prÁticas integrativas e complementares no controle da ansiedade: yoga, meditaÇÃo e ... · 2020....
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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO FACULDADE DE CIÊNCIAS FARMACÊUTICAS
Curso de Graduação em Farmácia-Bioquímica
PRÁTICAS INTEGRATIVAS E COMPLEMENTARES NO CONTROLE DA
ANSIEDADE: YOGA, MEDITAÇÃO E TAI CHI CHUAN
Fernanda de Carvalho Rocha Vieira
Trabalho de Conclusão do Curso de
Farmácia-Bioquímica da Faculdade de
Ciências Farmacêuticas da
Universidade de São Paulo.
Orientador(a): Prof.(a). Dr(a) Maria
Aparecida Nicoletti
São Paulo
2020
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SUMÁRIO
Pág.
Lista de Abreviaturas .............................................................. 3
RESUMO .............................................................................. 4
1. INTRODUÇÃO 5
2. OBJETIVOS 7
3. MATERIAL E MÉTODOS 7
4. RESULTADOS E DISCUSSÃO 8
5. CONSIDERAÇÕES GERAIS
26
6. CONCLUSÃO 27
7. BIBLIOGRAFIA 27
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LISTA DE ABREVIATURAS
ACTH. Hormônio Adrenocorticotrófico ANVISA Agência Nacional de Vigilância Sanitária BDNF Fator neurotrófico derivado do cérebro BZD Benzodiazepínico CAR Cortisol awakening response CBD. Canabidiol CRH Hormônio Liberador de Corticotrofina DMPFC Dorsomedial PFC (córtex pré-frontal) FDA Food and Drug Administration GC. Glicocorticóide HPA. Hipotálamo-Pituitária-Adrenal IDATE Inventário de Ansiedade Traço-Estado
ISRS Inibidores seletivos de recaptura de seratonina NK-1 Neurocinina-1 NO. Óxido Nítrico OMS Organização Mundial da Saúde PANAS. Escala de Afeto Positivo e Afeto Negativo PIC Práticas Integrativas e Complementares
PNPICs Política Nacional das Práticas Integrativas e Complementares
PSS. Perceived Stress Scale (Escala de Estresse Percebido) SERT Transportador de serotonina SNC Sistema Nervoso Central SP Substância P
STAI State-Trait Anxiety Inventory (Inventário de Ansiedade Traço-Estado) SUS Sistema Único de Saúde TCC Tai Chi Chuan THC Tetrahidrocanabinol
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RESUMO
DE CARVALHO ROCHA VIEIRA, FDCRV. Práticas Integrativas e Complementares no controle da ansiedade. 2009. 32p. Trabalho de Conclusão de Curso de Farmácia-Bioquímica – Faculdade de Ciências Farmacêuticas – Universidade de São Paulo, São Paulo, 2020. Palavras-chave: anxiety; yoga; meditation; tai chi chuan
INTRODUÇÃO: A ansiedade é um estado emocional com componentes
psicológicos, fisiológicos e sociais. Apesar de funcionar como uma função
natural do organismo de preparo diante a uma situação nova e desconhecida,
passa a ser patológica quando começa a comprometer o cotidiano causando
prejuízos importantes na capacidade funcional do indivíduo. Estudos indicam
que o yoga e outras Práticas Integrativas e Complementares como o tai chi e a
meditação podem ser eficazes na prevenção e no tratamento de distúrbios
induzidos por estresse, como a ansiedade. OBJETIVO: Analisar, por meio da
revisão da literatura, os efeitos de Práticas Integrativas e Complementares como
yoga, meditação e tai chi chuan como alternativas não farmacológicas
coadjuvantes no tratamento da ansiedade; compreender as características da
população frente a questão social e econômica que gera ansiedade e como ela
pode ser manejada com terapias cognitivas; avaliar o impacto na saúde pública
brasileira, isto é, como tais práticas estão inseridas no cenário nacional e no
Sistema Único de Saúde. MATERIAL E MÉTODOS: O presente trabalho foi
conduzido por meio de revisão narrativa. Para a revisão foram utilizados bancos
de dados eletrônicos como SciELO, Medline (Medical Literature Analysis and
Retrieval System Online), Cochrane, Scopus e Web of Science além de
documentos disponibilizados em sites institucionais nacionais e internacionais
que colaboraram com o entendimento do cenário apresentado. RESULTADOS:
As práticas de yoga, meditação e tai-chi podem, pelo menos em parte, reduzir
as respostas ao estresse e alterações cardiovasculares, imunológicas e
endócrinas relacionadas, bem como promover uma melhor resposta psicológica
ao estresse. Os resultados sugerem que os níveis de ansiedade foram
significativamente reduzidos com as técnicas de respiração conhecidas como
pranayama em uma população clínica. A meditação também pode promover
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mudanças neuroplásticas no sistema cerebral executivo, com modificações
físicas do formato e tamanho do cérebro e da amígdala. CONCLUSÃO: O
presente trabalho esclareceu os benefícios fisiológicos que as Práticas
Integrativas e Complementares em Saúde escolhidas (yoga, meditação e tai chi
chuan) podem ser uma alternativa não farmacológica na prevenção e tratamento
da ansiedade, e como tais práticas podem atuar como potenciais
desmedicalizadores no uso abusivo e indiscriminado de benzodiazepínicos,
reduzindo efeitos indesejados e um custo enorme em termos de sofrimento
humano, incapacidade e prejuízos econômicos.
1. INTRODUÇÃO
O campo das Práticas Integrativas e Complementares em saúde no Brasil
constitui fenômeno de crescente visibilidade. Sua legitimação ocorreu a partir do
incentivo da Organização Mundial da Saúde (OMS) nos anos 70 e do Ministério
da Saúde no Brasil, por meio da Política Nacional de Práticas Integrativas e
Complementares (PNPICs) de 2006. Desde então, ampliaram-se as práticas
para 29 Práticas Integrativas Complementares (PIC), incluindo a medicina
tradicional chinesa (da qual faz parte o tai chi chuan), yoga e meditação [1].
As Práticas Integrativas e Complementares estão disponíveis aos
usuários do Sistema Único de Saúde (SUS) e sinalizam para uma visão da saúde
entendida como bem-estar amplo, que envolve uma interação complexa de
fatores físicos, sociais, mentais, emocionais e espirituais. Além disso, elas
valorizam a integração do ser humano com o meio em que vive e favorecem a
integralidade de atenção à saúde numa perspectiva participativa que articula
vivências e espaço de saúde, estimula o autocuidado e a ênfase na saúde ao
invés da doença [2]. Seu foco, portanto, está na prevenção e promoção da saúde
e não apenas na assistência, tendo seu movimento se intensificado com o
aumento da demanda causado por doenças crônicas, insatisfação com os
serviços de saúde existentes e a crítica à relação assimétrica de poder entre
médicos e pacientes, dentre outros fatores [3]. Neste âmbito, as PIC dão
autonomia ao usuário em escolher a forma de cuidado além de responsabilizar
o usuário pelo cuidado da sua própria saúde. Ademais, apresentam como
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potencialidade a possibilidade de contribuição para a desmedicalização nos
serviços de saúde [2].
O Brasil é recordista mundial em prevalência de transtornos de
ansiedade: 9,3% da população sofre com o problema; ao todo, são 18,6 milhões
de pessoas [4]. A ansiedade é um estado emocional de nervosismo, tensão,
preocupação e apreensão que uma pessoa pode se encontrar por diversas
razões [5]. Distúrbios induzidos por estresse, como a ansiedade, podem ainda
exacerbar desordens como doença cardiovascular, obesidade, dor crônica,
osteoporose, complicações psicossomáticas, diabetes mellitus, depressão,
distúrbios gastrointestinais e de sono [6].
O yoga vem se destacando dentro das Práticas Integrativas e
Complementares na gestão da ansiedade. A respiração trabalhada nesta prática,
como a chamada pranayama, juntamente com series de postura e meditação
podem levar rapidamente a mente ao momento presente e reduzir o estresse e
sofrimento [6]. Isso porque o yoga atua melhorando funções autonômicas por
meio de mecanismos neuro-hormonais ativadores que suprimem a atividade
simpática por meio da regulação negativa do eixo hipotálamo-hipófise-adrenal,
além de levar à redução da frequência cardíaca e pressão arterial e reduzir níveis
de cortisol [7].
Tai chi chuan (TCC), é uma arte marcial chinesa antiga que inclui
exercícios aeróbicos tradicionais de baixa a moderada intensidade e envolve
essencialmente aprender uma sequência de movimentos que inclui movimentos
corporais circulares e espirais. Os indivíduos praticam o TCC, principalmente,
para desenvolver a interação mente-corpo, controle da respiração e do
movimento, coordenação olho-mão e um estado mental tranquilo. Nos últimos
anos, a prática do tai chi chuan tem sido associada a um melhor equilíbrio
postural, parâmetros cardiorrespiratórios, força muscular, flexibilidade, memória
e com resultados positivos no tratamento dos sintomas de insônia [8]. Há
evidências científicas de que uma única sessão de tai chi chuan se apresenta
como uma excelente alternativa de redução de sobrecarga cardiovascular, além
de ser outra forma capaz de fornecer o controle da pressão arterial do praticante [9].
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A medida que o tratamento medicamentoso convencional para distúrbios
relacionados ao estresse, como a manifestação de ansiedade, pode levar a
vários eventos adversos indesejáveis (como desenvolvimento de obesidade e
distúrbios metabólicos para o tratamento medicamentoso inibidor seletivo da
recaptação de serotonina) e tendo em vista o uso exacerbado de ansiolíticos na
sociedade, tais práticas apresentam-se como alternativas não farmacológicas
interessantes na prevenção e promoção da saúde, atuando em processos
inflamatórios, imunológicos e endócrinos [6] os quais estão abordados neste
texto. 2. OBJETIVO(S)
Objetivo Geral: • Analisar, por meio da revisão da literatura, os efeitos das Práticas
Integrativas e Complementares (yoga, meditação e tai chi chuan) como
alternativas não farmacológicas coadjuvantes na ansiedade.
Objetivos Específicos:
• Compreender as características da população frente a questão social e
econômica que gera ansiedade e como ela pode ser manejada com
terapias cognitivas;
• Avaliar o impacto de tais práticas inseridas no cenário nacional. 3. MATERIAL E MÉTODOS
Para a revisão foram utilizadas buscas para a obtenção de dados sobre o
estudo do tema os bancos de dados eletrônicos como SciELO, Medline (Medical
Literature Analysis and Retrieval System Online), Cochrane, Scopus e Web of
Science além de documentos disponibilizados em sites institucionais nacionais
e internacionais que colaborem com o entendimento do cenário a ser
apresentado.
O período considerado incluiu artigos científicos dos últimos 10 anos, nas
línguas portuguesa e inglesa, que após a leitura do título e resumo a leitura do
artigo na íntegra foi selecionado levando em consideração a confiabilidade, as
citações e a relevância do tema no que envolve a ansiedade e as PIC escolhidas.
Os descritores empregados foram “anxiety”, “benzodiazepines”, “anxiolytics”,
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“abuse”, “consumption”, “burnout”, “self-medication”, “yoga”, “meditation”, “tai chi
chuan”, “práticas integrativas e complementares”, “self-care”, “stress”
“hormones” “breath”. 4. RESULTADOS E DISCUSSÃO
Dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) apontam que a
prevalência mundial do transtorno de ansiedade é de 3,6%. No continente
americano esse transtorno mental alcança maiores proporções e atinge 5,6% da
população, com destaque para o Brasil, onde o transtorno de ansiedade está
presente em 9,3% da população, possuindo o maior número de casos de
ansiedade entre todos os países do mundo [10].
A ansiedade foi definida como uma emoção negativa caracterizada por
um desagradável estado de turbulência interna, muitas vezes acompanhada por
comportamento nervoso. Em contraste com o medo, que é induzido por ameaça
real ou imediata, a ansiedade é um sentimento desagradável ou expectativa de
ameaça futura. Ela pode ser induzida quando há falta de informações suficientes
para fazer julgamentos ou decisões adequadas sobre o ambiente em mudança [11].
A ansiedade se manifesta patologicamente em uma ampla gama de
transtornos psiquiátricos, sendo necessário diferenciar a ansiedade comum
(condição emocional construtiva e desejável, essencial ao desempenho do
indivíduo e importante como um mecanismo de sobrevivência que nos permite
preparar para um possível perigo) da ansiedade patológica, isto é, aquela que
persiste fortemente na ausência de um perigo real, envolve emoção exagerada
levando à diminuição da capacidade produtiva do indivíduo, impede a realização
das atividades diárias, prejudica o cotidiano e torna-se, portanto, um transtorno
de ansiedade. Coração disparado, músculos tensos, dor de barriga, boca seca
são alguns dos sintomas relatados, que são consequência de uma reação em
cadeia de adrenalina [12].
Quando estamos estressados, os hormônios adrenais aumentam nossa
frequência cardíaca, pressão arterial e açúcar no sangue, além de amortecer o
sistema imunológico. Deste modo, a pessoa ansiosa obtém algumas horas de
desempenho superior, mas como consequência tem estresse no cérebro e no
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corpo [13].
Considerando historicamente a questão da ansiedade, na época vitoriana
há relato de ingleses que se sentiam ansiosos com o crescimento das cidades,
abismo entre ricos e pobres e tecnologias novas [12]. Hoje, tal ansiedade parece
manter-se. O número de indivíduos com depressão ou outras doenças de origem
psicossomáticas (ansiedade, estresse, mudanças abruptas de humor,
bipolaridade, etc.) tem crescido a cada ano, o que é contraditório em um tempo
histórico em que a positividade é tão reverberada. [14]
Uma publicação de 2018 trouxe reflexões interessantes acerca da
característica da população frente a questão social e econômica que estabelece
valores e gera ansiedade, bem como a respeito de uma sociedade que vive um
momento de auto exploração e autodisciplina, a qual não necessariamente
implica liberdade:
“A sociedade do desempenho estabelece modos de vida que se expressam por um
excesso ou tirania da positividade, produzindo sujeitos que devem buscar sempre
superar-se com relação aos seus ganhos. Com isso, são engendradas subjetividades e
sociabilidades agenciadas pela multitarefa e constante (auto)produção. Inversamente,
esses pressupostos têm gerado, contudo, culpas e frustrações, mecanismos de
sofrimento que vêm desencadeando patologias neuronais diversas, uma vez que os
modelos impostos não são factíveis em sua realização. Ao invés de sujeitos com
desempenhos sempre crescentes, as cobranças resultam num cansaço psíquico que
induz a doenças muitas vezes difíceis de serem superadas, já que continua a ser
propagado o preceito de que o normal seria idealmente aquele desempenho uma vez já
não alcançado. Na sociedade do desempenho os sujeitos estão, assim, fadados a
falharem. Ao se entregar aos postulados do desempenho e suas urgências o sujeito pode
deixar escapar o olhar necessário sobre si mesmo” [14].
Outro ponto de relevância em torno do tema da ansiedade é a influência
das redes sociais e suas consequências para o bem-estar psicológico, dado que
as redes sociais têm sido utilizadas por vezes, mesmo que inconscientemente,
como uma forma de comparação social, especialmente em redes dedicadas a
conteúdo visual, como o Instagram. As mulheres, em particular, comparam sua
imagem com a de outras, então são particularmente vulneráveis à auto
objetificação, ansiedade, satisfação corporal e percepção inferior de si mesmas [15].
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Embora os sites de redes sociais tragam uma conveniência gigantesca e
até mesmo resultados psicológicos positivos associados como autoexpressão,
formação de identidade, benefícios cognitivos relacionados ao funcionamento
executivo, sentimento de pertencimento e aprimoramento das conexões, muitos
efeitos negativos sobre o bem-estar psicológico dos usuários precisam de mais
investigação, entre eles o aumento da solidão e ansiedade associados ao uso
de redes sociais que tem sido relatados nos últimos anos[16] .
Um estudo analisou a relação entre extroversão, necessidade de
aprovação e tempo no Facebook como indicadores de ansiedade e os resultados
indicaram que a necessidade de aprovação estava positivamente associada à
ansiedade. Isso indica que quanto mais um indivíduo precisa da aprovação dos
outros, mais ansioso ele tende a ficar. Também é possível que o medo de uma
avaliação negativa dos amigos do Facebook exacerbe a ansiedade. Isso seria
consistente com as evidências que indicam que o medo da avaliação negativa
produz ansiedade social. Além disso, aqueles que passam mais tempo on line
podem perceber o Facebook como uma fonte primária de validação de outras
pessoas. Assim, se alguém não receber feedback positivo e / ou instantâneo de
suas postagens, isso pode elevar os níveis de ansiedade [17].
O nível de estresse por gerações foi relatado em uma pesquisa
realizada nos Estados Unidos da América, sendo possível perceber que as mais
jovens são também as mais conectadas, com mais relações e muito mais
estressadas. Em suma, os níveis de estresse de adultos mais velhos
(classificados como "Tradicionalistas" na pesquisa “Stress in America”) no ano
de 2017 foram os mais baixos (3,3 em uma escala de 1 a 10) entre as gerações.
Já a geração Y (idade entre 18 e 38 anos) continua a ter os mais altos níveis de
estresse desde 2014, com a pesquisa deste ano encontrando um nível médio de
estresse de 5,7, um ligeiro aumento em relação a 2016 (5,6). Para Boomers
(idade entre 53 e 71 anos) e Geração X (idade entre 39 e 52 anos), os níveis de
estresse diminuíram ligeiramente desde 2016, para 3,9 (de 4,1) e 5,3 (de 5,4),
respectivamente (American Psycholocial Association, 2017).
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Em termos fisiológicos de grande importância são as amígdalas cerebrais
na manifestação da ansiedade. Um estudo de 2016 concluiu que a
disponibilidade do receptor neurocinina-1 da amígdala está associada a traços
de personalidade relacionados à ansiedade em indivíduos saudáveis,
consistente com um papel modulador do sistema substância P-neurocinina 1
(SP-NK1) na ansiedade humana. Explorar essa relação pode fornecer
informações importantes sobre os fundamentos neurobiológicos da ansiedade
humana e a etiologia dos transtornos de ansiedade, uma vez que os traços
ansiosos estão associados a uma suscetibilidade aumentada para desenvolver
condições psicopatológicas [18].
Já um outro estudo de 2014 evidencia que embora a amígdala inicie
respostas defensivas, ela não as mantém, não parecendo estar envolvida na
manutenção da ansiedade. Isso levanta a questão de qual mecanismo está por
trás da manutenção das respostas de ansiedade. Há nele a sugestão de algo
mais complexo que envolveria a excitação serotonérgica do circuito amígdala-
DMPFC (córtex pré-frontal), acompanhada pela amplificação de vieses
comportamentais negativos, podendo este circuito ser o alvo principal para
intervenção farmacológica [19].
Linhas convergentes de evidências fisiológicas e mecanísticas indicam
que a amígdala estendida central - incluindo o núcleo central da amígdala (Ce)
e o núcleo leito da estria terminal (BST) – (Figura 1) é um centro chave neste
circuito e motiva a hipótese de que alterações locais na amígdala estendida
central podem conduzir mudanças em regiões remotas do cérebro de forma a
promover o desenvolvimento e a manutenção de ansiedade, humor e transtornos
por uso de substâncias [20] .
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Figura 1: A importância potencial da amígdala estendida central (EAc), incluindo o núcleo leito da estria terminal (BST) e o núcleo central da amígdala (Ce) que juntos coordenam a resposta
à estímulos emocionais via alvos a jusante [21]
Estudos relevantes também demonstraram que o estresse pode causar
elevação de citocinas e óxido nítrico (NO) e, ainda, levar à hiperatividade do eixo
hipotálamo-pituitária-adrenal (HPA), aumentando a vulnerabilidade a doenças
ao longo da vida, incluindo disfunção cognitiva, hipertensão, diabetes,
ansiedade, depressão e dependência de drogas. Ao encontrar estresse físico ou
psicológico agudo, a entrada para os centros cerebrais superiores é conectada
sinapticamente com o hipotálamo para aumentar a produção do hormônio
liberador de corticotrofina (CRH) hipotalâmico e vasopressina. O CRH é
transportado por meio do sistema de porta hipofisária para a hipófise, onde
provoca a liberação do hormônio adrenocorticotrófico (ACTH) do lobo anterior
da glândula pituitária, que finalmente estimula a secreção de glicocorticóides
(GCs), principalmente cortisol em humanos. Os GC então interagem com seus
receptores em vários tecidos-alvo, incluindo o eixo HPA e o hipocampo, onde
exercem um efeito de feedback negativo inibitório sobre a síntese de fatores de
liberação hipotalâmica para ACTH, notavelmente CRH e vasopressina. O
sistema neuroendócrino atua em estreita cooperação com centros vegetativos
no cérebro e na regulação do metabolismo, a fim de estabelecer a homeostase.
O aumento dos níveis circulantes de ambos as catecolaminas e GCs também
promovem o aumento do tônus cardiovascular, e essas reações servem para
aumentar a disponibilidade e distribuição de substratos energéticos para atender
às demandas metabólicas impostas pelo estressor. Os GC elevados realmente
ajudam a encerrar as respostas fisiológicas e comportamentais de luta / fuga. No
entanto, quando a elevação de GCs e/ou CRH permanece por um período
prolongado, ela ameaça a viabilidade neuronal e aumenta o risco de distúrbios
relacionados ao estresse, como a ansiedade [22] .
Diferentes agentes ansiolíticos, incluindo antidepressivos tricíclicos,
inibidores de recaptação seletiva de serotonina e benzodiazepínicos (BZDs),
parecem normalizar o eixo HPA, sendo novas linhas de pesquisa desenvolvidas
para elucidar o mecanismo de ação já que os efeitos dos agentes ansiolíticos
sobre a atividade do eixo HPA ainda não estão claros [23].
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Os fármacos utilizados no tratamento de distúrbios da ansiedade
envolvem os benzodiazepínicos (diazepam, oxazepam, estazolam, flurazepam,
quazepam, temazepam) os quais entram no início para reduzir sintomas e os
antidepressivos, fármacos de escolha para distúrbios que precisam de
tratamento crônico. Os benzodiazepínicos atuam em receptores GABA-A
(ionotrópico, permeáveis a íons cloreto). O receptor GABA-A é um complexo,
constituído por diversas subunidades, com locais de ligação específicos para
seus ligantes, GABA, benzodiazepínicos (BZDs) e barbitúricos. Os barbitúricos
já não são utilizados como ansiolíticos e sim como anticonvulsivantes pois
possuem janela terapêutica estreita sendo menos seguros. Os
benzodiazepínicos ligam-se a sítios BDZ na interface entre alfa e gama. No
sistema nervoso central há dois tipos de receptores BDZ (BDZ e BDZ2) sendo o
BDZ2 o que está relacionado com a diminuição da ansiedade e localizam-se no
hipocampo, amígdala, córtex e medula (Figura 2). Quando GABA se liga a seu
sítio em GABA A, ocorre aumento do influxo de cloreto. Quando o
benzodiazepínico se liga a seu sítio em GABA A, ocorre aumento da frequência
de abertura do canal de cloreto, intensificando os efeitos de GABA e ocorrendo
hiperpolarização da membrana. Assim, é necessário que GABA esteja ligado
para a ação do benzodiazepínico. Os inibidores seletivos de recaptura de
serotonina (ISRS), classe de antidepressivos muito usados em componentes
ansiosos crônicos, por sua vez, agem bloqueando SERT (transportador de
serotonina) e impedindo a recaptura da serotonina e aumentando a
disponibilidade dela na fenda sináptica [24].
Figura 2: Canal de cloreto GABA A [25]
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Alguns efeitos colaterais de benzodiazepínicos e inibidores seletivos de
recaptura de serotonina utilizados no tratamento da ansiedade estão listados
abaixo:
Figura 3: Tabela com efeitos colaterais de benzodiazepínicos (BZD) e inibidores
seletivos de recaptura de serotonina (ISRS)
Fonte: Elaborada pelo autor [24].
Os benzodiazepínicos também causam tolerância do tipo farmacodinâmica
relacionada a receptores (o número de receptores de membrana diminui sendo
necessário mais fármaco para se ter efeito), síndrome de abstinência e
dependência e, portanto, não devem ser utilizados por longos períodos. Seu uso
é ideal apenas para tratamentos agudos ou subcrônicos e a retirada deve ser
feita aos poucos, conforme explicado na imagem a seguir:
EFEITOS COLATERAIS
•Benzodiazepínicos (BZD)
à Tremorà Aumento de peso
à Amnésia anterógradaà Tontura
à Incoordenação motoraà Xerostomia
à Aumento da pressão intraocular (Alprazolam, Clorazepam,
Diazepam e Lorazepam têm efeito anticolinérgico não devendo ser
utilizados em casos de glaucoma do ângulo estreito além de não serem indicados durante a gravidez por
atravessarem a barreira placentária)
EFEITOS COLATERAIS
•Inibidores seletivos de recaptura de serotonina (ISRS)
à Náusea, desconforto intestinal e diarreia
à Disfunção sexual (paroxetina, principalmente)
à Cefaleiaà Insônia (fluoxetina e sertralina)à Ganho de peso (paroxetina) ou
perda de peso (fluoxetina)à Nervosismo
à Fadigaà Tontura e parestesias (quando
súbita interrupção do tratamento)
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Figura 4: Representação do mecanismo de retirada abrupta do benzodiazepínico.
Fonte: Elaborada pelo autor [24]
Os transtornos de ansiedade impõem um fardo considerável à saúde
coletiva; eles são comuns, caros e contribuem para a etiologia da depressão e
do abuso de fármacos. Os tratamentos existentes são inconsistentemente
eficazes ou associados a efeitos adversos significativos, ressaltando a
necessidade de desenvolver uma compreensão mais profunda dos circuitos
neurais distribuídos que controlam a expressão de medo e ansiedade [26].
Outro fator que demonstra o porquê de os ansiolíticos serem usados de
forma consciente diz respeito à alta prevalência de variantes de metabolização
das enzimas do citocromo P450, como CYP2D6, CYP2C19, CYP1A2 em
algumas populações (como na asiática), os tornando particularmente sensíveis
a drogas como o diazepam e imipramina [27] .
Há ainda um fator de extrema importância que diz respeito a
hereditariedade da ansiedade. Além das influências ambientais, um estudo
recente indicou que existe uma variância genética que é responsável por ∼35%
da probabilidade de que uma criança desenvolver um transtorno de ansiedade.
Pais com ansiedade e transtornos depressivos são consideravelmente mais
propensos a ter filhos com um estado extremamente ansioso, sendo a herança
da ansiedade mais um fator que deve ser considerado no contexto maior da
saúde pública [28] .
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Ainda, é possível que as mulheres sejam mais acometidas por quadros
de ansiedade em razão da pressão social que recebem, da jornada de trabalho
e da renda inferior. Isso faz com que muitas tenham que trabalhar mais para
cumprir com pagamentos e manutenção da família. Outra possível justificativa
pode estar relacionada à exposição à violência que a mulher vem enfrentando
cotidianamente, o que pode deixá-la em constante sensação de medo, angústia
e ansiedade. No entanto, ainda que as mulheres apresentem maior gravidade
nos sintomas e evolução crônica nos transtornos de ansiedade, é preciso
salientar que, independentemente do gênero, os transtornos de ansiedade
podem causar grande prejuízo funcional na vida dos indivíduos [29].
Além disso, os transtornos de ansiedade são problemas frequentes
quando se aborda a saúde do trabalhador, visto que geram altos custos e
impacto nos índices de absenteísmo e afastamentos laborais. Na França, um
estudo de base populacional com amostra de 4.717 trabalhadores evidenciou
que a alta demanda psicológica, a baixa recompensa, as exigências emocionais
e a insegurança são fatores preditores de ansiedade [30].
Por fim, apenas 10% das pessoas com transtorno de ansiedade no mundo
fazem o tratamento correto. A maioria tende a tentar superá-la sozinha,
consomem álcool para relaxar (o que pode piorar a ansiedade a curto e longo
prazo) ou maconha (Tetrahidrocanabinol -THC - pode aumentar batimento
cardíaco apesar de existir relatos de que o Canabidiol – CBD - poderia ajudar) [12].
As prescrições de medicamentos para ansiedade aumentaram
substancialmente nos últimos anos, bem como, o uso não médico, ou seja, o uso
sem receita médica ou o uso em quantidades maiores, com mais frequência ou
mais tempo do que o prescrito ou por um motivo diferente do recomendado por
um médico [31].
Tendo em vista as prescrições desenfreadas de ansiolíticos, seus eventos
adversos e riscos de tratamento bem como as condições de não resposta aos
tratamentos convencionais, os impactos socioeconômicos relacionados e o fato
do Brasil possuir a população mais ansiosa do mundo, busca-se entender como
a ansiedade pode ser manejada com terapias integrativas na prevenção e
promoção da saúde, podendo colaborar na minimização da medicalização.
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YOGA E MEDITAÇÃO
Estudos têm demonstrado que a prática de yoga pode, pelo menos em
parte, reduzir as respostas ao estresse e alterações cardiovasculares,
imunológicas e endócrinas relacionadas, bem como promover uma melhor
resposta psicológica ao estresse [32]. O Yoga se originou por volta de 3.000 aC
na Índia e é popularmente reconhecido como um programa de exercícios físicos
(asana), controle da respiração (pranayama) e meditação. Todas estas
atividades são cada vez mais reconhecidos como técnicas eficazes para
melhorar a saúde, além de seu papel há muito reconhecido na prevenção e
gestão de doenças [27].
Um estudo de 2012 abordou os impactos no yoga na saúde bem como
um pouco de seu mecanismo fisiopatológicos. O eixo hipotálamo-pituitária-
adrenal (HPA) é acionado em resposta a estressores físicos ou psicológicos
principalmente como resultado da liberação de cortisol e catecolaminas
(epinefrina e norepinefrina). Com o tempo, o estado constante de hipervigilância
resultante de disparos repetidos do eixo HPA pode levar à desregulação do
sistema e à doenças como a ansiedade. Embora o mecanismo de ação preciso
não tenha sido determinado, foi levantada a hipótese de que alguns exercícios
de yoga ajudem no controle do estresse e da ansiedade ao causar uma mudança
em direção à dominância do sistema nervoso parassimpático, possivelmente por
meio da estimulação vagal direta [33].
O yoga modula os sistemas de resposta ao estresse reduzindo o estresse
percebido e a excitação fisiológica, por exemplo, reduzindo a frequência
cardíaca, diminuindo a pressão arterial e facilitando a respiração. Além disso, o
yoga diminui os níveis de glicose no sangue, renina plasmática, cortisol salivar e
os níveis de nor-epinefrina e epinefrina de 24 horas na urina.
Independentemente da via fisiopatológica, o yoga demonstrou ter efeitos
psicológicos importantes: diminuir a ansiedade e aumentar os sentimentos de
bem-estar espiritual, social e emocional. No mesmo artigo, há relatos de um
estudo na Universidade de Utah que mostrou que entre os indivíduos controle e
praticantes de yoga, este último tinha maior tolerância à dor e menor atividade
cerebral relacionada à dor durante a ressonância magnética [33] .
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Em outro estudo, foram doadas amostras de sangue antes e depois do
retiro de yoga de 3 meses com 200 participantes tornando possível verificar os
efeitos do BDNF, cortisol salivar e citocinas inflamatórias (ou seja, IL-1β, IL-6, IL-
8, IL-12, IFN-γ e TNF-α), IL-10 junto à variáveis psicológicas como a ansiedade [34].
O fator neurotrófico derivado do cérebro (BDNF) é uma neurotrofina que
promove o desenvolvimento, a sobrevivência e a plasticidade dos neurônios nos
sistemas nervosos central e periférico. Níveis reduzidos de BDNF têm sido
associados a distúrbios psiquiátricos e neurológicos, incluindo ansiedade,
depressão e doença de Alzheimer. A figura a seguir explica em termos
fisiológicos o mecanismo ocorrido:
Figura 5: Fluxograma Práticas de yoga e relação com BDNF.
Fonte: Elaborada pelo autor.
Logo, o estudo sugere que o aumento no BDNF pode estar relacionado a
marcadores psicológicos de bem-estar, sinalizando para a promoção da
resiliência ao estresse e bem-estar integrado mente-corpo. Além disso, o
hipocampo é um sítio ativo de neuroplasticidade, podendo tal sinalização de
BDNF relacionada à meditação ser uma explicação parcial para os achados
repetidos de volumes aumentados do hipocampo devido à prática meditativa em
estudos de curto e longo prazo.
-
Também foi observado o aumento de CAR (cortisol awakening response)
avaliados nas amostras de cortisol salivar, estando provavelmente relacionado
a maior alerta e prontidão para envolvimento mente-corpo.
Por fim, observou-se um padrão incomum de aumento tanto nas citocinas
antiinflamatórias como IL-10 como nas pró-inflamatórias como TNF-α, IFN-γ, IL-
1β, IL-6, IL-8 com diminuições simultâneas de IL-12. A hipótese sugerida aqui é
que o aumento de citocinas anti e pró-inflamatórias possivelmente indica maior
prontidão imunológica [34] .
Diferentemente do que muitos pensam, o objetivo da meditação, por sua
vez, não é se aproximar do divino ou esvaziar a mente. É, na verdade, prestar
atenção. Assim temos dois tipos de mentes focadas: a mente focada mas que
está tensa, e a mente focada e relaxada (que busca-se com a meditação). A
prática da meditação consciente ou mindfulness envolve sentar-se
confortavelmente, concentrar-se na respiração e, em seguida, trazer a atenção
da sua mente para o presente, sem se preocupar com o passado ou futuro. Ao
praticar a atenção plena, a pessoa se concentra no momento presente, tendo
consciência do que está acontecendo dentro e fora, sem nenhuma reação.
Assim, mindfulness promove o desapego do mundo externo e volta o foco do
indivíduo para dentro, quebrando os padrões usuais de responder quando
ansioso. Além disso, também inclui técnicas de relaxamento, que são eficazes
para reduzir a ansiedade. O propósito da meditação é a eliminação ou redução
dos processos de pensamento, a desaceleração do diálogo interno da mente
com o objetivo maior de se aumentar este estado de consciência superior e,
assim, pode levar a uma grande sensação de tranquilidade física e mental [35].
Em estudo recente publicado cientistas descobriram que uma fração
grande de nossos pensamentos - quase a metade - não está relacionada ao que
estamos fazendo. Surpreendentemente, tendemos a estar em outro lugar,
mesmo para atividades casuais e supostamente agradáveis, como assistir TV
ou conversar. Embora possa-se esperar que essa divagação mental esteja nos
levando a lugares mais felizes, os dados dizem o contrário e na verdade ficamos
mais felizes quando o pensamento e a ação estão alinhados, mesmo que
estejam alinhados apenas para lavar pratos. Neste mesmo estudo foi
desenvolvido um aplicativo para iPhone que pesquisava periodicamente os
pensamentos e atividades das pessoas. Em momentos aleatórios ao longo do
-
dia, o iPhone de um participante tocava e apresentava um breve questionário
que perguntava o quão feliz ele estava (em uma escala de 1-100), o que ele
estava fazendo e se ele estava pensando sobre o que ele estava fazendo. Se os
sujeitos estavam de fato pensando em outra coisa, eles relatavam se essa outra
coisa era agradável, neutra ou desagradável. Além de nos despertar para o
quanto nossas mentes vagam, o estudo mostrou claramente que somos mais
felizes quando pensamos sobre o que estamos fazendo. Embora imaginar
alternativas agradáveis fosse naturalmente preferível a imaginar alternativas
desagradáveis, o cenário mais feliz era não estar imaginando nada. Uma pessoa
que está passando uma camisa e pensando em passar é mais feliz do que uma
pessoa que está passando e pensando em ir tomar sol, por exemplo. Logo, a
presença mental - a combinação do pensamento com a ação – seria o indicador
de felicidade, embora o cérebro possa estar programado para trabalhar contra
suas tentativas de permanecer presente, necessitando bastante prática para
chegar lá. O que ainda não se sabe é o quanto as pessoas variam em sua
tendência a divagar mentalmente e se estas diferenças estão associadas a
doenças psiquiátricas. Nesse caso, podemos ser capazes de adaptar
intervenções terapêuticas para pessoas propensas a certos estilos cognitivos
que as colocam em risco de depressão, ansiedade ou outros transtornos [36] .
Uma das práticas mais importantes do ponto de vista de saúde são as
chamadas pranayama, isto é, um conjunto de exercícios de controle da
respiração. Prāṇāyāma, é uma palavra sânscrita para prana (energia vital) e
ayama (controle). Refere-se a uma série de exercícios voluntários de respiração
controlada que manipulam a frequência respiratória, inalação (puraka), retenção
(kumbhaka), exalação (rechaka) e bloqueios corporais (bandhas). Essas
técnicas de respiração demonstraram provocar mudanças significativas na
fisiologia e psicologia humana e efeitos positivos no estresse e ansiedade [37] .
Um estudo observou que a prática do pranayama Bhastrika com baixa
frequência respiratória diminuiu significativamente tanto a pressão arterial
sistólica quanto a diastólica, com uma diminuição modesta da frequência
cardíaca [38]. Além disso, as alterações na variabilidade da frequência cardíaca
também apoiam a noção de que a prática de pranayama melhora a função
respiratória e o equilíbrio simpático-vagal cardíaco, que são importantes
variáveis psicofisiológicas relacionadas ao estresse. [39] Foi hipotetizado que os
-
mecanismos psicobiológicos pelos quais o pranayama exerce seus efeitos são
mediados pelo nervo vago, por meio de interconexões entre órgãos sensoriais
periféricos, núcleo solitário, tálamo, áreas límbicas e córtex pré-frontal. Além
disso, foi sugerido que o aumento da atividade parassimpática (associada ao
tempo de expiração) reduz a liberação de hormônios associados ao estresse [40]
e aumenta a inibição do GABA do córtex pré-frontal e da ínsula para a amígdala,
reduzindo sua atividade, e os sintomas psicológicos e somáticos associados ao
estresse [41].
Em outro estudo, usou-se um desenho de ensaio clínico randomizado
com trinta adultos jovens saudáveis avaliados no início do estudo e após 4
semanas de práticas de pranayama. O nível de ansiedade foi avaliado pelo
Inventário de Ansiedade Traço-Estado (IDATE), que foi traduzido e validado para
o português brasileiro. Também utilizou-se a Escala de Afeto Positivo e Afeto
Negativo (PANAS) para avaliar os afetos positivos (PANAS-P), como bem-estar,
entusiasmo, inspiração e determinação, e afetos negativos (PANAS-N), voltada
para dimensões como o medo, o nervosismo e a perturbação. Este estudo
fornece a primeira evidência preliminar de que 4 semanas de Bhastrika
pranayama produziu os seguintes resultados principais: mudanças nas
pontuações PANAS e STAI sugerem níveis significativamente reduzidos de
estado de afeto negativo e ansiedade, aumento do afeto positivo e alterações de
fMRI sugerindo o envolvimento da amígdala, ínsula anterior, ACC, vmPFC,
vlPFC e dlPFC. Embora não sejam patológicos, os sujeitos apresentaram níveis
mensuráveis de ansiedade, correspondendo a uma amostra representativa de
nossa sociedade, principalmente de estudantes universitários. Os resultados
sugerem que os níveis de ansiedade foram significativamente reduzidos, o que
pode encorajar a futura exploração dos efeitos ansiolíticos do pranayama em
uma população clínica (Figuras 6 e 7). [37]
-
Figura 6: Efeitos de Bhastrika pranayama na ansiedade. Pontuações de STAI (estado e característica) em ambos os grupos (pranayama e controle) no início e após a intervenção. (A) Uma interação significativa (intervenção × tempo) foi observada na ansiedade estado com pontuações significativamente diminuídas dentro do grupo de pranayama. (B) Nenhuma interação significativa foi observada na ansiedade-traço [37].
Figura 7: Efeitos do pranayama Bhastrika no afeto. Escores PANAS (estado e traço), positivos (PANAS-P) e negativos (PANAS-N) para ambos os grupos (pranayama e controle) no início e após a intervenção. Interações significativas (intervenção × tempo) foram observadas no estado de afeto, ambas negativas (A) e positivo (B) com uma diminuição significativa no efeito negativo dentro do grupo pranayama. Para o traço PANAS, uma tendência para PANAS-N encontrado [37],
A respiração lenta e profunda bem como a respiração unilateral pela
narina esquerda parece reduzir a frequência cardíaca, diminuir níveis séricos de
catecolaminas relacionadas ao estresse e aumentar a ativação do sistema
nervoso autônomo parassimpático, que relaxa. Um estudo em estudantes
saudáveis comparou os efeitos de pranayama lento, rápido e sem pranayama
por 12 semanas em parâmetros cardiovasculares e estresse. Os resultados
demonstraram que tanto o rápido como o lento promoveram diminuições
-
significativas no estresse percebido medido pelo PSS (Perceived Stress Scale);
no entanto, apenas o pranayama lento foi relatado para promover uma
diminuição estatisticamente significativa na frequência cardíaca, pressão
arterial, produto de pressão de frequência e duplo produto, indicando assim um
aumento da dominância parassimpática e do tônus vagal no grupo lento em
comparação com os grupos rápido e sem prática [42] .
Um estudo avaliou a técnica de pranayama para reduzir a ansiedade dos
alunos antes de seus exames e aumentar o desempenho no teste. Após
responder a um questionário, foi possível avaliar por exemplo que 33,3% dos
participantes do grupo experimental tiveram alta ansiedade do teste, enquanto
66,7% dos participantes do grupo de controle tiveram ansiedade do teste, que
foi duas vezes mais do que o grupo experimental. Isso significa que a prática do
pranayama pode reduzir e controlar a ansiedade do teste. Também foi revelado
que quanto maior a ansiedade do teste, menor o desempenho do teste [43].
O objetivo dos exercícios respiratórios é fornecer oxigênio ao corpo e
eliminá-lo do dióxido de carbono e de outras toxinas, sendo o oxigênio no sangue
vital para: assimilar os alimentos que comemos para atender às várias
necessidades do corpo, como reconstruir tecidos e fornecer energia, estimular o
funcionamento das glândulas endócrinas, fornecer energia para o
funcionamento do cérebro, nervos, coração e outros órgãos vitais, distribuição
de energia vital por todo o corpo [43] .
Existem diversas técnicas de meditação que, de maneira geral,
promovem a redução dos níveis de estresse e ansiedade, o que pode ser
explicado pela redução significativa dos níveis de cortisol e noradrenalina,
juntamente com o aumento das concentrações de dopamina plasmática e
serotonina as quais aumentam a sensação de prazer e bem estar.
O aumento da atividade serotoninérgica pode estar relacionado à
estimulação do hipotálamo lateral; a inervação hipotalâmica na glândula pineal
contribui para o aumento da síntese e liberação de serotonina. A diminuição do
cortisol e noradrenalina e o aumento dopaminérgico estão associados à
diminuição da frequência cardíaca e respiratória, levando em consideração que
durante a prática meditativa há menos estimulação simpática e mais estimulação
parassimpática. O aumento da atividade do sistema parassimpático resultaria
em uma menor inibição do sistema GABAérgico em nível bulbar, desencadeando
-
alterações na pressão arterial, frequência respiratória, motilidade e
funcionamento do sistema gastrointestinal, melhora da memória, diminuição da
ansiedade e melhora a sensação de bem-estar, devido ao aumento
dopaminérgico [35].
A meditação também pode promover mudanças neuroplásticas no
sistema cerebral executivo. Menos falhas cognitivas e maior volume de matéria
cinzenta (GMV) foram relatados nas regiões frontal, límbica, temporal, occipital
e cerebelar de praticantes de meditação do que em controles correspondentes.
Em outras palavras, a meditação também modifica fisicamente o formato e
tamanho do cérebro, estando a matéria cinzenta mais densa nas áreas
associadas com aprendizagem, processamento da memoria e controle da
emoção após 8 semanas de um programa de meditação. Já a amígdala que lida
com o estresse, pressão arterial e o medo, havia reduzido sua matéria cinzenta.
Outros estudos encontraram níveis mais elevados de melatonina plasmática
(que, por sua vez, pode ser responsável pela melhora da sensação de bem-
estar) em meditadores experientes imediatamente após meditação do que sob
condições de controle com os mesmos indivíduos sem meditação. Deste modo,
a facilitação de níveis mais elevados de melatonina fisiológica em horários
apropriados do dia pode ser uma via através da qual ocorrem os alegados efeitos
da meditação na promoção da saúde [44].
TAI CHI CHUAN Tai Chi Chuan é uma arte marcial chinesa antiga que inclui exercícios
aeróbicos tradicionais de baixa a moderada intensidade e envolve
essencialmente aprender uma sequência de movimentos que inclui movimentos
corporais circulares e espirais. Os indivíduos praticam o TCC, principalmente,
para desenvolver a interação mente-corpo, controle da respiração e do
movimento, coordenação olho-mão e um estado mental tranquilo [9].
Em um estudo, noventa e duas mulheres grávidas com depressão pré-
natal foram aleatoriamente designadas para um grupo de controle de tai chi /
yoga ou grupo controle com uma média de 22 semanas de gestação. O grupo
de tai chi / yoga participou de uma sessão de grupo de 20 minutos por semana
durante 12 semanas. No final do período de tratamento, o grupo de tai chi / yoga
teve pontuações mais baixas de depressão sumária (CES-D), bem como
-
pontuações mais baixas de ansiedade (STAI) e menor pontuação de distúrbios
do sono [41]. Também há relatos de melhora dos sintomas de ansiedade,
depressão e estresse pós prática de tai-chi em pacientes com doença cardíaca
coronária após intervenção coronária percutânea, melhorando a qualidade de
vida dos pacientes [46] .
Um outro estudo em pacientes idosos mostrou que após praticarem
exercícios de tai chi em adição à terapia medicamentosa houve um efeito mais
significativo na melhora do transtorno de ansiedade do que aqueles que são
tratados apenas com o fármaco. Enquanto isso, se os pacientes são tratados
apenas com o fármaco, é fácil reaparecer após a cura. No entanto, se eles
insistem em fazer exercícios de tai chi, a taxa de recorrência é baixa e o efeito é
significativo [47].
Um contraponto no entanto é que, de maneira geral, os estudos que
mostravam benefícios no tai-chi na redução do estresse vinham acompanhados
de descrição das limitações do estudo, entre eles: efeitos de yoga e tai chi,
quando analisados juntamente são confundidos; necessidade de estudá-los
separadamente e em amostras maiores, adicionando medidas bioquímicas,
como ensaios de cortisol, para fornecer dados de confirmação sobre os efeitos
do relaxamento; necessidade de avaliar os efeitos em longo prazo de sessões
repetidas; número limitado de estudos revisados; número mínimo de estudos
que demonstram resultados significativos com diversos estudos e limitações
metodológicas; em muitos estudos que demonstram benefícios, seu efeito sobre
os sintomas depressivos e de ansiedade é pequeno [48] .
Logo, além de faltar artigos na literatura a respeito do Tai-chi e seus
benefícios fisiológicos na ansiedade, muitos dos resultados apresentam-se
como inconclusivos. Portanto, estudos futuros com design mais rigoroso
precisam examinar mais profundamente se o Tai-Chi pode promover mudanças
fisiológicas benéficas nos sintomas de ansiedade seja por exemplo na
variabilidade do batimento cardíaco ou no estresse percebido de forma
consistente.
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5.CONSIDERAÇŌES GERAIS
A saúde mental é tão importante como a saúde física para o bem-estar
dos indivíduos, das sociedades e dos países. Avanços na neurociência e na
medicina do comportamento já mostraram que, como muitas doenças físicas,
estas perturbações resultam de uma complexa interação de fatores biológicos,
psicológicos e sociais. Há neste contexto um custo enorme em termos de
sofrimento humano, incapacidade e prejuízos econômicos. Como gestores finais
de qualquer sistema de saúde, os Governos precisam assumir a
responsabilidade de assegurar a elaboração e implementação de políticas de
saúde mental, especialmente nos cuidados primários. O Brasil é referência
mundial na área de Práticas Integrativas e Complementares na Atenção Básica.
É uma modalidade que investe na prevenção e promoção da saúde, entendida
pelo âmbito de definição de saúde pela OMS, ou seja, como «não simplesmente
a ausência de doença ou enfermidade», mas como «um estado de completo
bem-estar físico, mental e social» [49].
Atualmente, o Sistema Único de Saúde (SUS) oferece, de forma integral
e gratuita, 29 procedimentos integrativos e complementares à população. Os
atendimentos começam na Atenção Básica, principal porta de entrada para
o SUS. Evidências científicas têm mostrado os benefícios das Práticas
Integrativas (dentre elas o yoga, tai-chi e meditação) as quais estimulam o
autocuidado atuam na prevenção e promoção da saúde e têm sido muito
procuradas com o aumento da demanda desencadeada por doenças crônicas,
insatisfação com os serviços de saúde existentes e a crítica à relação assimétrica
de poder entre médicos e pacientes, dentre outros fatores.
O 2º Relatório de PNPIC de 2015 permite observar como se encontram
algumas das práticas aqui estudadas no cenário nacional. Das 10 práticas
listadas, o tai-chi encontra-se em 3º lugar na distribuição das modalidades de
práticas complementares nos estados e municípios brasileiros e o yoga em 7º
lugar, sendo a maior área de atuação de ações de práticas integrativas e
complementares na Atenção Básica e Saúde da Família [50].
-
6.CONCLUSÃO O presente trabalho esclareceu os benefícios fisiológicos que as Práticas
Integrativas e Complementares em Saúde escolhidas (yoga, meditação e tai chi
chuan) podem proporcionar na prevenção e tratamento da ansiedade, e como
podem atuar como potenciais desmedicalizadores no uso abusivo e
indiscriminado de benzodiazepínicos, reduzindo efeitos indesejados.
A revisão narrativa e a construção deste trabalho tornou possível
compreender a saúde em um contexto integrativo e dentro de uma cultura de
autocuidado de modo a protagonizar o indivíduo no processo de recuperação da
saúde e ampliar a autonomia do usuário em escolher a forma de cuidado quando
da utilização das práticas abordadas. Assim, yoga, meditação e tai-chi
apresentam-se como formas de terapia não fundamentadas na doença sendo a
atenção voltada para o indivíduo de forma ampla e global. Mais estudos são
necessários para melhorar o entendimento dessa área, bem como examinar os
praticantes de meditação, yoga e tai-chi em diferentes contextos e condições.
O cenário nacional da ansiedade e seus impactos socioculturais
mostraram-se caóticos, podendo as PICs aqui estudadas virem a colaborar na
melhoria de qualidade de vida dos indivíduos ao serem disponibilizadas ao
acesso no contexto clínico.
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