sociologia da burocracia

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I BIBLIOTECA DE CIeNCIAS SOCIAIS " +. 1- :1 ,.J- SOCIOLOGIA J J j < DA BUROCRACIA Organizafão, introdufão e tradufão de EDMUNDO CAMPOS Quarta edição * Para referência bibliográfica adicional, ver no final do volume uma lista dos demais livros disponíveis nesta e em outras séries correlatás publicadas pela ZAHAR. II I j; ZAHAR EDITORES RJO DE JANEIRO

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  • I

    BIBLIOTECA DE CIeNCIAS SOCIAIS~. " +. 1:1 ,.JSOCIOLOGIA JJ j <

    DA V~Clt}fi ~ BUROCRACIA

    Organizafo, introdufo e tradufo de

    EDMUNDO CAMPOS

    Quarta edio

    *

    Para referncia bibliogrfica adicional, ver no final do volume uma lista dos demais livros disponveis nesta e em outras sries correlats publicadas pela ZAHAR.

    II I j;

    ZAHAR EDITORES RJO DE JANEIRO

  • capa de ERrco

    Nenhuma parte deste livro poder ser reproduzida

    se;am quais forem os meios empregados

    (mmeografia, xerox, datilografia, gravao, reproduo em disco

    ou em f#a) , sem a permisso por escrito da editora.

    Aos infratores se aplicam as sanes previstas nos artigos 122 ~

    Lei n.O 5.988 de 14 de dezembro de 1973.

    1978

    Direitos para a Ungua portuguesa adquiridos por

    ZAHAR EDITORES

    Caixa Postal 207, zeoo, Rio

    que se reservam a propriedade desta verso

    Impresso no Brasil

    INDICE

    INTRODUO . ,! . . . . . 7

    tos FUNDAMENTOS DA ORGANIZAO BUROCRTICA: UMA ___ CoNSTRUO OO:npO- IDEAL -=Max Weber ...... 15

    O CONCEITO DE BUROCRACIA: UMA CONTRIBUIO EMPi-RICA - RJchard H. Ha/I ........................ 29

    "BUROCRACIA" B "RACIONALIDADE" NA TEORIA WEBERlANA

    DA ORGANIZAO: UM ESTUDO EMPjRICO - S/antey H. Uy, 'r. 48.......................................1)Q da

    >.-cONFLITOS. NA TEORIA DE WEBER - Alvin JJV. Goutdner 59

    O EFEITO DO TAMANHO SOBRE A ESTRUTURA INTER,NA DAS ORGANIZAES - Freeric W. Terrien e DonaM L. Mith ........................................... 68

    O CoNCEITO DE SISTEMA DE AUTORIDADE - Teret1ce K. HopkinI ....................................... . 75

    BUROCRACIA, BUROCRATIZAO E DESBUROCRATIZAO S. N. EiIemt'adt ................................ . 81

    COQPTAO: UM MECANISMO PARA A ESTABILIDADE ORGANIZACIONAL - Philip Selznick ................... . 9~

  • 14 SOCIOLOGIA DA BUROCRACIA

    gaes empricas sobre o mesmo tema. ]j este o caso dos trabalhos de Udy e HaU que combinados com a anlise weberiana completam-se na caracterizao da burocracia. Da mesma forma, o estudo de caso apresentado por Selznick exemplifica empuicamente texto de Eisenstadt sobre a interao entre organizaes burocrticas e sociedade. O trabalho de Hopkins tem a vantagem de tentar a combinao das perspectivas de Weber e Chester Barnard - ambas clssicas sobre os sistemas de autoridade, sem perda de sua originalidade. Terrien e Mills comprovam de maneira objetiva a influncia da varivel. "dimenso organizacional" sobre O grau de burocratizao, medido pelo tamanho do componente administrativo. Se comparado ao. texto de HaU - onde a influncia dessa varivel mostra-se mnima - o trabalho de ambos sugere uma das orientaes que devem seguir a teoria e pesquisa organizacionais: a determinao ds situaes pre

    ,. -1'. "";~"Al ~~~ional--- se--correlacinna-- ----~.ctsaS---em ---que--C~-V~n_'l _-O.....IL~"''-, positiva ou negativamente, com c~da uma das demais. Finalmente, o. texto _de Blau, pela ma.nelCa clara com. que I apresenta certas onentaoes a serem segUidas pela pes.quls~, e d~ gr~n-de importncia para os que pretendem reahzar mvesbgaoes empricas.

    Outros textos e autores da maior importncia - Parsons, Simon, Argyris etc. - no puderam ser selecionados; de maneira geral os trabalhos eram muitos extensos e sua reproduo parcial prejudicaria a compreenso.

    Apesar de todas as deficincias, esperamos que a publica~~ desta coletnea venha atender satisfatoriamente os objetivos propostos.

    EDMUNDO CAMPO~

    OS FUNDAMENTOS DA ORGANIZAAO

    BUROCRTICA: UMA CONSTRUAO

    DO TIPO IDEAL

    MAX WEBER.

    'A . _. El:ETIVIJ)J'U)E D.

  • 16 SocIOLOGIA DA BUROCRACIA Os FUNDAMENTOS DA ORGANIZAO BUllOCRTICA 17

    parti.culares. O process.o. administrativo ~ busca rac~on..al p~a desempenho das funes; t) definio clara dos instrudos mteresses -. e;;pecl1cados ?as ordenaoes ~a assocI~ao mentos necessrios de coero e limitao de seu uso a con-_ dentro ?o~ l..mltes esta~lecldos pelos preceItos legaiS e dies definidas. Uma unidade organizada de tal forma que segundo prmclplos suscetveIs de formulaao geral - apro- nO exercido da autoridade ser denominada ,go adminisvados pelas ordenaes da associao ou, pelo menos, no ',ativo. . desaprovados por elas, . Neste sentido, rgos administrativos existem em orga

    3) Que, assim, a pessoa que representa tipicamente a nizaes privadas de grande envergadura, em partidos e autoridade ocupa um "cargo", Na atividade especfica de seu exrcitos, no Estado e na Igreja. Um presidente eleito, um .stattls, que inclui a 'atividade de mando, est subardinada a gabinete de ministros ou um rgo colegiado tambm constiuma ordem impessoal para a qual se orientam suas aes. tuem, neste sentido, rgos administrativos. Contudo, no 1550 verdadeiro no apenas para os que exercem a autori- este o lugar para a discusso desses conceitos; Nem todo rgo dade legal inscrita no conceito usual de "funcionrios", mas, administrativo provido de poder coercitivo, Mas esta respor exemplo, para o presidente eleito de um Estado. salva no apresenta importncia para os propsitos de agora.

    4) Que a pessoa que obedece autoridade o faz, como 3) A organizao dos cargos obedece ao princpio da usualmente estabelecido, apenas na qualidade de "mem. hierarquia: ca~a cargo inferior est sob o controle e super

    ____.____u1>!o'~_

  • 19 18 SOCIOLOGIA DA BUROCRACIA

    paro tcnico adequado. O quadro administrativo de uma as sociao racional consiste pois, tipicamente, em "funcionrios", esteja a organizao voltada para fins polfticos, religiosos, econmicos - em particular, capitalistas - ou outras.

    5) No tipo racional questo de principio que os membros do quadro administrativo"devam estar completamente separados da propriedade dos meios de produo e administrao. Funcionrios, empregados, trabalhadores vinculados ao quadro administrativo, no fazem seus os meios materiais de produo e administrao. Estes so fornecidos em espcie ou em dinheiro, e o funcionrio obrigado a prestar contas. Alm disso, existe, em princpio, completa separao entre a propriedade da organizao, que controlada dentro da esfera do cargo, e a propriedade pessoal do funcionrio, ~cessvel ao seu uso~rivado. Existe uma se a-rao correspondente entre o lugar onde so executadas as funes oficiais, o hureau, e o domiclio.

    ,', A

    . ~) ~ No tipo raclOnal ha tambem compl.eta au~e~cl~ d: apreClaao do cargo pelo ocupan~e., Onde eXIstem dueltos ao cargo - como no caso dos JUizes e, atualmente, no de

    - d f . ,. b Ih uma crescente p~oporao e unClo~a~los e mesmo. tr~ a adores - eles nao servem ao proposlto de aproprlaao por

    . ,. d . , pa~te. do f~nC1onano, mas ao e garantu o carater puramente ob}ettvo e lOdependente da ~onduta no cargo, de modo a ser onentada pelas normas pertlOentes.

    7) Atos administrativos, decises, normas, so formulados e registrados em documentos,.. mesmo nos casos em que a discusso oral a regra ou mesmo prescrita. Isto aplica-se, pelo mehos, s discusses preliminares e propostas, decises finais e toda sorte de ordens. A combinao de documentos com uma organizao continua de funes constitui o bllf'eau, que o ncleo de todos os tipos de atividade moderna das associaes.

    Os FUNDAMnITOS DA ORGANIZAO BUROCRTICA

    8) A autoridade legal pode ser exercida dentro de uma ampla variedade de formas diferentes que sero distinguidas e discutidas mais tarde. A. anlise seguinte ser, delberadamente, limitada em grande parte ao aspecto da dominao na estrutura do quadro administrativo. Consistir em uma an~lise, em trmos de tipo ideal, do funcionalismo ou hllf'OCf'tlCltI.

    Nos princpios gerais acima mencionados no se fz referncia espcie de autoridade suprema apropriada a um sistema de autoridade legal. Isso conseqncia de certas consideraes que somente podem ser inteiramente compreensveis numa etapa posterior da anlise. Existem vrios tipos importantes de dominao que, em funo da autoridade suprema, pertencem a outras categorias. ~ este o caso do tipo carismtico-hereditrio exemplificado nas monarquiasbereditrias edo tipo carismtico puro de um presiente escollliO:por plebiscito. Outros casos envolvem ele:

    mentos racionais em pontos importantes, mas so compostos pela combinao de componentes burocrticos e carismticos como no caso de um governo de gabinete. Outros ainda esto sujeitos autoridade do chefe carismtico ou burocrtico de outras associaes. Assim o chefe nor I d

    ' ma e umdepartamento governamental num regime parlamentar pode ser um ministro que ocupa tal posio devido s a to ._ua u rt dade dentro de um partido. O tipo de quadro administrativo racional legal suscetvel de aplicao a todas as espcies de situaes e contextos. :B o mais importante mecanismo para a administrao de assuntos quotidianos. Pois nesta esfera o exerccio da autoridade e, mais amplamente, o exerccio da dominao consistem, precisamente, em administrao.

    O tipo mais puro de exerccio da autoridade legal aqu~le. que emprega um quadro administrativo burocrtico. SQlIJente clIefe supremo da organizao ocupa sua posio de autoridade em virtude de apropriao. eleio ou designa

  • 21 20 SoCIOLOGIA DA BUROCRACIA

    o para a sucesso. Mas mesmo sua autoddade consiste nwn mbito de competncia legal. O conjunto do quadro administrativo subordinado autoridade suprema formado, no tipo mais puro, de funcionrios nomeados que atuam conforme os seguintes critrios:

    1) So individualmente livres e sujeitos autoridade apenas no que diz respeito a suas obrigaes ofiCiais.

    2) Esto organizados nwna hierarquia de cargos, claramente definida.

    3) Cada cargo possui uma esfera de competncia, no sentido legal, claramente determinada.

    4) O cargo preenchido mediante uma livre relao contratual. Assim, em princpio, h livre seleo.

    , ) Os candidatos so selecionados na base de qualificaes tcnicas. Nos casos mais racionais,~qtlalifica.()

    ------testa:aapor exames,a como- certa por diplomas que comprovam a instruo tcnica, ou utilizam-se ambos os critrios. Os candidatos so nomeados e no eleitos.

    6) So remunerados com salrios fixos em dinheiro. na maioria das vezes com direito a penses. Somente em determir.aadas circunstncias a autoridade empregadora, especialmente nas organizaes privadas, tem o direito de rescindir o contrato. Mas o funcionrio sempre livre para demitir-se. A escala salarial inicialmente graduada de acrdo com o nvel hierrquico; alm desse critrio, a responsabilidade do cargo e as exigncias do status social do ocupante podem ser levadas em conta.

    7) O cargo considerado como a nica ou, pelo menos, principal ocupao do funcionrio.

    S) O cargo estabelece os fundamentos de wna carreira. Existe um sistema de "promoo" baseado na antiguidade, no merecimento ou em ambos. A promoo depende do julgamento dos superiores.

    Os FUNDAMaNTOS DA ORGANIZAO BUROCRTI6A

    9) O funcionrio trabalha inteiramente desligado da propriedade dos meios de administrao e no se apropria do cargo.

    l~) Est sujeito a wna rigorosa e sistemtica disciplina e controle no desempenho do cargo.

    Esse tipo de administrao . em principio, aplicvel com igual facilidade a wna ampla variedade de setores diferentes. Assim, pode ser a organizaes que visam lucro, s de caridade ou a um nmero indefinido de outros tipos de empresas privadas que persigam objetivos materiais ou ideais. Com graduaes variadas na aproximao ao tipo puro, sua existncia histrica pode ser demonstrada em todas essas esferas.

    1) Por exemplo, esse tipo de burotracia encontrado __~ em c!nicasEarticular_es, embospitais_ de fut1d~oQ~ n

    mantidos por ordens religiosas. A organizao burocrtica exerce um papel importante na Igreja Catlica. O fato bem ilustrado pela funo adminiStrativa do clero na Igreja moderna que desapropriou quase todos os benefcios da Igreja antiga que estavam, ento, em larga escala sujeitos apropriao privada. 'Outro exemplo a concepo do episcopado universal como competncia formnl, universal e lesaI em assuntos religiosos. De modo idntico, a doutrina da infalibilidade papal considerada como abrangendo de fato uma competncia universal, mas vlida apenas ex cathedra na esfera do cargo, implicando, assim, a distino caracterstica entre a rea do cargo e a dos neg6cios particulares do ocupante. Os mesmos fenmenos so encontrados na gfande empresa capitalista; quanto maior esta, tanto mais importante o papel daqueles. O fato no menos vlido para os partidos, que ~ero tratados separadamente. E, por ltimo, o exrcito moderno essencialmente uma organizao burod,fica administrada por esse tipo caracterstico .de funcio~ n.Cio militar, o "oficial".

  • 23 22 SociOLOGIA DA BUROCRACIA

    2) A autoridade burocrtica exercida em sua forma mais pura ali onde f6r claramente dominada pelo princpio da nomeao. Uma hierarquia de funcionrios eleitos no tem o mesmo sentido de wna hierarquia ,p-e funcion.rios nomeados. No que se refere primeira, a eleio torna impOssvel submet-la a wna disciplina rigorosa, mesmo quando se proxime do tipo baseado na nomeao. A eleio permite ao funcionrio subordinado competir por posies eletivas nas mesmas condies que seu superior. e suas possibilidades passam a independer do julgamento deste.

    3) A nomeao por livre contrato. que possibilita a livre seleo. essencial moderna burocracia. Onde exista wna organizao hierarquizada com esferas impessoais de competncia. mas servida por funcionrios servis - escravos. servos etc., que atuam. contudo, de maneira formalmente ~~~___~~~~bu~ocrtica - sernl.l~aclo o termo "b-,rocracia patrimollial~.___~,

    4) O papel das qualificaes tcnicas em organizaes burocrticas contmuamente incrementado. Mesmo o funcionrio de wn partido ou organizao sindical necessita de conhecimento especializado. embora. usualmente, de carter ~prico, desenvolvido antes por experincia do que por aprendizagem formal. No Estado moderno os nicos cargos para os quais no se exigem qualificaes tcnicas so os de ministro e presidente. O fato demonstra que so "funcionrios" apenas em sentido formal e no substantivaIl1ente. o mesmo se dando com o gerente ou presidente de uma grande empresa. No h dvida de que a "posio" do empres.rio capitalista , como a de wn monarca, semelhante de apropriao definitiva. Assim, h necessariamente no pice da organizao burocrtica no mnimo wn elemento que no puramente burocrtico. A categoria de burocracia ' aplicada to-somente ao exerccio da dominao por meio de uma espcie particular de quadro administrativo.

    Os FUNDJI.M~TOS DA ORGANIZAO BUROCRTICA

    , ) O funcion.rio recebe normalmente um salrio fixo. Pelo contr.rio, as fontes de renda apropriadas privativamente sero denominadas "benefcios". O salrio na organizao burocrtica normalmente pago em dinheiro. Embora isso no seja essencial ao conceito de burocracia, o ajuste que melhor se adapta ao tipo puro. Os pagamentos em . espcie podem adquirir o carter de benefcios, e o recebimento destes implica, normalmente, a apropriao de oportunidades de rendimentos e cargos. H, contudo, transio gradual nesse terreno com ".rios tipos intermedirios. A apropriao em virtude de arrendamento ou compra de cargos ou a garantia de renda para o cargo so fenmenos estranhos ao tipo puro de burocracia.

    6) Os "cargos" que no constituem a ocupao principal do ocupante, em particular os cargos "honorificos", pertencem a outras categorias... O funcionrio "burocrtico" tp@uocupa o cargo-eomo sua principal ocupao.

    7) Com respeito separao do funcionrio frente a propriedades dos meios de administrao, a situao essencialmente a mesma; tanto na esfera da administrao pblica, como nas organizaes burocrticas privadas, tais como a grande empresa capitalista.

    8) ... Atualmente os rgos "colegiados" esto per7 dendo rapidamente sua importncia em favor dos tipos de organizao que so, em sua maioria, de fato e formalmente subordinados autoridade de um nico chefe. Por exemplo, os "governos" colegiados na Prssia cederam lugar, desde muito tempo. ao "presidente distrital monocrtico". O fator decisivo para t:Sse desenvolvimento fi a necessidade de rpidas e unvocas decises, livres da necessidade de compromisso entre diferentes opinies e livres tambm das maiorias instveis.

    9) 9 oficial do exrcito moderno um tipo de funcionrio nomeado e nttidamente diferenciado por certas dis

  • 24 25 SOCIOLOGIA DA BUROCllACJA

    tines de classe. .. A este respeito, tais oficiais diferem ra

    dicalmente dos chefes militares eleitos, dos condottieri caris

    mticos, dos oficiais que recrutam e lideram exrcitos merce

    nrios com caractedsticas de empresa capitalista e, final

    mente, dos que ocupam postos militares comprados. Pode

    haver transies graduais entre esses tipos. O "servidor" pa

    trimonial separado dos meios de execuo de suas funes

    e o proprietrio de um exrcito mercenrio com finalidades

    capitalistas foram, juntamente com o empresrio capitalista,

    os precursores na organi:zao do moderno tipo de burocracia.

    o TIPO MONOCRATICO DE

    ADMINISTRAO BUROCRATICA

    A experincia tende a mostrar universalmente que o . tipo burocrti~.u Illais puro deor~flizo admini~tra!.!ya -::-.=____....

    isto , o tipo monocrtico de burocracia - capaz, numa perspectiva puramente tcnica, de atingir o mais alto grau de eficincia e neste sentido , formalmente, o mais racional e conhecido meio de exercer dominao sobre os seres humanos. Este tipo superior a qualquer outro em preciso, estabilidi"de, rigor disciplinar e confiana. Da a possibilidade de que os chefes da organi:zao e os interessados possam contar com um grau particularmente elevado ~e calculabi.

    lidade dos resultados. Finalmente, superior tanto em eficincia quanto no raio de operaes, havendo ainda a possibilidade formal de sua aplicao a todas' as espcs de tarefas administrativas.

    O desenvolvimento da moderna forma de organi:zao

    coincide em todos os setores com o desenvolvimento e con

    tnua expanso da administrao burocrtica. Isso vlido

    para a Igreja, Estado, exrcitos, partidos polticos, empresas

    econmicas, organizaes promocionais de toda espcie, asso

    ciaes particulares, clubes e muitas outras. Seu desenvolvi-

    Os FUNDAME:NTOS DA ORGANIZAO BUROCRTlCA

    mento , para tomar apenas o caso mais penetrante, o mais crucial fenmeno do moderno Estado ocidental. Entretanto, muitas formas podem existir que no se aproximam do modelo: os rgos colegiados representativos, comisses parlamentares, sovietes, funcionrios honorrios, juizes no-profissionais e outras tantas. ,E, embora muitos se queixem dos "pecados da burocracia", seria iluso imaginar que o trabalho administrativo contnuo pudesse ser executado, em qualquer setor, sem a presena de funcionrios trabalhando em seu~ cargos. Todo modelo de vida quotidiana talhado para se adequar a esta estrutura. Porque a administrao burocrtica sempre, observada em igualdade de condies e de uma perspectiva formal e tcnica, o tipo mais racional. Ela , atualmente, indispensvel para o atendimento das necessidades da administrao de massa. No setor administrativo, a opo est ,entre a burocracia e o diletantismo .

    A fonte-principal da suproridade da administrao burocrtica reside no papel do conhecimento tcnico que, atravs do desenvolvimento da moderna tecnologia e dos mtodos econmicc;>s na produo de bens, tornou-se total

    men~e indispensvel. A este respeito indiferente que o sistema econmico seja organizado em bases capitalistas ou socialistas. Na verdade, se no segundo caso se desejasse um nvel igual de. eficincia tcnica, o resultado seria um enorme incremento na importncia da burocracia profissional.

    Os que esto sujeitos ao controle burocrtico s conseguem escapar mediante a criao de uma organizao prpria, igualmente sujeita ao processo de burocratizao. Da mesma forma, o aparato burocrtico orientado para um funcionamento contnuo por interesses compulsivos tanto materiais como objetivos, mas tambm ideais. Sem ele, uma $ociedade como a nossa - que separa os funcionrios, em

    pr~gadQs e trabalhadores da propriedade dos meios de admirn~t:rao ~ que depende da disciplina e da formao profissional - deixaria de existir. A nica exceo seriam aqueles

  • 27 26 SocIOLOGIA DA BUROCRACIA

    grupos, como os camponeses, que ainda possuem os pr6prios meios de subsistncia. Mesmo no caso de revoluo ou de ocupao por um inimigo, a mquina burocrtica continuaria funcionando normalmente, da mesma forma como o fazia no governo legal anterior.

    A questo sempre a de quem controla a mquina burocrtica existente. E esse controle apresenta sempre limitaes para os que no so profissionais. De maneira geral, o funcionrio profisional escapa muito mais fcilmente a essas limitaes do que seu superior nominal, o ministro de gabinete, que no profissional.

    O sistema capitalista - embora no somente ele desempenhou um papel fundamental no desenvolvimento da burocracia. Na verdade, sem ela a produo capitalista no poderia persistir, e todo tipo racional de socialismo teria simplesme(lte_

  • 28 SOCIOLOGIA DA BUROCRACIA

    a ser organizados em grandes associaes, inevitavelmente sujeitas a dominao burocrtica, inevitabilidade idntica da dominao das mquinas de preciso na produo em massa.

    As conseqncias principais e mais generalizadas da dominao burocrtica so:

    1) A tendncia ao "nivelamento" no interesse de uma base de recrutamentQ a mais ampla posvel em termos de qualificao profissional.

    2) A tendncia plutocratizao no interesse de uma formao profissional a mais prolongada possvel. Esta, freqentemente, continua at os trinta anos.

    3) A predominncia de um esprito de impessoalidade formalista, sine ira et sludio, sem dio ou paixes e, portanto, sem afeio ou entu~ia~!!l0' normaLdominantessQ_n

    . conceitoscle-oever estrito sem ateno para as consideraes pessoais. Todos esto sujeitos a tratamento formalmente igual, isto , todos na mesma situao de fato. Este o esprito dentro do qual o funcionrio ideal conduz seu cargo.

    O CONCEITO DE BUROCRACIA: UMA

    CONTRIBUIAO ~MPIRICA*

    RICHARD H. HALL

    O CONCEITO DE BUROCRACIA aqui concebido como uma s~rie de dimenses, cada qual na forma de um contnuo.-Quando se medeucada contnuo nenhuma variao ... concomitante encontrada entre as dimenses. Sugere-se que o conceito de burocracia empiricamente mais vlido quando abordado dessa maneira e no presumindo-se que as organizaes so ou totalmente burocrticas ou no-burocrticas. A abordagem sugerida demonstrada pela aplicao do modlo a dez organizaes.

    Os estudiosos das organizaes, desde Weber at o presente, tm utilizado o modelo burocrtico como base para a conceituao de sistemas de inter-relaes em organizaes. Essa aceitao do modelo burocrtico tem servido como ponto de partida para estudos de desenvolvimento e modificao da estrutura organizacional, do lugar do indivduo dentro dessa estrutura e de vrios problemas afins. Este artigo exmnina as bases do modelo burocrtico - as dimenses organizacionais ~ue so caracteristicamente citadas como atributos burocrti

    * Traciuztdo de "The Concept of Bureaucracy: an Empirical .Assessmeof', em The Amet'ican lournal of Sociologg, julho de 1963, vol. 69, o" 1.

    l

  • 58 SocIOLOGIA DA BUROCRACIA

    nado pela tecnologia; b) o nvel m101mo de racionalidade1 determinado pela tecnologia; c) o grau de acomodao necessria entre burocracia e racionalidade em algum nvel deJ eficincia (d). O estado de a e b determinam c para dados!

    I" valores de d; c presumlvelmente composto de diversas dif \ menses comensurveis, cada uma das quais representa paf dres alternativos possveis que so, em certo grau, substitu

    veis uns pelos outros.

    V-se, por conseguinte, que o tipo ideal weberiano pode ser transformado para servir de base para a construo de um modelo que leva em conta uma escala muito mais ampla de fenmenos do que aquela que se credita a Weber - fenmenos que freqentemente tm sido tratados ad hoc como caractersticas "informais". No entanto, tal modelo mais complexo do que parece primeira vista, pois a investigao emorita revela Que uma "burocracia racional" do tioo webe

    o riano , provavelmente, um sistema social instvel. Presentemente, a pesquisa est sendo dirigida para uma maior especificao operacional das variveis sugeridas e para explicaes mais detalhadas de suas inter-relaes.

    CONFLITOS NA TEORIA DE WEBER

    ALVIN W. GoULDNER

    I NEVITAVELMENTE, existem certos pontos obscuros no trabalho de Weber que, se esclarecidos, possibilitariam sua melhor utilizao. Diversos deles podem ser notados na di .

    nam "efetiva" uma burocracia. Escreve ele:

    A efetividade da autoridade legal ("burocrtica" no presente contexto - A. W. G.) repousa na aceitao da vali dez do seguinte . .. 1) Que toda norma legal dada pode ser estabelecida por acordo ou por imposio visando a fins utilitrios ou valores racionais, ou ambos, com pretenso de obedincia pelo menos por parte dos membros da associao.1

    Aqui, um problema essencial deixa de Ser considerado de maneira surpreendentemente inesperada, pois Weber no percebe a possibilidade de que a efetividade da burocracia

    Traduzido de Patterns of Industrial Bureaucracy (Glencoe. 1111nola: Pie~ Presa. 1964). pga. 19-27.

    1 A. M. Henderson e Talcott Parsons (orgs.) Max Weber: The Theory 01 Economic and Social Organization (Nova York: Odord Unlverslty Press. 1947). pg. 329.

  • 61 60 SocIOLOGIA DA BUROCRACIA

    - ou outra de suas caractersticas - possa variar segundo o modo pelo qual as normas so introduzidas: por imposio ou por acordo. Ele sups tacitamente que o contexto cultural de uma'burocracia especifica seria neutro frente aos diversos mtodos de introduo de normas burocrticas. Contudo, des~ de que nossa cultura no neutra, mas prefere as normas introduzidas por acordo s impostas, no se pode confundt-Ias sem obscurecer a dinmica da organizao burocrtica ...

    Weber silenciou sobre diversas outras questes. Primeiro: a quem deveriam ser teis as normas para que a burocracia fosse efetiva? Segundo: em termos dos objetivos de quem seriam as normas um recurso racional? Objetivos de quem deveriam elas realizar para que a burocracia operasse efetivamente? Weber admitia que as metas dos diferentes estratos burocrticos eram idnticas - ou, pelq menos, bastante similares e por isso no as distinguiu. A razo disso parece ~-----:--~~sido a utilizao aa Pllrocradagvernamental,aparent'~e----

    mente solidria, como modelo implcito. Tivesse ele focalizado a burocracia da fbrica, com suas tenses mais evidentes entre supervisores e supervisionados. , . i e teria de considerado imediatamente que uma norma dada poderia ser racional ou vanta~osa para a consecuo dos fins de um estrato, digamos o gerencial, mas poderia no ser racional ou vantajosa para os trabalhadores.lI

    Uma "burocracia" s tem "fins" num sentido metafrico. Contudo, a preciso exige que se especifiquem os objetivos de diferentes pessoas ou os objetivos tpicos de diferentes estratos na organizao. Tal postura sugere que esses fins podem variar, no so necessariamente idnticos ou importantes para todo o pessoal e podem mesmo ser contraditrios; uma concluso que de modo algum surpreender os es

    2 Sbre este ponto fizemos consideraOes mals gerais em nossa discusso de Industrial Sociology: Status and Prospects de Wllbert E.. Moore em Amerlcan Sociologlcal Review, vol. XIII. ri' .... agosto de 1948. pgs. 396...fllO.

    CONFLITOS .NA TEORIA DE WEBER

    tudiosos da indstria, ainda que os da administrao a te

    nham negligenciado sistematicamente.

    A incipiente distino de \Veber entre normas impostas

    e normas estabelecidas por acordo indica dois aspectos mais

    amplos de um mesmo problema, entrelaados em sua teoria.

    H, primeiro, sua nfase na burocracia como administrao

    por "especialistas" ou profissionais. Weber via nossa poca

    como a.quela em que o diletante estava desaparecendo rpi

    damente e assegurava que as formas modernas de adminis

    trao se caracterizariam pela importncia atribuda espe

    cializao:

    Na esfera da administrao a escolha apenas entre o diletantismo e a burocracia. O fundamento primeiro da administrao burocrtica reside no papel do conhecimento tcnico ... 3 Aqu~sto ~~ sempre a. deuquem controla-a maquinaria exist~~e~~n-te---~~

    e tal controle limitado para as pessoas que no so especialistas ... 4 A administrao burocrtica significa fundamentalmente o exerccio do controle baseado no conhecimento. Este o aspecto que a torna especIficamente racional ... 5 A burocracia superior em saber, tanto o tcnico como o do fato concreto dentro de sua esfera de interesse.6

    H, contudo, outro ingrediente na concepo weberiana

    de burocracia; trata-se do papel da disciplina, um elemento

    que acompanha sua nfase na "imposio" como fonte das

    normas burocrticas. Segundo Weber, a burocracia o "fruto

    . mais racional" da disciplina.7

    3 Henderson e Parsons, ibid., pg. 337.

    ... Il;Iid p{l~ 337.

    5 1t>ld., pg. 339. 6 IbiJ..: p6g. 339.

    7 C. W. Mills e H. Gerth. From Max Weber (Nova York: Oxford

    University Press. 1946). pg. 254.

  • 62 SOCIOLOGIA DA BUROCRACIA

    o contedo da disciplina - escreveu Weber apenas a execuo consistentemente r~ciona

    lizada, metodicamente exercitada e exata da ordem recebida, na qual toda crtica pessoal incondicionalmente suspensa e ao ator cabe nica. e exclusi-. vamente executar a ordem.8

    Taleott Parsons, um dos mais agudos comentaristas da teoria de Weber, acentuou que "sobretudo a burocracia implica disciplina. . . .E a adequao das aes do indivduo a um complicado padro de maneira que o carter de cada uma de suas relaes com o resto pode ser rigorosamente controlado ... li Assim, a burocracia implica uma nfase na obedincia; e por "obedincia" Weber entende que o contedo de uma ordem se torna, "por si mesmo, a base da ao" .10

    Weber, ento, concebia a burocracia como uma organi---z"fia"'..Ji;,.u----"brrj.fa"""dal.Po-r-unr1ado, seria uma ofgatiizaob'''se=a;o:doJ:a~-----+

    na especializao; por outro, uma organizao baseada na disciplina. No primeiro caso, a obedincia invocada como um meio para a realizao de um fim; um indivduo obedece porque a norma ou ordem percebida como o melhor mtodo conhecido para a consecuo de algum objetivo.

    ,

    Na segunda concepo, Weber assegurava que a burocracia era uma forma de administrao em que a obedincia seria um fim em si mesma. O indivduo obedece ordem, afastando os julgamentos sobre sua racionalidade ou moralidade, principalmnte por causa da posio ocupada pela pessoa que ordena. O contedo da ordem no discutvel. Neste sentido, os guardas nazistas nos campos de concentrao justificaram suas atrocidades inenarrveis porque,

    8 Mills e Gerth. ibid., pg. 254. 9 Talcott Parsons. The Structure of Social Action (Nova York:

    McGraw-HiIl Book Co. 1937). pg. 5

  • 64 SocIOLOGIA DA BUllOCRACIA

    no sentido da breve anlise de Parsons, uma forma de autoridade n~o-legitimada apenas pela presena ou uso de capacidades tcnicas. Aparentemente, algo mais do que isso

    asse~rado para conseguir o consentimento voluntrio. A concluso a que se chega a seguinte: Weber parece

    ter descrito impltcitamente no Um, mS dois tipos de burocracia. Um dt:sses tipos pode ser chamado de "forma representativa" da burocracia, baseado nas normas estabelecidas por acordo, regras que so tecnicamente justificadas e administradas por pessoal especialmente qualificado. " Um segundo padro que pode ser chamado de burocracia "punitiva" baseado na imposio de normas e na obedincia pura e simples.

    AS PUNOES OA ORGANIZAO BUROCRATICA: -tI.J;>"'f1'FENFl?5B-MA1\T,IFES'1'-A-

    A teoria weberiana da burocracia foi um ponto de partida fecundo na manipulao dos materiais empricos, mas 'no forneceu instrumentos analticos suficiel)temente gerais. Por. isso, voltamo-nos para as diretivas contidas na anlise "estru-. tural-tuncional". A mais til exposio deSsa abordagem, para as necessidades da pesquisa emprica, a formulada por Merton em Social T heory and Social Slruclure. 14

    De uma perspectiva funcionalista, a questo mais. fundamental a ser colocada a respeito da organizao burocrtica : como ela persiste? O funcionalismo relaciona-se, em particular, com as atividades de auto-sustentao .de uma organizao. Que faz ela para conseguir sobreviver? A resposta de Weber a esta questo, embora sucinta e incipiente, suficientemente dara:

    14 Robert K. Merton, Social Structure and Social Theory (GJencoe. lIJinols: Free Press. 19'19), esp. capitulo I.

    CONFLITOS NA 1'BORJA DE WBBER 65

    A expertenCla tende a mQstrar universalmente - escreve ele - que o. tipo duro de administrao -burocrtica. .. , de uma pe~spectiva puramente tcnica, capaz de atingir o mais alto grau de eficincia e nesse sentido o meio mais racional conhecido de exercer a dominao sdbre seres humanos.1II

    A burocracia superior, explica Weber, s outras formas

    historicamente conhecidas de administrao por causa de sua

    estabilidade, fidedignidade,- calculabilidade permitida dos re

    sultados e magnitude de suas operaes. IO

    Em termos funcionalistas, a anlise de Weber trata pri

    macialmente das funes "manifestas"17 da administrao

    burocrtica, isto , explica sua sobrevivncia da mesma for

    ma pela qual um burocrata explicaria o uso de recursos bu

    rocrticos, a saber, que so tnicas eficientes para a reali

    zaone alguriCbjettvo.Esta aiaio pubHcamenteace1~para o emprego de mtodos burocrticos. Contudo, uma explicao completa da sobrevivncia burocrtica deve considerar no apenas suas conseqncias prescritas e to conhecidas publicamente, mas tambm aquelas imprevisveis e no discutidas convencionalmente.

    Existem todos os motivos para se esperar que as buro

    cracias produzam uma rede complexamente ramificada de

    IS Henderson e Parsons. ibid. pg. 337.

    16 Ibid.

    17. Os termos "manifesto" e "latente" serllo usados da maneira se

    guinte neste estudo: "manifesto" referir-se- quelas conseqncias de

    um padro social. isto , burocracia. que silo culturalmente prescritas para

    ele;' o termo "latente" igualmente se referirA s conseqncias concretas

    do padrllo. mas, neste caso, elas nIlo so culturalmente prescritas ou prefe

    ri

  • ----

    66 SoctOLOGIA DA BUROCRACIA CONPLITOS NA TBOlUA DB WBBEIt 67

    conseqncias, muitas das quais esto abaixo do nvel de a deixar em estado rudimentar aquelas normas que reforaI percepo pblica. Embora no sejam facilmente perceptveis, riam a predicabilidade e segurana dos trabalhadores. essas conseqncias podem contribuir consideravelmente para De maneira mais geral, Weber parece ter concebido as a sobrevivncia e desenvolvimento burocrticos. Seria inteira normas como se elas se desenvolvessem e operassem. sem amente prematuro, ento, afirmar que as burocracias se man interveno de grupos interessados que. alm disso, possuemtm apenas devido sua existncia. o poder em graus diferentes. Certamente, a burocracia um

    ." .... " ..... * ....... ~ ....... ;. ................... ~ ................... * ... . instrumento produzido pelo homem e ser produzido por

    homens na proporo de seu poder numa situao dada ...

    H ainda outro aspecto da discusso weberiana sobre o papel da eficincia ao qual no se poderia dar assentimento. Em grande parte, Weber focalizou as contribuies que os mtodos burocrticos fazem para a organizao como um todo. Por exemplo, ele indicou que as normas burocrticas

    ~umentam a "predicabilidade" do desempenho na organizao pela restrio das amizades pessoais desagregadoras ou

    --Gdas-inin:6ade.s. .._-~..

    Mas fornecem as burocracias veculos igualmente efi

    cientes para a realizao dos objetivos de todos os estratos da

    organizao? As normas da fbrica, por exemplo, capaci

    tam os operrios a predizerem coisas de maior interesse para

    e::les]18 ~oder-se-ia ver que sob determinadas circunst~ndas

    as normas da fbrica tornam normalmente difcil ou impos

    svel a predio pata os estratos pessoais mais baixos; porque

    dada a implicita mas penetrante suposio de que a ansieda

    de e insegurana so motivadores efetivos, levando inVIsivel

    mente os homens a obedecerem, os empregadores tendero

    18 Por exemplo: para os operrios "os canais de ascenso no so

    claros. o como e o quando do avano nlio slio definidos. Quando pergun

    tam ao patrlo como podem progredir. ele pode apenas dizer que se ~raba

    lharem duramente. fizerem um bom servio, comportarem-se e tentarem

    aprender o servio, a eles ser dada eventualmente uma oportunidade de

    melhores trabalhos. Ele nlo pode dizer que se fizerem tal ou qual coisas

    Burletgh G. Gardner.serAo promovidos no fim de alguns meses ...

    Human Relations in Industrll (Chicago: Rlchard D. Irwin, Inc., 1946),

    pg. 174.

  • 92 SocIOLOGIA DA BUROCRACIA

    mento dos clientes ou membros ( este, freqentemente, o caso nos movimentos semipolticos, organizaes educacionais etc.), a organizao burocrtica dever interessar-se por numerosas reas de atividade de seus clientes, estabelecer. controle sobre elas ou sujeitar-se sua influncia e direo. Finalmente, quanto maior sua dependncia direta frente a diferentes participantes na arena poUtica e quanto menores as facilidades econmicas bsicas e o .apoio poUtico dado pelos detentores do poder poltico - como no caso de algumas organizaes pblicas nos Estados Unidos e, em certa medida, em diferentes organizaes em Israel - tanto maior ser a tendncia da organizao em sucumbir s exigncias de- diferentes grupos de presso econmicos e polticos, a desenvolver suas atividades e a desvirtuar suas prprias normas de maneira conseqente.'

    Como j foi dito, podem ocorrer em casos concretos certa n .~idn.ciaentte-astendnCl.sudeOOt:oatiz.()edesbU:-

    rocratizao. Assim, por exemplo, quando um grupo detentor do monoplio poltico adquire o controle sobre uma organizao burocrtica, pode desvirtuar as normas organizacionais a fim de conceder vantagens especiais aos detentores do poder ou manter sua influncia sobre diferentes segmentos da populao. Por outro lado, quando um processo de desburocratizao se desenvolve deVido crescente presso dos diferentes grupos sobre a burocracia surge, dentro da organizao, como uma espcie de defesa contra essas presses, uma tendncia para a formalizao e burocratizao. Isso mostra que o papel e os caracteres distintivos de uma organizao burocrtica particular so pressionadns em diversos sentidos, podendo-se distinguir qual dessas tendncias predominante em reas .diferentes da atividade burocd.tica. :a tarefa de pesquisas posteriores analisar' mais detalhadamente essas diferentes constelaes.

    9 Ver Janowltz et. ai op. cit. pgs. 107-114; tambm Katz e Elseostadt, op. cito

    COOPTAAO: UM MECANISMO PARA A ESTABILIDADE ORGANIZACIONAL*

    PHILlP SELZNICK

    o SISTEMA DE REFE~NCIA aqui adotado inclui a

    anlise do comportamento organizacional em termos de res

    postas da organizao s suas necessidades. Uma de tais ne

    .... cessidages . espedficada . ..romo."segurana-da organizao.--- . como um todo frente s fras sociais de seu meio". As respostas, por outro lado, so repetitivas e podem ser conc~bidas como um mecanismo, segundo a terminologia psicol6gica quando da anlise do ego e seus mecanismos de defesa. Um desses mecanismos organizacionais a ideologia. O outro, principal objeto deste estudo, denominamos cooptao ... Definimos previamente este conceito como "o processo de absoro de novos elementos na liderana ou estrutura de decises politicas de uma organizao, como meio de evitar ameaas sua estabilidade oq existncia". Este mecanismo geral adquire duas formas bsicas: cooptao formal, quando h n~essidade de estabelecer a legitimidade da autoridade ou de tornar a administrao acessvel ao pblico a que se dirige; e cooptao informal quando h necessidade de ajustamento s presses de centros especificos de poder na sociedade,

    '" Traduzido de "Cooptatlon: A Mechanlsm for Orghnlzatlonal Stabillty", em Robert K. Merton et ai .. ~eader in Bureaucracy (Glencoe, IlUnols: Free Pres.s, 1963). pgs. 135-139.

  • 94 SOCIOLOGIA DA BUROCRACIA

    Na administrao, a cooptao um processo pelo qual o poder ou os encargos do poder - ou ambos - so compartilhados. Por um lado, o centro real de autoridade e deciso pode ser deslocado ou feito mais inclusivo, com ou sem qual"quer reconhecimento pblico da mudana; por outro lado, a participao no exerccio da autoridade e a responsabilidade pblica por esta participao podem ser compartilhadas com novos elementos, com ou sem a real distribuio do poder em si. Os imperativos organizacionais que definem a necessidade da cooptao surgem de uma situao em que a autoridade formal est concreta e potencialmente em estado de desequilbrio com relao ao seu meio institucional. Por um lado, pode-se dar que a autoridade formal no consiga refletir o verdadeiro equilbrio de poder na sociedade; por outro, pode-se dar que lhe falte um sentido de legitimidade histrica ou que seja incapaz de mobilizar a sociedade para a o.

    __ ~ _A incpacid~ara~letitJl -yerdadeiro-equillbrio-epederexigir um ajustamento real aos centros de fora institucional que esto em condio de lanar golpes ordenados e, assim, de tornar efetivas exigncias concretas. Esta questo pode ser resolvida pelo tipo de cooptao que resulta numa distribuio real do poder. Contudo, o requisito de legitimidade pode exigir um ajustamento ao povo em seu aspecto indiferendado, a fim de que um sentimento de aceitao geral possa ser desenvolvido. Para este caso pode ser desnecessria uma distribuio concreta do poder: a criao de uma "frente" ou a incorporao aberta de elementos consentidos na estrutura da organizao pode ser suficiente. Desse modo, uma aura de respeitabilidade ser gradualmente transferida dos elementos cooptados para a organizao como um todo e, ao mesmo tempo, pode ser estabelecido um veculo de acessibilidade administrativa.

    Podemos sugerir a seguinte hiptese: a cooptao que resulta numa distribuio real do poder tender a operar

    CooPTAO 9:>

    informalmente e, inversamente, a cooptao orientada para

    a legitimao ou para a acessibilidade.-tender a ser efetuada

    atravs de recursos formais. Assim, um partido de oposio

    pode ser formalmente cooptado numa administrao politica

    por meio de um recurso como a nomeao de seus lderes

    para postos ministeriais. Este recurso pode ser utilizado quan

    do visada uma distribuio do poder; contudo, especial

    mente til quando seu objetivo a criao de solidariedade

    pblica, a legitimao de representatividade do govt:rno. Em

    tais circunstncias," os lderes . da oposio podem tornar-se

    prisioneiros do governo, trocando a esperana de um poder

    futuro (obtendo o crdito pblico por se manterem no go

    verno numa poca de crise) pela funo atual de compartilh;u'

    as responsabilidades pelos atos da administrao. O carter

    formal e pblico da cooptao essencial para os objetivos

    --Visados. PO:E-eUtfe--lado,qua-nde-a -cooptao--sedestin:rhea~-~ lizao de um ajustamento aos centros organizados de poder institucional, pode ser necessrio manter relaes que, enbora sejam c~nseqncia~, so informais e encobertas. Se se tornam pblicos os ajustamentos aos ncleos especficos de poder, a legitimidade da autoridade formal, como representativa de uma comunidade teoricamente indiferendada (o povo como um todo), pode ser minada. Por isso torna-se til e freqentemente essencial que tal cooptao permanea na sombra da interao informal.

    A cooptao informal de ncleos existentes de poder na

    estrutura total (formal e informal) de deciso poltica de

    uma organizao, sintomtica de uma presso subjacente,

    um mecanismo de ajustamento a foras concretas. Neste nvel

    interao ocorre entre os que esto em posio de arregi

    (uentar foras e utiliz-las, o que significa que o que est

    m jugo uma realocao substantiva de autoridade e no

    um reajuste puramente verbal. A cooptao formal, contudo.

  • 97 96 SOCIOLOGIA DA BUROCRACIA

    um tanto ambgua com relao realocao de facto do poder. O sentimento de insegurana, que um lder interpreta como necessidade de incremento da legitimidade, uma resposta a algo generalizado e difuso. No h uma demanda obstinada de poder por parte de instituies autoconscientes que estejam em condies de desafiar a prpria autoridade formal. As aparncias tornam-se, neste contexto, mais importantes do que a realidade, dai resultando que as frmulas verbais - que degeneram prontamente em propaganda e os recursos formais organizacionais paream adequados para a realizao dos objetivos. O problema passa a ser o de manipulao da opinio pblica, algo que em nada se assemelha s negociaes com um grupo organizado de interesse, portador de uma liderana estabelecida e autoconsciente.

    A cooptao formal reparte ostensivamente a autori~ ... dack.-mas,faz~-o;..y..se envolvicla-num-ditemr.()oDjefi~

    vo real a distribuio dos smbolos pblicos ou dos encargos administrativos da autoridade e, conseqentemente, das responsabilidades pblicas, sem a transferncia do poder substantivo; por isso, a cooptao formal torna-se necessria a fim de assegu~ar que os elementos cooptados no escapem ao controle, no tirem vantagem de sua posio f.;>rmal para se apropriarem da rea real de deciso. Conseqentemente, a cooptao formal requer controle in,formal sobre os elementos cooptados antes que a unidade de controle e deciso seja ameaada. Esse paradoxo uma das fontes de tenso permanente entre a teoria e a prtica no comportainento organizacional. A liderana, pela natureza concreta de sua posio, est- comprometida com os dois objetivos conflitantes: se ela no toma conhecimentp da necessidade da participao, o objetivo da cooperao pode perigar; se a participao con~ cedida em termos demasiadamente amplos, a continuidade da liderana e da poltica pode ser ameaada.

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    COOPTAO

    A REEXPOSIO EMPIRJCA

    DA DISCUSSO

    Deixando de lado o interesse da teoria analtica, a exposio anterior define o objeto especial dessa investigao e as bases para a sua aproximao, obviamente seletiva, com a experincia d TVA. Aquele sistema de referncia guiou a anlise emprica da qual apresentamos uma breve reCapitulao.

    1. A teoria de "grass-roots" torna-.se uma ideologia protecioni.sta - Tentou-se explicar a elevada autoconscincia da TVA - como manifestada na doutrina de "grass-roots" - com base na funo dessa doutrina em facilitar a aceitao da Authority na rea de operao e em satisfazer ao requisito de alguma justifkao geral de sua existncia como tipo

    .--..nioo--de.agnda-governamental:--A--'I'V:A-foi-revoludOtiria .tanto para, as atitudes da populao e instituies locais quanto para0 sistema de governo federaL Adotando a doutrina de "grass-roots" a Authority foi capaz de estabelecer-se como a defensora das instituies locais e, ao mesmo tempo, de formular uma perspectiva que poderia ser utilizada na justificao geral de sua autonomia administrativa dentro do sistema federal. Contudo, a fidelidade doutrina e sua traduo em compromissos polticos criaram srias indisposies entre a TVA e outros departamentos do governo federal, inclusive o Departamento da Agricultura e o Departamento do Interior. . Como resultado, esses departamentos, com base na experincia da TVA, opuseram-se extenso da forma ,de organizao da TVA a outras reas, um fato de conseqncias para o futuro da prpria Authority.

    N. do T.: A doutrina de "grass-roots democracy" incorporava o prinfpio de que Q governo central nflo se deve restringir imposio de sua autoridade numa determinada regio. mas que, pelo contrrio. sua populao deve ter voz ativa nos rgos federais que ai atuassem. Na prtica nomeavam~se representantes.

  • 98 SOCIOLOGIA DA BUROCRAClA COOPTAO 99

    ?: 0. program~ agrrio foi delegad01 a ~m. colegiado dade. Nesse sentido, as decises que resultaram nesta situaadmmlstratlVo orgamzado - No contexto do prmclpal exem o no podem ser consideradas como erros. pio de aplicao da doutrina de . "grass-roots" na TVA - o programa de distribuio de fertilizantes da Authority - 3. Num ambiente de controvrsia, os compromissos da foi elaborada uma forte relao entre colegiados envolvendo, TVA com seu colegiado agrrio resultaram num alinhamento de um lado, o sistema colegiado de concesso de terras e, de faccioso envolvendo conseqncias imprevistas para seu papel outro, o Agricultural Relation Department da TVA. Esta 110 cenrio nacional - No exerccio do poder de deciso em relao de colegiados pode ser vista como um caso de coop- questes agrrias, a TVA se encontrou numa situao cartao informal na qual poderosos centros de influncia no regada de conflitos organizacionais e polticos. As agncias Vale foram absorvidos, dissimuladamente, na estrutura de agrrias do .N ew Deal - como a Barm Security Administra-determinao poltica da TVA. O Agricultural Relation tion e a Social Conservation Service - foram atacadas pela Department da TVA assumiu um carter preciso que inclula poderosa American Farm Bureau Federation, que as consium conjunto de sentimentos valoradores do sistema colegiado derava ameaas sua vida especial de acesso populao de concesso de terras e a aceitao da misso de defender rural, a extenso dos servios dos colegiados dt; concesso de tal sistema na Authority. Tornando efetiva essa representa- terras. Sob a presso dos seus ruralistas, a Authority no o, os ruralistas da TVA puderam aproveitar-se de prerro- reco~eceu a F~~ Securi.ty Administration e procurou excluir ~~tivas especiais. ----: result1l.tes deu seu stldll..Lformal deele-~_. _ .~_aS9lLC.onsenratlon.8enzlcedas...()p~s-na--4rea do--Vale;~-' - mentos integrantes da Authority - inclusive do exerccio do O resultado foi uma situao polIticamente paradoxa em

    poder de deciso na sua rea especfica de jurisdio e da que. a TV~, ~ principal ag~cia do N e~ Deal, no conseguiu presso sobre o desdobramento da poltica geral da Author. apo.l~r age~clas com as qual~ ~o~partdhava uma comunho ity. O carter e papel especiais do grupo rural da TVA li- pohtica, altando-se aos seus lfllmlgos. mitou sua perspectiva com relao participao de insti- 4 Sob a p,'esswo d aJo t TVA I

    '., W .. a e seus rur: tS as a a terou, tUloe.~ de n.egros, como :xpedlen~e da doutrma ~e grass- g1'adualmente, um aspecto significativo de seu carter ma-roots , e cnou. uma ~elaao ~speclal para ~ Amencan Farm neira de uma agncia conservadora - O grupo rural da TVA, Bureau . Federatton. Amda aS~tm, a o~er~ao desse processo refletindo atitudes e interesses locais, lutou contra a poltica

    coop~a~lvo provavelmente ~U1tO contn~ulU para fortalecer a de utilizao de ter~as de propriedade pblica, uma atitude estabtltdade da TVA na area e, especIalmente, para tornar conservadora, e aSstm .contribuiu efetivamente para a altepossvel a mobilizao de apoio num momento de necessi- ra~.o da politica. original ,da. TVA a c:ste respeit(). A proble

    mattca da proprIedade publtca considerada como definidora de carter, no sentido de que um foco de controvrsia

    Alguns funcionrios da TVA questionaram o uso que se faz e diviso, e assim o foi na TVA por um longo perodo. A aqui do termo "delegado", Contudo. esta parece ser a palavra mais

    breve e significativa em termos de suas aplicaes. Alm disso, em seu b~~a inflexvel de seus interesses ideolgicos e locais levou relatrio da politica da TVA quando de seu afastamento da presidncia. o grupo '1lral a envolver a Authority num desacordo com oDavid E, Lilienthal disse: "A TVA tem, por esforo persistente. delegado e assim descentralizado suas funes ... " New York Times, 13 de no Peparta.men~o do Interior sobre a administrao das. terras vembro de 1946. pg, 56. sob. a responsabilidade da TVA.

  • 100 SOCIOLOGIA DA BUROCRACIA

    5. A utilizao das associaes voluntrias dentro da doutrina de /lgrass~roots" representa uma distribuio dos en~ cargos e responsabitidades do poder e no do poder em si O recurso associao voluntria - especialmente, mas no exclusivamente, no programa agrrio - interpretado como um caso de cooptao formal, primeiro por promover um acesso organizado para o pblico, mas tambm como um meio de dar suportes legitimidade do programa da TVA. Isto significa que, bpicamente, a autoridade real e, em ampla medida, a mquina organizacional continuaram em mos da agncia administradora. Aps nove anos de op~rao, as asso~ ciaes distritais de terras que controlavam os fertilizantes da TVA permaneciam como instrumentos do sistema de agentes distritais ao qual foi delegado o programa de demonstrao da TVA. Em conexo com esta anlise, um teste operacional para localizar o controle sobre os grupos de cidados coo~

    mtadosdeScrito, como sugereauquest~o~i) acesso associao por parte dos elementos de fora canalizado por mio dos funcionrios da agncia cooptante?

    A TENDENCIA BUROCRTICA DOS

    PARTIDOS POLfTICOS*

    ROBERT MrCHELS

    A ESPECIALIZAO TCNICA que resulta inevitavel~ mente de toda organizao extensiva torna necessria o que se chama de liderana especializada. Conseqentemente, o poder de fi:iso-passaa ser consideradoWnuaosmatribu"mt~o~s-----~ especficos da liderana e gradualmente tirado das massas para ser concentrado nas mos dos lderes, exclusivamente. Assim, eles que eram, inicialmente, no mais que os instrumentos de execuo a vontade coletiva se emancipam das massas e se tornam independentes do seu controle.

    A organizao implica uma tendncia oligarquia. Em toa organizao - seja um partido poltico, um sindicato ou qualquer outra associao dessa espcie - a tendncia aristocrtica manifesta~se muito claramente. O mecanismo organizacional, aina que conceda uma solidez de estrutura, inuz muanas graves na organizao de massa invertendo completamente as posies dos lderes e liderados. Como re~ sultado a organizao, todo partido ou sindicato divide-se numa minoria de irigentes e numa maioria, de dirigidos.

    .. Traduzido de "The Bureaucratic Tendency of PoHtical Parties". em Robert K..Merton el. 1'11.. organizadores. Reader in Bureaucracy (Glencoe. Illlnois~ Free Press. 1963). pgs. 88,92.

  • 106 SOCIOLOGIA DA BUROCRACIA

    dador da critica a este aspecto da democracia... A massa que delega sua soberania - o que significa transferi-la para as mos de uma minoria - abdica de suas funes soberanas. Porque a vontade do povo no transferivel, nem mesmo a vontade de um nico individuo.

    ESTRUTURA BUROCRATICA E PERSONALIDADE'"

    ROBERT KING MERTON

    U MA ESTRUTURA social racionalmente organizada envolve padres de atividade claramente definidos, nos quais, idealmente, todas as sries de aes esto funcional- _____

    -- ---mente---:relacionadas IOSfinsoerugiU:iiZao.c .E'mtaIOrgani_u zao est integrada uma srie de cargos e status hierarquizados aos quais inerente certo nmero de obrigaes e direitos, estabelecidos com muita preciso por normas especificas. A cada um desses cargos se atribui uma responsabilidade e uma jurlsdio. A autoridade, ou seja, o poder de controle que tem sua origem em um status reconhecido, inerente ao cargo e no pessoa que o desempenha. A conduta administrativa, de modo geral, realiza-se dentro do limite de normas preestabelecidas pela' organizao. O sistema de relao entre os distintos cargos implica um alto grau de formalidade e uma distncia social claramente definida entre os ocupantes dessas posies. A formalidade se manifesta por meio de uni ritual social mais ou menos compli

    .. Traduzido de "Bureaucratlc Structure and Personabty", em Robert K. MertoIi et. ai., Reader in Bureaucracy (G!encoe. IlIlnois: Pree

    ~~Ss, 1963). pgs. 361-371. . 1 Para o desenvolvimento do conceito de "organizao racionar'.

    ver KarlMannhe1m. Man and Society in ah Age of Recomtruction (J.'.l'ova York: Harcourt. Brace. and Company. 1949). esp. pgs. 51 e seguintes.

  • 108 SOCIOLOGIA DA BUROCRACIA

    cado que simboliza e mantm o complexo ordenamento dos distintos cargos. Tal formalidade, que est relacionada com a distribuio da autoridade dentro do sistema, serve para atenuar o atrito reduzindo os contatos oficiais e substituindo-os por frmulas que foram estabelecidas pelas normas da organizao. Assim possvel calcular a conduta dos funcionrios e estabelecer um sistema de expectativas mtuas. Mais ainda, a formalidade facilita OS' contatos entre os funcionrios nos casos em que haja atritos pessoais entre eles. Desse modo, o funcionrio protegido das possveis arbitrariedades de seus chefes, j que ambos esto limitados por normas que eles reconhecem. Frmulas especficas de procedimento favorecem a objetividade e impedem que "os sentimentos agressivos se transformem em atos de violncia".2

    .____ ~FSTRllTllRA-DA-l1UROCRAC1A__ ..

    o tipo ideal dessa organizao formal a burocracia. O estudo analtico clssico da burocracia o de Max Weber.3 Como assinala Weber, a burocracia implica uma clara diviso d~ atividades integradas que so consideradas como deveres inerentes aos cargos. Nos regulamentos se formula um sistema de diversos controles e sanes. A atribuio de funes se faz base de qualificaes tcnicas que so determinadas por procedimentos formais e imparciais, tais como exa

    2 H. D. Lasswell. Politics (Nova York: McGraw-HIII. 1936). pgs. 120-t21.

    3 From Max Weber: ESSB.IIS in Sodolom, (Nova York: Oxford Universlty Press. 1946). pls. 196-244. traduzido e editado por H. H. Gerth e C. Wrlght Mi11s. Para um sumrio das discusses de Weber, ver Ta\cott Parsons. The Strllcture of Social Action (Glencoe. IlIlnols: The Free Press, 1949). esp. pgs. 506 e seguintes. Para uma descril1o. que no uma caricatura. do burocrata como um tipo de personalidade. ver C. Rabany, "Les Types Sociaux: le fonctionnalre". em Revqe Gnrale d'Administration. LXXXVIII (1907),. pgs. 5-28.

    ESTRUTURA BUROCRTICA E PERSONALIDADE 109

    mes etc. Dentro da estrutura de ordenamento hierrquico da autoridade, as atividades dos tcnicos esto regidas por normas gerais abstratas e claramente definidas que tornam desnecessrias as formulaes de instrues especficas para cada caso determinado. A generalidade das normas requer uma constante categorizao, mediante a qual os problemas e casos so classificados segundo um dado critrio, de acordo com o qual so resolvidos. O tipo puro de funcionrio burocrtico designado para o desempenho de seu cargo ou por seu superior ou por uma prova ou exame imparcial. No eleito. Uma medida de flexibilidade dentro da burocracia dada pela eleio dos funcionrios superiores que, presumIvelmente, expressam a vontade do eleitorado (por exemplo, um conselho de cidados ou de direo). A eleio dos funcionrios superiores tem por objetivo influir nos fins da organizao; mas os meios tcnicos para o alcance desse fins per

    ------manecemeIIIlIlos--uopessoalburocrlito pefniane1fe.~-A grande maioria dos cargos burocrticos se exerce por

    toda a vida, sempre que no haja fatores de perturbao que possam reduzir as dimenses da organizao. A burocracia proporciona o mximo de segurana profissional.~ A funo da inamovibilidade, das penses, dos salrios reajustveis e das promoes regulamentadas assegurar o desempenho leal dos deveres do cargo sem considerao de presses estranhas.6 O principal mrito da burocracia est na sua eficincia tcnica devido nfase que d preciso, rapidez,

    4 Karl Mannhelm, Ideologg and Utopia (Nova York: Harcourt, Brace, 1936), 18, pgs. 105 e seguintes. Ver tambm Ramsay Muir. Peers and Bureaucrats (Londres: Constable, 1910), pgs. 12-13.

    5 E. G. Cahen-Salvador Insinua que o pessoal das burocracias est em grande parte constltuldo daqueles para quem a segurana mais Importante que qualquer outra coisa. Ver seu "La situatioo matrielle et morale de fonctionnaires", Revue politique et parlementaire (1926), pg. 319,

    6 H. J. Lasld. "Bureaucracy", na Encgclopaedia of the Social Sciences. &te artigo est escrito mais do ponto de vista do especialista em Cincia Politica do que do ponto de vista do 'socl6logo.

  • 110 SOCIOLOGIA DA BUROCRACIA

    controle tcnico, continuidade, discrio e por suas timas quotas de produo. A estrutura est concebida para eliminar por completo as relaes do tipo pessoal e as consideraes emocionais (hostilidade, ansiedad, vnculos efetivos etc.). Com a burocratizao crescente, torna-se claro que o homem , em alto grau, controlado por suas relaes sociais com os meios de produo. Isso j no pode ser considerado apenas como um postulado marxista, mas como um fato que deve ser reconhecido por todos, independentemente de seu valor ideolgico. A burocratizao aclara o que antes era obscuro. Cada vez mais as pessoas se do conta de que para trablhar tm que ser empregadas, posto que no possuem instrumentos e equipamento. E as burocracias privadas e pblicas so, em grau crescente, as que dispem desses meios. Por conseguinte, tem-se que ser empregado pela burocracias para se ter acesso aos instrumentos de que se necessita para trabalhar, jst~pra~._Neste sentido, a. bur.oaatizaG-nplka-a----separao entre os indivduos e os instrumentos de produo, tanto nas empresas capitalistas modernas como na empresa estatal (tal como existiam em 1951), do mesmo modo como no exrcito ps-feudal a burocratizao implicava a separao completa dos instrumentos de destruio. No caso tpico, o trabaU1ador no possui seus instrumentos nem o soldado suas armas. Nesse sentido, h cada dia mis pessoas que tm a condio de trabalhadores. Assim se desenvolveu, por exemplo, o novo tipo de trabalhador cientista na medida em que o cientista est "separado" de seu equipamento tcnico (o fsico no possui o seu dclotron). Para trabalhar em suas investigaes ele tem de ser empregado por uma burocracia que disponha de recursos de laboratrios.

    A burocracia um tipo de administrao que evita quase por completo a discusso pblica de seus procedimentos, ainda que seja possvel que se critiquem seus fins. l:!sse "segredo burocrtico ': no exclusivo nem das burocracias p-

    EsTRUTURA BUROCRTICA E PERSO,NALlDADE 111

    blicas nem das particulares.'!' B considerado necessrio para impedir que certas informaes valiosas caiam em poder de competidores econmicos privados ou em mos de grupos polticos estrangeiros e potencialmente hostis. A espionagem entre competidores, ainda que, geralmente, no seja chamada' assim, talvez to freqente - quando no altamente organizada - em um sistema da empresas privadas quanto em um sistema de Estados nacionais. Cifras acerca dos custos, listas de clientes, indicaes so~re novos procedimentos tcnicos, planos de produo, so considerados, em geral. como segredos essenciais das burocracias econmicas privadas, segredos qde poderiam ser revelados se as ba.ses de todas as decises e da pol~tica tivessem que ser defendidas publicamente.

    AS DISFUNOES DA BUROCRACIA

    Nesta descrio simplificada se enfatizam os resultados positivos e as funes desempenhadas pela burocracia, quase sem considerar as presses internas que afetam sua estrutura. A sociedade, em grande' parte, contudo, reala as imperfeies da burocracia, como se deduz do fato de que a palavra "burocracia" se converteu em um insulto.

    A passagem, para o estudo dos aspectos negativos da burocracia nos dada pela aplicao do conceito de Veblen de .. incapacidade treinada", da noo de Dewey de to psicose ocupacional" e da de Wa;rnotte de "deformao profissio-' nal". A incapacidade treinada corresponde situao em que a preparao pode tornar-se inadequada ao mudar certas condies. A falta de flexibilidade na sua aplicao a um meio em transformao produz desajustes mais u menos srios.8 Assim, adotando o exemplo do galinheiro e utilizado

    7 Weber, op. cll. 8 Para estimular a discussl'i(l e o uso desses conceitos, ver Kenneth

    Burke. Performance anel Change (Nova York: New Repubbc, 1935).

  • 112 SOCIOLOGIA DA BUROCRACIA

    por Burke neste sentido, os reflexos dos pintinhos podem ser condicionados para que o som de uma campainha se con- . verta em um sinal de alimento. A mesma campainha pode ser usada para reunir os "pintinhos treinados" para a sua decapitao. Em geral, adotam-se medidas que correspondem preparao anterior, e sob novas condies que no so percebidas como significativamente diferentes, a solidez desta preparao pode conduzir adoo de procedimentos errados. Como disso Burke, trpeople may be unftted by being ft in an unfit fitness". Assim a preparao pode resultar em incapacidade.

    O conceito de Dewey de psicose ocupacional se baseia, em grande parte, na mesma observao. Como resultado da sua rotina diria, os individuos vo adq~irindo preferncias e antipatias.9 (O termo psicose empregado por Dewey para significar uma "marcada caracterstica psiquica".) Essas psicoses se desew."Olvem-pelas exigncias da organizaooa aual o indivduo desempenha seu papel ocupacional.

    Os conceitos de Veblen e de Dewey referem-se a uma ambivalncia fundamental. Qualquer atividade pode ser considerada tanto da perspectiva do que se consegue como da perspectiva do que no se consegue. "Ver pode significar tambm. no ver - olhar o objeto. A exclui ver o objeto B" .10 Em seu estudo, Weber se ocupa quase excl1;lsivamente do que seconsegue,/ mediante a estrutura burocrtica: preciso, confiana, eficincia. Essa mesma estrutura pode ser estudada, tambm, enfocando o outro aspecto da ambivalncia. Quais so as limitaes da organizao concebida para a consecuo desse fins?

    Por razes que j apresentamos, a estrutura burocrtica exerce sobre o funcionrio uma constante presso para tor

    pgs. 50 e seguintes; Daniel Warnotte, "Bureaucratle et Fonctlonnarisme" , /(evue de rrnstitut de Socologie. XVII (1937), 245.

    9 Ibid.. pAgs. 58-59. 10 Ibid. pg. 70.

    ESTRUTURA BUROCRTICA E PERSONALIDADE 113

    n-Io "metdico, prudente, disciplinado". Se a burocraria deve funcionar satisfatoriamente, necessita um alto grau de confiana na conduta dos funcionhios, ou seja, um grau execpdonal de conformidade com as responsabilidades atribudas. Da a importncia fundamental da disciplina, que pode estar to desenvolvida em uma burocracia religiosa ou econmica como no exrcito. A disciplina s pode ser efetivada se os padres ideais so sustentados. por fortes sentimentos que assegurem dedicao aos prprios deveres, uma aguda percepo dos limites da prpria autoridade e competncia e a realizao metodizada das atividades de rotina. A eficcia da. estrutura social depende, finalmente, de que se possa infundir 110S grupos integrantes atitudes e sentimentos apropriados. Como veremos, existem disposies dentro da burocracia para inculcar e fortalecer tais sentimentos.

    Por enquanto basta observar que para assegurar a disciplina (a necessria-confiana no desempen.h)u esses sentimentos so, freqentemente, mais intensos do que o necessrio. H, por assim dizer, uma margem de segurana na presso exercida po~ esses (entimentos sobre o burocrata. com finalidade de mold-lo a suas obrigaes, assim como o engenheiro, ao efetuar os clculos de resistncia de uma ponte, toma a precauo de exagerar certas medidas. Essa nfase produz uma transferncia dos sentimentos dos fins da organizao para os detalhes particulares da conduta exigida pelas normas. A submisso norma, de incio concebida como meio, transforma-se em um fim em si mesma. Tratase do processo do deslocamento dos objetivos pelos quais "um valor instrumental se converte em valor final".u A disciplina

    11 Esse processo tem sido observado em multos aspectos. Temos. por exemplo, a "heterogonia dos fins" de Wundt e o "paradoxo dos re~ ultados" de Max Weber. Ver tambm as observaes de MacIver sobre a transformao da civilizao em cultura e a observao de Lasswell de que "o' homem se distingue por sua infinita capacidade para transformar seus meios em fins". Ver Robert K. Merton, "The Unanticipated Consequences of Purposive Social AcHoo", em Americiin Sociological Review. I (1946), pgs. 894~901. Este process tem sido analisado exaus~

    I

  • 114 SOCIOLOGIA DA BUROCRACIA

    interpretada como acatamento aos regulamentos - qualquer que seja a situao, no considerada como uma medida destinada a fins especficos, mas aparece na vida do burocrata como um valor imediato. Essa nfase, resultante do deslocamento dos objetivos, produz rigidez e incapacidade de ajustamentos imediatos. Assim surge o formalismo - e mesmo o ritualismo - sob a forma de um apgo excessivo aos exigentes procedimentos formais. 12 Esse apego pode ser exagerado at o ponto em que a observao rigorosa das normas interfere na consecuo dos fins da organizao; teremos, ento, o fenmeno corrente do formalismo ou tecnicismo dos funcionrios. Um produto extremo desse processo de deslocamento dos objetivos da organizao o burocrata "virtuoso" que no esquece, jamais, nem uma s das normas relativas a seu cargo e que, portanto, inacapaz de atender a muitos de seus clientes. 13 Um caso em que o reconhecimento estrito

    literal das normas produziram este resultado o de Bernt :;;.

    Dalchen, piloto do Almirante Byrd em sua expedio ao Plo Sul: "Conforme uma resoluo do Departamento do Trabalho, a Bernt Dalchen. " no se pode esquecer carta de cida

    tivamente em fun~o dos mecanismos psicolgicos por Gordon W. AlIport na discuss~o do que ele chama de "autonomia funcional dos motivos". AlIport corrige as formulaes anteriores de Woodworth. Tolman e William Stern e chega a uma formula!io do processo do ponto de vista da motivao individual. No considera aquelas fases da estrutura social que conduzem "transformao dos motivos". A formulao adotada neste estudo . portanto. um complemento das de Allport. Uma considera os mecanismos psicolgicos envolvidos. e as outras as presses da estrutura social. A convergncia da Psicologia e da Sociologia no sentido de um conceito intermedirio sugere que ele bem poderia ser um dos elos de unio conceptual entre as duas disciplinas. Ver Gordon W. AlIport. Personality (Nova York: Henry Holt & Co. 1937). capo 7.

    12 Ver E. C. Hughes. "Instltutlonal OUlce and tHe Person". em American !oumal of Soclo/ogy. XLIII (1937). 404-413: Robert K. Mertono "Social Structure and Anomle". em Social Theory and Social Structure (Glencoe. Illlnols: The Free. Press. 1949): iE. T. Hiller. "Social Structure In Relatlon to the Person". em Social P"rces. XVI (1937). pgs. 34-44.

    13 Mannheim. Ideology and Utopia. pg. 106.

    ESTRUTURA BUROCRTICA E PERSO~ALIDADE 115 ~I

    dania. Balchen, de nacionalidade norueguesa, havia solicitado I t sua nacionalizao em 1927. Na resoluo declara-se que no ,! cumpriu com O requisito de cinco anos de residncia contnua ~

    1

    nos E.U.A. A expedio antrtica de Byrd o levou para fora ~ do pas - embora navegasse em um barco de bandeira norte ~:,-americana - e foi um elemento valiosssimo em uma expe ir ~dio norte-americana, e em zona (Little America) sobre a [ qual os E.U.A. reivindicam sua soberania por hav-la explo I; ~. rado e ocupado. I

    ! "O departamento de nacionalizao sustenta que no ~ I

    pode proceder segundo a suposio de que Little America ): fl .territrio norte-americano, porque isso seria imiscuir-se em ! f questes de ordem internacional que no so de sua compe I tncia. Do ponto de vista do Departamento do Trabalho, Balchen no havia residido o tempo suficiente nos E.U.A., e tecnicamente no cumpria com os requisitos da lei de nacionalizao" . J l

    FONTES ESTRUTURAIS DA fCONFORMIDADE EXCESSIVA f I"

    A falta de adequao na orientao que implica incapa I f cidade treinada tem sua origem em causas estruturais. Reca I pitulando rapidamente: 1) Uma burocracia eficiente exige r confiana no desempenho e estrita observncia das normas; ! 2) esse cumprimento estrito das normas tende a transform-las 'em absolutas; j no so consideradas em relao a uma srie de fins; 3) isso interfere na pronta adaptao sob condies em transformao e no claramente percebidas por aqueles que redigem as ~ormas; 4) assim temos que os mesmos elementos favorveis eficincia, em geral, so a causa da

    H Do Chicago Tribune. de 24 de junho de 1931. pg. 10. citado por Thurman Arnold em The Symbols of Government (New Haven: Yale Onlverslty Press. 1935). pgs. 201-202 (os Itlicos so de R. K. M.).

  • 116 SOCIOLOGrA DA BUROCRACIA

    ineficcia em casos particulares. Os membros do grupo que no apartaram do significado que para eles tm as normas, raras vezes percebem, plenamente, a sua inadequao. Essas normas, por sua vez, se convertem em simblicas por natureza, mais do que teis.

    At agora temos tratado os sentimentos responsveis pelo rigor da disciplina unicamente como elementos dados. Contudo, pode-se observar quais aS caractersticas definidas da estrutura burocrtica que levam a esses sentimentos. A vida oficial 9'0 burocrata est projetada para ele em trmos de uma carreira graduada, por meio da promoo por antiguidade, penses, salrios reajustveis etc., tudo isso visando estimular o trabalho disciplinado e o acatamento das normas.1 11 Tacitamente se espera do funcionrio que adapte seus pensamentos, sentimentos e atuaes perspectiva dessa carreira. Mas esses mesmos elementos no somente aumentam &-ffifl:forfIlismo- c-o~mbm conduzemaoe~o-fia~ trita observao das normas, o que resulta no conservantismo e no tecnicismo. O enorme significado simbIlco dos meios (as normas) contribui para que os sentimentos se transfiram dos fins para os meios.

    O~tra caracterstica da estrutura burocrtica tende a produzir um resultado semelhante. Os funcionrios sentem que tm um destino comum com todos aqueles que trabalham juntos. Compartilham os mesmos interesses, o que se deve pouca competio, j que a'S promoes se fazem por antiguidade. A agressividade dentro do grupo fica, dc:sse modo, reduzida ao mnimo, situao qual se atribui uma funo positiva para a burocracia. Contudo, o "esprito de ,grupo" (esprit de corps) e as associaes de carter informal, que geralmente se desenvolvem em semelliantes circunstncias, freqentemente levam os funcionriqs a preferir a defesa de

    15 Mannheim reala a Importncia do "Lebensplan" e a "Amtskarriere". Ver os comenfrlos de Hughes. op. cit.. pg. 413.

    ESTRUTURA BUROCRTICA E PERSO,NALIDADE 117

    seus interesses em lugar de dar assistncia ao pblico e aos chefes superiores eleitos. Como afirma o Presidente Lowell, se os burocratas acreditam que seu status no suficientemente reconhecido por um chefe recentemente eleito, ocultar-lhe-o detalhes ao apresentar-lhe os informes, fazendo-o cometer erros pelos quais ser responsvel. Se tenta, por out.ro lado, dominar completamente, ferindo assim os sentimentos de integridade dos burocratas, estes o sobrecarregaro com tal nmero de documentos que lhe ser impossvel despach-los todos ou pelo menos l-Ios.l6 Isso demonstra que uma organizao informal e defensiva tende a aparecer sempre que a. integridade do grupo se v ameaada.l7

    Seria demasiado cmodo e em parte errneo atribuir essa resistncia dos burocratas apenas aos interesses adquiridos. sses interesses chocam-se com qualquer ordem nova que elimine ou diminua a certeza das vantagens estabelecidas.

    -tsso, .. sem dvida,Otma parte-da resistncia dosurocrafas mudana, mas h outro fen~meno que , talvez, mais significativo. Como temosvisto, o~ funcionrios burocrticos se identificam afetivamente com seu modo de vida. Tm um orgulho de ofcio que os leva a opor-se s mudanas na rotina estabelecida, pelo menos quelas mudanas que aparecem como impostas por pessoas alheias a seu circulo. Esse ilgico orgulho de oficio uma caracterstica difundida que se manifesta mesmo nos batedores de carteira que, a julgar pelo que disse Sutherland em Professional Thief, apesar do risco se deliciam em dominar a prestigiosa faanha de "afanar" tanto o bolso esquerdo como o direito das calas.

    16 A. L. Lowell. The GOl1ernment 01 Bngland (Nova York. 1908) I. pgs. 189 e seguintes.

    17 Para uma instrutiva descritlo da formatlo de uma semelhante organlzalo defensiva num grupo de trabalhadores. ver F. J. Roethlisberger e W. J. Olckson. Management and the Worker (Bostori: Harvard School of Buslness Admlnistratlon. 1934).

    I

  • 118 SOCIOLOGIA DA BUROCRACIA

    Em um estimulante estudo, Hughes aplicou os termos '''secular'' e "sagrado" a vrios tipos de diviso do trabalho. O "sagrado" das prerrogtivas de casta e de estamento contrasta, claramente, com a progressiva tendncia secularizadora na' diferenciao das ocupaes em nossa sociedade em mudana.18 ,Contudo, como o sugerimos, em algumas carreiraS e em certos tipos de organizaes, pode desenvolver-se o "processo de sacralizao" (como contrapartida do "processo de secularizao"). O que equivale a dizer que atravs da formao de sentimentos, da dependncia afetiva frente aos smbolos e statlls da burocracia e do envolvimento, afetivo nas esferas de jurisdio e de autoridade, desenvolvem-se prerroga.tivas que implicam atitudes de legitimidade moral erigidas em valores, por direito prprio, e no mais considerados como meios puramente tcnicos para tornar mais eficiente o trabalho administrativo. Pode-se notar em algumas

    L... ,. :~"~od-__L] ., M,Jlormas-'&Uo~rabcas,-J.llLJ. u;uyas.a-prlnGtpID-pot'-fazoes--tec--' -nicas, uma tendncia a tornarem-se rgidas e sagradas, embora, como diria Durkheim, sejam seculares na aparncia.lO

    Durkheim tratou desse processo geral numa descrio das atitudes ~ dos valores que persistem na solidariedade orgnica ,de uma sociedade marcadamente diferenciada.

    18 E. C. Hughes, "Personallty Types and the Dtvision of Labor",

    em Amedcan Tournal 01 Sociology, XXXIII (1928), pgs. 754768.

    Uma dlstlnll.o multo semelhante esboada por Leopold voo Wiese e

    Howard Becker em Systematic Sociology (Nova York: loho Wiley &

    Sons. 1932). pgs. 222-225 et passim.

    19 Hughes reconhece uma fase desse processo de sacrallzall.o ao

    escrever que a fornall.o profissional "acarreta" como um subproduto

    a assimUao do candidato a um conjunto de atitudes e controles profis

    sionais. uma conscincia e uma solidariedade prolissionais,. A prolisso

    pretende ser e procura converter-se numa entidade moral. Hughes. op.

    dt., pg. 762. A este respetlo o conceito de Summer de "pathos" , como

    a aurola de sentimentos que protege a um valor social das criticas, tem

    uma importncia especial j que fornece uma indicao dos mecanismos

    envolvidos no processo de sacralizao. Ver seu Polk-way, (Boston:

    Ginn & Co. 19(6). pgs. 180-181.

    ESTRUTURA BUROCRTICA E PERSO,NALIDADE 119

    REUOES PRIMARIAS E RELAOES SECUNDARIAS

    Outra caracterstica da estrutura burocrtica, a nfase no carter impessoal das relaes, tambm contribui para a incapacidade treinada do burocrata. O modelo da personalidade do burocrata forma-se em torno da norma de impessoalidade que, ao lado da tendncia a categorizar, resultante do predomnio das normas gerais e abstratas, tende a produzir conflitos nos contatos do burocrata com o pblico ou com a clientela. As particularidades dos casos individuais so, geralmente, ignoradas j que os funcionrios reduzem ao mnimoos contatos pessoais e recorrem categorizao. Mas o cliente, que muito compreenslvelmente est convencido de que o seu caso um "caso especial", faz, geralmente, objees a ser tratado como categoria. O tratamento estereotipado no se adap!a se~ignc.:!as dosprobkmas iQ(livid:u.ais.,___ _ 'O tr-afamnto impessoal que se d a assuntos que para o cliente podem ser de grande importncia pessoal a causa da imputao de "arrogncia" e "insolncia" que se faz aos burocratas. Assim, na Greenwich Employment Exchange, o trabalhador desempregado que procura o pagamento de seu seguro aborrece-se com o que ele considera como a "impessoalidade e, s vezes, o tratamento frio e a rispidez dos funcionrios. .. Alguns indivduos se queixam da atitude de superioridade que adotam os funcionrios".2o Outra fonte

    20 "Tratam as pessoas como a um monte de lixo, eis o que fazem.

    Vi um operador de escayadeira que sacudiu um empregado pelo pescoo.

    por cima do balco. Os demais estavam com vontade de aplaudir. Evi

    dentemente ele nada conseguiu... Mas o empregado o mereceu por seu

    modo desdenhoso" (E. W. Bakke, The Unemployed Man; Nova York:

    Dutton, 1934. pgs. 79-80). Note-se que a atribuio de arrogncia

    feita por um desempregado que se encontra num estado de tenso devido

    perda de status e dignidade numa sociedade em que corrente a idia

    de que todo "homem capaz" pode encontrar trabalho. Que essa atribui

    o , em grande parte, uma conseqncia do estado psicolgico que

    atravessa o desempregado pode deduzir-se da prpria observao de

    Bakke de que "os empregados eram ligeiros e no tinham tempo para

    amabilidades, mas havia poucos indicios da dureza ou arrogncia no

    seu tratamento com o pblico".

    I

    I

  • 120 SOCIOLOGIA DA BUROCRACIA

    de conflitos com o pblico tem sua origem na estrutura burocrtica. O burocrata, independentemente da parte de sua posio na ,hierarquia, atua como representante do poder e do prestgio de tda a estrutura. No desempenho de seu cargo est investido de uma autoridade definitiva, Isso, geralmente, conduz a uma atitude dominante, aparente ou verdadeira, que somente pode ser acentuada pelo conflito entre sua posio dentro da hierarquia e sua posio frente ao pblico,21 A queixa e o recurso a outros funcionrios, por parte do cliente, tornam-se, freqentemente, ineficazes ou neutralizados pelo "esprito de grupo" anteriormente mencionado, que congrega os funcionrios em um grupo mais ou menos solidrio, Essa fonte de conflito pode ser reduzida ao mnimo nas emprsas privadas, j que o cliente pode tornar efetivo seu protesto transferindo seus negcios para outra organizao dentro do sistema de concorrncia. Contudo, f tente ao carter

    __ -----menepoHstieo --da--organiza:u-pblica~ - semelnantealterria:tiva no possvel. Neste caso, ademais, a tenso aumenta pela discrepncia entre a ideologia e os fatos: supe-se que os funcionrios pblicos se)'am "os servi"dores d p ..

    o ovo, mas,- f "t t' " . .. de fato,el S sao requen emen e lllaCeSSlvels e raras vezes

    , I - , H posslve ,escapar-se da tensao recorrendo a outra repartIao

    21 A ste respeito note-se a importncia dos comentrios de Koffka sbre aves ordenadas segundo a freqncia e intensidade com que bicavam umas s outras, "Se se compara o comportamento da ave que est no alto da lista, ou seja, o dspota, com o comportamento de uma ave que est em terceiro ou segundo lugar a contar de baixo, encontramos que esta ltima muito mais cruel com as poucas sbre as quais domina do que a primeira em seu tratamento com tOdas as outras, To rpido como se remove do grupo todas as aves que se encontram acima da penltima, a conduta desta se torna mais transigente e. s vzes, at amistosa, '" No diflcil encontrar esta analogia nas sociedades humanas e, portanto, um aspecto dsse comportamento deve-se aos efeitos do grupo social e no s caracteristicas individuais", K, Koffka. Principies 01 Gestalt Psychology (Nova York: Harcourt. Brace. 1935) t pgs. 668-669.

    ESTRUTURA. BUROCRTICA E PERSONALIDADE 121

    pblica para obter o servio que se deseja.22 A tenso pode ser atribuda, em parte, confuso entre status social do burocrata e do cliente: ste pode julgar-se superior, socialmente ao funcionrio, que no momento adota uma atitude dominante.28

    Assim, no que diz respeito aos contatos entre o pblico e os funcionrios, uma das fontes estruturais de conflitos a tendncia ao tratamento formal e impessoal, quando o que o pblico deseja uma ateno especial e individualizada, O conflito pode ser considerado, ento, como resultante da adoo de atitudes e relaes inadequadas, O conflito dentro da estrutura burocrtica surge da situao contrria., isto , quando as relaes pessoais substituem as relaes que por ~azes estruturai~ deveriam ser ,mais impessoais, Esse conf~lto pode caractenzar-se da manetra que exporemos em segUlda,

    ... ,__o Aburm::rnda,- como temos-vistO;-esta tganizaaacomo um grupo formal, e secundrio. A~ rela:s, norrr;~is dentro

    d~ssa rede ~rgantzada de expectativas SOCiaIS apolam-se nas atitudes efetivas dos membros do grupo. Como o grupo est . d d d ' I'd di'onenta o segun o as normas a 1mpessoa 1 a e, qua quer atl.,tude que se deSVIe da conformIdade com essas normas des

    t h t'l'd d d I 'd t'f' I ' per a a os I I a e aque es que se I en I lCam com a egltimidade das mesmas. Da que a sub~tituio do tratamento impessoal por um tratamento pessoal encontra geral desaprovao dentro da estrutura e caracteriza-se por eptetos tais como nepotismo, favoritismo etc, os quais so manifestaes

    22 Nesse ponto a mquina poltica adquire. freqentemente, um significado funcional. Como Steffens e outros tm demonstrado, as relaes mais pessoais e a supresso de formalidades regulamentares por parte da mquina satisfazem m!,!is plenamente as necessidades dos .. clientes" do que o mecanismo estereotipado da burocracia governamental.

    23 Como notava um dos desempregados a respeito dos funcionrios da Greenwich Employment Exchange: "Esses tipos nl10 teriam seu emprego" se no fosse por ns. os desempregados, g por iss que me aborrece v-los de nariz empinado", Bakke. op, cit. pg. 80.

    1

  • 122 SOCIOLOGIA DA BUROCRACIA ESTRUTURA BUROCRTICA E PERSONALIDADE 123

    claras de sentimentos feridos. 24 A funo de tais "ressenti. buindo para evitar a desintegrao da estrutura burocrtica,

    mentos automticos" pode ser compreendida claramente nos .0 que ocorreria se as relaes impessoais fossem substitudas

    termos das necessidades da estrutura burocrtica. pelas relaes pessoais. Esse tipo de conflito pode ser des

    '" crito, genericamente, como a introduo de atitudes do grupo A burocracia uma estrutura de grupo secundrio destiprimrio quando o que a instituio requer so atitudes do nada a realizar certas atividades que no podem ser desemgrupo secundrio. Da mesma forma como o conflito entre penhadas satisfatoriamente com base num critrio de grupo o burocrata e o pblico tem sua origem, geralmente, no trataprimrio.211 Dai resulta que a conduta contrria s normas

    mento impessoal. quando o que se requer um tratamentoformalizadas converte-se em objeto de apaixonada desapro

    vao. Isso constitui uma defesa funcionalmente significa pessoal.

    tiva contra as tendncias que pem em perigo a realizao Problemas da Investigafo - A tendncia ao aumento

    de atividades socialmente necessrias. Certamente, essas rea da burocracia na sociedade ocidental, que Weber h bastante

    es no so prticas racionalmente determinadas e exphci tempq havia previsto, no a nica. razo que tm os socitamente concebidas para o desempenho dessa funo. Antes, logos para concentrar sua ateno nesse campo. Os estudos

    do ponto de vista da interpretao individual da situao, empiricos das relaes entre a burocracia e a personalidade esse ressentimento apenas uma resposta imediata oposta contriburam de maneira especial para a crescente compreen..desonestidade" daqueles que violam as regras do jogo. . so da est!,uttI!social. UmaSJ:d~ nmero de pmbleAAmAJ,a....s'---__

    --Contudo, apesardesse marco sbjelivO da referrieia:;-essas f: especficos solicitam nossa ateno. At que ponto os distinreaes desempenham a funo latente de manter os ele- tos tipos de personalidade so selecionados e modificados

    mentos estruturais essenciais da burocracia, reafirmando a pelas diferentes burocracias (empresas privadas, administra

    necessidade de relaes secundrias e formalizadas e contri o pblica, aparatos polticos semilegais, ordens .religiosas) ?

    Considerando-se que o predominio e a submisso constituem 2i P significado de elementos lInglsticos tais como os epitetos tem caractersticas da perosnalidade, apesar de suas variaes em

    sido pouco explorado pelos socilogos. Summer muito aptoprladamente distintas situaes, selecionam as burocracias as personalidaobserva que os eptetos expressam definies e "criticas sumrias" de si

    tuaes sociais. Dollard observa tambm que os ..epitetos &eqentemen des mais ou menos submissas ou dominantes? E j que vrios

    te definem os problemas mais importantes de uma sociedade" e Saplr tem estudos tm demonstrado que essas caracteristicas podem ser enfatizado a importncia das situaes na apreciao do significado dos

    eptetos. De Igual importncia a observalo de Linton. segundo a qual modificadas, a participao nas atividades burocrticas tende

    "nas histrias de casos a maneira de sentir de uma comunidade sobre a awnentar as tendncias dominadoras? Selecionam os disum dado acontecimento mais Importante para o nosso estudo do que a

    prprio conduta . " Um estudo sociolgico do "vocabulrlo de lou