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PUC - SÃO PAULO
O DESENVOLVIMENTO DO COMÉRCIO ELETRÔNICO NO ÂMBITO INTERNACIONAL DA CONVENÇÃO INTERNACIONAL
DE COMPRA E VENDA DE VIENA
Mestrado em Direito
PUC - SÃO PAULO
O DESENVOLVIMENTO DO COMÉRCIO ELETRÔNICO NO ÂMBITO INTERNACIONAL DA CONVENÇÃO INTERNACIONAL
DE COMPRA E VENDA DE VIENA
Dissertação apresentada à Banca Examinadora como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Direito Comercial pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, sob a orientação da Profª. Dra. Maria Eugênia Finkelstein.
São Paulo
2016
Autorizo exclusivamente para fins acadêmicos e científicos a reprodução total ou parcial desta Dissertação de Mestrado por processos de fotocopiadoras ou eletrônicos. Assinatura _____________________________________________________ Data 11/07/2016 e-mail:
S586
Silva, Luciana Vasco da O DESENVOLVIMENTO DO COMÉRCIO ELETRÔNICO NO ÂMBITO INTERNACIONAL DA CONVENÇÃO INTERNACIONAL DE COMPRA E VENDA DE VIENA/ Luciana Vasco da Silva. – São Paulo: s.n., 2016
. 170 p. ; 30 cm. Referências: 136-149 Orientadora: Profa. Dra. Maria Eugênia Finkelstein Dissertação (Mestrado), Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, Programa de Pós-Graduação em Direito, 2016.
1. Internet 2. Contratos eletrônicos - Direito 3. CISG
CDD 340
Banca examinadora:
AGRADECIMENTOS
Em primeiro lugar, agradeço a Deus e São Judas Tadeu, que me concederam a graça de cursar o mestrado e superar todas as dificuldades.
Agradeço aos meus pais por serem meus exemplos e por me apoiarem de todas as formas. Tudo o que eu faço de bom é mérito de vocês.
Agradeço ao meu irmão, Felipe Vasco da Silva, pelo constante apoio e exemplo, pela amizade eterna e fraterna que há entre nós.
Agradeço a minha orientadora Profa. Maria Eugênia Finkelstein pela constante atenção, incentivo e exemplo de profissional e, principalmente, orientadora, sabendo aplacar dúvidas e aflições.
Aos meus colegas da Central Nacional Unimed que estiveram comigo durante a caminhada e proporcionaram a conclusão do curso.
Aos meus colegas de mestrado que dividiram angústias, questionamentos e medos durante a trajetória.
LISTA DE SIGLAS
B2B Business to business / De empresa para empresa
B2C Business to consumer / De empresa para consumidor
C2C Consumer to consumer / De consumidor para consumidor
CDC Código de Defesa do Consumidor
CFR Common Frame of Reference
CPC Código de Processo Civil
CPI Comissão Parlamentar de Inquérito
CISG Convenção Internacional de Compra e Venda de Viena
CGI Comitê Gestor da Internet
F-Commerce Facebook Commerce / Comércio no Facebook
FTC Federal Trade Commission
G2B Government to business / De governo para empresa
G2C Government to citizen / De Governo para cidadão
GATS General Agreement on Trade in Services ou Acordo Geral sobre Comércio de Serviços
ICC Câmara Internacional do Comércio
ICP Infraestrutura de Chaves Públicas
INCE Iniciativa nacional para o comércio eletrônico
Incoterm International Commercial Terms / Termos Internacionais de Comércio
LINDB Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro
M-Commerce Mobile Commerce / Comércio Móvel
OECD Organization for Economic Co-operation and Development / Organização para Cooperação econômica e desenvolvimento
OMC Organização Mundial do Comércio
ONU Organização das Nações Unidas
PECL Princípios do Direito Contratual Europeu
UE União Européia
ULF Convenção para Lei Uniforme sobre a formação dos contratos de compra e venda internacional de mercadorias
ULIS Convenção para uma lei uniforme relativa à Compra e Venda Internacional
UNCTAD United Nations Conferencion Trade and Development on / Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e desenvolvimento
Uncitral Comissão das Nações Unidas para o Direito Comercial Internacional
LISTA DE FIGURAS
Figura 2 Crescimento do comércio B2C............................................ 30
Figura 3 Crescimento do Social Commerce nos Estados Unidos e no Mundo.............................................................................
34
Figura 4 O crescimento do m-commerce em âmbito mundial.... 36
Figura 5 Crescimento do m-Commerce no Brasil.............................. 36
SILVA, Luciana Vasco da. O DESENVOLVIMENTO DO COMÉRCIO ELETRÔNICO NO ÂMBITO INTERNACIONAL DA CONVENÇÃO INTERNACIONAL DE COMPRA E VENDA DE VIENA. 170 p. Dissertação (Mestrado em Direito) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC- SP), São Paulo, 2016.
RESUMO
O desenvolvimento da internet foi responsável pela criação de um mercado internacionalizado e conectado eletronicamente, englobando milhões de empresas e indivíduos que se beneficiam do contato ágil e prático proporcionado pelos meios eletrônicos. No início, o contato eletrônico era simples, porém com o volume cada vez maior, a complexidade torna-se uma das características do comércio eletrônico. Tais contratos, de execução parcial ou integral eletronicamente, passaram a regular o relacionamento jurídico de partes situadas em Estados diversos, em razão da transnacionalidade da internet e da globalização, resultando em contratos internacionais eletrônicos, objeto do presente estudo. No interesse de delinear os principais aspectos da disciplina dos contratos internacionais eletrônicos no cenário internacional, são analisadas normas elaboradas por Estados e Organizações Internacionais, que visam garantir direitos e obrigações semelhantes àqueles existentes nos documentos físicos, em papel. Após a investigação descrita, o estudo é concluído com a análise da Lei mais importante sobre o tema, aprovada em 2014: A Convenção Internacional de Viena sobre Compra e Venda, que apesar de inovadora não traz ainda menção ao contrato eletrônico, mas que pode ser facilmente adaptada a essa forma de contratação.
Palavras-chave: internet, contratos eletrônicos, CISG.
SILVA, Luciana Vasco da. The E-commerce development in international context. 170 p. Dissertação (Mestrado em Direito) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), São Paulo, 2016.
ABSTRACT
Internet development was responsible for the creation of an electronically internationalized and connected market, encompassing millions of companies and individuals, which benefit from the quick and practical contact provided by electronic means. In the beginning, the electronic contract was simple, however, with the increasing volume; complexity has become one of the e-commerce characteristics. Such contracts, of electronically partial or integral execution, have started to regulate the juridical relationship of parties situated in different states, due to Internet and globalization transnationality, resulting in electronic international contracts, object of the present study. Interested in delineating the main aspects of the subject of electronic international contracts in international scenario, some rules elaborated by states and International Organizations are analysed, seeking to ensure rights and obligations similar to those existing in material documents, in paper. After the described investigation, the study is concluded with the analysis of the most important law regarding the theme, passed in 2014: The United Nations Convention on Contracts for the International Sale of Goods, which even being innovative, does not mention the electronic contract, but can be easily adapted to this contracting fashion.
Keywords: internet, electronic contracts, CISG
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .............................................................................. 14
CAPÍTULO 1 A EVOLUÇÃO DO COMÉRCIO ELETRÔNICO DE COMPRA E VENDA DE MERCADORIAS .................................... 17
1.2. O Comércio Eletrônico e seu Desenvolvimento ............................. 17
1.3. Regulação da Internet no Brasil e no Mundo ................................. 26
1.4. Modalidades do Comércio Eletrônico ............................................. 29
1.4.1. Business to business – B2B ....................................................................... 29
1.4.2. Business to consumer – B2C .................................................. 30
1.4.2.1. Facebook Commerce (F-Commerce) .................................................... 33
1.4.2.2 Mobile Commerce (M-Commerce) ................................................................... 36
1.4.3. Consumer to consumer – C2C .................................................................... 37
1.4.4. Government to citizen – G2C e Government to business – G2B....... 38
1.5. Vinculação das partes no meio eletrônico ...................................... 39
1.6. A Universalização da Forma de contratação .................................. 43
CAPÍTULO 2 O CONTRATO INTERNACIONAL .......................... 45
2.1. Comércio Internacional .................................................................... 45
2.3. Dos Contratos Internacionais .......................................................... 53
2.3.1. Autonomia da vontade nos Contratos Internacionais .......................... 62
2.3.1.1. Da Ordem Pública.....................................................................................71
2.4. Questões sobre o Contrato Internacional na Forma Eletrônica.... 78
2.5. Lex Mercatoria ................................................................................... 83
CAPÍTULO 3 AS INICIATIVAS LEGISLATIVAS PARA O COMÉRCIO ELETRÔNICO .......................................................... 96
3.1. A necessidade de regulamentação mundial sobre o comércio eletrônico .................................................................................................. 96
3.1.1. A União Europeia e o Comércio eletrônico ................................. 97
3.1.1.1. As primeiras Diretivas ........................................................................................ 98
3.1.1.2. Diretiva 2000/31/CE ........................................................................................... 98
3.1.2. Lei modelo da United Nations Commission on International Trade Law (UNCITRAL) - Comissão das Nações Unidas para o Direito Mercantil Internacional (CNUDMI) ........................................................ 100 3.1.2.1. Formação do Contrato pela Lei Modelo da UNCITRAL ............................. 105
3.1.2.2. Lei Modelo de 2003 ......................................................................................... 106
3.1.3. OMC ...................................................................................................................... 107
3.1.4 Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Econômico (OECD) .................................................................................................... 109 3.1.5 Convenção de Viena ..................................................................... 111 3.2. Situação Legislativa sobre Comércio Eletrônico no Brasil ......... 113
3.2.1. O contrato eletrônico como meio de prova ............................... 116
CAPÍTULO 4 O CONTRATO ELETRÔNICO DE COMPRA E VENDA, REGULAMENTADO PELA CONVENÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A VENDA INTERNACIONAL DE MERCADORIAS - CISG ......................................................................................... 120
4.1. Importância da CISG ....................................................................... 120
4.2. Aplicação da CISG .......................................................................... 123
4.3. Princípio do Consensualismo (Da Liberdade de Forma e Prova)128
4.3.1 Princípio da Equivalência Funcional ........................................... 129
4.4. A CISG e o comércio eletrônico..................................................... 131
4.5. Concepção de Contrato na CISG ................................................... 137
4.5.1. Formação do contrato ................................................................. 138
4.5.2. Quanto à forma de celebração .................................................... 145
4.5.2.1 Local de formação do contrato ........................................................................ 148
4.5.3. Da capacidade das partes ..................................................................... 149
4.5.4. Foro para resolução de controvérsia ................................................... 150
4.5.5 Forma de resolução do contrato ................................................................... 150
SÍNTESE DE CONCLUSÕES ..................................................... 152
INTRODUÇÃO
Os avanços no âmbito da tecnologia, verificados ao longo dos séculos,
influenciaram o desenvolvimento do comércio.
Durante a história da humanidade, o surgimento de novas tecnologias
sempre representou desafio à organização e evolução das sociedades. Com o
Direito e os contratos não é diferente, vez que estes precisam acompanhar o
desenvolvimento da sociedade. Atualmente, os instrumentos materializados em
documentos escritos e assinados dividem espaço com os contratos
formalizados eletronicamente, por meio da internet.
Sob a ótica econômico-social, a internet contribuiu para o avanço do
comércio eletrônico, o qual vem crescendo exponencialmente em todo o
mundo. A expansão do comércio eletrônico está atrelada a características de
grande importância econômica a ele relacionadas, como exemplificativamente,
o encurtamento de distância, a amplificação da oferta, a diminuição de custos,
a superação de barreiras e a celeridade na celebração dos contratos.
As inovações tecnológicas facilitam a comunicação e,
consequentemente, estimulam as relações comerciais internacionais. Contudo,
o maior fluxo de transações comerciais remete a um questionamento jurídico
basilar, qual seja, em caso de litígio, qual a legislação aplicável: a do país do
vendedor ou a do país do comprador? E quando não se sabe a localidade
desses personagens, vez que estes estão comprando e vendendo on-line?
Uma solução para reduzir essa insegurança nas relações contratuais
internacionais seria unificar os regimes através de uma “lei internacional” que
pudesse reger todos os negócios internacionais. Essa lei reuniria, em um só
documento, princípios aplicados aos diversos sistemas legais, e seria
igualmente conhecida, reconhecida e estudada pelos juristas de todas as
nações.
Para tentar aplicar esse conceito, foi discutida a Convenção de Viena de
1980, que representa um grande passo para a segurança jurídica, a
racionalização e o consequente ganho em eficiência dos negócios
internacionais. A CISG já se transformou em um dos principais instrumentos
legais em comércio internacional, superando as expectativas de todos aqueles
que participaram de sua elaboração.
Pode-se dizer que a CISG é o resultado da busca dos comerciantes por
uma legislação uniforme que regule a compra e a venda internacional de
mercadorias. Esse conceito inicia-se com o termo lex mercatoria, surgido
durante a Idade Média, que vem se desenvolvendo até os dias atuais com a
união de esforços no sentido de homogeneizar as regras do comércio
internacional.
Nesse sentido, a presente pesquisa foi motivada pelo desenvolvimento
do comércio de compra e venda de bens e pela aplicação da CISG. Logo,
indaga-se: como o comércio eletrônico pode influenciar os contratos
internacionais e qual legislação aplicar a estes casos? A CISG também poderá
ser aplicada aos contratos eletrônicos? Como aplicar uma lei criada em 1980,
quando a revolução tecnológica não tinha alcançado seu ápice? Será que essa
legislação já nasceu ultrapassada no Brasil?
Salienta-se que o presente trabalho analisará especificamente a relação
de compra e venda de bens, regulado pela CISG. Apesar de ser possível a
aquisição de serviços via internet, este não é objeto da presente pesquisa pois
não é regulado pela CISG.
O Capítulo 1 desta dissertação abordará o desenvolvimento do comércio
eletrônico, na compra e venda de mercadoria. Estudaremos o impacto da
tecnologia no comércio atual, a aplicação das redes sociais e smartphones.
Veremos que atualmente o comércio é indissociável da tecnologia.
No Capítulo 2, verificaremos o desenvolvimento do comércio
internacional, a necessidade de uniformização da legislação para se garantir a
segurança das transações. Estudaremos detalhadamente o conflito de normas
e a necessidade de uma “legislação única” para segurança do comércio
internacional.
O Capítulo 3 é o resultado prático do que foi visto nos primeiros
capítulos. Nele abordaremos o resultado da junção entre o comércio eletrônico
e o internacional e as medidas legislativas para regulá-lo.
No quarto e último capítulo, abordaremos o desenvolvimento e a
utilização da Convenção Internacional de Compra e Venda de Viena – CISG,
analisando, conforme o panorama do comércio atual, se a mesma pode ser
considerada “natimorta” ou se apenas é necessário readequar seu
entendimento ao ambiente tecnológico atual.
Por fim, apresentaremos as conclusões da presente pesquisa.
Para a análise do tema, utilizaremos a pesquisa doutrinária, análise de
legislação estrangeira e decisões arbitrais que envolvam a CISG.
CAPÍTULO 1 A EVOLUÇÃO DO COMÉRCIO ELETRÔNICO DE COMPRA E VENDA DE MERCADORIAS.
O presente capítulo abordará o desenvolvimento do comércio eletrônico.
O Brasil representa 90% do comércio eletrônico da América Latina1. Nesse
contexto, o comércio eletrônico ultrapassa as fronteiras nacionais e passa a ser
objeto de preocupação de âmbito internacional, na medida em que o mercado
mundial absorve o comércio eletrônico em grande escala. Grandes transações
internacionais passam a ser realizadas em âmbito internacional.
1.2. O Comércio Eletrônico e seu Desenvolvimento
O comércio eletrônico é resultante do aperfeiçoamento do comércio
tradicional, que se iniciou com a troca de mercadorias2.
1 BLUM, Renato M. S. Opice; ALMEIDA, Rafael Augusto Paes de. Contratos eletrônicos internacionais. Disponível em: <www.buscalegis.ufsc.br/arquivos/contratosEl.html>. Acesso em: 04 dez. 2014. 2 A espécie de comércio mais primitivo foi o escambo, onde trovava-se mercadorias, sem o envolvimento de moeda. Aos poucos, surgiram as moedas advindas de metais não nobres, que não preservavam a riqueza. Com a criação de moedas de metais nobres, tais como ouro e cobre, as mercadorias passam a ser valorizadas monetariamente, não sendo mais trocadas por outras mercadorias. Em âmbito internacional, o comércio é realizado desde o Século V a.C, através da navegação pelo Rio Nilo. Durante a Idade Média, os comerciantes organizam-se em corporações, com intuito de definir as regras e diretrizes que deveriam balizar o desenvolvimento do comércio. O Direito Comercial nasce a partir dessas corporações, por meio do Direito consuetudinário e corporativo. A partir dos Séculos XIII e XIV, os grandes comerciantes já realizavam atividades econômicas de forma ordenada e racional, muitas vezes desenvolvendo atividades bancárias ou servindo de instrumento para as movimentações financeiras da Igreja. No Século XV, surgiram as feiras de comerciantes, nas quais reuniam-se mercadores de vários locais para o comércio de bens. A partir das feiras, criou-se os armazéns, que foi o pré modelo dos Centros de Distribuição de Mercadorias. Este modelo facilitava a entrega dos produtos, pois as vendas eram realizadas
desenvolvimento da Internet. Durante a Guerra Fria, a comunicação entre
bases militares americanas era feita atrás de uma rede chamada ArpaNet,
desenvolvida pela empresa ARPA, com intuito de interligar os departamentos
de pesquisa. Essa “nova comunicação” tinha como principal objetivo diminuir a
vulnerabilidade da comunicação. Inicialmente, a rede de informações era
utilizada apenas para troca de informações acadêmicas.
Segundo Turban e King3, “as primeiras aplicações do Comércio Eletrônico
ocorreram no início da década de 70, com a transferência eletrônica de fundos,
na qual se poderia transferir dinheiro eletronicamente”.
Em 1978, através dos franceses Simon Nora e Alain Minc, foi divulgado o
famoso relatório sobre o processo de informatização da sociedade. Os
referidos escritores publicaram a obra “A informatização da sociedade”, que
fazia menção à crescente associação entre computadores e
telecomunicações4.
permitiram as trocas eletrônicas de documentos comerciais (ordem de compras
e contas). No final dos anos 1980, a aceitação de cartões de créditos e o uso
de caixas eletrônicos tiveram aumento significativo, processos pelos quais
também se realiza o comércio eletrônico.
Segundo André Recalde Castells5:
por “caixeiros viajantes”. Esse também é o primeiro modelo no qual o consumidor não tinha contato direto com o produto, antes da compra. 3TURBAN, Efraim; KING, David. Comércio Eletrônico Estratégia e Gestão. São Paulo: Prentice Hall, 2004, p. 7. 4 SIQUEIRA, Ethevaldo. Revolução digital: história e tecnologia no século 20. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 137. 5 TRADUÇÃO LIVRE: “As primeiras manifestações de comércio eletrônico aparecem na década de 80 com a realização de transações comerciais, mediante determinadas linguagens formalizados através da emissão da declaração de vontade das partes (ordem de compra, venda, pagamento), que se conhece como Electronic Data Interchange (EDI).” In: CASTELLS, André Recalde. Comercio y Contratación Electrónica in Informática y Derecho. Jornada sobre Contratación Electrónica, Privacidad y Internet. Revista Iberoamericana de Derecho
las primeras manifestaciones de comercio electrónico aparecen en la década de los 80 con ocasión de la realización de transacciones comerciales mediante determinados lenguajes formalizados a través de los cuales las partes emiten sus declaraciones de voluntad (orden de compra, venta, pago), que es lo que se conoce como Electronic Data Interchange (EDI).
A popularização da internet – interligação entre computadores e meios de
telecomunicações – trouxe uma nova realidade jurídica às relações comerciais:
o e-commerce6. Esse fenômeno reflete diretamente na transformação das
relações jurídicas privadas, uma vez que esse tipo de comércio promove
comodidade e redução de custos.
Turban e King7 contam como foi o desenvolvimento da Internet e como
ela influenciou o cotidiano das empresas:
Desde 1995 os usuários da Internet vêm acompanhando o desenvolvimento de diversas aplicações, desde comerciais interativos até experiências com realidade virtual. Quase todas as empresas de médio e grande porte, em todo o mundo, já possuem um site, e a maioria das corporações norte- americanas tem grandes portais em que os funcionários, os parceiros comerciais e o público podem acessar informações corporativas. Essa nova possibilidade ampliou a participação de empresas financeiras, de manufatura, de revenda e prestadoras de serviços.
Na década de 1990, empresas americanas e europeias passaram a
oferecer serviços através da rede de computadores, e, a partir de então,
começou a associação da expressão “comércio eletrônico” com a possibilidade
de negociar e adquirir produtos ou serviços através da internet.
Olavo Baptista faz um interessante paralelo entre o comércio eletrônico e
a antiga figura do “mascate”:
Informático, Universidad Nacional de Educación a Distancia centro Regional de Extremadura. Mérida, 1999, p. 40. 6PAULA, A. S. Contratos eletrônicos na relação de consumo. Disponível em: <http:// www.jus.com.br/doutrina>. Acesso em 18 set. 2015. 7TURBAN, Efraim; KING, David. Comércio Eletrônico Estratégia e Gestão. São Paulo: Prentice Hall, 2004, p. 7.
O comércio eletrônico é, de certa forma, o retorno do "mascate". Todos nós temos a lembrança deste personagem, freqüente nos tempos coloniais, ainda existente no início do século XX, e que visitava a casa das pessoas na zona rural ou nos bairros afastados, levando mercadorias de pequeno porte, e imagens ou amostras de outras que entregaria quando encomendadas pelo comprador interessado. O mascate não tinha estabelecimento próprio. Ia até o comprador, e oferecia- lhe bens que, em grande parte, não tinha em estoque e adquiria para entregar, quando encomendados. A especificidade da atividade comercial do mascate era a de se deslocar diante do consumidor final e oferecer-lhe, verbalmente, a mercadoria, eliminando a necessidade de deslocamentos físicos deste, propondo-lhe uma variedade de bens.8
O comércio eletrônico é a melhor expressão e exemplo de aplicação de
tecnologias convergentes na nova economia digital. A rede oferece a
infraestrutura de comunicação de fácil acesso e uso, com custo compatível
com o cliente final do varejo9.
Marco Aurélio Greco diz que o comércio eletrônico tornou-se muito
significativo, tanto em volume de negócios como em valores de negócios
realizados10.
Para Rogério de Andrade, o conceito de comércio eletrônico pode ser
descrito como: “O Comércio Eletrônico é a aplicação de tecnologias de
comunicação e informação compartilhadas entre as empresas, procurando
atingir seus objetivos”11.
De acordo com a legislação tributária americana, no Internet Freedom Act
Section 1105, o e-commerce pode ser definido como:
Any transaction conducted over the Internet or through Internet access, comprising the sale, lease, license, offer, or deliver of
8BAPTISTA, Luiz Olavo. "Comércio Eletrônico: uma visão do Direito Brasileiro". Revista da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, São Paulo, v. 94, 1999, p. 83-100. 9MEIRELLES, Fernando de Souza. Informática: novas aplicações com microcomputadores. 2. ed. São Paulo: Makron Books, 1994, p. 11. 10 GRECO, Marco Aurélio. Internet e Direito. 2. ed. São Paulo: Dialética, 2000, p. 51. 11 ANDRADE, Rogério de. Guia Prático de E-Commerce. 1. ed. São Paulo: Angra, 2001, p. 13.
property, goods, services or information, wheter or not for consideration, and includes the provision of Internet access.12
Já o ETF Report da Australian Transactions Reports and Analysis Centre
–AUSTRAC define o e-commerce como:
A general term applied to use of computer and telecommunications technologies, particularly on an inter- enterprises basis, to support trading in goods and services. Electronic commerce uses a variety of technologies such as EDI, e-mail, facsimile transfer, electronic catalogues and directory systems.13
Os autores Kaloka e Whinston definem o e-commerce a partir de
perspectivas: pela distribuição de produtos, serviços, informação ou pagamento
por meio de rede de computadores ou outro meio eletrônico. É ferramenta de
atendimento às necessidades de distribuição de custos e elevação de
qualidade e agilidade de atendimento14.
Alberto Albertin15 conceitua o comércio eletrônico da seguinte maneira: “a
realização de toda cadeia de valor dos processos de negócio num ambiente
eletrônico, por meio de aplicação intensa das tecnologias de comunicação e
informação, atendendo aos objetivos do negócio”.
Fábio Ulhoa Coelho16 ensina que comércio eletrônico nada mais é do
que:
12TRADUÇÃO LIVRE: “Qualquer transação realizada através da Internet ou através de acesso à Internet, que inclui a venda, arrendamento, licença, oferta ou entrega de propriedade, bens, serviços ou informações, com ou sem título oneroso, ou até mesmo o fornecimento de acesso à Internet.” Disponível em: <http://www.gpo.gov/fdsys/pkg/USCODE-2011- title47/html/USCODE-2011-title47-chap5-subchapI-sec151.htm>. Acesso em: 18 set. 2015. 13TRADUÇÃO LIVRE: “Um termo geral aplicado ao uso do computador e tecnologia de telecomunicação, em especial numa base interempresariais, para apoiar o comércio de bens e serviços. O comércio eletrônico utiliza uma variedade de tecnologias, tais como EDI, e-mail, transferência de fac-símile, catálogos eletrônicos e sistemas de diretório. In: TEIXEIRA JUNIOR, Ivo, 2000, p. 1. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/3122/novas-formas-de- comercio-internacional>. Acesso em: 18 set.2015. 14 KALOKOTA, R.; ROBINSON, M. E-Business 2.0. Boston: Addison Wesley, 2001, p. 32. 15ALBERTIN, Alberto Luiz. Comércio eletrônico: modelo, aspectos e contribuição de sua aplicação. São Paulo: Atlas, 2000, p. 14. 16COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. Vol. 3. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 32.
Para Rodney de Castro Peixoto, há diversos conceitos que podem ser
aplicados com diferentes enfoques. Segundo ele17:
1 - Conceito técnico – comércio eletrônico é uma combinação de tecnologias, aplicações e procedimentos negociais que permitem a compra e venda on-line de bens e serviços entre governos, sociedades, corporações privadas e o público. [...] 2 - Conceito econômico – comércio eletrônico é a realização de toda a cadeia de valor dos processos de negócios, realização esta efetuada no ambiente digital. 3 - Conceito administrativo (privado) – comércio eletrônico é um termo genérico que descreve toda e qualquer transação comercial que se utiliza de um meio eletrônico para ser realizada. Com o uso de tecnologia se obtém a otimização do relacionamento da cadeia de suprimentos até o ponto de venda, bem como a melhora da comunicação entre a empresa e o cliente final. 4 - Conceito jurídico – comércio eletrônico é a atividade comercial explorada através de contrato de compra e venda com a particularidade de ser este contrato celebrado em ambiente virtual, tendo por objeto a transmissão de bens físicos ou virtuais e também serviços de qualquer natureza.
Complementando este entendimento sobre o conceito, Maria Eugênia
Finkelstein18 assevera que o comércio eletrônico nada mais é do que uma
modalidade de compra à distância, na qual são recebidas e transmitidas
informações por meio eletrônico.
Ressalta-se, ainda, que a definição de comércio eletrônico pode ser vista
sob dois aspectos, segundo Cláudia Lima Marques19: em sentido estrito, “como
sendo uma das modalidades de contratação não presencial ou à distância para
aquisição de produtos e serviços através de meio eletrônico ou via eletrônica”;
17PEIXOTO, Rodney de Castro. O comércio eletrônico e os contratos. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 10. 18FINKELSTEIN, Maria Eugênia Reis. Direito do comércio eletrônico. 2. ed. Rio de Janeiro: Elseiver, 2011, p. 38. 19MARQUES, Cláudia Lima. Confiança no comércio eletrônico e a proteção ao direito do consumidor: (um estudo dos negócios jurídicos de consumo no comércio eletrônico). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 38.
e em sentido amplo, “como um novo método de fazer negócios através de
sistemas e redes eletrônicas”.
Pode-se, assim, dizer que o comércio eletrônico (e-commerce) é o novo
meio para realizar o que já se fazia desde os primórdios da civilização: vender,
comprar, trocar produtos entre si, enfim, comercializar, mas agora por meio da
rede mundial de computadores, com um baixo custo, um grande mercado, um
grande alcance, ultrapassando fronteiras em segundos, com segurança e com
outras inúmeras facilidades, como também com problemas já conhecidos nos
meios tradicionais de comércio.
O acesso global a produtos/serviços oferecidos ao alcance de um clique e
sem fronteiras físicas confere maior e ilimitado acesso aos mercados on-line. A
ausência de intermediadores facilita a comercialização e barateia a compra.
Hoje, as corporações estão utilizando a web para, além de comprar e
vender, integrar sua cadeia de fornecedores, parceiros de negócios e sua força
de vendas. Além das tradicionais transações de compra e venda, o e-business
permite outros processos, tais como: esforços pré e pós-vendas, pesquisa de
mercado, suporte ao cliente, recrutamento, relações públicas, treinamento e
todo tipo de atividade colaborativa.
Com o comércio eletrônico, a principal mudança é o fato de que é levada
ao alcance do consumidor a “vitrine” do comerciante, sem a necessidade de
deslocamento físico, de um estabelecimento comercial.
O Comércio eletrônico vem crescendo, porém em ritmo menos acelerado
desde 2014, conforme prevê o gráfico abaixo:
Para se ter uma ideia do crescimento do comércio eletrônico, até março
de 2014, segundo dados da E-bit, 51,3 milhões de pessoas já utilizaram a web
ao menos uma vez para adquirir um produto. Os dados representam um
crescimento de 28% no comércio eletrônico em comparação a 2013,
alcançando um faturamento de 28,8 bilhões de reais.20
Até julho de 2015, o Brasil era o maior mercado de comércio eletrônico da
América Latina. O México ocupava o segundo lugar, com receitas projetadas
de US$ 5,7 bilhões em 2015. A Argentina estava na terceira posição (US$ 4,96
bilhões), mas deve ter crescimento de 40%, o mais rápido da região21.
O crescimento do e-commerce ocorre em virtude da grande demanda por
serviços financeiros, ou seja, as operações bancárias deixam de ser “in loco” e
passam a ser on-line. Há inclusive títulos de créditos eletrônicos onde a
cartularidade é relativizada.
Com o crescimento da sociedade da informação, a moeda também
desmaterializa-se, passando a ser de ordem virtual. A mais famosa moeda
virtual é a “bitcoin”. A extinção legal da circulação de cédulas e moedas e o uso
exclusivo de dinheiro em meio eletrônico, ou digitalizado, poderá revolucionar
20 Disponível em: <http://info.abril.com.br/noticias/mercado/2014/03/comercio-eletronico- alcanca-51-3-mi-de-consumidores-no-brasil.shtml> Acesso em: 04 dez. 2014. 21 Jornal Valor Econômico de 17 jul. 2015. Disponível em: <http://www.valor.com.br/empresas/4139880/comercio-eletronico-deve-crescer-173-em-2015- preve-emarketer>. Acesso em: 17 jul. 2015.
automação, da economia.
A Dinamarca anunciou que pretende eliminar a circulação de cédulas e
moedas no mercado até 2016, com o fito de fomentar a produtividade dos
negócios e cortar consideráveis custos administrativos e financeiros envolvidos
na utilização de moeda manual. Ao contrário do Brasil, apenas um quarto dos
pagamentos é feito em dinheiro pela população e praticamente todos os
pequenos negócios aceitam pagamento em cartão naquele país. Mais próximo
da realidade socioeconômica do Brasil, o Equador é outro país que começou a
adotar medidas para aumentar o uso do dinheiro eletrônico para por fim ao
dinheiro físico. A iniciativa equatoriana se apoia sobre a grande quantidade de
aparelhos celulares, uma vez que todos os domicílios têm no mínimo um
celular. E, através de uma central de atendimento telefônico, é possível abrir
uma conta eletrônica, útil para realizar transferências entre usuários, compras
em vários estabelecimentos e pagar passagens no transporte público.
No Brasil, o Projeto de Lei nº 48, de 2015, pretende extinguir a produção,
circulação e uso do dinheiro em espécie, de modo que todas as transações
financeiras se realizem apenas por meio digital, em cinco anos a contar da
aprovação, projeto que está em tramitação na Câmara dos Deputados (2015),
cuja justificativa destaca a inevitabilidade de se extinguir o dinheiro físico,
diante da crescente digitalização do dinheiro. Apesar das dificuldades
relacionadas à implantação da medida, bastante abrupta, é verdade, haja vista
que, não obstante as patentes vantagens e a oportunidade criada pela
sociedade da informação, não existia nenhuma política pública específica em
curso antes do projeto para eliminação da moeda manual.
A União Europeia já se debruçou em oferecer respostas legais ao
surgimento da atividade eletrônica de emissão de moedas, cujo teor é
precursor. A Diretiva 2000/46/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de
2000, tratou sobre o acesso e o exercício da atividade de emissão de moeda
eletrônica, com o intuito de promover uma supervisão prudencial e fortalecer o
mercado interno. Posteriormente, adveio a Diretiva 2009/110/CE, de 2009, para
facilitar ainda mais o acesso à atividade de emissão de moeda eletrônica e o
seu exercício, assegurando condições equitativas de concorrência aos
prestadores dos serviços de pagamento.
1.3. Regulação da Internet no Brasil e no Mundo
A regulação da internet ganhou forma a partir de 1994, nos Estados
Unidos. As primeiras leis que regularam a Internet, nos Estados Unidos,
protegiam as crianças. A primeira lei aprovada em 1996, passou a criminalizar
a distribuição de material pornográfico online envolvendo menores de idade.
Também em 1995 começaram a ser produzidos navegadores que permitiam
aos usuários filtrar o conteúdo da WEB. Foi o início da autorregulação
estimulada pela iniciativa privada.22
Outros países como China e países do Oriente Médio e Norte da África
também adotaram medidas de controle da Internet.
A Europa tem tentado promover ações integradas através da União
Europeia (UE). O programa “Internet Segura” da UE está investindo na
proteção de menores e prevenção da disseminação de material relacionado a
abusos sexuais de crianças, aliciamento e ciber bullying. A União Europeia
também tem criado diretivas para regular o comércio eletrônico (The Electronic
Commerce Directive), os conteúdos audiovisuais (The Audiovisual Media
Services Directive ), direitos autorais (Directive on Copyright and Related
Rights , e Directive on the Enforcement of Intellectual Property Rights ) e
segurança (Data Retention European Directive ).23
22 DENICOLI, Sérgio. A Regulamentação da Internet: Políticas da Era da Comunicação Digital. Diponível em: <http://compos.org.br/encontro2014/anais/Docs/GT01_COMUNICACAO_E_CIBERCULTURA/d enicolicompos_2137.pdf.> Acesso em 09 jun. 2016. 23 DENICOLI, Sérgio. A Regulamentação da Internet: Políticas da Era da Comunicação Digital. Diponível em: <http://compos.org.br/encontro2014/anais/Docs/GT01_COMUNICACAO_E_CIBERCULTURA/d enicolicompos_2137.pdf.> Acesso em 09 jun. 2016.
regulação do uso da internet.24 O Acordo Comercial Anticontrafação (ACTA -
Anti-Counterfeiting Trade Agreement ), foi o mais importante acordo sobre o
assunto, assinado pela Austrália, Canadá, Coréia do Sul, Estados Unidos,
Japão, Marrocos, Nova Zelândia e Singapura. O Parlamento Europeu rejeitou o
acordo, mesmo após 22 países membros da UE terem assinado. O ACTA tem
sido muito criticado, com acusações de que é um tratado que promove a
censura e cerceia a liberdade de expressão.
No caso brasileiro, as iniciativas de regulação de conteúdos online
tiveram início em 1995, quando foi criado o Comitê Gestor da Internet no Brasil
– CGI.br, constituído por membros do governo, do setor empresarial, do
terceiro setor e da comunidade acadêmica. Na esfera política governamental, a
discussão sobre a regulação dos conteúdos online começou, de fato, em 1999,
com a apresentação do Projeto de Lei 84/99, conhecido como Lei Azeredo. O
referido projeto trabalhava com a perspectiva de tornar crimes passíveis de
prisão ou multa diversos atos praticados na Internet. O projeto teve um grande
impacto na sociedade porque previa a criação de obrigações de vigilância e
ampliava os poderes de investigação policial na esfera online. Como
consequência, chegou a ser classificado por setores da imprensa e da
sociedade civil como uma espécie de AI-5 digital .
O Projeto de Lei 84/99 transformou-se na Lei nº 12.735/2012, de 30 de
novembro de 2012, mais conhecida como Lei Carolina Dieckmann. Essa Lei
alterou o Código Penal Brasileiro para tipificar como infrações uma série de
condutas no ambiente digital, principalmente em relação à invasão de
computadores. A Lei estabelece como pena a possibilidade de detenção de
três meses a um ano e multa.
24 Nos Estados Unidos houveram dois controversos projetos sobre a regulação da internet: Stop the Online Piracy Act (SOPA) and Protect IP Act - Preventing Real Online Threats to Economic Creativity and Theft of Intellectual Property (PIPA). Eles versam, principalmente, sobre direitos autorais e copyright dos conteúdos difundidos na rede. Ambos não foram aprovados.
A Legislação mais relevante sobre a Internet no Brasil é a Lei nº 12.965
de 2014, considerado como um Código Civil da Internet ou até mesmo a
Constituição da Internet, segundo Paulo Roberto Narezi25.
Para Paulo Roberto Narezi26, no Marco Civil da Internet:
“O legislador reuniu princípios que já estavam em nosso ordenamento jurídico e aplicados pelos tribunais brasileiros. Porém, merecem destaque na lei os pontos que tratam da neutralidade, da privacidade e da liberdade de expressão na internet [...]”
Quanto ao princípio da neutralidade, previsto no Marco Civil da Internet,
as operadoras ou fornecedoras de serviços de internet não podem tratar
diferentemente os usuários de acordo com o uso dos serviços, ou seja, a
velocidade deve ser igual, independentemente da utilização do usuário.
No que tange à privacidade, a lei garante ao usuário o direito à
inviolabilidade da intimidade e da vida privada, ao sigilo do fluxo de suas
comunicações, à exceção dos casos em que houver ordem judicial.
Apesar da previsão de privacidade, o artigo 15 da lei, obriga os
provedores de internet a manter os registros de acesso a aplicações de internet
de seus usuários, sob sigilo, pelo prazo de seis meses. Esse prazo poderá ser
aumentado em razão de ordem judicial específica.
Antes mesmo do Marco Civil da Internet, o Superior Tribunal de Justiça já
decidia, que os provedores eram (e continuam a ser) obrigados a viabilizar a
identificação de usuários, coibindo o anonimato. Segundo a decisão27, é dever
do provedor e oferecer meios de identificação dos usuários, através do
fornecimento do número do IP.
25 NAREZI, Paulo Roberto. Marco Civil da Internet – uma lei que ainda precisa de regulamentação. Disponível em < http://www.gazetadopovo.com.br/vida-publica/justica- direito/artigos/marco-civil-da-internet--uma-lei-que-ainda-precisa-de-regulamentacao- 8mznvd6csilh0ndr7a45iynv2>. Acesso em 09. Jun.2016. 26 Ibid 27 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial n.º 259482/MG, Relator Ministro Sidinei Beneti, Terceira Turma, julgado em 16.04.2013.
responsabilizados pelo conteúdo divulgado por terceiros, salvo se instados
judicialmente, não promoverem a retirada do conteúdo no prazo determinado.
No julgamento do Agravo Regimental no Recurso Especial n.º
1.182.5032128, de relatoria do Ministro Raul Araújo, julgado pela 4ª Turma do
Superior Tribunal de Justiça, restou estabelecido que: “a fiscalização prévia,
pelo provedor de conteúdo, do teor das informações postadas na web por cada
usuário não é atividade intrínseca ao serviço prestado, de modo que não se
pode reputar defeituoso”.
Dependendo dos agentes envolvidos no comércio eletrônico, este poderá
se caracterizar de forma diversa, como veremos em seguida.
1.4.1. Business to business – B2B
De acordo com Novaes29, o “business to business”, ou B2B, é o comércio
eletrônico entre empresas ou corporações, caracterizando-se por ter apenas
pessoas jurídicas envolvidas no processo.
Para Ching30, o B2B pode ser entendido por “companhias conduzindo
negócios uma com a outra por meio da World Wide Web [...] o B2B permite que
dezenas de milhares de companhias conectem-se com dezenas de milhares de
outras companhias, por meio de uma rede virtual”.
28 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Recurso Especial n.º 1.182.503, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, D.j em 19.10.2010. 29 NOVAES, A. G. Logística e gerenciamento de cadeia de distribuição (estratégia, operação e avaliação). Rio de Janeiro: Campus, 2001, p. 80. 30 CHING, H. Y. Gestão estratégica de estoques na cadeia de logística integrada: Supply Chain. São Paulo: Atlas, 2001, p. 185.
Bertaglia31 prefere enfatizar a melhoria no relacionamento entre as
empresas, explicando que “as soluções de B2B permitem uma comunicação
mais eficaz, integrando as organizações e seus processos e seus
fornecedores, clientes, parceiros estratégicos e distribuidores”.
Podem-se citar três grupos principais de portais do B2B: a) Portal para
colaborador (Intranet), que é utilizado para comunicação interna da empresa; b)
Portal com parceiro para manter relacionamento entre empresas. Trata-se de
uma rede que liga a empresa aos seus parceiros de negócios; e c) Portal de
terceiros, os famosos e-marketplaces, que promovem a negociação de
produtos/serviços através da internet, facilitam a compra on-line.
O faturamento dessa modalidade de comércio eletrônico chegou R$ 35,8
bilhões em 2014, com um incremento de 24% sobre o ano anterior, quando
esse número se situou na casa dos R$ 28,8 bi, segundo informações da
consultoria e-Bit, com apoio da Câmara Brasileira do Comércio Eletrônico32.
1.4.2. Business to consumer – B2C
Trata-se de comércio realizado entre o consumidor final e seu fornecedor,
por meio da Internet.
Essa modalidade é tão importante que as vendas de comércio eletrônico
B2C aumentaram 14,3% no mercado europeu em 2014, atingindo os 423,8 mil
milhões de euros. Os dados são revelados pela associação E-commerce
Europe no novo “European B2C E-commerce Report 2015”, compilados pela
GfK. Em 2015, em toda a Europa, as previsões apontam para uma subida dos
valores na ordem dos 12,5%, com um volume de negócios de 477 mil
milhões33.
31 BERTAGLIA, P. R. Logística e gerenciamento da cadeia de abastecimento. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 487. 32Guia de E-commerce. Disponível em: <http://guiadeecommerce.com.br/faturamento-do- ecommerce-em-2014/>. Acesso em: 17 set. 2015. 33 ACEPI – Associação da Economia Digital. Disponível em: <http://www.acepi.pt/artigoDetalhe.php?idArtigo=91682>. Acesso em: 22 nov. 2015.
No Brasil, o crescimento do B2C é evidente, porém esse crescimento
passa a ser menor nos últimos anos, em virtude da paralisação da economia
brasileira34:
Fonte: www.dothcom.net
A maior vantagem na utilização do B2C é a criação de lojas virtuais, onde
poderá haver promoções de determinadas marcas, com baixo custo e lucro
elevado.
O Comércio Eletrônico B2C possui três modelos distintos e facilmente
percebidos: leilões eletrônicos, lojas on-line e serviços on-line.
Os leilões eletrônicos são as licitações eletrônicas – oferecem mercadoria
e os lances dos supostos valores a serem pagos são feitos via internet. O baixo
custo da operação é um dos benefícios dessa modalidade de comércio.
As lojas on-line comercializam produtos da empresa através da web.
Exemplo: Amazon.com, Americanas.com, Submarino. As lojas on-line
apresentam diversos benefícios para a empresa, sendo o principal deles o
aumento da demanda, com custos bem mais baixos para armazená-lo do que
no estabelecimento físico.
34 DOTHCOM. Disponível em: <www.dothcom.net>. Visto em 03. Jan 2016
Para os clientes, as lojas online também oferecem benefícios; uma vez
que os preços são mais baixos, há maior opção de escolha, melhor qualidade
de informação, conveniência de comprar sem sair de casa.
O terceiro modelo de comércio eletrônico B2C é caracterizado pelos
serviços on-line. Nessa modalidade, as empresas se valem da internet para
fornecer serviços a clientes como: serviços bancários, ações da bolsa, dentre
outros. A missão dos serviços on-line é a de simplificar a vida do usuário
através de serviços interativos disponíveis a qualquer horário e em qualquer
lugar do mundo.
Uma das formas mais bem sucedidas de B2C é a compra e venda em
sites de compras coletivas. O primeiro site de compras coletivas no Brasil foi o
Peixe Urbano, que iniciou suas atividades em Março de 2010.
Segundo Gavioli35, “compra Coletiva é uma modalidade de comércio
eletrônico que tem como objetivo vender produtos e serviços para um número
mínimo pré-estabelecido de consumidores por oferta”.
O sucesso das compras coletivas está em sua simplicidade e no interesse
que os portais oferecem com seus descontos. Basta um mero cadastro rápido
e poucos cliques para efetivar a compra, e traz um benefício real ao
consumidor com desconto que pode chegar a 90% do valor do produto. Em
contrapartida as empresas anunciantes conseguem divulgar a marca de forma
fácil e rápida.
Em Dezembro de 2010, o Brasil já contava com 1025 sites de compras
coletivas, conforme registros contabilizados pelo site Bolsa de Ofertas, que
35 GAVIOLI, Guilherme. O que é compra coletiva. E-commerce News. Disponível em: <http://ecommercenews.com.br/glossario/o-que-e-compra-coletiva 20/04/2011>. Acesso em: 18 mar. 2016.
mede a quantidade de sites de compras coletivas existentes no país e publicam
informações sobre este novo segmento.36
Para regular esse tipo de comércio, houve a promulgação do Decreto nº
7.962, que veio dirimir algumas das tormentosas controvérsias que envolvem a
celebração de contrato de consumo no meio eletrônico.
As principais alterações legislativas sobre o assunto foram: garantia de
arrependimento e identificação do vendedor no meio eletrônico.
Especialmente em sites de compras coletivas, o Decreto Presidencial
prevê que tais sítios eletrônicos devem conter, obrigatoriamente, as
informações de identificação do fornecedor, a quantidade mínima de
consumidores para a efetivação do contrato e o prazo para utilização da oferta
pelo consumidor.
Por fim, o Decreto regulamenta a forma de contratação, assegurando ao
consumidor amplo acesso aos termos do contrato, antes mesmo da efetivação
do vínculo, e conhecimento dos termos do instrumento contratual, até as
formas possíveis e seguras de se efetivar o pagamento do preço.
Com algumas das alterações acima, o consumidor encontra-se mais
protegido perante as relações tecnológicas.
Claramente, outras situações surgirão. A fim de proteger o consumidor,
deveremos aplicar o Código de Defesa do consumidor e igualar o consumidor
eletrônico ao tradicional.
Um número crescente de comerciantes vem transformando as redes
sociais em vitrines de seus produtos. O Facebook passou a ser um meio de
Bussiness to Consumer.
O Facebook-Commerce, ou F-commerce como também é conhecido,
é uma loja virtual construída dentro do ambiente do Facebook, uma tendência
que tem tudo para crescer nos próximos anos. Essa ferramenta de vendas on-
line tem ganhado cada vez mais espaço na rede; desde pequenas empresas
até multinacionais como Coca-Cola e Natura têm usado desta
ferramenta para ofertar seus produtos a seus consumidores.
A tendência é que este mercado movimentasse até 30 bilhões de
dólares no ano de 2015 no mundo, segundo uma pesquisa realizada pela Booz
& Company, no ano de 2010. Desse total, 14 bilhões de dólares serão
movimentados nos Estados Unidos, país em que este tipo de e-commerce está
mais evoluído.
No Facebook, a loja virtual estimula não só a compra, mas também a
propagação das ações entre os amigos do consumidor. Por isso, no F-
commerce, a loja virtual pode ter funcionalidades próprias da rede, como o
sugerir (compartilhar) produtos para outros usuários37.
De acordo com a pesquisa brasileira, produzida e divulgada pela Hi-
Mídia38, grande parte dos usuários de alguma forma já está familiarizada com o
comércio na rede social.
O estudo foi realizado com 570 pessoas das cinco regiões do Brasil,
entre outubro e novembro de 2012, e mostrou que o F-commerce tem grande
aceitação do público. Para se ter uma ideia, 72% dos entrevistados afirmaram
que discutem sobre produtos que desejam comprar com amigos e parentes nas
redes sociais.
O estudo mostrou ainda que 12% é o número dos que afirmaram já
terem feito alguma compra diretamente pelo Facebook. Dos que nunca
compraram na rede, 35% não sabiam desta possibilidade – o que mostra que
muitas pessoas nunca compraram via Facebook simplesmente porque
desconheciam o serviço.
Finalmente, a pesquisa ainda demonstrou que cerca de 90% dos
usuários teriam interesse em ferramentas de indicação e comentários de
produtos para compartilhar as suas escolhas com outros usuários no intuito de
melhorar o processo de compra.
Se, para o usuário, a opção de ver e partilhar opiniões sobre um produto
ou marca e efetuar todo o processo de compra dentro de um ambiente que ele
já está familiarizado é uma vantagem, para o comerciante, é uma forma de
aumentar o número de clientes em potencial.
37ECOMMERCE BRASIL. Disponível em: <https://www.ecommercebrasil.com.br/artigos/f- commerce-como-vender-dentro-facebook/>. Acesso em: 20 set. 2015. 38 Revista Exame. Disponível em: <http://exame.abril.com.br/tecnologia/noticias/pesquisa- aponta-potencial-do-f-commerce-no-brasil>. Acesso em: 20 set. 2015.
Mobile Commerce, ou m-commerce, é toda e qualquer operação que
envolva a transferência de propriedade ou de direitos de utilização de bens e
serviços, que é iniciado e / ou concluído com a utilização de dispositivos
móveis.
O Mobile Commerce começou a se tornar convencional com a
introdução de ringtones, aplicativos para celular e jogos. Os usuários
procuravam suas músicas favoritas, aplicativos e jogos de seu gosto que
fossem compatíveis com dispositivos portáteis. Em seguida, podia-se comprar
esses bens digitais e baixá-los logo após a conclusão da transação. Com o
crescimento do Mobile Commerce, não apenas bens digitais estão sendo
vendidos, como bens tangíveis estão passando a ser ofertados pelos
varejistas.
Até junho de 2014, no Brasil, a participação dos dispositivos móveis nas
vendas subiu para 7% em comparação com o período do ano de 2013. Um
crescimento de 84% no período de um ano. Foram realizados 2,89 milhões de
pedidos, resultando em um faturamento de R$ 1,13 bilhão39.
O crescimento do m-commerce em âmbito mundial é espantoso e
demonstrado no gráfico abaixo:
demonstra sua grande influência, a partir de junho de 2014, conforme
demonstrado abaixo.
A estimativa da e-Bit é de que, mantida a taxa de crescimento registrada
nos últimos meses, até o fim do ano de 2015 o mobile commerce represente
perto de 10% das transações do e-commerce brasileiro, com mais empresas
de e-commerce adaptando seus sites para o uso em dispositivos móveis. O
despreparo dos varejistas on-line para suportar a atividade continua sendo o
principal entrave para o crescimento ainda mais acelerado do mobile
commerce no País, junto com a precariedade das comunicações 3G e a baixa
penetração de Wi-Fi nas residências40.
1.4.3. Consumer to consumer – C2C
Aqui, o comércio eletrônico se desenvolve entre usuários particulares da
internet.
Trata-se da comercialização entre consumidores diretamente ou através
de uma empresa intermediária. Bom exemplo desse tipo de comércio é o leilão
on-line, como Ebay, Mercado Livre, e o mais famoso atualmente, AliExpress.
Normalmente, não existem intermediadores, mas se existir uma empresa
que facilite a transação, ela passa a ganhar uma comissão por cada leilão ou
recebe uma taxa única de transação.
Os sites em que se realizam os leilões não se responsabilizam pela
qualidade do produto nem por valores. Apenas disponibilizam o espaço virtual
para que a transação seja realizada.
Vale ressaltar que, esse tipo de comércio é tão expressivo que AliExpress
tornou-se oficialmente líder em volume de vendas da internet brasileira. O site,
em 2014, movimentou US$ 250 bilhões. É mais que Amazon e EBay somados
(e quatro vezes o faturamento anual do Google)41.
1.4.4. Government to citizen – G2C e Government to business – G2B
Relação comercial que se viabiliza por meio da internet entre Governo e
cidadão/consumidor ou Governo com empresa.
Na prática, o comércio G2C são portais orientados para desempenharem
serviços ao público. São serviços prestados por sites oficiais do Governo e que
disponibilizam os mesmos serviços que a repartição pública oferta. A emissão
de certidões através do site oficial, é um exemplo dessa espécie de serviço.
Por outro lado, portais G2B são voltados às relações comerciais entre
Governo e empresas, também viabilizadas pela internet. Por exemplo, compras
41 TECNOMUNDO. Disponível em <http://www.tecmundo.com.br/comercio-eletronico/65023- aliexpress-site-maior-volume-vendas-internet-brasileira.htm>. Acesso em: 20 set. 2014.
preços, compra de fornecedores, etc.
1.5. Vinculação das partes no meio eletrônico
O intercâmbio de informações, formalizado por meio de papel, torna-se
obsoleto na prática do Comércio Eletrônico. Até mesmo no âmbito processual,
o documento físico torna-se secundário.
Impossibilitada a assinatura de próprio punho, a confirmação do
assentimento de ambas as partes quanto aos termos e condições de
determinado contrato pode ser obtida por diversos meios: o clique em área
específica que indica que a parte leu e concordou com os termos dispostos na
página disposta pelo website; o envio de mensagem eletrônica concordando
com os termos anteriormente lidos.
Entretanto, a voracidade com que as transações são rapidamente
concluídas por meio da internet tem levado à argumentação de que os termos
firmados não foram completamente cientificados. Assim, busca-se proteger as
partes, a fim de que seja possível quase certeza de que elas leram os termos.
Para evitar argumentos sobre a desinformação de seu conteúdo
contratual, muitos sites obrigam as partes a passar determinado intervalo de
tempo analisando os termos e condições propostas, ou proibindo-as de concluir
a transação caso o software empregado na negociação não detecte que o
usuário ao menos efetuou a exibição do texto integral dos termos e condições
em sua tela.
O que falta, na verdade, é a confiança entre as partes, no momento da
contratação eletrônica. A esta “desconfiança” Claudia Lima Marques42,
denomina de “a crise moderna de confiança nos contratos”.
Essa “desconfiança” entre as partes de um contrato eletrônico se dá
porque os termos, muitas vezes, são elaborados para um número
indeterminado de pessoas, sem possibilidade de ampla negociação de seus
termos, cabendo apenas ao contratante do serviço ou adquirente do produto
anuir ou não com as cláusulas preestabelecidas. Cláudia Lima Marques43 diz
que esses contratos são massificados, que utilizam condições gerais, dando o
exemplo dos contratos de home-banking.
Esses contratos são denominados de Adesão e são sintetizados por
Fábio Ulhoa Coelho44, da seguinte forma:
A expressiva maioria dos contratos é celebrada por simples adesão de um contratante às cláusulas gerais de negócio estipuladas unilateralmente pelo outro. São os contratos de adesão, que se interpretam sempre em desfavor do predisponente e que não podem estabelecer a antecipada renúncia do aderente a nenhum direito inerente à natureza do negócio.
Para Cláudia Lima Marques45, os contratos de adesão apresentam três
características importantes, quais sejam: 1. a sua pré-elaboração unilateral; 2.
a sua oferta uniforme e de caráter geral, para um número ainda indeterminado
de futuras relações contratuais; 3. seu modo de aceitação, onde o
consentimento se dá por simples adesão à vontade manifestada pelo parceiro
contratual economicamente mais forte.
42 MARQUES, Cláudia Lima. Proteção do Consumidor no Comércio eletrônico e a chamada nova crise do contrato: por um direito do Consumidor aprofundado. Revista de Direito do Consumidor, v. 57, p. 9-59, jan-mar., 2006. 43 MARQUES, Cláudia Lima. Direito Civil – Proteção do Consumidor no Comércio Eletrônico e a Chamada Nova Crise do Contrato: por um Direito do Consumidor Aprofundado. RDC, 57/9, 2005, p. 11. 44 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Civil 3: Contratos. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 78. 45 MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor: o novo regime das relações contratuais. Biblioteca de direito do consumidor. Vol. 1. 3.ed. rev., atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 57.
Para a autora46 os contratos eletrônicos celebrados na maioria das
vezes, na forma de contrato de adesão, são típicos da modernidade.
Segundo De Canto47, a contratação eletrônica cria novas características:
à desumanização do contrato; a imputabilidade da declaração de vontade,
refletindo em sua forma e validade; à distribuição de riscos da declaração de
vontade realizada online; à formação do consentimento; à definição do local e
do momento de celebração, com o fim de definir a legislação aplicável e o
tribunal competente; e os diferentes graus de utilização do meio digital.
Tendo em vista essa unilateralidade do contrato de adesão, qualquer
nulidade, ou seja, previsão extremamente onerosa, será reconhecida de ofício.
[...] o reconhecimento da abusividade e consequente declaração de nulidade das cláusulas inseridas em contratos de consumo podem e devem ser conhecidos de ofício (ex officio) pelo magistrado, portanto, independentemente da formulação de qualquer pedido na ação ajuizada pelo consumidor ou até mesmo quando o consumidor figurar como réu. Trata-se, portanto, de exceção à regra de que ‘o juiz decidirá a lide nos limites em que foi proposta’ (art. 128 do CPC).48
Vale dizer que o contrato de adesão deve ser interpretado conforme a
intenção das partes, observando atentamente, os Princípios do Direito
Contratual e os Princípios Constitucionais. A partir destes princípios, caberá ao
magistrado preencher o conteúdo das cláusulas abertas, construindo uma
regra que permita a realização da justiça, restabelecendo, no caso concreto, o
equilíbrio entre os contratantes.
Outro ponto importante, além de identificar as partes no contrato
eletrônico, é o local de formação.
46 MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor: o novo regime das relações contratuais. 5. ed. ver. Atual e ampl. São Paulo: Ed. RT, 2006, p. 110. 47 DE CANTO, Rodrigo Eidelvein. Direito do Consumidor e vulnerabilidade no meio digital. Revista de Direito do Consumidor, São Paulo, v. 87, p. 194, mai/jun, 2013. 48 BENJAMIN, Antônio Herman V.; MARQUES, Cláudia Lima; BESSA, Leonardo Roscoe. Manual de Direito do Consumidor. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007, p. 294.
O meio eletrônico quebrou o paradigma estatal, pois as leis dos Estados
(especialmente o seu Direito Internacional Privado) estariam conectadas com
determinados territórios (com o domicílio ou residência habitual), ou com um
status político estatal das pessoas (com nacionalidade, a identidade cultural),ou
com o lugar físico dos atos, ou com o lugar de localização física das coisas.49
Cláudia Lima Marques50 explica:
Com essa ubiquidade, não sabemos ao certo onde ocorrerá a negociação virtual e a contratação virtual, tudo acontece no Cyberspace! O meio eletrônico também modifica os conceitos de tempo real, impondo o tempo virtual, e de território, impondo a rede global como “lugar do contrato”, em contrato já denominado de desterritorializado, internacional ou nacional conforme as partes, não conforme o lugar da conclusão do negócio (art. 9º, § 2º da Lei de Introdução ao Código Civil de 1942), pois as ofertas nos sites são “globais” em rede e não encontram limites territoriais ou nacionais. No comércio eletrônico, o internacional é a oferta, ou é o resultado e não estritamente o meio. O consumidor continua passivo (não se desloca para outro país ou Estado, geralmente continua fixado no país de sua residência ou domicílio), conecta-se localmente e age internacionalmente! Aqui o desafio é a localização dos litígios, a manutenção das normas imperativas e de standards mínimo de proteção.
Quando tratamos de uma relação consumerista, onde o consumidor é
brasileiro e um fornecedor estrangeiro, sendo a obrigação adimplida no Brasil,
ou seja, se o produto ou serviço for entregue no Brasil, estabelece-se que a
autoridade brasileira será responsável pelo julgamento.
O Código de Defesa do Consumidor, por sua vez, determina que o
fornecedor teria que se adaptar às diversas legislações de todos os lugares
onde se encontrasse o consumidor.
49 MARQUES, Cláudia Lima. Proteção do Consumidor no Comércio eletrônico e a chamada nova crise do contrato: por um direito do Consumidor aprofundado. Revista de Direito do Consumidor, v. 57, p. 9-59, jan-mar., 2006. 50 MARQUES, Cláudia Lima. Proteção do Consumidor no Comércio eletrônico e a chamada nova crise do contrato: por um direito do Consumidor aprofundado. Revista de Direito do Consumidor, v. 57, p. 9-59, jan-mar., 2006.
Ocorre que o próprio art. 101, I do CDC determina como possível o
consumidor escolher o foro que quer demandar o fornecedor, podendo ser em
território nacional ou no local de origem do fornecedor.
Assim, deve-se analisar o local de nascimento da relação contratual, a
existência de tratados sobre a matéria eletrônica firmada pelas partes e a
necessidade de homologação, se for o caso, de sentença estrangeira, em
jurisdição brasileira.
Por sua vez, se o fornecedor não tiver estabelecimento no Brasil, haverá
um confronto entre as normas de proteção ao consumidor e as regras de
comércio mundial. Na hipótese de existir tratado ou convenção que discipline
regras de comércio mundial entre o país de origem do fornecedor e o do
consumidor, no caso, o Brasil, aplicam-se a estes contratos as normas
brasileiras de proteção ao consumidor, tendo como foro de eventuais litígios o
Brasil ou o país de origem do fornecedor, conforme a opção feita pelo
consumidor. Aplica-se a mesma regra se houver filial da empresa no território
brasileiro.51
Como já mencionado, as transações eletrônicas não ocorrem dentro de
um único território, pelo contrário, a característica principal do comércio
eletrônico é justamente a queda de fronteiras e barreiras comerciais.
A redução de distâncias espaciais e temporais é uma característica azabumbante da globalização, pois trouxe consigo benefícios nunca antes experimentados pelo ser
51 ROCHA, Layla Christiane Nunes. Comércio Eletrônico: aspectos legais dos contratos de consumo e a proteção jurídica do Consumidor na Internet. Monografia apresentada a Faculdade Integrada Antônio Eufrásio de Toledo. Disponível em: <http://intertemas.unitoledo.br/revista/index.php/Juridica/article/viewFile/67/73>. Acesso em: 19 de mar. 2016, p. 44.
Comércio Internacional.
Para tanto, nos próximos capítulos deste trabalho, estudaremos como se
comporta o Comércio Internacional influenciado pela internet e globalização.
Apesar da globalização e das tentativas de harmonização, o ambiente
digital é regulado por diversas leis, de diversos países. Esse é o grande
problema da contratação internacional eletrônica: a diversidade de legislação.
Hodiernamente, os Estados vêm-se organizando em blocos comerciais
regionais por meio de criação de Organizações Internacionais (como Mercosul
e União Europeia53), que visam à liberação comercial entre seus membros,
mediante redução ou mesmo eliminação de impostos de importação e
exportação, barreiras tarifárias, exigências fitossanitárias, bem como demais
formas que possam impedir ou dificultar o comércio entre seus integrantes54.
Será essa é melhor forma de unificar? Será que teremos um Direito
Universal sobre Legislação eletrônica?
52 MALHEIRO, Emerson Penha. Manual de direito internacional Privado. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 112-113. 53 A União Européia vem passando por uma grave crise institucional, na qual o Reino Unido vem requerendo sua saída do bloco – o chamado fenômeno Brexit 54 MALHEIRO, Emerson Penha. Manual de direito internacional Privado. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 113.
Para responder a essas questões, precisamos entender o
desenvolvimento do Comércio Internacional.
Antes de estudarmos o comércio eletrônico internacional, precisamos
entender o que é contrato internacional. Este capítulo traçará a conceituação
do contrato internacional e suas características, a escolha do foro e da
legislação aplicável.
A atividade que traduz uma visão projetiva transfronteira de todos os acontecimentos que envolvem intercâmbios visíveis e invisíveis manifestados pelos mecanismos da compra e venda de mercadorias, transferência de tecnologia, investimentos, representações e outros entendimentos que possibilitem a consecução de lucros e vantagens para as partes intervenientes, compreendendo os atos formais possibilitantes dessas relações.55
O comércio internacional é reconhecido desde o século XVI, quando se
tornou claro para os governantes que a utilização mais eficiente dos seus
recursos ocorria com a realização de troca de mercadorias que a nação detinha
por outras mais interessantes ou aquelas que trouxessem sensíveis economias
de escala em produção. O governo determinava quem deveria: produzir,
55 STRENGER, Irineu. Direito Internacional Privado. 4. ed. São Paulo: LTR, 2000, p. 750.
comercializar, exportar ou importar com objetivo de gerar superávits
comerciais56.
No século XIX, o Comércio Internacional se desenvolveu em virtude do
parque tecnológico inglês, para o escoamento de produtos para a Europa e
suas colônias. Esse comércio se intensificou com a formalização de tratados
internacionais, no final do mesmo século.
No final do século XIX, os Estados Unidos e o Japão passaram por suas
Revoluções Industriais e passaram a “competir” com os produtos europeus.
Durante a I Guerra Mundial, os países europeus focaram-se no comércio
interno, deixando de lado o comércio internacional.
De certa forma, a I Guerra Mundial enfraqueceu o comércio Internacional
europeu, enquanto os Estados Unidos aumentaram tarifas para a importação,
desmotivando-a.
A produção industrial norte-americana era tanta que não tinha plano de
escoamento, causando a crise que desencadeou na II Guerra Mundial. Assim
sendo, o Estado perde espaço na comercialização de produtos e as atividades
comerciais passam a ser realizadas por entidades particulares.
Após a Segunda Guerra Mundial, os países começam a se unir em
blocos econômicos a fim de intercambiar serviços, mercadorias e riquezas. As
relações econômicas internacionais passam, então, a articular interesses
comuns voltados à proteção da economia interna, com vistas a favorecer a
economia comunitária e o trânsito de bens e mercadorias57.
56 GOULART, José Braz. Comércio Eletrônico – Um estudo sobre a viabilidade da utilização do Brasil web trade para a inserção de micro e pequenas empresas no comércio internacional. 2010. Dissertação (Mestrado em Administração) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, PUC/SP, São Paulo, 2010, p. 22. 57 MORBIDELLI, Sidney. As relações internacionais entre os Estados e a livre concorrência no mercado mundial. 2009. Dissertação (Mestrado em Direito) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, PUC/SP, São Paulo, 2009, p. 24-26.
Para Chia-Jui Cheng, o desenvolvimento do Direito do Comércio
internacional atravessou três etapas:
The development of the Law of international trade has gone throuth three stages. In the first phase it appeared in the form of medieval Lex mercatoria, a body of universally accepted rules. In the second stage it was incorporated into the municipal Law of the various national States wich succeeded the feudal stratification on medieval society. The culmination of this development was the adoption in France of the Code the Commerce of 1807, in Germany the promulgation of the AllgemeineHandelsgesetzbuch of 1861, and in England the incorporation of the custom of merchants into the commom Law by Lord Mansfield. The third stage in the development of the Law of international trade is contemporary. Commercial custom has again developed widely accepted legal concepts, particularly such trade terms as f.o.b and c.i.f., and the instituion of the banker’s commercial credit and international conventions have brought a measure of unification in important branches of the Law of negotiable instruments, of transport by sea, air, and land, of arbitration and other topics.58
Com o intercâmbio de mercadorias entre diferentes países, ressalta-se a
divergência de legislação como um dos principais problemas. Para contornar a
situação, os tratados assumem papel importante na efetivação das relações
mundiais, promovendo a integração entre países signatários.
Em suma, pode-se dizer que a progressiva internacionalização dos
mercados de bens, serviços e créditos, a redução de tarifa de exportação e de
obstáculos aduaneiros,
O DESENVOLVIMENTO DO COMÉRCIO ELETRÔNICO NO ÂMBITO INTERNACIONAL DA CONVENÇÃO INTERNACIONAL
DE COMPRA E VENDA DE VIENA
Mestrado em Direito
PUC - SÃO PAULO
O DESENVOLVIMENTO DO COMÉRCIO ELETRÔNICO NO ÂMBITO INTERNACIONAL DA CONVENÇÃO INTERNACIONAL
DE COMPRA E VENDA DE VIENA
Dissertação apresentada à Banca Examinadora como exigência parcial para obtenção do título de Mestre em Direito Comercial pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, sob a orientação da Profª. Dra. Maria Eugênia Finkelstein.
São Paulo
2016
Autorizo exclusivamente para fins acadêmicos e científicos a reprodução total ou parcial desta Dissertação de Mestrado por processos de fotocopiadoras ou eletrônicos. Assinatura _____________________________________________________ Data 11/07/2016 e-mail:
S586
Silva, Luciana Vasco da O DESENVOLVIMENTO DO COMÉRCIO ELETRÔNICO NO ÂMBITO INTERNACIONAL DA CONVENÇÃO INTERNACIONAL DE COMPRA E VENDA DE VIENA/ Luciana Vasco da Silva. – São Paulo: s.n., 2016
. 170 p. ; 30 cm. Referências: 136-149 Orientadora: Profa. Dra. Maria Eugênia Finkelstein Dissertação (Mestrado), Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo, Programa de Pós-Graduação em Direito, 2016.
1. Internet 2. Contratos eletrônicos - Direito 3. CISG
CDD 340
Banca examinadora:
AGRADECIMENTOS
Em primeiro lugar, agradeço a Deus e São Judas Tadeu, que me concederam a graça de cursar o mestrado e superar todas as dificuldades.
Agradeço aos meus pais por serem meus exemplos e por me apoiarem de todas as formas. Tudo o que eu faço de bom é mérito de vocês.
Agradeço ao meu irmão, Felipe Vasco da Silva, pelo constante apoio e exemplo, pela amizade eterna e fraterna que há entre nós.
Agradeço a minha orientadora Profa. Maria Eugênia Finkelstein pela constante atenção, incentivo e exemplo de profissional e, principalmente, orientadora, sabendo aplacar dúvidas e aflições.
Aos meus colegas da Central Nacional Unimed que estiveram comigo durante a caminhada e proporcionaram a conclusão do curso.
Aos meus colegas de mestrado que dividiram angústias, questionamentos e medos durante a trajetória.
LISTA DE SIGLAS
B2B Business to business / De empresa para empresa
B2C Business to consumer / De empresa para consumidor
C2C Consumer to consumer / De consumidor para consumidor
CDC Código de Defesa do Consumidor
CFR Common Frame of Reference
CPC Código de Processo Civil
CPI Comissão Parlamentar de Inquérito
CISG Convenção Internacional de Compra e Venda de Viena
CGI Comitê Gestor da Internet
F-Commerce Facebook Commerce / Comércio no Facebook
FTC Federal Trade Commission
G2B Government to business / De governo para empresa
G2C Government to citizen / De Governo para cidadão
GATS General Agreement on Trade in Services ou Acordo Geral sobre Comércio de Serviços
ICC Câmara Internacional do Comércio
ICP Infraestrutura de Chaves Públicas
INCE Iniciativa nacional para o comércio eletrônico
Incoterm International Commercial Terms / Termos Internacionais de Comércio
LINDB Lei de Introdução às Normas de Direito Brasileiro
M-Commerce Mobile Commerce / Comércio Móvel
OECD Organization for Economic Co-operation and Development / Organização para Cooperação econômica e desenvolvimento
OMC Organização Mundial do Comércio
ONU Organização das Nações Unidas
PECL Princípios do Direito Contratual Europeu
UE União Européia
ULF Convenção para Lei Uniforme sobre a formação dos contratos de compra e venda internacional de mercadorias
ULIS Convenção para uma lei uniforme relativa à Compra e Venda Internacional
UNCTAD United Nations Conferencion Trade and Development on / Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e desenvolvimento
Uncitral Comissão das Nações Unidas para o Direito Comercial Internacional
LISTA DE FIGURAS
Figura 2 Crescimento do comércio B2C............................................ 30
Figura 3 Crescimento do Social Commerce nos Estados Unidos e no Mundo.............................................................................
34
Figura 4 O crescimento do m-commerce em âmbito mundial.... 36
Figura 5 Crescimento do m-Commerce no Brasil.............................. 36
SILVA, Luciana Vasco da. O DESENVOLVIMENTO DO COMÉRCIO ELETRÔNICO NO ÂMBITO INTERNACIONAL DA CONVENÇÃO INTERNACIONAL DE COMPRA E VENDA DE VIENA. 170 p. Dissertação (Mestrado em Direito) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC- SP), São Paulo, 2016.
RESUMO
O desenvolvimento da internet foi responsável pela criação de um mercado internacionalizado e conectado eletronicamente, englobando milhões de empresas e indivíduos que se beneficiam do contato ágil e prático proporcionado pelos meios eletrônicos. No início, o contato eletrônico era simples, porém com o volume cada vez maior, a complexidade torna-se uma das características do comércio eletrônico. Tais contratos, de execução parcial ou integral eletronicamente, passaram a regular o relacionamento jurídico de partes situadas em Estados diversos, em razão da transnacionalidade da internet e da globalização, resultando em contratos internacionais eletrônicos, objeto do presente estudo. No interesse de delinear os principais aspectos da disciplina dos contratos internacionais eletrônicos no cenário internacional, são analisadas normas elaboradas por Estados e Organizações Internacionais, que visam garantir direitos e obrigações semelhantes àqueles existentes nos documentos físicos, em papel. Após a investigação descrita, o estudo é concluído com a análise da Lei mais importante sobre o tema, aprovada em 2014: A Convenção Internacional de Viena sobre Compra e Venda, que apesar de inovadora não traz ainda menção ao contrato eletrônico, mas que pode ser facilmente adaptada a essa forma de contratação.
Palavras-chave: internet, contratos eletrônicos, CISG.
SILVA, Luciana Vasco da. The E-commerce development in international context. 170 p. Dissertação (Mestrado em Direito) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), São Paulo, 2016.
ABSTRACT
Internet development was responsible for the creation of an electronically internationalized and connected market, encompassing millions of companies and individuals, which benefit from the quick and practical contact provided by electronic means. In the beginning, the electronic contract was simple, however, with the increasing volume; complexity has become one of the e-commerce characteristics. Such contracts, of electronically partial or integral execution, have started to regulate the juridical relationship of parties situated in different states, due to Internet and globalization transnationality, resulting in electronic international contracts, object of the present study. Interested in delineating the main aspects of the subject of electronic international contracts in international scenario, some rules elaborated by states and International Organizations are analysed, seeking to ensure rights and obligations similar to those existing in material documents, in paper. After the described investigation, the study is concluded with the analysis of the most important law regarding the theme, passed in 2014: The United Nations Convention on Contracts for the International Sale of Goods, which even being innovative, does not mention the electronic contract, but can be easily adapted to this contracting fashion.
Keywords: internet, electronic contracts, CISG
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .............................................................................. 14
CAPÍTULO 1 A EVOLUÇÃO DO COMÉRCIO ELETRÔNICO DE COMPRA E VENDA DE MERCADORIAS .................................... 17
1.2. O Comércio Eletrônico e seu Desenvolvimento ............................. 17
1.3. Regulação da Internet no Brasil e no Mundo ................................. 26
1.4. Modalidades do Comércio Eletrônico ............................................. 29
1.4.1. Business to business – B2B ....................................................................... 29
1.4.2. Business to consumer – B2C .................................................. 30
1.4.2.1. Facebook Commerce (F-Commerce) .................................................... 33
1.4.2.2 Mobile Commerce (M-Commerce) ................................................................... 36
1.4.3. Consumer to consumer – C2C .................................................................... 37
1.4.4. Government to citizen – G2C e Government to business – G2B....... 38
1.5. Vinculação das partes no meio eletrônico ...................................... 39
1.6. A Universalização da Forma de contratação .................................. 43
CAPÍTULO 2 O CONTRATO INTERNACIONAL .......................... 45
2.1. Comércio Internacional .................................................................... 45
2.3. Dos Contratos Internacionais .......................................................... 53
2.3.1. Autonomia da vontade nos Contratos Internacionais .......................... 62
2.3.1.1. Da Ordem Pública.....................................................................................71
2.4. Questões sobre o Contrato Internacional na Forma Eletrônica.... 78
2.5. Lex Mercatoria ................................................................................... 83
CAPÍTULO 3 AS INICIATIVAS LEGISLATIVAS PARA O COMÉRCIO ELETRÔNICO .......................................................... 96
3.1. A necessidade de regulamentação mundial sobre o comércio eletrônico .................................................................................................. 96
3.1.1. A União Europeia e o Comércio eletrônico ................................. 97
3.1.1.1. As primeiras Diretivas ........................................................................................ 98
3.1.1.2. Diretiva 2000/31/CE ........................................................................................... 98
3.1.2. Lei modelo da United Nations Commission on International Trade Law (UNCITRAL) - Comissão das Nações Unidas para o Direito Mercantil Internacional (CNUDMI) ........................................................ 100 3.1.2.1. Formação do Contrato pela Lei Modelo da UNCITRAL ............................. 105
3.1.2.2. Lei Modelo de 2003 ......................................................................................... 106
3.1.3. OMC ...................................................................................................................... 107
3.1.4 Organização de Cooperação e de Desenvolvimento Econômico (OECD) .................................................................................................... 109 3.1.5 Convenção de Viena ..................................................................... 111 3.2. Situação Legislativa sobre Comércio Eletrônico no Brasil ......... 113
3.2.1. O contrato eletrônico como meio de prova ............................... 116
CAPÍTULO 4 O CONTRATO ELETRÔNICO DE COMPRA E VENDA, REGULAMENTADO PELA CONVENÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS PARA A VENDA INTERNACIONAL DE MERCADORIAS - CISG ......................................................................................... 120
4.1. Importância da CISG ....................................................................... 120
4.2. Aplicação da CISG .......................................................................... 123
4.3. Princípio do Consensualismo (Da Liberdade de Forma e Prova)128
4.3.1 Princípio da Equivalência Funcional ........................................... 129
4.4. A CISG e o comércio eletrônico..................................................... 131
4.5. Concepção de Contrato na CISG ................................................... 137
4.5.1. Formação do contrato ................................................................. 138
4.5.2. Quanto à forma de celebração .................................................... 145
4.5.2.1 Local de formação do contrato ........................................................................ 148
4.5.3. Da capacidade das partes ..................................................................... 149
4.5.4. Foro para resolução de controvérsia ................................................... 150
4.5.5 Forma de resolução do contrato ................................................................... 150
SÍNTESE DE CONCLUSÕES ..................................................... 152
INTRODUÇÃO
Os avanços no âmbito da tecnologia, verificados ao longo dos séculos,
influenciaram o desenvolvimento do comércio.
Durante a história da humanidade, o surgimento de novas tecnologias
sempre representou desafio à organização e evolução das sociedades. Com o
Direito e os contratos não é diferente, vez que estes precisam acompanhar o
desenvolvimento da sociedade. Atualmente, os instrumentos materializados em
documentos escritos e assinados dividem espaço com os contratos
formalizados eletronicamente, por meio da internet.
Sob a ótica econômico-social, a internet contribuiu para o avanço do
comércio eletrônico, o qual vem crescendo exponencialmente em todo o
mundo. A expansão do comércio eletrônico está atrelada a características de
grande importância econômica a ele relacionadas, como exemplificativamente,
o encurtamento de distância, a amplificação da oferta, a diminuição de custos,
a superação de barreiras e a celeridade na celebração dos contratos.
As inovações tecnológicas facilitam a comunicação e,
consequentemente, estimulam as relações comerciais internacionais. Contudo,
o maior fluxo de transações comerciais remete a um questionamento jurídico
basilar, qual seja, em caso de litígio, qual a legislação aplicável: a do país do
vendedor ou a do país do comprador? E quando não se sabe a localidade
desses personagens, vez que estes estão comprando e vendendo on-line?
Uma solução para reduzir essa insegurança nas relações contratuais
internacionais seria unificar os regimes através de uma “lei internacional” que
pudesse reger todos os negócios internacionais. Essa lei reuniria, em um só
documento, princípios aplicados aos diversos sistemas legais, e seria
igualmente conhecida, reconhecida e estudada pelos juristas de todas as
nações.
Para tentar aplicar esse conceito, foi discutida a Convenção de Viena de
1980, que representa um grande passo para a segurança jurídica, a
racionalização e o consequente ganho em eficiência dos negócios
internacionais. A CISG já se transformou em um dos principais instrumentos
legais em comércio internacional, superando as expectativas de todos aqueles
que participaram de sua elaboração.
Pode-se dizer que a CISG é o resultado da busca dos comerciantes por
uma legislação uniforme que regule a compra e a venda internacional de
mercadorias. Esse conceito inicia-se com o termo lex mercatoria, surgido
durante a Idade Média, que vem se desenvolvendo até os dias atuais com a
união de esforços no sentido de homogeneizar as regras do comércio
internacional.
Nesse sentido, a presente pesquisa foi motivada pelo desenvolvimento
do comércio de compra e venda de bens e pela aplicação da CISG. Logo,
indaga-se: como o comércio eletrônico pode influenciar os contratos
internacionais e qual legislação aplicar a estes casos? A CISG também poderá
ser aplicada aos contratos eletrônicos? Como aplicar uma lei criada em 1980,
quando a revolução tecnológica não tinha alcançado seu ápice? Será que essa
legislação já nasceu ultrapassada no Brasil?
Salienta-se que o presente trabalho analisará especificamente a relação
de compra e venda de bens, regulado pela CISG. Apesar de ser possível a
aquisição de serviços via internet, este não é objeto da presente pesquisa pois
não é regulado pela CISG.
O Capítulo 1 desta dissertação abordará o desenvolvimento do comércio
eletrônico, na compra e venda de mercadoria. Estudaremos o impacto da
tecnologia no comércio atual, a aplicação das redes sociais e smartphones.
Veremos que atualmente o comércio é indissociável da tecnologia.
No Capítulo 2, verificaremos o desenvolvimento do comércio
internacional, a necessidade de uniformização da legislação para se garantir a
segurança das transações. Estudaremos detalhadamente o conflito de normas
e a necessidade de uma “legislação única” para segurança do comércio
internacional.
O Capítulo 3 é o resultado prático do que foi visto nos primeiros
capítulos. Nele abordaremos o resultado da junção entre o comércio eletrônico
e o internacional e as medidas legislativas para regulá-lo.
No quarto e último capítulo, abordaremos o desenvolvimento e a
utilização da Convenção Internacional de Compra e Venda de Viena – CISG,
analisando, conforme o panorama do comércio atual, se a mesma pode ser
considerada “natimorta” ou se apenas é necessário readequar seu
entendimento ao ambiente tecnológico atual.
Por fim, apresentaremos as conclusões da presente pesquisa.
Para a análise do tema, utilizaremos a pesquisa doutrinária, análise de
legislação estrangeira e decisões arbitrais que envolvam a CISG.
CAPÍTULO 1 A EVOLUÇÃO DO COMÉRCIO ELETRÔNICO DE COMPRA E VENDA DE MERCADORIAS.
O presente capítulo abordará o desenvolvimento do comércio eletrônico.
O Brasil representa 90% do comércio eletrônico da América Latina1. Nesse
contexto, o comércio eletrônico ultrapassa as fronteiras nacionais e passa a ser
objeto de preocupação de âmbito internacional, na medida em que o mercado
mundial absorve o comércio eletrônico em grande escala. Grandes transações
internacionais passam a ser realizadas em âmbito internacional.
1.2. O Comércio Eletrônico e seu Desenvolvimento
O comércio eletrônico é resultante do aperfeiçoamento do comércio
tradicional, que se iniciou com a troca de mercadorias2.
1 BLUM, Renato M. S. Opice; ALMEIDA, Rafael Augusto Paes de. Contratos eletrônicos internacionais. Disponível em: <www.buscalegis.ufsc.br/arquivos/contratosEl.html>. Acesso em: 04 dez. 2014. 2 A espécie de comércio mais primitivo foi o escambo, onde trovava-se mercadorias, sem o envolvimento de moeda. Aos poucos, surgiram as moedas advindas de metais não nobres, que não preservavam a riqueza. Com a criação de moedas de metais nobres, tais como ouro e cobre, as mercadorias passam a ser valorizadas monetariamente, não sendo mais trocadas por outras mercadorias. Em âmbito internacional, o comércio é realizado desde o Século V a.C, através da navegação pelo Rio Nilo. Durante a Idade Média, os comerciantes organizam-se em corporações, com intuito de definir as regras e diretrizes que deveriam balizar o desenvolvimento do comércio. O Direito Comercial nasce a partir dessas corporações, por meio do Direito consuetudinário e corporativo. A partir dos Séculos XIII e XIV, os grandes comerciantes já realizavam atividades econômicas de forma ordenada e racional, muitas vezes desenvolvendo atividades bancárias ou servindo de instrumento para as movimentações financeiras da Igreja. No Século XV, surgiram as feiras de comerciantes, nas quais reuniam-se mercadores de vários locais para o comércio de bens. A partir das feiras, criou-se os armazéns, que foi o pré modelo dos Centros de Distribuição de Mercadorias. Este modelo facilitava a entrega dos produtos, pois as vendas eram realizadas
desenvolvimento da Internet. Durante a Guerra Fria, a comunicação entre
bases militares americanas era feita atrás de uma rede chamada ArpaNet,
desenvolvida pela empresa ARPA, com intuito de interligar os departamentos
de pesquisa. Essa “nova comunicação” tinha como principal objetivo diminuir a
vulnerabilidade da comunicação. Inicialmente, a rede de informações era
utilizada apenas para troca de informações acadêmicas.
Segundo Turban e King3, “as primeiras aplicações do Comércio Eletrônico
ocorreram no início da década de 70, com a transferência eletrônica de fundos,
na qual se poderia transferir dinheiro eletronicamente”.
Em 1978, através dos franceses Simon Nora e Alain Minc, foi divulgado o
famoso relatório sobre o processo de informatização da sociedade. Os
referidos escritores publicaram a obra “A informatização da sociedade”, que
fazia menção à crescente associação entre computadores e
telecomunicações4.
permitiram as trocas eletrônicas de documentos comerciais (ordem de compras
e contas). No final dos anos 1980, a aceitação de cartões de créditos e o uso
de caixas eletrônicos tiveram aumento significativo, processos pelos quais
também se realiza o comércio eletrônico.
Segundo André Recalde Castells5:
por “caixeiros viajantes”. Esse também é o primeiro modelo no qual o consumidor não tinha contato direto com o produto, antes da compra. 3TURBAN, Efraim; KING, David. Comércio Eletrônico Estratégia e Gestão. São Paulo: Prentice Hall, 2004, p. 7. 4 SIQUEIRA, Ethevaldo. Revolução digital: história e tecnologia no século 20. São Paulo: Saraiva, 2007, p. 137. 5 TRADUÇÃO LIVRE: “As primeiras manifestações de comércio eletrônico aparecem na década de 80 com a realização de transações comerciais, mediante determinadas linguagens formalizados através da emissão da declaração de vontade das partes (ordem de compra, venda, pagamento), que se conhece como Electronic Data Interchange (EDI).” In: CASTELLS, André Recalde. Comercio y Contratación Electrónica in Informática y Derecho. Jornada sobre Contratación Electrónica, Privacidad y Internet. Revista Iberoamericana de Derecho
las primeras manifestaciones de comercio electrónico aparecen en la década de los 80 con ocasión de la realización de transacciones comerciales mediante determinados lenguajes formalizados a través de los cuales las partes emiten sus declaraciones de voluntad (orden de compra, venta, pago), que es lo que se conoce como Electronic Data Interchange (EDI).
A popularização da internet – interligação entre computadores e meios de
telecomunicações – trouxe uma nova realidade jurídica às relações comerciais:
o e-commerce6. Esse fenômeno reflete diretamente na transformação das
relações jurídicas privadas, uma vez que esse tipo de comércio promove
comodidade e redução de custos.
Turban e King7 contam como foi o desenvolvimento da Internet e como
ela influenciou o cotidiano das empresas:
Desde 1995 os usuários da Internet vêm acompanhando o desenvolvimento de diversas aplicações, desde comerciais interativos até experiências com realidade virtual. Quase todas as empresas de médio e grande porte, em todo o mundo, já possuem um site, e a maioria das corporações norte- americanas tem grandes portais em que os funcionários, os parceiros comerciais e o público podem acessar informações corporativas. Essa nova possibilidade ampliou a participação de empresas financeiras, de manufatura, de revenda e prestadoras de serviços.
Na década de 1990, empresas americanas e europeias passaram a
oferecer serviços através da rede de computadores, e, a partir de então,
começou a associação da expressão “comércio eletrônico” com a possibilidade
de negociar e adquirir produtos ou serviços através da internet.
Olavo Baptista faz um interessante paralelo entre o comércio eletrônico e
a antiga figura do “mascate”:
Informático, Universidad Nacional de Educación a Distancia centro Regional de Extremadura. Mérida, 1999, p. 40. 6PAULA, A. S. Contratos eletrônicos na relação de consumo. Disponível em: <http:// www.jus.com.br/doutrina>. Acesso em 18 set. 2015. 7TURBAN, Efraim; KING, David. Comércio Eletrônico Estratégia e Gestão. São Paulo: Prentice Hall, 2004, p. 7.
O comércio eletrônico é, de certa forma, o retorno do "mascate". Todos nós temos a lembrança deste personagem, freqüente nos tempos coloniais, ainda existente no início do século XX, e que visitava a casa das pessoas na zona rural ou nos bairros afastados, levando mercadorias de pequeno porte, e imagens ou amostras de outras que entregaria quando encomendadas pelo comprador interessado. O mascate não tinha estabelecimento próprio. Ia até o comprador, e oferecia- lhe bens que, em grande parte, não tinha em estoque e adquiria para entregar, quando encomendados. A especificidade da atividade comercial do mascate era a de se deslocar diante do consumidor final e oferecer-lhe, verbalmente, a mercadoria, eliminando a necessidade de deslocamentos físicos deste, propondo-lhe uma variedade de bens.8
O comércio eletrônico é a melhor expressão e exemplo de aplicação de
tecnologias convergentes na nova economia digital. A rede oferece a
infraestrutura de comunicação de fácil acesso e uso, com custo compatível
com o cliente final do varejo9.
Marco Aurélio Greco diz que o comércio eletrônico tornou-se muito
significativo, tanto em volume de negócios como em valores de negócios
realizados10.
Para Rogério de Andrade, o conceito de comércio eletrônico pode ser
descrito como: “O Comércio Eletrônico é a aplicação de tecnologias de
comunicação e informação compartilhadas entre as empresas, procurando
atingir seus objetivos”11.
De acordo com a legislação tributária americana, no Internet Freedom Act
Section 1105, o e-commerce pode ser definido como:
Any transaction conducted over the Internet or through Internet access, comprising the sale, lease, license, offer, or deliver of
8BAPTISTA, Luiz Olavo. "Comércio Eletrônico: uma visão do Direito Brasileiro". Revista da Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo, São Paulo, v. 94, 1999, p. 83-100. 9MEIRELLES, Fernando de Souza. Informática: novas aplicações com microcomputadores. 2. ed. São Paulo: Makron Books, 1994, p. 11. 10 GRECO, Marco Aurélio. Internet e Direito. 2. ed. São Paulo: Dialética, 2000, p. 51. 11 ANDRADE, Rogério de. Guia Prático de E-Commerce. 1. ed. São Paulo: Angra, 2001, p. 13.
property, goods, services or information, wheter or not for consideration, and includes the provision of Internet access.12
Já o ETF Report da Australian Transactions Reports and Analysis Centre
–AUSTRAC define o e-commerce como:
A general term applied to use of computer and telecommunications technologies, particularly on an inter- enterprises basis, to support trading in goods and services. Electronic commerce uses a variety of technologies such as EDI, e-mail, facsimile transfer, electronic catalogues and directory systems.13
Os autores Kaloka e Whinston definem o e-commerce a partir de
perspectivas: pela distribuição de produtos, serviços, informação ou pagamento
por meio de rede de computadores ou outro meio eletrônico. É ferramenta de
atendimento às necessidades de distribuição de custos e elevação de
qualidade e agilidade de atendimento14.
Alberto Albertin15 conceitua o comércio eletrônico da seguinte maneira: “a
realização de toda cadeia de valor dos processos de negócio num ambiente
eletrônico, por meio de aplicação intensa das tecnologias de comunicação e
informação, atendendo aos objetivos do negócio”.
Fábio Ulhoa Coelho16 ensina que comércio eletrônico nada mais é do
que:
12TRADUÇÃO LIVRE: “Qualquer transação realizada através da Internet ou através de acesso à Internet, que inclui a venda, arrendamento, licença, oferta ou entrega de propriedade, bens, serviços ou informações, com ou sem título oneroso, ou até mesmo o fornecimento de acesso à Internet.” Disponível em: <http://www.gpo.gov/fdsys/pkg/USCODE-2011- title47/html/USCODE-2011-title47-chap5-subchapI-sec151.htm>. Acesso em: 18 set. 2015. 13TRADUÇÃO LIVRE: “Um termo geral aplicado ao uso do computador e tecnologia de telecomunicação, em especial numa base interempresariais, para apoiar o comércio de bens e serviços. O comércio eletrônico utiliza uma variedade de tecnologias, tais como EDI, e-mail, transferência de fac-símile, catálogos eletrônicos e sistemas de diretório. In: TEIXEIRA JUNIOR, Ivo, 2000, p. 1. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/3122/novas-formas-de- comercio-internacional>. Acesso em: 18 set.2015. 14 KALOKOTA, R.; ROBINSON, M. E-Business 2.0. Boston: Addison Wesley, 2001, p. 32. 15ALBERTIN, Alberto Luiz. Comércio eletrônico: modelo, aspectos e contribuição de sua aplicação. São Paulo: Atlas, 2000, p. 14. 16COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de direito comercial. Vol. 3. São Paulo: Saraiva, 2000, p. 32.
Para Rodney de Castro Peixoto, há diversos conceitos que podem ser
aplicados com diferentes enfoques. Segundo ele17:
1 - Conceito técnico – comércio eletrônico é uma combinação de tecnologias, aplicações e procedimentos negociais que permitem a compra e venda on-line de bens e serviços entre governos, sociedades, corporações privadas e o público. [...] 2 - Conceito econômico – comércio eletrônico é a realização de toda a cadeia de valor dos processos de negócios, realização esta efetuada no ambiente digital. 3 - Conceito administrativo (privado) – comércio eletrônico é um termo genérico que descreve toda e qualquer transação comercial que se utiliza de um meio eletrônico para ser realizada. Com o uso de tecnologia se obtém a otimização do relacionamento da cadeia de suprimentos até o ponto de venda, bem como a melhora da comunicação entre a empresa e o cliente final. 4 - Conceito jurídico – comércio eletrônico é a atividade comercial explorada através de contrato de compra e venda com a particularidade de ser este contrato celebrado em ambiente virtual, tendo por objeto a transmissão de bens físicos ou virtuais e também serviços de qualquer natureza.
Complementando este entendimento sobre o conceito, Maria Eugênia
Finkelstein18 assevera que o comércio eletrônico nada mais é do que uma
modalidade de compra à distância, na qual são recebidas e transmitidas
informações por meio eletrônico.
Ressalta-se, ainda, que a definição de comércio eletrônico pode ser vista
sob dois aspectos, segundo Cláudia Lima Marques19: em sentido estrito, “como
sendo uma das modalidades de contratação não presencial ou à distância para
aquisição de produtos e serviços através de meio eletrônico ou via eletrônica”;
17PEIXOTO, Rodney de Castro. O comércio eletrônico e os contratos. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 10. 18FINKELSTEIN, Maria Eugênia Reis. Direito do comércio eletrônico. 2. ed. Rio de Janeiro: Elseiver, 2011, p. 38. 19MARQUES, Cláudia Lima. Confiança no comércio eletrônico e a proteção ao direito do consumidor: (um estudo dos negócios jurídicos de consumo no comércio eletrônico). São Paulo: Revista dos Tribunais, 2004, p. 38.
e em sentido amplo, “como um novo método de fazer negócios através de
sistemas e redes eletrônicas”.
Pode-se, assim, dizer que o comércio eletrônico (e-commerce) é o novo
meio para realizar o que já se fazia desde os primórdios da civilização: vender,
comprar, trocar produtos entre si, enfim, comercializar, mas agora por meio da
rede mundial de computadores, com um baixo custo, um grande mercado, um
grande alcance, ultrapassando fronteiras em segundos, com segurança e com
outras inúmeras facilidades, como também com problemas já conhecidos nos
meios tradicionais de comércio.
O acesso global a produtos/serviços oferecidos ao alcance de um clique e
sem fronteiras físicas confere maior e ilimitado acesso aos mercados on-line. A
ausência de intermediadores facilita a comercialização e barateia a compra.
Hoje, as corporações estão utilizando a web para, além de comprar e
vender, integrar sua cadeia de fornecedores, parceiros de negócios e sua força
de vendas. Além das tradicionais transações de compra e venda, o e-business
permite outros processos, tais como: esforços pré e pós-vendas, pesquisa de
mercado, suporte ao cliente, recrutamento, relações públicas, treinamento e
todo tipo de atividade colaborativa.
Com o comércio eletrônico, a principal mudança é o fato de que é levada
ao alcance do consumidor a “vitrine” do comerciante, sem a necessidade de
deslocamento físico, de um estabelecimento comercial.
O Comércio eletrônico vem crescendo, porém em ritmo menos acelerado
desde 2014, conforme prevê o gráfico abaixo:
Para se ter uma ideia do crescimento do comércio eletrônico, até março
de 2014, segundo dados da E-bit, 51,3 milhões de pessoas já utilizaram a web
ao menos uma vez para adquirir um produto. Os dados representam um
crescimento de 28% no comércio eletrônico em comparação a 2013,
alcançando um faturamento de 28,8 bilhões de reais.20
Até julho de 2015, o Brasil era o maior mercado de comércio eletrônico da
América Latina. O México ocupava o segundo lugar, com receitas projetadas
de US$ 5,7 bilhões em 2015. A Argentina estava na terceira posição (US$ 4,96
bilhões), mas deve ter crescimento de 40%, o mais rápido da região21.
O crescimento do e-commerce ocorre em virtude da grande demanda por
serviços financeiros, ou seja, as operações bancárias deixam de ser “in loco” e
passam a ser on-line. Há inclusive títulos de créditos eletrônicos onde a
cartularidade é relativizada.
Com o crescimento da sociedade da informação, a moeda também
desmaterializa-se, passando a ser de ordem virtual. A mais famosa moeda
virtual é a “bitcoin”. A extinção legal da circulação de cédulas e moedas e o uso
exclusivo de dinheiro em meio eletrônico, ou digitalizado, poderá revolucionar
20 Disponível em: <http://info.abril.com.br/noticias/mercado/2014/03/comercio-eletronico- alcanca-51-3-mi-de-consumidores-no-brasil.shtml> Acesso em: 04 dez. 2014. 21 Jornal Valor Econômico de 17 jul. 2015. Disponível em: <http://www.valor.com.br/empresas/4139880/comercio-eletronico-deve-crescer-173-em-2015- preve-emarketer>. Acesso em: 17 jul. 2015.
automação, da economia.
A Dinamarca anunciou que pretende eliminar a circulação de cédulas e
moedas no mercado até 2016, com o fito de fomentar a produtividade dos
negócios e cortar consideráveis custos administrativos e financeiros envolvidos
na utilização de moeda manual. Ao contrário do Brasil, apenas um quarto dos
pagamentos é feito em dinheiro pela população e praticamente todos os
pequenos negócios aceitam pagamento em cartão naquele país. Mais próximo
da realidade socioeconômica do Brasil, o Equador é outro país que começou a
adotar medidas para aumentar o uso do dinheiro eletrônico para por fim ao
dinheiro físico. A iniciativa equatoriana se apoia sobre a grande quantidade de
aparelhos celulares, uma vez que todos os domicílios têm no mínimo um
celular. E, através de uma central de atendimento telefônico, é possível abrir
uma conta eletrônica, útil para realizar transferências entre usuários, compras
em vários estabelecimentos e pagar passagens no transporte público.
No Brasil, o Projeto de Lei nº 48, de 2015, pretende extinguir a produção,
circulação e uso do dinheiro em espécie, de modo que todas as transações
financeiras se realizem apenas por meio digital, em cinco anos a contar da
aprovação, projeto que está em tramitação na Câmara dos Deputados (2015),
cuja justificativa destaca a inevitabilidade de se extinguir o dinheiro físico,
diante da crescente digitalização do dinheiro. Apesar das dificuldades
relacionadas à implantação da medida, bastante abrupta, é verdade, haja vista
que, não obstante as patentes vantagens e a oportunidade criada pela
sociedade da informação, não existia nenhuma política pública específica em
curso antes do projeto para eliminação da moeda manual.
A União Europeia já se debruçou em oferecer respostas legais ao
surgimento da atividade eletrônica de emissão de moedas, cujo teor é
precursor. A Diretiva 2000/46/CE do Parlamento Europeu e do Conselho, de
2000, tratou sobre o acesso e o exercício da atividade de emissão de moeda
eletrônica, com o intuito de promover uma supervisão prudencial e fortalecer o
mercado interno. Posteriormente, adveio a Diretiva 2009/110/CE, de 2009, para
facilitar ainda mais o acesso à atividade de emissão de moeda eletrônica e o
seu exercício, assegurando condições equitativas de concorrência aos
prestadores dos serviços de pagamento.
1.3. Regulação da Internet no Brasil e no Mundo
A regulação da internet ganhou forma a partir de 1994, nos Estados
Unidos. As primeiras leis que regularam a Internet, nos Estados Unidos,
protegiam as crianças. A primeira lei aprovada em 1996, passou a criminalizar
a distribuição de material pornográfico online envolvendo menores de idade.
Também em 1995 começaram a ser produzidos navegadores que permitiam
aos usuários filtrar o conteúdo da WEB. Foi o início da autorregulação
estimulada pela iniciativa privada.22
Outros países como China e países do Oriente Médio e Norte da África
também adotaram medidas de controle da Internet.
A Europa tem tentado promover ações integradas através da União
Europeia (UE). O programa “Internet Segura” da UE está investindo na
proteção de menores e prevenção da disseminação de material relacionado a
abusos sexuais de crianças, aliciamento e ciber bullying. A União Europeia
também tem criado diretivas para regular o comércio eletrônico (The Electronic
Commerce Directive), os conteúdos audiovisuais (The Audiovisual Media
Services Directive ), direitos autorais (Directive on Copyright and Related
Rights , e Directive on the Enforcement of Intellectual Property Rights ) e
segurança (Data Retention European Directive ).23
22 DENICOLI, Sérgio. A Regulamentação da Internet: Políticas da Era da Comunicação Digital. Diponível em: <http://compos.org.br/encontro2014/anais/Docs/GT01_COMUNICACAO_E_CIBERCULTURA/d enicolicompos_2137.pdf.> Acesso em 09 jun. 2016. 23 DENICOLI, Sérgio. A Regulamentação da Internet: Políticas da Era da Comunicação Digital. Diponível em: <http://compos.org.br/encontro2014/anais/Docs/GT01_COMUNICACAO_E_CIBERCULTURA/d enicolicompos_2137.pdf.> Acesso em 09 jun. 2016.
regulação do uso da internet.24 O Acordo Comercial Anticontrafação (ACTA -
Anti-Counterfeiting Trade Agreement ), foi o mais importante acordo sobre o
assunto, assinado pela Austrália, Canadá, Coréia do Sul, Estados Unidos,
Japão, Marrocos, Nova Zelândia e Singapura. O Parlamento Europeu rejeitou o
acordo, mesmo após 22 países membros da UE terem assinado. O ACTA tem
sido muito criticado, com acusações de que é um tratado que promove a
censura e cerceia a liberdade de expressão.
No caso brasileiro, as iniciativas de regulação de conteúdos online
tiveram início em 1995, quando foi criado o Comitê Gestor da Internet no Brasil
– CGI.br, constituído por membros do governo, do setor empresarial, do
terceiro setor e da comunidade acadêmica. Na esfera política governamental, a
discussão sobre a regulação dos conteúdos online começou, de fato, em 1999,
com a apresentação do Projeto de Lei 84/99, conhecido como Lei Azeredo. O
referido projeto trabalhava com a perspectiva de tornar crimes passíveis de
prisão ou multa diversos atos praticados na Internet. O projeto teve um grande
impacto na sociedade porque previa a criação de obrigações de vigilância e
ampliava os poderes de investigação policial na esfera online. Como
consequência, chegou a ser classificado por setores da imprensa e da
sociedade civil como uma espécie de AI-5 digital .
O Projeto de Lei 84/99 transformou-se na Lei nº 12.735/2012, de 30 de
novembro de 2012, mais conhecida como Lei Carolina Dieckmann. Essa Lei
alterou o Código Penal Brasileiro para tipificar como infrações uma série de
condutas no ambiente digital, principalmente em relação à invasão de
computadores. A Lei estabelece como pena a possibilidade de detenção de
três meses a um ano e multa.
24 Nos Estados Unidos houveram dois controversos projetos sobre a regulação da internet: Stop the Online Piracy Act (SOPA) and Protect IP Act - Preventing Real Online Threats to Economic Creativity and Theft of Intellectual Property (PIPA). Eles versam, principalmente, sobre direitos autorais e copyright dos conteúdos difundidos na rede. Ambos não foram aprovados.
A Legislação mais relevante sobre a Internet no Brasil é a Lei nº 12.965
de 2014, considerado como um Código Civil da Internet ou até mesmo a
Constituição da Internet, segundo Paulo Roberto Narezi25.
Para Paulo Roberto Narezi26, no Marco Civil da Internet:
“O legislador reuniu princípios que já estavam em nosso ordenamento jurídico e aplicados pelos tribunais brasileiros. Porém, merecem destaque na lei os pontos que tratam da neutralidade, da privacidade e da liberdade de expressão na internet [...]”
Quanto ao princípio da neutralidade, previsto no Marco Civil da Internet,
as operadoras ou fornecedoras de serviços de internet não podem tratar
diferentemente os usuários de acordo com o uso dos serviços, ou seja, a
velocidade deve ser igual, independentemente da utilização do usuário.
No que tange à privacidade, a lei garante ao usuário o direito à
inviolabilidade da intimidade e da vida privada, ao sigilo do fluxo de suas
comunicações, à exceção dos casos em que houver ordem judicial.
Apesar da previsão de privacidade, o artigo 15 da lei, obriga os
provedores de internet a manter os registros de acesso a aplicações de internet
de seus usuários, sob sigilo, pelo prazo de seis meses. Esse prazo poderá ser
aumentado em razão de ordem judicial específica.
Antes mesmo do Marco Civil da Internet, o Superior Tribunal de Justiça já
decidia, que os provedores eram (e continuam a ser) obrigados a viabilizar a
identificação de usuários, coibindo o anonimato. Segundo a decisão27, é dever
do provedor e oferecer meios de identificação dos usuários, através do
fornecimento do número do IP.
25 NAREZI, Paulo Roberto. Marco Civil da Internet – uma lei que ainda precisa de regulamentação. Disponível em < http://www.gazetadopovo.com.br/vida-publica/justica- direito/artigos/marco-civil-da-internet--uma-lei-que-ainda-precisa-de-regulamentacao- 8mznvd6csilh0ndr7a45iynv2>. Acesso em 09. Jun.2016. 26 Ibid 27 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial n.º 259482/MG, Relator Ministro Sidinei Beneti, Terceira Turma, julgado em 16.04.2013.
responsabilizados pelo conteúdo divulgado por terceiros, salvo se instados
judicialmente, não promoverem a retirada do conteúdo no prazo determinado.
No julgamento do Agravo Regimental no Recurso Especial n.º
1.182.5032128, de relatoria do Ministro Raul Araújo, julgado pela 4ª Turma do
Superior Tribunal de Justiça, restou estabelecido que: “a fiscalização prévia,
pelo provedor de conteúdo, do teor das informações postadas na web por cada
usuário não é atividade intrínseca ao serviço prestado, de modo que não se
pode reputar defeituoso”.
Dependendo dos agentes envolvidos no comércio eletrônico, este poderá
se caracterizar de forma diversa, como veremos em seguida.
1.4.1. Business to business – B2B
De acordo com Novaes29, o “business to business”, ou B2B, é o comércio
eletrônico entre empresas ou corporações, caracterizando-se por ter apenas
pessoas jurídicas envolvidas no processo.
Para Ching30, o B2B pode ser entendido por “companhias conduzindo
negócios uma com a outra por meio da World Wide Web [...] o B2B permite que
dezenas de milhares de companhias conectem-se com dezenas de milhares de
outras companhias, por meio de uma rede virtual”.
28 BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Agravo Regimental no Recurso Especial n.º 1.182.503, Rel. Ministro Raul Araújo, Quarta Turma, D.j em 19.10.2010. 29 NOVAES, A. G. Logística e gerenciamento de cadeia de distribuição (estratégia, operação e avaliação). Rio de Janeiro: Campus, 2001, p. 80. 30 CHING, H. Y. Gestão estratégica de estoques na cadeia de logística integrada: Supply Chain. São Paulo: Atlas, 2001, p. 185.
Bertaglia31 prefere enfatizar a melhoria no relacionamento entre as
empresas, explicando que “as soluções de B2B permitem uma comunicação
mais eficaz, integrando as organizações e seus processos e seus
fornecedores, clientes, parceiros estratégicos e distribuidores”.
Podem-se citar três grupos principais de portais do B2B: a) Portal para
colaborador (Intranet), que é utilizado para comunicação interna da empresa; b)
Portal com parceiro para manter relacionamento entre empresas. Trata-se de
uma rede que liga a empresa aos seus parceiros de negócios; e c) Portal de
terceiros, os famosos e-marketplaces, que promovem a negociação de
produtos/serviços através da internet, facilitam a compra on-line.
O faturamento dessa modalidade de comércio eletrônico chegou R$ 35,8
bilhões em 2014, com um incremento de 24% sobre o ano anterior, quando
esse número se situou na casa dos R$ 28,8 bi, segundo informações da
consultoria e-Bit, com apoio da Câmara Brasileira do Comércio Eletrônico32.
1.4.2. Business to consumer – B2C
Trata-se de comércio realizado entre o consumidor final e seu fornecedor,
por meio da Internet.
Essa modalidade é tão importante que as vendas de comércio eletrônico
B2C aumentaram 14,3% no mercado europeu em 2014, atingindo os 423,8 mil
milhões de euros. Os dados são revelados pela associação E-commerce
Europe no novo “European B2C E-commerce Report 2015”, compilados pela
GfK. Em 2015, em toda a Europa, as previsões apontam para uma subida dos
valores na ordem dos 12,5%, com um volume de negócios de 477 mil
milhões33.
31 BERTAGLIA, P. R. Logística e gerenciamento da cadeia de abastecimento. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 487. 32Guia de E-commerce. Disponível em: <http://guiadeecommerce.com.br/faturamento-do- ecommerce-em-2014/>. Acesso em: 17 set. 2015. 33 ACEPI – Associação da Economia Digital. Disponível em: <http://www.acepi.pt/artigoDetalhe.php?idArtigo=91682>. Acesso em: 22 nov. 2015.
No Brasil, o crescimento do B2C é evidente, porém esse crescimento
passa a ser menor nos últimos anos, em virtude da paralisação da economia
brasileira34:
Fonte: www.dothcom.net
A maior vantagem na utilização do B2C é a criação de lojas virtuais, onde
poderá haver promoções de determinadas marcas, com baixo custo e lucro
elevado.
O Comércio Eletrônico B2C possui três modelos distintos e facilmente
percebidos: leilões eletrônicos, lojas on-line e serviços on-line.
Os leilões eletrônicos são as licitações eletrônicas – oferecem mercadoria
e os lances dos supostos valores a serem pagos são feitos via internet. O baixo
custo da operação é um dos benefícios dessa modalidade de comércio.
As lojas on-line comercializam produtos da empresa através da web.
Exemplo: Amazon.com, Americanas.com, Submarino. As lojas on-line
apresentam diversos benefícios para a empresa, sendo o principal deles o
aumento da demanda, com custos bem mais baixos para armazená-lo do que
no estabelecimento físico.
34 DOTHCOM. Disponível em: <www.dothcom.net>. Visto em 03. Jan 2016
Para os clientes, as lojas online também oferecem benefícios; uma vez
que os preços são mais baixos, há maior opção de escolha, melhor qualidade
de informação, conveniência de comprar sem sair de casa.
O terceiro modelo de comércio eletrônico B2C é caracterizado pelos
serviços on-line. Nessa modalidade, as empresas se valem da internet para
fornecer serviços a clientes como: serviços bancários, ações da bolsa, dentre
outros. A missão dos serviços on-line é a de simplificar a vida do usuário
através de serviços interativos disponíveis a qualquer horário e em qualquer
lugar do mundo.
Uma das formas mais bem sucedidas de B2C é a compra e venda em
sites de compras coletivas. O primeiro site de compras coletivas no Brasil foi o
Peixe Urbano, que iniciou suas atividades em Março de 2010.
Segundo Gavioli35, “compra Coletiva é uma modalidade de comércio
eletrônico que tem como objetivo vender produtos e serviços para um número
mínimo pré-estabelecido de consumidores por oferta”.
O sucesso das compras coletivas está em sua simplicidade e no interesse
que os portais oferecem com seus descontos. Basta um mero cadastro rápido
e poucos cliques para efetivar a compra, e traz um benefício real ao
consumidor com desconto que pode chegar a 90% do valor do produto. Em
contrapartida as empresas anunciantes conseguem divulgar a marca de forma
fácil e rápida.
Em Dezembro de 2010, o Brasil já contava com 1025 sites de compras
coletivas, conforme registros contabilizados pelo site Bolsa de Ofertas, que
35 GAVIOLI, Guilherme. O que é compra coletiva. E-commerce News. Disponível em: <http://ecommercenews.com.br/glossario/o-que-e-compra-coletiva 20/04/2011>. Acesso em: 18 mar. 2016.
mede a quantidade de sites de compras coletivas existentes no país e publicam
informações sobre este novo segmento.36
Para regular esse tipo de comércio, houve a promulgação do Decreto nº
7.962, que veio dirimir algumas das tormentosas controvérsias que envolvem a
celebração de contrato de consumo no meio eletrônico.
As principais alterações legislativas sobre o assunto foram: garantia de
arrependimento e identificação do vendedor no meio eletrônico.
Especialmente em sites de compras coletivas, o Decreto Presidencial
prevê que tais sítios eletrônicos devem conter, obrigatoriamente, as
informações de identificação do fornecedor, a quantidade mínima de
consumidores para a efetivação do contrato e o prazo para utilização da oferta
pelo consumidor.
Por fim, o Decreto regulamenta a forma de contratação, assegurando ao
consumidor amplo acesso aos termos do contrato, antes mesmo da efetivação
do vínculo, e conhecimento dos termos do instrumento contratual, até as
formas possíveis e seguras de se efetivar o pagamento do preço.
Com algumas das alterações acima, o consumidor encontra-se mais
protegido perante as relações tecnológicas.
Claramente, outras situações surgirão. A fim de proteger o consumidor,
deveremos aplicar o Código de Defesa do consumidor e igualar o consumidor
eletrônico ao tradicional.
Um número crescente de comerciantes vem transformando as redes
sociais em vitrines de seus produtos. O Facebook passou a ser um meio de
Bussiness to Consumer.
O Facebook-Commerce, ou F-commerce como também é conhecido,
é uma loja virtual construída dentro do ambiente do Facebook, uma tendência
que tem tudo para crescer nos próximos anos. Essa ferramenta de vendas on-
line tem ganhado cada vez mais espaço na rede; desde pequenas empresas
até multinacionais como Coca-Cola e Natura têm usado desta
ferramenta para ofertar seus produtos a seus consumidores.
A tendência é que este mercado movimentasse até 30 bilhões de
dólares no ano de 2015 no mundo, segundo uma pesquisa realizada pela Booz
& Company, no ano de 2010. Desse total, 14 bilhões de dólares serão
movimentados nos Estados Unidos, país em que este tipo de e-commerce está
mais evoluído.
No Facebook, a loja virtual estimula não só a compra, mas também a
propagação das ações entre os amigos do consumidor. Por isso, no F-
commerce, a loja virtual pode ter funcionalidades próprias da rede, como o
sugerir (compartilhar) produtos para outros usuários37.
De acordo com a pesquisa brasileira, produzida e divulgada pela Hi-
Mídia38, grande parte dos usuários de alguma forma já está familiarizada com o
comércio na rede social.
O estudo foi realizado com 570 pessoas das cinco regiões do Brasil,
entre outubro e novembro de 2012, e mostrou que o F-commerce tem grande
aceitação do público. Para se ter uma ideia, 72% dos entrevistados afirmaram
que discutem sobre produtos que desejam comprar com amigos e parentes nas
redes sociais.
O estudo mostrou ainda que 12% é o número dos que afirmaram já
terem feito alguma compra diretamente pelo Facebook. Dos que nunca
compraram na rede, 35% não sabiam desta possibilidade – o que mostra que
muitas pessoas nunca compraram via Facebook simplesmente porque
desconheciam o serviço.
Finalmente, a pesquisa ainda demonstrou que cerca de 90% dos
usuários teriam interesse em ferramentas de indicação e comentários de
produtos para compartilhar as suas escolhas com outros usuários no intuito de
melhorar o processo de compra.
Se, para o usuário, a opção de ver e partilhar opiniões sobre um produto
ou marca e efetuar todo o processo de compra dentro de um ambiente que ele
já está familiarizado é uma vantagem, para o comerciante, é uma forma de
aumentar o número de clientes em potencial.
37ECOMMERCE BRASIL. Disponível em: <https://www.ecommercebrasil.com.br/artigos/f- commerce-como-vender-dentro-facebook/>. Acesso em: 20 set. 2015. 38 Revista Exame. Disponível em: <http://exame.abril.com.br/tecnologia/noticias/pesquisa- aponta-potencial-do-f-commerce-no-brasil>. Acesso em: 20 set. 2015.
Mobile Commerce, ou m-commerce, é toda e qualquer operação que
envolva a transferência de propriedade ou de direitos de utilização de bens e
serviços, que é iniciado e / ou concluído com a utilização de dispositivos
móveis.
O Mobile Commerce começou a se tornar convencional com a
introdução de ringtones, aplicativos para celular e jogos. Os usuários
procuravam suas músicas favoritas, aplicativos e jogos de seu gosto que
fossem compatíveis com dispositivos portáteis. Em seguida, podia-se comprar
esses bens digitais e baixá-los logo após a conclusão da transação. Com o
crescimento do Mobile Commerce, não apenas bens digitais estão sendo
vendidos, como bens tangíveis estão passando a ser ofertados pelos
varejistas.
Até junho de 2014, no Brasil, a participação dos dispositivos móveis nas
vendas subiu para 7% em comparação com o período do ano de 2013. Um
crescimento de 84% no período de um ano. Foram realizados 2,89 milhões de
pedidos, resultando em um faturamento de R$ 1,13 bilhão39.
O crescimento do m-commerce em âmbito mundial é espantoso e
demonstrado no gráfico abaixo:
demonstra sua grande influência, a partir de junho de 2014, conforme
demonstrado abaixo.
A estimativa da e-Bit é de que, mantida a taxa de crescimento registrada
nos últimos meses, até o fim do ano de 2015 o mobile commerce represente
perto de 10% das transações do e-commerce brasileiro, com mais empresas
de e-commerce adaptando seus sites para o uso em dispositivos móveis. O
despreparo dos varejistas on-line para suportar a atividade continua sendo o
principal entrave para o crescimento ainda mais acelerado do mobile
commerce no País, junto com a precariedade das comunicações 3G e a baixa
penetração de Wi-Fi nas residências40.
1.4.3. Consumer to consumer – C2C
Aqui, o comércio eletrônico se desenvolve entre usuários particulares da
internet.
Trata-se da comercialização entre consumidores diretamente ou através
de uma empresa intermediária. Bom exemplo desse tipo de comércio é o leilão
on-line, como Ebay, Mercado Livre, e o mais famoso atualmente, AliExpress.
Normalmente, não existem intermediadores, mas se existir uma empresa
que facilite a transação, ela passa a ganhar uma comissão por cada leilão ou
recebe uma taxa única de transação.
Os sites em que se realizam os leilões não se responsabilizam pela
qualidade do produto nem por valores. Apenas disponibilizam o espaço virtual
para que a transação seja realizada.
Vale ressaltar que, esse tipo de comércio é tão expressivo que AliExpress
tornou-se oficialmente líder em volume de vendas da internet brasileira. O site,
em 2014, movimentou US$ 250 bilhões. É mais que Amazon e EBay somados
(e quatro vezes o faturamento anual do Google)41.
1.4.4. Government to citizen – G2C e Government to business – G2B
Relação comercial que se viabiliza por meio da internet entre Governo e
cidadão/consumidor ou Governo com empresa.
Na prática, o comércio G2C são portais orientados para desempenharem
serviços ao público. São serviços prestados por sites oficiais do Governo e que
disponibilizam os mesmos serviços que a repartição pública oferta. A emissão
de certidões através do site oficial, é um exemplo dessa espécie de serviço.
Por outro lado, portais G2B são voltados às relações comerciais entre
Governo e empresas, também viabilizadas pela internet. Por exemplo, compras
41 TECNOMUNDO. Disponível em <http://www.tecmundo.com.br/comercio-eletronico/65023- aliexpress-site-maior-volume-vendas-internet-brasileira.htm>. Acesso em: 20 set. 2014.
preços, compra de fornecedores, etc.
1.5. Vinculação das partes no meio eletrônico
O intercâmbio de informações, formalizado por meio de papel, torna-se
obsoleto na prática do Comércio Eletrônico. Até mesmo no âmbito processual,
o documento físico torna-se secundário.
Impossibilitada a assinatura de próprio punho, a confirmação do
assentimento de ambas as partes quanto aos termos e condições de
determinado contrato pode ser obtida por diversos meios: o clique em área
específica que indica que a parte leu e concordou com os termos dispostos na
página disposta pelo website; o envio de mensagem eletrônica concordando
com os termos anteriormente lidos.
Entretanto, a voracidade com que as transações são rapidamente
concluídas por meio da internet tem levado à argumentação de que os termos
firmados não foram completamente cientificados. Assim, busca-se proteger as
partes, a fim de que seja possível quase certeza de que elas leram os termos.
Para evitar argumentos sobre a desinformação de seu conteúdo
contratual, muitos sites obrigam as partes a passar determinado intervalo de
tempo analisando os termos e condições propostas, ou proibindo-as de concluir
a transação caso o software empregado na negociação não detecte que o
usuário ao menos efetuou a exibição do texto integral dos termos e condições
em sua tela.
O que falta, na verdade, é a confiança entre as partes, no momento da
contratação eletrônica. A esta “desconfiança” Claudia Lima Marques42,
denomina de “a crise moderna de confiança nos contratos”.
Essa “desconfiança” entre as partes de um contrato eletrônico se dá
porque os termos, muitas vezes, são elaborados para um número
indeterminado de pessoas, sem possibilidade de ampla negociação de seus
termos, cabendo apenas ao contratante do serviço ou adquirente do produto
anuir ou não com as cláusulas preestabelecidas. Cláudia Lima Marques43 diz
que esses contratos são massificados, que utilizam condições gerais, dando o
exemplo dos contratos de home-banking.
Esses contratos são denominados de Adesão e são sintetizados por
Fábio Ulhoa Coelho44, da seguinte forma:
A expressiva maioria dos contratos é celebrada por simples adesão de um contratante às cláusulas gerais de negócio estipuladas unilateralmente pelo outro. São os contratos de adesão, que se interpretam sempre em desfavor do predisponente e que não podem estabelecer a antecipada renúncia do aderente a nenhum direito inerente à natureza do negócio.
Para Cláudia Lima Marques45, os contratos de adesão apresentam três
características importantes, quais sejam: 1. a sua pré-elaboração unilateral; 2.
a sua oferta uniforme e de caráter geral, para um número ainda indeterminado
de futuras relações contratuais; 3. seu modo de aceitação, onde o
consentimento se dá por simples adesão à vontade manifestada pelo parceiro
contratual economicamente mais forte.
42 MARQUES, Cláudia Lima. Proteção do Consumidor no Comércio eletrônico e a chamada nova crise do contrato: por um direito do Consumidor aprofundado. Revista de Direito do Consumidor, v. 57, p. 9-59, jan-mar., 2006. 43 MARQUES, Cláudia Lima. Direito Civil – Proteção do Consumidor no Comércio Eletrônico e a Chamada Nova Crise do Contrato: por um Direito do Consumidor Aprofundado. RDC, 57/9, 2005, p. 11. 44 COELHO, Fábio Ulhoa. Curso de Direito Civil 3: Contratos. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 78. 45 MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no código de defesa do consumidor: o novo regime das relações contratuais. Biblioteca de direito do consumidor. Vol. 1. 3.ed. rev., atual e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 57.
Para a autora46 os contratos eletrônicos celebrados na maioria das
vezes, na forma de contrato de adesão, são típicos da modernidade.
Segundo De Canto47, a contratação eletrônica cria novas características:
à desumanização do contrato; a imputabilidade da declaração de vontade,
refletindo em sua forma e validade; à distribuição de riscos da declaração de
vontade realizada online; à formação do consentimento; à definição do local e
do momento de celebração, com o fim de definir a legislação aplicável e o
tribunal competente; e os diferentes graus de utilização do meio digital.
Tendo em vista essa unilateralidade do contrato de adesão, qualquer
nulidade, ou seja, previsão extremamente onerosa, será reconhecida de ofício.
[...] o reconhecimento da abusividade e consequente declaração de nulidade das cláusulas inseridas em contratos de consumo podem e devem ser conhecidos de ofício (ex officio) pelo magistrado, portanto, independentemente da formulação de qualquer pedido na ação ajuizada pelo consumidor ou até mesmo quando o consumidor figurar como réu. Trata-se, portanto, de exceção à regra de que ‘o juiz decidirá a lide nos limites em que foi proposta’ (art. 128 do CPC).48
Vale dizer que o contrato de adesão deve ser interpretado conforme a
intenção das partes, observando atentamente, os Princípios do Direito
Contratual e os Princípios Constitucionais. A partir destes princípios, caberá ao
magistrado preencher o conteúdo das cláusulas abertas, construindo uma
regra que permita a realização da justiça, restabelecendo, no caso concreto, o
equilíbrio entre os contratantes.
Outro ponto importante, além de identificar as partes no contrato
eletrônico, é o local de formação.
46 MARQUES, Cláudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor: o novo regime das relações contratuais. 5. ed. ver. Atual e ampl. São Paulo: Ed. RT, 2006, p. 110. 47 DE CANTO, Rodrigo Eidelvein. Direito do Consumidor e vulnerabilidade no meio digital. Revista de Direito do Consumidor, São Paulo, v. 87, p. 194, mai/jun, 2013. 48 BENJAMIN, Antônio Herman V.; MARQUES, Cláudia Lima; BESSA, Leonardo Roscoe. Manual de Direito do Consumidor. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2007, p. 294.
O meio eletrônico quebrou o paradigma estatal, pois as leis dos Estados
(especialmente o seu Direito Internacional Privado) estariam conectadas com
determinados territórios (com o domicílio ou residência habitual), ou com um
status político estatal das pessoas (com nacionalidade, a identidade cultural),ou
com o lugar físico dos atos, ou com o lugar de localização física das coisas.49
Cláudia Lima Marques50 explica:
Com essa ubiquidade, não sabemos ao certo onde ocorrerá a negociação virtual e a contratação virtual, tudo acontece no Cyberspace! O meio eletrônico também modifica os conceitos de tempo real, impondo o tempo virtual, e de território, impondo a rede global como “lugar do contrato”, em contrato já denominado de desterritorializado, internacional ou nacional conforme as partes, não conforme o lugar da conclusão do negócio (art. 9º, § 2º da Lei de Introdução ao Código Civil de 1942), pois as ofertas nos sites são “globais” em rede e não encontram limites territoriais ou nacionais. No comércio eletrônico, o internacional é a oferta, ou é o resultado e não estritamente o meio. O consumidor continua passivo (não se desloca para outro país ou Estado, geralmente continua fixado no país de sua residência ou domicílio), conecta-se localmente e age internacionalmente! Aqui o desafio é a localização dos litígios, a manutenção das normas imperativas e de standards mínimo de proteção.
Quando tratamos de uma relação consumerista, onde o consumidor é
brasileiro e um fornecedor estrangeiro, sendo a obrigação adimplida no Brasil,
ou seja, se o produto ou serviço for entregue no Brasil, estabelece-se que a
autoridade brasileira será responsável pelo julgamento.
O Código de Defesa do Consumidor, por sua vez, determina que o
fornecedor teria que se adaptar às diversas legislações de todos os lugares
onde se encontrasse o consumidor.
49 MARQUES, Cláudia Lima. Proteção do Consumidor no Comércio eletrônico e a chamada nova crise do contrato: por um direito do Consumidor aprofundado. Revista de Direito do Consumidor, v. 57, p. 9-59, jan-mar., 2006. 50 MARQUES, Cláudia Lima. Proteção do Consumidor no Comércio eletrônico e a chamada nova crise do contrato: por um direito do Consumidor aprofundado. Revista de Direito do Consumidor, v. 57, p. 9-59, jan-mar., 2006.
Ocorre que o próprio art. 101, I do CDC determina como possível o
consumidor escolher o foro que quer demandar o fornecedor, podendo ser em
território nacional ou no local de origem do fornecedor.
Assim, deve-se analisar o local de nascimento da relação contratual, a
existência de tratados sobre a matéria eletrônica firmada pelas partes e a
necessidade de homologação, se for o caso, de sentença estrangeira, em
jurisdição brasileira.
Por sua vez, se o fornecedor não tiver estabelecimento no Brasil, haverá
um confronto entre as normas de proteção ao consumidor e as regras de
comércio mundial. Na hipótese de existir tratado ou convenção que discipline
regras de comércio mundial entre o país de origem do fornecedor e o do
consumidor, no caso, o Brasil, aplicam-se a estes contratos as normas
brasileiras de proteção ao consumidor, tendo como foro de eventuais litígios o
Brasil ou o país de origem do fornecedor, conforme a opção feita pelo
consumidor. Aplica-se a mesma regra se houver filial da empresa no território
brasileiro.51
Como já mencionado, as transações eletrônicas não ocorrem dentro de
um único território, pelo contrário, a característica principal do comércio
eletrônico é justamente a queda de fronteiras e barreiras comerciais.
A redução de distâncias espaciais e temporais é uma característica azabumbante da globalização, pois trouxe consigo benefícios nunca antes experimentados pelo ser
51 ROCHA, Layla Christiane Nunes. Comércio Eletrônico: aspectos legais dos contratos de consumo e a proteção jurídica do Consumidor na Internet. Monografia apresentada a Faculdade Integrada Antônio Eufrásio de Toledo. Disponível em: <http://intertemas.unitoledo.br/revista/index.php/Juridica/article/viewFile/67/73>. Acesso em: 19 de mar. 2016, p. 44.
Comércio Internacional.
Para tanto, nos próximos capítulos deste trabalho, estudaremos como se
comporta o Comércio Internacional influenciado pela internet e globalização.
Apesar da globalização e das tentativas de harmonização, o ambiente
digital é regulado por diversas leis, de diversos países. Esse é o grande
problema da contratação internacional eletrônica: a diversidade de legislação.
Hodiernamente, os Estados vêm-se organizando em blocos comerciais
regionais por meio de criação de Organizações Internacionais (como Mercosul
e União Europeia53), que visam à liberação comercial entre seus membros,
mediante redução ou mesmo eliminação de impostos de importação e
exportação, barreiras tarifárias, exigências fitossanitárias, bem como demais
formas que possam impedir ou dificultar o comércio entre seus integrantes54.
Será essa é melhor forma de unificar? Será que teremos um Direito
Universal sobre Legislação eletrônica?
52 MALHEIRO, Emerson Penha. Manual de direito internacional Privado. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 112-113. 53 A União Européia vem passando por uma grave crise institucional, na qual o Reino Unido vem requerendo sua saída do bloco – o chamado fenômeno Brexit 54 MALHEIRO, Emerson Penha. Manual de direito internacional Privado. 2. ed. São Paulo: Atlas, 2012, p. 113.
Para responder a essas questões, precisamos entender o
desenvolvimento do Comércio Internacional.
Antes de estudarmos o comércio eletrônico internacional, precisamos
entender o que é contrato internacional. Este capítulo traçará a conceituação
do contrato internacional e suas características, a escolha do foro e da
legislação aplicável.
A atividade que traduz uma visão projetiva transfronteira de todos os acontecimentos que envolvem intercâmbios visíveis e invisíveis manifestados pelos mecanismos da compra e venda de mercadorias, transferência de tecnologia, investimentos, representações e outros entendimentos que possibilitem a consecução de lucros e vantagens para as partes intervenientes, compreendendo os atos formais possibilitantes dessas relações.55
O comércio internacional é reconhecido desde o século XVI, quando se
tornou claro para os governantes que a utilização mais eficiente dos seus
recursos ocorria com a realização de troca de mercadorias que a nação detinha
por outras mais interessantes ou aquelas que trouxessem sensíveis economias
de escala em produção. O governo determinava quem deveria: produzir,
55 STRENGER, Irineu. Direito Internacional Privado. 4. ed. São Paulo: LTR, 2000, p. 750.
comercializar, exportar ou importar com objetivo de gerar superávits
comerciais56.
No século XIX, o Comércio Internacional se desenvolveu em virtude do
parque tecnológico inglês, para o escoamento de produtos para a Europa e
suas colônias. Esse comércio se intensificou com a formalização de tratados
internacionais, no final do mesmo século.
No final do século XIX, os Estados Unidos e o Japão passaram por suas
Revoluções Industriais e passaram a “competir” com os produtos europeus.
Durante a I Guerra Mundial, os países europeus focaram-se no comércio
interno, deixando de lado o comércio internacional.
De certa forma, a I Guerra Mundial enfraqueceu o comércio Internacional
europeu, enquanto os Estados Unidos aumentaram tarifas para a importação,
desmotivando-a.
A produção industrial norte-americana era tanta que não tinha plano de
escoamento, causando a crise que desencadeou na II Guerra Mundial. Assim
sendo, o Estado perde espaço na comercialização de produtos e as atividades
comerciais passam a ser realizadas por entidades particulares.
Após a Segunda Guerra Mundial, os países começam a se unir em
blocos econômicos a fim de intercambiar serviços, mercadorias e riquezas. As
relações econômicas internacionais passam, então, a articular interesses
comuns voltados à proteção da economia interna, com vistas a favorecer a
economia comunitária e o trânsito de bens e mercadorias57.
56 GOULART, José Braz. Comércio Eletrônico – Um estudo sobre a viabilidade da utilização do Brasil web trade para a inserção de micro e pequenas empresas no comércio internacional. 2010. Dissertação (Mestrado em Administração) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, PUC/SP, São Paulo, 2010, p. 22. 57 MORBIDELLI, Sidney. As relações internacionais entre os Estados e a livre concorrência no mercado mundial. 2009. Dissertação (Mestrado em Direito) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, PUC/SP, São Paulo, 2009, p. 24-26.
Para Chia-Jui Cheng, o desenvolvimento do Direito do Comércio
internacional atravessou três etapas:
The development of the Law of international trade has gone throuth three stages. In the first phase it appeared in the form of medieval Lex mercatoria, a body of universally accepted rules. In the second stage it was incorporated into the municipal Law of the various national States wich succeeded the feudal stratification on medieval society. The culmination of this development was the adoption in France of the Code the Commerce of 1807, in Germany the promulgation of the AllgemeineHandelsgesetzbuch of 1861, and in England the incorporation of the custom of merchants into the commom Law by Lord Mansfield. The third stage in the development of the Law of international trade is contemporary. Commercial custom has again developed widely accepted legal concepts, particularly such trade terms as f.o.b and c.i.f., and the instituion of the banker’s commercial credit and international conventions have brought a measure of unification in important branches of the Law of negotiable instruments, of transport by sea, air, and land, of arbitration and other topics.58
Com o intercâmbio de mercadorias entre diferentes países, ressalta-se a
divergência de legislação como um dos principais problemas. Para contornar a
situação, os tratados assumem papel importante na efetivação das relações
mundiais, promovendo a integração entre países signatários.
Em suma, pode-se dizer que a progressiva internacionalização dos
mercados de bens, serviços e créditos, a redução de tarifa de exportação e de
obstáculos aduaneiros,