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The Silence in Between is Not Silence

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The silence in between is not silence.

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Faculdade de Belas-Artes | Universidade de LisboaMestrado Em Design de Comunicação e Novos Media

1º ANO | 2011 - 2012

S + 12

A Presença Indelével do Ruído

Carolina Henriques e Miguel Martins

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SILÊNCIO

De alguma forma, todos nós participamos na co-municação silenciosa, diariamente. Vivemo-la quando indicamos algo com a cabeça, piscamos um olho, levamos um dedo aos lábios, levantamos os olhos para o céu ou acenamos com a mão. Cada silêncio possui uma gran-de quantidade de informação, uma vez que, quando as palavras falham, o silêncio poderá exprimir grandes sen-timentos de dor ou de alegria, fazendo parte integrante da linguagem e ajudando a construir o sentido. Para além dos textos narrativos, como já percebe-mos, o silêncio invade ainda tecidos visuais e musicais. Ele é, inequivocamente, a manifestação da condição do sentido, constituindo uma linguagem subliminar, inerente à lingua-gem humana, porque há sempre silêncio à nossa volta, servindo simplesmente de intervalo ou de enleio à lingua-gem, assumindo uma dimensão metafórica e ambivalente. Para além de constatarmos a força e a presença do silêncio na linguagem visual, vale a pena estabelecermos

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aproximação entre o silêncio na escrita e o silêncio na arte da música. O tempo, na música, está diretamente ligado à pulsação da música e não propriamente ao som, daí que uma pausa na partitura corresponda igualmente a um determinado valor e duração, sendo, pois, consi-derada como um tempo ou parte dele. O tempo musical organiza o acontecimento sonoro, o espaço entre um som e o que se lhe segue ou a ausência deste. A arte da música reside numa sucessão de sons e silêncio, que se organizam num determinado tempo. Resultando a pausa que é fundamental para a música, assim como o silêncio é necessário para a pa-lavra, porque é entre eles, a pausa e o silêncio, que se permitem as reflexões. Segundo John Cage: “Not one sound fears the si-lence that extinguishes it. And no silence exists that is not pregnant with sound.”

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JOHN CAgE

John Cage (1912 | 1992) foi um compositor vanguardista, poeta, pintor, teórico musical experimen-talista e escritor norte-americano. As teorias Cage sobre a música, som e silêncio são mais interessantes do que as suas próprias compo-sições musicais. Para ele, não existe o silêncio sendo a música uma sucessão de sons e composições criadas a partir da organização de sons. Históricamente, a música tem sido uma comuni-cação de sentimentos, mas Cage argumenta que todos os sons têm esse potencial para a transmissão de senti-mentos no sentido mecânico e eletrónico. O silêncio foi o aspeto fundamental das suas teorias. Se o silêncio pode não existir, então os sentimen-tos, também poderiam ser categorizados igualmente como não-existentes. Assim menciona: “Debussy said quite some time ago, “Any sounds in any combination

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and in any succession are henceforth free to be used in a musical continuity.”

Será que existe silêncio absoluto?

John Cage, na peça 4’33”, obra composta para um concerto em que todos os intérpretes permaneceram em silêncio durante os quatro minutos e trinta e três se-gundos indicados no título da composição, ao longo dos quais foi permitido ao público ouvir aquela outra música, quotidianamente mais inaudível, composta pelos múlti-plos e dispersos sons do mundo. Na verdade, com esta peça, comprova-se que o grau zero do som, efetivamente, não existe. Alguns críticos argumentaram que 4’33’’ não era música e que não transmitia sentimentos. A performance de Cage tinha certamente como intenção despertar senti-mentos a quem a ouvisse. Como ele referiu: “There is no such thing as an empty space or an empty time. There is always something to see, something to hear. Infact, try as we may to make a silence, we cannot.” A peça 4’33” é realizada em três secções. A audi-ência, encontrava-se á frente do palco, onde contemplava o compositor que ao se sentar á frente do piano, abrindo e de seguida fechando a tampa marcou o fim do referi-do segmento, repetindo duas vezes este ato. O público sentou-se em “silêncio” porém não conseguiu resistir a sons acidentais, pois não sabia como ouvir o silêncio. Embora interessado em quebrar as definições tra-dicionais e conceitos, Cage não entrou em detalhes sobre

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os princípios do construcionismo ou da estética moder-na, apenas os apresentou. A popularização de Cage através de sons ale-atórios em forma de música não suporta uma escuta regular, antecipou assim os happenings da arte na déca-da de 60, e, indiretamente, anteviu o sucesso da música eletrónica criada exclusivamente com sintetizadores e outros aparelhos eletrónicos. Cage criara assim uma fórmula para a criativida-de, chamando as suas criações musicais de “purposeful purposelessness or a purposeless play.” Por vezes, ele parecia querer inspirar-se através da natureza e da emoção humana: “Hearing sounds which are just sound immediately sets the theorizing mind to theorizing, and the emotions of human beings are conti-nually aroused by encounters with nature.” Assim, a música não é apenas criada pelo som de um instrumento musical, mas sim por objetos feitos pelo homem e pelos sons da natureza. A ligação de Cage com a arquitetura contempo-rânea, como os edifícios de paredes de vidro de Mies Van der Rohe e com a arte moderna, como nas imagens desconstruídas de Marcel Duchamp, enfatizam a analo-gia entre o “olhar através de” em vez do “olhar para.” A música de Cage tem como objetivo olhar através dos sons e não para eles. Na composição musical, o silêncio é conhecido como um elemento que funciona como pausa ou como uma determinada frequência de som. As composições de Cage, enquanto criavam argu-mentos opostos à história da estética, não descobriram

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uma filosofia do silêncio, muito menos estética. O silêncio tornou-se uma ferramenta útil de uso composicional, em nada parecida com as ferramentas utilizadas pelos outros compositores históricos. Apesar de Cage defender um status igual para todos os sons, achava que não tinha significado, pois não necessitava deles, não por serem inúteis mas sim inexpressivos. Cage achava que Beethoven, Mozart e os sons de tráfego automóvel numa cidade grande eram equivalen-tes, apesar de nao precisar de nenhum deles. A composição de Cage é definida não só pelo seu conteúdo mas também pelo comportamento que ele provoca na plateia, comprovando que o silêncio na sua essência não existe. A ideia pré-concebida de música foi controversa, no entanto Cage ao tentar explicar a sua experiência, afirma que a duração é o elemento essencial de toda a música, surgindo como o único componente compartilhado, tanto pelo silêncio como pelo som.

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JEAN - LUC gODARD

Jean-Luc godard (1930 | — ) é um cineasta fran-co-suíço reconhecido pelo seu cinema vanguardista e polémico, que tomou como temas e assumiu como forma, de maneira ágil, original e quase sempre provocadora, os dilemas e perplexidades do século XX. No seu filme Eloge de l’amour, Godard desafia o olhar, pois questiona a nossa percepção do cinema, frus-trando a nossa expectativa do que deva ser um filme. Segundo Godard, “um filme deve ter início, meio e fim. Mas não necessariamente nessa ordem”, pretende as-sim frisar a importância central da estrutura numa obra cinematográfica e a importância do trabalho de montagem. A montagem é o que dá sentido ao todo, fazendo com que as partes contribuam para a aparição de algo que não se encontrava em nenhuma delas. Neste sentido, Eloge de l’amour é talvez a obra mais construída de godard. Uma obra cuja estrutura

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nada deixa ao acaso, revelando, caso ainda fosse neces-sário, a mestria da arte cinematográfica. O filme divide-se em dois blocos temporais esté-ticamente distintos, onde o filme que remete ao passado, é colorido, que sucede o do presente, em filme a preto e branco. Para além dessa demarcação maior, vão desfian-do pequenas sequências tenuemente ligadas entre si. Aos poucos vai se traçando algo, idéias, sentimen-tos, uma visão. Cada parte parece então ressoar na outra, cada sequência estar no lugar certo, no momento exato. Não há como contar a história do filme. Não por não haver história, mas porque esta não é contada como se esperaria, não se desenrola de modo linear e claro, como na vida, as coisas vão acontecendo, soltas, sem que se pos-sa defenir uma linha narrativa entre elas na hora em que acontecem. Somente quando já tudo aconteceu, de certa forma já é tarde, mas só nesse momento é que se consegue construir algo, dar sentido ao todo. “É quando uma história termina que ela começa a fazer sentido” diz a certa altura uma personagem do filme. O passado explica o presente do filme. A História explica o presente da Humanidade. Contudo neste filme deparamos-nos com algo profundamente godardiano que não são imagens em si. Durante todo o filme é muito frequente aparecer uma ima-gem preta que ocupa a totalidade do ecrã, simbolizando o silêncio, este silêncio entre imagens desempenha um papel semelhante á composição de John Gage, ecos, circulações, aleatoriedade, todo um fluxo entre as imagens. Não linear, não verbal .Uma forma de pensamento pela imagem. Godard passeia um olhar perplexo de filósofo so-bre o momento atual, ao mesmo tempo melancólico e

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otimista. Melancólico pois o cineasta inscreve-se numa tradição artística que considera desaparecida. Tudo é perda, e o tempo destruiu as esperanças nascidas ao final da guerra de um mundo melhor. Otimista, pois godard ainda quer acreditar no ser humano e na beleza do mun-do. “Aguardo o fim do cinema com otimismo” disse ele. O final, filmado com um instrumento que o cineasta assumidamente despreza, o vídeo, as cores pro-positadamente saturadas, é uma profissão de fé no ofício de artista, na possibilidade de criar imagens novas. Ou seja: de pensar de uma nova maneira. A relação entre o tempo na música e o tempo no cinema pode estar relacionado com a forma que Cage usou ao desmistificar o silêncio e as novas formas de au-toria quando se trata de compor uma obra de arte. O tempo das não-imagens entre as imagens dá origem a um silêncio aberto conduzindo a um processo emocional e imaginativo por parte do espectador, en-quanto adapta o seu mundo pessoal a estas imagens. Durante todo o filme existe um processo contí-nuo de reconstrução que ocorre naquele silêncio, naquela imagem preta, com a atmosfera do som da imagem ante-rior, que leva a uma nova imagem. godard mostra que a imagem ainda encerra em si possibilidades maiores que o conformado cinema atual.

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ZEN

O termo Zen tem origem em Dhyanna, termo sâns-crito que significa meditação. Ao ser introduzido na China, o termo Dhyanna tornou-se Ch’an, possivelmente este termo foi corrompido ao chegar ao Japão, e por sua similaridade sonora tornou--se Zen. Porém Zen não carrega mais o sentido de meditar, para isto existe o nome Zazen, que seria o sentar Zen. Alguns princípios utilizados no Zen são de gran-de importância para a compreensão deste. Um deles é o princípio da impermanência, ou seja, nada existe pra sempre. Outro princípio importante é o da Natureza Bú-dica, qualquer pessoa é um buda em potencial, somos todos iluminados pela natureza, porém temos que seguir este caminho de volta para a iluminação, esta iluminação dá-nos uma visão sobre a verdadeira realidade de tudo. Esta é a finalidade do Zen. O Zen não é decididamente um sistema fundado

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na lógica e na análise. É algo antípoda da lógica e do modo dualístico de pensar. Pode haver um elemento in-telectual no Zen, uma vez que ele é a mente total onde encontramos variadas realidades. O Zen nada tem a en-sinar no que diz respeito à análise intelectual, nem impõe qualquer conjunto de doutrinas aos seus seguidores. A esse respeito, pode-se afirmar que o Zen é caótico. Atual-mente é praticado em quase todo o mundo. Cage descobre a filosofia Zen Budista e coloca-se, cada vez mais, como um compositor dadaista que vê, em Erik Satie um precursor. Neste momento, impõe-se o uso deliberado do acaso, da indeterminação e da indistinção entre som es-truturado e ruídos advindos da vida comum. É deste modo que a obra de Cage leva às últimas consequências o seu projeto de crítica à racionalidade mu-sical ocidental, projeto agora amparado por uma junção entre expectativas vanguardistas tipicamente modernis-tas e aspirações de espiritualização da vida quotidiana. Através da arbitrariedade do acaso, Cage procu-rava abrir espaço para um retorno ao ser que se deixaria estar na imanência do sonoro. “Eu vi a arte não mais como uma forma de comunicação que parte do artista em direção ao seu público, mas como uma atividade na qual encontrei uma maneira de deixar os sons serem eles mesmos” afirma Cage.

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CAgE E ZEN

Os padrões de estética musical no século XX so-freram as mudanças mais rápidas na história da música e isso deve–se a vários fatores, incluindo os media, que tornaram possível o conhecimento das atividades dos indivíduos em locais extremos do mundo (quase que em simultâneo). As alterações que ocorreram foram: a inclusão de instrumentos, ritmos, padrões e estruturas “exóticas” para as peças e processos de composição de ‘ocidental’, os autores, mas mais importante foi a assimi-lação de conceitos filosóficos sobre a criação artística e o próprio artista e o seu papel com a empresa, que mudou completamente a nossa forma de ver arte. John Cage foi herdeiro de uma cultura musical em transição, um aluno de Arnold Shoenberg , amigo do “avant-garde” pintor Rauschenberg e Pierre Boulez. Cage foi, desde o início da sua carreira musical como uma forma revolucionária da estrutura e composição (processos alea-tórios, etc.) e elementos (incluindo o ruído não-acidentais,

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aliás, o uso de elementos extra-musicais, tais como produ-tores de som e media eletrônica), mas mais importante é a sua contribuição para a mudança da estética musical na concepção do silêncio como parte fundamental de toda a geração de criação musical única, esta última justificada a partir da filosofia oriental do Zen Budismo. Durante a década de 1940, quando Cage prepa-rava peças para piano, ficou preocupado com uma nova mudança. Ele notou que apesar de ter sido ensinado que a música era uma questão de comunicação, quando es-creveu uma peça triste a audiência riu e quando escreveu uma peça alegre o público chorou. A partir disso ele con-cluiu “music doesn’t really communicate to people. Or if it does, it does it in very, very different ways from one person to the next.” Ele concluiu assim que o propósito da música não poderia ser de comunicação.

Qual seria então o seu objetivo?

A resposta a essa questão surgiu em 1946, quando um estudante indiano, gita Sarabhai, chegou para estu-dar a harmonia ocidental com Cage em troca de aulas de música indiana. Ele perguntou-lhe o propósito da música na Índia. Ela respondeu que a sua professora teria lhe ensinado que o objetivo da música era para acalmar a mente, tornando-o suscetível a influências divinas. Cage estava tremendamente impressionado com isso. O seu amigo, o compositor Lou Harrison, encontrou uma de-claração semelhante num tratado do século XVII sobre a música Inglesa por Thomas Mace: “I also came to see

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that all art before the Renaissance, both Oriental and western, had shared this same basis, that Oriental art had continued to do so right along, and that the Renais-sance idea of self-expressive art was therefore heretical.” Cage decidiu então, descobrir o que era uma mente calma e o que eram influências divinas. Durante 18 meses, ele mergulhou na filosofia do Oriente e do Ocidente, e começou a estudar Zen Budismo com Daisetz T. Suzuki. “I had the impression that I was changing — you might say growing up. I realized that my previous understan-ding was that of a child.” Cage descobriu que uma mente calma, era uma mente livre de desgostos, mas, uma vez que desgostar exi-ge primeiramente gostar, ela deve ser livre de ambos os gostos e desgostos. “You can become narrow minded, lite-rally, by only liking certain things and disliking others, but you can become open-minded, literally, by giving up your likes and dislikes and becoming interested in things.” As “influências divinas” eram os sons e os aconteci-mentos que estavam livres para todos,ou seja, a natureza. O estudo de Cage sobre o Budismo também o levou à conclusão de que: “Sounds should be honored rather than enslaved. Every creature, whether sentient or nonsentient, is the Buddha. Each being is at the center of the universe.” Então, a função da música não é para entreter ou comunicar, mas para ser um processo de descoberta, para se tornar consciente e sensíveis aos sons ambientais que estão à nossa volta, e de estar livre do gosto pessoal e da manipulação. Assim, Cage conclui afirmando que: “Art may be practiced in one way or another, so that it rein-forces the ego in its likes and dislikes, or so that it opens

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that mind to the world outside, and outside inside. Since the forties and through the study with D.T. Suzuki of the philosophy of Zen Buddhism, I’ve thought of music as a means of changing the mind. I saw art not as something that consisted of a communication from the artist to an audience but rather as an activity of sounds in which the artist found a way to let the sounds be themselves. And, in being themselves, to open the minds of people who made them or listened to them to other possibilities than they had previously considered.” Assim, a música perdeu o seu propósito de comu-nicação e de expressão. Esta ideia tradicional oriental de viver em harmonia com a natureza contrasta com a práti-ca ocidental de controle e manipulação do ambiente que tem sido visto como a causa da deteorização do planeta.

Como é que essa harmonia com a natureza se manifesta na música?

Cage encontrou a resposta para essa questão nas obras de Ananda Coomaraswamy: “Art is to imitate na-ture in her manner of operation.”Isto não é para ser confundido com imitação da apa-rência da natureza. De acordo com uma teoria científica atual, fenômenos naturais, pelo menos numa escala mi-croscópica, não são baseados num modelo mecânico, determinista, mas sim na base da indeterminação e do acaso, como na mecânica quântica e na teoria do caos. Cage fez referência à arte seguindo o exemplo da ciên-cia, e a convergência é interessante, especialmente porque

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ele escolheu usar indeterminação ao acaso na sua música desde o tempo de 4’33 “. Outro passo em direção a essa estética foi tomada com a máxima de Cage de que arte e a vida não devem ser separados: “Art is not an escape from life, but rather an introduction to it.” Afirmou que “it is time to turn the environment into art.” Isto levou ao seu conceito de interpenetra-ção. De acordo com Cage, a música não podia mais ser considerada nova ou “experimental”, a menos que in-corporasse interpenetração. Anteriormente, os sons que não eram da intenção do compositor foram considerados invasões alienígenas, indesejáveis “ruídos”. Mas obras que incluem sons do que não pertenciam às intenções do compositor e aos intérpretes são aqueles que incluem interpenetração. Este conceito foi introduzido pela pri-meira vez por Erik Satie em Ameublement d’musique, e mais tarde foi retomada comercialmente pela Muzak. 4’33 “é o melhor exemplo de interpenetração. Com tudo isto em mente, 4’33 “pode ser mais fa-cilmente compreendida como uma verdadeira obra de arte. O acaso foi usado para liberar o compositor de con-trolar sons e exercitar os seus gostos e escolhas pessoais, as suas memórias, os seus gostos e desgostos. Usando o acaso foi literalmente uma imitação da forma de como a natureza atua. O “silêncio” de 4’33 “abriu o campo de influências divinas, isto é, os sons que não são feitos intencionalmente, mas já se encontram à nossa volta, li-vres para serem ouvidos e livres para penetrarem na arte. Assim, a natureza e a vida, tornaram-se literalmente arte. Para Cage, as performances deviam fazer com que

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as pessoas percebessem que ouvir uma peça é uma ação delas e não do compositor. A responsabilidade do com-positor muda de auto-expressão para abrir a janela para os sons do ambiente.

Porque era então necessário para Cage criar esse tipo de música quando ela já se encontra presente?

A resposta indica a sua finalidade didática: “Many people taking a walk would have their heads so full of pre-conceptions that it would be a long time before they were capable of hearing or seeing. Most people are blinded by themselves”. Assim, o objetivo do compositor revela ser principalmente a de um missionário. “Music is about changing the mind — not to understand, but to be aware.” “Many people in our society now go around the streets and in the buses and so forth playing radios with earphones on and they don’t hear the world around them. They hear only what they have chosen to hear. I can’t understand why they cut themselves off from that rich experience which is free. I think this is the beginning of music, and I think that the end of music may very well be in those record collections.” No entanto, há também uma razão artística e pes-soal para escrever música com esta estética, que é revelada numa confissão de Cage: “Not having, as most musicians do, an ear for mu-sic, I don’t hear music when I write it. I hear it only when it is played. If I heard it when I was writing it, I would write what I’ve already heard; whereas since I can’t hear it while I’m writing it, I’m able to write something that I’ve never

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heard before. And if I did hear something before it was audible, I would have had to take solfege, which would have trained me to accept certain pitches and not others. I would then have found the environmental sounds off tune, lacking tonality. Therefore, I pay no attention to solfege.” Esta afirmação representa uma rutura radical com todas as formas tradicionais de fazer música. Normalmen-te, um compositor ouve algo e depois grava-o, ou, pelo menos, trabalha com o som de algumas idéias básicas, transformando-os numa composição. O treino auditivo é em geral considerado requisito para um músico de for-mação nos currículos de música em todo o mundo. Cage disse que não é apenas desnecessário, mas indesejável. Ele confessou que não conseguia ouvir o que estava a escrever. Não ouvia a música antes, durante ou mesmo depois de a escrever. Ele escreveu a música para ouvir como ela (a no-tação) soou, e que ele não ouviu, até que foi tocada. Assim, Cage não estava a trabalhar a composição com o som em si, mas com estruturas matemáticas que incorporam e sons animados. Estava a trabalhar fora das concepções intelec-tuais dos quais ele não tinha idéia de como eles soariam. O sensorial, então, era um produto dessa intelecção. Cage também citou a sua incapacidade de deter-minar e controlar as preparações utilizadas nas suas peças para piano preparado como um ponto que ajudou a trans-formá-lo em direção ao uso do acaso. Disse que descobriu que, porque cada piano é diferentes, os sons dos prepa-rativos não poderiam ser inteiramente determinados, não importa o quanto se poderia tentar controlá-los, e que isso não era uma coisa má. Um último aspeto da filosofia de Cage que está pre-

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sente em 4’33 “diz respeito à sua determinação em usar a música como uma metáfora para a forma como uma socie-dade deve se comportar ”I was intent on making something that didn’t tell people what to do.” Para Cage, o ritmo incessante que mantém grande parte da nossa música convencional juntos foi análogo a um tipo de organização militar, a predominância de um tom cen-tral. Era como uma ditadura. Assim foi o maestro de uma orquestra. Assim, a sua música tendia a evitar essas situações. O trabalho de Cage antes de 4’33 “ é baseado numa estética radicalmente diferente daqueles que vieram depois dele. 4’33” marca então uma mudança na filosofia musical que não possuí precedentes durante a sua vida, e, possivel-mente, sem precedentes na história da música.

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No projeto A Presença Indelével do Ruído adap-tou-se a constante realidade da impossibilidade de existir silêncio, desde os inelimináveis ruídos exteriores prove-nientes das pessoas, que são a realidade real, ao barulho do metro a chegar, das bilheteiras, das escadas rolantes que formam os ruídos constantes. Tomando como inspiração o trabalho de John cage e na aleatoriedade que transmitia nas suas composi-ções, ao longo deste projeto as imagens vão aparecendo ao acaso. Para além dessa colocação aleatoria dos elemen-tos, Cage, como mencionámos anteriormente, baseou-se também na filosofia Zen Budista, e dessa forma durante os relatos dos utentes, no projeto são aplicadas imagens cujo objetivo é transmitir a sensação de calma e serenida-de que tanto se procura naqueles momentos do dia. Jean-Luc godard serviu também como base re-levante no desenrolar deste trabalho. Em semelhança à ausência de imagem por si usada, ao longo deste proje-to o espectador vai se deparando com telas pretas, com o objetivo de conduzir o público a pausas de refleção. Como ele afirmava e bem “Não nos podemos conformar com o cinema actual“ querendo dizer que existe muito mais a explorar no mundo cinematográfico. Outras duas influências possíveis de se constatar no projeto são os planos que se multiplicam e o uso de cor e o preto e bran-co no mesmo ato. Neste projeto são notórias todas estas as influên-cias de Jean-Luc godard e de Jonh Cage, dois importantes artistas da nossa história do mundo criativo.

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