhes na

linguagem que eles entendem. Pela mesma razão, as propostas

educacionais não produzem os frutos esperados.”341

4.5 Os Santos: testemunhas credíveis e modelos para os “novos

evangelizadores.”.

Outro ponto interessante no caminho percorrido em favor da nova evangelização

é a capacidade de inspiração que existe na vida dos Santos. Sejam os santos de longa

data, ou seja, os santos contemporâneos e próximos ao nosso tempo. Mais do que

métodos e recursos técnicos são necessários evangelizadores com uma profunda

experiência de fé, alimentada na comunhão com Deus. Os Santos, ao longo da história

da Igreja, foram cristãos autênticos e os evangelizadores eficazes:

“Há quem se console, dizendo que hoje é mais difícil; temos, porém,

de reconhecer que o contexto do Império Romano não era favorável

ao anúncio do Evangelho, nem à luta pela justiça, nem à defesa da

dignidade humana. Em cada momento da história, estão presentes as

fraquezas humanas, a busca doentia de si mesmo, a comodidade

egoísta e, enfim, a concupiscência que nos ameaça a todos. Isto está

sempre presente, sob uma roupagem ou outra; deriva mais da

limitação humana que das circunstâncias. Por isso, não digamos que

hoje é mais difícil; é diferente. Em vez disso, aprendamos com os

Santos que nos precederam e enfrentaram as dificuldades próprias do

339

L‟ Osservatore Romano. D. Leonardo Ulrich Steiner, O.F.M. Bispo auxiliar de Brasília, sábado 3 de

novembro de 2012, número 44, p. 7. 340

L‟ Osservatore Romano. D. Diarmuid Martin, Arcebispo de Dublin (Irlanda), sábado 17 de

novembro de 2012, número 46, p. 18. 341

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium. Exortação Apostólica. São Paulo: Paulus-Loyola, 2013, II,

§ 105, p. 66.

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seu tempo. Com esta finalidade, proponho-vos que nos detenhamos a

recuperar algumas motivações que nos ajudem a imitá-los nos nossos

dias”.342

5. A Igreja: Uma comunidade do mistério partindo do mistério do ser humano

ao mistério de Deus

Todo ser humano traz em si o desejo de conhecer-se mais profundamente a Deus

e de conhecer o mistério e o significado da própria existência. É justamente nesta busca

de sentidos e de significados que a Igreja olha para o homem e propõe o mistério de

Deus. O ser humano aspira conhecer e nesta busca fundamental colocam-se diante dele

outras dimensões da própria existência que o impedem de cogitar profundamente sobre

o seu existir, como por exemplo, o espetáculo.

A vida envolta pelos espetáculos. Nem sempre este homem é capaz de postar-se

diante de si e fazer a si questionamentos que alarguem as dimensões de seu próprio

conhecimento e sentido. É nesta abertura e crise existencial de uma constante fuga do

ser humano de si mesmo que a Igreja lhe apresenta o mistério de Deus que compreende

a encarnação como proximidade e possibilidade de um desvelar de sua identidade mais

profunda. No sínodo ouviram-se vozes que novamente apresentaram o lugar

intransferível do mistério na vida humana: “A verdadeira missão da Igreja é fazer

conhecer às pessoas o mistério. Como antídoto contra o espetáculo”.343

O mistério de Deus opera como caminho de unidade interna e externa da

dimensão humana tendo como desafios atuais o “racionalismo e o subjetivismo que

esvaziam a ética e justificam os piores ataques a dignidade da pessoa e da vida

humana, e pretendem fundar a ordem moral sobre o consenso social, sem qualquer

referência a natureza da pessoa e seus atos”.344

A Igreja ao referir-se ao mistério de Deus buscou ter sempre presente o mistério

do ser humano diante de si. De forma mais demarcada vemos que as reflexões que

partiram do grande evento do Concílio do Vaticano II ventilaram novas formas de

342

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium. Exortação Apostólica. São Paulo: Paulus-Loyola, 2013, V,

§ 263, p. 147. 343

L‟ Osservatore Romano. Pe. Robert Francis Prevost, O.S.A, Prior da Ordem de Santo Agostinho

(Agostiniano), sábado 27 de Outubro de 2012, número 43, p. 10. 344

L‟ Osservatore Romano. D. Benedito Beni Dos Santos, Bispo de Lorena (Brasil), 27 de Outubro de

2012, número 43, p. 9.

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compreensão do mistério de Deus na vida humana que buscaram realçar a profunda

conexão do mistério de Deus e do homem que encontram seu lugar comum na história:

“Na economia divina, não há dois mundos separados e

sobrepostos: um mistério da criação numa ordem “natural” e,

em seguida, um mistério sobreimposto da redenção, numa

ordem “sobrenatural”. Não há o mundo natural, de um lado, e

a Igreja sobrenatural, de outro lado, como duas realidades

concorrentes, com fronteiras mais ou menos pacíficas. Não há a

construção do mundo, duma parte, sem interesse nem valor

para o Reino e, doutra parte, O Reino de Deus sem interesse

nem contribuição na construção do mundo. Não, criação e

encarnação são compreendidas numa involução recíproca. Pois

a encarnação redentora se completou nesta total recapitulação

de toda verdade, de todo bem, de todos os valores humanos, em

germes na criação”.345

A comunidade do mistério é a comunidade da inclusão e não da exclusão. É a

comunidade que convida a comunhão com Deus a cada pessoa humana. Cada pessoa

humana deve ser vista como alguém precioso. A Comunidade do mistério é a casa do

Pai, é este rosto que devemos contemplar no rosto da igreja, uma comunidade para os

fracos os frágeis, é para eles que o Senhor quer se dar em alimento:

“A Eucaristia, embora constitua a plenitude da vida sacramental, não

é um prêmio para os perfeitos, mas um remédio generoso e um

alimento para os fracos. Estas convicções têm também conseqüências

pastorais, que somos chamados a considerar com prudência e

audácia. Muitas vezes agimos como controladores da graça e não

como facilitadores. Mas a Igreja não é uma alfândega; é a casa

paterna, onde há lugar para todos com a sua vida fadigosa”.346

5.1 A liturgia e a contemplação de Deus e do outro como pedagogia mistagógica

a serviço da nova evangelização

345

CHENU, M.D. A missão da Igreja no mundo de hoje. Petrópolis, Ed: Vozes, 1967, p. 340. 346

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium. Exortação Apostólica. São Paulo: Paulus-Loyola, 2013, I, §

47, p. 34.

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A liturgia sempre foi um lugar privilegiado de encontro com o Senhor por meio

da ação sacramental da Igreja:

“Uma preparação atenta da liturgia e dos demais da celebração constitui a

melhor catequese aos fiéis, por isso, proclamação e cânticos bíblicos devem conduzir-

nos a uma participação consciente ativa e frutuosa”347

Uma nova pedagogia de

transmissão da fé encontra-se na capacidade de fazer presente os seus valores por meio

de uma pedagogia mistagógica. A beleza fascinante e contagiosa do mistério escondido

dos ritos e nos símbolos deve manifestar-se com toda a força para que a liturgia seja

realmente evangelizadora. A nova evangelização depende, portanto em ampla medida

da capacidade de fazer da liturgia a fonte da vida espiritual. ”348

A Igreja” evangeliza e

se evangeliza com a beleza da liturgia, que é também celebração da atividade

evangelizadora e fonte dum renovado impulso para se dar.”349

Quando olhamos para a grande pirâmide da atividade humana e toda ação

evangelizadora da Igreja devemos atentar para a importância da contemplação como o

coroamento de toda a atividade humana em prol do Reino de Deus.

Um dos conceitos tidos como de fundamental importância para a ação

evangelizadora da Igreja em nossos dias e que fora retomado de modo mais intenso por

parte de alguns padres sinodais foi justamente a atitude contemplativa da Igreja e dos

Cristãos: “Só de um olhar adorante sobre o mistério de Deus, Pai, Filho e Espírito

Santo, só da profundidade de um silêncio que se apresenta como seio que acolhe a

única Palavra que salva, pode brotar um testemunho credível para o mundo”.350

O

compromisso em prol da evangelização encontra sua alegria e sua força na

contemplação.351

Outro sinal de autenticidade da nova evangelização é reconhecer o rosto de

Cristo presente também no rosto do pobre e nas fragilidades de nossos irmãos:

“Colocar-se ao lado de quem está ferido pela vida não é só uma prática de sociabilidade,

347

CONCÍLIO VATICANO II. Sacrossanctum Concilium Constituição. Petrópolis: Vozes, 1968, § 2,

p.259. 348

L‟ Osservatore Romano. D. Geraldo Lyrrio Rocha, Arcebispo de Mariana (Brasil), sábado 10 de

novembro de 2012, numero 45, p. 19. 349

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium. Exortação Apostólica. São Paulo:Paulus-Loyola, 2013, I, §

24, p. 22. 350

L‟ Osservatore Romano. Sábado 03 de novembro de 2012, número 44, p. 08. 351

L‟ Osservatore Romano. Padre Bruno Cadoré, O.P, Mestre Geral dos Padres Pregadores

(Dominicanos), sábado 10 de novembro de 2012, número 45, p. 16.

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mas antes de tudo um fato espiritual. Porque no rosto do pobre resplandece o próprio

rosto de Cristo: “Tudo o que fizerdes a um dos meus irmãos mais pequeninos é a mim

eu o fazeis” (Mt 25, 40). Aos pobres deve ser reconhecido um lugar privilegiado nas

nossas comunidades, um lugar que não exclui ninguém, mas quer ser um reflexo de

como Jesus se ligou com eles. A presença dos pobres em nossas comunidades é

misteriosamente poderosa: “muda as pessoas mais que um discurso, ensina fidelidade, e

faz compreender a fragilidade da vida, pede oração: em síntese, conduz a Cristo.”352

“O olhar contemplativo sobre mundo e sobre a cidade é um auxilio precioso para

descobrir Deus:”

“Precisamos identificar a cidade a partir dum olhar contemplativo,

isto é, um olhar de fé que descubra Deus que habita nas suas casas,

nas suas ruas, nas suas praças. A presença de Deus acompanha a

busca sincera que indivíduos e grupos efetuam para encontrar apoio e

sentido para a sua vida. Ele vive entre os citadinos promovendo a

solidariedade, a fraternidade, o desejo de bem, de verdade, de justiça.

Esta presença não precisa ser criada, mas descoberta, desvendada.

Deus não Se esconde de quantos O buscam com coração sincero,

ainda que o façam tateando, de maneira imprecisa e incerta”.353

Ao retomarmos a reflexão sobre o olhar contemplativo não queremos aqui nos

evadir de nossas responsabilidades cristãs e temporais, mas queremos justamente dar

razões mais profundas que nos motivam a sermos anunciadores do evangelho:

“A melhor motivação para se decidir a comunicar o Evangelho é

contemplá-lo com amor, é deter-se nas suas páginas e lê-lo com o

coração”. Se o abordamos desta maneira, a sua beleza deslumbra-

nos, volta a cativar-nos vezes sem conta. Por isso, é urgente

recuperar um espírito contemplativo, que nos permita redescobrir,

cada dia, que somos depositários dum bem que humaniza que ajuda a

levar uma vida nova. Não há nada de melhor para transmitir aos

outros”.354

352

L‟ Osservatore Romano. Sábado 03 de novembro de 2012, número 44, p. 09. 353

PAPA FRANCISCO. Evangelii Gaudium. Exortação Apostólica. São Paulo: Paulus-Loyola, 2013, II,

§ 71, p. 48. 354

Ibidem, V, § 264, p. 148.

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É o olhar contemplativo sobre o mistério e sobre o mundo que nos permite uma

aproximação em profundidade da própria realidade. A contemplação deve permear

nossas atividades: “A nossa contemplação deve ser universal e incessante.”355

A

contemplação remonta as origens fontais da evangelização: “Desta contemplação nasce,

em toda força interior, a urgência da missão, a necessidade imperiosa de “anunciar o

que vimos e ouvimos”, a fim de que todos estejam em comunhão com Deus (1 Jo 1,

3).”356

5.2 Veni Creator Espiritus: “Como um novo Pentecostes”

Toda a reflexão aqui desenvolvida tem como finalidade principal ajudar-nos a

perceber a Igreja dentro do seu mistério. A Igreja tem necessidade de uma nova efusão

do Espírito Santo. A nova evangelização precisa de um testemunho de vida que deve

acompanhar a obra evangelizadora.357

Pentecostes é o evento que coloca toa a Igreja em movimente frente a sua missão

de ser sinal histórico do Reino de Deus no mundo. O acontecimento de Pentecostes deu

início à primeira evangelização e agora necessitamos de um novo pentecostes. Só o

proceder de Deus torna possível o nosso caminhar o nosso cooperar, que é sempre um

cooperar, não uma nossa decisão.358

Os discípulos do Senhor ao fazerem a experiência

do Senhor Ressuscitado operando em seu meio compromete a sua atividade em favor do

Reino de Deus de modo que as atividades sejam teândrica, ou seja, uma ação de Deus

com o comprometimento dos agendes desta transformação na sociedade que são

justamente os discípulos do Senhor.

Acreditamos que também em nosso tempo podemos verificar certos sinais do

nascimento da Igreja já presente em vários lugares, verificamos um novo nascimento da

Igreja em lugares aparentemente desérticos espiritualmente e pastoralmente.

355

LEBRET, L.J. Princípios para a ação. São Paulo, Ed: Duas Cidades, 1959, p, 76. 356

BENTO XVI. Silêncio e Palavra: Caminhos de Evangelização. ( Dia das Comunicações Sociais, 20

de maio de 2012). São Paulo: Paulus, 2012, p. 8-9. 357

L‟ Osservatore Romano. D. Michel Aoun, Bispo de Jbeil dos Maronitas (Líbano), sábado 17 de

novembro de 2012, número 46, p. 21. 358

BENTO XVI. Homilia na Santa Missa para a abertura do sínodo dos Bispos e proclamação de São

João de Ávila e de Santa Hildegard de Binge “Doutores da Igreja”.Brasília: CNBB, 2013, p. 9-14.

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A Igreja vê a permanente necessidade de que este novo Pentecostes continue a

ser manifesto em seu interior, pois o Pentecostes caracteriza o início das grandes

renovações espirituais que ocorreram na Igreja que mantiveram acesa nela a consciência

de sua missão evangelizadora em meio aos homens. É justamente dentro desta

perspectiva que o acontecimento de Pentecostes deve gerar uma ação conjunta que

propõe no interior da Igreja aquilo que ela mesma vivenciará no início com a criação de

uma universalidade que comunica a cada pessoa esta presença Espiritual.359

Á referência ao acontecimento do Concílio Vaticano II é de fundamental

importância para compreender através de uma oportuna analogia podemos afirmar que

falar de um novo Pentecostes na Igreja é remeter-se a compreensão de uma analogia

“Jerusálem-Vaticano II”. É justamente procurar dentro desta compreensão missionária

que busca facilitar ao máximo um contato com o essencial por parte daqueles que não se

encontram nesta mesma fé. Encurtar o caminho é a tarefa da Igreja que reconheceu no

Concílio Vaticano II um Concílio de libertação que pretende desatar a Igreja das faixas

que nos séculos impediram seus movimentos, para que permita a Igreja anunciar o

evangelho com uma força renovada deste mesmo Espírito.360

Este novo pentecostes pode ser caracterizado também por um renovado

discernimento espiritual e uma continua abertura aos meios que podem auxiliar a nova

evangelização:

“Devemos promover a arte do discernimento dos espíritos.

Neste tempo de relativismo, no qual a verdade objetiva não é

facilmente aceita, podemos ajudar as pessoas a comparar as

suas exigências subjetivas para orientá-las rumo a verdade

objetiva. Não devemos apresentar apenas o evangelho e o

catecismo, mas promover exercícios espirituais, nos quais

pomos as pessoas em diálogo com Jesus. Isto significa que

devemos oferecer aos sacerdotes e aos religiosos uma formação

espiritual melhor, a fim de que sejam guias espirituais”.361

359

TILLICH, PAUL. Teologia Sistemática. São Paulo: Paulinas, p. 501. 360

LE GUILLOU, M.J. El Rostro Del Resucitado. Grandeza Profética, Espiritual y Doutrinal, Pastoral

y Missionária Del Concílio Vaticano II, Madrid: Encuentro, 2012, p. 71. 361

L‟ Osservatore Romano. D. Everardus Johannes de Jong, Bispo Títular de Cariama, Auxíliar-Geral

de Roermonda (países baixos), sábado 17 de novembro de 2012, número 46, p.17.

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143

Mantendo a reflexão teológica dentro de um discernimento que nos proporcione

continuarmos a aprofundar um novo momento da história da Igreja que marca de

maneira sentida o ser e o agir da Igreja nos próximos anos. Manter o pensamento aberto

é uma fundamental atitude teológica e pastoral. A nova evangelização considerando e

discernindo o processo de secularização, buscando dar uma resposta testemunhal quer

ser também um caminho de encontro e não de distanciamento de escuta de recíproco

crescimento seja no que se refere a vida humana na sua presença no mundo quanto ao

diálogo dialético com o mesmo processo:

“A meu ver, a partir do 11 de setembro de 2001, este espírito de

„compassio‟ passou a ter um significado decisivo na nova

situação de mundo, na qual os conflitos culturais e sociais se

sobrepõe mundialmente. Para além da defesa militar contra o

terrorismo, esse espírito criou no Ocidente a necessidade de nos

olharmos e avaliarmos não apenas com os nossos olhos, mas

também com os olhos dos outros, os olhos do”resto” do mundo,

e valorizarmos esse olhar. E, finalmente, na noção estritamente

secular de liberdade e nosso modo secular de vida, esse espírito

nos obriga a nos colocarmos – como no passado, diante da

assim, chamada “dialética do iluminismo” – diante da dialética

da secularização”, praticamente ainda não descoberta”.362

5.3 A experiência de Deus na nova evangelização como experiência de Sentido

Outro ponto importante que se deve destacar na nova evangelização é justamente

a experiência fontal da experiência de Deus por parte do homem que procura a Deus em

nossos dias. Vivemos tempos em que se faz corrente a expressão experiência de Deus.

A palavra experiência aparece de maneira bem incisiva nos escritos de Martinho

Lutero. O conceito chave de experiência trabalhado pelo ex-frade agostiniano aborda

uma experiência pessoal que a pessoa faz dentro do círculo da religião. Para Martinho

Lutero toda experiência com Deus é “experientia sola facit theologum”. A pessoa que

experiência Deus é uma pessoa teológica que experiência dentro de sua realidade,

362

METZ, J.B. Mística de olhos abertos. São Paulo: Paulus 2013, p. 89-90

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dentro de seu ambiente de vida e de relacionamentos. Outros teólogos procuraram

definir esta experiência como “cognitio experimentalis”.

A experiência com Deus pode ser classificada de diversas formas, e atualmente

alguns parâmetros são de fundamental importância para compreender a própria

experiência que se faz. Aqui apresentamos uma relação quádrupla desta experiência363

:

1) A relação com a vida: Uma autêntica experiência com Deus não tira a pessoa

de sua vida alienando-a frente ao „numinoso‟, mas as coloca dentro de uma

responsabilidade mais profunda ainda, responsabilidade que emerge como

convite continuo para que a pessoa se torne mais consciente a respeito de sua

própria vida como dom e tarefa e com relação a vida daqueles que a circundam;

2) A relação com a história: Toda a experiência com Deus ela acontece

historicamente dentro de uma temporalidade, mesmo sabendo que Deus não se

prende ao conceito de tempo e de espaço, mas a forma de Deus se fazer

conhecer na história humana é por meio de tempo e espaços bem definidos;

3) A relação com a realidade: A realidade como se verifica e a capacidade de

compreensão da mesma é indispensável por parte daquele que busca

compreender a própria experiência de fé;

4) A relação com a percepção: outro ponto importante é como que aquele que faz

a experiência com Deus consegue perceber a profundidade, a pertinência e a

relevância da própria experiência que o mesmo que faz com Deus pode

compreender.

Dentro destas últimas considerações apresentamos aqui apresentar a experiência

de Deus como parte fundamental na grande convocação que a Igreja faz para que se

realize como que um “novo pentecostes” em seu interior e no mundo por meio de uma

nova evangelização. Para que tal acontecimento tomar proporções de totalidade e

mudanças significativas fazemos aqui memória do conceito usado pelo Padre Henrique

de Lima Vaz no que se refere a fundamental compreensão sobre a experiência de Deus

na vida cristã e humana considerando a experiência de Deus como experiência de

sentido de plenitude ou de sentido radical: “Com efeito, a experiência cristã de Deus é

a experiência da presença do Sentido radical numa existência historicamente dada, a

363

LATOURELLE, Rene. O‟COLLINS, G. Problemas e perspectivas de teologia fundamental. São

Paulo, Loyola, 1993, P.28.

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145

existência de Jesus e na palavra da revelação que é totalmente condicionada por essa

existência histórica na medida em que dela procede e a ela se refere”.364

Experimentar Deus hoje não é uma questão apenas de fazer uma experiência

religiosa ou experiência do Sagrado, mas dentro de uma reflexão missionária fazer uma

autêntica experiência de Deus convida-nos a nos colocarmos em um caminho de

continua libertação de estruturas que não são e não revela em profundidade o mistério

de Deus. Padre Henrique de Lima Vaz compreendeu que a Experiência radical de Deus

é totalizante permeia nossa existência cristã, engaja-nos em responsabilidades

significativas dentro do tecido eclesial e social em que vivem os homens nosso

contemporâneos.

A experiência de sentido que cada cristão é chamado a fazer tende a tornar a sua

existência não apenas vivida em si mesma, mas uma existência “para”. O encontro com

Deus faz-nos “ser-par-os-outros”, na busca da construção de uma sociedade mais justa

e fraterna. A experiência de sentido faz-nos “ser-para-Deus”. Nossa existência torna-se

uma existência capaz de transcender o que apequena o projeto de Deus para o ser

humano ao passo que faz imanar a experiência do mistério do totalmente Outro no

contato e na cotidianidade dos outros próximos. A obra da evangelização não é apenas

expansão de instituições ou uma mera tarefa que exige o empenho de grandes ativistas

eclesiais. A resposta mais plausível a ser construída pela Igreja na grande convocação

para uma nova evangelização frente a um mundo secularizado é justamente uma

resposta testemunhal onde os valores do Reino são visibilizados no testemunho e na

coerência da vida daqueles que o anunciam, pois os homens de hoje escutam mais as

testemunhas que os mestres, e se escutam os mestres é porque estes, também são

testemunhas.

A nova evangelização é antes de tudo uma irradiação. Irradiação de uma

experiência que deu sentido a nossa vida e a nossa existência. Os agentes da nova

evangelização são pessoas que se abriram em sua disponibilidade ao chamamento, a ser

o prolongamento do Pathos divino por cada ser humano. Como bem definiu o Papa

364

LIMA VAZ, H.C., Escritos de Filosofia I: Problemas de Fronteira, 3ª edição, São Paulo: Loyola,

2002, p. 253.

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146

emérito Bento XVI no início de seu pontificado em 24 de abril de 2005: “Nós existimos

para mostrar Deus”. 365

365

http://www.vatican.va/holy_father/benedict_xvi/homilies/2005/documents/hf_benxvi_hom_20050424_

inizio-pontificato_po.html 29.06.2014/ 20:00hs.

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147

Conclusão

Ao concluirmos este trabalho em que procuramos compreender melhor o

conceito de nova evangelização e os desafios colocados pelo processo de secularização

constatamos a grandeza do tema e a vastidão de elementos que podem ser trabalhados

de modos mais setorizados dentro da teologia pastoral oferecendo preciosos contributos

para ação evangelizadora da Igreja. Poder aproximar-se da compreensão de um

acontecimento sinodal como o do ano de 2012, é justamente entrar em contato com a

dimensão universal de toda Igreja e poder considerar também as suas particularidades

como um grande tesouro a contribuir com a dimensão universal. Poder aprofundar

textos de diversos pastores da Igreja muitos dentre eles teólogos, temos a impressão de

“tocar” esta universalidade do Corpo de Cristo e perceber em cada continente os seus

desafios próprios. Poder ler e refletir sobre os discursos dos Bispos presentes no sínodo

vindos de todos os continentes nos aproxima de um “Sentire cum Ecclesia” que não é

algo focalizado apenas em uma dimensão ou em um epicentro. Sentire cum Ecclesia é

podes sentir o todo a partir dos tesouros presentes em cada particular.

Ao discorrermos sobre a nova evangelização, buscamos nos aproximar, também

do grande evento que fora o Concílio Vaticano II para toda a Igreja, e que se tornou uma

fonte fundamental para compreender a nova evangelização. Documentos como, por

exemplo, o da Constituição Pastoral “Gaudium et Spes”, que apresenta linhas

fundamentais para toda igreja no que se refere a missão da Igreja no mundo

contemporâneo. Outro documento é a Constituição Dogmática sobre a Igreja, “Lumem

Gentium”, que apresenta uma reflexão teológica sobre o mistério da Igreja. A “Dei

Verbum” apresenta a fecundidade da renovação bíblica, a “sacrossanctum Concilium”

abre novo caminho para a recepção dos sacramentos da iniciação cristã e a importância

da participação mais ativa, consciente e frutuosa dos fiéis nas celebrações. Preciosa é a

“Ad Gentes” sobre a evangelização dos povos.

O Concilio Vaticano II apresentou elementos importantes no que se refere à

terminologia da missão e o processo de evolução do conceito de evangelização até se

chegar ao conceito de nova evangelização, destacando o núcleo principal de “Novas

expressões, novos métodos e novo ardor” proposto pelo Papa João Paulo II.

O Papa Paulo VI contribuiu de modo singular com a Exortação Apostólica

Evangelii Nuntiandi onde procurou questionar profundamente a consciência cristã sobre

o significado do que é evangelizar? Ao mesmo tempo se perguntando sobre os

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conteúdos e os meios pelos quais esta evangelização deveria acontecer. Deste modo o

Papa Paulo VI vai apresentando através deste documento a importante tarefa de ver a

evangelização como uma força transformadora (EN 17-20) que assume uma dimensão

fundamental na vida cristã não apenas como uma função a se realizar mas como uma

opção a se fazer.

No documento do Papa João Paulo II “Redemptoris Missio”. Verificamos o

esforço do então pontífice em colocar a relevância da missão no mundo contemporâneo

na direção também daqueles que não conhecem a Cristo. O documento possui uma

ampla explanação onde procurou apresentar a centralidade da Pessoa de Jesus Cristo

como único Salvador, desdobrando e assinalando as características e exigências do

Reino. Apresenta o protagonismo do Espírito Santo que atua sobre a vida de Jesus e de

seus discípulos os enviando “até os confins da terra” (AT 1, 18). O Papa João Paulo II

procuro por meio deste documento colocar novamente a missão ad Gentes no centro das

atividades da Igreja , sem deixar de valorizar a importante ação missionária entre os

batizados que não praticam mais a sua fé.

No ano de 2000 uma importante contribuição foi dada pelo então Cardeal

Ratizinger sobre a “Nova evangelização” num artigo escrito para os catequistas e

professores de religião onde numa conferência procurou apresentar a estrutura, os

métodos e conteúdos desta grande obra de evangelização. Afirma que a Igreja nunca

deixou de evangelizar e celebrar os sacramentos diariamente, contudo, ele já introduz

uma reflexão sobre o movimento de secularização presente na sociedade. Convida ao

mesmo tempo a cultivar uma importante paciência que faz referência a parábola do grão

de mostarda (Mc 4, 26-29), convidando a atuar com humildade. Apresenta a obra da

evangelização tendo como força motriz a oração. Não será possível alcançar

significados plausíveis sem viver uma profunda experiência pessoal com Cristo que

passe pela Igreja como caminho eclesiológico para uma eficaz ação pastoral.

Na América Latina encontramos experiências significativas que vieram somar

com todo este caminhar da Igreja frente aos novos desafios da evangelização. Um

organismo eclesial que tem colaborado de modo bastante importante foi o CELAM

através de documentos que foram verdadeiras bussolas na ação evangelizadora da Igreja

na América Latina.

A conferência de Medellín de 1968 procurou deter-se em três pontos

importantes: o primeiro que foi compreender o conflito da fé com a modernidade; o

desafio da tensão que começava a aparecer entre uma eclesiologia que opõe

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institucional com o carismático e o problema social como resposta a “Populorum

progressio”. Outros pontos que se fez notar em Medellín foram à chave hermenêutica

de Leitura da sociedade que se utilizou do método ver, julgar e agir, assim como o

surgimento das CEBs como pequenas comunidades que buscam promover a vida cristã,

libertando-a do excesso de formalismos dando um “rosto” mais popular, seja no que se

refere à liturgia, seja em outras práticas eclesiais.

A conferência de Puebla em 1979 teve a difícil tarefa de buscar caminhos em

meio ao período de regimes totalitaristas e por vezes, sob pressão de guerras e

terrorismos. Temos neste período a transição de Papas: Paulo VI, João Paulo I e João

Paulo II no mesmo ano de 1978. O foco do documento situa-se sobre a importância da

conversão, projeção do testemunho, a participação vital no mistério de Cristo e ao

mesmo tempo a tudo aquilo que se opõe ao Reino. O documento fala da dimensão

missionária de cada batizado e seu compromisso de ser sinal do Reino de Deus no

mundo através do esforço que este realiza na construção de uma civilização do amor.

Na IV Conferência do Episcopado latino Americano de Santo Domingo o marco

histórico foi os quinhentos anos do descobrimento da América e a evangelização destes

povos. Esta conferência foi também uma oportunidade do Papa João Paulo II de lançar

de modo mais amplo para toda a América Latina o convite a uma conversão pastoral

como caminho para uma nova evangelização. O documento tem alguns pontos chaves

como a reconciliação, a solidariedade, a integração e a comunhão, que devem ser

características da nova evangelização. Santo Domingo recupera a importância do

Querigma cristão como núcleo insubstituível da mensagem cristã e propõe a cada

cristão a tarefa insubstituível de colaborar de modo eficaz na evangelização por meio do

testemunho e do zelo apostólico que se traduz em coerência de vida e serviço.

A conferência de Aparecida que ocorreu em 2007 enfrenta situações históricas

bem específicas como o acontecimento histórico de 11 de setembro e o fenômeno da

globalização como um completo desafio para a humanidade. Este documento convida a

todos os fiéis a sentirem-se convocados a tarefa evangelizadora da Igreja dentro dos

episódios de todas as conferências episcopais desde a conferência do Rio de janeiro até

Santo Domingo. O documento apresenta uma introdução. Uma primeira parte sobre a

vida de nossos povos hoje, numa segunda parte a vida de Jesus nos discípulos

missionários. E a terceira parte, a vida de Jesus para nossos povos, o documento traz

profundas contribuições pastorais para a proposta de uma fecunda missão continental.

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150

É dentro deste contexto que se insere o Sínodo da nova evangelização para a

transmissão da fé Cristã como um convite a uma nova e mais intensa onda missionária

na Igreja. Algumas iniciativas precedem o Sínodo como a Carta Apostólica

“Ubicumque et Semper”, de Bento XVI. Assim como a propagação do Ano da Fé que

tem como elemento principal recordar o acontecimento mais importante do século XX

na Igreja que foi o Concilio Vaticano II.

O documento “Instrumentum Laboris”, sobre o Sínodo da nova evangelização

retoma algumas linhas gerais, seja do documento Evangelii Nuntiandi como do

Redemptoris Missio. O texto apresenta o documento em quatro capítulos, o primeiro é

Jesus Cristo Evangelho de Deus para o homem; o segundo, o tempo de nova

evangelização; o terceiro, sobre a transmissão da fé e o quarto, reavivar a ação pastoral.

É dentro deste breve panorama que buscamos desenvolver este trabalho dando

um corte no início através de uma atenção especial a secularização, pois, vimos a

necessidade de considera-la como um dos temas de maior preocupação do Sínodo para

não dizer o maior, o que levou o Papa Bento XVI a escrever a carta “Ubicumque et

Semper” criando um novo dicastério nos organismos de governo da cúria Romana como

o Conselho para a Promoção da nova evangelização frente a um grande desafio atual

que é o da secularização, como bem o definiu o Papa Bento XVI em uma entrevista:

“Encontramo-nos diante do confronto entre dois mundos espirituais,

o mundo da fé e o mundo do secularismo. A questão é: em que o

secularismo tem razão? Em que coisa, portanto, a fé deve apropriar-

se de formas e imagens da modernidade, e em que deve, ao contrário,

opor resistência? Esta grande luta atravessa hoje o mundo inteiro. Os

bispos do Terceiro milênio dizem-me: “Também entre nós existe o

secularismo; aqui, porém, mistura-se a estilos de vida ainda arcaicos.

Muitas vezes nos perguntamos como é possível que cristãos, que são

pessoalmente crentes, não encontrem a força para tornar a sua fé

politicamente operante. Devemos buscar sobretudo que as pessoas

não percam de vista Deus; que reconheçam o tesouro que possuem;e

que, além disso, elas mesmas, a partir da própria fé, no embate com o

secularismo, possam praticar o discernimento espiritual. Este

processo enorme é a verdadeira, a grande tarefa do momento

presente. Podemos apenas esperar que a força interior da fé que

existe nas pessoas adquira vigor também na opinião pública,

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formando a opinião pública, e, ao agir assim, impeça a sociedade de

cair em um poço sem fundo366

Este texto denota grande preocupação do Papa Bento XVI com o avançado

processo de secularização, e como sendo até então Pastor da Igreja universal se

preocupou em convocar um sínodo para refletir sobre o tema da nova evangelização

tendo diante de si a grande importância de tornar novamente a fé cristã plausível, seja na

vida pessoal, familiar e social.

A conferência de Aparecida pode ter sido um ponto de despertar de esperanças

para Bento XVI, que após quatro anos quis realizar dentro de datas e comemorações

significativas na Igreja, um forte movimento de renovação espiritual, seja na Igreja, seja

no mundo.

No primeiro capítulo de nosso trabalho procuramos tendo diante dos olhos este

contexto histórico desenvolver uma melhor compreensão sobre o fenômeno do processo

de secularização. Adentramos na leitura de alguns textos, seja de filosofia, sociologia,

história e teologia que traziam reflexões sobre o impacto da secularização no mundo do

pensamento. Trouxemos como colaboração alguns textos dos padres sinodais onde a

palavra secularização aparece por mais de trinta vezes demonstrando assim uma grande

preocupação, seja daqueles pastores que vivem sobre o impacto da secularização seja

por aqueles que já começam a perceber com a globalização a transmissão de ideias e

formas de vida profundamente marcadas pela secularização. O Sínodo foi um momento

de compartilhar as dificuldades e buscar conjuntamente compreender o processo e se

fazer presente em meio a este contexto apresentando por meio de uma nova

evangelização um caminho possível.

Ao abordarmos o segundo capítulo procuramos observar a importante apreensão

do conceito de evangelização e nova evangelização apresentados no Sínodo e nos

documentos e contextos precedentes em que eles surgiram na intenção de uma

reaproximação e melhor reflexão sobre os desafios de evangelizar em meio a um mundo

secularizado. Enfrentar a barreira da linguagem e as fronteiras que ela coloca ao

pensamento de nossos contemporâneos é um desafio a se enfrentar. Num segundo

366

BENTO XVI. O Papa, a Igreja e os sinais dos tempos. Uma conversa com Peter Seewald. São

Paulo:Paulinas, 2011, p. 70.

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momento apresentamos, também o desfio de uma comunhão interna por meio de uma

espiritualidade de comunhão. A nova evangelização só verificará frutos consistentes se

as Igrejas locais juntamente com o clero e seu laicato for capaz de pensarem, refletirem

e decidirem juntos através de uma leitura aberta dos sinais dos tempos e de uma

capacidade renovada de aprofundar os aspectos espirituais que comportam uma ação

apostólica mais sólida. Uma pastoral orgânica, um projeto diocesano com diretrizes bem

definidas deve ser um trabalho conjunto de muitas mentes e corações que buscam

caminhar num mesmo compasso em uma mesma direção, sem isto a nova evangelização

não seria irradiação e transmissão, mas apenas um projeto fadado a se perder no vazio.

O terceiro capítulo a luz da experiência Sinodal e dentro do paradigma

apresentado já em Aparecida e reconfirmado na Exortação Apostólica Evangelii

Gaudium do Papa Francisco procurou ver na leitura de um novo paradigma para a

evangelização um caminho de conversão pastoral e de uma releitura da evangelização

tendo como ponto principal a chave hermenêutica da missão, apresenta-se a nova

evangelização como uma proposta para uma nova primavera do Espírito Santo para toda

a Igreja , como que um grande Pentecostes. Ter a coragem de se avaliar e propor dentro

do tecido eclesial uma auto-conversão de suas próprias estruturas, sejam internas na

Igreja sejam estruturas do próprio coração e da forma de pensar novos caminhos em

contradição com afirmações do tipo “sempre foi feito assim”. O caminho proposto pela

nova evangelização à luz da Exortação Apostólica é uma a atitude corajosa e audaciosa

do papa Francisco de propor a Igreja à coragem de responder aos grandes desafios

contemporâneos de um modo testemunhal. O rosto de uma Igreja diaconal pode ser um

precioso auxílio, seja na assimilação do conceito, seja por meio de uma prática que

demonstra o desejo da Igreja de ser servidora. Servidora dos mistérios de Deus,

servidora da Palavra de Deus, servidora do ser humano. Uma possível guinada na

conjectura da Igreja virá com a corajem de tomar a peito “novos paradigmas” de forma

a vivenciar “novos conteúdos programáticos” que falem diretamente ao coração a mente

dos homens de hoje. Existe uma carência na visibilidade de coerências e atitudes

evangélica. É necessário que todo o povo de Deus composto pelo clero e pelos fieis

saibam desprender-se das faixas que impedem uma maior mobilidade do Corpo de

Cristo. É preciso que a mensagem do evangelho, seja primeiro uma verdade capar de

transfigura a vida dos mesmos agentes de evangelização para que o mundo perceba

novamente o frescor do evangelho. O Sínodo dos bispos de 2012 assinalou a

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importância de voltar ao centro de voltar a Cristo, de tornar-se sinal histórico de seu

Reino. Muito existe ainda por aprofundar sobre o tema da nova evangelização, como

também sobre o fenômeno da secularização para considera-lo em seu aspectos positivos.

Estudar a nova evangelização e o processo de secularização à luz do Sínodo dos Bispos

de 2012, foi um primeiro passo para que eu pessoalmente melhor pudesse compreender

está “magna” missão da Igreja que desprende uma força valiosa, mas que traz alegrias

imensas e sentido profundo a própria vida. Termino dizendo que foi um colocar-se a

caminho, sabendo que existem muitas estradas ainda para ser percorridas na grande

tarefa e aventura humana e cristã que nos apresenta a nova evangelização.

“Ao início do ser cristão, não há uma decisão ética ou

uma grande idéia, mas o encontro com um

acontecimento, com uma Pessoa que dá a vida um novo

horizonte e, desta forma, o rumo decisivo.”

Papa Bento XVI

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