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    REVISTA VIRTUAL DE

    PSICOLOGIA HOSPITALAR

    E DA SAÚDE

    ypsicópio

    ©

    PSICÓPIO

    EditorSusana Alamy

    Ano 3 - Número 5 - Fevereiro a Julho-2007Edição Semestral - Distribuição Gratuita

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    PSICÓPIO: REVISTA VIRTUAL DE PSICOLOGIA HOSPITALAR E DA SAÚDERevista Semestral - Distribuição Gratuita

    Ano III, Número 5, Fevereiro a Julho-2007

    Editor: Susana AlamyIdealização e Realização, Capa, Editoração Eletrônica, Diagramação e Arte Final: Susana Alamy

    WebMaster: Carlos Alexandre de Melo Pantaleão

    Conselho Editorial:Susana Alamy   - psicóloga clínica e hospitalar, psicoterapeuta, professora de psicologia hospitalar e supervisora deestágios em Belo Horizonte/MG. CRPMG 6956 Elisângela Lins - psicoterapeuta, psicóloga clínica e hospitalar, professora de psicologia do CESUR – Centro de EnsinoSuperior de Rondonópolis. CRPMT 1281-2 Luciane Jordão Pereira   - psicoterapeuta, psicóloga clínica, gestora em saúde da Prefeitura Municipal de Itabira/MG.CRPMG 18744Glenda Rose Gonçalves-Chaves - advogada, bacharel em Letras, mestre em Direito Internacional e Comunitário (PUC-Minas), mestre em Literatura Brasileira (UFMG), professora de Direito Constitucional.

    Direitos AutoraisOs direitos autorais dos artigos publicados pertencem ao Editor de Psicópio: Revista Virtual de Psicologia Hospitalar eda Saúde, Susana Alamy. Copyright  © Susana Alamy. Todos os direitos reservados. Esta revista é protegida por leis deDireitos Autorais (Copyright ) e Tratados Internacionais. É permitida a sua duplicação ou a reprodução deste volume,em qualquer meio de comunicação, eletrônico, mecânico, gravação, fotocópia ou impresso, desde que integralmente. Areprodução parcial poderá ser feita somente mediante a autorização expressa dos autores dos artigos e do editor darevista.

    Para citação da revista na bibliografia:ALAMY, Susana (Ed.). Psicópio: Revista Virtual de Psicologia Hospitalar e da Saúde, Belo Horizonte, a.3, n.5, fev-jul2007. Disponível em: . Acesso em: (dia em números) (mês abreviado

    em letras minúsculas) (ano).

    Para citação de artigos da revista na bibliografia - modelo:(Sobrenome do autor em letras maiúsculas), (nome do autor com a 1ª. letra maiúscula e as demais minúsculas). (Nomedo artigo em letras comuns). Psicópio: Revista Virtual de Psicologia Hospitalar e da Saúde, Belo Horizonte, a.3, n.5,fev-jul 2007. Disponível em: . Acesso em: (dia em números) (mêsabreviado em letras minúsculas) (ano).

    Fale com o EditorE-mail: [email protected] ou [email protected]: Av. Prudente de Morais, 290 sl. 810

    Bairro Cidade Jardim30380-000 Belo Horizonte / MGTelefone: (31) 8774-3028

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    PSICÓPIO: REVISTA VIRTUAL DE PSICOLOGIA HOSPITALAR E DA SAÚDERevista Semestral – Distribuição Gratuita

    Ano III, Número 5, Fev-Jul-2007

    SUMÁRIO

    Editorial ............................................................................................................................................................................................... iii

    O brincar e suas conseqüências no contexto hospitalar .............................................................................................................. 05 Dâmaris Campos Teixeira (Belo Horizonte/MG) 

    Luto na infância: algumas considerações à luz da teoria do Édipo em Lacan ........................................................................ 09Carolina Alves Rezende (Salvador/BA)

    O psicólogo hospitalar brasileiro: uma visão da representação enquanto profissional ......................................................... 15Cláudia Furtado Borges (Uberlândia/MG) Vanessa Coelho de Sousa (Uberlândia/MG) 

    Aspectos psicológicos que predispõem ao aparecimento e desenvolvimento do câncer ...................................................... 19

     Marta Betania Cardoso Tavares Luzete (Brasília/DF) 

    Humanização hospitalar e qualidade do atendimento ................................................................................................................. 26 Mariana Amaral Guerra (Brasília/DF)

    O trabalho da psicologia no ambulatório de angiologia ............................................................................................................. 27 Danielle Silva Veiga (Rio de Janeiro/RJ)

    O abandono ao idoso ......................................................................................................................................................................... 31 Rose Mary Vilas Boas Tanajura Costa (Vitória da Conquista/BA) 

    Minha primeira intervenção hospitalar com criança - relato de caso ....................................................................................... 34 Luiza Gutz (Florianópolis/SC)

    Legislação brasileira sobre saúde - Principais dispositivos constitucionais sobre direito à saúde ...................................... 36

    Lançamento de livro - Ensaios de Psicologia Hospitalar  .......................................................................................................... 38

    Links - Conselhos de Psicologia ..................................................................................................................................................... 40

    Eventos ................................................................................................................................................................................................ 41

     Normas para envio de artigos .......................................................................................................................................................... 42

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    EDITORIAL

    É com grande satisfação que trazemos para os leitores a 5ª. edição da  Psicópio: Revista Virtual de Psicologia Hospitalar e da Saúde,  já em seu 3º. ano de publicação. Sentimo -nos gratificados pelo nosso esforço em manter a periodicidade proposta, uma vez que sabemos das dificuldades em manter uma revista gratuita e sem patrocínios. Eagradecemos a todos os colaboradores -autores, pois sem ess es seria impossível continuar nesta empreitada.

     Nossos objetivos são: promover o intercâmbio de informações, dar acesso ao conhecimento de maneira globalizada eirrestrita, respeitar as opiniões divergentes e aprender com cada uma delas. Assim, temos alcançado cada um desses aolongo dos três anos de publicação.

    Agradecemos os inúmeros e-mails recebidos, sempre incentivadores e motivadores, demonstrando a importância da Psicópio: Revista Virtual de Psicologia Hospitalar e da Saúde na formação e na vivência de cada um dos seus leitores.

    Em uma era globalizada onde temos visto abismos cada vez maiores entre os povos, os ideais e as ações, ficamoshonrados em poder oferecer uma revista que idealiza um mundo de paz, harmonia, responsabilidade e ética, sem ônus

    algum para os leitores, pois se trata de uma publicação que pode ser baixada gratuitamente através da internet ouconsultada nas bibliotecas universitárias.

    Sempre recebemos muito material para publicação e todos são analisados criteriosamente, os que fogem ao propósitodesta revista podem ser revistos pelos seus autores e reencaminhados para nova avaliação, os que são aprovados são

     publicados nos números seguintes. Muitas vezes publicamos o material encaminhado em números posteriores, pois nãotemos como publicar todos no mesmo número, em outras vezes são deixados propositalmente para frente para quetenhamos artigos com o mesmo tema em edições diferentes.

    A partir deste número estaremos publicando a legislação referente à saúde. Para isso solicitamos a colaboração de todosno sentindo de nos enviar a legislação de que tem conhecimento.

    Trazemos neste número os artigos: O brincar e suas conseqüências no contexto hospitalar ( Dâmaris Campos Teixeira ),Luto na infância: algumas considerações à luz da teoria do Édipo em Lacan (Carolina Alves Rezende), O psicólogohospitalar brasileiro: uma visão da representação enquanto profissional (Cláudia Furtado Borges, Vanessa Coelho deSousa), Aspectos psicológicos que predispõem ao aparecimento e desenvolvimento do câncer ( Marta Betania CardosoTavares Luzete), Humanização hospitalar e qualidade do atendimento ( Mariana Amaral Guerra),O trabalho da

     psicologia no ambulatório de angiologia (Danielle Silva Veiga), O abandono ao idoso ( Rose Mary Vilas Boas TanajuraCosta), Minha primeira intervenção hospitalar com criança - relato de caso ( Luiza Gutz), Legislação brasileira sobresaúde: principais dispositivos constitucionais sobre direito à saúde,  lançamento do livro   “Ensaios de Psicologia Hospitalar”, agenda de eventos e links interessantes. Temas que não se esgotam e que poderão ser trazidos novamentenos próximos números.

    Agradecemos a todos que colaboraram nesta edição, aos pacientes , aos professores e supervisores que incentivam seusalunos a produzirem e publicarem seus escritos, prática que muito valorizamos.

    A responsabilidade pelos artigos publicados é inteira mente de seus autores e as opiniões expressadas nos mesmos nãonecessariamente condizem com a opinião do Editor.

    Todas as correspondências deverão ser encaminhadas para a Psicópio, e-mail: [email protected]. Ose-mails que forem dirigidos aos autores das matérias publicadas serão repassados aos mesmos.

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    Desejamo-lhes uma boa leitura e esperamos sua colaboração com o envio dos seus escritos para a  Psicópio: RevistaVirtual de Psicologia Hospitalar e da Saúde.

    Sejam bem-vindos!!!

    Com o meu abraço,

    Susana AlamyVerão de 2007

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    O BRINCAR E SUAS CONSEQÜÊNCIAS NO CONTEXTO HOSPITALAR 1 Dâmaris Campos Teixeira 2 Orientadora: Susana Alamy

    O brincar

    O brincar, visto a partir de diferentes teorias, aparece como funções diversas na vida da criança e, por conseguinte,resulta em diferentes conseqüências. Não é objetivo de este artigo explicitar minuciosamente cada teoria, mas citá-lasde maneira breve para facilitar o leitor a situar-se a respeito de algumas das diversas formas de se pensar sobre o brincare, posteriormente descrever os benefícios de utilizar-se de recursos lúdicos com crianças hospitalizadas.

    Freud diz que o ato do brincar fica a cargo do princípio de prazer, satisfazendo a compulsão à repetição pelaaprendizagem que se consegue através do brinquedo e pelo prazer originado da repetição (Soifer, 1985). Além do mais,a partir da brincadeira, é possível à criança sair do seu lugar de passiva e encarar uma postura mais ativa (Freud, 1926).

    A criança estabelece a diferença entre o mundo real e o imaginário, e sente prazer ao conseguir fazer elo entre os

    mundos. Assim, é dada à criança uma possibilidade de reordenar o mundo do seu jeito, de tal forma, que o princípio de prazer se sobreponha ao princípio de realidade3.

    O brincar, para este teórico, estaria na margem da realidade, sendo constituído pela fantasia e realidade, mescladas,sendo uma das fontes de realização de desejos.

    Ao contrário de Freud, Vygotski, com sua perspectiva sócio-histórica, relata que o brincar não é uma atividade que visao prazer, porém, este pode aparecer em decorrência dessa. Considera que outras experiências, que não a brincadeira, sãofavorecedoras ao prazer, e, que, nem toda brincadeira é tida como prazerosa. Em seu livro “A Formação Social daMente” (1994), Vygotski cita como exemplo os pré-escolares, que por estarem em uma fase do desenvolvimentovoltadas para a realidade de si mesmos, só terão prazer mediante brincadeiras que impliquem em resultados

    considerados favoráveis.

    Acrescenta que o brinquedo propicia uma zona de desenvolvimento proximal (ZDP)4 dando oportunidade à criança dese comportar de maneira além dos seus comportamentos diários e compatíveis com sua idade. O brinquedo possui todasas tendências do desenvolvimento de forma sintetizada, sendo ele mesmo propício ao desenvolvimento. Sendo assim,ao possibilitar à criança uma atuação maior do que é na realidade, o brinquedo pode ser visto como uma fonte para odesenvolvimento do pensamento abstrato.

    1

     Artigo desenvolvido como requisito no encerramento do Curso Virtual de Psicologia Hospitalar, ministrado pela psicóloga SusanaAlamy.2 Graduanda de Psicologia da Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG3 De acordo com Laplanche e Pontalis (2001), princípio de prazer é um dos princípios que determinam o funcionamento mental,considerando que a atividade psíquica tem por objetivo evitar o desprazer, em virtude do prazer. Assim, o princípio de prazer nãoobedece a nenhuma instância psíquica e não poupa esforços para se realizar. O princípio da realidade funciona modificando o princípio do prazer e impondo-se como princípio regulador, procurando o desprazer de forma que o prazer possa ser adiado emdetrimento das condições impostas pelo mundo exterior.4Para que se entenda o conceito de zona de desenvolvimento proximal é fundamental que se compreenda os conceitos de nível dedesenvolvimento real e potencial. O nível de desenvolvimento real é a capacidade da criança de realizar tarefas independentemente.São as etapas já conquistadas pelo desenvolvimento. O nível de desenvolvimento potencial diz respeito às capacidades da criança deresolver tarefas com o auxílio de um companheiro que seja mais capaz em realização das mesmas. Faz referência às etapas nas quaiso desenvolvimento ainda não alcançou. A zona de desenvolvimento proximal é o caminho que as funções imaturas, mas que estão em processo de maturação, irão percorrer para se consolidar no nível de desenvolvimento real. É a distância entre o desenvolvimento real

    e potencial. (Oliveira, 1998).

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     Na visão de Klein (citada por Aberastury, 1982), no brincar, a criança vence a realidade dolorosa e domina os medos a partir das projeções feitas nos brinquedos. Afirma que tal estratégia é possível a partir da simbolização.

    Freud, em seu artigo “Além do Princípio de Prazer” (1926), diz que “... em suas brincadeiras as crianças repetem tudoque lhes causou uma grande impressão na vida real, e assim procedendo, ab-reagem6  a intensidade da impressão,tornando-se, por assim dizer, senhoras da situação.”. E  prossegue “...quando a criança passa para da passividade daexperiência para a atividade do jogo, transfere a experiência desagradável para um de seus companheiros de brincadeirae, dessa maneira, vinga-se num substituto.” (Freud, 1926, p. 28).

    Dessa maneira, o brincar aparece como um objeto de catarse para a criança, sendo nele descarregado todo o rancor comrelação à hospitalização. A partir da repetição dessa situação por meio da brincadeira, a criança domina sua angústia,elabora suas resistências e, por conseguinte, reelabora sua internação.

    Para que se compreenda corretamente uma brincadeira de criança, é necessária uma leitura dos significados dados ao jogo naquele momento e contexto. Deve-se levar em conta que a mesma brincadeira pode ter diferentes significados.Oferecendo um momento lúdico para a criança hospitalizada, além de se cumprir a lei7, propicia uma estratégia deenfrentamento da condição de fragilizada, permitindo que expresse seus medos e angústias.

    Assim, sistematizando o ato de brincar, é possível à criança apropriar-se do significado dado pelo brinquedo e assimilá -lo. Conciliando distração e terapêutica, a criança reelabora sua internação e patologia, passando a enxergar o meio naqual está inserida sob outra perspectiva. .

    A utilização de tal estratégia além de incentivar a cooperação e adaptação do paciente ao local, diminui o estresse,ansiedade e medo, ao torná-la ativa em seu tratamento,. De acordo com Gottfried e Brown (citado por Soares eZamberlan, 2001), a participação da criança hospitalizada em atividades lúdicas pode acelerar sua recuperação,diminuindo a sua permanência no hospital. Além de ser um material pedagógico de fácil compreensão facilitando aoaprendizado dos procedimentos médicos adotados, preparando a criança psicologicamente para tais procedimentos.

    Considerações finais

    Todos os recursos utilizados para  o restabelecimento da criança no hospital são válidos, desde que não agridam o seuestado emocional e físico. Tais recursos já descritos contribuem para uma humanização do ambiente hospitalar,melhorando a imagem deste perante as crianças internadas e seus familiares. Porém, salta aos olhos a carência de algunsmétodos paliativos que possibilitem a interpretação e intervenção das brincadeiras apropriadas para o caso dahospitalização. Ao fazer ponte entre a fantasia e realidade, é possível ao psicólogo auxiliar na reelaboração da situaçãoem si, fazendo com que o ambiente se torne mais suportável à criança. A proposta de tal atendimento é que, através dasua sistematização, a criança possa conviver bem com a sua realidade hospitalar independente da presença daquele

     profissional.

    R EFERÊNCIAS  

    ABERASTURY, Arminda.  Psicanálise da crian ça: teoria e técnica. Tradução Ana Lúcia de Campos. Porto Alegre:Artes Médicas, 1982.

    BRASIL. Congresso Nacional. Lei nº 8069 de 13 de julho de 1990. Estatuto da criança e do adolescente. Disponívelem . Acesso em: 23 maio 2006.

    6De acordo com Laplanche e Pontallis (2001), ab-reagir é a “descarga emocional pela qual um sujeito se liberta do afeto ligado àrecordação de um acontecimento traumático, permitindo assim que ele não se torne ou não continue sendo patogênico.”7

    Lei Federal 8069/ 1990 - Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA),  Art 16. O direito à liberdade compreende os seguintesaspectos: (IV) brincar, praticar esportes e divertir-se, entre outros. 

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    LUTO NA INFÂNCIA: ALGUMAS CONSIDERAÇÕES À LUZ DATEORIA DO ÉDIPO EM LACAN

    Carolina Alves Rezende1 

    “Amar o perdido / deixa confundido / este coração. Nada pode o olvido / contra o sem sentido / apelo do não".

    (Carlos Drummond de Andrade, “Memória”)

    Introdução

    O objetivo do presente trabalho consiste em apresentar brevemente algumas considerações acerca do complexo deÉdipo conforme relido por Lacan a fim de correlacioná-las com a temática do luto na infância, em especial no que dizrespeito ao processo de enlutamento decorrente da morte de um genitor. Nesse sentido, surge em função de algumasinquietações suscitadas pelo trabalho com crianças enlutadas (con)vivendo com o HIV/Aids em uma experiência deestágio na área de Psicologia. É comum entre essas crianças a vivência da morte de um dos pais, também afetados peloHIV/Aids, bem como as inúmeras fantasias (culpa, abandono, retaliação, dentre outras) que aparecem em decorrência

    dessa morte. Nesse sentido, os questionamentos acerca da prática com esse público conduziram a um levantamento naliteratura acerca da temática e despertaram algumas reflexões que são expostas ao longo do trabalho. Para tanto, busca-se inicialmente situar a importância do complexo de Édipo na teoria psicanalítica (nos estudos de Freud e releituralacaniana) e em seguida, propõe-se descrever os três momentos do Édipo conforme discutidos por Lacan. Por fim,objetiva-se relacionar aspectos da teoria do Édipo à problemática do luto na infância, destacando possíveisdesdobramentos.

    Teoria do Édipo – pedra angular da Psicanálise

    De acordo com Laplanche & Pontalis (1970), o complexo de Édipo corresponde ao conjunto de desejos amorosos e

    hostis experimentados pela criança em relação aos pais. Em sua forma positiva, o complexo apresenta-se através dodesejo da morte do rival, personagem do mesmo sexo, e desejo sexual do personagem do sexo oposto. Na formanegativa, observa-se uma inversão na medida em que há o amor pelo progenitor do mesmo sexo e ódio pelo progenitordo sexo oposto.

    Esses autores destacam o papel fundamental na estruturação da personalidade e na orientação do desejo humanoatribuído ao Édipo dentro da teoria psicanalítica. Freud (1905, apud Laplanche & Pontalis, 1970) destaca auniversalidade do Édipo, considerando que “a todo ser humano é imposta a tarefa de dominá-lo”.

    Ao Édipo são atribuídas funções fundamentais, dentre elas: a escolha do objeto de amor na medida em que esta éinfluenciada pelas identificações inerentes ao complexo e pela interdição de realizar o incesto; o acesso à genitalidade,

    considerando que a simples maturação biológica mostra-se insuficiente em tal tarefa já que a organização genital supõea instauração do primado do falo; e a estruturação da personalidade e constituição das instâncias como o superego –vinculação entre a origem da moralidade e problemática edípica (Laplanche & Pontalis, 1970).

    Bleichmar (1984) afirma que a expressão “complexo de Édipo” aparece em Freud em 1910, no texto “Um tipo especialde escolha de objeto feita pelo homem”. O autor situa três conceitualizações em Freud em relação ao Édipo, pontuandoque na primeira época freudiana o complexo de Édipo aparece de maneira a orientar a sexualidade infantil e suasemoções. A segunda formulação refere-se às identificações e sugere que a identidade sexual não é dada naturalmente, esim aparece como algo que se deve assumir. Por fim, o terceiro período faz referência à castração na medida em que secompreende que o Édipo não é igual para mulher e homem.

    1 Graduanda no 9º. semestre de Psicologia na UFBA - Universidade Federal da Bahia.

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    É no sentido de apontar o caráter fundamental da problemática edípica que Moreira (2003) destaca que o momentocrucial da constituição do sujeito situa-se na cena edípica. Segundo a autora, é a partir do Édipo que o sujeito estrutura eorganiza seu vir-a-ser em torno da diferenciação entre os sexos e de seu posicionamento frente à angústia de castração.Assim, “não existe um sujeito que preexista a relação com os pais” (Bleichmar, 1984).

    Moreira (2003) ainda pontua a importância e centralidade da teoria quando organiza o processo de crescente teorizaçãodo Édipo em quatro movimentos: “o Édipo na teoria dos sonhos” (sonho como uma manifestação e possibilidade derealização de um desejo inconsciente), “o Édipo no interior da problemática do pai totêmico”, “o mecanismo daidentificação no Édipo”, e por fim “o Édipo e complexo de castração”.

    A idéia do Édipo possibilita a superação da teoria da sedução e introduz a teoria da fantasia e sexualidade infantil. OÉdipo nomeia a dimensão conflitiva que faltava à teoria em desenvolvimento, estruturando o funcionamento psíquico.

    Em Lacan, apesar da ampliação do conceito do complexo de Édipo e da sua articulação com a estrutura da cultura,conforme destaca Bleichmar (1984), é mantida a centralidade da teoria do Édipo, sendo o Édipo estruturante de uma

     posição perante o desejo. É ao redor do Édipo que se situam conceitos centrais como a metáfora do Nome-do-pai e afunção paterna.

    Mediante as considerações anteriormente destacadas, pode-se pensar na teoria do Édipo como “pedra angular” daPsicanálise. O complexo de Édipo aparece na Psicanálise de forma central, seja nas manifestações do inconsciente, notratamento psicanalítico ou nas produções psicopatológicas.

    Teoria do Édipo em Lacan

    De acordo com Bleichmar (1984), a compreensão do Édipo em Lacan está embasada no conceito de falo e de sua

    função simbólica visto que no Édipo, os personagens colocam-se distintamente perante esse falo. De acordo com oautor, de maneira sucinta, no primeiro tempo do Édipo, a mãe tem o falo e o pai não aparece em destaque. No segundomomento, o pai é o falo. Por fim, no terceiro tempo do Édipo, o pai tem o falo, representando alguém que o possui.

     No primeiro momento do Édipo, evidencia-se uma relação fusional pela posição que a criança mantém junto à mãe,buscando identificar-se com o que supõe ser o objeto de seu desejo (Dor, 2003). Aqui, aparecem em destaque a mãe, acriança e o falo, de maneira tal que a criança intenciona se constituir como o falo materno. A relação imediata com amãe (ou com quem exerça a função materna) se estrutura de tal forma que a criança se faz de objeto que completa amãe, ocupando nesse sentido o lugar do falo. Neste momento, Gorski (2000) pontua que a criança encontra-se alienadano desejo da mãe.

    A maneira como se organiza a relação fusional entre a mãe e a criança parece estar relacionada aos primeiros cuidados esatisfação das necessidades da criança através da figura materna. Bleichmar (1984) destaca que a mãe não só satisfaz asnecessidades da criança como também as constrói na medida em que traz a ela a linguagem que lhe decifra o que estáacontecendo, como ter frio ou fome. Dessa forma, pode-se pensar que a relação mãe-criança marcada pelos cuidadoscorporais e pelo sentido que é atribuído ao olhar, à voz, ao grito, ao choro, propicia a passagem de algo do campo danatureza para o campo do simbólico.

     No que se refere à mãe evidencia-se a completude visto que a mesma sente que nada lhe falta e assim, tem o falo que acompleta (Bleichmar, 1984). A unidade formada pela mãe e seu filho implica no entendimento da mesma de que o filhorepresenta o falo e, portanto, pode-se falar na mãe fálica. Este tipo de relação corresponde ao que é comumente descritoacerca do primeiro tempo do Édipo.

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     No segundo momento do Édipo, a criança é apresentada ao registro da castração pela dimensão paterna. É neste sentidoque Gorski (2000) afirma que o entendimento do Édipo em Lacan deve ser pensando em torno da função paterna àmedida que esta articula o conceito de falo ao complexo de cas tração.

    Dor (2003) coloca que a mediação paterna ocorre sob a forma de privação sendo vivida pela criança como umainterdição e frustração. Assim, entende-se que o pai intervém na relação fusional mãe-criança, interditando a satisfaçãode ambos nesta. No que tange a este tempo do Édipo, Bleichmar (1984) afirma que com relação à criança, ela deixa deser o falo da mãe e percebe que a mãe prefere a outro que não ela, supõe, portanto que este outro tem algo que ela (acriança) não tem. Com relação à mãe, por outro lado, evidencia-se a importância de que esta não somente troque o filho

     pelo pai, mas também não mantenha o mesmo tipo de relação dual com este, visto que o contrário implicaria namanutenção de sua posição de mãe fálica.

     Na compreensão lacaniana do segundo tempo do Édipo, verifica-se o deslocamento do objeto fálico que culmina noencontro da criança com a lei paterna (Dor, 2003). Dito de outra forma, o surgimento do pai na relação mãe-criança, fazcom que esta perceba um outro capaz de intervir, interditar ao passo que a este passa a ser atribuído um novo valorsimbólico. A descoberta da criança de que a mãe depende da lei, sujeitando-se a ela (afinal, a mãe também é interditada)acarreta em um deslocamento em direção à lei paterna. O pai aparece como falo na medida em que interdita, priva,

     barra.

    Segundo Gorski (2000), para Lacan, ao se defrontar com a lei do pai, a criança confronta-se com a castração. À criançacabe aceitar não ser e não ter o falo assim como a mãe. O segundo momento do Édipo figura como passo essencial aoterceiro tempo do complexo.

    O terceiro tempo coincide com o tempo do declínio do complexo de Édipo. Para Bleichmar (1984), “no terceiromomento do Édipo ficam instaurados a lei e o falo como instâncias que estão acima de qualquer personagem”. Deacordo com Dor (2003), neste momento pode ser evidenciada a simbolização da lei e aceitação desta na medida em queo pai aparece como aquele que tem o falo, objeto desejado pela mãe.

     Neste tempo, verifica-se com o declínio do complexo de Édipo a abertura para as inúmeras identificações. O menino,identificando-se com o pai que supostamente tem o falo e a menina, identificando-se com a mãe que sabe buscar o falonaquele que supostamente o tem.

     Nesse sentido, reafirma-se a conjetura de que a concepção do Édipo para Lacan situa-se em torna das posiçõesatribuídas às figuras parentais e à criança no que se refere ao falo. Neste processo, destaca-se a intervenção da metáfora

     paterna que propiciará o recalque originário.

    Teoria do Édipo e luto na infância

    Mediante as considerações destacadas é possível situar o processo de luto na infância, em especial no que se refere aoenlutamento como decorrência de morte de um dos pais da criança, com os momentos relativos ao complexo de Édipo,conforme são desenvolvidos na teoria psicanalítica.

    De acordo com Freud (1917), o luto pode ser compreendido como uma reação à perda de um ente querido, nãoconstituindo condição patológica. O luto implica na perda de interesse pelo mundo externo na medida em querepresenta uma reação a uma perda real de um objeto amado. Pode representar uma possibilidade de manifestação daambivalência nas relações afetivas, podendo em alguns casos associar-se à auto-recriminação quando a própria pessoaenlutada sente-se culpada pela perda do objeto amado, sentindo que a desejou. Esta proposição mostra-se de grandevalia no estudo de algumas crianças enlutadas pela perda dos pais.

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    De outro lado, pode-se ainda pensar à luz da teoria do complexo de Édipo que a perda dos pais poderia representar a perda de objetos de identificação tão relevantes na dissolução de tal complexo. O menino, identificando-se com o paique supostamente tem o falo e a menina, identificando-se com a mãe não mais em uma relação fusional (para isto cabea intervenção paterna), mas considerando que a mãe sabe buscar o falo naquele que supostamente o tem. Nessecontexto, Felzenszwalb (2000, apud Hahn, 2005) destaca acerca da importância do pai:

    O pai cumpre o papel de representar a saída, a estrada para o mundo fora de casa, longe da domesticidade. O pai é o grande aliado da filha em sua luta para se separar psicologicamente da mãe e para estabelecer o sentimento de individualidade feminina.

    Outro aspecto interessante refere-se à fantasia de ocupar o lugar do genitor perdido. Dessa forma, quando a criança é domesmo sexo do genitor falecido, as fantasias familiares de reposição da figura perdida tendem a serem facilitadas(Tinoco, 2005). Assim, na criança que vivencia o momento de elaboração edípica esse desejo pode ser acentuado, comose a interdição simbólica, usualmente vivida como uma frustração, não tivesse tido efeito.

    A vivência do momento edípico pode ainda associar-se à fantasia de retaliação presente em algumas crianças através deataques reais do genitor perdido. Este ataque aparece, usualmente, no temor da castração peniana (Tinoco, 2005). Essafantasia talvez possa ser associada à idéia de que o genitor retornaria para um possível “acerto de contas” com a criança.

    Conclusão 

    As contribuições apresentadas no presente trabalho não esgotam as reflexões acerca das correlações entre o luto nainfância e a vivência do complexo de Édipo, e nem tão pouco abarcam uma vasta amostra que pudesse apresentar maiorvalidação das considerações realizadas. O trabalho apresenta-se antes como uma reflexão decorrente de um brevelevantamento na literatura sobre o tema. Não obstante, acredita-se que as inquietações levantadas podem fornecersubsídios e funcionar como fomentador de futuros estudos que contemplem a temática em questão e vise seuaprofundamento.

    R EFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS  

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    72.

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    Tinoco, V. (2005). O luto de crianças institucionalizadas em casas abrigo. Em.: Mazorra, L. & Tinoco, V. (2005).  Lutona infância – intervenções psicológicas em diferentes contextos. Campinas: Livro Pleno, p.147-170.

     ____________________Recebido em 02/07/2006Aprovado em 31/07/2006

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    O PSICÓLOGO HOSPITALAR BRASILEIRO:UMA VISÃO DA REPRESENTAÇÃO ENQUANTO PROFISSIONAL

    Cláudia Furtado Borges, Vanessa Coelho de Sousa1 

    RESUMO  

    Este artigo tem o objetivo de construir um panorama da atuação do psicólogo hospitalar brasileiro. Nesse sentido,devemos percorrer as origens da Psicologia, a consolidação da Psicologia Hospitalar no Brasil, suas variações narepresentação destes profissionais nos diferentes pontos de vistas das pessoas que compõe o contexto hospitalar. Estetrabalho resulta numa singela visão, que mostra a escassez de pesquisas com este tema; além de diversas dificuldades e

     barreiras encontradas pelos psicólogos hospitalares, uma recusa e resistência por parte da equipe de saúde e dos pacientes, más condições de trabalho, salários baixos que os levam a exercerem outras atividades. Além, que a função para outros profissionais é restrita a pontos como sofrimento, morte ou avaliações psicológicas.Palavras chave: representação, psicologia hospitalar, psicólogo hospitalar brasileiro.

    O presente artigo surgiu com o objetivo de apresentar um breve histórico da Psicologia Hospitalar e da atuação do

     psicólogo hospitalar no Brasil. Assim, tivemos o intuito a partir de uma revisão bibliográfica mostrar a representaçãodestes profissionais em algumas regiões do país.

    Schultz e Schultz (1991), afirmou que a Psicologia é uma das mais antigas disciplinas acadêmicas e, ao mesmo tempo,uma das mais novas. Segundo os autores, no século V a.C. Platão e Aristóteles, e outros sábios gregos, já se

     preocupavam com vários temas estudados pela psicologia atualmente.

    De acordo Sebastiani e Maia (2005) a psicologia se estruturou como Ciência e Profissão, a partir da segunda metade doséculo XIX, com os trabalhos de Wundt na Universidade de Liepezieg. Em seus primórdios, ela foi influenciada pelavisão cartesiano-positivista.

     No Brasil, a profissão de psicólogo foi regulamentada em 1962, consolidou-se prioritariamente na esfera privada, sendoque a área clinica era a principal fonte de interesse profissional (Marcon, Luna, Lisboa, 2004). Conforme Mello (1975in Yamamoto & Cunha; 1998), no Estado de São Paulo havia aproximadamente 80% daqueles poucos psicólogos jáexerciam atividades, exclusivas ou não, na área clínica. Este quadro permaneceu até a década de 80, quando a área desaúde pública tornou-se mais uma possibilidade de atuação profissional.

    Porém, existem relatos da presença de psicólogos no contexto hospitalar mesmo antes da regulamentação profissional(Lamosa, 1987; Campos, 1988 in Yamamoto & Cunha; 1998), mas somente nos últimos anos o psicólogo se inseriu deforma mais estável e significativa no ambiente hospitalar.

    Laloni (1995 in Reis, 2005) afirma que a Psicologia da Saúde é uma área da psicologia que surgiu recentemente -década de 60 - tendo sua história vinculada à aplicação de testes para avaliação da inteligência, personalidade oudesenvolvimento motor. Porém, a partir dos anos 70, a Psiquiatria começou a estudar as doenças psicossomáticas,dando abertura para o profissional de saúde mental em hospitais gerais, realizando interconsultas psiquiátricas de

     pacientes de outras especialidades (Reis, 2005).

     No Brasil, (Marcon; Luna e Lisboa 2004), o psicólogo começou a atuar na saúde pública anos 60, com maior foco nasaúde mental, principalmente em hospitais psiquiátricos, mesmo neste contexto o psicólogo ocupa um papel secundário,sendo sua principal atuação a avaliação psicológica.

    1 Alunas do 10º. período de Psicologia da Universidade Federal de Uberlândia.

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    A teoria de Hipócrates, considerando que para curar o corpo necessita conhecer o todo, pois, para ele, a alma (psique) eo corpo (soma) estariam dialogando entre si (SIMONETTI, 2004 aput PINTO; 2005); o movimento psicossomático; e ahumanização da saúde determinada pelo Comitê Técnico do Programa Nacional de Humanização da AssistênciaHospitalar do Brasil representam os antecedentes significativos para a Psicologia da Saúde (SEBASTIANI e MAIA;2005).

    A Associação Americana de Psicologia legalizou a atuação do psicólogo na área da saúde em 1978, criando a divisão dePsicologia da Saúde, fazendo com que o homem seja visto como um ser biopsicossocial (Reis, 2005).

    O Brasil tem sido considerado por algumas pesquisas como o precursor da Psicologia Hospitalar, área de atuação da psicologia que intervem nos processos doença – internação - tratamento envolvidos pela relação paciente-familia -equipe, utilizando teorias e técnicas específicas para a atenção às pessoas num contexto hospitalar. Os profissionaisdesta área focam seu trabalho nas demandas psicológicas apresentadas no processo doença-internação-tratamento, nasreações que podem agravar o problema do paciente ou dificultar o processo de recuperação. Além disso, temas como o

     processo de morte e morrer, perdas irreversíveis causadas pela doença, angústia e sofrimento ocorridos no período dainternação também são enfoques da psicologia hospitalar (Sebastiani e Maia; 2005).

    Simonetti (2004 in Pinto; 2005) considera a Psicologia Hospitalar como o campo de entendimento e tratamento de aspectos psicológicos ligados ao adoecimento, ou seja, manifestações subjetivas da doença, tais como as crenças, ossonhos, os conflitos, as lembranças e os pensamentos. Segundo este autor a doença não fala, o doente sim.

    “A psicologia hospitalar intervém na forma do paciente conceber e vivenciar os  problemas gerados pela patologiaorgânica, pela hospitalização, pelos tratamentos e pela reabilitação”. ( Alamy, 2003 p.15 in Ribeiro; 2005).

    Desta forma, o psicólogo hospitalar busca a promoção, a prevenção, a recuperação do bem-estar do paciente, no seutodo. (Campos, 1995 in Ribeiro; 2005).

    Atualmente, com o grande crescimento da área, vem se desenvolvendo algumas pesquisas visando verificar a inserçãodo psicólogo nos hospitais e sua atuação em tal contesto. MARCON, LUNA e LISBOA (2004) desenvolveram estudoscom o objetivo de conhecer a inserção dos psicólogos que atuam em hospitais em Florianópolis, comparando os dadosobtidos com pesquisas realizadas em outros estados brasileiros. Observaram que a maior concentração de psicólogos naárea hospitalar em Florianópolis estava em instituições psiquiátricas. A grande maioria (90%) dos psicólogos na áreahospitalar era do sexo feminino. 80% dos psicólogos exerciam outras atividades profissionais em psicologia, este fato

     pode ser relacionado à baixa remuneração de tais profissionais, pois mais da metade (87%) recebiam entre 3 e 9 saláriosmínimos. A metade dos sujeitos da pesquisa, em sua formação profissional realizou estágio em instituição hospitalar naGrande Florianópolis. Nesta cidade, 17% eram especialistas 14% eram mestrandos e 83% possuía curso de formaçãoteórico-metodológica em Psicoterapia. Já no Distrito Federal, encontraram uma maior proporção maior de profissionaiscom curso de pós-graduação, sendo 39,1% no nível de especialização, 34,8% com Mestrado e 2,2% com Doutorado. Aabordagem predominante em Florianópolis foi a psicanálise, com o modelo predominante clinico, embora já encontreum modelo de atenção integral à saúde ou biopsicossocial, já em Natal e Curitiba há um predomínio da Psicoterapia

    Breve. Observou-se, também uma diversidade de trabalhos desenvolvidos junto a paciente, familiares e equipe desaúde. (Marcon, Luna e Lisboa, 2004).

    Em 2002, Yamamoto, Trindade e Oliveira realizaram um estudo nos hospitais do Rio Grande do Norte, objetivandocaracterizar a atuação dos psicólogos e contribuir para o debate acerca da natureza da sua inserção no contextohospitalar. Seus resultados apontam que os psicólogos estão ingressando de forma significativa nos hospitais potiguares,

     porém há predominância do regime parcial de trabalho e pelos recentes empregos. Observaram que metade dos psicólogos deste estudo já iniciara suas atividades em hospitais. Todos os psicólogos deste estudo trabalhamdiretamente com o paciente, desenvolvendo alguma modalidade de trabalho psicoterápico. As orientações eaconselhamento, seguidos de avaliações psicológicas também apareceram com destaque. A segunda modalidade deatuação de tais profissionais é com a família, desenvolvendo trabalho semelhante. A maioria trabalha com referencial

     psicanalítico (56%). Os sujeitos da pesquisa consideraram sua formação proporcionada pela universidade deficiente,

    necessitando complementação nas diversas formas de estudos nas pós-graduações e supervisões. Seu trabalho tem uma

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     boa aceitação apesar das lacunas na formação e das dificuldades da atuação profissional, porém diversas dificuldades e barreiras foram relatadas por parte da equipe de saúde como a precariedade do material, do local; baixa remuneração efalta de integração entre profissionais.

    Yamamoto e Cunha (1998) desenvolveram uma pesquisa semelhante nos hospitais de Natal. Verificaram que aformação de nível de graduação também foi considerada insuficiente, o que fez com que os sujeitos do estudo

     buscassem um aprimoramento profissional sobre a forma de cursos (formais ou não) de especialização. Neste grupo foiencontrada uma atração (precoce) exercida pelo trabalho no campo da saúde. A maioria atuava com referencias noenfoque psicoterapia breve de base analítica, desenvolvendo alguma modalidade de trabalho psicoterápico com os

     pacientes e trabalhos de suporte com familiares. Quanto às condições nas quais o trabalho é desenvolvido, a maioriaconsidera-nas insatisfatórias. Os profissionais entrevistados consideram que seu trabalho é bem recebido pelos médicose também pelos pacientes.

    E como fica a opinião do paciente para estes profissionais? Em 2003, Nunes e Góia-Martins realizaram uma pesquisacom este objetivo, investigar a percepção do paciente hospitalizado a respeito do psicólogo que atua em hospitais gerais,com base na teoria das RS (Representações Sociais). Foram realizadas entrevistas semidirigida com 12 pacienteshospitalizados em unidades de internação (enfermarias) de um hospital particular da cidade de São Paulo, sendo quemetade da amostra já havia recebido ou estavam recebendo tratamento psicoterápico, e a outra metade não haviarecebido atendimento psicológico. Seus resultados demonstraram que a maioria dos participantes (66,67%) conseguiuexpressar a percepção de algumas atividades que fazem parte do exercício profissional do psicólogo hospitalar, porémcom respostas incompletas. 83,33% dos pacientes expressaram uma atitude favorável, sendo que a metade destes

     procurou-se usar palavras positivas em relação ao modo como viam o psicólogo, mas analisando essas respostas pode-se perceber que evitariam novo contato com o profissional de psicologia hospitalar, alegando “que não viamnecessidade de serem atendidos”, identificando uma atitude desfavorável e atribuição de um valor negativo, porémocultado por palavras positivas. Essa recusa ao novo atendimento estava associado à visão de psicólogo trabalha comdoido. Em relação à representação social, as respostas apresentaram grande variação, de associações com figuras comoorientador, conselheiro e padre (33,33%), a estereótipo do “psicólogo bonzinho”, que tranqüiliza e conforta (8,33%).Metade dos pacientes que não tiveram contato com o psicólogo do hospital, assim, tiveram maior dificuldade nadefinição de quem é esse profissional e quais suas atribuições, já apenas 16,67% dos pacientes que tiveram contato comele tiveram tal dificuldade.

    CONCLUSÃO

    Apesar deste trabalho, ter sido elaborado a partir de poucos artigos sobre o tema, devido à escassez de pesquisas, omesmo nos permite construir elementos que representam o psicólogo hospitalar brasileiro. Temos (em maioria)

     profissionais com base teórica psicanalítica. Encontra -se uma profunda deficiência e falta de incentivo na formaçãodestes profissionais, assim os mesmo buscam auxilio e orientações depois da graduação. Há também diversasdificuldades e barreiras encontradas por tais profissionais, como a recusa e resistência por parte da equipe de saúde edos pacientes, as más condições de trabalho, salários baixos que os levam a exercerem outras atividades. Sua função

     para outros profissionais é restrita a pontos como sofrimento, morte ou avaliações psicológicas. A família fica emsegundo plano, em suas atividades.

    Pode-se ver que há várias problemáticas na Psicologia Hospitalar Brasileira. De modo geral, esta é uma área nova, os psicólogos têm se inserindo de forma significante nos hospitais de várias regiões do Brasil. Mas é necessário modificare anular o estereotipo deste profissional perante seu local de trabalho e a sociedade, é primordial a valorização destaárea e destes profissionais. Percebe-se uma necessidade emergente, de investir em teorias e práticas em PsicologiaHospitalar nos cursos de graduação, fazendo um trabalho social, comunitário e organizacional com estes alunos; alémde uma vivência na realidade deste contexto. Também é necessário, fazer um processo no intuito estreitar as relaçõesentre o psicólogo hospitalar e os profissionais de saúde, através de dinâmicas de grupo, reuniões multidisciplinares, e

     principalmente, na definição e conscientização da equipe de saúde, dos funcionários e dos psicólogos hospitalares sobrea importância da atuação conjunta, da intervenção em pacientes e familiares.

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    Acreditamos que estas, são algumas formas de reciclagem pertinente a situações relatadas, e que tal processo, poderámodificar e renovar a representação da Psicologia nas salas de aula, na sociedade, e principalmente na Saúde Publica ePrivada do Brasil.

    BIBLIOGRAFIA 

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     ____________________Recebido em 03/12/2006Aprovado em 01/01/2007

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    ASPECTOS PSICOLÓGICOS QUE PREDISPÕEM AO APARECIMENTOE DESENVOLVIMENTO DO CÂNCER 1 

    Marta Betania Cardoso Tavares Luzete2 

    O ser humano é um ser complexo que está em constante interação com o meio, transformando-o e criando cultura, esendo por ele influenciado. Suas ações decorrem da interação dos seus aspectos bio-psico-sócio-espirituais associada à

    sua história de vida.

    O ser saudável tem a harmonia de todos estes aspectos. Quando ocorre um fato que desequilibra um destes fatores, ocorpo é afetado como um todo. Ele, então, mobiliza seu sistema de defesa para reequilibrar-se. Porém, se odesequilíbrio é continuo e intenso, a doença se manifesta.

    “O Câncer, por exemplo, surge como uma indicação de problemas em outras áreas da vida da pessoa, agravados oucompostos de uma série de estresses que surgem de 6 a 18 meses antes de aparecer o Câncer. Foi observado que as

     pessoas reagiram a esses estresses com um sentimento de falta de esperança, desespero, desistindo de lutar por uma vidamelhor. Acredita-se que essa reação emocional dispara um conjunto de reações fisiológicas que suprimem as defesasnaturais do corpo, tornando-o suscetível à produção de células anormais”. (1) 

    Como se vê o Câncer não é desenvolvido por uma única causa, mas pelo somatório de várias causas. Neste artigo,enfocarei principalmente os aspectos psicológicos que debilitam o organismo e o predispõe ao aparecimento edesenvolvimento do Câncer, evidenciando a importância da esperança na manutenção da saúde.

    E o que é Esperança?

    Esperança é acreditar com confiança que se conquistará algo que se deseja. Ela está presente em todos os atos da vida. Éela que nos faz acreditar que temos condições de aprender, de conseguir um emprego, de conquistar o ser amado, deadquirir os bens que des ejamos e de vencer as adversidades que surgem no decorrer da vida. Ela faz com que nos

    sintamos senhores do nosso destino e decidamos que viver vale a pena.

    Este sentimento de esperança nasce nos primeiros meses de vida, quando o mundo ainda é desconhecido para o bebê. Ea segurança básica que este estabelecerá com sua mãe será a semente da esperança que o acompanhará pela vida afora.Durante seu desenvolvimento, cada situação nova que a pessoa conseguir enfrentar satisfatoriamente reforçará essaconfiança básica e o ajudará a aumentar o seu próprio sentimento de esperança.

    E quando não se tem esperança?

    Lawrence Le Shan, psicólogo experimental por formação e clínico por experiência, que trabalhou com pacientes de

    câncer por mais de trinta e cinco anos, fala em seu livro O câncer como ponto de mutação (7), que as pessoas que nãotem esperanças sentem que só há dois caminhos em suas vidas:

    “Elas podem ser elas mesmas, relacionar-se, existir, criar, à sua própria maneira. Se assim fizerem, ficarãosozinhas, pois consideram que “sua maneira” de ser não é aceitável para os outros. A solidão será muito grande

     para ser suportada. Ou podem seguir o segundo caminho: adaptar-se aos desejos e exigências dos outros,enterrar sua singularidade, sua individualidade, e então serem aceitos pelos outros e – nas palavras de um

     paciente – “receber migalhas de amor, o suficiente para quase sobreviver”. Entretanto, se seguirem estecaminho, ainda se sentirão basicamente sozinhas. Elas serão aceitas pelo que fazem, não pelo que são. Além

    1 Trabalho produzido durante o Curso Virtual de Psicologia Hospitalar e da Saúde, ministrado pela psicóloga Susana Alamy.2

     Pedagoga formada pela Universidade de Brasília, com habilitação em Orientação Educacional. Licenciada em Psicologia peloUniceub - Brasília / DF. Psicóloga formada pelo Uniceub - Brasília / DF.

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    Dra. Elida Evans, psicanalista junguiana, autora do livro  A psychological Study of Câncer,  concluiu, após análise decem pacientes cancerosos, que muitos deles tinham perdido alguém querido um pouco antes da doença se manifestar.

    “Ela via esses pacientes como pessoas que haviam investido a sua identidade em um objeto ou papel individual(uma pessoa, um trabalho, um lar), ao invés de desenvolver a sua própria individualidade. Quando o objeto oufunção lhes era retirada, esses pacientes tinham de enfrentar a si mesmos, com poucos recursos para fazê-lo“.(apud 3 p.63)

    O Dr. Le Shan, descreve em seu livro  Brigando pela vida: aspectos emocionais do câncer (6) , descobertas semelhantesao de Elida Evans:

    “Com base em minhas observações, o padrão emocional do paciente de câncer parece possuir três elementos principais. O primeiro envolve uma infância ou adolescência marcada por sentimentos de isolamento. Há asensação de que os relacionamentos intensos e significativos são perigosos e provocam sofrimento e rejeição.O segundo elemento do padrão concentra-se no período em que é descoberto um relacionamento significativo,

     permitindo que o indivíduo desfrute a sensação de ser aceito pelos outros [...] e encontre um sentido para suavida. O terceiro aspecto vem para o primeiro plano, quando ocorre a perda daquele relacionamento central.Agora há um sentimento de desespero absoluto, relacionado ao sentimento de solidão da infância, porem maisintenso. Nessa terceira fase, é predominante a convicção de que a vida não encerra nenhuma esperança. E,algum tempo após o início da terceira fase, surgem os primeiros sintomas do câncer”. (1994, p.58)

    De mais de 500 pacientes cancerosos com quem Le Shan trabalhou, “76% dos pacientes que entrevistou partilharamdeste tipo básico de historia emocional. Dos pacientes cancerosos que estavam em terapia intensiva com ele, mais de95% tinham este padrão. Apenas 10% dos pacientes não-cancerosos demonstravam este modelo de vida.” (apud 3 p. 64)

    O Dr. W. A. Greene, que analisou por 15 anos as experiências sociais e psicológicas dos pacientes com leucemia elinfoma, também observou esta vivência de perda de um relacionamento importante na vida do paciente.

    “Tanto para os homens como para as mulheres, segundo Greene, a maior perda era a ameaça de morte da mãe,ou para o homem uma “figura maternal”, como, por exemplo, a esposa. Outros acontecimentos emocionaisimportantes para a mulher eram a menopausa ou mudança de domicílio; no caso de homens, perda ou ameaçade emprego, aposentadoria ou ameaça de aposentadoria. Greene chegou à conclusão de que a leucemia ou olinfoma se desenvolviam num ambiente em que o paciente fora forçado a lidar com perdas e separações que

     produziam um estado psicológico de desespero, desesperança e descontinuidade.” (apud 3 p. 65-66)

     No livro Quem ama não adoece  (11), o Dr. Marco Aurélio Dias da Silva comenta sobre este histórico de vidacaracterístico de pacientes com câncer, ressaltando que:

    “Eles não conseguem conviver bem com as perdas que a vida lhes traz, possivelmente em decorrência de másexperiências infantis de privação e desespero. Mais tarde, na vida adulta, diante de situações como perdas eseparações de pessoas queridas e importantes, toda a sensação de desespero infantil seria revivida – porém nãode fato vivenciada, com forte tendência a negar e não exprimir o afeto”. (pg.153)

    Que traços de personalidade são característicos de pessoas que desenvolvem o Câncer?

    Stephanie Simonton, no seu livro A família e a cura  (12), fala que, tanto nos estudos de Le Shan quanto no trabalho deCaroline B. Thomas, psicóloga da Universidade de Johns Hopkins, que durante 30 anos fez entrevistas extensas commais de 1300 pessoas, há “um perfil bastante característico das pessoas que desenvolvem câncer”:

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    Alguns pesquisadores observaram, em seus estudos, que pacientes cancerosos tem dificuldade de expressar emoçõesnegativas.

    O Dr. D.M. Kissen percebeu que a diferença entre os fumantes que desenvolviam câncer no pulmão e as pessoas que,apesar de fumarem tanto quanto aqueles, não desenvolviam a doença, era que os pacientes cancerosos tinham “poucassaídas para descarregar suas emoções”.

    O Dr. Bruno Keopfer, em um dos primeiros estudos psicológicos feitos sobre Câncer, conseguiu predizer qual seria avelocidade de crescimento do tumor (rápido ou vagaroso) a partir da negação dos sentimentos dos pacientes. “Os quesentiam uma grande necessidade de manter uma ‘boa’ imagem quando estavam sofrendo emocionalmente tinham umcrescimento mais rápido dos tumores”. (apud 3 p.84)

    Stephanie Simonton (12) afirma que a pessoa cancerosa pode “mascarar a raiva, com também encobrir e negar adepressão que dela resulta”. Para ela a pessoa com mais chances de ter esta conduta é o primeiro filho.

    “As estatísticas mostram uma maior incidência de câncer nas pessoas que são os primeiros filhos. Uma possível razão é que a família pressiona mais o primeiro filho a crescer rápido. A criança é levada a negar suavulnerabilidade desde tenra idade. De maneira típica, o 2º filho, que nasce em geral quando o 1º tem entre 18 e36 meses, passa a receber toda a atenção da família. Naturalmente, o 1º filho fica muito assustado e passa a sesentir rejeitado. Ele está numa idade em que deveria estar agindo de forma provocadora e assertiva, dizendonão à mãe para poder se definir como pessoa. Crianças que recebem autoridade para fazer isto e conhecem oslimites impostos pelos adultos aprendem que é seguro estarem separadas da mãe e zangadas com ela. Mas, como novo bebe por perto, tudo isto adquire uma nova perspectiva. Agora, não é seguro gritar com a mãe. Tudotornou-se incerto. Adicionem-se a esses fatores o temperamento e a crença dos pais a respeito da raiva e davulnerabilidade. Se forem criados de maneira tradicional, eles vão dizer ao pequeno John que ‘aja comohomem’ a partir do momento que ele começa a andar - em outras palavras, que ele não deve chorar nemdepender dos outros. E se a mãe estiver sobrecarregada com um segundo filho que lhe dá problemas, a meninamais velha será incentivada a ser uma ‘mamãezinha’ aos dois anos de idade. De uma forma ou de outra, essessão alguns dos fatores que levam o adulto a negar seus sentimentos e a ter sintomas físicos quando está sob

    tensão”. (p. 84-85)

    Qual a importância de conhecer o perfil psicológico do paciente com Câncer?

    Para o Dr. Marco Aurélio Dias da Silva (11), o perfil psicológico desempenha uma função importante tanto na origemquanto na evolução do câncer:

    “Mesmo os que negam a importância do psiquismo no desencadear do Câncer concordam que sua evolução,uma vez presente, seja influenciada de forma significativa pela personalidade do doente, sua maior ou menorresistência psíquica e ainda por sua maior ou menor disposição de lutar pela vida. Aqueles que renunciam e se

    entregam evoluem mal e morrem logo. Os que mantêm acesa a chama da esperança e crença na vida; os quequerem genuinamente viver; os que têm atitudes positivas, força de vontade e objetivos na vida e assumem ocompromisso de lutar por eles; os que não se limitam apenas a aceitar passivamente o que dizem os médicos...estes evoluem melhor, vivem mais e podem até curar-se. Além disso, mesmo que venham a morrer, o períodoentre o conhecimento da doença e a morte será provavelmente, não só maior como também melhor, em termosde bem-estar e qualidade de vida.” (pg. 154)

    Carl e Stephanie Simonton realçam, também, que a atitude do paciente aumenta as defesas do organismo.

    “Os sentimentos de fé e esperança como as preces têm o poder, já comprovados cientificamente, de colaborarno restabelecimento do sistema imunológico e provocar a destruição das células cancerígenas. Geram emoções

    fortemente positivas que estimulam a pineal, levando a glândula a produzir quantidades ideais de melatonina,

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    assegurando de forma mais intensa a defesa imunológica, levando o organismo a atacar rapidamente os vírus eas bactérias. A prece envia substâncias químicas que permitem a elevação da endorfina, encefalina eserotonina, responsáveis pela sensação de bem estar, e que auxiliam o movimento cerebral”. (8)

    Qual o papel do psicólogo junto aos pacientes cancerosos?

    Os pacientes cancerosos, assim como todos os outros enfermos, devem ser tratados por uma equipe multiprofissonal, de preferência atuando inter ou transdisciplinarmente, onde todos os seus aspectos são tratados com igual importância.

    O psicólogo deve ter como enfoque principal do seu trabalho psicológico a manutenção da saúde e a prevenção dasdoenças. Seu objetivo deve ser o de ajudar a pessoa a se identificar com o ser saudável que há nela, através de:

    ·  Fortalecimento da auto-estima;·  Encorajamento da esperança;·  Estímulo à expressão de sentimentos e emoções;·  Descoberta de maneiras positivas de superar ou de conviver com emoções negativas;

    · 

    Aceitação dos sentimentos e emoções, sem julgamento de valor nem sentimentos de culpa;·  Valorização do perdão, pois, quando o cliente conseguir se perdoar e perdoar aos outros, estabelecerá relaçõesmais saudáveis e prazerosas.

    Agindo assim, o psicólogo permite ao paciente reduzir vários fatores psicológicos que debilitam e tornam o organismo propenso ao aparecimento e desenvolvimento do câncer.

    Quando a doença já está instalada e há a necessidade de internação é importante que o profissional estimule a adesão do paciente ao tratamento e reduza os impactos do adoecer e da internação no enfermo, através de atos da humanizaçãohospitalar.

    É fundamental que o psicólogo conheça os estágios que o paciente passa na sua terminalidade, os quais foram descritos por Elizabeth Kübler-Ross em seu livro Sobre a morte e o morrer  (5), para que possa oferecer ao paciente uma melhorqualidade de vida possível, dentro das possibilidades.

    Além da atenção ao doente, o psicólogo também deve promover a saúde de seus familiares e de toda a equipe que oassiste.

    Conclusão

    Ao enfocar os aspectos psicológicos que debilitam o organismo e o predispõe ao aparecimento e desenvolvimento doCâncer, percebi que além da esperança, a fé e o amor são fundamentais na recuperação da saúde.

    Ter fé é acreditar no que não se vê, é confiar no que o médico diz. A fé é a base para a esperança e o amor. A esperançaestimula a buscar tratamentos, na expectativa da cura, do bem-estar e o amor proporciona o apoio da família, aaceitação incondicional de si mesmo, o auto-perdão, a troca de emoções positivas com outras pessoas e uma qualidademelhor de vida.

    Estes três fatores permitem ao paciente enfrentar a doença com mais segurança, fazer melhores escolhas, estabelecerrelacionamentos positivos e harmônicos que proporcionarão equilíbrio psicológico e saúde.

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    R EFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICAS 

    1. CABRAL, Ana Paula Tolentino et al, em parceria com o Professor-orientador: Fernando Pimentel Souza . O Estressee as Doenças Psicossomáticas: Relação com Câncer . Revista de Psicofisiologia, vol. 1, números 1 e 2. 1997(completo). Disponível em: Acessoem: 16 jun. 2006

    2. CERQUEIRA FILHO, Alírio de.  Por que precisamos de auto-estima? In: Núcleo de Estudos Científicos do InstitutoBrasileiro de Plenitude Humana. Disponível em: Acesso em: 18 jun. 2006

    3. CREIGHTON, James L.; SIMONTON, O. Carl; SIMONTON, Stephanie Matthews. Com a Vida de Novo - Umaabordagem de auto-ajuda para pacientes com câncer. SP, Summus Editorial, 1987.

    4. A Desesperança é um risco para pressão alta. Bibliomed, Inc: Boa Saúde. Disponível em: Acesso em: 18 jun. 2006

    5. KÜBLER-ROSS, Elizabeth. Sobre a morte e o morrer . São Paulo, Martins Fontes, 1998.

    6. LE SHAN, Lawrence. Brigando pela vida: aspectos emocionais do câncer . [Tradução Denise Bolanho; revisãotécnica Ruth Rejman]. SP, Summus, 1994.

    7. LE SHAN, Lawrence. O Câncer como ponto de mutação: um manual para pessoas com câncer, seus familiares e profissionais de saúde. [Tradução de Denise Bolanho; revisão técnica de Ruth Reveca Rejtman]. SP, Summus,1992.

    8. LOPES, Wilson e MAGNAVITA, Mônica. A importância do paciente em sua cura  in: Oncoguia Disponível em: <http://www.oncoguia.com.br/recursos_espirit/01_cura.asp > Acesso em: 20 jun. 2006

    9. Possível ligação de Prozac com o câncer cria polêmica. In: BBC Brasil.com: Saúde & Tecnologia. 26 de março, 2002. Disponível em: Acesso em: 17 jun. 2006

    10. SILVA, Glaci Ribeiro da. Câncer: um predador maligno cercado de mitos. In: Gazeta do Racionalismo Cristão.Diponível em: < http://www.racionalismo -cristao.org.br/gazeta/saude/cancer.html. Acesso em: 19 jun. 2006

    11. SILVA, Marco Aurélio Dias da. Quem ama não adoece: o papel das emoções na prevenção e cura das doenças.  SP,Editora Best Seller. 9ª edição.

    12. SIMONTON, Stephanie Matthews. A família e a cura: o método Simonton para famílias que enfr entam uma doença  [tradução de Heloísa Costa] SP, SUMMUS, s/d

     ____________________Recebido em 02/01/2007Aprovado em 01/02/2007

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    HUMANIZAÇÃO HOSPITALAR E QUALIDADE DO ATENDIMENTOMariana Amaral Guerra 1 

    Discutimos sobre humanização hospitalar muitas vezes pensando apenas no respeito, na afetividade e na emoção. Umdos aprendizados mais proveitosos que trago da graduação é a necessidade em aprender a trabalhar em equipe, pontoque vejo como essencial para que se fale sobre humanizar. É preciso a divisão de cargos e espaços, o amparo ao

     paciente e o apreço pela função que o outro exerce. É preciso dar lugar a atividades multidisciplinares. O bomatendimento, um local adequado de espera e um tratamento digno de qualquer pessoa – seja ela rica, pobre, pagante ounão de plano de saúde. Não é surpresa para ninguém que o Sistema Único de Saúde, SUS, encontra-se desfinanciado emal administrado. Ponto positivo a favor da desumanização! Para que consigamos trabalhar com um mínimo desucesso, evolução e ordem com a temática em questão não basta só vontade ou determinação. Necessita-se de umincentivo àqueles que além do papel de “cuidador” também precisam aprender a viver em um ambiente de diferenças,de incontáveis erros, de superação e de desgaste. Uma aplicação correta e coerente dos programas de Qualidade eHumanização do Atendimento Hospitalar se converteria em resultados mais claros, tanto para as ações dos profissionaisali inseridos quanto para a auto-estima de servidores e pacientes desta Instituição. Hospital por si só já é um retrato vivoda doença, da tristeza, do sofrimento e da frieza. É preciso trabalhar o emocional, a subjetividade, a interação, a troca decalor humano e principalmente o bem-estar de quem convive ali, independente de ser paciente ou profissional. Eacreditem se quiser, o avanço tecnológico responsável pela indiscutível melhoria dos recursos, é também marcado poruma desvantagem imensurável. Seu aspecto maquinal acaba por automatizar as ações. Mais do que nunca é preciso

    saber como harmonizar a tecnologia e a as intervenções que só ‘ pessoas’ estão capacitadas a realizar.  Pessoas dotadasde competências, habilidades específicas, moral e individualidade, aptas a fazerem, sim, mais do que realizamconstantemente em seus ofícios. Objetos não são o foco do trabalho. Objetos são instrumentos facilitadores deste. Amelhoria do atendimento deve constituir uma busca incessante para qualquer Instituição de Saúde e a grande questão precisa  ser “tornar humano” o contato entre aquele que ‘sofre’ e aquele que ‘cuida’.

     ____________________Recebido em 10/10/2006Aprovado em 01/02/2007

    1 Aluna do 8º. semestre de Psicologia da Universidade Católica de Brasília - UCB.

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    O TRABALHO DA PSICOLOGIA NO AMBULATÓRIO DE ANGIOLOGIADanielle Silva Veiga1 

     Neste artigo desejo relatar um pouco do que foi meu trabalho como estagiária do ambulatório de Angiologia da SantaCasa da Misericórdia do Rio de Janeiro em 2005. Primeiramente gostaria de falar um pouco do ambulatório e do nossoserviço.

    A responsável pelo serviço é a psicóloga Maria Alice Lustosa de Abreu, minha supervisora na especialização emPsicologia Hospitalar. O serviço é o mais recente dentre os ambulatórios cobertos pela equipe de Maria Alice. Fazem

     parte dele, três psicólogas formadas e ex-alunas do curso que se revezam em três manhãs por semana. Após conversarcom o chefe do ambulatório e saber o que era esperado da Psicologia, foi instituída uma pesquisa chamada “Perfil daPaciente de Angiologia” que visa conhecer um pouco melhor o perfil da clientela que freqüenta este ambulatório. Maistarde foi instituída uma outra pesquisa chamada: “Grau de Satisfação com o Companheiro” que visa conhecer um poucomelhor a relação da paciente com seu marido/namorado e com a doença. As pesquisas são realizadas por estagiários ediscutidas ao final do primeiro período letivo. A pesquisa ajuda também a instituir novos serviços de acordo com o

     perfil da clientela.

    Outros serviços da Psicologia são o grupo de sala de espera (informativo/educativo) e o atendimento individual quandonecessário. Pacientes que necessitem, são encaminhadas ao serviço de Psicoterapia Breve da supervisora, que é gratuitoe na própria Santa Casa.

    Participei da pesquisa e do grupo de sala de espera durante seis meses, junto com a psicóloga Judite, que ficava nomesmo dia que eu.

    Para o estagiário, a vista da Angiologia pode ser um pouco chocante, pois este deve se deparar com pessoas com as pernas feridas, escurecidas, por vezes muito inchadas. Algumas feridas estão tão mal cuidadas que fazem os própriosmédicos se sentirem mal com os curativos, como no caso de uma senhora com uma úlcera profunda.

    São casos de varizes, erisipela, trombose, linfedema, úlcera... nomes com os quais o estagiário acaba ficandofamiliarizado.

    A relação com os médicos foi excelente. Todos me acolheram de braços abertos, inclusive me fornecendo um auditórioonde eu pudesse ter privacidade com as pesquisadas.

    As pacientes também aceitavam bem a pesquisa, algumas reagindo com desconfiança a princípio, crendo se tratar de umteste no qual deviam ser aprovadas ou achando que teriam que se comprometer a responder outras vezes. No entanto,quando esclarecidas, se tornavam cooperativas e gostavam de contar seus problemas, incluindo dramas familiares.

    A chefe do ambulatório, que valoriza bastante a Psicologia, dizia ter conseguido curar algumas pacientes apenas apósatendimento psicológico. Percebemos muitos ganhos secundários com a doença (benefício do INSS, atenção,diminuição da responsabilidade), mas também um sofrimento consciente enorme.

    Muitas vezes privadas de uma vida normal, faziam as tarefas domésticas sentindo inúmeras dores, dores que nuncacessavam. Tinham a auto-estima diminuída por uma vergonha de mostrar o corpo, as feridas, um sentimento dedesvalorização, de estar sobrecarregando os outros. Muitas se apegavam na fé para negar essa realidade, fazendo daIgreja sua única vida social, dizendo que Deus iria ajudá-las e que “cristão não pode ficar triste”, por isso procuravamsorrir mesmo nos momentos mais difíceis, como se chorar fosse um desafio a Deus.

    1 Psicóloga, CRP 05/31191. Especializanda em Psicologia Hospitalar - Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro.

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    Mas como ajudar essas pessoas tão carentes de necessidades básicas? Tendo que trabalhar ao invés de fazer repouso,não podendo comprar um remédio mais caro? Apesar de todo esforço dos médicos, em fortalecer a relação médico-

     paciente e de todo carinho em acolher essa pessoa, muitas vezes o esforço era vão. Por carência material, a pessoaacabava não seguindo à risca o tratamento. Seja porque eram domésticas que não podiam perder o emprego, seja porqueeram mulheres solteiras que necessitavam fazer as tarefas de casa. Seja porque eram pessoas sem renda que viviam doINSS.

    Onde entra então a Psicologia?

    Bem, não podemos resolver estas questões sociais e sim trabalhar com as emoções implicadas por elas. Fazer a pacientecompreender o mecanismo psicológico da doença e mesmo como funciona a nossa circulação, já é uma grande ajuda.Ficamos ás vezes frustrados, pois após uma explicação trabalhosa, a paciente parece não ter absorvido quase nada. Issose dá devido à ansiedade e o medo de perder a consulta médica tão penosamente marcada ou à própria angústia dadoença. Quando se está muito angustiado, a “cabeça fica nas nuvens”. Apenas após repetidas explicações, o pacientecompreende o mecanismo de sua doença.

    Alguns nem querem saber por excessiva idealização do médico. Ele vai cuidar dela, ela está nas mãos dele e oimportante é que ele saiba o que está fazendo. Isto pode ser também uma defesa, uma regressão em relação à doença.

    Gosto muito do termo “co-responsabilidade” usado por Maldonado e Canella. Os autores dizem que o paciente éigualmente responsável pelo tratamento e não apenas o médico. E isto é importante deixar claro para nossos pacientes.Aos poucos eles são capazes de compreender o outro lado da moeda.

    A Psicologia trabalha o simbolismo do sangue e da circulação, os estressores ocultos na vida do paciente, suas difíceisrelações familiares e sua relação com o médico. Alguns pacientes acham difícil entender a relação entre estresse edoença, não conseguem perceber como a emoção influencia no corpo, o que já foi chamado um dia de Alexitimia. Oalexitímico era aquele paciente concreto, sem simbolismo. Hoje em dia são pesquisadas outras hipóteses para o mesmo

     problema.

    O encaminhamento à Psicoterapia Breve tem ajudado os pacientes a melhorarem seu emocional, influindo também nasua imunidade. Os pacientes que por acaso morem muito longe são encaminhados para locais próximos à suaresidência.

    O grupo de sala de espera auxilia na identificação dos pacientes com seus iguais. Nele surgem dúvidas como, porexemplo: se se pode usar aquele chazinho que o vizinho recomendou ou como passar roupa sem forçar as pernas. A

     ps icóloga auxilia com sugestões e os pacientes trocam entre si. Uma paciente relatou muito envergonhada, certa vez,que havia passado açúcar na úlcera, pois disseram que era muito bom, e que só piorou a vida dela, tornando a feridamuito pior. Há também a imp ortância de se orientar a família, que muitas vezes pensa que o paciente é preguiçoso, não

    quer fazer nada, principalmente nos casos em que não há lesão aparente.

     Não é incomum ver pacientes deprimidos (especialmente mulheres), vítimas de maridos violentos, alcoólatras, e quecontinuam dizendo que o marido é muito bom para elas, pois não têm como se sustentar sozinhas e precisam viveraquela situação. Usam desculpas como: “Quando ele não bebe é uma ótima pessoa”. A depressão é a forma de exprimira realidade de uma doença crônica e que torna a vida muito limitada. No entanto, vemos pacientes muito fortes,resistindo às dificuldades da vida e seguindo em frente. Talvez uma “calosidade” por viver exposto às variadasintempéries.

    O psicólogo deve ser uma pessoa muito acolhedora e disponível. Apto para “traduzir” a linguagem médica para os pacientes e vice-versa, entendo o “nervoso” como angústia, ansiedade ou depressão, explicar que imunidade é a defesa

    do organismo contra as doenças e muitas outras coisas. O psicólogo é visto como aquele com quem conversar, um outro

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    BIBLIOGRAFIA R ECOMENDADA 

    Lemgruber, V. Psicoterapia Breve: A Técnica Focal. Porto Alegre: Artmed, 1990.

    Maldonado, M.T. e Canella, P. A Relação Médico Cliente em Ginecologia e Obstetrícia. Rio de Janeiro: Atheneu ,1981.

    Silva, A.F.R. da e Caldeira, G. Alexitimia e Pensamento Operatório. IN: Mello Filho, J. Psicossomática Hoje. PortoAlegre: Artmed, 1992.

    Veiga, D.S. Fatores Estressantes no Trabalho do Psicólogo Hospitalar em Enfermarias. Monografia de Conclusão deCurso.[Não Publicada] Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2004.Disponível em: www.geocities.yahoo.com.br/danielle_veiga

     ____________________Recebido em 12/08/2005Aprovado em 01/10/2005

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    o fornecimento de medicamentos pelo poder público e garante descontos de 50% em atividades culturais e de lazer paraos maiores de 60 anos e gratuidade nos transportes públicos para pessoas acima de 65 anos.Trata-se de um conjunto deleis que estabelece os procedimentos legais que devem acontecer para melhoria da situação da população idosa doBrasil.

    A família deve ser o ponto de apoio do idoso em todos os momentos e circunstâncias. Esta sofreu mudançasimportantes decorrentes da maior participação da mulher no mercado de trabalho, da redução do tamanho da família, dosurgimento de novos papéis de gênero e da maior longevidade.

    Assim diz o art. 3º título 1 do Estatuto do Idoso: “É obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do PoderPúblico assegurar ao idoso, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação,à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar ecomunitária”.

    Há uma especificação no parágrafo único, inciso V: “priorização do atendimento ao idoso por sua própria família, emdetrimento do atendimento asilar, exceto dos que não a possuam ou careçam de condições de manutenção da própriasobrevivência".

     No art. 4º, determina-se que “Nenhum idoso será objeto de qualquer tipo de negligência, discriminação, violência ouopressão, e todo atentado aos seus direitos, por ação ou omissão, será punido na forma de lei”. No convívio familiar háo respeito, o carinho e as melhores condições de vida que cada indivíduo idoso necessita. O Estado assumirá aresponsabilidade quando não houver condições de manter a pessoa de idade avançada no convívio com a família.

    O Estatuto prevê o respeito à inserção do idoso no mercado de trabalho e à profissionalização, tendo em vista suascondições físicas, intelectuais e psíquicas. Nosso mercado está voltado para os jovens; tornam-se, portanto,imprescindíveis mudanças que estimulem a participação do idoso no processo de produção. Eles podem e devemcontribuir com a sua experiência para o crescimento do país. Estão asseguradas oportunidades de acesso à cultura,esporte e lazer com propostas e programas voltados para esta idade, além da facilidade do encontro de cursos especiais

    que são fundamentais para preservar a saúde física e mental do idoso. O Brasil gasta aproximadamente 22% de tudo oque investe em saúde no tratamento hospitalar da população idosa. O Estatuto contempla esta questão no Capítulo IV,onde está assegurada a atenção integral, bem como políticas de prevenção, promoção, proteção e recuperação da saúdedo idoso. O capítulo reservado à Previdência Social prevê os direitos constitucionais que estão sendo desrespeitados,como a vinculação das aposentadorias e pensões ao salário mínimo; a garantia de um salário mínimo para todo o idosoque a renda mensal per capita da família não ultrapasse um salário mínimo (1/4 do salário mínimo); a garantia de que oaposentado receba o mesmo número de salários mínimos que recebia na época em que se aposentou, além dorecebimento de uma indenização pelo que não foi pago e correção dos valores a receber daí para frente.

    Envelhecimento e Depressão

    O envelhecimento traz consigo adversidades dignas de atenção e cuidados. Essas adversidades podem se acentuar aindamais quando a depressão estiver associada ao processo do envelhecimento. A depressão em idosos tende a serrecorrente, mudando com isso o estilo de vida desses indivíduos e, por conseguinte exigirá da equipe de saúde, umacompanhamento a longo prazo. Os sintomas mais conhecidos podem ser caracterizados por lentidão dos processos

     psíquicos, humor irritável, redução de energia, incapacidade de sentir alegria, e ou prazer, pensamentos negativos,dificuldade de concentração, desânimo, apatia, idéias de ruína, desamparo, entre outros. As principais queixas do idosoestão em torno do sentimento de perda, que podem estar relacionados na perda da própria saúde físicos, do papel, socialantes desempenhado e das pessoas próximas e amigas. (Savóia)

    Narrarei um atendimento que fiz no Hospital onde faço estágio, e que me deixou bastante triste quando percebi oabandono de um pai idoso pelos se