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Seminário URBFAVELAS 2016 Rio de Janeiro - RJ - Brasil ZONAS ESPECIAIS DE INTERESSE SOCIAL EM FORTALEZA: PROGRESSOS, RETROCESSOS E HIPÓTESES DO QUE DEVERIA TER AVANÇADO PARA SUA REGULAMENTAÇÃO Amíria Bezerra Brasil (UFRN) - [email protected] Arquiteta e Urbanista, professora doutora da UFRN. Jade Stedile de Serpa (Universidade de Fortaleza - UNIFOR) - [email protected] Graduanda em arquitetura e urbanismo Letícia Cândido de Oliveira (Universidade de Fortaleza - UNIFOR) - [email protected] Graduanda em arquitetura e urbanismo Manuela de Oliveira Campos (Universidade de Fortaleza - UNIFOR) - [email protected] Graduanda em arquitetura e urbanismo Marjorie Martins Silveira (Universidade de Fortaleza - UNIFOR) - [email protected] Graduanda em arquitetura e urbanismo Pedro Vitor Monte Rabelo (Universidade de Fortaleza - UNIFOR) - [email protected] Graduando em arquitetura e urbanismo Renata Becco Pedrosa (Universidade de Fortaleza - UNIFOR) - [email protected] Graduanda em arquitetura e urbanismo Synara Barros de Holanda Leite Vieira - [email protected] Graduanda em arquitetura e urbanismo

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Seminário URBFAVELAS 2016Rio de Janeiro - RJ - Brasil

ZONAS ESPECIAIS DE INTERESSE SOCIAL EM FORTALEZA: PROGRESSOS, RETROCESSOSE HIPÓTESES DO QUE DEVERIA TER AVANÇADO PARA SUA REGULAMENTAÇÃO

Amíria Bezerra Brasil (UFRN) - [email protected] e Urbanista, professora doutora da UFRN.

Jade Stedile de Serpa (Universidade de Fortaleza - UNIFOR) - [email protected] em arquitetura e urbanismo

Letícia Cândido de Oliveira (Universidade de Fortaleza - UNIFOR) - [email protected] em arquitetura e urbanismo

Manuela de Oliveira Campos (Universidade de Fortaleza - UNIFOR) - [email protected] em arquitetura e urbanismo

Marjorie Martins Silveira (Universidade de Fortaleza - UNIFOR) - [email protected] em arquitetura e urbanismo

Pedro Vitor Monte Rabelo (Universidade de Fortaleza - UNIFOR) - [email protected] em arquitetura e urbanismo

Renata Becco Pedrosa (Universidade de Fortaleza - UNIFOR) - [email protected] em arquitetura e urbanismo

Synara Barros de Holanda Leite Vieira - [email protected] em arquitetura e urbanismo

ZONAS ESPECIAIS DE INTERESSE SOCIAL EM FORTALEZA: PROGRESSOS, RETROCESSOS E HIPÓTESES DO QUE DEVERIA TER AVANÇADO PARA SUA

REGULAMENTAÇÃO RESUMO Fortaleza conta atualmente com um intenso debate no âmbito das Zonas Especiais

de Interesse Social (ZEIS), na tentativa de implementação e regulamentação dessas áreas. Apesar das movimentações recentes, há muito tempo se discute sobre essa pauta na cidade, principalmente na iniciativa de movimentos sociais, instituições e entidades que impulsionam as conquistas alcançadas na esfera do Poder Público. Todavia, os esforços ainda não foram bastantes para o gozo pleno dos direitos estabelecidos para as ZEIS no Estatuto da Cidade. Apresenta-se, neste trabalho, um estudodo histórico de conquistas e retrocessos adquiridos ao longo do tempo por essas Zonas, a análise dos acontecimentos mais recentes, os processos paralelos que envolvem, de certa forma, a temática, e o estabelecimento de hipóteses do que deveria ter acontecido, a exemplo de outros casos de sucesso no Brasil, para que Fortaleza obtivesse êxito na implementação das Zonas Especiais de Interesse Social.

INTRODUÇÃO Surgidas de uma demanda social, as Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS) em

Fortaleza apresentam um histórico de luta e pressão popular, desde antes do processo de elaboração do Plano Diretor Participativo de Fortaleza (PDPFor), aprovado em 2009, até o ano presente de 2016, com avanços lentos em busca da sua regulamentação. Tal processo de luta social voltada ao âmbito das ZEIS encontrou diversas barreiras ao longo do tempo (governamentais, legais e orçamentárias), dentro das várias gestões municipais exercidas na cidade.

A delimitação das ZEIS, que é um dos instrumentos urbanísticos proposto pelo Estatuto da Cidade, tem como objetivo inicial priorizar áreas de precariedade habitacional ao atendimento das políticas urbana e habitacional, bem como diminuir a desigualdade e formalizar a moradia dessa população por meio da regularização fundiária e urbanística. Isso permite: a inclusão dessas áreas na cidade, a oferta de serviços e infraestrutura urbana, o estímulo a mecanismos de participação da população na tomada de decisões de cunho habitacional e urbano, o aumento da arrecadação do município e o aumento da oferta de terras (INSTITUTO POLIS, 2002).

O PDPFor classifica as ZEIS em três tipos: as ZEIS de assentamentos (tipo 1), as ZEIS de conjuntos e loteamentos irregulares (tipo 2) e as ZEIS de vazios urbanos (tipo 3), explicadas com mais detalhes posteriormente, delimitando 6% do território municipal referente a essas zonas. Apesar da delimitação no Plano Diretor, isso ainda não garante às áreas demarcadas os benefícios de priorização das políticas urbanas e habitacionais, nem as salvaguardam de intervenções urbanas danosas à comunidade. Para que isso não aconteça, faz-se necessário que o estabelecimento das ZEIS em Fortaleza saia do papel, do chamado “plano-discurso” explicado por Maricato (2000 apud GOMES, 2010), e tomem forma por meio da criação de planos e legislações próprias, norteando a tomada de decisões referentes à gestão, parâmetros urbanísticos, questões orçamentárias e governabilidade, garantindo a permanência e o direito à cidade dessa população.

Atualmente, a questão das ZEIS em Fortaleza tem ganhado destaque novamente no cenário das políticas urbanas com o avanço da pauta por parte do poder municipal, ainda que de forma lenta e burocrática, pressionado pelos movimentos populares na forma de

ações de mobilização, atos de protesto em audiências públicas e acampamento em frente ao Paço Municipal, segundo entrevistada 11.

Tendo a importância desse processo de luta por direitos como base, o seguinte trabalho objetiva traçar um breve histórico de avanços e retrocessos no que tange à pauta das ZEIS em Fortaleza e levantar hipóteses do que deveria ter avançado no município para que essas Zonas pudessem de fato atingir seus objetivos expostos no Estatuto da Cidade, e garantidos pelo PDPFor. Para auxiliar a construção dessas hipóteses e do porquê da não implementação desse instrumento em Fortaleza, procurou-se estudar demais estruturas organizacionais no Brasil que obtiveram, de alguma forma, sucesso no processo de direito à moradia através do instrumento das ZEIS ou AEIS2, como Diadema, São Bernardo do Campo e Recife.

Este artigo é resultado do grupo de pesquisa Metodologia para Implementação das ZEIS em Fortaleza. Para construir o desenvolvimento aqui apresentado, utilizou-se como metodologia a pesquisa indireta na forma de leitura de material bibliográfico(livros, artigos, teses e relatórios que abordam a questão das ZEIS em Fortaleza, Diadema, São Bernardo do Campo e Recife) e pesquisa direta na forma de entrevistas com alguns atores e entidades atuantes nessa questão3.

UM BREVE HISTÓRICO DAS ZEIS EM FORTALEZA Para compreender o contexto em que foi incluído o instrumento das ZEIS em

Fortaleza, precisamos observar primeiramente os fatores que levaram à multiplicação de assentamentos irregulares às margens da cidade formal, desde seu período de formação, de forma a captar os processos, os principais atores e a evolução da pauta na cidade.

No início do século XX, a cidade se encontrava em expansão e as secas no interior do estado provocaram grandes migrações para o litoral. Essas populações chegaram sem recursos e, ao se depararem com a dificuldade de acesso às terras de qualidade nas zonas consolidadas, se instalaram em áreas inadequadas para habitação, como leitos de rios, margens das ferroviais, periferias industriais, etc. O fato é que a cidade informal, que se desenvolveu e disseminou a partir desses primeiros assentamentos ilegais, se apresenta como a raiz dos problemas históricos no espaço urbano de Fortaleza, aliada a questão das moradias precárias (FREITAS; PEQUENO, 2011).

Ainda no século XIX, surgiram as primeiras tentativas de ordenação do tecido urbano da cidade, mas os planos e estratégias embrionárias, que tinham como principal meta o embelezamento da cidade, previam ações pontuais e segregadoras, voltadas para os interesses das classes possuidoras de terras. Foi só na segunda metade do século XX que os planos começaram a atentar para o crescimento irregular e desordenado das áreas periféricas da cidade, embora ainda não trouxessem propostas para elas. Em 1973, foi realizado o primeiro levantamento das favelas de Fortaleza, quando se constatou que elas representavam cerca de 20% da população da cidade (FREITAS; PEQUENO, 2011). 1 Entrevistada 1: membro do Laboratório de Estudos da Habitação da Universidade Federal do Ceará –

LEHAB/UFC. Entrevista concedida aos autores em 05 ago. 2016. 2As ZEIS podem receber outra nomenclatura em diferentes municípios do Brasil, como é o caso de

Diadema-SP que determinou “Áreas Especiais de Interesse Social” para classificá-las. 3Optou-se por preservar os nomes dos entrevistados, sendo atribuída a identificação por meio de números

(Ex.: Entrevistado 1). Foram realizadas entrevistas presenciais com a Entrevistada 1, representante do Laboratório de Estudos da Habitação da Universidade Federal do Ceará – LEHAB/UFC, bem como com a Entrevistada 2, Arquiteta e Urbanista, Professora na Universidade de Fortaleza – UNIFOR e atuante no grupo Centro de Estudos, Articulação e Referência sobre Assentamentos Humanos – CEARAH Periferia na época da elaboração do PDPFor, e com a Entrevistada 3, servidora da Secretaria de Urbanismo e Meio Ambiente - SEUMA. Por e-mail, foi concedida uma breve entrevista pelo Entrevistado 4, Professor Doutor da Universidade Federal de Pernambuco – UFPE e da Universidade de Pernambuco – UPE.

Entretanto, durante todo o século XX não havia diálogo entre os planos elaborados e a política e programas habitacionais. Em decorrência disso, a atitude adotada era a de remoção das comunidades irregulares quando essas eram alvo de intervenções, como a abertura de vias, realocando-as para áreas limítrofes da cidade, a exemplo do primeiro plano implantado pela Fundação do Serviço Social de Fortaleza (FSSF) e também no período de maior produção habitacional, durante o período do Banco Nacional de Habitação (BNH). A lógica foi a produção de grandes conjuntos habitacionais na periferia para a população que estava sendo deslocada, para implementação de obras de infraestrutura.

Em 1991, a população em assentamentos precários na capital já representava 30% da população total, em sua maior parte localizados em áreas verdes e alagáveis, como se pode observar na Figura 02. Na mesma época, a partir da Constituição de 1988, a provisão de moradias dignas passa a ser de responsabilidade do município, esfera com pouca estrutura e verba para lidar com a questão, acarretando maior lentidão ao processo, terminando por não acompanhar o crescimento rápido das comunidades irregulares. Como podemos observar nas imagens - (fig. 01), (fig. 02), (fig. 03) - os assentamentos precários na capital cresceram consideravelmente entre os anos de 1973 e 2012, ainda ocupando as áreas de proteção ambiental.

Figura 01: Evolução dos assentamentos precários em Fortaleza no ano de 1973.

Fonte: Mapa elaborado pelos autores sobre base fornecida pela Prefeitura Municipal

de Fortaleza em programa QGis .

Figura 02: Evolução dos assentamentos precários em Fortaleza no ano de 1991.

Fonte: Mapa elaborado pelos autores sobre base fornecida pela Prefeitura Municipal

de Fortaleza em programa QGis.

Figura 3: Evolução dos assentamentos precários em Fortaleza no ano de 2012.

Fonte: Mapa elaborado pelos autores sobre base fornecida pela Prefeitura Municipal

de Fortaleza em programa QGis.

De acordo com a Entrevistada 24, a partir das discussões sobre o Estatuto da

Cidade nos anos 2000, a questão da habitação se fortaleceu, ao mesmo tempo em que se iniciavam as revisões dos planos diretores municipais. A cidade de Fortaleza iniciou seu processo de revisão no ano de 2002.

Com a aprovação da Lei do Estatuto em 2001 e a criação do Ministério das Cidades em 2003, os movimentos sociais ganharam força e, com o auxílio de organizações não governamentais, começou a articulação para garantir a inserção da questão da moradia, com instrumentos de reforma urbana, no novo plano diretor, que ficou inicialmente a encargo da secretaria de infraestrutura em um processo fechado e sem transparência.

É necessário destacar aqui a importância de entidades e organizações não governamentais que levantaram o debate acerca do direito à moradia na cidade, antes mesmo de surgirem as discussões sobre a revisão do Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano (PDDU), que era de 1991. Em conversa, a Entrevistada 2 ressalta o papel da ONG CEARAH Periferia como importante articuladora e formadora de lideranças atuantes na questão habitacional e urbana, por intermédio, dentre outras coisas, da Escola de Planejamento Urbano e Pesquisa Popular. Trata-se então de um processo longo de formação e informação, de capacitação e discussão sobre a cidade que, como narra a professora, não surgiu repentinamente. As pessoas ali capacitadas saíram capazes de atuar em frentes para elaborações de projetos sociais, além de muitas lideranças formadas na época que atuam hoje nas frentes mais recentes de discussão do acesso à moradia. O foco no debate das ZEIS deu-se, segundo a entrevistada, como abordagem estratégica por ser um elemento mobilizador muito grande nas comunidades, sobretudo as ameaçadas historicamente.

Em 2004, a Prefeitura mandou para a aprovação da Câmara dos Vereadores o Projeto de Lei do Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano e Ambiental de Fortaleza (PDDUA-FOR), que apresentava diversas falhas, dentre elas conteúdo fraco, irregularidades na contratação da empresa responsável pela elaboração do plano e também falhas no processo participativo (BRASIL, 2016). Uma ação da sociedade civil (representada pela Federação de Entidades de Bairros e Favelas de Fortaleza – FBFF) junto ao Ministério Público suspendeu a votação do Plano na Câmara. Foi o primeiro caso no Brasil sobre um processo de votação ser barrado pela população, atraindo olhares de pesquisadores e estudiosos do assunto,segundo conta a Entrevistada 2. Após a suspensão, já na gestão da prefeita Luizianne Lins (2005-2008), o PDDUA foi retirado da pauta e começou-se a elaboração de um novo Plano Diretor Participativo.

Em 2008 foi apresentado o Plano Diretor Participativo de Fortaleza, no qual movimentos populares instigaram debates e apresentaram o produto da demarcação dos territórios de ZEIS.Ainda segundo a Entrevistada 2, nas duas audiências finais de fechamento do Plano, ainda era possível encontrar erros relacionados ao macrozoneamento da cidade. Ela lamenta dos acordos que foram feitos para que as ZEIS fossem consideradas no Plano em detrimento das demais reivindicações populares, bem como o não fortalecimento da pauta dos demais instrumentos urbanísticos que servem como apoio às ZEIS, como o IPTU Progressivo no Tempo.

Após oito anos de revisão e dois anos na Câmara Municipal, o Plano Diretor Participativo foi aprovado, com delimitação das áreas de Zonas Especiais de Interesse Social. O PDPFor classifica em três tipos de ZEIS:

Art. 126 - As Zonas Especiais de Interesse Social 1 (ZEIS 1) são compostas por assentamentos irregulares com ocupação desordenada, em áreas públicas ou particulares, constituídos por população de baixa renda, precários

4Em entrevista concedida aos autores em 11 jul. 2016.

do ponto de vista urbanístico e habitacional, destinados à regularização fundiária, urbanística e ambiental. Art. 129 - As Zonas Especiais de Interesse Social 2 (ZEIS 2) são compostas por loteamentos clandestinos ou irregulares e conjuntos habitacionais, públicos ou privados, que estejam parcialmente urbanizados, ocupados por população de baixa renda, destinados à regularização fundiária e urbanística. Art. 133 - As Zonas Especiais de Interesse Social 3 - ZEIS 3 - são compostas de áreas dotadas de infraestrutura, com concentração de terrenos não edificados ou imóveis subutilizados ou não utilizados, devendo ser destinadas à implementação de empreendimentos habitacionais de interesse social, bem como aos demais usos válidos para a Zona onde estiverem localizadas, a partir de elaboração de plano específico. (FORTALEZA, 2009).

A princípio, foram demarcadas 44 ZEIS do tipo 1, 56 ZEIS do tipo 2 e 34 ZEIS do tipo 3, resultando em um total de 134 áreas de ZEIS. Apesar das vitórias alcançadas, uma comunidade de importante força representativa não foi contemplada como área de ZEIS, na época da aprovação do PDPFor: trata-se da ZEIS do Lagamar (GONDIM; GOMES, 2012).

Tendo sua inclusão como ZEIS apenas através de Lei Complementar5 aprovada em março de 2010 após muita mobilização e pressão popular, o Lagamar se tornou objeto de estudo de diversos pesquisadores da área do direito à moradia, com destaque para os trabalhos de Gondim e Gomes (2012) eGomes (2011, 2012). Esses trabalhos levantam a questão dos interesses políticos e do setor imobiliário nessa área, que é estratégica na dinâmica urbana de Fortaleza, e como isso é prejudicial para a comunidade, levando em consideração que só o fato de ser classificada como ZEIS no Plano Diretor não a priva de manobras políticas danosas aos moradores.

RETROCESSOS Pode-se dizer, baseado nos eventos que sucederam a aprovação do PDPFor, que

houve um período de estagnação do Poder Municipal quanto a pauta de ZEIS. Mais do que isso, alguns retrocessos podem ser descritos, caracterizando o quanto essas áreas foram lesadas pelo não avanço da regulamentação. Como descreveu Brasil:

[...] apesar das ZEIS estarem previstas no plano diretor atual, o que deveria garantir aqueles direitos, essas áreas são permeadas de conflitos, entre o que garante a lei e o que acontece na realidade. Desde sua criação até hoje, essas zonas, por não terem sido regulamentadas, tiveram muitos dos seus direitos violados (BRASIL, 2016, p.180).

Alguns desses retrocessos ocorreram na forma de leis complementares, ligadas

principalmente à questão dos vazios urbanos e do interesse político e imobiliário, como vemos a seguir.

A perda progressiva de terrenos em ZEIS 3: entre a legalidade e a ilegalidade De acordo com o Plano Diretor, a não regulamentação das ZEIS de vazios em

determinado espaço de tempo acarreta na liberação progressiva de 5% dos terrenos inseridos nessas zonas para construção, a partir de solicitação do interessado para órgão responsável. A seguir, encontra-se um trecho do artigo retirado na Lei nº 062/2009 do Plano Diretor Participativo de Fortaleza:

5Lei Complementar nº 0076, de 18 de março de 2010.

Art. 312 – [...]§ 2º – Em não sendo instituídas as normas indicadas no § 1o, no prazo de 6 (seis) meses da publicação da presente Lei Complementar, passarão, progressivamente, a serem liberadas para a construção nos parâmetros da zona em que estão inseridas, 5% (cinco por cento) das áreas vazias contidas nas ZEIS 3. § 3o – A progressividade de liberação dos 5% (cinco por cento) das áreas vazias, será a cada 12 (doze) meses, a partir da primeira liberação, que se dará conforme o parágrafo anterior, prevalecendo até a data da revisão desta Lei ou em 5 (cinco) anos, evento que primeiro ocorrer [...]. (FORTALEZA, 2009).

Ou seja, passados seis meses da publicação dessa Lei (PDPFor), a cada um ano

em que a ZEIS 3 não for regulamentada pelo Executivo Municipal, perde-se 5% dos terrenos vazios contidos nessas áreas.

No Relatório das ZEIS (2015a), constatou-se que a porcentagem de terrenos em ZEIS 3 que foram liberados mediante autorização da Secretaria de Urbanismo e Meio Ambiente (SEUMA) para construção é de apenas 4%, enquanto a real perda desses terrenos, analisados pela equipe técnica através da ferramenta Google Earth para identificar as construções, é de 14%, 10% a mais do que o autorizado oficialmente. Portanto, além do que é perdido em conformidade com a lei, perde-se também a partir de construções independentes e sem autorização do Município (FORTALEZA, 2015a).

Na Lei Complementar nº 0101/20116, foi concedida autorização para retirada de uma área considerada como ZEIS de vazio. Ironicamente, essa área abriga hoje a sede da Secretaria Municipal de Urbanismo e Meio Ambiente.

Lei Complementar nº 0108/2012 Essa outra Lei Complementar também dispõe acerca de terrenos vazios: dessa vez,

internos a ZEIS do tipo 1. A grande questão aqui tratada é a inclusão de novos parágrafos ao Art. 126 da referida lei, que destitui terrenos vazios dentro de ZEIS 1, fazendo com que tais áreas obedeçam aos parâmetros da outra Zona ali estabelecida, e não mais aos parâmetros da ZEIS.

O que se perde com essa Lei é a possibilidade de manter uma reserva de terras para garantir possíveis reassentamentos dos moradores, caso necessário, sem precisar deslocá-los por grandes distâncias. Além disso, esses terrenos poderiam garantir também o estabelecimento de equipamentos públicos de lazer e comunitários, levando em conta a carência de boa parte dos assentamentos precários (FORTALEZA, 2015a).

O Lagamar e as desapropriações Como dito anteriormente, o Lagamar, comunidade de localização estratégica em

Fortaleza e classificada como ZEIS, está constantemente vinculado a embates entre Poder Público e população. Dentre esses embates, destacam-se as várias tentativas de desapropriação dos moradores por parte da prefeitura e do governo do Estado em detrimento a obras de infraestrutura na área. A mais recente e emblemática foi a tentativa de desapropriação de mais de 300 famílias por conta das obras de mobilidade na época da Copa do Mundo de 2014: a previsão de implantação do Veículo Leve sobre Trilhos (VLT) e a construção de uma rotatória próxima à comunidade (OBSERVATÓRIO DAS METRÓPOLES, 2016).

6Lei Complementar nº 0101 de 30 de dezembro de 2011.

Apesar das fortes tentativas, a proposta inicial de 300 famílias retiradas não foi cumprida graças à intensa mobilização e luta dos moradores que conseguiram reduzir esse número significativamente: das 300 famílias iniciais, apenas pouco mais de 10 sofreram com a desapropriação (OBSERVATÓRIO DAS METRÓPOLES, 2016).

Apesar da conquista, é fácil perceber a dificuldade que enfrentam essas comunidades pela não reserva de seus direitos enquanto Zonas Especiais de Interesse Social. O retrocesso se dá, nesse caso, nas vezes em que a vontade política e imobiliária prevalece acima do direito à cidade dessas pessoas e realizam manobras que deslegitimam o fato de serem ZEIS.

Vemos que, apesar da perda também no âmbito das ZEIS de assentamentos, é significativa a perda constatada nas ZEIS de vazios. Traz-se, então, o caso da cidade de Diadema-SP para análise, onde as ZEIS (que nesse município recebem a nomenclatura de AEIS – Áreas Especiais de Interesse Social) de vazios obtiveram algum êxito.

Diadema foi uma das primeiras cidades no Brasil a utilizar o instrumento de AEIS de vazio, com objetivo de que os terrenos vazios não utilizados ou subutilizados cumprissem sua função social. A cidade possuía um grande déficit habitacional, péssimos indicadores de qualidade de vida, muitos conflitos fundiários e já se utilizava de programas de gestão participativa, com a criação de um Fundo e Conselho Municipal de Habitação Social (FUMAPIS), que escolhia quais áreas receberiam intervenção e geria os recursos necessários para isso (NELSON BALTRUSIS, 2003).

Durante a revisão do Plano Diretor, os políticos, representando empresários e donos de terra, não aceitavam esse novo instrumento. Em resposta a isso, os movimentos sociais ocuparam a Câmara Municipal e não saíram até os textos serem aprovados. Foram estabelecidos parâmetros para essas áreas, sendo eles: lotes mínimos habitacionais de 42 m², taxa de ocupação de 0,9 vezes a área do terreno, coeficiente de permeabilidade de 5% para terrenos de 300 a 500 m² e de 15% para maiores que 500 m², e apenas famílias que possuem até 10 salários mínimos e não possuam outros imóveis podem ser contempladas (ROLNIK; SANTORO, 2013).

O apoio dos movimentos sociais, a rapidez da implementação e a Prefeitura servindo de mediadora entre a população e os donos da terra configuraram sucesso, por certo período, da produção habitacional no município. Um relatório da Prefeitura de Diadema contabiliza que em 1994, cerca de 2,8% do território da cidade foram reservados para as AEIS de vazio, e no início de 2008, as áreas vazias disponíveis correspondiam a apenas 0,6% (REALI; ALLI, 2010). Pode-se concluir que, apesar do bom funcionamento do instrumento (com 2,2% dos terrenos destinados à Habitação de Interesse Social – HIS – cumprindo sua função), a reserva de terras vem se esgotando e sem previsão de mais AEIS para suprir a demanda.

Analisando o contexto geral, muito se perdeu em Fortaleza em questão de direitos dessas Zonas, em decorrência da não regulamentação do que traz o Plano Diretor. Em meio a esses anos que se passaram, entretanto, esse tema nunca deixou de ser debatido entre os movimentos populares e as comunidades atuantes que, como já exposto anteriormente e como conta a Entrevistada 1, levaram suas exigências em audiências públicas, protestos nas Secretarias Municipais e realizaram muita pressão popular. De fato, o texto a seguir irá mostrar o resultado do que, segundo a Entrevistada 1, foi alcançado principalmente através de muita luta social.

O QUE ACONTECEU ENTRE OS ANOS DE 2013 E 2015 Apesar das ZEIS estarem presentes no PDPFor desde 2009, foi apenas em 2013,

depois de diversas reivindicações de diferentes grupos sociais, que a atual gestão da Prefeitura Municipal de Fortaleza (PMF) resolveu dar seguimento ao processo de implementação dessas áreas. Esse processo se seguiu com a criação do Comitê Técnico

Intersetorial e Comunitário das Zonas de Interesse Social, através do Decreto Municipal nº 13.241, em 21 de outubro de 2013. O comitê tinha como principal objetivo subsidiar o prefeito Roberto Cláudio de informações acerca dos três tipos de ZEIS, para que posteriormente pudessem ser tomadas decisões para efetivá-las em Fortaleza (FORTALEZA, 2013a).

Mesmo com o Decreto publicado em Diário Oficial, a escolha dos membros da equipe técnica só foi realizada sete meses depois. Por ser uma ferramenta de gestão participativa, o comitê foi composto por 29 membros, sendo 17 deles representantes do poder municipal e o restante da sociedade civil, com participantes de 9 ZEIS7 e de organizações não governamentais, como o Centro de Estudos, Articulação e Referência sobre Assentamentos Humanos (CEARAH Periferia). O comitê ficou sob a coordenação do Instituto de Planejamento de Fortaleza (IPLANFOR), com apoio da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Habitacional de Fortaleza (HABITAFOR) (FORTALEZA, 2013a). Ainda que a HABITAFOR apareça como parte desse processo, ela ainda não se faz protagonista nessa luta, ratificando a desconexão da política urbana com a política habitacional em Fortaleza. Essa fraca atuação foi confirmada na fala da entrevistada 1.

Vale salientar a participação de outras instituições nesse processo, não previstas em Decreto, mas que foram de extrema relevância para o acompanhamento das decisões, a cobrança de pautas importantes e o apoio à sociedade civil, representada pelas 9 ZEIS acima citadas. Essas instituições referidas são a Universidade Federal do Ceará – UFC e o Instituto de Assessoria para o Desenvolvimento Humano – IADH (FORTALEZA, 2015a). Em entrevista, a representante do LEHAB/UFC (Entrevistada 1) conta que o papel do Laboratório nas reuniões foi de defensor pleno dos interesses da comunidade, e não da Prefeitura.

A proposta inicial era que fosse elaborado, num prazo de 120 dias úteis, um relatório apresentando a atual situação das zonas de interesse social na cidade de Fortaleza. Para a elaboração do produto final, denominado Relatório das ZEIS, foram utilizadas, como principais fontes, as informações contidas no Plano Local de Habitação de Interesse Social (PLHIS), desenvolvido entre 2010 e 2012 na gestão municipal anterior. Nesse documento são caracterizados os assentamentos irregulares de Fortaleza, além de demarcar vazios urbanos que podem ser utilizados para implementação de HIS ou equipamentos públicos para atender determinadas comunidades (FORTALEZA, 2013b). Entretanto, a sociedade civil e representantes consideraram o prazo dado de 120 dias úteis insuficiente e propenso a resultar em um relatório raso e superficial, sendo sugerido um nivelamento das informações de “como estão as ZEIS no momento”, para então seguirem com o processo (entrevistada 1).

No dia 26 de outubro, seis meses após o início das reuniões, foi entregue o Relatório das ZEIS para o prefeito em uma solenidade realizada no Paço Municipal. Apesar do Comitê Técnico ter apenas 120 dias para entregar o documento detalhado ao Poder Executivo depois da publicação do decreto, o saldo final de tempo gasto nesse processo foram de quase dois anos. O Relatório das ZEIS foi composto não apenas por informações de cada ZEIS do tipo 1 e 3, mas também resultou em proposições importantes para dar continuidade ao processo de regulamentação desse instrumento.

Algumas das principais proposições do Relatório da ZEIS (2015a) foram: “Criação da Comissão de Proposição e Acompanhamento da Regulamentação das ZEIS, de caráter temporário, vinculada ao gabinete do prefeito”; “Definição de instância de governo responsável pela coordenação definitiva da implementação das ZEIS”; “Instituição de um fundo público para as ZEIS”; “Inclusão de programas e ações destinados às ZEIS nos instrumentos de planejamento (LOA, LDO e PPA)”; “Criação de novas ZEIS 1 e ZEIS 3, a

7Lagamar, Pirambu, Poço da Draga, Praia do Futuro, Moura Brasil, Mucuripe, Serviluz, Pici e Bom Jardim.

partir dos dados do PLHIS/Relatório das ZEIS, atendendo aos critérios do Plano Diretor Participativo de Fortaleza-2009”.

Cabe aqui traçar um paralelo do que ocorreu em Recife, que se destaca pelo pioneirismo na discussão e implementação dessa pauta e que teve seu processo aprovado na Câmara dos Vereadores em 1987, anterior ao Estatuto da Cidade. A criação da Lei do PREZEIS8 foi uma iniciativa da própria sociedade civil, com o apoio da Comissão Arquidiocesana de Justiça e Paz, que cansada de esperar pela iniciativa da prefeitura, elaborou um projeto de lei (Projeto de Lei do PREZEIS) visando à regulamentação do Art.14 da LUOS, onde se fixou normas, procedimentos e uma estrutura para urbanizar e legalizar todas as ZEIS (ALBUQUERQUE, 2006). Em Fortaleza, muito também se conseguiu através da pressão popular, embora não fosse o suficiente para a criação da lei regulamentadora das ZEIS, já que o Poder Público não chegou a concluir o processo. A Lei do PREZEIS estabelece um sistema de gestão participativa, que se realiza com base em duas instancias. A primeira instância são as COMULs (Comissões de Urbanização e Legalização) formadas por membros da Empresa de Urbanização do Recife (URB-Recife), órgão público, entidade civil e moradores da comunidade, sendo esses responsáveis por trabalhar diretamente com a população de cada ZEIS no desenvolvimento, formulação, implementação e fiscalização dos planos de urbanização e regularização fundiária. A segunda instância é o FORUM permanente do PREZEIS, composto por membros de cada COMUL, movimentos populares, entidades de pesquisa e profissionais, órgão publico, URB- Recife, COHAB-PE e ONGs, sendo assim uma instancia que abrange diversos segmentos da sociedade para a definição de metas e estratégias gerais e é também responsável por gerir os recursos do Fundo do PREZEIS (MIRANDA; MORAES, 2004).

Em Fortaleza, a Comissão de Proposição e Acompanhamento das ZEIS ficará responsável por determinar a estrutura organizacional que acompanhará a pauta das ZEIS na cidade. Esse processo determinará também a questão orçamentária que, a exemplo de Recife, poderá contar com um Fundo próprio para as ZEIS. Essas e outras atribuições ainda não foram definidas, visto que a Comissão está ainda em suas reuniões iniciais, como se pode ver a seguir.

AVANÇOS RECENTES Como dito anteriormente, ao final do Relatório das ZEIS, aparece como uma das

proposições a criação de uma “Comissão de Proposição e Acompanhamento da Regulamentação das Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS)”, que possui como objetivo, dentre outras coisas, a deliberação acerca da proposta de legislação regulamentadora das ZEIS. No dia da solenidade de entrega do Relatório ao prefeito de Fortaleza, o Decreto que instituía a Comissão foi assinado simbolicamente com a promessa de oficializar o ato posteriormente (Entrevistada 1). Entretanto, essa oficialização demorou oito meses para acontecer. Assim, no dia 01 de julho de 2016, o Decreto que institui a Comissão foi publicado em Diário Oficial, dando permissão e abertura para o início dos trabalhos, que ocorreu no dia 20 de julho com a primeira reunião.

Os fatos conseguintes ainda são recentes, portanto inconclusivos. Por ora, as reuniões continuam ocorrendo, com a participação dos mesmos atores sociais (representando sociedade ou instituição) interessados na temática, com a finalidade de darem continuidade ao trabalho iniciado durante a fase do Comitê Intersetorial.

8Lei Ordinária Nº16.113/95 que dispõe sobre o Plano de Regularização das Zonas Especiais de Interesse

Social, popularmente conhecido como PREZEIS.

PROCESSOS PARALELOS Observa-se em Fortaleza a falta de correlação entre as diferentes frentes de

planejamento que lidam com as Zonas Especiais de Interesse Social, dificultando seu processo de regulamentação. Atualmente, existem três importantes processos em andamento que tratam, em seus respectivos documentos, sobre as ZEIS, são eles: a implementação dessas zonas, exposta anteriormente, conduzido pelo IPLANFOR, a revisão da Lei de Uso e Ocupação do Solo (LUOS), dirigida pela Secretária de Urbanismo e Meio Ambiente (SEUMA), e a elaboração do documento do plano estratégico, Fortaleza 2040, comandado pelo IPLANFOR e pela Fundação Cearense de Pesquisa e Cultura – FCPC (BRASIL, 2016), as duas últimas serão apresentadas a seguir.

A LUOS vigente (Lei n. 7.987) é datada de 1996, sendo imprescindível sua revisão e regulamentação, visto a revisão do PDPFor, aprovado em 2009. Para esta finalidade a PMF concedeu à SEUMA a incumbência de realizar esse processo, que teve início em 2014. A revisão da lei foi composta por uma equipe multidisciplinar de 18 profissionais, de acordo com a Entrevistada 39. Um ponto negativo foi a ausência de representante da sociedade civil nesse grupo. A participação popular se deu apenas por meios online, via blog ou email, e por reuniões públicas realizadas, muitas vezes, em horários inacessíveis a uma grande parcela da população (LEHAB, 2014).

Essa nova legislação, que está na Câmara Municipal em processo de aprovação, poderia ser de fundamental importância para avanços no âmbito da moradia de interesse social, entretanto foi revisada sem o auxílio de outros órgãos que tratam do assunto, como o IPLANFOR e HABITAFOR, mostrando a falta de diálogo entre os mesmos. As Zonas Especiais de Interesse Social, que são um instrumento que garante tais avanços, foram citadas apenas em alguns momentos, sem haver muito progresso. Ela determina algumas regras e parâmetros, porém só irão valer até que a lei especifica regulamente as zonas. Além disso, o mapa de delimitação das ZEIS, enviado para a Câmara, possui alguns erros, dentre eles, a não delimitação da ZEIS do Poço da Draga. Segundo o LEHAB, em nota, a Prefeitura alegou que foi somente um engano, e que o mapa será refeito e reenviado à Câmara.

Paralelo à revisão da LUOS, vem se desenvolvendo o projeto Fortaleza 2040. Apresentado a sociedade civil em 2014 pela PMF, o projeto consiste na criação de um plano de desenvolvimento para a cidade de Fortaleza com estratégias a serem implantadas a curto, médio e longo prazo, que servirão para nortear as decisões do poder público quanto ao crescimento da capital cearense pelos próximos 24 anos. De acordo com a Entrevistada 1, o LEHAB juntamente com alguns membros da comunidade desconsideram o projeto como um processo legítimo e questionam a participação social divulgada pelo Plano. Ela conta que a proposta apresentada para o Eixo Urbanístico com os chamados “corredores urbanos” impactam diretamente em algumas comunidades, entretanto, a própria comunidade não compactua com as ideias ali apresentadas.

TRÊS EIXOS QUE DEVERIAM TER AVANÇADO A partir de então, tendo em consideração o histórico de avanços e retrocessos

percebidos na temática da habitação social em Fortaleza, serão abordados aqui os cenários considerados favoráveis, do que de fato deveria ter caminhado, em três eixos de análise: no âmbito da governança municipal, na ambiência legal e na viabilidade financeira.

9Em entrevista concedida aos autores em 10 ago. 2016

Governança municipal O impedimento no avanço relacionado à governança municipal encontra-se na

lentidão em que o processo de regulamentação das ZEIS é conduzido pelo Executivo de Fortaleza, independente de gestão partidária. Como visto anteriormente, são muitos retrocessos existentes frente aos poucos avanços alcançados pela resistência e cobrança da sociedade civil.

Para ilustrar essa situação, na Figura 4 se observa a relação entre datas previstas para ações que, de certa forma, interferem no processo de Regularização Fundiária e as datas em que realmente foram efetivadas.

Figura 4: Quadro de eventos e seus prazos

DATA PREVISTA REALIZADO EM

Revisão do Plano Diretor de Desenvolvimento Urbano (1992) 2002 2009

Revisão da Lei de Uso e Ocupação do Solo Na época de revisão do Plano

Diretor (2009)

Em processo de votação na Câmara (2015)

Entrega do Relatório das ZEIS abril de 2014 outubro de 2015

Publicação do Decreto que institui a Comissão de Proposição e Acompanhamento de Regulamentação das ZEIS

2015 2016

Fonte: Produção dos autores

Um cenário positivo de uma governança efetiva que atenda aos anseios da

sociedade civil, e não só de uma pequena parcela da população, envolve a necessidade de uma melhor estruturação para a participação social no processo de regulamentação das Zonas Especiais de Interesse Social. Tendo isso, considerando que a melhor opção seria a criação de um Grupo Gestor responsável por coordenar e gerir os interesses de cada ZEIS de assentamento em Fortaleza (sabendo que cada ZEIS possui sua peculiaridade e característica, logo, necessita de um Grupo Gestor próprio), a cidade ainda está em posição inicial para que isso se efetive. Para a criação do Grupo Gestor, seria necessária a regulamentação disso em Lei, e a Comissão responsável pela elaboração da proposta dessa legislação ainda se encontra nas primeiras reuniões.

Levanta-se então o questionamento, assim que instituída a Comissão definida pelo decreto, de que forma o poder público irá cumprir seu papel de articulador, supervisionando tais comissões, levando em consideração o desfalque de funcionários públicos capacitados para tal tarefa e o descompromisso de alguns em relação a assiduidade – de tal forma que, em alguns casos, submetem terceiros para lhes representar nas reuniões, sendo esses alheios ao assunto abordado, como esclarece a Entrevistada 1 ao comentar da participação de alguns membros de Secretarias Municipais nas reuniões do Comitê.

Ambiência legal No tocante à ambiência legal, pode-se destacar as falhas ocorridas pós PDPFor. Os

instrumentos não regulamentados em legislação própria protelam os benefícios que os mesmos poderiam trazer às áreas de habitação social.

Toma-se aqui como exemplo o caso de São Bernardo do Campo, onde as ZEIS de vazios urbanos funcionam com o auxílio dos instrumentos: IPTU Progressivo no Tempo; Parcelamento, Edificação e Utilização Compulsórios – PEUC; e o Direito de Preempção, regulamentados e funcionando devidamente à favor do instrumento de ZEIS (MALVESE, 2015).

Considerando favorável, dessa forma, um cenário no qual há regulamentação em lei desses e demais instrumentos, para que os mesmos possam contribuir na implementação das ZEIS, principalmente as que se referem aos vazios urbanos em Fortaleza, a cidade ainda se mostra longe de alcançar esse feito. Isso porque ainda há mais debate em torno das ZEIS de assentamentos (ZEIS 1) do que das ZEIS de vazios (ZEIS 3). É importante destacar: não se fala aqui da completa ausência de debate acerca das ZEIS 3, mas sim da menor representatividade deste em detrimento das ZEIS 1. Como corroboração disso temos o relato da Entrevistada 2, lamentando que as exigências quanto aos demais instrumentos de apoio às ZEIS e zonas da cidade tenham ficado em segundo plano à época do fechamento da confecção do PDPFor.

Nos moldes legais vê-se também a necessidade de revogação dos artigos que provocaram retrocessos nas conquistas do direito à moradia, a exemplo dos citados anteriormente no capítulo “Retrocessos”.

Viabilidade financeira Em relação à viabilidade financeira para implementação das ZEIS, faz-se uma breve

análise em relação aos três instrumentos que compõe o modelo orçamentário brasileiro - o Plano Plurianual (PPA), a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e a Lei Orçamentária Anual (LOA) – e as Zonas Especiais de Interesse Social na cidade de Fortaleza, visto que não existe ainda um Fundo que gerencie os investimentos para as ZEIS.

No que se refere ao PPA 2014-2017, Lei nº 10.095/2013, nota-se que o mesmo não contempla diretamente a implantação das ZEIS, no entanto o documento está estruturado de tal maneira, com diretrizes norteadoras, que tende a facilitar tal implantação.

Em relação à LDO 2015, vale ressaltar que pela primeira vez no município, desde a criação das ZEIS pelo Plano Diretor em 2009, uma LDO fez expressa referência às ZEIS como prioridade, na forma que se segue:

Quanto à melhoria da qualidade de vida e justiça social: prover meios de acesso à habitação de interesse social e à regularização fundiária, priorizando as comunidades das Zonas Especiais de Interesse Social (ZEIS 1 e 2) mais vulneráveis e conferindo celeridade ao novo processo de cadastramento para programas habitacionais de Fortaleza (FORTALEZA, 2015b).

Para melhor entendimento, foi feito um quadro (fig. 5) que expõe o que está previsto

para as ZEIS (ou no que concerne à habitação social e à regularização fundiária) em cada instrumento orçamentário exposto acima entre os anos de 2014 e 2017:

Figura 5: Quadro de provisões dos instrumentos PPA, LOA E LDO (2014-2017)

2014 2015 2016 2017 PPA Não contempla diretamente a questão das ZEIS, mas elaborado de tal

maneira, com eixos intersetoriais, que ajudaria a implementar o instrumento.

LOA Previa intervenções na ZEIS do

Pirambu, através do Projeto Vila do Mar (Programa nº 0084

Programa de Habitação de

Fortaleza/PAC)

Lista despesas financeiras para regularização

fundiária e melhorias

urbanísticas na ZEIS do Bom

Jardim

Consta despesas para implantação dos

Conselhos Gestores das ZEIS - 8 unidades -, representando um

investimento de R$246.000 (3,24% do

total). Além disso, apresenta investimentos

para Regularização Fundiária das ZEIS,

R$254.000 (3,34% do total), e intervenções

específicas no caso da ZEIS do Bom Jardim, R$ 150.000. Totalizando, nas

referidas despesas tocantes às ZEIS, 8,56% a mais do total de despesas

apresentados na LOA 2015.

-

LDO Abordam de forma tangencial o tema das ZEIS.

Fonte: Produção dos autores, baseada nas informações presentes na LOA, PPA e LDO, disponíveis em: <http://transparencia.fortaleza.ce.gov.br/index.php/orcamento>. Acesso

em: 28 jul. 2016. Conclui-se, dessa forma, que os investimentos financeiros para intervenções em

ZEIS ainda são destoantes e fragmentados em relação aos demais gastos da gestão. Vale ressaltar aqui o caso de Recife como exemplo, na esfera orçamentária, como

referencia estudada de estrutura institucional e organizacional. No ano de 1993 foi sancionada em Recife a Lei nº 15.790/93, que institui e regulamenta o Fundo Municipal do PREZEIS. Isso significa que, além da estrutura federal de Orçamento Participativo (PPA, LDO e LOA), a cidade de Recife possui esse Fundo que permite a captação e gestão de recursos destinados às ações relacionadas à pauta de Regularização Fundiária e gestão participativa setorial no município. Isso reflete o avanço da gestão democrática de determinada politica pública: a política pública da habitação de interesse social. A lei do PREZEIS instaura, além disso, a Câmara de Urbanização, a Câmara de Legalização e a Câmara de Orçamento e Finanças, responsáveis, dentre outras coisas, por estabelecer prioridades de aplicação do Fundo do PREZEIS em relação a obras, estabelecer prioridades para a aplicação dos recursos do Fundo do PREZEIS quanto à regularização fundiária e fiscalizar a aplicação dos recursos do Fundo do PREZEIS, respectivamente. Segundo De La Mora (2003), esse modelo funcionou bem durante mais de dez anos:

O PREZEIS foi criado e implantado na fase da transição, lenta e difícil, entre o modelo de gestão autoritária, fragmentada, desarticulada e tecnocrática da

cidade do capital, excludente e repressiva e o novo modelo de gestão democrática, articulada e popular, que tem como lema: uma Cidade para Todos. A estratégia de criar e implantar ilhas de gestão democrática e inclusão social na cidade excludente deu certo durante esta fase de transição. Pelo menos nas ZEIS, os planos urbanísticos, contendo programas de urbanização e regularização fundiária, conseguiram ser preservados da lógica do capital segregacionista do ponto de vista espacial e excludente do ponto de vista social (DE LA MORA, 2003).

Vale salientar que, em seu texto, De La Mora (2003) ressalta os atritos entre o

gerenciamento do programa da Gestão Democrática do Orçamento Público (na época, considerado novo) e o PREZEIS, depois de um horizonte de mais de 10 anos da implantação do PREZEIS. Tais atritos foram resultado de oposições de cunho político, com tomada de decisões baseadas em rixa partidária, resultando no esvaziamento do Fundo entre os anos de 2001 a 2012. Atualmente, o instrumento de participação do Orçamento Participativo já não existe mais em Recife, enquanto o PREZEIS continua atuando (Entrevistado 4). O PREZEIS ainda vigora pois foi, e continua sendo, um resultado da luta de participação social conquistada, tendo assim grande representatividade e força de ação.

Após essa breve explanação e considerando a descentralização e fragmentação dos investimentos em ZEIS presentes na lei orçamentária de Fortaleza, como já exposto anteriormente, cabe aqui fazer uma curta análise de dois cenários favoráveis a essa questão e que representam o que deveria ter avançado no município.

O primeiro cenário diz respeito à criação de um fundo público responsável por receber os recursos para custear as questões da habitação de interesse social na capital do Ceará. A exemplo de Recife, vê-se a necessidade da criação de um grupo responsável por gerir o recebimento desses recursos no tocante à aprovação e encaminhamento das propostas, chamado aqui de Grupo Gestor. Fortaleza atualmente não conta com esse Grupo Gestor. O processo de implementação dessa equipe, bem como a criação de Fundo próprio para as ZEIS, estão descritas nas competências e nas proposições necessárias atribuídas à Comissão de Proposição e Acompanhamento da Regulamentação das ZEIS, ainda em fase de reuniões iniciais.

O segundo cenário diz respeito à inclusão de programas e ações destinados às ZEIS nos instrumentos do orçamento de Fortaleza, já explanados anteriormente.

Em suma, o não avanço em relação à governança, à ambiência legal e à viabilidade financeira está atrelado à descontinuidade em que o processo é tratado no Executivo. Os grandes hiatos entre as ações relacionadas à regularização urbanística e fundiária dessas Zonas acabam por desacelerar o processo que já deveria estar bem encaminhado no contexto da cidade de Fortaleza.

CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao elencar os acontecimentos referentes às ZEIS, desde a formação dos primeiros

assentamentos precários até atualmente, como foi feito no decorrer deste trabalho, conclui-se que a temática de regularização urbanística e fundiária bem como a pauta do direito à moradia não são assuntos prioritários em nenhuma gestão municipal ao longo desses anos. De fato, as conquistas alcançadas até então se devem em grande parte pela forte mobilização popular e apoio de entidades e instituições que discutem a temática desde antes mesmo da elaboração do atual Plano Diretor da cidade.

Essas referidas Zonas ainda são palco de inúmeros conflitos dos mais variados tipos, já que a sua marcação não configura em garantia dos seus direitos, muitos deles relacionados com a especulação imobiliária e as vontades dos grandes possuidores de terras da capital. A não garantia dos seus direitos faz com que os moradores dessas

áreas tenham receio pela segurança e pela permanência em suas casas, fato que a situação adotaria outro cenário se uma lei que os regulamentassem existisse. Talvez esse seja o principal motivo de haver tanto empenho popular na luta travada entre sociedade e Poder Público na exigência de providências efetivas para essas ZEIS. Como sugere o Entrevistado 4, quando uma conquista é tida através do empenho dos movimentos sociais e se tal conquista configurar um anseio atemporal, podem passar diferentes gestões e diferentes visões políticas, a participação popular e os resultados positivos alcançados permanecerão.

Torna-se importante, dessa forma, acompanhar os fatos conseguintes relacionados às ZEIS que tramitam no Executivo Municipal, na forma de pesquisadores, acadêmicos e, sobretudo, cidadãos. É fundamental exigir a garantia dos direitos reservados a essas Zonas, a implementação também dos demais instrumentos que servem de apoio ao funcionamento das ZEIS, observar a destinação orçamentária para ZEIS e se realmente isso se efetiva, reivindicar as tomadas de decisões voltadas também para as ZEIS 3 e, por fim, cobrar os resultados prometidos pela Comissão das ZEIS, formada recentemente e em processo de execução do trabalho.

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