sÍndromes na prÁtica geriÁtrica · a aula abordará as principais alterações encontradas na...

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12 Ementa O módulo se propõe a apresentar síndromes típicas desta faixa etária que põem em risco a autonomia e o status funcional do indivíduo mais velho. Conteúdo programático e docentes Insuficiência cerebral: demências e delirium Carlos Montes Pai- xão Júnior. Médico clínico e geriatra, médico e coordenador do Setor de Geriatria do Hospital Universitário da UFRJ, mestre em Epidemiologia IMS/ UERJ, especialista em Geriatria pela Universidade de Paris, França; e Emylucy Martins Paiva Paradela. Médica geriatra, mestre em Saúde Coletiva na área de Epidemiologia. Imobilidade e úlceras de decúbito Ana Cristina Bruno Franzoi. Médica fisiatra, professora adjunta no Serviço de Medicina Física e Re- abilitação, HUCFF/ UFRJ, médica ABBR/ RJ, Ph.D. em Neurologia, pela UFRJ, especialista em Fisiatria pela UFRJ. Quedas e distúrbios da marcha Sérgio Telles Ribeiro Filho. Médi- co, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia – Secção Rio de Janeiro – SBGG/ RJ, especialista em Geriatria – SBGG/ RJ. Fragilidade e iatrogenia Rodrigo Serafim. Médico clínico e geriatra pela SBGG, médico do Serviço de Clínica Médica, Setor de Geriatria HUCFF/ UFRJ. Incontinência urinária e incontinência fecal Rodrigo Serafim e MÓDULO SÍNDROMES NA PRÁTICA GERIÁTRICA Coordenação – Professor Carlos Montes Paixão Júnior

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EmentaO módulo se propõe a apresentar síndromes típicas desta

faixa etária que põem em risco a autonomia e o status funcional doindivíduo mais velho.

Conteúdo programático e docentesInsuficiência cerebral: demências e delirium – Carlos Montes Pai-

xão Júnior. Médico clínico e geriatra, médico e coordenador do Setor deGeriatria do Hospital Universitário da UFRJ, mestre em Epidemiologia IMS/UERJ, especialista em Geriatria pela Universidade de Paris, França; e EmylucyMartins Paiva Paradela. Médica geriatra, mestre em Saúde Coletiva naárea de Epidemiologia.

Imobilidade e úlceras de decúbito – Ana Cristina Bruno Franzoi.Médica fisiatra, professora adjunta no Serviço de Medicina Física e Re-abilitação, HUCFF/ UFRJ, médica ABBR/ RJ, Ph.D. em Neurologia,pela UFRJ, especialista em Fisiatria pela UFRJ.

Quedas e distúrbios da marcha – Sérgio Telles Ribeiro Filho. Médi-co, vice-presidente da Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia –Secção Rio de Janeiro – SBGG/ RJ, especialista em Geriatria – SBGG/ RJ.

Fragilidade e iatrogenia – Rodrigo Serafim. Médico clínico e geriatrapela SBGG, médico do Serviço de Clínica Médica, Setor de GeriatriaHUCFF/ UFRJ.

Incontinência urinária e incontinência fecal – Rodrigo Serafim e

MÓDULO

SÍNDROMES NA PRÁTICAGERIÁTRICACoordenação – Professor Carlos Montes Paixão Júnior

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Leonam da Costa Martins. Médico do Serviço de Clínica Médica doHospital Universitário Clementino Fraga Filho, da UFRJ, especialista emGeriatria e Gerontologia pela Sociedade Brasileira de Geriatria eGerontologia/ AMB.

Ementas Insuficiência cerebral: demências e delirium – Carlos Montes Paixão

Júnior e Emylucy ParadelaAs demências são doenças degenerativas, cujo principal fator de

risco é a idade. Precisam ser corretamente diagnosticadas para benefíciodos pacientes, de suas famílias e da sociedade. Seu diagnóstico é emi-nentemente clínico e, por isso, é necessário cuidado e treinamento. Odelirium é uma emergência geriátrica que muitas vezes é confundidacom depressão, demência ou psicose. Idosos em delirium têm elevadosíndices de morbidade e mortalidade. Prevenir, diagnosticar e tratar cor-retamente o delirium são importantes tarefas.

Imobilidade e úlceras de decúbito – Ana Cristina Bruno FranzoiSíndrome da imobilidade. Definição. Causas. Efeitos da Imobili-

dade – Sistema cardiovascular, respiratório, musculoesquelético, gastrin-testinal, urinário, endócrino, nervoso e tegumentar. Medidas preventi-vas. Considerações finais.

Úlceras de pressão. Definição. Incidência. Alterações da pele nosidosos. Avaliação do risco. Fatores de risco. Escala de Braden. Interven-ção. Avaliação e documentação. Estágios. Mapa de cicatrização (PUSH).Tratamento. Considerações finais.

Quedas e distúrbios da marcha – Sérgio Telles Ribeiro FilhoA aula abordará as principais alterações encontradas na marcha dos

idosos bem como diagnosticar e tratar estas alterações. Causas, conse-qüências e prevenção de quedas em idosos.

Fragilidade e iatrogenia – Rodrigo SerafimFragilidade é um estado de vulnerabilidade fisiológica que se

relaciona diretamente com o envelhecimento e com as próprias alte-rações evolutivas do organismo. Muitas vezes não é valorizada ou éconfundida com o envelhecimento saudável. Ao mesmo tempo, estegrupo de pacientes se torna mais propenso às lesões iatrogênicas e

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necessitam de terapêutica apropriada. As lesões iatrogênicas se corre-lacionam com a Síndrome de Fragilidade, como causa e efeito. Cabeao profissional de Saúde aprender a reconhecer o idoso frágil e saberevitar iatrogenias que desencadeiem ou alimentem o ciclo de fragili-dade.

Incontinência urinária e incontinência fecal – Rodrigo Serafim eLeonam da Costa Martins

Incontinência urinária é a dificuldade de controle da diurese, poresforço, transbordamento ou urgência. Incontinência fecal é a incapaci-dade de controlar a passagem de gás e fezes pelo reto. Pode ter umdesastroso impacto social e na qualidade de vida. Quando somada àincontinência urinária, é considerada a segunda maior causa de institu-cionalização. Entretanto, freqüentemente não são referidas espontanea-mente pelo paciente, muitas vezes devido ao preconceito. Cabe ao pro-fissional de Saúde estar preparado para diagnosticar, investigar e ofere-cer o tratamento correto.

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DEMÊNCIASIntroduçãoAs síndromes demenciais se caracterizam por uma deteri-

oração em várias áreas das atividades cognitivas, geralmente com ma-nutenção do nível de consciência normal. Seu diagnóstico se tornamais seguro quando os déficits persistem por mais de três a seis mesese interferem de forma clara com o desempenho social ou ocupacionaldo indivíduo.

EpidemiologiaA prevalência das síndromes demenciais depende bastante da es-

trutura etária da população, pois, aparentemente, a prevalência da do-ença duplica praticamente a cada cinco anos a partir dos 60 anos. Apro-ximadamente uma a cada 100 pessoas na faixa etária dos 60 aos 69 anosé afetada, mas o valor correspondente chega a 50% nos idosos com maisde 90 anos. Em geral, as demências mais freqüentes são causadas porDoença de Alzheimer, e correspondem de 50 a 70% dos casos. Em se-guida, Doença de Corpos de Lewy e Demências Vasculares, em cerca de20% dos casos. Distúrbios metabólicos e algumas outras causas tratáveisperfazem aproximadamente 5% das demências.

Fatores de riscoEm geral, fatores de risco aceitos como definitivos são a idade, os

alelos APOE ε4, agregação familiar. Acidentes vasculares cerebrais au-mentam em nove vezes o risco de demência no primeiro ano e duplicamo risco por ano subseqüente. Diabetes mellitus, fibrilação atrial,aterosclerose, isquemia cardiovascular, álcool, hipertensão sistólica grave,

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INSUFICIÊNCIA CEREBRAL: DEMÊNCIASE DELIRIUMCarlos Montes Paixão Júnior eEmylucy Martins Paiva Paradela

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ingesta elevada de gorduras saturadas e colesterol parecem ser outrosfatores associados a aumento de risco.

DiagnósticoO diagnóstico das síndromes demenciais é eminentemente clínico

e, talvez por isto, freqüentemente esquecido. O não reconhecimento desintomas psiquiátricos associados às demências, o preconceito frente ao in-divíduo idoso, a pressa no “rótulo” de demência, a confusão com síndromesfocais, são apenas alguns fatores que confundem o diagnóstico. Em geral, oscritérios apontam para o aparecimento de distúrbios cognitivos múltiplospresentes há meses ou anos, como distúrbios de memória, linguagem, jul-gamento, função executiva; declínio funcional a partir de um nível funci-onal e cognitivo prévio; e que tais distúrbios estejam presentes fora docontexto de delirium. Os critérios também mencionam alteração da persona-lidade, ou seja, modificação ou acentuação dos traços pré-mórbidos.

Uma avaliação completa deve incluir história médica, neurológica,social, psiquiátrica e exame físico detalhado, na busca de sinais e sinto-mas que possam orientar o diagnóstico diferencial. Testes psicométricossimples, como o Miniexame do Estado Mental, Teste do Relógio, Escalade Blessed; exames laboratoriais para excluir causas tratáveis, e tomografiacomputadorizada ou ressonância magnética de crânio.

O diagnóstico diferencial pode ser dividido em patologias não-demenciais e demenciais. No primeiro grupo são incluídas afecções comodelirium, distúrbios tímicos, distúrbios mnésicos puros, quadros psicóticos,síndromes afásicas, distúrbio cognitivo relacionado à idade e uso defármacos, principalmente psicotrópicos e drogas cardiovasculares, quepodem ocasionar deficiências cognitivas. No grupo das demências, estaspodem ser subdivididas em primárias, demências, distúrbios endócrinose metabólicos, deficiências vitamínicas e quadros infecciosos.

DELIRIUM – CONFUSÃO MENTAL AGUDAConceitoÉ uma síndrome que se inicia subitamente, tem curso flutuante e

se manifesta por comprometimento global das funções cognitivas, distúr-bio da atenção e do ciclo sono–vigília e da atividade psicomotora anor-malmente elevada ou reduzida. Em sua quase totalidade, o delirium ésecundário a uma doença física grave, a infecções, reação adversa a umamedicação, abstinência a hipnóticos e sedativos, álcool ou outra droga de

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abuso. No idoso, a forma mais comum de apresentação de delirium é ahipoativa, com sonolência ou torpor, por isso mesmo é raramentediagnosticada. Nessas situações, geralmente são os familiares os primeirosa perceberem as primeiras alterações do estado mental do paciente,acham-no “muito quietinho”.

Características secundáriasAssocia-se a distúrbio do ciclo sono–vigília. Alguns pacientes po-

dem se mostrar sonolentos durante o dia e agitados à noite, com dificul-dade para dormir. Alterações do comportamento psicomotor tambémpodem estar presentes. Muitos pacientes ficam inquietos, tentam se le-vantar inoportunamente do leito, arrancam equipo endovenoso, catete-res, sondas, etc. Extremos da atividade psicomotora podem se alternarno curso de 24 horas num mesmo paciente.

DiagnósticoNo vocabulário leigo, delirium denota um estado de hiperatividade

francamente psicótico. O Manual Estatístico e Diagnóstico da AssociaçãoPsiquiátrica Americana (DSM-IV) estabelece que se requer a presençade quatro características fundamentais para o diagnóstico de delirium:distúrbio da consciência, alteração na cognição, rápido desenvolvimentodo distúrbio e evidência de que o distúrbio seja causado pelas conse-qüências fisiológicas diretas de uma condição clínica geral qualquer.

Fatores de riscoIdade, gravidade da doença física subjacente e limitação da função

cognitiva.

Diagnóstico diferencialA relação entre delirium e demência é mais complexa do que até

então considerada. Ambas as síndromes coexistem em muitos pacientesidosos hospitalizados, e demência é um dos fatores de risco mais importan-tes para delirium. Cerca de 40% dos pacientes com delirium na forma hipoativa,quieta, introvertida, são erroneamente diagnosticados como deprimidos.

TratamentoÉ uma emergência médica cujo desfecho depende da causa. A

abordagem inicial deve se centrar no diagnóstico e tratamento de qual-

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quer fator causal ou contribuinte. Medidas de apoio com vista às funçõesvitais do paciente: a) hipoativo, calmo, quieto não requer tratamentoespecífico; b) hiperativo, agitado, põe em risco sua própria saúde e a dosdemais, dificulta a abordagem diagnóstica e terapêutica e sobrecarregaas equipes médicas e de enfermagem. Se for necessário sedar o pacienteidoso, a droga de escolha é o haloperidol (Haldol) 0,5 a 1,0 mg por viaoral ou parenteral, de 30 em 30 minutos, até que o paciente fique calmoou sedado. Para os raros casos de agitação incontrolável com as medidasacima descritas, a exemplo de pacientes idosos francamente agitados naenfermaria ou em UTIs, haloperidol endovenoso, 5 mg a cada 30 minu-tos até o controle da agitação ou em associação com Diazepam, na pro-porção de 4 mg de haloperidol para 1 mg de Diazepam.

PrevençãoRecente trabalho de Inouye e colaboradores demonstra que pode-

mos reduzir a incidência global de delirium com abordagem preventivade fatores de risco como deficiência cognitiva, visual e auditiva, privaçãodo sono, imobilidade e desidratação. Essa intervenção pode reduzir aincidência de delirium em 40%.

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SÍNDROME DA IMOBILIDADESão sinais e sintomas secundários à imobilidade, que ocor-

rem na maioria dos sistemas, e podem resultar em importantes compli-cações. Os pacientes idosos são mais vulneráveis em função da diminui-ção de sua reserva fisiológica. As causas da imobilidade podem variar emfunção de seqüelas neurológicas, ortopédicas, reumáticas, e algumas vezespor iatrogenia.

Efeitos da inatividade prolongada no sistema cardiovascularAumento da freqüência cardíaca de repouso. Aumento do retorno

venoso e do volume intravascular, com aumento da diurese e diminuiçãodo volume plasmático. Há diminuição da tolerância ao exercício e dimi-nuição da tolerância ao ortostatismo – hipotensão ortostática. Há estasevenosa nos membros inferiores – com a ausência de contração dos mús-culos da panturrilha – e aumento da viscosidade sanguínea, e nesse casoa imobilidade é um importante fator de risco para a trombose venosaprofunda – TVP e suas complicações.

Efeitos da inatividade prolongada no sistema respiratórioNa posição supina, há restrição da excursão diafragmática e dos

músculos intercostais e maior esforço na respiração. Com o aumento dovolume sanguíneo no tórax, há redução nos volumes pulmonares com di-minuição da saturação de O2 e acúmulo de líquido intersticial nas bases.

Efeitos da imobilidade prolongada: sistema musculoesqueléticoHá alterações musculares com perda de força e atrofia muscular,

a intensidade da atrofia parece estar relacionada com o posicionamento

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IMOBILIDADE E ÚLCERASDE DECÚBITOAna Cristina Bruno Franzoi

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– músculos encurtados sofrem mais atrofia. Há diminuição da sínteseprotéica e da produção de colágeno. Em função de posicionamentosviciosos é freqüente a instalação de contraturas musculotendinosas. Quantoàs alterações ósseas, com a imobilização há um predomínio da atividadeosteoclástica, com redução da massa óssea e osteoporose. Há aumento docálcio urinário – com pico em cinco semanas. Em relação às modifica-ções articulares, há diminuição do líquido sinovial, com prejuízo danutrição da cartilagem articular. Ocorre espessamento sinovial, degene-ração cartilaginosa e hipertrofia do tecido conectivo peri-articular. Comoconseqüência, teremos as contraturas e anquiloses.

Efeitos da imobilidade prolongada: sistema gastrintestinalA passagem do alimento no esôfago é mais lenta, com maior tem-

po de permanência do alimento no estômago. Há aumento da acidezgástrica por ativação simpática e inibição da secreção gástrica de bicarbo-nato. Há diminuição da motilidade intestinal, com constipação, e daforça de evacuação. Devemos estar atentos a quadros de disfagia, impor-tantes fatores de risco para a pneumonia de aspiração.

Efeitos da inatividade prolongada: sistema urinárioEstase urinária com formação de cálculos. A posição supina dificul-

ta o ato de urinar, é freqüente o aumento do volume urinário residualpós-miccional. Essas alterações predispõem a infecções do trato urinário.Se possível, a postura sentada deve ser adotada para o ato de micção edefecação.

Efeitos da inatividade prolongada: sistema endócrinoA alteração endócrina mais descrita é a redução da tolerância à

glicose. Pode ocorrer aumento do hormônio da paratireóide. O aumentoda excreção urinária da hidrocortisona pode levar a maior atividade darenina plasmática e da secreção de aldosterona, além de alteração dohormônio do crescimento, da espermatogênese e da secreção de androgênios.

Efeitos da inatividade prolongada: sistema nervosoPodem ocorrer neuropatias compressivas. A privação sensorial pode

levar à deterioração das funções cognitivas. Pode ocorrer uma perda decoordenação e equilíbrio. São descritas alterações emocionais, comoansiedade e depressão, assim como inversão do ritmo do sono.

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Efeitos da inatividade prolongada: sistema tegumentarA complicação mais freqüente do paciente imobilizado é a úlcera

de pressão. Micoses são freqüentes e facilitadas pela umidade, muitasvezes constante em pacientes acamados. A dermatite amoniacal é decor-rente do contato da urina com a pele.

ÚLCERAS DE PRESSÃOÚlceras de pressão são áreas localizadas de necrose tecidual que

ocorrem quando o tecido mole é comprimido contra uma proeminênciaóssea e uma superfície externa por um tempo prolongado. A sua inci-dência é utilizada como um indicador da qualidade do atendimento. Osfatores implicados na patogênese da úlcera de pressão são pressão,cisalhamento, fricção e umidade. A pressão em tecidos sobre proemi-nências ósseas leva à isquemia e ao acúmulo de toxinas celulares. Oprocesso se inicia nos planos mais profundos e se estende à pele. Asforças de cisalhamento diminuem a quantidade de pressão necessáriapara causar dano à epiderme. Já a fricção e a umidade são mais impor-tantes no desenvolvimento de lesões superficiais, e seus efeitos são mai-ores quando a pressão excessiva está presente.

A avaliação inicial deve incluir a identificação dos fatores de riscoe o exame da pele do paciente, que deve enfocar as regiões mais vul-neráveis – áreas sobre proeminência óssea –, e o examinador deve estaratento para a presença de eritema persistente, vesículas, alterações dacoloração, endurações, calor e edema localizados. Os fatores de riscomais importantes são a imobilidade, alterações da sensibilidade, inconti-nência, alterações do nível de consciência, desnutrição e desidratação.Os principais fatores de risco externos são a pressão, a fricção e ocisalhamento.

Os cuidados com a pele devem incluir limpeza e hidratação comágua morna, a fricção excessiva ser evitada. A mudança de decúbito deveser instituída, e devem ser tomados cuidados em relação às manobras detransferência para evitar fricção. Durante a mudança de decúbito, obe-decemos à regra dos 30 graus. Para a redução da pressão poderão serutilizados colchões de ar e almofadas. A almofada tipo pneu está contra-indicada por estirar os tecidos durante a posição sentada.

Ao ser diagnosticada, a úlcera deverá ser estagiada. O estagiamentoé utilizado para documentar a profundidade da lesão. Ele é feito apósa retirada do tecido necrótico, se este estiver presente. Não há estagia-

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mento reverso. Depois de definido o estágio inicial e iniciado o trata-mento, as avaliações posteriores deverão descrever as características dalesão: tamanho, profundidade, presença de tecido necrótico ou exudato.O mapa de cicatrização PUSH (Pressure Ulcer Scale for Healing) poderá serutilizado. Ele categoriza o tamanho da úlcera, a presença e a quantidadede exudato e o tipo de tecido presente na lesão. A partir dos seusresultados, faz-se um gráfico que facilita visualmente a avaliação do trata-mento.

O tratamento da úlcera inclui a limpeza, o debridamento, quandonecessário, e o curativo. Durante a limpeza deve ser utilizado soro fisio-lógico sob pressão. Não devem ser utilizadas soluções com iodo, hipocloritode sódio ou acido acético. O debridamento tem por objetivo removertecidos desvitalizados, e pode ser mecânico, químico ou cirúrgico. Ocurativo visa proteger a lesão e proporcionar uma hidratação ideal. Oleito da úlcera deverá permanecer úmido com a pele em torno seca.Podem ser utilizados curativos industrializados, como hidrocolóides,hidrogéis, alginatos. Os hidrocolóides hidratam a ferida, promovem umdebridamento autolítico, e estão contra-indicados em úlceras contamina-das. Os hidrogéis absorvem fluidos, também promovem a hidratação edebridamento autolítico. Os alginatos são indicados para úlceras commuito exudato, contêm propriedades hemostáticas e não devem seraplicados em feridas secas.

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DefiniçãoO paciente vir, não intencionalmente, a se encontrar no chão ou em

qualquer outro nível mais baixo, não como resultado de um evento intrínseco grave(i.e., um acidente vascular cerebral ou uma síncope) ou de perigo externo grande osuficiente para causar queda de uma pessoa jovem e saudável. Mary Tinetti.

EpidemiologiaAproximadamente 30% dos idosos que vivem na comunidade e

50% dos idosos em instituições de longa permanência sofrem quedas emum período de um ano; é mais comum em mulheres, e a incidênciaaumenta com a idade. A mais temida das complicações é a fratura docolo do fêmur, que ocorre em cerca de 2% das quedas. Desses pacien-tes, cerca de 25% morrem dentro de um ano, 15% são institucionalizadose 60% nunca recuperam o nível funcional prévio.

Fisiopatologia e causasO envelhecimento está associado a certas mudanças na mobilidade,

quais sejam: marcha mais lenta, o passo mais curto, os braços balançammenos, postura em flexão da cabeça, do tórax, dos cotovelos e joelhos,os pés se afastam menos do chão. Existe um aumento da oscilação quan-do parado em pé – sway.

Muitas patologias estão associadas a um risco mais elevado de que-das: as visuais incluem catarata, degeneração macular, retinopatia, perdada capacidade de adaptação ao escuro; as vestibulopatias são a labirintite,lesão iatrogênica por medicamentos – aminoglicosídeo –, Síndrome deMeniére, otites; doenças musculoesqueléticas, tais como descondiciona-mento físico, fraqueza muscular proximal, artropatias, artrose do quadril

AULA 3

QUEDAS E DISTÚRBIOS DA MARCHASérgio Telles Ribeiro Filho

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e do joelho, artrite reumatóide, contraturas, e deformidades dos pés;doenças cardiovasculares incluem hipotensão postural, arritmias, e insu-ficiência cardíaca; neuropatias tais como o Mal de Parkinson, AVC, de-mência, depressão, e neuropatias periféricas; medicações – mais de quatromedicações já é fator de risco –, especialmente sedativos, antidepressivos,e anti-hipertensivos.

Não devemos esquecer que uma queda pode ser o primeiro sinto-ma de uma doença aguda – “queda sentinela”. Outra causa importanteé o uso inadequado de aparelhos como bengalas, cadeiras de rodas,óculos – especialmente bifocais –, sapatos inadequados e andadores.Quanto aos fatores extrínsecos, o local mais comum é a casa – 70% –, e10% dos tombos são nas escadas.

Distúrbios da marchaÉ importante saber distinguir as diferentes patologias da marcha.

Mielopatia cervical é comum, tem início insidioso, com tropeçosinexplicáveis, e evolui para uma marcha com espasticidade dos membrosinferiores e fraqueza, para passos pequenos, que podem ser assimétricos,e para tendência a arrastar uma ou ambas as pernas. O diagnósticodiferencial costuma ser com esta patologia. A Doença de Parkinson afetamais de 2% da população maior de 65 anos, causa tremor em repouso– às vezes, idosos não têm tremor –, bradicinesia, rigidez, instabilidadepostural.

Anormalidades da marcha são comuns, geralmente em estágiosmais avançados; podem ser unilaterais, muitas vezes tipo petits pas; eclassicamente existe dificuldade para iniciar a marcha. A hidrocefalia,além de afetar a marcha, causa demência e incontinência. Há dificul-dade de se levantar da cadeira, desequilíbrio durante a deambulação,passos pequenos, dificuldade de se virar e lentidão. A lesão cerebelarpor álcool é caracterizada por uma base alargada, instabilidade de tron-co, ataxia de marcha, colocação errática dos pés e dismetria.

As neuropatias periféricas – há diversas causas: diabetes mellitus,vasculopatias, medicações, intoxicações, deficiências nutricionais, comode vitamina B12, por exemplo – causam parestesias e disestesias, perdade reflexos profundos, perda de sensibilidade proprioceptiva e vibratória,a marcha tem base alargada e passos pequenos. As anormalidadesmusculoesqueléticas dos membros inferiores são importantes causadorasde quedas. Anormalidades dos pés que contribuem para alterar a mar-

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cha são o pes planus, pes cavus, hálux valgus, fasciite plantar. Doenças quecomumente afetam os pés são a artrite reumatóide, gota, diabetes eNeuroma de Morton.

Avaliação do paciente com história de quedasÉ importante identificar patologias associadas a quedas por meio

da história e do exame físico, com ênfase nos distúrbios da visão, nadetecção das patologias da marcha e equilíbrio e na hipotensão postural.Instrumentos de avaliação da mobilidade como o Teste de Tinetti ou amedida da velocidade da marcha costumam ser muito úteis porque ajudama detectar indivíduos com risco de quedas, ajudam a determinar quais sãoos déficits – equilíbrio? Marcha? –, introduzem um elemento objetivo naavaliação e servem para monitorizar a eficácia do tratamento. É fundamentalperguntar se houve alguma queda no último ano, e documentar todas asmedicações que o paciente usa, inclusive as de Medicina alternativa. Deve-mos também avaliar o nível de atividade física do paciente e a presença deperigos dentro de casa – pode-se usar uma lista de avaliação ambiental.Exames laboratoriais úteis incluem hemograma completo, bioquímica dosangue, dosagem do hormônio tireoestimulante, vitamina B12, radiografiado tórax, densitometria óssea, e eventualmente exames mais sofisticados deimagem cerebral, no caso de suspeita de patologia neurológica.

Estratégia geral para rastreamento de indivíduos com risco de so-frerem quedas

Certas anormalidades têm uma associação mais forte com o riscode quedas. As mais importantes são fraqueza muscular proximal, históriade quedas, e distúrbios da marcha. Programas eficazes de prevenção dequedas devem incluir uma abordagem multifatorial para redução dessesfatores: tratamento de problemas visuais, fisioterapia para fortalecimentomuscular proximal nos casos de fraqueza proximal, tratamento dos dis-túrbios da marcha – Parkinson, mielopatia cervical, hidrocefalia, etc. –,tratamento de hipotensão postural, eliminação dos riscos ambientais,redução das medicações.

Programas de prevenção primáriaProgramas de exercício físico, com vista a aumento de força e

flexibilidade, e programas de treinamento de equilíbrio como o Tai Chidiminuem a ocorrência de quedas. É preciso tratar a osteoporose;

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minimizar número de medicações. E também indicar a utilização corretade aparelhos: bengala – 70% usam incorretamente –; andador com rodasdianteiras para os pacientes com Mal de Parkinson. O acolchoamentotrocanteriano diminui a ocorrência de fratura de fêmur. São necessáriossapatos adequados e evitar salto alto; cadeiras e assentos de privada de-vem ser da altura correta e ter apoio para os braços. Os cuidados coma casa implicam em iluminação adequada e evitar objetos no chão.

ConclusãoDevido à sua alta prevalência e às freqüentes complicações, a pre-

venção das quedas é um dos problemas centrais da prática geriátrica. Achave para isso é a detecção dos fatores de risco presentes em cada casoe a implementação de programas individualizados, com intervençõesmúltiplas que diminuam esses riscos. Alguns tipos de programas de pre-venção primária, que incluem programas de exercício para grupos nacomunidade, também podem ser úteis.

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288 MÓDULO 12

IntroduçãoFragilidade é um estado de vulnerabilidade fisiológica que

se relaciona diretamente com o envelhecimento e com as próprias alte-rações evolutivas do organismo. Atinge entre 10% a 25% dos idososmaiores que 65 anos e pode chegar a 46% dos maiores de 85 anos. Estaprópria condição predispõe o paciente a lesões iatrogênicas e vice-versa.

FisiopatologiaBaseia-se nas alterações fisiológicas relacionadas à idade, em uma

complexa rede que não pode ser analisada separadamente. A diminui-ção em diversos graus da capacidade de manter a homeostase e a pre-sença mais freqüente de agentes estressores vão ditar o ritmo do surgi-mento da Síndrome de Fragilidade.

As principais alterações se mostram no sistema muscular, comsarcopenia, perda de massa magra e, conseqüentemente, de força muscu-lar; alterações do sistema neuroendócrino, com diminuição dos níveis dehormônios sexuais, do hormônio do crescimento e alterações da regulaçãodos níveis de cortisol; alterações do sistema imunológico, com aumento dascélulas de memória, porém com declínio nas células T nativas e da maioriadas interleucinas. Todos estes sistemas interagem entre si e ao mesmo tem-po podem ser desencadeadores ou perpetuadores do quadro.

Diagnóstico de fragilidadeMuitos possuem em sua mente uma imagem do que seria um

idoso frágil, mas possuem dificuldade em definir o quadro de fragili-dade. Na realidade, seu diagnóstico se baseia principalmente no enten-dimento de sua fisiopatologia.

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FRAGILIDADE E IATROGENIARodrigo Serafim

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Espiral da fragilidadeO declínio orgânico isolado não explica o conceito de fragilidade.

O conceito de espiral da fragilidade sugere um ciclo vicioso no qual asarcopenia, a redução do gasto energético, o balanço nitrogenado nega-tivo, a perda de massa óssea e a menor tolerância ao exercício secorrelacionam e se auto-alimentam, com a criação de um quadro dedifícil resolução.

Apresentação e trigger da FragilidadeCada indivíduo manifesta suas alterações de forma e velocidade

diferentes. O desenvolvimento da Síndrome de Fragilidade pode ocor-rer durante muito tempo até sua real manifestação, isto porque é apresença de um fator desencadeante que gera um trigger que fará ociclo vicioso se iniciar.

Principais causas preveníveis de complicações iantrogênicas e tra-tamento

a) PolifarmáciaEstudos norte-americanos mostram que idosos maiores de 65

anos são responsáveis pela utilização de um terço de todas as medica-ções prescritas e, em média, utilizam de três a quatro medicações pordia; e naqueles institucionalizados a média sobe para sete a oito; 65%deles utilizam drogas psicoativas. Portanto, temos de ter em mente apossibilidade de interações medicamentosas e as alterações metabóli-cas próprias do envelhecimento que aumentam o risco de intoxica-ções, e o impacto destas medicações nas atividades físicas e cognitivasdo idoso.

b) Doenças crônicasCom o aumento do número de doenças crônicas, principalmente

doenças cardiovasculares e reumatológicas, também crescem os riscos deiatrogenia pela terapêutica inadequada ou pela interação entre drogasou seus efeitos colaterais, como o desenvolvimento de úlcera pépticapelo uso de antiinflamatórios. No estudo do Health Interview SurveySupplement on Aging, observamos o impacto das doenças crônicas nas taxasde confinamento ao leito ou cadeira após dois anos:

4% nos > 70 anos com duas co-morbidades. 17% nos > 70 anos sem co-morbidades.

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36% naqueles com incapacidade física + duas co-morbidades. 42% nos > 80 anos + duas co-morbidades + incapacidade.

c) Múltiplos profissionaisA dificuldade do tratamento de todas as condições crônicas que o

idoso possui, a ansiedade gerada, e muitas vezes o mau atendimentofazem com que ele procure a ajuda de diversos profissionais, que não seinter-relacionam, o que gera iatrogenia, com freqüente polifarmácia,exames desnecessários, confusão na conduta clínica e gasto desnecessá-rio. Cabe ao profissional de Saúde orientar o paciente, tentar transmitirsegurança e trabalhar sempre com um time interdisciplinar, em conjun-to para o bem comum.

d) HospitalizaçãoA hospitalização pode ter um impacto catastrófico. Pode ser o pró-

prio desencadeante ou responsável pela perpetuação dos fatores do ci-clo da fragilidade. O idoso necessita de cuidados especiais intensivos emuito dispendiosos.

A presença de um cuidador é sempre desejável. A família deve ser encorajada a permanecer com o paciente,

quando possível. Cuidados com imobilização e prevenção de úlcera de decúbito. Tratamento adequado de delirium. Profilaxias adequadas. Pesar sempre o custo versus benefício dos procedimentos.

Prevenção de acidentesA ocorrência de acidentes se relaciona indiretamente com o que

foi comentado sobre iatrogenia e fragilidade. O risco de queda sempredeve ser analisado, com testes de avaliação da marcha e equilíbrio, porexemplo, teste do time up and go, avaliação cognitiva e dos perigosambientais. Os riscos de dirigir devem ser discutidos e expostos ao paci-ente e ao cuidador, mesmo com a freqüente resistência por significar deforma evidente perda de autonomia.

A avaliação dos riscos domiciliares é de fundamental importância,muitas vezes será necessário o treinamento de cuidadores e redução dosriscos ambientais, como tapetes, escadas, iluminação adequada e instala-ção de alarmes de fumaça, corrimões e suportes.

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292 MÓDULO 12

INCONTINÊNCIA URINÁRIAA incontinência urinária (IU) é definida como a perda

involuntária de urina pela uretra em quantidade ou freqüência suficien-te para se tornar um problema social ou de saúde. Afeta 25% dos idososque vivem na comunidade, um terço dos internados em hospitais depacientes agudos e mais de 50% dos institucionalizados. Sua prevalênciaaumenta com a idade e é duas vezes mais comum em mulheres. Éuma condição muito subdiagnosticada, tanto porque o paciente sen-te-se constrangido em relatar quanto porque o médico não faz ques-tão de perguntar.

Entre as conseqüências da incontinência urinária, temos ansiedade,retraimento social, depressão, distúrbios do sono, quedas, infecções dotrato urinário, infecções cutâneas por fungos, disfunção sexual, compro-metimento da integridade cutânea e institucionalização.

A abordagem do paciente deve necessariamente buscar causasagudas e transitórias. A incontinência aguda pode ter origem nas seguin-tes causas: a) medicamentos que interferem na fisiologia da micção –anticolinérgicos, β-bloqueadores, agonistas α-adrenérgicos, antagonistasdos canais de cálcio, opióides – ou no nível de consciência – sedativos,hipnóticos e álcool; b) retenção urinária, que leva à incontinência portransbordamento; c) delirium; d) imobilidade; e) infecção urinária; f)impactação fecal; g) poliúria – hiperglicemia, uso de diuréticos, hiper-calcemia; e h) pós-operatório de cirurgia urológica.

Classificamos a incontinência crônica ou persistente: por urgência,por esforço, por transbordamento – ou hiperfluxo – e funcional. Mais deum tipo pode coexistir em um paciente, o que é denominado inconti-nência mista.

AULA 5

INCONTINÊNCIA URINÁRIAE INCONTINÊNCIA FECALRodrigo Serafim e Leonam da Costa Martins

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Incontinência por urgência – Urge-incontinência. É o tipo mais fre-qüente em idosos, de ambos os sexos. Manifesta-se por um súbito desejo deurinar seguido pela perda de urina, cujo volume em geral é grande, masvariável. É causada pela hiperatividade do músculo detrusor da bexiga, quepode ser decorrente de hiperreflexia, isto é, condições neurológicas quedeprimem os mecanismos de inibição das contrações, ou de instabilidade,causada por condições locais da bexiga e do assoalho pélvico.

Incontinência de esforço. Manifesta-se por perda de urina, usual-mente em pequenas quantidades, acompanhada por um aumento dapressão abdominal, tal como ao tossir, espirrar e levantar da cama. Suafisiopatologia envolve dois mecanismos: fraqueza dos tecidos de susten-tação do assoalho vesical e distúrbio esfincteriano primário – disfunçãodo esfíncter uretral.

Incontinência por transbordamento. Decorrente da retenção urináriacrônica. As perdas urinárias usualmente são freqüentes e em pequenasquantidades e podem ocorrer de forma parecida com as da urge-incon-tinência ou da incontinência de esforço. Pode ser dividida em neuropática– bexiga neurogênica – e obstrutiva.

Incontinência funcional. Decorre de incapacidade física ou ausên-cia de iniciativa do indivíduo em ir ao banheiro. Freqüentemente asso-ciada à demência e à depressão.

As formas mais comuns de incontinência mista são as associaçõesde urge-incontinência com incontinência de esforço em mulheres idosase urge-incontinência com incontinência funcional entre idosos institu-cionalizados.

Durante o exame físico merecem especial importância: a) palpaçãoda bexiga; b) toque retal: pesquisar impactação fecal, aumento prostáticoe massa pélvica, avaliar a sensibilidade anal e a contração esfincteriana;c) exame ginecológico: pesquisar prolapso uretral, vesical e uterino,tumorações e inflamação e avaliar presença de escape induzido por tosse;e d) exame neurológico com ênfase na avaliação do estado mental, napesquisa de déficits neurológicos focais, de sinais extrapiramidais, e naavaliação funcional dos nervos dos dermátomos lombo-sacrais, que inervama bexiga e a uretra.

INCONTINÊNCIA FECALIntroduçãoIncontinência fecal (IF) é uma patologia comum, entretanto, muitas

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vezes subdiagnosticada. Apenas 5% dos pacientes com desordensgastrintestinais e incontinência fecal informam espontaneamente estasqueixas ao profissional de Saúde. Na população em geral, a prevalênciada IF é em torno de 2,2%.

DefiniçõesÉ a passagem involuntária de fezes pelo ânus (Tariq, 2004). É a

incapacidade de se controlar a passagem de gás e fezes pelo ânus(Hinninghofen, 2003). É a passagem involuntária contínua ou recorren-te de material fecal (>10ml) por pelo menos um mês, em indivíduosmaiores que três anos de idade (Drossman, 1990).

Alterações com a idadeCom o envelhecimento, algumas alterações relacionadas a idade se

tornam mais evidentes, como a fibrose do esfíncter interno, o adelgaça-mento e afinamento do esfíncter externo, a maior prevalência de trau-mas na região e um maior numero de doenças crônicas, principalmentea incontinência urinária, doenças psiquiátricas e a Síndrome de Imobi-lidade.

Investigação diagnósticaUm questionamento sobre o assunto por meio da Avaliação Geri-

átrica Ampla e uma história clínica bem colhida são a base para umdiagnóstico preciso. É importante definir os sintomas como urgência,perda involuntária ou presença de soiling, ou seja, da saída de fezes quese liquefazem. Devem ser questionados: a) o início, a freqüência e seve-ridade da doença; b) a capacidade de diferenciação entre gás e fezes;c) história medicamentosa cuidadosa; d) história patológica pregressa; ee) condições domiciliares.

Exame físicoÉ fácil, rápido e seu maior limitador é o preconceito. Traz infor-

mações valiosas e fundamentais para o diagnóstico. À inspeção do canalanal, deve-se procurar a presença de prolapsos, hemorróida, dermatitese fístula. O próprio toque da região perianal demonstra um reflexo decontração – reflexo perianal – e mostra a integridade do nervopudendo. Ao toque, percebe-se a hipotonia do esfíncter e a presençade fecaloma.

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Exames iniciais e exames especiaisA avaliação inicial deve ser feita apenas com a realização de uma

radiografia simples de abdome na qual poderemos observar a presençade fecaloma. Com alguns exames especiais somos capazes de fazer odiagnóstico da lesão funcional do paciente. A manometria anorretal e aeletroneuromiografia do nervo pudendo são os melhores métodos parase avaliar a funcionalidade do esfíncter retal. A ultrassonografia (US) ea ressonância magnética anorretal (RNM) são importantes para visualizaçãodireta do defeito esfincteriano. Com estes exames podemos observarlesões no esfíncter interno e externo e ajudar a programar uma inter-venção cirúrgica futura, caso seja necessária.

TratamentoBaseia-se em mudanças dos hábitos alimentares e estilo de vida,

terapêutica medicamentosa, biofeedback – técnica que tem mostrado re-sultados muito eficazes, apesar de pouco disponível – e tratamento cirúr-gico. Na maioria das vezes nesta ordem apresentada. A dieta deve serrica em fibras e estimulada a ingestão de líquidos. Os obstáculos até obanheiro devem ser eliminados para facilitar seu acesso.

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