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Faculdades Integradas do Vale do Ivaí Instituto Superior de Educação - ISE
Recredenciado pela Portaria MEC nº. 545 de 11/05/2012 D.O.U. – 14/05/2012
JEFERSON CARDOSO DA SILVA
ETNOMATEMÁTICA: SABERES DE UMA COSTUREIRA
IVAIPORÃ 2015
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JEFERSON CARDOSO DA SILVA
ETNOMATEMÁTICA: SABERES DE UMA COSTUREIRA
Trabalho de Conclusão do Estágio III apresentado ao
Curso de Licenciatura em Matemática, para obtenção total
de nota e parcial à aquisição do título de Licenciado em
Matemática pelas Faculdades Integradas do Vale do Ivaí.
Orientadora: Professora Ma. Kátia Regina Figueiredo
Lemos
IVAIPORÃ 2015
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JEFERSON CARDOSO DA SILVA
ETNOMATEMÁTICA: SABERES DE UMA COSTUREIRA
Trabalho de conclusão do Estágio III apresentado ao
Curso de Licenciatura em Matemática, para obtenção total
de nota e parcial à aquisição do título de Licenciado em
Matemática pelas Faculdades Integradas do Vale do Ivaí.
COMISSÃO EXAMINADORA
__________________________________________ Orientadora de Estágio: Profª Ma. Kátia Regina Figueiredo Lemos
Faculdades Integradas do Vale do Ivaí
___________________________________________ Professor (a) Convidado (a)
Faculdades Integradas do Vale do Ivaí
___________________________________________ Professor (a) Convidado (a)
Faculdades Integradas do Vale do Ivaí
IVAIPORÃ 2015
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DEDICATÓRIA
Dedico esse trabalho primeiramente a Deus,
em seguida a minha família a qual sempre
me apoiou, principalmente a minha mãe, a
qual serviu como estudo de caso para a
conclusão desse trabalho. Dedico também a
minha namorada que sempre esteve ao meu
lado, e a minha orientadora que me ajudou a
concluir esse trabalho com imensa dedicação
e competência.
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AGRADECIMENTOS
Agradeço primeiramente a Deus autor e consumador de
toda fé, o qual me deu sabedoria e força para concluir esse
trabalho, a minha família e a minha namorada que sempre
estiveram ao meu lado a me apoiar, aos meus amigos de curso, a
minha amiga Ângela Bolorino Martins e à professora Neide Biodere
que não mediram esforços para me ajudar. Agradeço também a
minha orientadora pela confiança em mim investida, pela ajuda e
pela dedicação como profissional exemplar que é e que nunca
mediu esforços para me ajudar na conclusão desse trabalho.
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SILVA, Jeferson Cardoso. Etnomatemática: Saberes de uma Costureira. Faculdades Integradas do Vale do Ivaí. Trabalho de Conclusão do Estágio III do Curso de Licenciatura em Matemática. Ivaiporã-PR, 2015.
RESUMO
Este trabalho apresenta a importância da matemática seja ela formal ou informal em meio à sociedade. A etnomatemática apresenta como pressuposto a ideia de que a matemática é transmitida informalmente de geração para geração em todas as culturas, ajudando a resolver problemas cotidianos através dos conteúdos matemáticos. Desse modo, o objetivo desse trabalho foi verificar como esse conhecimento foi adquirido e utilizado na profissão de uma costureira do Vale do Ivaí. O método utilizado consistiu em primeiramente realizar uma pesquisa bibliográfica como embasamento, com os principais autores do tema como D´Ambrósio, Santaló, Knijnlk, entre outros. A seguir foi realizada a pesquisa de campo composta por entrevista e registro de imagens. O resultado mostrou que apesar do conhecimento matemático ser adquirido de maneira informal pela entrevistada, ela realiza de forma eficiente sua profissão compreendendo os conceitos matemáticos de forma intuitiva. Pode-se concluir, ao término desta pesquisa, a comprovação da pertinência do estudo da etnomatemática, que nos aponta a importância do conhecimento matemático informal do dia a dia. Palavras - chave: Matemática. Etnomatemática. Conhecimento informal. Aplicação Matemática.
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SUMÁRIO
1 Introdução ............................................................................................................... 8
2 O QUE É ETNOMATEMÁTICA ............................................................................. 10
2.1 MATEMÁTICA FORMAL E INFORMAL .............................................................. 12
3. A ETNOMATEMÁTICA E A RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS ............................ 17
4. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DE DADOS ........................................................ 22
4.1 Metodologia ......................................................................................................... 22
4.1.1 Universo e Amostra .......................................................................................... 22
4.1.2 Método de Coleta de Dados ............................................................................. 22
4.2 O caso de uma costureira em Ivaiporã – apresentação e análise ................. 23
4.3 Confecção de um vestido .................................................................................... 24
CONSIDERAÇÕES FINAIS ...................................................................................... 29
REFERÊNCIAS ........................................................................................................ 31
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1 Introdução
O presente trabalho, intitulado “Etnomatemática: saberes de uma
costureira,” é fruto da nossa inquietação sobre os saberes presentes em
pessoas que pouco frequentaram a escola, mas que sabem ou utilizam de
muita matemática para viver.
Muitas vezes, nos deparamos com esses alunos nas turmas da
educação de jovens e adultos, que retornam aos bancos escolares depois de
um longo tempo terem se ausentado, muitos por motivos de trabalho, de
necessidade em ajudar financeiramente a família. E, quando eles retornam,
percebemos que sabem muita matemática, que são profissionais no que
fazem, embora não tenham completado, às vezes, os anos iniciais do ensino
fundamental.
Como acadêmicos do curso de Matemática, conhecemos a
Etnomatemática, de posse dessa teoria e metodologia, pudemos explicar e
reconhecer que há muitos saberes entre as pessoas “simples”, mas com
grande capacidade de utilizar a matemática no seu dia a dia para sobreviver.
A Etnomatemática é:
Um programa que visa explicar os processos de geração, organização e transmissão de conhecimento em diversos sistemas culturais e as forças interativas que agem nos e entre os três processos. Portanto, o enfoque é fundamentalmente holístico (D’AMBROSIO, 1998, p.7)
D’Ambrosio (1998) nos explica que a etnomatemática é a
matemática feita por pessoas de diversas áreas, de formas diferentes, cada um
produzindo segundo sua necessidade.
Portanto, tivemos como objetivo nesse trabalho conhecer como a
Etnomatemática aparece em nosso cotidiano, mostrando com uma pesquisa
qualitativa, utilizando como instrumento um estudo de caso como a matemática
pode ser modelada e adaptada para diferentes profissões.
Nossa pergunta inicial foi: Quais os saberes matemáticos de uma
costureira?
Para isso, iniciamos com uma pesquisa teórica, buscando autores
como D’Ambrosio, Guerdes, entre outros, conforme consta nos capítulos 2, 2.1,
onde conseguimos responder as perguntas principais do trabalho,
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compreendendo que esses saberes produzidos por grupos profissionais ou
culturais eram estudados pela Etnomatemática.
A pesquisa teórica também nos mostrou que a Etnomatemática e a
resolução de problemas podem caminhar juntas. Para isso pesquisamos
autores com Polya (1995) e Dante (1994).
Logo depois, fomos à pesquisa de campo, a qual realizamos uma
entrevista com uma costureira muito conceituada na cidade, sobre os métodos
utilizados nas confecções de roupas e sobre os saberes matemáticos
presentes nesse trabalho.
Por fim, concluímos que não importa o grau de instrução de uma
pessoa para que conheça a ciência matemática, mas sim que ela está presente
na vida de todos, mesmo que de modo informal, utilizando-a para resolver seus
problemas diários.
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2 O QUE É ETNOMATEMÁTICA
Segundo (Castilho, 2010) a Etnomatemática é hoje considerada uma
subárea da história da matemática e pode ser entendido como o fazer
matemático no dia a dia, através de construção histórica, ou seja, ao longo dos
anos a humanidade. Sentindo a necessidade de se construir coisas e objetos
os homens passaram a desenvolver uma maneira, uma forma de senso comum
para realizar tarefas e criar objetos, desenvolveram então o saber matemático
sem o conhecimento científico. Podemos denominar assim, que
Etnomatemática é o fazer matemática de forma comum, podendo ser realizado
mesmo sem algum tipo de escolaridade, apenas com senso comum ou de
forma passada de geração em geração. A Etnomatemática pode ser
considerada uma forma de aprendizagem cultural ou de etnia, sendo assim a
matemática ensinada em determinados grupos e culturas.
Em varias regiões do planeta as diferentes línguas começam a se delinear e permitem organizar sistemas de conhecimento. Registros começam a ser feitos. São particularmente ricos os registros da Eurásia e é possível fazer uma pré-história das ideias matemáticas que dão origem a matemática acadêmica. Na pré-história e na história identifica-se e etnomatemática como um sistema de conhecimento. (D´AMBRÓSIO, 2011, p. 33).
Vários autores citam a Etnomatemática em seus trabalhos, sem
dúvidas o mais conhecido nacionalmente e internacionalmente é Ubiratan
D´Ambrosio, com vários livros publicados com esse tema, seus trabalhos são
todos voltados para a educação matemática. Outros ainda abordam essa
tendência matemática, Ferreira, Gerdes são alguns desses exemplos.
Para Gerdes (1991) a Etnomatemática está contida na matemática,
na Etiologia (Antropologia Cultural) e também está contida na didática nas
aulas de matemática. Busca sempre enfatizar em seus textos a força da
colonização para afirmar a matemática cultural.
Já Ferreira (1991) identifica três visões diferentes na tentativa de
buscar uma teoria para a Etnomatemática: o saber, o trabalho com objetivo de
reconstruir a sistematização e de significado do saber matemático e trabalhos
que buscam compreender o desenvolvimento histórico conceito de
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determinado grupo que se orienta na perspectiva histórica e trabalhos na
perspectiva pedagógica.
Ambos os autores enfatizam o poder que o grupo exerce sobre o
ensino da matemática para os seus membros. Fazendo assim a
Etnomatemática, que como já foi mencionado acima, na forma de senso
comum é passado de geração para geração, sem o conhecimento escolar e
científico sobre determinado assunto ou objeto que utilizam no dia a dia. A
Etnomatemática pode ser compreendida também como a matemática utilizada
no dia a dia, ou seja, no fazer matemático mesmo sem saber, isto ocorrem com
diversos profissionais, alguns exemplos são: o pedreiro, o carpinteiro, pintor,
azulejista, projetistas, marceneiros, confeiteiros e a costureira que será o alvo
principal de nossa pesquisa.
D´Ambrosio (1990) diz que a Etnomatemática é a arte ou técnica
de explicar, de conhecer, de entender diversos contextos culturais. Sendo
assim, a Etnomatemática tem como função compreender como diversas
pessoas de diferentes níveis de cultura e com pouca escolaridade fazem a
matemática informal, e como mesmo sem saber formas e operações
matemáticas conseguem realizar trabalhos incríveis.
Esse estudo nos leva a refletir como é possível uma pessoa que
frequentou a escola por pouquíssimo tempo realizar tarefas tão complexas sem
ao menos conhecer a matemática envolvida por trás de tudo aquilo que passou
a realizar.
Muitas pessoas usam matemática na sua vida diária, sem ter se quer frequentado escola. Ás vezes, essa matemática é mais profunda do que se suspeita. Ao construir seu barraco, uma pessoa analfabeta, que nunca aprendeu a ler ou escrever, usa teorema de Pitágoras, calcula áreas, utiliza conceitos e as propriedades das diagonais do retângulo, etc. (D´AMBROSIO, 1190, s.p)
D´Ambrosio (1990) afirma que uma pessoa não necessita ter um
grau de escolaridade elevado para que consiga realizar tarefas que necessitam
de conceitos matemáticos complexos. Afirma ainda o autor que qualquer
pessoa ao construir seu barraco, por exemplo, pode utilizar-se de cálculos de
áreas e até mesmo teoremas mesmo sem saber o conceito matemático
envolvido por trás desse problema.
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Todos sem exceção, utilizam a matemática no seu dia a dia, sendo
ela formal ou informal, Pitágoras disse “tudo é número”, sem dúvidas, tudo em
nosso dia está ligado a sistemas numéricos e equações, por exemplo, um
simples café da manhã está cheio de matemática envolvido, ao colocar a água
pra ferver, que leva certo tempo para atingir a temperatura, para começar a
ebulição, ao por o pó de café no coador você está realizando matemática
simples utilizando regras de contagem. Basta olhar ao redor e perceber como a
matemática está presente em tudo, em cada detalhe da natureza, em uma
simples planta até uma complexa forma rochosa que levou milhares de anos
para se formar. Isaac Newton dizia que “a matemática é o alfabeto no qual
Deus escreveu o universo”, com isso queria dizer que como o universo é
perfeito, sem falhas, cheio de beleza e a matemática também é dessa forma,
bela, instigante e que nos faz a cada dia encontrar novidades sobre a mesma
que chamam a atenção do ser humano.
2.1 MATEMÁTICA FORMAL E INFORMAL
É dever dos professores seja de qual matéria for transmitir aos
alunos ao menos o conhecimento básico para que a partir dele os mesmos
alunos possam ter uma ideia de como lidar com os problemas que a sociedade
impõe a cada dia. Principalmente nós, professores de matemática, precisamos
desenvolver uma metodologia diferenciada que possa facilitar a aprendizagem
do aluno.
Sabendo que a matemática é uma das matérias mais utilizada no dia
a dia e que ela tem uma linguagem universal, é importante que os alunos
construam uma visão singela sobre a mesma, desprovida de receios e temores
mas percebida como uma ciência que nos ajuda a resolver os problemas da
vida. Com isso Santaló faz uma breve citação sobre a missão dos educadores.
A missão dos educadores é preparar as novas gerações para o mundo que terão que viver. Isto quer dizer proporcionar-lhes o ensino necessário para que adquiram as destrezas e habilidades que vão necessitar para seu desempenho, com comodidade e eficiência, no seio da sociedade que enfrentarão ao concluir a escolaridade. (SANTALÓ, 1996, p.11).
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Santaló (1996) diz também que os professores devem estar sempre
alertas quanto ao ensino, pois o mundo está sempre em constante mudança, é
preciso estar sempre pronto a buscar novas metodologias de ensino assim
como os conteúdos apropriados a cada tempo. O que não pode ocorrer é a
escola e nem mesmo os professores ficarem parados no tempo, enquanto o
mundo evolui lá fora, por isso é de extrema necessidade conciliar os conteúdos
principalmente os de matemática com o mundo, para que caminhem juntos e
em sintonia.
O ideal seria que a escola pudesse ter influência sobre esse mundo exterior para molda-lo segundo critérios bem estruturados científica e moralmente, porém, seu conhecimento prévio é indispensável, e o pior que se pode fazer é ignora-lo e seguir educando para um mundo diferente do real. Convém, portanto, analisar brevemente como é e como caminha esse mundo exterior. (SANTALÓ, 1996, p.12).
É importante mostrar ao aluno possibilidades para que ele resolva
um problema matemático, mas nem sempre é necessário que se mostre o
caminho, pois muitas vezes ele já tem o caminho todo em sua cabeça, embora
não seja o caminho mais simples. O aluno tem um conhecimento matemático
que traz de suas vivencias do dia a dia e que devem ser valorizadas pela
escola. Isso é mais notado em escolas de jovens e adultos e em escolas do
campo, onde o conhecimento é adquirido através das vivências familiares.
De acordo com Santaló (1996) não há dúvida que, devido aos
progressos científicos e tecnológicos do século passado e inclusive o atual, os
homens de hoje são muito superiores aos de poucas décadas atrás. Tudo isso
se dá graças à facilidade com que se tem a informação, é possível saber o que
está se passando a milhares de quilômetros e também do outro lado do mundo
em tempo real. Este é outro problema para a escola, pois é necessário que ela
se desenvolva para acompanhar as novas tecnologias.
O problema reside em decidir “como” educar esse homem informático, que tem poderosas bases e tão grandes possibilidades e que vai se adaptando a uma tecnologia que lhe permite potentes e variadas maneiras de agir, porém que lhe exige também diferente comportamento e diferente preparação das suas habilidades e destrezas. A vida tem-se tornado difícil, e a escola deve evoluir para reparar indivíduos com capacidade para atuar nesse mundo complexo e diversificado. (SANTALÓ, 1996, p. 13).
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Para os professores de matemática é um desafio enorme educar e
tentar ensinar aos alunos os conceitos matemáticos que se utilizam no dia a
dia, principalmente com as tecnologias tão avançadas. Estes precisam focar a
atenção dos alunos, e fazer com que a aula seja interessante, e principalmente,
mostrar como as novas tecnologias utilizam da matemática para tornar a vida
das pessoas melhor e mais confortável. Ai entra a questão dos conceitos
matemáticos, onde se deve mostrar para os estudantes qual conceito foi usado
nessas novas tecnologias. Mas, às vezes, esses conceitos não interessam
para os alunos, pois dizem que já sabem fazer de outra forma, e falam que
essa forma é a mais fácil.
Não existe o jeito certo ou errado de se fazer matemática, não existe
apenas um caminho, não existe apenas um tipo de solução, mas o que
realmente importa são os conceitos usados para a realização de um problema
mesmo que esse conceito não seja percebido pela pessoa que está resolvendo
a questão. Nem sempre será fácil para alguém que não se apropriou dos
saberes escolares, usando apenas seus conhecimentos adquiridos
informalmente, solucionar um problema sem conhecer os conceitos, fazendo
com que um simples problema leve um tempo maior para ser solucionado a
depender do caminho escolhido.
No entanto, muitas vezes, ao observarmos esses caminhos
encontramos modos de fazer que nos surpreendam. Simplificações que não
havíamos pensado demonstrando que por trás da simplicidade de uma pessoa
leiga pode estar um pensamento altamente sofisticado e lógico e que
apresenta resoluções interessantes e às vezes mais apropriadas a
determinados contextos.
Como vimos, a matemática revela-se em várias formas e de diversas
maneiras. Não tem como chegar a uma pessoa e dizer a ela que a mesma está
resolvendo um problema de maneira errada ou com o conceito errado se ela
tem conseguido lidar com as questões e resolver os problemas. Podemos
mostrar ao aluno que há várias possibilidades, mas sempre valorizando o
percurso escolhido pelo aluno.
Para se utilizar a matemática para resolver problemas não é
necessário diploma de nível médio ou qualquer outro, Freire (1986, p. 28) disse
“A educação tem caráter permanente. Não há seres educados e não educados.
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Estamos todos nos educando. Existem graus de educação, mas esses não são
absolutos”, esse pensamento quer dizer que não importa a formação do ser
humano, ele continuará aprendendo enquanto viver, querendo isso ou não,
pois o homem é um ser inacabado, que sempre necessitará buscar os mais
diversos caminhos e saberes para dar solução aos problemas que a vida lhe
impõe.
Há dois tipos de matemática, a formal que realiza as soluções dos
problemas por meio de conceitos matemáticos sejam eles quais forem, usando
fórmulas e teoremas. E também a matemática informal, essa é a matemática
que as pessoas utilizam todos os dias para resolver problemas simples com
operações matemáticas igualmente simples, por exemplo: contar dinheiro,
voltar troco e fazer cálculo de medidas, embora usem operações e alguns
conceitos matemáticos para resolverem tais problemas, mas usam de forma
informal, não distinguindo qual conceito foi usado ao realizar a operação
matemática. Santaló cita o que Platão diz a respeito desses tipos de fazer
matemático.
Platão faz distinção entre o que hoje chamamos matemática pura, que “facilita para a alma os meios de elevar-se a esfera da geração até a verdade e a essência”, e a matemática aplicada, “a matemática dos comerciantes e negociantes, que é utilizada como objetos de compras e vendas. (SANTALÓ, 1996, p. 14).
O fato de não se compreender os conceitos matemáticos levam
muitas pessoas a dizer que não gostam e que não tem afinidade com a ciência,
o que as pessoas não conseguem entender é que a matemática serve para
facilitar na hora de resolver os problemas do dia a dia e não para prejudicá-las.
O problema reside na seleção da matemática para aqueles que não têm interesse particular por ela e só aceitam como uma necessidade que ajuda a desempenhar melhor suas tarefas e a entender seu substrato básico. Para estes é fundamental que os encargos de projetar os planos de estudo que tenham em conta o valor formativo da matemática e também as técnicas sobre as quais é necessário formar em cada ciclo do ensino e em cada carreira profissional específica. (SANTALÓ, 1996. p, 15).
Sem a compreensão da ciência, um simples problema pode se
tornar um problema sem solução ou que leve o dobro ou triplo do tempo para
ser solucionado. No entanto, quantas pessoas são encontradas que
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conseguem fazer operações matemáticas de cabeça sem auxilio de
calculadoras ou de papel, geralmente são pessoas mais velhas, a quem a vida
lhes pediu a utilização da matemática desde muito cedo.
Aos professores de matemática compete selecionar entre toda a matemática existente. A clássica e a moderna, aquela que possa ser útil aos alunos em cada um dos diferentes níveis de educação. Para a seleção temos de levar em conta que a matemática tem um valor formativo, que ajuda a estruturar todo o pensamento e a agilizar o raciocínio dedutivo, porém que também é uma ferramenta que serve para a atuação diária e para muitas tarefas específicas de quase todas as atividades laborais. (SANTALÓ, 1996, p. 15)
Não é possível ensinar tudo ao aluno, mas o professor deve sempre
tentar ensinar aquilo que realmente importa para o aluno, que é significativo,
principalmente formando os conceitos básicos necessários a uma boa
compreensão matemática. Porém, se a escola for uma escola do campo ou
uma escola indígena, o professor deve fazer com que o conteúdo explicado
tenha sentido com a realidade do discente.
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3 A ETNOMATEMÁTICA E A RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS
Para viver e vencer os desafios que a vida impõe, qualquer pessoa
em seu dia a dia é desafiada a resolver diversos problemas em que é
necessário o pensamento matemático para a resolução, seja realizado de
maneira informal ou formal. Muitas vezes a pessoa que utiliza o cálculo mental,
por exemplo, nem sequer percebe qual procedimento matemático esta
realizando para resolver esse problema. Nesse caso entra a Etnomatemática
em ação, pois é ela quem mostra que mesmo sem o saber matemático formal
há muita matemática sendo utilizada para resolver os problemas e desafios da
vida.
G. Polya (1995), autor do livro A Arte de Resolver Problemas o qual
se tornou um livro muito citado em trabalhos de conclusão de cursos, também
muito utilizado por professores e pedagogos do mundo todo. Ele enfatiza que
para se resolver um problema um aluno ou uma pessoa qualquer se utiliza
apenas de quatro passos, sendo eles: compreensão do problema,
estabelecimento de um plano, execução do plano e retrospecto.
Nesse livro Polya (1995) ensina como resolver um com apenas
quatro passos. O primeiro passo indica que o aluno tente compreender o
problema proposto pelo professor, ou seja, fazer a leitura e entender o que esta
sendo pedido para ser feito, de maneira que não fique duvidas e que assim
possa partir para o segundo passo.
Primeiro de tudo, o enunciado verbal do problema precisa ficar bem entendido. O aluno deve também estar em condições de identificar as partes principais do problema, incógnita, os dados, a condicionante. Daí porque, raramente, pode o professor dispensar as indagações: Qual a incógnita? Quais são os dados? Qual é a condicionante?(POLYA, 1995, p, 4)
Segundo passo, estabelecer um plano, mas como isso? Isso o aluno
irá fazer da seguinte forma, ele após ler o problema e entender o que se pede
no problema, irá estabelecer uma sequencia de como e de qual maneira o
problema acabará se tornando mais simples e fácil de ser resolvido. A partir daí
ele começará a analisar qual operação matemática ele poderá usar, se terá
que fazer algum tipo de desenho e como irá desenvolver o exercício.
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Temos um plano quando conhecemos, pelo menos de um modo geral, quais as contas, os cálculos o os desenhos que precisamos executar para obter a incógnita. O caminho que vai desde a compreensão do problema ate o estabelecimento de um plano pode ser longo e tortuoso. Realmente o principal feito na resolução de um problema é a concepção de ideia de um plano. (POLYA,1995, p. 5)
O terceiro passo consiste em colocar em prática o passo anterior,
depois que o aluno já leu e viu qual procedimento irá realizar. Então ele
começa a colocar em prática tudo o que antes só existia em sua cabeça, em
uma folha de papel, parece um trabalho de artes em que o professor pede para
que o aluno desenhe algo que lhe traga alegria, e realmente tudo isso é uma
arte, a arte de resolver problemas.
Se o aluno conseguiu colocar em pratica o que antes tinha
imaginado, o professor terá certa tranquilidade com relação o acerto do aluno.
É importante que o aluno tenha hábito de estudar para que quando se deparar
com algum problema ele consiga resolver sem muita dificuldade.
Conceber um plano, a ideia da resolução, não é fácil. Para conseguir isso é preciso, além de conhecimentos anteriores, de bons hábitos mentais e de concentração no objetivo, mais uma coisa: boa sorte. Executar o plano é muito mais fácil, paciência é o que mais se precisa. (POLYA, 1995, p. 8)
O quarto passo tem como objetivo fazer uma revisão, ou seja, voltar
e rever o que foi feito para solucionar o problema, vendo quais conceitos
matemáticos foram usados para esse fim, vendo se está tudo correto. Feito
isso, o aluno começa a perceber como não é tão difícil quanto parece, assim
sendo quanto mais ele resolver um exercício e voltar analisando o que ele
mesmo fez ou deixou de fazer, fará com que ele possa estar criando em sua
mente uma forma mais fácil de resolver um problema, e cada fez que fizer isso
o aluno então terá cada vez mais facilidade e se aperfeiçoará em seu
conhecimento matemático, tanto na hora de interpretar quanto na hora de
resolver o problema.
Se fizerem um retrospecto da resolução completa, reconsiderando e reexaminando o resultado final e o caminho que levou até este, eles poderão consolidar seu conhecimento e aperfeiçoar a sua capacidade de resolver problemas. (POLYA, 1995, p. 10)
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Mas o que a resolução de problemas pode trazer de benefício para
os alunos? Dante (1994) traz alguns objetivos da resolução de problema, e
com eles os benefícios que proporcionam aos alunos. Segundo ele, a
resolução de problema faz com que o aluno pense produtivamente. Afirma o
autor que um dos principais objetivos do ensino da matemática é fazer com que
o aluno pense produtivamente, por isso apresentar-lhes problemas
matemáticos que os motivem a resolvê-lo é um dos principais objetivos.
Seguindo com o pensamento de Dante (1194) apoiado em Polya
(1995), a resolução de problema faz com que desenvolva o raciocínio do aluno.
Afirma ainda que o problema ensina o aluno a enfrentar situações novas e
também dá ao aluno a oportunidade de se envolver com aplicações
matemáticas e assim tornar as aulas de matemáticas mais interessantes e
desafiadoras.
Uma aula de Matemática onde os alunos, incentivados e orientados pelo professor, trabalham de modo ativo – individualmente ou em pequenos grupos – na aventura de buscar a solução de um problema que os desafia e mais dinâmica e motivadora do que a que segue o clássico esquema de explicar e repetir. O real prazer de estudar matemática está na satisfação que surge quando o aluno, por si só, resolve um problema. (DANTE, 1994, p. 14)
Para encerrar, o principal objetivo da resolução de problemas é dar
uma boa base matemática às pessoas, Dante (1994) explica que se precisa de
pessoas ativas e participantes, que possam tomar decisões rápidas, podendo
assim formar pessoas cidadãs matematicamente alfabetizadas, para que
possam resolver seus problemas diários de comércio, economia,
administração, medicina, economia doméstica e etc. Tudo isso de forma
inteligente e rápida, para que isso ocorra é necessário que os alunos tenham
em seu currículo a resolução de problema desde cedo, para que não cresçam
e se tornem pessoas alienadas.
Dante se apoia em Polya, como já dissemos, e oferece algumas
sugestões para compreender os passos ensinados por Polya, conforme o
quadro abaixo:
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Compreender o problema
a) O que se pede no problema?
b) Quais são os dados contidos no problema?
c) É possível fazer uma figura, um esquema ou um diagrama?
d) É possível estimar a resposta?
Elaborar um plano
a) Qual é o seu plano para desenvolver o problema?
b) Que estratégia você tentará desenvolver?
c) Você se lembra de um problema semelhante que pode ajudá-lo a
resolver este?
d) Tente organizar dado em tabelas e gráficos.
e) Tente resolver o problema por partes.
Executar o plano
a) Execute o plano elaborado, verificando-o passo a passo.
b) Efetue todos os cálculos indicados no plano.
c) Execute todas as estratégias pensadas, obtendo várias maneiras de
resolver o mesmo problema.
Fazer o retrospecto ou verificação
a) Examine se a solução obtida está correta.
b) Existe outra maneira de resolver o problema?
c) É possível usar o método empregado para resolver problemas
semelhantes?
Fonte: Dante (1994, p. 29)
Com esse quadro é possível resolver diversos problemas, sendo
estes matemáticos ou não. O aluno pode usar esse esquema na cabeça para
resolver um problema passado pelo professor, mas ao mesmo tempo seu pai
também estará se utilizando de um esquema semelhante a esse diante do
desafio de trocar um pneu de um carro. Uma costureira utiliza esse esquema
mesmo sem saber, mesmo sem ter a matemática formal em sua cabeça, diante
do problema de fabricar uma saia, por exemplo, ela compreende o que o
cliente quer, traça um plano, faz seus cálculos, desenvolve o plano, fabrica a
peça, e depois quando o cliente experimenta novamente a roupa, verifica se o
caminho escolhido resultou no que esperava. Coisas assim ocorrem
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constantemente com todas as pessoas, resolvem um problema que pra elas é
tão de comum que já nem encaram mais como um problema.
Professores de alunos das turmas regulares ou na educação de
jovens e adultos precisam ter consciência e respeito pelos saberes dos alunos
e pelas formas que os mesmos são construídos.
O aluno, ao apropriar-se da Matemática acadêmica em parceria com
a Etnomatemática sente que é valorizado os conhecimentos e produções do
seu grupo sociocultural e demonstra que utiliza as várias ferramentas para
resolução de problemas provenientes tanto do seu contexto como de outros, e
que escolhe, de acordo com a situação ou desafio proposto, qual a ferramenta
mais adequada.
D’Ambrosio (2005), afirma que é objetivo da Etnomatemática a
melhoria do conhecimento e dos modos em que a Matemática é difundida e
apropriada pelos alunos, e propõe que tenhamos na escola a prática dos
seguintes valores: ética de respeito, solidariedade e cooperação. Isso
demonstra a preocupação do autor com a dimensão política da
Etnomatemática, que enfoca na recuperação e valorização dos saberes de
grupos socioculturais marginalizados.
A proposta da Etnomatemática é restaurar, reconhecer, respeitar as
raízes culturais dos nossos alunos. A ideia principal não é negar o acesso dos
alunos a Matemática acadêmica, mas reforçar as raízes culturais dos mesmos
e ao mesmo tempo oportunizar o acesso ao saber escolar, no caso a
matemática, herança cultural da humanidade.
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4 APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DE DADOS
4.1 Metodologia
Esta pesquisa se enquadra na pesquisa descritiva, pois mostra
características de determinados fenômenos, não tendo compromisso de
explicá-los, serve apenas de base para a explicação destes fenômenos.
(VERGARA, 2009).
Quanto aos meios, enquadra-se na pesquisa de campo, com um
estudo de caso, sendo que foi necessário ir até a residência da costureira para
coletar dados, de acordo com Vergara (2009, p.43) “é investigação empírica
realizada no local onde ocorre ou ocorreu um fenômeno ou que dispõe de
elementos para explicá-lo. Pode incluir entrevistas, aplicação de questionários,
testes e observação participante ou não”.
4.1.1 Universo e Amostra
Vergara (2009, p.46) fala que Universo é “[...] um conjunto de
elementos (empresas, produtos, pessoa, por exemplo) que possuem
características que serão objetos de estudo”, com isso entende-se que o
universo da pesquisa é o conjunto de todas as pessoas que usam a
matemática informal. Desse universo escolhemos como amostra uma
costureira de Ivaiporã-PR reconhecida na comunidade.
4.1.2 Método de Coleta de Dados
O método de coleta de dados a ser utilizado por ser uma pesquisa
de campo será a entrevista.
De início, é importante atentar para o caráter de interação que permeia a entrevista. Mais do que outros instrumentos de pesquisa, que em geral estabelecem uma relação hierárquica entre o pesquisador e o pesquisado, como na observação unidirecional, por exemplo, ou na aplicação de questionários ou de técnicas projetivas, na entrevista a relação que se cria é a interação, havendo uma atmosfera de influência recíproca entre quem pergunta e quem responde. Especialmente nas entrevistas não totalmente
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estruturadas, onde não há uma imposição de uma ordem rígida de questões, o entrevistado discorre sobre o tema proposto com base nas informações que ele detém e que no fundo são a verdadeira razão da entrevista. (LUDKE e ANDRE, 1986, p.33)
4.2 O caso de uma costureira em Ivaiporã-PR – apresentação e análise
No mês de novembro de 2015, buscamos uma costureira renomada
do nosso município, Ivaiporã, PR, ao qual denominaremos apenas Costureira
X. Sua idade, 49 anos. Trabalha há 25 anos nessa profissão que aprendeu
quando contava com 24 anos.
Perguntamos para ela se estava empregada em algum lugar. Ela
nos respondeu que “Sim, em uma fábrica de confecção de camisetas e shorts
para times de futebol, fábrica que presta serviço para a Kanxa”.
Ou seja, ela trabalha em uma empresa que fabrica roupas
esportivas.
Continuando nossa entrevista, perguntamos: Costura em casa?
Respondeu-nos que “sim, nas horas vagas depois do serviço”.
Esse dado, nos mostra que o cotidiano dessa senhora não é nada
fácil. Tem jornada tripla pois além de trabalhar em empresa da cidade, exerce a
profissão de costureira em sua residência e ainda cuida da sua família.
Querendo saber como ela havia aprendido a sua profissão,
perguntamos: Quem te ensinou a costurar? E como?
Ela nos respondeu que: “Dona Ivone, ela dava curso de costura
então eu fiz o curso”. A nossa entrevistada se referia a outra pessoa do
município que havia ensinado para ela os seus saberes de costureira.
Ao perguntarmos se ela costura todo tipo de roupa ela nos disse que
sim e que as costura com auxílio de moldes ou usando apenas medida.
Seguindo com a pesquisa, perguntamos como ela consegue saber a
quantidade de pano que o cliente deve comprar, ela nos disse: Sabendo as
medidas da pessoa e o modelo de roupa que ela deseja, eu já deduzo a
quantidade de pano que ela deve comprar.
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Ela tira as medidas das pessoas com ajuda de uma fita métrica. Sem
dúvidas o trabalho de uma costureira tem total envolvimento com a
matemática.
Que operação matemática você utiliza para saber a quantidade de
pano que a cliente deve comprar? Respondeu-nos ela: “Contas de adição.”
Então, questionamos: Você sabe quantos porcento lucra por cada
peça de roupa produzida em casa? Tirando a despesas de linhas, energia, mão
de obra, consigo obter 50% de lucro.
Perguntamos até que série estudou, ela nos disse que frequentou
até o 3° ano do ensino fundamental I. ”Muitas pessoas usam matemática na
sua vida diária, sem ter sequer frequentado escola. Ás vezes, essa matemática
é mais profunda do que se suspeita.” (D´AMBROSIO, 1990, s.p)
Então questionamos: Por qual motivo você teve que parar seus
estudos? Ela nos informou que como a situação não era fácil teve que parar de
estudar para ajudar e em casa.
4.3 Confecção de um vestido
Quando estava sendo entrevistada a costureira X estava
confeccionando um vestido, então pedimos para que ela nos permitisse tirar
fotos e ver como era o trabalho desenvolvido por ela, quais os passos que ela
utilizava e quais operações matemáticas ela tinha usado.
Primeiro ela tirou as medidas da cliente, vamos chamá-la de cliente
Y. Ela utilizou a fita métrica para tirar as medidas da cliente Y, assim como ela
tinha nos dito na entrevista. As medidas dela foram as seguintes: Busto 90 cm,
costas 40 cm, decote 25 cm, cintura 75 cm, quadril 98 cm, altura da cliente 1,64
cm.
A costureira informou que com base nesses dados a quantidade
necessária de tecido seria 1,5 m. Questionando sobre como ela sabia que 1,5
metros seria suficiente para fazer o vestido, informou-me que com base na
altura da cliente e do seu quadril, chegava mentalmente ao valor proposto, pois
deduzia que o tamanho da cliente era M. A costureira nos informou que o
vestido seria justo no corpo. Giongo, (2008, p.8), explica que:
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Se na matemática associada à disciplina Matemática, as regras primavam pelo formalismo, assepsia e abstração, na matemática das disciplinas técnicas as regras aludiam às estimativas, às aproximações e aos arredondamentos. A análise do material de pesquisa também fez emergir a ideia de que há forte semelhança de família a) entre os jogos de linguagem que constituem a disciplina Matemática e aqueles que conformam a Matemática Acadêmica; b) entre os jogos de linguagem da matemática das disciplinas técnicas e aqueles que instituem a matemática camponesa.
Em seguida ela começou a cortar e riscar o tecido no formato de
desejo da cliente Y. E depois passou a confeccioná-lo na maquina. Foi possível
tirar algumas fotos para melhor explicação.
Aqui nessas imagens temos o vestido começando a ser cortado, é
possível ver essas marcas feitas com giz, é a partir dele que a costureira X
pôde cortar o tecido.
Enquanto ela costurava perguntamos quando que ela cobrava pela
confecção daquele vestido, ela no informou que iria cobrar 30 reais. E para
fazermos uma comparação de quanto ela ganha por hora, então perguntamos
quantas horas ela levaria para terminar esse vestido, ela nos informou que com
3 horas ele estaria pronto. Com base nas informações da costureira fizemos
cálculos básicos, e vimos que ela ganharia o valor bruto por hora de 10 reais,
mas como ela nos disse que tem 50% por cento de lucro calculamos que ela
ganhe livre o valor equivalente a 5 reais por hora. Nos demais 50% estariam a
luz que se gasta, aviamentos, desgaste da máquina, entre outros.
Esse valor, 5 reais a hora não representa muito, mas considerando
que se trata de um trabalho informal em que a costureira não precisou sair de
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sua casa ou ter que ir ao cliente é um valor significativo, até porque ela já
coloca no valor bruto sua mão de obra. Além do mais, é difícil mensurar se este
valor é pouco ou muito uma vez que esses valores são afixados a partir da
realidade local, da demanda de mão de obra na cidade, entre outros aspectos
que não são objeto do nosso trabalho.
Questionamos ainda o que ela julgava ser melhor para ela, trabalhar
fora ou em casa, já que trabalha numa fábrica de costuras local. Ela nos
informou que recebe livre de encargos já descontados em folha de pagamento
um valor de 942,00 reais. Esse valor é relativo à 44 horas semanal de trabalho,
4 semanas por mês, ela, calculamos que o valor do seu ganho por hora é de
aproximadamente 5,35 centavos. A vantagem de se trabalhar fora é a
segurança de estar registrada, e como ela nos disse o seu serviço fica a 4
minutos de sua casa, então ela já não gasta com transporte, e para ela acaba
sendo melhor trabalhar como empregada pelo fato de não se preocupar com o
dinheiro no fim do mês, como ela mesmo disse: “eu sei que o meu salário virá
certinho todos os meses, e que trabalho em casa apenas para complementar a
minha renda”.
Enfim, a entrevista com essa senhora demonstrou que ela consegue
avaliar o que é melhor para sua vida e que tem utilizado a Matemática em sua
profissão e também para refletir sobre os suas escolhas profissionais.
Abaixo apresentamos algumas fotos do vestido que estava sendo
confeccionado e que ela nos permitiu fotografar
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Nessas imagens já é possível ver o vestido com será, pois além de
estar cortado também já foi começada a parte de costura, na primeira imagem
vemos como será o corpo do vestido, já está quase todo montado, e na
segunda imagem a saia do vestido, sem dúvidas um trabalho interessante, a
matemática presente em toda a construção do vestido, desde as medidas
tiradas da cliente até a medida final.
Aqui o vestido quase todo finalizado, apenas faltando fazer a barra e
alguns detalhes, nessa fase da produção é onde a costureira vê e analisa se
seu trabalho saiu como desejado e onde também a cliente pode vir a
experimentar e ver se precisa fazer algum ajuste no tamanho ou no
comprimento. A partir daí a costureira já pode terminar o vestido e entregá-lo à
cliente.
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Nessas últimas imagens vemos o vestido pronto e já em mãos da
cliente, onde, segundo ela, ficou ótimo e que o trabalho da costureira é
excelente, diga-se de passagem.
Percebemos que a costureira consegue realizar a sua tarefa, usando
a matemática, o sistema de medidas, sem dar-se conta plenamente de todo o
processo matemático envolvido em cada uma das suas realizações. Não cabe
a nós, exaltarmos o saber comum como único, porém, nosso ideal nesse
trabalho é refletir sobre as considerações e respeito que devemos ter em nossa
sala de aula alunos com tais saberes, conforme aponta Knijnik (2006, p. 150):
Não se trata, portanto, de glorificar a Matemática popular, celebrando-a em conferências internacionais, como uma preciosidade a ser preservada a qualquer custo. Este tipo de operação não empresta nenhuma ajuda aos grupos subordinados. Enquanto intelectuais, precisamos estar atentos para não pô-la em execução, exclusivamente na busca de ganhos simbólicos no campo científico ao qual pertencemos. No entanto, também não se trata de negar à Matemática popular sua dimensão de autonomia, tão cara às teorias relativistas.
Portanto, percebemos que nos saberes da costureira, que
frequentou pouco a escola, estão saberes relativos à geometria, construção de
modelos, medidas, arredondamento, lucro que precisa obter, custos que
precisam ser elaborados, cálculos enfim, o necessário para realizar a sua
profissão com autonomia e assertividade.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em busca de conhecer como era a construção do conhecimento
matemático de uma costureira, realizamos essa pesquisa que nos permitiu
refletir sobre o valor dos conhecimentos produzidos por diversos grupos sociais
e culturais, entre esses o da profissional da costura.
Demonstrar que se conhece a matemática não é apenas para
aquele que realiza demonstrações, provas e fórmulas e muito menos aquele
que utiliza resoluções com estratégias mecânicas. Também encontramos entre
aqueles que não realizam tais procedimentos saberes matemáticos
interessantes que precisam ser valorizados pelos professores.
Agindo desse modo, o ensino da matemática, é entendido pelo
professor como um instrumento para a compreensão, para a investigação, para
a formação do indivíduo autônomo.
Nas escolas os alunos devem ser estimulados a construir, a
demonstrar seus caminhos, suas produções matemáticas.
Diante do desafio de realizar a confecção de uma peça de roupa a
costureira demonstra que tem domínio de diversos saberes matemáticos de
modo informal. Acreditamos que encontraremos, se pesquisarmos outros
profissionais outros saberes matemáticos tão interessantes e que precisam ser
prestigiados pelos professores de matemática.
A Etnomatemática permite que possamos ver a matemática com
outros olhos, de modo que saiamos de um contexto formal e cheio de regras
pra outro de forma informal e muito mais usual onde se pode ver como pessoas
simples, sem escolarização avançada utilizam a matemática no seu dia a dia
para resolver problemas.
O objetivo do nosso trabalho foi satisfeito uma vez que pudemos
explorar esses aspectos mostrando uma profissão que embora pareça simples,
utiliza de uma matemática não tão complexa, mas presente na elaboração e
desenvolvimento do seu trabalho. Com isso pudemos mostrar que em
diferentes culturas e profissões a matemática sempre esteve presente em
várias formas, sendo ela formal ou não, explícita ou implícita, cabendo a nós,
valorizar essas construções e observá-las com mais atenção.
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Esse trabalho mostrou que a matemática vai além da sala de aula,
onde estamos em um mundo abstrato e passa a ser contextualizada a partir
das profissões e culturas diferentes e é isso que a torna tão rica e por que não
dizer, tão bonita.
A matemática não escolhe quem a possa usar, mas sim a pessoa
que dela faz uso escolhe como irá aplicá-la. A partir disso é onde podemos
constatar que mesmo que uma pessoa nunca tenha ido à escola utiliza da
ciência para resolver problemas do dia a dia o tempo todo.
Ao ver como o trabalho de uma costureira acontece, embora pareça
tão simples, é tão complicado quanto a de um engenheiro, a diferença é que a
costureira utiliza de próprios métodos que aprendeu no decorrer da profissão,
métodos esses que nem ela mesma sabe explicar pelo fato de não conhecer a
matemática formal que lhe deveria ter sido ensinada na escola.
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REFERÊNCIAS
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LÜDKE, Menga; ANDRÉ, Marli E. D. A. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São Paulo: Pedagógica e Universitária, 1986.
POLYA. G. Arte de resolver problemas: um novo aspecto do método matemático. Rio d Janeiro: Interciência, 1995.
SANTALÓ. Luis A. Matemática para não matemáticos, in PARRA, Cecília; SAIZ, Irma. (orgs). Didática da Matemática: Reflexões Psicopedagógicas. Porto Alegre: Artmed, 1996.
VERGARA, Sylvia Constant. Projetos e Relatórios de Pesquisa em Administração.11.ed. Porto Alegre: Atlas, 2009.