sustentabilidade ong gorta self help africa

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1 | P ágina UNIVERSIDADE ABERTA Doutoramento em Sustentabilidade Social e Desenvolvimento, 6ª Edição Seminário de Aprofundamento Teórico I Tópico 5: Ética para a sustentabilidade Professora: Ana Paula Martinho Grupo: Peter Singer Doutorandos: Ana Pego Manuel Jossefa Xosé Carreira Tema: Uma inovação refletida nas ações da Self Help Africa Fevereiro de 2015 1. Introdução O presente trabalho aborda a questão da ética para a sustentabilidade e procura explorar as correntes éticas refletidas nas atividades da organização não-governamental Gorta Self Help Africa (abreviadamente SHA). Esta ONG tem como objetivo geral considerado nesta análise identificar carências em pequenas comunidades agrícolas e, mais especificamente, o combate contra a fome e a pobreza através da produção de alimentos provenientes de organizações rurais. O trabalho está organizado em cinco pontos. No primeiro apresenta-se uma breve introdução aos objetivos e desenvolvimento deste trabalho académico. No segundo descreve-se as atividades principais da SHA. No terceiro apresenta-se a questão da ética ambiental na atuação SHA identificando-se as principais correntes éticas incorporadas. No quarto são elencadas tanto as inovações bem como as consequências sociais e económicas no meio ambiente. Por último, no quinto ponto, conclui-se com algumas considerações dos autores em relação às atividades da ONG e sobre a análise do trabalho realizado.

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O trabalho aborda a questão da ética para a sustentabilidade e procura explorar as correntes éticas refletidas nas atividades da organização não-governamental Gorta Self Help Africa.

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    UNIVERSIDADE ABERTA

    Doutoramento em Sustentabilidade Social e Desenvolvimento, 6 Edio

    Seminrio de Aprofundamento Terico I

    Tpico 5: tica para a sustentabilidade

    Professora: Ana Paula Martinho

    Grupo: Peter Singer

    Doutorandos:

    Ana Pego

    Manuel Jossefa

    Xos Carreira

    Tema: Uma inovao refletida nas aes da Self Help Africa

    Fevereiro de 2015

    1. Introduo

    O presente trabalho aborda a questo da tica para a sustentabilidade e procura

    explorar as correntes ticas refletidas nas atividades da organizao no-governamental

    Gorta Self Help Africa (abreviadamente SHA). Esta ONG tem como objetivo geral

    considerado nesta anlise identificar carncias em pequenas comunidades agrcolas e,

    mais especificamente, o combate contra a fome e a pobreza atravs da produo de

    alimentos provenientes de organizaes rurais. O trabalho est organizado em cinco

    pontos. No primeiro apresenta-se uma breve introduo aos objetivos e

    desenvolvimento deste trabalho acadmico. No segundo descreve-se as atividades

    principais da SHA. No terceiro apresenta-se a questo da tica ambiental na atuao

    SHA identificando-se as principais correntes ticas incorporadas. No quarto so

    elencadas tanto as inovaes bem como as consequncias sociais e econmicas no meio

    ambiente. Por ltimo, no quinto ponto, conclui-se com algumas consideraes dos

    autores em relao s atividades da ONG e sobre a anlise do trabalho realizado.

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    2. Aes da Self Help Africa (SHA)

    A Self Help Africa foi fundada em 1984 em Dublin como uma organizao de

    caridade que, baixo o slogan comida e um futuro, encerra objetivos e aes que se

    enquadram na sustentabilidade. Desde a sua fundao, a organizao tem vindo a operar

    em nove pases da frica Subsariana nomeadamente Etipia, Malawi, Qunia, Uganda,

    Zmbia, Gana, Togo, Benim e Burquina Faso (figura 1). Com a fuso entre a SHA e a

    Gorta, estas aes foram estendidas para a Tanznia.

    Figura 1: Pases de atuao da SHA antes da fuso com a Gorta. Fonte:

    http://www.selfhelpafrica.org/ie/about-sha

    A SHA apresenta como objetivos principais:

    Promover maior crescimento dos pequenos produtores atravs do aumento

    da produo e da produtividade;

    Promover a diversificao das culturas e dos rendimentos das populaes

    rurais;

    Apoiar no acesso ao mercado para a venda do excedente;

    Facilitar o acesso dos pequenos produtores aos servios de microfinana;

    Promover solues de sustentabilidade para a agricultura em face das

    mudanas climticas;

    Promover a produo e utilizao da semente local incluindo sua

    certificao;

    Promover a inovao e privilegiar o trabalho com as mulheres.

    Os fundos para o funcionamento da organizao so provenientes maioritariamente

    da Ajuda Irlandesa, Comisso Europeia, USAID, DFID, Fundaes, Doadores

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    Internacionais e Pessoas Singulares. Uma vez sua sede estar localizada na Europa, com

    um escritrio nos Estados Unidos da Amrica, a SHA tem a Partner Africa como sua

    subsidiria e responsvel pelo apoio tica e socialmente responsvel na prtica de

    negcios cuja atuao abrange maior parte dos pases africanos incluindo os programas

    de desenvolvimento de capacidades. A Patner Africa est sediada em Nairob no Qunia,

    e a fuso entre a SHA e a Gorta em 2014, deu origem a Gorta-Self Help Africa, nome

    pelo qual designada ao nvel da Europa. A fuso permitiu conferir organizao,

    maior pujana nas suas intervenes nos pases africanos onde continua a actuar com a

    designao de SHA.

    Das atividades mais salientes desenvolvidas por esta organizao no perodo entre

    2012 e 2013, pode destacar-se a extenso para Benim onde estabeleceu uma empresa

    social atravs da Partner Africa que presta servios de auditoria em tica para o setor

    privado, promove formaes e d apoio no acesso dos negcios africanos cadeia de

    valor internacional. Envolveu-se tambm na criao de uma outra empresa social

    designada AAA que procura dinamizar o desenvolvimento de pequenas empresas do

    ramo agrrio. Esteve neste perodo a actuar tambm em programas de educao

    principalmente, a educao ps-primria.

    Durante os anos 2011 e 2012, a SHA levou a cabo o projeto change her life

    (muda a vida dela) que teve como objetivo mostrar ao mundo que, embora a mulher em

    frica faa cerca de 80% dos trabalhos ligados terra (agrcolas), recebe apenas 5-10%

    dos apoios destinados a este setor. Nos anos anteriores, mais concretamente em 2009, a

    organizao liderou a publicao de um documento que chama a ateno sobre a

    problemtica da adaptao das comunidades rurais s mudanas climticas. Este

    documento teve como lema Climate Frontline - African Communities Adapting to

    Survive (uma traduo que pode significar: Linha da frente para o clima

    comunidades africanas adaptando-se para sobreviver).

    3. A Questo da tica Ambiental na Atuao da SHA

    Correntes ticas como o ecofeminismo defendem que a mulher dever estar na

    vanguarda no bom relacionamento com a natureza. A atuao da SHA em relao

    mulher pode-se encaixar nesta corrente de tica ambiental uma vez que na maioria dos

    pases em desenvolvimento em especial os africanos, a mulher o garante do sustento

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    das famlias. Como defende Vandana Shiva, o facto de as mulheres possurem contacto

    mais perto com a natureza, permite-lhes melhor desempenhar o papel de guardis da

    biodiversidade evitando desta forma o conceito anacrnico de desenvolvimento assente

    em monoplios econmicos, globalizao e padres ocidentais de crescimento (Vaz e

    Delfino, 2010).

    Ao enfatizar a necessidade de preservar a natureza atravs da prtica de uma

    agricultura sustentvel, a SHA vai de encontro ao princpio de no depleo dos

    recursos naturais defendido pela ecologia profunda mas tambm ao preterir a semente

    manipulada em benefcio da semente localmente produzida, alcana a corrente

    Biocntrica da tica que defende importncia a todos os seres humanos e no humanos

    em clara oposio ao Antropocentrismo que d primazia existncia humana,

    considerando vlidos todos os meios para atingir o fim ltimo, o bem-estar humano.

    A SHA tem como objeto de melhora associado s questes ambientais o apoio ao

    desenvolvimento das pequenas comunidades rurais. Neste sentido, a tica ambiental da

    SHA est alinhada com a corrente positivista: os valores ambientais so tidos como

    secundrios e o bem-estar dos humanos o mais importante. Verifica-se que a ONG

    reflete uma anlise positivista ao considerar que a sua interveno de apoio ao

    desenvolvimento agrcola rural gera necessariamente benefcios para o meio ambiente.

    Outros autores consideram que os valores ambientais geram outros valores que devem

    ser considerados moralmente (Norton, 2008). O mesmo autor defende que se deve

    analisar a ao do homem produz novos mtodos de avaliao.

    A problemtica das mudanas climticas j no constitui um problema local, dos

    outros, mas sim de todas as sociedades no mundo inteiro. Ao reconhecer que as

    comunidades mais carenciadas nos pases da sua interveno podem encarar

    dificuldades de adaptao e de resilincia pondo em causa sua prpria sobrevivncia, a

    SHA entrou para as bases defendidas pelas correntes ecocntricas da tica ambiental,

    mas, paradoxalmente tambm, antropocntricas por defender a sobrevivncia humana e

    no a Terra como possuidora de valor intrnseco. De igual modo, ao promover maior

    produo e produtividade garantindo mercado para os excedentes dai resultantes, estar

    sem dvida, a enveredar pela via economicista combatida pelas correntes holistas como

    as Biocntricas, da Terra e Ecocntricas, contudo, so evidentes aes da SHA com

    virtudes ambientais incorporadas nomeadamente as formaes das pessoas em matrias

    de sustentabilidade e em tica nos negcios. Como refere Aldo Leopold (1887-1948),

    no basta a tica intra-humana necessrio transcendermos para a tica global da

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    comunidade em que vivemos, isto , considerarmos a natureza como um todo que deve

    merecer nosso respeito.

    4. Uma Perspetiva Inovadora

    Ao considerarmos que uma ONG portadora de alguma inovao quer econmica

    ou social, primeiro devemos ter em conta os benefcios que essa mesma ONG poder

    trazer para a comunidade em que est inserida. Parece-nos fundamental que esses

    benefcios no sejam s econmicos, mas tambm sociais e ambientais. Uma anlise

    mais profunda nesta questo salienta-se o facto da ONG escolhida trabalhar com

    pequenas organizaes rurais, onde o objetivo colmatar a pobreza, a fome e

    especialmente diminuir o desemprego da populao feminina. Neste sentido, e de

    acordo com o site http://www.selfhelpafrica.org/uk/, vrios aspetos podem ser

    considerados no novos em si, mas inovadores pela sua abordagem: (i) agricultura como

    um negcio; (ii) emprego feminino agrcola; (iii) impacto positivo no meio ambiente,

    comunidades rurais e luta contra a fome; (iv) agricultura vs nutrio; (v) cooperativas e

    associaes de produtores; (vi) melhores sementes e prticas agrcolas. Salienta-se,

    portanto, o empreendedorismo agrcola associado ao emprego feminino, organizao de

    produtores e prticas agrcolas, viradas para o meio ambiente e sustentabilidade do

    territrio. Contudo, esta anlise deve contemplar tambm os benefcios que o

    empreendedorismo agrcola consegue trazer na luta contra a pobreza e a satisfao de

    bens agrcolas nas populaes, pelo que a inovao no modelo de desenvolvimento

    desta ONG assenta, sobretudo, nesse ponto, ou seja, o melhoramento das zonas rurais,

    tendo como base prticas de sustentabilidade agrcola e do meio ambiente, aumento da

    ocupao das mulheres num continente em que como referido, so elas os actores

    principais no trabalho agrcola, mas beneficiam menos dos benefcios dai retirados e,

    sobretudo, uma agricultura virada essencialmente para satisfazer a procura dos meios

    locais de bens essenciais.

    Vrios estudos de casos so apresentados no site desta ONG; so salientados todos

    aqueles que conseguiram, de alguma forma, superar as dificuldades econmicas atravs

    do empreendedorismo agrcola, conforme relata John Michael: John Michael literally

    benefits from the fruit of his labours. You could also say that the benefits from the

    labours of his fruits, thanks to the advice and understanding he has gained from his

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    involvement in SHA-sponsored programmes in his area. As he sows, so does he reap,

    and by showing the way to other growers, he is passing on new and innovative

    approaches to traditional agricultural practices to his neighbours, who can also benefit

    financially simply by following his example () SHAs policy with mother gardening

    and more broadly is to work to the interest of a particular farmer, with the aim of

    facilitating progress by providing advice and support. Every so often one of these

    people turns into a lead farmer for their community, as is the case with John Michael.

    (). John Michael benefits on the double by having the fruit for income as well as for

    his own household. The vitamin-rich fruit he produces helps service the daily food

    needs of his large family, and selling surpluses generates income to help meet the

    myriad other daily household needs. The success and growth of his seedlings, therefore,

    are of real importance to his family, but also serve as an example to others in his

    community as a template to maximize their farming potential ().

    Podemos concluir que, face s especificidades desta ONG, a sustentabilidade

    agrcola relacionada com a produo de alimentos, diversificao de tcnicas agrcolas e

    empreendedorismo, possvel estabelecer uma relao direta entre o produtor e o

    mercado local numa perspetiva de sustentabilidade. Por outro lado, a produo

    direcionada para um modelo de desenvolvimento virada para o escoamento de produtos

    para colmatar a fome da comunidade onde a ONG est inserida, eleva o know-how local

    atravs do desenvolvimento de capacidades dos actores-beneficirios.

    5. Consideraes Finais

    As intervenes da SHA nos pases africanos tm sido marcadamente positivas por

    acautelar as preocupaes relativas a sustentabilidade, mas sobretudo por entender que a

    sustentabilidade envolve dimenses no s econmicas mas tambm sociais e

    ambientais.

    A base dos xitos da SHA, nas palavras do cineasta Jamie Doran quando visitou a

    Etipia, est no desenvolvimento holstico que a ONG consegue, envolvendo toda a

    comunidade: "Ver tal orgulho nos rostos dos agricultores que plantam as suas culturas,

    nas crianas nas suas escolas, e em particular, sobre as mulheres que dirigem os

    planos de poupana e emprstimo, uma memria que simplesmente no se desvanece.

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    Comunidades inteiras, centenas de homens, mulheres e crianas cavando valas,

    construindo barragens" referiu Doran.

    Uma inovao digna de assinalar imanentes na atuao da SHA a aplicao da

    filosofia Positive Deviance defendida por Parkin (2010). Para este autor, uma

    abordagem para problemas que exigem uma mudana social, deve ser baseada nos

    seguintes princpios: (1) as comunidades podem resolver os seus problemas com ajuda

    externa mnima, da o nome desta ONG; (2) as comunidades podem se auto-organizar;

    (3) o know-how no pode ficar concentrado em um lder ou especialista, mas distribudo

    na comunidade; (4) a sustentabilidade a pedra angular da abordagem. A comunidade

    deve descobrir as suas solues sustentveis para um determinado problema.

    Nestas notas finais, achamos tambm ser importante que a SHA esteja ciente que a

    estratgia de fuses de ONGs com diferentes culturas organizacionais e ticas, requer

    tempo e comunicao tendo em considerao que o impacto da atuao de uma ONG

    no vem do tamanho, mas da fora do seu vnculo com as pessoas que pretende apoiar.

    Uma diversidade de ONGs, cada uma trabalhando de acordo com as suas prprias

    foras, mas coordenadas por mecanismos apropriados e redes, pode responder melhor

    com agilidade, flexibilidade e eficcia para as diferentes facetas dos propsitos da sua

    interveno.

    Finalmente, o passo de sada duma tica deontolgica geral para uma formulao

    tica mais moderna e plural como o tringulo tico culturalmente negociado na tomada

    prtica de decises ticas, pode corrigir algumas carncias como assinalou Oram

    (2009). Embora se possam reconhecer algumas fragilidades, a SHA tem procurado

    responder satisfatoriamente a estas inquietaes atravs dos seus diferentes programas

    nos pases por si intervencionados.

    6. Referncias Bibliogrficas

    Gorta-Self Help Africa (6/02/15): http://www.selfhelpafrica.org/ie/about-sha

    Norton, B. G. ( 2008). Beyond Positive Ecology. Towards and Integrated Ecological Ethics. SCI Eng Ethics, N 14, pp. 581-592

    Oram, D. (2009). Considering Sustainability Through Ethical Approaches and their

    Practical Application. Technology and Society, International Symposium on January.

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    Parkin, S. (2010). The Positive Deviant: Sustainability Leadership in a Perverse World.

    Routledge. July.

    Patton, A. (2014). For the right reasons: lessons from an Irish NGO merger. Devex

    Impact. August.

    SHA (6/02/2015). http://www.selfhelpafrica.org/uk/

    Vaz, S. & Delfino, A. (2010). Manual de tica Ambiental. Universidade Aberta, manual

    nr. 311 (partes disponibilizadas pela Docente).

    Wikipdia (4/02/15): http://en.wikipedia.org/wiki/Self_Help_Africa.