pontivírgula nº18

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I Love You, Granny! Mais do que não perceber o Michael e a Barbra (contentava-se com o ritmo das músicas), percebeu que já não percebia a neta. Isso não teria feito diferença, se não fosse a Leonor a sua razão de viver..” Opinião: CapitaNATALismo É, de facto, uma época bonita. As pessoas tornam-se altamente sensíveis ao desastre social. O Natal é no inverno, felizmente – é como uma lareira que aquece os nossos corações. Andamos a ferver de boas intenções de tal forma que o frio na rua já não nos incomoda. E se o frio já não incomoda, nada melhor do que ir às compras.» página 19 Afinal, eles têm Abrigo «Estou nesta situação gerada por nada. Talvez porque eu quero. É muito complicado, mas já esve em situações bem piores. Temos é de saber lidar com isto. Tinha trabalho, nha família e desliguei-me disso tudo. O movo sou eu e o meu orgulho. A minha situação não pode ser a dos outros, é a minha» » página 14 a 16 Cante Alentejano é Património da Humanidade “O Cante Alentejano recebeu parecer posivo da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura e foi classificado Património da Humanidade a 27 de Novembro, após reunião em Paris. » página 17 Marques’Almeida Por outro lado, a mentalidade portuguesa baseia-se na ideia de que o que é feito lá fora é superior ao nacional, porque “não somos muito bons, não temos muitos meios, não temos tanto talento...”. Não me interpretem mal (...)” » página 22 » página 17 e 18 Discriminação Racial nos E.U.A. “A morte de Michael Brown originou protestos em Ferguson que pretendiam denunciar o racismo e uso de excesso de força por parte das autoridades. As manifestações começaram no dia 10 de Agosto, um dia depois da morte de Brown.” P ONTIVÍRGULA Direcção: Patrícia Fernandes e Joana Cavaleiro Edição nº18 - Dezembro de 2014 e Janeiro de 2015 - Publicação Mensal » página 28

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Jornal Pontivírgula nº 18, Dezembro de 2014 e Janeiro de 2015

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Page 1: Pontivírgula nº18

I Love You, Granny!

“Mais do que não perceber o Michael e a Barbra (contentava-se com o ritmo das músicas), percebeu que já não percebia a neta. Isso não teria feito diferença, se não fosse a Leonor a sua razão de viver..”

Opinião: CapitaNATALismo

“É, de facto, uma época bonita. As pessoas tornam-se altamente sensíveis ao desastre social. O Natal é no inverno, felizmente – é como uma lareira que aquece os nossos corações. Andamos a ferver de boas intenções de tal forma que o frio na rua já não nos incomoda. E se o frio já não incomoda, nada melhor do que ir às compras.”

» página 19

Afinal, eles têm Abrigo«Estou nesta situação gerada por nada. Talvez porque eu quero. É muito complicado, mas já estive em situações bem piores. Temos é de saber lidar com isto. Tinha trabalho, tinha família e desliguei-me disso tudo. O motivo sou eu e o meu orgulho. A minha situação não pode ser a dos outros, é a minha»

» página 14 a 16

Cante Alentejano é Património da Humanidade

“O Cante Alentejano recebeu parecer positivo da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura e foi classificado Património da Humanidade a 27 de Novembro, após reunião em Paris.”

» página 17

Marques’Almeida

“Por outro lado, a mentalidade portuguesa baseia-se na ideia de que o que é feito lá fora é superior ao nacional, porque “não somos muito bons, não temos muitos meios, não temos tanto talento...”. Não me interpretem mal (...)”

» página 22

» página 17 e 18

Discriminação Racial nos E.U.A.

“A morte de Michael Brown originou protestos em Ferguson que pretendiam denunciar o racismo e uso de excesso de força por parte das autoridades.

As manifestações começaram no dia 10 de Agosto, um dia depois da morte de Brown.”

Pontivírgula Direcção: Patrícia Fernandes e Joana Cavaleiro Edição nº18 - Dezembro de 2014 e Janeiro de 2015 - Publicação Mensal

» página 28

Page 2: Pontivírgula nº18

Por esta altura, torna-se inevitável não falar da sociedade consumista em que nos inseri-mos, suportada por mentes cada vez mais alimentadas pela ideia do “ter” e em que tudo se constrói com base numa imagem (muitas vezes, falsa e redutora) do indi-víduo.

Até que ponto devemos criar uma imagem falaciosa do nosso ser? Até que ponto essa con-cepção adultera a nossa própria realidade?

Segundo a expressão popular, “se repetires uma mentira demasiadas vezes, ela torna-se verdade” e reparo que cada vez mais somos impulsionados a criar um alter-ego para substituir o nosso verdadeiro “eu”, pois a sociedade vende a ideia do i n d i v í d u o c o m o u m ser único e especia l . No entanto, tudo é cada vez mais generalizado, levando a uma ideia errada do nosso interior.

Se temos consciência desta (triste) realidade, porque não existem verdadeiras manifesta-ções contra estas acções derro-tistas? Questiono então porque não se deve valorizar as opiniões, mesmo que divirjam absoluta-mente das nossas? E é aqui que me debato todos os dias.

Na ideia de imparcialidade, baseando-me apenas no valor dos argumentos utilizados e incenti-vando a comunicação individual, reforçada pelo pensamento único de cada pessoa.

É com isto que me debato, constantemente, na elaboração deste jornal.

Ficha Técnica

Directora: Patrícia FernandesVice-Directora: Joana Cavaleiro

RedacçãoAlexandra AntunesAlexandra NogueiraCatarina FélixDina TeixeiraFrancisco Bruto da CostaGuilherme TavaresInês AmadoInês CruzInês Linhares DiasJoana ContreirasJoana SantosMadalena GilManuel CavazzaMariana FidalgoSusana Santos

ColunistasCatarina Veloso, ModaDaniela Ribeiro de Brito, DesportoDiogo Barreto, MúsicaInês Sousa Almeida, SériesJoana Cavaleiro, LiteraturaJoão Marques da Silva, CinemaMariana Leão Costa, LifestyleMichelle Tomás, ActualidadeMitchel Martins Molinos, Gaming/InternetPedro Pereira, Literatura Contacto: [email protected]

REDES SOCIAIS

Site: www.jornalpontivirgula.wix.com/jornalpontivirgula

Facebook: www.facebook.com/pontivirgula.geral

Boas Leituras, Patrícia Fernandes

“o consumo é a única FinaLidade e o único ProPósito de toda a Produção.”adam smith

EDITORIAL 02

Jornal redigido com o antigo acordo ortográfico, salvo quando indicado.

A minha maior preocupação é o crescimento individual de cada elemento deste projecto e, acredito que isso acontece quando cada pessoa é incentivada a expressar os seus verdadeiros pensamentos, pois é nesse momento que passamos a conhecer a essência de cada um.

Se aceitarmos cada um pelas suas divergências, elementos-chave e factores comuns, sei que apenas algo de bom poderá sair dessa constante comunicação.

Essa é e sempre será a minha maior batalha durante toda a minha vida.

Nesta edição dupla, aborda-mos temas como o capitalismo, o lado solidário muito alimentado pela época festiva que vivemos, para além de focarmos assuntos culturais como uma dupla de sucesso na moda portuguesa, a censura nos diversos meios e a “felicidade” das músicas natalí-cias.

Reforço, como nota, que o próximo mês de Janeiro coincide com a pausa lectiva e que, por isso, regressaremos em força em Fevereiro, sempre com temas actualizados e conteúdos pertinentes.

Até lá...

Page 3: Pontivírgula nº18

FCH

madaLena GiL

03

Nesse dia, foram disponibilizadas duas carrinhas exteriores que os alunos puderam visitar, uma completamente renovada de 1957 e outra com as tecnologias mais recentes próprias para a execução de uma emissão fora de estúdio.

Francisco Marcelino, aluno de segundo ano do curso de Comunicação Social e Cultural, na vertente de Jornalismo, admitiu que “(…) a possibilidade de as conhecermos foi muito importante, pois dá um carácter prático e didáctico ao mundo da comunicação social, (…) mostrando como se trabalha em televisão e dando conta de toda a produção que é feita, e que não se vê nas transmissões que vemos em casa”.

Para além da exposição destes dois instrumentos pela RTP, também foi possível aos alunos da UCP ver em primeira mão televisores 4K, isto é, equipamentos com ecrãs cuja imagem é quatro vezes a alta definição. Estes ecrãs, que ainda não estão disponíveis para venda ao público em Portugal permitem ao espectador ter noção do mundo que vê no ecrã em três dimensões e não em duas, como é usual.

Dia Do Serviço Público na UcP - a DeSmiStificação Da televiSãoNo passado dia 21 de Novembro, a Universidade Católica Portuguesa comemorou o dia de Serviço Público de

Media com a RTP.

Teresa Fonseca, estudante do mesmo curso, porém na vertente de Comunicação Organizacional, afirmou que achou “incrível a forma como a imagem é transmitida de uma forma perfeita, dando quase a impressão de tridimensionalidade, quando nem sequer é preciso utilizar óculos ou qualquer outro aparelho. É uma enorme e óptima evolução e faz com que se tenha ainda mais gosto por ver televisão, com uma qualidade perfeita”.

Ainda, de modo a dar um contexto aos vários equipamentos em exibição, foi organizada uma conferência com a participação do engenheiro Simon Fell, director de tecnologia e inovação da União Europeia de Radiodifusão, intitulada “Os Ecrãs do Futuro: Novas Formas de Ver Televisão”.

Fell falou sobretudo da importância dos avanços tecnológicos, que tanto ajudam a comunicação social a tornar-se um meio cada vez mais dinâmico e interactivo. São ainda estes avanços tecnológicos que mudam, para melhor, a experiência do espectador, que, antigamente visto como passivo, actualmente tem a oportunidade de ter uma participação mais activa na comunicação social.

Outra experiência marcante deste dia foi a possibilidade de experimentar óculos da Samsung, que tinham o poder de levar uma pessoa “a uma realidade completamente diferente”, lembra Madalena Frischknecht. “Parece que estamos num mundo à parte ou que somos uma personagem de um videojogo”, conclui.

No fim, foi possível ver que a iniciativa proporcionada pela UCP, juntamente com a RTP, teve um impacto positivo nos vários participantes (alunos ou não), que, interessados, aprenderam mais sobre a forma de fazer televisão.

Como o professor José Lopes Araújo disse no início da conferência, foi “um dia de festa para quem trabalha em televisão”.

Conferência de Simon Fell, director de tecnologia e inovação da UE de Radiodifusão

Televisores com qualidade 4K

“a importância dos avanços

tecnológicos, que tanto ajudam

a comunicação social a

tornar-se um meio cada vez

mais dinâmico e interactivo”

Page 4: Pontivírgula nº18

fomentar o eSPírito SoliDário

FCH 04

Pelo terceiro ano consecutivo, a licenciatura em Serviço Social organiza e apresenta a Academia Solidária da Faculdade de Ciências Humanas. Serão três dias de experiência no terreno, com os jovens participantes da Academia Solidária a intervirem no quotidiano de pessoas em situação de vulnerabilidade social.

Dirigida a jovens entre os 13 e os 18 anos, esta iniciativa possibilita uma experiência in loco num ambiente propício ao serviço comunitário.

Do programa faz parte uma visita à Comunidade Vida e Paz, uma instituição particular de solidariedade social que vai ao encontro de pessoas sem-abrigo, acolhendo-as e ajudando-as a reconstruir o seu projecto de vida.

O Centro Social Paroquial do Campo Grande receberá, também, a ajuda e intervenção dos inscritos na Academia Solidária. O Centro, que integra a Pastoral Sócio-caritativa da Igreja, atende às necessidades correntes dos habitantes da zona de actuação da Paróquia, sendo dada prioridade aos mais pobres.

Estas instituições contam nas suas fileiras com dezenas de colaboradores e voluntários, aos quais se juntarão, durante alguns dias, os jovens participantes da Academia Solidária da FCH.

A iniciativa que aos participantes se apresenta explora a delicada realidade social que conhecemos e que se vai revelando cada vez menos remota. Revela-se necessário, por isso, incentivar os jovens para o envolvimento em acções de cariz social, informando-os e expondo-os ao que no mundo acontece e promovendo, assim, uma maior consciencialização social e cívica.

Com a participação na Academia Solidária, pretende-se que estes jovens reflictam sobre a importância crescente do voluntariado, valorizando a dedicação e a disponibilidade oferecida por milhares de pessoas a uma causa nobre e universal: a luta contra a pobreza.

Neste ano, a iniciativa contará com os alunos de Serviço Social como promotores do evento, sendo eles os responsáveis por acompanhar os voluntários nas várias actividades planeadas.

A Academia Solidária da FCH aconteceu nos dias 17 a 19 de Dezembro e teve um custo de 40 euros (propina), acrescido de 10 euros (donativo ao CSPCG e à Comunidade Vida e Paz).

“vai ao encontro de pessoas sem-abrigo,

acolhendo-as e ajudando-as a

reconstruir o seu projecto de vida.”

dina teixeira e inês amado

Jornal PontivírgUla no site Da UniverSiDaDe católica PortUgUeSa

O Jornal Pontivírgula está presente no site da Faculdade de Ciências Humanas da Universidade Católica Portuguesa.

Este é o jornal da Faculdade, tem edição mensal e é possível consultar os seus conteúdos relativos a diversas áreas acedendo ao site.

O Jornal Pontivírgula também pode ser visto no Facebook, gerindo um site próprio com conteúdos relacionados com a Actualidade.

Page 5: Pontivírgula nº18

FCH05

PSICOLOGIA neGociar o comPortamento: que motivação?

Já alguma vez pensaste em negociar o teu comportamento? Sim, é possível!

Através da motivação, consegues encontrar diferentes estratégias para te manteres sempre altamente estimulado!

Toda e qualquer pessoa se comporta conforme as suas próprias escolhas, é verdade, mas a inten-sidade ou o nível de envolvimento na actividade é diferente de pessoa para pessoa, assim como o são o tempo que se demora a iniciar esse mesmo comportamento após se ter tomado a decisão de o ter, e os pensamentos ou os sentimentos enquanto se está a realizá-lo.

Embora existam diferenças individuais, a motivação pode ser a moeda de troca deste negócio!

A motivação é uma força, que tanto pode ser exterior como partir de cada um de nós, que se orienta para os objectivos que nos propomos a atingir. Obviamente, estes têm significados peculiares e o seu grau de importância é variável de pessoa para pessoa.

Se a sua fonte se encontra nos teus interesses, responsabilidades e projectos futuros, irá dar mais intensidade, persistência e energia àquilo que queres fazer. Terás assim uma maior probabilidade de seres bem-sucedido no que quiseres!

Por outro lado, se quiseres fazer alguma coisa apenas com o fim de alcançares um outro, ages conforme a recompensa exterior que esperas obter.

E estes casos não são tão raros como podem parecer: um cão abana a cauda porque quer rece-ber festas, uma criança faz birras porque está implicitamente a pedir atenção, um cliente pede o seu café utilizando um tempo verbal no pas-sado porque tenta ser delicado e espera que o empregado de balcão também assim o seja e se instale um clima de mútua cumplicidade.

E é desta forma que podemos negociar as nossas atitudes: podemos fazer porque quere-mos, porque podemos, porque nos é imposto ou pura e simplesmente porque as recompensas que esperamos nos auto-motivam.

Nós podemos negociar o nosso compor-tamento e ter atitudes (que noutras ocasiões não teríamos) apenas pelas consequências que daí podem advir, já que sermos recompensa-dos pode fazer-nos ficar altamente motivados! E não se trata de questões pouco morais ou de violações do nosso próprio código ético, mas sim de uma forma de motivação – extrínseca – que contrasta com um grau de motivação superior que toma como base a tendência natural de procurar (e vencer!) desafios à medida que se perseguem interesses pessoais, projectos e curiosidades que nos levam a sentir-nos realizados – motivação intrínseca.

Por tudo isto, não te esqueças: negoceia o teu comportamento e sê sempre bem-sucedido no que fazes!

“A motivação é uma força, que tanto pode ser exterior como partir de cada um de nós, que se orienta para os objectivos

que nos propomos atingir.”

aLexandra noGueira

Page 6: Pontivírgula nº18

SERVIÇO SOCIAL comemoração do 66.º aniversário da decLaração universaL dos direitos humanos

FCH 06

Muitas destas condições revestem-se de necessidades e todas estas necessidades são, aos olhos da Declaração, inseparáveis da realização dos direitos positivos do Homem!

Esta novela de necessidades e direitos, dificilmente desenrola a sua ação sem o papel fundamental do Serviço Social.

Sendo uma profissão que se centra nas necessidades humanas e que reforça que a natureza fundamental destas necessidades é uma justiça básica da condição de ser humano, é impossível separar uma relação tão longa e séria e que se impõe como guia para o papel do assistente social.

Atrevo-me a dizer que o Serviço Social caminha no sentido de considerar os Direitos Humanos um princípio organizador da sua prática profissional e que é imperativo que os atores envolvidos na consagração destes direitos tenham em atenção as suas deixas, protegendo as diferenças individuais e de grupo e mediando a consagração dos direitos entre as pessoas e o Estado ou outras autoridades.

Como dizia Nélson Mandela, “negar ao povo os seus Direitos Humanos é pôr em causa a sua humanidade”.

E assim termino... Com alguém que percebe muito mais disto do que eu.

No mês em que se celebra o 66.º aniversário da Declaração Universal dos Direitos Humanos, pareceu-me que seria a altura ideal para refletir sobre esta relação que tanto persegue os estudantes de Serviço Social.

Esta “perseguição” persistente é, na realidade, essencial, pois os Direitos Humanos são uma pista fundamental para a compreensão do trabalho do Serviço Social, revestindo-se como uma peça chave da prática quotidiana de todos os profissionais desta área.

Perguntem: “O que é isso dos Direitos Humanos?”, e eu devolvo-vos uma definição muito simples: os Direitos Humanos são todos aqueles direitos que são inerentes à nossa natureza e sem os quais nos seria retirada a condição de “sermos Humanos”.

Infelizmente, algumas das condições que para muitos são adquiridas e asseguradas, descobrem-se de significado para algumas pessoas, às quais as condições de ser humano foram negadas ou retiradas.

Texto escrito com o Novo Acordo Ortográfico

inês cruz

“é uma justiça básica da condição de ser humano, é

impossível separar uma relação tão longa e séria”

“é imperativo que os atores envolvidos na consagração destes direitos tenham em

atenção as suas deixas”

Page 7: Pontivírgula nº18

FCH07

When your choice is the right one, you feel lucky. When this choice affects your whole life, you feel happy. This is what happened in the case of Portugal.

And it was obvious from the first minute I stepped into “Portuguese land”. With some heavy luggage, I arrived to Baixa, where I was supposed to find my apartment. All I had to do was ask where Bairro Alto was and walk til there... But the people whom I asked didn’t only tell me where I should go! They grabbed my luggage, they searched my address and we went all together to my house!

And this was just the beginning. The beginning of a new life, a new apartment, new experiences and new people. But it was also a new start without my parents, my relatives and my close friends, with whom I have passed my whole life, and of course without my native language. These difficul-ties, which seemed to be huge one month before I left my country, totally disappeared when I arrived to the Portuguese airport. Every part of these fears, as the days were passing, seemed stupid and pointless.

The program Erasmus may seem a chance to get drunk, become a party animal and do crazy stuff, but it is much more than that…

Erasmus is the best chance to see a new country, its people, in a way that nobody can. Because life doesn’t only exist in bars and clubs but also in the morning life, where you meet people and you can really communi-cate with them without the mask of a fancy dress or a costume. This is what Católica University allowed me to observe. Young people in their everyday lives, with dreams, smiles and happiness and also, sometimes, sad moments.

But this is the real life. And this is what I’ve faced in Católica University. Nice people, with polite and kind manners, that made me feel comfortable from the first day I went to the university bar and I stayed there almost the whole semester!

Simple things in life can make the difference. Especially when you have most of them. This is what Portugal gave me. A new life which is filled with nice people, a beautiful routine and a multicultural family. Sometimes you don’t need time, money, patience to be happy. You just have to apply for Erasmus!

Quando a tua escolha é a correcta, sentes-te um sortudo. Quando essa escolha afecta a tua vida inteira, sentes-te feliz. Foi isso que me aconteceu com Portugal.

E isso foi claro assim que pisei “terras lusas”. Com alguma bagagem pesada, cheguei à Baixa, onde era suposto encontrar o meu apartamento. Tudo o que tinha de fazer era perguntar onde era o Bairro Alto e andar até lá... Mas as pessoas a quem perguntei, não me disseram só para onde devia ir! Pegaram na minha bagagem, procuraram a minha morada e fomos todos juntos até ao meu apartamento.

E este foi apenas o começo. O começo de uma nova vida, um novo apartamento, novas experiências e novas pessoas. Mas também foi um novo começo sem os meus pais, a minha família e os meus amigos próximos, com quem passei a minha vida inteira e, claro, sem a minha língua materna. Estas dificuldades, que pareciam enormes um mês antes de sair do meu país, desapareceram por completo quando cheguei ao aeroporto em Portugal. Cada parte destes receios, à medida que os dias foram passando, pareciam estúpidos e sem sentido.

O programa Erasmus pode parecer uma oportunidade para ficarmos bêbedos, tornarmo-nos party animals e fazermos coisas loucas, mas há muito mais para além disso...O Erasmus é a melhor maneira de conhecer um novo país, as suas pessoas, de uma maneira que mais ninguém consegue. Porque a vida não existe apenas em bares e clubes mas também na vida quotidiana, em que conheces pessoas e consegues realmente falar com elas sem a máscara de um vestido mais extravagante ou um fato. Foi isso que a Universidade Católica me permitiu observar. Jovens no seu dia-a-dia, com sonhos, sorrisos e felicidade e, por vezes, momentos de tristeza.

Mas isto é a vida real. E foi isso que encontrei na Universidade Católica. Pessoas simpáticas, educadas e amáveis que me fizeram sentir confortável desde o primeiro dia em que fui ao bar da universidade e fiquei lá praticamente o semestre inteiro!

As coisas simples da vida fazem a diferença. Especialmente quando tens grande parte delas. Foi isso que Portugal me deu. Uma nova vida recheada de boas pessoas, bonitas rotinas e uma família multicultural. Por vezes não precisas de tempo, dinheiro, paciência para ser feliz. Apenas tens de participar no Erasmus!

GeorGina manoLi

CORRESPONDÊNCIA ERASMUS PortuGaL aos oLhos de uma GreGa

GeorGina no meio rodeada Por duas amiGas que a acomPanham nesta aventura

Page 8: Pontivírgula nº18

FCH 08

EX-ALUNOS: EXPERIÊNCIAS dioGo LoPes

Ter curiosidade e interesse, procurar, arriscar, todos estes clichés e frases feitas são realmente reais, funcionam. Não vos abrem as portas para nada automaticamente, mas dão contactos, dão experiência, tudo coisas que quanto mais se tem, mais se quer ter (e mais nos querem por termos). Há um colega vosso que tem uma página sobre tricot? Experimentem fazer qualquer coisa com ele. Gostam de tirar fotografias? Ponham-se a disparar para todo o lado e façam um portefólio.

Não tenham medo de falar, de perguntar ou de pedir - o ‘não’ está sempre garantido e muitas vezes podem ser surpreendidos. Façam qualquer coisa. Na nossa idade, não há nada que seja uma perda de tempo e não há nada que seja inútil (menos não tirar o rabo da cadeira).

Vivemos numa época difícil, claro, mas que, mesmo assim, ainda consegue oferecer coisas que nunca, em nenhuma outra altura, se conseguia oferecer. Basta procurar.

“Era uma vez um puto gordo que não se safava bem a jogar à bola e que foi descobrindo na música um sítio onde podia comer as bolachas todas que quisesse sem nunca sentir-se impedido de viver como todos devem: completos. Alguns aninhos depois, com a fase “chubby” bem guardada em fotografias antigas e calças de pijama estupidamente grandes, continua a encontrar na música o fulgor de se viver com o coração à flor-da-pele. Tudo o resto são aventuras, gargalhadas e disparates” - é com humor que o Diogo se descreve no site Altamont, para o qual escreve sobre música.

© Francisco FidaLGo

É fácil cair no discurso padrão de citar todos os sítios por onde se passou, ou quanto tempo se esteve lá, mas, pondo-me no lugar de um rapaz que conta aos amigos que finalmente arranjou um estágio (como eu, há um ano e meio), não deixo de pensar que não é um discurso como esse que faz sentido, que é útil.

Não há equação mágica para se conseguir o emprego X ou o estágio Y: os factores que se combinam para influenciar estas coisas são demasiados para se conseguir prever o que quer que seja. O acaso ou a sorte tem muito pesar neste processo, mas isso foge-nos das mãos, depende de coisas que não conseguimos controlar, por isso porquê preocuparmo-nos com isso? Logo um problema resolvido.

Excepção feita àquilo que não nos compete, o que se pode fazer? Num mundo onde cada vez mais o trabalho é algo que escasseia e o pouco que há demora muito tempo a chegar, há que saber marcar a diferença, destacar-se por não se ser apenas mais um currículo, mais uma cara. É aqui que entra o que eu sinto que aprendi na minha ainda pequenina experiência neste meio: trabalharmos em nós próprios é o caminho para trabalharmos no mundo real.

“Não tenham medo de falar, de perguntar ou de pedir - o ‘não’

está sempre garantido e muitas vezes podem ser surpreendidos.

Façam qualquer coisa.”

Page 9: Pontivírgula nº18

09 ACTUALIDADE

nova limitação Da imigração? “não”, SegUnDo oS SUíçoS

Num referendo, os Suíços rejeitaram uma nova limitação da imigração, proposta por um grupo denominado Ecopop.

A proposta desta iniciativa em nome da ecologia tinha como objetivo os Suíços decidirem se limitavam a imigração e investiam 125 milhões de euros em programas de controlo da natalidade em países em desen-volvimento. O intuito seria a preservação do ambiente.

Também foram submetidos a votação dois outros referendos: a elimi-nação dos privilégios fiscais dos estrangeiros e a compra de ouro em massa por parte do Banco Nacional. Todavia, perante os resultados do

cantão de Genebra, a resposta foi igualmente “não”.

A iniciativa, tomada pelo partido de esquerda, visou a eliminação de leis que permitem que os estrangeiros com mais poder económico paguem impostos em função dos seus gastos e não da sua fortuna ou rendimentos, como o resto dos cidadãos. Teve como foco principal a igualdade fiscal, segundo o partido, que afirmou que esta era violada. Desta forma, tornava-se um obstáculo à luta contra a criminalidade económica.

Contrariamente, o Governo e o Parlamento defendem que há mais benefícios do que desvantagens, pois o sistema fiscal permite elevados rendimentos para alguns cantões suíços.

As votações foram organizadas hoje em todo o país, sendo que estas são as primeiras estimativas da decisão tomada pelos Suíços.

© Steffen Schmidt/ePA

a PaleStina é Um eStaDo inDePenDente, Para Uma PeqUena Parte Da eUroPa

susana santosTexto escrito com o Novo Acordo Ortográfico

A Suécia tornou-se o primeiro país da Europa Ocidental, membro da União Europeia, a reconhecer a Pal-estina como Estado independente. Esta decisão foi anun-ciada em outubro pelo primeiro-ministro Stefan Lofven, juntando a Suécia a um conjunto de 134 Estados, dos quais oito são membros da U.E. (Bulgária, Polónia, Romé-nia, Eslováquia, Chipre, República Checa, Hungria, Malta), que já tinham aprovado a decisão no decorrer da Decla-ração de Independência, feita pelo Conselho Nacional Palestiniano em 1988.

A ministra dos Negócios Estrangeiros sueca, Margot Wallstrom, afirma que este reconhecimento “pretende apoiar as forças moderadas entre os Palestinianos, arran-car para negociações mais equitativas no futuro e dar aos jovens palestinianos a esperança de uma solução pacífica para o conflito”, numa área que define como “alvo de destruição e frustração”.

É necessário relembrar que, antes da Primeira Guerra Mundial, a Palestina era controlada pelo Império Otomano. Estes eram principalmente árabes, mas a maior parte das pessoas considerava-se turca. Por isso, vários grupos que dese-javam a independência israelita começaram a surgir. Apesar de serem diferentes entre si, lutavam por um objetivo comum: afastar os Turcos dos seus territórios.

De facto, foi durante a Primeira Guerra Mundial que os Ingleses encorajaram os Árabes a se organizarem e revoltarem contra os Otomanos. Os europeus prometeram, em contrapartida, a possibi l idade de criar um Estado árabe independente quando a guerra terminasse.

O mundo árabe cumpriu a sua promessa, começando a revoltar-se, e foi na mesma altura que o secretário dos Negócios Estrangeiros inglês, Arthur James Balfour, deu permissão para que os judeus se estabelecessem no território que viria a ser a Palestina. Ambos os lados, judeus e muçulmanos, consideravam ter o direito de se estabelecer na região e, portanto, durante 30 anos, começaram a entrar nestes territórios, posicionando-se efetivamente. Foi nesta altura que tudo começou.

“Os europeus prometeram, em contrapartida, a possibilidade de

criar um Estado árabe independente quando a guerra terminasse.”

Page 10: Pontivírgula nº18

10ACTUALIDADEEm 1947, Inglaterra e as Nações Unidas cumpriram a sua palavra: deixando que

os Palestinianos e os judeus estabelecessem a sua própria nação. Surge, então, a divisão da Palestina em dois: um Estado árabe (Palestina, a laranja no mapa) e outro judeu (Israel, a azul no mapa).

O problema era que vários Palestinianos moravam ou já se tinham estabelecido em regiões que eram agora israelitas e vice-versa.

Em 1948, a luta começou entre ambas as partes, sendo que os países que rodeiam estes territórios (por exemplo, a Síria, o Líbano, o Iraque, o Egito, entre outros) começaram a atacar Israel, numa tentativa de dissolver o seu Estado. Israel venceu esta batalha, na qual cerca de 700.000 Palestinianos fugiram, acabando por expandir a sua nação e controlando aproximadamente 70% do que é considerado como Palestina histórica. Após estes confrontos, os Palestinianos acusaram Israel de não os deixar retornar a casa, forçando muitas destas pessoas a refugiarem-se em dois locais: o Banco do Oeste e a Faixa de Gaza.

Desde então, sucederam-se vários conflitos em diferentes regiões. Todos seguem a mesma ideia: as forças armadas palestinianas, ou de grupos que os apoiam, tentam reconquistar territórios, criticam as condições dos Palestinianos que ainda se encontram sob a alçada israelita ou tentam

eliminar a região de Israel. Esta responde através das suas forças militares, expandindo cada vez mais o seu ter-ritório.

O Governo israelita critica a posição da Suécia, tendo enviado o seu embaixador a Estocolmo para demonstrar o seu descontentamento com a decisão tomada. Avigdor Lieberman, ministro dos Negócios Estrangeiros israelita, critica a aprovação sueca, afirmando que a decisão irá apenas responder “às exigências irrealistas dos Palestinianos”.

A Suécia veio disputar as posições de outros membros da U.E. O Parlamento britânico aprovou, no mês de outubro, uma moção pedindo ao Governo o reconhecimento da Palestina enquanto Estado indepen-dente (214 votos da moção e 12 votos contra). Já em dezembro, foi o Parlamento francês a adotar o mesmo comportamento, tendo a moção sido aprovada com 339 dos 490 votos. A Irlanda, segundo vários órgãos de comunicação social, será o próximo país a seguir o exemplo. Resta saber se a vontade em reconhecer a Palestina como Estado independente se vai alastrar ao resto dos países da Europa Ocidental.

© nAçõeS UnidAS

© nAçõeS UnidAS

Países que reconhecem a Palestina como Estado independente / © WikiPédiA

manueL cavazza e mariana FidaLGoTexto escrito com o Novo Acordo Ortográfico“Resta saber se a

vontade em reconhecer a Palestina

como Estado independente se vai alastrar ao resto dos

países da Europa Ocidental.”

Page 11: Pontivírgula nº18

11 ACTUALIDADEirmãS inDianaS lUtam com oS homenS qUe aS aSSeDiavam

Duas irmãs indianas tornam-se heroínas na Inter-net após aparecerem num vídeo a lutarem contra um grupo de homens que, alegadamente, as assediava. O vídeo mostra Aarti e Pooja Kumar numa viagem de autocarro no estado de Haryana, conhecido por ser um estado hostil para as mulheres, a agredirem três homens com murros e com um cinto.

Sendo do conhecimento público os sucessivos casos de violações coletivas na Índia, tanto referenciados nos meios de comunicação, o vídeo das duas jovens a ripostar contra os assédios sofridos está a tornar-se bastante popular na Internet.

O vídeo foi gravado por um passageiro e já foi partilhado centenas de milhares de vezes nas redes sociais. Isto levou a que no Twitter partilhassem outros vídeos de casos semelhantes, sob a hashtag “IFoughtThemBack”.

Numa entrevista à CNN, uma das irmãs, Aarti Kumar, de 22 anos, contou que ela e a irmã estavam numa paragem perto da sua universidade quando um grupo de homens apareceu e começou a atirar-lhes pedaços de papel com os seus números de telefone e a fazer comentários perversos. Mesmo assim, as irmãs continuaram a ignorá-los, mas os homens entraram no mesmo autocarro e continuaram com as provocações.

Aarti recorda que um dos homens chegou a comentar que as duas irmãs eram “demasiado pobres” até para andar de autocarro.

A luta no autocarro levou a que os polícias, s e g u n d o c o n t a r a m à C N N , prendessem os homens. Além disso, as duas jovens indianas deverão receber uma recompensa do Governo, assim como um reconhecimento oficial pela “bravura” que demonstraram.

susana santosTexto escrito com o Novo Acordo Ortográfico

Um aDoleScente PortUgUêS envia, em méDia, 100 SmS Por DiaJovens portugueses duplicam os acessos à Internet via telemóvel

Segundo um estudo efectuado pelo Instituto Nacional de Engenharia de Sistemas e Computadores (INOV-INESC), juntamente com o Instituto Superior Técnico, os acessos à Internet via smartphones duplicaram entre os adolescentes portugueses, com idades compreendidas entre os 10 e os 14 anos.

As conclusões t iveram como base a resposta a 6.500 inquéritos, realizados ao longo de três anos em diversas escolas do Ensino Secundário em Portugal (fonte: Público). Uma das justificações para esta duplicação do consumo é a baixa de custos que os dados móveis têm vindo a sofrer em comparação com valores de anos anteriores.

A maior parte dos inquiridos (aproximadamente 60%) indica ter recebido o seu primeiro telemóvel quando frequentava o 2.ºciclo, o que faz com que a média de idade em que os jovens obtêm o seu primeiro aparelho comunicativo esteja compreendida entre os 10 e os 11 anos.

A par do aumento do uso dos telemóveis por parte da camada mais jovem da população, também os tablets estão entre os aparelhos electrónicos mais utilizados nos lares portugueses, indica o mesmo estudo.

São ainda expostos os contraditór ios resultados que indicam que os jovens não caracterizam a comunicação por telemóvel como preferencial, mas enviam, em média, cerca de 100 SMS por dia.

catarina FéLix

© JoSé coelho / lUSA

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ACTUALIDADE 12

caSo SócrateS

Joana contreiras

O ex-primeiro-ministro José Sócrates está em prisão preventiva desde o dia 21 de Novembro, no âmbito da “Operação Marquês”. Encontra-se indiciado por crimes de corrupção, fraude fiscal, fraude fiscal qualificada e bran-queamento de capitais.

José Sócrates encontrava-se sob escuta telefónica desde o final de 2013. Foram ouvidas centenas de horas de conversas do antigo primeiro-ministro, que levaram o juiz Carlos Alexandre a determinar a detenção. Os investiga-dores têm também vindo a seguir os seus fluxos finan-ceiros desde há dois anos.

Quando foi detido para interrogatório no âmbito da “Operação Marquês”, o ex-primeiro-ministro estava a chegar a Lisboa através de um voo proveniente de Paris. Segundo o advogado de Sócrates, João Araújo, o seu cli-ente já sabia que ia ser detido. Para o advogado, que irá interpor recuso e não considera esta prisão legal, este é um dos argumentos mais fortes. O seu cliente sabia que ia ser detido e não fugiu.

No dia anterior, haviam sido detidos três outros indi-víduos: Carlos Silva, amigo de Sócrates e ex-administrador do grupo Lena; Gonçalo Trindade Ferreira, advogado de Carlos Silva; e João Perna, motorista de Sócrates. Vários órgãos de comunicação têm avançado que João Perna era um dos grandes apoios de Sócrates, chegando mesmo a viajar até Paris de carro para lhe levar dinheiro.

Foi divulgado que, na sua última estadia em Paris, Sócrates estaria a tentar vender a sua casa, avaliada em, aproximadamente, três milhões de euros e que está em nome de Carlos Silva. Numa carta enviada à RTP, afirma a sua inocência relativamente à casa de Paris, reforçando que a casa de Carlos Silva lhe fora emprestada e que, actualmente, vivia numa casa arrendada.

A 22 de Novembro, iniciaram-se as buscas à casa de Sócrates em Lisboa, na sua presença, e a RTP anunciou a suspensão do espaço de comentário que tinha nesse mesmo canal. No mesmo dia, a Procuradoria-Geral da República emitiu um comunicado onde apresentava as cir-cunstâncias das detenções, que teriam tido origem numa comunicação efectuada pela Caixa Geral de Depósitos no âmbito da prevenção de branqueamento de capitais e outros crimes fiscais. Esta comunicação deveu-se à real-ização de transferências de montantes superiores a 200 mil euros para a conta de Sócrates. Outros indicadores que levaram a uma investigação mais aprofundada sobre pos-síveis ilegalidades foram o seu estilo de vida e património não compatível com os seus rendimentos.

A acusação acredita que a compra e venda de vários imóveis a Carlos Silva foram realizadas com dinheiro de contas paralelas de Sócrates, que lhe chegava através de transferências efectuadas pela mãe ou pelo seu motorista João Perna.

A 24 de Novembro, foram conhecidas as medidas de coacção dos quatro detidos decididas pelo juiz, sendo que José Sócrates ficou em prisão preventiva, tendo sido ainda nessa noite transportado para uma prisão especial em Évora, onde lhe foi atribuído o número de recluso 44. A medida de coacção imposta foi justificada pela possibilidade de perturbação do inquérito, caso o arguido fosse libertado. No entanto, notícias recentes afirmam que esta pode não ser a única justificação: Sócrates tinha uma viagem profissional agendada para o Brasil a 24 de Novembro, e a sua empregada doméstica retirou, após o início das buscas, um computador da habitação.

A empresa farmacêutica Octapharma, para a qual José Sócrates trabalhava, cessou o vínculo contratual após a sua prisão, referindo em comunicado publicado a 25 de Novembro que, “face aos últimos desenvolvimentos, entende não estarem reunidas as condições para manter a colaboração com José Sócrates”.

Foi feito um primeiro pedido de habeas corpus, a 27 de Novembro. A 3 de Dezembro, pelas 15h30, o Supremo Tribunal de Justiça apresentou a sua deliberação relativamente a José Sócrates: continu-aria preso. A justificação do Supremo Tribunal de Justiça prendia-se com o facto de se verificar uma “manifesta falta de fundamento legal”. Nesse mesmo dia, foi apresentado outro habeas corpus por Jorge Domingos Dias Andrade, que viu a sua admissão rejeit-ada a 4 de Dezembro. O terceiro e último pedido de habeas corpus efectuado até agora aconteceu no dia 9 de Dezembro, sendo que ainda não se sabe se será aceite ou não.

Desde que José Sócrates está preso, têm sido feitas várias buscas em propriedades. A casa da ex-mulher do arguido, Sofia Fava, localizada em Montemor-o-Novo, foi um dos locais alvo de buscas, assim como a casa do administrador do grupo Lena, Antónia Barroca Rodrigues, em Leiria.

José Sócrates mantém contacto com o exterior através do envio de comunicações para jornalistas e de visitas de figuras ilustres, como é o caso de Mário Soares, António Guterres e Manuel Alegre. Também António Costa já afirmou que irá visitar Sócrates nas férias de Natal e que se trata de um incidente indepen-dente do Partido Socialista.

Já não é a primeira vez que Sócrates está envolvido num processo de grandes dimensões mediáticas, como são os exemplos dos casos Freeport e Face Oculta ou da Operação Monte Branco.

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ACTUALIDADE

aLexandra antunes

13

Os directores de informação e comunicação da RTP apresentaram, no início do mês, uma queixa à Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) relativa ao facto de o Conselho Geral Independente (CGI) ter como objectivo interferir na escolha dos conteúdos editoriais, nomeadamente os jogos da Liga dos Campeões.

Segundo os cinco directores (José Manuel Portugal, Fausto Coutinho, Hugo Andrade, Rui Pego e Elísio Oliveira), nenhum órgão externo à RTP deve determinar quais os conteúdos que são incluídos ou excluídos da grelha de programação, desde que estes estejam de acordo com o contrato de concessão e se mantenham dentro do orçamento estabelecido. Por sua vez, o CGI criticou a ausência de informação prévia sobre a candidatura aos jogos da Liga.

Sendo o CGI o órgão de supervisão e fiscalização interna do cumprimento das obrigações de serviço público de rádio e televisão, previstas no contrato de concessão celebrado entre a RTP e o Estado, a ERC emitiu um comunicado em que considerou que o CGI ultrapassou as suas competências ao intervir na aquisição dos direitos de transmissão da Liga dos Campeões.

Este comunicado foi adoptado por unanimidade: o regulador dos media considera que não é o CGI que deve definir os conteúdos destinados ao operador público, sob pena de violação da independência e autonomia editoriais.

caSo rtPDirectores da RTP acusam o Conselho Geral Independente de uma grave violação à autonomia e independência editorial

economia PortUgUeSa encerra 3.º trimeStre com Um creScimento De 0,3%A economia portuguesa cresceu 0,3% no terceiro

trimestre face ao trimestre anterior. Segundo dados revelados pelo Instituto Nacional de Estatística (INE), o crescimento foi superior em uma décima àquele revelado a 14 de Novembro.

Em termos homólogos, o produto interno bruto (PIB) do terceiro trimestre cresceu 1,1%, revela a segunda estimativa feita pelo INE.

Estes novos dados divulgam o segundo trimestre consecutivo de crescimento da economia, uma vez que houve um crescimento também de 0,3% do segundo trimestre face ao primeiro.

No segundo trimestre, houve um aumento de 0,9% em termos homólogos.

Segundo o INE, o aumento do PIB no terceiro trimestre deveu-se ao aumento da procura interna, isto é, ao aumento do consumo por parte das famílias.

A contrabalançar o contributo positivo do aumento da procura interna, houve uma diminuição da procura externa líquida, uma vez que as importações aumentaram a um ritmo superior ao das exportações, que mantiveram um crescimento semelhante ao do trimestre anterior, provocando assim um saldo negativo na balança externa.

O governo prevê que a economia portuguesa cresça 1% este ano. As organizações internacio-nais prevêem um cenário mais pessimista, ainda que não muito: o Fundo Monetário Internacio-nal (FMI) e a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) esperam um crescimento de 0,8%, já a Comissão Europeia aponta para um crescimento de 0,9%.

“O governo prevê que a economia portuguesa cresça 1% este ano.”

inês Linhares dias

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afinal, eleS têm Um abrigo

ACTUALIDADE 14

As luzes já iluminam as ruas de Lisboa. A cidade das Sete Colinas, todos os dias cruzada por inúmeras pessoas que desfrutam de toda a sua beleza, é a casa de tantos outros que, todas as noites, procuram refúgio num recanto qualquer, ou apenas um prato de comida quente e um agasalho. São vários os grupos de voluntariado que tentam, diariamente, combater – ou, pelo menos, atenuar – o problema da fome e da falta de condições em que algumas pessoas vivem.

O grupo ABRIGO, constituído por um conjunto de amigos, reúne-se quinzenalmente na cidade. Alice Andrade é voluntária há mais de dois anos, tendo passado já por vários grupos. Relativamente ao ABRIGO, afirma: «Não somos de associações, funda-ções, nada. Cada um de nós consegue angariar coisas e trazemo-las para a rua para dar a quem precisa, a quem não tem casa ou a quem não tem como arranjar comida e, assim, nós acabamos por facilitar-lhes um bocadinho a vida». É neste espírito que, numa única noite, o grupo passa por três locais onde é necessário agir.

Shakespeare dizia que «só os mendigos conseguem contar as suas riquezas». De facto, todas as pessoas que se encontram na rua têm uma história a contar, algo que os dota de uma fortuna imensa, mesmo que imaterial.

Gare do Oriente, 19h10m.

Como sempre, verifica-se o corrupio de pessoas que correm para os autocarros, com malas pesadas, cheias de tudo o que precisam. Em oposição, forma-se uma fila daqueles que pouco ou nada têm, defronte de uma mesa onde os voluntários distribuem uma tigela de sopa quente, um segundo prato e uma sobremesa. «Aqui come-se melhor do que num restaurante», dizem aqueles que aproveitam esta oportunidade para ter acesso a uma refeição. Num outro posto, são distribuí-das roupas, sapatos, produtos de higiene e cobertores para protecção do frio das noites de Inverno.

No túnel da Gare, o ambiente é mais calmo. Vários sem-abrigo encontram-se deitados no muro lateral, aprovei-tando a inclinação para terem um sítio onde dormir umas horas, com um tecto. Os voluntários vêem-se obrigados a intervir, para avisar que, lá em cima, existe uma equipa a distribuir mantimentos. Algumas pessoas não se conseguem movimentar, devido a problemas de saúde, sendo ajudados pelos voluntários ou pelos compan-heiros.

Confrontado com a pergunta «Já comeu hoje?», um sem-abrigo responde de forma a que se percebam todas as dificuldades por que passa: «Ontem já comi. Hoje ainda não. Mas já é tempo de comer, não é?».

Manuel, 52 anos, saiu de casa há cerca de seis anos. Deixou a mulher e os filhos, devido a uma traição, e encontrou na rua um refúgio. «Vim para aqui, dormi aqui algum tempo, uns dois anos. Conheci muita gente, ainda con-heço. Agora tenho um quarto em Alvalade, já a caminho dos cinco anos e meio». Manuel, tendo conseguido sair da rua, continua a recorrer ao apoio dos vários grupos para ter o que comer e vestir. Apesar das suas dificuldades, não hesita em ajudar os outros: «Venho aqui todos os dias, ajudo os sem-abrigo. Em vez de me ajudar a mim próprio, ajudo os outros. Arranjei quartos para muitos, consegui que baixassem os preços».

Esta realidade começa a atingir, cada vez mais, diferentes faixas etárias. Fábio é um jovem de 20 anos e recorre à ajuda dos voluntários para levar comida para casa. «A minha mãe abandonou-me e aos meus irmãos, e o meu pai ficou sozinho, ficou entre a espada e a parede. Ficou desleixado com a vida. Agora está sempre aqui no Casino de Lisboa a estoirar o dinheiro que ganha numa empresa a lavar carros. Já não é o pai que era: leva pouca quantidade de comida para casa, já não se preocupa comigo, se estou bem, se estou mal, se passo fome, se estou doente. Ele não se preocupa comigo e eu sou obrigado a vir aqui».

Por outro lado, pessoas de diferentes idades começam a tornar-se solidárias com estas situações. O grupo ABRIGO inclui, actualmente, cinco “mini-voluntários”. Mariana, 11 anos, afirma que fazer voluntariado é uma forma de «ajudar as pessoas a terem uma vida melhor e de apre-nder a não dizer que não se gosta de uma certa comida, porque há pessoas que gostavam de ter e não têm». Quando confrontados com esta realidade social, as reacções são inesperadas. Inês, 13 anos, confessa: «A primeira vez que vim aqui, fiquei admirada. Fez-me confusão não terem nada e ainda recusarem algumas coisas. Se eles não têm nada, deviam aceitar tudo o que lhes dão, mesmo que não gostem».

“De facto, todas as pessoas que se encontram na rua têm uma

história a contar”

“‘A minha mãe abandonou-me e aos meus irmãos, e o meu

pai ficou sozinho, ficou entre a espada e a parede.’”

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ACTUALIDADE15

Santa Apolónia, 20h44m.Na sua segunda paragem da noite, os voluntários

encontram a estação cheia. Misturados entre os indivíduos que entram e saem dos comboios, encontra-se uma fila de pessoas que esperam por algum apoio. São várias as histórias que se ouvem neste local. Pessoas com vidas cheias, completas, ficaram, repentinamente, sem nada.

Alcides, 56 anos, conta que viveu dois anos na rua e também num carro, antes de encontrar um quarto onde ficar. «Estou nesta situação gerada por nada. Talvez porque eu quero. É muito complicado, mas já estive em situações bem piores. Temos é de saber lidar com isto. Tinha trabalho, tinha família e desliguei-me disso tudo. O motivo sou eu e o meu orgulho. A minha situação não pode ser a dos outros, é a minha». Apesar de tudo, conta não se arrepender de nada do que fez e, confiante, afirma: «A vida é uma história e ainda hei-de ter muitas. Um dia melhor, outro pior. Mas mais rico do que sou, não sei se consigo ser».

É na rua que se encontram histórias curiosas, de quem já teve tudo nas mãos e, neste momento, não tem nada. Stanislaw Szalpunk, um músico polaco que não larga a sua flauta e toca simples melodias para os turistas, encontrou uma segunda casa nas ruas da cidade de Lisboa. Está há quatro anos em Portugal e, da nossa língua, pouco conhece. Afirma que «o Fado é um livro aberto, é amor», mas, quando confrontado com os motivos que o trouxeram aqui, encolhe os ombros e não sabe responder.

“‘Tinha trabalho, tinha família e desliguei-me disso tudo. O

motivo sou eu e o meu orgulho. A minha situação não pode ser

a dos outros, é a minha.’”

Esta vertente cultural é reforçada pelo projecto ini-ciado por José Luís, 66 anos, que, nunca tendo vivido na rua, passou por dificuldades depois «da ternura dos quarenta»: «Trabalhei em desenho publicitário, tinha uma oficina em Cascais. Depois, com as grandes empresas, deixei de ter trabalho. Ainda fui segurança uns anos, mas tive um AVC e deixei de poder trabalhar». Agora, vivendo com uma reforma que mal dá para suportar todos os gastos, recorre aos grupos de voluntariado para ter o que comer, mas, além disso, dedica-se a ajudar os sem-abrigo a conhecerem a cidade que os acolhe. «Entrei agora num projecto: levo os sem-abrigo a conhecer Lisboa, com a ajuda de vol-untários. A partir de Janeiro, vamos começar mesmo a sério. Vamos falar da história de Lisboa, desde o século XV até ao século XX, com todas as implicações que isso traz. Não suporto que me digam que conhecem uma cidade se não sabem a sua história. Eu, para conhecer uma pessoa, tenho de ir ao fundo da questão. Nós não somos só o que se vê. Com a cidade passa-se o mesmo. Então decidi levar esta rapaziada, pelo menos os que estão mais abertos à ideia, a conhecer Lisboa como ela é. Alguns não querem saber de nada, mas há sempre um ou dois que se interessam. Ficam a conhecer Lisboa e a história da cidade e sempre estão ocupados».

Entusiasmado com a ideia e mostrando a sua paixão pela história, José Luís afirma que, «além disto, é ir vivendo, esperar que a morte venha e me leve lá para cima, se houver alguma coisa».

Rossio, 22h11m.O Teatro D. Maria II serve de cenário para a última

acção de solidariedade da noite. Aqui, voltam a encontrar-se caras conhecidas dos outros dois locais. Apesar disso, descobrem-se novas narrativas, de vidas também complicadas.

Carlos, 42 anos, queixa-se da situação que o conduziu à rua: «Vivo na rua porque a minha assistente promete ajudar-me e depois não ajuda. Estou há mais de dois meses nesta situação. Vim parar à rua porque uma pessoa que é criada pela Santa Casa da Misericórdia, quando sai do colégio, não tem amparo nenhum, tenta fazer-se à vida, mas cai na miséria, como todos. Eu fui órfão, os meus pais nunca quiseram saber de mim e cá estou, desde os 18 anos».

Encontra-se, aqui, uma enorme crítica à sociedade, tanto a nível governamental como em relação a todas as pessoas que comentam este tipo de situações sem por elas terem passado. «É fácil dizer que se consegue sair desta situação, mas as pessoas que o dizem nunca estiveram do outro lado. É fácil querer tirar as pessoas da situação, mas, se formos a olhar, ninguém dá valor. Tiram a pessoa da rua, mas depois não querem saber dela e a pessoa volta ao mesmo outra vez. Fica sempre aquela revolta».

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nataiS SoliDárioS

ACTUALIDADE 16

É precisamente esta falta de apoio, por parte do Governo, que também é criticada pelos voluntários que se deparam com estes casos na rua. Leonor Santos explica que «há muita fome no nosso país e os governantes não ajudam e temos de ser nós, voluntários, a ajudar a matar a fome de quem está na cidade».

No final da noite, resta a certeza de que os volun-tários fizeram tudo o que conseguiram para proporcio-nar um pouco mais de conforto àqueles que pouco ou nada têm. Por noite, o grupo ABRIGO chega a distribuir cerca de 400 refeições por noite. João Paulo Silva, voluntário, afirma que se vê «cada vez mais pessoas na rua. Também são muitas as pessoas que passam fome. Têm um quarto, mas o dinheiro não dá para tudo». Todavia, esta situação começa a melhorar, com a quantidade de grupos que disponibilizam parte do seu tempo para apoiar as pessoas que passam por este tipo de situações.

Afinal, a riqueza de que falava Shakespeare revela-se nos sem-abrigo, que guardam todas as suas histórias como aprendizagens de uma vida difícil, mas também nos voluntários, que aprendem a olhar para a existência de cada ser humano de uma forma diferente, tendo em conta todas as suas dificuldades. No fim de contas, quem não tem um tecto acaba por ter um abrigo, mesmo que metafórico, nestas noites em que alguém lhes estende a mão.

aLexandra antunes

Com o Natal a aproximar-se, as pessoas tendem a ficar mais sensíveis a causas nobres e as campanhas acerca das instituições solidárias começam a aparecer-nos diariamente com mais frequência, como é o caso da Operação Nariz Vermelho e da Missão Sorriso.

É “impossível” chegarmos ao Natal sem olharmos ao nosso redor e ver que tantas pessoas precisam de apoio, de carinho e de ajuda financeira para suavizar os seus problemas, que são alheios a tantas pessoas. Nesta época natalícia, a onda de solidariedade inten-sifica-se e as instituições atuam mais nesse sentido.

A Operação Nariz Vermelho, é uma instituição par-ticular de solidariedade social, que foi oficialmente constituída em 2002. O objetivo desta instituição é criar sorrisos nos rostos de todas as crianças que se encontram doentes e internadas em treze hospitais portugueses e que precisam diariamente de con-forto e de quem as anime. Para isso, os “Doutores Palhaços” fazem o seu papel de animar as crianças no hospital para o qual trabalham, proporcionando-lhes verdadeiros momentos de alegria. Apesar de serem chamados de “Doutores Palhaços”, estas pessoas não são, na realidade, “doutores”, como muitas pessoas podem pensar, mas sim artistas profissionais que têm de participar num casting e ser selecionados antes de ir para um hospital.

A Missão Sorriso nasceu em 2003 e, associada ao Continente, através da compra de vários produtos, desde livros, CDs e bilhetes para eventos, a Missão Sorriso já conseguiu angariar mais de nove milhões de euros, que se converteram em equipamentos hospital-ares, materiais diversos de apoio a crianças e seniores e ainda em produtos básicos de alimentação e higiene. Esta instituição visa o apoio a crianças, idosos e pes-soas carenciadas, trabalhando conjuntamente com médicos e profissionais de saúde com o objetivo de doar equipamentos a diversos hospitais e áreas de saúde do país, e apoia a luta contra a fome, tentando melhorar a qualidade de vida de várias famílias e pes-soas carenciadas.

É comum na altura do Natal vermos a Leopoldina, que tanto faz as delícias das crianças, como imagem de marca desta nobre instituição. Na compra do seu CD, que com certeza animará os mais pequenos, uma parte do dinheiro reverte a favor desta causa.

No entanto, é importante salientar que os problemas não existem só no Natal e que as instituições solidárias, assim como milhares de pessoas, precisam sempre de uma ajuda.

Joana santos

Texto escrito com o Novo Acordo Ortográfico

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cante alenteJano é Património Da hUmaniDaDe

DiScriminação racial noS e.U.a.

ACTUALIDADE17

O Cante Alentejano recebeu parecer positivo da Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura e foi classificado Património da Humanidade a 27 de Novembro, após reunião em Paris.

Aproximadamente um ano e meio após a candi-datura entregue à UNESCO, chegou a notícia de que o Cante Alentejano está oficialmente inscrito no Património Cultural Imaterial da Humanidade. Assim que foi anunciada a decisão do comité, o grupo que se encontrava na sala fez uma breve actuação. No final do mês de Outubro, a candidatura já tinha sido definida como “exemplar”, motivo pelo qual as expectativas eram bastante elevadas.

À chegada a Portugal, eram dezenas as pessoas que esperavam os representantes do Cante Alentejano e que os quiseram congratular pela conquista.

Dias depois, e como proposta do PCP, um grupo de Vila Nova de São Bento, concelho de Serpa, deslocou-se ao Parlamento para actuar e recebeu um voto.

O Secretário de Estado da Cultura, Barreto Xavier, também deu os parabéns ao Cante: “Trata-se do reconhecimento da importância de uma prática que é parte integrante da cultura portuguesa e que, apesar de nascida no Alentejo, é valorizada em todo o ter-ritório nacional e, cada vez mais, a nível internacional. A importância do Cante Alentejano vai além da sua vertente cultural, integrando uma componente social muito forte que se manifestou ao longo de séculos de história e através da sua capacidade de transmissão geracional, que une cidadãos das mais diversas faixas etárias, tornando-o um veículo dinamizador de muitas comunidades”.

O Cante Alentejano é um cante característico da região do Alentejo, cantado colectivamente e sem recurso a instrumentos.

A exposição mediática que o Cante tem recebido permite que o número de interessados cresça e que cada vez mais pessoas se interessem por esta prática.

“O Cante Alentejano é um cante característico da região do alentejo,

cantado colectivamente”

Joana contreiras

A 9 de Agosto, Michael Brown, um jovem de 18 anos de origem afro-americana, foi morto por Darren Wilson, um polícia branco, em Ferguson, no Missouri. Os motivos que levaram o agente a disparar sobre o jovem desarmado ainda não foram apura-dos, visto que os testemunhos são contraditórios. A testemunha que acompanhava Brown afirmou que o polícia incorreu em actos de violência desne-cessária contra os dois jovens, enquanto o chefe da polícia de Ferguson declarou que o agente apenas agiu conforme está previsto na lei e os tiros que atin-giram o jovem foram disparados em defesa própria.

Este acontecimento sucedeu um mês depois da morte de Eric Garner. Garner era, também, um cidadão negro, de 43 anos, que morreu depois de ser abordado por uma patrulha policial. O afro-amer-icano era suspeito de vender cigarros ilegalmente. Daniel Pantaleo – agente da polícia de Nova Iorque – agarrou Garner pelo pescoço e derrubou-o, tendo Garner acabado por sufocar. Num vídeo gravado por um transeunte, podemos ouvir Garner repetir várias vezes que não conseguia respirar.

© dAve BledSoe / flickr

Page 18: Pontivírgula nº18

ACTUALIDADE 18

A morte de Michael Brown originou protestos em Ferguson que pretendiam denunciar o racismo e uso de excesso de força por parte das autoridades.

As manifestações começaram no dia 10 de Agosto, um dia depois da morte de Brown.

Os protestos eram de índole pacífica, mas, à noite, alguns protestantes envolveram-se em actos de vandalismo. Estes actos não-pacíficos encontraram resistência por parte da polícia de choque de Fergu-son, que procedeu à detenção de diversos manifes-tantes e até de jornalistas, que terão alegadamente desobedecido às ordens da polícia. O presidente americano, Barack Obama, pronunciou-se, afirmando que era condenável o emprego de força excessiva, por parte da polícia, contra manifestantes pacíficos ou o impedimento do trabalho dos jornalistas.

Os protestos e confrontos entre polícia e população continuaram nos meses seguintes, até que, a 24 de Novembro, um júri decidiu não indiciar Darren Wilson na morte de Michael Brown. Esta decisão levou a que uma multidão se juntasse à frente da esquadra, sob a forma de um protesto pacífico que deu origem depois a mais actos de vandalismo e violência que se prolongariam pela noite fora, terminando com a detenção de 61 pessoas.

“A morte de Michael Brown originou protestos em Ferguson

que pretendiam denunciar o racismo e uso de excesso de

força por parte das autoridades ”

No dia seguinte, a estação de televisão CNN noticiava que se tinham formado protestos em 170 cidades dos Estados Unidos da América, para mostrar o seu desagrado face à decisão do júri.

A 3 de Dezembro, um júri decidiu não indicar o agente Daniel Pantaleo na morte de Eric Garner. Esta decisão levou a protestos pacíficos na cidade de Nova Iorque, que se estenderam até dia 5. Durante os três dias de protesto, terão sido detidos 300 indivíduos, por conduta desordeira e por impedirem as ruas, embora maior parte dos manifestantes tenha agido de forma ordeira e pacífica.

Entre os cartazes empunhados pelos manifestantes, podia ler-se “Não consigo respirar” – frase proferida por Garner enquanto Pantaleo o sufocava – e “As vidas dos negros importam”.

A juntar à morte de Garner e de Brown, existem outros três casos semelhantes que têm recebido grande atenção: o primeiro, de Tamir Rice, um jovem negro de 12 anos que foi morto, enquanto brincava com uma pistola de ar comprimido; o segundo, de Ruman Brisbon, de 34 anos, que foi morto pela polícia por esta achar que ele ia buscar uma arma, quando, na verdade, tentava pegar numa caixa de comprimidos e, o terceiro, o caso de Akai Gurley, que foi baleado por um polícia sem razão aparente.

dioGo Barreto

© dAve BledSoe / flickr

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19 OPINIÃO

actUaliDaDe

CapitaNataLismo

Aguardamos, ansiosamente, quase desde janeiro, por esta altura do ano. É uma época que é um marco temporal, porque antes do Natal é quase sempre Natal e depois do Natal já foi Natal… E é sempre uma pena, porque estamos sempre desertos que chegue o Natal. E o tempo passa num instante, parece que ontem foi Natal e já estamos, novamente, no Natal.

É, de facto, uma época bonita. As pessoas tornam-se altamente sensíveis ao desastre social. O Natal é no inverno, felizmente – é como uma lareira que aquece os nossos corações. Andamos a ferver de boas intenções de tal forma que o frio na rua já não nos incomoda. E se o frio já não incomoda, nada melhor do que ir às compras.

Há uma estreita relação entre o Natal e o capitalismo, que é um sistema caracterizado por crises cíclicas (e não só). Em inícios de novembro, mais ou menos, entramos nas «loucas vésperas natalícias» (para os mais ansiosos, finais de outubro). Esta época é caracterizada pelo aumento do consumo. Há um grande boom, em que as pessoas se alienam dos problemas financeiros, seguem para as lojas e vão comprar presentes para toda a família, amigos, quase amigos e inimigos, não fosse o Natal uma época de generosidade.

Depois desta euforia, após as celebrações do Ano Novo, sofremos uma chamada à realidade. Olhamos para os gastos, reparamos que se deu o crash da carteira e esse dia não é pior do que a «quinta-feira negra». Andamos em baixo uns tempos, até que entramos, gradativamente, num processo de recuperação económica. Fazemos um New Deal e poupamos em despesas para corrigir os «investimentos» arriscados. Podemos mesmo dizer que, a dada altura das nossas vidas, somos todos Roosevelt. E isso é bom – foi um senhor inteligente.

Ironia à parte, o Natal traz ao de cima o melhor de nós. Tornamo-nos generosos, alegres, comovidos, a família reúne-se à mesa e estamos todos, realmente, felizes. É mágico. Parece que nos esquecemos da rotina, dos problemas, das ansiedades quotidianas e estamos, simplesmente, juntos. Partilhamos o melhor de nós.

Vive-se, então, na minha perspetiva, uma época que decidi denominar Capitanatalismo: época natalícia caracterizada pelo aumento do consumo e generosidade. Necessidade de ajudar o próximo seja de que maneira for, dado que o prazo limite se estende desde finais de outubro até 25 de dezembro.

Ah, como eu adoro o Natal!

“É, de facto, uma época bonita. As pessoas tornam-se altamente

sensíveis ao desastre social. O Natal é no inverno, felizmente - é

como uma lareira que aquece os nossos corações.”

“É uma época que é um marco temporal, porque antes do Natal

é quase sempre Natal e depois do Natal já foi Natal...”

micheLLe tomás

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OPINIÃO 20

a raPariga Do blazer roSa

LifestyLe

o amor

Eu sei, por experiência própria, que este assunto é o mais falado em toda a Humanidade. Desde os primórdios, passando pelos Gregos e Romanos, e acabando na sociedade de hoje. Toda a gente se dedica a pensar sobre o amor: o que é, o que não é, o que deve ser…

O que proponho hoje é que façamos uma viagem no tempo e recuperemos a nossa primeira ideia de amor. Alguém se lembra? Eu não, e foi por isso que perguntei à minha prima de oito anos o que para ela é o amor. Queria descobrir se o conceito era igual para as duas. Não era, felizmente não era.

Quando lhe perguntei o que era o amor, ela disse-me simplesmente “é amizade”. Eu fiquei confusa. Pedi-lhe para me dizer todas as palavras que lhe faziam lembrar amor e ela respondeu “carinho e ter amigos”. Uma resposta tão simples, uma coisa tão banal, mas que para ela retractava o amor.

Não há preconceitos, daqueles do tipo “amor é uma mulher gostar de um homem”, não há dramas do género “amar dói, e destrói-nos por dentro”, nada dessas coisas. Talvez seja pela tenra idade, mas não deixei de me sentir orgulhosa.

Mas, depois, uma pessoa cresce (felizmente!) e percebe que muito antes do amor há um estágio de amizade. É impossível conseguir estar com alguém sem que essa pessoa seja nossa amiga. Uma pessoa que saiba o que nos irrita, aquilo de que gostamos, aqueles detalhes que só os nossos amigos mais chegados sabem.

Talvez amor seja mesmo amizade. Talvez sejamos nós que complicamos tudo naqueles anos em que achamos que sabemos tudo e mais alguma coisa e dominamos o mundo. Talvez estejam nas crianças todas as respostas que procuramos. No que me diz respeito, e depois de muito reflectir, acabei por concordar por inteiro com a minha prima. Amor é amizade, amor é receber e dar carinho. Amor é ter amigos. A prova viva desta última afirmação sou eu. Namoro com o meu melhor amigo.

P.S. – Tenho de agradecer à minha Nonô por redireccionar todas as minhas teorias sobre o amor. Obrigada pelas respostas simples, mas tão complexas. Sou uma prima orgulhosa.

“Amor é ter amigos. A prova viva desta última afirmação sou eu.

Namoro com o meu melhor amigo.”

mariana Leão costaaraparigadoblazerrosa.wordpress.com

Page 21: Pontivírgula nº18

OPINIÃO21

tiqUi-taca Do DeSPortoDesporto

Lewis hamiLton: BicamPeão mundiaL com o herói ayrton senna na caBeça

Lewis Hamilton, piloto britânico bicampeão mundial, entra para a história sendo o primeiro negro campeão da Fórmula 1.

Com 29 anos, Hamilton foi campeão mundial em 2008 pertencendo à equipa McLaren e, após mudar-se para a Mercedes em 2013, foi no Grande Prémio Abu Dhabi 2014 que se sagrou bicampeão. Tornou-se o segundo britânico a conseguir realizar tal proeza, depois de Jackie Stewart.

Em 2008, no GP do Brasil, Hamilton decidiu toda a corrida na última volta, ao recuperar posição e ultrapassar Timo Glock, deixando também para trás Sebastian Vettel.

Desta vez, no GP Abu Dhabi, Hamilton dominou do início ao fim, deixando para trás o seu colega de equipa Nico Rosberg com problemas no motor. Terminada esta última prova, no total do campeonato Lewis conquistou 384 pontos, mais 67 que Rosberg. O terceiro lugar pertenceu a Daniel Ricciardo, com 238 pontos.

Desde pequeno que o seu grande herói é o ex-piloto brasileiro Ayrton Senna, falecido em 1994 após um grave acidente durante o GP de San Marino, em Itália. Acontecimento que chocou todos os amantes do automobilismo, que já estavam habituados a vê-lo correr riscos quando acelerava nas curvas em dias bastante chuvosos.

Em 2008, durante o GP do Brasil, visitou o túmulo de Senna e mandou fazer um capacete parecido ao que o brasileiro usava sempre, com as cores da bandeira brasileira predominantes.

maS afinal, qUem é o melhor Piloto Da hiStória Da fórmUla 1?

Para muitos, Senna é a melhor lenda sobre rodas na F1, mas estatisticamente, entre nomes como Juan Manuel Fangio, Jim Clark, Jackie Stewart, Alain Prost e Ayrton Senna, há um nome que se destaca para além de todos: Michael Schumacher.

Schumacher quebrou vários recordes: número de voltas mais rápidas, o maior número de campeonatos, vitórias, pole positions, pontos marcados e mais corridas vencidas numa única temporada (2004). Foi o único piloto a conquistar sete títulos (1994, 1995, 2000, 2001, 2002, 2003 e 2004).

Mas Ayrton Senna era um mágico no asfalto chuvoso, com uma capacidade e perícia digna de poucos, tal como demonstrou, por exemplo, no GP do Mónaco em 1984, no GP de Portugal em 1985 e no GP da Europa em 1993. Não havia vez nenhuma que Ayrton não impressionasse os atentos espectadores, como era o caso de Hamilton em criança, «ele (Senna) inspirou-me verdadeiramente quando eu era criança e ainda hoje o faz. Sempre disse que adoraria imitá-lo como piloto. A forma como conduzo hoje é inspirada pela forma como o via a ele a conduzir. Por vezes, quando alguém menciona o meu nome e o de Ayrton na mesma frase, sinto-me muito orgulhoso e honrado».

qUem é o melhor Da atUaliDaDe?

Na atualidade, um piloto de grande destaque é Sebastian Vettel. Para além de ter sido o mais jovem campeão, bicampeão e tricampeão, aos 26 anos tornou-se o mais jovem tetracampeão do mundo na F1. Um feito de que poucos se podem gabar. Desta forma, poderá ser o principal rival de Hamilton na luta pelo seu terceiro GP mundial, algo que o próprio já admitiu querer alcançar, para honrar Senna (que conquistou o prémio três vezes).

Destaques:- O Real Madrid superou o recorde de 18 vitórias

consecutivas de Frank Rijkaard no Barcelona;- Nani foi eleito o melhor jogador da I liga em

outubro/novembro;- Com Sara Moreira em destaque, dezasseis atletas

portugueses vão competir na Bulgária, nos Europeus de corta-mato;

- Portugal conquistou quatro medalhas na Taça de Amesterdão, mas nenhum nadador conseguiu mínimos para os Mundiais de 2015.

danieLa riBeiro de Britodanielar-footballmagazine.blogspot.pt

Texto escrito com o Novo Acordo Ortográfico

Page 22: Pontivírgula nº18

CULTURA 22

o cabiDemoDa

marques’aLmeida

Para quem aprecia design português, Marques’Almeida não é um nome estranho. Lembro-me de quando começaram a apresentar na Moda Lisboa e eu estranhei aquele design incomum na moda portuguesa. Comecei a pesquisar mais sobre eles e rapidamente se tornaram uma das minhas marcas nacionais preferidas. Esperava ansiosamente pelos seus desfiles, eram sem dúvida o momento alto do evento.

Marta Marques e Paulo Almeida estudaram na Central Saint Martins, uma das melhores universidades de design de moda do mundo. Decidiram juntar as suas ideias e nasceu a marca Marques’Almeida. Os criadores primam pelas peças em ganga, maioritariamente desfiadas, de aspecto cool e descontraído. A estética é simples, casual, arrojada e extremamente revivalista dos anos 90.

Actualmente, posso afirmar que Marques’Almeida são a dupla de criadores portugueses com mais influência nas tendências internacionais e com mais visibilidade a nível mundial. E porquê? Porque, para além de terem sido convidados a realizar uma parceria com a maior loja retalhista britânica Topshop, disponibilizando as suas peças a um preço mais convidativo, também ganharam o prémio Emerging Womenswear Designer nos British Fashion Awards (para quem não sabe, é um grande acontecimento no mundo da moda!).

Isto tudo para vos dizer que, a nível de moda nacional, gostamos muito da Fátima Lopes, Luís Buchinho e Ana Salazar (onde é que ela já anda, coitada!) e ficamos por aí. Damos-lhes destaque, artigos nos jornais, reportagens no telejornal. E os novos criadores são deixados de lado, sem apoios. Sentem necessidade de desenvolver as suas marcas além fronteiras, onde têm mais oportunidades de triunfar. Falo por experiência própria quando digo que sensivelmente 90% das vendas dos nossos criadores são para outros países que não Portugal.

Acredito que as pessoas preferem comprar em lojas de fast fashion (entenda-se fast fashion por lojas como H&M, Pull e Zara), preferem quantidade a qualidade. Gastar mais dinheiro numa peça de criador é completamente impensável porque o “país está em crise” e “não há dinheiro”. Então corremos à Primark, enchendo sacos com trapos e fazendo filas infindáveis. São opções e compreendo que as pessoas não estão para gastar uma pequena quantia numa peça de roupa “apenas” para ajudar o design e o comércio portugueses.

Por outro lado, a mentalidade portuguesa baseia-se na ideia de que o que é feito lá fora é superior ao nacional, porque “não somos muito bons, não temos muitos meios, não temos tanto talento...”. Não me interpretem mal, a marca sempre esteve elavadíssima na consideração das pessoas que se movimentam no meio da moda. Mas fora disso, é completamente inexistente. Os criadores nacionais não têm qualquer tipo de relevância no mercado retalhista português. A desculpa do costume é “ah, Portugal não tem mercado para essas coisas caríssimas!”, quando, na verdade, estão a perpectuar esta ideia.

Poderia continuar, uma vez que esta questão dá pano para mangas, mas não me permitem. Logo (e como referi no meu blogue), a parceria e o prémio referidos foram “um reconhecimento do bom design português e uma reafirmação da nossa qualidade enquanto criativos”, mas será que o povo português quer saber? Não.

catarina veLoso

o-cabide-moda.blogspot.pt

“Acredito que as pessoas

(...) preferem quantidade

a qualidade.”

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CULTURA23

fora De Sérieséries

Seria irrisório escrever uma coluna sobre séries e não mencionar Sons Of Anarchy. Escolho fazê-lo agora pelos piores motivos. Na verdade, é a minha preferida, pelo que é com pesar que a vejo chegar ao fim. Depois de sete temporadas muito intensas, consigo perceber que é melhor acabar em grande (à semelhança de Breaking Bad, por exemplo) do que tentar esticar uma fórmula já gasta (como aconteceu com Dexter).

Temos tudo o que seria de esperar de uma série sobre um clube motard. Tráfico de armas e droga, homicídios, sexo, motas e rivalidade entre clubes, à americana. E não desilude nem um bocadinho!

Talvez seja necessário ver um par de episódios para que a narrativa nos prenda incondicionalmente, mas os incontáveis plot twists que se sucedem, cumprem a sua função de nos deixar quase viciados e sedentos de saber quais os desenvolvimentos na história.

O destaque vai para o surpreendentemente britânico Charlie Hunnam, que encarna o papel do fenomenal Jax Teller, embora todo o elenco seja muito rico e nos ofereça um vasto leque de boas representações.

O último episódio desta série foi transmitido no passado dia 10 de Dezembro, num culminar necessário e previsível, não no sentido pejorativo.

Não há como negar o sucesso de Sons Of Anarchy, excelente até na banda sonora, que deixa uma legião de fãs enorme.

FinaL ride

inês sousa aLmeida

POST SCRIPTUM: Numa nota mais breve, quero recomendar-vos The Affair, que nos oferece uma perspectiva interessante e diferente ao contar uma história que tem todos os ingredientes para ser banal. Na primeira parte do episódio, absorvemos a história do ponto de vista dele, pai de família, que vai passar as férias de Verão a casa dos sogros. Na segunda metade, é ela, empregada de mesa de um pequeno café, quem nos conta o que se passou. Desde cedo, percebemos que houve um homicídio e que ambos prestam o seu testemunho perante um detective, o que adensa o mistério em torno desta relação proibida entre as duas personagens principais, que são Noah (por Dominic West) e Alison (por Ruth Wilson, que vimos desempenhar um fantástico papel em Luther).

Nota: Podem partilhar as vossas sugestões, porque estou sempre aberta a novas séries. Se quiserem partilhar a vossa opinião acerca de algo que tenham lido nesta coluna Fora de Série, podem fazê-lo através de [email protected].

“Depois de sete temporadas muito intensas, consigo perceber que é

melhor acabar em grande”

RevengeSe a trama apresentada na primeira temporada me fez desculpar ou tentar esquecer a péssima actuação da maior parte deste elenco, esta quarta temporada parece arrastar um peso que demora a ficar para trás. Tenho de ver como acaba, mas o desperdício de tempo já começa a ser penoso.

Page 24: Pontivírgula nº18

CULTURA 24

João marques da siLva

aStigmatiSmo ProficienteCiNema

itinerários de sanGue

Terminou o advento cristão. O período de quatro semanas que antecede o dia de Natal serve para, através do tempo, ter a atenção e admiração (re)conduzidas para o sítio certo. Neste caso, para a pessoa de Jesus. O advento é um processo de espera que se faz com um ritmo específico. Afirmar a encarnação só pode ser feito com olhos postos na cruz e no sangue derramado. O sangue sacrificial pauta a admiração – o requisito para liderar o noticiário é: “If it bleeds it leads”.

Em Nightcrawler (2014), que marca a estreia de Dan Gilroy na realização, o sangue oleia o motor mediático. Alguém sangra. A noite dá licença e o homem rasteja. O sangue falece. A luz artificial invade e os outros vêem. Então, ali, jaz a notícia.

Jake Gyllenhaal é Lou Bloom, um misantropo cuja primeira fala no filme é “I’m lost”. No contexto da cena, a afirmação tem carácter geográfico, escapista e mentiroso. Não obstante, é notório o prolongamento para a totalidade da sua vida. Lou é um low-life obsessivo que vive de pequenos furtos e passa os dias a consumir aprendizagens via Internet. No seguimento da cena, Lou rouba um relógio a um segurança. Ao invés de o vender, decide ficar com ele. Assinala-se, assim, o princípio do tempo de espera e o respectivo controlo (o ritmo). Inicia-se o advento para Lou. Não se trata de uma condução a um foco já conhecido, mas sim da descoberta do próprio foco.

E eis que há sangue para conduzir a atenção e admiração. Ao passar por um sangrento acidente de viação, Lou repara em Joe Loden (Bill Paxton), que passa as noites a ouvir os scanners da polícia com o objectivo de ser o primeiro a chegar e a recolher imagens. Posteriormente, as imagens seriam vendidas às estações de televisão sensacionalistas. A opulência da imagem do sangue rentável leva Bloom a entrar nesse mundo de paparazzi of pain. Floresce o voyeur de crimes.

O ecrã torna-se o mediador entre Lou e o sangue. Nunca mais ele deixará olvidar a sua essência, revendo e catalogando cada trabalho no seu currículo sanguinário. A banalização do crime é estimulada até ao ponto em que o próprio Lou fabrica crimes para os poder gravar em exclusivo. Sai das cenas do crime como um coiote calçando Louboutin – elegância, confiança e, visivelmente, somente a sola manchada do vermelho sangrento.

Nunca vemos Lou a dormir. O descanso é para aqueles cujas pegadas não estão visíveis. A noite é de quem planeou um itinerário em que as vítimas dos crimes nunca apresentam identidade, pois são meros experience points sem interesse humano. Dormir impossibilitaria a catatonia de Lou. Quebraria a magreza, a palidez e as olheiras. Dormir seria subversivo, já que, retiraria nutrientes ao sangue.

Nightcrawler encerra num tom vitorioso. Choca verificar que Lou singrou mesmo forjando submissões. Deu espaço ao tempo, mas não se prostrou ao ritmo natural. O anti-herói apresenta-se ensanguentado de sangue invisível mas indelével.

Não tenho dúvidas de que Lou conseguiu ganhar dinheiro suficiente para comprar um bilhete de lotaria. O problema é que o sangue acumulado impede a moeda anátema de raspar com precisão.

“(Lou) deu espaço ao tempo, mas não se prostou ao ritmo natural.

O anti-herói apresenta-se ensanguentado de sangue invisível

mas indelével.”

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inteligência artificialGamiNG/iNterNet

ho! ho! ho! a censura cheGou!

Chegou o Natal, passou o Natal e vem aí o Ano Novo (quem estiver a ler isto depois, Feliz Ano Novo!). Deram-se prendas, esteve-se com a família e, como é natural, esta época do ano desperta uma gama de diferentes emoções, entre elas, amor, solidariedade, companheirismo e amizade. É uma época que nos deixa reflectir sobre tudo o que é bom nas nossas curtas vidas é por isso que vou falar sobre a censura. Repararam no que eu fiz, repararam mesmo? É quase como fingir durante anos e anos que o Pai Natal existe. Também fingimos durante anos que a censura na sociedade moderna é coisa do passado.

O caso em particular do qual vou falar foca-se no jogo intitulado HATRED, que passou pelo processo de publicação conhecido como Greenlight na plataforma Steam. Este processo caracteriza-se por chamar à comunidade para dar o seu voto em diferentes títulos procurando assim a sua aceitação dentro desta plataforma. Contudo, contando com mais de 13.000 votos positivos e tão só 1.000 votos negativos, HATRED foi rejeitado e subsequentemente retirado da Greenlight, tendo apenas como desculpa, o facto de não acatar os termos e as condições do serviço. Acredito que sejamos todos espertos o suficiente para perceber que esse não é o caso.

Para quem não souber, a premissa de HATRED é tão simples como, o protagonista literalmente odiar a todos, tendo como objectivo a purgação total da sociedade na qual reside, sem porquês, sem comos, sem desculpas e sem razões; pensemos no Massacre de Columbine. Torna-se então óbvio que a razão pela qual este título foi retirado é a sua inclusão de conteúdo extremamente gráfico e violento, o qual não seria problemático se a posição tomada pelos responsáveis da Steam não fosse tão hipócrita, isto porque na mesma plataforma encontram-se jogos similares (POSTAL, o nosso querido GTA, ou como não o glorificado snuff film Manhunt).

Este problema foi rapidamente solucionado pelo presidente da Steam, Gabe Newell, que reinstaurou o jogo dentro do projecto Greenlight. Mesmo assim, isto não deixa de chamar à atenção, talvez pelo seu aspecto tão puro dentro da violência em comparação com outros títulos que apelam mais à sátira, sofrer este tipo de backlash neste médium não é, ou não devia ser, comum.

Outros tipos de média, como a indústria cinematográfica ou, inclusivamente, a escrita, i.e. romances, são aceites pelo seu conteúdo sem sofrer tão forte julgamento dos seus iguais. Isto recorda-nos, novamente, a vida tão jovem que os videojogos ainda possuem, em que a exclusão de conteúdo seja por censura ou autocensura é banal. Felizmente, contam também, com uma comunidade cujo fervor e paixão pelo progresso dentro do médium que consome, é tal, que visam e lutam pela sua revolução e evolução.

Espero que o Pai Natal vos tenha oferecido tudo aquilo que queriam, tipo um casaco.

Boas festas!

“Isto recorda-nos, novamente, a vida tão jovem que os videojogos

ainda possuem, onde a exclusão de conteúdo seja por censura ou

autocensura é banal”

mitcheL martins moLinos

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CULTURA 26

dioGo Barreto

harmoniaS e contraPontoSmúsiCa

mudem as canções de nataL

O Natal chegou e com ele vem tudo o que isso implica.

Árvores de Natal feitas de luzes verdes, amarelas, vermelhas, roxas e azuis enfeitam as ruas; anjos luminosos são pendurados nos candeeiros e Pais-Natal em várias casas podem ser vistos a trepar infinitamente as janelas.

Com o frio e o espírito natalício bem fincado em minha casa, são vários os rituais que voltam constantemente nesta época natalícia: bebidas quentes, árvore de natal, presépios, mantas, azevias e bolo-rei e surgem também, as infames músicas de Natal! Ano após ano, lá voltam aquelas harmonias centenárias a encher-me a casa e todos os anos o meu pai traz um novo disco, repleto de temas de Natal. As mesmas velhas canções que soam sempre ao mesmo, embora sejam cantadas por fulano tal que faz uma versão “completamente nova”.

Sejam as colectâneas de grandes êxitos sazonais, ou o disco de Natal do Bob Dylan, ou do Michael Bublé, todos os anos, entre 1 de Dezembro e a segunda semana de Janeiro, junto à aparelhagem lá de casa que se amontoam os discos com fachadas coloridas e imagens natalícias na capa. Todos sempre tão iguais e repetitivos, todos sempre tão sem graça.

Tirando raras excepções (na qual o Dylan não se enquadra!), insurjo-me contra a música natalícia que enche a minha sala no Natal! Quer seja a rena que canta, enquanto mexe os braços, quer seja o C.D. que traz o Pai Natal a distribuir prendas, insurjo-me contra a música natalícia!

Que se acabem os “Jingle Bells” e os “Here Comes Santa Claus”! Não, não quero ouvir o “Pinheirinho nem a “Noite Feliz”! Tragam-me de volta o Jazz e o Rock, o Paco e os Zeppelin, o Zeca e o Zappa!

Deixem ficar tudo o que caracteriza o meu Natal, mas alguém que leve a música de Natal da minha casa, por favor!

Feliz Natal! Boas Festas!

P.S. – Pai Natal, se leres isto, o meu sistema de som já não é o que era. Fica a dica, tio Nicolau!

“Tirando raras excepções (na qual o

Dylan não se enquadra!), insurjo-me

contra a música natalícia que enche

a minha sala no Natal!”

“Ano após ano, lá voltam aquelas

harmonias centenárias a encher-me

a casa e todos os anos o meu pai traz

um novo disco, repleto de temas de

Natal.”

Page 27: Pontivírgula nº18

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criticamente corretoLiteratura

matadouro 5, de Kurt vonneGut Jr.

Se há um assunto que me cansa em termos de exposição, é a Segunda Guerra Mundial (e zombies, e vampiros, e livros de conspiração, e romances históricos, eh até são alguns). Seja em videojogos, filmes ou livros, parece haver um foco, uma incapacidade de avançar do que, sem dúvida, foi um dos maiores eventos do século XX.

De um ponto de vista criativo, compreendo a atracção criativa por esta guerra. Vilões facilmente identificáveis com um líder com excentricidades e vilanismo suficientes para resultar sempre como rival, um grupo de países juntos a defender a democracia e um dos maiores genocídios do século XX formam uma época perfeita para uma boa história de heroísmo contra um vilão que poucos defendem, portanto é normal haver uma queda para o tema, contudo estou farto da fórmula, das mesmas histórias, mesmas personagens e mesmas morais.

Foi aí que encontrei o Matadouro 5, de Kurt Vonnegut Jr. Um livro sobre a Segunda Guerra Mundial que nada tem a ver com qualquer outra peça que tenha experienciado sobre a época.

“Billy Pilgrim descolou-se do tempo.” Esta é a frase que abre o romance e também a premissa central da história. Um homem que se desprendeu do tempo, condenado a entrar num momento da sua vida diferente a cada porta, a cada acordar. Num momento pode estar no fim da vida do universo, no outro pode estar a reviver os bombardeamentos de Dresden numa nota semi-biográfica do autor.

É esta rotina de imprevisibilidade que vai desumanizar o protagonista. Nada o afecta, todas as emoções há muito se desgastaram. A exposição aos massacres de guerra, ao fim do mundo, aos momentos mais traumáticos da guerra e da sua vida privada, a repetição afastam-no da importância dos eventos e até o mais marcante evento se torna uma questão de encolher os ombros e continuar em frente.

Este é um romance permeado de beleza, mesmo nos seus momentos mais escuros. Depois de ver o horizonte de Dresden bombardeado através de uma fecha num matadouro de gado, sabendo que não tem vontade livre e que está condenado a reviver aquele momento infinitas vezes, despe-se do medo e do terror e reflecte como até aquele momento atroz é insignificante no universo tão largo e quase imortal em que vive e viaja.

Mordaz, sarcástico e criativo, Matadouro 5 é um livro que nos faz rir, chorar e, por vezes, encolher os ombros como o seu protagonista, enquanto subtilmente nos faz olhar para as grandes questões, os grandes crimes da Segunda Guerra Mundial, e nos faz sentir desligados, uma metáfora para com a distância certa, com a repetição das mesmas atrocidades. Até a isso uma pessoa se torna facilmente indiferente, incapaz de compaixão. Algo importante de que nos devemos lembrar, e uma mensagem que evita o moralismo pesado com subtileza e sarcasmo mas, sempre, com coração e verdade.

Mesmo que, tal como eu, estejam fartos da Segunda Guerra Mundial, mesmo que não gostem de algumas pinceladas de ficção científica, este é um livro breve e marcante, com coração e honestidade, que se larga dos sítios-comuns do género.

“É esta rotina de imprevisibilidade

que vai ‘desumanizar’ o protago-

nista. Nada o afecta, todas as

emoções há muito se desgastaram.”

Pedro Pereira

Page 28: Pontivírgula nº18

CULTURA 28

“ProDUção eScrita”Literatura

i Love you, Granny!

Tinha três anos quando chegou a Inglaterra. Agora tinha cinco. Costumava chorar muito, em casa sobretudo, com os pais. Dizia-lhes que queria voltar para Portugal, que tinha saudades da avó. Não entendia a professora, a Miss Jones, e dos colegas sabia-lhes, quanto muito, os nomes: a Natacha, o Sam e o Liam. Não brincava com eles: como não a entendiam, não queriam brincar com ela. Não eram eles que eram maus, a idade é que se prestava à inocência, que consegue ser mais culpada do que a malícia. Pensavam que ela era polaca e ensinavam-lhes em casa a não gostar dos Polacos, um pouco à semelhança do sentimento que tantos Portugueses nutrem pelos Angolanos ou pelos Brasileiros. Ela bem dizia “I’m not polish. I’m portuguese”, como a mãe lhe tinha ensinado – não que tivesse alguma coisa contra os Polacos; na verdade, só queria ver a filha feliz –, mas eles não faziam caso. Por isso também, ela chorava. Não tinha amigos.

Agora tudo era diferente. A nacionalidade continuava a ser portuguesa, mas Inglaterra era a sua casa-mãe, aquela que agora era palco das memórias e da vida, e o Inglês tornara-se a sua primeira língua, como acontece quando o pensamento abandona de vez a língua materna. E quando o raciocínio se processa numa qualquer língua, a fala e a escrita acompanham. As palavras mummy e daddy saíam-lhe mais facilmente do que mãe e pai. O Português estava a perder-se pelo caminho. E os pais davam pelo nome, contentes, porque sabiam que a vida em Inglês reservar-lhe-ia mais oportunidades e sucessos. Já não a corrigiam. Já não tentavam incutir-lhe o Português com a mesma força do início. Afinal, como poderiam mostrar-se convictos se haviam deixado a convicção algures na viagem? “Portugal já não tem nada para nos oferecer”, forçavam-se a acreditar, e acreditavam. Não porque o regresso estivesse longe, ele simplesmente não estava. O que estava era a expectativa de um futuro “melhor” (mas o que é que cabe no adjetivo? A palavra melhor é tantas vezes uma fuga fácil quando não se quer pensar no assunto, quando magoa admitir a verdade… E melhor do que o quê? A vida que teriam tido em Portugal, se não se tivessem aventurado? A condição matava-lhes o ânimo e, por isso, não gostavam de a considerar). A vida tinha sido injusta para esta família, para a mãe, principalmente.

Ela, que falava fluentemente uma mão cheia de línguas e toda a vida trabalhara como guia turística nos museus mais celebrados de Lisboa, que tantas ambições profissionais tivera, via-se agora, como pássaro ferido que se perde do bando, “reduzida” à qualidade de cuidadora, como em Inglaterra chamam, num tentativa nobre, à pessoa que cozinha para os velhotes e lhes dá banho e lhes muda as fraldas.

Esta é, de resto, a perspetiva dominante nos discursos sobre emigração: a saída de mão-de-obra qualificada. Mas permitam-me introduzir uma outra, não tão evidente, mas, com certeza, mais humana (na qual as protagonistas ganham nomes!). Começa assim: para a Leonor, mais do que o número de presentes que tinha pedido ao Santa debaixo da Christmas tree, só era Natal se a avó Xana estivesse presente, a vê-la desembrulhá-los. Por isso, o Natal costumava ser uma época feliz para todos, em especial para a avó Xana, para quem o Skype não chegava a ser suficiente. “Posso mandar-lhe beijinhos e abraçar o computador, mas o que eu gostava mesmo era de senti-la aqui ao pé de mim”, queixava-se ao avô, ao filho mais novo (que, para seu grande desgosto, não tinha filhos), ao vizinho do quarto direito, à senhora do café, ao empregado da farmácia… Nos momentos de maior revolta, dizia até que o Skype era uma brincadeira de mau gosto. Ah, sentir! O calcanhar de Aquiles da distância não querida. Mas também a felicidade do encontro se estava a perder. Ontem à noite, enquanto, em família, via na televisão o programa de Natal com o Michael Bublé e a Barbra Streisand, a avó, magoada com a vida, percebeu que não percebia nada. Mais do que não perceber o Michael e a Barbra (contentava-se com o ritmo das músicas), percebeu que já não percebia a neta. Isso não teria feito diferença, se não fosse a Leonor a sua razão de viver.

Joana cavaLeiro

Texto escrito com o Novo Acordo Ortográfico

“(A avó) percebeu que já não

percebia a neta. Isto não teria

feito diferença, se não fosse a

Leonor a sua razão de viver.”

Page 29: Pontivírgula nº18

CULTURA29

PlayliSt

“CaNções De NataL que são bem-viNDas!”

1. Stevie Wonder – Someday at Christmas2. John Lennon – Happy Xmas (War is Over)3. Frank Sinatra – Have Yourself a Merry Little

Christmas4. Booker T. & The MG’s – Jingle Bells5. Chuck Berry – Run Rudolph Run6. Bruce Springsteen & The E Street Band – Santa

Claus Is Comin’ To Town7. James Brown – Santa Claus Go Straight to the

Ghetto8. Tom Waits – Christmas Card From a Hooker in

Minneapolis9. Ryuchi Sakamoto – Merry Christmas Mr. Lawrence10. The Flaming Lips – Christmas at the Zoo

11. Srfjan Stevens – Hey Guys! It’s Christmas Time12. Bin Crosby & David Bowie – Little Drummer

Boy/Peace on Earth13. Berliner Philharmoniker – Dance of the Sugar

Plum Fairy14. Mike Oldfield - In Dulci Jubilo15. Spike Jones – All I Want for Christmas (Is My

Two Front Teeth)16. Miles Davis – Blue Xmas (To Whom It May

Concer)17. Louis Armstrong – White Christmas18. Joni Mitchell – River19. Sérgio Godinho - Os Pais-Natais20. Zeca Afonso – Natal dos Simples

“Trocaria a memória de todos os beijos que me deste por um único beijo teu.

E trocaria até esse beijo pela suspeita de uma saudade tua, de um único beijo que te

dei.”miGueL esteves cardoso

Desenho por André Maia

Page 30: Pontivírgula nº18

agenDa cUltUral

concertoS:

31 de Dezembro, quarta-feira - Festas de Réveillon, Vários pontos de Lisboa e Porto;14 de Janeiro, quarta-feira - Gerard Way no Armazém F;15 de Janeiro, quinta-feira - Digitalism na Discoteca Lux;20 de Janeiro, terça-feira - Tó Trips e Filho da Mãe na Teatro Municipal Maria de Matos;28 de Janeiro, quarta-feira - Jorge Palma no Centro Cultural de Belém.

livroS:

“Antes de Adormecer”, de S.J. Watson;“Memória das Minhas Putas Tristes”, de Gabriel García Márquez;“Estou Nua, e Agora?”, de Francisco Salgueiro;“Por quem os Sinos Dobram”, de Ernest Hemingway;“Alabardas, Alabardas, Espingardas, Espingardas”, de José Saramago.

filmeS:

“Carvão Negro, Gelo Fino”, de Diao Yi’nam;“Mamã”, de Xavier Dolan;“Foxcatcher”, de Bennett Miller;“Sono de Inverno”, de Nuri Bilge Ceylan;“Cavalo Dinheiro”, de Pedro Costa.

eventoS:

5 de Janeiro - Hamlet (William Shakespeare Globe Theatre), Centro Cultural de Belém - Lisboa;Até 11 de Janeiro - O Narrador Relutante - Práticas Narrativas na Arte Contemporânea, Museu Coleção Berardo - Lisboa;Até 4 de Fevereiro - Femme, vários espaços culturais - Lisboa;Até 21 de Fevereiro de 2015 - Ciclo de Cinema “P’ra Rir” - Fundação Calouste Gulbenkian;Até 17 de Julho de 2015 - Alexandre Farto a.k.a. Vhils no Teatro Nacional D. Maria II - Lisboa.

JogoS:

Kingdom Hearts HD 2.5 Remix (PS3);Captain Toad Treasure Tracker (Wii U);Game of Thrones Ep.1: Iron from Ice (PC, PS3, PS4, Xbox360, XboxOne);Phoenix Wright: Ace Atorney Trilogy (3DS);Loadout (PS4).

SérieS:

The Newsroom; Olive Kitteridge (mini-série);The Missing; 2 Broke Girls;Sonic Highways.

CULTURA 30

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