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CENTRO UNIVERSITÁRIO SALESIANO DE SÃO PAULO campus Maria Auxiliadora - UNISAL Ricardo Miquelino PROJETO RETRETA NAS ESCOLAS: estudo de um caso de educação sociomusical Americana/SP 2015

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CENTRO UNIVERSITÁRIO SALESIANO DE SÃO PAULO

campus – Maria Auxiliadora - UNISAL

Ricardo Miquelino

PROJETO RETRETA NAS ESCOLAS:

estudo de um caso de educação sociomusical

Americana/SP

2015

CENTRO UNIVERSITÁRIO SALESIANO DE SÃO PAULO

Ricardo Miquelino

PROJETO RETRETA NAS ESCOLAS

estudo de um caso de educação sóciomusical

Dissertação apresentada como exigência parcial para

obtenção do grau de Mestre em Educação à Comissão

Julgadora do Centro Universitário Salesiano de São

Paulo – UNISAL – sob a orientação da Profa. Dra.

Valéria Oliveira de Vasconcelos.

Americana/SP

2015

Miquelino, Ricardo.

M57p Projeto Retreta nas escolas: estudo de caso de educação musical

/ Ricardo Miquelino. – Americana: Centro Universitário Salesiano

de São Paulo, 2015.

115 f.

Dissertação (Mestrado em Educação). UNISAL – SP.

Orientador: Valéria Oliveira de Vasconcelos.

Inclui bibliografia.

1. Música. 2. Música na educação. Educação sociocomunitária.

3. Corporação musical – Brasil. I. Título.

CDD 372.87

Catalogação elaborada por Lissandra Pinhatelli de Britto – CRB-8/7539

Bibliotecária UNISAL – Americana

Nome: Ricardo Miquelino

Título: PROJETO RETRETA NAS ESCOLAS: estudo de um caso de educação

sóciomusical

Dissertação apresentada como exigência parcial para

obtenção do grau de Mestre em Educação à Comissão

Julgadora do Centro Universitário Salesiano de São

Paulo – UNISAL.

Dissertação defendida e aprovada em 26/06/2015, pela comissão Julgadora:

BANCA EXAMINADORA:

_____________________________________________

Prof. Dr. Joel Luís da Silva Barbosa

Instituição: Universidade Federal da Bahia - UFBA

_____________________________________________

Profa. Dra. Sueli Maria Pessagno Caro

Instituição: Centro Universitário Salesiano de São Paulo - UNISAL

______________________________________________

Profª Dra. Valéria Oliveira de Vasconcelos

Centro Universitário Salesiano de São Paulo - UNISAL

Local: Americana, SP, Centro Universitário Salesiano de São Paulo – UNISAL

AGRADECIMENTOS

A Deus;

Ao meu pai Antonio Miquelino (in memorian), a quem dedico este trabalho;

À minha esposa Ieda, minha mãe Cleusa;

Aos meus filhos, Arthur, Raul e Nanny;

Ao Dr. Dorival Duarte e sua esposa Sônia, pelo acompanhamento e incentivo constante;

À Leo Gandelman, pela amizade e por acreditar em meu trabalho;

Ao Prof. Mestre Vandir Schäffer, meu eterno amigo e orientador;

À minha querida professora Rita Morelli;

À Corporação Musical 24 de Junho que muito me inspirou para este trabalho;

A todos os meus alunos, em especial Gustavo, Isadora e Marccella;

Ao Prof. Dr. Joel Barbosa;

Ao Maestro Francisco Belculfiné (Chiquito in memorian);

Aos Professores do Programa de Mestrado do Unisal;

Aos membros da Banca do Exame de Qualificação Profa. Valeria, Profa. Suely,

Prof. Joel Barbosa e Prof. Renato Soffner.

A todas as Corporações Musicais do Brasil.

RESUMO

O presente estudo de caso aborda os aspectos envolvidos num projeto de Educação Musical

denominado “Projeto Retreta”, que desde 2010 descentraliza o acesso ao ensino musical no

município de Artur Nogueira, estado de São Paulo. Inicialmente, foi realizado um breve

histórico acerca da origem das Corporações (Bandas) Musicais no Brasil, e também a história

da Corporação Musical 24 de Junho e seu desenvolvimento através dos anos. Se destaca na

pesquisa aqui apresentada, uma concisa abordagem sobre educação sociocomunitária,

ressaltando a importância da prática musical como ferramenta facilitadora de inclusão

sociocultural, e enfatizando o ensino coletivo de instrumentos musicais. Por meio deste estudo

de caso foi possível, através de um questionário digital coletar dados de docentes, discentes,

familiares e membros da comunidade local contendo informações relacionadas ao Projeto

Retreta. Como objetivo principal que se tem nesse trabalho é mensurar os aspectos a serem

melhorados e grau de influência que o projeto tem na esfera musical, mas também sociocultural.

Tem-se também como objetivo aferir o grau de envolvimento dos jovens e adolescentes com o

projeto. Por meio da análise dos dados, mostraram-se não somente as fragilidades que

dificultam o crescimento do projeto, mas principalmente afirmar as suas potencialidades, não

somente como o projeto inicialmente idealizado, mas também como ferramenta auxiliadora na

formação do caráter dos alunos como pessoas e cidadãos.

Palavras chave: Música, Educação Musical Sociocomunitária, Corporação Musical.

ABSTRACT

This case study investigates several aspects involved in the music education programme named

“ Retreta Project”, which since 2010 decentralizes access to music education in Artur Nogueira,

a city in the Sao Paulo state, in Brazil. Initially, a brief historical, functional and structural

analysis of the origin of Musical Corporations (Bands) in Brazil was made, including the history

of the Corporacao Musical 24 de Junho –which hosts Retreta Project- and its development over

the years. By means of a concise approach to socio-communitarian education, this research

shows the importance of musical practice as a facilitating tool to social and cultural inclusion,

and emphasizes the role of collective teaching of musical instruments in this process. By using

a digital questionnaire, it was possible to collect data from teachers, students, family and local

community members in order to relate information and statistics that summarize the results of

the Retreta Project. The main objective of this work is to measure the aspects to be improved

and the influence that the project has in its participants, not only in the musical sphere, but also

social and cultural. It is also intends to assess the degree of involvement of young people and

adolescents with the project. With such objectives in mind and through data analysis, it was

possible not only to show up the weaknesses that delay the project from fully developing, but

mostly point out their potential strengths. Thus, it was possible to evaluate the project not only

as it was initially dreamed and conceived, but also as an auxiliary tool in building the character

of the students as people and citizens.

Key words: Music, Musical Education, Social inclusion, Musical Corporation.

LISTA DE FIGURAS

Figura 1 - Charamelas............................................................................................................... 28 Figura 2 - Flautas ...................................................................................................................... 30 Figura 3 - Trompete .................................................................................................................. 30 Figura 4 - Fagotes ..................................................................................................................... 31

Figura 5 - Jornal do Senado ...................................................................................................... 32 Figura 6 - Coreto de Artur Nogueira ........................................................................................ 42 Figura 7 - Retreta no Coreto de Artur Nogueira ....................................................................... 42 Figura 8 - Retreta no Coreto de Artur Nogueira ...................................................................... 43 Figura 9 - Daniel Cezário de Andrade ...................................................................................... 44

Figura 10 - Sr. Nico (à direita) ................................................................................................. 45 Figura 11 - Músicos da Corporação Musical 24 de Junho em 2010 ........................................ 45

Figura 12 - Sede da Corporação Musical 24 de Junho no ano de 2009 ................................... 45 Figura 13 - Sede da Corporação Musical 24 de Junho no ano de 2009 ................................... 46 Figura 14 - Logotipo do Projeto Retreta ................................................................................... 47 Figura 15 - Obra de revitalização da Corporação Musical 24 de Junho................................... 47

Figura 16 - Obra de revitalização da Corporação Musical 24 de Junho................................... 48 Figura 18 - Obra de revitalização da Corporação Musical 24 de Junho................................... 50

Figura 19 - Barraca de pastel .................................................................................................... 50 Figura 20 - Participantes do projeto após a restauração da Sede.............................................. 51 Figura 21 - Sede restaurada ...................................................................................................... 51

Figura 22 - Workshop realizado na sede da Corporação .......................................................... 52 Figura 23 - Workshop realizado em anfiteatro municipal ........................................................ 53

Figura 24 - Alunos do Projeto em viagem ................................................................................ 53 Figura 25 - Alunos do Projeto em visita à Sala São Paulo ....................................................... 54

Figura 26 - Recital de violões ................................................................................................... 54 Figura 27 - Recital do coral na EE Severino Tagliari............................................................... 55 Figura 28 - Aluna do Projeto durante recital ............................................................................ 55

Figura 29 - Apresentação do coral na EMEF Aparecida Dias ................................................. 56

Figura 30 - Recital da fanfarra do Projeto no CAIC ................................................................ 56 Figura 31 - Alunos do Projeto durante ensaio .......................................................................... 57 Figura 32 - Alunos do Projeto durante concerto....................................................................... 57 Figura 33 - Alunos do Projeto durante estudo .......................................................................... 58 Figura 34 - Professores do Projeto animando o Carnaval do asilo local .................................. 58

Figura 35 - Coral do Projeto no programa EJA ........................................................................ 58 Figura 36 - Corpo docente do Projeto ...................................................................................... 59

Figura 37 - Concerto da Banda da Corporação com o músico Derico Sciotti.......................... 59 Figura 38 - Concerto da Banda da Corporação com o músico Renato Carlini ........................ 60 Figura 39 - Concerto da Banda da Corporação no Programa do Jô ......................................... 60 Figura 40 - Van recebida da prefeitura antes da reforma ......................................................... 82 Figura 41 -Van recebida da prefeitura após a reforma ............................................................. 83

Figura 42 - Banda sinfônica jovem do Projeto Retreta ............................................................ 83

LISTA DE GRÁFICOS

Gráfico 1 - Distribuição percentual da população extremamente pobre por faixa etária ......... 80 Gráfico 2 - Perfil entrevistado - Idade ...................................................................................... 92 Gráfico 3 - Perfil entrevistado - Gênero ................................................................................... 92 Gráfico 4 - Perfil entrevistado - Grau de escolaridade ............................................................. 93 Gráfico 5 - Perfil entrevistado - Estado civil ............................................................................ 93

Gráfico 6 - Perfil entrevistado - Envolvimento com o projeto ................................................. 94 Gráfico 7 - Primeira questão - contato musical anterior ........................................................... 94 Gráfico 8 - Segunda questão - contato com o projeto .............................................................. 95

Gráfico 9 - Terceira questão - o que o representa o projeto em sua vida ................................. 96 Gráfico 10 - Quarta questão - Opnião dos entrevistados sobre pontos fortes do projeto ......... 97 Gráfico 11 - Quinta questão - Opinião dos entrevistados sobre os pontos frágeis do projeto .. 98 Gráfico 12 - Sexta questão - Opinião dos entrevistados sobre o efeito da música ................... 99

Gráfico 13 - Sétima questão - Opinião dos entrevistados sobre aperfeiçoamento ................. 100

LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Ilustração 1 - Mapeamento das bandas de música por estado .................................................. 36 Ilustração 2 - Bandas de música no estado de São Paulo ......................................................... 38

Ilustração 3 - Bandas de música no estado de São Paulo (Coreto Paulista) ............................. 39

LISTA DE TABELAS

Tabela 1 - População em situação de extrema pobreza por faixa etária: .................................. 79 Universidades que exigem teste de aptidão ............................................................................ 111

SUMÁRIO

MEMORIAL ........................................................................................................................... 10

1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 19

2 METODOLOGIA ................................................................................................................ 24

3 A BANDA DE MÚSICA: DA CAPA SEM CODA ........................................................... 26

3.1 Pra ver a Banda chegar ................................................................................................ 27

3.2 O Coreto Brasil............................................................................................................ 36

3.3 O Coreto “São Paulo” ................................................................................................. 37

3.4 O Coreto Militar .......................................................................................................... 39

3.5 A Corporação Musical 24 de Junho de Artur Nogueira/SP ........................................ 43

3.6 A Revitalização do prédio da CorporaçãoMusical 24 de Junho ................................. 47

4 A EDUCAÇÃO NÃO FORMAL EXERCIDA PELAS BANDAS DE MÚSICA .......... 62

4.1 Aspectos relacionados sobre a intervenção sóciocomunitária através da música........... 65

4.2 A música como instrumento de intervenção sóciocomunitária ...................................... 68

4.3 Ensino coletivo de instrumentos musicais ...................................................................... 70

4.4 Método Da Capo ............................................................................................................. 76

4.5 Projeto Retreta nas escolas de Artur Nogueira ............................................................... 78

4.5.1 Lócus da pesquisa..................................................................................................... 78

4.5.2 Projeto Retreta como ferramenta de intervenção sóciocultural ............................... 81

4.5.3 Atividades do Projeto Retreta – propostas a partir dos participantes ....................... 86

4.5.4 Estrutura do Projeto Retreta ..................................................................................... 89

4.5.5 Divulgação na internet ............................................................................................. 90

5 SOB O OLHAR DO PARTICIPANTE ............................................................................. 92

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................ 101

7 REFERÊNCIAS ................................................................................................................ 106

ANEXO 1 - Tabela INEP ..................................................................................................... 110

ANEXO 2 - Relação dos melhores programas acadêmicos eleitos pelo guia do estudante

de abril de 2014 ..................................................................................................................... 111

ANEXO 3 - Relação de bandas de música cadastradas pela funarte (2015) ................... 112

ANEXO 4 - Relação das bandas paulistas segundo cadastro do projeto pró-bandas-SP

................................................................................................................................................ 112

ANEXO 5 - Dados completos do questionário virtual ...................................................... 112

ANEXO 6 - Questionário ..................................................................................................... 113

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MEMORIAL

A escolha deste tema está intrinsicamente ligada à minha biografia: nasci no início dos

anos 70, mais precisamente em 1973, os chamados anos de chumbo, filho de um músico militar

e de uma enfermeira. Minha trajetória até os dez anos de idade foi comum, aluno da rede pública

de educação, tive as minhas primeiras aulas de música com meu pai, Antonio Miquelino. Meu

pai era um músico trompetista, e dentre as suas inúmeras funções de caserna incluía-se também

a de maestro do Corpo Musical da Polícia Militar do estado de São Paulo. Nasci no Hospital

São Cristóvão, na rua Américo Ventura, 123, Alto da Mooca, perto da famosa avenida Paes de

Barros e bem no coração da maior comunidade italiana de São Paulo.

Os primeiros anos da minha infância foram marcados por inúmeras dificuldades devido

ao fato de eu ter nascido portador de bronquite asmática. Os recursos de tratamento

extremamente escassos da época, aliados ao alto índice de poluição da capital, contribuíram

para que os meus primeiros cinco anos de vida fossem vividos em frequentes internações no

Hospital da Policia Militar localizado no bairro do Cambuci. Os médicos da época,

recomendavam que eu fosse levado para um local que contasse com uma maior umidade no ar

bem como um menor índice de poluição.

Tal fato impulsionou meu pai para que colocasse em prática um antigo sonho que era,

(como para grande parte dos migrantes), voltar para a sua terra de origem: São João da Boa

Vista, S.P. Por este motivo, em 1982 ele conseguiu transferência do quartel Tobias de Aguiar

da cidade de São Paulo, para o 8o Batalhão da Policia Militar do interior localizado na avenida

João Jorge, 499, na Vila Industrial, no município de Campinas (era o quartel mais próximo da

sua cidade natal que contava com uma banda de música, já que esta era a sua função).

Ao completar dez anos de idade, sofri o primeiro grande golpe da minha vida: meu

querido pai foi assassinado por um grupo de assaltantes que invadiu uma agência do então

Banespa (que era localizada no interior da “Casa de Saúde de Campinas”). Sem ao menos exitar,

ao vê-lo fardado, os assassinos executaram os disparos. A partir daí, a vida da minha família,

que era constituída por minha mãe, minha irmã e eu, tornou-se uma verdadeira roda viva.

A minha mãe foi acometida de inúmeros problemas psicológicos por conta do

acontecido, o que motivou a nossa mudança para a cidade de Mogi Guaçu/SP, onde residiam

os meus avós maternos. Minha avó, D. Maria, uma senhora boa, entretanto indiferente para com

os netos; meu avô, Sr. Francisco, um homem austero, por vezes severo, atitudes estas que em

verdade escondiam um homem de bondade imensa que fora marcado pela vida.

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Foi neste cenário em que vivi minha pré-adolescência. Senti na pele o que um garoto

órfão de pai passa quando fica a mercê dos familiares. É impressionante como você passa a ser

o autor de absolutamente todas as traquinagens e outros pequenos “delitos” infantis, e nestes

casos todos os familiares se veem no direito de "educá-lo". Apesar de tudo, eu guardo desta

época muitas coisas positivas que inclusive me motivam hoje a realizar o presente trabalho.

Ainda em Mogi Guaçu, seis meses após a morte do meu pai, eu por vezes perambulava

pelas ruas para evitar ficar em casa. Em uma destas saídas eu passava pela calçada de uma

avenida chamada 9 de Abril, quando fui surpreendido por um som que me era familiar: uma

banda! Meu Deus! Uma banda! Que saudades do meu pai... Será que ele está lá? Foram os

devaneios de um pequeno garoto. Foi então que em meio ao "sonho”, surge um homem enorme

de pele muito clara, olhos azuis e um semblante aterrorizante. Empunhando um cigarro ele me

disse: O que você quer aqui? Eu...apenas um garoto, com muito medo respondi: Estou apenas

olhando! E ele prontamente replicou: entre!

Sem mais delongas, foi a primeira vez que entrei na Corporação Musical "Marcos

Vedovello" e o senhor citado era o maestro, Sr. Geraldo Vedovello, um italiano aposentado de

uma cerâmica que dedicava todo o seu tempo para aquela Corporação que fora fundada por seu

pai.

A metodologia aplicada ali era limitada aos conhecimentos do maestro, que certamente

havia aprendido de forma empírica. Entretanto, é inegável a eficácia do resultado musical. Com

o passar do tempo comecei a entender que assim como o meu avô Francisco, por trás de tanta

rigidez, o Sr. Geraldo fazia o seu melhor e amava os seus “discípulos”, como gostava de

denominá-los.

Já na adolescência, eu me dedicava totalmente à música, sendo que para tanto sempre

fui um aluno considerado de rendimento regular na escola convencional. Passava o dia inteiro

na sede da banda, inclusive ajudando meus amigos na “faxina” do prédio, que não possuía

qualquer funcionário e, no período noturno, ia para escola, muito a contragosto diga-se de

passagem.

Minha mãe casou-se novamente e, se por um lado as coisas melhoraram, inclusive com

a chegada do meu irmão mais novo (Arthur, o "Tuta"), por outro, as perseguições a mim foram

implacáveis. O fato de eu não me interessar por trabalho e estudos convencionais, (ao contrário,

eu pensava somente em música), desagradava muito à minha mãe e ao seu esposo, fazendo com

que mais uma vez eu encontrasse nas ruas o sossego desejado. Ainda na adolescência, por conta

própria, fui para o tão sonhado conservatório de Tatuí, onde tive acesso aos melhores

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professores e métodos de música da América-Latina. Minha formação musical começou a

melhorar e logo eu me tornaria um músico profissional.

Até os dezoito anos, em grande atividade profissional, tocava de quatro a cinco vezes

por semana nas boates de São Paulo (mais uma vez como uma forma de escapar de casa), e

ingressei no Exército Brasileiro. Foi um período realmente muito duro (senti saudades de

casa...) foi lá que passei por experiências pouco agradáveis, mas que hoje me servem também

de inspiração em meu trabalho.

Como tudo é prematuro em minha vida, em meio a esta época, nasceu o meu primeiro

filho, Raul Miquelino, um garoto muito desejado e amado. Deixei a música por um bom período

por conta da chegada do Raul. Trabalhei então como servente de pedreiro, borracheiro,

motorista de caminhão, entre outros “bicos” nos quais eu nunca permanecia.

A incompatibilidade no casamento era cada vez mais evidente, porém o amor ao Raul

era maior, o que se alongou com a chegada da minha filha Elaine (a "Nanny"). A Nanny era

especial, a minha filhinha querida. Ela chegou no mesmo período em que eu retomava a minha

carreira musical. E em pouco tempo eu já estava de volta aos grandes palcos, tocando com

diversos nomes consagrados da música popular brasileira. Permaneci por mais alguns anos

casado, porém, eu estava cansado e frustrado no ambiente familiar, o que culminou na

separação.

Anos depois, casei-me novamente e mudei muitas condutas em minha vida: abandonei

o cigarro, as bebidas e todos os excessos que me rodeavam, e iniciei um novo ciclo, sempre

tendo ao meu lado os meus filhos. Em 1997, fui convidado para lecionar música em um

consagrado colégio espanhol da cidade de Mogi Mirim, o Colégio Imaculada.

Apesar de nunca ter tido contato com a docência, aceitei o desafio inclusive

vislumbrando a possibilidade de viabilizar um ensino de qualidade para os meus filhos. Neste

período o Raul morava comigo e minha esposa Ieda. Foi um período muito gratificante, aprendi

a arte da docência na prática, observando antigos professores e ouvindo os conselhos das

madres.

Em paralelo, fui convidado pelo meu querido amigo Sr. Nico (já falecido), para ser o

maestro da Corporação Musical 24 de Junho, no pequeno município de Artur Nogueira/SP.

Uma banda... Como aquela do Sr. Geraldo, lembram?

Eis que na primeira visita à sede da corporação, me deparo com um quadro

desesperador: um prédio em ruínas, com uns poucos músicos amadores, sem o mínimo de

estrutura física. Entretanto, esses músicos recebiam uma subvenção municipal que deveria ser

destinada à manutenção da instituição.

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A verba era rateada entre os componentes, o que impedia investimentos em melhorias.

Devo aqui salientar que tal prática era e ainda é muito comum em muitas destas corporações

espalhadas pelo país. A vontade de retribuir à corporação todo o bem que me havia feito, foi

um fator determinante para que eu então começasse a pensar em alguma solução para aquele

que parecia um “caso perdido”.

O primeiro passo foi propor aos músicos que abrissem mão do numerário recebido, no

que fui prontamente atendido. Todavia, no próximo ensaio (que aconteceu na semana seguinte),

apenas a metade do quadro de músicos compareceu.

Muitos deixaram a Corporação por se sentirem ofendidos e, infelizmente, guardam

rancor da medida que tomei. Nessa época, confesso que quase desisti, pois conciliava as aulas

no Imaculada, a minha carreira profissional, que já incluía além de shows com artistas, aulas na

Universidade Adventista de São Paulo, da qual eu faço parte do corpo docente até os dias atuais.

A Corporação Musical 24 de Junho, muito embora com recursos escassos, se tornou para

mim uma obstinação. Eu queria fazer algo, porém algo diferente, e me perguntava como poderia

concretizar meu desejo. Nessa época eu passei a pesquisar projetos musicais, achava

interessante, mas faltava alguma coisa. Foi quando, eu remexendo o meu próprio "baú" da vida,

consegui por fim vislumbrar aquele garoto de Campinas que perdeu o pai tão cedo. Lembrei de

suas necessidades e anseios e o que a musica representou e modificou a sua vida, e assim

encontrei o diferencial do projeto que eu buscaria concretizar.

Nasceu então o Projeto Retreta, que oferece o ensino de música no município de Artur

Nogueira de forma gratuita, em que os educadores estão principalmente voltados para o fazer

sóciocomunitário. O Projeto já atendeu a mais de mil pessoas e atualmente conta com quinze

oficinas de instrumentos.

E a Banda? Ah! A Banda conta hoje com setenta e dois músicos provenientes de toda a

comunidade e classes sociais distintas. A Banda, que os munícipes chamam de "Orquestra",

realiza concertos por todo o estado de São Paulo, tendo inclusive participado do “Programa do

Jô” em 2014, convidada pelo próprio apresentador que se interessou pelo trabalho.

De Maestro a Educador Musical: a difícil tarefa de encontrar o caminho para oportunizar

o ensino de música para todo um município

Conforme citado anteriormente, realizar um trabalho de Educação Musical no município

de Artur Nogueira SP, deu-se inicialmente a partir da necessidade da renovação e ampliação do

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quadro de músicos da “Corporação Musical 24 de Junho”, a mais antiga entidade musical do

município, com 90 anos de existência.

Inicialmente, fui contratado como maestro para ensaiar uma pequena banda formada por

um pequeno grupo de pessoas, sendo este formado pela chamada “elite” da sociedade local.

Devido à minha crença (devo aqui dizer inconsciente) pelo fazer social, almejava ampliar as

vagas da Corporação, oportunizando a todas as camadas sociais o acesso ao fazer coletivo

musical.

Basta acessar os noticiários para aferirmos a triste realidade que nos permeia: um

importante número de crianças e jovens são expostos diariamente ao consumismo pela mesma

mídia que os condena, cidadãos cada vez mais alienados, e porque não dizer limitados, e

impedidos de expansão intelectual. O desejo de desenvolver um trabalho musical amplo e de

qualidade junto à comunidade me persegue há alguns anos, como músico, educador e

principalmente como uma forma de exercer a cidadania. À luz deste pensamento, iniciei há três

anos e meio a implementação do programa musical sóciocomunitário chamado: “Projeto

Retreta”, projeto este que me trouxe ao mestrado em busca de pesquisar a importância que um

programa assim exerce sobre os seus alunos.

Eu mesmo, como descrevi anteriormente, fui submetido a boa parte destas mazelas;

contudo, confesso que as sequelas diminuem à medida em que vislumbro a possibilidade de

fazer a diferença ao meu semelhante. Para tanto, entendo como necessário o acesso à academia

para que possamos, de forma imparcial, pesquisar e criar mecanismos que possibilitem a

viabilização de projetos de inclusão sociocomunitária no ambiente em que nos inserimos.

Um outro ponto muito importante a se destacar e algo ainda raro na carreira musical, é

acessar um curso superior de música. Quase nunca chega-se a uma pós-graduação. O ato de

ingressar em um curso superior em música oportuniza ao músico empírico compreender a

importância de aliar técnica e arte, alicerçando de maneira profunda os seus conhecimentos

musicais. No ensino superior, o aluno capacita-se ainda para reger grupos distintos, transitando

como uma maior fluência, tanto no repertório erudito quanto no popular, aprimorando ainda a

técnica de confecção de partituras para que estas sejam executadas pelos mais variados grupos.

A partir de dados colhidos no portal do INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas)

que é localizado dentro do site do MEC (Ministério da Educação) (vide tabela contida no Anexo

1), podemos visualizar todos os cursos de nível superior em música em vigência no Brasil.

Nos cursos de graduação em música existentes no país, a disciplina e a prática diárias,

tanto dos fundamentos teóricos como do instrumento, são pontos fundamentais para o sucesso

do aluno. Os eleitos como melhores programas acadêmicos do Brasil (vide abaixo dados

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levantados pelo guia do estudante de abril de 2014 – Anexo 2) exigem do candidato uma prova

de aptidão que objetiva aferir a habilidade e o grau de conhecimento específico do candidato.

Na matriz curricular, encontram-se disciplinas como história da arte e música, percepção

musical e prática instrumental.

Por inúmeras circunstâncias, a minha formação acadêmica ocorreu tardiamente, casado

e com dois filhos, detentor apenas de um título técnico de conservatório e ensino médio

incompleto, corri em busca de compensar o tempo perdido voltando aos bancos escolares.

Poucos colegas da minha época terminaram o ensino médio, quase sempre atribuindo o

insucesso à sua limitação financeira ou até mesmo à desvantagem social. Assim sendo, partilhar

o testemunho da minha experiência, tornou-se uma obrigação a qual eu não posso me omitir e,

quem sabe, através desta, contribuir para o incentivo de outros.

No ano de 1998, enquanto músico da Banda Sinfônica de Americana/SP, aceitei atuar

como professor voluntário de fanfarra no CAIC “Espaginol Silva” do bairro Antonio Zanaga,

no mesmo município. Foi lá que eu tive o meu primeiro contato com a triste realidade na qual

se inserem muitas das crianças brasileiras. Tal experiência me foi muito chocante e mudou

radicalmente o modo como eu enxergava o fazer musical: passei a aproveitar as aulas de música

para trabalhar outros conceitos de cidadania para aqueles alunos e, para a minha surpresa, isso

funcionava, e muito.

No ano de 2000 ingressei na UNASP (Universidade Adventista de São Paulo) através

de vestibular. A mesma instituição acabara de me contratar como professor de instrumento, e

logo eu senti a necessidade do complemento acadêmico. Paralelamente, participava de vários

cursos de extensão oferecidos pela Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), e integrava

ativamente diversos grupos musicais daquela instituição.

Posteriormente, em 2007, ingressei no curso de Pós-graduação em regência com

docência universitária na mesma instituição, pois outro grande interesse meu era pela área de

regência, atuar com grupos. Nesta época, tranquei o curso por várias vezes, uma vez que senti,

desde muito cedo, uma frequente “fogueira de vaidades”, a qual não me interessava. Tal

tendência ainda apresenta-se muito forte no meio acadêmico musical, desta forma eu vivia em

conflito, praticando fora do âmbito acadêmico soluções alternativas para planejar as minhas

aulas de música. Ou seja, na academia musical nos dedicamos integralmente à execução

artística. Tratam-se de inúmeras e exaustivas horas de estudo diário de instrumento e

fundamentos teóricos, entretanto, não se leva em conta a situação pessoal do indivíduo. São

raros os casos em que verificamos o sistema de avaliação por parâmetros, onde aferimos

indivídualmente o crescimento do aluno.

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Mesmo que tenha sido um período conturbado, eu trago boas recordações daquela

época, pois mais do que tudo contribuiu e muito para o meu crescimento como educador

musical. Hoje em dia, percebo que aliar a prática convencional de música com a inclusão social,

certamente melhora não só o aprendizado como a perspectiva de mundo do indivíduo que é

submetido a tal processo.

Levei alguns anos para tímidamente me aproximar da educação em si, o que em sua

totalidade ainda se trata de um terreno estranho para mim. Ainda assim, em 2012 ingressei

como aluno especial no curso de Educação Sóciocomunitária do UNISAL, o que foi-me uma

grata surpresa, ao encontrar no testemunho de professores como da Profa. Valéria, da Suely,

Norma e de amigos de curso como o Alex e irmã Marianne tudo aquilo em que eu acreditava

e acredito.

É bem possível que eu tenha me tornado um obstinado em defender a contribuição da

música e, neste caso principalmente, através do fazer coletivo, causou em minha vida. Assim

sendo, busco hoje descobrir o que tal metodologia causa na vida de cada um daqueles que

passam tal processo de intervenção sóciomusical.

A predileção em trabalhar com comunidades menos assistidas pela governança deve-se

ao fato de eu ter atuado muitos anos na rede privada onde eu acompanhava crianças e jovens

com acesso irrestrito a uma enorme diversidade de atividades, e quase sempre o seu

desempenho era lamentavelmente mediano. Partindo do pressuposto de que a música é

universal e um direito de todos, penso que deva fazer parte da formação integral de todo o

indivíduo independente da sua situação social.

O meu envolvimento com a “Corporação Musical 24 de Junho” de Artur Nogueira e a

idealização do “Projeto Retreta” se deu de forma natural; entretanto, foi necessário transpassar

inúmeras barreiras há muito tempo arraigadas em instituições como esta. Cheguei a uma

pequena cidade de cerca de quarenta mil habitantes, onde eu era apenas um jovem estranho com

a proposta de modificar a maneira como conduziam aquela entidade que já contava com mais

de setenta e cinco anos de existência.

Assim como muitas espalhadas por todo o território nacional, a Corporação Musical 24

de Junho privilegiava a poucas pessoas do município (cerca de 15 pessoas), sendo elas inseridas

na chamada classe média alta. Através da proposta do Projeto Retreta, que era a de

descentralização e intervenção sóciocomunitária utilizando as aulas de música como ferramenta

principal, da noite para o dia a Corporação Musical abre as portas para todos os interessados

sem nenhuma distinção de raça, credo ou situação social.

17

Inserir-me no maravilhoso mundo de pessoas pertencentes às mais diversas camadas

sociais me ensina muito mais do que eu penso ensiná-las. Aprender os diversos costumes e,

porque não dizer dialetos ou gírias, testemunhar a contribuição do fazer musical coletivo para

eles. É como se eu me visse em cada um deles, seja em uma condição familiar, financeira ou

de propósito que eles tenham na vida e hoje não sou apenas um idealizador com projetos em

minha mente, hoje faço parte de uma comunidade musical.

Através deste fazer de forma empírica, senti a necessidade de pesquisar outros trabalhos

semelhantes, para que a partir da coleta de experiências eu pudesse contribuir ainda mais com

a minha comunidade. Para um músico, tal missão parece impossível, já que dedicamos grande

parte do nosso tempo preocupados com questões artísticas.

No entanto, durante as aulas do mestrado eu pude perceber que a principal questão a ser

abordada seria a de como um programa como este contribui com a comunidade, já que o mesmo

se encontra em andamento. Assim, realizamos uma investigação sobre a concepção de alunos

e egressos a respeito do processo de ensino/aprendizagem para, a partir disso, planejar as nossas

ações com base nos dados obtidos. Além de refletirmos a respeito do programa proposto,

poderemos agir com mais qualidade ao definirmos os conteúdos pedagógicos e sociais do

Projeto Retreta.

O Projeto Retreta utiliza como ferramenta principal de aprendizado a prática coletiva de

instrumentos. Através desta, é possível que o educador trabalhe vários conceitos que

transcendem a prática musical. Além disso, a troca de experiência vivida pelos participantes

aponta importantes resultados.

Educadores como Paulo Freire (1983) e Joel Barbosa (2004), nos orientam a enxergar

o educando de forma ampla, como indivíduos dotados de distintos saberes, e nos indicam ainda

o caminho para desenvolvermos a prática educacional dentro da ética, solidariedade,

valorizando e reconhecendo em nossos alunos suas múltiplas capacidades. Desta forma, a partir

de aulas coletivas o aluno desenvolve de forma lúdica, a busca pelo saber, além da autoestima,

autocrítica, capacidade de reflexão e pesquisa.

Portanto, entendemos aqui o fazer musical sóciocomunitário como algo que deve ser

muito dinâmico, no qual o lúdico e a ânsia pelo saber devem ser um processo intrínseco, para

que não se corra o risco da padronização, o que comumente acontece com propostas de

educação musical.

Pretendemos, portanto, refletir sobre um projeto de educação musical alicerçado em

princípios da educação sóciocomunitária e da Educação Popular, buscando saber quais são os

resultados e qual a influência que as mesmas exercem sobre seus participantes diretos, indiretos

18

e egressos. A partir disso, podemos refletir sobre a ação que a música como ferramenta de

inserção sociocultural exerce sobre a comunidade.

Para fundamentar a pesquisa, tomaremos como referencial teórico os educadores Paulo

Freire e Joel Barbosa, que se destacam na área de educação popular e educação musical. Paulo

Freire, uma fonte inesgotável do saber popular, uma inspiração contínua para o fazer

sóciocomunitário. O educador musical Joel Barbosa, há quinze anos ocupa a cadeira de

professor titular da Universidade Federal da Bahia (UFBA), dentre as suas inúmeras atividades

como coordenador, consultor e e educador de projetos sóciomusicais em todo o território

nacional, tembém fez parte da Comissão de Community Music Activities da ISME

(International, Society for Music Education) e contantemente apresenta resultados dos trabalhos

por palestras e em eventos científicos.

Esta pesquisa busca ainda lançar um olhar analítico sobre a música coletiva como

ferramenta de intervenção sóciocomunitária. A experiência vivida por mim ao longo dos anos

foi de fundamental importância para que eu obtivesse uma melhor compreensão da diversidade

cultural e social que foram observadas dentre os discentes do projeto.

No decorrer da pesquisa procuramos verificar como esse projeto pode oferecer

possibilidades de promoção ou construção de um ambiente de educação, arte, música e

diferentes práticas sociais. Acreditamos que esse tipo de ensino musical que ocorre nos projetos

sociais que trabalham a música também é visto como um meio de inserção social onde o fazer

musical é “eixo aglutinador” (KLEBER, 2006) e através das interações entre os sujeitos

promove o seu desenvolvimento educacional, social e artístico. A presente pesquisa busca,

portanto, aprofundar essa compreensão e, possivelmente, ampliar os conhecimentos sobre

distintas formas de fazer musical.

19

1 INTRODUÇÃO

Música, a mais antiga manifestação da arte é intrínseca ao cotidiano de todos os povos.

Por mais que possamos retroceder na história da humanidade, sempre vamos encontar a música

presente em toda a história, como sendo ela primariamente ligada ao sagrado. Em diversas

circunstancias, sejam elas de alegria, tristeza, saúde, doença, catástrofes, conexões

sobrenaturais, o ser humano desde sempre vale-se da música em seus ritos. A música vocal,

corporal, ou mesmo aquela música“pensada” durante o duro trabalho, pequenos saraus

promovidos no interior de casas após o jantar, nas comemorações, nas danças sapateadas, ao

som de sanfona e violão, que animavam e ainda animam os bailes de jovens, adolescentes e

adultos nos finais de semana e se firmando como o som de uma vida. A música de louvor e a

música de “fervor”, todas elas ocupando um espaço imprescindível nas mais distintas

comunidades.

A banda de música destaca-se como um dos mais populares grupos de musicalização

coletiva, praticando o fazer sóciocomunitário de forma empírica. Trata-se de uma formação

instrumental muito requisitada e, dentre as suas atividades, destacam-se os concertos e retretas,

apresentações públicas nos coretos das praças, quando quase sempre mostra um repertório mais

elaborado, com peças eruditas, além das composições tradicionais (marchas militares, boleros,

valsas, maxixes, entre outras), preocupando-se ainda em executar peças atuais. Vale também

destacar a grande influência dos músicos europeus na formação dos nossos instrumentistas de

banda (STEHMAN, 1964, p. 125). D. João VI além de mandar muitos cantores para terras

brasileiras trouxe para o Rio de Janeiro por volta de 1812, vários músicos italianos e franceses

tais como: Christiano Antoni, Jean Antoine Gabriel, Giuseppe Moraglia, entre outros. No

entanto, pouco tempo depois já era possível encontrar em vários municípios espalhados pelo

país, várias famílias que se reuniam para a prática musical em conjunto, sendo que estas já

contavam com uma boa técnica no instrumento.

No início do século XX, devido à alta imigração no Brasil, deu-se início a vários

movimentos musicais em suas respectivas comunidades. Os grupos que formavam tal

movimento podem ser definidos como “banda musical”.

Há muito, questiona-se sobre a importância do trabalho da banda musical e da música

de uma maneira geral na sociedade, questiona-se ainda que resultados tem atingido ou deve

atingir o trabalho desenvolvido por estes grupos. Entreter? Expressar emoções? Comunicar?

Contribuir para a integração das pessoas através do lazer? A banda de música ao longo da sua

20

existência pratica todas essas funções, dentre outras prováveis que lhe foram certamente

atribuições como inatas.

Desde o seu surgimento, a banda de música já adotava mesmo que inconsciente a

metodologia do ensino coletivo de instrumentos musicais, pois todos os instrumentos eram

ensinados pelo maestro da banda em aulas coletivas. Tal método provoca uma troca de

informações que vai muito além do conteúdo artístico. O intercâmbio de experiências, que

quase sempre é mediado pelo maestro do grupo, faz com que cada integrante atue como uma

espécie de espelho, onde uns aos outros se refletem, promovendo assim uma imediata troca de

informações. Com isso é possível verificarmos o crescimento dos músicos, tanto na área

musical, quanto na área das relações interpessoais.

Além disso, as diversas experiências coletivas vivenciadas no ambiente musical pelos

educadores e educandos fazem com que a percepção do papel do indivíduo em sua comunidade

aumente gradativamente, promovendo assim um ambiente de cooperação.

Só conseguimos viver e experimentar a vida como uma coisa boa e valiosa

quando estamos juntos e partilhamos momentos significativos deste ‘estar

juntos’. Só podemos estar voluntariamente juntos quando cooperamos uns

com os outros e aprendemos a ser e viver uns por intermédio dos outros. Só

logramos compartir situações de cooperação quando não são uma necessidade

vital, mas quando uma vocação gratuita a ter os outros voluntaria e

afetuosamente junto a mim cria entre nós um contexto de emoções de

aceitação da pessoa do outro e de cooperação com ela (BRANDAO, 1985, p.

91).

Além de integrar, a música praticada no ambiente coletivo colabora também para o

crescimento individual da pessoa. Neste sentido, Confúcio, o grande filosofo chinês, afirmava

que a boa música contribui para a construção do caráter do homem: (CONFÚCIO, apud

IKEDA, 2015, p. 1).

A música do homem de espírito nobre, suave e delicada, conserva um estado

d’alma uniforme, anima e comove. Um homem assim não abriga o sofrimento

nem o luto no coração; os movimentos violentos e temerários lhe são

estranhos. Mais que isso: uma vez que os indivíduos são os materiais básicos

de construção da sociedade, a música também poderia afetar nações inteiras,

melhorando-as ou piorando-as. De acordo com Confúcio: “Se alguém desejar

saber se um governo é bem ou mal governado, se sua moral é boa ou má,

examine a qualidade da sua música, que obterá a resposta”.

Muitos filósofos dissertaram a respeito da grande importância da música no que diz

respeito à formação do homem, fazendo-se presente desde a antiguidade em todos os eventos

21

cotidianos a que se tem registro, sejam elas religiosas ou até mesmo de lazer, podemos dizer

que ela desde sempre cumpre um importante papel social. Treze séculos antes de Cristo, a China

já contava com a música em sua cultura. No Egito, a música era usada em todos os ritos

sagrados. O rei Davi era considerado músico, poeta e construtor de instrumentos, através dos

seus salmos e cânticos temos uma breve noção da música praticada por Davi. Infelizmente desta

época sobraram apenas indícios arqueológicos que nos revelam vagamente a história musical

daquele período.

Entretanto, o fato é que ela sempre esteve lá, como uma forma inclusive de educar.

Aristóteles, sugeria o ensino da música como um conteúdo importante a educação do corpo e

mente. Pensando na eficácia da prática coletiva de ensino de instrumentos, podemos ainda nos

apoiar em outro pensamento do mesmo filosofo que afirmava: “conhecer o universal também

nos faz conhecer o particular, mas conhecer o particular não envolve o universal”

(ARISTÓTELES, apud GARDNER, 1998, p. 47).

Partindo do pensamento de Aristóteles a respeito do conhecimento universal,

encontramos no “raga”, uma música de origem indiana que era praticada de forma empírica,

do professor para o aluno sem o seu registro formal em partituras, o conhecimento era apenas

passado de forma oral, objetivando a integração do grupo com o ser supremo em busca do

estado de espirito divino. Neste caso, utilizava-se a música em forma de mantras para

universalizar os conceitos pregados, tal prática buscava ainda fazer com que o indivíduo

transcendesse o estado material buscando uma meditação profunda, autoconhecimento e

concentração, o que segundo a crença resultaria na cura de doenças físicas e espirituais.

Passaram-se mais de cinco mil anos desde que a música do ser humano talvez não fosse

mais do que o percutir de restos de ossos sobre troncos, o que podemos entender como a

primeira forma de instrumentos de percussão, e a manifestação da música vocal, através de

sons desordenados emitidos pelo homem da antiguidade.

Não desconsiderando a teoria da evolução da espécie, proposta por Darwin, segundo a

cosmovisão cristã, existem registros do antigo Egito, oriente médio e em Roma que citam a

formação de grupos musicais ambulantes que podemos definir como uma banda; como

exemplo, o grupo citado no livro bíblico de Josué (cap. 6:6) a respeito da tomada de Jericó:

“Então o povo gritou quando os sacerdotes tocavam as suas trombetas”.

De volta aos dias atuais, mais especificamente no Brasil, a indústria midiática que busca

tão somente o sucesso financeiro tem cada vez mais fomentado a baixa qualidade de produção

artística, não se importando com quesitos como: qualidade poética, técnica, tampouco valores

sociais, transformando assim arte em um produto de prateleira comprometido apenas com os

22

altos índices de consumo. Uma das maneiras encontradas para amenizar esta problemática é a

intervenção educacional para que a música e as artes como um todo voltem a ter o seu valor

reconhecido desde a mais tenra infância, aplicada desde a primeira infância do indivíduo.

Neste sentido, Fonterrada (2008, p. 13) aponta que:

O fato de a música ter ou não seu valor reconhecido coloca-a dentro ou fora

do currículo escolar, dependendo do quanto é ou não considerada pelo grupo

social. Se, em determinada cultura, a música for uma das grandes disciplinas

do saber humano, o valor da educação musical também será alto, em pé de

igualdade com o de outros campos do conhecimento. Se, porém, não houver

esse reconhecimento, sua posição em relação às demais áreas será também

marginal. Esta é a questão crucial que se depara hoje no Brasil: o resgate do

valor da música perante a sociedade, único modo de recolocá-la no processo

educacional.

Acreditamos que a intervenção sóciocultural através da educação musical escolar pode

utilizar como ferramenta o método coletivo, assim como as bandas de música. O mediador da

classe deve promover a troca de informação com sabedoria e humildade, e aprender a todo o

tempo com o seu grupo. A este respeito Freire (1979, p. 15) diz que:

Por isso não podemos nos colocar na posição de ser superior que ensina grupo

de ignorantes, mas sim na posição humilde daquele que comunica um saber

relativo a outros que possuem outro saber relativo (É preciso saber reconhecer

quando os educandos sabem mais e fazer com que eles também saibam com

humildade).

A proposta desta pesquisa vem exatamente nesta direção, qual seja, revitalizar a cultura,

através do ensino da música pela educação musical sóciocomunitária. Considerando que a

grande maioria dos municípios do Brasil, segundo os dados oficiais da Funarte, contam com a

antiga tradição de manter Corporações Musicais em atividade, escolhemos a “Corporação

Musical 24 de Junho de Artur Nogueira/SP, que desenvolve o Projeto Retreta nas Escolas da

rede pública para este estudo de caso.

Portanto, qual a influência que o uso da música como ferramenta de inserção

sóciocultural exerce sobre a comunidade participante do Projeto Retreta? O que

representou/representa o Projeto Retreta na vida dos participantes? O que pensam sobre a

metodologia de ensino utilizada no Projeto? Quais os pontos fortes e as fragilidades em sua

opinião?

Assim sendo, a proposta deste trabalho é de que sirva como mais um dispositivo deste

processo, partindo do pressuposto de que a contribuição artística/musical que ele fornece à

23

comunidade é de extrema importância para o crescimento do indivíduo. A partir disso, analisar

o fazer social no processo de ensino/aprendizagem, buscando aprofundar, ampliar e

fundamentar uma melhor proposta de educação musical a partir de um olhar sóciocomunitário.

A presente pesquisa está organizada em três capítulos. No primeiro veremos um

pequeno histórico das bandas de música, falando de seu repertório, sua funcionalidade, como

podem ser classificadas; conhecendo a sua estrutura e as diferenças existentes entre suas

variadas formações e tipos. No segundo, abordaremos algumas considerações sobre o processo

de educação não formal exercido pelas corporações musicais. Para finalizar, o terceiro, será

composto do conteúdo e análise da pesquisa de campo – estudo de caso do Projeto Retreta.

24

2 METODOLOGIA

Na presente pesquisa, optamos pelo estudo de caso, trata-se de uma forma característica

de averiguação empírica que objetiva descrever, apontar ou testar teorias que possam

proporcionar uma generalização analítica. Severino (2007) afirma que o estudo de caso é uma

pesquisa escolhida pelo pesquisador visando um caso específico e que poderá ser representativa

para um grupo de casos análogos, cujos resultados poderão ser aproveitados para o estudo da

sua realidade, e os dados obtidos através da pesquisa devem ser analisados com o máximo

cuidado.

Esta pesquisa pode ser classificada como estudo de caso, já que, para tanto, temos um

objeto investigado (Corporação Musical 24 de Junho), entidade que desenvolve o Projeto

Retreta. Com o presente estudo de caso, verificaremos os pontos fortes e frágeis do projeto. No

entanto, para agregar ainda mais credibilidade aos resultados utilizaremos ainda aspectos da

pesquisa quantitativa.

No tocante à pesquisa quantitativa de estudo de caso, Ludke e André (1986, p. 17) afirma

que tal metodologia objetiva o estudo de somente um caso. Tal ferramenta de pesquisa deve ser

empregada no momento em que o investigador pretende analisar um caso distinto. Elas apontam

ainda que “o problema deve ser bem delimitado, devendo ter seus contornos claramente

definidos no desenvolver do estudo” (idem).

As autoras citam ainda as principais características do estudo de caso, que são:

a) Os estudos de caso visam à descoberta;

b) Os estudos de caso enfatizam a interpretação em contexto;

c) Os estudos de caso buscam retratar a realidade de forma completa e profunda;

d) Os estudos de caso usam uma variedade de fontes de informação;

e) Os estudos de caso revelam experiência vicária e permitem generalizações

naturalísticas;

f) Os estudos de caso procuram representar os diferentes e, às vezes, conflitantes pontos

de vista presentes numa situação social;

g) Os relatos de estudo de caso utilizam uma linguagem e uma forma mais acessível do

que os outros relatórios de pesquisa (LUDKE E ANDRE, 1986, p. 18-20).

O objetivo pretendido com a metodologia de pesquisa quantitativa é traduzir em gráficos

numerais a opinião dos participantes do projeto, apontando assim os pontos positivos e

negativos do objeto investigado. O instrumento a ser utilizado para a coleta de dados foi o

25

questionário digital, que possibilitou de maneira confiável o diagnóstico inicial para o

desenvolvimento dos gráficos.

O questionário foi partilhado com o auxílio da ferramenta Google.docs que é uma

plataforma de pesquisa digital muito utilizada na área da educação. A partir de um roteiro de

questões elaborados pelo pesquisador, os questionários foram enviados (via e-mail) a diversos

participantes de forma direta ou indireta do Projeto. Inicialmente, foi enviado um questionário

em caráter de teste, direcionado a um pequeno grupo de pessoas que auxiliaram com as suas

sugestões na melhor elaboração da ferramenta de pesquisa. A próxima etapa foi a análise dos

dados obtidos, para que o resultado das informações auxiliassem na obtenção da meta inicial

da presente pesquisa.

Partindo do pressuposto de que para o investigador de um estudo de caso interessa o

contato direto com o cotidiano do objeto investigado, desta forma, vale lembrar que projetos

semelhantes sofrem constantes mudanças do contexto social e até geográfico, o que certamente

ocasiona conflitos de dados dependendo do ambiente investigado.

Em resumo, os procedimentos metodológicos utilizados foram os seguintes: coleta de

dados por meio de um questionário digital, a fim de obter uma melhor compreensão do objeto

de estudo, e análise destes dados para fazer o diagnóstico e as considerações e, assim, obter os

resultados finais da pesquisa.

26

3 A BANDA DE MÚSICA: DA CAPO SEM CODA

Para compreendermos o contexto histórico e a importância da banda de música, é

necessário que, em primeiro lugar, saibamos claramente o significado da palavra “banda”. Uma

das possibilidades é a de que palavra “banda” tenha origem germânica anterior à Alemanha.

Segundo (SADIE, 1994, p. 71): o termo Banda é derivado de “bando”, trata-se de um conjunto

instrumental. Em sua forma mais livre, “banda” é usada para qualquer conjunto maior do que

um grupo de câmara. As cornetas e tambores, acompanhando um oficial que fazia uma

proclamação, formavam um bando. Nos tempos coloniais, era assim que anunciavam os

decretos, leis, festividades. Portanto, do bando veio a banda de cornetas, tambores, pífaros e,

desta, a banda militar ou de regimento completa e banda sinfônica.

Também pode-se explicar a sua origem francesa de “bande” que significa um sinal ou

uma bandeira. As fanfarras eram classificadas como banda por se tratarem de um grupo de

sopros e percussão o qual emitia sons demasiadamente altos.

Ainda a este respeito, Sadie (1994 p. 71) afirma que na Inglaterra do sec. XVIII, a

palavra banda era usada coloquialmente para designar uma orquestra. Hoje em dia, costuma

ser usada com referência a grupos de instrumentos relacionados, como em “banda de metais”,

“banda de sopros”, “banda de trompas”. Vários tipos recebiam seus nomes mais pela função

do que pela constituição (banda de dança, banda de jazz, banda de ensaio, banda de palco). A

banda destinada para desfiles (marching band), que se originou nos EUA, consiste de

instrumentos de sopro de madeira e metais, uma grande seção de percussão, balizas, porta

bandeiras etc.

Uma formação mais moderna é a banda sinfônica de sopros, norte-americana, que se

origina de grupos como a Gilmore’s Band , em 1859, e US Marine Band, dirigida por John

Philip Sousa, no período de 1880-92.

No que se refere à qualidade artística, ainda nos dias atuais conceitua-se erroneamente

uma certa hierarquia entre o grupo “banda” e “orquestra”. O músico violinista e compositor

americano John Phillip Sousa, um dos maiores ícones do movimento de bandas de todos os

tempos, sempre que indagado a respeito da qualidade de uma banda em relação à orquestra,

respondia: “Inferior nunca, apenas diferente! Em arte não há hierarquia. O critério de valor é o

efeito artístico” (MEIRA, 2000, p. 44).

Mundialmente falando, o número de bandas musicais é extremamente mais elevado

em relação às orquestras. Deve-se inclusive ao fato de ser muito mais fácil e simples a sua

viabilização do ponto de vista estrutural e financeiro. A facilidade logística de uma banda,

27

aliada à disciplina herdada dos jesuítas e dos militares, disseminaram a prática de banda, que

atuava e atua como uma espécie de conservatório popular, suprindo por décadas a lacuna da

educação musical formal, promovendo assim, uma das primeiras formas do fazer

sóciocomunitário através da música.

Podemos assim entender, ao confirmarmos a indispensável presença destes grupos nas

mais diversas manifestações públicas, sempre em “papel de destaque”, ao toque de uma banda

proclamaram-se guerras, foram e são recebidos reis, chefes de estado e todo o tipo de

autoridade, religiosa, militar ou política. São as bandas de música que servem para louvar nas

mais diversas manifestações espirituais, despertar o civísmo de distintos povos. Está presente

na música matrimonial e na música fúnebre, enfim, poderíamos enumerar muitas situações em

que a banda de música faz-se presente.

A seguir, veremos um pequeno histórico das bandas de música, falando de seu

repertório, sua funcionalidade, como são classificadas, conhecendo a sua estrutura e as

diferenças existentes entre suas variadas formações e tipos.

3.1 Pra ver a Banda chegar

Apesar de existirem indícios da existência da banda de música no estado do Pernambuco

por volta do século XVII, mais precisamente em Recife e Olinda - formações que hoje

classificamos como “grupos de pífanos” e “fanfarras” eram considerados “banda” na época. Foi

somente por volta da segunda metade do século XVIII que sua existência se ratifica com o

início do movimento de bandas no Brasil. Segundo apurou Pereira (1999), o registro mais

importante sobre o início do movimento de bandas no Brasil é por algum motivo até os dias

atuais pouco difundido. Trata-se de uma crônica do doutor em direito José Vieira Couto

Magalhães, que é citada por Vincenzo Cernicchiaro (1926), da qual Pereira (1999, p.21) destaca

o trecho referente à banda:

O padre Manuel de Paiva (que deveria ser um homem de mente extraordinária,

usando para o bem a arte musical) recebia em Santos a visita do padre Nunes

(Nunes), vindo de São Paulo. Depois do jantar o padre Nunes, maravilhado,

escuta uma serenata na vizinhança do convento. Eram os trovadores

portugueses e indígenas que mesclavam os próprios cantos com o dos

indígenas (sic), com boa e civil harmonia. A orquestra já organizada pelo

Padre Paiva era um atrativo para os jovens bárbaros, que tinham revelado rara

28

aptidão para a música. São brasis (sic) os vossos músicos? Alguns, porém

esperamos ter em breve uma banda completa dos nacionais.1

Ainda que o registro citado seja bem limitado, passa a ser de extrema importância, já

que apresenta nomes que não são citados comumente nos trabalhos históricos. A citação se

refere ao diálogo de dois padres que foram importantes na Companhia de Jesus, juntamente

com os padres Manuel da Nóbrega, em1549, e José de Anchieta, em 1553. O padre Manuel de

Paiva foi diretor e reitor do Colégio de São Paulo e o padre Leonardo Nunes, antes de 1550,

formou uma espécie de seminário ou colégio em São Vicente (REZENDE, 1954, p. 197 e 198,)

onde ensinava música aos meninos órfãos e aborígines.

Na citação inicial é importante destacar o diálogo que revela a “rara aptidão para a

música”, (o que não causa espanto, porque sabe-se que os indígenas desde as suas origens se

valem de inúmeras formas de manifestação musical, como por exemplo: em suas cerimônias

dedicadas aos “deuses” (do sol, da água, da terra), usavam flautas, chocalhos e outros tantos

instrumentos de percussão).

A respeito da denominação banda, vemos através da afirmação do padre Manoel Paiva:

formar “uma banda completa de nacionais” “em breve”. Na conversa, Leonardo Nunes

classifica o grupo ouvido como orquestra e mais adiante Manoel Paiva reafirma o termo banda.

Determinada a origem do termo e a existência da Banda de Música, já durante a

colonização, nos ateremos agora na busca de uma melhor compreensão a respeito dos

instrumentos que eram utilizados, sendo eles a grande maioria da família dos sopros e

provenientes da Europa.

Simão de Vasconcellos (1596-1671) confirma não só o interesse dos participantes pela

música, mas também a difusão do ensino musical e determina os instrumentos ao relatar: “São

afeiçoadíssimos à música, e os que são escolhidos para cantores do coro prezam muito do ofício;

e gastam os dias e noites a aprender e ensinar outros. Saem destros de todos os instrumentos

musicais: charamelas, flautas, trombetas e fagotes” (REZENDE, 1954, p.199).

Na Figura 1 podemos ver algumas ilustrações dos instrumentos citados por Simão.

Figura 1 – Charamelas

1Dada a importância histórica da citação, em que o termo Banda aparece explicitamente, podendo ser a primeira

informação bibliográfica sobre a origem da Banda de Música no Brasil, utilizou-se o grifo. Há o intercâmbio com

o termo orquestra, prática comum na época.

29

Fonte: JENSKINS (2009, p. 164)

A charamela é um instrumento de sopro construído em madeira, originário da Eurásia

(que podemos entender como um conglomerado dos continentes europeu e asiático), para a

emissão de som é necessário o uso de palhetas duplas ou simples, as charamelas contavam com

um grande volume sonoro. (No século XVII os grupos que antecederam a banda de música

eram denominados “charameleiros”, apesar de que os grupos não eram constituídos apenas de

charamelas). Provavelmente, instrumentos musicais como a clarineta, o oboé e até mesmo o

fagote originaram-se da charamela.

Na figura 2 temos diversas flautas, certamente um dos mais antigos instrumentos de

sopro dos quais se tem ciência. De acordo com MCCOMMON (1963) existem instrumentos

datados de 4.000 anos atrás que foram resgatados na região dos Alpes da Alemanha. Existem

muitas flautas também de origem indígena que eram confeccionadas com ossos de animais e

humanos, além de bambu e madeira. A flauta é classificada como um instrumento da família

das madeiras, trata-se de um tubo cilíndrico, o seu som é produzido pela vibração do ar ao

passar por uma aresta chamada bocal, a mudança da altura de notas se dá pelo processo

mecânico empregado nos orifícios encontrados por todo o corpo do instrumento.

30

Figura 2 – Flautas

Fonte: JENSKINS (2009, pp. 128-131)

Um dos instrumentos mais antigos que se tem registro é o Trompete (Figura 3) trombeta

ou pistão. Consta em documentos egípcios que registram a pintura do instrumento, além de

terem sido encontrados dois instrumentos no sarcófago do faraó Tutancâmon. Presença

constante na historiografia bíblica, o trompete é um instrumento oriundo dos chifres animais e

que hoje é construído em metal. O princípio de produção de som assemelha-se ao da flauta, no

entanto ao invés de orifícios o trompete conta em seu corpo com alguns mecanismos que são:

chave de água, pistões, volta de afinação, cotovelos e por fim o bocal.

Figura 3 – Trompete

Fonte: JENSKINS (2009, p. 108)

O próximo instrumento ilustrado na Figura 4 é derivado do italiano fagotto, o Fagote

também é um instrumento musical da família dos sopros, o som é produzido por um sistema de

palhetas duplas que são fixadas em um tudel de cobre, o seu corpo é construído em madeira de

cerca de 2,5 metros.

31

Figura 4 – Fagotes

Fonte: JENSKINS(2009, p. 176)

Alguns historiadores definem os instrumentos mais ligados aos indígenas. “Dançavam

e cantavam, por exemplo, em ocasiões de guerra, morte, doenças, colheitas, caça ou pesca.

Como instrumentos, usavam chocalhos de variada espécie, como o maracá, além de trombetas,

buzinas, flautas rústicas, assobios e os chamados bastões de ritmo” (REZENDE, 1954, p. 254).

Na Banda de música, ainda hoje, utiliza-se grande parte dos instrumentos de sopro que

provavelmente foram os primeiros a serem trazidos da Europa para o Brasil desde a

colonização. Além da presença significativa de instrumentos de sopro na época, uma das

formações mais mencionadas era o terno de flautas e de charamelas - os mais citados (JUSTI,

1995, p. 64).

A partir do século XVII, era muito comum a presença nas fazendas de café e outras

culturas, de bandas formadas por escravos e índios. Os senhores feudais, ou senhores de

engenho as exibiam aos demais como um troféu, concorrendo aos outros a respeito do tamanho

e da qualidade da sua “banda particular”.

No advento da abolição da escravatura, podemos verificar mais uma vez a forte presença

das bandas de música que foram as protagonistas dos festejos da época conforme comprova a

reportagem do “Jornal do Senado” de 1888 (Figura 5)

32

Figura 5 – Jornal do Senado

FONTE ( Rio de Janeiro, 2015)

Vale aqui apontar que, ainda nos dias atuais, permanece desde 1933 em atividade na

cidade de Campinas S.P., (município que tardiamente aderiu à abolição da escravatura), a

Corporação Musical Campineira dos Homens de Cor, a banda dos “homens de cor” (como é

chamada), teve como objetivo primário criar um espaço para que os negros pudessem se reunir

e expressar a sua arte através da música.

A este respeito Mariuzzo (1933, p. 1) cita que:

Por volta da metade do século XIX, várias bandas começaram a se formar em

Campinas, num processo que atingiu o seu auge em 1870, estendendo-se até

a virada do século. A expansão deste tipo de agrupamento musical ligava-se à

crescente urbanização pela qual a cidade passou neste período. Estas

mudanças permitiram a parcelas da população novas opções de lazer e

relações de sociabilidade. Neste cenário, é fundada a Banda Ítalo-brasileira no

ano de 1895, grupo que viria a gozar de grande prestígio na cidade. Pelo fato

33

da banda não aceitar a participação de músicos negros, essa foi a principal

motivação para a criação da Corporação Campineira dos Homens de Cor, em

1933. Um grupo de homens negros dos quais nem todos eram músicos,

resolveu criar uma banda que receberia apenas indivíduos negros. O objetivo

era criar uma alternativa de ensino musical e lazer para os negros de

Campinas, indo contra o forte legado escravista presente na sociedade

campineira.

Como podemos ver no texto de Mariuzzo , no século XIX, muitas bandas comunitárias

passaram a ser instituídas no pais ", difundindo assim a chamada“banda de barbeiros2”, que

além do repertório sacro, executavam músicas seculares nas mais diversas manifestações

populares.

Posteriormente, após o músico Anacleto de Medeiros fundar a banda de música da ilha

de Paquetá R.J., Anacleto a convite do tenente-coronel Eugênio Jardim formam a mais

importante Banda de Música que se tem registro no Brasil: A Banda de Música do Corpo de

Bombeiros do Estado do Rio de Janeiro. A respeito disso Cazes (2010, p.28) afirma que:

Em 1896, Anacleto recebeu do tenente-Coronel Eugenio Jardim o convite

para organizar a Banda do Corpo de Bombeiros e para isso arregimentou ex-

colegas do Arsenal de Guerra, como os trompetistas Luís de Souza e

Casemiro Rocha, e outros chorões de boa técnica. Isso fez com que a banda

passasse a se destacar das demais de sua época, pela melhor afinação, leveza

e arranjos bem-acabados.

Através do rigoroso trabalho de Anacleto de Medeiros a banda passou a agregar um

alto nível de qualidade técnica e artística, como podemos verificar no texto de Alexandre Pinto.

Além de exigente do ponto de vista técnico, Anacleto era considerado como um mestre

“violento”, devido a sua rispidez perante a Banda.

Como maestro ensaiador, transformou a Banda do Corpo de Bombeiros em

um conjunto de músicos professores que o respeitavam e o obedeciam, na

maior rispidez de suas energias, pois Anacleto, era um diretor de música

caprichoso e violento (PINTO, 1936, p. 78).

2Barbeiros - Realmente, dentre as atividades historicamente desempenhadas no Brasil Colônia por negros livres

ou a serviço de seus senhores, a que por seu caráter de atividade liberal mais conferia destaque pessoal era a de

barbeiro. O barbeiro, pela brevidade mesma do serviço - fazer barba ou aparar cabelos era questão de minutos -

sempre acumulara outras atividades compatíveis com sua necessidade manual e era representada pela função de

arrancar dentes e aplicar bichas (sanguessugas). Essas especialidades, sempre praticadas em público, situavam os

barbeiros numa posição toda especial em relação às profissões mecânicas ou demais atividades de caráter

puramente artesanal. E como seus serviços em tal atividade liberal lhe permitiam tempo vago entre um freguês e

outro, os barbeiros puderam aproveitar esse lazer para o acrescentamento de outra arte não mecânica ao quadro de

suas habilidades - a atividade musical (História Social da Música Brasileira, p. 157).

34

Há que se confirmar então que Anacleto de Medeiros arregimentou músicos de diversas

origens transformando-os em professores de alto nível, reconhecidos nacionalmente,

colaborando inclusive para as rodas de choro que se formavam naquela época nos subúrbios

do Rio de Janeiro, fazendo com que ambos os movimentos, a banda de música e as rodas de

choro passassem a contar com um admirável nível técnico e artístico.

A troca de saberes promovida pela ação de Anacleto de Medeiros ultrapassou os limites

artísticos; o processo de intercâmbio entre os músicos de banda e os de roda de choro, resultou

em um dos primeiros intercâmbio sociais a que se tem notícia no cenário musical brasileiro.

Cazes (2010, p. 31) afirma que: a ponte que Anacleto realizou entre a cultura das bandas

e das rodas de choro enriqueceu enormemente ambas as manifestações. Por um lado, a Banda

do Corpo de Bombeiros conseguiu um resultado único em termos de coesão e musicalidade,

por outro, a linguagem chorística se propagou como em nenhum outro momento.

Além de alavancar o cenário musical do Rio de Janeiro, Anacleto de Medeiros tornou

a Banda de Música do Corpo de Bombeiros do Estado do Rio de Janeiro uma referência de

qualidade para todas as bandas do Brasil até os dias atuais.

A Banda Militar e a Banda Civil, dentre as mais diversas formações, são as duas

caracterizações mais utilizadas. De acordo com Kandler (2011), quanto a denominação

das bandas participantes dos concursos da Confederação Nacional de Bandas e Fanfarras

– CNBF5 existem: Banda de percussão; Bandas e Fanfarras, e essas três se subdividem

de acordo com a composição dos instrumentos

Banda de Coreto (trata-se dos grupos que se dedicam a se apresentar em praças públicas

nos espaços denominados “coretos”).3

Banda Musical(A banda musical além de cumprir as atribuições da banda de coreto,

apresenta-se ainda marchando)

Banda Sinfônica : A banda sinfônica, conta com um repertório e consequentemente um

instrumental mais amplo, o que inclui piano, contrabaixo, violoncelo e, por vezes, harpa; a

banda sinfônica normalmente se apresenta em teatros ou espaços fechados, assim como as

orquestras.

Banda Filarmônica (se diferencia das demais por tratar-se de sociedades musicais que

se mantém com o apoio privado)

3é uma cobertura, situada ao ar livre, empraçasejardins, para abrigar bandas musicais em concertos, festas

eromarias (dicionário Aurélio). 5Disponível em http://www.cnbf.org.br/regulamento.html. Acesso em 05/08/2015

35

Banda Marcial que vem da subdivisão da banda de percussão, podendo

atualmente, no Brasil, banda marcial é composta de instrumentos de metais e

percussão e corpo coreográfico. Nao inclui instrumentos de madeira. certamente é

a que mais se aproxima das bandas militares no que diz respeito ao uso impecável de

uniformes que incluem quepes, além da ordem unida). A banda marcial nasceu no final

do século XVII, quando músicos militares foram enviados para a então escola

republicana, com a missão de formar bandas de sopros e percussão com os alunos e

músicos amadores.

Corporação Musical, trata-se de organizações formadas por músicos, com o objetivo de

estruturar legalmente um trabalho musical, fazendo com que estes trabalhos pudessem

inclusive receber apoio financeiro da iniciativa privada e governamental;

Euterpe, segundo a mitologia grega, era a deusa da música, muitas bandas de música no

Brasil adotam a denominação “Euterpe”, dentre elas destaca-se a Euterpe Cachoeirense

que é a mais antiga do estado de Minas Gerais.

No tocante ao repertório, além de um vasto repertório de origem européia, que incluiam

músicas folclóricas a reduções de grandes obras sinfônicas, as bandas de música tiveram e tem

importante papel na difusão da música popular brasileira em seus respectivos coretos,

dedicando-se à execução de choros, maxixes, valsa e ainda um vasto repertório de músicas

regionais.

A esse respeito, Tinhorão (1998) afirma que certamente seria de muita conveniência ir

aos poucos habituando essa gente (referia-se ao povo das praças públicas, reunindo para ouvir

música de coreto) a apreciar também boas melodias, e assim modificar o juízo de que os

concertos públicos são unicamente para os que tem pelos sambas e maxixes restrita preferência.

Ainda a respeito de repertório, ressaltamos que a partir de 1995 a FUNARTE iniciou

um trabalho de resgate e reestruturação de vários tipos de obras que foram escritas

específicamente para as bandas de música, a série intitulada “Repertório de Ouro das Bandas

do Brasil”. Em uma primeira fase, foram lançados 14 títulos que foram cuidadosamente

trabalhados pelo renomado maestro Marcelo Jardim.

A seguir foi lançado a série: “Música Brasileira para Banda”. Trata-se de vinte títulos

de músicas populares compostas em diversas épocas, cuja releitura dos arranjos confere um

toque de sofisticação às obras sinfônicas, contudo sem perder a essência primária. Um outro

ponto muito importante a destacar é que este material possibilita a execução das obras para os

mais variados tipos de formação de banda, não importando o número de músicos executantes.

Tal ação inclui os grupos de menor porte existentes no país.

36

Há que se dizer ainda que esta vitoriosa iniciativa da FUNARTE, disponibiliza em sua

plataforma digital todos os títulos gratuitamente, caso seja de interesse adquirir o arquivo físico

basta apenas contatar a FUNARTE através do projeto bandas disponível no site.

3.2 O Coreto Brasil

Neste tópico serão expostos os registros oficiais denominando e quantificando a

existência de Bandas de Música no Brasil e no estado de São Paulo. A Ilustração 1 foi

desenvolvida a partir de dados coletados junto ao Ministério da Cultura, através do Projeto

Bandas. A listagem completa de tais bandas é apresentada no Anexo 3.

Ilustração 1 - Mapeamento das bandas de música por estado

Fonte: Departamento de Música Funarte

0

100

200

300

400

500

600

37

Fundado em 1976, um ano após o início da FUNARTE (Fundação Nacional de Artes),

o projeto bandas dedica-se à preservação do patrimônio histórico das bandas de música do

Brasil, através de censos e cadastros que periodicamente são atualizados, sendo possível o

acesso aos grupos cadastrados por todo o território nacional. Além do banco de dados, o projeto

bandas da FUNARTE, fornece instrumentos musicais, cursos de capacitação, além de um rico

acervo de partituras chamado “edições FUNARTE”. A ação da FUNARTE é de extrema

importância para a manutenção das bandas musicais do país.

3.3 O Coreto “São Paulo”

Assim como a FUNARTE que é mantida pelo Governo Federal, a Secretaria de Cultura

do Estado de São Paulo solicitou ao Conservatório Dramático e Musical “Dr. Carlos de

Campos” (o conservatório de Tatuí), um projeto que objetivasse o cadastramento, o auxílio

técnico além de uma ouvidoria para as bandas de música do estado. Para tanto, em maio de

2008 foi realizado um grande congresso de regentes de banda, na cidade de Serra Negra, São

Paulo, do qual este autor participou. No congresso, foram ouvidos os regentes, além de haverem

varias reuniões de mesa redonda; o resultado foi uma ação estadual para a produção de um

projeto padrão para as bandas de música de São Paulo, nascia ali o Projeto “Coreto Paulista”.

Para analisarmos o número de bandas de música em atividade no estado de São Paulo,

usaremos além dos dados da FUNARTE (Ilustração 1) os dados obtidos pelo projeto Coreto

Paulista. O levantamento realizado pelo projeto Coreto Paulista indica que existem 142 Bandas

de Música inscritas somente neste estado.

A Ilustração 2 demonstra a quantidade de corporações musicais em atividade no estado

de São Paulo, sendo que muitas destas instituições, mantem uma escola de música que fornece

instrumentistas para os seus respectivos grupos. A relação completa é apresentada no Anexo

4.

É preciso ainda registrar que existem divergências entre as informações da FUNARTE

em relação ao Coreto Paulista conforme é representado na Ilustração 3 a lista detalhada pode

ser visualizada no anexo 4, os pedidos de esclarecimento feitos por este autor (via email), não

foram atendidos.

38

Ilustração 2 - Bandas de música no estado de São Paulo

Fonte: Departamento de Música Funarte

39

Ilustração 3 - Bandas de música no estado de São Paulo (Coreto Paulista)

Fonte: Projeto Coreto Paulista

Vale ainda ressaltar que a coleta dos dados estatísticos sobre o cadastramento das bandas

de música feito, tanto pela FUNARTE quanto pelo Coreto Paulista, e feitos através de

questionários respondidos de forma digital sem a solicitação de qualquer tipo de documentos

que comprovem a veracidade das informações cadastradas. Desta forma, podemos considerar

como sendo “frágeis” as informações de ambos os censos.

3.4 O Coreto Militar

Este tópico nos causa uma sensação de saudosismo e, ao mesmo tempo, uma certa

intimidade e grande interesse para falar do assunto. Como já fora citado no memorial, sou filho

de um músico militar, o que me proporcionou passar um bom período da infância, percorrendo

os corredores e as salas de música do Corpo Musical da Policia Militar do Estado de São Paulo,

que localiza-se no interior do Regimento “Tobias de Aguiar” na capital.

A banda de música está intrinsicamente ligada ao militarismo desde as suas primeiras

manifestações, usadas principalmente para aplicar conceitos e unificar as tropas, verificamos

40

desde o século XIX a presença de grupos de charameleiros e fanfarras que eram classificados

como uma banda.

Segundo a pesquisa realizada por Binder (2006), os indícios da existência da banda

militar anterior a 1808 não se restringiam somente ao Rio de Janeiro. “No final do século XIX,

Recife, Olinda e João Pessoa, então denominada Paraíba, possuíam conjuntos de

instrumentação muito similares ao prescrito no decreto português de 1802”, de acordo com

Costa (apud BINDER, 2006, p.28):

As bandas de música militar datam de fins do século XVIII, pelas que foram

criadas nos regimentos do Recife e Olinda por ato do governador D. Tomas

José de Melo, a cujo exemplo foi criada também uma no terço auxiliar de

Goiânia, em 1789, mantida pela respectiva oficialidade, e mediante

consentimento daquele governador.

Neste mesmo período, com a instituição da banda da guarda nacional, organizada pela

corte portuguesa através da vinda de D. João, iniciou-se um processo de modernização da

infraestrutura destes grupos.

Em 20 de Agosto de 1810, D. João VI promulga o decreto que determina o efetivo

musical que deveria ser implantado em cada regimento militar. Através do decreto, cada

comandante de infantaria da Corte passaria a ter uma verba destinada para a criação e a

manutenção de um grupo musical que deveria contar com: um maestro e cerca de quatorze

soldados músicos.

Tendo como ponto referencial as excelentes bandas musicais formadas por soldados

recém chegados da guerra peninsular, fora sistematizado em 1814 um programa de ensino

musical em todos os quartéis brasileiros, onde cada oficial músico deveria ensinar a quatro

soldados por vez, diversos instrumentos.

As bandas militares talvez tenham sido uma das primeiras formas de trabalho formal

para o músico, inserindo inclusive o músico amador no quadro social o qual pertencia. A partir

da banda musical militar, o músico não erudito passou a encarar a prática musical de maneira

mais sistematizada, passando a ser então um ponto de descoberta e abrigo de inúmeros grandes

músicos a que se tem ciência no Brasil e no mundo.

Sendo os músicos considerados profissionais diferenciados, era comum o ingresso de

músicos civis, muitas vezes portando o próprio instrumento, passarem a integrar as “fileiras

militares”, reafirmando novamente que o fator social o qual passavam a se enquadrar fazia

com que os mesmos não se portassem como militares “subordináveis”: agiam como oficiais

de primeiro escalão, inclusive na equiparação do soldo. Um outro fator a considerar era a

41

dificuldade inclusive financeira e logística, no que se referia à aquisição do instrumental, já

que esses eram trazidos exclusivamente da Europa.

Em dias mais recentes, segundo Andrade (1997), no Brasil existem 120 Bandas das

Forças Armadas e 100 das Forças Auxiliares. Sendo 23 Bandas da Força Aérea e 30 Bandas

Marciais; no Exército são 79 bandas com formações que variam de 16 a 97 músicos. A Marinha

possui 16 bandas com 600 músicos, totalizando cerca de 3500 músicos. Passaram-se quase vinte

anos após esta coleta de dados e infelizmente não foi possível encontrarmos atualizações a esse

respeito.

Segundo o dicionário Michaelis (2015), a palavra “coreto” deriva de coro, referindo-se

mais especificamente a “pequenos coros”, tratam-se de pequenas edificações de origem

francesa, onde utilizava-se este espaço para pequenas manifestações artísticas, em geral os

coretos ainda são encontrados em praças públicas. No Brasil, encontra-se em maior número no

estado de Minas Gerais, devido ao alto número de bandas existentes lá (Ilustração 1).

Ao longo da minha vivência junto às bandas de música, pude ouvir relatos de músicos

mais antigos que justificavam o tamanho diminuto dos coretos, devido também à influência

militar. Segundo esses relatos, era muito comum que músicos militares na fase da sua

aposentadoria, ou “ida para a reserva” como preferem os militares, voltassem aos municípios

de sua origem. Não era raro que estes profissionais assumissem então as bandas daquelas

localidades. A partir de suas experiências militares, eles influenciavam não somente no

repertório, mas também na disciplina, desfiles, uniformes, e até mesmo sugeriam que um coreto

deveria abrigar de quinze a vinte músicos, tocando em pé, já que na caserna o padrão instituído

de bandas era este.

O pequeno município de Artur Nogueira também conta com o seu coreto. Recentemente

restaurado (Figura 6), o coreto é referência turística do município, além de se fazer presente em

diversas ocasiões que vão de Retretas da banda a manifestações políticas e religiosas como

monstram as Figura 7 e 8.

42

Figura 6 - Coreto de Artur Nogueira

Fonte: Autor (2015)

Figura 7 - Retreta no Coreto de Artur Nogueira

Fonte: Autor (2015)

43

Figura 8 - Retreta no Coreto de Artur Nogueira

Fonte: Autor (2015)

Quando mencionamos o repertório e a área de atuação percebe-se que as bandas civis

e militares estão intimamente ligadas, assim sendo, podemos concluir que o movimento de

bandas militares como um todo, influenciou e influencia diretamente na formação das

corporações musicais, bem como, na cultura de bandas em geral.

Outrossim, no que se refere especialmente às bandas marciais de desfile, o eixo-

norteador para o desenvolvimento do seu trabalho quanto à disciplina, o uniforme, repertório,

concursos, festivais. Portanto, mais uma vez confere-se às corporações militares um grande

legado na formação e difusão de grupos instrumentais de sopro.

3.5 A Corporação Musical 24 de Junho de Artur Nogueira/SP

A “Corporação Musical 24 de Junho”, “a nossa banda”, como é carinhosamente

chamada pelos munícipes, foi fundada no município de Artur Nogueira/SP em 24 de Junho de

1924, por um grupo de músicos locais, sendo eles imigrantes e descendentes de europeus que

colonizaram o território no início do século passado. A Corporação conta hoje com 90 anos de

existência, sendo a instituição mais antiga da cidade, mais velha até mesmo que a existência do

município, que completou 63 anos de emancipação em 10 de abril.

Atualmente, para manter as suas atividades, a Corporação Musical 24 de Junho recebe

patrocínio do Governo Municipal de Artur Nogueira.

44

O destaque de maior importância é para o empresário e benfeitor português Sr. Daniel

Cezário de Andrade, retratado na Figura 9.

Figura 9 - Daniel Cezário de Andrade

Fonte: Autor (2015)

Apesar de não ser músico, o sr. Daniel Cesário foi o responsável pela fomentação da

cultura e, consequentemente, do grupo no município, além de doar um terreno no centro da

cidade onde hoje se localiza a sede da Corporação.

Outra figura de extrema importância para a história da Corporação Musical 24 de Junho

é o músico Antonio de Faveri Neto, o “Sr. Nico”. Logo abaixo (à direita da foto) podemos vê-

lo ministrando aulas de música para o seu cunhado, o sr. Luis Fernandes de Sousa, mais

conhecido como Luís “Ventania”, (à esquerda da Figura 10). Sr. Nico atuou por sessenta e

quatro anos ininterruptos, contribuíndo sempre para que a carinhosa banda, transcendesse ao

tempo. Antes da sua morte o ele pode inaugurar a nova sede da Corporação, o que foi motivo

de grande orgulho e alegria para ele e seus familiares.

Quase um século se passou e no ano de 2010, conforme podemos ver na Figura 11, e a

banda da Corporação Musical 24 de Junho contava apenas com cerca de quinze músicos e

dispunha de uma péssima infraestrutura como mostram as Figuras 12 e 13, o que dificultava

seu andamento, principalmente no que dizia respeito à modernização, bem como à ampliação

do quadro de músicos.

45

Figura 10 - Sr. Nico (à direita)

Fonte: Autor (2015)

Figura 11 - Músicos da Corporação Musical 24 de Junho em 2010

Fonte: Autor (2015)

Figura 12 - Sede da Corporação Musical 24 de Junho no ano de 2009

Fonte: Autor (2015)

46

Figura 13 - Sede da Corporação Musical 24 de Junho no ano de 2009

Fonte: Autor (2015)

Neste cenário, deu-se início a uma intensa pesquisa e várias visitas aos principais

projetos musicais do país, visando à articulação de um projeto musical social que utilizasse a

música como ferramenta de inclusão sóciocomunitária. O projeto deveria possibilitar uma

educação musical diferenciada, onde crianças, jovens e adultos de todas as idades, raças ou

credos, caminhassem de mãos dadas rumo ao fazer musical coletivo.

A busca por um nome para o projeto baseou-se na bagagem histórica da Corporação

Musical 24 de Junho, então com 85 anos de existência, e em sua relação com a população. De

uma reunião entre o autor e dois alunos do projeto (Gustavo e Isadora), surgiu a idéia de

homenagear a banda sobre o coreto, durante uma apresentação, ou, no linguajar dos músicos

de outrora, durante uma Retreta. Nascia o nome “Projeto Retreta”. O dicionário Michaelis

define retreta como “Toque de música, nas praças públicas, por bandas, geralmente militares”

(MICHAELIS, 2015).

A concepção do logotipo do projeto nasceu do desafio de levar a “Retreta”, palavra

restrita ao universo musical, à população. Optando por uma abordagem lúdica, e ao mesmo

tempo abrangente, no sentido de conceituar a definição de apresentação musical do passado,

utilizou-se elementos relacionados ao universo infanto-juvenil para a construção do logotipo.

O logotipo, em sua versão final, apresentado na Figura 14, obteve total aceitação entre os

participantes, permanecendo em uso.

47

Figura 14 - Logotipo do Projeto Retreta

Fonte: Autor (2015)

3.6 A Revitalização do prédio da Corporação Musical 24 de Junho

O primeiro passo para a implantação do Projeto Retreta em Artur Nogueira foi buscar a

revitalização do prédio da Corporação Musical 24 de Junho que encontrava-se em uma situação

de absoluto descaso (Figura 15). Após muitas investidas do Maestro junto ao poder público,

enfim foi concedida uma parceria junto a municipalidade que proporcionou as obras de

restauração do prédio, que localiza-se na rua 10 de Abril, no centro do município de Artur

Nogueira.

Figura 15 - Obra de revitalização da Corporação Musical 24 de Junho

Fonte: Autor (2015)

48

Durante todo o período de obras, professores pais, alunos, membros da diretoria e o

próprio maestro, literalmente “botaram a mão na massa”: era o primeiro ato de ação

sóciocomunitária promovido pelo Projeto Retreta (Figura 16).

Figura 16 - Obra de revitalização da Corporação Musical 24 de Junho

49

Fonte: Autor (2015)

Um dos desafios para a revitalização do prédio era modernizá-lo mantendo ao mesmo

tempo às suas características históricas. Fizemos então um levantamento de relatos de

munícipes, documentos e fotos históricas, inclusive “raspando” a parede antiga do prédio. Foi

possível resgatar as cores originais do prédio, fornecendo subsídios para que o aluno do projeto

Gustavo Duzzi Libanori desenvolvesse um projeto de restauração de pintura para o prédio,

representada nas Figuras 17 e 18.

Figura 17 - Obra de revitalização da Corporação Musical 24 de Junho

Fonte: Autor (2015)

50

Figura 18 - Obra de revitalização da Corporação Musical 24 de Junho

Fonte: Autor (2015)

Devido aos altos preços de material de acabamento, os participantes do projeto passaram

a atuar em festas públicas como quermesses e afins; a atividade era a venda de pastéis (Figura

19). Com os valores recebidos o maestro juntamente com demais membros da diretoria saiam

para comprar os materiais de acabamento e durante o período noturno trabalhavam como

pedreiros e assistentes.

Figura 19 - Barraca de pastel

Fonte: Autor (2015)

51

Figura 20 - Participantes do projeto após a restauração da Sede

Fonte: Autor (2015)

Figura 21 - Sede restaurada

Fonte: Autor (2015)

52

A nova sede, apresentada nas Figuras 20 e 21, passou a contar com um maior espaço

físico, com acessibilidade e infraestrutura digital (o que não existia antes), um hall de entrada

com as fotos históricas, que foram resgatadas durante o processo de revitalização, uma copa,

almoxarifado para o armazenamento de instrumentos, equipamentos e partituras, banheiro

masculino e feminino (já que, historicamente, as bandas de música davam a preferência para o

público masculino). Tal comodidade possibilitou de imediato a ampliação das atividades além

de provocar uma curiosidade do público em geral, o que antes indicava um certo descaso à

instituição.

A partir de então, passaram a ser organizadas palestras sobre música e recitais, contando

inclusive com a presença de músicos renomados no cenário nacional. Por fim, o espaço da

Corporação Musical 24 de Junho permite agora uma melhor aceitação e interação com a

sociedade de forma geral, os músicos atualmente se sentem “em casa” quando lá estão, e a

secretaria da sede é alvo de novas inscrições diariamente.

A sede da Corporação representa ainda um espaço de conhecimento e informação

musical que atende a todas as classes sociais sem distinção e, mais do que isso, evidencia como

a música é eficaz quando utilizada como ferramenta de transformação sóciocomunitária, como

apresentam as Figuras 22 a 39.

Figura 22 - Workshop realizado na sede da Corporação

Fonte: Autor (2015)

53

Figura 23 - Workshop realizado em anfiteatro municipal

Fonte: Autor (2015)

Figura 24 - Alunos do Projeto em viagem

Fonte: Autor (2015)

54

Figura 25 - Alunos do Projeto em visita à Sala São Paulo

Fonte: Autor (2015)

Figura 26 - Recital de violões

Fonte: Autor (2015)

55

Figura 27 - Recital do coral na EE Severino Tagliari

Fonte: Autor (2015)

Figura 28 - Aluna do Projeto durante recital

Fonte: Autor (2015)

56

Figura 29 - Apresentação do coral na EMEF Aparecida Dias

Fonte: Autor (2015)

Figura 30 - Recital da fanfarra do Projeto no CAIC

Fonte: Autor (2015)

57

Figura 31 - Alunos do Projeto durante ensaio

Fonte: Autor (2015)

Figura 32 - Alunos do Projeto durante concerto

Fonte: Autor (2015)

58

Figura 33 - Alunos do Projeto durante estudo

Fonte: Autor (2015)

Figura 34 - Professores do Projeto animando o Carnaval do asilo local

Fonte: Autor (2015)

Figura 35 - Coral do Projeto no programa EJA

Fonte: Autor (2015)

59

Figura 36 - Corpo docente do Projeto

Fonte: Autor (2015)

Figura 37 - Concerto da Banda da Corporação com o músico Derico Sciotti

Fonte: Autor (2015)

60

Figura 38 - Concerto da Banda da Corporação com o músico Renato Carlini

Fonte: Autor (2015)

Figura 39 - Concerto da Banda da Corporação no Programa do Jô

Fonte: Autor (2015)

61

Através do trabalho de intervenção sóciocomunitária utilizando a música como

ferramenta transformadora, a Corporação Musical 24 de Junho e o Projeto Retreta

inegavelmente fazem parte do cotidiano do município de Artur Nogueira.

62

4 A EDUCAÇÃO NÃO FORMAL EXERCIDA PELAS BANDAS DE

MÚSICA

No presente tópico analisaremos a função da educação não formal que aqui trataremos

como educação sóciocomunitária e de que forma a música pode ser considerada uma ferramenta

de intervenção social na comunidade. A música tem o poder de atrair as mais variadas pessoas,

independente do gênero, da raça, da idade ou da posição social. Ela encanta e envolve a todos,

não sendo necessário compreender sua estrutura para apreciá-la, pois trata-se de uma linguagem

universal, que dispensa legendas.

Para que possamos melhor compreender o papel da educação sóciocomunitária,

falaremos de educação formal e não formal, e claro, da educação sóciocomunitária. É preciso

frisar que a educação sóciocomunitária não se opõe às demais divisões, no entanto ela se

distingue.

Sempre que nos referimos à educação é muito comum associarmos como uma função

única e exclusivamente da escola, não levamos em conta porém a educação empírica que todo

sujeito recebe em casa, no seu cotidiano, podemos citar: os dialetos, os costumes, os paladares,

os critérios de escolhas (sejam elas quaisquer), as ações interpessoais, enfim, toda aquela

educação que aprendemos com os mais experientes, a começar pelo ambiente familiar.

Neste sentido, Brandão (apud CARO, 2004, p.1) apurou que: a vida está sempre ligada

à educação, não havendo uma forma única, nem um modelo de educação; a escola não é o

único lugar onde ela acontece e, talvez nem seja o melhor. A educação existe difusa, em todos

os mundos sociais, entre as incontáveis práticas dos mistérios do aprender; primeiro sem

classes de alunos, sem livros e sem professores especializados; mais adiante com escolas, salas,

professores e métodos pedagógicos.

Mesmo sendo esta uma importante ferramenta para a formação do indivíduo, este tipo

de educação ainda não é visto com bons olhos, se comparado com a educação formal, aquela

institucionalizada e padronizada, aplicada pelas instituições de ensino, devido ao fato desta não

contar com uma metodologia sistematizada. Lamentavelmente, a educação formal não tem a

mesma representatividade para todos, privilegiando aqueles que são provenientes de uma

situação socioeconômica mais elevada. Na educação formal tradicional, o professor ainda

ocupa o papel de “ser supremo” em sala de aula, detentor de toda a sabedoria, muitas vezes

ignorando os múltiplos saberes dos seus educandos.

Conforme Freire (1979, p. 19):

63

O Professor ainda é um ser que ensina a ignorantes. Isso forma uma

consciência bancária. O educando recebe passivamente os conhecimentos,

tornando-se um depósito do educador. Educa-se para arquivar o que deposita,

para depois despejar nas provas. Mas o curioso é que o arquivado é o próprio

homem, que perde assim, seu poder de criar, se faz menos homem, é uma

peça. O destino do homem deve ser criar e transformar o mundo, sendo o

sujeito da sua ação.

Logo, ações de intervenção sóciocomunitária não se opõem à educação formal,

tampouco prometem solucionar a todos os problemas inerentes a quaisquer comunidades. A

intervenção sóciocomunitária propõe ações através da educação não-formal, que além de

educar, provoquem o senso crítico do indivíduo, para que desta forma seja promovida a

transformação social do seu meio. Mais do que ensinar-lhes o “atirei o pau no gato”, fazer com

que reflitam a respeito das consequências deste “pau” atirado contra a cabeça do pobre do gato.

Confirmando as ações da educação não formal ou não escolar Chinelli (1993, p. 70,

apud Caro, 2004) diz que: “trata-se de um projeto pedagógico que pretende ser mais amplo...o

projeto tem um objetivo ainda mais ambicioso: o de contribuir para a formação de uma nova

consciência na comunidade...”

Enfim, através da educação sóciocomunitária, podemos muito mais do que aplicar os

conceitos institucionalizados, promovemos através desta, a troca de saberes entre todos os

envolvidos, reconhecendo no outro seus valores, sua carga cultural adquirida, sua capacidade

de discernimento, o seu querer individual. Com isso, conferimos valores uns aos outros,

fazendo com que passem a atuar de forma consciente em seu meio, confirmando assim que a

educação não acontece apenas dentro do ambiente escolar. Segundo Brandão (2004), a

educação abrange todos os processos de formação do indivíduo, desta forma, a troca de saberes

pode ocorrer nos mais diversos ambientes, sendo eles institucionalizados ou não.

A educadora Gohn (2006) esclarece algumas diferenças entre a educação formal e a

não-formal. Na primeira, quem transmite o saber é o professor e o espaço de aprendizagem é a

escola, a segunda apresenta um outro tipo de educador, “o outro”, com quem se interage nos

mais diversos locais. Von Simson (2001) descreve a educação informal como aquela que

voltada para a formação geral dos indivíduos, com currículos mais abertos, flexíveis e voltados

às necessidades das classes mais populares.

Mesmo estando bem embasado, o currículo não—formal vem se alicerçando na prática,

e, por ser multidisciplinar, mescla conhecimentos de diversas áreas.

Gohn aponta as cinco dimensões da educação não formal “A educação não formal

designa um processo com cinco campos ou dimensões, que correspondem a suas áreas de

64

abrangência. O primeiro envolve a aprendizagem política dos direitos dos indivíduos, enquanto

cidadãos. O segundo, a capacitação dos indivíduos para o trabalho, por meio da aprendizagem

de habilidades e desenvolvimento das potencialidades. O terceiro, práticas de aprendizagem

com objetivos comunitários, voltadas para a solução de problemas coletivos. O quarto é a

escolarização formal escolar, em formas e espaços diferenciados, com uma forma de ensinar

organizada pelo próprio grupo ou comunidade. E o quinto, é a educação desenvolvida na e pela

mídia, em especial a eletrônica (GOHN, 1999, p. 98).

Paulo Freire foi um dos principais idealizadores do modelo de Educação Popular em

que o professor perde o protagonismo e o aluno participa ativamente da troca de saberes.

Os Parâmetros Curriculares Nacionais foram fortemente influenciados pelas ideias de

Freire, entretanto, um estudo mais aprofundado de suas obras nos leva a concluir que ele

trabalhou muito mais na perspectiva da educação popular e não de uma educação formal

escolarizada. As obras de deste educador foram em grande parte responsáveis por disseminar

esta nova forma do fazer educativo e suas publicações embasam as propostas da educação não-

formal

Segundo ele, “A educação autêntica, repitamos, não se faz de A para B, ou de A sobre

B, mas de A com B, mediatizados pelo mundo. Mundo que impressiona e desafia a uns e a

outros, originando visões ou pontos de vista sobre ele. Visão impregnada de anseios, de dúvidas,

de esperanças ou desesperanças que implicitam temas significativos, à base dos quais se

constituirá o conteúdo programático da educação” (FREIRE, 1981, p. 98).

A educação fora dos espaços escolares apresenta inúmeros desafios, Freire reconhecia

a deficiência do estado em oferecer uma educação de qualidade e que atendesse às necessidades

de todos, portanto, seu objetivo era a oportunização de uma forma de ensino mais democrática

e adequada às necessidades sociais da nossa realidade. Este modelo de educação tem um grande

compromisso com a classe social mais humilde. A escola torna-se propriamente um órgão

público, com a participação e o apoio de toda a comunidade, assim o conhecimento surge a

partir de uma construção coletiva.

A educação popular ao cruzar a fronteira da escolarização, busca o resgate da cidadania

e a necessidade de inclusão em todos os sentidos.

De fato, a cidadania é formada a partir de diversas instancias, seria muito oportunismo

reduzir a construção do ser humano ao conteúdo formal escolar. Freire compreendeu a

importância da escola mas foi além e observou a interdisciplinaridade das políticas educativas

como formadora da justiça social na educação (FREIRE, 1995).

65

A educação popular, da forma como foi proposta por Freire, dialoga com a educação

não-formal ao buscar caminhos para formar o individuo a partir de sua realidade, onde estão

construídas as convenções sociais dos opressores e dos oprimidos, e este aprendizado acontece

como fruto de um processo contínuo e independente de um ambiente formal.

Percebo a linguagem musical como um importante elemento para o conhecimento e

conscientização social. De maneira não formal, diversos indivíduos buscam conhecimento

instrumental ou vocal de maneira não-formal e até mesmo auto-didata.

A música une protagonistas amadores, desperta o desejo de conhecer outras culturas e

de compreender seu próprio meio, preserva aspectos do conhecimento deixados de lado em um

ambiente de educação formal, produz motivações para a vida do individuo através de um novo

meio de se obter educação e possibilita ressignificação de valores.

Veremos a seguir, de que forma um trabalho musical pode exercer o papel de educação

sóciocomunitária, e de que forma podemos assim amenizar a falta de acesso ao fazer

sóciocultural, fazendo com que o participante passe a atuar de forma consciente, não somente

na atividade musical, mas no cenário sóciocultural a qual pertence.

4.1 Aspectos relacionados sobre a intervenção sóciocomunitária através da música

Desde a primeira infância somos submetidos a um processo educacional que encontra-se

inserido no seio familiar, as concepções que nos são passadas por nossos genitores e/ou

reponsáveis legais, invariavelmente acreditam ser as mais adequadas para a nossa inserção na

sociedade. Dentre as primeiras experiências sociais que vivemos, é bem provável que o culto

religioso, dentro das suas inúmeras formas, inicia a nossa construção de conceitos, ainda que

estes, quase sempre apresentem-se favoráveis ao ponto de vista ou aos dogmas estabelecidos

por seus respectivos grupos.

Ignorando esta forma de aprendizagem, comumente atribui-se à educação formal a tarefa

de educar o sujeito como um todo, já que especificamente no ensino público, (que deve ser

laico), espera-se ainda que cumpram o papel de interação e partilha das mais variadas

experiências do cotidiano.

Entretanto, mesmo na educação pública, podemos perceber uma enorme diversidade

sócioeconômica, religiosa e étnica que tornam-se impossíveis de serem discutidas, devido à

sistematização proposta pelo ensino formal. No entanto, através de um projeto de educação

sóciocomunitária é possível amenizar esta problemática.

66

Partindo da premissa que a intervenção sóciocomunitária causa uma ruptura nos

preconceitos do educando, torna-se o principal motivo pelo qual confirmamos que os projetos

que se utilizam da musicalização coletiva como eixo-norteador, apresentam notáveis resultados

nos grupos assistidos, devido ao fato de que a música em si, preencher a alguns aspectos

necessários para a promoção da integração social, tais como:

A música é uma linguagem universal que promove uma aceitação unânime da

sociedade;

Através da música é possível unificar valores culturais e comportamentais inerentes a

uma sociedade;

A prática musical coletiva não exige que o indivíduo renuncie da sua cultura, crença

religiosa, ou simplesmente do seu gosto musical, mas sim que através da troca de

experiência entre os participantes, permita a expansão e ampliação e compreensão sobre

as adversidades inerentes ao grupo.

O aprendizado musical exige o desenvolvimento de três qualidades imprescindíveis

para a vida: a paciência, a disciplina e a concentração. Recomenda-se que a prática musical

esteja presente desde a primeira infância para que esta possa auxiliar no desenvolvimento

psicomotor e cognitivo do indivíduo. Ao ler uma partitura, a pessoa treina interpretar signos e

símbolos, contribuindo para o desenvolvimento de inúmeras funções cerebrais que contribuem

para a a formação do pensamento lógico.

Incentivar a educação musical concorre para a formação de uma geração capaz de

compreender e trabalhar com esta arte, fortalecendo a cidadania e reconhecendo a arte musical

como agente de transformação social, conscientizando e tornando o indivíduo um ser crítico.

A música é dotada de uma dimensão política, como instrumento potencial de

transformação do homem e da sociedade, na medida em que, como as demais

formas de arte, ela contribui para a elaboração de um saber crítico,

conscientizador, propulsor da ação social, assim como para um

aperfeiçoamento ético individual (FREIRE, 1992, p. 14).

Tanto o universitário quanto o analfabeto, a criança ou o idoso, o pobre ou o rico, o

branco ou o índio apreciam e se beneficiam da música. Parafraseando Vandré (1964) “Somos

todos iguais braços dados ou não”, todos temos sons em nossas lembranças que nos remetem à

emoção: uma velha cantiga de ninar ou de roda, o som da chuva batendo na janela, a canção

que lembra o primeiro beijo, a trilha sonora daquele filme que fez chorar, aquela música que se

ouvia a mãe cantando... São memórias afetivas que são ativadas sempre que ouvimos algo

parecido. Sem querer as lembranças brotam e, com elas, revivemos as emoções.

67

Assim como Freire nos direciona para a humildade na troca de saberes, Brandão (2003

p.04) aponta para a tolerância quando afirma que: “[...] eu me ponho frente a um outro para me

fazer como ele, não para transformá-lo através de um projeto catequético ou pedagógico num

outro eu”. Ao praticarmos a docência com humildade e tolerância percebemos os diferentes

aspectos motivacionais inerentes ao processo de ensino-aprendizagem professor/aluno.

Notamos ainda que muitos alunos apresentam espontaneamente um enorme entusiasmo

e até mesmo facilidade durante o processo de aprendizagem, em contraponto, outros tantos

necessitam de uma atenção maior. Neste sentido, a capacidade do professor em manter acesa a

“chama” ou a “fome” do aprender do aluno torna-se imprescindível no processo de ensino.

Muitos fatores podem contribuir ou não para a motivação do aluno, o interesse pelo

conteúdo, a compreensão da sua aplicabilidade, entretanto, em minha opinião, o fator mais

importante para que se obtenha êxito talvez seja a atenção dispendida pelo professor, o interesse

em ouvir o aluno, conhecer os seus saberes e o contexto social em que se insere.

Vasconcelos (2010, p. 17) afirma que: “Quando os sujeitos não são ouvidos, quando não

lhes é dada a oportunidade de expressar os seus desejos e anseios, quando lhe são negados

direitos fundamentais, estão, igualmente, aleijados e impedidos de se reconhecerem como

sujeitos.”

Logo, percebemos o efeito que a aprovação e aceitação alheia que o professor que

estimula a aprendizagem provoca no aluno, mais do que acumuladores de informação, é preciso

despertar no aluno o seu senso crítico, que proporcionará a sua independência no processo de

aprendizagem. Ao aderirmos a estas ações, estamos não somente educando, mas, promovendo

pluralmente a integração social, buscando um objetivo comum junto ao grupo “ Caminhando e

cantando, seguindo a canção” (VANDRÉ, 1964).

Confirmando a diversidade da integração social, Almeida (apud MUNIZ, 2014, p. 830)

afirma que: [...] “a integração é antes definível como pluralidade vasta, aberta e mutável de

estilos de vida, todos partilhando a cidadania”. A integração social efetivamente acontece

quando se deixa de lado as diferenças para com o próximo, não praticando valores morais e sim

gozando das mesmas oportunidades dispostas em nossa sociedade. Por fim, entendemos que a

intervenção sóciocomunitária, e neste caso através da música, desempenha um papel de “colcha

de retalhos”, onde através da reflexão das inúmeras vivências e experiências do cotidiano,

resultem em um aumento do nosso conhecimento e sobre tudo o crescimento coletivo.

No decorrer do presente trabalho, podemos entender a educação sóciocomunitária

através da música, como sendo um conjunto de meios e ações que objetiva diminuir a exclusão

68

sóciocultural, oportunizando ao sujeito excluído a participação efetiva no processo de conquista

dos direitos e oportunidades sociais, dentre eles a cultura musical.

4.2 A música como instrumento de intervenção sóciocomunitária

Sendo a música uma poderosa ferramenta não só de prática artística mas de forte aliada

no processo de inclusão e interação social, deve- se ter extrema cautela no que se refere à sua

prática. Costumo dizer que a música é como uma enxada que cultiva a lavoura, mas se usada

de maneira mal intencionada pode se tornar uma arma e destruir vidas.

Mesmo na prática coletiva, o respeito à individualidade promove a troca de saberes e

experiências, que ajudam a melhorar o convívio em sociedade. Para tanto, o maior desafio é

transpor os obstáculos do dia a dia, a fim de melhorar e ampliar as relações interpessoais e

extraclasses abrindo assim novos espaços para que todos possam interagir e integrar-se, não só

no ambiente musical, mas na sociedade como um todo. Rumo a essa direção, devemos cada vez

mais, explorar e conhecer o mundo social e sonoro que nos rodeia, através desta que é

sabidamente uma linguagem universal, a música praticada de forma natural e ininterrupta.

Brandão (1985), aponta para o processo educativo como sendo todo o tipo de saber

adquirido no cotidiano do indivíduo. Logo, a educação ocorre em casa, no trabalho, no lazer,

na igreja, reuniões de família, enfim, um processo diário do qual todos nós fazemos parte.

Ninguém escapa da educação: Em casa, na rua, na igreja ou na escola, de um

modo ou de muitos, todos nos envolvemos pedaços da vida com ela: para

aprender, para ensinar, para aprender-e-ensinar. Para saber, para fazer, para

ser ou para conviver, todos os dias misturamos a vida com a educação. Com

uma ou com várias: educação? Educações? (BRANDÃO, 1985, p. 7).

Devemos partir do princípio de que, com orientação e instrumentos adequados, podemos

contribuir para o crescimento harmonioso, coerente e saudável daqueles menos favorecidos

pela sociedade. O eixo norteador para este processo pode ser o ensino da música através do

fazer coletivo. Por isso além de desenvolver o sentido de coletividade, a prática em grupo traz

ao indivíduo que participa dele o exercício da cidadania plena (direitos e deveres). Direito a

aprender música e com isso ter uma identidade cultural e percebendo seu importante papel na

sociedade, pois através de sua arte tem o “poder” de ser aceito e respeitado pela sociedade.

Como dever vem a disciplina e o compromisso, pois para o estudo musical ele precisa

ter dedicação diária aos estudos e respeitar as instruções do maestro e do professor de música.

69

Utilizando os poucos recursos com que contam as corporações musicais, buscamos

possibilitar a todos o direito de praticarem arte, explorando, através da linguagem musical, a

sensibilidade e a criatividade, desenvolvendo sua percepção, a atenção, a autodisciplina, a

autocrítica, a comunicação. Com isso o levamos a conhecer e perceber melhor o mundo sonoro

que o rodeia. Explorar e descobrir os sons, antigos ou recentes, torna o seu uso e o seu

significado ainda mais real e compreensível.

Pereira (2003, p. 68 e 69), afirma que: “a banda de música é um dos locais que os jovens

podem desenvolver e concretizar uma convivência sociocultural mais afetiva, com vínculos de

amizade mais fortes além das atividades musicais que geralmente são gratuitas”.

Apresentarei uma sugestão, baseada em minha experiência pessoal e profissional, de

uma metodologia a se seguir no que se refere a um projeto de ensino coletivo de instrumento

cujo resultado final será a inclusão sóciocomunitária do grupo assistido além da formação de

uma banda comunitária. Esta proposta pode ser aplicada em escolas.

Ao contrário de outras disciplinas, o ensino sistematizado da música em sala de aula

nem sempre alcança o êxito esperado, o aluno atem-se muito mais à prática do que à teoria, no

entanto tal advento não invalida a sua eficácia dos conceitos cognitivos atrelados à prática

musical, aumentando a concentração de disciplina do aluno o que consequentemente auxilía e

muito no processo de ensino-aprendizagem dos demais conteúdos aplicados em sala de aula.

Através da prática coletiva musical, pode-se contribuir em várias áreas da formação do

indivíduo, contribuindo para a sua maturidade social. Villa-Lobos pregava que a música era

para todos: “A todo o povo assiste o direito de ter, sentir e apreciar a sua arte, oriunda da

expressão popular...” (apud GOLDEMBERG, 2002, p. 498). A prática em grupo, assim como

podemos verificar nos esportes coletivos, faz com que o indivíduo passe a ter a noção de atuar

em equipe, a troca de “inteligências” do grupo promove a interação e integração, resultando em

uma maior valorização interpessoal, e ainda colaborando para a construção da comunidade a

qual se encontra.

Na prática musical é muito importante que ninguém se sinta excluído, o essencial é que

todos sejam ouvidos e respeitados, os mais introvertidos devem ser os mais estimulados. Ao

utilizar-se a estratégia do ensino coletivo de música para a socialização, promove-se uma maior

satisfação no participante, que passa a sentir-se importante no papel de buscar o objetivo

comum definido pelo grupo. Do ponto de vista psicológico, são inúmeros os benefícios

resultantes deste processo, o fazer em grupo contribuí para a construção do ser e a melhoria

dos relacionamentos interpessoais. A formação do grupo deve cuidar para que sejam elencadas

as competências individuais, para que se alcancem as metas traçadas, respeitando a

70

individualidade e reconhecendo a interdependência entre eles, assim sendo o objetivo musical

coletivo será plenamente alcançado.

4.3 Ensino coletivo de instrumentos musicais

Podemos dividir a metodologia do ensino prático de um instrumento musical da seguinte

forma: o chamado ensino individual que é muito praticado por conservatórios. No ensino

individual ou tutorial encontram-se inúmeros pontos positivos, dentre eles o tutor tem uma

maior percepção no que diz respeito às dificuldades do aluno, podendo ainda trabalhar as

soluções com maior tempo.

O ensino individual se baseia na relação mestre-aprendiz (CERQUEIRA, 2010), onde o

professor atua diretamente como referência sonora para o aluno. Entretanto, tal comodidade

acarreta ao aluno um alto investimento financeiro, haja vista que cursos como esses quase

sempre acontecem em grandes cidades, o que inviabiliza o acesso à grande parte da população

interessada ao saber e ao fazer musical, quando se tem acesso ao ensino individual promovido

pela iniciativa pública a dificuldade está na exigência de uma pré-experiência musical que é

aferida através de testes rigorosos, restringindo as vagas tão somente àqueles que buscam a

música como um meio de profissionalização.

O principal modelo base de ensino musical do Brasil ainda é o individual, assim sendo

a grande maioria das escolas providas de uma boa estrutura pedagógica praticam o modelo

conservatório, onde exige-se um grande e oneroso quadro de professores o que culmina em

altíssimos investimentos financeiros. Outro ponto a considerar é o de que essas instituições

adotam os chamados testes de aptidão onde quantifica-se e qualifica-se o conhecimento e a

capacidade musical pré-existente no candidato para que este seja aceito no corpo discente.

Como já foi mencionado, tal realidade reserva-se apenas a um seleto grupo que

invariavelmente, já possuem uma importante experiência musical, e ali estão com o intuito de

profissionalização.

Contrapondo esta realidade, encontramos as Corporações Musicais, as bandas de coreto,

que há muito tempo suprem a lacuna da educação musical em seus municípios, formando

grande parte dos músicos em nosso país. Sobre isso o músico e historiador CAZES (2010, p.

31) diz: “Mesmo um pouco desbancada de sua importância social, as bandas de música

continuaram, ao longo de todo o século XX, fornecendo músicos para o choro”. Para se ter uma

ideia, Joaquim Callado e Paulo Moura, ambos filhos de mestre de banda, tiveram o mesmo tipo

de iniciação musical com quase um século de diferença. Outros grandes músicos e compositores

71

como Capiba, Severino Araújo, Netinho, Claudionor Cruz, Moacyr Santos e Silvério Santos,

também aprenderam em casa e começaram cedo tocando na banda dos pais.

Ainda a este respeito, Nascimento (2006, p. 95) afirma que:

Verifica-se ainda, a existência de músicos entre as grandes orquestras e bandas

militares, nas instituições de ensino musical e em grupos populares famosos,

que tiveram sua iniciação musical nas bandas de música. Nota-se, também,

com certa obviedade, que a maioria atua como instrumentistas de sopro:

clarinetistas, saxofonistas, trombonistas, trompetistas, flautistas, tubistas,

além de percussionistas - devido à configuração da banda de música ser

formada, majoritariamente, por instrumentos de sopro e percussão. Há a

possibilidade, também, de existirem músicos que tiveram sua origem musical

na banda e, hoje, exercem funções musicais como regentes, arranjadores,

diretores musicais, produtores ou cantores.

A partir desta realidade podemos encontrar hoje inúmeras fanfarras, bandas, bandas-

escola e projetos de educação musical que preferem o modelo coletivo de ensino. É muito

simples entendermos o porquê de tal escolha, pesquisando a realidade logística destas

instituições: nas aulas em grupo, reduzimos drasticamente o número de professores o que atinge

diretamente e de forma positiva o balancete financeiro destas instituições.

A escolha do ensino coletivo como ferramenta principal, deve-se também ao fato da sua

enorme importância educacional. O educador Joel L. Barbosa, em um artigo publicado em

junho de 1996 na revista da Associação Brasileira de Educação Musical (ABEM ) afirma que:

O ensino coletivo gera certo entusiasmo no aluno por fazê-lo sentir-se parte

de um grupo, facilita o aprendizado dos alunos “menos talentosos”, causa uma

competição saudável entre os alunos em busca de sua posição musical no

grupo, desenvolve as habilidades de se tocar em conjunto desde o início do

aprendizado, e proporciona um contato exemplar com as diferentes texturas e

formas musicais (BARBOSA, 1996, p. 41).

A partir disso, os educadores musicais deixam o papel central, desenvolvendo

integralmente o processo de ensino/aprendizagem. Passam a ser agentes facilitadores da

aprendizagem, caminhando assim de mãos dadas junto ao grupo em busca do conhecimento.

Através do ensino coletivo, podemos ainda, atender a um maior número de alunos, sendo

que estes são desobrigados de submeterem-se a quaisquer tipo de testes de conhecimento

específico. Na maioria das vezes, eles são iniciados ali mesmo no aprendizado teórico e

instrumental. Muito além do ensino de música, o ensino coletivo proporciona a chamada

intervenção social, a troca de experiência entre os participantes, promovendo também a auto-

estima do participante.

72

Sobre tal advento, Tourinho (2007, p. 2) ressalta que: “todos aprendem com todos”,

citado anteriormente nesse trabalho. De acordo com a autora os alunos atuariam como um

“espelho”, uns para os outros.

Vários educadores musicais confirmam o sucesso do ensino coletivo de instrumentos

musicais na aprendizagem do grupo. A este exemplo Swanwick afirmava que:

O trabalho em grupo é uma excelente forma de enriquecer e ampliar o ensino

de um instrumento. Não estou defendendo a exclusividade de ensino em

grupo, e muito menos denegrindo as aulas individuais. Simplesmente quero

chamar a atenção para alguns benefícios em potencial do ensino em grupo

enquanto uma estratégia valiosa de ensino de instrumento...Somos fortemente

motivados ao observar os outros, e tendemos a ‘competir’ com nossos colegas

o que tem um efeito mais direto do que quando instruímos apenas aquelas

pessoas as quais chamamos ‘professores’ (1994, p. 9).

Outrossim, a missão do educador musical no contexto da educação coletiva deve ser a

de estimular o grupo como um todo e, de forma subjetiva o discente a criar no decorrer dos

fazeres musicais.

Nos últimos anos, a prática do ensino coletivo de instrumentos musicais tem tido um

importante aumento em todo país, desta forma tem despertado cada vez mais o interesse da

academia para que sejam realizadas pesquisas neste sentido. Pode-se ainda considerar que o

ensino coletivo tem ganhado força entre as propostas metodológicas de ensino de instrumentos

musicais, tendo ainda grandes desafios, visto que essa modalidade de ensino ainda é mais

utilizada em projetos de educação musical que não visam à formação profissional.

O ensino coletivo, apesar do crescente número de professores que o escolhem como

modelo pedagógico, muitas vezes é utilizado sem objetivos, fazendo com que o mesmo fique

desacreditado. Para Cerqueira (2010),“o ensino coletivo deve ser adotado de acordo com os

objetivos da formação pretendida”. Partindo dessa premissa, o ensino coletivo deve ser pautado

por alguns princípios, fazendo com que as aulas sejam mais produtivas e os objetivos traçados

sejam alcançados.

A exemplo do que acontece nas escolas da rede pública dos Estados Unidos da América,

muitos projetos de música no Brasil tem adotado o trabalho de ensino coletivo de instrumentos

devido ao seu impacto positivo no grupo, o educador musical Joel Barbosa afirma que:

A experiência nos EUA tem demonstrado a eficiência da metodologia de

ensino coletivo. ‘Música para toda criança’ tem sido o objetivo filosófico

tradicional da educação musical das escolas americanas de primeiro e de

segundo graus. Este objetivo não teria alcançado o êxito atual se não fosse o

ensino coletivo de instrumentos heterogêneos. O impacto positivo desta

pedagogia pode ser notado nas três primeiras décadas de sua aplicação, 1910-

73

1940, através do crescente número de bandas escolares que tomaram parte nos

concursos nacionais (1996, p. 39).

Tourinho (2007, p. 2-4) apresenta seis princípios que devem ser aplicados ao ensino

coletivo. Estes princípios, não só fundamentam, mas também justificam a sua utilização:

a) “Acreditar que todos podem aprender a tocar um instrumento”.

O ensino coletivo é uma forma de alcançar um maior número de alunos, oferecendo a

oportunidade de aprender um instrumento musical. Partindo da premissa de que “todos podem

aprender um instrumento”, pode-se justificar a ausência de teste de seleção eliminatória por

parte de quem opta pela utilização do ensino coletivo como modelo pedagógico. Os testes não

só contrariam o princípio citado pela autora, já que eles limitam-se àqueles que já tocam os

instrumentos, como também limitam o alcance do curso oferecido.

b) “Acreditar que todos aprendem com todos”.

Pode-se dizer que esse princípio, exclusivo do ensino coletivo, é um dos mais

importantes, portanto, deve reger a atividade pedagógica do professor. Os alunos têm a

oportunidade de aprender e compartilhar conhecimentos com os colegas em sala. Esse princípio

valoriza a troca de experiência musical entre os alunos, mesmo aqueles que possuem menos

experiência podem trazer algo que contribua para o desenvolvimento dos outros alunos. Sobre

esse princípio a autora ainda acrescenta que “os colegas atuam como espelhos, refletindo (ou

não) as dificuldades individuais do grupo”.

c) A aula é “planejada e direcionada para o grupo, exigindo do estudante disciplina,

assiduidade e concentração”.

Um dos grandes problemas do ensino coletivo está no fato de que, muitos alunos não

possuem seus próprios instrumentos, e muitos lugares que oferecem aulas de instrumentos não

permitem que os alunos levem os instrumentos para a casa. Desta forma, a aula planejada

minimamente ameniza esta ocorrência. É preciso explorar cada minuto em sala de aula,

preocupando-se para que cada aluno tenha o mesmo tempo de estudo no instrumento

O tempo em sala de aula é precioso, já que muitos alunos não praticam em outros

horários. Tourinho (2007) menciona que “planejamento prévio, disciplina e concentração

também são pré-requisitos para o professor. A aula precisa ser planejada, deve haver um roteiro

de apoio”. As dificuldades encontradas pelos alunos devem ser sanadas em sala de aula. Por

74

isso, o professor precisa encontrar o ritmo de aula e as estratégias didáticas, fazendo com que

todas as dificuldades, de todos os alunos, sejam esclarecidas.

A autora ainda acrescenta que “a aula coletiva exige também grande concentração do

professor, que precisa estar atento a muitos estudantes simultaneamente”.

d) “O planejamento é feito para o grupo, levando-se em conta as habilidades

individuais de cada um”.

O professor deve planejar a aula valorizando o que cada aluno tem a oferecer.Ao

entendermos a importância de cada um no fazer coletivo, aumentamos a nossa auto-estima e

capacidade de interação social. Dessa forma, as atividades musicais e os exercícios propostos

devem ser direcionados para o grupo, o que abre portas para a criação de exercícios. Sendo

assim, o professor pode não só valorizar as habilidades dos alunos, mas também detectar suas

limitações, tornando as aulas mais produtivas.

e) “Autonomia e decisão”.

O aluno quando desenvolve autonomia e decisão nos trabalhos coletivos, contribui não

só para o resultado artístico, mas para o seu aumento de confiança no que diz respeito às

tomadas de decisão do cotidiano. Esse princípio aborda a individualidade musical de cada aluno

e está fortemente ligado ao quarto princípio. Deste modo, os alunos não só aprendem em

conjunto, mas desenvolvem habilidade, autonomia musical e desenvolvimento interpessoal.

Em relação à música, esse princípio é importante por mostrar que, mesmo em aulas

coletivas, pode-se preparar o aluno para tomar suas decisões interpretativas, não dependendo

do restante do grupo.

f) “O ensino coletivo elimina horários vagos”.

No ensino coletivo o professor ganha tempo porque, se um aluno falta, outros estarão

presentes. Porém, essa que parece ser uma vantagem, pode provocar grandes prejuízos na

aprendizagem. A autora lembra que a “dificuldade passa a ser administrar o progresso dos

faltosos”. Nesse caso, a velocidade do aprendizado é prejudicada, o que nos remete ao quarto

princípio, o planejamento deve ser feito para o grupo, visando minimizar também essas perdas.

Esses seis princípios são fundamentais para que se tenha objetividade nas aulas coletivas

de instrumentos. Nota-se que eles abrangem questões simples de organização e planejamento,

mas sem deixar de lado as questões musicais. É fundamental que o professor, ao ministrar sua

aula, tenha-se apropriado desses princípios.

75

De acordo com Cerqueira (2010, p. 3), a categorização do ensino coletivo de

instrumentos se divide em dois tipos: “aulas com executantes do mesmo instrumento ou aulas

que envolvam a participação de diversos tipos de instrumentos”. Entende-se com “mesmo

instrumento”, aulas que tenham dentro de uma mesma sala, alunos com instrumentos sem

nenhuma distinção, como uma sala de violinos ou uma sala de flautas. Quando se tem uma

classe com instrumentos do mesmo naipe, mas que possuam características distintas como:

tessitura, timbre, afinação, clave e mecanismo de funcionamento, que é o que acontece com os

instrumentos de metal, tem-se uma classe com a “participação de diversos tipos de

instrumentos”.

Essa generalização era, e ainda é, muito comum, principalmente no interior do Brasil

onde os mestres de banda são responsáveis pelas aulas de todos os instrumentos que formam o

grupo. Segundo Souza e Silva (2011, p. 16): “Embora seja louvável tal atitude, sabe-se que este

tipo de generalização fez com que muitos músicos e bandas fossem prejudicados no que diz

respeito aos diversos aspectos técnicos relacionados ao instrumento”.

Existe um limite de tempo de estudo para o ensino coletivo de instrumentos?

Para Cerqueira (2010, p.5) o objetivo geral do ensino coletivo é o “aprendizado de

instrumentos e canto a nível elementar de “música”, e enfatiza que “É um meio didático

apropriado, envolvendo motivação, interação social, aprendizado com os colegas e baixo

custo”. Com isso, acreditamos que o ensino coletivo é uma forma eficaz de aprendizagem

musical, no entanto, destina-se ao aluno iniciante no instrumento, sendo aconselhável que, a

partir do nível intermediário ou do estudo de repertório específico para o instrumento, o aluno

passe a frequentar aulas individuais com professor especialista no instrumento. As aulas

coletivas, para esse aluno, passam a fazer parte de outras atividades complementares para a sua

formação, como máster-classes, oficinas de performance e prática de grupo.

O ensino coletivo e o individual não se opõem um ao outro, pelo contrário, ambos se

completam e são de extrema importância para a formação do músico. Logo, seria recomendável

que alunos que estudam instrumentos musicais e queiram uma melhor performance, passem

pelas duas experiências de ensino. O ensino coletivo, tem como função proporcionar aos alunos

iniciantes a interação social e a experiência musical. O ensino individual, considerando a

formação do músico profissional, tem a função de proporcionar conhecimentos técnicos

avançados e o estudo de repertório específico. Neste caso, o aluno terá uma formação ampla,

completa, específica e técnica.

76

4.4 Método Da Capo

Para conhecermos o método de ensino musical “Da Capo”, é preciso que antes saibamos

a respeito do autor. Natural de Piracicaba, SP, Joel Barbosa teve a sua iniciação musical através

da Banda da Guarda Mirim Municipal daquele município. A banda da guarda mirim que ainda

hoje se encontra em plena atividade é uma entidade sem fins lucrativos de apoio social a

menores carentes. Posteriormente em 1985, Joel concluiu o curso técnico em clarineta neste

que é considerado a melhor escola pública de música da América Latina, o Conservatório Dr.

Carlos de Campos em Tatuí e, mais tarde em 1989, graduou-se bacharel também em clarineta

pela UNICAMP/SP. Dentre as suas inúmeras premiações, destacam-se o primeiro lugar do VIII

Concurso Jovens Instrumentistas do Brasil, em Piracicaba SP. Através de prêmios obtidos nos

concursos promovidos pela CAPES e VITAE, tornou-se Mestre e Doutor em Artes Musicais

(DMA), em 1992 e 1994, respectivamente, pela University of Washington, Seattle, EUA.

A tese de Joel Babosa trata de uma metodologia de ensino coletivo de instrumentos de

banda. A tese ainda culminou no primeiro método brasileiro de ensino coletivo para

instrumentos de sopro e percussão .O referido método faz-se hoje uma importante ferramenta

para a educação musical praticada por bandas de todo o território nacional. Ainda sobre o

método, Joel é convidado a discursar nos principais encontros de educação musical do país e

América Latina, além de contar com várias publicações pela Associação Brasileira de Educação

Musical (ABEM), Associação Nacional de Pesquisa e Pós-Graduação em Música (ANPPOM),

International Society for Music Education (ISME) e Programa de Pós-graduação em Música

(PPGMUS).

Como clarinetista, Joel Barbosa tem atuado como solista no Brasil e em vários países

como: Colômbia, Alemanha, Áustria e Estados Unidos, tendo ainda obras que foram dedicadas

a ele de compositores brasileiros, japoneses, alemães e americanos

Atualmente, é Professor Titular da Escola de Música da Universidade Federal da Bahia,

onde ocupa a cadeira titular do curso de clarineta, além de ter coordenado o Programa de Pós-

graduação em Música (PPGMUS). O dr. Joel coordena projetos de extensão universitária

desenvolvido pela escola de música da UFBA. Por meio deste, são oferecidos cursos na área de

instrumentos de banda para jovens de bairros populares de Salvador. Os mesmos habilitam

alunos da UFBA para trabalharem com a metodologia de ensino coletivo de instrumentos de

banda.

O método de ensino coletivo Da Capo foi editado no Brasil pela Keyboard Editora

Musical Ltda., com o apoio da Weril, fábrica de instrumentos musicais, desenvolvido para

77

iniciantes em instrumentos de banda num trabalho pioneiro no Brasil. A proposta do método,

com uma coleção de 12 livros, é atender a uma demanda de práticas de ensino de instrumentos

para aulas em grupo por naipes, em banda ou individuais. Isto se torna um desafio para o autor

devido às diferenças encontradas nas peculiaridades dos diferentes instrumentos que compõem

uma banda, bem como, nas diferenças que envolvem aulas em grupo, como: idades, gostos,

experiências, facilidades. Além disso, há ainda outros desafios que envolvem este tipo de

trabalho, como a questão da disponibilidade de tempo de estudo dos músicos e trabalhar com

afinação, sonoridade, sociabilidade.

Por outro lado, a proposta de estudo em grupo auxilia em uma série de fatores quanto

ao aprendizado, entre elas podemos citar que o aluno fica mais à vontade entre os colegas por

ser um trabalho em conjunto. De acordo com a professora Diana Santiago, “os alunos se

preparam melhor por efeito da presença do grupo; aprendem a ter mais confiança em si próprios;

tem mais tempo que nas aulas individuais para se recobrarem dos erros cometidos, o que é

favorável para a construção de uma auto-imagem positiva” (SANTIAGO, 1995, p. 74). Ele

exercita com esta experiência a socialização e perde a vergonha de tocar com outras pessoas.

Destaca-se neste trabalho também a motivação, o desafio de trabalhar em equipe e da

experiência que se cria com o trabalho musical em grupo. Outro ponto a destacar é a valorização

do estudo dos instrumentos de grupo, isto é, não solísticos.

Neste sentido, a proposta e o trabalho do método Da Capo atende a esta necessidade e

cumpre muito bem o seu objetivo. Ele possibilita a integração dos diferentes instrumentos, das

pessoas de diferentes níveis sociais e culturais, dos regionalismos e estilos musicais dando

ênfase total à música brasileira. A proposta do método apresenta um baixo custo devido às aulas

em grupo e a economia de horas/aulas, aproveitamento de instrumentos, partituras e salas. Este

fato possibilita o uso da música em trabalhos sociais e parcerias com empresas, escolas, governo

e apoio de ONG’s.

Nesse momento, vamos considerar, após uma análise dos diferentes instrumentos e

partes do maestro, alguns problemas específicos na produção do material no que se refere à

escrita, concordância entre os diferentes livros, qualidade de impressão, formatação das páginas

e textos:

a) Ensino da clave – ele é apresentado apenas na página seis do livro, isto é, na quarta

aula quando, na verdade, o aluno já a utiliza desde a primeira aula;

b) Ensino de embocadura – não há uma orientação ao aluno de como proceder para

produzir os sons dos instrumentos considerando a peculiaridade que há em cada

naipe;

78

c) Erros de paginação entre o livro do maestro e o dos instrumentos;

d) Disposição gráfica – não houve uma preocupação com formatação das páginas;

e) Articulações – não houve uma indicação ou orientação quanto as diferentes formas

de articular os diversos instrumentos;

f) Alguns exercícios ou atividades complementares poderiam vir preenchidos na parte

do maestro/professor;

g) Apresentação de poucos exercícios técnicos específicos para cada instrumento ou

naipes;

h) As seções deveriam concluir após as músicas de banda completa; seção I na página

11 e seção II na página 21;

i) As pausas dobradas desnecessárias em divisão de vozes;

j) Problemas no livro do maestro:

- falhas nas linhas da pauta;

- a inexistência do exercício 85, 106 e 107;

- o exercício 110 está distribuído entre os exercícios 106 e 107;

- mudanças desnecessárias de páginas numa mesma música;

- no exercício 100 falta o último compasso.

Estas questões não chegam a comprometer a proposta musical do método, no entanto,

se tratando de um trabalho e uma edição profissional isto não poderia acontecer. Problemas

desta natureza poderiam ser facilmente detectados e corrigidos antes da impressão ou produção

final. Se compararmos com o material equivalente de edições americanas iremos encontrar um

resultado gráfico de apresentação final bem diferente e com melhor acabamento.

Entretanto o método Da Capo possui todas as qualidades para ser incluído entre os

materiais de estudo para sopros e bandas que todos os músicos da área e regentes deveriam

conhecer. O uso desse material e dessa metodologia confirma a crença e a necessidade de que

o aprendizado de um instrumento musical é para todos ou, pelo menos, para uma grande

maioria.

4.5 Projeto Retreta nas escolas de Artur Nogueira

4.5.1 Lócus da pesquisa

Descreveremos aqui alguns aspectos do município de Artur Nogueira/SP e dos pontos

em que atuam o Projeto Retreta.

79

De acordo com o banco de dados da Prefeitura Municipal, Artur Nogueira é um pequeno

município do interior de São Paulo que foi fundado, entre outros, pelo madeirense Daniel

Cesário de Andrade, chegado ao Brasil cerca de 1910. A população estimada no último senso

realizado (2014) conta com 49.346 habitantes. A partir da década de 1970, com o declínio da

agricultura, pode-se verificar um importante êxodo rural que causou e causa uma grande

concentração populacional no município. Além disso, verifica-se a migração de famílias

inteiras vindas de outros estados da federação em busca de uma melhor qualidade de vida, o

que quase sempre não acontece, causando uma sobrecarga na infraestrutura do município.

Por consequência disso, a comunidade é extremamente dividida da seguinte forma: um

pequeno número de famílias que participaram da fundação do município e “definem as regras”,

e a grande maioria de segregados e estigmatizados pela sociedade. Esta grande maioria ocupa

os bairros de periferia que são formados por programas de casas populares que quase sempre

situam-se nas áreas de risco e desassistidas de infraestrutura urbana. Vários outros problemas

de ordem social resultam da falha no planejamento: do sistema de saúde, do meio ambiente,

do mercado de trabalho restrito, da educação básica considerada mediana e destacando-se ainda

a baixa qualificação profissional.

Segundo informações do Censo IBGE 2012, o município de Artur Nogueira contava

com uma população de 49.346 residentes, dos quais cerca de 504 em situação de extrema

pobreza. No total de extremamente pobres, 163 (32,8%) viviam no meio rural e 339 (67,2%)

no meio urbano.

O mesmo Censo (Tabela 1 e Gráfico 1) ainda revela que havia 20 crianças na extrema

pobreza na faixa de 0 a 3 anos e nenhuma na faixa de 4 e 5 anos. Já no grupo de 6 a 14 anos,

por sua vez, totalizou 117 indivíduos na extrema pobreza, enquanto no grupo de 15 a 17 anos

havia 45 jovens nessa situação. Ainda foram registradas 55 pessoas com mais de 65 anos na

pobreza. 36%2 dos extremamente pobres do município têm de zero a 17 anos.

Tabela 1 - População em situação de extrema pobreza por faixa etária:

Fonte: IBGE, diretoria de pesquisas, coordenação de população e indicadores sociais,

pesquisa de informações básica municipal (2014).

80

Gráfico 1 - Distribuição percentual da população extremamente pobre por faixa etária

Fonte: IBGE, diretoria de pesquisas, coordenação de população e indicadores sociais,

pesquisa de informações básica municipal (2014)

Do total de extremamente pobres no município, 258 são mulheres (51,2%) e 246 são

homens (48,8%). Do total da população extremamente pobre do município, 367 (72,8%)

classificam-se como brancos e 137 (27,2%) como negros. Dentre estes últimos, 137 (27,2%) se

declaram pardos, mas nenhum deles se declara preto, indígenas ou amarelos.

Do levantamento de dados acerca dos moradores classificados como pertencentes a

camada de extrema pobreza; 127 contam com limitações visuais; 39 auditivas e 39 de

locomoção motora. Na faixa etária dos 15 anos inclusos como extrema pobreza, 88 pessoas

(25,8%) não sabiam ler ou escrever, sendo 34 chefes de família. O Censo ainda aponta que

havia 20 crianças de 3 anos não frequentando a creche, o que totaliza (100,0%) das crianças

extremamente pobres nesta faixa etária. Havia ainda nanhuma criança na faixa etária de 4 a 5

anos fora da escola e no grupo de 6 a 14 anos não havia nenhuma. Por fim, dentre os jovens de

15 a 17 anos na extrema pobreza, 02 estavam fora da escola (5,1% dos jovens pobres nessa

faixa etária).

Apesar da baixa oferta de emprego, Artur Nogueira não registra nenhum caso de

moradores de rua, o que passa a ser um importante dado para o desenvolvimento social do

município. Importante salientar que os dados mencionados tratam de uma estatística que há

muito tempo vem sendo observada.

A partir dos dados apresentados, temos uma descrição das características gerais do

município de Artur Nogueira, São Paulo, e assim podermos obter uma melhor compreensão da

constituição social e cultural dos participantes do Projeto Retreta no contexto do município.

81

4.5.2 Projeto Retreta como ferramenta de intervenção sóciocultural

No dia 19 de Agosto de 2010, inicia-se o “Projeto Retreta”, projeto de intervenção

sóciocultural que utiliza a música como ferramenta, o objetivo inicial era o de completar e

ampliar o quadro de músicos da Corporação Musical 24 de Junho, utilizando para tanto o

método de ensino coletivo “Da Capo” (vide 3.2.4).

Além de tentar resolver o problema de baixo efetivo vivído pela Corporação, o Projeto

Retreta preconizava também a descentralização do ensino musical voltado para crianças, jovens

e adultos, por todo o município de Artur Nogueira SP.

A história deste projeto tem sido uma estrada dura e sinuosa desde o princípio. Para a

efetivação do mesmo foi preciso promover um enfrentamento direto junto a integrantes da elite

do município, que se contrapunham ao ingresso de pessoas pertencentes a classes menos

favorecidas. Conforme trabalho realizado anteriormente (2009), um dos relatos de uma

integrante da Corporação foi o seguinte:

Maestro, eu não gosto mais de participar da banda! [...]

“[porque]Todas as vezes em que entro aqui eu tenho que me esbarrar

com esta gente do Sacilotto4!

Histórias como esta infelizmente foram e por vezes ainda são comuns, entretanto, a cada

dia que passa os participantes do projeto através de suas trocas de experiência, suas produções

artísticas em conjunto, tem amenizado este problema de forma considerável.

Voltando à cronologia, apenas seis meses após o início das atividades do projeto, que

contava com apenas dois educadores (este autor e mais um), após muito trabalho o primeiro

concerto foi apresentado aos pais da EMEF do bairro Laranjeiras. O concerto foi um sucesso,

muito bem aceito pela comunidade e o resultado foi o ingresso de vários alunos para o quadro

de músicos da Corporação.

Em 2011, o projeto foi devidamente apresentado à sociedade nogueirense, quando

contava com uma pequena estrutura de banda de música, com uma equipe de trinta e cinco

músicos (seis professores e 29 alunos).

Concomitantemente à Corporação, o Projeto Retreta passou a cumprir um papel de

descentralização do ensino de música, atuando em escolas da periferia. Com o enorme

reconhecimento do trabalho desenvolvido, a então denominada “Banda Sinfônica Jovem do

4 Bairro de Artur Nogueira em que vivem pessoas de baixa renda.

82

Projeto Retreta” passou a acumular inúmeros convites para realizar concertos, dentro e fora do

município.

Em 2012, o maestro fez um pedido ao então prefeito municipal, para que este doasse

um veículo do modelo micro-ônibus, com o objetivo de auxiliar em pequenos transportes de

professores e alunos. Pedido aceito, conquista de grande valia para o projeto, entretanto o

veículo citado, não contava com: motor, câmbio, rodas e outros acessórios (Figura 40). Frente

a essa realidade, o maestro juntamente com os alunos, pais, membros da diretoria, sairam em

busca de uma solução, que foi a montagem de uma barraca de lanches e pastéis (Figura 19) que

atuava e ainda atua em festas populares realizadas no município, cujo ganho possibilitou a total

restauração do veículo que hoje serve de apoio logístico ao projeto como pode ser visto na

Figura 41.

Figura 40 - Van recebida da prefeitura antes da reforma

Fonte: Autor (2015)

83

Figura 41 -Van recebida da prefeitura após a reforma

Fonte: Autor (2015)

Atualmente, com quase quatro anos de existência, o Projeto Retreta vem alcançando

resultados muito animadores, dentre eles o atendimento efetivo de mais de oitocentos alunos

por ano. Conta com uma Camerata de cordas, duas fanfarras, três corais, grupo de flautas doce,

grupo de flautas transversal, grupo de clarinetas, grupo de saxofones, grupo de metais, grupo

de percussão, grupo percussão corporal, além da Banda Sinfônica Jovem com setenta e dois

músicos. A excelência do trabalho culminou em um convite feito pelo jornalista e apresentador

Jô Soares para que no início do segundo semestre (dia 16/08/2014), a Banda participasse do

Programa do Jô (Figura 42).

Figura 42 - Banda sinfônica jovem do Projeto Retreta

Fonte: Autor (2015)

84

Quando nos referímos ao estudo da música, facílmente confunde-se com algo destinado

ao lazer, ou então num outro extremo, imaginando ser aquele severo processo tradicionalista,

no qual requer-se o máximo de disciplina e concentração, focando tão somente o valor artístico,

muitas vezes deixando de lado toda a bagagem sóciocultural que nos permeia.

De certa forma, o segundo exemplo realmente faz parte do processo de aprendizagem,

contudo não deve ser de maneira úníca, afinal não podemos jamais restringir a prática musical

a esta concepção formalizada. O meio em que vivemos, a nossa comunidade proporciona-nos

um aprendizado contínuo. Portanto, podemos e devemos, também na prática musical, afirmar

que não existe uma única forma de musicalizar.

O conhecimento musical está presente no cotidiano, que muito embora se apresente de

uma forma tão diversificada, é inerente a todas as comunidades. É justamente através deste

processo social amplo de troca de saberes que se contribui, através da música, para a formação

integral de mais do que apenas músicos: formam-se pessoas, o que pode culminar em um

melhor viver na sociedade a qual se insere. Brandão (1985, p.7), afirma que: “Ninguém escapa

da educação, pois ela pode existir livre e entre todos”.

Desde o ano de 2010 o Projeto Retreta Musical atende parte das escolas da Rede

Municipal de ensino de Artur Nogueira, mais do que musicalizar, o projeto busca promover a

integração dos aspectos afetivos, estéticos e cognitivos, bem como a interação e comunicação

social, conferindo assim um caráter significativo à linguagem musical. Sendo a música uma das

mais importantes formas de expressão humana, por si só já se justificaria sua presença na

educação.

Através da parceria firmada entre a Corporação Musical 24 de Junho e a Prefeitura

Municipal de Artur Nogueira, a introdução em música se inicia com os alunos da educação

infantil atendendo a partir da creche e vai até o quinto ano do ensino fundamental. No ensino

fundamental, as aulas de música estão inseridas na disciplina “Educação Artística”, com

apreciação musical.

A prática instrumental é realizada principalmente na sede da Corporação Musical, mas

conta ainda com diversos pontos distribuídos entre algumas unidades escolares, a

descentralização do ensino possibilita ao aluno um melhor acesso a todos os tipos de

instrumento que compõem as bandas, orquestras e corais do projeto. Através de uma parceria

85

firmada entre o projeto e a Universidade local (UNASP), os participantes podem inclusive

cursarem uma graduação em música.5

O método utilizado é o de ensino coletivo, tal ferramenta visa proporcionar um resultado

muito mais amplo no que diz respeito ao conteúdo artístico além do processo de integração

sóciocomunitária. Pela observação percebe-se claramente que a não distinção de raças, credos

e posição socioeconômica, torna-se um eixo central para o resultado artístico.

Através da afirmação de Brandão, podemos entender que o processo de

ensino/aprendizagem dos métodos coletivos nada mais é do que a prática sóciocomunitária:

As pessoas convivem umas com as outras e o saber flui, pelos atos de quem

sabe-e-faz, para quem não-sabe-e-aprende. Mesmo quando os adultos

encorajam e guiam os momentos e situações de aprender de crianças e

adolescentes, são raros os tempos especialmente reservados para o ato de

ensinar (1985, p. 18).

Com sede na Rua Dez de Abril 760, centro Artur Nogueira, no Projeto Retreta alunos

são introduzidos na música por um corpo docente de profissionais capacitados, nas mais

diversas áreas da educação musical. Segundo os documentos de registro da instituição, o Projeto

Retreta adota uma orientação metodológica que leva o aluno a vivenciar novas experiências.

Através das atividades musicais o aluno percebe um melhor desenvolvimento em suas

atividades psicomotoras e sensoriais. O desenvolvimento do aluno é imediatamente percebido

através da sua participação na grade curricular da sua escola.

Neste caso, o método de ensino coletivo contribui também para direcionar o aluno no

processo de aquisição do conhecimento musical e relacionamento interpessoal, de modo que

ele possa resolver suas dificuldades, almejar, traçar e concretizar seus projetos e adquirir

autonomia na música e na vida.

Santos afirma ainda que:

Essa prática tem se destacado cada vez mais dentro do processo de ensino

instrumental, como um importante recurso metodológico que estimula e

favorece o desenvolvimento técnico e musical a partir da observação,

imitação, interação e convívio com os demais alunos (2007, p. 2).

Partindo do pressuposto de que é melhor estudar, construir ou colher novos

conhecimentos, se for através do prazer, da estimulação e da vivência, devemos abrir o caminho

5 O UNASP, campus Engenheiro Coelho, mantêm convênios com o município de Artur Nogueira fazendo parcerias

e atendendo a comunidade em vários setores; dentre eles, parcerias musicais aonde as escolas e outras entidades

têm sido beneficiadas.

86

a partir de uma discussão sobre o que o aluno conhece, pensa, e espera em relação à música e

suas relações sociais.

4.5.3 Atividades do Projeto Retreta – propostas a partir dos participantes

Através de debate com o grupo, podemos também aprender sobre o conhecimento que

o aluno traz consigo mesmo de forma empírica, a sua capacidade de convivência em grupo, de

trabalho em equipe, seus conhecimentos dos instrumentos e fontes musicais, sua preferência

por cantores e gêneros musicais. Nessa metodologia acreditamos que devemos propor ao aluno

algumas atividades que favoreçam o seu desenvolvimento sensorial como um todo, usando

como por exemplo as aulas de percussão corporal, onde através do tato é possível conhecer de

forma detalhada todo o seu corpo e compreendê-lo assim melhor, inclusive no que diz respeito

aos cuidados higiênicos e alimentares

Algumas sugestões de atividades para executar a proposta acima são utilizadas:

Estimular respostas para perguntas do tipo: existe um momento ou lugar em que

predomina o silêncio absoluto? Onde? Em qual momento? ;

Identificar quais são e qual é a intensidade dos barulhos que se encontram ao

nosso redor ou não;

O que você mais gosta nas aulas de música?

Perceber a importância da ausência de som, ou o silêncio;

Identificar barulhos ou ruídos que fazem parte do nosso cotidiano;

Sugerir aos alunos que fiquem em silêncio por alguns minutos e em seguida

perguntar-lhes: que tipo de sons escutaram sem que possamos interferir para

eliminá-lo?

Controlar a ansiedade ao se expressar, respeitando a dinâmica de grupo,

esperando o momento oportuno para se pronunciar;

Para a consecução destas propostas, também é utilizado um questionário com a

finalidade de conhecer melhor o universo musical do aluno, contendo algumas questões:

O que você entende por música?

A partir dos exemplos musicais propostos em sala de aula, questionar qual deles

o aluno gosta, qual gosta menos e qual já era do seu conhecimento;

Peça para o aluno escrever o nome de alguns cantores ou grupo que conhecem e

apreciam;

Em que lugar costuma ouvir música?;

87

A partir da exposição da família de instrumentos musicais, (que podem perdurar

por algumas aulas), questionar qual já era familiar;

Cite fontes sonoras.

A seguir: sugere-se que os alunos respondam às questões, os resultados obtidos poderão

ser analisados e discutidos no término da aula. O objetivo é buscar, a partir das respostas, maior

integração e troca de informações entre o grupo e entre este e o professor. A partir de então,

surgem ideias de novas atividades. Exemplos:

Com o intuito de trabalhar a percussão corporal e ao mesmo tempo a descoberta das

partes do corpo, os alunos podem de forma lúdica explorar todas as possibilidades do

fazer em conjunto. No início colocamos a música para a apreciação e porque nao dizer

a diversão de todos, em seguida todos deverão aprender a letra da música fazemos um

círculo, onde o professor no centro fará os movimentos que deverão ser imitado por

todos. A letra aumenta gradativamente a medida em que incluímos mais membros do

corpo, poderá ser feita também em ordem aleatória, o que aumenta a velocidade do

raciocínio, e todos deverão tatear o devido membro mencionado de acordo com a letra.

Durante o processo, o professor deve verificar o grau de envolvimento de todos, instigando

o interesse do grupo, criando variáveis do exercício como: fazê-lo em duos, trios e assim por

diante.

Ex: Boneca de lata:

Minha boneca de lata bateu com a cabeça no chão...

Levou quase uma hora pra fazer a arrumação

Desamassa aqui, pra ficar boa...

Minha boneca de lata bateu com o ombro no chão...

Levou mais de duas horas pra fazer a arrumação

Desamassa aqui, Desamassa ali pra ficar boa...

...E assim sucessivamente

Coloque para os alunos para ouvirem alguns sons de instrumentos separadamente, em

seguida coloque os instrumentos tocando de forma coletiva e peça para eles

identificarem os instrumentos.

Conhecendo os grandes músicos ( de preferência brasileiros) cito como exemplo Luiz

Gonzaga, o professor conta uma breve história a respeito do músico, dados geográficos

e sociais do seu estado de origem e em seguida oferece uma de suas obras ao grupo que

88

inicialmente deverá interpretar o texto e discutir em grupo o conteúdo, no segundo

momento o grupo canta a obra, esta atividade deve ser transposta para inúmeros

compositores, ela propicia além de tudo uma melhor compreensão da diversidade

cultural brasileira.

Leitura de cordéis (sempre explicando sua origem), trava línguas, desenhos musicais,

certamente integram de maneira lúdica e faz com que o grupo caminhe além do ensino

musical, caminhem literalmente de mãos dadas para a construção de uma comunidade

melhor.

Além das atividades sugeridas, o professor deve (dentro do planejamento pedagógico)

ter a liberdade de “improvisar” novas atividades com o grupo, procurando interagir com o

conteúdo curricular em vigência, para que assim a música colabore efetivamente no processo

de ensino-aprendizagem. Dessa forma, buscamos alcançar um objetivo maior que é despertar o

aluno para o mundo sonoro e social, auxiliando-o constantemente no processo de integração

social.

Sempre mostrando a todos eles a possibilidade de uma integração satisfatória, bem como

a importância da vivência musical coletiva no contexto da banda.

Uma das hipóteses no desenvolvimento do projeto é que, mesmo com carga horária

reduzida, podemos obter um avanço significativo: a participação em um projeto musical

procicia ao aluno uma compreensão que vai muito além do fazer artístico, ele passa a entender

com mais tolerância e serenidade a realidade que o cerca.

A intervenção sociocomunitária na proposta do Projeto Retreta, aliada à experiência

inédita de tocar um instrumento, suscita um maior interesse no aluno, aumentando assim sua

motivação e participação mais efetiva nas atividades propostas.

As diferenças e deficiências são sempre respeitadas no decorrer deste trabalho. As

oportunidades de manipular e explorar os elementos da música são aprimoradas, seja através

da teoria musical ou através da prática do instrumento.

As aulas devem ainda, ter dinâmica própria a partir da participação ativa dos alunos e

da integração e motivação conquistadas. Torna-se possível o planejamento e a organização das

aulas subsequentes que, pautadas em conteúdos significativos, coerentes com a realidade do

aluno e com tendência à interdisciplinaridade, criam uma expectativa e uma participação mais

ousada, propiciando a autoconfiança dele além da crença na sua capacidade de construir,

avançar e fazer parte de um grupo.

Acreditamos que a educação musical, em suas diferentes estruturas, pode propiciar aos

alunos uma vivência igualitária entre os participantes culminando em uma experiência musical

89

em grupo, envolvendo e dando oportunidades a todos. Salientamos ainda que muitos benefícios

ao comportamento e atitudes dos alunos regulares e egressos do projeto são possíveis,

reafirmando assim um verdadeiro processo educativo de integração sociocultural através da

música.

Os pontos de atuação do Projeto Retreta dividem-se da seguinte forma:

Sede da Corporação Musical 24 de Junho aulas de:

Instrumentos de madeira (Flautas, Clarinetas, Saxofones);

Instrumentos de metais (Trompa, Trompete, Trombone, Bombardino, Tuba);

Instrumentos de Percussão (Bateria, percussão sinfônica, percussão acessórios,

teclas);

Cordas Sinfônicas: (violino, viola, violoncelo e contrabaixo).

EMEF Prefeito Ederaldo Rossetti:

Coral da EJA;

Fanfarra;

Percussão Corporal;

EMEF Aparecida Dias:

Coral infantil;

Flauta doce;

Centro Cultural Tom Jobim:

Piano;

Violão;

Viola Caipira.

4.5.4 Estrutura do Projeto Retreta

A implementação do Projeto Retreta resultou na estrutura musical abaixo:

- Banda sinfônica jovem – 70 músicos;

- Banda sinfônica infanto-juvenil – 35 músicos;

- Fanfarra – 60 músicos;

- Orquestra de violas caipira – 55 músicos;

- Coral Jovem – 60 cantores;

- Coral da 3ª idade – 43 cantores.

90

Os alunos participam de uma aula e dois ensaios semanais nos diversos grupos. Tanta

dedicação e investimento tem feito com que a população de Artur Nogueira tenha grande

acessibilidade à cultura musical.

Para desenvolver todo o programa estabelecido no Projeto Retreta, a Corporação

Musical além do apoio do governo municipal, necessita também do apoio da iniciativa privada.

Este apoio visa uma melhoria na estrutura física básica para que este projeto tenha continuidade

e excelência, oferecendo assim um ensino musical de qualidade para a população de Artur

Nogueira e região.

Ao chegar às proximidades do prédio da Corporação é possível ouvir sons de

instrumentos musicais, cuja arte e o gosto é perceptível, a música ecoa dentro da Corporação

mesmo quando esta encontra-se vazia. Esta música se expande hoje para todo o município,

levada pelos “músicos da banda”, como denominam carinhosamente os munícipes.

4.5.5 Divulgação na internet

Através do site da Corporação Musical 24 de Junho de Artur Nogueira é possível acessar

um link onde se pode acompanhar todas as etapas de desenvolvimento do PROJETO

RETRETA, aumentando sensivelmente a transparência na aplicação e utilização dos recursos

captados.

Com o registro e veiculação dos concertos dos grupos aumenta-se significativamente a

divulgação do projeto, acrescendo de forma ilimitada o número de pessoas com acesso as

apresentações musicais.

As bandas de música possuem importância ímpar na educação musical nas pequenas

cidades do interior do Brasil, exercendo o papel dos conservatórios das grandes cidades, e são

praticamente a única opção para o aprendizado musical na área de sopros desses locais. Além

dos benefícios educacionais, a realização dos concertos proporciona cultura e entretenimento

para a população da cidade e região.

Sabemos que o Brasil ainda conta com um número reduzido de bandas sinfônicas, pois

poucas são as cidades brasileiras que possuem este tipo de formação musical em função do alto

custo dos instrumentos musicais. Por esta razão, incentivar a formação de bandas sinfônicas

resulta no engrandecimento cultural de nosso povo e de nosso País.

Com a gravação e a divulgação via internet, estaremos ampliando significativamente o

número de pessoas beneficiadas com o projeto, e registrando nossas tradições e experiências.

91

Deste modo, ligados com nossas raízes, conservamos nossa verdadeira identidade, um

povo sem memória não tem identificação, e desconhecendo sua história, não compreende

corretamente o presente, e certamente, encontra dificuldade em construir seu futuro. Para

manutenção do Projeto Retreta, a Corporação Musical 24 de Junho conta basicamente com as

subvenções da Prefeitura Municipal, que totalizam hoje apenas dez salários mínimos.

Uma das diretrizes básicas de Projeto Retreta é manter constante desenvolvimento

técnico-instrumental, artístico e interpessoal do educando.

92

5 SOB O OLHAR DO PARTICIPANTE

A pesquisa de campo que embasa este estudo foi realizada no intuito de vislumbrarmos

o trabalho sóciomusical e a contribuição da Educação Musical praticada pelas Corporações no

cenário musical do Brasil e no processo da inclusão sociocultural do indivíduo nas

comunidades.

Esta pesquisa foi realizada entre fevereiro e março de 2015 onde foram enviados, via e-

mail, cerca de 100 questionários previamente definidos com nove perguntas (ver ANEXO 1).

O primeiro passo foi traçarmos um perfil social dos entrevistados, iniciamos com a idade

(Gráfico 2), tendo que 17% dos entrevistados estão numa faixa etária de 10 a 15 anos, 30.2%

de 16 a 25 anos, 29.2% de 26 a 40 anos e 23.6% 41 anos ou mais. Outra característica do perfil

social foi o gênero dos entrevistados (Gráfico 3) onde 44.1% é do gênero feminino e 55.9%

masculino. Com isso temos uma pesquisa realmente válida pois abrange várias faixas etárias,

não tendo inclinações por gênero ou idade, realizando então uma analise da comunidade como

um todo.

Gráfico 2 - Perfil entrevistado - Idade

Fonte: Autor (2015)

Gráfico 3 - Perfil entrevistado - Gênero

Fonte: Autor (2015)

93

Em relação à formação acadêmica (Gráfico 4), pudemos observar uma grande diversidade de

graus de escolaridade, de estudantes à doutores, sendo a maior proporção concentrada em

estudantes sem formação e de nível superior. Mais precisamente 42.5% possuem nível superior,

12.3% especialização, 1.9% mestrado, 1.9 doutorado e 41,5% estudantes, desde o ensino básico

até o superior. Estes dados nos mostram que a análise sociocomunitária engloba todos os tipos

de pensamentos, desde os iniciantes aos mais “maduros” academicamente. Quanto a situação

cível (Gráfico 5), 58.5% solteiros, 34% casados, 4.7% união estável e 2.8% declararam-se

separados.

Gráfico 4 - Perfil entrevistado – Grau de escolaridade

Fonte: Autor (2015)

Gráfico 5 - Perfil entrevistado – Estado civil

Fonte: Autor (2015)

Um dado relevante para a pesquisa é também o grau de envolvimento do entrevistado,

nesse quesito 13.8% dos entrevistados são ex-participantes, 63.3% são participantes e 22.9%

são apenas conhecedores do projeto (Gráfico 6). O envolvimento com o projeto foi um ponto

importante a ser analizado, pois assim não há apenas a opinião dos envolvidos, mas também

94

daqueles que apreciam ou não o projeto mas de forma passiva, tendo eles um contato anterior

ou não. Podendo visualizar de forma mais palpável a influencia sociocomunitária do mesmo.

Gráfico 6 - Perfil entrevistado – Envolvimento com o projeto

Fonte: Autor (2015)

No Gráfico 7 é apresentado um relatório com uma breve análise dos resultados da

primeira questão obtivemos 45.1% dos participantes que tiveram o seu primeiro contato com a

música através do Projeto Retreta, e outros 54,9 % já haviam tido um outro contato por outros

meios. Esta foi a primeira questão que realmente nos mostrou a mescla do perfil musical dos

envolvidos no projeto, mostrando que o grupo envolvido está dividido de forma equilibrada a

respeito do contato prévio musical. Deixando claro que o projeto não apenas trouxe a

oportunidade de aprender Música a muitos jovens, como também possibilita sua prática por

aqueles que já tinham contato por outros meios.

Gráfico 7 – Primeira questão – contato musical anterior

Fonte: Autor (2015)

95

Analisando as respostas da segunda questão, 35,3%% dos participantes tomaram

conhecimento do Projeto Retreta através da escola, 62.7% através de amigos, 11,8% ficaram

sabendo através de parentes, 4.9% em suas respectivas igrejas e outros 14,7% declararam outros

meios, essas proporções podem ser visualizadas no Gráfico 8. Estes dados nos mostram do tipo

de divulgação do projeto, que mesmo sem poderes aquisitivos para marketing, obteve uma

grande divulgação por meio do “networking” dos envolvidos. Mostrando que aqueles que por

mínimo contato com o projeto, perceberam que a intervenção sociocomunitária do projeto era

válido.

Gráfico 8 – Segunda questão – contato com o projeto

Fonte: Autor (2015)

As respostas da terceira questão – “O que representa o PROJETO RETRETA para você?” – na

qual poderiam ser assinaladas quantas alternativas lhe fossem adequadas, obtivemos as

seguintes porcentagens, para 32.7% o projeto representa lazer, para 83.2% aprendizado musical,

5.9 profissionalização, 1% obrigação escolar, para 64.4 % representa socialização/interação

social, para 55.4 é uma realização pessoal, para 4% status social, para 30.7% diversão e para

4% há outras representações (Gráfico 9). Este é um dos resultados mais importantes, pois

mostra qual o envolvimento real, sendo ela direta ou indiretamente, se destacando nas

porcentagens o aprendizado, socialização/interação social e realização pessoal. Vemos que os

principais objetivos estão sendo alcançados de forma individual.

96

Gráfico 9 – Terceira questão – o que o representa o projeto em sua vida

Fonte: Autor (2015)

As respostas da quarta questão – “Quais os pontos fortes do PROJETO RETRETA? ” – na

qual poderiam ser assinaladas quantas alternativas lhe fossem adequadas, 67.3% dos

participantes disseram que os pontos fortes do Projeto Retreta são participação em grupo, 88.1%

aprendizado de um instrumento, 61.4% participação em concertos, 47.5% ensaios, 20.8% são

as viagens, 50.5% disseram que é a forma de ensinar dos professores, 53.5% relacionamentos

entre os participantes, 59.4% disciplina e apenas 6.9% respondeu que outras (Gráfico 10).

Vemos que os pontos mais fortes são participação em grupos, aprendizado de um instrumento,

participação de concertos e disciplina. Para uma comunidade desestruturada, como a qual

busca-se trabalhar, é surpreendente o tipo de envolvimento dos mesmos com aprendizado,

disciplina e relacionamentos em grupos, pois nos mesmos não estão apenas aqueles de seu meio,

mas sim uma miscigenação de gêneros e origens que surpreenderia muitos que assistissem um

ensaio. Em uma análise rápida e superficial, é quase que impossível reunir tantas variedades de

pessoas, de credos religiosos, classes econômicas ou origens sociais em um mesmo ambiente,

com um mesmo objetivo e acima de tudo, valorizando o que estão fazendo.

97

Gráfico 10 – Quarta questão – Opnião dos entrevistados sobre pontos fortes do projeto

Fonte: Autor (2015)

Em contraponto, as respostas da quinta questão – “Quais os pontos frágeis do PROJETO

RETRETA? ” – Na qual poderiam ser assinaladas quantas alternativas lhe fossem adequadas,

obtivemos 9.7% dos participantes consideram que os pontos frágeis do projeto são participação

em grupo, 2.8% aprendizado de um instrumento, 6.9% participação em concertos, 15.3%

consideraram os ensaios como pontos frágeis, outros 26.4% citaram as viagens, 9.7% disseram

forma de ensinar dos professores, 11.1% relacionamento com os participantes, 18.1%

disciplina, e ainda 34.7% disseram outros (Gráfico 11). Para poder interpretar esses resultados

de forma mais profunda é necessário recordar que em sua maioria, os entrevistados são jovens,

e quase metade deles tiveram seu primeiro contato com a música no projeto. Isso faz com que

os mesmos anseiem mais apresentações, mas não apenas em seu meio, mas também poder ter

apresentações em outros lugares, podendo viajar, e de forma inconciente muitas vezes, ver suaa

valorização do seu empenho e dedicação. Não vendo muitas vezes as barreiras que há na

sociedade para encarar uma intervenção sociocomunitária como um trabalho sério como é feito

o PROJETO RETRETA, e também entender que as limitações financeiras existem e são

realmente significativoas, pois as mesmas envolvem custo de infraestrutura, equipamentos,

profissionais especializados e também o custo das viagens.

98

Gráfico 11 – Quinta questão – Opinião dos entrevistados sobre os pontos frágeis do projeto

Fonte: Autor (2015)

As respostas da sexta questão – “O que o ensino de música causa em você? ” – na qual

poderiam ser assinaladas quantas alternativas lhe fossem adequadas, 81.2%% dos participantes

disseram que o ensino de música lhes causa felicidade, 3% pressão, 5.9% ansiedade, 54.5%

paz, 0% angústia, 65.3% determinação, 71.3% melhora da autoestima, 1% piora a autoestima,

2% medo, 47.5% tranquilidade e 9.9% responderam outras (Gráfico 12). Esse é um ponto

importante para analisar se os objetivos do projeto, sendo o ponto principal o ensino da música,

estão sendo realmente alcançados de forma individual. E pelos dados obtidos ficam claros os

frutos do mesmo, sendo felicidade, paz, tranquilidade objetivos importantes, mas juntamente

com esses estão determinação e melhora do auto estima, o que pode impactar de forma

inimaginável uma sociedade, a qual proposital ou não pode retirar participantes da sociedade

menos privilegiada.

99

Gráfico 12 – Sexta questão – Opinião dos entrevistados sobre o efeito da música

Fonte: Autor (2015)

As respostas da sétima questão – “Quais itens podem contribuir para a melhoria do

PROJETO RETRETA? ” – na qual poderiam ser assinaladas quantas alternativas lhe fossem

adequadas, 37,4% maior número de aulas, 12.1% maior diversidade no repertório34.3% maior

carga de ensino de teoria musical, 2% a mudança do quadro de professores, 37.4% ampliação

do quadro de professores, 37.4% aquisição de mais instrumentos, 69.7% dos participantes

disseram que suporte financeiro e 66,7% citaram que a ampliação do espaço físico pode

contribuir para a melhoria do Projeto Retreta (Gráfico 13). Vemos nesses dados que há muito

a ser melhorado, mas na maioria das indicações/necessidades há necessidade de envolvimento

monetário, o que dificulta, e muito, pois por se tratar de um projeto filantrópico as rendas são

provenientes apenas de doações ou auxilio da prefeitura. Os dados mostram que há percepção,

por por parte dos participantes do projeto, da necessidade de apoio financeiro e melhores

condições de espaço físico, uma vez que tais fatores foram citados diretamente por grande parte

dos participantes, e suas consequências (ampliação do quadro docente, maior carga de aulas)

foram citadas de modo menos frequente. Assim, não apenas o suporte financeiro e um espaço

adequado são necessários ao desenvolvimento do projeto, mas afetam diretamente a percepção

dos participantes sobre o mesmo.

100

Gráfico 13 – Sétima questão – Opinião dos entrevistados sobre aperfeiçoamento

Fonte: Autor (2015)

101

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente estudo de caso buscou analisar a importância e a influência da intervenção

sociocomunitária através da música, praticada pelo Projeto Retreta que é desenvolvido no

município de Artur Nogueira São Paulo pela Corporação Musical “24 de Junho”. A Corporação

Musical “24 de Junho” é uma entidade sem fins lucrativos que conta com subsídios da

municipalidade para a sua manutenção, a entidade conta com 91 anos de existência, sendo

inclusive mais antiga do que o município citado.

Vale ressaltar que a educação musical praticada por estas corporações vem de longa

data, muito embora as mesmas contem com inúmeras dificuldades que vão do financeiro ao

pedagógico. Estas instituições praticam a mais de um século a educação sociocomunitária de

forma empírica. Na maioria dos casos além de contribuirem através dos seus grupos para a

participação nos mais diversos acontecimentos sociais do município, elas ainda bravamente

conservam a tradição musical brasileira tanto no repertório como na manutenção de escolas de

música que funcionam como verdadeiros conservatórios populares, cumprindo assim um papel

de educação sociocomunitária.

As instituições denominadas como “Corporação Musical” apesar de serem as mais

antigas no segmento, por algum motivo ainda são as menos investigadas dentre os grupos

ligados à educação. A partir de dados pesquisados junto a Funarte, as corporações musicais

estão presentes em grande parte dos municípios brasileiros; só no estado de São Paulo em 1975,

foram registradas 742; em 1984 cerca de 1027 e em 2000 foram verificadas 1302.

Em todo o Brasil, nos dois primeiros censos, o movimento cresceu em 20 estados

brasileiros. Na atualização ocorrida em 2000, em 18 estados brasileiros foram mantidos os

crescimentos, destacando que em 6 estados havia mais de 50 corporações e em 5, mais de 30.

Estas instituições trabalham essencialmente com projetos de banda, focando músicos amadores

da cidade e ainda ensinando música para novos interessados que queiram aprender instrumentos

e inseri-los gradativamente no programa da banda.

Tudo isto mantido por subvenções da municipalidade, estado, iniciativa privada,

associações de pais e amigos. Merece destaque nesta questão iniciativas do governo estadual e

federal tais como: programa de apoio às bandas de música, FUNARTE, lei Rouanet, e PROAC

(lei de incentivo fiscal).

A partir deste estudo, foi possível quantificar e qualificar a influência exercida pelo

trabalho do Projeto Retreta em relação aos alunos. Dessa forma, a ferramenta desenvolvida

102

tornou possível determinar o comportamento sociocultural da criança que participa das aulas

de música no projeto foco deste estudo.

Durante o desenvolvimento da pesquisa de campo, detectou-se que os participantes

impactados pelo projeto julgam que a música em sua vida causa felicidade e melhoria da

autoestima, e gostam de estar no projeto pelo aprendizado musical e interação social

possibilitados. Por outro lado, percebem-se fragilidades referentes às poucas viagens realizadas

pelos alunos, bem como pelo pouco apoio financeiro. Tais dados servirão de subsídio não

somente para a avaliação das potencialidades e fraquezas do projeto, mas como indicador para

a realização de mudanças que permitam seu maior sucesso.

Salientamos ainda que o projeto musical deve ser integralmente ligado ao processo de

educação sociocomunitária que trata o conhecimento obtido no chamado “extramuros”

escolares, tal tipo de ação desobriga a escola da função tradicional da sistematização do saber.

Por fim, entendemos que através da intervenção sociocomunitária na música torna-se

possível a construção de uma dinâmica estrutura metodológica musical/social capaz de aplicar

conteúdos artísticos de uma forma interativa, interpretativa, dialogando sobre as relações

humanas de maneira singular.

Em se tratando de intervenção sociocomunitária, que ferramenta mais democrática a ser

utilizada para reunir pessoas do que a música? Através da música podemos fazer um baile (ou

uma balada), organizar um recital ou utilizá-la como ferramenta de ensino, que pode vir a

formar profissionais da música ou somente bons apreciadores. Se tomarmos como exemplo o

ensino da música como ferramenta sociocomunitária podemos levantar vários aspectos: o

aprendizado em si, trazendo novos conteúdos culturais; a convivência entre os alunos, trazendo

noções básicas de respeito aos demais e senso de hierarquia; o desenvolvimento de

responsabilidade e autonomia, aumentar a sua capacidade de enxergar a vida em sua amplitude

muito além do abissal.

Tylor expressa em relação ao assunto da seguinte maneira:

Há pessoas tão concentradas no aspecto individual da vida de outras que não

conseguem aprender a noção de ação de uma comunidade como um todo; tal

observador, incapaz de uma visão ampla da sociedade, está adequadamente

descrito no dito: “as árvores o impedem de ver a floresta” (2005, p. 69).

Como hipótese, vamos pensar em uma banda como sendo a nossa floresta, composta

por um maestro, músicos de diversos instrumentos, pessoas que auxiliam na organização do

espaço, na distribuição de partituras, na limpeza do local.

103

Poucas atividades podem ser tão educativas quanto participar de uma banda. Há que se

respeitar a hierarquia, onde o maestro coordena, mas há que se respeitar cada componente da

mesma, pois cada um ao seu momento colocará em prática seus conhecimentos. Não há o mais

ou o menos importante. Todos trabalham para uma perfeita sincronia, com o objetivo de trazer

a quem está assistindo toda à emoção contida na execução da música.

Não importa quem tocou primeiro ou por último, se algum instrumento se sobressaiu ou

não, o que importa é o conjunto, ou seja, todos tocando juntos provocando a emoção na platéia,

que na maioria das vezes, não perceberá este ou aquele instrumento, mas sim a harmonia entre

todos eles. Não é assim que imaginamos uma sociedade saudável e produtiva? Todos inseridos

em um mesmo contexto, fazendo a sua parte, no seu momento, coordenados sim, mas com total

responsabilidade pela sua própria execução, que dependerá única e exclusivamente de seus

esforços pessoais.

A música tem esse poder, o poder de agregar pessoas diferentes entre si, porém com

propósitos semelhantes. Quando ouvimos uma banda, não sabemos a que religião pertence cada

músico, qual a sua origem, a sua orientação sexual, a cor de seus olhos ou sua idade. Levamos

dentro de nós apenas o resultado emocional de tantos sentimentos e sensações ativados por uma

boa música. E os músicos, o que levam dentro deles? A certeza de que pertencem a uma

sociedade e de que podem desenvolver boa parte de seu potencial, independentemente de seu

status econômico, gênero, raça ou credo.

104

REFLEXÕES SOBRE O MAESTRO

Município de Artur Nogueira SP, diretoria da Corporação Musical 24 de Junho, alunos

e professores do Projeto Retreta, familiares, poder público, iniciativa privada, enfim, a

comunidade como um todo hoje formam uma verdadeira catarse que resulta em um lindo e

prazeroso trabalho musical que tem feito a diferença para todos os envolvidos. Como todo

grande trabalho, o Projeto Retreta veio de um sonho, o meu sonho, o sonho do Maestro Ricardo

Miquelino, o sonho que atingiu um patamar que ninguém conseguiria imaginar no início do

trabalho devido há algumas das minhas características pessoais importantes.

Sou um sujeito de personalidade forte, um homem que não tem medo de dizer o que

pensa, por este motivo muitos me enxergam como um alguém arrogante, insensível ou rude,

perfil este que me trouxeram inúmeros contratempos, mas por outro lado aguçaram outras três

características fundamentais: coragem, persistência e liderança.

Coragem de fazer algo nunca antes feito em Artur Nogueira e a persistência para

enfrentar todos os que resistiam e não compreendiam a ideia do Projeto surgiram muitos

obstáculos. A liderança que busca não apenas o sucesso de um projeto ou uma banda, mas sim

de jovens que em certo ponto me idenfico, seja em um olhar determinado ou em um espirito

guerreiro que busca sair de onde está. E e este espirito de liderar que, pautado pela qualidade

de falar o que e preciso a qualquer preço e enfrentar tudo e todos. Tais ações trouxeram muitos

resultados, no entanto a um alto preço. Com o passar do tempo percebo que a minha capacidade

de liderança foi e está se moldando, tornando-se capaz de minimizar tal preço.

Essa experiência diária no Projeto Retreta me fez evoluir como maestro sim, mas

principalmente como pessoa pois a cada dia vejo o quanto nós influenciamos as pessoas ao

nosso redor. Ao pensar em quem eu sou, Ricardo Miquelino, não consigo pensar, definir ou

elaborar mais que poucas frases além de: alguém que busca fazer a diferença. Mesmo quando

há dificuldades no projeto, busco fazer com que as mesmas não afetem o trabalho que tenho

desenvolvido ou atrapalhem os objetivos que tenho em minha vida pessoal e profissional.

Nada mais me vem a mente. Mas ao perguntar de forma informal a alguns colegas de

profissão e integrantes do Projeto Retreta pude contemplar algo que, realmente em alguns

momentos, me surpreendeu. Ao se referir a mim, alguns falam Maestro ou simplesmente

Miquelino, alguns são bem diretos e dizem alguns adjetivos: determinado, orientador, lutador,

esperançoso, ambicioso, cooperador, dedicado, meticuloso dentre outros desta mesma natureza.

Entretanto quando falamos em um Projeto sociomusical vemos que o maestro não é apenas o

105

maestro, ele deve se envolver em toda a infraestrutura que vai desde as aulas até a realização

dos concertos, contratação de professores, ficar responsável por dirigir veículos (inclusive de

grande porte como: caminhão e ônibus). Levar instrumentos para a manutenção, compra de

equipamentos, arranjos musicais, busca de patrocínio, relacionamentos políticos e dentre

outras, sua ocupação é a regência da banda, coral ou orquestra.

Tanto nos ensaios quanto nas aulas e demais atividades do projeto, o Maestro deve

perceber e aproveitar-se de oportunidades para passar aos alunos não somente lições

relacionadas ao fazer musical, mas de cidadania e respeito ao próximo. Gosto de pensar que

através da arte sempre tive como objetivo promover a formação e o resgate do ser humano,

contribuindo para a evolução das pessoas através da universalidade da música. E acredito sim

que, contribui e contribuo na formação de crianças e jovens que se desenvolveram, não

necessariamente para a música, mas para a vida. Busco sempre estar aberto e disponível para

todos aqueles que necessitam de orientações ou apoio. Em alguns momentos, ou muitos quando

procurado por alunos e professores que encontram-se em meio a algum tipo de desanimo ou até

mesmo de conflitos pessoais, busco ensiná-los o que eu tive que aprender sozinho, e para ser

mais didático utilizo com frequência textos que já fazem parte do cotidiano da maioria deles:

“ Se enxerguei mais longe e porque eu subi no ombro de gigantes” Isaac Newton, “Ninguém

bater tão forte quanto a vida. Porem não se trata de quão forte você pode bater, se trata de quanto

você suporta apanhar se levantar e seguir em frente. E assim que a vitória e conquistada.”

Sylvester Stallone

Penso ainda que um líder ou um educador de um projeto musical deva ser movido pelo

ideal de levar a música àqueles que não tem acesso à cultura musical. No âmbito artístico deva

demonstrar todas as habilidades necessárias para a execução de um repertório variado e com

qualidade, além de ser capaz de aglutinar alunos e músicos voluntários em torno de um

programa comum.

O educador deve estar sempre aberto e disponível para todos aqueles que necessitam de

suas orientações e de seu apoio. Ao reger um grupo, mantenha-se sempre com imponente

postura, e firmeza em sua batuta, passando assim segurança e determinação ao grupo, mesmo

que isso por vezes esconda que em seu íntimo reside um homem/mulher sensível e com um

coração imenso. Deve, inclusive, visar o melhor para seus alunos, extrair, brigar (literalmente)

com eles para que se esforcem e cheguem ao mais próximo possível do seu potencial. O bom

educador instrui, critica e auxilia, mostrando e descobrindo novos caminhos junto ao educando.

Enfim, deve depositar a crença no potencial de cada aluno, professor, familiar que está ao seu

redor, de que são capazes e por isso devem caminhar lado a lado.

106

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109

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VON SIMSON, Olga R.M. (org) Educação Não Formal: Cenários de Criação. Campinas:

São Paulo. Editora da UNICAMP/ Centro de Memória, 2001

110

ANEXO 1

Tabela INEP http://emec.mec.gov.br/

Vide arquivo digital

111

ANEXO 2

Relação dos melhores programas acadêmicos eleitos pelo guia do estudante

de abril de 2015

Universidades que exigem teste de aptidão

FACULDADE ESTRELAS

(MG) Belo Horizonte – UFMG ★★★★★

(RS) Porto Alegre – UFRGS ★★★★★

(SP) São Paulo – Unesp ★★★★★

(SP) São Paulo – USP ★★★★★

(BA) Salvador – UFBA ★★★★

(DF) Brasília – UnB ★★★★

(GO) Goiânia – UFG ★★★★

(MG) Belo Horizonte – Uemg ★★★★

(MG) Uberlândia – UFU ★★★★

(PB) João Pessoa – UFPB ★★★★

(PR) Curitiba – UFPR ★★★★

(PR) Maringá – UEM ★★★★

(RJ) Rio de Janeiro – UFRJ ★★★★

(RJ) Rio de Janeiro – Unirio ★★★★

(RN) Natal – UFRN ★★★★

(RS) Pelotas – UFPel ★★★★

(RS) Santa Maria – UFSM ★★★★

(SC) Florianópolis – Udesc ★★★★

(SP) Campinas – Unicamp ★★★★

(SP) Ribeirão Preto – USP ★★★★

(SP) São Paulo – Fasm ★★★★

Fonte: Editora Abril (2015)

112

ANEXO 3

Relação de bandas de música cadastradas pela funarte (2015) http://www.funarte.gov.br/bandas/estado.php?uf=SP

Vide arquivo digital

ANEXO 4

Relação das bandas paulistas segundo cadastro do projeto pró-bandas-SP http://www.cultura.sp.gov.br/portal/site/SEC/menuitem.07db94ea1e7d7825e1628fc7a8638ca

0/?vgnextoid=990b30b51025c410VgnVCM1000008936c80aRCRD

Vide arquivo digital

ANEXO 5

Dados completos do questionário virtual

Vide arquivo digital

113

ANEXO 6

Questionário

PROJETO RETRETA

QUESTIONÁRIO- PESQUISA DE CAMPO

PROJETO RETRETA NAS ESCOLAS: estudo de um caso de educação sócio-musical

Prezados colegas,

Dentro do Programa do Mestrado do UNISAL, Unidade Americana - SP, estamos realizando

uma pesquisa sobre o Projeto Retreta, buscando identificar o perfil dos participantes e egressos,

compreender o que o Projeto representou ou representa em suas vidas e buscar subsídios para

a melhoria do Projeto e para a implantação de outras iniciativas de educação sócio-musical.

Para tanto desenvolvemos um questionário como forma de recolha de dados e informações a

serem posteriormente analisados.

Eu, autorizo o uso do depoimento escrito e imagem de acervo pessoal, por parte dos

pesquisadores Ricardo Miquelino e Valéria Vasconcelos, mestrando e docente do programa de

Mestrado em Educação – UNISAL, unidade Americana-SP, respectivamente, para fins

estritamente acadêmicos.

( ) Sim ( ) Não

114

PROJETO RETRETA

QUESTIONÁRIO- PESQUISA DE CAMPO

Prezados

Com o objetivo de conhecer o perfil dos participantes do Projeto Retreta, solicitamos sua

colaboração respondendo a este questionário. Gratos.

Idade -

Gênero –

Escolaridade

Estado civil

Ano de ingresso no projeto -

Ano de saída do projeto –

1. Você havia estudado música antes de ingressar no PROJETO RETRETA?

( ) Sim Onde ?______________________________________

( ) Não Porque?_____________________________________

2. De que forma tomou conhecimento da existência do PROJETO RETRETA?

(Assinalar quantas alternativas considerar adequadas)

( ) Escola

( ) Amigos

( ) Parentes

( ) Igreja

( ) Outros Quais? __________________________

3. O que representa o PROJETO RETRETA para você?

(Assinalar quantas alternativas considerar adequadas)

( ) Lazer

( ) aprendizado musical

( ) Passatempo

( ) profissionalização

( ) obrigação escolar

( ) socialização/interação social

( ) realização pessoal

( ) status social

( ) diversão

( ) Outros Quais? __________________________

4. Em sua opinião, quais os pontos fortes do PROJETO RETRETA? (Assinalar quantas

alternativas considerar adequadas)

( ) participação em grupos

( ) aprendizado de um instrumento

( ) Participação em concertos

( ) ensaios

( ) viagens

( ) forma de ensinar dos professores

( ) relacionamento entre os participantes

115

( ) disciplina

( ) Outros Quais? __________________________

5. Em sua opinião, quais os pontos frágeis do PROJETO RETRETA? (Assinalar quantas

alternativas considerar adequadas)

( ) participação em grupos

( ) aprendizado de um instrumento

( ) Participação em concertos

( ) ensaios

( ) viagens

( ) forma de ensinar dos professores

( ) relacionamento entre os participantes

( ) disciplina

( ) Outros Quais? __________________________

6. O que o ensino de música causa em você?

(Assinalar quantas alternativas considerar adequadas)

( ) felicidade

( ) pressão

( )Ansiedade

( ) Paz

( ) Angústia

( ) Determinação

( ) Melhora a auto-estima

( ) Piora a auto-estima

( ) Medo

( ) Tranquilidade

( ) Outros Quais? __________________________

7. Quais dos itens abaixo podem contribuir para a melhoria do PROJETO RETRETA?

(Assinalar quantas alternativas considerar adequadas)

( ) maior número de aulas

( ) maior diversidade de repertório

( ) maior carga de ensino de teoria musical

( ) mudança do quadro de professores

( ) ampliação do quadro de professores

( ) aquisição de instrumentos

( ) suporte financeiro para o projeto

( ) ampliação do espaço físico

( ) Outros Quais? __________________________

8. Escreva no máximo três palavras que vêm a sua cabeça ao ouvir o nome do “PROJETO

RETRETA”

1______________________ 2______________________ 3_____________________

9. Escreva aqui outros comentários que considerar relevantes:

116

_____________________________________________________________________

_____________________________________________________________________

_____________________________________________________________________

_____________________________________________________________________