tgi_1 2014 costura urbana: a cidade pelo avesso
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Caderno de apresentação do trabalho desenvolvido para a disciplina de Trabalho de Graduação Integrado 1 do curso de Arquitetura e Urbanismo do IAU-USP durante o primeiro semestre de 2014.TRANSCRIPT
3TGI 1_NATÁLIA PAULETTO FRAGALLE
costura urbana: a cidade pelo avessotrabalho de graduação integrado I.natália pauletto fragalle
INSTITUTO DE ARQUITETURA E URBANISMOUNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
SÃO CARLOS, 2013
5TGI 1_NATÁLIA PAULETTO FRAGALLE
PROFESSORES CAP:LUCIA ZANIN SHIMBO
JOUBERT JOSÉ LANCHAPAULO CÉSAR CASTRAL
PROFESSOR ORIENTADOR GT05: GIVALDO LUIZ MEDEIROS
CADERNO DE APRESENTAÇÃO DA PRIMEIRA ETAPA DE DESENVOLVIMENTO DO TRABALHO DE GRADUAÇÃO INTEGRADO
INTERVENÇÃO URBANA NA CIDADE DE SÃO CARLOS-SP
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INTRODUÇÃO...................................................................10
UNIVERSO PROJETUAL.....................................................20
SÃO CARLOS: CIDADE DE INTERVENÇÃO.........................26
O CENTRO: ÁREA DE INTERVENÇÃO................................30
DIRETRIZES.......................................................................40
PROGRAMA: UNIVER[CIDADE]...........................................50
PROJETO.........................................................................52
ESTUDO DAS FACHADAS.................................................70
QUADRA A QUADRA: INTERVENÇÕES..............................92
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS......................................140
10 COSTURA URBANA: A CIDADE PELO AVESSO
INTRODUÇÃO: INQUIETAÇÕES
Compatibilizar a conservação com a continuidade histórica: adicionar uma nova camada de tempo que se evidencia e dialoga criticamente com a preexistência conservada.
ALMEIDA, Eneida. 2009
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Dentre as várias possibilidades de temáticas a serem escolhidas como ponto
de partida para a elaboração de um problema a ser resolvido em forma de projeto de
arquitetura e urbanismo, foi escolhido explorar a relação entre a cidade e a memória
e de que forma as intervenções urbanas podem criar novos espaços que respeitem
a cultura, a identidade e a complexidade de um lugar, levando em consideração as
diversas camadas históricas de uma cidade de modo a serem rapidamente apropriados
pelos habitantes locais criando novas relações com a cidade e novos vínculos com
os moradores. Dessa forma, o presente trabalho surgiu a partir da busca de uma
maneira de intervir na cidade preexistente de modo a criar uma nova urbanidade ao
mesmo tempo em que se preserva a memória do local.
12 COSTURA URBANA: A CIDADE PELO AVESSO
Sabe-se que o surgimento das primeiras
teorias voltadas à preservação dos bens
culturais relaciona-se ao ambiente cultural de
formação das metrópoles, quando, a partir
das idéias iluministas, percebe-se uma nítida
separação entre passado e presente e passa-se
a agir criticamente em relação ao passado, uma
vez que até então as obras do passado eram
adaptadas às necessidades do presente sem
nenhuma restrição devido à ausência de uma
demarcação evidente entre passado, presente e
futuro:
A ativação da memória [...] nestes tempos de
transformações e de aceleração da história, diante da
perspectiva da perda, do esquecimento, configura-
se como uma necessidade premente de reconstrução
da própria identidade do indivíduo no seio da nascente
sociedade de massa (ALMEIDA, 2009, p.40
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Com isso, passa-se a buscar maneiras de se apropriar criticamente e
coletivamente do passado de forma que ele dialogue com o presente, com a
perspectiva de transmissão desse legado ao futuro.
Neste sentido, a obra de Camillo Sitte, é de extrema relevância, uma vez que
ele desenvolve uma compreensão de patrimônio que incorpora também o espaço
urbano, sua morfologia, seu traçado, seus gabaritos e suas relações sociais e
culturais, superando a seleção exclusiva de edifícios de caráter monumental e de valor
arquitetônico, destacando os efeitos positivos e atraentes obtidos pela irregularidade
dos tecidos urbanos e afirmando que as cidades estão fadadas ao esquecimento e
ao desaparecimento caso não haja uma ação deliberada de resgate cultural.
14 COSTURA URBANA: A CIDADE PELO AVESSO
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rua que corta uma quadra em são carlos. imagem: natália fragalle
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Entretanto, a corrente moderna que prega a necessidade de modernização
urbana em detrimento das possibilidade de preservação do legado do passado, acaba
por tornar-se dominante no final do século XIX e início do século XX, principalmente
após a Primeira Guerra Mundial, quando, entre as décadas de 20 e 30, o chamado
Movimento Moderno passa a adquirir mais prestígio. Passa-se a explorar o potencial
dos novos materiais e tecnologias juntamente com o emprego de formas puras e
estruturas racionais possibilitadas pela industrialização dos diversos componentes
da construção como forma de afrontar as necessidades urbanas e sociais da época,
acreditando que as condições que se apresentavam naquele momento nas cidades
“eram absolutamente inéditas em relação ao passado e que, portanto, os precedentes
históricos não devem ser tidos em conta para afrontar as novas aspirações” (ALMEIDA,
2009, p. 51).
Esse modo de pensar a arquitetura e o urbanismo começa a entrar em crise
a partir do fim da Segunda Guerra Mundial, quando começa-se a perceber que as
soluções propostas por esse movimento não estavam sendo suficientes para suprir
as demandas que se intensificaram com o fim da guerra e a destruição de várias
cidades européias. Dessa forma, a partir da década de 60, com a intensificação
das críticas às aplicações práticas realizadas a partir do pensamento do Estilo
Internacional, a corrente dominante do Movimento Moderno, questões relacionadas
à identidade e ao lugar começam a ganhar força novamente no debate sobre os
modos de se intervir nas cidades. Surgem uma série de propostas que se opõem ao
espaço funcionalista e homogêneo resultante da estandardização na sociedade de
massas que têm como objetivo revalorizar os elementos vernaculares e tradicionais
das cidades. As atenções se voltam para as necessidades subjetivas e para os
significados simbólicos e culturais dos diferentes espaços da cidade, que são
construídos através de uma memória coletiva, configurando uma imagem que se
mantém mesmo que a cidade “real” se altere (Carvalho in:Ortegosa, 2009). Neste
sentido as relações de intimidade que se estabelecem entre as pessoas e o espaço
possuem função primordial, configurando uma condição de âncora da memória, uma
vez que são essas relações que possibilitam a valorização dos espaços da cidade,
transformando-os em patrimônios da humanidade, de uma nação, de uma sociedade
ou mesmo individual (Bachelard in Ortegosa, 2009).
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Com isso, o interesse pela permanência de elementos
arquitetônicos e traçados urbanos como aspectos fundamentais
para a construção e a preservação de uma memória da
cidade adquirem um caráter importante ao se pensar novas
intervenções na cidade.
Todo esse pensamento ganhou ainda mais força com a
publicação em 1961 do livro Morte e vida das grandes cidades,
de Jane Jacobs, no qual a autora critica os espaços urbanos
“mortos” gerados pela monofuncionalidade do planejamento
urbano normativo moderno e defende a necessidade de
um planejamento urbano que se comunique diretamente
com a vida cotidiana, que se aproxime da dinâmica real das
ruas, levando em conta as associações intrasubjetivas para
a criação de um sentido de lugar. Para isso, a autora afirma
que as cidades necessitam possuir uma diversidade de usos
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complexa, densa e constante, propiciando um ambiente vivo.
Para gerar tal diversidade, Jacobs cita quatro condições que
devem estar associadas para desenvolver e desempenhar
potenciais: a multiplicidade de funções, a necessidade de
uma ampla possibilidade de percursos, a alta densidade de
pessoas e a necessidade de edifícios com idades e estados
de conservação variados, enfatizando a adaptação de velhos
espaços para novos usos. Dessa forma, passa-se a defender
ainda mais o incentivo à apropriação do espaço a partir de
usos que já existem e que são decorrentes da vida cotidiana
dos habitantes dos diversos espaços da cidade.
Esse interesse pela valorização do contexto local, da
cultura, da diversidade, da noção de lugar e da experiência
ganha, partir da década de 70, ainda mais destaque no debate
internacional como forma de se contrapor à visão unificadora
do movimento moderno, convertendo valores como a
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fragmentação da configuração urbana e o pluralismo em algo positivo (Ortegosa,
2009). Com isso, surge uma grande quantidade de obras teóricas que formulam
propostas de modos de se intervir na cidade, levando em conta a valorização da relação
de identidade entre as pessoas e o espaço, como Complexity and Contradiction in
Architecture (1966), de Robert Venturi; Collage City (1978) de Colin Rowe, no qual o
autor propõe uma ideia de cidade resultante da somatória de diferentes estratégias
de intervenção e A Arquitetura da Cidade (1971) de Aldo Rossi, no qual o autor refere-
se ao locus como sendo o princípio característico dos atos urbanos. Rossi discorre
sobre a correlação entre a tradição e a inovação, afirmando que a história motiva não
só a permanência de elementos que asseguram a unidade na expressão urbana, mas
também as transformações que incidem sobre o território.
Além disso, cabe ressaltar a importância de Kenneth Frampton, com a teoria
do lugar, segundo a qual o espaço deve ser tratado como o lugar de habitar dos
homens, e de Francisco de Gracia, com a arquitetura contextual, que estabelece uma
rara relação com o contexto onde está inserida por se basear em critérios definidos a
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partir das características locais, porém com a marca de seu tempo.
A partir da década de 80, uma série de locais com significados simbólicos para
as cidades tornam-se alvo de projetos de intervenção urbana. Entretanto, percebe-se
que em vários destes projetos as questões econômicas são privilegiadas, enquanto
os princípios elaborados pela reflexão teórica consolidada são relegados ao segundo
plano, resultando em uma certa estetização da relação entre as cidades e a história,
tornando-se um espetáculo midiático e gerando artificialização e dessocialização
(Ortegosa, 2009). Tais locais, que recebem investimentos massivos para serem
reconvertidos, passam a atrair cada vez mais a atenção do mercado imobiliário e,
com isso, passam a ser ocupados pelas classes mais altas, enquanto os moradores
mais pobres desses locais acabam por serem forçados a se retirar devido ao grande
aumento do custo de vida nesses locais. Esse processo acaba por configurar um
fenômeno extremamente paradoxal pois, ao mesmo tempo em que intervenções
urbanas são feitas para preservar a história, a memória e a cultura de certos locais, a
própria população que é responsável pela manutenção dessas múltiplas identidades
e culturas acaba por ser eliminada.
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A cultura e a memória de um local devem ser entendidas como fruto da sociedade, de sua história e de seus saberes e o arquiteto e o planejador urbano devem agir promovendo iniciativas que permitam a sua manutenção. Desta forma, o que se pretende realizar não é apenas um projeto de restauro de um edifício histórico, mas sim um redesenho de todo o conjunto, adicionando uma nova camada de tempo que evidencia e dialoga com a preexistência de modo a gerar uma nova relação entre edifícios e entorno situada entre o passado e o presente, tencionando usos e sugerindo novas formas de apropriação do espaço urbano.
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22 COSTURA URBANA: A CIDADE PELO AVESSO
Neste sentido, o Centro de Lazer Sesc Fábrica da Pompéia, projetado por Lina Bo Bardi (1977-1986), mostra-se como uma das referências de projeto para este trabalho, uma vez que a arquiteta, ao observar o conjunto de galpões de arquitetura industrial do século XIX, foi capaz de identificar diálogos possíveis entre os mesmos e o espaço urbano, criando uma relação de permeabilidade e harmonia entre os edifícios históricos, a intervenção contemporânea e o entorno do conjunto. Essa relação foi construída a partir de um processo de “restauro inventivo”, transformando a “fábrica fria” em uma “fábrica quente”, através da exploração dos materiais empregados e das possibilidades de apropriação do espaço pelos usuários sob uma perspectiva que engloba a cultura popular:
Essa poética de reconversão é uma manifestação daquilo que Lina chamou de caráter ‘quente’ da arquitetura: sua possibilidade de intervir, modificar a vida humana e as formas de uma comunidade, porém em um sentido artístico e expressivo, e não em um sentido instrumental, espetacular e manipulativo (SUBIRATES in: VAINAER; FERRAZ, 2013).
Portanto, o procedimento de intervenção adotado por Lina revela aquilo que há de valioso para que, em um segundo momento, novos elementos sejam agregados. Com isso, o projeto possibilitou o estabelecimento de novos vínculos afetivos entre o lugar e as pessoas que já estavam familiarizadas com aquela estrutura existente.
22 COSTURA URBANA: A CIDADE PELO AVESSO
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acima: o espaço do sesc pompéia quando era uma fábrica de tambores e atualmente. montagem: natália fragalle
ao lado: estudo da planta do sesc pompéia. desenho e montagem; natália fragalle
24 COSTURA URBANA: A CIDADE PELO AVESSO
Também foi referência para este trabalho outro projeto brasileiro, do escritório Brasil Arquitetura, que lida com a relação entre o antigo, o novo e o lugar: a Praça das Artes (2006-2012), projeto que se molda nos edifícios vizinhos ocupando sobras de lote em um miolo de quadra no centro histórico de São Paulo, explorando a relação com seu entorno através da permeabilidade e da costura urbana estabelecidas devido às possibilidades de circulação criadas a partir do térreo livre que se abre para três faces diferentes da quadra,. Cabe ressaltar que os dois projetos citados apresentam-se como cidadelas, conjuntos aparentemente fechados que então se abrem para o seu entorno através da intervenção projetual. É exatamente essa relação que se pretende trabalhar, intervindo no preexistente de modo a criar novos espaços que o reconectem com a cidade, tencionando a relação entre passado e presente. Serviram também como referência para o TGI dois projetos de habitação propostos para áreas urbanas consolidadas: o Conjunto Habitacional Rue des Suisses do escritório Herzog & De Meuron e o Conjunto Casarão do Carmo, do escritório
abaixo: estudos de permeabilidade do projeto da praça das artes. croquis 1 e 2: natália fragalle. croqui 3: brasil arquitetura
ao lado: 1_ planta de situação do projeto da praça das artes. montagem: natália fragalle2_inserção da planta do térreo na planta de situação. montagem: natália fragalle
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Hector Vigliecca & Associados, no que se refere à relação entre o edifício e a cidade em áreas urbanas consolidadas. Ambos os projetos propõem a adaptação dos novos edifícios às alturas e alinhamentos dos edifícios preexistentes e a passagem de pedestres em seu interior no sentido longitudinal do terreno, sendo que no projeto do arquiteto Hector Vigliecca, o caráter dessa transposição da quadra é essencialmente urbano e público, funcionando como uma ponto de conexão entre ruas, algo que pretendeu-se trabalhar na intervenção realizada no TGI. É importante ressaltar ainda um outro aspecto importante do trabalho do arquiteto Hector Vigliecca como importante referência a partir da sua atuação de projeto em torno do conceito que ele chama de terceiro território, uma estratégia de projeto que potencializa, mutuamente, o lugar e a intervenção que o transforma e é transformada por ele, de modo que o projeto arquitetônico não seja nem uma tabula rasa em relação ao lugar onde ele está inserido e nem refém do contexto. Como já foi dito anteriormente, a importância do lugar é fundamental, entretanto, no processo realizado ao longo da disciplina de TGI I foi possível perceber que, apesar de o lugar ser importante, o modo como o arquiteto o lê e o potencializa a partir de suas ações projetuais é ainda mais essencial. Desta forma, o presente trabalho se propõe a articular indivíduo, lugar e cidade através de uma ação projetual em uma escala local que torne visível ou potencialize as questões espaciais e culturais do lugar, conectando-o à cidade e à população. Isso se dará através de uma ação de costura que articule os espaços internos e externos privilegiando a permeabilidade, a partir da caracterização dos percursos em diferentes níveis e da articulação de volumes com diferentes gabaritos, de modo a criar um novo espaço na cidade e para a cidade, a ser reconhecido e apropriado por todos os seus habitantes.
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26 COSTURA URBANA: A CIDADE PELO AVESSO
SÃO CARLOS: CIDADE DE INTERVENÇÃO
A cidade de São Carlos surge no contexto da expansão da lavoura cafeeira no estado de São Paulo, em meados do século XIX e apresenta neste período a primeira fase importante do seu desenvolvimento (entre as duas últimas décadas do século XIX e as duas primeiras do século XX). A partir da chegada da ferrovia à cidade em 1884, a área central se firma como local de destaque político e econômico. Neste momento, o centro da cidade passa por um processo de embelezamento, com o surgimento de casarões de arquitetura eclética pertencentes aos grandes barões do café. Ao longo de seu processo de urbanização, a cidade de São Carlos expandiu-se para a periferia enquanto o centro, onde já existia a infraestrutura urbana necessária para receber novos habitantes, permaneceu pouco adensado. Atualmente, a cidade se caracteriza por possuir baixo adensamento urbano e consequentemente baixa verticalização, o que se pode notar ao observar que ainda há uma grande quantidade de lotes vazios no centro da cidade.
ao lado:planta de situação de são carlos com destaque para a área central. montagem: natália fragalle
30 COSTURA URBANA: A CIDADE PELO AVESSO
O CENTRO: ÁREA DE INTERVENÇÃO
30 COSTURA URBANA: A CIDADE PELO AVESSO
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A ocupação do centro de São Carlos se deu a partir das bordas das quadras, enquanto os fundos de lote ficaram vazios. Ao observar a fotografia área atual da cidade, nota-se que esses fundos de lote continuam desocupados, apontando o quanto o centro da cidade não se adensou, uma vez que a ocupação ainda apresenta essas reminiscências da primeira fase de urbanização referente ao período cafeeiro.Atualmente, o centro de São Carlos apresenta uso predominantemente comercial e de serviços, o que significa que há um alto fluxo de pessoas durante o dia, porém, com exceção de alguns bares e restaurantes e do Cine São Carlos, há pouquíssima atividade noturna, o que acaba por transmitir uma sensação de insegurança neste período. Com relação ao patrimônio arquitetônico, a centro da cidade ainda possui uma grande quantidade de imóveis de interesse, sendo que boa parte deles conta no Anexo XIX da Lei Municipal nº13.562/05 como “Bens de Interesse Histórico-Cultural”, porém, devido à falta de leis que favoreçam a preservação destes imóveis, muitos deles encontram-se em péssimo estado de conservação ou então descaracterizados devido à especulação imobiliária.
31TGI 1_NATÁLIA PAULETTO FRAGALLE
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Partindo de um recorte inicial de 72 quadras da área central, tendo como limites as Ruas Bento Carlos, Carlos Botelho, José Bonifácio e Dom Pedro II, foram realizados três levantamentos. O primeiro diz respeito às áreas sub-utilizadas dessas quadras: os fundos de lote ou estreitos acessos ao interior das quadras que são reminiscências do modo como estas foram loteadas e ocupadas. O segundo levantamento mapeia lotes cujo é extremamente intenso no centro da cidade: os estacionamentos, pensando que algumas dessas áreas pudessem ser apropriadas pela intervenção realizada. Já o terceiro mapeamento levantou todos os Bens de Interesse Histórico-Cultural de São Carlos na área delimitada, a partir do Anexo XIX da Lei Municipal nº13.562/05 e do Projeto Percursos da Fundação Pró-Memória de São Carlos. Desse modo, pretende-se atuar a partir da possibilidade de constituir um centro que nunca se consolidou, mas que ainda preserva importantes elementos de um tempo passado. A partir dos levantamentos realizados, escolheu-se 10 quadras de maior interesse, nas quais as três diretrizes mapeadas apresentam maior conciliação. Procurou-se também escolher quadras que faceassem os espaços públicos da área, de modo que estes pudessem ser articulados ao projeto de intervenção.
ao lado: LEVANTAMENTO DO RECORTE DE 72 QUADRAS
legendas
áreas sub-utilizadas estacionamentos
bens de interesse histórico (anexo XIX da Lei Municipal nº13.562/05)
quadras selecionadas
34 COSTURA URBANA: A CIDADE PELO AVESSO
ao lado: MOBILIDADE URBANA NA ÁREA DE INTERVENÇÃO
legendas
percurso das linhas de ônibus pontos de ônibus
As quadras selecionadas localizam-se entre as Ruas Episcopal e Dona Alexandrina e a Avenida São Carlos, que compõem os eixos viários mais importantes da cidade, sendo facilmente acessadas via transporte público.
37TGI 1_NATÁLIA PAULETTO FRAGALLEao lado: EDIFÍCIOS E EQUIPAMENTOS DE IMPORTÂNCIA HISTÓRICA E CULTURAL NA ÁREA DE INTERVENÇÃO E EM SUAS PROXIMIDADES
legendas
1_catedral de são carlos borromeu 2_mercado municipal 3_praça pedro de toledo 4_biblioteca municipal amadeu amaral 5_palacete bento carlos 6_fórum criminal 7_palacete conde do pinhal 8_são carlos clube (sede social) 9_câmara municipal10_escola estadual paulino carlos11_escola estadual dr. álvaro guião12_teatro municipal dr. alderico vieira perdigão13_prefeitrua municipal14_cdcc-usp (centro de divulgação científica e cultural)15_estação cultura e fundação pró-memória16_cine são carlos17_praça coronel paulino carlos18_praça dos voluntários19_praça coronel sales20_museu da ciência professor mário tolentino21_centro municipal de cultura afro-brasileira odette dos santos22_instituto cultural ítalo-brasileiro23_grêmio recreativo e familiar flor de maio
37TGI 1_NATÁLIA PAULETTO FRAGALLE
38 COSTURA URBANA: A CIDADE PELO AVESSO
ao lado: LEVANTAMENTO DE USO E OCUPAÇÃO
legendas
comercial serviços
residencial
institucional público
institucional privado
misto com habitação
misto sem habitação
outros
áreas sem edificação
edifício desocupdo
edifício parcialmente desocupado
espaços públicos
Nota-se que a área de intervenção apresenta um uso predominantemente de serviços, com poucos lotes residenciais e muitos edifícios desocupados. Destaca-se também a grande quantidade de edifícios de uso institucional público, uma vez que essa área abriga diversos órgãos e secretarias municipais devido à proximidade da prefeitura.
41TGI 1_NATÁLIA PAULETTO FRAGALLE
Partindo dos levantamentos e estudos realizados, adotou-se diretrizes para a realização do projeto. Alguns dos edifícios de interesse histórico levantados foram selecionados para serem incorporados à intervenção, juntamente com outros edifícios que não constam no Anexo XIX, mas possuem alguma importância arquitetônica, urbanística ou cultural, de modo a garantir a sua preservação. Além disso, alguns estacionamentos foram retirados e algumas edificações foram demolidas, sendo construções recentes de pouco valor arquitetônico, pequenas edículas ou imóveis extremamente descaracterizados, para dar lugar à intervenção.
41TGI 1_NATÁLIA PAULETTO FRAGALLE
42 COSTURA URBANA: A CIDADE PELO AVESSO
ao lado: DIRETRIZES DE PROJETOlegendas
bens de interesse histórico (anexo XIX da Lei Municipal nº13.562/05) a seremapropriados pela intervenção outros edifícios a serem apropriados pela intervenção
edifícios demolidos
jardins preexistentes a serem preservados
demais edifícios
44 COSTURA URBANA: A CIDADE PELO AVESSO
BENS DE INTERESSE HISTÓRICO APROPRIADOS
1
2
3
4
5
44 COSTURA URBANA: A CIDADE PELO AVESSO
46 COSTURA URBANA: A CIDADE PELO AVESSO
9
OUTROS EDIFÍCIOS APROPRIADOS
a b
c
d
46 COSTURA URBANA: A CIDADE PELO AVESSO
50 COSTURA URBANA: A CIDADE PELO AVESSO
PROGRAMA: UNIVER[CIDADE]
A maior parte das universidades no Brasil conformam-se em campi universitários, modelo criado pelas universidades americanas no século XIX que possui como objetivo agregar as instalações físicas das diversas áreas do conhecimento em um mesmo espaço para que elas possam ser integradas entre si. Entretanto, esse tipo de conformação acaba por segregar o espaço da universidade da cidade no qual ela está inserida do ponto de vista urbanístico através de barreiras físicas ou sociais que acabam por dar às costas à cidade e aos cidadãos.
Na cidade de São Carlos, onde há duas universidades públicas (dois campi da Universidade de São Paulo e a Universidade Federal de São Carlos), pode-se observar claramente a divisão que existe entre a comunidade acadêmica e a população da cidade, onde a primeira não sente verdadeiramente como cidadã sãocarlense e a segunda não se sente à vontade para adentrar o espaço da universidade, mesmo este sendo de caráter público e por tanto de acesso livre apara todos, apesar da existência de muros e do acesso controlado, o que acaba por intimidar aqueles que não possuem vínculo com a universidade.
51TGI 1_NATÁLIA PAULETTO FRAGALLE
Desta forma, o presente trabalho se pretende a tentar construir uma nova relação entre universidade, cidade, comunidade acadêmica e população em São Carlos, a partir da inserção de edifícios que abriguem instalações das universidades públicas, bem como edifícios habitação estudantil na malha urbana do centro da cidade. Além disso, prevê-se que os edifícios de importância histórica e cultural para a cidade selecionados anteriormente sejam incorporados pelas universidades de modo a garantir a sua preservação e manutenção. As instalações universitárias a serem trazidas para o centro da cidade devem ser acessíveis também à população de São Carlos, por isso, o que se pretende é criar espaços que possam ser utilizados por toda a população, como salas de aula, equipamentos culturais, espaços de discussão e divulgação do conhecimento e centros de lazer. Destaca-se ainda a importância de que hajam diversos tipos de equipamentos de cursos distintos e de ambas as universidades públicas coexistindo na área de intervenção para que haja uma maior integração entre as duas universidades entre si e entre elas e a cidade. A presença da habitação estudantil também é de extrema importância, uma vez que o centro habitado, principalmente pela população jovem, torna-se mais seguro e vibrante, uma vez que passa a ser utilizado tanto durante o dia, quanto durante a noite, impedindo a sua estagnação e a sua conseqüente degradação.
ao lado:localização das universidades
em são carlos, destacando a área de intervenção.
montagem: natália fragalle
53TGI 1_NATÁLIA PAULETTO FRAGALLE
A partir das questões desenvolvidas neste trabalho, pretendeu-se trabalhar um sistema de espaços que tencionasse o modelo de ocupação urbano existente e o processo de urbanização que se deu ao longo dos anos que privilegiou a expansão urbana para as bordas da cidade, criando uma reconfiguração da área central da cidade a partir da atuação em 10 quadras, articuladas com cinco espaços públicos, de modo a conformar novas maneiras de caminhar e de estar no centro. A declividade acentuada da área foi considerada de grande importância no processo de projeto e, a partir dela, formulou-se uma divisão entre passagem e permanência. Enquanto a parte externa às quadras, isto é, as ruas e calçadas, foram designadas como local de passagem, os miolos de quadra, com o tratamento do terreno e a criação de novos edifícios em conjunto com a apropriação de preexistências, foram designados como local de permanência, ou seja, onde a transposição das quadras é feita de forma lenta e gradual a partir de percursos diferenciados que unem o dentro e o fora.
53TGI 1_NATÁLIA PAULETTO FRAGALLE
54 COSTURA URBANA: A CIDADE PELO AVESSO
ao lado: IMPLANTAÇÃOlegendas
edifícios preexistentes incorporados à intervenção novos edifícios de caráter institucional (universidades)
novos edifícios de caráter residencial (habitação estudantil)
passarelas e ruas internas à quadra para pedestres
demais edifícios
páginas 54 e 55: IMPLANTAÇÃO COM COTAS E CURVAS DE NÍVEL
65TGI 1_NATÁLIA PAULETTO FRAGALLE
ao lado: CHEIOS E VAZIOS_ATUALlegendas
áreas edificadas áreas não edificadas
65TGI 1_NATÁLIA PAULETTO FRAGALLE
66 COSTURA URBANA: A CIDADE PELO AVESSO
ao lado: CHEIOS E VAZIOS_DIRETRIZESlegendas
áreas edificadas áreas não edificadas
edifícios preexistentes a serem incorporados na intervenção
66 COSTURA URBANA: A CIDADE PELO AVESSO
69TGI 1_NATÁLIA PAULETTO FRAGALLEao lado: CHEIOS E VAZIOS_PROJETOlegendas
áreas edificadas áreas não edificadas
edifícios preexistentes a serem incorporados na intervenção
novos edifícios de caráter institucional (universidades)
novos edifícios de caráter habitacional (habitação estudantil)
passarelas
71TGI 1_NATÁLIA PAULETTO FRAGALLE
Com o objetivo de estudar as relações entre os gabaritos na área de intervenção, foram realizados três estudos das fachadas de todas as quadras da área. O primeiro deles, analisa as quadras de acordo com a situação atual. O segundo analisa as relações a partir das diretrizes aplicadas, destacando-se os elementos a serem incorporados à intervenção e identificando possibilidades de atuação. Já o terceiro apresenta as novas relações que surgem a partir do projeto de intervenção.
71TGI 1_NATÁLIA PAULETTO FRAGALLE
92 COSTURA URBANA: A CIDADE PELO AVESSO
QUADRA A QUADRA: INTERVENÇÕES
92 COSTURA URBANA: A CIDADE PELO AVESSO
97TGI 1_NATÁLIA PAULETTO FRAGALLE
COTA 809
COTA 812
COTA 815
ao lado: ESTUDO DOS PATAMARESlegendas
novas áreas edificadas áreas não edificadas
passarelas ou ruas internas
demais edifícios
101TGI 1_NATÁLIA PAULETTO FRAGALLE
COTA 809
COTA 811
COTA 814
ao lado: ESTUDO DOS PATAMARESlegendas
novas áreas edificadas áreas não edificadas
passarelas ou ruas internas
demais edifícios
COTA 815COTA 817
105TGI 1_NATÁLIA PAULETTO FRAGALLE
COTA 816
ao lado: ESTUDO DOS PATAMARESlegendas
novas áreas edificadas áreas não edificadas
passarelas ou ruas internas
demais edifícios
109TGI 1_NATÁLIA PAULETTO FRAGALLE
COTA 828
ao lado: ESTUDO DOS PATAMARESlegendas
novas áreas edificadas áreas não edificadas
passarelas ou ruas internas
demais edifícios
COTA 823
COTAS 826 E 829
COTA 830
COTAS 831 E 834
COTAS 833 E 836
113TGI 1_NATÁLIA PAULETTO FRAGALLE
COTA 833
ao lado: ESTUDO DOS PATAMARESlegendas
novas áreas edificadas áreas não edificadas
passarelas ou ruas internas
demais edifícios
COTA 827
COTA 830
117TGI 1_NATÁLIA PAULETTO FRAGALLE
COTA 834
ao lado: ESTUDO DOS PATAMARESlegendas
novas áreas edificadas áreas não edificadas
passarelas ou ruas internas
demais edifícios
COTA 831
COTA 832
COTA 835COTA 837
COTAS 840, 843, 846 E 849
121TGI 1_NATÁLIA PAULETTO FRAGALLE
COTA 834
ao lado: ESTUDO DOS PATAMARESlegendas
novas áreas edificadas áreas não edificadas
passarelas ou ruas internas
demais edifícios
COTA 831
125TGI 1_NATÁLIA PAULETTO FRAGALLE
COTA 834
ao lado: ESTUDO DOS PATAMARESlegendas
novas áreas edificadas áreas não edificadas
passarelas ou ruas internas
demais edifícios
COTA 837
129TGI 1_NATÁLIA PAULETTO FRAGALLE
ao lado: ESTUDO DOS PATAMARESlegendas
novas áreas edificadas áreas não edificadas
passarelas ou ruas internas
demais edifícios
COTA 840
COTA 843
COTA 846
131TGI 1_NATÁLIA PAULETTO FRAGALLE
Alvo de uma série de reformas que vem sendo realizadas desde a década de 70 e abrigando a Câmara Municipal e a Escola Paulino Carlos, a praça é conhecida por ser um importante ponto de encontro da população para a realização das mais diversas atividades. Antigamente, a praça apresentava uma configuração totalmente distinta, apresentando ruas internas e um grande edifício em seu centro: o antigo Theatro Polytheama, que veio a se tornar o Cine São Carlos, importante ponto cultural da cidade e pioneiro no Estado de São Paulo. Com a demolição do cinema em 1976, a área da praça foi ampliada e passou a receber eventos cívicos, porém, com o passar dos anos e com mais reformas, a praça acabou adquirindo o caráter de praça seca, o que gerou uma diminuição do seu uso como área de estar. Dessa forma, realiza-se um projeto de intervenção de modo a recuperar o seu passado, ainda presente na memória de muitos habitantes, a partir da construção de um cinema ao ar livre, aproveitando-se do desnível do terreno. Prevê-se ainda a manutenção do caráter cívico da praça nas proximidades da Câmara Municipal e a realocação do Museu da Ciência Prof. Mario Tolentino no centro da praça, abaixo do área cívica e no nível mais baixo do cinema. Já na face que se volta para a Avenida São Carlos, prevê-se uma nova arborização de modo a criar áreas de estar e um percurso coberto por um pergolado que acaba em uma passarela que enquadra dois dos edifícios históricos apropriados pela intervenção.
133TGI 1_NATÁLIA PAULETTO FRAGALLE
acima:a praça coronel sales na década de 60imagem: são carlos antigo
ao lado:a atual conformação da praça coronel salesimagem: natália fragalle
135TGI 1_NATÁLIA PAULETTO FRAGALLE
ao lado: ESTUDO DOS PATAMARESlegendas
novas áreas edificadas áreas não edificadas
passarelas ou ruas internas
demais edifícios
COTA 837
COTA 841
137TGI 1_NATÁLIA PAULETTO FRAGALLE
ao lado:croqui illustrando a intervenção na praça coronel sales
nas páginas 136 e 137:perspectiva ilustrando a rua interna que sai da praça coronel sales, chegando à quadra 6
141TGI 1_NATÁLIA PAULETTO FRAGALLE
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