prost, antoine. doze lições sobre história. bh; autentica, 2008
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1(EDttes; Jltter t tt ti
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Biblioteca - ICHS/UFOP930P966c
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Nas pginas a seguir o
le itor vai pode r v is lum bra r a
maes t r i a de An to ine Pros te de seu olhar sobre a H istria .
Val ioso para historiadores,
estudantes e demais envolvidos
na rea de Cincias Humanas,
este livro surpreende por tecer,
em uma nica edio, umarede informacional rica, profun-
da e articulada sobre a Histria,
suas prticas e suas nuances.
Esta traduo, feita cuidadosa-
mente por Guilherme Joo de
Freitas Teixeira, convida os his-
toriadores a uma viagem que
passa por caminhos instigantes
e reveladores, escapando
idia de que Histria se refere
a algo que j passou.
Como forma de est imu-
lar o pensamento crtico, estelivro mostra como o "fazer
histria" veio se configurando
at a contemporaneidade. O
leitor tem em mos, portanto,
uma fonte inesgotvel de leitura
prazerosa, para reflexo e ques-tionamentos sobre a Histria,
seus processos e o ofcio do
historiador.
O AUTOR
Antoine Prost historiador,
professor da Universit Paris I epesquisador na rea de histria da
sociedade francesa no sculo XX
nos seus mltiplos aspectos: gru-
pos sociais, instituies, mentali
dades. autor de La grande guerre
explique mon petit fils (Seuil) e
organizador de Histria da vida pri-vada v.5 (Companhia das Letras).
Leia tambm da coleo
Histria e Historiografia:
A leitura e seu pblico no
mundo contemporneo: ensaiossobre Histria Cultural
JeanYves Mollier
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Doze lies sobre a histria
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Coleo
HISTRIA & HISTORIOGRAFIA
Antoine Prost
Doze lies sobre a histria
TRADUO
Guilherme Joo de Freitas Teixeira
autntica
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T tu lo o r ig ina l : "Douze le ons su r l ' h i s to i re " , de An to ine P ros t .
Copyr igh t d i t i ons du Seu i l , 1996
COORDE NADORA DA COL EO HISTRIA E HISTORIOGRAFIA
Eliana de Freitas Dutra
EDITORAO ELETRNICA
PROJETO GRFICO DE CAPA
Teco de Souza
c a p a : Sobre imagem de
Puv is de Chavannes. Le Bois sacr(deta lhe) . Grand A m ph ith tre de la .
A rch iv e s G ir a ud on . S o rb onne , Par isTales Leon de Marco
REVISO
A iko Mine
REVISO TCN ICA
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EDITORA RESPONSVEL
Rejane Dias
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AUTNTICA EDITORA LTDA.
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www.autenticaeditora.com.br
D a d os I n te r n a c i on a i s d e C a ta l og a o n a Pu b l i ca o ( C I P)
(Cmara Brasi leira do Livro)
Prost, Antoine, 1933- .
Doze lies sobre a histria / An toin e Prost ; [traduo de G uilherm eJoo de Freitas Teixeira]. Belo Ho rizonte : Au tntica Editora , 2008 .
Ttulo original: Douze leons sur l 'histoire.
Bibliografia.
ISBN 978-85-7526-348-8
1. Historiografia 2. Histria - Metodologia I. Ttulo.
08 - 07528 CDD-907 . 2
ndices para catlogo sistemtico:
1. Historiografia 907.2
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S U M R I O
Introduo.................................................................................................... 7
Ca ptulo I - A histria na sociedade francesa
(scu los XIX e XX)...................................................................................... 13
Ca ptulo II - A profisso de historiador.................................................. 3 3
Captu lo III - Os fatos e a crtica histr ica ............................................ 5 3
Cap tu lo IV - As questes do his toriador............................................... 75
Captu lo V - Os tem pos da his tria ........................................................ 9 5
Captu lo VI - O s conceitos....................................................................... 115
Cap tulo VII - A histria co mo co mpree nso ..................................... 133
Cap tulo VIII - Im ag ina o e a tribuio ca usal.................................. 153
Captulo IX - O mod elo sociolgico ...................................................... 169
Captu lo X - A histria socia l.................................................................... 189
Cap tulo XI - C riao de enredos e na rra tividade............................. 211
Captu lo XII - A histria se escreve......................................................... 2 3 5
Conclus o - Verdade e funo social da hist ria.............................. 2 5 3
Referncias.................................................................................................. 2 7 3
Lista dos livros em destaque..................................................................... 286
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Introduo
Se verdade alis, este estudo tenta fazer tal demonstrao que a
histria depende da posio social e institucional de quem a escreve, no
ficaria bem ocultar o contexto em que estas reflexes foram elaboradas;
tendo surgido de u m curso, o ttulo deste livro Lies sobre a histria
utilizado em seu sentido prprio.
Com efeito, a formao dos estudantes em histria inclui, tanto na
universidade da qual sou professor quanto e m u m grande n m ero de
outras, o ensino de historiografia ou de epistemologia que, atravs de
diferentes abordagens, visa suscitar u m olhar crtico sobre o q ue se faz
quando se pretende fazer histria. Esse ensino inscreve-se, por sua vez,
em uma tradio secular: antes de ter sido professado, em seu tempo, por
Pierre Vilar ou Georges Lefebvre, ele havia sido inaugurado em 1896
1897, na Sorbonne, por Charles-Victor Langlois e Charles Seignobos,
cujo curso foi publicado, em 1897, com o ttulo que teramos adotado
de bom grado Introduction aux tudes historiques.
N o entanto , trata-se de um a trad io frgil e ameaada; at o final da
dcada de 1980, na Frana, a reflexo metodolgica sobre a histria foi
considerada intil. verdade que alguns historiadores, tais como Ch.-O.
Carbonell, F. Dosse, F. Hartog, O. Dumoulin e ainda outros, chegaram a
manifestar interesse pela histria da histria, mas eles deixaram a reflexo
epistemolgica nas mos dos filsofos (R. Aron, P. Ricreur). significa
tivo que, atualmente, as nicas obras de sntese disponveis em livraria
sejam iniciativas oriundas do exterior: o livro Histoire et mmoire, de J. Le
Goff, foi publicado, inicialmente, em italiano; por sua vez, o compndio
de E. Carr deve-se a George Macaulay Trevelyan lectures de Cambridge, assim
como o livrinho que continua sendo notvel de H.-I. Marrou, De la
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Do z e l i e s s o b r e a His t r ia
connaissance historique, contendo as aulas administradas em Louvain, na c
tedra Cardinal-Mercier. Os inspiradores da escola dos Annales F. Braudel,
E. Le Roy Ladurie, F. Furet, P. Chaunu multiplicaram as coletneas de
artigos ou promoveram a publicao de obras coletivas, por exemplo,
aquelas organizadas por J. Le G off e P. N ora ; no entan to, M arc Bloch,
com seu livro Apologie pour lhistoire infelizmente, inacabado foi o
nico que se empenhou em explicar o oficio de historiador.
Alis, essa a conseqncia de uma atitude deliberada: at aqui, os
historiadores franceses haviam feito pouco caso das consideraes gerais.
Para L. Febvre, filosofar constitua o crime capital ;1 na aula inaugural
no Collge de France, ele j havia observado que os historiadores no pos
suem grandes necessidades filosficas. E, para confirmar sua afirmao,
citava o depoimento irnico do poeta Charles Pguy (1988):
Habitualmente, os historiadores fazem histria sem meditar a respeito
dos limites, nem das condies dessa matria. Sem dvida, eles tm
razo; prefervel que cada um exera seu ofcio. De maneira geral,
um historiador deveria comear por fazer histria sem delongas: caso
contrrio, nunca conseguir fazer seja l o que for!2
Tal postura vai alm da simples diviso das tarefas: mesmo que lhesfosse oferecida tal oportunidade, inmeros historiadores recusariam em
preender um a reflexo sistemtica sobre sua disciplina. Tal rejeio relativa
s filosofias sobre a histria considerada por Philippe Aris, em seu livro
Le temps de lhistoire, como uma insuportvel vaidade: Elas so ignoradas
ou postas de lado, deliberadamente, com um simples dar de ombros, como
se tratasse de falatrio terico de amadores sem competncia: a insuportvel
futilidade do tcnico que permanece confinado dentro de sua tcnica, sem
nunca ter tentado observ-la de fora! (Ar i s , 1986 p. 216).
Abundam as declaraes para confirmar a pertinncia desse depoi
mento. Tendo freqentado assiduamente os historiadores, sem se eximir
de critic-los, Paul Ricreur em sua obra, Temps et Rcit, I cita a este
propsi to , de fo rm a um ta nto prfida, Pierre Chaunu:
A epistemologia uma tentao que deveria ser afastada resoluta
mente [...] No mximo, admite-se que seja oportuno que essa tarefa
1 Resenha do l ivro de Marc Bloch, Ap olog ie po ur Vhistoir e, na Revue de m tap hy siq ue et de morale (LVII,
1949), em Combats p our lhistoire (FEBVRE, 1953, p. 419-438): O autor no poder ser acusado de
filosofar o que significa, na bo ca de u m h istoriador, estejamos certos disso, o crime capital (p. 433).
2 Ve r a aula de Lucien Febvre em Combats pour Vhistoire (1953, p. 3-17; em particular, p. 4).
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In t r o d u o
seja executada por alguns mentores no esse, absolutamente,
nosso caso, nem alimentamos tal desejo a fim de que os robustos
artesos de um conhecimento em construo alis, essa seria a
nossa nica pretenso fiquem mais bem preservados das perigosas
tentaes da mrbida Cpua. (Ric^ ur, 1983-1985, p. 171)
Com efeito, os historiadores franceses adotam, naturalmente, a pos
tura de um modesto arteso: para a foto de famlia, eles posam em seu
ateli e exibem-se como homens de ofcio que, aps uma longa aprendi
zagem, dominam os recursos de sua arte. Elogiam a beleza da obra e
valorizam a habilidade, em vez das teorias de que esto entulhados em
sua opinio, inutilmente os colegas socilogos. Inmeros so aqueles
que, no comeo de seus livros, se eximem de definir tarefa consideradaobrigatria pelos colegas alemes os conceitos e os esquemas de inter
pretao utilizados. Por m aio r fora de razo, eles ju lg am que a elabo ra
o de uma reflexo sistemtica sobre sua disciplina algo de pretensioso
e perigoso: isso corresponderia a reivindicar uma posio de fundador de
escola que uma atribuio rejeitada por sua modstia mesmo que seja
fingida e que, sobretudo, deix-los-ia expostos crtica, nem um pouco
benevole nte , de colegas que, eventu alm ente , pudesse m ter a impresso
de que eles pretendem ensinar-lhes o ofcio. Segundo parece, a reflexoepistemolgica atenta contra a igualdade dos mestres da corporao;
eximir-se de lev-la a efeito um a forma de evitar, po r um lado, perder
seu tempo e, por outro, expor-se s crticas dos pares.
Felizmente, essa atitude est em via de mudar. A indagao metodo
lgica torn ou -se mais freqente, tanto nas revistas mais antigas po r e xem
plo, a Revue de synthse, qua nto nas mais recentes, co m o Genses. Por sua
vez, em seu sexagsimo aniversrio, a revista dos Annales retomou uma
reflexo que, desde ento, continua a ser elaborada.
verdade que se alterou a conjuntura do fazer histria. O complexo
de superioridade dos historiadores franceses, orgulhosos de pertence
rem, em maior ou menor grau, escola dos Annales cuja excelncia, su
postamente, elogiada pelos historiadores do m undo inteiro comeou a
tornar-se, no propriamente irritante, mas injustificado. A historiografia
francesa fragmentou-se e trs questes tm lanado a dvida relativamen
te a suas antigas certezas. Assim, as tentativas de sntese aparecem como
ilusrias e votadas ao fracasso; a nfase atribuda, neste momento, s
micro-histrias e monografias sobre temas cujo inventrio permanece ili
mitadamente aberto. Por outro lado, a pretenso cientfica compartilhada,
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Do z e l i e s s o b r e a His t r ia
apesar de seu desacordo, por Seignobos e Simiand vacila sob os efeitos
de um subjetivismo que incorpora a histria literatura; o universo das
representaes desqualifica o dos fatos. Por ltimo, o empreendimento
unificador de Braudel e dos defensores de uma histria total que fossecapaz de recapitular a contribuio de todas as outras cincias sociais re
dundou em uma crise de confiana: fora de servir-se de questes, con
ceitos e mtodos que ela pede de emprstimo economia, sociologia,
etnologia e lingstica, a histria passa, hoje em dia, por uma crise de
identidade que suscita a reflexo. Em poucas palavras, F. Dosse transfor
mou, acertadamente, essa constatao em ttulo de um livro: a histria
encontra-se, atualmente, em migalhas.
Neste novo contexto , u m livro de reflexo sobre a histria nada te ma ver com o manifesto de uma escola. Em vez de uma tomada de posio
terica, destinada a valorizar determinadas formas de histria, desvalori
zando as outras, trata-se de participar de uma reflexo comum para a qual
todos os historiadores esto convidados; atualmente, nenhum deles pode
evitar o confronto entre o que julga fazer e o que faz.
Posto isto, no vale dissimular que esta reflexo empreendeu, aqui,
o itinerrio didtico de um curso destinado a estudantes universitrios do
prim eiro ciclo. Tive pra zer de apresent -lo repetidas vezes; m in ha im
presso a de que ele co rresp ondia a um a expectativa, at mesmo, a um a
necessidade. Portanto, resolvi orden-lo e introduzir notas de referncia,
ou seja, torn-lo mais consistente e aprimor-lo, sem perder de vista seu
pblico-alvo. Resolu o que implica evidentes serventias: o le itor te m o
direito de esperar, por exemplo, determinadas informaes mais perti
nentes sobre aspectos peculiares aos historiadores experientes, a crtica
histrica de acordo com Langlois e Seignobos, ou os trs tempos da hist
ria segundo Braudel. Do mesmo modo, para garantir a nitidez do texto,
tive de sacrificar algumas liberdades de estilo e todas as aluses.
N atu ra lm ente , com o qualquer professor, elaborei estas aulas a pa rtir
de reflexes elaboradas por outros. Tive um verdadeiro prazer na leitura
de Lacombe, Seignobos, Simiand, Bloch, Febvre, Marrou; ou, entre os
autores do exterior, Collingwood, Koselleck, Hayden White, Weber e
ainda muitos outros seria impossvel mencionar o nome de todos. O
desejo de fazer compartilhar este prazer levou-me a apresentar longas
citaes, integrando-as no meu prprio texto; de fato, pareceu-me desti
tudo de interesse repetir bem, pessoalmente com menos qualidade, o
que j havia sido afirmado com brilhantismo por uns, com humor por
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outros, e com pertinncia, por todos. Da, os boxes que no devero
ser postos de lado pelo leitor afobado em chegar concluso: tais textos
constituem, muitas vezes, etapas essenciais da argumentao.
Como se pode ver, em vez de um manifesto pretensioso ou de umensaio brilhante, este livro uma modesta reflexo com o objetivo de ser
til: eis uma ambio de que sou capaz de avaliar a amplitude. Alm
disso, trata-se de uma forma, semelhante a outras, de reencontrar a postu
ra to apreciada pelos historiadores franceses do arteso que explica o
ofcio aos aprendizes...
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A histria na sociedade francesa(sculos XIX e XX)
A histria o que fazem os historiadores
Em vez de uma essncia etema, de uma idia platnica, a disciplina
chamada histria uma realidade, em si mesma, histrica, ou seja, situada
no tempo e no espao, assumida por homens que se dizem historiadores
e que so reconhecidos como tais, alm de ser aceita como histria por
diversos pblicos. Em vez de uma histria sub spccie aetemitatis, cujas ca
ractersticas tivessem atravessado, sem qualquer alterao, as vicissitudes
do tempo, existem diferentes produes que os contemporneos de de
terminada poca esto de acordo em considerar como histria; ou seja,
antes de ser uma disciplina cientfica - segundo sua pretenso e, at certo
po nt o, co nfor m e ela o ef et iva me nte a his tr ia um a pr tica social.
Essa afirmao pode tranqilizar o historiador que empreende uma
reflexo sobre sua disciplina, na medida em que o remete ao que ele est
acostumado a fazer: o estudo de um grupo profissional, de suas prticas e
de sua evoluo. Existem grupos de historiadores que reivindicam tradi
es, constituem escolas, reconhecem normas constitutivas de seu ofcio
comum, obedecem a uma deontologia, alm de praticarem rituais deincorporao e excluso. Os homens e as mulheres que se consideram
historiadores cuja unio ocorre, efetivamente, pela conscincia de per
tencer a essa comunidade fazem histria para um pblico que os l ou
escuta, discute com eles e acha seu trabalho interessante. Certamente, eles
so estimulados, tambm, pela curiosidade intelectual, pelo amor pela
verdade e pelo culto cincia; no entanto, seu reconhecimento social,
assim como sua subsistncia, dependem da sociedade que lhes atribui um
status e lhes garante uma remunerao. Portanto, um duplo reconheci
men to - pelos pares e pelo pblico consagra o historiador com o tal.
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Bis por que os (c*x11 >s histo iiog i.ilu os iU>s lnsoii.tdor cs cstao irl.i cio
nados co m uma histria indissocivel men te social e cultural. A o pinio
dos historiadores de determinada poca ou escola sobre sua disciplina
suscetvel de uma dupla leitura: a primeira, ao p da letra, empenha-se 11a
concepo da histria definida por seus textos; e a outra, mais distanciada,
atenta ao contexto da histria, decifra sua exposio metodolgica ao iden
tificar as mltiplas implicaes desses documentos. Por exemplo, o cle
br e liv ro de Lan glo is e Se ign obos , ntroduction aux tudes historiques, cor
respondeu, em um primeiro plano, a um discurso do mtodo em que a
anlise das diversas formas de crtica histrica conserva um interesse
po r si m es m o; em um se gu nd o n ve l, tal ob ra re m et ia a um con te xt o
intelectual, inclusive, poltico, dominado pelas cincias experimentais
maneira de Claude Berna rd,1 enqu anto a emergncia da sociologia
durkheimiana - ao preconizar a aplicao de um rigoroso mtodo ex
pe rim en ta l aos fato s sociais - am eaava a pret en s o cie nt fic a da his t riaem seu prprio fundamento.
Assim, os historiadores que escrev em sobre a histria - e, neste aspec
to, no estamos fora do destino comum estariam condenados a situar-se
em relao a seus predecessores e seus contemporneos da mesma disci
plin a, mas ta m b m em rela o s c orpo raes cien tfi cas sem elh an tes , co m
as quais a histria mantm uma inevitvel competio pelo controle de
um campo simultaneamente cientfico e social. Alm disso, eles devem
levar em considerao a sociedade em seu conjunto e em seus segmentos
que, afinal, so os destinatrios de seu trabalho e para quem essa histria
tem, ou no, sentido. Como a histria , antes de ser uma prtica cient
fica, uma prtica social ou, mais exatamente, como seu objetivo cientfico
, tambm, uma forma de tomar posio e adquirir sentido em determi
nada sociedade, a epistemologia da histria , por sua vez, em parte, uma
histria; o que ilustrado, de maneira exemplar, pelo caso francs.
A histr ia na Fr an a : um a p o si o pr iv il eg ia d a
N o un iver so cu ltu ra l e soc ial dos fran ces es, a his t ria oc up a um a
posi o em in en te . Em pa rte alg um a, ela est to pres en te nos disc urso s
po lt ico s ou nos co me ntr ios dos jornal ista s; em parte alg um a, ela se be
neficia de um status to prestigioso. A histria a referncia obrigatria, o
horizonte incontomvel de toda a reflexo. J se afirmou que ela era uma
1 Fisiologista (1813-1878), seu livro Introduo ao estudo da medicina experimental (1865) definiu osprin cpi os fund ame ntais de toda a pe squisa cient fica. (N. T.).
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p.u .111 Ii.iiim-..i ^jnuiAH.i>, 1J'M), talv i. fosse possvel at consider-la
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Para ilustrar essa constatao, vou basear-me em uma frase, cujo in
teresse o de parecer evidente. Afirmao de bom senso que se impe,
po r si s, sem qu e algu m tenh a vo nt ad e de quest ion -l a; e, po r acrsci
mo, qualificada por ter sido proferida pela maior autoridade do Estado.
Em 1982, por ocasio de um Conselho de Ministros em que havia sido
evocado o problema do ensino da histria, o presidente Mitterrand rece
be u um a ap rov ao un n im e ao dec lara r: U m po vo qu e n o ensina sua
histria um povo que perde sua identidade.
Nessa afi rma o , o intere ssa nte n o , em pr im ei ro lug ar, sua falsi
dade, alis, confirmada por uma simples olhadela lanada para fora do
Hexgono3: apesar da posio marginal, inclusive inexistente, do ensino
da histria em numerosos pases - a comear pelos EUA e a Gr-Breta
nha , seus habitan tes no deixam de manifestar um sen time nto bastante
vigoroso de identidade nacional. Nos EUA, por exemplo, em toda a
escolaridade at os dezoito anos, o lugar da histria reduz-se, em geral, a
um s curso, administrado durante um nico ano. De fato, a construo
da identidade nacional pode servir-se de um grande nmero de outros
expedientes, alm da histria. Inversamente, esta no consegue desen
volver, automaticamente, a identidade to cobiada: a independncia da
Arglia foi empreendida por homens que, durante a infncia, haviam
aprendido a histria da Frana, repetindo Nossos antepassados, os gau-
leses.... Em decorrncia exatamente dessa generalidade, a afirmao do
ex-presidente da Repblica errnea.
Contudo, ela no deixa de ser bastante significativa por duas razes:
em primeiro lugar, ningum ousou apontar, nem mesmo de forma res
pe ito sa , o er ro do pr es iden te . D e fat o, ele n o havia ma ni festa do um a
opinio pessoal: limitara-se a exprimir o ponto de vista correntemente
aceito, uma banalidade. Entre os franceses, existe unanimidade para con
siderar que sua identidade e, praticamente, sua existncia nacional
passa pe lo ensin o da hist ria : U m a soc ied ade que, ins ensiv elm en te, re tira a histria de suas escolas suicida .6 Nada m enos...
No sso int uito, aqu i, no discutir tal convico : ao passar po r outr as
vias, a identidade nacional no exclui que, na Frana, ela esteja enraizada,
efetivamente, em uma cultura histrica. O importante que, fundamentado
3Metonmia aplicada ao territrio francs, cuja configurao geogrfica faz lembrar essa figura geomtrica. (N.T.).
Editorial da revista L Histoire, janeiro de 1980, citado em Historiais et Gographes, n. 277, fev./rnar.1980, p. 375.
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nu i i . i ii i imi fi.Mii * ii tm uo il.i luiiao ulentit.ui.i d.i historia
ualia investindo n, hr.lon.uloics da mais importante e prestigiosa de to
das as misses; seu shitiis na sociedade encontra-se enaltecido, seja qual
Ioi o preo a pagar por esse prestgio redobrado.
Em segundo lugar, ningum se espantou que o chefe de Estado
tivesse decidido exprimir sua opinio sobre o ensino da histria; para os
franceses, parece ser evidente que isso faa parte dos deveres de sua fun
o. A Frana , sem dvida, o nico pas no mundo em que o ensino da
histria uma questo de Estado, evocada como tal no Conselho de
Ministros por exemplo, em 31 de agosto de 1982; melhor ainda, o
nico pas em que o primeiro-ministro acha que, no exerccio de suas
funes, no perde seu tempo ao pronunciar o discurso inaugural de um
colq uio sobre o ensino da histria.7 Se, porve ntura, o presidente dos
EUA ou o primeiro-ministro britnico adotassem tal procedimento, eles
suscitariam entre os jornalistas um espanto parecido ao que seria provo
cado se esses polticos se pronunciassem sobre a arbitragem de uma
pa rti da de fu teb ol . Na Fra na, pe lo co nt r rio , a fun o iden tit r ia at ri
bu d a ao en sino da hi st ria acaba po r tr an sfor m - lo em um a qu es to
importante da poltica.
Esse lugar particular da histria na tradio cultural francesa aparece,
po rta nt o, asso ciado sua posi o no ensin o: tra ta- se, de fato , do n ico
pas em qu e ela cons tit ui um a disc iplina ob rig at ria em tod as as se es e
em todos os anos da escolaridade obrigatria, ou seja, dos seis aos dezoito
anos.8 A histria do ensino da histria na Frana h de esclarecer-nos
sobre a funo especfica que ela desempenha na sociedade francesa, as
sim como o lugar ocupado em sua tradio cultural.9
Deste ponto de vista, a diferena evidente entre o ensino mdio e
o fundamental: no primeiro, a histria toma-se obrigatria desde 1818; e,
no segundo, efetivamente, desde 1880. Ou seja, no sculo XIX, a histria
no diz respeito escola do povo, mas trata-se de um assunto de notveis.
7Aluso ao discurso de Pierre Mauroy po r ocasio do Colloque national sur lhistoire et son enseignement,e m
Montpellier, em janeiro dc 1984 (MINIST RE ..., 1984, p. 5-13).
8 Em geral, a histria obrigatria, som ente, em uma parte da escolaridade, mais frequ entem ente nas
classes elementare s qu e nas classes superiores.
9Nosso intuito no delinear, propriamente, a histria da histria no ensino mdio e fundamental. Esse
tema foi abordado por Paul Gerbod, em relao ao ensino mdio, em seu artigo publicado em
L Information historique(1965), texto que continua sendo insubstituvel; relativamente ao ensino funda
menta], cf. o artigo de Jean-Ne l Luc publicado em Historiens et Gographes (1985, p. 149-207), assim
como a tese de Brigitte Dancei (1996).
ftibtiotrxa Atphonsus dc bumawms]7 iCHS*UF)P
Mariana MG
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Os usos sociais da histria no sculo XIX
A his t ria no en si no md io
A introduo precoce da histria no ensino mdio tanto mais
impressionante pelo fato de que tal operao o distinguia no s do
ensino fundamental, mas tambm do ensino superior: a histria foi en
sinada nos liceus e colgios muito antes de ser includa entre as matrias
das faculdades. A primeira vista, trata-se de uma defasagem surpreenden
te, mas que explica a posio central ocupada pelo ensino mdio na soci
edade francesa. At a dcada de 1880, as prprias faculdades de letras
esto orientadas para esse ensino: no verdade que sua principal funo
consistia em outorgar o baccalaurat?10 Os raros cursos de histria eram
ministrados a um pblico mundano, sob uma forma retrica, pelo profes
sor encarregado, simultaneamente, de histria universal e geografia mundial; foi necessrio esperar pela derro ta de 1870" e pela chegada dos re
pu bl ican os pa ra ser co ns ti tu d o, nas fac uldade s, o en sino cien tf ic o da
histria com professores relativamente especializados, de alguma forma
historiadores profissionais.12
Em compensao, um papel capital na formao das elites foi de
sempenhado pelo ensino mdio que, bem cedo, entre suas matrias, in
cluiu a histria: aps uma tmida apario nas escolas centrais da Revolu
o e uma inscrio de princpio nos programas dos liceus napolenicos,
ela se instalou realmente, em 1814, nos programas do ensino mdio; e,
em 1818, tornou-se matria obrigatria, razo de uma aula de duas horas
po r sema na, a co me a r pela classe de dnquime at a classe de premire. Na
seqncia, esse ensino passou por vrias vicissitudes, sem ter desaparecido:
Ou, na forma abreviada, bac: designa, ao mesmo tempo, os exames e o diploma conferido ao final
do 2 ciclo do ensino de 2 grau. Para facilitar a compreenso do texto, apresentamos o quadro dacorrespondncia, aproximada, entre o sistema escolar francs e o sistema escolar brasileiro: a classe de
siximecorresponde, aproximadamente, 5asrie; cinquime= 6asrie; quatrme= Tsrie; troisime=
8a srie; seconde= Io ano do 2o grau; premire - 2 ano do 2ograu; terminale = 3 ano do 2ograu; e
baccalaurat = vestibular. Cf. BOURDIEU, 1998, p. 249. (N.T.).
" Diante da Alemanha que sacramenta a queda do 2o Imprio de Napoleo III, seguida pela proclamao
da 3aRepblica. Para facilitar a compreenso do texto, apresentamos o quadro dos regimes franceses, a
par tir da R evo lu o France sa (1789): Ia Re pb lica (179 1-1 804 ); I o Imp rio (180 4-ab ril de 1814) e os
Cem Dias (maro-junho de 1815); Restaurao (1814-1830); Monarquia de Julho (1830-1848); 2a
Repblica (1848-1852); 2oIm prio (1852-1870); 3aRepb lica (1871-1940); Estado Francs/Vichy
(1940-1944); Governo provisrio da Repblica (1944-1947); 4aR epblica (1947-1959); 5aRepblica
(com a proclamao da nova Constituio, em 26 de setembro de 1959). (N.T.).
12Em relao a esses aspectos bem conhecidos, ver C ARB ONE LL e K EYLO R.
.111.is, todos os homens >|ur, no sei ulo XIX, exerceram influencia na 1'rana,
im luindo aqueles que se contentaram com os primeiros anos do ensino
mdio sem terem atingido o baccalaurat, fizeram a matria de histria.
Pelo menos, em princpio. De fato, muitas vezes, verificou-se uma
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0 estudo, de acordo com os autores da Antigidade comparados entre si,
das mudanas introduzidas na constituio e na sociedade atenienses, desde
o final das Guerras Mdicas at Alexandre; a histria da ordem dos cavalei
ros romanos, desde os Gracos at a morte de Augusto; e o estado moral e
po lti co da Glia no m om en to das invases, de aco rdo co m os autores co n
temporneos ( G e r b o d , 1965, p. 127). Ora, independentemente de terem
pre parad o o concur so po r si m esm os ou na Ecole normale suprieure(ENS), os
agrgs15 acabaram por dar o tom, apesar de seu reduzido nme ro: 4 a 6 em
cada ano e 33 em 1842. Eles eram professores nos liceus mais importantes e
seus compndios por exemplo, a coleo lanada por Victor Duruy, jo
vem agrg estudante da ENS , nas vsperas dos acontecim entos de 184816 -
impuseram uma concepo mais abrangente da histria.
O mesmo movimento fortaleceu o lugar reservado histria con
tempornea; na verdade, ela nunca tinha sido totalmente excluda. A listadas questes previstas pelo programa de 1840 para o exame de baccalaurat-
os examinadores no tinham o direito de modificar os termos em que elas
haviam sido formuladas - compreend ia, por exem plo, 50 questes sobre
a histria antiga, 22 sobre a histria da Idade Mdia e 23 de histria mo
derna at 1789. Em 1852, a fronteira simblica da Revoluo Francesa foi
transposta e a Antigidade perdeu sua preeminncia, limitada a 22 ques
tes, contra 15 sobre a histria medieval e 25 sobre a histria dos tempos
modernos at o Io Imprio.
N o en ta nto, te nd o sido mi ni str o de 186 3 a 186 9, Vi ctor Dur uy in
crementou, de maneira decisiva, a importncia dos ltimos sculos: em
1863, o programa de retrica inclua o perodo entre meados do sculo
XVII e 1815; po r sua vez, o de filosofia referia-se Revo luo de maneira
detalhada e prosseguia at 1863, segundo uma perspectiva amplamente
aberta para os outros pases e para a histria que designaramos como
econmica e social.
1. Victor Duruy: Algumas questes de seu programa
24- Rpido desenvolvimento da Unio Norte-Americana, suas cau
sas. - Descob erta das jazidas aurferas da Califrnia e da Austrlia:
efeitos da abundncia de ouro no mercado europeu. Guen-a entre
15 Estudante que obteve xito no concurso de agrgation, por conseguinte, portado r do ttulo de
agrg e titular do posto de professor de liceu ou de faculdade. Para o ensino superior na Frana,consultar: http://vvww.france.org.br. (N.T.).
16As Jornadas de Fevereiro criaram a 2a Rep blica, que estabeleceu o sufrgio universal, assim com o aliberdade de imprensa e de reunio. (N .T.).
20
os I .t.ulo'. do Niuic r m dn Sul. Situao das antigas colnias
espanholas. lxpedio do Mxico. Tomada de Puebla e ocupa
o do Mxico [...].
26- Novas caractersticas da sociedade moderna:
Io Rel aes estreitas estabelecidas entre os povos pelas estradas de
fenx> e pela navegao a vapor, pelo telgrafo eltrico, pelos bancos
e pelo novo regime comercial f...].
2 Solicitude dos governos pelos interesses materiais e morais do
maior nmero possvel de pessoas.
3o Pela igualdade dos direitos e pela livre expanso da atividade
industrial, a riqueza produzida em maior abundncia e se distribui
em melhores condies [...]. Grandeza, no sem perigo, da civi
lizao moderna, necessidade de desenvolver os interesses morais
para com pens ar o imen so dese nvo lvim ent o dos interesses mat eri
ais. - Participao da Frana na obra geral de civilizao. (Pioietta,1937, p. 834-835)
Revista em vrias ocasies, essa arquitetura dos programas de hist
ria subsistiu at 1902; ela se caracterizava por um percurso contnuo dos
tempos histricos. Assim, o programa de 1880 reservava 2 horas semanais
pa ra o en sin o da his tr ia an tiga, a co m e ar pela classe de six ime at a
quatrime. E depois, 3 horas, nas classes seguintes: a Idade Mdia, em
troisime, at o ano 1270; em seconde, de 1270 a 1610; em retrica, de 1610
a 1789; e, de 1789 a 1875, em filosofia ou matemtica elementar.
A constituio pelos republicanos de um verdadeiro ensino supe
rior na rea das letras, nas ltimas dcadas do sculo XIX, serviu de
coroamento a essa evoluo. A agrgation tornava-se a via normal de
recrutamento de professores especializados, formados da em diante
po r hi stor ia do re s prof iss iona is das fac uld ades de let ras ; ela in cl u a um a
iniciao pesquisa com a obrigao de obter, previamente, o Diplo
ma de Estudos Superiores (1894), predecessor da maitrise.1' A reforma
de 1902 acabou por conferir as caractersticas desse ensino, ao estabe
lecer a distino entre um primeiro e um segundo ciclos: em cada um,
pe rc or re -s e a to ta lid ad e dos pe rod os , desde as or igen s ao te m po pr e
sente ( D u b i e f , s.d., p. 9-1 8). 18
17 Diploma de 2 ciclo, equiparado graduao plena no Brasil, outorgado no final do 4 ano
universitrio. (N.T.)
18 A estrutura em dois ciclos foi interrompid a entre 1935 e 1938. Para uma comparao sistemtica dos
progr amas, ve r LE DU C; MA RC OS -AL VA RE Z; LE PELL EC, 1994.
21
http://vvww.france.org.br/http://vvww.france.org.br/ -
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Terceiro aspecto interessante: essa evoluo direcionada para uma his
tria mais autnoma, mais contempornea e mais sinttica foi conflitante; no
foi uma evoluo linear, mas uma sucesso de avanos e recuos, associados ao
contexto poltico. A introduo da histria como matria obrigatria deveu-
se aos constituintes, inspirados pelos idelogos - por exem plo, Ro ye r-C o-
llard - entre 1814 e 1820. A criao da agrgation, seu fortalecimento e a mul
tiplicao das ctedras especializadas caracterizaram a Mona rqui a de Ju lh o.19 O
Imprio liberal e, em seguida, a 3a Rep blica consagraram a importncia da
histria nos programas e horrios; inversamente, a passagem pelo poder dos
ultra-reacionrios de 1820 a 1828, assim como o Imprio autoritrio, foram
per odo s de infort nio para a disciplina h istria .
Com efeito, do ponto de vista poltico esse ensino no foi neutro.
Certamente, de todos os lados, repetia-se que ele deveria evitar as consi
deraes demasiado genricas e os juzos categricos; de acordo com seusparti d rio s, ele po de ria de se nv ol ve r o am or pel a rel igi o e pe lo tron o.
Apesar de todos os seus esforos, a histria ensinava, por definio, que
os regimes e as instituies eram mutveis; tratava-se de um empreendi
mento de dessacralizao poltica. A reao podia aceitar uma histria re
duzida cronologia, centrada na histria sagrada e no passado mais lon
gnquo; ao abordar os tempos modernos, e mesmo detendo-se no patamar
de 1789, ela tornava-se suspeita de conivncia com o esprito moderno.
Inversamente, os partidrios da histria assumiram essa funo pol
tica, conforme vimos mais acima, com o programa de V. Duruy. Os repu
bli canos rea firmaram , ain da co m mais nit ide z, a me sma pos io: A hi st
ria da Frana, em particular, dever enfatizar o desenvolvimento geral das
instituies do qual oriunda a sociedade moderna; ela dever inspirar o
respeito e o apego aos princpios que servem de alicerce a essa socieda
de .20 O lugar da histria no ensino m dio remetia explicitamente a uma
funo poltica e social: tratava-se de uma propedutica da sociedade
moderna, tal como ela procedia da Revoluo e do Imprio.
Os histor iadores no debate pbl icoNos liceus e colg ios do sc ulo X IX , a his tr ia foi, assim, um ensino
pr ec oc em en te ob rig atr io qu e evoluiu em dir e o ao co nt em po r ne o e
sntese, graas a professores especializados, atravs de conflitos que lhe
19Pe rodo de 1830 a 1848 que correspo nde ao reinado de Lus Filipe, marcado pela supremacia poldcae econmica da burguesia. (N.T.).
20Portaria de 12 de agosto de 1880, ver GERBOD, 1965, p. 130.
22
1 1 tiilriii.mi 11 1n.i sigmlit i politit.i ( social. No entanto, convm desco-
hi ti ,is r.i/e.s de tais car.it icrstiias: po r que m oti vo esse ensino se to m ou
obrigatrio? Como teria adquirido essa importncia?
A resposta no pode ser procurada no prprio ensino j que ele
carecia dos mritos pedaggicos que poderiam justific-lo. A maneira
caricatural como a histria havia sido ensinada no incio do sculo XIX
tenderia a conden-la: o simples aprendizado de listas de datas ou reina
dos no poderia, de modo algum, servir de formao. A legitimidade e a
necessidade relativamente ao ensino da histria baseavam-se em outros
aspectos, explicando-se por razes semelhantes s que justificaram a posi
o considervel ocupada pelos historiadores no debate pblico da poca.
Existe a um paradoxo. Com efeito, o ensino da histria nas faculda
des inexistia, praticamente, durante os primeiros 75 anos do sculo XIX;
no entanto, nesse perodo, grandes historiadores acabaram suscitando ointeresse do pblico, promovendo debates e conquistando notoriedade.
De fato, em Paris, existiam algumas ctedras de histria - em grandes
estabelecimentos, tais como o Collcge de France,2] Ecole normale suprieure e
Sorbonne -, cujo funcionamento era bastante diferente das faculdades inte-
rioranas de letras: seus titulares no se dirigiam a estudantes, mas a uma
numerosa audincia culta em uma poca em que as reunies pblicas
careciam de autorizao e a imprensa estava sob controle. Nesses recintos
preserv ado s, os curs os de his tr ia assumia m, inev ita ve lm en te , um alca nce
po lt ico su bl in ha do , s vez es, po r aplaus os. O co rr ia qu e, por sent ir- se
incomodado, o governo poderia ordenar a suspenso do curso, tal como
aconteceu com Guizot, em 1822; a retomada de sua ctedra, em 1828, foi
saudada como uma vitria poltica.
O grupo desses historiadores era impressionante. Ao lado de Gui
zot, Michelet, Quinet e, mais tarde, Renan e Taine, conviria contar com
autores, tais como Augustin Thierry, Thiers ou Tocqueville: no debate
intelectual de seu tempo, eles ocupavam um lugar central. A histria queescreviam ainda no era a histria erudita dos historiadores profissionais
do final do sculo: em vez de um verdadeiro trabalho de erudio, ela
bas eav a-s e em crn ica s e co mp ila es ; al m disso , o pr p rio M iche le t,
que afirmava ter extrado sua obra de uma freqncia assdua dos arqui
vos, segundo parece, havia limitado sua consulta s ilustraes. Por outro
lado, tratava-se de uma histria bastante literria, no estilo propositalmente
21E stabelecimento de ensino superior, fora da Universidade, fundado em Paris, em 1529, por Francisco
Io. (N.T.).
23
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oratrio: alis, situao facilmente explicvel pelas condies em que ela
se desenvolvia. Os professores de universidade republicanos de 1870-
1880, sensveis ao atraso da Frana diante da erudio alem, iro criticar
seus predecessores por terem sido artistas, em vez de cientistas. No entan
to, por sua qualidade de escrita, a obra desses historiadores ainda continualegvel, atualmente.
Tanto mais que essa histria demonstra certa ousadia. Seu pblico
no teria suportado que eles se perdessem em detalhes insignificantes.
Eles tinham predileo pelos amplos afrescos cronolgicos, percorrendo
vrios sculos em algumas aulas, o que lhes permitia identificar as grandes
evolues. Deste modo, sua histria no era estritamente poltica; rara
mente se referiam ao detalhe dos acontecimentos, preferindo resumir a
significao global e respectivas conseqncias. Seu objeto era mais am
plo : tra tav a-se da hi st ria do po vo fran cs , da civ iliz ao (Guiz ot) ou da
Frana (Michelet). A luz das evolues sociais, eles explicavam as trans
formaes das instituies; em suma, tratava-se de uma histria, simultaneamente, social e poltica.
N a ve rdad e, essas obr as his tr ica s m arc adas, s vez es, pe la ref le
xo filosfica ou pelo que designamos, atualmente, por cincia poltica,
tal como a de Tocqueville giravam em torno de uma questo central,
ou seja, aquela que a Revoluo Francesa havia formulado sociedade
do sculo X IX .22 Da, a suspeio atribuda histria pelos reacionrios:
pa ra co me a r, ela aceita va a R ev ol u o , ao co ns ider- la co m o um fato
que se explica e no como um erro, uma falta ou um castigo divino.
Conservadores ou republicanos, os historiadores partiam da Revoluo
como fato consumado j que eles andavam procura de suas causas econseqncias.
Ora, a sociedade francesa do sculo XIX se questionava, predomi
nantemente, sobre a questo poltica formulada por esse evento; trata
va-se do conflito entre o Antigo Regime e o que se designava, ento,como a sociedade moderna ou civil, ou seja, sem rei nem deus.
Diferentemente do que ocorria no Reino Unido, a problemtica no se
referia ao pauperismo. O problema suscitado pelas revoltas operrias no
tinha a ver propriamente com o desenvolvimento econmico, mas com o
regime; alm disso, elas eram analisadas como novas figuras da Revolu
o. No entanto, esse conflito poltico comportava verdadeiros desafios
22A respeito deste aspecto, ver, evid entem ente, os trabalhos de Franois Fu ret - citados na bibliografia
sobre as leituras da Revoluo pelos historiadores e polticos do sculo XIX.
24
sociais: de lato, tratava-se dos princpios que serviam de suporte para
organizar a sociedade inteira. Assim, na sociedade francesa, a histria as
sumia o lugar que a economia ocupava na sociedade britnica. Do outro
lado do Canal da Mancha, a amplitude do desemprego e da misria fazia
apelo a uma reflexo econmica: o debate intelectual era dominado por
Adam Smith, Ricardo e Malthus. Na Frana, Guizot, Thiers, A. Thierry,
Tocqueville, Michelet tomaram-se protagonistas por abordarem a ques
to decisiva da Revoluo e das origens da sociedade moderna.
Ao proceder desta fonna, eles forneciam aos franceses a explicao
de suas divises, conferindo-lhes sentido, o que lhes permitia assumi-las
e viv-las sob o modo poltico e civilizado do debate, em vez do modo
violento da guerra civil. Por um desvio reflexivo, a mediao da histria
pe rm it iu ass imi lar e in te gr ar o ac on te ci m en to re vo lu ci on r io , alm de
reordenar o passado da nao em funo de tal evento (J o u t a r d , 1993,
p. 543-54 6) . Pel a his tr ia, a soc ied ade francesa re pres en tou- se a si mes
ma, procurou sua prpria compreenso e refletiu sobre si mesma; neste
sentido, profundamente exato que a histria serve de fundamento
identidade nacional.
A maneira como, aps 1870, a escola histrica francesa adotou o
modelo da erudio alem confirma essa anlise. Seignobos, por exem
plo , depo is de te r elog iad o a erud io cr tica dos aleme s, n o de ix ou de
censur-los por esquecer a composio histrica; eles careciam de
idias gerais e de um trabalho de organizao e criao. A primeira vista,
tratava-se de uma acusao surpreendente por parte de um historiador
que criticava Guizot, Thiers e Michelet por fazerem literatura; essa acusa
o, porm, traduzia um apego fundamental funo social da histria, tal
como ela se havia consolidado na Frana. A histria - escreve ele -, em
vez de relatar ou comprovar, feita para responder s questes sobre o
passado susci tadas pe la observao das soc iedade s pre sentes (S e i g n o b o s ,
I884, p. 35-60). No mesmo artigo, ele fixava-lhe como objeto a descriodas instituies e a explicao de suas mudanas, de acordo com uma
concepo comtiana em que haveria alternncia entre-perodos de estabi
lidade e revolues. Mas tal postura vem a dar no mesmo. De fato, por
instituio, ele entendia todos os usos que garantem a unio dos homens
na sociedade (S e i g n o b o s , 1884, p. 37). O problema central era, portan
to, o da coeso social cuja manu ten o cabe s instituies , o que
remetia fragilidade da sociedade francesa ou, antes, ao sentimento ex
pe rim en ta do pe los co nt em po r ne os , ob ce ca do s pe la sucess o de re vo
lues que marcaram o sculo XIX. Eis por que, na memria assim
25
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construda, no h.ivi.i lugai par.i memrias eomplemeiitares, ideolgicas, sociais ou regio nais.23
Tendo sido, ao lado de Lavisse, um dos organizadores dos estudos
de histria nas faculdades, no final do sculo, Seignobos colocava, assim,
as tcnicas da erudio alem a servio de uma concepo da histria
herdada da primeira metade do sculo XIX: ele permitia que a histria
pros seguiss e a me sm a fun o socia l ao benefic iar -se dos pre stg ios co nj u
gados da modernidade com a cincia.
N o in c io do sculo X X , os pro gra ma s do ensin o m di o, ela bo ra
dos por Lavisse e Seignobos, confirm aram essa orientao que j havia
sido encetada por Duruy. Ela foi explicitada por Seignobos (1984): O
ensino da histria uma parte da cultura geral por levar o aluno a com
pr ee nd er a soc ied ade em qu e ele viv er , to rn an do -o cap az de to m ar parte
na vida social. A histria era, neste caso, uma propedutica do social, de
sua diversidade, de suas estruturas e de sua evoluo. Ela ensinava aosalunos que, por ser normal, a mudana no deveria causar receio; a hist
ria mostrava-lhes como os cidados podiam dar sua contribuio para tal
efeito. Em uma perspectiva progressista e reformista, a meio caminho das
revolues e do imobilismo, tratava-se exatamente de transformar a his
tria em um instrumento de educao poltica.
O sculo XX: uma histria fragmentada
O ensino fundamento/: uma histria diferenteEnquanto o debate poltico esteve limitado aos notveis, a histria
referia-se elite culta e era ministrada apenas no ensino mdio. No en
tanto, com a democracia, a poltica tomou-se o negcio de todos; neste
caso, levantou-se a questo da histria no ensino fundamental.
Ne ste po nt o, as datas so elo qen tes : em 1867, quando o 2o Imp rio
se liberalizava, a histria tomou-se, em princpio, matria obrigatria, no ensino fundamental. Entretanto, na prtica, ela se imps nas classes somente
aps o triunfo dos republicanos: em 1880, fzia parte da prova oral para a
obten o do Certificado de Estudos24 e foi necessrio esperar o ano de
1882 para que viesse a ocupa r seu lugar definitivo nos horrios - 2 horas
po r sem ana - e pro gra ma s da escola elem en ta r.25 O ensino da his tr ia foi
23De acordo com a lcida observao de JOUTARD, 1993.
24 Diploma outorgado no final da 8a srie. (N.T.).
25R efere-se ao perodo at a 4asrie. (N.T.).
26
implementado, ntao, com seu desenrolai regulai e seus suportes peda
ggicos; por sua vez, o compndio tornou-se obrigatrio em 1890. A
histria na escola primria atingiu seu apogeu aps a Grande Guerra: por
uma portaria de 1917, foi instituda uma prova escrita de histria ou de
cincias (por sorteio) para a obteno do Certificado, j mencionado.
Em relao ao ensino mdio, a defasagem cronolgica patente,
duplicando-se por uma diferena fundamental no esprito e nos mto
dos. Enquanto a continuidade reinava entre a histria do ensino mdio,
po r um lad o, e, po r ou tro, a dos grande s his tor iad ore s da pr im ei ra m eta
de do sculo ou a dos historiadores profissionais da universidade republi
cana, a orientao era diferente no ensino fundamental: a histria da esco
la primria difere da histria tanto dos liceus, quanto das faculdades.
Em primeiro lugar, ela dirigia-se a crianas: para ser compreens
vel, convinha que fosse o mais simples possvel, evitando raciocniosdemasiadamente detalhados. No entanto, alm das exigncias pedag
gicas, outros aspectos foram objeto de discusso. Os republicanos con
tavam com a histria para desenvolver o patriotismo e a adeso s insti
tuies; alm de ter o objetivo de inculcar conhecimentos bem definidos,
o ensino da histria deveria levar partilha de sentimentos. O amor
pel a p tr ia n o se ap re nd e de co r, mas nasce do co ra o ,26 afi rm ava
Lavisse. E ainda: Evitemos, definitivamente, aprender a histria com a
insensibilidade que convm ao ensino do uso dos particpios; neste
aspecto, t rata-se da carne de nossa carne e do sangue de nosso
sangue(NoRA, 1984, p. 283).
Esse objetivo supunha o recurso s imagens, narrativas e lendas. A
determinao dos republicanos relativamente construo de uma iden
tidade, indissociavelmente patritica e republicana, ficou perfeitamente
demonstrada p or seus esforos para comear o ensino da histria no m ater
nal (Luc, 1985, p. 127-138); com efeito, desde os cinco anos de idade,eles previam historietas, narrativas e biografias extradas da histria na
cional. Tratava-se de construir um repertrio comum de lendas em que,
incessantemente, fossem evocadas as mesmas figuras, desde Vercinge-
trix at Joana dArc. Apesar de conscientes do exagero de tal ambio, as
inspetoras hesitaram contestar, em 1880, um ensino que, aparentemente,
era defendido com tanto empenho pelos polticos. Foi necessrio esperar
26 No original, Lamou r de la patrie ne sapprend poin tpar cceur, il sapprendpar le cceur - trocadilho,
em francs, a partir de um vocbulo cujo timo latino cor, cordis, corao. (N.T.).
de
Mariana
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o incio do sculo XX para que a historia e a geografia nacionais deixas
sem de aparecer no programa do maternal.
O ensino da histria teria atingido o objetivo fixado pelos republica
nos? difcil apresentar um balano. Graas tese de B. Dancei, sabemos
como esse ensino era ministrado. A memria ocupava a um lugar decisi
vo, apesar da resoluo dos pedagogos oficiais: Convm confiar me
mria apenas o que a inteligncia tenha compreendido perfeitamente,
pre scre via Co m pa yr . De fato , a aula de his tr ia org an iza va- se em to m o
de palavras-chave, inscritas no quadro negro, explicadas e comentadas
pe lo me str e, an tes de se to rn ar em o pi v de pe rgun tas, cuj as res pos tas
constituam seu resumo que deveria ser aprendido e recitado na aula se
guinte. Os programas no privilegiavam a Revoluo Francesa, nem a
histria do sculo XIX, abordados, em princpio, 11 0 terceiro trimestre do
cours m oy en f com efeito, esses temas ocupavam um lugar central no testedestinado obteno do Certificado de Estudos. No entanto, as provas da
dcada de 1920, encontradas no departamento de Somme, no autoriza
vam qualquer tipo de triunfalismo: apenas metade dos alunos candidatos
a esse certificado que, por sua vez, nem representavam 50% dos indiv
duos de sua faixa etria foram capazes de responder, sem erros, a um
pe qu en o n cleo de co nh ec im en tos sobre 1789, a To m ad a da Bas tilha ou
a batalha de Valmy.28 O precrio co nhec imen to de histria adquirido por
um entre quatro alunos do ensino fundamenta] j , certamente, alguma
coisa, mas seria possvel esperar melhores resultados...
Ne ste caso , de ve ra mo s tir ar a co nc lus o de qu e a escola pr im r ia
fracassou na transmisso da mensagem que lhe havia sido confiada pelos
republicanos? Isso no certo. A idia de que a Revoluo teria institu
do um corte entre um antes no qual, certamente, os reis esforaram-
se por reunir o territrio, mas no qual predominavam os privilgios, ao
lado da ausncia de liberdade, e 11111 depois perseguido pela Repblicacom a garantia da liberdade, o estabelecimento da igualdade entre os
cidados e, graas escola, a possibilidade do progresso - parec e ser,
efetivamente, objeto de um consenso.
Pelo menos, o ensino da histria teria conseguido impor-se: os fran
ceses j no c once bem ensino fundamental - por maio r fora de razo,
27 Corresponde, aproximadamente, 4asrie. (N.T.).
28 Em pleno perodo revolucionrio (1789-1799), a vitria obtida nesta batalha (20 de setembro de 1792)
contra os prussianos interrompeu a invaso do territrio e de volveu a confiana ao exrcito francs. (N.T .).
28
ensino mdio m htsloiu. 1li ia/ ou no, tal ensino parece sei indis
pen svel; o qu e ser de mo ns tra do po r suas vic issi tudes ul ter ior es.
As per ip c ia s da se gu nda me ta de do sc ulo XX
Ao universalizarem a escolarizao alm da escola elementar, em
estabelecimentos do Io ciclo29 que, progressivamente, ganharam auton o
mia, as reformas escolares do perodo entre 1959 e 1965 transformaram a
pr p ria fu n o da esco la pr im r ia . Da em dian te , ela de ix ou de ser a
nica escola do povo e de ter a obrigao de fornecer sozinha aos futuros
cidados a bagagem de conhecimentos de que teriam necessidade duran
te a vida inteira; as lacunas do ensino da escola primria sero completa
das, posteriormente, pelo colgio de ensino geral ou mdio.
Essa transformao morfolgica do sistema escolar duplicou-se por
uma evoluo pedaggica. A dcada de 1960 acolheu, de bom grado, asabordagens psicossociolgicas ou psicolgicas: na empresa, verificou-se a
moda da dinmica de grupo ou dos seminrios inspirados por Carl Ro-
gers; no ensino, comeou-se a pensar que Piaget e os psiclogos teriam
algo a dizer. Prevaleceu a idia de que a democratizao do ensino supu
nha uma renovao sensvel dos mtodos.
O ensino fundamental passou, ento, por um profundo questiona
mento que atingiu o estatuto de todas as disciplinas. A aprendizagem das
linguagens fundamentais - francs e matemtica opunh am-se discipli
nas, tais como histria, geografia e cincias; de acordo com as instrues
oficiais, deixou de ser necessria a aquisio, na faixa etria de 6 a 11 anos,
dos conhecimentos indispensveis a essas disciplinas, uma vez que estes
sero garantidos no decorrer do Io ciclo. Em 1969, a reforma do terceiro
tempo pedaggico reservou 15 horas semanais s linguagens bsicas, 6
horas educao fsica e esportiva, alm de 6 horas s atividades de est
mulo. Para privilegiar a fomiao intelectual, a escola elementar tevede abandonar o procedimento de memorizao dos conhecimentos, tor
nando, assim, o esprito curioso em relao sua existncia e levando-o a
parti cipar de sua elabora o; era a conde na o dos programas, em beneficio
de uma ao pedaggica convidada a servir-se de todas as oportunidades
oferecidas pelo ambiente de vida imediato ou longnquo e a privilegiar
o trabalho individualizado, a investigao e a pesquisa de documentos
(Luc, 1985, p. 145-207).
29C ompreend e, aproximadamente, o perodo entre a 5ae a 8asries. (N.T.).
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A filosolia inspiradora dessa leloinu nao era absurda. No entanto, o
estimulo teria pressuposto medidas de acom panh amen to que foram me
nosprezadas. C om base na pretens o de suscitar as iniciativas, os professores
primrios haviam sido leva dos a des cobri r po r si mesmo s a ma ne ira co mo
implementar tais princpios. Ora, esse procedimento era muito mais difcil e
complexo que a aplicao de um programa bem definido. Convidados a
inovar sem ajuda nem instrues, os professores primrios adotaram as mais
diversas solues: uns uma minoria da ordem de um em cinco abandona
ram tal ensino, em especial, no curso elementar; outra minoria, um pouco
mais numerosa, disps-se a ministr-lo de forma episdica; os restantes con
tinuaram a ensinar a histria de forma regular, dos quais cerca da metade ou
seja, 25% do total conservou o programa anterior.
A transformao da histria em atividade de estmulo, na escola
pr im r ia , j havia sido em pr ee nd id a h vrio s anos qu an do ou tra re fo r
ma havia includo esta matria, precisamente, no Io ciclo. Apesar de sua
hostilidade aos mpetos reformistas, o ministro Ren Haby empreen
deu, nesse nvel, a unificao do ensino da histria, geografia e de um
rudimento de cincias econmicas e sociais, em nome da afinidade en
tre essas disciplinas relativamente a seus procedimentos, objetos e obje
tivos. Ainda neste aspecto, a inteno era interessante: a interdisciplina-
r idade em moda, nessa poca poderia permitir a abordagem do
mesmo objeto por vrios procedimentos convergentes. Entre os histo
riadores, uma corrente inovadora oriunda de Maio de 68 preconizava a
quebra dos compartimentos estanques; entretanto, em seu entender, o
ministro era suspeito de pretender subjugar o ensino s exigncias de
um capitalismo modernizador. Portanto, ele foi combatido, direita,
pe los co ns erva do res e, ao m es m o te m po , es qu erd a, pe los re fo rm ad o
res que o acusavam de traio.
Foi um deus-nos-acuda. Durante o ano de 1980, verificou-se uma
mobilizao miditica, sem precedentes, em favor da histria: na imprensa escrita, espocaram tanto as crticas, quanto as invectivas. A campanha
culminou no incio de maro: no dia 4, por ocasio do lanamento de seu
400 nmero, a revista Historia organizou uma jornada de debates com a
par tic ipa o do minis tro , de pol ti cos p or exe mplo, M. De br, E. Fau re,
J--P- Che vne men t - e de historiadores, tais como F. Braudel, E. Le RoyLadurie, M. Gallo, H. Carrre dEncausse, alm do presidente da Asso ci-
ao dos Professores de Histria e de Geografia (APHG). Tendo recebido a
espada de acadmico no dia 5, com a cerimnia de recepo na Aca dm ie
marcada para o dia 13, A. Decaux conferiu a esse debate uma repercusso
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s( iu precci lriilt s ! i>. t!u \
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A P I i l I I t ) I I
A profisso de historiador
A histria est presente na nossa sociedade no apenas atravs de
uma disciplina universitria, de livros e de algumas grandes figuras, mastambm - como ficou demonstrado no decorrer dos debates de 1980 -
po r um gr up o de pessoas qu e se afi rm am his tor iad ore s co m o ac ordo de
seus colegas e do pblico. Esse grupo, por sua vez, diversificado, com
pr ee nd en do es se nc ial me nte pro fes sor es e pe squ isa dores, est uni do po r
uma formao comum, uma rede de associaes e de revistas, assim como
pela co nsc in cia nt ida da im po rt nc ia da his tri a. Al m de co mp ar til ha r
critrios de julga me nto - sobre a produo de obras histricas, sobre o
que um bom ou ruim livro de histria, sobre o que um historiador
deve, o u no de ve, fazer , ele est unid o po r normas co mun s, a despeito
de previsveis clivagens internas. Em suma, estamos em presena de uma
prof isso po de ra m os diz er, qua se, de um a co rp or a o se lev arm os
em considerao o grande nmero de referncias ao ofcio, oficina e
banc ada de tra ba lho qu e cir cu lam no in te rio r do grup o.
A organizao de uma comunidade cientfica
A profisso de historiador aparece na transio da dcada de 1880
quando as faculdades de letras propuseram um verdadeiro ensino da his
tria.' Anteriormente, havia amadores muitas vezes, de talento; e, s
vezes, de gnio , mas no um a profisso, ou seja, um a coletiv idade o rga
nizada com suas regras, seus rituais de reconhecimento e suas carreiras. Os
1 Sobre esse assunto, poderemos consultar alm das obras de CAR BON ELL (1983) e KEY LOR
(1975) - o livro de Christoph e Charle, La R pubtiq ue des universitaires (1994); o artigo de NOIRIEL
(1990) e o texto de CO RB IN (1992).
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nicos especialistas, formados nos mtodos da erudio pela l:colc des chai
tes, fundada em 1821, eram os arquivistas palegrafos, em geral, isolados
nas sedes das administraes regionais e absorvidos pela edio cie docu
mentos e inventrios, sem vnculo com liceus e faculdades.
Ao tomarem o poder, os republicanos pretendiam criar na Frana, a
exemplo do que ocorria na Alemanha, um verdadeiro ensino superior;
tal iniciativa exigia uma profunda reforma para fornecer verdadeiros estu
dantes s faculdades de letras, graas s bolsas concedidas para a obteno
de licenar (1877) e de agrgation (1880), alm da criao, ao lado de cursos
pbli cos, de co nfern cias ho je , fala ramos de sem in rio s. Assim , os
estudantes tiveram a possibilidade de se iniciar, pela prtica, nos mtodos
rigorosos da erudio, tais como eles haviam sido ilustrados pelos bene
ditinos do sculo XVIII ou pelos alunos de VEcole des chartes e eram prati
cados pelas universidades alems.Essa reforma recebeu o vigoroso apoio de uma gerao de jo
vens historiadores, sensveis ao prestgio da historiografia alem e cr
ticos relativamente ao amadorismo literrio dos historiadores fran
ceses. Pouco antes da Guerra de 1870, a Revue critique dhistoire et de
littrature, fundada em 1866, a exemplo de Historische Zeitschrift, critica
va Fustel de Coulanges, autor de La Cit antique (1864), por no ter
pr oc ed id o a um a anli se su fi ci en te m en te sr ia dos fatos e de tal hes; no
entanto, a confirmao da nova histria cientfica ocorreu apenas
com a criao da Revue historque por G. Monod e G. Fagniez, em
1876, e com a nomeao de E. Lavisse como diretor do Departamento
de histria na Sorbonne ( N o r a , 1986).
A profisso de historiador construa-se na conjuno desse empreen
dimento de cientificizao da histria, que lhe conferia as normas me
todolgicas, com a poltica universitria dos republicanos ao garantir-lhe
uma moldura institucional. Com efeito, a reforma implicou a criao depos tos de pro fess ore s uni versit ri os ao lad o das ctedras qu e se mu lti pl i
caram e se especializaram: na Sorbonne, por exemplo, as duas ctedras de
histria existentes em 1878 passaram, em 1914, para 12.3 O departame nto
ganha visibilidade, sem atingir uma dimenso considervel em decorrn
cia do nmero reduzido de estudantes: em seu conjunto, as faculdades de
2T tulo outorgado no final do 3o ano universitrio. (N.T.).
3 Cifras fornecidas por DU MO UL IN (1983); por sua vez, KEY LOR (1975) apresenta nmeros um
po uc o mais elev ado s.
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I rh r . nu l u i t w l n .i S o i b o i i in \ n u i n i p . u a i i i m e n o s de 100 Icvikvs e m h i s t r ia ,
poi .mo , n o f in a l d o s c u l o X I X 1 e , e m 1914, e la s c o n t a v a m a p e n a s c o m
V > i . i te d r a s d e h i s t r i a .
A dupla hierarquia, estatutria e geogrfica, dos postos nas faculda
des permitiu a organizao de carreiras; as mais bem-sucedidas condu
zi.mi do posto de professor universitrio no interior a uma ctedra na
Sorbonne ( C h a r l e , 1990, p. 82 ss.). No entanto, a tomada de decises
competia aos pares: as nomeaes eram feitas pelo ministro a partir da
prop os io do Con se lh o de cad a fac uld ade. Os ca nd idatos er am ju lg a
dos, po rta nt o, pel a bit ola de seu va lor cien tf ico , tal co m o ele hav ia sido
apreciado pelos colegas da disciplina, e por sua notoriedade no mundo
acadmico, uma vez que os votantes eram os professores titulares de
todas as disciplinas.
Co mo as carreiras depend iam do julgam ento dos pares, as normas profissionais adotadas por eles impunham-se corporao e con
tribuam para unific-la; a tese deixou de ser uma dissertao para
tornar-se um trabalho de erudio, elaborado a partir de documentos,
e, em primeiro lugar, de documentos de arquivos. O respeito pelas
regras do m todo cr tico - formalizado, um p ouco mais tarde, por
Langlos e Seignobos, para uso dos estudantes ( L a n g l o i s ; S e i g n o b o s ,
I897) quand o um primeiro trabalho de pesquisa lhes era imposto
antes de se submeterem prova da agrgation, para a obteno do Di
plom a de Es tu do s Su pe riores (18 94 ), to rn ou -s e a co nd i o prv ia ab
soluta de qualquer reconhecimento pelos pares. A corporao adotou
critrios de admisso e de excluso. De uma forma bastante pragmti
ca, ela tambm produziu mtodos de trabalho: a partir de ento, as
fichas substituram os cadernos para as anotaes extradas dos docu
mentos; ao mesmo tempo, as bibliografias e as referncias de rodap
se tomaram incontornveis.
A profisso de historiador que se constituiu nas faculdades, entre
1870 e 1914, no deixou de permanecer, entretanto, vinculada ao ensino
mdio; com efeito, a maior parte das carreiras de professor de faculdade
comeavam pela obteno de um posto de agrg em um liceu. Alis, no
seria essa a nica posio que permitia a um pesquisador preparar sua
lese? A nomeao para a faculdade no descartava a eventualidade de
algum vir a ser integrado ao ensino mdio porque a preparao dos
4 GE RB OD (1965, p. 115) indica 40 licences em 1871 e, em 1898, 70.
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e s t u d a n t e s p a r a a agrgation c o n s t i t u a u m a d a s p r in c i p a i s f u n e s r io s p r o
f e s s o r e s ;5 p o r t a n t o , a s d u a s o r d e n s d e e n s i n o p e r m a n e c e r a m s o l id r i as .
Essa solidariedade acarretou particularidades notveis que marcaram
a singularidade dos historiadores franceses. Os professores universitrios
bri tn ico s ou aleme s n o possu am vn cu los an logos co m o en sin o m dio,
nem eram contratados entre os professores de gram mar school ou de Gym
nasium. As qualidades retricas indispensveis ao sucesso no concurso da
agrgation tinham, naturalmente, menos importncia no exterior que na Fran
a e era possvel contentar-se em ler seu texto. Entre os nossos vizi
nhos, inversamente, pela pesquisa que os candidatos s ctedras univer
sitrias se destacam. Eles permaneciam na rbita dos seminrios que os
haviam formado e constituam uma plataforma de investigao, sem equi
valente fora da Frana.
Alm de explicar a preferncia pelas idias gerais e a importnciaatribuda s qualidades de composio e de expresso, o vnculo entre a
pro fiss o de hi sto riad or e o en sin o m d io jus tif icav a o pa re ntes co bas
tante forte que unia a histria geografia. Todos os historiadores france
ses fizeram geografia porque essa disciplina obrigatria no concurso
de agrgation e, com a histria, todos eles a ensinaram aos alunos do
ensino mdio; deste modo, na Frana, a geografia tem sido ensinada nas
faculdades de letras, e no nas faculdades de cincias, como ocorre no
exterior. Essa singularidade epistemolgica foi fortalecida pela influn
cia de mestres, tais como Vidal de Lablache, cujo livro Tableau de la
gog rap hie de la France6 marcou sucessivas geraes de historiadores e, em
parti cu la r, os fu nd ad ores dos Annal es, como eles prprios tinham prazer
em sublinhar; deste ponto de vista, conviria estabelecer um balano das
conseqncias positivas e negativas do impacto da geografia sobre Blo-
ch, Febvre ou Braudel.
A escola dos An na les e a histria-pesquisa
Uma revista de combate
N o un ivers o acadm ico , a prof iss o de hi sto ria do r se be ne fic iou, no
final do sculo XIX, de uma dupla preeminncia. Por um lado, como
5Ver sobre este aspecto, o estudo de CH ERVE L, 1992, em particular, o captulo VIII, Lagrgation et
les disciplines scolaires.
6Tomo I de His toire de la France dep uis les orig ines jus qu la R vo lu tio n , dirigida por Lavisse (1903).
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unos m ar. ,n m u, *Itm* >
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eleito paia outra ctedra em I'MS, j ha via ( om ple lad o \ anos qu an do leve
acesso ctedra de histria da Revoluo, em 1937.
O retraimento e a decrepitude da histria universitria acarretaram
um verdadeiro conservadorismo; a renovao metodolgica, a abertura
para nov as pro ble m tic as e par a no vo s ho riz on tes ficara m com prom et idas
pe lo im ob il is mo . Em de co rr n ci a, pa rt ic ul ar m en te , de sua po si o no
ensino mdio e de seu papel no concurso da agrgation, a histria poltica
manteve sua preeminncia. Do ponto de vista institucional, tornou-se
necessrio procurar paliativos: a dificuldade de acesso Sorbonne au
mentou o interesse pelos estabelecimentos de ensino franceses no exterior,
tais como as Escolas de Atenas e de Roma, e ainda mais, em Paris, pela
Ecole des hautes tudes (IV seo) e polo Collge de France.
Simultaneamente, surgiram os primeiros elementos do que vir a
ser o CNRS; criada em 1921, a Casse des recherches scientifiquessubvencionou os trabalhos em curso. Em 1929, Marc Bloch se beneficiou desse
recurso para sua investigao sobre as estruturas agrrias. Vrias institui
es - Caisse nationale des lettres (1930), Conseil suprieur de la recherche scien
tifique (1933) e Caisse nationale de la recherche scientifique (1935) prodigaliza
ram um tratamento favorvel aos historiadores ao financiarem colees e
grandes inventrios. Em 1938, G. Lefebvre obteve uma subveno para
mandar empreender pesquisas relativamente situao dos casebres insa
lubres. Nestas condies, apareceram os primeiros professores com con
trato por tempo determinado; alm disso, o Estado chegou a remunerar
pesqu isa dor es pro fiss ion ais, cu ja n ica co nt rapa rti da con sist ia em efe tuar
suas investigaes. No caso da histria, tratava-se, quase sempre, de pes
soas idosas, cujo mrito havia sido reconhecido tardiamente, tais como
Lon Cahen, secretrio da Socit dhistoire modeme, que foi contratado
como professor na rea da pesquisa aos 62 anos.
Ne sse co nt ex to in st itu ci on al de um a pro fis so em cri se, co nv m
incluir a fundao, por Marc Bloch e Lucien Febvre, em 1929, dos An
nales dhistoire conomique et sociale.11 A iniciativ a deve ser analisada, a um
" Raros episdios da historiografia foram to estudados. Citaremos, em particular, o colquio de
Estrasburgo editado por CAKBONELL; LIVET, 1983. Do lado dos defensores da herana, ver os
artigos Annales de REVEL e CH ART IER, assim como Histoire nouv elle de GOFF (1978); ver,
tambm, os artigos de BUR GU IRE (1979) e de REVE L (1979), o de Pomian (1986), alm da obra
de STOIA NOV ICH (1976), com prefcio de F. Braudel. Ne m po r isso sero menosprezados os estudos
dos adversrios, em particular, COU TAU -BGA RIE: sua obra, Le Phnomne nouvelle histoire(1989) -
s vezes, exagerada apresenta um nmero considervel de informaes. O texto de J. H. Hexter,
Fernand Braudel & the Monde Braudellien [s/c], retomado em O/iHistorians (p. 61-145), repleto
de veive e de perspiccia; alm disso, o balano lavrado por GLENIS SON em 1965, em Lhistoriographie
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mi temp o, om.i um i < ti ii> t-i.i juoliv.mii.il e i'oino um n ovo pa radigma
da historia I .--. dm r.ti ' to-. \,io ind issoci vei s: a quali dade cie ntf ica do
|iaradignia condi loiiava o sucesso da estratgia; inversamente, a estratgia
orientava o paradigma. Alis, a iniciativa obteve sucesso sob esse duplo
aspecto: alm de terem sido titularizados em Paris L. Febvre no Collge
de France, em 1933, e M. Bloch na S orbonne, e m 1936 , tom ou-se in -
contomvel o tipo de histria promovido por ambos.
A novidade dos Ann ales no est no mtodo, mas nos objetos e nas
questes. As normas da profisso foram integralmente respeitadas por L.
Febvre e M. Bloch: o trabalho a partir dos documentos e a citao das
fontes. Eles haviam aprendido o oficio na escola de Langlois e Seigno-
bo s,12 sem de ixa r de cri ticar a estr eit eza das ind aga es e a fra gm ent ao
das pesquisas; rejeitam a histria poltica factual que, nessa poca, era
dominante em uma Sorbonne que, alm de se isolar, estava corroda peloimobilismo. Eles chegaram a diabolizar, sem poupar exageros e simplifi
caes ( D u m o u l i n , 1972, p. 70-90; Prost, 1994), essa histria historici-
zante o termo foi criado por Simiand no debate de 1903 para opor-
lhe uma histria amplamente aberta, uma histria total, empenhada em
assumir todos os aspectos da atividade humana. Essa histria econmica
e social - para retomar o ttulo da nov a revista - p retendia acolhe r as
outras disciplinas: sociologia, economia e geografia. Histria viva, ela se
interessava diretamente pelos problemas contemporneos. A maior origi
nalidade da revista, entre 1929 e 1940, foi o lugar considervel atribudo aos
sculos XIX e XX: 38,5% dos textos incidiram sobre esse perodo, contra
26% do espao reservado aos diplomas de estudos superiores, 15,6% s
teses e 13,1% aos artigos da Revue historique ( D u m o u l i n , 198 3).13
Do ponto de vista cientfico, o paradigma dos An nal es fornecia
histria uma inteligibilidade bastante superior: a vontade de sntese, relacio
nando os diferentes fatores de uma situao ou de um problema, permitiacompreender, a um s tempo, o todo e as partes. Tratava-se de uma
histria mais rica, mais viva e mais inteligente.
franaise contemporaine, continua sendo til e profundo. Para a evoluo ulterior, alm do compndio
dc BOURD e MARTIN (1983), mencionaremos DOSSE, cm L Histoire en miettes.Por ter tomado
conhecimento demasiado tarde da obra de RAPHAL (1994), no a levei em considerao neste estudo.
12Marc Blo ch evoca o ho mem de inteligncia to perspicaz que foi meu caro mestre, Seignobos (1960,
p. 16). E, em out ro trech o, falando d ele e de Langlois, escreve: Re cebi preciosas demon strae s da boa
vontade de ambos; fico devendo grande parte de meus primeiros estudos a seu ensino e a suas obras (p. 109).
15Lem bremo s que o Diploma de Estudos Superio res correspond e atual mahrise.
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Entretanto, a criao dos An na les perseguia, simultaneamente, desa
fios mais estratgicos, comprovando-se a veracidade de que todo proje
to cientfico inseparvel de um projeto de pode r.14 Neste caso, os A n-
nales empreendiam o combate em duas frentes: por um lado, ataque
contra a concepo dominante da histria, o que correspondia a uma
disputa leal, uma vez que seus representantes se encontravam em compe
tio com os partidrios dessa histria para obter a hegemonia no campo
da disciplina;15 por o utro, reivin dicao para a histria de um a posio
privil egi ada no ca mp o das ci ncias socia is ain da em via de est ru tur a o .
Ao preconizar uma histria aberta s outras cincias sociais, ao afirmar a
unidade profunda de tais cincias e a necessidade de seu vnculo recpro
co, eles defendiam a histria como o prprio espao desse vnculo. Con
feriam-lhe, assim, uma espcie de preem inncia: a histria - a nica capaz
de fazer convergir as cincias sociais e de promover a ligao entre as
respectivas contribuies - tomava-se a disciplina rainha, mater et magistra,tanto mais que ainda no havia uma rival suficientemente forte para con
testar-lhe esse papel. Ao retomar por sua conta, com a condenao da
histria historicizante, as perspectivas defendidas pelos socilogos no de
ba te de 190 3, os Ann ales fortaleciam a posio dominante que a histria
havia assumido 11 0 incio do sculo; a adeso dos historiadores ao seu
campo era tanto mais facil na medida em que suas proposies apareciam
como mais bem posicionadas para confirmar a supremacia da histria. A
estratgia extema dos Ann ales, diante das outras cincias sociais, fortale
ceu, assim, sua estratgia intema, diante das outras formas de histria.
A in st it uc io na li za o de um a es co la
Aps a guerra, os Ann ales - cuja revista passou a ter o ttulo de A nn a-
les, conomies, Socits, Civilisations perseguiram essa dupla estratgia em
um contexto diferente. Em primeiro lugar, em 1947, com o apoio de
fundaes americanas e da diretoria do ensino superior, a criao de umaVT section na Ecole pratique des hautes tudes direcionada para as cincias
econmicas e sociais, cuja presidncia foi entregue a L. Febvre. No incio
4BU RG UI RE (1979): O historiador est inserido em uma rede complexa de relaes universitrias e
cientficas, cujo pretexto a legitimao de seu saber - o u seja, de seu trabalho - e a preeminncia de
sua disciplina. Da domina o puram ente intelectu al s mltiplas repercusses sociais dessa domina o,
a ambio cientfica pode adotar um verdadeiro leque de objetivos mais ou menos comuns, segundo o
temperamento do cientista e sua posio na sociedade.
15Temv el polemista, Lucien Febvre perdeu o co ntrole, nesse combate, a ponto de comete r injustias ainda
remanescentes; apresento alguns exemplos de suas posies no meu artigo Seignobos revisite (1994).
Sobre a diabolizao de seus adversrios pelos Annales, ver DUMOULIN (1983, p. 79-103).
40
il.i dn.uLi li 'i! i i, . r.mit m o loi .r.Minildo poi Irm .iiu l Hi.uulrl que
vmli.i di m i toip.i^ md o poi mi,i tese sobre /ai Mditerrcinc / poque de
PUilippc II (lM9) r,
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Por outro, .1 histria problema (Ir longa durao e, naturalmente, serial: a
regio do Beauvaisis, de P. Goubert, ou Li Mditenane, de F. Braudel,
uma histria global, atenta s coerncias que servem de liame aos aspectos
eco nm ico, social e cultura l.19
Para enfrentar o desafio da lingstica e da etnologia, os historiado
res que se autoproclamam novos privilegiaram novos objetos e
novas abordagens para retomar o ttulo de dois dos trs volumes de Faire
de Vhistoire. Certamente, ainda subsistem historiadores fiis vontade de
compreenso global da primeira fase dos Ann ales, mas um grande nmero
renunciou a essa ambio, considerada exagerada, para dedicar-se ao es
tudo de objetos limitados, cujo funcionamento desmontado por eles. O
livro de E. Le Roy Ladurie, Mon taillo u20 (1975), por seu prprio sucesso,
confirmou o deslocamento dos temas originais: apesar de evidentes con-
tinuidades, a monografia suscitou, da em diante, mais interesse que oafresco panormico, o acontecimento tomou-se o revelador de realida
des que, caso contrrio, permaneceriam inacessveis (P o m i a n , 1984, p. 35);21
assim, passava-se das estruturas materiais para as mentalidades, ao passo
que o inslito levava a melhor sobre a relao com o presente.
Simultaneamente, o aspecto poltico voltou com todo o vigor e, em
sua companhia, o acontecimento: a implosao das democracias populares
e o trabalho coletivo sobre a memria da guerra prestavam homenagem
ao tempo curto e, com um vivo interesse, foi possvel seguir Marc Feiro,
ex-secretrio da redao dos Ann ales , na srie televisiva semanal, Histoire
paral lle, ao revisitar as atualidades da ltima guerra.
Desde ento, tomou-se possvel fzer todo o tipo de histria: a extenso
ilimitada das curiosidades histricas tratadas acarretou o fracionamento dos
objetos e dos estilos de anlise; esse precisamente o tema da histria em
migalhas ( D o s s e , 1987). Em vez de continuar a se definir atravs de deter
minado paradigma cientfico, a escola dos Annales pautou-se por sua realidade social de grupo centrado sobre uma instituio (a EHESS e a revista).
A histria em migalhas no o fim dos plos de influncia, mas apenas o de
sua definio em tennos cientficos.
9Trata-se da pesquisa Beauvais et le Beauvaisis de 1600 I 130. Contribution Vhistoire sociale de la France du
X VI I sicle(1982), em que, alm dos grandes comerciantes, o autor tentou conhecer os camponeses desta
regio a 70 km a norte de Paris. (N.T.).
20 Referncia monografia etnogrfica - Montaillou, village occitan - em que ele estuda o mundo dessaaldeia de pastores do sculo XIV. (N.T.).
21V oltarei a este aspecto na concluso deste livro.
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A Irmjmentao da profisso
Plos de influncia
O sucesso, pelo menos, provisrio dessa estratgia externa preser
vou a posio da histria no campo das cincias sociais e foi acompanhado
pe lo suces so da estr atgia in te rna disc ipli na. A cria o da EH ES S n o se
limitou a uma mudana de nome: semelhante s universidades, o novo
estabelecimento pde conferir doutorados. Diante da Sorbonne, enfra
quecida e dividida aps 1968, um plo autnomo se constituiu e se con
solidou e nele se afirmava uma histria isenta das condicionantes do ensi
no, inclusive, superior. No mesmo momento, o efetivo dos historiadores
conheceu um brusco crescimento: seu nmero passou de algumas cente
nas, em 1945, para um milhar de professores universitrios e de pesquisa
dores, em 1967, e, em seguida, para o dob ro, em 1991.22 A profisso de
historia dor se manif estou, assim, aos pouc os, en tre dois ou, antes, trs -
p los de in flu n cia des igu al qu e tra a ram um a esp ci e de tri n gu lo no
quartier Latin :23 cada um dispunha de seus prprios meios de publicao,
de suas prprias redes de influncia e de suas clientelas.
O plo universitrio continua sendo o mais importante e, por fora,
o mais tradicional, uma vez que leva aos concursos de contratao; em si
mesmo, plural, disseminado entre uma meia dzia de universidades na
regio parisiense e alguns grandes centros no interior do pas (por exem
plo , Ly on ou Ai x- en -P ro vi nc e) . Ele co nt ro la as rev istas clssicas, tais co m o
a Revue historique ou a Reime dhistoire modeme et contemporaine] suas pesqui
sas so publicadas pelas editoras das universidades (P UF)21 ou pelas edito
ras clssicas (Hachette); domina as teses, os comits de especialistas e as
carreiras universitrias. Apesar de ser, incontestavelmente, o plo mais
po de ro so pe lo n m er o e pela div ers ida de de seus in tegran tes e ativid a
des, sua plena irradiao impedida pelas rivalidades internas.
O segundo plo constitudo pela EHESS, fortalecida pelo CNRS.
As pesquisas so mais livres e a inovao tem sido mais facilitada: o desejo
22 Ver CHAR LE (1993, p. 21-44) e BO UTIE R; JULIA (1995, p. 13-53). Limitando-se aos historia
dores, titulares de postos nas universidades, esses autores indicam (p. 29) as cifras de 302, em 1963, e
de 1.155, em 1991.
23Bairro Latino , na margem esquerda do rio Sena: com a fundao da Sorbonne em 1257, esse bairro
parisi ense con cen tra , em gran de parte , a vid a univ ersit ria. (N. T.).
24 Sigla de Presses universitaires de France [Editoras Universitrias da Frana], (N.T.).
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5/28/2018 PROST, Antoine. Doze Lies Sobre Histria. BH; Autentica, 2008
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de explorar novos territrios 01 1 novos procedimentos est isento de qual
quer restrio pedaggica. Esse plo apia-se em uma poderosa rede de
relaes internacionais, a qual, certamente, tem como referncia o prest
gio dos An na les. Entre seus trunfos, ele tem cultivado com esmero as
relaes estabelecidas com a mdia e as editoras: o semanrio Le Nouvel
Observateur aceita, de bom grado, as resenhas elaboradas por algum dos
diretores de departamento ou de pesquisa da