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1 UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE INSTITUTO DE SAÚDE DA COMUNIDADE PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SAÚDE COLETIVA MESTRADO EM SAÚDE COLETIVA PRISCILA RIBEIRO CAMPOS PAURA EQÜIDADE NO ACESSO AO TRANSPLANTE DE RIM COM DOADOR FALECIDO NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO Niterói 2010

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1

UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

INSTITUTO DE SAÚDE DA COMUNIDADE

PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM SAÚDE COLETIVA

MESTRADO EM SAÚDE COLETIVA

PRISCILA RIBEIRO CAMPOS PAURA

EQÜIDADE NO ACESSO AO TRANSPLANTE DE RIM

COM DOADOR FALECIDO NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

Niterói

2010

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2

PRISCILA RIBEIRO CAMPOS PAURA

EQÜIDADE NO ACESSO AO TRANSPLANTE DE RIM

COM DOADOR FALECIDO NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

Dissertação apresentada ao

Programa de Pós-graduação em Saúde

Coletiva, do Instituto de Saúde da

Comunidade da Universidade Federal

Fluminense, como requisito parcial para

obtenção do grau de Mestre em Saúde

Coletiva.

Orientador: Prof. Dr. Carlos Dimas Martins Ribeiro

Co- orientador: Prof. Dr. Aluísio Gomes da Silva Júnior

Niterói

2010

Page 3: priscila ribeiro campos paura.pdf

3

EQÜIDADE NO ACESSO AO TRANSPLANTE DE RIM

COM DOADOR FALECIDO NO ESTADO DO RIO DE JANEIRO

PRISCILA RIBEIRO CAMPOS PAURA

Dissertação apresentada ao

Programa de Pós-graduação em Saúde

Coletiva, do Instituto de Saúde da

Comunidade da Universidade Federal

Fluminense, como requisito parcial para

obtenção do grau de Mestre em Saúde

Coletiva.

Aprovada em 23 de novembro de 2010.

BANCA EXAMINADORA

Prof. Dr. Dr. Carlos Dimas Martins Ribeiro (Orientador)

Universidade Federal Fluminense

Prof. Dr. Aluísio Gomes da Silva Júnior (Co-orientador)

Universidade Federal Fluminense

Prof. Dr. Tulio Franco Batista

Universidade Federal Fluminense

Prof. Dr. Gustavo Corrêa Matta

Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio – Fundação Oswaldo Cruz

Page 4: priscila ribeiro campos paura.pdf

4

“Não vos conformeis com este mundo, mas transformai-o segundo a

renovação da vossa mente.”

Romanos 12:2

Page 5: priscila ribeiro campos paura.pdf

5

AGRADECIMENTOS

A Deus, por sua presença constante em minha vida e por me capacitar,

possibilitando a realização de mais um sonho.

Ao meu marido Marcelo por todo carinho, companheirismo e incentivo.

Ao meu filho Marcelo Júnior pela compreensão e carinho. E ao Daniel que em tão

pouco tempo, compartilhou comigo as angustias e alegrias da realização deste sonho.

Aos meus pais Ana e Celso pelo incentivo e investimento em minha formação,

sem os quais este sonho não seria possível.

As minhas irmãs Patrícia e Paula pelo amor dispensado a mim e por fazerem

parte da minha vida.

Ao prof. Dr. Carlos Dimas Ribeiro pela orientação e sugestões construtivas,

importantes para a realização deste trabalho.

Ao prof. Dr. Aluísio Gomes da Silva Júnior pela valiosa orientação. Por ter me

dado oportunidade de compartilhar seus conhecimentos científicos.

Aos profissionais da Central de Transplante do Rio de Janeiro pelas importantes

contribuições.

A todos os amigos que ajudaram a tornar esta caminhada mais leve e alegre.

A ADRETERJ e a todos as pessoas que aguardam por um transplante de rim,

pelas experiências vividas que contribuíram para que este trabalho se tornasse

realidade.

Page 6: priscila ribeiro campos paura.pdf

6

RESUMO

O transplante de rim é uma das opções terapêuticas para o tratamento da

insuficiência renal crônica. No Brasil o transplante é um direito da sociedade,

entretanto a escassez de órgãos de doadores falecidos tem refletido no aumento da

demanda por transplante. Nesse contexto, o presente trabalho tem como objetivo

analisar o acesso ao transplante de rim no Estado do Rio de Janeiro sob a ótica da

equidade. Buscou-se identificar e analisar dentre os não transplantados classificados

para transplante de rim no ano de 2008 os fatores que dificultam o acesso, a partir

das etapas necessárias para que o potencial receptor se submeta ao transplante e

dentre os transplantados, identificar e analisar a posição ocupada na listagem dos

mais pontuados e o perfil clínico-demográfico deste grupo. Além disso, foi realizado

levantamento bibliográfico e pesquisa de dados secundários. O estudo baseou-se no

consenso de que a Equidade é um princípio constitucional e do Sistema Único de

Saúde e que as opções conceituais influenciam na escolha de critérios distributivos,

nos indicadores utilizados para avaliar o grau de eqüidade e na interpretação dos

resultados para efetividade das intervenções. Entre os resultados, destaca-se o

“soro vencido” (70,6%) como principal motivo de não transplante dentre os

classificados, seguidos de “Não informado” (11%), Contato telefônico (6,9%); Sem

condições clínicas (4,7%); Contra-indicação pela equipe transplantadora (2,7%);

Sem exame (2,4%) e Outros (1,8%). Em relação aos transplantados houve

predomínio do sexo masculino e faixa etária de 40 a 59 anos. A doença de base

predominante foi hipertensão arterial sistêmica seguida da diabetes melitus. 98%

dos transplantes foram realizados no município do Rio de Janeiro e destes 50% pelo

HGB. Tempo de espera em lista com média de 4 anos e mediana de 3 anos. A

posição ocupada na listagem de classificação teve média na 18ª posição e mediana

na 15ª. Em geral, contatou-se que o atual critério de seleção para transplante de rim

apresenta inúmeros limites à implementação de forma equitativa, principalmente no

que tange a organização da rede e no consumo de serviços de saúde. A política

nacional de transplante apresenta ainda uma rede desarticulada que não é capaz de

garantir o acesso as ações e serviços de saúde, não contemplando assim todas as

necessidades de saúde da população usuária dos serviços de transplante no Estado

do Rio de Janeiro e, por conseguinte, acesso equitativo à saúde.

Page 7: priscila ribeiro campos paura.pdf

7

LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS

CF/88: Constituição Federal de 1988

CIB: Comissão Intergestores Bipartite

CIT: Comissão Intergestores Tripartite

CNCDO: Central de Notificação, Captação e Distribuição de órgãos e tecidos

CONASS: Conselho Nacional dos Secretários Estaduais de Saúde

CONASEMS: Conselho Nacional dos Secretários Municipais de Saúde

CTRJ: Central de Transplantes do Rio de Janeiro

CTx: Centro Transplantador

DV: Doador Vivo

DV: Doador Falecido

HCN: Hospital de Clínicas de Niterói

HEMORIO: Instituto Estadual de Hematologia Arthur de Siqueira Cavalcanti

HEAA: Hospital Estadual Álvaro Alvim

HGB: Hospital Geral de Bonsucesso

HLA: Antígenos Leucocitários Humanos

HUAP: Hospital Universitário Antônio Pedro

HUCFF: Hospital Universitário Clementino Fraga Filho

HUPE: Hospital Universitário Pedro Ernesto

IDH: Índice de Desenvolvimento Humano

IRC: Insuficiência Renal Crônica

IT: Itinerário Terapêutico

LOS: Lei Orgânica da Saúde

ME: Morte Encefálica

MS: Ministério da Saúde

NOAS: Norma Operacional de Assistencial a Saúde

NOB: Norma Operacional Básica

PMP: Por Milhão de População

PPI: Programação Pactuada e Integrada

PR: Potencial Receptor

PRA: Reatividade contra painel

SES: Secretaria Estadual de Saúde

Page 8: priscila ribeiro campos paura.pdf

8

SESDEC: Secretaria de Estado de Saúde e Defesa Civil

SNT: Sistema Nacional de Transplante

SUS: Sistema Único de Saúde

Tx: Transplante

Page 9: priscila ribeiro campos paura.pdf

9

Lista de Ilustrações

Figuras

Figura 1 Lista de Espera VS nº Tx realizados. 2001 a 2008 16

Gráficos

Gráfico 1

Distribuição dos indivíduos quanto ao motivo soro

vencido

68

Gráfico 2 Distribuição dos indivíduos quanto a localização por

contato telefônico

72

Gráfico 3 Distribuição dos indivíduos quanto aos motivos de

exclusão na 3ª etapa

75

Gráfico 4 Distribuição dos indivíduos quanto ao motivo contra-

indicação por resultado de crossmatch

83

Gráfico 5 Distribuição dos indivíduos por motivo de exclusão após

o resultado do crossmatch

84

Gráfico 6

Motivos de não transplante dentre os classificados do

ano de 2008

88

Gráfico 7

Distribuição dos transplantados por faixa etária e gênero

no ano de 2008

91

Gráfico 8

Distribuição dos Centros Transplantadores quanto a

origem de inscrição dos transplantados e local de

realização do transplante no ano de 2008

93

Quadros

Page 10: priscila ribeiro campos paura.pdf

10

Quadro 1 Tipo de informação dos receptores coletadas a partir

dos prontuários de doadores efetivos de rim no Estado

do Rio de Janeiro

43

Quadro 2

Classificação dos motivos de não-transplante dentre os

potenciais receptores de rim classificados no Estado do

Rio de Janeiro

44

Tabelas

Tabela 1 Lista de Espera VS nº de transplante renal realizado no

Brasil. 2001 a 2008

15

Tabela 2 Lista de Espera VS nº de transplante renal realizado no

Estado do Rio de Janeiro. 2004 a 2008

16

Tabela 3 Distribuição dos transplantados por gênero e faixa etária 90

Tabela 4

Distribuição dos transplantados segundo municípios de

residência e de diálise

94

Tabela 5

Distribuição dos transplantados por doença base

95

Tabela 6

Distribuição dos transplantados por intervalo de tempo

para inscrição no transplante

97

Tabela 7

Distribuição dos transplantados quanto a posição na

listagem de classificação do transplante renal no ano de

2008

99

Tabela 8 Dimensões da Equidade em transplante 102

Page 11: priscila ribeiro campos paura.pdf

11

SUMÁRIO

1. INTRODUÇÃO

12

1.1. Contexto de estudo 12

1.1.1 O Transplante no Brasil e no Rio de Janeiro 12

2. OBJETIVOS 20

2.1. Objetivo Geral 20

2.2. Objetivos Específicos 20

3. REFERENCIAL TEÓRICO 21

3.1. Direito à Saúde no Brasil 21

3.2. Eqüidade em Saúde 28

3.2.1 Os conceitos de eqüidade em saúde 32

4. MATERIAL E MÉTODOS 42

5. ARTIGO 45

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS 108

7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 111

Page 12: priscila ribeiro campos paura.pdf

12

1. INTRODUÇÃO

O presente estudo partiu do interesse de conhecer os principais motivos que

fazem com que os candidatos a transplante de rim não consigam ser selecionados,

após serem classificados como os mais compatíveis com o doador. A motivação

inicial se deve a minha inserção profissional no plantão da Central de Transplantes

do Rio de Janeiro, entre os anos de 2005 e 2007, onde pude observar a dificuldade

que os usuários inscritos na lista única de transplante encontravam para ter acesso

aos serviços de saúde e, conseqüentemente, ao transplante. Assim, com base nas

experiências vivenciadas, foi possível verificar a importância de um estudo que

tenha em vista subsidiar a melhoria do Sistema de transplante.

1.1 Contexto do estudo

1.1.1 O Transplante no Brasil e no Rio de Janeiro

O primeiro transplante realizado no Brasil foi o de rim na Cidade do Rio de

Janeiro, em 1964. Desde então, essa atividade teve uma evolução considerável em

termos de variedade de órgãos transplantados e número de procedimentos

realizados. Todos os tipos de transplante são financiados pelo Sistema Único de

Saúde (SUS), podendo também ser realizados pela iniciativa privada. Atualmente, o

Brasil possui o maior Programa de Transplante Público do mundo, além de ser o

segundo país do mundo em número de transplantes (1) (2).

Segundo Castro (2), a conjunção de diversos fatores tem contribuído para

seu êxito:

A melhora da legislação brasileira, a criação do Sistema Nacional de Transplantes, o financiamento público de grande parte dos procedimentos relacionados a transplantes, as campanhas governamentais de incentivo à doação de órgãos, a qualidade do trabalho realizado pelas equipes transplantadoras (...)

Em 1997 foi sancionada a legislação vigente no Brasil, a Lei Federal nº. 9.434

que trata sobre a disposição de órgãos e tecidos para transplante (3). A partir de

então, diversos decretos, resoluções, portarias e lei foram publicados para

Page 13: priscila ribeiro campos paura.pdf

13

instrumentalizar legalmente as atividades relacionadas ao processo de doação-

transplante de órgãos e tecidos no Brasil.

No mesmo ano foi criado, no âmbito do Ministério da Saúde, através do

Decreto Federal nº 2268, o Sistema Nacional de Transplantes (SNT). A

Coordenação-Geral do Sistema Nacional de Transplantes (CGSNT) é o órgão

responsável pela gestão do programa, é assistida por Grupo de Assessoramento

Estratégico (GAE) composta por órgãos, entidades e associações de interesses no

transplante e assessorada tecnicamente pelas Câmaras Técnicas Nacionais (CTNs)

(8). Para execução das atividades de coordenação de logística e distribuição de

órgãos e tecidos no processo de doação/transplante em âmbito nacional, a CGSNT

conta com a Central Nacional de Transplante (CNT) que tem dentre outras

atribuições o gerenciamento da alocação de órgãos e tecidos entre os Estados e

Distrito Federal. (3) (4) (5)

A estrutura organizacional do SNT é desdobrada pelas demais unidades da

federação. Atualmente existem vinte e três Centrais Estaduais e uma no Distrito

Federal, que são as Centrais de Notificação, Captação e Distribuição de Órgãos

(CNCDO). Também integra o SNT, as CNCDOs Regionais, Organizações por

Procura de Órgãos (OPOs), Comissões Intra-Hospitalares de Doação de Órgãos e

Tecidos para Transplante (CIHDOTTs), Equipes e estabelecimentos

transplantadores. (1) (5)

O Sistema de “Lista Única” foi criado a partir da Lei 9.434/97, está previsto no

Decreto 2.268/97 e regulamentado pela Portaria GM nº 3.407/98, este, vigente até

20 de outubro de 2009. Tem como objetivo organizar a lista de espera para os

receptores de órgãos e tecidos provenientes de doadores falecidos. É constituído

pelo conjunto de potenciais receptores brasileiros, natos ou naturalizados, ou

estrangeiros residentes no país inscritos para recebimento de cada tipo de órgão,

tecido, célula ou parte do corpo, e regulado por um conjunto de critérios específicos

para a distribuição deles a estes potenciais receptores, assim constituindo o

Cadastro Técnico Único (CTU). (3) (4) (5) (6)

Page 14: priscila ribeiro campos paura.pdf

14

A inscrição no CTU gera um número de registro, o Registro Geral da Central

de Transplantes, ou RGCT. Esse número deve ser informado ao potencial receptor

para que este tenha acesso a informações sobre sua a situação na lista de espera.

Em relação ao critério de alocação, cada órgão ou tecido tem um critério

específico para distribuição sendo a grande maioria por antiguidade, no qual quem

se inscreve primeiro irá transplantar primeiro, ou seja, a principal pontuação é o

tempo de espera em Lista. A exceção deste critério estão o dos órgãos fígado e rim,

no primeiro a seleção do receptor é feita pela gravidade, medida através da

pontuação do Meld/Peld (Portaria nº 1.160/2006), neste modelo transplanta primeiro

quem está mais grave ao invés de quem está inscrito há mais tempo, e no

transplante de rim, o critério de seleção é por compatibilidade HLA, passando a

vigorar em território nacional a partir da Portaria nº 783/2006. Em ambos os casos o

tempo de espera em lista é usado como critério de desempate. (7) (8)

No que se refere a quem pode ser doador, a legislação brasileira prevê dois

tipos de doadores, o doador vivo e o doador falecido. O doador vivo refere-se ao

indivíduo saudável, disposto a doar órgão ou tecido para fins de transplante. Sendo

permitido apenas para órgãos duplos, parte de órgãos ou tecidos desde que não

ofereça riscos a saúde do doador. A doação inter-vivos pode ser feita por cônjuge ou

parentes consangüíneos até o quarto grau inclusive (doador relacionado). Quando o

doador é “não aparentado” (não-relacionado), faz-se necessária autorização judicial

prévia, além do parecer do comitê de ética do Hospital Transplantador (5). O doador

vivo necessita se submeter a exames de compatibilidade dentre outros e

atendimento psicológico e social, onde será verificado o grau de motivação para o

ato da doação.

Após a morte é necessário que a família do falecido tenha autorizado a

doação (9). Neste caso a doação pode ocorrer em situação de morte encefálica ou

de “coração parado”. No Brasil para haver doação de órgãos após a morte, neste

incluído o do rim, é necessário que o doador esteja em morte encefálica, após a

parada do coração, só é permitida a doação de tecidos.

Page 15: priscila ribeiro campos paura.pdf

15

A política nacional de transplante trata ainda de assuntos referentes ao

financiamento dos transplantes, publicidade, prontuários, compulsoriedade da

notificação da morte encefálica, sansões penais e administrativas, dentre outros

temas previstos nas diversas legislações sobre o tema. (10)

Apesar de possuir uma das melhores políticas de transplante no cenário

internacional, o número de transplantes realizados no país, quando analisado em

relação à necessidade da população, é ainda insuficiente. Conforme dados da

Associação Brasileira de Transplante de Órgão (ABTO), “apenas a metade dos

potenciais doadores que se estima existir é notificada, e somente um em cada cinco

destes, transforma-se em doador efetivo” (11). Estima-se que de 1% a 4% das

pessoas que morrem em hospital, apresente quadro de morte encefálica e das que

morrem em unidades de tratamento intensivo, esse percentual aumente para 10% a

15% (12) (13).

A escassez de órgãos para transplante é uma realidade internacional o que

tem fomentado avanços tecnológicos e freqüentes revisões nas contra-indicações

relativas e absolutas do potencial doador, ampliando a possibilidade de

aproveitamento dos órgãos doados.

O trabalho de Ribeiro e Schramm aponta quatro estratégias para enfrentar o

problema de escassez de órgãos: a) atuar na prevenção da doença e na promoção

da saúde, tentando evitar que as pessoas venham a precisar de um transplante,

diminuindo “a incidência de hipertensão arterial e diabetes mellitus, ou suas

complicações, reduzindo a necessidade de transplante de rins, considerando-se que

elas são as principais causas de falência renal”; b) “buscar alternativas terapêuticas

menos custosas e/ou prescindir dos órgãos e tecidos de pessoas vivas ou mortas.

Nesta perspectiva cita-se a engenharia genética e, em particular, a utilização das

células-tronco”; c) aumentar a obtenção de órgãos e tecidos, e d) centrar-se nos

mecanismos e critérios de seleção dos pacientes que deveriam se beneficiar de uma

política pública de transplante de órgãos e tecidos. (14)

Apesar do SUS investir desde 2004 financeiramente no transplante

aumentando de R$ 409,4 milhões para R$ 824,2 milhões em 2008, os números de

Page 16: priscila ribeiro campos paura.pdf

16

potenciais doadores ainda é sub-notificado e o número de pessoas que se

inscrevem para transplante com doador falecido aumenta a cada ano, refletindo

diretamente no aumento do tempo de espera em lista para o transplante. (11) (15)

(16)

Figura 1 - Lista de Espera VS n° Tx realizados. 2001 a 2008.

Fonte: ABTO, 2008

No âmbito do Estado do Rio de Janeiro, coube à Secretaria Estadual de

Saúde instituir a CNCDO/RJ, Central de Transplantes do Rio de Janeiro (CTRJ) que

é responsável pela coordenação de todos os processos relativos à doação-

transplante de órgãos e tecidos no Estado.

O Estado do Rio de Janeiro teve, no ano de 2008, 421 potenciais doadores

(27,4 pmp), mas apenas 71(4,6 pmp) se tornaram doadores efetivos. Ao analisar o

perfil destes, constata-se que os doadores são majoritariamente do sexo masculino

(61,19%), de uma população adulta economicamente ativa (74,62%), tendo como

principal causa da morte o acidente vascular cerebral (38,80%). (16)

Foram registradas na Central de Transplante do Rio de Janeiro (CTRJ),

referente a dezembro de 2008, 7.741 pessoas inscritas na “Lista Única”, destas

3.466 aguardavam pelo transplante de rim.

Page 17: priscila ribeiro campos paura.pdf

17

Tabela 1 - Lista de Espera VS nº de transplante renal realizado no Brasil. 2001 a 2008.

2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008

Txa realizado 3117 3042 3185 3486 3373 3286 3460 3780

DVb

1853 1849 1825 1695 1753 1760 1709 1747

DFc

1264 1193 1360 1791 1620 1526 1751 2033

LEd

23812 28127 30125 32668 31973 33209 34108 34789

%tx ano/LE 13% 11% 11% 11% 11% 10% 10% 11%

a Tx: Transplante

b DV: Doador vivo

c DF: Doador falecido

d LE: Lista de espera

Tabela 2 - Lista de Espera vs nº de transplante renal realizado no Estado do Rio de Janeiro.

2004 a 2008.

ÓRGÃO 2004 2005 2006 2007 2008

LE – RIM 2555 3299 3349 3651 3466

Rim DF 148 119 116 122 79

Rim DV 135 102 110 85 86

Tx realizado 283 221 226 207 165

%tx ano/LE 11% 7% 7% 6% 5%

Fonte primária: CTRJ/SNT. Elaboração da autora

Conforme dados acima, a demanda por órgãos para transplante é crescente

e por mais que o aumento nacional no número de transplante tenha se mantido, não

é suficiente sequer para a manutenção dos números da lista de espera.

Os dados do Estado demonstram que cada ano a procura por transplante de

rim é maior e que o número de cirurgias realizadas é inferior a esta demanda. Em

Page 18: priscila ribeiro campos paura.pdf

18

estudo realizado entre os anos de 2004 a 2006, Marinho contextualiza o Rio de

Janeiro no cenário nacional, num movimento oposto ao observado no restante do

país e com quantidades de transplantes “baixas quando comparadas aos demais

estados da região Sul e Sudeste”. (17)

Nesta investigação, analisaremos o transplante de rim, como uma das

modalidades de tratamento para uma doença de elevada morbi-mortalidade e cuja

incidência e prevalência tem aumentado progressivamente em “proporções

epidêmicas” no Brasil e em todo o mundo que é a insuficiência renal crônica (IRC)

(18) (19). Os números do Rio de Janeiro ratificam esta constatação e o que se

observa é que em relação ao número de pessoas que fazem diálise no Estado, os

de inscritos para transplante é menor que o esperado. Em São Paulo, a proporção

do número de receptores inscritos, em relação ao número de pacientes em diálise, é

de aproximadamente 50%. (20)

A política de atenção a pessoa com Insuficiência renal crônica prevê acesso

integral a esta população usuária do SUS, contemplados pelos diferentes níveis de

atenção e complexidade, garantindo a possibilidade de escolha terapeutica e dentre

as modalidades disponíveis encontra-se o transplante (18). O custo elevado para

manter pacientes em tratamento renal substitutivo (TRS) tem sido motivo de grande

preocupação por parte de órgãos governamentais, responsáveis por subsidiar 95%

desse tratamento. Em 2002 estimava-se terem sido gastos R$ 1,4 bilhões no

tratamento de pacientes em diálise crônica e com transplante renal no Brasil (19).

São diversas as variáveis que influenciam na sobrevida do órgão e/ou

receptor de transplante renal, incluindo fatores relacionados com o doador, com o

órgão doado e com o receptor. Quanto ao primeiro, inclui-se o tipo de doador (vivo

ou falecido), a idade e a causa de óbito. Quanto ao segundo, deve ser ressaltada a

qualidade do órgão doado, dependente, entre outros aspectos, do tempo de

isquemia fria (intervalo de tempo entre a retirada no doador e o transplante no

receptor). Quanto ao receptor, cita-se a idade, as co-morbidades (obesidade;

hepatopatia, infecções latentes, diabetes melittus, hipertensão arterial, dislipidemia,

etc.), o risco imunológico (sensibilização e compatibilidade HLA, marcadores virais

Page 19: priscila ribeiro campos paura.pdf

19

pré-transplante, re-transplante, etnia, hemotransfusões e gravidez) e o uso de

imunossupressores, considerando-se sua efetividade e efeitos colaterais. (21)

Como se pode observar são diversas as etapas e serem cumpridas, variáveis

a ser consideradas, instituições envolvidas e recursos materiais utilizados, desde os

mais simples aos mais complexos científicos e tecnológicos. Nesta diversidade de

etapas a serem cumpridas podemos observar muitos entraves para o pleno

funcionamento do Programa de Transplantes e, exatamente por isso, ele deve ser

analisado sob o princípio da eqüidade e sob a ótica do direito a um serviço de

qualidade e inclusivo, pelos usuários do transplante.

Page 20: priscila ribeiro campos paura.pdf

20

2. OBJETIVOS

2.1 OBJETIVO GERAL

O objetivo desta investigação é analisar o acesso ao transplante renal no

Estado do Rio de Janeiro, sob a ótica da eqüidade.

2.2. OBJETIVOS ESPECÍFICOS

Identificar e analisar os obstáculos para o não-transplante entre os Potenciais

Receptores listados mais pontuados para as doações de rim realizadas no

ano de 2008;

Identificar e analisar dentre os transplantados a posição ocupada na Listagem

dos mais pontuados gerada pelo SNT 5.0 e o perfil clínico e demográfico.

Page 21: priscila ribeiro campos paura.pdf

21

3. REFERENCIAL TEÓRICO

3.1. Direito à Saúde no Brasil

O direito à saúde é um dos principais direitos reconhecidos no Brasil. A

Constituição Federal de 1988 (CF/88) foi a responsável pela ampliação desse direito

e do conceito de saúde em nosso país (22). A partir de sua publicação, surgem

novos instrumentos normativos voltados à redução dos riscos de doenças e de

outros agravos à saúde, bem como ao estabelecimento de condições que

possibilitem o acesso universal, igualitário e regionalizado às ações e serviços que

visem a promoção, proteção e recuperação da saúde, para que este direito seja de

fato uma realidade (23).

Entretanto cabe salientar que o direito a saúde é decorrente das opções

político-constitucionais de uma sociedade, consagradas como “princípios

fundamentais”. Para Silva, estes princípios “revelam a sua importância capital no

contexto da Constituição”, pois seus artigos consagram a “matriz de todas as

restantes normas constitucionais”, ou seja, é a partir dos princípios fundamentais,

expressos nos artigos 1º ao 4º CF/88, que todos os demais princípios ou normas

devem derivar. Assim, o direito à saúde deve estar, sem prejuízo dos outros

princípios, em consonância com os fundamentos da cidadania e da dignidade da

pessoa humana (art. 1º II e III), além de atender aos objetivos fundamentais de

“construir uma sociedade livre, justa e solidária”; e de “erradicar a pobreza e a

marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais” (art. 3º, I e III). (24)

Para Silva, cidadania deve ser compreendida num sentido mais amplo do que

freqüentemente é associado, ou seja, reduzido a titularidade de direitos políticos

(votar e ser votado), mas para além deste, esta categoria/conceito/princípio, deve

ser interligada aos de soberania popular que remete ao Estado Democrático de

Direito1 e de dignidade da pessoa humana “que atrai o conteúdo de todos os direitos

fundamentais do homem” (art. 5º). Desta forma, decorre do princípio da cidadania,

por exemplo, o direito “gratuito” à educação, à certidão de óbito e nascimento, ou

1 “A tarefa fundamental do Estado Democrático de Direito consiste em superar as desigualdades sociais e

regionais e instaurar um regime democrático que realize a justiça social.

Page 22: priscila ribeiro campos paura.pdf

22

apresentação popular de projeto de Lei à Câmara dos deputados, ou ainda a

participação, enquanto sociedade civil organizada, como representante em

conferências e conselhos de políticas e de direitos. (24)

O princípio da dignidade da pessoa humana requer o entendimento de que

para além da defesa de direitos pessoais, este zela pela garantia “das bases da

existência humana”. Decorre deste, o titulo “da ordem econômica”, que não só

protege a livre concorrência, mas tem por fim assegurar “a todos existência digna,

conforme os ditames da justiça social” (art. 170), observando dentre outros, o

princípio da “redução das desigualdades regionais e sociais”, inscrito no inciso VII do

mesmo artigo. Deste princípio fundamental decorre também o título “da ordem

social”, objetivando “o bem-estar e a justiça sociais” (art. 193). (24)

É neste contexto de princípios fundamentais que a saúde é afirmada como

direito social (art. 6º) e inscrita no Título “Da Ordem Social”, a qual tem como

objetivo, o bem-estar e a justiça sociais. Sendo integrada então, na Seguridade

Social que é definida por “um conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes

Públicos e da sociedade, destinada a assegurar os direitos relativos à saúde, à

previdência e à assistência social”, fundada dentre outros objetivos, na

universalidade da cobertura e do atendimento; e eqüidade na forma de participação

no custeio, cabendo então à sociedade seu financiamento de forma direta ou indireta

(art. 193 a 195). (22)

Note-se que esses princípios fundadores em alguns momentos podem ser

imbricáveis o que reforça a existência de uma harmonia de valores pretendida pelo

constituinte, definida por estes como “valores supremos” de uma sociedade fraterna,

pluralista e sem preconceitos. Estes valores constam no preâmbulo da Constituição,

como necessários para instituir um Estado Democrático que assegure o exercício

dos direitos sociais e individuais que são: “a liberdade, a segurança, o bem-estar, o

desenvolvimento, a igualdade e a justiça.

Entretanto, por mais que o objetivo da ordem econômica e social seja

assegurar “os ditames da justiça social” e esta seja respaldada pelos valores e

princípios fundamentais (preâmbulo e art. 1º), eventualmente algumas contradições

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23

podem causar estranheza, como o de determinado direito social ser dever do

Estado, mas também ser livre à iniciativa privada. Silva nota que: (24)

a Constituição não prometeu a transição para o socialismo mediante a realização da democracia econômica, social e cultural e o aprofundamento da democracia participativa, como o faz a Constituição portuguesa, mas com certeza ela se abre também, timidamente, para a realização da democracia social e cultural, sem avançar significativamente rumo à democracia econômica.

Assim, por mais avanço que a CF/88 tenha trazido aos direitos e garantias

fundamentais, nestes incluído o da saúde, e o fez, tende freqüentemente a encontrar

resistências em sua operacionalização, pois apesar de dever ser garantido mediante

políticas sociais e econômicas (art.196), é limitado quando depende de mudanças

no modelo econômico.

A Carta Magna avança ao trazer na Seção da Saúde que: (22)

- A saúde é direito de todos e dever do Estado;

- Este direito deve ser garantido mediante políticas sociais e econômicas;

- Estas políticas devem visar:

1- “A redução do risco de doença e de outros agravos” - Condições de

vida que possibilitem boas condições de saúde e assim a justiça social; (25)

2- “Ao acesso às ações e serviços de saúde” – A atenção à saúde para

sua promoção, proteção e recuperação;

- Estas ações e serviços são: a) de relevância pública; b) sua

regulamentação, fiscalização e controle são de responsabilidade do Poder Público,

podendo sua execução ser realizada diretamente ou através de terceiros e; c)

constitutivos num sistema único;

- Este Sistema será financiado com recursos do orçamento da seguridade

social, dos entes federativos, além de outras fontes e;

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24

- A assistência é livre à iniciativa privada;

Consagra ainda seus princípios e diretrizes, definindo-os especificamente na

Lei 8.080/90 e na Lei 8.142/90, nestas acrescem ainda, os objetivos. Assim ficam

expressos nos artigos 196 e 198 da Carta Magna que as ações e serviços de saúde

devem seguir os seguintes princípios e diretrizes: (22) (26) (27)

- Universalidade: O acesso universal pode ser compreendido como

contraposição a idéia de contributividade, assim independe de

pagamento/contribuição à previdência social ou a um seguro saúde, agora todos os

cidadãos brasileiros têm direito às ações e serviços de saúde.

A noção deste direito não deve estar associada a que antes o cidadão

pagava pela saúde e hoje é dado de graça, mas que antes da CF/88 o cidadão

financiava diretamente este direito mediante pagamento, e hoje a forma de

financiamento é indireta através da arrecadação pelo Estado de impostos e

contribuições sociais. (art. 193 e 198 §1º) (22) (25)

- Igualdade: Remete-se ao conceito de que todos são iguais perante a lei em

direitos e deveres, sem distinção de qualquer natureza como: raça, sexo, religião ou

privilégio de qualquer espécie, referidos no artigo 5º da CF. Apesar de o texto

explicitar “acesso igualitário”, diversos autores se utilizam do termo Eqüidade como

categoria que melhor expresse a idéia contida na letra da lei.

Esta discussão será trazida posteriormente, visto ser essencial ao tema deste

trabalho;

- Regionalização: Rede regionalizada e hierarquizada permite um

conhecimento maior, por parte da rede de serviços do SUS, dos problemas de

saúde da população de uma área delimitada, favorecendo ações de vigilância

epidemiológica, sanitária, controle de vetores, educação em saúde, além de permitir

que se organize a rede em todos os níveis de atenção e em todos os níveis de

complexidade.

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25

Dessa forma, o acesso da população à rede deve dar-se por intermédio de

serviços qualificados e resolutivos, para atender e resolver os principais problemas

que são demandados aos serviços de saúde. E organizados de forma a permitir que

o fluxo de referência e contra referência adquira legitimidade perante a população

usuária.

O princípio da hierarquização pressupõe a diferenciação de vários níveis de

atenção, cada qual oferecendo um conjunto de procedimentos e apresentando um

conjunto distinto de recursos tecnológicos. A idéia de regionalização está

relacionada a delimitação de um território, “de modo que a unidade (ou o conjunto de

unidades) possa assumir a responsabilidade, por dar resposta às necessidades dos

serviços de saúde da população que vive nesse território”. (28)

Para que o princípio da regionalização seja efetivo ao ser operacionalizado,

cabe a compreensão de que o território não se limita a mera repartição geográfica

de uma região, “mas um espaço de interação de sujeitos sociais, sendo, portanto,

também cultural, social e político” (29)

- Descentralização: “Corresponde à distribuição de poder político, de

responsabilidades e de recursos da esfera federal para a estadual e municipal”. (22)

Neste sentido, esta diretriz objetiva tanto a desconcentração de poder pelos entes

federativos, quanto de organização do sistema de saúde, o que não deve ser

confundido nem com a redução do papel do Estado proposta pelo ideário neoliberal,

nem com dissolução da noção de Estado. (24)

O objetivo é que, quanto mais perto da demanda a decisão for tomada, mais

chance haverá de acerto. A redefinição das atribuições dos entes federativos, com

um nítido esforço de orientar a regulamentação do sistema, está sendo pautada pela

municipalização, ou seja, pela maior responsabilidade dos Municípios na

implementação das ações de saúde, como indica o art. 7º, IX, a, da LOS;

- Integralidade: Tem sido identificado diversos sentidos para a integralidade

no campo da saúde. Segue então algumas das dimensões possíveis para esta

categoria.

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26

*Preventivo e Curativo (nível de atenção) implica no atendimento pelos

serviços de saúde ao indivíduo como um ser integral, submetido às mais

diferentes situações de vida e de trabalho, que o levam a adoecer e morrer. O

indivíduo deve ser entendido como um ser social, cidadão que biológica

psicológica e socialmente está sujeito a riscos de vida. Dessa forma, o

atendimento deve ser feito para a sua saúde e não somente para as suas

doenças;

* Individual e Coletivo - prevenção de riscos e de exposições às

doenças, para manter o estado de saúde de cada um e da coletividade,

incluindo ações de saneamento básico, imunizações, ações coletivas e

preventivas, vigilância à saúde e sanitária dentre outros;

*Intersetorial - O SUS deve garantir o acesso a ações de atenção à

saúde, envolvendo ações entre os diversos serviços da área da saúde e

também em outras áreas, como habitação, meio ambiente, educação,

transporte;

- Participação da Comunidade: compreendido como um espaço no qual a

sociedade civil organizada pode exercer sua cidadania através da democracia

participativa e o controle social em cada esfera de governo. Dar-se-á através das

seguintes instâncias colegiadas:

*Conferências de saúde: reúne-se, no mínimo, uma vez a cada quatro

anos com a representação dos vários segmentos sociais, para avaliar a

situação da saúde e propor as diretrizes para a formulação da política de

saúde nos níveis correspondentes, convocada pelo Poder Executivo ou,

extraordinariamente, por este ou pelo Conselho de Saúde;

*Conselhos de saúde: Tem caráter permanente, deliberativo e paritário

(usuários 50% e profissionais de saúde e gestores 25% cada); Suas

atribuições incluem a formulação de estratégias e o controle da execução da

política de saúde referente a cada esfera correspondente inclusive nos

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27

aspectos econômicos e financeiros, cujas decisões serão homologadas pelo

chefe do poder legalmente constituído em cada esfera de governo.

A principal inovação desses mecanismos consiste em seu caráter deliberativo

e não apenas consultivo o que significa que as decisões sobre as políticas de saúde

terão que ser compartilhadas pelos representantes do poder público e da sociedade.

Além disso, os Conselhos constituem-se em instrumentos de fiscalização pela

comunidade do desempenho das funções estatais, favorecendo uma maior eficácia

na aplicação dos recursos e, portanto, a concretização dos princípios que orientam o

Sistema Único de Saúde. (30)

Cabe ressaltar que ao recepcionar as normas infraconstitucionais, enquanto

essenciais à especificidade da norma geral, e em consulta a trabalhos acadêmicos e

ao de doutrinadores, abre-se a possibilidade de diferenciação entre princípios e

diretrizes, sob diferentes aspectos. (24)(25)(29)(31)

Assim, de 1988 aos dias atuais, houve a publicação de diversas Leis Federais

como as Leis Orgânicas da Saúde criadas para dar maior concretude às normas

constitucionais. Além das normas infraconstitucionais como Decretos, Portarias,

Resoluções e “demais normas infralegais, editadas para regulação das ações e

serviços de interesse à saúde no Brasil”. Entretanto é necessário que sejam criados

não apenas normas jurídicas, mas instrumentos norteadores de sistemas resolutivos

e vontade política. (23)

A Constituição Federal estabelece que os grandes responsáveis pela

organização e execução das ações e serviços públicos de saúde, são os órgãos do

Poder Executivo de cada ente federativo brasileiro e que ora estas atribuições são

exclusivas de um ente, ora estas são concorrentes ou complementares, assim, cabe

a estes implementar políticas públicas de saúde, coerentes aos princípios

constitucionais.

Considerando a posição privilegiada dos princípios fundamentais no

ordenamento jurídico brasileiro, Aith considera que essa visão mais abrangente,

exige do gestor que sejam consideradas as interações entre o direito e o meio no

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28

qual ele atua. Pois, é mediante as políticas sociais e econômicas designadas pelo

Estado que o mesmo pode cumprir seu dever constitucional para a efetivação do

direito à saúde, seja através da prevenção de doenças, promoção da saúde ou sua

recuperação. (23)

Mas como garantir o acesso à saúde a todos, em todas as suas

necessidades, sem discriminação ou privilégio de qualquer natureza,

disponibilizando todas as tecnologias, em todos os níveis de atenção, por todos os

entes federativos, de forma a alcançar a justiça social numa sociedade com tantas

desigualdades sociais e econômicas?

Faz-se necessário então, recepcionar a categoria eqüidade como eixo

estruturante rumo à justiça social de forma a reduzir as desigualdades econômicas e

sociais e assim avançar na garantia aos princípios fundamentais constitucional da

dignidade da pessoa humana e da cidadania.

3.2. Eqüidade em Saúde

A eqüidade é um dos princípios fundamentais da Constituição Federal e

norteador do Sistema Único de Saúde no Brasil. A partir deste e em consonância

com os demais princípios, devem ser elaboradas as políticas públicas inclusive as

de saúde.

Explicitamente a categoria eqüidade é pouco utilizada na Carta Magna. Não a

lemos nem entre os valores, princípios, objetivos, direitos e garantias fundamentais e

nem entre os da ordem econômica e social, entretanto ela está presente dentre os

artigos e no que os doutrinadores classificam como igualdade material.

O princípio da igualdade, segundo Aith e Silva, deve ser compreendido nas

suas duas dimensões: a dimensão formal e a dimensão material. (23)(24)

A Igualdade em sua dimensão formal é reconhecida em diversas

constituições enquanto “igualdade perante a lei”. Aplicam e tratam todos igualmente

perante a lei, sem considerar as distinções dos grupos. Na Constituição cidadã

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29

baseia-se no art. 5º caput e inciso I, em que “todos são iguais perante a lei, sem

distinção de qualquer natureza” e todos “são iguais em direitos e obrigações”.

A dimensão material é quando se especifica as características relevantes

para um tratamento igual, criando regras de proibição e de consentimento diante de

certos fatores. Pode ser observada ao proibir distinções, presente no artigo 7º, XXX

e XXXI, onde constam algumas das regras da igualdade material, explicitando

alguns fatores, como distinção de salário por motivo de idade, sexo, estado civil ou

deficiência. Pode ser observada também quando consente distinção de condições

em relação à idade, sexo e ocupação para aposentadoria prevista no art. 40, III.

Além destes, diversos outros exemplos de igualdade material podem ser

encontrados na CF/88. Ao considerar dentre os objetivos fundamentais

constitucionais o de “reduzir as desigualdades sociais e regionais, Silva afirma que

(24):

[a República Federativa do Brasil] veementemente repulsa a qualquer forma de discriminação (art. 3º, IV), a universalidade da seguridade social, a garantia ao direito à saúde, à educação baseada em princípios democráticos e de igualdade de condições para o acesso e permanência na escola, enfim a preocupação com a justiça social como objetivo das ordens econômica e social (arts. 170, 193, 196 e 205) constituem reais promessas de busca da igualdade material.

Já Aith defende que o princípio da eqüidade é diferente do da igualdade, mas

que este em seu sentido material é essencialmente fundado no princípio da

eqüidade. Assim, considerando: a) que estes princípios sejam distintos; b) que a

Constituição apesar de declarar que todos são iguais perante a lei, sem distinção de

qualquer natureza, permite o direito ao tratamento diferente a determinados grupos,

fatores ou situações; c) que este tratamento diferente é justificável

constitucionalmente quando voltado a reduzir desigualdades sociais, geográficas e

econômicas, ou erradicar a pobreza e a marginalização e d) que a possibilidade de

tratamento desigual é classificada pelos doutrinadores de igualdade material, para

efeito de fundamentação legal, este trabalho irá considerar a igualdade material

como sinônimo de Eqüidade e assim, um princípio e valor constitucional.

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30

Enquanto valor constitucional, a eqüidade é um importante instrumento na

garantia da cidadania e dignidade da pessoa humana. Conseqüentemente

influenciará dentre outros direitos e garantias, os já citados direitos sociais, inclusive

no que tange a Saúde.

Para que todos e cada um alcancem as condições necessárias para seu

pleno desenvolvimento, a sociedade deve se organizar num sistema público de

solidariedade sem o qual não se alcança a eqüidade. O Pacto Social permeia todos

os direitos sociais (art. 6º), como a saúde é parte integrante da seguridade social,

juntamente com a previdência social e assistência social, o art. 194 define que:

“compete ao poder público organizar a seguridade social com base dentre outros,

nos objetivos da universalidade da cobertura e do atendimento”. É o que resume

Aith, quando se refere à criação da seguridade social pelo Estado. (23)

(...) tem por objetivo a socialização dos riscos inerentes à vida, ou seja, a sociedade arca com os custos decorrentes dos riscos sanitários e sociais a fim de garantir a todos, sobretudo aos pobres, uma vida digna, através do acesso universal, gratuito e igualitário aos cuidados de assistência social e de saúde que se mostrarem necessários.

A eqüidade perpassa pelos diversos princípios e diretrizes do SUS. E traz

usualmente, implícita ou explicitamente, o conceito de acesso, pode-se assim

afirmar que esta palavra tem suportado diferentes usos: pela presença física de

equipamento e insumos, pela proximidade geográfica, aos profissionais, para todos,

aos níveis de complexidade, viável financeiramente, dentre outros. Quando tratado

em conjunto, Cohn denomina-o por acessibilidade (32)

A acessibilidade, portanto, não se reduz ao conceito de acesso pela proximidade, tal como destacam os documentos de políticas de saúde neste país, nem se traduz na concepção empobrecida de disponibilidade pela presença física dos recursos nas áreas onde existem. A acessibilidade formulada pela população usuária corresponde a relação funcional entre as „resistências‟ que são oferecidas pelos próprios serviços. (...) e o „poder de utilização‟ (...) por parte de quem é atendido e conforma o seu perfil de demanda.

O princípio da eqüidade pode ser expresso sob a ótica da integralidade no

qual é exigido do Estado a organização de uma rede de atenção à saúde que

garanta ao cidadão o acesso a todos os tipos de tratamentos, para todos os tipos de

doenças, em todos os níveis de sua evolução e em todos os níveis de atenção e de

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31

complexidade do sistema, de que cada um necessite. Neste sentido, o acesso

integral equitativo deve ser pautado pelo princípio da necessidade da população

usuária.

A universalidade é outro aspecto do princípio da eqüidade. No SUS, a

universalidade é garantida pelo financiamento indireto na atenção à saúde, evitando-

se assim que, barreiras econômicas restrinjam seu uso. Entretanto, os custos

incorridos no consumo de serviços de saúde incluem também, aqueles de transporte

(inclusive para o acompanhante), de espera para o atendimento, de aquisição de

medicamento etc. Esses custos tendem a ser proporcionalmente maiores para os

grupos de menor renda, que geralmente vivem em áreas onde a disponibilidade de

serviços é menor, e carente de rede de apoio formal, dificultando o acesso. A

universalização pressupõe assim a efetivação da acessibilidade (32).

A eqüidade também tem sido utilizada sob a dimensão da eficiência. A

Constituição orienta o mecanismo que deve ser utilizado para alcançar a eficiência

do Sistema que é a descentralização em uma rede regionalizada e hierarquizada. A

eficiência é um dos novos princípios recepcionado pela administração pública,

regida pela regra “da consecução do maior benefício com o menor custo possível”.

(23) O SUS terá suas ações e serviços hierarquizados, executados por instituições

pertencentes aos entes federativos (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) e

por instituições privadas conveniadas ou contratadas pelo SUS, atendendo aos

diferentes níveis de complexidade e de atenção à saúde e, regionalizada,

compreendendo a noção de territorialidade (território-processo), não

necessariamente restrito à abrangência municipal, objetivando a resolução de

problemas e otimizando os recursos disponíveis. (33) (34)

Em relação à otimização dos recursos disponíveis, se no princípio orientador

das definições de políticas de saúde, preponderar às reformas setoriais orientadas

por eficiência de recursos, incorre-se no risco do princípio da eqüidade ficar

subordinado à dimensão da eficiência e como conseqüência inverte-se os valores.

Vale ressaltar que o princípio da eficiência deve estar pautado pela garantia dos

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32

direitos sociais e considerar as necessidades em saúde do cidadão como meta a ser

alcançada. Dois aspectos sobressaem na análise da eqüidade nesta dimensão para

Escorel:

Focalização de políticas – a predominância de políticas universais vs. políticas

residuais e seletivas (focalização com cestas “mínimas”);

Distribuição dos recursos financeiros – critérios baseados em estudos e

modelos sobre eqüidade na alocação de recursos financeiros pautados nos

conceitos de “reserva do possível” e do “mínimo existencial”;

Ao que se refere a eficiência em relação aos objetivos da descentralização,

pode-se observar uma dimensão voltada para a institucionalidade do Sistema de

Saúde que irá refletir num segundo aspecto sobre as instâncias decisórias na

implementação das políticas:

O processo de descentralização real de poder e autonomia para o nível local

de regulação do sistema de saúde e sua conseqüente responsabilização

pelas condições de saúde e assistência aos munícipes;

O processo decisório analisando a presença ou ausência de efetivo e

representativo controle social. (34)

3.2.1 Os conceitos de eqüidade em saúde

As opções conceituais influenciam na escolha de critérios distributivos, nos

indicadores utilizados para avaliar o grau de eqüidade e na interpretação dos

resultados para efetividade das intervenções. (35)

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33

Não existe uma única teoria de eqüidade, mas aquela socialmente aceita num

contexto histórico, econômico e cultural, refletindo os valores dominantes de cada

sociedade. Estes valores influenciam na formulação de políticas de saúde de

variadas formas na organização dos sistemas de saúde, sendo necessário então

definir os parâmetros e prioridades que regem as sociedades para então definir o

que se quer universalizar, o que se quer igualar, o quanto e para quem será

distribuído. (36)

No artigo eqüidade na gestão descentralizada do SUS, Lucchese adota como

ponto de partida para as novas definições do conceito de eqüidade em saúde, o

defendido por Whitehead no qual “todos deveriam ter a justa oportunidade de obter

seu pleno potencial de saúde e ninguém deveria ficar em desvantagem de alcançar

o seu potencial, se isso puder ser evitado.” (37)

O Center for Health Equity, Training, Research and Evaluation - CHETRE

apresenta sua síntese conceitual também a partir da definição de Whitehead, no

qual todos deveriam ter acesso aos recursos para suprir suas necessidades em

saúde, traz ainda que a diferença entre as pessoas não deva ser influenciada por

fatores além de seu controle; e que a iniqüidade afetas aos grupos quando ocorrem

diferenças nas condições de saúde, ou diferenças nas características sociais e

demográficas. “Essas diferenças são consideradas iníquas se elas ocorrem porque

as pessoas têm escolhas limitadas, acesso a mais ou menos recursos para saúde

ou exposição a fatores que afetam a saúde, resultantes de diferenças que

expressam desigualdades injustas”. (38)

Estas diferenças desnecessárias ou desigualdades injustas, também são

denominadas por Travassos como iniqüidades e podem ser compreendidas como:

“danos causados à saúde quando a liberdade de escolha de estilo de vida é restrita”,

concepção esta, também defendida por Duarte, Escorel, Luchese e Sen.

(34)(35)(37)(39)

Torna-se necessário distinguir o termo diferença do termo diversidade.

Diversidades são fatores alheios a vontade humana, ou é o resultado de vontades

individuais. Já as diferenças, são referidas às questões éticas, morais e políticas,

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34

assim, as diferenças indesejáveis são consideradas socialmente injustas e então

passíveis de intervenção de políticas públicas. Nesta perspectiva, o termo iniqüidade

não se aplica ao conceito de diversidade, o termo parece ser usado apenas ao que é

evitável, ou seja, iniqüidade é então considerada para as diferenças desnecessárias,

injustas e evitáveis. (40)

Fundamentado na obra de Rawls, Beauchamp & Childress discutem a regra

da “Oportunidade Equitativa”, como uma regra de distribuição social que objetiva

reduzir formas injustas de distribuição. Segundo a regra, deve ser oferecida a

pessoa uma chance equitativa na vida, sempre que suas “propriedades

desfavoráveis” não sejam de sua responsabilidade. Rawls se refere a “loteria

natural” e “loteria social”, nas quais todas as nossas habilidades e inabilidades são

originadas e que numa teoria de justiça social, a regra da oportunidade equitativa

deve ser usada para mitigar estes efeitos das loterias da vida. Desse modo, as

inabilidades que restrinjam a liberdade de escolha do estilo de vida devem ser

niveladas, quer pelos motivos de diferenças evitáveis (origem social), quanto pelas

“desvantagens desditosas” (origem biológica). (36)

Porto (39) sintetiza os principais conceitos do pensamento liberal, como:

(...) as tendências preponderantes reconhecem como pilares principais do conceito de eqüidade a distribuição de recursos através de uma discriminação positiva em favor dos mais desfavorecidos e a diminuição das desigualdades que resultam de fatores que estão fora do controle individual. Apesar desta constatação, "a aceitação, quase consensual, de princípios eqüitativos, permanece restrita exclusivamente à definição formal de um direito, sem que na realidade seja assegurado seu efetivo exercício".

Assim, mais do que concordar, que a eqüidade requer uma redistribuição de

recursos, cabe questionar os critérios desta redistribuição, sob quais princípios e em

qual teoria de justiça distributiva ela estará fundamentada.

A Justiça distributiva se refere a uma “distribuição justa, equitativa e

apropriada no interior da sociedade, determinada por normas justificadas que

estruturam os termos da cooperação social”. (36) Deve ser baseada em princípios,

que são:

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35

Princípio da justiça formal – Fundamentada em Aristóteles que conceitua a

justiça como: “iguais devem ser tratados de modo igual, e não-iguais devem ser

tratados de modo não-igual”. É um princípio formal, pois não oferece parâmetros de

igualdade, diferente do princípio de justiça material que explicita, especifica e refina

os critérios relevantes a serem utilizados.

Princípio da Justiça material - Os principais princípios são: “a todas as

pessoas uma parte igual”; “a cada um segundo a sua necessidade”, “a cada um de

acordo com seu esforço”; “a cada um de acordo com sua contribuição”; “a cada um

de acordo com seu merecimento”; “a cada um de acordo com as trocas do livre

mercado”.

Estes princípios podem ser usados no contexto de diversas políticas públicas

e não necessariamente serem antagônicas. Na seguridade social brasileira, inserida

nela a saúde, estão presentes alguns princípios: na Previdência social é usado o da

“contribuição”, na Saúde “a todos uma parte igual” e na Assistência social “a cada

um segundo a sua necessidade.”

Turner diferencia quatro tipos de eqüidade: ontológica, de oportunidade, de

condições e de resultados. (39)

A eqüidade ontológica é inerente aos seres humanos, refere-se à igualdade

fundamental entre as pessoas. Varia de abordagens religiosas, passando por

correntes filosóficas.

A eqüidade de oportunidades compõe os princípios das doutrinas liberais,

está na base da teoria social da meritocracia. Considera que dado um mesmo

patamar de direitos (à vida, liberdade e a propriedade), o acesso a posições na

estrutura ocupacional da sociedade, resulta na competição entre os indivíduos,

preenchida apenas pelo mérito pessoal;

O terceiro tipo é o de eqüidade de condições, segundo Turner, as

oportunidades iguais começam no ponto de partida, “apenas pessoas submetidas às

mesmas condições de vida podem vir a ser consideradas „em igualdade' para

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36

competir com base em habilidades e méritos individuais”. Esta concepção mais

completa e complexa, dificilmente é alcançada sem significativa alteração no modelo

econômico. Apenas a mudança no modelo social não seria capaz de alterar os

aspectos estruturais na determinação do grau de mobilidade entre as diferentes

classes sociais.

A eqüidade dos efeitos ou resultados é o quarto tipo e neste envolve

mudanças nos critérios de distribuição para transformação das desigualdades de

início em igualdade de conclusão. As medidas políticas ou legislação procuram

compensar os efeitos das desigualdades de condições sociais. A discriminação

positiva age em favor de grupos menos privilegiados aumentando suas

oportunidades e assegurando a eqüidade nos resultados.

No Brasil este tipo pode ser observado pela garantia das cotas nas

universidades para algumas minorias e vagas exclusivas para portadores de

necessidades especiais nos concursos públicos, mas também pode ser visto nos

diversos artigos constitucionais que exemplificam a igualdade material, já

referenciado anteriormente.

Segundo Duarte (39), como os significados mais comuns atribuídos a

eqüidade “são variáveis das expressões „igualdade de acesso‟ e „tratamentos iguais

para as mesmas necessidades‟”, ocupa lugar de destaque nos propósitos das

políticas de saúde, a definição adotada por Turner que coincide com a de “eqüidade

de oportunidades”. A autora afirma que:

A concepção que decorre a partir desta leitura é a de que a cobertura universal dos serviços e a não discriminação de acesso aos recursos de diagnóstico e tratamento, caracterizam um sistema de saúde eqüitativo. Os dois últimos tipos de eqüidade propostos por Turner são desconsiderados.

Contudo, ao confrontar estes tipos de eqüidade propostos por Turner à norma

maior, pode-se perceber que a CF/88 parte sim de um conceito formal de igualdade

refletindo na eqüidade de oportunidade, mas para além deste, existe uma

intencionalidade do constituinte, também expressa, em erradicar a pobreza e reduzir

as desigualdades pelos ditames da justiça social, tentando alcançar a eqüidade de

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37

condições, mas efetivamente só consegue mitigar os efeitos das desigualdades

através de políticas que tentem garantir eqüidade nos resultados.

Este contexto é decorrente do momento em que a constituição cidadã foi

gestada e reflete a correlação de forças na disputa de poderes daquele momento

histórico. Por mais avanço que tenha havido em relação aos direitos sociais, o

avanço referente à ordem econômica ainda não fora suficiente para imprimir uma

mudança estrutural na sociedade brasileira. Desta forma, aqueles que não se

sobressaem pelos seus méritos ou esforços, ficam sujeitos às políticas de

discriminação positiva.

Para orientar a operacionalização de ações voltadas à eqüidade, Lucchese

indica a “perspectiva da capacidade” desenvolvida por Sen, no esforço de responder

a indagação: “está se buscando igualdade de quê?” Ele considera que conceitos de

pobreza e de grupos vulneráveis não podem ter em vista apenas os rendimentos

econômicos, mas considerar pobreza como privação de capacidades. Para Amartya

Sen, (37)

a adequação dos meios econômicos não pode ser julgada independentemente da real possibilidade de “converter” rendimentos e recursos em capacidades”. (...) Rendimentos adequados para fugir da pobreza variam com as características pessoais e das circunstâncias”. (...) “Possuir rendimentos inadequados não é um caso de ter rendas abaixo de uma dada linha de pobreza e sim de ter rendas abaixo do que é adequado para gerar níveis específicos de capacidades para o indivíduo em questão.

A proposta é que para além de elaborar políticas eqüitativas voltadas para os

grupos economicamente mais vulneráveis sob a ótica financeira, seja realizado um

diagnóstico da pobreza como privação de capacidades para então conseguir

alcançar a real necessidade de cada um a cada momento. Assim é preponderante

considerar que não apenas a situação econômica interfere nas iniqüidades, mas

também as oportunidades de escolhas que o indivíduo tem (ou não) de influenciar

seu estado de saúde ou a situação em que vive, ou seja, suas necessidades. (34)

O fundamento ético do princípio de igualdade é que a distribuição de serviços

de saúde efetivos - que impactam positivamente a sobrevivência e/ou a redução de

incapacidades, da dor ou do desconforto - devem estar disponíveis segundo as

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38

necessidades de cada indivíduo. Dessa forma, a definição de prioridades na

distribuição de serviços efetivos só é eticamente aceitável enquanto estratégia de

transição para uma situação de universalidade de acesso com base em

necessidades.

Para Travassos (35), é importante distinguir o conceito de eqüidade em

saúde do conceito de eqüidade no uso ou no consumo de serviços de saúde.

Tal distinção parece-me importante, pois os determinantes das desigualdades no adoecer e no morrer diferem daqueles das desigualdades no consumo de serviços de saúde. As desigualdades em saúde refletem, dominantemente, as desigualdades sociais, e, em função da relativa efetividade das ações de saúde, a igualdade no uso de serviços de saúde é condição importante, porém não suficiente, para diminuir as desigualdades existentes entre os grupos sociais no adoecer e morrer.”

No que se refere à eqüidade em saúde, sabe-se que existe uma forte

correlação entre indicadores sanitários e renda per capita e do nível educacional.

Estudos evidenciam que indivíduos socialmente menos privilegiados tendem a

adoecer mais precocemente.

No trabalho de Duarte (39) foram analisadas duas tabelas segundo regiões

do Brasil com dados da década de 90, a primeira sobre indicadores sociais constata

que o analfabetismo e a proporção de pobres no Norte e Nordeste são pelo menos

duas vezes maior que no Sul e Sudeste. Aquelas regiões também são menos

privilegiadas em relação ao abastecimento de água e esgoto sanitário e não seria

diferente o resultado do Índice de Desenvolvimento Humano (IDH) com os piores

resultados na região norte e nordeste.

A segunda tabela refere-se aos indicadores de recursos, mortalidade infantil e

esperança de vida ao nascer e os dados mostraram que a região norte e nordeste

tem a menor relação de profissionais de saúde e de leitos por 10.000 habitantes

dentre as regiões, as maiores taxas de mortalidade infantil e menor esperança de

vida ao nascer, diferença esta de 12 anos entre o Sul e o Nordeste.

Estes dados demonstram que as regiões com piores indicadores sociais são

aquelas que têm menor relação de profissionais de saúde, menor investimento

financeiro e que os moradores desta região vivem menos, evidenciando que não

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39

houve “esforço compensatório para redistribuição de recursos que privilegiasse as

áreas menos favorecidas”.

Através dos dados sobre as condições de saúde da população pode-se

analisar a distribuição dos riscos de adoecer e morrer. Os vários perfis de doença

não se distribuem igualmente por todas as camadas populacionais. As variações

biológicas, até determinam diferenças nas suas formas de sofrer e adoecer, mas “a

maior parte das diferenças de condições de saúde são socialmente determinadas e

não decorrem de variações naturais, ou de livres escolhas pessoais por estilos de

vida mais ou menos saudáveis”. Os grupos social e economicamente vulneráveis

acumulam a maior freqüência de distribuição de doenças nas diversas origens,

sejam as infecciosas, crônico-degenerativas ou por causas externas. Há quem diga

que estes grupos sofrem duas vezes, são acometidos pelas doenças dos pobres e

dos ricos. (34)

A influência do social no adoecer, resulta no fato de os grupos sociais

apresentarem demandas diversas aos diferentes serviços de saúde, tanto em

termos de volume, tipo de problema e nível de complexidade de acordo com suas

necessidades em saúde. Assim, as diferenças dos grupos social e economicamente

mais vulneráveis precisam ser consideradas na programação da oferta de serviços

quando se busca construir um sistema de saúde mais equânime. (34)

A conceitualização que Cecílio adota reconhece quatro conjuntos de

necessidades de saúde. O primeiro são as boas condições de vida, entendendo-se

que o modo como se vive traduz diferentes necessidades. O segundo conjunto diz

respeito ao acesso às tecnologias que melhoram ou prolongam a vida. É importante

destacar, nesse caso, que o valor de uso de cada tecnologia é determinado pela

necessidade de cada pessoa, em cada momento. O terceiro bloco refere-se à

criação de vínculos efetivos entre o usuário e o profissional ou equipe dos sistemas

de saúde. Vínculo deve ser entendido, nesse contexto, como uma relação contínua,

pessoal e calorosa. Por fim, necessidades de saúde estão ligadas também aos

graus crescentes de autonomia que cada pessoa tem no seu modo de conduzir a

vida, o que vai além da informação e da educação. (42)

Page 40: priscila ribeiro campos paura.pdf

40

O conceito de eqüidade no uso ou no consumo de serviços de saúde,

classificado por Travassos, refere-se à igualdade de acesso aos serviços de saúde e

é considerado por Turner como igualdade de oportunidade. Pode ser analisado a

partir de duas dimensões complementares: a geográfica e a social. A primeira diz

respeito às variações entre áreas ou intra-necessidades (eqüidade horizontal); a

segunda refere-se a variações entre grupos intra-áreas (eqüidade vertical). (35)

Dimensão Geográfica - analisa as possibilidades de consumo dos serviços de

saúde de diferentes graus de complexidade por indivíduos com “iguais necessidades

de saúde”. Neste caso adota-se o conceito de eqüidade horizontal, mantendo as

desigualdades existentes previamente à entrada no sistema, compara a utilização de

serviços de saúde entre áreas geográficas e pode ser mensurada a partir da análise

de taxas de utilização entre regiões/estados/municípios. As variações geográficas

refletem a capacidade local de financiamento, o tamanho e a complexidade da rede

de serviços, assim como, a pluralidade do atual sistema de saúde e a capacidade de

compra de serviços de saúde das populações locais. Variações nessas taxas

expressam desigualdades geográficas, mas não necessariamente as sociais. (35)

(43)

Dimensão Social - analisa as possibilidades de consumo dos serviços de

saúde entre os diferentes grupos sociais. Neste caso adota-se o conceito de

eqüidade vertical, pois o tratamento é desigual para grupos sociais com

necessidades distintas dentro de uma mesma região. Reflete o caráter seletivo do

sistema de saúde, pois a organização local desses serviços impacta diretamente o

perfil de desigualdades entre estes grupos. A desigualdade encontrada é decorrente

de uma estrutura plural, fragmentada e geradora de seletividade na oferta dos

serviços, provocando um padrão de uso desigual. As variações existentes nos

sistemas de saúde locais podem reduzir ou ampliar essas desigualdades.

A análise do uso e do consumo dos serviços de saúde, em geral é feita por

tipo (centros de saúde, ambulatórios especializados, policlínicas, hospitais de

emergência) segundo a distribuição geográfica e/ou segundo a distribuição social

(quintis de renda). (43)

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41

Considerando estas duas dimensões, pode-se pressupor que uma

distribuição mais equânime de recursos financeiros na saúde entre regiões, apesar

de vir a reduzir as desigualdades geográficas na utilização de serviços de saúde e

ampliar equitativamente o acesso, não é condição suficiente para alterar as

desigualdades sociais (intra-regiões). Para a autora, pode não só não as alterar,

como, eventualmente, vir a aumentá-las, caso não se acompanhe de medidas

reguladoras voltadas para eqüidade. “Destaca-se, assim, a fundamental importância

do desenho do modelo assistencial local para a redução das desigualdades sociais

na utilização de serviços de saúde.” (35)

Travassos afirma que a passagem das condições de desigualdades

existentes hoje no sistema de saúde brasileiro para uma situação mais igualitária

depende, não apenas de maior disponibilidade de recursos financeiros para o setor

saúde, mas de: a) melhor uso dos já existentes; b) implementação de uma política

redistributiva na alocação de recursos entre esferas de governo e organização da

rede local de serviços de saúde voltada para garantir a universalidade no acesso,

por meio de melhor distribuição espacial desses serviços e adequação da oferta às

necessidades dos diferentes grupos populacionais (35) (43).

Diante do exposto, o presente trabalho parte do pressuposto que a equidade

não é sinônimo de igualdade, mas uma forma de alcançà-la. È um princípio

constitucional e pode ser observado na realidade brasileira a partir dos tipos

equidade de oportunidade e equidade de resultados ou efeitos, ainda que para que

se alcance a equidade em saúde fosse necessário garantir a equidade de

condições. Parte-se da definição de que todos deveriam ter a justa oportunidade de

obter seu pleno potencial de saúde e ninguém deveria ficar em desvantagem de

alcançar o seu potencial, se isso puder ser evitado e para que a equidade seja

alcançada faz-se necessário adotar enquanto princípio de justiça distributiva que a

cada um seja dado segundo suas necessidades, como forma de mitigar os efeitos

da loteria da vida.

É sob esta concepção teórica que este estudo pretende analisar se o acesso

ao transplante de rim consegue ter equidade no uso e no consumo dos serviços de

saúde, tanto na dimensão geográfica quanto na dimensão social.

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42

4. MATERIAIS E MÉTODOS

Esta investigação é um estudo, de caráter quantitativo, de dados sobre

transplantes de rim com doador falecido no Estado do Rio de Janeiro, durante o ano

de 2008. A pesquisa foi realizada considerando-se várias fases conforme descritas a

seguir.

Na fase exploratória, foi realizada a pesquisa bibliográfica, a pesquisa

documental e a pesquisa de dados secundários. Na pesquisa bibliográfica foi feito

levantamento da bibliografia sobre os princípios constitucionais aprofundando o

tema da Eqüidade e questões afins, buscando balizar a discussão teórico-conceitual

sobre o tema, bem como a operacionalização do conceito. Tal levantamento incluiu

consulta a textos disponíveis na rede mundial de computadores, consulta a teses e

dissertações de mestrado e livros publicados sobre transplante de rim.

Na pesquisa documental, foram analisadas atas de reuniões de câmara

técnica de transplante renal e normas legais que regulamentam a organização dos

serviços de saúde utilizados pelos usuários do transplante. Finalmente, a pesquisa

de dados secundários foi feita com vistas ao levantamento de dados

socioeconômicos, demográficos, e da oferta dos serviços de saúde à pessoa

portadora de insuficiência renal crônica do Estado, através de consultas a bancos de

dados da Central de Transplantes do Rio de Janeiro, Central de Regulação da

Secretaria de Estado de Saúde e Defesa Civil, DATASUS, Tribunal de Contas União

e ABTO.

No trabalho de campo, foram analisados 55 prontuários de doadores de rim

de janeiro a dezembro de 2008, da Central de Transplantes do Rio de Janeiro. As

informações dos potenciais receptores selecionados ao transplante renal foram

coletadas dos prontuários dos doadores e colocadas em uma planilha do Microsoft

Excell®, composta de identificação codificada do doador, posição do receptor no

ranking da doação e os principais motivos identificados para o não transplante,

dentre os potenciais receptores listados mais pontuados para as doações de rim,

realizadas no ano de 2008. Foram excluídos os prontuários dos doadores oriundos

de outra unidade da federação e os de doações ocorridas no Estado do Rio de

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43

Janeiro com receptores de outra unidade da federação. No quadro 01,

apresentamos uma classificação das informações coletadas dos prontuários e, no

quadro 02, uma classificação dos motivos de não-transplante dentre os potenciais

receptores de rim.

Quadro 01: Tipo de informação dos receptores coletadas a partir dos prontuários

de doadores efetivos de rim no Estado do Rio de Janeiro.

Variável Definição

RGCT Registro Geral da Central de Transplante. Número de registro do doador e do receptor de órgãos e tecidos para transplante no Sistema Nacional de Transplante. Cada notificação de potencial doador possui um número de registro, assim como cada potencial receptor possui um único RGCT vigente em todo território nacional.

Data do transplante

Data em que o transplante foi realizado.

Data da diálise Data em que o receptor iniciou a terapia renal substitutiva.

Data da Inscrição Data em que o receptor se inscreveu para transplante.

Nome Iniciais do receptor

Sexo Caracterização do perfil de gênero do receptor

Idade Caracterização da faixa etária do receptor

Centro Transplantador

Instituição hospitalar autorizada pelo SNT para realizar transplante e que realizaram o procedimento no ano de 2008.

Centro de Acompanhamento pré-transplante

Instituição hospitalar autorizada pelo SNT para realizar transplante, responsável por preparar o potencial receptor para realizar o procedimento.

Posição no Ranking

Posição em que o potencial receptor ocupa na listagem gerada a partir de cada doador efetivo.

Município de residência

Município onde reside o receptor.

Município de diálise

Município onde está localizado o Centro de diálise do receptor.

PRA Reatividade contra painel. Percentual de reatividade registrada no último semestre.

Re-transplante Registro de transplante ocorrido anterior ou posterior ao ano de 2008

Motivo Registro no prontuário realizado pelo profissional de saúde plantonista da CNCDO referente ao motivo alegado pelo potencial receptor ou equipe transplantadora para a não realização do transplante. Esta informação também pode ser dada pelo próprio Sistema como no caso do “Soro Vencido”.

Quadro 02: Classificação dos motivos de não-transplante dentre os potenciais receptores de rim classificados no Estado do Rio de Janeiro.

Variável Definição Informações encontradas

Soro Vencido Data do exame de sangue superior a 91 dias ou 15 dias após transfusão sanguínea, inviabilizando o transplante por desatualização da soroteca.

*Sim *Não

Contato Telefônico Refere-se às dificuldades de localização dos PR, que devem ser contatados em curto espaço de tempo pela CTRJ, usualmente pelo número de telefone fornecido em ficha cadastral. Inclui

*Sim *Não

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44

telefones errados, atendidos por pessoa que desconhece o PR, que não completa chamada, que está fora de área de cobertura, além do número de conhecidos que não se prontificam em dar recado.

Condições Clínicas Potenciais Receptores que deveriam ser afastados temporariamente da Lista Única para tratamento de saúde e que não avisaram ao CTx, ou que este não comunicou a CTRJ.

*Sim *Não

Exame Potenciais Receptores que alegam ao telefone não ter concluído a realização de exames pré-transplante solicitado pela Equipe Transplantadora, os que nunca realizaram exames ou os que apresentam exames desatualizados.

*Não realizado *Incompleto *Vencido

Crossmatch Exame realizado entre o sangue do doador e do Potencial Receptor constata o risco de rejeição.

*Positivo *Negativo

Equipe Contra indicação alegada pela equipe transplantadora para a não realização do transplante.

*Sorologia Positiva *Isquemia prolongada *Incompatibilidade antropométrica

Outros Motivos que apareceram com menor incidência *Não informado *Óbito *Transplantado *Não compareceu a seleção *Não quer transplantar

Para a análise do material empírico com dados sobre os não transplantados

recorreu-se as etapas de exclusão ao transplante, onde foram identificados em cada

etapa os motivos que fizeram com que o(s) mais pontuado(s) não transplantasse(m).

Posteriormente os motivos foram reagrupados por ordem de ocorrência.

Na análise sobre os transplantados, os dados coletados foram categorizados

em grupos temáticos sobre o perfil clínico-demográfico e a posição ocupada na

listagem de classificação dos mais pontuados para o transplante de rim com doador

falecido.

Os temas diretamente relacionados foram o acesso ao uso e consumo de

serviços de transplante de rim em suas duas dimensões, a equidade horizontal e

vertical, que serão analisados a partir dos sub-temas identificados como as

dimensões da equidade no transplante. Entendendo enquanto equidade horizontal

as diferenças de oferta de serviços entre as regiões do Estado do Rio de Janeiro e

enquanto equidade vertical as diferenças de oferta de serviços entre os grupos

sociais dentro do Estado.

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45

5. ARTIGO

EQUIDADE NO ACESSO AO TRANSPLANTE DE RIM COM DOADOR FALECIDO

NO RIO DE JANEIRO

Priscila Ribeiro Campos Paura¹, Carlos Dimas Martins Ribeiro², Aluísio Gomes da Silva Júnior ³

¹ Assistente Social, Especialista em Direito Sanitário e Mestranda em Saúde Coletiva da Universidade

Federal Fluminense – UFF. ² Doutor em Saúde Pública – ENSP e Professor do Curso de Pós-Graduação em Saúde Coletiva da UFF.

³ Doutor em Saúde Pública – ENSP e Professor do Curso de Pós-Graduação em Saúde Coletiva da UFF.

.

RESUMO

O presente trabalho tem como objetivo analisar o acesso ao transplante de

rim no Estado do Rio de Janeiro sob a ótica da equidade, evidenciando os fatores

que dificultam o acesso, a partir das etapas necessárias para que o potencial

receptor se submeta ao transplante. Utilizou-se a abordagem quantitativa,

envolvendo análise dos prontuários dos doadores que deram origem aos rins

recebidos pelos receptores do ano de 2008. Além disso, foi realizado levantamento

bibliográfico e pesquisa de dados secundários. O estudo baseou-se no consenso de

que a Equidade é um princípio constitucional e do Sistema Único de Saúde e que as

opções conceituais influenciam na escolha de critérios distributivos, nos indicadores

utilizados para avaliar o grau de eqüidade e na interpretação dos resultados para

efetividade das intervenções. Em geral, contatou-se que o atual critério de seleção

para transplante de rim apresenta inúmeros limites à implementação de forma

equitativa, principalmente no que tange a organização da rede e no consumo de

serviços de saúde. A política nacional de transplante apresenta ainda uma rede

desarticulada que não é capaz de garantir o acesso as ações e serviços de saúde,

não contemplando assim todas as necessidades de saúde da população usuária dos

serviços de transplante no Estado do Rio de Janeiro e, por conseguinte, acesso

equitativo à saúde.

PALAVRAS-CHAVES: Equidade, Equidade no acesso, Transplante de Órgãos,

Direito à Saúde, Direito Sanitário.

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46

INTRODUÇÃO

O Transplante no Brasil e no Rio de Janeiro

O primeiro transplante realizado no Brasil foi o de rim na Cidade do Rio de

Janeiro, em 1964. Desde então, essa atividade teve uma evolução considerável em

termos de variedade de órgãos transplantados e número de procedimentos

realizados. Todos os tipos de transplante são financiados pelo Sistema Único de

Saúde (SUS), podendo também ser realizados pela iniciativa privada. Atualmente, o

Brasil possui o maior Programa de Transplante Público do mundo (1), além de ser o

segundo país do mundo em número de transplantes (2).

Em 1997 foi sancionada a legislação vigente no Brasil, a Lei Federal nº. 9.434

que trata sobre a disposição de órgãos e tecidos para transplante (3). A partir de

então, diversos decretos, resoluções, portarias e lei foram publicados para

instrumentalizar legalmente as atividades relacionadas ao processo de doação-

transplante de órgãos e tecidos no Brasil.

No mesmo ano foi criado, no âmbito do Ministério da Saúde, através do

Decreto Federal nº 2268, o Sistema Nacional de Transplantes (SNT). A

Coordenação-Geral do Sistema Nacional de Transplantes (CGSNT) é o órgão

responsável pela gestão do programa, é assistida por Grupo de Assessoramento

Estratégico (GAE) composta por órgãos, entidades e associações de interesses no

transplante e assessorada tecnicamente pelas Câmaras Técnicas Nacionais (CTNs)

(8). Para execução das atividades de coordenação de logística e distribuição de

órgãos e tecidos no processo de doação/transplante em âmbito nacional, a CGSNT

conta com a Central Nacional de Transplante (CNT) que tem dentre outras

atribuições o gerenciamento da alocação de órgãos e tecidos entre os Estados e

Distrito Federal. (3) (4) (5)

A estrutura organizacional do SNT é desdobrada pelas demais unidades da

federação. Atualmente existem vinte e três Centrais Estaduais e uma no Distrito

Federal, que são as Centrais de Notificação, Captação e Distribuição de Órgãos

(CNCDO). Também integra o SNT, as CNCDOs Regionais, Organizações por

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47

Procura de Órgãos (OPOs), Comissões Intra-Hospitalares de Doação de Órgãos e

Tecidos para Transplante (CIHDOTTs), Equipes e estabelecimentos

transplantadores. (1) (5)

O Sistema de “Lista Única” foi criado a partir da Lei 9.434/97, está previsto no

Decreto 2.268/97 e regulamentado pela Portaria GM nº 3.407/98 (6), este, vigente

até 20 de outubro de 2009. Tem como objetivo organizar a lista de espera para os

receptores de órgãos e tecidos provenientes de doadores falecidos. É constituído

pelo conjunto de potenciais receptores brasileiros, natos ou naturalizados, ou

estrangeiros residentes no país inscritos para recebimento de cada tipo de órgão,

tecido, célula ou parte do corpo, e regulado por um conjunto de critérios específicos

para a distribuição deles a estes potenciais receptores, assim constituindo o

Cadastro Técnico Único (CTU). (3) (4) (5) (6)

No que se refere a quem pode ser doador, a legislação brasileira prevê dois

tipos de doadores, o doador vivo e o doador falecido. O doador vivo refere-se ao

indivíduo saudável, disposto a doar órgão ou tecido para fins de transplante. Sendo

permitido apenas para órgãos duplos, parte de órgãos ou tecidos desde que não

ofereça riscos a saúde do doador. A doação inter-vivos pode ser feita por cônjuge ou

parentes consangüíneos até o quarto grau inclusive (doador relacionado). Quando o

doador é “não aparentado” (não-relacionado), faz-se necessária autorização judicial

prévia, além do parecer do comitê de ética do Hospital Transplantador (5). O doador

vivo necessita se submeter a exames de compatibilidade dentre outros e

atendimento psicológico e social, onde será verificado o grau de motivação para o

ato da doação.

A política nacional de transplante trata ainda de assuntos referentes ao

financiamento dos transplantes, publicidade, prontuários, compulsoriedade da

notificação da morte encefálica, sansões penais e administrativas, dentre outros

temas previstos nas diversas legislações sobre o tema. (10)

Apesar de possuir uma das melhores políticas de transplante no cenário

internacional, o número de transplantes realizados no país, quando analisado em

relação à necessidade da população, é ainda insuficiente. Conforme dados da

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48

Associação Brasileira de Transplante de Órgão (ABTO), “apenas a metade dos

potenciais doadores que se estima existir é notificada, e somente um em cada cinco

destes, transforma-se em doador efetivo” (3).

A escassez de órgãos para transplante é uma realidade internacional o que

tem fomentado avanços tecnológicos e freqüentes revisões nas contra-indicações

relativas e absolutas do potencial doador, ampliando a possibilidade de

aproveitamento dos órgãos doados.

No âmbito do Estado do Rio de Janeiro, coube à Secretaria Estadual de

Saúde instituir a CNCDO/RJ, Central de Transplantes do Rio de Janeiro (CTRJ) que

é responsável pela coordenação de todos os processos relativos à doação-

transplante de órgãos e tecidos no Estado.

Foram registradas na Central de Transplante do Rio de Janeiro (CTRJ),

referente a dezembro de 2008, 7.741 pessoas inscritas na “Lista Única”, destas

3.466 aguardavam pelo transplante de rim.

Conforme dados acima, a demanda por órgãos para transplante é crescente

e por mais que o aumento nacional no número de transplante tenha se mantido, não

é suficiente sequer para a manutenção dos números da lista de espera.

Os dados do Estado demonstram que cada ano a procura por transplante de

rim é maior e que o número de cirurgias realizadas é inferior a esta demanda. Em

estudo realizado entre os anos de 2004 a 2006, Marinho contextualiza o Rio de

Janeiro no cenário nacional, num movimento oposto ao observado no restante do

país e com quantidades de transplantes “baixas quando comparadas aos demais

estados da região Sul e Sudeste”. (15)

São diversas as etapas e serem cumpridas, variáveis a ser consideradas,

instituições envolvidas e recursos materiais utilizados, desde os mais simples aos

mais complexos científicos e tecnológicos. Nesta diversidade de etapas a serem

cumpridas podemos observar muitos entraves para o pleno funcionamento do

Programa de Transplantes e, exatamente por isso, ele deve ser analisado sob o

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49

princípio da eqüidade e sob a ótica do direito a um serviço de qualidade e inclusivo,

pelos usuários do transplante.

Direito à Saúde no Brasil

O direito à saúde é um dos principais direitos reconhecidos no Brasil. A

Constituição Federal de 1988 (CF/88) foi a responsável pela ampliação desse direito

e do conceito de saúde em nosso país (20). A partir de sua publicação, surgem

novos instrumentos normativos voltados à redução dos riscos de doenças e de

outros agravos à saúde, bem como ao estabelecimento de condições que

possibilitem o acesso universal, igualitário e regionalizado às ações e serviços que

visem a promoção, proteção e recuperação da saúde, para que este direito seja de

fato uma realidade (21).

Mas como garantir o acesso à saúde a todos, em todas as suas

necessidades, sem discriminação ou privilégio de qualquer natureza,

disponibilizando todas as tecnologias, em todos os níveis de atenção, por todos os

entes federativos, de forma a alcançar a justiça social numa sociedade com tantas

desigualdades sociais e econômicas?

Faz-se necessário então, recepcionar a categoria eqüidade como eixo

estruturante rumo à justiça social de forma a reduzir as desigualdades econômicas e

sociais e assim avançar na garantia aos princípios fundamentais constitucional da

dignidade da pessoa humana e da cidadania.

Eqüidade em Saúde

A eqüidade é um dos princípios fundamentais da Constituição Federal e

norteador do Sistema Único de Saúde no Brasil. A partir deste e em consonância

com os demais princípios, devem ser elaboradas as políticas públicas inclusive as

de saúde.

Explicitamente a categoria eqüidade é pouco utilizada na Carta Magna. Não a

lemos nem entre os valores, princípios, objetivos, direitos e garantias fundamentais e

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50

nem entre os da ordem econômica e social, entretanto ela está presente dentre os

artigos e no que os doutrinadores classificam como igualdade material.

O princípio da igualdade, segundo Aith e Silva, deve ser compreendido nas

suas duas dimensões: a dimensão formal e a dimensão material. (21)(22)

A Igualdade em sua dimensão formal é reconhecida em diversas

constituições enquanto “igualdade perante a lei”. Aplicam e tratam todos igualmente

perante a lei, sem considerar as distinções dos grupos. Na Constituição cidadã

baseia-se no art. 5º caput e inciso I, em que “todos são iguais perante a lei, sem

distinção de qualquer natureza” e todos “são iguais em direitos e obrigações”.

A dimensão material é quando se especifica as características relevantes

para um tratamento igual, criando regras de proibição e de consentimento diante de

certos fatores. Pode ser observada ao proibir distinções, presente no artigo 7º, XXX

e XXXI, onde constam algumas das regras da igualdade material, explicitando

alguns fatores, como distinção de salário por motivo de idade, sexo, estado civil ou

deficiência. Pode ser observada também quando consente distinção de condições

em relação à idade, sexo e ocupação para aposentadoria prevista no art. 40, III.

Aith defende que o princípio da eqüidade é diferente do da igualdade, mas

que este em seu sentido material é essencialmente fundado no princípio da

eqüidade. Assim, considerando: a) que estes princípios sejam distintos; b) que a

Constituição apesar de declarar que todos são iguais perante a lei, sem distinção de

qualquer natureza, permite o direito ao tratamento diferente a determinados grupos,

fatores ou situações; c) que este tratamento diferente é justificável

constitucionalmente quando voltado a reduzir desigualdades sociais, geográficas e

econômicas, ou erradicar a pobreza e a marginalização e d) que a possibilidade de

tratamento desigual é classificada pelos doutrinadores de igualdade material, para

efeito de fundamentação legal, este trabalho irá considerar a igualdade material

como sinônimo de Eqüidade e assim, um princípio e valor constitucional.

Enquanto valor constitucional, a eqüidade é um importante instrumento na

garantia da cidadania e dignidade da pessoa humana. Conseqüentemente

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51

influenciará dentre outros direitos e garantias, os já citados direitos sociais, inclusive

no que tange a Saúde.

A eqüidade perpassa pelos diversos princípios e diretrizes do SUS. E traz

usualmente, implícita ou explicitamente, o conceito de acesso, pode-se assim

afirmar que esta palavra tem suportado diferentes usos: pela presença física de

equipamento e insumos, pela proximidade geográfica, aos profissionais, para todos,

aos níveis de complexidade, viável financeiramente, dentre outros. Quando tratado

em conjunto, Cohn denomina-o por acessibilidade (32)

A acessibilidade, portanto, não se reduz ao conceito de acesso pela proximidade, tal como destacam os documentos de políticas de saúde neste país, nem se traduz na concepção empobrecida de disponibilidade pela presença física dos recursos nas áreas onde existem. A acessibilidade formulada pela população usuária corresponde a relação funcional entre as „resistências‟ que são oferecidas pelos próprios serviços. (...) e o „poder de utilização‟ (...) por parte de quem é atendido e conforma o seu perfil de demanda.

O princípio da eqüidade pode ser expresso sob a ótica da integralidade no

qual é exigido do Estado a organização de uma rede de atenção à saúde que

garanta ao cidadão o acesso a todos os tipos de tratamentos, para todos os tipos de

doenças, em todos os níveis de sua evolução e em todos os níveis de atenção e de

complexidade do sistema, de que cada um necessite. Neste sentido, o acesso

integral equitativo deve ser pautado pelo princípio da necessidade da população

usuária.

A universalidade é outro aspecto do princípio da eqüidade. No SUS, a

universalidade é garantida pelo financiamento indireto na atenção à saúde, evitando-

se assim que, barreiras econômicas restrinjam seu uso. Entretanto, os custos

incorridos no consumo de serviços de saúde incluem também, aqueles de transporte

(inclusive para o acompanhante), de espera para o atendimento, de aquisição de

medicamento etc. Esses custos tendem a ser proporcionalmente maiores para os

grupos de menor renda, que geralmente vivem em áreas onde a disponibilidade de

serviços é menor, e carente de rede de apoio formal, dificultando o acesso. A

universalização pressupõe assim a efetivação da acessibilidade (32).

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52

A eqüidade também tem sido utilizada sob a dimensão da eficiência. A

Constituição orienta o mecanismo que deve ser utilizado para alcançar a eficiência

do Sistema que é a descentralização em uma rede regionalizada e hierarquizada. A

eficiência é um dos novos princípios recepcionado pela administração pública,

regida pela regra “da consecução do maior benefício com o menor custo possível”.

(21) O SUS terá suas ações e serviços hierarquizados, executados por instituições

pertencentes aos entes federativos (União, Estados, Distrito Federal e Municípios) e

por instituições privadas conveniadas ou contratadas pelo SUS, atendendo aos

diferentes níveis de complexidade e de atenção à saúde e, regionalizada,

compreendendo a noção de territorialidade (território-processo), não

necessariamente restrito à abrangência municipal, objetivando a resolução de

problemas e otimizando os recursos disponíveis. (34)

Em relação à otimização dos recursos disponíveis, se no princípio orientador

das definições de políticas de saúde, preponderar as reformas setoriais orientadas

por eficiência de recursos, incorre-se no risco do princípio da eqüidade ficar

subordinado à dimensão da eficiência e como conseqüência inverte-se os valores.

Vale ressaltar que o princípio da eficiência deve estar pautado pela garantia dos

direitos sociais e considerar as necessidades em saúde do cidadão como meta a ser

alcançada. Dois aspectos sobressaem na análise da eqüidade nesta dimensão para

Escorel: Focalização de políticas e distribuição de recursos financeiros;

Ao que se refere a eficiência em relação aos objetivos da descentralização,

pode-se observar uma dimensão voltada para a institucionalidade do Sistema de

Saúde que irá refletir num segundo aspecto sobre as instâncias decisórias na

implementação das políticas: O processo de descentralização real de poder e

autonomia para o nível local de regulação do sistema de saúde e sua conseqüente

responsabilização pelas condições de saúde e assistência aos munícipes; e o

processo decisório analisando a presença ou ausência de efetivo e representativo

controle social. (34)

Os conceitos de eqüidade em saúde

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53

As opções conceituais influenciam na escolha de critérios distributivos, nos

indicadores utilizados para avaliar o grau de eqüidade e na interpretação dos

resultados para efetividade das intervenções. (35)

Não existe uma única teoria de eqüidade, mas aquela socialmente aceita num

contexto histórico, econômico e cultural, refletindo os valores dominantes de cada

sociedade. Estes valores influenciam na formulação de políticas de saúde de

variadas formas na organização dos sistemas de saúde, sendo necessário então

definir os parâmetros e prioridades que regem as sociedades para então definir o

que se quer universalizar, o que se quer igualar, o quanto e para quem será

distribuído. (36)

No artigo eqüidade na gestão descentralizada do SUS, Lucchese adota como

ponto de partida para as novas definições do conceito de eqüidade em saúde, o

defendido por Whitehead no qual “todos deveriam ter a justa oportunidade de obter

seu pleno potencial de saúde e ninguém deveria ficar em desvantagem de alcançar

o seu potencial, se isso puder ser evitado.” (37)

O Center for Health Equity, Training, Research and Evaluation - CHETRE

apresenta sua síntese conceitual também a partir da definição de Whitehead, no

qual todos deveriam ter acesso aos recursos para suprir suas necessidades em

saúde, traz ainda que a diferença entre as pessoas não deva ser influenciada por

fatores além de seu controle; e que a iniqüidade afetas aos grupos quando ocorrem

diferenças nas condições de saúde, ou diferenças nas características sociais e

demográficas. “Essas diferenças são consideradas iníquas se elas ocorrem porque

as pessoas têm escolhas limitadas, acesso a mais ou menos recursos para saúde

ou exposição a fatores que afetam a saúde, resultantes de diferenças que

expressam desigualdades injustas”. (38)

Estas diferenças desnecessárias ou desigualdades injustas, também são

denominadas por Travassos como iniqüidades e podem ser compreendidas como:

“danos causados à saúde quando a liberdade de escolha de estilo de vida é restrita”,

concepção esta, também defendida por Duarte, Escorel, Luchese e Sen.

(32)(33)(35)(37)

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54

Torna-se necessário distinguir o termo diferença do termo diversidade.

Diversidades são fatores alheios a vontade humana, ou é o resultado de vontades

individuais. Já as diferenças, são referidas às questões éticas, morais e políticas,

assim, as diferenças indesejáveis são consideradas socialmente injustas e então

passíveis de intervenção de políticas públicas. Nesta perspectiva, o termo iniqüidade

não se aplica ao conceito de diversidade, o termo parece ser usado apenas ao que é

evitável, ou seja, iniqüidade é então considerada para as diferenças desnecessárias,

injustas e evitáveis. (40)

Fundamentado na obra de Rawls, Beauchamp & Childress discutem a regra

da “Oportunidade Equitativa”, como uma regra de distribuição social que objetiva

reduzir formas injustas de distribuição. Segundo a regra, deve ser oferecida a

pessoa uma chance equitativa na vida, sempre que suas “propriedades

desfavoráveis” não sejam de sua responsabilidade. Rawls se refere a “loteria

natural” e “loteria social”, nas quais todas as nossas habilidades e inabilidades são

originadas e que numa teoria de justiça social, a regra da oportunidade equitativa

deve ser usada para mitigar estes efeitos das loterias da vida. Desse modo, as

inabilidades que restrinjam a liberdade de escolha do estilo de vida devem ser

niveladas, quer pelos motivos de diferenças evitáveis (origem social), quanto pelas

“desvantagens desditosas” (origem biológica). (36)

Assim, mais do que concordar, que a eqüidade requer uma redistribuição de

recursos, cabe questionar os critérios desta redistribuição, sob quais princípios e em

qual teoria de justiça distributiva ela estará fundamentada.

A Justiça distributiva se refere a uma “distribuição justa, equitativa e

apropriada no interior da sociedade, determinada por normas justificadas que

estruturam os termos da cooperação social”. (36) Deve ser baseada em princípios,

que são:

Princípio da justiça formal – Fundamentada em Aristóteles que conceitua a

justiça como: “iguais devem ser tratados de modo igual, e não-iguais devem ser

tratados de modo não-igual”. É um princípio formal, pois não oferece parâmetros de

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55

igualdade, diferente do princípio de justiça material que explicita, especifica e refina

os critérios relevantes a serem utilizados.

Princípio da Justiça material - Os principais princípios são: “a todas as

pessoas uma parte igual”; “a cada um segundo a sua necessidade”, “a cada um de

acordo com seu esforço”; “a cada um de acordo com sua contribuição”; “a cada um

de acordo com seu merecimento”; “a cada um de acordo com as trocas do livre

mercado”.

Estes princípios podem ser usados no contexto de diversas políticas públicas

e não necessariamente serem antagônicas. Na seguridade social brasileira, inserida

nela a saúde, estão presentes alguns princípios: na Previdência social é usado o da

“contribuição”, na Saúde “a todos uma parte igual” e na Assistência social “a cada

um segundo a sua necessidade.”

Turner diferencia quatro tipos de eqüidade: ontológica, de oportunidade, de

condições e de resultados. (39)

A eqüidade ontológica é inerente aos seres humanos, refere-se à igualdade

fundamental entre as pessoas. Varia de abordagens religiosas, passando por

correntes filosóficas.

A eqüidade de oportunidades compõe os princípios das doutrinas liberais,

está na base da teoria social da meritocracia. Considera que dado um mesmo

patamar de direitos (à vida, liberdade e a propriedade), o acesso a posições na

estrutura ocupacional da sociedade, resulta na competição entre os indivíduos,

preenchida apenas pelo mérito pessoal;

O terceiro tipo é o de eqüidade de condições, segundo Turner, as

oportunidades iguais começam no ponto de partida, “apenas pessoas submetidas às

mesmas condições de vida podem vir a ser consideradas „em igualdade' para

competir com base em habilidades e méritos individuais”. Esta concepção mais

completa e complexa, dificilmente é alcançada sem significativa alteração no modelo

econômico. Apenas a mudança no modelo social não seria capaz de alterar os

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56

aspectos estruturais na determinação do grau de mobilidade entre as diferentes

classes sociais.

A eqüidade dos efeitos ou resultados é o quarto tipo e neste envolve

mudanças nos critérios de distribuição para transformação das desigualdades de

início em igualdade de conclusão. As medidas políticas ou legislação procuram

compensar os efeitos das desigualdades de condições sociais. A discriminação

positiva age em favor de grupos menos privilegiados aumentando suas

oportunidades e assegurando a eqüidade nos resultados.

Segundo Duarte (39), como os significados mais comuns atribuídos a

eqüidade “são variáveis das expressões „igualdade de acesso‟ e „tratamentos iguais

para as mesmas necessidades‟”, ocupa lugar de destaque nos propósitos das

políticas de saúde, a definição adotada por Turner que coincide com a de “eqüidade

de oportunidades”. A autora afirma que:

A concepção que decorre a partir desta leitura é a de que a cobertura universal dos serviços e a não discriminação de acesso aos recursos de diagnóstico e tratamento, caracterizam um sistema de saúde eqüitativo. Os dois últimos tipos de eqüidade propostos por Turner são desconsiderados.

Contudo, ao confrontar estes tipos de eqüidade propostos por Turner à norma

maior, pode-se perceber que a CF/88 parte sim de um conceito formal de igualdade

refletindo na eqüidade de oportunidade, mas para além deste, existe uma

intencionalidade do constituinte, também expressa, em erradicar a pobreza e reduzir

as desigualdades pelos ditames da justiça social, tentando alcançar a eqüidade de

condições, mas efetivamente só consegue mitigar os efeitos das desigualdades

através de políticas que tentem garantir eqüidade nos resultados.

Este contexto é decorrente do momento em que a constituição cidadã foi

gestada e reflete a correlação de forças na disputa de poderes daquele momento

histórico. Por mais avanço que tenha havido em relação aos direitos sociais, o

avanço referente à ordem econômica ainda não fora suficiente para imprimir uma

mudança estrutural na sociedade brasileira. Desta forma, aqueles que não se

sobressaem pelos seus méritos ou esforços, ficam sujeitos às políticas de

discriminação positiva.

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57

Para orientar a operacionalização de ações voltadas à eqüidade, Lucchese

(37) indica a “perspectiva da capacidade” desenvolvida por Sen, no esforço de

responder a indagação: “está se buscando igualdade de quê?” Ele considera que

conceitos de pobreza e de grupos vulneráveis não podem ter em vista apenas os

rendimentos econômicos, mas considerar pobreza como privação de capacidades.

Para Amartya Sen,

a adequação dos meios econômicos não pode ser julgada independentemente da real possibilidade de “converter” rendimentos e recursos em capacidades”. (...) Rendimentos adequados para fugir da pobreza variam com as características pessoais e das circunstâncias”. (...) “Possuir rendimentos inadequados não é um caso de ter rendas abaixo de uma dada linha de pobreza e sim de ter rendas abaixo do que é adequado para gerar níveis específicos de capacidades para o indivíduo em questão.

A proposta é que para além de elaborar políticas eqüitativas voltadas para os

grupos economicamente mais vulneráveis sob a ótica financeira, seja realizado um

diagnóstico da pobreza como privação de capacidades para então conseguir

alcançar a real necessidade de cada um a cada momento. Assim é preponderante

considerar que não apenas a situação econômica interfere nas iniqüidades, mas

também as oportunidades de escolhas que o indivíduo tem (ou não) de influenciar

seu estado de saúde ou a situação em que vive, ou seja, suas necessidades. (34)

Para Travassos (35), é importante distinguir o conceito de eqüidade em

saúde do conceito de eqüidade no uso ou no consumo de serviços de saúde.

No que se refere à eqüidade em saúde, sabe-se que existe uma forte

correlação entre indicadores sanitários e renda per capita e do nível educacional.

Estudos evidenciam que indivíduos socialmente menos privilegiados tendem a

adoecer mais precocemente.

Através dos dados sobre as condições de saúde da população pode-se

analisar a distribuição dos riscos de adoecer e morrer. Os vários perfis de doença

não se distribuem igualmente por todas as camadas populacionais. As variações

biológicas, até determinam diferenças nas suas formas de sofrer e adoecer, mas “a

maior parte das diferenças de condições de saúde são socialmente determinadas e

não decorrem de variações naturais, ou de livres escolhas pessoais por estilos de

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58

vida mais ou menos saudáveis”. Os grupos social e economicamente vulneráveis

acumulam a maior freqüência de distribuição de doenças nas diversas origens,

sejam as infecciosas, crônico-degenerativas ou por causas externas. A influência do

social no adoecer, resulta no fato de os grupos sociais apresentarem demandas

diversas aos diferentes serviços de saúde, tanto em termos de volume, tipo de

problema e nível de complexidade de acordo com suas necessidades em saúde.

Assim, as diferenças dos grupos social e economicamente mais vulneráveis

precisam ser consideradas na programação da oferta de serviços quando se busca

construir um sistema de saúde mais equânime. (33)

A conceitualização que Cecílio adota reconhece quatro conjuntos de

necessidades de saúde. O primeiro são as boas condições de vida, entendendo-se

que o modo como se vive traduz diferentes necessidades. O segundo conjunto diz

respeito ao acesso às tecnologias que melhoram ou prolongam a vida. É importante

destacar, nesse caso, que o valor de uso de cada tecnologia é determinado pela

necessidade de cada pessoa, em cada momento. O terceiro bloco refere-se à

criação de vínculos efetivos entre o usuário e o profissional ou equipe dos sistemas

de saúde. Vínculo deve ser entendido, nesse contexto, como uma relação contínua,

pessoal e calorosa. Por fim, necessidades de saúde estão ligadas também aos

graus crescentes de autonomia que cada pessoa tem no seu modo de conduzir a

vida, o que vai além da informação e da educação. (42)

O conceito de eqüidade no uso ou no consumo de serviços de saúde,

classificado por Travassos, refere-se à igualdade de acesso aos serviços de saúde e

é considerado por Turner como igualdade de oportunidade. Pode ser analisado a

partir de duas dimensões complementares: a geográfica e a social. A primeira diz

respeito às variações entre áreas ou intra-necessidades (eqüidade horizontal); a

segunda refere-se a variações entre grupos intra-áreas (eqüidade vertical). (35)

Dimensão Geográfica - analisa as possibilidades de consumo dos serviços de

saúde de diferentes graus de complexidade por indivíduos com “iguais necessidades

de saúde”. Neste caso adota-se o conceito de eqüidade horizontal, mantendo as

desigualdades existentes previamente à entrada no sistema, compara a utilização de

serviços de saúde entre áreas geográficas e pode ser mensurada a partir da análise

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59

de taxas de utilização entre regiões/estados/municípios. As variações geográficas

refletem a capacidade local de financiamento, o tamanho e a complexidade da rede

de serviços, assim como, a pluralidade do atual sistema de saúde e a capacidade de

compra de serviços de saúde das populações locais. Variações nessas taxas

expressam desigualdades geográficas, mas não necessariamente as sociais. (35)

(43)

Dimensão Social - analisa as possibilidades de consumo dos serviços de

saúde entre os diferentes grupos sociais. Neste caso adota-se o conceito de

eqüidade vertical, pois o tratamento é desigual para grupos sociais com

necessidades distintas dentro de uma mesma região. Reflete o caráter seletivo do

sistema de saúde, pois a organização local desses serviços impacta diretamente o

perfil de desigualdades entre estes grupos. A desigualdade encontrada é decorrente

de uma estrutura plural, fragmentada e geradora de seletividade na oferta dos

serviços, provocando um padrão de uso desigual. As variações existentes nos

sistemas de saúde locais podem reduzir ou ampliar essas desigualdades.

A análise do uso e do consumo dos serviços de saúde, em geral é feita por

tipo (centros de saúde, ambulatórios especializados, policlínicas, hospitais de

emergência) segundo a distribuição geográfica e/ou segundo a distribuição social

(quintis de renda). (43)

Considerando estas duas dimensões, pode-se pressupor que uma

distribuição mais equânime de recursos financeiros na saúde entre regiões, apesar

de vir a reduzir as desigualdades geográficas na utilização de serviços de saúde e

ampliar equitativamente o acesso, não é condição suficiente para alterar as

desigualdades sociais (intra-regiões). Para a autora, pode não só não as alterar,

como, eventualmente, vir a aumentá-las, caso não se acompanhe de medidas

reguladoras voltadas para eqüidade. “Destaca-se, assim, a fundamental importância

do desenho do modelo assistencial local para a redução das desigualdades sociais

na utilização de serviços de saúde.” (35)

O presente estudo tem o objetivo de analisar o acesso ao transplante renal no

Estado do Rio de Janeiro, sob a ótica da eqüidade.

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60

MATERIAL E MÉTODOS

Foi realizado levantamento de dados demográficos, e da oferta dos serviços

de saúde à pessoa portadora de insuficiência renal crônica do estado, através de

consultas a bancos de dados da Central de Transplantes do Rio de Janeiro, Central

de Regulação da Secretaria de Estado de Saúde e Defesa Civil, DATASUS, Tribunal

de Contas União e ABTO.

No trabalho de campo, foram analisados 55 prontuários de doadores de rim,

de janeiro a dezembro de 2008, da Central de Transplantes do Rio de Janeiro. As

informações dos potenciais receptores selecionados ao transplante renal foram

coletadas dos prontuários e colocadas em uma planilha do Microsoft Excell®. Foram

excluídos os prontuários dos doadores oriundos de outra unidade da federação e os

de doações ocorridas no Estado do Rio de Janeiro com receptores de outra unidade

da federação.

Foram coletadas as seguintes informações dos transplantados: Número de

registro do doador e do receptor de órgãos e tecidos para transplante no Sistema

Nacional de Transplante; a data em que o transplante foi realizado, data de diálise e

de inscrição para transplante; iniciais do nome, sexo e idade; instituição hospitalar

autorizada pelo SNT para realizar transplante onde o procedimento aconteceu e

onde o transplantado se inscreveu; município de diálise e de residência; PRA, re-

transplante, doença base; tempo de espera em lista para transplante. E as seguintes

informações dos não-transplantados: posição em que o potencial receptor ocupa na

listagem gerada a partir de cada doador efetivo e motivo alegado pelo potencial

receptor ou equipe transplantadora para a não realização do transplante.

Os motivos alegados para a não realização do transplante seguiram a

seguinte classificação: soro vencido (sim ou não); localização dos potenciais

receptores por contato telefônico (sim ou não); condições clínicas adequadas (sim

ou não); realização de exames pré-transplante (não realizado, incompleto ou

vencido); crossmatch (positivo ou negativo); contra indicação alegada pela equipe

transplantadora (sorologia positiva, isquemia prolongada ou incompatibilidade

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61

antropométrica), não informado e outros motivos (óbito, transplantado, não quer

transplantar ou não compareceu a seleção).

RESULTADOS E DISCUSSÕES

O processo seletivo para o transplante renal com doador falecido

Toda pessoa portadora de insuficiência renal crônica em tratamento dialítico e

sem contra-indicações clínicas tem o direito a se inscrever no Sistema de Lista Única

para transplante de rim da CNCDO local (6). Para isso deve procurar um hospital

transplantador credenciado ao SNT que encaminhará o paciente à CNCDO local

para efetivar sua inscrição. Neste momento o paciente receberá um número de

Registro (RGCT) vinculado ao Sistema informatizado do SNT, tornando-se assim um

potencial receptor. Assim, toda pessoa com número de RGCT está legalmente

inscrita no Cadastro Técnico Único (CTU) ou “Lista de Espera” de transplante com

doador falecido (10).

a) Critério de alocação e o Sistema de pontuação para o transplante de rim

com doador falecido

O Sistema de Lista Única foi previsto na Lei nº 9.434, de 4 de fevereiro de

1997, preconizado no Decreto nº 2.268, de 30 de junho de 1997e na Portaria nº

3.407/GM, de 5 de agosto de 1998, mas foi após a publicação da Portaria nº 783/GM

de 12 de abril de 2006, que dispõe sobre a obrigatoriedade de uso do sistema

informatizado do SNT para informações sobre doação e transplante e para o

gerenciamento da lista de espera que o critério de alocação de transplante renal

passa a ser o de compatibilidade HLA (antígenos leucocitários humanos). (8) (10)

Até julho de 2006, a seleção de potenciais receptores para transplante de rim

era baseada no tempo de espera em lista, ou seja, a posição dos candidatos estava

diretamente relacionada ao tempo decorrido da data de inscrição no Sistema de

Lista Única. Outros critérios excludentes e de classificação também eram

considerados e, se atendidos, legitimavam o candidato inscrito há mais tempo a

transplantar primeiro.

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62

Em cumprimento à Portaria nº 783/2006, a partir de julho do mesmo ano, o

sistema de Lista Única passou a ser operacionalizado pelo software do SNT (versão

5.0) que contém os dados de todos os inscritos na Lista de Espera (8). Este

Programa recebe as notificações de morte encefálica, seleciona os potenciais

receptores para os órgãos de um determinado doador, obedecendo aos critérios

definidos pela norma vigente.

Para fins de transplante de rim, a seleção de potenciais receptores será

processada mediante identidade ABO e por exame de histocompatibilidade,

avaliadas as incompatibilidades no sistema HLA entre doador e receptor. (5)

O critério de seleção passa então a ser o de compatibilidade HLA, ou seja,

não existe mais uma posição pré-determinada, agora quaisquer das 3.466 pessoas

inscritas na lista única para transplante de rim com doador falecido pode ser

potencialmente a próxima a transplantar.

O sistema de pontuação define a listagem gerada pelo Sistema 5.0 no caso

concreto de um doador específico, exerce assim, um papel de seleção gerando um

processo de exclusão mais amplo, no qual estão inseridas as regras do critério de

alocação. Nesta etapa pode-se identificar três dimensões, a técnica, a legal e a

ética.

Sob a dimensão técnica o software é programado para excluir potenciais

receptores com sistema ABO diferente do doador e filtrar dentre os que têm mesmo

grupo sanguíneo, os que se encontram com o status ativo, para então pontuá-los

segundo número de incompatibilidades, conforme legislação em vigor. Ainda nesta

dimensão o sistema pontua potenciais receptores em prioridade para transplante, o

tempo de inscrição no Cadastro Técnico Único e os que têm o PRA alto.

Contudo, apesar da legislação ser clara sobre o critério de alocação a ser

usado e pretender ser justa ao prever critérios excludentes, de classificação e de

urgência, a legislação na época da pesquisa era incompleta por não atribuir os

pesos relacionados a cada critério, publicados em Portaria ou outro instrumento

legal de publicidade, fazendo com que a dimensão legal também mereça ser

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63

analisada, ou seja, não fica explícito nem na norma, tão pouco o SNT ou DATASUS

disponibiliza a informação em site, prejudicando assim a efetivação do princípio

constitucional do controle social. (6) (44)

Com a publicação da portaria nº 2600/09 contempla-se então este quesito,

tornando-se de conhecimento público não apenas o critério de alocação para o

transplante de rim, mas discrimina cada item considerado para pontuação e o peso

que cada item tem, explicitando ainda os critérios de exclusão, desempate, e

tratando de assuntos como pontuação para criança e adolescentes e transplante em

pessoas com função renal agravada, mas que ainda não estejam em programa de

terapia renal substitutiva (transplante preemptivo). (5)

Outro aspecto legal que deve ser considerado é que tanto a portaria nº

3407/98, quanto a atual 2600/09 admite que os Estados definam critérios

diferenciados na alocação dos órgãos, o que fez com que o Estado de São Paulo já

antes de 2009 utilizasse sistema próprio com critérios diferenciados, como por

exemplo, criar pontuação para o receptor menor de 18 anos quando o doador

também fosse menor de 18 anos. (44) Apesar de ser um exemplo positivo, tanto que

a Portaria vem depois de três anos corrigir este equívoco, deve-se ter atenção a este

tipo de permissão, pois se o cadastro técnico único é nacional, a sociedade, e nesta

os potenciais receptores, acredita disputar a chance do transplante, pelo menos em

igualdade de oportunidade em todo o território nacional, apesar das evidentes

diferenças regionais.

Cabe considerar que tanto a ausência de norma de conhecimento público,

quanto a existência desta permitindo diferenças regionais, implicam no

enfraquecimento de estudos estatísticos e análises sobre a equidade de acesso ao

transplante no Brasil. (44)

Sob a dimensão ética há de se analisar as opções tomadas pelo Sistema

Nacional de Transplante na escolha desta pontuação, ou seja, a partir da dimensão

técnica adotada, que peso foi dado em cada item considerado para pontuação.

Pode-se constatar, por exemplo, que a nova Portaria manteve a mesma pontuação

para o HLA e PRA, mas agora pontua diabéticos, doador inter-vivo e define as

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64

regras para o transplante preemptivo. É através do critério de seleção e seu sistema

de pontuação que se define a população usuária que terá mais ou menos chance de

transplantar.

b) Estar apto para o transplante

Além do critério de alocação, existem alguns quesitos que necessitam ser

atendidos para que a pessoa já inscrita também consiga concorrer ao transplante no

momento da avaliação clínica e nas etapas que antecedem a cirurgia.

Não basta estar inscrito para se estar apto. Apenas é considerado apto, ou

seja, “ativo”, aquele potencial receptor que: a) esteja com a soroteca atualizada

(amostra do soro do receptor); b) com os exames para estudo de pré-transplante em

dia (avaliação clinico-laboratorial); c) seja localizado rapidamente via telefone, d)

encontre-se em condições de saúde básicas para se submeter a uma cirurgia de alto

risco; e) consiga comparecer em tempo hábil para a avaliação clínica que precede

os instantes da cirurgia. Além destes, também são considerados os resultados do

crossmacth2, PRA, do grupo sanguíneo e do HLA como fatores excludentes de um

candidato a transplante renal.

Isto quer dizer que os inscritos que não estejam com status “ativo”, estarão

categorizados como “semi-ativo” (afastados temporariamente) ou “removido”

(afastado definitivamente). Os semi-ativos são os potenciais receptores que foram

afastados temporariamente, devido às condições clínico-laboratorial, por suspensão

da equipe, ou perda de seguimento. Os removidos são aqueles que se encontram

no cadastro técnico único, mas que foram afastados defnitivamente em virtude de

óbito, transplante, contra-indicação absoluta, desistência, abandono de tratamento

ou transferência para outra CNCDO. (5)

No ano de 2008 a Central de Transplante do Rio de Janeiro tinha em seus

registros 25% de potenciais receptores “ativos” e 75% “semi-ativos” inscritos em

Lista de Espera para transplante de rim com doador falecido.

2 Prova cruzada, exame que compara o nível de rejeição do sangue do doador com o do receptor.

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65

Uma vez aptos, os potenciais receptores eram classificados pela

compatibilidade HLA e se houvesse empate, os critérios de desempate eram: tempo

de espera em lista, idade, painel de reatividade (PRA)3 e urgência.

Para a definição se o paciente é apto ou não e seleção do(s) receptor(es)

renal(is), segue-se o seguinte fluxo4:

Após a notificação de Morte encefálica e da autorização familiar, o sangue do

doador era enviado para o HEMORIO, instituição responsável em realizar a

sorologia, e o HLA do doador;

Laboratório de Imunogenética do HEMORIO informa à Central de

Transplantes do Rio de Janeiro (CTRJ) o resultado do HLA do doador;

CTRJ digita o resultado no Programa “SNT 5.0”;

O Programa compara o HLA do doador com o dos potenciais receptores (PR)

e gera uma listagem nominal de pontuação em ordem decrescente;

CTRJ identifica os Potenciais Receptores (PRs) que estão com a soroteca

atualizada, os localiza por telefone para deixá-los de sobreaviso e verifica

alguns critérios de aptidão;

CTRJ envia listagem nominal com os 10 (dez) primeiros selecionados para o

Laboratório de Imunogenética realizar o crossmatch;

Laboratório de Imunogenética realiza o exame crossmath e envia o resultado

deste e do PRA para a CTRJ;

3 PRA – Avaliação laboratorial que “mede” o percentual de reatividade que há no organismo de cada pessoa, no

caso, potencial receptor, em relação a diversidade étnica, dado este que pode ser alterado a cada transfusão

sanguínea, re-transplante e gravidezes. 4 Fonte: Central de Transplante do Rio de Janeiro. Referente ao ano de 2008.

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66

CTRJ comunica ao Centro Transplantador (CTx) o nome dos PRs com

crossmatch negativo e avisa a estes, o local e horário da avaliação clínica

prévia ao implante;

Os PRs devem chegar no horário e local marcados para a avaliação da

equipe médica do CTx;

O CTx selecionará um ou dois candidato(s), conforme número de rins doados,

que atenda(m) aos critérios de aptidão respeitando o(s) que tenha(m) a

maior pontuação na Listagem do Sistema 5.0;

O CTx dispensará os demais não selecionados e, se necessário, justificará

por escrito à CTRJ, o motivo de não ter selecionado os 2 primeiros

candidatos listados no crossmatch.

Todo este processo deve acontecer dentro do período de isquemia do órgão,

que é o tempo em que o sangue deixa de perfundir o órgão do doador até a hora em

que se implanta cirurgicamente no receptor. No caso do rim, o limite de tempo ideal

é de até 24 horas, podendo ser estendido até 36 horas (45).

Nesta diversidade de etapas a serem cumpridas podemos observar muitos

entraves para o pleno funcionamento do Programa de Transplantes e o baixo

número de doadores efetivos não é o único impeditivo para realização de transplante

de rim com doador falecido no Brasil. Na análise sobre o acesso ao transplante de

rim no Brasil deve-se considerar não apenas o número de órgãos ofertados, mas as

condições em que se encontra o potencial receptor enquanto aguarda ser

beneficiado.

Dos prontuários analisados foram identificados cinqüenta e cinco doadores de

rins que beneficiaram noventa e seis receptores no Estado do Rio de Janeiro.

Foi possível constatar com os dados a seguir que não basta ser um potencial

receptor com maior pontuação na seleção pela compatibilidade HLA para conseguir

transplantar, este deverá reunir condições sob diferentes aspectos, sendo

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67

justamente nesta fase (pré-transplante) que se encontram os maiores problemas. Os

principais motivos de não estar apto para receber o transplante foram categorizados

e serão analisados conforme as etapas de exclusão do processo de seleção que o

potencial receptor passa até ser transplantado.

Considerando os números da CTRJ, dos 3466 potenciais receptores inscritos,

uma média de 870 conseguiram participar deste processo seletivo, já que os demais

estavam afastados temporariamente. Diante de um doador específico, dentre os 870

que é o somatório de todos os grupos sanguíneos, exclui-se os potenciais

receptores sem identidade ABO e então o Sistema 5.0 “distribui” os órgãos ao gerar

a listagem dos mais pontuados. A partir desta listagem dá-se início a 1ª etapa do

processo de seleção do candidato a transplante de rim.

Etapas para a realização do transplante

1ª Etapa – Listagem dos mais pontuados (verificação da exclusão por

Soro Vencido)

É nesta etapa que o software emitirá a relação nominal dos mais

pontuados e a CTRJ terá acesso ao nome de quem deverá transplantar. Nesta

listagem consta dentre outras informações o RGCT do potencial receptor, o Centro

transplantador a que está vinculado, sua pontuação, classificação e a data do último

soro.

É partir da informação sobre a data do último soro que se identifica aqueles

que serão excluídos pelo motivo “soro vencido”. Ao identificar esta informação, a

equipe de plantão deve excluir este potencial receptor do processo de seleção já

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68

que o sangue deste, não poderá ser submetido ao crossmatch (exame de prova

cruzada).

O “soro vencido” foi o principal motivo identificado para a não realização do

transplante no ano de 2008, 635 pessoas deixaram de transplantar por, no momento

do ranking, estar com o soro vencido. Das 954 pessoas que perderam a

oportunidade de transplantar no referido ano, este item representou 66,6% do total

dentre todos os motivos identificados. Cabe considerar que esse número é

superestimado, pois o mesmo candidato pode ser chamado mais de uma vez em

situações de compatibilidade com diversos doadores do mesmo grupo sanguíneo.

Gráfico 1 – Distribuição dos indivíduos quanto ao motivo soro vencido

Dois exames são fundamentais para a realização do transplante: o

crossmatch (prova cruzada) e a reatividade de anticorpos contra painel (PRA). O

primeiro é um exame realizado entre o sangue do doador e do Potencial Receptor

para constatar o risco de rejeição crônica, quando o resultado é negativo significa

que este risco é controlado e quando o resultado é positivo significa que o risco de

rejeição é aumentado. Neste caso a possibilidade de reversão de rejeição é quase

nula e é um fator clínico previsível na literatura da área médica. O segundo exame é

o PRA que avalia a probabilidade do paciente encontrar doador contra o qual

apresente crossmatch positivo em dada população, evitando assim que haja

transplante com doador que possua antígenos contra os quais o receptor já

apresenta anticorpos. Juntos estes testes de histocompatibilidade previnem a

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69

rejeição hiper aguda nas primeiras 48 horas e diminuem o risco de rejeição aguda

ou acelerada na primeira semana após o transplante. (46)

Estes exames são realizados a partir da amostra do soro coletado a cada 90

dias ou 15 dias após transfusão sanguínea, em todo potencial receptor para

transplante renal. A não atualização do soro implica na veracidade do resultado

influenciando a qualidade do exame.

A coleta e processamento do sangue (soro) necessário para realizar o PRA e

o Crossmatch é realizado pelo HEMORIO, instituição pública, de qualidade

reconhecida, que funciona diariamente atendendo os potenciais receptores de

transplante de rim com doador falecido (de 2ª a 5ª feira, das 10 às 12h) e consegue

atender toda a demanda da Lista Única. Apesar de não haver nenhuma pesquisa

com dados sobre os principais motivos de falta no comparecimento trimestral ao

HEMORIO pelo Potencial Receptor, podem-se elencar algumas hipóteses. Se

considerar que apenas um único local realiza coleta e processamento do sangue

dos Potenciais Receptores provenientes das diversas regiões do Estado do Rio e

que este deslocamento muitas vezes distante e carente de meios de transporte

disponíveis e gratuitos tem que ser feito a cada três meses, há de se considerar que

a universalidade de acesso fique comprometida. Outro fator relacionado a

organização do serviço é o horário de funcionamento que devido a restrição pode se

transformar numa barreira de acesso. Somam a este, o fato de que ainda está

relativamente recente a mudança do modelo e a socialização da informação pode

não estar ocorrendo de forma eficaz, além destes a de se considerar o fato de que

esta população usuária, freqüentemente vive momentos de indisposição e de co-

morbidades, características da insuficiência renal crônica.

Os prejuízos sócio-econômicos e as condições clínicas desta população

usuária não são exclusivos ao Estado do Rio de Janeiro, e legislação vigente já

apresenta alternativa de enfrentamento deste problema responsabilizando os

centros de diálise no envio periódico do soro de seus pacientes inscritos no

Cadastro Técnico Único para transplante ao laboratório de histocompatibilidade a ele

referenciado. Conforme disposto na resolução em vigor - RDC nº 154, de 15 de

junho de 2004, (47)

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70

4.6.3 O serviço de diálise deve encaminhar formalmente o paciente, acompanhado do relatório médico atualizado, ao estabelecimento e equipe escolhidos para realização do transplante, comprometendo-se a encaminhar, trimestralmente,amostras do soro coletado, além de informar a situação clínica e o status em lista de espera.

À exceção de algumas clínicas de diálise como as de Campos, que enviam

periodicamente o sangue da região, esporadicamente mais três centros de diálise do

interior do Estado encaminhavam o soro de seus pacientes. Assim os mais de

noventa centros de diálise, das diversas naturezas de gestão com muito ou poucos

inscritos, não cumpre a referida resolução.

Não se pode ignorar que o cumprimento da RDC nº 154/2004 resolveria a

grande parte dos motivos de exclusão ao transplante que é o soro vencido, mas

existem questões técnicas que terão que ser discutidas em outro momento que é a

qualidade da amostra que chegará ao laboratório de histocompatibilidade, já que a

má conservação desta amostra pode comprometer o resultado tanto do PRA quanto

do crossmatch. No Brasil, estados com alto número de potenciais receptores em

Lista de Espera como o de São Paulo conseguiram transpor as dificuldades técnicas

e de resistência dos centros de diálise no envio do soro, fazendo do cumprimento da

RDC rotina na coleta da amostra do soro.

Nesta etapa, o princípio da equidade pode ser analisado sob a ótica tanto da

eficiência quanto sob o da universalidade. A “gratuidade” necessária para a

efetivação da universalidade deve ser observada para que as barreiras econômicas

não restrinjam o seu uso, neste sentido, o custo com locomoção, tempo de espera

para atendimento e para o deslocamento, devem ser considerados no planejamento

de serviços voltados a atender a necessidade da população usuária dos serviços de

transplante.

Cohn atenta para o fato de que a disponibilidade pela presença física de um

serviço, não é o único fator que deva ser considerado, mas também o poder de

utilização que o usuário dispõe, a legitimidade do fluxo de referência com seus

horários e rotinas e as resistências que são oferecidas pelos próprios serviços. (32)

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71

Durante o recadastramento de transplante renal realizado pela Central de

Transplante do Rio de Janeiro, entre os meses de setembro a novembro do referido

ano, os potenciais receptores com status ativo foram convocados a comparecer ao

núcleo de recadastramento instalado no HEMORIO para atualização da soroteca,

atualização dos dados cadastrais e para participar de palestra informativa sobre a

lista de espera e a importância de manterem-se com status ativo para conseguir

transplantar. No momento da palestra foi possível identificar algumas das

dificuldades vivenciadas pelos potenciais receptores e seus familiares e dentre as

questões referentes a esta etapa de exclusão, estão os relatos dos que residem em

municípios distante da capital do Estado, certo grupo registrou durante a palestra

que para conseguir comparecer ao recadastramento sendo transportados por

veículo do município, precisaram embarcar as vinte e três horas do dia anterior,

junto com alguns outros munícipes portadores de outras patologias e que

provavelmente só chegariam às suas residências ao anoitecer. Apesar do transporte

ter sido disponibilizado pelo município, o que não é usual, o custo com as refeições

necessárias seriam custeadas pelos próprios pacientes. Cabe considerar que esta

população usuária tem restrições alimentares fazendo com que o custo não seja o

único fator limitador de uma refeição adequada às necessidades deste grupo. Como

realizar 3 a 4 refeições fora de casa durante um dia sem uma estrutura mínima

adequada?

Assim, os custos tendem a ser proporcionalmente maiores para quem reside

distante dos serviços de saúde, como também para os grupos de menor renda,

grupo este que freqüentemente é duplamente vitimado, primeiro por ter renda abaixo

do necessário para gerir suas necessidades em saúde e segundo por geralmente

residir em locais com pouca disponibilidade de serviços de saúde e carente de apoio

formal, o que demanda maior dependência de rede social de apoio.

Sob a ótica da eficiência a Constituição aponta para a descentralização do

SUS em uma rede regionalizada e hierarquizada, assim ao se apropriar deste

mecanismo de eficiência, os Hemonúcleos poderiam ser utilizados como ponto de

coleta regionalizado, fazendo com que a distribuição geográfica no uso e no

consumo dos serviços de saúde não venha determinar desigualdades evitáveis.

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72

2ª Etapa – Contato com os potenciais receptores (momento pré-

crossmatch)

Após a exclusão dos que estavam com o soro vencido inicia-se a etapa de

contato telefônico com os potenciais receptores classificados. Os números são

informados pelos próprios pacientes ou seus representantes legais na época da

inscrição e devem ser atualizados a qualquer momento em caso de alteração.

Entretanto não é incomum identificar problemas através deste meio de

comunicação, apesar de atualmente ser a forma mais efetiva de contato em curto

espaço de tempo.

Os principais problemas identificados nesta etapa foram à existência de

números desatualizados, ou errados, telefones atendidos por pessoa que

desconhece o potencial receptor, celular que não completa chamada ou que está

fora da área de cobertura, além do número de conhecidos que não se prontificam

em dar recado.

Dentre os que não estavam com o “soro vencido”, foi tentado contato com

318 potenciais receptores, mas destes 62 apresentaram algum dos problemas acima

elencados. O motivo “não contatado” representou 20% dentre os que não estavam

com o “soro vencido” e 7% dentre todos os motivos identificados de exclusão para o

transplante.

Gráfico 2 - Distribuição dos indivíduos quanto à localização por contato telefônico

Esta etapa traz diversas implicações que merecem ser consideradas:

256 (80%)

62 (20%)

Contatados

Não contatados

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73

a) Quem faz o contato telefônico

No Estado do Rio de Janeiro historicamente quem faz o contato com o

potencial receptor de transplante renal é a CNCDO. É esta quem tenta contato com

a rede social de apoio como o centro de diálise em situações de insucesso com os

números fornecidos. Situação esta bastante limitada por legalmente não ser

atribuição desta instituição. Apesar da legislação em vigor não proibir esta prática, a

responsabilidade pelo contato com seu paciente é da equipe transplantadora. No

caso dos demais órgãos e tecidos, quem faz este contato é a equipe

transplantadora. Assim como nos demais Estados da federação o potencial receptor

de rim é responsabilidade do Centro transplantador que o inscreve.

Estas situações dificilmente acontecem nos serviços de Campos, pois quando

um Potencial Receptor é selecionado, os médicos responsáveis pelas duas equipes

da região são acionados e informam à CTRJ se este está preparado e se

responsabilizam pela comunicação ao seu paciente das etapas seguintes.

b) Acesso a este meio de comunicação

Este item traz um componente sócio-econômico quando é identificado que os

únicos números de contatos são os do Centro de diálise, pessoas conhecidas ou

associação de moradores. Cabe considerar que esta etapa não acontece

necessariamente em dias úteis ou horário comercial, exigindo que esta população

usuária tenha acesso aos meios de comunicação capazes de contatá-las inclusive

nos finais de semana e madrugada.

c) Tempo destinado a esta etapa

A necessidade de rápida localização explica-se pela importância do curto

tempo de isquemia fria que o órgão a ser implantado deve ter. Quanto maior for o

tempo despendido na localização do paciente, maior poderá ser o tempo de

definição de quem irá receber o(s) órgão(s) doado(s), podendo refletir no tempo de

isquemia fria e conseqüentemente na qualidade do enxerto implantado.

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74

d) A informação sobre o processo e a importância desta etapa

A socialização da informação sobre o processo não deve ser desconsiderado.

Sensibilizar esta população usuária sobre a importância desta etapa é tão

importante quanto orientá-la sobre os riscos e benefícios da cirurgia, já que o acesso

ao transplante depende também de conseguir informar que sua vez chegou.

Comunicar que tem um órgão compatível não é o único objetivo do contato

telefônico, é através deste contato que se obtém a informação sobre a atual

condição de saúde do potencial receptor e sobre a atualização de seus exames.

Assim, o contato telefônico tem também o objetivo de identificar 10 (dez) potenciais

receptores em que será realizado o exame de prova cruzada. O critério utilizado ao

telefone é perguntar se o potencial receptor se encontra com os exames em dia e se

atualmente encontra-se com algum problema de saúde que inviabilize o transplante.

As respostas recebidas neste contato geram uma nova etapa de exclusões, já

que nem todos os potenciais receptores “ativos” encontram-se em condições de

transplantar.

3ª Etapa – Contatados (Avaliação pré crossmatch)

Foram contatados duzentos e cinqüenta e sete potenciais receptores, destes,

cento e quinze passaram para a etapa seguinte e cento e quarenta e dois foram

excluídos nesta etapa. Após a exclusão dos “sem contato”, foram identificados os

seguintes motivos de exclusão ao transplante.

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75

Gráfico 3 – Distribuição dos indivíduos quanto aos motivos de exclusão na 3ª etapa

Sem exames – Potenciais Receptores que alegam ao telefone não ter

concluído a realização de exames pré-transplante solicitados pela Equipe

Transplantadora, os que nunca realizaram exames ou os que apresentam exames

desatualizados.

Este motivo representou nesta etapa 8,5% (12) dos motivos identificados.

Segundo Castro, é uma temeridade submeter alguém a cirurgia sem avaliação pré-

transplante adequada, sendo recomendado o estudo e preparo pré-transplante feito

pela equipe transplantadora com revalidação ao menos anual. “Não raro, problemas

como tumores, obstruções coronarianas severas, infecções crônicas, graves, são

detectados no momento do estudo pré-transplante.” (2)

A legislação não era clara sobre a responsabilidade institucional na realização

de exames para estudo pré-transplante. Havia um consenso tácito de que o hospital

transplantador deveria absorver a demanda de exames ao inscrever o Potencial

Receptor. Por outro lado, há os profissionais de saúde e gestores hospitalares que

defendiam que qualquer instituição pública ou conveniada ao SUS poderia realizar

estes exames, responsabilizando assim os municípios na absorção desta demanda.

No que se refere a regionalização e hierarquização dos serviços, cabe aos

serviços de média complexidade as ações de saúde que demande a disponibilidade

de profissionais especializados e a utilização de recursos tecnológicos para o apoio

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76

diagnóstico e tratamento. Já a alta complexidade é composta por procedimentos que

envolvem alta tecnologia e alto custo. (18)

Em setembro de 2008 foi publicada Portaria GM/MS nº 2041 que dentre

outras estabelece remuneração na realização de exames para inclusão de pacientes

em lista de transplante. No ano seguinte a Portaria nº 2600/2009 ratifica o

pagamento dos exames necessários para a entrada em Lista de Espera, o que foi

um grande avanço, mas conforme demonstrado neste estudo, as pessoas não

conseguem transplantar antes do vencimento de seus exames sendo necessárias

na maior parte dos casos, diversas renovações e estas ainda não foram cobertas

pela nova Portaria. (5) (48)

No ano de 2008 tinham seis equipes cadastradas que realizavam este estudo

pré-transplante e absorviam mais de 95% da demanda. Destes, nem sempre todos

se encontravam em condições de realizar o transplante (implante), neste caso,

continuavam apenas no acompanhamento pré-operatório aos potenciais receptores.

Três estão localizados no município do Rio (HUPE, HGB, HUCCF), dois no

município de Campos (PRORIM, Hospital Municipal Álvaro Alvim) e um em Niterói

(HUAP).

Estes seis hospitais que antes da mudança do critério de alocação de rim, se

programavam para preparar os primeiros de cada grupo sangüíneo têm

semestralmente que: agendar consulta, realizar exames, remarcar a consulta para

avaliação dos resultados dos exames de cada paciente e não raramente encaminhar

para outros serviços, aqueles que apresentaram alteração nos resultados e, é claro,

acompanhá-los até a solução do problema. O resultado é que nem os Hospitais

transplantadores, nem as Equipes transplantadoras (vinculadas a estes hospitais)

têm conseguido atender a demanda. Como conseqüência, os potenciais receptores

que não conseguem ficar preparados são excluídos da seleção de transplante e a

alternativa que alguns poucos privilegiados encontraram, foi de recorrer à saúde

privada pelo menos para realização dos exames.

É sabido que em todos os níveis da assistência existem diversos problemas a

serem superados e que os problemas aqui apontados passam longe de ser

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77

exclusivos do transplante, sendo freqüentemente encontrados e denunciados no dia-

a-dia das ações e serviços de saúde pública e de saúde suplementar.

Entretanto no transplante, mais especificamente no que se refere aos

serviços de financiamento público, tem ficado evidente duas formas de organização

e financiamento.

Ambos os modelos tem propostas baseadas nos princípios do SUS apesar de

apresentarem forma de organização e de financiamento de maneira distinta. Os dois

têm prós e contras, mas um fator iguala os dois modelos, ambos não atendem as

necessidades da população usuária do transplante renal. Um tem fonte de

financiamento, mas não cobre todos os procedimentos e o outro cobre todos os

procedimentos, mas não pode extrapolar os tetos de financiamento, ou seja, há

restrição de uso em qualquer dos modelos, ou melhor, ambos não adequaram sua

forma de financiamento as exigências do atual critério de seleção para transplante

de rim. Como o financiamento não é o único entrave a um atendimento integral a

saúde, outros dilemas merecem ser discutidos.

Sem condições clínicas – Potenciais Receptores que deveriam ser afastados

temporariamente da Lista Única para tratamento de saúde e que não avisaram ao

Centro Transplantador ou que este não oficializou a informação a CNCDO.

Este motivo representou a principal causa de exclusão nesta etapa. Seus 27

relatos corresponderam a 19% dos casos de não-transplante dentre os que

conseguiram ser contatados. São relatadas situações de cirurgias pré-marcadas,

doenças diagnosticadas há poucos dias ou há alguns meses e até relatos de que

haviam sido excluídos em seleção anterior por motivo de saúde que ainda se

perpetuava nas seleções seguintes.

A ausência de condições clínicas para o transplante requer uma análise mais

aprofundada em que se consiga identificar quais os multifatores que permeiam este

motivo. Onde se encontra a dificuldade do usuário em comunicar seu atual estado

de saúde? Está na falta de agenda com sua equipe transplantadora ou na falta de

informação de que este dado é importante para o transplante? A falta de

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78

acompanhamento com intervalos menos longos pela equipe transplantadora tem

quais causas? Poucos profissionais disponíveis? Demanda institucional reprimida?

Usuários não comparecem na data marcada? Ausência de vínculo equipe-usuário?

Descrédito no transplante? Desculpa para não transplantar naquele dia?

Estas e tantas outras perguntas merecem ser feitas e investigadas. Cabe

considerar que os números encontrados neste motivo de não transplante não

contemplam as condições clínicas daqueles que estavam com o soro vencido e sem

contato telefônico, ou seja, também poderíamos nos perguntar qual é o estado de

saúde destes ativos com soro vencido que sequer foram contactados? Será que

este motivo perderia sua relevância ou reforçaria a importância de identificar o real

número de potenciais receptores “ativos” na lista única de transplante renal no

Estado do Rio de Janeiro?

Nesta etapa, o princípio da equidade pode ser analisado sob a ótica da

Integralidade, ou seja, pautado pelo conceito da necessidade da população usuária

e do cuidado em saúde.

Apesar da CF/88 remeter a integralidade, um conceito restrito a acesso (a

níveis de complexidade e atenção), ao princípio da Integralidade tem-se atribuído

diferentes sentidos, sendo usualmente referidos ao sistema de saúde, à organização

dos serviços e às práticas profissionais. Para que o transplante seja enxergado

como área de atenção à saúde que também precisa ser tratada sob ótica da

integralidade para alcançar a equidade é necessário desconstruir alguns

paradigmas.

É necessário desconstruir a idéia da atenção básica como lugar privilegiado

de práticas integrais, Cecílio afirma que a integralidade não pode ser realizada em

um único serviço, sendo necessário o acesso a todos os níveis de atenção “seja

porque as várias tecnologias em saúde para melhorar e prolongar a vida estão

distribuídas em uma ampla gama de serviços, seja porque a melhoria das condições

de vida é tarefa para um esforço intersetorial”. (42)

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79

Entretanto o que se observa é que o usuário tem que travar uma batalha

individual, fruto de um esforço pessoal, árduo e muitas das vezes desesperado para

ser atendido de forma fragmentada e desarticulada. É preciso então, que o sistema

esteja organizado para responder as demandas através de uma rede integrada.

Esta rede requer profissionais de saúde que compreendam e tratem a saúde

com uma abordagem biopsicosocial que permita ver além das demandas

espontâneas trazidas pelos indivíduos, buscando compreender o conjunto de

necessidades de ações e serviços de saúde que um usuário apresente explícita e

implicitamente. E ainda outras necessidades que não estão diretamente ligadas à

doença presente ou a um tratamento específico, neste caso o transplante, mas que

podem interferir no cuidado da mesma. O transplante é apenas uma das

modalidades terapêuticas da Insuficiência renal crônica e o mau funcionamento

renal não é o único problema vivido pelos portadores desta patologia, na maior parte

dos casos é resultado de uma hipertensão arterial ou diabetes não controlados,

doenças estas que não afetam apenas o rim, mas outros órgãos, trazendo diversas

co-morbidades a médio e longo prazos.

A gestão do sistema de saúde é outro aspecto a ser considerado com a

clássica dicotomia entre as ações de caráter individual/coletivo e curativo/preventivo.

A importante articulação entre estas ações traz resolutividade para o usuário.

Conhecer a necessidade da população que se atende pode fazer toda a diferença

para o adequado planejamento das demandas espontâneas e das reprimidas.

Neste sentido, o foco deve ser a população usuária e não a oferta de uma

terapia a uma patologia. Quando um serviço é organizado para ofertar determinado

tratamento sem ter como objetivo principal atender as necessidades do usuário, este

entra e sai dos serviços e suas necessidades de saúde continuam sendo

negligenciadas, sendo apenas tratada uma pequena parte de um todo que muitas

das vezes é conhecido.

Ao analisar a política nacional da pessoa com insuficiência renal crônica,

observa-se que existe a intenção de responsabilizar o Estado com intervenções

desde a atenção primária, com ações de baixa complexidade até chegar às

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80

modalidades de terapias de alta complexidade, entretanto quando o Estado

terceiriza, por exemplo, a diálise, este paga pelo material, o número de

procedimentos, o pacote de exames laboratoriais, mas não “paga” ou referencia os

diversos outros cuidados necessários a saúde integral da pessoa com insuficiência

renal crônica. Quem trata das repercussões cardíacas, do comprometimento ósseo,

do cuidado odontológico? (18)

Boa parte destes cuidados que são negligenciados por não ter fonte de

financiamento ou uma rede integrada conhecida de todos, vai refletir em motivo de

exclusão ao transplante. Algumas das conhecidas co-morbidades características da

IRC, são inclusive fator de exclusão de entrada na Lista de Espera quando estão em

estágio avançado, ou seja, por falta de um cuidado integral, tem usuários que sequer

conseguem dispor de seu poder de escolha ao transplante. (49)

Outro fator interessante de se observar nesta Política é que pouco se define

sobre o transplante enquanto modalidade terapêutica da IRC, talvez por pressupor

que o assunto vá ser discutido na Política Nacional de Transplante, mas esta

também só trata do transplante de rim sob a lógica dos procedimentos e não sob a

lógica da atenção aos usuários e então, fragmentada e desconexa não apenas da

necessidade em saúde deste grupo, como da própria rede prestadora de serviços.

Apesar de problemas odontológicos serem motivo de exclusão na seleção para

transplante, não tem código de procedimento para financiamento e os serviços não

são organizados para referenciar dentista para renal crônico. (18)

Conforme Mattos, (50)

“não é aceitável que os serviços de saúde estejam

organizados exclusivamente para responder às doenças de uma população, embora eles devam responder tais doenças. Os serviços devem estar organizados para realizar uma apreensão ampliada das necessidades da população ao qual atendem.”

Contra-indicações pela equipe transplantadora – Os motivos categorizados

neste item não se referem especificamente a problemas de saúde do potencial

receptor, mas a condições administrativas da equipe ou do hospital em realizar o

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transplante, ou relacionados a fatores circunstanciais de uma doação como a

incompatibilidade antropométrica entre doador e receptor ou o tempo de isquemia

prolongada agravada pelo fator geográfico, ou ainda resultado de sorologia positiva

no doador em receptor com o mesmo marcador viral negativo.

Em relação a questões administrativas foram identificadas situações como

não renovação da documentação necessária ao recredenciamento do centro e/ou

equipe transplantador, ausência de material cirúrgico ou disponibilidade de centro

cirúrgico/leito disponíveis para a cirurgia ou pós-operatório.

Em relação aos demais fatores, a equipe contra indicou o transplante por

incompatibilidade entre peso e altura nos casos em que o doador era criança

fazendo necessário que o transplante fosse em bloco (implantar os dois rins num

único receptor). Esta causa de não transplante poderia ser resolvida se o próprio

sistema informatizado – SNT versão 5.0 - contemplasse no ranking um filtro, ou seja,

assim como tem um filtro para o sistema ABO, também deveria ter para este item,

assim este potencial receptor nem deveria ter sido listado. Mas se por um lado

caberia um filtro referente a medidas de peso e altura, por outro lado caberia

analisar em quais situações deve-se optar em beneficiar apenas um receptor ao

invés de dois. No caso de um doador pequeno, quer em idade quer em estatura,

qual seria o justo? Beneficiar o mais pontuado ou dois compatíveis

antropometricamente? Na portaria em vigor a opção tomada foi para a Equipe, no

ato da inscrição, definir não apenas o tamanho do enxerto aceitável para dado

receptor, mas informar qual sorologia poderia ser aceita, salvo nas contra-indicações

absolutas previstas na mesma norma. Com isso o outro motivo de exclusão

identificado que se refere ao resultado de sorologia positiva, também seria evitado,

pois o sistema já excluiria automaticamente os marcadores virais incompatíveis entre

doador e receptor. Restaria ainda o motivo tempo de isquemia fria que ora deflagra o

mau funcionamento do programa, ora evidencia a necessidade de regionalização da

Lista Única quando o que está em questão é a distância causada pelo fator

geográfico.

Não informado – A pesquisa considerou as informações constantes no

prontuário, entretanto algumas das informações referente a comunicação com os

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82

potenciais receptores não foram registradas no prontuário, mas no livro de

comunicação da Equipe da CTRJ, já que na listagem gerada pelo ranking não existe

espaço suficiente reservado para as justificativas. Nestes casos não foi possível

identificar os motivos relatados. Os motivos não identificados corresponderam a

51,4% (73) do total nesta etapa.

Outros – Motivos que apareceram com menor incidência como,

transplantado, falecido, ou paciente contatado, mas que ao telefone alegou não

querer transplantar naquele momento. Corresponde aos que deveriam estar

afastados admistrativamente. Apesar de estes motivos terem aparecido com menor

incidência com 13 relatos (9,2%), ao final do ano pesquisado, a CTRJ realizou um

recadastramento dos potenciais receptores ao transplante renal onde foi identificado

que dentre os potenciais receptores com status ativo, cerca de 20% deveriam ter

sido afastados definitivamente, pois já haviam realizado transplante com doador vivo

ou já haviam falecido. A estimativa do dado se deve ao fato de não ter sido possível

confirmar alguns destes, por falta de documentação oficial dos centros de diálise,

equipe transplantadora e/ou central de regulação da TRS. Foi possível identificar

com o recadastramento que a listagem dos ativos estava superdimensionada por

constar óbitos, transplantados, desistências ou pessoas que deveriam estar

afastadas temporariamente enquanto decidem se querem ou não transplantar. Esta

situação fez com que fosse publicada a resolução Sesdec nº 1004/2010 que

considerando a necessidade de atualização permanente do cadastro de pacientes

em Terapia Renal Substitutiva na Central de Transplantes do Estado do Rio de

Janeiro e a necessidade de garantir a integralidade do cuidado ao paciente portador

de Doença Renal Crônica em Terapia Renal Substitutiva, resolve incluir no sistema

eletrônico estadual de terapia renal substitutiva, dados referentes aos pacientes

cadastrados no sistema estadual de transplante sob responsabilidades das

respectivas unidades de diálise. (51)

Este dado revela a necessidade do sistema informatizado do SNT, não

apenas se interligar com outros sistemas de informações oficiais, mas criar

estratégias de atualização contínua sobre o real status dos potenciais receptores do

transplante. Apesar dos recadastramentos de tempo em tempo serem importantes

mecanismos organizadores da lista única, e tanto no recadastramento realizado em

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83

2002, quanto o de 2008 terem sido instrumentos reveladores de uma lista de espera

superdimensionada, Marinho alerta que mutirões de transplante e campanhas

esporádicas para aumento de doações não interferem em resultados mais

permanentes, isto faz com que “o SNT se adapte razoavelmente as questões de

curto prazo, mas não esteja dando respostas capazes de, no longo prazo, melhorar

a eficiência do quadro geral de transplante.” (52)

4ª Etapa – Crossmatch (Prova cruzada)

Foram submetidos a 4ª etapa, os dez primeiros potenciais receptores com

status “ativo”, “soro atualizado”, contatados por telefone ou pela equipe

transplantadora e, que neste contato não apresentaram nenhuma das contra-

indicações listadas na 3ª Etapa. Isto quer dizer que cento e quinze potenciais

receptores tiveram seu soro submetido ao exame crossmatch.

Gráfico 4 – Distribuição dos indivíduos quanto ao motivo contra-indicação por resultado de crossmatch

Nesta etapa define-se dentre os 10 (dez) selecionados quem será excluído

por ter resultado positivo no exame de prova cruzada. Dos que tiveram resultado

negativo foram comunicados por telefone sobre a etapa seguinte que consiste em

comparecer ao hospital avaliador com seus exames em data e horário informados.

Os principais motivos que positivam o resultado da prova cruzada, estão

relacionados ao número de gestações, re-transplante e transfusão sanguínea.

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84

Independente do resultado do HLA, o resultado positivo no crossmatch é uma

contra-indicação absoluta para transplante.

5ª Etapa – Avaliação pós-crossmatch (Avaliação pela equipe

transplantadora)

Dos cento e quinze potenciais receptores que tiveram resultado negativo na

prova cruzada e foram encaminhados para o hospital avaliador, foram identificados

os seguintes motivos para exclusão no transplante.

Gráfico 5 – Distribuição dos indivíduos por motivo de exclusão após o resultado do crossmatch

A avaliação pós-crossmatch é a última etapa que antecede ao transplante.

Nesta fase foram identificados os motivos: sem exames, sem condições clínicas,

equipe, não comparecimento a seleção e não informado.

No Estado do Rio de Janeiro, a avaliação para o transplante é realizada pelo

hospital de rodízio da semana, ou seja, o potencial receptor pode ou não

transplantar no hospital em que se inscreveu, depende da escala de rodízio dentre

os hospitais que estão realizando este procedimento. De igual forma a equipe que

fará a cirurgia e o acompanhamento pós-transplante poderá ou não ser a equipe que

o inscreveu e que o tem acompanhado antes do transplante. É esta equipe que não

necessariamente conhece o histórico do potencial receptor, quem irá avaliá-lo para o

transplante.

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85

Sem exame – Este motivo aparece novamente na fase pós crossmatch, isto

porque no primeiro contato quem diz se os exames estão em dia e se o resultado é

favorável ao transplante é o próprio paciente ou seu responsável. Nesta fase quem

informa o motivo é o profissional da equipe de transplante, obviamente com outra

leitura do que significa estar com os exames em dia. Corresponde a 16% desta fase

com dez relatos.

Visto que a realização de exames é apenas a questão que deve ser

solucionada em curto prazo, acrescem a este outros mais. Estar com exames em

mãos seria um imenso avanço para aqueles cujo resultado não apresente

anomalias, entretanto, ser selecionado e chegar a minutos de poder transplantar e

neste momento descobrir que o exame só serviu para excluí-lo, é no mínimo uma

incoerência. Situação esta inadmitida expressamente na Lei nº 8.080/90 art. 7º, ao

listar os princípios do SUS, em particular o da igualdade de acesso aos serviços de

saúde (26).

Será que é o potencial receptor quem deve ser culpabilizado por não saber

que seus exames estão em dia? Por que será que pacientes com exames

desatualizados encontram-se como ativos na Lista de Espera? Ou ainda, por que os

exames estão desatualizados?

Estas indagações reafirmam a necessidade de rediscutir o cuidado em saúde

que requer a responsabilização pelo usuário, a reorganização do sistema de saúde

voltado para atender as suas necessidades e não sob a lógica dos procedimentos,

mas que mesmo, enquanto modelo de transição, os serviços sejam organizados a

partir de uma programação que não apenas contemple o número de procedimentos,

mas que seja incluída a regionalização destes serviços com fluxos de referências e

contra-referência previamente definidos.

Condições clínicas – Ocupando 25% (15) das causas nesta etapa, a ausência

de condições clínicas descoberta na hora da avaliação pré-transplante representou o

principal motivo de exclusão identificado nesta etapa, após o motivo “não

informado”.

Page 86: priscila ribeiro campos paura.pdf

86

Ao somar os motivos “condições clínicas” e “sem exames” tem-se a maioria

dos motivos identificados, isto quer dizer que todos estes deveriam estar com status

semi-ativo e conseqüentemente não terem sido classificados. Revela também que

se estes potenciais receptores tivessem sido devidamente acompanhados por suas

equipes transplantadoras e tivessem conseguido acessar aos serviços de saúde,

provavelmente a grande parte destes se encontraria em condições de transplantar.

Bellato traz que “adentrar” os serviços de saúde, talvez não seja a maior

dificuldade dos usuários, assim a concepção de acesso (funcional) reduzida a

chegar à porta de entrada de um serviço, deve para além desta, ser confrontada

com a concepção de acessibilidade, na qual é implicada não apenas as múltiplas

dificuldades de chegar ao serviço, assim como de obter resolutividade para os seus

problemas de saúde. (53)

Desse modo, a equidade no acesso aos procedimentos em saúde deve ser

operacionalizada sob a ótica da integralidade, (54)

“como oferta organizada de assistência curativa e de recuperação, garantindo-se referência e contra-referência em uma rede articulada entre o setor ambulatorial e hospitalar que inclua unidades/procedimentos nos distintos níveis de complexidade (baixa, média e alta), com fluxos e percursos definidos e ordenada espacialmente com a demanda populacional de cada território.”

Apesar de nos últimos anos ter ocorrido um aumento na prestação de

serviços especializados de apoio e diagnóstico terapêutico, a referência para os

serviços na média e alta complexidade ainda representa um gargalo no sistema de

saúde.

Nesse sentido, a estratégia para garantir a referência e contra-referência é a

de que seja implementada redes de atenção a saúde no SUS (RAS), uma rede

articulada em todos os níveis de atenção, destinada a garantir a continuidade dos

serviços prestados conforme as necessidades demandadas pelos usuários. (29)

(55)

Conforme Silva e Magalhães Jr, as RAS representam:

Page 87: priscila ribeiro campos paura.pdf

87

“uma malha que interconecta e integra os estabelecimentos e serviços de saúde de determinado território, organizando-os sistemicamente para que os diferentes níveis e densidades tecnológicas de atenção estejam articulados e adequados para o atendimento ao usuário e para a promoção da saúde.”

Contra-indicação pela equipe transplantadora – Assim como no motivo de

exclusão pré-crossmacth, os itens que apareceram foram: tempo de isquemia

prolongado com três relatos e incompatibilidade antropométrica com quatro relatos,

este representando 57% da justificativa apresentada pela equipe transplantadora

para não realizar o transplante no receptor classificado.

Isto quer dizer que tiveram alguns potenciais receptores que viveram horas

de angústias e expectativas, passaram por diversas etapas, se deslocaram de

municípios distantes, mobilizaram rede social de apoio, ficaram horas em jejum para

no exame clínico que antecede a cirurgia o profissional responsável informar que

seu peso e altura eram incompatíveis com o do doador. Informação esta existente

desde antes da listagem ser gerada, mas que não foi considerada durante todo o

processo de seleção.

O tempo de isquemia prolongado pode ser um marcador de que os diversos

serviços multisetoriais, necessários para a realização do transplante não estão

desenvolvendo suas atividades em tempo suficiente para serem efetivos, ou que

aspectos geográficos e de disponibilidade de equipes transplantadoras sejam

questões a serem discutidas. Estes são exemplos que reforçam a definição de Sen

quanto a privação de capacidades estar relacionada ao potencial que os usuários

tem de alcançar a real necessidade de cada um a cada momento.

Este item corresponde a 6% das exclusões e se destaca pela necessidade de

aperfeiçoamento do sistema de saúde e da organização dos serviços. A expectativa

é de que o novo sistema informatizado do transplante que está para ser implantado

em todo o Brasil, adequado às normas da nova portaria, venha minimizar estas

insuficiências do atual sistema, tanto no que se refere a pontuação no critério de

alocação para transplante quanto o da organização da rede.

Page 88: priscila ribeiro campos paura.pdf

88

Não informado – A pesquisa considerou as informações constantes no

prontuário, assim, nos casos em que as justificativas não foram encontradas no

prontuário, foram categorizadas como “não informado”. Foram registradas 26

ocorrências correspondendo a 43% desta etapa.

Outros – Nesta etapa este motivo correspondeu ao não comparecimento a

seleção com 3 relatos (5%). Ou seja, o potencial receptor passou por todas as

etapas foi convocado a comparecer no hospital para avaliação da equipe

transplantadora prévia a cirurgia, mas não compareceu em horário e local agendado.

Não foram identificadas maiores informações para o motivo de não comparecimento,

não há registro de que tenha sido por desistência do potencial doador, por não

possuir meio de transporte efetivo para comparecimento em horário e local

informado ou qualquer outro motivo que justifique esta ausência nos prontuários

analisados.

Ao reordenar os dados por “motivos” ao invés de por “etapas”, apareceram

em ordem decrescente os seguintes percentuais:

Soro Vencido (70,6%); Não Informado (11%); Contato telefônico (6,9%); Sem

condições clínicas (4,7%); Contra-indicação pela equipe transplantadora (2,7%);

Sem exame (2,4%) e Outros (1,8%).

Gráfico 6 – Motivos de não transplante dentre os classificados do ano de 2008

Page 89: priscila ribeiro campos paura.pdf

89

Estes dados evidenciam a importância de resolver a questão da atualização

da soroteca dos potenciais receptores a transplante de rim com doador falecido no

Estado do Rio de Janeiro, quer responsabilizando os centros de diálise no envio

periódico do soro ao laboratório de imunogenética, conforme a RDC nº 154/04, quer

regionalizando os postos de coleta pelos hemocentros, ou repensando outras

alternativas, desde que o foco seja facilitar o acesso ao usuário. Os motivos “sem

condições clínicas” e “sem exames” também remetem a falta de acesso no uso e

consumo dos serviços de saúde. Estes três motivos juntos representam 75% dos

motivos de falta de acesso ao transplante e podem ser categorizados como

desigualdades sanitárias enquanto aspecto das dimensões da equidade em

transplante.

Os motivos “Equipe” e “Outros” apesar da baixa significância estatística

remetem ao mecanismo de seleção dos potenciais receptores, ou seja, como o

sistema informatizado pode ou não, facilitar a escolha pelo potencial receptor a ser

transplantado. A ocorrência de pessoas com status “ativo” inscritas em Lista de

espera que já faleceram, transplantaram, não desejam transplantar, assim como

classificados com incompatibilidade antropométrica ou sorológica com o doador,

reforçam a necessidade de filtros que permitam otimizar a busca pelo melhor

receptor. Neste sentido, faz diferença tanto o sistema de pontuação, quanto a

atualização do status do cadastro técnico único.

Estas ocorrências nos remetem ao aspecto da dimensão da equidade em

transplante referente ao critério de seleção para o transplante.

6ª Etapa – Transplante

Esta etapa refere-se aos que finalmente conseguiram transplantar. No ano de

2008 as cinqüenta e cinco doações foram revertidas em cento e dois transplantes,

entretanto esta pesquisa só analisou os dados dos doadores e receptores oriundos

do estado do Rio de Janeiro, assim ao excluir os oriundos de outros estados da

federação, os dados corresponderam a noventa e seis receptores.

Page 90: priscila ribeiro campos paura.pdf

90

Os seguintes dados foram identificados: Idade, gênero, Centro

Transplantador (onde foi o transplante), Centro de acompanhamento de pré-

transplante (onde o potencial receptor se inscreveu para transplante), município do

centro de diálise, município de residência, PRA, re-transplante, data de início de

diálise, data de inscrição para transplante, data do transplante, posição no ranking e

doença de base para a insuficiência renal crônica.

Gênero e Faixa Etária

Tabela 3 – Distribuição dos transplantados por gênero e faixa etária

Variáveis N %

Masc- Fem Total

0 a 17 2-0 2,0%

18 a 29 3-6 7,8%

30 a 39 7-9 14,7%

40 a 49 12-14 26,9%

50 A 59 15-10 24,0%

60 a 69 8-5 12,7%

70 a 79 5-0 4,9%

Total 52-44 100%

Os receptores beneficiados no ano de 2008 eram em sua maioria do gênero

masculino (55,8%). Quanto a idade foi possível confirmar o quanto a pontuação

vigente à época dificultava o acesso das crianças e adolescentes ao transplante,

apenas 2% dos rins implantados contemplaram esse grupo. Cabe ressaltar que após

críticas dos diversos atores sociais pelo país e registradas inclusive nas atas das

reuniões de Câmara técnica estadual, apenas a partir de 2009 com a vigência da

nova Portaria esta situação foi revista e a norma atual passa então a privilegiar esta

faixa etária. (1) Assim, para efeito de pontuação no que se refere à idade, “serão

atribuídos às crianças e adolescentes: 4 (quatro) pontos para potenciais receptores

com idade inferior a 18 (dezoito) anos.” (5)

Conforme esclarecido anteriormente, o sistema informatizado de São Paulo já

pontuava crianças e adolescentes, antes da publicação da portaria 2600/09 o que

fez com que houvesse elevada taxa de transplantes nesta faixa etária em relação

Page 91: priscila ribeiro campos paura.pdf

91

aos demais estados da federação. Conforme Pereira, “o alto percentual de

transplantes em crianças, com relação à lista de espera, é explicado pelos critérios

de distribuição vigentes, que priorizam o transplante em crianças quando o doador

tem até 18 anos”. (20)

Apesar de o principal grupo beneficiário estar concentrado na faixa dos 30

aos 59 anos (64%) é possível observar um número relativamente alto de idosos

transplantando (18%), o que há poucos anos atrás era considerado critério de

exclusão. Esse dado reflete a mudança da pirâmide etária brasileira, com o aumento

da expectativa de vida, mas reflete também a melhoria na qualidade de vida e do

tratamento dialítico da pessoa com IRC.

Gráfico 7 – Distribuição dos transplantados por faixa etária e gênero no ano de 2008

Como pode ser observado no gráfico acima, ao analisar o componente de

gênero á faixa etária foi possível perceber que a partir dos 50 anos de idade, o

masculino tende a ser o principal gênero beneficiado.

Centro Transplantador

Quanto ao Centro Transplantador o Hospital Geral de Bonsucesso não foi

apenas o Centro que mais transplantou (51 transplantes) no Estado como também

concentrava o maior número de pacientes acompanhados em pré-transplante, além

de ter sido o responsável por ter preparado 60% dos transplantados do ano de 2008.

Page 92: priscila ribeiro campos paura.pdf

92

Apesar de haver outros centros transplantadores públicos e privados cadastrados

pelo SNT, apenas 4 (quatro) realizaram transplante com doador falecido no referido

ano, destes apenas o Hospital Estadual Álvaro Alvim é situado fora do município do

Rio de Janeiro e todos que realizaram este procedimento o fizeram com

financiamento do SUS. No referido ano, apesar de não ter realizado procedimentos

de transplante, os Centros transplantadores HUAP, HSE e HCN foram responsáveis

pelo preparo de cinco (5), quatro (4) e um (1) pacientes transplantados

respectivamente.

Com exceção do HEAA (Campos) todas as equipes realizaram transplante

em paciente dos quais não havia realizado acompanhamento prévio, respaldando-se

na avaliação dos exames de estudo pré-transplante.

Como houve algumas divergências de informações em relação aos números

de procedimentos realizados pelas equipes credenciadas ao SNT, a pesquisa não

considerou os dados publicados pela ABTO, restringindo os dados aos números

fornecidos pela CTRJ/SNT. Segundo Marinho, no ano de 2006 haviam 22 centros

transplantadores credenciados ao SNT o que fez com que o estado do Rio de

Janeiro ocupasse a 3ª posição em número absoluto de centros transplantadores e a

4ª posição na relação per capita, mas ao analisar o número de transplantes per

capita o Estado do Rio de Janeiro desce para a 10ª posição apesar de ser o 5º

estado em número absoluto de transplante tendo realizado 220 procedimentos

naquele ano estudado. “Em um aparente paradoxo com esse desempenho, o Estado

do Rio de Janeiro é razoavelmente bem aquinhoado em termos de disponibilidades

de equipes de transplante per capita.”, mas ao se referir à atividade transplantadora,

o Estado estaria “em situação inferior ao potencial sanitário, humano e econômico

que tem a disposição.” (17)

Já em 2008 houve uma considerável redução no número de centros

transplantadores credenciados ao SNT, ou pelo menos o que se pode observar é

que poucos centros transplantadores efetivamente realizaram este procedimento no

Estado, provavelmente se esta pesquisa fosse sobre os dados de 2006 iria constatar

que no referido ano os números do Estado estavam superestimados por não

considerar os centros que realmente realizaram transplante e sim a quantidade de

Page 93: priscila ribeiro campos paura.pdf

93

centros credenciados o que deflagra a necessidade de aprofundar o conhecimento

sobre o número de equipes e centros credenciados para transplante no Estado, o

número dos que realmente estão ativos e outro fator tão importante quanto os

outros, quantos destes fazem o procedimento pelo SUS ou pela iniciativa privada,

considerando o número de potenciais receptores vinculados a cada fonte pagadora.

Conforme os dados da CTRJ/SNT 100% dos transplantes realizados no ano

de 2008 tiveram como fonte pagadora o SUS e 98% dos potenciais receptores

inscritos para transplante de rim estavam vinculados a centros transplantadores

públicos. Houve ainda 1 (um) transplantado que originalmente estava inscrito por

centro transplantador privado, mas foi submetido à cirurgia em um público. Assim,

além de avaliar a disponibilidade de equipes e centros de transplante per capita no

Estado, cabe relacionar este dado a natureza de gestão das referidas entidades com

sua capacidade de responder as reais necessidades da população usuária dos

transplantes.

Gráfico 8 – Distribuição dos Centros Transplantadores quanto a origem de inscrição dos transplantados e local de realização do transplante no ano de 2008

Outro dado analisado por Marinho no que se refere à disponibilidade de

equipes transplantadoras per capita é que esta parece ser muito importante para

Page 94: priscila ribeiro campos paura.pdf

94

determinar a quantidade de transplantes per capita nos estados, mas quando

relacionadas ao IDH e aos gastos em saúde per capita esta relação perde

importância não revelando nenhuma associação estatisticamente significativa. (17)

Assim a disponibilidade pela presença física dos serviços de saúde pode não

garantir a acessibilidade ao usuário, mas facilita o acesso equitativo as ações de

saúde. Mesmo que o número de equipes transplantadoras (efetivamente ativas) não

altere a equidade em saúde, é um indicador positivo quando se analisa a equidade

no uso e consumo dos serviços de saúde do transplante. (35)

Travassos afirma que a passagem das condições de desigualdades

existentes hoje no sistema de saúde brasileiro para uma situação mais igualitária

depende, não apenas de maior disponibilidade de recursos financeiros para o setor

saúde, mas de: a) melhor uso dos já existentes; b) implementação de uma política

redistributiva na alocação de recursos entre esferas de governo e organização da

rede local de serviços de saúde voltada para garantir a universalidade no acesso,

por meio de melhor distribuição espacial desses serviços e adequação da oferta às

necessidades dos diferentes grupos populacionais (35) (43).

Município de residência e município de diálise

O dado abaixo registra o local onde os transplantados residiam e onde faziam

diálise.

Tabela 4 – Distribuição dos transplantados segundo municípios de residência e de diálise

Região /Município: Rio de Janeiro

Região /Município Residência

n(%)

Centro de Diálise

n (%)

Rio de Janeiro

Baixada Fluminense

Metropolitana II

Norte/Noroeste

Baixada Litorânea

52 (54,2)

17 (17,7)

8 (8,3)

7 (7,3)

5 (5,2)

55 (57,3)

13 (13,5)

9 (9,4)

7 (7,3)

4 (4,2)

Page 95: priscila ribeiro campos paura.pdf

95

Médio Paraíba

Baía da Ilha Grande

Serrana

Centro-Sul

2 (2,1)

2 (2,1)

2 (2,1)

1 (1,0)

2 (2,1)

2 (2,1)

3 (3,1)

1 (1,0)

Total 96 (100) 96 (100)

Com estes dados foi possível identificar que existe uma boa compensação

entre as regiões do estado no que se refere ao local de residência e de diálise, mas

não é o que se observa em relação ao município de inscrição para transplante ou

transplante realizado. A concentração de Centros transplantadores (CTx) no

município do Rio faz com que todo o Estado se inscreva nestes centros e mesmo

nas regiões fora da capital em que existe centro transplantador não é evidente a

permanência dos transplantados próximo ao local de residência, exceto os

transplantados residentes no mesmo município do Centro transplantador. Ou seja,

nesta amostra, identificou-se pelo menos três situações: que apesar de haver um

fluxo formal definido para a TRS nos municípios entre as regiões do Estado, o

transplante não segue a mesma lógica; que para os transplantados de 2008 a opção

tomada foi inscrever-se no município do Rio quando não havia CTx em seu

município e que a existência de CTx no município de residência foi um fator para

fixar o transplantado neste Centro.

Doença Base

Tabela 5 – Distribuição dos transplantados por doença base

Variável N %

Doença Base

Hipertensão Arterial Sistêmica (HÁS) 35 36,5

Diabetes Mellitus (DM) 10 10,4

DM+HAS 4 4,2

Glomerulonefrite Crônica (GNC) 8 8,3

Pielonefrite Crônica 5 5,2

Lupus 2 2,1

Page 96: priscila ribeiro campos paura.pdf

96

Nefropatia de refluxo 1 1,0

Glomerulo Esclerose Segmentar e Focal (GESF) 3 3,1

Rins Policísticos 7 7,3

Insuficiência Renal Crônica 3 3,1

ICM 1 1,0

Não Informado 6 6,3

Indeterminado

TOTAL

11

96

11,5

100

No Estado do Rio de Janeiro a doença de base mais prevalente foi a

hipertensão arterial sistêmica seguida da diabetes, as duas foram responsáveis por

50,1% dos dados registrados. Apesar de estar de acordo com os dados da literatura

médica internacional e ser compatível com a prevalência destas doenças na

população de pessoas com insuficiência renal crônica, não é o que tem se

observado nos dados nacionais do transplante. Segundo David Saitovitch, (56)

os dados (nacionais) demográficos e clínicos não surpreenderam, estando, em sua maioria, de acordo com dados da literatura médica internacional. Chama a atenção que a doença de base mais prevalente foi a glomerulonefrite crônica (36%), ficando aquelas atualmente consideradas líderes na etiologia da doença renal, diabetes e hipertensão arterial sistêmica, com índices bem inferiores (5% e 16%, respectivamente). Uma análise contemporânea destes dados deverá esclarecer tal questão.

Cabe considerar que 20,9% das doenças identificadas foram registradas

como insuficiência renal crônica e indeterminado, ou simplesmente não informado, o

que requer uma revisão desta informação no prontuário dos demais potenciais

receptores objetivando a exatidão do dado.

Intervalo de Tempo para inscrição no transplante

Este dado se refere ao intervalo de tempo entre a data de início da diálise e a

data de inscrição ao transplante. Mais de 70% dos transplantados se inscreveram

Page 97: priscila ribeiro campos paura.pdf

97

com período inferior a três anos, destes 40% se inscreveram com menos de um ano

em diálise.

Ao correlacionar este dado com a origem do município de residência, foi

possível constatar que no município do Rio de Janeiro se concentra 50% dos

transplantados que levaram menos de um ano para se inscrever para transplante,

mas também concentrou 60% dos transplantados que levam mais de oito anos para

se inscrever. Este dado demonstra que a localização geográfica é um facilitador do

acesso aos usuários no uso e consumo dos serviços de saúde, mas a proximidade

pela presença física não garante a equidade, já que no município em que se

concentra a maior parte dos centros transplantadores e o maior número de

pacientes em diálise, também é o município em que a maior parte dos

transplantados levou mais tempo para se inscrever na lista de espera.

Tabela 6 – Distribuição dos transplantados por intervalo de tempo para inscrição no transplante

Variável N %

Tempo

< 1 ano 33 34,4

1 ano 29 30,2

2 anos 16 16,7

3 anos 3 3,1

4 anos 2 2,1

6 anos 3 3,1

7 anos 1 1,0

8 anos 5 5,2

9 anos 2 2,1

10 anos 2 2,1

PRA e Re-transplante

Dentre os noventa e seis transplantados, apenas seis receptores tinham PRA

acima de 50%, destes três com 100% de reatividade. Neste grupo, 50% faziam

Page 98: priscila ribeiro campos paura.pdf

98

diálise há 10 anos em média e os outros 50% há 7,5 anos em média. No que se

refere ao tempo de espera em Lista a média foi de 4, 5 anos. Já no que se refere ao

grupo que tinha PRA igual a zero, a média de tempo em diálise foi de 6 anos e de

espera em lista de 4 anos.

Em relação ao re-transplante nenhum dos receptores de 2008 haviam sido

transplantados anteriormente, mas em busca realizada no ano de 2010 ao

prontuário eletrônico dos transplantados de 2008 foi registrada a re-inscrição de dois

receptores que haviam perdido o órgão em menos de um ano. Este dado não

permite inferir sobre a sobrevida do receptor e do enxerto, mas aponta para a

necessidade do sistema informatizado do SNT colocar em vigor o quanto antes a

nova portaria que responsabiliza as equipes transplantadoras no acompanhamento

pós-transplante a emitir: (6)

III - relatório da produção e acompanhamento dos resultados de transplantes com doadores vivos e falecidos realizados durante os períodos de vigência da autorização, apresentando o resultado de sobrevida de pacientes e enxertos aos 15 dias, 3º, 6º, 12º, 36º e 60º meses, nos casos em que se aplique;

Apesar destes dados desassociados do cadastro técnico único (CTU) limitar a

análise, foi possível com esta amostra identificar que potenciais receptores com PRA

alto leva mais tempo para conseguir transplantar, ou seja, quanto menor o PRA,

menor o tempo de espera em lista para transplante de rim com doador falecido.

Posição no ranking

Tabela 7 – Distribuição dos transplantados quanto a posição na

listagem de classificação do transplante renal no ano de 2008

Variáveis N %

Posição

1ª e 2ª 2 2,1

3ª a 9ª 33 34,4

10ª a 19º 32 33,3

20 a 29º 11 11,5

30º a 39ª 12 12,5

40ª a 49ª 4 4,2

>50ª 2 2,1

TOTAL 96 100

Page 99: priscila ribeiro campos paura.pdf

99

Outro dado analisado foi o da posição ocupada no ranking pelo receptor

selecionado. Foi possível constatar que na maioria das vezes, o mais compatível, ou

o maior pontuado não é quem transplanta no Estado do Rio de Janeiro. Apenas 2%

dos transplantados encontram-se na primeira e/ou segunda posição da listagem dos

mais pontuados. Também é minoria o grupo seguinte, ou seja, mesmos que todos

os oito primeiros potenciais receptores selecionados para o crossmatch tivessem

resultado positivo, que não foi o caso, ainda assim o objetivo do critério de seleção

por melhor compatibilidade HLA que é o de transplantar o mais pontuado ao invés

do inscrito há mais tempo, não foi alcançado.

O que se observou foi que na média os transplantados ocupavam a 18ª

posição e na mediana a 15ª posição. Foi identificado na análise dos dados que em

uma doação ocorrida no interior do Estado, por questões geográficas as posições

ocupadas pelos receptores foram a 33ª e 153ª posições.

Tempo de Espera em Lista

Os dois receptores de transplante de rim que levaram mais tempo para

transplantar aguardaram por 17 e 11 anos respectivamente. Dos que levaram menos

tempo aguardaram por 2 e 4 meses. O tempo médio de espera em lista no ano

pesquisado foi de 4 anos e a mediana de 3 anos.

Segundo Marinho (17) o tempo de espera do transplante de rim em 2004,

2005 e 2006 teria o limite inferior de 5,19 ; 5,84 ; e 7,50 anos respectivamente e

limite superior igual ao dobro do limite inferior o que justificaria em parte, o tempo de

espera do receptor que aguardou por mais tempo para transplantar, entretanto o

recorte temporal da pesquisa de Marinho, não considerou os anos que sucederam a

mudança do critério de seleção o que dificulta o aprofundamento da análise. Se

considerarmos o aumento do número de pessoas que ingressam na lista de espera

por transplante de rim ao longo dos anos em todo Brasil, inclusive no Rio de Janeiro,

a tendência seria que o tempo médio de espera estivesse aumentando e não

diminuindo conforme foi observado nos dados apresentados referente ao ano de

2008. Contudo o que se constatou neste ano é que em relação ao tempo de espera

de quem conseguiu transplantar, houve uma diminuição.

Page 100: priscila ribeiro campos paura.pdf

100

Cabe considerar que estes dados não se referem ao tempo de espera em

lista dos que ainda aguardam pelo transplante, informação esta que não foi possível

identificar com os dados disponibilizados referente ao ano de 2008, mas permite

concluir que com a mudança do critério de seleção de transplante de rim para o de

melhor compatibilidade HLA ao invés do de antiguidade, favoreceu a que pessoas

com menos tempo de inscrição acessasse o transplante. Este dado deve ser

analisado em conjunto com o tempo de espera daqueles que ainda não

transplantaram para então concluir se este tempo está aumentando ou diminuindo.

O cálculo do tempo de espera em lista é fundamental para identificar a

equidade deste modelo de seleção, entretanto os dados a serem considerados

fazem desta análise uma tarefa árdua diante de tantas variáveis. Para estimar o

tempo de espera em lista é necessário considerar não apenas o tempo que se leva

para conseguir transplantar, mas quem consegue transplantar. Como o critério de

seleção considera a identidade genética, pelo HLA, pontua o PRA, a idade, dentre

outros, é importante saber qual grupo étnico, com qual percentual de PRA, com qual

idade, e com quais equipes os inscritos tem conseguido transplantar. Talvez a

importância de se identificar quais variáveis afetam o acesso ao transplante e

conseqüentemente o tempo de espera em lista perca seu valor, num contexto de

aumento no número de doações efetivas, entretanto num contexto de escassez de

órgãos, o conhecimento destes dados é imprescindível para compreender se o

acesso ao transplante está acontecendo de forma equitativa. Será que este modelo

se auto-regula ou favorece a desigualdade?

A demora no tempo de espera em lista exerce impacto sobre o bem-estar da

pessoa com insuficiência renal crônica, a sobrevida do enxerto e do receptor e a

extensão das co-morbidades no potencial receptor; como conseqüência aumenta a

necessidade de re-transplante, eleva a mortalidade pós-transplante, diminui a

sobrevida do enxerto, além do custo e do sofrimento dos pacientes que estão na

lista e seus familiares. Mas pior do que a demora é a imprevisibilidade do tempo, já

que as incertezas “impedem o planejamento das vidas dos pacientes e seus

familiares, da atuação do sistema de saúde e do funcionamento do sistema

produtivo onde eles por ventura trabalhem.” (17)

Page 101: priscila ribeiro campos paura.pdf

101

Apesar da lista de espera ser única e da atribuição das atividades respeitar

uma divisão geopolítica através das CNCDOs, conforme Marinho, a observação das

diferentes probabilidades de realizar transplante, nas diferentes centrais estaduais,

nos diferentes estabelecimentos e equipes médicas autorizados deveria ir além,

caberia (52)

“investigar, pelo menos as diferentes taxas de mortalidade nas filas, a duração dos enxertos, a qualidade e a sobrevida dos pacientes, considerando-se os necessários controles pela gravidade e outras características (como idade, tipo sanguíneo etc) dos casos, e pelas condições sócio-econômica e de acesso aos bens e serviços de saúde de cada pessoa.

Observa-se então que existe uma multiplicidade de indicadores dos

resultados de cada CNCDO, centros e equipes transplantadores como também dos

recursos disponíveis. O referido autor apresenta um modelo resumido dos

indicadores relevantes que deveriam ser contemplados.

Em relação aos recursos (“inputs”) devem ser considerados na análise os

recursos humanos, materiais e financeiros utilizados. Em relação aos resultados

(“outputs”) caberia avaliar o tempo de espera em lista; as taxas de mortalidade em

lista de espera e durante a cirurgia; a sobrevida do órgão e do receptor; a razão

entre os órgãos e tecidos doados e os implantados; a razão entre os quantitativos de

doadores vivos e falecidos; a taxa de notificação de morte encefálica; e “medidas de

equidade horizontal: incluindo a acessiblidade dos serviços para pacientes com

iguais necessidades.” (52)

A partir da análise das etapas de exclusão, do perfil demográfico e clínico dos

transplantados e dos conceitos de equidade foi possível identificar que no acesso ao

transplante de rim com doador falecido algumas questões devem ser consideradas.

Estas questões foram agrupadas por eixos e classificadas como dimensões da

equidade em transplante.

Tabela 8 – Dimensões da Equidade em transplante

Critério de seleção para o

transplante

o Aspectos legais: pontuação diferenciada nos Estados,

publicidade na pontuação dos critérios de alocação

o Aspectos étnicos: Prejuízo para pequenos grupos étnicos;

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102

o Aspectos técnicos: Sobrevida do enxerto quando

analisados em relação ao tempo de isquemia fria e ao nº

de lócus e alelos idênticos;

o Aspectos sociais: Custo Social alto;

Desigualdade sanitária

o Acesso aos exames clinico-laboratoriais;

o Distribuição geográfica de recursos/ Porte populacional

dos municípios;

o Distribuição geográfica das Equipes transplantadoras;

o Necessidades em saúde

Demanda e Disponibilidade

o Aumento da prevalência de IRC;

o Aumento da demanda por re-transplante;

o Baixo número de doadores por milhão de população;

o Relação entre o número de pessoas com IRC em TRS e

o número de inscritos para transplante.

Financiamento

o FAEC x Teto de finaciamento

o Relação entre o nº de procedimentos e o tempo em Lista

de Espera

Política de atenção ao

usuário

o Legislação do transplante;

o Política de atenção a pessoa com IRC

Segundo Pereira o sistema utilizado pelo SET-SP,

(...) apesar de pouco tempo de acompanhamento, mostra uma correlação entre pontuação e sobrevida do enxerto. Já a sobrevida em 4 anos, associada à melhor compatibilidade HLA avaliada por número de MM, confirma dados da literatura (ref.: UNOS/Eurotransplant), onde se evidencia a importância deste sistema na evolução do transplante renal.

Entretanto o referido autor aponta que “apesar dos dados apresentados neste

período, faz-se necessário aperfeiçoar a seleção de receptores, mediante

compatibilidade HLA.” Diz ainda que alguns pontos devem ser discutidos como os

referidos “aos receptores sensibilizados, aos receptores que apresentem

homozigose, aos priorizados, às crianças e aos idosos.” (20)

Assim, a análise conjunta destes dados deixa claro que o sistema de

pontuação utilizado até hoje pela maior parte dos entes federativos requer

consideráveis adequações e que mesmo o novo Sistema baseado no modelo do

SET-SP, adequado a Portaria 2600/09, deve ser avaliado respeitando as

especificidades regionais.

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103

A realidade nacional não se difere muito do Rio, segundo relatório do Tribunal

de Contas da União (TCU). (15)

Constatou-se, portanto, que a distribuição heterogênea das equipes transplantadoras pelo território brasileiro, as dificuldades para fazer os exames pré-transplante pelo SUS e a suspensão de alguns serviços públicos de transplante geram dificuldades de acesso a esses tratamentos, principalmente para a população de baixa renda, residente distante dos centros transplantadores e que não possui recursos para arcar com gastos de deslocamento e de procedimentos particulares. Observa-se que os pacientes que realizam os exames para o transplante, conseguem inscrever-se mais rapidamente nas listas de espera e, por isso, são beneficiados, (...)

Conforme citação acima, o TCU aponta que no território brasileiro existe má

distribuição das equipes transplantadoras, dificuldades em realizar os exames pré-

transplante pelo SUS, Centros transplantadores com dificuldades administrativas,

dificuldade de acesso pela população por estes centros estarem suspensos, a

dificuldade de acesso sobre cai na população de baixa renda, fator este agravado

por residirem distante dos centros transplantadores e por não possuir recursos para

arcar com os gastos tanto de deslocamento quanto de procedimentos particulares.

Observou ainda que aqueles que conseguem realizar os exames conseguem

inscrever-se mais rapidamente, sendo então beneficiados.

Como garantir que o maior programa público de transplante do mundo, ou

parte dele, não se transformará, em médio prazo, em instrumento de desigualdade

social?

Com esse trabalho foi possível ratificar que a população do Estado do Rio de

Janeiro também tem vivido esta realidade denunciada pelo TCU, mas que o próprio

SUS com seus princípios e diretrizes aponta caminhos para organizar a rede de

atenção aos serviços de transplante.

Cabe agora a apropriação dos mecanismos de enfrentamento dos problemas

previstos pela Constituição Federal e norma infraconstitucional, estando em vigor a

NOAS/2001 que aponta a regionalização como categoria estratégica de “(...) forma a

garantir o acesso aos cidadãos a todas as ações e serviços de saúde necessários

para a resolução de seus problemas de saúde, otimizando os recursos disponíveis.”

(57)

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104

O Governo do Estado do Rio de Janeiro catalogou no Plano diretor de

regionalização, os recursos disponíveis e agrupou a assistência em microrregiões

com formação de redes intermunicipais, para diferentes níveis de complexidade (58).

Sabe-se então, por exemplo, que em média 40% das pessoas com insuficiência

renal crônica estão inscritas para transplante e que estas, periodicamente, deverão

realizar determinados exames de média e alta complexidade. Segundo os números

deste documento, sabe-se, por exemplo, que a Região Metropolitana II do Estado

absorve em torno de 15% da demanda por hemodiálise (sem considerar a demanda

reprimida). Estes dados, somados ao da CTRJ, poderiam ser norteadores da

inclusão do Programa de Transplante Renal na rede de referência de média e alta

complexidade do Plano Estadual de Saúde. Plano este que está sendo rediscutido

em função da adequação ao Pacto pela Saúde/2006 (59) e da elaboração do atual

Plano Estadual de Saúde.

Giovanella et. al. aponta que as centrais de marcação de consultas e exames

especializados pode garantir a articulação entre os níveis de assistência - básica,

média e alta complexidade. Nesses casos, uma das tendências tem sido a

construção de Consórcios Intermunicipais, já prevista na legislação do SUS. Esses

consórcios fazem parte de uma “estratégia de cooperação entre municípios cujo

objetivo principal é garantir atendimento à população dos municípios de pequeno e

médio porte que não possuem em seu território todos os níveis de complexidade do

sistema de saúde”.

Caberia então aos gestores da saúde dos diferentes níveis do Sistema,

aprofundar a discussão sobre o tema, utilizando “as instâncias de representação,

monitoramento e pactuação política e administrativa” que envolve as três esferas do

governo e criadas pela NOB/SUS 01/96: a Comissão Intergestores Tripartite (CIT) e

a Comissão Intergestores Bipartite (CIB), onde se poderia pactuar a contrapartida de

cada município e/ou região (60). Além destas ainda foram criados o Conselho

Nacional de Secretarias Municipais de Saúde (Conasems) e o Conselho Nacional de

Secretários de Saúde (Conass).

Na perspectiva da descentralização e da regionalização, em cada

microrregião poderia haver serviços de realização de exames e um serviço

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105

especializado (ambulatorial), que se tornasse referência, com profissional qualificado

na especialidade (nefrologista com conhecimentos essenciais sobre transplante).

Este médico, integrante de uma equipe multidisciplinar, referenciaria à rede os casos

necessários (ex. tratamento de Hepatite C, problema cardíaco, entre outros), ou

emitiria parecer ao Centro Transplantador de origem do potencial receptor, relatando

os fatos pertinentes. Assim, tanto os Potenciais Receptores teriam mais chances de

se manterem aptos, como desafogaria a porta de entrada do Programa.

Outras alternativas seriam equipar hospitais públicos, dispostos a realizar

transplantes, de profissionais qualificados e recursos materiais necessários e

credenciá-los para a realização do procedimento. Esta não deixa de ser uma

excelente opção, rumo à acessibilidade geográfica, mas muito mais custosa para o

Estado. Ainda teria a possibilidade de convenio com a rede privada para atender

principalmente as regiões carentes de serviços de transplante público.

É claro que nenhuma sugestão simplista ou unilateral daria conta de resolver

as questões antigas e novas do atual modelo, faz-se então necessária a participação

dos diversos atores sociais envolvidos com o tema para que as dificuldades surgidas

no decorrer das proposições, que certamente irão surgir, possam ser consideradas

pelos diversos saberes até se chegar a um possível consenso.

Enquanto para uns a equidade no acesso fica comprometida por ter um PRA

alto, outros por não conseguir realizar exames, neste grupo, mas do que ter

rendimentos econômicos para, por exemplo, financiar seus exames pré-operatórios,

sua capacidade (necessidade em saúde) fica comprometida por não ter como

interferir no tempo de isquemia dos órgãos doados. Para este grupo a ineficiente

organização de alguns serviços não pode ser compensada por rendimentos

econômicos. Assim, ao elaborar políticas e reorganizar serviços equitativos devem-

se considerar os grupos economicamente mais vulneráveis, mas considerar também

que não apenas a situação econômica interfere nas iniqüidades, como as

oportunidades de escolhas que o indivíduo tem (ou não) de influenciar seu estado de

saúde ou a situação em que vive, ou seja, suas necessidades. Para Amartya Sen,

os conceitos de pobreza e de grupos vulneráveis, não podem ter em vista apenas os

rendimentos econômicos, mas considerar pobreza como privação de capacidades,

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106

ou seja, considerar a real possibilidade que o indivíduo tem de converter

rendimentos e recursos em capacidades/oportunidades de escolha. (27)

CONCLUSÃO

Contatou-se que em relação ao princípio de justiça distributiva o critério de

seleção por melhor compatibilidade HLA tem a intenção de ser equitativo criando no

do sistema de pontuação, mecanismo de compensação a grupos em desvantagem.

Tenta-se então, mitigar os efeitos da loteria da vida através da discriminação

positiva.

No que se refere à equidade no uso e consumo dos serviços do transplante,

foi identificado padrão desigual tanto na dimensão geográfica (equidade horizontal)

quanto na social (equidade vertical).

Na dimensão geográfica, os dados demonstraram que a distribuição das

equipes e centros transplantadores estão concentrados em um único município,

assim como apenas um único serviço realiza coleta e análise para o exame de

histocompatibilidade. Esta concentração geográfica em relação a prestação de

serviços também foi observada em relação a origem de residência daqueles que

conseguiram transplantar.

Na dimensão social constatou-se que os potenciais receptores encontram

dificuldades em realizar exames (principalmente os da soroteca) e de manterem-se

em condições clínicas para serem submetidos ao transplante.

O atual critério de seleção para transplante de rim apresenta inúmeros limites

à implementação de forma equitativa, principalmente no que tange a organização da

rede e no consumo de serviços de saúde.

A política nacional de transplante apresenta ainda uma rede desarticulada

que não é capaz de garantir o acesso as ações e serviços de saúde, não

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107

contemplando assim todas as necessidades de saúde da população usuária dos

serviços de transplante no Estado do Rio de Janeiro e, por conseguinte, acesso

equitativo à saúde.

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108

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nesta pesquisa, procurou-se verificar a possibilidade de haver acesso

equitativo para o transplante de rim no âmbito do estado do Rio de Janeiro. Isso

representou um desafio significativo, sendo necessária a formulação de um

arcabouço teórico que sustentasse as proposições acerca do tema.

Contatou-se que em relação ao princípio de justiça distributiva o critério de

seleção por melhor compatibilidade HLA tem a intenção de ser equitativo criando no

do sistema de pontuação, mecanismo de compensação a grupos em desvantagem,

tentando mitigar os efeitos da loteria da vida através da discriminação positiva.

Neste aspecto o que se deve considerar é se a pontuação dada a estes grupos tem

conseguido fazê-los transplantar.

No que se refere à equidade no uso e consumo dos serviços de transplante,

foi identificado padrão desigual tanto na dimensão geográfica (equidade horizontal)

quanto na social (equidade vertical).

Na dimensão geográfica, os dados demonstraram que a distribuição das

equipes e centros transplantadores estão concentrados em um único município,

assim como apenas um único serviço realiza coleta e análise para o exame de

histocompatibilidade. Esta concentração geográfica em relação a prestação de

serviços também foi observada em relação a origem daqueles que conseguiram

transplantar.

Na dimensão social constatou-se que os potenciais receptores encontram

dificuldades em realizar exames (principalmente os da soroteca) e de manterem-se

em condições clínicas para serem submetidos ao transplante.

O atual critério de seleção para transplante de rim apresenta inúmeros limites

à implementação de forma equitativa, principalmente no que tange a organização da

rede e no consumo de serviços de saúde.

A política nacional de transplante apresenta ainda uma rede desarticulada

que não é capaz de garantir o acesso as ações e serviços de saúde, não

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109

contemplando assim todas as necessidades de saúde da população usuária dos

serviços de transplante no Estado do Rio de Janeiro e, por conseguinte, acesso

equitativo à saúde.

Embora não tenha sido possível realizar a caracterização demográfica e

clínica do cadastro técnico único por centrar-se nos transplantados e pelo recorte

temporal, não permitir analisar a tendência evolutiva dos dados, essa estratégia de

pesquisa possibilitou uma aproximação com a caracterização da população usuária

dos que conseguem e dos que não conseguem acessar os serviços de transplante.

Também nos permitiu olhar os reflexos da Política Nacional do Transplante. Ou seja,

foi possível identificar suas possibilidades e limites, ao mesmo tempo em que

notamos que as diferenças regionais interferem nos resultados.

Em nossas análises, também depreendemos que com métodos quantitativos,

restringimos o conhecimento dos aspectos subjetivos responsáveis por preencher

lacunas do estudo, não consegue, por exemplo, captar os aspectos mais subjetivos

da relação médico-paciente, da trajetória assistencial e sobre a rede social de apoio,

sendo necessárias outras abordagens, que trabalhem, por exemplo, o itinerário

terapêutico percorrido pelo usuário enquanto aguarda o transplante. (61) (62) (63)

Nesse sentido, cabe aqui traçarmos certas ponderações a respeito do Estado

estudado. Apesar de o Estado fornecer serviços de referência para transplante

almejando a integralidade nas suas ações, ao disponibilizar serviço de alta

complexidade do sistema, tornou-se a partir de 2006, inviável a manutenção desta

estrutura diante das condições existentes. Se antes o principal entrave era a

regionalização destes serviços, agora se somam a este, a prestação de serviços

insuficientes. Esta insuficiência irá se manifestar tanto como fator de exclusão, como

de privilegiamento de determinada pessoa ou grupo.

Contudo, a criação de protocolos de atendimento e de fluxos formais dentro

da rede; a criação de uma central de marcação de consultas e exames; a criação de

consórcios intermunicipais como estratégia de cooperação entre municípios; dentre

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110

outras estratégias, podem ser primordiais para que o acesso ao transplante para

toda a população se torne mais equitativo.

Em síntese, contatou-se que o acesso equitativo ao transplante renal como

sinônimo de acesso a todos, garantido em todos os níveis de atenção e em todas as

necessidades de saúde da população usuária do transplante tem encontrado

diversos limites a serem transpostos.

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111

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