porque sim - bibliblog · 2011-09-27 · porque sim• danielsampaio autoritarismo dos seus...
TRANSCRIPT
•porque SImDaniel Sampaio
autoritarismo dos seus avós não pode voltar.Espancamentos, sequestros e ausência totalde diálogo, tão frequentes na primeira metadedo século XX, são agora raros, até porque ascrianças conhecem os seus direitos e depressa osdenunciam. Oproblema é que o autoritarismodo passado deu origem, em muitos lares, àpermissívidade, a um deixar andar que nãocontribui para a formação do carácter.
A sociedade de hoje também não ajuda ospais na criação de limites e na educação paraos valores. Ao promover, a todos os níveis, aexpressão de um individualismo exacerbado,ao cultivar a cultura narcísica e a permanentesuperação, não fornece o contexto adequadoao sentir do outro. Cada um se quer reconhecersempre livre e deseja viver para si mesmo,portanto não há disponibilidade psíquica paracorrigir, para ajudar a perceber o que está certo eerrado, o que se deve ou não deve fazer.É evidente que temos de educar em liberdade.
Não é possível voltar à educação castradora, nemà ideia de que as crianças, colocadas numa escolaadequada, iriam evoluir sempre bem. A educaçãoem liberdade, todavia, implica sempre a educaçãoda vontade da criança e o fornecimento de umsistema ético de orientação, que permita umaescolha em cada comportamento decisivo.
Na prática, não é tão difícil como possa parecer.Junto de cada criança, basta perguntar: o que fazesagora? Por que razão estás a fazer isso? Que vaisuceder a ti e aos outros se o fizeres? É esta pausareflexiva muito simples que vai ajudar a criança afazer escolhas e a tomar decisões adequadas, aomesmo tempo que lhe atribui a consciência dodever e o sentido do outro.
A ternura e a exigência, ou o afecto e adisciplina como escreve Brazelton, são as basesfundamentais da educação do carácter. Postasem prática muito cedo através de uma autoridadesegura e confiante por parte dos pais combatema educação indulgente e impedem o regresso aoautoritarismo .•
A educação indulgente
oproblemaéqueo
autoritarismodo passadodeuorigemaumdeixarandar que
não contribuipara a
formaçãodocarácter
Dicionário Houaiss define"indulgente" como "aquele que tem disposiçãopara desculpar ou perdoar; clemente". Aetimologia da palavra relaciona indulgente comaquele "que se entrega, inclinado, propenso" .
Não encontro melhor palavra para definir muitosaspectos da educação de hoje. Preocupados como (des)emprego, com alguma falta de tempo masmuito afecto, os pais de agora preferem deixarcorrer a tomar uma medida correctora ou atraçar uma fronteira. É certo que, na maioria doscasos, se interessam muito pela instrução dosfilhos e questionam os mais novos sobre a suavida escolar; mas esquecem que, para além dainstrução, a educação se deve preocupar com aformação do carácter. E há muito de aprendido(ensinado) nessa parte da personalidade aqueconvencionámos chamar "carácter" ..
A personalidade de cada um corresponde aum conjunto de respostas comportamentais quecaracteriza a pessoa e determina a forma como elaresponde às solicitações do seu quotidiano. É umcompromisso entre os impulsos e a necessidade decontrolo, de modo a manter uma relação estávelentre a pessoa e o seu contexto. Todos temos umapersonalidade recebida, herdada, uma matrizpessoal determinada nos nossos genes; mas existeuma personalidade aprendida, o carácter, umaespécie de "segunda natureza", adquirida atravésda cristalização de hábitos afectivos, cognitivos emorais.É assim que a educação pode ser definida -
como faz José Antonio Marina -, como a instruçãoe a formação do carácter; e é aqui que a educaçãoactual se tornou indulgente, porque lutar pelaformação de um carácter forte e atento aos demaisexige uma mistura bem doseada de firmeza eafecto, nem sempre conseguida pelos pais de hoje.
Os pais dos nossos dias sabem que [email protected]
Pública> 25Setembro 2011• 73