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Thomae de Aquino De ente et essentia <PROLOGUS> Quia parvus error in principio magnus est in fine, secundum philosophum in I caeli et mundi, ens autem et essentia sunt quae primo intellectu concipiuntur, ut dicit Avicenna in principio suae metaphysicae, ideo ne ex eorum ignorantia errare contingat, ad horum difficultatem aperiendam dicendum est quid nomine essentiae et entis significetur et quomodo in diversis inveniatur et quomodo se habeat ad intentiones logicas, scilicet genus, speciem et differentiam. Quia vero ex compositis simplicium cognitionem accipere debemus et ex posterioribus in priora devenire, ut, a facilioribus incipientes, convenientior fiat disciplina, ideo ex significatione entis ad significationem essentiae procedendum est. CAPITVLVM 1 Sciendum est igitur quod, sicut in V metaphysicae philosophus dicit, ens per se dicitur dupliciter, uno modo quod dividitur per decem genera, alio modo quod significat propositionum veritatem. Horum autem differentia est quia secundo modo potest dici ens omne illud, de quo affirmativa propositio formari potest, etiam si illud in re nihil ponat. Per quem modum privationes et negationes entia dicuntur; dicimus enim quod affirmatio est opposita negationi et quod caecitas est in oculo. Sed primo modo non potest dici ens nisi quod aliquid in re ponit. Unde primo modo caecitas et huiusmodi non sunt entia. Nomen igitur essentiae non sumitur ab ente secundo modo dicto, aliqua enim hoc modo dicuntur entia, quae essentiam non habent, ut patet in privationibus; sed sumitur essentia ab ente primo modo dicto. Unde Commentator in eodem loco dicit quod ens primo modo dictum est quod significat essentiam rei. Et quia, ut dictum TOMÁS DE AQUINO, Sobre o ente e a essência * <Prólogo> Uma vez que, segundo o Filósofo em Sobre o céu e o mundo I, “um pequeno erro no princípio é grande no final” 1 , mas, como diz Avicena no princípio de sua Metafísica, “o ente e a essência são aqueles que são primeiramente concebidos pelo intelecto” 2 , então, para que não haja erro por ignorá- los, para que apareça o que há de difícil sobre eles, cumpre dizer o que é significado pelo nome “essência” e pelo nome “ente”; de que modo {isso que é significado por tais nomes} 3 é encontrado em diversos e de que modo está vinculado às intenções lógicas, isto é, ao gênero, à espécie e à diferença. De fato, uma vez que devemos receber o conhecimento dos simples partindo dos compostos e chegar aos anteriores partindo dos posteriores, para que começando pelo que é mais fácil, a disciplina seja mais convenientemente realizada, então, cumpre proceder partindo da significação de “ente” para a significação de “essência”. 1º Capítulo Portanto, tal como o Filósofo diz em Metafísica V 4 , cumpre saber que há dois modos de dizer o ente por si. De um modo, o ente por si é aquilo que é dividido por dez gêneros; de outro modo, aquilo que significa a verdade da proposição. Ora, há diferença entre eles porque, do segundo modo, pode ser chamado de “ente” tudo aquilo a respeito de que se pode formar uma proposição afirmativa, mesmo que aquilo nada ponha na coisa. Segundo esse modo, as privações e as negações são ditas “entes”. Com efeito, dizemos: “a afirmação é oposta à negação”; “a cegueira está no olho”. Mas, do primeiro modo, não pode ser dito “ente” senão aquilo que põe algo na coisa, donde, do primeiro modo, a cegueira, e os que são do mesmo modo dela, não são “entes”. Portanto, o nome “essência” não é tomado de “ente” dito do segundo modo: com efeito, deste modo, alguns que não têm essência são ditos “entes”, como é patente nas privações. Ora, “essência” é tomada de “ente” dito do primeiro modo. Donde o Comentador dizer, no mesmo lugar, que “ ‘ente’, dito do primeiro modo, é aquilo que * TOMÁS DE AQUINO, De ente et essentia. In: Sancti Thomae de Aquino Opera Omnia iussu Leonis XIII edita [= Leonina]. Tomus XLIII, Cura et Studio Fratrum Praedicatorum. Roma: Santa Sabina, 1976, p. 369-381. Tradução: Carlos Eduardo de Oliveira. 1 De caelo I 9 (271 b 8-13); ainda, AVERRÓIS In De anima III comm. 4: “com efeito, um erro mínimo no princípio é causa de um erro máximo no final, como Aristóteles disse” (ed. Crawford, p. 384, l. 32). 2 Cf. AVICENA, Metaph. I, cap. 6: “Dizemos, então, que o ente e a coisa e o necessário são tais que são imediatamente impressos na alma pela impressão primeira” (ed. Venetiis 1508, f. 72 rb A); certamente falta ali a palavra “essência”, mas pouco abaixo segue-se: “Com efeito, qualquer coisa tem a certeza pela qual é aquilo que é... Qualquer coisa tem a certeza própria que é sua quididade” (ibidem f. 72 va C). 3 Advirta-se que se trata de acréscimo do tradutor todo texto que aqui aparecer entre {}. (N. do T.). 4 Metaph. V 9 (1017 a 22-35).

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Thomae de Aquino De ente et essentia

Quia parvus error in principio magnus est in fine, secundum philosophum in I caeli et mundi, ens autem et essentia sunt quae primo intellectu concipiuntur, ut dicit Avicenna in principio suae metaphysicae, ideo ne ex eorum ignorantia errare contingat, ad horum difficultatem aperiendam dicendum est quid nomine essentiae et entis significetur et quomodo in diversis inveniatur et quomodo se habeat ad intentiones logicas, scilicet genus, speciem et differentiam. Quia vero ex compositis simplicium cognitionem accipere debemus et ex posterioribus in priora devenire, ut, a facilioribus incipientes, convenientior fiat disciplina, ideo ex significatione entis ad significationem essentiae procedendum est.

CAPITVLVM 1 Sciendum est igitur quod, sicut in V metaphysicae philosophus dicit, ens per se dicitur dupliciter, uno modo quod dividitur per decem genera, alio modo quod significat propositionum veritatem. Horum autem differentia est quia secundo modo potest dici ens omne illud, de quo affirmativa propositio formari potest, etiam si illud in re nihil ponat. Per quem modum privationes et negationes entia dicuntur; dicimus enim quod affirmatio est opposita negationi et quod caecitas est in oculo. Sed primo modo non potest dici ens nisi quod aliquid in re ponit. Unde primo modo caecitas et huiusmodi non sunt entia. Nomen igitur essentiae non sumitur ab ente secundo modo dicto, aliqua enim hoc modo dicuntur entia, quae essentiam non habent, ut patet in privationibus; sed sumitur essentia ab ente primo modo dicto. Unde Commentator in eodem loco dicit quod ens primo modo dictum est quod significat essentiam rei. Et quia, ut dictum

TOMS DE AQUINO, Sobre o ente e a essncia*

Uma vez que, segundo o Filsofo em Sobre o cu e o mundo I, um pequeno erro no princpio grande no final1, mas, como diz Avicena no princpio de sua Metafsica, o ente e a essncia so aqueles que so primeiramente concebidos pelo intelecto2, ento, para que no haja erro por ignor-los, para que aparea o que h de difcil sobre eles, cumpre dizer o que significado pelo nome essncia e pelo nome ente; de que modo {isso que significado por tais nomes}3 encontrado em diversos e de que modo est vinculado s intenes lgicas, isto , ao gnero, espcie e diferena. De fato, uma vez que devemos receber o conhecimento dos simples partindo dos compostos e chegar aos anteriores partindo dos posteriores, para que comeando pelo que mais fcil, a disciplina seja mais convenientemente realizada, ento, cumpre proceder partindo da significao de ente para a significao de essncia.

1 Captulo Portanto, tal como o Filsofo diz em Metafsica V4, cumpre saber que h dois modos de dizer o ente por si. De um modo, o ente por si aquilo que dividido por dez gneros; de outro modo, aquilo que significa a verdade da proposio. Ora, h diferena entre eles porque, do segundo modo, pode ser chamado de ente tudo aquilo a respeito de que se pode formar uma proposio afirmativa, mesmo que aquilo nada ponha na coisa. Segundo esse modo, as privaes e as negaes so ditas entes. Com efeito, dizemos: a afirmao oposta negao; a cegueira est no olho. Mas, do primeiro modo, no pode ser dito ente seno aquilo que pe algo na coisa, donde, do primeiro modo, a cegueira, e os que so do mesmo modo dela, no so entes. Portanto, o nome essncia no tomado de ente dito do segundo modo: com efeito, deste modo, alguns que no tm essncia so ditos entes, como patente nas privaes. Ora, essncia tomada de ente dito do primeiro modo. Donde o Comentador dizer, no mesmo lugar, que ente, dito do primeiro modo, aquilo que

* TOMS DE AQUINO, De ente et essentia. In: Sancti Thomae de Aquino Opera Omnia iussu Leonis XIII edita [= Leonina]. Tomus XLIII, Cura et Studio Fratrum Praedicatorum. Roma: Santa Sabina, 1976, p. 369-381. Traduo: Carlos Eduardo de Oliveira. 1 De caelo I 9 (271 b 8-13); ainda, AVERRIS In De anima III comm. 4: com efeito, um erro mnimo no princpio causa de um erro mximo no final, como Aristteles disse (ed. Crawford, p. 384, l. 32). 2 Cf. AVICENA, Metaph. I, cap. 6: Dizemos, ento, que o ente e a coisa e o necessrio so tais que so imediatamente impressos na alma pela impresso primeira (ed. Venetiis 1508, f. 72 rb A); certamente falta ali a palavra essncia, mas pouco abaixo segue-se: Com efeito, qualquer coisa tem a certeza pela qual aquilo que ... Qualquer coisa tem a certeza prpria que sua quididade (ibidem f. 72 va C). 3 Advirta-se que se trata de acrscimo do tradutor todo texto que aqui aparecer entre {}. (N. do T.). 4 Metaph. V 9 (1017 a 22-35).

Toms de Aquino, Sobre o ente e a essncia 2

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est, ens hoc modo dictum dividitur per decem genera, oportet quod essentia significet aliquid commune omnibus naturis, per quas diversa entia in diversis generibus et speciebus collocantur, sicut humanitas est essentia hominis, et sic de aliis. Et quia illud, per quod res constituitur in proprio genere vel specie, est hoc quod significatur per diffinitionem indicantem quid est res, inde est quod nomen essentiae a philosophis in nomen quiditatis mutatur. Et hoc est quod philosophus frequenter nominat quod quid erat esse, id est hoc per quod aliquid habet esse quid. Dicitur etiam forma secundum quod per formam significatur certitudo uniuscuiusque rei, ut dicit Avicenna in II metaphysicae suae. Hoc etiam alio nomine natura dicitur accipiendo naturam secundum primum modum illorum quattuor, quos Boethius in libro de duabus naturis assignat, secundum scilicet quod natura dicitur omne illud quod intellectu quoquo modo capi potest. Non enim res est intelligibilis nisi per diffinitionem et essentiam suam. Et sic etiam philosophus dicit in V metaphysicae quod omnis substantia est natura. Tamen nomen naturae hoc modo sumptae videtur significare essentiam rei, secundum quod habet ordinem ad propriam operationem rei, cum nulla res propria operatione destituatur. Quiditatis vero nomen sumitur ex hoc, quod per diffinitionem significatur. Sed essentia dicitur secundum quod per eam et in ea ens habet esse.

significa a essncia da coisa5. E uma vez que, como se disse, o ente dito desse modo dividido pelos dez gneros, preciso que essncia signifique algo comum a todas as naturezas pelas quais entes diversos so colocados em gneros e espcies diversos, assim como humanidade a essncia de homem e assim por diante. Posto que aquilo pelo que a coisa colocada no gnero adequado, ou na espcie, isso que significado pela definio que indica o que a coisa , segue-se, ento, que o nome essncia seja intercambiado pelos filsofos6 com o nome quididade,7 e isso tambm o que o Filsofo frequentemente nomeia o que era ser algo 8, ou seja, isso pelo que algo qualquer tem o ser algo determinado 9. dito tambm forma, segundo o que, por forma, significada a certeza de qualquer coisa, como diz Avicena no livro II de sua Metafsica10. Isso, por outro nome, tambm dito natureza, tomando natureza segundo o primeiro modo daqueles quatro assinalados por Bocio no livro Sobre as duas naturezas, a saber, segundo o que se diz natureza aquilo que pode ser tomado de algum modo pelo intelecto11, com efeito, a coisa no inteligvel seno por sua definio e essncia; e, assim, tambm o Filsofo diz em Metafsica V que toda substncia natureza12. V-se, no entanto, que o nome natureza, tomado desse modo, signifique a essncia da coisa segundo o que est ordenada para a operao prpria da coisa, dado que nenhuma coisa seja destituda de operao prpria; o nome quididade, porm, tomado do fato de que {aquilo pelo que a coisa colocada no gnero adequado, ou na espcie,} seja significado pela definio. Mas se diz essncia segundo o que, nela e por ela, o ente tem ser.

5 AVERRIS, Metaph. V comm. 14: Mas deves saber que, universalmente, este nome ente que significa a essncia da coisa diverso de ente que significa o verdadeiro (ed. Venetiis 1552, f. 55 va 56). 6 Por exemplo, AVICENA, Metaph. V, cap. 5, passim, igualmente, AVERRIS, Metaph. VII, passim. 7 Toms sugere algo que se perde no portugus, a saber, que o vocbulo latino quiditas (quididade) seja uma derivao que faz referncia questo quid est? (o que ?) de modo a nomear quilo que serve de resposta para essa questo. (N. do T.). 8 A expresso , que lemos s dezenas nos Segundos analticos II 4-6 (91 a 25-92 a 25) ou em Metafsica VII, cap. 3-6 (1028 b 34-1032 a 29), foi vertida pelos tradutores latinos por quod quid erat esse, como em Tiago de Veneza, como se encontra em sua traduo dos Segundos analticos (AL IV. 1-4) e da Metafsica Vetustissima (AL XXV.I.I), mas no em Guilherme de Moerbeke, como, por exemplo, na nova traduo da Metafsica. 9 Nessa passagem, Toms sugere um modo de se ler a expresso latina que verte a expresso grega citada na nota anterior, a saber, que quod quid erat esse (o que era ser algo) fosse entendida como hoc per quod aliquid habet esse quid (isso pelo que algo qualquer tem o ser algo determinado). (N. do T.). 10 Metaph. I cap. 6: qualquer coisa tem a certeza prpria que sua quididade (f. 72 va) e II cap. 2 esta certeza ... a forma (f. 76 ra). 11 De persona et duabus naturis cap. 1: H natureza daquelas coisas que, quando so, podem ser tomadas de algum modo pelo intelecto (PL 64, 1341 B). 12 Metaph. V 5 (104 b 36): A natureza dos existentes dita, de outro modo, natureza substncia (ms. P, fol. 195 vb; ms. V, fol. 39 r).

Toms de Aquino, Sobre o ente e a essncia 3

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Sed quia ens absolute et per prius dicitur de substantiis et per posterius et quasi secundum quid de accidentibus, inde est quod essentia proprie et vere est in substantiis, sed in accidentibus est quodammodo et secundum quid. Substantiarum vero quaedam sunt simplices et quaedam compositae, et in utrisque est essentia, sed in simplicibus veriori et nobiliori modo, secundum quod etiam esse nobilius habent. Sunt enim causa eorum quae composita sunt, ad minus substantia prima simplex, quae Deus est. Sed quia illarum substantiarum essentiae sunt nobis magis occultae, ideo ab essentiis substantiarum compositarum incipiendum est, ut a facilioribus convenientior fiat disciplina.

CAPITVLUM II In substantiis igitur compositis forma et materia nota est, ut in homine anima et corpus. Non autem potest dici quod alterum eorum tantum essentia esse dicatur. Quod enim materia sola non sit essentia rei planum est, quia res per essentiam suam et cognoscibilis est et in specie ordinatur vel genere. Sed materia neque cognitionis principium est, neque secundum eam aliquid ad genus vel speciem determinatur, sed secundum id quod aliquid actu est. Neque etiam forma tantum essentia substantiae compositae dici potest, quamvis hoc quidam asserere conentur. Ex his enim quae dicta sunt patet quod essentia est illud, quod per diffinitionem rei significatur. Diffinitio autem substantiarum naturalium non tantum formam continet, sed etiam materiam; aliter enim diffinitiones naturales et mathematicae non differrent. Nec potest dici quod materia in diffinitione substantiae naturalis ponatur sicut additum essentiae eius vel ens extra essentiam eius, quia hic modus diffinitionis proprius est accidentibus, quae perfectam essentiam non habent. Unde oportet quod in diffinitione sua subiectum recipiant, quod est extra genus eorum. Patet ergo quod essentia comprehendit materiam et formam.

Mas, posto que ente seja dito absoluta e primeiramente a respeito das substncias13, e a respeito dos acidentes pelo posterior e como se de acordo com a determinao14, ento, tem-se, ainda, que h essncia prpria e verdadeiramente nas substncias, mas, nos acidentes, h de certo modo e de acordo com a determinao. De fato, entre as substncias, algumas so simples e outras compostas, e de cada uma delas h essncia; mas nas simples de modo mais verdadeiro e mais nobre, segundo o que, ademais, tm mais nobre ser: com efeito, so causa daqueles que so compostos, ao menos a substncia primeira simples que Deus. Mas uma vez que as essncias dessas substncias so mais ocultas para ns, ento, cumpre comear pelas essncias das substncias compostas, dado que a disciplina seja mais convenientemente realizada partindo do que mais fcil.

2 Captulo Portanto, nota-se a forma e a matria nas substncias compostas tal como nota-se a alma e o corpo no homem. Ora, no possvel dizer que apenas uma daquelas duas seja dita essncia. Com efeito, est claro que, isolada, a matria da coisa no seria a essncia, porque a coisa tanto cognoscvel quanto ordenada na espcie ou no gnero pela sua essncia: ora, nem a matria princpio de cognio nem algo determinado para o gnero ou para a espcie segundo ela, mas { determinado} segundo seja algo em ato. Nem, ainda, unicamente a forma pode ser dita a essncia da substncia composta, embora alguns15 procurem asseverar isso. Com efeito, patente do que foi dito que essncia aquilo que significado pela definio da coisa: ora, a definio das substncias naturais no contm unicamente a forma, mas contm tambm a matria, com efeito, de outro modo, as definies naturais e as matemticas no difeririam. Tambm no pode ser dito que a matria seria posta na definio da substncia natural tal como um acrscimo para a essncia dela, ou como um ente fora da essncia dela, visto que este o modo das definies prprio para os acidentes, que no tm uma essncia perfeita donde ser preciso que {os acidentes} recebam em sua definio o sujeito que est fora do gnero deles. Portanto, patente que a essncia compreende tanto a matria como a forma.

13 O ente dito a respeito das substncias quando se diz Scrates ente; a respeito dos acidentes, quando se diz branco ente. (N. do T.). 14 de acordo com a determinao: secundum quid, ou seja, de acordo com aquilo pelo que algo qualquer tem o ser algo determinado . (N. do T.). 15 Cf. TOMS DE AQUINO, Super Metaph. VII 9: V-se essa opinio em Averris e em alguns de seus seguidores. Com efeito, Averris diz em Metaph. VII comm. 21: A quididade do homem ... a forma do homem, e no o homem que unido a partir de matria e forma (fol. 81 ra 31-33).

Toms de Aquino, Sobre o ente e a essncia 4

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Non autem potest dici quod essentia significet relationem, quae est inter materiam et formam vel aliquid superadditum ipsis, quia hoc de necessitate esset accidens et extraneum a re nec per eam res cognosceretur, quae omnia essentiae conveniunt. Per formam enim, quae est actus materiae, materia efficitur ens actu et hoc aliquid. Unde illud quod superadvenit non dat esse actu simpliciter materiae, sed esse actu tale, sicut etiam accidentia faciunt, ut albedo facit actu album. Unde et quando talis forma acquiritur, non dicitur generari simpliciter, sed secundum quid. Relinquitur ergo quod nomen essentiae in substantiis compositis significat id quod ex materia et forma compositum est. Et huic consonat verbum Boethii in commento praedicamentorum, ubi dicit quod usia significat compositum. Usia enim apud Graecos idem est quod essentia apud nos, ut ipsemet dicit in libro de duabus naturis. Avicenna etiam dicit quod quiditas substantiarum compositarum est ipsa compositio formae et materiae. Commentator etiam dicit super VII metaphysicae: natura quam habent species in rebus generabilibus est aliquod medium, id est compositum ex materia et forma. Huic etiam ratio concordat, quia esse substantiae compositae non est tantum formae nec tantum materiae, sed ipsius compositi. Essentia autem est secundum quam res esse dicitur. Unde oportet quod essentia, qua res denominatur ens, non tantum sit forma neque tantum materia, sed utrumque, quamvis huiusmodi esse suo modo sola forma sit causa. Sic enim in aliis videmus, quae ex pluribus principiis constituuntur, quod res non denominatur ex altero illorum principiorum tantum, sed ab eo, quod utrumque complectitur, ut patet in saporibus, quia ex actione calidi digerentis humidum causatur dulcedo, et quamvis hoc modo calor sit causa dulcedinis, non tamen denominatur corpus dulce a calore, sed a sapore qui calidum et humidum complectitur.

Ora, no pode ser dito que a essncia signifique a relao que h entre a matria e a forma ou algo acrescentado a elas, pois este seria necessariamente um acidente e estranho coisa e tampouco a coisa seria conhecida por aquela relao, tudo que convm essncia16. Com efeito, pela forma que ato da matria, a matria feita ente em ato e este algo. Por conseguinte, aquilo que sobrevm no d matria o ser em ato simplesmente, mas d, em ato, o ser tal; assim como tambm o fazem os acidentes, tal como a brancura faz o branco em ato. Por conseguinte, tambm quando tal forma adquirida, no se diz que {o ente} seja gerado simplesmente, mas {que seja gerado} de acordo com a determinao. Portanto, resta que, nas substncias compostas, o nome essncia significa aquilo que composto a partir de matria e de forma. E concorda com isso a palavra de Bocio no comentrio das Categorias, em que diz que ousia significa o composto17; com efeito, entre os gregos, ousia o mesmo que essncia entre ns, como ele mesmo diz no livro Sobre as duas naturezas. Avicena tambm diz que a quididade das substncias compostas a prpria composio de forma e de matria18. Tambm o Comentador diz sobre o livro VII da Metafsica: a natureza que as espcies tm nas coisas gerveis algo intermedirio, isto , composto a partir de matria e forma19. Tambm a razo concorda com isso, posto que o ser da substncia composta no unicamente da forma nem unicamente da matria, mas do prprio composto. Ora, a coisa dita ser de acordo com a essncia. Por conseguinte, preciso que a essncia, pela qual a coisa denominada ente, no seja unicamente forma nem unicamente matria, mas ambas, por mais que apenas a forma, a seu modo, seja a causa de tal ser. Com efeito, vemos que seja assim em outros que so constitudos a partir de vrios princpios: a coisa no denominada unicamente a partir de um desses princpios, mas { denominada} desde aquilo que abarca ambos {os princpios}; como patente nos sabores: pois a doura causada a partir da ao do quente que digere o mido, e, por mais que, desse modo, o calor seja a causa da doura, o

16 tudo que convm essncia, ou seja, convm essncia (a) que ela no seja nada de estranho ou acidental para a coisa e (b) que a coisa seja conhecida por ela. (N. do T.). 17 Essa afirmao atribuda a Bocio por ALBERTO MAGNO, Super Sent. I d. 23 a. 4 (Borgnet 25, 591 a); ibid. BOAVENTURA dub. 1; o prprio TOMS DE AQUINO, q. 1 a. 1; mas no se encontra em Bocio. {Embora a edio crtica latina parea ter razo quanto ao comentrio das Categorias, o mesmo no acontece com a referncia ao Sobre as duas naturezas: cf. PL 64, c. 1344C. (N. do T.)}. 18 AVICENA, Metaph. V cap. 5: a quididade ... composta desde forma e matria: com efeito esta a quididade do composto, e a quididade esta composio (fol. 90 ra F). 19 AVERRIS, Metaph. VII comm. 27 (fol. 83 va 42-44).

Toms de Aquino, Sobre o ente e a essncia 5

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Sed quia individuationis principium materia est, ex hoc forte videtur sequi quod essentia, quae materiam in se complectitur simul et formam, sit tantum particularis et non universalis. Ex quo sequeretur quod universalia diffinitionem non haberent, si essentia est id quod per diffinitionem significatur. Et ideo sciendum est quod materia non quolibet modo accepta est individuationis principium, sed solum materia signata. Et dico materiam signatam, quae sub determinatis dimensionibus consideratur. Haec autem materia in diffinitione hominis, in quantum est homo, non ponitur, sed poneretur in diffinitione Socratis, si Socrates diffinitionem haberet. In diffinitione autem hominis ponitur materia non signata; non enim in diffinitione hominis ponitur hoc os et haec caro, sed os et caro absolute, quae sunt materia hominis non signata. Sic ergo patet quod essentia hominis et essentia Socratis non differunt nisi secundum signatum et non signatum. Unde Commentator dicit super VII metaphysicae: Socrates nihil aliud est quam animalitas et rationalitas, quae sunt quiditas eius. Sic etiam essentia generis et speciei secundum signatum et non signatum differunt, quamvis alius modus designationis sit utrobique, quia designatio individui respectu speciei est per materiam determinatam dimensionibus, designatio autem speciei respectu generis est per differentiam constitutivam, quae ex forma rei sumitur. Haec autem determinatio vel designatio, quae est in specie respectu generis, non est per aliquid in essentia speciei exsistens, quod nullo modo in essentia generis sit, immo quicquid est in specie, est etiam in genere ut non determinatum. Si enim animal non esset totum quod est homo, sed pars eius, non praedicaretur de eo, cum nulla pars integralis de suo toto praedicetur.

corpo, no entanto, no denominado doce pelo calor, mas pelo sabor, que abarca o quente e o mido20. Mas uma vez que o princpio de individuao a matria, talvez a partir disso fosse visto se seguir que a essncia, que abarca em si a matria e, simultaneamente, a forma, seja unicamente do particular e no do universal: disso se seguiria que os universais no teriam definio, se essncia for aquilo que significado pela definio. Donde cumpre saber que no a matria tomada de qualquer modo que princpio de individuao, mas unicamente a matria assinalada; e digo matria assinalada aquela que considerada sob dimenses determinadas. Ora, essa matria no posta na definio que do homem enquanto homem, mas seria posta na definio de Scrates se Scrates tivesse definio: na definio de homem posta a matria no assinalada. Com efeito, no se pe na definio de homem este osso e esta carne, mas osso e carne absolutamente, os quais so a matria no assinalada do homem. Portanto, patente, assim, que a essncia de homem e a essncia de Scrates no diferem seno segundo o assinalado e o no assinalado; donde diz o Comentador sobre o livro VII da Metafsica: Scrates no nada alm da animalidade e da racionalidade que so sua quididade21. Assim, ainda, a essncia do gnero e da espcie diferem segundo o assinalado e o no assinalado, por mais que seja diverso o modo de designao de cada um: uma vez que a designao do indivduo com relao espcie se d pela matria determinada pelas dimenses, mas a designao da espcie com relao ao gnero se d pela diferena constitutiva que tomada a partir da forma da coisa. Ora, essa determinao que se d na espcie com relao ao gnero, no se d por algo existente na essncia da espcie que no se daria de nenhum modo na essncia do gnero; ou melhor, tudo o que se d na espcie tambm se d no gnero como no determinado. Com efeito, se animal no fosse o todo que homem, mas fosse sua parte, no seria

20 Ou seja, (a) o quente e o mido so os princpios da doura, pois a doura , segundo Toms, o resultado da digesto do mido pelo quente. Assim, uma vez que, para haver doura, (b) o quente digere o mido, pode-se dizer que (c) o calor isto , o quente, a causa da doura. O corpo que doce, porm, no dito doce por causa do calor. O corpo dito doce por causa do sabor, que aquilo que abarca tanto o quente como o mido, princpios da doura. Do mesmo modo, (a) a matria e a forma so os princpios do ser da substncia composta, pois o ser da substncia composta o resultado da atualizao da matria pela forma. Assim, uma vez que, para haver o ser da substncia composta, (b) a forma atualiza a matria, pode-se dizer que (c) a forma a causa do ser da substncia composta. A substncia composta, porm, no dita ser unicamente por causa da forma. A substncia composta dita ser por causa de sua essncia, que abarca tanto a forma como a matria, princpios do ser da substncia composta. (N. do T.). 21 AVERRIS, Metaph. VII comm. 20: ... que so sua quididade: assim no mss XIII s., tal como em Vat. lat. 2081, fol. 74 vb e Ottob. Lat. 2215, fol. 91 vb; ed. Venetiis 1552: ... suas quididades (fol. 80 ra 23).

Toms de Aquino, Sobre o ente e a essncia 6

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Hoc autem quomodo contingat videri poterit, si inspiciatur qualiter differt corpus secundum quod ponitur pars animalis et secundum quod ponitur genus. Non enim potest eo modo esse genus, quo est pars integralis. Hoc igitur nomen quod est corpus multipliciter accipi potest. Corpus enim, secundum quod est in genere substantiae, dicitur ex eo quod habet talem naturam, ut in eo possint designari tres dimensiones; ipsae enim tres dimensiones designatae sunt corpus, quod est in genere quantitatis. Contingit autem in rebus, ut quod habet unam perfectionem ad ulteriorem etiam perfectionem pertingat, sicut patet in homine, qui et naturam sensitivam habet et ulterius intellectivam. Similiter etiam et super hanc perfectionem, quae est habere talem formam, ut in ea possint tres dimensiones designari, potest alia perfectio adiungi, ut vita vel aliquid huiusmodi. Potest ergo hoc nomen corpus significare rem quandam, quae habet talem formam, ex qua sequitur in ipsa designabilitas trium dimensionum cum praecisione, ut scilicet ex illa forma nulla ulterior perfectio sequatur; sed si quid aliud superadditur, sit praeter significationem corporis sic dicti. Et hoc modo corpus erit integralis et materialis pars animalis, quia sic anima erit praeter id quod significatum est nomine corporis et erit superveniens ipsi corpori, ita quod ex ipsis duobus, scilicet anima et corpore, sicut ex partibus constituetur animal. Potest etiam hoc nomen corpus hoc modo accipi, ut significet rem quandam, quae habet talem formam, ex qua tres dimensiones possunt in ea designari, quaecumque forma sit illa, sive ex ea possit provenire aliqua ulterior perfectio sive non. Et hoc modo corpus erit genus animalis, quia in animali nihil est accipere quod non implicite in corpore continetur. Non enim anima est alia forma ab illa, per quam in re illa poterant designari tres dimensiones; et ideo, cum dicebatur quod corpus est quod habet talem formam, ex qua possunt designari tres dimensiones in eo, intelligebatur: quaecumque forma esset, sive animalitas sive lapideitas sive quaecumque alia. Et sic forma animalis implicite in forma corporis continetur, prout corpus est genus eius.

predicado a ele, visto que nenhuma parte integral22 seria predicada a seu todo. Ora, ser possvel ver de que modo isso acontece23 se for inspecionado sob que condies feita a distino do corpo segundo o que sustentado como parte do animal, e segundo o que sustentado como gnero. Com efeito, no pode ser gnero do mesmo modo pelo qual parte integral. Portanto, este nome corpo pode ser tomado de muitos modos. Com efeito, segundo o que est no gnero da substncia, chamado corpo a partir disto: que tem tal natureza que nele podem ser designadas trs dimenses, pois as prprias trs dimenses designadas so o corpo que est no gnero da quantidade. Ora, nas coisas, acontece que aquilo que tem uma perfeio tambm se estenda perfeio ulterior: assim como patente no homem, que tanto tem a natureza sensitiva como, ulteriormente, a intelectiva. De modo semelhante, ainda, tambm a esta perfeio {do corpo} que ter tal forma de modo que nela possam ser designadas trs dimenses pode ser acrescentada outra perfeio, como a vida ou algo desse modo. Portanto, este nome corpo pode significar certa coisa que tem tal forma a partir da qual se segue nela a designabilidade de trs dimenses a modo daquilo que prescinde, a saber, de modo que no se siga a partir daquela forma nenhuma perfeio ulterior, mas, se algo diverso for acrescido a ela, estar alm da significao de corpo assim dito. E, desse modo, corpo ser a parte integral e material do animal, uma vez que, assim, a alma estar alm daquilo que significado pelo nome corpo, e ser superveniente ao prprio corpo, de modo que a partir destes dois, a saber, de alma e corpo, o animal ser constitudo tal {animal} como a partir de partes. Este nome corpo pode tambm ser tomado de modo a significar certa coisa que tem tal forma a partir da qual trs dimenses podem ser designadas nela, qualquer que seja aquela forma, quer alguma perfeio ulterior possa provir dela, quer no. Desse modo, corpo ser gnero de animal, porque no haver nada para tomar em animal que no esteja contido implicitamente em corpo. Com efeito, a alma no uma forma diversa daquela pela qual aquelas trs dimenses poderiam ser designadas na coisa; e, por isso, quando se disse que o corpo aquilo que tem tal forma a partir da qual nele podem ser designadas trs dimenses, entendeu-se, ento, qualquer forma que fosse: a alma, a petreidade ou qualquer outra. E, assim, a forma do animal est contida implicitamente na forma do corpo, na medida em que corpo gnero dela.

22 A expresso parte integral designa algo que, embora seja parte de um todo, tomado como se, por si, fosse algo independente desse todo. (N. do T.). 23 Cf. TOMS DE AQUINO, Super Sent. I d. 25 q. 1 a. 1 ad 2, referindo-se a Avicena; veja-se AVICENA, Metaph. V cap. 3 (fol 88 ra A).

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Et talis est etiam habitudo animalis ad hominem. Si enim animal nominaret tantum rem quandam, quae habet talem perfectionem, ut possit sentire et moveri per principium in ipso existens cum praecisione alterius perfectionis, tunc quaecumque alia perfectio ulterior superveniret, haberet se ad animal per modum partis et non sicut implicite contenta in ratione animalis, et sic animal non esset genus; sed est genus secundum quod significat rem quandam, ex cuius forma potest provenire sensus et motus, quaecumque sit illa forma, sive sit anima sensibilis tantum sive sensibilis et rationalis simul. Sic ergo genus significat indeterminate totum id quod est in specie, non enim significat tantum materiam; similiter etiam differentia significat totum et non significat tantum formam; et etiam diffinitio significat totum, et etiam species. Sed tamen diversimode, quia genus significat totum ut quaedam denominatio determinans id quod est materiale in re sine determinatione propriae formae. Unde genus sumitur ex materia, quamvis non sit materia, ut patet quod corpus dicitur ex hoc quod habet talem perfectionem, ut possint in eo designari tres dimensiones; quae quidem perfectio est materialiter se habens ad ulteriorem perfectionem. Differentia vero e converso est sicut quaedam denominatio a forma determinate sumpta praeter hoc quod de primo intellectu eius sit materia determinata, ut patet, cum dicitur animatum, scilicet illud quod habet animam; non enim determinatur quid sit, utrum corpus vel aliquid aliud. Unde dicit Avicenna quod genus non intelligitur in differentia sicut pars essentiae eius, sed solum sicut ens extra essentiam, sicut etiam subiectum est de intellectu passionum. Et ideo etiam genus non praedicatur de differentia per se loquendo, ut dicit philosophus in III metaphysicae et in IV topicorum, nisi forte sicut subiectum praedicatur de passione. Sed diffinitio vel species comprehendit utrumque, scilicet determinatam materiam, quam designat nomen generis, et determinatam formam, quam designat nomen differentiae. Ex hoc patet ratio quare genus, species et differentia se habent proportionaliter ad materiam et formam et

E tal tambm o vnculo de animal a homem. Com efeito, se animal nomeasse unicamente certa coisa que tem tal perfeio de modo que possa sentir e se mover pelo princpio nela existente prescindindo de outra perfeio, ento, qualquer outra perfeio que fosse superveniente estaria vinculada a animal a modo de comparte e no tal como implicitamente contida na noo animal, e, assim, animal no seria gnero. Ora, gnero segundo o que significa certa coisa a partir de cuja forma pode provir o sentido e o movimento, seja qual for aquela forma: quer seja unicamente alma sensitiva, quer seja simultaneamente alma sensitiva e racional. Portanto, assim, o gnero significa indeterminadamente tudo aquilo que h na espcie; com efeito, no significa unicamente a matria. Ainda, de modo semelhante, tambm a diferena significa o todo, e no significa unicamente a forma; e tambm a definio significa o todo, ou, ainda, a espcie {significa o todo}. Ora, {significam o todo}, no entanto, de modos diversos24: uma vez que o gnero significa o todo de modo que {significa} certa denominao que determina aquilo que material na coisa sem a determinao da forma prpria, donde o gnero ser tomado a partir da matria por mais que no seja matria ; como patente uma vez que dito corpo a partir disto que tem tal perfeio de modo que trs dimenses possam ser designadas nele, perfeio que, certamente, est vinculada materialmente perfeio ulterior. De fato, a diferena, inversamente, tal como certa denominao tomada desde a forma determinada, para alm disso que a respeito da primeira inteleco dela h a matria determinada; como patente quando se diz animado, a saber, aquilo que tem alma. Com efeito, no se determina o que , se corpo ou algo diverso: donde Avicena25 dizer que o gnero no inteligido na diferena tal como parte da essncia dela, mas unicamente assim como o ente exterior essncia, assim como tambm a respeito da inteleco das afeces h o sujeito. E, por isso, tambm o gnero no predicado diferena falando por si, como o Filsofo diz em Metafsica III e em Tpicos IV26, a no ser, talvez, assim como o sujeito predicado afeco. Ora, a definio ou a espcie compreende ambas, a saber, a matria determinada que o nome gnero designa e a forma determinada que o nome diferena designa. E, a partir disso, patente a razo pela qual27 o gnero, a espcie e a diferena esto vinculados, na natureza,

24 Em Super Sent. II d. 3 q. 1 a. 5 arg. 4, Toms de Aquino faz referncia a Avicena; cf. AVICENA Metaph. V cap. 5 (fol. 89 va D). 25 AVICENA, Metaph. V, cap. 6: O gnero ... predicado diferena de modo a ser dela concomitante, no parte de sua quididade (fol. 90 va B). 26 Metaph. III 8 (998 b 24) e Topic. IV cap. 2 (122 b 20). 27 Cf. AVICENA, Metaph. V cap. 5 (fol. 89 v D-E).

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compositum in natura, quamvis non sint idem quod illa, quia neque genus est materia, sed a materia sumptum ut significans totum, neque differentia forma, sed a forma sumpta ut significans totum. Unde dicimus hominem esse animal rationale et non ex animali et rationali, sicut dicimus eum esse ex anima et corpore. Ex anima enim et corpore dicitur esse homo, sicut ex duabus rebus quaedam res tertia constituta, quae neutra illarum est. Homo enim neque est anima neque corpus. Sed si homo aliquo modo ex animali et rationali esse dicatur, non erit sicut res tertia ex duabus rebus, sed sicut intellectus tertius ex duobus intellectibus. Intellectus enim animalis est sine determinatione specialis formae, exprimens naturam rei ab eo quod est materiale respectu ultimae perfectionis. Intellectus autem huius differentiae rationalis consistit in determinatione formae specialis. Ex quibus duobus intellectibus constituitur intellectus speciei vel diffinitionis. Et ideo sicut res constituta ex aliquibus non recipit praedicationem earum rerum, ex quibus constituitur, ita nec intellectus recipit praedicationem eorum intellectuum, ex quibus constituitur. Non enim dicimus quod diffinitio sit genus aut differentia. Quamvis autem genus significet totam essentiam speciei, non tamen oportet ut diversarum specierum, quarum est idem genus, sit una essentia, quia unitas generis ex ipsa indeterminatione vel indifferentia procedit, non autem ita, quod illud quod significatur per genus sit una natura numero in diversis speciebus, cui superveniat res alia, quae sit differentia determinans ipsum, sicut forma determinat materiam, quae est una numero, sed quia genus significat aliquam formam, non tamen determinate hanc vel illam, quam determinate differentia exprimit, quae non est alia quam illa, quae indeterminate significabatur per genus. Et ideo dicit Commentator in XI metaphysicae quod materia prima dicitur una per remotionem omnium formarum, sed genus dicitur unum per communitatem formae significatae. Unde patet quod per additionem differentiae remota illa indeterminatione, quae erat causa unitatis generis, remanent species per essentiam diversae.

proporcionalmente matria e forma e ao composto, por mais que no sejam o mesmo que esses: uma vez que nem o gnero a matria, mas tomado desde a matria de modo que significa o todo; nem a diferena a forma, mas tomada desde a forma de modo que significa o todo. Donde dizemos que homem seja animal racional, e no {que homem seja} a partir de animal e racional assim como dizemos que ele seja a partir de alma e corpo. Com efeito, o homem dito ser a partir de alma e corpo assim como, a partir de duas coisas, h uma terceira coisa constituda que no nenhuma daquelas: com efeito, o homem nem alma nem corpo. Ora, se o homem for de algum modo dito ser a partir de animal e racional, no ser assim como uma terceira coisa a partir de duas coisas, mas tal como uma terceira inteleco a partir de duas inteleces. Com efeito, a inteleco de animal se d sem a determinao da forma especial, que exprime a natureza da coisa desde aquilo que material com relao perfeio ltima; ora, a inteleco da diferena racional consiste na determinao da forma especial: a partir dessas duas inteleces constituda a inteleco da espcie ou da definio. E, por isso, assim como a coisa constituda a partir de alguns no recebe a predicao daquelas coisas a partir das quais constituda, assim, tambm a inteleco no recebe a predicao daquelas inteleces a partir das quais constituda; com efeito, no dizemos que a definio seja o gnero ou a diferena. Ora, ainda que o gnero signifique toda a essncia da espcie, no preciso, porm, que haja uma nica essncia das diversas espcies das quais h o mesmo gnero, posto que a unidade do gnero procede da prpria indeterminao ou indiferena {da essncia da espcie}, mas {procede} no de modo que aquilo que significado pelo gnero seja uma nica natureza em nmero nas diversas espcies, qual sobrevenha outra coisa que seja a diferena que determina aquilo {que significado pelo gnero} assim como a forma determina a matria, que una em nmero, mas {a unidade do gnero procede da prpria indeterminao ou indiferena} porque o gnero significa alguma forma no, porm, determinadamente esta ou aquela que exprime determinadamente a diferena, a qual no outra {forma} alm dessa que ser significada pelo gnero de modo indeterminado. E, por isso, o Comentador diz em Metafsica XI que a matria prima dita una pela remoo de todas as formas, mas o gnero dito uno pela comunidade das formas significadas28. Donde patente que, pela adio da diferena, removida aquela

28 AVERRIS, Metaph. XI (=XII) comm. 14: [Aristteles] tinha a inteno de declarar a diferena entre a natureza da matria no ser e a natureza da forma universal, e maximamente daquilo que o gnero... Ora, esta comunidade, que inteligida na matria, pura privao, dado que no seja inteligida seno segundo a ablao das formas individuais dela (fol. 141 va-vb).

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Et quia, ut dictum est, natura speciei est indeterminata respectu individui sicut natura generis respectu speciei, inde est quod sicut id quod est genus, prout praedicabatur de specie, implicabat in sua significatione, quamvis indistincte, totum quod determinate est in specie, ita etiam et id quod est species, secundum quod praedicatur de individuo, oportet quod significet totum id quod est essentialiter in individuo, licet indistincte. Et hoc modo essentia speciei significatur nomine hominis, unde homo de Socrate praedicatur. Si autem significetur natura speciei cum praecisione materiae designatae, quae est principium individuationis, sic se habebit per modum partis. Et hoc modo significatur nomine humanitatis; humanitas enim significat id unde homo est homo. Materia autem designata non est id unde homo est homo; et ita nullo modo continetur inter illa, ex quibus homo habet quod sit homo. Cum ergo humanitas in suo intellectu includat tantum ea, ex quibus homo habet quod sit homo, patet quod a significatione eius excluditur vel praeciditur materia designata. Et quia pars non praedicatur de toto, inde est quod humanitas nec de homine nec de Socrate praedicatur. Unde dicit Avicenna quod quiditas compositi non est ipsum compositum, cuius est quiditas, quamvis etiam ipsa quiditas sit composita, sicut humanitas, licet sit composita, non est homo, immo oportet quod sit recepta in aliquo quod est materia designata. Sed quia, ut dictum est, designatio speciei respectu generis est per formam, designatio autem individui respectu speciei est per materiam, ideo oportet ut nomen significans id, unde natura generis sumitur, cum praecisione formae determinatae perficientis speciem significet partem materialem totius, sicut corpus est pars materialis hominis. Nomen autem significans id, unde sumitur natura speciei cum praecisione materiae designatae, significat partem formalem. Et ideo humanitas significatur ut forma quaedam, et dicitur quod est forma totius, non quidem quasi superaddita partibus essentialibus, scilicet formae et materiae, sicut forma

indeterminao que era a causa da unidade do gnero, as espcies permanecem diversas pela essncia. E, como foi dito, posto que a natureza da espcie indeterminada com relao ao indivduo assim como a natureza do gnero com relao espcie, da h que, assim como aquilo que o gnero, na medida em que era predicado espcie, implicava na significao dele por mais que indistintamente tudo que est determinadamente na espcie, do mesmo modo, ainda, tambm preciso que aquilo que a espcie, segundo o que predicada ao indivduo, signifique tudo aquilo que est essencialmente no indivduo, embora indistintamente. E, desse modo, a essncia da espcie significada pelo nome homem, donde homem ser predicado a Scrates. Ora, se a natureza da espcie fosse significada prescindida a matria designada que o princpio de individuao, ento, {a natureza da espcie} estaria vinculada {ao indivduo} a modo de parte; e , desse modo, significada pelo nome humanidade. Com efeito, humanidade significa aquilo de onde o homem homem. Ora, a matria designada no aquilo de onde o homem homem, e, assim, no est contida de nenhum modo entre aqueles a partir dos quais o homem tem o ser homem. Portanto, visto que a humanidade na sua inteleco inclua unicamente aqueles a partir dos quais o homem tem o ser homem, patente que a matria designada excluda ou prescindida da significao; e, uma vez que a parte no predicada ao todo, h da que humanidade nem predicada a homem nem a Scrates. Donde Avicena dizer que a quididade do composto no o prprio composto do qual quididade, por mais que a prpria quididade seja tambm composta; assim como a humanidade, por mais que seja composta, no o homem29. Pelo contrrio: {para que a humanidade seja o homem,} preciso que seja recebida em algo que a matria designada. Mas, como foi dito, posto que a designao da espcie com relao ao gnero se d pela forma enquanto a designao do indivduo com relao espcie se d pela matria, ento, preciso que o nome que significa aquilo de onde tomada a natureza do gnero prescindida a forma determinada que perfaz a espcie signifique a parte material do todo, assim como o corpo a parte material do homem; ora, o nome que significa aquilo de onde tomada a natureza da espcie, prescindida a matria designada, significa a parte formal. E, ento, a humanidade significada

29 AVICENA, Metaph. V cap. 5: A quididade aquilo que tudo que forma existente em conjunto com a matria... o composto ainda no esta inteno, porque {a inteno} composta a partir de forma e de matria: com efeito, esta a quididade do composto, e a quididade esta composio (fol. 90 ra F).

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domus superadditur partibus integralibus eius, sed magis est forma, quae est totum scilicet formam complectens et materiam, tamen cum praecisione eorum, per quae nata est materia designari. Sic igitur patet quod essentiam hominis significat hoc nomen homo et hoc nomen humanitas, sed diversimode, ut dictum est, quia hoc nomen homo significat eam ut totum, in quantum scilicet non praecidit designationem materiae, sed implicite, continet eam et indistincte, sicut dictum est quod genus continet differentiam; et ideo praedicatur hoc nomen homo de individuis. Sed hoc nomen humanitas significat eam ut partem, quia non continet in significatione sua nisi id, quod est hominis in quantum est homo, et praecidit omnem designationem. Unde de individuis hominis non praedicatur. Et propter hoc etiam nomen essentiae quandoque invenitur praedicatum in re, dicimus enim Socratem esse essentiam quandam; et quandoque negatur, sicut dicimus quod essentia Socratis non est Socrates.

CAPITVLVM III Viso igitur quid significetur nomine essentiae in substantiis compositis videndum est quomodo se habeat ad rationem generis, speciei et differentiae. Quia autem id, cui convenit ratio generis vel speciei vel differentiae, praedicatur de hoc singulari signato, impossibile est quod ratio universalis, scilicet generis vel speciei, conveniat essentiae secundum quod per modum partis significatur, ut nomine humanitatis vel animalitatis. Et ideo dicit Avicenna quod rationalitas non est differentia, sed differentiae principium; et eadem ratione humanitas non est species nec animalitas genus. Similiter etiam non potest dici quod ratio generis vel speciei conveniat essentiae, secundum quod est quaedam res exsistens extra singularia, ut Platonici ponebant, quia sic genus et species non praedicarentur de hoc individuo; non enim potest dici quod Socrates sit hoc quod ab eo separatum est; nec iterum illud separatum proficeret in cognitionem huius singularis. Et ideo relinquitur quod ratio generis vel speciei conveniat essentiae, secundum quod significatur per modum totius, ut nomine hominis vel animalis, prout

como certa forma, e dita30 aquilo que a forma do todo; certamente no como se acrescida s partes essenciais, a saber, a forma e a matria, assim como a forma da casa acrescida s partes integrais dela: mas, antes, a forma que o todo, a saber, a forma que tambm faz a complexo com a matria, ainda que prescindidos aqueles pelos quais a matria naturalmente designada. Portanto, patente, desse modo, que este nome homem e este nome humanidade significam a essncia do homem, mas de modos diversos, como foi dito: uma vez que este nome homem significa aquela {essncia} como todo, a saber, enquanto no prescinde da designao da matria, mas contm aquela {designao} implicitamente e indistintamente, assim como foi dito que o gnero contm a diferena eis por que este nome homem predicado aos indivduos. Mas este nome humanidade significa aquela {essncia} como parte, porque no contm na sua significao seno aquilo que do homem enquanto homem, e prescinde de toda designao; donde {o nome humanidade} no ser predicado aos homens individuais. E em razo disso, s vezes se acha o nome essncia predicado coisa; com efeito, dizemos que Scrates seja certa essncia; e, s vezes, isso negado, assim como dizemos que a essncia de Scrates no Scrates.

3 Captulo Portanto, visto o que teria sido significado pelo nome essncia nas substncias compostas, cumpre ver de que modo {este nome} estaria vinculado noo de gnero, de espcie e de diferena. Ora, posto que aquilo a que convm a noo de gnero ou de espcie ou de diferena predicado a este singular assinalado, impossvel que a noo universal, a saber, de gnero e de espcie, seja conveniente essncia segundo o que significada a modo de parte, como pelo nome humanidade ou animalidade. Donde Avicena dizer que a racionalidade no a diferena, mas o princpio da diferena31; e, pela mesma razo, humanidade no espcie, nem animalidade gnero. De modo semelhante, ainda, no pode ser dito que a noo de gnero ou de espcie seja conveniente essncia segundo o que certa coisa existente fora dos singulares, como sustentavam os Platnicos, uma vez que, assim, o gnero e a espcie no seriam predicados a este indivduo; com efeito, no pode ser dito que Scrates seja isto que separado dele, nem, ainda, esse separado seria de proveito para o conhecimento daquele singular. E, por isso, resta que

30 Cf. TOMS DE AQUINO, Super Sent. I d. 23 q. 1 a. 1; de um modo um pouco diverso, ALBERTO MAGNO, De IV coaequevis tr. 4 q. 20 a. 1: Ora, digo forma do todo aquela forma que predicvel a todo composto, assim como homem a forma de Scrates (Borgnet 34, 460 a-b). 31 AVICENA, Metaph. V cap. 6: A diferena no tal qual a racionalidade e a sensibilidade... Portanto, mais conveniente que estes sejam o princpio das diferenas, no as diferenas (fol. 90 rb A).

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implicite et indistincte continet totum hoc, quod in individuo est. Natura autem vel essentia sic accepta potest dupliciter considerari: uno modo, secundum rationem propriam, et haec est absoluta consideratio ipsius. Et hoc modo nihil est verum de ea nisi quod convenit sibi secundum quod huiusmodi. Unde quicquid aliorum attribuatur sibi, falsa est attributio. Verbi gratia, homini in eo quod est homo convenit rationale et animal et alia, quae in diffinitione eius cadunt. Album vero aut nigrum vel quicquid huiusmodi, quod non est de ratione humanitatis, non convenit homini in eo quod homo. Unde si quaeratur utrum ista natura sic considerata possit dici una vel plures, neutrum concedendum est, quia utrumque est extra intellectum humanitatis et utrumque potest sibi accidere. Si enim pluralitas esset de intellectu eius, nunquam posset esse una, cum tamen una sit secundum quod est in Socrate. Similiter si unitas esset de ratione eius, tunc esset una et eadem Socratis et Platonis nec posset in pluribus plurificari. Alio modo consideratur secundum esse quod habet in hoc vel in illo, et sic de ipsa aliquid praedicatur per accidens ratione eius, in quo est, sicut dicitur quod homo est albus, quia Socrates est albus, quamvis hoc non conveniat homini in eo quod homo. Haec autem natura duplex habet esse, unum in singularibus et aliud in anima, et secundum utrumque consequuntur dictam naturam accidentia. Et in singularibus etiam habet multiplex esse secundum singularium diversitatem et tamen ipsi naturae secundum suam primam considerationem, scilicet absolutam, nullum istorum esse debetur. Falsum enim est dicere

a noo de gnero ou de espcie seja conveniente essncia segundo o que significada a modo de todo, como pelo nome homem ou animal, na medida em que contm implcita e indistintamente tudo isto que h no indivduo. Ora, assim tomada,32 a natureza ou essncia pode ser considerada de dois modos. {1:} De um modo, segundo a noo prpria, e essa sua considerao absoluta: e desse modo nada verdadeiro a respeito dessa natureza ou essncia a no ser aquilo que a ela conveniente em conformidade com esse modo, donde haver uma falsa atribuio quanto a tudo o mais que a ela for atribudo. Por exemplo, ao homem, naquilo que homem, convm o racional, o animal e outros que entram em sua definio; ora, o branco e o negro, ou o que quer que seja de modo que no diz respeito noo humanidade, no conveniente ao homem naquilo que homem. Por conseguinte, se for perguntado se essa natureza assim considerada poderia ser dita una ou vrias, nem uma nem outra deve ser concedida, posto que uma e outra est fora da inteleco humanidade, e uma e outra pode ser o caso para ela {i.e., para a humanidade}. Com efeito, se a pluralidade dissesse respeito inteleco humanidade, jamais {a humanidade} poderia ser una, ainda que, no entanto, seja una segundo o que h {humanidade} em Scrates. De modo semelhante, se a unidade dissesse respeito noo humanidade, ento seria una e a mesma {a humanidade} de Scrates e de Plato, e no poderia multiplicar-se em vrios33. {2:} De outro modo, {a natureza ou essncia} considerada segundo o ser que tem nisto ou naquilo: e, assim, algo predicado a ela por acidente em razo daquilo em que h {tal natureza ou essncia}, assim como se diz que o homem branco porque Scrates branco, embora isso no seja conveniente ao homem naquilo que homem. Ora, esta natureza {considerada segundo o ser que tem nisto ou naquilo} tem um duplo ser: um nos singulares e outro na alma, e, segundo cada um deles, os acidentes se seguem dita natureza; ademais, nos singulares tem ser mltiplo segundo a diversidade dos singulares. E, no entanto, nenhum destes {dois modos de} ser devido prpria natureza segundo sua primeira considerao, a

32 Isto , tomada na medida em que contm implcita e indistintamente tudo isto que h no indivduo. (N. do T.). 33 Nesse trecho, Toms de Aquino busca declarar o que constitui a noo prpria ou a considerao absoluta de uma natureza. Para faz-lo, delimita tal constituinte quilo que puder ser incondicionalmente atribudo a tudo que se disser possuidor de tal natureza. Assim, os dois argumentos relatados, a respeito da inteleco e da noo, ilustram um nico ponto: que a unidade ou a pluralidade no cabem noo prpria ou considerao absoluta da natureza do homem. De algum modo, o exemplo supe que apenas seria possvel conceder a pluralidade como um predicado da inteleco humanidade se a pluralidade fosse uma caracterstica definidora da prpria humanidade. O mesmo, proporcionalmente, concludo a respeito da predicao da unidade noo humanidade. (N. do T.).

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quod essentia hominis in quantum huiusmodi habeat esse in hoc singulari, quia si esse in hoc singulari conveniret homini in quantum est homo, nunquam esset extra hoc singulare. Similiter etiam si conveniret homini in quantum est homo non esse in hoc singulari, nunquam esset in eo. Sed verum est dicere quod homo non in quantum est homo habet quod sit in hoc singulari vel in illo aut in anima. Ergo patet quod natura hominis absolute considerata abstrahit a quolibet esse, ita tamen quod non fiat praecisio alicuius eorum. Et haec natura sic considerata est quae praedicatur de individuis omnibus. Non tamen potest dici quod ratio universalis conveniat naturae sic acceptae, quia de ratione universalis est unitas et communitas. Naturae autem humanae neutrum horum convenit secundum suam absolutam considerationem. Si enim communitas esset de intellectu hominis, tunc in quocumque inveniretur humanitas inveniretur communitas. Et hoc falsum est, quia in Socrate non invenitur communitas aliqua, sed quicquid est in eo est individuatum. Similiter etiam non potest dici quod ratio generis vel speciei accidat naturae humanae secundum esse quod habet in individuis, quia non invenitur in individuis natura humana secundum unitatem, ut sit unum quid omnibus conveniens, quod ratio universalis exigit. Relinquitur ergo quod ratio speciei accidat naturae humanae secundum illud esse quod habet in intellectu. Ipsa enim natura humana in intellectu habet esse abstractum ab omnibus individuantibus, et ideo habet rationem uniformem ad omnia individua, quae sunt extra animam, prout aequaliter est similitudo omnium et ducens in omnium cognitionem in quantum sunt homines. Et ex hoc quod talem relationem habet ad omnia individua intellectus adinvenit rationem speciei et attribuit sibi. Unde dicit Commentator in principio de anima quod intellectus est qui agit universalitatem in rebus. Hoc etiam Avicenna dicit in sua metaphysica. Et quamvis haec natura intellecta habeat rationem universalis secundum quod

saber, a absoluta. Com efeito, falso dizer que a essncia de homem, enquanto desse modo34, tenha ser neste singular, uma vez que, se ser neste singular fosse conveniente ao homem enquanto homem, jamais seria fora deste singular; de modo semelhante, ainda, se fosse conveniente ao homem enquanto homem no ser neste singular, jamais seria nele: mas verdadeiro dizer que o homem, no enquanto homem, tem o ser neste ou naquele singular ou na alma. Portanto, patente que a natureza de homem absolutamente considerada abstrai de seja qual for o ser, no entanto, de modo que no se d que prescinda de algum deles {i.e., de algum dos homens}. E essa natureza assim considerada {i.e., absolutamente} a que predicada a todos os indivduos. No entanto, no pode ser dito que a noo universal seja conveniente natureza assim tomada {i.e., absolutamente}, posto que a unidade e a comunidade dizem respeito noo universal; ora, nem uma nem outra convm natureza humana segundo sua considerao absoluta. Com efeito, se a comunidade dissesse respeito inteleco de homem, ento, em qualquer um que fosse encontrada a humanidade, seria encontrada a comunidade; e isso falso35, uma vez que em Scrates no encontrada nenhuma comunidade, mas tudo que h nele individuado. De modo semelhante, ainda, no pode ser dito que a noo de gnero ou de espcie seja o caso para a natureza humana segundo o ser que {a natureza humana} tem nos indivduos36, uma vez que, nos indivduos, no encontrada a natureza humana segundo a unidade de modo que seja uno o que conveniente para todos, o que exigido pela noo universal. Portanto, resta que a noo de espcie seja o caso para a natureza humana segundo aquele ser que tem no intelecto. Com efeito, a prpria natureza humana, no intelecto, tem um ser que abstrado de tudo o que individualizante; e, por isso, tem uma noo uniforme para todos os indivduos que so fora da alma, na medida em que igualmente semelhana para todos e conduz ao conhecimento de todos enquanto so homens. E a partir disso que tem tal relao com todos os indivduos, o intelecto chega noo de espcie e atribui a ela; donde o Comentador dizer, no princpio do Sobre a alma, que o intelecto quem, na universalidade, age pelas coisas37; Avicena tambm diz isso em sua Metafsica38. E por mais que essa natureza inteligida

34 Isto , enquanto absolutamente considerada. (N. do T.). 35 Afinal, se a comunidade fosse algo prprio quilo mesmo que inteligido (e no prpria inteleco/ato intelectual), ento, haveria a comunidade em qualquer indivduo inteligido, o que seria contraditrio. (N. do T.). 36 Isto , segundo o ser que tem nisto e naquilo. (N. do T.). 37 AVERRIS, De anima I comm. 8 (p. 12 lin. 25). 38 AVICENA, Metaph. V cap. 2 (fol. 87 v).

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comparatur ad res extra animam, quia est una similitudo omnium, tamen secundum quod habet esse in hoc intellectu vel in illo est quaedam species intellecta particularis. Et ideo patet defectus Commentatoris in III de anima, qui voluit ex universalitate formae intellectae unitatem intellectus in omnibus hominibus concludere, quia non est universalitas illius formae secundum hoc esse quod habet in intellectu, sed secundum quod refertur ad res ut similitudo rerum, sicut etiam, si esset una statua corporalis repraesentans multos homines, constat quod illa imago vel species statuae haberet esse singulare et proprium secundum quod esset in hac materia, sed haberet rationem communitatis secundum quod esset commune repraesentativum plurium. Et quia naturae humanae secundum suam absolutam considerationem convenit quod praedicetur de Socrate, et ratio speciei non convenit sibi secundum suam absolutam considerationem, sed est de accidentibus, quae consequuntur eam secundum esse, quod habet in intellectu, ideo nomen speciei non praedicatur de Socrate, ut dicatur: Socrates est species, quod de necessitate accideret, si ratio speciei conveniret homini secundum esse, quod habet in Socrate vel secundum suam considerationem absolutam, scilicet in quantum est homo. Quicquid enim convenit homini in quantum est homo praedicatur de Socrate. Et tamen praedicari convenit generi per se, cum in eius diffinitione ponatur. Praedicatio enim est quiddam, quod completur per actionem intellectus componentis et dividentis, habens fundamentum in re ipsa unitatem eorum, quorum unum de altero dicitur. Unde ratio praedicabilitatis potest claudi in ratione huius intentionis, quae est genus, quae similiter per actum intellectus completur. Nihilominus tamen id, cui intellectus intentionem praedicabilitatis attribuit, componens illud cum altero, non est ipsa intentio generis, sed potius illud, cui intellectus intentionem generis attribuit, sicut quod significatur hoc nomine animal. Sic ergo patet qualiter essentia vel natura se habet ad rationem speciei, quia ratio speciei non est de his, quae conveniunt ei secundum suam absolutam considerationem, neque est de accidentibus, quae consequuntur ipsam secundum esse, quod habet extra animam, ut albedo et nigredo, sed est de accidentibus, quae consequuntur eam secundum esse, quod habet in

tenha uma noo universal segundo o que comparada s coisas fora da alma, posto que a similitude una de tudo, no entanto, segundo o que tem ser neste intelecto ou naquele certa espcie inteligida particular. E, por isso, patente a falha do Comentador, em Sobre a alma III39, que quis concluir a unidade do intelecto em todos os homens a partir da universalidade da forma inteligida; uma vez que a universalidade daquela forma no segundo este ser que tem no intelecto, mas segundo o que referida coisa enquanto similitude das coisas; assim como, ainda, se houvesse uma esttua corporal que representasse muitos homens, consta que aquela imagem ou espcie da esttua teria um ser singular e prprio segundo o que viesse a ser nesta matria, mas teria a noo de comunidade segundo o que seria o comum que representa a muitos. Posto que convm que, segundo sua considerao absoluta, a natureza humana seja predicada a Scrates e que a noo de espcie no convm quela {natureza} segundo a considerao absoluta dessa natureza ora, {a noo de espcie} diz respeito aos acidentes que se seguem natureza humana segundo o ser que {esta} tem no intelecto , ento, o nome espcie no predicado a Scrates de modo a dizer Scrates espcie, o que aconteceria necessariamente se a noo de espcie fosse conveniente a homem segundo o ser que {a natureza humana} tem em Scrates, ou segundo a considerao absoluta dela {i.e., da natureza humana}, a saber, enquanto {Scrates} homem; com efeito, tudo o que convm ao homem enquanto homem predicado a Scrates. E, no entanto, ao gnero convm ser predicado por si {a Scrates}, como sustentado em sua definio. Com efeito, a predicao algo concludo pela ao do intelecto que compe e que divide, tendo fundamento na prpria coisa a unidade daqueles dos quais um dito a respeito do outro. Por conseguinte, a noo de predicabilidade pode ser encerrada na noo daquela inteno que o gnero, {predicabilidade} que, de modo semelhante, concluda pelo ato do intelecto. Mas aquilo a que o intelecto atribui a noo de predicabilidade ao comp-lo com outro no a prpria inteno gnero, mas, antes, aquilo a que o intelecto atribui a inteno gnero, assim como o que significado por este nome animal. Assim, ento, fica patente sob que condies a essncia ou natureza est vinculada noo de espcie, uma vez que a noo de espcie no diz respeito queles que so convenientes essncia ou natureza segundo a sua considerao absoluta, nem diz respeito aos acidentes que a ela se seguem segundo o ser que ela tem fora da alma, como a brancura e a negrura, mas {a noo de espcie} diz respeito aos acidentes que se seguem essncia ou

39 AVERRIS, De anima III comm. 5 (sobretudo nas p. 399-413).

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intellectu, et per hunc modum convenit etiam sibi ratio generis vel differentiae.

CAPITVLVM IV Nunc restat videre per quem modum sit essentia in substantiis separatis, scilicet in anima, intelligentia et causa prima. Quamvis autem simplicitatem causae primae omnes concedant, tamen compositionem formae et materiae quidam nituntur inducere in intelligentias et in animam, cuius positionis auctor videtur fuisse Avicebron, auctor libri fontis vitae. Hoc autem dictis philosophorum communiter repugnat, qui eas substantias a materia separatas nominant et absque omni materia esse probant. Cuius demonstratio potissima est ex virtute intelligendi, quae in eis est. Videmus enim formas non esse intelligibiles in actu nisi secundum quod separantur a materia et a condicionibus eius; nec efficiuntur intelligibiles in actu, nisi per virtutem substantiae intelligentis secundum quod recipiuntur in ea et secundum quod aguntur per eam. Unde oportet quod in qualibet substantia intelligente sit omnino immunitas a materia, ita quod neque habeat materiam partem sui neque etiam sit sicut forma impressa in materia, ut est de formis materialibus. Nec potest aliquis dicere quod intelligibilitatem non impediat materia quaelibet, sed materia corporalis tantum. Si enim hoc esset ratione materiae corporalis tantum, cum materia non dicatur corporalis nisi secundum quod stat sub forma corporali, tunc oporteret quod hoc haberet materia, scilicet impedire intelligibilitatem, a forma corporali. Et hoc non potest esse, quia ipsa etiam forma corporalis actu intelligibilis est, sicut et aliae formae, secundum quod a materia abstrahitur. Unde in anima vel in intelligentia nullo modo est compositio ex materia et forma, ut hoc modo accipiatur essentia in eis sicut in substantiis corporalibus, sed est ibi compositio formae et esse. Unde in commento IX propositionis libri de causis dicitur quod intelligentia est habens formam et esse, et accipitur ibi forma pro ipsa quiditate vel natura simplici. Et quomodo hoc sit planum est videre. Quaecumque enim ita se habent ad invicem quod unum est causa esse

natureza segundo o ser que ela tem no intelecto. E de tal modo40 convm ainda essncia ou natureza a noo de gnero ou de diferena.

4 Captulo Agora resta ver por qual modo h essncia nas substncias separadas, a saber, na alma, na inteligncia e na causa primeira. Ora, por mais que todos concedam a simplicidade da causa primeira, alguns, no entanto, se esforam a fim de introduzir a composio de forma e matria nas inteligncias e na alma. V-se que o autor dessa posio tenha sido Avicebron, o autor do livro Fonte da vida41, mas isso incompatvel com o que geralmente dizem os filsofos, posto que nomeiam tais substncias de separadas da matria e provam que elas sejam afastadas de toda matria. A demonstrao disso potssima, desde que se entenda o que h nelas. Com efeito, vemos que as formas no sejam inteligveis em ato seno em virtude da substncia inteligente, segundo o que so recebidas nela e segundo o que agem por meio dela. Por conseguinte, preciso haver total imunidade da matria em qualquer substncia inteligente, de modo que nem tenha a matria como parte de si, nem, ainda, seja assim como a forma impressa na matria, como se d com as formas materiais. E no possvel que algum diga que no qualquer matria que impede a inteligibilidade, mas apenas a matria corporal. Com efeito, se isso {i.e., o impedimento da inteligibilidade} se desse unicamente em razo da matria corporal, dado que a matria no seja dita corporal seno segundo o que se mantm sob a forma corporal, ento, seria preciso que a matria tivesse isso, a saber, o impedir a inteligibilidade, a partir da forma corporal; e isso no pode se dar, posto que at mesmo a prpria forma corporal inteligvel em ato tal como tambm as outras formas segundo o que abstrada da matria. Donde no h de nenhum modo na alma ou na inteligncia a composio a partir de matria e forma, pois, desse modo, a essncia seria tomada nelas como nas substncias corporais. Mas h ali a composio entre forma e ser; donde se diz no comentrio da nona proposio do livro Sobre as causas que a inteligncia aquilo que tem forma e ser42: e, ali, toma-se forma pela prpria quididade ou natureza simples. E fcil de se ver de que modo isso se d. Com efeito, em todos os vinculados entre si de modo que um causa de ser

40 Isto , segundo o ser que a natureza ou essncia tem no intelecto. (N. do T.). 41 Cf. Cl. BAEUMKER, Avencebrolis (Ibn Gebirol) Fons vitae ex arabico in latinum translatus, Monasterii 1895; sobretudo no tr. IV De inquisitione scientie materie et forme in substantiis simplicibus. Ao qual muitos seguem, diz Toms em Super Sent. II d. 3 q. 1 a. 1. 42 De causis prop. 9 comm.: E a inteligncia aquilo que tem yliatim, visto que ser e forma (ed. H.-D. Saffrey, p. 57 b; ed. A. Pattin, 90).

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alterius, illud quod habet rationem causae potest habere esse sine altero, sed non convertitur. Talis autem invenitur habitudo materiae et formae, quia forma dat esse materiae. Et ideo impossibile est esse materiam sine aliqua forma. Tamen non est impossibile esse aliquam formam sine materia. Forma enim non habet in eo quod est forma dependentiam ad materiam, sed si inveniantur aliquae formae, quae non possunt esse nisi in materia, hoc accidit eis secundum quod sunt distantes a primo principio, quod est actus primus et purus. Unde illae formae, quae sunt propinquissimae primo principio, sunt formae per se sine materia subsistentes (non enim forma secundum totum genus suum materia indiget, ut dictum est) et huiusmodi formae sunt intelligentiae. Et ideo non oportet ut essentiae vel quiditates harum substantiarum sint aliud quam ipsa forma. In hoc ergo differt essentia substantiae compositae et substantiae simplicis quod essentia substantiae compositae non est tantum forma, sed complectitur formam et materiam, essentia autem substantiae simplicis est forma tantum. Et ex hoc causantur duae aliae differentiae: una est quod essentia substantiae compositae potest significari ut totum vel ut pars, quod accidit propter materiae designationem, ut dictum est. Et ideo non quolibet modo praedicatur essentia rei compositae de ipsa re composita; non enim potest dici quod homo sit quiditas sua. Sed essentia rei simplicis, quae est sua forma, non potest significari nisi ut totum, cum nihil sit ibi praeter formam quasi formam recipiens; et ideo quocumque modo sumatur essentia substantiae simplicis de ea praedicatur. Unde Avicenna dicit quod quiditas simplicis est ipsummet simplex, quia non est aliquid aliud recipiens ipsam. Secunda differentia est quod essentiae rerum compositarum ex eo quod recipiuntur in materia designata multiplicantur secundum divisionem eius, unde contingit quod aliqua sint idem specie et diversa numero. Sed cum essentia simplicis non sit recepta in materia, non potest ibi esse talis multiplicatio; et ideo oportet ut non inveniantur in illis substantiis plura individua eiusdem speciei, sed quot sunt ibi individua, tot sunt ibi species, ut Avicenna expresse dicit. Huiusmodi ergo substantiae quamvis sint formae tantum sine materia, non tamen in eis est omnimoda simplicitas nec sunt actus purus, sed habent permixtionem

do outro, aquele que tem a noo de causa pode ter ser sem o outro, mas no se d o inverso. Ora, entre a matria e a forma encontra-se uma tal vinculao, pois a forma d ser matria, e, por isso, impossvel haver matria sem alguma forma; no entanto, no impossvel haver alguma forma sem matria, com efeito, a forma, naquilo que forma, no tem dependncia com a matria. Mas se forem encontradas algumas formas que no podem ser seno na matria, isso acontece para elas segundo o que so distantes do primeiro princpio que o ato primeiro e puro. Donde aquelas formas que so maximamente prximas do primeiro princpio so as formas subsistentes por si sem a matria, com efeito, como foi dito, no segundo todo o seu gnero que a forma carece de matria; e as formas desse modo so inteligncias, e, por isso, no preciso que as essncias ou quididades daquelas substncias sejam algo que no a prpria forma. Portanto, a essncia da substncia composta e da substncia simples diferem nisto: que a essncia da substncia composta no a forma unicamente, mas abarca a forma e a matria; ora, a essncia da substncia simples a forma unicamente. E, a partir disso, so causadas outras duas diferenas. Uma que a essncia da substncia composta pode ser significada como todo ou como parte, o que acontece em razo da designao da matria, como foi dito. E, por isso, a essncia da coisa composta no predicada de qualquer modo prpria coisa composta; com efeito, no pode ser dito: o homem sua quididade. Mas a essncia da coisa simples que sua forma no pode ser significada seno como todo, dado que nada h ali alm da forma, como se um recipiente da forma; e, por isso, de qualquer modo que for tomada, a essncia da substncia simples predicada prpria {coisa simples}. Donde Avicena dizer que a quididade do simples o prprio simples43, posto que no h algo diverso a receb-la. H uma segunda diferena, posto que as essncias das coisas compostas, disso que so recebidas na matria designada, so multiplicadas segundo a diviso dela {i.e., da matria designada}, donde acontece que algumas so iguais em espcie e diversas em nmero. Mas dado que a essncia simples no seja recebida na matria, no pode haver ali tal multiplicidade; e, por isso, preciso que naquelas substncias no sejam encontrados vrios indivduos da mesma espcie, mas tantos so ali os indivduos quantas so ali as espcies, como Avicena diz expressamente44. Portanto, nas essncias desse modo45, por mais que sejam unicamente formas sem matria, no h, no entanto, simplicidade de todos os modos, nem so ato puro, mas tm

43 AVICENA, Metaph. V cap. 5 (fol. 90 ra F). 44 AVICENA, Metaph. V cap. 2 (fol. 87 va A). 45 A saber, nas essncias simples (N. do T.).

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potentiae. Et hoc sic patet. Quicquid enim non est de intellectu essentiae vel quiditatis, hoc est adveniens extra et faciens compositionem cum essentia, quia nulla essentia sine his, quae sunt partes essentiae, intelligi potest. Omnis autem essentia vel quiditas potest intelligi sine hoc quod aliquid intelligatur de esse suo; possum enim intelligere quid est homo vel Phoenix et tamen ignorare an esse habeat in rerum natura. Ergo patet quod esse est aliud ab essentia vel quiditate, nisi forte sit aliqua res, cuius quiditas sit ipsum suum esse; et haec res non potest esse nisi una et prima, quia impossibile est, ut fiat plurificatio alicuius nisi per additionem alicuius differentiae, sicut multiplicatur natura generis in species, vel per hoc quod forma recipitur in diversis materiis, sicut multiplicatur natura speciei in diversis individuis, vel per hoc quod unum est absolutum et aliud in aliquo receptum, sicut si esset quidam calor separatus, esset alius a calore non separato ex ipsa sua separatione. Si autem ponatur aliqua res, quae sit esse tantum, ita ut ipsum esse sit subsistens, hoc esse non recipiet additionem differentiae, quia iam non esset esse tantum, sed esse et praeter hoc forma aliqua; et multo minus reciperet additionem materiae, quia iam esset esse non subsistens sed materiale. Unde relinquitur quod talis res, quae sit suum esse, non potest esse nisi una. Unde oportet quod in qualibet alia re praeter eam aliud sit esse suum et aliud quiditas vel natura seu forma sua. Unde oportet quod in intelligentiis sit esse praeter formam; et ideo dictum est quod intelligentia est forma et esse. Omne autem quod convenit alicui vel est causatum ex principiis naturae suae, sicut risibile in homine, vel advenit ab aliquo principio extrinseco, sicut lumen in aere ex influentia solis. Non autem potest esse quod ipsum esse sit causatum ab ipsa forma vel quiditate rei (dico sicut a causa efficiente) quia sic aliqua res esset sui ipsius causa et aliqua res seipsam in esse produceret, quod est impossibile. Ergo oportet quod omnis talis res, cuius esse est aliud quam natura sua habeat esse ab alio. Et quia omne, quod est per aliud, reducitur ad illud quod est per se sicut ad causam primam, oportet quod sit aliqua res, quae sit causa essendi omnibus rebus, eo quod ipsa est esse tantum. Alias iretur in infinitum in causis, cum omnis res, quae non est esse tantum, habeat causam sui esse, ut dictum est. Patet ergo quod intelligentia est forma et esse et quod esse habet a primo ente, quod est esse tantum. Et hoc est causa prima, quae Deus est.

a mistura de potncia. E isso patente assim: com efeito, tudo o que no diz respeito inteleco da essncia ou da quididade, advm de fora e faz composio com a essncia, uma vez que nenhuma essncia pode ser inteligida sem aqueles que so partes da essncia. Ora, toda essncia ou quididade pode ser inteligida sem que algo seja inteligido a respeito de seu ser: com efeito, posso inteligir o que o homem ou a fnix e, no entanto, ignorar se, acaso, {algum deles} tem ser na natureza das coisas; portanto, patente que o ser algo diverso da essncia ou quididade. A no ser, talvez, que haja alguma coisa cuja quididade seja seu prprio ser, e essa coisa no pode ser seno una e primeira, uma vez que impossvel que seja feita a plurificao de algo a no ser por meio da adio de alguma diferena, assim como a natureza do gnero multiplicada nas espcies; ou por meio disso que a forma recebida em diversas matrias, assim como a natureza da espcie multiplicada em diversos indivduos; ou por meio disso que o uno absoluto e algo diverso em algum recebido, assim como se houvesse certo calor separado, ele, a partir de sua prpria separao, seria diverso do calor no separado. Ora, se for sustentada alguma coisa que seja unicamente ser, de tal modo que o prprio ser seja subsistente, esse ser no receberia a adio da diferena, uma vez que, se recebesse, no seria ser unicamente, mas ser e, alm disso, alguma forma determinada; e muito menos receberia a adio da matria, uma vez que, se recebesse, no seria ser subsistente, mas material. Donde resta que tal coisa que seria seu ser no pode ser seno una; donde ser preciso que em qualquer outra coisa alm dela seu ser seja diverso de sua quididade ou natureza ou forma; donde ser preciso que, nas inteligncias, alm da forma haja o ser, e, por isso, foi dito que a inteligncia forma e ser. Ora, tudo o que convm a algo, ou causado a partir dos princpios de sua natureza, assim como, no homem, o ser capaz de rir, ou advm desde algum princpio extrnseco, assim como a luz no ar a partir da influncia do Sol. Ora, no pode se dar que o prprio ser seja causado a partir da prpria forma ou quididade da coisa, digo, tal como a partir de uma causa eficiente, posto que, assim, alguma coisa seria causa de si mesma e alguma coisa produziria a si mesma no ser: o que impossvel. Portanto, preciso que toda coisa que tal cujo ser algo diverso de sua natureza , tenha o ser a partir de algo diverso. E posto que tudo o que por algo diverso reduzido quilo que por si assim como causa primeira, preciso que haja alguma coisa que seja causa de ser para todas as coisas na medida em que ela unicamente ser; de outro modo, ir-se-ia ao infinito nas causas, dado que toda coisa que no unicamente ser tenha a causa de seu ser, como foi dito. Portanto, patente que a inteligncia forma e ser, e que tem o ser a partir do

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Omne autem quod recipit aliquid ab alio est in potentia respectu illius, et hoc quod receptum est in eo est actus eius. Oportet ergo quod ipsa quiditas vel forma, quae est intelligentia, sit in potentia respectu esse, quod a Deo recipit; et illud esse receptum est per modum actus. Et ita invenitur potentia et actus in intelligentiis, non tamen forma et materia nisi aequivoce. Unde etiam pati, recipere, subiectum esse et omnia huiusmodi, quae videntur rebus ratione materiae convenire, aequivoce conveniunt substantiis intellectualibus et corporalibus, ut in III de anima Commentator dicit. Et quia, ut dictum est, intelligentiae quiditas est ipsamet intelligentia, ideo quiditas vel essentia eius est ipsum quod est ipsa, et esse suum receptum a Deo est id, quo subsistit in rerum natura. Et propter hoc a quibusdam dicuntur huiusmodi substantiae componi ex quo est et quod est vel ex quod est et esse, ut Boethius dicit. Et quia in intelligentiis ponitur potentia et actus, non erit difficile invenire multitudinem intelligentiarum; quod esset impossibile, si nulla potentia in eis esset. Unde Commentator dicit in III de anima quod, si natura intellectus possibilis esset ignorata, non possemus invenire multitudinem in substantiis separatis. Est ergo distinctio earum ad invicem secundum gradum potentiae et actus, ita quod intelligentia superior, quae magis propinqua est primo, habet plus de actu et minus de potentia, et sic de aliis. Et hoc completur in anima humana, quae tenet ultimum gradum in substantiis intellectualibus. Unde intellectus possibilis eius se habet ad formas intelligibiles sicut materia prima, quae tenet ultimum gradum in esse sensibili, ad formas sensibiles, ut Commentator in III de anima dicit. Et ideo philosophus comparat eam tabulae, in qua nihil est scriptum. Et propter hoc quod inter alias

primeiro ente que unicamente ser, e este a causa primeira que Deus. Ora, tudo o que recebe algo desde outro em potncia no que se refere a esse outro, e isso que nele recebido seu ato; portanto, preciso que a prpria quididade ou forma que a inteligncia seja em potncia no que se refere ao ser que recebe desde Deus, e aquele ser recebido a modo de ato. E desse modo encontra-se a potncia e o ato nas inteligncias, no entanto, no a forma e a matria, a no ser por equivocidade. Por conseguinte, tambm sofrer, receber, ser sujeito e todos {os nomes} que, assim como esses, se v serem convenientes s coisas em razo da matria, convm por equivocidade s substncias intelectuais e s substncias corporais, como o Comentador diz em Sobre a alma III46. E posto que, como foi dito, a quididade da inteligncia a prpria inteligncia, ento, sua quididade ou essncia o mesmo que ela , e seu ser recebido de Deus aquilo pelo que {ela} subsiste na natureza das coisas; e, em razo disso, alguns47 dizem que as substncias desse modo so compostas de pelo que e o que 48, ou, como diz Bocio, de o que e ser49. E posto que a potncia e o ato so sustentados nas inteligncias, no ser difcil encontrar uma multiplicidade de inteligncias, o que seria impossvel se no houvesse nenhuma potncia nelas. Donde o Comentador dizer em Sobre a alma III50 que, se a natureza do intelecto possvel fosse desconhecida, no poderamos encontrar a multiplicidade nas substncias separadas. Portanto, h distino delas entre si segundo o grau de potncia e de ato, de modo que a inteligncia superior, que mais prxima do primeiro {intelecto}, tem mais ato e menos potncia, e assim por diante. E isso se completa na alma humana, que tem o ltimo grau nas substncias intelectuais. Por conseguinte, o intelecto possvel dela est vinculado s formas inteligveis assim como a matria primeira que ocupa o ltimo grau no ser sensvel s formas sensveis, como o Comentador diz em Sobre a alma III51: eis por que o Filsofo a compara tbua

46 AVERRIS, De anima III comm. 14 (p. 429 lin. 23-28). 47 Cf. ALEXANDRE DE HALES, Glosa in librum II Sent. d. 3 n. 7 (ed. Quaracchi 1952, p. 27-28); ALBERTO MAGNO, Super Sent. II d. 3 a. 2: Partes que os nossos doutores chamam o que e pelo que , e que se v Bocio chamar o que e ser (Borgnet 27, 48 a). 48 Portanto, no vocabulrio de Toms, quod est (o que ) equivale a essncia, enquanto quo est (pelo que ) equivale a ser. (N. do T.). 49 Cf. BOCIO, De hebdom.: H diferena entre o ser e aquilo que ... Para todo composto, um o ser, outro, o prprio (PL 64, 1311 B-C). 50 AVERRIS, De anima III comm. 5: E a no ser que houvesse este gnero de entes que conhecemos na cincia da alma, no poderamos entender a multiplicidade nas coisas abstratas, do mesmo modo, a no ser que conheamos esta natureza do intelecto, no poderemos entender que as virtudes que movem abstratamente devem ser inteligncias (p. 410 lin. 667-672). 51 AVERRIS, De anima III comm. 5 (p. 387 lin. 27-32).

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substantias intellectuales plus habet de potentia, ideo efficitur in tantum propinqua rebus materialibus, ut res materialis trahatur ad participandum esse suum, ita scilicet quod ex anima et corpore resultat unum esse in uno composito, quamvis illud esse, prout est animae, non sit dependens a corpore. Et ideo post istam formam, quae est anima, inveniuntur aliae formae plus de potentia habentes et magis propinquae materiae in tantum quod esse earum sine materia non est. In quibus etiam invenitur ordo et gradus usque ad primas formas elementorum, quae sunt propinquissimae materiae. Unde nec aliquam operationem habent nisi secundum exigentiam qualitatum activarum et passivarum et aliarum, quibus materia ad formam disponitur.

CAPITVLVM V His igitur visis patet quomodo essentia in diversis invenitur. Invenitur enim triplex modus habendi essentiam in substantiis. Aliquid enim est, sicut Deus, cuius essentia est ipsummet suum esse; et ideo inveniuntur aliqui philosophi dicentes quod Deus non habet quiditatem vel essentiam, quia essentia sua non est aliud quam esse eius. Et ex hoc sequitur quod ipse non sit in genere, quia omne quod est in genere oportet quod habeat quiditatem praeter esse suum, cum quiditas vel natura generis aut speciei non distinguatur secundum rationem naturae in illis, quorum est genus vel species, sed esse est diversum in diversis. Nec oportet, si dicimus quod Deus est esse tantum, ut in illorum errorem incidamus, qui Deum dixerunt esse illud esse universale, quo quaelibet res formaliter est. Hoc enim esse, quod Deus est, huius condicionis est, ut nulla sibi additio fieri possit; unde per ipsam suam puritatem est esse distinctum ab omni esse. Propter quod in commento IX propositionis libri de causis dicitur quod individuatio primae causae, quae est esse tantum, est per puram bonitatem eius. Esse autem commune sicut in intellectu suo non includit aliquam additionem, ita non includit in intellectu suo praecisionem additionis; quia si

na qual nada est escrito52. E uma vez que aquela que mais tem potncia entre as substncias intelectuais, eficientemente produzida to prxima das coisas materiais que atrai as coisas materiais para participarem de seu ser, a saber, de modo que a partir de alma e corpo resulta um ser em um composto, por mais que aquele ser, na medida em que da alma, no seja dependente do corpo. E, por isso, depois dessa forma que a alma, so encontradas outras formas, com mais potncia e, medida que o ser delas no se d sem a matria, mais prximas da matria. No ser delas encontra-se ordem e grau at as primeiras formas dos elementos, que so maximamente prximas da matria, donde tampouco tm alguma operao se no segundo a exigncia das qualidades ativas e passivas e de outras qualidades pelas quais a matria disposta para a forma.

5 Captulo Tendo visto isso, fica, ento, patente de que modo a essncia encontrada em diversos. Com efeito, encontra-se nas substncias um trplice modo de ter a essncia. Pois h algo tal como Deus, cuja essncia seu prprio ser, donde serem encontrados alguns filsofos53 que dizem que Deus no tem quididade ou essncia, posto que sua essncia no algo diverso de seu ser. Disso se segue que ele no est num gnero, uma vez que preciso que tudo que est num gnero tenha a quididade alm de seu ser, j que, segundo a noo de natureza, naqueles dos quais h gnero ou espcie, a quididade ou natureza do gnero ou da espcie no sofre distino, mas o ser diverso nos diversos. E no preciso, se dissermos que Deus unicamente ser, que caiamos no erro daqueles que disseram que Deus seja aquele ser universal pelo qual qualquer coisa formalmente54. Com efeito, esse ser que Deus com condies tais que nada pode ser adicionado a ele, donde, por sua prpria pureza, um ser que se distingue de todo ser; em razo disso, se diz no Comentrio para a nona proposio do livro Sobre as causas55 que a individuao da primeira causa, que unicamente ser, se d pela pura bondade dele. Ora, o ser comum, assim como no inclui alguma adio em sua inteleco, tambm no inclui em sua inteleco que a adio seja prescindida, uma vez que, se

52 ARISTTELES, De anima III 3[9] (430 a 1). 53 Sobretudo Avicena, por exemplo, na Metaph. VIII cap. 4: Tudo que tem quididade causado, e, fora o ser necessrio, todos os demais tm quididade... para os quais no se d que [ele] seja seno algo extrnseco; portanto, o primeiro no tem quididade (fol. 99 rb B). 54 Cf. TOMS DE AQUINO, Suma de Teologia I, q. 3, a. 8, resp.: Diz-se que essa tenha sido a opinio dos seguidores de Amaury; esses erros de Paris foram condenados no ano de 1210 (Chartularium Univers. Paris. I, p. 71). 55 Yliatim, isto , seu ser infinito, e sua individualidade a pura bondade (ed. Saffrey, p. 57; cf. ed. Pattin, 91).

Toms de Aquino, Sobre o ente e a essncia 19

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hoc esset, nihil posset inte