subsunçor 1 2 sayonara salvador cabral da costa 3 · 22 o uso de instrumentos musicais para o...
TRANSCRIPT
![Page 1: subsunçor 1 2 Sayonara Salvador Cabral da Costa 3 · 22 O uso de instrumentos musicais para o ensino de acústicaFísica na Escola, v. 10, n. 2, 2009 U ma das dificuldades enfrentadas](https://reader036.vdocuments.net/reader036/viewer/2022062413/5bf8c3f109d3f294138c9980/html5/thumbnails/1.jpg)
22 Física na Escola, v. 10, n. 2, 2009O uso de instrumentos musicais para o ensino de acústica
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○ ○
Uma das dificuldades enfrentadaspor professores no ensino médioé o desinteresse demonstrado pe-
los alunos quando abordamos tópicos defísica. Frequentemente a física é apresen-tada como uma série de “fórmulas” pron-tas, com as quais o aluno opera sem lhesdar sentido ou fazer qualquer relação como seu cotidiano. Sem efetuar a relação en-tre teoria e fenômeno o aluno acaba porconsiderar o assunto apresentado comoalgo totalmente novo e sem sentido.
Segundo David Ausubel, para queocorra uma aprendi-zagem significativa énecessária a interaçãoentre o conhecimentonovo e o conhecimen-to prévio existente naestrutura cognitiva doaprendiz, além de umapredisposição paraaprender (apud [1]).Defende a ideia de que“A nova informação se vincula a aspectosrelevantes preexistentes na estrutura cogni-tiva e nesse processo se modificam tanto ainformação recém adquirida como a es-trutura cognitiva preexistente” [1, p. 159].Existem algumas condições necessáriaspara que a aprendizagem significativa sejaalcançada, “o novo conhecimento deve serrelacionável de modo não-arbitrário esubstantivo com o conhecimento préviodo aprendiz e este deve adotar uma atitudede predisposição em aprender de formasignificativa” (ibid). Nesse sentido, elabo-ramos uma proposta que usou os conhe-cimentos musicais dos alunos como pontode partida, buscando gerar uma relaçãoentre o conhecimento científico e o do coti-diano, além de criar uma predisposiçãopara a aprendizagem.
A aprendizagem significativa con-trasta, fundamentalmente, com a apren-dizagem mecânica, na medida em que, naprimeira, a nova informação interage com
Wilson Leandro Krummenauer1,Terrimar Ignácio Pasqualetto2 eSayonara Salvador Cabral da Costa3
1Colégio Luterano Arthur Konrath,Estância Velha, RS, BrasilE-mail: [email protected]égio Adventista Marechal Rondon,Porto Alegre, RS, BrasilE-mail: [email protected]ícia Universidade Católica doRio Grande do Sul, Porto Alegre, RS,BrasilE-mail: [email protected]
Este artigo relata as atividades desenvolvidasem uma turma de ensino médio do Colégio Lu-terano Arthur Konrath, Estância Velha, RS. Aproposta de trabalho aqui apresentada visaabordar conteúdos de física através de conceitosprévios dos educandos. Foram utilizados osinstrumentos musicais como motivação parao estudo da acústica, pois percebemos que agrande maioria dos educandos tinha contatocom algum tipo de instrumento. Foi realizadoainda um comparativo entre o artigo aqui apre-sentado e outros artigos e dissertações sobre omesmo tema. O projeto se baseia na teoria daaprendizagem significativa de Ausubel, utili-zando, sobretudo, os subsunçores presentes naestrutura cognitiva dos aprendizes.
algum subsunçor,1 enquanto na segunda,não há nenhuma interação entre a novainformação e os conceitos ou proposiçõespreexistentes na estrutura cognitiva doaluno. Nossa experiência docente combi-nada com a pesquisa em sala de aula [2]tem reforçado a importância de conhecer-mos os subsunçores com os quais nossosalunos vêm para as aulas de física. Umexemplo de aprendizagem mecânica é amemorização de um conteúdo sem qual-quer fundamentação que lhe dê signi-ficado.
A prática docentemostra, em geral,que em uma turmade ensino médio amaioria dos alunospossui noções musi-cais. A Fig. 1 apresen-ta o resultado da con-sulta feita a um gru-po de 35 alunos,especificamente se
possuíam algum conhecimento musicalde algum instrumento específico. Estesalunos frequentavam a 3ª série do ensinomédio de uma escola privada de EstânciaVelha, RS. Verificou-se que, apesar dealguns termos utilizados cotidianamentenão serem os termos científicos, elesconseguiam distinguir a diferença entreum som “fino e grosso” (agudo e grave),entre “alto e baixo” (forte e fraco), porexemplo.
A partir dessas noções de acústica,propusemos atividades que utilizasseminstrumentos musicais já conhecidos doseducandos, para abordar o tema. Nossahipótese era de que o uso dos conhecimen-tos prévios, neste caso, favoreceria a moti-vação e, consequentemente, a predisposi-ção para aprender. Além disso, esta pro-posta usou as noções musicais dos apren-dizes como subsunçores para os conceitoscientíficos abordados na acústica.
A existência de noções musicais nos
Elaborou-se uma proposta queusou os conhecimentos
musicais dos alunos comoponto de partida, buscandogerar uma relação entre o
conhecimento científico e o docotidiano, além de criar uma
predisposição para aaprendizagem
![Page 2: subsunçor 1 2 Sayonara Salvador Cabral da Costa 3 · 22 O uso de instrumentos musicais para o ensino de acústicaFísica na Escola, v. 10, n. 2, 2009 U ma das dificuldades enfrentadas](https://reader036.vdocuments.net/reader036/viewer/2022062413/5bf8c3f109d3f294138c9980/html5/thumbnails/2.jpg)
23Física na Escola, v. 10, n. 2, 2009 O uso de instrumentos musicais para o ensino de acústica
alunos tem sido usada como estratégia deensino por diversos professores da edu-cação básica. Encontram-se textos queabordam desde a física de um único ins-trumento musical [3] até dissertações demestrado que apresentam propostas didá-ticas utilizando instrumentos musicaispara ensinar física [4].
Estudar a física presente no funcio-namento de um instrumento específico éum assunto tão vasto quanto a diversi-dade de instrumentos. Cada instrumentose apresenta como uma fonte de aborda-gens físicas diferindo desde a maneira co-mo se gera o som até o processo para emi-tir as diferentes notas musicais. Encon-tramos artigos que abordam a física deinstrumentos clássicos como a flautatransversal [5]. O autor utiliza este instru-mento para estudar a dependência entrea frequência, a posição dos nodos e o com-primento de onda da onda estacionáriaformada dentro da flauta. Usando umaabordagem semelhante, encontramos oestudo da física de um instrumento típicoda Bahia, o Berimbau. Neste texto é discu-tida a propagação ao longo de cordas e noar usando como motivação o estudo desseinstrumento vastamente encontrado nasrodas de capoeira. Nesses textos os autoresprocuram contextualizar os assuntos dafísica usando os mais variados instru-mentos musicais.
Nesse sentido foi também desenvol-vida uma proposta em escolas da redepública na cidade de Juiz de Fora, MG [6].Nesse estudo foi aplicado um pré-teste quevisava verificar o conhecimento prévio dosalunos. Em seguida, os autores ministra-ram uma palestra abordando a física pre-sente em diversos instrumentos musicais.Organizaram também uma visita aoMuseu Dinâmico de Ciência e Tecnologiada Universidade Federal de Juiz de Fora,onde relacionaram informalmente oconhecimento científico com as peças domuseu e as músicas ouvidas pelos alunosno dia a dia. Os resultados apresentadospelos autores confirmam a ideia de queos alunos são motivados por tal tema.
Metodologia
A proposta apresentada aqui diferedas citadas acima no que tange ao tempode desenvolvimento e metodologia utili-zada. Foi aplicado um questionário queverificou se os alunos tinham algumconhecimento musical, bem como setocavam algum tipo de instrumento. Apartir do levantamento realizado foi cons-tatado que a grande maioria dos alunospossuía algum conhecimento sobre notasmusicais ou algum tipo de instrumentomusical.
De maneira informal e usando umbrinquedo chamado “mola maluca” (verFig. 2) e um violão, trabalhamos os dife-rentes tipos de ondas mecânicas (longitu-dinais e transversais) e o conceito de som.Usando ainda o violão e um dispositivogerador de ondas es-tacionárias discuti-mos o significado dealguns conceitos im-portantes como fre-quência, período,comprimento de ondae velocidade de propa-gação.
C o n v i d a m o squatro componentesdo coral da escola,sendo um contralto,um barítono, um tenor e uma sopranopara que apresentassem uma música aosalunos. Separamos os alunos em gruposde quatro componentes e pedimos queobservassem as diferentes vozes. Em se-
guida eles foram desafiados a ordenar oscomponentes da voz mais “fina” (aguda)até a mais “grossa” (grave). A partir doscomentários dos alunos definimos arelação entre o som ouvido e a frequência,caracterizando assim, um som grave ou
agudo. Após esta dis-cussão abordamos ascaracterísticas fisioló-gicas do som: altura,intensidade e timbre.
Na aula seguintesolicitamos que osalunos trouxessemdiversos instrumentosmusicais; foram tra-zidos: flauta, violão,violino e guitarra. Pe-dimos, então, para o
aluno que trouxe o violão que emitisseuma nota “lá” (440 Hz). Com auxílio doprograma analisador de espectro VisualAnalyser (ver Fig. 3) aferimos o valor dafrequência que estava sendo emitida pelo
Figura 1 – Gráfico da distribuição do conhecimento musical dos alunos.
Figura 2 – Uma “mola maluca” (disponível em flickr.com/photos/mineirasuai/360059807/, acessado em 20/12/2008).
Estudar a física presente nofuncionamento de um
instrumento específico é umassunto tão vasto quanto a
diversidade de instrumentos.Cada instrumento se apresentacomo uma fonte de abordagens
físicas diferindo desde amaneira como se gera o somaté o processo para emitir as
diferentes notas musicais
![Page 3: subsunçor 1 2 Sayonara Salvador Cabral da Costa 3 · 22 O uso de instrumentos musicais para o ensino de acústicaFísica na Escola, v. 10, n. 2, 2009 U ma das dificuldades enfrentadas](https://reader036.vdocuments.net/reader036/viewer/2022062413/5bf8c3f109d3f294138c9980/html5/thumbnails/3.jpg)
24 Física na Escola, v. 10, n. 2, 2009O uso de instrumentos musicais para o ensino de acústica
violão. Em seguida, solicitamos ao alunoque trouxe a flauta que também tocassea nota lá e, novamente, aferimos a fre-quência (440 Hz).
Questionamos os alunos sobre os doissons que foram produzidos. Foi fácil per-ceberem a diferença entre o som do violãoe o som da flauta, mesmo quando pro-duzindo a mesma nota musical. Nestemomento introduzimos o conceito de tim-bre; novamente, com o programa anali-sador de espectro, mostramos aos alunosa diferença nas intensidades dos harmô-nicos da onda emitida pelo violão e daonda emitida pela flauta.
A partir da flauta também estudamoscomo variar a frequência (nota musical)mudando apenas ocomprimento do tubo(flauta). A partir daí,introduzimos o con-ceito de ressonância, eretomamos a ideia deharmônico, tema esseque foi ensinado pormeio da afinação doviolão.2 Ao final daaula os alunos responderam a um ques-tionário sobre acústica.
Como atividade prática foi propostoque cada grupo construísse um instru-mento musical rústico e explicasse o seufuncionamento, além de usá-lo paraapresentar uma música para a turma.
Tabulamos os escores dos testes e ana-lisamos os resultados de cada aluno, alémde comparar a evolução da turma comoutra onde abordamos o conteúdo da ma-neira tradicional. Os testes objetivaramverificar a aprendizagem dos principaisconceitos trabalhados durante o projeto:
Referências
[1] M.A. Moreira, Teorias de aprendizagem(E.P.U., São Paulo, 1999), 195 p.
[2] W.L. Krummenauer, O Movimento Cir-cular Uniforme Para Alunos da EJA queTrabalham no Processo de Produção doCouro. Dissertação de Mestrado, Ins-tituto de Física, Universidade Federaldo Rio Grande do Sul, 2009.
[3] A. Kandus, Revista Brasileira de Ensinode Física 2828282828, 427 (2006).
[4] E. Trentin, Os Instrumentos Musicais comoRecurso Didático no Ensino de Acústica.Dissertação de Mestrado, Instituto deFísica, Unversidade de São Paulo,2006.
[5] C. Lemmi y J. Mazaferri, Física de laFlauta Traversa (Universidad de Bue-nos Aires, Buenos Aires, 2003).
[6] F. Lopes e J.R. Tagliati, in: Resumos e Pro-grama do XVI Simpósio Nacional deEnsino de Física (Zit Editora, Rio deJaneiro, 2005).
[7] D.P. Ausubel, School Learning, An Intro-duction to Educational Psychology(Holt, Rinehart and Winston, NovaYork, 1969) 1. ed., 691 p.
Figura 3 – Tela do programa analisador de espectro.
período, frequência, comprimento de on-da, altura, intensidade, timbre, ressonân-cia e harmônicos. Uma segunda turma(turma de controle) também respondeuaos mesmos testes da turma estudada. Aofinal das apresentações os alunos res-ponderam também a um questionário deopiniões que avaliou a motivação e inte-resse gerado pela proposta.
Resultados
Ao calcular a média entre os resulta-dos dos pré-testes verificamos a existênciade pequenas diferenças entre os resultadosdas duas turmas. Consideramos que estadiferença é desprezível do ponto de vistaestatístico. Usamos o mesmo tratamento
estatístico com os pós-testes e verificamosque a diferença entreas médias aumentou,bem como a média decada turma. A turmaque participou da no-va abordagem obteveum aumento na suamédia 15% maior que
a melhora da turma de controle.As respostas apresentadas nos ques-
tionários demonstraram uma apreciaçãomaior pelo novo método. 88% concordamplenamente que este método é mais inte-ressante que a forma tradicional deensinar física.
Conclusão
Após a aplicação da proposta e análisedo seu resultado, constatou-se que partirde um tema conhecido dos alunos servecomo motivação para o ensino da acústi-ca. Partir de conhecimentos prévios dos
aprendizes tornou a aprendizagem signifi-cativa [7], apud [1], pois os alunos perce-beram a proposta como significativa erelevante. Demonstraram predisposição àaprendizagem bem como interesse e par-ticipação em todas as atividades desenvol-vidas.
Este projeto foi desenvolvido experi-mentalmente em apenas uma turma deensino médio, mas pelos bons resultadosconstatados no item anterior percebemosa importância e a validade de desenvol-vermos o mesmo método em outrasturmas da escola.
A partir dos resultados dos questio-nários de opiniões ficou evidenciado quea proposta alcançou os objetivos, poispercebemos nas respostas que a grandemaioria dos alunos aprendeu com prazer,acharam as aulas atrativas e comentaramque gostariam que mais conteúdos fos-sem abordados da mesma maneira.
Notas1Um conhecimento específico, com
pelo menos alguma clareza, estabilidadee diferenciação é o que se chama desubsunçor [1].
2Para tanto, o aluno manteve a sextacorda presa na quinta casa e tocou a notamusical, abafando-a logo em seguida, issofez com que a quinta corda vibrasse semser tocada.
Ficou evidenciado que aproposta alcançou os objetivos,
pois a grande maioria dosalunos aprendeu com prazer,
achou as aulas atrativas ecomentou que gostaria que
mais conteúdos fossemabordados da mesma maneira