privatizaÇÃo do sistema prisional brasileiro ferreira... · expostas as mazelas do sistema...
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Rodrigo Ferreira Severino
PRIVATIZAÇÃO DO SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO
Centro Universitário Toledo
Araçatuba
2012
12
Rodrigo Ferreira Severino
PRIVATIZAÇÃO DO SISTEMA PRISIONAL BRASILEIRO
Centro Universitário Toledo
Araçatuba
2012
Monografia apresentada como requisito
para obtenção do grau de bacharel em
Direito à Banca Examinadora do Centro
Universitário Toledo sob a orientação do
Prof. Adriano
13
Banca Examinadora
____________________________________
Prof. Adriano
____________________________________
____________________________________
Araçatuba, __ de ______________ de 2012.
14
Aos meus pais, que me deram o bem mais valioso no mundo, a educação, sem o qual
hoje eu não seria nada.
15
Agradeço ao meu orientador Professor Adriano, pela paciência, competência e que, ao
longo dessa pesquisa, não poupou esforços e dedicação para que o sucesso fosse
alcançado. Aos meus colegas de classe, pelos cinco anos de perseverança e batalha para
a realização de um sonho.
Especialmente, agradeço meus pais que sempre me incentivaram e acreditaram em mim,
dando força para concluir esta primeira fase desta jornada que apenas se inicia.
16
Invictus1
Do avesso desta noite que me encobre,
Preta como a cova, do começo ao fim,
Eu agradeço a quaisquer deuses que existam,
Pela minha alma inconquistável.
Na garra cruel desta circunstância,
Não estremeci, nem gritei em voz alta.
Sob a pancada do acaso,
Minha cabeça está ensanguentada, mas não curvada.
Além deste lugar de ira e lágrimas
Avulta apenas o horror das sombras.
E apesar da ameaça dos anos,
Encontra-me, e me encontrará destemido.
Não importa quão estreito o portal,
Quão carregada de punições a lista,
Sou o mestre do meu destino:
Sou o capitão da minha alma.
1 Invictus é um pequeno poema do poeta Inglês William Ernest Henley (1849-1903). Ele foi escrito em 1875 e publicado pela primeira vez em 1888.
Nelson Mandela, citou-o como fonte de inspiração durante seu tempo na prisão.
17
Resumo
Em um primeiro momento, procura-se delimitar a evolução do sistema penitenciário sob
uma análise histórica das penas e dos estabelecimentos prisionais. Em seguida, são
expostas as mazelas do sistema carcerário brasileiro, demonstrando a falência do cárcere
e sua ineficácia na ressocialização do preso. Posteriormente, analisam-se os aspectos
concernentes a privatização do sistema prisional, bem como uma possível proposta
prática de implantação nos moldes constitucionais e legais. Busca-se, especificamente,
avaliar a nova perspectiva e/ou única alternativa para concretizar os fins da pena
privativa de liberdade. Adota-se a metodologia bibliográfica bem como documental.
PALAVRAS-CHAVE: presídios, privatização, sistema prisional, parceria público-privada.
18
Abstract
At first, we try to define the evolution of the prison system in a historical analysis of
pens and prisons. They are then exposed the ills of the Brazilian prison system,
demonstrating the failure of the prison and its ineffectiveness in the rehabilitation of the
prisoner. Subsequently, we analyze the aspects concerning the privatization of the
prison system, as well as a practical proposal possible deployment in constitutional and
legal manner. We seek to specifically evaluate the new perspective and / or only
alternative to achieve the purposes of the custodial sentence. It adopts the methodology
literature as well as documentary.
KEYWORDS: prisons, privatization, prisons, public-private partnership.
19
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO.............................................................................................................. 11
I - SISTEMA PENITENCIÁRIO BRASILEIRO.......................................................... 13
1.1 - Evolução da Pena................................................................................................... 13
1.2 - Breve Histórico Sobre o Sistema Penitenciário..................................................... 16
1.3 - Modelos de Sistemas Penitenciários...................................................................... 18
1.4. Legislação Penal no Brasil..................................................................................... 23
II - SISTEMA PENITENCIÁRIO NA LEGISLAÇÃO ATUAL.................................. 27
2.1 - Constituição Federal – Art. 5º................................................................................ 27
2.2 - Lei de Execução Penal.......................................................................................... 30
2.3 – Estabelecimentos Prisionais previsto na Legislação Brasileira............................. 34
2.3.1 – Penitenciária............................................................................................ 34
2.3.2 – Colônia Agrícola, Industrial ou Similar.................................................. 35
2.3.3 – Casa do Albergado.................................................................................. 35
2.3.4 – Centro de Observação............................................................................. 36
2.3.5 – Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico..................................... 36
2.3.6 – Cadeia Pública........................................................................................ 36
III - CONDIÇÕES ATUAIS DO SISTEMA PENITENCIÁRIO BRASILEIRO......... 38
3.1 - Superlotação........................................................................................................... 38
3.2 - Maus Tratos............................................................................................................ 39
3.3 - Falta de Atendimento Médico................................................................................ 40
3.4 - As Rebeliões e Fugas das Penitenciárias e a Reincidência.................................. 41
IV - PRIVATIZAÇÃO DO SISTEMA PRISIONAL.................................................... 43
4.1 - Análise Comparada dos Modelos Estrangeiros de Privatização ........................... 43
4.1.1 - Modelo Norte-Americano....................................................................... 43
4.1.2 - Modelo Inglês.......................................................................................... 44
4.1.3 - Modelo Francês....................................................................................... 45
4.2 - Intervenção da Iniciativa Privada no Sistema Prisional Pátrio.............................. 46
20
4.3 Viabilidade da Privatização do Sistema Penitenciário no Brasil.............................. 47
4.4 - Proposta de Privatização do Sistema Prisional...................................................... 51
4.5 - Parceria Público-Privada........................................................................................ 52
4.6 - Aspectos Importantes do Direito Administrativo sobre as Parcerias Público-
Privada............................................................................................................................ 54
4.6.1 - Da Licitação nas Parcerias Público-Privadas.......................................... 56
4.6.2 O Controle e a Fiscalização do Parceiro Privado pela Administração
Pública................................................................................................................ 57
4.7 - Algumas experiências brasileiras........................................................................... 58
4.7.1 - Penitenciária de Guarapuava – Estado do Paraná................................... 59
4.7.2 - Penitenciária de Joinville – Estado de Santa Catarina............................. 60
4.7.3 - Penitenciária Regional do Cariri, Penitenciária Industrial Regional de
Sobral e o Instituto Presídio Professor Olavo Oliveira II– Estado do
Ceará................................................................................................................... 62
4.7.4 - Outros Estados......................................................................................... 64
4.8 - Respondendo a legítimas preocupações ................................................................ 64
4.8.1 - Os apenados podem ser colocados em prisões privadas? ....................... 64
4.8.2 - Os agentes penitenciários em prisões privadas podem usar força física
para conter os apenados? ................................................................................... 65
4.8.3 - Como assegurar que os direitos dos prisioneiros não sejam violados, e
como seriam controladas e fiscalizadas as instituições penais privadas? .......... 66
4.8.4 - Não haveria o risco de as prisões privadas manter os presos além do
prazo de condenação? ........................................................................................ 66
4.8.5 - As prisões privadas não ficariam apenas com os prisioneiros de baixa
periculosidade? .................................................................................................. 67
4.7.6 - O preso estará obrigado a trabalhar nas prisões privadas?...................... 67
CONCLUSÃO ............................................................................................................... 68
REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA ............................................................................... 71
11
INTRODUÇÃO
A atual condição do sistema penitenciário brasileiro é preocupante. Há
tempo nosso sistema vem apresentando diversos problemas como, por exemplo, a
superlotação, a falta de atendimento à saúde, rebeliões e fugas, corrupção. Problemas
estes que tornam o processo de reabilitação ineficiente impossibilitando o retorno
adequado do apenado ao convívio em sociedade. Diante desta situação, o sistema
brasileiro clama por novas perspectivas. Entre várias soluções apresentadas para sanar
os problemas acima mencionados o que mais tem se discutido é a proposta de
privatização do sistema prisional.
O primeiro capítulo do presente trabalho inicia-se o com o estudo
sobre a pena, analisando a sua evolução, desde a sua origem quando era apenas uma
vingança privada até a privação da liberdade de liberdade, pena a ser aplicada por
excelência, bem como a história das prisões, remontando a sua origem quando esta
possuía apenas a finalidade de assegurar uma futura execução da pena, que geralmente
era a pena de morte. Em seguida, passa-se ao estudo dos sistemas penitenciário
delimitando os principais modelos, quais sejam o Pensilvânico ou Filadélfico, o
Auburniano e o Progressivo, sendo que este último é o modelo adotado pelo Brasil.
Finalizando o capítulo, faz-se uma breve análise da legislação penal brasileira ao longo
de sua história.
No segundo capítulo, busca-se analisar o sistema penitenciário dentro
do contexto da legislação brasileira. A intenção deste capítulo é demonstrar como o
sistema penitenciário de encontra na legislação brasileiro, apontando sistematicamente
quais são os direitos legalmente assegurados aos condenados em especial aqueles
previstos em texto constitucional. Neste capítulo ainda são delimitadas as espécies
estabelecimentos prisionais previsto na legislação brasileira, destacando as principais
nuances das penitenciárias, colônias agrícolas, industriais ou similares, casa do
albergado, centros de observação, hospitais de custódia e tratamento psiquiátrico e
cadeias públicas.
No capítulo seguinte, são analisadas as mazelas do sistema prisional,
especificamente a superlotação, os maus tratos sofridos pelos presos, a falta de
atendimento médico, as fugas e as rebeliões e as fugas nas penitenciárias, bem como a
12
reincidência, entre outros, demonstrando a incapacidade do Estado em administrar o
sistema carcerário.
No último capítulo, é abordado o tema central deste trabalho que é a
privatização do sistema prisional. Inicialmente são exibidos os fatores que ensejaram a
experiência privatizante. Em seguida faz-se uma análise dos principais modelos de
privatização existente no mundo, que são o francês, inglês e norte-americano. É também
apresentada a tímida inicialização brasileira da entrega do cárcere a iniciativa privada,
bem como um breve estudo de sua viabilidade. Neste capítulo, busca-se ainda
demonstrar alguns exemplos de sucesso na parceria entre os estados membros e a
iniciativa privada no que tange ao sistema penitenciário. Ao final tenta-se responder
algumas da mais importante preocupações naquilo que diz respeito a participação da
iniciativa privada em um setor predominantemente público como é o sistema
penitenciário.
A problemática em torno da situação da falência do sistema prisional é
de interesse amplo, vinculando a sociedade de forma direta, vez que o delinquente é
fruto de seu meio e para ela retornará. Se o Estado já se mostrou ineficiente para
administrar toda a estrutura carcerária, torna-se imprescindível a busca por novas
alternativas. A sociedade e a Administração Pública não podem ficar inertes antes as
deficiências do mundo intramuros.
13
I - SISTEMA PENITENCIÁRIO BRASILEIRO
1.1 - Evolução da Pena
O Direito Punitivo passou por diversas transformações ao longo do
tempo e das civilizações, principalmente no modo de aplicação das penas.
Nos tempos primitivos, a pena não significava mais nada senão a
vingança, ou seja, o revide à agressão sofrida, que normalmente era desproporcional
com a ofensa e não havia preocupação que ela fosse aplicada com justiça. As fases de
evolução da vingança penal foram variadas, mas elas não foram sucedidas de modo
sistemático, como veremos a seguir.
No princípio o que imperava era a vingança privada, que era violenta
e quase sempre eivada de demasias (GARCIA apud MARQUES JÚNIOR, 2007, pág.
1). Naquele tempo, como não existia uma sociedade organizada (Estado) o direito de
punir cabia exclusivamente ao particular. Então, se indivíduo sentisse vítima de um
crime, ele poderia reagir com violência contra aquele indivíduo que lhe praticou algum
mal. Não havia necessidade de que o revide fosse proporcional ao mal sofrido. Inexistia
um controle para assegurar que o ofendido não revidasse de modo desproporcional, a
única preocupação que se tinha naquele tempo era que o infrator deveria ser punido,
pouco se importando com a sua causa.
Explica GARCIA (apud MARQUES JÚNIOR, 2007, pág. 1) que:
Sem observar, mesmo aproximadamente, a lei física da reação igual e
contraria à ação, o ofendido e os do seu agrupamento procediam desordenada
e excessivamente, de modo que, às vezes, aquilo que constituía ofensa a um
indivíduo passava a sê-lo relativamente à comunidade toda a que ele
pertencia, travando-se lutas e guerras que o ódio eternizava.
A “Lei de Talião” surge para moderar a vingança privada, para que as
tribos não acabassem uma com a outra, ou até mesmo se autodizimassem. Nela buscou-
se conter os excessos, devendo, portanto, existir uma correspondência entre a ofensa e a
reação. Nesta época, foram adotados o Código de Hamurábi (Babilônia) e o Código de
Manu.
14
Com o avançar das civilizações o direito de punir passa a ter cunho
religioso, fundamentando-se na justiça divina, e a punição passou a representar a própria
vontade dos deuses. Nesse momento a vingança deixa de ser privada e passa ser divina.
Assim, o indivíduo que cometesse um delito estaria ofendendo aos deuses, ainda que
sua conduta atingisse apenas uma determinada pessoa.
Esta modelo de Direito Punitivo foi adotado por alguns povos, tais
como os gregos, os hindus, os babilônios, os chineses e os persas.
Em Roma a crença de que o delito era uma ofensa aos deuses e que
eles só se acalmariam com a aplicação de uma pena ao infrator, perdurou até 509 a.C.,
data da instalação da República Romana. A partir daí o Estado romano toma para si o
direito de punir, passando a ser o único ente legitimado a aplicação da pena. Deste
modo, o direito romano influenciou outros povos e, consequentemente, desapareceu a
vingança privada por completo.
Apesar de o Estado ter tomado para si o direito de punir, as penas
continuaram a ser praticadas com violência e com pouca ou sem nenhuma
fundamentação.
Foram os filósofos gregos trouxeram a debate uma questão geralmente
ignorada pelos povos anteriores: a da razão e fundamento do direito de punir e da
finalidade da pena. Questão esta, que preocupou diversos pensadores e que vieram a ser
mais detidamente considerada no movimento iniciado por Sócrates, com o particular
interesse que então se tomou pelos problemas éticos.
Apesar de pouco se saber sobre o Direito Punitivo grego, o que há de
mais importante advém da obras de dois importes filósofos: Platão e Aristóteles. Na
visão de Platão a pena tinha apenas caráter expiatório, para ele o indivíduo que
praticasse alguma conduta que era recriminada pela sociedade deveria ser penalizado,
deste modo a pena serviria como um castigo em retribuição ao mal cometido.
Aristóteles não via o caráter expiatório nas penas, mas sim o caráter intimidatório. Para
este importantíssimo filósofo, o castigo além de intimidar o réu para que não praticasse
novamente condutas recriminadas, deveria também servir de exemplo para os demais,
que por ventura, estivessem com intenção de cometer um crime.
Já na Idade Média, o direito de punir ficou marcado por sua crueldade.
Fortemente influenciado pelo Sistema das Ordálias ou “Juízos de Deus”, os julgamentos
consistiam-se na realização de provas de superação e sobrevivência e cujo resultado era
interpretado como um juízo divino. O sistema das “Ordálias” ou "Juízos de Deus”
15
originou-se no direito germano, quando a pena passou a constituir uma satisfação à
Deus.
A partir do século IX as penas começaram a sofrer um processo de
humanização. Com o fortalecimento Direito Canônico decorrente da expansão da Igreja
Católica, as penas sofreram abrandamento e não se buscava mais a regeneração do
infrator através da violência, mas sim por meio da oração e penitência. Segundo este
sistema, o infrator deveria ser castigado para que meditasse sobre o crime cometido e se
arrependesse. Foi justamente neste período que se deu a introdução da pena privativa de
liberdade.
A pena de morte e a tortura foram pouco utilizadas, pelo menos até o
surgimento da Santa Inquisição, que devido a proliferação da Igreja Católica pelo
mundo e sua forte ligação com o Estado, principalmente no século XIII, qualquer
conduta considerada como heresia pela Igreja era considerada como se fosse uma
infração contra o próprio Estado. As penas aplicadas pela Igreja aos infratores tinham
cunho intimidatório. Nesta época foram cometidas grandes arbitrariedades.
O caráter cruel das penas continuou durante o período absolutista, que
perdurou entre os séculos XV e XVIII. As penas tinham como finalidades a reafirmação
do poder soberano e a intimidação das demais pessoas para que outros não viessem a
cometer crimes.
Por volta do fim do século XVIII e início do século XIX, deu-se início
à aplicação das “penas de grande suplício”, em que os condenados eram totalmente
destituídos de sua dignidade e humilhados perante todos da sociedade. As penas, muitas
vezes, eram aplicadas em local aberto e de fácil acesso a população, estas penas
possuíam caráter intimidatório, pois visava intimidar a população para que futuramente
não viesse a cometer nenhuma conduta criminosa.
Aos poucos, o suplício passou a dar lugar à prisão, à deportação, aos
trabalhos forçados e até mesmo ao enforcamento, que não era considerado suplício
devido à rapidez em sua execução.
Com a institucionalização da prisão, a pena privativa de liberdade se
torna a pena a ser aplicada por excelência, iniciando uma nova história da punição. A
prisão, como pena propriamente dita, tornou-se uma forma do Estado castigar o infrator
pelo mal que ele causou. Esta forma pode ser considerada a mais racional encontrada
pelo Estado e pelo homem para legalizar a vingança contra o responsável da conduta
criminosa.
16
1.2 - Breve Histórico Sobre o Sistema Penitenciário
O Sistema Penitenciário remonta a sua origem ao início da civilização
humana. A sociedade, ainda que primitiva, sempre buscou, de alguma forma, penalizar
aqueles indivíduos que não conseguiam se enquadrar ao seu modo de vida, excluindo-os
de seu seio social.
No mundo primitivo tinha-se o ato de encarcerar como uma forma de
manter sob custódia e tortura aqueles indivíduos que cometiam faltas ou praticasse
algum ato que fossem considerados como condutas criminosas ou contrárias aos bons
costumes. Naquele tempo, os recintos que serviam como cárcere aos infratores eram os
mais diversos possíveis e, a sua finalidade era apenas de afastar do convívio em
sociedade aquele indivíduo. Assim como diversos eram os locais que serviam de
depósito humano, também eram diversas as penalidades impostas aos infratores.
O encarceramento dos indivíduos não possuía o caráter de pena. A
finalidade da reclusão destes indivíduos era apenas preservá-lo sob custódia até a data
do julgamento, para assegurar uma futura execução da pena.
No Direito Romano, as infrações eram dividias em: crimina publica
(crimes públicos) e delicta privada (crimes privados). Crimina publica constituía-se
naqueles atos que eram considerados atentatórios à segurança do Estado Romano, seja
interna ou externamente e, portanto, cabia ao Estado exercer a repressão conta o
indivíduo infrator. As penas impostas a esta categoria de crime, em regra, eram severas
e na maioria das vezes o infrator era condenado à morte ou era exilado, que naquele
tempo era quase a mesma coisa do que ser condenado à morte. Delicta privada
consistia basicamente em delitos de gravidade menor, cuja repressão ficava a cargo do
ofendido, o Estado somente intervinha para regular esse exercício. As penas para essa
categoria crime eram, geralmente, de natureza pecuniária e possuía caráter
compensatório.
Em Roma, o recolhimento do indivíduo infrator para a prisão não
possuía natureza de pena propriamente dita. A prisão nada mais era que um local o qual
o condenado ficava retido até que pagasse a sua dívida com a sociedade
Naquela época a figura do defensor, do acusador e do julgador
concentrava-se em uma única pessoa, o juiz. Isto conferia ao juiz plenos poderes, não
havia observância a nenhum tipo de princípio que garantisse o mínimo de respeito à
17
integridade física daquele indivíduo investigado, muito menos aos indivíduos
condenados. Como se isso não bastasse, os condenados aguardavam a execução de sua
pena em locais que não possuíam o mínimo de condição para abrigar uma pessoa. Isto
se dava devido ao fato de que originalmente as prisões não possuíam caráter de sanção,
era apenas o local de custódia no qual a pessoa condenada aguardava até o momento em
que a pena a ele imposta seria executada, assegurando desta forma o cumprimento das
punições. Estes locais que serviam de depósito humano eram os mais diversos
possíveis, como por exemplo: calabouços, aposentos em ruínas, torres, palácios
abandonados e outros edifícios.
Contudo, foi na Idade Média que surgiu a diferença entre prisão
custódia e prisão eclesiástica. A prisão custódia era o local no qual o réu ficava retido
temporariamente aguardando a execução da verdadeira pena cominada. Já a prisão
eclesiástica era mais humana que a prisão secular, destinava-se aos clérigos que se
rebelavam pregando idéias de caridade e fraternidade.
Foi nesta época também que começou a se adotar a privação de
liberdade como forma de cumprimento de pena. Isto se deu graças a Igreja Católica que
pelo fato de não coadunar a pena de morte, passou possuir locais que tinha como
finalidade de restringir a liberdade dos indivíduos que cometessem pecados ou crimes
merecedores de condenação. Estes eram locais de penitência e oração para onde eram
levados os condenados para serem reeducados com a finalidade de reingressá-los ao
convívio social. Esses condenados eram chamados de “penitenciários”. As experiências
dos penitenciários da Igreja contribuíram para uma mudança político penal nos Estados,
não somente por ter dado a prisão um caráter punitivo, como também por ter deixado
um legado no que tange à reforma do condenado.
Com isso, a privação da liberdade do indivíduo, como maneira de
punição em decorrência da prática de delitos penais, gerou o surgimento de
estabelecimentos organizados, cuja finalidade era excluir do convívio social os
indivíduos que representavam risco à sociedade. Esses estabelecimentos organizados
eram presídios, casas de detenção, penitenciárias, nos quais havia uma população
vivendo em comunidade. Essa população mantida nos estabelecimentos prisionais é que
deu origem ao denominado sistema penitenciário.
18
1.3 - Modelos de Sistemas Penitenciários
Vimos no item anterior, que as prisões eram apenas os locais onde os
condenados ficavam reclusos temporariamente aguardando o cumprimento da pena.
Vimos também que o termo “penitenciária” teve origem através da Igreja Católica que
chamava de penitenciária a clausura onde se recolhiam os pecadores arrependidos para
cumprirem penitência, refletirem sobre o erro praticado e abominá-lo.
Neste sentido, MIRABETE (2004, p. 271) nos lembra das palavras de
PIMENTEL
A pena de prisão teve sua origem nos mosteiros da Idade Média, “como
punição imposta aos monges ou clérigos faltosos, fazendo com que se
recolhessem às suas celas para se dedicarem ao silêncio, à meditação e se
arrependerem da falta cometida, reconciliando-se assim com Deus”. Essa
idéia inspirou a construção da primeira prisão destinada ao recolhimento de
criminosos, a House of Correction, construída em Londres entre 1550 e 1552,
difundindo-se de modo marcante no século XVIII.
Superada esta fase e tornando-se a privação da liberdade a pena a ser
aplicada por excelência, começa então a surgir importantes movimentos para
desenvolver a criação de locais (prisões) que servissem para correção dos condenados.
Entre os anos de 1550 e 1552, em Londres, foi construída a House of
Corretion, a primeira prisão destinada ao recolhimento de criminosos, que servia aos
desocupados e desordeiros, e tinha a finalidade de reformá-los para o trabalho
obrigatório, forçando-os a ganharem seu próprio sustento, além disto, buscava-se evitar
que outros dedicassem à delinquência.
Como esse modelo prisional obteve êxito, rapidamente foi adotado por
outros países, espalhando-se pela Europa de modo marcante no século XVI e XVII, com
as prisões de Nuremberg (1558), Amisterdã (1597), Bremen (1609), Lubek (1613),
Hamburgo (1622), Paris (1656) e Roma (1703).
No final do século XVII surge o modelo de estabelecimento prisional
conhecido como sistema panóptico, que foi apresentado pelo filósofo e jurista inglês
Jeromy Bentham. O sistema panóptico era um modelo de prisão celular que se
caracterizava pela forma radical em que só uma pessoa poderia exercer, a qualquer
momento, um posto de observação. A prisão deveria ser circular, pois possibilitava ao
observador ver todos os locais onde houvesse presos. Os prisioneiros ficavam
19
confinados em celas individuais, onde eram observados por um vigia, que não podia ser
visto pelos prisioneiros.
Para Foucault (1984, p.90),
O Panóptico de Bentham é a figura arquitetural dessa composição. O
princípio é conhecido: na periferia, uma construção em anel; no centro, uma
torre; esta é vazada de largas janelas que se abrem sobre a face interna do
anel; a construção periférica é dividida em celas, cada uma atravessando toda
a espessura da construção; elas têm duas janelas, uma para o interior,
correspondendo às janelas da torre; outra que dá para o exterior, permite que
a luz atravesse a cela de lado a lado. Basta então colocar um vigia na torre
central, e em cada cela trancar um louco, um doente, um condenado, um
operário ou um escolar. Pelo efeito da contraluz pode-se perceber da torre,
recortando-se exatamente sobre a claridade, as pequenas silhuetas cativas nas
celas da periferia. Tantas jaulas, tantos pequenos teatros, em que cada ator
está sozinho, perfeitamente individualizado e constantemente visível. O
dispositivo panóptico organiza unidades espaciais que permitem ver sem
parar e reconhecer imediatamente. Em suma, o princípio da masmorra é
invertido; ou antes, de suas três funções – trancar, privar de luz e esconder –
só se conserva a primeira e suprimem-se as outras duas. A plena luz e o olhar
de um vigia captam melhor do que a sombra, que finalmente protegia. A
visibilidade é uma armadilha.
Nos Estados Unidos, em meados do século XVII, devido a
preocupação em se estabelecer uma organização sistêmica das prisões, começam a
surgir novos modelos de sistemas penitenciário, mas conservando as linhas
fundamentais dos estabelecimentos penais ingleses, holandeses e alemães, além das
ideias de Beccaria, Howard e Benatham, assim como os conceitos religiosos aplicados
pelo Direito Canônico. Os principais modelos foram o sistema celular Pensilvânico ou
Filadélfico e o sistema Auburniano, que são os modelos para as prisões da época.
O sistema Filadélfico, consistia no isolamento completo do
sentenciado, era utilizado o isolamento celular absoluto, tanto durante o dia quanto
durante a noite. Aos penitenciários era vedado o contato com o mundo externo, eles não
podiam sair, não havia trabalho, não havia visitas, o que era possibilitado à estas
pessoas era apenas passeio esporádico pelo pátio e leitura da Bíblia, para que elas se
dedicassem exclusivamente à educação religiosa. O único contato que esses presos
poderiam ter era com o capelão.
O seu surgimento deu-se na prisão de Walnut Street, em Filadélfia, no
ano de 1790, Newgate (Nova York), Charlestown (Massachussetts), tendo sido
posteriormente implantado nas prisões de Western Penitenciary (Pittsburgh) e Eastern
Penitenciary (Cherry Hill), respectivamente em 1818 e 1819.
20
PRADO (2006, p. 543) defende que:
Em verdade, esse sistema penitenciário visava a organização do caos
existente nos estabelecimento prisionais da época. Consistia em uma tentativa
de sistematização da execução da pena privativa de liberdade, com vistas a
superação de inúmeros problemas (promiscuidade, fuga, rebeliões, higiene
deficitária, entre outros). Apesar de simbolizar um efetivo avanço, são muitas
as objeções feitas a esse sistema, que, colocado na segregação e no silêncio,
não proporcionava a reinserção social do condenado.
Contudo, esse sistema passou por transformações e o rigorismo do seu
isolamento foi atenuado, assim, posteriormente, passou a permitir que os presos
mantivessem contatos com os diretores do presídio, os funcionários, médicos,
religiosos, educadores e a realização de pequenas tarefas.
Não se pode negar que esse sistema foi um avanço, mas, eram muitas
as suas objeções, uma vez que, calcado na segregação e no silêncio, dificilmente o preso
iria se reintegrar à sociedade.
Por outro lado, o sistema Auburniano, surgiu no início do século XIX
na cidade de Auburn nos Estados Unidos, sendo o modelo no qual o preso era colocado
sob isolamento, em células individuais, apenas no período noturno; durante o dia, eles
dedicavam-se a trabalho em comum. Apesar de haver convívio entre os presidiários, a
comunicação entre eles era impedida sob ameaça de castigos corporais. Além disto, as
visitas de familiares, o lazer, a prática de exercícios físicos e as atividades educacionais
eram proibidas. O ponto vulnerável do sistema, como observa Pimentel (apud
MIRABETE, 1997, p. 321): “era o costume dos presos se comunicarem com as mãos
em decorrência da regra desumana do silêncio.”
O Sistema Auburniano ficou marcado como sendo um sistema calcado
na crueldade de seus castigos impostos aos presidiários. Por isso, podemos afirmar que
este sistema seria desapropriado para a correção do detento porque seria apenas uma
forma de impor o poder.
Por serem sistemas que davam tratamento de modo genérico aos
presidiários, não buscavam atender as peculiaridade de cada indivíduo delinquente, e
sacrificava aos interesses da disciplina o objetivo superior de sua recuperação social,
tanto o sistema Filadélfico quanto o sistema Auburniano não alcançaram êxito devido
aos métodos empregados. O fracasso desses sistemas acarretou no completo extermínio
de suas concepções originais em poucas décadas.
21
O sistema Progressivo nasceu da necessidade de sobrepor os sistemas
Filadélfico e o Auburniano, uma vez que estes dois se demonstraram extremamente
falhos. Esse sistema tinha por objetivo a preparação gradativa do indivíduo para a vida
em liberdade.
O sistema Progressivo, idealizado em meado do século XIX, é um
sistema baseado em marcas ou vales nos quais o condenado pode ir obtendo-os em
conformidade com suas condutas e seus rendimentos no trabalho. Com isso, o
sentenciado vai aos poucos melhorando a sua condição e assim reduzindo a gravidade
do regime inicial do cumprimento da pena inicialmente imposta (p. ex: um preso
condenado a iniciar o cumprimento de sua pena no regime fechado, obtendo o benefício
da progressão, passaria a cumpri-la no regime semi aberto e, se caso o preso iniciasse o
cumprimento de sua pena no regime aberto, passaria a cumpri-la no regime aberto). A
espinha dorsal destes sistemas é a divisão da pena em períodos, e a cada progressão
destes os privilégios são incorporados ao recluso, desde que possua boa conduta e
esteja, realmente, se readaptando à sociedade. Outro aspecto significativo é a
possibilidade do detento se reintegrar a sociedade antes do término de sua condenação.
Esse sistema é dividido em: Sistema Progressivo Inglês, o Sistema
Progressivo Irlandês e o Sistema de Montesinos
Desenvolvido por Alexander Maconochie, o Sistema Progressivo
Inglês ou Mark System, dividia-se em três períodos. O primeiro período era o de
isolamento celular diurno e noturno, podendo o recluso ser submetido a trabalho pesado
e alimentação escassa, esta etapa tinha o intuito de fazer o detento refletir sobre seu ato
delituoso. O segundo período o preso era submetido ao trabalho em comum, contudo
sob a regra do silêncio. Contudo, havia a possibilidade de liberdade condicional aos
reclusos, desde que tivessem boa conduta e produtividade. O terceiro e último período,
seria a própria liberdade condicional, a qual seria identificada pela liberdade limitada.
Superado este período, sem restrições, o preso finalmente obtinha-se a sua liberdade
definitiva.
O Sistema Progressivo Irlandês foi, na verdade, nada mais é do que
um aperfeiçoamento, feito por Walter Crofton, do regime de Maconochie. Este regime
buscava melhorar o que diz respeito à preparação do detento para seu retorno à
sociedade, com a ideia de se estabelecer uma prisão intermediária, isto é, uma etapa
entre as prisões e a liberdade condicional.
22
Diferentemente do Sistema Progressivo Inglês, este sistema era
composto de quatro períodos. O primeiro deste período era a reclusão celular diurna e
noturna. Nesta primeira fase era proibida a comunicação entre os presos e a alimentação
era escassa. No segundo momento, a reclusão celular noturna e trabalho diurno em
comum. Os presos eram divididos em classes e a progressão era obtida por acumulação
de pontos, que trariam privilégios e maior liberdade. O terceiro período (denominado
período intermediário), por sua vez, encontrava-se entre a prisão e a liberdade
condicional, eram prisões especiais nas quais os reclusos trabalhavam ao ar livre como
qualquer trabalhadores livres. E finalmente, o quarto período, a liberdade condicional,
que era exatamente igual ao Sistema Progressivo Inglês.
ASSIS (2007, p.2) apresenta um julgamento do regime progressivo, o
qual envolveu variantes de outros sistemas, assim observa:
A ideia de um sistema penitenciário progressivo surgiu no final do século
XIX, mas, no entanto, sua utilização generalizou-se através da Europa só
depois da I Guerra Mundial. A essência desse regime consistia em distribuir
o tempo de duração da condenação em períodos, ampliando-se em cada um
deles os privilégios que o recluso poderia desfrutar, de acordo com sua boa
conduta e do avanço alcançado pelo tratamento reformador. Outro aspecto
importante era o fato de possibilitar ao recluso reincorporar-se à sociedade
antes do término da condenação. Basicamente, o sistema progressivo tinha
como fundamento dois princípios: estimular a boa conduta do recluso e obter
sua reforma moral para uma futura vida em sociedade. O avanço considerável
obtido pelo sistema progressivo justifica-se pela importância por ele dada à
vontade do recluso e de que ele diminuíra o rigor excessivo na aplicação da
pena privativa de liberdade. Da filosofia original do sistema progressivo
surgiram várias variantes e peculiaridades em outros sistemas, o que na
verdade se constituíam num aperfeiçoamento do próprio sistema progressivo.
As primeiras mudanças decorreram do surgimento do sistema progressivo
inglês, desenvolvido pelo capitão Alexandre Maconochie, no ano de 1840, na
Ilha de Norfolk, na Austrália. Esse sistema consistia em medir a duração da
pena através de uma soma do trabalho e da boa conduta imposta ao
condenado, de forma que a medida que o condenado satisfazia essas
condições ele computava um certo número de marcas (mark system), de tal
forma que a quantidade de marcas que o condenado necessitava obter antes
de sua liberação deveria ser proporcional à gravidade do delito por ele
praticado. A duração da pena baseava-se então da conjugação entre a
gravidade do delito, o aproveitamento do trabalho e pela conduta do apenado.
O último dos regimes progressivo foi o Sistema de Montesinos, e a
sua principal mudança foi a substituição dos castigos pelos princípios de uma disciplina
racional, a qual era baseada na confiança e no estímulo.
23
Para BITENCOURT (2005, p. 171) o regime progressivo pode ter
algumas limitações como:
A efetividade do regime progressivo ser uma ilusão, diante das poucas
esperanças sobre os resultados que se podem obter de um regime que começa
com um controle rigoroso sobre toda a atividade do recluso, especialmente no
regime fechado; O sistema progressivo alimenta a ilusão de favorecer
mudanças que sejam progressivamente automáticas. O afrouxamento do
regime não pode ser admitido como um método social que permita a
aquisição de um maior conhecimento da personalidade do interno.
Por dar importância à vontade do recluso e diminuindo o rigorismo na
aplicação da pena privativa de liberdade, o regime progressivo significou um avanço
considerável ao sistema penitenciário.
Ressalta-se que alguns países atualmente empregam este sistema,
tendo como objetivo o reingresso do condenado na sociedade.
1.4. Legislação Penal no Brasil
No Brasil, assim como em outros países, a prisão figurando como
pena teve seu aparecimento tardio. Inicialmente, no país a prisão era aplicada apenas
aqueles acusados que estavam à aguardando o seu julgamento.
Até a introdução do Código Criminal do Império, em 1830, no Brasil
vigorou as Ordenações Afonsinas, Manuelinas e Filipinas. Essas ordenações tinham por
base um direito penal baseado na brutalidade das sanções corporais e na violação dos
direitos do acusado.
Essa situação perdurou até a introdução do Código Criminal do
Império, em 1830. Nascido da necessidade de substituir a legislação do Reino, pois o
país era recém independente, este código estabelecia três tipos de crimes: os públicos,
os particulares e os policiais. Os públicos eram aqueles crimes praticados contra a
ordem política instituída. Os particulares eram os crimes praticados contra a propriedade
ou contra o indivíduo. Os policiais, por sua vez, eram os crimes praticados contra a
civilidade e os bons costumes. Nestes últimos incluíam-se os vadios, os capoeiras, as
24
sociedades secretas e a prostituição. O crime de imprensa era também considerado
policial.
Em quaisquer dos casos acima citados, o governo imperial poderia
agir aplicando as penas que continham no código como, por exemplo, prisão perpétua
ou temporária, com ou sem trabalhos forçados, banimento ou condenação à morte.
Em 1830, este código, ao ser transformado em lei, tornou-se o
primeiro Código Penal autônomo da América Latina. Influenciado pelas ideias liberais
que inspiraram leis penais européias e as dos Estados Unidos, este estatuto já trazia
consigo ideias de justiça e de equidade.
No ano de 1832, pouco tempo depois do Código Criminal ter entrado
em vigor, foi introduzido na legislação pátria o Código de Processo. Este código,
também calcado no espírito liberal, foi de suma importância para a legislação brasileira,
pois de vigorou como sendo a sua lei processual em matéria repressiva o ano de 1941.
Em 1889, com a Proclamação da República, intensificou-se a
necessidade de se promover reforma na legislação criminal, mesmo porque já haviam se
passado 60 anos da promulgação do Código do Império, e as suas leis ficaram
envelhecidas por não mais acompanhar a realidade.
Em 1890, passou a vigorar no Brasil um novo Código Penal. Os
grandes marcos deste código recém instituído foi a abolição da pena de morte e a
implementação do regime penitenciário de caráter correcional, cuja finalidade era de
ressocializar e reeducar o detento. Contudo, este novo código, por ter sido feito às
pressas, foi objeto de inúmeras críticas, pois apresentava vários defeitos técnicos,
apresentava vários defeitos técnicos.
Para Pereira Cuano (2010, p. 5), aduz que:
“O código Penal dos Estados Unidos do Brasil” foi promulgado pelo Decreto
de Governo Provisório, sob o n.° 847, de 11 de outubro de 1890, só tendo
entrado em vigor no ano de 1891, face o Decreto 1.127, de 6 de dezembro de
1890, que assinava o prazo de seis meses para a sua execução no território
nacional (art.411, CP).
O Código, era dividido em 4 livros, sendo que o primeiro tratava dos crimes e
penas, o segundo militava sobre os crimes em espécie, o terceiro, das
contravenções em espécie, e o quarto, das disposições gerais, sendo
composto de quatrocentos e doze artigos.
O primeiro Código penal republicano foi menos feliz que o seu antecessor. A
pressa com que foi concluído, prejudicou-o em mais de um ponto, e nele a
crítica pôde assinalar, fundadamente, graves defeitos, embora, muitas vezes
com excesso de severidade. Não tardou a impor-se a idéia de sua reforma, e
25
em menos de três anos depois da sua entrada em vigor, já aparecia o primeiro
projeto de Código, para substituí-lo.
O movimento de reforma, entretanto tornara-se imperioso. Em 1916, o
Instituto da Ordem dos Advogados, no Rio de Janeiro, fazia sentir no
Congresso a necessidade urgente da reforma penal e dois anos depois, uma
Comissão da Câmara e do Senado, entrava a discutir as bases de um projeto,
que ficou também sem andamento.
O Poder Executivo fez um projeto para um novo Código na tentativa de
sanar tais problemas. Em 1940, depois de inúmeras tentativas, o projeto definitivo foi
apresentado, sendo promulgado em 7 de dezembro do mesmo ano, entrando em vigor
em 1º de janeiro de 1942.
Vicente Piragibe coligiu toda a legislação penal posterior ao Código de 1890
e elaborou uma “Consolidação das Leis Penais”, obra de grande valor, pois facilitava a
todos quantos tinham de indagar qual direito penal estava vigente.
Para fazer o Código de 1940, o legislador brasileiro inspirou-se em um
Código Italiano, de 1930, chamado Código de Rocco, e também seguiu como exemplo
para inúmeras soluções adotadas, o Código Suíço de 1937.
O Código Penal, apesar de elaborado durante regime ditatorial, unifica
fundamentalmente as bases de um direito punitivo democrático e liberal. Na parte geral
do Código, temos por base: o princípio da reserva legal; o sistema progressivo para o
cumprimento da pena privativa de liberdade; a pluralidade de penas privativas da
liberdade; o sistema de duplo binário; a exigência do início da execução para a
configuração da tentativa; a suspensão condicional da pena e o livramento condicional.
Na parte especial, dividida em onze títulos, a matéria se inicia pelos crimes contra a
pessoa, terminando pelos crimes contra a administração pública.
O código Penal de 1940 viria a sofrer modificações nos anos de 1969, 1977,
1981 e 1984, sempre buscando se adequar as ideologias vigentes à época.
Em 1961, o governo decidiu fazer uma reforma na legislação criminal, e
solicitou a Nelson Hungria, mestre de Direito Penal Brasileiro, para que a fizesse.
Modificou-se a parte geral, tendo como ponto marcante o abandono do sistema do duplo
binário (medidas de segurança detentivas para imputáveis), adotando o sistema
vicariante (pena ou medida de segurança), nos casos em que o agente é semi-imputável.
No ano de 1984, juntamente com a nova Parte Geral do Código Penal, foi
estabelecida a Lei que cuida da Execução das penas, Lei nº 7.210/84, visando
regulamentar a classificação e individualização das penas, rezando ideias mínimas para
27
II - SISTEMA PENITENCIÁRIO NA LEGISLAÇÃO ATUAL
2.1 - Constituição Federal – Art. 5º
A Lei Máxima nacional, desde seus primeiros dispositivos, vem
preceituando direitos e deveres em relação aos indivíduos privados de sua liberdade.
Podemos notar que o legislador constituinte buscou resguardar aos presos todos os
direitos concedidos a qualquer cidadão comum. Por mais gravoso que seja o crime
praticado pelo condenado, este não poderá ter seus direitos fundamentais atingidos pela
sentença penal condenatória.
Veremos a seguir, previsões constitucionais no tocante aos direitos
dos presidiários.
A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5º, estabelece um rol
de diretos e garantias fundamentais inerentes ao ser humano como indivíduos.
O inciso III dispõe que “ninguém será submetido à tortura ou
tratamento desumano ou degradante”. Neste sentido, SILVA nos ensina que “a tortura
não é só um crime contra a vida. É uma crueldade que atinge a pessoa em todas as suas
dimensões e a humanidade como um todo”. Comumente utilizada à longa data, a tortura
foi expressamente vedada pelo constituinte, que buscou coibir esta conduta tão
temerária, porque se assim não fosse o Estado deixaria a condição de vítima, tendo o
direito de punir e ingressaria no conjunto dos agressores, tornando-se assim um agente
delituoso.
O inciso X dispõe que “são invioláveis a intimidade, a vida privada, a
honra e a imagem das pessoas, assegurado o direito a indenização pelo dano material ou
moral decorrente de sua violação”. É Indispensável lembrar que a idéia de intimidade,
honra, imagem estão intimamente ligadas ao conceito de dignidade da pessoa humana, e
por isso são fundamentos da liberdade e da justiça. Através da norma constitucional, de
caráter pétreo, o condenado aprisionado, além de não perder sua natureza humana,
deveria conservar o direito à dignidade e aqueles que dela decorrem, tais como a
privacidade e a intimidade, independentemente do mal que tenha cometido.
28
O inciso XXXV prevê que “a lei não excluirá da apreciação do Poder
Judiciário lesão ou ameaça a direito”. Portanto, o Poder Judiciário deverá apreciar
qualquer lesão ou ameaça a direito dos detentos.
O inciso XXXIX dispõe que “não há crime sem lei anterior que o
defina, nem pena sem prévia cominação legal”. Com isso a CF/88 assegura a todos,
homens livres ou presos, o princípio da legalidade, também chamado de reserva legal ou
princípio da anterioridade penal. Através desse princípio, é preciso conferir se a pena
que está sendo aplicada é a adequada em cada momento da execução.
O inciso XL dispõe que “a lei penal não retroagirá, salvo para
beneficiar o réu”. Com isso a retroatividade da norma penal em favor da sociedade fica
proibida, no entanto, em benefício do réu ela será permitida.
Os direitos e liberdades fundamentais estão descritos no inciso XLI,
que é mais um dispositivo de proteção judicial, tornando efetiva a garantia e os direitos
fundamentais assegurados pela Constituição Federal. O inciso XLI dispõe que “a lei
punirá qualquer discriminação atentatória dos direitos e liberdades fundamentais”.
Nesse sentido são assegurados aos detentos os remédios constitucionais como o Habeas
Corpus e o Mandado de Segurança, destinados a assegurar o cumprimento de tais
direitos injustamente violados ou em vias de serem violados.
O inciso XLV dispõe que “nenhuma pena passará da pessoa do
condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de
bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o
limite do valor do patrimônio transferido”. Tal inciso está assegurando que nenhuma
pena passará da pessoa do condenado, portanto, não incidirá sobre terceiros,
estabelecendo assim o princípio da pessoalidade ou da intangibilidade da pena.
O princípio da individualização da pena está previsto no inciso XLVI,
no qual é exigida estreita correspondência entre a responsabilização da conduta do
agente e a norma a ser aplicada para que a pena atinja suas finalidades de prevenção e
repressão. Tal inciso estabelece o rol das penas a serem previstas pela legislação
ordinária.
No que se refere à pena imposta aos presos, o inciso XLVI estabelece
o rol das penas a serem previstas pela legislação ordinária e, no inciso XLVII, prevê as
penas inaplicáveis no direito brasileiro e dispõe que a pena não pode ter finalidade
vingativa e deve respeitar a dignidade humana.
29
Com relação à execução da pena, o inciso XLVIII dispõe que “a pena
será cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito, a
idade e o sexo do apenado”. Contudo, o que ocorre na realidade é uma mistura dos mais
diferentes tipos de condenados num mesmo ambiente carcerário, acabando por
influenciar a maioria daqueles que são condenados ao cárcere, contribuindo para o
fracasso da pena como prevenção especial ressocializadora.
O inciso LXIII assegura ao preso o direito de permanecer em silêncio,
sem que o exercício de tal direito acarrete prejuízo algum a si. Ainda foi assegurado ao
preso a assistência familiar e jurídica, bem como a ciência dos motivos de sua prisão.
Conforme dispõe o inciso LXIII: “o preso será informado de seus direitos, entre os
quais o de permanecer calado, sendo-lhe assegurada a assistência da família e de
advogado”.
É assegurado a todos internos, que comprovarem insuficiência de
recursos, a assistência jurídica gratuita, conforme previsto no inciso LXXIV, que
dispõe: “o Estado prestará assistência jurídica integral e gratuita aos que comprovarem
insuficiência de recursos”. Nesta situação será nomeado um defensor que irá zelar pelos
seus interesses.
O inciso LXXV dispõe que “o Estado indenizará o condenado por erro
judiciário, assim como o que ficar preso além do tempo fixado na sentença”. Pelo inciso
LXXV, há o direito à indenização àquele que foi erroneamente detido, ou ainda, por
excesso ilegal do tempo de prisão fixado em sentença, afim de que os danos sejam, ao
menos em parte, reparados.
É conveniente observar, ainda, o princípio da dignidade humana ou da
humanização da pena encontrado no artigo 1º, inciso III, bem como no artigo 5º, incisos
XLI e XLIX, todos da CF/88, sendo imprescindível para que se consiga alcançar a
reinserção do detento na sociedade, ou seja, a sua efetiva reabilitação para a vida em
sociedade.
Por fim, a sanção aplicada pelo Estado não constitui, modernamente,
uma vingança social, tendo como escopo a retribuição e prevenção do crime, buscando
a efetiva ressocialização do preso, o que, no entanto, na realidade não vem ocorrendo.
30
2.2 - Lei de Execução Penal
O projeto do Código Penitenciário da República 1933 foi a primeira
tentativa de se criar um código que tratasse da execução penal no Brasil. No entanto,
esse projeto veio a fracassar devido a promulgação do Código Penal de 1940, pois havia
discrepância entre eles. Em 1981, através de uma comissão instituída pelo Ministro da
Justiça e também composta por diversos professores, foi apresentado um anteprojeto da
nova Lei de Execução Penal, tendo sido aprovado e, posteriormente, a lei foi
promulgada em 11 de julho de 1984, surgindo assim a Lei nº 7.210.
Como se pode perceber, atualmente função da execução penal não é
simplesmente punir o infrator, deve assegurar também a aplicação humanizada da pena.
A Lei de Execução Penal de 1984, que foi uma obra vanguardista introduzida na
legislação brasileira da sua época, uma vez que pautada nos princípios e ideias da nova
defesa social, buscou-se garantir aos presos assistência das mais variadas ordem. Ao
reconhecer o devido respeito aos direitos humanos dos presos, a Lei de Execução Penal
passa a ter como foco principal a ressocialização dos condenados, ou seja, de
proporcionar ao egresso o retorno à sociedade e a inserção no meio em que vive, e não
mais a punição em si.
O artigo 1º da Lei de Execução Penal estabelece duas ordens de
finalidade. A primeira ordem trata da correta aplicação dos mandamentos existentes na
sentença, servindo de parâmetro para repressão e prevenção dos delitos. A segunda
ordem, não visa somente cuidar do sujeito passivo da execução, mas também da defesa
social, como se verifica na disposição a seguir:
Art. 1º - A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições de
sentença ou decisão criminal e proporcionar condições para a harmônica
integração social do condenado e do internado.
Quando a lei de Execução Penal estabelece “proporcionar condições
para a harmônica integração social”, ela buscou afirmar que o Estado de fornecer ao
condenado ou internado a devida assistência e a ajuda necessária para que estes
obtenham meios eficazes que sejam capazes de permitir a estes indivíduos o seu
regresso ao convívio social em condições favoráveis para sua efetiva integração.
31
Está previsto no artigo 3º da Lei de Execução Penal e artigo 38 do
Código Penal o princípio da humanização da execução penal. Este princípio assegura
que direitos como o direito à vida, à integridade física, ao sigilo de correspondência, à
alimentação, ao vestuário adequado, dentre outros não sejam atingidos pela sentença
penal condenatória ou por lei. Por força do artigo 15, inciso III da Constituição Federal
de 1988, a única limitação de direitos a qual os condenados estarão submetidos será no
que diz respeito a seus direitos políticos. Estes terão seus direitos políticos suspensos
enquanto durarem os efeitos da condenação criminal, tratando-se de uma exceção à
regra citada acima.
Entre os artigos 5º e o 9º da Lei de Execução Penal está prevista a
individualização da pena, que é outro princípio formador na missão de tutela da pessoa
humana do indivíduo que se encontra preso. Individualizando as penas, busca-se dar a
cada pessoa presa oportunidades e elementos capazes de reabilitá-los possibilitando a
sua reintegração social de forma eficaz, não somente devolvê-lo a sociedade do mesmo
modo o qual se encontrava antes de ser preso.
A individualização se inicia com a indispensável e prévia classificação
do condenado. Esta classificação é feita mediante exame da personalidade do
condenado, bem como exame criminológico, onde a personalidade do agente é
examinada com relação ao crime em concreto. Obrigatória para todos os condenados à
pena privativa de liberdade, essa perícia deve ser realizada por uma Comissão Técnica
de Classificação. A finalidade da classificação é a obtenção de um programa de
execução adequado as suas condições pessoais do condenado.
Portanto, o condenado, teoricamente, deveria ter o seu comportamento
e atitudes estudados por especialistas para que ao final se transferido para um
estabelecimento mais adequado para o cumprimento da pena e efetivamente reintegrá-lo
à sociedade.
Os artigos de 10 a 27 da Lei de Execução Penal são artigos referentes
ao tratamento penitenciário, que deve ser digno e humano.
No artigo 10 está disposto que a assistência ao preso e ao internado é
um dever do Estado, cuja finalidade é prevenir o crime além de orientar a sua
reabilitação social. O parágrafo primeiro deste mesmo artigo estende esta assistência ao
egresso.
32
No artigo 11 podemos encontrar o rol das assistências às quais o
Estado está submetido a prestar aos presos, como por exemplo: material, saúde, jurídica,
educacional, social e religiosa.
Os artigos 12 e 13 dispõem sobre a assistência material. Segundo o
artigo 12 o Estado tem o dever de fornecer a alimentação, vestuário e instalações
higiênicas. O artigo 13, por sua vez, versa sobre as instalações e serviços do
estabelecimento penal destinado aos condenados e a sua efetiva reeducação.
Está previsto no artigo 14, o direito do condenado à assistência à
saúde, qual compreende atendimento médico, farmacêutico e odontológico. No entanto,
para que isso seja possível, é indispensável que o Estado equipe os estabelecimentos
penais com instalações médico-sanitárias adequadas a fim de que os profissionais
executem os serviços que a lei preceitua.
Os artigos 15 e 16 disciplinam sobre a assistência jurídica aos presos e
aos internados que não tenham recursos financeiros para constituir um defensor. Isto
ocorre porque a grande maioria da população carcerária no Brasil não tem condições de
contratar um defensor. O artigo 16 dispõe que as “Unidades da Federação deverão ter
serviços de assistência jurídica, integral e gratuita, pela Defensoria Pública, dentro e
fora dos estabelecimentos penais”.
Dentre os demais direitos na lei assegurados, a assistência jurídica ao
condenado constitui a matriz de todos os demais. Nesse sentido como ensina Pimentel
(apud MIRABETE, 1997, p. 321): “É importante que o preso sinta a seu alcance a
possibilidade de lançar mão das medidas judiciais capazes de corrigir eventual excesso
de pena, ou que possa abreviar os dias de prisão”.
Entre os artigos 17 a 21 está disposto a assistência educacional aos
presos e internados. A assistência e a habilitação profissional, juntamente com o
trabalho, são os elementos mais importantes do tratamento que visam a reeducação do
preso, para que contribua para sua futura reintegração ao meio social. Ainda neste
sentido, é dever do Estado dotar os estabelecimentos prisionais com bibliotecas, para
uso de todas as categorias de reclusos, provida de livros instrutivos, recreativos e
didáticos.
O dever de assistência social ao preso é tratado nos artigos 22 e 23,
cuja finalidade é prepará-lo para retornar a liberdade, ou seja, a voltar viver no meio
social. A figura do assistente social é de suma importância no processo de reabilitação
social do preso, uma vez que cabe ao assistente estabelecer a comunicação entre o preso
33
e a sociedade da qual ele está afastado. Os meios para essa comunicação estão
disciplinados no artigo 23 da LEP.
Art. 23 - Incumbe ao serviço de assistência social:
I - conhecer os resultados dos diagnósticos ou exames;
II - relatar, por escrito, ao Diretor do estabelecimento, os problemas e as
dificuldades enfrentadas pelo assistido;
III - acompanhar o resultado das permissões de saídas e das saídas
temporárias;
IV - promover, no estabelecimento, pelos meios disponíveis, a recreação;
V - promover a orientação do assistido, na fase final do cumprimento da
pena, e do liberando, de modo a facilitar o seu retorno à liberdade;
VI - providenciar a obtenção de documentos, dos benefícios da Previdência
Social e do seguro por acidente no trabalho;
VII - orientar e amparar, quando necessário, a família do preso, do internado
e da vítima.
A assistência religiosa está versada no artigo 24, segundo a qual será
prestada aos presos e aos internados, permitindo-lhes a participação nos serviços
organizados no estabelecimento penal, bem como a posse de livros de instrução
religiosa. Caberá ao Estado propiciar aos presos, local apropriado aos cultos religiosos
dentro do estabelecimento prisional.
A assistência do egresso, prevista no artigo 25, consiste na orientação
e apoio para reintegrá-lo à vida social, além da concessão, se necessário, de alojamento
e alimentação em estabelecimento adequado por um período de 2 (dois) meses. O artigo
27 garante ao egresso a colaboração do serviço de assistência social para a obtenção de
trabalho.
O Capítulo III da Lei de Execução Penal, que vai do artigo 28 ao 37,
regulamenta o trabalho do condenado, como dever social e condição de dignidade
humana. Neste Capítulo está disposto que o condenado à pena privativa de liberdade
estará obrigado ao trabalho interno. Este trabalho terá a finalidade educativa e
produtiva, pois seu objetivo é a formação profissional do condenado. As aptidões e
capacidade deverão ser respeitada, ou seja, na atribuição do trabalho deverão ser levadas
em conta a habilitação, a condição pessoal e as necessidades futuras do preso, bem
como as oportunidades oferecidas pelo mercado. Na realização do trabalho deverá se
aplicar à organização e aos métodos de trabalho as precauções relativas à segurança e à
higiene.
O Título IV da Lei de Execução Penal versa sobre os estabelecimentos
penais, e seu objetivo é facilitar a realização de programas de tratamento ou da
34
reintegração social do preso. Estes estabelecimentos penais destinam-se ao condenado,
ao submetido à medida de segurança, ao preso provisório e ao egresso. Eles deverão
contar em suas dependências com áreas e serviços destinados a dar assistência,
educação, trabalho, recreação e prática esportiva. Naqueles estabelecimentos destinados
a mulheres deverão contar com berçários para que as condenadas possam cuidar de seus
filhos. Além disso, a lotação destes estabelecimentos deverá ser com compatível com a
sua estrutura e finalidade, que será determinada pelo Conselho Nacional de Política
Criminal, visando atender a sua natureza e peculiaridades.
Podemos então concluir que o objetivo da Lei de Execução Penal é
humanizar a pena do condenado, reabilitando-o para o convívio em sociedade e
capacitando-o para que este consiga reintegrar-se a sociedade de forma plena, não
apenas o devolvendo sem nenhum preparo psicológico e profissional.
O grande problema é que, passado duas décadas da introdução da Lei
de Execução Penal, muitas das garantias concedidas aos condenados não saíram do
papel, ou seja, fica apenas na teoria. O que foi projetado com o intuito de reabilitar os
condenados é muito bonito e perfeito, no entanto, pouca coisa é executada de fato,
pouco se efetivou.
2.3 – Estabelecimentos Prisionais previsto na Legislação Brasileira
A Lei de Execução Penal, além de assegurar vários direitos e garantias
aos presos, estabelece ainda em seus artigos de 87 a 102 diversos modelos de
estabelecimentos prisionais, são eles: a Penitenciária; a Colônia Agrícola, Industrial ou
Similar; a Casa do Albergado; o Centro de Observação; o Hospital de Custódia e
Tratamento Psiquiátrico; e a Cadeia Pública.
2.3.1 – Penitenciária
A penitenciária, conforme dispõe o artigo 87, é destinada ao
condenado à pena de reclusão, em regime fechado. Nela o condenado será alojado em
cela individual que conterá dormitório, aparelho sanitário e lavatório.
35
Segundo o artigo 88 da legislação acima mencionada, o condenado
será alojado em cela individual que conterá dormitório, aparelho sanitário e lavatório,
sendo requisitos básicos da unidade celular a salubridade do ambiente pela concorrência
de fatores de aeração, insolação e condicionamento térmico adequado à existência
humana e área mínima de seis metros quadrados.
2.3.2 – Colônia Agrícola, Industrial ou Similar
A Colônia Agrícola, Industrial ou Similar destina-se ao cumprimento
da pena em regime semiaberto. Nela o condenado poderá ser alojado em compartimento
coletivo. Nas palavras de Fernando Capez (2007, p.73), essa espécie de estabelecimento
deve preservar relativa liberdade para os presos, sendo a vigilância moderada, com os
muros mais baixos.
Conforme dispõe o artigo 91 da Lei de Execução Penal, o condenado
poderá ser alojado em compartimento coletivo, observados os mesmo requisitos
aplicáveis às penitenciárias (salubridade, aeração, isolação e condicionamento térmico
adequados à existência humana, além de área de seis metros quadrados por indivíduo).
Assegura ainda este dispositivo legal que o limite de capacidade máxima deve
resguardar os objetivos da individualização da pena
2.3.3 – Casa do Albergado
A Casa do Albergado destina-se ao cumprimento de pena privativa de
liberdade, em regime aberto, e da pena de limitação de fim de semana.
Por determinação do artigo 94 da Lei de Execução Penal, este
estabelecimento prisional deverá situar-se em centro urbano, separado dos demais
estabelecimentos, e caracterizar-se-á pela ausência de obstáculos físicos contra a fuga,
sendo que, conforme o artigo 95, em cada região haverá pelo menos, uma Casa de
Albergado, a qual deverá conter, além de aposentos para acomodar os presos, local
adequado para cursos e palestras, bem como instalações para os serviços de fiscalização
e orientação dos condenados.
36
2.3.4 – Centro de Observação
No Centro de Observação realizar-se-ão os exames gerais e o
criminológico, cujos resultados serão encaminhados à Comissão Técnica de
Classificação. Segundo o artigo 96 da Lei de Execução Penal, o Centro de Observação,
em harmonia com o Departamento Penitenciário local ou similar, é órgão destinado a
procedes a classificação dos condenados que iniciam o cumprimento da pena em regime
fechado, mediante a realização de exames e teste de personalidade, como o
criminológico, visando à individualização na execução da pena. Os resultados obtidos
neste estabelecimento são encaminhado à Comissão Técnica de Classificação, a qual
formulará o programa individualizador e acompanhará a execução da pena privativa de
liberdade
2.3.5 – Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico
O Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico destina-se aos
inimputáveis e semi-imputáveis referidos no artigo 26 e seu parágrafo único do Código
Penal. Ou seja, cabe ao hospital abrigar os doentes mentais, os portadores de
desenvolvimento mental incompleto ou retardado e aos que manifestam perturbação das
faculdades mentais.
Em relação ao Hospital de Custódia e Tratamento Psiquiátrico o item
99 da Exposição de Motivos da Lei de Execução Penal, dispõe que não existe a previsão
da cela individual, vez que a estrutura e as divisões de tal unidade estão na dependência
de planificação especializada, dirigida segundo padrões da medicina psiquiátrica,
porém, são estabelecidas as garantias mínimas de salubridade do ambiente e área física
de cada aposento.
2.3.6 – Cadeia Pública
A cadeia pública destina-se ao recolhimento de presos provisórios.
Cada comarca terá, pelo menos 1 (uma) cadeia pública a fim de resguardar o interesse
da Administração da Justiça Criminal e a permanência do preso em local próximo ao
seu meio social e familiar.
Nas palavras de MIRABETE (1999, p. 263):
37
A separação instituída com a destinação à Cadeia Pública é necessária, pois a
finalidade da prisão provisória é apenas a custódia daquele a quem se imputa
a prática do crime a fim de que fique à disposição da autoridade judicial
durante o inquérito ou a ação penal e não para o cumprimento da pena, que
não foi imposta ou que não é definitiva. Como a execução penal somente
pode ser iniciada após o trânsito em julgado da sentença, a prisão provisória
não deve ter outras limitações se não as determinadas pela necessidade da
custódia e pela segurança da ordem dos estabelecimentos.
Dispõe o artigo 5º do Pacto de San Jose da Costa Rica (Convenção
Americana de Direitos Humanos), que os condenados e os processados devem ficar
separados, sendo que o Código de Processo Penal, em seu artigo 300, também prevê que
as pessoas presas provisoriamente ficarão separadas das que já estiverem
definitivamente condenadas.
38
III - CONDIÇÕES ATUAIS DO SISTEMA PENITENCIÁRIO
BRASILEIRO
A condição dos estabelecimentos prisionais no Brasil é precária e se
encontra destoante daquilo que prega sua legislação, principalmente naquilo que se
refere ao direito do preso previsto em texto constitucional e das condições de ambiente
carcerário estabelecidos na Lei de Execução Penal. No Brasil, os estabelecimentos
prisionais, em especial a penitenciária e a cadeia, são debilitados e sucateados e, muitas
vezes também com problema de superlotação. Percebemos que nestes estabelecimentos
falta ocupação para os condenados, a ociosidade impera nesses ambientes.
3.1 - Superlotação
Quando estudamos a Lei de Execução Penal, vimos que ela em seu
artigo 88 assegura ao condenado o direito de ser alocado em uma cela individual que
deverá conter dormitório, aparelho sanitário e lavatório. No primeiro deste mesmo
artigo enumera os requisitos básicos da unidade celular: a) salubridade do ambiente pela
concorrência dos fatores de aeração, insolação e condicionamento térmico adequado à
existência humana; b) área mínima de seis metros quadrados.
Agora, se juntarmos estes dispositivos com o inciso terceiro do artigo
1º da Constituição Federal de 1988, o qual garante o supraprincípio da dignidade da
pessoa humana, teremos o quanto a atual condição do sistema penitenciário brasileiro
está longe de estar em conformidade com aquilo previsto em lei.
Neste sentido, NUCCI (2011, p. 1027)
A lotação do presídio deve ser compatível o controle por parte do Conselho
Nacional de Política Criminal e Penitenciária (art. 85, LEP). Esse é outro
ponto extremamente falho no sistema carcerário brasileiro. Se não houver
investimento efetivo para o aumento do número de vagas, respeitadas as
condições estabelecidas na LEP para os regimes fechado, semiaberto e
aberto, nada de útil se poderá esperar do processo de recuperação do
condenado. Na verdade, quando o presídio está superlotado a ressocialização
torna-se muito mais difícil, dependente quase que exclusivamente da boa
vontade individual de cada sentenciado.
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Segundo dados do Ministério da Justiça (BRASIL, 2012a) relativos a
dezembro do ano de 2011, a população carcerário no país é de 514.582, incluindo
homens e mulheres, em todos os regimes. Ocorre que, segundo as mesmas estatísticas, o
número de vagas disponíveis é de 306.497, somando-se todas as formas de
estabelecimentos prisionais. Portando, percebe-se que há um déficit de 208.085 vagas,
sem prejuízo dos mandados de prisão não cumpridos.
Diante deste dado, podemos concluir que a atual distribuição de
detentos nas instituições penitenciárias não atende àquilo que a lei exige, e que muito
menos resguarda o direito à dignidade da pessoa humana. O problema da superlotação é
que além dela ter se tornado algo freqüente, também tornou-se inevitável, porque, a
superlotação é alimentada pela incapacidade de os presídios promoverem a recuperação
dos egressos e pelo crescimento da criminalidade. O fenômeno da superlotação não
ocorre apenas nas penitenciárias, também ocorre nas cadeias públicas espalhadas pelo
Brasil. E tal fato não poderia estar mais longe da realidade: é rotineiro encontrarmos nas
cadeias prisioneiros condenados, que devido à lotação das penitenciárias e à burocracia
do sistema, estão cumprindo pena em cadeias públicas.
A superlotação, além de destruir a integridade moral e física do
indivíduo, contribui para o aumento da violência entre os condenados, leva à destruição
material do estabelecimento e é uma das principais razões para os presos iniciarem uma
rebelião.
Concernente a este problema, leciona NUCCI (2011, p.1027)
A lotação do presídio deve ser compatível com sua estrutura e finalidade,
havendo o controle por parte do Conselho Nacional de Política Criminal e
Penitenciária (art. 85, LEP). Esse é outro ponto extremamente falho no
sistema carcerário brasileiro. Se não houver investimento efetivo para o
aumento do número de vagas, respeitadas as condições estabelecidas na LEP
para os regimes fechado, semiaberto e aberto, nada de útil se poderá esperar
do processo de recuperação do condenado. Na verdade, quando o presídio
está superlotado a ressocialização torna-se muito mais difícil, dependente
quase exclusivamente da boa vontade individual de cada sentenciado.
3.2 - Maus Tratos
A superlotação não é o único problema encontrado no sistema
penitenciário nacional. O tratamento dado aos presos também é algo igualmente
40
lastimável. A violência contra os internos é algo rotineiro. Espancamentos, violência
física e sexual são situações comum no dia a dia dos detentos, e isto gera um ambiente
de revolta e ódio. Esse sofrimento psicológico vai destruindo aos poucos a dignidade do
indivíduo como pessoa, deixando-o cada vez mais humilhado e bestializado.
Estes tratamentos brutais aos quais os presos são submetidos
diariamente impossibilitam a reabilitação dos mesmos, pois, a violência gera inúmeros
danos psicológicos e físicos, tornando a penitenciária um local tenso e angustiante.
Então, pergunta-se: Como tirar da mente de um indivíduo a violência sendo que ele é
exposto à mesma a todo instante?
3.3 - Falta de Atendimento Médico
Aos condenados é assegurado o direito a saúde, conforme dispõe o
artigo 14 da Lei de Execução Penal. Como bem sabemos, instituições como os presídios
são ambientes extremamente propícios a propagação de doenças e outras enfermidades,
e por isso, a assistência médica se faz um serviço indispensável. No entanto, até mesmo
este tipo de serviço essencial sofre com descaso pelo Poder Público, uma vez que o
atendimento no sistema penitenciário é precário e deficiente.
A Lei de Execução Penal dispõe que a “assistência à saúde do preso e
do internado de caráter preventivo e curativo, compreenderá atendimento médico,
farmacêutico e odontológico”. No entanto, o que pode ser observado na realidade é bem
diverso do que expõe a referida lei. Em alguns presídios, por exemplo, os medicamentos
se resumem à alguns analgésicos e similares, muitas vezes, ficando a encargo dos
próprios presos o financiamento de medicamentos específicos ao seu tratamento. Não
esquecendo ainda de apontar que o serviço médico prestado pelos profissionais da área
é precário e muito aquém daquilo que é adequado ao paciente.
Devemos salientar ainda que nos presídios faltam equipamentos
adequados ao tratamentos dos detentos e os poucos equipamentos que podem ser
encontrado no interiores destes estabelecimentos são equipamentos sucateados e
inadequados para atender a sua finalidade.
A saúde daqueles indivíduos que se encontram encarcerados não se
resume a equipe médica, medicamentos e aparelhos médicos. Uma boa saúde tem por
41
base uma alimentação de qualidade, além do fato dos locais aos quais estas pessoas se
encontram devem ser limpos e higienizados, com ventilação e iluminação adequada a
estas instalações. Os médicos deveriam fazer visitas diárias aos presos e cuidar da saúde
física e mental de todos eles.
O mal da falta de assistência médica assola também as cadeias
públicas, normalmente superlotadas, e sem qualquer tipo de estrutura para tratamento
médico. Todo este descaso para com a saúde do condenado é mais uma amostra de
como, no atual sistema, a reabilitação do recluso é praticamente inviável.
3.4 - As Rebeliões e Fugas das Penitenciárias e a Reincidência
A rebelião juntamente com as fugas de presos é outro grave problema
do sistema carcerário no Brasil. A rebelião, de certo modo, é resultado de todos os
fatores negativos citados anteriormente. A falta de segurança nos presídios e o ócio dos
detentos são fatores que também contribuem significativamente para que as rebeliões
sejam algo corriqueiro nas prisões brasileiras.
Não obstante a existência na legislação nacional de garantias para os
indivíduos que cumprem pena privativa de liberdade, na prática ela não são observadas.
Os estabelecimentos prisionais, em especial as penitenciárias e as cadeias, são
associadas a insegurança que, devido a falta de ocupação para os detentos, acabam por
gerar conflitos internos entre os detentos e sentimento de revolta contra o sistema, que
culminam muitas vezes em rebeliões e possíveis fugas.
As rebeliões consistem em levantes organizados pelos detentos de
modo violento. No entanto, nada mais são do que uma tentativa de chamar a atenção das
autoridades quanto à situação degradante e subumana na qual eles são submetidos
constantemente dentro das prisões.
As fugas, por sua vez, são decorrentes da falta de segurança dos
estabelecimentos prisionais, que são inadequado, precários e superlotados, como
também do despreparo dos agentes que atuam nestes estabelecimentos, que muitas
vezes estão mais preocupados com a própria segurança. Há ainda o fator da grande
atuação das organizações criminosas dentro e fora dos presídios, além do aumento da
42
corrupção por parte dos policiais e agentes, que somados são incentivo para fugas em
massa de presos ou realização de rebeliões internamente organizadas.
A Lei dos Crimes Hediondos agravou ainda mais essa situação quando
trouxe, expressamente, a impossibilidade de progressão de regime em vários, fazendo
com que o sentenciado cumpra a pena integralmente em regime fechado.
Tanto a rebelião quanto a fuga, não condutas extremamente
inaceitáveis, porém compreensíveis, pois não se podendo exigir conduta diversa
daqueles que permanecem diariamente ociosos, sendo submetidos a um sistema
penitenciário fracassado.
A comprovação de que o atual sistema penitenciário não se demonstra
eficaz a reabilitar o condenado pode ser comprovado pelo elevado índice de
reincidência. Não existem dados oficiais quanto ao número de reincidência, mas na falta
de informação confiável, surgem inúmeras estimativas sem qualquer base concreta,
segundo as quais 70% dos ex-presidiários voltam ao crime. Este elevado índice de
reincidência demonstra que o sistema penitenciário, sobre tudo a pena de prisão, tem se
mostrado inútil. Ainda que não oficiais estes dados servem de alerta para que os poderes
públicos repensem a política de encarceramento.1
43
IV - PRIVATIZAÇÃO DO SISTEMA PRISIONAL
Diferentemente do que muitos acreditam: problemas referentes à
administração de sistema penitenciário não é coisa apenas de países subdesenvolvidos.
A superlotação, violência, más condições dos presídios e a escassez de verbas também
foram questões que motivaram as autoridades dos países ricos a procurarem alternativas
que viesse reduzir os gastos despendidos pelo Estado com a manutenção do sistema
carcerário. A privatização surge como uma ideia a ser discutida.
Estes Estados se encontravam à época sob influência do modelo de
política neoliberal, cuja ideia central era delegar à iniciativa privada a administração de
vários serviços estatais, dando ao particular uma grande ingerência em vários campos
sociais, e uma das alternativas encontradas para solucionar o problema do sistema
penitenciário foi a privatização.
A ideia de privatizar o aparelho estatal penitenciário surge nos Estados
Unidos e se estendeu por vários países que tinha um modo de produção em comum, o
capitalismo. Dessa forma, o ideário privatizante teve sua gênese oriunda do pensamento
neoliberal e no chamado modo de produção capitalista.
4.1 – Privatização dos Presídios: Uma Análise Comparada
4.1.1 - Modelo Norte-Americano
Os Estados Unidos, sob o fundamento de redução de gastos públicos,
foi o precursor do modelo privatizante das prisões. Inicialmente, a experiência das
privatizações estados-unidenses limitou-se a uma pequena parcela da população
carcerária, basicamente formada por jovens delinquentes e criminosos que estavam em
fase final do cumprimento da pena privativa de liberdade.
O modelo norte-americano de privatização dos presídios comportava
três espécies, são elas: o arrendamento das prisões; a administração privada das
penitenciárias; a contratação de serviços específicos com particulares.
44
O primeiro modelo é aquele que consistia no arrendamento das prisões
dos particulares ao Poder Público. Neste modelo as empresas privadas financiavam
construíam as prisões e posteriormente as arrendavam por um determinado período ao
governo federal. Transcorrido este período a propriedade dos estabelecimentos
prisionais passava ao Estado.
No segundo modelo as empresas privadas não somente construíam os
presídios como também os administrava.
O terceiro modelo era essencialmente uma terceirização, pois nele o
Estado contratava empresas privadas, por meio de um contrato, para a execução de
determinados serviços. A empresa contratada deveria abrigar, alimentar e vestir os
presos, e teria como contraprestação o trabalho deles.
O que pode se observar no modelo norte-americano, em qualquer um
dos três, é o fato de que o preso é tido como terceiro beneficiário do contrato realizado
entre a empresa particular e o Poder Público. Ao preso ainda é concedido o direito de
compelir juridicamente o empresário a cumprir com as obrigações estabelecidas no
referido contrato.
Este modelo de privatização tem como ponto positivo o fato de que as
empresas privadas oferecem os serviços a um custo menor e com qualidade superior
além de reduzir os gastos estatais. Em contrapartida, para os críticos deste modelo é a
questão da exploração da atividade laboral do preso e no uso inapropriado da pena.
Contudo, devemos ressaltar que, devido ao modelo de federalismo
adotado pelos Estados Unidos, a privatização do sistema prisional não é uniforme em
todo país, ou seja, não são todos os estados que adotam.
4.2.2 - Modelo Inglês
Igualmente com o que ocorreu nos Estados Unidos, a Inglaterra, na
década de 80, passava por crise em seu sistema penitenciário. Diante do aumento dos
custos, superlotação e precarização das condições de encarceramento, a privatização se
apresenta como alternativa para superação da crise.
Em 1991, com o Criminal Justice Act, veio a autorização para as
empresas privadas administrarem os estabelecimentos prisionais. No início a
participação privada somente poderia cuidar dos presos provisórios. Somente em 1993
45
foi permitido ao Estado contratar entidades particulares para custodiar também os
presos condenados.
Atualmente, neste modelo de privatização, o Estado celebra um
contrato com uma empresa privada, ou mais comumente com um consórcio de empresa.
Estes consórcios incluem, geralmente, um banco ou outra organização financeira, uma
construtora e uma empresa com experiência em um ou vários aspectos da gestão de
segurança. A empresa que celebra o contrato com a administração pública leva a prisão
desde o projeto até a operação final. Isto significa dizer que a empresa, ou mais
comumente um consórcio de empresas, fica responsável pela concepção do
estabelecimento prisional, bem como o seu financiamento, sua construção e sua gestão.
Neste contrato de um lado fica o consórcio que se compromete a fornecer o
estabelecimento prisional com capacidade para um determinado número de presos, e do
outro lado o Estado que se compromete a pagar um determinado valor por um certo
tempo, que normalmente é de 25 anos. Este modelo é o que hoje é aplicado na Escócia,
na Inglaterra e no País de Gales.
Portanto, neste modelo de privatização, diferentemente do que ocorre
nos Estados Unidos, a intervenção da iniciativa privada é mitigada, cabendo-lhe apenas
o fornecimento dos serviços de hotelaria, assim compreendidos os serviços de limpeza,
alimentação, vestuários, etc.
4.2.3 - Modelo Francês
Na França, diversamente do que ocorre nos Estados Unidos, não é
admitida a privatização total. O modelo francês de privatização consiste no sistema de
dupla responsabilidade, também denominada co-gestão ou gestão mista, na qual o
gerenciamento e a administração do estabelecimento prisional são de responsabilidade
tanto ao Estado quanto a empresa privada.
A parceria público-privada resulta de uma convenção assinada entre o
Estado e a pessoa ou grupo pertencentes ao setor privado, que são designadas após um
processo de licitação, a qual se compromete a atender um rol de obrigações previamente
estabelecidas por decreto. Neste modelo, o setor privado está autorizado a realizar de
serviços como construção e adaptação de estabelecimentos penitenciários e executar
algumas atividades como trabalho, a educação, o transporte, a alimentação, o lazer, bem
como a assistência social, jurídica, religiosa e a saúde física e mental do preso. Em
46
contrapartida a execução de tais serviços a empresa recebe do Estado uma quantia
predeterminada por preso/dia.
Ao Estado, por sua vez, compete indicar o Diretor-Geral do
estabelecimento, a quem competirá o relacionamento com o juízo da execução penal e a
responsabilidade pela segurança interna e externa da prisão.
A privatização não ocorre em todos os setores do sistema
penitenciário, alguns permaneciam sob responsabilidade exclusiva do Estado, como por
exemplo, a direção, a secretaria e a segurança.
4.2 - Intervenção da Iniciativa Privada no Sistema Prisional Pátrio
No Brasil, a proposta tendente à adoção de prisões privadas foi
apresentada em 1992 pelo Edmundo Oliveira, então conselheiro do Conselho Nacional
de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP). Para Oliveira o problema da superlotação
carcerária no Brasil poderia ser resolvido mediante privatização das prisões brasileiras.
Acreditava, ainda, que finalmente as regras insculpidas na Lei de Execução Penal
seriam observadas, tudo isso, a um custo reduzido. A proposta é resultado de
observações modernos modelos adotados em estabelecimentos prisionais nos Estados
Unidos, Inglaterra, Austrália e França.
Na proposta que foi apresentada ao Conselho Nacional de Política
Criminal e Penitenciária estava previsto a adoção de um sistema de gestão mista, com
atribuições tanto para a iniciativa privada quanto para o Estado, aproximando-se do
modelo de privatização francês.
Visando por em prática a proposta do conselheiro Edmundo Oliveira,
o Deputado Federal Luiz Barbosa apresentou o Projeto de Lei nº 2.146/99 no sentido de
autorizar o Poder Executivo “a privatizar o sistema penitenciário”. O Deputado
reconhece que, o Projeto de Lei visa compartilhar o gerenciamento e a participação da
iniciativa privada na solução de um grave problema, ainda sem respostas enquanto
limitado à exclusiva competência do Poder Público, embora a segurança pública seja
um dever do Estado.
Segundo o Projeto de Lei supracitado, os estados da federação
ficariam autorizados a firmar contratos de concessão com entidades particulares,
47
visando à construção e exploração de estabelecimentos prisionais. Estes
estabelecimentos privados seriam dirigidos por um diretor administrativo e por um
diretor de execução penal.
O diretor administrativo seria o responsável pelo apoio logístico das
instalações e não possuiria vínculo com o Poder Público. O diretor de execução penal,
por outro lado, seria responsável pela observância das regras atinentes à execução da
sentença condenatória e seria vinculado à Secretaria de Segurança Pública.
Edmundo Oliveira aponta, sinteticamente, como sendo os maiores
problemas verificados no sistema penitenciário no Brasil: o crime organizado, a
corrupção, a superlotação, a ociosidade e a baixa inteligência na administração dos
estabelecimentos prisionais. Problemas estes que seriam sanadas com auxílio da
iniciativa privada.
4.3 - Viabilidade da Privatização do Sistema Penitenciário no Brasil
A implantação da ideia privatizadora no Brasil encontra resistência
naquilo que diz respeito a sua viabilidade jurídica. A parte contraria a privatização
afirma que a condenação e o cumprimento do que diz expressamente a Lei de Execução,
a Constituição da República, é função pública indelegável do Estado, não podendo ser
transferida aos particulares, pois se assim o fosse, o Estado não estaria cumprindo uma
de suas atribuições sociais (função jurisdicional) e o mundo do crime poderia virar uma
“industria” totalmente legalizada.
Assim, o sistema penitenciário viraria uma grande empresa que busca
somente o lucro e não o bem do condenado, pois quanto mais presos nas prisões, mais
lucros teriam os seus proprietários e a ressocialização ficaria desprivilegiada nessa
situação.
Conforme João Marcello de Araújo Júnior há um obstáculo jurídico à
privatização das prisões decorrente da Lei de Execução Penal. Segundo ele,
[...] a administração penitenciária participa da atividade jurisdicional. O
pessoal penitenciário, de qualquer nível, embora vinculado ao Poder
Executivo para fins de gestão financeira e disciplinar, ao praticar os atos de
execução são a longa manus do juiz da execução.
E complementa que
48
[...] sendo, assim, a execução penal uma atividade jurisdicional e sendo,
como se sabe, a atividade jurisdicional indelegável, devemos concluir que a
administração penitenciária é, também, indelegável e, por isso, somente
poderá ser exercida pelo Estado. A violação da indelegabilidade da atividade
jurisdicional importa em inconstitucionalidade.
Em contrapartida, defendendo a privatização, está Luiz Flávio Borges
D‟Urso que na sua percepção não se estaria transferindo a função jurisdicional do
Estado para a iniciativa privada. Para ele a iniciativa privada cuidaria exclusivamente da
função material da execução da pena, portando, podemos dizer que o administrador
particular seria responsável pela hospedagem do condenado, que incluiria a comida, a
limpeza, a roupas, ou seja, serviços que são indispensáveis a manutenção de um
presídio. Diz ainda, que a parte indelegável da função jurisdicional permaneceria nas
mãos do Estado, porque continuaria sendo o único ente, por meio de seu órgão-juiz,
capaz de determinar quando um homem poderá ser preso, quanto tempo assim ficará,
quando e como ocorrerá a punição e quando o homem poderá sair da cadeia. ( )
Neste sentido:
Mas ocorre que o Estado não está delegando função pública stricto sensu. O
Poder Judiciário continuará apreciando pedidos de benefícios legais
(indultos, saídas temporárias, remições, progressões de regime, etc),
incidentes e demais atos da execução, igual como faz hoje, e os demais
órgãos de execução penal continuarão existindo e atuando. O que se defere à
iniciativa particular é tão-somente a administração do espaço físico prisional
e a possibilidade de ser o empregador do preso. Não há, portanto, „delegação
de atividade estatal‟. Se entendêssemos assim, a iniciativa privada jamais
poderia atuar em áreas como educação e saúde, atribuições também inerentes
ao poder público. (LEIRIA, 2012)
Em análise ao artigo 5º, XLVIII, da CF/88, que dispõe que “a pena
será cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito a idade
e o sexo do apenado”, percebemos que a Magna Carta não exclui a possibilidade de que
estes estabelecimentos prisionais sejam propriedades privadas ou administrados por
particulares, desde que observem os direitos garantidos na Constituição.
Percebemos, então, que a Constituição Federal não veda
expressamente a administração prisional por parte da iniciativa privada, no entanto, a
Lei de Execução Penal faz algumas restrições quanto a gestão de penitenciárias por
parte da iniciativa privada. A principal restrição imposta ao modelo de privatização
consubstanciado na exploração de mão de obra dos detentos com o intuito de obtenção
de lucros é o fato de que a Lei de execução Penal em seu artigo 34 ao regulamentar o
trabalho do preso, dispõe em seu artigo 34 que o “trabalho poderá ser gerenciado por
49
fundação ou empresa pública, com autonomia administrativa, e terá por objetivo a
formação profissional do condenado”.
Para os críticos que defendem este posicionamento o Estado não
poderia permitir a um ente privado que além de exercer o domínio sobre o apenado
também obtenha vantagem econômica sobre o trabalho dos mesmos. O trabalho dos
presos faz parte da natureza da pena e somente ao Estado será moralmente lícito obter
receita do mesmo.
Portanto, este modelo de privatização estaria incorrendo em
ilegalidade, uma vez que, não seria uma empresa pública que estaria administrando o
trabalho do preso, tal qual a lei exige, mas sim uma empresa privada, a qual estaria
vislumbrando não apenas a formação profissional do preso, mas também o recebimento
de lucro por parte da empresa administradora.
No entanto, para os favoráveis a privatização, o argumento de que a
empresa privada estaria enriquecendo às custas da mão de obra dos presos parecer um
discurso alienado, uma vez que a própria Lei de Execução Penal, em seus artigos 28 e
29, dispõe que o trabalho além de ser um dever social e de proporcionar dignidade,
possui a finalidade produtiva, assim o condenado será remunerado, mediante prévia
tabela. O trabalho nos presídios possui fundamental importância na ressocialização do
condenado, e se ele não trabalhar, será um forte indício de que ele não está sendo
preparado à sua reintegração social.
Observemos o quer dispõe o artigo 36 da LEP.
Art. 36 - O trabalho externo será admissível para os presos em regime
fechado somente em serviço ou obras públicas realizadas por órgãos da
Administração Direta ou Indireta, ou entidades privadas, desde que tomadas
as cautelas contra a fuga e em favor da disciplina.
Como podemos observar a exploração de trabalho por particular é
expressamente permitida pela lei. O artigo acima autoriza o trabalho externo dos presos,
inclusive em entidades privadas, este benefício é estendido inclusive ao condenado a
cumprimento da pena em regime fechado. Mas para isso, tais entidades devem tomar as
cautelas necessárias contra a fuga dos presos, e sempre em favor da disciplina.
Assim, não haveria como se falar em exploração do preso por parte da
iniciativa privada, pois, havendo a privatização e passado ao ente privado a
administração das penitenciárias, ao Poder público, por meio de seus órgãos oficiais,
teria a responsabilidade de fiscalizar a execução das atividades pela empresa privada. O
50
que não seria difícil, já que no modelo de privatização sugerido haveria o diretor-geral
do estabelecimento, que seria indicado pelo Estado.
Há ainda por parte dos críticos que contrários a instalação da gestão
privada o argumento de que o Brasil não possui estrutura política mínima para fiscalizar
e controlar a atuação da iniciativa privada. Para eles, isto seria mais uma atitude de
subserviência do governo ao modelo de política neoliberal. Argumentam ainda que isto
faria com que o país voltasse a agir em conformidade com o interesse dos grandes
grupos econômicos e a ordem capitalista que impera atualmente.
Porém, a experiência tem revelado que o Estado tem sido desastroso
na administração de diversos serviços, que além de não serem bons e satisfatórios, são
deficitários e onerosos, enquanto os privatizados são melhores e lucrativos, por isso a
privatização se faz necessária.
Ainda, em favor da privatização, há o argumento de garantir-se ao
preso a ocupação de seu tempo ocioso com educação e trabalho. É sabido que um dos
grandes causas dos problemas no sistema penitenciário é a ociosidade dos detentos, que
ficam trancafiados em estabelecimentos precários e sem ter o que fazer no maior parte
do tempo, para não falar na sua totalidade. A empresa privada que viesse a administrar o
presídio ficaria encarregada de qualificar profissionalmente os detentos através do
trabalho que serviria para ocupar o tempo deles, além de se reverter em uma fonte de
renda para auxílio próprio e de sua família, que atualmente dependendo do caso é
custeado pelo governo, e também um provável ressarcimento aos prejuízos ocasionados
em razão de seu crime.
No entanto, não seria possível a implantação de um modelo de
administração privatizada nos moldes do que foi adotado nos Estados Unidos, pois o
ordenamento jurídico do Brasil proíbe a delegação total do poder jurisdicional.
O que pode e vem sendo implantado de imediato, tal como se encontra
a legislação brasileira, não seria uma privatização propriamente dita, mas sim a
delegação ao particular das atividades extrajudiciais da administração no curso da
execução penal.
Diante deste impasse de implantação imediata da privatização com
administração plena por parte da iniciativa privada surge a proposta de parcerias
público-privadas abordada no Novo Plano Nacional de Política Penitenciária.
51
4.4 - Proposta de Privatização do Sistema Prisional
Conforme já citado anteriormente, no Brasil não há a possibilidade de
implantação de um sistema penitenciário privado nos moldes do modelo norte-
americano, ou seja, privatização total dos estabelecimentos penitenciários. O modelo
norte-americano não se adéqua às previsões constitucionais da Carta Magna Brasileira,
isto porque, “é indelegável o poder jurisdicional do Estado, que contempla o tempo que
o homem fica encarcerado e suas infrações disciplinares no cárcere” (D‟URSO, 2012).
A proposta de privatização do sistema carcerário deve se limitar as atividades
administrativas extrajudiciais.
Em que pese os inúmeros apontamentos à privatização dos presídios no
Brasil, restou evidente que o Estado permanecerá com as junções
jurisdicionais indelegáveis constitucionalmente, apenas, havendo a
possibilidade de cada Estado Federado implantar, de acordo com as
peculiaridades de cada Região, a realização de parceria com a iniciativa
privada nas atividades administrativas extrajudiciais. (CHACA, 2012)
De acordo com a proposta, o Estado ficaria incumbido de administrar
a pena, prende-se ao aspecto jurídico. Caberia ao Estado punir ou premiar o preso
dependendo da conduta deste. É o Estado que, detendo a função jurisdicional, determina
o início e final da pena:
Com as tarefas pública e privada bem estabelecidas a função que cabe ao
Estado – da execução – será melhor cumprida, afirmando assim os princípios
do artigo 37 da CF/88 que são: legalidade, impessoalidade, moralidade,
publicidade e eficiência, o quinteto da boa gerência governamental que já nos
provou não poder trabalhar sozinha (CARVALHO, 2012)
Continuaria sendo responsabilidade do Estado a segurança e pela
disciplina dos detentos, já a gestão das instalações físicas e serviços de hotelaria, bem
como da construção dos estabelecimentos, entre outros passaria a ser responsabilidade
da iniciativa privada.
Ao firmar parceria com a iniciativa privada, a Administração Pública
deverá estabelecer metas para as empresas que iram administrar os presídios,
delimitando, por exemplo, padrões de limpeza, taxas de fuga, frequência da manutenção
predial bem como um índice de reclamação.
52
Em contraprestação ao serviço prestado pelo parceiro privado o
Estado pagaria um valor pré-determinado por preso, que variaria de acordo com o grau
de periculosidade oferecida ao particular.
É inegável que durante sua administração o parceiro privado poderá
cometer erros ou provocar danos, diante de situações assim o empresa privada deverá
sofrer punições financeira e, se for o caso, ser condenada a pagar indenizações.
O contrato que rege a parceria público-privada deverá ser revestido de
peculiaridades próprias, haja vista a especialidade de seu objeto. Neste contrato deverá
estar previstas as mais diversas situações, mas principalmente naquilo que se refere à
responsabilidade de cada uma das partes envolvidas em relação a casuais danos
materiais ocorridos no interior dos presídios em decorrência de rebeliões, além de danos
físicos e morais porventura ocasionados aos presos. (CORDEIRO, 2005, p. 139).
Portanto, a espécie de contrato administrativo que melhor enquadra a
situação fática à previsão legal é a concessão administrativa, modalidade das
denominadas Parcerias Público-Privadas, sendo imprescindível que seja obedecido um
processo licitatório, na modalidade de concorrência, que obedeça todas as normas legais
e constitucionais concernentes a espécie contratual em apreço.
4.5 - Parceria Público-Privada
As parcerias público-privadas foram instituídas pela Lei nº
11.079/2004 sendo uma modalidade de contrato administrativo celebrado entre um entre
particular e o Poder Público sob o argumento de que o Estado não possui recursos
financeiros e administrativos suficientes para atender demandas de infra-estrutura.
No tema leciona SANTOS (2012, p.1)
As PPPs estão relacionadas às diferentes formas de articulação entre o setor
público, empresas e organizações não governamentais. Essa articulação tem
por objetivo viabilizar projetos de interesse para a sociedade ao mesmo
tempo em que supõe o exercício de atividade empresarial pelo setor privado.
Nas PPPs existe a previsão de retorno positivo para todos os envolvidos. No
setor público, esse retorno positivo está relacionado aos objetivos sociais,
econômicos e políticos. Já no lado do parceiro privado, o retorno,
normalmente, diz respeito ao capital financeiro [...]
Portanto, a parceria público-privada é uma parceria na qual a
administração pública celebra com a iniciativa privada, cujo objetivo é fornecer
53
determinado serviço com qualidade à população, por um determinado período. Esta
parceria tem como finalidade viabilizar projetos de interesse social ao mesmo tempo
colaborando com o exercício de atividade empresaria pelo setor privado. Nas parcerias
público-privadas existe a previsão de retorno positivo tanto para a iniciativa privada
quanto ao poder público. Enquanto no setor público esse retorno está relacionado aos
objetivos sociais, políticos e econômicos, no setor privado este retorno normalmente
está atrelado ao capital financeiro, apesar de haver situações nas quais ambos os
envolvidos não visam o retorno econômico e financeiro, como são os casos em que o
Estado faz parceria com fundações/instituições sem fins lucrativos.
No Brasil, a adoção do sistema de parcerias público-privadas em
presídios apresenta-se como uma realidade interessante. A proposta dessas parcerias
tem como ponto principal a adoção de um modelo misto, quase semelhante ao modelo
francês.
Assim, o investimento para a construção ficaria a encargo do parceiro
privado, que também ficaria responsável pela operação e manutenção de penitenciárias.
O Poder Público ficaria incumbido das obrigações de nomear os diretores e chefes de
funções-chave do estabelecimento penal; proporcionar segurança interna e externamente
ao presídio; executar as penas e/ou medidas de segurança em todas as suas acepções;
proporcionar o ensino fundamental, bem como, de acordo com o desempenho do
trabalho efetivado pelo parceiro privado, arcar com o retorno financeiro a este.
O Estado busca com esta parceria a obtenção de algumas vantagens
em um curto espaço de tempo, como: redução de custos, aumento do número de vagas
no sistema prisional, melhor qualidade no padrão de serviço e, aplicação de novas
tecnologias.
Esta parceria é uma tentativa de se efetivar as exigências legais de
respeito aos direitos humanos explicitados tanto na Constituição Federal Brasileira
quanto na Lei de Execução Penal. Tudo isto com a finalidade de dar uma maior
possibilidade de recuperação dos detentos por intermédio da capacitação deles para o
mercado de trabalho.
Atualmente, são cinco grandes empresas estão nesse mercado: a
Companhia Nacional de Administração Presidiária (CONAP), o Instituto Nacional de
Administração Penitenciária (INAP), a Montesinos, a Reviver e a Yumatã.
Contudo, é importante salientar que não são somente empresas que
participam da administração prisional. Em alguns estados, como Bahia e São Paulo,
54
estão em curso gestões prisionais comandadas por Igrejas, Organizações Não
Governamentais (ONGs) entre outros.
Atualmente, as ONGs vêm ganhando cada vez mais espaço para
atuarem em parceiras com o Estado no sistema prisional. Apesar das ONGs não se tratar
de PPP, estas também se inserem no propósito de aumentar a participação de gestores
não estatais na administração para ampliar e diversificar as modalidades de
aprisionamento.
O exemplo de parceria entre o poder público de um estado e uma
ONG no que se refere administração do sistema prisional é a parceria celebrada pelo
estado de São Paulo com tais entidades para a administração dos Centros de
Ressocialização. Em 2000, sob gestão do então governador Mário Covas estabeleceu, o
estado de São Paulo autorizou a criação de Centros de Ressocialização (CR) que
funcionam em parceria com Organizações Não Governamentais de Assistência ao
Condenado (APAC‟s). Os Centros de Ressocialização são presídios de pequeno porte
que buscam consolidação como uma nova experiência na prática de encarceramento.
Atualmente, existem cerca de vinte e dois Centros de Ressocialização espalhados pelo
interior do Estado de São Paulo, sendo quatro unidades femininas.
4.6 - Aspectos Importantes do Direito Administrativo sobre as Parcerias Público-
Privada
A Lei nº 11.079/2004 foi introduzida no ordenamento jurídico
brasileiro com a finalidade de instituir normas gerais para licitação e contratação de
parceria público-privada no âmbito da administração pública, sendo que a principal
inovação trazida é a “garantia da contrapartida, pelo parceiro público, do retorno do
capital empregado pelo parceiro privado” (ANDRADE, 2008, p. 285)
Segundo Marçal Justen Filho (2011, p. 772), “a expressão parceria
público-privada ingressou no cenário jurídico pátrio por influência de práticas difundida
no âmbito europeu, especialmente na Grã-Bretanha e na França”:
As parcerias público-privadas nascem da necessidade de o Estado buscar
parceiros no desenvolvimento de infra-estrutura e serviços públicos para o
atendimento das demandas da sociedade. Essa associação se dá por vários
fatores e em diferentes modos, mas tem início no final do século passado, se
55
desenvolvimento no Reino Unido, na França, Nos Estados Unidos, Portugal,
Itália, Holanda e alguns países da América Latina, entre outros. (SANTOS,
2012, p. 1)
Para José dos Santos Carvalho Filho (2009, p. 404), as parcerias
público-privada nada mais são do que concessões especiais e as conceitua do seguinte
modo:
Dentro dos objetivos da lei, pode o contrato de concessão especial sob regime
de parceria público-privada ser conceituado como o acordo firmado entre a
Administração Pública e a pessoa do setor privado com o objetivo de
implantação ou gestão de serviços públicos, com eventual execução de obras
ou fornecimento de bens, mediante financiamento do contrato,
contraprestação pecuniária do Poder Público e compartilhamento dos riscos e
dos ganhos entre os pactuantes (2009, p. 406)
O autor acima mencionado ainda destaca o sucesso na implementação
dessas parcerias em outros países.
As parcerias público-privadas têm sido adotadas com sucesso em diversos
ordenamentos jurídicos, como, entre outros, os de Portugal, Espanha,
Inglaterra e Irlanda, e apresentam como justificativa dois pontos
fundamentais, sobretudo em relação aos países ainda em desenvolvimento: a
falta de disponibilidade de recursos financeiros e a eficiência da gestão do
setor privado. (2009, p. 405)
O grande objetivo das parcerias público-privadas é justamente atrair a
iniciativa privada para investimentos em projetos de infra-estrutura de grande vulto,
necessários ao desenvolvimento do país, cujos recursos envolvidos excedem a
capacidade financeira do setor público.
Nesse sentido Marcelo Alexandrinho e Vicente Paulo (2011, p. 728)
destacam:
A principal estratégia para atrair esses investimentos é, simplificadamente,
assegurar ao “parceiro privado” (denominação que a lei utiliza para referir-se
ao particular contratado) um retorno mínimo sobre o capital investido. Esse
“retorno mínimo” é proporcionado por uma “contraprestação” paga ao
investidor privado pela administração pública.
Segundo as regras brasileiras que regem a parceria público-privada,
são admissíveis contratos de parceria desde que o valor mínimo seja de R$
20.000.000,00, além de período de prestação de serviços superior a cinco anos e inferior
a trinta e cinco anos, conforme estabelece o artigo 2º, § 4º, incisos I e II combinado com
o artigo 5º, inciso I da Lei nº 11.079/2004.
56
Como a parceria público-privada foi instituída como uma modalidade
de contrato administrativo, fica evidente que seu objeto somente pode ser a prestação de
um serviço público, pois, se assim não for, fica evidente a nulidade do contrato.
Contudo a referida lei, em seu artigo 4º, inciso III dispõe que deve ser
observada a indelegabilidade de algumas atividades exclusivas do Estado, como o
exercício do podas funções, funções de regulação, jurisdicional, entre outras.
Sobre o tema leciona SANTOS (2008, p. 1):
As PPPs estão relacionadas às diferentes formas de articulação entre o setor
público, empresas e organizações não governamentais. Essa articulação tem
por objetivo viabilizar projetos de interesse para a sociedade ao mesmo
tempo em que supõem o exercício de atividade empresarial pelo setor
privado. Nas PPPs existe a previsão de retorno positivo para todos os
envolvidos. No setor público, esse retorno positivo está relacionado aos
objetivos sociais, econômicos e políticos. Já no lado do parceiro privado, o
retorno, normalmente, diz respeito ao capital financeiro, todavia, há casos de
parcerias em que ambos os envolvidos não visam o retorno financeiro, que
são os casos em que o Estado faz parceria com fundações/instituições sem
fins lucrativos.
Conforme assevera Maria Sylvia Zanella Di Pietro (2011, p. 309), a
lei citada anteriormente, em seu artigo 2º, reservou a expressão parceria público-privada
para duas modalidades de parceria entre os setores público e privado, quais sejam a
concessão administrativa2 e a concessão patrocinada
3. Contudo, é necessário destacar
apenas na concessão administrativa é possível encontrar um perfeito enquadramento
entre a situação fática (privatização de presídios) e a previsão legal.
4.6.1 - Da Licitação nas Parcerias Público-Privadas
O artigo 10 da Lei nº 11.079/2004 dispõe que é obrigatória a
realização de licitação na modalidade concorrência para a contratação de parceria
público-privada seguindo as formalidades previstas no mesmo dispositivo.
As exigências legais podem ser sintetizadas da seguinte forma:
a) autorização pela autoridade competente, devidamente motivada com a
demonstração da conveniência e oportunidade da contratação; demonstração
2 Segundo Maria Sylvia Zanella di Pietreo (2011, p. 310): É possível definir concessão patrocinada como o contrato administrativo pelo qual a
Administração Pública (ou o parceiro público) delega a outrem (o concessionário ou parceiro privado) a execução de um serviço público, precedida ou
não de obra pública, para que o execute, em seu próprio nome, mediante tarifa paga pelo usuário, acrescida de contraprestação pecuniária paga pelo
parceiro público. 3 Nos termos do artigo 2º, §2º, da Lei 11.079/2004 a concessão administrativa é conceituada como “o contrato de prestação de serviços de que a
Administração Pública seja a usuária direta ou indireta, ainda que envolva a execução de obra ou fornecimento e instalação de bens”
57
de cumprimento da Lei de responsabilidade Fiscal – Lei Complementar nº
101, de 4-5-2000; c) submissão da minuta do edital e do contrato a consulta
pública; e d) licença ambiental prévia ou diretrizes para o licenciamento
ambiental do empreendimento, na forma do regulamento, sempre que o
objeto do contrato exigir. (DI PIETRO, 2011, p. 319-320)
A autoridade competente para autorizar a licitação para se firmar uma
parceria público-privada com o escopo de conceder a iniciativa privada a administração
do sistema prisional é a Agência Reguladora fiscalizada pelo Ministério da Justiça.
Outra condição imposta pela lei para abertura da licitação para a
celebração do contrato é que “o objeto da parceria esteja previsto no plano plurianual
em vigor no âmbito onde o contrato será celebrado”, conforme observa Marcelo
Alexandrinho e Vicente Paulo (2011, p. 737).
É necessário ainda que a minuta de edital e contrato seja submetida à
consulta pública, mediante publicação na imprensa oficial, jornais de grande circulação
e meio eletrônico. Deve-se também informar a justificativa para a contratação,
identificação do objeto, prazo do contrato, valor estimado, fixando prazo mínimo de
trinta dias para recebimentos de sugestões.
No que diz respeito ao edital, este deve conter a minuta do futuro
contrato, podendo inclusive prescrever a utilização da arbitragem. Além disso, é
facultado que estabeleça a exigência de garantia prestada pelos licitantes e garantias de
contraprestação do parceiro público a serem concedidas ao parceiro privado
(ALEXANDRINO, PAULO, 2011, p.737).
Por fim, faz-se necessário ressaltar que as regras básicas do
procedimento licitatório são as mesmas contidas na Lei 8.666/93, sendo que as normas
apontadas na lei da parceria têm caráter complementar (CARVALHO FILHO, 2009, p.
422).
4.6.2 O Controle e a Fiscalização do Parceiro Privado pela Administração Pública
A criação de uma agência reguladora por parte da Administração se
faz imprescindível para que se obtenha o efetivo controle das atividades do parceiro
privado. O objetivo institucional de tais agências “consiste na função de controle de
pessoas privadas incumbidas da prestação de serviços públicos, em regra, sob a forma
de concessão ou permissão, ou seja, a agência reguladora ficaria incumbida da função
58
de fiscalizar e regular os estabelecimentos prisionais. (CARVALHO FILHO, 2009, p.
464-465).
Marcelo Alexandrinho e Vicente Paulo (2011, p. 163) lecionam sobre
o tema:
Trata-se de entidades administrativas com alto grau de especialização técnica,
integrantes da estrutura formal da administração pública, instituídas como
autarquias sob o regime especial, com a função de regular um setor
específico de atividade econômica ou um determinado serviço público, ou de
intervir em certas relações jurídicas decorrentes dessas atividades.
As peculiaridades da agência reguladora é definida pela mesma lei que
as institui, a depender do seu setor de atuação, a orientação política, bem como o nível
de intervenção almejado (ANDRADE, 2008, p. 102), porém, conforme expõe Marcel o
Alexandrinho e Vicente Paulo (2011, p. 167) é possível listar características gerais
concernente ao exercício de atividade típicas de Estado, tais como: edição de normas,
fiscalização, aplicação de sanções, solução de conflitos privados e solução de
reclamação dos consumidores.
É importante ressaltar que apesar das agências reguladoras terem o
poder para dirimir conflitos em última instância administrativa, nada obsta que o objeto
de suas decisões seja também apreciado pelo Poder Judiciário, em respeito ao que
dispõe o artigo 5º, inciso XXXV da Constituição Federal: “a lei não excluirá da
apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. Da mesma forma, os atos
normativos emanados da agência reguladora não podem conflitar com normas legais e
constitucionais em respeito ao princípio da legalidade. As agências reguladoras ainda
devem se submeter ao controle administrativo realizado pelo Ministério a que se achar
vinculada. Portanto, podemos perceber que praticamente não há independência das
agências reguladoras em relação ao Poder Judiciário, Poder Legislativo e Poder
Executivo.
4.7 - Algumas experiências brasileiras
Segundo o artigo 24 da Constituição Federal, cada estado da federação
possui competência para legislar sobre direito penitenciário. Assim:
59
O art. 244 da Constituição Federal prevê as regras de competência
concorrente entre a União, Estados e Distrito Federal, estabelecendo quais as
matérias que deverão ser regulamentadas de forma geral por aquela e
específica por estes. Dentre as matérias, estabelece o inciso I do art. 24 da
Carta Magna, a competência concorrente para legislar sobre direito
penitenciário. Nesse diapasão está também o princípio da eficiência da
Administração Pública o qual, agregado à legalidade, vem insculpido no art.
37 da Carta Maior. Desta forma, as Assembleias Legislativas de diversos
estados brasileiros editaram normas referentes às parcerias público-privadas
como, por exemplo, a lei nº 12.234/2005 do Rio Grande do Sul, a lei nº
9.290/2004 da Bahia, a lei nº 14.868/2003 de Minas Gerais (nesta vem
explicitado em seu § 1º, art. 5º, a autorização para contratos de PPPs na área
do sistema penitenciário, entre outras. (SANTOS, 2012, p.1)
Portanto, pelo fato de a Constituição Federal permitir que os estados
venham a legislar supletivamente sobre as regras de direito penitenciário, cada estado
membro vem adotando um modelo de privatização próprio. Para melhor compreender
cada um desses modelos peculiares passaremos a analisá-los separadamente.
4.7.1 - Penitenciária de Guarapuava – Estado do Paraná
Devemos lembra que no caso do sistema prisional, antes mesmo da
Lei nº 11.079/2004, já havia entre administração pública e o setor privado algumas
iniciativas de gestão compartilhada.
Foi na cidade de Guarapuava que se iniciou a experiência de gestão
compartilhada do sistema prisional entre o poder público e a iniciativa, onde foi
inaugurada em 1999 a Penitenciária Industrial de Guarapuava, cuja capacidade era para
240 internos, tendo como principal objetivo atender as metas de ressocialização do
presidiário, bem como a interiorização das unidades penais, visando manter os presos
próximos dos familiares e do seu local de origem.
Este contrato de cogestão foi firmado com a empresa “Humanitas –
Administração Prisional Privada S/C Ltda” (posteriormente passando a se denominar
Companhia Nacional de Administração Prisional – CONAP), que ficou responsável por
executar todos os serviços que visam garantir o pleno funcionamento da penitenciária,
abrangendo além dos recursos humanos, os materiais destinados a hospedagem,
alimentação, saúde, manutenção, segurança, bem como oferecer aos internos terapia
ocupacional com acompanhamento psicológico e a reciclagem educacional e
profissional.
60
A empresa Azulbras Estofados em convênio com a Secretaria do
Estado da Justiça, instalou nesta penitenciária uma unidade industrial, oferecendo aos
presos trabalho na fabricação de móveis. Se não bastasse o fato de a empresa ter que
instalar, ela ainda é responsável por oferecer alimentação aos presos, além de ter que
pagá-los pelos serviços prestados. O pagamento de salário realizado pela empresa aos
presos é de aproximadamente 75% do salário mínimo. Aos presos ainda é concedida a
redução na pena, sendo um dia a menos no cumprimento da pena para cada três dias
trabalhado
A segurança na penitenciária é realizada com o auxílio de um
moderno sistema de monitoramento dos setores, permitindo que agentes observem toda
a movimentação dos internos no interior da Unidade. A penitenciária conta ainda com
portões eletrônicos e aparelho detector de metal fixo.
O uso de uniforme nas dependências da penitenciária é obrigatório
tanto para os agentes quanto para os detentos.
A Secretaria de Justiça incumbe nomear o Diretor e o Sub-Diretor da
Penitenciária. A segurança externa da penitenciária é de responsabilidade da Polícia
Militar do Estado do Paraná. A empresa “Humanitas”, por sua vez, ficou responsável
pela segurança interna, e para isso ela promoveu a prévia capacitação profissional
específica para 150 Agentes de Disciplina Penitenciária.
A penitenciária Industrial de Guarapuava é hoje um exemplo de que a
iniciativa privada pode desempenhar a gestão de penitenciária com qualidade e
responsabilidade, ficando demonstrado ser capaz de zelar pela eficiência do serviço que
assumiu.
Devido ao resultado satisfatório alcançado pele Penitenciária
Industrial de Guarapuava, a iniciativa de gestão compartilhada prisional foi estendida a
outros municípios paranaenses, também se obtendo bons resultados.
4.7.2 - Penitenciária de Joinville – Estado de Santa Catarina
A Penitenciária Industrial de Joinville – Jucemar Cesconetto foi
inaugura no ano de 2005 e teve seu prédio construído na gestão do governador Luiz
Henrique da Silveira. Com capacidade para abrigar 366 apenados, a penitenciária
oferece ensino fundamental e médio aos presidiários, além de possuir convênio
61
celebrado entre a direção da penitenciária e a Associação Comercial e Industrial vem
permitindo que os presos trabalhem normalmente.
A Penitenciária Industrial de Joinville também possui a filosofia de
gestão baseada na terapia ocupacional e no trabalho em grupo de uma série de
profissionais de diferentes áreas. Sua gestão é feita da seguinte forma: o governo
estadual de Santa Catarina indica os diretores, que a administrará com auxílio de
servidores técnicos e agentes prisionais que integram a empresa Montesinos –
Administração Prisional.
Em resumo seu funcionamento é o seguinte: a administração do
presídio é de responsabilidade da empresa, cabendo a ela fazer a segurança interna e
prestar serviços básicos aos detentos, como alimentação, vestuário e atendimento
médico. O Estado, por outro lado, tem o dever de fiscalizar os trabalhos realizados pela
empresa, além de ser o responsável pela segurança externa, ou seja, fazer o
policiamento nas muralhas. Ao Estado cabe ainda decidir sobre como lidar com a
indisciplina dos presidiários.
Inúmeros são os benefícios obtidos pelo Estado de Santa Catarina
decorrente desta parceria. Um exemplo deles é a redução do custo na manutenção dos
presos, enquanto na Penitenciária Industrial de Joinville um preso representa para os
cofres público a quantia de R$ 77,50 (setenta reais e cinqüenta centavos) , nas
penitenciárias mantidas pelo governo, o custo de um detento fica acima de R$ 500,00
(quinhentos reais).4
Diferentemente do que ocorre nas penitenciárias administradas pelo
Poder Público, na penitenciária de Joinville os presos não possuem tempo ocioso, uma
vez que o este estabelecimento prisional possui inúmeras atividade programadas para
ocupação do tempo, o trabalho é uma delas.
No ano de 2010, graças ao convênio celebrado entre a direção da
penitenciária e a Associação Comercial e Industrial, 11 empresas de Joinville
promoveram canteiros de trabalho dentro da unidade prisional, proporcionando trabalho
a 240 presos. O dinheiro que o detentos recebem é revertido para a manutenção de suas
famílias. Além do salário recebido pelos detentos, a atividade laboral também lhes
4 Informações obtidas do site “Blog das PPPs” Disponível em: <http://www.blogdasppps.com/2011/03/o-caos-e-solucao-para-o-sistema.html>
Acessado em 04 de outubro de 2012
62
concede direito à redução no cumprimento da pena. Para cada três dias trabalhados, um
dia5 do cumprimento de sua pena é retido.
A redução do tempo de cumprimento da pena significa economia aos
cofres do governo, pois o preso permanece menor tempo na penitenciária. Segundo
relatório do diretor Richard Chagas dos Santos, 2010 contabilizou redução de gastos
públicos de R$ 4.870.284,442
A penitenciária conta ainda com assistência religiosa, formação de um
coral, biblioteca, grupo musical, terapia ocupacional com artes.
4.7.3 - Penitenciária Regional do Cariri, Penitenciária Industrial Regional de
Sobral e o Instituto Presídio Professor Olavo Oliveira II– Estado do Ceará
Foi no ano de 2000, que a gestão compartilhada em presídios começou
a ser implantada no Ceará. Este sistema foi adotado na Penitenciária Industrial Regional
do Cariri, no município de Juazeiro do Norte. O estabelecimento prisional possui uma
área de 15.000 m2, contando com 66 celas coletivas para cinco presos cada uma e 117
para dois presos cada, perfazendo uma capacidade total de 549 vagas.
Assim como no Paraná e em Santa Catarina, o modelo administrativo
é o da co-gestão e foi implementado com a empresa “Humanitas Administração
Prisional S/C” (que como vimos anteriormente, passou a se denominar Companhia
Nacional de Administração Prisional – CONAP).
A Penitenciária Industrial regional do Cariri está em funcionamento
desde 2001. A penitenciária é resultado da parceria entre o Governo do Estado do
Ceará, por meio da Secretaria de Justiça, e a empresa Companhia Nacional de
Administração Prisional – CONAP. De acordo com o contrato celebrado entre as partes,
é da competência da contratada:
selecionar, recrutar, contratar sob sua inteira responsabilidade, observadas as
regras de seleção da Superintendência do Sistema Penal – SUSIPE,
preferencialmente da Região do Cariri, os recursos humanos necessários para
o pleno desenvolvimento da Penitenciária Industrial do Cariri, assumindo os
encargos administrativos dos mesmos, e cumprindo com todas as obrigações
trabalhistas, fiscais, previdenciárias e outras, em decorrência de sua condição
de empregadora/contratante.
5 Idem ao item 1
63
Nessa penitenciária, através de convênio firmado com a empresa
Criativa Jóias, cerca de 150 presidiários fabricam folheados, a produção mensal é de
250 mil peças. Cada preso recebe cerca de 75% do salário mínimo por mês e redução do
cumprimento pena. Assim como nas penitenciárias citadas anteriormente a redução se
dá na proporção 3 por 1, ou seja a cada três dias trabalhados, um dia é reduzido na sua
pena.
O estabelecimento prisional conta ainda com assistência jurídica que é
prestada por um quadro composto por 04 (quatro) advogados contratados e auxiliados
por estagiários que prestam a referida assistência aos internos que não possuem
defensores.
Em 2002, o governo do Ceará resolveu levar adiante a política de
terceirização do sistema prisional em seu estado. Com apoio do Ministério de Justiça foi
inaugurado à época a Penitenciária Industrial Regional de Sobral e o Instituto Presídio
Professor Olavo Oliveira II.
Em 2005, o Juiz Federal, em resposta a ação civil pública impetrada
pelo Ministério público federal e a Ordem dos Advogados do Brasil, determinou a
suspensão do contrato firmado entre o Governo do Estado do Ceará e a empresa
responsável pela administração de três unidades prisionais do Estado: Penitenciária
Industrial Regional de Sobral, Penitenciária Industrial Regional do Cariri e Instituto
Presídio Professor Olavo Oliveira II. Na ação civil pública foi alegado que a custódia de
presos é função exclusiva do poder público, indelegável e, portanto, a iniciativa privada
não pode administrar presídios. Em 19 de julho de 2007, as penitenciárias cearenses
administradas pela Companhia Nacional de Administração Prisional Ltda., foram
reintegradas à Secretaria de Justiça do Ceará.
No entanto, na visão Luiz Flávio Borges D‟Urso o entendimento do
magistrado julgador da ação civil pública de que a gestão de unidades prisionais é
função típica do Estado, e por isso deve ficar a cargo exclusivo da administração
pública, não possui sustentação. Uma vez que neste modelo de gestão compartilhada
não há a transferência da função jurisdicional do Estado para iniciativa privada, que
apenas cuidaria do aspecto material da pena, como por exemplo: acomodação e
alimentação dos presos, entre outros.
Entretanto, não se pode negar que no período no qual as referidas
penitenciárias estiveram na mão da iniciativa privada os resultados produzidos foram
muito mais satisfatórios do que aqueles produzidos sob administração do Estado.
64
4.7.4 - Outros Estados
O estado da Bahia possuía, até o ano de 2007 cinco estabelecimentos
penitenciários sob administração de gestão compartilhada. São eles: Conjunto Penal de
Valença (2003), Conjunto Penal de Juazeiro (2005), Conjunto Penal de Serrinha (2006),
Conjunto Penal de Itabuna (2006) e Conjunto Penal de Lauro de Freitas (2006). No total
são 1.717 internos naquele estado que estão sob o controle da iniciativa privada.
O governo do Estado do Amazonas buscando terceirizar serviços na
área do sistema penitenciário, assim como o Ceará, firmou parceria com a empresa
Companhia Nacional de Administração Penitenciária. Os estabelecimentos prisionais
são: o Complexo Penitenciário Unidade Prisional do Puraquequara, o Instituto Penal
Antonio Trindade e o Complexo Penitenciário Anísio Jobim, presídio com capacidade
para 450 presos do regime fechado e 138 vagas no regime semi-aberto.
O Estado do Espírito Santo, atualmente, apresenta quatro
penitenciárias em funcionamento o modelo de gestão compartilhada implantado com o
governo estadual em parceria com o Instituto Nacional de Administração Prisional Ltda
(INAP). São elas: a Penitenciária de Segurança Média de Colatina, a Penitenciária de
Segurança Máxima, a Unidade Prisional de Guarapari; e a Unidade Prisional de Serra.
Em 2009, o Governo do Estado de Minas Gerais assinou contrato para
o início da construção de um complexo penitenciário implantado por meio de Parceria
Público-Privada. A construção e operação do complexo serão de responsabilidade do
Consórcio Gestores Prisionais Associados que é formado por cinco empresas. São elas:
CCI – Construções S/A, Construtora Augusto Velloso S/A, Empresa Tejofran de
Saneamento e Serviços, N.F Motta Construções e Comércio e o Instituto Nacional de
Administração Prisional. As obras já estão em fase final. Serão criadas 3.000 (três mil)
vagas pelo governo, e a previsão de funcionamento no final do ano de 2012.
4.8 - Respondendo a legítimas preocupações
4.8.1 - Os apenados podem ser colocados em prisões privadas?
Dentre os direitos que a Constituição Federal concede aos presos,
destacam-se aqueles previstos nos incisos do art. 5º. O inciso XLVI do referido artigo
65
dispõe que “a pena será cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a
natureza do delito, a idade e o sexo do apenado”, assim, podemos notar não há
impedimento na CF quanto a possibilidade de existir prisões privadas, ela simples fala
em estabelecimentos diferenciados, não excluindo a possibilidade de que estes
estabelecimentos sejam propriedade ou geridos por particulares. O inciso XLIX dispõe
que “é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral” e está previsto no
inciso LXII que “a prisão de qualquer pessoa e o local onde se encontre serão
comunicados imediatamente ao juiz competente e à família do preso ou à pessoa por ele
indicada”, se observados estes direitos, não conflitariam com a existência de prisões
privadas.
O Código de Processo Penal, assim com a Constituição Federal, não
contém nenhuma norma impedindo a delegação da responsabilidade da administração
prisional.
No artigo 41 da Lei de Execução Penal, pode ser encontrado um rol de
direitos concedidos aos presos, mas não há nenhuma exigência que o encarceramento
seja de responsabilidade exclusiva do Estado.
Portanto, o confinamento propriamente dito, poderá ocorrer em
estabelecimentos privado. Contudo, é importante ressaltar ainda que os
estabelecimentos prisionais sejam particulares, o Poder Público continuaria com a
responsabilidade exclusiva pela sentença penal, bem como o acompanhamento da
execução penal.
4.8.2 - Os agentes penitenciários em prisões privadas podem usar força física para
conter os apenados?
Como sabido, a legislação brasileira permite a qualquer pessoa o uso
da força física, desde que em legítima defesa. Por exemplo, é permitido a um segurança
particular de um Shopping Center, empregar força física, usando moderadamente os
meios necessários, para impedir a consumação de um delito. No caso das prisões
privadas se aplicaria o mesmo princípio, assim, é um agente diante de uma situação em
que há risco de dano a direito seu ou alheio está autorizado a valer-se do emprego da
força para conter interno. Caso o agente aja com abuso, o interno terá direito a ser
indenizado, seja pelo Estado, seja pela empresa responsável pela administração
prisional.
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Podemos observar na prática que países em adotaram este sistema de
gestão prisional, como os Estados Unidos, por exemplo, possuem regras claras quanto a
quantidade mínima de agentes penitenciários por grupo de presos, bem como o
treinamento que eles devem receber. A empresa contratada ficaria responsável de
contratar e qualificar os agentes penitenciários.
4.8.3 - Como assegurar que os direitos dos prisioneiros não sejam violados, e como
seriam controladas e fiscalizadas as instituições penais privadas?
A responsabilidade de assegurar que os direitos do preso fossem
respeitados seria do Estado. O fato de se adotar prisões privadas não afasta a vigência da
legislação brasileira que trata dos direitos dos presos e da execução das penas.
Os órgãos da execução penal continuariam vigilantes: o Conselho
Nacional de Política Criminal e Penitenciária; o Juízo da Execução; o Ministério
Público; o Conselho Penitenciário; os Departamentos Penitenciários; o Patronato; e o
Conselho da Comunidade.
As prisões privadas seriam controladas e fiscalizadas pelos mesmos
órgãos que hoje são responsáveis pela execução penal, que aqueles mencionados
anteriormente, ou ainda, poderia ser instituída uma agência reguladora para executar
cuja função seria fiscalizar e regular os presídios.
Portanto, havendo violação de direitos do preso ou algum
descumprimento de termos do contrato por parte do parceiro privado, o Estado deverá
rescindir o contrato pondo termo a parceria.
4.8.4 - Não haveria o risco de as prisões privadas manter os presos além do prazo
de condenação?
Não se pode negar que esse risco existe, mas também não se pode
negar que esta situação ocorra nas prisões que são administradas pelo Estado. No
entanto, caso ocorra em uma instituição privada quem arcaria com as consequências
seria a empresa privada que a administra e não o próprio Estado.
Diante de uma situação como esta ficaria evidente que empresa
proprietária do estabelecimento carcerário estaria violando o contrato firmado por ela
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com o Estado e, portanto, deveria ser submetida à aplicação de multa, podendo ainda ter
o seu contrato rescindido pela administração pública.
4.8.5 - As prisões privadas não ficariam apenas com os prisioneiros de baixa
periculosidade?
Nos Estados Unidos, a maioria das prisões privadas abriga apenas
presos de baixa periculosidade, porém, há também prisões particulares destinadas aos
presos perigosos. A vantagem desse sistema reside exatamente em sua flexibilidade. O
poder público pode contratar um estabelecimento correcional destinado apenas a
prisioneiros idosos, onde a ênfase será dada na assistência médica. Ou então para
detentos jovens, em que a prioridade seria para a formação profissional.
4.8.6 - O preso estará obrigado a trabalhar nas prisões privadas?
Segundo a proposta de privatização brasileira, para que os presos
possam trabalhar para as empresas privadas eles deverão consentir. Aqueles que não
consentirem em trabalhar serão transferidos para estabelecimento operado pelo Poder
Público. Os que aceitarem vão receber pagamento que corresponderá a pelo menos a
três quartos do salário mínimo (75%), para uma jornada de quarenta e quatro horas
semanais.
Entre as garantias pelo trabalho, a proposta inclui capacitação e
treinamento profissional, equipamento de proteção individual e seguro contra acidente.
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CONCLUSÃO
Ao longo da história da humanidade, diversas foram as práticas
punitivas adotadas e dentre elas a privação da liberdade foi eleita como a forma mais
adequada de punir e, pelo menos em teoria, a mais eficiente na tentativa de reintegrar o
condenado a sociedade. Diante disto, concluímos que e instituição prisional é
imprescindível.
No Brasil, o sistema carcerário é composto pelos seguintes
estabelecimentos: as penitenciárias, as colônias agrícolas, industriais ou similares, as
casas do albergado, centros de observação, hospitais de custódia e tratamentos
psiquiátricos e as cadeias (além dos Centros de Ressocialização e Centros de Detenção
Provisória, substitutos alternativos destas últimas).
O descaso com o sistema prisional por parte do Poder Público é
notório. O que vemos comumente pelo Brasil a fora são estabelecimentos prisionais
debilitados e sucateados e, muitas vezes também com problema de superlotação.
Percebemos que nestes estabelecimentos falta ocupação para os condenados, a
ociosidade impera nesses ambientes. O grande responsável por isso é o próprio Estado
brasileiro, que como sabemos não possui condições de manter todos os aparatos estatais
funcionando perfeitamente, ora por falta de verbas, ora por falta de pessoal capacitado.
Nesta esteira, talvez a solução esteja na desestatização, portanto, a
privatização do sistema prisional se apresenta como uma alternativa discutível. Ocorre
que os opositores a sua implementação apresentam argumentos em grande parte com
viés político, contudo, sem oferecer melhores formas de reestruturar o sistema
carcerário nacional.
As experiências internacionais têm demonstrado resultados positivos,
e por isso serviu de inspiração ao Poder Público brasileiro na elaboração da proposta de
privatização, uma vez que as dificuldades existentes no sistema penitenciário do exterior
são as mesmas vivenciadas aqui no Brasil. No entanto, ocorre que, em conformidade
com a legislação nacional sobre tudo a Constituição Federal, não é possível adotar o
modelo de privatização idêntico daqueles que se observa pelo mundo. O modelo norte-
americano, por exemplo, é inviável, pois não existe a possibilidade de entregar nas mãos
da iniciativa privada a plenitude da atividade punitiva.
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No Brasil, a proposta que foi apresentada ao Conselho Nacional de
Política Criminal e Penitenciária, nela estava previsto a adoção de um sistema de gestão
mista, com atribuições tanto para a iniciativa privada quanto para o Estado. O modelo
de privatização proposto aqui no Brasil, respeitada as devidas alterações, assemelha-se
ao modelo adotado na França.
À primeira vista, a proposta de privatização do sistema penitenciário
pode dar a ideia de transferência do poder estatal para uma empresa privada, que
utilizará da mão de obra dos encarcerados, visando lucro. Porém, na verdade, o que e
pretende com essa proposta é a transferência da administração das prisões para
iniciativa privada, sem implicar na retirada da função do Estado, à qual é indelegável.
Portanto, responsabilidade da administração dos presídios ficaria nas mãos da iniciativa
privada, enquanto o poder público seria responsável de dar apoio através de incentivos
fiscais e subsídios, bem como fiscalização e controle, com apoio da sociedade, da
imprensa e do Ministério Público.
Segundo a proposta apresentada, caberia ao Estado celebrar um
convênio com a iniciativa privada através de um contrato de parceria público-privada,
na modalidade da concessão administrativa, repassando ao particular as atividades
extrajudiciais, como os serviços de hotelaria, assistência médica, odontológica,
psicológica, bem como atividades educacionais e profissionalizantes.
O parceiro privado também assumiria a função estrutural física dos
estabelecimentos prisionais, que abrangeria a construção de novos presídios, bem como
a recuperação dos que já existem. O trabalho, fator essencial a recuperação dos presos,
também pode (e deve) ser desenvolvido pelo particular, tendo em vista a própria
previsão da Lei de Execução Penal.
De acordo com a proposta o Estado deverá estabelecer metas a serem
cumpridas pelo parceiro privado, ficaria responsável por controlar e fiscalizar todas as
atividades praticadas por este, além de aplicar punições financeiras a empresa
administradora, se for necessário.
Ressalta-se ainda que o contrato que disciplina a parceria público-
privada para a administração dos presídios deve ser detalhado, com expressa
especificação de responsabilidade, metas, valores e todas as condições que cercam o
complicado ambiente interno das prisões.
No que diz respeito a experiência nacional de gestão compartilhada do
sistema prisional podemos observar que devido o fato de a Constituição Federal
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permitir que os estados venham a legislar supletivamente sobre as regras de direito
penitenciário, cada estado membro vem adotando um modelo de privatização próprio.
Alguns estados como o Paraná e o Ceará iniciaram a atividade privativa, porém de
forma tímida e desregrada. Portanto, não há que se falar em um modelo de privatização
brasileiro, pois não há no território nacional, uma universalidade sobre o tema.
Diante do que pode ser observado na realidade, a parceria público-
privada vem se mostrando uma alternativa viável como resposta aos problemas
enfrentados pelo sistema prisional brasileiro.
Concluí-se, portanto, que a implantação do sistema de parcerias
público-privadas na administração de presídios, diante da atual realidade carcerária
vivida hoje no Brasil, enseja, em nosso entendimento, circunstâncias extremamente
positivas. O Estado há de estar presente na fiscalização, na implantação e no decorrer da
gestão modelo de parcerias. Com o devido cumprimento das obrigações obrigatórias de
ambos os lados da parceria, tendo em vista a finalidade de recepcionar um ex-detento
ressocializado, esse novo modelo de gestão prisional, que agora inicia seu processo de
implantação, proporcionará muitos benefícios para a sociedade, principalmente se
comparado com o modelo vigente.
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