revista atuação - edição 6 - março de 2013

40
Personalidade Merendeira com orgulho, Dona Cidinha, relata uma vida dedica- da à escola pública. Pág. 20 EDIÇÃO 06 | MARÇO 2013 UMA PUBLICAÇÃO DA FEDERAÇÃO DOS TRABALHADORES EM EDUCAÇÃO DE MATO GROSSO DO SUL REVISTA Aniversário FETEMS completa 34 anos de his- tória, lutas e conquistas. Pág. 10 Pesquisa elaborada para tese de doutorado do professor Marcos Paz abordou aspectos da violência dentro da comunidade escolar. Pág 22

Upload: revista-atuacao

Post on 08-Apr-2016

220 views

Category:

Documents


0 download

DESCRIPTION

Revista Atuação, uma publicação da Federação dos Trabalhadores em Educação de Mato Grosso do Sul (FETEMS). Redação e Produção: Íris Comunicação Integrada; Diretora de Criação: Nanci Silva; Diretor de arte: Ivan Cardeal Nunes; Jornalista responsável e editora: Laura Samudio Chudecki (DRT-MS 242); Revisão: Vanda Escalante (DRT-MS 159); Mário Márcio Cabreira (DRT-MS 109); Colaboraram nesta edição: Vanda Escalante; Carol Alencar; Fotos: Wilson Jr., Elis Regina, Jefferson Ravedutti; Rua Chafica Fatuche Abussafi, 200; Vila Nascente - CEP 79036-112; Campo Grande; Mato Grosso do Sul; Brasil

TRANSCRIPT

Page 1: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

1Revista ATUAÇÃO | Março 2013 |

PersonalidadeMerendeira com orgulho, Dona Cidinha, relata uma vida dedica-da à escola pública. Pág. 20

EDIÇÃO 06 | MARÇO 2013UMA PUBLICAÇÃO DA FEDERAÇÃO DOS TRABALHADORESEM EDUCAÇÃO DE MATO GROSSO DO SUL

R E V I S T A

AniversárioFETEMS completa 34 anos de his-tória, lutas e conquistas. Pág. 10

Pesquisa elaborada para tese de doutorado do professor Marcos Paz abordou aspectos da violência dentro da comunidade escolar.

Pág 22

Page 2: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

2 | Revista ATUAÇÃO | Março 2013

Page 3: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

3Revista ATUAÇÃO | Março 2013 |

Page 4: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

4 | Revista ATUAÇÃO | Março 2013

EXPEDIENTE

Redação e Produção Íris Comunicação IntegradaRua Chafica Fatuche Abusafi, 200Parque dos Poderes - 79036-112Campo Grande/MS+ 55 67 3025.6466

Diretora de criação: Nanci SilvaDiretor de arte: Ivan Cardeal NunesJornalista responsável e editora: Laura Samudio Chudecki (DRT-MS 242)Revisão: Vanda Escalante (DRT-MS 159), Mário Márcio Cabreira (DRT-MS 109)

Colaboraram nesta ediçãoVanda EscalanteCarol Alencar

FotosWilson Jr.Elis ReginaJefferson Ravedutti (SIMTED Ponta Porã)

Os textos assinados são de responsabilidade dos autores e não representam, necessariamente, a opinião da revista.

WWW.FETEMS.ORG.BRRua 26 de Agosto, 2.296, Bairro Amambaí. Campo Grande - MS

CEP 79005-030. Fone: (67) 3382.0036. E-mail: [email protected]

DiretoriaPresidente: Roberto Magno Botareli Cesar Vice-Presidente: Elaine Aparecida Sá CostaSecretária-Geral: Deumeires Batista de Souza Secretária-Adjunta: Maria Ildonei de Lima Pedra Secretário de Finanças: Jaime Teixeira Sec. Adjunto de Finanças: José Remijo Perecin Sec. de Assuntos Jurídicos: Amarildo do Prado Sec. de Formação Sindical: Joaquim Donizete de Matos Sec. de Assuntos Educacionais: Edevagno P. da Silva Sec. dos Funcionários Administrativos: Idalina da Silva Sec. de Comunicação Social: Ademir Cerri Sec. de Administração e Patrimônio: Wilds Ovando Pereira Sec. de Políticas Municipais: Ademar Plácido da Rosa Sec. dos Aposentados e Assuntos Previdenciários: José Felix Filho Sec. de Políticas Sociais: Iara G. Cuellar Sec. dos Especialistas em Educação e Coord. Pedagógica: Sueli Veiga Melo Dep. dos Trabalhadores em Educação em Assent. Rurais: Rodney C. da Silva Ferreira Dep. dos Trabalhadores em Educação Antirracismo: Edson Granato Dep. da Mulher Trabalhadora: Leuslania C. de Matos

Vice-presidentes regionais: Amambai: Humberto Vilhalva; Aquidauana: Francisco Tavares da Câmara; Campo Grande: Paulo César Lima; Corumbá: Raul Nunes Delgado; Coxim: Thereza Cristina Ferreira Pedro; Dourados: Admir Candido da Silva; Fátima do Sul: Manoel Messias Viveiros; Jardim: André Luiz M. de Mattos; Naviraí: Nelfitali Ferreira de Assis; Nova Andradina: Maurício dos Santos; Paranaíba: Sebastião Serafim Garcia; Ponta Porã: Vitória Elfrida Antunes; Três Lagoas: Maria Aparecida Diogo

Delegados de base à CNTE: Jardim: Sandra Luiza da Silva; São Gabriel do Oeste: Marcos Antonio Paz da Silveira; Costa Rica: Rosely Cruz Machado

Conselho Fiscal da FETEMS: Fátima do Sul: Adair Luis Antoniete; Naviraí: José Luis dos Santos; Dourados: Nilson Francisco da Silva; Miranda: Robelsi Pereira

Assessoria de Imprensa da FETEMS: Karina Vilas Boas e Azael Júnior

Page 5: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

5Revista ATUAÇÃO | Março 2013 |

DESTAQUES

Sarobá ..................................................................................................................................................07

Ação cultural leva para as ruas de Campo Grande as diversas expressões da arte regional

Especial Mulher ................................................................................................................................30

Tendências, estilos, comportamentos, sentimentos e aspirações: esses são os elementos que compõem o perfil da mulher moderna

Capa .....................................................................................................................................................22

Pesquisa revela que maioria dos casos de violência na escola está ligada as dificuldade de relações interpessoais

Entrevista ...........................................................................................................................................16

Emmanuel Marinho deixou os grandes centros culturais do país, voltou às origens e se tornou uma referência da cultura sul-mato-grossense

FETEMS .................................................................................................................................................10

Maior entidade sindical do Estado completa 34 anos de história

Page 6: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

6 | Revista ATUAÇÃO | Março 2013

EDITORIAL

Escola é lugar de educaçãoe não de agressão

“A prática da compreensão é vital contra pestilências humanas, como o desprezo e o ódio. Quem compreende isso deixa de odiar”.

Edgar Morin

A sexta edição da Revista Atuação chama os leitores para uma reflexão sobre um tema que afeta a sociedade de um modo geral: a violência. Uma pandemia mundial que adentra nossas vidas, nossas escolas e nossos lares, roubando-nos o direito a uma convivência pacífica.

Quem, nos dias atuais, nunca presenciou ou foi alvo de um ato de violência? Não importa como ela se manifesta – corporal, verbal, emocional –, todos já sentiram, de algum modo, seus efeitos, muitas vezes, devastadores e irreparáveis.

É impossível classificar em qual espaço da sociedade a violência é mais prejudicial. Contudo, podemos afirmar que a violência no ambiente escolar está ganhando contornos de barbárie, com consequências imensuráveis.

Infelizmente, a mídia tem veiculado com frequência casos de violência nas escolas de todo o mundo. Alunos sem limites, pais sem autoridade e uma escola em meio a transformações sociais efêmeras, buscando construir um novo papel, uma nova identidade.

Nós, educadores, inseridos neste contexto, precisamos refletir e agir. Como nos alerta o sociólogo Edgar Morin, é necessário exercitar a compreensão. “Isso deveria começar nas classes infantis, ensinando aos meninos e meninas que brigam entre si, a sair do círculo vicioso no qual a ofensa de um provoca a ofensa no outro”. Também é fundamental e imprescindível investir na cultura da paz, indo além dos muros da escola.

Escola é lugar de educação, e não de agressão. É na escola que aprendemos que somos cidadãos, que temos direitos e deveres. É, também, na escola que devem residir os princípios de respeito, moral e ética. O estudo, aliado à tríade respeito, moral e ética, garante a dignidade e a liberdade do ser humano.

Para combater a violência, também é preciso combater as desigualdades sociais, entre elas, a pobreza. Pobreza gera exclusão, exclusão gera violência.

A reportagem de capa desta edição é uma oportunidade para repensarmos nosso papel enquanto educadores, cidadãos e formadores de opinião. Como diria o eterno Paulo Freire, “se a educação sozinha não pode transformar a sociedade, tampouco sem ela a sociedade muda”.

Boa leitura!

Roberto Magno Botareli CesarPresidente da Federação dos Trabalhadores em Educação de Mato Grosso do Sul

Page 7: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

7Revista ATUAÇÃO | Março 2013 |

CULTURA

7Revista ATUAÇÃO | Março 2013 |

Page 8: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

8 | Revista ATUAÇÃO | Março 2013

Mas o que é Sarobá? É o que a maioria das pes-soas, provavelmente,

deve se perguntar. Se você, tam-bém, quer saber como é o evento de rua que ganhou adeptos e a simpatia dos campo-grandenses, venha com a gente redescobrir ritmos, cores e sabores dos bair-ros e recantos da bela Cidade Morena.

O Sarobá é uma ação cultural de caráter coletivo e espontâneo. Foi idealizado com o objetivo de estreitar as relações huma-nas, criando um espaço onde as pessoas possam contar suas ex-periências de vida, trocar ideias, mostrar talentos, onde possam esquecer seus medos e ser acei-tas, sem preconceito ou discrimi-nação. Pode-se dizer que o Sa-robá começou parecido com um sarau.

Os primeiros encontros do Sa-robá aconteceram num bar, na esquina das ruas da Imprensa e Rui Barbosa, no São Francisco, um dos bairros mais antigos da capital sul-mato-grossense. No São Francisco, o Sarobá ficou por algum tempo, virou um ponto de encontro de amigos e de pessoas que se identificavam com a pro-posta.

Um dia, o bar que servia de teto para as reuniões do Sarobá, fechou. E para onde ir? Sem teto, os idealizadores do Sarobá, que, também, compunham o Teatro Imaginário Maracangalha, deci-diram ganhar as ruas da cidade – unindo poesia, música, dança, teatro, artesanato e todas as for-mas de expressão artístico-cultu-ral. Com isso, o Sarobá se tornou móvel, mutante, uma festa que muda de lugar, mais ou menos assim. Os itinerantes levam cultu-ra, alegria e diversão para bares, praças e pontos históricos da ci-dade.

E esse nome, Sarobá? Bom, o nome foi inspirado na obra do poeta corumbaense Lobivar Ma-tos, publicada no ano de 1936. O

poeta abordava a vida do bair-ro negro da Cidade Branca, vida marcada pela miséria. O popular e o social eram temáticas da lite-ratura do autor.

A proposta do nome foi apre-sentada pelo ator e diretor de te-atro Fernando Cruz, em um con-curso realizado pelo proprietário do bar no São Francisco, Edson José. Na época, o bar também foi batizado de Sarobá.

Agora, as edições do Sarobá acontecem a cada dois meses, e as atividades têm duração de dois dias. O primeiro dia é dedi-cado ao seminário Arena Aberta,

com algumas palestras e alguns debates com a plateia. No segun-do dia, acontece a Festa-Sarau com shows, sarau, teatro, dança, poesia, artes visuais, artesanato, bolicho e escambo.

A primeira edição de 2013 fez menção ao Carnaval e aconteceu no Bar Pingo de Ouro, popular-mente conhecido como Bar da Dona Carmem, também na região do São Francisco.

Com o tema Sambas, Bam-bas e Cateretês (trecho de uma das poesias de Lobivar), o Co-letivo Sarobá deu movimento à rua, à calçada e ao bar. A trupe constituiu um cenário colorido, misturando fantasia e realida-de. Tambores, bumbas e versos prenderam a atenção dos curio-sos transeuntes.

Bar da

Dona Carmem

Aos 76 anos, Dona Carmem vive há 53 no mesmo lugar. Lá, ficou viúva de dois maridos, criou filhos, netos e bisnetos. Dedicou--se dia a dia ao bar e à clientela. O estabelecimento soma 50 anos de tradição e é, até hoje, o sus-tento da família.

A música é a grande paixão de Dona Carmem. Entre os inter-valos de um cliente e outro, um ensaio. Ela no violão e o genro,

Nilton Couto, na sanfona. A dupla fundou o grupo Pingo de Ouro, que apresenta um repertório vol-tado para o sertanejo de raiz ou, como ela mesma diz, música cai-pira. “Nada me deixa triste, nem cliente bebum. Quando alguma coisa está para pegar, eu canto e espanto essas energias”, revela.

Ícones como a pinga com gua-vira (genuinamente pantaneira), o pastel de carne e os tapetes feitos com retalhos, que Dona Carmem customiza, revelaram a contribuição à nossa cultura e fi-zeram parte do cenário da festa. Artistas, produtores, estudantes, amantes da arte e cultura, pen-sadores, poetas e pessoas que apreciam uma boa música forma-ram o público do Sarobá.

Page 9: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

9Revista ATUAÇÃO | Março 2013 |

A primeira edição de 2013 fez menção ao carnaval e aconteceu no Bar Pingo de Ouro, popularmente conheci-do como Bar da Dona Carmem (...) Tambores, bumbas e versos pren-deram a atenção dos curiosos transeuntes.

Page 10: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

10 | Revista ATUAÇÃO | Março 2013

CAPA

10 | Revista ATUAÇÃO | Março 2013

Page 11: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

11Revista ATUAÇÃO | Março 2013 |

FETEMScompleta34 anos delutas econquistasA maior entidade sindical do Centro-Oeste representa mais de 22 mil servidores municipais e estaduais, o que equivale a 45% do fun-cionalismo público de Mato Grosso do Sul

11Revista ATUAÇÃO | Março 2013 |

Page 12: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

12 | Revista ATUAÇÃO | Março 2013

A história da maior enti-dade sindical de Mato Grosso do Sul se con-

funde com a história do próprio Estado. Os tempos eram de mu-dança e desafios e, para a cate-goria da educação, uma grande luta era defender os interesses dos trabalhadores, fazendo fren-te à prática das nomeações e contratações pautadas pela in-fluência política.

Na década de 1980, havia muito a se fazer. A educação era precária em todos os sentidos, não havia condições estrutu-rais, faltavam escolas, não exis-tia concurso público, não havia uma carreira estabelecida. Na pauta de reivindicações, com as questões salariais, sempre este-ve a luta por uma educação de qualidade, bem como pela valo-rização profissional da categoria, tanto professores quanto admi-nistrativos.

A capacidade de organiza-ção foi determinante para con-solidar o movimento e hoje, ao completar 34 anos de funda-ção, a FETEMS já é a maior en-tidade de todo o Centro-Oeste brasileiro: reúne 72 sindicatos municipais filiados, mais de 22 mil trabalhadores na base e re-presenta 45% do funcionalismo

público de Mato Grosso do Sul.Ao longo do tempo e soman-

do avanços, o movimento sin-dical foi passando por grandes transformações. Atualmente, já não exige tanto uma postura de enfrentamento, mas sim, de ma-nutenção das conquistas e reno-vação das bandeiras de luta.

O ano de 2012 foi marco de grandes vitórias para a FETEMS. Em meio a protestos, reivindica-ções, muita luta e persistência, foi possível garantir direitos e efetivar conquistas. Entre elas, a retomada de negociações com o governador André Puccinelli, que resultou na reformulação da Lei Complementar 0087/2000. A legislação unifica a carreira de administrativos e professores, acrescentando oito mil profis-sionais ao Estatuto da Educação Básica, amplia a promoção fun-cional e regulamenta a implan-tação de 1/3 da hora-atividade, a partir de 2014. A unificação da carreira é uma reivindicação que vinha sendo debatida por mais de 20 anos.

Outros pontos conquistados são a política salarial do magis-tério, contemplando a política salarial nacional, a progressão funcional dos administrativos da educação, a realização do con-

curso de remoção do magistério, e a realização do concurso pú-blico para o magistério e para os administrativos da educação, no primeiro semestre de 2013.

A FETEMS comemora os 34 anos de fundação no dia 3 de março de 2013 e reconhece que ainda existe muita luta pela fren-te, mas se pauta nas conquistas obtidas para continuar a batalha pela educação pública de qua-lidade, uma educação que seja mais justa, humana e igualitária.

Page 13: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

13Revista ATUAÇÃO | Março 2013 |

“Nossa entidade nasceu com a criação do Estado de Mato Grosso do Sul. Na época, não tínhamos estrutura alguma. Negociávamos com os professores do interior e da capital, até chegarmos num consenso, de que éramos todos responsáveis pela fun-dação da entidade que nos representaria. Levou um tempo, mas conseguimos. Co-meçamos do zero e na labuta! Lembro-me do primeiro Estatuto do Magistério, que foi elaborado por professores unicamente indicados pela FEPROSUL. Sinto-me feliz e ciente de toda a minha contribuição como primeiro presidente da maior entidade sindical do Estado. Ainda pretendo escrever um livro, contando na íntegra toda essa história”.

Personagens que ajudaram a construir a maior entidade sindi-cal de Mato Grosso do Sul

Eusébio Garcia Barrio Ex-presidente da FETEMS1979 a 1980 e 1981 a 1982

Antônio Carlos BiffiAtual Deputado Federal pelo PT e ex-presidente da FETEMS por três mandatos 1983 a 1984; 1985 a 1986 e 1990 a 1992

Elza Maria JorgeEx-presidente da FETEMS 1987 a 1989

“Ainda éramos Mato Grosso e a FETEMS era um movimento que vinha na esteira da divisão do Estado para Mato Grosso do Sul. Nossa entidade nasce com a criação do Estado. Foi um desafio enorme, porque era um momento propício para mudanças. Foi um período de muita luta, de muito trabalho, porque não havia ninguém com experiência, e nos identificamos para construir o que, atualmente, é de muita valia. Tenho certeza, que todos que atuaram na fundação sentem-se honrados por este legado. Nos dias atuais, a educação pública de Mato Grosso do Sul tem um nível de desenvolvimento, de qualidade e, deve isso à organização sindical, porque os líderes sindicais participaram dos grandes debates nacionais ao longo da história, levaram propostas daqui e trouxeram outras propostas de melhorias para a educa-ção local. Neste período, nós pudemos experimentar avanços que outros Estados ainda não têm; portanto, isso nos torna referência.”

“O período em que estive à frente da FEPROSUL, atual FETEMS, foi um período mui-to difícil para educação pública do Estado. A educação e os trabalhadores estavam desamparados. Constantemente, realizávamos greves, mobilizações e protestos. Lu-távamos pelo pagamento do salário em dia, pela eleição para diretor nas escolas, pela criação do plano de cargos e carreira e pelo Piso Salarial – reivindicações que se transformaram, ao longo dos anos, em direitos garantidos, frutos de muitas lutas e união dos trabalhadores em educação. A FEPROSUL mudou a história do movi-mento sindical sul-mato-grossense. É muito gratificante ver os resultados de uma história que teve início há décadas”.

Depoimentos

13Revista ATUAÇÃO | Março 2013 |

Page 14: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

14 | Revista ATUAÇÃO | Março 2013

“O período em que estive na FETEMS como presidente foi uma época de muita efervescência política em todo o Estado, marcada por total descaso com a so-ciedade sul-mato-grossense, em especial, com o funcionalismo público: salários atrasados, carreiras desrespeitadas, corrupção e total desgovernação. Um caos, o campo, a cidade e os movimentos sociais em pleno fervor de mobilizações e ma-nifestações com muita criatividade e garra para mudar o que precisava ser muda-do. Gostaria de citar o fórum dos servidores do Estado, que teve um papel muito importante: a mobilização dos funcionários para garantir as jornada de seis horas e a luta para receber os salários em dia. Foi uma época de tempos muitos difíceis, mas, também, de garra e mobilizações. Nestes 34 anos, fomos protagonistas dos momentos históricos de nosso Estado e do país. Foi uma honra muito grande fazer parte desta história, sendo presidente da minha entidade profissional, ser protago-nista de um momento histórico com mulheres e homens que seguem defendendo a educação pública e valorização dos seus profissionais... seguimos com nossos sonhos e nossas utopias”. Fátima Aparecida da Silva

Atual secretária de Relações In-ternacionais da CNTE e ex-presi-dente da FETEMS1996 a 1998 e 1999 a 2002

“Acredito que foi um período em que houve várias modificações. Conseguimos trabalhar a liberdade sindical, e as várias correntes tinham vez e voz. Foi também um período um tanto conturbado, por conta de que as correntes majoritárias lu-tavam para que a política se modificasse. Mas, foi de uma evolução muito grande, tanto que hoje, nas eleições da FETEMS forma-se chapa única, o que demonstra que todos aprenderam a conviver”.

Mara Eulália Carrara da SilvaEx-presidente da FETEMS 2002 a 2004

“Lembro-me de que uma de nossas marcas era tentar manter os salários em dia. Tinha época, que o governo pagava em dia, e outras, que em virtude das dificuldades em caixa, efetuava o pagamento por regiões. Outra lembrança é a luta pela eleição de diretor nas escolas. Conquistamos o direito de eleger nossos diretores em 1991. Em determinada situação, eu havia me candidatado a diretor, e nosso grupo foi eleito. Aquela eleição foi minha base para eu chegar à presi-dência da FETEMS – nossa campanha da Federação tinha um lema: 93, três outra vez – que se referia aos três salários mínimos como Piso Salarial para a categoria. Enfrentamos um governo avesso aos educadores, um período difícil. Porém, nos-sa luta não foi em vão. Estamos colhendo o que plantamos. É muito gratificante”!

François de Oliveira Vasconcelos Ex-presidente da FETEMS1993 a 1995

14 | Revista ATUAÇÃO | Março 2013

Page 15: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

15Revista ATUAÇÃO | Março 2013 |

“Eu praticamente vivi essa história da FETEMS nas ruas, no dia a dia, no decorrer da história, tenho um conhecimento amplo do que a FETEMS representa e o que ela significa para a evolução das escolas de Mato Grosso do Sul. Quando a FETEMS ampliou os interesses, passando a atender todos os trabalhadores da educação, foi uma evolução, uma posição de vanguarda. Obtivemos uma plenitude na educação no final dos anos 1990, mas nosso maior desafio, ainda hoje, está na modernização das escolas, na universalização do acesso à Educação Infantil e na luta pelo Plano Nacional de Educação. O movimento sindical está diferente, mais preparado tecni-camente, e estamos bastante ativos.”

Jaime TeixeiraAtual tesoureiro da FETEMSe ex-presidente da entidade2005 a 2008 e 2009 a 2012

Roberto Magno Botareli CesarAtual presidente da FETEMS2012 a 2015

“Ao falar dos 34 anos da FETEMS, confesso que fiquei emocionado. Relembrei vários momentos da minha história no movimento sindical. Já tenho 20 anos de militância, e minha história está entrelaçada à história da FETEMS. Revivi momen-tos ao lado de companheiros como o Biffi, o Jaime, a Fátima e outros que me antecederam e foram de suma importância para que a FETEMS chegasse ao que é hoje. Foram muitas lutas e muitas conquistas – ações que fizeram da FETEMS a maior entidade sindical do Estado, com aproximadamente 25 mil filiados. Tenho certeza que a cada passo dado, a nossa federação se torna mais forte e atuante. Como diria o eterno Paulo Freire, não é no silêncio que os homens se fazem, mas na palavra, no trabalho, na ação-reflexão”.

15Revista ATUAÇÃO | Março 2013 |

Page 16: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

16 | Revista ATUAÇÃO | Março 2013

ENTREVISTA

Vers

atil-

Música, teatro, edu-cação, literatura e artes visuais com-põem o trabalho de Emmanuel Marinho

Page 17: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

17Revista ATUAÇÃO | Março 2013 |

No início dos anos 1990, fui convidado pela Biblioteca Nacio-nal, por meio do programa Nacio-nal de Incentivo à Leitura [Pro-ler], a ministrar oficinas de leitura e palestras em diferentes regiões do país, experiência valiosa de trocas e aprendizagem. Esta vi-vência possibilitou que eu criasse um comitê de leitura em Doura-dos para realizar esses encontros também em minha cidade.

A cada encontro, recebíamos mais de 600 educadores de todo o Mato Grosso do Sul, oferecen-do oficinas, palestras, workshops, minicursos, seminários, lança-mento de livro, assegurando o acesso à cultura para diferentes segmentos da sociedade, por meio desses educadores, multi-plicadores do conhecimento em leitura. Vale ressaltar que signifi-cativos nomes da cultura brasilei-ra e internacional participam des-ses encontros, como Bartolomeu Campos Queirós, Frei Beto, Eze-quiel Theodoro, Bartomeu Meliá, Moacyr Scliar, Francisco Gregó-rio, entre outros.

Revista Atuação – Como você define os projetos desenvolvidos junto à comunidade escolar e aos grupos de terceira idade?

Emmanuel – O acesso à cul-tura deve ser propiciado a todas as classes e grupos sociais. Só a arte salva! Foi uma experiência gratificante ter trabalhado com a terceira idade, levando para este grupo momentos de alegria e de conhecimento. Quanto à co-munidade escolar, é um trabalho contínuo, que desenvolvo desde 1980, essencial por contribuir para uma educação com mais qualidade, voltada para a educa-ção dos sentidos, possibilitando a formação de alunos e educa-dores mais atuantes, criativos e críticos.

Revista Atuação – A crítica social e a defesa dos povos in-dígenas sempre foram marca de seu trabalho e renderam, inclusi-ve, prêmios a suas obras. Como

Aos 56 anos, Emmanuel Marinho é uma referên-cia da cultura sul-mato-

-grossense. Poeta, ator e edu-cador, Emmanuel deixou duas décadas de vivência nos grandes centros culturais brasileiros e re-tornou para suas origens na cida-de de Dourados, onde coordena, desde 1993, oficinas de leitura, mostras culturais, festivais e uma série de atividades que assegu-ram acesso à cultura e melhoram a qualidade da educação.

Revista Atuação – Ao unir poesia, teatro, música e litera-tura, você fez da versatilidade uma das marcas do seu traba-lho, que, também, é instrumen-to de arte-educação. Como você próprio define a arte de Emmanuel Marinho?

Emmanuel – Sou um “brin-cante”, que trabalha na frontei-ra das diferentes linguagens das artes. A minha poesia está mais próxima da música, das artes vi-suais e do teatro do que da lite-ratura propriamente dita, e o te-atro que faço é todo tecido pela poesia. Este é o meu trabalho, um cantador que brinca com as pa-lavras, que canta a sua terra e as cidades que nos habitam.

Revista Atuação – Durante cinco anos, de 2006 a 2011, você foi coordenador de Cultura da Universidade Federal da Gran-de Dourados (UFGD). Qual a sua avaliação sobre esse período? Que resultados você aponta?

Emmanuel – Foi um momento muito importante em minha vida, ali atuava o poeta-educador, um momento inaugural, uma univer-sidade que nascia, tudo para ser criado. Na minha gestão, criamos a sala de exposições, cineauditório, cineclube, Festival Internacional de Teatro, Mostra Sul-Americana de Música, encontros de leitura, oficinas de todas as artes, celebra-ções que aconteciam mensalmen-te, com shows de artistas da casa e de grandes nomes da música po-

pular brasileira. A implantação do curso de Artes Cênicas, que, em 2012, formou sua primeira turma. Tudo foi uma grande conquista.

Ressalto, ainda, o trabalho so-ciocultural com a implantação de vários pontos de leitura; pontos de teatro; o resgate da tecela-gem indígena; ponto de hip-hop na aldeia indígena, que revelou o grupo de rap indígena Brô Mc’s e tantos outros projetos que fi-zeram a diferença em Dourados, contribuindo, sobremaneira, com o desenvolvimento cultural da ci-dade.

Revista Atuação – Entre os diversos projetos que desenvol-veu e coordenou, estão várias atividades de incentivo à leitura em Dourados. Que tipo de trans-formações projetos como os en-contros de leitura e as oficinas de contação de história são capazes de provocar?

Emmanuel – A leitura é uma ferramenta poderosa para se ler o mundo, instrumento fundamen-tal na construção de uma educa-ção de qualidade, possibilita no-vos olhares sobre o mundo e para o exercício pleno da cidadania.

“Como artis-ta, sou um an-dante, recebo convites de va-rios lugares e, assim, vou con-tando historia e cantando minha ter-ra por este mundo”

-

-

-

Page 18: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

18 | Revista ATUAÇÃO | Março 2013

você define sua ligação com essa temática?

Emmanuel – É uma forma do artista mostrar sua indignação com esses cenários que a civili-zação nos apresenta, dar voz aos oprimidos e denunciar os opres-sores através da arte.

Revista Atuação – Diferente de outros artistas, mesmo com trabalho e trajetória reconhe-cidos e fartamente premiados, você continua vivendo e traba-lhando em Dourados. Por que essa opção?

Emmanuel – Durante 20 anos, morei em São Paulo e Rio de Ja-neiro; em 1993, voltei para Dou-rados, que sempre foi meu porto seguro, para ficar mais próximo da família e dos amigos daqui. Quanto ao trabalho, continuo atuando em outros lugares, as-sim como em minha cidade. Como artista, sou um andante, recebo convites de vários luga-res e assim vou contando história e cantando minha terra por este mundo.

Revista Atuação – Pela sua vi-vência junto às comunidades es-colares, é possível fazer uma ava-liação da educação brasileira?

Emmanuel – Sim, precisamos de uma escola que trabalhe ques-tões ligadas à educação do olhar e dos sentidos, uma educação voltada para as humanidades, que incentive diferentes leituras

do mundo, o contato com a na-tureza e com a arte. Precisamos de muita arte nas escolas, pro-fessores que sejam educadores e criadores, que levem o conheci-mento de forma lúdica, com ale-gria e encantamento para a sala de aula. Uma escola que contri-bua para a sensibilidade, forman-do cidadãos críticos, criativos e atuantes, fazendo da sala de aula um ambiente propício para a ge-ração de ideias e de práticas cul-turais.

Os educadores que atuam hoje, na educação brasileira, são frutos do que aconteceu nos anos de 1960 e 1970, quando eram alunos, no projeto MEC/USAID, implantado em nosso país pelo governo americano, em parceria com a ditadura mili-tar brasileira. Reformularam uma educação que era voltada para as humanidades, para uma edu-cação tecnicista, dirigida para fa-vorecer as grandes corporações internacionais, nacionais, o capi-tal e o consumo. Paisagem que a gente assiste todos os dias, nos mais diversos meios de comuni-cação do país. Precisamos estar sempre atentos a nossa história, a nossa memória e desvendar esses e outros acontecimentos que maculam a educação no Bra-sil. Só assim, poderemos criar no-vos caminhos e novas perspecti-vas de transformações efetivas e afetivas na educação brasileira.

“O acesso a cultura deve ser propicia-do a todas as classes e gru-pos sociais. So a arte salva!”

“Precisamos de uma escola que trabalhe questoes liga-das a educacao do olhar e dos sentidos”

-

---

-

-

Page 19: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

19Revista ATUAÇÃO | Março 2013 |

Dicas para uma boa leitura

O livro conduz o leitor a questões fundamentais para a Educação no século XXI. Ao longo das páginas, constata-se que o Brasil é grande, mas os desafios e as inquietações dos nossos profissionais são comuns.

Para começar, a autora apresenta um breve histórico das correntes pedagógicas, organizadas dentro de três grandes teorias: a liberal, a pro-gressista e a evolucionária. Em cada uma delas, dados sobre seus pen-sadores, o papel a que a escola se propõe, os conteúdos abordados, o método utilizado, a relação estabelecida entre o professor e os alunos, a concepção de aprendizagem e os principais seguidores.

A função da escola no processo de inclusão de tantos excluídos (ne-gros, mulheres e homossexuais, entre outros) é colocada de forma clara e objetiva e acrescida das políticas públicas vigentes no país acerca do tema. Já o vínculo entre a intolerância e a violência é abordado por meio de pesquisas feitas em escolas de todo o Brasil. No conjunto, o livro de-monstra a fragilidade das relações estabelecidas na escola, onde tudo se entrelaça: a exclusão gera a violência, que causa dificuldades de aprendi-zagem e resulta em frustração, afetando, assim, a carreira docente.

A Inteligência Emocional é um dos aspectos mais importante de uma pessoa. Possuir inteligência emocional promove as relações com os de-mais e consigo mesmo, melhora a aprendizagem, facilita a resolução de problemas e favorece o bem-estar pessoal e social.

Nesta obra, são trabalhados cinco blocos de competências emocionais, um bloco por capítulo: consciência emocional, adequação emocional, au-tonomia emocional, habilidades socioemocionais e habilidades para a vida e o bem-estar emocional.

Em cada capítulo, um grande número de atividades e exercícios é pro-posto para ajudar os educadores a desenvolver a inteligência emocional das crianças.

Adquirir e ensinar inteligência emocional não são tarefas fáceis. É ne-cessário treinamento e muita prática. Por isso, a obra é uma ferramenta fundamental para os educadores e pais, que encontrarão nela exemplos de como abordar e avançar esse tema nas crianças entre 8 e 12 anos.

Inquietaçõese desafios na escolaPriscila Pereira Boy148 páginas Editora Wak

Atividades para odesenvolvimento da inteligência emocional nas criançasTextos GropIlustrações Ana Zurita192 páginasEditora Ciranda Cultural

Fonte: Site Nova Escola; autor da Resenha: AIRTON CARDOSO, mestre em Ciência da Educação e consultor educacional

Fonte: http://www.magiadaleitura.com.br

19Revista ATUAÇÃO | Março 2013 |

Page 20: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

20 | Revista ATUAÇÃO | Março 2013

PERSONALIDADE

A felicidade sempre este-ve presente no ritmo de vida de Maria Apareci-

da da Costa Souza, a dona Cidi-nha. Aos 48 anos, ela não mede esforços para fazer sempre o melhor para atender as pessoas, principalmente as crianças da es-cola onde trabalha. Dona Cidinha é merendeira, “com muito orgu-lho”, e, desde a hora que levanta, às 4h45 da manhã, está disposta a servir. “A cozinha é uma peça importante na minha vida; faço na cozinha da escola o que eu faria em casa, porque o amor é tudo na arte de cozinhar, e é com amor que vivo”, exclama dona Ci-dinha. Atualmente, ela atende 325 alunos, no período da manhã, na Escola Estadual Elvira Mathias de Oliveira, no bairro Santo Eugênio, em Campo Grande.

Nascida na área rural de Campo Grande, dona Cidinha conta que sempre teve o sonho de trabalhar dentro de uma escola. Ela come-çou na faxina e, desde então, sen-tia-se privilegiada em estar onde sempre quis estar. Depois que prestou concurso público para o administrativo escolar, ela ficou na espera durante quatro anos, até ingressar de vez na cozinha e se tornar a merendeira mais co-nhecida do bairro. “Não gosto de me gabar, mas até as mães de alu-nos me falam que sentem o cheiro da minha comida do lado de fora da escola, isso é demais de gratifi-cante”, conta. E o reconhecimento entre a comunidade também a faz feliz. “Até conselhos para alunos e mães eu dou, porque acho que, se estou ali, é para ajudar. E a gente, que fica o tempo todo na escola, passa a fazer parte da família dos alunos”, avalia.

Casada há mais de 30 anos, Cidinha teve apenas uma filha e tem uma paixão imensurável pe-los três netos, Talisson (10), Renan (7) e Juan (3), que estudam na mesma escola em que ela traba-lha. “Eles são minha alegria... mas se tiver que corrigir, eu corrijo. E,

quando eles estão na escola, con-sigo separar bem, porque o trata-mento é igual a todos os outros alunos”, diz.

Cardápio

Para dona Cidinha, o segredo para cozinhar com amor está as-sociado à maneira de preparar as coisas na cozinha. A merendeira explica que o cardápio é definido com antecedência e, de acordo com ela, a preferência das crian-ças serve de inspiração.

“Como já fica definido o car-dápio da semana, a gente sempre chega inspirada para cozinhar. O que as crianças mais gostam é do arroz carreteiro”, conta.

Entre as outras receitas servi-das nas cumbucas dos pequenos, também fazem sucesso a macar-ronada com molho vermelho, as saladas, o arroz com calabresa ou linguiça e, esporadicamente, al-gum prato com sardinha.

Educação

Ativa em movimentos relacio-nados aos trabalhadores da edu-cação, dona Cidinha é presença assídua no movimento sindical de Campo Grande e leva consigo todas as experiências adquiridas

“Na minha época, a gente tinha ver-gonha de o pro-fessor chamar a atenção na frente de todo mundo”

DonaCidinhaorgulhode ser me-rendeira e amor à arte de cozinhar

..

20 | Revista ATUAÇÃO | Março 2013

Page 21: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

21Revista ATUAÇÃO | Março 2013 |

nos 20 anos dentro da escola. “Eu sempre participo dos congressos promovidos pela FETEMS, porque acho importante estar a par desta evolução. A sociedade fica melhor se todos se envolverem e harmo-nizarem com o ambiente de tra-balho e para o próximo”, conta a merendeira, que já esteve em Co-xim/MS, Jardim/MS, Três Lagoas/MS e Brasília/DF, aprendendo e partilhando experiências com re-presentantes dos administrativos da educação pública.

Sobre o ensino dos dias de hoje, dona Cidinha enfatiza: “Na minha época, a gente tinha ver-gonha de o professor chamar a atenção na frente de todo mundo. Hoje em dia, a criançada desafia o professor. Acredito que boas ati-tudes têm que começar em casa, com o respeito ao próximo e aos pais; a base deve vir de casa e ser estendida à escola”.

Dona Cidinha considera, ainda, que muito desse “descaso” vem dos pais, que “deixam as crian-ças na escola e não participam da educação dos filhos”.

“Vejo muitas mães que lar-gam a criança na escola e não se empenham para a criação e até mesmo para o futuro do filho e, depois, vem culpar a escola por conta da personalidade que o fi-lho tem. Isso sim é errado, e se você não souber dialogar, ele se torna alvo das maledicências que há no mundo”, conclui.

“A gente, que fica o tempo todo na escola, passa a fa-zer parte da famí-lia dos alunos”

Page 22: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

22 | Revista ATUAÇÃO | Março 2013

CAPA

Pesquisa mostra a realidade cotidiana e aponta caminhos para repensar a convivência no espaço escolar

22 | Revista ATUAÇÃO | Março 2013

Page 23: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

23Revista ATUAÇÃO | Março 2013 | 23Revista ATUAÇÃO | Março 2013 |

Page 24: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

24 | Revista ATUAÇÃO | Março 2013

Quando se fala em vio-lência na escola, qual a primeira imagem que

vem à cabeça? Vandalismo? De-predação do patrimônio? Agres-sões físicas? Franco-atiradores fazendo vítimas na pré-escola? Ou a morte do diretor de escola em Nova Andradina no ano pas-sado?

Ainda é recente na memória, a tragédia de Realengo, no Rio de Janeiro, em 2011, quando um ex-aluno, de 23 anos, invadiu a escola e matou a tiros 12 crianças, ferindo outras dez. Em dezembro passado, em Newport, Connecti-cut (EUA), 20 crianças e seis adul-tos foram mortos por um atirador de apenas 20 anos.

Mas qual ou quais motivos le-vam crianças e jovens a comete-rem atos de violência em um am-biente onde o respeito, a amizade, a educação e a disciplina deve-riam prevalecer?

A pesquisa desenvolvida pelo professor Marcos Paz para sua tese de doutorado em Educação abordou o assunto. “Buscamos identificar o que de fato é essa vio-lência, como se dá, de que forma é encarada, enfrentada ou incorpo-rada no cotidiano escolar, com o objetivo de promover o enfrenta-mento da questão. Não queremos dar uma receita pronta, mas esse diagnóstico é necessário no senti-do de apontar caminhos”, explica.

Professor da rede pública es-tadual em São Gabriel do Oeste, desde 2000, Marcos Paz já havia trabalhado tema relacionado à disciplina dentro da escola quan-do fez mestrado em Educação, na Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS), em 2005. Agora, para o doutorado, ainda pela UFMS, escolheu o tema “Vio-lências na Escola”. Como é tam-bém representante sindical, ob-teve a parceria da FETEMS para realizar a pesquisa e optou pelo tratamento dos dados a partir da visão dos trabalhadores em edu-cação.

De acordo com o professor, a maioria dos casos registrados nas escolas está ligada a dificul-dades nas relações interpessoais (de professor com aluno, aluno com aluno, aluno com funcioná-rio, com a comunidade de forma geral) e com a própria rotina es-colar.

“Repete-se muito o jargão de que o pai tem que estar presente na vida escolar do filho, mas não é tão simples assim. O cotidiano escolar é que está desconectado da comunidade, não há uma vi-vência da comunidade com a ro-tina escolar, e isso foi identifica-do como causa das situações de violência. Ficou muito claro que o fundamental é a questão do con-vívio, da harmonia e da convivên-cia no espaço escolar”, considera.

Além disso, o professor assi-nala que é preciso haver “um ob-jetivo na educação”. “O projeto pedagógico da escola tem que ter uma ligação com a realidade do aluno, porque a educação não é uma coisa mecânica. Se a gente não avançar nessa integração no ambiente escolar, pode encher de computador, pode encher de estrutura material, que não vai suprir a necessidade, que é o que acaba gerando a situação de vio-lência. A ação educacional den-tro do espaço escolar precisa ter sentido, não só para o trabalha-dor, mas também para o aluno. O aluno tem que estar sabendo o que ele está fazendo no espaço escolar, para quê está ali, por que é importante ele passar por esse processo de educação formal que a escola dá. Quando isso per-de o sentido, o aluno questiona o que é que ele está fazendo ali, e, aí, começam os conflitos, xinga-mentos e agressões”, afirma.

Pesquisa

A pesquisa do professor Mar-cos Paz, iniciada em 2009, teve a participação de outras entidades e foi desenvolvida sob a orien-

tação e supervisão do professor doutor Antônio Osório, da linha de pesquisa em Educação e Tra-balho, da UFMS, que elaborou também o instrumento de coleta de dados (questionário) aplicado pelo Projeto Tosco (veja matéria a seguir) nas escolas estaduais.

Universo

Os dados da pesquisa em par-ceria com a FETEMS foram cole-tados durante o último Congres-so Estadual dos Trabalhadores em Educação, realizado em 2011, na cidade de Jardim. Dos 995 de-legados participantes do evento, que representavam sindicatos de 71 municípios, de todas as regi-ões do Estado, 891 responderam o questionário.

Desse total, 78% são do sexo feminino, e 65% têm idade entre 41 e 50 anos; sendo que 74% têm vínculo com escolas da rede es-tadual; cerca de 90% delas loca-lizadas na zona urbana (53% nos bairros e 35% no centro).

Entre os pesquisados que atu-am no magistério, 62% estão no ensino Fundamental e 26% no ensino Médio. Entre os adminis-trativos, 40% estão em cargos na secretaria ou na coordenação escolar.

Professor Marcos Paz

Page 25: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

25Revista ATUAÇÃO | Março 2013 |

Característica da violência76% dos entrevistados afirmaram haver ocorrências deviolência nas escolas onde atuam75% das ocorrências acontecem entre os alunos20% das ocorrências acontecem entre alunos e professores15% das ocorrências acontecem entre alunos e familiares

Horário das ocorrências36% dos entrevistados disseram que as ocorrências acontecemem qualquer período22% dos entrevistados disseram que as ocorrências acontecemno período matutino 27% dos entrevistados disseram que as ocorrências acontecemno período vespertino 47% das ocorrências acontecem na saída escola43% das ocorrências acontecem na hora do intervalo/recreio

Idade dos agressores 87% dos casos envolvem alunos entre 11 e 16 anos

Tipo de violência80% desrespeito aos colegas 58% xingamento e agressões verbais54% agressões físicas52% desrespeito ao professor50% constrangimento pessoal(apelidos e comentários negativos sobre o físico do aluno)27% danificação do patrimônio escolar

Bullying, drogas e agressão53% dos entrevistados convivem com alunos que são alvo de bullying47% dos entrevistados convivem com alunos que praticam bullying41% dos entrevistados têm conhecimento de alunos que usam drogas lícitas(cigarro e álcool)35% dos entrevistados têm conhecimento de alunos que usam drogas ilícitas(maconha, cocaína, cola e crack)39% dos entrevistados têm conhecimento de alunos que feriram aintegridade física do colega

Causa da violência50% dos entrevistados responderam que a família desagregada e/oudesestruturada é uma das principais causas que levam os alunos a atos de violência24% família ausente no ambiente escolar18% falta de limites e/ou respeito às pessoas13% excesso de liberdade e ociosidade dos jovens

Resultados dos dados coletados durante o Congresso Estadual dosTrabalhadores em Educação, em 2011.Pesquisa “Violências na Escola” - Professor Marcos Paz

891 trabalhadores em educação responderam o questionário da pesquisa

Page 26: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

26 | Revista ATUAÇÃO | Março 2013

Medidas

Sobre quais instrumentos a escola utiliza para resolver as ocorrências de violência, 65% das respostas indica-ram que a escola tem ficha de ocorrência e o envolvido é chamado para resolver o problema; 59% responderam que, quando há reincidência, a família é convocada a to-mar providências com rigor; e 54% responderam que a ocorrência é encaminhada ao

Em 2012, a Secretaria de Estado da Educação de Mato Grosso do Sul implantou nas escolas públicas estaduais o Projeto Tosco em Ação, desen-volvido pela Editora Alvorada. O projeto consiste na capaci-tação dos professores, na apli-cação de uma pesquisa e no trabalho em sala com um livro – intitulado Tosco – que conta a história de um menino acos-tumado à violência e que, com a ajuda de um professor, conse-gue superar a situação e mudar

Marcos Paz já foi diretor de escola, presidente do SIMTED por dois mandatos, vice-presidente regional da FETEMS, delegado de Base da FETEMS na CNTE, e exerce o terceiro mandato consecutivo como vereador pelo PT, sendo atualmente o Presi-dente da Câmara Municipal de São Gabriel do Oeste.

o curso de sua história. Na fase de pesquisa, em todo o Estado, foram entrevistadas aproxima-damente 45 mil pessoas, entre alunos e professores das esco-las públicas estaduais.

Entre os resultados obtidos, ficou demonstrado que 67% dos alunos haviam apresentado comportamento agressivo nos seis meses anteriores à pesqui-sa, e que 74,63% das manifes-tações de agressividade se dão por meio de provocações ver-bais. Entre os professores en-trevistados, 82% afirmaram já ter presenciado agressões físi-cas, verbais ou psicológicas no

ambiente escolar, e 55,54% dis-seram que as agressões acon-tecem no mínimo uma vez na semana.

Embora componham uma amostragem significativa, os números não conseguem tra-duzir a complexidade cada vez maior das relações de crianças e adolescentes com pais e pro-fessores. E em meio a pesqui-sas – embora poucas –, análises, relatos e troca de experiências, uma constatação é frequente e comum: o grande problema é a falta de limites. Mas, onde está a raiz do problema?

O promotor da Infância e Ju-

Sem limites

conselho tutelar. O preenchimento de formulá-

rio específico para registro dos casos de violência foi citado em 22% das respostas, seguido por 20% em que a ocorrência é re-gistrada na delegacia de polícia e 18% de que as ocorrências são encaminhadas à promotoria pú-blica.

Acionar a polícia, também, aparece como ação corriqueira no ambiente escolar: 61% afir-maram que a escola já acionou a polícia para resolver questão de aluno que praticou violência. Entre esses, 51% afirmaram que a polícia é acionada às vezes, e 33% responderam que a polícia é acionada diversas vezes.

Soluções e consequências

Quanto à ação mais eficien-te para o enfrentamento da vio-lência escolar, a alternativa mais abordada foi a de trazer a família para uma maior participação na escola e na vida escolar, resposta presente em 31% dos formulários; seguida de maior sensibilização e conscientização de alunos e pais,

com 23%; promoção do diálogo/conversas na comunidade esco-lar com 23%; estabelecimento de disciplina e limites aos alunos cumprindo leis e regras escolares e penalizando os infratores obte-ve 18% de respostas; promoção de palestras, projetos e cursos de combate à violência escolar 16% e conscientização e união da comu-nidade escolar para esse enfren-tamento 13% das respostas.

Finalmente, na questão sobre a violência escolar ter ou não re-lação com casos de problemas de saúde do trabalhador em Edu-cação, 30% afirmaram que não existe relação da violência com a saúde do trabalhador e 25% não responderam. Dos formulários que afirmaram que sim à ques-tão, 39% citaram o estresse como consequência do acometimento da saúde; 34% a depressão, se-guido de doenças e desgaste com alterações psicológicas em 22% das respostas; 14% com doenças e desgaste com alterações físicas; síndrome do pânico com 10%; e sentimento de apatia, impotência ou sensação de impunidade em 6% das respostas.

Page 27: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

27Revista ATUAÇÃO | Março 2013 |

ventude, Sérgio Fernando Har-fouche, defende que se faça, de forma “emergencial”, um “res-gate à autoridade”. “O respei-to dentro da sala de aula só vai ser concretizado quando essa autoridade do professor voltar a valer. Hoje alunos humilham zelador, desrespeitam o pro-fessor e até o diretor. É preciso disciplinar o aluno – sujou, tem que limpar; quebrou, conserte; destratou, retrate-se”, diz.

Nesse sentido, desde 2009, o promotor desenvolve um projeto junto a diretores e pro-fessores da rede pública, cen-trado, justamente, na aplicação de medidas disciplinares. Ape-sar de ter sido divulgado que esse trabalho já teria reduzido em 60% os casos de violência nas escolas, a iniciativa não re-cebe apenas elogios, mas tam-bém tem críticas e questiona-mentos.

“Afinal, não se pode judi-cializar a educação”, resume o professor Marcos Paz, que tem pesquisa recente sobre o tema. “A escola não está con-seguindo resolver essa questão e está chamando um suporte de fora, que, num primeiro mo-mento, talvez, dê a sensação de que está solucionando, mas nós estamos é tirando da rotina escolar a capacidade de ten-tar mudar a realidade. A gente está transferindo esse enfren-tamento para outra instituição, que, no caso, é a Promotoria”, completa.

A psicóloga Gleice Taciana Barbosa, que há cerca de 10 anos atende internos da Unei Dom Bosco, em Campo Grande, avalia, ainda, que é preciso res-tabelecer a ordem dos valores, sobretudo dentro da família. A psicóloga explica que os alunos que apresentam comportamen-to agressivo ou violento dentro da escola, geralmente, estão repetindo padrões: “Por exem-plo, a diretora chama a mãe por

conta de um infração cometida pelo aluno, e ela chega e espan-ca o filho na frente da diretora ou da professora, e o humilha. Isso faz parte da vivência dele e, por isso, ele vai agir da mes-ma forma. Se ele apanha, ele vai bater. A agressividade é um aspecto do ser humano, todos têm, e isso deve ser trabalha-do”.

Gleice também aponta a falta de limites como uma das marcas dessa geração que des-conhece a autoridade e vive sob um regime de inversão de valores. “Vivemos numa socie-dade de consumo, onde o im-portante é ter. Ora, se os pais estão ocupados trabalhando e ficam ausentes a maior parte do tempo, acabam dando tudo para os filhos, como uma for-ma de compensar essa ausên-cia. E, então, a criança aprende que ela tem que ter tudo que ela quer, não importa como. Ao mesmo tempo, e também por esse distanciamento imposto pelo ritmo de vida, os pais aca-bam transferindo para a esco-la uma responsabilidade que é deles, pais. A escola não é a responsável pela educação da criança, mas sim, pelo ensino, pela instrução formal”.

O promotor Harfouche, tam-bém, compartilha dessa avalia-ção. “Os pais estão transferindo a responsabilidade para o pro-fessor, e não é por aí. Pela lei, os pais têm total responsabili-dade pela formação do filho e podem, inclusive, ser punidos por abandono intelectual”, co-menta.

De modo geral, a falta de li-mites, a desestruturação fami-liar, o contexto de violência e agressividade, a falta de orien-tação e a ausência dos pais são fatores que compõem o cenário cotidiano da maioria dos alunos que acabam se envolvendo nos episódios de violência dentro da escola, sobretudo nas es-colas públicas. “São crianças e adolescentes que não têm a menor consciência ou o menor discernimento do que é certo ou errado, porque não apren-deram isso. Eles, simplesmen-te, fazem o que querem, o que têm vontade, e não sabem que é errado o que estão fazendo”, relata a psicóloga Gleice.

E esse “fazer o que quer” engloba situações das mais di-versas, que vão desde a provo-cação verbal a colegas e pro-fessores, até aos extremos da agressão física.

Promotor Sérgio Harfouche

“O respeito dentro da sala de aula só vai ser concretizado quando essa auto-ridade do professor voltar a valer”

Page 28: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

28 | Revista ATUAÇÃO | Março 2013

Em junho de 2012, o diretor da Escola Municipal Luiz Cláu-dio Josué, uma extensão da Es-cola Estadual Luiz Carlos Sam-paio, no distrito de Nova Casa Verde, em Nova Andradina, foi morto a tiros na hora da saí-da da escola, por um aluno de 16 anos, que sequer sabia seu nome. Delmiro Salvione Bonin tinha 55 anos e fazia quatro meses que havia assumido a di-reção.

O aluno, por sua vez, cole-ciona um histórico de proble-mas e violência, tanto na vida escolar quanto na familiar. Segundo noticiário da época, o pai, acusado de homicídio, era foragido da Justiça; a irmã mais velha cumpria pena pelo assassinato de uma mulher; e, em março de 2012, ele próprio chegou a ser expulso da esco-la, por ter ferido a facadas um colega de 15 anos. Em sua ficha de ocorrências constam brigas dentro e fora da escola, desde o ano de 2010.

A expulsão do adolescen-te teria sido revertida por uma medida cautelar da Promotoria.

De volta à escola, ficou definido que ele trocaria de turno, pas-sando a frequentar as aulas no período da tarde. Mas o rapaz, segundo ele próprio contou à polícia, estava contrariado por-que o diretor o obrigava a entrar na aula em horário diferente, 20 minutos depois do restante da turma, que entrava às 11h40. Ele contou ainda ao delegado que estava muito zangado pelo fato de o diretor “pegar no pé” dele, “encher o saco” constantemen-te, e ter dito que ele “não tinha-mais jeito”.

A arma utilizada no crime foi comprada duas semanas antes, por R$ 500. Depois de atirar no diretor, o adolescente pas-sou quatro dias escondido no mato, para fugir do flagrante. Contou à polícia que escolheu antecipadamente o local do es-conderijo e já havia deixado lá uma garrafa pet com água para beber. Disse que à noite dormia em cima de uma árvore e que, na fuga, perdeu a arma. Da de-legacia de Nova Andradina, foi transferido para a Unei de Dou-rados, onde permanece inter-nado.

Para o presidente do Simted de Nova Andradina, professor

Edson Granato, esse episódio trágico foi o extremo de uma si-tuação que denuncia a falta de articulação entre as instituições. “Quando a escola contatava o conselho tutelar, a Promotoria ou a própria família, não obti-nha retorno. Ficou evidente que é preciso trabalhar em parceria para enfrentar esse tipo de situ-ação. Houve diversas reuniões, fizemos um planejamento para um trabalho em conjunto, en-volvendo escola, família e auto-ridades. Então, vamos ver este ano se conseguimos bons resul-tados”, diz o diretor.

Experiências negativas que geram situações positivas

Campo Grande, também, registrou no ano passado um caso emblemático, pela extre-ma violência, numa escola esta-dual. No dia 13 de abril de 2012, um professor de Física, de 29 anos, foi esfaqueado e o diretor da escola foi ameaçado com a faca encostada no pescoço por um adolescente de 17 anos, alu-no do 1º ao do ensino Médio, no período noturno. Foi na Escola Estadual José Barbosa Rodri-gues, no bairro Universitária II,

Violência extrema

Psicóloga Gleice Barbosa

“Eles, simples-mente, fazem o que querem, o que têm von-tade, e não sa-bem que éerrado o que estão fazendo”

Page 29: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

29Revista ATUAÇÃO | Março 2013 |

Professor Edson Granato, presiden-te do SIMTED de Nova Andradina

Professor Edvaldo Lourenço, dire-tor da Escola Estadual José Barbosa Rodrigues

“Ficou eviden-te que é preci-so trabalhar em parceria para enfrentar esse tipo de situação (…) Vamos ver se este ano con-seguimos bons resultados”

“Cabe à família acompanhar e ensinar valores positivos(...) É preciso traba-lhar o resgate dos valores fa-miliares e so-cioculturais”

região Sul de Campo Grande.Segundo o noticiário, o jo-

vem conversava com uma ado-lescente fora da sala de aula, quando o professor pediu para que a aluna entrasse. Teria co-meçado aí uma discussão, e foi quando o rapaz tirou uma faca da mochila. O professor foi fe-rido com duas facadas, uma nas costas e outra no braço, foi levado para o hospital e levou sete pontos no total.

Ao fugir, o garoto se depa-rou com o diretor da escola no portão, e o teria ameaçado en-tão. Dali, o garoto correu para casa, onde foi apreendido pela Polícia Militar.

O adolescente não tinha his-tórico de indisciplina na escola, nem registro de infrações na polícia. Os pais, também, mos-traram-se surpresos com a ati-tude do rapaz, que foi levado para a Delegacia Especializada de Atendimento à Infância e Ju-ventude (Deaij), para responder por ato infracional análogo à le-são corporal dolosa e ameaça. Na delegacia, disse que estava de “cabeça quente”.

O professor ferido ficou afastado do trabalho por uma semana. Ao final da licença, desligou-se da escola por pres-são familiar. “Foi uma pena, porque ele era muito querido pelos alunos”, comenta o dire-tor da escola, Edvaldo Louren-ço da Silva.

O diretor afirma que, na es-cola, não há histórico de violên-cia entre alunos, ou entre alu-nos e professores, e que esse foi um episódio isolado, extre-mo, que acabou modificando a rotina e aproximando mais as famílias da escola. “O clima fi-cou bastante tenso, todos fica-mos assustados. Eu, por exem-plo, passei vários meses vindo trabalhar nos três turnos, por-que nossa presença na escola dá uma sensação de mais segu-rança aos alunos e aos pais. Os pais também se aproximaram mais, passaram a trazer e bus-car os filhos. Então, de um fato negativo, acabaram surgindo várias situações positivas. E, no geral, a comunidade, aqui, é bastante parceira”, avalia.

“Os jovens de hoje estão per-

dendo os valores, que têm que ser passados pela família. Cabe à família acompanhar e ensi-nar valores positivos, mostrar o que é negativo e que as coisas negativas têm consequências. É preciso trabalhar o resgate dos valores familiares e socio-culturais”, conclui o diretor.

Page 30: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

30 | Revista ATUAÇÃO | Março 2013

ESPECIAL MULHER

30 | Revista ATUAÇÃO | Março 2013

Page 31: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

31Revista ATUAÇÃO | Março 2013 |

Page 32: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

32 | Revista ATUAÇÃO | Março 2013

Discutir “o papel da mu-lher”, ou “o comportamento feminino” na atualidade, é abrir um campo de infinitas possibilidades e particulari-dades

Ao separar o coito da concepção, a pílula de-flagrou um dos mais

monumentais movimentos dos tempos recentes, o gradual di-vórcio entre sexo e reprodução”. A frase foi dita pelo químico Carl Djerassi, austríaco radicado nos Estados Unidos, que, em 1951, in-tegrava o grupo de responsáveis pela primeira síntese de um con-traceptivo oral.

A criação da pílula anticon-cepcional marcou a conquista da mulher ao pleno direito sobre o próprio corpo, a possibilidade da escolha de procriar ou não. Pra-zer e concepção passaram a ser situações distintas.

O marco da liberdade sexual e reprodutiva é, assim, inquestio-navelmente, o mais visível entre as conquistas femininas, depois de aproximadamente cinco mil anos de patriarcado. No entan-to, na esteira dessa verdadeira revolução, vêm outras várias dis-cussões que envolvem questões relativas ao gênero num contex-to ainda mais amplo, que é o das

múltiplas e rápidas transforma-ções da sociedade contemporâ-nea.

Assim, discutir “o papel da mulher”, ou “o comportamento feminino” na atualidade, é abrir um campo de infinitas possibili-dades e particularidades. “Pen-so que existem duas vertentes em relação ao comportamento. Temos uma questão biológica e a questão ambiental/cultural. Na questão biológica, homens e mulheres são completamen-te diferentes, com organismos diferentes. Os homens sofrem a influência da testosterona, e as mulheres do estrogênio. Os hormônios influenciam no com-portamento. Sendo assim, exis-te uma grande diferença entre comportamento masculino e feminino. Além disso, temos a questão cultural/ambiental. A sociedade trata, desde o nasci-mento, homens e mulheres de maneira diferente. Contudo, a sociedade vem mudando”, pon-dera a psiquiatra Danusa Cespe-des Guizzo Ayache.

As mulheres de hoje desfru-tam conquistas que resultaram de duras lutas históricas pela igualdade de direitos, mas ainda reservam-se ao direito de querer fazer do casamento e da família uma prioridade em suas vidas. Ao mesmo tempo em que se

desdobram. E, muitas vezes, até “reeducam” o companheiro para que possam dividir obrigações e responsabilidades domésticas, ainda abrem mão de muita coisa, em nome da profissão, num mer-cado de trabalho cada vez mais disputado.

“A sociedade mudou, e os valores também mudaram. Po-rém, vejo ainda um desejo das mulheres em ter um companhei-ro. É evidente que, para manter um casamento, elas não aceitam mais o que aceitavam no passa-do. Hoje, não precisam mais se submeter a uma relação infeliz. São poucas as que aceitam tais circunstâncias. Na minha vivên-cia profissional, tenho visto mu-lheres emocionalmente depen-dentes. Penso que existe uma independência emocional maior do que existia no século passa-do. Entretanto, muitas mulheres são ainda emocionalmente de-pendentes de um companheiro. Essa dependência não é exclu-sividade feminina, ela é do ser humano. Contudo, o desejo de casar e de constituir família con-tinua sendo mais evidente entre as mulheres”, revela Danusa.

Já para a psicóloga social Jacy Corrêa Curado (veja entre-vista), a dependência emocional é, na realidade, uma espécie de sequela dos séculos de domina-

“A sociedade trata, desde o nascimento, homens e mulheres de maneira diferente”Danusa Cespedes Gu iz zo Ayache, p s iqu iatra

Page 33: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

33Revista ATUAÇÃO | Março 2013 |

ção machista e patriarcal. “Esse é um dos setores mais complexos, porque, há milênios, as mulheres se encontram em uma posição de subordinação que deixou profun-das marcas emocionais. Rose Ma-rie Muraro, Heleieth Saffioti, entre tantas outras feministas, aponta-ram que o patriarcado e o mito do amor romântico foram devas-tadores para vivência emocional das mulheres (…) No Brasil, os sé-culos de escravidão colaboraram para estreitar a relação de ‘posse’ à relação afetiva. (…) Eu ainda so-nho com uma sociedade em que o gênero não deva importar e ser motivo para desigualdade, explo-ração, mutilação e qualquer outro tipo de violência ainda tão comuns em nossa sociedade.” A análise de Jacy pode servir, também, como indicativo de que, mesmo com to-das as transformações, ainda há muito a superar.

Tudo ao mesmo tempo agora

Para definir a “mulher moder-na”, então, é necessário fazer um “mix” de tendências, estilos, com-portamentos, sentimentos e aspi-rações. No geral, se fosse possível traçar uma linha reta, ideal e ima-ginária, na história da humanida-de, teríamos um período de total dominação machista, seguido pela reação revolucionária do fe-minismo e agora uma tendência a compatibilizar tudo numa espécie

de síntese, ainda em curso.E mesmo com toda a supera-

ção, com toda a cobrança e – ain-da hoje – com toda a culpa que acompanham as mulheres nas transformações da sociedade, a grande diferença é que as mulhe-res agora podem, sim, escolher. E não têm medo ou vergonha de as-sumir e defender suas escolhas ou sua condição.

Aos 48 anos, a jornalista Ana Cláudia Salomão Silva pode ser considerada uma espécie de anti-heroína se quisermos bus-car exemplos para um perfil da mulher contemporânea. Soltei-ra – não exatamente por opção, mas por força das circunstâncias – avessa aos padrões de “felici-dade obrigatória” que a socieda-de vem impondo com rigor cada vez maior, ela conta que viveu um grande amor, que pensou em ser mãe, diz que se realiza com as relações familiares, mas acredita que o engajamento e a partici-pação política são fundamentais para sua satisfação pessoal e pro-fissional.

Aos 22 anos, Ana Cláudia já era militante do PCdoB e participa-va de vários movimentos sociais. Trabalhava num banco e fazia fa-culdade de Letras. Foi presa por ocasião de uma mobilização en-volvendo questões sindicais, e foi nesse contexto que encontrou o amor e viveu um grande romance, que durou quatro anos. O moço

era advogado de um sindicato e a tirou da prisão. “Ele era dois anos mais velho que eu, e foi um relacionamento muito bacana. Pensei até em ‘juntar os trapos’ com ele (não casar de véu e gri-nalda como minha mãe sonhava). Nossos ideais eram semelhantes e tínhamos as mesmas vontades de vida”, lembra.

Mas um acidente de trânsito mudou o curso dessa história e a morte do namorado deixou mar-cas profundas. Superada a dor, Ana Cláudia se declara avessa a “padrões de relacionamento de conto de fadas” e contra todos os padrões de felicidade socialmente impostos. Numa família com mais três irmãs, sobrinhos e sobrinhos--netos, ela se diz realizada com re-lação aos laços familiares e conta que superou até a cobrança para que ela própria tivesse filhos.

“Aos 35 anos me questionei se teria ou não uma produção inde-pendente. Optei por não ter. E já que os caminhos da vida me le-varam a não ter um casamento e não ser mãe, eu me acomodei. Hoje não consigo imaginar como seria viver com outra pessoa den-tro da privacidade da minha casa. Sou bastante racional. Não acho que maternidade e casamento se-jam prioridades da forma como as pessoas veem. Para mim, o papel social da mulher é a causa, a luta”, afirma.

“para mim, o papel social da mulher é a causa, a luta”ana Cláud ia salomão Silva, jornal i s ta

Page 34: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

34 | Revista ATUAÇÃO | Março 2013

Especialista em Metodologia de Pesquisa em Gênero, a psicó-loga social Jacy Corrêa Curado fala sobre as conquistas e os de-safios das mulheres na socieda-de atual

Como a sociedade encara a posição que a mulher contem-porânea vem representando, de múltiplas funções?

Existem vários modos de compreender as “múltiplas fun-ções” da mulher, mas conside-ro importante reconhecer que elas não fazem parte de uma essência ou um comportamento estável e permanente, mas são construídos em dadas circuns-tâncias, em que as mulheres são cobradas a cuidar dos filhos, da casa e do emprego, e, ainda, participar da política, frequen-tar academia de ginástica etc.. Me parece um fenômeno bas-tante característico das mulhe-res ocidentais modernas do pe-ríodo pós-revolução feminista. Contudo, assistimos, hoje, a um uso nem sempre positivo desse comportamento, o que tem ser-vido para uma superexploração das mulheres, pois, já que so-mos multifuncionais, então vão se acumulando novas funções, sem haver, no entanto, uma re-distribuição mais equitativa.

A mulher atual é mais feliz? Como ela vê a felicidade nos dias de hoje?

É difícil medir um estado subjetivo como a felicidade. No entanto, se colocarmos alguns critérios, como liberdade e auto-nomia, podemos dizer que sim. Atualmente, posso ler muitos li-vros que, na época da ditadura, eram proibidos. Não sei se isso me faz mais feliz, mas com cer-teza, prefiro ter a liberdade de

Não basta ser mulher para transformar!

Page 35: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

35Revista ATUAÇÃO | Março 2013 |

lê-los. Assim funciona para as mulheres. Se propusermos um retorno à condição de apêndice, ou a “outra” do ser integral “ho-mem”, o qual era o único porta-dor de projetos pessoais, como dizia Simone de Beauvoir, acre-dito que ninguém vá querer. Po-rém, se, hoje, com os nossos inú-meros projetos e nossas funções, estamos mais felizes, isso não sa-beria dizer. Só posso afirmar que não queremos um “backlash” (retornar às fases anteriores) e, sim, ampliar as liberdades e au-tonomia para todas as mulheres!

Como tem sido, a seu ver, o posicionamento dos homens em relação às mulheres?

Acredito que vivemos em re-lação, e se uma das partes muda de posição, a “outra” muda também. Os homens, não to-dos, estão questionando os pa-drões rígidos de masculinidade, e também estão se libertando das amarras do machismo e do sexismo. Mas há, ainda, aqueles que preferem usufruir dos bene-fícios da condição subordinada da mulher, principalmente em relação ao trabalho doméstico e

nos empregos dos setores mais conservadores. Acredito que de-vemos trabalhar as relações de gênero em uma perspectiva da transformação, porque não me agrada essa escalada da mulher ao poder pelo poder. Para mim, é trocar seis por meia dúzia. Exis-tem inúmeros exemplos que de-monstram que não basta ser mu-lher para transformar!

A dependência emocional é uma característica de todo ser humano? Como ela é dividida entre masculino e feminino?

Esse é um dos setores mais complexos, porque há milênios as mulheres se encontram em uma posição de subordinação que deixou profundas marcas emocionais. Rose Marie Muraro, Heleieth Saffioti, entre tantas ou-tras feministas, apontaram que o patriarcado e o mito do amor romântico foram devastadores para vivência emocional das mu-lheres. O sofrimento, a posse e a culpa são componentes cons-titutivos do sentimento de amor na sociedade judaico-cristã, e para podermos nos livrar des-ses sentimentos necessitamos

de um esforço de desconstru-ção muito grande. No Brasil, os séculos de escravidão colabora-ram para estreitar a relação de “posse” à relação afetiva. Para o homem, amar significa dominar; e, para mulher, entregar-se é se deixar dominar. Essa relação é difícil de ser desfeita, e aí está

“Para o homem, amar signifi-ca dominar; e para a mulher, entregar-se é se deixar dominar. Essa relação é difícil de ser desfeita”

Jacy Corrêa Curado, doutora em Psicologia Social PUC/SP; Mas-ter of Arts in Gender and Deve-lopment (ISS/ Holand); Mestre em Psicologia (UCDB); Especia-lista em Metodologia de Pesqui-sa em Gênero (UERJ/ FIOCRUZ) e professora Adjunta da UFGD.

Page 36: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

36 | Revista ATUAÇÃO | Março 2013

a raiz dos milhares de casos de violência doméstica, por a mu-lher desobedecer essa posição. Quando esse homem é punido pela lei, a mulher se sente culpa-da, por não ter cumprido o papel que lhe foi milenarmente conce-bido. São dependências mútuas, das relações de dominação-su-bordinação, que ainda resistem às mudanças. O Brasil possui a melhor lei (Lei Maria da Penha) do mundo para combater a vio-lência doméstica, o que vem tra-zendo alterações positivas para as relações emocionais entre ho-mens e mulheres.

Qual a prioridade para a mu-lher moderna? Isso é relativo ou faz parte de um conjunto?

As pesquisas indicam que as mulheres estão priorizando o projeto de vida profissional, o que é uma mudança enorme em se tratando de prioridade femi-nina, que até há poucas décadas, era exclusivamente composta de casamento e maternidade, quase como um destino. As tendências apontadas pelos estudos de gê-nero indicam um compartilha-mento, a corresponsabilidade das atividades domésticas, do cuidado dos filhos, com o mari-do, a família, o Estado e as em-presas. Não dá para pensar em projeto emancipatório com essa sobrecarga absurda de trabalho das mulheres. O empoderamen-to político e econômico, tam-bém, são considerados prioritá-rios, já que aí residem as maiores iniquidades. Precisamos ampliar as conquistas feministas, pois ainda existem milhares de mu-lheres sem acesso à educação e que vivem sob a tutela do Esta-do e/ou do marido, e sonham em ser “uma” e não o complemento inferior do “outro”. Eu ainda so-nho com uma sociedade em que o gênero não deva importar e ser motivo para desigualdade, ex-ploração, mutilação e qualquer outro tipo de violência ainda tão comuns em nossa sociedade.

“Eu ainda sonho com uma so-ciedade em que o gênero não deva importar e ser motivo para desigualdade, explora-ção, mutilação e qualquer ou-tro tipo de violência ainda tão comuns em nossa sociedade”

Page 37: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

37Revista ATUAÇÃO | Março 2013 |

Ao longo da história, o mo-vimento de mulheres organi-zadas no mundo tem obtido avanços significativos em vá-rios setores: participação no mercado de trabalho, acesso à educação e às universidades, conquista de direitos sociais e civis.

No entanto, nos espaços institucionalizados da política e do poder, as mulheres ainda são subrepresentadas, apesar de serem a metade da popu-lação mundial. Essa desvanta-gem também está presente no movimento sindical. Isso não é um problema apenas das mu-lheres, mas é um tema político, exigindo que as organizações repensem seus modelos de participação e representação, criando novas metodologias de superação de práticas sexistas e excludentes.

De acordo com levanta-mento da Internacional da Educação (IE), no movimento sindical da Educação na Amé-rica Latina, cerca de 70% dos membros das organizações são mulheres. Porém, nas direções sindicais, representam apenas 30%. Repensar as nossas or-ganizações requer reconhecer que o espaço de direção sin-dical continua sendo majorita-riamente masculino e exige de todos nós uma vontade políti-ca de modificar essa realidade.

A ausência das mulheres nos espaços de poder e de decisão significa um déficit na demo-cracia e uma dívida que a so-ciedade ainda tem para com todas nós. A nossa represen-tação política e sindical é fun-damental para se avançar na construção de uma sociedade mais democrática e com mais

igualdade. É fundamental que, em todos os espaços políticos e representativos, as mulheres tenham uma inserção condi-zente com a sua presença no conjunto da população, consi-derando sempre a diversidade étnica, ou seja, a representati-vidade negra e indígena.

A luta das mulheres pela ci-dadania é histórica e foi, lite-ralmente, de perder a cabeça. Em 1793, em plena Revolução Francesa, quando se transpira-vam lemas de liberdade, igual-dade e fraternidade, Olympe de Gouges acabou decapitada por defender os direitos das mulheres e propor a “Declara-ção dos Direitos da Mulher e da Cidadã”, em que afirmava que as mulheres tinham os mesmos direitos dos homens – eram, portanto, iguais – e, também, tinham necessidades especí-ficas por serem mulheres, ou seja, diferentes. É de Olympe a célebre frase “se a mulher pode subir ao cadafalso, pode também subir à tribuna”.

Para compreender a nossa sub-representação nos espa-ços de poder, devemos utilizar o conceito de gênero, uma ca-tegoria que surgiu nas ciências sociais, para dar conta dos sím-bolos, valores, das representa-ções e práticas que cada cul-tura tem na relação entre um e outro sexo. Essa reformulação conceitual veio para mostrar que as desigualdades entre ho-mens e mulheres foram cons-truídas histórica, social e politi-camente. Portanto, acontecem no campo político, cultural e re-lacional. Não foram dadas pela natureza. O conceito de gênero surgiu com o intuito de romper com o conceito de “sexo”, que

analisa a relação entre homens e mulheres a partir da biologia, dos corpos sexuados. Portan-to, gênero não é sinônimo de mulher. Refere-se aos distintos significados, social e político, que existem numa sociedade, ao se tratar do ser mulher e do ser homem.

É necessário lembrar que as desigualdades do presente têm as suas raízes na divisão sexual e social do trabalho, instituída

ARTIGO

Sindicatos de Educação da América LatinaEm busca da igualdade em todos os espaçosde poder e decisão

Fátima SilvaSecretária de Relações Internacionais da CNTE e Vice-Presidenta do Comitê Regional da Internacional da Educação

Page 38: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

38 | Revista ATUAÇÃO | Março 2013

ACOMPANHE

A FETEMS NAS

MÍDIAS SOCIAIS facebook/fetems twitter/fetems youtube/fetems

com o surgimento da socie-dade patriarcal, quando o tra-balho masculino passou a ser supervalorizado, e o trabalho feminino desvalorizado. Os es-paços públicos e de poder fo-ram dominados pelos homens. E, deles, as mulheres foram ex-cluídas.

A supremacia do poder masculino estendeu-se pelos mais diferentes períodos his-tóricos e, ainda hoje, tem força na sociedade contemporânea. Porém, com outros contornos e outras contradições.

E, até hoje, as barreiras cul-turais têm um peso muito im-portante na exclusão das mu-lheres dos espaços políticos. Os padrões machistas a res-peito da vida privada, o cuida-do com os filhos e as tarefas domésticas fazem com que as mulheres tenham uma dupla jornada de trabalho, dificultan-do a sua participação social. Por isto, muitas mulheres que participam em cargos de di-reção são solteiras, viúvas ou divorciadas. E, quando têm fi-lhos, são grandes, já criados. Portanto, todos esses fatores devem ser considerados na construção de novas práticas e cultura sindical. As demandas da vida privada das mulheres precisam ser consideradas na agenda dos sindicatos.

A Internacional da Educação tem reiterado que, sendo o Ma-gistério um setor majoritaria-mente composto por mulheres, é imprescindível a construção de políticas eficazes de partici-pação, formação política e em-poderamento das mulheres.

Um passo importante foi a elaboração e publicação de um estudo que revela os obstácu-

los e as práticas que dificultam a participação das mulheres na vida sindical e apresenta uma série de recomendações para o fortalecimento da democracia sindical e construção de uma nova cultura.

Nesse aspecto, a política de cotas tem se constituído num importante caminho. As co-tas alteram a composição dos espaços de tomada de deci-são, trazem diferentes pontos de vista e favorecem um novo aprendizado. No entanto, não são uma solução mágica ou automática. Mas, sua aplicação rompe com a visão de que o poder é somente masculino. A aplicação das cotas não é um fim em si mesmo, mas inaugu-ra diferentes perspectivas. É uma construção política que tem como base novas confi-gurações para a igualdade de condições entre homens e mu-lheres.

Paridade nos sindicatos

Participar de direções sin-dicais é um direito político das mulheres. A ausência de traba-lhadoras nesses espaços tem reflexos na organização sindi-cal, nas pautas de negociações que atingem diretamente a vida das trabalhadoras.

É um desafio para o movi-mento sindical incorporar uma nova concepção de trabalho e de organização sindical, que considere o trabalho reprodu-tivo realizado pelas mulheres no âmbito familiar e domésti-co, na definição da política sin-dical e que, portanto, leve em consideração as desigualdades de gênero e a divisão sexual do trabalho.

A Central Única dos Traba-lhadores (CUT) é, atualmente, uma importante referência na construção da igualdade no movimento sindical. O seu 11º congresso aprovou a paridade de gênero na direção. Para o movimento nacional dos tra-balhadores em Educação da CNTE, está colocado o desafio de realizar esse debate e apri-morar os espaços de participa-ção das educadoras nos cargos de direção.

Para a Rede de Trabalha-doras da Educação da América Latina da IE, as organizações da categoria de educadores de cada país precisam, além da política de cota, investir na se-guinte agenda:

• trabalhar mais a forma-ção político-sindical das traba-lhadoras;

• incorporar novas temá-ticas na formação, tais como: conceito de gênero, vida públi-ca e privada, direito e legisla-ção, economia, análise conjun-tural, entre outros;

• garantir financiamen-to para o desenvolvimento de uma política de gênero;

• incorporar cláusulas de gênero nas negociações coleti-vas;

• realizar formação espe-cífica para os homens em te-mática de gênero, que permita desenvolver uma nova masculi-nidade.

É assim que vamos rompen-

do os muros visíveis e invisíveis da exclusão e da discriminação, e engendrando a tão sonhada igualdade entre homens e mu-lheres, em todos os espaços da vida humana.

Page 39: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

39Revista ATUAÇÃO | Março 2013 |

Page 40: Revista Atuação - Edição 6 - Março de 2013

40 | Revista ATUAÇÃO | Março 2013

Rua 26 de Agosto, 2296 - Bairro Amambaí Campo Grande - MS Cep 79005-030

(67) 3382-0036 / (67) [email protected]

www.fetems.org.br