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SECRETARIA DA COORDENAÇÃO E PLANEJAMENTO ISSN 0103-3905 FUNDAÇÃO DE ECONOMIA E ESTATÍSTICA Siegfried Emanuel Heuser A revista Indicadores Econômicos FEE é uma publicação trimestral da Fundação de Economia e Estatística Siegfried Emanuel Heuser que divulga análises socioeconômicas de caráter conjuntural no âmbito das economias gaúcha, nacional e internacional. EDITOR Octavio Augusto Camargo Conceição SECRETÁRIA EXECUTIVA Lilia Pereira Sá Trimestral CONSELHO DE REDAÇÃO Octavio Augusto Camargo Conceição Adalberto Alves Maia Neto André Luis Forti Scherer Jéferson Daniel de Matos Maria Lucrécia Calandro Teresinha da Silva Bello CONSELHO EDITORIAL Octavio Augusto Camargo Conceição Álvaro Antônio Louzada Garcia Maria Aparecida Grendene de Souza Pedro Cezar Dutra Fonseca Otília Beatriz K. Carrion Dercio Garcia Munhoz Leda Paulani Maurício Coutinho Luiz G. Belluzzo Indic. Econ. FEE Porto Alegre v. 33 n. 3 p. 1-180 2005

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SECRETARIA DA COORDENAÇÃO E PLANEJAMENTO ISSN 0103-3905FUNDAÇÃO DE ECONOMIA E ESTATÍSTICA Siegfried Emanuel Heuser

A revista Indicadores Econômicos FEE é uma publicação trimestral da Fundação de Economia e Estatística Siegfried Emanuel Heuser que divulga análisessocioeconômicas de caráter conjuntural no âmbito das economias gaúcha, nacional e internacional.

EDITOROctavio Augusto Camargo Conceição

SECRETÁRIA EXECUTIVALilia Pereira Sá

Trimestral

CONSELHO DE REDAÇÃOOctavio Augusto Camargo ConceiçãoAdalberto Alves Maia NetoAndré Luis Forti SchererJéferson Daniel de MatosMaria Lucrécia CalandroTeresinha da Silva Bello

CONSELHO EDITORIALOctavio Augusto Camargo ConceiçãoÁlvaro Antônio Louzada GarciaMaria Aparecida Grendene de SouzaPedro Cezar Dutra FonsecaOtília Beatriz K. CarrionDercio Garcia MunhozLeda PaulaniMaurício CoutinhoLuiz G. Belluzzo

Indic. Econ. FEE Porto Alegre v. 33 n. 3 p. 1-180 2005

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SECRETARIA DA COORDENAÇÃO E PLANEJAMENTOFUNDAÇÃO DE ECONOMIA E ESTATÍSTICA Siegfried Emanuel HeuserCONSELHO DE PLANEJAMENTO: Aod Cunha de Moraes Junior (Presidente), André Luis Campos, Ernesto Dornelles Saraiva, Leonardo Ely Schreiner, Nelson MachadoFagundes, Pedro Silveira Bandeira e Thômaz Nunnenkamp.CONSELHO CURADOR: Carla Giane Soares da Cunha, Flávio Pompermayer e Lauro Nestor Renck.DIRETORIA

PRESIDENTE: AOD CUNHA DE MORAES JUNIORDIRETOR TÉCNICO: ÁLVARO ANTÔNIO LOUZADA GARCIADIRETOR ADMINISTRATIVO: ANTONIO CESAR GARGIONI NERY

CENTROSESTUDOS ECONÔMICOS E SOCIAIS: Marinês Zandavali GrandoPESQUISA DE EMPREGO E DESEMPREGO: Roberto da Silva WiltgenINFORMAÇÕES ESTATÍSTICAS: Adalberto Alves Maia NetoINFORMÁTICA: Antônio Ricardo BeloEDITORAÇÃO: Valesca Casa Nova NonnigRECURSOS: Alfredo Crestani

Indicadores Econômicos FEE está indexada em:Ulrich's International Periodicals DirectoryÍndice Brasileiro de Bibliografia de Economia (IBBE)International Bibliography of The Social Sciences (IBSS)Citas Latinoamericanas en Ciencias Sociales y Humanidades (CLASE)Cambridge Science Abstracts (CSA)Hispanic American Periodicals Index (HAPI)

INDICADORES ECONÔMICOS FEE / Fundação de Economia e Estatística Siegfried Emanuel Heuser. — v. 16, n. 2 (1988) - . - Porto Alegre: FEE, 1988 - . - v.- Trimestral

Continuação de: Indicadores Econômicos RS, v. 16, n. 2, 1988. Índices: 1973-1988 em v. 17, n. 1; 1973-1990 em v. 19, n. 1; 1973-1992 em v. 21, n. 4; 1992-1994 em v. 23, n. 3.

ISSN 0103-3905

1. Economia - periódicos. 2. Estatística - periódicos. I. Fundação de Economia e Estatística Siegfried Emanuel Heuser. CDU 33(05) CDU 31(05)

Tiragem: 530 exemplares.

Os artigos assinados são de exclusiva responsabilidade dos autores.

Toda correspondência para esta publicação deverá ser endereçada à: FUNDAÇÃO DE ECONOMIA E ESTATÍSTICA Siegfried Emanuel Heuser (FEE)Revista Indicadores Econômicos FEE - Secretaria

Rua Duque de Caxias, 1691 - Porto Alegre, RS — CEP 90010-283Fone: (51) 3216-9049 Fax: (51) 3225-0006E-mail: [email protected] Home Page: www.fee.rs.gov.br

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Sumário

A CONJUNTURA NO TRIMESTRE .................................................................................................

Política econômica

As negociações comerciais do Brasil: arenas, agendas e interesses — Luiz Augusto Estrella Faria ..

Análise setorial

AgropecuáriaExportações de carne: um segmento dinâmico do agronegócio — Vivian Fürstenau ............................

IndústriaO emprego industrial no RS: um breve balanço no Governo Lula — Maria Isabel H. da Jornada ...........

Relações internacionaisAlgumas reflexões sobre a valorização cambial — Teresinha da Silva Bello ..........................................

Mercado de trabalho

Mercado de trabalho na Região Metropolitana de Porto Alegre: melhoria no perfil dos assalariados —Alejandro Kuajara Arandia ...............................................................................................................

Indicadores sociais

Educação infantil no Brasil e no Rio Grande do Sul: o descompasso frente à legislação — Hélios PuigGonzalez e Salvatore Santagada ..................................................................................................

INDICADORES SELECIONADOS DO RS .........................................................................................

ARTIGOS DE CONJUNTURA ............................................................................................................

Os fluxos externos de capitais privados no Brasil — 1991-04 — Roberto Marcantonio .........................

Mudança no regime cambial da China — André Moreira Cunha ............................................................

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63-70

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111

129

137

163

A determinação da taxa de juros em uma economia sob metas para inflação: o caso brasileiro — HelderFerreira de Mendonça, Lucas Lautert Dezordi e Marcelo Luiz Curado ..........................................

Telecomunicações: os resultados da política de competição — Renato Antonio Dal Maso .................

A ineficácia dos programas públicos pró-pobres: o caso do Programa Bolsa-Família — Régis Rathmann

Desigualdades sociais e espaciais na metrópole: um olhar sobre a Região Metropolitana de Porto Alegreem 2000 — Rosetta Mammarella e Tanya M. de Barcellos ...............................................................

Concentração e especialização em setores industriais na região Noroeste Colonial do Rio Grande doSul — David Basso, Benedito Silva Neto e Janete Stoffel ................................................................

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A CONJUNTURA NO TRIMESTRE

Luiz Augusto Estrella Faria

Indic. Econ. FEE, Porto Alegre, v. 33, n. 3, p. 7-14, dez. 2005

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De volta do futuro? O comércio exterior do Brasil no começo do século XXI

Indic. Econ. FEE, Porto Alegre, v. 33, n. 3, p. 7-14, dez. 2005

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1 - Introdução

Durante a maior parte do século XX, o Brasilconsiderou-se o país do futuro, um futuro de modernidade,que tinha na indústria seu motor econômico. Oesgotamento do modelo primário exportador foiacompanhado pela Revolução de 1930, que promoveuuma série de profundas mudanças na sociedadebrasileira. Um novo consenso econômico formou-se desdeentão, cuja idéia central via na industrialização o caminhopara o desenvolvimento. Foi assim que, a partir dos anos40 e pela via da substituição de importações, a dinâmicada economia brasileira passou a ser comandada pelodesempenho de seu setor industrial. Desde 1981,desafortunadamente, o desenvolvimento esgotou-se. Astaxas de crescimento caíram a menos de um terço doque haviam sido nos 40 anos anteriores, e o peso daindústria no PIB reduziu-se. Passados 25 anos deestagnação, em que, além do mau desempenho daestrutura produtiva, a inflação e o desequilíbrio no balançode pagamentos, originado pela dívida externa, geraramuma circunstância de permanente estagnação, a elevaçãodas exportações aparece como principal elemento deuma melhora no quadro cinzento da economia nacional.Assim, no alvorecer do novo século, as expectativas decrescimento econômico estão depositadas no comércioexterior, principalmente no de produtos primários. É comose o futuro se encontrasse no passado.

Nessa época, a sociedade brasileira viu-seenvolvida no processo mundial de financeirizaçãocapitalista, a hegemonia que a alta finança passou a

Política econômica

As negociações comerciais do Brasil: arenas,agendas e interesses

Luiz Augusto Estrella Faria* Economista da FEE e Professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

Artigo recebido em 21 out. 2005.

exercer sobre as estruturas de poder econômico e políticoem escala planetária. Esse processo teve noendividamento externo e em seu “outro”, a dívida pública,seu epicentro. Daí decorreu a ascensão do rentismo àcondição de forma fundamental de acumulação de riquezapor parte de uma oligarquia econômica brasileiraassociada ao grande capital internacional, proprietáriosde ativos no País ou detentores de posições credorassobre o endividamento nacional. A acumulação rentistaé viabilizada por uma surpreendente capacidade de asestruturas produtivas suportarem o peso dessatransferência de valor e pela não menos surpreendentecapacidade arrecadatória do Estado, que alcançou elevara carga tributária de 28% para 36% do PIB entre 1994 e2004, para fazer frente aos custos da dívida pública. Apolítica monetária extremamente amigável às finanças(juros elevados, câmbio livre, baixa tributação e fracaregulamentação) atrai investidores estrangeiros, o que,somado aos bons resultados do comércio exterior,mantém a estabilidade das contas externas.

A cena internacional que se descortina põe umconjunto de desafios para o Brasil, dentre os quais sedestacam as transformações nas regras do comérciointernacional, item decisivo em razão da fragilidadeexterna da economia brasileira. Este trabalho traça umarelação entre as negociações comerciais em que o Paísestá envolvido e seus efeitos sobre as perspectivas dedesenvolvimento econômico.

2 - Política externa e forças sociais

A política externa brasileira teve, ao longo do séculoXX, uma característica pendular, que alternou períodos

* O autor agradece as críticas de Joachim Becker à pesquisaque está na origem do presente texto, bem como a FAPERGSpelo apoio. Os equívocos porventura remanescentes são deresponsabilidade do autor.

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de estreito alinhamento com os interesses dos EUA comoutros de maior autonomia. Após um último momento dealinhamento automático a Washington, que predominouna última década do século passado, o novo governo —empossado, em 2003, sob o signo da mudança e que,para decepção da opinião pública, não apenas mantevecomo aprofundou o caráter neoliberal da políticaeconômica —, no que toca às relações exteriores,imprimiu uma clara inflexão. Com uma visão fortementevoltada para o que percebe ser o interesse nacional, suasprioridades passaram a ser a integração sul-americana,a consolidação de alianças com os países do sul e ofortalecimento da posição negociadora nos fóruns docomércio internacional.

Uma clara contradição marca esse governo,neoliberal na economia e o que se poderia chamarneoterceiromundista nas relações exteriores. Essacontradição tem a ver com uma recomposição commudança de hegemonia interna ao bloco do podereconômico, com o deslocamento do empresariadoindustrial e a ascensão da grande finança globalizada,ocorrida no final dos anos 80. A direção política daAdministração Lula buscou uma conciliação com essesinteresses, ao mesmo tempo em que fazia um movimentoem direção à enorme massa de cerca de 100 milhões debrasileiros miseráveis e politicamente desorganizados,alvo de suas políticas sociais, embora tímidas, de grandeabrangência. De um lado, os movimentos populares, basesocial original do PT — decepcionada com a continuidadeda política econômica —, vêem na política externa umdos poucos campos em que existe espaço para umadisputa real com o modelo neoliberal. A análise dasnegociações comerciais que segue exemplifica bem oponto. Do outro, encontra-se o bloco das classesdominantes, que, embora tenha abandonado, de formageral, a antiga crença no crescimento acelerado comofonte de prosperidade, trocado que foi pelo rentismofinanceiro, busca controlar a agenda da política externa,do mesmo modo como faz com a política econômica.Assim, a compreensão das posições brasileiras nasnegociações comerciais deve partir das forças sociaisnelas envolvidas.

No bloco dominante, o primeiro segmentoimportante é o do chamado agronegócio: proprietáriosde terra produtores de commodities, indústriasbeneficiadoras de produtos agropecuários e empresascomerciais exportadoras. Herdeiros das antigasoligarquias rurais, sua capacidade de ação política édesproporcional a seu peso no PIB. A importância dostemas acesso aos mercados e bens agrícolas na pautabrasileira revela toda a sua força.

Um segundo grupo é aquele ligado às indústrias deprodutos semimanufaturados e estandardizados, comoaço, produtos de celulose, química ou minérios. É umacoalizão de poucas grandes empresas oligopolistas,muitas recém-privatizadas, de propriedade de bancos,fundos de pensão e multinacionais. Formadores de preçono mercado interno e tomadores no mercado externo,seu interesse maior é superar barreiras na Europa e nosEUA.

Um terceiro segmento importante é o vinculado àsindústrias de bens duráveis de consumo, comoautomóveis, máquinas agrícolas e eletrodomésticos,formado principalmente por multinacionais, em algunscasos associadas a grupos locais, e estruturado emmercados de concorrência monopolista no plano regional.Seu maior interesse está no Mercosul e na integraçãosul-americana. Um caso particular é o da indústriaaeronáutica, cujo mercado é mundial e dependentefundamentalmente de iniciativas de política comercialestratégica, como subsídios, compras governamentais,negociações bilaterais e iniciativas de acionamento dosmecanismos de solução de controvérsias no âmbito daOrganização Mundial do Comércio (OMC).

Por fim, há o grupo da indústria de bens nãoduráveis, como têxtil, alimentação e calçados. Seusinteresses são preservar o mercado interno e superar asbarreiras dos países desenvolvidos. Menos concentradoe com presença significativa de pequenas e médiasempresas, é um setor menos articulado para intervir nasnegociações. É também muito sensível às oscilaçõesdo câmbio, tendo sofrido duras perdas em razão daabertura indiscriminada e da valorização do real nos anos90.

No campo popular, três grupos estão maisorganizados para interferir nas negociações. Os pequenosagricultores são o primeiro deles, representados pelaConfederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura(Contag) e pelo Movimento dos Sem-Terra (MST), queluta pela preservação e pela conquista da propriedadeda terra e dos empregos no campo. Seu objetivo é aprodução de alimentos para o consumo popular,preservando o mercado interno e a segurança alimentarda nação. É, por essa razão, um grupo vigilante sobre asconcessões de acesso ao mercado brasileiro, ao mesmotempo em que tem pouco interesse nas exportações,não sendo, portanto, um aliado do agronegócio, comoocorre com a agricultura familiar nos paísesdesenvolvidos.

O segundo grupo é formado pelos sindicatos detrabalhadores urbanos. Da mesma forma que os pequenosagricultores, fazem oposição ideológica ao livre-mercado

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e são muito vigilantes em relação às concessões emtorno do acesso a mercados, preocupados com seu efeitosobre o emprego, principalmente na indústria nacional.Diferentemente de seus companheiros do campo, essegrupo tem mais facilidade em estabelecer alianças comos interesses empresariais da indústria na busca deacesso a mercados externos.

Um colorido mosaico de ONGs, em sua maioriamilitantes do movimento antiglobalização, forma o terceirogrupo de interesses no campo popular. Como os demaisgrupos, está bastante preocupado com os efeitos docomércio sobre o emprego e é especialmente sensível atemas como propriedade intelectual, medidas“antidumping”, comércio de serviços e compras governa-mentais. Junto com os sindicatos de trabalhadores,diversas ONGs constituíram a Aliança Social Continental,da qual fazem parte as principais centrais sindicais docontinente, a começar pela norte-americana — AmericanFederation of Labor (AFL-CIO) — e pela brasileira —Central Única dos Trabalhadores (CUT) —, e que foiformada para se opor à proposta da Área de LivreComércio das Américas (ALCA), opondo à integraçãodos mercados uma integração dos povos.

Essas contradições da sociedade cívil estãorefletidas no Estado, embora sua burocracia goze de umarelativa autonomia. O Banco Central e o Ministério daFazenda têm, em seus quadros superiores, uma fortepresença de fundamentalistas neoliberais, com suacrença nas virtudes do livre-mercado. Sua interlocuçãosocial encontra-se no grupo da alta finança internacio-nalizada. Muitas vezes, esse grupo poderoso é apoiadopelos Ministérios da Agricultura e do Desenvolvimento,onde o agronegócio e os segmentos industriais nacionaise multinacionais estão bem representados. Em oposiçãoa esses, estão os integracionistas do Ministério deRelações Exteriores, outra burocracia bastante tradicionaldo Estado brasileiro, talvez a que melhor seja capaz deformular uma interpretação ativa do interesse nacional.Sua posição negociadora é apoiada pelas forçaspopulares, sindicatos e ONGs, tendo, em diversasoportunidades, sido alvo de movimentos de verdadeirasabotagem por parte do Ministério da Fazenda e do BancoCentral.

3 - As três arenas de nego- ciação

A estratégia da política externa brasileira atual, talcomo é verbalizada pelos representantes do Itamaraty,

busca alcançar um protagonismo para o País na cenainternacional.1 Suas diretrizes pretendem vincularintegração regional, comércio exterior e desenvolvimento.Essa posição é seguida em três arenas de negociação.A primeira é multilateral e tem seu tabuleiro principal naatual rodada de Doha, da OMC, embora fóruns como aUnited Nations Conference on Trade and Development(UNCTAD) também sejam relevantes. Uma segunda arenaé formada pelas negociações em torno de acordos quechamarei bilaterais, como no caso da ALCA ou dasnegociações Mercosul-União Européia.2 A terceira arenaé aquela da integração regional, com o Mercosul em seucentro e tendo como perspectiva a consolidação daComunidade Sul-Americana de Nações.

É importante salientar uma relativa fragilidade inicialda posição negociadora brasileira no balanço do quedeseja conquistar e o que está disposto a conceder. Aúltima década de reformas econômicas de corteneoliberal, que fizeram do Brasil e de quase todos ospaíses latino-americanos “bons alunos” desse receituário,representa uma significativa desvantagem para suaparticipação nas negociações, pois reduziu significativa-mente as ofertas que podem ser feitas em razão do corteunilateral de tarifas do começo dos anos 90.3 O mesmovale para a desregulamentação e para as privatizaçõesde serviços públicos, também unilateralmente abertosao capital estrangeiro, assim como para a abertura domercado financeiro, da mesma maneira realizada deforma unilateral.

Um outro aspecto é a definição de qual agenda paracada arena. Para o Brasil, interessa limitar a agendadessas negociações bilaterais à questão do acesso aosmercados e remeter ao foro da OMC os temas sensíveis,como propriedade intelectual, investimento e serviços.Isto porque a diplomacia brasileira vê no foro multilateral

1 Explicando a posição do Brasil, o Embaixador José Bustani(2004) critica o que chama de um mito contemporâneo, o deuma ordem mundial imperial imposta aos menos desenvolvidose “(...) que recomenda timidez no cenário internacional e aceitaçãodas supostas realidades de poder”. Ao contrário, diz que “(...) épossível uma atuação corajosa e ao mesmo tempo pragmática”.

2 No caso da ALCA, bilateral porque opõe Mercosul e seus aliadossul-americanos aos EUA, como se fosse uma negociação entredois blocos.

3 Insistindo no mesmo erro, recentemente o Ministério da Fazendatornou pública uma proposta negociadora em que admite umaredução prévia da tarifa externa comum do Mercosul, comomedida para sinalizar que um gesto equivalente deveria ser feitopelos países desenvolvidos. Essa ingenuidade do fundamen-talismo de mercado, que encanta a equipe econômica, em outrostempos seria considerada uma ação de inimigo na trincheira.

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um espaço mais favorável à sua posição, pois permiteque os países em desenvolvimento ajam coordena-damente, como no bem-sucedido caso da formação doG20+ na Conferência de Cancún. No caso da arena daintegração regional, o escopo é bem mais amplo, pois setrata de ir muito além de uma zona de livre comércio econsolidar uma comunidade de nações, o que implicaconvergência institucional e política, formação de normascomuns, construção de uma infra-estrutura comum eassim por diante.

3.1 - As negociações multilate- rais na OMC

Na arena multilateral, o interesse central do Brasile de seus aliados é a superação da agenda inauguradana Rodada Uruguai do General Agreement on Tariffs andTrade (GATT) (Bahadian, 2004), onde, sob a influênciada inflexão ideológica ao neoliberalismo dos EUA e devários países da Organização de Cooperação eDesenvolvimento Econômico (OCDE), foram incluídosnas negociações comerciais temas como propriedadeintelectual (Trips), investimento (Trims) e serviços (GATS).Para os países em desenvolvimento, tais temas devemser tratados à luz das diferenças e peculiaridades desuas trajetórias de desenvolvimento, pois vêem nasnovas regras a imposição de uma uniformização, quemuitos autores, como Rodrik (1999), qualificam comoum impeditivo à sua liberdade de escolher trajetórias eestratégias de desenvolvimento em conformidade comsuas características nacionais. Mais ainda, tais medidaspodem vir a ser um real obstáculo ao desenvolvimento,por proibirem ações indispensáveis à sua consecução(Chang, 2003).

Desde 2003, a nova agenda brasileira passou a terno fortalecimento de alianças ao sul sua estratégia,donde resultou a formação do G20+, organizado emCancún e culpado pelo fracasso daquele encontro, naversão dos EUA. O ponto central de dissenso foi aagricultura, com seus dois desdobramentos: o acessoaos mercados do norte por parte dos países emdesenvolvimento e a redução dos subsídios aosagricultores europeus e dos EUA, responsáveis peladeterioração dos preços e pela deformação daconcorrência internacional.

O peso da questão agrícola para o Brasil tem trêsrazões. Primeiro, o tema permite um alargamentoconsiderável das alianças na arena de negociação,consolidando um bloco razoavelmente coeso de nações

em desenvolvimento. Segundo, o acesso aos mercadosatende às demandas do agronegócio, politicamenteimportante. E, terceiro, dá um forte argumento para umamaior intransigência nas negociações de outros tópicos.

Até o presente, o G20+ tem sido bem-sucedido emmanter os chamados temas de Cingapura fora da agenda,o que dá uma perspectiva melhor para as negociaçõesdo que aquela da rodada Uruguai do GATT, em que osinteresses dos países desenvolvidos prevaleceramlargamente. Os resultados positivos até agora só forampossíveis pela organização dos países em desenvolvi-mento, um saldo promissor do processo até o momento(Drábek, 2004). Mesmo que a pauta desses países tenhacolocado em evidência os interesses do grupo doagronegócio e dos produtores de produtos industriaisestandardizados, pela própria complexidade dasnegociações nessa arena, o raio de manobra daburocracia do Itamaraty, para defender o que entendemcomo interesse nacional no longo prazo, é maior.

3.2 - Os acordos de livre- -comércio bilaterais

Sem dúvida, os acordos de livre-comércio bilateraissão as arenas de negociação mais difíceis, porenvolverem uma assimetria muito grande das partes. Astratativas com a União Européia (UE) aceleraram-sedesde 2003, num movimento visando concorrer com ocalendário da ALCA, e tiveram, de início, uma agendamenos ambiciosa, onde o acesso a mercados foi o temacentral. Representando mais de 40% do mercado expor-tador do Mercosul, concentrado em bens agropecuários,e apenas 3% das exportações européias, o fluxo decomércio entre os dois blocos produziu um déficit para aEuropa de 10,3 bilhões de euros em 2003. O ponto centralda discórdia está na posição européia de querer introduziralguns dos temas de Cingapura, como proteção aoinvestimento e serviços, enquanto admite um pequenorecuo em sua política de quotas para produtos sensíveis,como carne suína e de frango, e força uma maior aberturano segmento de produtos industriais.

Para os sul-americanos, as pressões dos gruposindustriais de bens duráveis e de capital e da agriculturafamiliar, como no caso dos laticínios, reforçaram umaposição mais intransigente. Da mesma forma, seusnegociadores perceberam no tema das quotas umatentativa de um criar um precedente para a arena da OMC,bem como não mostraram disposição de renunciar aodireito soberano de regular investimentos e serviços e

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mantiveram a posição de remeter tais temas ao foromultilateral da rodada de Doha. O impasse levou a umretardamento das negociações.

A arena de negociações entre as naçõesamericanas tinha uma agenda inicial que combinavacomércio e desenvolvimento, respeitando as assimetriasentre seus participantes, a qual, em razão da pautaproposta pelos EUA para a ALCA, ficou reduzida à questãodo livre-comércio (Bahadian, 2004). Pior, vários dos temasde Cingapura e outros elementos, como a cláusulaEstado-investidor e um mecanismo de solução decontrovérsia, foram sugeridos, numa repetição quaseliteral dos instrumentos do Acordo de Livre-Comércio daAmérica do Norte (NAFTA).4

Desde o início das negociações, grupos de interessevêm intervindo. De um lado, o agronegócio e os produtoresde bens industriais estandardizados, favoráveis a amplasconcessões em troca do acesso ao mercado norte--americano e, de outro lado, uma coalizão de sindicatosde trabalhadores e ONGs, contrários ao livre-comércio edefensores de uma retirada do Brasil das negociações.Como foi referido, esse grupo está organizado em sintoniacom forças sociais dos outros países, formando a AliançaSocial Continental, da qual fazem parte desde a CUTbrasileira até a AFL-CIO dos EUA.

As negociações que haviam iniciado em 1994passaram a assumir um caráter público apenas em 2001,quando seu conteúdo foi divulgado. Desde então, suacontinuidade foi influenciada pelas mudanças políticasque levaram a uma nova atitude por parte dos maiorespaíses da América do Sul e também a um enrijecimentoda posição dos EUA. Desde 2003, o processo defronta--se com um impasse pelo desequilíbrio das concessõesaceitáveis pelos principais atores, EUA e Mercosul. Osprimeiros insistem em regras rígidas para investimento,propriedade intelectual e serviços, muito além do queestá sendo negociado na OMC, mas recusam itens deinteresse do Mercosul, como suas barreiras agrícolasou medidas “anti-dumping”.

O grupo sul-americano propôs que se fizesse umacordo geral, remetendo as questões sensíveis para aOMC e negociando avanços adicionais num formatoestritamente bilateral. Essa fórmula, no entanto, sópoderia funcionar num ambiente de redução generalizada

de tarifas. Entretanto, como lembrou o EmbaixadorBahadian, a “(...) tentativa de excluir o setor agrícola ouparte dele da desgravação demonstra que se perdeu opudor em relação à retórica na área comercial” (Bahadian,2004). Mais ainda, além de recusar a fórmula sugerida,os EUA fizeram ao Mercosul sua pior oferta deconcessões adicionais. Co-presidindo as negociações,Brasil e EUA têm a dura tarefa de superar o ambientenegativo das tratativas. Intimamente ligadas, asnegociações da ALCA e do Mercosul-UE parecemdependentes de avanços na arena multilateral da OMC.

3.3 - A integração regional na América do Sul

A terceira arena de negociação parece ser a maispromissora. Todas as forças sociais envolvidas no temadas relações comerciais apóiam a integração regional.Ao mesmo tempo, há razões para precaução, pois, comexceção do Mercosul, com sua trajetória, até o presente,contraditória, iniciativas nessa direção têm sido umamatéria de muita retórica e pouca efetividade. O começodo Mercosul foi entusiasmante. Entre 1991 e 1997, ocomércio dentro do bloco passou de 11,1% para 24,3%do total de suas exportações. Entre 1998 e 2002, oprocesso de integração assumiu um caráter letárgico,em razão da profunda crise que assolou as economiasda região. Apenas após 2003, iniciativas mais concretasforam retomadas, ao mesmo tempo em que o comérciovoltava a crescer. Mesmo assim, as exportações doBrasil para o bloco haviam caído para a média de 1981,quando, em 2004, atingiram apenas 11,6% do total.

Os princípios a regerem o Tratado de Assunção,que criou o Mercosul, além do mercado comum com livrecirculação de mercadorias, capital e trabalho, apontavamtambém uma convergência institucional e a coordenaçãode políticas macroeconômicas e setoriais, baseados nogradualismo, na flexibilidade, na reciprocidade e noequilíbrio. Seu espírito, que inclusive norteia as iniciativasde integração que vão além dele e envolvem os paísesassociados e as negociações com a Comunidade Andinae demais países do continente, indica uma vasta agenda,que vai muito além dos aspectos comerciais e da livremovimentação de fatores.

A interconexão de sua infra-estrutura, por razõeshistóricas construída de forma estanque entre os países,é uma primeira necessidade do processo de integração.Se o ambiente político hoje é favorável, a situaçãoeconômica é um obstáculo difícil de superar. Baixo

4 Tais mecanismos têm sido apontados como subversivos dasleis nacionais e da soberania dos Estados, por possibilitarem aimunidade do investidor estrangeiro à lei e por impedirem arevisão judicial de contratos ou atos jurídicos, objeto de umainiciativa de revisão do NAFTA em tramitação no Parlamento doCanadá.

Luiz Augusto Estrella Faria

Indic. Econ. FEE, Porto Alegre, v. 33, n. 3, p. 7-14, dez. 2005

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crescimento, endividamento elevado, compromissos deausteridade fiscal e falta de mecanismos operacionais,após o desmonte das estruturas estatais da região,tornam seu financiamento de difícil execução.

Outro item decisivo na agenda é a integraçãoinstitucional, que tem também um obstáculo histórico asuperar, a arraigada crença que confunde soberanianacional com chauvinismo. Qualquer avanço do processoalém do estágio inicial de zona de livre comércio requero deslocamento das estruturas de regulação e a transfe-rência de certas responsabilidades e atribuições dosEstados para organismos regionais. Escasso avanço foirealizado até o momento nesse sentido, permanecendoa estrutura institucional do Mercosul organizada de modointergovernamental. Como lembrou Werter Faria (2002),esse tipo de instituição é apropriado para cooperação,mas incompatível com as necessidades do processo deintegração, o qual requer a formação de organismosdirigidos por uma burocracia que seja independente dosinteresses nacionais e que se possa dedicar integral-mente a suas tarefas internacionais.

Apesar dos notáveis avanços na aproximação comseus vizinhos, de que são exemplos a ampliação dosmembros associados, o avanço das negociações com oPacto Andino e o recente anúncio do ingresso daVenezuela como membro pleno, no Mercosul a integraçãoainda está restrita ao comércio e a matérias correlatas.Sua agenda está repleta de disputas sobre desequilíbriodo comércio, pedidos de salvaguardas e acusações dedumping e outras práticas desleais, que não são maisdo que a música a acompanhar o declínio dos fluxos decomércio. Nas negociações intra-regionais, os produtoresde bens industrializados duráveis e não duráveis são osmais importantes grupos de interesses, com algumasintervenções localizadas do agronegócio, pois, paraesses setores, o mercado regional é um destino prioritáriode suas exportações.

No que diz respeito às negociações em que oMercosul está envolvido como bloco, o tema do acessoa mercados para produtos primários é predominante,mostrando a influência do agronegócio nas posiçõesnegociadoras. Como já mencionado, esse setor é forteno Brasil e, em relação à Argentina, é quase o únicosobrevivente do fundamentalismo neoliberal que levoueste país à devastadora crise de 2001. Embora incluídospela estrutura institucional do Tratado de Assunção naforma da participação da sociedade civil na definiçãodas agendas e das propostas em todas as fases doprocesso de integração, a presença de representaçõesdo campo popular tem sido pouco efetiva, na medida emque a agenda tem estado ocupada com os temas do

comércio; e os assuntos de maior interesse dessessetores, como a livre circulação dos trabalhadores,avançaram muito pouco em virtude do insuficientedesenvolvimento institucional do Mercosul.

4 - Conclusão

O triunfo do neoliberalismo não apenas consolidoua alta finança como grupo hegemônico das classesdominantes, como erodiu o compromisso do grandecapital do setor produtivo com qualquer projeto dedesenvolvimento nacional. A fração superior do queoutrora se chamou burguesia nacional está resignada aum papel secundário, esperando que o investimentoestrangeiro lidere seus movimentos. No que diz respeitoao comércio exterior, essa nova correlação de forças fazecoar uma concepção ricardiana das vantagens compara-tivas do agronegócio e da exportação de bens industriaisestandardizados.

Se, na arena regional, o processo de integraçãocarece de um projeto comum de desenvolvimentocompartilhado pelas nações sul-americanas, que lhe dêum norte e uma perspectiva histórica; nas arenasbilaterais e na multilateral, a coordenação entre paísesem desenvolvimento tende a enfatizar os interesses emtorno das exportações de produtos primários. Ora, talposição reforça uma especialização regressiva eaprofunda, em vez de reduzir, o fosso que separa o grupode países desenvolvidos dos demais. Mesmo a inclusãode tópicos como o dos têxteis ou o da siderurgia nãomuda muito a figura, pois não ajuda a reduzir essasdistâncias. A prevalência dessas posições representa,de fato, uma reprise do passado primário exportador daAmérica do Sul, o que, para quem já cumpriu diversasetapas de sua industrialização, aponta o regresso do que,um dia, foi o futuro.

Para países pobres ou de renda intermediária,desenvolvimento significa diversificação econômica, oque ainda quer dizer industrialização, requer acesso anovas tecnologias e é o oposto da exploração devantagens comparativas. É isso que está inscrito noTratado de Assunção, sob a forma do princípio doequilíbrio, e que torna concreta a idéia de que, nasrelações internacionais, nosso norte é o sul.

De volta do futuro? O comércio exterior do Brasil no começo do século XXI

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Referências

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Luiz Augusto Estrella Faria

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Exportações de carne: um segmento dinâmico do agronegócio

Introdução

O objetivo deste texto é traçar um panorama sucintodo comportamento recente das exportações do segmentoprodutor de carne no Brasil. Para tal, descreve-se odesempenho das vendas de carne bovina, suína e defrango no mercado internacional. A análise está baseadano desempenho em termos de valores dessasexportações. Serão também identificados os estadosresponsáveis pelo maior dinamismo apresentado pelossegmentos produtores de carne, dando-se especialênfase ao desempenho do Rio Grande do Sul. O períodoanalisado vai de 2000 a 2004.

Inicialmente, traça-se um panorama geral, visandodimensionar a importância das exportações de carne nabalança comercial brasileira, bem como na balança doagronegócio. A seguir, faz-se uma análise de cada umdos segmentos produtores: carne bovina in natura eindustrializada, carne suína e carne de frango in natura eindustrializada. Em cada caso, é analisada a taxa decrescimento de cada um dos segmentos e descrita aevolução das vendas estaduais.

Panorama atual

A exportação brasileira de carnes tem assumidoum papel de destaque nos últimos anos, com o Brasil

transformando-se no maior exportador mundial emvolume. O desempenho extremamente positivo do setorno mercado internacional reflete-se numa trajetóriacrescente de participação dessas vendas no total dasexportações brasileiras. O movimento de ganho deimportância do setor exportador de carne na balançacomercial brasileira tomou maior fôlego na década atual.A participação do setor produtor de carnes, que se situavaem torno de 2% das exportações em 1990, chegou a3,5% em 2000 e atingiu 6,4% em 2004. Com relação àbalança comercial do agronegócio, a participação dasexportações de carne, que era de 5% do total das vendasexternas oriundas do agronegócio em 1990, chegou a15,8% em 2004 (BRASIL, 2005).

Essa evolução das participações decorre de umaumento de mais de 200%, entre 2002 e 2004, no totaldas exportações do conjunto de carnes analisado: carnebovina in natura e industrializada, carne suína e carne defrango in natura e industrializada. Dentro do setor, a maiortaxa de crescimento das exportações no período é dosegmento produtor de carne suína, seguido das vendasde carne de frango industrializada e das de carne bovinatambém industrializada. Há que se fazer aqui uma ressalvacom relação às taxas de crescimento dos segmentos,especialmente no que se refere à carne de frango. Asvendas no mercado internacional de carne de frango innatura apresentam, desde a década de 80, um volumesignificativo, tanto que o Brasil era, de longa data, osegundo maior exportador desse tipo de carne, ocupando,atualmente, o primeiro lugar nesse comércio. Mesmoassim, as exportações de carne de frango in naturapermanecem em crescimento, apresentando taxasconsideráveis para um setor já consolidado (Tabela 1).

*A autora agradece aos colegas Maria Domingues Benetti,Martinho Roberto Lazzari e Terezinha da Silva Bello a leitura dotexto e as sugestões.

Análise setorialAnálise setorialAnálise setorialAnálise setorialAnálise setorialAgropecuária

Exportações de carne: um segmento dinâmico do agronegócio

Análise setorialAnálise setorialAnálise setorialAnálise setorialAnálise setorialAgropecuária

Exportações de carne: um segmento dinâmico do agronegócio

Vivian Fürstenau* Economista da FEE.

Artigo recebido em 10 out. 2005.

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Vivian Fürstenau

O Rio Grande do Sul, por sua vez, ocupava o terceirolugar no total das exportações do agronegócio em 1990e manteve essa posição em 2004, apesar de umaparticipação decrescente. As exportações gaúchas doagronegócio, que eram de 20,84% do total brasileiroexportado pelo setor em 1990, reduziram-se para 15,92%desse total em 2004 (BRASIL, 2005). A perda departicipação gaúcha no total das vendas oriundas doagronegócio e exportadas pelo País deveu-se, em suamaior parte, aos demais produtos da pauta, já que, noque se refere ao setor produtor de carnes, o Rio Grandedo Sul manteve sua participação, em torno de 17% dototal das exportações do Brasil (Tabela 2).

No entanto, ao se examinarem os diferentessegmentos produtores de carne, verifica-se que a posiçãodo Rio Grande do Sul no total das exportações brasileirasde carne foi mantida graças ao aumento das exportaçõesde frango in natura. Na verdade, o volume dasexportações gaúchas desse tipo de carne foi significativoe crescente, capaz de compensar as perdas departicipação do Estado nas vendas externas dos demaistipos de carne.

O crescimento das vendas no mercado internacionaldos produtos do segmento carne deu-se numa conjunturabastante propícia. A desvalorização cambial de 1999,aliada ao surgimento da "doença da vaca louca"—encelopatia espongiforme bovina (EEB) — em diversospaíses da Comunidade Européia, em 2000, e aoreaparecimento da febre aftosa, inicialmente, na Inglaterrae, posteriormente, na França e na Alemanha, criou umcontexto extremamente favorável para as exportaçõesbrasileiras de carne. O segmento produtor de carne deaves, por já ser um setor tradicionalmente exportador ebastante eficiente no aproveitamento das oportunidadesexternas para colocação de seus produtos, a partir dadesvalorização do real, imediatamente passou aapresentar um crescimento de suas exportações. A partirde 2000, os problemas sanitários nos países europeussó fizeram aumentar ainda mais as vendas do setor. Emrazão dos riscos oferecidos, houve uma retração noconsumo de carne vermelha e suína, decorrendo daí umaumento do consumo de carne de frango. Esse aumentoda demanda na Europa passou, então, a ser supridoatravés do redirecionamento da produção local de frangopara o mercado interno. Tal movimento abriu apossibilidade de colocação da carne de aves produzidano Brasil nos mercados antes abastecidos pelosprodutores europeus.

No que se refere às carnes bovina e suína, osproblemas sanitários fizeram com que os mercadoseuropeus, bem como os de fora da Comunidade Européia,

necessitassem de novos fornecedores. Esse quadro crioupossibilidades para a colocação das carnes bovina esuína brasileiras nesses mercados. O otimismo dosprodutores desses dois segmentos também tinha baseno reconhecimento, em 2000, pela Organização Mundialde Epizotias (OIE), dos Estados de Santa Catarina e doRio Grande do Sul como áreas livres de aftosa semvacinação e no reconhecimento de outros estadosbrasileiros com importante produção de carne bovina esuína como áreas livre de aftosa com vacinação.

"O contexto de problemas apresentados naComunidade Européia foi favorável tambémpara os produtores de frango. A retração noconsumo de carne vermelha na Europadecorrente do temor com a 'doença da vacalouca', ampliado com o surgimento da aftosanos rebanhos bovino e suíno europeus, fezcom que a carne de frango se tornasse aprincipal fonte de proteína animal. Nessecenário, os produtores europeus passaram aatender à maior demanda na ComunidadeEuropéia e cederam espaços no mercadointernacional. Além disso, com a proibição dautilização de insumos de origem animal paraa alimentação das aves, os produtores tiveramde importar farelo de soja e milho, o que serefletiu em um aumento de seus custos deprodução. Esse quadro permitiu que o Brasilocupasse uma fatia dos mercados cedidospela Comunidade Européia e, mais ainda,conquistasse alguns mercados europeus, jáque, frente aos produtores locais, havia obtidovantagens comparativas." (Furstenau, 2002,p. 163).

Assim, no início da década, havia perspectivasextremamente positivas para as exportações do setor eque, na sua maior parte, se confirmaram até o momento.Com relação ao Rio Grande do Sul, o reaparecimento dafebre aftosa no Estado, em maio de 2001, frustrouexpectativas, e a performance não foi a esperada. Mas,mesmo assim, excetuando-se a carne bovina, as demaisapresentaram um desempenho bastante positivo,acompanhando a evolução das vendas brasileiras.

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Exportações de carne: um segmento dinâmico do agronegócio

Tabela 1 Taxas de crescimento do valor das exportações de carnes brasileiras e gaúchas — 2000-04

(%)

DISCRIMINAÇÃO 2001 2000

2002 2001

2003 2002

2004 2003

2004 2000

RS Bovina in natura .................. -55,40 20,19 77,63 128,33 117,40

Bovina industrializada ......... -2,66 25,97 4,28 75,35 124,22 Suína .................................. 32,04 20,84 54,27 54,88 281,26 De frango in natura ............. 78,92 2,62 38,93 32,49 237,97 De frango industrializada .... 131,81 19,04 31,53 -1,39 257,88

Brasil Bovina in natura .................. 46,79 5,08 48,72 70,03 290,04

Bovina industrializada ......... -1,73 18,89 14,53 39,12 86,16 Suína .................................. 112,83 35,51 12,18 41,34 357,29 De frango in natura ............. 60,31 3,36 28,07 45,87 209,52 De frango industrializada .... 83,15 37,07 54,44 13,16 338,75 FONTE DOS DADOS BRUTOS: PORTAL do exportador. Alice Web. NOTA: Os códigos da Nomenclatura Comum do Mercosul (NCM) foram agrupados segundo os tipos de carne, a saber: carne bovina in natura, 0201.10.00 até 0202.30.00; carne bovina industrializada, 1601.00.00 e 1602.50.00; carne de frango in natura, 0207.11.00 e 0207.14.00; carne de frango industrializada,1602.32.00; carne suína, 0203.11.00 até 0203.29.00.

Tabela 2 Valor e participação percentual das exportações de carne do Rio Grande do Sul e do Brasil — 2000-04

2000 2001 2002

DISCRIMINAÇÃO Valor (US$ mil)

Participação no Total do

BR (%)

Valor (US$ mil)

Participação no Total do

BR (%)

Valor (US$ mil)

Participação no Total do

BR (%) RS Bovina in natura .................. 30 076 5,98 13 414 1,82 16 122 2,08 Bovina industrializada ......... 26 855 10,12 26 142 10,02 32 930 10,62 Suína .................................. 50 526 31,04 66 717 19,26 80 622 17,18 De frango in natura ............. 185 406 23,01 331 736 25,68 340 433 25,50 De frango industrializada .... 6 174 26,83 14 312 33,96 17 038 29,49 Subtotal (5 tipos de carne) 299 038 16,99 452 321 16,88 487 145 16,52 Brasil Bovina in natura .................. 503 296 100,00 738 805 100,00 776 318 100,00 Bovina industrializada ......... 265 468 100,00 260 872 100,00 310 158 100,00 Suína .................................. 162 758 100,00 346 401 100,00 469 409 100,00 De frango in natura ............. 805 737 100,00 1 291 658 100,00 1 335 051 100,00 De frango industrializada .... 23 009 100,00 42 142 100,00 57 765 100,00 Subtotal (5 tipos de carne) 1 760 269 100,00 2 679 878 100,00 2 948 701 100,00

2003 2004

DISCRIMINAÇÃO Valor (US$ mil)

Participação no Total do

BR (%)

Valor (US$ mil)

Participação no Total do

BR (%) RS Bovina in natura .................. 28 637 2,48 65 387 3,33 Bovina industrializada ......... 34 339 9,67 60 215 12,18 Suína .................................. 124 376 23,62 192 635 25,88 De frango in natura ..…….... 472 951 27,66 626 622 25,13 De frango industrializada .... 22 409 25,12 22 096 21,89 Subtotal (5 tipos de carne) 682 712 17,80 966 956 16,68 Brasil Bovina in natura .................. 1 154 509 100,00 1 963 066 100,00 Bovina industrializada ......... 355 224 100,00 494 202 100,00 Suína .................................. 526 576 100,00 744 278 100,00 De frango in natura ............. 1 709 743 100,00 2 493 929 100,00 De frango industrializada .... 89 209 100,00 100 954 100,00 Subtotal (5 tipos de carne) 3 835 261 100,00 5 796 428 100,00

FONTE DOS DADOS BRUTOS: PORTAL do exportador. Alice Web. NOTA: Os códigos da NCM foram agrupados segundo os tipos de carne, a saber: carne bovina in natura, 0201.10.00 até 0202.30.00; carne bovina industrializada, 1601.00.00 e 1602.50.00; carne de frango in natura, 0207.11.00 e 0207.14.00; carne de frango industrializada, 1602.32.00; carne suína, 0203.11.00 até 0203.29.00.

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tipo de carne, com exceção de Goiás, perderam, noperíodo, participação no total de carne bovina in naturaexportado pelo Brasil. A perda de participação do RioGrande do Sul foi influenciada pela suspensão dosembarques de carne desse tipo oriunda do Estado em2001, em virtude do reaparecimento da febre aftosa emmaio daquele ano. As vendas foram retomadas em 2002,e o volume de carne bovina in natura vendido pelo Estadoem 2004 já foi o dobro do observado em 2000.

Da mesma forma que São Paulo é um tradicionalexportador de carne bovina in natura, o Rio Grande doSul o é de carne bovina industrializada. Como a ocorrênciade febre aftosa não tem implicações nas vendas dessacarne, já que é industrializada, o Estado aumentou suaparticipação frente aos demais exportadores desse tipode carne entre 2000 e 2004 (Tabela 4).

Carne bovina

As exportações brasileiras de carne bovina in naturaderam um salto de quase 300% desde o início da décadaaté 2004. Esse crescimento parece estar apenas no início,já que, se observarmos as taxas anuais, fica evidenteum movimento crescente das exportações de carnebovina desse tipo. Com relação à carne industrializada,o crescimento é menor: foi de 86% entre 2000 e 2004(Tabela 3).

A carne bovina in natura já tem, de longa data, oEstado de São Paulo como principal exportador. Mesmoassim, entre 2000 e 2004, esse estado aumentou a suaparticipação nas exportações brasileiras. Os demaisestados com produção e exportação significativas desse

Tabela 3

Valor e participação percentual da exportação de carne bovina in natura de estados selecionados e do Brasil — 2000-04

2000 2001 2002 ESTADOS

E PAÍS Valor (US$ mil)

Participação no Total

do BR (%) Valor

(US$ mil)

Participação no Total

do BR (%) Valor

(US$ mil)

Participação no Total

do BR (%)

São Paulo ......................... 309 319 61,46 384 793 52,08 534 383 68,84 Paraná .............................. 29 888 5,94 42 986 5,82 46 553 6,00 Rio Grande do Sul ............ 30 076 5,98 13 414 1,82 16 122 2,08 Mato Grosso do Sul ....... 42 642 8,47 133 337 18,05 46 462 5,98 Mato Grosso ..................... 29 801 5,92 47 533 6,43 47 271 6,09 Goiás ................................ 35 043 6,96 80 847 10,94 66 539 8,57 Brasil ................................ 503 296 100,00 738 805 100,00 776 318 100,00

2003 2004 ESTADOS

E PAÍS Valor (US$ mil)

Participação no Total

do BR (%)

Valor (US$ mil)

Participação no Total

do BR (%)

São Paulo ......................... 799 590 69,26 1 338 685 68,19 Paraná .............................. 61 421 5,32 101 533 5,17 Rio Grande do Sul ............ 28 637 2,48 65 387 3,33 Mato Grosso do Sul ....... 58 221 5,04 118 062 6,01 Mato Grosso ..................... 73 515 6,37 87 806 4,47 Goiás ................................ 97 805 8,47 173 416 8,83 Brasil ................................ 1 154 509 100,00 1 963 066 100,00 FONTE DOS DADOS BRUTOS: PORTAL do exportador. Alice Web. NOTA: Os códigos da NCM para carne bovina in natura são 0201.10.00 até 0202.30.00.

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Exportações de carne: um segmento dinâmico do agronegócio

Tabela 4

Valor e participação percentual da exportação de carne bovina industrializada de estados selecionados e do Brasil — 2000-04

2000 2001 2002 ESTADOS

E PAÍS Valor (US$ mil)

Participação no Total

do BR (%)

Valor (US$ mil)

Participação no Total

do BR (%)

Valor (US$ mil)

Participação no Total

do BR (%)

São Paulo .................... 194 769 73,37 211 526 81,08 242 348 78,14

Paraná ......................... 593 0,22 161 0,06 235 0,08

Rio Grande do Sul ....... 26 855 10,12 26 142 10,02 32 930 10,62

Mato Grosso do Sul .. 389 0,15 0 0,00 535 0,17

Mato Grosso ................ 21 670 8,16 14 055 5,39 20 274 6,54

Goiás ........................... 20 0,01 0 0,00 39 0,01

Brasil ............................ 265 468 100,00 260 872 100,00 310 158 100,00

2003 2004 ESTADOS

E PAÍS Valor (US$ mil)

Participação no Total

do BR (%)

Valor (US$ mil)

Participação no Total

do BR (%)

São Paulo .................... 272 779 76,79 354 255 71,68 Paraná ......................... 365 0,10 733 0,15 Rio Grande do Sul ....... 34 339 9,67 60 215 12,18 Mato Grosso do Sul .. 1 521 0,43 3 347 0,68 Mato Grosso ................ 23 675 6,66 29 690 6,01 Goiás ........................... 0 0,00 132 0,03 Brasil ........................... 355 224 100,00 494 202 100,00

FONTE DOS DADOS BRUTOS: PORTAL do exportador. Alice Web. NOTA: Os códigos da NCM para carne bovina industrializada são 1601.00.00 e 1602.50.00.

Carne suína

A produção e a exportação de carne suína ébastante concentrada no sul do País. Tanto é que, em2000, 95% das exportações brasileiras dessa carne seoriginaram dos Estados do Paraná, de Santa Catarina edo Rio Grande do Sul. Nesse grupo, Santa Catarina é oestado que mais exporta carne suína — em 2000, maisde 50% das vendas brasileiras de carne suína nomercado internacional saíram de lá. O Rio Grande do Sulé o segundo maior exportador dessa carne — com maisde 30% das vendas em 2000. No período 2000-04, tantoSanta Catarina como o Rio Grande do Sul diminuíram

sua participação nas exportações nacionais de carnesuína, mas mantiveram, com folga, o primeiro e o segundolugar nas vendas do País (Tabela 5).

Deve ser ressaltado que foram da carne suína asmaiores taxas de crescimento das vendas brasileirasentre 2000 e 2004. As exportações do Brasil desse tipode carne cresceram mais de 350% nesse início dedécada. Esse crescimento decorreu de estratégias demarketing implementadas por empresários do setor eapoiadas pelo Governo Federal, que consistiam no enviode missões de empresários aos principais paísesimportadores, com o objetivo de firmar contratos deexportação.

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Tabela 5

Valor e participação percentual da exportação de carne suína de estados selecionados e do Brasil — 2000-04

2000 2001 2002 ESTADOS

E PAÍS Valor (US$ mil)

Participação no Total

do BR (%)

Valor (US$ mil)

Participação no Total

do BR (%)

Valor (US$ mil)

Participação no Total

do BR (%)

Rio Grande do Sul .... 50 526 31,04 66 717 19,26 80 622 17,18 Santa Catarina .......... 87 233 53,60 218 223 63,00 246 967 52,61 Paraná ....................... 17 068 10,49 36 240 10,46 58 765 12,52 Brasil ......................... 162 758 100,00 346 401 100,00 469 409 100,00

2003 2004 ESTADOS

E PAÍS Valor (US$ mil)

Participação no Total

do BR (%)

Valor (US$ mil)

Participação no Total

do BR (%) Rio Grande do Sul .... 124 376 23,62 192 635 25,88 Santa Catarina .......... 186 408 35,40 324 715 43,63 Paraná ....................... 90 560 17,20 101 466 13,63 Brasil ......................... 526 576 100,00 744 278 100,00

FONTE DOS DADOS BRUTOS: PORTAL do exportador. Alice Web. NOTA: Os códigos da NCM para carne suína são 0203.11.00 e 0203.29.00.

Carne de frango

Como já foi dito, as exportações brasileiras de carnede frango ocupam o primeiro lugar no comércio mundial,superando países como a França, que, durante muitotempo, deteve essa condição. As dificuldades interpostaspelos diferentes países importadores, como barreirastarifárias e/ou sanitárias, estas últimas extremamentesignificativas quando se trata de um produto como carne,tornam bastante importante essa conquista do setorprodutor e exportador brasileiro de frango. Assim, tendoem vista as dificuldades para abrir novos mercados e,especialmente, o atual volume das exportações, era dese esperar que as taxas de crescimento das exportaçõesarrefecessem. No entanto, isso não tem ocorrido, sendomantido o dinamismo do setor que, com relação àsexportações de frango in natura, cresceu mais de 200%entre 2000 e 2004. Por sua vez, com relação às vendasde carne de frango industrializada, com um valorsignificativamente maior por tonelada, o crescimento de2002 a 2004 foi de quase 340%.

O Rio Grande do Sul era, em 2000, o terceiro maiorexportador de carne de frango in natura, atrás de Santa

Catarina e do Paraná. Em 2004, o estado gaúcho manteveessa colocação, mas com um diferencial: o valoralcançado pelas exportações gaúchas aproximou-se dosobtidos por Santa Catarina e pelo Paraná. Essemovimento reflete um aumento da participação dasexportações do Rio Grande do Sul no total exportadopelo Brasil (Tabela 6).

O que poderia parecer vantagem para o Rio Grandedo Sul não é tanto assim quando se examinam asexportações de carne de frango industrializada, cujo valorda tonelada é mais do que o dobro do obtido com a vendade carne de frango in natura. A perda de participaçãonas vendas de frango in natura apresentadas por SantaCatarina foram compensadas por um aumento departicipação daquele estado nas exportações de carnede frango industrializada. Mesmo considerando que ogrosso das exportações de frango do Brasil — 96% — éin natura, o aumento da participação do estadocatarinense nas exportações de carne de frangoindustrializada pode indicar uma especialização do estadovizinho na colocação, no mercado internacional, deprodutos de maior valor (Tabela 7).

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Indic. Econ. FEE, Porto Alegre, v. 33, n. 3, p. 15-22, dez. 2005

Exportações de carne: um segmento dinâmico do agronegócio

Tabela 6

Valor e participação percentual da exportação de carne de frango in natura de estados selecionados e do Brasil — 2000-04

2000 2001 2002

ESTADOS E PAÍS Valor

(US$ mil)

Participação no Total

do BR (%)

Valor (US$ mil)

Participação no Total

do BR (%)

Valor (US$ mil)

Participação no Total

do BR (%)

Rio Grande do Sul ..... 185 406 23,01 331 736 25,68 340 433 25,50

Santa Catarina .......... 356 257 44,21 539 181 41,74 508 075 38,06 Paraná ....................... 219 699 27,27 321 267 24,87 331 303 24,82 São Paulo .................. 16 157 2,01 22 304 1,73 37 092 2,78 Brasil ......................... 805 737 100,00 1 291 658 100,00 1 335 051 100,00

2003 2004 ESTADOS

E PAÍS Valor (US$ mil)

Participação no Total

do BR (%)

Valor (US$ mil)

Participação no Total

do BR (%)

Rio Grande do Sul ..... 472 951 27,66 626 622 25,13 Santa Catarina .......... 559 040 32,70 778 921 31,23

Paraná ....................... 445 426 26,05 679 134 27,23 São Paulo ................. 74 011 4,33 155 275 6,23 Brasil ......................... 1 709 743 100,00 2 493 929 100,00

FONTE DOS DADOS BRUTOS: PORTAL do exportador. Alice Web. NOTA: Os códigos da NCM para carne de frango in natura são 0207.11.00 e 0207.14.00.

Tabela 7

Valor e participação percentual da exportação de carne de frango industrializada de estados selecionados e do Brasil — 2000-04

2000 2001 2002 ESTADOS

E PAÍS Valor (US$ mil)

Participação no Total

do BR (%)

Valor (US$ mil)

Participação no Total

do BR (%)

Valor (US$ mil)

Participação no Total

do BR (%)

Rio Grande do Sul 6 174 26,83 14 312 33,96 17 038 29,49

Santa Catarina ..... 10 102 43,91 18 490 43,87 28 438 49,23

Paraná ................... 3 774 16,40 5 315 12,61 4 809 8,33

São Paulo ............. 503 2,19 631 1,50 1 575 2,73 Brasil ..................... 23 009 100,00 42 142 100,00 57 765 100,00

(continua)

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Indic. Econ. FEE, Porto Alegre, v. 33, n. 3, p. 15-22, dez. 2005

Vivian Fürstenau

Conclusões

O desempenho do segmento produtor de carnes noPaís, entre 2000 e 2004, pode ser consideradoexcepcional, no que se refere ao crescimento das vendasdos seus produtos no mercado internacional. No caso daexportação de carne de frango in natura, as conquistasde fatias do mercado externo têm sido constantes já háalgum tempo, mas nem por isso têm apresentado perdade dinamismo. Mais recentemente, houve um incrementonas exportações de carnes bovina e suína, com especialdestaque para as taxas de crescimento obtidas pelasvendas de carne suína.

O Estado do Rio Grande do Sul tem acompanhadoo movimento das vendas nacionais, mas não com omesmo dinamismo. Uma razão para esse desempenhoaquém do nacional foi o reaparecimento da febre aftosano Estado, em 2001, que inviabilizou, naquele ano, asvendas externas de carne bovina in natura e de carnesuína. Um episódio como esse tornou bastante difícil asituação das vendas do Estado, mas, já em 2002, houveuma retomada das exportações estaduais de carnesbovina e suína. Por sua vez, com relação à carne defrango in natura, o Estado tem aumentado o volumeexportado a taxas superiores às dos demais estadosexportadores.

Referências

BRASIL. Ministério da Agricultura, Pecuária e Abaste-cimento. Balança comercial. Notas à imprensa. Dispo-nível em: http://www.agricultura.gov.br/pls/portal/docs/Acesso em: ago. 2005.

FÜRSTENAU, Vivian. Uma análise comparada dodesempenho do setor exportador de carnes no Brasil eno Rio Grande do Sul — 2001. Indicadores EconômicosFEE, Porto Alegre: FEE, v. 29, n. 4, p. 161-174, 2002.

INDICADORES ECONÔMICOS FEE. Porto Alegre: FEE,v. 29, n. 4, 2002.

INDICADORES ECONÔMICOS FEE. Porto Alegre: FEE,v. 30, n. 4, 2003.

Tabela 7

Valor e participação percentual da exportação de carne de frango industrializada de estados selecionados e do Brasil — 2000-04

2003 2004 ESTADOS

E PAÍS Valor (US$ mil)

Participação no Total

do BR (%) Valor

(US$ mil)

Participação no Total

do BR (%)

Rio Grande do Sul 22 409 25,12 22 096 21,89

Santa Catarina ..... 50 393 56,49 65 689 65,07

Paraná ................... 4 867 5,46 4 459 4,42

São Paulo ............. 1 766 1,98 2 437 2,41

Brasil ..................... 89 209 100,00 100 954 100,00

FONTE DOS DADOS BRUTOS: PORTAL do exportador. Alice Web. NOTA: O código da NCM para carne de frango industrializada é 1602.32.00.

O emprego industrial no RS: um breve balanço no Governo Lula

Indic. Econ. FEE, Porto Alegre, v. 33, n. 3, p. 23-32, dez. 2005

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Introdução

O presente artigo propõe-se a realizar um balançogeral do comportamento do segmento formal do mercadode trabalho industrial ao longo do Governo Lula,contrastando o Rio Grande do Sul com o Brasil. Paratanto, utilizaram-se como fontes de dados as bases daRelação Anual de Informações Sociais (RAIS) e doCadastro Geral de Empregados e Desempregados(Caged), ambos do Ministério do Trabalho e Emprego(MTE). A RAIS fornece o estoque de empregados comvínculo formal em 31 de dezembro de cada ano, e oCaged informa a flutuação mensal do emprego comcarteira assinada. A combinação dessas duas basestornou possível que, mediante recomposição do estoquea partir do último dado disponível na RAIS (2003), seestendesse a análise até agosto de 2005, último dadodisponível no Caged. Rigorosamente, é preciso terpresente que os níveis de emprego pós 2003 são umaaproximação da realidade. Para efeitos decompatibilização entre as duas bases, foram extraídosda RAIS todos os trabalhadores não regidos pelaConsolidação das Leis do Trabalho (CLT), já que não sãocomputados no Caged.

O movimento do emprego formal foi examinado àluz do desempenho da atividade produtiva, utilizando-se, para tanto, a Pesquisa Industrial Mensal-ProduçãoFísica (PIM-PF) (2005) e a Pesquisa Industrial Mensalde Emprego e Salário (PIMES) do IBGE (2005).

No primeiro item após esta Introdução, encontra--se uma abordagem da evolução da totalidade do mercado

Indústria

O emprego industrial no RS: um brevebalanço no Governo Lula

Maria Isabel H. da Jornada* Socióloga da FEE.

Artigo recebido em 18 out. 2005.

de trabalho formal; no segundo, o foco é o comportamentodo emprego formal na indústria, com uma parte finaldedicada ao exame dos ganhos de produtividade daindústria no RS e no Brasil.

1 - Movimento geral

Mesmo que a mudança do regime cambial em 1999tenha possibilitado uma retomada de fôlego para omercado de trabalho, notadamente para o segmentoformal, esta foi a instância que mais demorou a reagir naatual recuperação da economia brasileira. No primeiroano do Governo Lula, o nível do emprego formal no Brasilcresceu 2,9%, passando de 21.953.360 em 2002 para22.596.269 em 2003, uma geração líquida de 642.909postos de trabalho. Um bom resultado, se for consideradoo baixo desempenho da atividade econômica, expressono pífio crescimento do PIB brasileiro em 2003 (0,5%).No ano seguinte, o cenário econômico aqueceu-se,mostrando sinais de recuperação, com o crescimento doPIB da ordem de 5,3%. Neste último ano, o contingentede ocupados com carteira de trabalho assinadaexperimentou um forte impulso com a contratação de1.523.276 indivíduos (6,7%), elevando o nível do empregoformal para 24.119.545 ao final de 2004. Até agosto de2005, o mercado de trabalho manteve o dinamismograças, principalmente, às taxas recordes dos quatroprimeiros meses, já que, a partir de maio, os sinais dedesaceleração eram visíveis. A alta continuada das taxasde juros e o real valorizado, especialmente, começarama travar as novas oportunidades de trabalho. A taxa devariação do emprego, considerando-se agosto de 2005,situou-se em 5,1%, o que significou a incorporação de1.219.236 trabalhadores. Houve, assim, um crescimentodo emprego formal no Brasil de 15,4% do início doGoverno Lula até agosto de 2005 (Tabela 1).

*A autora agradece à colega Sheila Sara W. Sternberg apermanente e qualificada interlocução, o que já tem rendido tantas(e exitosas) parcerias de pesquisa. Agradece, igualmente, àestagiária de Economia Cristiane Fumegalli o apoio no tratamentoestatístico.

Maria Isabel H. de Jornada

Indic. Econ. FEE, Porto Alegre, v. 33, n. 3, p. 23-32, dez. 2005

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O Rio Grande do Sul acompanhou muito de perto odesempenho do mercado de trabalho formal brasileironos dois primeiros anos do Governo Lula, afastando-seno terceiro ano. Em 2003, o incremento do emprego formalno Estado situou-se um pouco abaixo do que foi verificadonacionalmente, 2,2%, para um crescimento do PIBestadual de 5,4%, muito acima do nacional. O estoquede trabalhadores com vínculos expandiu-se de 1.646.396em 2002 para 1.682.526 em 2003. No ano seguinte, oRS praticamente empatou com o Brasil, com uma taxade variação do emprego de 6,9% (um acréscimo de116.822 trabalhadores), momento em que a variação doPIB gaúcho recuou para 3,6%, colocando-se atrás dobrasileiro. Em 2005, até agosto, a perda de dinamismodo mercado de trabalho no RS é evidente. A combinaçãode fatores climáticos, que provocaram a quebra da safra,com o câmbio valorizado, que prejudicou as exportações,resultou na baixa taxa de crescimento do emprego comcarteira; 0,8% até o mês de agosto. O nível de empregoelevou-se, assim, para 1.813.352, um acréscimo deapenas 14.004 postos. No Governo Lula, até o momento,o mercado de trabalho no RS experimentou umincremento de 10,1%, muito abaixo do alcançado noBrasil, em decorrência do seu fraco desempenho no anoem curso (Tabela 1).

Na estrutura setorial do emprego formal no Brasil,1

o setor serviços liderou com 38,8% dos empregos comvínculos legais, secundado pela indústria de transforma-ção (23,9%) e pelo comércio (22,5%). A agricultura foiresponsável por 5,8% dos empregos formais; a constru-ção civil, por 4,7%; e a administração pública2, por 2,4%.Os serviços industriais de utilidade pública (SIUP) e aindústria extrativa mineral tiveram pouco significado, 1,2%e 0,5% respectivamente. No Rio Grande do Sul, aindústria e o setor serviços apresentaram, para todos osefeitos, a mesma importância relativa, respondendo por33,8% e 33,6% do total do emprego respectivamente.3

O comércio, o terceiro em importância, deteve 22% dosempregados; a construção civil, 4,1%; a agricultura, 3,9%;a administração pública, 1,5% do total dos celetistas; oSIUP, 1,0%; e a indústria extrativa mineral, 0,2%.

A evolução setorial do emprego formal no Brasilmostrou que, no primeiro ano do Governo Lula, com exce-

ção da construção civil (-5,1%) e da administração pública(-0,2%), todos os setores exibiram crescimento, comdestaque para a agricultura (6,4%)4 e o comércio (6,0%).A indústria de transformação alcançou uma taxa de incre-mento próxima da média do agregado, 2,8%, um poucoacima dos 2,6% do SIUP, enquanto, no setor serviços, avariação foi de 2,1%. No ano seguinte, o único setor quenão contratou empregados foi a administração pública(-0,1%). A indústria de transformação mostrou o melhordesempenho relativo, com a maior variação do empregoem 2004 (9,5%), bem acima da média do agregado, incor-porando 504.610 trabalhadores. O comércio ampliou oseu contingente de empregados em 7,9%, seguindo-sea agricultura (6,6%), o setor serviços (5,3%) e a constru-ção civil (4,9%). Embora o ano de 2005 ainda esteja emcurso, já se pode falar em desaceleração no mercado detrabalho, notadamente na indústria de transformação eno comércio, que apresentaram uma das menores taxasde crescimento do emprego entre os setores, ambos com3,7%.O SIUP exibiu o menor incremento setorial (3,3%),mas foi de escasso significado no cômputo geral doemprego, enquanto a agricultura exibiu o maior (15,6%).A construção civil teve a segunda maior variação (8,4%),seguida, a uma certa distância, pela administração pública(5,7%) e pelo setor serviços (4,8%) — Tabela 1.

No Rio Grande do Sul, diferentemente do planonacional, todos os setores de atividade experimentaramelevação no nível de emprego, no primeiro ano do novoGoverno. O SIUP e a administração pública despontaramcom as maiores variações de 2002 a 2003, 19,7% e 9,5%respectivamente. Seguiram-se a agricultura (4,0%), ocomércio (3,7%), a indústria de transformação (2,3%), aconstrução civil (1,5%), a indústria extrativa mineral(1,2%) e o setor serviços (0,2%). Todavia os responsáveispela maior parte dos postos preenchidos no ano foram ocomércio (36,1%) e a indústria de transformação (35,3%).No ano de 2004, à semelhança do que ocorreu no Brasil,a indústria de transformação demonstrou o maior fôlego,com um incremento de 9,2% no contingente de empre-gados, próximo ao alcançado pela construção civil (8,0%)e pelo comércio (7,8%), todos eles acima da média doagregado. O emprego no setor serviços cresceu 5,0%,praticamente o mesmo da indústria extrativa mineral; naagricultura, elevou-se em 3,5%; e, no SIUP, 3,1%. O em-prego celetista na administração pública foi o único caso

1 Refere-se à última informação disponível — agosto de 2005.2 Apenas os servidores públicos sob o regime da CLT, porque oCaged só contempla celetistas.

3 Essa situação de equilíbrio provocou uma alternância na liderançaentre os dois setores, até mesmo de um ano para o outro. Em2004, predominava a indústria de transformação, com 34,47%dos empregados, secundada pelo setor serviços, com 32,70%.

4 Ressalva-se que as bases de dados do MTE não são adequadaspara aferir o emprego nas atividades agrícolas, porque sãorestritas ao emprego com vínculos legais; logo, o que essasestatísticas devem estar captando é o movimento de formalizaçãode relações de trabalho preexistentes.

O emprego industrial no RS: um breve balanço no Governo Lula

Indic. Econ. FEE, Porto Alegre, v. 33, n. 3, p. 23-32, dez. 2005

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de recuo (-3,7%). A maior parte dos postos acrescidosem 2004 localizou-se na indústria de transformação(44,7%), seguida pelo comércio e pelo setor serviços,com praticamente a mesma participação, ao redor de24,4%. Em 2005, mudou o panorama do mercado de traba-lho formal, a desaceleração é marcadamente visível naagricultura (-4,8%), na construção civil (-2,1%) e na indús-tria de transformação (-1,2%), além de na indústria extrati-va mineral (-2,8%), que é pouco representativa no cômpu-to geral do emprego no RS. O setor serviços (3,4%) e ocomércio (1,2%), embora tenham crescido, perderam in-tensidade. O SIUP, com 5,5%, obteve a maior taxa positi-va, seguida pela administração pública, com 4,4%. A in-dústria de transformação liderou o processo de demis-sões, sendo responsável pela eliminação de 7.685 vagas(Tabela 1).

O acompanhamento da trajetória do mercado detrabalho formal no período recente despertou a atenção

para um fenômeno já observável no final dos anos 90,no plano nacional, mas só visível, no Estado, em 2004:a tendência de crescimento do emprego em ritmo maiordo que o do PIB. Isso se deve, provavelmente, a umamaior formalização das relações de trabalho, associada,em larga medida, ao crescimento do agronegócio, àinteriorização da indústria — já que a indústria é o locusdo emprego regulamentado — e à maior fiscalização doMinistério do Trabalho, especialmente no comércio e nosetor serviços. Possivelmente, parcela do que se captacom essas estatísticas de emprego seja de pessoas quetransitaram da informalidade para uma inserção regula-mentada no mercado de trabalho.

Após esse breve panorama do desempenho geraldo mercado de trabalho formal sob a égide do GovernoLula, focaliza-se a indústria, decompondo-a na sua for-mação mais abrangente: os subsetores de atividade.

Tabela 1 Evolução do emprego formal, por setores de atividade, no Brasil e no RS — 2002/05

2002 2003 2004 2005 (1) SETORES

Brasil RS Brasil RS Brasil RS Brasil RS

TOTAL ............................. 21 953 360 1 646 396 22 596 269 1 682 526 24 119 545 1 799 348 25 338 781 1 813 352

Extrativa mineral .............. 121 000 4 406 122 154 4 459 132 491 4 693 140 807 4 561

Indústria de transformação 5 185 738 555 194 5 331 762 567 945 5 836 372 620 175 6 054 703 612 490

Serviços industriais de uti- lidade pública ................... 286 209 14 278 293 799 17 093 298 365 17 631 308 345 18 593

Construção civil ................ 1 095 676 68 752 1 039 923 69 792 1 090 686 75 388 1 181 892 73 793

Comércio .......................... 4 817 031 351 830 5 105 954 364 880 5 509 894 393 440 5 715 255 398 124

Serviços ............................ 8 739 511 558 904 8 922 195 560 263 9 392 318 588 385 9 845 848 608 535

Administração pública ...... 580 829 24 447 579 780 26 781 579 398 25 800 612 459 26 939

Agricultura, silvicultura, etc. ................................... 1 127 366 68 585 1 199 781 71 313 1 279 055 73 835 1 478 455 70 317

Outros/ignorado .............. - - 921 - 966 1 1 017 -

FONTE: RAIS: Relação Anual de Informações Sociais. Brasília: Ministério do Trabalho e Emprego, 2002-2003. FONTE: CADASTRO GERAL DE EMPREGADOS E DESEMPREGADOS — CAGED. Brasília: Ministério do Trabalho e Em- prego, 2004-2005. (1) Até agosto.

Maria Isabel H. de Jornada

Indic. Econ. FEE, Porto Alegre, v. 33, n. 3, p. 23-32, dez. 2005

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maior parte dos estados, incluindo-se o RS. A produçãoindustrial cresceu a uma taxa de 8,3% no Brasil e de6,4% no RS, em 2004, frente a igual período do ano ante-rior, o que ampliou a oferta de postos de trabalho naindústria, expressa no notável crescimento de 9,5% nocontingente de empregados no Brasil, praticamente omesmo do RS: 9,2%. O desafio que se coloca é a susten-tabilidade desse crescimento. A variação da produçãofísica no Brasil, de janeiro a julho de 2005, face a igualperíodo do ano anterior, foi de 4,31%, o que ainda nãorecomenda prognósticos para o ano.7 O RS, abatido pelaquebra de safra e pela política cambial, acusou um des-censo na atividade industrial, com um recuo de 3,99%na produção física. O emprego na indústria brasileira evo-luiu, com uma taxa de 3,7% de janeiro a agosto de 2005,enquanto, na gaúcha, o emprego se retraiu (-1,2%) —Tabela 2.

O descompasso entre a indústria brasileira e a doRS encontra sua explicação nas diferenças estruturaisentre elas. No Brasil, os subsetores que mais pesaramna estrutura do emprego industrial foram: a indústria deprodutos alimentícios, bebidas e álcool etílico (22,7%)8,a têxtil, do vestuário e artefatos de tecidos (13,6%), aquímica, de produtos farmacêuticos, veterinários, perfu-maria (10,4%), a metalúrgica (9,8%), a da madeira e domobiliário (7,1%), a do material de transporte (6,5%), amecânica (5,8%), a do papel, papelão, editorial e gráfica(5,4%), a indústria de calçados (5,1%) e a de produtosminerais não-metálicos (5,0%). Os outros segmentos nãoatingiram 5,0% de participação cada um: a indústria daborracha, fumo, couros, peles, similares, indústrias diver-sas obteve 4,7%; e a de material elétrico e de comuni-cações, 3,6%.

Já no Rio Grande do Sul, verificou-se o predomínio,na estrutura do emprego industrial, de um segmento quetem no mercado externo o seu fator dinamizador, aindústria de calçados, responsável por 21,4% do total deempregos. Segue-se, em ordem de relevância, a indústriade produtos alimentícios, bebidas e álcool etílico (17,6%),a metalúrgica (9,3%), a da borracha, fumo, etc. (8,9%), amecânica (7,9%), a da madeira e do mobiliário (7,9%), aquímica, de produtos farmacêuticos, etc. (7,6%), a domaterial de transporte (5,4%), a têxtil, do vestuário eartefatos de tecidos (4,6%), a do papel, papelão, etc.

5 Cabe observar que, nesse momento, o emprego na indústria doRS estava crescendo acima do na indústria do País.

6 Refere-se ao emprego na indústria de transformação.

7 Todavia recente estudo do Instituto de Estudos para oDesenvolvimento Industrial (IEDI) assinala que as taxas decrescimento da produção na comparação mês a mês, positivasa partir de março, sugerem que a indústria recuperou o ritmo decrescimento iniciado em 2004 (INSTITUTO..., 2005).

8 Participações referentes a agosto de 2005.

2 - Emprego industrial

A indústria brasileira vem enfrentando grandestransformações dos anos 90 até os dias de hoje. Aliberalização comercial sem precedentes patrocinada peloGoverno Collor no início da década de 90 resultou emforte aumento da competição, numa indústria acostumadaa uma série de barreiras protecionistas durante décadas.Pressionada pela abertura econômica e pelo acirramentoda competição provocada pela entrada maciça, no merca-do doméstico, de produtos fabricados no exterior, aindústria brasileira viu-se forçada a empreender um inten-so processo de reestruturação na direção de um novopatamar tecnológico e organizacional. O resultado foi umsubstancial crescimento da produtividade sem umapolítica de crescimento econômico sustentado, o quelevou à queima de milhares de postos de trabalho naindústria, principalmente nos primeiros anos da décadade 90. As medidas de política econômica implementadasnos anos 90, especialmente o Programa de EstabilizaçãoEconômica — Plano Real I (1994 a 1999), Plano Real II(a partir de 1999) —, aprofundaram as dificuldades estru-turais do mercado de trabalho brasileiro, impulsionandoo processo de precarização, expresso no crescimentodo número de empregados sem carteira de trabalho as-sinada, dos trabalhadores autônomos, dos ocupados emtempo parcial e de tantos outros tipos de ocupação àmargem de qualquer proteção legal.

A adoção do câmbio flutuante e do regime de metasde inflação em 1999, configurando o que se convencionouchamar de Plano Real II, alterou o ambiente socioeconô-mico nacional, repercutindo favoravelmente sobre oemprego industrial, notadamente no RS, que havia sidoespecialmente prejudicado com a valorização cambialvigente durante a fase do Plano Real I. O PresidenteLula assumiu quando o emprego formal na indústria esta-va em uma trajetória ascendente,5 iniciada em 1999, quefoi interrompida em 2003, no final do primeiro ano do seumandato. O pífio desempenho da atividade industrialnesse primeiro ano — variação da produção física de0,04% para a indústria geral no Brasil e de -0,35% noRS — fez recuar a taxa de crescimento do empregoindustrial6, no Brasil, de 4,7% em 2002 para 2,8% em2003 e de 3,2% para 2,3%, respectivamente, no RS. Oano de 2004 marcou uma retomada do crescimentoindustrial acelerado na indústria brasileira, bem como na

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(4,3%), a do material elétrico e de comunicações (2,6%)e a de produtos minerais não-metálicos (2,5%).

O exame da evolução do emprego por subsetoresde atividade evidencia os contrastes no interior da própriaindústria brasileira e da gaúcha, bem como põe em relevoos contrastes entre uma e outra (Tabela 2).

Observando-se o que ocorre no plano nacional, tem--se que o subsetor que mais cresceu em 2002 e 2003 éo de maior importância relativa na estrutura do empregoindustrial no País, a indústria de produtos alimentícios,bebidas e álcool etílico (6,7%), seguindo-se a do materialde transporte (5,0%), a de calçados (3,8%), a metalúrgica(3,5%), a da borracha, fumo, couros, peles, similares,indústrias diversas (3,4%), a mecânica (3,1%) e a indús-tria química, de produtos farmacêuticos, veterinários,perfumaria (3,0%). Todos os outros segmentos ficaramabaixo da média do agregado, sendo que três experimen-tam retração: produtos minerais não-metálicos (-1,3%),madeira e mobiliário (-0,7%) e têxtil, do vestuário eartefatos de tecidos (-0,4). Em 2004, ano em que todosos subsetores alcançaram uma recuperação notável noemprego formal, três sobressaíram-se com as maiorestaxas de crescimento — material de transporte (14,3%),calçados (13,6%) e material elétrico e de comunicações(13,2%) —, seguidos por mecânica (10,7%), metalúrgica(10,0%), produtos alimentícios, bebidas e álcool etílico(9,7%) e por borracha, fumo, etc. (9,5%). Nota-se que osegundo e o terceiro subsetores em importância nacomposição do emprego industrial alcançaram um incre-mento inferior ao da média do agregado — a indústriatêxtil, do vestuário e artefatos de tecidos (9,0%) e aquímica, de produtos farmacêuticos, etc. (8,3%). Abaixodesses, ficaram a da madeira e do mobiliário (7,3%), ade produtos minerais não-metálicos (5,4%) e a do papel,papelão, editorial e gráfica (4,9%). Embora não se prestema comparações, as taxas de janeiro a agosto de 2005parecem ser mais modestas, com dois segmentos produ-tivos em queda: madeira e mobiliário (-2,1%) e calçados(-0,8%). A indústria de produtos alimentícios puxou a gera-ção de postos, com um incremento de 6,9%, seguidapela do material elétrico e de comunicações (5,5%) e pe-la da borracha, fumo, etc. (5,3%). Acima e em torno damédia do total da indústria, situaram-se, ainda, materialde transporte (4,9%), têxtil, vestuário e artefatos de teci-dos (4,2%), química, produtos farmacêuticos, etc. (3,7%)e produtos minerais não-metálicos (3,6%).

No RS, ao contrário do que foi registrado no Brasil,em 2003, a maior empregadora, a indústria de calçados,registrou queda de 0,9%. Os segmentos que sofreram omaior impulso nesse ano foram a indústria mecânica(8,8%), a do material de transporte (6,4%) e a de produtos

alimentícios, bebidas e álcool etílico (5,8%), esta última,a segunda expressão em termos de emprego industrial.Acima da média da indústria, situaram-se, ainda, a quími-ca, a de produtos farmacêuticos, etc. (2,9%), a da borra-cha, fumo, etc. (2,8%), a metalúrgica (2,4%) e a têxtil,do vestuário e artefatos de tecido (1,6%). Somando-seao segmento de calçados no seu comportamento decli-nante, tem-se material elétrico e de comunicações(-3,3%), papel, papelão, etc. (-1,5%) e madeira e mobiliário(-0,9%). A arrancada da economia em 2004 beneficioutodos os subsetores da indústria gaúcha, naturalmenteuns muito mais do que outros. O emprego recebeu umforte impulso no segmento de material elétrico e decomunicações (18,0%) e no de material de transporte(17,8%), que alcançaram as maiores taxas. Acima damédia do agregado, ficaram, também, a metalúrgica(10,4%), a de calçados (9,9%) e a mecânica (9,3%). Aindústria de produtos alimentícios, bebidas e álcool etílicoe a indústria química, de produtos farmacêuticos, etc.cresceram com intensidade um pouco menor, 8,8% e8,1% respectivamente. Seguiram-se a da borracha, fumo,etc. (7,4%), a de madeira e mobiliário (7,3%) e a têxtil,do vestuário e artefatos de tecidos (7,2%). As menorestaxas encontradas foram em papel, papelão, etc. (4,5%)e em produtos minerais não-metálicos (3,0%). Dada aimportância relativa da indústria de calçados, quase umquarto (24,5%) das vagas acrescidas no ano foram delaoriginárias. No ano em curso de 2005, o emprego formalno segmento dos calçados despencou (-7,7%), elimi-nando 10.993 postos, o que equivale a 75,6% das vagassuprimidas pelo total da indústria. A trajetória de quedafoi acompanhada pela indústria mecânica (-2,9%), pelade madeira e mobiliário (-2,5%) e pela metalúrgica(-1,5%). A indústria de produtos alimentícios, bebidas eálcool etílico, a segunda em importância no ranking doemprego industrial, experimentou o menor incremento(0,5%), enquanto o maior ficou por conta do segmentoborracha, fumo, etc. (6,8%). A indústria química, de produ-tos farmacêuticos, etc., a do papel, papelão, etc., a têxtil,do vestuário, etc. e a de produtos minerais não-metálicosalcançaram 2,5%, 2,1%, 1,5% e 0,7% respectivamente.

O movimento do emprego industrial está associadoao movimento de uma outra variável que é a produtivida-de, que, por sua vez, é resultado de estratégias empresa-riais para assegurar capacidade competitiva. As varia-ções anuais da produtividade, ao longo do período janeirode 2003 a julho de 2005, colocaram em relevo outradistinção importante entre a indústria brasileira e a gaúcha.

No primeiro ano do Governo Lula, o ganho deprodutividade foi maior na indústria do RS do que na doBrasil. A indústria geral teve um ganho de produtividade

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No tocante à indústria gaúcha, pelas informaçõessetoriais de que se dispõe, o ano de 2003 marcou umacréscimo de 1,16% para a indústria de transformação,sendo que apenas dois segmentos, dos em que foipossível realizar a mensuração da produtividade,alcançaram taxas positivas, produtos de metal (7,61%)e calçados e artigos de couro (1,23%); fumo e borrachae plástico tiveram as maiores taxas negativas, em tornode -10,50%. Já em 2004, a indústria de transformaçãodo RS alcançou um aumento de produtividade maior queo do Brasil (7,11%), registrando-se o notável crescimentoverificado no segmento de borracha e plástico (22,69%),seguido à distância por calçados e artigos de couro(8,41%); dois segmentos exibiram queda na produtividade,o fumo (-16,38%) e o refino de petróleo e álcool (-12,51%).Em 2005, a evolução da produtividade, de janeiro a julho,acusou um crescimento de 1,86% para a indústria detransformação (inferior à nacional), sobressaindo-se odesempenho altamente positivo de calçados e artigosde couro, com um acréscimo de 29,71%; todos os outrossegmentos com dados disponíveis tiveram taxasnegativas, a mais alta delas foi a da metalúrgica básica(-11,32%). O desempenho da produtividade no segmentocalçados e artigos de couro ocorreu em razão de umrecuo acentuado nas horas pagas (-20,06%) e de umaumento da produção (3,69%) frente a igual período doano anterior.

Assim sendo, se ainda é prematuro falar em curvade desaceleração no mercado de trabalho formal noBrasil, evidencia-se, no RS, um nítido cenário de perdade dinamismo no emprego formal, sobretudo o industrial,no último ano. A política de juros elevada, que inibe oinvestimento produtivo, e a apreciação cambial, que oneraas exportações, foram particularmente danosas para aeconomia gaúcha. O RS contou ainda com prejuízosnotáveis por conta da quebra de safra, em virtude daestiagem que atingiu o Estado nos primeiros meses de2005.

As perspectivas para o mercado de trabalhodependem em larga medida de uma política econômicacomprometida com o crescimento sustentado, condiçãonecessária — embora não suficiente — para a geraçãode postos de trabalho de qualidade, como se costumareferenciar o emprego com vínculos formais, o denomi-nado emprego protegido. O que está em questão na pre-sente conjuntura é o fôlego da economia para assegurarum ritmo de expansão de postos de trabalho compatívelcom a pressão exercida sobre o mercado de trabalhopelos indivíduos que integram a População Economi-camente Ativa.

9 Devido à diferenciação entre a classificação setorial das duasfontes — PIMES (horas trabalhadas) e PIM-PF (produção físi-ca) —, foram usadas as aberturas que coincidem entre as duas.No entanto, a PIM-PF não disponibiliza informações para váriossetores, quando se trata do âmbito estadual.

10 Nesse período, registra-se o salto da indústria extrativa brasileira,com uma elevação na produtividade de 12,33%.

de 1,14% no Estado e de 0,90% no País, frente a igualperíodo do ano anterior, decorrência de queda nas horaspagas, associada a um ínfimo acréscimo na produçãofísica para o último e de queda nas horas pagas maiordo que na produção física para o primeiro. No anoseguinte, os dois espaços tiveram um considerável saltona produtividade, maior para o RS, com 7,12%, do quepara o Brasil, com 6,09%. No Estado, verificou-se a combi-nação de aumento da produção física com um pequenodeclínio nas horas pagas, enquanto, no País, a produçãofísica e as horas pagas cresceram, só que a produçãocresceu bem mais. No período mais recente, a situaçãoinverteu-se: de janeiro a julho de 2005, o incremento naprodutividade foi maior no Brasil do que no RS. A indústriabrasileira exibiu um ganho de 2,63% contra 1,92% dagaúcha, para igual período do ano passado. No Brasil,isso ocorreu em razão de uma elevação da produçãofísica mais acentuada do que a das horas pagas, aocontrário do RS, em que o ganho de produtividade sedeveu a um recuo na produção menor do que o recuonas horas pagas (Tabelas 3 e 4).

Em termos setoriais,9 considerando-se a aberturadisponível, no primeiro ano o melhor desempenho, notocante à produtividade, no Brasil, foi o do segmento damadeira, com um ganho de 7,19% frente a igual períododo ano anterior; o pior foi o do segmento do refino depetróleo e álcool, com -12,49%. A indústria de transfor-mação como um todo alcançou um incremento de produ-tividade de 1,21%. Em 2004, a indústria de transformaçãoatingiu um ganho de produtividade que não deixa de sernotável, 6,36%, destacando-se a indústria de produtosde metal (14,23%), a têxtil (10,89%) e a do vestuário eacessórios (10,27%); no outro extremo, ficaram a metalur-gia básica (-6,26%), o refino de petróleo e álcool (-4,93%)e o fumo (-3,69%). De janeiro e julho de 2005,10 a indústriade transformação conseguiu um aumento de produtivida-de de 2,24%, com ênfase no segmento calçados e artigosde couro, com um acréscimo de 12,74%, seguido à dis-tância pelo segmento madeira (5,96%); o destaquenegativo foi o refino de petróleo e álcool (-11,89%) e ofumo (-4,72%), registrando-se, ainda, mais três segmen-tos com retração em relação a igual período do anoanterior.

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Tabela 2

Evolução do emprego formal, por subsetores da indústria de transformação, no Brasil e no RS — 2002/05

2002 2003 SUBSETORES

Brasil RS Brasil RS

TOTAL ......................................................................... 5 185 738 555 194 5 331 762 567 945

Indústria de produtos minerais não-metálicos ............. 281 195 14 403 277 572 14 745

Indústria metalúrgica ................................................... 509 982 51 040 527 666 52 117

Indústria mecânica ...................................................... 301 012 42 142 310 329 45 834

Indústria do material elétrico e de comunicações ....... 181 163 13 454 185 129 13 006

Indústria do material de transporte.............................. 314 772 26 158 330 377 27 846

Indústria da madeira e do mobiliário............................ 414 338 46 723 411 395 46 314

Indústria do papel, papelão, editorial e gráfica ........... 305 842 25 257 306 348 24 880

Indústria da borracha, fumo, couros, peles, similares, indústrias diversas ...................................................... 238 367 46 181 246 449 47 467

Indústria química, de produtos farmacêuticos, veteri- nários, perfumaria ....................................................... 545 696 40 802 561 997 42 000

Indústria têxtil, do vestuário e artefatos de tecidos ...... 730 674 25 349 728 045 25 765

Indústria de calçados ................................................... 261 864 130 296 271 878 129 177

Indústria de produtos alimentícios, bebidas e álcool etílico ........................................................................... 1 100 833 93 389 1 174 577 98 794

2004 2005 (1) SUBSETORES

Brasil RS Brasil RS

TOTAL ......................................................................... 5 836 372 620 175 6 054 703 612 490

Indústria de produtos minerais não-metálicos ............. 292 456 15 181 302 892 15 287

Indústria metalúrgica ................................................... 580 392 57 565 595 496 56 715

Indústria mecânica ...................................................... 343 569 50 109 351 760 48 636

Indústria do material elétrico e de comunicações ....... 209 527 15 350 220 958 15 676

Indústria do material de transporte.............................. 377 722 32 806 396 231 33 176

Indústria da madeira e do mobiliário............................ 441 622 49 698 432 140 48 465

Indústria do papel, papelão, editorial e gráfica ........... 321 474 26 006 329 468 26 545

Indústria da borracha, fumo, couros, peles, similares, indústrias diversas ...................................................... 269 906 50 961 284 328 54 405

Indústria química, de produtos farmacêuticos, veteri-nários, perfumaria ....................................................... 608 427 45 412 631 161 46 542

Indústria têxtil, do vestuário e artefatos de tecidos ..... 793 670 27 612 826 830 28 034

Indústria de calçados .................................................. 308 960 141 989 306 367 130 996

Indústria de produtos alimentícios, bebidas e álcool etílico .......................................................................... 1 288 647 107 486 1 377 072 108 013

FONTE: RAIS: Relação Anual de Informações Sociais. Brasília: Ministério do Trabalho e Emprego, 2002-2003. FONTE: CADASTRO GERAL DE EMPREGADOS E DESEMPREGADOS — CAGED. Brasília: Ministério do Trabalho e Em- prego, 2004-2005. (1) Até agosto.

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Tabela 3 Indicadores acumulados de produção, horas pagas e produtividade na indústria do Brasil — 2003/05

(∆%)

JAN-DEZ/03 JAN-DEZ/04 JAN-JUL/05

SETORES DE ATIVIDADE Produção

Física Horas Pagas

Produti- vidade

Produção Física

Horas Pagas

Produti- vidade

Produção Física

Horas Pagas

Produti- vidade

Indústria geral ........................ 0,04 -0,85 0,90 8,30 2,08 6,09 4,31 1,64 2,63 Indústria extrativa .................. 4,72 3,47 1,21 4,28 4,44 -0,15 10,48 -1,65 12,33 Indústria de transformação .... -0,20 -0,94 0,75 8,52 2,03 6,36 3,99 1,71 2,24 Fumo ..................................... -6,42 2,86 -9,02 18,94 23,50 -3,69 -6,07 -1,42 -4,72 Têxtil ...................................... -4,50 -4,94 0,46 10,11 -0,70 10,89 -0,11 3,45 -3,44 Vestuário e acessórios .......... -12,24 -5,35 -7,28 1,54 -7,92 10,27 0,66 -3,12 3,90 Calçados e artigos de couro .. -9,65 -1,75 -8,04 2,33 -0,43 2,77 1,00 -10,41 12,74 Madeira .................................. 5,31 -1,75 7,19 7,68 1,13 6,48 0,07 -5,56 5,96 Refino de petróleo e álcool .... -2,17 11,79 -12,49 2,32 7,63 -4,93 1,23 14,89 -11,89 Borracha e plástico ................ -3,46 0,04 -3,50 7,77 4,62 3,01 -0,44 -2,35 1,96 Minerais não-metálicos .......... -3,56 -4,47 0,95 4,85 -1,78 6,75 4,11 0,08 4,03 Metalurgia básica .................. 5,96 1,75 4,14 3,35 10,25 -6,26 -2,83 4,19 -6,74 Produtos de metal, exclusive máquinas e equipamentos .... -5,49 1,86 -7,22 9,97 -3,73 14,23 2,44 6,45 -3,77

FONTE: PESQUISA INDUSTRIAL MENSAL: produção física. Rio de Janeiro: IBGE. Disponível em: http://www.sidra.ibge.gov.br Acesso em: set. 2005. PESQUISA INDUSTRIAL MENSAL DE EMPREGO E SALÁRIO. Rio de Janeiro: IBGE. Disponível em: http://www.sidra.ibge.gov.br Acesso em: set. 2005. NOTA: Calculado a partir do índice acumulado, com base em igual período do ano anterior = 100. Tabela 4

Indicadores acumulados de produção, horas pagas e produtividade na indústria do RS — 2003/05

(∆%)

JAN-DEZ/03 JAN-DEZ/04 JAN-JUL/05

SETORES DE ATIVIDADE Produção

Física Horas Pagas

Produti- vidade

Produção Física

Horas Pagas

Produti- vidade

Produção Física

Horas Pagas

Produti- vidade

Indústria geral ........................ -0,35 -1,47 1,14 6,39 -0,68 7,12 -3,99 -5,80 1,92

Indústria extrativa ................... - 1,42 - - -1,83 - - -16,65 -

Indústria de transformação ..... -0,35 -1,49 1,16 6,39 -0,67 7,11 -3,99 -5,74 1,86

Fumo ...................................... -5,74 5,23 -10,42 26,84 51,69 -16,38 -8,65 -3,08 -5,75

Têxtil ...................................... - 0,84 - - 1,61 - - 0,54 -

Vestuário e acessórios ........... - -13,94 - - 1,40 - - 3,39 -

Calçados e artigos de couro ... -4,43 -5,59 1,23 0,69 -7,12 8,41 3,69 -20,06 29,71

Madeira .................................. - -10,90 - - 5,00 - - 5,74 -

Refino de petróleo e álcool ..... -3,58 -1,14 -2,47 -6,17 7,25 -12,51 -3,57 -1,45 -2,15

Borracha e plástico ................ -3,95 7,55 -10,69 13,28 -7,67 22,69 -9,10 -4,92 -4,40

Minerais não-metálicos .......... - -5,36 - - -4,86 - - -3,39 -

Metalurgia básica ................... 1,30 1,92 -0,61 14,62 12,86 1,56 -3,62 8,68 -11,32

Produtos de metal, exclusive máquinas e equipamentos ..... 5,32 -2,13 7,61 8,67 7,31 1,27 2,75 7,46 -4,38

FONTE: PESQUISA INDUSTRIAL MENSAL: produção física. Rio de Janeiro: IBGE. Disponível em: http://www.sidra.ibge.gov.br Acesso em: set. 2005. PESQUISA INDUSTRIAL MENSAL DE EMPREGO E SALÁRIO. Rio de Janeiro: IBGE. Disponível em: http://www.sidra.ibge.gov.br Acesso em: set. 2005. NOTA: Calculado a partir do índice acumulado, com base em igual período do ano anterior = 100.

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Referências

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INSTITUTO DE ESTUDOS PARA O DESENVOLVI-MENTO INDUSTRIAL — IEDI. Produtividade industrialno primeiro semestre de 2005: desempenho eperspectivas. Disponível em: http://www.iedi.org.brAcesso em: set. 2005.

JORNADA, Maria Isabel H. da. O mercado de trabalhono Rio Grande do Sul e o Plano Real: principaisevidências. Indicadores Econômicos FEE, PortoAlegre: FEE. v. 32, n. 2, p. 223-246, 2004.

PESQUISA INDUSTRIAL MENSAL: produção física —PIM/PF. Rio de Janeiro: IBGE. Disponível em:http://www.sidra.ibge.gov.br Acesso em: set. 2005.

PESQUISA INDUSTRIAL MENSAL DE EMPREGO ESALÁRIO — PIMES. Rio de Janeiro: IBGE. Disponívelem: http://www.sidra.ibge.gov.br Acesso em: set. 2005.

RAIS: Relação Anual de Informações Sociais. Brasília:Ministério do Trabalho e Emprego, 2002-2003.

STERNBERG, Sheila S. W. O Plano Real e o mercadoformal de trabalho no Rio Grande do Sul. IndicadoresEconômicos FEE, Porto Alegre: FEE, v. 32, n. 4,p. 249-270, 2005.

Maria Isabel H. de Jornada

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Algumas reflexões sobre a valorização cambial

Indic. Econ. FEE, Porto Alegre, v. 33, n. 3, p. 33-38, dez. 2005

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Introdução

Desde meados de 2004, o real vem valorizando-senão só frente ao dólar como em relação à cesta das 13moedas mais importantes na corrente de comércio doPaís1 e, segundo a Fundação Centro de Estudos deComércio Exterior (Funcex), em julho deste ano, atingiua maior valorização em relação à cesta de moedas. Ocâmbio é considerado um dos mais importantes preçosmacroeconômicos, sendo determinante não só docomportamento da balança comercial (BC), mas de todoo balanço de pagamentos (BP), além de manter relaçãocom os salários reais, com o consumo, com a poupançainterna e com o investimento, influindo também nos níveisde inflação. Daí a atenção que deve ser dada aos níveisde valorização alcançados pelo real.

O objetivo deste texto é levantar alguns aspectosainda pouco abordados dos efeitos de uma valorizaçãocambial sobre a economia brasileira. Diferentemente doperíodo 1995-98, quando violentos choques externos,aliados a um forte déficit nas contas externas, levarama uma sucessão de crises econômicas no País, a valori-zação cambial da atualidade tem se deparado com umcenário favorável, tanto comercial quanto financeiro, des-de 2003, o que tem limitado os efeitos danosos observa-dos nos primeiros anos do Plano Real sobre o BP.

Relações internacionais

Algumas reflexões sobre a valorização cambial

Teresinha da Silva Bello* Economista da FEE.

Artigo recebido em 14 set. 2005.

Por que o real está valori-zado?

Não tanto os bons fundamentos da economiabrasileira, mas muito mais um fato concreto vemmantendo o dólar em baixa: o excesso de oferta da moedanorte-americana no mercado, resultado não apenas daBC, como também dos altos juros internos e da liqui-dez internacional, com o Risco-País mantendo-se relativa-mente baixo — inferior a 500 pontos — e próximo dosníveis registrados no início de 1997, considerado a melhorfase do real, antes da eclosão das crises cambiais daÁsia e da Rússia e do próprio Brasil. E, quanto maisbaixo o risco, menores as expectativas do mercado deque o Governo e as empresas brasileiras deixem de honrarseus compromissos com o exterior e menores os custospara levantar empréstimos no mercado financeirointernacional, o que resulta em mais um estímulo à entradade dólares no País.

Embora com menos intensidade, também o movi-mento do dólar no mercado internacional, perdendo valorem relação a várias moedas, tem influenciado a quedada moeda norte-americana em relação à brasileira. Masos altos juros internos, a BC positiva e a alta liquidezinternacional têm contribuído para que o real se valorizetambém em relação a outras moedas, como o euro.Apesar de a valorização cambial frente às moedas fortesnão ser um caso típico do Brasil — vários países emer-gentes têm apresentado o mesmo comportamento —, oreal foi o que mais teve apreciação, se comparado comas moedas da Índia, da Rússia, do México, da Turquia,do Chile e da Argentina (Borges, 2005). Não obstante astaxas de juros nos países emergentes também seremmais elevadas em relação aos juros praticados nos paísesdesenvolvidos, é no Brasil que se encontram as maiorestaxas de juros reais, em torno de 14% ao ano. Enquantoisso, tanto nos Estados Unidos quanto na Europa, os

* A autora agradece os colegas Sônia Unikowsky Teruchkin, Enéasde Souza e Martinho Lazzari pelos comentários e sugestõesapresentados em leitura preliminar.

1 Na cesta de moedas, estas são ponderadas pela participaçãomédia do respectivo país na corrente de comércio brasileira(exportação mais importação), e os respectivos vetores deponderação atuais são: Estados Unidos (35,6), Argentina (16,3),Alemanha (9,6), Japão (7,0), Itália (5,6), França (4,9), Holanda(4,6), Reino Unido (3,8), México (3,4), Bélgica (3,1), Chile (3,0),Uruguai (1,6) e Paraguai (1,5) (B. Com. Ext., 2005).

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juros continuam desestimulando a atração de capitalexterno.

Mesmo que o Federal Reserve Bank (o BancoCentral dos EUA) tenha fixado a taxa básica, nos EUA,no maior patamar em quase quatro anos (3,5% ao ano),ainda assim, os especialistas consideram-na abaixo doque definem como “ponto neutro”. Ou seja, capaz deimpulsionar a economia ao invés de contê-la, visto estarmuito próxima da taxa de inflação, o que faz a taxa dejuros real nos EUA ainda se manter baixa, desestimulandoas aplicações internacionais em seu território. Na Europa,o Banco Central Europeu mantém sua taxa de juros em2% há dois anos, e o Banco da Inglaterra (o Banco Centralinglês) baixou sua taxa de juros de 4,75% para 4,5% aoano, com vistas a estimular o consumo doméstico e oinvestimento. No Japão, as taxas de juros também têm--se mantido em baixa. Com isso, mantêm-se a liquidezinternacional e o fluxo de recursos financeiros para ospaíses emergentes.

Como forma de compensar o câmbio baixo, muitosexportadores estão utilizando o mercado financeiro paracontrabalançar a queda de rentabilidade em suasexportações, já que o juro alto tem estimulado operaçõesde arbitragem. Empresas com dólares a receber vêmantecipando a liquidação através de Adiantamentos deContratos de Câmbio (ACC) e aplicando os reais obtidosno mercado financeiro interno, compensando a perdacambial e, com isso, também alimentando a entrada dedólares no País. Assim, há um descompasso entre asexportações contratadas e as físicas, pois, de acordocom o Banco Central (Bacen), de janeiro a julho de 2005,o câmbio contratado nas operações de exportaçãosuperou em US$ 2,7 bilhões o valor das exportaçõesefetivamente realizadas, enquanto, no mesmo períodode 2004, essa diferença foi de US$ 1,2 bilhão (BANCOCENTRAL DO BRASIL, 2005).

O fluxo de moeda estrangeira para o Brasil tem sidotão grande que nem as compras de dólares pelo TesouroNacional e pelo Banco Central têm conseguido alterar avalorização do real. Enquanto o Bacen atua no mercadocambial como autoridade monetária, comprando ouvendendo moeda estrangeira de acordo com asnecessidades do BP e da manutenção do nível dasreservas, o Tesouro Nacional é considerado um compradorcomo outro qualquer, comprando conforme a necessidadede quitar compromissos de sua dívida externa e levandoem conta as oportunidades. Entretanto, de acordo com oBacen, de agosto a dezembro de 2005, o Tesouro sópoderá contratar, aproximadamente, US$ 3,5 bilhões,

valor equivalente aos compromissos da dívida externaque ainda faltam ser liquidados neste ano.2

Em relação à intervenção governamental nomercado de câmbio, é importante destacar que taisoperações teriam forte implicação sobre o endividamentointerno do Governo, o que limitaria sua capacidade deatuação. Embora, na teoria, a capacidade do Bacen deintervir no câmbio seja ilimitada, na prática isso nãoocorre, já que, para obter os reais com os quais comprariaos dólares, teria de emitir títulos, pelos quais pagariajuros muito maiores do que receberia no mercadointernacional ao aplicar os dólares adquiridos. Enquantoestes renderiam algo em torno de 2% a 3% ao ano, osreais custariam ao Governo 19,75% ao ano (taxa Selicatual), sob a forma da dívida pública. Além disso, seoptasse pela emissão, ao jogar mais reais no mercado,teoricamente poderia aumentar a inflação, o que,considerando-se a política de controle de preços praticadapelo Governo, levaria a mais aumento nas taxas de juros.Ou seja, mesmo que queira aumentar as reservasinternacionais do País, consideradas baixas quandocomparadas com as de outros países emergentes (Chinae Rússia por exemplo), o custo é muito alto, devido àstaxas internas de juros aqui praticadas. Assim, se, paraa autoridade monetária, esperar pela reação do mercado,visando reverter a valorização do real, pode ter um custo(desestímulo às exportações e a novos investimentos),intervir comprando dólares também não sai de graça parao Governo e atinge diretamente a dívida pública.

Ao manter-se afastado do mercado cambial, oGoverno não só evita aumentar seu endividamento, comopode estar usando novamente a âncora cambial parasegurar a inflação, ao baratear as importações e todasas despesas relacionadas à remessa de moedaestrangeira para o exterior. Além disso, para algunsespecialistas, ao manter o real forte, estar-se-ia criandoum “colchão” que permitiria o enfraquecimento da moedanacional, caso fosse criada uma situação de aversão aorisco internacional. Entretanto a inflação brasileira estámais atrelada aos preços administrados — os quais, pornão serem bens comercializáveis com o exterior,praticamente não dependem do câmbio e podem ser

2 “O Tesouro Nacional poderá contratar divisas no mercado decâmbio para liquidar o serviço da dívida (principal e juros) relativoa Clube de Paris e dívida velha (bônus bradies e pré-bradies),com vencimentos entre agosto e dezembro de 2005, cujo valorestimado é de US$ 1.763 milhões. Adicionalmente, o TesouroNacional poderá contratar divisas para liquidar o serviço da dívidarelativo a bônus com vencimentos entre agosto e dezembro de2005, no valor de US$ 1.764 milhões.”

Algumas reflexões sobre a valorização cambial

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substituídos por similares importados, como os serviçosde energia, saneamento e telefonia — do que propria-mente à demanda por bens importados. Ou seja, oscontratos indexados seriam o maior problema da inflação,o que reduziria a importância do preço do dólar no controleda taxa inflacionária, embora não se possa negar o papelda valorização do real no controle de alguns preços,como ocorre com o trigo e o petróleo por exemplo. Casonão houvesse queda nos preços, pelo menos haveriacrescimentos menores nos produtos tradables.

O ciclo de forte elevação dos preços em dólaresdas commodities observado a partir de 2001, juntamentecom o aumento nos preços dos bens exportados emgeral e com o crescimento das exportações mundiais,tem contrabalançado, em parte, a valorização do realpara os exportadores e colaborado para a obtenção dosaldo comercial, apesar do câmbio. Além de ser atribuídoao próprio excesso de liquidez da economia global, oaumento dos preços internacionais também é fruto dademanda aquecida nos Estados Unidos — cujo porte desua economia é capaz de alterar os preços externos —e da entrada com mais força da China e da Índia nomercado de consumo mundial. Esses fatores tambémcontribuíram para que o real se valorizasse, ao favorece-rem a obtenção de superávits na BC brasileira, emboraseja bom lembrar que:

“O espaço de tempo entre a valorização e aqueda das exportações será maior quando aeconomia mundial estiver crescendo mais,pois os importadores poderão repassar oaumento para seus clientes. Mas se o au-mento do preço foi causado por valorizaçãodo câmbio, sempre vai existir um produtor emum país que não está vivendo a mesmavalorização cambial. No caso atual, de maiode 2004 a maio de 2005, o real experimentouvalorização de mais de 20,91% frente ao dólarnorte-americano, enquanto uma cesta de 16países apresentou valorização média deapenas 7,64%,este diferencial de câmbioimplicará um aumento de competitividade deprodutores de outros países” (FEDERAÇÃO...,2005).

Alguns efeitos davalorização cambial

Na cadeia produtiva

Caso a valorização do real se mantenha por umperíodo mais longo, poderá ocorrer alguma desestrutu-ração não só no setor exportador em si, mas na própriacadeia produtiva de alguns setores, já que não apenasos bens finais, mas também insumos e matérias-primaspassariam a ser adquiridos lá fora, ao invés de seremfornecidos pela produção nacional. No caso brasileiro,uma análise dos índices de preços e de quantum dasimportações elaborado pela Funcex mostra que, noacumulado de 12 meses, até junho de 2005, à exceçãodos combustíveis, cujo preço subiu mais do que asquantidades importadas, as demais categorias de usoregistraram maior crescimento nos índices de quantumdo que nos de preços. O maior aumento nos índices dequantum das importações ocorreu nos bens de consumoduráveis, seguidos dos bens de capital e dos bensintermediários (B. Com. Ext., 2005).

Quadro semelhante de substituição de produtonacional por importado já havia sido observado no período1995-98, com estragos sobre as cadeias produtivas doPaís. A verdade é que, se a valorização do câmbio afetaas exportações no longo prazo, via perda de fôlego, nasimportações a reação é mais rápida, já que osimportadores, aproveitando o dólar baixo, se definem maisrapidamente em relação às suas compras. Inclusive osexportadores, na tentativa de segurarem a queda narentabilidade das exportações, tanto quanto possível,passam a se abastecer de insumos e de matérias-primasno exterior, beneficiando-se ainda mais do drawback.Assim, as primeiras empresas a sofrerem os efeitosnegativos da taxa cambial baixa são aquelas cujamercadoria a ser exportada depende fundamentalmentede fornecedores nacionais. Tal é o caso dos produtoscuja fabricação é intensiva em mão-de-obra. Ou seja,mesmo entre os exportadores, a taxa de câmbio podeser fator de maior ou menor importância para o sucessode suas vendas ao exterior. Para aqueles setores quevêm incorporando vantagens de produtividade em relaçãoaos seus concorrentes internacionais, o real valorizadoterá um efeito negativo menor do que para aqueles cujaestrutura produtiva não permite reduzir custos via câmbioe que, ainda por cima, vêem reduzido o valor recebidoem reais para cada dólar exportado, já que a valorizaçãotem sido nominal e não apenas real.

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Nos investimentos

Sob o ângulo dos investimentos, a valorização docâmbio pode favorecer a modernização do parqueprodutivo nacional, através de maior aquisição demáquinas e equipamentos no exterior. E tudo indica queisso já esteja ocorrendo no Brasil, já que a taxa devariação do quantum importado de bens de capital ficouatrás apenas daquela de bens de consumo duráveis,conforme já citado anteriormente. Essa opção, atualmente,está sendo favorecida não só pelo câmbio, mas tambémpelo financiamento externo abundante e a juros baixos epela reduzida tarifa aduaneira para bens de capital. Poroutro lado, alguns segmentos do setor exportador maisprejudicados pela cotação cambial podem optar por umaredução nos investimentos, repensando projetoscentrados nas exportações. E um dos aspectos perversosdessas decisões é que seus efeitos somente serãosentidos no longo prazo, na expansão futura dasexportações, devido ao tempo de maturação dosinvestimentos. O próprio Governo, na pessoa do Ministrodo Desenvolvimento, já vem dando sinais depreocupação em relação a isso (Leo, 2005).

Ainda em relação aos investimentos, vale destacarque tem havido um aumento na ofensiva de companhiasbrasileiras no exterior, comprando empresas estrangeirasou abrindo fábricas em outros países, fruto do estímuloà saída de capital decorrente do câmbio. Assim, deacordo com o Banco Central, de janeiro a julho de 2005,os investimentos brasileiros diretos líquidos no exteriorsomaram US$ 2 bilhões, com crescimento de 33% emrelação a igual período do ano anterior. Os investimentosem carteira feitos pelo Brasil nos primeiros sete mesesde 2005 somaram US$ 1,1 bilhão, valor 86% maior quede janeiro a julho de 2004. Já outros investimentosbrasileiros no exterior apresentaram uma saída líquidade US$ 5,9 bilhões de janeiro a julho de 2005, enquanto,em igual período de 2004, houve um repatriamento(entrada) líquido de US$ 1 bilhão. Com isso, o Brasil, nopassado, nunca registrou um nível tão elevado de saídade capitais brasileiros para o exterior, mesmo se levandoem conta que, devido à valorização nominal de suamoeda, uma parte desse crescimento em 2005 se deveao câmbio no momento da conversão de real para dólar.Isto porque, ao converter, como o preço do dólar estámenor, se obtêm mais dólares na troca.

Do mesmo modo, o estoque de investimento externodireto no País, quando convertido para dólares, tambémsofre uma elevação, que, em parte, pode ser explicadapela menor taxa de câmbio nominal.

Na concentração de empresasexportadoras

Outro aspecto da atual valorização da moedabrasileira está relacionado com a diminuição do númerototal de empresas exportadoras desde março de 2005. Aquantidade mensal das que saíram do mercado externodesde essa data tem sido maior que o número das queentraram, de acordo com levantamento feito pelaAssociação de Comércio Exterior do Brasil (AEB)(ASSOCIAÇÃO..., 2005). Em alta havia um ano, essecrescimento mensal foi interrompido a partir de março,embora o número total de empresas, no acumulado jan.--maio/05, ainda tenha sido maior que no mesmo períodode 2004.

Analisando-se o número de empresas pela faixa devalor das exportações, observou-se que a redução sóocorreu para aquelas com vendas ao exterior de até US$60 mil por ano, ou seja, micro, pequenas e médias (Grupo3), sendo que as empresas do Grupo 1 (de US$ 6 milhõespara cima) e as do Grupo 2 (entre US$ 60 mil e US$ 6milhões) tiveram elevação no número de empresasexportadoras, caracterizando uma concentração dasvendas externas em empresas de maior porte. De acordocom a AEB, as empresas do Grupo 3 “(...) têm maiorcusto de produção e não possuem saúde financeira paracontinuar exportando com a taxa cambial vigente, quenão proporciona rentabilidade financeira e muito menoscompetitividade comercial” (ASSOCIAÇÃO..., 2005).Afora os aspectos negativos internos dessa retirada domercado exportador — o maior deles ligado à reduçãono emprego —, a concentração de empresas pode terreflexos negativos também na vulnerabilidade externado País, já que o volume e o valor das exportaçõesdependeriam de um número menor de exportadores.

Além disso, entre as firmas que se retiraram,predominam aquelas ligadas a segmentos com fortepresença de capital nacional, como calçados, confecçõese móveis (FEITIÇO..., 2005). Tal fato também podeaumentar a vulnerabilidade, já que concentra ainda maisas exportações em mãos das empresas multinacionais,e sabe-se que as decisões de entrar ou não no mercadoexterno, de quanto e para quem vão exportar, por exemplo,na maioria das vezes, fazem parte de uma estratégiaglobal dessas corporações. Ou seja, políticas internaslevadas a termo pelo Brasil teriam influência menor nastomadas de decisão, já que dependeriam, principalmente,do que fosse decidido pelas matrizes das multinacionais.A própria AEB mostrou preocupação com a saída deempresas pequenas do mercado externo:

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“O quadro atual é contrário aos objetivosalmejados para as exportações brasileiras,representados pela descentralização dasexportações, mediante o fortalecimento e aexpansão do número de micro, pequenas emédias empresas exportadoras” (ASSOCIA-ÇÃO..., 2005).

Na remessa de lucros edividendos

Ainda em relação às empresas multinacionais, éimportante destacar que um real fortalecido cria umadicotomia: se, de um lado, a desvalorização do dólar reduza rentabilidade e as oportunidades das exportações, deoutro, facilita a remessa de lucros e dividendos, além demelhorar a apresentação de resultados no exterior, já queestes, em sua maioria, são expressos em dólares. Aexpansão das remessas de lucros e dividendos, emvalores absolutos, no Brasil, não é um evento novo e jávem sendo observada há alguns anos, juntamente como aumento dos investimentos externos diretos. Mas, coma retomada do crescimento econômico no País e avalorização cambial, esse incremento nas remessasvinha sendo atribuído à maior lucratividade das empresase à antecipação de remessas de lucros e dividendosdevido ao câmbio. Neste último caso, haveria o temor deuma retomada da desvalorização do real, o que até agoranão ocorreu. Com a queda do preço do dólar em valoresnominais, outro fator pode ser apresentado como causade aumento dessas remessas: o real valorizado nominal-mente faz com que os lucros auferidos em reais, nosbalanços das empresas multinacionais aqui localizadas,quando medidos em dólares, fiquem maiores, à seme-lhança do que ocorre com o estoque de capital estrangeiro.

Assim, nos primeiros sete meses de 2005, asremessas líquidas de lucros e dividendos relativos aosinvestimentos diretos elevaram-se 75% em relação a jan.--jul./04. Já aquelas relativas aos investimentos emcarteira tiveram um acréscimo de 53%. No total(remessas de lucros e dividendos de investimentosdiretos mais remessa de lucros e dividendos deinvestimentos em carteira), até julho, o País enviou aoexterior US$ 6,8 bilhões contra US$ 4,1 bilhões nosprimeiros sete meses de 2005 (BANCO CENTRAL DOBRASIL, 2005).

Considerações finais

Os bons resultados nas transações correntes eespecialmente os recordes que vêm sendo obtidos nasexportações podem levar à suposição de que avalorização do câmbio não tenha prejudicado o desem-penho da BC e da economia em geral. Entretanto, nãofosse o desestímulo às vendas externas, o País poderiaestar beneficiando-se bem mais das oportunidades deum mercado externo em expansão. Desde 2003, ascircunstâncias internacionais têm sido muito boas, querno plano comercial, quer no financeiro: expansão nademanda externa, com aumento no preço dascommodities exportadas pelo Brasil, e excelente liquidezinternacional, favorecida pelos baixos juros praticadosnos maiores mercados do mundo.

A dúvida que permanece é se todas essas circuns-tâncias se manterão nos próximos anos, devido, principal-mente, ao risco representado pela situação financeirados Estados Unidos. Assim, parece conveniente que oPaís não se descuide em termos de ajustamento externoe procure manter uma taxa de câmbio mais competitiva,direcionada ao estímulo às exportações e ao exercíciode um relativo controle das importações de bens eserviços, evitando uma apreciação exagerada do real,como a que vem acontecendo desde 2004.

O fascínio pelo aumento do valor externo da moedaé grande: barateia a importação de bens e serviços, reduzo custo doméstico das dívidas em moeda estrangeira efavorece o combate à inflação. Talvez por isso, muitosgovernos, em época de grande liquidez internacional,deixem-se seduzir pela sobrevalorização cambial. Valelembrar, porém, que não se conhece exemplo de paísem desenvolvimento que tenha logrado crescimentoeconômico expressivo com taxa de câmbio valorizada,sem um forte setor externo e com exportações e reservassubstanciais. Desse modo, parece ser consenso que, seo Brasil quiser crescer, dificilmente poderá fazê-lomantendo a atual política cambial. Mesmo longe do queaconteceu com o câmbio em 1998, já que, à época, haviaforte fuga de capitais, ainda resta a lembrança do que oPaís enfrentou — e até hoje enfrenta — comoconseqüência dos desequilíbrios externos gerados pelouso prolongado da âncora cambial.

A questão, então, é saber por quanto tempo poderáser mantida essa política, sem causar danos expressivosà economia, especialmente para a indústria nacional, nãosó pela valorização, mas, mais do que isso, pelavolatilidade do câmbio, já que o valor do dólar para daquia 12 meses, no Brasil, é difícil de predizer.

Teresinha da Silva Bello

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Enquanto isso, a autoridade monetária, talvez atépelo custo que a intervenção no câmbio pode acarretaraos cofres públicos, parece esperar por um ajusteclássico da taxa de câmbio, isto é, ao sabor das forçasdo mercado: quando os efeitos da valorização se fizeremsentir sobre a economia, aumentando a saída e reduzindoa entrada de dólares, os próprios agentes do mercadotrocarão suas posições, invertendo a tendência. Enquantoessa reversão não ocorre, a internalização de dólarespara conversão em real parece ser um dos melhoresnegócios do mundo em 2005. Resta saber se, em umprazo mais longo, será também um bom negócio para oPaís.

Referências

ASSOCIAÇÃO DE COMÉRCIO EXTERIOR DO BRA-SIL (AEB). Reflexos da taxa de câmbio sobre asexportações. São Paulo. Disponível em:http://www.aeb.org.br/AEB-EmpresasExportadorasQtdAcesso em: 27 jun. 2005.

BANCO CENTRAL DO BRASIL. Nota para a impren-sa — setor externo. Brasília, 18 ago. 2005.

BOLETIM DO COMÉRCIO EXTERIOR. Rio de Janeiro:FUNCEX, v. 9, n. 7, jul. 2005.

BORGES, Ana. Real é o mais valorizado entre emer-gentes. Jornal do Comércio, Porto Alegre, p. 11, 06 jun.2005.

FEDERAÇÃO DAS INDÚSTRIAS DE SÃO PAULO(FIESP). As sete quedas das exportações: o que ahistória nos ensina? São Paulo. Disponível em:http://www.fiesp.com.br/download/pesquisa/ Acesso em:24 jun. 2005.

FEITIÇO cambial. Folha de São Paulo, São Paulo, p.A--2, 30 maio 2005.

LEO, Sérgio. Furlan admite que câmbio já prejudicanegócios e ameaça o investimento. Valor Econômico,São Paulo, p. A-3, 06 ago. 2005.

Mercado de trabalho na Região Metropolitana de Porto Alegre...

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O artigo que ora se apresenta tem por finalidadeanalisar o mercado de trabalho da Região Metropolitanade Porto Alegre (RMPA) com base nas informações maisrecentes da Pesquisa de Emprego e Desemprego naRegião Metropolitana de Porto Alegre (PED-RMPA),através de dois recortes, um mensal e outro anual, ouseja, tomando-se o mês de agosto de 2005 comoreferência, estabeleceu-se comparação com o mês dejulho deste ano, bem como com o mês de agosto de2004.

Para atingir o objetivo proposto, são utilizadas asprincipais variáveis do mercado de trabalho, tais como aocupação, o desemprego e os rendimentos, com afinalidade de captar, através do exame das variaçõesmensal e anual, os movimentos mais recentes do mercadode trabalho da RMPA.

Examinando os dados da PED-RMPA, constata-seque o mercado de trabalho evoluiu de maneira favorávelno período recente de 2005. Segundo o levantamentoaludido, apesar de ter registrado, em agosto, um aumentode 1,4% na taxa de desemprego, em comparação com omês anterior, houve crescimento do nível de ocupaçãotanto na comparação mensal quanto na anual, comdestaque para um maior crescimento de assalariados dosetor privado com carteira de trabalho assinada eelevação, nos meses recentes, da massa de rendimentosreais, tanto dos ocupados quanto dos assalariados.

Mercado de trabalhoMercado de trabalhoMercado de trabalhoMercado de trabalhoMercado de trabalho

Mercado de trabalho na Região Metropolitanade Porto Alegre: melhoria no perfil

dos assalariados

Alejandro Kuajara Arandia* Economista, Pesquisador da FEE e Professor da Unisinos.

Artigo recebido em 10 out. 2005

Expansão continuada daocupação

Em relação ao nível de ocupação, os dados deagosto de 2005 confirmam um aumento pelo quarto mêsconsecutivo — após o decréscimo de três mesesseguidos —, com a criação de 11.000 novos postos detrabalho na comparação com o mês anterior. Em relaçãoa agosto de 2004, houve crescimento de 3,7%,significando uma incorporação de 56.000 trabalhadores.Com esse desempenho, o resultado dos períodos mensale anual pesquisados denota uma evolução positiva daocupação (Tabela 1).

Na desagregação da ocupação por setor deatividade, o comércio registrou crescimento de 5,5% tantono confronto mensal — agosto contra julho de 2005 —,como quando se compara o mês de agosto com o mesmomês do ano anterior, caracterizando evolução positivade 15.000 vagas.

A indústria de transformação também merece aten-ção especial, pois, embora tenha apresentado oscilaçõesao longo do período em foco, registrou alta de 2,0% emrelação ao mês anterior e crescimento expressivo de5,1% na comparação entre agosto de 2005 e agosto de2004.

Considerando-se o mês de agosto ante o de julhode 2005, o comércio foi o que apresentou o maiorcrescimento mensal, ao passo que, na ponta oposta, osetor serviços foi responsável pela extinção de 12.000vagas, apresentando um saldo negativo de 1,4%.

O fato de praticamente todos os setores de ativida-de terem mostrado expansão no mês de agosto, quandocomparado ao mês anterior e ao mesmo mês do ano an-terior, é indicativo do grau de consistência do desempenhodo mercado de trabalho da RMPA (Tabela 2).

* O autor agradece à equipe de análise da PED-RMPA, especial-mente a Roberto Wiltgen, Raul Assumpção Bastos e Míriam DeToni, pelos comentários e sugestões, bem como à bolsista ThaísFerreira Persson e à estagiária Gabriela Holtz Boffo, pelo auxíliona elaboração das tabelas e dos gráficos.

Alejandro Kuajara Arandia

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Tabela 1

Estimativa do número de pessoas ocupadas, por posição na ocupação, na RMPA — ago./04-ago./05

(1 000 pessoas)

ASSALARIADOS (1)

Setor Privado PERÍODOS TOTAL DE

OCUPADOS Total Setor

Público (3) Total

Com carteira

assinada

Sem carteira assinada

AUTÔNO- MOS

EMPREGA- DOS DO- MÉSTICOS

OUTROS (2)

2004 Ago. 1 527 1 010 191 819 667 152 268 104 145

Set. 1 555 1 030 198 832 677 155 276 105 144

Out. 1 551 1 019 191 828 671 157 279 108 145

Nov. 1 536 1 012 190 822 665 157 280 107 137

Dez. 1 533 1 015 192 823 668 155 274 109 135

2005 Jan. 1 557 1 027 191 836 688 148 286 109 135

Fev. 1 549 1 030 184 846 705 141 283 107 129

Mar. 1 544 1 031 177 854 715 139 278 103 131

Abr. 1 535 1 031 181 850 712 138 273 97 134

Maio 1 537 1 030 187 843 707 136 272 97 138

Jun. 1 550 1 042 188 854 718 136 274 99 135

Jul. 1 572 1 062 198 864 728 136 272 104 134

Ago. 1 583 1 072 193 879 740 139 269 104 138

∆ mensal

Ago./05 sobre jul./05 11 10 -5 15 12 3 -3 0 4

∆ anual

Ago./05 sobre ago./04 56 62 2 60 73 -13 1 0 -7 FONTE: PED-RMPA - Convênio FEE, FGTAS/SINE-RS, SEADE-SP, DIEESE e apoio PMPA.

NOTA: Os dados têm como base a média de 2000 = 100.

(1) Exclui empregados domésticos. (2) Engloba empregadores, profissionais universitários autônomos, donos de negócio fami-liar, etc. (3) Engloba empregados nos Governos Municipal, Estadual e Federal, nas empresas de economia mista, nas autar-quias, etc.

Mercado de trabalho na Região Metropolitana de Porto Alegre...

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Maior formalização doemprego

Em relação à desagregação das ocupações por tipode inserção ocupacional, houve, para o setor privado,tanto na comparação mensal quanto na anual, umamelhora na qualidade do conjunto das ocupações, emrazão de um aumento do emprego com carteira detrabalho assinada.

Considerando-se o mês de agosto em relação aomês anterior, ocorreu variação positiva para o contingentede assalariados (1,7%). No âmbito do setor privado, caberegistrar o crescimento do emprego com carteira assinada(1,6%), seguindo movimento ascendente pelo terceiromês consecutivo, e o crescimento do emprego semcarteira de trabalho assinada (2,2%) pela primeira vezneste ano. Na comparação com o mesmo mês do anoanterior, constata-se uma expansão do contingente deassalariados de 7,3%, destacando-se a criação de postos

de trabalho com carteira de trabalho assinada (73.000)em paralelo a uma expressiva redução das inserçõeslegalmente desprotegidas, isto é, sem carteira de trabalhoassinada (-13.000). Registre-se que, no setor público, asalterações foram pouco expressivas, com acréscimo de1,0% em seu contingente (2.000 empregos a mais) —Tabela 1.

Com esses movimentos, a variação do contingentede trabalhadores com carteira de trabalho assinada, porsetor de atividade, ante o total de trabalhadores semcarteira manteve-se elevado para os setores serviços,indústria e comércio (Tabela 3). O grau de formalidade,considerando-se apenas os trabalhadores com carteiraassinada do setor privado, em agosto, em relação aomesmo mês do ano anterior, registrou crescimento de7,3%, ante 1,0% do setor público, e de 3,7% para o totalde ocupados, em paralelo a uma queda de 8,6% dostrabalhadores assalariados sem carteira assinada (Ta-bela 1).

Tabela 2

Estimativa da População Economicamente Ativa, ocupada, por setor de atividade econômica, e desempregada, na RMPA — ago./04-ago./05

(1 000 pessoas)

OCUPADOS

PERÍODOS PEA Total

Indústria de Transfor- mação

Comércio Serviços Construção Civil

Serviços Domésticos

Outros

DESEMPRE- GADOS

2004 Ago. 1 816 1 527 291 272 776 78 104 6 289 Set. 1 832 1 555 299 262 797 84 105 8 277 Out. 1 820 1 551 288 262 799 86 108 8 269 Nov. 1 796 1 536 278 261 796 86 107 8 260 Dez. 1 791 1 533 279 262 796 80 109 7 258 2005 Jan. 1 817 1 557 294 265 800 81 109 8 260 Fev. 1 807 1 549 304 266 785 79 107 8 258 Mar. 1 806 1 544 313 264 777 79 103 8 262 Abr. 1 800 1 535 309 264 783 77 97 5 265 Maio 1 806 1 537 299 255 807 74 97 5 269 Jun. 1 824 1 550 301 260 806 76 99 8 274 Jul . 1 839 1 572 300 272 811 77 104 8 267 Ago. 1 856 1 583 306 287 799 79 104 8 273

∆ mensal Ago./05 sobre jul./05 17 11 6 15 -12 2 0 0 6 ∆ anual Ago./05 sobre ago./04 40 56 15 15 23 1 0 2 -16 FONTE: PED-RMPA - Convênio FEE, FGTAS/SINE-RS, SEADE-SP, DIEESE e apoio PMPA.

Alejandro Kuajara Arandia

Indic. Econ. FEE, Porto Alegre, v. 33, n. 3, p. 39-46, dez. 2005

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Cresce a participaçãofeminina na ocupação

Considerando as características individuais dostrabalhadores, a desagregação da ocupação por sexoapontou variação positiva para ambos os segmentos,com ampliação mais expressiva para as mulheres. Assim,na comparação dos resultados de agosto e julho de 2005,o incremento foi de 1,0% para as mulheres e de 0,4%para os homens, com aumento de 7.000 ocupações parao contingente de mulheres e de 4.000 para o de homens.No que diz respeito à comparação anual, o movimentotambém foi semelhante: crescimento de 4,8% para asmulheres e de 2,8% para os homens, o que significa que32.000 mulheres foram absorvidas pelo mercado detrabalho, contra 24.000 homens. Em termos departicipação relativa por sexo no total da ocupação, essemovimento significou, na comparação anual, um

Tabela 3

Estimativa dos assalariados do setor privado, por setor de atividade e vínculo de trabalho, na RMPA — ago./04-ago./05

(1 000 pessoas)

INDÚSTRIA CONSTRUÇÃO CIVIL COMÉRCIO SERVIÇOS PERÍODOS Com

Carteira Sem

Carteira Com

Carteira Sem

Carteira Com

Carteira Sem

Carteira Com

Carteira Sem

Carteira 2004 Ago. 222 31 25 (1)- 133 32 286 78 Set. 226 35 25 (1)- 131 29 294 80 Out. 213 35 27 (1)- 133 29 296 82 Nov. 210 34 27 (1)- 129 31 299 78 Dez. 210 32 26 (1)- 127 33 303 77 2005 Jan. 220 31 25 (1)- 127 35 314 70 Fev. 231 29 24 (1)- 135 33 314 71 Mar. 244 26 24 (1)- 137 32 309 75 Abr. 244 26 22 (1)- 135 29 310 77 Maio 236 24 22 (1)- 134 26 315 80 Jun. 236 24 24 (1)- 139 27 317 78 Jul. 237 22 25 (1)- 148 27 316 79 Ago. 243 24 25 (1)- 154 28 316 76

∆ mensal Ago./05 sobre jul./05 6 2 0 (1)- 6 1 0 -3 ∆ anual Ago./05 sobre ago./04 21 -7 0 (1)- 21 -4 30 -2

FONTE: PED-RMPA - Convênio FEE, FGTAS/SINE-RS, SEADE-SP, DIEESE e apoio PMPA.

(1) A amostra não comporta desagregação para essa categoria.

aumento, para as mulheres, de 43,4% para 43,8% e umaqueda, para os homens, de 56,6% para 56,2% do totalde ocupados (Tabela 4).

Em relação à desagregação da ocupação por faixasde escolaridade dos trabalhadores, o contingente depessoas que possuem ensino médio completo ou superiorincompleto foi o grupo que mais cresceu. Observa-se,na comparação mensal de agosto contra julho de 2005,que um número significativo de 13.000 pessoas comensino médio completo ou superior incompleto e umnúmero de 2.000 pessoas com curso superior completoforam absorvidas pelo mercado de trabalho.

No que diz respeito à comparação anual, dos 56.000postos de trabalho gerados em agosto de 2005, emrelação a agosto do ano anterior, 49.000 forampreenchidos pelas pessoas com ensino médio completoou superior incompleto; o contingente de pessoas commais escolaridade, ou seja, superior completo, aumentouem 14.000 pessoas.

Mercado de trabalho na Região Metropolitana de Porto Alegre...

Indic. Econ. FEE, Porto Alegre, v. 33, n. 3, p. 39-46, dez. 2005

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Considerando-se que o movimento positivo, tantona comparação mensal quanto na anual, se deuprincipalmente entre os mais escolarizados, associadoao fato de o emprego no setor privado ter crescido maisentre os com carteira de trabalho assinada, pode-seapontar como característica, no período estudado, e quedeve ser monitorada de perto nos próximos meses, acriação de empregos de melhor qualidade (Tabela 5).

Outro fato positivo entre agosto de 2005 e o mesmomês do ano anterior foi a capacidade de absorção demão-de-obra mostrada pelo mercado de trabalho, quandoo aumento da ocupação (56.000 pessoas) se revelou, noperíodo em foco, mais do que suficiente para absorver apressão dos novos ingressantes no mercado detrabalho — 40.000 pessoas entraram na PopulaçãoEconomicamente Ativa (PEA) —, o que provocou umadiminuição no contingente de desempregados(-16.000) — Gráfico 1.

Ao examinar o Informe PED de agosto de 2005,constata-se que, em relação à taxa de desemprego,apesar de ter havido elevação da mesma em agosto, nacomparação com julho de 2005, de 1,4%, houvedecréscimo de 7,5%, quando se leva em conta a variaçãoanual agosto de 2005 contra agosto de 2004. A elevaçãoda taxa de desemprego total em agosto de 2005 decorreudo aumento da taxa de desemprego oculto, que passou

de 4,2% da PEA em julho para 4,6% em agosto. Já odeclínio observado na comparação anual decorreu daqueda conjunta tanto da taxa de desemprego abertoquanto da do oculto1.

Tomando como referência a taxa de desempregopor atributo pessoal, observa-se, na comparação anual,que esse indicador caiu para quase todos os segmentos,com exceção daquele com 40 anos e mais e do doschefes de domicílio2. No que diz respeito aos chefes dedomicílio, cabe ressaltar que a taxa de desempregorespectiva, após apresentar queda desde o início de 2005,reverteu essa tendência a partir do mês de julho, sendoque, em agosto, o crescimento da taxa de desempregodos chefes foi de 11,0% frente ao mês anterior. Casoesse movimento continue, trará efeitos adversos àsfamílias, na medida em que a sobrevivência passa adepender cada vez mais do esforço coletivo da família.

Na comparação anual, segundo o Informe PED deagosto de 2005, o decréscimo observado na taxa dedesemprego refletiu na redução do indicador tempo médiodespendido pelos desempregados na procura de trabalho,o qual recuou de 44 para 39 semanas, ou seja, umdecréscimo de cinco semanas. Registre-se que, emboraesse resultado denote uma melhoria do indicador, o tempode procura por trabalho ainda permanece elevado.

1 Para maiores informações sobre o comportamento da taxa dedesemprego aberto e oculto, consultar Informe PED (2005b).

2 Para um maior detalhamento dos dados sobre a evolução dataxa de desemprego por atributo pessoal, ver Informe PED(2005b).

Tabela 4

Estimativa e distribuição dos ocupados, por sexo, na RMPA — ago./04, jul./05 e ago./05

PERÍODOS E PARTICIPAÇÕES MULHERES HOMENS TOTAL

Ago./04 Absoluta (1 000 pessoas) .................................. 662 865 1 527 Relativa (%) ....................................................... 43,4 56,6 100,0 Ago./05 Absoluta (1 000 pessoas) .................................. 694 889 1 583 Relativa (%) ....................................................... 43,8 56,2 100,0 Jul./05 Absoluta (1 000 pessoas) .................................. 687 885 1 572 Relativa (%) ....................................................... 43,7 56,3 100,0

FONTE: PED-RMPA - Convênio FEE, FGTAS/SINE-RS, SEADE-SP, DIEESE e apoio PMPA.

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Tabela 5

Estimativa e distribuição dos ocupados, por escolaridade, na RMPA — ago./04, jul./05 e ago./05

PERÍODOS E PARTICIPAÇÕES FUNDAMENTAL INCOMPLETO

FUNDAMENTAL COMPLETO OU

MÉDIO INCOMPLETO

MÉDIO COMPLETO OU

SUPERIOR INCOMPLETO

SUPERIOR COMPLETO

TOTAL

447

321

557

182

1 527

Ago./04 Absoluta (1 000 pessoas) ..................... Relativa (%) .......................................... 29,3 21,0 36,5 11,9 100,0

443

322

606

196

1 583

Ago./05 Absoluta (1 000 pessoas) ..................... Relativa (%) .......................................... 28,0 20,3 38,3 12,4 100,0

440

326

593

198

1 572

Jul./05 Absoluta (1 000 pessoas) ..................... Relativa (%) .......................................... 28,0 20,7 37,7 12,6 100,0 FONTE: PED-RMPA - Convênio FEE, FGTAS/SINE-RS, SEADE-SP, DIEESE e apoio PMPA.

NOTA: A amostra de ocupados sem escolaridade não comporta desagregação da informação.

9

10

11

12

13

14

15

16

17

18

Jan.

Fev

.

Mar

.

Abr

.

Mai

o

Jun.

Jul.

Ago

.

Set

.

Out

.

Nov

.

Dez

.

Jan.

Fev

.

Mar

.

Abr

.

Mai

o

Jun.

Jul.

Ago

.

1 450

1 470

1 490

1 510

1 530

1 550

1 570

1 590

Taxa de desemprego Ocupados

Gráfico 1

Taxa de desemprego e estimativa do número de ocupados na RMPA — jan./04-ago./05

Taxa de desemprego (%) Ocupados (1 000 pessoas)

Legenda:

FONTE: PED-RMPA - Convênio FEE, FGTAS/SINE-RS, SEADE-SP, DIEESE e apoio PMPA.

0 0

Mercado de trabalho na Região Metropolitana de Porto Alegre...

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Evolução desfavorável dosrendimentos do trabalho

De acordo com as informações da PED-RMPA sobrerendimentos do trabalho, no mês de julho do correnteano, o rendimento médio real dos ocupados permaneceurelativamente estável, e o dos assalariados apresentouvariação negativa de 0,6%. Em termos monetários, essesrendimentos passaram a ser de R$ 900 e de R$ 903respectivamente (Gráfico 2).

Examinando os dados sobre o salário médio realno trabalho principal, segundo o setor de atividadeeconômica e o registro em carteira de trabalho3, na RMPA,verificam-se movimentos opostos de recomposição nascomparações mensal e anual. Em julho de 2005, frenteao mês anterior, o salário médio real apresentou variação

positiva de 0,8% para os trabalhadores com carteira detrabalho assinada e de 1,2% para os sem carteira. Aocontrário, esse indicador, na comparação com julho doano anterior, registrou decréscimo de 1,7% para os comcarteira e de 9,9% para os sem carteira de trabalhoassinada. Como houve um aumento expressivo depessoas no contingente de ocupados com carteira detrabalho assinada, é provável que esses trabalhadorestenham entrado, em grande parte, com salários menores,pressionando os rendimentos médios dessa categoriapara baixo.

Quanto à massa de rendimentos reais, segundo oInforme PED do mês de agosto de 2005, verificou-secrescimento, na comparação anual, de 2,7% para osocupados e de 2,3% para os assalariados, determinadopelo aumento no emprego, que mais que compensou aqueda no rendimento médio real.

3 Referentemente aos dados sobre a variação dos rendimentosem geral por setor de atividade econômica e registro em carteirade trabalho, consultar Informe PED (2005b).

80

82

84

86

88

90

92

Jul./

04

Ago

./04

Set

./04

Out

./04

Nov

./04

Dez

./04

Jan.

/05

Fev

./05

Mar

./05

Abr

./05

Mai

o/05

Jun.

/05

Jul./

05

Rendimento Salário

Índices do rendimento e do salário médio real na RMPA — jul./04-jul./05

Índice

FONTE: PED-RMPA - Convênio FEE, FGTAS/SINE-RS, SEADE-SP, DIEESE e apoio PMPA. NOTA: Inflator utilizado: IPC-IEPE; valores em reais de jul./05.

Legenda:

Gráfico 2

Alejandro Kuajara Arandia

Indic. Econ. FEE, Porto Alegre, v. 33, n. 3, p. 39-46, dez. 2005

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Considerações finais

Apesar de ter-se registrado, em agosto de 2005,um aumento de 1,4% na taxa de desemprego, nacomparação com o mês anterior, houve decréscimo de7,5%, quando se leva em conta a variação anual agostode 2005 contra agosto de 2004. Em sentido contrário,merece destaque o movimento desfavorável dosrendimentos do trabalho.

Em relação ao nível de ocupação, houvecrescimento tanto na comparação mensal quanto naanual, com destaque para um maior crescimento dosassalariados do setor privado com carteira de trabalhoassinada. O grau de formalidade, considerando-se apenasos trabalhadores com carteira assinada do setor privado,em agosto, em relação ao mesmo mês do ano anterior,registrou crescimento de 7,3%, ante 1,0% do setor públicoe de 3,7% para o total de ocupados, em paralelo a umaqueda de 8,6% dos trabalhadores assalariados semcarteira assinada.

Dada a evolução desse conjunto de indicadores —exceção aos rendimentos do trabalho —, pode-se dizerque, considerando a comparação de agosto de 2005 como mês anterior e com o mesmo mês do ano anterior, omercado de trabalho evoluiu positivamente, comdestaque para a melhoria da qualidade dos novos postosde trabalho, o que significa maior formalização.

Dessa maneira, o mercado de trabalho da RegiãoMetropolitana de Porto Alegre parece não ter sentido,ainda, os impactos da desaceleração apontada por algunsindicadores do nível de atividade, especialmente daindústria gaúcha, na esteira do processo de elevação dataxa de juros, que começou em setembro do ano passado,além da desvalorização do dólar. Contudo, a se confirmaresse cenário negativo que coloca a indústria gaúcha emestado de alerta, tal impacto deverá, mais cedo ou maistarde, repercutir sobre a ocupação, com todas as agrurasque a diminuição de criação de postos de trabalho trazpara os demais indicadores do mercado de trabalho e,conseqüentemente, para a qualidade de vida dapopulação.

Referências

CARTA DE CONJUNTURA FEE. Porto Alegre: FEE,v. 14, n. 7, jun. 2005a.

CARTA DE CONJUNTURA FEE. Porto Alegre: FEE,v. 14, n. 8, ago. 2005b.

INFORME PED. Porto Alegre: FEE, v. 14, n. 7, ago.2005a.

INFORME PED. Porto Alegre: FEE, v. 14, n. 8, ago.2005b.

MERCADO de trabalho. Conjuntura e Análise, Brasília:IPEA, v. 10, n. 27, maio 2005.

Educação infantil no Brasil e no Rio Grande do Sul: o descompasso frente à legislação

Indic. Econ. FEE, Porto Alegre, v. 33, n. 3, p. 47-62, dez. 2005

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1 - Introdução

Neste artigo, investiga-se a educação infantil noperíodo 1999-05, examinando-se a compatibilização entrea oferta disponível de matrículas e o potencial dademanda acenado pelos objetivos da legislação nessenível de ensino, através de um grupo de indicadoreseducacionais, quais sejam, matrículas iniciais, alunosna escola por faixa etária, formação de professores erecursos educacionais disponíveis nas escolas. Tambémse busca contribuir para o debate sobre a importânciada educação infantil, para levar a bom termo os objetivosda educação básica brasileira.

Assim, no primeiro momento, são apresentados alegislação pertinente à educação infantil e oquestionamento quanto à alocação dos recursosfinanceiros para viabilizá-la. E, no segundo, a partiranálise dos dados, são avaliadas as possibilidades e ascarências no cumprimento dos objetivos estabelecidospela legislação.

2 - A educação infantil: uma parte importante da educação básica

Nos últimos 20 anos, a educação infantil, no Brasile no mundo, foi foco de profundas reflexões no campoda legislação, da investigação pedagógica e das políticaspúblicas governamentais.

Indicadores sociais

Educação infantil no Brasil e no Rio Grande do Sul: o descompasso frente à legislação

Hélios Puig Gonzalez* Economista da FEE.

Salvatore Santagada* Sociólogo da FEE.

As Nações Unidas, a partir da Conferência Mundialde Educação para Todos (em Jomtien, na Tailândia, em1990), que contou com a participação do Governobrasileiro, preconizou que a educação é, ao mesmotempo, um direito verdadeiramente humano e umaresponsabilidade social dos governos.

As transformações no campo da educação infantilde zero a seis anos, no Brasil, ocorridas a partir do finaldos anos 80, foram moldadas num contexto dereivindicações por “educação pública, gratuita e dequalidade”, parcialmente reconhecidas na legislação,sendo que essa luta representa, por diversas causas, acontinuidade de um movimento mais amplo no planomundial.1

De acordo com Longhi, esse reconhecimento, noBrasil, se deve a diferentes motivações:

“Dentre os principais motivos que levaram àexpansão da área de educação infantil,destacam-se o reconhecimento da sociedadeda importância das experiências da infânciapara o desenvolvimento da criança; asconquistas sociais dos movimentos pelosdireitos da criança, dentre elas, o acesso àeducação nos primeiros anos de vida; acrescente urbanização do País; a inserção dasmulheres no mercado de trabalho. Os novospadrões de organização familiar; as condiçõesde abandono infantil e, especialmente, oreincidente fracasso escolar nas primeirasséries do ensino básico (...)” (Longhi, 2005,p. 198).

* Os autores agradecem ao colega Carlos Roberto Winckler asobservações feitas à versão preliminar deste artigo.

1 Um marco básico é o do reconhecimento pelos governos,através da ONU, da necessidade da defesa dos direitos dascrianças e dos adolescentes. O documento inicial foi aDeclaração dos Direitos da Criança (20.11.1959).

Hélios Puig Gonzalez; Salvatore Santagada

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Para Alessio Surian (2005), no mundo, há mais de900 milhões de analfabetos (70% dos quais sãomulheres), 120 milhões de crianças não alfabetizadas(na grande maioria, mulheres) e 150 milhões de alunosque abandonam a escola antes de completar o quartoano de escolarização básica. No Brasil, segundo Marie--Pierre Poirier (Rodrigues; Nascimento, 2005, p. 49),representante da Unicef no País, 2,7 milhões de criançasnão completam a quarta série, e muitas saem das escolasanalfabetas.

Uma motivação de fundo que aponta a superaçãoda falta de qualidade do ensino no Brasil diz respeito àcrítica do Professor Dermeval Saviani (Domínios..., 2002,p. 5), que afirma que “O ensino no Brasil, a partir dosanos 90, ficou atrelado ao assistencialismo, à maquiagemestatística e à onda de privatizações” e que “(...) aspolíticas educacionais governamentais têm estimulado,nos últimos anos, um viés assistencialista”.

A prioridade em implementar políticas públicas paraalcançar a “educação para todos” tem, na educaçãoinfantil, um primeiro passo para qualificar e redefinir aeducação do País. Os argumentos científicos quemostram a importância de se acompanhar odesenvolvimento da criança2 levam à requisição de umaampliação dos recursos educacionais, através dahabilitação de pedagogos e de outros profissionais paraacompanharem a criança na escola.

A legislação brasileira começou a reconhecer osdireitos das crianças na Constituição Federal (Brasil,1988). Esses direitos ampliaram-se com o Estatuto daCriança e do Adolescente (Conselho Nacional dosDireitos da Criança e do Adolescente, 1990), na definiçãoda Política Nacional de Educação infantil (1993), e coma nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional(LDB) (Brasil, 1996), onde a creche (para crianças dezero a três anos) e a pré-escola (para crianças de quatroa seis anos) formam o primeiro nível de ensino —educação infantil. Além da educação infantil, ainda fazemparte da educação básica definida na LDB os ensinosfundamental e médio.

O novo enfoque do legislador e os compromissos aserem assumidos pela sociedade civil e pelo Governosobre a educação das crianças pequenas terãoconseqüências fundamentais, conforme Kappel (2001,p. 36), “(...) na organização da política de atendimento e

na definição de estratégias visando à expansão, àmelhoria e à garantia da qualidade” da educação infantil.

A LDB proclamou, conforme Cerisara (2002, p. 331),pela primeira vez na história das legislações brasileiras,a educação infantil como um direito das crianças, umdever do Estado e uma opção das famílias, nãoassumindo um caráter de obrigatoriedade. A passagemdas creches para a responsabilidade das Secretarias deEducação dos municípios rompeu com o caráter, anterior,meramente assistencialista. Agora, existe uma propostaindissociável e complementar entre a obrigatoriedade dafunção de educar e a de cuidar.

A LDB considera a educação infantil uma parteinseparável da educação básica, tendo por finalidade odesenvolvimento integral da criança de zero a seis anos,em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social,complementando a ação da família e da comunidade.

As orientações constantes na LDB (Brasil, 1996)estão consubstanciadas na proposta pedagógica ecurricular indicada pelo Referencial Curricular NacionalPara a Educação Infantil (RCNEI) (Brasil, 1998, v. 1, p.18), do Ministério da Educação, pelas DiretrizesCurriculares Nacionais Para Educação Infantil (DCNEI)(Brasil, 1999), do Conselho Nacional de Educação.Nesses documentos, são assumidas as especificidadesda educação infantil e revistas as concepções sobre ainfância.3

3 - O financiamento da educação infantil

O financiamento da educação infantil, apesar deser contemplado na Constituição de 1988, nunca estevegarantido, e o problema permaneceu com a EmendaConstitucional (EC) nº 14, de 12 de setembro de 1996,que visou, prioritariamente, estabelecer uma novasistemática de financiamento para o ensino fundamental,através da criação do Fundo de Manutenção eDesenvolvimento do Ensino fundamental e de Valorizaçãodo Magistério (Fundef).

No que diz respeito à educação infantil, na EC 14,o art. 211 continuou com a seguinte redação: “A União,os Estados, o Distrito Federal e os Municípiosorganizarão em regime de colaboração seus sistemasde ensino”. E reafirmou, na nova redação do parágrafo

2 “A ciência mostra que o período que vai da gestação até o sextoano de vida, particularmente de 0 a 3 anos, é o mais importantena preparação das bases das competências e habilidades nocurso de toda a vida humana.” (Relevância..., 2005).

3 Não é objeto do presente artigo analisar a proposta político--pedagógica subjacente tanto no RCNEI quanto nas DCNEI.

Educação infantil no Brasil e no Rio Grande do Sul: o descompasso frente à legislação

Indic. Econ. FEE, Porto Alegre, v. 33, n. 3, p. 47-62, dez. 2005

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2º, “Os Municípios atuarão prioritariamente no ensinofundamental e na educação infantil”.

A Constituição de 1988, ao apontar a responsabili-dade dos municípios no atendimento da necessidade definanciamento do ensino fundamental e da pré-escola (queagora se classifica como educação infantil), estabeleceque estes devem aplicar 25%, no mínimo, da receitaresultante de impostos, compreendida também aproveniente de transferências, na manutenção e nodesenvolvimento do ensino sob sua responsabilidade.No art. 208, no parágrafo 1º, já estava estabelecidoapenas o ensino fundamental como obrigatório. Essasdeterminações, juntamente com o Fundef (Brasil, 1996),acarretaram uma maior atenção ao ensino fundamental,em detrimento da educação infantil.

Conforme Cerisara (2002, p. 333-334) a omissãoda LDB em relação ao financiamento da educaçãoinfantil, aliada à EC 14, regulamentada pela Lei nº 9.424//96, que criou o Fundef, deixa clara a opção governamentalde não dar nenhuma prioridade para atender à educaçãoinfantil, pois a autora afirma que os municípios canalizarãoseus recursos para o ensino fundamental; os estados,para o ensino médio; e a União ficará com o ensinosuperior. Desse modo, a legislação, mesmo insinuandocolaboração e parceria entre os entes públicos, dilui asresponsabilidades em relação à educação infantil, e, naprática, recai sobre os municípios a maior responsabi-lidade para com esse nível de educação, dificultando acanalização de recursos para esse fim.

Os movimentos de educadores, dentre eles oMovimento Interfóruns de Educação infantil no Brasil(MIEB), procuraram contra-atacar a desresponsabilizaçãodo Estado em relação à educação infantil (Cerisara, 2002,p. 334) através da proposta de defesa de uma educaçãoinfantil de qualidade, com a criação de um fundo para aeducação básica ou com a criação de um fundo específicopara a educação infantil.4

O embate entre a sociedade civil e o Estado, quantoao financiamento da educação infantil, não terminou,entretanto “(...) não há boas perspectivas nesta área,em curto prazo, pois o Governo Federal enviou aoCongresso, em 15.06.2005, a proposta de emendaconstitucional que cria o Fundo de Manutenção eDesenvolvimento da Educação Básica [Fundeb], quebeneficiará a pré-escola, os ensinos fundamental e médio,mas excluirá as creches” (Santagada, 2005, p. 2).

Conforme o Professor Magno de Aguiar Maranhão,membro do Conselho Estadual de Educação do Rio deJaneiro, a proposta governamental do Fundeb nãopriorizou a educação infantil devido à possível pressãodos estados.5

4 - A situação atual da edu- cação infantil no Brasil e no Rio Grande do Sul

A educação infantil, na nova agenda social brasileira,tem como objetivos buscar a educação “integral” dacriança pequena — desenvolvimento físico, psicológico,intelectual e social — e também propiciar sua maiorinclusão na escola. A qualificação dos docentes e dopessoal de apoio que atua com a criança, aliada àscondições da infra-estrutura material das escolas, teráconseqüências diretas para a educação infantil e, porfim, para os demais níveis de ensino que receberão essaparcela da população.6

Os dados aqui reunidos foram produzidos pelo INEP,do Ministério da Educação, através do Censo Escolar e

4 O 2º Congresso Nacional de Educação (Coned) propunha, em1997, uma política específica de financiamento para auniversalização gradativa da demanda nas creches e nas pré--escolas (Duas..., 1998, p.45). Em 1998-99, o gasto público total(municipal, estadual e federal) em educação básica e superiorrepresentava 4,3% do PIB. A educação infantil equivalia a 0,4%do PIB. A esfera municipal contribuía com 91,5% dos gastostotais nesse nível educacional, e o restante provinha dos estados(Brasil, 2003). O atual Ministro da Educação, Fernando Haddad,afirmou que o Brasil investe menos que 4% do PIB na sua áreae que precisaria “(...) investir, durante 20 anos, pelo menos 6%do PIB, se quiser realmente resolver seus problemas na áreaeducacional” (Alencar, 2005), sendo este o patamar deinvestimentos recomendado pela UNESCO.

5 “Até onde sabemos, o corte na educação infantil, expressosobretudo na exclusão das creches do Fundeb, teria sidoprovocado pela pressão dos estados, que temem os gastosque seriam gerados para acolher a massa de crianças de atétrês anos excluídas do sistema educacional. Além disso, comojá divulgado em estudo de vários órgãos do Governo, a rede decreches teria que crescer 470% até 2011, para absorver umaclientela de 4,3 milhões, e os investimentos saltariam de 0,07%para 0,56% do PIB; a despesa por aluno/ano chegaria a R$2.469, a maior da educação básica.” (Maranhão, 2005).

6 Investigações do Ministério de Educação e Cultura/InstitutoNacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira(MEC/INEP) apontam um melhor desempenho no Sistema deAvaliação da Educação Básica (SAEB) dos alunos do ensinofundamental que passaram pela educação infantil, em relaçãoàqueles alunos que não cursaram a educação infantil (Maranhão,2005). Segundo Longhi (2005, p. 221), a pré-escola pode prevenira reprodução do analfabetismo e futuros problemas quanto àalfabetização.

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do Banco de Dados EDUDATABRASIL, e, quandonecessários, foram trabalhados pelo Núcleo deIndicadores Sociais da FEE.

A análise das informações sobre a educação infantil7

abarca, num primeiro momento, os anos 1999 e 2005,com informações sobre o total de matrículas iniciais, pordependência administrativa, em creches e na pré-escolae, no segundo momento, 1999 e 2003, sendo este o últimoano do qual se tem informações sobre a faixa etária dosalunos, a formação dos professores e a infra-estruturadas escolas.

A presente análise enfatiza os indicadoreseducacionais, no que diz respeito à situação atual daeducação infantil no País e, em especial, no RS.

4.1 - Matrículas iniciais por de- pendência administrativa

Em 2005, o número de matrículas na educaçãoinfantil foi de 7,2 milhões de crianças no Brasil e de 285mil crianças no RS.

No Brasil, no período 1999-05, as matrículas emcreches aumentaram em 583.153, um crescimento de70,1%, e, na pré-escola, aumentaram 1.554.265, umcrescimento de 36,7%, totalizando 2.137.418 matrículasnovas de crianças atendidas pela educação infantil noBrasil, um crescimento de 42,2%.

A participação de creches e da pré-escola, noBrasil, no total da educação infantil passou de 16,4% e83,6% em 1999, respectivamente, para 19,6% e 80,4%em 2005.

A pré-escola, considerando-se apenas as criançasmatriculadas, detém a maior participação no total daeducação infantil, enquanto as creches representam umquinto da oferta total de matrículas desse nível de ensino.

A análise do total das matrículas nas creches, noBrasil, no período investigado, indicou um pequenoacréscimo, da ordem de 3,2 pontos percentuais.Evidenciam-se, quanto à dependência administrativa, umretraimento da participação estadual e um pequenocrescimento da participação municipal e privada, queconcentram a quase-totalidade das matrículas dascreches, com destaque para as matrículas municipais.

A oferta de matrículas iniciais na pré-escola, noBrasil, em igual período, teve uma retração de 3,2 pontospercentuais, embora estas representem 80,4% do totaldisponível na educação infantil, em 2005. O mesmofenômeno de decréscimo no número de matrículasestaduais, ocorrido em creches, repete-se agora na pré--escola. Entretanto, neste nível de ensino, as perdas foramde 130.688 matrículas, um decréscimo de 34,4%,constatando-se um forte recuo da participação do Estadoe uma maior presença dos municípios na oferta dasmatrículas perdidas naquela dependência admistrativa.Ainda na pré-escola, a iniciativa privada amplioulevemente sua participação no total de matrículas, aorealizar um crescimento de 43,4%, em números absolutossomou 457.887 novas matrículas, ou seja, quase umterço das realizadas em nível municipal, o qual aumentou1.226.623 matrículas, apresentando um crescimento de43,8% no período.

No Brasil, ao observar-se a distribuição dasmatrículas iniciais existentes na educação infantil, pordependência administrativa, verifica-se que a rede pública(federal, estadual e municipal) ofereceu, em 2005, 71,6%das matrículas existentes, embora a rede privadaapresente uma taxa de crescimento de 52,1%, percentualsuperior ao crescimento de 38,6% da rede pública.

A esfera municipal é a que mais matrículas iniciaisofertou em valores absolutos. Essa instância, como estámais próxima das famílias e corresponde à prioridadeconstitucional de atuação dos municípios, refletindo apressão pelo aumento de vagas, teve um melhor resultado(Brasil, 2001).

No período 1999-05, no RS, as matrículas iniciaisna educação infantil aumentaram em 98.158, umcrescimento de 52,5%. As creches tiveram o número dematrículas iniciais aumentado em 57.776, umcrescimento de 415,0%.

E, na pré-escola, o número de matrículas iniciaisaumentou em 40.382, um crescimento de 23,3%.

A análise do total de matrículas nas creches, noRS, no período investigado, indica um desempenho bemdiverso do caso brasileiro, pois essas passaram de13.923 para 71.699, ou seja, a oferta, no período,quadruplicou.8 Sua participação no total das matrículasda educação infantil do RS passou de 7,4% para 25,1%.

7 Os dados da educação infantil, em especial as matrículas nascreches, devem ser avaliados com cuidado, porque, pela formacomo é realizado o Censo Escolar, somente as creches comregistro oficial são captadas na pesquisa do MEC (Kappel, 2001).

8 A oferta de vagas em creches, no RS, era pequena em 1999.Vale lembrar que, nesse ano, teve início o registro oficial denovas escolas. O crescimento posterior é um somatório dosnovos registros, da necessidade das mães trabalhadoras e deuma nova valorização da educação das crianças de até trêsanos.

Educação infantil no Brasil e no Rio Grande do Sul: o descompasso frente à legislação

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No caso da pré-escola, no RS, o comportamentoda oferta de matrículas iniciais é peculiar, pois, nessemesmo período, a oferta cresceu menos do que no País.As matrículas passaram de 173.168 para 213.550, umcrescimento de 23,3%, em comparação aos 36,7%alcançados em nível nacional. Em 1999, a participaçãoda pré-escola era de 92,6% do total da educação infantil,diminuindo, em 2005, para 74,9%.

Comparando-se com o Brasil, verifica-se que, noRS, a participação da rede pública na educação infantiltambém se sobressai na oferta de matrículas, com 72,9%em 2005. A presença municipal cresce, embora a esferaestadual ainda participe com uma parcela importante dasmatrículas. A participação da rede privada (confessional,filantrópica, comunitária, ONGs e outras) aumentou, noperíodo, na ordem de 130,0%, deixando à mostra o muitoque deve ser realizado em termos de uma maior ofertada área pública no RS, sem se menosprezar anecessidade de o mesmo esforço ocorrer em nívelnacional.

Verifica-se que, quanto à oferta de matrículas nascreches no Estado, estas apresentam uma performance

bastante diferenciada daquela do Brasil. No período 1999--05, a dependência estadual, que já ofertava poucasmatrículas, diminuiu ainda mais sua participação. Emque pese à pequena oferta de matrículas em creches,tanto na rede privada quanto na esfera municipal, em1999, o crescimento dessas dependências administra-tivas é bastante representativo. A rede privada cresceu684,6%, e a esfera municipal, 322,0%, no períodoinvestigado. Vale lembrar que esses crescimentosespetaculares ocorreram segundo a causa já comentada,ou seja, devido ao fato de a base de dados de 1999partir de um patamar pequeno de matrículas iniciais,dentre outros fatores.

Comparando-se o Brasil com o Estado, constata--se, na pré-escola, uma característica do RS, onde émarcante a presença da oferta estadual, embora comuma retração de 5.064 matrículas em 2005, em relaçãoa 1999. A rede privada aumentou sua participação noperíodo em foco, e cresceu 63,6%, ou seja, quase o dobroda esfera municipal, mesmo assim essa dependênciaadministrativa ofereceu mais vagas em númerosabsolutos.

Tabela 1 Matrículas iniciais em creches, na pré-escola e no total da educação infantil, por dependência administrativa, no Brasil e no Rio Grande do Sul — 1999 e 2005

a) educação infantil (creche mais pré-escola) 1999 2005 VARIAÇÃO 1999-05

DISCRIMINAÇÃO Número Composição

(%) Número Composição

(%) Absoluta %

∆ a.a.

Brasil ...................... 5 067 256 100,00 7 204 674 100,00 2 137 418 42,2 6,0 Rede pública ........... 3 720 251 73,40 5 155 910 71,60 1 435 659 38,6 5,6 Federal ............... 1 733 0,05 2 561 0,05 828 47,8 6,7 Estadual ............. 396 395 10,70 266 378 5,20 130 017 -32,8 -6,4 Municipal ............ 3 322 123 89,30 4 886 971 94,80 1 564 848 47,1 6,6 Rede privada ........... 1 347 005 26,60 2 048 764 28,40 701 759 52,1 7,2 RS ........................... 187 091 3,70 285 249 4,00 98 158 52,5 7,3 Rede pública ........... 153 494 82,00 207 964 72,90 54 470 35,5 5,2 Federal ............... 0 0,00 144 0,07 144 - - Estadual ............. 62 049 40,40 57 080 27,40 4 969 -8,0 -1,4 Municipal ............ 91 445 59,60 150 740 72,50 59 295 64,8 8,7 Rede privada ........... 33 597 18,00 77 285 27,10 43 688 130,0 14,9

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será abordada a taxa de escolarização líquida9. Elapermite situar as matrículas ocupadas pelas crianças nafaixa etária adequada ao nível de ensino, em relação aototal da população nessas mesmas faixas etárias, bemcomo verificar as carências de matrículas para ascrianças que estão fora da escola.

9 A taxa de escolarização líquida da educação infantil, das crechese da pré-escola corresponde à relação entre o total de matrículasde estudantes na faixa etária adequada ao nível de ensino e ototal da população na faixa etária correspondente àquele nível.

Tabela 1 Matrículas iniciais em creches, na pré-escola e no total da educação infantil, por dependência administrativa, no Brasil e no Rio Grande do Sul — 1999 e 2005

b) creches 1999 2005 VARIAÇÃO 1999-05

DISCRIMINAÇÃO Número Composição

(%) Número Composição

(%) Absoluta %

∆ a.a.

Brasil ..................... 831 978 16,40 1 415 131 19,60 583 153 70,1 9,3 Rede pública .......... 539 804 64,90 879 085 62,10 339 281 62,9 8,5 Federal ............. 508 0,09 893 0,10 385 75,8 9,9 Estadual ............ 16 593 3,07 17 264 1,96 671 4,0 0,7 Municipal .......... 522 703 96,80 860 928 97,90 338 225 64,7 8,7 Rede privada ........ 292 174 35,10 536 046 37,90 243 872 83,5 10,6 RS........................... 13 923 7,40 71 699 25,10 57 776 415,0 31,4 Rede pública .......... 10 328 74,20 43 496 60,70 33 168 321,1 27,1 Federal ............. 0 0,00 58 0,10 58 - - Estadual ............ 75 0,70 170 0,40 95 126,7 14,6 Municipal .......... 10 253 99,30 43 268 99,50 33 015 322,0 27,1 Rede privada ......... 3 595 25,80 28 203 39,30 24 608 684,5 41,0

c) pré-escola

1999 2005 VARIAÇÃO 1999-05 DISCRIMINAÇÃO

Número Composição (%) Número Composição

(%) Absoluta % ∆ a.a.

Brasil .......................... 4 235 278 83,60 5 789 543 80,40 1 554 265 36,7 5,3 Rede pública ............... 3 180 447 75,10 4 276 825 73,90 1 096 378 34,5 5,1 Federal ................... 1 225 0,04 1 668 0,04 443 36,2 5,3 Estadual ................. 379 802 11,90 249 114 5,80 130 688 -34,4 -6,8 Municipal ................ 2 799 420 88,00 4 026 043 94,10 1 226 623 43,8 6,2 Rede privada ............... 1 054 831 24,90 1 512 718 26,10 457 887 43,4 6,2 RS ............................... 173 168 92,60 213 550 74,90 40 382 23,3 3,6 Rede pública ............... 143 166 82,70 164 468 77,00 21 302 14,9 2,3 Federal ................... 0 0,00 86 0,05 86 - - Estadual ................. 61 974 43,30 56 910 34,60 5 064 -8,2 -1,4 Municipal ................ 81 192 56,70 107 472 65,30 26 280 32,4 4,8 Rede privada ............... 30 002 17,30 49 082 23,00 19 080 63,6 8,5

FONTE: MEC/INEP. FEE/CIE/NIS.

4.2 - Matrículas na educação infantil por faixa etária

Antes de se analisarem as informações dematrículas iniciais existentes em creches e na pré-escola,por faixa etária, para os anos de 1999 e 2003, sendo2003 o último ano para o qual esse quesito é divulgadono Banco de Dados EDUDATABRASIL, do MEC/INEP,

Educação infantil no Brasil e no Rio Grande do Sul: o descompasso frente à legislação

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As taxas de escolarização líquida, em 2003, para ototal da educação infantil, as creches e a pré-escola foramcalculadas a partir dos dados de matrículas iniciais, porfaixa etária, provenientes da Tabela 3 e a partir dapopulação por faixa etária do Brasil (IBGE, 2004) e doRS (Jardim, 2005). A partir do cálculo da taxa deescolarização de cada nível de ensino, identifica-se odéficit e/ou a carência do atendimento.

Em 2003, a educação infantil no Brasil atendeu a5.318.893 crianças na faixa etária de zero a seis anos,ou seja, 21,8% da população nessa faixa etária, que erade 24.384.955 crianças. No RS, o percentual foi aindamenor (17,9%), ou seja, foram atendidas 218.976crianças de uma população de 1.220.351 crianças.

A situação é calamitosa nos diferentes níveis,embora a da pré-escola esteja numa posição diferenciadafrente às outras. No Brasil, somente 5,3% (755.371crianças) do total das crianças de zero a três anos estãoem creches, e 44,8% das crianças de quatro a seis anos(4.563.522 crianças) estão na pré-escola. No RS, oatendimento nas creches era de 6,0% (42.689 crianças),ou seja, um atendimento levemente superior ao do País,enquanto, na pré-escola, 34,5% (176.287 crianças) eramatendidas, apresentando taxa de escolarização líquidabem menor que a brasileira.

Como se mostra na Tabela 2, a partir das taxas deescolarização líquida, são apontadas as taxas de criançasnão matriculadas, evidenciando-se uma carência pormatrículas em creches da ordem de 94,7% no Brasil ede 94,0% no RS; enquanto, para a pré-escola, tal carênciaé de 55,2% e de 65,5% respectivamente. Dessa forma,confirmam-se o fosso existente entre a situação real e ademanda potencial10 e o muito que ainda deve serrealizado urgentemente para atender às metas do PlanoNacional de Educação. O Plano propôs alcançar, em cincoanos (até 2007), as metas de ampliação da oferta em30% para a população de até três anos de idade e de60% para a população de quatro a seis anos (ou quatroe cinco anos) e, em uma década, atender, respectivamen-te, a 50% e a 80% dessas crianças (Brasil, 2001).

A distância entre a meta de escolarização dapopulação infantil, de 30% em creches e de 60% na pré--escola, a ser alcançada para o início de 2007, conformeos objetivos do Plano Nacional de Educação, e o quehavia sido realizado de concreto em dois anos, até 2003,era de 24,7 pontos percentuais para as creches no Brasil

e de 24,0 pontos percentuais no RS; enquanto, na pré--escola, faltavam, no Brasil, 15,2 pontos percentuais e,no RS, 25,5 pontos percentuais.

Na análise em separado das faixas etárias de zeroa três anos (creches) e de quatro a seis anos (pré-escola),é possível constatarem-se qual o número de matrículasdos alunos que estão participando do sistema escolarem relação à idade adequada definida nos objetivos legaisda educação infantil e o quanto as instituições públicase privadas atendem a esses dois níveis educacionais.

Conforme a Tabela 3, entre 1999 e 2003, o Brasilatendia a 91,8% e a 93,3% das crianças que participavamdo sistema educacional na educação infantil, com idadesadequadas que variaram entre zero e seis anos. Em 2003,nas idades de sete anos e mais, havia 432.427 crianças,ou seja, elas se encontravam fora da faixa etária esperada.No Brasil, em igual período, as matrículas em crechespassaram de 58,9% para 61,0% na faixa etária adequadaa esse nível. Em 2003, 41,1% das crianças matriculadasem creches tinham idades acima da faixa etáriaadequada. A situação das matrículas na pré-escola, noBrasil e no RS, com idade adequada entre quatro e seisanos, estava em melhores condições quanto a essequesito, quando comparada com as taxas de atendimentodas creches. No Brasil, a matrícula, na pré-escola, decrianças com idade adequada variou de 85,9% para88,5%, verificando-se uma pequena melhoria.

No RS, a defasagem de faixa etária na educaçãoinfantil teve um movimento inverso do verificado no Brasil,pois o percentual de crianças matriculadas com idadeadequada era de 97,5% e passou para 89,9% nos anoscitados, ou seja, a distorção na faixa etária é maior queno País, pois apresentou, em 2003, uma taxa de 10,1%,e, em números absolutos, havia 27.276 criançasmatriculadas fora da faixa etária adequada. Ainda noEstado, em 1999, com um número pequeno de matrículasem creches, 72,5% estavam na faixa etária adequada,e, em 2003, a situação era semelhante àquela do Brasil,embora com um percentual levemente superior (67,6%).Entre as crianças desse nível escolar, 32,4% estavamfora da idade esperada. A pré-escola, no RS, entre 1999e 2005, passou de um atendimento de 90,6% para 85,5%de crianças matriculadas na faixa etária adequada, comuma retração de mais de cinco pontos percentuais.

Comparando-se o Brasil e o RS, verifica-se, paraambos, quanto ao atendimento da faixa etária adequadadas crianças e o respectivo nível de ensino, que a crecheé onde a defasagem de idade se apresenta maior. Emsegunda posição quanto a esse quesito, está a educaçãoinfantil como um todo e, com menor defasagem, emterceiro lugar, a pré-escola.

10 Miola afirma que: “(...) dos 500 municípios brasileiros commelhores indicadores na educação infantil, somente 18 sãogaúchos’’ (Miola, 2003). Estudo realizado pela equipe do Núcleode Indicadores Sociais da FEE (Accurso, 2004) apontou que193 municípios do RS não disponibilizavam creches em 2002.

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Tabela 3

Matrícula inicial em creches, na pré-escola e no total da educação infantil, por faixa etária, no Brasil e no Rio Grande do Sul — 1999 e 2003

MATRÍCULAS TOTAIS MATRÍCULAS DE 0 A 3 ANOS

1999 2003 1999 2003 DISCRIMINAÇÃO

Número % Número % ∆ a.a.

1999-03 Número % Número % ∆ a.a.

1999-03

Educação infantil Brasil ..................... 5 067 256 100,0 6 393 234 100,0 6,0 688 158 13,6 930 780 14,6 7,8 RS ......................... 187 091 3,7 269 340 4,2 9,5 23 214 12,4 45 686 17,0 18,4 Creche Brasil ..................... 831 978 100,0 1 237 558 100,0 10,4 490 070 58,9 755 371 61,0 11,4 RS ......................... 13 923 1,7 63 176 5,1 46,0 10 090 72,5 42 689 67,6 43,4 Pré-escola Brasil ..................... 4 235 278 100,0 5 155 676 100,0 5,0 198 088 4,7 175 409 3,4 -3,0 RS ......................... 173 168 4,1 206 164 4,0 4,5 13 124 7,6 2 997 1,5 -30,9

MATRÍCULAS DE 4 A 6 ANOS MATRÍCULAS DE 7 ANOS E MAIS 1999 2003 1999 2003 DISCRIMINAÇÃO

Número % Número % ∆ a.a.

1999-03 Número % Número % ∆ a.a.

1999-03

Educação infantil Brasil ..................... 3 963 072 78,2 5 030 027 78,7 6,1 416 026 8,2 432 427 6,8 1,0 RS ......................... 159 195 85,1 196 378 72,9 5,4 4 682 2,5 27 276 10,1 55,4 Creche Brasil ..................... 325 627 39,1 466 505 37,7 9,4 16 281 2,0 15 682 1,3 -0,9 RS ......................... 2 327 16,7 20 091 31,8 71,4 1 506 10,8 396 0,6 -28,4 Pré-escola Brasil ..................... 3 637 445 85,9 4 563 522 88,5 5,8 399 745 9,4 416 745 8,1 1,0 RS ......................... 156 868 90,6 176 287 85,5 3,0 3 176 1,8 26 880 13,0 70,6

FONTE: MEC/INEP/SEEC. FONTE: FEE/CIE/NIS. NOTA: A idade foi obtida a partir do ano de nascimento informado no Censo Escolar, isto é, foi considerada a idade que o aluno completou em 1999 e 2003.

Tabela 2 Matrícula inicial em creches, na pré-escola e no total da educação infantil, por faixa etária e taxa de escolarização líquida, no Brasil e no RS — 2003

DISCRIMINAÇÃO POPULAÇÃO TOTAL

MATRÍCULA INICIAL

TAXA DE ESCOLARIZAÇÃO

LÍQUIDA (%)

TAXA DE NÃO MATRICULADOS

(%)

Brasil

Educação infantil (de 0 a 6 anos) .............. 24 384 955 5 318 893 21,8 78,2

Creche (de 0 a 3 anos) .............................. 14 192 808 755 371 5,3 94,7

Pré-escola (de 4 a 6 anos) ........................ 10 192 147 4 563 522 44,8 55,2

Rio Grande do Sul

Educação infantil (de 0 a 6 anos)............... 1 220 351 218 976 17,9 82,1

Creche (de 0 a 3 anos) .............................. 708 808 42 689 6,0 94,0

Pré-escola (de 4 a 6 anos) ........................ 511 473 176 287 34,5 65,5 FONTE: MEC/INEP.

IBGE. FEE/CIE/NIS.

Educação infantil no Brasil e no Rio Grande do Sul: o descompasso frente à legislação

Indic. Econ. FEE, Porto Alegre, v. 33, n. 3, p. 47-62, dez. 2005

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11 O Censo da Educação infantil 2000, do MEC (Instituto Na-cional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira,2005), nos resultados preliminares, abarca uma série de temasque não formam o escopo da presente análise.

12 “A restrição existente na leitura desse indicador é a impossi-bilidade de estabelecer a carga horária cumprida pelo docente ea quantidade de turnos em que ele atua.” (Brasil, 2002).

4.3 - A educação infantil e a formação dos professores

A análise das Tabelas 4 e 5 está circunscrita àformação dos professores e à oferta de recursoseducacionais que constam no EDUDATABRASIL, doMEC/INEP. Sabe-se que as questões levantadasabarcam uma parte da realidade vivenciada por alunos eprofessores da educação infantil em relação aos recursoshumanos e físicos. Estão fora da análise os serviços deapoio pedagógico e administrativo, os serviços de saúdee alimentação, as oficinas de arte, as orientaçõesdidáticas para os profissionais, dentre outros temas11.

Os professores que atuam na educação infantil,segundo a LDB, devem ter como formação mínima oCurso Normal, oferecido em nível médio. Considerando--se que a educação ocorre já desde os primeiros anosde vida e “(...) dada a maleabilidade da criança àsinterferências do meio social (...)” (Brasil, 2001), torna--se importante a busca da qualificação dos profissionaisdessa área.

No Brasil, em 2003, havia, na educação infantil,345.340 funções docentes12, sendo 222.506 públicas(64,4%) e 122.834 particulares (35,6%). Entre as públicas,206.811 eram municipais, e 15.440, estaduais, sendoque a dependência federal era praticamente inexpressiva.Do conjunto dos professores, 21,6% lecionavam emcreches, e 78,4%, na pré-escola. Entre os que lecionavamem creches, a formação de ensino médio — formaçãomínima para a educação infantil — representava 70,9%,e o ensino superior, 17,7%. Somente 11,4% dosprofessores não tinham a formação requerida pelalegislação.

Entre os docentes da rede pública do Brasil,18,8% atuavam em creches, e 81,2%, na pré-escola.A formação dos professores que atuavam em crechesera a seguinte: 72,7% tinham o ensino médio, 16,7%, osuperior, e 10,7%, somente o fundamental, os quais,dessa forma, não cumpriam a legislação. No Brasil, aformação dos docentes da pré-escola é mais próxima daesperada, pois 65,5% cursaram o nível médio, e 31,3%,

o superior, sendo que somente 3,2% tinham apenas aformação de nível fundamental.

Na rede privada, 26,8% dos docentes, no Brasil,trabalhavam em creches, e 73,2%, na pré-escola. Dosque atuavam em creches, 68,6% tinham a formação denível médio, e 19,0%, a superior, e a formação de cursofundamental tinha uma participação maior que entreaqueles profissionais da rede pública, pois alcançava ataxa de 12,4%. Na pré-escola, a formação apresentava--se em sua quase-totalidade no nível esperado, pois65,2% tinham formação de nível médio, 31,2%, de níveluniversitário, e apenas 3,6% atuavam apenas com aformação de nível fundamental.

Em 2003, no RS, havia 19.575 pessoas exercendofunções docentes na educação infantil, sendo que 33,1%estavam lotadas nas creches, e 66,9%, na pré-escola.Ainda no Estado, nesse mesmo ano, a formação dosprofessores que trabalham em creches é inferior à dosdocentes do Brasil, pois 21,8% tinham somente o ensinofundamental. Já a formação dos docentes que atuam napré-escola é semelhante às do que atuam no País, emboraa participação de educadores com curso superior sejamaior, pois estes representavam 41,9% do total, esomente 4,4% tinham o ensino fundamental.

Na rede pública, no RS, 28,4% dos professorestrabalham em creches, e 71,6%, na pré-escola. Essesprofessores que atuam em creches têm uma formaçãodiferenciada frente aos docentes do País, pois 18,9%possuem somente o curso fundamental. Na pré-escola,repete-se um quadro semelhante ao registrado no Brasil,no âmbito da formação geral dos professores públicos,pois 3,1% não apresentam a formação esperada. Odiferencial é a participação dos professores que têm cursosuperior, 42,5%.

Os docentes da rede privada do RS têm umacaracterística diferenciada em relação ao padrão nacional,pois, em creches, os professores que têm somente aformação fundamental são o dobro do percentualbrasileiro, ou seja, 25,6%. Na pré-escola, a formação dosdocentes com curso superior era mais elevada que anacional, pois 40,3% deles tinham o nível superior.Entretanto os profissionais com o curso fundamentalapresentavam uma taxa de 7,5%, ou seja, o dobro dabrasileira.

O Plano Nacional de Educação (PNE) (Brasil, 2001)propõe que, em cinco anos, todos os professores tenhamhabilitação específica de nível médio e, em 10 anos,

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Indic. Econ. FEE, Porto Alegre, v. 33, n. 3, p. 47-62, dez. 2005

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13 Melo (2004, p.36) afirma que: “Um dos artigos da lei [LDB]estabelecia, pela primeira vez desde a criação da primeira EscolaNormal, em 1830, a necessidade de formação específica denível superior a todos os professores contratados a partir de2007. A exigência caiu, mas antes disso gerou uma debandadados cursos normais”.

70% tenham formação específica de nível superior.13 Apartir da análise sobre a formação dos docentes quetrabalham com crianças pequenas, ficou demonstradoque há uma longa distância a percorrer para se alcançaremas metas propostas no PNE. Recentemente, essas metas

foram prorrogadas, tendo em vista o pedido dasuniversidades brasileiras para terem mais tempo paracriar os novos cursos de formação de professores dentrodas novas diretrizes do Conselho Federal de Educação.

Tabela 4 Número e percentual de professores, segundo a formação e a dependência administrativa, em creches,

na pré-escola e no total da educação infantil do Brasil e do Rio Grande do Sul — 2003

a) total de professores

EDUCAÇÃO INFANTIL CRECHES PRÉ-ESCOLA DISCRIMINAÇÃO

Número % Número % Número %

Brasil .................... 345 340 100,0 74 765 21,6 270 575 78,4

Rede pública ......... 222 506 64,4 41 895 18,8 180 611 81,2

Rede privada ........ 122 834 35,6 32 870 26,8 89 964 73,2 RS ........................ 19 575 5,7 6 473 33,1 13 102 66,9

Rede pública ........ 13 072 66,8 3 709 28,4 9 363 71,6

Rede privada ......... 6 503 33,2 2 764 42,5 3 739 57,5

b) professores com ensino fundamental (completo ou incompleto)

EDUCAÇÃO INFANTIL CRECHES PRÉ-ESCOLA DISCRIMINAÇÃO

Número % Número % Número %

Brasil ................... 17 207 5,0 8 556 11,4 8 651 3,2

Rede pública ......... 9 875 4,4 4 471 10,7 5 404 3,0

Rede privada ......... 7 332 6,0 4 085 12,4 3 247 3,6

RS ......................... 1 982 10,1 1 409 21,8 573 4,4

Rede pública ......... 992 7,6 701 18,9 291 3,1

Rede privada ......... 990 15,2 708 25,6 282 7,5

c) professores com ensino médio (completo)

EDUCAÇÃO INFANTIL CRECHES PRÉ-ESCOLA DISCRIMINAÇÃO

Número % Número % Número %

Brasil .................... 230 238 66,7 52 996 70,9 177 242 65,5

Rede pública ......... 149 026 67,0 30 444 72,7 118 582 65,7

Rede privada ........ 81 212 66,1 22 552 68,6 58 660 65,2 RS ......................... 11 123 56,8 4 079 63,0 7 044 53,8

Rede pública ......... 7 508 57,4 2 415 65,1 5 093 54,4

Rede privada ........ 3 615 55,6 1 664 60,2 1 951 52,2

Educação infantil no Brasil e no Rio Grande do Sul: o descompasso frente à legislação

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Tabela 4 Número e percentual de professores, segundo a formação e a dependência administrativa, em creches,

na pré-escola e no total da educação infantil do Brasil e do Rio Grande do Sul — 2003

d) professores com ensino superior (completo e sem licenciatura)

EDUCAÇÃO INFANTIL CRECHES PRÉ-ESCOLA DISCRIMINAÇÃO

Número % Número % Número %

Brasil ..................... 97 895 28,3 13 213 17,7 84 682 31,3

Rede pública .......... 63 605 28,6 6 980 16,7 56 625 31,4

Rede privada ......... 34 290 27,9 6 233 19,0 28 057 31,2 RS .......................... 6 470 33,1 985 5,0 5 485 41,9

Rede pública .......... 4 572 35,0 593 16,0 3 979 42,5

Rede privada ......... 1 898 29,2 392 14,2 1 506 40,3

FONTE: MEC/INEP. FEE/CIE/NIS.

NOTA: 1. O mesmo docente pode atuar em mais de um nível ou modalidade de ensino e em mais de um estabelecimento. 2. O mesmo docente com ensino fundamental pode atuar de 1ª a 4ª e de 5ª a 8ª séries.

4.4 - A educação infantil e os recursos educacionais

O exame dos indicadores elaborados a partir dosrecursos educacionais é uma das maneiras de visualizarcomo as crianças são instigadas a participar doprocesso de ensino-aprendizagem na educação infantil,no sentido da busca do desenvolvimento integral dacriança, assim como está inscrito nos documentos queorientam o ensino infantil no País. Os recursoseducacionais disponíveis — ainda que não se tenha oquadro da sua qualidade e desempenho —, aliados auma boa formação dos professores, do pessoal de apoioe aos equipamentos, poderão ser um diferencialimportante para uma boa performance das criançaspequenas. Dos 12 itens selecionados, serão analisadosnove, ficando de fora os três que atingiram percentuaispróximos à universalização, variando sua cobertura entreum mínimo de 83,5% e um máximo de 100%, quaissejam, água, energia elétrica e esgoto.

Em 2003, o número de escolas, no Brasil, comcreches era de 18.603, o número de funções docentesera de 74.765, e o número de alunos por docente era

16,6.14 A infra-estrutura escolar dessas crechesapresentava o seguinte quadro de recursos: 24,0% combibliotecas; 11,8% com laboratório de informática; 6,0%com laboratório de ciências; 14,4% com quadra deesportes; 31,4% com sala de TV; 9,9% com TV/vídeo//parabólica; 26,1% com microcomputador; 6,1% comacesso a internet; e 53,3% com sanitários.

Em 2003, o número de escolas, no Brasil, com pré--escola era de 80.878, o número de funções docentesera de 270.575, e o número de alunos por docente era19,1. A infra-estrutura escolar nesse nível de ensinoapresentava o seguinte quadro de recursos: 29,1% combibliotecas; 10,9% com laboratório de informática; 7,6%com laboratório de ciências; 19,3% com quadra deesportes; 21,1% com sala de TV; 15,3% com TV/vídeo//parabólica; 25,2% com microcomputador; 5% comacesso a internet; e 29,9% com sanitários.

Em 2003, no RS, as escolas com creches eram1.815, e as funções docentes, 6.473, e havia 9,8 alunospara um docente. Esses indicadores apontam umasituação melhor que a brasileira, mas devem ser avaliadoscom os cuidados já apontados na nota de rodapé 14. Ainfra-estrutura escolar nessas creches apresentava o

14 “No Censo Escolar, onde o levantamento tem como unidade decoleta a escola, é registrado o número de funções docentes, jáque o mesmo professor pode atuar em mais de um nível//modalidade de ensino, num mesmo estabelecimento de ensino,como também em mais de uma escola. A restrição existente naleitura desse indicador é a impossibilidade de estabelecer acarga horária cumprida pelo docente e a quantidade de turnosem que ele atua.” (Brasil, 2002).

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seguinte quadro de recursos: 29,0% com bibliotecas; 8,8%com laboratório de informática; 3,0% com laboratório deciências; 14,3% com quadra de esportes; 48,5% comsala de TV; 18,5% com TV/vídeo/parabólica; 36,7% commicrocomputador; 13,8% com acesso a internet; e 72,8%com sanitários.

Na comparação entre os recursos disponíveis nascreches do Brasil e nas do RS, o Estado leva vantagemem seis dos nove recursos educacionais analisados,sendo estes, pela ordem, as escolas com sanitários, comsala com TV, com microcomputador, com biblioteca, comTV/vídeo/parabólica e as escolas com acesso a internet.A situação das creches no Brasil supera a do RS emlaboratório de informática e laboratório de ciências. Noquesito quadra de esportes, o Brasil e o RS ficamequiparados.

Em 2003, no RS, as escolas com pré-escola eram5.785, e as funções docentes, 13.102, e havia 15,7 alunospara cada docente. A infra-estrutura educacional na pré--escola oferecia o seguinte quadro de recursos: 66,8%

com bibliotecas; 23,5% com laboratório de informática;25,6% com laboratório de ciências; 49,8% com quadrade esportes; 43,4% com sala de TV; 21,9% com TV//vídeo/parabólica; 64,9% com microcomputador; 17,0%com acesso a internet; e 65,5% com sanitários.

Na comparação entre a situação da pré-escola doBrasil e a do RS, este último apresenta uma melhor ofertade recursos educacionais, pois supera o total nacionalem todos os nove quesitos analisados. A oferta dessesrecursos na pré-escola foi, inclusive, superiores à dascreches. Chamam atenção as diferenças entre os dadosdo Estado e os do País, sendo, respectivamente: paraas bibliotecas, 66,8% contra 29,1%; para osmicrocomputadores, 64,9% contra 25,2%; para quadrade esportes, 49,8% contra 19,3%; para sala de TV, 43,4%contra 21,1%; e, para acesso a internet, 17,0% contra5,0%. A essa realidade tão díspar, acrescenta-se tambémo fato, com preocupação, de que somente 65,5% dasescolas no RS tinham sanitário, contra uma oferta menorainda, de 29,9%, no Brasil.

Tabela 5

Recursos educacionais em creches e pré-escolas, no Brasil e no Rio Grande do Sul — 2003

BRASIL RIO GRANDE DO SUL DISCRIMINAÇÃO

Número % Alunos/ /Recursos Número % Alunos/

/Recursos Creches ........................................................... 18 603 100,0 66,5 1 815 100,0 34,8

Professores ...................................................... 74 765 16,6 6 473 9,8

Matrículas ......................................................... 1 237 558 63 176

Recursos educacionais totais

Biblioteca ..................................................... 4 467 24,0 277,0 526 29,0 120

Laboratório de informática ........................... 2 189 11,8 565,0 159 8,8 397

Laboratório de ciências ................................ 1 111 6,0 1 114,0 54 3,0 1170

Quadra de esportes ..................................... 2 677 14,4 462,0 259 14,3 244

Sala de TV ................................................... 5 848 31,4 212,0 881 48,5 72

TV/vídeo/parabólica ..................................... 1 846 9,9 670,0 335 18,5 189

Microcomputador ......................................... 4 847 26,1 255,0 667 36,7 95

Acesso à internet ......................................... 1 129 6,1 1 096,0 250 13,8 253

Água ............................................................. 18 275 98,2 68,0 1 815 100,0 35

Energia elétrica ............................................ 17 845 95,9 69,0 1 815 100,0 35

Esgoto .......................................................... 18 060 97,1 69,0 1 814 99,9 35

Sanitários ..................................................... 9 914 53,3 125,0 1 321 72,8 48 (continua)

Educação infantil no Brasil e no Rio Grande do Sul: o descompasso frente à legislação

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5 - Considerações finais

A legislação construída no campo da educaçãoinfantil iniciou com a Constituição Federal, passandopelo Estatuto da Criança e do Adolescente edesembocando na Lei de Diretrizes e Bases daEducação Nacional. A partir desses textos, foramelaborados pareceres, emendas constitucionais, decretose resoluções que orientaram a política educacional paraa criança.

Constatou-se que, nas últimas décadas, a educaçãoinfantil, ao ser considerada um direito das crianças e umdever do Estado, e inserida como a primeira etapa daeducação básica, passou a assumir institucionalmenteum campo de investigação importante para alicerçar odesenvolvimento integral da criança, atendendo àscarências e aos pré-requisitos das últimas descobertasdas ciências na área da educação infantil.

Apesar dos avanços sobre as diferentes dimensõesdo desenvolvimento das crianças, a educação infantil,no que diz respeito às responsabilidades nocomprometimento de atendimento e financiamento dessenível de ensino, ainda é uma incógnita.

Tabela 5

Recursos educacionais em creches e pré-escolas, no Brasil e no Rio Grande do Sul — 2003

BRASIL RIO GRANDE DO SUL DISCRIMINAÇÃO

Número % Alunos/ /Recursos Número % Alunos/

/Recursos Pré-escola ....................................................... 80 878 63,7 5 785 35,6

Professores ...................................................... 270 575 19,1 13 102 15,7

Matrículas ......................................................... 5 155 676 206 164

Recursos educacionais totais

Biblioteca ..................................................... 23 551 29,1 219,0 3 865 66,8 53

Laboratório de informática ........................... 8 852 10,9 582,0 1 360 23,5 152

Laboratório de ciências ............................... 6 186 7,6 833,0 1 479 25,6 139

Quadra de esportes ..................................... 15 622 19,3 330,0 2 883 49,8 72

Sala de TV ................................................... 17 075 21,1 302,0 2 511 43,4 82

TV/vídeo/parabólica .................................... 12 358 15,3 417,0 1 266 21,9 163

Microcomputador ......................................... 20 375 25,2 253,0 3 753 64,9 55

Acesso à internet ......................................... 4 040 5,0 1 276,0 984 17,0 210

Água ............................................................ 77 698 96,1 66,0 5 781 99,9 36

Energia elétrica ........................................... 67 559 83,5 76,0 5 779 99,9 36

Esgoto ......................................................... 73 688 91,1 70,0 5 767 99,7 36

Sanitários .................................................... 24 189 29,9 213, 0 3 787 65,5 54 FONTE: MEC/INEP.

FEE/CIE/NIS.

A não-obrigatoriedade da oferta da educação infantil,

aliada à escolha da esfera municipal para o seuatendimento e ao fato de o financiamento não estarassegurado por um fundo público nacional, deixoubastante vulnerável esse nível de ensino.

Através da análise da oferta das matrículas tantonas creches como na pré-escola, no Brasil e RS, nosúltimos seis anos, constatou-se um crescimentosignificativo, mas não suficiente para atender ao enormepotencial da demanda.

A rede pública, em especial a dependênciamunicipal, atende ao maior número de alunos da educaçãoinfantil, inclusive na Constituição é assegurada agratuidade do ensino quando ofertado por essa rede,entretanto a presença da iniciativa privada no Brasil aindaé significativa, e, no RS, ocorreu, inclusive, umcrescimento na participação desse setor. Na atualconjuntura brasileira, as famílias foram forçadas a reduzirseus gastos com educação. Essa característica, aliadaao pequeno atendimento da população infantil na faixaetária legal, deixa poucas opções para os que têmnecessidade de matrícula nas escolas públicas.

Hélios Puig Gonzalez; Salvatore Santagada

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No conjunto da educação infantil, o fato de ascreches ficarem com, aproximadamente, 20% do totaldas matrículas no Brasil e 25% no RS, aliado aosresultados apontados quanto à faixa etária adequada nacreche e também na pré-escola, mostra o descompassoentre o arsenal das boas intenções da legislação e arealidade presente nas escolas. Esse descompasso ficaevidente quando se constata que, em 2003, a taxa deescolarização líquida da educação infantil, no Brasil, foide 21,8% na faixa etária de zero a seis anos, enquanto,no RS, o percentual foi ainda menor, da ordem de 17,9%.

O reconhecimento da educação infantil como umprimeiro passo na formação das crianças e um espaçode inclusão da massa da população infantil indica nãoter havido um compromisso público compatível com asmetas estabelecidas nos últimos anos.

A formação dos professores da educação infantilpode ser considera razoável pelos parâmetros nacionais,embora ainda permaneçam, no magistério, profissionaisque não possuem a formação mínima esperada, alémda insuficiência de professores numa perspectiva de“educação para todos”.

O descaso com a educação infantil fica comprovadocom a pouca oferta nas escolas dos recursoseducacionais mínimos, como biblioteca, laboratório deciências, laboratório de informática, quadra de esportes,microcomputadores, acesso à internet, sala de TV esanitários. O RS está melhor aparelhado, entretantopoucos desses quesitos chegam a ultrapassar a coberturade 50% para os que estão nas escolas.

Os indicadores educacionais analisados, por umlado, apontam que houve uma expansão da coberturanos últimos seis anos e, por outro, confirmam uma fortecarência da educação infantil tanto no Brasil como noRS, desvendando um impasse entre as reaisnecessidades da demanda por creches e pré-escolas eos parcos recursos postos à disposição de alunos eprofessores.

Referências

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ALENCAR, Kennedy. País investe em educação menosdo que diz, São Paulo. Folha de São Paulo, 14 out.2005.

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BRASIL. Lei nº 10.172, de 9 de janeiro de 2001; PlanoNacional de Educação. Brasília, 2001. Disponível em:http://www.prolei.inep.gov.br/prolei/ Acesso em: 30 out.2005.

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BRASIL. Ministério da Educação. Resultados prelimi-nares do Censo da Educação infantil — 2000. Bra-sília: MEC, 2002. Disponível em: http://www.mec.gov.brAcesso em: 9 set. 2004.

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INDICADORES SELECIONADOS DO RS

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Tabela 2 Taxas de crescimento da produção da indústria de transformação, segundo os setores de atividade,

no Rio Grande do Sul — 2004/05

(%)

2004 1° TRIM./05 2° TRIM./05 3° TRIM./05 JAN-SET/05 SETORES 2003 1° TRIM./04 2° TRIM./04 3° TRIM./04 JAN-SET/04

Alimentos ………………………...……..…..…… -0,3 7,9 2,9 -2,4 2,6 Bebidas ............................................................ 7,0 3,1 -7,7 3,9 -1,3 Borracha e plástico .......................................... 13,3 -8,9 -6,5 -8,7 -8,1 Calçados e artigos de couro ............................ 0,7 4,7 5,2 -10,1 -0,6 Celulose, papel e produtos do papel ............... 1,6 0,4 -1,8 6,5 1,5 Edição, impressão e reprodução de gravações 5,5 -0,3 5,4 2,9 2,7 Fumo ................................................................ 26,8 -22,7 1,9 -0,9 -4,5 Máquinas e equipamentos ............................... 16,8 -16,5 -23,5 -17,8 -19,2 Metalurgia básica ............................................. 14,6 2,2 -4,4 -8,8 -4,0 Mobiliário .......................................................... 12,1 -13,7 -10,9 -7,1 -10,5 Outros produtos químicos ............................... -0,6 -5,6 -5,8 -6,5 -6,0 Produtos de metal — exceto máquinas e equi-pamentos ......................................................... 8,7 16,2 -2,1 -8,2 0,6 Refino de petróleo e álcool .............................. -6,2 -10,0 0,2 24,6 3,2 Veículos automotores ...................................... 21,8 -2,7 -2,5 2,8 -0,7 Total ................................................................ 6,4 -3,4 -2,9 -3,6 -3,3 FONTE DOS DADOS BRUTOS: PESQUISA INDUSTRIAL MENSAL: produção física. Rio de Janeiro: IBGE, 2004-05.

Tabela 1

Taxas de crescimento da produção, da área colhida e da produtividade dos principais produtos da lavoura no Rio Grande do Sul — 2004/05

(%)

2004/2003 2005/2004 (1) PRODUTOS

Produção Área Produtividade Produção Área Produtividade

Arroz ................................. 34,9 8,6 24,3 -3,7 -3,6 0,0 Banana ............................. -17,2 -3,6 -14,1 13,8 1,2 12,5 Batata-inglesa .................. -5,8 -11,9 93,0 -3,7 -9,1 8,8 Cana-de-açúcar ................ -9,7 -0,7 -9,1 -13,6 2,8 -16,0 Cebola .............................. 28,2 -13,7 48,5 -13,9 -6,0 -8,4 Feijão ................................ -3,0 -12,5 74,3 -43,9 -20,4 -28,7 Fumo ................................ 49,9 16,7 28,4 -10,9 5,6 -15,6 Laranja ............................. 0,5 0,7 -0,1 -9,3 -0,7 -8,7 Maçã ................................. 7,2 0,7 6,5 -16,0 11,2 -24,5 Mandioca .......................... -6,1 -0,9 -5,2 -8,9 0,8 -9,6 Milho ................................. -37,9 -15,2 -26,7 -56,0 -19,5 -45,3 Soja .................................. -42,1 10,5 -47,7 -55,9 -5,9 -53,1 Trigo ................................. -13,9 5,8 -18,6 -20,1 -24,8 6,3 Uva ................................... 42,4 4,8 36,0 -12,2 5,2 -16,5 FONTE DOS DADOS BRUTOS: LEVANTAMENTO SISTEMÁTICO DA PRODUÇÃO AGRÍCOLA. Rio de Janeiro: IBGE,

2004-05. (1) Dados do boletim de setembro de 2005.

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Tabela 3

Taxas de crescimento do volume real de vendas do comércio varejista, segundo os setores de atividade, no Rio Grande do Sul — 2000/05

(%)

2004 1° TRIM./05 2° TRIM./05 3° TRIM./05 JAN-SET/05 SETORES 2003 1° TRIM./04 2° TRIM./04 3° TRIM./04 JAN-SET/04

Combustíveis e lubrificantes .................................. 2,3 -9,8 -21,6 -24,9 -19,0

Supermercados, hipermercados, produtos alimen-tícios, bebidas e fumo ............................................. 7,8 8,8 2,1 0,1 3,6

Tecidos, vestuário e calçados ................................ 2,2 -3,9 -9,7 -8,4 -7,8

Móveis e eletrodomésticos .................................... 16,2 6,2 2,7 -3,1 1,7

Artigos farmacêuticos, médicos, ortopédicos de perfumaria e cosméticos ........................................ - 0,1 -0,5 5,6 1,7

Equipamentos e material para escritório, infor- mática e comunicação ........................................... - 15,9 16,7 31,0 21,5

Livros, jornais, revistas e papelaria ....................... - 3,2 12,8 8,1 7,2

Outros artigos de uso pessoal e doméstico .......... - 28,5 20,1 17,2 21,5

Comércio varejista .............................................. - 4,5 -2,1 -3,8 -0,6

Veículos, motos, partes e peças ........................... - 0,7 -10,9 -14,2 -8,4

Material de construção ......................................... - -7,7 -11,2 -16,6 -11,9

Comércio varejista ampliado (1) ....................... - 2,5 -5,0 -7,5 -3,5

FONTE DOS DADOS BRUTOS: PESQUISA MENSAL DO COMÉRCIO. Rio de Janeiro: IBGE, 2004-05.

(1) Inclui os itens do comércio varejista, mais as atividades de veículos, motos, partes e peças e as de material de construção, que abarcam varejo e atacado.

Tabela 4

Exportações do Brasil e de seus principais estados — jan.-out./05

JAN-OUT/05 JAN-OUT/04

(%) BRASIL E UFs VALOR (US$ 1 000)

PARTICIPAÇÃO (%)

Valor Volume Preço

Brasil ………………………..……… 96 622 520 100,00 22,1 11,7 9,4 São Paulo ……………………..….… 31 183 602 32,27 22,9 14,0 7,8 Minas Gerais .................................. 10 924 221 11,31 34,2 12,9 18,9 Rio Grande do Sul .......................... 8 592 625 8,89 3,9 -7,6 12,4 Paraná ............................................ 8 287 135 8,58 2,3 0,8 1,4 Rio de Janeiro ................................ 6 414 572 6,64 19,0 -9,7 31,8 Santa Catarina ............................... 4 741 335 4,91 46,1 17,3 24,5 Espírito Santo ................................ 4 608 229 4,77 16,1 6,1 9,4 Bahia .............................................. 4 506 112 4,66 36,4 -2,5 39,9 Pará ............................................... 3 870 901 4,01 27,2 4,9 21,2 Mato Grosso .................................. 3 569 817 3,69 34,5 52,0 -11,5 Demais estados ............................. 9 923 970 10,27 FONTE DOS DADOS BRUTOS: BRASIL Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Secretaria do Comér-

cio Exterior.

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Tabela 5 Exportações, segundo os principais setores de atividade, do Rio Grande do Sul — jan.-out./05

JAN-OUT/05 JAN-OUT/04

(%) SETORES VALOR (US$ 1 000)

PARTICIPAÇÃO %

Valor Volume Preço

Agropecuária .................................................... 1 248 737 14,53 -34,4 -40,0 9,4

Fumo .................................................................. 1 103 485 12,84 6,7 -6,1 13,7

Soja .................................................................... 104 294 1,21 -83,4 -80,4 -14,9

Indústria de transformação ............................. 7 223 665 84,07 15,4 2,3 12,8

Produtos alimentícios e bebidas ........................ 1 704 125 19,83 8,8 4,6 4,1

Couros e fabricação de artefatos de couro, arti-gos de viagem e calçados ................................. 1 518 972 17,68 2,5 -9,0 12,6

Produtos químicos ............................................. 1 070 217 12,46 43,1 16,0 23,4

Máquinas e equipamentos ................................. 957 282 11,14 21,1 3,7 16,8

Veículos automotores, reboques e carrocerias 584 883 6,81 18,4 -0,1 18,5

Móveis e indústrias diversas .............................. 289 240 3,37 0,2 -11,6 13,4

Demais setores .................................................. 1 098 945 12,79

TOTAL ............................................................... 8 592 625 100,00 3,9 -7,6 12,4 FONTE DOS DADOS BRUTOS: BRASIL. Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Secretaria do Comér-

cio Exterior.

Tabela 6

Taxas de crescimento do volume físico das exportações, segundo os principais setores de atividade, do RS — 2004/05 (%)

SETORES 2004 2003

1º TRIM./05 1º TRIM./04

2º TRIM./05 2º TRIM./04

3º TRIM./05 3º TRIM./04

JAN-SET/05 JAN-SET/04

Agricultura, pecuária, silvicultura e exploração florestal 2,4 -53,8 -44,4 -28,5 -39,8

Soja ......................................................................................... -42,0 -93,2 -98,8 -64,0 -82,7

Fumo ....................................................................................... 22,5 43,5 -1,0 -10,1 -0,9

Indústria de transformação .................................................. 11,0 6,8 2,8 -0,8 2,8

Produtos alimentícios e bebidas ............................................. 9,7 18,3 4,3 -8,8 3,4 Couros e fabricação de artefatos de couro, artigos de viagem e calçados ............................................................................... 1,7 -7,4 -7,0 -11,0 -8,6

Produtos químicos ................................................................... -6,3 24,2 19,1 11,1 17,8

Máquinas e equipamentos ...................................................... 23,7 -2,0 -1,0 9,8 2,0

Veículos automotores, reboques e carrocerias ....................... 17,6 7,4 1,1 6,3 5,0

Móveis e indústrias diversas ................................................... 40,5 3,0 -8,9 -21,2 -10,5

Total ........................................................................................ 8,9 -3,0 -10,3 -8,0 -7,3 FONTE DOS DADOS BRUTOS: BRASIL. Ministério do Desenvolvimento, Industria e Comércio Exterior. Secretaria do Comércio Exterior.

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Tabela 7 Taxa média de desemprego, por tipo, na Região Metropolitana de Porto Alegre — 2004/05

(%)

TAXA DE DESEMPREGO

PERÍODOS Oculto

Total Aberto

Total Precário Desalento

2004 15,9 10,7 5,2 3,6 1,6 1º trim./04 16,1 10,4 5,7 3,8 1,9 2º trim./04 17,2 11,7 5,5 3,6 1,9 3º trim./04 15,8 10,7 5,1 3,5 1,6 Acumulado no ano 16,4 10,9 5,4 3,6 1,8 2005 1º trim./05 14,4 9,9 4,5 2,8 1,7 2º trim./05 14,9 10,8 4,1 2,9 1,2 3º trim./05 14,7 10,3 4,4 3,1 1,3 Acumulado no ano 14,6 10,3 4,3 2,9 1,4 FONTE DOS DADOS BRUTOS: PED-RMPA - Convênio FEE, FGTAS/SINE-RS, SEADE-SP e DIEESE. Tabela 8

Taxas de crescimento do nível de ocupação, segundo os setores de atividade, na RMPA — 2004/05

(%)

SETORES 2004 2003

1º TRIM./05 1º TRIM./04

2º TRIM./05 2º TRIM./04

3º TRIM./05 3º TRIM./04

JAN-SET/05 JAN-SET/04

Indústria de transformação ........................ 5,7 11,8 5,5 3,4 6,8

Comércio .................................................... 6,7 4,6 3,5 4,9 4,3

Serviços ..................................................... 1,5 0,7 3,2 3,2 2,4

Construção civil .......................................... 2,4 -5,9 -9,2 -5,8 -7,0

Serviços domésticos .................................. -2,0 0,9 0,0 0,0 0,3 Total ........................................................... 2,9 3,2 2,8 2,9 3,0

FONTE DOS DADOS BRUTOS: PED-RMPA - Convênio FEE, FGTAS/SINE-RS, SEADE-SP e DIEESE.

Tabela 9 Taxas de crescimento do nível de emprego, do rendimento real e da massa de rendimentos reais dos

ocupados e dos assalariados na RMPA — 2004/05

(%)

DISCRIMINAÇÃO 2004 2003

1º TRIM./05 1º TRIM./04

2º TRIM./05 2º TRIM./04

3º TRIM./05 3º TRIM./04

JAN-SET/05 JAN-SET/04

Ocupados Emprego ................................................................. 3,1 3,7 3,0 2,9 3,2 Rendimento real ..................................................... -0,6 -1,8 -1,5 3,6 0,1 Massa de rendimentos reais .................................. 2,4 1,9 1,4 6,7 3,4 Assalariados Emprego ................................................................. 5,6 4,7 4,3 5,4 4,8 Rendimento real ..................................................... 0,5 -1,8 -3,0 2,3 -0,9 Massa de rendimentos reais .................................. 6,1 2,9 1,2 7,8 4,0 FONTE DOS DADOS BRUTOS: PED-RMPA - Convênio FEE, FGTAS/SINE-RS, SEADE-SP e DIEESE.

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Tabela 10

Taxas reais de crescimento do ICMS arrecadado, segundo os setores de atividade, no RS — 2004/05

(%)

SETORES 2004 2003

1º TRIM./05 1º TRIM./04

2º TRIM./05 2º TRIM./04

3º TRIM./05 3º TRIM./04

JAN-SET/05 JAN-SET/04

Produção animal e extração vegetal ...... 14,6 -27,8 -49,0 -39,4 -39,9 Extrativa mineral ..................................... 13,6 -11,4 -28,7 -1,2 -14,5 Transformação ........................................ -4,6 -10,8 10,4 6,2 1,9 Comércio varejista .................................. 5,9 -2,7 30,8 11,1 11,5 Comércio atacadista ............................... 10,3 6,0 20,2 20,3 15,6 Serviços e outros .................................... -2,4 19,6 31,3 47,0 32,6 Total ....................................................... 0,2 -2,4 16,2 14,5 9,3 FONTE DOS DADOS BRUTOS: RIO GRANDE DO SUL. Secretaria Estadual da Fazenda. NOTA: ICMS deflacionado pelo IGP.

Tabela 11

Inflação mensal, acumulada no ano e nos últimos 12 meses, na RMPA — 2004 e 2005

(%)

PERÍODOS IPC-IEPE INPC-IBGE

Dez./03-dez./04 ..................................................................... 6,9 6,9

Ago./05 .................................................................................. -0,6 -0,2

Set./05 ................................................................................... -0,1 0,1

Out./05 ................................................................................... 0,6 0,3

Acumulada no ano (jan.-out./05) ........................................... 6,3 7,2

Acumulada nos últimos 12 meses (out./04-out./05)............. 6,4 7,1 FONTE DOS DADOS BRUTOS: IBGE. IEPE.

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Os fluxos externos de capitais privados no Brasil — 1991-04

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ARTIGOS DE CONJUNTURA

Roberto Marcantonio

Indic. Econ. FEE, Porto Alegre, v. 33, n. 3, p. 73-84, dez. 2005

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Os fluxos externos de capitais privados no Brasil — 1991-04

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Os fluxos externos de capitais privados no Brasil — 1991-04

Roberto Marcantonio Economista da FEE.

ResumoEste artigo analisa a evolução dos fluxos líquidos do financiamento externoprivado na economia nacional, entre 1991 — ano da liberalização dosfluxos internacionais de investimentos no Brasil — e 2004. Examina acontribuição dos investimentos diretos, dos investimentos em carteira ede outros investimentos para o financiamento externo total. As duasprimeiras categorias de investimentos citadas foram as únicas fontesefetivas de financiamento. Para melhor elucidar os fatos, o artigo tomacomo referência as transformações ocorridas no sistema financeirointernacional e a liberalização dos fluxos internacionais de recursos noBrasil. A razão de fundo do artigo é tentar, a despeito das dificuldades,contribuir para o estabelecimento de bases para avaliar as perspectivasdo financiamento externo no País.

Palavras-chave: Securitização; liquidez internacional; dese-

quilíbrios domésticos.

AbstractThis paper examines the evolution of the net flow of private foreign financingin brazilian’s economy, from 1991 — the year of opening to foreigninvestments flow in Brazil — to 2003. It analyzes the contribution of directinvestiments, portfolio investiments, derivatives and the so called otherinvestiments for the total external financiament of national economy. Inorder of elucidate better the facts, this paper examines the transformationsthat ocurred in the international financial system and the opening to capitalflows in Brazil. The bottom line of this paper is endeavor to contribute,despite the difficulties, improve de conditions to asses the perspectiveof foreign financing in Brazil.

Artigo recebido em 26 out. 2005.

Roberto Marcantonio

Indic. Econ. FEE, Porto Alegre, v. 33, n. 3, p. 73-84, dez. 2005

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Introdução

Este artigo examina a evolução dos fluxos anuaisdo financiamento externo na economia nacional, desdeque nesta se liberalizou, em 1991, a mobilidadeinternacional dos capitais. Nos anos finais da década de80 e nos iniciais da de 90, verificou-se a retomada dasentradas voluntárias de recursos externos na AméricaLatina e no Brasil, depois de longos anos de escassez,devido à crise da dívida externa. A retomada dosfinanciamentos foi determinada por um conjunto defatores. Dentre eles, cabe destacar o processo demudanças do sistema financeiro internacional,intensificado na década de 80, nos países desenvolvidos.Os elementos centrais dessas mudanças foram aproliferação dos bancos internacionais, o advento doschamados novos instrumentos financeiros, a liberaçãodas atividades de financeiras e a emergência das novasfontes de financiamento — as companhias de seguro,os fundos de aposentadoria e as grandes corporações.Essas alterações não ocorreram de inopino, masaprofundaram tendências manifestadas — não apenasas citadas anteriormente — desde a segunda metade dadécada de 60. Essas mudanças chegaram aos paísesem desenvolvimento principalmente nos anos 90.

Um aspecto crucial das mudanças do sistemainternacional de crédito foi o advento dos novos instrumen-tos financeiros voltados para a aquisição de títulos derenda fixa negociáveis em mercados secundáriosorganizados e de ações, os quais, no balanço de paga-mentos, passaram a ser registrados como investimentosem carteira. Excluídos os investimentos diretos, osinvestimentos em carteira tornaram-se praticamente aforma exclusiva de financiamento internacional, suprindoa lacuna deixada pelos empréstimos sindicalizados —operações compartilhadas por um conjunto de bancospara diluir riscos —, que foi o instrumento dominanteanteriormente. Nos anos 80, a crise da dívida externanos países em desenvolvimento e a quebra de bancos ede grandes corporações em países desenvolvidosabalaram a credibilidade do sistema bancário, diminuindoseus fundos para empréstimos. Deduz-se que os bancosarcaram com grandes prejuízos, inclusive peladesvalorização de suas ações. Desde então, osempréstimos sindicalizados mergulharam num impassecrítico definitivo, declinando globalmente, e, ao menosnos países em desenvolvimento, seus fluxos líquidostornaram-se negativos.

Diz a autora D. M. Prates:“Essas transformações [do sistema financeirointernacional] tiveram como conseqüências oaumento significativo dos fluxos financeirosinternacionais e mudanças em sua natureza.Os investimentos em portfólio — aquisiçãode títulos de renda fixa e ações — constituem,atualmente, o principal componente dos fluxosde capitais globais e daqueles direcionadosao países em desenvolvimento, ante osempréstimos bancários sindicalizados, quepredominavam nos anos 70” (Gooptu, 1993;Baer, 1995 apud Prates, 1999).

Sobre os determinantes do retorno dos financiamen-tos externos à América Latina, diz Prates:

“A partir do final dos anos 80, os fluxos deportfólio foram direcionados, de forma crescen-te, para as economias latino-americanas,estimulados por um conjunto de fatores(Steiner, 1994 apud Prates, 1999). Algunsautores, dentre eles El-Erian (1992 apudPrates, 1999), enfatizam a importância dosfatores internos — os programas de estabiliza-ção e ajuste nos moldes recomendados pelosorganismos multilaterais e os acordos derenegociação de dívida externa —, enquantooutros, como Calvo, Leiderman e Reinhart(1993 apud Prates, 1999), interpretam o ciclorecente de endividamento como determinado,em última instância, por fatores externos,especialmente a queda da taxa de juros e arecessão nos países centrais” (Prates, 1999).

Este artigo tem como propósito analisar a evoluçãoda conta financeira nacional entre 1991 e 2004, o queimplica examinar as principais modalidades dofinanciamento externo da economia, nomeadamente osinvestimentos diretos, os investimentos em carteira eos outros investimentos.1 São avaliados apenas os fluxosde capitais privados, o que significa que foram excluídas

1 Os derivativos são registrados, na conta financeira, ao lado dosinvestimentos diretos, dos investimentos em carteira e de outrosinvestimentos. Contudo, no caso brasileiro, dois aspectoscaracterizam os derivativos: (a) de modo geral, as cifrasregistradas são negativas; sempre foram negativas na vigênciado regime de câmbio flutuante; (b) os valores dos derivativos,no Brasil, no período observado, foram, em geral, pouco outotalmente expressivos, quando comparados com as demaisgrandes rubricas da conta financeira. Neste artigo, essascaracterísticas relegaram os derivativos a referências mínimas.De fato, os derivativos não caracterizam uma modalidade definanciamento externo, mas os pagamentos devidos por umserviço.

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as operações de regularização com o FMI e as outrasoperações de regularização, além das operações comagências e organismos. Essa subtração oferece duasvantagens: deixa mais visível a instabilidade dos fluxosde financiamentos privados e torna as séries dos dadosnacionais comparáveis com as estatísticas do FMIreferentes aos países em desenvolvimento. A despeitode todas as incertezas inerentes à evolução vindourados fluxos dos investimentos externos, o intuito últimodeste artigo é tentar identificar elementos que permitammelhor especular sobre as possibilidades futuras dofinanciamento estrangeiro no Brasil.

Além desta Introdução, este artigo se compõe deduas seções e das Considerações finais. A primeiraseção aborda dois fatores importantes na determinaçãoda evolução do financiamento da economia brasileira.Esses fatores são a securitização do processo deendividamento internacional em escala mundial, a partirdos anos 80, e a liberalização dos fluxos financeirosinternacionais no Brasil. Tomamos o início do processode liberação financeira referido como critério para definiro ponto de partida do período examinado pelo artigo. Asegunda seção descreve a trajetória dos fluxos definanciamento externo no Brasil, procurando abarcar seusprincipais condicionantes; como pano de fundo desseexercício, tomamos a evolução dos fluxos internacionaisde financiamento nas economias em desenvolvimento.

Dois condicionantes dosfluxos de capitaisinternacionais no Brasil

Vários fatores interferem — seja nos fluxos deliquidez internacional global, seja nos fluxos definanciamento externo — numa economia nacionalespecífica. Esta seção aborda dois condicionantes dosfluxos internacionais de capital que exercem ou passarama exercer influência no Brasil. Eles se referem, o primeiro,à securitização das operações internacionais definanciamento e, o segundo, à liberalização dos fluxosinternacionais de capital no País como forma deadequação à nova configuração do sistema financeirointernacional. A abordagem desse tema é crucial paraelucidar a evolução do financiamento externo daeconomia nacional no período examinado.

No que respeita à securitização das operaçõesinternacionais de crédito, interessa defini-la, datar suaemergência e ressaltar sua importância. Esse exercício

permite compreender aspectos relevantes da naturezado novo sistema internacional; isso possibilita que umconjunto de fatos nacionais correlacionados seja melhorcompreendido.

As securities são instrumentos financeiros quesucederam e deslocaram em importância os instru-mentos dominantes em um período anterior. Estes últimossão os empréstimos sindicalizados, compartilhados porum consórcio de bancos para reduzir riscos e concedidosa partir de um contrato entre as partes credoras edevedora(s). Nos empréstimos sindicalizados, umaspecto crucial reside em que o contrato de débito-créditonão encontra um mercado organizado onde o credorpossa vendê-lo. Assim, o crédito não é líquido antes dadata do vencimento; mais do que isso, o valor efetivo docrédito — valor de mercado — carece de um mecanismode explicitação. Logo, a eventual inadimplência dedevedores “pesados” lança suspeita sobre o valor dacarteira dos ativos bancários e sobre a solidez financeirados próprios bancos. Nessas circunstâncias, estes arcamcom prejuízos, porque os investidores retraem suasaplicações nas instituições atingidas, diminuindo seufounding e, portanto, sua capacidade de empréstimo. Comoexemplo, constatamos que os depósitos captados pelosbancos internacionais junto a não-bancos caíram de US$63,0 bilhões em 1982 para US$ 40 bilhões em 1984; osempréstimos bancários, nos mesmos anos, caíram deUS$ 80 bilhões para US$ 40 bilhões (Ferreira; Freitas,1990). Por isso, no sistema bancário, aumentam asperdas realizadas e os riscos das perdas potenciais. Nolimite, se o banco não escapar suficientemente da rotade prejuízos, sua sobrevivência estará em risco.

Desde os anos 60, identifica-se uma sucessão defases na transformação do sistema financeirointernacional. No entendimento dos Economistas Ferreirae Freitas, a securitização é o aspecto distintivo doprocesso de transformação dos mercados financeirosinternacionais nos anos 80 (Ferreira; Freitas, 1990). Paraesses autores, a securitização das operações deempréstimos — entendida como processo de crescenteabrangência — teria estado condicionada, em parte, àalteração ocorrida, a partir de 1982, nos fluxosinternacionais de liquidez. Esse fato, por seu turno, teriaresultado do seguinte conjunto de fatores: queda dossuperávits em transações correntes dos paísesexportadores de petróleo e, pela mesma razão, reduçãodas inversões financeiras desses países no euromercado;recuperação econômica dos países desenvolvidos;transformação dos Estados Unidos em receptor líquidode recursos; e crise da dívida externa de países doTerceiro Mundo. Ademais, à mesma época, emergiram

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as novas fontes internacionais de recursos: os fundosde pensão, as companhias de seguros e as grandescorporações. Contudo, frente à perda de credibilidade quese abateu sobre o sistema bancário, as novas fontes derecursos evitaram as operações intermediadas por essesistema. Assim, passaram a emprestar, através deinstrumentos de dívidas diretas para tomadores de“excelente risco” — governos e corporaçõesrelativamente líquidas —, a um custo inferior ao do créditobancário. Os instrumentos de dívidas diretas são, no caso,as securities, ou bonds, títulos emitidos pelo devedor enegociáveis a qualquer momento em mercadosorganizados. Respeitadas essas característicasessenciais, as securities assumiram, no transcurso dotempo, uma variedade de formas que perseguiram oobjetivo de dirimir ou transferir riscos. Rapidamente, elasatingiram abrangente proporção dos empréstimosinternacionais e ampliaram a magnitude dos mesmos:

“Em 1981, a emissão de securities respondiapor ¼ do fluxo de endividamento global dosistema financeiro internacional, com osrestantes ¾ sendo compostos por em-préstimos sindicados. Essa participação [foi]rapidamente revertida e, já em 1985, o merca-do de bônus alcançava mais de 90% do fluxode endividamento total, chegando ao valor US$213 bilhões (US$ 289,8 bilhões em 1986),contra US$ 45 bilhões em 1981. Os emprés-timos sindicados foram reduzidos de US$131,5 bilhões em 1981 para US$ 37,8 bilhõesem 1986, sendo que, neste último ano, cercade 20% do total representavam empréstimos‘não espontâneos’, ligados a pacotes dereescalonamento das dívidas de paísesendividados” (Ferreira; Freitas, 1990).

Apontamos, mais adiante, a grande participaçãodos investimentos no financeiamento externo do Brasil,principalmente entre 1991 e 1998. A citação acima elucidauma das causas internacionais dessa participação; outracausa relevante do mesmo fato foi a liberalizaçãofinanceira externa nacional, por franquear a presença dosinvestimentos em carteira.

A liberalização das relações financeiras externasnacionais objetivou adequar a legislação específicanacional à nova realidade do sistema financeirointernacional. A presente abordagem visa datar e caracte-rizar a emergência das citadas regras liberalizantes. Estaexposição segue duas linhas: primeiro, são mencionadasas mudanças institucionais que definiram as possibili-dades — antes inexistentes — da presença dos investi-mentos de portfólio estrangeiros no Brasil; segundo, são

apontadas medidas liberalizantes, que institueminstrumentos de captação para uso das instituiçõesfinanceiras e não financeiras residentes.

O primeiro passo para abrir a economia nacionalaos investimentos de portfólio foi a instituição do AnexoIV à Resolução do Conselho Monetário Nacional (CMN)nº 1.289/87, a qual disciplina os investimentosestrangeiros em títulos e valores mobiliários de compa-nhias abertas; o Anexo IV foi instituído pela Resoluçãonº 1.832/91 do CMN.

“Ao contrário dos demais anexos dessa Reso-lução (n. 1.832/91), que exigem a constituiçãode sociedade ou fundo de investimento paraingresso no País, o Anexo IV não está sujeitoa critérios de composição, capital mínimoinicial e período de permanência, e permite aentrada direta de investidores institucionaisestrangeiros no mercado acionário doméstico,definidos como fundos de pensão, companhiasde seguro, instituições financeiras estran-geiras, fundos de investimentos constituídosno exterior etc. (...) o Anexo IV concedeliberdade ao investidor na constituição dascarteiras (...)” (Prates, 1999).

Os investidores estrangeiros passaram a participardo mercado financeiro nacional também pela aquisiçãode cotas de quatro diferentes modalidades de fundos deinvestimento, criadas na década de 90. Os Fundos dePrivatização-Capital Estrangeiro foram autorizados, em1991, para a aquisição de papéis de empresas emprocesso de privatização e de moedas de privatização.Em 1993, foram instituídos os Fundos de Renda Fixa--Capital Estrangeiro, que disponibilizam um conjunto deaplicações de renda fixa. Em 1996, duas modalidadespreexistentes de fundos de investimentos foram abertasao capital estrangeiro: os Fundos de Investimento emEmpresas Emergentes e os Fundos de InvestimentoImobiliário (Prates, 1999).2

Da liberalização financeira nacional, restamencionar as medidas referentes à tomada de recursosno exterior por parte de instituições financeiras e nãofinanceiras residentes. A exposição a seguir evidenciatais medidas. Antes de mencioná-las, convém apon-tarmos aspectos históricos, de acordo com asEconomistas Prates e Freitas.

2 Nos anos 90, momentânea ou permanentemente, o BancoCentral modificou as normas de alguns tipos de investimentosem carteira, para meramente aperfeiçoá-las ou para enfrentara instabilidade cambial (Prates, 1999).

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“Em relação aos instrumentos mais conven-cionais — eurobônus e fixed e floating ratesnotes —, sua emissão pelas empresas nãofinanceiras residentes já era permitida, desdea década dos 60, para os dois primeirosinstrumentos, e, após a década dos 70, paraas floating rates notes (Costa, 1994 apudPrates; Freitas, 1999). A Lei n. 4.131, de 1962,regulamentava tanto o endividamento externoindireto (empréstimos bancários) quanto oendividamento externo direto (naquelemomento, emissão de euronotas e eurobônus,os instrumentos então disponíveis) dasempresas. Contudo, na década de 70, osempréstimos bancários eram a modalidade deempréstimo externo mais barata e abundante.Apesar de viável em termos legais, a emissãode euronotas e eurobônus no mercadointernacional tornou-se uma opção de financia-mento, para as empresas brasileiras, comcustos relativamente baixos — em relação àsfontes de financiamento interno e aos emprés-timos bancários externos — apenas napresente década. A mudança fundamentalintroduzida na década dos 90 foi a autorizaçãoda emissão desses instrumentos pelasinstituições financeiras ‘nos termos e nos finsprevistos pela Resolução nº 63, de 21/8/1967’(Resolução do CMN n. 1.835, de 31/7/1991)”(Prates; Freitas, 1999).3

Com as medidas referidas acima, as empresasforam autorizadas a emitir export securities e títulos dedebêntures conversíveis em ações; às dependênciasexternas dos bancos ficou facultada a emissão decertificados de depósitos (Prates; Freitas, 1999).

As primeiras medidas de liberalização financeiraocorreram, no Brasil, em 1991, embora, nos anosposteriores, tenham havido ampliações e correção dasmudanças introduzidas. Dessa forma, adequaram-se asregras nacionais aos novos instrumentos e ao novofuncionamento do sistema financeiro internacional. Talfato exerceu importante influência na retomada e nocrescimento do financiamento externo, na economianacional.

A evolução dos financia-mentos externos privadosno Brasil e outros dos seusprincipais condicionantes

Os fluxos de financiamento externo da economiabrasileira, no período analisado, foram determinados porum conjunto de fatores. Dois deles já apontados acima.A presente seção é complementar à anterior, porqueprocura considerar outros fatores intervenientes dofinanciamento externo da economia nacional. Dentreesses, destacamos, de um lado, a evolução dos fluxosde financiamentos internacionais nos mercadosemergentes e em economias em desenvolvimento —doravante chamados simplesmente economias emdesenvolvimento —, que alternou fases de expansão eretração marcadas por oscilações de curta duração.4

Examinamos também determinantes domésticos dosfluxos de financiamento externo, destacando a políticacambial e suas mudanças. Numa simplificação queentendemos razoável — porque não abstrai ou “torce”qualquer aspecto relevante —, abordamos a questãocambial, como se houvessem se sucedido apenas doisregimes cambiais: o de bandas estreitas atrelado aodólar e o regime de câmbio flutuante.

No agregado dos países em desenvolvimento, entrea virada da década de 80 para a de 90 e 1996, ocorreuuma fase de forte expansão dos fluxos de financiamentosexternos. A despeito da participação expressiva dosinvestimentos produtivos, o evento assumiu intensocaráter especulativo, o qual, segundo entendemos, foireforçado pela vigência de regimes cambiais fixos oupouco flexíveis, “corrigidos” segundo uma regra, numconjunto importante de economias em desenvolvimento.Na vigência desse regime, a mobilidade internacional doscapitais goza de garantias contra os riscos de perdas derenda e de capital causadas pelas imprevistas desvalori-zações cambiais inerentes ao câmbio flutuante; esse fatoincentivou a mobilidade especulativa dos fluxos finan-ceiros. No mesmo sentido, agiram as maiores possibilida-des especulativas dos novos instrumentos financeiros e

3 A Resolução nº 63 faculta aos bancos residentes tomarempréstimos externos para repassá-los internamente.

4 A denominação mercados emergentes e países emdesenvolvimento é adotada pelo FMI no seu periódico WordEconomic Outlook (2004, 2005), que serviu de fonte dasestatísticas internacionais utilizadas neste artigo. Por fidelidadeà fonte dos dados, esse esclarecimento se fez necessário.

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também a liberalização financeira na quase-totalidade dospaíses em questão. As componentes especulativas dosfinanciamentos externos terminaram por conduzir a faseexpansiva dos mesmos a uma súbita e crítica interrupção,seguida por imediata fase de contração. A retração dosfluxos de financiamentos iniciou a partir das crisesfinanceiras internacionais, que tiveram seu epicentro empaíses em desenvolvimento do Sudeste Asiático, em1997. O legado dessas crises — um fortíssimo aumentoda aversão ao risco financeiro — contribuiu para quenovas crises eclodissem no transcorrer dos anosseguintes, em vários países. Dadas as críticas condiçõesde financiamento externo que acometeram as economiasem desenvolvimento, os regimes de câmbio fixo ou rígido“quebraram”, sendo substituídos por regimes de câmbioflutuante.

Além das crises do Sudeste Asiático, o défault daRússia reforçou o desencadeamento da fase de contraçãodos financiamentos externos nos países em desenvolvi-mento. No transcorrer dos anos, outros fatos — ocorridoscom freqüência nas principais economias e praçasfinanceiras do mundo — prolongaram e aprofundaram afase citada, a qual apenas deu claros sinais de reversãoem 2003. A Tabela 1 auxilia-nos a melhor visualizar essaevolução entre 1996 e 2004. Em 1996 e 1997, a totalidadedos financiamentos líquidos somou, respectivamente,US$ 196,7 bilhões e US$ 198,4 bilhões. Em 1997, anodas crises do Sudeste Asiático, a totalidade dos financia-mentos foi sustentada, em grande parte, pelo cresci-mento de 27,0% dos investimentos diretos. A tendênciade redução do fluxo total dos financiamentos atingiu seusníveis mínimos em 2000 e 2001, com a média anual deUS$ 60,9 bilhões. Essa média foi 69,0% menor do que aglobalidade dos recursos de 1996. A responsabilidadedessa queda repousa no comportamento dos capitaisfinanceiros stricto sensu, ou seja, os investimentos emcarteira e os outros investimentos. Esta última modalidadede financiamento acumulou saídas líquidas de US$ 441,8entre 1998 e 2001; no mesmo período, os investimentosem carteira acumularam entradas líquidas de US$ 45,2bilhões, montante significativamente menor do que osverificados nos anos anteriores. As cifras apontadasevidenciam que as formas mais tradicionais definanciamento contribuíram de modo muito mais intensopara a instabilidade dos fluxos de financiamentos do queas novas modalidades de financiamentos, contrariando,assim, o que seguidamente é dito. Por seu turno, osinvestimentos diretos mantiveram firme tendência de

crescimento, passando de US$ 116,0 bilhões em 1996para 184,7 bilhões em 2001.5

Nos países em desenvolvimento, a totalidade dosfinanciamentos externos atingiu os níveis mínimos em2000 e 2001, sob a influência de um conjunto de fatores,dentre os quais cabe destacar: a desaceleração daeconomia norte-americana entre o terceiro trimestre de2000 e o final de 2001; a diminuição do ritmo de crescimen-to da economia e do comércio mundiais; e as incertezaspresentes nos Estados Unidos, que foram simultaneamen-te causa e efeito de expressivo declínio dos índices dasbolsas de valores daquela e das demais economiasindustrializadas.

A partir de 2003, verificou-se forte reação dosfinanciamentos externos aos países em desenvolvimen-to; esses financiamentos alcançam US$ 149,5 bilhões,montante 97,0% maior do que o do ano anterior. Em2004, a totalidade dos financiamentos somou US$196,6bilhões, o mesmo valor registrado em 1996, ou seja, noano anterior ao da eclosão da crise do Sudeste Asiático.Merece destaque o fato de que a recuperação dos finan-ciamentos ocorreu caracterizada pela grande dominânciados investimentos diretos. Em 2004, por exemplo, osinvestimentos diretos representaram 95,0% dos financia-mentos líquidos externos totais nos países em desen-volvimento.

Nas economias em desenvolvimento, a contraçãodo financiamento externo causou desvalorização cambialexpressiva e generalizada frente às moedas “fortes”. Emum conjunto dessas economias, isso ocorreu às custasda “quebra” de regimes cambiais rígidos ou poucoflexíveis. A desvalorização cambial desencadeou intensatendência de melhora do saldo em transações correntes,no agregado dos países em desenvolvimento, comoevidencia a Tabela 1. Nesse agregado, as transaçõescorrentes passaram de um déficit médio de US$ 76,4bilhões entre 1996 e 1998 para um superávit médio deUS$ 161,2 bilhões entre 1999 e 2004. Em 2003 e 2004, aretomada do crescimento do comércio mundial contribuiupara que os superávits em transações correntesatingissem as cifras de, respectivamente, US$ 233,8bilhões e US$ 336,3 bilhões. Esses fatos fazem ver queo declínio da entrada de capitais internacionais decorreutambém da diminuição ou da reversão dos desequilíbriosexternos no agregado dos países em desenvolvimento.Com isso, parte dos integrantes desse agregado tenderam

5 Em 2002 e 2003, os investimentos diretos evidenciaram quedana comparação com 2002, retomando trajetória de aumento em2003.

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a diminuir suas necessidades de financiamento ou a secredenciarem como exportadores de capital.

No caso do Brasil, os fluxos líquidos de financia-mentos externos estão expostos na Tabela 2. O confrontodesses registros com os fluxos de financiamento, noagregado dos países em desenvolvimento, permiteperceber facilmente que, em grande parte do períodoexaminado, existe elevado grau de “paralelismo” naevolução das duas séries de variáveis. Assim, enquantoo financiamento externo foi abundante no conjunto dospaíses em desenvolvimento, a economia nacionalrecebeu crescentes montantes de recursos externos, oque lhe permitiu cobrir déficits em transações correntescada vez maiores. Quando houve uma “maré vazante”dos financiamentos internacionais no agregado dos paísesem desenvolvimento, o fato refletiu-se na economianacional. As similitudes entre uma e outra das instânciasobservadas não se esgota nos aspectos apontados. Ocomportamento dos investimentos diretos, dosinvestimentos em carteira e de outros investimentos, aolongo do tempo, guarda também certo grau elevado deparecença.

A partir de 2002, contudo, houve uma quebra domencionado “paralelismo” por, no mínimo, dois motivos.Em primeiro lugar, porque, em 2002, o Brasil viveu umaexperiência sui generis, quando a provável vitória docandidato Luís Inácio Lula da Silva à Presidência daRepública assustou os investidores externos, fazendo--os retirar vultosas somas líquidas de capital do País.Sob o efeito do “Lula vem aí!”, a conta financeira registroudéficit de US$ 4,3 bilhões. Esse foi o único caso de déficitanual da conta financeira no período examinado. A crisede financiamento externo de 2002 legou para 2003 umaconjuntura marcada por elevadas taxas de inflação ejuros, baixo ritmo de crescimento e incertezas, inclusiveem vista da magnitude atingida pela dívida do setorpúblico. É provável que essa conjuntura tenha contribuídopara manter relativamente baixos os fluxos de capitaisexternos no mesmo ano; a conta financeira registrouentradas líquidas de apenas US$ 1,9 bilhão. Em segundolugar, porque, a partir do terceiro trimestre de 2001 e atéo final do período examinado neste artigo, o saldo dabalança comercial manteve forte tendência de melhora.Em grande parte por esse motivo, o déficit em transaçõescorrentes caiu de US$ 23,2 bilhões em 2001 para apenasUS$ 7,7 bilhões em 2002. Em 2003 e 2004, na mesmaconta, houve superávits de, respectivamente, US$ 4,2bilhões e US$ 11,7 bilhões. Dessa forma, resultoueliminada a necessidade de ampliação do endividamento

externo da economia, fato que contribuiu para manterreduzido — ou levemente negativo —, em 2004, o registrolíquido de entrada de capitais na conta financeira. Assim,no Brasil, não se refletiu a recuperação dos fluxos definanciamentos externos ocorrida nos países emdesenvolvimento, desde 2003.

A seguir, procuramos descrever a evolução dasdiferentes modalidades de financiamento externo daeconomia nacional a partir de 1991. Essa descriçãopermitirá, adiante, melhor considerarmos aspectosreferentes à política cambial e à evolução da taxa decâmbio, que tiveram grande importância na determinaçãodos financiamentos externos, ao longo do tempo. Nadescrição anunciada, adotamos a seguinte periodização:o primeiro período vai de 1991 a 1996; o segundo, de1997 a 2001; e o terceiro segue a partir de 2002. Oscritérios principais dessa periodização foram a tendência,crescente ou decrescente, do valor das entradas anuaislíquidas registradas na conta capital e a qualidade dosfinanciamentos recebidos.

O primeiro período — transcorrido entre 1991 e1996 — foi definido de acordo com duas característicasprincipais: primeiro, a recuperação dos fluxos de financia-mentos externos voluntários, seguida por forte tendênciade crescimento dos mesmos, a qual terminou por alcançarníveis insustentáveis; segundo, a grande participação dosinvestimentos em carteira (Tabela 2). Tais fatos setornaram possíveis graças à liberalização da presençados capitais estrangeiros na economia nacional, a partirde 1991. Entre 1991 e 1993, os investimentos em carteirasomaram US$ 30,6 bilhões, o que ressalta seu papel nacitada recuperação. Pelos mesmos motivos, foramresponsáveis pela recuperação das reservas externas apartir de 1993, portanto, antes do lançamento do PlanoReal. Em todo o primeiro período, os investimentos emcarteira, de longe, ocuparam o primeiro lugar, segundo aordem de grandeza das entradas líquidas; acumularamingressos líquidos de US$ 112,1 bilhões, enquanto a contafinanceira registrou ingressos líquidos de US$ 93,0bilhões.

Em termos da contribuição acumulada, entre 1991e 1996, os investimentos em carteira e os investimentosdiretos foram os exclusivos financiadores da economia.Os últimos contribuíram com US$ 18,8 bilhões. Contudoestes apenas atingiram cifra mais expressiva em 1996,anunciando, com isso, a vigorosa tendência de cresci-mento que se estendeu até 2000 e a importante parti-cipação, no financiamento externo, nos dois períodos

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6 No segundo período, os investimentos diretos atingiram níveisparticularmente elevados e passaram a evidenciar tendência deredução no terceiro período. A despeito dessa tendência, osmontantes anuais mantiveram níveis expressivos.

posteriores.6 De outro lado, no período em consideração,os outros investimentos acumularam saídas líquidas deUS$ 37,9 bilhões, evidenciando a obsolescência dosinstrumentos financeiros utilizados. Os derivativos,realizaram pagamentos líquidos ao exterior de US$ 38,0milhões. Essa minguada cifra evidencia, segundoentendemos, a ausência de risco cambial percebido pelosoperadores financeiros.

É necessário considerarmos a hipótese de que partedas entradas dos investimentos em carteira represen-taram, de fato, o remanejamento de recursos que jáestavam presentes na economia sob o registro de outrosinvestimentos. Se verdadeira essa hipótese, a novaregulamentação dos capitais estrangeiros facultou amigração de capitais dos velhos instrumentos financeirospara os novos. Essa suposição se baseia nas vultosassaídas e entradas, respectivamente, de outros investimen-tos e investimentos em carteira, em 1992 e 1994. Maisconcretamente, baseia-se no elevado montante dosvalores e em certa proximidade entre os mesmos.

A descrição acima confirma que a “âncora cambial”do Plano Real se apoiou largamente nos investimentosem carteira. À época, esse fato provocou críticas, sob oargumento de que eram financiamentos altamentevoláteis e, por isso, mantinham a economia na iminênciade grande instabilidade. Os eventos mostraram que acrítica era pertinente. Contudo aqueles foram os recursosdisponíveis aos fazedores da política econômica.

Os anos de 1997 até 2001 definem o segundoperíodo considerado, o qual transcorreu durante a fasede contração dos financiamentos externos naseconomias em desenvolvimento. Na economia nacional,essa contração manifestou-se com intensidade em 1997,através de contração dos investimentos em carteira ede outros investimentos. O superávit da conta financeiracaiu de US$ 34,8 bilhões em 1996 para US$ 24,7 bilhõese US$ 18,4 bilhões, respectivamente, em 1997 e 1998.Na perspectiva dos investidores internacionais, o riscopercebido no Brasil resultou aumentado, porque, nos doisúltimos exercícios citados, o déficit nacional emtransações correntes aumentou muito, atingindo os níveishistóricos máximos. A combinação da fase de contraçãodos financiamentos nas economias em desenvolvimentocom o aumento do desequilíbrio externo brasileiro e comum amplo e persistente desequilíbrio fiscal causou, nos

dois anos citados, duas crises cambiais no País, forçandoo Banco Central a substituir o regime cambial de bandasestreitas pelo regime de câmbio flutuante em janeiro de1999. Essa mudança foi de particular importância, porque,com o novo regime de câmbio, os fluxos de capitaisfinanceiros, stricto sensu, resultaram à mercê dos riscosda variação cambial. Entendemos que esse fatocontribuiu significativamente — ao lado de outros fatoresexternos e internos — para manter a continuidade daretração dos fluxos líquidos desses capitais — iniciadaem 1997 —, nos anos posteriores. A propósito, interessaver, na Tabela 2, que o risco cambial causou significativoaumento dos pagamentos líquidos ao exterior a título dederivativos.

No período em questão — 1997-01 —, as entradaslíquidas registradas na conta financeira nacional oscilaramamplamente de ano para ano, em vista do instávelcomportamento dos investimentos em carteira e dosoutros investimentos. O superávit mínimo da conta finan-ceira foi registrado em 1999 — US$ 11,6 bilhões —, tendocomo causa o paroxismo das incertezas provocado pela“quebra” do regime cambial de bandas no início do ano.Os dramáticos acontecimentos anteriores, ocorridos emoutras economias que também tiveram seus regimescambiais fixos “quebrados”, contribuíram, certamente,para extremar os riscos percebidos na economia brasileira.Em 2000, a conta financeira registrou US$ 26,1 bilhões,o nível mais elevado entre 1998 e 2001. Em todo esseperíodo, a conta financeira acumulou entradas líquidasde US$ 99,2 bilhões, o que corresponde à média anual,bastante elevada, da ordem de US$ 20,0 bilhões. Essamagnitude se tornou possível graças ao comportamentodos investimentos diretos, que, exceção feita ao ano de2001, mantiveram trajetória de alta; eles acumularam,no segundo período, US$ 126,0 bilhões, dos quais US$28,3 bilhões corresponderam a pagamentos estrangeirosao programa de privatizações. Convém lembrar que osinvestimentos diretos relacionados às privatizaçõessomaram US$ 30,9 bilhões, integralizados, entre 1996 e2002. Desse total, 91,5% foram pagos no segundoperíodo. O ano de encerramento desse período, 2001,foi o último de expressiva contribuição dos pagamentosàs privatizações, com o valor de US$ 7,0 bilhões; em2002 e 2003, esses pagamentos somaram, respectiva-mente, US$ 1,1 bilhão e US$ 280 milhões, evidenciandoo esgotamento dessa fonte de financiamento. Tal esgota-mento explica, em parte, a queda do patamar dos inves-timentos diretos ocorrida nos anos seguintes e,igualmente em parte, a redução das entradas líquidasregistradas na conta financeira.

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Do primeiro para o segundo período, a mudança daqualidade dos financiamentos externos materializou-seprincipalmente, de um lado, pelo grande aumento dosinvestimentos diretos e, de outro, pela expressiva diminui-ção dos investimentos em carteira. Estes totalizaramUS$ 41,6 bilhões. Cerca de 74,0% dessas entradasocorreram em 1997 e 1998, ou seja, antes da adoção doregime de câmbio flutuante. Cabe insistir dizendo que osriscos inerentes ao câmbio flutuante colocaram o adventodesse regime como um marco divisório entre dois“momentos” sucessivos. O primeiro marcado pelo grandeafluxo, ainda que instável, de investimentos em carteira.O segundo caracterizado por forte tendência de reduçãodos ingressos líquidos. Em 2001, as entradas líquidasdos investimentos em carteira foram quase nulas,totalizando US$ 77,0 bilhões. Essa foi a menor cifra atéentão, desde que foi franqueada sua presença no Brasil.Essa tendência de redução persistiu no terceiro período,não obstante a grande oscilação dos fluxos de ano paraano. Por seu turno, as despesas líquidas com derivativoscresceram bastante e assumiram cifras significativas apartir de 1997, em decorrência do risco cambial. Emtodo o segundo período, acumularam o montante líquidonegativo de US$ 1,3 bilhão. Por último, foi notável ocomportamento dos outros investimentos, por manteremcifras anuais negativas elevadas desde 1997 até o finaldos anos observados neste artigo. O fato ilustra asuperação e a obsolescência dos instrumentosfinanceiros tradicionais.

No terceiro período — 2002-04 —, constatamosgrande contração do financiamento externo. Nos três anosem questão, a conta financeira acumulou déficit de US$3,2 bilhões, e os investimentos diretos, superávit de US$32,7 bilhões. Essas duas cifras confrontadas ressaltamas elevadas saídas acumuladas pelos investimentos emcarteira (US$ 4,5 bilhões) e principalmente pelos outrosinvestimentos (US$ 30,2 bilhões).

Mais uma vez é necessário apontarmos a incertezacambial como uma das causas principais docomportamento evasivo dos capitais internacionais nasdiferentes rubricas, exceção feita aos investimentosdiretos, dada sua racionalidade específica, orientada pelasexpectativas de longo prazo. A propósito da incertezacambial prevalecente, um dos indícios do fato é oaumento expressivo das despesas líquidas comderivativos, com o intuito de fazer hedge no período. Em2004, os derivativos registraram, de longe, o valor negativomais elevado de toda a série examinada. Pareceimportante notar também que a incerteza cambialcontraiu o fluxo de financiamento externos não apenasem vista do comportamento dos credores estrangeiros,

mas, talvez principalmente, pelo comportamento dosdevedores nacionais. Entendemos que estes trataramde se ver livres de posições de risco, saldando dívidas.A manifestação macroeconômica desse fato seexpressou através da redução da dívida externa líquidado Brasil. Essa redução resultou, de um lado, das entradasde investimentos diretos e, de outro, dos superávits emtransações correntes, em 2003 e 2004, de, respectiva-mente, US$ 4,2 e US$ 11,7 bilhões. Devemos frisar acontribuição desses superávits. Passando de deficitáriospara superavitários, os saldos em conta correnteinverteram a direção de sua ação causal sobre os fluxosde financiamentos externos. Deixaram de ser financiadoscom dívidas externas para passarem a fornecer fundospara a amortização dessas dívidas.

É necessário falarmos dos efeitos da então provávelvitória da candidatura de Luiz Inácio Lula da Silva naseleições à Presidência da República sobre a contafinanceira no terceiro período definido por este artigo.Notoriamente, no ano da eleição, 2002, a elevadaprobabilidade da vitória de Lula causou grande fuga decapitais estrangeiros do País e rebuliço no mercadonacional de câmbio. A cotação cambial do dólar chegouao pico de R$ 4,0 nos momentos mais críticos daqueleseventos. No ano, a conta financeira registrou déficit deUS$ 4,7 bilhões, fato que contribuiu grandemente parareduzir o saldo acumulado da mesma conta, em todo operíodo.7 Todos sabemos dos graves efeitos negativosque os eventos em pauta causaram ao País em termosde — para ser breve — desaceleração do crescimento eaumento do desemprego. Contudo, especificamentequanto ao que nos interessa — a evolução dos fluxos definanciamentos externos privados —, devemos mantero cuidado para não exagerar a capacidade daqueles fatosde imprimir efeitos ou características no período empauta. É nossa convicção que o novo perfil adquiridopelo conjunto das rubricas da conta financeira foipropiciado fundamentalmente pela auspiciosa tendênciade melhora dos saldos em transações correntes desde oterceiro trimestre de 2001, graças, em especial, aopersistente crescimento do saldo da balança comercial.

7 No agregado dos países em desenvolvimento, os fluxos definanciamentos aumentaram 24,5% em 2002, na comparaçãocom 2001. Teriam aumentado bem mais, se não fossem oseventos ocorridos na economia brasileira. Em suma, não épossível atribuir alguma influência da conjuntura internacionalnos fatos ocorridos no Brasil, naquele ano.

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Tabela 1

Fluxos líquidos de capitais privados e transações correntes nos mercados emergentes e em países em desenvolvimento — 1996-04

(US$ bilhões)

DISCRIMINAÇÃO 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004

Total .................................. 196,7 198,4 84,8 89,1 60,8 60,9 75,8 149,5 196,6 Investimento direto ............ 116,0 147,2 159,8 173,3 174,3 184,7 144,4 151,9 186,4 Investimento em carteira ... 86,3 60,4 42,5 69,1 20,5 -86,9 -90,0 -9,9 28,8 Outros capitais privados .... -5,6 -9,2 -117,6 -153,3 -134,0 -36,9 21,4 7,5 -18,6 Conta corrente .................. -93,8 -83,5 -51,9 38,9 126,6 89,4 142,5 233,8 336,3

FONTE: FMI.

Tabela 2

Fluxos de capitais privados e transações correntes no Brasil — 1991-04 (US$ bilhões)

DISCRIMINAÇÃO 1991 1992 1993 1994 1995 1996 1997

Conta financeira ............. 3,52 2,45 12,25 10,01 30,42 34,33 24,59

Investimento direto ......... 0,09 1,92 0,80 1,46 3,31 11,26 17,88

Investimento em carteira 3,81 14,47 12,33 50,64 9,22 21,62 12,62

Derivativos ...................... 0,00 0,00 0,01 -0,03 0,02 -0,04 -0,03

Outros investimentos ...... -0,38 -13,94 -0,88 -42,07 17,88 1,49 -5,88

Transações correntes ..... -1,41 6,14 -0,59 -1,69 -17,97 -23,50 -30,45

DISCRIMINAÇÃO 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004

Conta financeira ............. 18,07 11,60 26,14 19,03 -4,76 1,90 -0,39

Investimento direto ......... 26,00 26,89 30,50 24,72 14,11 9,89 8,70

Investimento em carteira 18,13 3,80 6,96 0,08 -5,12 5,31 -4,76

Derivativos ...................... -0,46 -0,09 -0,20 -0,47 -0,36 -0,15 -0,68

Outros investimentos ...... -25,60 -19,00 -11,12 -5,29 -13,39 -13,15 -3,66

Transações correntes ..... -33,42 -25,34 -24,22 -23,22 -7,72 4,18 11,67

FONTE DOS DADOS BRUTOS: Banco Central do Brasil.

Considerações finais

Anteriormente, caracterizamos três períodos, naevolução da conta financeira nacional, entre 1991 e 2004e tecemos algumas considerações acerca dos fatosverificados. Em seguida, retomamos alguns aspectosdesse quadro, incorporando, contudo, aspectos de outranatureza. Procuramos referir, de maneira um pouco maiscompleta, diferentes instâncias da realidade queinteragiram e determinaram, em boa medida, aquelaevolução.

No período observado por este artigo, a sucessãode fases e “momentos” de expansão e contração daliquidez dos mercados financeiros internacionais, nospaíses em desenvolvimento, produziu, quase sempre,reflexos de igual sentido no Brasil. Assim, a faseexpansiva dos fluxos de financiamentos no agregado doscitados países, encerrada em 1997, propiciou abundantesrecursos externos ao Brasil e, por isso, facultou ao PlanoReal a utilização da “âncora cambial” como um importanteinstrumento — dentre outros — de “desindexação” dospreços e de redução das taxas de inflação. A “âncora

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tendência de crescimento dos investimentos diretos,alheios, por sua lógica, às razões que atemorizam asdemais modalidades dos financiamentos. Por isso, adesvalorização cambial havida contribuiu para reduzir odéficit em transações correntes, entretanto, até 2001,em medida insuficiente para reduzi-los para níveissustentáveis.

As elevadas entradas líquidas anuais deinvestimentos diretos entre 1997 e 2001 fazem acreditarque se assistiu, naqueles anos, a uma momento históricode — o leitor perdoe a redundância — característicaspeculiares. As críticas dificuldades enfrentadas pelaeconomia nacional durante um longo período anterior,iniciado nos anos 80, haviam-na mantido à margem dosinteresses e dos investimentos das empresasestrangeiras. Quando tais dificuldades evidenciaram sinaismais claros de superação e foram iniciadas reformasmodernizantes, o Brasil — uma das 10 maioreseconomias do mundo, dotada de uma estrutura produtivabastante complexa e completa, além de demanda amplae especialmente dinâmica — abriu-se como parte doespaço estratégico da competição global. Nessemomento, coube às empresas internacionaisempreenderem a corrida para implantar ou ampliar suapresença no País. Por esses motivos, durante algunsanos, foi excepcionalmente elevado o montante dosinvestimentos diretos, que se distribuíram entremodernização e ampliação de instalações, aquisições,privatizações, fusões e abertura de novosempreendimentos. Então, a competição entre asempresas configurou-se como uma corrida para “chegarprimeiro”, levando os investimentos estrangeiros diretosa um elevado grau de concentração entre 1997 e 2001.Nesses cinco anos, eles apresentaram a média anual deUS$ 25,2 bilhões; nos três anos posteriores, a mesmavariável registrou valor de US$ 10,9 bilhões. Esta últimacifra parece ser evidência de que, no que respeita aosfluxos de investimentos diretos, o Brasil ingressou emnova fase, na qual, já anteriormente realizados osinvestimentos de “ocupação de espaço” e modernização,as empresas estrangeiras passaram a realizar novosinvestimentos, principalmente para manter acompetitividade e para ampliar a capacidade produtiva.Se essa hipótese é verdadeira, os montantes dasentradas líquidas de investimentos diretos estarãocondicionados, daqui para a frente muito mais do quenos cinco anos anteriores, ao ritmo de crescimento doproduto nacional. Em suma, as taxas de crescimento daeconomia — por determinarem a maior ou a menorocupação da capacidade produtiva existente — e asexpectativas mais ou menos otimistas dos rendimentos

cambial” foi adotada em meados de 1994 e, a partir demaio de 1995, seguiu definida como um regime cambialde bandas estreitas “atrelado” ao dólar. Ela sobreviveuàs condições da liquidez internacional que possibilitaramsua adoção. No seu período de vigência, a insustentáveltendência de aumento do déficit em transações correntesevidenciou que o real esteve excessivamente valorizadofrente ao dólar. Porém, enquanto os fluxos definanciamentos externos permitiram, o Banco Centralmanteve a política cambial, na esperança de que oaumento da competitividade da produção nacional —causado pelo processo de reestruturação produtiva emcurso — terminasse sendo suficiente para reduziradequadamente os déficits em transações correntes.Essa expectativa não se cumpriu em tempo hábil. A crisede financiamento externo, iniciada no segundo semestrede 1998, “quebrou a âncora cambial” no princípio de 1999.Ato contínuo, o Banco Central adotou o regime de câmbioflutuante.

No Brasil, a retomada e o crescimento dos fluxosde financiamentos externos a partir de 1991 e até 1997foram marcados pela grande participação dosinvestimentos em carteira; nesses anos, a soma dessesinvestimentos foi superior à da conta financeira. Fatoresnacionais — ao lado dos internacionais — determinaramesse fato. Um dos fatores domésticos de atração dosinvestimentos em carteira foi a então recente aberturade um novo espaço nacional de oportunidades deaplicações lucrativas, seja na compra de ações a preçosmódicos, seja na aquisição de títulos de renda fixa deelevada remuneração. No mesmo sentido, cabe dizer que,quando da liberação financeira no País, o endividamentoexterno da economia, na perspectiva das possibilidadesdos novos instrumentos financeiros, era avaliado comobaixo. A ausência de risco cambial — dado o regime decâmbio que passou a viger — foi outro importantechamariz para os investimentos em carteira.

Após a troca do regime cambial no País, a maioriados analistas — orientados pela lógica econômicaabstrata, mas traídos pela especificidade dos fatosconcretos — previram contração dos financiamentosexternos e desvalorização cambial de grandezassuficientes para, ao menos em boa parte, sanar osdesequilíbrios externos da economia. Em larga medida,essas expectativas não se confirmaram, embora tenhahavido expressiva contração dos fluxos de capitaisfinanceiros stricto sensu. Assim, diminuíram as entradaslíquidas dos investimentos em carteira e aumentaramas saídas líquidas dos outros investimentos. Nãoobstante isso, os montantes totais dos financiamentosexternos foram sustentados, em certa medida, pela forte

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futuros passaram a ser os determinantes principais dosinvestimentos estrangeiros diretos.

Os fatos e as considerações expostos acima levam--nos a entender que os elevados valores registrados atítulo de investimentos em carteira e investimentosdiretos, nos específicos “momentos de auge” citados,não se deverão repetir nos próximos anos, no Brasil. Atendência decrescente dos investimentos em carteira —no agregado dos países em desenvolvimento e no Bra-sil — é um indicativo de que os agentes envolvidos na“farra especulativa” encerrada em 1997 amargaramprejuízos vultosos. As experiências do passado têmevidenciado que fatos dessa natureza exigem largoperíodo para serem esquecidos, antes do retorno das“bolhas especulativas”. Além disso, a maior proliferaçãodos regimes de câmbio flutuante nos países emdesenvolvimento é um forte desestímulo aos movimentosespeculativos de grande monta.

Aqui, os outros investimentos e os derivativosmerecem apenas menção brevíssima. Os outrosinvestimentos em carteira notabilizaram-se apenas pelaenorme soma de recursos retirados da economia nacional,praticamente em todos os anos do período examinado.A persistência e a intensidade dessa tendênciaevidenciam que, em algum momento futuro, ela arrefeceráe se esgotará. Esse esgotamento se constituirá num fatorde elevação do saldo líquido da conta financeira. Por seuturno, os derivativos acumularam saídas líquidas de US$2,7 bilhões em todo o período observado. Esse valor,sem ser desprezível, é pouco importante na perspectivado financiamento externo da economia. Por isso, ointeresse maior pela variação dos saldos da rubricaderivativos tende a se reduzir à indicação que fornecedo estado momentâneo das incertezas referentes àsoperações internacionais no País. Logo, o afluxo derecursos externos para a economia nacional permaneceráestritamente ao encargo dos investimentos em carteirae dos investimentos diretos. Quanto a essas duasmodalidades de financiamento, o exame feito por esteartigo sugere que, nos próximos anos, não deveremosvoltar a assistir à pujança verificada, no primeiro caso,até 1998 e, no segundo, especialmente entre 1998 e 2001.Essa expectativa tenderá a ser contestada, sepreenchidas as seguintes condições: primeiro, na medidaem que a economia nacional, evidenciando capacidadede sustentar taxas de crescimento há muito não vistas,aumente sua capacidade de atrair investimentos;segundo, se mantida a credibilidade da política econômicanacional; terceiro, se o crescimento do PIB e o docomércio mundial se mantiverem favoráveis à

continuidade da expansão dos investimentosinternacionais nos países em desenvolvimento.

Referências

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WORLD ECONOMIC OUTLOOK. Washington, DC: IMF,Sept 2004.

WORLD ECONOMIC OUTLOOK. Washington, DC: IMF,Apr 2005.

Mudança no regime cambial da China

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Mudança no regime cambial da China*

André Moreira Cunha** Professor do Departamento de Economia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e Pesquisador do CNPQ.

ResumoNeste trabalho, analisa-se o novo regime cambial da China. Argumenta--se que a opção gradualista dos "policymakers" chineses reflete anecessidade de se lidar com as pressões contraditórias com respeito aovalor externo do yuan renminbi. Enfatiza-se o contexto internacional dosdesequilíbrios de pagamentos entre a economia norte-americana e o restodo mundo, especialmente as economias asiáticas.

Palavras-chave: China; regime cambial; desequilíbrios exter-

nos.

AbstractIn this paper we analyze the new exchange rate regime in China. Weargue that the gradualist option of chinese policymakers reflects thenecessity of manage contradictory pressures over the external value ofthe yuan renminbi. We emphasize the international context of paymentsimbalances among U.S. economy and the rest of the world, especially theasian economies.

Artigo recebido em 23 ago. 2005.

1 - Introdução

Há cerca de três anos, intensificaram-se as críticasà opção chinesa de manter sua moeda — o yuanrenminbi1 — atrelada ao dólar norte-americano (somentedólar, de agora em diante) através de um regime decâmbio fixo. Tal posição vinha tanto dos setores oficiaise privados dos EUA, quanto de países que estavam

sofrendo com a pressão concorrencial chinesa.Argumentava-se que a rigidez daquele regime cambialestaria potencializando os desequilíbrios nos pagamentosinternacionais, manifestos, especialmente, noscrescentes déficits em conta corrente dos EUA. Aestratégia da China e de outras economias asiáticas deatuar de forma ativa nos mercados cambiais, com oobjetivo de estabilizar o valor de suas moedas em termosdo dólar e de ampliar — em um ritmo sem precedente nahistória recente das finanças internacionais — as reservasoficiais, passou a ser apontada, de forma depreciativa,como sendo "mercantilista"2.

2 Sobre tais questões, recomenda-se a leitura de: Goldstein (2003),Bergsten (2004) e Eichengreen (2004). Ver, também, as análisesda revista The Economist, de 10.07.03, de 18.09.03 e de05.02.04 (Fear..., 2003; Oriental..., 2003; Let..., 2004).

* Versão de agosto de 2005. As traduções de citações originais doinglês para o português foram feitas pelo autor. O mesmoagradece pelo apoio de pesquisa ao bolsista do PIBIC-CNPQ,Henrique B. Renck.

** E-mail: [email protected] O yuan renminbi (RMB) é a moeda oficial da China. Eventualmente

yuan e renminbi serão utilizados, isoladamente, ao longo dotexto. Devem ser lidos como simplificações de uma mesmaunidade monetária.

André Moreira Cunha

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Em julho de 2005, a China surpreendeu o mundo,ao anunciar um novo regime cambial. O yuan passaria aser administrado em função da flutuação de uma cestacomposta por 11 moedas, com destaque para o dólar, oeuro, o iene japonês e o won coreano. Nesse sentido, opresente artigo tem por objetivo analisar as origens detal mudança e suas possíveis implicações. Para tanto,inicia-se analisando a natureza dos desequilíbriosrecentes na economia internacional e das estratégiasmacroeconômicas adotadas nas regiões periféricas,especialmente na Ásia. A seguir, mostra-se o papel cadavez mais importante da China nas dinâmicas econômicasregional e mundial. A partir de tais elementos, parte-separa uma análise do novo regime cambial chinês. Mesmosendo um fato recente, há elementos de naturezaestrutural que permitem realizar uma avaliação, ainda quepreliminar, daquele movimento tático da China. Seguemalgumas considerações finais.

2 - Desequilíbrios estrutu- rais na economia inter- nacional e estratégias macroeconômicas nas economias periféricas

A economia internacional vem demonstrando umgrande dinamismo desde meados de 2003. Depois daretração no ritmo de crescimento de seus principais pólosdinâmicos em 2001 e 2002, os elevados estímulos fiscaise monetários nas economias centrais, especialmente nosEUA, garantiram o quadro atual de recuperação, cujo ápicese deu em 2004. Verificou-se, ali, uma convergência defatores positivos, com destaque para: (a) o maior nívelde crescimento do PIB mundial desde 1976; (b) uma forteexpansão do comércio internacional, tanto em termosde volume quanto, principalmente, de preços; e (c) umaabundante liquidez financeira, que favoreceu amanutenção de um ambiente global de baixas taxas dejuros reais (International Monetary Fund, 2005).

Todavia os mesmos fatores determinantes darecuperação estão gerando um conjunto dedesequilíbrios, dentre os quais cabe destacar o elevadodéficit em conta corrente dos EUA, que passou de umpatamar abaixo de 2% do PIB, no começo dos anos 90,para 4%, no final da década, atingindo 6% no ano de2004. Sua tendência segue sendo de alta. No atual ciclo

político, o déficit externo vem sendo acompanhado pordéficits fiscais também crescentes, dados ossignificativos estímulos de redução de impostos e deampliação de gastos ocorridos depois de 2001. A voltados "déficits gêmeos" tem colocado em debate aqualidade (no futuro) da dívida pública norte-americana,cujo nível corrente vem-se aproximando, velozmente, depatamares mais típicos das economias periféricas.3 Emuma perspectiva mais ampla, verifica-se que as famíliase as empresas também apresentam níveis recordes deendividamento4, o que caracterizaria a emergência deuma situação de elevada fragilidade financeira. O modelode crescimento liderado pelo consumo e amparado porum elevado endividamento traduzir-se-ia em estímulosà produção mundial em regiões emergentes, quepassaram a absorver, nas últimas duas décadas, umaparcela crescente da capacidade produtiva mundial.Ademais, segmentos dos mercados financeiros, como omercado imobiliário, estariam superaquecidos. Em 2004,a variação anual dos preços dos imóveis atingiu níveisrecordes nos EUA, sendo também altista em vários outrospaíses (Ann. Rep., 2005).

A contrapartida para a ampliação da posiçãodevedora líquida dos EUA estaria no aumento da posiçãocredora do resto do mundo, implicando exportação depoupança por parte de economias centrais e periféricas.5

3 "A medida mais ampla do total da dívida dos Estados Unidoscom o resto do mundo — a posição líquida de investimentosinternacionais ou PLI — aumentou de 5% do PIB em 1997 (US$360 bilhões) para um valor esperado de 28% do PIB (US$ 3,3trilhões) até o final de 2004. Equivalendo a 280%, a taxa dedívida sobre exportações dos EUA está atingindo rapidamentepatamares das economias latinas mais problemáticas, comoArgentina e Brasil. Sem ajustes mais profundos, o endividamentoexterno líquido dos EUA está no caminho de atingir 50% do PIBe cerca de 500% das receitas de exportação em 2008." (Roubini;Setser, 2005b, p. 9 — esta e as demais citações foram traduzidaspor nós). Roubini e Setser (2005b) estimam que, ainda em 2005,os EUA se tornem pagadores líquidos de juros para o resto domundo.

4 Papadimitriou et al. (2005) realizam uma análise detalhada doendividamento norte-americano a partir de um referencial teóricoque valoriza a tradição keynesiana-minskyiana.

5 Bernanke (2005) analisa os desequilíbrios das contas externasdos EUA, assumindo que há um problema global de "excessode poupança" (global saving glut). Para o então Diretor do FED,a economia norte-americana seria passiva nesse processo. Talexcesso de poupança se originaria, principalmente, de: (a)questões demográficas dos países centrais (envelhecimentoda população); (b) aumento do preço do petróleo (o que gerariauma transferência de renda para os países exportadores dessaimportante commodity); e (c) das estratégias defensivas dospaíses periféricos nesse período (pós-crise asiática) de crisesfinanceiras e de volatilidade dos mercados, caracterizadas pela

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Países estruturalmente superavitários, especialmente emconta corrente, como Japão, China, Coréia do Sul, outraseconomias asiáticas emergentes, os países da regiãodo euro, exportadores de petróleo e, desde 2003, os latino--americanos vêm financiando os "déficits gêmeos" norte--americanos pela reconversão de seus superávitsexternos em reservas, as quais são aplicadas em ativosfinanceiros denominados em dólares norte-americanos.Os bancos centrais dos países asiáticos vêmdesempenhando um papel de destaque nesse processo.

Diante de tal quadro, há analistas que consideramos crescentes déficits dos EUA como um elementopotencialmente desestabilizador de uma conjuntura globalque se revela excepcionalmente favorável desde 2003.6

Há, porém, os que enxergam um elemento positivo nosdéficits, que estariam dinamizando o crescimento deregiões periféricas.7 Entre o primeiro grupo8, cresce oconsenso de que o ajuste para os "desequilíbrios" globaispassaria por um realinhamento de moedas, no qual ospaíses asiáticos, notadamente a China, deveriam aceitaruma maior flexibilidade em suas taxas de câmbio. Avalorização da moeda chinesa (frente ao dólar) viria a sesomar à apreciação de outras moedas, como o euro,permitindo uma depreciação mais significativa da taxade câmbio real e efetiva do dólar, o que, por sua vez,garantiria uma acomodação dos desajustes comerciaisbilaterais, pelo aumento das exportações líquidas dosEUA.

Os países que estão sendo pressionados paraabsorver os novos ajustes cambiais — e aqui o casochinês segue na linha de frente — passaram a argumentarque a origem dos "desequilíbrios" estaria não em suaspolíticas macroeconômicas "defensivas"ou "mercanti-listas", mas, sim, no baixo nível de poupança norte--americana, o que é um eufemismo para o "excesso de

gasto". Por essa ótica, a correção viria, principalmente,de um ajuste fiscal do Governo dos EUA e de um aumentoda poupança privada.9 Diante de tal consideração,respeitados analistas norte-americanos vêm-serefugiando na tese de que há um problema global de"excesso de poupança", que busca abrigo em ativosdenominados em dólares, de modo que os EUA seriampassivos nesse processo.10 A mudança no regime cambialchinês, conforme será demonstrado na seqüência,implicou uma nova linha de argumentação, que agorapassou a enfatizar a busca de maior flexibilidade dorenminbi. Na prática, a moeda chinesa elevou-se poucomais de 2% diante do dólar até o presente momento.

Por qualquer linha de argumentação, ao seconsiderarem os desequilíbrios de pagamentos como umproblema a ser corrigido em um horizonte relativamentepróximo, abre-se espaço para a avaliação dos possíveisimpactos de um ajuste global de preços — juros e câmbiodas principais moedas — e quantidades — mudançasna demanda induzidas, por exemplo, por alterações napolítica fiscal dos EUA. Dentre outros aspectos, há umaênfase nos efeitos esperados: (a) de um aperto fiscalnos EUA capaz de promover a redução dos gastospúblicos e privados, o que afetaria negativamente asexportações de terceiros países; (b) de mudanças súbitase/ou mais intensas do que o projetado pelas expectativascorrentes dos investidores nos preços de importantesativos financeiros, especialmente a partir da elevaçãonos juros curtos e longos dos EUA11; (c) o que poderiaampliar a aversão ao risco dos investidores internacionaise, assim, reverter o quadro recente de recomposição daliquidez financeira para os países periféricos; e (d) acapacidade de mudanças de preços relativos induzidaspela queda na taxa de câmbio real e efetiva do dólar —agora com o estímulo de uma valorização dorenminbi — em reverter o quadro de desequilíbrios nos

geração de superávits em conta corrente e acúmulo de reservas.Stephen Roach, estrategista do Morgan Stanley e um dos maisfestejados analistas da economia internacional, contesta a tesede Bernanke, argumentando que, de acordo com as estimativasmais recentes do FMI, a poupança global não teria aumentadosignificativamente no período recente. Seu ligeiro aumento (de23% na média do período 1983-00 para 25% em 2004) teriaacompanhado a elevação dos investimentos. Por isso, elequestiona: "(...) onde está o excesso de poupança?". Ver What(2005).

6 Alguns exemplos, nesse sentido, são: Roubini e Setser (2005a),Eichengreen (2004), Frankel (2005) e Summers (2004).

7 É o argumento de Dooley, Folkerts-Landau e Garber (2003) ede Dooley e Garber (2005), no que se convencionou chamar dehipótese Bretton Woods II.

8 Ver, dentre outros, Bergsten (2004), Bergsten e Williamson (2004)e International Monetary Fund (2005, cap. 3).

9 O debate, aqui, retoma os contornos verificados na primeirametade dos anos 80, quando os EUA pressionavam Japão eAlemanha para assumirem o ônus do ajuste dos desequilíbriosnos balanços de pagamentos. A desvalorização coordenada dodólar, depois do Acordo do Plaza, foi uma das respostas maisevidentes da tensão política da época.

10 Bernanke (2005) expôs esse argumento de forma contundente.Dooley e Garber (2005) tomam-no como um elemento acessórioem sua análise da hipótese Bretton Woods II.

11 Cá está uma das aparentes "anomalias" dos mercadosfinanceiros globais. O conundrum da taxa de juros norte-ameri-cana foi explicitado por Stephen Roach (Real..., 2005). Trata-seda questão dos reduzidos níveis da taxa real de juros e doaparente descolamento dos movimentos de elevação das taxascurtas do FED (policy rate dos Fed Funds) com respeito àstaxas longas dos T-bonds.

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pagamentos internacionais. É importante lembrar que oajuste nos mercados de ativos financeiros poderia ocorrerem função da perda de um movimento mais amplo deconfiança no dólar, dadas as estratégias de recomposiçãode portfólio dos detentores dos instrumentos de dívidaemitidos nos EUA.

Entre os otimistas, como os proponentes dahipótese Bretton Woods II (Dooley; Folkerts-Landau;Garber, 2003; Dooley; Garber, 2005), o estabelecimentode um jogo de soma positiva entre o devedor em últimainstância, os EUA e os países exportadores emergentespoderia dar longa vida ao processo de (re)localização departe significativa da produção industrial mundial, docentro para a periferia, notadamente para a região doPacífico Asiático. Com isso, tais regiões emergentespoderiam crescer de forma acelerada, incorporando seuscontingentes populacionais ainda à margem dos setoresmodernos. Em contrapartida, a poupança financeiragerada pelo processo de crescimento via drive exportadorseria reciclada pelos mercados financeiros dos paísescentrais, mais especificamente, dos EUA, mais robustose confiáveis que os mercados locais dos paísesperiféricos. Todavia esse jogo não inclui todos os paísesperiféricos. Os ganhos na absorção de capitais e novastecnologias e a inserção nos mercados consumidoresmais dinâmicos têm-se concentrado em poucos "paísesvencedores". Em geral, os resultados verificados, atéagora, do processo de liberalização econômica,especialmente na dimensão financeira, sinalizam para oaumento da instabilidade e não para o crescimentosustentável.12

As tensões correntes que ligam as economiascentrais às periféricas repõem, tanto na dimensãocomercial quanto, principalmente, na esfera financeira, odesafio da busca de estratégias alternativas de inserçãona economia global. Esta vem se caracterizando pelarecorrência de ciclos de expansão e contração da liquidezfinanceira, o que, por sua vez, cria ondas de crescimentoreal e financeiro nos países receptores de capital, cujosdeclínios posteriores, quando dos movimentos de refluxodaqueles capitais, geram graves crises econômicas esociais. A posição financeira externa das economiasperiféricas é particularmente sensível aos movimentosexogenamente determinados de expansão e contraçãoda liquidez nos mercados financeiros dos países centrais,bem como ao perfil de composição das carteiras dosseus investidores. Movimentos de "fuga para qualidade",

provocados por um aumento na aversão ao risco dosinvestidores e/ou na ampliação das taxas de retorno depapéis de maior qualidade emitidos no centro do sistema,provocam fortes oscilações nos mercados financeirosdomésticos dos países em desenvolvimento.

No quadro atual, de sensíveis desequilíbrios nospagamentos internacionais, uma crise de confiança nodólar só poderia ser evitada caso o resto do mundomantenha a disposição de financiar o "crescimentoliderado pelo consumo" dos EUA e, assim, seus déficitsem transações correntes. Para Dolley, Folkerts-Landaue Garber (2003) e Dooley e Garber (2005), esse cenárionão só é possível no curto prazo, como pode se estenderainda por um longo tempo. Os críticos à idéia de que osdéficits externos dos EUA não são uma ameaça àeconomia internacional não consideram plausível ahipótese da sustentabilidade dos déficits norte--americanos em um horizonte de tempo muito largo.Quanto mais longo o acerto de contas entre o paísdeficitário e suas contrapartes superavitárias, maisdolorosos tenderiam a ser os custos desse ajuste (Roubini;Setser, 2005a).

Dolley, Folkerts-Landau e Garber (2003) e Dooley eGarber (2005) consideram ser mais provável amanutenção do atual status quo, onde caberia aos bancoscentrais asiáticos o papel de financiar os desequilíbriosexternos dos EUA. O interesse na manutenção daaquisição de ativos denominados em dólares,especialmente de títulos emitidos pelo Tesouro norte--americano, apesar de sua baixa remuneração e docrescimento na posição devedora (fiscal e externa)daquele país, estaria fundamentado em dois elementosde caráter aparentemente estrutural. O primeiro seria odesejo, inclusive no caso japonês, de seguir priorizandoo crescimento baseado nas exportações. O segundo fatorestaria associado aos impactos da crise financeira de1997-98 sobre o padrão de financiamento dos asiáticose suas estratégias macroeconômicas. Ter-se-ia criadouma sensível rejeição ao modelo de sobre-endividamentocom base em poupança externa, cuja apreciação realdas moedas domésticas e a inflação nos preços de ativosfinanceiros e não financeiros foram os subprodutos quemais teriam contribuído para a fragilização financeiraanterior à crise. As novas prioridades seriam asustentação do valor real das taxas de câmbio frente aodólar, o que implica a adoção de regimes cambiais duros,como nos casos da China, da Malásia e de Hong Kong,ou, no caso dos países que adotam regimes de câmbioflutuante (Japão, Coréia, Índia, Taiwan, Tailândia eIndonésia), a forte intervenção das autoridadesmonetárias, que passaram a reciclar os resultados dos

12 Ver, dentre outros, Prasad et al. (2003) e Comisión Económicapara America Latina y el Caribe (2002; 2004).

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superávits em conta corrente e dos ingressos líquidosde capitais privados, transformando-os em reservasoficiais. O incremento destas, por sua vez, traduziria umabusca aparentemente intencional de reduzir o grau deexposição das diversas economias aos ciclos financeirosexternamente determinados.

Para se compreender a perspectiva asiática, épreciso lembrar que, depois de flertar com a liberalizaçãofinanceira, o que implicou crescente fragilidade externa,muitas economias asiáticas passaram a ter comoestratégia (implícita ou explícita) a criação de "colchões"de liquidez (em dólares) suficientemente elásticos paraafastar o que se passou a perceber na região como umrisco inerente ao processo de globalização, qual seja,crises financeiras geradas pela conversibilidade da contacapital. A idéia de que a busca de tal proteção é "racional"é admitida até por analistas contrários a essa estratégia(Eichengreen, 2004; Institute of International Finance,2004). Alguns indicadores de vulnerabilidade externaapresentaram uma melhora substantiva na Ásia. Arelação reservas internacionais com respeito ao volumede importações dobrou, ao passo que quadruplicou arelação reservas e dívida de curto prazo — proxydestacada na literatura para identificar problemas deliquidez em um contexto de livre mobilidade de capitais.13

É interessante notar que, desde o começo de 2002,a moeda norte-americana chegou a perder entre 40% e50% de seu valor, em termos nominais (entre 10% e25% em termos reais e considerando-se as ponderaçõesdos fluxos de comércio), com respeito ao euro e àsmoedas de outros parceiros comerciais importantes dosEUA, como Canadá e Austrália, ao passo que as moedasasiáticas subiram muito menos — desde a posição fixadas moedas chinesa (até junho de 2005) e malaia,passando pela depreciação do peso filipino, atéapreciações moderadas entre 5% e 20% nos demaiscasos. O esforço oficial para evitar flutuaçõessignificativas nas taxas de câmbio tem-se traduzido noaumento das reservas externas, que, por sua vez, tendem

a resultar em medidas de esterilização do excesso decrédito doméstico (Bergsten, 2004; World Bank, 2005;BIS, 2004; 2005; Aizenman; Lee; Rhee, 2004;Eichengreen, 2004). No caso asiático, entre 2001 e 2004,a variação de reservas como proporção da renda atingiuo nível médio mais elevado das últimas quatro décadas,algo em torno de 5%, contra uma média pouco superiora 1% no período 1970-00.14 Tal nível também não encontraprecedentes quando se compara o desempenho correnteou histórico de outras regiões.

As intervenções cambiais procurariam preservar acompetitividade das moedas nacionais diante do dólare, assim, o drive exportador que está no núcleo de suasestratégias de desenvolvimento. Ademais, ao atrelarem,de direito ou de fato, suas moedas ao dólar, os paísesasiáticos estariam criando uma área "periférica"estruturalmente ligada ao centro norte-americano tantopelos canais comerciais quanto pelos financeiros. Aanalogia ao padrão dólar-ouro derivado do Acordo deBretton Woods tenderia a se ampliar com a incorporaçãode novos países ao novo arranjo de "câmbio fixo". Issose daria por efeito das pressões competitivas entre ospaíses que adotam câmbio flutuante e apresentam forteapreciação de suas moedas frente ao dólar, aorenminbi — e, assim, frente à máquina exportadorachinesa — e às demais moedas asiáticas. Com maispaíses adotando a "estratégia asiática", cresceria oespaço de financiamento dos déficits em conta correntedos EUA. No pós-guerra, os interesses geopolíticos teriamdeterminado um certo padrão de solidariedade entre osEUA e a Europa Ocidental e o Japão, permitindo a estesúltimos lançar mão do drive exportador por meio doacesso ao mercado norte-americano como fonte decrescimento. Agora tal catching-up estaria baseado noduplo interesse da economia central (e devedora) empreservar seu "crescimento liderado pelo consumo" (efinanciamento externo) e das economias periféricas aela atreladas em manter seus respectivos modelos de"crescimento liderado pelas exportações".

13 Para se colocar em perspectiva, em 1995, a relação reservas//dívida de curto prazo era de 1,7 na Ásia e de 1,4 na AméricaLatina (AL). Em 2003, passou, respectivamente, para 8,8 e 1,6.A relação reservas/importações passou de 38% para 68% naÁsia e de 51% para 48% na AL, tendo 2002 como ano de ponta(estimativas do autor com base no Anexo Estatístico doInternational Monetary Fund (2004)). O bom desempenho dascontas externas da maior parte dos países latinos em 2004melhorou tais indicadores (Comisión Económica para AmericaLatina y el Caribe, 2005; World Econ. Outlook, 2005). Ainda assim,o desempenho asiático seguiu sendo superior.

14 Estimativas do autor com base nos dados de diversos WorldEconomic Outlook Database, disponível em: http://www.imf.org

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3 - A China e as economias asiáticas: da crise finan- ceira à crescente integração

As economias asiáticas vêm demonstrando umrenovado dinamismo nesses anos que se seguiram àcrise financeira de 1997 e 1998. Após a abruptainterrupção de uma trajetória até então sustentada decrescimento com estabilidade econômica e avançossignificativos em áreas sociais, a maioria dos países daregião logrou experimentar uma vigorosa recuperação jáa partir de 1999, com um interregno em 2001 e 2002, emfunção da retração da economia norte-americana e, pordecorrência, de um desempenho desfavorável nomercado mundial de bens eletrônicos.

Em 1998, com a crise financeira, o PIB retraiu-seem 13,1% na Indonésia — que precisou de quase cincoanos para recuperar o nível de renda pré-crise —, 10,5%na Tailândia, 7,4% na Malásia, 6,9% na Coréia e 0,6%nas Filipinas. Desde então, voltou a se expandir em umritmo superior à média mundial, entre 5% e 8% em médiaao ano, dependendo do grupo de país considerado,especialmente se há a inclusão da China. Em particular,os anos de 2003 e 2004 marcaram não somente umaexpansão forte do produto, como também a manutençãode resultados bastante expressivos nas contas externas.O superávit global do balanço de pagamentos regionalchegou à casa dos US$ 200 bilhões em 2003 e a US$312 bilhões em 2004.15 Neste ano, verificou-se umexpressivo superávit da conta capital, à qual somou-seo resultado em conta corrente já superior a US$ 100bilhões/ano em média nos últimos três anos (World Bank,2005; Asian..., 2005a; Institute of Internacional Finance,2005).

Tal desempenho externo merece uma atençãoespecial, pois ele marca uma diferença fundamental doperíodo que antecedeu a crise financeira, refletindo,também, o esforço de redução da vulnerabilidade externana região. Desde o início dos anos 90, os países asiáticosvêm tentando lidar com as pressões oriundas de umambiente internacional marcado pela crescente aberturaeconômica, especialmente dos mercados financeiros, epela recorrência de episódios de ampliação e contração

da liquidez financeira gerada nos países avançados. Emresposta a esse fato, alguns países, como Coréia,Indonésia, Tailândia, Malásia, ampliaram o grau deconversibilidade de suas contas capitais desde o finaldos anos 80. Assim, até a crise, os países da regiãoabsorveram, em média, algo entre 3% e 4% dosrespectivos produtos em poupança externa.Acontrapartida disso foram os elevados déficits emtransações correntes (Asian..., 2005a; World Bank, 2005).

Com níveis internos de poupança já elevados, aampliação da liquidez doméstica alimentada pelo créditoexterno gerou um boom de investimentos reais efinanceiros que contribuiu para o acúmulo de fragilidadesfinanceiras e reais. A inflação nos preços dos ativosfinanceiros, o excesso de investimento em setoresprodutivos, especialmente no complexo eletrônico (o quecontribuiu para a queda nos preços dos produtoseletrônicos no período que antecedeu a crise), a ampliaçãodo endividamento do setor privado (de curto prazo edenominado em dólares) e a redução da rentabilidadeem diversos setores produtivos compuseram o quadroque deu margem a uma crescente vulnerabilidade,explicitada quando da crise cambial iniciada na Tailândiae que logo contaminou os demais países da região, comdestaque para o caso coreano, cuja estrutura econômicaera (e é) muito mais profunda e desenvolvida que a devários de seus vizinhos do Leste e, principalmente, doSudeste Asiático (Asian..., 2005a; Ann. Rep., 2004; 2005).

Entre 1997 e 2001, a região digeriu a crise ampliandoexportações, o que permitiu, salvo na retração domercado eletrônico, em 2001, resultados excepcionaisem transações correntes. Já na conta capital, verificou--se uma saída líquida de recursos. Verificou-se uma quedano ritmo de expansão dos investimentos, mesmo no casochinês. O crescimento dependeu fortemente de políticasfiscais e monetárias mais acomodatícias e do driveexportador. É importante destacar-se que os superávitsem transações correntes mais do que compensaram osdéficits nos fluxos de capitais, permitindo uma persistenterecomposição dos níveis de reservas externas. A partirde 2002, o resultado global do balanço depagamentos — que passou de 3,1% em 2001 para 9,3%do PIB em 2004 — e o nível de recomposição dasreservas — que é a contrapartida contábil daqueleresultado — passaram a ocorrer de uma forma que nãoencontra precedentes na história recente da economiainternacional (World Bank, 2005).

A China tem sido o motor do cada vez mais intensoprocesso de integração comercial e financeira da regiãoasiática. Em termos mais amplos, o crescimento chinêsrespondeu por um quarto da expansão do comércio

15 Estimativas do Banco Mundial (World Bank, 2005, p. 27), queexcluem o resultado de Hong Kong.

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mundial em 2002 e 2003 e por cerca de 15% em 2004,um ano marcado por uma sensível recuperação dademanda mundial. O efeito-China tem-se manifestado noaumento da demanda internacional de commodities,16 oque contribuiu para uma forte expansão nos preços dosprodutos agrícolas e minerais nos últimos três anos.17

Aqui, quando se toma em perspectiva o comércio intra--regional, deve-se ressaltar a complementaridade entrea estrutura produtiva e comercial da China e a dos demaispaíses da região. Assim, por exemplo, no setoragropecuário, a China é exportadora de produtostemperados para os países da ASEAN18, enquantoimporta produtos tropicais. Esse fato vem garantindo aviabilização do acordo de cooperação, que tem porobjetivo criar uma área de livre comércio China-ASEAN,a ser implementada entre 2010 e 2015. Nesse processo,foram reduzidos os impostos de importação dos produtosprimários de origem agropecuária para níveis entre 0% e5%. O comércio nesse setor vem crescendo a um ritmode 15% ao ano entre tais países (World Bank, 2005).

Por outro lado, países com estruturas produtivasmais complexas que a China, como Japão, Taiwan eCoréia, vêm se tornando fontes importantes desuprimento de máquinas e equipamentos, que dãosustentação a um ritmo intenso de ampliação dosinvestimentos no setor produtivo industrial. Capital etecnologia fluem na forma financeira — via investimentodireto externo — ou na importação de equipamentosmodernos. Somente quatro economias da região, HongKong, Japão, Coréia e Taiwan, vêm respondendo por cercade 60% do investimento direto externo (IDE) absorvidopela China.19 A demanda chinesa por matérias-primas e

equipamentos fica patente no fato de suas importaçõespassarem de uma média mensal de US$ 20 bilhões nocomeço de 2002 para mais de US$ 50 bilhões/mês nofinal de 2004, início de 2005. Para se colocar emperspectiva, a China importa, em um mês e meio, o queo Brasil importa em um ano. Segundo as estimativas doBanco Mundial, entre 2002 e 2004, as importaçõeschinesas foram responsáveis por metade do crescimentodas exportações dos demais países da região (WorldBank, 2005, p. 17). Por outro lado, a presença cada vezmais forte das exportações chinesas em terceirosmercados tem-se revelado um importante desafio tantopara os países que apresentam vantagens comparativassemelhantes às chinesas, pela abundância relativa demão-de-obra barata, quanto para países como a Coréia,que dependem sensivelmente do drive exportador emmanufaturados mais sofisticados.20

Assim, a consolidação da China como motor detransmissão regional dos impulsos de crescimento vindosdo ocidente está configurando um novo quadro deintegração das economias asiáticas, o que, por um lado,amplia os riscos de "efeito contágio" no caso de umareversão da conjuntura externa e, por outro, cria espaçopara (em um futuro que ainda não pode ser visualizado)a emergência de um novo bloco geopolítico mais orgânico.Há, desde a crise financeira, um esforço crescente deinstitucionalização da cooperação econômica, tanto nocomércio quanto nas finanças. Medidas recentes, comoos acordos de swap da Iniciativa de Chiang Mai, os "AsianBond Market Initiatives" — uma série de medidasvoltadas ao aprimoramento dos mercados de capitais daregião, com o intuito de viabilizar a fixação das poupançasna região —, e a idéia de criação de um Fundo MonetárioAsiático (inicialmente esboçada pelos japoneses em 1997e retomada pelo Banco Asiático de Desenvolvimento em2005), além de diversos acordos de livre-comércio, vêmdando vida ao que se pode perceber com a buscapoliticamente consciente de se ampliarem margens demanobra para a realização de estratégias desenvolvimen-tistas em um novo ambiente de globalização econômicacom predomínio das finanças privadas.

20 Rajan (2005) analisa os aspectos de complementaridade econcorrência entre a China e os demais países da região.

ser uma praça financeira internacional, uma parcela nãodesprezível do IDE de Hong Kong representa, em últimainstância, capitais da própria China e de terceiros países quefazem arbitragem regulatória com vistas à obtenção devantagens tributárias.

16 Para tomar um dos exemplos mais expressivos, basta lembrarque a China foi responsável por um quinto da demanda mundialpor produtos minerais em 2004 e que o crescimento anual desua demanda esteve na casa dos 16% entre 1997 e 2004, o querepresentou 60% da demanda mundial (World Bank, 2005,p. 22).

17 Entre 2001 e 2003, o preço da soja e derivados cresceu mais de50%; em 2004, verificou-se uma tendência de queda. Já ascommodities metálicas, cujos preços se ampliaram em cercade 10% naquele período, atingiram um crescimento de 20% em2004. No começo de 2005, os segmentos energia e mineraismetálicos seguiram em alta (International Monetary Fund, 2005;Ann. Rep., 2005).

18 Association of South-East Asian Nations (Associação dasNações do Sudeste Asiático): Indonésia, Malásia, Tailândia,Filipinas, Cingapura, Laos, Brunei, Camboja, Vietnã e Miamar.

19 Dados de Prasad e Wei (2005, p. 41). Em 2003, por exemplo,33% do IDE originou-se em Hong Kong; 9,4%, no Japão; 8,4%,na Coréia; e 6,3%, em Taiwan. É importante observar que, por

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4 - A mudança no regime cambial da China e suas possíveis implicações

No dia 21 de julho de 2005, o Banco do Povo daChina (BPoC) anunciou que o País passaria a adotar umregime de flutuação administrada para o yuan, tendo porbase uma cesta de moedas. Abandonava-se, assim, apolítica de mais de uma década de fixação do valor damoeda chinesa em termos do dólar, com a cotação RMB8,27 desde 1997. A partir de julho, o yuan renminbi passoua poder flutuar21 dentro de uma banda estreita(inicialmente, em 0,3%). Isso pode implicar movimentosmais largos com respeito às moedas que individualmentecompõem a cesta, como o dólar. Até agora (agosto de2005), não foi explicitada a ponderação exata de cadamoeda naquela cesta, mas analistas de mercadoacreditam que o dólar responderá por cerca de 45%, como iene participando com 20%, e o euro, com 15%. Alémda participação de cada país no comércio exteriorchinês,22 também teriam sido levados em conta aspectosfinanceiros, tais como o perfil da dívida externa da Chinaem termos de denominação monetária, bem como aorigem dos fluxos de investimento externo, que tem sidoa forma predominante de absorção de capitais (Len, 2005;Prasad; Wei, 2005). Conforme se viu no item anterior,tanto do ponto de vista do comércio quanto dos fluxosfinanceiros, o peso de um "bloco do dólar", compostopelos EUA e por economias que atrelam o valor de suasmoedas ao dólar, de jure ou de facto, além da participaçãocrescente dos países da região do Pacífico Asiático estãona base da cesta que, aos poucos, vai sendo reveladapelas autoridades chinesas.

Os objetivos oficiais da reforma no regime cambialparecem dar conta de responder às pressões advindasdo Governo e do Congresso dos EUA, que, por sua vez,faziam eco a interesses privados, financeiros e nãofinanceiros, em torno de uma eventual valorização damoeda chinesa frente ao dólar. Assim, o anúncio do BPoC

fala em "(...) aprimorar o sistema de economia socialistade mercado na China, capacitando os mercados dedesempenharem de forma plena a alocação dos recursos(...)" (Public..., 2005) e garantir "maior flexibilidade" narelação entre o dólar e o renminbi. Por outro lado, o BPoCmanteve o compromisso de atuar no mercado em funçãode uma estratégia econômica mais ampla, o que ficaexplícito quando anuncia que "(...) irá fazer ajustes nabanda cambial do RMB sempre que necessário de acordocom os movimentos de mercado e, também, com asituação econômica e financeira". Assim, o BPoCconsidera-se responsável por "(...) manter a taxa decâmbio do RMB basicamente estável em um níveladaptativo e de equilíbrio, de modo a promover o equilíbriodo balanço de pagamentos e assegurar a estabilidademacroeconômica e financeira".

Há, nessa nova estratégia chinesa, umreconhecimento de que os superávits em conta correntee na conta capital podem agravar o quadro dedesequilíbrios no comércio internacional, com umpotencial político de provocar retaliações sobre o País.Os elevados níveis de reservas oficiais, acima dos US$700 bilhões no final de junho de 2005, atestariam omovimento interno de absorção dos superávits no balançode pagamentos e a sustentação no antigo regime decâmbio fixo com referência no dólar. O BPoC, através doseu porta-voz, explicitou ainda mais o contexto em quese deu a mudança de regime e seus objetivos.

"O ajuste apropriado no nível da taxa decâmbio do RMB ajuda na implementação deuma estratégia de desenvolvimentosustentável baseada na demanda domésticae otimiza a alocação de recursos; contribui paraaprimorar a independência da políticamonetária e amplia a efetividade dos controlese das regulamentações financeiras; ajuda amanter o equilíbrio entre importações eexportações e aprimora as condições decomércio; conduz à manutenção daestabilidade de preços e à redução dos custosempresariais; incentiva as empresas aalterarem seus mecanismos operacionais,aprimorando sua própria capacidade inovativa,acelerando as transformações nos padrões decrescimento do comércio exterior, ampliandoa competitividade internacional e a habilidadede lidar com os riscos; auxilia a otimizar autilização da estrutura de capital estrangeiro,aprimora a eficiência no uso daquele capital;conduz à utilização plena de recursosdomésticos e estrangeiros, nos mercados

21 Do final de julho de 2005 à primeira quinzena de agosto, o yuanflutuou entre RMB 8,1128 e RMB 8,0980 por dólar, centrando-seem 8,11 (ECONOMIC..., 2005).

22 Na média do período 2001-03, Japão e EUA participaram comum pouco mais de 15% da corrente de comércio chinesa (quefoi de US$ 850 bilhões ou 60% do PIB em 2003), com os paísesda região do euro respondendo por cerca de 10%, e a Coréia doSul, por 7%. Estimativas do autor com base no AsianDevelopment Bank Key Indicators (2004).

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interno e externo, ampliando o grau de aberturaao mundo." (PBOC..., 2005).

A opção de ligar o yuan a uma cesta de moedas,enfatizando o caráter "gradual" e "adaptativo" do novosistema, parece revelar a preocupação do Governo chinêsem equilibrar tensões que são contraditórias. No frontexterno, a pressão pela valorização do yuan frente aodólar manifesta-se no plano comercial, especialmentenas ameaças de retaliações protecionistas dos EUA.Ademais, os influxos crescentes de capitais de curtoprazo posicionados nos mercados futuros em torno deapostas em um yuan forte vêm adicionando um elementoespeculativo ao processo corrente de ajuste cambial. Eracrescente o descolamento entre a antiga cotação oficialdo RMB e o seu valor nos mercados futuros. Por outrolado, no plano interno, havia de se compatibilizar umeventual fortalecimento da moeda doméstica com oequilíbrio do sistema financeiro. Nos últimos anos, osbancos chineses foram capitalizados com ativosfinanceiros denominados em dólares. Com isso, umavalorização do yuan nos níveis desejados em Washingtone Wall Street — algo entre 10% e 20% — poderia causarum profundo desequilíbrio patrimonial nos bancoschineses, com efeitos potencialmente desestabilizadoressobre o sistema financeiro, em particular, e o conjuntoda economia, em uma perspectiva mais geral. Osexemplos recentes da crise financeira japonesa e deoutros países asiáticos, como Coréia, Indonésia eTailândia, parecem assombrar os líderes da tecnocraciaeconômica chinesa.23

É importante lembrar que praticamente toda aintermediação financeira na China se dá através dosistema bancário. Em meados de 2005, os empréstimosbancários equivaliam a 145% do PIB; e os depósitos, a190% do PIB. Para se colocar em perspectiva, o mercadode títulos de dívida tem uma proporção muito menor,20% do PIB, e é praticamente dominado por títulospúblicos. Roubini e Setser (2005) apontam a elevadainadimplência no setor bancário, estimando a existênciade empréstimos problemáticos, que podem oscilar entre30% do PIB (US$ 570 bilhões) e 50% do PIB (US$ 770bilhões). Nesse contexto, uma crise bancária teria efeitosprofundamente desestabilizadores sobre a economia.Desde 2003, o BPoC capitalizou em US$ 60 bilhões trêsdos quatro principais bancos comerciais estatais — oBanco da Construção, o Banco da China e o Banco

Comercial e Industrial da China. É bem provável queaquele montante tenha sido insuficiente para garantir asolvência do núcleo duro do sistema bancário. Ademais,a capitalização deu-se com base em ativos denominadosem dólares, transferidos das reservas internacionais, oque faz com que o fortalecimento do yuan gere perdasde capital. Quanto maiores os movimentos de valorização,maiores as perdas no potencial de capitalização dosistema bancário.

Há, também, uma clara preocupação em estabelecerum padrão de crescimento "sustentável", o que setraduziu no esforço, iniciado em 2003, de frear a expansãodos investimentos industriais, que vêm se situando emníveis superiores a 40% ao ano. Tal ritmo gera pressõessobre a infra-estrutura dos principais centros industriais,com impactos adicionais sobre: o meio ambiente, ospreços de commodities industriais e a capacidade degestão política do sucesso econômico, para citar algumasáreas enfatizadas pelos policymakers chineses (Roubini;Setser, 2005c). Uma certa flexibilidade cambial ampliariaa autonomia da política monetária, e a valorizaçãocontrolada do yuan permitiria reduzir potenciais pressõesinflacionárias e ampliar, gradualmente, a participação doconsumo doméstico como fonte de crescimento dademanda.

Além disso, ao se retomar o tema dos desequilíbriosde pagamentos na economia internacional, explorado noitem 2 do presente trabalho, é possível especular sobrealguns possíveis desdobramentos da mudança no regimecambial chinês. No curto prazo, a ênfase no ajuste"gradual" e "adaptativo" do câmbio chinês parece afastardo horizonte uma valorização mais significativa do yuanfrente ao dólar. Se isso é verdade, não parece razoávelimaginar-se uma reversão dos déficits comerciais norte--americanos por essa via. No cálculo estratégico da China,teme-se uma valorização excessiva ou "descontrolada"do yuan, que poderia provocar significativosdesequilíbrios patrimoniais no seu sistema financeiro.

Já em um horizonte de médio e longo prazos, hádesdobramentos adicionais que devem ser consideradoscom maior atenção. Com uma ligação menos rígida entreo yuan e o dólar, o BPoC poderá ter menos incentivospara manter o ritmo atual de aquisição de ativos emitidosnos EUA para a composição de suas reservas. Em tese,quanto mais flexível for um regime cambial, mais osajustes nos fluxos de divisas se dão por mudanças nataxa de câmbio em detrimento de alterações nos níveisde reservas. Tal cenário pode gerar um afrouxamento —mesmo que parcial — na atual simbiose entre aseconomias norte-americana e chinesa e que está na baseda tese otimista de Dooley, Folkerts-Landau e Garber

23 Uma análise detalhada dos riscos envolvidos na (então possível)valorização do yuan sobre o sistema financeiro chinês pode serencontrada em Roubini e Setser (2005c).

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(2003), onde os déficits externos dos EUA poderiam serfacilmente financiados pelos bancos centrais da Ásia.Não que desapareça o interesse desenvolvimentista daChina e das demais economias asiáticas em garantir ocrescimento baseado no consumo (e no endividamento)dos EUA. Mas, sim, porque uma eventual redução noritmo de aquisição asiática de ativos denominados emdólares, especialmente de dívida pública, poderácontaminar os mercados de dívida, o que poderia levara: (a) uma elevação mais intensa dos juros longos; e/ou(b) um ajuste fiscal mais forte, capaz de sinalizar para asolvência dos papéis governamentais dos EUA.

A hipótese anterior ampliaria a possibilidade de umareversão no quadro atual de expansão na demandaagregada dos EUA, com efeitos potencialmentecontracionistas sobre a economia internacional. Oelevado nível de endividamento de famílias, empresas egovernos nos EUA (Papadimitriou et al., 2005) torna asua economia significativamente sensível a mudançasabruptas no arranjo corrente de juros baixos eexpansionismo fiscal. Ainda que o crescimento daeconomia chinesa e o yuan forte possam, no futuro,ampliar (ainda mais) o papel da China como fonte globalde demanda, a possibilidade de uma retração maisintensa da economia norte-americana seguirá ditando oshumores dos mercados financeiros e o potencial decrescimento da economia mundial.

5 - Considerações finais

A recente mudança no regime cambial chinêsparece ser um movimento tático da China em seu esforçoestratégico de manter uma bem-sucedida trajetória demodernização e crescimento econômico. Expandindo-seem um ritmo anual de 9% no último quarto de século, oPaís defrontou-se, no período recente, com a necessidadede administrar tensões externas e internasaparentemente contraditórias. As pressões em torno davalorização do yuan vinham tanto dos interessescomerciais de quem via na sua política cambial uma fonteadicional de vantagens competitivas, quanto dosinteresses financeiros dos que estão apostando, nosmercados futuros, em um yuan forte. Ademais, partesignificativa do establishment oficial e privado norte--americano passou a canalizar para o "problema chinês"os desconfortos causados pela dimensão externa dosdéficits gêmeos, o que eximia a atual administraçãorepublicana (no Tesouro) e greenspaniana (no FED) dequalquer culpa pela "bolha" consumista e pelaespeculação em diversos segmentos dos mercados de

ativos, especialmente em imóveis. No plano interno, umavalorização traria benefícios potenciais na gestãomacroeconômica chinesa, ao ampliar a autonomia dapolítica monetária e criar espaço para o desenvolvimentodos mercados financeiros, mais especificamente, dosinstrumentos de hedge cambial. Pesando no sentidocontrário, estaria o temor de se gerarem desequilíbriospatrimoniais nos bancos, além de uma maior aberturapara a tomada de posições especulativas na esferafinanceira.

A China optou por um modelo "gradual" e"adaptativo" de ajuste no yuan. Ainda que a nova políticajá tenha sido tornada pública, sua gestão cotidiana edetalhes operacionais ainda estão por serem descobertose "testados", tanto pelos operadores de mercado quantopelos analistas preocupados com os impactos daspolíticas chinesas sobre a economia internacional. Nobojo do novo arranjo cambial, a valorização de 2% doyuan frente ao dólar surge como um sinal de "boa vontade"diante das pressões externas. Explorou-se, neste artigo,o fato de que os desequilíbrios correntes nos pagamentosinternacionais vêm sendo amortecidos pela política deaquisição de ativos denominados em dólares, realizadapelos bancos centrais asiáticos, com destaque para oBanco do Povo da China. A mudança no regime cambialchinês introduz, no horizonte de médio e longo prazos, apossibilidade de tal arranjo perder vitalidade. Se talhipótese se verificar, tende a crescer a possibilidade deos EUA terem de ajustar seus desequilíbrios externo efiscal mediante a elevação do nível de poupançainterna — pública e privada —, o que colocaria em xequeo padrão corrente de crescimento liderado pelo consumoe pelo endividamento. Ainda é prematuro afirmar que taldesdobramento é inexorável. Todavia a China estámovendo, de forma mais explícita, suas peças no xadrezgeopolítico e geoeconômico internacional. Não se podedeixar de ficar atento a tais movimentos, cujasrepercussões tendem a transbordar cada vez mais parafora da própria China e de seu entorno, atingindo os maisdistintos mercados — de mercadorias e financeiros —dos países centrais e periféricos.

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A determinação da taxa de juros em uma economia sob metas para inflação: o caso brasileiro

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A determinação da taxa de juros em uma economia sob metas para inflação: o caso brasileiro

Helder Ferreira de Mendonça Professor do Departamento de Economia da UFF e Pesquisador do CNPq.Lucas Lautert Dezordi Mestre em Economia pela UFPR e Professor do Departamento de Economia da FAE Business School.Marcelo Luiz Curado Professor do Departamento de Economia da UFPR.

ResumoA resposta da taxa de juros ao processo inflacionário e ao hiato do produtoé o principal desafio para a condução da política monetária sob um regimede metas para inflação. Com o objetivo de avaliar a adequabilidade daadoção da regra de Taylor (RT) original para a determinação da taxa dejuros básica da economia brasileira, foi calculada a taxa de juros, combase nessa regra, para o período posterior à introdução do regimemonetário supracitado. Ademais, foi estimada a influência do desvio dainflação em relação à meta, do hiato do produto, da Selic defasada e doRisco-País sobre a taxa Selic. Os resultados obtidos sugerem que a taxaSelic nem se encontra em um patamar capaz de fazer com que as metaspara inflação determinadas sejam alcançadas, nem é capaz de obteruma taxa de desemprego compatível com o produto potencial.

Palavras-chave: inflação; taxa de juros; regra de Taylor.

AbstractThe response of the interest rate to both the gap between the inflationrate and a given target for inflation, and the gap between real GDP andpotential real GDP is the main challenge under inflation targeting. With theaim of evaluating the adequacy of the adoption of the original Taylor’s rulein the determination of the basic Brazilian interest rate, the interest ratewas calculated, based on this rule, after the implementation of theabove-mentioned monetary regime. Furthermore, the influences of thedeparture of inflation from its target, of the output gap, of the Selic lagged,and of the country-risk, over the Selic rate were estimated. The findingsdenote that the Selic rate has neither an adequate level for leading to theachievement of the inflation targets nor is capable of maintaining theunemployment rate compatible with potential output.

Artigo recebido em 10 out. 2005.

Helder Ferreira de Mendonça; Lucas Lautert Dezordi; Marcelo Luiz Curado

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1 - Introdução

Do ponto de vista macroeconômico, a políticaeconômica pode ser dividida em dois instrumentosbásicos: a política monetária e a fiscal.1 Ao longo dasdécadas de 80 e 90, a maioria das nações passou aconcentrar-se na busca da estabilidade de preços. Aprincipal estrutura utilizada para a consecução desseobjetivo tem sido a separação da função monetária deoutras instituições fiscais do Governo. Os motivos quelevaram à mudança na condução da política monetáriase devem aos choques de oferta ocorridos nos anos 70e ao rompimento com o paradigma keynesiano tradicionalpara a condução da política econômica.

Em resposta às transformações observadas nosanos 70, houve o desenvolvimento do debate regrasversus discrição. A antiga literatura sobre o assuntoconsiderava, na análise, as intenções e a capacidade doresponsável pela condução da política. Argumentosfavoráveis ao uso de regras tinham por base oconhecimento imperfeito dos agentes sobre a economiae a tendência de as autoridades políticas conduzirem apolítica econômica para fins inadequados do ponto devista do bem-estar social. Essa visão sobre regras oudiscrição sofreu uma mudança significativa a partir doestudo feito por Kydland e Prescott (1977). Desde então,as regras passaram a ser consideradas uma tecnologiade compromisso capaz de evitar a manifestação doproblema de inconsistência temporal. Nos anos 80, essetema para análise da política econômica recebeu novoimpulso com a proposta feita por Rogoff (1985), na quala condução da política monetária deveria ser feita porum banco central independente e conservador.

Com a consolidação do argumento de que o bancocentral deve ter independência operacional e de que oseu objetivo deve ser a busca da estabilidade de preços,o regime de metas para inflação tornou-se uma estratégiaadotada por diversos países para a condução da políticamonetária desde o início dos anos 90.2 Como

conseqüência de o objetivo final da condução da políticamonetária estar focado na busca da estabilidade depreços, a taxa de juros tornou-se a meta intermediáriado banco central.3

É reconhecido que a taxa de juros representa oinstrumento mais importante à disposição da autoridademonetária para o combate à inflação. Todavia uma taxade juros muito elevada pode prejudicar o equilíbrio fiscaldevido à incidência da mesma sobre o estoque da dívidapública, implicando déficits cada vez mais elevados.Portanto, há limitações para o uso da taxa de juros natentativa de estabilizar a inflação. Um outro ponto a serconsiderado é que não é adequada uma taxa de jurosbaixa resultante de uma passividade monetária, pois háo risco de se colocar a economia em uma rota de aumentodo endividamento público e de aceleração inflacionária.Em suma, para estabilizar a razão dívida/PIB e a taxade inflação, é preciso um esforço para o alcance de umadisciplina fiscal concomitante ao combate à inflação.

Desde junho de 1999, devido à introdução do regimede metas para inflação no Brasil, a taxa de juros tornou--se uma variável proeminente para análise da conduçãoda política econômica.4 Com o objetivo de se avaliar aadequabilidade da adoção da regra de Taylor (RT) originalpara a determinação da taxa de juros básica da economiabrasileira, foi calculada a taxa de juros, com base nessaregra, para o período posterior à introdução do regimesobredito. Ademais, foi estimada a influência do desvioda inflação em relação à meta, do hiato do produto, daSelic defasada e do Risco-País sobre a taxa Selic. Alémdesta Introdução, o artigo está organizado da seguinteforma. A segunda seção apresenta, brevemente, aestrutura utilizada pelo Banco Central do Brasil (Bacen)para a definição da taxa de juros básica da economia e aproposta feita por Taylor (1993). A terceira seção apresentaa evolução da taxa de juros brasileira no período posteriorà introdução do regime de metas para inflação, com base

1 É importante ressaltar-se que a análise desenvolvida neste artigose concentra no estudo da política monetária. Além disso, adivisão mencionada não significa, por parte dos autores, que háuma negação aos instrumentos microeconômicos, tais comopolítica comercial, estrutura de impostos, etc.

2 De forma diferente de simples regras políticas, as metas parainflação permitem ao banco central levar em conta todas asinformações relevantes na escolha da ação política maisadequada para a obtenção da meta. Ademais, há a possibilidadedo uso de políticas discricionárias sem levar à perda decredibilidade. Ou seja, o regime de metas inflacionárias deve serentendido como um caso onde há discrição limitada.

3 Deve-se ressaltar que a escolha da meta intermediária pelobanco central deve levar em conta três característicasfundamentais: (a) ela deve ser mensurável; (b) o banco centraldeve possuir controle sobre a mesma; e (c) deve haver umefeito previsível sobre o objetivo. Dado que um banco centralpode determinar a taxa de juros, ainda que não tenha controleperfeito sobre a oferta de moeda, isso implica que o seu uso émais conveniente do que os agregados monetários.

4 Existem diversas taxas de juros na economia — taxas de pou-pança, taxas de empréstimo, taxas de financiamento,etc. —, que são classificadas, de acordo com o prazo, comocurto, médio e longo termo. É importante ressaltar que o bancocentral possui controle direto apenas sobre a taxa de juros domercado de reservas bancárias.

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na regra de Taylor original, e a importância do Risco-Paíspara a análise da taxa de juros. A quarta seção apresentaalgumas evidências empíricas para se avaliar adeterminação da Selic. Por último, é apresentada aconclusão do artigo.

2 - A determinação da taxa de juros e a regra de Taylor

O principal instrumento à disposição do Bacen paraa condução da política monetária é a taxa de juros domercado de reservas bancárias (taxa Selic). Aimportância da definição da taxa de juros pelo Bacen é acapacidade que essa variável possui para influenciar ocomportamento do nível de preços e a atividade daeconomia. Também se deve ressaltar que é por meio dataxa Selic que as demais taxas, por arbitragem, sãodeterminadas.

Desde junho de 1996, as diretrizes da políticamonetária e a definição da taxa Selic têm sido um encargodo Comitê de Política Monetária (Copom) do BancoCentral do Brasil.5 O principal objetivo da criação doComitê foi a tentativa de aumentar a transparência paraa definição da taxa de juros.6 Esse é um ponto quemerece atenção, porque a necessidade do aumento datransparência na condução da política monetária se temconstituído em um dos principais argumentos favoráveisà adoção de metas inflacionárias.7 O argumento centralé que, na maioria dos países que utilizam o sistema demetas para inflação, a transparência se torna maior,

devido ao anúncio de uma meta explícita e ao aumentoda comunicação entre a autoridade monetária e o público.8

O regulamento do Copom sofreu uma série dealterações ao longo do tempo, visando ao aperfeiçoa-mento do processo decisório em relação à taxa de jurose para adequar-se às mudanças de regime monetário.Dentre as principais mudanças efetuadas, merecedestaque a introdução do regime de metas para inflação.Desde então, as decisões do Copom passaram a ter comoobjetivo cumprir as metas para inflação definidas peloConselho Monetário Nacional. No caso de as metas nãoserem alcançadas, o Presidente do Bacen deve explicaros motivos do descumprimento ao Ministro da Fazendae anunciar as medidas tomadas para que a inflação sesitue dentro dos limites estabelecidos. Em suma, sãotrês os objetivos do Copom: (a) implementar a políticamonetária; (b) definir a meta da taxa Selic e seu eventualviés;9 e (c) analisar o relatório de inflação.

De acordo com o Bacen, a taxa de juros básica daeconomia tem sido definida com o objetivo de alcançar ameta anual de inflação. Conforme pode ser observadopor meio da Figura 1, verifica-se que há uma elevadacorrelação (0,86) entre a Selic e a taxa de inflação noperíodo posterior à introdução do regime de metas parainflação. Essa constatação sugere que o comportamentoda inflação tem sido a principal variável levada emconsideração para a definição da taxa de juros.

Um teste de causalidade de Granger confirma aintuição presente na Figura 1. A Tabela 1 apresenta o re-sultado de um teste de causalidade de Granger entre ainflação (medida pelo IPCA) e a taxa Selic, entre julhode 1999 e dezembro de 2003, para uma defasagem. Deacordo com o teste de Granger efetuado, observa-se quehá uma relação recíproca de “causalidade” entre a inflaçãoe a Selic. A probabilidade de a inflação não causar, nosentido de Granger, Selic (e vice-versa) é menor do que1%.

Não obstante, a taxa de juros no modelo estruturalutilizado pelo Bacen durante o regime de metas parainflação considera três possibilidades para a adoção deuma regra para condução da política monetária: (a) umatrajetória exógena para a taxa de juros; (b) a possibilidadede a taxa de juros responder ao hiato do produto e aodesvio da inflação em relação à meta (uma regra de

5 A taxa de juros fixada na reunião do Copom é a meta para a taxaSelic (taxa média dos financiamentos diários, com lastro emtítulos federais, apurados no Sistema Especial de Liquidação eCustódia), a qual vigora por todo o período entre reuniõesordinárias do Comitê.

6 O Copom teve como referência o Federal Open MarketCommittee (FOMC), do Banco Central dos Estados Unidos, e oCentral Bank Council, do Banco Central da Alemanha.

7 O caso mais formalizado para a transparência das ações de umbanco central é o da Nova Zelândia. Neste país, o Governo temo direito de demitir o presidente de seu banco central, caso ainflação se desvie em 25% da taxa anunciada. Exemplo debenefícios oriundos de maior transparência das ações de bancoscentrais podem ser ilustradas com os casos do Canadá e daInglaterra. Para uma análise detalhada sobre esses países, verMishkin e Posen (1997).

8 Uma boa resenha da literatura sobre a transparência da políticamonetária encontra-se em Geraats (2002).

9 O viés representa uma prerrogativa concedida ao Presidente doBacen para alterar, na direção do viés, a meta para a taxa Selic,a qualquer momento entre as reuniões ordinárias.

Helder Ferreira de Mendonça; Lucas Lautert Dezordi; Marcelo Luiz Curado

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Taylor); e (c) uma regra de reação ótima, calculada deforma determinística ou estocástica.10

O segundo ponto supracitado tem sido objeto deintensa pesquisa acadêmica desde a proposta elaboradapor Taylor (1993). Judd e Rudebusch (1998) apresentam,de forma sumária, os motivos que despertaram ointeresse na análise da regra para a definição da taxa dejuros.

“(...) a regra de Taylor original ajusta-serazoavelmente bem à taxa de juros no períodoGreenspan. O R2, para o período, é de 87%referente à taxa de juros nominal trimestral emnível e de 52% para variações trimestrais. Osargumentos na regra — inflação e hiato doPIB — aproximadamente correspondem àsmetas definidas para a política monetária nosEUA — preços estáveis e pleno emprego(tradução nossa).” (Judd; Rudebusch, 1998,p. 5-6).11

O elemento fundamental da análise diz respeito aohorizonte para a ação da política monetária. A grandemaioria dos economistas acredita na ineficácia da políticamonetária para afetar variáveis reais no longo prazo(crescimento do produto, nível de emprego, etc.).Entretanto, no curto prazo, a autoridade monetária nãodeve negligenciar a estabilização do emprego ou osefeitos sobre a economia oriundos da condução da políticamonetária na busca da estabilidade de preços. Ajustificativa para que o banco central tenha esseprocedimento é resultado da observação de que ocomportamento da inflação se deve, em alguma medida,ao efeito da taxa de juros sobre o emprego e a atividadereal.

A proposta de Taylor estabelece uma regra simplespara a determinação da taxa de juros, que leva emconsideração quatro fatores básicos: (a) a inflação; (b) ataxa de juros real de equilíbrio; (c) a diferença entre ainflação observada e a meta; e (d) o hiato entre o produtoefetivo e o potencial. Os dois primeiros fatores servem

de referência para o caso em que a economia se encontrafuncionando no nível potencial e revelam a hipóteseimplícita do uso de uma taxa de juros real constante.12

Os fatores subseqüentes da regra de Taylor representamos objetivos da política monetária, sendo que osparâmetros de ajuste se referem ao trade-off de curtoprazo entre a inflação e o produto. O terceiro fator indicaum aumento (ou uma queda) da taxa de juros, quando ainflação se encontra acima (ou abaixo) da meta. De formaanáloga, o quarto fator indica que, no caso de umadiferença positiva (ou negativa) entre o produto efetivo eo produto potencial, deve haver um aumento (ou umaqueda) na taxa de juros (Kozicki, 1999). Ou seja, de acordocom a proposta original de Taylor (1993), a taxa básicade juros seria obtida por meio da equação (1).

10 De acordo com os resultados encontrados por Freitas e Muinhos(2001), regras do tipo Taylor podem ter um desempenho tãosatisfatório quanto o das regras ótimas. O ponto principal paraque esse resultado seja obtido é a escolha adequada dosparâmetros às preferências do banco central.

11 “(...) the original Taylor rule fits reasonably well to the actual fundsrate during the Greenspan period. The R2 for the period is 87percent for quarterly levels of the nominal funds rate, and 52percent for quarterly changes. The arguments in the rule —inflation and the GDP gap — roughly correspond with goalslegislated for US monetary policy — stable prices and fullemployment.” (Judd; Rudebusch, 1998, p. 5-6).

it = p

t + r* + g(y

t) + h(p

t - p*) (1)

onde

i = taxa básica de juros nominais;r* = taxa real de juros de equilíbrio;π = taxa média da inflação dos últimos quatro tri- mestres (deflator do PIB);π* = meta da taxa de inflação; ey = hiato do produto (100 . (PIB real - PIB poten- cial) ÷ PIB potencial).13

Taylor (1993, 1998) sugere que os pesos dados pelaautoridade monetária aos desvios da inflação (h) e doproduto (g), para a determinação da taxa de juros,correspondam a 0,5. Além disso, é assumido que a taxade juros real e a meta para a inflação são ambas iguais a2%. Ou seja, a taxa de juros real será igual a 2%, quandoa inflação for de 2% e não houver divergência entre oPIB real e o PIB potencial. Também é observado que,para cada ponto percentual de inflação ou do PIB acima(ou abaixo) de 2%, a taxa básica de juros aumenta (oudiminui) 0,5%. Uma importante observação feita por Taylor,em relação à sua regra, refere-se à ausência da taxa decâmbio para a definição da taxa de juros. Conformesalientado pelo autor em consideração, o fato de a taxa

12 Deve-se ressaltar que a taxa de juros real desempenha papelrelevante na formulação da política monetária. Embora a taxa dejuros nominal seja a variável de ajuste da autoridade monetária,é a taxa de juros real que afeta o lado real da economia.

13 Taylor (1993) utilizou uma tendência linear do logaritmo do PIBreal, com base no período compreendido entre 1984 (primeirotrimestre) e 1992 (terceiro trimestre), como proxy para o produtopotencial.

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de juros responder ao hiato do produto e à meta deinflação revela uma importante reação indireta à taxa decâmbio.

Considerando-se um regime de metas para inflação,a equação (1) pode mostrar-se útil como um guianormativo para a condução da política monetária e,conseqüentemente, para a decisão de aumentar oudiminuir a taxa de juros de curto prazo. É importantedestacar que o coeficiente da inclinação da inflação naequação (1) é dado por 1 + h. Assim, a resposta da taxade juros em relação ao produto é capturada pelo

parâmetro g, enquanto aquela relativa à inflação é dadapor 1 + h. Também deve ser ressaltado que os valoresde g e 1 + h dependem do regime de política monetáriaadotado pelo banco central, mas a probabilidade de osvalores serem positivos é alta. Simulações de diferentesmodelos econômicos indicam que o coeficiente h nãodeve ser negativo, uma vez que isso implicaria um valorde 1 + h menor do que 1, levando a uma quedasignificativa da taxa de juros real e a um aumentoconsiderável no caso de uma queda da inflação.

Tabela 1

Teste de precedência temporal de Granger para a taxa Selic e a inflação no Brasil — jul./99-dez./03

HIPÓTESE NULA NÚMERO DE OBSERVAÇÕES ESTATÍSTICA-F PROBABILIDADE

Selic não Granger causa inflação ........................... 53 91,74600 6,7E-13 Inflação não Granger causa Selic ........................... 53 6,79531 0,01201 FONTE DOS DADOS BRUTOS: Bacen. IBGE.

Fonte: Estimações dos autores.

Inflação versus taxa Selic no Brasil — jul./99-dez./03

0

3

6

9

12

15

18

21

24

27

0 3 6 9 12 15 18

Figura 1

FONTE DOS DADOS BRUTOS: IBGE. Bacen.NOTA: Inflação medida pelo IPCA.

Inflação

Taxa Selic

Helder Ferreira de Mendonça; Lucas Lautert Dezordi; Marcelo Luiz Curado

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3 - A obtenção da taxa de juros brasileira por meio da utilização da regra de Taylor original

Conforme foi destacado na seção anterior, adeterminação da taxa de juros representa o maisimportante instrumento operacional do Bacen para aconsecução das metas para inflação. Ainda que a taxade juros seja um instrumento eficiente para o combate àinflação, é forçoso reconhecer que uma taxa de juroselevada implica efeitos negativos sobre o produto, quepodem ser compreendidos como um aumento do custosocial. A Figura 2 mostra a trajetória da taxa Selic duranteo regime de metas para inflação. Observa-se que, mesmoque se exclua o ano de 2003 da análise,14 a taxa de jurosse situou dentro da faixa de 15% a 19% (ver área definidapelas linhas pontilhadas na Figura 2). Logo, pode-seafirmar que, depois de transcorridos quatro anos e meioda adoção do regime de metas para inflação, a taxa dejuros não atingiu um nível que pudesse, de formaconcomitante, conduzir a inflação para o alcance dasmetas estabelecidas e/ou estimular a atividadeeconômica.15

Diante da imperícia do Banco Central para o alcancedas metas para inflação e estímulo ao crescimentoeconômico no período recente, uma importante análisea ser feita consiste em verificar se a utilização de umaregra do tipo Taylor (o mais próximo possível da original)seria mais eficiente para a definição da taxa de juros(mesma taxa de inflação e taxas de juros mais baixas).Deve-se ressaltar que, de acordo com a teoriaeconômica, uma economia que possui mobilidade decapitais e um regime de câmbio flexível permite a açãode uma política monetária ativa. Ou seja, o Banco Centraltem a capacidade de determinar a taxa de juros. A regrade Taylor sugerida por Bogdanski, Tombini e Werlang

14 Período marcado pela necessidade de o novo governo federalacomodar a instabilidade gerada na expectativa dos agenteseconômicos sobre a condução da política econômica durante oprocesso de eleição presidencial.

15 Com exceção de 1999 e 2000, as metas para inflação dos anossubseqüentes foram descumpridas. Cabe destacar que, naanálise da condução da política monetária com base nas atasdo Copom e nos relatórios de inflação, não foi encontrado nenhumindício significativo que mostrasse uma preocupação do Bacenem conduzir a política monetária com objetivo de estabilizar oproduto real.

(2000), trabalho que serve como referência para análisedo regime de metas para inflação implementado no Brasil,é a seguinte:

De acordo com os mesmos autores, “(...) quandoë = 1, isso é equivalente à regra de Taylor padrão; emboraquando ë å (Q1), essa é uma regra de Taylor comsuavização da taxa de juros (tradução nossa)”16

(Bogdanski; Tombini; Werlang, 2000, p. 15). Essa afirmaçãomerece uma reflexão. Não é verdade que, se ë for igual1, se obtém a regra de Taylor padrão. O fato de o primeirotermo da equação ser eliminado quando ë é igual 1 não ésuficiente para capturar a essência da proposta de Taylor(1993, 1998). Conforme apresentado na seção anterior, aregra de Taylor original considera uma taxa de juros realde equilíbrio adicionada à taxa de inflação, o que, porconseguinte, não é equivalente à constante α

3, utilizada

na equação (2). Ademais, o fato de considerar, naequação sobredita, a taxa de juros defasada implica apossibilidade de haver uma inércia para a taxa de jurosque prejudica uma possível redução.

Diante das divergências apontadas, decidiu-se pelouso da regra de Taylor original para a obtenção da taxade juros no período posterior à introdução do regime demetas para a inflação (jul./99-dez./03). Destarte, tomando--se como referência a equação (2), as seguintes sériesforam utilizadas:

a) taxa de juros nominal (it) - é utilizada a taxa de

juros básica da economia (Selic) comperiodicidade mensal divulgada pelo Bacen;

b) taxa de juros real (r*) - taxa de juros Selic defla-cionada pelo IPCA (divulgado pelo IBGE);17

c) hiato do produto (yt) - são utilizados os dados

divulgados pelo IBGE sobre a produção industrial

it = (1 – ë)i

t-1 + ë(α

1(ð

t – ð*) + α

2y

t + α

3) (2)

onde

ðt = log da inflação;

ð* = log da meta de inflação;y

t = hiato do produto; e

it = log da taxa de juros.

16 “(…) when , this is equivalent to a standard Taylor rule, whilewhen this is a Taylor rule with interest ratesmoothing.” (Bogdanski; Tombini; Werlang, 2000, p. 15).

17 A variável inflação esperada foi obtida por meio de informaçãodivulgada pelo Bacen sobre as expectativas de mercado para ainflação.

ë=1ë ∈ (0,1)

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em razão da periodicidade mensal. A série dohiato do produto é obtida a partir da diferençaentre o valor observado para o produto e o produtopotencial. O produto potencial (tendência) écalculado por meio da aplicação do filtro deHodrick-Prescott;18

d) inflação (πt) - média (geométrica) da inflação dos

últimos 12 meses, medida pelo IPCA.A Figura 3 mostra a evolução da taxa Selic e da

taxa de juros obtida pela regra de Taylor. A trajetória dasduas taxas permite observar que, ao longo de quase todoo período, a taxa Selic se situou abaixo da RT. Esseresultado não chega a ser surpreendente. Deve-seressaltar que a RT tem como principais variáveis paraexplicar sua flutuação tanto os desvios da inflação emrelação à meta quanto os desvios do produto efetivo emrelação ao potencial. Dado que, desde 2000, as metaspara inflação não são alcançadas pelo Bacen, é naturalque um valor de (π

t - π*) > 0 contribua para uma elevação/

/manutenção da taxa de juros. Além disso, observa-seque, ao longo do período, o hiato do produto apresentouoscilações que não justificam uma redução da RT. Logo,observa-se que os dois motivos mencionadosrepresentam dois aspectos fundamentais que justificama tendência de aumento da taxa de juros capturada pelaRT.

A observação acima não significa que a RT sejaadequada para definir a taxa de juros básica da economiabrasileira ao longo do período em consideração. Aocontrário, a manutenção da taxa de juros em um patamarelevado tem conseqüências importantes para aeconomia. Além do conhecido argumento keynesiano deque uma taxa de juros acima do necessário provoca umefeito perverso sobre o produto, devido à queda no nívelde investimento,19 uma importante observação práticapara o impacto dos juros sobre a economia brasileira dizrespeito às suas conseqüências sobre a dívida pública.Essa ponderação se justifica pelo fato de que o principalindexador da dívida é a taxa Selic.20 Logo, a manutenção

18 O método de Hodrick-Prescott para suavização de uma série émuito empregado por macroeconomistas, para estimar atendência de longo prazo de uma série. A metodologia para aobtenção do hiato do produto é a mesma que foi aplicada porGonçalves (2001).

19 A justificativa para a queda no nível de investimento deve-se aofato de que o retorno real proveniente dos juros se torna superiorà eficiência marginal do capital em parte da economia.

20 Atualmente, a taxa Selic é responsável por mais de 60% daindexação da dívida pública.

da taxa de juros em um patamar inadequado provoca umaumento desnecessário na razão dívida pública/PIB.

Uma conseqüência do aumento da dívida públicaprovocada por uma taxa de juros elevada é a criação deuma rigidez para a queda na própria taxa de juros, devidoa duas razões básicas: (a) aumento do risco deinsolvência do Governo — os investidores preferemtransferir-se para outros mercados, provocando umadesvalorização cambial, o que, por conseguinte,pressiona para uma alta da inflação —; e (b) necessidadede aumento da carga tributária — o Governo aumenta aalíquota dos impostos, ou cria novas contribuições, paraevitar que a dívida pública entre em uma rota explosiva.O resultado desse procedimento é um encarecimento nocusto de produção das empresas, que tende a serrepassado para os seus preços.

Vale ressaltar que a regra sugerida por Taylor (1993)foi elaborada para análise da economia norte-americana,o que, por sua vez, justifica a desnecessidade deapresentar elementos que capturem modificações, nocenário internacional, capazes de influenciar a definiçãoda taxa de juros. Como o Brasil não representa o casode uma grande economia e ainda pelo fato de a taxa dejuros no período posterior ao Real ter sido fixada combase no desequilíbrio externo e não no nível de atividades,é necessário considerar alguma outra variável, alémdaquelas presentes na regra de Taylor, que seja umindicador representativo de modificações da conjunturainternacional.

Com o objetivo de observar se há algumaassociação entre as mudanças no cenário internacionale a determinação da taxa de juros, foi considerado oRisco-País (EMBI+) para análise.21 A idéia para considerara diferença entre a taxa de juros doméstica e a dos títulosdo Governo norte-americano é que, com um Risco-Paísmais elevado (ou mais baixo), a taxa de câmbio tende aser depreciada (ou apreciada).22 A justificativa para oprocedimento adotado é que a taxa de câmbio influencia,de forma indireta, o nível de preços por meio de doiscanais: (a) o uso de insumos importados — quando ataxa de câmbio sofre apreciação (ou depreciação), ocusto de produção dos bens diminui (ou aumenta),implicando provável redução (ou aumento) no preço —;

21 O EMBI+ é calculado pelo banco JP Morgan e mede, emcentésimos de pontos percentuais, o prêmio sobre os títulosbrasileiros no exterior, em comparação com papéis do Tesouronorte-americano.

22 Para uma análise elucidativa da relação entre o Risco-País e ataxa de juros, ver Toledo (2002).

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e (b) a substituição de bens domésticos por similaresimportados — quando a taxa de câmbio sofre apreciação,o preço dos bens importados torna-se mais barato,implicando um deslocamento de parte da demanda dosbens domésticos por similares importados, o que, porsua vez, acarreta queda na demanda agregada e menorpressão sobre o nível dos preços. Em suma, um aumento(ou uma queda) no Risco-País tende a prejudicar (ou afacilitar) quedas na taxa de juros.

A Figura 4 mostra que há uma forte correlação entreo Risco-País e a taxa Selic (0,90) no período posterior à

introdução do regime de metas para inflação. Um testede precedência temporal de Granger para seis defasagensentre as duas variáveis supracitadas confirma a idéia deque o Risco-País afeta a taxa Selic, mas não o contrário.23

Conforme pode ser observado por meio da Tabela 2,verifica-se que o Risco-País implica “causalidade” sobrea taxa Selic, com um nível de confiança de 99%. Emrelação à possibilidade de a Selic apresentar alguma“causalidade” sobre o Risco-País, o teste não evidenciaum resultado robusto que confirme essa possibilidade (ahipótese nula só é rejeitada a mais de 85%).

23 A justificativa para o uso das defasagens é que a influência doRisco-País sobre a taxa de juros não ocorre de formainstantânea. É preciso algum tempo para que o processo descritono parágrafo anterior seja concluído.

05

1015202530

Jul./

99

Set

./99

Nov

./99

Jan.

/00

Mar

./00

Mai

o/00

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00

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./00

Nov

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/01

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./01

Nov

./01

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/02

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Nov

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03

Set

./03

Nov

./03

Trajetória da taxa Selic durante o regime de metas para a inflação no Brasil — jul./99-dez./03

Figura 2

Rompimento na trajetória provocada pelas eleições presidenciais

FONTE DOS DADOS BRUTOS: Bacen.

Taxa Selic

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Risco-País (-6) versus taxa Selic no Brasil — dez./99-dez./03

0

5

10

15

20

25

30

0 5 10 15 20 25

Figura 4

Taxa Selic

Risco-País

FONTE DOS DADOS BRUTOS: Bacen. JP Morgan.

Legenda:

FONTE DOS DADOS BRUTOS: Bacen.

Evolução da taxa Selic e da RT no Brasil — jul./99-dez./03

05

101520253035

Jul./

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./99

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Nov

./02

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o/03

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03

Set

./03

Nov

./03

Selic RT

Figura 3

(%)

Legenda:

Tabela 2

Teste de precedência temporal de Granger para a taxa Selic e o Risco-País no Brasil — jul./99-dez./03

HIPÓTESE NULA NÚMERO DE OBSERVAÇÕES ESTATÍSTICA-F PROBABILIDADE

Risco-País não Granger causa Selic ..................................... 48 5,48316 0,00044 Selic não Granger causa Risco-País ..................................... 48 0,44789 0,84147 FONTE DOS DADOS BRUTOS: Bacen. IBGE.

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4 - Algumas evidências empíricas para a taxa Selic

Uma questão importante a ser destacada nacondução da política monetária sobre o regime de metasde inflação refere-se à resposta da taxa Selic em relaçãoà inflação e ao produto. A equação (1) mostra que osparâmetros g e h são, respectivamente, os responsáveispela resposta da taxa de juros ao hiato do produto e aodesvio da inflação em relação à meta. Em razão da fortecorrelação existente entre a taxa Selic e a inflação medidapelo IPCA, no período posterior a junho de 1999 (verFigura 1), é esperado que a sensibilidade da taxa de jurosem relação à inflação seja muito significativa (umparâmetro 1 + h > 1,5). Em outras palavras, a respostada taxa de juros em relação à inflação deve ser maior doque aquela proposta por Taylor (1993) — 1 + h = 1,5.Por outro lado, devido à despreocupação do Bacen(registrada nos relatórios de inflação) em estabilizar oproduto, é esperado que o parâmetro g não tenhasignificância estatística. Conforme ficou evidenciado naseção anterior, é esperado que a influência do Risco--País na determinação da Selic seja significativa. Alémdisso, é importante verificar em que medida a própriataxa de juros influencia sua trajetória.

Com o objetivo de evitar os problemas salientadospor Granger e Newbold (1974) em relação à possibilidadede que equações estimadas com base em séries detempo podem apresentar resultados espúrios, foirealizado o teste de raiz unitária das séries. Conformepode ser observado por meio dos resultados apresenta-dos na Tabela 3, o teste ampliado de Dickey-Fuller (ADF)indica, com exceção da série hiato do produto, a aceitaçãoda hipótese nula (séries não estacionárias) para os valoresoriginais das séries. Por outro lado, em relação àsprimeiras diferenças, a hipótese nula é rejeitada para asséries ao nível de significância de 1%. Portanto,excetuando-se a série hiato do produto, as demais sériessão integradas de primeira ordem, isto é, I(1).

Com a finalidade de se avaliar a importância dasvariáveis supracitadas na determinação da taxa Selic,foi utilizado um modelo auto-regressivo vetorial (VAR)na análise. Fazendo-se uso dos critérios de Schwarz eHannan-Quinn, para a definição da ordem ótima do VAR,

verificou-se que o modelo adequado se refere àquele comduas defasagens e sem constante (Tabela 4).24

Por causa da dificuldade de se interpretarem oscoeficientes estimados para o modelo VAR, é usual queos resultados sejam analisados por intermédio da análiseda função impulso-resposta parcial e por meio dadecomposição da variância. Devido ao fato de os dadosutilizados na amostra serem mensais, é levado em contao período de 12 meses depois da incidência de um choquena análise impulso-resposta para o VAR e para aexplicação da variância das séries. Dado que o objetivoprincipal é verificar qual o impacto que as variáveispresentes na regra de Taylor acrescida do Risco-Paísgeram sobre a taxa Selic, a ordenação que se mostrarazoável para análise do VAR é dada por: Selic, hiato doproduto, desvio da inflação em relação à meta e Risco--País.

As seqüências de valores das funções impulso--respostas podem ser visualizadas por meio da Figura 5,enquanto os dados relativos à explicação da variânciase encontram na Tabela 5. O Gráfico A da Figura 5 revelaque os impactos originários de choques externos sobreos valores passados da taxa Selic apresentamregularidade histórica significativa. A significânciaestatística é confirmada pela importância da própria Selicna explicação de sua variância, depois de transcorridos12 meses — 41% (Tabela 5). Esse resultado sugere queuma elevação na taxa de juros, no período atual, tende ase perpetuar na economia, implicando a necessidade deum esforço maior, no futuro, por parte da autoridademonetária, no caso de haver o interesse em provocaruma queda nessa variável.

A análise do hiato do produto indica o quãodesimportante é essa variável para a determinação dataxa de juros na economia brasileira, no período recente.O Gráfico B da Figura 5 mostra que os impactos do hiatodo produto sobre a Selic não possuem significânciaestatística. Ademais, a decomposição da variânciadenota uma participação desprezível do hiato do produtona explicação da variância da taxa Selic (menos de 1%).Essa observação denota uma resposta da taxa de jurosao desvio do produto efetivo em relação ao potencialmuitíssimo inferior ao daquela sugerida por Taylor.

O resultado, até certo ponto, surpreendente refere--se à resposta da taxa Selic aos desvios da inflação emrelação à meta estabelecida. De acordo com o regime

24 SC = -2(l/T) + klog(T)/T e HQ = -2(l/T) + 2klog(log(T))/T consideramuma regressão com k parâmetros estimados usando Tobservações; l é o valor do log da função probabilidade com kparâmetros estimados.

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monetário em vigência no País, seria esperado o encontrode uma forte significância estatística. Entretanto aresposta da Selic em relação ao desvio da inflação(Gráfico C da Figura 5) encontra-se próxima ao eixo. Soma--se a isso o fato de a decomposição da variância denotaruma importância relativa do desvio da inflação naexplicação da variância da Selic menor que 2%. Esse éum resultado problemático, pois sugere que o processoinflacionário não está sendo combatido de forma eficientepelo Bacen. Em termos da proposta de Taylor, 1 + hestaria próximo a 1, o que implicaria uma rigidez para ataxa de juros real.25

25 Uma análise sobre a rigidez da taxa de juros no Brasil ultrapassao escopo deste artigo. Todavia o resultado obtido sugere que apresença de falhas de mercado, tais como o grau de monopólioe a possibilidade de assimetrias de informação que favoreçam aação de rentistas, pode justificar a dificuldade para reduções nataxa de juros.

Por último, contata-se que a principal variável queinfluencia o comportamento da taxa Selic no períodorecente é o Risco-País. O Gráfico D da Figura 5 indicaque os impactos do Risco-País sobre a Selic sãoestatisticamente relevantes e que um aumento no Risco--País tende a provocar uma elevação na taxa Selic, quenão é eliminada ao longo do tempo. A importância doRisco-País para a taxa de juros é corroborada com aanálise da decomposição da variância. O resultado obtidomostra que cerca de 57% da variância da taxa Selic,passados 12 meses, se deve ao Risco-País.

Tabela 3

Teste de raiz unitária ADF

ESPECIFICAÇÃO SELIC ∆ DA SELIC

HIATO DO PRODUTO (πT - π*) ∆(πT - π*) RISCO-PAÍS ∆ DO

RISCO-PAÍS

Constante ........................ 2,7136 - 2,1801 2,8866 1,7462 2,2929 - Variável defasada ........... -2,8062 -2,1007 -5,3643 -2,2225 -6,7876 -2,6215 -3,6186 Tendência ....................... - - -2,0945 - - - - Primeira diferença ........... 6,3164 0,8619 3,6754 - - 5,8996 - Segunda diferença .......... 0,2119 - 4,4920 - - - - Terceira diferença ........... - - 4,0429 - - - - Quarta diferença ............. - - 3,0223 - - - - Quinta diferença ............. - - 3,3582 - - - - Sexta diferença ............... - - 2,8828 - - - - Sétima diferença ............. - - 2,1827 - - - - AIC0 ................................. 2,5162 1,4808 6,1764 2,4120 2,5236 3,3983 2,9930 AIC1 ……………………… 1,4069 1,4632 6,2202 2,4447 2,5837 2,9335 3,0022 AIC2 ................................. 1,3831 1,4983 6,1969 2,4745 2,6454 2,9440 3,0200 AIC3 ................................. 1,4382 1,5034 6,1621 2,4993 2,7077 3,0006 3,0715 AIC4 ................................. 1,4259 1,5568 6,2205 2,5218 2,7699 3,0561 3,0922 AIC5 ................................. 1,4664 1,5824 6,1758 2,5340 2,6389 3,1085 3,1464 AIC6 ................................. 1,4903 1,5959 6,1173 2,5645 2,7023 3,1628 3,2028 AIC7 ................................. 1,5415 1,6316 6,0708 2,6293 2,7694 3,2326 3,2557 AIC8 ................................. 1,5559 1,6701 6,1226 2,6872 2,8318 3,2659 3,3070 Valor crítico a 1%............. -3,5625 -2,6081 -4,1678 -3,5572 -3,5598 -3,5598 -2,6072 Valor crítico a 5% ............ -2,9190 -1,9471 -3,5088 -2,9167 -2,9178 -2,9178 -1,9470 FONTE DOS DADOS BRUTOS: Bacen. IBGE. NOTA: A estatística t do teste ADF e a estatística do critério de informação de Akaike (AIC) mínimo para a seleção do núme-ro adequado de defasagens estão em negrito.

Helder Ferreira de Mendonça; Lucas Lautert Dezordi; Marcelo Luiz Curado

Indic. Econ. FEE, Porto Alegre, v. 33, n. 3, p. 97-110, dez. 2005

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Tabela 4

Critério de Schuvarz (SC) e critério de Hannan-Quinn (HQ) para a ordem do VAR

DEFASAGENS PRESENÇA DE CONSTANTE SC HQ

0 Com constante 21,49591 21,40120 1 Com constante 14,77967 14,30610 2 Com constante (1)14,08086 (1)13,22845 3 Com constante 14,56679 13,33552 4 Com constante 15,34883 13,73871 1 Sem constante 14,59777 14,21892 2 Sem constante (1)13,96869 (1)13,21099 3 Sem constante 14,54714 13,41059 4 Sem constante 15,45292 13,93751

FONTE DOS DADOS BRUTOS: Bacen. IBGE. (1) Denota a ordem selecionada pelo critério.

NOTA: Impulso-resposta de dois desvios padrões.

Funções de impulso-resposta para o VAR

Figura 5

2

1

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12-2

-1

0

1

2

3

4

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12

2

1

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12

(C ) R esposta de SE LIC para desvio da in flação

-2

-1

0

1

2

3

4

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12

(D ) R espo sta da SE LIC para risco-pa ís(D) Resposta da SELIC para risco-país(C) Resposta de SELIC para desvio da inflação

(A) Resposta de SELIC para SELIC (B) Resposta de SELIC para hiato do produto

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12

2

1

0

-1

-2

4

3

2

1

0

-1

-2

4

3

A determinação da taxa de juros em uma economia sob metas para inflação: o caso brasileiro

Indic. Econ. FEE, Porto Alegre, v. 33, n. 3, p. 97-110, dez. 2005

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Tabela 5

Decomposição da variância da taxa Selic

MESES TAXA SELIC HIATO DO PRODUTO (πT - π*) RISCO-PAÍS

1 100,0000 0,000000 0,000000 0,000000 2 98,17430 0,102122 1,719880 0,003693 3 96,61319 0,165145 2,708031 0,513633 4 92,61411 0,325949 3,021798 4,038141 5 84,63950 0,543044 2,843723 11,973730 6 74,37193 0,709101 2,463685 22,455280 7 64,53148 0,775361 2,106703 32,586460 8 56,54874 0,763769 1,864857 40,822630 9 50,57737 0,713200 1,748154 46,961270

10 46,25381 0,651276 1,740165 51,354750 11 43,14761 0,592188 1,821917 54,438290 12 40,90630 0,541573 1,977534 56,574590

FONTE DOS DADOS BRUTOS: Bacen. IBGE.

5 - Considerações finais

Calibrar a resposta dos juros nominais, tomandocomo referência os processos inflacionários e o hiato doproduto, é um desafio para a condução da políticamonetária sob um regime de metas para inflação. Umataxa de juros elevada pode não ser um bom instrumentopara o combate à inflação, podendo, até mesmo, gerarum efeito reverso ao esperado. Ainda que a taxa de jurosseja o principal instrumento à disposição do Bacen parao combate à inflação, há indícios de que a mesma nãofoi utilizada de forma correta durante o período analisado.

Em relação ao controle da inflação, observou-seum sucessivo descumprimento das metas para inflaçãonos últimos anos. Essa observação está de acordo comos resultados encontrados na seção anterior, pois aausência de uma resposta efetiva da taxa de juros aosdesvios da inflação fez com que o regime de metas parainflação não alcançasse os resultados pretendidosquando de sua implementação.26 Uma conseqüênciadireta do descumprimento das metas anunciadas é adificuldade que o Bacen encontra para reduzir a taxaSelic, sem comprometer as expectativas dos agenteseconômicos para um possível descontrole da inflação.

Essa é uma observação importante, pois justifica oresultado encontrado para a relevância da própria Selicna explicação de sua trajetória.

Um outro aspecto a ser ressaltado diz respeito aohiato do produto. O fato de o Bacen não responder aosdesvios do produto significa que a taxa de juros não seencontra em um nível adequado para que o produtopotencial seja alcançado. Uma conseqüência é que amanutenção de uma elevada taxa de juros tende a causarum desestímulo à atividade econômica, o que, porconseguinte, incrementa a taxa de desemprego. Logo,observa-se que a taxa Selic nem se encontra em umpatamar capaz de fazer com que as metas para inflaçãodeterminadas sejam alcançadas nem é capaz de mantera taxa de desemprego compatível com o produtopotencial.

O ponto crucial para a explicação docomportamento da taxa Selic refere-se ao Risco-País. Aimportância dessa variável é justificada pelo fato de quehá fortes indícios de que a taxa de juros básica daeconomia brasileira tem sido utilizada tendo como principalobjetivo o alcance do equilíbrio do balanço de pagamentos.Assim, para que a taxa de juros possa ser utilizada deforma efetiva para o controle da inflação, ou que considerede forma simultânea o desvio da inflação em relação àmeta e o hiato do produto, é preciso que a necessidadede um superávit na conta de capitais, via sustentaçãode uma elevada taxa de juros, seja eliminada.26 Para uma análise sobre a implementação do regime de metas

para inflação no Brasil, ver Mendonça (2001) e Netto (1999).

Helder Ferreira de Mendonça; Lucas Lautert Dezordi; Marcelo Luiz Curado

Indic. Econ. FEE, Porto Alegre, v. 33, n. 3, p. 97-110, dez. 2005

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Telecomunicações: os resultados da política de competição

Indic. Econ. FEE, Porto Alegre, v. 33, n. 3, p. 111-128, dez. 2005

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Telecomunicações: os resultados da política de competição

Renato Antonio Dal Maso* Economista e Coordenador do Núcleo de Políticas Públicas da FEE.

ResumoO texto aborda a política de competição nas telecomunicaçõesimplementada pelo Governo Federal entre 1997 e 2004. Pesquisam-se osresultados dessa política, que teve como objetivo liberar a entrada deempresas no setor, permitindo que a maioria dos usuários pudesse escolhera operadora dos serviços de sua preferência. Buscaram-se informaçõesrelacionadas às empresas prestadoras e à participação no mercado, bemcomo indicadores quantitativos destas no controle dos acessos fixos ecelulares e sobre a evolução das tarifas no período. A análise evidencia apresença da competição na telefonia celular e nos serviços internacionais,pouca competição nos demais serviços e um processo de concentraçãodo capital no setor. Esse movimento constituiu grandes grupos deempresas prestadoras multisserviços, restringindo a competição econsolidando a liderança de uma firma dominante em nível regional.

Palavras-chave: telecomunicações; competição na telefonia;

concentração na telefonia.

AbstractThis paper is concerned with the competition policy implemented in thearea of telecommunications by the Brazilian federal government between1997 and 2004. The research is focused on the results of this policy,which was aimed at liberating the entry of enterprises in this economicsector so that users could freely choose the services of the companythey prefer. The evidence used in this research were: information relatedto the activities of the enterprises and their respective participation in themarket; quantitative data on the share of the companies in the control ofaccesses of users to fixed and mobile telephones; and the evolution ofthe taxes. The analysis indicates that a measure of competition, as wellas a capital concentration in multi-services firms, has developed in thesector. This process hindered full competition between companies andconsolidated the dominance of a firm at a regional level.

Artigo recebido em 18 out. 2005.

* O autor agradece as sugestões precisas de Walter Arno Pichlere o apoio do acadêmico Paulo Henrique de Campos.

Renato Antonio Dal Maso

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1 - Introdução

A política de telecomunicações do Governo Federalenvolve questões relacionadas à regulação do mercado,à universalização, à qualidade dos serviços, à políticaindustrial e tecnológica e ao regime de competição. Essesaspectos se entrelaçam na implementação da políticasetorial. Entretanto este texto foca apenas a política decompetição, implementada entre os anos de 1997 e 2004,ressaltando alguns aspectos para a compreensão doobjeto. A implementação da política iniciou-se com aabertura do mercado dos serviços de telefonia celular,seguindo-se a instituição do órgão regulador, aprivatização das empresas originárias do SistemaTelebrás e a entrada de novos investidores privados nomercado. A política de competição compreende o conjuntode medidas implementadas para criar um mercado semlimite de prestadoras dos serviços, onde a maioria dosusuários pudesse exercer a liberdade de escolha dasempresas provedoras dos serviços de sua preferência.1

Esse cenário foi chamado de “plena competição”.Atualmente, o processo de competição é uma

realidade visível no mercado, especialmente na telefoniacelular, onde operam quatro grandes grupos empresariais.Na telefonia fixa, o cenário atual não é o de “plenacompetição” apregoado, vigorando um regime onde umafirma é dominante no mercado. O cenário atual estáorganizado a partir da liderança dessa firma. Esse fatocomprova existir pouca competição. Se a política nãoimplantou o cenário de plena competição, conformeidealizaram os policies makers, que regime elaconfigurou? O regime de liderança de uma firma e deoligopólios configura a competição possível no setor detelecomunicações? Para responder às questões,propõe-se, neste texto, que os resultados efetivos dapolítica na experiência brasileira carecem de melhorqualificação. Certamente, a competição instalou-se emalgumas modalidades de serviços e nos nichos maislucrativos do mercado, mas não sob o regime de plenacompetição. Ao contrário, na maioria das pequenas emédias cidades, ela não existe. Argumenta-se ainda queas operadoras originárias do Sistema Telebrás herdaram

assimetrias que lhes garantem grande poder competitivoem relação às demais entrantes. Essas assimetrias sãoo controle dos acessos e das redes e a sua grandecapilaridade.

A análise da política envolve aspectos complexosque dificultam o entendimento do funcionamento domodelo de telecomunicações, apresentado a seguir parailustrar a funcionalidade do cenário competitivo idealizado.2

O modelo de telefonia fixa representou-se no Quadro 1,e o modelo de telefonia celular, no Quadro 2. Neles, omercado brasileiro foi dividido em regiões, criadasespecificamente para o setor, que delimitam a área deautorização das empresas para prestar serviços, emborasempre necessitem obter autorização para atuarem nasregiões, nas localidades e nos municípios. Observa-se,com isso, que o cenário competitivo tem como locus aregião, mais especificamente os nichos do mercado, ondeas empresas buscam vantagens na prestação dasmodalidades de serviços da telefonia fixa (local ouresidencial e não residencial, longas distâncias nacional(LDN) e internacional (LDI)), da telefonia celular e dosdemais serviços de comunicação de dados e internet. Apolítica de competição implantou o regime, gradualmente,pelas etapas destacadas abaixo.

No cenário da telefonia fixa, atuam a Telemar, aBrasil Telecom, a Telefônica e a Embratel nas suasrespectivas Regiões I, II, III e IV, denominadas empresasoriginárias, pois elas herdaram os acessos telefônicos eas redes do Sistema Telebrás. As empresas Vésper, aGlobal Village Telecom (GVT) e Intelig Telecom, chamadasde entrantes (espelhos), também são prestadoras,respectivamente, naquelas regiões, a partir de 1999.Outras empresas entrantes (espelhinhos), a partir de2000, passaram a atuar em alguns dos municípios e emalgumas localidades onde as “espelhos” decidiram nãoprestar serviços. A partir de 2002, novas empresasentrantes foram autorizadas, não havendo mais limitespara a presença de prestadoras. A liberação para a entradano mercado e a presença de diversas empresas criaramum cenário de competição, por suposto, em cada região(Quadro 1).

1 Conforme a Lei Geral de Telecomunicações, n° 9.472, de16.07.97, define-se telecomunicações como a transmissão,emissão ou recepção, por fio, radieletricidade, meios ópticos ouqualquer outro processo eletromagnético, de símbolos,caracteres, sinais, escritos, imagens, sons ou informações dequalquer natureza (art. 60).

2 Para uma análise detalhada do modelo, ver Anatel (2005),Dalmazo (2002, Cap. 4) e Relatórios Teleco (2005a). Toda abase material e legal que fundamenta o mercado detelecomunicações encontra-se no site da Anatel.

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Na telefonia celular, o modelo idealizadoestabeleceu 10 áreas, que também foram criadasespecificamente para o setor. Em cada área, atuavamuma empresa originária, operando a Banda A, e umaentrante, na Banda B, sob regime de duopólio no SistemaMóvel Celular (SMC). Esse regime foi modificado, no anode 2000, para o Sistema Móvel Pessoal (SMP), quedelimitou a atuação das empresas não por área, maspelo mesmo espaço das Regiões I, II e III. Todas asprestadoras se adaptaram ao SMP, configurando um novocenário, não no regime de duopólio, mas por quatrograndes operadoras nas Bandas A, B, D e E em cadaregião (Quadro 2).

A política implantou, gradualmente, a competição,criando oportunidades atraentes para os investidoresprivados e liberando a entrada de prestadoras no setor.Seu objetivo maior foi criar um cenário de “plenacompetição”, em cujo mercado não existiria limite paraentrada de empresas e onde os usuários poderiamescolher os serviços das prestadoras segundo suaspreferências. Esse processo implicou também imporassimetrias de direitos e deveres entre as empresas,com a finalidade de reduzir as vantagens das origináriase estimular as entrantes. As assimetrias impostas àsprimeiras foram as obrigações de universalização econtinuidade, de qualidade dos serviços, o controle detarifas e sanções para os casos de quebra das regras docontrato. E, para as entrantes, exigiram-se um plano decompromisso de abrangência dos acessos e umaregulação menos intensa, como a ausência de controlede tarifas e de universalização. Essas assimetrias foramconsideradas suficientes para configurar, assim, o regimecompetitivo.3

A partir dessa visão sintética do modelo e do cenárioidealizado das telecomunicações, apresenta-se, a seguir,a política de competição. Conforme citado no Quadro 3,a implementação da política ocorreu por etapas. Cabeapontar aqui os fatos relevantes do processo: em 1997,teve início a competição na telefonia celular, autorizando--se novas empresas entrantes para operar a Banda B;em 1998, ocorreu a privatização das empresas origináriasdo Sistema Telebrás e a vigência de monopólio privadotemporário. Em 2000, iniciou-se a competição na telefoniafixa, através das autorizações para as empresasentrantes (espelhos) atuarem em cada região e daimplantação do Código de Seleção de Prestadora (CSP),cuja medida permitiu que o usuário escolhesse a

prestadora dos serviços de longa distância, bem comoatravés da implantação do Serviço Móvel Pessoal, quelimita o número de prestadoras por região a quatroempresas nas Bandas A, B, D e E. Esse rearranjo domodelo inicial mudou o cenário da competição de duaspara quatro empresas, atuando não mais por área, maspor região. Na verdade, ocorreu um movimento de fusõese aquisições entre as empresas para se adaptarem aoSMP, e elas marcaram presença em todas as regiões.Assim, a competição nessa modalidade passou a serdisputada no plano nacional e nos nichos regionais. Porúltimo, em 2002, ocorreu a liberação do mercado detelefonia fixa para novas entrantes e a implantação doCSP na telefonia celular, em julho de 2003. Assim, ocenário idealizado da “plena competição” estárepresentado nos Quadros 1 e 2, onde se registra apresença de diversas prestadoras de telefonia fixa emcada região. Por sua vez, na telefonia celular, implantou--se o regime de oligopólio limitado à presença de quatroempresas em cada região.

Além desta Introdução, contendo uma síntese domodelo idealizado, o texto está estruturado nos seguintesitens. No item 2, pesquisou-se a reação das principaisprestadoras frente ao cenário competitivo, através deinformações qualitativas sobre fusões e aquisições esobre as estratégias adotadas para ganhar vantagensem relação às demais. No item 3, analisa-se um conjuntoimportante de indicadores, que revelam os resultadosda política de competição. Os indicadores examinadossão: (a) a participação percentual das operadorasoriginárias na receita bruta de telefonia fixa, que revela,de fato, qual a fonte de riqueza que está em jogo nosetor de telecomunicações; (b) a participação percentualdas empresas nos acessos fixos e celulares e nosacessos totais, que apresentam uma visão geral daimportância delas em termos de controle de acessos nomercado nacional; (c) a participação das empresas nosacessos fixos e celulares por região, que revela aliderança e o domínio das operadoras na sua região-base;e (d) a evolução das tarifas praticadas pelas operadorasoriginárias para serviços locais, LDN e LDI. No item 4,além de se tomarem informações sobre a reação dasempresas em relação ao novo cenário, examinam-se osindicadores do jogo oligopolista na telefonia celular, osindicadores da participação das empresas nos acessose da evolução das tarifas, bem como as razões daexplosão dos acessos celulares. A abordagem emseparado das telefonias fixa e celular nesses itens tevepor objetivo qualificar a competição possível nasmodalidades de serviços de telecomunicações (telecoms).Por último, registram-se as considerações finais.3 Ver texto sobre o tema em Santos e Taboada (2004).

Renato Antonio Dal Maso

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Quadro 2

Modelo de telecomunicações para a telefonia celular no Brasil — 1997 e 2002

REGIÕES ÁREAS DE CONCESSÃO

ORIGINÁRIAS DA BANDA A

(1997)

ENTRANTES DA BANDA B

(1997)

ENTRANTES DA BANDA D

(2002)

ENTRANTES DA BANDA E

(2002)

Área 3: RJ e ES Claro TIM Área 9: BA e SE

Vivo

Área 4: MG

TIM Área 8: AM, RO,

AP, PA e MA

Opportunity Vivo

Claro

Região I

Área 10: PI, CE, RN,PB, PE ,AL

TIM Claro

Oi

-

Área 5: PR, SC TIM Vivo Claro Área 6: RS

Região II

Área 7: DF, GO, TO MS, MT, RD e AC

Vivo

Claro

TIM

Brasil Telecom

(set./2003)

Região III Área 1: SP Capital Área 2: SP interior

Vivo Claro TIM -

Outras Áreas 2, 4 e 7: GO, MG e SP

Londrina (PR)

CTBC Telecom

Sercomtel

-

-

-

FONTE: DALMAZO, Renato. As mediações cruciais das mudanças político-institucionais nas telecomunicações do FONTE: Brasil. Porto Alegre: FEE, 2002. Cap. 4. (Teses FEE, n. 2). FONTE: RELATÓRIOS TELECO. Telefonia celular no Brasil 2005. 2005b. Disponível em: http: www.teleco.com.br Acesso FONTE: em: 2005. FONTE: ANATEL. Relatório anual 2004. Disponível em: http: www. anatel.gov.br Acesso em: 2005.

Quadro 1

Modelo de telecomunicações para a telefonia fixa no Brasil — 1998-2002

REGIÕES SETORES (1)

ORIGINÁRIAS (1998)

ENTRANTES (espelhos)

(1999)

ENTRANTES (espelhinhos)

(2000)

NOVAS ENTRANTES (2002)

1, 2, 4 a 17 Telemar Região I

(2) 3 CTBC

Vésper (Embratel)

Tmais; Transit; Enlevos; Nortelpa; Sermatel.

Telefônica; GVT; Intelig Telecom; Telmex (AT&T); Teledados (EMTL).

18,19,21,23, 24, 26 a 30

Brasil Telecom

20 Sercomtel Região II

(3) 22 a 25 CTBC

GVT

Tmais; Transit; Options.

Telefônica; Embratel; Telmex (AT&T); Intelig Telecom; Sercomtel.

Região III (4)

31, 32 e 34 Telefônica Vésper SP (Embratel)

Tmais; Transit; Aerotech; Ampla.

Intelig Telecom; GVT; Comercial Cabo TV São Paulo; Telmex (AT&T).

Região IV (5)

Todo o Brasil Embratel Intelig Telecom Aerotech; Enlevos; Transit.

Telemar; Brasil Telecom; Telefônica; Claro; TIM; CTBC.

FONTE: DALMAZO, Renato. As mediações cruciais das mudanças político-institucionais nas telecomunicações doFONTE: Brasil. Porto Alegre: FEE, 2002. Cap. 4. (Teses FEE, n. 2).

FONTE: RELATÓRIOS TELECO. Telefonia Celular no Brasil 2005. 2005a. Disponível em: http: www.teleco.com.br Acesso em: 2005. FONTE: ANATEL. Relatório anual 2004. Disponível em http: www.anatel.gov.br Acesso em: 2005. (1) Setor é uma divisão do Brasil em áreas que delimitam o espaço de atuação das empresas e, no caso, definem os setores das empresas existentes CTBC (3, 22 a 25) e Sercomtel (20). (2) RJ, MG, ES, BA, SE, AL, PE, PB, RN, CE, PI, MA, PA, AP, AM, RR. (3) RS, DF, GO, MT, RN, AC, MS, PR, SC. (4) SP. (5) Todo o Brasil.

Telecomunicações: os resultados da política de competição

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2 - Fusões e aquisições consolidam a liderança dos grupos dominantes

Neste item, analisam-se informações maisqualitativas, que revelam os movimentos das empresasfrente ao cenário competitivo. Para tal, pesquisaram-seas estratégias e o movimento de concentração do capitaldas empresas originárias, tendo em vista a suaexperiência similar e a representatividade no setor.

Inicialmente, cabe ressaltar que as novasautorizações para entrantes no mercado, a implementa-ção do SMP e do CSP e a liberação do mercado foram

Quadro 3 As etapas de implantação da política de competição no Brasil

ANOS ETAPAS DO CENÁRIO COMPETITIVO

1997 Autorização para a entrada de novas operadoras da Banda B na telefonia celular em 10 áreas. Início da competição na telefonia celular.

1998 Privatização das empresas públicas originárias do Sistema Telebrás nas quatro regiões seguintes: Região I - RJ, MG, ES, BA, SE, AL, PE, PB, RN, CE, PI, MA, PA, AP, AM, RR (Telemar); Região II - RS, DF, GO, MT, RN, AC, MS, PR, SC (Brasil Telecom); Região III - SP (Telefônica); Região IV - todo o Brasil (Embratel). Empresas originárias iniciam competição nos serviços de LDN.

1999 Autorização para a entrada de uma nova empresa em cada região (espelho ou entrante), criando o regime de duopólio: Região I, Global Village Telecom (GVT); Região II, Vésper Holding S.A.; Região III, Vésper Holding São Paulo S/A; Região IV, Intelig Telecom. Início da competição entre originárias e entrantes.

2000 Mudanças no cenário da competição: - implantação do Sistema Móvel Pessoal pela autorização de novas empresas operarem as Bandas D e E nas Regiões I, II e III; - adaptação das operadoras do Sistema Móvel Celular das Bandas A e B existentes ao SMP; - permissão para as fusões e aquisições de empresas; - autorização para a entrada de novas empresas (espelhinhos) para operar em municípios e localidades onde as espelhos decidiram não prestar telefonia fixa; - implantação do Código de Seleção de Prestadora na telefonia fixa, através do qual o usuário escolhe a operadora dos serviços de LDN e LDI. Ampliação da competição nos serviços de longa distância e na telefonia celular.

2002 Liberação do mercado de telefonia fixa sem limite para operadoras nas regiões. Novas autorizações às originárias que cumpriram as obrigações de universalização para operar nas demais regiões. Concentração do capital em quatro grandes grupos que operam multisserviços: Telemar/Oi; Brasil Telecom/TIM (e BrTelecom Celular); Telefônica/Vivo e Embratel/Claro/Vésper.

2003 Implantação do Código de Seleção de Prestadora na telefonia celular. Vigência da plena competição.

FONTE: DALMAZO, Renato. As mediações cruciais das mudanças político-institucionais nas telecomunicações do Brasil. Porto Alegre: FEE, 2002. Cap. 4, p. 220. (Teses FEE, n. 2).

fatos relevantes e inexoráveis da política de competição4.As empresas reagiram com estratégias um tantosimilares. Por exemplo, a Telemar, a Telefônica e aEmbratel buscaram antecipar o cumprimento dasobrigações de universalização dos serviços em 2001,para obterem novas autorizações para atuarem nasdemais regiões. Todas buscaram capacitar-se para provermultisserviços de telecomunicações. E o fizeram por umarazão singular, dada pela convergência dos serviços quepodem ser providos pelas mesmas redes. Também

4 Para implementar a política, a Anatel concedeu 11 novasautorizações de telefonia local com abrangência variada, 14autorizações para LDN e LDI e licitou as Bandas D e E.

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desenvolveram ações voltadas para a fidelização dosseus usuários, através das seguintes ações: na telefoniafixa residencial, disponibilizaram serviços inteligentes,tais como secretária eletrônica virtual, discagem rápida,chamada em espera, siga-me (transferência temporária),identificador de chamadas, acesso à internet em bandalarga, acessos fixos pré-pagos e ações para retenção deusuários; na telefonia local não residencial corporativa,disponibilizaram serviços inteligentes, atendimentoexclusivo e diferenciado, planos de tarifas mais atrativos,acessos à internet em banda larga, etc. Nos serviços deLDN e LDI, a introdução do Código de Seleção dePrestadora promoveu a quebra do monopólio da Embratel,que passou a ser o inimigo comum das demais e,especialmente, das originárias, que passaram a praticartarifas sempre inferiores às dos concorrentes, bem comopromoveram campanhas de fidelização dos usuários. Nocaso da Intelig Telecom, inicialmente, promoveram-sepreços abaixo das concorrentes, porém estes forammantidos apenas por um certo período de tempo (Santos;Taboada, 2004). Em suma, a reação dos grandes gruposfoi consolidar, na sua região-base, a capacidade paraprover multisserviços. A seguir, apresentam-seinformações sobre o movimento de concentração docapital para formar os quatro grandes grupos e consolidara estratégia comum.

A Telemar buscou capacitar-se para provermultisserviços. Em junho de 2002, obteve autorizaçãopara operar a Banda D na Região I, através da TNL PCSS/A (Oi), e serviços de LDN e LDI nas Regiões I, II e III.Em dezembro de 2002, adquiriu o controle acionário daPegasus Telecom S/A, para exploração e prestação deserviços de transmissão de dados nas três regiões,especialmente no mercado corporativo e empresarial deSão Paulo.5 Controla a Companhia AIX Participações,especializada na construção de infra-estrutura de dutospara instalação de fibras óticas, que atua em rodoviasdo Estado de São Paulo e da Capital, bem como para aTelemar e para a Pegasus. Em março de 2001, criou aABS 52 Participações Ltda., alterada para TelemarInternet, para prestar serviços de instalação e prestaçãode serviços de acesso à internet em banda larga, chamadade Velox.

A Brasil Telecom decidiu garantir o domínio na RegiãoII, buscando desenvolver infra-estrutura e consolidar um

grupo para prover todos os serviços de telecoms. Em2000, adquiriu o controle da CRT, operadora de telefoniafixa no Rio Grande do Sul. Em junho de 2003, passou agerar serviços de LDI, ao comprar todo o sistema decabos submarinos de fibra ótica do Grupo GlobeNet6,reforçando sua posição em tráfego de dados, LDI eredução de custos de interconexão, bem como assumiua MetroRed, em fevereiro de 2003, que operava redesdigitais de fibras óticas. Adquiriu ainda a iBest Serviçosde Internet S/A, em junho de 2003, e passou a ser osegundo maior provedor de internet gratuita no mercadobrasileiro. Em 2002, lançou os acessos em banda larga,o BrTurbo, baseado em tecnologia Asymmetric DigitalSubscriber Line (ADSL). Atualmente, avança com açõesde aquisição de infra-estrutura de rede de alta tecnologiapara fincar liderança no mercado corporativo, bem comofaz gestões para compra da Intelig Telecom e da InternetGroup do Brasil Ltda. (iG). Um dos seres controladores,Itália Móbile Telecom, controla a prestadora de telefoniacelular nas três regiões. Outro controlador, Opportunity eoutros, controla a Brasil Telecom Celular que atua naRegião II, na Banda E.

O grupo Telefônica instalou novas empresas noBrasil, com o objetivo de centrar sua atuação nos serviçosconvergentes de telecomunicações. Adquiriu o controleda ZAZ na área de internet, segundo maior provedor doPaís, e constituiu a empresa Terra Networks Brasil emjunho de 1999. No ano 2000, realizou vários negócios:em outubro, concluiu a incorporação da Ceterb S/A e daCeterb Celular, que operavam em Ribeirão Preto, SãoPaulo; em novembro, constituiu a subsidiária TelefônicaEmpresas S/A, para prover serviços de comunicação dedados, lançou serviço de conexão rápida à internetchamado Speedy, bem como adaptou suas empresasde celular nas Bandas A e B ao SMP, através daoperadora Vivo, em todo o País. Também criou a AtendoHolding, para prestar serviços de call centers a terceiros,de telemarketing e de administração de banco de dados,além de publicar listas telefônicas, através da TPIPáginas Amarelas.

A Embratel buscou complementar sua capacitaçãopara prover também serviços locais e celular. Em 2003,adquiriu a Vésper Holding S/A e a Vésper Holding SãoPaulo S/A, da empresa norte-americana QUALCOMM

5 A Pegasus opera uma rede de cabos de fibra óptica e tambémvia rádio (wireless) nas 25 cidades mais importantes do Sudestee do Sul do País, representando a segunda maior rede de anéismetropolitanos na Cidade de São Paulo.

6 A GlobeNet Communications Group Ltd. interliga pontos deinterconexão nas regiões de Nova Iorque e Miami (EUA), St.David’s (Ilhas Bermudas), Maiquetia (Venezuela) e Fortaleza eRio de Janeiro (Brasil). Trata-se de empresa criada em 1998,para prover serviços de comunicação de fibra ótica entre osEUA e a América do Sul.

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Incorporadora, nas Regiões I e III, e a CT Torres Ltda.,que controlava 622 torres de comunicação. Mantém-secomo líder no mercado brasileiro de transmissão dedados. Em novembro de 2000, constituiu a Star OneS/A, para gerir e operar satélites, sendo a principaloperadora de transponders para serviços de comunicaçãono Brasil e a principal fornecedora de internet em bandalarga via satélite. Lançará, em 2006 e 2007, os satélitesStar One C1 e C2, para substituir os BrasilSat B1 e B2.Em agosto de 2003, constituiu a Click 21 Comércio ePublicidade Ltda., para prestar serviços de conexão eoferecer produtos de internet para clientes residenciais eempresas. Manteve a sua rede internacional de cabossubmarinos inteiramente óticos, ligando o Brasil a diversospaíses.7 Por último, a mexicana Telmex, que controla aClaro na telefonia celular, adquiriu a Embratel da norte--americana MCI, em março de 2004.

Portanto, o processo de fusões e aquisições nasempresas originárias, desencadeado para consolidar umgrupo empresarial de multisserviços, por um lado,configura uma reação clara dos agentes ao cenário decompetição, buscando ganhar vantagens no mercado. Poroutro, representou um movimento de concentração docapital para constituir uma escala adequada para garantirposição de liderança de firma dominante.

3 - Os resultados da política de competição

Neste item, examinam-se os resultados da política,avaliados através de indicadores da participação relativadas empresas nas receitas dos serviços, do controle dosacessos fixos e celulares e da evolução das tarifas. Oprimeiro indicador sintetiza as principais fontes de riquezadisputadas nas telecoms. Em seguida, tomaram-sedados sobre o controle dos acessos telefônicos e aparticipação das prestadoras, e, por último, examina-sea evolução de tarifas, que reflete a rivalidade vista pelospreços cobrados. Em relação às tarifas, as empresascomprometeram-se, no contrato de concessão, a reduzi--las, de forma escalonada, entre 1998 e 2005, nosmontantes de 4,9% nos serviços locais, de 23,3% nosde LDN e de 64,2% nos de LDI.

O primeiro indicador é revelador da disputa, semdúvida, obtido pelas participações percentuais na receitabruta dos serviços. Os dados estão disponíveis apenaspara as originárias, mas são representativos para osargumentos da análise. Conforme dados da Tabela 1, aEmbratel fatura mais provendo ligações de LDN (54,7%)e serviços de comunicação de dados (23,3%). As demaisoriginárias faturam alto com serviços locais, em torno de42,5%, especialmente com receitas da assinatura básica.Essa é uma importante fonte de receita vinculada aocontrole dos acessos fixos, como se fossem recursoscativos das empresas. As receitas das ligações fixo--móvel também são significativas e representam omontante de 21%. Elas cresceram em decorrência daexpansão da rede, especialmente da rede celular comos planos pré-pagos. Por sua vez, a relevância dasreceitas com serviços de LDN em torno de 15% tambémse deve à expansão da planta. No essencial,representam-se, na Tabela 1, as principais fontes dereceitas disputadas pelas empresas, as quais apontamos limites possíveis do novo cenário.

Na telefonia fixa residencial, a competição existenteé muito pouca e restringe-se aos nichos mais lucrativosdo mercado. As originárias Telemar, Brasil Telecom eTelefônica dominam, na sua região-base, essamodalidade, porque controlam os acessos e as redes,como dito anteriormente. No caso das entrantes,entretanto, elas conquistaram uma minúscula fatia domercado. A participação mais expressiva tem sido daVésper — adquirida pela Embratel em 2003 —, na RegiãoI, onde controla 20,9% dos acessos. Elas se fixaramapenas nos nichos do mercado, localizados nas grandescidades, nas áreas de comércio e indústrias e nos bairrosde altas rendas. Além do alto custo para construíremredes, pesa contra as entrantes a baixíssima taxa demigração dos usuários entre as prestadoras. Portanto, afraca competição nessa modalidade, atualmente, deve--se à baixa migração dos usuários entre prestadoras e àpouca penetração das redes das entrantes.

Em relação às tarifas dos serviços locais, suaevolução pouco ou nada reflete a existência decompetição, como a queda esperada dos preços, apesarde haver diferenciações nos valores cobrados entre asoriginárias (Tabela 2). Na verdade, as empresas obtiveramganhos reais nas tarifas de assinatura residencial e nãoresidencial, e reduziram-se os preços dos pulso e fichalocais. Elas também desoneraram os custos parahabilitação dos telefones, para facilitar a adesão dosusuários. Exceto estes, todos os demais são preçosadministrados, no sentido de que é o agente reguladorquem define a tarifa. Dessa forma, a grande expansão

7 A rede de cabos submarinos da Embratel permite mais de 25 milligações simultâneas por telefone e compõe-se das seguintesredes: Américas-1 e Américas-2 (EUA); Columbus-1, Columbus--2 e Atlantis-2 (Europa e Ásia); e Unisur (América do Sul).

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da rede e dos acessos gerou receitas cativas àsprestadoras, tendo em vista desfrutarem da condiçãodominante no mercado. Essa condição em si limita osespaços para um ambiente competitivo na telefonia local,que poderá ser ampliado não pelo número de prestadoras,mas por meio de inovações e da oferta de novosserviços.

Os impactos da política nas tarifas dos serviçosde LDI foram significativos. Um deles ocorreu naparticipação da Embratel na receita bruta total, que, anoapós ano, vem perdendo posição no mercado. Em 2000,embolsava 91,9%, mas faturou 66,3% da receita em 2004.A Intelig Telecom, que é a concorrente direta, ficou com14,8% (Tabela 3). As demais vêm obtendo ganhoscrescentes desde que passaram a realizar ligaçõesinternacionais. Isso sugere que a entrada de novasprestadoras ampliou a disputa entre a Embratel, a inimigacomum, contra os três grupos, mais a Intelig Telecom eoutras. Portanto, a entrada de novas empresas implicouatribuir crescentes perdas à Embratel. Porém ela continualíder nessa modalidade, operando suas redesinternacionais. A emergência recente da Brasil Telecome da Telefônica nessa modalidade, também operando suaspróprias redes internacionais, aprofundará a disputa pelasreceitas de LDI.

Além disso, a mudança nas tarifas praticadas pelaEmbratel revela os impactos provocados pelas medidasque autorizam a entrantre Intelig em 1999, a implantaçãodo Código de Seleção de Prestadora (CSP) em 2000 eas que autorizam a Brasil Telecom, a Telefônica e outrasa operarem chamadas de LDI. Principalmente, a queda éexplicada pelo compromisso assumido no contrato deconcessão, para reduzir em 64,2% os valores cobradosno período. Enfim, essas medidas se refletiram em todasas tarifas internacionais da Embratel, num montante emtorno de 70%, no período, especialmente nas ligaçõespara EUA (76,5%), Portugal (69,5%) e países da AméricaLatina (Tabela 4). Portanto, a redução dos preços nessamodalidade superou o compromisso acordado no contrato.Não obstante, a tendência das prestadoras será praticartarifas niveladas, como está a ocorrer hoje, e evitar guerrade tarifas.

Na modalidade dos serviços de LDN, a competiçãofoi ampliada em 2000, quando os usuários passaram ater a possibilidade de escolha da prestadora dos serviços,via o CSP, e pelas autorizações para novas entrantes nomercado. Essas medidas criaram forte rivalidade paracom a Embratel, que era a inimiga comum das originárias,da Intelig Telecom e demais entrantes, GVT e Vésperbasicamente. Disputava, com as originárias, os serviçosintra-regionais e, com a Intelig, os inter-regionais e os de

LDI. A importância que essas empresas assumiram podeser examinada pelo indicador da participação dos grandesgrupos na receita bruta das ligações de LDN (Tabela 5) epela participação no controle dos acessos fixos ecelulares em cada região (Tabela 6).

O indicador da participação dos grupos na receitabruta mostra vantagens e perdas para as prestadoras. AEmbratel apresentou perda no faturamento, entre 2000 e2004, de 44% para 31,1%, bem como a Telemar. Por suavez, a Telefônica, a Brasil Telecom e a Intelig Telecomobtiveram ganhos expressivos. A participação dos grupospara mais ou para menos, de fato, é um indicativo darivalidade existente, como mostra a Tabela 5. Entretantoo nível de competição aqui será melhor qualificado comindicadores da participação no controle de acessos e daevolução das tarifas, sem, todavia, negá-la.

Uma conclusão geral importante nesse nível daanálise é que a competição se trava, de fato, na região--base das prestadoras, onde as originárias disputam asligações intra-regionais com a Embratel e com asentrantes Intelig, GVT ou Vésper. Nessa busca porvantagens, as originárias têm assegurado posição deliderança e domínio na respectiva região-base. E, nasligações inter-regionais, elas fizeram acordos dereciprocidade entre si, especialmente para as chamadasfixo-fixo de regiões distintas. Significa dizer que umaoriginária, como a Telefônica, não invadirá o mercado dasdemais, mas negociou interconexão para completar suasligações nas demais regiões, embora tenha autorizaçãopara prestar o serviço.

A seguir, examinam-se os indicadores que afirmama liderança das firmas através do controle dos acessosfixos e celulares em cada região. Na Região I, o grupoTelemar/Oi controla 76,6% dos telefones fixos e 44%dos acessos fixos e celulares, e o grupo Embratel//Vésper/Claro, 20,9% e 17,6% respectivamente. O grupoBrasil Telecom/TIM controla 89,9% dos acessos fixos e41,8% do total de acessos na sua região-base. O grupoTelefônica/Vivo desfruta vantagens, explorando serviçosde 89,4% dos fixos e 68,9% dos celulares e fixos naRegião III (Tabela 6). Esses dados sobre o grande controledos acessos telefônicos e das redes são a prova dodomínio dos grupos na sua região-base. O domínio sobrea infra-estrutura de rede inexoravelmente garanteapropriação da maior fatia de receitas dos serviços,especialmente das ligações locais e de LDN intra-regional.O controle dos acessos revela existir também uma outraforma de competição entre os grupos. Ela está a ocorrernão por modalidade de serviço conforme idealizada, maspor serviços diferentes, como a telefonia local versustelefonia celular pré-paga. Os grupos desenvolveram-se

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para prestar todos os serviços. São hoje prestadores demultisserviços (telefonia fixa, celular, comunicação dedados e internet) e marcam presença em todas as regiões.Dessa forma, cada originária, através da sua operadoracelular, compete nas demais regiões via planosbasicamente pré-pagos.

Aquele argumento anterior sobre a liderançaencontra guarida também nos relatórios anuais dasoriginárias, que reafirmam a sua existência nas ligaçõesde LDN intra-regional e na crescente participação nas deLDI. A Brasil Telecom cita ter provido 84,3% das ligaçõesintra-regionais, 48,9% das inter-regionais e 26,6% dasinternacionais em 2004. A Telefônica também destacater a vantagem de operar em torno de 75% das chamadasintra-regionais e, em 2002, controlou 36% das chamadasinter-regionais e 32% das LDI. Portanto, tem-se, nessasinformações, mais um dado revelador da liderança dasfirmas. Assim, a pouca competição pode serdimensionada pelas receitas geradas e apropriadas pelasdemais prestadoras, que são relativas ao montante deacessos que controlam, sendo em torno de 5% nasRegiões II e III e de 23,4% dos acessos na Região I(Tabela 6).

Por sua vez, o efeito da política sobre redução dastarifas de LDN não foi o esperado. A evolução do custodo minuto normal de uma ligação, na verdade, retrata acompetição possível nessa modalidade. Os relatórios

anuais das originárias registram que praticaram tarifassempre inferiores às concorrentes e reafirmam aestratégia comum dos grupos de fixarem o seu códigode prestadora na cultura dos seus usuários para preferiremseus serviços. Qual é a competição possível então? Apouca competição ocorre nos nichos do mercado, juntoàs áreas metropolitanas, onde as entrantes GVT, Véspere Intelig se fixaram. Nesse filão do mercado, aplica-se atarifa conurbada ou tarifa de ligação local. São ligaçõeslocais feitas dentro da cidade ou entre cidades adjacentesque a Anatel estabeleceu que fossem consideradas locais.Nesse caso, a reação das originárias foi reduzir as tarifas,especialmente nas Regiões I e III, por conta da entradada Vésper; além disso, elas reduziram os custos dasligações com distância em torno de 300km ou mais(Tabela 7). Novamente, aqui, trata-se de preçosadministrados pela Anatel, que acordou permitir reajustesanuais pelo IGP-DI e aplicar um redutor de 23,3%, deforma escalonada, no período.

Em suma, a competição na telefonia fixa revela-semuitíssimo restrita nas ligações locais e nas de LDN,pois os grupos originários controlam os acessos e asredes e garantem liderança e domínio do mercado.Destacou-se também que foram constituídos grandesgrupos capazes de prover multisserviços, buscandooperar, no plano nacional, todos os serviços convergentesde telecomunicações.

Tabela 1 Receita bruta de telefonia fixa das principais operadoras no Brasil — 2004

(%)

TIPOS DE SERVIÇOS TELEMAR BRASIL TELECOM TELEFÔNICA TOTAL EMBRATEL

(1)

Total do serviço local (fixo-fixo) 44,6 37,2 43,9 42,5 8,3 Habilitação .................................... - - - 0,3 - Assinatura ..................................... 30,5 24,8 27,3 27,6 - Serviço (pulsos) ............................ 13,5 11,6 16,6 14,2 - Outros ........................................... 0,6 0,7 - 0,4 - Total do LDN (2) .......................... 14,5 13,3 16,6 15,0 54,7 Intra-regional ............................... 11,4 11,7 12,7 11,9 - Inter-regiões ................................. 3,1 1,7 4,0 3,1 - Serviços de LDI (3) ..................... 0,5 0,3 0,6 0,5 10,5 Serviço fixo-móvel ...................... 17,4 24,4 21,8 20,8 - TUP (“orelhão”) .......................... 5,1 3,8 2,1 3,7 - Comunicação de dados ............. 8,1 11,7 5,4 8,0 23,3 Uso da rede ................................ 5,9 5,8 6,0 5,9 - Outros serviços .......................... 3,6 3,6 3,5 3,6 3,2 TOTAL .......................................... 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0

FONTE DOS DADOS BRUTOS: RELATÓRIOS TELECO. Telefonia celular no Brasil 2005. 2005a. Disponível em: http: www.teleco.com.br Acesso em: 2005.

(1) Dado sobre a receita líquida. (2) LDN: longa distância nacional. (3) LDI: longa distância internacional.

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Tabela 3

Participação das operadoras na receita bruta dos serviços de longa distância internacional, no Brasil — 2001-04

(% sobre a receita total)

OPERADORAS 2000 2001 2002 2003 2004

Telemar ................................... - - 1,0 5,2 7,0

Brasil Telecom ........................ - - - 0,1 2,2

Telefônica ................................ - - 2,7 6,5 7,4

Embratel (1) ............................ 91,9 82,9 79,4 71,3 66,3

Intelig ....................................... 8,1 17,1 17,0 17,0 14,8

Outros (2) ................................ - - ... ... 2,3

TOTAL .................................... 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0

FONTE DOS DADOS BRUTOS: ANATEL. FONTE DOS DADOS BRUTOS: RELATÓRIOS TELECO. Telefonia celular no Brasil 2005. 2005a. Disponível em: FONTE DOS DADOS BRUTOS: http: www.teleco.com.br Acesso em: 2005. FONTE DOS DADOS BRUTOS: BRASIL TELECOM. Relatório da anual da administração 1999-2004. Disponível em: FONTE DOS DADOS BRUTOS: http: www.brasiltelecom.com.br Acesso em: 2005. (1) Valores estimados. (2) Inclui as participações da Intelig Telecom, da CTBC, da Sercomtel, da GVT e da Vésper.

Tabela 2 Índice das tarifas de telefonia fixa local no Brasil — 1998/2005

TELEMAR (Setor 2-RJ)

BRASIL TELECOM (Setor 29-RS)

TELEFÔNICA (Setor 34-SP Capital)

CHAMADAS LOCAIS

(horário normal) 1998 2000 2003 2005 1998 2000 2003 2005 1998 2000 2003 2005

Assinatura residen-cial .......................... 100,0 118,6 134,0 121,7 100,0 118,6 133,6 121,4 100,0 118,6 133,2 121,0Assinatura não resi-dencial .................... 100,0 123,1 158,7 144,2 100,0 109,1 123,7 111,9 100,0 123,1 152,2 138,3Assinatura-tronco ... 100,0 123,1 119,0 108,1 100,0 98,9 92,8 75,0 100,0 123,1 114,1 103,7Pulso local .............. 100,0 95,7 88,4 80,3 100,0 102,6 92,7 84,2 100,0 94,9 88,6 80,6Habilitação residen-cial .......................... 100,0 52,5 30,0 20,2 100,0 52,5 45,3 25,0 100,0 57,4 54,6 42,5Habilitação não resi-dencial .................... 100,0 52,5 30,0 20,2 100,0 52,5 45,3 25,0 100,0 57,4 54,6 42,5Habilitação-tronco .. 100,0 87,5 49,9 33,7 100,0 87,5 75,5 41,6 100,0 95,7 91,0 70,8Ficha local .............. 100,0 70,0 63,0 64,2 100,0 70,0 67,7 ... 100,0 70,0 67,7 69,1Mudança de ende-reço ........................ 100,0 99,9 105,8 107,9 100,0 87,5 92,6 64,3 100,0 99,9 105,8 107,9Tarifa rede de uso local TU-RL ............ 100,0 99,9 84,6 51,8 100,0 102,3 86,6 ... 100,0 94,9 80,3 49,2

FONTE DOS DADOS BRUTOS: ANATEL. NOTA: Valores deflacionados pelo IGP-DI médio anual entre maio/04 e abr./05 = 100.

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Tabela 5

Participação das operadoras na receita bruta dos serviços de longa distância nacional, no Brasil — 2001-04 (%)

GRUPOS 2000 2001 2002 2003 2004

Telemar ................................................. 16,8 14,2 13,6 12,9 11,8

Brasil Telecom ...................................... 13,6 15,2 17,2 17,7 19,8

Telefônica .............................................. 19,2 21,1 22,7 27,4 29,8

Embratel (1) .......................................... 44,0 43,7 38,0 33,9 31,1

Outros (2) .............................................. 6,3 5,8 8,5 8,2 7,5

TOTAL .................................................. 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 FONTE DOS DADOS BRUTOS: RELATÓRIOS TELECO. Telefonia celular no Brasil 2005. 2005a. Disponível em: http: www.teleco.com.br Acesso em 2005.

(1) Estimativa a partir da receita líquida. (2) Estimativa que inclui as participações de Intelig, CTBC, Sercomtel, GVT e Vésper.

Tabela 4

Valor das tarifas de longa distância internacional (LDI) cobradas pela Embratel no Brasil — 1997-05

VALOR (1) REDUÇÃO DAS TARIFAS (%) PAÍSES DE DESTINO

1997 1998 2000 2001 2003 2004 2005 2000 1998

2003 2000

2005 2004

2005 1998

LDI por DDI (2)

Argentina ........................ 106,7 100,0 85,4 100,8 54,1 47,5 28,3 14,6 36,6 40,3 71,7

Estados Unidos ............... 106,7 100,0 85,4 100,8 34,6 30,3 23,5 14,6 59,5 22,6 76,5

Portugal .......................... 106,7 100,0 85,4 100,8 39,0 34,2 30,5 14,6 54,4 10,8 69,5

Países da Europa ........... 106,7 100,0 85,4 100,8 58,7 45,7 37,9 14,6 31,3 17,1 62,1

Países da África .............. 106,7 100,0 85,4 100,8 69,2 36,1 32,4 14,6 19,0 10,1 67,6

Países da Ásia ................ 106,7 100,0 85,4 100,8 69,2 36,1 32,4 14,6 19,0 10,1 67,6

LDI Regional por DDI (2)

Rio Grande do Sul para Uruguai ........................... 106,7 100,0 85,4 100,8 38,7 29,5 22,6 14,6 54,7 23,5 77,4

Amazonas para Colômbia 106,7 100,0 85,4 100,8 38,1 29,1 22,2 14,6 55,4 23,5 77,8

Santa Catarina para Ar- gentina ............................ 106,7 100,0 85,4 100,8 38,7 29,5 22,6 14,6 54,7 23,5 77,4

FONTE DOS DADOS BRUTOS: ANATEL. NOTA: Valores deflacionados pelo IGP-DI médio anual entre maio/04 e abr./05 = 100.

(1) Valor em reais do minuto inicial normal. (2) DDI: discagem direta internacional.

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Tabela 7

Índice das tarifas das ligações de longa distância nacional (LDN) no Brasil — 1998-05

TELEMAR

(Setor 2-RJ) BRASIL TELECOM

(Setor 29-RS) TELEFÔNICA

(Setor 31-SP Capital) CHAMADAS LDN (horário normal)

1998 2000 2003 2005 1998 2000 2003 2005 1998 2000 2003 2005

DC - Conurbada (1) ....... 100,0 96,4 55,3 51,5 100,0 103,6 113,3 102,5 100,0 106,2 87,4 81,3

D1 - < 50km ................... 100,0 114,3 140,0 110,4 100,0 114,3 119,0 99,7 100,0 106,3 110,5 91,2

D2 - > 50km e < 100km 100,0 114,3 140,0 113,9 100,0 114,3 119,0 99,8 100,0 101,8 105,8 87,4

D3 - > 100km e < 300km 100,0 100,8 111,6 96,9 100,0 114,3 93,6 78,4 100,0 93,1 96,8 79,9

D4 - > 300km ................. 100,0 114,3 112,4 86,0 100,0 102,7 82,1 66,7 100,0 93,1 84,0 73,0

TU-RIU por minuto ......... 100,0 97,9 92,8 ... 100,0 112,6 106,7 89,4 100,0 112,6 106,7 89,4 FONTE DOS DADOS BRUTOS: ANATEL.

NOTA: Valores deflacionados pelo IGP-DI médio anual entre maio/04 e abr./05 = 100.

(1) São ligações locais feitas dentro da cidade ou entre cidades adjacentes que a Anatel estabeleceu que fossem consideradas locais.

Tabela 6

Participação dos principais grupos nas telecomunicações do Brasil — 2004 e jun./05

(% de acessos)

JUNHO DE 2005 BRASIL (ano de 2004) Região I Região II Região III

GRUPOS

Fixos Celulares Total Receita Bruta

Fixos Fixos e celulares

Fixos Fixos e celulares

Fixos Fixos e celulares

Telemar/Oi ........................... 35,2 10,5 19,9 22,6 76,6 44,0 - 12,4 - - Brasil Telecom /TIM (1) ....... 21,7 21,7 21,3 22,0 - 14,1 89,9 41,8 - 10,6 Telefônica/Vivo .................... 26,8 40,5 35,2 33,6 - 14,5 - 29,2 89,4 68,9 Embratel/Vésper/Claro ........ 12,3 20,8 17,8 16,6 20,9 17,6 - 13,3 8,9 19,6 Subtotal .............................. 95,9 93,4 94,3 94,8 97,5 90,2 89,9 96,7 98,4 99,1 Telemig/Amazonas Celular - 6,0 3,4 2,0 - 8,3 - - - - CTBC Telecom .................... 1,7 0,5 1,3 - 2,5 1,5 0,4 0,2 1,6 0,9 Sercomtel ............................ 0,3 0,1 0,2 - - - 1,4 0,6 - - GVT ..................................... 2,0 1,5 0,9 - - - 8,4 2,5 - - Demais espelhinhos ............ - - - - - - - - - - Outros .................................. - - - 3,2 - - - - - - TOTAL ................................ 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 FONTE DOS DADOS BRUTOS: ANATEL. Relatório anual 2004. Disponível em: http: www.anatel.gov.br Acesso em: 2005. RELATÓRIOS TELECO. Telefonia celular no Brasil 2005. 2005a. Disponível em: http: www.teleco.com.br Acesso em: 2005.

RELATÓRIOS TELECO. Telefonia fixa no Brasil 2005. 2005b. Disponível em: http: www.teleco.com.br Acesso em: 2005.

(1) Inclui os acessos celulares da Brasil Telecom Celular.

Telecomunicações: os resultados da política de competição

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4 - O oligopólio institucio- nal na telefonia celular e o nivelamento das tarifas

Igualmente foram decisivas, no cenário da telefoniacelular, as seguintes medidas da política de competição:as empresas entrantes na freqüência da Banda B, aimplantação do SMP, o Código de Seleção de Prestadorae a liberação para quatro operadoras em cada região.Desde meados de 1997, as empresas buscaram, comousadia e agressividade, firmar posição nas áreas maisdensas, através de planos de expansão arrojados paracobertura de rede, da oferta de planos de tarifas atrativose de campanhas agressivas para diferenciar seusserviços.

O segundo fato relevante foi a nova regulamentaçãopara o Serviço Móvel Pessoal (Resolução nº 248/2000,da Anatel), substituindo o Serviço Móvel Celular. Asautorizações do SMP passaram a ser não mais para asnove áreas do SMC, mas para as Regiões I, II e III. Amedida autorizou novas entrantes para as freqüênciasdas Bandas D e E em cada região e permitiu que asoperadoras das Bandas A e B se adaptassem ao novocenário. Esse rearranjo no modelo da telefonia celularpromoveu uma corrida de fusões e aquisições e culminoucom a adaptação de todas as empresas, obtendoautorização para atuar em todas as regiões. Vale lembrarque o impedimento das fusões e aquisições teria findadoapós cinco anos do início das operações. Os resultadosdo novo cenário foram os seguintes:

a) a Vivo, controlada pela Telefônica, incorporou aSpice do Brasil na Região I (área 8), a GlobalTelecom, da japonesa DDI, na Região II (área 5)e associou-se a Portugal Telecom na Região III;

b) a Claro (ou Telecom Américas) é controlada pelamexicana Telmex. Na Região I, incorporou a Algar,da norte-americana Southwesther Bell (área 3),e a BSE, da norte-americana Bell South//Bombshell e do Banco Safra (área 10); na RegiãoII, incorporou a Telet, das canadenses Bell Canadáe Telesystem Wireless (área 6); na Região I,incorporou a BCP, da norte-americana Bell Southe do Banco Safra (área 1) e a Tess S/A, daoperadora sueca Telia Overseas (área 2); adaptou--se ao SMP, adquirindo autorização para operara Banda E nas áreas 4 e 9; e, atualmente, estáassociada à Embratel e à Vésper;

c) a TIM é controlada pela Telecom Itália Móbile,que detém o controle da Brasil Telecom (telefoniafixa). Na Região I, adquiriu autorização para aBanda E (áreas 3 e 8), bem como para a BandaD nas Regiões II (áreas 6 e 7) e III (áreas 1 e 2);

d) a Oi é controlada pela Telemar e foi uma entranteda Banda D em 2002;

e) a Brasil Telecom Celular é controlada pela BrasilTelecom e passou a operar serviços na BandaD, na Região II, em setembro de 2004. Nessecaso, existe propriedade cruzada irregular daTelecom Itália, controladora da TIM, que tambémopera na Região II, e, indiretamente, também daBrasil Telecom Celular, através da participaçãoacionária na Brasil Telecom. Essa irregularidadeserá objeto de decisão da Anatel.

No essencial, os resultados da política, sem dúvida,foram significativos: primeiro, porque acirraram a disputano plano regional; segundo, porque promoveram aconcentração de capitais em grandes grupos, ampliandoo jogo competitivo para o plano nacional. Na verdade,trata-se de uma medida de ajuste do modelo que atendeuaos interesses dos agentes, particularmente paraconsolidar suas estratégias de prover multisserviços emtodas as regiões (Quadro 2). O rearranjo do modelo eseus resultados na formação de quatro grandes gruposcertamente configurou uma escala e uma estruturaempresarial adequadas ao fortalecimento da liderançano novo cenário competitivo.

No que se refere aos indicadores quantitativos, adistribuição dos acessos celulares entre as operadorasreafirma a liderança do grupo Telefônica/Vivo em todo oBrasil. O Grupo operou 44,8% dos acessos totais em2003 e 36,5% dos mesmos em agosto de 2005. Elepredomina nas Regiões II e III, onde controla em tornode 53% dos acessos. A TIM detém a segunda posiçãono ranking e explora 22,8% dos acessos celulares. Seudesempenho é significativo, dizendo-se a única operadoraque atua em todos os estados brasileiros. A Claro é aterceira no ranking, controlando 21,7% dos acessos, loca-lizados principalmente nas Regiões II e III. A Oi tem umafatia do mercado nacional de 11,1% dos acessos e liderana Região I. As demais empresas controlam menos de7% dos celulares totais, exceto a participação do grupoOpportunity na Região I, que é de 13,0% (Tabela 8).

Portanto, os ganhos da política vieram com as altastaxas de adesão e mobilidade dos usuários a partir de1999, especialmente quando os planos de acessos pré--pagos passaram a ser o carro-chefe da expansão doscelulares. A oferta de acessos e o número de usuáriostiveram crescimento explosivo de 32,9% em 2003 e de

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41,5% em 2004. Porém a competição pesada ocorre nafração de mercado dos usuários de planos pós-pagos,cujos usuários são empresas e as classes de renda A eB, que propiciam receita média por acesso mais elevada.Essa fração encontrava-se estagnada num montante de9,8 milhões de usuários até 2002 e expandiu-se para12,8 milhões em 2004. Atualmente, eles representam emtorno de 17% dos acessos. O crescimento recente foi oresultado das campanhas focadas para aumentar a receitamédia desses planos, diferençando os serviços atravésde qualidades fictícias, tecnológicas, ofertas de planosde tarifas, disponibilizando outros serviços e o baixo custodo aparelho celular, “objeto de desejo” fascinante,contendo multifunções (som, imagem, dados, internet,hora, despertar, avisos, rádio, jogos, câmera fotográfica,etc.).

Os acessos com planos pré-pagos atraíram milhõesde usuários. Representavam 59% dos usuários ou 13,6milhões de acessos em 2000 e ampliaram-se para 52,8milhões de usuários, que representam 83,4% dosacessos em 2004. Esse fato singular explica a grandeexpansão da telefonia celular, tendo em vista a altaparticipação dos pré-pagos em todas as operadoras(Tabela 8).

Os usuários dos pré-pagos desejavam ter controledos gastos com ligações mensais. Por isso, os planosadequaram-se à renda disponível ao acesso e uso dosserviços. Trata-se de usuários que pouco originamchamadas ou fazem ligações rápidas, porémpotencializam a utilização das redes, recebendo ligaçõese torpedos. O interesse das empresas em ofertar essesplanos está nas receitas significativas que geram viatarifa de interconexão, denominada Valor de Uso da redeMóvel (VU-M), pois ela remunera a rede de uma prestadoramóvel, quando a ligação iniciada de um telefone daprestadora fixa é terminada no celular. Ou seja, na áreada operadora, a regra é: quem liga paga.

Portanto, a explosão dos planos pré-pagosprotagoniza uma guinada na tendência da telefonia emgeral, determinada por duas condições principais: agrande capilaridade das redes celular e fixa e anecessidade dos usuários em controlar gastos. A grandecapilaridade da rede, atualmente, sustenta a expansão eo sucesso dos pré-pagos. A principal barreira que limitaa competição entre os acessos pré-pagos e os fixos estáno grande diferencial das tarifas desses, em torno de R$0,90 o minuto e de R$ 0,105 por pulso de quatro minutosnormais respectivamente. Como os usuários e as famíliasresolvem esse ônus preferindo o celular pré-pago?Controlam gastos, ajustando-os à sua renda e às suasnecessidades. Assim, esse “objeto de desejo” preferido

passou a gerar um serviço substituto mais eficiente erival da telefonia fixa local. Trata-se de uma nova rivalidadeimpulsionada pelas firmas multisserviços e pelacompetição ampliada para o plano nacional. Os grandesgrupos marcam presença em todas as regiões,controlando parte expressiva dos acessos celulares,especialmente os pré-pagos (Tabela 8).

Os impactos da política sobre as tarifas celularesforam expressivos. Para dimensioná-los, selecionaram--se indicadores das tarifas para chamadas locais (VC--1), chamadas para fora de sua área de registro (VC2) echamadas de fora da área de concessões (VC3). Umaobservação geral é que as tarifas praticadas por cadagrupo não foram similares, mas distintas em cada estado.Porém apresentaram a mesma tendência de queda noperíodo. Por isso, elegeu-se São Paulo (interior), por serum mercado muito competitivo, para mostrar a evoluçãodos preços por prestadora (Tabelas 9) e a evolução datarifa média em alguns estados representativos (Tabela10). A tarifa VC3 sofreu a maior redução por todas asoperadoras. A Vivo e a Claro diminuíram-na num montantesuperior a 50% em termos reais, e a TIM (SP), em tornode 20%. Basicamente, essa queda foi o resultado doimpacto da medida que permitiu aos usuários escolherema operadora de sua preferência para as chamadas deLDN (VC3). A tarifa VC2 sofreu redução próxima de 40%reais aplicada pela Vivo e pela Claro e de 20% aplicadospela TIM. O maior impacto ocorreu nas tarifas médiascobradas em São Paulo (interior), conforme revelam osdados da Tabela 10. No caso das chamadas locais (VC1),ocorreu um nivelamento das tarifas em todos os estados,algumas tendo elevação, outras, redução. Ou seja, asoperadoras Vivo e Claro reduziram significativamentesuas tarifas, como resultado da entrada de novasoperadoras. Porém a tendência é se tornarem niveladas.Os agentes oligopolistas evitam competir por tarifas.Sempre preferem buscar vantagens através dadiferenciação dos serviços.

Em suma, em 2003 e 2004, a explosão dos pré--pagos e as receitas de interconexão atrativas passarama ser fatores dinâmicos que tiraram da estagnação asprestadoras. O efeito da política de competição já cumpriusua missão, e a tendência será o nivelamento ou a práticade tarifas similares. O rearranjo do cenário da telefoniacelular foi ao encontro dos interesses dos grandes grupos,ao consolidar empresas operadoras de multisserviços,concentrando capital e configurando a liderança de firmasdominantes.

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Tabela 8

Participação das operadoras no total de acessos celulares do Brasil — 2003-05

(% de acessos)

2005 PRÉ-PAGOS OPERADORAS BANDAS 2003 2004

Região I Região II Região III Total 2003 2004

Vivo ....................... A, B 44,8 40,5 23,0 48,0 51,0 36,5 76,6 80,0

TIM ........................ A, B, D, E 18,0 20,7 24,0 22,0 20,0 22,8 - 76,0

Claro ...................... B, D, E 20,6 20,8 16,0 23,0 29,0 21,7 81,3 82,4 Oi ........................... D 8,4 10,5 24,0 - - 11,1 83,0 86,1

Telemig/Amazonas Celular ................... A 7,3 6,0 13,0 - - 5,4 70,1 73,0 Brasil Telecom ...... E - 0,9 - 6,0 - 2,1 - 66,9

TBC Telecom ........ A 0,7 0,52 1,0 - - 0,4 - - Sercomtel Celular A 0,2 0,14 - - - 0,1 - -

TOTAL .................. 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 100,0 76,2 80,5 Total de acessos

(1 000) ................... A, B, D, E 46 373 65 605 33 675 22 881 18 962 78 947 35 336 52 812

FONTE DOS DADOS BRUTOS: ANATEL. Relatório anual 2004. Disponível em: http: www.anatel.gov.br Acesso em: 2005. RELATÓRIOS TELECO. Telefonia Celular no Brasil 2005. 2005a. Disponível em: http: www.teleco.com.br Acesso em: 2005.

Tabela 9 Tarifas das operadoras da telefonia celular em São Paulo (interior) — 1997/05

(R$ do minuto normal)

VC-1 (1) VC-2 (2) VC-3 (3)

ANOS Vivo CTBC Claro TIM Vivo CTBC Claro

TIM Vivo CTBC Claro TIM

1997 0,648 0,672 - - 1,392 1,392 - - 1,584 1,584 - -

1998 0,607 0,630 0,562 - 1,304 1,304 1,102 - 1,484 1,484 1,327 -

1999 0,653 0,661 0,637 - 1,402 1,369 1,258 - 1,596 1,558 1,515 -

2000 0,628 0,636 0,613 - 1,349 1,317 1,210 - 1,535 1,499 1,457 -

2001 0,560 0,567 0,547 - 1,204 1,176 1,080 - 1,370 1,338 1,300 -

2002 0,562 0,562 0,562 - 1,214 1,176 1,110 - 1,381 1,338 1,337 -

2003 0,588 0,588 0,588 0,597 0,765 0,765 0,765 0,597 0,629 0,629 0,629 0,735

2004 0,552 0,552 0,552 0,645 0,717 0,717 0,717 0,645 0,717 0,717 0,717 0,645

2005 0,536 0,536 0,542 0,650 0,697 0,697 0,704 0,650 0,697 0,697 0,704 0,650 FONTE DOS DADOS BRUTOS: ANATEL. Relatório anual 2004. Disponível em: http: www.anatel.gov.br Acesso em: 2005. NOTA: Tarifas reais corrigidas pelo IGP-DI, média anual de maio/04 a abr./05 = 100.

(1) VC1: valor da comunicação das chamadas locais de celular. (2) VC2: chamada celular da área de registro. (3) VC3: chama-da celular para fora da área de concessão.

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Tabela 10

Tarifas médias praticadas na telefonia celular — 1997/05 (R$ do minuto normal)

RIO DE JANEIRO

(Vivo, Claro, TIM e Oi)

SP-INTERIOR

(Vivo, Claro, TIM e CTBC)

RIO GRANDE DO SUL

(Vivo, Claro, TIM e Brasil Telecom)

BAHIA (Vivo, Claro, Oi e TIM) ANOS

VC-1 (1) VC-2 (2) VC3 (3) VC-1 (1) VC-2 (2) VC3 (3) VC-1(1) VC-2 (2) VC3 (3) VC-1(1) VC-2 (2) VC3 (3)

1997 0,67 1,39 - 0,66 1,39 1,58 - 1,39 1,58 0,62 1,39 1,58

1998 0,56 0,90 1,38 0,60 1,24 1,43 0,60 1,02 1,47 0,55 1,23 1,39

1999 0,59 0,94 1,47 0,65 1,34 1,56 0,64 1,10 1,58 0,59 1,32 1,51

2000 0,57 0,91 1,41 0,63 1,29 1,50 0,62 1,06 1,52 0,56 1,14 1,30

2001 0,51 0,81 1,26 0,56 1,15 1,34 0,55 0,94 1,36 0,53 1,09 1,24

2002 0,53 0,83 1,33 0,56 1,17 1,35 0,54 0,94 1,36 0,56 1,13 1,29

2003 0,57 0,66 0,66 0,59 0,72 0,66 0,56 0,71 0,71 0,62 0,76 0,76

2004 0,57 0,65 0,65 0,57 0,70 0,70 0,54 0,67 0,67 0,55 0,68 0,68

2005 0,53 0,61 0,61 0,57 0,69 0,69 0,57 0,65 0,65 0,55 0,67 0,67 FONTE DOS DADOS BRUTOS: ANATEL. Relatório anual 2004. Disponível em: http: www.anatel.gov.br Acesso em: 2005.

NOTA: Tarifas reais corrigidas pelo IGP-DI, média anual de jun.-maio, base maio/05 = 100.

(1) VC1: valor da comunicação das chamadas locais celular. (2) VC2: chamada celular da área de registro. (3) VC3: chamada celular para fora da área de concessão.

5 - Observações finais

A política de telecomunicações do Governo Federal,a partir de 1997, buscou implantar um regime competitivosem limite de prestadoras de serviços nas regiões, oqual, por suposto, criaria um cenário de “plenacompetição” até 2003. A competição é uma realidadevisível em algumas modalidades, como na telefoniacelular, na LDN inter-regional e na LDI; noutras, revelou--se muito restrita, como na telefonia local e na LDN intra--regional. Nestas últimas, concentram-se as maioresfontes de receitas, conforme Tabela 1. A análise destacouque o jogo competitivo ocorreu no plano regional, ondeduas assimetrias basicamente asseguraram liderança dasempresas dominantes, que são o controle das redes edos acessos telefônicos.

As originárias Telemar, Brasil Telecom, Telefônica eEmbratel reafirmaram o domínio dos mercados regionais,controlando as redes e os acessos fixos, bem como oscelulares, através de suas respectivas operadoras Oi,TIM, Vivo e Claro. A formação dos quatro grandes gruposfoi decisiva para consolidar empresas multisserviçosconvergentes das telecomunicações.

Fala-se muito em competição equilibrada entre osgrupos, sugerindo a presença da plena competição.Porém os indicadores analisados sugerem outra leitura,

que é a liderança de firmas dominantes em cada região,formando quatro grandes grupos empresariais.

Certamente, a telefonia celular é uma exceção,devido às suas características, que possibilitam maiordiferenciação dos serviços e maior mobilidade dosusuários, e por desfrutar das tecnologias de últimageração. O rearranjo do modelo e do cenário competitivo,combinado com o processo de fusões e aquisições,promoveu a concentração de capitais em quatro grandesgrupos e projetou a competição para o plano nacional,inclusive uma nova forma de competição entre os planosdo celular pré-pago com os serviços de telefonia fixalocal, apesar do grande diferencial nas tarifas cobradas.Em relação às tarifas, a análise dos dados permiteafirmar, primeiro, a tendência de queda e, segundo, denivelamento com as das concorrentes. Esse fato sugereque a prática de redução das tarifas tenha se esgotado.A disputa via tarifas, sendo destrutiva, faz com que osgrupos a evitem, preferindo rivalizar pela diferenciaçãodos serviços, pelas inovações e pela oferta de novosserviços.

Telecomunicações: os resultados da política de competição

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Renato Antonio Dal Maso

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A ineficácia dos programas públicos pró-pobres: o caso do Programa Bolsa-Família

Régis Rathmann* Graduado da Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS).

ResumoA intenção, neste artigo, é apresentar-se a problemática atual do ProgramaBolsa-Família, relacionada ao relatório do Banco Mundial de 2004 (WDR2004), em consonância com os dados atuais dos gastos com o Programae com suas fontes de financiamento. Tem-se como objetivo verificar seas normas de regulação estão sendo seguidas, quais os impactos reaisdessa entrada de dinheiro na economia e como a teoria trata a eficáciadesses programas de redistribuição de renda. Para isso, utilizam-sepesquisas nos atos normativos de institucionalização do Programa, dedados do lado real da economia e pesquisa de teorias da economia dosetor público. Conclui-se que existe uma falta de interação entre ospoderes, ou seja, uma total inexistência de "accountability", além do fatode que o Programa não conseguiu, até hoje, atingir seu principal objetivo:distribuir renda.

Palavras-chave: setor público; programa social; distribuição

de renda.

AbstractThe intention of this article is to present problematic current of the ProgramaBolsa-Família, related to the report of the World Bank of 2004 (WDR2004), in accord to the current data of the expenses with the program andits sources of financing. We have as objective to verify if the regulationnorms are being followed, which the real impacts in the economy of thismoney entrance and as the theory deals with the effectiveness theseprograms of income redistribution.For this in we will use them of researchto the normative acts of institutionalization of the program, data of thereal side of the economy and searches to the theories of the economy ofthe public sector. Concludes that a lack of interaction between existsbeing able them, or either, one total inexistence of "accountability", beyondthe fact that the program did not obtain today until reaching its mainobjective; to distribute income.

Artigo recebido em 03 out. 2005.

*E-mail: [email protected]

Régis Rathmann

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1 - Introdução

Nos últimos meses, foram amplamente divulgadaspela imprensa as distorções ocorridas no acesso aoBolsa-Família, o qual é um programa de auxílio, doGoverno Federal brasileiro, que surgiu com a missão deunificar os antigos benefícios, ainda não extintos: Bolsa--Escola, Bolsa-Alimentação, Cartão-Alimentação eAuxílio-Gás. O Bolsa-Família visa atingir aquelas famíliascom renda de até R$ 100,00 per capita mensais; portanto,é um programa que visa à transferência de renda àpopulação, procurando, através disso, diminuir asmazelas sociais.

Esses programas também vêm ganhando espaçona agenda mundial, demonstrando o reconhecimento dasnações de que o sistema capitalista de produção distribuia renda de forma altamente desigual (Galbraith, 1998).Daí decorre, atualmente, a defesa desses programas porum grande número de economistas (apesar de seusobjetivos políticos divergentes), sejam ligados à correnteheterodoxa, sejam à ortodoxa, estando entre eles:Frederick Hayek, Milton Friedman, Mario HenriqueSimonsen, Paul Singer e Eduardo Suplicy (Suplicy, 1993).

Os mecanismos para a obtenção do benefício noBrasil agregam, dentre outros fatores, o fato de que "seobriga", para a obtenção do benefício, o acesso de umagrande massa de crianças à educação, assim comorequerem a adesão total das crianças da famíliabeneficiada aos programas de vacinação. Isso possuilógica econômica, pois, supostamente, levaria, por umlado, à "qualificação" de uma futura massa de trabalha-dores e, por outro, enquanto na lógica da medicina preven-tiva, diminuiria gastos com saúde pública "curativa", quenada mais é do que aquela que visa evitar a doença enão as curar após seu surgimento.

Como o cadastramento é de responsabilidade dasprefeituras, começaram a surgir distorções, advindas de"interesses políticos", de "beneficiamento ilícito" e/ou defalhas institucionais intrínsecas ao processo. Esses tiposde benefícios, em muitos casos, acabam por não atenderàquelas famílias necessitadas, demonstrando umaineficácia distributiva, pois os mesmos terminam, algu-mas vezes, privilegiando as classes médias, o que acabalevando a uma concentração maior da renda.

Portanto, a intenção, neste estudo, é apresentarpossíveis soluções à atual problemática da gestão depolíticas públicas do Governo Federal brasileiro — nocaso, o Programa Bolsa-Família — em consonância como World Development Report 2004 (World..., 2004), doBanco Mundial, o qual apresenta amplamente a necessi-

dade de accountability para a superação das ineficiênciasde gestão governamental, porém sem deixar deapresentar antes tanto as atribuições do Programa quantoas conclusões do citado relatório. O termo acima referidosignifica, literalmente, que é preciso haver uma comuni-cação interativa dos mais diversos agentes públicos coma sociedade, assim como uma total prestação de contase uma avaliação acerca da qualidade dos serviçospúblicos prestados (World..., 2004).

Além disso, busca-se efetuar tanto o levantamentodos gastos atuais com o dito programa, quanto identificarquestões acerca das fontes de financiamento do mesmo.Também se tem a intenção de demonstrar, no final, pos-síveis soluções para a eficácia do Programa, baseadastanto na interpretação do referencial teórico utilizadoquanto nas conclusões propostas no relatório do BancoMundial.

2 - O Programa Bolsa- -Família e suas atribuições

Criado através da Lei nº 10.836, de 09 de janeiro de2004, o Programa é destinado às ações de transferênciade renda com condicionalidades, tendo por finalidade aunificação dos procedimentos de gestão e execução dasações de transferência de renda do Governo Federal,especialmente do Programa Nacional de Renda Mínimavinculado à Educação, o Bolsa-Escola; do ProgramaNacional de Acesso à Alimentação (PNAA); do ProgramaNacional de Renda Mínima vinculado à Saúde, o Bolsa--Alimentação; e do Programa Auxílio-Gás (BRASIL, 2004).As finalidades dos mesmos são:

- benefício básico - destinado a unidades familiaresque se encontrem em situação de extremapobreza;

- benefício variável - destinado a unidades familia-res que se encontrem em situação de pobreza oude extrema pobreza e que tenham em suacomposição gestantes, nutrizes, crianças entrezero e 12 anos ou adolescentes de até 15 anosde idade.

Ademais, são seus objetivos:a) promover o acesso à rede de serviços públicos,

em especial, de saúde, educação e assistênciasocial;

b) combater a fome e promover a segurança ali-mentar e nutricional;

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c) estimular a emancipação sustentada das famíliasque vivem em situação de pobreza ou de extremapobreza;

d) combater a pobreza; ee) promover a intersetorialidade, a complementa-

ridade e a sinergia das ações sociais do poderpúblico (BRASIL, 2004).

O valor mensal dos benefícios pode variar de R$50,00 para famílias com renda per capita de até R$ 50,00,assim como de R$ 15,00 por beneficiário, até o limite deR$ 45,00, para famílias com renda per capita de até R$100,00, devendo ser concedido, através de depósito, emdinheiro, em uma conta corrente previamente cadastradajunto ao sistema bancário público.

Cabe à Caixa Econômica Federal (CEF) a emissãodos cartões magnéticos, a serem confeccionados combase no cadastro efetuado pelas prefeituras municipais,devendo o crédito dos valores acima referidos ser efetua-do em conta bancária, preferencialmente à mulher.

Ao analisar-se a finalidade do Programa, observam--se semelhanças com o Programa de Garantia de RendaMinima (PGRM), defendido, dentre outros, por Hayek,que tem como objetivo a distribuição de renda à socie-dade sob a forma de papel moeda e não através de cestasbásicas, remédios e outros serviços, o que, segundo oautor, levaria ao uso da renda segundo a preferência decada um (Hayek apud Suplicy, 1993).

3 - A execução do Progra- ma Bolsa-Família e suas distorções

A lei que criou o Programa condiciona omantenimento do benefício a periódicas avaliações,sendo elas:

- exame pré-natal;- acompanhamento nutricional;- acompanhamento de saúde;- freqüência escolar de 85% em estabelecimento

de ensino regular.Os administradores públicos responsáveis pelo

controle do Programa (prefeituras) apontam que nãoconseguem efetuar a fiscalização acerca dos itens acima,alegando, preponderantemente, que têm carência defuncionários para a sua execução (Clicnotícias, 2004).

Porém existem distorções que são originadas pelaprópria forma como é concebido o Programa, sendo umexemplo a forma como é feito o cadastramento, no caso,

declaratório. Este se baseia em informações prestadaspelas pessoas que desejam obter acesso ao serviço,onde o declarante informa quanto aufere em rendamensalmente, munido da cópia de seu RG eacompanhado de uma testemunha.

Assim sendo, colocam-se inúmeros problemas:- impossibilidade de conferência da renda de

trabalho informal, a qual leva a que sejam aceitasas informações na íntegra;

- defasagem de informações, o que conduz a quebeneficiários com renda recebam o beneficio, ouseja, quando efetuou o cadastro estavadesempregado, porém depois arrumou empregoe continuou recebendo o beneficio;

- famílias com alunos em estado de evasão escolarcontinuam recebendo o beneficio, ou seja, naocasião do cadastro, estavam estudando, porém,após, deixaram de freqüentar a escola.

Todos os problemas acima são apontados pelospróprios funcionários responsáveis pelo cadastramentono Programa. Entretanto os mesmos alegam que, emfunção do baixo contingente de funcionários, nãoconseguem efetuar a fiscalização satisfatoriamente(Clicnotícias, 2004).

4 - O Programa Bolsa- -Família em números

O resumo demonstrativo do Bolsa-Família porunidade da Federação, para o mês de referência marçode 2005, mostra uma participação de 99,50% demunicípios brasileiros recebendo o beneficio, sendo quea participação não atinge 100% somente nos Estadosde Goiás, Pernambuco, Piauí, Rondônia, São Paulo eTocantins. O número de famílias atendidas foi de6.562.155, e receberam um montante de R$430.198.315,00 no mês citado, sendo o valor médio porbeneficio R$ 65,56 (BRASIL, 2004).

Cabe ressaltar que esses valores se referemunicamente ao Bolsa-Família, tendo sido destinado aosdemais benefícios: R$ 61.131.660,00 (Bolsa-Escola); R$887.775,00 (Bolsa-Alimentação); R$ 5.267.850,00(Cartão-Alimentação); e R$ 76.842.705,00 (Auxilio-Gás).Então, o total de "gastos" do Governo com benefícios dedistribuição de renda totalizaram, para o mês de marçode 2005, R$ 574.628.305,00.

Assim, ao se avaliarem os valores acima de formaagregada, pode-se chegar às seguintes conclusões:

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a) o gasto projetado com o Programa Bolsa-Famíliapara o ano de 2005 (R$ 5.162.379.780,00) é de0,003% em relação ao PIB total de 2004;

b) o gasto projetado com o Programa Bolsa-Famíliaatinge, aproximadamente, 5% do total do gastopúblico com o pagamento dos juros da dívidainterna (JURO..., 2005);

c) o Programa Bolsa-Família atinge em torno de10% da população total do Brasil, enquanto osjuros da divida interna são pagos a 4% dapopulação total;

d) a parcela de renda apropriada pelos 10% maisricos1 em 2002 era de 47,02% (valorespercentuais da renda total), valor quase idênticoao de 1994, que era de 47,85% (Pesq. Nac.Amost. Domic., 2002);

e) a parcela de renda apropriada pelos 50% maispobres2 em 2002 era de 12,98% (valorespercentuais da renda total), valor praticamenteidêntico ao de 1994, que era de 12,35% (Pesq.Nac. Amost. Domic., 2002).

A análise preliminar desses números aponta aconclusão de que a distribuição de renda no País continua,em níveis percentuais, semelhante na última década.Uma das causadoras dessa situação, dentre outras, foramas altas taxas de juros no período 1994-04, o que levoua que o montante dos juros pagos da dívida interna peloGoverno fosse cada vez maior, os quais são, sabida-mente, destinados a uma pequena parcela da população,que é detentora de títulos da dívida pública, no caso,aquela situada na parcela dos 10% mais ricos dapopulação.

Ademais, no que tange às fontes de financiamento,cabe ressaltar-se que os juros da dívida interna são pagossem "(...) restrições orçamentárias, ou seja, se o caixado governo não é suficiente para pagar todos os encargosda dívida, o governo pode tomar empréstimos (atravésda emissão de mais títulos), opção que não existe paragastos sociais" (JURO..., 2005).

Entretanto o Governo brasileiro, atualmente, encon-trou uma nova forma de financiar seus gastos sociais.Recentemente, conforme inúmeras publicações na

imprensa, o País obteve empréstimo, junto ao BancoMundial, de US$ 572 milhões (aproximadamente R$1.372.000.000,00, o que representa 25% do totalnecessário para financiar o Bolsa-Família no ano de 2005).Tal empréstimo é reflexo da concordância da instituiçãocom as políticas econômico-sociais adotadas no Brasile tem como foco, segundo o próprio Banco, "(...) a consoli-dação dos quatro principais programas de transferênciacondicional de renda (Bolsa-Escola, Bolsa-Alimentação,Cartão-Alimentação e Auxílio-Gás) e o aprimoramentoda arquitetura básica do Programa Bolsa Família"(World..., 2005).

Aqui cabe um questionamento, que tem como baseo fundamento econômico da distribuição de renda, sob oqual está embasado, conforme citado anteriormente, oarcabouço teórico dos programas de redistribuição derenda. O País gerou renda para distribuir? Essa perguntatorna-se fundamental, pois o valor obtido junto ao BancoMundial foi repassado como empréstimo; logo, dando aidéia de que essa renda já existia para ser distribuída,pois assim haveria como pagar o valor emprestado.

Fundamentalmente, fruto de uma política econômicaque não beneficia a desconcentração de renda, pois"privilegia" a esfera financeira ao invés do circuito produ-tivo, vem ocorrendo uma não-absorção de níveis crescen-tes de trabalhadores desempregados.

Decorrente dessa conjuntura, observa-se, no Gráfico1, que o rendimento real médio do trabalhador, entredezembro de 2004 e março de 2005, caiu de R$ 1.159,95para R$ 948,83.

Ainda se analisando o período de um ano, quecompreende março de 2004 a março de 2005, verifica--se que não houve qualquer acréscimo na renda realmédia, o que comprova uma estagnação em níveis derenda.

Em especial os jovens recém-chegados ao mercadode trabalho são os mais atingidos, por não encontraremalocação para a sua força de trabalho, o que implica queestes, em conjunção com o restante da massa dedesempregados, procurem formas alternativas de obteremseu sustento e o de suas famílias. Isso leva a que essecontingente de pessoas fora da produção, ou ligados àmesma precariamente, sejam os depositários doPrograma Bolsa-Família.

1 Série baseada na Pesquisa Nacional por Amostra deDomicílios (PNAD) do IBGE. É a proporção da renda apropriadapelos indivíduos pertencentes aos 10% mais ricos da distribuiçãode indivíduos segundo a renda domiciliar per capita.

2 Série baseada na Pesquisa Nacional por Amostra deDomicílios do IBGE. É a proporção da renda apropriada pelosindivíduos pertencentes aos 50% mais pobres da distribuiçãode indivíduos segundo a renda domiciliar per capita.

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5 - Apresentando o Relató- rio de Desenvolvimento do Mundo do Banco Mundial (WDR 2004)

Em suma, o relatório elaborado pelo Banco Mundialpara 2004 procura demonstrar, utilizando-se de amplosexemplos empíricos, como se dá atualmente o acessopor parte da população, em nível mundial, aos serviçosbásicos de responsabilidade do Estado, como saúde,educação, saneamento, eletricidade e água. Introduz otermo accountability como a solução principal dosproblemas atuais, o qual será apresentado posteriormente(World..., 2004). Mesmo sabendo ser o foco destetrabalho o Brasil, e mais especificamente o ProgramaBolsa-Família, não se podem deixar de lado asconclusões principais do Relatório, pois as mesmas sãototalmente factíveis na realidade brasileira.

Uma das principais conclusões desse relatório éque o crescimento econômico não necessariamente érevertido em benefício aos pobres, pois os gastos emsaúde e educação, assim como os gastos em geral,favorecem muito mais os ricos. Essas distorções sãoapontadas também pelas Metas do Milênio (World...,2004), as quais apontam que somente a pobreza "está acaminho" de diminuir, porém devido a um único país-

-potencial: a China. No que tange a esta última informação,cabe citar que tais dados demonstram-se "enganadores",pois 100 milhões de pessoas passaram a ganhar, apenas,mais de um dólar por dia (antes ganhavam menos deUS$ 1), o que não garante o atendimento, tampouco, àsnecessidades básicas das pessoas.

Os recursos não atingem, muitas vezes, a camadamais pobre da população por alguns fatores, conforme oRelatório:

- acesso longínquo à saúde e à educação (benefícioao rico), o que leva à exclusão ao serviço porfalta de condições de deslocamento da populaçãopobre;

- "patronagem" e "clientelismo" na prestação doserviço público;

- serviços disfuncionais (médicos não aceitam irpara locais onde há miséria);

- estrutura da prestação do serviço público disfun-cional (por exemplo, falta de hospitais públicos

em vilas, atendimento público centralizado emregiões centrais, distantes da periferia);

- distância social entre provedores e clientes;- baixo nível técnico dos prestadores do serviço

público; - falta de incentivo ao servidor público.Assim, o relatório apresenta como solução-chave

para o funcionamento do serviço público a relaçãointerativa entre policy makers, funcionalismo e população,que nada mais é do que a tradução correta do termo

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Gráfico 1

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Rendimento real médio efetivo das pessoas ocupadas no Brasil — set./01-mar./05

FONTE: www.bcb.gov.br Acesso em mar. 2005.

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accountability, ou seja, precisa haver uma comunicaçãointerativa entre esses agentes, assim como uma totalprestação de contas e uma avaliação acerca da qualidadedo serviço público (World..., 2004).

6 - Conclusões

Avaliando-se o Programa Bolsa-Família do GovernoFederal em conjunto com a leitura do WDR 2004, não hácomo deixar de evidenciar semelhanças. Existe uma totaldependência desse programa da interação entre o PoderCentral e as prefeituras municipais, na medida em que ocadastramento e a fiscalização são de inteira responsabi-lidade municipal. Assim sendo, coloca-se a seguinteproblemática: por que a eficácia do Programa vem sendoatualmente discutida pela imprensa e pela opinião públicae também porque não tem gerado ganhos reais de rendapara os trabalhadores?

Fica muito claro, pelos depoimentos dos funcioná-rios públicos, que existe uma falta de interação entre ospoderes, ou seja, uma total inexistência de accountability,até mesmo porque a população fica à margem dadiscussão, resignando-se à exclusão do Programa, o qualdeveria ser o mais abrangente possível. Ainda, muitasvezes, pessoas sem necessidade têm acesso aoPrograma, caracterizando uma ineficácia na distribuiçãodo gasto público.

Isso corrobora a opinião de Gough (1975), o qualenfatiza que os programas sociais de distribuição de rendanão têm como seu objeto a redução da desigualdadesocial e tampouco conseguem redistribuir renda, o quede fato se verifica na exposição gráfica colocada nestetrabalho, a qual comprova que o Programa não conseguiu,até hoje, atingir seu principal objetivo: distribuir renda.Ademais, o autor vê esses programas como uma amplia-ção da responsabilidade do Estado em relação aos custosda reprodução da força do trabalho, seja como formas decontrole, seja de diminuição dos graus explosivos de lutade classe (Gough, 1975).

Possíveis soluções para o aumento da eficácia doPrograma passam pela necessidade de que sejamouvidos os responsáveis pela "ponta" do Programa, istoé, aqueles que verificam, in loco, as distorções, no casoos agentes públicos lotados em prefeituras municipais.Abaixo, apontam-se algumas sugestões para a correçãodo rumo do Programa, porém reconhece-se que, paraque as mesmas tenham sucesso, deva existir umaabertura do poder público à avaliação da população, aqual sabe analisar as distorções e os problemas com osquais se depara diariamente:

- inclusão e conferência dos dados cadastrais emconjunto com o Censo do IBGE;

- inclusão de campos específicos na DeclaraçãoAnual de Isento da Secretaria da Receita Federal,que permitam verificar os dados constantes docadastro do Programa Bolsa-Família;

- campanha de conscientização da responsabilida-de social do cidadão;

- conscientização do poder público para a inibiçãode fraudes.

Ainda assim, reconhece-se que não bastam taissugestões para a resolução do problema, pois há, emmuitos casos, a necessidade de uma reestruturação daestrutura dos gastos públicos, o que não é permitido,muitas vezes, pela política macroeconômica adotada,como no caso brasileiro.

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Régis Rathmann

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Desigualdades sociais e espaciais na metrópole:...

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Desigualdades sociais e espaciais na metrópole:

um olhar sobre a Região Metropolitana

de Porto Alegre em 2000*

Rosetta Mammarella Mestre em Sociologia e Técnica da Fundação de Economia e Estatística.

Tanya M. de Barcellos Mestre em Sociologia e Técnica da Fundação de Economia e Estatística.

ResumoPartindo do pressuposto de que o trabalho tem papel estruturador nasociedade e tomando como base as informações sobre a populaçãoocupada levantadas no Censo Demográfico 2000, este texto apresentaum retrato da segmentação e da diversidade social do espaçometropolitano de Porto Alegre. A análise desenvolve-se a partir daconstrução de uma tipologia socioocupacional e da identificação dealgumas características básicas da população. A hipótese principal giraem torno da idéia de que está em curso uma tendência de segregaçãosocioespacial que se aprofunda nas grandes aglomerações urbanas, tendoem vista as transformações provocadas pela reestruturação econômica.

Palavras-chave: metropolização; diferenças sociais; estrutura

social.

AbstractThis paper presents a picture of the segmentation and social diversity inthe Metropolitan Area of Porto Alegre. It is based on the assumption thatlabor has a structuring role in society. Evidence was collected in theDemographic Census of the year 2000. The authors built asocial-occupational typology and it identifies a number of basiccharacteristics in the population. The main hypothesis is that a processof social and spatial segregation is under way and that this was deepenedin the most densely populated urban areas due to the transformationsprovoked by the economic restructuring.

Artigo recebido em 03 out. 2005.

* Este texto tem por base o trabalho apresentado no XXVCongresso da Associação Latino-Americana de Sociologia(ALAS), ocorrido em Porto Alegre, entre 22 e 26 de agosto de2005. Uma versão do trabalho enfocando basicamente osresultados da tipologia socioespacial e discutindo sua construçãometodológica foi encaminhada para publicação na revista

Cadernos Metrópole. Na discussão e na definição da tipologiada Região Metropolitana de Porto Alegre (RMPA), as autorascontaram com a participação da Arquiteta Mirian Regina Koch,membro da equipe responsável pela pesquisa na FEE. Asautoras agradecem a equipe do Núcleo de Estudos Regionais eUrbanos pelas sugestões e pelos comentários sobre o texto.

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Introdução

Este texto tem por finalidade apresentar um retratoda segmentação social do espaço metropolitano de PortoAlegre no ano 2000.1 Integrado ao Projeto Observatóriodas Metrópoles2, o estudo dá seqüência a análisesrealizadas sobre o tema com foco nos anos de 1980 e1991 (Mammarella; Barcellos; Koch, 2004). A partir daidentificação dos principais traços que marcam aconfiguração da metrópole gaúcha, permitida pelaconstrução de uma tipologia social de seus espaços,procura-se ressaltar sua diversidade, apontando algumascaracterísticas básicas das populações que vivemnessas áreas.

O cenário de referência para a abordagem é o quadrode mudanças que se instalou, a partir dos anos 70 e,com maior visibilidade, durante os 80, com areestruturação econômica, social e política nos âmbitosmundial, nacional e local. A hipótese principal que orientaa análise diz respeito à tendência de segregaçãosocioespacial que se avoluma nas grandes aglomeraçõesurbanas, tendo em vista essas profundas transformações.Em grande parte, isso se evidencia na opção crescentedos ricos e de parcelas das camadas médias pelaresidência em bairros cada vez mais elitizados e auto--suficientes e em “condomínios fechados”, promovendoum isolamento em relação ao resto da população.3 Poroutro lado, a moradia em áreas precárias, do ponto devista do acesso aos benefícios urbanos, aparece comoalternativa também sempre mais freqüente para ossegmentos que se situam na base da pirâmide social.4

A tipologia dos diferentes espaços que conformama Região foi elaborada com base em um trabalhoestatístico de correlação entre categoriassocioocupacionais (CATs), definidas a partir de umaclassificação das ocupações, e áreas de ponderação,

ou Áreas de Expansão dos Dados da Amostra (AEDs)5,que configuram a menor unidade espacial que o IBGEdisponibilizou para os resultados da amostra do CensoDemográfico 2000.6 O pressuposto nessa escolhametodológica é o de que o trabalho tem papel estruturadorna sociedade. Nessa perspectiva, as categorias foramconstruídas levando em consideração as grandesoposições que captam as formas de segmentação socialda sociedade brasileira e que se expressam na relaçãoentre as seguintes categorias: capital e trabalho; grandee pequeno capital; autonomia e subordinação; manual enão manual; controle e execução; Secundário e Terciário;moderno e tradicional (Ribeiro; Lago, 2000, p. 113-114).7

O texto foi organizado em duas partes, além destaIntrodução. Na primeira, são apresentados os resultadosda tipologia socioespacial, com ênfase na descrição doperfil sociourbano geral dos tipos; na segunda, é realizadauma análise das principais características da populaçãoresidente nas áreas dos diferentes tipos, utilizandoindicadores que dão conta de aspectos relativos àqualidade de vida: situação no trabalho, instrução, rendae infra-estrutura das moradias.

Sobre a estrutura ocupa-cional e socioespacial daRMPA

A tipologia socioespacial tem sustentação em umconjunto de categorias socioocupacionais, cuja

1 A tipologia trabalha a Região na sua formatação vigente em2000, o que introduz uma maior complexidade na expressão dourbano e em sua análise, uma vez que os municípios que foramincorporados à RMPA no período mais recente não têm perfiltipicamente urbano. A RMPA foi originalmente constituída com14 municípios, foi expandida para 22 municípios em 1989, apartir das mudanças na Constituição Estadual, e é atualmenteformada por 31 municípios. Existem ainda dois processos deinclusão tramitando na Assembléia Legislativa.

2 Disponível em: http://www.ippur.ufrj.br/observatorio3 Ver, por exemplo, Caldeira (1997), Andrade (2001), Ueda (2004)

e Bogus e Pasternak (2004).4 Sobre essas tendências do fenômeno metropolitano, ver Ribeiro

(2000).

5 As AEDs foram definidas como unidades geográficas formadaspor agrupamentos de setores censitários, visando à “(...)aplicação dos procedimentos de calibração das estimativas comas informações conhecidas para a população como um todo”. Otamanho dessas áreas em termos de número de domicílios e depopulação foi estabelecido com a finalidade de garantir a precisãodas estimativas. Para o Censo 2000, o IBGE usou métodos esistemas automáticos de formatação de áreas de ponderação,“(...) que conjugam critérios tais como tamanho, contigüidade(no sentido de serem constituídas por conjuntos de setoreslimítrofes com sentido geográfico) e homogeneidade em relaçãoa um conjunto de características populacionais e de infra--estrutura conhecidas” (IBGE, 2002).

6 Para os dados do universo, o IBGE disponibiliza as informaçõespor setores censitários.

7 As categorias socioocupacionais são construções feitas a partirda discussão entre pesquisadores franceses e brasileiros,visando a trabalhos comparativos sobre desigualdadessocioespaciais nas grandes metrópoles. Sobre asparticularidades que orientaram sua montagem, ver Ribeiro eLago (2000).

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construção se baseia em informações obtidas a partirdos dados de ocupação do Censo8. A intenção é obteruma visão aproximada da estrutura social e permitir umaleitura hierarquizada da composição social da RMPA.Entende-se que as categorias resultantes desse trabalhotraduzem, em grande medida, o lugar que as pessoasocupam nas relações econômicas, bem como adimensão simbólica desse lugar (Bourdieu, 1989). Comojá se mencionou, essa construção se sustenta empressupostos teóricos que concebem, de um lado, otrabalho como variável central para a compreensão dasociedade e, de outro, a noção de espaço social comopermitindo compreender as posições que os agentesocupam no espaço. A idéia implícita é a de que asociedade está estratificada em classes e que essa é adivisão fundamental para entender a hierarquia social(Barcellos; Mammarella, 2000).

O primeiro aspecto que ressalta na análise dadistribuição dos ocupados segundo as categoriassocioocupacionais, em 2000, é a importância dascategorias dos Trabalhadores do Setor Secundário e dasOcupações Médias, que têm participação quase igualna conformação da estrutura social metropolitana (27,7%e 26,5% respectivamente) (Anexo 1)9. Essa é umaconstatação importante, se forem considerados asgrandes mudanças verificadas na RMPA, entre 1991 e2000, no que diz respeito à sua espacialidade, com aincorporação de sete novos municípios, e os movimentosmais amplos da economia. Esses novos municípios,como se salientou antes, apresentam perfil nãopropriamente metropolitano, o que poderia interferir naconfiguração social da região.10 Com relação à estrutura

produtiva metropolitana, é importante ressaltar que, naúltima década, ela sofreu relevantes alterações, tendo--se reduzido, entre 1990 e 1998, a participação relativado setor industrial no conjunto do Produto Interno Bruto,com a contrapartida de um avanço do setor serviços. Jáno período que vai de 1999 a 2001, o setor industrialrecuperou posição na formação do produto. Ao mesmotempo, a indústria experimentou profundo processo deajuste (fusões, terceirização de serviços e introdução deinovações tecnológicas), acompanhando a reestruturaçãoprodutiva internacional e seus desdobramentos no País(Alonso, 2004). A estrutura social da Região, não obstantetal rearticulação, reflete a concentração industrial e aatratividade da RMPA para investimentos industriais.

É importante observar que tanto os trabalhadoresda indústria como as camadas médias participam comum peso significativo na estrutura social metropolitana(representam, em conjunto, mais de 54% dos ocupados).Esse fato contraria, de certo modo, a perspectiva postapor alguns estudiosos dos efeitos da globalização e dareestruturação sobre a evolução da estrutura social eseu correlato espacial, que identificam, nas grandesmetrópoles, a existência de um processo de polarizaçãosocial. Como resultado, o segmento dos operáriosexperimentaria rápida e forte redução, tendo em vista osavanços tecnológicos, e as camadas médias tenderiama ser reduzidas em função das novas formas dearticulação e inserção no mundo do trabalho. Essasanálises projetam uma hierarquia mais pesada nossegmentos profissionais muito especializados e, no seuoposto, uma massa de trabalhadores sem qualificação(Sassen, 1998). Na metrópole gaúcha, tal fenômeno nãofoi constatado. Os operários têm grande importância naconformação da estrutura da Região, o que deve sercreditado, em boa parte, ao tamanho do segmentocoureiro-calçadista, estabelecido especialmente no Valedo Sinos.

Considerando o tamanho das CATs que se situamnas extremidades da pirâmide social, ou seja, as relativasàs elites e às camadas populares (Anexo 1), verifica-seque a presença da elite Dirigentes no conjunto da estruturasocial da Região é muito reduzida (1,4%). A eliteIntelectuais, por sua vez, tem participação um poucomais expressiva (7,4%), mas ainda relativamentepequena, incluindo ocupações nem sempre bemremuneradas, como os professores com formação denível superior.11 No outro limite, os Trabalhadores do Setor

8 Na Documentação dos Microdados da Amostra do CensoDemográfico 2000, a ocupação está assim definida: “Entende--se por ocupação a função, cargo, profissão ou ofíciodesempenhado por uma pessoa numa atividade econômica,referindo-se sempre ao trabalho principal” (IBGE, 2002).

9 O Anexo 1 reúne as informações que dizem respeito à distribui-ção absoluta e relativa dos ocupados segundo os oito grandesconjuntos de categorias definidoras da estrutura socioocupa-cional e as 24 categorias em que eles se subdividem (primeira esegunda colunas), as quais são objeto de análise nesta parte dotexto. Inclui também a tipologia dos espaços metropolitano e seuperfil socioocupacional e a densidade das CATs em cada tipo.

10 No seu conjunto, esses municípios contribuem com 6% dosocupados nos 24 municípios que compunham a Região em1991. Levando em consideração a estrutura social apenasnesses sete municípios, tanto o peso dos agricultores como odos trabalhadores da indústria tradicional são, de fato, muitosignificativos (12,10% e 13,92% respectivamente). Mas, quandose considera a Região como um todo, essa particularidade édiluída.

11 No nível das representações sociais, os professores detêm umstatus que os situa entre as elites.

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Terciário Não Especializado apresentam umarepresentatividade um pouco maior (14,6%), e osagricultores, como é coerente com a configuraçãometropolitana, são minoritários (2,0%).12

Feitas essas primeiras considerações, devem-sedestacar algumas particularidades que dizem respeitoàs categorias de ocupações que integram e compõemcada um dos agrupamentos de CATs (Anexo 1). Noconjunto dos Trabalhadores do Setor Secundário, o maiorpeso é o dos operários da indústria tradicional (9,2%).Salientam-se, no que diz respeito às Ocupações Médias,as de escritório (9,1%), que reúnem um contingentebastante diversificado de atividades, em grande parte,tradicionais, como contínuos, escriturários, cobradores,secretários de expediente e estenógrafos. Também sãodignas de nota a importância dos trabalhadores nocomércio e a dos prestadores de serviços especializados,cada um participando com mais de 8% na estrutura social.

Essa estrutura social foi o componente fundamentalpara a elaboração da tipologia dos espaços, construídapara analisar a RMPA sob o enfoque da segmentaçãosocioespacial de seu território. A tipologia foi construídacom base nas técnicas estatísticas da Análise Fatorial eda Classificação Hierárquica Ascendente (CHA),considerando a relação entre CATs e AEDs.13 A análisefatorial mostra que os três primeiros fatores, queexpressam fundamentalmente a divisão entre trabalhomanual e intelectual, explicam 84,15% das variaçõestotais do conjunto original de dados.

O espaço fatorial no plano das CATs expõe essaoposição, mostrando, de um lado, a presença dostrabalhadores da indústria tradicional (em maior escala)e a dos agricultores. Em contraposição, estão ascategorias de profissionais de nível superior, junto comos grandes empregadores, estes últimos em menorescala.

Mais uma vez, esses resultados não coincidem comas perspectivas postas pela bibliografia sobre a global

city, que está vendo crescer, nas metrópoles globais, osreflexos espaciais de uma estrutura polarizada entre, deum lado, poucos trabalhadores muito qualificados e comaltos salários e, de outro, uma massa de mão-de-obracom inserção precária no mercado de trabalho, combaixíssimos rendimentos e sem qualificação. No casoda RMPA, o peso das ocupações da indústria tradicionalestá demarcando ainda fortemente a configuração doespaço metropolitano.

Conhecidas as principais oposições que configuramo espaço fatorial da RMPA, foi procedida a CHA, com ointuito de obter grupos de AEDs que mantivessem entresi o máximo de homogeneidade e de diferenciação emrelação às médias. Através da análise do perfil socialdos tipos, da distribuição das categorias nos tipos (querevela o grau de concentração social) e do índice dedensidade relativa, foi possível identificar noveagrupamentos capazes de representar a estruturação doespaço metropolitano em 2000. Esses grupos foramassim nomeados: superior, médio superior, médio,médio inferior, operário, operário tradicional, operárioinferior, popular e agrícola popular. Essa denominação,além de já expressar uma hierarquia social, procuratambém traduzir o tipo de combinação de categorias oude mistura social que marca de modo predominante cadaum desses espaços.

Como pode ser conferido no Anexo 1, em todos osespaços ocorre uma certa mistura social. No entanto, évisível que, em alguns, em especial naquelesclassificados no topo da hierarquia espacial, predominaum perfil mais homogêneo em termos sociais.14 A análiseda tipologia, descrita a seguir, tem como interessesubjacente a busca de elementos que permitam situar aquestão da segregação socioespacial na realidade dametrópole gaúcha e as especificidades por ela assumidas.

Examinando a composição dos tipos segundo operfil ocupacional e a densidade relativa, verifica-se queas áreas de tipo superior são aquelas onde estáconcentrada a moradia dos Dirigentes e dos Intelectuais,embora nelas também seja significativa a presença decamadas médias, representadas pelas OcupaçõesMédias e pelos Pequenos Empregadores. A participação12 Com a incorporação de sete novos municípios à RMPA após

1991, acreditava-se que haveria uma certa proeminência dessacategoria, tendo em vista as características socioeconômicasdesses municípios. No entanto, essa hipótese não se confirmou.

13 A primeira cria fatores pela ordem de explicação do problema,que é a relação entre as AEDs e as categoriassocioocupacionais. Com isso, permite a diminuição dadimensionalidade do universo com que se está trabalhando e oconhecimento da importância de cada variável na composiçãoda variação dos principais fatores. A segunda é um instrumentopara definir agrupamentos a partir das informações dos fatoresextraídos dos dados, levando em conta a proximidade dos perfisdas áreas e a sua distância em relação ao perfil médio.

14 Além do contingente absoluto e do perfil geral das CATs, o Anexo1 apresenta a distribuição percentual e a densidade dascategorias em cada um dos nove tipos que foram definidos noestudo. O primeiro indicador permite identificar qual o perfil socialde cada um dos tipos. A segunda medida, a da densidade, permiteinferir o grau de representação de cada categoria nos diferentestipos de área, sendo obtida pela divisão dos percentuais doperfil das CATs nos tipos pelos do perfil médio metropolitano.

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das categorias Dirigentes e Intelectuais nesses espaçosé cerca de quatro vezes maior do que suarepresentatividade no perfil médio da metrópole. Nas detipo médio superior, a moradia de Dirigentes eIntelectuais é igualmente expressiva, porém com menorintensidade do que no tipo superior. Nessas áreas, é muitodestacada a incidência de Ocupações Médias, que têmo maior peso na conformação do tipo, com umaparticipação de 41%. As camadas médias também sãoos elementos marcantes na estruturação do tipo médio,não obstante sua presença seja menos intensa do queno anterior (39%). A característica central do perfil dessestrês tipos de agrupamentos é a menor participação e amenor densidade relativa das camadas operárias epopulares.

Dando seqüência à análise do perfil dos tipos,constata-se que o grupo de tipo médio inferior jáapresenta maior mistura social. Ele se caracteriza comomoradia de uma parte relevante das Ocupações Médias(29,8%) e pela presença significativa dos Trabalhadoresdo Setor Terciário — especializado (20,5%) ou nãoespecializado (16,6%) — e do Setor Secundário (23,5%).É interessante ressaltar que apenas os trabalhadores doSetor Terciário e do Secundário representam, emconjunto, mais de 60% dos ocupados que conformam otipo. A partir desse patamar da hierarquia, a característicafundamental dos agrupamentos é a quase-inexistênciade moradia das categorias superiores (Dirigentes eIntelectuais). Tal evidência aponta uma separação dasclasses sociais no espaço, de tal modo que, embora amoradia de parcela das camadas médias se misture aosespaços de elites, fica demarcado um tipo desegmentação em relação às categorias operárias epopulares.

Os grupos de AEDs onde a residência de operáriosé muito expressiva foram classificados em três tipos: otipo operário, em que predominam trabalhadores doSecundário, em especial os trabalhadores da indústriamoderna (15,0%)15; o tipo operário tradicional, onde apresença dos trabalhadores da indústria tradicionalultrapassa os 32% e tem uma densidade relativa quasequatro vezes maior do que a média do tipo; e o tipo

operário inferior, onde os trabalhadores do SetorSecundário dividem moradia com categorias do SetorTerciário Especializado e Não Especializado. Emcomparação com o tipo operário tradicional, aheterogeneidade social é bem maior nos outros dois tiposoperários, onde é sempre mais relevante a presença deoutras categorias socioocupacionais. A relativahomogeneidade dos espaços da indústria tradicionalcorresponde, em grande parte, a áreas em que, de fato,está concentrada a moradia dos operários, mas que, emalguns casos, a AED, devido ao tamanho da população,foi formada pelo município inteiro, não possibilitando aexpressão de toda a estratificação social no exercíciotipológico. Ou seja, o tamanho das elites é muito pequenoe não pesa na configuração do tipo de área. No que dizrespeito aos demais espaços operários, aheterogeneidade abrange sobretudo categorias médiase populares, estas correspondendo aos trabalhadores doTerciário não especializado.

O grupo de tipo popular caracteriza-se pelapresença mais intensa, relativamente aos demaisagrupamentos, dos trabalhadores do Terciário nãoespecializado, com destaque para os empregadosdomésticos, que têm uma participação de 10,8% naestrutura socioocupacional. São áreas onde se verificamas maiores representatividade e densidade das camadaspopulares, embora sua participação seja menor que ados trabalhadores do Secundário. As categorias doTerciário não especializado juntam-se aos ocupados ematividades do Terciário especializado e do Secundário,nesse caso, salientando-se os operários da construçãocivil (12,3%).

O perfil do último grupo, do tipo agrícola popular,é marcado pela intensidade da moradia dos agricultores(19%), presença que significa uma densidade dessacategoria cerca de 10 vezes superior à representada namédia metropolitana. A formação desse agrupamentoestá fortemente relacionada com a presença, na RMPA,de municípios com perfil agrícola, em especial aquelesque foram incorporados após 1991.

Outro destaque, agora referente à concentração decategorias em alguns espaços da metrópole, faz-senecessário, porquanto ilustrativo da existência depolarização social na metrópole gaúcha. Trata-se, de umlado, da forte presença de Dirigentes e de Intelectuaisnos espaços de tipo superior e médio superior: 43% dosDirigentes e 52% dos Intelectuais vivem em áreas dessesdois tipos. De outro, na outra ponta da hierarquia, observa--se que mais de 56% da moradia dos operários daindústria tradicional se situa em áreas que conformam otipo operário tradicional, sendo que, no caso dos

15 Apesar de a categoria dos trabalhados da indústria moderna serpredominante na conformação desse tipo, optou-se por nãoqualificá-lo como “moderno”, porque também se verifica umapresença importante dos trabalhadores dos serviços auxiliaresà indústria e dos da construção civil, ao contrário, por exemplo,do tipo operário tradicional, em que os trabalhadores da indústriatradicional são efetivamente definidores do tipo.

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agricultores, suas residências no tipo agrícola popular éda ordem de 46%. Com isso, pode-se dizer que, emboraos espaços sejam bastante heterogêneos, existepolarização naqueles caracterizados como superiores,de tipo operário tradicional e agrícola popular(Mammarella, 2005).

Sobre as diferenciaçõessociais dos espaçosmetropolitanos

Complementando essas análises, será efetuada, aseguir, a localização dos tipos no território da RMPA,conforme o Mapa 1 e a listagem dos Anexos 2 e 3, ondese encontram a distribuição das AEDs por município e acorrespondência destas em relação a bairros e municípiosda região.16 Com isso, estão-se abrindo caminhos parafazer uma incursão na temática da expansão imobiliáriana Metrópole. Ao mesmo tempo, a tipologia seráqualificada do ponto de vista da infra-estrutura urbana edas principais características demográficas e sociais desuas populações, de modo a traçar um quadro dasegmentação social que se evidencia na região. Asinformações sobre as principais característicasdemográficas e sociais dos tipos estão contidas nasTabelas 1, 2 e 3 e nos Gráficos 1, 2 e 3 e orientarão asanálises a partir deste momento.

O tipo superior é composto por nove AEDs, todasde Porto Alegre (Anexo 3). Uma parte dessas áreaslocaliza-se na zona sul, e outra, na zona central doMunicípio. Na zona sul, as AEDs representativas são asque abrangem dois conjuntos de bairros: Vila Assunção,Tristeza e Vila Conceição; Pedra Redonda, Ipanema,Espírito Santo e Guarujá. As AEDs centrais congregamum conjunto de bairros onde se identificamcaracterísticas diversificadas de ocupação. Em alguns,está consolidada a moradia das elites locais(Independência, Moinhos de Vento, Auxiliadora); emoutros, verificou-se, e ainda está em curso, importantetransformação por conta da expansão imobiliária (BelaVista, Boa Vista, Três Figueiras, Mont´Serrat, Chácara

das Pedras, Higienópolis, Rio Branco, Santa Cecília,Petrópolis)17 — Mapa 1.

Examinando inicialmente o perfil demográfico dapopulação residente nesse tipo de área, verifica-se apresença de uma estrutura marcada pelas seguintescaracterísticas: índices elevados de pessoas nas faixasde idade entre 45 e 64 anos e acima de 65 anos(Tabela 1) — os mais significativos, tendo em vista osoutros tipos —, juntamente com os menores percentuaisde crianças; preponderância de mulheres, numaproporção que é a segunda mais elevada (para cada 100mulheres há 82,56 homens); e predomínio de populaçãobranca, que tem a maior participação em relação a todosos tipos — quase 93,35% dos residentes no tipo(Tabela 2).

Em relação à situação social, encontram-se, nessasáreas, as maiores proporções de pessoas com instruçãouniversitária (31,32%), como mostra o Gráfico 1, e comaltos rendimentos (19,14% recebem entre 10 e 20 saláriosmínimos (SMs), e 21,20% têm rendimentos superiores a20 salários mínimos, conforme o Gráfico 2). A distânciaque separa a população do tipo superior daquelas menosprivilegiadas pode ser vista nas taxas médias de instruçãoe de rendimento (Tabela 2). Nesse sentido, verifica-seque a população do tipo superior alcança o dobro de anosde estudo da média da das áreas de tipo popular e emtorno de cinco vezes a sua renda média. Quanto à posiçãona ocupação (Tabela 3), que mostra o modo de inserçãono mercado de trabalho, a partir da qual se podem extrairdados sobre a qualidade da ocupação, contata-se que,nesse tipo, os empregadores têm uma participaçãorelativa alta (10,93%), bastante mais elevada que a média(3,96%); o percentual dos empregados sem carteira nãoé pequeno (20,74%), sendo inclusive maior que o damédia da região. Mas, nesse caso, deve-se levar em contaque os funcionários públicos e os militares têm um pesomuito significativo no conjunto dos qualificados comosem carteira. Os trabalhadores domésticos com e semcarteira chegam a quase 5% na distribuição dos ocupadossegundo a posição na ocupação, revelando uma situaçãoem que moradia e emprego provavelmente coincidem. Éainda nesse tipo que se pode observar o maior índice decobertura em termos de saneamento (Gráfico 3).

16 As AEDs, fora as do Município de Porto Alegre, não respeitam otraçado dos bairros, portanto, a identificação representa partesde diferenciados bairros. Mesmo em Porto Alegre, uma AEDpode congregar mais de um bairro. Por isso, é preciso esclarecerque a denominação dada às AEDs pretende ser, acima de tudo,uma referência para o reconhecimento das áreas.

17 Porém esses processos de expansão imobiliária não atingiramde maneira homogênea os diferentes bairros. Pode-semencionar, por exemplo, a AED que reúne os bairros TrêsFigueiras, Chácara da Pedras e Vila Jardim, onde se encontrauma situação de polarização social, uma vez que nele convivemcamadas Dirigentes com parcela importante de camadaspopulares.

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O tipo médio superior é formado por 15 AEDs, sendoque apenas quatro delas pertencem à Capital: duas sãode Canoas, e duas, de São Leopoldo. Nesses casos,estão abrangidos os bairros centrais. Na capital, por suavez, referem-se a bairros que estão no entorno dos detipo superior, tais como Centro, Cidade Baixa, Santana,Menino Deus, Teresópolis, Cavalhada (Anexo 3).

Um percentual elevado da população que conformaesse tipo, de modo similar ao que se verifica no tiposuperior, recai nas faixas etárias entre 45 e 64 anos(22,18%) e mais de 65 anos (11,40%), com presençareduzida de crianças com até 9 anos de idade (10,97%)e de crianças e adolescentes com idade entre 10 e 14anos (6,43%). Há predominância feminina e de populaçãode cor branca, sendo que 32,15% da população do tipotêm nível universitário incompleto (de 11 a 14 anos deestudo), e apenas 18,96% concluíram o ensino superior.Tal percentual é significativamente menor do que overificado no tipo superior, mas representa uma situaçãobem mais favorável do que a da média da região. Orendimento médio é de 6,79 salários mínimos,praticamente a metade do que foi encontrado para apopulação nas áreas de tipo superior. Em termos dedistribuição dos rendimentos, chama atenção que, nessetipo, a proporção de pessoas na faixa superior derendimentos (mais de 20 SMs) cai significativamente emrelação ao tipo superior, não alcançando 10%. Em termosda distribuição da população segundo a posição naocupação, destaca-se que se encontra a maior proporção,dentre todos os tipos, de empregados sem carteiraassinada (24,12%), novamente mostrando a importânciade funcionários públicos e militares na configuração dasáreas melhor situadas na hierarquia socioespacial daregião. Tal como no tipo superior, as áreas do tipo médiosuperior têm baixa proporção de população em domicílioscom saneamento inadequado (1,59%).

O tipo médio é composto por 13 AEDs. Destas,como pode ser visto no Anexo 3, oito estão localizadasem Porto Alegre, também no entorno da zona centraldos bairros de tipo superior e aproximando-se da zonasul (Jardim Lindóia, Floresta, São João, Navegantes,Cristal, dentre outros). As outras cinco AEDs desse tipoestão assim situadas (total ou parcialmente): uma nocentro de Esteio, uma na região do OrçamentoParticipativo Centro de Gravataí e três em NovoHamburgo, sendo uma delas o Centro. Mais uma vez,observa-se que as áreas melhor situadas em termossociais, quando localizadas em outros municípios quenão a Capital, são, na sua maioria, centrais.

Também no tipo médio, há uma presença importantede população madura (de 45 a 64 anos) e idosa (mais de

65 anos), com números que se situam acima da médiada região. Ainda como nos agrupamentos anteriores, issoé acompanhado por uma baixa incidência de crianças,indicando que são áreas onde o ciclo familiar e de vidade uma parte relevante das pessoas está em uma fasejá avançada (Cecconi, 2004); a presença de homens faceà de mulheres é mais significativa do que nos dois tiposanteriores (86,11 homens para 100 mulheres), e 92,80%da população são de cor branca. Quanto à média de anosde estudo, não há grande diferença em relação ao tipomédio superior, e, em termos de rendimento médio, osocupados recebem em torno de um salário mínimo amenos do que no tipo anterior. O grupo apresentaproporção de trabalhadores sem carteira assinada abaixoda média metropolitana, e, nele, os empregadores têmmaior significado do que no tipo médio superior, o quesurpreende, pois essa categoria, em tese, estariaenquadrada nas elites. A incidência de condiçõesinadequadas de saneamento sofre um aumentoconsiderável nesse agrupamento (4,20%), mas é nostipos subseqüentes ao médio que a proporção depopulação com saneamento inadequado passa a ser maissignificativa.

No tipo médio inferior, há 37 AEDs, e é nele quecomeça a ser percebida uma maior mistura social.Também a partir desse grupo, passa-se a verificar umapredominância de áreas localizadas fora da Capital.Chama atenção que a maior parte dessas áreas seconcentra nos municípios do entorno imediato de PortoAlegre e no sentido do eixo da BR-116 (Guaíba, Alvorada,Cachoeirinha, Canoas, Gravataí, Viamão, Esteio,Sapucaia do Sul, São Leopoldo e Novo Hamburgo), emgrande parte, também circundando áreas de tiposhierarquicamente superiores. Em Porto Alegre, são, namaioria, bairros situados na periferia da cidade — comoBelém Novo, Passo das Pedras, Vila Nova e Serraria,por onde se expande a urbanização —, outros maispopulares — como Sarandi e Rubem Berta — e algunstipicamente de classe média — como Glória eMedianeira.18

Esse conjunto de áreas demarca um diferencial,em termos sociais, entre os tipos superiores e inferioresda hierarquia que foi construída. Destacam-se o baixopercentual de população com 65 anos e mais (5,98%) eo percentual de crianças de zero a nove anos (17,46%)na média metropolitana. A razão de masculinidade é maiordo que nos tipos anteriores (para cada 100 mulheres, há

18 Em alguns desses bairros, estão ocorrendo importantesprocessos de investimentos do setor imobiliário.

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92,75 homens), e o percentual de negros e pardos éelevado (17,64%), sendo a segunda maior concentraçãodentre os tipos de áreas. A média de anos de estudo dapopulação é de 6,09 anos, ficando em 32,99% a parcelados que não chegaram a completar a oitava série. Nessetipo, já começa a ser pouco relevante o percentual depopulação que completa o ciclo universitário (só 4,14%).Em termos médios, o rendimento nesse agrupamento éde três SMs, inferior à média da RMPA, que é de 3,65SMs. Quando se analisa a distribuição da população porfaixas de renda, percebe-se que o tipo médio inferiorobedece à mesma lógica que o torna demarcador dodiferencial social: mais de 15% da população ganhamaté um salário mínimo, e só 8,43% têm renda superior a10 SMs. Com relação ao modo de inserção na ocupação,destaca-se que a mudança de patamar em relação aostipos anteriores dá-se em dois aspectos: no peso dosempregados domésticos, tanto aqueles com carteiracomo os sem carteira assinada, que aqui já ultrapassa amédia da região, e na importância dos empregadores,cuja participação se reduz para apenas 3,30%. As baixascondições de saneamento também começam a sermotivo de grande preocupação: mais de 86 mil pessoas(9,24%) convivem com situações inadequadas.

Os tipos operário (13 áreas), operário tradicional (25áreas) e operário inferior (13 áreas) não contemplamnenhuma AED de Porto Alegre. Aliás, o tipo operáriotradicional concentra as AEDs localizadasexclusivamente na região da produção calçadista, àexceção de uma referente à área urbana de Santo Antônioda Patrulha. Nos demais tipos, predominam (mas nãocom exclusividade) AEDs localizadas em municípioslimítrofes a Porto Alegre, como Canoas, Gravataí, Esteio,Alvorada, Cachoeirinha, Guaíba.

Em termos gerais, o perfil demográfico dos tiposoperários é semelhante. A razão de masculinidadeaproxima-se da paridade entre homens e mulheres,particularmente nos tipos operário e operário tradicional.A distribuição etária é mais carregada nas faixas menoresde idade, com percentuais inferiores tanto à média comoà distribuição encontrada nos tipos que lhes antecedem(em torno de 19% da população têm até 9 anos de idade),com a contrapartida de uma menor participação dosidosos (em torno de 4%). O tipo operário tradicional expõe,considerando os demais tipos, o mais elevado percentualde população na faixa de maior atividade, que vai dos 25aos 44 anos (33,16%). Quanto ao perfil de cor, ressalta abaixa participação de negros e pardos nos tipos operários,sempre abaixo da média (variando entre 8% e 12%,quando ela é de 13,5% na RMPA). No tipo operáriotradicional, a participação de negros e pardos ocupa a

terceira menor posição dentre todos os agrupamentos,sendo apenas precedida pelos superior e médio. Talsituação pode estar relacionada com a forte influênciada imigração européia (em especial a alemã) na regiãoonde as áreas desse tipo se localizam.

A situação social dos moradores das áreas dostipos operário, operário tradicional e operário inferior ébastante próxima. Com uma média de anos de estudoque fica ao redor dos cinco anos e de rendimentos umpouco acima de dois salários mínimos, a populaçãodessas áreas concentra-se em faixas de instrução maisbaixas, sempre com valores acima da médiametropolitana. Em termos de escolaridade, o maiorpercentual está na faixa que equivale ao fundamentalincompleto, especialmente no tipo operário tradicional,onde 44,22% da população acima de cinco anos de idadenão completaram esse ciclo. Nessas áreas (assim comonos tipos popular e agrícola popular,) a parcela daspessoas que chegou a concluir o nível universitário équase 20 vezes inferior à do tipo superior. Em relaçãoaos níveis de rendimento, ressalta a elevada participação,no tipo operário tradicional, de ocupados na faixa de umaté dois salários mínimos (35,96%). Nos outros tiposoperários, a concentração fica na faixa de dois a cincoSMs (em torno de 36%). Além disso, em todos os gruposoperários, é significativo, e sempre acima da média daregião (15,41%), o percentual de ocupados que ganhamaté um salário mínimo. É interessante observar, por outrolado, que nos tipos operários estão as maiores proporçõesde empregados com carteira assinada, o que é aindamais relevante no operário tradicional, onde essa situaçãoatinge 55,62%. Esse nível de formalização do trabalho,juntamente com a concentração dos rendimentos na faixaentre um e dois salários mínimos, aponta uma dascaracterísticas do trabalho industrial tradicional,predominante nessas áreas. Finalmente, o patamar quedefine a população desprotegida em termos desaneamento adequado atinge mais de 100.000 pessoas,considerando-se os três tipos operários (31,42%).

Examinando as áreas de tipo popular (30 AEDs),observa-se que sua característica principal é nãoaparecerem na região da produção coureiro-calçadista,nem nos últimos municípios incorporados à RMPA.Concentram-se na periferia leste-sul de Porto Alegre, emmunicípios do seu entorno e em outros espaços comalta densidade de população urbana e/ou significativaconcentração de atividades econômicas (Canoas,Gravataí, Guaíba, Eldorado do Sul, Cachoeirinha,Alvorada e Viamão).

No perfil demográfico dessas áreas, é importanteressaltar o peso que têm as crianças com até nove anos

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de idade (21,84%) e a alta participação de negros epardos (20,34%), índices estes mais elevados,considerando-se todos os tipos.

Do ponto de vista social, algumas evidênciaschamam atenção, sinalizando aspectos indicativos dosdiferenciais de nível de vida existentes na metrópole. Apopulação no tipo popular tem a mais baixa média deanos de estudo (4,79) e uma proporção de pessoas seminstrução que é a segunda mais elevada entre os tipos(12,78%). O rendimento médio é o mais baixo também,levando-se em conta todos os outros tipos (menos dedois SMs) e, como não poderia deixar de ser, a parcelada população com rendimentos elevados, acima de 10SMs, é também a menor (3,30%). Em relação à inserçãono trabalho, é nesse agrupamento que o trabalhodoméstico tem o maior significado, seja com ou semcarteira assinada. Cerca de 11% dos ocupados no tiposão trabalhadores domésticos, enquanto essa cifra nãoatinge 7% na média metropolitana. É interessanteobservar que também é representativa a presença detrabalhadores por conta própria no tipo popular (22,55%),completando o quadro de precariedade no trabalho. Altospercentuais também se verificam, com igual e até maiorintensidade, nos tipos superior, médio superior e médio,onde, porém, essa condição não está ligada a situaçõesde fragilidade da inserção no mercado de trabalho.

Quanto às condições de saneamento, a populaçãodas áreas de tipo popular só se encontra em situaçãomais favorável do que a dos moradores das áreas detipo agrícola popular, onde é baixo o índice deurbanização. São praticamente 130.000 pessoas quemoram em domicílios onde o saneamento é inadequado(18,51% da população dessas áreas).

As nove áreas de tipo agrícola popularcompreendem as AEDs-Municípios de Arroio dos Ratos,Glorinha, Montenegro, São Jerônimo e Triunfo, além daAED rural de Santo Antônio da Patrulha e os distritos deGravataí. Além dessas, são desse tipo duas AEDs deViamão, correspondendo às regiões de Águas Claras,Espigão e Itapuã. Sua localização coincide, em grandeparte, com os novos municípios incorporados à RMPAapós 1991, sendo dotados de grande extensão territorial.

Em termos demográficos, destaca-se que é apenasnesse tipo que a proporção de homens supera a demulheres. Na distribuição etária, chama atenção que aproporção de população na faixa mais ativa (25 a 44 anos)seja a menor (29,47%) dentre todos os tipos e que aparticipação dos maduros e dos idosos seja levementesuperior à média metropolitana, revelando, dessa forma,possíveis efeito de processos de emigração. A proporção

de negros e pardos está entre as quatro menores dentretodos os tipos.

O perfil social dessas áreas não se distingue muitodaquele das áreas de tipo popular. O maior diferencialem relação à instrução e aos níveis de rendimento estána proporção de pessoas que concluíram o cursouniversitário e que recebem mais de 10 SMs. A instruçãoe os níveis de rendimento são significativamente maisaltos, embora estejam bem abaixo da médiametropolitana, configurando situações que devem seratribuídas à própria delimitação das AEDs que abrangemmunicípios inteiros, cuja diversidade social não pode sercaptada em função do tamanho da população. Odiferencial desse tipo quanto ao modo de inserção notrabalho é a existência de alguma representatividade,quando se trata de pessoas que trabalham semremuneração em ajuda a membros do domicílio (4,15%)e em atividades para o próprio consumo (2,80%),situações típicas da produção agrícola. Nessas áreas,também é significativa, quase na mesma intensidade queno tipo popular, a participação de empregadosdomésticos, seja com ou sem arteira assinada, atingindoquase 10% dos ocupados. Quanto às condições desaneamento, é no tipo agrícola popular que se encontrao maior índice de população em domicílios comsaneamento inadequado (31,96%), embora, em termosabsolutos (57.000), não alcance os números das áreasde tipo popular.

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Considerações finais

A análise das desigualdades sociais que seexpressam na configuração espacial da metrópolegaúcha enseja alguns comentários finais, onde sepretende destacar os principais resultados alcançados edemarcar uma agenda para novos estudos.

No que diz respeito à estrutura social metropolitana,é interessante apontar que seu formato, fortementeinfluenciado pela importância dos operários, com grandepeso dos trabalhadores da indústria tradicional, aindaexpressa uma conformação típica da sociedade industrialem sua fase fordista. A presença significativa dascamadas médias reforça esse caráter. Essascaracterísticas não correspondem à imagem que, parauma parte da literatura internacional, ilustraria o modeloda sociedade atual, que é da ampulheta, com

estreitamento do meio (operariado e categorias médias)e alargamento das extremidades (elites e subproletariado).

Quanto à configuração tipológica da estruturasocioespacial, o primeiro registro que merece ser feito éo da existência de uma demarcação do espaço, pelapresença, de um lado, dos operários da indústriatradicional e, de outro, dos profissionais de nível superior,equivalente à oposição entre trabalho manual e intelectual.Esse fenômeno expressa-se em uma relativa polarizaçãoque se verifica nas áreas de tipo superior, localizadasexclusivamente em Porto Alegre, onde as elites estãoconcentradas, e nas áreas de tipo operário tradicional,situadas ao norte da região, no espaço de influência dosMunicípios de Novo Hamburgo e São Leopoldo, onde aprodução coureiro-calçadista é predominante.

Em segundo lugar, é interessante assinalar que,mesmo sendo fundamentais na caracterização dos tipos

Mapa 1

FONTE: IBGE. Censo Demográfico 2000: dados da amostra. Rio de Janeiro: IBGE, 2002. MALHA de setores censitários do Censo Demográfico 2000. (Cedida pela METROPLAN, versão revisada, tendo

como fonte o Atlas Social da Região Metropolitana de Porto Alegre. Dados primários do IBGE.)

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superior, médio superior e médio, as Ocupações Médiasnão se constituíram em fatores determinantes na suadefinição, uma vez que elas se distribuem porpraticamente todo o espaço metropolitano. Essa maneirade localização extensiva pelo território, em especial nosespaços mais urbanizados, suscita algumas indagaçõesque merecem aprofundamento: existe algumadiferenciação na distribuição espacial, na metrópole, dasocupações que conformam as Ocupações Médias? Seráque são as mesmas que se fazem presentes em todosos espaços? Quais são as parcelas das camadas médiasque estão nos espaços superiores? Quais são as quedividem os espaços com as classes populares?

A abordagem do perfil demográfico e social dapopulação, considerando a diferenciação dessascondições entre os tipos, permitiu, antes de tudo,identificar-se uma grande distância separando o tiposuperior dos demais. Há situações, como, por exemplo,na renda e na instrução, em que a diferença entre opercentual de ocupados nas melhores situações é cercade duas vezes maior no tipo superior do que o encontradono tipo médio superior. Um segundo patamar demarca

as diferenças entre os tipos médio superior e médio e asáreas dos tipos médio inferior, operários e populares. Otipo popular, por exemplo, apresenta proporção depessoas com nível universitário cerca de 13 vezes menordo que o tipo médio e rendimentos na faixa de mais de20 SMs em proporção sete vezes inferior.

Em síntese, pode-se afirmar que existe umacorrespondência entre a hierarquia socioespacial e o perfilsocial predominante das populações que vivem nosdiferentes tipos de áreas da Região Metropolitana dePorto Alegre.

Diante dessas constatações, a primeira leitura datipologia socioespacial aqui realizada deixa em abertoum leque de possibilidades analíticas para um avançodo conhecimento sobre a diferenciação social e espacialda RMPA. Permanece como agenda para próximasinvestigações a análise da evolução da estruturasocioespacial e do comportamento do setor imobiliário ede seu papel na estruturação do espaço metropolitano,em especial no que diz respeito às novas formas desegregação representadas pela moradia em condomíniosfechados.

Tabela 1

Distribuição da população, segundo faixas de idade e tipos de áreas, na RMPA — 2000 (%)

TIPOS DE 0 ATÉ 9 ANOS

DE 10 ATÉ 14 ANOS

DE 15 ATÉ 24 ANOS

DE 25 ATÉ 44 ANOS

DE 45 ATÉ 64 ANOS

65 ANOS OU MAIS TOTAL

Superior ........................ 9,92 6,21 17,73 30,53 23,84 11,77 100,00 Médio superior .............. 10,97 6,43 17,46 31,56 22,18 11,40 100,00 Médio ............................ 12,30 7,21 17,47 31,53 21,76 9,74 100,00 Médio inferior ................ 17,46 8,87 18,81 30,80 18,08 5,98 100,00 Operário ........................ 18,62 9,40 19,30 31,78 16,78 4,12 100,00 Operário tradicional ...... 19,14 9,38 18,61 33,16 15,03 4,68 100,00 Operário inferior ........... 19,41 9,73 19,03 31,09 16,38 4,36 100,00 Popular ......................... 21,84 9,98 19,02 30,12 14,92 4,12 100,00 Agrícola popular ........... 17,71 8,96 17,34 29,47 18,98 7,55 100,00 Total ............................. 17,42 8,78 18,53 31,13 17,81 6,34 100,00

FONTE DOS DADOS BRUTOS: IBGE. Censo Demográfico 2000: dados da amostra. Rio de Janeiro: IBGE, 2002.

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Tabela 3

Distribuição da população, por modo de inserção no trabalho e tipos, na RMPA — 2000

TIPOS TRABALHADORES

DOMÉSTICOS COM CARTEIRA

TRABALHADORES DOMÉSTICOS

SEM CARTEIRA

EMPREGADOS COM CARTEIRA

EMPREGADOS SEM CARTEIRA EMPREGADOR

Agrícola popular ..... 4,61 5,12 35,92 19,58 2,78 Popular ................... 5,52 5,24 45,44 18,32 1,33 Operário inferior ...... 3,17 4,40 48,99 18,64 2,32 Operário tradicional 2,23 2,33 55,62 18,26 3,61 Operário .................. 2,62 3,57 50,63 18,35 2,24 Médio inferior .......... 3,92 3,40 45,97 19,49 3,30 Médio ...................... 1,58 1,38 45,23 18,82 8,19 Médio superior ........ 1,77 1,53 42,21 24,12 5,79 Superior .................. 3,43 1,51 37,22 20,74 10,9 Média da RMPA ...... 3,40 3,25 46,41 19,49 3,96

TIPOS CONTA- -PRÓPRIA

APRENDIZ OU ESTAGIÁRIO

SEM REMUNERAÇÃO

NÃO REMUNERADO EM AJUDA

A MEMBRO DO DOMICÍLIO

TRABALHADOR NA PRODUÇÃO

PARA O PRÓPRIO CONSUMO

TOTAL

Agrícola popular ..... 24,73 0,30 4,15 2,80 100,00 Popular ................... 22,55 0,36 1,02 0,22 100,00 Operário inferior ..... 21,14 0,38 0,84 0,11 100,00 Operário tradicional 16,29 0,21 0,82 0,64 100,00 Operário ................. 21,07 0,34 0,93 0,25 100,00 Médio inferior ......... 22,50 0,40 0,93 0,10 100,00 Médio ..................... 23,03 0,76 0,90 0,10 100,00 Médio superior ....... 22,67 0,97 0,90 0,04 100,00 Superior ................. 23,86 1,52 0,75 0,04 100,00 Média da RMPA ..... 21,59 0,51 1,06 0,33 100,00

FONTE DOS DADOS BRUTOS: IBGE. Censo Demográfico 2000: dados da amostra. Rio de Janeiro: IBGE, 2002.

Tabela 2

Indicadores selecionados, segundo os tipos de áreas, na RMPA — 2000

COR (%) TIPOS RAZÃO DE

MASCULINIDADE Brancos Negros e Pardos

ANOS DE ESTUDO

RENDA (SMs)

Superior ...................................... 82,56 93,35 6,26 10,04 11,45 Médio superior ........................... 81,88 89,35 10,11 8,82 6,79 Médio ......................................... 86,11 92,80 6,85 8,14 5,65 Médio inferior ............................. 92,75 81,74 17,64 6,09 3,00 Operário ..................................... 99,83 89,51 10,11 5,34 2,20 Operário tradicional .................... 99,33 91,44 8,27 4,94 2,44 Operário inferior ......................... 96,41 87,37 12,27 5,20 2,10 Popular ....................................... 97,32 79,01 20,34 4,79 1,89 Agrícola popular ......................... 101,87 89,68 9,68 4,90 2,33 Total ........................................... 93,57 86,02 13,47 6,11 3,65

FONTE DOS DADOS BRUTOS: IBGE. Censo Demográfico 2000: dados da amostra. Rio de Janeiro: IBGE, 2002.

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12,78

10,61

10,78

10,91

9,52

5,73

5,31

4,14

9,69

19,48

16,98

17,53

15,85

14,09

9,01

7,90

6,35

14,54

38,91

39,69

39,30

44,22

38,50

32,99

23,34

19,63

34,01

17,53

14,94

19,39

19,24

17,48

16,06

13,16

11,42

10,92

13,48

10,80

13,76

30,49

2,47

0,96

1,19

1,73

1,59

4,14

13,95

18,96

13,18

18,11

15,51

14,53

18,45

17,24

32,15

29,51

18,09

20,03

31,32

6,43

- 5,00 10,00 15,00 20,00 25,00 30,00 35,00 40,00 45,00 50,00

Agrícola popular

Popular

Operário inferior

Operário tradicional

Operário

Médio inferior

Médio

Médio superior

Superior

Média da RMPA

Sem instrução Básico incompleto

Fundamental incompleto Médio incompleto

Superior incompleto Superior completo

0

Distribuição da população de cinco anos e mais, por anos de estudo e segundo os tipos, na RMPA — 2000

Gráfico 1

(%)

FONTE: IBGE. Censo Demográfico 2000: dados da amostra. Rio de Janeiro: IBGE, 2002.

Legenda:

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Distribuição da população total, segundo as faixas de rendimento e os tipos, na RMPA — 2000

8,87

35,96

14,24

25,23

35,31

35,72

31,99

36,83

34,19

28,55

31,84

13,40

13,49

17,47

15,96

3,38

3,42

3,96

6,23

16,71

7,38

0,82

0,99

2,20

9,30

4,18

18,36

19,66

15,41

6,97

9,69

15,26

17,59

27,13

16,77

28,32

30,89

11,16

17,03

24,65

27,13

27,9828,24

21,47

26,43

10,60

23,76

24,45

20,06

11,10

10,82

13,51

19,14

3,69

2,51

7,47

21,20

1,87

0,79

1,25

- 5,00 10,00 15,00 20,00 25,00 30,00 35,00 40,00

Agrícola popular

Popular

Operário inferior

Operário tradicional

Operário

Médio inferior

Médio

Médio superior

Superior

Média da RMPA

Até 1 SM De 1 até 2 SMs De 2 até 5 SMs

De 5 até 10 SMs De 10 até 20 SMs Mais de 20 SMs

Gráfico 2

FONTE: IBGE. Censo Demográfico 2000: dados da amostra. Rio de Janeiro: IBGE, 2002.

0

(%)

Legenda:

Desigualdades sociais e espaciais na metrópole:...

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151

31,96

18,51

8,61

11,49

11,32

9,24

4,20

1,59

0,88

11,02

68,04

81,49

91,39

88,51

88,68

90,76

95,80

98,41

99,12

88,98

- 20,00 40,00 60,00 80,00 100,00 120,00

Agrícola popular

Popular

Operário inferior

Operário tradicional

Operário

Médio inferior

Médio

Médio superior

Superior

Média da RMPA

População com saneamento adequado

População com saneamento inadequado

(%)

Legenda:

FONTE: IBGE. Censo Demográfico 2000: dados da amostra. Rio de Janeiro: IBGE, 2002.

Distribuição da população, segundo as condições de saneamento e tipos, na RMPA — 2000

Gráfico 3

0

Rosetta Mammarella; Tanya M. de Barcellos

Indic. Econ. FEE, Porto Alegre, v. 33, n. 3, p. 137-162, dez. 2005

152

Perfil e índice de densidade relativa das categorias socioocupacionais, segundo os tipos de áreas,

na Região Metropolitana de Porto Alegre — 2000

a) RMPA, superior, médio superior, médio e médio inferior

RMPA SUPERIOR MÉDIO SUPERIOR

MÉDIO MÉDIO INFERIOR

CATs

Freqüência Perfil (%)

Densidade Perfil (%)

Densidade Perfil (%)

Densidade Perfil (%)

Densidade Perfil (%)

Densidade

Dirigentes ................. 21 742 1,4 1,0 5,0 3,6 2,5 1,8 2,7 1,9 1,0 0,7

CAT 21 - grandes em-pregadores ................ 12 228 0,8 1,0 3,2 4,1 1,2 1,5 1,8 2,4 0,5 0,7

CAT 22 - dirigentes do setor público .............. 4 355 0,3 1,0 0,8 2,9 0,8 2,8 0,2 0,9 0,2 0,7

CAT 23 - dirigentes do setor privado .............. 5 159 0,3 1,0 1,0 3,1 0,6 1,8 0,6 1,7 0,3 0,8

Intelectuais ............... 115 979 7,4 1,0 27,7 3,7 19,3 2,6 13,7 1,8 5,3 0,7

CAT 41 - profissionais autônomos de nível superior ...................... 32 439 2,1 1,0 9,4 4,6 5,1 2,5 3,9 1,9 1,2 0,6

CAT 42 - profissionais empregados de nível superior ...................... 42 981 2,7 1,0 10,0 3,7 6,8 2,5 5,3 1,9 2,1 0,8

CAT 43 - profissionais estatutários de nível superior ...................... 10 658 0,7 1,0 2,7 4,0 2,3 3,4 0,9 1,3 0,5 0,7

CAT 44 - professores de nível superior ........ 29 901 1,9 1,0 5,5 2,9 5,0 2,6 3,6 1,9 1,5 0,8

Pequenos Emprega-dores ......................... 50 425 3,2 1,0 7,9 2,5 4,7 1,5 6,4 2,0 2,8 0,9

CAT 31 - pequenos empregadores ........... 50 425 3,2 1,0 7,9 2,5 4,7 1,5 6,4 2,0 2,8 0,9

Ocupações Médias .. 414 925 26,5 1,0 33,8 1,3 41,0 1,5 39,0 1,5 29,8 1,1

CAT 51 - ocupações de escritório ............... 142 868 9,1 1,0 9,0 1,0 13,9 1,5 12,4 1,4 11,1 1,2

CAT 52 - ocupações de supervisão ............ 68 870 4,4 1,0 7,9 1,8 7,0 1,6 7,5 1,7 4,2 1,0

CAT 53 - ocupações técnicas ..................... 97 494 6,2 1,0 8,4 1,4 9,5 1,5 11,0 1,8 6,6 1,1

CAT 54 - ocupações médias da saúde e educação ................... 56 573 3,6 1,0 3,6 1,0 5,3 1,5 4,6 1,3 4,4 1,2

CAT 55 - ocupações da segurança pública, justiça e correios ........ 29 882 1,9 1,0 2,7 1,4 3,4 1,8 1,9 1,0 2,4 1,2

CAT 32 - ocupações artísticas e similares .. 19 238 1,2 1,0 2,2 1,8 1,9 1,5 1,5 1,2 1,2 1,0

(continua)

AnexoAnexo 1

Desigualdades sociais e espaciais na metrópole:...

Indic. Econ. FEE, Porto Alegre, v. 33, n. 3, p. 137-162, dez. 2005

153

Perfil e índice de densidade relativa das categorias socioocupacionais, segundo os tipos de áreas,

na Região Metropolitana de Porto Alegre — 2000

a) RMPA, superior, médio superior, médio e médio inferior

RMPA SUPERIOR MÉDIO SUPERIOR

MÉDIO MÉDIO INFERIOR

CATs

Freqüência Perfil (%)

Densidade Perfil (%)

Densidade Perfil (%)

Densidade Perfil (%)

Densidade Perfil (%)

Densidade

Trabalhadores do Setor Terciário Es-pecializado ............... 270 806 17,3 1,0 11,1 0,6 14,9 0,9 15,8 0,9 20,5 1,2

CAT 61 - trabalhado-res do comércio ......... 136 450 8,7 1,0 5,5 0,6 7,4 0,9 8,5 1,0 10,1 1,2

CAT 62 - prestadores de serviços especia-lizados ....................... 134 356 8,6 1,0 5,6 0,6 7,5 0,9 7,3 0,9 10,4 1,2

Trabalhadores do Setor Secundário ..... 433 916 27,7 1,0 5,8 0,2 8,8 0,3 13,4 0,5 23,5 0,9

CAT 71 - trabalhado-res da indústria mo-derna ......................... 100 319 6,4 1,0 1,2 0,2 2,4 0,4 3,6 0,6 5,8 0,9

CAT 72 - trabalhado-res da indústria tradi-cional ......................... 144 081 9,2 1,0 1,3 0,1 2,1 0,2 4,2 0,5 4,8 0,5

CAT 73 - trabalhado-res dos serviços au-xiliares ....................... 76 226 4,9 1,0 1,5 0,3 2,1 0,4 2,8 0,6 5,5 1,1

CAT 74 - trabalhado-res da construção civil 113 290 7,2 1,0 1,8 0,3 2,2 0,3 2,8 0,4 7,4 1,0

Trabalhadores do Setor Terciário Não Especializado ........... 229 468 14,6 1,0 8,6 0,6 8,6 0,6 8,7 0,6 16,6 1,1

CAT 63 - prestadores de serviços não espe-cializados ................... 71 350 4,5 1,0 1,8 0,4 2,5 0,5 2,5 0,5 5,1 1,1

CAT 81 - trabalhado-res domésticos .......... 105 220 6,7 1,0 5,0 0,7 3,4 0,5 3,0 0,4 7,4 1,1

CAT 82 - ambulantes e catadores ................ 52 898 3,4 1,0 1,7 0,5 2,8 0,8 3,2 1,0 4,1 1,2

Agricultores ............. 30 956 2,0 1,0 0,2 0,1 0,2 0,1 0,3 0,2 0,5 0,3

CAT 10 - agricultores 30 956 2,0 1,0 0,2 0,1 0,2 0,1 0,3 0,2 0,5 0,3

TOTAL ....................... 1 568 217 100,0 1,0 100,0 1,0 100,0 1,0 100,0 1,0 100,0 1,0

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154

Perfil e índice de densidade relativa das categorias socioocupacionais, segundo os tipos de áreas, na Região Metropolitana de Porto Alegre — 2000

b) operário, operário tradicional, operário inferior, popular e agrícola popular

OPERÁRIO OPERÁRIO TRADICIONAL

OPERÁRIO INFERIOR

POPULAR AGRÍCOLA POPULAR

CATs Perfil (%)

Densidade Perfil (%)

Densidade Perfil (%)

Densidade Perfil (%)

Densidade Perfil (%)

Densidade

Dirigentes ................. 0,7 0,5 1,1 0,8 0,6 0,5 0,3 0,2 0,9 0,6

CAT 21 - grandes em-pregadores ................ 0,3 0,4 0,7 0,9 0,3 0,4 0,1 0,2 0,3 0,4

CAT 22 - dirigentes do setor público .............. 0,2 0,6 0,1 0,5 0,2 0,6 0,1 0,5 0,2 0,7

CAT 23 - dirigentes do setor privado .............. 0,2 0,6 0,3 0,8 0,2 0,5 0,1 0,2 0,4 1,2

Intelectuais ............... 3,2 0,4 2,5 0,3 2,5 0,3 2,0 0,3 3,7 0,5

CAT 41 - profissionais autônomos de nível superior ...................... 0,6 0,3 0,6 0,3 0,7 0,3 0,6 0,3 1,2 0,6

CAT 42 - profissionais empregados de nível superior ...................... 1,2 0,4 1,0 0,4 0,9 0,3 0,8 0,3 1,1 0,4

CAT 43 - profissionais estatutários de nível superior ...................... 0,3 0,4 0,2 0,2 0,1 0,2 0,1 0,2 0,3 0,4

CAT 44 - professores de nível superior ........ 1,1 0,6 0,8 0,4 0,8 0,4 0,5 0,3 1,2 0,6

Pequenos Emprega-dores ......................... 2,0 0,6 2,9 0,9 2,0 0,6 1,2 0,4 2,5 0,8

CAT 31 - pequenos empregadores ........... 2,0 0,6 2,9 0,9 2,0 0,6 1,2 0,4 2,5 0,8

Ocupações Médias .. 21,8 0,8 18,9 0,7 21,1 0,8 18,7 0,7 15,9 0,6

CAT 51 - ocupações de escritório ............... 7,1 0,8 6,0 0,7 7,7 0,8 7,3 0,8 5,3 0,6

CAT 52 - ocupações de supervisão ............ 3,4 0,8 3,9 0,9 3,0 0,7 2,4 0,6 2,4 0,5

CAT 53 - ocupações técnicas ..................... 5,7 0,9 4,7 0,8 5,5 0,9 3,7 0,6 2,8 0,5

CAT 54 - ocupações médias da saúde e educação ................... 3,2 0,9 2,5 0,7 2,6 0,7 2,8 0,8 3,4 0,9

CAT 55 - ocupações da segurança pública, justiça e correios ........ 1,3 0,7 0,7 0,4 1,2 0,6 1,7 0,9 1,4 0,7

CAT 32 - ocupações artísticas e similares .. 1,1 0,9 1,1 0,9 1,1 0,9 0,8 0,7 0,7 0,6

(continua)

Desigualdades sociais e espaciais na metrópole:...

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Perfil e índice de densidade relativa das categorias socioocupacionais, segundo os tipos de áreas, na Região Metropolitana de Porto Alegre — 2000

b) operário, operário tradicional, operário inferior, popular e agrícola popular

OPERÁRIO OPERÁRIO TRADICIONAL

OPERÁRIO INFERIOR

POPULAR AGRÍCOLA POPULAR

CATs Perfil (%)

Densidade Perfil (%)

Densidade Perfil (%)

Densidade Perfil (%)

Densidade Perfil (%)

Densidade

Trabalhadores do Setor Terciário Es-pecializado ............... 17,8 1,0 12,2 0,7 19,9 1,2 21,2 1,2 14,5 0,8

CAT 61 - trabalhado-res do comércio ......... 9,0 1,0 6,4 0,7 10,8 1,2 10,2 1,2 7,8 0,9

CAT 62 - prestadores de serviços especia-lizados ....................... 8,8 1,0 5,8 0,7 9,1 1,1 11,1 1,3 6,7 0,8

Trabalhadores do Setor Secundário ..... 38,5 1,4 49,7 1,8 36,4 1,3 31,5 1,1 26,8 1,0

CAT 71 - trabalhado-res da indústria mo-derna ......................... 15,0 2,4 6,6 1,0 11,2 1,7 7,6 1,2 6,1 0,9

CAT 72 - trabalhado-res da indústria tradi-cional ......................... 7,6 0,8 32,6 3,6 7,8 0,9 5,0 0,5 7,1 0,8

CAT 73 - trabalhado-res dos serviços au-xiliares ....................... 6,9 1,4 3,9 0,8 7,6 1,6 6,6 1,4 5,0 1,0

CAT 74 - trabalhado-res da construção civil 9,0 1,2 6,6 0,9 9,8 1,4 12,3 1,7 8,6 1,2

Trabalhadores do Setor Terciário Não Especializado ........... 15,0 1,0 9,6 0,7 16,8 1,1 23,2 1,6 16,6 1,1

CAT 63 - prestadores de serviços não espe-cializados ................... 5,3 1,2 3,0 0,7 5,2 1,1 7,9 1,7 4,5 1,0

CAT 81 - trabalhado-res domésticos .......... 6,2 0,9 4,6 0,7 7,6 1,1 10,8 1,6 9,8 1,5

CAT 82 - ambulantes e catadores ................ 3,5 1,0 2,0 0,6 4,0 1,2 4,5 1,3 2,3 0,7

Agricultores ............. 1,1 0,6 2,9 1,5 0,5 0,3 1,9 0,9 19,1 9,7

CAT 10 - agricultores 1,1 0,6 2,9 1,5 0,5 0,3 1,9 0,9 19,1 9,7

TOTAL ....................... 100,0 1,0 100,0 1,0 100,0 1,0 100,0 1,0 100,0 1,0

FONTE DOS DADOS BRUTOS: Censo Demográfico 2000. Amostra. IBGE.

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Anexo 2

Número de AEDs e códigos adotados segundo os municípios da RMPA — 2000

MUNICÍPIOS NÚMERO DE AEDs CÓDIGOS

Alvorada 9 Alv01... Alv09

Araricá 1 Araricá01

Arroio dos Ratos 1 Arroio Ratos01

Cachoeirinha 7 Cach01... Cach07

Campo Bom 1 Campo Bom01

Canoas 15 Can01... Can15

Capela de Santana 1 Capela de Santana01

Charqueadas 1 Charqueadas01

Dois Irmãos 1 Dois Irmãos01

Eldorado do Sul 1 Eldorado do Sul01

Estância Velha 1 Estância Velha01

Esteio 4 Estei01... Estei04

Glorinha 1 Glorinha01

Gravataí 11 Gravat01... Gravat11

Guaíba 3 Guai01... Guai03

Ivoti 1 Ivoti01

Montenegro 1 Montenegro01

Novo Hamburgo 15 Nham01... Nham15

Nova Hartz 1 Nova Hartz01

Nova Santa Rita 1 Nova Santa Rita01

Parobé 1 Parobé01

Porto Alegre 49 Poa01... Poa49

Portão 1 Portão01

Santo Antônio da Patrulha 2 Santpa01; Santpa02

São Jerônimo 1 São Jerônimo01

Sapiranga 4 Sapir01... Sapir04

Sapucaia do Sul 6 Sapuc01... Sapuc06

São Leopoldo 10 Sleo01... Sleo10

Taquara 1 Taquara01

Triunfo 1 Triunfo01

Viamão 11 Viam1... Viam11

TOTAL DA REGIÃO METROPOLITANA 164 FONTE: IBGE.

Desigualdades sociais e espaciais na metrópole:...

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157

Anexo 3Identificação das AEDs de acordo com a tipologia e sua localização na RMPA — 2000

CÓDIGO DAS AEDs TIPOLOGIA LOCALIZAÇÃO Arroio Ratos01 Agrícola popular Município Arroio dos Ratos Glorinha01 Agrícola popular Município Glorinha Gravat11 Agrícola popular Distritos Gravataí (OP7Barro Vermelho/ /OP8Morungava/OP10Ipiranga) Montenegro01 Agrícola popular Município Montenegro Santpa02 Agrícola popular Parte rural São Jerônimo01 Agrícola popular Município São Jerônimo Triunfo01 Agrícola popular Município Triunfo Viam09 Agrícola popular OP12 Região Águas Claras Viam11 Agrícola popular OP13 Região Espigão/OP15 Região Itapuã Alv02 Médio inferior Maringá lv08 Médio inferior Algarve Cach04 Médio inferior OP3 Vila Bom Princípio/Parque Matriz; OP4 Parques Atlântico/Silveira

Martins Cach05 Médio inferior OP2 City Nova/City Velha/Distrito Industrial; OP1 Veranópolis/Eunice

Nova Cach07 Médio inferior OP1 Vila Imbuhi/Eunice Velha/Jardim América/Santo Ângelo; OP2

Wilkens/Vila Regina Can01 Médio inferior Niterói/Base Aérea Can10 Médio inferior Igara/Brigadeira/São José/São Luiz Can11 Médio inferior Chácara Barreto/Fernandes Esteio01 Médio inferior Vila Nova/Cruzeiro/São José Gravat03 Médio inferior OP2 São Geraldo Gravat04 Médio inferior OP12 Vila Branca Gravat07 Médio inferior OP1 Moradas/OP11 Águas Claras Guai03 Médio inferior Centro/Balneáreos Nham08 Médio inferior Ideal/Liberdade Nham13 Médio inferior Primavera/Rincão/Vila Rosa Poa2 Médio inferior Belém Novo Poa03 Médio inferior Camaquã Poa15 Médio inferior Passo das Pedras Poa18 Médio inferior Rubem Berta Poa23 Médio inferior Sarandi Poa25 Médio inferior Jardim Carvalho Poa28 Médio inferior Morro Santana Poa29 Médio inferior Arquipélago/Humaitá/Anchieta Poa34 Médio inferior Bom Jesus/Jardim do Salso Poa35 Médio inferior Vila João Pessoa/Coronel Aparicio Borges Poa36 Médio inferior Glória/Cascata/Belem Velho Poa37 Médio inferior Medianeira/Santa Teresa Poa39 Médio inferior Vila Nova/Campo Novo Poa43 Médio inferior Serraria/Hípica Sleo03 Médio inferior Campestre/Feitoria (parte) Sapuc06 Médio inferior Vacchi/Kurashiki/Diehl/Silva/Centro (parte) Viam01 Médio inferior OP2 Região Cecília Viam02 Médio inferior OP1 Região Santa Isabel

(continua)

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Identificação das AEDs de acordo com a tipologia e sua localização na RMPA — 2000

CÓDIGO DAS AEDs TIPOLOGIA LOCALIZAÇÃO Vviam04 Médio inferior OP5 Região São Lucas/OP7 Volta da Figueira Viam05 Médio inferior OP9 Região Centro/OP8 Região Querência Viam06 Médio inferior OP10 Região Autódromo Viam07 Médio inferior OP6 Região São Tomé Estei03 Médio Centro/Vila Rica Gravat08 Médio OP5 Centro (parte) Nham05 Médio Centro/Hamburgo Velho/Rio Branco/São José Nham12 Médio Industrial/Ouro Branco/Pátria Nova Nham14 Médio Operário/Vila Nova/Guarani Poa07 Médio Cristal Poa08 Médio Cristo Redentor Poa09 Médio Floresta Poa21 Médio São João Poa30 Médio Navegantes/São Geraldo Poa31 Médio Jardim São Pedro/Santa Maria Goretti/Jardim Floresta Poa32 Médio Jardim Lindóia/São Sebastião Poa49 Médio Vila Ipiranga/Jardim Itú Can09 Médio superior Ideal/Cidade Nova; Igara/Marechal Rondon/Chácara Barreto (parte) Can15 Médio superior Centro/Fernandes; Harmonia/Marechal Rondon (parte) Poa04 Médio superior Cavalhada Poa05 Médio superior Centro Poa06 Médio superior Cidade Baixa Poa11 Médio superior Jardim Botânico Poa13 Médio superior Partenon Poa14 Médio superior Passo da Areia Poa19 Médio superior Santana Poa20 Médio superior Santo Antônio Poa26 Médio superior Jardim Sabará Poa38 Médio superior Teresópolis/Nonoai Poa44 Médio superior Azenha/Menino Deus/Praia de Belas Sleo09 Médio superior Fião/Padre Reus/São João/Cristo Rei/Morro do Espelho/Rio Branco Sleo10 Médio superior Centro ALV01 Operário inferior Passo do Feijó/União ALV06 Operário inferior Sumaré/Americana CACH02 Operário inferior OP7 Vista Alegre CAN12 Operário inferior Fátima/Mato Grande ESTEI02 Operário inferior Parque Claret/Parque Primavera/Santo Antônio GRAVAT02 Operário inferior OP3 Parque Florido/OP13 Central Guai02 Operário inferior COHAB/Jardim Santa Rita Sleo01 Operário inferior Vicentina/São Miguel;São João Batista (parte) Sleo02 Operário inferior Scharlau/Campina Sleo04 Operário inferior Feitoria Sleo07 Operário inferior Santos Dumont/Rio dos Sinos Sapuc01 Operário inferior Capão da Cruz Sapuc02 Operário inferior Vargas/Camboim/Nova Sapucaia/Walderes Ararica01 Operário tradicional Município Araricá

(continua)

Desigualdades sociais e espaciais na metrópole:...

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Identificação das AEDs de acordo com a tipologia e sua localização na RMPA — 2000

CÓDIGO DAS AEDs TIPOLOGIA LOCALIZAÇÃO

Campo Bom01 Operário tradicional Município Campo Bom Caoelo de Santana01 Operário tradicional Município Capela de Santana Dois Irmãos01 Operário tradicional Município Dois Irmãos Estância Velha01 Operário tradicional Município Estância Velha Ivoti01 Operário tradicional Município Ivoti Nova Hartz01 Operário tradicional Município Nova Hartz Nham01 Operário tradicional Canudos (parte) Nham02 Operário tradicional Canudos (parte) Nham03 Operário tradicional Mauá/Canudos (parte-Horto Municipal) Nham04 Operário tradicional São Jorge Nham06 Operário tradicional Dihel/Roselândia Nham07 Operário tradicional Santo Afonso Nham09 Operário tradicional Lomba Grande Nham10 Operário tradicional Canudos (parte-Aeroclube) Nham11 Operário tradicional Rondônia/Boa Vista Nham5 Operário tradicional Boa Saúde/Petrópolis Parobé01 Operário tradicional Município Parobé Portão01 Operário tradicional Município Portão Santpa01 Operário tradicional Parte urbana Sapir01 Operário tradicional Centro/Piquete Sapir02 Operário tradicional São Luiz/Santa Fé/Quatro Colônias Sapir03 Operário tradicional Vila Nova/Amaral Ribeiro Sapir04 Operário tradicional Centenário/Oeste Taquara01 Operário tradicional Município Taquara Cach03 Operário OP5 Parque Tancredo Neves/Granja Esperança/Fátima Can03 Operário Jardim Atlântico/Estância Velha Charqueadas01 Operário Município Charqueadas Estei04 Operário Parque de Exposições/Teópolis/Parque Amador Gravat01 Operário OP4 COHAB A/OP14 São Jerônimo Gravat05 Operário OP15 São Vicente Gravat09 Operário OP5 Centro (parte) Sleo05 Operário Pinheiro/Fazenda São Borja/Santo André Sleo06 Operário Campus Unisinos/Duque de Caxias/Santa Tereza; Jardim América/São

João Batista (parte) Sleo08 Operário Boa Vista/Arroio Manteiga Sapuc03 Operário Centro/São José Sapuc04 Operário Boa Vista/Ipiranga/Jardim América/Lomba da Palmeira Sapuc05 Operário COHAB/São Jorge/Colonial Alv03 Popular Parque Madepinho/São Francisco Alv004 Popular Chácara do Tordilho/Formosa/Três Figueiras/Intersul Alv005 Popular Stella Maris/Aparecida Alv007 Popular Salomé Alv009 Popular Distrito Estância Grande Cach01 Popular OP8 Nova Cachoeirinha

(continua)

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Identificação das AEDs de acordo com a tipologia e sua localização na RMPA — 2000

CÓDIGO DAS AEDs TIPOLOGIA LOCALIZAÇÃO

Cach06 Popular OP6 Residencial Ritter/Moradas do Bosque/Sítios Can02 Popular Rio Branco/Niterói (parte) Can04 Popular Olaria/Planalto Canoense/Guajuviras (parte) Can05 Popular Guajuviras Can06 Popular Santo Operário/Matias Velho (parte) Can07 Popular Cinco Colônias; Natal/Santo Operário (parte) Can08 Popular Natal/Matia Velho (parte) Can13 Popular Harmonia/Matias Velho (parte) Can14 Popular Matias Velho/ Industrial Eldorado do Sul01 Popular Município Eldorado do Sul Gravat06 Popular OP9 Itacolomi Gravat10 Popular OP6 Parque dos Anjos

Guai01 Popular Morada da Colina/Pedras Brancas/Parque 35/Columbia City

Nova Santa Rita01 Popular Município Nova Santa Rita Poa01 Popular Agronomia Poa12 Popular Lomba do Pinheiro Poa17 Popular Restinga Poa22 Popular São José Poa24 Popular Farrapos Poa27 Popular Mario Quintana

Poa40 Popular Ponta Grossa/ Chapéu do Sol/Lageado/Lami

Viam03 Popular OP7 Região Volta da Figueira/OP9 Região Centro

Viam08 Popular OP3 Região Passo Dorneles Viam10 Popular OP4 Região Viamópolis Poa10 Superior Independência Poa16 Superior Petrópolis Poa33 Superior Higienópolis/Boa Vista Poa41 Superior Vila Assunção/Tristeza/Vila Conceição

Poa42 Superior Pedra Redonda/Ipanema/Espírito Santo/Guarujá

Poa45 Superior Bom Fim/ Farroupilha Poa46 Superior Auxiliadora/ Mont Serrat/Moinhos de Vento/ Bela Vista

Poa47 Superior Rio Branco/Santa Cecília

POA48 Superior Três Figueiras/Chácara das Pedras/Vila Jardim FONTE: IBGE. NOTA: OP é área do Orçamento Participativo.

Desigualdades sociais e espaciais na metrópole:...

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Referências

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Rosetta Mammarella; Tanya M. de Barcellos

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Concentração e especialização em setores industriais...

ResumoEste trabalho analisa o grau de concentração industrial nos setores demadeira e mobiliário, têxtil e metal-mecânico, na região Noroeste Colonial,comparativamente às regiões formadas pelos demais ConselhosRegionais de Desenvolvimento (Coredes) do Rio Grande do Sul, e o graude especialização entre os municípios daquela região. Foram calculadosos Índices de Gini locacionais (GLs) para os Coredes e os quocienteslocacionais (GLs) para os municípios, com base no número deestabelecimentos e no número de empregados. Constatou-se que existeconcentração e especialização nas indústrias metal-mecânica e demadeira e mobiliário, em alguns municípios do Corede Noroeste Colonial,especialmente em relação ao número de empregados.

Palavras-chave: aglomeração industrial; especialização pro-

dutiva; desenvolvimento regional.

AbstractThe paper analyzes the industrial concentration in the sectors of the woodand of the furniture, textile and metal-mechanic in the Corede NoroesteColonial (Regional Council of Development) region comparatively to thegroup of the regions formed by the Coredes of the Rio Grande do SulState. The paper analyses too the industrial specialization these sectorsamong the municipal districts inside the region of the Noroeste Colonial.The Locacionals Quotients and Gini Locacional's Coefficients werecalculated, for the Coredes and the municipal districts, with base in thenumber of establishments and in the number of employees. A concentrationand specialization was verified in the industry metal-mechanic and in theindustry of the wood and of the furniture in some municipal districts of theregion Noroeste Colonial, especially in relation to the number of employees.

Artigo recebido em 28 set. 2005.

Concentração e especialização em setores industriais

na região Noroeste Colonial do Rio Grande do Sul

David Basso* Doutor e Professor do Departamento de Economia e Contabilidade da Unijuí.

Benedito Silva Neto** Doutor e Professor do Departamento de EstudosAgrários da Unijuí.

Janete Stoffel*** Mestre e Professora do Departamento de Economiae Contabilidade da Unijuí.

*E-mail: [email protected]

**E-mail: [email protected]

***E-mail: [email protected]

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David Basso; Benedito Silva Neto; Janete Stoffel

1 - Introdução

Os estudos sobre concentração e especializaçãoindustrial inserem-se nas discussões acerca do papelque aglomerações, sistemas locais de produção eclusters desempenham no desenvolvimento local. A ca-racterização da distribuição geográfica das atividades eco-nômicas quanto ao seu grau de especialização e con-centração é, nesse sentido, uma etapa importante paraa compreensão das dinâmicas presentes nos processoslocais de desenvolvimento.

O presente trabalho busca identificar a existênciade aglomerações industriais nos setores de madeira emobiliário, têxtil e metal-mecânico na região integradapelos municípios que compõem o Conselho Regional deDesenvolvimento (Corede) Noroeste Colonial.

Além desta Introdução, o trabalho compõe-se detrês partes, iniciando com a apresentação de algumasabordagens que privilegiam a análise dos processos dedesenvolvimento a partir das dinâmicas locais deprodução. Em seguida, apresentam-se os procedimentosmetodológicos utilizados para mensurar o grau deconcentração e especialização industrial. Por fim, sãodiscutidos os resultados obtidos, e, deles, retiradasalgumas conclusões.

2 - Aglomerações industriais e dinâmicas de desenvolvimento local

Entender e explicar as especificidades e a formacomo o desenvolvimento acontece nas diferentes regiõese localidades têm merecido uma preocupação crescentepor parte de estudiosos do mundo inteiro, em particulara partir do último quartel do século XX.

Experiências localizadas de desenvolvimento, comdestaque para o caso da Terceira Itália, mereceram oolhar atento de pesquisadores de várias áreas doconhecimento, particularmente interessados em embasarcientificamente sua compreensão do processo dedesenvolvimento como um fenômeno local ou regional(Becattini, 1979; Bagnasco, 1988; Garofoli, 1985). Taisexperiências tiveram o mérito de evidenciar que a análisedo desenvolvimento centrada unicamente no viés dadinâmica de acumulação capitalista é, no mínimo,insuficiente para apreender a complexidade e a

diversidade das situações observadas em vários paísesou regiões, a partir dos anos 70 do século XX.

Uma das referências que têm exercido forteinfluência em muitos dos estudos contemporâneosvoltados ao estudo de processos de desenvolvimentolocal vem da noção de distrito industrial desenvolvidapor Alfred Marshall, ainda no século XIX, com base naconstatação de um fenômeno de concentração deempresas especializadas em um ramo de produção, emcertas comunidades inglesas, com uma divisão detrabalho entre pequenos produtores baseada em laçosde solidariedade. Marshall (1985) explica esse fenômenoem função das externalidades ou economias externasàs empresas individuais, mas internas aos ramos deprodução, tratando-se, portanto, de economias que nãosurgem diretamente de empresas, mas, sim, do territórioonde elas estão localizadas, em função da proximidadedos produtores. Tais economias externas podem estarrelacionadas à difusão de conhecimento, à aprendizagemdifusa das profissões, às invenções e inovações, aodesenvolvimento do comércio e dos transportes, aoscontatos estreitos entre fornecedores e compradores, àsredes de subcontratação de serviços e ao mercado demão-de-obra qualificada, etc. Segundo Marshall, noentanto, a cooperação econômica explica apenas emparte as vantagens de um distrito industrial, e, por isso,o seu interesse vai além dos aspectos econômicos,realçando a importância dos valores imateriais dalocalização, como as relações sociais e a cultura local,para mostrar que a dinâmica industrial não pode serreduzida a seu aspecto meramente mercantil.

Alguns trabalhos que aprofundaram a noção dedistrito industrial desenvolvida por Marshall para explicara experiência italiana se tornaram centrais nos estudosrelacionados com o desenvolvimento local, dentre osquais destacam-se as contribuições de Becattini (1979),Garofoli (1985) e Bagnasco (1988), exercendo grandeinfluência na estruturação de abordagens recentes, como,por exemplo, a dos sistemas locais de produção(Schmitz, 1990; 1994; Benko; Lipietz, 1992; Courlet,2001a; 2001b).

Outros estudiosos foram buscar em Schumpeter(1985) as explicações teóricas sobre a diversidadeobservada no desenvolvimento em níveis local e regional,enfatizando o papel das inovações na análise dascondições que permitiram a certas regiões se destacaremdas demais em termos de desenvolvimento.Diferentemente de Schumpeter, no entanto, algumascorrentes neo-schumpeterianas enfatizam que odesenvolvimento não necessariamente acontece porrupturas radicais, podendo dar-se de forma adaptativa e

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progressiva, destacando o papel do aprendizado noprocesso (learning by doing e learning by using), doconhecimento tácito e da rotina nos processosinovadores. Da mesma forma, a figura isolada doempresário, central no modelo original de Schumpeter, émenos enfatizada em favor das instituições de pesquisae desenvolvimento de produtos e processos, surgindo,assim, conceitos como "meios inovadores" (Aydalot,1986) e "sistemas nacionais/locais de inovação"(Freeman, 1995; Dosi et al., 1988; Nelson; Winter, 1997;Cassiolato; Lastres, 1999).

No Brasil, o interesse pelos estudos sobre sistemaslocais de produção cresceu muito a partir da década de90 do século XX, a ponto de hoje existirem vários centrosou grupos de pesquisa em várias instituições.1 Além dointeresse acadêmico, também é expressivo oenvolvimento de instituições na identificação de sistemasprodutivos e no fomento de aglomerações nas diferentesregiões do País.2

Segundo Suzigan et al. (2004), aglomerações deempresas e instituições têm como característicaessencial a capacidade de gerar economias externas,incidentais ou deliberadamente criadas, que contribuempara o incremento da competitividade das empresas e,em conseqüência, de todo o sistema local de produção.Além das economias externas tradicionais, já apontadasnos estudos do próprio Marshall, a cooperação entre asempresas e o apoio público são fatores fundamentaispara o êxito de sistemas locais de produção (Suzigan etal., 2001).

De acordo com os estudos da Redesist, no Brasil émais freqüente a identificação de conjuntos de atividadeseconômicas em municípios ou microrregiões que seconstituem sob a forma de arranjos produtivos locais nãoavançados ou não "clusterizados", que apresentam comocaracterísticas: (a) concentração geográfica; (b) elevadograu de especialização setorial; (c) grupos de micro epequenas empresas sem nucleação por grande empresaou empresa-âncora; (d) baixo nível de eficiência coletivabaseada em economias externas e em ação conjunta;(e) e coesão e intensidade na divisão de trabalho entreas firmas relativamente limitadas.

A predominância de micro e pequenas empresasnesses ambientes locais organizados industrialmentecomo sistemas produtivos explica por que a literaturasobre a economia industrial vem incorporando, nosúltimos tempos, a dimensão da proximidade geográficae da formação de redes de cooperação como elementosde competitividade e sobrevivência dessas empresas demenor porte.

Por meio de redes horizontais, as empresas podem,coletivamente, atingir economias de escala acima dacapacidade individual de cada uma, realizar comprasconjuntas de matérias-primas e insumos, melhorar o usoda maquinaria, definir estratégias mercadológicasconjuntas, concentrar atividades de design e promovervendas em conjunto. Tanto a forma de articulação dasempresas quanto o papel que elas desempenham nosdiferentes arranjos ou sistemas produtivos locais podemvariar. A conformação de diferentes tipos de sistemasprodutivos locais, por conseqüência, vai depender dosatributos socioeconômicos, institucionais e culturais, dosistema de governança, da capacidade inovadora, dosprincípios de organização e da qualidade dosencadeamentos produtivos internos e externos a cadauma das aglomerações geográficas.

Possuir um diagnóstico adequado dasespecificidades das dinâmicas produtivas, portanto, éindispensável para embasar projetos e políticas dedesenvolvimento local, justificando, assim, o esforço deidentificação do grau de especialização e concentraçãode setores industriais para qualificar as aglomeraçõesgeográficas e setoriais de empresas que podem serpotencializadas por ações conjuntas deliberadas, sejano sentido de incrementar a cooperação entre asempresas, seja no direcionamento das políticas públicas.

3 - Metodologia

A análise da concentração e da especializaçãoindustrial dos setores de madeira e mobiliário, têxtil emetal-mecânico nas regiões delimitadas segue osprocedimentos utilizados por Suzigan, Garcia e Furtado(2003), a partir de dois índices básicos: o Índice de Ginilocacional (GL) e o quociente locacional (QL). O primeiropermite identificar as classes industriais que sãogeograficamente concentradas na região em estudo,enquanto o segundo possibilita identificar e delimitarespecializações dentro da região e apontar algumas dascaracterísticas principais da estrutura industrial local.

1 Podem-se citar, por exemplo, a Rede de Pesquisa em SistemasProdutivos e Inovativos Locais (Redesist), da URRJ, disponívelem http://www.ie.ufrj.br/redesist, e o grupo liderado pelo Profes-sor Wilson Suzigan, da Unicamp.

2 Dentre outras, merecem destaque instituições como o Sebrae,o BNDES, o Banco do Nordeste e secretarias ou institutos liga-dos a governos estaduais.

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3.1 - A base de dados

A base de dados utilizada neste trabalho é aRelação Anual de Informações Sociais (RAIS) doMinistério do Trabalho e Emprego. As informaçõesutilizadas referem-se ao número de estabelecimentos ede empregados nos setores industriais da madeira e domobiliário, têxtil e metal-mecânico referentes ao ano de2001.

A coleta e a tabulação dos dados da RAIS sãorealizadas anualmente pelo Ministério do Trabalho eEmprego, apresentando informações detalhadas sobrevolume de emprego e número de estabelecimentos poratividade econômica e por município. A principal vantagemda RAIS é a desagregação setorial e geográfica dosdados, o que facilita o detalhamento das informações.

Dentre as principais limitações da RAIS, podem-secitar: (a) o fato de que ela informa apenas as relaçõescontratuais formalizadas; (b) as informações sãoautoclassificadas pelas empresas informantes, sem quehaja qualquer verificação sobre sua consistência; e (c)as empresas informantes podem optar por respostasúnicas, seja no caso de empresas que atuem em váriossetores, que podem concentrar os dados em um únicosetor de atividade, seja no de empresas multiplantas,que podem informar os dados em uma única unidade(geralmente na matriz).

A base de dados da Pesquisa Industrial Anual(PIA), organizada pela Fundação Instituto Brasileiro deGeografia e Estatística (IBGE), também pode ser utilizadapara avaliar a especialização e a concentração industrial,mas ela apresenta duas inconveniências importantes: aprimeira é que oferece uma baixa cobertura de micro epequenas empresas, uma vez que os dados dessapesquisa cobrem preferencialmente unidades com maisde 30 empregados; a segunda é que a pesquisa é feitapor amostragem, não cobrindo todas as localidades.Assim, mesmo reconhecendo as limitações da base dedados da RAIS, considera-se que a amplitude dasinformações levantadas e a possibilidade de referenciá--las a uma análise descentralizada no âmbito demunicípios justificam a opção metodológica pela suautilização.

3.2 - Indicadores de concentração e de especialização

Conforme Suzigan, Garcia e Furtado (2003), osindicadores de concentração e especialização permitemverificar a distribuição geográfica da produção, identificarespecializações regionais e mapear movimentos dedeslocamento por região das atividades econômicas,sejam elas concentradas ou descentralizadaseconomicamente. A concentração e a especializaçãopodem ser observadas em função de distintas variáveis,como, por exemplo, o número de estabelecimentos e onúmero de empregados.

O Índice de Gini locacional possibilita identificarclasses de indústrias com elevado grau de concentraçãogeográfica da produção, enquanto o quociente locacionalmede o grau de especialização e serve para identificarsistemas locais de produção nas classes de indústriasgeograficamente concentradas.

O Índice de Gini é um dos indicadores maisutilizados como medida de concentração (Hoffmann,1998). Suzigan, Garcia e Furtado (2003), por exemplo,utilizam o Índice de Gini locacional para estudar aconcentração industrial nas regiões do Estado de SãoPaulo. Esse índice varia de zero a um, e, quanto maisconcentrada for a indústria na região, mais próximo daunidade ele estará, de tal forma que, se a indústria foruniformemente distribuída no espaço (território), o índiceserá zero. Para calcular o GL, é preciso ordenar as regiõesde forma decrescente quanto ao QL da variávelconsiderada (número de empregados ou número deestabelecimentos).

O cálculo do GL é efetuado por meio da elaboraçãode uma poligonal de Lorenz, onde o total acumulado davariável considerada é colocado na ordenada, e o setorialacumulado é colocado na abscissa, conformeexemplificado na Figura 1.

Por definição, o Índice de Gini é a relação entre aárea de concentração, indicada na Figura 1 por e aárea do triângulo ABC (cujo valor é 0,5), isto é,

Sendo , temos , oqual é adimensional.

α,

G = α / 0,5 = 2 α

0 <= α < 0,5 0 <= G < 1

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Concentração e especialização em setores industriais...

∑∑

∑=

i jij

iij

jij

ij

ij

E

E

EE

QL

∑∑i j

ijE =

O QL indica a especialização relativa de umaindústria num local delimitado. Esse índice, no entanto,deve ser utilizado com cuidado, já que comparaçõesabsolutas entre regiões podem gerar conclusõesequivocadas, como no caso de uma região poucodesenvolvida industrialmente que pode apresentar índicede especialização elevado, mesmo existindo nela apenasuma unidade produtiva.

Excluídas as situações em que a atividadeindustrial é inexpressiva, quanto maior for o QL, maiorserá o peso do setor na estrutura produtiva localcomparativamente ao peso do mesmo setor no Estadoou na região, indicando a especialização produtiva,característica dos clusters ou sistemas locais deprodução. A partir da análise do QL, é possível identificara especialização produtiva na microrregião.

A região do Corede Noroeste Colonial é formadapor 32 municípios, sendo que, na maioria deles, aatividade industrial é pouco significativa. Para facilitar aanálise do grau de especialização industrial da região,foram considerados apenas os municípios que, na RAISdo Ministério do Trabalho e Emprego referente ao ano de2001, possuíam pelo menos 10 estabelecimentos nasoma de todos os setores industriais.

Assim, pelo cálculo e pela somatória dos trapéziosque se situam entre a linha da poligonal e o eixo dasabscissas, obtêm-se a área , indicada na Figura 1, e,na seqüência, o GL (na medida em que

Para o cálculo do QL, com base no número deestabelecimentos ou de empregados, Suzigan, Garcia eFurtado (2003) propõem a seguinte equação:

α = β - 0,5). β

onde

empregos ou estabelecimentos emtodos os setores de todas as regiões.

quociente locacional do setor i da região j;

empregos ou estabelecimentos no setor i daregião j;

empregos ou estabelecimentos no setor iem todas as regiões;

empregos ou estabelecimentos em todosos setores da região j;

Eij

=

QL

ij

=

∑j

ijE =

∑i

ijE =

Exemplo de poligonal de Lorenz para o cálculo do GL

0,0

0,2

0,4

0,6

0,8

1,0

0,0 0,1 0,2 0,3 0,4 0,5 0,6 0,7 0,8 0,9 1,0

Acumulado total

Acumulado do setor

Figura 1

α

β

C

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4 - Apresentação e discussão dos resultados

Neste trabalho, comparou-se o grau deconcentração industrial observado na região formada peloconjunto dos Coredes do Estado do Rio Grande do Sul eaquele observado na região do Corede Noroeste Colonial,nos setores de madeira e mobiliário, têxtil e metal--mecânico. O cálculo do Índice de Gini locacional para oEstado como um todo tomou por base a regionalizaçãodos 22 Conselhos Regionais de Desenvolvimento,enquanto o GL para a região Noroeste Colonial levou emconta os 32 municípios que compõem este Corede. Naseqüência, analisa-se o grau de especialização industrialna região constituída pelo Corede Noroeste Colonial, nostrês setores selecionados.

4.1 - Concentração industrial no Corede Noroeste Colo- nial comparativamente aos demais Coredes do Rio Grande do Sul

O grau de concentração industrial entre as regiõesque compõem os 22 Coredes do Estado do Rio GrandeSul, nos setores de madeira e mobiliário, têxtil e metal--mecânico, medido pelo Índice de Gini locacional emfunção do número de estabelecimentos e do número deempregados, é mostrado na Tabela 1.

Os resultados apresentados na Tabela 1 indicamque nenhum dos três setores apresenta um grau deconcentração significativo, já que os índices de GLcalculados podem ser considerados baixos, indicandoque essas indústrias estão distribuídas de formarelativamente uniforme entre as diferentes regiões doEstado. Em termos relativos, no entanto, a indústria demadeira e mobiliário é a que apresenta maiores níveisde concentração dentre os três setores analisados,apresentando índices de GL mais elevados tanto do pontode vista do número de estabelecimentos quanto do donúmero de empregados. A indústria têxtil, por sua vez, éa que se apresenta de forma mais dispersa entre asregiões gaúchas, em relação tanto ao número deestabelecimentos como ao número de empregados.

Pode-se observar ainda, pelos dados da Tabela 1,que o grau de concentração analisado em função donúmero de empregados é maior do que quando calculadoa partir do número de empresas para os três setoresanalisados.

A Tabela 2, por sua vez, mostra o grau deconcentração nos três setores selecionados na regiãodo Corede Noroeste Colonial, com base no número deestabelecimentos e no número de empregados.

Tabela 1

Índices de Gini locacional nas indústrias de madeira e mobiliário, têxtil e metal-mecânica, segundo

o número de estabelecimentos e o número de empregados, calculados a partir

dos 22 Coredes do RS — 2001

INDÚSTRIAS NÚMERO DE ESTABELECI- MENTOS

NÚMERO DE

EMPREGADOS

De madeira e mobiliário 0,30 0,41

Têxtil ........................... 0,14 0,19

Metal-mecânica .......... 0,19 0,29

FONTE DOS DADOS BRUTOS: BRASIL. Ministério do Tra- balho e Emprego. RAIS: Relação Anual de Informa- ções Sociais. Brasília: O Mi- nistério, 2001.

Tabela 2

Índices de Gini locacional nas indústrias de madeira e mobiliário, têxtil e metal-mecânica, segundo

o número de estabelecimentos e o número de empregados, calculados a partir dos 32

municípios do Corede Noroeste Colonial do RS — 2001

INDÚSTRIAS NÚMERO DE ESTABELECI- MENTOS

NÚMERO DE

EMPREGADOS

De madeira e mobiliário 0,35 0,68 Têxtil ............................ 0,45 0,66 Metal-mecânica ........... 0,25 0,77

FONTE DOS DADOS BRUTOS: BRASIL. Ministério do Tra- balho e Emprego. RAIS: Relação Anual de Informa- ções Sociais. Brasília: O Ministério, 2001.

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Concentração e especialização em setores industriais...

A primeira constatação que se retira da observaçãodos dados da Tabela 2 é que existe uma concentraçãoimportante na região do Corede Noroeste Colonial, nostrês setores estudados, segundo a variável número deempregados, com níveis ligeiramente superiores naindústria metal-mecânica, mas igualmente relevantes nossegmentos de madeira e mobiliário e têxtil. A segundaobservação é que há uma inversão na posição dossetores quando o grau de concentração é calculadosegundo o número de estabelecimentos. Se, de um lado,o setor metal-mecânico apresenta o maior grau deconcentração em função do número de empregados, deoutro, é o que apresenta a menor concentração, quandose refere ao número de estabelecimentos, indicando opredomínio de empresas de maior porte, com maior ofertade emprego por estabelecimento. O setor têxtil, por suavez, possui a maior concentração de estabelecimentose a menor concentração de trabalhadores ocupados,indicando a presença de um número maior de empresasde pequeno porte, com um baixo volume de empregoem cada uma delas.

Comparando-se os resultados apresentados nasTabelas 1 e 2, pode-se observar que a concentraçãoindustrial nos setores analisados é mais elevada na regiãodo Corede Noroeste Colonial do que entre os Coredes doEstado do Rio Grande do Sul, em especial quandocalculada com base no número de empregados.Confirmada a existência de uma concentração industrial,avalia-se, na seqüência, o grau de especialização dosmunicípios daquela região nos segmentos industriaismetal-mecânico, têxtil e de madeira e mobiliário.

4.2 - Análise da especialização industrial nos municípios da região Noroeste Colonial

Nesta seção, são apresentados e discutidos osindicadores de especialização industrial, segundo oquociente locacional, na região do Corede NoroesteColonial, com base nos setores de madeira e mobiliário,têxtil e metal-mecânico, em função do número deestabelecimentos e do número de empregados.

A Tabela 3 apresenta dados do QL da indústria demadeira e mobiliário para os municípios do CoredeNoroeste Colonial do Rio Grande do Sul, calculados apartir do número de estabelecimentos. O Município deCrissiumal é o que apresenta a maior especialização no

ramo de madeira e mobiliário, quando se toma comoreferência o número de estabelecimentos. Apesar dealguns municípios disporem de um número significativode estabelecimentos, como é o caso de Ijuí, Panambi eTrês Passos, eles apresentam quocientes locacionaisconsideravelmente baixos, porque a importância do setorse dilui diante de outros setores industriais presentesnessas localidades, e, por isso, o grau de especializaçãoé inexpressivo.

Tabela 3

Quocientes locacionais da indústria de madeira e mobiliário, segundo o número de estabelecimentos, nos municípios

do Corede Noroeste Colonial do RS — 2001

NÚMERO DE ESTABELECI- MENTOS

EMPRESAS DO SETOR

ORDEM MUNICÍPIOS

Total Setor QL % do Total

1 Crissiumal ......... 46 18 2,68 39,00 2 Condor .............. 23 8 2,38 35,00 3 Augusto Pestana 19 5 1,80 26,00 4 Ajuricaba ........... 19 5 1,80 26,00 5 Pejuçara ............ 12 3 1,71 25,00 6 Tenente Portela 44 9 1,40 20,00 7 Catuípe .............. 32 6 1,28 19,00

8 Humaitá ............. 17 3 1,21 18,00 9 Três Passos ...... 117 15 0,88 13,00

10 São Martinho ..... 32 4 0,86 13,00 11 Panambi ............ 158 15 0,65 9,00 12 Ijuí ...................... 284 25 0,60 9,00 13 Campo Novo ...... 17 1 0,40 6,00 14 Santo Augusto .. 42 1 0,16 2,00

Outros ................ 76 19 - - TOTAL ............... 938 137 - 14,00

FONTE DOS DADOS BRUTOS: BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego. RAIS: Relação Anual de Informações Sociais. Brasília: O Ministério, 2001.

Os indicadores de especialização na indústria demadeira e mobiliário dos municípios do Corede NoroesteColonial, segundo o número de empregados, sãoapresentados na Tabela 4.

Observa-se que, segundo essa variável, o Municípiode Crissiumal também apresenta o maior grau deespecialização, seguido dos Municípios de TenentePortela e Catuípe. Nesses municípios, o número deempregos no setor de madeira e mobiliário representamais da metade do número de vagas de todos os setoresindustriais locais, chegando a representar 77% no casodo Município de Crissiumal.

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A Tabela 5 apresenta o quociente locacional naindústria têxtil, nos municípios que compõem a regiãodo Corede Noroeste Colonial do Estado do Rio Grandedo Sul, em função do número de estabelecimentos nosetor, comparativamente ao total de empresas industriaisexistentes em cada município.

Como se vê na Tabela 5, o maior grau deespecialização na indústria têxtil no Corede NoroesteColonial, considerando-se o número de estabelecimentos,aparece no Município de Três Passos. O baixo grau deespecialização no setor têxtil de municípios como Ijuí ePanambi, os quais possuem um número absoluto maiselevado de empresas no ramo do que outros municípiosdessa região, explica-se pela presença de um maiornúmero de empresas em outros setores industriais.

A Tabela 6 apresenta o quociente locacional daindústria têxtil para os municípios da região NoroesteColonial, confrontando o número de empregados no setorcom o total de empregos industriais.

Segundo os dados da Tabela 6, três municípios doCorede Noroeste Colonial apresentam um grau deespecialização na indústria têxtil, segundo o número deempregados, ligeiramente superior aos demais — São

Confrontando-se as Tabelas 3 e 4, observa-se umaespecialização maior do Município de Crissiumal noâmbito do Corede Noroeste Colonial, na indústria demadeira e mobiliário, em relação tanto ao número deestabelecimentos quanto ao de empregados no setor. Aordem de classificação dos demais municípios maisespecializados segundo o número de estabelecimentos(Condor e Augusto Pestana), no entanto, não é a mesma,quando se toma como referência o número deempregados (Tenente Portela e Catuípe), indicando aexistência de uma considerável variação no número deempregados por estabelecimento entre os municípios.

Tabela 4

Quocientes locacionais da indústria de madeira e mobiliário, segundo o número de empregados, nos municípios

do Corede Noroeste Colonial do RS — 2001

NÚMERO DE EMPREGADOS

EMPREGOS NO SETOR

ORDEM MUNICÍPIOS (1)

Total Setor QL % do Total

1 Crissiumal .......... 222 171 8,82 77,00

2 Tenente Portela 265 155 6,70 58,00

3 Catuípe .............. 101 58 6,58 57,00

4 Augusto Pestana 47 14 3,41 30,00

5 Pejuçara ............ 57 16 3,21 28,00

6 Humaitá ............. 50 14 3,21 28,00

7 Ajuricaba ............ 67 11 1,88 16,00

8 Condor .............. 178 24 1,54 13,00

9 São Martinho ..... 104 9 0,99 9,00

10 Três Passos ...... 1 148 92 0,92 8,00

11 Ijuí ...................... 2 111 110 0,60 5,00

12 Panambi ............ 3 714 45 0,14 1,00

Outros ............... 568 34 - -

TOTAL .............. 8 634 754 - 8,70

FONTE DOS DADOS BRUTOS: BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego. RAIS: Relação Anual de Informações Sociais. Brasília: O Ministério, 2001. (1) Santo Augusto e Campo Novo não possuíam empregados re-gistrados no setor.

Tabela 5

Quocientes locacionais da indústria têxtil, segundo o número de estabelecimentos, para os municípios do Corede

Noroeste Colonial do RS — 2001

NÚMERO DE ESTABELECI- MENTOS

EMPRESAS NO SETOR

ORDEM MUNICÍPIOS (1)

Total Setor QL % do Total

1 Três Passos ..... 117 20 1,76 17,00

2 Pejuçara ........... 12 2 1,72 17,00

3 São Martinho .... 32 5 1,61 16,00

4 Tenente Portela 44 6 1,41 14,00

5 Humaitá ............ 17 2 1,21 12,00

6 Ajuricaba .......... 19 2 1,09 11,00

7 Augusto Pestana 19 2 1,09 11,00

8 Santo Augusto .. 42 4 0,98 10,00

9 Crissiumal ......... 46 4 0,90 9,00

10 Panambi ............ 158 12 0,78 8,00

11 Ijuí ..................... 284 21 0,76 7,00

12 Catuípe ............. 32 2 0,64 6,00

13 Campo Novo ..... 17 1 0,61 6,00

Outros ............... 76 19 - -

TOTAL .............. 938 91 - 9,00

FONTE DOS DADOS BRUTOS: BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego. RAIS: Relação Anual de Informações Sociais. Brasília: O Ministério, 2001. (1) Condor não possuía estabelecimentos registrados no setor.

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Tabela 6

Quocientes locacionais da indústria têxtil, segundo o número de empregados, para os municípios do Corede Noroeste

Colonial do RS — 2001

NÚMERO DE EMPREGADOS

EMPREGADOS NO SETOR

ORDEM

MUNICÍPIOS (1)

Total Setor QL % do Total

1 São Martinho ..... 104 41 6,77 39,00

2 Humaitá ............. 50 19 6,53 38,00

3 Ajuricaba ........... 67 23 5,90 34,00

4 Três Passos ...... 1 148 178 2,66 16,00

5 Pejuçara ............. 57 7 2,11 12,00

6 Esperança do Sul 10 1 1,78 10,00

7 Santo Augusto ... 181 11 1,04 6,00

8 Tenente Portela 265 16 1,04 6,00

9 Crissiumal .......... 222 10 0,77 5,00

10 Augusto Pestana 47 2 0,73 4,00

11 Ijuí ...................... 2 111 72 0,59 3,00

12 Catuípe .............. 101 2 0,34 2,00

13 Panambi ............. 3 714 48 0,22 1,00

Outros ................ 526 - - - TOTAL ............... 8 634 484 - 5,60

FONTE DOS DADOS BRUTOS: BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego. RAIS: Relação Anual de Informações Sociais. Brasília: O Ministério, 2001.

(1) Condor não possuía empregados registrados no setor.

Martinho, Humaitá e Ajuricaba. Mesmo assim, ostrabalhadores ocupados no setor, nesses municípios, nãochega a 40% do total de empregados industriais.

nos municípios do Corede Noroeste Colonial, com baseno número de estabelecimentos podem ser observadosna Tabela 7.

A participação do número de estabelecimentos naindústria metal-mecânica só é relevante para o Municípiode Panambi, onde representam, como revelam os dadosda Tabela 7, pouco mais de um terço do total dasempresas industriais locais. É interessante observar que,na região Noroeste Colonial, apenas os Municípios dePanambi e Ijuí apresentam mais de 10 empresas no setor.No geral, pode-se dizer que não existe umaespecialização no setor metal-mecânico nessa região doEstado, considerando-se apenas o número de unidadesde produção.

A Tabela 8 apresenta os indicadores do quocientelocacional da indústria metal-mecânica nos municípiosque compõem o Corede Noroeste Colonial, considerando-

Tabela 7

Quocientes locacionais da indústria metal-mecânica, segundo o número de estabelecimentos, para os municípios

do Corede Noroeste Colonial do RS — 2001

NÚMERO DE ESTABELECI- MENTOS

EMPRESAS DO SETOR

ORDEM MUNICÍPIOS

(1)

Total Setor QL % do Total

1 Panambi .............. 158 57 2,29 36,00

2 Humaitá .............. 17 5 1,86 29,00

3 Condor ................ 23 4 1,10 17,00

4 Tenente Portela 44 7 1,01 16,00

5 Ijuí ...................... 284 44 0,98 15,00

6 Santo Augusto ... 42 5 0,75 12,00

7 Augusto Pestana 19 2 0,67 11,00

8 Ajuricaba ............ 19 2 0,67 11,00

9 Catuípe ............... 32 3 0,59 9,00

10 Crissiumal ........... 46 4 0,55 9,00

11 Pejuçara ............. 12 1 0,53 8,00

12 Três Passos ....... 117 6 0,33 5,00

13 São Martinho ...... 32 1 0,20 3,00

Outros ................ 61 0 - -

TOTAL ............... 938 148 - 16,00

FONTE DOS DADOS BRUTOS: BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego. RAIS:Relação Anual de Informações Sociais. Brasília: O Ministério, 2001.

(1) Campo Novo não possuía estabelecimentos registrado no setor.

Comparando-se as Tabelas 5 e 6, observa-se que aposição dos municípios dentro do Corede NoroesteColonial, segundo o grau de especialização, é diferente,conforme se adota como critério o número deestabelecimentos ou o de empregados para o cálculo doquociente locacional. Isso pode ser explicado pelo fatode haver uma certa disparidade no número médio deempregados por empresa entre os municípios. Mesmoapresentando o maior número de trabalhadores no ramotêxtil, em 2001, o Município de Três Passos não é o maisespecializado dessa região, pois o conjunto detrabalhadores está disperso em outros setores da indústrialocal.

Os indicadores do quociente locacional que medemo grau de especialização da indústria metal-mecânica,

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-se o número de empregados no setor confrontado como volume total de empregos no conjunto da atividadeindustrial em cada município.

Como pode ser observado na Tabela 8, há uma forteespecialização na indústria metal-mecânica, segundo onúmero de empregados, nos Municípios de Panambi eCondor, nos quais 73% e 63%, respectivamente, dostrabalhadores industriais estão ocupados em empresasdesse setor industrial. Mesmo possuindo um númeroimportante de trabalhadores ocupados, o grau deespecialização do Município de Ijuí nesse setor deatividade é baixo, o que se explica pela presença de umnúmero maior de empregos gerados em outros setoresda atividade industrial nesse município.

A observação conjunta das Tabelas 7 e 8 permiteconstatar que a maior especialização na região NoroesteColonial, no setor metal-mecânico, se encontra noMunicípio de Panambi, tanto em relação ao número deestabelecimentos (36%) quanto ao de empregados comcarteira assinada (73%).

Tabela 8

Quocientes locacionais da indústria metal-mecânica, segundo o número de empregados, para os municípios do Corede

Noroeste Colonial do RS — 2001

NÚMERO DE EMPREGADOS

EMPREGOS NO SETOR

ORDEM MUNICÍPIOS (1) Total Setor QL

% do Total

1 Panambi ............. 3 714 2 726 1,87 73,00

2 Condor ............... 178 113 1,62 63,00

3 Ajuricaba ............. 67 14 0,53 21,00

4 Ijuí ....................... 2 111 440 0,53 21,00

5 Humaitá .............. 50 6 0,31 12,00

6 Santo Augusto ... 181 16 0,23 9,00

7 Tenente Portela .. 265 21 0,20 8,00

8 Augusto Pestana 47 2 0,11 4,00

9 Catuípe .............. 101 4 0,10 4,00

10 Crissiumal ........... 222 6 0,07 3,00

11 Pejuçara ............. 57 1 0,04 2,00

12 Três Passos ....... 1 148 14 0,03 1,00

Outros ................ 425 - - -

TOTAL ............... 8 634 3 382 - 39,00

FONTE DOS DADOS BRUTOS: BRASIL. Ministério do Trabalho e Emprego. RAIS: Relação Anual de Informações Sociais. Brasília: O Ministério, 2001.

(1) Campo Novo e São Martinho não possuíam empregados registrados no setor.

5 - Conclusões

Os resultados obtidos neste trabalho permitemconcluir que as indústrias de madeira e mobiliário, têxtile metal-mecânica apresentam uma distribuiçãorelativamente uniforme (baixo grau de concentração) entreos Coredes do Estado. Entre os municípios do CoredeNoroeste Colonial, entretanto, existe uma distribuição nãouniforme (alto grau de concentração) nos setores demadeira e mobiliário, têxtil e metal-mecânico, quando setoma por base o número de empregados, em especialquando se trata da indústria metal-mecânica.

No interior do Corede Noroeste Colonial, existe umaespecialização industrial, em alguns municípios, nossetores de madeira e mobiliário e metal-mecânico,principalmente quando se considera o número deempregados com carteira assinada. Crissiumal é omunicípio com maior especialização na indústria demadeira e mobiliário, enquanto Panambi é o municípiomais especializado no setor metal-mecânico. O setor têxtilé o que apresenta os menores índices de especialização,em termos tanto de número de estabelecimentos comode empregados.

Por fim, deve-se destacar que o quocientelocacional apresenta algumas limitações para identificaro grau de especialização industrial, já que ele nãoconsidera adequadamente o grau absoluto deindustrialização do município analisado. Assim, algunsresultados obtidos indicam um alto grau de especializaçãoem alguns ramos industriais, em municípios cujo setorindustrial apresenta um papel praticamente nulo na suadinâmica de desenvolvimento. Tais resultados aconselhamprudência na interpretação dos valores de QL obtidos,especialmente quando se pretenda utilizá-los naidentificação de aglomerados industriais como base paraa elaboração de políticas de desenvolvimento. Nessesentido, devem-se agregar outros dados na análise, quepermitam um melhor dimensionamento dos setoresindustriais não apenas em relação ao conjunto daatividade industrial, mas também em relação à dinâmicaeconômica local no seu todo.

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b) capítulo ou artigo de livro - MIRANDA, José Carlos da Rocha (1997). Dinâmica financeira e política macroe-b) capítulo ou artigo de livro conômica. In: TAVARES, M. C.; FIORI, J. L., orgs. Poder e dinheiro: uma eco-b) capítulo ou artigo de livro - nomia política da globalização. Petrópolis: Vozes, p. 243-275.

c) periódicos - CONJUNTURA ECONÔMICA (2000). Rio de Janeiro: FGV, n. 12, dez.

e) artigos de jornais - SALGUEIRO, Sônia (2000). Autopeças brasileiras conquistam mercado externo. Gazetae) artigos de jornais - Mercantil, São Paulo, p. A-4, 6-8 mar.e) artigos de jornais - PARTICIPAÇÃO de salários no PIB cai para 38% (1997). Folha de São Paulo, Sãoe) artigos de jornais - Paulo, 12 dez., p. 2-5.

f) informação ou texto obtidos pela internet - BNDES (2000). O IED no Brasil e no mundo: principais tendên-f) informação ou texto obtidos pela internet - cias. Sinopse Econômica. Disponível em:f) informação ou texto obtidos pela internet - http://bndes.gov.br/sinopse/poleco.htm Acesso em 21 mar.

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