trabalho decente na américa lana - redlat.net · conduzir o país rumo ao abismo andemo-cráco e...
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Coordenação e Elaboração da Pesquisa
Juliana Sousa
Equipe de Pesquisa
Leandro Machado
Lilian Arruda
Sheila Fernandes
Sheila Fernandes
Projeto Gráfico, Diagramação e Infografia
Vicente Gomes Macedo Neto
Trabalho Decente na América La�na: BrasilFicha Técnica
Oportunidades de Emprego
5
Trabalho Decente na América La�na: BrasilSumário
3
Sumário
Capítulo 1:
Contexto Socioeconômico
Capítulo 2:
Remunerações
Capítulo 3:
Capítulo 4:
812
16 Seguridade Social
21 Capítulo 5:
Liberdade Sindical eNegociação Cole�va
24 Conclusões
5
812
16
21
24
Introdução
o segundo volume deste Ni n f o r m e , c o n s t a t a m o s
consumado o golpe ins�tucio-
nal de Estado no Brasil. Em 2016 foi
decretado o fim de nossa jovem república,
inaugurada em 1985 com a eleição
indireta de Tancredo Neves e posse de José
Sarney, após 21 anos de ditadura militar.
Condenada por congressistas, dos quais
60% são acusados ou suspeitos de crimes
de diversas naturezas, a guerreira presi-
denta Dilma Rousseff foi arbitrariamente
des�tuída da presidência, em um cínico
julgamento instaurado em regime de
exceção em que as provas de sua inocência
foram em vão e a sentença ardilosamente
preconcebida. Será a penúria da classe
trabalhadora no Brasil? Está anunciado um
governo (ilegí�mo) e seu programa foi
derrotado nas urnas nas quatro úl�mas
eleições no país.As classes dominantes, hegemônicas
econômica e ideologicamente, atuando
em bloco para retomar as instâncias do
poder polí�co-ins�tucional nacional e
conduzir o país rumo ao abismo an�demo-
crá�co e neoliberal: princípios dentre os
quais o demonstram a anunciada adoção
da prevalência do negociado sobre o
legislado, com acordos estabelecidos
diretamente entre empregadores e
trabalhadores, negociados em condições
Trabalho Decente na América La�na: BrasilIntrodução
Esta publicação é uma síntese de pesquisa. A versão completa está disponível em
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desiguais, podendo se sobrepor à legisla-
ção trabalhista – a expansão da jornada de
trabalho, de 40 horas legais para 80 horas
semanais já está nos rondando –; a
liberalização da terceirização nas a�vida-
des-fim das empresas, em tramitação no
parlamento; a reforma restri�va da
previdência, sob argumentos fiscais
falaciosos; além das priva�zações, tal qual
a entrega da camada de petróleo do pré-
sal, como propõe e ar�cula o ministro
i legí�mo e delatado das Relações
Exteriores. Em menos de três meses no poder,
cinco ministros de Estado deixaram o
cargo após envolvimento em escândalos
de corrupção e o presidente Temer
apresentava popularidade inferior a 15%.
Concomitantemente, transitou no
Congresso Nacional um projeto sem
autoria que tentou aprovar anis�a ao Caixa
2 (doação oculta e ilícita a campanhas
eleitorais), mas que, diante da repercus-
são nega�va, está paralisado. Com a
consolidação do golpe parlamentar, em 31
de agosto de 2016, as recentes conquistas
sociais estão ameaçadas, assim como as
norma�vas jurídicas das relações de
trabalho (a Consolidação das Leis
Trabalhistas vige desde 1943), sindicais e
de proteção social instauradas com a
Cons�tuição da República de 1988.
4
Capítulo 1: Contexto Socioeconômico
Trabalho Decente na América La�na: BrasilCapítulo 1: Contexto Socioeconômico
Gráfico 1 - Brasil: variação anual do PIB (%)
Fonte: IBGE.
% d
e V
aria
ção
do
PIB
Ano de Referência
1,3
4,4
0,5
3,4
2,2
4,2
3,1
1,2
5,7
3,1
4,0
6,0
5,0
- 0,2
7,6
3,9
1,8
2,7
0,5 -3,8
19951996
19971998
19992000
20012002
20032004
20052006
20072008
20092010
20112012
2013
2014
0,4
om o prolongamento e a intensifi-Ccação da deterioração da conjun-
tura econômica internacional -
até então favorável à balança comercial
brasileira pelo incremento dos preços das
commodi�es entre 2003 e 2012,
restringindo, no entanto, o Brasil a um
capitalismo dependente, que associado
ao boom do consumo domés�co,
impulsionaram o crescimento econômico
e a arrecadação do governo federal - a
2015
recessão, sobretudo a par�r de 2014,
agravada pela crise polí�ca nacional que
se instalou e recrudesceu desde as
vésperas da posse em segundo mandato
da presidenta eleita Dilma Rousseff em
2015, golpearam os principais indicadores
da economia brasileira e o mercado de
trabalho. Em 2015, o Produto Interno
Bruto (PIB) encerrou o ano com recuo de
3,8% em relação a 2014. Acompanhe no
gráfico 1 que segue:
Embora em discurso de campanha o
modelo desenvolvimen�sta, respaldado
nas polí�cas econômicas an�cíclicas e na
alavancagem econômica pelo Estado
adotadas no primeiro mandato (como a
redução con�nuada da taxa básica de
juros, a Selic), tenha sido vitorioso, por
margem restrita mas irrefutável, nas
eleições de 2014, a agenda polí�ca foi
mais uma vez modificada e o governo de
Dilma sucumbiu às pressões do capital
financeiro e ao ideário neoliberal. Na
5
tenta�va equivocada e frustrada de
salvaguardar a governabil idade, o
governo foi se fragilizando, rumando ao
autossacr i�c io e aprofundando a
recessão: as medidas de “austericídio”
fiscal – sendo que o Programa de
Aceleração do Crescimento, criado no
governo Lula para incen�var os inves�-
mentos em obras de infraestrutura, foi um
dos mais a�ngidos pelos cortes de verbas
públicas, tendo o pacote pró-cíclico
também reduzido o crédito oferecido por
bancos públicos, em conformidade com o
impera�vo de assegurar o superávit
primário – foram contestadas por parte
das classes trabalhadoras que, contudo,
em defesa da democracia, denunciam o
golpe.
Esse contexto tem impactado e
degradado progressivamente o mercado
de trabalho brasileiro: elevação das taxas
de desemprego, afetando sobretudo
trabalhadoras e trabalhadores jovens;
elevação da taxa de par�cipação, com a
inserção ou retorno de indivíduos para
contrabalançar a restrição de renda nos
domicílios; evolução do grau de informali-
dade, com destaque à expansão do grupo
dos empregados sem carteira e de
trabalhadores por conta própria; redução
da média do rendimento do trabalho
principal. A deterioração dos índices do mercado
de trabalho preocupa pela repercussão
em termos de intensificação do empobre-
cimento da classe trabalhadora. Já no
segundo mandato da presidenta afastada
Dilma Rousseff a desigualdade social
tornou a crescer, consequência do ajuste
fiscal recessivo e da inflexão da polí�ca
econômica que a gestão adotou.Com a interrupção e reversão da
trajetória de queda da pobreza, conforme
vinha sendo verificado na úl�ma década
(acompanhe no gráfico 2 a proporção de
pessoas pobres e extremamente pobres,
segundo a renda domiciliar per capita, de
2004 a 2013), as polí�cas de transferência
de renda deveriam ser fortalecidas e
ampliadas – tais como o Programa Bolsa
Família, que não teve reajuste em 2015,
sob os auspícios do Ministro da Fazenda
de Dilma, Joaquim Levy, vulgo “mãos de
tesoura”. Em 2014, de acordo com informações
do IPEADATA, os 10% mais pobres da
população �veram renda domiciliar per
capita mensal média (R$ 133,12) equiva-
lente a 2,83% da renda dos 10% mais ricos
no país (R$ 4.711,91); dito de outra
maneira, os mais ricos ganharam 35,40
vezes mais do que os mais pobres. Em
2004, o estrato inferior recebia o equiva-
lente a 1,90% dos mais ricos, cuja renda
(R$ 2.967,81) superava em 52,76 vezes à
dos mais pobres (R$ 56,25).
6 Trabalho Decente na América La�na: BrasilCapítulo 1: Contexto Socioeconômico
A depressão econômica
que o país enfrenta tem se
configurado em subterfúgio
para a adoção de medidas
de austeridade
“
”
1
Gráfico 2 - Brasil: Proporção de Pessoas Pobres e Pessoas Extremamente Pobres, segundo a renda domiciliar per capita, no período de 2004 a 2013 (%)
2004 2005 2006 2007 2008 2009 2011 2012 2013
Na Linha de Pobreza¹ Na Linha de Pobreza Extrema²
22,4
Ano de Referência
% d
e Pe
sso
as P
ob
res
e Ex
trem
amen
te P
ob
res
02
46
810
1214
1618
2022
Fontes: IPEADATA.Notas: ¹ Proporção de pobres (P0) – Linha de Pobreza Baseada no Decreto 7492 (Brasil sem Miséria) - (%) - Ins�tuto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) - PMP140.² Proporção de extremamente pobres (P0) – Linha de Pobreza Baseada no Decreto 7492 (Brasil sem Miséria - (%) - Ins�tuto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) - PMP070.
No es�lo tradicional da oligarquia
polí�ca brasileira, a ascensão dos “de
baixo” da pirâmide social, que marcou o
período Lula e o primeiro mandato da
presidenta Dilma Rousseff, está sendo
estrangulada. A depressão econômica
que o país enfrenta tem se configurado
em subterfúgio para a adoção de medi-
das de austeridade com cortes de
inves�mento público, retomada da
escalada das taxas de juros (a Selic estava
em 14,25% em julho de 2016, o mesmo
patamar fixado em julho de 2015,
pra�camente o dobro da taxa referente a
março de 2013, em 7,25%) e choque de
tarifas que afetam as cadeias produ�vas
e os serviços, propagando-se pela
economia.
O compromisso em combater a
desigualdade social brasileira está em
re�rada na agenda do governo e os
programas sociais estão na berlinda. No
mote da polí�ca econômica pós-golpe, a
tendência é a prevalência da lógica do
crescimento econômico via contenção e
contração de salários.
Trabalho Decente na América La�na: BrasilCapítulo 1: Contexto Socioeconômico
7
Trata-se do percentual de pessoas em domicílios com renda domiciliar per capita inferior à linha de pobreza. A linha de extrema pobreza (indigência ou miséria) foi estabelecida em R$ 70,00, em Junho de 2011, tal como es�pulado no Decreto 7492 (Programa “Brasil sem Miséria”). Série calculada a par�r dos dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD/IBGE). Fonte: IPEADATA.
1
Fonte: NASSIF, Luis. “Belluzzo diz que Brasil pode crescer, mas desigualdade vai aumentar” (16/05/2016). 2
2
Capítulo 2: Oportunidade de Emprego
No decorrer de 2015 o quadro Neconômico brasileiro apre-
sentou um aprofundamento
da crise que vinha dando sinais desde
2014, afetando a dinâmica do mercado de
trabalho, com desaceleração da ocupação
e dos rendimentos. Esse recuo da popula-
ção ocupada aconteceu, sobretudo, no
mercado formal da economia, com fração
considerável de trabalhadoras e trabalha-
dores deslocando-se rumo aos segmentos
de “conta própria”. Dados referentes a dezembro de 2015
apontam o avanço do desemprego, tendo
a taxa de desocupação sido registrada em
6,9%, com elevação de 2,6% perante
dezembro de 2014, quando foi registrada
em 4,3%, de acordo com dados da
PME/IBGE. As sucessivas elevações da taxa
de desocupação registradas em 2015
interrompem o já saudoso movimento de
declínio do desemprego no Brasil que
vinha sendo construído desde 2003.
Embora tenha se iniciado no segundo
trimestre de 2014, a recessão brasileira
passou a exercer impacto mais direto
sobre o emprego no país a par�r do início
de 2015.Decompondo o desemprego segundo
o gênero e o corte geracional, verificamos
que os jovens e as mulheres permanecem
apresentando as maiores taxas de
desocupação assim como as maiores
taxas de incremento desta desocupação.
Em 2015 (acompanhe no gráfico 3
abaixo), enquanto a taxa de desocupação
dos homens teve elevação de 2,5% frente
ao ano anterior, a rela�va às mulheres
aumentou 2,7% e a dos jovens, 6% em
relação a 2014.
Gráfico 3 - Brasil: Taxas de desocupação total, por gênero e de jovens, em anos selecionados (%)
Total Homens Mulheres Jovens
8,3
5,34,3 4,3
6,96,9
4,13,5 3,8
6,3
10,2
6,65,3
4,9
7,6
17,7
11,410,2 10,5
16,5
Taxa
s d
e d
eso
cup
ação
to
tal p
or
gên
ero
Anos selecionados
Fonte: PME/IBGE.Nota: Para o Brasil, em dezembro. Regiões Metropolitanas (Recife, Salvador, Belo Horizonte, Rio de Janeiro, São Paulo e Porto Alegre). Jovens: pessoas de 18 a 24 anos.
8 Trabalho Decente na América La�na: BrasilCapítulo 2: Oportunidade de Emprego
“O Avanço do Trabalho Indecente”
Analisando as caracterís�cas da
população desocupada em 2014, conforme a
PNAD/IBGE, 56,7% dos desocupados eram
mulheres; 28,3% nunca haviam trabalhado;
34,3% eram jovens na faixa de 18 a 24 anos
de idade; 60,3% eram pretos ou pardos e
50,1% não apresentavam o ensino médio
completo. Diante do observado em 2013, as
variações mais significa�vas referem-se à
proporção dos desocupados que não �nham
trabalhado anteriormente (decréscimo de
2,7%) e dos jovens de 18 a 24 anos de idade
(acréscimo de 1,6%). Em 2014, a população
ocupada segundo a posição no mercado de
trabalho foi distribuída em 61,3% de
empregados (60,5 milhões); 21,4% de
trabalhadores por conta própria (21,1
milhões); 6,5% de trabalhadores domés�cos
(6,4 milhões) e 3,8% de empregadores (3,7
milhões). Veja na tabela 1.Na comparação com 2013, a par�cipação
dos empregados teve contração de 1,0% em
2014 e, numa análise regional, a queda foi
mais acentuada na região Sudeste do país,
onde a proporção passou de 67,7% para
66,2% no período. A evolução mais desfavo-
rável do emprego na região Sudeste pode
estar relacionada com a composição setorial
do emprego, uma vez que houve ajuste
bastante expressivo na indústria manufatu-
reira. Já as regiões Norte e Nordeste
apresentaram as maiores par�cipações de
trabalhadores por conta própria em 2014:
27,8% e 25,2%, nesta ordem, também em
2014, segundo a PNAD/IBGE.
Tabela 1 - Brasil: Pessoas de 16 anos ou mais de idade, ocupadas na semana de referência, total e respec�va percentual, por posição na ocupação - 2012 a 2014 (%)
Fonte: PNAD/IBGE.
Trabalho Decente na América La�na: BrasilCapítulo 2: Oportunidade de Emprego
9
Avaliando o desempenho da ocupação
de acordo com os grupamentos de
a�vidade econômica (tabela 2), em 2014
havia 13 milhões de trabalhadores na
indústria, que registrou queda da par�ci-
pação na população ocupada: o con�n-
gente passou de 13,5% em 2013 para
13,1% em 2014. O setor de construção era responsável
pela colocação de 9,2% da população
ocupada em 2014, o mesmo patamar
referente ao ano anterior. De acordo com
o IPEA (2016: 16-7), a queda no número
de ocupados esteve concentrada
principalmente na administração pública
– nas três esferas de governo da
Administração geral, nas instâncias do
execu�vo, legisla�vo, administração
tr ibutária etc. , nas a�vidades de
regulamentação e fiscalização das
a�vidades nas áreas social e econômica,
nas a�vidades de defesa, jus�ça, relações
exteriores, bem como na gestão do
sistema de seguridade social –, com
decréscimos registrados em todos os
trimestres de 2015 frente a 2014.
Fonte: PNAD/IBGE.
2013 2014
Tabela 2 -Pessoas de 15 anos ou mais de idade, ocupadas segundo a a�vidade do trabalho principal
10Trabalho Decente na América La�na: BrasilCapítulo 2: Oportunidade de Emprego
O grau de informalidade na economia brasileira vinha numa trajetória permanente de queda desde 2004 até 2013, quando a�ngiu o patamar de 42,0% (tabela 3). A análise da evolução do grau de informalidade leva em consideração o contraste entre os resultados verificados para o con�ngente dos trabalhadores protegidos, ou seja, emprega-dos com carteira de trabalho assinada, trabalhadores domés�cos com carteira de trabalho assinada, militares, funcionários públicos estatutários, conta própria e empregadores que contribuíram para a Previdência Social, de um lado, e do outro ocupados sem registro em carteira e os não remunerados sem a cobertura da Previdência Social.
Em 2014 a taxa tornou a subir, quando a proporção de trabalhos informais correspon-deu a 42,3% da ocupação, ao passo que englobava 54,3% do total de ocupados no país em 2004. Pontuando a desigualdade em
função da cor ou raça no país, observamos que a formalização, para pessoas autodecla-radas brancas, saltou de 53,0% do total de ocupados em 2004 para 64,7% em 2014, com avanço de 11,7%. Em contrapar�da, no que se refere às pessoas pretas e pardas ocupa-das, a formalização abrangia 37,3% destas em 2004, a�ngindo 51,6% em 2014, com acréscimo de 14,3%.
Ressaltamos, nesse sen�do, que a formalização contemplou proporcionalmen-te, de modo mais acentuado, a população brasileira preta e parda no período de 2004 a 2014. No entanto, vale frisar que no mercado de trabalho, assim como na sociedade brasileira, ainda persiste o racismo, haja vista que quase a metade das pessoas pretas e pardas ocupadas (48,4%) estavam em trabalhos informais, ao passo que em torno de um terço (35,3%) das pessoas brancas vivenciava a informalidade no trabalho em 2014.
Fonte: PNAD/IBGE.Notas 1:Inclui empregado com carteira de trabalho assinada, trabalhador domés�co com carteira de trabalho assinada, militar, funcionário público estatutário, conta própria e empregador que contribuíam para a previdência social; 2: Inclusive amarelos e indígenas.
Trabalhos formais¹ Trabalhos informais
Tabela 3 - Brasil: Proporção de pessoas de 16 anos ou mais de idade, ocupadas na semana de referência em trabalhos formais e informais, por cor ou raça, de 2004 a 2014 (%)
Trabalho Decente na América La�na: BrasilCapítulo 2: Oportunidade de Emprego
11
12
Capítulo 3: Remuneração do Trabalho
Trabalho Decente na América La�na: BrasilCapítulo 3: Remunerações
endo analisado o recente movimento Tde desaceleração da ocupação e
avanço do desemprego no Brasil,
podemos afirmar que no decorrer de 2015 o
comportamento dos rendimentos reais, de
certo modo, surpreendeu. As expecta�vas, no
princípio do processo de deterioração no
mercado de trabalho, eram de acentuada
queda do salário real, entretanto, ao longo dos
meses, a desaceleração demonstrou-se mais
suave, diferentemente do que temos observa-
do em 2016. Esse movimento de contração
mais amena dos salários em 2015 pode ser
explicado por três caracterís�cas principais que
dizem respeito ao contexto mais recente dos
aspectos socioeconômicos e polí�cos no país,
em seus avanços e limitações. A primeira refere-se ao incremento da
formalização do trabalho que se destacou na
úl�ma década, tornando os salários mais
rígidos. Adicionalmente, podemos apontar a
polí�ca nacional de reajuste do salário
mínimo (tabela 4), que possibilitou ganhos
reais nos úl�mos anos e balizou os patamares
de reajustes conquistados nas negociações
salariais das diversas categorias profissionais.
Além destas, há a tendência de que os
empresários dispensem, no início da
recessão, trabalhadores menos qualificados e
com menores rendimentos.
2002¹ 475,50 180,00
2003 479,74 200,00
2004 498,30 240,00
2005 535,31 260,00
2006 619,27 300,00
2007 653,35 350,00
2008 668,76 380,00
2009 720,96 415,00
2010 752,78 510,00
2011 752,90 540,00
2012 811,76 622,00
2013 832,37 678,00
2014 836,58 724,00
2015 821,85 788,00
2016 880,00 880,00
Ano Salário Mínimo Real Médio
Salário Mínimo Nominal Nacional
Fontes: DIEESE; PME/IBGE.
Tabela 4 - Salário Mínimo Real Médio Anual¹ em Reais de 1º de janeiro de 2016 e Salário Mínimo Nominal Nacional no mês de janeiro, em Reais (R$)- 2002 a 2016
“Defesa do Salário Mínimo contra o Empobrecimento”
Notas: ¹ Valores deflacionados por projeção do ICV – estrato inferior. ² Referente ao mês de fevereiro.
Entre abril de 2002 e janeiro de 2016,
o salário mínimo teve reajuste nominal
de 340,00%, oscilando de R$ 200,00 a R$
880,00 (no mesmo período a inflação
calculada pelo INPC foi de 148,34%), com
aumento real de 77,18%, de acordo com
o DIEESE (2016). Em 2015, no entanto, a
massa salarial encerrou o ano com queda
de 3% e a renda disponível para o
consumo sofreu retração em decorrência
da sobreposição de elevação da inflação,
redução da ocupação e recuo da renda. Em relação à faixa etária, os jovens
apresentaram a maior queda no rendi-
mento real em 2015. Na desagregação
do rendimento dos ocupados segundo o
sexo, o estudo do IPEA (2016) pondera
que as mulheres �veram crescimento de
1,20% no rendimento médio real entre
2014 e 2015, enquanto para os homens
foi verificado declínio de 0,60% no
mesmo intervalo de tempo. No entanto, no que concerne à
discrepância de gênero, é impera�vo
reafirmar que as mulheres no Brasil, a
despeito de percorrerem maiores níveis
de instrução formal, conforme já
tenhamos apontado acima, receberam
rendimentos expressivamente inferiores
aos auferidos pelos homens: de fato, em
2014 (gráfico 4), elas receberam
rendimentos quase 30% inferiores
àqueles usufruídos pelos homens.
R$ 1.644,00
% de Renda dos Homens recebida pelas e Mulheres
70,78%
69,85%
70,33%R$ 1.539,00
R$ 1.763,00
R$ 1.396,00
R$ 1.602,00
R$ 1.882,00
R$ 1.332,00
R$ 1.240,00
R$ 1.119,00
An
o d
e R
efer
ênci
a
Gráfico 4 - Brasil: Valor do rendimento médio mensal de todos os trabalhos das pessoas de 15 anos ou mais de idade ocupadas na semana de referência, segundo o sexo, em Reais
Fonte: PNAD/IBGE.
13Trabalho Decente na América La�na: BrasilCapítulo 3: Remunerações
Fonte: Valor. Disponível em: <h�p://www.valor.com.br/brasil/4533311/queda-no-rendimento-real-puxa-piora-do-mercado-de-trabalho-no-inicio-do-ano>. Acesso em: 12/07/2016.Fonte: Valor. Disponível em: <h�p://www.cnf.org.br/no�cia/-/blogs/queda-da-massa-salarial-ja-e-maior-que-na-da-crise-de-2003>. Acesso em: 12/07/2016.
3
4
3
4
Em 2015, a média anual do rendimento
médio real habitualmente recebido no
trabalho principal (PNAD Con�nua/IBGE) foi
registrada em R$ 1.887,00, valor pra�camente
estável frente ao observado na média de
2014, de R$ 1.888,00. Na análise da evolução trimestral, nos dois
primeiros trimestres de 2015, o rendimento
médio real permaneceu acima do rela�vo ao
ano anterior, ao passo que, no terceiro e
quarto trimestres, ocorreram duas quedas
sucessivas, de 1,70% e 0,30%, respec�vamen-
te. Desse modo, o valor dos rendimentos no
úl�mo trimestre de 2015 foi inferior ao
registrado no mesmo período de 2014 assim
como de 2013 (veja no gráfico 5 o rendimento
médio real segundo a a�vidade econômica
em 2013).
Fonte: PNAD/IBGE. Elaboração: IPEA/DISOC/NINSOC - Núcleo de Informações Sociais.
Adm Pública Comécio/Serviço Construção Insdústria Outras a�vidades
Gráfico 5 - Valor do rendimento médio real recebido no mês pelo trabalho principal, da população com 16 anos ou mais de idade, segundo o setor de a�vidade, em 2013 (em Reais).
Analisando por faixas o rendimento
médio mensal compara�vamente ao salário
mínimo nacional (tabela 5), verificamos que
mais de 25% destes trabalhadores, ou seja,
uma em cada quatro pessoas abrangidas
pela pesquisa, receberam rendimentos de
até um salário mínimo no triênio de 2012 a
2014. Aproximadamente 60% das pessoas
ocupadas ob�veram como rendimento até
dois salários mínimos no Brasil: 61,73% em
2012, 59,97% em 2013 e 58,6% em 2014. Observando a desigualdade de gênero no
mercado de trabalho brasileiro, podemos
constatar, proporcionalmente, a maior
representação das mulheres em posições
ocupacionais abrangidas nas classes de
rendimento inferiores: em 2014, 30,58%
das mulheres ocupadas recebiam até um
salário mínimo mensal, realidade enfrenta-
da por 21,50% dos homens ocupados. Já em
se tratando de ocupados sem rendimento,
es�veram representadas 9,78% das
mulheres, diante de 5,01% dos homens. No outro extremo, em relação aos
vultosos rendimentos acima de 20 salários
mínimos, eram usufruídos por 0,94% dos
homens ocupados no país, ao passo que o
percentual de mulheres equivalia a 0,39%.
14Trabalho Decente na América La�na: BrasilCapítulo 3: Remunerações
Tabela 5 - Brasil: Pessoas de 15 anos ou mais de idade, ocupadas na semana de referência, e valor do rendimento médio mensal de todos os trabalhos, por classes de rendimento, no Brasil
Fonte: PNAD/IBGE. Nota 1: Inclusive as pessoas que recebiam somente em bene�cios.
20132012 2014Classe de
Rendimento Mensal
No triênio de 2014 a 2016, o Ins�tuto
Brasileiro de Economia da Fundação Getulio
Vargas (Ibre-FGV) es�ma que haverá retração
acumulada de 9,4% do PIB per capita
brasileiro, a segunda maior queda em 116
anos – na série iniciada em 1900, somente no
triênio 1981-1983 foi registrado recuo mais
acentuado da renda per capita, 12,3%, a
preços de 2015, na moeda nacional, ao passo
que sob efeito da crise de 1929, entre 1929 e
1931, o país sofreu retrocesso de 7,9% do PIB
per capita.No período de 2014 a 2018, a Tendências
Consultoria es�ma que 5,21 milhões de
famílias brasileiras devem deixar a classe C
rumo à base da pirâmide social, o que deve
afetar sobretudo os trabalhadores de baixa
qualificação. Esse movimento deverá reverter a
expansão da classe média – mais apropriada-
mente a nova classe trabalhadora ou os
“batalhadores brasileiros”, de acordo com
Jessé Souza, ou ainda as classes populares,
segundo Marcio Pochmann. Foi o que
aconteceu nos anos recentes, quando, entre
2006 e 2013, 3,87 milhões de famílias saíram
das classes D e E, ascendendo à classe C, na
esteira do boom do consumo e da renda.
Com o avanço do desemprego, a queda da
renda e a economia em recessão, o sistema
de proteção social será fundamental no país.
% % %
No período de 2014 a
2018, es�ma-se que mais de 5
milhões de famílias brasileiras
devem deixar a 'classe C'
rumo à base da pirâmide
social
“
” 15Fonte: Valor (04/07/2016). Disponível em: <h�p://www.valor.com.br/brasil/4622889/familias-da-nova-classe-media-voltam-para-base-da-piramide >. Acesso em: 08/07/2016.5
5
Trabalho Decente na América La�na: BrasilCapítulo 3: Remunerações
Previdência Social brasileira Aincorporou, no século 21, 13
milhões de pessoas embora o
gasto com as aposentadorias e bene�cios
em geral tenha permanecido pra�camen-
te estável em proporção ao PIB.
Em dezembro de 2015, o Ins�tuto
Nacional do Seguro Social (INSS) pagou
32,7 milhões de bene�cios, dos quais 23,5
milhões (72%) foram des�nados a
atendidos domiciliados em zonas urbanas
e 9,3 milhões (28%), em áreas rurais. O
total de beneficiários ao final de 2015
significou um crescimento de 67% em
comparação a 2000, impulsionada pela
criação de postos de trabalho com
carteira assinada.
A abrangência da Previdência Social é
de tal ordem que especialistas a conside-
ram o maior programa social e de redistri-
buição de renda no país: os gastos
16
Capítulo 4: Seguridade Social
Trabalho Decente na América La�na: BrasilCapítulo 4: Proteção Social
previdenciários e assistenciais no Brasil
cons�tuem mecanismos de redução da
miséria e atenuação da desigualdade
social. Na seguridade social, o segmento
da Previdência tem gasto o equivalente a
8% do PIB.
No final de 2014, por meio da Medida
Provisória nº 665 (conver�da em 2015 na
lei nº 13.134), o governo brasileiro alterou
as regras para a solicitação do seguro-
desemprego. No caso de trabalhadores
que fizessem a primeira solicitação,
passou a ser exigido o recebimento de
salários rela�vos a, no mínimo, 12 meses
nos úl�mos 18 meses imediatamente
anteriores à data da dispensa. O regra-
mento anterior exigia, no caso, que o
segurado �vesse recebido salários em
cada um dos 6 meses imediatamente
anteriores à data da dispensa.
Essa modificação restringiu a rede de
proteção social num momento muito
delicado do mercado de trabalho nacio-
nal, quando as taxas de desemprego
iniciavam a trajetória de crescimento e a
economia dava sinais de recessão.
Acompanhe na tabela 6 um histórico do
seguro-desemprego no Brasil: A seguridade social abrange as áreas de Saúde, Assistência Social e Previdência.
“A Narra�va do Déficit e o Regresso à Barbárie”
“”
7
6
Fonte: Carta Capital. Disponível em: <h�p://www.cartacapital.com.br/economia/cobertura-da-previdencia-explode-mas-gasto-fica-estavel>.
Acesso em: 01/08/2016.
7
6
A Previdência Social
brasileira incorporou, no
século 21, 13 milhões de
pessoas
Tabela 6 -Histórico do Seguro-Desemprego¹ do Trabalhador Formal (anos selecionados)
TOTAL DE REQUERENTES
TOTAL DE SEGURADOS
TAXA DE HABILITAÇÃO
VALOR EMITIDO DO BENEFÍCIO (em moeda corrente)
De 1986 a março de 2016, o seguro-desemprego foi solicitado por 151.947.740 requerentes, dos quais 147.128.471 foram atendidos como segurados (96,83%), representando 7.634.464.932.084,81 em valores nas respec�vas moedas correntes nacionais (US$ 144.868.974.423,11). Em comparação ao salário mínimo, o valor médio do bene�cio, nesse período de quase duas décadas, foi equivalente à proporção de 1,43. Ao longo de 2016, o valor máximo do bene�cio, pago em 3 a 5 parcelas, foi de R$1.542,24.
A tabela 7 aponta a quan�dade de aposentadorias a�vas em 2014: nas áreas urbanas, 25% das aposentadorias foram mo�vadas pela invalidez de trabalhadores. Nas áreas rurais, 93% das aposentadorias foram mo�vadas pela idade, sendo apenas 0,3% concedidas por tempo de contribuição, o que demonstra que, embora o trabalho no campo comece com frequência já na infância, muitas vezes, como o vínculo de trabalho não foi formalizado em todo esse período, é necessário trabalhar até a idade limite para se aposentar.
17Trabalho Decente na América La�na: BrasilCapítulo 4: Proteção Social
VALOR MÉDIO DO BENEFÍCIO em SMR
1,75
1,56
1,51
1,48
1,42
1,38
1,39
1,36
1,31
1,29
_
1,28
1,28
1,26
1,29
1,28
1,28
1,30
1,30
1,27
Fonte: CGSAP/DES/SPPE/MTE.Notas: ¹ Emi�do em: 07/03/2016. ² Salário Mínimo.
2
Tabela 7 - Brasil: Quan�dade de Aposentadorias Urbanas e Rurais A�vas, por grupos de espécies, posição em Dezembro, de 2010 a 2014
QTD DE APOSENTADORIAS URBANAS ATIVAS QTD DE APOSENTADORIAS RURAIS ATIVAS
Fonte: Anuário Esta�s�co da Previdência Social.
No que se refere aos acidentes de
trabalho, na úl�ma década houve um
aumento da capacidade do Estado brasilei-
ro de captá-los. Contudo, em 2014, 20% dos
acidentes de trabalho não �veram o devido
registro da Comunicação do Acidente de
Trabalho (CAT), sendo portanto muito
elevada a subno�ficação dos acidentes
ocorrido. Veja na tabela 8 o total de
acidentes, com e sem registro da CAT:
Tabela 8 - Brasil: Quan�dade de acidentes de trabalho, por situação de registro e mo�vo, de 2005 a 2014
Com CAT registrada
Fonte: Anuário Esta�s�co da Previdência Social.
Trabalho Decente na América La�na: BrasilCapítulo 4: Proteção Social
18
om o recente avanço do desempre-Cgo no Brasil, da queda dos rendi-
mentos e a consequente queda das
contribuições provenientes dos empregos
formais, propostas restri�vas têm se
fortalecido. A Reforma da Previdência que
já vem sendo anunciada é um dos princi-
pais obje�vos do governo instaurado pelo
golpe em 2016. A reforma seria realizada
mediante: a alteração das normas para
restringir o acesso aos bene�cios; a
desvinculação do valor dos bene�cios ao
salário mínimo, que atualmente estabele-
ce um piso; a definição de uma idade
mínima para aposentadoria – alegando a
maior expecta�va de vida no Brasil
apontada pelos dados esta�s�cos,
embora discrepâncias regionais e setoriais
sejam muito expressivas –; e estabelecen-
do ainda a uniformização das idades
mínimas para aposentadoria de mulheres
e homens. A defesa contra o desmonte da
Previdência Social brasileira é um dos mais
importantes espaços em que a resistência
ao golpe deve concentrar sua denúncia e
ar�culação para reagir. Analisando compara�vamente os
efeitos da priva�zação dos regimes
previdenciários de nossos vizinhos da
América La�na, propomos que estejamos
envolvidos no empenho de defender o
atual sistema previdenciário brasileiro,
estabelecido pela Cons�tuição Federal de
1988 (CF 1988). A CF 1988 estabelece o
regime de repar�ção no sistema previden-
ciário, cuja sustentação financeira se
fundamenta no compromisso do Estado,
de capitalistas e trabalhadores: um pacto
geracional e solidário. A proposta de
reforma conservadora tem, na verdade, o
obje�vo de impulsionar a população a
inves�r na previdência privada. Assim,
deixaríamos de ser cidadãos portadores
de direitos e passaríamos a ser todos
inves�dores no mercado de capitais.
Estar íamos subme�dos às regras
selvagens do capitalismo financeiro, da
vola�lidade e dos riscos no inves�mento
no mercado de ações: o fundo pode falir, a
rentabilidade das aplicações pode
despencar de um momento para outro, há
ainda o denominado “risco da longevida-
de”, quando se vive por mais tempo do
que havia sido programado ao contribuir.
Essa transição, portanto, favoreceria o
sistema financeiro e agravaria a vulnerabi-
lidade da população, sujeita a uma série
de riscos próprios do mercado financeiro. O sistema de proteção social brasileiro
(nos moldes estabelecidos pela CF 1988) é
o mais abrangente da América La�na e
está na berlinda, sobretudo no pós-golpe
de 2016. Nesse sen�do, em 13 de
dezembro de 2016, a Proposta de Emenda
à Cons�tuição (PEC) 55 foi aprovada no
Senado Federal, gerando a Emenda
Cons�tucional 94, e impondo um teto de
gastos pelo setor público ao determinar o
congelamento dos inves�mentos no país
por 20 anos. A medida limita o reajuste
Capítulo 6: Terceirização
19Trabalho Decente na América La�na: BrasilCapítulo 4: Proteção Social
A PROPOSTA DE “REFORMA” DA PREVIDÊNCIA NO BRASIL
Trabalho Decente na América La�na: BrasilCapítulo 4: Proteção Social
20
anual ao equivalente à reposição da
inflação do ano anterior (crescimento real
nulo) nas áreas de infraestrutura, sanea-
mento básico, saúde, educação, assistên-
cia social e previdência – denominados
gastos primários do Governo Federal.
E s s a s p ro p o sta s d e s re s p e i ta m a
Cons�tuição e violam a cidadania,
possuindo um viés priva�zante, de
ampliação da par�cipação de empresas
privadas no mercado previdenciário,
segundo interesses do sistema financeiro
de priva�zação da Seguridade Social.
Para jus�ficar a tese de que a
previdência necessita de uma reforma, o
governo brasileiro tem afirmado que as
contas públicas estão no vermelho e um
dos principais problemas seria o “déficit
previdenciário”. Diagnós�co controverso,
sobre o qual não há consenso. Isso porque,
considerando todas as receitas (fontes de
recursos) previstas e vinculadas pela CF
1988 ao orçamento da Previdência, o saldo
é posi�vo, suficiente para financiar todo o
sistema (gastos do Governo Federal com
previdência, saúde e assistência social).
Quando as contas do governo indicam
déficit, conforme apontam economistas
crí�cos da proposta (dentre os quais
ressaltamos Denise Gen�l, professora da
UFRJ), a discrepância entre os números
alegados decorre de uma manipulação,
manobra contábil ou fraude nas contas da
Previdência, no propósito de depreciar o
sistema, alegar falência e insustentabilida-
de, um suposto desajuste nas contas
públicas que não corresponde à realidade. Na verdade, parte volumosa dos
recursos previstos na CF 1988 para compor
a receita no orçamento vem sendo
desviada para o pagamento de juros da
dívida pública. Também constam, nessa
perda de recursos, as desonerações
concedidas às empresas e as sonegações
das contribuições previdenciárias que
geram perda de arrecadação: R$ 136
bilhões foram re�rados do orçamento da
Seguridade Social em 2014. Portanto, a
Previdência brasileira é superavitária se
não houver desvios das receitas vinculadas
cons�tucionalmente e se não houver
desonerações. Além disso, o campo de
proteção social poderia ser ampliado se
houvesse aumento da formalização do
trabalho (R$ 47 bilhões, pois aumenta a
contribuição); fim da remuneração “por
fora” a trabalhadores (R$ 20 bilhões);
reembolso pelas empresas das despesas
com acidentes de trabalho (R$ 8,8
bilhões); fim do enquadramento de
acidentes de trabalho como doenças
comuns (R$ 17 bilhões); eliminação das
perdas de arrecadação por subno�ficação
de acidentes de trabalho (R$ 13 bilhões).
Considerando todas as
receitas (fontes de recursos)
previstas e vinculadas pela
CF 1988 ao orçamento da
Previdência, o saldo é
posi�vo
“
”
83,2%
21
Capítulo 5: Liberdade Sindical
as duas úl�mas décadas a taxa de Nsindicalização no Brasil tem permanecido rela�vamente
constante, oscilando em representações próximas ao intervalo entre 19% e 16%, a despeito das mudanças ocorridas no âmbito do trabalho e da produção. Em 2014 (acompanhe na gráfico 6 que segue), do total das mulheres ocupadas no país, com
idade a par�r de 15 anos, 16,7% estavam filiadas ao sindicato de sua categoria profissional, frente aos 15,5% referentes ao ano anterior. Independentemente do sexo, em 2014, 16,8% do total de ocupados no Brasil estavam associados ao sindicato correspon-dente, enquanto no ano anterior o total de associados somava 16,1%.
Trabalho Decente na América La�na: BrasilCapítulo 5: Liberdade Sindical e Negociação Cole�va
Gráfico 6 - Brasil: Pessoas de 15 anos ou mais de idade, ocupadas, por sexo, segundo a associação a sindicato
Nº abs.(em mil) e %TOTAL
Nº abs.(em mil) e %HOMENS
Nº abs.(em mil) e %MULHERES
100%16,8%
83,2% 100%16,8%
100%
16,7%
83,3%
Ano
de
2014
Ano
de
2014
Fonte: IBGE, Diretoria de Pesquisas, Coordenação de Trabalho e Rendimento, Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios 2013-2014.
Nº abs.(em mil) e %TOTAL
Nº abs.(em mil) e %HOMENS
Nº abs.(em mil) e %MULHERES
100%16,1%
83,9% 100%16,6%
83,4% 100%15,5%
84,5%
Ano
de
2013
Ano
de
2013
NÃO ASSOCIADOS
Numa análise segundo as Grandes Regiões brasileiras, a taxa de associação ao sindicato mais elevada em 2014 foi registrada na Região Nordeste, com 22,4% das mulheres trabalhadoras filiadas ao sindicato, ao passo que, quanto aos homens, a taxa de associação era de 18,1%.
Em 2013, esse percentual equivalia a 20,2% para as mulheres e 18,3% para os homens ocupados.
Nessa região, pelo menos uma em cada quatro mulheres ocupadas estavam associadas à sua respec�va en�dade de classe.
TOTAL NÃO ASSOCIADOSTOTAL NÃO ASSOCIADOSTOTAL
NÃO ASSOCIADOSTOTALNÃO ASSOCIADOSTOTALNÃO ASSOCIADOSTOTAL
“Protagonismo e Alianças Horizontais em Combates”
As Negociações Cole�vas em 2015
No dia 6 de abril de 2016 o De-
partamento Intersindical de Esta�s�cas e
Estudos Socioeconômicos (DIEESE) e as
Centrais Sindicais realizaram a 12ª Jornada
Nacional de Debates – Desafios na
Negociação Cole�va em Cenário de Crise,
que contou com a presença de dirigentes
sindicais, reunidos no auditório da Escola
DIEESE de Ciências do Trabalho, em São
Paulo. No início do evento foi apresentado,
pelo coordenador de relações sindicais,
José Silvestre, o Balanço das Negociações
dos Reajustes Salariais de 2015. Elaborado
pelo Sistema de Acompanhamento de
Salários (SAS), o levantamento analisou os
reajustes salariais de 708 unidades de
negociação da indústria, do comércio e de
serviços, em estabelecimentos localizados
em quase todo o território nacional.Desde 2004, de acordo com o Balanço,
não era observado um cenário tão desfa-
vorável a trabalhadoras e trabalhadores no
país: em 2015, ganhos e perdas reais
concentraram-se nas faixas mais próximas
à variação da inflação. Do total de reajustes salariais rela�vos a
2015, aproximadamente 52% ob�veram
ganhos, situando-se acima da inflação
medida pelo INPC (Índice Nacional de
Preços ao Consumidor, calculado pelo
IBGE); 30% �veram valor equivalente à
variação do índice e 18% ficaram abaixo. O
aumento real médio em 2015 foi de 0,23%.
Em 2014 haviam sido analisadas 779
unidades de negociação, das quais 90,2%
ob�veram reajustes acima do INPC-IBGE;
7,3% igual ao índice e apenas 2,4% dos
reajustes foram inferiores ao INPC. A
variação real média de 2014 foi de 1,34%.
Ainda que tenha sido registrada a
degradação dos reajustes, os resultados
verificados em 2015 foram significa�-
vamente melhores do que os observados
no período precedente a 2004.E m 2 0 1 5 , o d e s e m p e n h o d a s
negociações salariais foi deteriorando-se
conforme as datas-bases avançavam no
calendário anual, possivelmente em
decorrência do agravamento do desfa-
vorável quadro econômico brasileiro,
par�cularmente quanto ao nível de
a�vidade (no quarto trimestre o PIB
nacional decresceu 5,9% em relação ao
mesmo período de 2014), da ocupação e
da inflação. Em 2013 foram registradas
2.050 greves no Brasil. Houve crescimento
de 134% em relação a 2012, quando
haviam sido registradas 877 greves, e este
consis�u no maior número de toda a série
histórica (acompanhe na tabela 9 que
segue). Os dados indicadores são apresentados
pelo Sistema de Acompanhamento de
Greves (SAG), desenvolvido e man�do
pelo DIEESE, que reúne informações das
paralisações e greves de trabalhadores
desde 1978.
22 Trabalho Decente na América La�na: BrasilCapítulo 5: Liberdade Sindical e Negociação Cole�va
8
9
Fonte: DIEESE. Estudos e Pesquisas. Balanço das Negociações dos Reajustes Salariais de 2015. Nº 80 – abril de 2016. Disponível em: h�p://www.dieese.org.br/balancodosreajustes/2016/estPesq80balancoReajustes2015.pdf. Acesso em: 06/06/2016.
(%)
ESFERA
Fonte: DIEESE. Sistema de Acompanhamento de Greves (SAG-DIEESE).Nota 1: Greves empreendidas conjuntamente por trabalhadores das esferas pública e privada.
Tabela 9 - Brasil: Total de greves, nas esferas públicas e privadas, em 2012 e 2013
Variação da par�cipação
(pp)
23Trabalho Decente na América La�na: Brasil
Capítulo 5: Liberdade Sindical e Negociação Cole�va
Em total de horas paradas, que
correspondem à soma da duração de
horas em cada greve, foram 111.342 horas
paradas em 2013, o que significa aumento
de 28% em comparação às registradas em
2012, quando foram verificadas 86.921
horas paradas. É o número mais elevado
desde o ano de 1990, com registro de
117.027 horas paradas. Em termos de
duração, as greves tornaram-se mais
curtas, tendo ampliação do número de
paralisações que se encerraram no
mesmo dia em que foram deflagradas:
corresponderam a 30% do total em 2012
e tornaram-se 49% em 2013. Em 2013 as
greves mobil izaram 2 milhões de
g r e v i s t a s , c o m m é d i a d e 2 . 1 6 4
trabalhadores por greve.8
9
Fonte: DIEESE. DIEESE Comunic@. Ano VI – Número 170 – 17/04/2016. Disponível em: h�p://www.dieese.org.br/materialins�tucional/2016/dieeseComunica170.html. Acesso em: 06/06/2016.
Esse movimento de greves e parali-
sações, que tomaram novo impulso
desde 2008 no Brasil, demonstra que, na
contramão da tendência declinante que
se verifica nos países do Norte global, os
sindicatos brasileiros seguem mais
a�vos e mobilizados, a despeito de todas
a s d i fi c u l d a d e s , ta i s q u a i s a s j á
a p o n t a d a s , c o m o p u l v e r i z a ç ã o
progressiva e baixa representa�vidade
de parcela significa�va das ins�tuições,
a lém da r ig idez h ierárquica e da
excessiva burocra�zação da estrutura
sindical oficial.
Trabalho Decente na América La�na: BrasilConclusões
o cenário de degradação do Nmercado de trabalho nacional,
com o agravamento da reces-
são, a taxa de desocupação registrou
elevação acentuada ao longo de 2016, o
que impactou mais incisivamente os
salários reais e tem prejudicado a retoma-
da do crescimento, em função da retração
da demanda interna.
No trimestre até outubro de 2016, a
taxa de desemprego manteve-se em
11,8% e o total de desocupados escalou
patamar superior a 12 milhões de pessoas
(PNAD Con�nua/IBGE). Em ranking
internacional do número de demissões,
elaborado pela Trading Economics, o
Brasil está entre os três primeiros países
que apresentam as maiores taxas de
desemprego, ao lado de Espanha e Itália.
O salário mínimo é uma das conquistas
da classe trabalhadora que estão no alvo
principal do golpe em curso no Brasil.
Com a proposta de prevalência do
negociado sobre o legislado, o valor de
referência poderia não ser mais uma
obrigatoriedade, sobressaindo os
argumentos que enfa�zariam os custos
para os empresários e as supostas
implicações para a compe��vidade da
economia brasileira.
Argumentos falsos, haja vista que o
salário dos trabalhadores de baixa renda
é integralmente gasto em despesas no
comércio, alavancando o mercado
interno e dinamizando a produ�vidade
nacional. O salário mínimo também
estabelece um piso para os bene�cios
pagos pela Previdência Social no Brasil.
Associados, salário mínimo e bene�cios
p rev i d e n c i á r i o s co n s i s� ra m n o s
principais instrumentos recentes de
distribuição de renda no país.As informações registradas pela
PNAD-IBGE apontam que as taxas de
associa�vismo sindical no Brasil têm se
deslocado das regiões urbanas e industri-
alizadas, bem como de um perfil mais
expressivamente masculino – assim
como formatado a par�r do final da
década de 1970, com o movimento
grevista e a luta exitosa pela redemocra�-
zação do país, os direitos do trabalho e a
cidadania plena, conforme as conquistas
inscritas na Cons�tuição de 1988 –, em
direção ao trabalho desempenhado no
campo, especialmente entre não
assalariados, e mais enfa�camente às
mulheres trabalhadoras. Esse diagnós�co, aliás, também se
verifica no perfil de sindicalizados da CUT,
Conclusões
24
25Trabalho Decente na América La�na: Brasil
Conclusões
a maior central sindical brasileira. Com as
mudanças contemporâneas nas relações
de trabalho, decorrentes do processo de
reest ruturação produ�va que se
intensificou na década de 1990, da
abertura comercial no país, do avanço das
pr iva�zações, da flexib i l idade na
produção e da globalização neoliberal,
novos desafios têm se apresentado à ação
sindical em escalas nacional e global nas
úl�mas décadas. Os novos contratos de trabalho
refletem esse movimento: o crescimento
da precariedade e da instabilidade dos
vínculos profissionais, caracterís�cas que
ademais tendem a ampliar-se na conjun-
tura econômica recessiva e de grave crise
polí�ca que o país enfrenta em nossos
dias. Por outro lado, este contexto amplia
os espaços de oportunidades para
revigorar os sindicatos, fortalecendo a
organização e sua apropriação, nas
diversas instâncias da estrutura sindical,
pelas mulheres e a juventude trabalhado-
ra, principais alvos da precarização do
trabalho e do desemprego. A possibilidade desse refortalecimen-
to, no entanto, passa pela superação do
sexismo e a composição de uma aliança
com a juventude brasileira entre
estudantes e trabalhadores jovens (nos
moldes da formação que insurgiu em
Paris em 2016, com protestos e greves
contra as reformas trabalhistas anuncia-
das pelo presidente François Hollande), o
que por sua vez exigirá que o movimento
sindical brasileiro se reinvente cri�ca-
mente e se reconfigure de modo mais
horizontal. Afinal, tornou-se evidente o descola-
mento significa�vo entre a juventude
brasileira e os sindicatos, tal como as
manifestações sociais de junho de 2013
escancararam.
26
Braga, Rui; Santana, Marco Aurélio. “Dinâmi-
c a s d a A ç ã o C o l e � v a n o B r a s i l
Contemporâneo: encontros e desencon-
tros entre o sindicalismo e a juventude
trabalhadora”. In: Santana, Marco Aurélio
(coord.). Dossiê: Para Onde foram os
Sindicatos? Caderno CRH, Salvador, V. 28,
Nº 75, p. 529-544, Set./Dez. 2015.
Departamento Intersindical de Esta�s�ca e
Estudos Socioeconômicos (DIEESE).
Balanço das Greves em 2013. Estudos e
Pesquisas, nº 79 – dezembro de 2015.
Departamento Intersindical de Esta�s�ca e
Estudos Socioeconômicos (DIEESE).
Polí�ca de Valorização do Salário Mínimo:
valor para 2016 é fixado em R$ 880,00.
Nota Técnica Número 153 - Dezembro de
2015 (atualizada em janeiro de 2016).
Gen�l, Denise. A Falsa Crise da Seguridade
Social no Brasil: uma análise financeira do
período 1900-2005. Tese de Doutorado
(UFRJ), 2006.
Gen�li, Pablo (Editor). Golpe en Brasil.
Genealogía de uma farsa. CLACSO.
Octubre Editorial. Buenos Aires. Junio de
2016.
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