tratamento efetivo de gliossarcoma com mais de 5 anos

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J Bras Neurocirur 29 (4): 685-689, 2018 Fraga GS, Siqueira JM, Borges EF, Gonçalves VDMA, Tanamati KY, Auersvald EC et al.- Tratamento Efetivo de Gliossarcoma com mais de 5 Anos Livre de Doença. Relato de caso e revisão de literatura Case Report Tratamento Efetivo de Gliossarcoma com mais de 5 Anos Livre de Doença. Relato de caso e revisão de literatura Effective Treatment of Gliosarcoma Over 5 Years of Progression-free Survival. Case report and literature review Gabriel Schier de Fraga¹ Jacqueline Martins Siqueira¹ Emerson Faria Borges¹ Vitoria Diana Mateus de Almeida Gonçalves¹ Karen Yumie Tanamati² Elisabete Coelho Auersvald³ Flora Mitie Watanabe 4 Adriano Keijiro Maeda 5 Alfredo Lohr Júnior 6 Mara Lúcia Ferreira Schmitz dos Santos³ Daniel Almeida do Valle³ Renata Bernardini de Lima 7 Guilherme Massoqueto 8 RESUMO Introdução: O gliossarcoma é raro em adultos (2-3%), incomum em crianças e presente geralmente em homens idosos. A sua histologia bifásica, sarcomatosa e gliomatosa, torna seu manejo complexo e prognóstico sombrio. Relato do Caso: Paciente masculino de 2 anos que iniciou náuseas e vômitos por 6 dias sem melhora, com suspeita de hipertensão intracraniana. À TC, constatou lesão em lobo frontal direito; e à RM, lesão sugestiva para tumor teratoide rabdoide. Após 1 mês, houve ressecção total e constatado gliossarcoma. Quatro meses depois, ocorreu recidiva tumoral tratada com ressecção parcial e radioterapia adjuvante, com vincristina semanal e ciclos de carboplatina e etoposídeo. A duração do tratamento adjuvante foi de 3 meses. Após 6 anos livres de doença, as sequelas atuais são epilepsia residual e sequela cognitiva leve. Discussão: As opções terapêuticas acabam imitando o tratamento disponível para glioblastoma com a terapia trimodal: tentativa de ressecção completa, radioterapia e quimioterapia. Estudos mostram que retirar uma dessas opções reduz a sobrevida dos pacientes. Conclusão: A falta de consenso na literatura é reflexo da falta de dados a respeito dessa raridade. Evidencia-se o valor científico do relato deste caso, com sobrevida excepcional quando comparado aos demais casos descritos em literatura. Palavras-Chave: Gliossarcoma; Neurocirurgia; Sobrevida livre de progressão; Neuropediatria ABSTRACT Introduction: Gliosarcoma, a rare tumor in adults (2-3%) and children, is usually found in older individuals. It presents a biphasic histology, sarcomatous and gliomatous, that makes its management complex and prognosis obscure. Case Report: A 2 year-old male patient, presenting nausea and vomits for 6 days without improvement and suspicion of intracranial hypertension. CT-Scan showed a lesion on the right frontal lobe; MRI found a lesion suggestive for rhabdoid theratoid tumor. Aſter 1 month, the patient underwent total resection and pathology diagnosed gliosarcoma. Four months later, recurrence was treated with partial resection and adjuvant radiotherapy, with weekly vincristine and cycles of carboplatin and etoposide. Duration of adjuvant treatment was 3 months. Aſter 6 years free of disease, the remaining sequelae are residual epilepsy and mild cognitive impairment. Discussion: erapeutic options mimic the treatment available for glioblastoma with trimodal therapy: complete resection, radiotherapy and chemotherapy. Conclusion: e lack of consensus in the literature is a reflection of the few data regarding this tumor. e scientific value is evident in this case and survival rate is exceptional when compared to the other cases described in the literature. Keywords: Gliosarcoma; Neurosurgery; Progression free survival; Neuropediatrics ¹ Student of Medicine, Faculdades Pequeno Príncipe (FPP), Curitiba, Paraná. ² MD, Resident of Pediatric Neurology, Hospital Pequeno Príncipe (HPP), Curitiba, Paraná. ³ MD, Pediatric Neurologist, Hospital Pequeno Prínicipe (HPP), Curitiba, Paraná. 4 MD, Pediatric Oncologist, chief of service of pediatric oncology, Hospital Pequeno Príncipe (HPP), Curitiba, Paraná. 5 MD, Neurosurgeon, Hospital Pequeno Príncipe (HPP), Curitiba, Paraná. 6 MD, Pediatric Neurologist, chief of service of pediatric neurology, Hospital Pequeno Príncipe (HPP), Curitiba, Paraná. 7 MD, Resident of Pathology, Hospital Erasto Gaertner (HEG), Curitiba, Paraná. 8 Biomedical Scientist, Instituto de Pesquisa Pelé Pequeno Príncipe, Curitiba, Paraná. Received Apr 10, 2019 Accepted Jul 16, 2019

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J Bras Neurocirur 29 (4): 685-689, 2018Fraga GS, Siqueira JM, Borges EF, Gonçalves VDMA, Tanamati KY, Auersvald EC et al.- Tratamento Efetivo de Gliossarcoma com mais de 5 Anos Livre de Doença. Relato de caso e revisão de literatura

Case Report

Tratamento Efetivo de Gliossarcoma com mais de 5 Anos Livre de Doença. Relato de caso e revisão de literatura Effective Treatment of Gliosarcoma Over 5 Years of Progression-free Survival. Case report and literature review

Gabriel Schier de Fraga¹ Jacqueline Martins Siqueira¹ Emerson Faria Borges¹ Vitoria Diana Mateus de Almeida Gonçalves¹ Karen Yumie Tanamati² Elisabete Coelho Auersvald³ Flora Mitie Watanabe4 Adriano Keijiro Maeda5 Alfredo Lohr Júnior6 Mara Lúcia Ferreira Schmitz dos Santos³ Daniel Almeida do Valle³ Renata Bernardini de Lima7 Guilherme Massoqueto8

RESUMOIntrodução: O gliossarcoma é raro em adultos (2-3%), incomum em crianças e presente geralmente em homens idosos. A sua histologia bifásica, sarcomatosa e gliomatosa, torna seu manejo complexo e prognóstico sombrio. Relato do Caso: Paciente masculino de 2 anos que iniciou náuseas e vômitos por 6 dias sem melhora, com suspeita de hipertensão intracraniana. À TC, constatou lesão em lobo frontal direito; e à RM, lesão sugestiva para tumor teratoide rabdoide. Após 1 mês, houve ressecção total e constatado gliossarcoma. Quatro meses depois, ocorreu recidiva tumoral tratada com ressecção parcial e radioterapia adjuvante, com vincristina semanal e ciclos de carboplatina e etoposídeo. A duração do tratamento adjuvante foi de 3 meses. Após 6 anos livres de doença, as sequelas atuais são epilepsia residual e sequela cognitiva leve. Discussão: As opções terapêuticas acabam imitando o tratamento disponível para glioblastoma com a terapia trimodal: tentativa de ressecção completa, radioterapia e quimioterapia. Estudos mostram que retirar uma dessas opções reduz a sobrevida dos pacientes. Conclusão: A falta de consenso na literatura é reflexo da falta de dados a respeito dessa raridade. Evidencia-se o valor científico do relato deste caso, com sobrevida excepcional quando comparado aos demais casos descritos em literatura.

Palavras-Chave: Gliossarcoma; Neurocirurgia; Sobrevida livre de progressão; Neuropediatria ABSTRACTIntroduction: Gliosarcoma, a rare tumor in adults (2-3%) and children, is usually found in older individuals. It presents a biphasic histology, sarcomatous and gliomatous, that makes its management complex and prognosis obscure. Case Report: A 2 year-old male patient, presenting nausea and vomits for 6 days without improvement and suspicion of intracranial hypertension. CT-Scan showed a lesion on the right frontal lobe; MRI found a lesion suggestive for rhabdoid theratoid tumor. After 1 month, the patient underwent total resection and pathology diagnosed gliosarcoma. Four months later, recurrence was treated with partial resection and adjuvant radiotherapy, with weekly vincristine and cycles of carboplatin and etoposide. Duration of adjuvant treatment was 3 months. After 6 years free of disease, the remaining sequelae are residual epilepsy and mild cognitive impairment. Discussion: Therapeutic options mimic the treatment available for glioblastoma with trimodal therapy: complete resection, radiotherapy and chemotherapy. Conclusion: The lack of consensus in the literature is a reflection of the few data regarding this tumor. The scientific value is evident in this case and survival rate is exceptional when compared to the other cases described in the literature.

Keywords: Gliosarcoma; Neurosurgery; Progression free survival; Neuropediatrics

¹ Student of Medicine, Faculdades Pequeno Príncipe (FPP), Curitiba, Paraná.² MD, Resident of Pediatric Neurology, Hospital Pequeno Príncipe (HPP), Curitiba, Paraná.³ MD, Pediatric Neurologist, Hospital Pequeno Prínicipe (HPP), Curitiba, Paraná.4 MD, Pediatric Oncologist, chief of service of pediatric oncology, Hospital Pequeno Príncipe (HPP), Curitiba, Paraná. 5 MD, Neurosurgeon, Hospital Pequeno Príncipe (HPP), Curitiba, Paraná. 6 MD, Pediatric Neurologist, chief of service of pediatric neurology, Hospital Pequeno Príncipe (HPP), Curitiba, Paraná.7 MD, Resident of Pathology, Hospital Erasto Gaertner (HEG), Curitiba, Paraná.8 Biomedical Scientist, Instituto de Pesquisa Pelé Pequeno Príncipe, Curitiba, Paraná.

Received Apr 10, 2019Accepted Jul 16, 2019

J Bras Neurocirur 29 (4): 685-689, 2018Fraga GS, Siqueira JM, Borges EF, Gonçalves VDMA, Tanamati KY, Auersvald EC et al.- Tratamento Efetivo de Gliossarcoma com mais de 5 Anos Livre de Doença. Relato de caso e revisão de literatura

Case Report

O gliossarcoma (GS) é um tumor variante do glioblastoma. Raro em adultos – correspondendo a cerca de 2-3% dos glioblastomas nos Estados Unidos¹ – em crianças, a estatística ainda é falha. Existem apenas alguns relatos de casos espalhados pelo mundo2-6. Este tumor tende a aparecer a partir dos 60 anos e tem predominância maior no sexo masculino7.

O GS apresenta diferenciação histológica bifásica, parte gliomatosa e parte sarcomatosa, e essa característica é parcialmente responsável por tornar seu estudo e prognóstico tão complexos8.

Recentemente, foram descritos dois subtipos histológicos de GS. Um está associado à predominância da parte sarcomatosa e seu comportamento pode simular o de um meningioma. Esse tipo tende a ser mais superficial e está associado a um melhor prognóstico – com uma ressecção cirúrgica que tende a ser mais simples. O segundo tipo é similar ao glioblastoma e seu prognóstico é pior – apresenta relação com sobrevida global de 9,6 meses, enquanto o primeiro chega a 16 meses – grande parte devido sua característica infiltrativa9. Isso pode nem sempre ser verdadeiro, considerando um estudo prospectivo, publicado em 2017, que relatou que complicações do prognóstico advinham de achados intraoperatórios não previstos em exames de imagem, não relacionados com o subtipo do tumor10.

Quando não tratado, a sobrevida global do gliossarcoma pode chegar a somente 4 meses¹¹. Um dos fatores que está associado a um pior prognóstico é a habilidade do tumor de metastização extracraniana, associada a via hematogênica, que a maioria dos pesquisadores associa a parte sarcomatosa do tumor. Os locais mais comuns de aparecimento de metástase são os pulmões, fígado, cadeia de linfonodos cervicais, baço, adrenais, rins, mucosa oral, pele, medula óssea, crânio, costelas e coluna vertebral¹². Os marcadores genéticos também têm sido alvo de estudos. Recentemente identificou-se que tumores positivos para mutação TP53 (gene supressor de tumor) estão associados a pior prognóstico. Isso também

pode estar relacionado com a diferenciação sarcomatosa, já que este gene tem papel na cascata dos genes de transição epitélio-mesenquimal (EMT) – um dos processos pelos quais células epiteliais podem se transformar em mesenquimais. Além disso, a mutação TP53 parece ainda ter relação com resistência ao tratamento no GS, novamente contribuindo para um prognóstico mais sombrio¹³.

Paciente de 2 anos, sexo masculino, branco, apresentou início de náuseas e vômitos há 6 dias com piora progressiva e hemiparesia à esquerda, sem outras queixas. Em tomografia computadorizada (TC) axial de crânio apresentou lesão frontal direita expansiva e invasora de 4,8 cm com hiperdensidades e hipoatenuações. O passo seguinte foi a solicitação de uma ressonância magnética (RM) de crânio para complementar a investigação diagnóstica. Nas janelas T2 e FLAIR notou-se hiperintensidade com realce após contraste paramagnético apresentando lesão de 4,7 cm x 4,2 cm x 4,6 cm. Foram levantadas hipóteses de diagnósticos diferenciais de glioblastoma, tumor neuroectodérmico primitivo supratentorial e tumor teratoide rabdoide atípico (Figura 1).

Figura 1. RM de crânio em corte coronal e sagital, respectivamente, evidenciando massa tumoral medindo 4,7 cm x 4,2 cm x 4,6 cm em lobo frontal direito com realce após contraste.

INTRODUÇÃO

APRESENTAÇÃO DO CASO

Figura 1. RM de crânio em corte coronal e sagital, respectivamente, evidenciando

massa tumoral medindo 4,7 cm x 4,2 cm x 4,6 cm em lobo frontal direito com realce

após contraste.

O paciente foi, então, submetido a neurocirurgia, com acesso frontoparietal direto. Após

debulking tumoral, as peças cirúrgicas foram encaminhadas para análise

anatomopatológica e avaliação das margens tumorais. O paciente evoluiu bem no pós-

operatório, sem apresentar déficits motores e sensitivos. Iniciou uso de carbamazepina

J Bras Neurocirur 29 (4): 685-689, 2018Fraga GS, Siqueira JM, Borges EF, Gonçalves VDMA, Tanamati KY, Auersvald EC et al.- Tratamento Efetivo de Gliossarcoma com mais de 5 Anos Livre de Doença. Relato de caso e revisão de literatura

Case Report

O paciente foi, então, submetido a neurocirurgia, com acesso frontoparietal direto. Após debulking tumoral, as peças cirúrgicas foram encaminhadas para análise anatomopatológica e avaliação das margens tumorais. O paciente evoluiu bem no pós-operatório, sem apresentar déficits motores e sensitivos. Iniciou uso de carbamazepina devido a descargas epileptiformes em região frontal direita.

O resultado do exame anatomopatológico acusou necrose em pseudopaliçada com proliferação fusocelular, proliferação vascular, células fusiformes com atipias, mitoses excessivas e necrose (Figura 2). Após a realização da imunohistoquímica, foi confirmado o diagnóstico de gliossarcoma, que revelou positividade para Vimentina, GFAP, EGFR, P53 de 5% e o KI67 indicou proliferação celular de 60%.

Figura 2. Exame anatomopatológico evidenciando em seta (1) proliferação vascular e em seta (2) células alongadas fusiformes em feixes com atipias, necrose e mitoses.

O paciente manteve o tratamento com carbamazepina e o seguimento com a equipe de Neurocirurgia, Neurologia e Oncologia pediátrica. Em RM de acompanhamento, um ano e quatro meses após a primeira cirurgia, foi identificada formação nodular com dimensão de 1,6 cm x 1,4 cm x 1,3 cm em torno do sítio cirúrgico e outra em região gânglio-capsular medindo 0,8 cm no maior diâmetro com realce ao contraste. A análise radiológica não excluía a hipótese de recidiva tumoral. Foi então optado por nova abordagem neurocirúrgica com

acesso por craniotomia fronto-temporal à direita. Durante a cirurgia, foi descoberto que a lesão apresentava tamanho maior do que sugerido pelo exame de imagem e que infiltrava a substância branca no lobo frontal direito. Apesar disso, a cirurgia transcorreu sem intercorrências, com retirada de cerca de 90% maior lesão. Optou-se por não abordar a lesão mais profunda. A evolução do paciente no pós-operatório foi satisfatória, sem déficits. A TAC de crânio realizada para controle pós-cirúrgico não evidenciou complicações. A análise anatomopatológica realizada das peças cirúrgicas confirmou o diagnóstico de recidiva tumoral.

Após análise e discussão do caso com a equipe de oncologia pediátrica, foi iniciado tratamento adjuvante. O paciente realizou 4 ciclos de carboplatina e etoposídeo por 3 dias, seguido por 6 ciclos de carboplatina D1 e etoposídeo D3. Por fim, fez tratamento com radioterapia por 3 semanas com administração concomitante de vincristina semanal.

O paciente manteve-se em seguimento com a equipe multiespecialidades por 6 anos e 6 meses. A última RM evidenciou áreas de gliose e encefalomalácia cística em lobo frontal com dimensão de 2,9 cm, sem sinais de recidiva. Segue em tratamento por epilepsia residual após a primeira cirurgia e com sequela cognitiva leve, porém sem déficits motores.

Em última RM, evidências apenas de gliose e encefalomalácia cística no lobo frontal de 2,9 cm, sem mais evidência de recidiva (Figura 3). Em acompanhamento livre de doença por mais de 6 anos com apenas epilepsia residual e sequela leve cognitiva.

Figura 3. Última RM após 6 anos e 6 meses, sem sinais de recidiva. Apresentando áreas de gliose e encefalomalácia.

Figura 3. Última RM após 6 anos e 6 meses, sem sinais de recidiva. Apresentando

áreas de gliose e encefalomalácia.

Discussão

O gliossarcoma é um tumor raro em crianças, com poucos casos descritos na literatura.

Sua complexidade histológica e agressividade são fatores associados ao prognóstico

sombrio9,11. A raridade associada ao tumor traz um problema fundamental associado

ao tratamento: a falta de dados epidemiológicos torna difícil a construção de um plano

terapêutico ideal. Consequentemente, as opções terapêuticas existentes hoje, acabam

simulando o tratamento do glioblastoma grau IV, ou seja, cirurgia seguida por

radioterapia e quimioterapia adjuvante (em esquema com temozolamida)1.

Um estudo retrospectivo recente, no entanto, mostrou o benefício dessa terapia

trimodal no tratamento do GS, indicando que, retirar qualquer um dos pontos de

devido a descargas epileptiformes em região frontal direita. O resultado do exame

anatomopatológico acusou necrose em pseudopaliçada com proliferação fusocelular,

proliferação vascular, células fusiformes com atipias, mitoses excessivas e necrose

(Figura 2). Após a realização da imunohistoquímica, foi confirmado o diagnóstico de

gliossarcoma, que revelou positividade para Vimentina, GFAP, EGFR, P53 de 5% e o

KI67 indicou proliferação celular de 60%.

Figura 2. Exame anatomopatológico evidenciando em seta (1) proliferação vascular e

em seta (2) células alongadas fusiformes em feixes com atipias, necrose e mitoses.

O paciente manteve o tratamento com carbamazepina e o seguimento com a equipe de

Neurocirurgia, Neurologia e Oncologia pediátrica. Em RM de acompanhamento, um

ano e quatro meses após a primeira cirurgia, foi identificada formação nodular com

J Bras Neurocirur 29 (4): 685-689, 2018Fraga GS, Siqueira JM, Borges EF, Gonçalves VDMA, Tanamati KY, Auersvald EC et al.- Tratamento Efetivo de Gliossarcoma com mais de 5 Anos Livre de Doença. Relato de caso e revisão de literatura

Case Report

DISCUSSÃO

O gliossarcoma é um tumor raro em crianças, com poucos casos descritos na literatura. Sua complexidade histológica e agressividade são fatores associados ao prognóstico sombrio9,11. A raridade associada ao tumor traz um problema fundamental associado ao tratamento: a falta de dados epidemiológicos torna difícil a construção de um plano terapêutico ideal. Consequentemente, as opções terapêuticas existentes hoje, acabam simulando o tratamento do glioblastoma grau IV, ou seja, cirurgia seguida por radioterapia e quimioterapia adjuvante (em esquema com temozolamida)1.

Um estudo retrospectivo recente, no entanto, mostrou o benefício dessa terapia trimodal no tratamento do GS, indicando que, retirar qualquer um dos pontos de tratamento, ou fazer uma ressecção sub-ótima, pode reduzir a sobrevida dos pacientes14. Entretanto, ainda não há um consenso sobre esses dados, justamente devido à raridade do tumor. Em outro estudo retrospectivo, a quimioterapia com temozolamida na terapia trimodal não demonstrou ter benefício efetivo na sobrevida global, quando comparada somente com cirurgia com ressecção total e radioterapia adjuvante15. No caso relatado, apesar do paciente ter recebido terapia trimodal – ainda que apenas após recidiva – a escolha da quimioterapia é diferente da encontrada na literatura, embora tenha sido encontrado outro relato de paciente com esquema quimioterápico similar e sobrevida fora da curva16.

Alguns fatores associados à maior sobrevida são pacientes do sexo feminino, com idade jovem, a ressecção cirúrgica agressiva, uso de terapia adjuvante com radioterapia, uso de temozolamida e expressão tumoral de PTEN e EGFR17. O paciente relatado apresentava somente 3 desses fatores: idade jovem, expressão tumoral de EGFR, ressecção agressiva e radioterapia adjuvante apenas na recidiva, pois a ressecção desta foi sub-ótima, sendo a expressão tumoral, pois não foram avaliadas) e demonstrou sobrevida excelente quando comparada a outros casos descritos.

A falta de um consenso na literatura a respeito do melhor curso de ação referente ao gliossarcoma é reflexo da falta de dados a respeito desse tumor raríssimo. Fica evidente a necessidade de mais estudos sobre o assunto, especialmente multi-institucionais e prospectivos. É necessário, também, ampliar as pesquisas científicas e moleculares que permitam a análise genética e a possibilidade de novas e melhores terapias para o tratamento desta patologia. Com isso, evidencia-se o valor científico do relato deste caso, com sobrevida excepcional quando comparado aos demais casos descritos em literatura.

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2. Meena US, Sharma S, Chopra S, Jain SK. Gliosarcoma: a rare variant of glioblastoma multiforme in pediatric patient: case report and review of literature. World J Clin Cases. 2016;4(9):302-305. Doi: 10.12998/wjcc.v4.i9.302.

3. Graham RT, Bell EH, Webb A, Timmers C, Robison N, Palmer J, et al. HGG-30. Pediatric Gliosarcoma with and without neurofibromatosis type 1: a whole-exome comparison of two patients. Neuro-Oncol. 2018;20(2):i95. Doi: 10.1093/neuonc/noy059.302.

4. Yao, K & Duan, Z & Wang, Y & Zhao, X & Fan, T & Qi, X. Spinal cord gliosarcoma with rhabdomyoblastic differentiation: A case report. Inter J Clin Exper Path. 2017;10(9):9779-9785.

5. Moscote-Salazara LR, Alcalá-Cerra G, Gutiérez-Paternina JJ, Penagos Gonzélezc PJ, Zubieta Vega C, Chater-Cure G, et al. Pediatric gliosarcoma: case report and literature review. Bol Asoc Med P R. 2014;106(3):43-47.

CONCLUSÃO

REFERÊNCIAS

J Bras Neurocirur 29 (4): 685-689, 2018Fraga GS, Siqueira JM, Borges EF, Gonçalves VDMA, Tanamati KY, Auersvald EC et al.- Tratamento Efetivo de Gliossarcoma com mais de 5 Anos Livre de Doença. Relato de caso e revisão de literatura

Case Report

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10. Jain A, Correia J, Schweder P, McMahon A, Merola J, Aspoas R. Analysis of Outcomes of Multidisciplinary Management of Gliosarcoma: A Single-Center Study, 2000–2013. World Neurosurg. 2017;106:30–36. Doi: 10.1016/j.wneu.2017.06.073.

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14. Frandsen J, Orton A, Jensen R, Colman H, Cohen A, Tward J, et al. Patterns of care and outcomes in gliosarcoma: an analysis of the National Cancer Database. J Neurosurg. 2018;128(4):1133-38. Doi: 10.3171/2016.12.JNS162291.

15. Castelli J, Feuvret L, Haoming QC, Biau J, Jouglar E, Berger A, et al. Prognostic and therapeutic factors of gliosarcoma from a multi-institutional series. J Neuro-Oncol 2016;129(1):85–92. Doi: 10.1007/s11060-016-2142-9.

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17. Wang Z, Kong QT, Wu XH, Zhu XX. Long-term survival in gliosarcoma with radiation-induced meningeal sarcomas: Case report and molecular features. J Cancer Res Ther. 2015;11(3):651. Doi: 10.4103/0973-1482.137995.

Gabriel Schier de FragaStudent of MedicineFaculdades Pequeno Príncipe (FPP)Curitiba, ParanáE-mail: [email protected]

Estudo realizado no Hospital Pequeno Príncipe, Curitiba, Paraná, Brasil.

Declaração de conflito de interesse: Os autores declaram não haver conflito de interesse.  

CORRESPONDING AUTOR