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# 82 FEVEREIRO ‘13 O BOLETIM DO QUE POR CÁ SE FAZ MENSAL / DISTRIBUIÇÃO GRATUITA Mãe, vou mascarar-me de Norberto.

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o boletim do que por cá se faz

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#82 FEVEREIRO ‘13 O BOLETIM DO QUE POR CÁ SE FAZMENSAL / DISTRIBUIÇÃO GRATUITA

Mãe, vou mascarar-me de Norberto.

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Fazendo Editorial

2.

Editorial82No arquipélago açoriano há uma considerável subida dos preços dos transportes, dos lacticínios e dos com-bustíveis e a inflação ronda os 30%. O Aeroporto do Pico é inaugurado com uma pista com 1760 metros de com-primento, em asfalto. O selo Europa CEPT Açores retrata O Embarque dos Bravos do Mindelo e custa 33 escu-dos e cinquenta centavos. Álamo Oli-veira, figura proeminente da cultura terceirense, edita o livro de poesia

“Itinerário das gaivotas” e a obra de fic-ção “Burra preta-com uma lágrima”. A poetisa Natália Correia coordena um ensaio e colige notas na antologia “A Ilha de Sam Nunca - Atlantismo e Insu-laridade” na poesia de António Sousa. O agrupamento musical Construção edita “Há Qualquer Coisa” e anuncia uma nova geração de músicos com no-vas sonoridades até então pouco ex-

ploradas em terras açorianas. O Brasil despede-se de Elis Regina com apenas 37 anos de idade e em Vilar de Mouros ouvem-se os U2, Anar Band, The Gist e Durutti Column, entre outros, na segunda edição do Festival. Michael Jackson lança o seu álbum Thriller, o disco mais vendido do ano e da histó-ria da música com mais de 109 milhões originais vendidos. Na RTP1 estreia de Vila Faia, a primeira telenovela portu-guesa. O Centro Nacional de Cultura em Portugal organiza os Encontros

“Ser (Homo) sexual” em que participam Afonso de Albuquerque, Natália Cor-reia, Guilherme de Melo e Guilherme d’Oliveira Martins e são organizados por Isabel Leiria, José Calisto e Helena Vaz da Silva.

O Norberto Serpa é o nosso lobo do mar. Com ele, há quem tenha observado baleias de todas as cores e feitios, nadado junto de jamantas, golfinhos, e, inclusive, tubarões. Há quem só tenha viajado com o prazer de estar com ele em alto mar, curiosos somente em apertar cabos ou olhar o céu em noite de estrelas enquanto se atravessa o canal bem como presenciar in loco a sua vitalidade e juventude! Há também quem tenha saboreado um caldo de peixe con-feccionado por ele e aproveitado para beber um copo de vinho da sua terra natal na sua adega picarota. Nesta pintura da Helena Krug, ele tem os olhos muito verdes, são os mesmos que serviram de farol e esperança quando a gaso-lina findou numa noite em que viajávamos de semi-rígido entre São Mateus e a Madalena. Numa série de ficção que passava na televisão espanhola, nos idos anos oitenta, um grupo de miúdos que passava as suas férias estivais em Nerja, tiveram a sorte de conhecer um homem que vivia num barco em terra: Chanquete, era o seu nome. O Norberto Serpa vive, como só ele sabe viver, num barco em alto mar.O Norberto existe e é de carne e osso. Ele é o nosso verão azul da idade adulta!

Fernando Nunes

Helena Krug sabia desde muito nova que um dia usaria as mãos para criar tal qual a sua mãe que fez obras em cerâmica. Até que um dia experimentou pintar e agora não quer outra coisa. Helena bate-

-se pelos rostos, dialoga com eles através das cores, são estes o seu ancoradouro quando se lança em aventuras com os pincéis. E assim se enche de brio e de brilho. Arrisca. Tem confiança. Helena sabe que o mais importante é ser fiel ao traço, às cores que cada rosto ostenta. Podemos considerar que as suas figuras são alegres, pois permitem-nos imaginar que a luz de cada um ficou ali registada, que cada um dos quadros revela o que há de mais luminoso nos rostos apresentados. Ela gosta de expôr. E quem vê o Pico todos os dias sabe que os rostos à semelhança dos dias que se vão alterando, modificando, constituem essa beleza de captar as nuances de cada figura pintada. Primeiro, começa-se pelo olhar, fixar esse espelho da alma e depois continuar, penetrar nessa profundidade de cada um para que pelo menos essa camada permita chegar às outras todas, realçando ou anulando os seus contrates. Por isso, podemos imaginar que cada quadro é um repto, uma disputa constante consigo mesmo para chegar ao rosto final. Tal e qual os gregos antigos que se bateram pela ou-tra Helena.

Fernando Nunes

Norberto Serpa Helena Krug

DirecçãoAurora RibeiroTomás Melo

CapaHelena Krug

Colaboradores Cristina LouridoFernando Manuel ResendeFernando NunesFrancisco HenriquesGraça PatrãoHelen MartinsJoão da PonteJorge FalcatoJorge A. Paulus BrunoJosé Luís NetoJosé Nuno Garcia PereiraLia GoulartOrlanda AndréPatrícia BarbosaPaulo BicudoPedro LucasPedro Paulo CâmaraPittaTiago RodriguesVictor Rui Dores

Layout DesignMauro Santos Pereirawww.comunicaratitude.pt

PaginaçãoTomás Melo

RevisãoCarla Dâmaso

Propriedade Associação Cultural Fazendo

Sede Rua Conselheiro Medeirosnº 19 — 9900 Horta

Periodicidade Mensal

Tiragem 500 exemplares

Impressão Gráfica O Telégrapho

Capa

GinO gin, originário do Norte da Europa, onde começou a ser produzido a par-tir do século XVII, é uma aguardente de cereais. A sua fama mundial está associada à água tónica (refrigeran-te basicamente composto por soda e quinino), com a qual passou a ser be-bido. O hábito instalou-se no Império Britânico, na Índia, no século XIX, com o objetivo inicial de combater a malá-ria ingerindo quinino, mas depressa ultrapassou as fronteiras e passou a ser uma bebida apreciada universal-mente.No Peter Café Sport, na Horta, o “Gin do Peter”, a bebida dos navegadores que cruzam o Atlântico Norte em iate, é a bebida de culto. É aqui que um simples gin Bombey com água tónica e gelo se transforma num prazer que

Bebida de Cultotodos os que passam por este santuá-rio não se cansam de evocar.É frequentemente bebido com água tónica, gelo e limão, mas cada vez mais são divulgadas e experimenta-das diferentes formas de o apreciar. O limão tem vindo a ser substituído por vários elementos aromáticos, desde os frutos secos, a malagueta, a bau-nilha, o pepino, o alecrim, os coentros, a casca de laranja, a canela, os grãos de pimenta preta e da Jamaica, a noz moscada, o gengibre, e muitos outros, adicionados conforme as indicações ou sugestões dos fabricantes e pro-dutores das marcas de gin.Este fenómeno está associado ao aparecimento de um mercado de gin premium, onde, mesmo em Portugal, já se podem encontrar perto de seis

No primeiro dia de setembro saí do Porto com destino a S. Miguel. Ainda não tinha aterrado na ilha verde e já tinha sido arrebatada pelo azul do mar dos Açores. Durante os dias seguintes conheci a ilha maior e no nono dia ru-mei à ilha do Pico.A aproximação à ilha negra foi feita de avião e pela costa norte. Além da curiosidade da vista da montanha, tentei adivinhar Santo Amaro entre as povoações à beira-mar. Estive em Santo Amaro de setembro a novem-bro, a participar na Residência Criativa

Volta à ilhaem namoradeirasWhat makes Açores look like Açores

dezenas de marcas de gin e outras, mas não tantas, de água tónica.O aparecimento dos clubes do gin é também um fator responsável pelo estímulo e fomento do consumo do gin como bebida sofisticada e por tor-ná-lo numa bebida de culto, que tem vindo a granjear o entusiasmo de uma comunidade atenta ao prazer sublime de apreciar uma bebida espacial, por regra aromatizada a partir do zimbro, mas com um potencial de diversifica-ção aromática quase inesgotável.Nada disto, porém, existe sem outros prazeres mais extremados. A par de quem aprecia o gin no seu estado li-quido puro (sem gelo, limão ou água tónica, ou não fosse o gin uma aguar-dente), outros começam a apreciá-lo de modo bem diferente. É o caso de

um bar em Londres cuja novidade é proporcionar a troca do prazer de be-ber o gin pelo prazer de o inalar…O prazer do gin pode ser enorme. Pode ser indizível. Basta saber apreciá-

-lo nos seus mais variados sabores. Conto-me entre aqueles que têm esse privilégio. Jorge A. Paulus Bruno

na Escola de Artesanato e a desenvol-ver um projeto que consistia na cons-trução de uma namoradeira a partir de duas cadeiras usadas. Nos meus passeios tive a oportunida-de de descobrir que a namoradeira é uma tipologia recorrente na ilha, es-cavada nos muros baixos à beira-mar. Estas namoradeiras são elementos da paisagem que acabam por carac-terizar a ilha do Pico e dar mais força e um novo significado à minha ideia de projeto, que nasceu a uns milhares de quilómetros de distância desta reali-

dade que eu desconhecia. Atravessei o canal entre o Pico e o Faial no dia do lançamento do Fazendo n.º 78. Foi assim que fiquei a conhecer a ilha e a publicação. Nesse mesmo número, no artigo “What makes Açores look like Açores”, o Tomás dizia: “O que temos de especial? O que temos de típico?”. Agora, para mim, uma das respostas possíveis é: as namoradeiras do Pico. Reconheço-as como um elemento típico que devemos preservar e mul-tiplicar. Estas namoradeiras não exis-tem só na ilha do Pico (vi algumas em

Porto Pim, também), mas acredito que são mais recorrentes ali devido à geografia, com as povoações dispos-tas em torno da ilha, entre a encosta íngreme e o mar, com longos muros a acompanhar as ruas junto à costa.Encontrei exemplos destas namora-deiras (posso dizer típicas?) em S. Ro-que, Santa Cruz, Calhau, Manhenha e Calheta de Nesquim e acredito que se tivesse conseguido completar a “volta à ilha em namoradeiras” a que me pro-pus, mais seriam os exemplos a desco-brir. Um dia volto. Patrícia Barbosa

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Fazendo Arquitectura

Fazendo Crónica

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In Folio pode ter como tradução do latim, à letra, dentro das folhas. No centro da cidade de Angra o ruído automóvel sobre a calçada é agressi-vo. Apercebemo-nos dessa violência quando entramos na livraria in Folio. A porta fecha-se e o espaço é preenchi-do por pautas de música: acompanha-

-nos a programação da antena 2. Res-piramos. Entrámos num livro? À beira de completar 24 anos esta livraria não pertence a este tempo, esta livraria não pertence a este espaço. Estas prateleiras são para quem gosta de li-vros (in folios), para quem gosta de os ler, de os ouvir, de os viver. Como era de se esperar, estamos sós, eventu-almente poderá dar-se a presença de mais um devoto destes objectos e ao fundo a proprietária, Paula Quadros.Aqui vender livros é sinónimo de li-berdade de escolha, prazer pela des-coberta sem imposições ou desres-peito, mercantis ou outros. Aqui se reconhece paixão pelos livros e o que estes contêm e podem possibilitar e a mais curta troca de palavras com a proprietária comprova-o, sabe os li-vros e os autores. Esta livraria não é um negócio. Por exemplo, olhemos a secção de poesia, a quantidade de tí-tulos, de envergonhar qualquer espa-ço semelhante presente em qualquer grande superfície, estão presentes todos os nomes que fizeram a história desta arte, com especial enfoque no século transacto, e em igual número os nomes que a história não mencio-na, estão os autores açorianos e não esquece os estrangeiros. A secção de filosofia é de igual ou maior espanto,

In FolioDentro das Folhas

esta livraria não pertence a este lugar, e há o livro infantil, a música e a arte, as ciências naturais, a banda desenha-da, as ciências sociais e quando volta-mos à literatura, desta feita ao roman-ce e à prosa, novamente: esta livraria não pertence a este tempo. Esta li-vraria não é um negócio. Mecenato? A literatura dita light não encontra, ou quase não encontra, espaço aqui, é uma raridade, deve ser procurada no híper. O critério é a qualidade. Uma cidade devia orgulhar-se de ter uma livraria com esta apresentação, com esta exigência e com esta diversidade de oferta livreira.Paula Quadros, economista e mes-trada em Gestão Pública, proprietá-ria, “um passatempo”, informa: abriu as portas em 1989 e as vendas foram crescendo, não acentuadamente, até meados da década passada em que a tendência se inverteu, nos últimos três anos a queda foi abrupta. Livra-rias OnLine? Crise? Não sabe. Não há ilusões, a rentabilidade económica nunca foi um objectivo, é por gosto e porque pode, e espaços como este estão condenados à extinção, embo-ra nesta equação a insularidade seja um factor de somenos. O mercado livreiro está direcionado às grandes superfícies e não se compadece com pedidos de três ou quatro exemplares, os grandes grupos editoriais dão mais atenção a estes pedidos apenas quan-do as fnac’s e afins começam a devol-ver exemplares. As pequenas editoras necessitam do pagamento aquando da encomenda.Olha-se, no entanto, a montra: Tony Judt e Timothy Snyder, Mo Yan (o mais recente Nobel da Literatura), Sándor Mára, Ana Teresa Pereira, a poesia reunida de Manuel António Pina, “A Civilização do Espectáculo” de Mário Vargas Losa, “Dentro do Segredo - Uma Viagem na Coreia da Norte”, de José Luís Peixoto, “Não é Meia Noite Quem Quer”, de António Lobo Antu-nes e o último de Onésimo Teotónio de Almada e João Maurício Brás intitulado

“Utopias em Dói Menor”. Uma preciosi-dade, portanto. Uma cidade devia or-gulhar-se de ter uma livraria com esta apresentação, com esta exigência e com esta diversidade de oferta livrei-ra. Saímos da In Folio. O ruído reina.

Tiago Rodrigues

Aqui vender livros é sinónimo de liberdade de escolha, prazer pela descoberta sem imposições ou desrespeito

Esta Livrarianão é um negócio

O critério é a qualidade

Fazendo Literatura

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A sala de exposições da Biblioteca Pública da Horta é, na minha opinião, o único espaço do Faial que dia-loga com a contemporaneidade. Não conheço, nestailha, melhor lugar para expor artes plásticas. Daí que, para mim, seja sempre um enorme prazer ali poder apreciar eventos artísticos.Desta vez, e até ao dia 16 de março do corrente ano, está patente uma exposição de pintura, com o título genérico de “Expressões”, da autoria de Helena Krug, bióloga marinha de profissão, mas que mantém com a pintura um compromisso de paixão. Eis a prova pro-vada que a arte pode atingir a ciência, e esta pode imiscuir-se naquela. Podemos observar 49 quadros em acrílico – muitíssimo bem expostos e ilumina-dos, e que dão unidade, coerência e consistência à referida exposição. E o que vemos? A tridimensiona-lidade de rostos expressivos de homens, mulheres e crianças que, com olhar frontal, olham e nos olham. Em cores bem calibradas que denotam sobriedade e integridade. Porque o que mais singulariza a pintura

de Helena Krug é precisamente a captação do olhar, a força de expressão desse olhar. Com efeito(s), há em cada quadro um rosto que nos convida a olhar. E a naturalidade de uma expressão. E cada um des-ses olhares revela um estado de alma, sendo que a humana expressão está nesses olhos enormes e brilhantes e na maneira como a pintora os valoriza. Alguns retratados exprimem exuberante alegria e outros estão sérios e introspetivos. Lá estão velhos e novos, gente do povo e gente urbana. Perante as telas, sentimos mistério e dramatismo. Há o grito de incontida raiva e há a expressão ensimesmada daquela emigrante. E vemos rostos africanos (de muito bem conseguidos contrastes), deparamos com os traços fisionómicos daqueles alentejanos, e descobrimos o escritor Dias de Melo, o incontornável Norberto Diver e tantas outras figuras reconhecidas e reconhecíveis, íntimos e familiares. Todos recor-tados em fundos de multi-tons e a respirarem sere-nidade. Trabalhando a partir de fotografias, Helena

Krug não nos dá propriamente retratos, mas feições que foram moldadas pela sua imaginação plástica de criadora, ela que não pinta o que vê, mas o que sente. Resultado: os rostos que conhecemos do dia a dia surgem-nos encantados, transfigurados. E isto por-que a pintora agarra, e bem, o lado psicológico e a luz interior dos seus modelados. É por isso que olharuma imagem não é só entendê-la, é também criá-la.Pintados com simplicidade formal e revelando bele-za plástica, sobressaem nestes quadros valores de originalidade e de modernidade. Estamos perante uma harmonia cromática, um equilíbrio dos elemen-tos de composição, a delicadeza dos contornos, jo-gos de luz e sombra, uma ou outra ressonância com a arte africana. O resultado é perfeitamente realista (ia escrever expressionista) e cria uma ilusão de vo-lume muito convincente e coerente com o estilo de Helena Krug, a artista bióloga que pinta com emo-ção e talento à rédea solta.

Victor Rui Dores

Fazendo Artes Plásticas

Helena Krug

Helena KrugDesdobrando a palavra EXPRESSÃO, que Helena Krug nos brindou, como titulo na forma plural, na sua exposição patente na Biblioteca da Horta, te-mos pois, como o povo bem diz ‘pano para mangas’ … Trata-se dum substantivo feminino , cuja separação das silabas será ex-pres-são, possuindo 9 letras, as vogais A e O, as consoantes P, R, S e X. Significando ação de exprimir, do latim expressio , manifestação de pensamento, de um sentimento, pela palavra, fi-sionomia ou gesto…Ainda do ponto de vista etimológico nos damos conta que a palavra é bem mais abrangente, a sua raiz latina implica ‘fazer sair’, pronunciar, arrancar, espremer, dar a conhecer, num sentido mais laico até mesmo comunicar… Fazendo um jogo de sons, damo-nos conta que a palavra EXPRESSÃO rima na plenitude com palavras como Submissão, Desilusão, Escuridão, Solidão, Suspensão, Apreensão, Impres-são, Confissão, Dispersão, Negridão, Indecisão, en-tre muitas outras palavras…Foi exatamente tudo isso que Helena Krug conse-guiu, de forma sublime, transmitir através das suas

telas… na solidão e total introspeção do seu ateliê a pintora conseguiu algo fabuloso, os aparentes rostos a retratar, no momento em que passam para a tela, deixam de o ser, não são mais caras, mas sim Expressões.Numa pintura todos os elementos podem ser vistos ao mesmo tempo, o espetador pode necessitar de tempo para examinar os elementos ou motivos mais pequenos ou escondidos, dependendo do tema ou da dimensão da tela. Poderá ter que se afastar ou aproximar do quadro para melhor perceber ou assi-milar a mensagem do mesmo.Nos trabalhos de Helena Krug, a ação do espetador é aparentemente mais fácil, no entanto, e uma vez que um rosto é um desvendamento incompleto e passageiro de uma pessoa, e que para compreen-der um rosto é preciso vagar, paciência, respeito e algum amor, esse analisar do espetador torna-se então mais demorado e portanto mais consciente.Ninguém, nem mesmo uma criança, sai da exposição indiferente: há telas que nos atraem, outras que nos são bem mais queridas, umas que simplesmente

nem nos demoramos, outras pelo contrário gosta-ríamos de ter próximas, há algumas que nos fazem lembrar lugares, vizinhos, familiares… O rosto trans-mite a evolução do ser humano; uma criança, um adulto, um idoso... O rosto também traduz de formamuda a etnia; um africano, um europeu, um asiáti-co... O rosto é o símbolo daquilo que há de especial no homem, esse especial é a Expressão, é a porta e ao mesmo tempo montra, daquilo que somos, que sentimos…nenhum outro ser vivo possui esta carac-terística, o rosto é o locus principal para as nossas relações com os outros.Sempre foi dito que a pintura do retrato é o eterno esforço da humidade para capturar a essência de si mesmo. O mesmo tem sido dito sobre a Arte em geral, desta forma a pintura do rosto, o retrato, é a arte da Arte, e o pintor dos retratos é o artista dos Artistas.Não sei bem, mas talvez nada é mais pessoal do que um rosto…

Jorge Falcato

ou a Captação do Olhar

Expressões

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Remontando a sua origem a tempos medievais, o culto popular do Espírito Santo foi trazido para as ilhas pelos seus primeiros habitantes. De iniciativa aristocrática, no seu início, as festas do Espírito San-to significavam originalmente a magnanimidade dos senhores para com a população das localidades em que decorriam. A distribuição gratuita de carne, pão e vinho mantém ainda hoje esse significado original. Porque o culto do Espírito Santo baseia-se na dádivae na partilha.

O Pézinho dos Bezerros remete-nos para a “folia dos bezerros” que vão ser abatidos e cuja carne será repartida, em quinhões de esmola, pelos Mordomos,

pelos Irmãos e, noutros tempos, pela pobreza do lu-gar, hoje, pela população em geral.

Os bezerros são enfeitados com boninas ou flores e fitas de papel de variadas cores, coladas à pelagem com “breu”. Nas hastes levam às vezes arcos de ver-dura e flores com uma cruz ou bandeira no topo. Na testa costumam prender uma coroa ou uma pomba recortada em cartolina branca. Duas ou três vacas, com vistosos colares de cabedal enfeitados a fivelas e pregaria de latão, tendo pendentes grandes cho-calhos, precedem o cortejo em cujo couce segue a fiada dos cantadores e a dos músicos, cantando e to-cando o Pézinho, denominado “dos bezerros”, para o

Pézinhodos bezerrosDuas ou três vacas com vistosos colares

Será que o filme tem a ver com a nossa vivência de ilha?

WWW. NFB. CA

Pour la suitedu monde

Brancos são os campos na Ilha das Avelaneiras. Em noite escura, o que fazem dois homens, velhos lobos do mar, a espreitarem a Lua?

Tentam adivinhar a altura das marés, o momento em que virão as colheitas de Primavera, e a oportunida-de que terão de voltar a caçar a baleia branca (beluga soa melhor), a poucas milhas da terra. Banhados pe-las águas salobras do Atlântico e do rio st. Lawrence, os habitantes desta pequena comunidade do Cana-dá, mais precisamente do Québec, mantiveram du-rante trezentos anos a prática de encurralar as ba-leias brancas com um sistema de estacas plantadas no leito do rio. A actividade foi abandonada em 1925, até que trinta e sete anos depois decidem reconsti-tuir a tradição, formar uma nova companhia baleeira e serem abençoados para uma nova faina. Vinte ho-mens partem das margens enlameadas em 5 canoas, rio acima, até chegarem ao açude a três milhas de distância, onde preparam a sua armadilha durante três ou quatro marés, com a água pelos joelhos.Porque é que o fazem? Não se trata de um exaltante passado. São os homens velhos que evocam a per-petuidade dos costumes, porque acham que os

seus jovens merecem viver com a memória ascen-dente da tradicional captura da beluga, tal como eles, que viram os seus pais a irem atrás das baleias. Ho-mens velhos que agem por aqueles que virão, para que não se interrompa o curso do tempo.Mas tal como se declara no início do filme, esta reabi-litação da pesca é instigada por Pierre Perrault, o ci-neasta que persuadiu os membros da comunidade a regressarem ao passado. Com as várias imagens do quotidiano, a ilha parece renascer com uma experi-ência histórica que relata um tempo perdido. E assim, até ao final, velhos e novos conciliam-se com o pre-sente. A baleia não é morta, mas é levada do centro do mundo para um lugar exótico.Será que o filme tem a ver com a nossa vivência de ilha? Absolutamente.Também aqui, a tradição flui. Na Ilha das Avelaneiras existem festas, arrematações e bailes que pouco invejam às Chamarritas. Em vez de romeiros e pro-messas, fazem-se peditórios às almas do Purgatório e bebe-se a água da Páscoa. E o Mar é fonte de mis-tério e de recursos, fonte de tudo o que não seencontra em terra. Na ilha, os homens são ilhéus, e o filme parece girar à volta desta determinação.

“Pour la suite du monde”, gravado em 1962, é um fil-me de outro mundo.Que isto sirva apenas de introdução, até porque está acessível a todos no site do Instituto Canadiano de Cinema (www.nfb.ca), é só dar uma espreitadela, como quem procura a Lua numa noite de bruma.

Francisco Henriques

Ponta dos Rosais

Os Filmes quepor cá se Fazem

Encontrei o Paulo Abreu no “Manel Cigano” em finais de 2010. Há anos que não o via, penso que desde que, em 1997, vim viver para os Açores. Com ele partilhara, desde meados dos anos 80, aventuras várias no B.A. (passando pelo Café Estádio, o Gin-gão, o Trapézio, etc.), a Bica e Alfama e a Mouraria, frequentando tascas e outros locais da noite lisbo-eta de então, com personagens como o Maçarico, o Brasas, a Eduarda, a Maria João, o Voz Grossa, o Luca, o Tubarão, o Choninhas, a Marina, a Sissí, a Lília e as suas amigas circenses, e muitos outros...Estas aventuras incluíram uma adaptação para ví-deo de um conto do gin tónico, um videoclip dos Mão Morta e experiências lideradas pelo Vítor Ratinho.E agora, aqui estava ele, em plena Calheta de Pêro de Teive, a partilhar uns chicharros com feijão as-sado (talvez o melhor prato do mundo!) com o Nuno Costa Santos, o Dinarte Branco (actor que me lem-brava de ter visto no Regueirão dos Anjos numa peça de teatro criada em plena experiência zapatista em Chiapas), o irmão deste, o Sérgio Gregório e mais um ou dois camaradas que não conhecia. Estavam em Ponta Delgada para apresentar no Teatro Micaelen-se a peça do Nuno, “Brel nos Açores”.Tinham passado 13 ou 14 anos desde o nosso último encontro mas era como se tivesse sido ontem...Fui ver a peça (excelente!), bebemos uns copos e conversámos até altas horas e, uns dias depois, re-encontrámo-nos todos no São Luís, em Lisboa.Atalhando, que a história já vai longa, o Paulo, o Sér-gio Gregório e eu fizemos o “Adormecido” no vulcão

dos Capelinhos em 2011 e, a vinte e tal de Agosto passado, o Paulo propõe-me um texto do Dinarte, escrito a partir de uma experiência concreta, para adaptar para uma curta metragem a filmar no Faial e em São Jorge, mas sempre a olhar para o Pico.Em 3 ou 4 dias, o Dinarte escreveu um guião e pre-parámos listas de personagens e cenários, ficha téc-nica e currículos, cronograma e orçamento, convida-mos o Teatro de Giz para se associar à produção, e concorremos à “Curtas Açores” lançada pela Azores Film Commission.Entretanto, é criada em Ponta Delgada a AGECTA (Agência para a Coesão Territorial) que pretende desenvolver uma actividade cultural e a quem pro-ponho o projecto que é acolhido com entusiasmo. O resultado do concurso, que estava anunciado para final de Setembro, é conhecido apenas nos últimos dias de 2012. Tínhamos sido contemplados com uma verba que representava quase metade do orçamen-to!Este atraso e as datas complicadas do Dinarte (peça no Alentejo, outra no São João e, ainda outra, no D. Maria), que irá realizar a curta para além de fazer o papel do protagonista, forçam-nos a avançar a toda a força e, entre 2 e 9 de Janeiro deste ano, o Dinarte e eu visitamos o Faial e São Jorge em répèrage mas já, e sempre, com um olho no Pico.Com o imprescindível apoio da SATA e do Teatro de Giz (em particular, da Anabela Morais), foram con-seguidas condições para efectuarmos esta tão ne-cessária viagem de preparação numa altura em que

Curta metragem de ficção de Dinarte Brancoainda não tínhamos qualquer dinheiro disponível. Conseguiu a Anabela os melhores preços para a nos-sa estadia, para além de condições de pagamento favoráveis, que nos permitiram percorrer os locais de filmagem previstos nas duas ilhas, contactar as respectivas câmaras municipais e outras entidades para solicitar os necessários apoios e autorizações, e realizar um casting extremamente proveitoso em busca dos talentos locais que possam integrar o nosso pequeno elenco.Com o extraordinário esforço da Anabela e a sim-patia e colaboração da Aurora Ribeiro, da Aline, do Filipe Porteiro, do Hélder Castro, do José Henrique Azevedo, da Ruth e de tantos outros estamos, agora, em condições de rever e finalizar o guião, reestrutu-rar o orçamento, obter o financiamento que nos fal-ta e planificar a rodagem que, sabemos agora, deve-rá ter lugar de 12 a 19 de Março nas ilhas de São Jorge e do Faial mas, inevitavelmente, sempre a olhar para o Pico, a Montanha Mágica, como lhe chama o Zeca Medeiros, que inspirou um outro projecto do Paulo Abreu de que falarei noutra ocasião.É, naturalmente, curto o tempo que nos resta para todas as tarefas que nos esperam, mas estamos confiantes e entusiasmados com a perspectiva de regressarmos em breve ao Triângulo, de novo para filmar.

João da Ponte

É em São Jorge que damos início a uma nova rubrica do Fazendo. Produtores, realizadores, argumentistas… são convidados a, mês após mês, falarem e mos-trarem um pouco dos filmes que estão a fazer. Espera-se assim que os nossos leitores conheçam por dentro as ideias, os processos e os meios que se utilizam hoje para fazer filmes nos e sobre os Açores. Isto é o tipo de informação que não vem em nenhum manual, nem é ensinada em nenhuma escola. Como é que se fazem filmes nos Açores agora? É assim.

distinguir do Pézinho “do bailho”, que é uma “moda” diferente e nenhuma afinidade tem com a outra.

Os músicos tocam violas (da terra e violão), rabeca, clarinete e contrabaixo, acompanhados a ferrinhos. A folia para em frente da igreja, do império, das casas do imperador, dos irmãos benfeitores, dos criadores de gado que gratuitamente engordaram os bezer-ros, de todos, enfim, que contribuíram para o luzi-mento da festa. Os cantadores encarregam-se de a todos saudar com quadras improvisadas.

Victor Rui Dores

Fazendo Música

Fazendo Cinema

Fazendo Cinema

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Passaram dez anos de puro silêncio.Lá de cima, a ilha apresentava-se exatamente, me-lancolicamente, tragicamente igual. Pela janela, sob a asa, avistava o mar que devorava a rocha, a espu-ma que devorava a onda, a areia que devorava a ter-ra, o verde que devorava o azul e moinhos de vento abandonados que enfeitavam montes. Vi o meu rosto espelhado nas águas das lagoas amareladas, vi velhos desejos aninhados como tímidos prematu-ros fetos nas crateras de vulcões, vi paredes que já pintei e tetos que me acolheram em noites de luzidia felicidade e dias de negra mágoa dolente. Trazia comigo uma mala cheia de trapos inúteis e um dedo anelar que morrera solteiro. Condenei-o. Tal-vez seja tempo de colocar a maquilhagem no fundo do saco e recriar um velho Mateus, um velho sorriso e uma ingénua faúlha de esperança moribunda. Tal-vez… Há precisamente dez anos atrás, arranquei das minhas narinas o perfume que a ilha emanava com as garras de uma penitência auto infligida. Talvez fosse a hora de inspirar fundo e deixar que me inva-dissem, todos. Talvez seja este o dia, o local, o tempo certo. Talvez…Eu jurara que não voltaria. Ignorei as lágrimas silen-ciosas que se espraiavam no rosto, fingi desconhe-cer o porquê de lábios salgados cerrados e menti. Menti com todas as forças que me habitavam e com todas as palavras que conhecia. Para o Diabo se eu ficasse nesta ilha a remar contra a maré. Criei a mi-nha própria maré, construí as minhas próprias asas, mesmo que à custa das penas de outros.A verdade é que, se fosse hoje, não teria partido, não teria mentido, não teria provocado lágrimas mudas. O avião vinha quase cheio. Era capaz de perceber a ânsia da maior parte dos passageiros: uma dúzia de turistas desejosos de conhecer solo açoriano, alguns indivíduos que aparentavam ser homens de negócios, uma equipa de basquetebol empolgada, um prisioneiro no último banco da máquina, acom-panhado por dois policiais sisudos, e alguns filhos pródigos que regressam para as férias da Páscoa. Não sabia em qual dos grupos me encaixaria melhor. Não deveria ter regressado. Ou deveria. Aos poucos, nos instantes coloridos, percebo, nas gotas de suor bafiento que escorregam nas fiéis avelhentadas rugas da minha testa, que não sou mais livre do que o homem cabisbaixo no último ban-co, seu provisório trono. Hoje, sairei do hotel pela primeira vez. O carro alu-gado levar-me-á onde preciso. É hora de destruir os receios que me corroem.

- Regressaste?! - Sim. Não se nota? - É bom ter-te de volta, mas... O que te fez regressar

aos Açores? Estiveste tanto tempo sem dar sinal de vida, mudez absoluta e ininterrupta. Nem facebook, nem hi5. Até mudaste de número de telemóvel. Ten-tamos ligar-te vezes sem fim. Nada de morada, nem um mail.

- Estou aqui e isso basta. Tenho assuntos a tratar por cá, amarras para soltar.

- Ai sim? O que se passa? Ganhaste o euromilhões e vens comprar a ilha, é? Olha que São Miguel não está à venda. Só se a Troika insistir.

- Vim saber quem sou, afinal. Ou se me perdi… Não posso continuar a imitar as avestruzes no deserto, não é? Vim redescobrir os Açores. Vim…

- Redescobrir? Oh meu amigo, deves estar a brincar. Não tens vistos os noticiários? Vieste descobrir os Açores, isso sim. As coisas por aqui mudaram muito. Já nada está no mesmo sítio. A ilha até está maior, ganhámos metros em várias direções e o mar recuou o quanto baste. Daqui a dias São Miguel apalpa San-ta Maria!

- Tens a certeza? Não sei se concordo contigo! Os olhares parecem os mesmos. Mal cheguei, o tom de muitas vozes baixou e muitos olhos se semicerra-ram!

Um diálogo fragmentado mas tranquilo decorre es-tranhamente sobre a mesa de plástico. O Sandro é o mesmo Sandro…

- …Vá, Mateus, bebamos. Não há nada melhor do que uma fresquinha durante a tarde. E não penses que eu não ouvi durante esse teu discurso quando disseste vocês. Ainda bem que te corrigiste logo de seguida. Não deixaste de ser ilhéu. Não consegues escapar a essa marca de nascença.

- Preciso de um favor teu!- Tudo o que precisares…- Preciso que venhas comigo até às Sete Cidades logo

à noite.- Oh Mateus, não faças isso. - Tem que ser. Vens ou não?- Que remédio…

A conversa com o Sandro correu melhor do que an-tecipava. Já estava à espera de um chorrilho incon-tornável de questões, dos sobrolhos franzidos, dos suspiros intermináveis e constantes, de cantos la-biais que se apertam para não me atirarem palavras

de ordem aos olhos. Nada disso chegou. E tudo pare-ceu incrivelmente, serenamente, natural. Esta noite será a noite! Esta noite não existirão cor-das que me manietem, nem mordaças que me pri-vem de soletrar letras que transpirem incontáveis perdões, inumeráveis pedidos de esclarecimento. Durante anos, escrevinhei numa única, solitária, amarelada, folha de papel todas as questões que me importava colocar. Hoje terei respostas! Por agora chega. É tempo de tomar duche, colocar a camisa azul de colarinho branco, vestir as calças castanho-escuras de sarja e usar os sapatos de ve-ludo azul-escuro. Esta é uma indumentária que ela aprovaria. Eles, certamente, não terão que dizer.

Vinte minutos de dolorosa espera, por alguém que não está atrasado.Dez anos depois, o mesmo carro!

- Vamos pela Vista do Rei? O hotel ainda lá está, cada vez mais decrépito. Sabes que já roubaram tudo o que havia de valor? Nem as loiças das casas de ba-nho escaparam. Qualquer dia, e falo a sério, até as paredes roubam.

- Que desperdício! É uma zona tão linda. Aquilo bem apro…

- Já sabes o que vais dizer quando lhes bateres à por-ta?

- Como eu dizia: aquilo bem aproveita…- Não mudes de assunto. Já sabes o que vais dizer

quando bateres à porta? - Sei! Sei-o há quase tanto tempo como aquele que

estive ausente. - E?- E o quê? - O que lhes dirás?- Não te preocupes! Na hora sairá o que é suposto sair.

A viagem mais longa da minha vida.

- Olha, o hotel já se avizinha. Consegues vê-lo?- Sim. Podemos parar?- Mas não estavas com pressa?- Isso pode esperar! Será que ainda tem cães de guar-

da?- Veremos! Duvido muito meu amigo, duvido muito! Já

não há que guardar! Nada há a defender.

Se algum dia me perguntarem o motivo pelo qual abandonei este chão tecido de lava, responderei que tanto verde e esta imensidão de azul infetavam

o meu quotidiano. Esta resposta desconcertará qualquer um, mesmo os que acreditam ser senho-res da suprema inteligência insular. Aqui, nestas ilhas, a essência de cada um é absorvi-da pela alma da terra, pelo espírito do mar, pelo sen-tir dos cumes e das crateras. Como sabe bem ser-se uno, viver-se em comunhão com este solo negro. Como sabe bem alimentar-me do cheiro a enxofre que inunda os sentidos sem permissão. Só na dis-tância me apercebi da importância destas monta-nhas eretas no meio do Atlântico. Fui um ilhéu na distância. Sou menos ilhéu na proximidade. O Monte Palace aparenta estar mais apodrecido do que eu. Eu e ele temos mais em comum do que pos-sa parecer. As paredes que apresentamos ao mun-do afiguram-se robustas, senhoras de uma antiga opulência contagiante, concebida por mãos enge-nhosas que nos votaram ao abandono, perdidos nos cumes da ausência enevoada. O nosso interior compõe-se de camadas de detritos conspurcados pelo peso de mil passos alheios. As nossas janelas já não olham o horizonte com o brilho de quem pos-sui esperança, os nossos lugares já não acolhem hóspedes com a amabilidade com que uma estreia ansiosa o faz.Pertencemos às mãos que nos criaram, que nos moldaram à sua imagem. Não somos mais do que a representação material do seu sonho, imagem desbotada de um anelo. O hotel permanece fiel no monte, contemplando, ora o oceano, ora o vale. É eternamente mais corajoso do que aquilo que eu fui. De cacos, a existência não sobrevive. Está na hora de descer até à freguesia e procurar por aquela casa na Rua da Cidade. Espero que não vejam em mim o mesmo que veem quando elevam os olhos para as Cumeeiras. Tentarei que não me olhem por dentro. Está na hora! O sol já se põe no horizonte, já adormece atrás das ondas do Atlânti-co. Tenho medo!

- Chegámos. Estás pronto?- Não devem estar em casa… - Agora que cá estamos vais carregar imediatamen-

te naquela campainha. Se queres a verdade, já evi-taste este encontro tempo demais.

Trim!

- Só isso? Carrega com mais força!- Está calado, pá! Eu sei como se faz! Vai para o carro!

Eu faço isto sozinho!- Como queiras! Calo-me já!

Dolorosas tentativas infindáveis.

- Sim? Quem é?

O choque! As vozes! Nascem por detrás da porta! Rios de palavras durante horas isoladas.Dobadouras.

- Preciso que prestem atenção. A sua morte é da mi-nha responsabilidade.

- A Marta escolheu o caminho dela. A culpa não foi tua, não foi nossa, não foi dos limites impostos pelo mar, nem foi do aborto involuntário. Ela foi a senhora do seu destino. Todos nós escapamos da opressão da ilha à nossa singular maneira

- Eu amava muito a vossa filha! Ainda amo, acho! - Não estará na altura de a deixares partir?- Outra vez? - Porque fugiste? - Ou porque regressaste?- Fugi para esquecer! Não consegui. Voltei para con-

fessar-me! Estou a fazê-lo.- Se foi para isso que voltaste, fizeste-o em vão. Nun-

ca ninguém te acusou!

Explicações trémulas de ambas as partes.

- Temos pena que ela não tenha suportado os cochi-chos, os medos, as vergonhas, a autocrítica deso-nesta. Não te prendas! A Marta entrou consciente-mente pela lagoa adentro. Não podias ter feito nada. Se não fosse naquele dia, seria noutro. Temos que seguir em frente! Tens que seguir em frente!

Mais!

- Então estou perdoado?- Se houvesse algo a perdoar, estarias!

A tranquilidade chegou!Vivi enjaulado, prisioneiro da incerteza, recluso de mim próprio. Duvidei! Desconfiei de mim…. E, por fim, desconheci-me. Encontrei-me nas vozes desgasta-das de uma razão velha, mas plena de experiência. Esse ardor que senti na minha pele atacava pela calada e deixava-se ficar, descansar, permanecer, agrilhoando o meu ser, como o nevoeiro abandona as Cumeeiras e toma de assalto as freguesias dis-

Pedro Paulo Câmara lançou o seu primeiro livro de poesia,Perfumes, em 2011. Participou no Concurso “Jovem Criador Avei-

ro 2012”, tendo sido distinguido com menção honrosa, com o conto “Madrugadas”, que recebeu exposição no Museu de

Aveiro. Tem escrito letras para Marchas Populares e canções. O escritor é regularmente convidado para participar em pa-

lestras como orador e para saraus de poesia como declamador. O seu segundo livro de poesia vai ser publicado em breve,

sendo que está a terminar uma novela.

traídas à beira mar. Durante anos não resisti, não o soube fazer, não o ousei. Balbuciei palavras sem nexo, em terras estrangeiras, rodopiei nos espaços desiguais, em braços díspares; avancei e recuei sem vacilar, sem parar, inúmeras ve-zes; lamuriei sem lágrimas, pois já nem as tinha para verter. Quis voar de mim! Quis outrar-me. Talvez não mais.Naquela noite sem lua, sem neblina, sem grilos can-tantes, sem rãs que saltassem avisando do perigo… a minha pele lacrimejou silenciosamente tocada pela pré-saudade. Vociferei uivos de indignação pela tua fraqueza. Os teus sonhos repousam no meio das algas e não correm o risco de se evaporar nos escaldantes verões. Estou aqui para assegurar que ganham vida. Por toda a cidade me lembro de ti. Em cada pedra de polida calçada, em cada semáforo amarelo intermi-tente, em cada canto de rua desmaiado que se re-veste de solitude. Ausculto a tua voz em cada onda que morre contra o cais e que renasce em cada re-cuo da mãe-maré. E sinto, ainda, o teu toque em cada gota de chuva que pousa na minha pele e que escor-re, serenamente, lentamente pelos poros do meu corpo. E leio a tua caligrafia na página de cada livro que folheio. E provo o teu sabor de cada vez que o meu paladar acorda desperto pelos tímidos raios de sol de uma manhã inglesa ou alvorada insular. E toda essa panóplia me anima e me aflige, ainda, ou pouco. É difícil perder velhos hábitos de barba robusta.Alimento-me de cheiros e sons que já não existem e que morreram contigo. Amanhã é um novo dia! Amanhã renascerei.Amanhã morrerás, outra vez, de vez! Se for capaz de te assassinar… Aqui encerrarei este capítulo! A suprema oitava ma-ravilha destes cumes és tu. Uma nova lenda nascerá amanhã. Iniciaste a sua narrativa há dez próximos anos…. Era uma vez, há muito tempo atrás, uma prin-cesa chamada Marta….Almejei descobrir açores no céu, ou milhafres, ou eu próprio; almejei redescobrir as cores e os odores, os relevos e os declives. Almejei reavivar as recorda-ções, o som da tua voz, a cor rosácea dos teus lábios, o manear da tua fronte, o sabor do teu beijo. Reen-contrei o meu nome, o meu corpo, o meu sentir. Eu estou aqui, para sempre, aqui! Estou em casa!Cheguei!

Re(Descobrir) Açoresvencedor do concurso de escrita “Descobrir Açores 2013”

Fazendo Literatura

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Fazendo Ciência

Garrafas de Cerveja

Jogo do Petróleo

praia ou costa rochosa, ser comido por algum ser marinho ou depositar-se no fundo do mar.Ora sabe-se muito pouco sobre o lixo existente no leito do mar costeiro ou profundo (assim como da maioria das espécies que lá habitam): quanto há, onde se acumula, que tipo de lixo é mais frequente?Para responder a estas questões, jovens investigadores utilizaram imagens de submarinos que mergu-lharam para estudar o monte Condor,

identificando e quantificando os que materiais estranhos que aí ocorrem.As estimativas superaram as especta-tivas. Com uma densidade de cerca de 1500 itens por km2, as de garrafas de cerveja atingem 160 garrafas por km2.O que significa 1 garrafa de cerveja por cada área equivalente a um campo de futebol!Note-se que são apenas estimativas (não exactas), e para o topo do mon-te, diminuindo aparentemente com a profundidade. Ainda assim, o Condor

apresenta menos detrítos que outros leitos marinhos junto a zonas povoa-das.O impacto do vidro é desconhecido, e inferior ao dos pneus e outros deriva-dos do petróleo, a sua rápida deposi-ção e forma familiar devem servir para nos lembrar que o fundo do mar está hoje mais perto (e poluído) do que ima-ginamos.

JNGP

No primeiro estudo sobre lixo deposi-tado num monte submarino, investi-gadores do DOP-IMAR da Universida-de dos Açores, revelam que no Condor além dos aparelhos de pesca, são as garrafas de cerveja que mais ocorrem sobre o fundo.Se deitar lixo ao mar, ele irá degradar-

-se um dia, mas durante aqueles 500 anos que o plástico por exemplo (ma-terial semelhante ao de uma linha de pesca), pode levar para desaparecer, é certo que irá encalhar em alguma Se pensa que lhe proponho uma reflexão sobre a

indústria petrolífera ou uma lavagem cerebral sobre os seus malefícios, pode ficar descansado. O títu-lo do artigo não se trata de uma metáfora batida e deve ser lido no seu sentido mais literal. O “Jogo do Petróleo” é de facto um jogo. De tabuleiro. Do géne-ro Cluedo, Trivial ou Party and Company. Mas em vez de testarmos a nossa inteligência ou criatividade, atestamos barris de petróleo.É verdade, estou a falar sem conhecimento de causa porque nunca joguei o dito jogo. Pude apenas apre-ciar a sua caixinha azul marinho e ler a sua “sinopse” pois a curiosidade era, de facto, muita. Como poderia a empresa fazer valer o seu marketing? Como pode-ria cativar potenciais compradores (pais) e lidar com um mercado tendencialmente (espero eu!) viradopara uma maior consciência ambiental e energetica-mente alternativo?A resposta não tardou a chegar e o argumento que

encontrei no verso da caixa era de peso: “Vai conse-guir tornar-se um barão do petróleo? Ou vai deixar-

-se afundar? Leve (...) os seus ziliões no fascinante negócio do petróleo e passe a fazer parte da elite que explora a principal fonte de energia do planeta (...).” Abaixo, seguia-se a lista de itens do jogo:72 Cartas de prospecção de jazidas12 Depósitos do petróleo52 Torres de prospecção60 Barris de petróleo1 Conjunto de notas de ziliões(...)Ziliões. É que mesmo que não quisesse, o jogo não me permite ser despromovida para milionária ou coi-sa que o valha porque as notas do jogo são em ziliões. Deve ser uma espécie de monopólio mas a um nível muito mais avançado. Não adquiro imóveis nem cobro rendas, compro barris e exploro plataformas petrolíferas.

Não resisti a imaginar: Que casas (de jogo) poderão existir para dar mais emoção à coisa? “Casa Maré Negra: Oh que chatice. A sua companhia provocou um destastre ambiental. Terá de pagar 5 ziliões de indeminização. Uma vez sem jogar”, Ou a “Casa Gre-enpeace” que lhe impede de explorar determinada área protegida mas riquíssima no combustível fóssil. Mas a pior de todas seria a “Casa das energias alter-nativas: Ou não! Tem de se converter às energias al-ternativas e perder todo o seu império!”Talvez fosse um golpe duro demais para um meni-no de 9 anos zilionário. Ter menos em prole de um bem maior, são conceitos complicados e chatos de se incutir numa criança. Bom bom é deixá-la sonhar, nem que apenas de vez enquando, que o mundo do petróleo é azul marinho e que não há nada que uma nota de zilião não possa comprar.

Lia Goulart

Uma Garrafa e Meia de Cerveja por cada hectarede Fundo do Mar

ArquipélagoA Arquipelago - Life and Marine Scien-ces nº 29 saiu, também está online, plena de contribuições exclusivas de excelência, que se estendem desde a bioquímica em algas dos Açores, a re-gistos de espécies no Senegal. Um jor-nal a cores, livre de encargos para au-tores e leitores. Visite-nos em www.arquipelago.info.

Em terraPereira et al. (UAç) demonstram que sementes de plantas endémicas guardadas há 18 anos podem ser ger-minadas com sucesso, utilizando a germinação in vitro.O grupo da biodi-versidade de artrópodes da Madeira reporta novos dados de distribuição espacial para 33 espécies endémicas de escaravelhos, incluindo grandes áreas de floresta nativa (um trabalho liderado por Boieiro, UL). Ben-Dov et al. (ARO, Israel) apresentam dados sobre 4 insectos-escama (Hemipterídeos, maior parte parasitas de plantas), dois deles novos para os Açores.

Na zona costeiradois trabalhos da Universidade dos Açores, Paiva et al. e Barreto et al. demonstram potencialidades antio-xidantes de macroalgas comuns nos Açores, com aplicações que se esten-dem da medicina, à indústria alimentar

ou produção de cosméticos. Oito no-vas espécies de algas desconhecidas na região dos Açores são ainda repor-tadas por Léon-Cisneros et al. (UAç) nesta edição.Wirtz e Duarte demonstram que uma espécie de ouriço do mar (Arbacia lixu-la) se afasta das zonas onde os seus conspecíficos são predados, reagin-do à presença de compostos na água que resultam da destruição da sua carapaça. Riera et al. (CIMA, Canárias) demonstra como as comunidades de espécies que habitam os sedimentos costeiros podem reflectir alterações ambientais.

No MarVasconcelos et al. (DRP Madeira) re-vela épocas de reprodução, tamanho e idades de primeira maturação para a cavala (Scomber colias) na Madeira. Gomes-Pereira et al. (UAç) descreve a associação de peixes demersais a um recife artificial oportunista, filmado após um ano no topo do monte sub-marino Condor. Wirtz (UAlg) reporta sete novos registos de peixes na ilha de NGor (Senegal, tema de capa), in-cluíndo uma possível nova espécie de castanheta, e Rodrigues (GIRM) regis-ta cinco novas ocorrências nas ilhas das Berlengas.

José Nuno Pereira e Helen Martins

Life and Marine Sciences

Cidade da Horta - 1852 versus 2013Duplas

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Fazendo Crítica

Fazendo Comparação

Fazendo PublicidadeFazendo Ciência

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Sebenta de exercícios

CalendárioFazendo Poesia

Fazendo Saúde

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Elevação Frontal dos Braços Pés paralelos à largura dos ombros e braços ao longo do corpo com as mãos pou-sadas na face externa das coxas. Eleve simultaneamente os dois braços em fren-te à altura do peito de forma controlada e lenta e depois baixe os dois braços em simultâneo e controladamente, voltando a pousar as mãos na face externa das coxas. Quando eleva os braços inspire e quando baixa expire. Repita 10 vezes o movimento.

Projecção dos Braços para trás Pés paralelos à largura dos ombros e braços ao longo do corpo com as mãos pou-sadas na face externa das coxas. Projecte em simultâneo, e de forma controlada, os braços para trás, abrindo bem o peito e inspire. Expire trazendo os dois braços de forma controlada ao longo do corpo e pouse as mãos na face externa das co-xas. Repita 10 vezes o movimento

Orlanda André

ilustrações da Pantera cor-de-rosa

Paulo Bicudo

+info em : ) www.luzarou.blogspot.com

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Milhoaté São João

se semeia o Pão

Couvesno vazante da Lua

Salsano vazante da Lua

(sexta-feira santa)

Ervilhas e Feijãono enchente da Lua

Melão, Melancia e Abóborano enchente da lua e vazante da maré

QuandoSemear

Ser para sempre, em círculoPara sempre, hoje - o objectivo de ser ou o propó-sito para o estar e fazer simultâneos que preenche quotidianos.Pretende-se perpetuar a alma, obter a imortalidade pela transformação.Uma declaração de amor cravada no tronco de uma árvore ou homens que deitam abaixo estátuas: Fa-zer.Faz-se no tempo e deixa-se que o eco se funda e perturbe as coisas. Elas mexem-se.Revolvem, excitam-se, rebolam.Deixam entrar o rumor e mudam de forma - de den-tro para fora.Alimentam-se e dão de alimentar.São o aparelho auditivo e o som que o faz vibrar.São as fontes e os riachos que delas brotam.Pedras nas paredes que levantam.Pontos adimensionais com presença omnidimensio-nal.Consequências que colidem consecutivamente com contíguas consequências reverberandoincomensoravelmente.A máquina não pára.O movimento não teve ínicio.O movimento não encerra. O caminho que ainda não percorremos limpa as pe-gadas que no caminho deixámos.A rota apaga o rasto. A origem e o destino conso-mem-se.Olhamos em frente, para o desconhecido, e na né-voa distinguimos traços familiares que não reconhe-cemos. Nãonos lembramos.Os sentidos percebem texturas que a razão não al-cança. As formas encerram conteúdos que fizemos questão deesquecer.Em criança, na praia, enviámos pedras ao mar sos-segado. Escutámos e observámos o seu mergulhar e as ondasque desse ponto rapidamente se espalhavam. Nun-ca entendemos que essas pequenas perturbações seguiamsozinhas, e interagiam, segundo as leis da física, com outras ondas de outras pedras, de outras praias comoutras crianças.O tempo passa, sentamo-nos agora à beira mar num continente diferente e contemplamos o rebentar de outrasondas. Aí, nesse rebentar, os sentidos reconhecem distintamente o bocado que lhes pertence mas per-mitem quea razão pasme, num misto de surpresa e beldade. Continuamos a fazer - queremos ser para sempre. Alcançar a imortalidade no eco, sem dela dar conta.Por saturação, esse fazer implodirá, e no fim, ser-se-

-à só por estar. Pedro Lucas, 2008

O taxista revela em canada,travejes, antigos abrigos, longos currais,lajes de lava com sulcos de rodas,desígnio de talhadas relheiras,segredo maior de um colosso,adegas, poças de maré, bagacinas,solarengas ermidas abandonadas,arco sem nuvens ali desenhado,o chão de rola pipas impressiona,dá tom e piso ao rubro afastamento,delicado júbilo na véspera de domingo. Fernando Nunes

Um dia acordei e estava naTerra. Viajei então interiormente edescobri Coimbra que ao longepartilhava com o Mondego uma longadescida até à foz.Navegando encontrei livros tãoextraordinários que pensei quenão existiam e ainda mais ao longe Appolo e Dafnerecordaram-me a Vida e a Morte.Novamente viajei. Abrindo muito osolhos reconheci outros rostos ealguns tão amigos que aViagem assumiu um sentido.Quando voltar a acordarnão estarei maisna Terra! Graça Patrão

Ao princípio não era assim. Eu não sentia tanta falta daquela metade impossí-vel de mim. Tinha trocado o impossível do meu mundo pelo pos-sível do teu. Naquele que foi o meu último mergulho. O meu amor por ti. Um amor-de-água. Um amor-apneia.

Hoje sei que me falto a mim mesma. E que há mais de mim do que aquilo que vejo. Do que aquilo que vês. Mais do que aquilo que trago todos os dias para casa.

Há mais azul. Há mais prata.

E à noite quando durmo a teu lado o meu corpo mo-ve-se sem querer.As pernas cruzam-se e os pés esticam-se. E as mãos nas coxas sentem de novo o frio metálico das escamas. Por uns instantes volto ao mar. Regresso a casa e ao ser de água que ainda existe em mim. Pitta

ilust

raçã

o: Is

abel

Sam

paio

Sou alguém com poucas certezas absolutas na vida!O saber é pouco, imensa a dúvida.Mas o que realmente sinto são saudades,Não consigo definir onde, no meu ser…Saudades do tempo do crescer, do vivido,Saudades da alegria; dos medos em enfrentar o des-conhecido,Saudades das liberdades; do que fui e não mais se-rei…Saudades!Sentimento de perda reprimido.Perda continua, o ganhar esporádico no viver,Em adulto dar, em pequeno receber.É difícil avaliar o conseguido neste meu caminhar…Vou marcando os meus pés na areia.Nesta confusão do eu que tento organizar, A forma, o como está a tardar.Mas, ante a saudade tudo se reduz,Saudade dos sentimentos sentidos!O meu peito habituou-se às tormentas e bonanças,Caminho alimentando esperanças…Perante esta realidade do sentir presente,Equilibro o passado e o hoje constantemente.Enfim, o que penso serão banalidades…Mas no meu peito o que vibra são as saudades

Fernando Manuel Resende

Lajido 40

A Viagem

Saudade...

A Sereia Arrependida

Para Sempre,em Círculo

Fazendo Ambiente

Fazendo Literatura

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Entrevista com o MorcegoOrlanda Goulart André

Os Açores e os Seres Humanos têm a mesma idade

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Exposição

Expressões - Pinturas de Helena KrugBiblioteca Pública da HortaData: até 16 de MarçoHora: 9h ás 19h - sáb. 9h30 às 12h

Workshop

Escrita Criativa como ferramenta pedagógica IIcom Susana MouraBiblioteca da MadalenaData: 16 FevereiroHora: 15h

Cinema

ArgoRealizador: Ben AffleckLajes do PicoData: 15 FevereiroHora: 21hTeatro FaialenseData: 16 e 17 FevereiroHora: 21h30

Agenda Fevereiro ‘13

Nome: Orlanda Goulart AndréIdade: 53

Profissão: Enfermeira

O que é que pequeno-almoçaste?O mesmo de quase sempre, bem à portuguesa. Se o Conde Drácula viesse cá às ilhas onde o levarias?Cenário improvável, os condes não se misturam com a plebe… Qual é a semelhança entre o Pico e o Faial?O canal. Se não gostas de chuva o que é que estás aqui a fazer?À procura do sol.

Na escola que outra “disciplina” deveria ser obrigatória?Não sei que nome se poderia dar à “disciplina” ou “discipli-nas”…. mas ajudar as crianças a desenvolverem mais compe-tências do domínio do saber fazer e saber estar, através de diferentes linguagens e metodologias diversificadas e indivi-dualizadas, parece-me um bom contributo. Porque é que tens alguns projectos na gaveta?Que projectos?! Qual gaveta?! A cabeça? … lembrei-me agora mesmo que guardei um projecto antigo, muito antigo ….ma-nuscrito, dentro de um livro de receitas, será que ainda lá está?!

O que é que mais odeias na internet?Ter que ficar sentada em frente a um ecrã. Que forma de arte é que te aguça os caninos?

Todas… desde que me agucem os sentidos. O que é que gostavas de ter nascido?Menina. Gostavas de ir morrer longe?Nunca se morre longe.

Tomás Melo

Gatafunhos

Concerto

Aniversário Artista Faialense 155 anosSociedade Amor da PátriaData: 16 de FevereiroHora: 21h

Feira

Feira Rural da PedreiraCanada do Monte / Criação VelhaData: 17 FevereiroHora: 11h30 às 16h30

Concerto

Aniversário da Reconstrução do Teatro Faialense 10 anosTeatro FaialenseData: 17 FevereiroHora: 21h30

Crianças

Roda do ContoHistórias e JogosBiblioteca Lajes do PicoData: 22 FevereiroHora: 15h30

Concerto

Recital de GuitarraAlunos Escola MúsicaAuditório Lajes do PicoData: 22 FevereiroHora: 20h30

Cinema

O HobbitRealizador: Peter JacksonTeatro FaialenseData: 23 FevereiroHora: 17h e 21h30Lajes do PicoData: 24 Fevereiro Hora: 21h

Workshop

Fábrica de IdeiasVamos construir reciclandoBiblioteca Lajes do PicoData: 25 de FevereiroHora: 15h30

[email protected]

[email protected]

Fazendo ArtigosFazendo AgendaFazendo Leitores

Fazendo Publicidade

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Horários

Horta — Madalena 7h30 10h30 13h15 15h15 17h15

Madalena — Horta8h15 11h15 14h00 16h00 18h00

Cedros — Horta7h00; 12h45; 16h00;Sábados: 8h00

Piedade — S. Roque — Madalena6h15; 13h30;Domingos e feriados: 13h15

Piedade — Lajes — Madalena5h45; 12h55;Domingos e feriados: 12h55

Madalena — Lajes — Piedade10h00; 17h45;Domingos e feriados: 9h30

Horta — Cedros11h45; 15h20 (Hospital); 18h15;Sábados: 13h15

P. Norte — Horta7h00; 12h45;Sábados: 8h00

Madalena — S. Roque — Piedade10h00; 17h45;Domingos e feriados: 9h30

Horta — P. Norte11h45; 17h30;Sábados: 13h15

Índice

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Fazendo ArquitecturaVolta à Ilha em Namoradeiras

Fazendo CrónicaGin

Fazendo LiteraturaIn Folio

Fazendo Artes PlásticasHelena Krug

Fazendo CinemaOs Filmes quepor cá se fazem

Fazendo MúsicaPézinhos dos Bezerros

Fazendo CinemaPour la suitedu monde

Fazendo LiteraturaRe(Descobrir) Açores

Fazendo CiênciaGarrafas de Cerveja

Fazendo CiênciaArquipélago

Fazendo CríticaJogo do Petróleo

Fazendo ComparaçãoDuplas

Fazendo LiteraturaFazendo Poesia

Fazendo AmbienteCalendário

Fazendo SaúdeSebenta de exercícios

Fazendo EntrevistaCom o Morcego

Gatafunhos

Agenda

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