toxoplasmose 12

7
71 Ciência Animal, 16(2):71-77, 2006 TOXOPLASMOSE: UMA REVISÃO (Toxoplasmosis: a review) Francisco William Soares da SILVA 1 , Nilza Dutra ALVES 1 , Sthenia Santos Albano AMÓRA 2 , Francisco Henrique Veras TEXEIRA 1 , Marina Parisse ACCIOLY 1 , Cristiane Guedes CARVALHO 1 , Rafaela Machado NÓBREGA 1 , Kilder Dantas FILGUEIRA 1* & Francisco Marlon Carneiro FEIJÓ 1 1 Departamento de Ciências Animais, Universidade Federal Rural do Semi-Árido 2 Programa de Pós-Graduação em Ciências Veterinárias, Universidade Estadual do Ceará RESUMO A toxoplasmose é uma doença parasitária de mamíferos, aves e répteis que afeta principalmente o sistema nervoso central e ocasionalmente o sistema reprodutivo, músculos e órgãos viscerais. É causada pelo protozoário Toxoplasma gondii, sendo esta a única espécie capaz de produzir a doença em todos os hospedeiros. Os felídeos são os hospedeiros definitivos e o homem e outros animais homeotérmicos são considerados hospedeiros intermediários, nos quais o parasito realiza apenas o ciclo tecidual extra-intestinal. T. gondii tem distribuição mundial, sendo considerado o mais cosmopolita de todos os parasitos causadores de zoonoses. A partir do exposto, o presente trabalho teve como objetivo revisar os principais aspectos da toxoplasmose, mostrando a importância desta enfermidade na conduta dos médicos veterinários. Palavras-chave: Toxoplasma gondii, zoonose, gato. ABSTRACT Toxoplasmosis is a parasitic illness of mammals, birds and reptiles that mainly affects the central nervous system and occasionally the reproductive system, muscles and visceral organs. Caused by the protozoan Toxoplasma gondii, this species being the only one capable of producing the illness in all hosts. Cats are the definitive hosts whilst man and other homeothermic animals are considered intermediate hosts, in which the parasite spends only the extra-intestinal tissue cycle. T. gondii is a parasite of worldwide distribution, being considered the most cosmopolitan of all parasites causing zoonosis. Based on the above, this research sought to review the main aspects of toxoplasmosis, showing the importance of this disease in the behavior of veterinarians. Key words: Toxoplasma gondii, zoonosis, cat. INTRODUÇÃO parasitária de mamíferos, aves e répteis que afeta principalmente o sistema nervoso central, e ocasionalmente o sistema reprodutor, músculos esqueléticos e órgãos viscerais. A maioria das infecções é inaparente ou latente (HILL et al., 2005). A enfermidade tem grande importância na saúde pública e acredita-se que cerca de 500 milhões de pessoas em todo mundo apresentam * Autor para correspondência Rua Campos Sales, 1273, CEP 59611-050. Bairro Santo Antônio, Mossoró-RN. e-mail: [email protected] A toxoplasmose é uma zoonose cosmopolita, causada pelo protozoário Toxoplasma gondii, sendo esta a única espécie capaz de produzir a doença em todos os hospedeiros. É caracterizada como uma doença Ciência Animal, 16(2):71-77, 2006

Upload: iuri-oliveira

Post on 18-Dec-2015

6 views

Category:

Documents


0 download

DESCRIPTION

Toxoplasmose12

TRANSCRIPT

  • 71Cincia Animal, 16(2):71-77, 2006

    TOXOPLASMOSE: UMA REVISO

    (Toxoplasmosis: a review)

    Francisco William Soares da SILVA1, Nilza Dutra ALVES1, Sthenia Santos AlbanoAMRA2, Francisco Henrique Veras TEXEIRA1, Marina Parisse ACCIOLY1, CristianeGuedes CARVALHO1, Rafaela Machado NBREGA1, Kilder Dantas FILGUEIRA1* &

    Francisco Marlon Carneiro FEIJ11Departamento de Cincias Animais, Universidade Federal Rural do Semi-rido

    2Programa de Ps-Graduao em Cincias Veterinrias, Universidade Estadual do Cear

    RESUMO

    A toxoplasmose uma doena parasitria de mamferos, aves e rpteis que afeta principalmente osistema nervoso central e ocasionalmente o sistema reprodutivo, msculos e rgos viscerais. causada pelo protozorio Toxoplasma gondii, sendo esta a nica espcie capaz de produzir a doenaem todos os hospedeiros. Os feldeos so os hospedeiros definitivos e o homem e outros animaishomeotrmicos so considerados hospedeiros intermedirios, nos quais o parasito realiza apenas ociclo tecidual extra-intestinal. T. gondii tem distribuio mundial, sendo considerado o maiscosmopolita de todos os parasitos causadores de zoonoses. A partir do exposto, o presente trabalhoteve como objetivo revisar os principais aspectos da toxoplasmose, mostrando a importncia destaenfermidade na conduta dos mdicos veterinrios.Palavras-chave: Toxoplasma gondii, zoonose, gato.

    ABSTRACT

    Toxoplasmosis is a parasitic illness of mammals, birds and reptiles that mainly affects the centralnervous system and occasionally the reproductive system, muscles and visceral organs. Caused bythe protozoan Toxoplasma gondii, this species being the only one capable of producing the illnessin all hosts. Cats are the definitive hosts whilst man and other homeothermic animals are consideredintermediate hosts, in which the parasite spends only the extra-intestinal tissue cycle. T. gondii is aparasite of worldwide distribution, being considered the most cosmopolitan of all parasites causingzoonosis. Based on the above, this research sought to review the main aspects of toxoplasmosis,showing the importance of this disease in the behavior of veterinarians.Key words: Toxoplasma gondii, zoonosis, cat.

    INTRODUOparasitria de mamferos, aves e rpteis que afetaprincipalmente o sistema nervoso central, eocasionalmente o sistema reprodutor, msculosesquelticos e rgos viscerais. A maioria dasinfeces inaparente ou latente (HILL et al.,2005).

    A enfermidade tem grande importnciana sade pblica e acredita-se que cerca de 500milhes de pessoas em todo mundo apresentam

    * Autor para correspondnciaRua Campos Sales, 1273, CEP 59611-050.Bairro Santo Antnio, Mossor-RN.e-mail: [email protected]

    A toxoplasmose uma zoonosecosmopolita, causada pelo protozorioToxoplasma gondii, sendo esta a nica espciecapaz de produzir a doena em todos oshospedeiros. caracterizada como uma doena

    Cincia Animal, 16(2):71-77, 2006

  • 72 Cincia Animal, 16(2):71-77, 2006

    reao sorolgica positiva para o parasito(MAROBIN et al., 2004). Causa importantesalteraes neonatais, leses oculares,microcefalia, hidrocefalia, calcificaescerebrais, alteraes psicomotoras e retardomental, tornando a infeco primria na gestantee, conseqentemente a infeco do feto por viatransplacentria, considerando o aspecto maisgrave da toxoplasmose humana (LUCAS et al.,1998).

    A doena foi comprovada em todas asreas zoogeogrficas em cerca de 200 espciesde mamferos. Muitas espcies de aves tambmalbergam o parasito, alm do que quase todas asespcies de animais homeotrmicos sosusceptveis ao protozorio T. gondii, ainda queem diferentes graus (HILL et al., 2005).

    Nos animais, a toxoplasmose adquireimportncia, principalmente porque quandoesses so infectados servem de fonte direta ouindireta de infeco ao homem, alm de causardanos diretos aos animais de interesse econmicoe de estimao. O parasito se deposita namusculatura e pode infectar o homem pelaingesto de carne crua ou mal cozida(OLIVEIRA et al., 2001).

    Dos animais susceptveis os felinosexercem um importante papel nesta zoonose,considerando que esses animais esto envolvidoscom a produo de oocistos e perpetuao dadoena, devido contaminao ambiental(GARCIA et al., 1999).

    No raramente profissionais mdicosencaminham proprietrios de ces aos mdicosveterinrios para que esses animais sejamsacrificados devido ocorrncia de casos detoxoplasmose nos habitantes da casa. importante esclarecer que, o co um hospedeirointermedirio do T. gondii e a possibilidade detransmitir o parasito fica quase que restrita aoconsumo de sua carne, hbito pouco comumentre os brasileiros (GARCIA et al., 1999).

    Portanto, considerando o exposto, opresente trabalho visou fornecer subsdios aosriscos da toxoplasmose para os animaisdomsticos e ao homem. Adicionalmente,pretendeu fornecer tambm informaes para osprofissionais da sade e acadmicos quanto aos

    principais aspectos da etiologia, epidemiologia,clnica, teraputica e preveno da doena.

    Etio-epidemiologiaToxoplasma gondii um protozorio de

    ciclo de vida facultativamente heteroxeno einfecta todas as espcies de animaishomeotrmicos, incluindo mamferos, aves e ohomem (SILVA et al., 2003). um parasitointracelular obrigatrio, pertencente famliaToxoplasmatinae, ordem Coccidia. Os gatosdomsticos e outros feldeos so os nicoshospedeiros definitivos, mas muitas espcies devertebrados servem como hospedeirosintermedirios (MARTINS & VIANA, 1998;HILL et al., 2005).

    Das fases de desenvolvimento do T.gondii, os taquizotas apresentam forma emarco ou meia lua que, por vezes torna-searredondada. Medem 4 a 7 por 2 a 4 m dedimetro, sendo sua extremidade anterior maisafilada do que a posterior. Seu ncleo, na maioriadas vezes, semicentral, localizado na metadeposterior. Os bradizotas envoltos por umamembrana argiroflica formam cistos de tamanhovarivel; os jovens podem medir 5 m,possuindo 4 bradizotas; os cistos mais velhospodem ter at 100 m e conter centenas debradizotas em seu interior (DUBEY et al., 1998).

    Aps a ingesto dos bradizotosencistados do T. gondii, os oocistos aparecemnas fezes aps 4 a 5 dias e continuam a serexcretados, freqentemente, em grandesquantidades, por 3 a 20 dias. Esses oocistosesporulam em 2 a 4 dias, em condiesfavorveis, e tornam-se infectivos para todos osvertebrados (MAROBIN et al., 2004).

    A toxoplasmose prevalente em muitasreas do mundo, sendo considerado como a maiscosmopolita de todas as zoonoses (SILVA et al.,2003). Tem importncia veterinria e mdica porser causa de abortamentos e doena congnitaem vrias espcies de hospedeirosintermedirios.

    A epidemiologia do parasitismo por T.gondii ainda no est totalmente esclarecida. Hcarncias de pesquisas sobre o papel das aves nacadeia epidemiolgica da doena. Contudo,

  • 73Cincia Animal, 16(2):71-77, 2006

    acredita-se que as aves tm grande importnciana sua transmisso, principalmente porque seustecidos e ovos representam importante fonte deprotena na alimentao humana e de felinos emgeral (MAROBIN et al., 2004).

    Parece que os autores confundem o termoepidemiologia com transmisso. No entantoapenas para ilustrar o dicionrio Aurlio definecomo Estudo das inter-relaes dos vriosdeterminantes da freqncia e distribuio dedoenas num conjunto populacional

    Os feldeos, notadamente os gatos,desempenham papel fundamental na transmissodo T. gondii para o homem e outros animais(LANGONI et al., 2001). Os gatos so o ponto-chave da epidemiologia da toxoplasmose, sendoos nicos hospedeiros definitivos do parasito etransmissores de forma sexuada. Por eliminaremoocistos dos parasitos pelas fezes, so a nicafonte de infeco dos animais herbvoros. Osoocistos so resistentes s condies ambientaise resultam da fase sexuada do ciclo, que limitada ao epitlio intestinal desses animais(DAGUER et al., 2004).

    Em sunos (DUBEY et al., 2002a),caprinos (WALSH et al., 1999), ovinos (DUBEY& FOREYT, 2000) e roedores (DUBEY &FRENKEL, 1998) ocorre apenas o ciclo extra-intestinal, com proliferao de taquizotas nosrgos e com a resposta imune desenvolvem-seos cistos teciduais. Estes permanecem viveis eso infectantes para os gatos e para outroshospedeiros, como o homem e os ces. Nestesltimos, a infeco geralmente pode ocorrer pelaingesto de oocistos, presentes no solo, alimentosde origem vegetal, ou atravs de carnes comcistos tissulares (LANGONI et al., 2001).

    A transmisso ao homem tambm podeser congnita (JONES et al., 2003), quando ainfeco aguda coincide com a gestao. T.gondii multiplica-se na placenta, difundindo-separa os tecidos fetais, com conseqncias gravespara os fetos no primeiro tero ou metade dagestao. Quanto mais adiantada a gestao,maior a probabilidade da infeco fetal, emboraos riscos de fetopatias graves sejam menores(LANGONI et al., 2001; DUBEY et al., 2002b).O espectro clnico da infeco congnita varia

    de alteraes aparentes ao nascimento commorbimortalidade perinatal elevada(microcefalia, crescimento intra-uterinoretardado, hidrocefalia), a uma infecosubclnica com possibilidade de risco para odesenvolvimento de coriorretinite e/oucomplicaes tardias (CASTRO et al., 2001;DUBEY et al., 2002b).

    Os parasitos disseminam-se pelos vasoslinfticos e pelo sistema porta, com subseqenteinvaso de vrios rgos e tecidos. Eminfestaes macias, os taquizotos emmultiplicao podem produzir reas de necroseem rgos vitais, como miocrdio, pulmes,fgado e crebro e, durante esta fase o hospedeiropode tornar-se febril e manifestar linfadenopatia.Conforme evoluo da doena, formam-sebradizotos, sendo esta fase usualmenteassintomtica (MAROBIN et al., 2004).

    Considerando-se as outras formas deinfeco no homem, a eutansia de gatos nosoluciona o problema (DUBEY et al., 2004;DUBEY, 2005). A comprovao da presena doparasito na carne de animais de abate de grandeinteresse em sade pblica, tendo-se em contaque estes alimentos insuficientemente cozidosso uma das principais fontes de infeco do serhumano (HILL et al., 2005).

    Em condies naturais, o gato eliminaoocistos somente quando sofre a primo-infeco,geralmente nos primeiros meses de vida. Essesoocistos contaminam o meio ambiente, gua ealimentos, o que possibilita a sua ingesto pelohomem ou por outros animais (DAVIDSON,2000; DE BRITO et al., 2002).

    O ciclo vital inteiro se completa noepitlio do intestino delgado dos feldeos. Osestgios assexuais e sexuais se desenvolvemendogenamente e os oocistos so eliminados nasfezes. Trs formas ou estgios de T. gondii podeminiciar a infeco em animais vertebrados: otrofozoto ou taquizota a forma proliferativaobservada nas infeces disseminadas agudas, epode estar presente nos fludos corporais. Ocistozoto ou bradizota a forma latente doparasito e est presente nas infeces congnitase adquiridas, crnicas ou assintomticas. encontrado em cistos, principalmente no crebro,

  • 74 Cincia Animal, 16(2):71-77, 2006

    olho, fgado, musculatura cardaca e esqueltica(MAROBIN et al., 2004).

    Em condies ideais de temperatura eumidade, os oocistos eliminados nas fezesesporulam no ambiente entre 24 e 48 horas erepresentam a principal via de transmisso paraoutros animais. Quando as condies sodesfavorveis ao seu desenvolvimento, osoocistos podem permanecer viveis durante 18meses no ambiente (LINDSAY et al., 2003). Nostecidos, o ciclo muito semelhante nos gatos enos hospedeiros intermedirios. Quandoingeridos, os oocistos que contm oitoesporozotos liberam-nos e estes esporozotospenetram nas clulas intestinais, multiplicam-see transformam-se em taquizotos (forma demultiplicao rpida) nas clulas intestinais e noslinfonodos (DAVIDSON, 2000).

    Os taquizotos, ento, disseminam-sepelo sistema vascular e atingem vrios rgos,como o sistema nervoso central (SNC), msculoesqueltico, vsceras e olhos. Nestes tecidos, ostaquizotos se multiplicam intracelularmente e,caso a multiplicao seja intensa, causam lisecelular e desencadeiam reao inflamatria local.O desenvolvimento de resposta imune protetoraleva ao encistamento do organismo, formandoos cistos teciduais que contm bradizotos (formade multiplicao lenta), os quais permanecemlatentes sem causar doena (DUBEY et al.,1998).

    SintomatologiaEm ces a doena manifesta-se por

    pneumonia, sintomas nervosos, ataxia e diarria.Com freqncia a toxoplasmose respiratriamuitas vezes est associada com cinomose, cujovrus causa imunossupresso, facilitando aproliferao de T. gondii. A forma generalizadada toxoplasmose caracterizada por febreintermitente, dispnia, diarria, vmito,pneumonia e linfadenopatia. J a formaneuromuscular caracterizada por radicomielitee miosite, que levam a paresia, paralisiasprogressivas e convulses (DUBEY et al., 2003,2006).

    Nos animais jovens, particularmente nosces, gatos e leites, os taquizotos disseminam-

    se sistematicamente e causam pneumoniaintersticial, miocardite, necrose heptica,meningoencefalite, coriorretinite, linfadenopatiae miosite. Os sinais clnicos incluem febre,diarria, tosse, dispnia, ictercia, episdiosconvulsivos e morte (DAVIDSON, 2000). T.gondii tambm constitui importante causa deabortamentos e natimortos em ovinos e, algumasvezes em sunos e caprinos (TSUTSUI et al.,2003). Depois da infeco da ovelha prenhe, ostaquizotos difundem-se pela corrente sanguneapara os cotildones placentrios, causandonecrose. Os taquizotos tambm acometem ofeto, causando necrose em muitos rgos(DAVIDSON, 2000).

    A infeco no homem hgido e mulheresque no estejam grvidas no representa grandesriscos de doena. Nesses grupos os sintomas sosimilares aos estados gripais, sendo comumfebre, dores de cabea e musculares, que securam espontaneamente dentro de um curtoespao de tempo. J o grupo de indivduosimunossuprimidos, tais como indivduos HIVpositivo ou indivduos que possuam algumadoena debilitante podem sofrer danos maiorestais como, cegueira e leses cerebrais, podendos vezes, em casos extremos, evoluir para a morte(GARCIA et al., 1999).

    Apesar de os gatos se infectarem comfreqncia, a doena clnica rara, emboratenham sido registrados enterite, linfonodosmesentricos aumentados, pneumonia,alteraes degenerativas no SNC e encefalite eminfeces experimentais (SIMPSON et al., 2005).Entre os sintomas mais freqentes da doena nosgatos incluem-se: febre, tosse, dispnia, letargia,anorexia, vmito, diarria e ictercia, alm daocorrncia de alteraes miocrdicas,hiperestesia muscular, alteraes neurolgicas eoculares. Embora a doena no seja tofreqente, fatores iatrognicos ou naturais quepromovem alteraes dos mecanismos de defesa,como a administrao de altas doses decorticosterides e a infeco pelo vrus daimunodeficincia dos felinos, podem reativar ainfeco latente resultando em quadrossintomticos de toxoplasmose (LUCAS et al.,1998; SIMPSON et al., 2005).

  • 75Cincia Animal, 16(2):71-77, 2006

    DiagnsticoO diagnstico da toxoplasmose antes da

    morte pode ser difcil. Se outros sistemasorgnicos estiverem envolvidos, a bipsia dotecido extraneural acometido pode permitir aidentificao do microrganismo (HILL &DUBEY, 2002).

    Para a realizao do diagnsticosorolgico dois testes so comumente utilizados:o teste do corante de Sabin-Feldman e o teste deimunofluorescncia indireta (IFI). Qualquer queseja o mtodo usado se faz importante o empregode amostras colhidas com intervalo de duassemanas para determinar a soroconverso,indicativo de infeco recente (HILL & DUBEY,2002). O teste de imunoadsoro enzimtica(ELISA), mais moderno, permite a deteco deresposta de IgM compatvel uma infeco ativarecente. J que a resposta de IgG geralmentealta e pode persistir por vrios dias, indica umaexposio anterior, ou seja indicativo de casoscrnicos. Nos casos fatais, a histopatologia revelaos taquizotos e os cistos teciduais nos rgosafetados (McCANDLISH, 2001).

    Exames de sangue podero mostrarT.gondii sob forma taquizita em macrfagos. Asecreo nasal e ocular preparadas em esfregaoe coradas pelo Giemsa tambm podero permitiro diagnstico. Biopsias de linfonodos infartadospodem ser preparadas citolgica ehistopatologicamente (HILL & DUBEY, 2002).

    Na necropsia, os focos necrticospuntiformes, no SNC, nos pulmes, fgado elinfonodos infartados so indicativos detoxoplasmose. No caso de abortamentos, o fetoe a placenta devem ser encaminhadosrefrigerados para o diagnstico (DAVIDSON,2000). Os rgos parenquimatosos supracitadosso adequados para o diagnstico citolgico,isolamento e imunofluorescncia direta.

    TratamentoO diagnstico precoce, assim como o

    tratamento antiparasitrio adequado da me, temdemonstrado ser capaz de reduzir a taxa detransmisso para o feto e por conseqncia onmero de seqelas nos casos em que ocorreu ainfeco intra-uterina (CASTRO et al., 2001).

    As drogas utilizadas para o tratamentoda toxoplasmose so: pirimetamina, sulfadiazinae cido flico. Outras sulfas associadas aotrimetoprim, podem tambm ser usadas, sendoto efetivas quanto a sulfadiazina, sulfapirazina,sulfametazona e sulfamerazina, na dose de 50mg/kg, a cada 24 horas durante 2 semanas parahumanos (DINIZ & VAZ, 2003).

    Como tratamento, a combinao dapirimetamina com sulfadiazina foi descrita comoeficaz contra taquizotos, mas no bradizotos,no homem, porm bastante txica em gatos(HILL & DUBEY, 2002). A clindamicina (3 a13 mg/kg, a cada 24 horas, 2 semanas) constituiprovavelmente a droga de escolha para ces, epode ser bem administrada intramuscularmente,pois as doses orais altas podem causartranstornos gastrintestinais (McCANDLISH,2001).

    PrognsticoO prognstico para humanos

    considerado desfavorvel nos casos de rpidaprogresso da doena, na presena de lesesmultifocais do SNC, com hiperextenso dosmembros ou quando o incio do tratamento demorado (RUEHLMANN et al, 1997). Todavia,o prognstico na toxoplasmose dos animais,excetuando-se o caso de abortamento, dereservado para bom, porque a respostateraputica boa (DAVIDSON, 2000).

    PrevenoEm situaes domsticas, a preveno de

    infeco requer a limpeza diria dos locaisusados por esses animais e a remoo adequadadas fezes. Devem ser observadas tambmprecaues higinicas, como lavar as mos antesde comer e o uso de luvas em jardinagem, poisos canteiros de flores e de verduras so reas dedefecao prediletas dos gatos. Mulheresgrvidas no devem efetuar a limpeza de gatos.Alm disso, gatos no devem ser alimentadoscom carne crua. Nas fazendas, o controle maisdifcil, mas quando possvel s raes dosanimais devem ser cobertas para impedir oacesso de gatos, roedores e insetos (HILL &DUBEY, 2002).

  • 76 Cincia Animal, 16(2):71-77, 2006

    REFERNCIA BIBLIOGRFICA

    CASTRO, F. C.; CASTRO, M. J. B. V.; CABRAL,A. C. V. Comparao dos Mtodos para Diagnsticoda Toxoplasmose Congnita. Revista BrasileiraGinecologia e Obstetrcia. v. 23, p. 277-282, 2001.DAGUER, H.; TRIQUEIRO, R.; COSTA, T.Soroprevalncia de anticorpos anti-Toxoplasmagondii em bovinos e funcionrios de matadouros damicrorregio de Pato Branco, Paran, Brasil. CinciaRural, v. 34, p. 1133-1137, 2004.DAVIDSON, M. G. Toxoplasmosis. VeterinaryClinics of North America small Animal Practice, v.30, p. 1051-1062, 2000.DE BRITO, A. F.; DE SOUZA, L. C.; DA SILVA, A.V.; LANGONI, H. Epidemiological and serologicalaspects in canine toxoplasmosis in animals withnervous symptoms. Memrias do Instituto OswaldoCruz, v. 97, p. 31-35, 2002.DINIZ, E. M. A.; VAZ, F. A. C. Qual arecomendao atual para o tratamento datoxoplasmose congnita. Revista da AssociaoMdica Brasileir,. v. 49, p. 10-10, 2003.DUBEY, J. P.; FRENKEL, J. K. Toxoplasmosis ofrats: a review, with considerations of their value asan animal model and their possible role inepidemiology. Veterinary Parasitology. v. 77, p. 1-32, 1998.DUBEY, J. P.; LINDSAY, D. S.; SPEER, C. A.Structures of Toxoplasma gondii tachyzoites,bradyzoites, and sporozoites and biology anddevelopment of tissue cysts. Clinical MicrobiologyReview. v. 11, p. 267-299, 1998.DUBEY, J. P.; FOREYT, W. J. Seroprevalence ofToxoplasma gondii in Rocky Mountain bighorn sheep(Ovis canadensis). The Journal of Parasitology. v.86, p. 622-623, 2000.DUBEY, J. P.; GAMBLE, H. R.; HILL, D.;SREEKUMAR, C.; ROMAND. S.; THUILLIEZ, P.High prevalence of viable Toxoplasma gondiiinfection in market weight pigs from a farm inMassachusetts. The Journal of Parasitology. v. 88,p. 1234-1238, 2002a.DUBEY, J. P.; LEWIS, B.; BEAM, K.; ABBITT, B.Transplacental toxoplasmosis in a reindeer (Rangifertarandus) fetus. Veterinary Parasitology. v. 110, p.131-135, 2002b.DUBEY, J. P.; ROSS, A. D.; FRITZ ,D. ClinicalToxoplasma gondii, Hammondia heydorni, andSarcocystis spp. infections in dogs. Parassitologia.v. 45, p. 141-146, 2003.

    DUBEY, J. P.; NAVARRO, I. T.; SREEKUMAR, C.;DAHL, E.; FREIRE, R. L.; KAWABATA, H. H.;VIANNA, M. C.; KWOK, O. C.; SHEN, S. K.;THULLIEZ, P.; LEHMANN, T. Toxoplasma gondiiinfections in cats from Paran, Brazil:seroprevalence, tissue distribution, and biologic andgenetic characterization of isolates. The Journal ofParasitology. v. 90, p. 721-726, 2004.DUBEY, J. P. Unexpected oocyst shedding by catsfed Toxoplasma gondii tachyzoites: in vivo stageconversion and strain variation. VeterinaryParasitology. v. 133, p. 289-298, 2005.DUBEY, J. P.; CHAPMAN, J. L.; ROSENTHAL, B.M.; MENSE, M.; SCHUELER, R. L. ClinicalSarcocystis neurona, Sarcocystis canis, Toxoplasmagondii, and Neospora caninum infections in dogs.Veterinary Parasitology. v. 137, p. 36-49, 2006.GARCIA, J. L.; NAVARRO, I. T.; OGAWA, L.;OLIVEIRA, R. C.; KOBILKA, E. Soroprevalncia,epidemiologia e avaliao ocular da toxoplasmosehumana em uma rea rural em Jaquapit, Paran Brasil. Jornal Americano de Revista Panamericanade Sade Pblica, v. 6, p. 157-163, 1999.HILL, D. E.; DUBEY, J. P. Toxoplasma gondii:transmission, diagnosis and prevention. ClinicalMicrobiology and Infection. v. 8, p. 634-640, 2002.HILL, D. E.; CHIRUKANDOTH, S.; DUBEY, J. P.Biology and epidemiology of Toxoplasma gondii inman and animals. Animal Health Research Reviews.v. 6, p. 41-61, 2005.JONES J, LOPEZ A, WILSON M. Congenitaltoxoplasmosis. American Family Physician, v. 15,p. 2131-2138, 2003.LANGONI, H.; SILVA, A. V.; CABRAL, K. G.Prevalncia de toxoplasmose em gatos dos Estadosde So Paulo e Paran. The Brazilian JournalVeterinary Research and Animal Science, v. 38, p.243-244, 2001.LINDSAY, D. S.; COLLINS, M. V.; MITCHELL, S.M.; COLE, R. A.; FLICK, G. J.; WETCH, C. N.;LINDQUIST, A.; DUBEY, J. P. Sporulation andsurvival of Toxoplasma gondii oocysts in seawater.The Journal of Eukaryot Microbiology, v. 50, p. 687-688, 2003.LUCAS, S. R. R.; HAGIWARA, M. K.; RECHE Jr.A. Ocorrncia de anticorpos antitoxoplasma em gatosinfectados naturalmente pelo vrus daimunodeficincia dos felinos. The Brazilian JournalVeterinary Research and Animal Science, v. 35, p.41-45, 1998.McCANDLISH, I. A. P. In: Infeces especficascaninas. DUNN, J. K.ed. Tratado de medicina de

  • 77Cincia Animal, 16(2):71-77, 2006

    pequenos animais. So Paulo: Roca, p. 946-947,2001.MAROBIN, L.; FLORES, M. L; RIZZATTI, B. B.Prevalncia de anticorpos para Toxoplasma gondiiem emas (Rhea americana) em diferentes criatriosdo Estado do Rio Grande do Sul. The BrazilianJournal Veterinary Research and Animal Science, v.41, p.5-9, 2004.MARTINS, C. S.; VIANA, J. A. Toxoplasmose o quetodo profissional de sade deve saber. ClnicaVeterinria, v. 15, p. 33-37, 1998.OLIVEIRA, F. C. R.; COSTA, A. J.; SABATINI, G.A. Clnica e hematologia de Bos indicus, Bos tauruse Bubalus bubalis inoculados com oocistos deToxoplasma gondii (Apicomplexa:Toxoplasmatinae). Cincia Rural, v. 31, p. 621-626,2001.RUEHLMANN, D.; PODELL, M.; OGLSBEE, M.;DUBEY, J. P. Canine neosporosis: a case report andliterature review. Journal of the American AnimalHospital Association, v. 31, p. 174-183, 1997.

    SILVA, A. V.; CUNHA, E. L. P.; MEIRELES, L. R.Toxoplasmose em ovinos e caprinos: estudosoroepidemiolgico em duas regies do Estado dePernambuco, Brasil. Cincia Rural, v. 33, p. 115-119, 2003.SIMPSON, K. E.; DEVINE, B. C.; GUNN-MOORE,D. Suspected toxoplasma-associated myocarditis ina cat. Journal of Feline Medicine and Surgery, v. 7,p. 203-208, 2005.TSUTSUI, V. S.; NAVARO, I. T.; FREIRE, R. L.;FREITAS, J.C.; PRUDENCIO, L. B.; DELBEM, A.C.B.; MARANA, E. R. M. Soroepidemiologia eFatores Associados Transmisso do Toxoplasmagondii em Sunos do Norte do Paran. Archives ofVeterinary Science, v. 8, p. 27-34, 2003.WALSH C. P.; HAMMOND, S. E.; ZAJAC, A. M.;LINDSAY, D. S. Survival of Toxoplasma gondiitachyzoites in goat milk: potential source of humantoxoplasmosis. The Journal of EukaryotMicrobiology, v. 46, p. 73S-74S, 1999.

    Recebido em: 2.03.2006 Aceito em: 24.09.2006