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APrémio GAZETA NOVEMBRO ’ 12
repórterdomarão+ norte
Jovem economistaquer provar que o Douro “não tem de ser só vinha
e produtos regionais”
CASTANHAum fruto com tanto para dar
CARMINHO e ANA MOURAduas vidas que só podiam dar fado
as paixões do fazer
Fotos: O processo de fabrico do papel artesanal: da trituração dos trapos de algodão, na pilha holandesa, à prensagem da pasta e secagem das folhas
Ana Sofia Gomes, 34 anos, trocou a segurança de um emprego estável pelo sonho de querer fazer mais e diferente. “Sempre pensei fazer algo relacio-nado com a reciclagem e esta ideia surgiu casual-mente, através do contacto com uma empresa de Viseu que começou a ensaiar o processo de uma forma muito rudimentar.” Nessa circunstância, no-tou logo “uma grande oportunidade de negócio, desde que soubesse explorá-la bem”.
Depois de concluir a licenciatura em Economia em 2002, Ana começou a trabalhar numa Institui-ção Particular de Solidariedade Social em Sabrosa. Contudo, sete anos depois, acabaria por sair para abraçar o seu próprio projecto.
Da mãe herdou a componente artística, im-prescindível para acrescentar valor a esta indústria, cujas raízes remontam a 105 a.C, quando o chinês Tsai Lun descobriu que a casca da amoreira mistu-rada com trapos, cânhamo e redes de pesca po-dia ser reduzida a fibras que, trituradas e emara-nhadas, formavam uma folha. É dessa cronologia e processo produtivo que dão conta as paredes da fábrica de Ana Sofia.
A Papel D’Ouro implicou um investimento de 550 mil euros, sendo que a candidatura ao Proder – Programa de Desenvolvimento Rural valeu um apoio na ordem dos 133 mil euros. “Decidi apos-tar no Douro porque tinha um mercado potencial mesmo aqui à porta. Depois, pelo apoio impres-
cindível da câmara de Alijó, que acarinhou muito o projeto”, justifica.
A empresa quer conjugar diferentes vertentes, sem desvirtuar a sua identidade. A prioridade, claro está, vai para o fabrico de “um produto de qualida-de, personalizado e artesanal”. Por outro lado, a cul-tura e a fileira do turismo e do lazer também não fo-ram esquecidas. Ana tornou o espaço visitável para poder receber escolas e grupos de pessoas interes-sadas em observar o processo artesanal de fabrico de papel e até experimentá-lo. Em mente, tem tam-bém a realização de workshops com artistas que desejem fazer experiências com este tipo de papel.
Os desperdícios têxteis têm de ser 100% algo-dão e chegam à fábrica pela mão de um fornece-dor de Penude [Lamego]. Há ainda remessas de mungo de algodão [que resulta do seu esfarrapa-mento e compactação], material que é misturado com os farrapos para ajudar a dar consistência. “A ganga é a matéria-prima mais barata. Dentro dos trapos, os de cor são mais caros que os brancos”, refere a empresária.
Artesanal e amigo do ambienteO processo começa com a passagem dos des-
perdícios de roupa pela pilha holandesa – máquina formada por um tambor estriado que roda sobre uma peça plana, também com estrias (foto à es-querda, no rodapé) –, onde são macerados e trans-formados em pasta de papel. Posteriormente, é canalizada para dois tanques de diferentes dimen-sões, o que permite que num se trabalhe só com cor branca e no outro se façam misturas de cores ou adições. A título de exemplo, a casca de cebo-la, a canela, o gengibre ou o açafrão podem ser al-ternativas viáveis à aplicação dos corantes naturais.
Ana Sofia à conquista do mercado de papel artesanalComo o Douro “não tem de ser só vinha e produtos regionais”, a vila-realense Ana Sofia Gomes ousou inovar, recuperando o saber ancestral associado à produção de papel. Deixou-se guiar pelas convicções e planeou cada passo até abrir as portas da sua empresa, a Papel D’Ouro. Sediada em Alijó, a fábrica começou a produzir papel artesanal no início deste mês e emprega já três jovens.
"Papel D'Ouro" nasce em Alijó pela mão de uma jovem economista e empreendedora
08 novembro'12 | repórterdomarão
Patrícia Posse | [email protected] | Fotos | J. S.
A pasta de papel é recolhida dos tanques e es-corrida em moldes de rede com diversos formatos. Depois, é desenformada sobre os feltros, que absor-vem a água, libertam o molde e separam das folhas procedentes. A incorporação de elementos acon-tece neste momento e culmina na criação de tex-turas, aromas e/ou relevos. Já foram feitas experi-ências com linhas de costura, alecrim, folhas secas, espigas ou até borras de café.
A passagem pela prensa hidráulica retira o ex-cesso de água, ajuda a reforçar a ligação entre as fi-bras e possibilita uma secagem mais homogénea. “Nesta fase, estima-se que o papel ainda tenha en-tre 55 a 65% de água. Na estufa, a pellets, a média de 60⁰ centígrados leva à desidratação do papel e uma vez seco, é retirado dos feltros onde está pendura-do e passa-se ao processo de conclusão”, descreve.
Na etapa final, o papel é aparado com uma gui-lhotina, eliminando os rebordos (“barbas”) que fi-cam. “Temos a vantagem de não se desperdiçar muito nesta indústria, porque aquilo que é cortado pode voltar a ser utilizado a posteriori”, frisa. Para fi-car liso e/ou fino o papel passa ainda pelos rolos do laminador. Na prensa de corte, é retalhado confor-
me os objetos já idealizados. O portefólio é diversificado e ajusta-se aos po-
tenciais clientes que a empreendedora iden-tificou. Além dos arti-gos escolares, pastas, candeeiros, caixas e embalagens, marca-dores de livros, a Pa-pel D’ Ouro posicio-na-se também nos segmentos discográ-ficos, com a produ-ção de capas para CD, DVD ou vinil; das Artes, com a disponibilização do suporte para serigrafias e agua-relas; da decoração de montras; dos artigos de ho-telaria e de luxo (guarda-jóias, caixas para calçado, invólucros de sabonetes artesanais, perfumes, em-balagens para chocolates, amêndoas, etc.).
Até ao limite da imaginaçãoSe por um lado, o cliente particular poderá en-
contrar livros de curso ou diplomas, por outro, as
empresas organizadoras de eventos, podem soli-citar convites de casamento, envelopes, cardápios,
lembranças ou brindes para oferta.
As quintas, as casas de tu-rismo rural, os hotéis e restau-rantes da região duriense são outros dos alvos da jovem em-presária, que se propõe ofe-recer-lhes cardápios, toalhas de mesa ou individuais, ces-tos para pão, livros de honra, álbuns, entre outros produtos.
O mercado dos rótulos e embalagens para vinho, azeite ou compotas também será explorado.
Ecodesign, impermeabilização, durabilidade e resistência são características comuns a todos os produtos com a marca de Ana Sofia Gomes. “Te-mos o aspeto visual que, por si só, já é apelativo, a resistência e a durabilidade, ou seja, o papel não se degrada e, jogando com as diferentes gramagens, permite fazer objetos totalmente ecológicos. A im-permeabilização [conseguida pela utilização de co-las resinosas] garante que, na fase posterior de im-pressão, as tintas não borratem.”
No primeiro semestre de laboração, Ana espe-ra conseguir faturar 150 mil euros e, até 2017, quin-tuplicar esse valor. “A ideia também passa pela ex-portação, ao fim de dois anos a laborar e já ter tudo bem assente. É um produto que tem todo o poten-cial para se distinguir lá fora”, avança.
Agora, feitas as primeiras experiências e com uma amostra da primeira folha feita na Papel D’Ouro na mão, Ana sabe bem que valeu a pena “nunca ter desistido”, mesmo quando muitos lhe apontaram a insensatez de apostar em tempos de crise numa área tão pouco explorada. “Encontrei um negócio que tinha muito para explorar e decidi arriscar e contrariar a nossa tendência para nos aco-modarmos”, sublinha.
Ana Sofia à conquista do mercado de papel artesanal"Papel D'Ouro" nasce em Alijó pela mão de uma jovem economista e empreendedora
repórterdomarão | novembro'12 09