trabalho filosofia

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1ÁGORA Praça pública (da Grécia antiga), onde fervilhava a vida social da cidade grega: nela se situava o mercado que depois passou a ser o centro político, cívico e religioso da cidade. Ficou célebre a ágora de Atenas. 2Alienação Conceito que se refere a um conjunto de situações em que um ser não se reconhece porque perdeu algo da sua essência. Em Hegel a alienação era uma condição necessária da realização do Absoluto como Espírito que tudo governa. Em Marx (filósofo alemão-imagem ao lado) o sujeito da alienação é o homem e a alienação é uma degradação física e moral de que urge salvá-lo. Para Marx a alienação fundamental é a económica: o trabalhador é obrigado a vender o seu trabalho para satisfazer necessidades que não são especificamente humanas (comer, beber...). A exploração do trabalho aliena o trabalhador, isto é, desumaniza-o. Na raiz da degradação está a propriedade privada dos meios de produção. Só o comunismo, ao abolir esta situação, poderá salvar o homem. 3Aristoteles (384-322 a. C.) Um dos mais influentes filósofos de sempre. Nasceu em Estagira, no norte da Grécia. Foi discípulo de PLATÃO em Atenas e mestre de Alexandre Magno, na Macedónia. Depois da morte de Platão, fundou em Atenas a sua própria escola, a que deu o nome de Liceu. Os seus interesses eram os mais variados. Não houve quase nenhum domínio do conhecimento sobre o qual não tivesse escrito e atribuía uma grande importância à observação da natureza. Ele próprio procedeu a estudos minuciosos nos domínios da física, biologia, psicologia e linguagem. Como é típico nos melhores filósofos, era muito rigoroso na justificação das suas opiniões e meticuloso na ponderação dos argumentos contrários, evitando chegar a conclusões precipitadas. Entre as disciplinas filosóficas que desenvolveu contam-se a LÓGICA, a METAFÍSICA, a ÉTICA, a FILOSOFIA POLÍTICA, e a ESTÉTICA. Pode mesmo dizer-se que foi o fundador da Lógica, começando o seu estudo praticamente do nada. Se bem que limitada e com várias deficiências, a teoria lógica aristotélica foi o resultado de um trabalho notável de inteligência, de tal modo que, no essencial, se manteve incontestada e Object 1 Object 2

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Page 1: trabalho filosofia

1ÁGORAPraça pública (da Grécia antiga), onde fervilhava a vida social da cidade grega: nela se situava o mercado que depois passou a ser o centro político, cívico e religioso da cidade. Ficou célebre a ágora de Atenas.

2Alienação Conceito que se refere a um conjunto de situações em que um ser não se reconhece porque perdeu algo da sua essência. Em Hegel a alienação era uma condição necessária da realização do Absoluto como Espírito que tudo governa. Em Marx (filósofo alemão-imagem ao lado) o sujeito da alienação é o homem e a alienação é uma degradação física e moral de que urge salvá-lo. Para Marx a alienação fundamental é a económica: o trabalhador é obrigado a vender o seu trabalho para satisfazer necessidades que não são especificamente humanas (comer, beber...). A exploração do trabalho aliena o trabalhador, isto é, desumaniza-o. Na raiz da degradação está a propriedade privada dos meios de produção. Só o comunismo, ao abolir esta situação, poderá salvar o homem.

3Aristoteles (384-322 a. C.) Um dos mais influentes filósofos de sempre. Nasceu em Estagira, no norte da Grécia. Foi discípulo de PLATÃO em Atenas e mestre de Alexandre Magno, na Macedónia. Depois da morte de Platão, fundou em Atenas a sua própria escola, a que deu o nome de Liceu. Os seus interesses eram os mais variados. Não houve quase nenhum domínio do conhecimento sobre o qual não tivesse escrito e atribuía uma grande importância à observação da natureza. Ele próprio procedeu a estudos minuciosos nos domínios da física, biologia, psicologia e linguagem. Como é típico nos melhores filósofos, era muito rigoroso na justificação das suas opiniões e meticuloso na ponderação dos argumentos contrários, evitando chegar a conclusões precipitadas. Entre as disciplinas filosóficas que desenvolveu contam-se a LÓGICA, a METAFÍSICA, a ÉTICA, a FILOSOFIA POLÍTICA, e a ESTÉTICA. Pode mesmo dizer-se que foi o fundador da Lógica, começando o seu estudo praticamente do nada. Se bem que limitada e com várias deficiências, a teoria lógica aristotélica foi o resultado de um trabalho notável de inteligência, de tal modo que, no essencial, se manteve incontestada e estudada até ao final do séc. XIX. Aristóteles procurou determinar as formas válidas de inferência, isto é, as inferências cuja forma nos impede de chegar a uma CONCLUSÃO falsa a partir de premissas verdadeiras (verPREMISSA). E estabeleceu um conjunto de regras para identificar as boas e evitar as más inferências (ver LÓGICA ARISTOTÉLICA). Organon é o nome dado ao conjunto das suas obras de lógica. Na Metafísica, uma das suas obras mais marcantes (assim chamada apenas porque foi publicada a seguir à Física), Aristóteles descreve esta disciplina como o estudo do "ser enquanto ser", isto é, o estudo do ser em geral, independentemente do modo particular como as coisas são. Muitos dos conceitos metafísicos ainda hoje utilizados foram introduzidos por si. Em Ética a Nicómaco (assim chamada por ter sido dedicada a seu filho Nicómaco), Aristóteles argumenta, entre outras coisas, a favor da ideia de que as virtudes morais, como a generosidade e a honestidade, não são inatas. Só o hábito de evitar excessos de qualquer tipo nos pode tornar pessoas virtuosas. Por isso, a virtude adquire-se com a prática. Sobre filosofia política escreveu a Política e sobre estética a Poética, entre outros livros. AA

4 Ciencia

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Page 2: trabalho filosofia

As disciplinas que agrupamos sob a designação "ciência" incluem as ciências formais e as ciências empíricas (ver EMPÍRICO).

As principais ciências formais, assim chamadas pelo facto de os seus objectos de estudo não terem

existência concreta (ver ABSTRACTO/CONCRETO), são a matemática e a LÓGICA.

As ciências empíricas são aquelas que estudam, com base na experiência, os

fenómenosnaturais e sociais. A finalidade de tais ciências é descobrir e explicar os padrões e

regularidades desses fenómenos, enunciando-os rigorosamente sob a forma de leis. As leis

genuinamente científicas 1) constituem generalizações corroboradas acerca dos fenómenos que

descrevem, 2) permitem realizar previsões rigorosas e 3) são passíveis de ser testadas. Estas três

características diferenciam-nas dos enunciados da FILOSOFIA, da religião, do SENSO COMUM e das

pseudociências (como a alquimia, a astrologia ou a parapsicologia). Outro aspecto que diferencia a

ciência dos demais saberes, e também das pseudociências, é o recurso sistemático a métodos

formais de prova. Saber se as ciências sociais têm por objectivo, como as naturais, a elaboração de

leis, é ponto de discórdia entre os especialistas.

O conjunto de procedimentos dos cientistas no seu trabalho constitui o MÉTODO CIENTÍFICO.

Em FILOSOFIA DA CIÊNCIA discute-se se existe um método científico único e como poderemos

descrevê-lo apropriadamente, sendo particularmente importantes a este respeito os trabalhos de

Imre Lakatos (1922-1974), Karl POPPER, Paul FEYERABEND e Thomas KHUN.

A cisão moderna entre a filosofia e a ciência dá-se progressivamente com os trabalhos de Copérnico

(1473-1543), Kepler (1571-1630), GALILEU e Newton (1642-1727), que impulsionaram

decisivamente o recurso à experimentação e a matematização da ciência.Ver EXPLICAÇÃO

CIENTÍFICA, OBSERVAÇÃO, MÉTODO CIENTÍFICO, MÉTODO EXPERIMENTAL, MÉTODO HIPOTÉTICO-

DEDUTIVO, CORROBORAÇÃO, GENERALIZAÇÃO,PROBLEMA DA

INDUÇÃO, VERIFICACIONISMO, VERIFICABILIDADE, FALSIBICABILIDADE,FALSIFICACIONISMO, CRIT

ÉRIO DE DEMARCAÇÃO, POSITIVISMO e COMTE. APC

5conhecimento

Os verbos conhecer e saber são sinónimos e costumam ser utilizados de três maneiras diferentes.

Na frase "a Ana sabe nadar", o termo "sabe" serve para atribuir à Ana uma determinada

competência ou capacidade; por sua vez, na frase "a Ana conhece o primeiro-ministro" o termo

"conhece" significa que a Ana é capaz de identificar alguém (ou algo), ou também pode significar

que ela tem ou teve algum tipo de contacto com essa pessoa (ou coisa); finalmente, na frase "a Ana

sabe que Paris é a capital da França", o que se afirma que a Ana sabe é algo que tanto pode ser

verdadeiro como falso. Neste último caso, o que vem a seguir a "sabe que" é uma outra frase que

exprime uma PROPOSIÇÃO. Este é o sentido proposicional de "conhecer" que é objecto de estudo

da EPISTEMOLOGIA. Não existe uma definição satisfatória de "conhecimento", mas há pelo menos

três CONDIÇÕES NECESSÁRIAS que, em geral, os filósofos aceitam: não há conhecimento

Page 3: trabalho filosofia

sem crença; a crença tem de ser verdadeira; além de verdadeira, a crença tem também de

ser justificada. Quer isto dizer que não podemos conhecer algo em que não acreditamos; que não

podemos conhecer falsidades; e que não há conhecimento se as nossas crenças, apesar de

verdadeiras, não forem justificadas. AA

7 Cosmogonia - Teoria sobre a origem do universo geralmente fundada em lendas ou em mitos e ligada a uma metafísica.

8 Cosmologia - Parte da filosofia que tem por objeto o estudo do mundo exterior, isto é, da essência da matéria e da vida.

9 Cosmo - Designa o mundo enquanto ele é ordenado e se opõe ao caos: mundo considerado como um todo organizado, como uma ordem hierarquizada e harmoniosa.

10 crença

O termo é usado para referir 1) um estado mental disposicional, que tem como conteúdo

uma PROPOSIÇÃO, verdadeira ou falsa (ver VERDADE/FALSIDADE), ou 2) para referir a proposição

que constitui o conteúdo desse estado mental. Quando tomamos "crença" na segunda acepção, ela é

independente de quem quer que a pense e o estado mental correspondente constitui uma atitude

proposicional, uma atitude de crença numa proposição, que envolve certo grau de confiança

na VERDADE dessa proposição (daí a relação próxima entre crença e verdade). O facto de as

crenças, enquanto estados mentais, serem disposicionais significa que podemos ter uma disposição

para agir de certa forma devido às crenças que temos. Uma concepção comum de FILOSOFIA,

presente, por exemplo, em Bertrand RUSSELL, vê esta como a análise CRÍTICA das crenças (na

segunda acepção) instintivas, com o objectivo de determinar quais as justificadas e construir,

assim, um sistema coerente de crenças instintivas nas quais todas as outras se

fundem. VerFUNDACIONALISMO. AN

14 DOGMA, DOGMATISMO — Um dogma é uma tese aceita às cegas, por simples crença, sem crítica, sem levar em conta as condições de sua aplicação. O dogmatismo é característico de todos os sistemas teóricos que defendem o velho, o caduco, o reacionário e combatem o novo, o progressista. São dogmáticas as teorias sociais que já não encontram apoio na realidade em vias de desenvolvimento. Uma tese justa em si mas aplicada de maneira não dialética, sem ter em conta as mudanças concretas da situação, pode degenerar em dogma. Marx e Engels não cessaram de lembrar que sua doutrina não era um dogma, mas apenas um jniia para ação.

O marxismo antênticamente revolucionário é um marxismo criador que se enriquece sem

cessar com dados novos do desenvolvimento social, da experiência revolucionária das massas.

11

Dedução - Raciocínio que nos permite tirar de uma ou várias proposições uma conclusão que delas decorre logicamente.

Page 4: trabalho filosofia

12 democracia

Sistema de governação do povo, pelo povo (democracia directa) ou seus representantes

(democracia representativa), e para o povo. PLATÃO defendeu que a democracia é irracional

porque coloca o poder de decisão nas mãos da maioria da população, que muitas vezes não tem o

conhecimento apropriado para tomar as melhores decisões. Outra crítica relacionada com esta é

que a democracia, sem restrições, é apenas uma injusta ditadura da maioria. Finalmente, discute-se

também se a democracia tem valor em si ou se tem valor apenas porque as suas consequências são

melhores do que as de qualquer outra forma de governação. DM

13 Descartes, René (1596-1650)

Filósofo, matemático e cientista francês. É considerado o pai da filosofia

moderna. Abandonou os métodos que até então eram habituais da filosofia do

continente europeu e que seguiam o estilo de TOMÁS DE AQUINO: no estudo

de cada problema filosófico recorria-se à comparação das teorias dos filósofos

do passado, sobretudo ARISTÓTELES, e das doutrinas da Bíblia. Ao invés,

Descartes enfrenta directamente os problemas da filosofia, sem comparar as

teorias dos filósofos anteriores e sem atender às doutrinas da Bíblia. A sua formação científica

diferencia-o também de muitos filósofos medievais, cuja formação era fundamentalmente

teológica. Descartes era, contudo, um homem muito religioso e alega que o seu método filosófico

lhe foi revelado em sonhos.

No Discurso do Método (1637), Descartes apresenta um resumo do seu pensamento filosófico, que

mais tarde desenvolve nas Meditações sobre a Filosofia Primeira (1641). A preocupação central de

Descartes é conseguir estabelecer um método seguro para a filosofia, que a coloque no mesmo

caminho de sucesso que a ciência do seu tempo começava a percorrer. Como muitos filósofos do

seu tempo, Descartes está igualmente preocupado com o CEPTICISMO. A sua famosa dúvida

metódica consiste em levar até às últimas consequências as dúvidas dos cépticos, convencido de

que no fim haverá uma verdade da qual não será possível duvidar. SANTO AGOSTINHO já tinha

proposto o mesmo método de refutação do cepticismo, mas Descartes entende que, com base no

que restar depois da aplicação da dúvida metódica, será possível reconstruir os fundamentos de

todo o conhecimento. Descartes costuma por isso ser visto como um fundacionalista

(verFUNDACIONALISMO) com respeito à EPISTEMOLOGIA.

A verdade irrefutável e que nem os cépticos mais radicais poderiam recusar é a própria existência

de quem duvida; daí a famosa expressão "Penso, logo existo" — isto é, posso duvidar de tudo,

incluindo da realidade do mundo exterior, mas, para poder duvidar, tenho de existir, e por isso a

minha própria existência é indubitável e evidente. Mas a minha existência não se pode confundir

com a existência do meu corpo, do qual posso duvidar. E Descartes introduz assim o famoso e

poderoso argumento dualista: se é possível que o meu corpo seja uma ilusão, mas é impossível que

Page 5: trabalho filosofia

eu seja uma ilusão, então eu não sou o meu corpo. Com base na certeza de que o eu existe,

Descartes procura então mostrar a existência de Deus e, com base na existência de Deus, a

existência do mundo exterior. A obra de Descartes, sobretudo as Meditações, é um modelo da

actividade filosófica genuína e constitui um bom ponto para começar o estudo da filosofia. DM

Blackburn, Simon, Pense, Cap. 1 (Lisboa: Gradiva, 2001). Descartes, René, Discurso do Método (Lisboa: Sá da Costa, 1984). Descartes, René, Meditações sobre a Filosofia Primeira (Coimbra: Almedina, 1985). Kenny, Anthony, História Concisa da Filosofia Ocidental, Cap. 11 (Lisboa: Temas e Debates, 1999). Magee, Bryan, Os Grandes Filósofos, cap. 4 (Lisboa, Presença, 1989).

15

empírico

Diz-se do que se refere à experiência sensível. Assim, uma afirmação é empírica se descrever ou de

algum modo estiver relacionada com a descrição de um estado de coisas de que temos experiência

e puder ser confirmada ou falsificada pela experiência sensível. E o mesmo se aplica em relação às

nossas crenças. Ao afirmar que há seres inteligentes extraterrestres estamos a defender uma tese

empírica; ao afirmar que Lisboa é maior do que Faro estamos a exprimir uma crença empírica. Isto

contrasta com teses ou crenças não empíricas (isto é, conceptuais), como a tese de que 30 + 60 =

90, ou a crença de que o vermelho é uma cor (o que é diferente da crença de que um dado objecto é

vermelho). Podemos ainda falar de qualidades empíricas quando dizemos, por exemplo, que

determinado objecto é azul. Neste caso trata-se de uma qualidade empírica porque referimos uma

característica que pode ser directamente observada, enquanto que as qualidades teóricas são

inferidas (ver INFERÊNCIA). Ver também A PRIORI/A POSTERIORI eEMPIRISMO. AA

16

empirismo

Perspectiva filosófica de acordo com a qual todo o nosso conhecimento substancial deriva da

experiência e das impressões colhidas pelos cinco sentidos (ver A PRIORI/A POSTERIORI). O

empirismo divide-se, em geral, em duas posições. A posição segundo a qual todo o conhecimento

deriva da experiência, não havendo espaço para o conhecimento a priori (esta é a posição empirista

radical); e a posição segundo a qual, apesar de todo o nosso conhecimento substancial derivar da

experiência, existe conhecimento a priori, só que este não é substancial, nada nos diz acerca do

mundo exprimindo meras relações entre os conceitos (esta é a posição empirista moderada). Um

dos primeiros grandes filósofos empiristas foi o inglês do séc. XVII John LOCKE. Este defendeu que

a nossa mente se compara a uma folha de papel em branco (ou a umaTÁBUA RASA, como

dizia ARISTÓTELES) na qual os nossos sentidos vão deixando registadas as impressões colhidas do

exterior. A mente era vista como uma espécie de recipiente que se vai enchendo à medida que o

contacto com o mundo à nossa volta o permite, mas incapaz de ter uma intervenção activa que não

Page 6: trabalho filosofia

seja a interpretação e manipulação dos dados sensíveis. O desrespeito pelos dados sensíveis é que

está, segundo o empirista, na origem das interpretações abusivas em que se apoiam as nossas

crenças falsas. O empirismo opõe-se, pois, ao RACIONALISMO, o qual defende que podemos obter

conhecimento a priori substancial acerca do mundo. O filósofo escocês do séc. XVIII

DavidHUME enfrentou, sempre numa perspectiva empirista, algumas das dificuldades apontadas

pelos racionalistas, acabando por tirar a conclusão céptica (ver CEPTICISMO) de que era impossível

basear na experiência ideias tão importantes para a ciência como as deCAUSALIDADE e de

universalidade (ver UNIVERSAIS). Os ingleses Stuart MILL (séc. XIX), o alemão Rudof CARNAP e o

filósofo americano W. V. QUINE estes já no séc. XX, são alguns dos mais destacados empiristas. São

duas as grandes dificuldades que qualquer teoria empirista enfrenta, explicar a forte intuição de

que temos conhecimento a priorisubstancial, e explicar a forte intuição de que existem verdades

necessárias. Ver

tambémCOERENTISMO, FUNDACIONALISMO, INDUÇÃO, PRAGMATISMO, VERIFICACIONISMO. AA

Blackburn, Simon, Pense: Uma Introdução à Filosofia, capítulo 1 (Lisboa: Gradiva, 2001). Kenny, Anthony, História Concisa da Filosofia Ocidental, capítulos 12 e 14 (Lisboa: Temas e Debates, 1999). Nagel, Thomas, O Que Quer Dizer Tudo Isto?, capítulo 2 (Lisboa: Gradiva, 1995). Russell, Bertrand, Os Problemas da Filosofia, capítulos V-X (Coimbra: Almedina, 2001).

17

epistemologia

A disciplina tradicional da filosofia, também conhecida por TEORIA DO CONHECIMENTO,que trata

de problemas como "o que é o conhecimento?", "o que podemos conhecer?", "qual é a origem do

conhecimento?", "como justificamos as nossas crenças?", envolvendo um conjunto de noções

relacionadas entre si, como "conhecer", "perceber", "prova", "crença", "certeza", "justificação" e

"confirmação", entre outras. O nome deriva de epistêmê,termo do antigo grego que

significa CONHECIMENTO. A esse termo opunha-se o termodoxa, que significa opinião. Isto porque,

como PLATÃO começou por sublinhar, não é possível conhecer falsidades, sendo contudo possível

— e até frequente — ter opiniões falsas. Assim, um dos problemas que desde logo se coloca é o de

saber como se alcança o conhecimento e se evita a mera opinião. A célebre TEORIA DAS IDEIAS de

Platão continha uma resposta para esse problema. Para Platão, só através de um processo racional

de afastamento das impressões sensíveis somos conduzidos à contemplação das Ideias perfeitas, de

que os objectos captados pelos nossos SENTIDOS são simples cópias imperfeitas. É nas Ideias que

reside a verdade, pelo que o chamado "conhecimento sensível" não deve, em rigor, ser considerado

conhecimento. A discussão acerca do papel dos sentidos na formação do conhecimento e na

justificação das nossas crenças acabou por dar lugar a duas grandes doutrinas epistemológicas

rivais: o EMPIRISMO e oRACIONALISMO. Empiristas como os

britânicos LOCKE, HUME e BERKELEY defendem que todo o conhecimento substancial provém da

experiência sensível, enquanto osRACIONALISTAS, como o francês DESCARTES e o alemão LEIBNIZ,

Page 7: trabalho filosofia

consideram que o conhecimento, se correctamente entendido, deve exibir as marcas da

universalidade (verUNIVERSAL) e da necessidade (ver NECESSÁRIO), características que de modo

algum dependem da experiência. Assim, para os racionalistas nem todo o conhecimento deriva da

experiência sensível. KANT, procurou determinar com exactidão como se constitui o conhecimento,

concluindo que este depende tanto da matéria fornecida pelos sentidos como das formas A

PRIORI do pensamento a que os dados sensíveis têm de se submeter. Kant opõe-se assim tanto ao

empirismo como ao racionalismo tradicional.

A justificação das nossas crenças é outro dos problemas epistemológicos que têm gerado

importantes debates. Há filósofos que defendem que por muito boas que sejam, as nossas

justificações nunca conseguem ser inteiramente satisfatórias, vendo-nos assim permanentemente

confrontados com dúvidas insuperáveis. Este problema é também conhecido por "problema

do CEPTICISMO", uma vez que os cépticos acabam por concluir, aparentemente de forma

justificada, que o conhecimento não é possível. No sentido de evitar o cepticismo, muitos filósofos

procuraram um fundamento para o conhecimento, isto é, um reduzido número de certezas

inabaláveis a partir das quais se estrutura todo o nosso sistema de crenças. Essas certezas tanto

podem pertencer ao domínio da razão como da experiência, consoante as inclinações racionalistas

ou empiristas do filósofo. A este ponto de vista chama-se FUNDACIONALISMO, e Descartes constitui

um dos exemplos mais conhecidos. Mas há também quem não aceite qualquer tipo de fundamento

último para o conhecimento, sem contudo aderir ao cepticismo. É o caso dos defensores

doCOERENTISMO, para quem as nossas crenças se apoiam mutuamente umas nas outras sem

precisarem que uma delas sustente as restantes. À maneira de uma rede ou das inúmeras peças de

madeira de que é feito um barco, permitindo-lhe flutuar no mar sem se afundar — esta é a

metáfora de Otto Neurath (1882-1945) —, o importante é que as crenças sejam coerentes entre si.

Mais directamente ligado ao que se passa com a ciência, embora não só, há o chamadoPROBLEMA

DA INDUÇÃO, a propósito do qual se discute se o tipo de justificação baseado em inferências

indutivas é ou não aceitável. Podemos ainda encontrar problemas de epistemologia da religião,

tratando-se aí da justificação das crenças religiosas; epistemologia da matemática, etc. AA

Blackburn, Simon, Pense, Capítulo 1 (Lisboa: Gradiva, 2001). Dancy, Jonnathan, Epistemologia Contemporânea (Lisboa: Edições 70, 1990).Nagel, Thomas, O Que Quer Dizer Tudo Isto?, Capítulo 2 (Lisboa: Gradiva, 1995). Russell, Bertrand, Os Problemas da Filosofia (Coimbra: Almedina, 2001). Warburton, Nigel, Elementos Básicos de Filosofia, Capítulo 4 (Lisboa: Gradiva, 1998).

18

filosofia

O estudo dos problemas de carácter mais geral e conceptual que afectam o nosso pensamento

científico, religioso, artístico e quotidiano, para os quais não há respostas científicas. Eis alguns

Page 8: trabalho filosofia

exemplos de problemas filosóficos: Será tudo relativo e mera opinião? Será que temos livre-

arbítrio? O que é o conhecimento? Será o conhecimento possível? Como devemos viver? O que é o

bem moral e qual é o seu fundamento? O que é a justiça? Dizer que os problemas da filosofia são

conceptuais é dizer que não são problemas que se possam decidir recorrendo à experiência. Neste

aspecto, a filosofia é como a matemática, e não como a história ou a física.

O método da filosofia é a discussão racional de argumentos. Isto significa que não há métodos

formais nem científicos de prova, como na matemática ou na física; tudo o que se pode fazer é

pensar tão correctamente quanto possível, procurando soluções adequadas.

Os primeiros filósofos não faziam uma distinção profunda entre as diferentes áreas do

conhecimento. ARISTÓTELES, por exemplo, dedicou-se não apenas ao que hoje reconhecemos como

filosofia, mas também à física, astronomia, biologia, etc. Para os primeiros filósofos, o estudo da

filosofia tinha muito mais em comum com a biologia, a matemática ou a história, do que com outras

manifestações culturais como a arte ou a religião. E o que tinha em comum era o estudo racional da

natureza das coisas e a procura da verdade. A filosofia surge assim associada, juntamente com as

outras áreas do conhecimento, à própria ideia de investigação livre, opondo-se à atitude dogmática

que consiste em proclamar pretensas "verdades" que não se podem colocar em causa.

A filosofia não é coisa do passado. Apesar da sua longa história (ver FILOSOFIA, HISTÓRIA DA), a

filosofia continua viva; na verdade, há talvez mais filósofos hoje em dia do que ao longo de toda a

história da humanidade. E também não é verdade que não exista progresso em filosofia; sem

dúvida que a compreensão actual dos problemas, teorias e argumentos da filosofia é superior à de

qualquer época do passado. Simplesmente, talvez não haja na filosofia o tipo de progresso por

acumulação de resultados que podemos encontrar na ciência. O progresso da filosofia é um

alargamento da compreensão. Podemos continuar sem conseguir provar se temos ou não livre-

arbítrio, ou se Deus existe ou não, ou sequer como se pode justificar a nossa crença no mundo

exterior; mas a compreensão que temos hoje destes problemas é mais profunda do que a que se

tinha no passado.

Não se pode exigir do filósofo, ou do estudante de filosofia, respostas definitivas como temos em

medicina, por exemplo, em que é possível dizer exactamente o que provoca a diabetes, ou como se

cura a tuberculose. Mas isto não significa que as opiniões dos filósofos, ou do estudante de filosofia,

sejam "meras opiniões", incomensuráveis, subjectivas e pessoais, insusceptíveis de avaliação

racional e de estar mais ou menos próximas da verdade ou da plausibilidade. A opinião que se

espera de um filósofo, ou de um estudante de filosofia, é como a opinião que se espera de um

médico quando vamos a uma consulta: uma opinião fundamentada e informada, que se pode

discutir e avaliar racionalmente. O objectivo do estudo da filosofia é saber avançar "diagnósticos",

tão bons quanto possível, relativamente aos problemas tradicionais da filosofia. Isto exige um bom

conhecimento do que está em causa e das diferentes respostas que tentam resolver esse problema,

tanto antigas como modernas. Exige a capacidade para compreender os diferentes aspectos dos

Page 9: trabalho filosofia

problemas, os diferentes mecanismos de argumentação ou fundamentação e as diferentes maneiras

como uma teoria ou ideia pode ser melhorada para responder a objecções e contra-exemplos.

As principais disciplinas da filosofia merecem artigos próprios neste dicionário:METAFÍSICA,

EPISTEMOLOGIA, ÉTICA, LÓGICA, FILOSOFIA DA RELIGIÃO, FILOSOFIA POLÍTICA, ESTÉTICA,

FILOSOFIA DA CIÊNCIA, FILOSOFIA DA MENTE, FILOSOFIA DA LINGUAGEM, FILOSOFIA DA

ACÇÃO. DM

Nagel, Thomas, Que Quer Dizer Tudo Isto? (Lisboa: Gradiva, 1995). Russell, Bertrand, Os Problemas da Filosofia (Coimbra: Almedina, 2001). Warburton, Nigel, Elementos Básicos de Filosofia (Lisboa: Gradiva, 1988).

22

INDUÇÃO

Raciocínio que consiste em tirar conclusões gerais a partir de casos particulares considerados como portadores de relações gerais. O problema do raciocínio indutivo está no facto de que, contrariamente à dedução, a verdade das premissas não garante a verdade da conclusão.

indução

Geralmente usa-se este termo para falar de dois tipos diferentes de argumentos: as generalizações

e as previsões. Uma generalização é um ARGUMENTO quantificacional (verQUANTIFICADOR) não

dedutivo cujas premissas são menos gerais do que a conclusão. Este tipo de argumentos apresenta

a seguinte FORMA LÓGICA, ou outras formas lógicas análogas: "Alguns F são G. Logo, todos os F são

G". Por exemplo: "Alguns corvos são pretos; logo, todos os corvos são pretos". Uma previsão é um

argumento quantificacional não dedutivo cujas premissas se baseiam no passado e cuja conclusão é

um caso particular. Por exemplo: "Todos os corvos observados até hoje são pretos; logo, o corvo do

João é preto". É defensável que qualquer argumento não dedutivo se baseia na indução,

nomeadamente qualquer ARGUMENTO DE AUTORIDADE e ARGUMENTO POR

ANALOGIA. Ver PROBLEMA DA INDUÇÃO. DM

23

Kant, Immanuel (1724-1804)

Filósofo alemão. Kant nasceu em Königsberg (actual Kaliningrado), na Prússia

oriental, onde estudou, trabalhou e viveu toda a sua vida, tornando-se um dos

mais influentes filósofos de sempre. Durante mais de uma década trabalhou

como preceptor e em 1755 juntou-se ao corpo docente da universidade de

Königsberg, onde leccionou as mais variadas disciplinas: lógica, metafísica,

matemática, geografia, antropologia, pedagogia, etc. É habitual dividir a sua

vida intelectual em dois períodos: o "período pré-crítico" e o "período crítico".

Durante o primeiro período, Kant escreveu trabalhos menos influentes, nos quais se pode constatar

Page 10: trabalho filosofia

a grande influência de Wolff (1679-1754), discípulo de LEIBNIZ, e do próprio Leibniz. Kant foi

também fortemente influenciado por LOCKE,HUME e Jean-Jacques Rousseau (1712-78). O seu

período crítico teve início em 1770 com a publicação da sua Dissertação de 1770.

A Crítica da Razão Pura (1781) é a sua primeira grande obra. O problema que a domina é o de

saber como é o conhecimento a priori acerca do mundo possível (ver A PRIORI/A POSTERIORI), ou

para usar a sua terminologia, como é o conhecimento sintético a prioripossível

(ver ANALÍTICO/SINTÉTICO). Kant defendeu que não é possível saber como o mundo é em si,

independentemente da nossa experiência. Sucintamente, a ideia de Kant é que o nosso aparato

cognitivo, seja ele perceptivo ou puramente intelectual (ou teórico), impõe certas estruturas ao

mundo. Kant defendeu que uma metafísica científica deve usar criticamente a razão na procura dos

seus próprios limites: temos de procurar as "formas" que o nosso aparato cognitivo impõe ao

mundo. Esta é a "revolução copernicana" de Kant: para sabermos o que podemos conhecer, temos

de saber como o conhecemos.

Na Crítica da Razão Prática (1788), Kant procura os fundamentos da nossa razão prática, isto é, os

fundamentos do nosso raciocínio moral. Defende que agir racionalmente é agir moralmente, é agir

de acordo com o nosso DEVER, é agir de acordo com o IMPERATIVO CATEGÓRICO. Na Crítica da

Faculdade do Juízo (1790), volta a defender a objectividade da razão, mas desta vez relativamente

aos juízos estéticos. Contudo, esta não é meramente uma obra de estética. Nela, Kant fornece-nos

uma visão global do seu sistema filosófico. CT

Kant, Immanuel, Crítica da Razão Pura (Lisboa: FCG, 1989). Kant, Immanuel, Crítica da Razão Prática (Lisboa: Edições 70, 1997). Kant, Immanuel, Crítica da Faculdade do Juízo (Lisboa: INCM, 1992). Kant, Immanuel, Fundamentação da Metafísica dos Costumes (Lisboa: Edições 70, 1991). Kenny, Anthony, História Concisa da Filosofia Ocidental, cap. 16 (Lisboa: Temas e Debates, 1999). Magee, Bryan, Os Grandes Filósofos, cap. 8 (Lisboa: Presença, 1989).

24

lógica

O estudo da argumentação válida (ver VALIDADE/INVALIDADE). A lógica formal estuda a

argumentação cuja validade depende exclusivamente da FORMA LÓGICA. A lógica informal estuda a

argumentação cuja validade não depende unicamente da forma lógica. A lógica foi fundada

por ARISTÓTELES, que pela primeira vez usou a noção de forma lógica para distinguir os

argumentos válidos dos inválidos (ver LÓGICA ARISTOTÉLICA). A lógica conheceu relativamente

poucos desenvolvimentos até Gottlob FREGE e Bertrand RUSSELLterem revolucionado a disciplina.

Hoje em dia há muitos sistemas diferentes de lógica, que procuram resolver os problemas em

aberto na disciplina. A chamada "lógica clássica", de Frege e Russell, é encarada como a "lógica

canónica", e é essa que geralmente se começa por estudar.

Page 11: trabalho filosofia

Repare-se no seguinte argumento: 1) "Platão e Aristóteles eram filósofos; logo, Platão era um

filósofo". A lógica clássica (mas não a aristotélica) permite explicar por que razão este argumento é

válido. Dado que a validade deste argumento depende inteiramente da sua forma lógica, qualquer

argumento que tenha a mesma forma lógica será igualmente válido. Podemos ilustrar a forma

lógica do argumento assim: "P e Q; logo, P" — sendo "P" e "Q" símbolos que representam

proposições. Assim, se "P" for a proposição expressa pela frase "O aborto é um mal" e "Q" a

proposição expressa pela frase "Os animais têm direitos", obtemos o seguinte argumento válido: 2)

"O aborto é um mal e os animais têm direitos; logo, o aborto é um mal". A lógica permite também

compreender por que razão são inválidos os argumentos inválidos; e permite compreender que

alguns argumentos que parecem válidos são de facto inválidos (as falácias). Repare-se no seguinte

argumento: 3) "Tem de haver uma só causa para todas as coisas porque todas as coisas têm uma

causa". Este argumento parece válido, mas é inválido. A lógica explica por que razão o argumento é

inválido. Repare-se que o argumento seguinte é obviamente inválido: 4) "Tem de haver uma mãe

para todas as pessoas porque todas as pessoas têm uma mãe". O argumento 4 tem a mesma forma

lógica do argumento 3. Mas porque o argumento 3 é mais abstracto, parece válido, apesar de o não

ser. Dado que os argumentos filosóficos são geralmente muito abstractos, a lógica tem um papel

crucial na filosofia: ajuda-nos a evitar erros no pensamento filosófico.

A lógica clássica tem duas partes distintas: a lógica proposicional e a lógica de predicados (também

chamada "lógica quantificada"). Na lógica proposicional (ver CÁLCULO PROPOSICIONAL) estudam-

se argumentos cuja validade depende exclusivamente de certos aspectos da forma lógica

proposicional (argumentos como 1 e 2). Os aspectos da forma lógica proposicional que contam na

lógica proposicional clássica decorrem inteiramente do uso de cinco tipos de operadores:

a NEGAÇÃO, a CONJUNÇÃO, a DISJUNÇÃO, aCONDICIONAL e a BICONDICIONAL (ver OPERADOR

VEROFUNCIONAL). Assim, os argumentos 1 e 2 são válidos porque ambos dependem

exclusivamente do operador de conjunção ("e").

Na lógica quantificada ou de predicados (ver CÁLCULO DE PREDICADOS) estudam-se os

argumentos que dependem exclusivamente da quantificação (ver QUANTIFICADOR), como é o caso

dos argumentos 3 e 4. A quantificação ocorre quando se afirma ou nega que uma certa propriedade

ou relação é exemplificada um certo número de vezes. Por exemplo, afirmar que há filósofos é dizer

que a propriedade de ser filósofo é exemplificada por algumas coisas (nomeadamente, pessoas);

afirmar que não há lobisomens é dizer que a propriedade de ser um lobisomem não é

exemplificada por coisa alguma. Há muitos tipos de quantificação, mas na lógica clássica estuda-se

apenas dois desses tipos: a universal e a existencial (ver QUANTIFICADOR

UNIVERSAL e QUANTIFICADOR EXISTENCIAL).

Há dois aspectos fundamentais em qualquer lógica: a sua linguagem e a lógica propriamente dita. A

linguagem lógica é uma forma de traduzir certos aspectos relevantes da linguagem de todos os dias

numa linguagem mais transparente. O objectivo é destacar e explicitar com rigor os aspectos que se

Page 12: trabalho filosofia

quer estudar por serem relevantes para o tipo de argumento que se tem em vista. Assim, um

argumento como "Se a vida não faz sentido, Deus não existe; dado que a vida não faz mesmo

sentido, Deus não existe" pode ser formalizado do seguinte modo: ¬P → ¬Q, ¬P   Q. A formalização,

com os seus símbolos estranhos (ver APÊNDICE: SÍMBOLOS LÓGICOS), é um instrumento crucial

para se compreender com rigor a estrutura lógica do pensamento, o que por sua vez é crucial para

determinar a sua validade, o que por sua vez é crucial para determinar a verdade das nossas

conclusões.

Na lógica propriamente dita desenvolvem-se métodos para testar a validade das formas lógicas que

se exprimem por meio da linguagem lógica (que por sua vez traduz a linguagem quotidiana). Entre

esses métodos contam-se os INSPECTORES DE CIRCUNSTÂNCIAS e as derivações

(ver DERIVAÇÃO). DM

Murcho, Desidério, O Lugar da Lógica na Filosofia, Capítulos 4 e 5 (Lisboa: Plátano, 2003). Newton-Smith, W. H., Lógica: Um curso introdutório, Capítulos 1, 2, 3 e 5 (Lisboa: Gradiva, 1998). Priest, Graham, Lógica (Lisboa: Temas e Debates, 2002).

25

maiêutica

Nome pelo qual a personagemSÓCRATES, no Teeteto de PLATÃO, designa o seu método de

perguntas e respostas. O interesse da expressão está no facto de pôr ênfase no lado positivo do

processo, uma vez que se trata de partejar as almas dos interlocutores de modo a que estes dêem à

luz as ideias que de forma não consciente já contêm em si e que pode, por isso, ser entendido como

um processo complementar da REMINISCÊNCIA. Nesse sentido, talvez seja mais uma noção

platónica do que socrática. AN

26

método científico

Conjunto de procedimentos usados pelos cientistas para obter um CONHECIMENTO tão certo

(ver CERTEZA) e seguro quanto possível na sua área de investigação. Até aos primeiros anos do séc.

XX, uma concepção de método baseada na INDUÇÃO e derivada das ideias de Francis Bacon (1561-

1626) e de GALILEU Galilei teve a preferência dos cientistas. A descoberta de que

algumas TEORIAS científicas, consideradas verdadeiras com base nesse método eram, na realidade,

falsas, levou à formulação de metodologias alternativas, das quais a mais importante e conhecida é

o FALSIFICACIONISMO de KarlPOPPER. Outras tentativas de explicar a investigação científica, como

a de Thomas KUHN, que, em vez de formular teorias normativas e racionalistas

(ver RACIONALISMO) da ciência, procura descrever (ver NORMATIVO/DESCRITIVO) a forma como

progride, ou como a de Paul FEYERABEND, ao defender a inexistência do método científico e a ideia

Page 13: trabalho filosofia

de que "qualquer coisa serve", têm sido por muitos consideradas irracionalistas

(verIRRACIONALISMO). Ver EXPERIÊNCIA, EXPLICAÇÃO CIENTÍFICA, FALSIBICABILIDADE,

FILOSOFIA DA CIÊNCIA, GENERALIZAÇÃO, INCOMENSURABILIDADE, MÉTODO EXPERIMENTAL,

MÉTODO HIPOTÉTICO-DEDUTIVO, PROBLEMA DA INDUÇÃO, VERIFICABILIDADE,

VERIFICACIONISMO. AN

27

Mito - Relato fabuloso contando uma história que serve ao mesmo tempo de origem e justificação de um grupo social.

29

Platão (427-347 a. C.)

Filósofo grego que, juntamente com SÓCRATES, seu mestre, eARISTÓTELES,

seu discípulo, é uma das figuras mais importantes daFILOSOFIA ocidental.

Nasceu em Atenas, numa família aristocrática, e, como era comum na época e

nos jovens da sua classe, ter-se-ia dedicado à política activa não o tivesse dela

afastado, primeiro, o governo dos Trinta Tiranos e, depois, a execução de

Sócrates, em 399. Apesar disso, fez várias viagens à Sicília com o objectivo de

influenciar Dionísio II, tirano de Siracusa, e a sua filosofia está profundamente

marcada por preocupações de carácter ético (ver ÉTICA) e político (ver FILOSOFIA POLÍTICA).

Fundou em Atenas, em 387, uma escola dedicada ao ensino e à investigação, chamada Academia,

onde ensinou até ao final da sua vida. Com excepção da Apologia de Sócrates(trad. 1993, INCM),

todas as outras obras que escreveu são diálogos, que é comum distribuir por três períodos:

juventude, maturidade e velhice. As obras do primeiro período tratam de conceitos morais

específicos, como a piedade (Êutifron) ou a coragem (Laques) e nelas SÓCRATES é a figura central;

as obras de maturidade expõem as suas principais teorias (teoria das ideias, da imortalidade e

transmigração das almas); e nas obras de velhice, critica e revê algumas das teorias dos diálogos de

maturidade. Defendeu que aquilo que várias acções justas têm em comum é o facto de participarem

da IDEIA ou Forma de JUSTIÇA. As Ideias são eternas e imutáveis, ao passo que as coisas sensíveis,

que delas participam, são perecíveis e mutáveis. Existe uma hierarquia do SER, desde as imagens,

artefactos (ver ARTEFACTO) e seres vivos, que constituem o MUNDO SENSÍVEL e que são objecto

de OPINIÃO, até às entidades matemáticas e às Ideias (de que a suprema é a Ideia incondicionada

de Bem), que constituem o mundo inteligível e cujoCONHECIMENTO consiste na recordação

(ver REMINISCÊNCIA) daquilo que a alma imortal contemplou aquando da

sua EXISTÊNCIA separada do corpo. A justiça consiste em cada um desempenhar na cidade a função

para a qual a sua natureza é mais adequada e a sociedade justa é aquela em que os cidadãos estão

distribuídos por três classes, de acordo com a sua natureza: guardiões, que têm a seu cargo o

Page 14: trabalho filosofia

governo; guerreiros, que protegem a cidade dos inimigos; e artesãos, a que pertencem a

generalidade dos habitantes. As contribuições de Platão para vários domínios da filosofia são tão

importantes que houve quem afirmasse que toda a filosofia posterior é apenas uma nota de rodapé

à sua obra.Ver ALEGORIA DA CAVERNA, DIALÉCTICA, INTELIGÍVEL, UNIVERSAIS. AN

Hare, R. M., O Pensamento de Platão, (Lisboa: Presença, 1998). Kenny, Anthony, História Concisa da Filosofia Ocidental, cap. 3 (Lisboa: Temas e Debates, 1999). Koyré, Alexandre, Introdução à Leitura de Platão, (Lisboa: Presença, 18987).Koyré, Alexandre, Galileu e Platão (Lisboa: Gradiva, 1986). Magee, Brian, Os Grandes Filósofos, cap. 1 (Lisboa: Presença, 1989). Platão, Êutifron, Apologia de Sócrates, Críton (Lisboa: INCM, 1993). Platão, Laques, (Lisboa: Edições 70, 1989). Platão, Hípias Maior (Lisboa: Ed. 70, 2000). Platão, Hípias Menor (Coimbra: INIC, 1990). Platão, Cármides (Coimbra: INIC, 1988). Platão, Lísis (Coimbra: INIC, 1990). Platão, Íon (Lisboa: Editorial Inquérito, 1988). Platão, Protágoras (Lisboa: Relógio D'Água, 1999). Platão, Górgias (Lisboa: Edições 70, 1997). Platão, Ménon, (Lisboa: Colibri, 1992). Platão, Fédon (Coimbra: Minerva, 1998). Platão, Crátilo, (Lisboa: Sá da Costa Ed., 1994). Platão, Fedro, (Lisboa: Edições 70, 1997). Platão, O Banquete, (Lisboa: Edições 70, 1991). Platão, A República (Lisboa: Gulbenkian, 2001). Platão, Parménides, (Lisboa: Instituto Piaget, 2001).

31

POLISA polis era o centro de cada um dos estados gregos -- uma cidade rodeada de uma pequena comarca. Estados autónomos, o seu governo foi inicialmente monárquico, tendo passado depois para as mãos da aristocracia e, mais tarde, ocupado nalgumas cidades por tiranos apoiados pelo povo.

32

POLÍTICAO termo política deriva do grego polis, que designa "a cidade". Assim, a política é (um conjunto de três significados):

1) uma arte: a arte de governar a cidade de acordo com um projecto relativo ao conjunto da cidade (este sentido é utilizado em expressões como "ter uma política");

2) uma actividade: "fazer política" é empenhar-se na acção que pretende a tomada do poder para fazer triunfar as suas ideias (o seu projecto -- ver significado anterior);

3) um domínio específico (distinto, por exemplo, do poder económico). Neste significado, o substantivo é masculino: numa entrevista, Paul Ricoeur estabelece a distinção "entre opolítico, como estrutura da acção em comum e a política, como actividade gravitando em torno do poder, da sua conquista e do seu exercício".

Page 15: trabalho filosofia

4)

33

pré-socráticos

O termo refere-se aos filósofos que surgiram antes de Sócrates, sendo que muitos deles

procuravam compreender a origem, a constituição e a natureza do mundo físico, tendo

apresentado as primeiras teorias cosmológicas. Os pré-socráticos mais importantes foram Tales de

Mileto, Anaximandro e Anaxímenes (da escola jónia de meados do séc. VI a. C.), Pitágoras de Samos

(c. 429-347 a. C.), Heraclito de Éfeso (c. 560-475 a. C.), Empédocles de Agrigento (c. 493-c. 433 a.

C.), os eleatas Parménides (n. c. 515 a. C.) e Zenão (n. c. 490 a. C.), os atomistas Demócrito (460-370

a. C.) e Leucipo (c. 450 a. C.) e ainda Anaxágoras de Clazómenas (c. 499- 427 a. C.). AA

34

razão

A faculdade de raciocinar, compreender, ponderar, ajuizar, etc. Os filósofos dividem-se quanto à

confiança que depositam na razão. Os mais cépticos duvidam dos seus produtos; alguns,

como HUME, confiam mais nas emoções e sentimentos. Outros,

como DESCARTESou KANT, confiam mais no poder da razão para descobrir verdades importantes.

A racionalidade instrumental permite, perante fins dados, determinar os melhores meios para os

atingir; por exemplo, quando tenho sede e sei que há água na cozinha, um meio de matar a sede é ir

à cozinha. A racionalidade não instrumental, negada por filósofos como Hume, permite determinar

os próprios fins. DM

35 Reflexão critica, é uma reflexão critica de consciência.Um exame, análise dos fundamentos.Refletindo criticamente. Uma investigação crítica da própria consciência, sendo necessário ter conhecimento do que é investigado, com olhar de preconceito de critica.

36

SENSAÇÃOVivência simples, produzida pela acção de um estímulo (externo ou interno: luz, som, calor, etc.) sobre um órgão sensorial, transmitida ao cérebro através do sistema nervoso.Embora por vezes se considere a sensação como o ponto de partida para a construção da experiência e do saber, ela não é, no entanto, um dado imediato da consciência: a sensação só se apresenta ao nosso espírito sob uma forma mais complexa -- a forma de percepção. Apenas podemos falar de sensações nas percepções se as considerarmos em si mesmas, sem considerar o que significam.

37senso comum

Page 16: trabalho filosofia

O conjunto mais alargado de crenças que uma comunidade tem por verdadeiras e partilha durante

um certo período de tempo. O senso comum é um "saber" que resulta da experiência de vida

individual e colectiva. Os hábitos e costumes, as tradições e rituais, os "ditos" e provérbios, as

opiniões populares, etc., são habitualmente referidos como manifestações do senso comum. A sua

aprendizagem é uma condição necessária para a socialização de cada membro da comunidade,

funcionando como um mecanismo regulador do seu pensamento e da sua ACÇÃO. Do ponto de vista

da CIÊNCIA e daFILOSOFIA, os processos de justificação das crenças de senso comum afiguram-se

muitíssimo superficiais e falíveis, e é frequente tais crenças resistirem mal a um exame crítico mais

minucioso, pelo que a sua ampla aceitação não é uma garantia de que sejam verdadeiras. Alguns

filósofos têm discutido a CONTINUIDADE/DESCONTINUIDADE entre o senso comum e a ciência e a

filosofia, tendo particular relevância, nessa discussão, o problema da

demarcação. Ver CRENÇA, VERDADE/FALSIDADE, CRÍTICA, CRITÉRIO DE DEMARCAÇÃO. APC

38

Sócrates (c. 469-399 a. C.)

Uma das figuras mais carismáticas e enigmáticas da HISTÓRIA DA FILOSOFIA.

Embora nada tenha escrito, a sua influência é enorme e é responsável pela

viragem da filosofia das questões da natureza para as questões humanas.

Pouco mais se sabe acerca da sua vida, para além de que participou na guerra

do Peloponeso e foi condenado à morte sob a acusação de impiedade e de

corromper a juventude. Também se sabe pouco acerca do seu pensamento,

embora seja a figura central de muitos diálogos de PLATÃO, uma vez que é difícil diferenciar o

Sócrates histórico da personagem platónica. Para Sócrates, a FILOSOFIA é um modo de vida e, por

isso, fazia filosofia na ágora (praça pública), no ginásio ou nas ruas de Atenas, dialogando com

aqueles que estivessem dispostos a investigar com ele um qualquer CONCEITO MORAL. Começava

por pedir ao seu interlocutor a DEFINIÇÃO de uma virtude, como a JUSTIÇA, e depois, por

intermédio de perguntas e respostas, levava-o a chegar a uma conclusão contraditória

(ver CONTRADIÇÃO) com a definição que tinha apresentado. Com este método

de REFUTAÇÃO (elenchus) procurava mostrar àqueles que pretendiam ser sábios que as suas

crenças (ver CRENÇA) eram inconsistentes (verINCONSISTÊNCIA) e, deste modo, levá-los a formular

crenças mais adequadas. Apesar de afirmar não saber as respostas às questões que punha sobre as

definições, há algumas ideias que parece ter assumido. As mais importantes são que a virtude,

embora não possa ser ensinada, é CONHECIMENTO; que ninguém faz o mal (ver MAL MORAL)

voluntariamente; que não se pode fazer mal a um homem bom; que é pior fazer do que sofrer o

mal; e que todas as virtudes se reduzem a uma, o conhecimento do que é e não é bom para um ser

humano. Ver DIALÉCTICA, ÉTICA DAS VIRTUDES, IRONIA, MAIÊUTICA.AN

Page 17: trabalho filosofia

Kenny, Anthony, História Concisa da Filosofia Ocidental, cap. 3 (Lisboa: Temas e Debates, 1999). Magee, Brian, Os Grandes Filósofos, cap. 1 (Lisboa: Presença, 1989). Platão, Êutifron, Apologia de Sócrates, Críton (Lisboa: INCM, 1993). Platão, Laques, (Lisboa: Edições 70, 1989). Platão, Hípias Maior (Lisboa: Edições. 70, 2000). Platão, Hípias Menor (Coimbra: INIC, 1990). Platão, Cármides (Coimbra: INIC, 1988). Platão, Lísis (Coimbra: INIC, 1990). Platão, Íon (Lisboa: Editorial Inquérito, 1988).

39

• TEOLOGIACiência que tem Deus por objecto. A teologia dita natural procura mostrar que Deus existe, partindo apenas dos dados da razão (é o caso, por ex., de Aristóteles). Por outro lado, ateologia revelada parte dos ensinamentos revelados por Deus na Bíblia para esclarecer o mundo e a inteligência humana. Ao contrário do primeiro caso, em que se procura esclarecer Deus através da razão, no segundo busca-se o esclarecimento da razão através de Deus -- cuja existência, em lugar de (ter que) ser demonstrada, é tida como certa.

40

teoria

Um conjunto de proposições estruturadas entre si que visam resolver um problema ou explicar um

fenómeno. Diz-se que são proposições estruturadas porque numa teoria as suas diferentes partes

se articulam, isto é, apresentam uma estrutura lógica. As teorias não podem ser válidas ou inválidas

no mesmo sentido em que um argumento é válido ou inválido; as teorias são verdadeiras ou falsas,

tal como as proposições (e tal como as proposições podem ser fecundas ou estéreis, interessantes

ou triviais, etc.). Não há uma receita automática para avaliar teorias, mas os seguintes aspectos

devem ser tidos em conta: 1) Se o problema que uma teoria procura resolver é ABSURDO, a teoria é

absurda; 2) Se uma teoria não resolve os problemas que se propunha resolver, ou não explica o que

se propunha explicar, é inadequada; 3) Se uma teoria for inconsistente

(verCONSISTÊNCIA/INCONSISTÊNCIA), é falsa; 3) Se uma teoria tiver consequências falsas, é falsa;

4) Se os ARGUMENTOS que sustentam uma teoria forem maus, a teoria é má. DM