reestruturação produtiva e seus impactos

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1 Projeto de Pesquisa A Reestruturação Produtiva no Campo e seus Impactos Marcos Cassin p/ Coordenação de Projetos

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Projeto Guarda Chuva do Grupo de Pesquisas do ICLS

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Page 1: Reestruturação Produtiva e seus Impactos

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Projeto de Pesquisa

A Reestruturação Produtiva no Campo e seus Impactos

Marcos Cassin p/Coordenação de Projetos

Ribeirão PretoFevereiro de 2011

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Introdução

Esta pesquisa tem como objeto de análise o espaço rural em sua

forma específica de organizar o trabalho, seu processo de modernização e

de reestruturação produtiva que corresponde à lógica do capital e suas

contradições.

A preocupação, a partir da definição do objeto de pesquisa, é

buscar analisar, estudar e compreender o campo enquanto elemento de uma

totalidade, em permanentes transformações, com avanços e recuos. Nesse

sentido, a proposta é de uma investigação de caráter mais estrutural e

universal, que aponte para o processo de produção enquanto unidade do

processo de trabalho e das relações de produção e, que tenha o processo de

produção como lócus, na busca de suas conexões, determinações, rupturas

e continuidades na organização do trabalho universal e na sua

particularidade rural.

Nessa linha de conduta, faz-se necessária a recuperação de

alguns referenciais teóricos, como por exemplo, Nicos Poulantzas ao se

referir ao processo de produção:

O processo de produção é pois composto da unidade do processo de trabalho e das relações de produção. Mas, no seio desta unidade, não é o processo de trabalho – incluindo a tecnologia e o processo técnico – que detém o papel principal: são as relações de produção que dominam sempre o processo de trabalho e as forças produtivas, imprimindo-lhes seu traçado e seu modo de proceder. É esta mesma dominação das relações de produção sobre as forças produtivas que dá à sua articulação a forma de um processo de produção e reprodução (Poulantzas, 1978, p. 22).

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Na citação acima, o autor ainda aponta para a distinção entre

processo de produção e processo de trabalho, como também sobre a

determinação das relações de produção sobre o processo de trabalho e a

relação entre processo de produção e tecnologia. Sobre este último ponto, o

autor é mais enfático em outro trecho do mesmo livro, onde argumenta

que:

...o processo de produção não é definido por dados “tecnológicos”, mas pelas relações dos agentes com os meios de trabalho e, assim, entre eles, portanto, pela unidade do processo de trabalho das “forças produtivas” e das relações de produção. Os processos de trabalho e as forças produtivas, inclusive “a tecnologia”, não existem em si, mas sempre na sua relação constitutiva com as relações de produção. Não se pode então falar, em sociedades divididas em classe, de trabalho “produtivo” neutro e em si. É trabalho produtivo, em cada modo de produção dividido em classes, o trabalho que corresponde às relações de produção deste modo, isto é, aquele que dá lugar à forma específica e dominante de exploração. Produção, nestas sociedades, significa ao mesmo tempo, e num mesmo movimento, divisão de classes, exploração e luta de classes (Poulantzas, 1978, p. 21).

A recuperação de Poulantzas e da determinação, em última

instância, das relações de produção, têm aqui como objetivo, relacionar à

discussão “Reestruturação Produtiva no Campo e Relações de Produção

Capitalista”, a organização do trabalho em seu caráter mais particular

(campo) na perspectiva da reorganização do capital e seus impactos na

educação, saúde, organização sindical, movimentos sociais etc., ou seja, o

processo de trabalho no meio rural deve ser entendido de forma integrada

ao desenvolvimento do capitalismo e como síntese de seu processo

histórico.

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No Brasil são encontradas diversas formas de organização e

relações de trabalho no meio rural, desde os grandes proprietários de terras

que compram a força de trabalho dos não proprietários, os operários rurais,

médios e pequenos proprietários, passando ainda pelos meeiros, parceiros,

pequenos proprietários que compram força de trabalho nos períodos de

safra e vendem a sua própria nos períodos de entressafra. Diante dessa

multiplicidade de relações, faz-se necessário procurar entendê-las em sua

singularidade e em sua totalidade, pois trata-se de uma realidade

determinada historicamente pelas relações locais, porém, subordinadas

sempre aos interesses gerais do capital.

A composição desigual na ocupação, nas relações de trabalho, na

propriedade e na distribuição e comercialização dos produtos, também se

manifestam na incorporação de novas tecnologias e formas de organização

do trabalho. Essa incorporação não se dá de forma homogênea, mas

diversificada e, ao mesmo tempo, integrada a determinadas necessidades e

interesses.

Outro problema a ser enfrentado é a definição de urbano e rural,

pois segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que

utiliza as Pesquisas Nacionais por Amostragem Domiciliares (Pnads), tem

as seguintes definições:

Na situação urbana consideram-se as pessoas e os domicílios recenseados nas áreas urbanizadas ou não, correspondentes às cidades (sedes municipais), às vilas (sedes distritais) ou às áreas urbanas isoladas. A situação rural abrange a população e os domicílios recenseados em toda a área situada fora desses limites, inclusive os aglomerados rurais de extensão urbana, os povoados e os núcleos (IBGE, 2007).

O critério domiciliar adotado pelo IBGE para caracterizar o corte

urbano/rural leva José Graziano da Silva a afirmar que, a população rural

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de 21% apontada pelas Pndas, de 1995, poderia ser elevada a 40%, se

utilizado como um dos parâmetros para definir um aglomerado urbano,

municípios com população acima de 20 mil habitantes1.

Tendo como objeto de análise “A Reestruturação Produtiva no

Campo” e tomando as referencias acima, cabe levantar a tese de que a

organização do trabalho rural, a partir de meados da década de oitenta do

século passado, com a mecanização, informatização, utilização de insumos

químicos e biológicos e o aparecimento das agroindústrias, dão uma nova

configuração à realidade rural no Brasil. Segundo ainda o mesmo autor,

essa nova realidade apresenta-se como novo rural composto

Basicamente de quatro grandes subconjuntos, a saber:uma agropecuária moderna, baseada em commodities e intimamente ligada às agroindústrias, que vem sendo chamada de o agribusiness brasileiro;um conjunto de atividades de subsistência que gira em torno da agricultura rudimentar e da criação de pequenos animais, que visa primordialmente manter relativa superpopulação no meio rural e um exército de trabalhadores rurais sem terra, sem emprego fixo, sem qualificação , os “sem-sem” como já os chamamos em outras oportunidades, que foram excluídos pelo mesmo processo de modernização que gerou o nosso agribusiness: um conjunto de atividades não-agrícolas, ligadas à moradia, ao lazer e a várias atividades industriais e de prestação de serviços;um conjunto de “novas” atividades agropecuárias, localizadas em nichos especiais de mercados.O termo “novas” foi colocado entre aspas porque muitas dessas atividades, na verdade, são seculares no país, mas não tinham, até recentemente, importância econômica. Eram atividades de “fundo de quintal”, hobbies pessoais ou pequenos negócios agropecuários intensivos (piscicultura, horticultura, floricultura,

1 O Censo Demográfico de 1991 registrou que 16,6% da população brasileira morava em municípios com menos de 20 mil habitantes.

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fruticultura de mesa, criação de pequenos animais, etc.), que foram se transformando em importantes alternativas de emprego e renda no meio rural nos anos mais recentes. Essas atividades, antes pouco valorizadas e dispersas, passaram a integrar verdadeiras cadeias produtivas, envolvendo, na maioria dos casos, não apenas transformações agroindustriais, mas também serviços pessoais e produtivos relativamente complexos e sofisticados nos ramos da distribuição, comunicações e embalagens. Tal valorização também ocorre com as atividades rurais não-agrícolas derivadas da crescente urbanização do meio rural (moradia, turismo, lazer e prestação de serviços) e com as atividades decorrentes da preservação do meio ambiente (Graziano, 2002, p.ix-x).

Esse novo rural brasileiro, de atividades agropecuárias e

agroindustriais, é também acompanhado de um conjunto de atividades

não-agrícolas e/ou urbanas.

Um novo ator social já desponta nesse novo rural: as famílias pluriativas que combinam atividades agrícolas e não-agrícolas na ocupação de seus membros. A característica fundamental dos membros dessas famílias é que eles não são mais apenas agricultores e/ou pecuaristas: combinam atividades dentro e fora de seu estabelecimento, tanto nos ramos tradicionais urbano-industriais, como lazer, turismo, conservação da natureza, moradia e prestação de serviços pessoais. Em resumo, deixaram de ser trabalhadores agrícolas especializados para se converterem em trabalhadores (empregados ou por conta própria) que combinam formas diversas de ocupação (assalariada ou não) em distintos ramos de atividades (agrícolas e não-agrícolas) (Graziano, 2002, p. x).

Com essa reorganização do espaço rural, a mecanização e a

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informatização, o uso de insumos industrializados, as agroindústrias e um

conjunto de atividades não-agrícolas, mostram, segundo Graziano2, que a

renda obtida dessas atividades, em 1998, já superava a de atividades

agrícolas das famílias rurais. É importante destacar que, essas novas

tecnologias no campo têm diminuído o tempo de trabalho em relação ao

tempo de produção das atividades agrícolas, aumentando o período de não-

trabalho nessas atividades, possibilitando assim, que as famílias rurais

dediquem parte de seu tempo em ocupações não-agrícolas, o que autores

têm chamado de elementos part-time.

Nessa perspectiva que avalia-se necessário pesquisar os impactos

e a nova conformação do rural brasileiro, a partir da reestruturação

produtiva.

Objetivo

O presente projeto tem como objetivo analisar, o significado da

reestruturação produtiva, a partir do final da década de 70 e início da de 80

do século XX, como esta reestruturação produtiva se implementa no início

da década de 90 do mesmo século no Brasil e seus impactos no meio rural

com relação à reorganização do trabalho, saúde, educação, organização

sindical, movimentos sociais e outros.

Justificativa

Este projeto se justifica como contribuição na discussão da

reestruturação produtiva e, em particular, no campo e os vários impactos

sociais, políticos, econômicos e ideológicos dessa reorganização do

trabalho.

2 José Graziano da Silva & Mauro Eduardo Del Grossi, O novo rural brasileiro: atualização para 1992-98. In: www.ie.unicamp.br.

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O projeto também se justifica como mais um elemento que pode

contribuir para os movimentos sociais, sindicatos e nas lutas gerais dos

trabalhadores do campo e da cidade.

Metodologia

A pesquisa em questão será realizada, através de revisão

bibliográfica, análise documental, visitas, entrevistas e todos os meios

possíveis na obtenção de material relativo à temática do projeto.

Esta proposta tem o caráter de “projeto guarda-chuva”, o que implica

na criação de subprojetos e linhas de pesquisas.

Cronograma

Neste primeiro ano, a criação de pelo menos três subgrupos (linhas

de Pesquisas) Saúde, Sindicalismo e Assentamentos.

Na primeira etapa (primeiro semestre), os subgrupos devem escrever

um Projeto de Pesquisa da Linha do subgrupo, realizar levantamento

bibliográfico, leitura, visitas, entrevistas e análise da mesma. Ainda nesse

primeiro esforço, iniciar produção escrita individuais e em grupo, do tema

geral e de sua linha de pesquisa.

A segunda etapa (segundo semestre), dar continuidade das atividades

da primeira etapa, organizar e apresentar o seminário da linha de pesquisa e

produção no mínimo de dois textos, entre 10 e 15 páginas, para o primeiro

“Cadernos de Pesquisas ICLS”.

Bibliografia

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