todorov, t. poética da prosa

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    Potica da Prosa

    http://groups-beta.google.com/group/digitalsource

    http://groups-beta.google.com/group/digitalsourcehttp://groups-beta.google.com/group/digitalsource
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    Tzvetan Todorov nasceu na Bulgria e vive na Franadesde 19!. Pes"uisador do #$%&' autor de vrias obrassobre teoria literria' hist(ria do pensamento e anlise dacultura.

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    Tzvetan Todorov

    Potica da Prosa

    )radu*o#+,, B0%+$0%

    Martins Fontes

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    S o P a u l o 2 0 0 3Esta obra foi publicada originalmente em francs com o ttulo

    P0TIQUE E !" P#$%Epor ditions du %euil&

    'op(rig)t ditions du %euil* +,-+&'op(rig)t 2003* !i.raria /artins ontes Editora !tda&*

    %o Paulo* para a presente edi1o&

    1 edioun)o de 2003

    Traduo'!"UI" E#!I4E#

    Acompanhamento editorial!u5ia "parecida dos %antos

    Reviso grfica/aria !ui5a a.ret/argaret PresserProduo grfica

    6eraldo "l.esPaginao/otolitos

    %tudio 3 esen.ol.imento Editorial

    !ados "nternacionais de #atalogao na Pu$licao %#"P&%#'mara (rasileira do )ivro* +P* (rasil&

    )odorov' )2vetan' 19!9- .Potica da prosa / )2vetan )odorov 3 tradu*o #laudia Berliner.

    4 &*o Paulo : 5artins Fontes' 677!. 4 8)(picos. )tulo original: Poti"ue de la prose. &B$ ;

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    Tel& -- a? @>-e;mailA infoBmartinsfontes&com&br )ttpA88CCC&rnartinsfontes&com&br

    >$#0?

    4ota introdutDria.................................. @

    1. Alegado metodol(gico do ormalismo 1

    6. +inguagem e literatura.................... !1

    !. Potica e crtica............................... C)+A !PA\)#, 0 #%>)#,1

    0is a"ui dois livros cuOo conronto promete serinstrutivo. Possuem uma "uantidade suiciente de traosem comum para "ue a oposi*o pereita ormada porseusoutros aspectos n*o seOa arbitrria' mas carregada de umsentido "ue eLige ser revelado.

    0ssa oposi*o concerne a dierentes aspectos deambos os livros. Primeiro o tema: %tructure du langagepoGtiue um estudo das propriedades comuns a todasasobras literrias3 igures dedica-se K descri*o desistemaspoticos singulares: o de \tienne Binet' o de Proust' o de

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    lR"strGe& A obOetivo do primeiro ormular osundamentos da poGtica o do segundo' reconstituirpoGticas& m visa a poesia' o outro' a obra potica.

    , oposi*o se estende Ks propriedades ormais. ,escrita de #ohen sinttica e seu livro pretende sertransparente. As teLtos de Renette s*o' ao contrrio'analticos' descritivos e' por assim di2er' opacos: n*oremetem a um WPgina C

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    inalmente nascidoI 0m caso airmativo' como "ue elapode se encarnar ao mesmo tempo em dois livros t*odierentesI

    Para responder a essas "uestHes' podemos partir deum dos artigos de Renette' intitulado precisamenteQ0struturalismo e crtica literriaQ. ,o problema colocadopor esse ttulo' Renette d "uatro respostas sucessivas:todo crtico ' independentemente de suas intenHes'QestruturalistaQ' por"ue' como um bricoleur* fa5 uso doselementos das estruturas eListentes 8as obras literrias para

    orOar novas 8a pr(pria obra crtica3 os aspectos da obrapertencentes simultaneamente aos campos da anliseliterria e da lingSstica devem ser estudados com a aOudados mtodos elaborados pela lingSstica estrutural3 oestruturalista WPgina CX

    impotente diante da obra singular' sobretudo se ocrtico a investe com um sentido' o "ue sempre o casose esta obra nos or suicientemente pr(Lima3 a hist(ria

    literria' em contrapartida' pode e deve se tornarestrutural' estudando os gNneros e sua evolu*o. Pararesumir' pode-se di2er "ue' na concep*o de Renette' ocampo da literatura deveria ser dividido em dois' sendo"ue cada uma das partes se presta a um tipo dierente deanlise: o estudo da obra singular n*o pode ser eito coma aOuda de mtodos estruturais' mas estes continuampertinentes no "ue concerne K outra parte do campo.

    Podemos nos perguntar se o vocabulrio da divis*oterritorial o mais apropriado para caracteri2ar essadierena essencial. Preeriramos antes alar de um graude generali2a*o. , anlise estrutural' n*o se devees"uecer' oi criada no interior de uma ciNncia3 destinava-se a descrever o sistema onol(gico de uma lngua' n*o umsom' o sistema de parentesco numa sociedade' n*o umparente. \ um mtodo cientico e ao aplic-lo a2emos

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    ciNncia. Ara' o "ue pode a ciNncia diante do obOeto singular"ue um livroI $o mLimo' pode tentar descrevN-lo3 masa descri*o em si mesma n*o ciNncia e s( se torna ciNncia

    a partir do momento em "ue tende a se inscrever numateoria geral. Por isso' a descri*o da obra s( pode ser daordem da ciNncia 8e portanto admitir a aplica*o dosmtodos estruturais com a condi*o de "ue nos aadescobrir propriedades de todo o sistema de eLpress*oliterria ou ent*o de suas variedades sincrVnicas ediacrVnicas.

    %econhecem-se nisso as diretri2es prescritas porRenette K Qcrtica estruturalQ: a descri*o daspropriedades do discurso literrio e a hist(ria literria. ,obra singular ica ora do obOeto de estudo dosestruturalistas' menos por causa do investimento desentido "ue se d por WPgina C=X

    ocasi*o da leitura "ue pela ora de sua condi*o mesmade obOeto singular. &e o Qcrtico estruturalistaQ s( eListe'O a2 muito tempo' no modo optativo por"ue nesser(tulo h uma contradi*o: a ciNncia "ue pode serestrutural' n*o a crtica.

    , hist(ria literria estrutural tampouco eListe' poren"uanto. 0m contrapartida' eis "ue o livro de ean#ohen nos ornece uma imagem do "ue pode ser essainvestiga*o das propriedades do discurso literrio' K

    "ualmelhor convm' a nosso ver' o nome de poGtica& esdesuaQntrodu*oQ' #ohen a2 deliberadamente uma escolha:por um lado' "uer ormular hip(teses cienticas'veriicveis e reutveis' sem temer o sacrilgio "ue alar de uma QciNncia da poesiaQ3 por outro' considera apoesia' acima de tudo' como uma orma particular da

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    linguagem' e por isso limita seu trabalho ao estudo dasQormas poticas da linguagem e apenas da linguagemQ8p. ;. A obOetivo a "ue se propHe o seguinte: descobrire descrever as ormas da linguagem' pr(prias da poesia'por oposi*o K prosa3 pois Qa dierena entre prosa epoesia de nature2a lingSstica' ou seOa' ormalQ 8p.199. 0is "ue a potica ganha por im o lugar "ue lhecabe' do lado dalingSstica. 0stamos evidentemente longe do crtico cuOoobOetivo seria caracteri2ar especiicamente uma obra: o"ue interessa a #ohen um Qinvariante "ue perdure aolongo das variaHes individuaisQ e "ue eLista Qnalinguagem de todos os poetasQ 8p. 1C.

    5as se a Qcrtica estruturalistaQ uma contradi*o' o"ue di2er do QestruturalismoQ de RenetteI ma leituraatenta nos revelar "ue as estruturas literrias s*o de atoo obOeto de seu estudo3 mas n*o no mesmo sentido dapalavra "ue para #ohen' "ue estuda a Qestrutura da

    linguagem poticaQ. , estrutura de #ohen uma rela*oWPgina C;X

    abstrata "ue se maniesta na obra singular sob ormasmuito variadas. ,ssemelha-se a"ui K lei' K regra' e seencontra num nvel de generali2a*o dierente do dasormas por meio das "uais se reali2a. $*o esse o casodas estruturas de Renette. ,"ui' essa palavra deve ser

    entendida num sentido espacial' como se ala' poreLemplo' das estruturas gricas num "uadro. , estrutura a disposi*o particular de duas ormas' uma em rela*oK outra. $um de seus teLtos' Q+Yor tombe sous le erQ'Renette deleitou-se at em desenhar' no sentido pr(priodo termo' a estrutura ormada pelos QelementosQ' osmetais' as pedras' no universo da poesia barroca. $*o setrata a"ui de um princpio logicamente anterior Ksormas' mas do espao singular "ue separa e une duas ou

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    mais ormas.

    sso nos leva ao pr(prio cerne da vis*o crtica de

    Renette. Poderamos di2er "ue o Gnico obOetivo de suasinvestigaHes preencher' caso ap(s caso' todos os cantosde um amplo espao abstrato3 ica ascinado diante desse"uadro imenso em "ue simetrias dissimuladas aguardamim(veis "ue um olhar atento venha destac-las. ar a veras estruturas n*o passa de uma maneira de ter acesso a essaimagem "ue' a cada instante' se torna mais rica' mas cuOodesenho de conOunto permanece sempre igualmente

    incerto.Percebe-se "ue nenhum ponto doutrinai postula a

    eListNncia obrigat(ria dessas estruturas na obra literria.&em declar-lo eLplicitamente' Renette d a entender "ue

    o escritor go2a de certa liberdade "ue lhe permitesubmeter ou n*o o universo de seu livro Ks leisestruturais.0mbora as preerNncias pessoais de Renette recaiamprecisamente nos autores "ue organi2am esse universosegundo um desenho preestabelecido' nada nos di2 "ueoutros n*o teriam escrito ignorando esse modo depensar. WPgina C9X

    As autores "ue Renette escolhe s*o QtcnicosQ 4 ospoetas barrocos' %obbe-Rrillet e outros3 na contram*o'

    comose vN' da crtica psicol(gica' "ue se rego2iOava com osautores QespontneosQ e QinspiradosQ.

    Por isso ningum se surpreender ao ver metade dacoletnea de Renette dedicada K obra dos crticos: comoele mesmo eLplicou' a crtica uma vitrine de estruturasparticularmente rica. 0 esse aspecto da crtica "ue o atrai'

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    a crtica-obOeto' e n*o a crtica en"uanto mtodo3 inGtil

    procurar nesse livro de crtica' dedicado em grande parte

    K crtica' mais de de2 linhas sobre o mtodo pr(prio doautor 5esmo a prop(sito dos crticos' Renette se satisa2

    com uma eLplicita*o e n*o a2 com "ue a ela se siga aconstru*o de um sistema crtico transcendente: n*o Renette sobre @alrE' Renette sobre Borges "ue lemos3@alrE e Borges' eles mesmos' vNm a"ui nos apresentar'cada "ual' um teLto-sntese de todos os seus teLtos.Renette reali2a a uma verdadeira proe2a: lemos pginas"ue ao mesmo tempo lhe pertencem e a2em parte daobrade um outro.

    Uual ent*o esse mtodo ugidio de RenetteI Pode-se di2er' de "ual"uer modo' "ue ele n*o adota o princpio

    do estruturalismo de "ue o mtodo tem de ser elaboradoK imagem de seu obOeto 8"uando n*o o obOeto "ue seconorma K imagem do mtodo. , metodologia deRenette assemelha-se mais K"uele comentrio "ueesposaas ormas do obOeto para a2N-las suas' "ue n*oabandona a obra eLceto para reprodu2i-la em outra parte.

    @oltemos K nossa anttese inicial. #onstata-se "ue oespao delimitado por essas duas metodologias'contrrias e vi2inhas' a"uele "ue separa a potica dacrtica: pois a anlise de Renette merece plenamente onome WPgina

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    leitura provoca: crtica e ciNncia' crtica e potica.)entemos agora precisar as possibilidades e os limites decada uma.

    Primeiro a potica: o "ue ela estuda n*o a poesiaou a literatura' mas a QpoeticidadeQ e a QliteraridadeQ. ,obra singular n*o para ela um im Gltimo3 "uando sedetm numa obra e n*o em outra' por"ue esta deiLatransparecer de maneira mais clara as propriedades dodiscurso literrio. , potica ir estudar n*o as ormasliterrias O eListentes' mas' partindo delas' um conOunto

    de ormas virtuais: o "ue a literaturapode ser mais do "ue

    o "ue ela G& , potica ao mesmo tempo menos e maiseLigente "ue a crtica: n*o pretende nomear o sentido deuma obra' mas se considera bem mais rigorosa "ue amedita*o crtica.

    As deensores da idia de Qanalisar a obra pelo "ue

    ela ' n*o pelo "ue ela eLprimeQ nada ter*o' portanto' aganhar com a potica. #om eeito' as pessoas sempre se"ueiLam das interpretaHes de uma crtica psicol(gica ousociol(gica: ela analisa a obra n*o como um im em si'mas como um meio de chegar a outra coisa' como oeeito de uma causa. 5as "ue a psicanlise ou asociologiase consideram ciNncias3 por isso' a crtica "ue nelas se

    inspira est condenada a n*o poder se ater K obra em simesma. , partir do momento em "ue os estudosliterrios se constituem em ciNncia' como tem eito apotica hoOe' volta-se a eLtrapolar a obra: esta considerada' outra ve2'um eeito' mas agora ela o eeito de sua pr(pria orma.Portanto' a Gnica dierena 4 mas uma dierenaimportante 4 "ue em ve2 de transpor a obra para umoutro tipo de discurso' estudam-se as propriedades

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    subOacentes do pr(prio discurso literrio. WPgina

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    eLpress*o pura e simples. 0s"uecer disto' isolar as duaspartesseria considerar a igura 4 ou a poesia 4 do ponto devista WPgina

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    conlussem. m dos mais belos teLtos de igures*Q&ilences de FlaubertQ' nos permite entrever' emboravagamente' as possibilidades "ue assim se abrem. $esseteLto' Renette procura apreender Ka escrita de Flaubertno "ue ela tem de mais especicoQ 8p. 6C63simpliicando muito' poderamos di2er "ue se trata daun*o singular "ue Flaubert atribui K descri*o' dopapel t*o importante"ue ela desempenha em seus romances. eparamos assim

    com noHes da potica "ue parecem bem esclarecedoras3WPgina

    trata-se' contudo' apenas de um tira-gosto "ue s( a2aumentar o deseOo. Pois ala-se da descri*o como se ela

    osse algo (bvio3 mas' na verdade' de "ue se trataI Por"ue ela se opHe K narra*o' se ambas parecem pertencerao discurso do narrador por oposi*o ao dos

    personagensI A "ue a ela se opHe simplesmente asubstitui*o de um movimento por uma paradaI &er*oestas as Gnicas noHes desse nvel de generali2a*o' ouhaver outrasI $*o podemos mais nos remeter KsdeiniHes das poticas clssicas' "ue alis Oes"uecemos3 temos de orOar novas. Por "ue "ue adescri*o se inclui entre as iguras ret(ricasI D apenasaltera*o no modo de eLpress*o ou tambm na posi*o

    do narrador em rela*o aos personagens 8passagem davis*o QcomQ para a vis*o Qpor trsQ nesta rasedeslumbrante de o.ar( "ue aparece no meio de umQuror de locomo*oQ: Qvelhos de roupas pretaspasseiam ao sol num terrao todo verdeOante de heras...Q8p. 6!9I &*o "uestHes para as "uais a potica poderiadar' se n*o uma resposta' pelo menos os meios paraencontr-la.

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    $*o h portanto muro intransponvel entre poticae crtica3 e a prova disso est n*o s( no proOeto "ueacabamos de esboar' mas tambm no ato de "ue essecrtico puro e esse poeticista puro encontraram umterreno em comum e trataram' ambos' de um mesmoproblema: as iguras da ret(rica. , escolha desse localde encontro O signiicativa 8entre outras coisas' pelainluNncia real de @alrE sobre o pensamento crticoatual: trata-se Oustamente de uma reabilita*o daret(rica. $*o endossam' verdade' todas as airmaHes

    dos retores clssicos3 mas ica claro "ue n*o se podemais li"uidar em dois tempos o problema das iguras'problema real' importante e compleLo. WPgina

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    desenvolvimento e na veriica*o dessa hip(tese por meiode algumas iguras representativas. \ preciso di2er logo deincio "ue esse desenvolvimento e essa veriica*o s*o'

    com algumas eLceHes insigniicantes' impecveis' e "ueeetivamente provam "ue as iguras consideradasrepresentam inraHes a uma regra lingSstica "ual"uer.

    5as isso ainda n*o resolve o problema da igura. Adenominador comum das "uatro ou cinco iguraseLaminadas por #ohen precisa ser encontrado em todasas outras para "ue seOa uma condi*o necessria do

    enVmeno QiguraQ. #aso contrrio' eListem duaspossibilidades a considerar 8o mesmo ocorrendo com adeini*o de Renette: ou bem se declara "ue o "ue n*otiver esse denominador WPgina

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    haveria mais o mesmo sentido a Gnica coisa "uepermaneceria idNntica o obOeto evocado' o referente&Fontanier e Renette desli2am a"ui da oposi*o entre duas

    ormas de um sentido para a oposi*o entre dois sentidos"ue remetem a um reerente3 mas agora eles n*ocircunscrevem mais um espao lingSstico' e sim umespao psicol(gico: descrever ou n*o descrever. ,descri*o' como tampouco a anttese' a grada*o einGmeras outras iguras' n*o se reere a uma eLpress*oliteral. A espao da linguagem desaparece a.

    A raciocnio de #ohen n*o e"uivocado' masincompleto. \ verdade "ue as iguras "ue ele eLaminas*o inraHes3 mas muitas outras n*o o s*o. , alitera*o'nos di2 #ohen' uma igura por"ue se opHe aoparalelismo ono-semntico WPgina

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    iguras.Q \ igura o "ue d ao discurso Qum carterpr(prioQ' o "ue o torna perceptvel3 o discurso igurado um discurso opaco' o discurso sem iguras transparente.#hamar o navio de QnavioQ utili2ar a linguagem apenascomo mediador de signiica*o' matar ao mesmo tempoo obOeto e a palavra. #ham-lo de QvelaQ deter nossoolhar sobre a palavra' dar um valor pr(prio K linguageme uma chance de sobreviver no mundo.

    5as para isso n*o necessrio "ue eLista uma outraeLpress*o para di2er a mesma coisa' nem uma regra

    lingSstica inringida. Basta haver uma orma' umadisposi*o particular da linguagem 8u 5arsais O dissera:Qum modo particularQ para "ue possamos perceber essapr(pria linguagem. \ igura o "ue se deiLa descrever' o "ue institucionali2ado como tal. , grada*o uma igurapor"ue percebemos a sucess*o de trNs nomes da mesmaespcie: o olhar d vida K igura assim como mata0urdice. &e n*o houvesse iguras' talve2 ainda

    ignorssemos a WPgina

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    ,chamos "ue a QoutraQ mensagem n*o passa' poisnunca eListiu' pelo menos n*o sob a orma "ue lhe atribui#ohen. 0 como n*o na sua argumenta*o "ue

    pretendemos procurar uma alha' teremos' para detectar ascausas de uma nova conus*o' "ue descer para aspremissas l(gico-lingSsticas de onde partiu seuraciocnio.

    , ace signiicada do signo lingSstico se divide' para#ohen' em duas partes: orma e substncia. 0sse par determos' tomado de DOelmslev' sore de certa imprecis*o no

    uso' motivo pelo "ual nos interessa determinar seu sentidodesde o comeo. Q, orma o estiloQ 8p. !

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    #omecemos pelas premissas. A "ue chama a aten*onessa teoria da signiica*o 4 e algo paradoLal 4 oato de "ue as palavras n*o tNm sentido: tNm apenas umreerente 8a substncia e um valor estilstico e emocional

    8a orma. Ara' a l(gica e a lingSstica airmam a2 muitotempo "ue alm desses dois elementos eListe um terceiro'

    o mais importante' chamado desentido ou compreenso&QA satlite da )erraQ e Qessa oice douradaQ' nos di2#ohen' apenas se opHem por sua orma: a primeiraeLpress*o n*o contm nenhuma igura e aetivamenteneutra' a segunda composta de imagens e emocional.Q, +ua potica como Yrainha da noiteY ou como Yessaoice douradaY...3 prosaica como Yo satlite da )erraYQ 8p.!9. Ara' n*o s( o valor estilstico "ue diere nessasduas eLpressHes' tambm o sentido3 o "ue elas tNm emcomum um reerente' n*o uma signiica*o3 mas esta interior K linguagem. , dierena essencial n*o est na

    rea*o emocional "ue provocam no receptor 8e ser "ueprovocamI' mas no sentido "ue tNm.

    Q!e !ac de +amartine' Tristesse dS$l(mpio de Dugo'!e

    %ou.enir de 5usset di2em a mesma coisa' mas cada "ualodi2 de uma maneira novaQ' airma #ohen 8p. C63 ou

    ainda: o valor esttico do poema n*o reside no "ue eledi2' WPgina

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    resida no "ue #ohen chama de a QormaQ: casoconseguisseprovar "ue ela n*o est no reerente' ainda n*o teria nosdito nada no "ue concerne ao sentido. D' emcontrapartida' muitos argumentos contra a redu*o dopoema a um compleLo de emoHes. aTobson O nosalertava "uarenta anos atrs: K"poesia pode empregar osmeios da linguagem emocional' mas sempre com intuitos"ue lhe s*o pr(prios. 0ssa semelhana entre os doissistemas lingSsticos' bem como a utili2a*o "ue alinguagem potica a2 de meios pr(prios da linguagememocional' muitas ve2es provoca a identiica*o dos dois.0ssa identiica*o e"uivocada pois n*o leva em conta adierena uncional undamental entre os dois sistemaslingSsticos.Q %edu2ir a poesia a um QsentimentoQanlogo no poeta e em seu leitor' como "uer #arnap' retroceder para concepHes psicol(gicas h muitoultrapassadas. , poesia n*o um assunto desentimentos' e sim de signiica*o.

    A abismo "ue #ohen cava entre dois tipos opostos designiica*o dos "uais apenas um esteticamente vlidovem restabelecer' em toda a sua antiga magnitude' o parQormaQ e QconteGdoQ. A perigo dessa concep*o 8"ue opr(prio @alrE n*o evitou por completo n*o se encontrana prima2ia atribuda ao conteGdo em detrimento da orma:airmar o contrrio seria igualmente also3 mas na pr(pria

    eListNncia dessa dicotomia. &e o estruturalismo deu umpasso adiante em rela*o ao ormalismo oi precisamentepor ter parado de isolar uma orma' a Gnica vlida' e de sedesinteressar pelos conteGdos. , obra literria WPgina 7X

    n*o tem uma orma e um conteGdo' mas uma estruturade signiicaHes cuOas relaHes internas preciso

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    conhecer.

    , concep*o reducionista de #ohen choca-se mais

    uma ve2 com os atos: muitas ve2es a potica n*o seeLplica como inra*o aos princpios da linguagem. 5asQa esttica clssica uma esttica antipoticaQ' declaraele8p. 67. $*o3 "ue a potica uma categoria mais ampla"ue a"uela "ue ele nos apresenta3 e a esttica dosclssicos encontra um lugar dentro dela.

    As comentrios crticos "ue acabamos de ormularn*o pretendem diminuir a importncia do trabalho de#ohen. Rrande parte de suas anlises constitui umacolabora*o incontestvel' e se as premissas e asconclusHes se prestam K discuss*o' este talve2 seOa ummrito adicional: pois O era tempo de comear a discutiros problemas de potica. WPgina 1X

    19.

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    #,P>)+A C)PA+AR, A %A5,$#0 PA+#,+

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    A gNnero policial n*o se subdivide em espcies.,penas apresenta ormas historicamente dierentes.

    BA+0,-$,%#0,#1

    &e escolho essas palavras como epgrae de um artigo"ue trata' Oustamente' das QespciesQ no gNnero QromancepolicialQ' n*o para sublinhar meu desacordo comos autores em "uest*o' mas por"ue essa uma atitudemuito diundida e portanto a primeira em rela*o K "ual preciso tomar posi*o. A romance policial n*o tem nada

    a ver com isso: h "uase dois sculos percebe-se umaintensa rea*o nos estudos literrios "ue contesta apr(pria no*o de gNnero. Au bem se escreve sobre aliteratura em geral' ou ent*o sobre uma obra3 e icoutacitamente convencionado "ue classiicar vrias obrasdentro de um gNnero desvalori2-las. 0ssa atitude temuma boa eLplica*o hist(rica: a releL*o literria dapoca clssica' "ue se dedicava mais aos gNneros "ue Ks

    obras' tambm maniestava uma tendNncia punitiva: aobra era Oulgada ruim se n*o obedecesse de modosuiciente Ks regras do gNnero. Portanto' essa crticaprocurava n*o s( descrever os gNneros WPgina !X

    JJJJJJJJJJJJJJJJJ8$ota de rodap 1.!e roman policier* Paris' PaEot' 19C' p. 1;

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    precedia a cria*o literria em ve2 de vir depois dela.

    , rea*o oi radical: os romnticos e seus descendentes

    recusaram-se n*o s( a se conormar Ks regras dos gNneros8o "ue era seu direito' mas tambm a reconhecera pr(pria eListNncia dessa no*o. Por isso a teoria dosgNneros continua singularmente pouco desenvolvida athoOe. $o entanto' atualmente' percebe-se uma tendNnciaa encontrar um intermedirio entre a no*o geral demaisde literatura e esses obOetos singulares "ue s*o as obras.A atraso deve-se sem dGvida ao ato de "ue a tipologia

    implica a descri*o dessas obras singulares e estimplicada nela3 mas esta Gltima tarea dista de terencontrado soluHes satisat(rias: en"uanto n*o seconseguir descrever a estrutura das obras' ser precisocontentar-se em comparar elementos "ue se sabe comomedir' como o metro' por eLemplo. , despeito daatualidade de uma investiga*o sobre os gNneros 8comobem notou )hibaudet' do problema dos universais "ue setrata' n*o podemos dar incio a ela sem primeiro avanarna descri*o estrutural: somente a crtica do classicismopodia se permitir dedu2ir os gNneros a partir de es"uemasl(gicos abstratos.

    ma diiculdade adicional vem se somar ao estudodos gNneros devido ao carter especico de toda normaesttica. , grande obra de certa orma cria um novogNnero' e ao mesmo tempo transgride as regras do gNnero

    vlidas at ent*o. A gNnero da 'artu?a de Parma* ou seOa'a norma K "ual esse romance se reere' n*o o romancerancNs do comeo do sculo ZZ3 o gNnero QromancestendhalianoQ "ue criado precisamente por esta obra' epor algumas outras. Poder-se-ia di2er "ue todo grande livroestabelece a eListNncia de dois gNneros' a realidade deduas normas: a do gNnero "ue ele transgride' "uepredominava na literatura precedente' e a do gNnero "ue elecria. WPgina CX

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    D no entanto um campo em "ue eli2mente essacontradi*o dialtica entre a obra e seu gNnero n*oeListe: o da literatura de massa. Reralmente' a obra-prima literria n*o se encaiLa em nenhum gNnero' a n*oser emseu pr(prio3 mas a obra-prima da literatura de massa precisamente o livro "ue melhor se inscreve em seugNnero. A romance policial tem suas normas3 a2erQmelhorQ do "ue elas eLigem ao mesmo tempo a2erpior: "uem "uiser Qembele2arQ o romance policial' a2QliteraturaQ e n*o romance policial. A romance policialpor eLcelNncia n*o a"uele "ue transgride as regras dogNnero' mas a"uele "ue a elas se conorma:4o $rc)idsfor /iss landis) uma encarna*o do gNnero' n*o umasupera*o. #aso os gNneros da literatura popular ossembem descritos' n*o se poderia mais alar de suas obras-primas: daria na mesma3 o melhor romance ser a"uelesobre o "ual nada se tem a di2er. m ato pouco notadoe cuOas conse"SNncias aetam todas as categorias

    estticas o seguinte: estamos hoOe em presena de umcorte entre suas duas maniestaHes essenciais3 n*oeListe mais uma Gnica norma esttica em nossasociedade' mas duas3 n*o se pode medir com as mesmasmedidas a QgrandeQ arte e a arte QpopularQ.

    Portanto' a eLposi*o dos gNneros dentro do romancepolicial promete ser relativamente cil. Para isso' no

    entanto' temos de comear pela descri*o das QespciesQ'

    o "ue e"uivale a di2er: por sua delimita*o. )omaremoscomo ponto de partida o romance policial clssico' "ue teve

    seu momento de gl(ria entre as duas guerras e "uepodemos chamar de Qromance de enigmaQ. orameitas vrias tentativas de determinar as regras desse

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    gNnero 8voltaremos mais adiante Ks vinte regras de @anine3 mas a melhor caracterstica global parece sera"uela "ue WPgina

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    da investiga*o' n*o agem' s( tomam conhecimento. $adapode acontecer com eles: uma regra do gNnero postula aimunidade do detetive. \ impossvel imaginar Dercule

    Poirot ou Philo @ance ameaados por algum perigo'atacados' eridos' e' com mais ra2*o ainda' mortos. ,s centoe cin"Senta pginas "ue separam a descoberta do crime darevela*o do culpado s*o dedicadas a uma lenta WPginaX

    aprendi2agem: eLamina-se indcio ap(s indcio' pista ap(sWlista. A romance de enigma tende' pois' para uma

    ar"uitetura puramente geomtrica: "ssassinato noE?presso do $riente 8,. #hristie' por eLemplo' apresentado2e personagens suspeitos3 o livro consiste em do2e'mais uma ve2 do2e interrogat(rios' pr(logo e eplogo 8ouseOa' descoberta do crime e descoberta do culpado.

    0ssa segunda hist(ria' a hist(ria da investiga*o' go2aportanto de umstatus muito particular. $*o por acaso"ue ela muitas ve2es contada por um amigo dodetetive' "ue reconhece eLplicitamente estar escrevendoumlivro: ela consiste' com eeito' em eLplicar como apr(pria narrativa pVde surgir' como o pr(prio livro escrito., primeira hist(ria ignora por completo o livro' ou seOa'ela nunca se conessa livresca 8nenhum autor deromances policiais poderia se permitir indicar o carterimaginrio da hist(ria' como ocorre em QliteraturaQ. 0mcontrapartida' espera-se da segunda hist(ria n*o s( "ueela leve em conta a realidade do livro' mas "ue seOaprecisamente a hist(ria desse livro.

    Poderamos tambm caracteri2ar essas duas hist(riasdi2endo "ue a primeira' a do crime' conta Qo "ue de atoaconteceuQ' ao passo "ue a segunda' a da investiga*o'

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    eLplica Qcomo o leitor 8ou o narrador tomouconhecimento dos atosQ. 5as essas deiniHes O n*o s*omais as das duas hist(rias no romance policial' e sim dedois aspectos de "ual"uer obra literria descobertos pelosormalistas russos "uarenta anos atrs. 0les distinguiam abula e o tema de uma narrativa: a bula o "ueaconteceu na vida' o tema' a maneira como o autor nosapresenta isso. , primeira no*o corresponde K realidadeevocada' a acontecimentos semelhantes aos "ue ocorremna nossa vida3 a segunda' ao pr(prio livro' K narrativa' aosprocedimentos WPgina =X

    literrios de "ue o autor a2 uso. $a bula' n*oh invers*o no tempo' as aHes seguem sua ordemnatural3no tema' o autor pode nos apresentar os resultados antesdas causas' o inal antes do comeo. 0ssas duas noHesn*ocaracteri2am duas partes da hist(ria ou duas hist(rias

    dierentes' mas dois aspectos de uma mesma hist(ria's*odois pontos de vista sobre a mesma coisa. #omo' ent*o'o romance policial consegue tornar ambos presentes'coloc-los lado a ladoI

    Para eLplicar esse paradoLo' preciso lembrarinicialmente o status particular das duas hist(rias. ,

    primeira' a do crime' na verdade a hist(ria de umaausNncia: sua caracterstica mais precisa a de n*o poderestar imediatamente presente no livro. 0m outraspalavras' o narrador n*o pode nos transmitir diretamenteas rplicas dos personagens envolvidos nela' nem nosdescrever seus gestos: para a2er isso' temnecessariamente de passar pela intermedia*o de umoutro 8ou do mesmo personagem "ue relatar' nasegunda hist(ria' as palavras escutadas ou os atos

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    observados. A status da segunda ' como vimos'igualmente eLcessivo: uma hist(ria "ue n*o temnenhuma importncia em si mesma' "ue serveeLclusivamente de mediador entre o leitor e a hist(ria docrime. As te(ricos do romance policial sempreconcordaram em di2er "ue o estilo' nesse tipo deliteratura' tem de ser pereitamente transparente'ineListente3 a Gnica eLigNncia K "ual obedece sersimples' claro' direto. #hegou-se mesmo a tentar 4 o "ue signiicativo 4 suprimir por completo essa segundahist(ria: uma editora publicou verdadeiros dossiNs'compostos de relat(rios policiais' interrogat(rios' otos'impressHes digitais' at mesmo mechas de cabelo3 essesdocumentos QautNnticosQ deveriam levar o leitor Kdescoberta do culpado 8em caso de racasso' umenvelope WPgina ;X

    echado' colado na Gltima pgina' dava a resposta doOogo:

    por eLemplo' o veredicto do Oui2.$o romance de enigma' h portanto duas hist(rias:

    uma ausente mas real' a outra presente masinsigniicante. 0ssa presena e essa ausNncia eLplicam aeListNncia deambas na continuidade da narrativa. , primeiracomporta tantas convenHes e procedimentos literrios

    8"ue nadamais s*o do "ue o aspecto QtemaQ do relato "ue o autorn*o pode deiL-los sem eLplica*o. $ote-se "ue essesprocedimentos s*o essencialmente de dois tipos'inversHes temporais e QvisHesQ particulares: o teor decada inorma*o determinado pela pessoa "ue atransmite' n*o eListe observa*o sem observador3 o autorn*o pode' por deini*o' ser onisciente' como era noromance clssico. , segunda hist(ria aparece portanto

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    como um lugar onde se Oustiicam e Qnaturali2amQ todosesses procedimentos: para lhes dar um ar QnaturalQ oautor tem de eLplicar "ue est escrevendo um livro 0 oipor medo de "ue essa segunda hist(ria se tornasse elamesma opaca' de "ue lanasse uma sombra inGtil sobre aprimeira' "ue tanto se recomendou manter o estilo neutroe simples' torn-lo imperceptvel.

    0Laminemos agora um outro gNnero dentro doromance policial' a"uele criado nos 0stados nidospouco antes da &egunda Ruerra e sobretudo depois dela'

    e "ue na Frana publicado na Qsrie noireKpodemoscham-lo de romance noir* embora este termo tambmtenha outra signiica*o. A romance noir um romancepolicial "ue unde as duas hist(rias ou' em outraspalavras' suprime a primeira e d vida K segunda. $*onos relatam mais um crime anterior ao momento danarrativa' a narrativa coincide com a a*o. $enhumromance noir apresentado sob a orma de mem(rias:

    n*o h um ponto de chegada a partir WPgina 9X

    do "ual o narrador abarcaria os acontecimentospassados' n*o sabemos se ele chegar vivo ao inal dahist(ria. , prospectiva substitui a retrospectiva.

    $*o h hist(ria para adivinhar3 e n*o h mistrio' nosentido em "ue estava presente no romance de enigma.5as nem por isso o interesse do leitor diminui: percebe-se

    a"ui "ue eListem duas ormas de interesse totalmentedierentes. , primeira pode ser chamada de curiosidade elavai do eeito K causa: a partir de certo eeito 8um cadver ealguns indcios preciso encontrar sua causa 8o culpado ea"uilo "ue o levou a cometer o crime. , segunda orma o suspense* e a"ui se vai da causa ao eeito: mostram-nosprimeiro as causas' os dados iniciais 8gngsteres "uepreparam golpes' e nosso interesse mantido pela

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    eLpectativa do "ue vai acontecer' ou seOa' dos eeitos8cadveres' crimes' brigas. 0sse tipo de interesse erainconcebvel no romance de enigma' pois seus

    personagens principais 8o detetive e seu amigo' onarrador estavam' por deini*o' imuni2ados: nada podiaacontecer-lhes. , situa*o se inverte no romance noirAtudo possvel' e o detetive pHe em risco sua saGde e atsua vida.

    ,presentei a oposi*o entre romance de enigma eromance noir como uma oposi*o entre duas hist(rias e uma

    Gnica3 mas esta uma classiica*o l(gica' e n*o hist(rica.Para surgir' o romance noir n*o precisou reali2ar essamudana especica. neli2mente para a l(gica' os gNnerosn*o se constituem em conormidade com as descriHesestruturais3 um gNnero novo cria-se em torno de umelemento "ue n*o era obrigat(rio no antigo: os doiscodiicam elementos dierentes. \ por isso "ue a potica doclassicismo procurava em v*o uma classiica*o l(gica dosgNneros. A romance noir moderno constituiu-se n*o emtorno de um procedimento de apresenta*o' mas em tornodo meio WPgina =7X

    representado' em torno de personagens e de costumesparticulares3 em outras palavras' sua caractersticaconstitutiva est em seus temas. ,ssim o descreveu' em19C

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    no presente' ocupa um lugar central3 mas a supress*o daprimeira n*o um trao obrigat(rio: os primeirosautores da Qsrie noireK* . Dammett' %. #handler'mantNm o mistrio3 o importante "ue agora ele teruma un*o secundria' subordinada e n*o mais central'como no romance de enigma. 0ssa caracteri2a*o domeio descrito distingue tambm o romance noir doromance de aventuras' embora esse limite n*o seOa muitontido. Percebe-se "ue as propriedades enumeradas ata"ui 4 o perigo' a persegui*o' o conronto 4 tambmpodem ser encontradas num romance de aventuras3 aindaassim' o romance noir mantm sua autonomia' e isto porvrios motivos: o relativo desaparecimento do romancede aventuras e sua substitui*o pelo romance deespionagem3 em seguida' seu pendor para o maravilhosoe o eL(tico' "ue o aproLima' por umlado' do relato de viagem' e' por outro' dos romancesatuaisde ic*o cientica3 enim' uma tendNncia para a descri*o'

    totalmente estranha ao romance policial. , dierena domeio e dos costumes descritos soma-se a essas outrasdistinHes3 e oi precisamente ela "ue e2 com "ue oromance noir se constitusse. WPgina =1X

    m autor de romances policiais particularmentedogmtico' &. &. @an ine' enunciou em 196; vinte

    regras Ks "uais tem de se conormar todo autor deromances policiais digno do nome. 0ssas regras oramreprodu2idasmuitas ve2es depois disso 8ver' por eLemplo' no livro Ocitado de Boileau e $arceOac e oram sobretudo muitocontestadas. #omo nosso intuito n*o prescrever amaneira de proceder' mas descrever os gNneros doromance policial' interessa-nos eLaminar por um instante

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    essas regras. 0m sua orma original' elas s*o bastanteredundantes e podem acilmente ser resumidas nosseguintes oito pontos:

    1. A romance deve ter no mLimo um detetive e umculpado' e no mnimo uma vtima 8um cadver.

    6. A culpado n*o deve ser um criminoso proissional3n*o deve ser o detetive3 deve matar por motivos pessoais.

    !. A amor n*o tem lugar no romance policial.C. A culpado deve go2ar de certa importncia

    a na vida: n*o ser um criado ou uma

    camareira3b no livro: ser um dos personagens principais.

  • 5/22/2018 TODOROV, T. Potica Da Prosa

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    #om eeito' no romance noir muitas ve2es h mais de umdetetive

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    descrevem atos assustadores3 Qcom cinismoQ'poderamos di2er 8Qoe sangrava como um porco. \incrvel "ue um velho possa sangrar tantoQ' Dorace 5ac#oE' iss TomorroC 6oodb(e "dieu la .ie* adieulRamour&&&J=& ,s comparaHes conotam certa rude2a8descri*o das m*os: Qeu sentia "ue se um dia suas m*osagarrassem minha garganta' ele aria Oorrar sangue pormeus ouvidosQ' . D. #hase' Vou 4e.er noC Cit)Nomen 6arces de femmesJ=& Basta ler tal passagem parater certe2a de "ue temos um romance noir nas m*os. $*o de surpreender "ue entre essas duas ormas t*odierentes tenha surgido uma terceira "ue combina suaspropriedades: o romance de suspense. o romance deenigma ele mantm o mistrio e as duas hist(rias' a dopassado e a do presente3 mas n*o redu2 a segunda a umasimples detec*o da verdade. #omo no romance noir* essa segunda hist(ria "ue ocupa a"ui o lugar central. Aleitor ica interessado n*o s( pelo "ue aconteceu antes'mas tambm pelo "ue acontecer mais tarde' ele se

    pergunta tanto sobre o uturo como sobre o passado.,mbos os tipos de interesse encontram-se portantoreunidos a"ui: h a curiosidade de saber como osacontecimentos passados se eLplicam3 e h tambm osuspense: o "ue vai acontecer com os personagensprincipaisI +embremos "ue esses personagens go2am deimunidade no romance de enigma3 a"ui arriscam o tempotodo a vida. A mistrio tem uma un*o dierente da "ue

    tinha no romance de enigma: antes um ponto de partida'o interesse principal vem da segunda hist(ria' a"uela "uese desenrola no presente. Distoricamente' essa orma doromance policial surgiu WPgina =CX

    em dois momentos: serviu de transi*o entre o romance deenigma e o romance noir e eListiu ao mesmotempo "ue este Gltimo. , esses dois perodos

  • 5/22/2018 TODOROV, T. Potica Da Prosa

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    correspondem dois subtipos do romance de suspense. Aprimeiro' "ue poderamos chamar de Qhist(ria do detetivevulnervelQ' veriica-se sobretudo nos romances de

    Dammett e de #handler. &eu trao principal "ue odetetive perde sua imunidade' ele QapanhaQ' erido' suavida est constantemente em risco' em suma' est integradono universo dos outros personagens em ve2 de ser umobservador independente dele' como o leitor 8lembremosda analogia detetive-leitor de @an ine. 0sses romancescostumam ser classiicados de romances noirspor causa domeio "ue descrevem' mas vemos "ue sua composi*o

    aproLima-os mais dos romances de suspense.

    A segundo tipo de romance de suspense "uisOustamente livrar-se do meio convencional dosproissionais do crime e voltar ao crime pessoal doromance de enigma' conormando-se ao mesmo tempo Knova estrutura. isso resultou um romance "uepoderamos chamar de Qhist(ria do suspeito-detetiveQ.

    $esse caso' um crime cometido nas primeiras pginase as suspeitas da polcia recaem sobre determinadapessoa 8"ue o personagem principal. Para provar suainocNncia' essa pessoa tem de encontrar por contapr(pria o verdadeiro culpado' mesmo se para isso colocaa vida em perigo. Pode-se di2er "ue' nesse caso' essepersonagem ao mesmo tempo o detetive' o culpado 8aosolhos da polcia e a vtima 8potencial' dos verdadeirosassassinos. 5uitos romances de rish' PatriT Uuentin'#harles ^illiams oram construdos sobre esse modelo.

    \ dicil di2er se as ormas "ue acabamos dedescrever correspondem a etapas de uma evolu*o oupodem WPgina =

  • 5/22/2018 TODOROV, T. Potica Da Prosa

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    eLpans*o do romance policial 8como em #onan oEle ou5aurice +eblanc' nos aria tender para a segunda solu*o'tanto mais "ue essas trNs ormas coeListem pereitamente

    hoOe em dia. 5as bastante notvel "ue a evolu*o doromance policial em suas grandes linhas tenha seguidoprecisamente a sucess*o dessas ormas. Poderamos di2er"ue' num dado momento' o romance policial sente comoum peso inOustiicado as restriHes de tal ou "ual gNnero elivra-se delas para constituir um novo c(digo. , regra dogNnero percebida como uma restri*o a partir domomento em "ue se torna pura orma e n*o se Oustiica

    mais pela estrutura de conOunto. ,ssim' nos romances deDammett e de #handler o mistrio global tornara-se puropreteLto' e o romance noir "ue veio depois deles livrou-sedele para elaborar mais proundamente essa nova orma deinteresse "ue o suspense e se concentrar em torno dadescri*o de um meio. A romance de suspense "uenasceu depois da grande poca do romance noir* sentiuesse meio como um atributo inGtil' e conservou apenas o

    pr(prio suspense. 5as ao mesmo tempo oi precisoreorar a intriga e restabelecer o antigo mistrio. Asromances "ue tentaram prescindir tanto do mistriocomo do meio pr(prio K Qsrie noireK L como' poreLemplo'efore t)e "ct PrGmGditationsJ de Francis lesou /r& #iple( de Patrcia Dighsmith 4 s*o muito pouconumerosos para "ue se possa airmar "ue ormam umgNnero K parte.

    #hegamos a"ui a uma Gltima "uest*o: o "ue a2ercom os romances "ue n*o entram em nossa classiica*oI,cho "ue n*o por acaso "ue romances como os "ueacabo de mencionar costumam ser avaliados pelo leitorcomo estando K margem do gNnero' como uma ormaWPgina =X

    intermediria entre o romance policial e o romance puro

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    esimples. $o entanto' se essa orma 8ou outra vier a setornar o germe de um novo gNnero de livros policiais'isso n*o ser argumento contra a classiica*o proposta3como O disse' o novo gNnero n*o se constituinecessariamente a partir da nega*o do trao principaldo antigo' mas a partir de um compleLo de propriedadesdierente' sem nenhuma preocupa*o de ormar com oprimeiro um conOunto logicamente harmonioso. WPgina==X

    19.

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    #,P>)+A )+A ;, F,+, &0R$A #A$&),$)

    , pala.ra parece dotada de um poder mgico em"dolp)e& Qma palavra minha a teria acalmado: por "uen*o pude pronunciar essa palavraIQ 8p. 1C. Q0lainsinuava "ue uma s( palavra a traria toda de volta paramimQ 8p. 1C9. Qma palavra e2 desaparecer a"uelaturba de adoradoresQ 8p. 1

  • 5/22/2018 TODOROV, T. Potica Da Prosa

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    certa maneira de discorrer. , solid*o umcomportamento verbal3 o deseOo de independNncia'outro3 o amor' umterceiro. , degrada*o do amor de ,dolphe por 0llnoreWPgina 16

  • 5/22/2018 TODOROV, T. Potica Da Prosa

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    matar 0llnore. $ada mais violento "ue a linguagem.

    Para entender corretamente o sentido da ala'

    devemos indagar primeiro a rela*o "ue esta mantmcom o"ue ela denota' rela*o "ue pode adotar vrias ormas.)emos inicialmente a rela*o mais clssica' "ue podemos

    chamar de simb(lica: nela' o comportamento verbalapenas tradu2 certa disposi*o interna' sem ter com estauma rela*o de necessidade3 uma rela*o arbitrria e

    convencional entre duas sries "ue eListemindependentemente WPgina 16X

    uma da outra. Por eLemplo' ,dolphe dir: Qs ve2es eutentava conter meu aborrecimento' reugiava-me numaprounda taciturnidadeQ 8p.

  • 5/22/2018 TODOROV, T. Potica Da Prosa

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    pode ser dito sobre o ato de alar ou o de escrever.

    , partir de outras rases semelhantes' seria

    interessante a2er um estudo das ormas lingSsticas "uepossibilitam a n(s' leitores' interpretar sem diiculdadeessa lngua dos comportamentos verbais. , orma maisutili2ada seria a coordena*o: o paralelismo sinttico nosleva a descobrir uma semelhana semntica. ,ssim: Qeume reanimava' eu alavaQ' Qo silNncio e o humorQ'Qtaciturno e preocupadoQ' Qeu tentava conter...'reugiava-me numa taciturnidadeQ etc. 0ncontramos

    tambm oraHes predicativas: o verbo ser ou umsubstituto estabelece a rela*o de signiica*o entre asduas partes da ora*o. Por eLemplo: Q5inhas palavrasoram consideradas como prova de WPgina 16=X

    uma alma rancorosaQ3 QA despre2o silenciosoQ3 QAsilNncio ia se tornando embaraosoQ. s ve2es' entre umae outra estabeleceremos uma rela*o de causalidade.

    Q$*o me sustentava nenhum impulso vindo do cora*o.0Lprimia-me' pois* com embaraoQ3 Q,s ra2Hes "ue eualegava eram rgeisporue n*o eram verdadeirasQ. Auainda: Qoendidapor meu silNncio...Q

    , rela*o simb(lica' na "ual a nature2a do signo indierente K nature2a do obOeto designado' n*o abarca oconOunto das ocorrNncias da ala. )omemos por eLemploa cena do Oantar em "ue ,dolphe consegue alegrar

    0llnore. , conversa*o brilhante de ,dolphe simboli2aas "ualidades de sua alma e' ao mesmo tempo' a2 partedela. ma das "ualidades de ,dolphe ser precisamentesua arte da conversa*o. $*o se pode mais alar de umaatitude verbal "ue simboli2a uma propriedade interna'pois a2 parte dela. Au ainda: para chegar K conclus*oQ0llnore nunca ora amada dessa maneiraQ 8p. ;

  • 5/22/2018 TODOROV, T. Potica Da Prosa

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    palavras' a ternura' a densidade dessa carta designam'simboli2am o amor de ,dolphe3 mas ao mesmo tempoa2em parte dele: o amor ' se n*o eLclusivamente' pelomenos parcialmente essa ternura' essa densidade dosentimento3 elas n*o o simboli2am de um modoarbitrrio e convencional. eparamos' pois' a"ui comoutra rela*o entre o signo e o obOeto designado' "ue ado ndice em oposi*o ao smbolo3 ou' se preerirem' dasindo"ue em oposi*o K alegoria.

    s ve2es' um comportamento verbal s( designa esse

    comportamento verbal. A poder indicial t*o grande "ueprovoca uma auto-reerNncia3 dessa orma' a rela*o designiica*o redu2-se a 2ero. \ o "ue ocorre na cena'importante para o desenvolvimento do sentimento em"dolp)e* WPgina 16;X

    da dissimula*o' do segredo 8cap. @. D nela um silNncio"ue signiica precisamente o silNncio' a ausNncia

    de palavras' o segredo' a dissimula*o. Q#alvamo-nosportanto sobre o Gnico pensamento "ue nos ocupavaconstantemente. 8... Uuando eListe um segredo entredois coraHes "ue se amam' "uando um deles resolveuocultar do outro uma Gnica idia' o encanto se rompe' aelicidade est destruda. 8... , dissimula*o Ooga no amor

    um elemento estranho "ue o desnatura e o avilta a seus

    pr(prios olhosQ 8p. 17C. A "ue mata o amor precisamente a dissimula*o' o silNncio3 portanto essesilNncio s( designa ele mesmo.

    5uitas ve2es' uma signiica*o aparentementesimb(lica ter por Gnica inalidade dissimular melhor asigniica*o indicial "ue se encontra no pr(prio ato dealar ou de calar. ,ssim ,dolphe' alando de si mesmo:Q0ntreguei-me a alguns graceOos 8...3 era a necessidade

  • 5/22/2018 TODOROV, T. Potica Da Prosa

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    de alar "ue me possua' e n*o a conianaQ 8p.

  • 5/22/2018 TODOROV, T. Potica Da Prosa

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    0ssa identiica*o do personagem com as palavras"ue proere eLplica a importncia "ue a vo2 ou a escritade uma pessoa podem ganhar. ,ssim ,dolphe: Q0stavaeli2 de adiar o momento em "ue iria ouvir de novo suavo2Q 8p. 1!: n*o se ala do sentido das palavras' masda vo2 "ue as pronuncia. A mesmo se d com 0llnore: aoescutar ,dolphe' ela grita: QFoi a vo2 dele "ue me e2 malQ

    8p. 1C: a vo2 torna-se "uase um obOeto material' passada ordem auditiva para a ordem tctil. Au em 'GcileA Qacomo*o "ue eu sentira K vista de sua escrita...Q 8p. 1;

  • 5/22/2018 TODOROV, T. Potica Da Prosa

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    s*o os mesmos antes e depois do ato de denomina*o3 e arela*o entre as palavras e as coisas uma rela*odinmica e n*o esttica.

    $*o se verbali2a impunemente3 nomear as coisas modiic-las. ,dolphe eLperimenta isso o tempo todo.Q5al tinha traado algumas linhas e minha disposi*omudouQ 8p. 179' "ueiLa-se ele. Pensar uma coisa' por umlado' e di2N-la' ou escrevN-la' ou escut-la' ou lN-la' poroutro' s*o dois atos muito dierentes. $o entanto'poderiam di2er' os pensamentos tambm s*o verbais'

    n*o se pensa sem palavras. e ato3 mas a palavra QalaQdesigna algo mais "ue a simples srie de palavras. ,dierena dupla: primeiro' h o ato de pronuncia*o oude escrita "ue n*o nada gratuito 8lembremos da Qvo2"ue me e2 malQ' segundo as palavras de 0llnore3depois' e isso undamental' a ala est constituda depalavras dirigidas WPgina 1!1X

    a um outro' ao passo "ue o pensamento' ainda "ueverbal' dirige-se apenas a si mesmo. , idia de alaimplica a do outro' de um tu-interlocutor3 por isso' a alaestproundamente vinculada ao outro' "ue desempenha umpapel decisivo no mundo de #onstant.

    @eOamos um eLemplo: os encontros de ,dolphe como bar*o de )???. )udo o "ue o bar*o lhe di2 ,dolphe sabe

    pereitamente3 mas nunca escutara ningum di2er' e oato de essas palavras terem sido pronunciadas "ue setorna signiicativo. Y,"uelas palavras unestas: Y0ntretodosos tipos de sucesso e o senhor eListe um obstculointransponvel' e esse obstculo 0llnoreY ressoavamaomeu redorQ 8p. 1!6. $*o a novidade da idia "ue aeta

  • 5/22/2018 TODOROV, T. Potica Da Prosa

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    ,dolphe' a rase' "ue' pelo ato de eListir' muda arela*o entre 0llnore e ,dolphe' "ue ela supostamentedescrevia. a mesma orma' ,dolphe repetiu mil ve2espara si mesmo 8mas sem di5;lo= "ue tem de abandonar0llnore3 um dia' ele o di2 para o bar*o: a situa*o mudacompletamente. Qmplorara ao cu para "ue erguesseentre 0llnore e mim um obstculo "ue eu n*o pudessetranspor. 0ste obstculo se ergueraQ 8p. 11. A ato deter designado' verbali2ado sua decis*o' muda suanature2a. A "ue leva #onstant a ormular esta mLima:Q0Listem coisas "ue icamos por muito tempo sem di2erpara n(smesmos' mas uma ve2 ditas' nunca mais paramos derepeti-lasQ 8p. 9=.

    As sentimentos de ,dolphe s( eListem por meio daala' o "ue tambm "uer di2er "ue s( eListem paraoutrem. , presena do outro na ala d a esta Gltima seucarter criador' assim como a imita*o do outro

    determinaos sentimentos do personagem: ,dolphe descobrir0llnore por"ue um de seus amigos arrumou umaamante3 e no mais intenso de seus sonhos por uma outramulher' WPgina 1!6X

    companheira ideal' s( a descrever por meio do deseOoimaginrio de seu pai: Qmaginava a alegria de meu paiQ'

    Qse o cu tivesse me concedido uma mulher... "ue meu paipudesse aceitar como ilha sem corarQ 8p. 1!C. Acasamento n*o consiste na escolha por parte do suOeito deuma mulher para ele' mas de uma ilha para um outro' opai.

    esignar os sentimentos' verbali2ar os pensamentos modiic-los. 0Laminemos com mais vagar a nature2a e adire*o dessas mudanas. 0ssa dire*o dupla' segundo a

  • 5/22/2018 TODOROV, T. Potica Da Prosa

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    "ualidade das palavras "ue pronunciamos' e aetasobretudo seu valor de verdade. , primeira regra damodiica*o pode ser ormulada assim: se uma ala

    procurar ser verdadeira' ela se tornar alsa. Uuererdescrever um estado de alma tal como ele ' dar dele umadescri*o alsa' pois depois da descri*o ele n*o ser maiso "ue era antes. 0 o "ue ,dolphe sente o tempo todo: Q,medida "ue ia alando sem olhar para 0llnore' sentiaminhas idias se tornarem mais vagas e minha resolu*oenra"uecerQ 8p. 119: depois de nomeada' a resolu*odeiLa de eListir. Au em outra passagem: Q&a di2endo

    essas palavras: mas "uem me eLplicar por "ualmobilidade o sentimento "ue me as ditava se esvaeceuantes mesmo de eu terminar de pronunci-lasIQ 8p. 1!6.,gora O conhecemos a resposta: o sentimento se esvaeceuprecisamente por"ue as palavras "ue o designavam orampronunciadas. Au ainda: Q0stava angustiado com aspalavras "ue acabara de pronunciar' e mal acreditava napromessa "ue i2eraQ 8pp. 1

  • 5/22/2018 TODOROV, T. Potica Da Prosa

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    de ingir' de repente tive a impress*o de eLperiment-locom urorQ 8pp. =7-1. ,s palavras alsas tornam-severdadeiras' n*o se pode alar ou escrever impunemente.ma cena semelhante est descrita em!e ca)ier rougeAQe tanto di2N-lo' chegava "uase a acreditarQ 8pp. 1!;-9.0 se as palavras criam a realidade "ue antes evocavamicticiamente' o silNncio' por sua ve2' a2 essa mesmarealidade desaparecer. Q,s triste2as "ue eu ocultava'es"uecia-as em parteQ 8p. 11= etc.

    0ssas duas regras' por mais simples "ue seOam'

    abarcam o conOunto da produ*o verbal. isso decorreum paradoLo relativo K sinceridade ou K veracidade' "ue#onstant ormulou com precis*o: QUuase nunca algum totalmente sincero ou age totalmente de m-Q 8p. =7.

    0ssa airma*o remete tanto K ausNncia de unidade napersonalidade como Ks propriedades da pr(pria ala "ue'mentirosa' torna-se verdadeira' e sincera' se torna alsa.

    $*o eListe pura mentira nem pura verdade.As signos e o "ue eles designam n*o mais se

    apresentam como duas sries independentes' cada "ualpodendo representar a outra3 ormam um todo e "ual"uer

    delimita*o territorial alseia sua imagem. $*o seconsegue denominar ou comunicar um sentimento sem

    alter-lo3 n*o eListe ala puramente constativa. Au' demodo WPgina 1!CX

    mais geral: n*o se deve alar da essNncia de um ato ou deum sentimento tentando a2er abstra*o da eLperiNncia"ue dele temos. #onstant nos propHe uma concep*odinmica da psi"ue: n*o eListe "uadro estvel' iLo de umave2 por todas' no "ual apareceriam' um depois do outro'elementos novos: o surgimento de cada um modiica a

  • 5/22/2018 TODOROV, T. Potica Da Prosa

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    nature2a dos outros e eles s( se deinem por suas relaHesmGtuas. sso n*o "uer di2er "ue os sentimentos n*oeListem ora das palavras "ue os designam3 mas eles s(

    s*o o "ue s*o por sua rela*o com essas palavras.Uual"uer esoro de conhecer o uncionamento ps"uiconum "uadro esttico est destinado ao racasso.

    @imos "ue a ala alsa se tornava verdadeira' "ue tinhao poder de criar o reerente evocado Qde brincadeiraQ numprimeiro momento. Pode-se generali2ar essa regra e di2er"ue as palavras n*o surgem em conse"SNncia de uma

    realidade ps"uica "ue elas verbali2am' mas "ue elas s*o apr(pria origem dessa realidade: no comeo era o verbo...,s palavras criam as coisas em ve2 de serem um plidoreleLo delas. Au como di2 #onstant em 'Gcile a prop(sitode um caso particular: Q#omo tantas ve2es acontece navida' as precauHes "ue ele tomou para "ue a"uelesentimento n*o se reali2asse oram precisamente o "ue e2com "ue ele se reali2asseQ 8p. 197.

    )odo comrcio amoroso' por eLemplo' obedece a essalei3 os personagens de #onstant est*o cientes dela e agemde acordo. Uuando 0llnore "uer se proteger do amor de,dolphe' tenta inicialmente aastar as palavras "ue odesignam. Q&( raramente ela consentia em me receber' ...com a promessa de "ue eu Oamais lhe alasse de amorQ8p. =9. 0llnore precavida' pois sabe "ue aceitar alinguagem aceitar o pr(prio amor' as palavras n*o

    tardar*o a criar as coisas. 0 o "ue ocorre pouco depois:Q0la permitiu "ue eu lhe pintasse meu amor3 oi seamiliari2ando WPgina 1!

  • 5/22/2018 TODOROV, T. Potica Da Prosa

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    linguagem "ue a cada dia me mais impossvel lhe alarQ8p. 66. Rermaine n*o pede amor' mas a linguagemdo amor3 o "ue' sabemos agora' n*o menos e sim mais3

    #onstant tambm sabe bem disso3 n*o o amor "ue setornou impossvel' mas precisamente o emprego dessalinguagem. ,dolphe n*o agir de outra orma "uandotentar interromper seu relacionamento com 0llnore.QFelicitei-me "uando consegui substituir as palavras deamor pelas da aei*o' da ami2ade' da devo*o...Q 8p. 17=.

    Autra cena notvel em "dolp)e descreve assim o

    surgimento da piedade. 0llnore di2 a ,dolphe: Q#rNs teramor mas apenas tens piedade.Q 0 ele comenta: QPor "uepronunciou ela essas palavras unestasI Por "ue merevelou um segredo "ue eu "ueria ignorarI... Amovimento ora destrudo3 estava determinado em meusacricio' mas ele n*o me deiLava mais eli2... Q 8p. 11C. ,piedade toma' pois' o lugar do amor pela ora de umarase: a piedade' cuOa eListNncia era at ent*oproblemtica' torna-se o sentimento predominante em

    ,dolphe.

    )odas as palavras' e n*o s( as do mgico' tNm umcarter encantat(rio. $o conto"sfadas* Perrault descreveo maravilhoso dom "ue uma ada concede a duas irm*s.Para a primeira: Q#oncedo-lhe o dom' prosseguiu a ada'de "ue a cada palavra "ue alar' de sua boca sair*o umalor ou uma pedra preciosa.Q Para a segunda: Q#oncedo-

    lhe o dom de "ue a cada palavra "ue alar' de sua bocasair*o uma cobra ou um sapo.Q 0 a predi*o se reali2a logo

    em seguida: Q0nt*o' m*e' respondeu a mal-educada'WPgina 1!X

    soltando duas vboras e dois sapos.Q 5as' diria #onstant'

    todos n(s recebemos esse mesmo dom e as palavras "ue

  • 5/22/2018 TODOROV, T. Potica Da Prosa

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    saem de nossa boca se transormam inevitavelmente emrealidade palpvel. escobrimos "ue sobre nossosombros pesa uma responsabilidade insuspeitada: n*o sepode alar por alar' as palavras s*o sempre mais "ue aspalavras' e corre-se grande perigo caso n*o se leve emconta as conse"SNncias do "ue se di2. A pr(prio#onstant ormula assim a Qidia principalQ de"dolp)eAindicaro perigo presente Qno simples hbito de adotar alinguagem do amorQ. ,o a2ermos isso' Qembrenhamo-nosnum caminho cuOo im n*o podemos preverQ 8p. !=.

    Por isso' as palavras s*o mais importantes 4 e maisdiceis 4 "ue as aHes "ue elas designam. ,dolphe n*oconseguira deender a honra de 0llnore com suaspalavras' embora n*o hesite em duelar por ela3 e elecomenta: Q)eria preerido lutar com eles a responder-lhesQ 8p. 176. 0 #onstant dir de si mesmo: QA "uesempre me preOudicou oram minhas palavras. &empre

    diminuram o mrito de minhas aHesQ

  • 5/22/2018 TODOROV, T. Potica Da Prosa

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    #oisas presentes e ausentes

    $em toda ala tem o mesmo poder de evocar no

    mundo o "ue ela nomeia. ma cena do oitavo captulonos ornece uma boa ilustra*o disso. 0llnore a2 com "ue,dolphe encontre uma de suas amigas "ue deve servirde intermediria entre os amantes desunidos. ,dolphe'num arroubo de sinceridade' revela seu verdadeirosentimento por 0llnore diante da amiga: Y,t estemomento nunca disse a ningum "ue n*o amo mais0llnoreQ 8p. 1C63 e' como O sabemos' entre pensar uma

    coisa' nem "ue osse mil ve2es' e di2N-la' h uma distnciaininita. 5as esse ato torna-se a"ui particularmentesigniicativo' pois essa ala est dirigida a uma terceirapessoa. Q0ssa verdade' at ent*o encerrada em meu cora*o'e s( Ks ve2es revelada a 0llnore em meio a discussHes ec(leras' ganhou aos meus pr(prios olhos mais realidade eora pelo simples ato de "ue um outro dela se tornaradepositrioQ 8p. 1C!. ,s mesmas palavras dirigidas a0llnore n*o tinham o mesmo signiicado' n*odesempenhavam o mesmo papel' pois 0llnore era um tu en*o um ele& ,oposi*o entre ambos a "ue eListe entreuma alapessoal "ue s( conhece eu e tu e a ala impessoal*"ue a do ele e sobretudo' como veremos' a de um aspessoas& , dierena entre ambas claramente sentida por,dolphe: Q0 um grande passo' um passo irreparvel"uando de repente desvelamos aos olhos de um terceiro osrecVnditos de uma rela*o ntima...Q 8p. 1C!. , ala

    impessoal transorma o sentimento em realidade: mas sera realidade outra coisa sen*o o "ue enunciado por essaala impessoal' pela ala das n*o-pessoasI

    sso eLplica a importncia "ue ,dolphe atribui 8bemcomo #onstant em seus dirios K opini*o pGblica: estaWPgina 1!;X

    nada mais sen*o essa ala impessoal' cuOo suOeito da

  • 5/22/2018 TODOROV, T. Potica Da Prosa

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    enuncia*o permanece anVnimo e "ue tem o poder de criaratos. ,o tentar entender o "uanto vale' ,dolphe n*oindaga a si mesmo' mas tenta evocar na mem(ria Ou2osimpessoais. Q+embrava-me... dos elogios eitos aos meusprimeiros ensaiosQ 8p. 1!6. Q)odo louvor' toda aprova*o

    Ks minhas idias ou aos meus conhecimentos me soavam

    como uma crtica insuportvel...Q 8p. 1!! etc. $otemos'por um lado' o carter incontestvel 8para ,dolphedesses Ou2os' por outro' o ato de "ue n*o a2 sentido"uestionar-se sobre seu autor. \ isso "ue #onstantchama'para si mesmo' de Quma situa*o parecida com oinernoQ: Qo alat(rio ininterrupto' esse espanto doshomens mais esclarecidos da Frana sobre a estranhaassocia*o com a "ual terminei...

  • 5/22/2018 TODOROV, T. Potica Da Prosa

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    citada doZournalA Q,o inici-lo Wesse dirioX' impus amim mesmo a lei de escrever tudo o "ue sentia.Abservei essa lei da melhor WPgina 1!9X

    maneira "ue pude' porm a inluNncia do hbito de alarpara a galeria tamanha "ue ve2 por outra n*o a observeitotalmenteQ 8p. C6;. 0screver Qalar para a galeriaQ:pelo simples ato de escrever 8e n*o alar #onstant vN seudiscurso se parecer com a"uele dirigido a um pGblico' coma ala impessoal. 0le ainda ir notar muitas ve2es essapresena do pGblico na escrita. Q,Oamos de boa- e n*o

    escrevamos para n(s como se osse para o pGblicoQ

  • 5/22/2018 TODOROV, T. Potica Da Prosa

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    nos adverte otempo todo de "ue o dirio n*o uma descri*otransparente' um puro releLo da QvidaQ: a escrita OamaisWPgina 1C7X

    poderia sN-lo. Qevo registrar a"ui "ue trato meu diriocomo trato minha vidaQ' escreve ele

  • 5/22/2018 TODOROV, T. Potica Da Prosa

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    numa s(' deveremos di2er: as palavras ditas n*o signiicam apresena das coisas' mas sua ausNncia. Formulada assim'essa lei pertinente para o conOunto dos reerentes' e n*os( para uma de suas partes: a verbali2a*o altera a nature2adas atividades ps"uicas e indica sua ausNncia3 ela n*oaltera a nature2a dos obOetos materiais' mas iLa antessua ausNncia "ue sua presena. WPgina 1C1X

    )odos os casos analisados at a"ui se encaiLam nessalei. 0is um outro' particularmente elo"Sente' "ueencontramos em 'GcileA QA 2elo com "ue assegurava "ue

    depois de casada Oamais se arrependera dessa uni*oconvenceu-me de imediato de "ue ela n*o tardara a searrependerQ 8p. 1;;. Au ainda esta rase de "dolp)eAQ0ncanto do amor' "uem te sentiu n*o conseguiria tedescreverQ 8p. 97. , descri*o do amor designa suaausNncia' assim como a airma*o da ausNncia dearrependimento designa sua presena 8a ausNncia daausNncia. ,s palavras n*o designam as coisas' mas ocontrrio das coisas.

    \ necessrio compreender essas airmaHes paradoLaisprecisamente en"uanto tais. $*o se pode substituir aspalavras por seus contrrios para paliar as ameaas "ueespreitam a comunica*o3 e n*o se trata de um empregoinade"uado da linguagem. A sentido do paradoLo icariaobliterado se n*o eListisse uma lei Gnica "ue postulasse"ue o emprego das palavras implica a ausNncia de seu

    reerente. ,s palavras designam o contrrio do "ueparecem designar3 se essa aparNncia' esse QsemblanteQdesaparecesse' o sentido da lei contradit(ria da linguagemdesapareceria por completo e imediatamente.

    0m "dolp)e* somos constantemente lembrados dessarealidade primordial' necessria para "ue a transgress*oseOa possvel. ,ssim' o bar*o de )??? dir a ,dolphe: QAsatos s*o positivos' s*o pGblicos Wmais uma ve2 a opini*o

  • 5/22/2018 TODOROV, T. Potica Da Prosa

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    pGblica "ue torna um YatoY YpositivoYX3 impedindo-me delembr-los' o senhor pensa destru-losIQ 8p. 1!7. 0 opr(prio ,dolphe airmar: QA "ue n*o se di2 nem por isso

    deiLa de eListirQ 8p. ;. 0ssas rases n*o contradi2em deorma alguma a doutrina da ala "ue se separa de tudo o"ue a precede3 ao contrrio' ornecem a sua condi*onecessria' essa rela*o primordial sem a "ual o paradoLo daala n*o teria eListido. WPgina 1C6X

    , releL*o sobre a nature2a da ala e' por conseguinte'de "ual"uer comunica*o' provoca em #onstant um

    sentimento "ue poderamos caracteri2ar como sendo odo Qverbo trgicoQ. , comunica*o nada mais sen*o um

    mal-entendido dissimulado ou adiado3 o esoro para secomunicar uma brincadeira de criana' o "ue #onstantdeve ter sentido proundamente' a Oulgar por estaspoucas rases eLtradas de seu dirio: Q$ingum nosconhece a n*o ser n(s mesmos' ningum mais pode nos

    Oulgara n*o ser n(s mesmos: entre os outros e n(s h umabarreira intransponvelQ 8p. 1!9. QAs outros s*o osoutros'Oamais aremos com "ue seOam n(s mesmos... 0ntre n(se o "ue n*o somos n(s h uma barreira inultrapassvelQ8p. C6;. Q$o undo minha vida n*o est em nenhumoutro lugar sen*o em mim mesmo...' seu interior est

    cercado de n*o sei "ue barreira "ue os outros n*otranspHem...Q 8p. C9C. 0ssa obsedante barreira "ue#onstant n*o consegue se impedir de sentir reside nanature2a mesma da palavra e ela ' de ato'inultrapassvel: motivo suiciente para o pessimismo"ue geralmente percebemos ao ler os teLtos de #onstant., idia de "ue n*o havendo comunica*o os sentimentos"ue dela se tornariam obOeto permaneceriam intactos n*o

    serve de consolo: sabemos agora "ue eles s( eListem

  • 5/22/2018 TODOROV, T. Potica Da Prosa

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    nessa comunica*o. ,gimos ent*o' dir #onstant' Qcomose "uisssemos nos vingar em nossos pr(priossentimentos da dor "ue sentimos por n*o poder d-los aconhecerQ 8p.

    sonhar t*o-somente com a independNncia "ue lhe alta3uma ve2 livre' no entanto' n*o consegue desrutar disso:QUuanto me pesava' essa liberdade "ue eu tanto almeOaraUuanto altava para meu cora*o a"uela dependNncia "uetantas ve2es me revoltaraQ 8pp. 1=!-C. , aboli*o dadistncia entre suOeito e obOeto do deseOo abole o pr(priodeseOo.

    sso tem vrias conse"SNncias. 0m primeiro lugar' o

  • 5/22/2018 TODOROV, T. Potica Da Prosa

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    deseOo nunca ser t*o intenso como na ausNncia de seuobOeto3 o "ue leva #onstant a valori2ar de orma absoluta aausNncia' a desvalori2ar a presena. 0screver em seu

    dirio: Q5inha imagina*o "ue sente t*o vivamente osinconvenientes de toda a situa*o presente...Q 8p. !!3QUual"uer "ue seOa a minha vontade' apenas em ausNncia"ue uma resolu*o "ual"uer pode ser eLecutadaQ 8p. !;!.#hegar at mesmo a esta (rmula' Gnica em sua concis*o:Q&( amo em ausNncia...Q 8p. =1.

    , satisa*o do deseOo signiica sua morte e portanto ainelicidade. &er amado ser ineli2. Q$ingum oi mais

    WPgina 1CCX

    amado' mais louvado' mais acariciado "ue eu' e Oamaisum homem oi menos eli2Q' escrever ainda #onstant8p.

  • 5/22/2018 TODOROV, T. Potica Da Prosa

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    ele "ue o cria 8tema avorito dos mitos e dos contospopulares: pensemos em todas as hist(rias deinterdiHes.#onstant escrever a respeito de sua segunda mulher:QDorrivelmente cansado dela "uando ela "uis se unir amim' K primeira palavra sua de "ue' conorme o rogo deseu pai' ela "ueria adiar essa uni*o' senti-me novamentetomado de uma paiL*o devoradoraQ 8p. !76.

    ,o mesmo tempo' n*o basta di2er "ue se deseOa n*oa presena de um obOeto mas sua ausNncia3 mais uma ve2

    n*o se trata de um uso lingSstico inade"uado' esubstituir as palavras por seus contrrios n*o resolveriaas coisas. A paradoLo e a tragdia do deseOo decorremprecisamente de sua nature2a dupla. eseOa-se a um s(tempo o WPgina 1C

  • 5/22/2018 TODOROV, T. Potica Da Prosa

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    relativo' a dor do outro um valor absoluto' e suanega*o' sua recusa' a Gnica reerNncia positiva. 0sseprincpio determinar a conduta de ,dolphe' assim como

    determina a de #onstant 8 nisso "ue pensamos ao alar daQra"ue2a de carterQ deles. , elicidade' ou melhor' o "uea substitui a"ui' a ausNncia de inelicidade' tambmdepende totalmente do outro: QA nec plus ultra da elicidadeseria nos a2ermos mutuamente o menos mal possvelQ 8p.

  • 5/22/2018 TODOROV, T. Potica Da Prosa

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    da hist(ria da psicologia 8o "ue . DEtier sugeriu em!esromans de lRindi.iduA QA nome de #onstant deveriaigurar nos manuais de psicologiaQI D no entanto umato material "ue deveria nos deiLar alertas: "uase todosos elementos dessa teoria se encontram em"dolp)e* eat eLclusivamente em"dolp)e& As dirios ou os outrosescritos apenas conirmam uma parte das idias de#onstant. &er por acaso "ue seu Gnico teLtopropriamente literrio "uase totalmente dedicado aesse temaI

    Pode-se propor a eLplica*o seguinte para esse ato.\ ra2ovel supor "ue a variedade temtica da literaturaseOa apenas aparente3 "ue na base de toda literatura seencontram os mesmos' digamos' universais semnticos'pouco numerosos' mas cuOas combinaHes etransormaHes ornecem toda a variedade de teLtoseListentes. &e assim or' pode-se ter certe2a de "ue odeseOo seria um WPgina 1C=X

    desses universais 8a troca poderia ser outro. Ara' ao tratarda ala' #onstant tambm trata do deseOo: observamos ae"uivalNncia ormal entre ambos. Pode-se portanto di2er"ue toda essa problemtica proundamente literria3 odeseOo seria at mesmo uma das constantes "uepermitem deinir a pr(pria literatura.

    5as por "ue' podem perguntar' o deseOo seria um dosuniversais semnticos da literatura 8apenas suaimportncia na vida humana n*o uma ra2*osuicienteI ,cabamos de ver "ue o deseOo unciona damesma maneira "ue a ala 8da mesma maneira "ue atroca' alis3 ora' tambm a literatura ala' embora umaala dierente. ,o tomar o deseOo como uma dasconstantes temticas' a literatura nos revela' de maneiradistorcida' seu segredo "ue sua lei primordial: "ue ela seu pr(prio obOeto essencial. ,o alar do deseOo ela

  • 5/22/2018 TODOROV, T. Potica Da Prosa

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    continua a alar de si mesma. Pode-se' pois' desde Olanar uma hip(tese sobre a nature2a dos universaissemnticos da literatura: eles sempre ser*o apenastransormaHes da literatura ela mesma. WPgina 1C;X

    19=.

    #,P>)+A 9

    , R%,5)#, , $,%%,)@,

    A emprego meta(rico de "ue desrutam termos comoQlinguagemQ' QgramticaQ' QsintaLeQ etc. costuma nosa2er es"uecer "ue essas palavras poderiam ter umsentido preciso' mesmo "uando n*o se reerem a uma

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    lngua natural. ,o nos propormos a tratar da Qgramticada narrativaQ' devemos inicialmente precisar "ual osentido "ue a palavra QgramticaQ adota a"ui.

    esde os prim(rdios da releL*o sobre a linguagem'surgiu a hip(tese de "ue' para alm das dierenasevidentes entre as lnguas' pode-se descobrir umaestrutura comum. ,s investigaHes sobre essa gramticauniversal prosseguiram' com enorme sucesso' durantemais de vinte sculos. ,ntes da poca atual' seu augesem dGvida se situa nos modistas dos sculos Z e

    Z@3 eis como um deles' %obert il`ardbE' ormulava ocredo deles: Q, gramtica s( pode se constituir numaciNncia com a condi*o de ser uma para todos oshomens. \ por acaso "ue a gramtica enuncia regraspr(prias a uma determinada lngua' como o latim ou ogrego3 assim como a geometria n*o se ocupa de linhas ousupercies concretas' a gramtica estabelece a corre*odo discurso na medida em "ue este WPgina 1C9X

    a2 abstra*o da linguagem real Wo uso atual nos levaria ainverter os termos discurso e linguagemJ& $ obOeto dagramtica o mesmo para todo o mundoQ1.

    Porm' caso admitamos a eListNncia de uma gramticauniversal' n*o devemos mais nos limitar apenas Kslnguas. 0la decerto ter uma realidade psicol(gica3 nessesentido' podemos citar Boas' cuOo testemunho temainda mais valor O "ue seu autor inspirou precisamentea lingSstica antiuniversalista: QA surgimento dos conceitosgramaticais mais undamentais em todas as lnguas deveser considerado como prova da unidade dos processospsicol(gicos undamentaisQ

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    simb(licas do homem alm da lngua natural. #omo essagramtica continua sendo hipottica' evidente "ue osresultados de um estudo sobre tal atividade ser*o pelo

    menos t*o pertinentes para seu conhecimento "uanto os deuma investiga*o sobre o rancNs' por eLemplo.neli2mente' eListem pou"ussimas pes"uisas avanadassbre a gramtica das atividades simb(licas3 um dos raroseLemplos "ue podemos citar o de Freud e seu estudo dalinguagem onrica. ,lis' os lingSistas nunca tentaram lev-lo em conta "uando se indagaram sobre a nature2a dagramtica universal.

    Portanto' uma teoria da narrativa tambm contribuirpara o conhecimento dessa gramtica' na medida em "ueWPgina 1

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    duas unHes' e a interpenetra*o delas no lLico muitasve2es nos leva a es"uecer a dierena "ue eListe entreelas. Uuando digo Ka crianaQ' essa palavra serve paradescrever um obOeto' para enumerar suas caractersticas8idade' altura etc3 mas ao mesmo tempo ela me permiteidentiicar uma unidade espao-temporal' dar-lhe umnome 8em particular' nesse caso' devido ao artigo. 0ssasduas unHes est*o distribudas de modo irregular nalngua: os nomes pr(prios' os pronomes 8pessoais'demonstrativos etc' o artigo ser-vem antes de tudo paraa denomina*o' ao passo "ue o nome comum' o verbo' oadOetivo e o advrbio s*o sobretudo WPgina 1

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    sentido principal de Qnome prDprioK n*o Qnome "uepertence a algumQ' mas Qnome sem sentido pr(prioQ'Qnome por eLcelNnciaQ. &e o agente de uma rase or um

    nome comum 8um substantivo' devemos submetN-lo auma anlise "ue distinga' na pr(pria palavra' seus aspectosdenominativo e descritivo. i2er' como costuma a2erBocaccio' Qo rei da FranaQ ou Qa viGvaQ ou Qo criadoQ' aum s( tempo identiicar uma pessoa Gnica e descreveralgumas de suas propriedades. )al eLpress*o e"uivale a todauma ora*o: seus aspectos descritivos ormam o predicadoda ora*o' seus aspectos denominativos' o suOeito. QA rei

    da Frana parte de viagemQ contm' na verdade' duasoraHes: QZ rei da FranaQ e QZ parte de viagemQ' onde Zdesempenha o papel de nome pr(prio' mesmo "ue essenome esteOa ausente na novela. A agente n*o pode WPgina1

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    contrrio' o e"uilbrio restabelecido3 o segundo e"uilbrio semelhante ao primeiro' mas os dois nunca s*o idNnticos.

    D' por conseguinte' dois tipos de epis(dios numanarrativa: os "ue descrevem um estado 8de e"uilbrio ou dedese"uilbrio e os "ue descrevem a passagem de um estadopara outro. A primeiro tipo ser relativamente esttico e'pode-se di2er' iterativo: o mesmo gNnero de a*o poderiaser repetido indeinidamente. A segundo' emcontrapartida' ser dinmico e' em princpio' s( ocorre umave2.

    0ssa deini*o dos dois tipos de epis(dios 8e portantode rases "ue os designam nos permite relacion-los comduas partes do discurso' o adOetivo e o verbo. #omo O oidito muitas ve2es' a oposi*o entre verbo e adOetivo n*o a de uma a*o sem nenhuma rela*o com uma "ualidade'mas a de dois aspectos' provavelmente iterativo e n*o-iterativo. As QadOetivosQ narrativos ser*o' portanto' a"uelespredicados "ue descrevem estados de e"uilbrio ou de

    dese"uilbrio3 os QverbosQ' a"ueles "ue descrevem apassagem de um para o outro. WPgina 1

    )alve2 algum se indague por "ue nossa lista daspartes do discurso n*o comporta substantivos. 5as osubstantivo pode sempre ser redu2ido a um ou vriosadOetivos' como O ressaltaram alguns lingSistas. D. Paulescreve: QA adOetivo designa uma propriedade simples

    ou "ue representada como simples3 o substantivocontm um compleLo de propriedadesQ

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    narrativo. ma propriedade pode ser designada tanto porum adOetivo como por um substantivo ou at por umalocu*o. 0stamos tratando a"ui dos adOetivos ou verbosda gramtica da narrativa e n*o da do rancNs.

    )omemos um eLemplo "ue nos permitir ilustraressas Qpartes do discursoQ narrativo. Peronella recebe oamante na ausNncia do marido' pobre pedreiro. 5as umdia este retorna mais cedo K casa. Peronella esconde oamante num barril3 depois "ue o marido entra' ela lhe di2"ue algum "ueria comprar o barril e "ue esse algum o

    est eLaminando na"uele momento. A marido acreditanela e alegra-se com a venda. 0le vai raspar o barril paralimp-lo3 en"uanto isso' o amante a2 amor comPeronella' "ue passou a cabea e os braos pela aberturado barril' tapando-o dessa orma 8@' 6.

    Peronella' o amante e o marido s*o os agentes dessahist(ria. As trNs s*o nomes pr(prios narrativos' embora os

    dois Gltimos n*o seOam nomeados3 podemos design-lospor Z' e . ,s palavras amante e marido indicamademais WPgina 1

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    a esposa iniel3 mas essa a*o serviria para restabelecer oe"uilbrio inicial. Ara' a novela 8ou pelo menos asnovelas de Bocaccio Oamais descrevem tal repeti*o daordeminicial. A verbo QpunirQ est portanto presente na novela8 o perigo "ue ameaa Peronella' mas n*o se reali2a'permanece em estado virtual. , segunda possibilidadeconsiste em encontrar um meio de evitar a puni*o3 o"ue ar Peronella3 consegue-o disarando a situa*o dedese"uilbrio 8a transgress*o da lei em situa*o dee"uilbrio 8a compra de um barril n*o burla a leiamiliar. D portanto um terceiro verbo' QdisararQ. Aresultado inal novamente um estado' portanto umadOetivo: instaura-se uma nova lei "ue' embora n*oeLplcita' admite "ue a mulher siga suas inclinaHesnaturais.

    , anlise da narrativa nos permite' portanto' isolarunidades ormais "ue revelam evidentes analogias com as

    partes do discurso: nome pr(prio' verbo' adOetivo. #omo'nesse caso' n*o levamos em conta a matria verbal "uesuporta essas unidades' torna-se possvel deini-las demaneira mais clara do "ue estudando uma lngua.WPgina 1

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    enuncia*o. Para comear' distinguiremos duas classes: oindicativo' por um lado3 todos os outros modos' poroutro.0sses dois grupos opHem-se tal como o real ao irreal. ,s

    rases enunciadas no indicativo s*o percebidas comodesignando aHes "ue realmente ocorreram3 se o modoor outro' por"ue a a*o n*o se reali2ou' mas eListepotencialmente' virtualmente 8a puni*o virtual dePeronella um eLemplo.

    ,s antigas gramticas eLplicavam a eListNncia dasrases modais pelo ato de "ue a linguagem serve n*o s(para descrever e' portanto' para se reerir K realidade' mastambm para eLprimir nossa vontade. a tambm aestreita rela*o' em vrias lnguas' entre os modos e outuro' "ue geralmente s( denota uma inten*o. $*oiremos com elas at o im: pode-se estabelecer umaprimeira dicotomia entre os modos pr(prios do

    ecamero* "ue s*o "uatro' indagando se eles est*o oun*o ligados a uma vontade. 0ssa dicotomia nos d doisgrupos: os modos da .ontade e os modos da )ipDtese&

    As modos da vontade s*o dois: o obrigativo e ooptativo. A obrigati.o o modo de uma rase "ue temde acontecer3 uma vontade codiicada' n*o-individual"ue constitui a lei de uma sociedade. Por isso' o obrigativotem WPgina 1

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    personagem. 0m certo sentido' toda rase pode serprecedida pela mesma rase no optativo' na medida em"ue cada a*o do ecamero L embora em dierentesgraus 4 resulta do deseOo "ue algum tem de "ue essaa*o se reali2e. , ren[ncia um caso particular dooptativo: um optativo airmado e depois negado.,ssim Rianni renuncia a seu primeiro deseOo detransormar sua mulher em Oumento "uando ica sabendodos detalhes da transorma*o 8Z' 17. )ambm,nsaldo renuncia ao seu deseOo de possuir ianora'"uando ica sabendo da generosidade do marido dela 8Z'

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    ,nsaldo Qum Oardim "ue' em Oaneiro' esteOa lorido comono mNs de maioQ3 se tiver sucesso' poder possu-la.$uma novela' a prova*o pode chegar a ser o temacentral: PErrhus pede a +dia' como prova de seu amor'"ue ela reali2e trNs atos: matar' sob os olhos do marido'seu melhor alc*o3 arrancar um tuo da barba de seumarido3 eLtrair' por im' um de seus melhores dentes.epois de +dia passar pela prova*o' ele consentir emdeitar com ela 8@' 9.

    Finalmente' oprediti.o tem a mesma estrutura "ue o

    condicional' mas o suOeito "ue predi2 n*o deve ser osuOeito da segunda ora*o 8a conse"SNncia3 nisso' ele separece com o Qtrans-relativoQ deinido por ^hor.$enhuma restri*o pesa sobre o suOeito da primeiraora*o. Pode' pois' ser o mesmo "ue o suOeito daenuncia*o 8em ' !: se eu deiLar 5elchisedechconstrangido' pensa &aladin' ele me dar dinheiro3 em Z'17: se eu or cruel com Rriselda' pensa Rautier' ela

    tentar me preOudicar. ,s duas oraHes podem ter omesmo suOeito 8@' ;: se Rirolamo se aastar da cidade'pensa sua m*e' ele deiLar de amar &alvestra3 @' =: semeu marido estiver com ciGmes' supHe Beatrice' ele selevantar e sair. 0ssas prediHes s*o Ks ve2es muitoelaboradas: assim' na Gltima novela' para deitar com+udovic' Beatrice di2 a seu marido "ue +udovic lhe a2a corte3 de modo semelhante' em ' !' para provocar o

    amor de um cavalheiro' uma dama se "ueiLa ao amigoda"uele de "ue ele n*o pra de lhe a2er WPgina 1

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    maniesta*o particular da l(gica do verossmil. &upomos"ue uma a*o provocar outra por"ue essa causalidadecorresponde a uma probabilidade comum. #ontudo' n*ose deve conundir esse verossmil dos personagens comas leis "ue o leitor sente como verossmeis: tal conus*onos levaria a procurar a probabilidade de cada a*o emparticular "uando na verdade o verossmil dospersonagens tem uma realidade ormal precisa' opreditivo.

    ,o tentarmos articular melhor as relaHes eListentes

    entre os "uatro modos' teremos' alm da oposi*oQpresena/ausNncia de vontadeQ' uma outra dicotomia"ueopor o optativo e o condicional' por um lado' aoobrigativo e preditivo' por outro. As dois primeiros secaracteri2am por uma identidade do suOeito daenuncia*o com o suOeito do enunciado: somos n(smesmos "ue nos colocamos em "uest*o. As doisGltimos' em contrapartida'reletem aHes eLteriores ao suOeito "ue enuncia: s*o leissociais e n*o individuais.

    !. &e nos propusermos a ir alm do nvel da rase'aparecem problemas mais compleLos. #om eeito' ata"uipodamos comparar os resultados de nossa anlise comos dos estudos sobre as lnguas. 5as n*o eListe teoria

    lingSstica do discurso3 portanto n*o tentaremos nosreerir a ela. 0is algumas conclusHes gerais sobre aestrutura do discurso narrativo "ue podemos tirar daanlise doecamero&

    ,s relaHes "ue se estabelecem entre rases podemser de trNs tipos. , mais simples a rela*o temporal emWPgina 1

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    sucedem no mundo imaginrio do livro. , rela*o l(gica um outro tipo de rela*o3 geralmente as narrativasbaseiam-se em implicaHes e pressuposiHes' ao passo"ue os teLtos mais aastados da ic*o se caracteri2ampela presena da inclus*o. Por im' uma terceira rela*o de tipo QespacialQ' na medida em "ue as duas rasesest*o Oustapostas por causa de certa semelhana entreelas' desenhando assim um espao pr(prio ao teLto.)rata-se' claro' do paralelismo' com suas mGltiplassubdivisHes3 essa rela*o parece predominar nos teLtosde poesia. , narrativa possui os trNs tipos de relaHes'mas numa dosagem sempre dierente e segundo umahierar"uia pr(pria a cada teLto em particular!.

    Podemos estabelecer uma unidade sinttica superiorK ora*o3 chamemo-la seYncia& , se"SNncia tercaractersticas dierentes conorme o tipo de rela*oentre oraHes3 mas' em cada caso' uma repeti*oincompleta da

    ora*o inicial marcar seu im. Por outro lado' a se"SNnciaprovoca uma rea*o intuitiva por parte do leitor: "ual seOa'

    ele sabe "ue esta uma hist(ria completa' uma anedotaterminada. 5uitas ve2es' mas nem sempre' uma novelacoincide com uma se"SNncia: a novela pode conter vrias

    se"SNncias ou s( parte dela.o ponto de vista da se"SNncia' podemos distinguirvrios tipos de oraHes. 0sses tipos correspondem KsrelaHes l(gicas de eLclus*o 8ou-ou' de disOun*o 8e-oue de conOun*o 8e-e. #hamaremos o primeiro tipo deoraHes alternati.as* pois s( uma delas pode aparecernum WPgina 17X

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    JJJJJJJJJJJJJJJJJJJ8$ota de rodap !. )rato mais longamente desses trNs tipos de rela*o no

    captulo QPoti"ueQ da obra coletiva QuSest;ce ue le structuralismeW*

    Paris' &euil' 19;.determinado ponto de se"SNncia3 aparecimento este "ue'por outro lado' obrigat(rio. A segundo tipo ser o dasoraHes facultati.as* cuOo lugar n*o deinido e cuOoaparecimento n*o obrigat(rio. Por im' um terceiro tiposer ormado pelas oraHes obrigatDrias* a"uelas "uesempre tNm de aparecer num lugar deinido.

    0Laminemos uma novela "ue nos permitir ilustraressas dierentes relaHes. ma dama de Rascogne ultraOada por Quns maleitoresQ durante sua estada em#hipre. Uuer se "ueiLar ao rei da ilha3 mas di2em-lhe"ueseria perda de tempo' pois o rei indierente aos insultos"ue ele mesmo recebe. )odavia' ela o encontra e lhedirige palavras amargas. A rei ica tocado e abandona

    suaindolNncia 8' 9.

    ma compara*o entre essa novela e os outros teLtos"ue ormam o ecamero nos permitir identiicar ostatus de cada ora*o. D' inicialmente' uma ora*oobrigat(ria: o deseOo da dama de modiicar a situa*oprecedente3 reencontramos esse deseOo em todas asnovelas da coletnea. Por outro lado' duas oraHescontNm as causas desse deseOo 8o ultraOe praticado pelosmaleitores e a inelicidade da dama e podemos"ualiic-las de acultativas: trata-se da motiva*opsicol(gica da a*o modiicadora de nossa herona'motiva*o em geral ausente noecamero 8ao contrriodo "ue ocorre na novela do sculo Z)Z. $a hist(ria dePeronella 8@' 6' n*o h motivaHes psicol(gicas3 mastambm encontramos uma ora*o acultativa: o ato de

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    "ue os dois amantes a2em amor de novo pelas costas domarido. 0ntendam-nos bem: ao "ualiicar essa ora*o deacultativa' "ueremos di2er "ue ela n*o necessria para"ue se perceba a intriga do conto como um todocompleto. , novela' ela sim' precisa muito dessa ora*o'ela a Qpimenta da hist(riaQ3 mas WPgina 11X

    preciso saber separar o conceito de intriga do de novela.

    0Listem' por im' oraHes alternativas. )omemos' poreLemplo' a a*o da dama "ue modiica o carter do rei.o ponto de vista sinttico' tem a mesma un*o "ue a

    de Peronella "ue escondia o amante no barril: ambasvisam a estabelecer um novo e"uilbrio. $o entanto' a"uiessa a*o um ata"ue verbal direto' ao passo "uePeronella a2ia uso do disarce. Q,tacarQ e QdisararQ s*o'portanto' dois verbos "ue aparecem em rases alternativas3em outras palavras' eles ormam um paradigma.

    #aso "ueiramos estabelecer uma tipologia dasintrigas' s( possvel a2N-lo baseando-se nos elementos

    alternativos: nem as rases obrigat(rias "ue tNm deaparecersempre' nem as acultativas "ue podem aparecer semprepodem nos aOudar. Por outro lado' a tipologia poderiabasear-se em critrios puramente sintagmticos:dissemos acima "ue a narrativa consistia na passagem deum e"uilbrio a um outro' mas numa narrativa podemostambm encontrar apenas parte desse traOeto. Podeportanto descrever somente a passagem de um e"uilbrio

    a um dese"uilbrio' ou vice-versa.A estudo das novelas doecamero nos levou' por

    eLemplo' a ver nessa coletnea apenas dois tipos dehist(rias. A primeiro eLempliicado pela novela sobrePeronella poderia ser chamado de Qa puni*o evitadaQ.,"ui' percorre-se todo o traOeto 8e"uilbrio 4 dese"uilbrio4 e"uilbrio3 por outro lado' o dese"uilbrio provocadopela transgress*o de uma lei' ato "ue merece puni*o. A

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    segundo tipo de hist(ria' ilustrado pela novela sobre adama de Rascogne e o rei de #hipre' pode ser designadocomo uma Qconvers*oQ. ,"ui' apenas a segunda parte danarrativa est presente: parte-se de um estado dedese"uilbrio 8um rei mole para chegar ao e"uilbrioinal. ,lm disso' WPgina 16X

    esse dese"uilbrio n*o tem como causa uma a*oparticular 8um verbo' mas as pr(prias "ualidades dopersonagem 8um adOetivo.

    0sses poucos eLemplos bastam para dar uma idiada gramtica da narrativa. Poder-se-ia obOetar "ue' assima2endo' n*o conseguimos QeLplicarQ a narrativa' tirarconclusHes gerais. 5as o estado atual dos estudos sobreanarrativa eLige "ue nossa primeira tarea seOa aelabora*o de um aparato descritivo: antes de podereLplicar osatos' preciso aprender a identiic-los.

    Pode-se 8e deve-se encontrar impereiHes nascategorias concretas a"ui propostas3 meu obOetivo eraantes o de levantar "uestHes