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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE BIOCIÊNCIAS
DEPARTAMENTO DE BIOQUÍMICA
MONIQUE GABRIELA DAS CHAGAS FAUSTINO ALVES
PROPRIEDADES ANTIOXIDANTE, ANTI-HEMOSTÁSTICA E
ANTIPROLIFERATIVA DE GALACTANAS SULFATADAS DA
ALGA VERMELHA Hypnea musciformis (Wulfen) J. V.
Lamouroux
NATAL 2011
MONIQUE GABRIELA DAS CHAGAS FAUSTINO ALVES
PROPRIEDADES ANTIOXIDANTE, ANTI-HEMOSTÁSTICA E
ANTIPROLIFERATIVA DE GALACTANAS SULFATADAS DA
ALGA VERMELHA Hypnea musciformis (Wulfen) J. V.
Lamouroux
Dissertação apresentada ao Departamento de Bioquímica da Universidade Federal do Rio Grande do Norte como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Bioquímica. Orientadora: Dra. Edda Lisboa leite
NATAL
2011
MONIQUE GABRIELA DAS CHAGAS FAUSTINO ALVES
PROPRIEDADES ANTIOXIDANTE, ANTI-HEMOSTÁSTICA E
ANTIPROLIFERATIVA DE GALACTANAS SULFATADAS DA ALGA
VERMELHA Hypnea musciformis (Wulfen) J. V. Lamouroux
Dissertação apresentada ao Departamento de Bioquímica da Universidade Federal do Rio Grande do Norte como requisito parcial para obtenção do título de Mestre em Bioquímica.
Aprovada em: 18/07/2011
BANCA EXAMINADORA
________________________________________________
Dra. Edda Lisboa Leite
Departamento de Bioquímica – UFRN
Orientadora
_________________________________________________
Dr. Eduardo Henrique Cunha de Farias
1º Examinador
_________________________________________________
Dr. Roberto Dimenstein - UFRN
2º Examinador
Dedico esta obra
A minha orientadora Profª Dra. Edda Lisboa Leite pela sua
paciência e ensinamentos constantes.
A minha mãe Vera, por todo apoio e carinho incondicional na
minha jornada de vida.
AGRADECIMENTOS
Primeiramente a Deus por me permitir está aqui hoje.
Aos meus pais Vera e Jorge, e ao meu irmão Beto, por estarem sempre ao
meu lado compartilhando momentos, e por todo carinho e apoio recebido.
Á minha família por está sempre presente na minha vida.
Á minha orientadora Edda pelos seus ensinamentos constantes,
companheirismo, e por entender como ninguém cada um dos seus orientandos.
Por se preocupar não somente com nossa vida acadêmica, mas também com a
nossa vida pessoal. Muito obrigada por ter me aceitado no laboratório e ter
acreditado no meu futuro acadêmico.
Aos professores do Departamento de Bioquímica que contribuíam para minha
formação.
A professora Helena Nader do INFAR (UNIFESP) por permitir a realização de
experimentos em seu laboratório na cidade de São Paulo-SP.
Aos meus amigos da graduação pela amizade e que desde sempre
acreditaram no meu “potencial” e me apoiaram muito.
Aos meus amigos do laboratório de Glicobiologia Vegetal que participaram
diretamente da minha jornada acadêmica, e que se tornaram não somente
colegas de trabalho, mas sim, verdadeiros amigos.
A Maria Emília (Mila), a primeira pessoa que me mostrou como se comportar e
como trabalhar no laboratório de pesquisa. Muito obrigada por tudo.
A Celina, uma pessoa que aprendi a gostar, e passamos a compartilhar muitos
momentos juntas, fazendo experimentos, discutindo resultados, viajando. E
como ela mesma disse uma vez, “nos damos muito bem pois somos
parecidas”, e isso é verdade mesmo.
A Marília, uma pessoa muito especial que com o passar do tempo foi possível
conhecer a verdadeira mulher que ela é, e que apesar do preconceito com os
pobres ICs, é uma pessoa extremamente atenciosa e prestativa.
A Adriane, também minha companheira de experimento, pela ajuda e amizade
a mim dedicadas.
A Allisson, que me aguentava sem nunca reclamar. Que sempre estava perto
quando eu precisava de uma palavra amiga, sensata e inteligente. Obrigada
por está sempre disponível para mim, a qualquer momento.
A Almino, pelas ótimas conversas que sempre tivemos no laboratório, fossem
estas de caráter bioquímico, acadêmico ou sobre a nossa profissão.
A Thiago, Leonardo, Luíza, Joedyson, Thuane, Kahena e Hugo, pela constante
amizade, carinho, atenção e auxílio.
Aos colegas da minha turma de mestrado, Alexandre, Paulo, Fernanda,
Raquel, Daniel, Joycelane, Sara, Adilson, Jethe, Luciana, Ayrton por
compartilharmos e superarmos juntos tantos momentos de dificuldades,
sempre com muita preocupação uns com os outros.
Aos colegas do laboratório do professor Eliseu, que sempre me ajudaram e que
com certeza contribuíram para a realização deste trabalho. Obrigada a
Norberto, Rafael Russi, Paula, Luciana...
Aos colegas do laboratório de Biopolímero que contribuíram de forma direta ou
indireta para a realização do trabalho, obrigada a Sara, Jailma, Leonardo,
Nednaldo, Mariana, Rafael...
Aos colegas do INFAR (Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP) pela
acolhida quando da minha estada em São Paulo para a realização dos
experimentos e pelo grande auxílio e atenção que recebi. Obrigada
especialmente a Valquíria, Renan e Gioconda.
Aos funcionários e aos responsáveis pela limpeza do departamento de
Bioquímica, pelo companheirismo de todo dia, especialmente a Creuza que me
ajudou muito desde o início, e a Ângela pelos muitos cafés da manhã.
Emancipate yourself from mental slavery,
None but ourselves can free our minds.
Bob Marley
“A mente que se abre a uma nova idéia jamais voltará ao seu
tamanho original”
Albert Einstein
RESUMO
Algas marinhas são uma das principais fontes de compostos biologicamente ativos. Na matriz extracelular desses organismos existem os polissacarídeos sulfatados que funcionam como componente estrutural prevenindo-a contra desidratação. A fração 1,0 (F1,0) rica em galactanas sulfatadas obtida da alga vermelha Hypnea musciformis foi caracterizada fisicoquimicamente e avaliada quanto a atividade farmacológica por meio de ensaios de atividade antioxidante, ação citotóxica sobre hemácias, atividade anticoagulante, ação estimulatória sobre a síntese de heparam sulfato antitrombótico e seus efeitos na proliferação e progressão do ciclo celular. Os principais componentes da F1,0 foram carboidratos (49,70 ± 0,10%) e sulfato (44,59 ± 0,015%), apresentando compostos fenólicos (4,79 ± 0,016%) e baixa contaminação protéica (0,92 ± 0,001%). F1,0 mostrou perfil polidisperso e sinais na análise de infravermelho em 1262, 1074 e 930, 900 e 850 cm-1
atribuídos a ligações S=O de ésteres de sulfato, presença de ligação C-O de 3,6-anidrogalactose, β-D-galactose não sulfatada e ligação C-O-SO4 no C4 da galactose, respectivamente. A fração rica em galactanas sulfatadas exibiu forte ação antioxidante sobre o ensaio de peroxidação lipídica com IC50 de 0,003 mg/mL. Além da alta inibição da hemólise induzida por H2O2 em hemácias humanas tratadas com F1,0, esta fração não promoveu citotoxicidade significativa sobre a membrana de hemácias. F1,0 exibiu baixa atividade anticoagulante, causando moderada inibição direta da atividade enzimática da trombina. Esta fração promoveu estimulação de cerca de 4,6 vezes na síntese de heparam sulfato (HS) pelas células endoteliais da aorta de coelho (RAEC), em cultura, quando comparadas com as células não tratadas com F1,0. A fração dessa alga mostrou atividade antiproliferativa sobre as células RAEC, causando aumento no número de células na fase S, impedindo a progressão do ciclo celular. Assim, F1,0 apresentou ação citostática e não citotóxica sobre esta linhagem celular. Esses resultados sugerem que F1,0 de H. musciformis tem potencial antioxidante, efeito importante para um composto utilizado como alimento e na indústria alimentícia, podendo ser uma alternativa na indústria alimentícia para a prevenção do decaimento da qualidade dos alimentos contendo lipídio devido a peroxidação lipídica, uma vez que a fração em estudo exibiu forte ação inibitória sobre a peroxidação lipídica. Além disso F1,0 apresenta forte ação antitrombótica promovendo a estimulação da síntese de HS antitrombótico pelas células endoteliais, sendo útil na prevenção da trombose, devido também a sua ação inibitória sobre as espécies reativas do oxigênio (ROS) em alguns sistemas in vitro, estando envolvidos na promoção de estado de hipercoagulabilidade.
Palavras-chave: Galactanas sulfatadas; Alga vermelha; Hypnea musciformis;
Anticoagulante; Antitrombótica; Atividade antioxidante; Proliferação celular.
ABSTRACT
Marine algae are one of the major sources of biologic compounds. In extracellular matrix of these organisms there are sulfated polysaccharides that functions as structural components and provides protection against dehydration. The fraction 1.0 (F1.0) rich in sulfated galactans obtained from red seaweed Hypnea musciformis was physicochemical characterized and evaluated for pharmacologic activity through antioxidant activity, cytotoxic action on erythrocytes, anticoagulant, stimulatory action under antithrombotic heparan sulfate synthesis and their effects on cell proliferation and cycle cell progression. The main components of F1.0 were carbohydrates (49.70 ± 0.10%) and sulfate (44.59 ± 0.015%), presenting phenolic compounds (4.79 ± 0.016%) and low protein contamination (0.92 ± 0.001%). Fraction 1.0 showed polidisperse profile and signs in infrared analysis in 1262, 1074 and 930, 900 and 850 attributed to sulfate esters S=O bond, presence of a 3,6-anidrogalactose C-O bond, non-sulfated β-D-galactose and a C-O-SO4 bond in galactose C4, respectively. The fraction rich in sulfated galactans exhibited strong antioxidant action under lipid peroxidation assay with IC50 of 0.003 mg/mL. Besides the inhibition of hemolysis induced by H2O2 in erythrocytes treated with F1.0, this fraction did not promote significant cytotoxity under erythrocytes membranes. F1.0 exhibited low anticoagulant activity causing moderate direct inhibition of enzimatic activity of thrombin. This fraction promoted stimulation around of 4.6 times on this synthesis of heparan sulfate (HS) by rabbit aortic endothelial cells (RAEC) in culture when was compared with non treated cells. The fraction of this algae displayed antiproliferative action under RAEC cells causing incresing on cell number on S fase, blocking the cycle cell progression. Thus F1.0 presented cytostatic and no cytotoxic action under this cell lineage. These results suggest that F1.0 from H. musciformis have antioxidant potential which is a great effect for a compound used as food and in food industry which could be an alternative to food industry to prevent quality decay of lipid containing food due to lipid peroxidation. These polysaccharides prevent the lipid peroxidation once the fraction in study exhibited strong inhibitory action of this process. Furthermore that F1.0 present strong antithrombotic action promoting the stimulation of antithrombotic HS synthesis by endothelial cells, being important for thrombosis preventing, by its inhibitory action under reactive oxygen species (ROS) in some in vitro methods, being involved in promotion of hypercoagulability state.
Keywords: Sulfated galactans; Red seaweed; Hypnea musciformis;
Anticoagulant; Antithrombotic; Antioxidant activity; Cell proliferation.
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 Árvore diagramática representando a organização dos
eucariotos em seis grupos principais......................................
21
Figura 2 Estrutura química das carragenanas........................................ 24
Figura 3 Unidade dissacarídica da carragenana kappa......................... 25
Figura 4 Representação esquemática da ativação das vias intrínseca,
extrínseca e comum da coagulação sanguínea.......................
29
Figura 5 Representação esquemática dos complexos procoagulantes. 31
Figura 6 Formação do coágulo no local de lesão tecidual...................... 32
Figura 7 Esquema da ação dos ROS sobre os componentes da
hemostasia...............................................................................
37
Figura 8 Redução do oxigênio molecular (O2) na mitocôndria até a
formação de água.....................................................................
39
Figura 9 Hypnea musciformis................................................................. 42
Figura 10 Esquema de extração e fracionamento dos polissacarídeos
sulfatados de H. musciformis....................................................
48
Figura 11 Esquema do teste de tempo de tromboplastina parcial
ativada (aPTT)..........................................................................
57
Figura 12 Esquema do teste de tempo de protrombina (PT).................... 58
Figura 13 Eletroforese em gel de agarose das frações de
polissacarídeos sulfatados de H. musciformis obtidas do
fracionamento com acetona.....................................................
65
Figura 14 Cromatografia descendente em papel da F1,0 com solvente
butanol:piridina: água...............................................................
67
Figura 15 Cromatografia de gel filtração da F1,0 de H. musciformis
monitorada pela determinação de açúcares totais e
identificação de compostos aromáticos....................................
68
Figura 16 Espectro de infravermelho da F1,0 rica em galactanas
sulfatadas da alga Hypnea musciformis...................................
70
Figura 17 Poder redutor de concentrações diferentes da F1,0 de
Hypnea musciformis.................................................................
74
Figura 18 Inibição da peroxidação lipídica de concentrações diferentes
da F1,0 de Hypnea musciformis...............................................
75
Figura 19 Inibição da hemólise induzida por H2O2 promovida pela F1,0
de H. musciformis.....................................................................
76
Figura 20 Ação citotóxica da F1,0 de H. muscifomis sobre eritrócitos de
diferentes grupos sanguíneos ABO e Rh positivo e negativo..
78
Figura 21 Tempo de tromboplastina parcial ativada de pool de plasma
tratado com F1,0 em diferentes massas..................................
79
Figura 22 Tempo de protrombina de pool de plasma tratado com F1,0
em diferentes massas...............................................................
80
Figura 23 Ação da F1,0 rica em galactanas sulfatadas da alga Hypnea
musciformis na síntese de glicosaminogicanos sulfatados
pelas células endoteliais da aorta de coelho (RAEC)...............
84
Figura 24 Efeito da F1,0 isolada de H. musciformis na proliferação de
células endoteliais da aorta de coelho (RAEC).......................
85
Figura 25 Análise de citometria de fluxo com dupla marcação para
anexina V-FITC e PI em células endoteliais da aorta de
coelho (RAEC)..........................................................................
87
Figura 26 Padrão de viabilidade de células endoteliais da aorta de
coelho avaliada por citometria fluxo.........................................
88
Figura 27 Análise da distribuição no ciclo celular das células endoteliais
da aorta de coelho (RAEC).......................................................
89
LISTA DE TABELAS
Tabela 1 Atividade farmacológica de polissacarídeos sulfatados de
algas vermelhas......................................................................
26
Tabela 2 Rendimento (% do peso seco) das frações de Hypnea
musciformis obtidas do fracionamento com acetona..............
64
Tabela 3 Composição química (% peso seco) da F1,0 extraída de
Hypnea musciformis................................................................
66
Tabela 4 Resumo dos sinais de espectroscopia de infravermelho da
F1,0 rica em galactanas sulfatadas da alga vermelha H.
musciformis.............................................................................
71
Tabela 5 Ensaios de atividade antioxidante........................................... 73
Tabela 6 Ensaio do substrato cromogênico da trombina....................... 81
Tabela 7 Ensaio do substrato cromogênico do FXa.............................. 82
Tabela 8 Distribuição das células endoteliais da aorta de coelho
(RAEC) no ciclo celular...........................................................
90
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
µCi/mL
Micro Curie por mililitro
µl Microlitros
µM Micromolar
35S
Sulfato radioativo
aPTT Tempo de tromboplastina parcial ativada
ATP Adenosina trifosfato
A- Hemácias do grupo sanguíneo A negativo
A+ Hemácias do grupo sanguíneo A positivo
AB+ Hemácias do grupo sanguíneo AB positivo
BHA Hidroxianisol butilado (Butylated hydroxyanisole)
BHT Hidroxitolueno butilado (Butylated hydroxytoluene)
B+ Hemácias do grupo sanguíneo B positivo
C4 Carbono 4
cm Centímetros
cm-1
por cm
CS
Condroitim sulfato
DMSO Dimetilsulfóxido
DS Dermatam sulfato
EDTA Etileno diamino tetraacetato de sódio
EGF
Fator de crescimento epidérmico
F0,3 Fração precipitada com 0,3 volume de acetona
F0,5
Fração precipitada com 0,5 volume de acetona
F1,0 Fração precipitada com 1,0 volume de acetona
F1,5
Fração precipitada com 1,5 volume de acetona
F2,0 Fração precipitada com 2,0 volume de acetona
F3,0 Fração precipitada com 3,0 volume de acetona
FITC
Isotiocianato de flurosceína
FIX Fator IX – Fator B anti-hemofílico (Fator de Christmas)
FV
Fator V- Pró acelerina
FVII Fator VII – Pró convertina
FVIII Fator VIII – Fator A anti-hemofílico
FX Fator X- Fator de Stuart-Prower
FXI Fator XI- Antecedente da Tromboplastina plasmática
FXII Fator XII – Fator de Hageman
GAGs Glicosaminoglicanos
GLC Cromatografia gás - líquido
h Hora
HS
Heparam sulfato
IU/mL Unidades internacionais por mililitros
kDa Quilo Dáltons
LDL Lipoproteína de baixa densidade
M
Molar
mg
Miligramas
mg/mL Miligramas por mililitro
min
Minutos
mL
Mililitro
mM Milimolar
N Normal
NADH Nicotinamida adenina dinucleotídeo na forma reduzida
NADPH Nicotinamida adenina dinucleotídeo fosfato na forma reduzida
NIH/mL
Unidades de trombina por mililitro
nm Nanômetro
p/v
Peso/volume
oxLDL Lipoproteína de baixa densidade oxidada
O+ Hemácias do grupo sanguíneo O positivo
PBS Solução tampão (Phosphate buffered saline)
PDGF
Fator de crescimento derivado de plaqueta
pH
Potencial hidrogeniônico
PI Iodeto de propídio
PT
Tempo de protrombina
RAEC Célula endotelial da aorta de coelho (Rabbit aortic endothelial cell)
RNase
Ribonuclease A de pâncreas bovino
ROS Espécies reativas do oxigênio
rpm
Rotações por minuto
SFB
Soro bovino fetal
TBHQ
tert-Butylhydroquinone
TF Fator tecidual
TFPI Inibidor da via do fator tecidual
UV Ultravioleta
V
Voltagem
v Volume
v/v Volume/ volume
VEGF Fator de crescimento endotelial vascular
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO.......................................................................... 20
1.1 ALGAS MARINHAS.................................................................. 20
1.1.1 Algas vermelhas...................................................................... 21
1.2 CARRAGENANAS.................................................................... 22
1.3 HEMOSTASIA........................................................................... 26
1.4 PAPEL DA CÉLULA ENDOTELIAL NA HEMOSTASIA............ 32
1.5 HEPARINA - COMPOSTO ANTICOAGULANTE/
ANTITROMBÓTICO.................................................................
34
1.6 RELAÇÃO ENTRE COAGULAÇÃO E ESPÉCIES REATIVAS
DO OXIGÊNIO..........................................................................
35
1.7 ESPÉCIES REATIVAS DO OXIGÊNIO.................................... 38
1.8 COMPOSTOS ANTIOXIDANTES............................................. 40
2 OBJETIVO GERAL................................................................... 41
2.1 OBJETIVOS ESPECÍFICOS..................................................... 41
3 MATERIAIS E MÉTODOS........................................................ 42
3.1 MATERIAIS............................................................................... 42
3.1.1 Alga marinha............................................................................ 42
3.1.2 Materiais químicos e aparelhos............................................. 43
3.2 MÉTODOS................................................................................ 47
3.2.1 Extração e fracionamento dos polissacarídeos sulfatados 47
3.2.2 Caracterização dos polissacarídeos sulfatados obtidos
de H. musciformis...................................................................
49
3.2.2.1 Eletroforese em gel de agarose................................................ 49
3.2.2.2 Análises químicas..................................................................... 49
3.2.2.2.1 Dosagem de açúcares totais.................................................... 49
3.2.2.2.2 Dosagem de sulfato.................................................................. 50
3.2.2.2.3 Dosagem de proteínas.............................................................. 50
3.2.2.2.4 Dosagem de compostos fenólicos........................................... 50
3.2.2.3 Cromatografia descendente em papel...................................... 50
3.2.2.4 Determinação da massa molecular........................................... 51
3.2.2.5 Análise de infravermelho........................................................... 51
3.2.3 Avaliação da Atividade Biológica.......................................... 51
3.2.3.1 Ensaios de atividades antioxidantes......................................... 51
3.2.3.1.1 Seqüestro de radicais hidroxila................................................. 51
3.2.3.1.2 Ação quelante de ferro.............................................................. 52
3.2.3.1.3 Sequestro de radicais DPPH.................................................... 52
3.2.3.1.4 Sequestro de radicais superóxido............................................. 53
3.2.3.1.5 Poder redutor............................................................................ 53
3.2.3.1.6 Peroxidação lipídica.................................................................. 54
3.2.3.1.7 Inibiçao de hemólise induzida por H2O2.................................... 54
3.2.3.2 Avaliação da ação citotóxica sobre hemácias de grupos
sanguíneos ABO e Rh positivo e negativo (Hemólise direta)...
55
3.2.3.3 Atividade anticoagulante........................................................... 56
3.2.3.3.1 Tempo de tromboplastina parcial ativada (aPTT)..................... 57
3.2.3.3.2 Tempo de protrombina (PT)...................................................... 58
3.2.3.3.3 Atividade enzimática de fatores da coagulação (Ensaio do
substrato cromogênico).............................................................
58
3.2.3.3.3.1 Ensaio de atividade da trombina............................................... 58
3.2.3.3.3.2 Ensaio de atividade do FXa...................................................... 59
3.2.3.4 Atividade estimulatória sobre a síntese de heparam sulfato
antitrombótico em células endotelais em cultura......................
60
3.2.3.4.1 Manutenção das culturas.......................................................... 60
3.2.3.4.2 Ensaio da ação da F1,0 na síntese de glicosaminoglicanos
pelas células endoteliais...........................................................
60
3.2.3.4.2.1 Marcação dos glicosaminoglicanos sulfatados......................... 60
3.2.3.4.2.2 Análise dos glicosaminoglicanos sulfatados sintetizados....... 60
3.2.3.5 Ação da F1,0 na proliferação celular in vitro (Ensaio de MTT). 61
3.2.3.6 Ensaio de apoptose (Anexina V-FITC /PI) e distribuição do
ciclo celular nas células endoteliais da aorta de coelho
(RAEC).......................................................................................
62
3.2.3.6.1 Ensaio de apoptose (Anexina V-FITC /PI)................................. 62
3.2.3.6.2 Ensaio da distribuição das células no ciclo celular................... 63
3.2.3.7 Análise estatística..................................................................... 63
4 RESULTADOS.......................................................................... 64
4.1 EXTRAÇÃO E FRACIONAMENTO DOS
POLISSACARÍDEOS SULFATADOS.......................................
64
4.2 ELETROFORESE EM GEL DE AGAROSE............................. 65
4.3 COMPOSIÇÃO QUÍMICA DA F1,0........................................... 66
4.4 CROMATOGRAFIA DESCENDENTE EM PAPEL................... 67
4.5 DETERMINAÇÃO DA MASSA MOLECULAR.......................... 68
4.6 ANÁLISE DE ESPECTROSCOPIA DE INFRAVERMELHO... 69
4.7 AVALIAÇÃO DA ATIVIDADE BIOLÓGICA................................ 72
4.7.1 Ensaios de atividade antioxidante......................................... 72
4.7.1.1 Sequestro de radicais hidroxila................................................. 72
4.7.1.2 Ação quelante de ferro.............................................................. 72
4.7.1.3 Sequestro de radicais DPPH..................................................... 72
4.7.1.4 Sequestro de radicais superóxido............................................. 72
4.7.1.5 Poder redutor............................................................................ 74
4.7.1.6 Peroxidação lipídica.................................................................. 75
4.7.1.7 Inibição de hemólise induzida por H2O2.................................... 76
4.7.2 Avaliação da ação citotóxica da F1,0 sobre hemácias de
grupos sanguíneos ABO e Rh positivo e negativo..............
77
4.7.3 Atividade anticoagulante........................................................ 79
4.7.3.1 Tempo de tromboplastina parcial ativada e tempo de
protrombina...............................................................................
79
4.7.3.2 Ensaios de atividade de fatores da coagulação........................ 81
4.7.3.2.1 Ensaio de atividade da trombina............................................... 81
4.7.3.2.2 Ensaio de atividade do FXa...................................................... 82
4.7.4 Investigação da atividade estimulatória da F1,0 extraída
de H. musciformis sobre a síntese de heparam sulfato
antitrombótico por células endoteliais da aorta de coelho
(RAEC)......................................................................................
83
4.7.5 Ação da F1,0 na proliferação celular (Ensaio de MTT)........ 85
4.7.6 Ensaio de anexina V/PI e distribuição do ciclo celular em
células endoteliais da aorta de coelho (RAEC)....................
86
5 DISCUSSÃO............................................................................. 91
6 CONCLUSÕES......................................................................... 103
REFERÊNCIAS......................................................................... 104
Introdução 20
1. INTRODUÇÃO
1.1. Algas marinhas
As algas são organismos avasculares cujas células formam
aglomerações na forma de fios ou de lâminas finas. Elas podem ser
classificadas em três grupos de cores: verde (Chlorophyta), marrom
(Phaeophyta) e vermelha (Rhodophyta) (PÁDUA, FONTOURA, MATHIAS,
2004). Encontram-se distribuídas por oceanos, corpos de água doce, solos,
rochas, sobre a neve e superfície de vegetais, desde que disponham de luz e
umidade suficientes (VIDOTTI, ROLLEMBERG, 2004). Estão confinadas as
estreitas faixas de litoral e sublitoral do ambiente marinho e requerem certas
condições do ambiente para crescimento adequado e estabelecimento em
diferentes regiões da linha costeira. A ocorrência de alterações na distribuição
e abundância de diferentes tipos de algas é devida as flutuações na topografia,
natureza física do substrato, salinidade, corrente, ação das marés e outros
fatores do ambiente marinho na costa litorânea. O substrato marinho ou algal é
utilizado como superfície de ancoragem com papel chave no crescimento, pois
este crescimento depende bastante da disponibilidade de substratos nas áreas
litorais e sublitorais da linha costeira (RAO, 1970).
De acordo com o sistema proposto por Whittaker, (1969) as espécies
dos organismos vivos foram classificadas em cinco reinos: Animalia (Metazoa),
Plantae, Fungi e Protista (eucariotos), e Monera (procariotos). Pela
classificação desse autor, as algas vermelhas (Filo Rhodophyta) pertencem ao
reino protista, que compreende algas que apresentam pigmentos organizados
em organelas (plastos) que permitem a fotossíntese (VIDOTTI, ROLLEMBERG,
2004).
Anteriormente, foi adquirido um maior conhecimento no entendimento
das relações evolucionárias dos organismos devido a avanços na filogenética
molecular. Atualmente os eucariotos podem ser divididos em seis grupos
principais: Opisthokonta, Amoebozoa, Plantae, Chromalveolata, Rhizaria,
Excavata. As algas vermelhas, nesta nova divisão, encontram-se inseridas no
grupo Plantae, que compreende organismos fotossintéticos que possuem
Introdução 21
cloroplastos originados por endossimbiose primária (SIMPSON, ROGER,
2004).
Figura 1. Árvore diagramática representando a organização dos eucariotos em seis
grupos principais. O grupo Plantae que compreende as algas vermelhas está destacado por
uma seta vermelha. Fonte: adaptado de Simpson, Roger, (2004).
1.1.1.Algas vermelhas
As algas vermelhas são algas quase que exclusivamente pluricelulares e
marinhas que vivem fixadas em substratos. A principal característica desse
grupo de algas é a presença do pigmento ficoeritrina em suas células, o qual
confere a coloração característica que apresentam. Além deste pigmento, as
algas vermelhas apresentam clorofilas a e d, carotenóide e amido como
material de reserva. Possuem grande importância econômica, uma vez que são
utilizadas como alimento (homem e gado), na extração de ágar utilizado como
meio de cultura para bactérias, para fabricação de laxantes, gomas e na
extração de carragenanas. Estas são hidrocolóides amplamente utilizadas nas
Introdução 22
indústrias alimentícias (VIDOTTI, ROLLEMBERG, 2004), de tintas, têxteis e
perfumes, como na indústria farmacêutica (ARMISEN, 1995).
O gênero Hypnea J. V. Lamour compreende aproximadamente 67
espécies descritas, e está representada em litorais tropicais e subtropicais ao
redor do mundo, sendo economicamente importante como alimento
(MSHIGENI, CHAPMAN, 1994; GERALDINO et al., 2009). Este gênero foi
estabelecido por Lamouroux (1813) baseado em seis espécies e é tipificado
por H. musciformis (Wulfen) J. V. Lamour (KYLIN, 1930; PAPENFUSS, 1958)
apresentando distribuição cosmopolita e considerável variação morfológica
(GERALDINO et al., 2010).
O gênero Hypnea é caracterizado por um talo muito ramificado com
pequenos ramos laterais, cistocarpos globulosos e tetrasporângia em laterais
curtas (LAMOUROUX, 1813; MSHIGENI, 1978; WOMERSLEY, 1994). A
principal característica desta espécie é a presença de processos em forma de
ganchos nas porções terminais dos eixos principais, que apresentam como
função a fixação da alga sobre outras algas suportes ou outros substratos
(FRITSCH, 1965).
A alga Hypnea musciformis é consumida como alimento em geléias
adoçicadas com ou sem leite de coco e também como sopa de legumes na
costa de Warambadi, Ilha de Sumba, Indonésia (ANGGADIREDJA, IKN 78 –
IKN 89). Espécies de Hypnea são algumas das algas comestíveis encontradas
em diferentes localidades ao longo da Costa da Índia (RAO, 1970).
1.2.Carragenanas
Na matriz extracelular das algas marinhas encontram-se os
polissacarídeos sulfatados que formam mucilagens e parecem apresentar
capacidade protetora contra a desidratação em períodos de maré baixa. Ainda,
fornecem flexibilidade a estrutura da alga, facilitando o processo de captura de
luz e nutrientes por estes organismos (PERCIVAL, MCDOWELL, 1967).
Estes polissacarídeos sulfatados expressam estrutura heterogênea e
complexa, e são componentes estruturais da matriz extracelular destes
Introdução 23
organismos marinhos (POMIM, MOURÃO, 2008). Percival e McDowell, (1967)
relataram que os polissacarídeos sulfatados encontrados nas algas vermelhas
podem estar na forma de galactanas sulfatadas, que são polissacarídeos
sulfatados, geralmente de alta massa molecular (≥ 100 KDa), que possuem alta
eletronegatividade, devido aos ésteres sulfatados em sua estrutura, o que os
torna bastante aniônicos, possibilitando interação eletrostática com proteínas
específicas, o que concorre para as suas ações biológicas observadas
(POMIN, 2010).
A variação estrutural pode ocorrer em galactanas sulfatadas de
diferentes espécies de algas vermelhas e nas amostras coletadas em
diferentes ambientes ou em diferentes estações do ano (PEREIRA et al.,
2005). As interações intermoleculares entre as galactanas sulfatadas e
determinadas proteínas estão diretamente relacionadas com as características
estruturais dos glicanos como a configuração anomérica, padrão de sulfatação,
posição da ligação glicosídica e sua conformação (POMIN, 2009).
As galactanas sulfatadas apresentam estrutura linear alternante de
resíduos de β-D-galactopiranose 3- ligadas e α-galactopiranose 4-ligadas, os
quais estão na configuração D em carragenanas e na configuração L em ágar.
Alguns resíduos estão na forma de anidrogalactose (KNUTSEN et al., 1994).
A origem do nome carragenana é proveniente de uma pequena vila na
costa da Irlanda chamada Carragheen (BIXLER, 1994). Carragenanas são
galactanas sulfatadas produzidas por algas vermelhas de várias famílias de
Rhodophyta (FALSHAW et al., 1996), com estrutura linear e solúveis em água.
As preparações de carragenana podem conter além de galactose e
sulfato, outros resíduos de carboidratos como, por exemplo, xilose, glicose e
ácidos urônicos, e ainda substituintes como metil e piruvato. As carragenanas
são tradicionalmente classificadas por um prefixo grego de acordo com o grau
de sulfatação e a presença de ponte 3,6- anidro na α-D-galactose 4-ligada
(VAN DE VALDE, PEREIRA, ROLLEMA, 2004).
Introdução 24
Figura 2. Estrutura química das carragenanas. Unidades dissacarídicas das principais
carragenanas que diferem em padrões de sulfatação (A-D) e na substituição da α-D-galactose
por 3,6-anidro-α-D-galactose (A e D). R: grupo substituinte. Letras gregas são referentes a
tipos de carragenanas. β: beta; κ: kappa; ι: iota; μ: mu; ν: nu; λ: lambda; θ: teta; δ: zeta. Fonte:
adaptado de Pomin, (2010).
Estes polímeros possuem ampla aplicação na indústria de alimentos,
uma vez que apresentam a capacidade de formar géis aquosos, tratando-se de
hidrocolóides (LAHAYE, 2001) e são utilizados, portanto, como agentes
texturizantes, com propriedades gelificantes espessantes (MC HUGH, 2003), e
como estabilizadores. No mercado de carnes processadas como de presunto e
peito de peru, as carragenanas funcionam como um agente ligante de água
que previne a perda da umidade durante o cozimento, evitando, uma textura
seca indesejável da carne (BIXLER, PORSE, 2010). A solução de
carragenanas, normalmente exibe coloração translúcida e quando incorporada
em outras soluções, não causam alteração no gosto nem na coloração original
destas soluções (RIBIER, GODINEAU, 1984; CRAIGIE, 1990). Tais
propriedades são bastante apreciadas pelas indústrias alimentícias.
As carragenanas são tradicionalmente divididas em seis formas básicas:
iota (ι), kappa (κ), lambda (λ), Mu (μ) e Nu (ν) e teta (ө) carragenana, e esta
divisão é importante para a classificação química e produção comercial desde
Introdução 25
que diferentes subtipos de carragenanas são obtidos de diferentes fontes de
algas (CAMPO et al., 2009).
A alga vermelha, objeto deste estudo, Hypnea musciformis é uma fonte
natural de carragenana kappa, um galactana sulfatada importante
comercialmente e por isso bastante explorada na costa nordeste do Brasil
(OLIVEIRA, 1998). A carragenana kappa é composta por unidade dissacarídica
de β-D-galactopiranose 1,3-ligada e 3,6-anidro-α-D-galactopiranose 1,4-ligada,
podendo formar géis termorreversíveis, influenciados pela presença e
concentração de certos íons (ROCHAS, RINAUDO, 1980; GRASDALEN,
SMIDSROD, 1981; BELTON, MORRIS, TANNER, 1985).
Figura 3. Unidade dissacarídica da carragenana kappa.
(A) Projeção de Haworth. (B) Conformação em cadeira.
Fonte:http://www.cienciaviva.pt/rede/oceanos/1desafio/Artigosintesesobrecarragenanas.pdf
Segundo O´Sullivan et al., (2010), as algas marinhas vermelhas são
fontes de compostos biologicamente ativos na natureza, e entre eles estão as
galactanas sulfatadas, que apresentam atividade reconhecida também por
outros autores conforme demonstrado na Tabela 1.
Introdução 26
Tabela 1. Atividade farmacológica de polissacarídeos sulfatados de algas vermelhas.
Atividade
farmacológica Alga marinha (Referência)
Antiproliferativa Gracilaria caudata (COSTA et al., 2010)
Antioxidante
Porphyra haitanensis (ZHANG et al., 2003; ZHANG et
al., 2004), Porphyra yezoensis (LIU et al., 2007),
Gracilaria caudata (COSTA et al., 2010), Schizymenia
binderi (BARAHONA et al., 2011)
Antitumoral Champia feldmannii (LINS et al., 2009); Chondrus
ocellatus (ZHOU et al., 2004)
Anticoagulante Gigartina skottsbergii (CARLUCCI et al., 1997);
Botryocladia occidentalis (FARIAS et al., 2000)
Antiviral Gigartina skottsbergii (CARLUCCI et al., 1997)
Imunoestimulatória Chondrus ocellatus (ZHOU et al., 2004)
Devido à presença de atividades antioxidante e anticoagulante de
polissacarídeos sulfatados de algas marinhas, é importante entender a
hemostasia e de que forma as espécies reativas de oxigênio podem interferir
neste processo, assim como, a importância da proteção antioxidante para o
organismo e manutenção da qualidade dos alimentos.
1.3.Hemostasia
A hemostasia é uma resposta fisiológica protetora ao dano vascular
resultando na exposição de camadas subendoteliais da parede do vaso aos
componentes sanguíneos (MACKMAN, TILLEY, KEY, 2007), funcionando
como um processo dinâmico que tem como objetivo a interrupção do
sangramento em local de lesão tecidual, no qual a coagulação do sangue é
Introdução 27
iniciada e terminada de forma rápida e bastante regulada (NATHAN et al.,
2003). O sistema hemostático mantém o sangue em estado fluido sobre
condições normais, e responde com rápida formação de um coágulo quando há
lesão vascular (MACKMAN, TILLEY, KEY, 2007). No local de lesão são
necessários mecanismos que restrinjam a formação de agregados plaquetários
e o coágulo de fibrina, visando à manutenção da fluidez do sangue
(HOFFBRAND, CATOVSKY, TUDDENHAM, 2005). Assim os mecanismos
hemostáticos são regulados para contrapor-se a perda excessiva de sangue e
evitando por outro lado, a formação de trombos intravasculares decorrentes de
formação excessiva de fibrina (ZAGO, FALCÃO, PASQUINI, 2004).
O sistema hemostático é constituído por plaquetas, vasos sanguíneos,
proteínas da coagulação, anticoagulantes naturais e o sistema de fibrinólise. O
equilíbrio funcional da hemostasia é garantido por vários mecanismos
envolvendo interações entre proteínas, respostas celulares complexas e
regulação do fluxo sanguíneo (ZAGO, FALCÃO, PASQUINI, 2004).
A resposta primária da hemostasia envolve o endotélio vascular e
plaquetas, formando o trombo plaquetário (de efeito transitório), este que é
reforçado pela fibrina gerada pelas proteínas da coagulação. O sistema
fibrinolítico dissolve o trombo, gradualmente, visando à restauração do fluxo
sanguíneo normal (ZAGO, FALCÃO, PASQUINI, 2004) promovendo a
degradação da fibrina mediada pela plasmina. Este sistema é composto por
várias proteínas que regulam a formação da plasmina, gerada a partir do
plasminogênio e de seus ativadores (COLLEN, 1999). A inibição do sistema
fibrinolítico pode ser realizada em nível dos ativadores do plasminogênio
mediada por inibidores específicos, os denominados inibidores dos ativadores
do plasminogênio (PAIs), e diretamente sobre a plasmina exercida pela α2
antiplasmina (BAJZAR, 2000).
No estado fisiológico não ocorre à formação e deposição de fibrina no
compartimento intravascular devido às propriedades anticoagulantes do
endotélio, à forma inativa das proteínas da coagulação e à presença de
inibidores fisiológicos. No entanto, a perda do equilíbrio dinâmico das reações
da coagulação conduz a distúrbios hemorrágicos ou trombóticos (COLMAN et
al., 2001a).
Introdução 28
A coagulação sanguínea é controlada por anticoagulantes que sob
condições normais prevalecem sobre as forças procoagulantes (DAHLBACK,
VILLOUTREIX, 2005). As reações bioquímicas da coagulação devem ser
reguladas para evitar a ativação excessiva, formação inadequada de fibrina e a
oclusão vascular. Os inibidores fisiológicos da coagulação (anticoagulantes
naturais) de maior relevância fisiológica são antitrombina, TFPI (inibidor da via
do fator tecidual), proteína C (PC) e proteína S (PS) (COLMAN et al., 2001a).
Vários fatores de coagulação foram descobertos ao longo dos anos de
1940 e 1950, sendo designados com algarismos romanos de acordo com a
sequência de descoberta (JR et al., 2007).
Em 1964, foi introduzido o modelo de ativação da coagulação através de
uma série de passos, em que cada fator de coagulação conduz a ativação de
outro fator, culminado na geração de trombina que converte o fibrinogênio
solúvel em fibrina insolúvel. Este modelo da cascata de coagulação
(cascade/waterfall model) foi proposto por dois grupos independentes de
bioquímicos, e os artigos tratando deste modelo foram publicados na revista
Nature por MacFarlane, (1964) (cascade model) e na revista Science por Davie
e Ratnoff, (1964) (waterfall model).
A teoria da cascata de coagulação organiza a seqüência de eventos
bioquímicos nas vias extrínseca, intrínseca e comum, considerando que o fator
tecidual inicia a via extrínseca enquanto que a iniciação da via intrínseca é
mediada pelo colágeno (MACFARLANE, 1964; DAVIE, RATNOFF, 1964).
Desta forma, a sequência da coagulação está dividida em duas vias, a via
intrínseca, uma vez que todos os componentes estão presentes no sangue, e a
via extrínseca, em que além dos componentes circulantes do sangue, há a
necessidade da presença do fator tecidual, proteína de membrana do
subendotélio. A iniciação de cada via culmina na ativação do FX (Fator de
Stuart-Prower) em FXa (ativado) e geração do coágulo de fibrina através da via
comum (LUCHTMAN-JONES, BROZE, 1995).
A via extrínseca do sistema de coagulação é ativada pelo fator tecidual
(TF), que é exposto ao sangue. O fator VII ativado (FVIIa) circulante se liga ao
TF e o complexo gerado FVIIa–TF converte o fator IX e fator X em enzimas
ativas, fator IX ativado (FIXa) e fator X ativado (FXa), respectivamente
Introdução 29
(MORRISSEY, 2001; HOFFMAN, 2003; SCHENONE, FURIE, FURIE, 2004;
DAHLBACK, 2005). O fator tecidual é expresso por células epiteliais,
macrófagos e outros tipos celulares que estão, normalmente, separados do
sangue e dos fatores da coagulação (OSTERUD, 1998; GIESEN et al., 1999).
Segundo a teoria cascata, a via intrínseca é iniciada quando o fator XII
entra em contato com cargas negativas do endotélio subjacente, gerando o
FXa através de uma cascata de ativação de zimogênios. Este processo é
denominado “ativação por contato” e necessita da presença da pré-calicreína
(serina protease) e cininogênio de alto peso molecular (cofator não enzimático)
(JENNY, MANN, 1998; COLMAN et al., 2001b).
Figura 4. Representação esquemática da ativação das vias intrínseca, extrínseca e
comum da coagulação sanguínea. Fonte: adaptado de Franco, (2001).
Introdução 30
A divisão da coagulação do sangue em via extrínseca, intrínseca e
comum é inadequada do ponto de vista fisiológico, uma vez que a separação
dos processos hemostáticos não ocorre in vivo (JENNY, MANN, 1998;
COLMAN et al., 2001b). Porém, esta divisão em vias é utilizada para
interpretação de testes laboratoriais que avaliam a coagulação sanguínea,
como o teste de tempo de protrombina (PT) e tempo de tromboplastina parcial
ativada (aPTT), que detectam distúrbios nos fatores da coagulação que
compõem as vias extrínseca e intrínseca, respectivamente (MARTINI et al.,
2008).
Devido a esta constatação, foi desenvolvido um novo modelo para
ativação da coagulação sanguínea baseado em células, no qual estão
envolvidos três complexos procoagulantes: complexo tenase extrínseco,
complexo tenase intrínseco e complexo protrombinase (Figura 5), que
compreendem serinoproteases dependentes de vitamina K (fatores II, VII, IX e
X) e cofatores (V e VIII), localizados em uma superfície de membrana contendo
fosfolipídeos (JENNY, MANN, 1998; COLMAN et al., 2001b).
Introdução 31
Figura 5. Representação esquemática dos complexos procoagulantes. A ligação do VIIa
ao TF (fator tecidual) promove a ativação dos fatores IX e X, conduzindo a geração de
trombina, em pequenas quantidades. O complexo IXa/VIIIa (complexo tenase intrínseco)
ativam o X com maior eficiência. O Xa juntamente com o Va, converte a protrombina (II) em
trombina (IIa). Os complexos tenases ativam o fator X, convertendo em Xa (forma ativada) e o
complexo protrombinase converte a protrombina (II) em trombina (IIa). Todas essas reações
ocorrem na superfície de membrana celular. A trombina também promove a ativação dos
fatores V e VIII, cofatores da coagulação que uma vez ativados, eles participam do complexo
tenase intrínseco e complexo protrombinase. Fonte: adaptada de Jenny, Mann, (1998).
A descoberta de que a exposição do sangue a células que expressam
fator tecidual na sua superfície é necessária e suficiente para iniciar a
coagulação sanguínea in vivo, levou a conclusão que a via intrínseca não tem
papel fisiológico verdadeiro na hemostase (HOFFBRAND, CATOVSKY,
TUDDENHAM, 2005). O complexo FVIIa–TF é tradicionalmente referido como
a via extrínseca e é proposto ser o ativador primário da coagulação in vivo
(MACKMAN, TILLEY, KEY, 2007).
Introdução 32
As quatro fases da coagulação que compreendem este modelo são
iniciação, amplificação, propagação e terminação. Em linhas gerais, a fase de
iniciação tem início com a perturbação do endotélio vascular e células
sanguíneas circulantes, ocorrendo interação do TF com FVIIa plasmático,o que
leva a produção de pequena quantidade de trombina. A amplificação ocorre
pela ação da trombina, esta proteína que ativa plaquetas e cofatores (FVa e
FVIIIa) e FXI nas superfícies plaquetárias. Como resultado da ação da
trombina, existe a produção e consequente atividade de nível significante da
trombina, geração de tampão estável no local da lesão tecidual e interrupção
do sangramento (fase de propagação). A fase de terminação é importante para
que o processo de coagulação seja limitado a fim de evitar oclusão trombótica
em áreas normais do vaso ao redor da lesão (JR et al., 2007).
Figura 6. Formação do coágulo no local de lesão tecidual. A lesão induz rápida associação
de plaquetas ao subendotélio e ativação da cascata de coagulação pelo fator tecidual. A
propagação do trombo envolve o recrutamento adicional de plaquetas e amplificação da
cascata de coagulação pela via intrínseca. A deposição de fibrina estabiliza o coágulo.
Fonte: Mackman, Tilley, Key, (2007).
1.4. Papel da célula endotelial na hemostasia
Trombose é uma causa importante de morte no mundo todo, gerando
complicações em doença aterosclerótica, falha cardíaca, câncer, cirurgia e
gestação (BAILEY, SCANTLEBURY, SMYTH, 2009).
Introdução 33
Colburn e Buonassisi (1982), nos anos 80, relataram que a superfície
das células endoteliais tem atividade antitrombótica. Quando esta superfície
muda, há possibilidade de formação de trombo.
A camada intacta de células endoteliais fornece uma superfície não
trombogênica que ajuda a prevenir hemostasia indesejável (MICHIELS, 2003),
uma vez que se apresentam cobertas de proteoglicanos de heparam sulfato,
que são capazes de potencializar a ação da antitrombina (CINES et al., 1998),
promovem a síntese de substâncias como a trombomodulina (envolvida com a
ativação da proteína C), TFPI (inibidor da via do fator tecidual), prostaciclina,
ativador do plasminogênio tecidual, que ou inibem a cascata de coagulação e
função plaquetária ou ativam a fibrinólise (AMBROSIO, TRITTO, GOLINO,
1997). Além, de sintetizar a proteína S (cofator da proteína C) e produzir
vasodilatadores como o óxido nítrico (NO) (CINES et al., 1998). No entanto, a
perturbação da integridade endotelial conduz ao desenvolvimento de superfície
aderente e formação de lacunas intercelulares que permitem a passagem de
plasma solúvel e células sanguíneas para fora do lúmen vascular para o tecido
subjacente (MICHIELS, 2003).
Na superfície e na matriz extracelular das células endoteliais encontra-se
presente o heparam sulfato, um glicosaminoglicano que tem mostrado possuir
atividade antitrombótica em vários modelos. Sugere-se que a atividade
antitrombótica da heparina e de outros agentes antitrombóticos esteja, pelo
menos em parte, relacionada com a ação destes nas células endoteliais
estimulando a síntese de heparam sulfato antitrombótico (NADER et al., 2001).
Heparam sulfato é um polímero linear polidisperso que compartilha
características estruturais com a heparina, sendo composto por unidades
alternantes de α-D-glucosamina (GlcN) e ácido urônico, ou β-D-ácido
glicurônico (GlcA) ou α-L-ácido idurônico (IdoA), unidos por ligação glicosídicas
(1→ 4). Uma diferença importante entre o heparam sulfato e a heparina é o
grau de sulfatação, em que a heparina apresenta grau de sulfatação superior
ao heparam sulfato (DREYFUSS et al., 2009). O heparam sulfato é encontrado
na superfície da maioria das células eucarióticas e na matriz extracelular,
ancorados a superfície celular pelo cerne do seu proteoglicano. Células
endoteliais em cultura sintetizam heparam sulfato. Cerca de 1% a 10% dessas
Introdução 34
moléculas apresentam atividade anticoagulante, pois contém resíduos de
glicosamina 3-0-sulfatadas que é a região do pentassacarídeo de ligação à
antitrombina (HALLGREN, SPILLMANN, PEJLER, 2001). A ligação do
pentassacarídeo à antitrombina induz alteração conformacional na
antitrombina, acelerando de 2 a 3 ordens de magnitude a taxa de inibição da
antitrombina sobre alguns fatores de coagulação (WEITZ, 2003).
1.5. Heparina - Composto anticoagulante/ antitrombótico
A heparina, o primeiro componente utilizado como agente anticoagulante
e antitrombótico, foi isolado de fígado de cachorro em 1916 por McLean no
Canadá. A heparina comercial, introduzida na prática clínica há 60 anos, era
proveniente de mucosa intestinal bovina e de porco, e de pulmão bovino
(SILVA, DIETRICH, 1975). A heparina atua como anticoagulante, pois forma
um complexo ternário com a antitrombina e diferentes serinaproteases da
cascata de coagulação. Quando a heparina se associa a antitrombina, a
inibição da trombina mediada pela antitrombina é acelerada por mais de 1000
vezes (NADER et al., 2001). Um local específico da estrutura da heparina
composta pela sequência pentassacarídica, com padrão específico de
composição de açúcar e sulfatação, é necessário para promover a ativação
conformacional da antitrombina (THUNBERG, BÄCKSTRÖM, LINDAHL, 1982;
LINDAHL, BACKSTRÖM, THUMBERG, 1983).
A heparina também promove potencialização da ação de uma serpina
denominada de cofator da heparina II, que inibe especificamente a trombina, e
este glicosaminoglicano ainda conduz a liberação e aumento da síntese de
TFPI pelas células endoteliais. Entretanto, são observados alguns efeitos
adversos no uso da heparina como a necessidade de monitoramento freqüente
do tempo de tromboplastina parcial ativada, efeitos anticoagulantes variáveis,
incapacidade de inibir a trombina ligada ao coágulo e ocorrência de
trombocitopenia (diminuição do número de plaquetas) (NADER et al., 2001). Há
a possibilidade de contaminação da heparina por príons e vírus (ROCHA et al.,
2005) já que a mesma é extraída de fontes de mamíferos como mucosa
Introdução 35
intestinal de porco ou pulmão bovino. Assim, a heparina apresenta limitações
quanto ao uso, devido a efeitos colaterais, limitada fonte do material, e
ocorrência de contaminação. Os polissacarídeos sulfatados marinhos oferecem
baixo nível de contaminação por vírus e príons pelo fato de serem extraídos de
fonte exclusivamente marinha (MOURÃO, 2004). Por essa razão, é necessária
a busca por novos compostos anticoagulantes e antitrombóticos de fontes
naturais.
1.6. Relação entre coagulação e espécies reativas do oxigênio
Coagulação exacerbada e trombose estão ligadas a várias doenças
metabólicas, cardiovasculares e câncer. Muitas dessas doenças estão
associadas a níveis aumentados de espécies reativas do oxigênio (ROS)
causando citotoxicidade e funcionam também, como moléculas de sinalização
em várias células. Algumas evidências mostram que os ROS e o estado redox
são importantes no controle da coagulação do sangue e trombose (GÖRLACH,
2005). As ROS são capazes de afetar o equilíbrio delicado entre os sistemas
procoagulante, anticoagulante e fibrinolítico, e por essa razão estão envolvidos
em doenças trombóticas (GÖRLACH, KIETZMANN, HESS, 2002; HERKERT et
al., 2004; GÖRLACH, 2004). As ROS interferem adicionalmente, no processo
de formação do trombo em múltiplos passos, nas plaquetas, parede do vaso e
fatores da coagulação (AMBROSIO, TRITTO, GOLINO, 1997).
As reações de oxidação-redução (redox) e as ROS têm papel importante
no metabolismo intermediário e no controle da regulação gênica por fatores de
transcrição, interação proteína-proteína e síntese de DNA (DROGE, 2002).
As plaquetas possuem papel principal na formação do trombo e são
alvos principais para oxidantes produzidos ou liberados no lúmen vascular, e
também são capazes de gerar oxidantes endogenamente (DEL PRINCIPE et
al., 1991; FINAZZI-AGRO‟ et al., 1992). As plaquetas, uma vez ativadas, são
capazes de secretar alguns fatores como fator de crescimento derivado de
plaqueta (PDGF), fator de crescimento epidérmico (EGF) e fator de
crescimento endotelial vascular (VEGF). Estes fatores podem estimular a
produção de ROS dentro da parede do vaso principalmente pela ativação da
Introdução 36
NADPH oxidase vascular (GÖRLACH, KIETZMANN, HESS, 2002; ANITUA et
al., 2004). A geração aumentada de ROS promove a adesão e ativação de
plaquetas e leucócitos, e também conduz a proliferação de células endoteliais e
células musculares lisas (GÖRLACH et al., 2000).
A produção vascular de ROS tem sido associada com sistemas como a
cadeia transportadora de elétrons mitocondrial, lipooxigenases,
ciclooxigenases, xantina e glicose oxidase, NADPH oxidases, óxido nítrico
(NO) sintase, as citocromos P450, peroxidases e várias hemeproteínas
(DROGE, 2002; CAI, GRIENDLING, HARRISON, 2003). A enzima NADPH
oxidase catalisa a redução de um elétron do oxigênio usando o NADH ou
NADPH como doador de elétron, promovendo a geração de radical superóxido
(O2-), e tem sido identificada como provavelmente a fonte mais proeminente de
geração de ROS nas células vasculares e em plaquetas (KROTZ et al., 2002;
CAI, GRIENDLING, HARRISON, 2003; LASSEGUE, CLEMPUS, 2003).
As ROS podem levar a formação de trombos intravasculares uma vez
que também interferem nos inibidores das vias de coagulação. Estudos
mostram que peróxidos lipídios podem aumentar a quantidade de trombina
produzida e retardar a taxa de decaimento da trombina (BARROWCLIFFE,
GUTTERIDGE, DORMANN, 1975). Esses dois efeitos são devido à inibição da
antitrombina promovida pelo peróxido lipídio (GRAY, BARROWCLIFFE, 1985).
Outros fatores antitrombóticos sofrem inativação mediada por oxidantes como
o ativador do plasminogênio (LAWRENCE, LOSKUTOFF, 1986) e
trombomodulina (GLASER et al., 1992), proteína de membrana associada com
ativação do sistema da proteína C ativada, um anticoagulante que inibe os
fatores V e VIII ativados (Va e VIIIa) (FRANCO, 2001).
Células endoteliais são uma fonte e um possível alvo de agentes
oxidantes liberados no vaso (ZWEIER et al., 1994). Após breve exposição a
radicais de oxigênio exógenos, estas células mostram um aumento significativo
nos níveis de mRNA de TF (fator tecidual) acompanhado de grande atividade
procoagulante induzida por este fator (GOLINO et al., 1996). Além disso,
células endoteliais expostas a ROS exibem uma diminuição nos níveis de TFPI
a níveis quase indetectáveis (GOLINO et al., 1995). O TFPI, inibidor da via do
Introdução 37
fator tecidual, é uma proteína sintetizada pelas células endoteliais e que inibe a
via extrínseca da coagulação (GÖRLACH, 2005).
Outro mecanismo demonstrando como o ambiente oxidante conduz a
estado protrombótico (GÖRLACH, 2005) ocorre quando a lipoproteína de baixa
densidade (LDL) encontra-se oxidada (oxLDL). Observou-se interação direta
entre os fosfolipídeos oxidados e a proteína TFPI, de forma que a atividade
anticoagulante deste inibidor estaria prejudicada (OHKURA et al., 2004).
A trombina também pode ativar produção de ROS em células vasculares
pela estimulação da NADPH oxidase (GÖRLACH, KIETZMANN, HESS, 2002),
contribuindo para uma geração prolongada de ROS no local de lesão vascular.
De forma que esta proteína teria ação indutora e ativadora o sob o TF em uma
forma dependente de ROS envolvendo a NADPH oxidase (HERKERT et al.,
2004).
Figura 7. Esquema da ação das ROS sobre os componentes da hemostasia. ROS:
espécies reativas do oxigênio; TF: fator tecidual; TFPI: inibidor da via do fator tecidual; oxLDL:
lipoproteína de baixa densidade oxidada; NADH: nicotinamida adenina dinucleotídeo na forma
reduzida; NADPH: nicotinamida adenina dinucleotídeo fosfato na forma reduzida.
Introdução 38
1.7.Espécies reativas do oxigênio
Ao mesmo tempo em que os organismos foram evoluindo para utilizar o
oxigênio, houve em paralelo, a evolução da defesa antioxidante para proteção
contra os efeitos tóxicos causados pelo oxigênio. Desta forma, a evolução dos
organismos aeróbios multicelulares e os mecanismos de defesa antioxidante
estão intimamente relacionados (ARUOMA, 1998).
Radical livre é uma espécie química que possui um ou mais elétrons
desemparelhados, no qual um elétron desemparelhado está sozinho em um
orbital. Geralmente, os radicais são menos estáveis e uma vez formados
podem interagir de várias formas com outros radicais ou com outras moléculas.
A taxa e seletividade dos tipos de interação dependem da concentração dos
radicais, na deslocalização do elétron sozinho, e ausência de ligações fracas
nas moléculas que irão interagir com o radical. Entre os radicais livres de
importância para os organismos vivos estão o radical hidroxila (OH.),
superóxido (O2.-), no entanto o peróxido de hidrogênio (H2O2) e oxigênio singlet
(O2) não são radicais livres, mas podem conduzir a reações de radicais livres
nos organismos. O termo espécies reativas do oxigênio é frequentemente
utilizado para radicais (OH., O2.-) e não radicais livres (H2O2, O2) (ARUOMA,
1998).
As espécies reativas do oxigênio (ROS) são metabólitos fisiológicos
formados durante o metabolismo celular aeróbio (FERREIRA, MATSUBARA,
1997), para a geração de ATP na cadeia transportadora de elétrons localizada
na membrana mitocondrial interna (MURAVCHICK, LEVY, 2006). As ROS são
gerados como subprodutos da interação entre elétrons livres e oxigênio, e
embora somente pequena quantidade do oxigênio metabolicamente consumido
seja convertida em ROS, estas moléculas de vida curta e altamente reativas
podem causar dano ou destruir complexos enzimáticos mitocondriais,
membranas e outros componentes estruturais da arquitetura celular através de
contato direto ou por peroxidação lipídica (KELSO et al., 2002). O oxigênio
molecular (O2) sofre redução tetravalente (Figura 8), resultando na geração de
H2O, no entanto, durante este processo são formados os intermediários
Introdução 39
reativos do oxigênio como os radicais superóxido, hidroperoxila, hidroxila e
peróxido de hidrogênio (FERREIRA, MATSUBARA, 1997).
Figura 8. Redução do oxigênio molecular (O2) na mitocôndria até a formação de água.
Fonte: Ferreira, Matsubara, (1997).
Proteínas, membranas celulares, DNA e outros constituintes celulares
são sítios alvos de processos de degradação induzidos por ROS, e
consequentemente conduzem a doenças como artrite reumatóide, distrofia
muscular, catarata, algumas desordens neurológicas, alguns tipos de câncer,
assim como também o envelhecimento e aterosclerose (KOVATCHEVA et al.,
2001; RUBERTO et al., 2001). A aterosclerose, presença de placas de ateroma
a partir de acúmulo de LDL no espaço subendotelial, que se tornam alvo das
espécies reativas do oxigênio, sendo oxidadas a oxLDL (LDL oxidada) e
levando a ativação dos macrófagos que expressam moléculas inflamatórias e
induzem a expressão de moléculas de adesão, fatores tissulares, quimiocinas
nas plaquetas, células sanguíneas, células endoteliais e da parede arterial,
conduzindo ao recrutamento, retenção e ativação de células inflamatórias na
parede vascular e conseqüentemente para o crescimento do ateroma (LIBBY,
2002).
Introdução 40
1.8. Compostos Antioxidantes
Devido o espectro de ação das espécies reativas do oxigênio no corpo
humano e em relação aos alimentos, os agentes antioxidantes são necessários
no sistema corporal a fim de evitar danos a biomoléculas, e também para
estender o tempo de estocagem dos alimentos (HEO et al., 2005).
Os agentes antioxidantes retardam ou previnem a oxidação de
substratos celulares oxidáveis, promovendo a inibição da geração ou o
sequestro das espécies reativas do oxigênio. Alguns agentes antioxidantes
sintéticos como BHA (hidroxianisol butilado), BHT (hidroxitolueno butilado) e
TBHQ (tert-Butylhydroquinone) são normalmente utilizados em alimentos
processados, no entanto devido a preocupações de segurança do uso destes,
há um crescente interesse na busca de antioxidantes naturais (FORMANEK et
al., 2001). Em seu habitat natural, as algas marinhas são expostas a
concentrações de oxigênio e luminosidade de forma combinada, o que
promove a geração de radicais livres como também de outros agentes
oxidantes. No entanto, as algas não sofrem dano fotodinâmico, o que sugere a
presença de componentes e mecanismos antioxidantes nestes organismos
(MATSUKAWA et al., 1997).
Tendo em vista o amplo espectro de atividades atribuídas aos
polissacarídeos sulfatados das algas marinhas, é de interesse o estudo desses
compostos quanto a sua atividade antioxidante, anti-hemostática e
antiproliferativa da alga vermelha Hypnea musciformis, objeto deste estudo.
Objetivos 41
2. OBJETIVO GERAL
Avaliar o potencial antioxidante, anticoagulante, antitrombótico e ação sobre a
proliferação celular de galactanas sulfatadas da alga vermelha Hypnea
musciformis.
2.1. OBJETIVOS ESPECÍFICOS
Caracterizar fisicoquimicamente a fração 1,0 (F1,0) rica em galactanas
sulfatadas da alga vermelha H. musciformis;
Avaliar a atividade antioxidante in vitro da F1,0 por meio de
metodologias diferentes;
Determinar a ação citotóxica desta fração sobre hemácias humanas de
grupos sanguíneos ABO e Rh positivo e negativo;
Avaliar in vitro a influência desta fração nas vias intrínseca e extrínseca
da coagulação;
Analisar a ação direta da F1,0 sobre a atividade enzimática da trombina
e do FXa;
Investigar a ação estimulatória da F1,0 sobre a síntese de heparam
sulfato antitrombótico pelas células endoteliais em cultura;
Verificar a ação desta fração sobre a proliferação celular em linhagem de
células RAEC (células endoteliais da aorta de coelho) e determinar se a
F1,0 provoca apoptose ou necrose celular, ou se interfere na progressão
do ciclo celular desta linhagem.
Resultados 64
4. RESULTADOS
4.1. Extração e fracionamento dos polissacarídeos sulfatados
O cru de polissacarídeos obtido da alga vermelha Hypnea
musciformis (295 mL) foi submetido a fracionamento com concentrações
crescentes de acetona (0,3 – 3,0 v), do qual foi obtida a fração 1,0 (F1,0),
precipitada com 1volume de acetona. A fração 1,0 foi a escolhida para a
realização do estudo devido ao seu maior rendimento conforme a tabela 2. O
rendimento da F1,0 em relação ao peso inicial da alga seca foi de 1,74%. A
fração total (FT) não consta na tabela do rendimento, uma vez que a mesma foi
adquirida a partir de uma alíquota separada do cru de polissacarídeos (10 mL).
Tabela 2. Rendimento (% do peso seco) das frações de Hypnea musciformis obtidas do
fracionamento com acetona.
Frações de H. musciformis Rendimento (%)
F0,3 16,73
F0,5 7,13
F1,0 59,76
F1,5 8,10
F2,0 3,91
F3,0 4,37
Resultados 65
4.2. Eletroforese em gel de agarose
Um composto rico em sulfato demonstra coloração azul arroxeada
característica em presença de azul de toluidina (NEWTON, SCOTT,
WHITEMAN, 1974). A eletroforese das frações de Hypnea musciformis obtidas
do fracionamento com acetona mostra que estas frações são constituídas por
polissacarídeos sulfatados, sendo comprovado pela metacromasia
apresentada, o que indicaria a possível presença de sulfato nas frações.
Conforme a figura 13, a F1,0 exibe perfil polidisperso comum a polissacarídeos
de algas, com uma população de alto peso que permanece na origem da
corrida eletroforética.
Figura 13. Eletroforese em gel de agarose das frações de polissacarídeos sulfatados de
H. musciformis obtidas do fracionamento com acetona. Eletroforese em gel de agarose
0,6% em tampão PDA. 5 L das frações (10 mg/mL) foram aplicadas em poços no gel e
submetidas à corrente elétrica por volta de 1 h e 30 min a 100 V, em cuba resfriada a 4oC.
Origem: referente ao ponto da aplicação das amostras testes; +: pólo positivo; -: pólo negativo.
Resultados 66
4.3. Composição química da F1,0
A composição química da F1,0 é dada na tabela 3. Os resultados
mostram que a F1,0 é composta principalmente por carboidratos (49,70 ±
0,10%), apresentando alto conteúdo de sulfato (44,59 ± 0,015%). A fração
possui baixa contaminação protéica (0,92 ± 0,001%) e baixo conteúdo de
compostos fenólicos (4,79 ± 0,016%).
Tabela 3. Composição química (% peso seco) da F1,0 extraída de Hypnea musciformis.
F1,0 (%)
Açucares totais a 49,70 ± 0,10
Sulfato b 44,59 ± 0,015
Proteínas c 0,92 ± 0,001
Compostos fenólicos d 4,79 ± 0,016
a. Dubois et al., (1956). b. Dodgson, Price (1962). c. Bradford, (1976). d. Swain, Hills, (1959).
Resultados 67
4.4. Cromatografia descendente em papel
Conforme pode ser observado na Figura 14 abaixo, a cromatografia
descendente em papel dos hidrolisados ácidos da F1,0 em solvente butanol:
piridina: água, mostra que esta fração é composta principalmente pelo
monossacarídeo galactose, definindo a presença de uma homogalactana. A
F1,0 não apresenta em sua estrutura qualquer outro monossacarídeo utilizado
como padrão nesta cromatografia.
Figura 14. Cromatografia descendente em papel da F1,0 com solvente
butanol:piridina:água. Monossacarídeos utilizados - Fuc: fucose; Xil: xilose; Man: manose;
Glc: glicose; Gal: galactose; GlcA: ácido glicurônico. F1,0: fração 1,0 precipitada com 1 v de
acetona. Origem: referente ao ponto de aplicação da F1.0 e dos monossacarídeos. A seta se
refere à direção da corrida cromatográfica.
Resultados 68
4.5. Determinação da massa molecular
A cromatografia de gel filtração da F1,0 monitorada pela dosagem de
açúcares totais (DUBOIS et al., 1956) e identificação de compostos aromáticos
que usualmente absorvem em 280 nm/ UV (DAHMANE, LASIA, ZHAO, 2008),
mostra um perfil polidisperso da F1,0, a qual é constituída por duas populações
de polissacarídeos de massas moleculares diferentes (> 150 kDa e 147 kDa),
evidenciados pelos dois picos visualizados na Figura 15 abaixo. A F1,0 exibiu
picos coincidentes para carboidratos e compostos aromáticos, estes que
podem ser devido a presença de proteína ou ainda de pigmentos associados a
parte polissacarídica da F1,0.
Figura 15. Cromatografia de gel filtração da F1,0 de H. musciformis monitorada pela
determinação de açúcares totais e identificação de compostos aromáticos. A F1,0 foi
submetida a cromatografia de gel filtração em sephadex G-100 (140 x 1 cm) utilizando 0,2 M de
ácido acético + 0,15 M de cloreto de sódio para eluição. Linha azul: referente a absorbância de
carboidratos; Linha vermelha: referente a absorbância de compostos aromáticos.
Resultados 69
4.6. Análise de Espectroscopia de Infravermelho
Análise de infravermelho da fração 1,0 extraída da alga H. musciformis
mostrou sinais em 3423, 2930, 1653, 1415, 1262, 1156, 1074, 930, 900, 850,
770, 740 cm-1, como pode ser visto na Figura 16 e na Tabela 4. Sinais
observados em 3423 e 2930 cm-1 são referentes a vibração do H-O existente
na ligação de hidrogênio das moléculas e vibração do -CH, respectivamente
(SUN et al., 2009). O sinal em 1653 cm-1 indica apresença de água associado
ao composto teste (KIM et al., 2006) e em 1413 cm-1 estaria associado com
vibração simétrica devido a grupos carboxila (VAN HOOGMOED, BUSSCHER,
DE VOS, 2003). O sinal em 1262 cm-1 ´comprovou a ligação S=O de ésteres
de sulfato, relacionado a presença de sulfatação na amostra (PEREIRA et al.,
2009). Sinais em cerca de 1156 cm-1 demonstram vibrações C-O do anel de
piranose, comum a todos os polissacarídeos (GÓMEZ-ORDÓÑEZ, RUPÉREZ,
2011). Os sinais obtidos a 1074 e 930 cm-1 revelam a presença de ligação C-O
da 3,6-anidrogalactose. Em 900 e 850 cm-1 foram sinais atribuídos a β-D-
galactose não sulfatada e a ligação C-O-SO4 no C4 da galactose,
respectivamente (PEREIRA et al., 2009). Os sinais em 770 e 740 cm-1 são
referentes ao esqueleto de flexão do anel piranose (MATSUHIRO, 1996).
Sinais entre 537 – 606 cm-1 estão associados a bandas características de
ligação peptídica, sendo referente a flexão C=O fora do plano, designada como
amida VI (KONG, YU, 2007).
Resultados 70
Figura 16. Espectro de infravermelho da F1,0 rica em galactanas sulfatadas da alga
Hypnea musciformis. Em foco a região de 500 – 1000 cm-1
.
Resultados 71
Tabela 4. Resumo dos sinais de espectroscopia de infravermelho da F1,0 rica em
galactanas sulfatadas da alga vermelha H. musciformis.
Sinais
(cm-1)
Descrição do sinal Referência
3423 Vibração do H-O existente na ligação de
hidrogênio das moléculas
SUN et al., 2009
2930 Vibração do -CH SUN et al., 2009
1653 Presença de água associado ao
composto teste
KIM et al., 2006
1413 Vibração simétrica devido a grupos
carboxila
VAN HOOGMOED,
BUSSCHER, DE
VOS, 2003
1262 Ligação S=O de ésteres de sulfato,
relacionado a presença de sulfatação na
amostra
PEREIRA et al., 2009
1156 Vibrações C-O do anel de piranose,
comum a todos os polissacarídeos
GÓMEZ-ORDÓÑEZ,
RUPÉREZ, 2011
1074, 930 Presença de ligação C-O da 3,6-
anidrogalactose
PEREIRA et al., 2009
900 β-D-galactose não sulfatada PEREIRA et al., 2009
850 Ligação C-O-SO4 no C4 da galactose, PEREIRA et al., 2009
770, 740 Esqueleto de flexão do anel piranose MATSUHIRO, 1996
537 – 606 Ligação peptídica, referente a flexão C=O
fora do plano, designada como amida VI
KONG, YU, 2007
Resultados 72
4.7. Avaliação da Atividade Biológica
4.7.1. Ensaios de atividade antioxidante
4.7.1.1. Sequestro de radicais hidroxila
A F1,0 mostra ação sequestradora de radicais hidroxila dose
dependente nas concentrações testadas (0,08 – 5,0 mg/mL) variando de 2,08 ±
0,72% a 32,50 ± 1,77%, promovendo o seqüestro da ordem de 32,5% desses
radicais quando a F1,0 foi utilizada a 5 mg/mL, conforme tabela 4. O EC50 foi
de 13,68 mg/mL.
4.7.1.2. Ação quelante de ferro
Nas concentrações testadas (0,08 – 5,0 mg/mL), a F1,0 exibe baixa
ação quelante do metal ferro, de forma dose dependente, com atividade
quelante de 1,03 ± 0,09% a 8,03 ± 0,13%, como mostrado na tabela 4. O EC50
observado foi de 56,19 mg/mL.
4.7.1.3. Sequestro de radicais DPPH
Pode ser observado na tabela 4, a ação seqüestradora dose dependente
de concentrações variadas da F1,0 (0,08 – 5,0 mg/mL) sobre radicais DPPH
oscilando entre 4,49 ± 0,32% e 9,88 ± 0,09%, com EC50 de 37,46 mg/mL.
4.7.1.4. Sequestro de radicais superóxido
Conforme tabela 4, a F1,0 apresenta baixa atividade sequestradora dos
radicais superóxido dose dependente nas concentrações testadas (0,08 – 5,0
mg/mL), exibindo uma ação sequestradora que variava de 7,73 ± 0,41% a
15,39 ± 1,34%, com EC50 de 19,61 mg/mL.
Resultados 73
Tabela 5. Ensaios de atividade antioxidante
Ensaios de atividade antioxidante
Concentração da F1,0 (mg/mL)
Percentual de atividade (%)
Sequestro de radicais hidroxila
0,08 2,08 ± 0,72 0,16 3,75 ± 1,77 0,31 6,88 ± 0,88 0,63 15,00 ± 3,54 1,25 23,75 ± 1,77 2,5 26,88 ± 2,65 5,0 32,50 ± 1,77
Ação quelante do Fe+2
0,08 1,03 ± 0,09 0,16 1,25 ± 0,43 0,31 1,34± 0,06 0,63 1,42 ± 0,24 1,25 3,25 ± 0,54 2,5 3,46 ± 0,98 5,0 8,03 ± 0,13
Sequestro de radicais DPPH
0,08 4,49 ± 0,32 0,16 4,49 ± 1,30 0,31 4,89 ± 1,01 0,63 5,60 ± 1,44 1,25 5,98 ± 0,96 2,5 6,05 ± 0,26 5,0 9,88 ± 0,09
Sequestro de radicais superóxido
0,08 7,73 ± 0,41 0,16 7,44 ± 1,24 0,31 9,56 ± 1,34 0,63 10,21 ± 0,21 1,25 11,31 ± 0,72 2,5 12,11 ± 0,21 5,0 15,39 ± 1,34
Valores foram expressos por médias ± desvio padrão (n=3).
Resultados 74
4.7.1.5. Poder redutor
A Figura 17 mostra que o poder redutor da F1,0 foi dose dependente,
e quanto maior a concentração da fração maior foi a absorbância observada.
Pelo método estudado, na presença das concentrações testadas (0,08 – 5,0
mg/mL) da F1,0 a absorbância a 700 nm oscilou entre 0,031 e 0,145. O BHT,
antioxidante utilizado como padrão, a 4 mg/mL tem alta ação redutora com
absorbância de 0,790 (dados não mostrados). Utilizando a equação reta, foi
possível inferir que a concentração de F1,0 necessária para atingir a
absorbância de 0,790 foi de 33,4 mg/mL, mostrando o baixo poder redutor da
F1,0.
Figura 17. Poder redutor de concentrações diferentes da F1,0 de Hypnea musciformis.
Valores foram expressos por médias ± desvio padrão (n=3).
Resultados 75
4.7.1.6. Peroxidação lipídica
Pelo sistema de peroxidação lipídica induzida em gema de ovo, as
concentrações variadas (0,08 – 5,0 mg/mL) da F1,0 promoveram inibição em
cerca de 57,92% a 0,08 mg/mL, mostrando alto poder de inibição sobre o
método utilizado, no entanto atinge um platô, com inibição da peroxidação de
66,98% quando utilizada na concentração de 5 mg/mL, com IC50 de 0,0030
mg/mL, de acordo com a Figura 18 abaixo.
Figura 18. Inibição da peroxidação lipídica de concentrações diferentes da F1,0 de
Hypnea musciformis. Valores foram expressos por médias ± desvio padrão (n=3).
Resultados 76
4.7.1.7. Inibição de hemólise induzida por H2O2
A Figura 19 exibe a ação protetora da F1,0 sobre as hemácias humanas
no modelo de hemólise induzida por H2O2. As concentrações testadas (0,08 –
5,0 mg/mL) da F1,0 promoveram a inibição da hemólise variando entre 39,43 ±
4,93% (na concentração de 0,08 mg/mL) e 67,89 ± 0,70% a 5 mg/mL, e com
IC50 de 0,375 mg/mL. Esses dados mostram que a F1,0 apresentou alta ação
protetora da hemólise induzida por H2O2 quando comparado com o controle
positivo reativo (100% de hemólise).
Figura 19. Inibição da hemólise induzida por H2O2 promovida pela F1,0 de H.
musciformis. Valores foram expressos por médias ± desvio padrão (n=3).
Resultados 77
4.7.2. Avaliação da ação citotóxica da F1,0 sobre hemácias de grupos
sanguíneos ABO e Rh positivo e negativo
Pelo método utilizado, podemos verificar que a F1,0 não apresentou
ação citotóxica sobre as hemácias, uma vez que nas massas testadas (50, 100
e 150 µg) da F1,0, não foi detectada hemólise significativa nas hemácias de
diferentes grupos sanguíneos ABO (A+, B+, AB+ e O+) e Rh (A+ e A-).
Demonstrou assim, maior ação citotóxica com 0,57 ± 0,033% de hemólise
sobre hemácias A- tratadas com 50 µg de F1,0 por 6 h. O menor percentual de
hemólise (0,035 ± 0,00%) provocado pela F1,0 foi visualizado quando as
hemácias AB+ foram incubadas com 50 µg da fração por 1 h.
Não foram encontradas diferenças estatisticamente significantes
(p>0,05) entre as hemácias dos grupos Rh positivo e negativo entre todas as
massas testadas da F1,0 (50, 100 e 150 µg), quando foi avaliado o mesmo
tempo de incubação (1h ou 6 h) . Isto demonstra que não existe influência do
fator Rh na ação que a F1,0 exerce sobre as hemácias. Também, não foram
detectadas diferenças estatisticamente significativas entre as hemácias dos
grupos B+, AB+ e O+ (p>0,05). Porém, a F1,0 promove hemólise
estatisticamente diferente (p<0,05) sobre hemácias do grupo A+ quando
comparada com o percentual de hemólise provocado pela fração em estudo
sobre as hemácias dos outros grupos ABO testados (B+, AB+ e O+). Assim,
F1,0 não provocou danos significativos nas membranas de hemácias dos
grupos sanguíneos ABO e Rh como pode ser visualizado na Figura 20.
Resultados 78
Figura 20. Ação citotóxica da F1,0 de H. musciformis sobre eritrócitos de diferentes
grupos sanguíneos ABO e Rh positivo e negativo. (A) Hemólise direta em eritrócitos A+ e
A-. Não há diferença estatisticamente significante entre os grupos Rh positivo e negativo
(p>0,05). (B) Hemólise direta em eritrócitos de grupos sanguíneos A+, B+, AB+ e O+ incubados
por 1 hora com 50 μg de F1,0. Não há diferença estatisticamente significante entre os
eritrócitos B+, AB+ e O+. ( ) p> 0,05; (*)=p<0,05. Valores foram expressos por médias ± desvio
padrão (n=3).
Resultados 79
4.7.3. Atividade anticoagulante
4.7.3.1. Tempo de tromboplastina parcial ativada e tempo de protrombina
Os resultados obtidos pelo ensaio de tempo de tromboplastina parcial
ativada, conforme Figura 21, demonstraram que a F1,0 apresentou atividade
anticoagulante (p<0,001) quando comparada com o controle negativo (30 s).
As diferentes massas testadas (5, 10, 25, 50, 100, 150, 200, 250, 350 µg)
causaram aumento no tempo para a formação do coágulo, com exceção das
massas de 5 e 10 µg de F1,0 nas quais não foi visualizado diferença
estatisticamente significante no tempo de formação do coágulo comparando-se
com o controle (p>0,05).
Figura 21. Tempo de tromboplastina ativada de pool de plasma tratado com F1,0 em
diferentes massas. Nível de significância em relação ao controle: ( ) p>0,05; (***)
p<0,001.Valores foram expressos por médias ± desvio padrão (n=3).
Resultados 80
Os resultados adquiridos no ensaio de tempo de protrombina
demonstraram que todas as massas testadas (50, 75, 100, 150, 200 µg) da
F1,0 apresentaram menor tempo de formação do coágulo em relação ao grupo
controle (p< 0,05), de acordo com a Figura 22. No entanto, não há diferença
estatisticamente significante entre as massas testadas (p>0,05), quando
comparadas entre si.
Figura 22. Tempo de protrombina de pool de plasma tratado com F1,0 em diferentes
massas. Nível de significância em relação ao controle: (*) p<0,05; (**) p<0,01. Valores foram
expressos por médias ± desvio padrão (n=3).
Resultados 81
4.7.3.2. Ensaios de atividade de fatores da coagulação
4.7.3.2.1. Ensaio de atividade da trombina
Utilizando-se o ensaio do substrato cromogênico da trombina, pode-se
observar que a F1,0 de H. musciformis quando utilizada a massa de 150, 250 e
350 µg mostrou ação inibitória sobre a atividade enzimática da trombina de
cerca de 40,00 ± 2,26%, 50,67 ± 2,64% e 45,73 ± 6,60%, respectivamente,
conforme tabela 6. Assim, a trombina exibiu atividade enzimática remanescente
de 60,00 ± 2,26%, 49,33 ± 2,64% e 54,27 ± 6,60% para 150, 250 e 350 µg de
F1,0, respectivamente. Não há diferença estatisticamente significante (p>0,05)
entre as massas testadas, comparando-se entre elas. Esse resultado mostrou
que a F1,0 apresentou moderada ação inibitória sobre a trombina.
Tabela 6. Ensaio do substrato cromogênico da trombina. Atividade inibitória da F1,0 sobre
a atividade enzimática da trombina. Valores foram expressos por médias ± desvio padrão
(n=3). Nível de significância em relação ao controle (100% de atividade enzimática).
F1,0 (μg) Inibição da atividade enzimática da trombina (%)
Nível de significância
0 0,00 ± 0,00 -
150 40,00 ± 2,26 p<0,01
250 50,67 ± 2,64 p<0,001
350 45,73 ± 6,60 p<0,001
Resultados 82
4.7.3.2.2. Ensaio de atividade do FXa
Utilizando o ensaio do substrato cromogênico do FXa, podemos
observar que F1,0 de H. musciformis quando utilizada a massa de 150, 250 e
350 µg mostrou ação estimulatória de 8,51%, 4,93% e 9,70% sobre a atividade
enzimática do FXa, respectivamente, uma vez que o FXa mostrou atividade
enzimática de 108,51 ± 1,48%, 104,93 ± 3,17% e 109,70 ± 3,59%,
respectivamente, conforme tabela 7. Não há diferença entre a massa de 150 µg
e as massas de 250 e 350 µg (p>0,05). No entanto, as massas de 250 e 350
µg apresentaram diferenças de atividade (p<0,05).
Tabela 7. Ensaio do substrato cromogênico do FXa. Atividade estimulatória da F1,0 sobre a
atividade enzimática do FXa. Valores foram expressos por médias ± desvio padrão (n=3). Nível
de significância em relação ao controle (100% de atividade enzimática).
F1,0 (μg) Atividade enzimática do FXa (%)
Nível de significância
0 100,00 ± 0,00 -
150 108,51 ± 1,48 p<0,01
250 104,93 ± 3,17 p<0,05
350 109,70 ± 3,59 p<0,001
Resultados 83
4.7.4. Investigação da atividade estimulatória da F1,0 extraída de H.
musciformis sobre a síntese de heparam sulfato antitrombótico por
células endoteliais da aorta de coelho (RAEC)
As investigações sobre a influência da F1,0 na síntese de heparam
sulfato e condroitim sulfato pelas células endoteliais da aorta de coelho (RAEC)
demonstraram que a F1,0 causou aumento na quantidade de heparam sulfato
liberada no meio pelas células endoteliais quando comparadas ao grupo
controle de células não tratadas com F1,0 (p<0,001). Isto pode ser verificado
pela forte estimulação na produção e liberação de heparam sulfato para o meio
sendo de 4,6 vezes maior que o expresso pelo controle (células não tratadas
com F1,0), conforme mostra a Figura 23A.
As células endoteliais, às quais foram adicionadas F1,0, apresentaram
menor quantidade de heparam sulfato em seu interior quando comparadas com
o controle de células não tratadas com F1,0 (p<0,001), como pode ser
visualizado na Figura 23B. O perfil das células endoteliais utilizadas no estudo
quanto a presença de glicosaminoglicanos mostrou que, as células não
tratadas com F1,0 exibiram uma maior quantidade de heparam sulfato no seu
interior quando comparado com o meio em que se encontravam. Inversamente,
as células endoteliais tratadas com F1,0 mostraram quantidades superiores de
heparam sulfato, encontrando-se este no meio celular.
A F1,0 rica em galactanas sulfatadas não apresentou ação estimulatória
sobre a síntese de condroitim sulfato quando foi avaliada a quantidade deste
glicosaminoglicano no interior das células e no meio, sem diferença em relação
ao controle com p>0,05 (Figura 23A e 23B).
Resultados 84
Figura 23. Ação da F1,0 rica em galactanas sulfatadas da alga Hypnea musciformis na
síntese de glicosaminogicanos sulfatados pelas células endoteliais da aorta de coelho
(RAEC). Células RAEC foram tratadas com 100 μg/mL da F1,0 na presença de 150 μCi/mL de
[35
S]-sulfato de sódio e mantidas por 22 h a 37ºC sob tensão de 2,5% de CO2. (A) Efeito de
F1,0 na síntese de glicosaminogicanos sulfatados pelas células endoteliais e liberados no
meio. (B) Efeito de F1,0 na síntese de glicosaminogicanos sulfatados presente no interior das
células endoteliais. HS – heparam sulfato; CS – condroitim sulfato. Nível de significância em
relação ao controle: ( ) p> 0,05; (***) p<0,001. Valores foram expressos por médias ± desvio
padrão (n=3).
Resultados 85
4.7.5. Ação da F1,0 na proliferação celular (Ensaio de MTT)
A F1,0 mostrou ação antiproliferativa sob as células endoteliais da aorta
de coelho (RAEC), quando estas células foram tratadas por 24 horas com 25,
50 e 100 µg, exibindo inibição da proliferação celular de 33,06 ± 2,51%, 32,26±
2,41% e 29,81± 6,37% respectivamente (Figura 24), e com EC50 de 132,2 µg.
Não existe diferença estatisticamente significante entre as concentrações
testadas (p>0,05).
Figura 24. Efeito da F1,0 isolada de H. musciformis na proliferação de células endoteliais
da aorta de coelho (RAEC). Células RAEC tratadas com 25, 50 e 100 µg de F1,0 por 24
horas. Nível de significância em relação ao controle: (***) p<0,001. Valores são médias ±
desvio padrão (n=3).
Resultados 86
4.7.6. Ensaio de Anexina V/ PI e distribuição do ciclo celular em células
endoteliais da aorta de coelho (RAEC)
As figuras 25 e 26 mostram os resultados obtidos da análise por
citometria de fluxo das células RAEC tratadas e não tratadas com F1,0 para
marcação de anexina V e PI. Utilizando esta metodologia é possível afirmar
que as células viáveis apresentam marcação anexina V (-) e PI (-), células em
apoptose precoce são anexina V (+) e PI (-), células em apoptose tardia são
anexina V (+) e PI (+) e células necróticas exibem marcação anexina V (-) e PI
(+) (ZHAO et al., 2009). As células tratadas com a F1,0 apresentaram
marcação similar às células do grupo controle não tratadas com F1,0, com
pequena diferença não estatisticamente significante (p>0,05), indicando que a
F1,0 rica em galactanas sulfatadas de H. musciformis não provoca morte
celular por apoptose ou necrose.
Resultados 87
Figura 25. Análise de citometria de fluxo com dupla marcação para anexina V-FITC e PI
em células endoteliais da aorta de coelho (RAEC). As células foram tratadas com 100 µg de
F1,0 por 24 horas. (A) e (B): controle negativo (sem tratamento com F1,0); (C) e (D): células
tratadas com 100 µg de F1,0 por 24 horas. Quadrante superior esquerdo: marcação negativa
para anexina V-FITC e positiva para PI (células não viáveis – necrose); quadrante superior
direito: marcação positiva para anexina V-FITC e PI (células não viáveis – apoptose tardia);
quadrante inferior esquerdo: marcação negativa para anexina V-FITC e PI (células viáveis);
quadrante inferior direito: marcação positiva para anexina V-FITC e negativa para PI (células
não viáveis – apoptose precoce).
Resultados 88
Figura 26. Padrão de viabilidade das células endoteliais da aorta de coelho avaliada por
citometria de fluxo. Células não tratadas: sem tratamento com F1,0; Células tratadas com 100
µg de F1,0 por 24 horas. Células viáveis: marcação negativa para anexina V-FITC e PI; Células
não viáveis: marcação positiva para anexina V-FITC e negativa para PI (células em apoptose
precoce); marcação negativa para anexina V-FITC e positiva para PI (células em necrose);
marcação positiva para anexina V-FITC e PI (células em apoptose tardia). ( ) p>0,05 em
relação ao grupo de células não tratadas. Valores foram expressos por médias ± desvio padrão
(n=2).
Resultados 89
A análise da influência da F1,0 na progressão do ciclo celular das
células RAEC tratadas por 24 h avaliada por citometria de fluxo mostrou que a
fração estudada de H. musciformis promoveu alteração na proporção de
células em algumas fases do ciclo celular. A Tabela 8 e Figura 27 mostra que a
proporção das células não tratadas com F1,0 em cada fase do ciclo celular se
referem a G1: 83,79 ± 0,00%; G2: 7,81 ± 0,00%; S: 8,41 ± 0,00%; G2/G1: 2,00
± 0,00%; enquanto que as células tratadas com F1,0 apresentaram distribuição
de G1: 64,47 ± 3,68%; G2: 5,06 ± 1,48%; S: 30,48 ± 2,21%; G2/G1: 2,00 ±
0,00%. Assim, podemos demonstrar que a F1,0 causou aumento no número de
células que se encontram na fase S do ciclo, uma vez que 8,41% das células
não tratadas com F1,0 foram detectadas na fase S do ciclo celular enquanto
que 30,48% das células estavam nesta fase após o tratamento com F1,0,
impedindo a progressão do ciclo celular da fase S para fase G2. Há também
uma diminuição na proporção de células tratadas com F1,0 nas fases G1 e G2
quando comparado com as células do grupo controle não tratadas.
Figura 27. Análise da distribuição no ciclo celular das células endoteliais da aorta de
coelho (RAEC). (A): distribuição do ciclo celular das células não tratadas com F1,0 (células
controle); (B): distribuição do ciclo celular das células tratadas com 100 µg de F1,0 por 24
horas.
Resultados 90
Tabela 8. Distribuição das células endoteliais da aorta de coelho (RAEC) no ciclo celular.
Células endoteliais da aorta de coelho tratadas ou não tratadas com 100 µg de F1,0 por 24
horas. Valores foram expressos por média (n=2). Fases do ciclo celular - G1: gap 1; G2: gap 2;
S: fase de síntese.
Fase do ciclo
celular
Células não tratadas
com F1,0 (%)
Células tratadas com
F1,0 (%)
G1 83,79 ± 0,00 64,47 ± 3,68
G2 7,81 ± 0,00 5,06 ± 1,48
S 8,41 ± 0,00 30,48 ± 2,21
G2/G1 2,00 ± 0,00 2,00 ± 0,00
Discussão....91
5. DISCUSSÃO
No presente estudo, a F1,0 rica em galactanas sulfatadas foi extraída da
alga vermelha Hypnea musciformis por precipitação em diferentes
concentrações de acetona, e submetidas de forma prévia a delipidação e
proteólise para a remoção de contaminantes. As análises químicas da F1,0 (1v
de acetona) apresentaram carboidratos da ordem de 49,70 ± 0,10%, altos
teores de sulfatos (44,59 ± 0,015%) e baixa contaminação protéica (0,92 ±
0,001%). Aziza et al., (2008), em um estudo realizado com carragenanas de
Hypnea musciformis da costa Atlântica do Marrocos, e extraídas de acordo
com método adaptado de Craigie e Leigh, (1978) observaram que a fração
polissacarídica obtida desta alga com 3 v de isopropanol continha 67,7% de
açúcares totais e 17% de sulfato, determinado por cromatografia de gás –
líquido (GLC).
O teor de sulfato da fração 1,0 (F1,0) observada neste estudo (44,59 ±
0,015%) é diferente dos encontrados por Saito e Oliveira (1990), que relataram
baixos teores de sulfato na mesma espécie de alga. Os níveis de sulfato
encontrados para carragenanas comerciais citados por Souza et al., (2007)
para lambda, iota e kappa foram respectivamente 33,38 ± 0,06%, 27,60 ±
0,12% e 17,90 ± 0,05%. Adicionalmente, os dados obtidos por De Ruiter e
Rudolph, (1997) também mostraram conteúdos de sulfato variando de acordo
com o tipo da carragenana (lamba: 38%, iota: 32%, e kappa: 22%). Tais
estudos demonstraram que a carragenana kappa exibiu menor grau de
sulfatação em relação às demais. Sabe-se que variações nestas análises
químicas seriam decorrentes de diferenças existentes entre espécies de algas,
lotes e forma de extração (DE RUITER, RUDOLPH, 1997).
A cromatografia descendente em papel observada nos mostrou que a
F1,0 seria composta de galactose. A espectroscopia de infravermelho
confirmou estes dados demonstrando sinais indicando que F1,0 apresentou
absorções características da presença de ésteres de sulfato em 1262 cm-1 (HU
et al., 2010). Tais dados foram confirmados pelo método de Dodgson, Price,
(1962) indicando a presença de sulfato no polímero. Sinais em 1074 e 930 cm-1
foram referentes à ligação C-O da 3,6-anidrogalactose (PEREIRA et al., 2009),
Discussão....92
o que demonstrou a presença de galactanas sulfatadas, tipo carragenanas, na
fração estudada.
Estudos de Silva et al., (2010) com carragenanas comerciais, mostraram
que o espectro de infravermelho da carragenana kappa exibiu sinais a 1250
cm-1 correspondendo a grupos de ésteres de sulfato. Sinais encontrados em
930 cm-1 corresponderiam a 3,6-anidrogalactose e 845 cm-1 referentes a
galactose-4-sulfato também foram detectados por esse espectro, mostrando
sinais similares ao espectro de infravermelho da F1,0 rica em galactanas
sulfatadas de H. musciformis. Estudos de Aziza et al., (2008) afirmaram que
carragenanas extraídas de H. musciformis exibiram espectro de infravermelho
semelhante ao espectro de carragenanas kappa. Todos esses dados nos
levam acreditar que a F1,0, extraída em nosso estudo, seja constituída por
carragenana kappa.
A cromatografia de gel filtração mostrou que a F1,0 exibiu duas
populações polissacarídicas de massas moleculares aproximadas (> 150 kDa e
147 kDa). A existência de proteínas e pigmentos, em baixo níveis, associados
a F1,0 foram observadas. A espectroscopia de infravermelho confirmou estes
dados demonstrando um sinal relacionado ao grupo amida característico de
proteínas (KONG, YU, 2007).
A eficiência de um agente antioxidante é determinada pela sua estrutura
química e pode variar de acordo com a concentração, temperatura, tipo de
substrato, oxidação e estado físico do meio do sistema. Além da presença de
agentes que funcionariam como antagonistas ou em sinergia (YANISHLIEVA-
MASLAROVA, 2001).
Algumas pesquisas têm sugerido uma relação entre atividades
antioxidantes, massa molecular e o grau de sulfatação de polissacarídeos
sulfatados de algas (ZHAO et al., 2004; QI et al., 2005). Esta correlação foi
observada por Tannin-Spitz et al., (2005), estudando polissacarídeos de
Porphyridium, os quais mostraram que as frações de polissacarídeos com
maior teor de sulfato (4,5%) apresentavam atividade antioxidante 20% superior
a outro grupo de polissacarídeos que possuíam 3% de sulfato, quando avaliada
pelo método de FOX (WOLF, 1994). No entanto, neste mesmo estudo, a
carragenana lambda (10 mg/mL) com grau de sulfatação de cerca de 40%
Discussão....93
mostrou baixo efeito antioxidante (30% de inibição) quando comparado com os
polissacarídeos de Porphyridium na mesma concentração (10 mg/mL) que
exibiram ação antioxidante de cerca de 90% de inibição.
A F1,0 rica em galactanas sulfatadas de Hypnea musciformis apresentou
duas populações de polissacarídeos que juntas exibem alto grau de sulfatação,
ainda, não podemos afirmar qual população é a mais sulfatada e qual delas
encontra-se em maior concentração. Uma vez que não podemos correlacionar
o conteúdo de sulfato da F1,0 com sua ação antioxidante. Existe portanto, a
necessidade de mais estudos para esclarecer a relação entre o conteúdo de
sulfato com a sua ação antioxidante. A fração 1,0 (F1,0) mostrou alta massa
molecular com duas populações, uma de 147 kDa e a outra >150 kDa.
Carragenanas comerciais possuem estruturas de alta massa molecular
variando de 100 a 1000 kDa (VAN DE VELDE et al., 2002).
A remoção de radicais hidroxilas é muito importante para a defesa
antioxidante em células e em sistemas alimentares (ARUOMA, 1998). Os
compostos podem apresentar mecanismos antioxidantes diferentes em relação
aos radicais hidroxilas, suprimindo a geração desses radicais ou seqüestrando
os radicais já gerados (UEDA et al., 1996). A geração destes radicais ocorreria
pela reação do Fe+2 e H2O2. Estudos mostraram que o grupo sulfato dos
polissacarídeos poderia reduzir a formação de radicais hidroxilas pela ação
quelante de Fe+2 (ZOU et al., 2008). Uma vez que os íons metálicos participam
da geração dos radicais hidroxilas, os agentes quelantes de íons promoveriam
a inibição da geração destes radicais (UEDA et al., 1996). No presente estudo,
encontramos resultados diferentes dos encontrados por Zou et al., (2008) pois
a fração F1,0 (5 mg/mL) rica em sulfato apresentou moderada ação
antioxidante sobre radicais hidroxila promovendo o seu seqüestro em 32,50% e
baixa ação quelante de Fe+2 (8,03%), quando utilizada na mesma concentração
(ver Tabela 4). A F1,0 (1,5 mg/mL) mostrou atividade quelante de ferro de
cerca de 3,25%, sendo inferior à atividade de uma fração da alga vermelha
Gracilaria caudata precipitada com 2 volumes de etanol, que exibiu ação
quelante de cerca de 40,2% quando avaliada pela mesma metodologia e
utilizada na mesma concentração (COSTA et al., 2010).
Discussão....94
A atividade antioxidante de um dado composto é expressa como
habilidade de seqüestrar o radical livre 2,2-difenil-1-picrilhidrazil (DPPH)
(WANG et al., 2010). Em nosso estudo, a F1,0 apresentou baixa ação
antioxidante sobre radicais DPPH, na concentração de 2,5 mg/mL promovendo
6,05±0,26% de atividade sequestradora sobre esses radicais. Yangthong,
Hutadilok-Towatana, Phromkunthong, (2009) estudando extratos aquosos de 4
algas marinhas comestíveis do sudeste da Tailândia, mostram que em relação
à atividade seqüestradora de radicais DPPH, o extrato aquoso da alga verde
Ulva lactuca exibiu EC50 de 103,73±0,59 mg/mL, sendo este 2,8 vezes superior
ao EC50 da F1,0 (37,5 mg/mL). A F1,0 exibiu baixa ação antioxidante pelo método de seqüestro de
radicais superóxidos, com atividade seqüestradora de 15,39% na concentração
de 5 mg/mL. Estudos de Liu et al., (2007) mostram que polissacarídeos
purificados da alga vermelha Porphyra yezoensis exibem ação seqüestradora
de radicais superóxidos cerca de 80% quando utilizado na concentração de
160 µg/mL.
O poder redutor apresentado por um composto pode funcionar como um
indicador do seu potencial antioxidante (SUN et al., 2009). Podemos observar
que a F1,0 de H. musciformis nas concentrações testadas apresentou baixo
poder redutor quando comparado ao BHT (0,790). No entanto, a F1,0 a 2,5
mg/mL mostrou poder redutor (0,080) similar à fração polissacarídica F2
extraída de Laminaria japonica eluída de coluna de cromatografia quando
utilizada na mesma concentração (WANG et al., 2008) e poder redutor inferior
quando comparada a um extrato aquoso-quente proveniente da alga
Sargassum hemiphyllum, que na concentração de 1 mg/mL exibiu absorbância
de cerca de 1,2 a 700 nm (HWANG et al., 2010).
Em nosso estudo, podemos observar que a F1,0 exibiu forte ação
inibitória sobre a peroxidação lipídica induzida em gema de ovo, pois na
concentração de 0,08 mg/mL promoveu inibição de 57,92% da peroxidação,
com IC50 de 0,003 mg/mL. Estudos de Sun et al., (2009) avaliando a atividade
antioxidante de polissacarídeos purificados do fungo marinho Penicillium sp.
F23-2 mostraram que os polissacarídeos PS1-1, PS1-2 e PS2-1 a 0,8 mg/mL,
em uma concentração 10 vezes maior que a F1,0 de H.musciformis, exibem
Discussão....95
ação inibitória da peroxidação lipídica induzida em gema de ovo similar a F1,0
(42,32%, 53,58% e 64,70%, respectivamente). Entretanto, neste mesmo de
Sun et al., (2009) o BHT, um conhecido agente antioxidante, na concentração
de 0,8 mg/mL mostrou inibição da peroxidação de 81,32%, ou seja, de cerca de
23,40% superior a inibição provocada pela F1,0 quando utilizada a 0,08 mg/mL
(concentração 10 vezes inferior).
A alga vermelha Hypnea musciformis poderia ter grande importância na
indústria alimentícia, pois como é rica em galactanas sulfatadas (carragenanas)
que além de possuírem propriedades texturizantes, espessantes, gelificantes e
estabilizantes para os alimentos, exibem ação protetora contra a peroxidação
lipídica. Isto é uma questão preocupante na indústria de alimentos onde os
fabricantes minimizam a oxidação de alimentos contendo lipídios pelo uso de
antioxidantes durante o processo de produção (ARUOMA, 1998). As espécies
reativas de oxigênio são as causas predominantes de decaimento na qualidade
de alimentos, gerando rancidez, toxicidade e destruição de biomoléculas
importantes no metabolismo fisiológico (HEO et al., 2005).
A exposição das hemácias aos ROS pode causar peroxidação lipídica,
dano a proteínas e hemólise (SROUR, BILTO, JUMA, 2000). O peróxido de
hidrogênio é uma espécie reativa de oxigênio que apresenta relativamente alta
estabilidade, difusão e envolvimento em cascatas de sinalização, e por isso é
considerado como um atrativo modelo oxidante (UGARTONDO et al., 2009), de
forma que consegue atravessar membranas e oxidar um grande número de
compostos (ARUOMA, 1998). A hemólise induzida por H2O2 é um processo no
qual o H2O2 reage com o Fe+2 nos eritrócitos formando radical hidroxila, este
que substancialmente promove a hemólise. Podemos observar que a F1,0 de
H. musciformis mostrou alta ação inibitória da hemólise induzida por H2O2 em
hemácias humanas atingindo o IC50 na concentração de 0,3750 mg/mL.
Zhang et al., (2003) mostraram que frações de polissacarídeos
sulfatados da alga Porphyra haitanensis apresentaram ação protetora contra a
hemólise induzida por H202 em eritrócitos de ratos inferior a da F1,0 de H.
musciformis, em hemácias humanas, causando inibição de cerca de 30% da
hemólise quando as frações foram utilizadas a aproximadamente 8 mg/mL.
Discussão....96
Além desta ação protetora sobre a hemólise induzida por H2O2, a F1,0
não apresentou qualquer ação danosa significativa sobre a membrana dos
eritrócitos humanos dos diferentes grupos sanguíneos ABO e Rh positivo e
negativo, uma vez que pelos ensaios de atividade hemolítica direta, não foi
visualizada atividade hemolítica significativa da F1,0 sobre as hemácias
humanas. A hemólise direta se refere à hemólise causada diretamente por um
dado composto sem qualquer participação do sistema complemento (CHAVES-
MOREIRA et al., 2009).
A ação citotóxica direta sobre a membrana das hemácias foi mais
pronunciada (0,57 ± 0,033%) quando as hemácias A- foram tratadas com a
menor massa da F1,0 (50 µg) por 6 h, enquanto que o menor percentual de
hemólise (0,035 ± 0,00%) foi detectado quando as hemácias AB+ foram
tratadas com mesma massa (50 µg) por 1 h, o que pode ser visualizado pelo
fato de existir diferença estatisticamente significante entre a ação da F1,0 sobre
a membrana de hemácias dos grupos ABO acima citados. Esta diferença pode
ser explicada pela constituição monossacarídica diferente dos grupos
sanguíneos ABO, em que o antígeno A apresenta na extremidade da sua
estrutura a N-acetilgalactosamina (ZAGO, FALCÃO, PASQUINI, 2004), que
poderia provocar uma maior interação entre suas cargas positivas com as
cargas negativas da F1,0.
A teoria do paradoxo polar ilustra o comportamento paradoxal de
agentes antioxidantes em diferentes meios, na qual os antioxidantes polares
são mais efetivos em meios menos polares como bulk oils, enquanto que
antioxidantes não polares são mais efetivos em meios relativamente mais
polares como emulsões de óleo em água ou lipossomas (PORTER, 1993). Os
antioxidantes adicionados a uma emulsão e a bulk oils exibem diferentes
eficiências devido à natureza física diferente desses dois sistemas (FRANKEL,
2001). Emulsões óleo em água consistem em três partes: gotas lipídicas, uma
fase aquosa contínua e a interface óleo-água. Os componentes lipídicos e não
lipídicos adicionados a uma emulsão se encontram em uma parte em particular
de acordo com a sua solubilidade e superfície de atividade, estas que são
determinadas pela estrutura química e polaridade do composto (CHAIYASIT et
al., 2007).
Discussão....97
Antioxidantes não polares apresentam alta eficiência em emulsões
devido a sua grande afinidade a interface óleo-água, formado uma membrana
protetora ao redor da gota lipídica, enquanto que antioxidantes polares são
predominantemente dissolvidos na fase aquosa da emulsão (FRANKEL et al.,
1994; COUPLAND, MCCLEMENTS, 1996). Os nossos dados não corroboram
com a teoria do paradoxo polar, uma vez que a F1,0 apresentou polaridade
devido à presença do sulfato na fração, e exibiu ação antioxidante pelo sistema
da peroxidação lipídica induzida em gema de ovo, o que consiste em uma
suspensão de fosfolipídios em tampão PBS.
Segundo a teoria do paradoxo polar, os antioxidantes de diferentes
polaridades apresentam comportamento diferente frente aos diferentes meios
lipídicos, o que pode nos levar a imaginar que assim como em meios lipídicos,
os agentes antioxidantes possam apresentar tal atividade variável em meios
aquosos de acordo com as condições do sistema em que se encontram,
podendo estas condições ser favoráveis ou desfavoráveis para a eficiência
deste agente. Isto pode explicar porque F1,0 de H. musciformis apresentou
ação antioxidante variável de acordo com o sistema in vitro utilizado.
Com relação à atividade anticoagulante, as galactanas sulfatadas
fornecem grande vantagem como alternativa para terapia anticoagulante
realizada com a heparina (FAREED, HOPPENSTEADT, BICK, 2000).
Entretanto, nem todos os polissacarídeos sulfatados mostram ação
anticoagulante, e a ação antitrombótica exibida por estes polissacarídeos é
importante uma vez que causa inibição indireta na formação do trombo, como
observado por Rocha et al., (2005), estudando uma galactofucana de
Spatoglossum schroederi.
Estudos dos mecanismos envolvidos na atividade anticoagulante das
galactanas sulfatadas e fucanas, realizados por Melo et al., (2004), com a alga
vermelha Botryocladia occidentalis e invertebrados como Echinometra lucunter,
Herdmania monus e Strongylocentrotus franascanus, mostraram que
exigências estruturais para a interação de galactanas sulfatadas com inibidores
da coagulação e proteases alvos não são, simplesmente, uma conseqüência
da densidade de carga e do conteúdo de sulfato, mas que estas conferem
esteroespecíficidade às mesmas. A base estrutural da interação é complexa
Discussão....98
porque envolve polissacarídeos heterogêneos, mas depende da distribuição de
grupos sulfato no polímero e da composição monossacarídica. As galactanas
sulfatadas possuem cadeias significativamente mais longas que a heparina
para realizar a atividade anticoagulante. Por outro lado, galactanas sulfatadas e
a heparina se ligam em lugares diferentes na antitrombina e são menos
efetivas na promoção da ativação conformacional da antitrombina quando
comparada com a heparina.
Rodrigues et al., (2009), estudando a alga vermelha Halymenia
pseudofloresia, demonstraram que seus polissacarídeos sulfatados
apresentaram surpreendentemente efeito na coagulação 4,6 vezes mais
potente que o padrão de heparina , interferindo na via intrínseca ou comum da
coagulação.
A ação anticoagulante da F1,0 de Hypnea musciformis no ensaio de
tempo de tromboplastina parcial ativada (aPTT) estaria corroborando com o
estudo de Rodrigues et al., (2009), no qual galactanas sulfatadas de algas
vermelhas apresentaram atividade anticoagulante sobre a via intrínseca e
comum da coagulação. Observamos ainda, que a F1,0 possui alto conteúdo de
sulfato, demonstrando baixa atividade anticoagulante, estando de acordo com
estudos de Melo et al., (2004) que afirmam que a ação anticoagulante não é
apenas uma consequência da densidade de carga e do conteúdo de sulfato.
Estudos anteriores feitos em nosso laboratório mostraram que heparinas
comerciais (heparina padrão – liquemine e heparina de baixo peso molecular -
enoxeparina) apresentaram tempo de tromboplastina parcial ativada (aPTT) de
>240 s com 5 µg para a enoxeparina (dados não mostrados). Esses dados
demonstraram que a baixa atividade anticoagulante da F1,0 nas concentrações
testadas sobre a via intrínseca e comum da coagulação. Entretanto a heparina,
um glicosaminoglicano obtido de origem animal, apresenta riscos à saúde
humana, conforme citado por Nader et al., (2001).
Os inibidores diretos da trombina e do FXa exercem sua inibição sobre
serino proteases individuais, e oferecem uma metodologia avançada para
profilaxia e tratamento da trombose, uma vez que esses inibidores diretos tem
como alvo produtos finais da cascata de coagulação (ANSELL, 2007; WEITZ,
2007). Segundo Pereira, Mulloy e Mourão, (1999), os polissacarídeos
Discussão....99
sulfatados de algas poderiam apresentar ação inibitória direta sobre os fatores
da coagulação, e não somente, uma ação inibitória indireta através da
antitrombina ou do cofator de heparina II. Este mesmo estudo sugere que esta
inibição direta pelas fucanas sulfatadas não é dependente da massa molecular,
uma vez que os polissacarídeos obtidos das espécies de Laminaria brasiliensis
e Fucus vesiculosus diferem na massa molecular e ambos são inibidores
diretos da trombina.
Podemos observar que a F1,0 promoveu moderada inibição direta da
atividade enzimática da trombina causando também baixa estimulação da
atividade enzimática do FXa. A atividade anticoagulante da F1,0 determinada
pelo teste aPTT, que avalia a influência dos compostos testes nos fatores nas
vias intrínseca e comum da coagulação pode ser devido à moderada ação
inibitória direta provocada pela fração estudada sobre a atividade enzimática da
trombina.
Estudos de Farias et al., (2000) mostraram que frações F2 e F3 de
galactanas sulfatadas extraídas da alga vermelha Botryocladia occidentalis
exibem potente atividade anticoagulante devido à inibição aumentada da
trombina (IIa) e do FXa provocada pela antitrombina e cofator II da heparina.
Entretanto, a F1,0 mostrou tempo menor para a formação do coágulo no
teste de tempo de protrombina (PT) quando comparado ao controle (ausência
de F1,0), o que pode ser explicado pelo fato da F1,0 promover baixa
estimulação da atividade enzimática do FXa, enzima que compõe a via comum
da coagulação, e que por esta razão levaria a diminuição do tempo de
formação do coágulo detectado por este teste, que avalia a via extrínseca e
comum da coagulação. Porém há a necessidade de mais estudos que
comprovem tal hipótese.
Os nossos dados quanto à influência da F1,0 na atividade enzimática da
trombina e do FXa estão de acordo com estudo de Farias, (2011) mostrando
que galactanas sulfatadas extraídas da alga verde Codium isthmocladum
exibem ação inibitória sobre a trombina e ação estimulatória sobre a atividade
enzimática do FXa, quando avaliada em sistema purificado pelo método do
substrato cromogênico na presença de antitrombina, mostrando que galactanas
Discussão....100
sulfatadas podem interagir diretamente com a trombina e FXa, e/ ou com a
antitrombina.
Estudos mostraram que a heparina previne a trombose devido a sua
atividade anticoagulante e ação indutora da síntese de heparam sulfato
antitrombótico pelas células endoteliais, ou seja, pela sua atividade
antitrombótica, sendo muito difícil distinguir esses dois efeitos (ROCHA et al.,
2005). Estudos de Leite et al., (1998), com uma xilofucoglucuronana da alga
marrom Spatoglossum schroederi, mostraram que este polissacarídeo
promoveu estimulação de cerca de 2,7 vezes na produção e liberação do
heparam sulfato para o meio, sendo esta ação comparável a atividade
estimulatória provocada pela heparina, neste mesmo estudo.
A F1,0 rica em galactanas sulfatadas de H. musciformis apresentou
ação estimulatória na síntese de heparam sulfato antitrombótico, induzindo um
aumento na síntese e liberação deste glicosaminoglicano para o meio pelas
células endoteliais da aorta de coelho em cultura tratadas com F1,0.
Observou-se que a F1,0 não causou estimulação na síntese de condroitim
sulfato pelas células endoteliais. Esses resultados corroboram com os dados
de Leite et al., (1998) e Rocha et al., (2005), uma vez que a fração estimulou a
produção de heparam sulfato e não causou qualquer efeito estimulatório sobre
a produção de condroitim sulfato. A heparina tem também, ação estimulatória
sobre a síntese de heparam sulfato sem apresentar qualquer efeito
estimulatório sobre a síntese de condroitim sulfato.
Nader et al., (2001), avaliando a ação estimulatória de vários agentes
antitrombóticos sobre a síntese de heparam sulfato antitrombótico pelas células
endoteliais em cultura, mostraram que a heparina quando é N-dessulfatada
perde completamente sua ação estimulatória sobre a síntese de heparam
sulfato. Este dado sugere que o sulfato possa ter importância na atividade
estimulatória da síntese de heparam sulfato pelas células endoteliais, o que
poderia explicar a forte atividade estimulatória provocada pela F1,0 (4,6 vezes),
a qual apresenta alto conteúdo de sulfato (44,59 ± 0,015%).
Inibição da proliferação celular foi observada através do ensaio de MTT
quando as células endoteliais da aorta de coelho foram incubadas com a F1,0,
demonstrando que a fração estudada neste trabalho promoveu alteração no
Discussão....101
metabolismo das enzimas mitocondriais que são responsáveis pela conversão
do reagente MTT a formazan, que é o composto detectado no ensaio em
questão.
A anexina V se associa a fosfatidilserina, um marcador de células
apoptóticas, mas que também marca células necróticas. O iodeto de propídio
(PI) pode ser internalizado por células que apresentam a integridade da
membrana comprometida, ou seja, em células necróticas ou em apoptose
tardia (FERGUSON et al., 2004). Pela análise de citometria de fluxo, as células
RAEC tratadas com a F1,0 de Hypnea musciformis apresentaram marcação
para anexina V e iodeto de propídio (PI) semelhante a marcação das células do
grupo controle não tratadas. Portanto, pela citometria de fluxo a F1,0 não
causou alteração significativa no percentual de células viáveis e não viáveis
determinado por este teste.
De acordo com os resultados obtidos no nosso estudo, a F1,0 de H.
musciformis promoveu alteração do metabolismo das enzimas mitocondriais
sem causar morte das células, seja por apoptose ou necrose, por essa razão a
F1,0 poderia está causando um desvio do metabolismo mitocondrial e
direcionando o metabolismo das células endoteliais da aorta de coelho para a
síntese do heparam sulfato antitrombótico. Estas células quando incubadas
com a F1,0, exibiram um aumento na síntese do heparam sulfato
antitrombótico.
Em relação à influência da F1,0 na progressão do ciclo celular, podemos
observar uma diminuição na proporção de células endoteliais da aorta de
coelho nas fases G1 e G2, sendo visualizado um aumento no percentual de
células que se encontravam na fase S do ciclo celular, quando estas células
foram tratadas com a F1,0, sugerindo a ocorrência de impedimento da
progressão do ciclo da fase S para a fase G2, assim como foi demonstrado por
Lazzè et al., (2004). Estes autores estudando a influência de uma antocianina
aglicona, a delfinidina (DP) em células NHF (fibroblastos embrionários
humanos normais), mostraram que este composto promoveu o acúmulo de
células na fase S do ciclo celular, sugerindo um bloqueio na transição da fase S
para G2. Conclui-se que, a fração estudada promoveu inibição da proliferação
celular como visto no ensaio de MTT, apresentando ação citostática por causar
Discussão....102
uma parada no ciclo celular, já que foi visualizado um acúmulo de células na
fase S. O que nos leva a sugerir que a F1,0 tenha como possíveis alvos de
ação as quinases dependentes de ciclina, ciclinas ou inibidores de quinases
dependentes de ciclina relacionadas com a fase S do ciclo celular, como a
ciclina A e CDK2 (quinase dependente de ciclina 2) (VERMEULEN, VAN
BOCKSTAELE, BERNEMAN, 2003).
Assim, a F1,0 rica em galactanas sulfatadas da macroalga marinha
vermelha Hypnea musciformis, composta principalmente de carboidratos e
sulfato, apresenta forte potencial contra a ocorrência de trombose, uma vez
que pode apresentar vigorosa ação antitrombótica pela alta estimulação da
síntese de heparam sulfato antitrombótico pelas células endoteliais da aorta de
coelho em cultura, assim como também pela sua ação inibitória sobre os ROS
em alguns sistemas in vitro, que como já discutido, os ROS estão envolvidos
na promoção do estado de hipercoagulabilidade. A F1,0 também não exibiu
ação citotóxica sobre as células endoteliais da aorta de coelho, apresentando
ação citostática sobre esta linhagem, uma vez que causou impedimento da
progressão do ciclo celular. Além disso, a F1,0 pode ser uma alternativa na
indústria alimentícia para a prevenção do decaimento da qualidade dos
alimentos contendo lipídio devido a peroxidação lipídica, pois a fração em
estudo exibiu forte ação inibitória da peroxidação lipídica pelo método utilizado.
Conclusões 103
6. CONCLUSÕES
A F1,0 rica em galactanas sulfatadas obtida da alga vermelha Hypnea
musciformis foi a fração com melhor rendimento proveniente do fracionamento
com acetona.
A fração possui alta concentração de açúcares totais e sulfato, com
baixo teor de compostos fenólicos e baixa contaminação protéica. Sendo
composta pelo monossacarídeo galactose, tratando-se da presença de
galactanas sulfatadas na fração estudada de H. musciformis.
F1,0 mostrou sinais referentes a ligações S=O de ésteres de sulfato,
presença de ligação C-O de 3,6-anidrogalactose, β-D-galactose não sulfatada e
ligação C-O-SO4 no C4 da galactose.
A F1,0 exibiu ação antioxidante significativa sobre o ensaio da
peroxidação lipídica e no modelo de hemólise induzida por H2O2.
F1,0 apresentou baixa atividade anticoagulante nas concentrações
testadas, atuando sobre a via intrínseca e comum, não apresentando atividade
anticoagulante sobre a via extrínseca da coagulação.
A fração estudada promoveu moderada inibição direta sobre a atividade
enzimática da trombina e baixa estimulação da atividade enzimática do FXa.
A F1,0 exibiu ação estimulatória significativa na síntese de heparam
sulfato antitrombótico (4,6 vezes) pelas células endoteliais em cultura quando
comparadas com o controle.
F1,0 apresentou ação citostática uma vez que inibiu a proliferação de
células da aorta de coelho pelo ensaio de MTT, o que pode ter sido ocasionado
pela parada do ciclo celular (não progressão da fase S para fase G2)
promovida pela fração estudada. No entanto, a F1,0 não causou morte celular
por apoptose ou necrose, ou seja, não mostrou ação citotóxica, quando
avaliada por citometria de fluxo.
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