stj, resp 146367 - posse bem púbilco

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Superior Tribunal de Justiça RECURSO ESPECIAL Nº 146.367 - DF (1997/0061039-0) RELATOR : MINISTRO BARROS MONTEIRO RECORRENTE : ANÉSIO SOBRAL SOBRINHO FILHO ADVOGADO : DJALMA NOGUEIRA DOS SANTOS FILHO E OUTROS RECORRIDO : COMPANHIA IMOBILIÁRIA DE BRASÍLIA - TERRACAP ADVOGADO : NELSON FERRO COSTA E OUTROS EMENTA INTERDITO PROIBITÓRIO. OCUPAÇÃO DE ÁREA PÚBLICA, PERTENCENTE À “COMPANHIA IMOBILIÁRIA DE BRASÍLIA TERRACAP”. INADMISSIBILIDADE DA PROTEÇÃO POSSESSÓRIA NO CASO. – A ocupação de bem público, ainda que dominical, não passa de mera detenção, caso em que se afigura inadmissível o pleito de proteção possessória contra o órgão público. Não induzem posse os atos de mera tolerância (art. 497 do CC/1916). Recurso especial não conhecido. ACÓRDÃO Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas: Decide a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, não conhecer do recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator, na forma do relatório e notas taquigráficas precedentes que integram o presente julgado. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Cesar Asfor Rocha, Fernando Gonçalves, Aldir Passarinho Junior e Jorge Scartezzini. Brasília, 14 de dezembro de 2004 (data do julgamento). MINISTRO BARROS MONTEIRO Relator Documento: 520561 - Inteiro Teor do Acórdão - Site certificado - DJ: 14/03/2005 Página 1 de 8

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Posse de bem público

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Page 1: STJ, Resp 146367 - Posse Bem Púbilco

Superior Tribunal de Justiça

RECURSO ESPECIAL Nº 146.367 - DF (1997/0061039-0) RELATOR : MINISTRO BARROS MONTEIRORECORRENTE : ANÉSIO SOBRAL SOBRINHO FILHO ADVOGADO : DJALMA NOGUEIRA DOS SANTOS FILHO E OUTROSRECORRIDO : COMPANHIA IMOBILIÁRIA DE BRASÍLIA - TERRACAP ADVOGADO : NELSON FERRO COSTA E OUTROS

EMENTA

INTERDITO PROIBITÓRIO. OCUPAÇÃO DE ÁREA PÚBLICA, PERTENCENTE À “COMPANHIA IMOBILIÁRIA DE BRASÍLIA – TERRACAP”. INADMISSIBILIDADE DA PROTEÇÃO POSSESSÓRIA NO CASO.

– A ocupação de bem público, ainda que dominical, não passa de mera detenção, caso em que se afigura inadmissível o pleito de proteção possessória contra o órgão público. Não induzem posse os atos de mera tolerância (art. 497 do CC/1916).

Recurso especial não conhecido.

ACÓRDÃOVistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas:Decide a Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça, por unanimidade, não

conhecer do recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator, na forma do relatório e notas taquigráficas precedentes que integram o presente julgado. Votaram com o Relator os Srs. Ministros Cesar Asfor Rocha, Fernando Gonçalves, Aldir Passarinho Junior e Jorge Scartezzini.

Brasília, 14 de dezembro de 2004 (data do julgamento).

MINISTRO BARROS MONTEIRO Relator

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RECURSO ESPECIAL Nº 146.367 - DF (1997/0061039-0)

RELATÓRIO

O SR. MINISTRO BARROS MONTEIRO:

Anésio Sobral Sobrinho Filho ajuizou interdito proibitório contra a

“Terracap – Companhia Imobiliária de Brasília”, alegando ser possuidor direto da área

de terras localizada às margens da estrada que liga o Plano Piloto a Sobradinho,

designada "Chácara Boa Vista n. 10", a qual foi adquirida de Augusto Pereira da Silva

e sua esposa, Gumercinda Maria de Jesus, em 23.01.1989. Tais vendedores, segundo o

autor, já exerciam a posse mansa e pacífica da referida área há mais de dez anos.

Esclareceu que, no dia 6.2.1990, foi acordado por funcionários da ré, acompanhados

de policiais militares, que iniciaram a demolição das casas vizinhas, e foi avisado de

que também a sua seria demolida.

A liminar foi deferida a fl. 9, inaudita altera parte.

O MM. Juiz de Direito julgou procedente o pedido inicial para,

confirmando a liminar, determinar que a ré se abstenha de ameaçar a posse do autor,

sob pena de pagar multa diária de R$ 300,00 (trezentos reais).

A Quinta Turma Cível do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e

Territórios, por maioria, vencido o Desembargador Júlio de Oliveira, deu provimento

ao apelo da ré, para julgar improcedente a ação. Eis a ementa do acórdão:

“INTERDITO PROIBITÓRIO – TERRAS RURAIS DA TERRACAP ADMINISTRADAS PELA FUNDAÇÃO

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ZOOBOTÂNICA – BEM PÚBLICO – DOCUMENTO PARTICULAR, DE MERA CESSÃO DE POSSE – REGISTROS IMOBILIÁRIOS E PLANTA DA ÁREA EM LITÍGIO – CONFRONTO – PREVALÊNCIA DESTES – JUSTO RECEIO, AMEAÇA E DATA DA TURBAÇÃO – NÃO COMPROVAÇÃO.I – Não comprovando o autor, de forma eficaz, que o bem em litígio não integra o patrimônio da ré (Terracap), bem como o justo receio, a ameaça ou a data da turbação, caracterizando a moléstia à posse, não se justifica o interdito proibitório.II – O documento particular, de mera cessão de posse, não faz frente a documentação hábil e consistente apresentada a contento pelo órgão público, mediante registros imobiliários e planta da área em litígio, com indicação, inclusive, do local ocupado.” (Fl. 85)

Com apoio no voto minoritário, o autor ofereceu embargos infringentes,

os quais foram rejeitados pela Primeira Câmara Cível daquele Tribunal, por maioria,

vencido o Desembargador Vasquez Cruxen, em acórdão assim ementado:

“Direito Civil – Posse – Terras Públicas – Interdito proibitório – Não há turbação por parte da Administração se os apelantes não possuem autorização para a ocupação e utilização da área pública. A posse exercida por particulares sobre bem público constitui ato de mera tolerância e 'é exercida de forma contínua como decorrência, de seu modo de ser como emanação de sua própria autoridade'. A Administração atuou dentro dos limites do poder de polícia. Auto-executoriedade do ato administrativo. Embargos infringentes desprovidos.” (Fl. 128)

Inconformado, o demandante manifestou este recurso especial com

arrimo na alínea “a” do permissivo constitucional, apontando negativa de vigência aos

arts. 501 do Código Civil de 1.916; 926 e 932 do CPC. Afirmou ser admissível a posse

sobre as coisas públicas dominicais, acentuando constituir fato inconteste o de ter

ocupado por vários anos, de forma mansa e pacífica, o imóvel objeto do litígio.

Ademais, para a concessão da proteção possessória, basta a prova da posse como

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estado de fato e justo receio de turbação ou esbulho.

Oferecidas as contra-razões, o apelo nobre foi admitido na origem,

subindo os autos a esta Corte.

É o relatório.

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RECURSO ESPECIAL Nº 146.367 - DF (1997/0061039-0)

VOTO

O SR. MINISTRO BARROS MONTEIRO (Relator):

Inexiste no caso ofensa aos arts. 501 do Código Civil de 1916, 926 e 932

do CPC.

Em verdade, o autor – ora recorrente – não tem a posse do imóvel objeto

da lide, mas a mera detenção. Conforme registrou o acórdão da apelação, Augusto

Pereira da Silva, cedente dos direitos relativos à ocupação da área em questão ao

demandante, requerera à “Fundação Zoobotânica do Distrito Federal" a regularização

da chácara, importando o ato em reconhecimento acerca da sua natureza de bem

público (fls. 4 e 91). De outro lado, o mesmo Augusto Pereira da Silva e sua mulher,

mediante o instrumento de fls. 5/6, desistiram da ocupação da referida gleba em favor

do recursante. Constata-se, pois, que o autor tinha e tem consciência de que se trata de

mera ocupação de bem público dominical, insuscetível de ser apossado por particular.

Tito Fulgêncio, citado por Tito Lívio Pontes, traça a distinção nítida

entre posse e detenção:

“Haverá posse sempre que houver o corpus e a affectio tenendi .

Haverá simples detenção ou posse precária:a) quando se tem o corpus sem o animus ;b) quando, apesar da coexistência dessas condições, um

dispositivo legal negar a posse, em alguma hipótese.Fâmulo da posse: quem conserva a posse em nome de outrem

ou em cumprimento a ordem deste (art. 487)' (Da Posse, Prática, Doutrina, Jurisprudência e Legislação, págs. 62/63, 3ª ed.).

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Não induzem posse os atos de mera permissão ou tolerância, reza em sua primeira parte o art. 497 do Código Civil/1916, inteiramente aplicável à espécie em exame. Escorreita, destarte, a asserção constante do acórdão recorrido segundo a qual 'a ocupação de terras públicas não passa de mera detenção', com base em julgado oriundo da Suprema Corte: 'O bem do Estado é inintegrável no patrimônio do particular, pela prescrição aquisitiva ou usucapião. O poder do particular sobre terras públicas não é posse, mas mera detenção (RF 143/102)'.”

Jansen Fialho de Almeida, Magistrado no Distrito Federal, observa que

“a jurisprudência, contudo, tem entendimento pela impossibilidade jurídica de pedido

possessório em área pública, quando deduzido por particular sobre bem público

contra o órgão detentor da propriedade, pois, não podendo ser objeto de usucapião, a

ocupação é mera detenção tolerada ou permitida, portanto, à precariedade.” (O

Cabimento da Oposição pela Administração como Proprietária, com base no Domínio,

em Ação Possesória disputada por Terceiros sobre Bens Públicos, Revista do Tribunal

Regional Federal da 1ª Região, vol. 3, pág.19).

É exatamente esse o caso dos autos. Cuida-se de uma ocupação precária

e, por isso, passível de reclamo pelo Poder Público a qualquer tempo.

Ao apreciar o REsp n. 341.395-DF, sob a relatoria do Ministro Carlos

Alberto Menezes Direito, a Terceira Turma deste Tribunal decidiu sob a ementa

seguinte:

"Ação de reintegração de posse. Ocupação indevida de áreas públicas. TERRACAP.

1. Tratando-se de ocupação de áreas públicas sem a devida autorização, afastada pelo exame da prova dos autos as alegações do réu, não há direito à permanência, configurado o esbulho pela não devolução das áreas ocupadas após a devida notificação.

2. Recurso especial não conhecido."

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De anotar-se que in casu a ausência de notificação ao autor afigura-se

irrelevante à solução do litígio, seja porque o recorrente não ventila o tema em suas

razões recursais, seja porque, de todo modo, possuía ele e possui plena ciência de que

se trata de bem público dominical.

Isso posto, não conheço do recurso.

É o meu voto.

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Superior Tribunal de Justiça

CERTIDÃO DE JULGAMENTOQUARTA TURMA

Número Registro: 1997/0061039-0 RESP 146367 / DF

Números Origem: 2187791 3701796

PAUTA: 14/12/2004 JULGADO: 14/12/2004

RelatorExmo. Sr. Ministro BARROS MONTEIRO

Presidente da SessãoExmo. Sr. Ministro FERNANDO GONÇALVES

Subprocurador-Geral da RepúblicaExmo. Sr. Dr. DURVAL TADEU GUIMARÃES

SecretáriaBela. CLAUDIA AUSTREGÉSILO DE ATHAYDE BECK

AUTUAÇÃO

RECORRENTE : ANÉSIO SOBRAL SOBRINHO FILHOADVOGADO : DJALMA NOGUEIRA DOS SANTOS FILHO E OUTROSRECORRIDO : COMPANHIA IMOBILIÁRIA DE BRASÍLIA - TERRACAPADVOGADO : NELSON FERRO COSTA E OUTROS

ASSUNTO: Civil - Direito das Coisas - Posse - Interdito - Possessório

CERTIDÃO

Certifico que a egrégia QUARTA TURMA, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão:

A Turma, por unanimidade, não conheceu do recurso, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator.

Os Srs. Ministros Cesar Asfor Rocha, Fernando Gonçalves, Aldir Passarinho Junior e Jorge Scartezzini votaram com o Sr. Ministro Relator.

O referido é verdade. Dou fé.

Brasília, 14 de dezembro de 2004

CLAUDIA AUSTREGÉSILO DE ATHAYDE BECKSecretária

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